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Análise comparativa de modelos conceituais

de descrição arquivística: RiC e NEDA


Análisis comparativo de los modelos conceptuales de descripción archivística RiC y NEDA
Comparative analysis of the RiC and NEDA conceptual models for archival description

Marcos Vinicius BITTENCOURT DE SOUZA

Marcos Vinicius Bittencourt de Souza, doctorando en Formación de la Sociedad del Conocimiento,


Universidad de Salamanca (Spain), https://orcid.org/0000-0001-5292-7658, marcos.cpd@ufsm.br

Resumen Abstract
El presente estudio analiza el modelo conceptual es- The spanish conceptual model for archival description
pañol para la descripción archivística (NEDA) y la (NEDA) and the new proposed standard Records in
nueva norma propuesta, Records in Context (RiC), Context (RiC) are analyzed, seeking to identify com-
buscando identificar puntos comunes y equivalencias mon points and equivalences among their entities that
entre sus entidades que puedan facilitar futuras migra- may help future migrations of descriptions and data in-
ciones de descripciones e intercambio de datos. terchange.
Palabras clave: Modelo conceptual. Descripción ar- Keywords: Conceptual model. Archival description.
chivística Records in Context. NEDA-MC. Intercambio Records in Context. NEDA-MC. Data interchange.
de datos.

1. Introdução Nación, 2016b). Na Espanha foram desenvolvi-


dos ainda padrões específicos para as suas re-
A década de 1990 foi de grandes avanços para a giões autônomas, de modo a abranger as suas
descrição arquivística graças à publicação da especificidades, são elas: NOGADA (Norma Ga-
ISAD(G) (General International Standard Archi- lega de Descrición Arquivística) (Grupo de Arqui-
val Description – Norma Geral Internacional de veiros de Galícia, 2010) e NODAC (Norma de
Descrição Arquivística) (ICA, 1994) pelo Interna- Descripción Archivística de Cataluña) (Generali-
tional Council on Archives (ICA – Conselho Inter- tat de Cataluña, 2007). Todas essas normas ci-
nacional de Arquivos). As descrições dos arqui- tadas têm como pedra basilar a ISAD(G), utili-
vos tornaram-se mais uniformes facilitando e pro- zando os seus elementos e áreas de descrição
movendo o intercâmbio entre as instituições cus- fazendo as devidas adaptações de códigos e
todiadoras. Subsequentemente à ISAD(G), o ICA exemplos de aplicação individuais.
criou três normas complementares, com objeti-
vos e usos específicos: a) ISAAR(CPF) (Interna- Na Espanha, em 2017, foi publicado o “Modelo
tional Standard Archival Authority Record for Cor- Conceptual de Descripción Archivística” (NEDA-
porate Bodies, Persons and Families – Norma In- MC) visando a implantação de um novo padrão
ternacional de Registro de Autoridade Arquivís- para a descrição arquivística espanhola, tendo
tica para Entidades Coletivas, Pessoas e Famí- como característica principal a descrição multidi-
lias) (ICA, 2003); b) ISDF (International Standard mensional. Em 2016, o Conselho Internacional
for Describing Functions – Norma Internacional de Arquivos publicou a primeira proposta de um
para Descrição de Funções) (ICA, 2007), e; c) IS- novo padrão de descrição arquivística, nomeado
DIAH (International Standard for Describing Insti- “Records in Context” (ICA, 2016) que igualmente
tutions with Archival Holdings – Norma Interna- apresenta a característica de ser multidimensio-
cional para Descrição de Instituições com Acervo nal.
Arquivístico) (ICA, 2008). Após a publicação das O presente estudo analisa os padrões “Records
normas, diversos países e regiões iniciaram es- in Context” e NEDA-MC procurando identificar in-
forços para a criação de normas específicas com tersecções de conceitos e aplicações assim
o intuito de adaptá-las às suas realidades arqui- como diferenças entre si, buscando apoiar futu-
vísticas, como são os casos da NOBRADE ros esforços de migrações entre os padrões. Pri-
(Norma Brasileira de Descrição Arquivística) meiramente são apresentados os padrões inter-
(CONARQ, 2006), NORDA (Norma Dominicana nacionais em uso ISAD(G), ISAAR (CPF), ISDF
de Descripción Archivística) (Archivo Nacional de e ISDIAH. Após são exploradas algumas das
la Nación, 2019a), NUDA (Norma Uruguaya de
Descripción Archivística) (Archivo General de la

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adaptações realizadas a níveis nacionais e regi- arquivística, fornecendo um ponto de partida em


onais. Após, são apresentados os padrões comum.
NEDA-MC e “Records in Context”, seguido pela
De maneira inovadora, o modelo apresenta a ca-
análise comparativa entre os padrões e as con-
racterística de focar em uma descrição multidi-
clusões encontradas no estudo.
mensional, não priorizando a hierarquização das
entidades de arquivo, tal como acontece com a
2. Normas ISAD(G), ISAAR(CPF), ISDF ISAD(G). A descrição não é mais focada so-
e ISDIAH mente nos documentos, mas traz à luz a neces-
A construção da primeira norma do ICA, a sidade de se descrever os contextos ao qual se
ISAD(G) trouxe uma mudança de paradigma no inserem, mudando o paradigma estabelecido até
campo da descrição arquivística, mudando o foco então.
anterior que era voltado principalmente à criação Conforme são identificadas as características do
de instrumentos de acesso para a descrição do contexto, descrevem-se as entidades correspon-
patrimônio arquivístico através de elementos de dentes relacionando-as aos documentos e de-
descrição. Essa mudança permitiu a criação de mais elementos construindo uma rede de cone-
mecanismos que facilitam a gestão dos itens do- xões que enriquece o arquivo. Além disso é favo-
cumentais sem prejudicar a localização e dispo- recida a reutilização das entidades, permitindo
nibilização do acervo documental (Lannes-Pa- que a atualização dos atributos de um determi-
drón, 2011, p.45). nado elemento do contexto sejam refletidas em
A normalização da descrição arquivística, promo- todos os documentos os quais possui relação,
vida pelo ICA, permitiu a interoperabilidade e fa- melhorando a qualidade das informações (Za-
cilitou a troca de informações entre diferentes ar- lama, 2018).
quivos. Como vantagem, as descrições podem O modelo apresenta seis entidades principais
ser realizadas uniformemente através de ele- que “constituem classes de objetos da realidade
mentos padronizados, facilitando o acesso de arquivística” (CNEDA, 2017, p. 9): a) Documen-
usuários de arquivos e integrações de sistemas tos de arquivo; b) Agente; c) Função e suas divi-
de informação. sões; d) Norma; e) Conceito, objeto e aconteci-
A metodologia adotada nas normas do ICA foi a mento; e f) Lugar.
de descrição multinível unidimensional, configu- A entidade “Documentos de arquivo” foi subdivi-
rando uma hierarquia entre os elementos a guiar dida em tipos que permitem acomodar a reali-
a descrição do elemento mais genérico do ar- dade presente nos arquivos. Aos agrupadores de
quivo até o item documental. Essa abordagem documentos, foram reservados oito subtipos: a)
visa o reaproveitamento de informações de ní- Grupo de fundos; b) Fundo; c) Divisão de fundo
veis superiores ao mesmo tempo em que, à me- ou de grupo de fundos; d) Séries; e) Subsérie; f)
dida em que a descrição avança no sentido dos Fração de série ou de subsérie; h) Coleção; I) Di-
documentos, detalhes específicos de cada nível visão de coleção. A representação dos documen-
vão sendo inseridos (ICA, 2000, p.12). tos em si e seus componentes é realizada atra-
vés dos subtipos, respectivamente, Unidade do-
3. NEDA-MC cumental e Componente documental.
Em 2007, foi criada na Espanha a Comissão de A entidade “Documentos de arquivo” juntamente
Normas Espanholas de Descrição Arquivística com os seus subtipos representam a granulari-
(CNEDA - Comisión de Normas Españolas de dade dos níveis de agrupadores de documentos,
Descripción Archivística) com o objetivo de as- partindo do nível mais genérico até o nível mais
sessorar a descrição arquivística espanhola específico dos documentos.
desenvolvendo e atualizando as normas do país A entidade “Agente” representa os agentes res-
(CNEDA, 2017, p.6). O trabalho da comissão de ponsáveis por interagir com os elementos do ar-
imediato identificou a necessidade de atualizar a quivo através de eventos, tais como a produção
norma nacional iniciando o processo de elabora- do documento, gestão documental e a própria
ção que levaria à publicação, em 2017, do docu- descrição arquivística. Essa entidade apresenta
mento “Modelo Conceptual de Descripción Archi- três subtipos: a) Instituição; b) Família; c) Pes-
vística: entidades, relaciones y atributos” (Mo-
soa. A entidade Agente apresenta uma estreita
delo Conceitual de Descrição Arquivística: enti- relação com a ISAAR(CPF) que prevê a descri-
dades, relações e atributos) (CNEDA, 2017).
ção dos atores que interagem com o arquivo. A
O modelo tem o intuito fornecer apoio à constru- descrição de entidades custodiadoras de docu-
ção de novos padrões espanhóis de descrição

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mentos, função principal da norma ISDIAH, uti- para cada uma. No entanto, o CNEDA deixa claro
liza a entidade Instituição, um dos subtipos da que podem ser criados tipos que se adaptem às
entidade Agente. realidades específicas de cada instituição custo-
diadora (CNEDA, 2017, p.10).
Para preencher o papel da ISDF, no NEDA-MC
foi adicionada a entidade “Função e suas di- O modelo define, ainda, um conjunto de relações
visões”, que possui quatro subtipos: a) Função; possíveis entre as entidades existentes. Para o
b) Divisão de função; c) Atividade ou processo; CNEDA (2017, p.21), as relações são partes fun-
d) Ação. As descrições que utilizam tais entida- damentais do modelo, uma vez que “[…] preser-
des permitem a identificação das ações efetua- vam o significado, o valor testemunhal, o con-
das sobre os elementos do arquivo desde a ges- texto e a acessibilidade dos documentos do ar-
tão documental até as rotinas de preservação. quivo através do tempo”. São previstas relações
sob sete perspectivas diferentes: 1) Contexto e
O modelo conta ainda com as entidades “Norma”
valor testemunhal dos documentos; 2) Estrutura
que descreve os marcos legais que regem os do-
dos documentos; 3) Conteúdo dos documentos e
cumentos ou ainda as ações executadas pelos
valor informativo; 4) Associação entre documen-
agentes, complementando o contexto dos docu-
tos; 5) Vinculação entre agentes; 6) Estrutura das
mentos e respaldando os eventos realizados.
funções, e; 7) Associação entre funções. O
A entidade “Lugar” permite a descrição de uma NEDA-MC apresenta ainda os atributos das enti-
localização geográfica, seja através da sua iden- dades e das relações que “[…] representam ca-
tificação exata com coordenadas de latitude e racterísticas informativas que se consideram de
longitude, por exemplo, ou através da identifi- utilidade para o conhecimento de tais entidades
cação de uma área, povoado, reinado, etc. e relações” (CNEDA, 2017, p.48, tradução
nossa). De forma a esclarecer os usos dos atri-
Por último, a entidade “Conceito, objeto y acon- butos, o modelo detalha as suas utilizações, obri-
tecimento” permite a descrição de entidades que gatoriedades e restrições de uso, adicional-
não se encaixem no perfil das outras entidades
mente.
definidas. Dessa forma, torna-se possível a
adição de outras descrições que ajudam a enri- Um ano antes da publicação do modelo concei-
quecer o contexto do arquivo, assim como auxi- tual espanhol, o Conselho Internacional de Arqui-
liam a descrição do conteúdo dos documentos. vos publicou a sua nova proposta de norma para
descrição arquivística, nomeada Records in Con-
text (RiC). Embora os modelos sejam contempo-
ISAD(G) ISAAR(C ISDF ISDIAH râneos e as suas comissões de elaboração pos-
PF)
suam membros em comum, o resultado de cada
Documentos Agente Funções e Instituição órgão mostrou-se distinto, apresentando entida-
de Arquivo suas (subtipo de des, atributos e relações diferentes. Mesmo dife-
divisões Agente) rentes, ambos compartilham o conceito central da
Grupo de Instituiçã Função e multidimensionalidade das descrições.
fundos, o Divisão de
Fundo e função
Divisão de
4. Records in Context (RiC)
fundos
Em 2012, o ICA constituiu o Grupo de Especia-
Séries, Família Atividade ou listas em Descrição arquivística (Experts Group
Subsérie e Processo on Archival Description – EGAD) e a ele atribuiu
Fração de a missão de desenvolver o novo padrão interna-
série ou de
subséries cional de descrição arquivística. O trabalho foi re-
conhecido pelo próprio EGAD como um “desafio
Coleção e Pessoa assustador” (ICA, 2016 p.1) à medida em que
Divisão de
coleção
visa contemplar a realidade heterogênea dos ar-
quivos mundiais.
Tabela I. Entidades NEDA-CM e relações com as O processo foi conduzido de forma colaborativa
normas ICA ( adaptado de CNEDA, 2017)
recebendo as contribuições da comunidade ar-
quivística mundial. A primeira proposta elabo-
A Tabela I resume as relações das entidades rada pelo EGAD foi exposta no documento “Re-
NEDA-MC com as normas ICA.As entidades pro- cords in Context: A Conceptual Model for Archival
jetadas no modelo conceitual são consideradas Description. Consultation Draft v0.1” (“Records in
obrigatórias e devem existir nos sistemas de des- Context: Modelo Conceitual para Descrição Ar-
crição arquivística que implementem o modelo, quivística. Rascunho de consulta versão 0.1.”)
mesmo que não existam descrições realizadas

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(ICA, 2016). Como o próprio documento escla- paradigma de orientação a objetos. Essa meto-
rece, é apresentado um rascunho a ser estudado dologia permite que as entidades herdem as pro-
e analisado por arquivistas e demais profissio- priedades e comportamentos das classes superi-
nais envolvidos na descrição arquivística a fim de ores, facilitando a manutenção e evitando a repe-
gerar um entendimento comum que embase a fi- tição de informações (Snyder, 1986). Em alguns
nalização do modelo conceitual. casos, o modelo apresenta até quatro níveis de
herança das entidades.
A ideia principal e norteadora do modelo é relaci-
onar o documentos ao seus contextos criando
uma descrição rica em elementos que expressa • RiC-E01 Thing
a sua proveniência (Llanés-Padron; Moro-Ca-
bero, 2017). Ao se descrever um documento, de • RiC-E02 Record Resource
pronto são identificados dados externos a ele,
pertencentes ao contexto o qual está emergido, • RiC-E03 Record Set
fazendo com que seja necessária a descrição • RiC-E04 Record
dos outros elementos (Zalama, 2018, p.33). Tais
descrições devem se tornar independentes, po- • RiC-E05 Record Part
rém relacionadas entre si aprimorando o contexto
• RiC-E06 Instantiation
geral do acervo arquivístico.
Na realidade atual, dos documentos digitais e da • RiC-E07 Agent
pós-custodialismo, em que muitas vezes os do- • RiC-E08 Person
cumentos são elaborados e produzidos colabo-
rativamente, o RiC busca dilatar o conceito origi- • RiC-E09 Group
nal da proveniência, permitindo que os documen-
tos descritos pertençam a mais de um fundo, por • RiC-E10 Family
exemplo, graças aos relacionamentos previstos • RiC-E11 Corporate Body
no modelo (ICA, 2016). Segundo Llanés-Padrón
e Moro-Cabero (2017), o RiC se adapta aos no- • RiC-E12 Position
vos tempos e contribui na gestão documental,
• RiC-E13 Mechanism
preservação de documentos e reutilização de da-
dos através da sua maneira como prevê a descri- • RiC-E14 Event
ção dos contextos.
• RiC-E15 Activity
Após a primeira rodada de recebimento de con-
tribuições da comunidade arquivística, o EGAD • RiC-E16 Rule
realizou um intenso trabalho para efetivar as al-
terações sugeridas e, em dezembro de 2019, pu- • RiC-E17 Mandate
blicou a primeira versão da ontologia referente ao • RiC-E18 Date
RiC (RiC-O) (ICA, 2019b) e a prévia da segunda
versão do modelo conceitual (ICA, 2019a). • RiC-E19 Single Date

Mesmo que o caráter do documento seja de ver- • RiC-E20 Date Range


são prévia, o ICA elucida que ele já substitui a
versão 0.1 anterior (ICA, 2016) e, embora não • RiC-E21 Date Set
seja o documento completo do modelo concei- • RiC-E22 Place
tual, “[…] inclui as principais seções do RiC-CM:
entidades, seus atributos, e relações que podem Tabela II. Entidades do modelo RiC
existir entre elas” (ICA, 2019c, tradução nossa). (elaborado a partir de ICA, 2019a)
A publicação visa apoiar a compreensão da ver-
são v0.1 da ontologia RiC-O “[…] provendo con-
texto para as classes, propriedades e apresen- O modelo apresenta 22 entidades, sendo a enti-
dade RiC-E01 Thing, a mais genérica e conside-
tando a lógica geral da RiC-O […]” (ICA, 2019c,
rada a raiz de todas. Nela são definidas proprie-
tradução nossa). A finalização da versão 0.2 do
dades e comportamentos que são herdados por
modelo conceitual está prevista para ser disponi-
bilizada para o ano de 2020 adicionando exem- todas as outras entidades. Por seu caráter mais
genérico, o seu uso deve se restringir aos casos
plos de uso, definições mais acuradas e docu-
em que as demais entidades não consigam re-
mentações de apoio.
presentar o conceito a ser descrito tais como con-
O projeto de entidades do RiC-CM foi realizado ceitos abstratos e movimentos culturais, por exe-
através da hierarquia de entidades, utilizando mplo (ICA, 2019). A Tabela II exibe os tipos de
conceitos bem estabelecidos e concretizados no

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entidades presentes no RiC, sendo possível no- de um processo. A entidade possui o subtipo
tar que todas descendem da entidade RiC-E01 RiC-E15 Activity que está ligada às atividades
Thing e que a entidade RiC-E07 Agent possui que as pessoas desenvolvem para a realização
dois níveis de subtipos associados à ela. de um determinado processo.
A entidade RiC-E02 Record Resource possui três A entidade RiC-E16 Rule rege as normas que
subtipos: a) RiC-E03 Record Set: representa os embasa a atuação dos agentes no desenvolver
agrupadores de documentos geralmente relacio- de suas atividades em interação com os elemen-
nados ao Plano de Classificação de Documentos tos do arquivo. A entidade RiC-E17 Mandate é
da instituição (PCD), como fundos, coleções ou um subtipo de RiC-E16 Rule sendo usada para
séries; b) RiC-E04 Record: representa o docu- representar explicitamente leis, mandatos ou, até
mento arquivístico a ser descrito; c) RiC-E05 Re- mesmo, um plebiscito que resguardam as ações
cord Part: se refere a uma parte integrante de um tomadas por agentes.
documento, sem o qual não pode existir separa-
A representação de datas e períodos de im-
damente, estando sempre atrelada ao docu-
portância para o arquivo é realizada através da
mento ao qual pertence.
entidade RiC-E18 Date e seus subtipos: a) RiC-
A entidade RiC-E06 Instantiation é herdeira di- E19 Single Date: utilizada para um instante único
reta de RiC-E01 Thing e não possui subtipos. O do tempo, como uma data histórica; b) RiC-E20
seu uso deve ser realizado para descrever as for- Date Range: delimita um período relacionado aos
mas de representações dos documentos arqui- documentos como, por exemplo, uma década ou
vísticos. Para exemplificar o seu uso, pode-se um semestre acadêmico; c) RiC-E21 Date Set:
pensar na descrição de um documento digitali- representa um conjunto de vários tempos distin-
zado, com o seu original em papel, descrito com tos, empregada, por exemplo, para descrever as
a entidade RiC-E04 Record. Nesse caso, deve- faixas temporais de documentos contidos em um
se criar duas instâncias da entidade RiC-E06 Ins- RiC-E03 Record Set. A exatidão das datas utili-
tantiation para descrever as características espe- zadas na tarefa de descrição nem sempre é pos-
cíficas da representação original em papel e para sível de ser verificada, sendo muitas vezes apro-
a descrição das características da representação ximada. Para sinalizar esse grau de incerteza, as
digital. Cada uma das representações possuirá entidades que representam as datas possuem o
informações diferentes contendo os detalhes dos atributo RiC-A26 Certainty.
seus suportes, por exemplo.
Os lugares físicos pertinentes à descrição devem
A entidade RiC-E07 Agent tem o papel de regis- ser representados através da entidade RiC-E22
trar a descrição das figuras que interagem ou Place, podendo representar uma localização
estão relacionadas aos elementos do arquivo, geográfica bem delimitada com coordenadas de
como arquivistas, autores, produtores, etc. A en- latitude e longitude, como também para descre-
tidade possui quatro subtipos: 1) RiC-E08 Per- ver uma região ou um povoado constituído.
son: descreve seres humanos ou uma personali-
A versão 0.2 do RiC (ICA, 2019) prevê 78 tipos
dade existente que interage com o arquivo; 2)
de relações entre as entidades do modelo, repre-
RiC-E09 Group: representa grupo de agentes re-
sentando uma redução drástica nessa quanti-
conhecido no contexto social; 3) RiC-E12 Posi-
dade que, na versão 0.1 era de 792 (ICA, 2016).
tion: descreve um cargo ocupado por um agente
O alto número de relações da versão anterior foi
e que existe independente da existência do
alvo de sérias críticas da comunidade arquivís-
agente, como, por exemplo, presidente da repú-
tica, pois tornaria o modelo burocrático, de difícil
blica; 4) RiC-E13 Mechanism: utilizado para des-
entendimento e implementação nos sistemas de
crever um sistema ou software que, por exemplo,
descrição (Conselho Nacional de Arquivos, 2016;
produziu um determinado documento.
Gillean, 2017; Interpares Trust, 2016).
A entidade RIC-E09 Group ainda se subdivide
A forma como as informações são informadas em
em dois tipos: 1) RiC-E10 Family: utilizado para
cada entidade e/ou relação são apresentadas
descrever uma família, um relacionamento social
como atributos, totalizando 41 atributos de enti-
reconhecido como família ou, até mesmo, uma
dades e 5 atributos de relações de entidades.
dinastia; 2) RiC-E11 Corporate Body: representa
um determinado órgão, entidade ou instituição O uso dos relacionamentos entre as entidades do
que se relaciona com as demais entidades do arquivo auxilia a descrever o contexto de pro-
modelo. dução e gerenciamento dos documentos assu-
mindo um alto grau de importância no registro
Os acontecimentos presentes no arquivo são
das ações realizadas durante a história dos do-
descritos com a entidade RiC-E14 Event, regis-
cumentos (ICA, 2019). Dessa forma, a descrição
trando, por exemplo, a produção de um docu-
arquivística deve procurar identificar o máximo
mento, verificações de integridade e tramitações

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de ligações possíveis entre os elementos a fim A entidade NEDA Agente possui mapeamento di-
de que se conheçam mais detalhes sobre o con- reto para a entidade RiC-E07 Agent. Os seus
texto dos documentos, incrementando inclusive o subtipos Instituição, Família e Persona, da
grau de autenticidade dos elementos descritos. mesma forma, possuem os seus corresponden-
tes RiC-E11 Corporate Body, RiC-E10 Family e
Da mesma forma como as entidades, as relações
RiC-E08 Person, respectivamente. O subtipo
foram elaboradas através de hierarquia, sendo a
RiC-E12 Position não possui entidade equiva-
relação “RiC-R001 is related to” a relação raiz e
lente projetada no NEDA, no entanto, o Portal de
mais genérica, da qual todas as demais descen-
Arquivos Espanhóis (Portal de Archivos Españo-
dem.
les – PARES) utiliza na prática uma entidade com
características semelhantes para registrar a po-
5. Mapeamento das entidades sição ou cargo de um agente. O subtipo RiC-E13
entre os modelos conceituais Mechanism não encontra correspondência no
A fim de auxiliar a migração das descrições rea- modelo NEDA.
lizadas em um modelo para outro modelo, são O mapeamento da entidade NEDA Função e
apresentadas as correlações e entre as entida- suas divisões deve ser feito através da entidade
des dos modelos. Pode-se inferir que a entidade RiC-E14 Event e o seu subtipo RiC-E15 Activity.
“Documentos de arquivo” do modelo NEDA co- As entidades NEDA Função, Divisão de função e
rresponde à entidade RiC-E02 Record Resource. Ação correspondem à própria entidade RiC-E14
A Tabela III exibe a correspondência dos subti- Event, enquanto a entidade NEDA Atividade/pro-
pos da entidade NEDA “Documentos de arquivo” cesso corresponde à entidade RiC-E15 Activity.
para as entidades do RiC. É possível notar que O modelo NEDA torna clara a relação hierárquica
oito subtipos da entidade NEDA correspondem à das funções, o que não acontece no RiC, no en-
uma entidade do RiC. Dessa forma, a descrição tanto, é prevista a relação “RiC-R006 has sub
de todos os agrupamentos de documentos do event” a ser usada para compor arranjos de
NEDA pode ser realizada com o uso da entidade eventos e atividades.
RiC-E03 Record Set, que possui o atributo RiC- A entidade NEDA Norma corresponde à entidade
A36 Record Set Type para diferenciar o tipo de RiC-16 Rule podendo-se utilizar conforme o caso
agrupamento que está sendo descrito, caso ne- e, após uma análise criteriosa, a entidade RiC-17
cessário. Esse atributo equivale também à pro- Mandate.
priedade “3.1.4 Level of description” da ISAD(G)
que “identifica o nível de arranjo da unidade de Os lugares físicos representados pela entidade
descrição” (ICA, 2000, p.16, tradução nossa). NEDA Lugar são mapeados diretamente para a
entidade RiC-E22 Place. Enquanto no NEDA a
entidade Lugar possui somente o tipo de relação
Entidade NEDA Entidade RiC “é assunto de”, no RiC, a entidade RiC-E22 Place
possui as relações “RiC-R074 is place associa-
Documento de arquivo RiC-E02 Record Resource
ted”, “RiC-R075 is location of”, “RiC-R076 is juris-
Grupo de fundos RiC-E03 Record Set diction of”, “RiC-R007 contains”, “RiC-R077 is ad-
jacent to” e “RiC-R078 overlaps”.
Fundo
As demais abstrações do mundo real que neces-
Divisão de fundos/ Grupo
de fundos
sitam ser descritas e não se encaixam nas defi-
nições das outras entidades devem utilizar a en-
Série tidade NEDA “Conceito, objeto e acontecimento”,
Subsérie
podendo se relacionar normalmente com as de-
mais entidades do modelo. Similarmente, no RiC,
Fração de série/ Subsérie a entidade raiz RiC-E01 Thing pode ser utilizada
Coleção para descrever conceitos que não se enquadram
nos tipos das demais entidades, no entanto, a
Divisão de coleção sua utilização desordenada pode tornar a inter-
Unidade documental RiC-E04 Record pretação das descrições difícil, assim como a mi-
gração para outros modelos conceituais.
Componente documental RiC-E05 Record Part
Uma atenção especial foi dada às datas no RiC,
Tabela III. Mapeamentos das entidades dedicando quatro entidades para registrar esse
"Documentos de arquivo" tipo de informação, já no NEDA, as datas devem
ser informadas nos atributos das entidades e re-
lações, quando necessário. Do ponto de vista de

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representação da informação, projetar uma enti- Referências


dade específica para as datas e períodos permite
Archivo General de la Nación (República Dominicana) (2019).
que sejam feitas relações delas com as entida- NORDA: Norma Dominicana de Descripción Archivística.
des, facilitando o entendimento global da descri- Santo Domingo, República Dominicana.
ção do arquivo. A forma como diversas universi- Archivo General de la Nación (Uruguai) (2016). NUDA:
dades funcionam, através de semestres acadêmi- Norma Uruguaya de Descripción Archivística. Montevi-
cos, se torna refletida com a utilização dessa en- deo, Uruguai.
tidade e suas relações com os documentos pro- CNEDA. Comisión de Normas Españolas de Descripción Ar-
duzidos no decorrer desse período, por exemplo. chivística (2017). NEDA-MC: modelo conceptual de des-
cripción archivística: entidades, relaciones y atributos.
Conselho Nacional de Arquivos (2016). RIC-CM: consultation
6. Conclusões draft v0.1. Comments by Brazilian Rio de Janeiro Group
and Câmara Técnica de Documentos Eletrônicos of Con-
A utilização de padrões para a descrição arqui- selho Nacional de Arquivos. (Dezembro, 2016).
vística visa o estabelecimento de um entendi- Conselho Nacional de Arquivos (2006). NOBRADE: Norma
mento universal na comunidade assim como a Brasileira de Descrição Arquivística. Rio de Janeiro, Bra-
normalização das informações inseridas. Os pa- sil. http://www.siga.arquivonacional.gov.br/images/public
acoes/nobrade.pdf (2020-04-20).
drões internacionais buscam fornecer meios para
que possa haver integração entre as plataformas Generalitat de Cataluña (2007). NODAC: Norma de Descrip-
ción Archivística de Cataluña. Barcelona, Espanha.
de descrição e promover o intercâmbio de dados
Gillean, Dan (2017). Artefactual response to RiC-CM Draft.
entre as instituições. https://groups.google.com/d/msg/ica-atom-users/QwSor
Os padrões nacionais, como é o caso do NEDA- 7OQ90U/DpsDM1P5BAAJ (2020-03-18).
MC, visam adaptar a descrição para a realidade Grupo de Arquiveiros de Galícia (2010). NOGADA: Norma
Galega de Descrición Arquivística.
de cada país conforme os seus usos práticos. No
Interpares Trust (2016). InterPARES Trust response to
entanto, para que as descrições possam navegar EGAD-RiC. https://interparestrust.org/trust/article/interpa
e se mesclar entre as instituições, é necessário res-trust-response-to-egadric (2020-03-18).
haver um mapeamento desses modelos regio- Llanes-Padrón, Dunia (2011). La representación nornalizada
nais para um modelo comum interpretável por de los documentos. Estudio comparado de normas de
outros países, como é o caso dos padrões inter- descripción. Tesis doctoral (Doctorado en Bibliotecono-
mía y Documentación). Salamanca: Universidad de Sala-
nacionais. manca, Julio, 2011. 766 p.
O ICA, através do modelo conceitual e a ontolo- Llanes-Padrón, Dunia; Moro-Cabero, Manuela (2017). Re-
gia do RiC, pretende criar um ponto comum da cords in contexts: Un nuevo modelo para la representa-
ción de la información archivística en el entorno de la web
descrição arquivística que possa ser usado glo- semántica. // El Profesional de la Información. 26: 3 (Ju-
balmente e, na medida necessária, ser adaptado nio, 2017) 525-533.
às realidades peculiares de cada instituição cus- ICA. International Council on Archives (2000). ISAD(G): Ge-
todiadora de documentos. O processo de elabo- neral International Standard Archival Description: adop-
ração do modelo ainda está em andamento, pois ted by the Committee on Descriptive Standards,
Stockholm, Sweden, 19-22 September 1999. 2nd ed. Ot-
prevê o recebimento de colaborações da comu- tawa: International Council on Archives, 2000.
nidade arquivística. Assim mesmo, a realização
ICA. International Council on Archives (2004). ISAAR (CPF):
de estudos das versões prévias deve ser reali- International Sstandard Archival Authority Record for Cor-
zada e incentivada a fim de embasar futuras mu- porate Bodies, Persons and Families. 2nd. ed. Canberra,
danças no modelo. Australia: Committee on Descriptive Standards, 2004.
ICA. International Council on Archives (2007). ISDF: Interna-
Sabe-se que, após a finalização do modelo, no- tional Standard for Describing Functions. 1st. ed. Desden,
vos estudos serão necessários para identificar as Germany: Committee on Best Practices and Standards,
mudanças e adaptações necessárias tanto na 2007.
metodologia de descrição quanto nas ferramen- ICA. International Council on Archives (2008). ISDIAH: Inter-
tas de descrição. Da mesma forma, a migração national Standard for Describing Institutions with Archival
Holdings. 1st. ed. London, United Kingdom: Committee
das descrições existentes, deve ser realizada on Best Practices and Standards, 2008.
cuidadosamente para que não hajam erros ou ICA. International Council on Archives (2016). Records In
perda dos dados, envolvendo, sempre que pos- Context: a Conceptual Model for Archival Description.
sível, equipes de arquivistas e profissionais dos Consultation Draft v0.1 ed. Experts Group on Archival
sistemas gerenciadores de documentos. O pre- Description, 2016.
sente estudo pode ainda auxiliar a guiar os traba- ICA. International Council on Archives (2019). Records In
Context: a Conceptual Model for Archival Description.
lhos futuros de migração para o RiC dos padrões Consultation Draft v0.2 (preview). Experts Group on Ar-
nacionais e regionais que têm as normas chival Description, 2019. https://www.ica.org/sites/defa
ISAD(G), ISAAR(CPF), ISDF e ISDIAH como pe- ult/files/ric-cm-0.2_preview.pdf (2020-03-06).
dra basilar, auxiliando na compreensão dos con- ICA. International Council on Archives (2019). Records In
ceitos envolvidos. Context Ontology. V0.1. ed, 2019. https://www.ica.org
/standards/RiC/ontology.html (2020-03-06).

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