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UNIVERSIDADE FEDERAL DO MARANHÃO

CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS


CURSO DE LICENCIATURA EM TEATRO
CORPO E MOVIMENTO
DOCENTE: TÂNIA CRISTINA COSTA RIBEIRO
DISCENTE: GRAZIELLA NOGUEIRA FROTA

Resenha crítica sobre a conferência “O corpo Utópico”, de Michel Foucault, do


ano de 1966, o qual integra o livro El Cuerpo Utópico.

Em "O corpo utópico", a citação seguinte chama a atenção:


"Meu corpo é o contrário de uma utopia,
é o que jamais se encontra sob outro céu,
lugar absoluto, pequeno fragmento de espaço com o qual,
no sentido estrito, faço corpo" (Foucault, 2013: 7).

Foucault inicia dizendo que o corpo não é o mesmo que uma utopia e ao
mesmo tempo o chama de "utopia" implacável. Afirma que as utopias foram
feitas contra o corpo. Para transfigurá-lo. Torná-lo belo, como num país das
fadas, num país mágico. Logo a seguir expõe também que há uma utopia feita
para apagar o corpo e a relaciona com o país dos mortos, como as múmias ou
até as pinturas e esculturas dos túmulos. Para ressaltar a utopia capaz de
apagar a triste topologia do corpo, cita o grande mito da alma. A alma é "meu
corpo liso, castrado, ar redondeado como uma bolha de sabão" (p. 9). Foucault diz que
a alma, os túmulos, os gênios e as fadas são utopias que podem fazer o corpo
desaparecer. Mas, ao mesmo tempo, o autor fala que o corpo não se deixa
reduzir tão facilmente, pois possui fontes próprias. O corpo utópico é
simultaneamente incompreensível, penetrável e opaco, aberto e fechado,
visível e invisível. Leve, transparente e imponderável. Evidencia ainda que para
que o corpo seja utopia, basta ser um corpo. No decorrer da obra. Foucault
reconhece que se enganou ao dizer que as utopias se voltavam contra o corpo
e tinham como objetivo apagá-lo. Para ele, as utopias nascem do próprio corpo
e talvez retornem contra ele. Certeza somente de que "o corpo humano é o ator
principal de todas as utopias" (2013: 12).

Das utopias dos gigantes, o autor passa para a reflexão sobreas máscaras, a
maquiagem e a tatuagem. Utopias que fazem o corpo se comunicar com
poderes secretos e forças invisíveis, passando de seu espaço próprio para um
espaço outro. Foucault diz ainda que tudo que se refere ao corpo, como a cor,
a tiara, a vestimenta, dentre outros elementos, faz nascer as utopias no corpo.
Além dessa reflexão sobre as coisas, Foucault também discorre sobre a
ligação do corpo com o restante do mundo. Após tecer uma relação intrínseca
entre corpo e mundo, Foucault elege o espelho e o cadáver como responsáveis
por nos ensinar que temos um corpo e que este ocupa um lugar. Graças a eles,
o corpo não é simplesmente utopia. Para o filósofo, o amor, assim como o
espelho e a morte, abranda a utopia do nosso corpo.

Para ele, as utopias nascem do próprio corpo e podem pagar contra ele. No
trecho
“Meu corpo, de fato, está sempre em outro lugar.
Está ligado a todos os outros lugares do mundo,
e, para dizer a verdade, está num outro lugar que é o além do mundo.
É em referência ao corpo que as coisas estão dispostas,
é em relação ao corpo que existe uma esquerda e uma direita,
um atrás e um na frente, um próximo e um distante.
O corpo está no centro do mundo, ali onde os caminhos e
os espaços se cruzam, o corpo não está em nenhuma parte:
o coração do mundo é esse pequeno núcleo utópico a partir do qual sonho,
falo, me expresso, imagino, percebo as coisas em seu lugar
e também as nego pelo poder indefinido das utopias que imagino.
O meu corpo é como a Cidade de Deus, não tem lugar,
mas é de lá que se irradiam todos os lugares possíveis,
reais ou utópicos”(FOUCAULT, 2012).
O corpo é feito e vai se organizando para limitar seus desejos, que faz com
que o ser humano se limite, guardando aquela liberdade, ou seja sua
liberdade, indo pelo decorrer da vida, levando o corpo a muito lugares, a
lugares nenhum, tentando se encontrar na alma do mundo, mas acabando se
enraiando em todos os lugares.

Chega ao uma questão interessante, o que é o corpo? No trecho a seguir


“Meu corpo, utopia desapiedada. E se, por ventura,
eu vivesse com ele em uma espécie de familiaridade gastada,
como com uma sombra, como com essas coisas de todos os dias
que finalmente deixei de ver e que a vida passou para segundo plano,
como essas chaminés, esses telhados que se amontoam
cada tarde diante da minha janela? Mas, todas as manhãs,
a mesma ferida; sob os meus olhos se desenha
a inevitável imagem que o espelho
impõe: rosto magro, costas curvadas, olhos míopes,
careca, nada lindo, na verdade. Meu corpo é uma jaula desagradável
, na qual terei que me mostrar e passear.
É através de suas grades que eu vou falar, olhar, ser visto.
Meu corpo é o lugar irremediável a que estou condenado.”(FOUCAULT,2012.1)

Foucault traz como uma utopia desgastada, como algo em que já não serve
mais, como algo em que ele realmente está preso, o que traz um reflexão
sobre “ eu estou condenada a esse corpo?” com o decorrer do texto lemos
como é que esse corpo é violado, explorado, arrumado, bagunçado e
desprezado. Na verdade quando pensamos, geralmente, esse corpo é passado
na sociedade e ela nos faz levar marcas, a vida nos faz ter cicatrizes, e esse
corpo é o que você vê no espelho, mas as vezes ele é bem mais que isso.

“Corpo incompreensível, penetrável e opaco, aberto e fechado:


corpo utópico. Corpo absolutamente visível – porque
sei muito bem o que é ser visto por alguém de alto a baixo,
sei o Que é ser espiado por trás, vigiado por cima do ombro,
surpreendido quando menos espero, sei o que é estar nu.
Entretanto, esse mesmo corpo é também tomado por uma certa
invisibilidade da qual jamais posso separá-lo.
A minha nuca, por exemplo, posso tocá-la, mas jamais vê-la;
as costas, que posso ver apenas no espelho;
e o que é esse ombro, cujos movimentos e
posições conheço com precisão, mas que jamais
poderei ver sem retorcer-me espantosamente.” ( FOUCAULT, 2012)
No trecho acima o autor fala de um corpo em que pode ser olhando
completamente por outra pessoa, mas por ele somente por um espelho,
trazendo a um olhar de que o corpo realmente é aquele que se mostra, ele
sente seus músculos, mas o seu corpo é diferente do que toca e sente, essa
luta constante de saber como esse corpo se encontra, como se encaixa. No
trecho a seguir, ele reforça a ideia de um corpo fantasma:
“O corpo, fantasma que não aparece senão na
miragem de um espelho e, mesmo assim,
de maneira fragmentada. Necessito realmente dos gênios
e das fadas, e da morte e da alma,
para ser ao mesmo tempo indissociavelmente visível e invisível?
E, além disso, esse corpo é ligeiro, transparente,
imponderável; não é uma coisa: anda, mexe,
vive, deseja, se deixa atravessar sem resistências
por todas as minhas intenções. Sim.
Mas até o dia em que fico doente, sinto dor de estômago e febre.
Até o dia em que estala no fundo da minha boca a dor de dentes.” (FOUCAULT,2012)

Esse corpo que responde, o corpo que se arruma de acordo com suas
vivências e momentos, guardando tudo e ao mesmo tempo mostrando tudo,
ele traz esse corpo que se mostra a sociedade e suas reações ao encontro
disso tudo.
“Talvez seria preciso dizer também que fazer
o amor é sentir seu corpo se fechar sobre si,
é finalmente existir fora de toda utopia,
com toda a sua densidade, entre as mãos do outro.
Sob os dedos do outro que te percorrem, todas
as partes invisíveis do teu corpo se põem a existir,
contra os lábios do outro os teus se tornam sensíveis,
diante de seus olhos semiabertos teu rosto
adquire uma certeza, há um olhar finalmente par
ver tuas pálpebras fechadas. Também o amor,
assim como o espelho e como a morte, acalma
a utopia do teu corpo, a cala, a acalma,
a fecha como numa caixa, a fecha e a sela.” (FOUCAULT, 2012)

Além dessa reflexão sobre as coisas, Foucault também discorre sobre a


ligação do corpo com o restante do mundo. Após tecer uma relação intrínseca
entre corpo e mundo, Foucault elege o espelho e o cadáver como responsáveis
por nos ensinar que temos um corpo e que este ocupa um lugar. Graças a eles,
o corpo não é simplesmente utopia. Para o filósofo, o amor, assim como o
espelho e a morte, abranda a utopia do nosso corpo.
“É por isso que é um parente tão próximo da ilusão
do espelho e da ameaça da morte;
e se, apesar dessas duas figuras perigosas que o rodeiam,
se gosta tanto de fazer o amor é porque, n
o amor, o corpo está aqui.”(FOUCAULT, 2012).
A conferência “O corpo utópico”, de 1966, integra o livro El cuerpo utópico. Las
heterotopías, cuja versão espanhola acaba de ser publicada (Ed. Nueva Vision). Esta
versão está publicada no jornal argentino Página/12, 29-10-2010.

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