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Texto da aula Aulas do curso

História da Igreja Antiga

A heresia gnóstica
Nos primeiros séculos, a fé católica sofreu um duro golpe e quase foi aniquilada pela heresia gnóstica. Deus
levantou grandes santos para combatê-la, todavia, seus resquícios são observados até os dias de hoje. Mais do
que você imagina. Quer saber se o seu pensamento é gnóstico?

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Apesar da grande perseguição sofrida pelos cristãos durante o Império Romano, conforme visto na aula
passada, a Igreja continuou crescendo. Esse fenômeno foi muito bem explicado por Tertuliano, escritor
cristão do terceiro século, que viveu no norte da África: “o sangue dos mártires é semente de novos
cristãos”. Mas, a maior ameaça enfrentada pelo cristianismo recém-nascido foi a dificuldade cultural,
espiritual e religiosa do gnosticismo.

O gnosticismo era um fenômeno religioso e filosófico no qual se encontrava uma explicação para a origem
do mundo, e do mal no mundo, de uma forma mais plausível que a oferecida pelo cristianismo. A pretensa
racionalidade do gnosticismo atraiu um número considerável de pessoas e acabou por adentrar ao seio da
Igreja nascente, de certa maneira parasitando-a, sugando suas forças e fazendo com que os devotos se
tornassem falsos devotos, pois aderiam a uma filosofia estranha ao cristianismo.

Em sua obra “A Igreja dos Apóstolos e dos Mártires”, Daniel-Rops descreveu o gnosticismo, também
chamado de heresia do conhecimento, da seguinte forma:

“O gnosticismo apoiava-se em duas idéias: a da sublime elevação de Deus, idéia tomada dos judeus
dos tempos mais próximos, para quem Javé se tornara infinitamente longínquo e misterioso - o Poder, o
Grande Silêncio, o Abismo -, e a miséria infinita do homem e da sua abjeção. Mostrava-se obsessionado
por dois problemas, exatamente os mesmos que hoje continuam a prender a atenção das inteligências:
o da origem da matéria e da vida, obras tão visivelmente imperfeitas de um Deus que se diz perfeito, e o
do mal no homem e no universo. [...] Deus, único e perfeito, está absolutamente separado dos seres de
carne. Entre Ele e esses seres, há outros seres intermediários, os éones que emanam dEle por via da
degradação; os primeiros assemelham-se a Deus por terem sido gerados por Ele, mas por sua vez
geram outros menos puros, e assim sucessivamente. Cálculos esotéricos de números permitiam dizer
quantas classes de éones havia, e o conjunto formava o mundo completo, os trezentos e sesseta e
cinco graus, o pleroma.” (p.284 e 285)

Assim, para os gnósticos, principalmente para aqueles que seguiam a vertente de Valentino, era impossível
que o Deus Perfeito tivesse criado esse mundo tão imperfeito e cheio de miséria. Criaram então um sistema
de degradação que justificaria o mal no homem e no mundo. Para eles, Deus criou pares de éons (sizígias,
pares ativos-passivos, masculinos-femininos, machos-fêmeas), os quais originaram quatro
casais(octôades), degradaram-se e deram origem a outros cinco casais (décades), novamente degradaram-
se e originaram mais seis casais (duodécades). Quanto mais degradados tanto mais distantes da divindade
(éon). Na última degradação, havia um éon passivo (feminino) chamado Sofia que, tomada pela soberba, quis
dar origem a algo sozinha. Ela criou a matéria e um outro éon muitíssimo imperfeito, chamado Demiurgo.
Daniel-Rops explica de maneira resumida:

“No meio da série, um éon cometeu uma falta: tentou ultrapassar os limites ontológicos e igualar-se a
Deus. Expulso do mundo espiritual, foi obrigado a viver a sua descendência no universo intermediário, e
foi na sua revolta que ele criou o mundo material, obra má e marcada pelo pecado. A este éon
prevaricador alguns gnósticos chamam Demiurgo, e outros o identificam com o Deus criador da Bíblia.”
(p.285)

O Demiurgo, então, “brincando” com a matéria, criou o mundo material. Como ele estava isolado dos demais
éones acabou por crer-se o único e, ainda segundo Valentino, passou a revelar-se aos homens, originando o
Antigo Testamento. Daniel-Rops continua:

“Que acontece ao homem nestas perspectivas? Em si, ele não é integralmente mau, visto que, como
suprema emanação do éon, contém uma centelha divina, um elemento espiritual cativo na matéria e
que aspira a ser libertado. A falta é existir; o mal é a vida. Aqueles que se contentam com existir, os
‘hílicos’ ou ‘materiais’, estão rigorosamente perdidos; aqueles que empreendem pela gnose o caminho
da salvação, os ‘psíquicos’, podem avançar rumo à paz divina; aqueles que renunciaram a toda a vida, os
‘espirituais’, iniciados superiores e almas muito elevadas, são os que se salvam.” (p.285)

Para os gnósticos, Jesus não era o Filho de Deus, mas um éon que, através do conhecimento, guiaria as
pessoas presas à matéria ao verdadeiro Deus. Um psicopompo. O autor de “A Igreja dos Apóstolos e dos
Mártires”, sintetiza:

“Mesmo através de um resumo tão breve, vemos até que ponto tais especulações se opunham ao
cristianismo. A personagem histórica de Jesus desaparecia e Cristo não era mais do que um membro
da hierarquia divina de éones, e a sua carne humana uma espécie de invólucro ilusório da centelha
divina. O ideal cristão da redenção do homem inteiro, alma e corpo, pelo sofrimento e morte de Cristo
encarnado, e o da realização do reino de Deus, eram substituídos por uma espécie de apelo ao nirvana,
pela libertação da alma arrancada às abjeções do mundo material. A moral cristã cedia o lugar a uma
outra moral que, umas vezes brutalmente hostil ao corpo, conduzia a asceses excessivas; e outras, pelo
desprezo da carne, tornava-se complacente e dava livre curso aos instintos.” (p. 285)

A heresia gnóstica possuía um ar de racionalidade muito atraente. A maldade e miséria do mundo era
colocada na conta do Demiurgo, deixando Deus livre. E também pelo fato de que a salvação era algo fácil de
ser conseguido, pois bastava a pessoa tomar ‘conhecimento’ de tudo isso e seria libertada.

Aceitar a gnose significa fazer parte de uma elite, de um grupo de ‘escolhidos’ (os pneumáticos). A missão
destes era levar o conhecimento (a gnose) ao segundo grupo, os ‘psíquicos’. Para o terceiro grupo de
pessoas, os hílicos não havia salvação, posto que não possuíam alma, nasceram para serem destruídos.
O gnosticismo se proliferou de maneira espantosa entre o cristianismo, como bem disse Daniel-Rops,
“como um câncer espiritual”. Era necessário que a Igreja reagisse e assim se deu. “Cada comunidade se
agrupou em torno de seu bispo, que era o legítimo depositário da tradição ortodoxa, e as instituições
cristãs se tornaram mais precisas e rigorosas, para que o ácido da heresia não as corroesse.” (p. 289) Em
especial, surge a figura de Santo Irineu de Lyon, nascido na atual Turquia, provavelmente próximo à Esmirna,
que teve Policarpo como bispo. Policarpo havia conhecido o apóstolo João que, por sua vez, havia sido o
discípulo amado de Jesus. A fim de combater a heresia gnóstica, Santo Irineu usa como argumento a
sucessão apostólica.

A ideia da tradição apostólica é algo bastante documentado ao longo da história. No final do primeiro
século, quando, provavelmente, São João ainda estava vivo, houve um bispo chamado Inácio de Antioquia,
o qual foi levado para Roma a fim de ser martirizado. No caminho, Santo Inácio escreveu diversas cartas e
existem registros de sete delas. Nelas, o santo é enfático ao dizer que para ser Igreja é preciso estar unido
ao Bispo, ao episcopado. “Ubi episcopus, ibi ecclesiae”, onde está o bispo, aí está a Igreja. Em outra carta,
Santo Inácio afirma que é a Igreja de Roma quem preside sobre as demais (a Igreja de Roma preside na
caridade…), ou seja, a Igreja não ficou católica, mas já nasceu católica. Nestas cartas se vê claramente o
princípio da catolicidade, a estrutura e a hieraquia da Igreja.

Santo Irineu viveu depois de Santo Inácio e teve de enfrentar a heresia gnóstica que estava seduzindo o seu
rebanho. Para tanto, ele escreveu a sua maior obra intitulada “Exposição e refutação da falsa gnose”, mais
conhecida como “Adversus haereses” (Contra os Hereges), em cinco volumes:

“(...) nos dois primeiros volumes, Santo Irineu analisa com precisão todas as heresias de seu tempo; diz
ele: “Expor os sistemas é vencê-los, assim como arrancar uma fera das selvas e trazê-la para a luz do
dia é torná-la inofensiva. Por outro lado, nos últimos três volumes, apresenta a doutrina ortodoxa de tal
forma que os erros heréticos não mais serão possíveis. Assim surge um pensamento filosófico e
teológico não tão novo quanto sólido, e que no futuro servirá de base para todo o pensamento cristão.
(...)

Materialmente, não é uma sequência qualquer de pretensos iniciados cujo pensamento não se pode
determinar; é a tradição da Igreja, que todos podem conhecer, a dos bispos, cuja lista se pode
estabelecer, a de Roma, que desempenha aqui um papel eminente. Espiritualmente, não é um dado
fossilizado, que maltrata a inteligência; é um princípio de vida ‘que o Espírito rejuvenesce sem cessar’,
que orienta a razão e lhe determina o fim.” (p. 292)

Um outro fator explorado por Santo Irineu de Lyon no combate às heresias, especialmente ao gnosticismo,
foi a chamada Regula Fidei, ou seja, a Regra de Fé, a reafirmação da fé primeira de que Deus é um só e é Ele
o criador do céu e da terra. Não há outro Deus e se o mundo está mal, não é por causa da matéria - que é
boa -, mas por causa do diabo, seus demônios e dos próprios homens. Para a Igreja Católica o pecado não
tem origem na matéria.

Deste modo, com os três pilares descritos: os bispos (sucessão apostólica), a regula fidei e a Sagrada
Escritura, a Igreja foi respondendo aos poucos a grave dificuldade em que se constituiu a heresia gnóstica

Bibliografia
“A Igreja dos Santos e dos Mártires”, Daniel-Rops, Editora Quadrante. 

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