Você está na página 1de 350

HARUN

O VISÍVEL
PROGRAMANDO

ORGANIZAÇÃO
JANE DE ALMEIDA
PATRÍCIA MORAN
PRISCILA ARANTES

FAROCKI
HARUN

O VISÍVEL
PROGRAMANDO

ORGANIZAÇÃO
JANE DE ALMEIDA
PATRÍCIA MORAN
PRISCILA ARANTES

FAROCKI
COLEÇÃO CINUSP
PRÓ-REITORIA DE CULTURA E
EXTENSÃO UNIVERSITÁRIA
UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO
2017
HARUN

O VISÍVEL
PROGRAMANDO

ORGANIZAÇÃO
JANE DE ALMEIDA
PATRÍCIA MORAN
PRISCILA ARANTES

FAROCKI
UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO CINUSP
REITOR DIRETORA
Dean Director
Marco Antonio Zago Patricia Moran Fernandes

VICE-REITOR VICE-DIRETOR
Vice Dean Vice Director
Vahan Agopyan Cristian Borges

PRÓ-REITOR DE GRADUAÇÃO COORDENAÇÃO DE PRODUÇÃO


Undergraduate School Dean Production Coordinator
Antônio Carlos Hernandes Thiago Afonso de André

PRÓ-REITOR DE PÓS-GRADUAÇÃO ESTAGIÁRIOS


Graduate School Dean Interns
Carlos Gilberto Carlotti Junior Flora Correia, Henrique Casimiro, Joyce
Rossi, Maria Carolina Gonçalves, Renato
PRÓ-REITOR DE PESQUISA Trevizano, Sabrina Santos, Thiago Pereira
Dean Of Research Viera, Thomás Ceschin, Vitor Sepinho,
José Eduardo Krieger Carolina Tiemi, Dharla Soares, Larissa
Castilho, Victor Sousa, Yasmin Canabrava
PRÓ-REITORIA DE CULTURA
E EXTENSÃO UNIVERSITÁRIA ASSISTENTE CONTÁBIL E FINANCEIRO
Culture And Extension Program Division Finance And Accounting Assistant
PRÓ-REITOR DE CULTURA  Moises Santana
E EXTENSÃO
Culture And Extension Program Dean ANALISTA ADMINISTRATIVO
Marcelo de Andrade Romero Administrative Analyst
Rodolfo Ferronato de Souza
PRÓ-REITORA ADJUNTA DE CULTURA
Adjunct Dean Of Culture AUXILIAR ADMINISTRATIVA
Ana Cristina Limogni-França Administrative Support
Maria Aparecida Santos
ASSISTENTE DE GABINETE
Staff Assistant PROJECIONISTA
Karen Regina de Casas Castro Marins Projecionist
Fransueldes de Abreu
HARUN FAROCKI
PROGRAMANDO O VISÍVEL
Programming The Visible

COLEÇÃO CINUSP
CINUSP COLLECTION – VOLUME 10

COORDENAÇÃO GERAL
Coordination
Patrícia Moran

ORGANIZAÇÃO
Organization
Jane de Almeida, Priscila Arantes,
Patrícia Moran

PRODUÇÃO EDITORIAL
Editorial Production
Carolina Ferreira, Thiago de André

PREPARAÇÃO DE ORIGINAIS E REVISÃO


Revision And Proofreading
Adriano C. A. e Sousa

DESIGN GRÁFICO
Graphic Design
Guilherme Falcão
Almeida Jane; Arantes, Priscila; Moran, Patrícia
TRADUÇÃO (Orgs.)
Harun Farocki: Programando o Visível
Translation São Paulo
Brian Mier, Helena Prates Pró-Reitoria de Cultura e Extensão
Universitária – USP
2017
344p; 21 x 15,9 cm
ISBN 978 85 62587 22 1
1.Cinema 2.Harun Farocki 3.Videoinstalação
I.Arantes, Priscila II.Moran, Patricia III.Almeida,
Jane IV. Nesteriuk, Sérgio V.Elsasser Thomas
VI. Suppia, Alfredo
CDD 791.43092
CDU 791
8 12
APRESENTAÇÃO PROGRAMANDO O VISÍVEL
Foreword Programming the Visible
PRISCILA ARANTES JANE DE ALMEIDA
+ PATRÍCIA MORAN
74
10 PROGRAMANDO O VISÍVEL:
APRESENTAÇÃO CONVERSAS ENTRE VILÉM
Acknowledgements FLUSSER E HARUN FAROCKI
JANE DE ALMEIDA Programming the Visible:
Conversations between
Vilém Flusser and Harun Farocki
PRISCILA ARANTES
+ SERGIO NESTERIUK

104
O NOVO CONSTRUTIVISMO:
HARUN FAROCKI E ERIKA
BALSOM CONVERSAM SOBRE
PARALLEL I–IV
The New Constructivism :
Harun Farocki and Erika Balsom
Discuss Parallel I–IV

146
SIMULAÇÃO E O TRABALHO
DA INVISIBILIDADE:
PARALLEL I-IV DE
HARUN FAROCKI
THOMAS ELSAESSER

178
FAROCKI: IMAGENS
E CONVENÇÕES NO JOGO
E NA ARTE
Farocki: Images and Conventions in
the Game and Art
PATRÍCIA MORAN
220
SOBRE UMA POSSÍVEL
FOTOGENIA NOS VIDEOGAMES:
A PROPÓSITO DE PARALLEL I-IV
(2012-2014), DE HARUN FAROCKI
On a Possible Photogenic in Video
games: The Proposal of Parallel I-IV
(2012-2014), by Harun Farocki
ALFREDO SUPPIA

294
INTERFACE
HARUN FAROCKI

336
COLABORADORES
Collaborators

342
FICHA TÉCNICA
8

APRESENTAÇÃO

Promover exposições de artistas fundamentais no cenário artístico nacional e


internacional é uma das estratégias que o Paço das Artes vem desenvolvendo há 46
anos. Foi dentro deste contexto que a instituição recebeu a exposição Programan-
do o visível, de Harun Farocki, com curadoria de Jane de Almeida.

O CINUSP por seu lado, objetiva com suas mostras manter viva a dimensão ensa-
ística do cinema, seu lugar de produtor de pensamento. Convidados pelo Paço e
por Jane de Almeida para curar e acolher uma mostra sobre Harun Farocki, realiza-
da concomitantemente à exposição, de bom grado integrou-se ao evento. O cine-
asta e artista alemão Farocki expressa nossos anseios de reflexão, unir esforços
institucionais engrandece ambas as partes.

Para complementar e ampliar as discussões levantadas pela exposição e mostra, o


CINUSP e o Paço das Artes lançam esta publicação, com textos de pesquisadores
fundamentais sobre a obra de Harun Farocki, possibilitando, assim, um mergulho
na obra do artista que soube transitar como ninguém entre o cinema e a arte con-
temporânea.

O leitor poderá, ainda, ter acesso ao texto produzido por Farocki para Interface
(1995), trabalho que integrou a mostra no Paço das Artes, em conjunto com a
série Paralelo I-IV (2014), e Frases de impacto, imagens de impacto: Uma conversa
com Vilém Flusser.

Com esta publicação, esperamos ampliar a bibliografia em língua portuguesa so-


bre a obra de Farocki, além de contribuir com uma reflexão nacional. Com Farocki
encontramos uma oportunidade de cruzar as fronteiras do cinema e da arte canô-
nicos, pensando a criação contemporânea para além de sua materialidade e de seu
suporte final. A união CINUSP e Paço neste projeto expressa o salutar atravessa-
mento de fronteiras.

PRISCILA ARANTES, Diretora artística e curadora do Paço das Artes


PATRÍCIA MORAN, Diretora do CINUSP
FOREWORD

The Paço das Artes has developed the strategy of promoting exhibitions by
fundamental artists on the national and international scenes over the course of the
past 46 years. It was within this context that the institution received the exhibition
of work by Harun Farocki, Programming the Visible, curated by Jane de Almeida.

CINUSP, the film programming entity within the University of São Paulo, has
helped keep the essayistic dimension of cinema alive as part of its role as a
producer of knowledge. CINUSP was invited by the Paço das Artes and by Jane
de Almeida to curate and host a film series devoted to Farocki that coincided with
the exhibition and that could be integrated with the event. The German filmmaker
and artist Farocki expresses our yearning for reflection, and joining institutional
forces enriched both sides.

To complement and widen the discussions raised by the exhibition and the
series, CINUSP and the Paço das Artes jointly organized this publication of
texts by important researchers on Harun Farocki’s work, thus enabling a dive
into the production of an artist who knew how to navigate between cinema and
contemporary visual art like no one else could.

The reader can further see the text produced by Farocki for Interface (1995), a
work that formed part of the exhibition at the Paço das Artes together with the
installation series Parallel I-IV (2014) and the work Catch Phrases – Catch Images: A
Conversation with Vilém Flusser (1986).

With this publication, we hope to expand the body of literature available in


Portuguese and in English about Farocki’s work. In Farocki, we find an opportunity
to cross the canonical lines between cinema and the visual arts, and to consider
contemporary creation in a way that goes beyond its materiality and its medium
of completion. The union between CINUSP and the Paço das Artes on this project
expresses the beneficial crossing of frontiers.

PRISCILA ARANTES, Artistic director and curator of Paço das Artes


PATRÍCIA MORAN, Director of CINUSP

9
10

AGRADECIMENTOS

Este livro é resultado da Exposição Harun Farocki: Programando o Visível que ocor-
reu no Paço das Artes, em São Paulo, no período de 28 de janeiro a 28 de março de
2016. Eu quero agradecer vários colegas e amigos que me encorajaram a realizar
estes dois trabalhos: a exposição e o livro. A ideia de uma exposição com trabalhos
de Farocki teve início em 2009, durante as discussões do grupo de pesquisa Cine-
ma e a Experiência do Conhecimento, na Pontifícia Universidade Católica de São
Paulo. Agradeço aos meus colegas Miguel Chaia, Maria Amélia da Silva e Mauro
Perón pelo apoio e oportunidade de apresentar as primeiras questões sobre a obra
de Farocki.

Aos colegas e amigos do Labcine (Laboratório de Artes Cinemáticas) da Univer-


sidade Presbiteriana Mackenzie que se envolveram com traduções, revisões de
termos, além de inúmeras discussões sobre a exposição e o livro, agradeço imen-
samente e em especial a Michelle Antunes, Adriano C.A. e Sousa, Helena Prates,
André Olzon e Cicero Inácio da Silva.

Agradeço à Sabine Himmelsbach e a David Rodowick pelos gentis contatos com


importantes participantes da exposição e do livro. Agradeço aos autores Priscila
Arantes, Sérgio Nesteriuk, Erika Balsom, Alfredo Suppia, Thomas Elsaesser e
Patrícia Moran pela confiança de participar desta coletânea e a Matthias Rajmann
pela paciência dedicada ao projeto inicial, além da abertura e liberdade que nos
concedeu para realizar a exposição.

Agradeço especialmente à Antje Ehmann pela generosidade e confiança com que


acolheu este projeto, sem hesitação, além das palavras de incentivo durante o
percurso.

As revisões de traduções foram apoiadas pelo Fundo Mackpesquisa da Universi-


dade Presbiteriana Mackenzie.

JANE DE ALMEIDA, Curadora da exposição Programando o visível


ACKNOWLEDGMENTS

This book is the result of the exhibition Harun Farocki: Programming the Visible,
which took place at the Paço das Artes in São Paulo from January 28 to March 28,
2016. I would like to thank several colleagues and friends who encouraged me to
take on these two projects: The exhibition and the book. The idea of an exhibition
of Farocki’s works was born in 2009, during conversations within the research
group Cinema and the Experience of Knowledge, at the Catholic Pontifical
University of São Paulo. I would like to thank my colleagues Miguel Chaia, Maria
Amélia da Silva, and Mauro Perón for their support and for the opportunity to raise
the first questions about Farocki’s work.

I would like to express my immense gratitude to my colleagues and friends from


LabCine (the Cinematic Arts Laboratory) of Mackenzie Presbyterian University
who worked on translations and revision of terms and who partook in innumerable
conversations about the exhibition and the book, especially Michelle Antunes,
Adriano C.A. e Sousa, Helena Prates, André Olzon, and Cicero Inácio da Silva.

I would like to thank Sabine Himmelsback and David Rodowick for their help
with contacting important participants in the exhibition and the book. I would
like to thank the authors Priscila Arantes, Sérgio Nesteriuk, Erika Balsom, Alfredo
Suppia, Thomas Elsaesser, and Patrícia Moran for their trust in participating in
this collection, and Matthias Rajmann for his patience dedicated to the initial
project, as well as for the opportunity and freedom that he conceded us in creating
the exhibition.

I would like to give special thanks to Antje Ehmann for the generosity and trust
with which she unhesitatingly welcomed this project, as well as for her motivating
words during its course.

The revisions to the translations were supported by Mackenzie Presbyterian


University’s Mackpesquisa Fund.

JANE DE ALMEIDA, Curator of Harun Farocki: Programming the Visible

11
12

HARUN FAROCKI : PROGRAMANDO O VISÍVEL


PROGRAMANDO O VISÍVEL

PROGRAMANDO
O VISÍVEL
JANE DE
ALMEIDA

13
14

ALIENAÇÃO PSÍQUICA E ALIENAÇÃO POLÍTICA


Há uma conhecida passagem na história de Sigmund Freud na qual ele
descreve uma determinada “sensação de estranhamento” (em alemão,
Entfremdungsgefühl) que pode também ser traduzida por “sentimento de
alienação” ou desrealização1. Em 1936, Freud escreve uma carta ao seu ami-
go Romain Rolland contando um episódio que teria lhe ocorrido em 1904,
episódio que não consegue esquecer. Trata-se de sua primeira primeira
visita à Acrópole de Atenas, sobre a qual escreve as seguintes palavras:
“Quando, finalmente, na tarde de nossa chegada, eu me achava na Acrópo-
le e lançava o olhar sobre a paisagem ao redor, veio-me subitamente este
singular pensamento: ‘Então tudo isso existiu realmente, tal como nós
aprendemos na escola!’”2
Para melhor explicar este pensamento, Freud acrescenta a imagem de
uma pessoa que, diante do Loch Ness é surpreendida pelo famoso Mons-
tro e chega a admitir que ele existe, uma “serpente na qual jamais acredi-
tamos”. Freud assume certo exagero no seu exemplo, afirmando que não
seria verdadeiro o fato de que teria duvidado da existência de Atenas na
época da escola. Mas aborda o evento psíquico a partir de uma divisão da
mente entre uma parte que duvida da realidade para comprová-la e outra
que apenas admira a Acrópole, pois nunca duvidou de tal realidade.
Freud acredita que a sua reação neste episódio se deve a um sentimen-
to de culpa por ter superado as expectativas familiares de uma posição
intelectual que ultrapassa a de seu pai, que não tinha completado o ensino
secundário. Freud apresenta dois motivos para o psiquismo produzir a
“sensação de estranhamento”: 1) a resistência de uma vitalidade contínua
de experiências dolorosas anteriores e reprimidas; e 2) a produção de um

1 S. Freud, O mal-estar na civilização, p. 444.


2 Ibidem, p. 443.

HARUN FAROCKI : PROGRAMANDO O VISÍVEL


PROGRAMANDO O VISÍVEL

mecanismo de defesa que desenvolve uma denegação. Ao ressalvar que


nunca duvidou da existência de Atenas, Freud afirma que seu sentimento
foi provocado por um deslocamento sobre o fato de que não podia imagi-
nar que chegaria “tão longe”. Este sentimento, segundo ele, proveniente
de sua pobreza e condições de vida.
Há várias interpretações sobre este evento, mas evoca-se aqui o fenô-
meno em que a narrativa da realidade impede a experiência subjetiva no
lugar de justamente incentivá-la. Transportando este efeito para o cinema,
pode-se apontar as várias teorias fílmicas que se preocupam com a produ-
ção de um efeito narrativo alienador, que ultrapassa a própria realidade ou
é inferior a ela. Evidentemente, o filme não corresponde ao tamanho exato
da realidade, mesmo quando aspira a isto, como por exemplo pela simula-
ção. Neste caso, o cinema poderia ser comparado a um professor que narra
a história de Atenas de forma absolutamente impactante de maneira a
reprimir a Atenas real das possibilidades de seus alunos. No caso de Freud,
foi preciso que ele tivesse 48 anos, que fosse praticamente “empurrado”
para Atenas e se sentisse muito mal durante o dia no qual deveria realizar a
sua viagem, perseguido por um sentimento de que não conseguiria chegar
a Atenas. Aliás o estado psíquico que Freud diz ter acompanhado sua in-
credulidade sobre o fato de poder ir a Atenas é o de depressão. Ele especula
sobre o que teria havido na época: “Vamos ver Atenas? Está fora de questão;
há muitas dificuldades”. Finalmente, Freud associa o “fora de questão” ao
referente inverso: “bom demais pra ser verdade”.
Esta perturbação da memória na Acrópole revela como o mecanismo
de denegação da realidade pode induzir à passividade de um estado de
não-pertencimento – que poderia, com efeito, ser produzido pelo cinema.
Esta parece ter sido a preocupação de vários teóricos do cinema. Ou, ao
contrário, o cinema poderia exercer o papel de libertador deste modelo
de passividade, ajustando o ponto de vista crítico do receptor em relação

15
16

ao sentimento de não-pertencimento. Sobre tais efeitos do cinema escre-


veram Theodor Adorno, Walter Benjamin, Siegfried Kracauer, Jean-Louis
Baudry, Christian Metz, Laura Mulvey. Estes são apenas alguns exemplos
e a lista poderia continuar com muitos outros nomes, mas o propósito
aqui é apenas referir-se ao “universo” em questão.
Lembrando que a desalienação sugerida por Freud não está associa-
da especificamente ao universo político, porém o cinema e sua teoria
que buscam o método libertário inspirados por Bertolt Brecht e Victor
Schklóvski estão envolvidos com o problema da alienação de acordo com
a teoria marxista. A influência de ambos os autores é assumida por vários
cineastas e foi analisada por inúmeros críticos e teóricos.
A Entfremdung (alienação) de Marx, refere-se a um estranhamento
psicológico do trabalhador em relação à produção decorrente de seu tra-
balho e o valor que lhe é pago pelo trabalho proveniente da lógica do capi-
talismo. “Estranhamento”, “distanciamento”, “quebra da quarta parede”
fazem parte dos métodos mais conhecidos da cartilha brechtiana que foi
reelaborada pelos cineastas libertários com envolvimentos políticos, mas
com significados singulares em cada uma de suas obras. Jean-Luc Godard
faz reverência a Brecht pelo menos a partir de Le mépris (Contempt, 1963)
quando BB, de Brigitte Bardot se desloca para Bertolt Brecht3. Fica mais
evidente a influência brechtiana quando Godard se une a Jean-Pierre Go-
rin para formar o Grupo Dziga Vertov, a partir de 1968 e ambos assumem
um Brecht radical, com um pensamento fílmico que envolve não apenas a
sua linguagem, mas todo o sistema ou aparato.

3 T. Elsaesser, Political Filmmaking after Brecht: Farocki, for Example, em T. Elsaesser (ed.), Harun Farocki: Working
on the Sightlines.

HARUN FAROCKI : PROGRAMANDO O VISÍVEL


PROGRAMANDO O VISÍVEL

FAZER POLITICAMENTE O FILME POLÍTICO


Parte do “fazer politicamente o filme político” contava com a estratégia
de combate ao filme político melodramático de estética hollywoodiana
que promove a catarse pública em vez da revolução e que, portanto, no
lugar de promover a consciência política, leva à passividade. Um dos parâ-
metros deste tipo de filme político nos anos de 1960 era A batalha de Argel
de Gillo Pontecorvo (1966), que foi inspirado pelo neorealismo italiano e
venceu o prêmio de melhor filme em Veneza. O filme retrata a luta de mo-
vimentos populares contra a colonização francesa na Argélia. Pontecorvo
costuma dizer sobre o filme: “As pessoas praticamente jamais vivenciam
os grandes eventos da história com seus próprios olhos”. Por sua vez, para
o cineasta japonês Nagisa Oshima4, trata-se mais de um filme dramático
que político, dado que é eficiente ao perseguir as emoções do espectador,
por exemplo, ao associar a morte da personagem heroica (no filme, Ali)
ao levante revolucionário argelino. A personagem Ali não delata seus
amigos e por isso os soldados da repressão explodem o prédio onde ele se
esconde com mais três pessoas, inclusive um bebê. O silêncio de Ali leva
ao levante em uma conexão melodramática da ficção sentimentalista que
serve a propósitos (ou à manipulação) políticos. A sequência de eventos é
arranjada de acordo com os sistemas fílmicos hollywoodianos, com músi-
ca sincronizada de forma a romantizar o filme. Como resultado, a obra se
torna um filme manipulador, como uma propaganda ideológica. O ponto
de vista de Oshima pode ser associado ao que Walter Benjamin chama de a
“estetização da política”5.
Resgatando o episódio freudiano, o filme político de Pontecorvo seria
mais encobridor de desejos subjetivos e manipulador que emancipador.

4 N. Oshima, Cinema, Censorship, and the State


5 W. Benjamin, A obra de arte na época de sua reprodutibilidade técnica, em L.C. Lima (org.), Teoria da cultura de
massa.

17
18

O filme provocaria uma espécie de deslocamento do espectador ingênuo


para um lugar cujo destino passa a ser traçado pelo cinema em processo
manipulador: não fale e morra! Uma boa revisão deste sistema pode ser
visto em Tout va bien (1972) de Godard e Gorin através do qual fazem uma
clara homenagem a Brecht.
Ao longo do tempo que este debate envolveu a política, também
ficou evidente que no processo de desalienação do meio, os métodos
praticados, no caso do cinema poderiam se tornar eles mesmos um
“fetiche”, facilitando a reificação dos sujeitos ao serem conduzidos por
um discurso de farsa. Estranhamentos sem propósito, distanciamentos
esperados e câmeras surgindo na tela como elemento de quebra foram
realizados à exaustão e facilmente percebidos como filmes feitos “à ma-
neira” de Godard, por exemplo. Mais grave que o aspecto mais comercial
e estético resultantes dos métodos é o fato de que as imagens se esva-
ziam do sentido político e se tornam mais uma vez espetáculo – será en-
tão necessário reinventar o método e os artistas do cinema o fazem com
semelhanças e diferenças.
Coincidentemente, ou como consequência, o conceito de dispositivo6
adentra a teoria e a prática fílmicas na medida em que incorpora o “todo”
do cinema e deverá ser pensado como a parede a ser demolida: a filma-
gem sem as tradicionais hierarquias de funções, o autor que deixa de ser
o “artista” e passa a ser um coletivo sem nomes definidos, a distribuição
alternativa além, claro, dos procedimentos de linguagem, com radical e
deliberada contraposição entre som e imagem. Godard e Gorin fizeram
filmes experimentais que não apenas buscavam o posicionamento liber-
tador do espectador, mas também sua cumplicidade em atos que na época
eram vistos como revolucionários.

6 O conceito se torna conhecido na teoria do cinema devido ao artigo de J.-L. Baudry, Le Dispositif: approches
métapsychologiques de l’impression de realité, Communications, n. 23.

HARUN FAROCKI : PROGRAMANDO O VISÍVEL


PROGRAMANDO O VISÍVEL

A demolição da quarta parede vai se deslocar na direção da denúncia


do “aparato” do cinema7, um “dispositivo” que integra todas as particu-
laridades do filme, para além da mensagem e da linguagem: a sala escura,
o projetor, a cadeira, a programação, o tempo do filme. Nesta linhagem
surgem as críticas às chamadas “imagens operacionais” produzidas pela
caixa fotográfica, ou seja a própria máquina está em questão8 e às “ima-
gens técnicas”9, chamando a atenção para a produção de imagens médicas,
industriais e de treinamento.
Em certo sentido, seria preciso reinventar Brecht ou mesmo procurar
uma compreensão desse “ir além de Brecht” repensando e produzindo ou-
tros efeitos condizentes com o contexto mais recente, com diferentes pers-
pectivas. Autores acabaram por retomar Benjamin10 para iniciar então uma
releitura de Brecht a partir de seu texto sobre o gesto, que escrevera sobre o
teatro chinês11 quando viu a Ópera de Pequim em Moscou, por exemplo.

KLUGE EM FAROCKI
Na perspectiva do Novo Cinema Alemão, o premiado cineasta e inte-
lectual Alexander Kluge é um legatário da teoria brechtiana que propõe
um tipo de montagem com a conexão de imagens contraditórias, ou
mesmo imagens sem conexão imediata com o objetivo de proporcionar
ao espectador uma associação particular. Propõe assim a condução da
narrativa para um tipo de relação ativa da mente do espectador diante
das imagens, evitando ao máximo o processo manipulador12. Kluge é um

7 L. Althusser, Aparelhos ideológicos de Estado; e J.-L. Baudry, op. cit.


8 Ver V. Flusser, Filosofia da caixa preta.
9 Ao comentar os conceitos de Kittler e de Flusser, Elsaesser observa que as imagens operacionais ou técnicas
chamam a atenção de Farocki antes que elas apareçam de forma mais elaborada na obra desses teóricos. Ver T.
Elsaesser, The Future of “Art” and “Work” in the Age of Vision Machines: Harun Farocki, em R. Halle; R. Steingröver
(eds.), After the Avant-garde, p. 37
10 W. Benjamin, Que é o teatro épico? Um estudo sobre Brecht, Magia e técnica, arte e política, p. 89.
11 B. Brecht, Um Homem é um Homem, Teatro completo 2.
12 M. Langford, “Alexander Kluge”, Senses of Cinema.

19
20

cineasta alinhado com as preocupações brechtianas, mas prosseguiu


pesquisando seus próprios métodos no sentido de alimentar a partici-
pação intelectual do espectador. A partir dos anos de 1980, os trabalhos
de Kluge passam a ser mais fortemente construídos com uma varie-
dade de fragmentos imagéticos compostos por fotografias, filmes de
arquivos, ilustrações e livros infantis, desenhos, material de televisão,
intertítulos, além de documentários e episódios ficcionais filmados es-
pecialmente para os filmes. Segundo Stuart Liebman, “em vez de juntar
esses fragmentos com um ‘significado ideal’ final, Kluge coloca a ênfase
no papel do espectador na produção do significado. Quanto mais solta
a conexão lógica, ou mais ampla a lacuna entre imagens consecutivas,
mais espaço é deixado ao espectador para ativar sua própria Phantasie”13.
Em A garota de ontem, (1966), Kluge já faz uso de materiais heterogêneos
como desenhos e maquetes, ainda de forma inibida. Este procedimento
ganha contornos ensaísticos em O poder dos sentimentos (1986) quando
se pode perceber o seu uso intenso e impactante. A importância política
do procedimento não está apenas no fato de que as imagens remetem o
espectador a novos sentidos, mas também no fato de que a historicidade
dos meios fica evidenciada na montagem que não ambiciona a homoge-
neidade visual. Mirian Hansen inclusive associa a montagem de Kluge
com narrativas curtas e intertítulos aos filmes dos primeiros cinemas,
da época dos Nickelodeons14.
Além do uso de material heterogêneo, Kluge também adota a perfor-
mance realista com elementos documentais e fictícios em suas narrativas
fragmentadas. Um exemplo de documentário e performance muito co-

13 S. Liebman, “Why Kluge?”, On New German Cinema, Art, Enlightenment, and the Public Sphere: An Interview
with Alexander Kluge, October, n. 46.
14 M. Hansen, Reinventando os nickelodeons: Considerações sobre Kluge e o primeiro cinema; R. Stollmann, A
realidade não é realista: Alexander Kluge, o cinema alemão e europeu, em J. de Almeida (org), Alexander Kluge: o
quinto ato.

HARUN FAROCKI : PROGRAMANDO O VISÍVEL


PROGRAMANDO O VISÍVEL

mentado é o quadro de A patriota (1987), no qual a personagem Gabi Tei-


chert, professora de história vai à convenção do partido social-democrata
SPD (Sozialdemokratische Partei Deutschlands) e conversa com os polí-
ticos reais para reivindicar uma “história alemã que vale a pena ensinar”.
A professora de história da Alemanha, personificada pela atriz Hannelore
Hoger, deixa os delegados da convenção perplexos e irritados. Estes pro-
cedimentos são elementos de construção de linguagem e não dizem res-
peito ao aparato diretamente. Porém a heterogeneidade material fílmica
denuncia um aparato em sua composição, tornando-se assim uma escolha
ética do cineasta, pois a história do cinema e suas invenções se apresen-
tam nos filmes, assim como suas narrativas. Kluge, depois desta época,
praticamente para de fazer filmes com propósitos cinematográficos e vai
trabalhar com documentários para a televisão e escrever livros.
A partir deste enquadramento é que são feitas neste artigo as dedu-
ções sobre o nascimento da obra de Harun Farocki. O cineasta e posterior
videoartista assume sua influência do Grupo Dziga Vertov e de Godard
(além da conhecida admiração por Huillet e Straub), mas fala pouco so-
bre a influência da obra de Alexander Kluge15. Autores que abordam sua
obra, costumam lembrar que Farocki necessitou se diferenciar da geração
anterior de cineastas da Alemanha, no caso, justamente da geração de
Alexander Kluge16. Em rara ocasião, em entrevista a Thomas Elsaesser,
Farocki defende Kluge de acusações a respeito de sua voz condutora nos
filmes, dizendo que “‘Kluge tem essa maravilhosa, saxoniana e feminina
melodia das palavras!’ e continua ‘quando Kluge fala, não é tão fácil com-

15 Ver C. Pavsek, Harun Farocki’s Images of the World, em que o autor assume que Kluge é uma influência maior na
obra de Farocki, mas que também há a de Huillet.
16 Ver comentário de N. Alter, The Political Im/perceptible: Images of The World... em T. Elsaesser (ed.), op. cit.,
p. 229. Ver também J. Becker, Images and Thoughts, People and Things, Materials and Methods em T. Elsaesser
(ed.), op. cit., p. 58, que afirma: “Neles, excursões e investigações históricas em, e o exame de, um tema visual dado
estão misturados com filmagens atuais para criar uma teia sincrônica e diacrônica, uma estrutura fílmica que está
relacionada initimamente em suas numerosas aberturas, suas linhas principais e paralelas, com o trabalho de
Alexander Kluge”.

21
22

preender o que ele diz, há ainda muito trabalho para o espectador’”17. Mas
também acusa: “Kluge é megalomaníaco demais para tornar a cooperação
possível”18. Como ambos são alemães e produziram obras políticas, pode
parecer que estas sejam as relações mais importantes entre os artistas. No
entanto, há uma profunda relação também, e talvez mais afinada, entre os
procedimentos fílmicos dos dois cineastas: uso de imagens de diferentes
procedências, a voz condutora do filme-ensaio (mesmo que Farocki tenha
escolhido outras vozes, além da sua), despreocupação com o tempo fílmi-
co e grande preocupação com o intervalo entre as imagens na montagem.
Farocki inicia sua carreira com apoio da televisão, com produtos em
formato 16mm para serem transmitidos pela televisão19, pois nos anos
1960 e 70, a televisão é que vai acolher a vanguarda fílmica na Alemanha
Ocidental20. Segundo o site com banco de dados que abriga a sua obra, só
em 1970, depois de realizar onze filmes, é que seu A divisão de todos os dias
vai participar de um festival de cinema, em Oberhausen21. Seus primeiros
filmes, considerados já ensaísticos, contam com sua participação como
ator e com performances filmadas. Estes ensaios tratam de questões
efervescentes do momento como greves, guerras e debates, o que pode
ser associado a uma natureza televisiva de produção. A televisão naquele
momento era um evento bastante novo e só em 1963 a Zweites Deutsches
Fernsehen – ZDF (Second German Television) vai dar início à transmissão

17 T. Elsaesser, Making the World Superfluous: An Interview with Harun Farocki, em T. Elsaesser (ed.), op. cit., p. 188.
18 R. Hüser, Nine Minutes in the Yard: A Conversation with Harun Farocki, em T. Elsaesser (ed.), op. cit., p. 311.
19 WDR (Westdeutscher Rundfunk) ver: 1. Original title Jeder ein Berliner Kindl, Director Harun Farocki
Cinematographer Gerd Delp Production DFFB, Berlin-West Format 16mm, b/w, 1:1,37 Length 4 min. 2. Original
title Zwei Wege Director, Scriptwriter Harun Farocki Cinematographer Horst Kandeler Production SFB, Berlin-West
TV-producer Hanspeter Krüger Format 16mm, b/w, 1:1,37 Length 3 min. First broadcast 31.03.1966, Nord 3 Note
commissioned for the TV series Berliner Fenster 3. Original title Die Worte des Vorsitzenden Director Harun Farocki
Assistant director Helke Sander Scriptwriter Harun Farocki, based on texts by Lin Piao Cinematographer Holger
Meins Production DFFB, Berlin-West Format 16mm, b/w,1:1,37 Length 3 min. First broadcast 27.06.1969, ZDF 4.
Original title Die Worte des Vorsitzenden Director Harun Farocki Assistant director Helke Sander Scriptwriter Harun
Farocki, based on texts by Lin Piao Cinematographer Holger Meins Production DFFB, Berlin-West Format 16mm,
b/w,1:1,37 Length 3 min. First broadcast 27.06.1969, ZDF.
20 N. Alter, Two or Three Things I Know about Harun Farocki, October, n. 151, p. 24.
21 Ver <http://www.harunfarocki.de/home.html>.

HARUN FAROCKI : PROGRAMANDO O VISÍVEL


PROGRAMANDO O VISÍVEL

centralizada de televisão com programação contínua. Este contexto indi-


ca no seu nascimento um tipo de produção sem a expectativa de um reco-
nhecimento cinematográfico tradicional, pautado pela materialidade ci-
nemática (16mm e 35mm), conteúdo com acabamento dirigido para a sala
de cinema e duração pré-definida por festivais (curta-metragem de até 15
minutos e longa-metragem de mais de 60 minutos). Os filmes de Farocki
desde o início não fazem uso de atores reconhecidos, de duração estabe-
lecida e, apesar de terem sido filmados em 16mm, fizeram suas estreias
na televisão. Por isso, Farocki inicia sua carreira como um “cineasta” bas-
tante outsider, sem cumprir os requisitos básicos da carreira de sucesso
da época que visava festivais de respeito na Europa. Lembrando aqui que
ambos, Godard e Kluge também acabam se deslocando para um tipo de
cinema impuro, com obras financiadas por canais de televisão, mas após
terem sido reconhecidos por festivais europeus importantes que lhes as-
seguravam espaço para experimentações ousadas e recepção.

FILMES DE ARQUIVO
No curta Natal branco (1968) Farocki usa imagens de diferentes fontes
materiais22, podendo ser considerado um “proto” filme de arquivo de sua
extensa obra. Com cerca de 3 minutos, o filme é uma colagem de fotos e
imagens de diferentes fontes sincronizadas com trilha de Bing Crosby para
fazer crítica da imagem inocente do natal branco enquanto as pessoas mor-
rem na guerra do Vietnam. Um ano depois, Farocki realiza um filme sobre o
mesmo tema – talvez o mais comentado de todos – chamado O fogo inextin-
guível (1969), fazendo uso de performance, mas não de material de arquivo.

22 Ver H. Steyerl, Beginnings: Harun Farocki, 1944–2014, E-Flux, n. 59, onde se lê: “Os lendários trabalhos de Harun
Farocki – como diretor, escritor e organizador – são repletos de começos exemplares. De curtas agitprop para
filme-ensaios e além. De ficção didática para o cinema vérité. Do single channel a múltiplas telas. Do Kodak ao .avi, de
Mao para o mashup. Do cinema silencioso a conversas acaloradas. Do close reading ao comentário distanciado. Da
entrevista à intervenção, da colaboração à corroboração. Em 30 de julho, Harun Farocki faleceu.”

23
24

Farocki retorna ao procedimento ensaístico marcado por imagens múlti-


plas e de diferentes origens materiais em O problema com imagens (1973)23,
que foi montado a partir de cenas da televisão. Este foi seu primeiro filme
inteiramente feito com imagens de arquivo. No ano anterior ele havia reali-
zado A linguagem da revolução (1972) com grande parte de material fílmico
de terceiros, mas ainda com excertos filmados por ele. Sobre O problema
com imagens, Farocki afirma o seguinte: “Eu quero demonstrar que a maior
parte dos filmes é de um tipo que faz as pessoas perder seu interesse e
apetite pelo mundo real.”24 Eis um ponto nodal da produção de Farocki em
seus mais distintos estilos de filmes (filmes-ativistas, filmes observacio-
nais25 ou filmes-ensaio), somando-se o fato de que a frase corresponde com
muita justeza à inibição sobre a qual dissertara Freud.

FILMES DE OBSERVAÇÃO: NENHUM DOS DOIS,


NEM ENTRE OS DOIS, MAS ALÉM DOS DOIS
Quem conhece um pouco a obra de Harun Farocki reconhecerá facil-
mente seus filmes ativistas (O fogo inextinguível, etc.) e a coleção de filmes-
-ensaio ou filmes de compilação26. Já os seus filmes mais recentes os de-
nominados “filmes de observação”, segundo Pavsek, têm início com Um
imagem (1983): um documentário com planos longos em que a câmera se
coloca na posição de voyeur diante de uma sessão de fotos de uma mulher
nua para a revista Playboy. O filme tem 25 minutos e foi encomendado pela
televisão para a série Projektionen´83.

23 Segundo V. Siebel, Painting Pavements, em T. Elsaesser (ed.), op. cit., p. 45: “O objetivo era expor suas
maquinações. O WDR (Transmissões da Alemanha Ocidental) ofereceu-lhe uma plataforma para isso. Em 1973, para
as séries Telekritik (tele-crítica), Farocki realizou O problema com imagens, um metafilme crítico no qual ele marcou
pontos tendo o noticiário televisivo como formato, destacando o uso excessivo de imagens insignificantes.”
24 < http://www.harunfarocki.de/films/1970s/1973/the-trouble-with-images-a-critique-of-television.html>
25 Ou Filmes de Observação. C. Pavsek, op. cit., afirma que Tilman Baumgärtel chama a fase fílmica de Farocki de
“filmes de observação”.
26 A teoria tem debatido sobre a precisão e a nomenclatura de procedimentos fílmicos que surgem com o uso de
material reciclado do cinema e da televisão. Compilation Film refere-se a uma tradição primeiramente teorizada por J.
Leyda, Film Beget Films. Mais tarde surgem os Found Footage e mais recentemente os film-essay ou essay films.

HARUN FAROCKI : PROGRAMANDO O VISÍVEL


PROGRAMANDO O VISÍVEL

O fato de a câmera se demorar na imagem deixando o espectador


como um atento participante ou o fato de que os filmes conduzem à des-
naturalização das imagens27 são elementos importantes, porém é singu-
lar e estratégico o mal-estar provocado pelo posicionamento das partes
envolvidas nos filmes observacionais: a posição da televisão que “enco-
menda” o filme, buscando a crítica da imagem publicitária de consumo e
a posição dos fotógrafos que acreditam estar sendo filmados para serem
publicizados. Farocki, no entanto, não opta por nenhum dos lados e afir-
ma querer ir além destes lugares28. A duplicidade de posicionamentos é
melhor compreendida se o espectador conhece o posicionamento de Fa-
rocki, um autor militante e pensador das imagens. Além do mais, Farocki
não se posiciona jamais fora da cena. O espectador fica preso na armadilha
fantasmática entre os dois lugares, na espera de que o cineasta escolha
um deles, entre o lugar do gozo da imagem da mulher nua e o da crítica do
sistema de exploração da imagem. Entre o espectador desavisado (o Tes-
tadura, como diria o filósofo Arthur Danto a respeito do espectador ingê-
nuo diante da arte contemporânea29) e o espectador cúmplice da política
crítica, Farocki justamente procura outro caminho.
Em Still Life, realizado em 1997, o cineasta retorna ao tema da foto-
grafia de consumo, desta vez mostrando objetos sendo meticulosamente
preparados para a publicidade, em filme mais longo que teve sua estreia
em exposição de arte. Novamente Farocki coloca o espectador diante da
contradição que por um lado espera cumprir o lugar de crítico da cultura de
consumo e que, por outro, espanta-se com a dignidade com que o trabalho

27 Efeitos assinalados por C. Pavsek, op. cit.


28 “Este filme, Uma imagem, é parte de uma série que estou trabalhando desde 1979. A estação de TV que
encomendou supõe que nesses casos estou fazendo um filme que é crítico de seu tema de interesse, e o proprietário
ou empresário da coisa que está sendo filmada supõe que meu filme é uma propaganda para ele. Eu tento fazer
nenhum deles. Nem quero fazer algo entre, mas além de ambos.”, sinopse do filme escrita por Harun Farocki, ver
<http://www.harunfarocki.de/films/1980s/1983/an-image.html>.
29 A.C. Danto, O mundo da arte, Artefilosofia, n. 1.

25
26

publicitário é retratado, mostrando a persistência, esmero e obsessividade


com detalhes da imagem que é construída. Neste caso, a solução de Farocki
ultrapassa o fantasma do duplo lugar ao relacionar surpreendentemente a
fotografia publicitária com a pintura flamenga do século XVII. A hipótese se
apresenta como um terceiro conciliador, mas também perturbador. A pintu-
ra flamenga que descreve os objetos surge durante o nascimento do sistema
capitalista na região, assim como a imagem publicitária que, por sua vez,
serve ao sistema capitalista de consumo da nossa época. A pronkstilleven ou
a “natureza morta ostensiva” descrevia a abundância de objetos e comidas
– ou animais a serem comidos, da época. Estima-se que tenham sido pro-
duzidas de 5 a 10 milhões de pinturas durante a era dourada holandesa com
o objetivo de serem vendidas, diferentemente do sistema europeu italiano
que apadrinhou sua produção pictórica por meio dos interesses da Igreja ou
dos banqueiros. Assim, por associação, surge também o espectro de que a
imagem publicitária seja a iconicidade reconhecida como aquela que repre-
sentará nossa época, ultrapassando a fotografia de arte ou o cinema. Ao final
do filme, Farocki, mantendo sua preocupação humanista, argumenta que as
pessoas que fabricam os objetos não podem ser vistas nas imagens e resul-
tam não serem imagináveis, assim, as pessoas que vêm os objetos tornam-se
também não imagináveis e este é um novo “ponto de partida para uma nova
visão do ser humano”. Os Sketches documentais de fotógrafos publicitários
de caráter observacional se juntam a imagens de pinturas flamengas, com
voz over amarrando as associações ou produzindo contrastes associativos.
Seus filmes observacionais são compostos de poucos movimentos
de câmera, poucos ângulos de posicionamento – são quase vídeos de vi-
gilância. No caso de Still Life, há muitos planos próximos e em primeiro
lugar percebe-se a particular estratégia de conceder tempo para que o
espectador retenha seu olho na imagem. O próximo passo será procurar
um sentido para esta escolha do cineasta, pois durante algum tempo o

HARUN FAROCKI : PROGRAMANDO O VISÍVEL


PROGRAMANDO O VISÍVEL

espectador fica diante de planos longos, sem as esperadas conexões com


outros planos, poucos cortes, nenhuma fusão, quase sem “montage”.
Resta ao espectador questionar o autor sobre suas intenções e fazer asso-
ciações, geralmente a partir de referências históricas – seja com o tema,
seja com a linguagem, seja com o meio em sua especificidade. Este pro-
cedimento sugere um deslocamento significativo da carreira de Farocki,
que aos poucos se ausenta do cinema para adentrar o mundo da arte em
sua perspectiva contemporânea.
O exemplo mais recente deste procedimento é a série de videoinstala-
ções Jogos Sérios, iniciada em 2009. O primeiro trabalho da série, chamado
Imersão é composto por uma instalação com projeções em duas telas com
imagens captadas em um centro de treinamento de militares americanos,
na Califórnia. A tela da esquerda mostra um game computacional de trei-
namento e na tela da direita vê-se um sujeito com máscara de realidade
virtual. Nenhuma novidade na linguagem de cada filme, a não ser a divisão
da imagem que levanta questões e associações intelectuais a respeito da di-
visão mesma do sujeito ao qual a imagem se remete. Porém, quando o sol-
dado manifesta sua crise traumática em surto, a tela da esquerda fica per-
turbadoramente preta30. Trata-se de um jogo terapêutico para veteranos de
guerra com Posttraumatic Stress Disorder (PTSD), que em português sig-
nifica “transtorno de estresse pós-traumático”. Durante quase a totalidade
dos 20 minutos da obra, o soldado refaz seu percurso traumático na guerra,
agora percorrendo o espaço simulado no videogame e acompanhado por
uma psicóloga em ação supostamente terapêutica. A situação “game” para

30 L. Chinen, At Our Expense: Harun Farocki’s Images at War. Rhizome. “Inicialmente, eu não estava ciente de que
o exercício na parte dois era encenado; um deslize similar entre realidade e simulação ocorreu na terceira parte,
Imersão. Em uma sessão de terapia, um soldado reconta uma experiência traumática de combate ao mesmo tempo
usando um headset que transmite um ambiente simulado que reproduz a memória. O soldado parece cada vez
mais vulnerável à medida que a sessão prossegue, revelando sentimentos desconexos em relação aos seus colegas
soldados e a visão do corpo mutilado de seu parceiro. Quando a sessão termina, entretanto, o soldado sorri, uma
plateia aplaude e vemos que esse grande cenário era a demonstração do software usado para recriar ambientes de
guerra para tratar o transtorno de estresse pós-traumático.”

27
28

curar “trauma de guerra” é em si anedótica, se levarmos em conta a rele-


vância teórica do tema nos campos da psicanálise, psicologia e literatura,
principalmente. O trauma é um conceito teórico que Freud e Lacan reela-
boraram a partir da psiquiatria em nome de uma abordagem complexa e
importante na psicanálise e nos estudos sobre o psiquismo em geral. Mais
recentemente, os estudos literários adotaram o conceito de trauma para
falar sobre o evento do holocausto. Ou seja, a teoria do trauma carrega uma
carga intelectual nas humanidades que contrasta imediatamente com o
uso dos games para fins terapêuticos. Esta questão se apresenta como sub-
texto diante da curiosidade de entender como o campo visual e o psíquico
podem ser afetados pelas tecnologias computadorizadas de imagem. Mais
uma vez o espectro do duplo se coloca e é causado justamente pela ausên-
cia de um cinema de montagem associativo e pela presença de um cinema
“direto”, mas um cinema direto contemporâneo que aguarda o julgamento
do espectador que não mais acredita na verdade da câmera crua. A narrati-
va avança e o soldado “revive” o trauma de forma contundente – amplian-
do ainda mais o fantasma que habita o espaço entre a imagem que quer se
mostrar (Farocki alega que foi super fácil obter permissão para filmar o
centro de pesquisa militar31, inclusive imagina que o centro queria ser pu-
blicizado) e aquela que investiga (da parte do cineasta) e que não pode cair
como presa fácil na armadilha baudrillardiana do simulacro como imagem
de cópia da realidade. Conduzir o filme nesta tensão até o ponto em que o
soldado se revela como demonstrador de vendas do software é um ato de
grande perícia de Farocki. Uma estratégia de dobra retórica que se deslo-
ca do método da metalinguagem dos anos anteriores. Tal deslocamento
permite também pensar em uma preocupação de Farocki com a alienação
psíquica, talvez como antecedente à alienação política.

31 Ibidem.

HARUN FAROCKI : PROGRAMANDO O VISÍVEL


PROGRAMANDO O VISÍVEL

PASSAGEM PARA O ESPAÇO


No meio deste percurso de criação, que vai de 1983 a 2009 é conhecida
a passagem do cineasta para a condição de artista, com grande aceitação
crítica. Sua primeira instalação artística Interface, foi feita sob encomenda
para o Museu de Arte Moderna de Lille, na França em 1995. A encomenda
visava um trabalho do artista sobre sua obra e Farocki inaugura esta passa-
gem com a questão sobre o que significa fazer trabalhos com obras de ou-
tras pessoas. A cineasta soviética Esther Schub fez filmes de outros filmes
a partir de 1927 e é o exemplo introdutório de um tipo de filme, se não um
gênero, que é constituído de outros filmes provenientes de arquivos32. A
partir deste ponto, há inúmeros outros filmes sendo feitos com o uso de
materiais distintos. No contexto da Segunda Guerra Mundial, foi realiza-
do o infame filme O judeu eterno (1940), composto basicamente com ima-
gens de terceiros para manipular o público alemão e justificar os crimes
cometidos pelo regime nazista. Mais tarde, foi feito o comentado Noite e
neblina (1956) de Alain Resnais que justamente faz uso da linguagem do ar-
quivo de filmes para conscientizar o espectador de seu compromisso com
uma política das imagens e que Farocki assume tê-lo inspirado33. Ambos
os casos trazem a questão ética complexa do holocausto, o primeiro usado
para propaganda nazista e o segundo com o objetivo de pensar o absurdo
das atrocidades do evento. As imagens do holocausto representam um
ponto crucial sobre a verdade da imagem no século XX e a discussão sobre
o assunto pode ser acompanhada por meio do debate proposto por Claude
Lanzmann em Shoá (1985). Um exemplo curioso é o fato de que o primeiro
filme de ficção a usar as cenas do material registrado nos campos de con-
centração foi O estranho (1946) de Orson Welles. O filme é sobre o resgate

32 Ver J. Leyda, op. cit. Pode-se considerar que mesmo os filmes dos irmãos Lumière são de arquivo, já que muitas
cenas não foram filmadas por eles próprios, mas com câmeras enviadas para “trazer o mundo ao mundo”.
33 T. Elsaesser, Political Filmmaking after Brecht: Farocki, for Example, op. cit.

29
30

de um nazista fugitivo e, para convencer a personagem sobre a verdade da


identidade de seu marido, o investigador usa as cenas reais do holocausto
como forma de garantir a veracidade dos fatos. No entanto, em Interface, o
problema que Farocki aborda apesar de tocar na margem da questão sobre
a verdade da imagem, se dirige para o problema da apropriação de imagens
que foram feitas para um contexto e ganharem outro com a remontagem.
Com Interface, Farocki também inaugura em sua carreira o modo de
apresentar um filme por meio de duas telas para dialogar com o especta-
dor da galeria de arte, um circuito bem diferente daquele dos cineclubes.
Além das diferenças sociais básicas provenientes do mero fato de que
uma obra de arte custa bastante caro e é geralmente feita com materiais
baratos – com exceções, claro – um filme necessita de muito dinheiro para
ser feito, mas requer pouco para ser assistido, os dois mundos intelectuais
produziram teorias inerentes aos seus campos34. Algumas vezes as teorias
e produções se encontraram, mas nem sempre. Um exemplo é justamen-
te a preocupação com a alienação do espectador que foi um emblema do
cinema político do pós-guerra, movimentando um debate robusto e du-
radouro, e que não impulsionou a discussão da arte com a mesma força.
Não é o que se viu no debate sobre a forma e o realismo nas artes, sobre os
objetos gerais e específicos, ou mesmo sobre o fim da história da arte. A
política nutriu vários movimentos, mas não se apresentou como o assunto
primeiro. Hoje em dia, uma das demandas do “discurso político” da arte
contemporânea é diminuir o espaço entre a arte e a vida, devido ao fato de
que a arte dos últimos tempos ter produzido um discurso intelectual her-

34 Seria um erro dizer que não houve preocupação política nas arte plásticas no século XX, mas grandes discussões
da arte envolvendo Clement Greenberg, Arthur Danto, Aby Warburg tocam em política de forma tangencial. Giulio
Carlo Argan, no entanto, foi um exemplo de historiador e ativista político. Os artistas-celebridades, comentados
intelectualmente como Duchamp, Picasso ou Warhol não são reconhecidos pela suas performances políticas. No
cinema, a divisão pode ser considerada outra: entre o cinema hollywoodiano e o europeu. No universo europeu,
uma parte significativa dos grandes nomes fez filmes com preocupações e plataformas políticas: Eisenstein, Vertov,
Godard, Resnais, Marker, Fassbinder, Pasolini, Visconti, Oshima, Marker – para falar alguns clássicos.

HARUN FAROCKI : PROGRAMANDO O VISÍVEL


PROGRAMANDO O VISÍVEL

mético e pouco acessível ao iniciante ou a classes sociais que não foram


introduzidas a ela.
Quando Farocki apresenta Interface no museu faz também uma passa-
gem de linguagem, para além da ousadia do olhar dividido em duas telas
para o espectador acostumado a ver as pinturas nas paredes. A curadora e
teórica alemã Doreen Mende chama este momento de sua obra de “vira-
da espacial”35. Junta-se à projeção dividida, o “filme” exibido em looping
contínuo, sem a velha necessidade dos dispositivos do cinema e da te-
levisão de programar o horário das exibições. Ou seja, o espectador das
instalações de arte vai encontrar o “filme” em qualquer parte da narrativa
e o artista entende que será necessário pensar uma linguagem adequada a
este fenômeno.
Tematicamente, Interface se propõe a pensar a prática artística de
Farocki que recupera seus filmes produzindo uma metalinguagem que
reflete sobre sua obra acionando uma autorreferencialidade coincidente
com a passagem de uma carreira que se afasta do cinema e se aproxima
das artes de museus e galerias. Em 1997, o filme Still Life teve sua estreia na
Documenta de Kassel, mas em mostra de filmes da exposição, não como
instalação. Interface, no entanto, depois de Lille teve carreira extensa em
museus de arte e foi acolhida ironicamente por duas facções críticas rivais
no debate da arte do fim do século XX e início do século XXI: a que expri-
me o chamado “fim do cubo branco”, cuja representante é a francesa Ca-
therine David; e a que encarna a luta pela importância da “especificidade
do meio”, cuja defensora é a crítica americana Rosalind Krauss.

O MOVIMENTO DO CAVALO: DUPLO ATAQUE


Catherine David, uma assumida cineclubista, foi a primeira mulher

35 D. Mende, The Many Haruns, E-Flux, n. 59.

31
32

curadora da Documenta e responsável pela encomenda do filme Still


Life de Farocki na edição X da gigantesca mostra. Decretando o “fim do
cubo branco”, entendido como o espaço neutro concebido para garantir
atemporalidade e sacralidade às obras em exposições de arte, a curadora
também rompe com uma representação da ideologia do modernismo pela
inferência de que o cubo branco favorece as aspirações de uma metanarra-
tiva. David, consequentemente, alega que as práticas contemporâneas não
correspondem mais aos propósitos de um espaço considerado “neutro”36.
Com apelo interdisciplinar e multicultural, a exposição vai extrapolar
espacial e conceitualmente o ambiente esperado do museu se expandindo
para além da cidade de Kassel e para além das paredes de algum galpão,
com instalações, performances e conferências (a famosa “100 days, 100
guests”) com manifestações políticas, além de estéticas.
Do outro lado, a crítica americana e editora do influente periódico de
arte October não concorda com o fim do cubo branco, acusando a Docu-
menta X de ser precisamente o modelo de uma fraude da arte contempo-
rânea com a ubiquidade das chamadas “instalações” de arte. Para Krauss,
os meios, transformados em instalação criam espetáculos que “engolem
e oprimem seus espectadores” induzidos pelas grandes feiras de arte37.
Para levar adiante seu ponto de vista, Krauss usa Harun Farocki38 como
exemplo, desafiando o ponto de vista de David a respeito de suas obras
“perversamente [...] referidas sempre como instalação”. Levando adiante
a provocação, lembra que as obras do cineasta são justamente “projetadas
em uma parede branca do cubo”. Depois de alguns parágrafos explicando
a relação entre o método de edição de Farocki e seu meio, Krauss argu-

36 Ver R. Storr, Kassel Rock: Interview with Curator Catherine David, Artforum, v. 35, n. 9, p. 77.
37 R. Krauss, The Power Of The Specific Image. “The media, translated as video installations, which create vivid
spectacles that engulf and overwhelm their viewers are now, indeed, the contemporary work elicited by the
international exhibition or art fair.”
38 Ibidem.

HARUN FAROCKI : PROGRAMANDO O VISÍVEL


PROGRAMANDO O VISÍVEL

menta que em Interface, ao contrário de uma instalação de feira de arte, “o


espectador de Farocki é obrigado a perder tempo com o filme de forma a
analisar sua raison d’être”. E, “nesta tarefa, o espectador entra na Schnitts-
telle (Interface em alemão) para se identificar com o artista”.
Farocki que foi então convidado por Catherine David pela primeira vez
para participar deste ambiente concorrido da arte contemporânea, alguns
anos depois caiu nas graças de Rosalind Krauss que afirma ter visto Inter-
face no Jeu de Paume, em Paris, provavelmente em 200939. Farocki é por
ela considerado um “knight of the medium” definido como um daqueles
que “estão fazendo o que têm de fazer, que é reinventar o meio ao inventar
ou emprestar de um suporte técnico novo”. A lista dos knights inclui os ar-
tistas William Kentridge, James Coleman, Ed Ruscha, Sophie Calle e Chris
Marclay. Na sua obra mais recente, Under Blue Cup (Sob uma xícara azul),
Krauss faz uma interessante articulação teórica com a implicação da pala-
vra knight – que em português é também o cavalo do tabuleiro de xadrez,
para explicar Interface de Farocki.
No capítulo chamado “Knight’s Move” (O movimento do cavalo), há
o subtítulo “Farocki’s Fork” (O garfo de Farocki) inspirado no movimen-
to do cavalo cuja referência é a obra de Viktor Schklóvski, publicada em
1923. Knight’s Move acolhe uma coleção de artigos curtos, escritos para um
jornal de teatro em anos anteriores e Schklóvski a inicia afirmando que há
muitas razões para a “estranheza do movimento do cavalo”, sendo que “a
principal é a convencionalidade da arte”. Afirma que a segunda razão re-
side no fato de que o cavalo (knight) não está livre, “ele se move em forma
de L porque lhe é proibido tomar a estrada em linha reta.” Antes de tudo é
preciso lembrar que “estranheza” refere-se ao famoso conceito Ostranne-
nie, em português traduzido como estranhamento.

39 Y.-A. Bois, In Conversation: Rosalind Krauss with Yve-Alain Bois, The Brooklyn Rail, Feb 1st, 2012.

33
34

Para explicar sua hipótese, Krauss descreve a operação de Farocki que


apresenta a transposição para o universo digital das imagens fílmicas da
película que pode ser tocada com as mãos, mostrando que a materialidade
fílmica desaparece sem deixar traços. Esta transposição é associada ao
processo do Enigma, máquina de cifragem nazista cujas primeiras versões
tinham um modelo com máquina de escrever incorporada no dispositivo.
A maioria dos modelos de Enigma usou 3 ou 4 rotores com um refletor
para permitir que as mesmas configurações fossem usadas para codificar e
decodificar as mensagens. Interface, que em alemão é Schnittstelle, significa
também “mesa de edição”. Nas palavras de Farocki “Seria esta mesa de
edição uma codificadora ou descodificadora?”40 Trata-se de decodificar
um segredo, ou de mantê-lo? Farocki com sua projeção de dupla imagem
(no caso da versão mencionada por Krauss, duas televisões em cima de
pedestal), apresenta em uma tela as imagens brutas a serem editadas e na
outra aquelas já montadas.
Krauss então elabora o seguinte argumento: “O duplo duplicado como
celebração da especificidade de Farocki está inscrito como meio – o duplo
do “garfo” do cavalo – segurando o rei “instalação” em xeque. Como ca-
valeiro da sala de edição, ele diz “xeque” à demanda da arte da instalação
pelo fim do meio e do cubo branco. Seus trabalhos podem ser chamados
instalações, mas isto ultrapassa o problema.”41
O garfo no tabuleiro do xadrez representa uma jogada de duplo ata-
que com bifurcação pela qual o cavalo é colocado estrategicamente em
posição para atacar ao mesmo tempo duas peças importantes do adver-
sário que perderá uma delas, pois não pode defender as duas ao mesmo
tempo. Quando a tática é muito eficaz, o cavalo pode colocar o rei em xe-
que. Outras peças podem fazer o duplo ataque, mas o cavalo é o mais co-

40 R. Krauss, op. cit.


41 R. Krauss, Under Blue Cup, p. 114.

HARUN FAROCKI : PROGRAMANDO O VISÍVEL


PROGRAMANDO O VISÍVEL

nhecido por esta tática por causa de seu movimento singular no xadrez.
O garfo de um rei ou rainha é algumas vezes chamado de “garfo real”. No
caso de Schklóvski, o movimento do cavalo evocado parece ter relação
com seu artigo anterior “A arte como procedimento” de 1925 através do
qual apresenta a necessidade da técnica da desfamiliarização na arte para
liberar as imagens solidificadas e não percebidas pelo seu uso contínuo e
sem reflexão. Mas também o Movimento do cavalo é um metáfora do ca-
minho tortuoso que Schklóvski afirma preferir ao movimento “obediente
do peão e do rei”.
Entre dois universos teóricos e críticos, Farocki empresta à Documen-
ta a discussão política necessária para o momento, mas persiste no jogo
modernista cuja ética exige a “invenção de um meio”, como diria Stanley
Cavell42. O livro Art Since 1900, um compêndio sobre a história da arte
dos séculos XX e XXI, editado por Krauss e outros historiadores ligados à
October, incluiu na sua terceira edição de 2016 uma entrada sobre Harun
Farocki entre os proporcionalmente poucos exemplos de arte depois do
ano 200043, argumentando que o artista apresenta “uma série de traba-
lhos sobre a guerra e a visão [...] demonstrando a relação entre as formas
populares de entretenimento das novas mídias, como os videogames e as
condutas da guerra.”44 Duplo ataque no cânone da arte – o movimento do
cavalo é o movimento dos bravos, diz Schklóvski. É fato que Harun Faroc-
ki nunca deixou de fazer filmes, mas é um dos cineastas mais conhecidos
como artista da arte contemporânea.

42 S. Cavell, The World Viewed, p. 104. “Eu caracterizei a tarefa do artista moderno como não sendo a de criar uma
nova instância de sua arte, mas um novo meio dentro dela.”
43 O compêndio apresenta apenas vinte artistas de 2000 a 2016.
44 H. foster et. al., Art Since 1900, v. 2.

35
36

COMPUTADOR, UM MEIO. ENFIM


Durante a exposição Programando o visível, no Paço das Artes, o Brasil
estava sofrendo sua maior crise política dos últimos vinte anos. O Partido
dos Trabalhadores estava sendo acusado de ser responsável por uma gi-
gantesca corrupção e a presidente do país sofria um processo de impeach-
ment, que irá se efetivar alguns meses depois. Os grupos de amigos e cole-
gas se dividiam a respeito de suas posições e a mídia estava sendo acusada
de manipular a opinião pública sobre o impeachment, que era chamado de
“golpe”. As obras de Farocki expostas nortearam um espaço público muito
peculiar e efervescente de estudantes de graduação de mídias, cinema, ar-
quitetura, artes plásticas, sociologia, educação etc., além de professores e
pesquisadores destas áreas. Eu acolhi centenas de estudantes em conver-
sas informais sobre a obra de Farocki que sempre resvalavam para as ques-
tões da imagem da mídia referentes à política local. Eu tenho a impressão
de que Farocki teria gostado de participar daqueles debates com pessoas
tão próximas das imagens de games de Paralelo. Muitas ficavam felizes em
reconhecer os games que lhes são familiares nas obras expostas, em for-
mato de grandes projeções. Alguns percorriam atentamente as instalações
ouvindo com cuidado o que as imagens tinham a lhes dizer. Eu pensava
comigo mesma sobre o fato de que as imagens locais da mídia não tinham
impedido as pessoas de irem à rua em manifestações contra ou favor do
governo, porém os intelectuais pró-governo afirmavam que na realidade a
mídia estava manipulando os ingênuos. Esta é realmente uma linha muito
tênue, entre as imagens que manipulam e as imagens que inibem. Além
do mais, aquelas pessoas, jovens e conhecedoras dos games não tinham
vivido o debate do século XX sobre o estatuto da imagem na política ou da
imagem política.
No caso do debate brasileiro sobre a imagem, vinha-me sempre à mente
a proposta de Glauber Rocha diante de uma suposta provocação de Godard

HARUN FAROCKI : PROGRAMANDO O VISÍVEL


PROGRAMANDO O VISÍVEL

sobre chamado “cinema do terceiro mundo”, que o francês acreditava que


deveria ser destruído (penso que revolucionariamente)45. Glauber, por
outro lado, argumentava que o cinema brasileiro sequer havia sido cons-
truído: “em todos os níveis, na linguagem, na estética, na técnica…”. Este
provável gap entre o debate europeu sobre o cinema político e o debate bra-
sileiro implicava em que tipo de leitura da obra de Farocki? É difícil mensu-
rar, mas há um interesse acadêmico bastante significativo pelo seu cinema
em cinematecas e cineclubes, sempre associado ao âmbito político.
A obra de Farocki deve ter sido inicialmente mostrada no Brasil por
volta de 2008 ou 2009, com um ou dois filmes em mostras no Itaú Cultu-
ral e no CINUSP (Cinema da USP). Mais tarde, em 2010, suas instalações
Jogos Sérios foram exibidas na 29a. Bienal de São Paulo, quando houve
uma mostra extensiva de seus filmes na Cinemateca Brasileira. Desde
então, várias mostras e exposições aconteceram no Brasil, destacando-se
a mostra do MAR (Museu de Arte do Rio) chamada Harun Farocki e a Polí-
tica das Imagens com sua presença e da artista Antje Ehmann, sua parcei-
ra, com a proposta de curso e oficina, em 2012. Eu entrei em contato com
Farocki propondo uma exposição extensiva à Bienal de São Paulo que
aconteceria em 2010 e ficamos de conversar sobre este possível projeto
que não aconteceu naquele momento. Naquele mesmo ano tivemos um
contato diante da oportunidade de uma conversa em Johannesburgo por
ocasião da exibição de sua obra excepcional Jogo profundo, sobre a copa

45 G. Rocha, Revolução do cinema novo, p. 201-202. “Falei […] com Godard, que me disse: ‘Vocês, brasileiros, devem
destruir o cinema’. Eu não concordo. Vocês, na França, na Itália, podem destruí-lo. Mas nós ainda o estamos
construindo em todos os níveis, na linguagem, na estética, na técnica...”; p. 151-152: “Nos dias passados falei com
Godard sobre a colocação do cinema político. Godard sustenta que nós no Brasil estamos na situação ideal para
fazer um cinema revolucionário, e ao invés disso, fazemos ainda um cinema revisionista, isto é, dando importância
ao drama, ao desenvolvimento do espetáculo, em suma. Na sua concepção, existe hoje um cinema para quatro
mil pessoas, de militante a militante. Eu entendo Godard. Um cineasta europeu, francês, é lógico que se ponha o
problema de destruir o cinema. Mas nós não podemos destruir aquilo que não existe. E colocar nestes termos o
problema é sectário e, portanto, errado. Nós estamos em uma fase de liberação nacional que passa também pelo
cinema, e o relacionamento com o público popular é fundamental. Nós não temos o que destruir, mas construir.
Cinemas, Casas, Estradas, Escolas etc.”

37
38

do mundo de futebol de 200646. Naquele ano estava ocorrendo a copa do


mundo na África do Sul, mas Farocki não pode comparecer ao evento que
anunciava sua presença.
Conversando com Priscila Arantes sobre este projeto frustrado de ex-
posição, surgiu a oportunidade generosa de expor parte da obra de Farocki
no Paço das Artes em 2015, adiada para 2016. Interface foi a obra primeira-
mente selecionada por ser seminal e dar eixo à exposição. Além do fato de
nunca ter sido mostrada no Brasil, o obra corresponde a um deslocamento
não apenas de um artista, mas de todo um aparato de pensamento que o
cinema do século XX representou. Farocki não foi o primeiro cineasta a
expor em galerias, nem o primeiro artista a produzir filmes para museus.
Mas sua trajetória configura uma reorganização significativa do pensa-
mento intelectual e crítico do cinema programático em forma de instala-
ções fílmicas para ambientes artísticos. Há várias críticas a esta reorgani-
zação47, mas o espaço expositivo tem acolhido filmes de forma sistemá-
tica, permutando obras com cinematecas e festivais. E, se Farocki é um
grande cineasta que conseguiu a façanha de ser também um reconhecido
artista, Interface é a obra paradigmática deste cruzamento.
Interface também é paradigmática porque neste cruzamento oferece
um point-de-capiton, ou um ponto nodal (conforme terminologia freudia-
na), para possíveis significados dos meios (medium) diante do enigma da
máquina computadorizada que hoje domina tanto as instalações de arte
quanto as mostras de cinema. Sobre este assunto observa-se que, ironi-
camente, ainda hoje, os filmes apresentados em instalações costumam a
ser descritos como “vídeo”. Trata-se de uma herança da “videoarte” ou

46 Nora Alter relata que Farocki adorava futebol e que era a única arena na qual ele expressava orgulho nacional. Ela
também descreve que ele teria assistido aos jogos da copa que ocorreu no Brasil. Seria interessante saber qual foi a
reação dele diante do vergonhoso 7 a 1, placar do jogo que a Alemanha venceu o Brasil. Como teria compreendido as
imagens de uma profunda ferida do orgulho nacional brasileiro?
47 Ver R. Bellour, La querelle des Dispositifs.

HARUN FAROCKI : PROGRAMANDO O VISÍVEL


PROGRAMANDO O VISÍVEL

simplesmente uma submissão ao universo computacional, onde o filme


é sempre “vídeo” – “vídeo do youtube”, formato do vídeo, etc.? E é jus-
tamente este debate que a sua outra obra selecionada Paralelo I-IV trata.
Trata-se de uma instalação quadripartida que reflete sobre jogos compu-
tadorizados e que foi iniciada em 2012 e terminada em 2014, acabando
por ser a última obra do artista que faleceu naquele ano. São apresentados
excertos de jogos populares como Minecraft, Grand Theft Auto e Assassin’s
Creed, mas estes jogos falam mais da história da arte e do cinema, do que
de games ou dos problemas geralmente relacionados a eles como a violên-
cia. Um questão que intriga Farocki é o fato de que os games em idade re-
lativamente avançada não conseguiram produzir uma teoria significativa
como o cinema: “Quando o cinema tinha 35 anos de idade, já contava com
Arnheim, Balázs e Eisenstein entre seus teóricos.”48. E continua: “alguém
tinha de começar. Com toda modéstia. Eu não estou teorizando, mas de
alguma forma eu tentei abrir o campo para reflexão”49.
Para problematizar o lúdico da imagem gerada por computador o
artista baseou-se de modo geral nas noções culturais sobre a reprodutibi-
lidade técnica e as histórias culturais da pintura, lembrando que ambas as
trajetórias incluem a questão da imagem e sua relação com o real. Durante
as projeções de Paralelo I-IV, uma narradora nos leva através das quatro
instalações artísticas, discutindo a tradição grega de questionar a mímesis
na pintura, mencionando a história de Zêuxis e também o debate cine-
matográfico sobre a ontologia do cinema, conforme explorado por André
Bazin. Farocki produz um “arco da história” para interrogar o mais recente
dispositivo, o computador e a natureza das imagens que produz. O artis-
ta apresenta com cuidado a trajetória histórica e cultural que envolve o
debate, recusando-se a inclinar tanto para a noção de imagem gerada por

48 Ver “The New Constructivism: Harun Farocki and Erika Balsom Discuss Parallel I–IV”, infra.
49 Ibidem.

39
40

computador como progresso, quanto como fonte irreversível de alienação.


À primeira vista, Farocki parece desconfortável com a falta de perspecti-
va em jogos de computador, bem como a típica violência de que os jogos
são frequentemente acusados. A narração de Paralelo II diz que “o mundo
neste jogo é uma planície achatada como a Terra na visão pré-Helênica do
mundo.” Também parece incomodado com o aspecto de simulacro destas
obras quando afirma que “nos filmes, há o vento que sopra e o vento que é
produzido por uma máquina de vento. As imagens de computador não têm
dois tipos de vento”. Porém o próprio fato de estabelecer a historicidade
das imagens de jogos sugere que Farocki está elevando estas imagens à
condição de “primeira imagem”, como já aconteceu com a imagem da pers-
pectiva renascentista, assim como com a fotografia e o cinema.
Observa-se no entanto que as imagens de jogos são apenas algumas
das inúmeras imagens geradas e co-produzidas pelo computador. Outras
imagens, amplamente propagadas, incluem animações de computador
para o domínio médico e científico, às quais podem ser atribuídas uma
crença ainda maior no “realismo” e que deveriam também ser pensadas
com o mesmo escrutínio e cuidado da análise que Farocki concede às
imagens de jogos de computador. Nas recentes imagens de exploração da
Nasa, o contracampo para os participantes que comemoram o sucesso
de seus projetos de exploração astronômica é frequentemente uma ima-
gem ou animação gerada por computador que poderia ser considerada
uma imagem técnica em busca de narrativa. Assim como há uma crença
imperiosa na imagem médica – da radiografia, do ultrassom – tem havido
uma naturalização crescente da animação computadorizada a serviço da
ciência como imagem estabelecida. É desta perspectiva que a mostra foi
denominada Programando o visível.

HARUN FAROCKI : PROGRAMANDO O VISÍVEL


PROGRAMANDO O VISÍVEL

BIBLIOGRAFIA
ALTER, Nora. Two or Three Things I Know about the Avant-garde: Contemporary German and Austrian
Harun Farocki. October, n. 151, Winter 2015. Experimental Film. Rochester, N.Y. Camden House
______. The Political Im/perceptible: Images of The 2008.
World... In: ELSAESSER, Thomas. (ed.). Harun Farocki: ______. (ed.). Harun Farocki: Working on the Sightlines.
Working on the Sightlines. Amsterdam: Amsterdam Univ. Amsterdam: Amsterdam Univ. Press, 2004.
Press, 2004. FOSTER, Hal et. al. Art Since 1900, v. 2: 1945 to the Pre-
ALTHUSSER, Louis. Aparelhos ideológicos de Estado. São sent. 3 ed. New York : Thames & Hudson, 2016.
Paulo: Graal, 1992. FLUSSER, Vilém. Filosofia da caixa preta. São Paulo:
BALSOM, Erika. A World Beyond Control. Disponível Hucitec, 1985.
em: <http://www.lafuriaumana.it/index.php/56-archive/ FREUD, Sigmund. O mal-estar na civilização, novas con-
lfu-23/358-erika-balsom-a-world-beyond-control>. ferências introdutórias e outros textos (1930-1936). Trad.
BALSOM, Erika; FAROCKI, Harun. Parallel I-IV: Con- P.C. de Souza. São Paulo: Cia das Letras, 2010.
versation. Conversation between Erika Balsom, Harun HANSEN, Miriam. Reinventando os Nickelodeons:
Farocki, and the Public. Disponível em: <https://hkw.de/ Considerações Sobre Kluge e o Primeiro Cinema. In:
en/programm/projekte/veranstaltung/p_103694.php> ALMEIDA, Jane (org). Alexander Kluge: o quinto ato. São
BAUDRY, Jean-Louis. Le dispositif: approches mé- Paulo: CosacNaify, 2007.
tapsychologiques de l’impression de realité. Communi- HARUN Farocki e a política das imagens. Catálogo da
cations, n. 23, 1975. mostra, Rio de Janeiro: MAR, 2012. Disponível em: <htt-
______. Cinéma: effets idéologiques produits par ps://harunfarockieapoliticadasimagens.files.wordpress.
l’appareil de base. Cinéthique, n. 7/8, 1970. com/2012/11/farocki_programa.pdf>.
BECKER, Jörg. Images and Thoughts, People and HÜSER, Rembert. Nine Minutes in the Yard: A Conver-
Things, Materials and Methods. In: ELSAESSER, Tho- sation with Harun Farocki. In: ELSAESSER, Thomas.
mas. (ed.). Harun Farocki: Working on the Sightlines. (ed.). Harun Farocki: Working on the Sightlines. Amster-
Amsterdam: Amsterdam Univ. Press, 2004. dam: Amsterdam Univ. Press, 2004.
BELLOUR, Raymond. La querelle des dispositifis: Cinéma KRAUSS, Rosalind. The Power Of The Specific Image.
– installations, expositions. Paris: POL, 2012. Disponível em: <http://www.doppiozero.com/materiali/
BENJAMIN, Walter. A obra de arte na época de sua saggi/power-specific-image>. Acesso em: 11 mar. 2017.
reprodutibilidade técnica. In: LIMA, Luiz Costa (org.). ______. Under Blue Cup. Cambridge: MIT press, 2011.
Teoria da cultura de massa. São Paulo: Paz e Terra, 2000. ______. Reconfigurações no sistema da arte contempo-
______. Que é o teatro épico? Um estudo sobre Brecht. rânea. In: ARANTES, Priscila; BOUSSO, Daniela (orgs).
Magia e técnica, arte e política: Ensaios sobre literatura São Paulo: Paço das Artes, 2010.
e história da cultura. 7ed. São Paulo: Brasiliense, 1994. LANGFORD, Michelle. “Alexander Kluge”. Senses of
(Obras escolhidas, v. 1). Cinema, July, 2003. Disponível em: < http://sensesofci-
BOIS, Yve-Alain. In Conversation: Rosalind Krauss with nema.com/2003/great-directors/kluge/>
Yve-Alain Bois. The Brooklyn Rail, Feb 1st, 2012. Dispo- LIEBMAN, Stuart. “Why Kluge?”, On New German
nível em: <http://brooklynrail.org/2012/02/art/rosalind- Cinema, Art, Enlightenment, and the Public Sphere: An
-krauss-with-yve-alain-bois>. Acesso em: 12 mar. 2017. Interview with Alexander Kluge. October, n. 46, 1988
BORGES, Cristian; MOURÃO, Patrícia; MOURÃO, LEYDA, Jay. Film Beget Films: A Study of the Compilation
Maria Dora (orgs.). Harun Farocki: Por uma politização Film. New York : Hill and Wang, 1971.
do olhar. São Paulo: Cinemateca Brasileira, 2010. Dispo- MENDE, Doreen. The Many Haruns: A Timeline Th-
nível em: < http://cinemateca.gov.br/farocki/catalogo. rough Books and Hand Gestures from 18,000 BC–2061.
php>. Acesso em: 21 nov. 2016. E-Flux, n. 59, Nov., 2014 Disponível em: <http://
BRECHT, Bertolt. Um Homem é um Homem. Teatro www.e-flux.com/journal/59/61102/the-many-haruns-a-
Completo 2. Trad. de Fernando Peixoto. São Paulo: Paz -timeline-through-books-and-hand-gestures-from-18-
e Terra, 1991. -000-bc-2061/>. Acesso em: 11 mar. 2016.
CAVELL, Stanley. The World Viewed. Cambridge: Har- OSHIMA, Nagisa. Cinema, Censorship, and the State: The
vard University press, 1995. Writings of Nagisa Oshima. Editado por Annette Michel-
CHINEN, Lucy. At Our Expense: Harun Farocki’s Ima- son. Cambridge and London: The MIT Press, 1992.
ges at War. Rhizome. Disponível em: < https://rhizome. PAVSEK, Christopher. Harun Farocki’s Images of the
org/editorial/2014/jul/25/harun-farocki/>. World. Disponível em: <http://www.rouge.com.au/12/
DANTO, Arthur C. O Mundo da Arte. Artefilosofia, Ouro farocki.html>.
Preto, n. 1, jul. 2006. RODOWICK, David N. A consciência liberada de Harun
ELSAESSER, Thomas. The Future of “Art” and “Work” Farocki. In: SOBRINHO, Gilberto Alexandre (org.). Ci-
in the Age of Vision Machines: Harun Farocki. In: nemas em redes: tecnologia, estética e política na era digital.
HALLE, Randall; STEINGRÖVER, Reinhill (eds.). After Campinas: Papirus, 2016.

41
42

ROCHA, Glauber. Revolução do cinema novo. São


Paulo: Cosacnaify, 2004.
SIEBEL, Volker. Painting Pavements. In: ELSAESSER,
Thomas (ed.). Harun Farocki: Working on the Sightlines.
Amsterdam: Amsterdam Univ. Press, 2004.
STEYERL, Hito. Beginnings: Harun Farocki, 1944-2014.
E-Flux. n. 59, Nov., 2014. Edição especial dedicada a Fa-
rocki. Disponível em: <http://www.e-flux.com/announ-
cements/30738/beginnings-harun-farocki-1944-2014/>.
Acesso em: 11 mar. 2017.
STOLLMANN, Rainer. A realidade não é realista:
Alexander Kluge, o cinema alemão e europeu. In: AL-
MEIDA, Jane de (org). Alexander Kluge: o quinto ato. São
Paulo: CosacNaify, 2007.
STORR, Robert. Kassel Rock: Interview with Curator
Catherine David. Artforum, v. 35, n. 9, May 1997.

ENTREVISTAS E VÍDEOS
Erika Balsom – Serious Games.
Harun Farocki On Materiality – Cine-fils. Disponível
em: <http://marocservers.com/mp3/video/YuVLO-
zW3J-k/Harun_Farocki_On_Materiality_-_Cine-fils.
html>. Acesso em: 11 mar 2016.

HARUN FAROCKI : PROGRAMANDO O VISÍVEL


PROGRAMANDO O VISÍVEL

43
44

PROGRAMMING
THE VISIBLE
JANE DE
ALMEIDA

HARUN FAROCKI : PROGRAMANDO O VISÍVEL


PROGRAMMING THE VISIBLE

PSYCHIC AND POLITICAL ALIENATION


There is a well-known passage in the history of Sigmund Freud in which
he describes a determined “sense of disassociation” (in German, Ent-
fremdungsgefühl) that could also be translated as a feeling of alienation or
disaffection1. In 1936, Freud wrote a letter to his friend Romain Rolland
telling of an episode, which occurred in 1904, that he was unable to forget.
It was during his first visit to the Acropolis in Athens, of which he wrote
the following: “When finally, on the afternoon after our arrival, I stood on
the Acropolis and cast my eyes on the landscape, a surprising thought sud-
denly entered my mind: ‘So all of this really does exist, just as we learned
in school!’”2
To better explain this thought, Freud added the image of a person who,
facing Loch Ness, was surprised by the famous monster and forced to ad-
mit that it existed, a “sea-serpent we’ve never believed in!” Freud admit-
ted to a certain exaggeration in his example, affirming that it was not true
that he had doubted the existence of Athens during his school years. With
that said, he approached the psychic event starting from a division of the
mind between the part that doubted reality and the other that merely ad-
mired the Acropolis, because it had never doubted its reality.
Freud believed that his reaction to this episode was due to a feeling
of guilt over having transcended his family’s expectations of an intel-
lectual position that surpassed that of his father, who had not completed
high school. Freud presented two motives for his psyche to produce his
“sensation of defamiliarization”: 1) The continually active appearance of
repressed past painful experiences; and 2) The production of a defense
mechanism that developed denial. In reserving that he never doubted the
existence of Athens, Freud affirmed that his feeling was provoked by a dis-

1 S. Freud; A. Zweig, The Letters of Sigmund Freud and Arnold Zweig, p. 119.
2 Ibidem.

45
46

placement in relation to the fact that he had not imagined that he would
make it “that far”. This feeling, according to him, came from his poverty
and from his life conditions.
There are various interpretations of this event, but here it evokes the
phenomenon that the narrative of reality impedes the subjective experi-
ence in place of motivating it. When transposing this effect to the cinema,
one can point to various instances of film theory that concern themselves
with the production of an alienating narrative effect that either surpasses
reality or is inferior to it. Evidently, a film does not correspond to the ex-
act size of reality even when it aspires to do so, for example, through simu-
lation. In this case, cinema could be compared to a professor who narrates
the history of Athens in an absolutely impactful way in order to repress
the real Athens from his students’ reach. In the case of Freud, it took until
he was forty-eight years old for him to be practically “pushed” to Athens
and to feel very bad during the day on which he should have made his trip,
hounded by a feeling that he would not be able to arrive at the city. The
psychic state of Freud accompanied his incredulity about the fact that he
could arrive in Athens and feel depressed. He speculated about what had
happened at the time: “We’re going to see Athens? Out of the question! –
It will be far too difficult!” Finally, Freud associated “out of the question”
with its inverse reference: “Too good to be true”.
This disturbance of memory at the Acropolis reveals how the mecha-
nism of denial of reality can passively induce a state of non-belonging – an
effect that can also be produced by cinema. This appears to be a concern
for various film theorists. Or, to the contrary, cinema could exercise the
role of liberator from this model of passivity, adjusting the critical point
of view of the receiver in relation to the sensation of non-belonging. The-
odor Adorno, Walter Benjamin, Siegfried Kracauer, Jean-Louis Baudry,
Christian Metz, Laura Mulvey – these are just some examples and the list

HARUN FAROCKI : PROGRAMANDO O VISÍVEL


PROGRAMMING THE VISIBLE

could continue with other names, but the proposal here is only to refer to
the “universe” in question.
The dis-alienation suggested by Freud is not specifically associated
with the political universe, yet cinema and its accompanying theoreti-
cal side which seeks a libertarian method inspired by Bertolt Brecht and
Viktor Shklovsky are both concerned with the problem of alienation,
according to Marxist theory. The influence of both authors has been ac-
knowledged by various film directors and analyzed by numerous critics
and theorists.
Marx’s Entfrumdung (alienation) refers to the psychological disas-
sociation of the worker in relation to the production resulting from his
labor and the monetary value that he is given for his work according to
the logic of capitalism. “Defamiliarization”, “distancing”, and “breaking
the fourth wall” are some of the best-known methods from the Brechtian
playbook that have been elaborated by politically engaged filmmakers,
albeit with singular meanings on display in each of their works. Jean-Luc
Godard makes reference to Brecht beginning at least with Le Mépris (Con-
tempt, 1963) in which Brigitte Bardot’s BB moves into Bertold Brecht3.
The Brechtian influence becomes more evident once Godard unites with
Jean Pierre Gorin to form the Dziga Vertov Group. Beginning in 1968, both
filmmakers assume the position of a radical Brecht, with a line of investi-
gation that involves not only language, but the entire system or apparatus
of filmmaking.

3 T. Elsaesser, “Political Filmmaking after Brecht: Farocki, for Example”, in T. Elsaesser (ed.), Harun Farocki: Working
on the Sightlines.

47
48

MAKING THE POLITICAL FILM POLITICALLY


Part of “making the political film politically” depended on the strategy
of fighting the melodramatic political film of the Hollywood aesthetic
that offered public catharsis in the place of revolution, and that, therefore,
promoted passivity over political consciousness. One of the parameters
of this type of political film of the 1960s is Gillo Pontecorvo’s The Battle of
Algiers (1966), which was inspired by Italian Neorealism and which won
the Golden Lion at the Venice Film Festival. The film depicts the popular
struggle against French colonization in Algeria. Pontecorvo would state in
defense of his film, “People practically never experience the great events
of history with their own eyes.” But, for the Japanese filmmaker Nagisa
Oshima4 , The Battle of Algiers was more of a dramatic film than a political
film due to its efficient pursuit of the spectators’ emotions – for example,
through associating the death of a heroic character (that of Ali) with the
stirring of the Algerian revolution. The character Ali does not report on
his friends, and for this reason, the repressive French soldiers blow up the
building where he is hiding with three other people, including a baby. Ali’s
silence creates a melodramatic connection between the uprising and sen-
timental fiction that serves the film’s political purpose (or manipulation).
The sequence of events is arranged in accordance with Hollywood codes,
including with synchronized music to romanticize the film. As a result,
the work becomes a manipulative film and ideological propaganda. Os-
hima’s point of view could be associated with that which Walter Benjamin
calls the “aestheticization of politics”5.
Returning to the Freudian episode, Pontecorvo’s political film would
be more of a concealer of subjective and manipulative wishes than an
emancipator. The film would provoke a kind of delocalization of the naive

4 N. Oshima, Cinema, Censorship, and the State.

HARUN FAROCKI : PROGRAMANDO O VISÍVEL


PROGRAMMING THE VISIBLE

spectator to a place whose fate becomes traced by cinema through a ma-


nipulative process: Don’t talk, and die! A good revision of this system can
be seen in Godard and Gorin’s Tout va Bien (1972), within which the film-
makers stage a clear homage to Brecht.
During the time in which the debate has involved politics, it has also
become clear that in the process of the disalienation of the medium, the
cinematic methods practiced could transform themselves into a fetish,
facilitating the reification of the subjects conducted by a discourse of
farce. Estrangements without purpose, awaited distanciations, and cam-
eras appearing onscreen as elements utilized to break the fourth wall have
all been used to the point of exhaustion and are easily perceived as in films
made “after the manner” of Godard, for example. Even worse than the
commercial and aesthetic results of these methods is the fact of how the
images become emptied of political meaning and again turn into spectacle
– it will therefore be necessary to reinvent the method and film artists will
do it with similarities and differences.
Coincidentally, or as a consequence, the concept of the mechanism5
penetrates film theory and practice in the sense that it incorporates the
“all” of cinema and should be thought of as a wall to be demolished: Film-
making without its traditional hierarchies of functions, the author that
ceases to be the “artist” and becomes a collective without attributed in-
dividual names, the alternative distribution system, and, of course, not to
mention linguistic procedures that juxtapose sound and image in delib-
erately radical fashion. Godard and Gorin made experimental films that
sought not only a liberating position for their spectators, but also those
spectators’ complicity in acts that, at the time, were seen as revolutionary6.

5 The concept became known in cinema theory due to the article by J.-L. Baudry, “Le Dispositif: approches
métapsychologiques de l’impression de realité”, Communications, n. 23.
6 Today, they can be decodified as terrorists. For example, when they offer a manual about how to make a domestic
bomb in Wind from the East (1968).

49
50

The demolition of the fourth wall moves towards the direction of de-
nouncing the cinematic “apparatus”7, a “mechanism” that integrates all of
the particularities of a film beyond its message and aesthetic technique:
The dark room, the projector, the chair, the programming, the duration
of the film. This line of thinking fueled the criticisms of so-called “op-
erational images” produced by the photographic box, placing the very
machine8 and its “technical images”9 in question and drawing attention to
the production of medical and industrial images as well as images of train-
ing.
In a certain sense, it would be necessary to reinvent Brecht or even
search for a comprehension of “going beyond Brecht”, rethinking and
producing other effects proper to a more recent context with different
perspectives. Authors have ended up going back to Benjamin10 in order to
commence a rereading of Brecht, beginning with Benjamin’s text about
the gesture, which he wrote in relation to Chinese11 theater when he saw
the Peking Opera in Moscow, for example.

KLUGE IN FAROCKI
Within the perspective of the New German Cinema, the prize-
winning filmmaker and intellectual Alexander Kluge is a torchbearer of
Brechtian theory who proposes a kind of editing made through connect-
ing contradictory images, or even images with no immediate connections
between them, with the goal of providing particular associations for his
audiences. He thus proposes the guidance of narrative towards a place in

7 L. Althusser, Ideology and Ideological State Apparatuses; e J.-L. Baudry, op. cit.
8 See V. Flusser, Towards a Philosophy of Photography.
9 In commenting on Kittler’s and Flusser’s concepts, Elsaesser observes that the operational or technical images,
according to Flusser and Kittler, drew Farocki’s attention before they appeared in better-developed form in the work
of these theorists. See T. Elsaesser, “The Future of ‘Art’ and ‘Work’ in the Age of Vision Machines: Harun Farocki”, in
R. Halle; R. Steingröver (eds.), After the Avant-garde, p. 37.
10 W. Benjamin, “Que é o teatro épico? Um estudo sobre Brecht”, Magia e técnica, arte e política, p. 89. (PT)
11 B. Brecht, Man Equals Man.

HARUN FAROCKI : PROGRAMANDO O VISÍVEL


PROGRAMMING THE VISIBLE

which spectators’ minds can be active in response to images and avoids a


manipulative process as much as possible12. Kluge is a filmmaker aligned
with Brechtian concerns, but he has proceeded by researching his own
methods in the sense of fostering his spectators’ intellectual participa-
tion. Beginning in the 1980s, Kluge’s works became more strongly built
with a variety of image fragments composed of photographs, archival
footage, illustrations from children’s books, drawings, material from
television, and intertitles, in addition to documentary footage and fic-
tional episodes recorded especially for the films. According to Stuart
Liebman, “Instead of putting these fragments together as an ‘ideal mean-
ing’, Kluge puts the emphasis on the role of the spectator in the produc-
tion of meaning. The more loose the logical connection is, or the wider
the gap is between consecutive images, the more space is left to the spec-
tator to activate his own Phantasie.”13
In Yesterday Girl (1966), Kluge already uses heterogeneous materi-
als like drawings and models, albeit in inhibited form. This procedure
gains essayistic meanings in The Power of Feelings (1986), in which one can
perceive its intense and impactful usage. The political importance of the
procedure is not merely in the fact that the images refer the spectator to
new sentiments, but also in the fact that the historicity of the mediums
and materials used is evidenced through an editing scheme that does not
provide visual homogeneity. Mirian Hansen has associated Kluge’s con-
structions of short narratives with intertitles to early films made in the era
of nickelodeons14.
In addition to a usage of heterogeneous material, Kluge adopted a

12 M. Langford, “Alexander Kluge”, Senses of Cinema.


13 S. Liebman, “On New German Cinema, Art, Enlightenment, and the Public Sphere: An Interview with
Alexander Kluge,” October, n. 46.
14 M. Hansen, “Reinventando os nickelodeons: Considerações sobre Kluge e o primeiro cinema”; R. Stollmann, “A
realidade não é realista: Alexander Kluge, o cinema alemão e europeu”, in J. de Almeida (org), Alexander Kluge: o
quinto ato. (PT)

51
52

realistic representation of performance with documentary and fictional


elements in his fragmented narratives. One example of documentary
and performance that is frequently commented upon is the frame in The
Female Patriot (1987), in which the character of the history professor Gabi
Teichert goes to the convention of the Social Democratic Party (Sozialde-
mokratische Partei Deutschlands) and speaks with real politicians to vindi-
cate a “German story that is worth teaching.” The German history teacher,
played by the actress Hannelore Hoger, leaves the convention delegates
perplexed and irritated. These procedures are elements of linguistic con-
struction and are not directly connected to the apparatus. However, the
filmic material’s heterogeneity denounces an apparatus through its very
composition, thus turning itself into an ethical choice of the filmmaker,
since the history of cinema and its inventions presents itself in films
themselves as well as in their narratives. After this era, Kluge practically
stopped making films with cinematographic proposals and began working
with television documentaries and writing books.
Starting from this framework, this article will make deductions about
the beginning of Harun Farocki’s work. The filmmaker and subsequent
video artist made public the influences of the Dziga Vertov Group and Go-
dard on his practice (as well as his known admiration for Straub-Huillet),
but spoke little about the influence of Alexander Kluge15. Authors that
approached Farocki’s work typically noted that he needed to differentiate
himself from members of the previous generation of German filmmakers,
which, in this case, was precisely the generation of Alexander Kluge16. On
a rare occasion, in an interview with Thomas Elsaesser, Farocki defended
Kluge from accusations made in respect to the guiding presence of his

15 See C. Pavsek, “Harun Farocki’s Images of the World”, one of the few articles to present Kluge as an influence on
Farocki’s work.
16 Ibid.

HARUN FAROCKI : PROGRAMANDO O VISÍVEL


PROGRAMMING THE VISIBLE

voice in films, saying, “Kluge has such a wonderful feminine Saxon word-
melody!” He then continued, “When Kluge speaks it’s not at all easy to
understand what he says – there is still plenty of work for the spectator”17.
But Farocki also accused: “Kluge is just too much of a megalomaniac to
make co-operation possible”18. Since both artists were German and pro-
duced political works, it could appear that these are the most important
connections between them. Nevertheless, there is also a deep relation-
ship, that is perhaps more defined, between the filmmaking procedures
of the two directors: The usage of images from different sources, the con-
ductive narrating voice of the essay film (even though Farocki chose vari-
ous voices in addition to his own), the lack of concern with filmic time,
and the great concern with the intervals between images in montage.
Farocki began his career with the support of television by making works
in 16mm to be transmitted through the medium19, since during the 1960s
and 1970s, television was what welcomed the cinematic vanguard in West
Germany20. According to the filmmaker’s website, it was only in 1970 – af-
ter he had made 11 films – that Farocki’s film The Division of All Days (1970)
became his first work to participate in a film festival (in Oberhausen)21. His
early films, already considered to be essayistic, counted with his participa-
tion as an actor and with filmed performances. These film essays explored

17 T. Elsaesser, “Making the World Superfluous: An Interview with Harun Farocki”, in T. Elsaesser (ed.), op. cit., p.
188.
18 R. Hüser, “Nine Minutes in the Yard: A Conversation with Harun Farocki”, in T. Elsaesser (ed.), op. cit., p. 311.
19 WDR (Westdeutscher Rundfunk) see: 1. Original title Jeder ein Berliner Kindl, Director Harun Farocki
Cinematographer Gerd Delp Production DFFB, Berlin-West Format 16mm, b/w, 1:1,37 Length 4 min. 2. Original
title Zwei Wege Director, Scriptwriter Harun Farocki Cinematographer Horst Kandeler Production SFB, Berlin-West
TV-producer Hanspeter Krüger Format 16mm, b/w, 1:1,37 Length 3 min. First broadcast 31.03.1966, Nord 3 Note
commissioned for the TV series Berliner Fenster 3. Original title Die Worte des Vorsitzenden Director Harun Farocki
Assistant director Helke Sander Scriptwriter Harun Farocki, based on texts by Lin Piao Cinematographer Holger
Meins Production DFFB, Berlin-West Format 16mm, b/w,1:1,37 Length 3 min. First broadcast 27.06.1969, ZDF 4.
Original title Die Worte des Vorsitzenden Director Harun Farocki Assistant director Helke Sander Scriptwriter Harun
Farocki, based on texts by Lin Piao Cinematographer Holger Meins Production DFFB, Berlin-West Format 16mm,
b/w,1:1,37 Length 3 min. First broadcast 27.06.1969, ZDF.
20 N. Alter, “Two or Three Things I Know about Harun Farocki”, October, n. 151, p. 24.
21 See <http://www.harunfarocki.de/home.html>.

53
54

effervescent issues of his time such as strikes, wars, and ongoing public de-
bates, and they can be associated with a style of production typical to tele-
vision. The medium at that time marked a very new event, and it was only
in 1963 that Zweites Deutsches Fernsehen – ZDF (Second German Televi-
sion) began centralized transmission of television with continual pro-
gramming. This context indicates, in Western German television’s birth, a
type of production work undertaken without the expectation of traditional
cinematographic recognition, characterized by the usage of filmic material
(16mm and 35mm), content directed towards reception within a cinema
theater, and duration that fell within festival range (short films, up to 15
minutes, and long films, over 60 minutes). From the beginning, Farocki’s
films did not make use of well-known actors, nor of pre-established dura-
tions, and despite being filmed in 16mm, they debuted on television. For
these reasons, Farocki began his career as a filmmaker who was considered
to be an extreme outsider, one who failed to meet the basic requirements
for a successful career at the time with an aim to screen work in reputed
European festivals. It is worth remembering that both Godard and Kluge
ended up dislocating themselves towards a type of impure cinema made up
of works financed by television, but that they did so after they had received
recognition from important European festivals that assured them space
for daring experiments and guaranteed reception.

FOUND-FOOTAGE FILMS
In the short film White Christmas (1968), Farocki uses images from dif-
ferent material sources22 to make what can be considered a “proto” found-

22 See H. Steyerl, “Beginnings: Harun Farocki, 1944–2014”, E-Flux, n. 59, which says: “Harun Farocki’s legendary
works – as filmmaker, writer, and organizer – are full of exemplary beginnings. From agitprop shorts to film essays
and beyond. From didactic fiction to cinema verité. From single channel to multi-screen. From Kodak to .avi, from
Mao to mashup. From silent films to hyperventilating talkies. From close reading to distanced comment. From
interview to intervention, from collaboration to corroboration. On July 30, Harun Farocki died.”

HARUN FAROCKI : PROGRAMANDO O VISÍVEL


PROGRAMMING THE VISIBLE

footage film within his extensive body of work. This film of around three
minutes in length is a collage of photos and images from different sources,
all synchronized to a soundtrack of music by Bing Crosby, that criticizes
the innocent image of a white Christmas offered while people die in the
Vietnam War. One year later, Farocki made a film on the same subject –
perhaps the most commented-upon of all his works – called The Inextin-
guishable Fire (1969), which makes use of performance, but not of archival
material. Farocki returns to the essay procedure marked by multiple im-
ages from different origins in The Trouble with Images (1973)23, which was
compiled from television scenes. This was his first film made entirely with
archival footage. During the previous year he had made The Language of
Revolution (1972) with a great part of the material filmed by third parties,
but still with some excerpts filmed by him. About The Trouble with Images,
Farocki offered the following: “I want to demonstrate that most feature
films are of the sort that make people lose their interest and appetite for
the real world.”24 This is a nodal point of production in his most distinct
styles of filmmaking (activist, observational, or essayistic), adding to the
fact that the phrase rightly corresponds well with the inhibition about
which Freud wrote.

OBSERVATIONAL FILMS: NEITHER OF THE TWO, NOR BET-


WEEN THE TWO, BUT BEYOND THE TWO
Whoever knows a little about the work of Harun Farocki easily recog-
nizes his activist films (The Inextinguishable Fire, etc.) and the grouping of

23 See V. Siebel, “Painting Pavements”, in T. Elsaesser (ed.), op. cit., p. 45: “The aim was to expose their
machinations. The WDR (West German Broadcasting) offered him a platform for this. In 1973, for the series
Telekritik (tele-criticism), Farocki made Der Ärger mit den Bildern (The Trouble with Images), a critical meta-film
in which he settled scores with the television news feature as a format, by pointing out the systematic over use of
meaningless images.”
24 < http://www.harunfarocki.de/films/1970s/1973/the-trouble-with-images-a-critique-of-television.html>.

55
56

essay films or compilation films25. His most recent films are denominated
as “observational films” and, according to Pavsek, had their start with the
film An Image (1983): A documentary with long takes in which the camera
puts itself in the position of voyeur during a session of photos taken of a
nude woman for Playboy Magazine. The film is 25 minutes long and was
made for television for the series Projektionen´83.
The fact that the camera takes its time in residing on the image – thus
leaving the spectator in the place of an attentive participant – and the fact
that these films steer towards denaturalizing images26 are important ele-
ments, since a singular and strategically used discomfort is provoked by
the positioning of the parts involved in observational films: The position
of television that “commissioned” the film, aiming for criticism of the
advertising image of consumption, and the position of photographers that
believe they are being filmed in order to be publicized. Farocki, however,
does not opt for any of the sides and affirms that he wants to go beyond
these places27. The duplicity of positioning is better understood if the
spectator knows of Farocki’s standpoint as a militant author and contem-
plator of images. Furthermore, Farocki does not ever position himself
out of the scene. The spectator is imprisoned in the ghostly trap between
two places, with the hope that the filmmaker chooses one of them – the
place of enjoying the image of a naked woman, and that of the critic of the
system of image exploitation. Between the uninformed spectators (the
Testadura, as philosopher Arthur Danto said in respect to the naive spec-

25 The theory contains debates about the precision and the nomenclature of filming procedures that arose with the
usage of recycled material in film and television. Compilation Film refers to a tradition first theorized by J. Leyda, Film
Beget Films. Later the term Found Footage arose, and more recently, Film-Essay or Essay Films.
26 Effects marked by C. Pavsek, op. cit.
27 “This film, An Image, is part of a series I’ve been working on since 1979. The television station that commissioned
it assumes in these cases that I’m making a film that is critical of its subject matter, and the owner or manager of
the thing that’s being filmed assumes that my film is an advertisement for them. I try to do neither. Nor do I want
to do something in between, but beyond both.” Synopsis written by Farocki, see <http://www.harunfarocki.de/
films/1980s/1983/an-image.html>.

HARUN FAROCKI : PROGRAMANDO O VISÍVEL


PROGRAMMING THE VISIBLE

tator facing contemporary art28) and the accomplice-spectator of political


criticism, Farocki looks for another path altogether.
In Still Life, made in 1997, the filmmaker returns to the subject of pho-
tography of consumption, this time showing objects being meticulously
prepared for publicity purposes, in a longer film that had its debut within
an art exhibition. Once again, Farocki places the spectator in front of the
contradiction that, on one hand, waits to fulfill the place of the cultural
critic of consumption and, on the other, frightens him with the dignity with
which the advertising work is treated, showing the persistence, dedication,
and obsession with details through which an image is constructed. In this
case, Farocki’s solution surpasses the ghost of double place in surprisingly
associating the advertising photographer with 17th-entury Flemish paint-
ings. The hypothesis presents itself like a third-party conciliator, but is
also disturbing. Flemish painting, which describes objects, arose during
the birth of the capitalist system in the region, just as the advertising im-
age, in its way, serves the capitalist consumption system in our time. The
pronkstilleven or the “ostensible still life” would describe the abundance of
objects and food items – or animals to be eaten, at that time. It is estimated
that, during the Dutch golden age, between five and ten million paintings
were produced with the aim of being sold, different from the Italian system
that sponsored pictorial production through the Church or through bank-
ers. In this way, by association, the specter also emerges that the advertis-
ing image is the recognized iconicity that represents our age, surpassing
art or film photography. At the end of the film Farocki, maintaining his
humanistic concerns, argues that the people who build the objects cannot
be seen in the images and therefore cannot be imaginable, just as how the
people who view the object also become unimaginable, all of which leads to

28 A.C. Danto, “The Artworld”, Artefilosofia, n. 1. (PT)

57
58

a new “starting point for a new vision of the human being”. Documentary
sketches of advertising photographs with an observational character join
with images of Flemish paintings, with voiceover narration making asso-
ciations between them or else producing associative contrasts.
Farocki’s observational films are composed with few camera move-
ments and few positioning angles – they are almost security videos. In the
case of Still Life, there are many extended close shots, and at first, their
usage appears to be a particular strategy to concede time so that the spec-
tator may retain his view of the image. The next step is to find a reason for
this choice of the filmmaker, since for some time the spectator stays in
front of long shots without the expected connections to other shots, no
cuts, no fusion, almost no “montage”. It is left to the spectator to ques-
tion the author’s intentions and make associations, generally starting
from historical references – whether from the theme, or from language, or
from the medium in its specificity. This procedure suggests a significant
dislocation in Farocki’s career, which, little by little, removes itself from
cinema to enter the world of art in its contemporary perspective.
A more recent example of this procedure is the series of video instal-
lations, Serious Games, begun in 2009. The first work of the series, called
Immersion, is composed of a two-screen installation filmed in an American
military training center in California. The left-hand screen shows a com-
puter training game and the right-hand screen shows a person wearing a
virtual reality mask. There is nothing new in the language of either film, if
not the division of the image that raises intellectual questions and associa-
tions related to the very division of the subject from what the image repre-
sents. However, when the soldier suddenly makes manifest his traumatic
collapse, the left screen turns disturbingly black29. What is being shown is a

29 L. Chinen, “At Our Expense: Harun Farocki’s Images at War”. Rhizome: “Initially, I wasn’t aware that the exercise

HARUN FAROCKI : PROGRAMANDO O VISÍVEL


PROGRAMMING THE VISIBLE

therapeutic game for war veterans who have Post-Traumatic Stress Disor-
der (PTSD). For nearly the entirety of the 20-minute-long film, the soldier
retraces his traumatic warpath, now within a simulated space in the video
game and accompanied by a psychologist in a supposedly therapeutic ac-
tivity. The game situation employed to cure war trauma is itself anecdotal
if we take into account the theoretical relevance of the theme in the fields
principally of psychoanalysis, psychology, and literature. Trauma is a theo-
retical concept that Freud and Lacan recreated in psychiatry to name a
complex and important approach in psychoanalysis and in studies about
the psyche in general. More recently, literary studies adopted the concept
of trauma to speak about the Holocaust. This is to say that the theory of
trauma carries an intellectual weight in the humanities, which immedi-
ately contrasts with the usage of games for therapeutic ends. This issue
presents itself as a subtext to the curiosity in understanding how the visual
field and the psyche can be affected by computerized image technologies.
Once again, the specter of the double appears, willed into place precisely
by the absence of a cinema of associative montage and by the presence of
a “direct” cinema, but a contemporary kind of direct cinema that awaits
the judgment of the spectator who no longer believes in the raw truth of
the camera. The narrative proceeds and the soldier “relives” the trauma
in a blunt manner – making ever-larger the ghost that inhabits the space
between the image that wants to show itself (Farocki alleges that it was
very easy to obtain permission to film inside the military training center30,
and it is imaginable that the center wanted to be publicized) and that which

in part two was staged; a similar slippage between reality and simulation occurred in the third part, Immersion. In
a therapy session, a soldier retells a traumatic combat experience while wearing a headset streaming a simulated
environment which replicates the memory. The soldier seems more and more vulnerable as the session proceeds,
revealing feelings of disconnect toward his fellow soldiers and the sight of the mutilated body of his partner.
When the session ends, though, the soldier smiles, an audience claps, and we see that this whole scenario was a
demonstration of the software used to recreate war environments to treat post-traumatic stress disorder.”
30 Ibidem.

59
60

investigates (on the part of the filmmaker) without being able to fall easy
prey to the Baudrillardian trick of the simulacrum as an image of the copy
of reality. Conducting the film along this line of tension towards the point
in which the soldier reveals himself as a software salesman is an act of great
expertise on Farocki’s part – a rhetorical doubling strategy that dislocates
itself from the method of meta-language used in earlier years. Such a dislo-
cation also enables consideration of Farocki’s concern with psychic alien-
ation, perhaps as a predecessor of political alienation.

PASSAGE TO SPACE
This creative trajectory, which occurred between 1983 and 2009, is
known as the journey of the filmmaker towards the condition of artist,
which met with great critical acclaim. Farocki’s first art installation, In-
terface, was commissioned by the Lille Modern Art Museum in France in
1995. The commission envisioned a piece by the artist about his work, and
Farocki inaugurated this stage with a question about what it meant to use
works from other people. The Soviet filmmaker Esfir Shub made films
with material from other films beginning in 1927 and is the introductory
example of a type of film, if not genre, constituted from archival material31.
Starting from this point, there have been innumerable other films made
with various materials. In the context of the Second World War, the infa-
mous film The Eternal Jew (1940) was composed primarily from third-par-
ty images in order to manipulate the German public and justify the crimes
committed by the Nazi regime. Later, Alain Resnais’s renowned film Night
and Fog (1956) made use of archival footage to raise the spectator’s aware-
ness of his commitment to a politics of images, a usage that Farocki has

31 See J. Leyda, op. cit. Once can consider that even the films of the Lumière brothers are made of archival material,
since many scenes were not filmed by them, but with cameras sent out to “bring the world to the world”.

HARUN FAROCKI : PROGRAMANDO O VISÍVEL


PROGRAMMING THE VISIBLE

said inspired him32. Both cases bring to bear the complex ethical issue of
the Holocaust, with the first case used for making Nazi propaganda and
the second with the goal of considering the absurdity of the event’s atroci-
ties. Images of the Holocaust represent a crucial point in the discussion
of the truth of the image in the 20th century, and this discussion can be fol-
lowed through the debate proposed by Claude Lanzmann in Shoah (1985).
A curious example is the fact that the first fiction film to use scenes of
material registered in the concentration camps was The Stranger (1946),
directed by Orson Welles. The film is about the postwar hunt to capture a
fugitive Nazi. In order to convince the character of the Nazi’s wife about
the true identity of her husband, the investigators uses real scenes from
the Holocaust to guarantee the truthfulness of their position. However,
in Interface, the problem that Farocki approaches – despite touching on
the margin of the question of the truth of the image – directs itself to an
appropriation of images that were initially made for one context and that
then gained another through subsequent reassembly.
With Interface, Farocki also inaugurated a mode of presenting a film by
means of two screens to enter into dialogue with the viewer in an art gal-
lery, operating in a very different circuit from that of the film club. In addi-
tion to the basic social differences generated by mere facts – a work of art
is expensive and generally made with cheap materials (with exceptions,
of course), while a film needs a great deal of money to be made but very
little to be watched – the two intellectual worlds each produced theories
that are inherent to their fields33. Sometimes theory and production meet,

32 T. Elsaesser, “Political Filmmaking after Brecht: Farocki, for Example”, op. cit.
33 It would be an error to say that there is no political concern in 20th-century fine arts, but great conversations
involving Clement Greenberg, Arthur Danto, and Aby Warburg touched on politics in a tangential manner. Giulio
Carlo Argan was an example of a historian and political activist. The celebrity-artists who have been discussed in
intellectual circles, such as Duchamp, Picasso, and Warhol, are not recognized for their political performances.
In cinema, the division can be considered another: Between Hollywood cinema and European. In the European
universe, a significant portion of great names made films with political concerns or platforms: Eisenstein, Vertov,
Godard, Resnais, Marker, Fassbinder, Pasolini, Visconti, Oshima, and Marker – to name a few of the classics.

61
62

but not always. One example is precisely the concern with the alienation
of the spectator, which was emblematic of postwar political cinema and
fueled by a robust and lasting debate, and which did not provoke a discus-
sion of art at the same level. It is not that the debate was seen as being over
form and realism in the arts, over general and specific objects, or even
over the end of art history. Politics fomented various movements, but did
not present itself as the primary subject. Today, one of the demands of
“political discourse” in contemporary art is to diminish the space between
art and life, due to the fact that art in recent times has produced a herme-
neutic intellectual discourse deemed inaccessible to novitiates and to
social classes that have not been introduced to it.
When Farocki presented Interface in a museum, he also made a linguis-
tic passage towards an eye divided between two screens for the viewer
accustomed to seeing paintings on walls. The German curator and theo-
retician Doreen Mende called this moment of his work a “spatial turn”34.
Together with the divided space, the “film” was exhibited in continual
looping, without the old need of the apparatuses of cinema and television
to program the time of the exhibitions. The audience of art installations
would therefore encounter the “film” in any part of its narrative and the
artist would understand that it would be necessary to conceive of an ad-
equate language for this phenomenon.
Thematically, Interface prompts one to think of Farocki’s artistic prac-
tice that recuperated his films in order to produce a meta-language that
reflected on his work, triggering a self-referential process that coincided
with the trajectory of a career as it withdrew from cinema and approxi-
mated museum and gallery art. In 1997, the film Still Life had its debut in
documenta in Kassel, but within a series of films connected to the exhibi-

34 D. Mende, “The Many Haruns”, E-Flux, n. 59.

HARUN FAROCKI : PROGRAMANDO O VISÍVEL


PROGRAMMING THE VISIBLE

tion, not as an installation. Interface, however, had an extensive career in


art museums following its Lille premiere and was ironically welcomed by
two rival critical factions within the debate over art during the end of the
20th and beginning of the 21st centuries: Those that proposed the “end of
the white cube”, whose chief proponent was the French curator Catherine
David, and those who represented the struggle for the importance of the
“specificity of the medium”, whose chief defender was the American critic
Rosalind Krauss.

THE MOVEMENT OF THE HORSE: DOUBLE ATTACK


Catherine David, an enthusiastic frequenter of film clubs, was the first
female curator of documenta and was responsible for commissioning
Farocki’s film Still Life for edition X of the gigantic exhibition. Decreeing
the “end of the white cube”, understood as a neutral space conceived to
guarantee an atemporal quality and sanctity to the works in art exhibitions,
the curator also broke with a representation of the ideology of modernism
by inferring that the white cube favors the aspirations of a meta-narrative.
David consequently alleged that contemporary practices no longer cor-
responded to the proposals of a space considered “neutral”35. With inter-
disciplinary and multicultural appeal, the exhibition spatially and concep-
tually extrapolated the environment expected of the museum by expand-
ing beyond the city of Kassel and beyond the walls of a warehouse with
installations, performances and conferences (the famous “100 days, 100
guests”) featuring political manifestations as well as aesthetic ones.
On the other side, the American editor and critic from the influential
journal October did not agree with the end of the white cube and accused
documenta X of being precisely the model of a fraud in contemporary
art with its ubiquity of so-called “art installations”. For Krauss, the artis-

35 See R. Storr, “Kassel Rock: Interview with Curator Catherine David”, Artforum, v. 35, n. 9, p. 77.

63
64

tic means and materials, when transformed into installations, created


spectacles that “swallow and oppress their spectators”, induced by large
art fairs36. To advance her point of view, Krauss used Harun Farocki37 as
an example, challenging David’s point of view in respect to his works,
which were “perversely [...] always referred to as installation”. Further-
ing her provocation, she recalled that the works of the filmmaker were
indeed “projected on the white wall of the cube”. After a few paragraphs
explaining the relation between Farocki’s method of editing and his me-
dium, Krauss argued that in Interface, contrary to in an art fair installation,
“Farocki’s viewer is required to linger over his films so as to analyze their
raison d’être”. And, she claimed, “in this task the viewer here enters the
Schnittstelle [Interface in German] to identify with the artist”.
Farocki was invited by Catherine David to participate in this competi-
tive environment of contemporary art for the first time, and some years
afterwards, he fell into grace with Rosalind Krauss, who affirmed having
seen Interface in Jeu de Paume, in Paris, probably in 200938. She consid-
ered Farocki a “knight of the medium”, defined as one of those who “are
doing what they have to do, which is reinventing the medium by inventing
or borrowing a new technical support”. The knight’s list included artists
such as William Kentridge, James Coleman, Ed Ruscha, Sophie Calle, and
Christian Marclay. In her most recent work, Under Blue Cup (2011), Krauss
makes an interesting theoretical articulation with the implication of the
word “knight” to analyze Farocki’s Interface.
There is a subtitle called “Farocki’s Fork” in the chapter called
“Knight’s Move”, inspired by the knight’s movement, whose reference is

36 R. Krauss, “The Power Of The Specific Image”. “The media, translated as video installations, which create
vivid spectacles that engulf and overwhelm their viewers are now, indeed, the contemporary work elicited by the
international exhibition or art fair.”
37 Ibidem.
38 Y.-A. Bois, “In Conversation: Rosalind Krauss with Yve-Alain Bois”, The Brooklyn Rail, Feb 1st, 2012.

HARUN FAROCKI : PROGRAMANDO O VISÍVEL


PROGRAMMING THE VISIBLE

the work of the same name by Viktor Shklovsky, published in 1923. Shk-
lovsky’s Knight’s Move contains a collection of short articles written in
previous years for a theater journal, and he begins by affirming that there
are many reasons for a “strangeness of the movement of the knight”,
with “the first being the conventionality of art.” He affirms that the sec-
ond reason resides in the fact that the knight is not free, “he moves in the
form of an L because it is prohibited for him to take the road in a straight
line”. Before going further, it is necessary to remember that “strange-
ness” refers to the famous concept of Ostrannenie, which is called “defa-
miliarization” in English.
To explain his hypothesis, Krauss describes Farocki’s operation, which
presents the transposition to the digital universe of filmed celluloid im-
ages that can be touched with the hands, showing that the filmic material
disappears without leaving a trace. This transposition is associated with
the process of Enigma, a Nazi encryption machine whose first versions
had a model with a typewriter incorporated in the device. Most of the
Enigma models used three or four rotors with a reflector to allow for the
same configurations to be used to code and decode messages. Interface,
which in German is Schnittstelle, also means “editing table”. In the words
of Farocki, “Might this editing station be an encoder or a decoder?”39 Is it
to decode a secret or to maintain one? Farocki, with his dual-image projec-
tion (in the case of the version mentioned by Krauss, two televisions on
top of a pedestal), presents on one screen the raw material to be edited,
and on the other, the edited footage.
Krauss then creates the following argument: “The double doubled as
Farocki’s celebration of specificity is enrolled as medium – the double of
the knight’s fork – holding the installation’s king in check. As knight of

39 R. Krauss, op. cit.

65
66

the editing room, he says ‘check’ to installation art’s demand for an end
to the medium, as for the white cube. His works may be called installa-
tions, but this circumvents the question.”40
On the chessboard, the fork represents a double attack move through
a bifurcation by which the knight is strategically placed in position to
attack two important pieces of the opponent at the same time. The op-
ponent will lose one of them, since it is impossible to defend both simul-
taneously. When the tactic is very efficient, the knight can put the king
in check. Other pieces can also make the double attack, but the knight is
known best for this tactic because of its unique movement on the chess-
board. The fork of a king or a queen is sometimes called the royal fork. In
the case of Shklovsky, the evoked knight’s movement seems to relate to
his 1925 article “Art as Technique” or “Art as Device”, in which he presents
the need for the technique of defamiliarization in art to liberate the im-
ages that are solidified and not perceived by their continual usage without
reflection. However, the knight’s movement is also a metaphor for the tor-
tuous path that Shklovsky prefers to the “obedient movement of the pawn
and the king”.
Between two theoretical and critical universes, Farocki lent the politi-
cal discussion necessary for the moment to documenta, but persisted in
the modernist game whose ethics demand the “invention of a medium”,
as Stanley Cavell wrote41. The book Art Since 1900 (2004), a summary of
the history of art in the 20th and 21st centuries that was edited by Krauss
and by other historians connected to October, included an entry on Harun
Farocki in its third edition of 2016 among the proportionately few ex-
amples of art after 200042, arguing that “Harun Farocki exhibits a range of

40 R. Krauss, Under Blue Cup, p. 114.


41 S. Cavell, The World Viewed, p. 104. “I characterized the task of the modern artist as one of creating not a new
instance of his art but a new medium in it.”
42 The compendium presents only twenty artists from 2000 to 2016.

HARUN FAROCKI : PROGRAMANDO O VISÍVEL


works on the subject of war and vision at the Ludwig Museum in Cologne
and Raven Row in London that demonstrate the relationship between
popular forms of new-media entertainment such as video games and the
conduct of modern war”43. A double attack in the art canon – the move-
ment of the knight is the movement of the brave, says Shklovsky. It is a
fact that Harun Farocki never stopped making films, but he is one of the
filmmakers most recognized as being an artist of contemporary art.

COMPUTER, A MEDIUM. ANYWAY


During the Programming the Visible exposition at the Paço das Artes,
Brazil was suffering its greatest political crisis of the previous twenty years.
The ruling Workers’ Party was being accused of responsibility for a gigantic
corruption scheme and the President of the country suffered an impeach-
ment process, whose result would be achieved some months later. Groups
of friends and colleagues were divided in respect to their opinions and the
media was accused of manipulating public opinion about the impeachment,
which was called a coup d’etat. The exhibited works of Farocki guided a very
peculiar and effervescent public space filled with graduate students in media
studies, cinema, architecture, art, sociology, education, and other fields, as
well as teachers and researchers in them. I welcomed hundreds of students
for informal conversations about Farocki’s work, which always returned to
questions of image and media in relation to local politics. I have the impres-
sion that Farocki would have liked to participate in those debates with people
so close to the game images in Parallel. Many were happy to recognize the
games they were so familiar with in the exhibited works in the format of large
projections. Some attentively made their way through the installations while
carefully listening to what the images had to say to them. I thought about the

43 H. Foster et. al., Art Since 1900, v. 2.

67
68

fact that the images in the local media did not prohibit people from going
into the streets in protests in favor or against the government, although the
pro-government intellectuals affirmed that, in reality, the media was manip-
ulating the naïve. There is really a very tenuous line between images that ma-
nipulate and those that inhibit. Above all, these people, who are young and
knowledgeable about games, did not experience the 20th-century debates
about the status of the image in politics or the political image.
In the case of the Brazilian debate over the image, I always keep in
mind Glauber Rocha’s proposal made in reaction to a supposed provo-
cation of Godard about the so-called “Third World Cinema”, which
the Frenchman believed should be destroyed (I think in revolutionary
fashion)44. Glauber, on the other hand, argued that Brazilian cinema had
barely even been built, “on all levels, in language, in aesthetics, in tech-
nique”. This probable gap between the European debate about politi-
cal cinema and the Brazilian debate implicates what kind of reading of
Farocki’s work? It is difficult to measure, but there is a significant academ-
ic interest for his cinema in cinematheques and in film clubs that is always
associated with the political realm.
Farocki’s work was likely initially shown in Brazil around 2008 or
2009, with one or two films shown during film series in Itaú Cultural and
CINUSP (Cinema of the University of São Paulo). Later, in 2010, his Seri-
ous Games installations were exhibited at the 29th São Paulo Art Biennial,
during which time an extensive series of his films also took place at the

44 G. Rocha, Revolução do cinema novo, p. 201-202. “I spoke […] with Godard, who told me: ‘You, Brazilians, should
destroy cinema’. I don’t agree. You in France and Italy should destroy it. But we are still building it on all levels, in
language, aesthetics and technique.”; p. 151-152: “I recently spoke with Godard about political cinema. Godard insists
that we in Brazil are in an ideal situation to make revolutionary cinema, and contrary to this, we still make revisionist
cinema that is giving importance to drama and development of the spectacle. In his conception today there is a
cinema for four thousand people, from militant to militant. I understand Godard. As a European, French filmmaker,
it is logical that he would suggest the problem of destroying cinema. But we cannot destroy something that doesn’t
exist yet. And raising these issues is sectarian and therefore wrong. We are in a phase of national liberation that also
passes through cinema, and the relationship with the popular public is fundamental. We don’t have to destroy but
build. Movie theaters, houses, roads, schools, etc. ”

HARUN FAROCKI : PROGRAMANDO O VISÍVEL


PROGRAMMING THE VISIBLE

Cinemateca Brasileira. Since then, various screenings and exhibitions


have taken place in Brazil, with a highlight being a 2012 screening at MAR
(Rio de Janeiro Art Museum) called Harun Farocki e a Política das Imagens
(Harun Farocki and the Politics of the Image) that included the participation
of the artist Antje Ehmann, his partner, who gave a course and workshop. I
initially contacted Farocki to propose an extensive exhibition at the 2010
Biennial and we talked about this possible project that did not happen at
that time. That same year, however, we had contact about the possibility
of a conversation in Johannesburg on the occasion of the exhibition of his
exceptional work Deep Play, about the World Cup of 200645. That year, the
World Cup took place in South Africa, but Farocki was unable to attend
the event that announced his presence.
During a conversation with Priscila Arantes about this frustrated exhi-
bition project, the generous opportunity arose to exhibit part of Farocki’s
work at the Paço das Artes in 2015, a project that was postponed until
2016. Interface was the first work chosen for its seminal importance and
as a way of giving an axis to the exhibition. In addition to the fact that it
had never been shown in Brazil, the work corresponded to a displacement
not only of an artist, but also of an entire apparatus of thought that 20th-
century cinema represented. Farocki was not the first filmmaker to show
in galleries, nor was he the first artist to produce films for museums. His
trajectory, however, configured a significant reorganization of intellectual
and critical thinking around programmatic cinema in the form of film in-
stallations for artistic environments. There are various criticisms of this
reorganization46, but the exhibition space has come to welcome films in

45 Nora Alter relates that Farocki adored football [soccer] and that it was the only arena in which he expressed
national pride. She also said that he watched the Brazilian World Cup games in 2014. It would be interesting to
know what his reaction was to the Brazilian team’s embarrassing 7-1 loss to the German side. How would he have
understood the images of a profound wound to Brazilian national pride?
46 See R. Bellour, La querelle des Dispositifs.

69
70

a systematic manner, even through swapping works with cinematheques


and festivals. And, if Farocki is a great filmmaker who achieved the feat of
also becoming a recognized artist, Interface is a paradigmatic work repre-
senting this junction.
Interface is also paradigmatic because this junction offers a point-de-
capiton or a nodal point (according to Freudian terminology) for pos-
sible meanings of medium in the face of the enigma of the computerized
machine that today dominates art installations as much as it does film
series. It can be observed that, ironically, even today, the films presented
in installations tend to be described as “videos”. Could this be an inheri-
tance of “video art” or simply a submission to the computational universe,
where film is always called “video” – “YouTube video”, video format, etc?
It is precisely this debate with which Farocki’s other selected work, Paral-
lel I-IV, engages. The work is an installation in four parts that reflects on
computerized games; it was begun in 2012 and finished in 2014 as what
was ultimately the last work of the artist, who died that year. Excerpts
from popular games like Minecraft, Grand Theft Auto, and Assassin’s Creed
are presented, but these games speak more to art and film history than to
gaming or to problems generally related to it, such as violence. One mat-
ter that intrigued Farocki was the fact that games, even at a relatively ad-
vanced age, had still not managed to produce a significant body of theory
like cinema had: “When cinema was thirty-five years old, it had already its
Arnheim, its Balázs, and its Eisenstein as theoreticians.”47 And he contin-
ues: “So somebody had to start. In all modesty, I’m not theorizing it, but
somehow I tried to open this field for reflection.”48
In order to problematize the playful nature of the computer-generated
image, the artist based himself in a general manner on cultural notions

47 See “The New Constructivism: Harun Farocki and Erika Balsom Discuss Parallel I–IV”, infra.
48 Ibidem.

HARUN FAROCKI : PROGRAMANDO O VISÍVEL


PROGRAMMING THE VISIBLE

about the technical reproducibility and cultural histories of painting, re-


membering that both trajectories included the question of the image and its
relationship with the real. During the projections of Parallel I-IV, a narrator
takes us through the four artistic installations, while discussing the Greek
tradition of questioning the mimesis in painting and mentioning the story
of Zeuxis as well as the cinematographic debate about the ontology of film
as explored by André Bazin. Farocki produced an “arc of history” to inter-
rogate the most recent device, the computer, and the nature of the images
it produces. The artist carefully presented the historical and cultural tra-
jectory of the debate, refusing to incline neither towards the notion of the
image generated by computer as progress, nor towards that of its being an
irreversible source of alienation. At first glance, Farocki appears uncomfort-
able with the lack of perspective in computer games, as well as the typical
violence of which the games are frequently accused. The narrator of Parallel
II says that “the world in this game is a flat landscape, like the Earth in the
pre-Hellenic vision of the World.” Farocki also appears bothered with the
aspect of simulacrum of these works when he affirms that, “In films, there is
the wind that blows and the wind that is produced by a wind machine. The
computer images do not have two types of wind”. However, the very fact of
establishing the historicity of game images suggests that Farocki is elevating
these images to the condition of “first image”, as has happened with the im-
ages of Renaissance perspective, as well as with photography and cinema.
Observe, therefore, that game images are only some of the numer-
ous images generated and co-produced by the computer. Other images,
widely propagated, include computer animations for the medical and
scientific fields, of which a still greater belief in realism can be attributed
and which should be considered with the same scrutiny and analytic care
that Farocki concedes to computer game images. In the recent explora-
tion images recorded by NASA, the reverse shot for the participants who

71
72

commemorate the success of the astronomical exploration projects is fre-


quently a computer-generated image or animation that could be consid-
ered a technical image in search of a narrative. Just as there is an imperi-
ous belief in the medical image – of radiography, of ultrasound – there is a
growing naturalization of computerized animation as established images
in the service of science. It is from this perspective that the Harun Farocki
exhibition was denominated Programming the Visible.

BIBLIOGRAPHY
ALTER, Nora. Two or Three Things I Know about Harun
Farocki. October, n. 151, Winter 2015.
______. The Political Im/perceptible: Images of The World...
In: ELSAESSER, Thomas. (ed.). Harun Farocki: Working
on the Sightlines. Amsterdam: Amsterdam Univ. Press,
2004.
ALTHUSSER, Louis. Aparelhos ideológicos de Estado.
São Paulo: Graal, 1992.
BALSOM, Erika. A World Beyond Control. <http://www.
lafuriaumana.it/index.php/56-archive/lfu-23/358-erika-
balsom-a-world-beyond-control>.
BALSOM, Erika; FAROCKI, Harun. Parallel I-IV: Conver-
sation. Conversation between Erika Balsom, Harun Farocki,
and the Public. <https://hkw.de/en/programm/projekte/
veranstaltung/p_103694.php>
BAUDRY, Jean-Louis. Le Dispositif: approches métapsy-
chologiques de l’impression de realité. Communications,
n. 23, 1975.
______. Cinéma: effets idéologiques produits par l’appareil
de base. Cinéthique, n. 7/8, 1970.
BECKER, Jörg. Images and Thoughts, People and Things,
Materials and Methods. In: ELSAESSER, Thomas. (ed.).
Harun Farocki: Working on the Sightlines. Amsterdam:
Amsterdam Univ. Press, 2004.
BELLOUR, Raymond. La querelle des dispositifis: Ci-
néma – installations, expositions. Paris: POL, 2012.
BENJAMIN, Walter. A obra de arte na época de sua re-
produtibilidade técnica. In: LIMA, Luiz Costa (org.). Teoria
da cultura de massa. São Paulo: Paz e Terra, 2000.
______. Que é o teatro épico? Um estudo sobre Brecht.
Magia e técnica, arte e política: Ensaios sobre literatura
e história da cultura. 7ed. São Paulo: Brasiliense, 1994.
(Obras escolhidas, v. 1).
BOIS, Yve-Alain. In Conversation: Rosalind Krauss with
Yve-Alain Bois. The Brooklyn Rail, Feb 1st, 2012. <http://
brooklynrail.org/2012/02/art/rosalind-krauss-with-yve-
alain-bois>. Acesso em: 12 mar. 2016.

HARUN FAROCKI : PROGRAMANDO O VISÍVEL


PROGRAMMING THE VISIBLE

BORGES, Cristian; MOURÃO, Patrícia; MOURÃO, Maria the-many-haruns-a-timeline-through-books-and-hand-


Dora (orgs.). Harun Farocki: Por uma politização do gestures-from-18-000-bc-2061/>. Acesso em: 11 mar. 2016.
olhar. São Paulo: Cinemateca Brasileira, 2010. < http:// OSHIMA, Nagisa. Cinema, Censorship, and the State:
cinemateca.gov.br/farocki/catalogo.php>. The Writings of Nagisa Oshima. Editado por Annette
BRECHT, Bertolt. Um Homem é um Homem. Teatro Michelson. Cambridge and London: The MIT Press, 1992.
Completo 2. Trad. de Fernando Peixoto. São Paulo: Paz e PAVSEK, Christopher. Harun Farocki’s Images of the
Terra, 1991. World. <http://www.rouge.com.au/12/farocki.html>.
CAVELL, Stanley. The World Viewed. Cambridge: Har- Acesso em: 11 mar. 2016.
vard University Press, 1995. RODOWICK, David N. A consciência liberada de Harun
CHINEN, Lucy. At Our Expense: Harun Farocki’s Images Farocki. In: SOBRINHO, Gilberto Alexandre (org.). Cin-
at War. Rhizome. < https://rhizome.org/editorial/2014/ emas em redes: tecnologia, estética e política na era
jul/25/harun-farocki/>. digital. Campinas: Papirus, 2016.
DANTO, Arthur C. O Mundo da Arte. Artefilosofia, Ouro ROCHA, Glauber. Revolução do cinema novo. São Paulo:
Preto, n. 1, jul. 2006. Cosacnaify, 2004.
ELSAESSER, Thomas. The Future of “Art” and “Work” SIEBEL, Volker. Painting Pavements. In: ELSAESSER,
in the Age of Vision Machines: Harun Farocki. In: HALLE, Thomas (ed.). Harun Farocki: Working on the Sightlines.
Randall; STEINGRÖVER, Reinhill (eds.). After the Avant- Amsterdam: Amsterdam Univ. Press, 2004.
garde: Contemporary German and Austrian Experimental STEYERL, Hito. Beginnings: Harun Farocki, 1944-2014. E-
Film. Rochester, N.Y. Camden House, 2008. Flux. n. 59, Nov., 2014. Edição especial dedicada a Farocki.
______. (ed.). Harun Farocki: Working on the Sightlines. <http://www.e-flux.com/announcements/30738/beginnings-
Amsterdam: Amsterdam Univ. Press, 2004. harun-farocki-1944-2014/>. Acesso em: 11 mar. 2016.
FOSTER, Hal et. al. Art Since 1900, v. 2: 1945 to the Pres- STOLLMANN, Rainer. A realidade não é realista: Alex-
ent. 3 ed. New York : Thames & Hudson, 2016. ander Kluge, o cinema alemão e europeu. In: ALMEIDA,
FLUSSER, Vilém. Filosofia da caixa preta. São Paulo: Jane de (org). Alexander Kluge: o quinto ato. São Paulo:
Hucitec, 1985. CosacNaify, 2007.
FREUD, Sigmund; ZWEIG, Arnold. The Letters of Sig- STORR, Robert. Kassel Rock: Interview with Curator Cath-
mund Freud and Arnold Zweig. New York: Harcourt erine David. Artforum, v. 35, n. 9, May 1997.
Brace & World, 1970.
HANSEN, Miriam. Reinventando os Nickelodeons: Consid-
erações Sobre Kluge e o Primeiro Cinema. In: ALMEIDA,
Jane (org). Alexander Kluge: o quinto ato. São Paulo:
CosacNaify, 2007. INTERVIEWS AND VIDEOS
HARUN Farocki e a política das imagens. Catálogo
da mostra, Rio de Janeiro: MAR, 2012. < https://harun-
farockieapoliticadasimagens.files.wordpress.com/2012/11/ Erika Balsom – Serious Games.
farocki_programa.pdf >. Harun Farocki On Materiality – Cine-fils. <http://maroc-
HÜSER, Rembert. Nine Minutes in the Yard: A Conversa- servers.com/mp3/video/YuVLOzW3J-k/Harun_Farocki_
tion with Harun Farocki. In: ELSAESSER, Thomas. (ed.). On_Materiality_-_Cine-fils.html>. Acesso em: 11 mar 2016.
Harun Farocki: Working on the Sightlines. Amsterdam:
Amsterdam Univ. Press, 2004.
KRAUSS, Rosalind. The Power Of The Specific Image.
<http://www.doppiozero.com/materiali/saggi/power-
specific-image>.
______. Under Blue Cup. Cambridge: MIT press, 2011.
______. Reconfigurations in Contemporary Art System. In:
ARANTES, Priscila; BOUSSO, Daniela (orgs). São Paulo:
Paço das Artes, 2010.
LANGFORD, Michelle. “Alexander Kluge”. Senses of
Cinema, July, 2003. < http://sensesofcinema.com/2003/
great-directors/kluge/>
LIEBMAN, Stuart. “Why Kluge?” On New German Cin-
ema, Art, Enlightenment, and the Public Sphere: An Inter-
view with Alexander Kluge. October, n. 46, 1988
LEYDA, Jay. Film Beget Films: A Study of the Compila-
tion Film. New York: Hill and Wang, 1971.
MENDE, Doreen. The Many Haruns: A Timeline through
Books and Hand Gestures from 18,000 BC–2061. E-Flux, n.
59, Nov., 2014 <http://www.e-flux.com/journal/59/61102/

73
74

HARUN FAROCKI : PROGRAMANDO O VISÍVEL


PROGRAMANDO
O VISÍVEL:
CONVERSAS
ENTRE VILÉM
FLUSSER E
HARUN FAROCKI
PRISCILA
ARANTES
SÉRGIO
NESTERIUK
75
76

O questionamento sobre a natureza das imagens do século XXI foi o mote


da exposição Programando o visível, apresentada no Paço das Artes, insti-
tuição da Secretaria de Estado da Cultura de São Paulo entre os dias 28 de
janeiro a 27 de março de 2016. A exposição reuniu uma série de obras do
artista e cineasta Harun Farocki (1944-2014): Paralelo I-IV (2012-2014),
Interface (1995) e Frases de impacto, imagens de impacto: Uma conversa com
Vilém Flusser (1986).
Harun Farocki é conhecido internacionalmente por sua leitura crítica
das imagens que constituem o mundo. Tendo realizado uma série de fil-
mes, muitos deles inspirados em Bertolt Brecht e Jean-Luc Godard, o artis-
ta, nos últimos anos de sua vida, migra para o universo da arte contemporâ-
nea realizando filmes e instalações que discutem a relação do ser humano
com o universo das imagens técnicas.
Em 2010, participa da 29ª. Bienal Internacional de São Paulo com a vi-
deoinstalação Serious Games em que propunha refletir sobre a animação
computacional e o uso das imagens voltadas para debater violência, to-
mando como ponto de partida o processo terapêutico desenvolvido com
soldados norte-americanos que haviam passado por situações traumáticas
no Oriente Médio.
Programando o visível apresentou não somente parte do universo
criativo de Farocki, mas abordou o deslocamento das imagens captadas
por aparelhos ópticos para aquelas construídas por algoritmos compu-
tacionais. Por outro lado, a exposição não somente discutiu a natureza
das imagens contemporâneas, mas também seu poder na construção
da maneira como vemos e percebemos a realidade. O título da mostra,
nesse sentido, não poderia ser mais apropriado. Aquilo que vemos não
somente é criado por códigos de programação, mas nossa visibilidade é
programada; vivemos envoltos em um mundo programável e manipu-
lado pelos códigos das máquinas. A imagem computacional, portanto,

HARUN FAROCKI : PROGRAMANDO O VISÍVEL


PROGRAMANDO O VISÍVEL: CONVERSAS ENTRE VILÉM FLUSSER E HARUN FAROCKI

cria mundos paralelos, afeta trajetórias: a imagem é o próprio mundo-


-realidade que vivemos.
Paralelo I-IV, um dos trabalhos apresentados na mostra, é um filme ins-
talação constituído por quatro partes que abordam a linguagem dos games
refletindo sobre trechos de jogos populares, geralmente narrados por uma
voz ensaística em off. Nesses filmes Farocki investiga os dispositivos utili-
zados para a construção das imagens ao longo da história da arte, tal como
a perspectiva renascentista. A obra é um filme instalação sobre a história
das imagens e as estratégias de representação ao longo da história.
No primeiro filme da série, realizado em 2012, Farocki analisa o es-
tilo de computação gráfica dos games dos anos de 1980, que utilizavam
imagens sem profundidade de campo e eram compostas por linhas hori-
zontais, verticais e pontos. No segundo e terceiro filmes, ambos de 2014,
o artista analisa as produções que se utilizam da perspectiva e profundi-
dade de campo até chegarmos ao quarto filme, um dos últimos trabalhos
criados pelo artista, em 2014, que tem como protagonista os heróis dos
games inspirados na Los Angeles dos anos de 1940, nas imagens pré-apo-
calípticas e nos filmes de Western. Nesse filme, muitas das sequências
são assustadoras e violentas; dão a ver sequências fílmicas de briga de rua,
perseguições e ameaças a mão armada.
Farocki trata nesses filmes de uma questão fundamental: o fato de que
vivemos mergulhados em um mundo de imagens que têm influência deci-
siva na maneira como vemos e nos comportamos frente à realidade. Dis-
cute a natureza da imagem do século XXI que, diversamente das imagens
ópticas, se despregam da realidade criando sua própria realidade com
regras e criaturas próprias. “O herói não teve pais, nem professores. Teve
que aprender por si mesmo quais são as regras válidas”, diz uma voz em off
em um dos filmes que fizeram parte da exposição.

77
78

A obra de Farocki, nesse sentido, parece assumir uma dimensão polí-


tica à flor da pele em sintonia com as obras de Godard, mestre do cinema
em criar planos de beleza terrificantes mesmo que calcados no mal estar
da vida contemporânea e em sua violência intrínseca.
Em seu ensaio “Como Abrir Los Ojos”, Georges Didi-Huberman diz
que Farocki passou a vida inteira obcecado por uma mesma pergunta: “por
que, de que maneira e como é que a produção de imagens participa da des-
truição dos seres humanos?”1
Lidar com a violência do mundo devolvendo-lhe mais violência para re-
fletirmos sobre o mal estar do mundo, talvez seja esta a estratégia de Farocki:

Elevar o próprio pensamento até o nível do eno-


jar-se (o nojo provocado por toda a violência que
há no mundo, essa violência à qual negamos es-
tar condenados). Elevar o próprio enojar-se até
o nível de uma tarefa (a tarefa de denunciar essa
violência com toda a calma e a inteligência que
sejam possíveis).2

FRASES DE IMPACTO, IMAGENS DE IMPACTO:


UMA CONVERSA COM VILÉM FLUSSER
Interessante perceber como as questões de Paralelo I-IV ecoam em
outro trabalho apresentado na exposição, referimos a Frases de impacto,
imagens de impacto: Uma conversa com Vilém Flusser. Nele, Farocki pede
para o filósofo Vilém Flusser analisar a primeira página do tabloide sensa-
cionalista alemão Bild Zeitung. Realizada décadas antes da série Paralelo, a
entrevista oferece respostas inquietantes para muitas das questões do mal

1 G. Didi-Huberman, Como Abrir Los Ojos, em H. Farocki (org.), Desconfiar de Las Imágenes, p. 28
2 Ibidem, p. 14, tradução nossa.

HARUN FAROCKI : PROGRAMANDO O VISÍVEL


PROGRAMANDO O VISÍVEL: CONVERSAS ENTRE VILÉM FLUSSER E HARUN FAROCKI

estar contemporâneo. Aqui, imagens, textos e fontes reforçam-se mutua-


mente para gerar “impacto” de mídia e realidade.
Cabe sinalizar que muitas das questões colocadas na entrevista reto-
mam discussões já desenvolvidas por Vilém Flusser na publicação Filoso-
fia da caixa preta, lançada em 1985, um ano antes da entrevista.
Em Filosofia da caixa preta a fotografia é tomada como exemplo para
se desenvolver uma crítica sobre as relações entre tecnologia e socieda-
de a partir do que Flusser nomeia de imagens técnicas. A fotografia é um
modelo básico de dispositivo cujas características serão ressignificadas
no cinema, no vídeo e na televisão até chegar às imagens computacionais
de hoje em dia. Nesse sentido, Filosofia da caixa preta não é um livro sobre
a fotografia apenas, mas sobre a produção de imagens tecnológicas que
modificam nossa forma de nos relacionar com o mundo. Assim sendo, a
fotografia funciona mais propriamente como um pretexto para, através
dela, verificar o funcionamento de nossa sociedade marcada pelo colapso
do texto e pela hegemonia das imagens midiáticas.
O advento das imagens técnicas marca o início de uma nova relação
com o visível que se estrutura de modo distinto do modelo da linguagem
escrita: as imagens técnicas se propõem como superfícies que aspiram ser
representações do mundo, mas isso de fato oculta sua real dimensão, que
não é outra que o de ser imagem.
O exercício proposto por Flusser é exatamente o de, ao perceber uma
nova etapa da cultura contaminada pela explosão das técnicas e das mídias,
lançar um olhar crítico aos aparelhos entendendo-os como caixas pretas,
dispositivos cujo interior programado é completamente opaco e incerto.
Dentro deste contexto, o sujeito tende a se converter, pela ação de pro-
gramas tecnossociais, em um funcionário programado e programável, de
quem se espera respostas às questões colocadas pelo aparato técnico. Em
outras palavras: o que vemos realmente, em um mundo dominado pelas

79
80

imagens técnicas, não é o mundo, mas determinados conceitos relativos


ao mundo impregnados na estrutura midiática.
A entrevista, portanto, resgata pontos importantes da discussão flus-
seriana: a hegemonia do mundo das imagens e seu poder na programação
de nossa visibilidade.
Interessante perceber que, diferentemente dos demais textos do filó-
sofo, Flusser desenvolve nesta entrevista uma “filosofia aplicada”. Realiza
um exercício minucioso de leitura das relações subliminares entre texto e
imagem da primeira página do jornal sensacionalista alemão, desvendan-
do a maneira como os códigos expressivos se inter-relacionam na criação
de slogans e discursos demagógicos.
O tema da violência, que é um dos tópicos colocados na primeira pá-
gina do jornal, mais propriamente a respeito de uma pessoa baleada, são
reforçados pela maneira como o texto e a imagem se interpenetram, crian-
do uma forma subliminar de tratar a violência como se fosse algo banal.
Diz Flusser em um dos trechos da entrevista:

O texto diz: “Ela teve que se ajoelhar.” “Baleada


na nuca.” E aqui a imagem quebra o texto. Então,
se alguém olha aqui, uma poderosa indicação é
obtida. Muito importante, quero dizer [...] até
mesmo antes de quebrarmos nossas cabeças
para entender o que essa página realmente está
querendo dizer [...]. Aqui, a situação construí-
da é deliberamente caótica, com a intenção de
irromper em nossa consciência. Sua intenção é
eliminar nossa consciência. Sua intenção é eli-
minar nossa consciência, para que supostamen-
te absorvamos a mensagem em um nível baixo

HARUN FAROCKI : PROGRAMANDO O VISÍVEL


PROGRAMANDO O VISÍVEL: CONVERSAS ENTRE VILÉM FLUSSER E HARUN FAROCKI

de consciência, onde não a percebamos corre-


tamente. Estamos contemplando aqui, de modo
aparentemente transcendente, essa “kitschfica-
ção”, brutalização e redução da dignidade huma-
na por tamanha demagogia.

Ao final do vídeo Flusser chama atenção para o fato de que a entrevista


também é uma imagem – já que a entrevista está sendo filmada – e que,
nesse sentido, o espectador deve ter uma visão crítica e reflexiva em relação
ao que vê: “Acho que honestamente quando alguém nos assiste na TV, isso
deve ser dito. Devemos fazer um apelo ao espectador agora e dizer: ‘use essa
habilidade crítica por que estamos usando a palavra contra nós mesmos’”.
Esse é o ponto em que a filosofia de Flusser quer intervir: produzir uma
reflexão sobre as possibilidades de criação e visão crítica, bem como de
liberdade em uma sociedade cada vez mais programada e dominada pelas
imagens tecnológicas. Dessa forma, é preciso também que desconfiemos
das imagens, uma vez que elas são códigos e, como tais, programáveis.

DESIGN DE GAMES:
ENTRE VILÉM FLUSSER E HARUN FAROCKI
Em O mundo codificado, Flusser define o design como uma área em es-
treita sintonia com o mundo da comunicação. Longe de ver o design como
uma área separada da linguagem, ambas são codificações do mundo:

O design, como todas as expressões culturais,


mostra que a matéria não aparece (é inaparen-
te), a não ser que seja informada e, assim, uma
vez informada, começa a se manifestar, a tornar-
-se fenômeno. A matéria no design, como qual-

81
82

quer outro aspecto cultural é o modo como as


formas aparecem3.

Ou seja, para Flusser, diferentemente de uma visão modernista do de-


sign em que a forma deve seguir a função, a forma de algo, o artefato carre-
ga consigo o sentido de in+formar, ou seja, de dotar algo com intenção:

Todo objeto manufaturado, por sua vez, tem


como meta transformar as relações do usuá-
rio com seu entorno de modo a tirar dele algum
proveito. Ao concretizar uma possibilidade de
uso, o artefato se faz modelo e informação. Por
exemplo, depois que se vê uma alavanca em ope-
ração e se compreende o princípio empregado,
não é mais possível olhar para qualquer vara de
madeira ou metal sem reconhecer seu potencial
de aplicação à mesma finalidade. O que antes era
um simples pedaço de pau adquire uma função e
significado específico pela existência de um con-
ceito, ou seja, informar também é fabricar.4

Diante de um artefato massivo de entretenimento, uma das principais


intenções de um game designer é projetar e implementar estratégias e re-
cursos diversos que favoreçam a ubiquidade e a imersão do jogador. Desta
forma, é possível manter o jogador naquilo que Mihaly Csikszentmihalyi5
denominou de flow: um estado de concentração (ou absorção) extremo na

3 V. Flusser, O mundo codificado, p. 28.


4 Ibidem, p. 13.
5 M. Csikszentmihalyi, Flow: The Psychology of Optimal Experience.

HARUN FAROCKI : PROGRAMANDO O VISÍVEL


PROGRAMANDO O VISÍVEL: CONVERSAS ENTRE VILÉM FLUSSER E HARUN FAROCKI

atividade per se, como se o próprio ego se desfizesse diante de um fenôme-


no autotélico.
Entretanto, o que a literatura da área parece desconsiderar são justa-
mente os limites que estas (e outras) questões de game design revelam.
O flow destituiria o sujeito-jogador, sua “suspenção da descrença”, de um
distanciamento crítico em relação a obra (o “jogo praticado”), assim como
de uma ampliação de experiências potenciais que os games podem ofere-
cer, justamente por estar confinado entre certos parâmetros desejáveis.
E é justamente nesse interstício que Farocki pensa os games: entre
o real, o imaginário e o simbólico, para se valer dos registros psíquicos
propostos por Lacan. Ao se apropriar, mediatizar e subverter a lógica dos
games, o artista os posiciona em uma espécie de não lugar digital, um pa-
limpsesto em que se revelam outros textos; o invisível por trás daquilo que
chamou de “imagens operativas”: imagens que partem de uma operação
técnica com o objetivo de restituir ou criar uma dada realidade.
Diferentemente do que havia feito com Serious Games, em que abordou
um game criado pelo próprio exército americano, na instalação Paralelo,
composta por quatro vídeos, Farocki utiliza diferentes games lançados
comercialmente para explorar questões relevantes as quais escapam não
apenas aos jogadores, como também aos críticos de videogame.
No primeiro vídeo, elementos da natureza, como fogo, água e árvores
servem de referência para mostrar uma espécie de salto em apenas trinta
anos de representação da imagem digital, de poucos pontos na tela para
linhas até chegar ao tridimensional, o 3D. Como é dito no vídeo, os cria-
dores de imagens 3D não tiveram que esperar a Renascença, pois o digital
permitiu à imagem sair de sua dimensão simbólica para o que Farocki con-
vencionou chamar de um novo construtivismo. O registro de um designer
intercalando seu olhar entre dois monitores para criar nuvens em um
cenário 3D é emblemático: em uma das telas, ele opera a interface de um

83
84

software enquanto na segunda o resultado de sua manipulação forma um


céu virtual, composto por diferentes camadas de nuvens. Diferentemente
do pintor grego Zêuxis, que teria pintado uvas tão perfeitas que chegavam
a atrair pássaros, as imagens de computador pretendem atrair seres cria-
dos pelo seu próprio design. Farocki acredita que, da mesma forma que a
fotografia liberou a pintura para os movimentos de vanguarda, as imagens
tridimensionais irão assumir as funções do cinema, liberando-o para ou-
tras possibilidades.
O segundo vídeo tangencia a espacialidade: o espaço, suas superfícies,
seus limites e o vazio. A partir da colocação de um pressuposto ontológico
de que “o mundo não existe se não o estou observando”, Farocki oferece
uma reflexão para se tentar compreender a (in)finitude dos espaços cria-
dos por estas imagens operativas. “Até quão longe pode chegar?”, pergun-
ta a voz no vídeo enquanto as imagens mostram tentativas de se ultrapas-
sar fronteiras inescaláveis ou mesmo invisíveis programadas pelos jogos.
O terceiro vídeo da instalação explora questões sobre o deslocamento,
mostrando o controle de uma câmera em uma espécie de grande zoom in
/ zoom out que permite sair de uma visão quase microscópica dentro da
cena de um combate de guerra até um afastamento que revela um cenário
sem sons e suspenso em uma espécie de grande vazio: “O mundo termina
como um tabuleiro”, nos diz agora a voz no vídeo. Por meio da manipu-
lação do código de programação do game é possível fazer a câmera pene-
trar objetos e superfícies sólidas mostrando-os como se fossem ocos por
dentro. A ausência de colisão proporciona outras formas de experienciar
a espacialidade nesse “novo construtivismo”. Ao romper as relações ime-
diatas entre matéria e forma, o artista reforça o hiper-real6 nas manifesta-
ções de tempo e espaço proporcionadas pela manipulação direta do joga-

6 J. Baudrillard, Simulacres et simulations.

HARUN FAROCKI : PROGRAMANDO O VISÍVEL


PROGRAMANDO O VISÍVEL: CONVERSAS ENTRE VILÉM FLUSSER E HARUN FAROCKI

dor, estimulando assim novas formas de cognição e imaginação: “Como


a criança que rasga um boneco para conhecer os mistérios da representa-
ção”, complementa a narração no vídeo.
No quarto vídeo, Farocki investiga situações limite envolvendo perso-
nagens controladas pelo jogador e suas interações com npcs (non-player
characters) orientados pela programação de um algoritmo de inteligência
artificial. Além da violência gratuita, um dos artifícios usados é o de per-
manecer imóvel com a personagem controlada pelo jogador diante de um
npc, isto é, de não agir ou buscar formas de interação que um gamer nor-
malmente buscaria. Esse distanciamento adotado reforça o estranhamen-
to do público diante de algo que se apresenta simultaneamente familiar e
estranho (unheimlich)7. Desta forma, coloca-se diante de nós uma diegese
intrínseca que nos indaga não apenas sobre a simulação ou mimese do
comportamento humano, mas sobre as próprias limitações da liberdade
humana. Ou seja, até que ponto a própria vida em sociedade também não
poderia ser considerada programada ou programável? Até que ponto o
jogador possui o controle de sua própria vida? Até que ponto sua própria
vida pode ser considerada um grande jogo?

CONSIDERAÇÕES FINAIS: (RE)PROGRAMANDO O (IN)VISÍVEL


Podemos ponderar que ao propor novas formas de codificação e de-
codificação do mundo, Farocki atribui diferentes possibilidades de uso
de um artefato valorizando não apenas o seu modelo, mas, sobretudo, a
potencialidade de sua informação.
Todavia, podemos expandir esta consideração se tivermos por base
outros aspectos presentes no termo “design”, tanto em seu uso como

7 Um dos paradoxos observados nos games é um fenômeno conhecido como uncanny valley, em que quanto mais
próximo a uma representação absoluta da figura humana uma personagem virtual fica, maior é o seu estranhamento
e menor se torna sua empatia com os jogadores.

85
86

substantivo quanto como verbo. Para Flusser, mesmo as acepções mais


ordinárias do termo evocam uma dimensão “pérfida e ardilosa”, pois, se-
gundo ele: “A palavra design ocorre em um contexto de astúcias e fraudes.
O designer é, portanto, um conspirador malicioso que se dedica a engen-
drar armadilhas.”8
Assim, os artefatos dos quais Farocki se apropria podem ser entendi-
dos como processos de maquinações, dispositivos de enganação e, nesse
sentido, a própria alavanca, exemplo utilizado por Flusser, possui como
mecânica principal enganar a gravidade. Da mesma forma, o filósofo
acredita que o designer provoca o aparecimento da forma e que, por isso,
deva ser considerado como um impostor que seduz o homem a considerar
ideias “deformadas”.
A separação dicotômica promovida pelo Iluminismo entre o mundo
das artes e o da técnica, das máquinas, portanto, mostrou-se insustentável
ainda no século XIX, junto com o surgimento das imagens técnicas. Para
Flusser, é justamente o design moderno que irá ocupar este hiato, como
um elo de ligação entre aqueles dois mundos ao explicitar suas conexões
internas e tornar viável uma nova forma de cultura:

Esse é o design que está na base de toda cultura:


enganar a natureza por meio da técnica, substi-
tuir o natural pelo artificial e construir máquinas
de onde surja um deus que somos nós mesmos.
Em suma: o design que está por trás de toda a cul-
tura consiste em, com astúcia, nos transformar
de simples mamíferos condicionados pela natu-
reza em artistas livres.9

8 V. Flusser, O mundo codificado, p. 182.


9 Ibidem, p. 184.

HARUN FAROCKI : PROGRAMANDO O VISÍVEL


PROGRAMANDO O VISÍVEL: CONVERSAS ENTRE VILÉM FLUSSER E HARUN FAROCKI

Assim, também é possível pensar a obra de Farocki, como um facilita-


dor do entendimento de que uma fotografia, um filme ou um game chega
ao seu público de forma cada vez mais mediada e mediatizada, desvendan-
do, manipulando ou ocultando muitas vezes seus segredos, seus códigos
invisíveis. E que, quanto mais esse processo se repete, mais evidente ele
fica. Por isso mesmo, tal qual o jogador de um game, o sujeito contemporâ-
neo talvez possa ser entendido como um enganador que é ao mesmo tem-
po enganado, ainda que esta visibilidade esteja oculta sob outros códigos.

87
88

BIBLIOGRAFIA
ARANTES, Priscila. Post-History, Technical Images And
Freedom in Times of Barbarism. Flusser Studies, n. 18,
Nov., 2014.
______. Media, Gestures And Society: Dialogues Bet-
ween Vilém Flusser And Fred Forest. Flusser Studies, n.
8, May., 2009.
______. Reescrituras da arte contemporânea: História,
arquivo e mídia. Porto Alegre: Sulina, 2005.
BAUDRILLARD, Jean. Simulacres et simulations. Paris:
Galilée, 1981.
CSIKSZENTMIHALYI, Mihaly. Flow: The Psychology of
Optimal Experience. New York: Harper Perennial Mo-
dern Classics, 2008.
DIDI-HUBERMAN, Georges. Como Abrir Los Ojos.
In: FAROCKI, Harun (org.). Desconfiar de Las Imágenes.
Buenos Aires: Caja Negra, 2013.
FLUSSER, Vilém. O mundo codificado: Por Uma Filosofia
do Design e da Comunicação. Organização de Rafael
Cardoso, tradução de Raquel Abi-Sâmara. São Paulo:
Cosac Naify, 2007.
______. Filosofia da caixa preta. São Paulo: Hucitec, 1985.

HARUN FAROCKI : PROGRAMANDO O VISÍVEL


PROGRAMANDO O VISÍVEL: CONVERSAS ENTRE VILÉM FLUSSER E HARUN FAROCKI

89
90

PROGRAMMING
THE VISIBLE:
CONVERSATIONS
BETWEEN VILÉM
FLUSSER AND
HARUN FAROCKI
PRISCILA
ARANTES
SÉRGIO
NESTERIUK
HARUN FAROCKI : PROGRAMANDO O VISÍVEL
CONVERSATIONS BETWEEN VILÉM FLUSSER AND HARUN FAROCKI

The Programming the Visible exposition, presented at the Paço das Artes,
a São Paulo State Culture Ministry institution, from January 28th to March
27th in 2016 focused on questioning the nature of images from the 21st Cen-
tury. The exposition united a series of works by the artist and film maker
Harun Farocki (1944-2014): Parallel I-IV (2014), Interface (1995) and
Catch Phrases, Catch Images: A Conversation with Vilém Flusser (1986).
Harun Farocki is internationally known for his critical reading of the
images that make up the World. He made a series of films, many inspired by
Bertolt Brecht and Jean-Luc Godard, and during his last years of life migrat-
ed to the contemporary art universe, making films and installations about
the relationship between being human and the universe of technical images.
In 2010 he participated in the 29th São Paulo Biennial with the video
installation, Serious Games, which proposes reflection about computer
animation and the use of images focusing on debating violence. It’s start-
ing point comes from a therapeutic process developed with North-Ameri-
can soldiers who have had traumatic experiences in the Middle East.
Programming the Visible presented not only part of Farocki’s universe
but compared image dislocation captured by optical apparatus with those
built by computer algorithms. The exposition did not only discussed the
nature of contemporary images but their power to build the way we per-
ceive reality. In this case the title of the exposition (“Programming the
Visible” in English) could not be more appropriate. That which we see is
not only created by programming codes, but our visibility is programmed.
We live surrounded by a programmable world and manipulated by ma-
chine codes. The computer image, therefore, creates parallel worlds and
affects trajectories: the image is the very world-reality in which we live.
Parallel I-IV, one of the works presented in the show, is a four-part film
installation that looks at the gaming language, reflects about segments of
popular games and is generally narrated by an off-screen voice-over. In

91
92

these films Farocki investigates the devices used for making images dur-
ing the history of art, such as the use of perspective in the Renaissance.
The work is a film installation about image history and representation
strategies through history.
During the series’ first film, released in 2012, Farocki analyzes the style
of computer graphics in 1980s computer which used images composed by
horizontal and vertical lines and dots without depth of field. In the sec-
ond and third films, both from 2014, the artist analysis productions that
use perspective and depth of field until we arrive at the fourth film, one
of the last works made by the artist, in 2014, which features game heroes
inspired by Los Angeles during the 1940s, in pre-apocalyptic images and
Western movies. Many of the sequences in this film are scary and violent;
with sequences from street fights, persecution and armed threats.
Farocki presents fundamental question in these films: the fact that we
live immersed in a world of images that have a decisive influence over the
way we see and behave confronted with reality. The work looks at the nature
of the image in the 21st Century which, diverging from optical images, discon-
nects from reality, creating its own reality with its own rules and creatures.
“The hero had no parents or teachers. He had to learn what the valid rules are
himself,” says an off camera voice in one of the films in the exhibition.
In this sense Farocki’s work seems to take on a political dimension
close to the surface in synch with Godard, the cinematic master of
creating terrific plans of beauty even when dressed in the unease and
intrinsic violence of contemporary life.
In his treatise, “Como Abrir los Ojos” (how to open the eyes), Georges
Didi-Huberman says Farocki passed his entire life obsessed with the same
question: “why, in what way and how is it that the production of images
participates in the destruction of human beings”1.

1 G. Didi-Huberman, Como Abrir Los Ojos, em H. Farocki (org.), Desconfiar de Las Imágenes, p. 28.

HARUN FAROCKI : PROGRAMANDO O VISÍVEL


CONVERSATIONS BETWEEN VILÉM FLUSSER AND HARUN FAROCKI

Maybe Farocki’s strategy was to cope with the violence of the world by
giving it back with more violence and reflect on the malaise of the world:

Elevate thought to the level of disgusting oneself


(the disgust provoked by all of the violence in the
world, this violence to which we deny we are con-
demned to). Elevate and disgust oneself to the
level of a task (the task to denounce this violence
with all the calm and intelligence possible).2

CATCH PHRASES, CATCH IMAGES:


A CONVERSATION WITH VILÉM FLUSSER
It is interesting to think how the questions raised in Parallel I-IV echo
with another work presented at the exposition, Catch Phrases, Catch Im-
ages: A Conversation with Vilém Flusser. In it, Farocki asks the philoso-
pher Vilém Flusser to analyze the first page of the German sensationalist
tabloid Bild Zeitung. Conducted before the Parallel series, the interview
provides disturbing answers to many of the questions about contempo-
rary malaise. Images, texts and sources mutually reinforce themselves to
generate media and reality impact.
It is important to note that many of the questions posed during the
interview build on ideas that were already developed by Vilém Flusser in
the publication Towards a Philosophy of Photography in 1985, one year
before the interview.
In Towards a Philosophy of Photography, photography is used to de-
velop criticism about the relationship between technology and society
starting from what Flusser calls technical images. Photography is a basic

2 Ibidem, p. 14.

93
94

device whose characteristics are re-signified in cinema, video and televi-


sion until we arrive at today’s computer images. In this sense, Towards a
Philosophy of Photography is not only about photography but about the
production of technological images that modify our form of relating to the
world. In this sense, photography functions more as a pretext for verifying
our society’s functioning marked by the collapse of text and the hegemony
of media images.
The advent of technical images marks the beginning of a new rela-
tionship with the visible that is structured in a distinct model of written
language: the technical images propose themselves as surfaces that aspire
to represent the world, but this in fact hides their real dimension which is
that they are nothing other than images.
Flusser proposes the perception of a new stage of culture contami-
nated by the explosion of techniques and media, launching a critical eye
on the gadgets and understanding them as black boxes – tools whose pro-
gramed interior is completely opaque and uncertain.
Within this context, the subject tends to covert itself, by the techno-so-
cial programs’ actions, into a programmed and programmable functionary
who waits for the answers and questions posed by the technical apparatus.
In other words what we really see, in a world dominated by technical im-
ages, is not the world but determined concepts relative to the world im-
pregnated in the media structure.
The interview, therefore, recuperates important points in the Flus-
serian discussion related to the world of images’ hegemony its power in
programming our visibility.
It is interesting to perceive that, unlike other philosophy texts, Flusser
developed an applied philosophy in this interview. To conduct a miniscule
exercise of reading the subliminal relationships between text and image
on the first page of a sensationalistic German paper, unraveling the way

HARUN FAROCKI : PROGRAMANDO O VISÍVEL


CONVERSATIONS BETWEEN VILÉM FLUSSER AND HARUN FAROCKI

in which the expressive codes interrelate in the creation of slogans and


demagogic discourses.
The theme of violence, which is one of the topics on the paper’s front
page, specifically about a person who was shot, is reinforced by the way in
which the text and image penetrate themselves, creating a subliminal form
to treat violence as if it were something banal. Flusser says about one of the
passages from the interview:

The text says, “She had to kneel”. “Shot in the


head”. And here the image breaks the text. So
if someone looks here a powerful suggestion
is obtained. It is very important. I want to say
[…] that even before we broke our heads to un-
derstand what this page was really trying to say
[…], the constructed situation is deliberately
chaotic with the intention of interrupting our
consciousness. Its intention is to eliminate our
consciousness. Its intention is to eliminate our
consciousness so that we supposedly absorb the
message on a low level of consciousness where it
is not perceived correctly. We are contemplating
here, in an apparently transcendent manner, this
“kitchification”, brutalization and reduction of
human dignity to a demagogic level.

By the end of the video Flusser calls attention to the fact that the in-
terview is also an image – since it is being filmed – and that, in this sense,
the spectator should have a critical and reflective relationship with what
he sees: “I think that honestly, when someone sees us on TV, it should be

95
96

said. We should make an appeal to the spectators and say, ‘use this critical
ability because we are using the word against our very selves’.”
This is the point with which Flusser’s philosophy wants to intervene –
to produce a reflection about the possibilities of creation and visual criti-
cism as a society’s freedom is more and more programed and dominated
by technical images. In this manner, it is important to not trust images,
since they are codes and, in such, programmable.

GAME DESIGN: BETWEEN VILÉM FLUSSER


AND HARUN FAROCKI
In The Shape of Things: Philosophy of Design, Flusser (2007) defines
design as an area in direct harmony with the world of communication. Far
from viewing design as a separate area of language, both are codifications
of the world:

Design, like all cultural expressions, shows that


the material does not appear (is unapparent), if
it is not informed and, therefore, once informed,
starts to manifest and turns itself into a pheno-
menon. Like any cultural aspect the material in
design the way in which forms appear.3

For Flusser, differently than a modernist vision of design in which the


form should follow the function, the form of something – the artifact –
carries the feeling of in+form, or to provide something with intention:

3 V. Flusser, O mundo codificado, p. 28.

HARUN FAROCKI : PROGRAMANDO O VISÍVEL


CONVERSATIONS BETWEEN VILÉM FLUSSER AND HARUN FAROCKI

Every manufactured artifact, in its way, aims to


transform the users relationship with his sur-
roundings in a way to take some kind of advanta-
ge. To solidify the possibility of use, the artifact
turns into an information model. For example,
after you see a lever in operation and understand
the principle used, it is no longer possible to see
any wooden or metal beam without recognizing
its potential of application towards the same
goal. What was once a simple piece of wood ac-
quires a new function and specific meaning for
the existence of a concept, in other words inform
is also to fabricate.4

Faced with a massive entertainment artifact, one of the main inten-


tions of a game designer is to project and implement strategies and di-
verse resources that favor ubiquity and the immersion of the player. In
this manner, it iris possible to maintain a player in what Mihaly Csikszent-
mihalyi5 denominates as a flow: a state of extreme concentration (or ab-
sorption) in the activity per se, as if the very ego takes itself apart in front
of the autotelic phenomenon.
Meanwhile, the literature in the area appears to ignore the very limits
which are (among others) questions that the game design reveals. The
flow relieves the subject-player in his suspension of disbelief, of a critical
distance in relation to the work (the played game), and this increases the
potential experiences that the games can offer, exactly because it is con-
fined within certain wished parameters.

4 Ibidem, p. 13.
5 M. Csikszentmihalyi, Flow: The Psychology of Optimal Experience.

97
98

It is exactly in this interstitial zone that Farocki thought about games:


between the real, the imaginary and the symbolic, in order to value the
psychic registers proposed by Lacan. In appropriating, mediating and
subverting the logic of games, the artists position themselves in a species
of digital non-places, a palimpsest in which other texts are revealed; the
invisible behind that which is called “operative images”- images that start
from a technical operation with the objective of restituting or creating a
given reality.
Differently Serious Games, in which a game created by the US army
was examined, in the Parallel installation, made up of four videos, Farocki
utilizes different commercially launched games to explore relevant ques-
tions that escape video game players and critics.
In the first video elements of nature like fire, water and trees serve as
references to show a kind of jump in only 30 years of digital image repre-
sentation, from a few points on the screen to the three dimensional im-
ages, 3D. As it is says in the video, the creators of 3D images did not have
to wait for a Renaissance because the digital permits that the image leaves
its symbolic dimension to what Farocki agreed to call a new constructiv-
ism. The register of a designer inter-laying his eye between two monitors
to create 3D clouds is emblematic. On one of the screen he operates an
interface with software while on the second the results of his manipula-
tion form a virtual sky, composed by different cloud layers. Differently
from the Greek painter Zeuxis, who painted such perfect grapes that they
attracted birds, the images of the computer intend to attract beings cre-
ated by the very design. Farocki believes that, in the same manner that a
photographer liberates painting for the movements of the vanguard, the
three-dimensional images will assume the functions of cinema, freeing it
for other possibilities.
The second video tangent is spatiality- space, its surfaces, its limits

HARUN FAROCKI : PROGRAMANDO O VISÍVEL


CONVERSATIONS BETWEEN VILÉM FLUSSER AND HARUN FAROCKI

and the void. Starting with the placement of a proposed ontology that
“the world does not exist if it is not being observed”, Farocki offers a
reflection to try to understand the infinitude of created spaces by these
operative images. “How far can we go?”, asks a voice in the video which
the images show attempts to pass unscalable or invisible borders pro-
grammed by the games.
The third video of the installation explores questions about displace-
ment showing the control of a camera and a form of of great zoom in/
zoom out that permits a nearly microscopic vision within a war combat
scene until pulling back reveals a scenario without sound that is sus-
pended in a kind of great void: “The world ends with a board”, the voice
in the video tells us. Through the means of manipulation of the game’s
programing code it is possible to make the camera penetrate objects and
solid surfaces showing them as if they were hollow inside. The absence of
collision provides other forms of experience and spatiality in this “new
constructivism”. In breaking with immediate relations between material
and form, the artist reinforces the hyper-real6 (Baudrillard: 1981) in the
manifestations of time and space proportioned by the manipulation of
the player, stimulating new forms of cognition and imagination: “Like the
child who rips up a doll to know the mysteries of representation,” says the
video narrator.
In the fourth video, Farocki investigates situation limits involving
characters controlled by the player and their interactions with npcs
(non-player characters) oriented by algorithm programming of artificial
intelligence. In addition to gratuitous violence, one of the artifices used
is to keep the character controlled by the player immobile in front of an
NPC, that is, to not act or seek forms of interaction that a gamer would

6 J. Baudrillard, Simulacres et simulations.

99
100

normally look for. This adopted distancing reinforces the estrangement


of the public in front of something that presents itself as simultaneously
familiar and strange (unheimlich)7. In this form, it puts itself inf front of
us as an intrinsic diegesis that asks us not only about the simulation or
miming of human behavior, but about the very limits of human freedom.
In other words to what point the very life in society can also be considered
programmed or programmable? To what point does the player control his
own life? To what point will his own life be considered a great game?

FINAL CONSIDERATIONS:
(RE)PROGRAMMING THE (IN)VISIBLE
We can ponder that in proposing new forms of codification and decodi-
fication in the world, Farocki attributes different possibilities of use of an
artifice adding value not only to its model but, above all, the potentiality of
its information.
However, we can expand this consideration if we have other aspects
presented in the term “design” as a base, as much in its use as a substan-
tive as a verb. For Flusser, even with the most ordinary acceptance of the
term evokes an “evil and cunning” dimension because, according to him, “
design occurs in a context of tricks and fraud. The designer is, therefore, a
malicious conspirator who is dedicated to building traps.”8
In this way the artifacts that Farocki appropriates can be understood
as processes of intrigue, devices of trickery and in this sense, the very
lever, example used by Flusser, has the tricking of gravity as its main me-
chanical principle. In the same manner the philosopher believes that the
designer provokes the appearance of form and because of this should be

7 One of the paradoxes observed in the games is the phenomenon known as uncanny valley, in which the closer a
representation of a charecter becomes to the human figure the greater its estrangement and less empathy it gains
from players.
8 V. Flusser, O mundo codificado, p. 182.

HARUN FAROCKI : PROGRAMANDO O VISÍVEL


CONVERSATIONS BETWEEN VILÉM FLUSSER AND HARUN FAROCKI

considered an imposter who seduces man and considers ideas as “de-


formed”.
The dichotomous separation promoted by the Enlightenment be-
tween the world of arts and technique, of machines, therefore, shows
itself unsustainable by in the 19th Century, together with the advance of
technical images. For Flusser (2007) it is exactly modern design that will
occupy this hiatus, as a connective axis between these two worlds, mak-
ing its internal connections explicit and enabling a new form of culture:

This is the design which is at the base of every


culture: tricking nature by means of techni-
que, substituting the natural for the artificial
and building machines where a god rises up
that is ourselves. To summarize, the design
that is behind everything a culture consists of,
with cunning, transforms us from simple mam-
mals conditioned by nature into free artists.9

In this way it is also possible to think of Farocki’s work, as a facilitator


of understanding about how a photograph. A film or a game arrives to its
public in a manner that is increasingly mediated and mediatized, unrav-
eled, manipulated or hiding its secrets and invisible codes. The more this
process repeats istelf the more clear it becomes. For this reason, like the
player of a game, the contemporary subject may be understood as a trick-
ster who at the same time is being tricked because this visibility is hidden
under other codes.

101

9 Ibidem, p. 184.
102

BIBLIOGRAPHY
ARANTES, Priscila. Post-History, Technical Images And
Freedom in Times of Barbarism. Flusser Studies, n. 18,
Nov., 2014.
______. Media, Gestures And Society: Dialogues Between
Vilém Flusser And Fred Forest. Flusser Studies, n. 8, May,
2009.
______. Reescrituras da Arte Contemporânea: História,
Arquivo e Mídia. Porto Alegre: Sulina, 2005.
BAUDRILLARD, Jean. Simulacres et simulations. Paris:
Galilée, 1981.
CSIKSZENTMIHALYI, Mihaly. Flow: The Psychology of
Optimal Experience. New York: Harper Perennial Modern
Classics, 2008.
DIDI-HUBERMAN, Georges. Como Abrir Los Ojos. In:
FAROCKI, Harun (org.). Desconfiar de Las Imágenes.
Buenos Aires: Caja Negra, 2013.
FLUSSER, Vilém. O Mundo Codificado: Por Uma Filoso-
fia do Design e da Comunicação. Organização de Rafael
Cardoso, tradução de Raquel Abi-Sâmara. São Paulo: Cosac
Naify, 2007.
______. Filosofia da Caixa Preta. São Paulo: Hucitec,
1985.

HARUN FAROCKI : PROGRAMANDO O VISÍVEL


103
104

HARUN FAROCKI : PROGRAMANDO O VISÍVEL


O NOVO CONSTRUTIVISMO

O NOVO
CONSTRUTIVISMO
HARUN FAROCKI
E ERIKA BALSOM
CONVERSAM
SOBRE PARALELO
I-IV

105
106

Por muitos anos, Harun Farocki se interessou pela ascensão de imagens


computáveis. Em Eu pensei que estava vendo convictos (2000) e na trilogia
Olho/máquina (2001-2003), ele avaliou as tecnologias de vigilância, ao
passo que em Jogos sérios (2009-2010), analisou a forma como os militares
americanos utilizam simulações de animação computadorizada para edu-
cação, treinamento e fins terapêuticos.
Com Paralelo I-IV (2012-2014), essa linha de raciocínio continua em um
ensaio reflexivo sobre videogames. Farocki renuncia a qualquer abordagem
sociológica que questionaria se os jogos seriam “bons” ou “maus”, em vez dis-
so, faz uma análise de seus sistemas representacionais. Procura compreender
como eles criam seus mundos, que lugar o corpo humano pode ter em relação
a eles, e qual tipo de relação eles têm com outras formas de mídia. Paralelo
renuncia à obsessão pela novidade que está sempre presente em discussões
sobre games – e, certamente, está presente no próprio termo “novas mídias”
– para, em seu lugar, inserir os jogos ao longo da história da representação, de
uma maneira a levar a todos nós de volta aos conceitos pré-helênicos sobre o
mundo. Farocki faz uma referência implícita à teoria clássica do cinema a fim
de construir um quadro comparativo que conteste qualquer narrativa sobre a
transformação dos suportes como uma progressão linear.
Paralelo pergunta o que constituiriam as ramificações do crescente
domínio dessas imagens geradas por computador. É importante ressaltar
que Farocki começa voltando-se aos temas do mundo natural – como o
vento, as árvores e as nuvens – que estão intimamente ligados à contin-
gência e historicamente foram aliados ao poder mimético do cinema.
Farocki encontra nesses temas intersecções onde o empenho das ani-
mações de computador pela verossimilhança é mais profundo. A voz over
em Paralelo I nos diz: “No cinema, há o vento que sopra e o vento soprado
por uma máquina de vento. Em imagens de computador, existe apenas um
tipo de vento: um novo construtivismo.”

HARUN FAROCKI : PROGRAMANDO O VISÍVEL


O NOVO CONSTRUTIVISMO

Esta noção de um novo construtivismo e a melhor forma de caracteri-


zá-la estão no centro de Paralelo: é a maneira com a qual Farocki descreve
um mundo completamente planejado, desprovido de contingência, tão
central para o fascínio cinematográfico e desprendido de um referencial
da realidade física.
Porém, nem tudo é sobre a perda: este é um mundo de espaço acio-
nável, aberto ao controle e à manipulação do jogador, pelo menos dentro
dos parâmetros estabelecidos pelo jogo. Torna-se muito claro ao longo de
Paralelo que, para Farocki, o prazer e o interesse nos jogos encontra-se na
exploração do mundo e de seus limites, de preferência a qualquer narrati-
va ou objetivo.
Isso fica especialmente visível nos últimos capítulos de Paralelo, que
sondam as limitações, fracassos e falhas desses mundos dos games. Por
um lado, serve para inflar suas promessas de expansividade e liberdade.
Por outro, contudo, ao desvencilhar elementos do jogo orientados a trans-
mitir a progressão para, ao contrário, comemorar defeitos aparentes ou
falhas, Farocki encontra oportunidades inesperadas para o jogar dentro
do jogo, momentos lúdicos que residem dentro e ao lado de não importa
qual narrativa esteja em andamento.
Paralelo precisa habilmente especulação e rigor, combinando um
modo poético com uma força analítica sutil, levando seu espectador para
um espaço de conexões, comparações e contradições produtivas, com
uma perceptível generosidade.
Esta conversa aconteceu em 31 de maio de 2014, no cenário da terceira
edição do Berlin Documentary Forum, produzido por Haus der Kulturen
der Welt. A ocasião marcou a estreia de Paralelo I-IV, que foi instalado no
auditório em quatro projeções separadas que foram vistas pelo público
em intervalos ao longo da conversa.

107
108

Erika Balsom Talvez possamos começar falando sobre a gênese de Para-


lelo. Como você passou a se interessar em trabalhar com games? Foi em
consequência de seu trabalho anterior, Jogos sérios?

Harun Farocki Começou antes disso. Acho que meu trabalho sobre
esse tema é mais velho do que o gênero. Nos anos de 1980, comecei a
pensar em quantas vezes as imagens técnicas, muitas vezes, têm a ver
com a mensuração. Há todas estas formas de cálculo que criam uma
ferramenta para além da imagem. Esses são os antecessores e precur-
sores do processamento de imagens. Eu estava interessado nessas
coisas e tinha lidado com elas em vários filmes sobre as chamadas “ar-
mas inteligentes”, em que as imagens podem ser processadas de modo
que o destino ou a finalidade seja encontrado automaticamente. Ocor-
reram muitos testes durante a Guerra do Iraque em 1991. Mais tarde,
fiquei sabendo que animações de computador são utilizadas para fins
educacionais, como a formação de soldados, mas também para fins
terapêuticos. Agora, esse gênero de animação por computador tem 35
anos de idade. Há jogos sérios e os jogos não tão sérios. Mesmo nes-
tes jogos não tão sérios, um monte de tecnologias e ideologias estão
envolvidas. Quando o cinema tinha 35 anos de idade, já contava com
Arnheim, Balázs e Eisenstein entre seus teóricos. Então, alguém tinha
que começar. Com toda a modéstia, eu não estou teorizando os games,
mas de alguma forma eu tentei abrir esse campo para a reflexão.

EB É realmente surpreendente que os temas que você usa para desenvol-


ver essas ideias de cálculo no Paralelo I tendem a ser temas do mundo na-
tural que são frequentemente associados com a contingência. Nós temos
a chama, a nuvem, o vento e a água. É notável que a água é uma das coisas
que os animadores da computação têm encontrado mais dificuldade em

HARUN FAROCKI : PROGRAMANDO O VISÍVEL


O NOVO CONSTRUTIVISMO

renderizar. O vento nas árvores, é claro, tem uma longa história no cine-
ma; aparentemente, era o que mais fascinava os primeiros espectadores.
Em se tratando de temas que são tão intimamente ligados à teorização
do cinema, você está tentando estabelecer um quadro comparativo entre
cinema e videogames?

HF Sim. No geral, Paralelo I não é tanto sobre os jogos. É mais sobre


imagens, estilo e sobre “história da arte”, entre aspas mesmo, do re-
tratar. É uma história da arte muito idiossincrática, não independente,
mas que está relacionada com a história da arte oficial que a rodeia. Ela
não pode ser lida de uma forma darwinista, como muitas vezes a his-
tória da arte é lida. Este aspecto da contingência, o que acrescenta um
sabor de verossimilhança, é o que eu acho que nós precisamos analisar.
Você sente essa força muito estranha desde o início nessas imagens
que estão em concorrência com as imagens cinematográficas/foto-
gráficas. Assim como o socialismo queria derrotar o capitalismo, eles
querem derrotar estas imagens e provavelmente eles estão prestes
a derrotá-las agora. Acho que as imagens animadas por computador
estão se tornando as imagens padrão.

EB Relacionado a essa questão de as imagens animadas por computador


se tornarem padrão, na narração de Paralelo I, você faz o que eu acho uma
referência implícita ao “A Ontologia da Imagem Fotográfica”, de André
Bazin. Você diz que assim como o advento do cinema libertou a pintura da
tarefa de reproduzir a semelhança, é provável que o atual advento desse
modo digital de apreensão de mundo permitirá ao cinema fazer outras
coisas. Você tem uma noção de que outras coisas o cinema pode ser capaz
de fazer a partir de agora?

109
110

HF É muito controverso. Eu preciso voltar um pouco atrás na história:


quando a cinematografia surgiu, ela nasceu do interesse científico,
como Étienne-Jules Marey e até mesmo Muybridge. Embora fosse um
showman, Muybridge ainda estava fazendo uma pesquisa sobre os
movimentos do cavalo. Depois de dez ou vinte anos, essa relação foi
perdida e o cinema se tornou entretenimento, educação e assim por
diante. Isso não é bom! É melhor se ter trabalho a fazer. Sabemos que
a libertação está muitas vezes ligada a se ter trabalho. Muitas pessoas
trabalharam sem terem sido pagas, ou sem terem tido reconhecimen-
to por isso. Mas se o trabalho é reconhecido, muda alguma coisa. Essa
libertação do cinema é comparável ao que aconteceu na história da
modernidade, quando o objetivo da pintura não era mais retratar as
posses de uma pessoa burguesa. Em uma espécie de analogia, o mesmo
pode ser dito sobre o cinema.

EB É realmente admirável que se faça uma longa perspectiva da história


da representação neste trabalho. Em alguns dos escritos que existem so-
bre videogames há um foco, ou até mesmo uma obsessão, pela novidade.
Aqui, porém, você olha para trás, muito distante no passado, até mesmo
para os antigos egípcios. Você pode falar um pouco por que isso era impor-
tante para você?

HF Ah, sim. A ideia que eu tive nunca foi a de procurar pela novidade.
Eu sou um pouco estranho. Pode-se imaginar que eu tenha lido mais
livros ou que eu jogue videogames...

EB Você não joga videogame?

HARUN FAROCKI : PROGRAMANDO O VISÍVEL


O NOVO CONSTRUTIVISMO

HF Não, eu não jogo. Mas posso te entreter com o fato de que em


Peenemünde, antes de eu nascer, eles já dispunham de um joystick
para dirigir o V-2. É uma invenção alemã. Não só o cinema foi inventa-
do aqui, mas também o joystick. Eu não sou um jogador, mas eu tive a
ideia de olhar para a forma como esses jogos retratam coisas. Isso tem
a ver com o meu interesse em saber como essas imagens tornaram-se
uma espécie de padrão. Minha hipótese é que a ideia do construtivis-
mo é muito importante para a animação por computador. Estamos
recriando o mundo. As questões de referência e verossimilhança são
muito fortes. Mas nós criamos esse mundo e nos sentimos tão inteli-
gentes por tê-lo feito! Nós compartilhamos deste sentimento ao ver-
mos um filme, jogarmos um jogo, ou assistirmos televisão. É por isso
que eu analisei como animações de computador retratam as coisas e
como se desenvolveram.

EB Sobre o que você chama de um “novo construtivismo”: parece que uma


grande parte dele é uma derrota da contingência. Contingência tem sido
uma parte significativa de como as pessoas têm historicamente teorizado
o fascínio do cinema. Se o elemento da fascinação foi perdido agora, onde
está a fascinação pelo videogame? Você acha que está na ideia de uma oni-
potência, em nossa sensação de termos criado inteiramente um mundo?

HF Talvez. Mas quando analisamos games em geral, eles têm um forte


senso de limitação. Mas quando olhamos para bons jogos – como aque-
les jogados com dados – eles ainda têm um forte sentido de contingên-
cia. É uma contingência muito guiada e sintética, mas ainda existente.
Os jogos são um campo de representação. Por que não deveria ser o
caso de a contingência agora acontecer dentro dos limites do jogo?

111
112

EB Então, talvez, poderíamos dizer que a contingência geralmente era


localizada no momento da captura da imagem, registrando um traço do
mundo físico, mas agora reside nas ações do jogador que pode intervir
dentro de um determinado conjunto de parâmetros. Há um elemento de
acaso na forma como o jogador irá controlar o seu avatar.

HF Sim. E, eu mostro muitas falhas nesses mundos. A contingência


não pode ser excluída. Mesmo dentro de um conjunto limitado de op-
ções, nem tudo pode ser calculado. Algo ainda pode ser experimenta-
do como inesperado.

Hito Steyerl [da plateia]: Obrigada, Harun, por apresentar esse trabalho
maravilhoso. Eu tenho duas perguntas, talvez até sejam apenas comen-
tários. A primeira é a questão de saber sobre se você em um determinado
momento considerou referir-se à animação como um precursor para estas
imagens geradas por computador. Parece-me que são as precursoras lógi-
cas do que você está mostrando. Em termos de ideias como gênese, gera-
ção, a criação de um novo mundo, e assim por diante, elas parecem muito
mais relacionadas, para mim, do que as imagens feitas por lentes. Talvez
esta seja uma grande mudança em relação às imagens feitas por lentes
como tais. Talvez a gente não precise mais da lente. O segundo comentá-
rio é sobre contingência e construtivismo. Parece-me que, pelo menos na
última geração de jogos, você tem tamanha liberdade em incluir a física
ficcional, em mudar completamente as leis da física e os conjuntos de
possibilidades dentro de universos. Eu tenho praticamente zero problema
com isso, porque remove as limitações fundamentais que de certa forma
condicionam o cinema. As coisas que podemos imaginar agora são muito
maiores e eu considero isso um grande benefício.

HARUN FAROCKI : PROGRAMANDO O VISÍVEL


O NOVO CONSTRUTIVISMO

HF Não posso avaliar isso. Eu diria que é como um gênero literário:


muitas regras são definidas, e você pode não ser surpreendido, mas
você pode ser surpreendido, mesmo por um romance policial. No caso
de seu primeiro comentário, eu só queria manter tudo nos jogos de
computador e não introduzir outras coisas. Mais ou menos, a anima-
ção feita à mão tinha um estilo próprio. Claro, havia diferentes gêneros
para retratar, vindos de gráficos e assim por diante. Mas se você anali-
sar Walt Disney ou qualquer outra animação, não houve nenhuma ten-
tativa de imitar a linguagem cinematográfica ou os filmes live-action.
De alguma forma, eles procuraram um estilo que fez das limitações
uma qualidade. É um pouco surpreendente que animações de compu-
tador não façam isso. Eles são arrogantes o suficiente para se tornar a
nova burguesia. Eles não dizem, “É maravilhoso que temos um traba-
lho nesta sociedade!”

Participante da Plateia: Você sugeriu uma relação entre representação


realista e comércio, que as imagens burguesas são o oposto da pintura abs-
trata e que há um fundo financeiro para isso. Quais você pensa que seriam
as conexões entre representação realista e poder ou finanças?

HF De uma forma muito simples, eu diria que o formato de filmes ci-


nematográficos – hoje, infelizmente, é 16:9, outrora, 4:3 – é o formato
ideal para mostrar uma família e suas posses. Você pode incluir um
carro e uma empregada doméstica ou qualquer outra coisa, mas será
sempre um modo de dizer: “Esse é o meu prédio, essa é a minha fa-
mília”. Ou “meus empregados”, no caso dos Lumière. Claro, existem
outras opções e você pode lê-las de forma diferente. Mas, quando se
pensa sobre o poder, acho que essa relação ao mostrar, ou esse aspecto
do domínio simbólico na tomada de uma imagem, às vezes, é negligen-

113
114

ciado. Eu queria voltar a isso, porque assistir esses jogos por um tempo
torna impossível não pensar sobre o domínio do simbólico.

EB Em Paralelo II, a organização espacial desses mundos do jogo se torna


muito importante. Parece cumprir uma tensão entre, por um lado, os sen-
timentos de mobilidade e liberdade do jogador e, por outro, as invisíveis
– ou às vezes visíveis – barreiras que existem dentro do jogo para limitar
essa mobilidade e liberdade. Você vê essas barreiras como uma limitação
simples ou há uma sensação de que elas são necessárias para o jogo? Elas
podem se tornar produtivas? Elas podem se tornar uma fonte de humor,
como vemos no caso do skatista que cai para fora no espaço em Paralelo II?

HF Os tabuleiros de xadrez têm que ter limites; caso contrário, só


nerds iriam jogar o jogo e levariam nove anos para fazê-lo. O jogador é
introduzido em Paralelo II sem ser mostrado como ele ou ela. A ideia
aqui do que Galloway chama de “espaço acionável” ou “acionabilida-
de” é muito importante1. Eu não queria me concentrar tanto na ma-
tança de pessoas, por isso, acho mais interessante essa questão de se
descobrir um mundo em que se vive. É um pouco como as crianças na
puberdade tentando descobrir o que rodeia a casa de seus pais ou a sua
escola – e que provavelmente é um shopping center. Há uma palavra
alemã maravilhosa, Streifradius, que significa o raio de alcance que é
acessível a uma criança. A sociologia diz que, no momento atual, está
se tornando cada vez menor. As crianças já não exploram mais o mun-
do; elas só andam por mais cinco metros até a próxima loja ou estação
de metrô. Aqui você vê esse raio novamente no impulso de explorar

1 Alexander Galloway é autor de: Protocol: How Control Exists After Decentralization, MIT Press, 2004. Gaming: Essays
on Algorithmic Culture, University of Minnesota Press, 2006. E, em coautoria com Eugene Tracker, The Exploit: A
Theory of Networks. University of Minnesota Press, 2007, entre outros.

HARUN FAROCKI : PROGRAMANDO O VISÍVEL


O NOVO CONSTRUTIVISMO

o mundo e no aspecto da falta de limites. Há jogos que colocam suas


figuras em espaços do tamanho da Grã-Bretanha. Pode ser muito cha-
to, mas você pode navegar por dias.

EB Você mencionou o trabalho de Alex Galloway sobre games. Penso que


outra parte importante do seu trabalho que se apresenta em Paralelo II
é a predominância da perspectiva da primeira pessoa, que é anormal no
cinema. Enquadramentos de ponto de vista são, naturalmente, comuns,
mas muitas vezes eles não compartilham a visão real da personagem. Eles
acontecem por cima do ombro e são justificados muito pelas regras de edi-
ção de continuidade. Com efeito, enquadramentos em subjetiva são bas-
tante raros e muitas vezes estranhos no cinema. Eles são, por vezes, utili-
zados em estados alterados das personagens como estupores alcóolicos
ou alucinações induzidas por drogas, e também em algumas experiências
fracassadas de famosos filmes noir como A Dama do Lago e no primeiro
terço de Prisioneiro do Passado. Mas em videogames, o ponto de vista em
primeira pessoa é muito comum. O que você acha que permite aos video-
games usarem este dispositivo, de modo eficiente, e de uma forma que o
cinema não tem sido capaz de fazer?

HF Acho que é bastante óbvio. A “acionabilidade” pode compensar


uma representação pré-determinada. De forma bem simples, quando
somos capazes de navegar, mesmo que de forma limitada, isso nos
permite muito mais do que apenas visualizar uma sequência de ce-
nas, mesmo quando editada pelos mestres da cinematografia. Talvez
isso possa ser comparado a ler e escrever. Se você pudesse imaginar
que alguém só conseguisse ler e nunca escrever por si próprio e, de
repente, esta pessoa tem a atividade da escritura, por algumas dé-
cadas ela poderia então preferir a escritura, porque seria uma expe-

115
116

riência maravilhosa que o indivíduo era incapaz de realizar até então.


Nos últimos vinte ou trinta anos, as cenas no cinema tornaram-se
cada vez menores. Na época clássica, você tinha dez cortes por mi-
nuto e hoje em dia você tem uma nova imagem a cada três segundos
ou até mesmo a cada 1,5 segundos. Não há crianças aqui, então, posso
dizer: há muitas crianças que são incapazes de assistir um filme com
cenas superiores a três ou dez segundos. Elas pensam que vão mor-
rer quando as assistem! Mas elas são capazes de jogar esses jogos.
Obviamente, a atuação simbólica desses jogos compensa um filme
bem ou atraentemente editado.

EB A capacidade de agir de acordo com o espaço também permite que o


corpo do avatar desapareça, para que possamos ter um acesso direto ao
mundo na tela.

HF Sim, e quebrar as regras é uma parte de todo jogo. Tentando


descobrir se você pode quebrar as regras e que tipo de punição isso
implicaria. Esse é um estado experimental que você tem em toda
relação com autoridade.

EB Eu tenho uma pergunta muito simples, uma cuja resposta estou in-
teressada em ouvir. Trata-se do título desse trabalho. Eu posso pensar
em muitos paralelos potenciais que possam estar presentes em Paralelo,
mas eu gostaria de ouvir suas considerações sobre como você chegou a
esse título.

HF Tenho uma resposta muito simples. Com Second Life, nós tínha-
mos uma vida paralela. É a simples ideia de que os jogos são algo para-
lelo ao nosso mundo. O título não diz se eles são um modelo, um espe-

HARUN FAROCKI : PROGRAMANDO O VISÍVEL


O NOVO CONSTRUTIVISMO

lho, ou uma janela para a realidade – apenas chama atenção para dizer
que eles são paralelos.

EB Parece também que a análise comparativa entre o cinema e os jogos


poderia ser outro paralelo importante. É interessante que você não os
coloca um contra o outro, e com razão. Em vez disso, você mostra que os
jogos estão herdando do cinema uma certa ideia de criação do mundo.

HF Sim, essa ideia de que o quadro esconde algo que continua para
além dele, é fortemente visível aqui. É uma ideia que Bazin elabora em
um texto bem curto, “Pintura e Cinema”. Há uma expressão em inglês
que não é usada em alemão: técnicos não falam em quadro, mas em
“janela” de um projetor ou de uma câmera. Para mim, esta é uma boa
metáfora, porque uma fenestra comprime algo. Pode-se ir um pouco
mais longe e dizer que no primeiro filme, Workers Leaving the Factory
(Trabalhadores deixando a fábrica), você só vê que eles são traba-
lhadores, porque estão comprimidos por esse elemento de possível
abertura. Se você tem um curral, você pode quantificar o número de
bovinos que você possui apenas por enviá-los através deste espaço
estreito. Nesses jogos, há esse desejo sem fim de continuar e explorar
cada vez mais. Sabe-se mais ou menos que o mundo não é realmen-
te acessível, mas se tem um desejo muito forte de explorá-lo. É uma
espécie de escopofilia compulsiva da qual gosto profundamente, em
especial, no cinema. Filmes permitem-me alimentar esse desejo, mas
há também uma presença forte disso nesses jogos.

EB Queria perguntar a você sobre sua escolha em expor seu trabalho como
uma instalação, como você fez no passado com Jogos sérios. Para deixar bem
claro, gostaria de perguntar: por que não apenas mostrá-lo em um cinema?

117
118

HF Às vezes eu mostro! Mesmo em espaços de arte, às vezes eu apenas


mostro esses trabalhos em duas telas, se não há espaço. Mas se há uma
opção para fazer essas referências cruzadas entre as diferentes partes,
eu gosto de fazê-las. Editamos movimentando entre as telas.

EB Essa simultaneidade de comparação é algo que acontece mesmo apenas


em Paralelo III, na sua utilização do formato de dupla projeção. Eu sei que
você escreveu sobre a projeção dupla como algo que permite não só uma
montagem de sucessão, mas também uma montagem de simultaneidade.

HF Para ser mais modesto, deve haver sempre uma razão legítima para
usar uma tela dupla. Em alguns casos, era porque eu tinha que compa-
rar duas imagens. Em Paralelo III, era a ideia de que a cena final deveria
mostrar tanto a abordagem quanto o distanciamento do mundo do
jogo. Eu precisava de duas telas para isso e, depois, precisei encontrar
outros motivos para o uso delas. Tem a ver com a copresença, que é
uma abordagem interessante, e ela também pode se tornar bastante
estranha e perigosa. Logo você percebe que faz uso dessas duas telas
como faria uso de plano/contra-plano, como a maneira mais fácil de
estruturar uma sequência ou um discurso.

Hito Steyerl [da plateia]: Fiquei completamente fascinada pelo jeito


como você usou a superfície em Paralelo III. Isso me lembra algo que
Siegfried Kracauer escreveu sobre a aparência da superfície, um termo que
ele chama em alemão de Oberflächenerscheinung. Para ele, a aparência da
superfície era basicamente uma imagem documental de relações sociais
que seriam condensadas na superfície. De fato, é uma questão genérica e
eu não espero que você responda por completo, mas para mim a ideia real-
mente fascinante é que esses jogos são documentários no sentido de que

HARUN FAROCKI : PROGRAMANDO O VISÍVEL


O NOVO CONSTRUTIVISMO

eles são aparências superficiais. Mas do quê? Eles são um documentário


sobre o quê? Que as relações sociais estão sendo condensadas neles?

HF O aspecto mais surpreendente é que às vezes não existe nem mes-


mo superfície em ambos os lados. Muitas vezes a superfície é apenas
visível de um único lado, que é algo novo na geometria pós-Euclidiana
e para além da nossa experiência. Talvez seja esse tipo de mentalidade
que esteja documentado, como o xadrez tridimensional. Eu também
queria acrescentar: meu colaborador Matthias Rajmann descobriu
que você pode comprar um dispositivo por 150 euros para gravar o seu
desempenho em qualidade HD. As crianças nem sempre podem dizer:
“Mãe, olha o que eu fiz!”. Eles têm de gravar isso, colocar o vídeo no
YouTube, e assim esperar uma reação. 150 euros é muito, mas se você
fizer um trabalho em um tipo de instalação como esta, é realmente
uma oportunidade maravilhosa. Essa ideia de que as pessoas estão
fazendo filmes ao jogarem um jogo está de fato acontecendo. Achei tão
surpreendente que no “Theater Mode”2 você pode efetivamente pro-
gramar uma pequena câmera para se mover. Agora, qualquer pessoa
de doze anos pode filmar. Isso também pode ser uma força libertadora
para o verdadeiro cinema – ninguém aguenta mais tanto Steadicam.

EB Essa capacidade de gravar o jogo também realmente altera a tempora-


lidade dos videogames. Ela passa de algo que tem uma espécie de vivacida-
de e uma mobilidade voluntária a algo que é reprodutível e distribuível.

2 Alguns jogos oferecem a funcionalidade “Theater Mode” em que é possível gravar o jogo, para depois assisti-lo com
várias opções de pontos de vista, com diversos movimentos e posicionamentos de câmera. Ou seja, o jogador pode
fazer um filme de suas jogadas, exportá-lo e compartilhá-lo de diversas formas e formatos (N. da T.).

119
120

Participante da Plateia: Eu queria perguntar a você mais sobre as


implicações políticas. Você disse que jogar um jogo é mais parecido
com escrever do que ler. Mas o único escritor que há nesse processo é o
construtor do jogo. É de fato uma ilusão perfeita, a de que estamos es-
crevendo, mas não estamos. Somos impotentes, quando pensamos que
somos onipotentes.

HF Por um lado, você está certo. Por outro, pense em todas essas teorias
sobre a escritura na década de 1970, quando esses jogos estavam em
seus estágios iniciais. Muitas pessoas teorizaram que sempre que você
escreve, você é escrito pela linguagem. Este tipo de mediação é limitado,
não só pelas estruturas da linguagem e pelo gênero. Você está certo – eu
não quero negar, é claro que não é a mesma atividade da escritura. Mas,
talvez você possa escrever coisas novas ao jogar estes jogos.

EB Há uma sensação de que a parte final de Paralelo volta para a primeira


parte. Em Paralelo I, ficamos com a ideia de cálculo aplicado para o mun-
do natural: árvores e água. Em Paralelo IV, ficamos com a ideia de cálculo
articulado em relação ao gesto humano. Comecei a pensar lá atrás como
isso foi uma parte importante da formação de atores na década de 1920
na URSS. Havia a noção de que o movimento humano poderia ser abso-
lutamente codificado, com cada gesto ligado a um significado específico.
Mas, mesmo neste tipo de formação de ator, há uma sensação perceptível
de personificação que permanece. Em videogames, isso desaparece por
completo. Quero saber como podemos conceituar o corpo do avatar do
videogame. É algo mais do que um conjunto programável de ações?

HF Podemos ler nestes jogos todas aquelas coisas que são tão impor-
tantes na puberdade: como se posicionar, onde mexer e onde não me-

HARUN FAROCKI : PROGRAMANDO O VISÍVEL


O NOVO CONSTRUTIVISMO

xer, e assim por diante, todos esses movimentos. É muito elaborado.


Quando se trata do registro do diálogo, é mais limitado. Nunca enten-
di por que a mulher em Paralelo IV às vezes vai para a direita, por vezes,
para a esquerda. Talvez seja uma falha. A questão da contingência volta
em escala menor e estranha. É como se ideias programadas estivessem
se contradizendo, o que você também pode encontrar na narração
clássica de filmes de gênero.

EB Parece que há uma lacuna ou, para ser mais preciso, “despsicologiza-
ção” desses avatares. Pergunto-me se isso é necessário para que o jogador
sinta que ele ou ela possa habitar plenamente ou controlar essa figura.

HF Essa é uma boa ideia. É, talvez, como o que se chama de pensa-


mento positivo. Eu tenho que retornar àquela ideia sobre a escritura e
leitura. Talvez deva-se comparar este tipo de mediação mais à da cul-
tura do carro, do que à mediação de dirigir. Soa um pouco como crítica
cultural, mas há um sentido extraordinário conferido a se ter engrena-
gens e pedais. Agora que a cultura do carro está terminando – ela em
breve chegará ao fim aqui [em Berlim] –, vemos os aspectos surpreen-
dentes que ela promete. Mas é óbvio que ela não cumpre o que prome-
te. Ok, você não se molha quando chove e você não tem que esperar na
parada do ônibus, mas ela nunca te levará para a Riviera e lindas mo-
chileiras nunca entrarão no seu carro. Há todas estas promessas não
cumpridas, e ainda assim essa cultura tem funcionado tão fortemente
por cem anos. Com esta mediação, não se vê muito. Mas o que significa
realmente ver uma coisa? Significa que ela pertence a você? Que você
tem, pelo menos, acesso a ela? O que você deve fazer neste mundo pelo
qual passa? A cinematografia, muitas vezes abordou este tema em seus
road movies, especialmente, nos filmes undergrounds a partir dos anos

121
122

de 1970 com sua música e suas articulações maravilhosas. É uma coisa


estranha, essa promessa sem fim.

EB Uma vez que nós temos os créditos nesta última sessão, eu queria
perguntar-lhe sobre a sua coletânea. Como você chegou à escolha destes
jogos específicos para seu trabalho? Você disse que você não joga videoga-
mes, portanto, quais foram os critérios que utilizou para selecioná-los? É
notável que muitos dos jogos com os quais você trabalha têm uma relação
com os gêneros cinematográficos clássicos.

HF No caso de Paralelo I, é muito simples, especialmente para as pes-


soas aqui em Berlim. Há um museu do jogo de computador aqui. Lá,
eles são muito bem-informados e têm dispositivos que você pode usar
para jogar games que deixaram de estar tecnicamente acessíveis. Eles
dispõem de emuladores que você pode usar para gravar sequências.
Pedimos para eles nos oferecerem coisas e, então, nós escolhemos
entre elas de acordo com a ideia de desenvolver como as nuvens e as
folhas foram representadas. Neste caso, há muitos gêneros de jogos.
Eu queria mostrar algo sobre a exploração do mundo, porque esse as-
pecto da exploração – ou tentar descobrir o que acontece se eu acertar
alguém ou se eu cruzar uma determinada linha –, é uma forma de in-
terpretação inerente. Então, nós olhamos para certos tipos de imagens
e para as configurações que têm a ver com a cinematografia, especial-
mente, com o gênero “pós-apocalíptico”. É um gênero maravilhoso
que possui todos esses aspectos de negligência e solidão.

EB Você diria que o prazer essencial dos videogames está nessa explo-
ração do mundo no lugar de, digamos, vencer? Muitos jogos são empre-
sas orientadas para os objetivos. Eu sei que em debates iniciais sobre

HARUN FAROCKI : PROGRAMANDO O VISÍVEL


O NOVO CONSTRUTIVISMO

os videogames, havia duas escolas de pensamento: os ludologistas e os


narratologistas. Os ludologistas privilegiavam o jogar, enquanto os nar-
ratologistas estavam, como o próprio nome deles sugere, interessados
na orientação narrativa dos jogos. Quando você fala sobre o seu interesse
em explorar o mundo do jogo, parece para mim que você está se colocan-
do do lado dos ludologistas.

HF Sim, às vezes a gente faz a diferença entre jogo e jogar. Acho que
estou mais interessado no jogar. O milagre de jogar tem mais a ver com
imaginar, com preencher vazios. Provavelmente, nós não sabemos
o que realmente acontece. Se você observar crianças jogando, você
nunca vai saber o que se passa na imaginação delas. Eu tentei construir
algo em que você pudesse imaginar alguns aspectos do que acontece
durante o jogar.

EB Sim, em alguns casos você pega elementos do jogo que são explicita-
mente orientados para a progressão prospectiva e os desvia de modo a
descobrir o potencial para o jogar dentro do jogo. Eu também queria per-
guntar a você sobre outra coisa que se refere não só a Paralelo, mas a sua
prática como um todo: o que você acha que está em questão ao se produzir
análises de imagem através da produção de imagens em movimento, em
vez de através, por exemplo, de texto? Isso é algo que tem sido a essência
de seu trabalho por muitos anos. Eu venho de uma formação acadêmica,
por isso, muitas vezes eu encontro textos escritos que impulsionam ideias
que são em algumas instâncias semelhantes às que encontramos em Pa-
ralelo, mas acho que algo pode ser gerado por este trabalho que não está
disponível para a escritura. Portanto, gostaria de saber como você descre-
veria o seu investimento neste tipo de prática.

123
124

HF Eu não posso dar um relato sistemático de uma abordagem a isso,


mas eu tento não fazer algo como palestras com PowerPoint, embora
isso também possa ser maravilhoso. Nos últimos vinte anos, muitas
coisas sobre o cinema, que costumavam ser totalmente inacessíveis,
puderam ser debatidas. Quando começamos a analisar filmes, gostáva-
mos de nos sentar nos cinemas e secretamente contar quantos cortes
havia em um determinado filme ou sequência. Mais tarde, queríamos
nos sentar em um café e argumentar se estávamos certos ou errados.
Em seguida, encontramos um livro afirmando que, em À bout de souffle
(Acossado) havia nove cortes secos, quando ele está dirigindo o carro,
mas tínhamos certeza de que eram sete. Não se tinha o DVD naquela
época, ao passo que, agora, se pode verificar através dele. Você pode
reeditar a sequência, ou mostrar dois assuntos em paralelo. Esse é um
campo maravilhoso que me influencia, claro, esse tipo de trabalho que
pode ser feito analítica e sinteticamente no campo da investigação e da
educação. Mas aqui eu tentei fazer pequenas narrações, pequenas com-
posições em que as coisas estão inscritas e que se pode interpretá-las e,
portanto, esperamos conduzir a uma contextualização de ideias. Espe-
ro que elas proponham questões sobre o que se tratam estes jogos.

Tradução de Helena Prates

HARUN FAROCKI : PROGRAMANDO O VISÍVEL


O NOVO CONSTRUTIVISMO

BIBLIOGRAFIA
BAZIN, André. A Ontologia da Imagem Fotográfica. In:
XAVIER, Ismail. (org.). A Experiência do Cinema. São
Paulo: Graal, 1991.
______. Peinture et cinéma. Qu’est-ce que le cinéma?
20ed. Paris: Cerf, 2011.
GALLOWAY, Alexander. Gaming: Essays on Algorithmic
Culture. Minneapolis: University of Minnesota Press,
2006.
______. Protocol: How Control Exists After Decentraliza-
tion. Cambridge: MIT Press, 2004
GALLOWAY, Alexander; TRACKER, Eugene. The
Exploit: A Theory of Networks. Minneapolis: University of
Minnesota Press, 2007.

125
126

THE NEW
CONSTRUCTIVISM
HARUN FAROCKI
AND ERIKA
BALSOM DISCUSS
PARALLEL I–IV

HARUN FAROCKI : PROGRAMANDO O VISÍVEL


THE NEW CONSTRUCTIVISM

For many years, Harun Farocki has been interested in the rise of calcu-
lable images. In I Thought I Was Seeing Convicts (2000) and the Eye/
Machine trilogy (2001–03) he examined surveillance technologies, while
in Serious Games (2009–10) he looked at how the American military uses
computer-animated simulations for educational, training, and therapeu-
tic purposes. With Parallel I–IV (2012–14), this line of thinking continues
with an essayistic meditation on video games. Farocki foregoes any socio-
logical approach that would question whether games are “good” or “bad,”
instead examining their representational system. He seeks to understand
how they create their worlds, what the place of the human body might
be within them, and what kind of relationships they have to other media
forms. Parallel foregoes the obsession with novelty that is so often pres-
ent in discussions of gaming – and indeed is present in the very term “new
media” – to instead insert these games into a longer history of representa-
tion, one that takes us all the way back to pre-Hellenistic conceptions of
the world. He makes implicit reference to classic texts of film theory in
order to construct a comparative framework that disputes any narrative
of medium change as one of linear progress.
Parallel asks what the ramifications of the increasing dominance of
these computer-generated images might be. Importantly, Farocki begins
by turning to motifs from the natural world – such as wind, trees, and
clouds ­– which are closely tied to contingency and have historically been
allied to the mimetic power of cinema. Farocki finds in these charged mo-
tifs sites at which computer animation’s striving for verisimilitude is most
profound. The voiceover of Parallel I tells us, “In cinema, there is the wind
that blows and the wind blown by a wind machine. In computer images,
there is only one kind of wind: a new constructivism.” This notion of a new
constructivism and how to best characterize it are at the heart of Parallel:
it is Farocki’s way of describing a completely planned world, devoid of the

127
128

contingency so central to cinematic fascination, and detached from a ref-


erent in physical reality. It isn’t all about loss, though: this is a world of ac-
tionable space, open to the control and manipulation of the player, at least
within the parameters set by the game. It becomes very clear throughout
Parallel that, for Farocki, the pleasure and interest of games is to be found
in the exploration of the world and its limits rather than in any narrative or
goal. This is especially visible in the later chapters of Parallel, which probe
the limitations, failures, and glitches of these game worlds. On the one
hand, this serves to deflate their promises of expansiveness and freedom.
But on the other, by derailing elements of the game oriented to forward
progression to instead celebrate ostensible defects or flaws, Farocki finds
unanticipated opportunities for play within the game, ludic moments that
reside within and alongside whatever narrative may be operative. Parallel
skilfully calibrates speculation and rigor, combining a poetic mode with a
subtle analytical strength, leading its viewer into a space of connections,
comparisons, and productive contradictions with a palpable generosity.
This conversation took on May 31, 2014 in the framework of the third
edition of the Berlin Documentary Forum, produced by the Haus der Kul-
turen der Welt. The occasion marked the premiere of Parallel I–IV, which
was installed in the auditorium as four separate projections that were
viewed by the audience at intervals throughout the conversation.

***

Erika Balsom Maybe we can start by talking about the genesis of Parallel.
How did you become interested in working with these games? Was it an
outgrowth of your earlier work, Serious Games?

HARUN FAROCKI : PROGRAMANDO O VISÍVEL


THE NEW CONSTRUCTIVISM

Harun Farocki It goes back farther. I think my work on this topic is


older than the genre. In the 1980s, I started to think about how often
technical images very often have to do with measurement. There are
all these forms of calculation that make a tool out of the image. These
are the predecessors and forerunners of image processing. I was in-
terested in this stuff and dealt with it in several films about so-called
“smart weapons,” where images can be processed so that the target
or the aim can be found automatically. There were many tests of this
during the Iraq War in 1991. Later, I learned that computer animations
are used for educational purposes, like training soldiers, but also for
therapeutic purposes. Now this genre of computer animation is thirty-
five years old. There are serious games and not-so-serious games.
Even in these not-so-serious games, a lot of technology and ideology
are involved. When cinema was thirty-five years old, it had already its
Arnheim, its Balázs, and its Eisenstein as theoreticians. So somebody
had to start. In all modesty, I’m not theorizing it, but somehow I tried
to open this field for reflection.

EB It’s really striking that the motifs that you use to unfold these ideas
of calculation in Parallel I tend to be motifs from the natural world that
are often associated with contingency. We have the flame, the cloud, the
wind, and the water. It’s notable that water is one of the things computer
animators have found most difficult to render. The wind of the trees, of
course, has a long history in film; apparently it was what most fascinated
the earliest spectators. In turning to motifs that are so closely linked to
theorization of cinema, are you attempting to create a comparative frame-
work between cinema and video games?

129
130

HF Yes. In general, Parallel I is not so much about games. It’s more


about imagery, style, and the quote-unquote “art history” of depic-
tion. It’s a very idiosyncratic art history, not an independent one, but
one that is related to the official art history that surrounds it. It can’t
be read in the Darwinist way art history is often read. This aspect of
contingency, which adds a flavour of verisimilitude, is what I think
we need to look at. You feel this very strange force that from the be-
ginning on, these images are in competition with cinematographic/
photographic images. Just like socialism wanted to defeat capitalism,
they want to defeat these images and probably they are on the verge of
defeating them right now. I think computer-animated images are be-
coming the standard images.

EB Related to this idea of computer-generated images become the stan-


dard, in the voiceover of Parallel I, you make what I think is an implicit
reference to André Bazin’s “The Ontology of the Photographic Image.”
You say that just as the advent of cinema liberated painting from the task
of reproducing likeness, perhaps now the advent of this digital mode of
world-making will allow cinema to do other things. Do you have a sense of
what other things cinema might now be able to do?

HF It’s very controversial. I must jump back a minute when cinema-


tography began, it was born out of scientific interest, like Étienne-Jules
Marey and even Muybridge. Though he was a showman, Muybridge was
still doing research about horse movements. After ten or twenty years,
this connection was lost and cinema become entertainment, educa-
tion, and so on. That’s not good! It’s better to have work to do. We know
that liberation is very often linked to having a job. Many people have
worked without being paid for it, or without recognition. But if work

HARUN FAROCKI : PROGRAMANDO O VISÍVEL


THE NEW CONSTRUCTIVISM

is recognized, it changes something. This liberation of cinema is com-


parable to what happened in the history of modernity, when the aim of
painting was no longer to depict the possessions of a bourgeois person.
In a kind of analogy, this same could be said for cinema.

EB It’s really striking that you take a very long view of the history of represen-
tation in this work. In some of the writing that exists on video games, there’s a
focus, or even an obsession, with novelty. Here, though, you look back very far
into the past, even to the ancient Egyptians. Can you speak a little about why
this was important to you?

HF Oh yes. The idea never came to me to look for novelty. I’m quite an
outsider. One might imagine that I’ve read more books or that I play
video games...

EB You don’t play video games?

HF I don’t play, no. But I can entertain you with the fact that in Peen-
emünde, before I was born, they already had a joystick to steer the V-2.
It’s a German invention. Not only cinema was invented here, but also
the joystick. I’m not a player, but I had the idea to look at how these
games depict things. This has to do with my interest in how these im-
ages have become a kind of standard. My hypothesis is that the idea
of constructivism is very important to computer animation. We are
recreating the world. The questions of reference and verisimilitude
are very strong. But we have created this world and feel so smart to
have done so! We partake in this feeling when seeing a movie, playing
a game, or watching television. This is why I looked at how computer
animations depict things and how they have developed.

131
132

EB About what you call a “new constructivism” it seems that a large part
of this is a vanquishing of contingency. Contingency has been a significant
part of how people have historically theorized the fascination of cinema.
If that element of fascination is now gone, where does the fascination of
video games lie? Do you think it’s in this idea of an omnipotence, in our
sense that we have entirely created this world?

HF Maybe. But when we look at games in general, they have a strong


sense of limitation. But when we look at good games – like those
played with dice – they still have a strong sense of contingency. It is a
very guided and synthetic contingency, but still it exists. Games are a
field of representation. Why shouldn’t it be the case that contingency
is now happening within the limits of the game?

EB So maybe we could say that contingency used to be located at the mo-


ment of capturing the image, registering a trace of the physical world, but
that now it resides in the actions of the player who can intervene within a
given set of parameters. There’s a chance element in how the player will
control his or her avatar.

HF Yes. And, I show many glitches in these worlds. Contingency can’t


be excluded. Even within a limited set of options, not everything can
be calculated. Something can still be experienced as unexpected.

Hito Steyerl [from the audience] Thanks, Harun, for showing this won-
derful work. I have two questions, maybe even just comments. The first
one is the question of whether you at a certain point considered referring
to animation as a precursor to these computer-generated images. It seems
to me that these are the logical precursors of what you’re showing. In

HARUN FAROCKI : PROGRAMANDO O VISÍVEL


THE NEW CONSTRUCTIVISM

terms of the ideas of genesis, generation, the creation of a new world, and
so on, they seem much more related to me than lens-based imagery. May-
be this is about a shift away from lens-based imagery as such. Maybe we
don’t need the lens anymore. The second comment is about contingency
and constructivism. It seems to me that in at least the last generation of
games, you have such a liberty in including fictional physics, in completely
changing the laws of physics and the sets of possibilities within universes.
I have basically zero issues with this because it removes fundamental limi-
tations that sort of weighed down cinema. The things we can imagine now
are much enhanced and I consider this a real benefit.

HF I can’t judge. I would say that it’s like literary genre many rules are
set, and you might not be surprised, but you can be surprised, even by
a detective novel. In the case of your first comment, I just wanted to
keep it all to computer games and not introduce other things. More
or less, hand-made animation had a stylization of its own. Of course,
there were different genres of depiction coming from graphics and so
on. But if you look at Walt Disney or whatever, there was no attempt
to imitate cinematographic, live-action film. Somehow they tried to
have a style that made a quality of the limitations. It’s a bit astonishing
that computer animations don’t do this. They are arrogant enough to
become the new bourgeoisie. They don’t say, “It’s wonderful that we
have a job in this society!”

Audience member You suggested a relation between realistic represen-


tation and commerce, that bourgeois images are the opposite of abstract
painting and that there is a financial background to this. What do you
think the connections between realistic representation and power or fi-
nance might be?

133
134

HF In a very simple way, I would say that the format of cinemato-


graphic film – nowadays unluckily 16:9, but once 4:3 – is the ideal for-
mat to show a family and its possessions. You can include a car and
maid or whatever, but it is somehow to say, “That is my building, that’s
my family.” Or “my workers,” in the case of Lumière. Of course, there
are other options and you can read them differently. But when one
thinks about power, I think this relation to showing, or this aspect of
symbolic mastery in making an image, is sometimes neglected. I want-
ed to get back to it, because watching these games for a while makes it
impossible not to think about symbolic mastery.

EB In Parallel II, the spatial organization of these game worlds becomes


very important. It seems to abide by a tension between, on the one hand,
the player’s feelings of mobility and freedom and, on the other, the invis-
ible – or sometimes visible – barriers that exist within the game to limit
this mobility and freedom. Do you see these barriers as a simple limitation
or is there a sense that they are necessary for game play? Can they become
generative? Can they become a source of humor, as we see in the case of
the skateboarder who falls out into space in Parallel II?

HF Chessboards have to have edges; otherwise only nerds would play


the game and it would take nine years. The player is introduced in Par-
allel II without showing him or her. The idea here of what Galloway
calls “actionable space” or “actionability” is very important. I didn’t
want to focus so much on killing people, therefore I find it more inter-
esting to discover the world in which one is living. It’s a bit like kids in
puberty trying to find out what surrounds their parents’ home or their
school – it’s probably a shopping mall. There’s a wonderful German
word, Streifradius, which means the radius of what is accessible to a

HARUN FAROCKI : PROGRAMANDO O VISÍVEL


THE NEW CONSTRUCTIVISM

child. Sociology says that is becoming smaller and smaller right now.
Children no longer explore the world; they only walk the five meters to
the next shop or subway station. Here you see it again in the impulse
to explore the world and the aspect of limitlessness. There are games
that place their figures in spaces the size of Great Britain. It can be very
boring, but you can navigate for days.

EB You mentioned Alex Galloway’s work on gaming. I think another im-


portant part of his work that comes up in Parallel II is the predominance of
the first-person perspective, which is quite anomalous in cinema. Point-of-
view shots are of course common, but often they don’t share the actual vi-
sion of the character. They happen over the shoulder and are justified very
much by the rules of continuity editing. Truly subjective shots are quite
rare and often very awkward in cinema. They’re sometimes used in altered
states like drunken stupors or drug-induced hallucinations, and also in
some famous failed experiments in film noir like Lady in the Lake and the
first third of Dark Passage. But in video games, the first-person point of
view is very common. What do you think enables video games to use this
device so efficiently, and in a way that cinema has not been able to?

HF I find it quite obvious. Actionability can compensate for a pre-given


representation. Quite simply, when we are able to navigate, even in a
limited sense, it gives us far more than seeing a sequence, even when
edited by the masters of cinematography. Perhaps one could compare
it to reading and writing. If you could imagine that one could only read
and never write on one’s own, and then suddenly one has the agency to
write, one might prefer it for some decades because it would be such
a wonderful experience. In the last twenty or thirty years, the shots in
cinema have become shorter and shorter. In the classical era, you had

135
136

ten cuts per minute and nowadays you have a new image every three
seconds or even every 1.5 seconds. There are no kids here so therefore I
can say it there are many kids who are unable to watch a film with shots
longer than three or ten seconds. They think they will die when they see
it! But they are able to play these games. Obviously, the symbolic agen-
cy of these games compensates for a well- or attractively edited film.

EB The ability to act upon the space also enables the body of the avatar to
go missing, so that we have a direct access to the on-screen world.

HF Yes, and breaking the rules is a part of every game. Trying to find out
if you can break the rules and what kind of punishment it might entail.
This is an experimental state that you have in every relation to authority.

EB I have a very simple question, but one I’m interested to hear you an-
swer. It concerns the title of this work. I can think of many potential paral-
lels that might be operative in Parallel, but I’d like to hear your thoughts
on how you came to this title.

HF I have a very simple answer. With Second Life, we have a paral-


lel life. It is the simple idea that games are something parallel to our
world. It doesn’t say whether they are a model, a mirror, or a window
to reality – it’s just carefully to say that they are parallel.

EB It seems also that the comparative analysis of cinema and gaming


could be another important parallel. It’s interesting that you don’t pit
them against one another, and rightfully so. Rather, you show that games
are inheriting a certain idea of world-making from cinema.

HARUN FAROCKI : PROGRAMANDO O VISÍVEL


THE NEW CONSTRUCTIVISM

HF Yes, this idea that the frame hides something that has to continue
beyond it is strongly visible here. It’s an idea that Bazin elaborates in
his very short text, “Cinema and Painting.” There’s an English expres-
sion that is not used in German technicians talk not about the frame,
but about the “gate” of a projector or a camera. For me, this is a good
metaphor because a gate compresses something. One can go a little bit
far and say that in the first film, Workers Leaving the Factory, you only
see that they are workers because they are compressed by this gate. If
you have a corral, you can quantify the number of cattle you have only
by sending them through this narrow space. In these games, you have
this endless desire to continue and explore more and more. One knows
more or less that the world is not really accessible, but one has a very
strong desire to explore. It is a kind of compulsive scopophilia that I
strongly like, especially in cinema. Films enable me to feed this desire,
but there is also something strong about it in these games.

EB I wanted to ask you about your choice to exhibit this work as an instal-
lation, as you have in the past with Serious Games. To put it very bluntly, I
would ask why not just show it in a cinema?

HF Sometimes I do! Even in art spaces, sometimes I just show these


works on two screens if there’s no space. But if there is an option to
make these cross-references between the different parts, I like to. We
edit by moving between the screens.

EB This simultaneity of comparison is something that happens even


just within Parallel III, in its use of the double-projection format. I know
you’ve written about double projection as something that allows not only
a montage of succession but also a montage of simultaneity.

137
138

HF To be more modest, there must always be a legitimate reason to


use a double screen. In some cases, it was that I had to compare two
images. In Parallel III, it was the idea that the final shot should show
both one’s approach to and one’s distanciation from the game world. I
needed two screens for this, and then I needed to find other reasons to
make use of them. It has to do with co-presence, which is an interest-
ing approach, and it can also become quite kinky and dangerous. Very
soon you realize that you make use of these two screens as you would
make use of shot/counter-shot, as the easiest way to structure a se-
quence or a discourse.

Hito Steyerl [from the audience] I’m completely fascinated by your use of
the surface in Parallel III. It reminds me of something Siegfried Kracauer
wrote about, a term he called in German the “Oberflächenerscheinung,”
the surface appearance. For him, the surface appearance was basically a
documentary image of social relations that would be condensed in the
surface. This is really a general question that I don’t entirely expect you to
answer, but for me the really fascinating idea is that these games are docu-
mentaries in the sense that they are surface appearances. But of what?
What are they a documentary about? Which social relations are being con-
densed in them?

HF The most amazing aspect is that even the surface doesn’t exist from
both sides sometimes. Sometimes the surface is only visible from one
side, which is something new in post-Euclidean geometry and beyond
our experience. Perhaps it is this kind of mind-set that is documented,
like three-dimensional chess. I also wanted to add my collaborator
Matthias Rajmann found out that you can buy a device for 150 euros
to record your performance in HD quality. The kids can’t always say,

HARUN FAROCKI : PROGRAMANDO O VISÍVEL


THE NEW CONSTRUCTIVISM

“Mother, look what I’ve done!” They have to record it, put it on You-
Tube, and then get a reaction. 150 euros is a lot, but if you work on this
kind of an installation, it’s really a wonderful opportunity. This idea
that people are making films by playing a game is really around. I found
it so astonishing that in theater mode you really can program a little
camera to move. Now every twelve-year-old can do it. This might also
be a liberating force for real cinema – no one wants to see all these Stea-
dicams anymore.

EB This ability to record the game also really alters the temporality of vid-
eo games. It changes from being about a kind of liveness and a volitional
mobility into something that is reproducible and distributable.

Audience member I wanted to ask you more about the political implica-
tions. You said that playing a game is more like writing than reading, but
the only writer that is there is the constructor of the game. It’s actually a
perfect illusion that we are writing, but we’re not. We are impotent, when
we think we are omnipotent.

HF On the one hand, you are right. On the other, think of all these
theories about writing in the 1970s, when these games were in their
early stages. So many people theorized that whenever you write, you
are written by language. This kind of agency is limited, not only by the
structures of language and by genre. You’re right – I don’t want to deny
it, of course it’s not the same agency of writing. But maybe you can
write new things by playing these games.

EB There’s a sense that the final part of Parallel circles back to the first
part. In Parallel I, we get the idea of calculation applied to the natural

139
140

world trees and water. In Parallel IV, we get the idea of calculation articu-
lated in relation to human gesture. I started thinking back to how this was
an important part of the training of actors in the 1920s in the USSR. There
was the idea that human movement could be absolutely codified, with
every gesture attached to a specific meaning. But even in this form of actor
training, there is a palpable sense of embodiment that remains. In video
games, this completely vanishes. I’m wondering how we can conceptual-
ize the body of the video game avatar. Is it anything more than a program-
mable set of actions?

HF We can read in these games all those things that are so important
in puberty how to stand, where to scratch and where not to scratch,
and so on, all these movements. It’s very elaborate. When it comes to
the register of dialogue, it is more limited. I never understood why the
woman in Parallel IV sometimes takes a right and sometimes takes
a left. Perhaps it’s a glitch. Contingency comes back on this strange
minor scale. It’s like programmed ideas are contradicting themselves,
which you can also find in the classical narration of genre films.

EB It seems that there’s a vacancy or, to be more precise, a de-psycholo-


gization of these avatars. I wonder if that’s necessary for the player to feel
that he or she can fully inhabit or control that figure.

HF That’s a good idea. It’s perhaps like what you call wishful thinking.
I have to take back this this idea about writing and reading. Perhaps
one should compare this kind of agency more to car culture, to the
agency of driving. It sounds a bit like cultural critique, but there is
unbelievable meaning ascribed to having gears and pedals. Now that
car culture is ending – it will soon come to an end here – we see the

HARUN FAROCKI : PROGRAMANDO O VISÍVEL


astonishing aspects that it promises. But it’s obvious that it doesn’t
fulfil what it promises. Okay, you don’t get wet when it rains and you
don’t have to wait at the bus station, but it will never get you to the Riv-
iera and wonderful hitchhikers will never enter your car. There are all
these unfulfilled promises, and still it has worked so strongly for one
hundred years. With this agency, you don’t see much. But what does it
mean when you do see something? Does it mean that it belongs to you?
That you can at least access it? What should you do in the world that
you pass by? Cinematography often picked this up in road movies and
especially in that underground film from the 1970s with wonderful
music and joints. It’s a strange thing, this endless promise.

EB Because we get the credits in this last section, I wanted to ask you
about your corpus. How did you come to select these particular games to
work with? You said that you don’t play games yourself, so what were the
criteria that you used to select them? It’s notable that many of the games
you work with have a relationship to classical cinematic genres.

HF In the case of Parallel I, it’s very simple, especially for people here in
Berlin. There is a computer game museum here. They are very knowl-
edgeable and they have devices you can use to play games that are no
longer technically accessible. They have emulators you can use to record
sequences with them. We asked them to offer us things and then we
picked them according to the idea of developing how the clouds and the
leaves were represented. In this case, there are many genres of games. I
wanted to show something about the exploration of the world, because
this aspect of exploration, or trying to find out what happens if I hit
somebody or I cross a certain line, is a form of in-built interpretation.
So we looked for certain kinds of images and for settings that have to

141
142

do with cinematography and especially the genre you call “post-apoc-


alyptic.” It’s a wonderful genre that has all these aspects of neglect and
solitude.

EB Would you say that the essential pleasure of video games lies in this ex-
ploration of the world rather than in, say, winning? Many games are goal-
oriented enterprises. I know that in early debates around video games,
there were two schools of thought the ludologists and the narratologists.
The ludologists privileged play, while the narratologists were, as their
name would suggest, interested in the narrative orientation of games.
When you talk about your interest in exploring the game world, it sounds
to me like you’re putting yourself on the side of the ludologists.

HF Yes, sometimes one makes a difference between game and play.


I find I’m more interested in play. The miracle of play has to do with
imagining, with filling gaps. Probably we don’t really know what hap-
pens. If you watch children playing, you will never know what goes on
in their imagination. I tried to construct something in which you could
imagine some aspects of what happens during play.

EB Yes, in some cases you take elements of the game that are explicitly
oriented towards forward progression and derail them so as to find the
potential for play within the game. I also wanted to ask you about some-
thing else that pertains not only to Parallel but to your practice as a whole
what do you think is at stake in producing image analysis through the
production of moving images rather than through, say, text? This is some-
thing that has been at the heart of your work for many years. I come from
an academic background, so I often encounter written texts that put forth
ideas that are in some instances similar to those we encounter in Parallel,

HARUN FAROCKI : PROGRAMANDO O VISÍVEL


THE NEW CONSTRUCTIVISM

but I think there’s something that can be generated in this work that is not
available to writing. So I was wondering how you would describe your in-
vestment in this kind of practice.

HF I can’t give a systematic account of an approach to it, but I try not


to make something like lectures with movable PowerPoint, though
this can also be wonderful. In the last twenty years, many things about
cinema can be discussed which used to be totally inaccessible. When
we started looking at films, we would sit in cinemas and secretly count
how many cuts there were in a certain film or sequence. Later, we
would sit in a café and debate whether we were right or wrong. Then
we found a book that said that in À bout de souffle there are nine jump
cuts when he’s driving in the car, but we were sure there were seven.
You didn’t have a DVD then, whereas now you can look at it to check.
You can re-edit the sequence, or show two motifs in parallel. This is a
wonderful field that influences me, of course, this kind of work that
can be done analytically and synthetically in the field of research and
education. But here I tried to make little narrations, little composi-
tions in which things are inscribed and which you can interpret and
which will then hopefully lead to a contextualization of ideas. I hope
they pose questions as to what these games are about.

143
144

BIBLIOGRAPHY
BAZIN, André. Ontologie de l’image photographique.
Qu’est-ce que le cinéma? 20ed. Paris Cerf, 2011.
______. Peinture et cinéma. Qu’est-ce que le cinéma?
20ed. Paris Cerf, 2011.
GALLOWAY, Alexander. Gaming Essays on Algorithmic
Culture. Minneapolis University of Minnesota Press, 2006.
______. Protocol How Control Exists After Decentral-
ization. Cambridge MIT Press, 2004
GALLOWAY, Alexander; TRACKER, Eugene. The Exploit
A Theory of Networks. Minneapolis University of Min-
nesota Press, 2007.

HARUN FAROCKI : PROGRAMANDO O VISÍVEL


THE NEW CONSTRUCTIVISM

145
146

HARUN FAROCKI : PROGRAMANDO O VISÍVEL


SIMULAÇÃO E O TRABALHO DA INVISIBILIDADE: PARALELO I-IV DE HARUN FAROCKI

SIMULAÇÃO E O
TRABALHO DA
INVISIBILIDADE:
PARALELO I-IV
DE HARUN
FAROCKI1
THOMAS
ELSAESSER
1 Conferência apresentada durante o evento “Life Remade”, na Birkbeck College, Universidade de Londres, entre 5 e
6 de junho de 2015. O ensaio virá a lume editado por Joel Mckim para um número especial de Animation, periódico da
Sage Publications.

147
148

CRENDO NA IMAGEM
Em “A Evolução da linguagem do cinema”, André Bazin notoriamente
dividiu o mundo do cinema entre “cineastas que creem na imagem” e
“cineastas que creem na realidade”1. Frequentemente interpretada como
“antimontagem” e “anti-Eisenstein”, essa distinção – no contexto da obra
de Bazin – não é tão categoricamente direcionada à estética plano-sequên-
cia/profundidade de campo (à estética Renoir-Rossellini) como já pareceu
aos radicais (des)construtivistas na década de 1970, quando Bazin costu-
mava ser tratado como um “empirista teoricamente ingênuo”2.
De forma semelhante, há um tipo de ingenuidade enganosa na obra
Paralelo I-IV (2012-2014) de Harun Farocki, a qual devemos enfrentar sem
hesitação a fim de tentar compreender o que mais ela pode significar. Na
divisão de Bazin, Farocki, como o seu mentor Jean-Luc Godard, faz da
montagem a sua “bela preocupação”3 e, por isso, pertence ao grupo dos
diretores que creem na imagem, muito embora os outros mentores de
Farocki – Jean-Marie Straub e Danièle Huillet – possam ser considerados
a epítome dos diretores que creem na realidade, ou, no mínimo, na reali-
dade da mise-en-scène, pró-fílmica. No entanto, os dois lados se encontram
quando reconhecemos que “a crença na imagem” pode muito bem ser a
consequência e não a causa de uma desconfiança na imagem e que “a crença
na realidade” pode muito bem ser fundamentada em uma profunda per-
cepção de que o que se vê não é o que é.
Deixe-me, portanto, confrontar o que parece tão ingênuo a respeito
de Paralelo I-IV. À primeira vista, as quatro partes são como um curso para
principiantes em animação digital e em história da computação gráfica,

1 A. Bazin, The Evolution of the Language of Cinema, em L. Braudy; M. Cohen (eds.), Film Theory and Criticism, p. 43.
No texto original francês de Bazin, lê-se “croire” (crer), ao passo que no inglês de Elsaesser, lê-se “put faith” (ter fé),
que literalmente não dá conta em português. Optou-se, portanto, por uma versão mais fiel a Bazin (N. da T.).
2 Sabe-se que Bazin era o espantalho no trabalho de C. MacCabe, Realism and the Cinema: Notes on Some Brechtian
Thesis, Screen 15, n. 2, p. 7-27, o qual o chamava de “um empirista teoricamente ingênuo, tipo de idiota da família”.
3 J.-L. Godard, Montage, mon beau souci, Cahiers du cinéma, n. 65, p. 30-31.

HARUN FAROCKI : PROGRAMANDO O VISÍVEL


SIMULAÇÃO E O TRABALHO DA INVISIBILIDADE: PARALELO I-IV DE HARUN FAROCKI

levando-nos através da “evolução” das figuras que representam galhos de


árvores e arbustos em uma rede rígida de linhas horizontais e verticais,
para renderizações cada vez mais fotorrealistas de paisagens e pessoas,
de folhas e ondulações na água, do gesto e do movimento. Em outras pa-
lavras, parece curiosamente uma narrativa linear e teleológica, “de... até”,
como se estivesse inscrita na teleologia, desacreditada para a história do
filme, de um cada vez maior realismo, a qual até mesmo Bazin julgou de-
masiado simplista, quando exclamou depois de ler Histoire générale du ci-
néma (História geral do cinema) de Georges Sadoul: “o cinema ainda tem
de ser inventado!”4
Embora logo se perceba que a referência de Farocki aos elementos – a
água, a terra e o ar –, proponha-se a tarefa de “voltar ao básico”, eu me senti
bem confuso, especialmente à luz das centenas de vídeos no YouTube,
apresentando o showreel de empresas de efeitos especiais como Industrial
Light & Magic, Pixar Studio, The Mill, ou Rhythm & Hue5. A maioria deles
tem a intenção de explicar o CGI (Computer Graphics Imagery), gráficos
gerados por computador, levando-nos através da construção de imagens
fotorrealistas através de camadas sobre camadas, detalhando as diferenças
entre captura de gesto e captura de performance, ou nos deixando mara-
vilhados com os vários milhões de pelos digitais que foram programados a
fim de se ter um tigre totalmente digital em As Aventuras de Pi, que pareces-
se e se movesse como um tigre-de-bengala vivo. De fato, Paralelo I-IV não é
um instigante exercício de Relações Púbicas e pretende ser mais parecido
com uma meditação em história da arte sobre diferentes estilos de gráficos.
Farocki poderia até mesmo ser aconselhado a apoiar a tese de Lev Mano-
vich de que o “foto-gráfico” é apenas uma entre as várias possibilidades

4 A. Bazin, The Myth of Total Cinema, What is Cinema? v. 1, p. 21-22.


5 <https://www.youtube.com/watch?v=H8aoUXjSfsI>, <https://www.youtube.com/watch?v=BzZun53Lefg>. <https://
www.youtube.com/watch?v=WhN1STep_zk>. <http://www.bfi.org.uk/news-opinion/sight-sound-magazine/
features/video-essay-animal-menagerie-rhythm-hues>; <https://vimeo.com/147743032>.

149
150

(historicamente contingentes) de renderizações gráficas do mundo6, os-


cilando entre a abstração (linguística, matemática, pictórica) e a figuração
(icônica, indicial, mimética). No entanto, Paralelo parece estranhamente
antiquado, não só porque grande parte do material usado por Farocki re-
monta aos primeiros dias dos jogos de computador e fia-se nos encantos
obsoletos de uma animação com movimentos irregulares, mas também
porque Paralelo se abstém de fazer uma contextualização social ou política
de seus jogos, do mesmo modo que Jogos sérios (2009), a série anterior de
Farocki, fizera de forma tão perturbadora quanto extremamente poética.
Por fim, parece haver uma certa disjunção entre as longas passagens de
avatares que circulam em torno de si, batendo uns nos outros ou desenhan-
do armas uns sobre os outros, e o comentário em voz over, filosoficamente
culto e sofisticado. Uma frase em particular me impressionou – como
aconteceu com vários outros críticos: “Nos filmes, há o vento que sopra e o
vento que é produzido por uma máquina de vento. As imagens de compu-
tador não têm dois tipos de vento.”7 Se associada à anedota bem conhecida
de que os primeiros espectadores de filmes dos irmãos Lumière ficavam
mais assustados com o movimento das folhas de uma árvore, a ondulação
de uma fumaça, nuvens passageiras ou ondas quebrando na praia, do que
com o movimento de pessoas ou cavalos, então já podemos vislumbrar que
um paralelo esboçado por Paralelo é entre o início do cinema e o da anima-
ção por computador, entre as origens do cinema e as da suposta morte do
cinema. É uma questão à qual devo retornar.
A seguir, o próprio Farocki descreve seu trabalho, quando Paralelo I-IV
foi apresentado como uma instalação na galeria Greene Naftali, em Nova
York, e depois na galeria Thaddaeus Ropac, em Paris:

6 L. Manovich, What is Digital Cinema.


7 <http://www.harunfarocki.de/installations/2010s/2012/parallel.html>.

HARUN FAROCKI : PROGRAMANDO O VISÍVEL


SIMULAÇÃO E O TRABALHO DA INVISIBILIDADE: PARALELO I-IV DE HARUN FAROCKI

Paralelo I abre caminho a uma história dos esti-


los em computação gráfica. Os primeiros jogos
da década de 1980 consistiam apenas em linhas
horizontais e verticais. Essa abstração era vista
como uma falha, e as representações de hoje são
orientadas pelo fotorrealismo.

Paralelo II e III desvendam os limites dos mun-


dos dos jogos e da natureza dos objetos. Verifica-
-se que muitos mundos dos games assumem a
forma de discos no universo – uma reminiscên-
cia de concepções pré-helênicas do mundo. Os
mundos têm um proscênio e um pano de fundo,
como palcos de teatro, e as coisas nesses jogos
não têm existência real. Cada uma das suas pro-
priedades deve ser construída e atribuída sepa-
radamente.

Paralelo IV explora os heróis dos jogos, os pro-


tagonistas cujos respectivos jogadores seguem
através de uma Los Angeles dos anos de 1940,
um mundo pós-apocalíptico, um cenário oci-
dental ou outros gêneros de mundos. Os heróis
não têm pais ou professores; eles devem encon-
trar as regras para segui-las por conta própria.
Eles quase não têm mais do que uma expressão
facial e só muito poucos traços de caráter que se
expressam em um número de diferentes, quan-
do intercambiáveis, frases curtas. São homúncu-

151
152

los, seres antropomorfos, criados por seres hu-


manos. Quem joga com eles tem sua parcela no
orgulho do criador.8

Anselm Franke também acrescentou a Paralelo I-IV alguns contextos


adicionais úteis:
Hoje, a mímesis tornou-se uma questão de algo-
ritmos gerativos e as tecnologias resultantes são
cada vez mais capazes de calcular, prever e con-
trolar processos complexos – da manufatura à
guerra e às experiências emocionais nos mundos
animados do entretenimento de massa. Na base
da investigação de Farocki para as fronteiras da
inovação nas atuais tecnologias da imagem, está
a suposição de que, cada vez mais, vivemos em
mundos-imagens tecnologicamente produzidos
em que as imagens se tornaram o que ele chama
de “típico-ideal”. No novo paradigma mimético
do “realismo digital”, a realidade já não é a medi-
da da imagem sempre imperfeita; em vez disso, a
imagem virtual cada vez mais torna-se a medida
de uma realidade sempre imperfeita.9

Sem elaborar especificamente sobre esse parágrafo, quero destacar


essa noção de perfectibilidade ilusória, que parece ser bastante típica de
vários discursos que tratam de mídias digitais, e contra a qual Farocki
sublinha um e outro, a possibilidade de fracasso e o seu próprio estatuto

8 Ibidem. Ver também <https://www.youtube.com/watch?v=c8YKKs0Pcx8>


9 A. Franke, Modern Monsters / Death and Life of Fiction, Taipei Biennial.

HARUN FAROCKI : PROGRAMANDO O VISÍVEL


SIMULAÇÃO E O TRABALHO DA INVISIBILIDADE: PARALELO I-IV DE HARUN FAROCKI

provisório – dois traços que alinham o trabalho dele com certas vertentes
da “arqueologia da mídia” ou – como pode ser o caso com Jogos sérios e
Paralelo I-IV –, o cineasta deliberadamente adota a postura de realizar um
work-in-progress, para sinalizar que está apresentando parte de uma in-
vestigação em curso – interrompida pela morte prematura de Farocki em
julho de 201410.
Dentro do espírito desse work-in-progress, vou oferecer variados con-
textos em que Paralelo I-IV faz sentido não só como parte de outras grandes
preocupações de Farocki, mas também como essa obra – quer esteja em
curso por omissão ou incompleta por necessidade –, pode lançar luz sobre
a nossa situação atual. Em princípio, esses contextos são: Representação e
Reprodução, Imagens Operacionais, Vigilância e as Forças Armadas, Simulação
e Dramatização e O Trabalho da Invisibilidade e a Invisibilidade do Trabalho.

REPRESENTAÇÃO E REPRODUÇÃO
OU O MATERIALISMO DE FAROCKI
Por um lado, Farocki talvez seja melhor conhecido por explorar a re-
lação entre imagens, máquinas de imagens e produção de imagem e, por
outro, a realidade social/política correspondente. Sob muitos aspectos um
materialista marxista clássico, ele percebeu que em algum momento as
imagens do século XX começaram a assumir uma vida própria, em vez de
ser representações de alguma realidade distinta ou exterior a elas. Con-
tudo, ele também sabia que as imagens estavam circulando como merca-
dorias que absorvem tanto a realidade social como o trabalho humano, no
sentido marxista de serem “fantasmagorias” e “fetiches-mercadoria”. Isso
o levou a uma crítica bastante fundamentada da “representação”, enquan-
to nosso paradigma de imagem dominante. Na entrevista que acabei de

10 Para uma retrospectiva contextual, publicada para homenagear Farocki, ver a edição especial do E-Flux, n. 59,
Nov., 2014, dedicada ao artista.

153
154

mencionar, na verdade, uma das últimas que foi capaz de dar, ele conclui
afirmando: “a era da reprodução parece ter acabado, e a era da construção
do novo mundo parece estar no horizonte – não, ela já está aqui”11.
Destaco o uso que ele faz do termo “reprodução”, de Walter Benjamin,
para também abranger “representação” de maneira mais geral, assim
como “construção” que aqui significa ou inclui “simulação”. Quanto a
quais possam ser as outras implicações de uma mudança tão radical no
modo da representação, eu devo deixar para o fim, mas o que Farocki pa-
rece sinalizar é que houve uma mudança de valores padrão, de tal forma
que a imagem digital tornou-se agora o ponto de referência principal para
todos os tipos de imagens, incluindo as imagens analógicas, da mesma
maneira que discos de gramofone tiveram de ser novamente rotulados
“vinil”, porque daí por diante passaram a ser vistos a partir da perspecti-
va implícita do CD ou do download de mp3. Eis o que Farocki sugere ao
chamar tais simulações de representações do “tipo-ideal”, comparando-
-as aos modelos matemáticos ou algorítmicos da realidade, em geral,
incluindo a “formatação” de seres humanos, perfilando seus gostos e
preferências. Em certo sentido, isso implicaria que os modelos do mundo
feitos por computador “concorrem e derrotam” manifestações físicas e
materiais do mundo, e que, especificamente, o pró-fílmico não é mais a
origem e o fundamento da imagem, tornou-se apenas a sua matéria-prima
descartável. Diante disso, portanto, o interesse de Farocki na simulação
(ou, se quiser, a sua “crença na imagem digital”) parece ser o oposto do
seu materialismo, mas, por enquanto, podemos levar em conta a possibili-
dade de que existe um paradoxo – materialismo versus simulação – que se
resolve, revelando-se como dois lados da mesma moeda.

11 <https://www.youtube.com/watch?v=c8YKKs0Pcx8>

HARUN FAROCKI : PROGRAMANDO O VISÍVEL


SIMULAÇÃO E O TRABALHO DA INVISIBILIDADE: PARALELO I-IV DE HARUN FAROCKI

IMAGENS OPERACIONAIS
Uma forma de abordar tal paradoxo é considerar como Farocki silen-
ciosamente tem reescrito a história do cinema, ao favorecer, durante sua
longa carreira como cineasta, um certo tipo de imagens, que ele chamou
de “imagens operacionais”. Estas são imagens e sequências cinemato-
gráficas extraídas de fontes muito diferentes e feitas para fins muito dis-
tintos: as fontes podem ser experimentos científicos, estudos de tempo
e movimento, apropriadas a partir do enorme arquivo de filmes médicos,
imagens de vigilância feitas pelos militares, filmes de instrução, filmes
industriais e imagens reconstituídas a partir de sensores e dispositivos
de controle. Os propósitos originais poderiam ser instrução, experimen-
tação, testes, monitoramento ou quando foram feitas gravações de fenô-
menos muito rápidos ou muito lentos para o olho humano. Esse material
de filme tende a ser chamado de found-footage12 e, agora, é procurado por
cineastas e artistas que trabalham na interface entre o cinema e a instala-
ção de arte, ou na travessia das fronteiras porosas entre documentários e
filme-ensaio. Farocki é cauteloso ao não tratar tais imagens como “encon-
tradas” e, geralmente, esforça-se ao máximo para indicar como e por que
esses filmes foram feitos, por quem e em que dispositivo institucional.
Ao desenterrar os usos industriais, científicos, burocráticos e milita-
res de imagens que geralmente simulam profundidade de campo e ação
à distância, Farocki desconstruiu, analisou bem como contextualizou
historicamente as imagens na iminência do “ver” e “agir”13. Ele está con-
trapondo nossa forma habitual de tratar as imagens como “visualizações
para serem vistas” com outra, que entende as imagens como fontes de
informação a serem digitalizadas, classificadas e editadas, em títulos que

12 No literal, “cenas encontradas” refere-se a imagens de arquivo filmadas por anônimos (N. da T.).
13 “Imagens operacionais” são discutidas por C. Blümlinger, “Harun Farocki: Critical Strategies”, em T. Elsaesser
(ed.), Harun Farocki: Working on the Sight-Lines, p. 318-320.

155
156

vão desde Imagens do mundo e inscrições de guerra (1989) a Olho/máquina


(2001-2003); e de Eu pensei estar vendo convictos (2000) a Jogo profundo
(2007). Seja com a fotografia estereométrica usada na arquitetura e na
agrimensura no século XIX, as imagens de vigilância da segurança de pri-
sões e supermercados, os estudos de tempo e movimento nas fábricas,
seja com as imagens da final da Copa do Mundo de 2006 em Berlim, en-
quanto monitoradas por sensores e máquinas de visão, Farocki mostrou
repetidas vezes que as imagens não são apenas algo para ser contemplado,
para se imergir, para ser olhado ora com admiração, ora com desinteresse,
porém, agora, de um modo geral, funcionam como instruções para a ação,
ou como conjuntos de dados para processamento e tradução em ações14.
Em suma, trazer essas imagens operacionais – um conceito que deriva
do teórico da mídia Vilém Flusser15 – para a história do cinema, como uma
das genealogias negligenciadas do cinema, deve-se contar entre as mais
significativas contribuições de Farocki à arqueologia da mídia, bem como
a uma parte essencial da pré-história das imagens digitais. Em Imagens do
mundo e inscrições de guerra, por exemplo, Farocki seguiu a linha de descen-
dência das imagens operacionais de volta para um Albrecht Meydenbauer,
inventor da Messbild-Photographie (fotogrametria) como um meio de não
só registrar edifícios históricos, como igrejas ou campanários, mas também
de calcular escalas e dimensões, de modo a apresentá-los com precisão na
forma de plantas de arquitetura e diagramas. Em Imagens do mundo e inscri-
ções de guerra, Farocki vincula a invenção de Meydenbauer ao choque e ao
trauma de quase ter sido morto quando tentava dimensionar esses prédios
in situ, de maneira que as imagens operacionais são imagens que carregam
com elas a memória de lugares ou a antecipação de situações muito peri-
gosas para que os seres humanos estejam presentes em carne e osso. Pode-

14 Sobre Harun Farocki, ver também A. Ehmann; K. Eshun (eds.), Harun Farocki: Against What? Against Whom?
15 Ver C. Blümlinger, An Archaeologist of the Present, E-Flux, n. 59, Nov., 2014.

HARUN FAROCKI : PROGRAMANDO O VISÍVEL


SIMULAÇÃO E O TRABALHO DA INVISIBILIDADE: PARALELO I-IV DE HARUN FAROCKI

mos traçar uma linha direta entre a fotogrametria de Meydenbauer16 e os


mísseis teleguiados, as bombas inteligentes e os drones.
Farocki, a esse respeito, antecipa a distinção de Manovich entre as
imagens que usamos a fim de “mentir” com (simulação, como cenários hi-
potéticos, faz de conta, ficção) e imagens que usamos a fim de “agir” com
(agir à distância, extrair dados acionáveis, iniciar um processo, gravar um
teste, realizar um experimento)17. Na medida em que as imagens operacio-
nais são imagens que já não funcionam como uma “janela para o mundo”,
elas apontam o caminho para uma nova definição do que uma imagem é.
Tendemos a associar essas mudanças com a transformação digital, mas as
imagens operacionais apenas nos lembram de que as imagens em movi-
mento assim como as estáticas têm muitas histórias, e nem todas passam
pelo cinema ou pertencem à história da arte. As imagens digitais podem
apenas ter tornado estas histórias paralelas mais evidentemente atuais,
como Farocki claramente entendeu, sempre fizeram parte da cultura vi-
sual que nos rodeia. Por exemplo, Uma Imagem (1983), o filme de Farocki
sobre um editorial das páginas centrais da Playboy – que, aliás, às vezes é
mostrado ao lado de Paralelo I-IV – documenta, por vezes, com insupor-
tável detalhamento, quanto trabalho tem que ser investido na criação de
imagens operacionais, mesmo aquelas que dizem: “veja, como sou linda”.
Pode-se ir ainda mais longe e afirmar que as imagens operacionais
– imagens que funcionam como instruções para a ação – constituem o
novo valor padrão para se elaborar toda e qualquer imagem, em relação às
quais as imagens mais tradicionais, isto é, as que têm significado apenas
para contemplação, para serem olhadas desinteressadamente ou por suas
qualidades estéticas, passaram a ser redefinidas como instâncias especia-
lizadas de imagens operacionais – e, sobretudo, não estou sequer falando

16 Albrecht Meydenbauer foi o pai da fotogrametria em arquitetura (N. da T.).


17 L. Manovich, To Lie and to Act, em T. Elsaesser; K. Hoffmann (eds.), Cinema Futures, p. 198-199.

157
158

sobre publicidade, propaganda ou pornografia. Afinal, surgiu uma geração


de usuários que, em vez de apenas querer olhar as imagens, esperam poder
clicar em imagens em seu “feed” do Facebook ou do Instagram.

VIGILÂNCIA E AS FORÇAS ARMADAS


Farocki teve seu reconhecimento internacional por volta de 1990-1991
com Imagens do mundo e inscrições de guerra. Esse filme passou um longo
tempo sendo produzido, na verdade, foi finalizado antes da Queda do
Muro de Berlim, em 1990, e antes da Primeira Guerra do Golfo de 1991. No
entanto, seu lançamento coincidiu exatamente com a publicação inglesa
de Guerra e cinema de Paul Virilio. A conjugação desses três eventos criou
uma espécie de tempestade perfeita para a recepção do filme de Farocki,
que, de repente, parecia ser estranhamente oportuno e premonitório. Ao
circular pelos EUA, quase no momento em que a maioria de nós fomos
pela primeira vez apresentados às “bombas inteligentes”, Imagens do
Mundo e Inscrições de Guerra parecia um breve comentário sobre o livro de
Virilio, com a vantagem adicional de já incluir, por assim dizer, o general
Schwarzkopf, que, durante a primeira Guerra do Golfo, poderia ser visto
no noticiário da noite, com sua vara ponteiro, indicando as pequenas ba-
foradas de fumaça em que se seguiram os “ataques cirúrgicos” sobre as
posições do exército do Iraque, as rodovias, ou pontes iraquianas. Foi uma
introdução viva a Jogos sérios. Não apenas Schwarzkopf tinha o nome de-
vidamente a ver com O Arco-íris da gravidade de Thomas Pynchon – suas
demos o faziam parecer como se ele tivesse saído do filme de Farocki.
O outro feliz acidente, se me permitirem a expressão, é que Imagens do
mundo e inscrições de guerra falou sobre Auschwitz, em um momento – pós-
-Guerra Fria, pós-colapso da União Soviética – quando o Holocausto esta-
va prestes a se tornar o tópico em nosso entendimento não só da Segunda
Guerra Mundial, mas do século XX, e, também, sobre a história e a memó-

HARUN FAROCKI : PROGRAMANDO O VISÍVEL


SIMULAÇÃO E O TRABALHO DA INVISIBILIDADE: PARALELO I-IV DE HARUN FAROCKI

ria: entre Shoah (1985) e A Lista de Schindler (1993) a atenção do mundo


mudou da ameaça nuclear pós-Hiroshima e das armas atômicas norte-
-americanas em solo europeu (na verdade, um tema relevante no filme
de Farocki, juntamente com as energias renováveis), para a preocupação
com o legado do Holocausto, com a cumplicidade da maioria dos países da
Europa na destruição dos judeus, e também com o papel ambíguo desem-
penhado pelo cinema e pela fotografia. Central para esta leitura do filme
de Farocki são as fotos de Auschwitz registradas por aviões de reconheci-
mento e aquelas tiradas por um soldado na rampa de seleção para o seu ál-
bum pessoal como despojo de guerra. Ambos os tipos são imagens opera-
cionais – e aqui o termo “imagens encontradas” pode não ser totalmente
impreciso – e ambos encontram o seu significado retroativo no paradigma
contemporâneo da vigilância, na medida em que são a prova de uma deter-
minada dinâmica inerente aos atos de vigilância. Imagens de vigilância são
tanto mortais quanto ignorantes, podem ser prazerosas ou ameaçadoras –
dependendo com que finalidade alguém se posiciona frente a elas. Farocki
menciona que, se os pilotos desses voos de reconhecimento dos Estados
Unidos, em 1944, estavam vendo Auschwitz (com suas câmeras) e não
vendo “Auschwitz” (com sua imaginação), isso aponta para o fato de que
a vigilância pode ser uma forma de estupidez, dando uma sensação trai-
çoeira de estar no controle. Os aviões estavam à procura de algo mais, não
sabiam ainda o que Auschwitz significava, enquanto o homem que tirou
as fotos na rampa de Auschwitz não só cometeu um ato ilegal que poderia
ter-lhe custado a vida, mas também estava à procura de algo mais – espe-
rando montar um álbum de suas façanhas – e apenas inadvertidamente
documentou o crime do século. A ironia é ainda mais pungente, quando se
considera que essas fotografias de vigilância de Auschwitz só foram desco-
bertas porque um oficial no final de 1970 ficou tão comovido com a série de
televisão Holocausto que se lembrou de uma vez ter visto imagens dos cam-

159
160

pos em um armário de arquivamento no Pentágono. Foi preciso um pro-


grama de televisão de ficção trazer à luz essa prova documental. Como um
aparte, isso também confirmou que os objetivos de guerra dos Aliados não
eram o resgate dos judeus – como é agora a versão oficial dos EUA, quando
se visita o Museu do Holocausto de Washington – mas sim desmantelar e
destruir as máquinas de guerra da Alemanha nazista, nesse caso, a fábrica
de borracha sintética Buna, parte do campo de trabalho escravo Monowitz
perto de Auschwitz.
São atos falhos, lapsos de referência e relevância, reescritas retroativas
repentinas como essas, revelando conexões inesperadas, coincidências
estranhas ou surpreendentes desconexas em nosso mundo, que fazem
de Imagens do mundo e inscrições de guerra uma obra tão indelevelmente
impressionante, que permite a reformulação sucessiva de tantos debates
fundamentais. Desde então, Farocki explorou essas linhas de investigação
para a guerra, fotografia e vigilância em muitos de seus filmes e insta-
lações subsequentes, notavelmente em Eu pensei estar vendo convictos e
Olho/máquina. Na verdade, já é possível localizar nessas obras anteriores a
predileção em Paralelo pelo ponto de vista do jogo de atirador em primeira
pessoa, dado que o alinhamento rigoroso entre câmera-olho e visão-arma
aparece com destaque na abertura de Eu pensei estar vendo convictos. No
final desse filme, no entanto, Farocki melancolicamente observa que tal
aparelho de controle, com base na visualização de vigilância, já havia se
tornado obsoleto à luz das novas tecnologias de vigilância eletrônica que
etiquetam, rastreiam e “desterritorializam”.
Parece que a ingenuidade enganosa começa a dar frutos: de repente,
vemos como Farocki puxa o tapete do argumento de “um cada vez maior
realismo”, quando ele mostra como, em imagens geradas por computador,
não importa quão “realistas”, o fundo do oceano não tem profundidade,
uma colina fica sem declive ou uma cordilheira sem inclinação, e uma

HARUN FAROCKI : PROGRAMANDO O VISÍVEL


SIMULAÇÃO E O TRABALHO DA INVISIBILIDADE: PARALELO I-IV DE HARUN FAROCKI

floresta ou uma cena urbana da rua podem simplesmente ficar à margem,


desaparecer ou flutuar no espaço. O mundo das imagens digitais pode ser-
vir a Farocki como uma metáfora porque elas nos lembram que a realidade
que vemos e experimentamos todos os dias pode não ter nada a ver com a
que de fato afeta nossas vidas e determina nosso destino. Nós só precisa-
mos pensar em transações eletrônicas de alta velocidade, onde milhares
de milhões de euros, libras ou dólares deslocam continentes em questão
de nanossegundos, e deixamos pegadas invisíveis sempre que ficamos
on-line com nossos laptops ou smartphones. Assim, enquanto os parale-
los ostentados em Paralelo I-IV estão entre fotografias analógicas e seus
clones digitais, os paralelos mais oblíquos são nitidamente políticos, na
medida em que sugerem quanto mais densos os detalhes, mais enganosa a rea-
lidade. Percepção, sensação, visualidade: tanta camuflagem (Farocki cita
adequadamente o famoso esquete de Monty Python), ou como Friedrich
Kittler colocou: “senso e os sentidos se transformam em colírio”18.
Diversos filmes e instalações de Farocki, certamente desde o início dos
anos de 1990 e da primeira Guerra do Golfo, são como sondas estendidas
para o que poderia ser chamada de a nova invisibilidade. Corresponde ao
que o próprio Farocki chama de “observação controladora”, o que signi-
fica uma visualidade a que nenhum observador humano corresponde, e
para a qual o corpo e os sentidos – tato, audição, movimento, afeto – tor-
naram-se os substitutos invocados como forma de defesa e proteção. Esta
nova invisibilidade coloca um desafio especial para o cineasta, porque
como Farocki discute:

a cena da hora de visita na prisão [tão central


para o gênero de filmes de prisão] em breve se

18 F. Kittler, Gramophone, Film Typewriter, p. 1-2.

161
162

encontrará sem uma correlação na realidade.


A introdução do dinheiro eletrônico vai fazer
[filmes que mostram] assaltos a bancos pratica-
mente impossíveis também [...]. Com o aumen-
to dos dispositivos de controle eletrônico, a vida
cotidiana se tornará tão difícil de retratar e dra-
matizar assim como já é o trabalho cotidiano19.

Destaco que o argumento de Farocki não é apenas desejar mapear os


limites do visível na própria era das máquinas de visão, mas, que, muito
provavelmente, como resultado dessas máquinas de visão, a própria in-
visibilidade tornou-se uma espécie de mercadoria, em especial, dentro
do que gera comercialmente altos lucros, porém, aqueles eram dias pré-
-Wikileaks, pré-Snowden, de “sinergias” políticas ainda discretas, que
estavam estabelecendo-se entre as empresas de software, especialistas de
segurança e as indústrias de serviços ao consumidor.
Invisibilidade, em outras palavras, é algo ativamente produzido, em
vez de simplesmente uma ausência, uma lacuna ou uma deficiência. Como
que em resposta a esse desafio, Farocki embarcou em séries de vídeos e
instalações, especialmente Jogos sérios I-IV (2009-2010) e, claro, Paralelo
I-IV (2012-2014), ambas adotam a simulação como uma das estratégias
fundamentais da nova invisibilidade, combinando uma investigação sobre
realidade virtual e computação gráfica com temas de seu trabalho ante-
rior, já mencionado, mas também incluindo Jogo profundo (2007) assim
como Vivendo na RFA (1990) e Os Criadores do mundo dos shoppings (2001).
Em Olho/máquina outro pensamento que surgirá de novo em Paralelo
I-IV já está formulado, isto é, uma das muitas ironias da disputa da mídia

19 H. Farocki, Controlling Observation, em T. Elsaesser (ed.), Harun Farocki: Working on the Sight-Lines, p. 294.

HARUN FAROCKI : PROGRAMANDO O VISÍVEL


SIMULAÇÃO E O TRABALHO DA INVISIBILIDADE: PARALELO I-IV DE HARUN FAROCKI

no noticiário noturno é a nossa disponibilidade de nos comovermos com


a capacidade de destruição de uma bomba inteligente vista do alto. Olho/
máquina I & II traça a relação cada vez mais assimétrica entre mãos huma-
nas, olhos e máquinas, como corpos parecem tornar-se o elo mais fraco
em uma cadeia de interação automatizada que promove o olho às expen-
sas da mão, e promove o ver enquanto registro e controle, no lugar do ver
como forma de reconhecimento e compreensão: assim, põe fim também
à equação epistemológica segundo a qual “ver é saber”. Essas transforma-
ções do corpo e dos sentidos em relação às máquinas e armas são frequen-
temente projetadas por Farocki como meditações sobre a distância e a
proximidade de ações realizadas em locais remotos, mas cujas consequên-
cias devem ser contabilizadas em casa. Como tais, a distância e a proximi-
dade são em geral reflexivamente duplicadas por uma interrogação sobre
o que pode ser dito e o que não pode ser mostrado, às vezes até mesmo
acompanhada por uma autorreferência corporal muito pessoal – como em
O fogo inextinguível (1969), onde o incomensurável de uma certa realidade
da guerra e sua representação fílmica já antecipa o impasse ético e o trau-
ma corporal de ataques aéreos e da guerra de joy-stick em Jogos sérios. Em
Paralelo, a repetida perspectiva do atirador em primeira pessoa lembra-
-nos da câmera “subjetiva” montada em um míssil, onde o ponto de vista
privilegiado aparentemente nos faz esquecer que o câmera será morto
juntamente com o alvo, ou seja, que o prazer de partilhar a perspectiva de
uma câmera-bomba tem um preço: é mortal não só para o alvo. Filmes de
Hollywood como Sniper americano, de Clint Eastwood, e Good Kill, de An-
drew Niccol, (ambos de 2014) ou a instalação Cinco mil pés é melhor (2013),
do artista Omer Fast, tentam, de diferentes maneiras, convencer-nos
do custo moral dessa perspectiva privilegiada, insinuando que tal ação à
distância pode matar a nossa capacidade de amar, assim como nossa em-
patia, para com nossos entes mais queridos, mas Farocki olha isso em um

163
164

contexto mais amplo, que abrange a simulação não em algum longínquo


teatro da guerra, mas também na dramatização próxima de nossa casa.

SIMULAÇÃO, ANIMAÇÃO E DRAMATIZAÇÃO


Embora o que acabo de me referir como a nova invisibilidade seja
“nova” somente no sentido de que as instalações de Farocki possam ter
contribuído para identificá-la de forma mais clara, o outro aspecto que
quero chamar a atenção, é a maneira com que Farocki alinha suas explora-
ções de invisibilidade com diferentes tipos de trabalho. O primeiro deles
é o trabalho militar da invisibilidade, que pode começar com as diferentes
espécies de camuflagem – de uniformes dos soldados, centros de interro-
gatório avançados a bombardeiros invisíveis – mas abrange campanhas de
desinformação oficiais, o sigilo em nome da segurança nacional, e inclui a
invisibilidade das vítimas em conflitos armados, não apenas os danos co-
laterais de bombas inteligentes e ataques aéreos entre os civis, nem mes-
mo os sacos invisíveis para os corpos de soldados mortos que retornam,
mas também a invisibilidade das feridas psíquicas que especialmente no
longo processo das guerras no Iraque e no Afeganistão têm infligido a mi-
lhares de jovens e suas famílias. Jogos sérios liga esse trabalho de invisibili-
dade, que camufla esses traumas ao removê-los duas vezes a partir de sua
realidade vivida, com jogos de computador e outras técnicas de simulação
à medida que migram entre os campos de batalha e filmes blockbuster, su-
gerindo que as imagens digitais podem tentar vender-nos “uma melhor
visibilidade”, mas no momento da entrega, recebemos uma invisibilidade
cada vez mais densamente texturizada. Por trás disso, sustenta-se um possí-
vel paralelo entre a mão de obra industrial e o poder militar que cada vez
mais terceirizam seus trabalhos a empresas do comércio, levantando a
questão complementar de quais poderiam ser as consequências, quando
não só os trabalhadores estão deixando a fábrica, para serem substituídos

HARUN FAROCKI : PROGRAMANDO O VISÍVEL


SIMULAÇÃO E O TRABALHO DA INVISIBILIDADE: PARALELO I-IV DE HARUN FAROCKI

por robôs, mas também quando os soldados estão deixando o campo de


batalha para serem substituídos por drones controlados à distância.
Por outro lado, as sessões de terapia simulada em Jogos sérios são um
lembrete de outro lugar para o trabalho mais tradicional da invisibilidade:
funcionários de hospitais e equipes de enfermagem, serviços domésticos
e cuidadores de crianças, em suma: o trabalho tipicamente do gênero da
empatia e da escuta atenta, ou, no caso de grupos de autoajuda e centros
de bem-estar, o trabalho daqueles que servem a alguma das feridas narcí-
sicas com as quais o Ocidente está atormentado, e as atribuiu a si próprio.
Vivendo na RFA de Farocki é, além de várias outras coisas, um verdadeiro
compêndio das diferentes situações do trabalho afetivo, como passamos
a chamá-lo. O próprio fato, no entanto, de agora ter um nome indica que
esse tipo de trabalho possa ter se tornado menos invisível, ainda que tenha
levado pelo menos duas gerações de esforço feminista concentrado para
colocá-lo no centro das atenções.
Em Vivendo na RFA, jogos e simulações de cenários da vida real tor-
nam-se os exercícios de treinamento do viver entendidos como tentativas
de antecipar contingências e previsão de resultados sob, desde sempre,
o pior cenário de condições. Farocki foi primeiramente inspirado pela
prática de companhias de seguros, que rotineiramente têm que jogar com
histórias de vida, a fim de calcular prováveis resultados e avaliar os riscos
financeiros. Contudo, logo percebeu que a conversão da experiência de
vida em situações roteirizadas e das situações roteirizadas em exercícios
de treinamento de ação ao vivo foi muito mais predominante do que havia
imaginado. Ele deu por si filmando em escolas, escritórios, clínicas de ma-
ternidade, em clubes de striptease, abrigos para os moradores de rua, cen-
tros para a formação de gestores, delegacias, observando os terapeutas de
criança e os exercícios nos campos do exército. Às imagens operacionais
correspondem instruções de operação para a vida. A razão, como a voz

165
166

over nos informa, é que: “Com cada vez mais incerteza na sociedade, sobre
as regras e regulamentos pelos quais se viver, há mais e mais jogos, com a
vida treinada como um esporte”. Alguns anos depois, com Jogo profundo,
Farocki demonstrou graficamente como o esporte e o campo dos esportes
tornaram-se locais de trabalho, tão cuidadosamente monitorados como a
linha de montagem foi, desde os dias de “estudos de tempo e movimento”
de Frank e Lillian Gilbreth, na década de 1920.
Vivendo na RFA é uma ótima, triste, engraçada e profundamente irô-
nica pesquisa sobre essa obsessão com as experimentações de (e para a)
vida, bem como os terrores e as ansiedades à espreita logo abaixo da su-
perfície. Um blog capturou a estranheza do filme, mesmo que exagere em
suas polêmicas:

inclui a formação de pessoas para matar, prover


cuidados obstétricos, como separar aqueles en-
volvidos em discussões domésticas, etc. Tudo
isso é intercalado com imagens de equipamen-
tos de fábrica sendo testados em longevidade
(por exemplo, uma porta de carro sendo aberta
e fechada mil vezes por uma máquina). Tudo
sai conforme uma programação bem banal e es-
téril. Eu já ouvi como o sentimento é algo que
tem sido terceirizado para profissionais (isto
é, os psiquiatras) e aqui os psiquiatras são tão
impessoais [como a máquina], a obtenção de
um paciente para desenhar um gráfico de séries
temporais de sua fobia, incapaz de oferecer o
que o paciente necessita, um ombro para cho-
rar, alguém para abraçar e compreender. Como

HARUN FAROCKI : PROGRAMANDO O VISÍVEL


SIMULAÇÃO E O TRABALHO DA INVISIBILIDADE: PARALELO I-IV DE HARUN FAROCKI

alguém que já participou de cursos de dramati-


zação, posso dizer que os acho profundamente
desconfortáveis, e mais, penso que os outros os
acham mais desconfortáveis ainda20.

De modo mais amplo, como a dramatização, os test-drives, as amostras


e os ensaios de situações de emergência – em suma, como abordagens
performativas para a vida social e pessoal – começaram a tomar conta, de
fato, começaram a definir o social, Farocki mostrou do que esses manuais
de vida são substitutos. Eles são o placebo para um compromisso verda-
deiramente ativo, interativo e colaborativo com o mundo, que, de acordo
com ele – enquanto marxista e romântico – sempre foi definido pelo “tra-
balho”. Essa ideia de trabalho tem, naturalmente, um duplo legado, na
medida em que, nessa tradição marxista, a divisão persiste entre trabalho
assalariado como trabalho escravo – ambos condenados como evidência
e expressão da exploração capitalista –, e o trabalho considerado como
realização pessoal e autorrealização, definição fiel ao lema: “a cada um,
segundo as suas necessidades; de cada um, segundo as suas capacidades”,
do qual Arbeit macht frei (o trabalho liberta) e Jedem das Seine (a cada um
o de si) tornaram-se o eco cínico e pervertido21. Uma quantia conside-
rável de filmes de Farocki constitui extensas autointerrogações sobre
essa tensão entre a dignidade do trabalho e das condições degradantes,
muitas vezes impostas por ele: trabalho manual, trabalho intelectual, a
solidariedade dos trabalhadores, dos sindicatos e da classe trabalhadora
organizada, o trabalho com as mãos ou Handwerk (arte e habilidade). Às

20 OogiandujaOo, Sterile Practice, Worldscinema, 7 Aug. 2010.


21 Estas eram os slogans dos portões dos campos de concentração de Auschwitz e Buchenaus, respectivamente. Ver
<https://de.wikipedia.org/wiki/Jedem_das_Seine>.

167
168

vezes, trabalho manual e trabalho intelectual são o tema basilar, como no


primeiro filme de longa-metragem de Farocki, Entre as guerras; por vezes,
o trabalho industrial é apresentado em retrospectiva melancólica, como
em Trabalhadores deixando a fábrica, às vezes, o trabalho aparece indireta-
mente ou através de sua simulação angustiante, como em Vivendo na RFA,
e, finalmente, em seu último projeto, O Trabalho em tomada única, Farocki
fornece um compêndio da diversidade de tipos de trabalho e de homens e
mulheres envolvidos, com frequência, em tarefas fisicamente desgastan-
tes e repetitivas – que, precisamente, devido à sua rotina e repetitividade,
em geral, permanecem invisíveis, em cidades tão distantes quanto Banga-
lore e Berlim, Boston e Buenos Aires, Hangzhou e Hanói, Lisboa e Lódz,
Cidade do México e Moscou, Rio de Janeiro e Tel Aviv.22
Os novos tipos de invisibilidade e o trabalho investido neles, em ou-
tras palavras, requerem repensar as estratégias sobre o fazer visível, e
eu vejo O Trabalho em tomada única como uma tentativa heroica de fazer
justamente isso: contra o horizonte dessa invisibilidade do trabalho e o
trabalho da invisibilidade, O Trabalho em tomada única é concebido como
um modo de inverter a invisibilidade, bem como de lutar contra a lógica
dominante do trabalho de terceirização, ao mesmo tempo, não obstante,
muito consciente de que não só as multinacionais como a Apple, Merce-
des ou IKEA adotam a prática da terceirização. Na falta de material novo,
curadores de museus vão, portanto, viajar pelo mundo em busca de novos
talentos; festivais de cinema têm igual ansiedade por explorar um novo
potencial criativo nos países em desenvolvimento e emergentes, através
da organização de campi de talentos ou pela oferta de sementes – oferta de
dinheiro que cria laços com esses potenciais talentos para a sua institui-
ção ou marca.

22 <http://www.labour-in-a-single-shot.net/en/project/concept/>.

HARUN FAROCKI : PROGRAMANDO O VISÍVEL


SIMULAÇÃO E O TRABALHO DA INVISIBILIDADE: PARALELO I-IV DE HARUN FAROCKI

O Trabalho em tomada única combate a terceirização pela recontrata-


ção, mas não da maneira que os trabalhadores dos anos de 1970 tentaram
fazer ao entregar câmeras nas mãos dos trabalhadores em greve, ou da
forma como os antropólogos deram uma câmera de vídeo para as tribos da
Amazônia, a fim de que elas falassem contra as iniquidades da exploração
madeireira e a destruição das florestas tropicais brasileiras. O Trabalho em
tomada única evita tanto a capacitação missionária quanto a exploração
dos talentos, impondo restrições criativas – por exemplo a tomada única
– que remetem às origens do cinema, quando os irmãos Lumière enviaram
seus operadores para os quatro cantos do mundo. Farocki disse uma vez
sobre os filmes de trabalhadores feitos pelo seu colega, o diretor Christian
Ziewer: que o diretor se fez o servo de sua própria atribuição: “er schickt
sich selber los” – ele remete a si mesmo23. Farocki é cuidadoso para não
remeter a si próprio, e assim a atribuição é multiplamente filtrada e me-
diada, recentrada e feita de forma reflexiva, pelas aulas magistrais que ele
deu naquelas cidades e capacitando assim os olhos e as mãos, o nível de
habilidade e o temperamento dos cineastas aspirantes, de todos indígenas
das cidades visitadas.

MÍMESIS, UMA VEZ MAIS


Assim sendo, onde é que isso me deixa com respeito à minha sensa-
ção de que Paralelo I-IV é mais enigmático do que de fato seu tom parece
sugerir, e que pode ser um work-in-progress em vez de uma obra autôno-
ma? Parte do discurso do pós-humanismo afirma que as fronteiras entre
o jogo e o jogar e a dissimulação entre dramatização e a realidade estão
ficando mais porosas e reversíveis. Paralelo I-IV oferece um bom número
desses tipos de declarações, opiniões, descrições – ainda assim, creio que

23 H. Farocki, Schneeglöckchen blühen im September, Filmkritik, p. 168.

169
170

seria um erro deixar por isso mesmo. Com Farocki, é-se bem aconselha-
do a complementar o não dito pelo dito, e se percebe as lacunas entre os
elementos que são criadas pela montagem. Porque é o próprio trabalho
da invisibilidade do cineasta que entra nesta montagem, e se manifesta
através de seus cortes invisíveis: separando o que é habitualmente pen-
sado para estar juntos, e juntando o que ninguém antes havia pensado
em associar ou conectar. E, assim, os longos silêncios em Paralelo entre
os comentários em voz off não estão lá somente para nós entendermos o
que está sendo dito, ou as imagens que se seguem, como se essas imagens
fossem meramente ilustrações das palavras. Em vez disso, os silêncios são
eles próprios algo como o contra-argumento, ou como Farocki gostava
de dizer, são a “contra-música”. Em outras palavras, Paralelo I-IV – como
o título sugere – poderia muito bem ser a película negativa a alguma coi-
sa, assim como, em grande parte, tenho argumentado que os manuais de
vida de Vivendo na RFA têm o desaparecimento do “trabalho” como um
meio de autorrealização, como sua película negativa e impressão invisível.
Então, de que modo pensar a estranheza de Vivendo na RFA junto com os
efeitos do vale de Paralelo I-IV?
Para me aproximar de uma resposta, devo retornar uma vez mais à
distinção de Bazin entre cineastas que creem na imagem e os que creem
na realidade. Depois do que argumentei até aqui, uma conclusão seria que
essa distinção não mais se aplica simplesmente a cineastas, mas também
a sociedades inteiras, onde – intermediada através dos diferentes tipos
de invisibilidade – aqueles que creem na dramatização e nos manuais
de vida, que usam seus corpos para exercícios em esteiras e pensam em
auto-otimização como a autoiluminação, ou aceitam a autoexploração
como “criatividade”, junto com aqueles que cada vez mais aperfeiçoam
fotos realísticas do mundo com animação computadorizada – assim, não
apenas tratando o mundo como uma cebola, que consiste em nada além

HARUN FAROCKI : PROGRAMANDO O VISÍVEL


SIMULAÇÃO E O TRABALHO DA INVISIBILIDADE: PARALELO I-IV DE HARUN FAROCKI

de camadas, com um cerne vazio, mas, precisamente, a fim de manter sob


controle e manter invisível aqueles que não têm nenhuma outra escolha
senão crer na realidade, o que significa dizer, que experimentam a mate-
rialidade dura e as consequências mortais de um mundo que, atualmente,
vive da imagem simulada, enquanto ainda tem esperanças de que sua rea-
lidade intolerável um dia mudará. É para essas esperanças que os filmes de
Farocki tentam falar, também Em Comparação (sobre fabricação de tijolos
em diferentes partes do mundo), ou, notavelmente, sua instalação A Prata
e a cruz (sobre uma pintura da cidade boliviana de Potosí e suas fabulosas
minas de prata, que pagaram pela primeira globalização ocidental liderada
pela Espanha). Eles são exemplos de uma materialidade inferior presente
de modo invisível na imaterialidade aparente das imagens, o que sugere
que Paralelo também poderia ter uma implícita, mas, à primeira vista, par-
te inferior invisível.
Há muitos anos durante uma entrevista comigo, Farocki admitiu que
ele era, como cineasta e produtor de imagem, parte daqueles cuja tarefa
era “tornar o mundo supérfluo”, isso significa que um mundo que crê na
imagem, torna-se descuidado sobre o destino deste mundo “na realida-
de”. Claramente, essas observações sobre o cinema tornando o cinema
supérfluo ressoam a desmaterialização do trabalho e do trabalho da invisi-
bilidade tão prevalente na sua obra posterior. Nesse sentido, Paralelo I-IV
como o temos, poderia ser a primeira etapa, se você preferir, a tese de uma
dialética muito mais extensa, onde Jogos sérios, embora feita anteriormen-
te, seria algo como a antítese, na medida em que Jogos sérios nos mostra
as consequências psíquicas e morais de tornar o mundo supérfluo, o que
também explicaria por que Paralelo se abstém de apontar as consequên-
cias materiais da animação por computador.
Então, qual poderia ser a síntese possível, se Paralelo é a tese (ou seja,
ao mostrar como o mundo da simulação de computador parece para nós

171
172

tornar qualquer coisa possível, sem resistência ou impedimento material,


mas onde a cada cruzamento de cidade ou beira-mar, a realidade pode
mergulhar no vazio) e se Jogos sérios é a antítese (ao nos mostrar as con-
sequências desse vazio, ao virar da esquina e à beira do nosso campo de
visão: um mundo sem sombras, um mundo que vendeu sua alma ao diabo,
se nos lembrarmos daqueles filmes expressionistas sobre sombras perdi-
das). Uma síntese (ou simplesmente outra consequência) do declínio de
simulação de uma simulação de uma simulação nos levaria a uma escalada
rumo a algum céu platônico de tipos ideais sempre em retrocesso, da per-
fectibilidade, de ação preventiva antecipada e pré-mediação da realidade
e seus riscos, tentando controlar a contingência através de cada vez mais
simulações ricas em dados de “realidade”. Outra síntese (ou apenas mais
uma contra-música) seria reavaliar o que perdemos quando perdemos a
nossa sombra, o que significa dizer que, quando passamos de “realidade”
para o “cinema” e do cinema para o “pós-cinema”, ou seja, simulação digi-
tal, ou – usando um vocabulário diferente – quando a imagem imaginária
da realidade abre caminho para a imagem simulada da realidade, ou ainda
com mais outro vocabulário, quando o efeito de realidade como um efeito
de sujeito (isto é, a construção imaginária de uma posição do sujeito) dá
lugar ao efeito de realidade como um efeito de avatar (ou seja, a constru-
ção simulada de uma posição interativa).
Perto do final do Paralelo I, Farocki invoca um dos mais famosos artis-
tas entre os que creem na imagem, especificamente, o pintor grego Zêuxis.
Sobre isso é que a narração diz: “De acordo com a lenda, Zêuxis poderia
fazer desenhos de frutas tão realistas que as aves migravam para bicá-los”,
seguida de uma longa pausa, e a afirmação de que os pintores CGI de hoje
aspiram a uma perfeição diferente. O que o filme não mostra – exceto na
medida em que deixa o lado esquerdo da tela com um vazio sem imagem
– é como a história prossegue, pelo menos como relatado por Plínio, o

HARUN FAROCKI : PROGRAMANDO O VISÍVEL


SIMULAÇÃO E O TRABALHO DA INVISIBILIDADE: PARALELO I-IV DE HARUN FAROCKI

historiador. Quando Zêuxis se gabou para seu colega, o pintor Parrásio,


este convidou Zêuxis a seu estúdio, entusiasmado em demonstrar a seu
rival uma façanha similar. Zêuxis, em frente da obra, exigiu que Parrá-
sio recuasse a cortina, que estava pendurada em toda a tela, a fim de ser
capaz de julgar por si mesmo as habilidades de seu colega. Mas a cortina
era a pintura. Sabendo que Parrásio era o melhor dos dois, Zêuxis disse:
“Eu enganei os pássaros, mas você enganou a mim.”24 Traduzindo para
nossa situação contemporânea: enquanto o semelhante ao real, as uvas
com aparência natural nos dão versões do fotorrealismo, que é, por as-
sim dizer, estritamente para as aves, e ao simular algo de “lá fora” produz
apenas o falso; a cortina velando a “pintura” de Parrásio alcança um efeito
na mente do observador, e, portanto, produz uma “verdade”: não sobre o
mundo, mas sobre a mente, sobre a imaginação, nosso desejo e/ou nossa
capacidade para (auto) decepção, puxando nosso tapete ou nos colocando
no círculo de uma repetição (compulsiva). Em outras palavras, Zêuxis e
Parrásio são dois tipos de “realistas”, cujas estratégias são, no entanto,
diferentes e quase diametralmente opostas, no sentido de que o segundo
é o metacomentário do primeiro. Não é que Parrásio seja meramente um
artista “barroco”, realista, com o domínio da técnica trompe-l’oeil, contra o
representacional e “clássico” Zêuxis. Importa a interação ou a troca entre
os dois, quando Zêuxis “exige ver” os erros de Parrásio atrás da cortina
como se ela se interpusesse entre ele e tudo o que espera ver representa-
do. A classe do erro de Zêuxis é a pintura de Parrásio, ou colocando de ou-
tra forma, enquanto Zêuxis pinta uvas, Parrásio pinta (o) desejo (por uvas).
Essa duplicação da mímesis pelo seu próprio e impossível desejo de
posse (e emaranhamento sempre fatal nos paradoxos da representação,
que abrange, de modo preciso, o abismo do nada ou o medo de que, em úl-

24 <https://en.wikipedia.org/wiki/Parrhasius_%28painter%29>.

173
174

tima análise, não haja nada “lá”) aponta para o que poderíamos ter perdi-
do neste novo mundo sem sombras, e, assim é o que está, por assim dizer,
inevitável e necessariamente “faltando” tanto em Jogos sérios como em
Paralelo I-IV: o cinema como uma vez o conhecemos, o cinema como ago-
ra é emblematicamente incorporado no diretor que, para Bazin foi o epí-
tome dos cineastas que creem na imagem, a saber, Alfred Hitchcock. Dele
podemos dizer – como de Parrásio: enquanto os Zêuxis entre os diretores
filmaram Marilyn Monroe ou Julia Roberts como se fossem reais, Hitch-
cock filmou o véu: o desejo por Melanie, por Marnie e por Madeleine.
Enquanto o cinema analógico, centrado na produção, procurou “cap-
turar” a realidade, a fim de “atrelá-la” a uma representação, o cinema digi-
tal, concebido a partir da perspectiva de pós-produção, procede por meio
de “extrair” a realidade, a fim de “coletá-la” em conjuntos de dados. Em
vez da divulgação e da revelação (a ontologia de filmes desde Jean Epstein
a Bazin, de Siegfried Kracauer a Stanley Cavell), ou colocar véus sobre o
mundo, para a mente e os sentidos melhor experimentarem seus próprios
prazeres e terrores (como em Hitchcock or Fritz Lang), um cinema de
pós-produção trata o mundo como um dado a ser a processado ou garim-
pado, como matérias-primas e recursos a serem explorados. Em outras
palavras, a mudança da produção para pós-produção, como o centro de
gravidade no cinema digital, altera mais do que um mero procedimento:
altera a lógica interna do cinema (e, portanto, sua ontologia). A ênfase na
pós-produção, tornada possível pelo digital – embora não “causada” por
ele – não é mais fundamentalmente baseada na percepção: sua visualidade
pode ser dita como da ordem dos vegetais, ou ambiental e ecológica. Não
admira, portanto, que Paralelo de Farocki comece ao retornar às folhas e
árvores, para as folhas de relva, o balanço das ondas, e para o ar, céu e as
nuvens: é onde o cinema começou e, com ele, a divisão entre “aqueles que
creem na realidade e aqueles que creem na imagem”. Para saber como foi

HARUN FAROCKI : PROGRAMANDO O VISÍVEL


SIMULAÇÃO E O TRABALHO DA INVISIBILIDADE: PARALELO I-IV DE HARUN FAROCKI

mais uma vez: Nos filmes, há o vento que sopra e o vento que é produzido por
uma máquina de vento. As imagens de computador não têm dois tipos de vento.
Mas isso é porque a verdadeira tempestade está soprando – ritmo Benja-
min25 – a partir das bordas e a partir da parte inferior, isto é, o “paraíso”
de pixels que agora chamamos progresso. Por outro lado, a pós-produção
como o novo valor padrão, também pode sinalizar o fim desse relaciona-
mento tão explorador do mundo e seus recursos, como o praticado pelo
capitalismo industrial. Isso também seria um respiro de ar fresco: talvez
os ventos do progresso, afinal de contas.

25 Referência à passagem do Angelus Novus, nas “Teses Sobre a Filosofia da História”, em W. Benjamin, On the
Concept of History.

175
176

BIBLIOGRAFIA
BAZIN, André. The Evolution of the Language of
Cinema. In: BRAUDY, Leo; COHEN, Marshall (eds.).
Film Theory and Criticism. New York: Oxford University
Press, 1999.
______. The Myth of Total Cinema. What is Cinema? v. 1.
Berkeley: University of California Press, 1967.
BENJAMIN, Walter. On the Concept of History. The
Theses on the Philosophy of History, 1974. Disponível em:
<http://members.efn.org/~dredmond/ThesesonHistory.
html>. Acesso em: 28 out. 2016.
BLÜMLINGER, Christa. An Archaeologist of the
Present. E-Flux, n. 59, Nov., 2014 Disponível em: <http://
www.e-flux.com/journal/an-archaeologist-of-the-
present/>. Acesso em: 28 out. 2016.
______. “Harun Farocki: Critical Strategies”. In:
ELSAESSER, Thomas. (ed.). Harun Farocki: Working
on the Sight-Lines. Amsterdam: Amsterdam University
Press, 2004.
E-FLUX. n. 59, Nov., 2014. Edição especial dedicada
a Farocki. Disponível em: <http://www.e-flux.com/
announcements/issue-59-harun-farocki-out-now/>.
Acesso em: 28 out. 2016.
EHMANN, Antje; ESHUN, Kodwo. (eds.). Harun
Farocki: Against What? Against Whom? Cologne: Walther
König, 2010.
FAROCKI, Harun. Controlling Observation. In:
ELSAESSER, Thomas. (ed.). Harun Farocki: Working
on the Sight-Lines. Amsterdam: Amsterdam University
Press, 2004. (Originalmente publicado na Alemanha em
Jungle World, n. 37, 8 Sept. 1999).
______. Schneeglöckchen blühen im September.
Filmkritik, mar., 1975.
FRANKE, Anselm. Modern Monsters / Death and Life
of Fiction. Taipei Biennial, 2012. Disponível em: <http://
proa.org/eng/exhibition-harun-farocki-obras-1.php>.
Acesso em: 28 out. 2016.
GODARD, Jean-Luc. Montage, mon beau souci. Cahiers
du cinéma, n. 65, 1965.
KITTLER, Friedrich. Gramophone, Film Typewriter.
Stanford: Stanford University Press, 1999.
MACCABE, Colin. Realism and the Cinema: Notes on
Some Brechtian Thesis. Screen 15, n. 2, 1974.
MANOVICH, Lev. To Lie and to Act: Cinema and
Telepresence. In: ELSAESSER, Thomas; HOFFMANN,
Kay. (eds.). Cinema Futures: The Screen Arts in the Digital
Age. Amsterdam: Amsterdam University Press, 1998.
______. What is Digital Cinema, 1995. Disponível em:
<http://manovich.net/index.php/projects/what-is-
digital-cinema >
OOGIANDUJAOO. Sterile Practice, Worldscinema,
7 Aug. 2010. Disponível em: <http://worldscinema.
org/2012/05/harun-farocki-leben-brd-aka-how-to-live-
in-the-german-federal-republic-1990/>. Acesso em: 28
out. 2016.

HARUN FAROCKI : PROGRAMANDO O VISÍVEL


SIMULAÇÃO E O TRABALHO DA INVISIBILIDADE: PARALELO I-IV DE HARUN FAROCKI

177
178

HARUN FAROCKI : PROGRAMANDO O VISÍVEL


FAROCKI:
IMAGENS E
CONVENÇÕES
NO JOGO
E NA ARTE
PATRÍCIA
MORAN

179
180

Impossível não pensar em certas mazelas do século XX depois de ter con-


tato com a obra do artista multimídia Harun Farocki.
Ensaísta1 contemporâneo a seu tempo, Farocki problematiza em seus
filmes e instalações a construção de representações por meio de institui-
ções e sistemas de controle social como a escola e a publicidade, dedica-se
ainda à análise de aparelhos de Estado – “aparelho” entendido na tradi-
cional acepção marxista – e guerras como a Segunda Grande Guerra e a
do Vietnã, entre outras. Quer produza para o cinema, TV, galerias de arte,
quer para a imprensa escrita, Farocki colocará em perspectiva a relação
privilegiada das imagens e dos seus produtores com o poder, problemati-
zando assim também seu lugar. Estamos diante de autor político cuja bio-
grafia se confunde e alinha a tensões e violências internacionais de toda
ordem, especialmente as impetradas pela guerra e por discursos político-
-ideológicos inscritos na cultura.
A nacionalidade de Farocki relaciona-se diretamente à guerra, como
informado por ele mesmo em seu “trailer escrito”2. Nasceu na República
Tcheca quando seus pais fugiam dos bombardeios de Berlim em 1944,
assume e reconhece a inscrição da guerra em seu percurso ao destacar no
“trailer” as disputas por espaço social e as violências material e simbólica
provocadas pelos abusos do capital. Cresceu em Berlim Oriental se debru-
çando com seus filmes nas imagens técnicas e discursos a elas associados.
Entre duas guerras (1978), acompanha o avanço da indústria armamentista
entre 1917 e 1933; a guerra, as violências a ela relacionadas e sua construção
pelos meios de comunicação estão em Diante de seus olhos, Vietnã (1982).

1 Hoje, há vasta bibliografia sobre o ensaio audiovisual sendo relida e recuperada, de Montaigne passando por
Theodor Adorno. No Brasil, Arlindo Machado, Ismail Xavier, Consuelo Lins, André Brasil entre outros, têm
se dedicado a pesquisas sobre realizadores com produção audiovisual, tendo a subjetividade como enfoque,
explicitando o sujeito de fala.
2 H. Farocki, Trailers escritos, em C. Borges; P. Mourão; M.D. Mourão, (orgs.), Harun Farocki: Por uma politização do
olhar, p. 66.

HARUN FAROCKI : PROGRAMANDO O VISÍVEL


FAROCKI: IMAGENS E CONVENÇÕES NO JOGO E NA ARTE

Os mais de cem filmes de Farocki3 lançam e desenvolvem teses usando


a potência da imagem e da associação de ideias e sensações propiciadas
pela montagem. Bom leitor de Eisenstein, faz do ensaio audiovisual e es-
crito, arma para se expressar como teórico dos meios, enfim, como um
pensador. Erika Balsom em entrevista a Farocki neste volume, reconhece
nos problemas colocados pelos filmes, questões teóricas comuns às aca-
dêmicas como, por exemplo, a discussão sobre regimes de visibilidade, a
percepção do mundo e de suas representações. Farocki cita na entrevista
tradicionais pensadores do cinema como Rudolf Arnheim e Bela Balázs,
o jovem pesquisador dos meios e dos jogos Alexander Galloway4 lhe é fa-
miliar, bem como debates clássicos e os colocados pela nova configuração
dos meios. Sua obra é fruto da retroalimentação entre o pensamento for-
mal da academia e as liberdades da arte, entre os problemas expressos nas
imagens e nas questões colocadas pela voz over e montagem.
Programando o visível foi apresentada no Paço das Artes, entre janei-
ro e março de 2016. A exposição contou com as instalações Paralelo I-IV
(2014), Interface (1995) e Frases de impacto, imagens de impacto: Uma con-
versa com Vilém Flusser (1986), todas de Farocki. A instalação Paralelo I-IV
foi montada no Paço em quadro projeções dispostas em volta de puffs. No
machinima5, forma expressiva audiovisual desenvolvida a partir de games,
foram gravadas ou criadas a maioria das imagens e situações. Paralelo
apresenta e questiona a construção material de representações ao longo
da história da arte, e a mudança da mesma a partir do mundo digital, espe-
cialmente dos games. A voz over mantém o mesmo tom ao longo do desen-
rolar dos quatro vídeos. Muda-se a duração das pausas, e como a natureza

3 <http://www.harunfarocki.de/biography.html>.
4 Galloway é autor de Protocol: How Control Exists After Decentralization (2004); Gaming: Essays on Algorithmic Culture
(2006); e, em coautoria com Eugene Tracker, The Exploit: A Theory of Networks (2007), entre outros.
5 Para uma genealogia do Machinima e debate sobre sua inscrição na história dos meios ver P. Moran; J. Patrocínio,
(orgs.), Machinima.

181
182

e questões das imagens também mudam, a continuidade da entonação


gera estranhamento, seu lugar de sentido se desloca.
Artistas como Farocki, com investimento crítico dirigido a representa-
ções audiovisuais e sua produção, têm no machinima um ambiente de tra-
balho propício, pois a estrutura matemática do meio é o ponto de partida
para a criação, principalmente nos primeiros filmes. Eram fruto tanto de
gravações da tela quanto de invasões no sistema, neste segundo caso, alta
perícia se fazia necessária. Os vídeos criados a partir do jogo costumam
inverter o percurso e característica original da maioria dos ambientes na-
vegáveis. Ganham formas lineares baseadas no tempo e não mais a experi-
ência de construção de percursos. As invasões avançaram para ambientes
virtuais 3D como o Google e aos poucos a indústria percebeu seu potencial
de comércio, lançando jogos como o The Movies6. Os desenvolvedores de
jogos transformaram o fruto de uma invasão hacker em produto, um jogo
voltado à realização de vídeos.
Farocki conhece bem a capacidade do capitalismo absorver seus opo-
nentes como no caso de The Movies, ele menciona a multinacional Apple
como exemplar. Seus fundadores foram hackers, invadiram uma empresa
americana de telefonia, e hoje ocupam outro lugar. Farocki adota a concep-
ção do Verbund7 como metáfora de estratégia ideal para se evitar subsumir a
dinâmicas previamente instaladas nos sistemas, objetos e representações.
A lógica do Verbund é vista como caminho para serem usadas as forças do
sistema. A utilização de sua dinâmica deslocada do contexto original deixa
à mostra aspectos políticos e ideológicos em diversas estruturas sociais,
incluindo-se a arte e a cultura. O termo se adequa material e conceitualmen-
te à poética do realizador, calcada na bricolagem de imagens e dispositivos.

6 Lançado em 2005 pela Lionhead Studios e Robsoft Technologies.


7 Tradução para o alemão de truste ou cartel. Ver o debate em T. Elsaesser; A. Alberro, Farocki: A frame for no longer
visible: Thomas Elsaesser in conversation with Alexander Alberro, E-flux, n. 59, Nov. 2014.

HARUN FAROCKI : PROGRAMANDO O VISÍVEL


FAROCKI: IMAGENS E CONVENÇÕES NO JOGO E NA ARTE

No Verbund de Farocki, há o deslocamento no propósito das encomen-


das por ele recebidas de diversos meios tais como a televisão, o rádio, as
críticas cinematográficas, as filmagens, assim como da crítica realizada
por estudiosos8. Ele subverte o uso dos recursos disponíveis e dos “hábi-
tos de estilo”’ recorrentes nos meios expressivos, como sua recusa de usar
o contra-plano na televisão. Pretende desnaturalizar o meio evidenciando
sua materialidade e inscrição em processos sócio-culturais e artísticos
mais amplos, sem contra-planos procura se dirigir diretamente ao públi-
co. Fica claro em seu depoimento a consciência do realizador dos desafios
de uma proposta de arte política, avessa a simplificações de experimento
estético em prol única e exclusivamente de discurso, como ele esclarece:

Não foi fácil fazer algo político na televisão, pois eu


não entendia política como simples conteúdo ou
discurso. Buscava uma prática política avançada,
como aquela promovida pelo grupo Dziga Vertov
ou pela revista Tel Quel. Eu era, por exemplo, contra
os planos de cobertura e o campo/contracampo.9

Farocki é um observador das estruturas, experimenta meios tradicio-


nais e novos, usando suas palavras, busca uma “prática de política avan-
çada”, o debate sobre dispositivos em sua acepção política é evidente em
seus temas e no diálogo com o pensamento de Jean-Louis Baudry, Michel
Foucault e Umberto Eco colaboradores da Tel Quel à época, revista france-
sa de arte e cultura fundada em 1960 pelo poeta Philippe Sollers. A adesão
à investigação política e estética foi tomada como desafio e levada às últi-
mas consequências em trajetória sólida e de rara coerência.

8 Idem, ibidem, p. 3.
9 H. Farocki, op. cit., p. 68.

183
184

Apesar de tratar a ampliação e o alcance de seu trabalho junto aos


museus como um caminho quase natural, como uma maneira de alcan-
çar outros públicos, certamente essa entrada no circuito das artes tem
estreita relação com a sua pesquisa formal e indagações. O dispositivo
cinematográfico do teatro não é o lugar ideal para projetos ensaísticos
como Paralelo. Não cabe em uma grande sala e não pede resolução, pelo
contrário, quer tensionar as estruturas, a matéria da imagem. O ma-
chinima é uma plataforma fruto de módulos de programação, traz em
si o Verbund, sendo um de seus traços distintivos o fato de que “com-
binam, misturam e transformam livremente elementos das mídias
tradicionais”10. Todavia, coloca Janaína Patrocínio que essa plataforma
de criação “não modifica as formas de ver ou representar o mundo [...].
Pelo contrário, há, em muitos exemplos, um esforço de reproduzi-lo”11.
A recombinação de estruturas sociais carece de centelhas de sentido
e de relação para promover ruídos em termos de significação. Paralelo
I-IV é uma provocação ao meio e suas fragilidades. Como os caminhos
do diretor são disruptivos, ele usa a imagem e a estrutura do jogo aberto
para recolocar problemas sobre a representação na história da arte e
uma nova noção de espaço antevista nos jogos.
Farocki problematiza perspectivas de abordagem questionáveis sobre
a representação ao longo da história da arte, em imagens criadas a partir
de materialidades e contextos distintos. Circunscreve modelos em seus
aspectos estritamente formais e as ideias por eles implicadas. Trata todo
e qualquer objeto representativo de um estado da arte ou da sociedade,
como passível de debate, matéria a ser pensada. Nesta acepção, inexiste
imagem banal ou pobre, seja materialmente ou em termos de sentido. Fa-

10 M. Nitsch, Reivindicando seu espaço: Machinima, em P. Moran; P. Janaina (orgs.), Machinima, p. 76.
11 J. Patrocínio, A questão não é “O que é Machinima?” mas “Por que Machinima? em P. Moran; J. Patrocínio (orgs.),
Machinima, p. 100.

HARUN FAROCKI : PROGRAMANDO O VISÍVEL


FAROCKI: IMAGENS E CONVENÇÕES NO JOGO E NA ARTE

185
186

(pág anterior)
IMAGEM 1
MISTERY HOUSE, 1980.
PARALELO 1

IMAGEM 2
A CIÊNCIA DA COMPUTAÇÃO.
PARALELO I.

IMAGENS 3
A CRIAÇÃO DE ÁGUA.
PARALELO I

HARUN FAROCKI : PROGRAMANDO O VISÍVEL


FAROCKI: IMAGENS E CONVENÇÕES NO JOGO E NA ARTE

rocki as relaciona à complexidade das tensões sociais e discursos políticos


e ideológicos sobre a guerra, o consumo, o trabalho, enfim, aos enfrenta-
mentos verbais e físicos e às distintas condições de responder a eles. Além
desta vinculação, mais, ou menos direta, ao contexto social, os objetos e
representações como produtos da cultura são exemplo material de conti-
nuidades e de repetições, de analogias com a organização e funcionamento
do mundo cotidiano, social e político. As interfaces de jogos – de pro-
gramas como o próprio Word – reproduzem uma estrutura material e de
pensamento não mais necessária ao mundo digital, inscrita na forma de se
nomear por exemplo, o “arquivo”. Em outras palavras, estamos tentando
mostrar a migração por analogia, de modelos de pensamento das realidade
sociais e físicas, ao mundo digital. Há mudanças e continuidades de proce-
dimentos e de representações, e é deste lugar que Paralelo I-IV se coloca.
O questionamento da história da arte em Paralelo I parte da narrativa
sobre a construção de modelos de representação traçando um percurso
da pintura para a fotografia e, agora, à imagem infográfica. Com cuidado
didático, constrói uma história do “avanço” da imagem digital, desde as
primeiras interfaces gráficas e da falta de jogabilidade em algumas ima-
gens. Mistery House de 1980 abre sua arqueologia sobre o jogo, não se podia
entrar na casa e a árvore carecia de função narrativa. Prossegue a voz over
nos informando sobre a baixa resolução das árvores e a falta de condições
para se jogar em diversos objetos. A representação visualmente rudimentar
com que a materialidade digital está colocada em 1980, tem a superfície vi-
sível constituída de linhas horizontais e verticais, em 1986 de quadrados do
pixel. A apresentação de certa história da resolução e vínculos especulares
com a vida material, alcança no ano de 2006 o movimento das folhas com o
jogo Anno 1701, os pássaros agora deixam sombras, observa a narradora.
A perícia narrativa de Farocki conta com uma serena voz over feminina,
um suposto lugar da verdade. Segura, suave e contínua, e ainda sem qual-

187
188

quer inflexão, a falsa narração teleológica é relevada como tal ao se intro-


duzir outro assunto, como a qualificação, ou melhor, a desqualificação pela
história oficial da arte da representação egípcia. Aproxima a imagem na
qual os pixels estão visíveis e a imagem egípcia, nenhuma alcança a repre-
sentação especular. A fragilidade desse entendimento é logo questionada,
tomando-se a visão dos pintores modernistas como ponto para a crítica da
história da arte, ou pelo menos, daquele entendimento. É pela montagem,
pela proximidade entre as informações que as ideias vão se estruturando e
substituindo. Afirma-se em um sentido, para logo depois outro dado, outra
informação, levar a questionar o que estava sendo dito. Como bem coloca
Elsaesser: “as ideias de Farocki sobre montagem são complexas e sofistica-
das, a lógica do ‘and-and’ prevalece sobre o ‘either-or’”12.
Esse pequeno exemplo fala da permanência de uma ideia tida como
fato histórico durante anos. Limitada ou não, ainda se faz presente em
convenções artísticas. A teleologia em direção à alta resolução sugerida
em Paralelo I, bem como ao efeito especular da imagem, é um produto da
indústria, um recurso para se alimentar a cadeia produtiva do mercado. O
debate sobre resolução e sobre a representação em seu aspecto visual é re-
gularmente alimentado por interesses comerciais das corporações sendo
evidentes nas estratégias publicitárias relacionadas à resolução. Foi uma
constante na discussão sobre o vídeo na ocasião do surgimento do VHS e
formatos considerados sem qualidade técnica, a rigor, sem resolução para
merecer o estatuto de arte.
Em Paralelo I, a representação, a imagem e seus índices especulares es-
tão imbricados em debates sobre modelos e construções sociais presentes
em regimes de visibilidade de qualquer ordem. Um dos grandes problemas
nesse quesito é a compartimentalização da sociedade estruturada a partir

12 T. Elsaesser; A. Alberro, op. cit., p. 3.

HARUN FAROCKI : PROGRAMANDO O VISÍVEL


FAROCKI: IMAGENS E CONVENÇÕES NO JOGO E NA ARTE

de especialidades, entre elas a separação entre técnica e ciência. O game, a


imagem programada e desenhada numericamente explicita a presença da
técnica e do pensamento científico no desenho, sua criação passa por uma
prótese cuja manipulação demanda conhecimento, cuja vinculação com a
técnica é evidente, pois a imagem é criada em uma máquina. Desse ponto
de vista, um novo lugar para as imagens está dado. Em um primeiro mo-
mento as imagens dos jogos não tinham relação especular com a matéria
visível. Se era distante da imagem fotográfica em termos visíveis, trouxe
como ela, uma série de questões. Hoje, há uma espécie de inversão, pois a
imagem parece especular e não o é. A imagem fotográfica foi considerada
prova de verdade. Por sua característica indicial, sugere a presença, logo é
testemunha. Ao se evidenciar nas estruturas constitutivas da imagem seu
aspecto programável, outra natureza material, as distâncias entre o visível
e a “realidade da programação na imagem” traz novos problemas. A inda-
gação semiótica sobre a “imagem da realidade” e a “realidade da imagem”
precisa incluir outra natureza de indagação e procedimento, a constituição
matemática do meio exigindo a entrada em lógica relacionada à abstração
no fazer. É o ver e o que é uma imagem que está posto.
Não se trata mais apenas da representação, a imagem mudou se pres-
tando a ser tocada nas telas e substituir eventualmente a presença13, não
se destina apenas a se ver. A comunicação à distância é mais um sinal da
evidência científica da imagem. Paralelo I recupera na passagem de milha-
res de anos desde o Renascimento, a associação entre o trabalho técnico
e o científico, e na evidente transposição contemporânea da abstração ao
concretismo, oferece uma mostra da aproximação entre arte e ciência.
Outra passagem, que evidencia a preocupação com esta problemática é

13 Encontra-se em avançado estado de pesquisa a holoportation (ver <https://www.youtube.com/


watch?v=7d59O6cfaM0>). Tecnologia interativa em 3D que permite o encontro a partir da imagem. A mesma ainda
não está disponível para o grande público em função dos custos e de banda de transferência de dados.

189
190

o cruzamento entre as esferas artística, política e a técnica nos processos


de produção simbólica. No diário sobre a criação de um filme a partir de O
capital de Karl Marx, Farocki afirma ser sua proposta: “fazer filmes cienti-
ficamente e fazer ciência politicamente”14. Finalmente, questionado por
Erika Balsom15 sobre a constante menção ao imbricamento entre técnica
e ciência, Farocki vê no digital a recuperação de pesquisa na produção da
imagem, ou seja, a imagem como um elemento para se levar a problemas
na área da medicina, da pesquisa física e filosófica sobre o movimento
como acontecia em Edward Muybridge e Etienne Jules-Marey. A ima-
gem em movimento não como um fim, mas como um meio relacionado à
pesquisa. As situações exploradas atravessam campos de conhecimento
e ideias, mostram e descrevem de maneira direta as vinculações entre es-
tética e política em filmes como A Saída dos operários da fábrica (1995). A
tão almejada ciência está em meta-discursos como de Paralelo e em Jogos
sérios, filmes cuja imagem gráfica é ciência, como o Afeganistão atacado
virtualmente. O cruzamento de indústrias (da guerra e do audiovisual) e
dos conhecimentos implicados para a sua realização plena, como foram
expostos por Farocki, procuram explicitar discursos, instâncias sociais e
produtos da produção simbólica e material em nossa sociedade.
Os demais Paralelos seguem a mesma estrutura: uma voz feminina
calma traz grandes temas, enquanto a imagem é exemplo, uma ilustração
inicial dos problemas apresentados. Mudam-se as questões tratadas e o
uso das imagens do jogo. A instalação usa a semelhança visual do jogo pro-
piciada pela qualidade especular das personagens, para tratar os loopings
e a programação da engine como comportamentos sociais. Faz da automa-
ção do jogo, oportunidade para discutir processos humanos calcados em
hábitos impensados e repetitivos, pois, como os bonecos dos jogos, nossa

14 Ver O novo construtivismo: Harun Farocki e Erika Balsom conversam sobre Parallel I-IV, supra.
15 Ver idem, ibidem.

HARUN FAROCKI : PROGRAMANDO O VISÍVEL


FAROCKI: IMAGENS E CONVENÇÕES NO JOGO E NA ARTE

espécie reitera rotineiramente movimentos, gestos, enfim, costumes. Em


cada um dos Paralelos exploram-se pontos de aproximação e distância
entre as materialidades do corpo virtual e do físico.
Paralelo II inicia-se indagando o que vem a ser a percepção e a pos-
sibilidade de existência de um mundo se eu não o estou “observando”.
A partir de então, explora a irrealidade do espaço do jogo. Um caubói se
choca às rochas e caminha a esmo, um guarda bate o carro em estrutura
de cimento virtual, o guarda determinado vai ao sinal e confisca o carro
de um civil, bate no mesmo lugar. Se o mundo material existe ou não sem
a minha presença, o dos games perde o sentido, continua existindo como
nonsense. O guarda tromba repetidamente, o avião flanando espera o joga-
dor, foi para uma zona proibida, a laranja, é avisado pela voz do jogo sobre
o perigo da zona, há uma contagem regressiva, o avião explode. Ao tempo
contínuo e neutro da voz over, soma-se a contagem regressiva nervosa.
A voz de Deus da narração é neutra, a das personagens do jogo, traz os
medos e a irritabilidade. Duas temporalidades se alternam, do tom con-
tínuo da voz over e da contagem regressiva ameaçadora. O avião explode.
Silêncio. Como em Paralelo I, o tom da voz over não condiz com os fatos
apresentados, sua neutralidade pode ser lida como ironia, como crítica a
trabalhos estruturados pela voz over. O desencontro entre a voz oficial e
a imagem produz linhas de sentido paralelas e o esvazia, há efeitos de sus-
pensão na continuidade monótona da voz alternada com o vazio produti-
vo de momentos sem qualquer informação verbal.
Paralelo II faz do jogo, outro jogo. As personagens andam de skate,
escapando dos limites do espaço programado, flutuam em espaço não
programado. Se andar de skate é uma brincadeira, voar sem skate é outra
ainda maior, os jogos contemporâneos autorizam aventuras nesses luga-
res. Farocki nos leva para esse espaço, ou antiespaço, revelando a sua ine-
xistência, inconsistência e ao mesmo tempo, os prazeres dela resultantes.

191
192

Evidencia a representação, fazendo de seu desvelamento, narrativa. O


terceiro paralelo persegue a imaterialidade virtual. O visível e o invisível
no interior dos objetos bem como a possibilidade de se atravessar espaços
feitos de folhas ou concreto tornam-se convenções estabelecidas pela
programação. A matéria visível e programável não tem propriedades,
responde a convenções determinadas pelos objetivos do jogo, pelos inte-
resses do realizador. A entrada e saída em uma guerra também constituem
um jogo, mesmo não o sendo. O visível suporta um debate sobre o ver,
sobre convenções da representação, sobre a construção da matéria virtual
e, é claro, do jogo. Em Farocki, a imagem numérica se aproxima da ciência,
o conhecimento e convenções necessárias a sua construção são dados,
extrapolam a semiose, produzem sentido incluindo o que expressa a ma-
terialidade digital, para além de relações de substituição.
O herói é o tema de Paralelo IV, e como faz parte do universo de Faro-
cki, tem por primeira ação destacar seu lugar grotesco e sua relação com
o masculino nas narrativas espetaculares. Na instalação, inexiste herói a
rigor, ele não salva ninguém, não olha para o mundo ou cuida de alguém,
ele coça o saco e sugere mirar para um infinito inexistente. Jocoso. O uni-
verso do herói é introduzido com a tranquila voz over: “Ele não tem pro-
fessores, aprende por si.”
Um percurso solitário e singular parece se apresentar, um herói sem
mestre, a arrogância e a falta de sentido das cenas posteriores esvazia o
aprendizado, inexiste a rigor. Um movimento de câmara de 360º nos revela
a localização do herói em Nova York, a primeira ação do autodidata é sair
correndo, trombar com uma mulher (sugestão de assalto) e sair correndo.
A voz over tranquila é substituída por frases soltas, enquanto “pesso-
as” desgovernadas em looping repetem ações a esmo. Não tiveram pro-
fessores, nem aprenderam, aqui a repetição é do mesmo, não se aprende.
Essa tese é explicitada quando a personagem corre para fora da loja ao ser

HARUN FAROCKI : PROGRAMANDO O VISÍVEL


FAROCKI: IMAGENS E CONVENÇÕES NO JOGO E NA ARTE

ameaçada por um homem armado. A inclemente voz over chama a atenção


para a falta de memória da personagem que retorna logo ao sair, sendo
obrigada a se retirar da loja em seguida, a personagem continua lá, esta-
mos testemunhando sua entrada e saída pela ameaça de uma personagem
no mesmo lugar.
Tendo o herói como foco, há em Paralelo IV jocoso jogo com a repeti-
ção e com a humanização dos bonecos. O movimento duro evidencia seu
aspecto não humano, mas a voz de outras personagens, como o grito de
uma senhora com quem ele tenta se relacionar, aponta para outra direção.
O grito dirige-se a um boneco duro, mal move ao se aproximar da senhora
diversas vezes. Rompe limites de distância e aproximação socialmente
praticados, sem tocá-la uma única vez, uma espécie de mise-en-abyme. O
trechinho de filme, o pedaço de jogo é melancólico, ações se repetem, se re-
petem levando ao mesmo, um senhor também é cercado pelo boneco nada
ameaçador. Catatônico, repete seu não aprendizado: andar em círculos.
A estrutura narrativa calcada na alternância ação-situação-ação, con-
sagrada pelo cinema americano e hoje em vigor em diversas cinemato-
grafias, ou situação-ação-situação16 exibe a ação sem situação. Ações sem
sentido, sem consequências, sem desdobramentos ou contexto seguem
no looping de uma situação de um módulo do jogo, uma situação prepa-
ratória de uma ação, mas sem antes ou depois. O tempo desaparece, um
eterno presente de uma situação fadada a assim continuar, sem violência,
sem encontro, sem outro, enfim, uma preparação eterna e vazia: os dois
estão ali presos sem devir. O grito da senhora é pela aproximação do ho-
mem, apenas aproximação e a ação está dada socialmente. Circulando a
senhora, ou o senhor, o boneco animado do jogo volta, ela grita, o senhor

16 A fórmula S-A-S (da situação à situação transformada por meio da ação) é proposta por Noël Burch e chamada a
grande forma, traz a atualização de potências. Para a grande e pequena forma ver: G. Deleuze, A imagem-movimento,
p. 178-220.

193
194

fica impassível e o boné, volta. A repetição muda e esvazia o looping, as si-


tuações e ações prosseguem sem qualquer expressão facial, sem qualquer
reação física. Farocki parte de poucos elementos para em seguida com-
biná-los e recombiná-los. Desse arranjo, sobressaem estruturas sociais e
narrativas, convenções do jogo, da vida e da história da arte, sua relação e
absurdo, enfim, as convenções da vida social e de representações na arte
e em seu pensamento.

(ao lado)
IMAGEM 4
EM DIREÇÃO À
FALTA DE GRAVIDADE.
PARALELO II

IMAGEM 5
FORA DA ÁREA
DE SEGURANÇA.
PARALELO II

HARUN FAROCKI : PROGRAMANDO O VISÍVEL


FAROCKI: IMAGENS E CONVENÇÕES NO JOGO E NA ARTE

195
196

IMAGEM 6
ESCOLHENDO O MODO.
PARALELO II

HARUN FAROCKI : PROGRAMANDO O VISÍVEL


FAROCKI: IMAGENS E CONVENÇÕES NO JOGO E NA ARTE

BIBLIOGRAFIA
ADORNO, Theodor W. O ensaio como forma. Notas
de literatura 1. Tradução: Jorge de Almeida. SP: Duas
Cidades, 2003.
DELEUZE, Gilles. A imagem-movimento. São Paulo:
Brasiliense, 1985.
ELSAESSER, Thomas; ALBERRO, Alexander.
Farocki: A Frame For No Longer Visible: Thomas
Elsaesser in Conversation With Alexander Alberro.
E-Flux, n. 59, nov. 2014. Edição especial dedicada a
Farocki. Disponível em: <http://www.e-flux.com/
announcements/issue-59-harun-farocki-out-now/>.
Acesso em: 28 out. 2016.
ELSAESSER, Thomas. Harun Farocki: Cineasta, artista
e teórico da mídia. In: BORGES, Cristian; MOURÃO,
Patrícia; MOURÃO, Maria Dora (orgs.). Harun Farocki:
Por uma politização do olhar. São Paulo: Cinemateca
Brasileira, 2010. Disponível em: < http://cinemateca.
gov.br/farocki/catalogo.php>. Acesso em: 21 nov. 2016.
______. (ed.). Harun Farocki, Working on the Sightlines.
Amsterdam: Amsterdam University Press, 2004.
FAROCKI, Harun. Trailers escritos. In: BORGES,
Cristian; MOURÃO, Patrícia; MOURÃO, Maria Dora
(orgs.). Harun Farocki: Por uma politização do olhar. São
Paulo: Cinemateca Brasileira, 2010.
FLUSSER, Vilém. Palavras-chave, imagens-chave:
Diálogo de Harun Farocki com Vilém Flusser. In: YOEL,
Gerardo (org.). Pensar o cinema: Imagem, ética e filosofia.
São Paulo: CosacNaify, 2015.
GALLOWAY, Alexander. Gaming: Essays on Algorithmic
Culture. Minneapolis: University of Minnesota Press,
2006.
______. Protocol: How Control Exists After
Decentralization. Cambridge: MIT Press, 2004.
GALLOWAY, Alexander; TRACKER, Eugene. The
Exploit: A Theory of Networks. Minneapolis: University of
Minnesota Press, 2007.
LOWOOD, Henry. A tecnologia encontrada: Jogadores
como inovadores na produção de Machinima. In:
MORAN, Patricia; PATROCÍNIO, Janaina (orgs.)
Machinima. São Paulo: Pró-Reitoria de Cultura e
Extensão da USP, 2011.
MACHADO, Arlindo. O filme-ensaio. Intermídias, n. 5/6,
2006. Disponível em: <www.intermidias.com/miolo/
cinema_home.htm>.
NITSCHE, Michael. Reivindicando seu espaço:
Machinima. In: MORAN, Patrícia; JANAINA, Patrocínio
(orgs.). Machinima. São Paulo: Pró-Reitoria de Cultura e
Extensão da USP, 2011.
PATROCÍNIO, Janaina. A questão não é “O que é
machinima?” mas “Por que machinima? In: MORAN,
Patricia; PATROCÍNIO, Janaina (orgs.). Machinima. São
Paulo: Pró-Reitoria de Cultura e Extensão da USP, 2011.

197
198

FAROCKI:
IMAGES AND
CONVENTIONS
IN THE GAME
AND ART
PATRÍCIA MORAN

HARUN FAROCKI : PROGRAMANDO O VISÍVEL


FAROCKI: IMAGES AND CONVENTIONS IN THE GAME AND ART

It is impossible not to think of certain 20th-century problems after


encountering the multimedia artist Harun Farocki’s work.
In his films and installations Farocki, a contemporary essayist1 of his
times, problematized the construction of representations through
means of institutions and social control systems such as school and
publicity apparatuses, dedicating himself further to analysis of State
apparatuses – “apparatus” understood in the traditional Marxist
sense – and to wars such as World War II and Vietnam, among
others. Regardless of whether he was producing for cinema, for
television, for art galleries, or for the written press, Farocki always
put into perspective the privileged relation of images and of their
producers to power, in this way also problematizing their place.
In Farocki. we see a political author whose biography overlaps
and aligns with international violence and tensions of all kinds,
especially those caused by war and by political and ideological
discourses that have been culturally inscribed.
Farocki’s nationality is directly related to war, as he informs us
in his “written trailer”2. Born in the Czech Republic after his parents
fled the Berlin bombings of 1944, he assumes and recognizes the
inscription of war in his trajectory by highlighting in his “trailer”
the disputes for social space and material and symbolic violence
provoked by abuses of capital. He grew up in East Berlin and, with

1 There is a vast bibliography about the audiovisual essay form that is being reread and recuperated, from Montaigne
passing through to Theodor Adorno. In Brazil, Arlindo Machado, Ismail Xavier, Consuelo Lins, and André Brasil,
among others, have researched artists with audiovisual production by focusing on subjectivity and making explicit
the matter of speech.
2 H. Farocki, “Trailers Escritos”, in C. Borges; P. Mourão; M.D. Mourão, (org.), Harun Farocki: Por uma politização do
olhar, p. 66.

199
200

his films, examined technical images and discourses associated


with them. Between Two Wars (1978) accompanies the advance of
the arms industry from 1917 to 1933; Before Your Eyes: Vietnam (1982)
looks at war, its related violence, and its construction through
means of communication. In over one hundred films, Farocki3
proposed and developed theses using the power of images and the
association of ideas and sensations propitiated by their assemblage.
A good reader of Eisenstein, he transformed written and filmed
essays into weapons with which to express himself as a theorist of
mediums, and in short, as a thinker. In an interview with Farocki
that appears in this volume, Erika Balsom recognizes common
theoretical concerns among academics regarding the problems
posed by the films, such as discussions on visibility regimes, the
perception of the world, and its representations. In the interview,
Farocki cites traditional cinematic thinkers like Rudolf Arnheim
and Bela Balázs and the young mediums and games researcher
Alexander Galloway4, as well as both classic debates and new ones
provoked by the new configuration of mediums. Farocki’s oeuvre is
the result of feedback between the academy’s formal thinking and
the freedoms of artistry, between problems expressed in images and
in the questions posed through voice-over and montage.
Programming The Visible was shown at the Paço das Artes, in
São Paulo, between January and March of 2016. The exhibition
featured the installations Parallel I-IV (2014), Interface (1995), and

3 <http://www.harunfarocki.de/biography.html>.
4 Galloway is the author of Protocol: How Control Exists After Decentralization (2004); Gaming: Essays on Algorithmic
Culture (2006); and, with Eugene Tracker, The Exploit: A Theory of Networks (2007), among others.

HARUN FAROCKI : PROGRAMANDO O VISÍVEL


FAROCKI: IMAGES AND CONVENTIONS IN THE GAME AND ART

Catch Phrases, Catch Images: A Conversation with Vilém Flusser (1986).


Parallel I-IV was installed on projection screens that surrounded
bean bag chairs. Most of the images and situations were recorded
in machinima5, an audiovisual format developed from video
games. Parallel presents and questions the material construction
of representations throughout the history of art and the changes
to it caused by the digital world, especially in the case of video
games. The voice-over maintains the same tone throughout the
development of the four videos. The durations of pauses change, as
do the nature of and questions inherent in the images, thus leading
the continuity of intonation towards an estrangement as its secure
place is dislocated.
Artists such as Farocki, who hold critical investment directed
towards audiovisual representations and their production,
encountered a propitious work environment with machinima, since
their own medium’s mathematical structure is the starting point
for creation, principally in the first films. These works were equally
the result of screen recordings and of system invasions, the latter
requiring a high level of expertise. The videos that were made from
the games tended to invert the original courses and characteristics
of most of the navigable environments. They gained linear forms
based on time and no longer through the experience of path-
building. The invasions were advanced to virtual 3-D environments
like Google, and little by little, the industry perceived their

5 For a genealogy of machinima and the debate over its inscription in the history of mediums, see P. Moran; J.
Patrocínio, (orgs.), Machinima.

201
202

commercial potential, eventually launching games like The Movies6.


Game developers thus transformed the fruit of a hacker invasion
into a product – a game geared towards video-making.
Farocki fully understood capitalism’s capacity to absorb
its opponents, as in the case of The Movies, and he cited the
multinational Apple as exemplar. The company’s founders were
hackers who invaded an American phone company and who
today occupy a different place. Farocki adopted the concept of
Verbund7 as a metaphor for the ideal strategy of avoiding being
subsumed by dynamics previously installed in systems, objects,
and representations. The logic of Verbund is seen as a path to use
the system’s forces. The usage of its dynamic, dislocated from
the original context, allows for the illustration of political and
ideological aspects in diverse social structures, including art and
culture. The term conceptually and materially merges the maker’s
poetics based on a bricolage of images and apparatuses.
In Farocki’s Verbund, there is a shift in the purpose of orders
received by him from diverse fields such as television, radio, film
criticism, and filmmaking, as well as from academic criticism8. He
subverts the usages of disposable resources and of “style habits”
recurrent in expressive mediums, such as through his refusal
to use television’s established scheme of shot/countershot. He
aims to denaturalize the medium by evidencing its materiality

6 Launched in 2005 by Lionhead Studios e Robsoft Technologies.


7 Translation from German as “trust” or “cartel”. See the debate in T. Elsaesser; A. Alberro, “Farocki: A frame for no
longer visible: Thomas Elsaesser in conversation with Alexander Alberro”, E-flux, n. 59, Nov. 2014.
8 Idem, ibidem, p. 3.

HARUN FAROCKI : PROGRAMANDO O VISÍVEL


FAROCKI: IMAGES AND CONVENTIONS IN THE GAME AND ART

and inscription in wider sociocultural and artistic processes –


for instance, through a lack of reverse shots, he seeks to address
the public directly. The filmmaker’s awareness of the challenges
of a political art averse to the simplifications of aesthetic
experimentation in favor of a singular, exclusive discourse is clear in
his statement that:

It was not easy to do something political on television


because I did not understand politics as simple
content or discourse. I sought an advanced political
practice such as that promoted by the Dziga Vertov
Group or by the Tel Quel magazine. I was, for example,
against the coverage plans and the reverse shot.9

Farocki is an observer of structures, an experimenter with


traditional and new mediums who uses his own words as tools
and searches for a “practice of advanced politics”. The debate
over apparatuses in political meaning is evident in his themes
and in dialogue with the reflections of Jean-Louis Baudry, Michel
Foucault, and Umberto Eco, all contributors at that time to Tel Quel,
a notable French magazine of art and culture founded in 1960 by the
poet Philippe Sollers. Farocki’s adhesion to political and aesthetic
investigation was taken as a challenge and brought to its final
consequences in a solid trajectory of rare coherence.
Despite treating the amplification and reach of his work with
museums as a quasi-natural path, as a means to reach other publics,

9 H. Farocki, op. cit., p. 68.

203
204

certainly this entrance into the arts circuit had a direct relationship
with Farocki’s formal research and inquiries. The cinematographic
apparatus of the theater is not the ideal place for essayistic projects
like Parallel. The work does not fit inside a large room, nor does it
seek resolution – to the contrary, it looks to place tension on the
structures and materiality of the image. The platform of machinima
is the result of programming modules and it brings within itself
the Verbund, with one of its distinctive traits being the fact that it
“combines, mixes and freely transforms elements of traditional
media”10. However, Janaína Patrocínio claims that this platform of
creation “does not modify the forms of seeing or representing the
world […]. To the contrary, there are, in many examples, efforts to
reproduce it”11. The recombination of social structures lacks sparks
of sense and of relation sufficient towards promoting noise in terms
of meaning. Parallel I-IV provokes the medium and its fragilities.
Since the director’s paths are disruptive, he uses the image and
the structure of the open game in order to relocate problems of
representation in the history of art and a new notion of space
foreseen in games.
Farocki problematized perspectives of questionable approaches
to representation throughout the history of art in images created
from distinct material conditions and contexts. He circumscribed
models in their strictly formal aspects, as well as the ideas implied
by them. He treated any and all objects that were representative

10 M. Nitsch, “Reivindicando seu espaço: Machinima”, in P. Moran; P. Janaina (org.), Machinima, p. 76.
11 J. Patrocínio, “A questão não é ‘O que é Machinima?’ mas ‘Por que Machinima?’” in P. Moran; J. Patrocínio (org.),
Machinima, p. 100.

HARUN FAROCKI : PROGRAMANDO O VISÍVEL


TÍTULO DO TEXTO

205
206

(pág anterior)
IMAGE 1
MISTERY HOUSE, 1980.
PARALELO 1

IMAGE 2
THE
COMPUTER SCIENCE.
PARALELO I.

IMAGE 3
THE CREATION OF WATER.
PARALELO I

HARUN FAROCKI : PROGRAMANDO O VISÍVEL


FAROCKI: IMAGES AND CONVENTIONS IN THE GAME AND ART

of artistic and social states as grounds for debate, material to be


contemplated. Within this context, there is no such thing as a
trivial or a poor image, whether materially or in terms of meaning.
Farocki related images to the complexity of social tensions and
political and ideological discourses about war, consumption, work
– in short, to a variety of kinds of verbal and physical clashes and
the distinct conditions for responding to them. In addition to this
more or less direct connection with social context, the objects
and representations as cultural products are material examples
of continuities and repetitions, of analogies of the organizing
and functioning of quotidian, social, and political worlds. Game
interfaces – even in programs like Word – reproduce a material
and intellectual structure that is no longer necessary to the
digital world, inscribed, for example, through naming itself as the
“archive”. In other words, we are trying to show the migration, by
analogy, of models of contemplation of social and physical realities
into the digital world. There are changes as well as continuities in
procedures and in representations, and it is here where Parallel I-IV
places itself.
The question of art history in Parallel I begins with a narrative
about the construction of models of representation that traces
a route from painting to photography and, now, to information
graphics. With didactic care, Farocki builds a history of the
“advance” of the digital image, starting with the first graphic
interfaces and the lack of playability in some images. Mystery House,
from 1980, opens the archeology of the game, with an inability to

207
208

enter a house and a tree lacking narrative function. A voice-over


subsequently informs us of the low resolution of the trees and the
lack of ability to place oneself into diverse objects. The visually
rudimentary representation with which digital materiality is placed
in 1980 has a visible surface made of horizontal and vertical lines
that, by 1986, consists of pixel squares. In 2016, the presentation of
a certain history of resolution and specular links with material life
reaches the movement of leaves in the game Anno 1701. The narrator
observes that the birds now cast shadows.
Farocki’s carefully crafted narrative relies on a serene,
female voice-over as an ostensible site of truth. Secure, soft, and
continuous, and with no inflections, the false teleological narration
is revealed as such when shifting to introduce another subject, such
as the qualification, or better, the disqualification of the official
history of art involving Egyptian representation. It approximates
the image, in which the pixels are visible and the Egyptian image
fails to achieve any specular representation. The fragility of this
understanding is immediately questioned, and the vision of the
modernist painters is assumed as a departure point for criticism of
art history, or at least, for the understanding. It is through montage,
through proximity between pieces of information, that ideas take
structure and substitute for one another. They affirm themselves
with one meaning, in order for another piece of data or information
to then immediately raise questions about what is being said. As
Thomas Elsaesser states, “Farocki’s ideas on assembly are complex

HARUN FAROCKI : PROGRAMANDO O VISÍVEL


FAROCKI: IMAGES AND CONVENTIONS IN THE GAME AND ART

and sophisticated, the logic of ‘and-and’ prevails over ‘either-or’”12.


This small example speaks to the permanence of an idea taken
as historical fact for years. Limited or not, it remains present in
artistic conventions. The teleology in directed of high resolution
as suggested by Parallel I, as well as the specular effect of the image,
is a product of industry, a resource to feed the market’s productive
chain. The debate over resolution and over representation in its
visual aspect is regularly fed by corporate commercial interests
manifest in advertising strategies related to resolution. It was
constant in the discussion about video on the occasion of the arrival
of VHS and formats considered to not have high technical quality,
lacking the rigor or resolution to deserve the stature of art.
In Parallel I, representation, the image, and its specular indexes
overlap in debates about social models and constructions present
in visibility regimes of any order. One of the great problems in
this matter is the compartmentalization of society structured
from specialties, among them the separation between technique
and science. The game, the image programmed and explicitly
numerically designed in the presence of technique and of scientific
thinking of design, is a creation passing for a prosthesis whose
manipulation demands knowledge, whose connection with
technique is evident, since the image is created with a machine. A
new place for images is given through this point of view. In an early
moment, the image of the game did not have a specular relation
with visible material. If it was distant from the photographic image

12 T. Elsaesser; A. Alberro, op. cit., p. 3.

209
210

in visual terms, it brought with it a series of questions. Today there


is a type of inversion, for the image appears to be specular but is
not. The photographic image was considered proof of truth. Due to
its indexical characteristic, it suggests a presence to which it turns
witness. In evidencing within the constitutive structures of the
image its programmable aspect, another material nature – that of
the distances between the visible and the “reality of programming
in the image” – brings new problems. The semiotic questioning
about the “image of reality” and the “reality of image” needs to
include another form of questioning and procedure, with the
mathematical constitution of the medium demanding the entrance
of a logic related to the abstraction in doing. It is “seeing an image”
and “what is an image” that are at issue.
Mere representation is no longer discussed, as the image
has changed from being preset to being touched on the screens,
eventually substituting a presence13 with the goal of being more
than seen. Communication from a distance is one more sign of
scientific evidence of the image. Parallel I recuperates the passing
of hundreds of years since the Renaissance, with its associating
of technical and scientific work, and in its evident contemporary
transposition of abstraction to concretion, it offers a show of
approximation between art and science. Another passage that
presents a concern with this problematic is the crossing of artistic,
political, and technical spheres in the processes of symbolic

13 It is already in such an advanced state the research of a holoportation (see <https://www.youtube.com/


watch?v=7d59O6cfaM0>). Interactive 3-D technology that enables meetings based on image. It is not yet available
for a greater number of users because it is still expensive and there are issues with minimum bandwidth.

HARUN FAROCKI : PROGRAMANDO O VISÍVEL


FAROCKI: IMAGES AND CONVENTIONS IN THE GAME AND ART

production. In his diary, writing about the creation of a film based


on Marx’s Capital (1867), Farocki states that his proposal is to
“make films scientifically and make science politically”14. Finally,
when questioned by Erika Balsom15 about the constant mention of
interweaving between technique and science, Farocki sees in the
digital realm the recuperation of research on image production –
essentially, the image as an element with which to explore problems
in the areas of medicine, physics, and philosophical research on
movement, as occurred in the works of Eadweard Muybridge and
of Étienne-Jules Marey. The image in movement not as an end, but
as a means for study. The situations that are explored cross fields of
knowledge and of ideas by directly demonstrating and describing
the connections between aesthetics and politics in films such as
Workers Leaving the Factory (1995). The sought-after science appears
in meta-discourses like those in Parallel and in Serious Games, works
whose graphic image is science, such as the Afghanistan attacked
in virtual fashion. The crossing of industries (war and audiovisual)
and of the fields of study implicated in their full realization,
as exposed by Farocki, seeks to make explicit the presences of
discourses, social instances, and products of symbolic and material
production in our society.
The additional Parallels follow the same structure: A calm
female voice raises large themes while the image serves as an
example, an initial illustration of the problems presented. The

14 See “The New Constructivism: Harun Farocki and Erika Balsom Discuss Parallel I–IV”, supra.
15 Ibidem.

211
212

issues covered and the usage of the game images change over
time. The installation utilizes the visual appearance of` a game
propitiated by the specular quality of the characters to treat
looping and engine programming as social behaviors. It creates
with the automation of the game an opportunity to discuss human
processes based in non-thinking and repetitive habits, since, as
in the onscreen beings in games, our species routinely repeats
movements, gestures, and customs. In each of the Parallels, points
of approximation and the distance between the materiality of
physical and virtual bodies are all explored.
Parallel II begins by inquiring into what comes to be the
perception and the possibility of existence of a world if I am
not “observing” it. From there, the work goes on to explore
the unreality of game space. A cowboy hits the rocks and walks
aimlessly, a guard crashes a car into a virtual cement structure, the
determined guard goes to a stoplight and confiscates a man’s car
in order only to crash into the same spot. If the material world can
continue existing with or without my presence, then the world
of games loses meaning and continues existing as nonsense. The
guard crashes repeatedly, the circling plane awaits the player, enters
a forbidden zone, and is advised by the voice of the game about
the danger there. There is a countdown and the plane explodes.
The continual rhythm of the neutral voice-over is overtaken by a
nervous countdown. The voice of God, i.e., the voice of the narrator,
is neutral, while the voices of the game characters bring fear and
irritability. Two time periods alternate, that of the continual tone

HARUN FAROCKI : PROGRAMANDO O VISÍVEL


FAROCKI: IMAGES AND CONVENTIONS IN THE GAME AND ART

of the voice-over and that of the threatening countdown. The plane


explodes. Silence.
As in Parallel I, the tone of the voice-over does not match with
the facts that are presented. Its neutrality can be interpreted
as irony, as criticism of works structured with voice-over. The
disconnect between the official voice and the image produces
parallel lines of meaning and is drained. There are effects of
suspension in the continuous monotone of the voice alternated
with the productive void of movements lacking verbal information.
Parallel II makes the game another game. The characters ride
skateboards and escape the limits of programmed space to float
in non-programmed space. If the riding of a skateboard is a joke,
then flying without them is an even greater joke, and contemporary
games allow for adventures in these places along these lines.
Farocki brings us to this space, or anti-space, and reveals its
nonexistence, inconsistency, and at the same time, the pleasure
resulting from it. He witnesses the representation and makes
narrative from its unveiling. The third Parallel pursues virtual
immateriality. The visible and invisible in the interior of objects,
as well as the possibility of crossing spaces made of leaves or of
concrete, becomes established convention in the programming.
The visible and programmable material has no properties, it
responds to the conventions determined by the objectives of the
game, by the interests of the director. The entrance and existence of
a war also constitutes a game, even without being one. The visible
supports a debate over sight, over conventions of representation,

213
214

over the construction of virtual material and, of course, of the game.


With Farocki, the numerical image approximates science. The
knowledge and conventions necessary to its construction are given,
and they extrapolate semiotics and produce meaning, including
what digital material expresses beyond the relations of substitution.
Parallel IV’s theme is the hero, and as part of Farocki’s universe,
its first action is to highlight the grotesque place of the hero and
his relation with the masculine in spectacle-based narratives. In
the installation there is no hero, strictly speaking. He does not
save anyone, nor does he look at the world, nor care for anyone.
He scratches his testicles and seems to look out into a nonexistent
infinity. A joke. The hero’s universe is introduced by the calm voice-
over: “The hero has no parents and has no teachers.”
A solitary and singular trajectory seems to present itself, that of
a hero without a master, with the arrogance and senselessness in
subsequent scenes draining the possibility of learning and leaving
rigor nonexistent. A 360º camera movement reveals the hero’s
placement in New York. This autodidact’s first action is to take off
running, bump into a woman (suggesting assault), and keep running.
The calm voice-over is replaced by scattered phrases while
ungoverned “people” repeat actions aimlessly in looping. They
had no teachers and learned nothing, leading to a repetition of
non-learning. This thesis is made explicit when the character
runs out of a store upon being threatened by an armed man.
The merciless voice-over calls attention to the character’s lack
of memory as he immediately returns to the store and is then

HARUN FAROCKI : PROGRAMANDO O VISÍVEL


FAROCKI: IMAGES AND CONVENTIONS IN THE GAME AND ART

immediately made to leave again. The character continues his


pattern as we witness his repeated entrance into the same location
and his repeated exit by threat.
With the hero as its focus, Parallel IV grows jocular through
repetition and through the humanization of its figures. The sharp
movements shows the hero’s non-human aspect, yet the voices
of other characters – such as the scream of a woman with whom
he tries to relate – point in another direction. The scream directs
itself at a hard figure that barely moves as it comes near the woman
several times. The figure breaks with socially practiced limits of
distance and approximation without touching her a single time in a
kind of mise-en-abyme. This part of the film, this piece of the game, is
melancholic. Actions repeat and repeat themselves and bring about
the same results. A man is also approached by a non-threatening
doll. Catatonic, it repeats what it has not learned – it walks in circles.
The narrative structure of alternating action-situation-action
or situation-action-situation16, consecrated by American cinema
and in use today throughout diverse filmmaking scenes, shows
action without situation. Actions without meaning, without
consequences, without development or context proceed in
looping, as in the situation of a game module. It is a preparatory
situation for an action, but without a before or an after. Time

16 The formula S-A-S (from situation to a situation changed by


action) by Noël Burch is called the “large form”, and it brings up an
actualization of potencies. About the small and the large form see G.
Deleuze, The Movement-Image, p. 178-220.

215
216

disappears in the face of the eternal present of a doomed situation,


and in this way it continues, without violence, without meetings,
without alternatives, until finally reaching an eternal and empty
preparation. The two characters are imprisoned without becoming.
The woman only screams because of the man’s approximation,
mere approximation, and her action is performed as a social
gesture. Circling the woman, or the man, the animated game
doll returns, she screams, the man remains impassible and the
cap returns. The repetition changes and clears the looping, the
situations and actions proceed without any type of facial expression
or physical reaction. Farocki begins with few elements in order
to combine and recombine them. From this arrangement, what
stand out are social and narrative structures; conventions in
gaming, life, and art history; a relation with the absurd; and, finally,
the conventions of social life and of representations in art and in
considerations of it.

(ao lado)
IMAGEM 4
EM DIREÇÃO À
FALTA DE GRAVIDADE.
PARALELO II

IMAGEM 5
FORA DA ÁREA
DE SEGURANÇA.
PARALELO II

HARUN FAROCKI : PROGRAMANDO O VISÍVEL


FAROCKI: IMAGES AND CONVENTIONS IN THE GAME AND ART

217
218

(pág anterior)
IMAGEM 1
MISTERY HOUSE, 1980.
PARALELO 1

IMAGEM 2
A CIÊNCIA DA COMPUTAÇÃO.
PARALELO I.

IMAGENS 3
A CRIAÇÃO DE ÁGUA.
PARALELO I

HARUN FAROCKI : PROGRAMANDO O VISÍVEL


FAROCKI: IMAGES AND CONVENTIONS IN THE GAME AND ART

BIBLIOGRAPHY

ADORNO, Theodor W. O ensaio como forma. Notas de


literatura 1. Tradução: Jorge de Almeida. SP: Duas Cidades,
2003.
DELEUZE, Gilles. A imagem-movimento. São Paulo:
Brasiliense, 1985.
ELSAESSER, Thomas; ALBERRO, Alexander. Farocki: A
Frame For No Longer Visible: Thomas Elsaesser in Conver-
sation With Alexander Alberro. E-Flux, n. 59, nov. 2014.
Special edition dedicated to Farocki. <http://www.e-flux.
com/announcements/issue-59-harun-farocki-out-now/>.
Accesed on: 28 out. 2016.
ELSAESSER, Thomas. Harun Farocki: Cineasta, artista e
teórico da mídia. In: BORGES, Cristian; MOURÃO, Patrí-
cia; MOURÃO, Maria Dora (orgs.). Harun Farocki: Por
uma politização do olhar. São Paulo: Cinemateca Brasilei-
ra, 2010. < http://cinemateca.gov.br/farocki/catalogo.php>.
Accessed on: 21 nov. 2016.
______. (ed.). Harun Farocki, Working on the Sightlines.
Amsterdam: Amsterdam University Press, 2004.
FAROCKI, Harun. Trailers escritos. In: BORGES, Cristian;
MOURÃO, Patrícia; MOURÃO, Maria Dora (org.). Harun
Farocki: Por uma politização do olhar. São Paulo: Cin-
emateca Brasileira, 2010.
FLUSSER, Vilém. Palavras-chave, imagens-chave: Diálogo
de Harun Farocki com Vilém Flusser. In: YOEL, Gerardo
(org.). Pensar o cinema: Imagem, ética e filosofia. São
Paulo: CosacNaify, 2015.
GALLOWAY, Alexander. Gaming: Essays on Algorithmic
Culture. Minneapolis: University of Minnesota Press, 2006.
______. Protocol: How Control Exists After Decentral-
ization. Cambridge: MIT Press, 2004.
GALLOWAY, Alexander; TRACKER, Eugene. The Exploit:
A Theory of Networks. Minneapolis: University of Min-
nesota Press, 2007.
LOWOOD, Henry. A tecnologia encontrada: Jogadores
como inovadores na produção de Machinima. In: MORAN,
Patricia; PATROCÍNIO, Janaina (orgs.) Machinima. São
Paulo: Pró-Reitoria de Cultura e Extensão da USP, 2011.
MACHADO, Arlindo. O filme-ensaio. Intermídias, n. 5/6,
2006. <www.intermidias.com/miolo/cinema_home.htm>.
NITSCHE, Michael. Reivindicando seu espaço: Machinima.
In: MORAN, Patrícia; JANAINA, Patrocínio (org.). Ma-
chinima. São Paulo: Pró-Reitoria de Cultura e Extensão da
USP, 2011.
PATROCÍNIO, Janaina. A questão não é “O que é ma-
chinima?” mas “Por que machinima? In: MORAN, Patricia;
PATROCÍNIO, Janaina (orgs.). Machinima. São Paulo:
Pró-Reitoria de Cultura e Extensão da USP, 2011.

219
220

HARUN FAROCKI : PROGRAMANDO O VISÍVEL


SOBRE UMA POSSÍVEL FOTOGENIA NOS VIDEOGAMES

SOBRE UMA
POSSÍVEL
FOTOGENIA NOS
VIDEOGAMES:
A PROPÓSITO
DE PARALLEL
I-IV (2012-2014),
DE HARUN
FAROCKI
ALFREDO SUPPIA
221
222

O poder emocional dos videogames baseia-


se em larga medida no poder inerente ao
computador de sustentar um mundo simulado
e um ambiente meditativo.1

Em “A consciência liberada de Harun Farocki”, David Rodowick revisita


as três obras mais famosas de Farocki, apresentando-as como pontos de
inflexão fundamentais na análise do poder e originalidade da ética liberta-
dora do ver inscrita na carreira do artista alemão de origem tcheca. Rodo-
wick refere-se a O fogo inextinguível (1969), Imagens do mundo e inscrições da
guerra (1989) e Jogos sérios (2010). Após percorrer em comentários as três
obras, Rodowick finalmente observa que:

Da fotografia à simulação digital, Farocki mos-


tra como a ação espacial da imagem sofreu uma
mudança radical. As fotografias de bombardeios
automatizados da Segunda Guerra Mundial bus-
cam preservar o registro da destruição passada
num dilúvio de imagens singulares – instantâ-
neos em tempo sequencial, como um filme -, em
que toda informação que a imagem pode revelar
está totalmente presente nela. O futuro da ima-
gem é o da descoberta de novos tipos de inteli-
gibilidade, que permanecem dormentes até que
novas vontades de conhecimento e novos en-
quadramentos de referência avancem com seus

1 S. Turkle, Video Games and Computer Holding Power, em N. Wardrip-Fruin; N. Montfort (eds.), The New Media
Reader, p. 511: “The emotional power of videogames draws heavily on the computer power within that supports a
simulated world and a medidative environment”. Todas as traduções do inglês e do francês são minhas.

HARUN FAROCKI : PROGRAMANDO O VISÍVEL


SOBRE UMA POSSÍVEL FOTOGENIA NOS VIDEOGAMES

dados. A transição do registro fotográfico para a


modelagem 3D em tempo real digital transforma
e amplifica o que está em jogo na história.2

Ainda segundo Rodowick, “Em cada uma de suas obras, Farocki nos
pergunta novamente: ‘o que é uma imagem?’ ou, melhor, ‘o que é a imagem
humana?’ [...]. [N]os pede para reconsiderar como cada imagem provoca
tanto a inteligência quanto a ética do ver”3. Se a simulação se comporta
como um tema-chave ou tutorial em Imagens do mundo e inscrições da
guerra, e mesmo em O fogo inextinguível, em Jogos sérios Farocki passa
a escrutinar mais detidamente a simulação digital, computadorizada.
Videoinstalação dividida em quatro partes ou “capítulos”, Jogos sérios
baseia-se em material coletado em centros de treinamento militar em
Twentynine Palms, na Califórnia, em uma instituição de atendimento a
soldados com estresse pós-traumático. A terapia compreende a exposição
desses soldados a recriações de situação de trauma de guerra em simula-
ções de realidade virtual. À exceção de Jogos sérios II: Três mortos, todos os
demais capítulos da série são constituídos por imagens contíguas, numa
interface em que Farocki procede a um cotejo entre registros documentá-
rios (videográficos) de ex-soldados submetidos à terapia contra estresse
pós-traumático e imagens digitais interativas. Rodowick salienta que “[d]
e fato, a questão-chave aqui é entender a simulação como uma variante
central na filosofia da imagem de Farocki, e como a expansão da sua escri-
tura audiovisual por meio da montagem recombinatória”4. O experimento
ético e estético procedido por Farocki em 2010 com Jogos sérios continua
e se expande numa obra posterior do cineasta, ausente do arco de análise

2 D.N. Rodowick, A consciência liberada de Harun Farocki, em G.A. Sobrinho (org.), Cinemas em redes, p. 77.
3 Ibidem, p. 69.
4 Ibidem, p. 75.

223
224

proposto por Rodowick. Trata-se da série Paralelo I-IV (2012-2014), um


dos últimos trabalhos do artista e ainda pouco conhecido no Brasil, trazi-
do pela primeira vez ao país pela curadora Jane de Almeida na exposição
Programando o visível: Harun Farocki, que ficou aberta de 28 de janeiro a 27
de março no Paço das Artes, em São Paulo.
Paralelo I-IV (2012-2014), de Harun Farocki, pode ser compreendido
como um filme-ensaio5 em quatro episódios, voltado a um aspecto que
tem me chamado a atenção há quase sete anos, quando ouvi falar pela pri-
meira vez do jogo Heavy Rain (Quantic Dream; Sony Computer Entertain-
ment, 2010), lançado para Playstation 3. Exemplo de artefato plantado
numa área limítrofe entre os domínios do videogame e do cinema, Heavy
Rain funcionava como um filme interativo, no qual o jogador assume os
papéis de personagens envolvidas num drama policial. Heavy Rain, por sua
vez, fazia-me lembrar de Hell, A Cyberpunk Thriller (Take-Two Interactive
Software; Game Tek, 1994), jogo de aventura dos tipos RPG (role-playing
game) e “point-and-click” para PC. Hell ganhou fama por ter sido um dos
primeiros games unicamente em CD-ROM a usar diálogos e gráficos em
alta resolução, similarmente a outro título de sua época, BloodNet (Micro-
prose, 1993) – este um videogame de estilo cyberpunk role-playing. Tam-
bém como num filme interativo, o jogador de Hell devia investigar uma
trama policial futurística, explorando um espaço virtual em que precisava
agir e travar conversações com personagens “digitalmente encarnadas”
por atores como Dennis Hopper, Grace Jones, Stephanie Seymour e Geof-
frey Holder. Seymour e Holder apareciam em imagens do tipo live action

5 Classificar uma obra de Farocki é quase sempre uma tarefa ingrata e problemática. Aqui pretendo assumir
uma provável dimensão ensaística do cinema de Farocki, à revelia de problematizações mais detidas como a
de D.N. Rodowick, para quem “Farocki observou, relatou, criticou, e analisou e desconstruiu, por vezes, com a
própria voz e, por outras, estrategicamente utilizando voz alheia numa relação indireta livre. É tentador dizer
que Farocki trabalhou com o gênero do filme-ensaio, embora essa categoria possa ser muito restrita e vaga para
conter a amplitude inventiva de suas obras em imagem em movimento, nem mesmo elas podem ser diretamente
consideradas documentários em qualquer sentido restritivo”, Ver Ibidem, p. 69.

HARUN FAROCKI : PROGRAMANDO O VISÍVEL


SOBRE UMA POSSÍVEL FOTOGENIA NOS VIDEOGAMES

no jogo, enquanto os demais atores, como Dennis Hopper e Grace Jones,


emprestavam suas vozes a seus avatares. A trama de Hell era ambientada
num futuro distópico, em 2095, quando os EUA estão sob domínio de uma
teocracia fascista chamada “Hand of God” (Mão de Deus), a qual é capaz
de literalmente enviar para o inferno criminosos e insurgentes. Alguns
destes, porém, conseguem retornar para contar sua história.
Em Hell vi, pela primeira vez, a entrada de atores profissionais de cine-
ma no mercado dos videogames, cuja crescente complexidade narrativa,
então muito inspirada na própria tradição do roteiro hollywoodiano, já
remontava a antecedentes como o esquemático Adventure, considerado
o primeiro videogame de ação-aventura, criado por Warren Robinett e
lançado comercialmente em 1979 para o console Atari 2600. Adventure
consistiu numa versão com gráficos 2D do Adventure original de Wil-
liam Crowther, Colossal Cave Adventure (1975-1976) – por sua vez, uma
adaptação de RPGs populares, como Dungeons & Dragons, para ambiente
computacional. Adventure também permitia que o herói pudesse usar
um conjunto de itens, o que levava o jogador a escolher qual iria utilizar a
cada momento por meio apenas de seu joystick. Poderia abandonar um e
apoderar-se de outro sem precisar inserir nenhum comando – a coleta de
itens pelo jogador já existia em Colossal Cave Adventure, mas tornava-se
agora mais intuitiva. Àquela época, a Atari não creditava seus designers/
programadores, e Adventure foi o primeiro game a ter um “ovo de páscoa”6
bem conhecido – no caso, uma sala (ambiente do jogo) onde se podia ler
“Created by Warren Robinett”. Não surpreende que um livro como Game
Writing: Narrative Skills for Videogames, organizado por Chris Bateman e
voltado ao ensino da criação de games (game design), traga tantas referên-
cias dos estudos de cinema, sobretudo em seus três primeiros capítulos.

6 No jargão da informática, um “ovo de páscoa” ou easter egg, em inglês, como é mais conhecido, é qualquer item
oculto passível de ser encontrado em qualquer tipo de sistema virtual, incluindo músicas, filmes, videogames, etc.

225
226

Com base nele, poderíamos dizer que uma nascente “teoria” do roteiro
para videogames nada mais é do que uma adaptação de uma certa “teoria”7
do roteiro para cinema.8
Heavy Rain, Hell e Adventure, entre outros títulos, deixaram-me curioso,
ao menos desde 2009, a respeito de uma possível história paralela – ou jus-
taposta – do cinema e dos videogames. Minha hipótese é a de que há muitos
pontos em comum entre a história do estilo cinematográfico e a história do
estilo dos videogames, e mesmo os pontos mais divergentes me parecem
igualmente instigantes e significativos. Como se a história dos videogames
repetisse, em vários momentos, a história do cinema, ora como farsa, ora
como tragédia, por vezes avançando em fast forward, por outras a contrape-
lo ou em reverso. Creio que tal hipótese ou ideia esteja longe de ser nova ou
original, pois vem informando o trabalho de uma variedade de autores, ora
mais, ora menos explicitamente, como em Manovich9, Jenkins10, Wardrip-
-Fruin e Montfort11, Manovich e Kratky12, Bateman13, Wardrip-Fruin e Har-
rigan14, Harrigan e Wardrip-Fruin15, ou Stanton16.
Da mesma forma que se costuma escrutinar a história do cinema
(entenda-se aqui, sobretudo, uma história do estilo cinematográfico), a
partir de uma compartimentação em movimentos, escolas e períodos (e.g.
cinema clássico e cinema moderno), bem como em “autores”, suponho
que o mesmo possa ser feito em relação a uma história dos videogames. Por

7 Entre aspas, porque talvez esses conjuntos de saberes não cheguem a tanto.
8 Teoria do roteiro para o cinema, por sua vez substancialmente tributária da literatura e da dramaturgia.
9 L. Manovich, The Language of New Media; e L. Manovich, What is Digital Cinema? em P. Lunenfeld (ed.), The Digital
Dialectic.
10 H. Jenkins, Game Design as Narrative Architecture, em N. Wardrip-Fruin; N. Montfort (eds.), The New Media
Reader.
11 N. Wardrip-Fruin; N. Montfort (eds.), The New Media Reader.
12 L. Manovich; A. Kratky, Soft Cinema.
13 C. Bateman (ed.), Game Writing.
14 N. Wardrip-Fruin; P. Harrigan, First Person.
15 P. Harrigan; N. Wardrip-Fruin, Second Person; P. Harrigan; N. Wardrip-Fruin, Third Person.
16 R. Stanton, A Brief History of Video Games.

HARUN FAROCKI : PROGRAMANDO O VISÍVEL


SOBRE UMA POSSÍVEL FOTOGENIA NOS VIDEOGAMES

exemplo, no que diz respeito a abordagens da noção de autor, lembremos


de séries de sucesso na indústria dos jogos, como Metal Gear Solid, de Hideo
Kojima, conforme apontado por Stanton17. Também na história dos video-
games talvez pudéssemos identificar um período clássico; outro, moderno;
e ainda, um pós-moderno, muito embora nenhum deles signifique o mes-
mo que para a história do cinema, e tampouco esteja confinado às mesmas
balizas cronológicas. Análogos, porém não idênticos. Justaposta (ou em
comparação) a uma história do cinema, a “modernidade” nos videoga-
mes pode mesmo ter aparecido antes de seu próprio “classicismo”; o que
poderíamos entender por “clássico” nos games, segundo um paradigma
cinemático, pode ter surgido depois, e assim por diante. Enfim, hipóteses
que partilho aqui. Talvez, a história dos videogames esteja para a história
do cinema assim como esta está para as demais artes que antecederam o
advento da imagem em movimento, refiro-me, por exemplo, à literatura,
ao teatro e, sobretudo, à pintura. Apesar disso, sob uma certa perspectiva,
provavelmente também não faça sentido, hoje, separar o cinema do video-
game, sendo ambos artefatos ou manifestações de um macrodomínio que
poderíamos chamar de audiovisual expandido, de artes cinemáticas, ou
simplesmente sons e imagens em movimento. De toda maneira, acredito
que ainda se revele frutífera uma investigação mais detida e aprofunda-
da da história dos videogames em paralelo à história do cinema, mesmo
que seja para se finalmente superar tal comparação. Henry Jenkins, por
exemplo, já observou que a aplicação da teoria do cinema aos games pode
ser demasiado grosseira, geralmente fracassando no reconhecimento das
diferenças mais profundas entre essas duas mídias18. O paralelo história do
cinema – história dos videogames é forçado, sem dúvida, tendo em vista
todo o período que antecede a revolução informática. Contudo, também é

17 Ibidem, p. 277.
18 H. Jenkins, op. cit., p. 119.

227
228

justificado, entre outros aspectos, pelo fato de que a indústria dos games
incorporou amplamente a tradição da linguagem cinematográfica em seus
produtos, bem como muito do sistema de produção da indústria audiovi-
sual. Há pelo menos trinta anos, muitos dos lançamentos cinematográficos
são seguidos de lançamentos no mercado de games, e vice-versa, ou então
ambos os produtos (o filme e o game) são pensados em concerto. É justa-
mente um esforço mais detido de investigação do paralelo cinema-video-
game que Harun Farocki faz em Paralelo I-IV. Na verdade, uma investigação
que justapõe, a partir da história dos videogames, as histórias do cinema e
da pintura, com uma finalidade última de melhor compreender o fascínio
exercido pelos videogames nas artes, cultura e comportamento contempo-
râneos. Como se Farocki, intuitivamente ou não, investigasse cinematica-
mente a proposta de Jenkins, para quem a espacialidade se apresenta como
fator-chave para um novo entendimento das relações entre videogames e
narrativas (e, por extensão, videogames e cinema), baseado na concepção
de que os game designers talvez sejam menos contadores de histórias do
que “arquitetos narrativos” (narrative architects)19. Numa tentativa de re-
conciliar duas frentes teóricas – a dos ludologistas, cujo foco recai sobre
a mecânica do ato de jogar, e a dos narratologistas, os quais se interessam
pelo estudo dos videogames no contexto mais amplo das mídias narrati-
vas20 –, Henry Jenkins propõe uma abordagem limítrofe, entre os territó-
rios da ludologia e da narratologia, respeitando as particularidades dos
videogames, e examinando-os menos como meras histórias e mais como
espaços plenos de possibilidades narrativas21.
Como bem lembra Sherry Turkle, por volta de 1982 as pessoas (no
caso, a classe média americana) já gastavam mais dinheiro em videogames

19 Ibidem, p. 121.
20 Ibidem, p. 118.
21 Ibidem, p. 119.

HARUN FAROCKI : PROGRAMANDO O VISÍVEL


SOBRE UMA POSSÍVEL FOTOGENIA NOS VIDEOGAMES

do que em cinema e música somados22. Em 1983, o computador já estava


tão entronizado na vida contemporânea que a revista Time estampou-o
em sua capa, no lugar de destaque habitual para o homem ou para a mu-
lher do ano23. Em larga medida, a obra Paralelo I-IV de Farocki é também
informada pelo poder de atração (holding power) dos computadores, con-
forme proposto por Turkle:

Os videogames são uma janela para uma nova


forma de intimidade com máquinas, que é carac-
terística da nascente cultura do computador. A
relação especial que jogadores estabelecem com
os videogames tem elementos em comum com
a interação com outros tipos de computadores.
O poder de atração dos videogames, sua fasci-
nação quase hipnótica, é o poder de atração dos
computadores [computer holding power]. […] No
coração da cultura do computador está a ideia de
mundos construídos, “governados por regras”
[rule-governed].24

Turkle observa também que os videogames oferecem ainda uma


outra promessa, atrelada à própria presença do computador, e para
além dos “mundos construídos e estritamente governados por regras”:
“[e]sta é a promessa da perfeição”25. A “promessa da perfeição” me
parece outro ponto crucial no horizonte das reflexões engendradas
por Paralelo I-IV.

22 S. Turkle, op. cit., p. 500.


23 Ibidem.
24 Ibidem, p. 501.
25 Ibidem, p. 511.

229
230

Em Paralelo I, Farocki investiga o universo dos videogames a propósito


de uma dada iconografia típica, a rigor símbolos concernentes aos quatro
elementos: terra, fogo, água e ar. Paralelo I começa dissertando sobre a re-
presentação das árvores nos videogames (0’0” – 4’55”), em seguida passa à
representação do fogo (4’56” – 6’39”), da água (6’40” – 10’46”), e finalmen-
te do ar (10’47” – 15’46”). Em resumo, uma investigação elemental da na-
tureza nesse universo digital dos jogos para computador, ou simplesmen-
te na computação gráfica contemporânea, sob o ponto de vista (implícito)
de um cineasta ou artista cinemático.
Paralelo II parece começar inspirado pela filosofia de Schopenhauer.
Conforme colocado pela narração (na voz de Cynthia Beatt): “O mundo
existe se não estou observando-o?” (00’08” – 00’12”). Schopenhauer su-
geriu a ociosidade de tal indagação, a qual habita o mais corriqueiro temor
humano da morte:

O terror da morte depende, em grande parte,


da falsa aparência de que, neste instante, o Eu
desaparece e o mundo permanece. Mas é antes
o contrário que é verdadeiro: o mundo desapa-
rece, enquanto o núcleo mais íntimo do Eu, o
sustentáculo e produtor de cada sujeito, em cuja
representação somente o mundo possuía sua
existência, permanece. Com o cérebro sucum-
be o intelecto e, com este, o mundo objetivo, sua
mera representação. Que em outros cérebros,
depois como antes, um mundo semelhante pai-
re e viva, é indiferente no que tange ao intelecto
que sucumbe.26

26 A. Schopenhauer, The World As Will And Idea, v. 3, p. 289-290.

HARUN FAROCKI : PROGRAMANDO O VISÍVEL


SOBRE UMA POSSÍVEL FOTOGENIA NOS VIDEOGAMES

Os videogames, sugere Paralelo II, evocam a perspectiva de uma crian-


ça numa viagem de trem ou de carro: “Tudo que vejo passar foi posto ali só
para mim” (00’30” – 00’34”). “Tudo aparece do nada e depois desaparece
novamente no vazio” (00’35” – 00’41”), comenta a narração. Logo em
seguida vem à tona o problema das fronteiras – fronteiras do mundo, da
percepção, da realidade –, inseparável da indagação precedente, sobre se
o mundo existe caso não o estejamos observando. O caubói de Red Dead
Redemption (Rockstar, 2010), galopando em velocidade por uma paisa-
gem do oeste americano, enseja a pergunta seguinte da narradora: “Onde
acaba este mundo?” (01’19” – 01’20”). Ao que ela mesmo responde: “Este
mundo parece infinito. Um mundo gerado pelo olhar de quem o observa”
(01’30” – 01’36”). Paralelo II enceta uma reflexão debruçada sobre a pre-
sença e suas fronteiras. Podemos então conjeturar que os videogames,
sob a perspectiva de Paralelo II, oferecem portanto uma segunda versão
para o “experimento metafísico” proposto por Schopenhauer27, bastando
para isso que troquemos a palavra “mundo”, na formulação do filósofo,
por “jogo” – algo como se tentássemos supor o universo do jogo sem nos-
sa própria presença: “A saber, tentemos de maneira vivaz presentificar o
tempo, por certo não muito distante, em que estaremos mortos. Abstraia-
mos, então, a nós mesmos do [ jogo] mundo e deixemos que ele subsista e
logo descobriremos, para nossa surpresa, que ainda estamos lá”28.
E, mais adiante, quando Schopenhauer afirma:

– Mas se partirmos do princípio de que a diferen-


ça entre o exterior a mim e o em-mim, enquanto
espacial, reside apenas no fenômeno, não na coi-
sa-em-si, e que, portanto, não é em absoluto real,

27 Ibidem, p. 272.
28 Ibidem.

231
232

então veremos na perda da própria individuali-


dade apenas a perda de um fenômeno, portanto
apenas uma perda aparente. Por mais realidade
que tenha aquela diferença na consciência empí-
rica, ainda assim, do ponto de vista metafísico, as
sentenças: “Eu sucumbo, mas o mundo perdura”
e “O mundo sucumbe, mas eu perduro” no fundo
não são propriamente diversas.29

Paralelo II poderia assim sugerir, para além de “jogo, logo existo” (paródia
do cogito ergo sum cartesiano), algo como “o mundo existe porque eu o jogo”.
Por sua vez, Paralelo III é um filme sobre cartografias virtuais/digitais.
Ele expande as questões levantadas nos episódios I e II, concentrando-se
sobre a “pele” dos objetos. André Bazin já se referiu a Jean Renoir como o
“maior diretor francês”, um cineasta cuja câmera seria capaz de “tocar” a
“pele das coisas”: “Mil exemplos poderiam ilustrar esta maravilhosa sen-
sibilidade à realidade física e tátil do objeto e de seu meio; os filmes de Re-
noir são feitos com a pele das coisas. Donde acontece que sua encenação
seja tantas vezes uma carícia”30. Em Paralelo III, Farocki investiga o que há
por baixo da “pele” dos objetos que habitam a mise-en-scène dos videoga-
mes - e não encontra senão o vazio. As “câmeras” dos videogames (desne-
cessário dizer que não há câmera alguma no sentido tradicional do termo)
penetram os objetos para demonstrar que, se por fora um pedestal de
granito parece sólido e pesado, resistente aos tiros de uma metralhadora,
por dentro se comporta como um cubo transparente, leve, diáfano, sem
substância senão aquela que demarca as linhas retas de seus contornos.
O mar é novamente citado como apenas uma superfície, como um tecido

29 Ibidem, p. 298.
30 A. Bazin, O realismo impossível, p. 110.

HARUN FAROCKI : PROGRAMANDO O VISÍVEL


SOBRE UMA POSSÍVEL FOTOGENIA NOS VIDEOGAMES

ou papel celofane que tremula sobre o nada. O mesmo se aplica ao solo,


por baixo do qual não há qualquer representação de terra. Os videogames
seriam portanto uma arte dos contornos e superfícies, uma replicação das
cidades cenográficas dos filmes de faroeste de baixo orçamento?
Em Paralelo IV, Farocki investiga a interatividade como simulacro do
livre arbítrio. Seu foco recai sobre personagens de games como Assassin’s
Creed (Ubisoft, 2013), Grand Theft Auto IV (Rockstar, 2008) e Grand Theft
Auto V (Rockstar, 2013), ou L.A. Noire (Rockstar, 2011). Conforme bem ob-
serva Stanton: “nos videogames os jogadores têm de seguir um caminho que
foi projetado por desenvolvedores. Qualquer ilusão de escolha é exatamente
isso”31. Partindo tacitamente dessa premissa, e analisando videogames nota-
bilizados por sua “ilusão de livre-arbítrio”, a narração de Paralelo IV começa
por dizer que “O herói é largado no seu mundo (00’11” – 00’15”). “O herói
não possui pais ou professores” (00’42” – 00’46”). “Ele tem de aprender
sozinho quais regras são válidas” (00’47” – 00’50”). De certa maneira, a obra
de Farocki ilustra com propriedade o pensamento de Turkle acerca dos pro-
cessos de identificação provocados pelos videogames, bem como das even-
tuais relações entre o autor (do jogo em questão) e o jogador implícitos:

Quando você joga um videogame você entra no


mundo dos programadores que o criaram. Você
deve fazer mais que se identificar com uma per-
sonagem na tela. Você deve agir por isso. A iden-
tificação por meio da ação tem um modo especial
de atrair. Como praticando um esporte, ela colo-
ca as pessoas num estado mental de alta tensão,
extremamente focado.32

31 R. Stanton, op. cit., p. 283.


32 S. Turkle, op. cit., p. 509.

233
234

Nesse sentido, Paralelo IV vai investigar uma série de ações possíveis:


“empurrando/esbarrando”, “protesto/pedido de ajuda”, “assistência”, ou
“sacando uma arma”. Sob uma perspectiva semi-hobbesiana, a cada ação
do herói-personagem cabe uma reação dos coadjuvantes. Porém, a varie-
dade e amplitude dessas reações do mundo às ações do herói dependem,
como sempre na história dos videogames, da potência do hardware e do
software, ou da complexidade do algoritmo. Em suas maiores ou menores
limitações, o algoritmo termina por reinserir a dimensão trágica no jogo.
Como a personagem da lojista de Grande Theft Auto, citada em Paralelo IV,
que não consegue deixar definitivamente sua loja diante do herói que lhe
aponta uma arma: “A vendedora tem uma memória curta. [...] Se ela for
ameaçada ela deve sair da loja. Quando ela estiver do lado de fora, ela tem
de voltar à loja novamente. Essa constelação trágica revela ao herói as li-
mitações da liberdade de ação do ser humano” (07’40” – 09’04”).
Em função do espaço aqui disponível e da amplitude das indagações
provocadas por Paralelo I-IV, a seguir tentarei deter-me em especial sobre
um pequeno aspecto: a obra de Farocki como possível investigação acerca
de uma eventual “fotogenia” nos videogames. Fotogenia aqui compreen-
dida nos termos de Jean Epstein33. Sarah Keller explica que a

Fotogenia, que para Epstein ocorre em breves


flashes, significa a qualidade que a filmagem de
um objeto confere a esse mesmo objeto, uma
qualidade particularmente fotográfica (com to-
dos os seus efeitos) e cinemática (em virtude de
sua natureza móvel) que nos permite ver tal ob-
jeto sob nova luz.34

33 J. Epstein, Écrits sur le cinéma: 1921-1953.


34 S. Keller, Introduction, em S. Keller; J.N. Paul (eds.), Jean Epstein: Critical Essays and New Translations, p. 25.

HARUN FAROCKI : PROGRAMANDO O VISÍVEL


SOBRE UMA POSSÍVEL FOTOGENIA NOS VIDEOGAMES

Quando Turkle observou, em 1984, que “[n]ovas gerações de gráficos


computacionais permitirão às personagens dos games ter gestos e expres-
sões faciais mais realistas”35, a autora já previa o avanço da fotogenia como
categoria fundamental na estética dos videogames. Nesse sentido, preten-
do aproximar o pensamento de Epstein sobre o cinema das reflexões de
Farocki acerca dos videogames, utilizando como liame o próprio conceito
de fotogenia, guardadas as devidas proporções e adaptações concernentes
à própria transposição de um conceito inicialmente fotográfico/cinema-
tográfico para o contexto das mídias digitais, notadamente o dos videoga-
mes ou imagens de síntese.

POR UMA FOTOGENIA NOS VIDEOGAMES?


A PROPÓSITO DE PARALELO I DE FAROCKI
Paralelo I começa tratando de Mistery House (Sierra Entertainment,
1980), o primeiro jogo de aventura baseado em texto acompanhado de
imagens. Projetado por Ken e Roberta Williams, Mistery House foi inspi-
rado no Colossal Cave Adventure de William Crowther36. Aqui, Farocki se
concentra num detalhe de Mistery House, a representação de uma árvore
sem função no jogo, que aparece estática ao lado da representação de
uma casa, o principal espaço diegético a ser adentrado pelo jogador. A
propósito da árvore em Mistery House, Farocki avança com a investigação
das representações de árvores numa variedade de videogames, em linha
cronológica. Em seguida a Mistery House, uma imagem de Pitfall (1982)
passa a ilustrar a argumentação. Neste game para a plataforma Atari, as
árvores se restringem ao segundo plano, estáticas, e são suas pequenas
variações de posicionamento e disposição que iludem o jogador, sugerin-
do que a personagem se move dentro de uma extensa floresta repleta de

35 S. Turkle, op. cit., p. 506.


36 R. Stanton, op. cit., p. 65.

235
236

perigos. Os veios dos troncos e alguma nuance em termos de luz e sombra


sobre a copa das árvores só aparecerão dois anos depois, pela primeira
vez e de forma ainda muito rudimentar, em King’s Quest (Sierra Entertain-
ment, 1984). Paralelo I avança demonstrando que em The Legend of Zelda
(Nintendo, 1986), árvores quadriculadas e com sombreamento mais pro-
nunciado se multiplicam na tela, enquanto em Archipelagos (Prism/Astral
Software, 1989), talvez pela primeira vez as árvores ganhem uma função
no jogo, para além de mero ornamento ou pano de fundo.
Não obstante, ao contrário do que Paralelo I parece sugerir, desde ao
menos Pitfall as árvores em videogames teriam uma função menos óbvia
do que a mera decoração: são elas que, de fato, ratificam o movimento das
personagens, são elas que chancelam o progresso do jogador ao longo de
um território virtual, diegético. Em sua imobilidade, são as árvores que,
alternando-se ou multiplicando-se com diminutas variações de formato e
posicionamento na tela do game, sugerem um “território em exploração”
para além do quadrilátero bidimensional do monitor eletrônico. Nada
trivial nessa função: sem elas, as árvores (leia-se aqui “representações digi-
tais de árvores”), os videogames talvez nunca tivessem avançado além de
Space War, o primeiro jogo para computador, criado pelo MIT no começo
da década de 1960, ou mesmo Pong (Atari, 1972), o primeiro videogame
lucrativo da história, criado por Nolan Bushnell37. De toda maneira, Paralelo
I prossegue demonstrando que, na década de 1990, o vento (virtual) ensaia
balançar as folhas em Secret of Mana (Square Co., 1993), enquanto em The
Elder Scrolls: Arena (Bethesda Softworks, 1994), a água do rio corre ao lado
de uma árvore estática, porém soberba em suas sombras e texturas. Em
Anno 1602 (Sunflowers Interactive, 1998), as árvores se multiplicam com

37 Entusiasta de Space War e ex-aluno do MIT, Bushnell fundou a Atari para comercializar Pong, primeiro game
possível de ser jogado em ambiente doméstico, e não num laboratório de computação (como Space War), graças a
um aparelho muito menor que uma máquina de pinball.

HARUN FAROCKI : PROGRAMANDO O VISÍVEL


SOBRE UMA POSSÍVEL FOTOGENIA NOS VIDEOGAMES

variações mais significativas de cor, sombra e formato, graças à repetição


e a configurações variadas de agrupamento de um número limitadíssimo
de modelos, algo que poderíamos chamar de uma recursividade análoga
à recursividade linguística. Apenas os animais se movem, as árvores con-
tinuam estáticas. Mas finalmente em Anno 1701 (Blue Byte Mainz/Sunflo-
wers Interactive, 2006), a árvore ganha movimento. Segundo a narração
de Paralelo I: “Desta vez as folhas balançam levemente ao vento. Pássaros
atravessam a imagem, alguns deles apenas como sombras” (2’14” – 2’24”).
A atenção ao detalhe da “árvore digital”, de Mistery House a Anno 1701, é par-
ticularmente curiosa se lembrarmos do que George Méliès teria dito sobre
a árvore ao fundo em Le repas de bébé (O lanche do bebê, 1895), o pequeno e
famoso filme dos irmãos Lumière: “au cinéma, les feuilles bougent” (no
cinema, as folhas balançam). Ismail Xavier explica que, para Méliès:

o encanto do que se projetava na tela não estava


no seu centro, em que se registrava a cena fami-
liar, mas no seu fundo, lá atrás, onde a imagem
em movimento tornava visível justamente algo
fugaz, o movimento das folhas que, até então,
não era possível ver na experiência teatral em
que o chamado “pano de fundo” trazia um dese-
nho, uma pintura, enfim uma imagem fixa, evo-
cadora de um ambiente, mas não o sentimento
vivo de sua presença e movimento38.

Xavier explica que a frase de Méliès ainda hoje induz à pergunta: afinal,
o que é mesmo o cinema? Seria a cena da família burguesa ao redor de sua

38 I. Xavier, Maquinações do olhar: A cinefilia como ver além na imanência, em A.S. Médola; D. Araújo; F. Bruno
(orgs.), Livro da XV Compós, p. 24.

237
238

mesa? Ou seria a captação do movimento das folhas ao vento? O que Xavier


explica a seguir, com base na observação de Méliès a propósito do filme dos ir-
mãos Lumière, poderia valer também para a investigação que Farocki propõe
acerca das representações digitais de árvores, de Mistery House a Anno 1701:

Aqui, a imagem em movimento faz sentir a pre-


sença do instante que não é o centro de um
drama, ponto de inflexão de uma vida, mas um
instante qualquer que ganha interesse em sua
singularidade, justamente porque é efêmero,
não porque seja síntese ou ponto culminante de
um processo, nem porque seja marco inaugu-
ral, nem mesmo porque simbolize um princípio
transcendente.39

A reboque da observação de Méliès, Xavier revisita o termo “fotoge-


nia” em Louis Delluc, mas sobretudo em Jean Epstein, a quem teria cabido
teorizar esse conceito. Xavier continua por explicar que:

A imagem em movimento é vista então como


captação (e recriação) de movimento, e seus me-
lhores efeitos podem vir de situações em que, no
seio de uma evolução contínua das coisas, ocor-
re uma perturbação que destaca um evento, faz
emergir o detalhe que traz a diferença. Objeto,
pessoa ou natureza, tudo já está em movimento
e, dentro deste, produz-se uma imagem singular

39 Ibidem, p. 25.

HARUN FAROCKI : PROGRAMANDO O VISÍVEL


SOBRE UMA POSSÍVEL FOTOGENIA NOS VIDEOGAMES

que desperta a emoção, um conhecimento novo.


Esta é a propriedade do cinema que Luis Delluc
batizou de fotogenia, em 1919: uma inflexão no
movimento que celebra o instante em sua insta-
bilidade, pois nada é, tudo é devir, como nos re-
velam os close-ups de rostos, de gestos furtivos e
de detalhes das coisas. A fotogenia não está ape-
nas no fundo; pode vir ao centro da cena.40

Pergunto-me se todas as observações de Xavier acerca do fascínio


exercido pela captação e reprodução do movimento no cinema não pode-
riam ser transpostas, guardadas as devidas proporções e especificidades,
para o contexto dos videogames. Trocando-se os vocábulos “filme” e
“cinema”, nas passagens acima, pelo vocábulo “videogame”, permanece o
sentido das mesmas observações? Pergunto-me também se a história dos
videogames não reencena uma parte do “percurso” do cinema, o que me
leva a pensar mais detidamente no controverso conceito de fotogenia em
Jean Epstein. Poderíamos investigar uma suposta fotogenia própria dos
videogames, ou simplesmente justapor esse conceito cinematográfico a
uma análise dos videogames? Epstein certa vez sentenciara:

Não diga: o obstáculo e o limite fazem a arte,


manco que cultua sua muleta. O cinema prova
seu erro. Ele por inteiro é movimento, sem obri-
gação de estabilidade ou de equilíbrio. A fotoge-
nia, entre todos os outros logaritmos sensoriais
da realidade, é o da mobilidade.41

40 Ibidem, p. 26.
41 J. Epstein apud J. Aumont, As teorias dos cineastas, p. 92, grifos meus.

239
240

O termo “fotogenia” (que literalmente significa “produção de luz”)


surge pela primeira vez em 1851 para referir-se a objetos que produzem luz
ou, mais precisamente, que refletem suficientemente bem a luz para im-
pressionar a placa fotográfica. Com o aperfeiçoamento da técnica fotográ-
fica e a invenção de emulsões mais eficientes em termos de fotossensibili-
dade, a fotogenia passa a designar, progressivamente, uma certa qualidade
dessa produção de luz por parte de corpos e objetos fotografados. Àquela
altura, entendia-se por fotogênico o objeto, em geral um rosto, que se sai
bem quando fotografado, ou seja, é valorizado pela fotografia que, por sua
vez, revela aspectos inesperados, encantadores e poéticos do objeto, qua-
lidades virtualmente inacessíveis a olho nu42. Na concepção estética das
vanguardas, como em Louis Delluc, mas sobretudo em Jean Epstein: “a fo-
togenia constitui um aumento sensível da realidade pela sua filmagem, que
se pode obter pela câmera lenta, pela iluminação ou pelo grande plano”43.
Especialmente em Epstein, a fotogenia – termo, por essência, abstrato e
nunca definido de forma unívoca, tampouco provado – se confunde com
um “grande mistério” que responde pelo “aumento sensorial e sensível da
realidade através de sua filmagem”44. Jacques Aumont e Michel Marie, por
exemplo, ligam o conceito de fotogenia à concepção ontológica da imagem
fotográfica presente sobretudo no pensamento de Sigfried Kracauer: “que
fala da revelação das ‘coisas normalmente não vistas’ como uma espécie
de essência dessa imagem”45. Em “Bonjour cinéma”, texto de 1921, Epstein
sugere que a fotogenia seria o contrário do literário ou folhetinesco:

Rosto da beleza é um gosto das coisas. Eu o re-


conheço como uma frase musical com ameaças

42 J. Aumont; M. Marie, Dicionário teórico e crítico de cinema, p. 136.


43 M.-Th. Journot, Vocabulário de cinema, p. 74.
44 J. Aumont; M. Marie, op. cit., p. 136.
45 Ibidem.

HARUN FAROCKI : PROGRAMANDO O VISÍVEL


SOBRE UMA POSSÍVEL FOTOGENIA NOS VIDEOGAMES

de sentimentos que o acompanham, específicos.


[...] Nosso olho, exceto por um hábito muito lon-
go, não consegue descobri-lo diretamente. Uma
objetiva centra-o, drena-o e distila a fotogenia
entre seus planos focais. Como a outra, essa vi-
são tem sua ótica.46

Em seus escritos da década de 1930 e do pós-guerra, Epstein passa a


conferir uma dimensão filosófica e psicológica ao termo fotogenia. Au-
mont explica que, segundo a reflexão de Epstein: “[o] cinema revela algo
da interioridade dos sujeitos filmados: isso faz parte da revelação fotogê-
nica (é até o essencial dela)”47. Aumont segue explicando aspectos que me
parecem fundamentais aqui, na perspectiva de um cruzamento com as
reflexões estimuladas por Farocki em Paralelo I-IV. Segundo o estudioso
francês, ainda sobre a fotogenia de Epstein:

O interessante é a crença quase ingênua no ci-


nema como modo de pensar novo, diferente.
Ao lado do modo habitual, fundamentado na
percepção comum, existiria a possibilidade de
um outro modo de pensar, fundamentado na
percepção fílmica, com suas leis e suas virtuali-
dades. Nascido com o século, Epstein não igno-
rou a importância do sonho como pensamento
“outro”. O que, para ele, aproxima o cinema do
sonho é sua oposição comum ao modo habitual
do pensamento, em particular, a reversibilidade,

46 J. Epstein apud J. Aumont, op. cit., p. 91-92.


47 J. Aumont, op. cit., p. 70.

241
242

a plasticidade do tempo, do espaço, da causali-


dade. Essa outra maneira de perceber e pensar o
mundo não é nem menos interessante nem me-
nos pertinente que o modo comum.48

Em sua digressão a propósito do movimento das árvores e das águas em


Paralelo I, bem como ao investigar a “revelação” da natureza dos objetos
em Paralelo II, Farocki sugere, a reboque de um “modo habitual de pensar”
e de “um outro modo de pensar, fundamentado na percepção fílmica, com
suas leis e suas virtualidades”, um terceiro modo de pensar, ainda mais
contemporâneo e igualmente tributário do sonho, formulado agora pelos
videogames. Como se Farocki refizesse o percurso de Epstein uma vez
mais, investigando uma “outra maneira de perceber e pensar o mundo”
que também não é nem menos pertinente, nem menos interessante que os
modos que a precederam: o modo habitual e o modo cinematográfico.
Epstein chegou a defender que: “[c]om a noção de fotogenia, nasce a
ideia do cinema-arte, pois, como definir melhor a fotogenia indefinível
do que dizendo: a fotogenia é para o cinema o que a cor é para a pintura, o
volume para a escultura: o elemento específico dessa arte”49. A fotogenia
seria portanto, explica Aumont, a virtus artistica do cinema50. Seria tam-
bém a fotogenia ou, num sentido mais específico, uma fotoludogenia, a
virtus artistica dos videogames, a forma de arte contemporânea mais arre-
batadora e crescente que o começo deste século XXI tem visto florescer?
É claro que, como explica Xavier, a fotogenia em Epstein corresponde
a um “momento de visão”: “[é] uma capacidade, exclusiva do cinema, de
revelar o aspecto poético das coisas na tela, esta poesia que está no repen-

48 Ibidem, p. 71-72.
49 J. Epstein apud J. Aumont, op. cit., p. 92.
50 J. Aumont, op. cit., p. 92.

HARUN FAROCKI : PROGRAMANDO O VISÍVEL


SOBRE UMA POSSÍVEL FOTOGENIA NOS VIDEOGAMES

tino palpitar das folhas, tal como se reiterou na reflexão que amplificou o
alcance das palavras de Méliès, tornadas referência emblemática”51.
Xavier continua explicando que

O poético aqui é à imagem genuína, inespe-


rada, nova, contra o clichê; imagem que nos
libera do controle racional – uma vivência ple-
na, pré-verbal, do instante. [...] Para Epstein e
os pensadores afinados à sua forma de saldar a
novidade do cinema, a narrativa é, no entanto,
uma grade, uma sintaxe que domestica o olhar,
e que o faz perceber apenas o que está inserido
na cadeia de ações e reações que compõem a es-
fera do drama. A fotogenia, ao contrário, é a va-
lorização do fugaz, do ver aquilo que a simples
sintaxe e o encadeamento reprimem. Ou seja,
para a vivência da fotogenia, o fundamental é
a crença na imagem, na revelação de uma pre-
sença (não um símbolo, não um signo de uma
linguagem que supõe um sistema).52

De fato, dada a orientação “revelacionista” do Epstein que investiga a


especificidade do cinema, havemos de questionar se tal fotogenia poderia
ser pensada no âmbito das imagens de síntese, desprovidas de liame mais
óbvio com o mundo empírico e geradas 100% em ambiente computacional,
por meio de algoritmos. Malcolm Turvey propõe que, além das duas mais
conhecidas tradições do pensamento cinematográfico, o modernismo (ou

51 I. Xavier, op. cit., p. 26.


52 Ibidem, p. 26-27.

243
244

formalismo) e o realismo, haveria ainda uma “terceira tradição”, à qual dá o


nome de “revelacionismo” e filia quatro autores europeus nascidos no final
do século XIX: Jean Epstein, Dziga Vertov, Siegfried Kracauer e Béla Balázs.
Como teórico “revelacionista”, nos termos de Turvey, Epstein constrói seu
pensamento e sua obra inspirado na ideia de que a visão humana é limitada,
incapaz de ver a verdadeira natureza da realidade. Em função de o cine-
matógrafo poder revelar verdades inacessíveis a olho nu, e pelo fato de ser
uma máquina independente (sic) de intenções humanas, Epstein e demais
“revelacionistas” depositaram no cinema as esperanças de desvendar uma
realidade mais ampla e rica que aquela perceptível à nossa visão imediata53.
Natural supor, portanto, que o paradigma indexical, baseado na concepção
da imagem fotográfica – e cinematográfica – como portadora de traços in-
contestes da realidade, seja razoavelmente influente sobre o pensamento
de autores como Kracauer ou Epstein, e sobre conceitos como o de foto-
genia. Não obstante, pergunto: diante de repetidas revisões do paradigma
indexical54, não seria o caso de averiguarmos a possibilidade de adaptar
conceitos orbitais a esse mesmo paradigma indexical, ou ao pensamento
realista cinematográfico mais amplo, no sentido de revigorar análises con-
temporâneas acerca do macrodomínio dos sons e imagens em movimento?
Mesmo porque, conforme já demonstraram autores como Lev Manovich, as
fronteiras entre a imagem cinematográfica de natureza (mais) indexical e o
CGI (Computer Graphics Imagery) andam cada vez mais borradas ou indis-
tintas. Manovich propõe que:

a construção manual de imagens no cinema di-


gital representa um retorno às práticas pré-ci-

53 M. Turvey, Epstein, Bergson and Vision, em T. Trifonova (ed.), European Film Theory, p. 93-94.
54 Ver, por exemplo, G. Currie, Image and Mind; e S. Prince, True Lies: Perceptual Realism, Digital Images, and Film
Theory, Film Quarterly, v. 49, n. 3.

HARUN FAROCKI : PROGRAMANDO O VISÍVEL


SOBRE UMA POSSÍVEL FOTOGENIA NOS VIDEOGAMES

nemáticas do século XIX, quando imagens eram


pintadas e animadas a mão. Na virada do século
XX, o cinema delegou essas técnicas manuais
para a animação e se definiu como uma mídia de
registro. Conforme o cinema entra na era digital,
essas técnicas estão novamente se tornando lu-
gar-comum no processo de realização cinemato-
gráfica. Consequentemente, o cinema não pode
ser claramente distinguido da animação. Ele não
é mais uma tecnologia de mídia indexical mas, na
verdade, um subgênero da pintura55.

Manovich observa que durante a maior parte do século XX o paradig-


ma indexical, ilustrado entre outros pelo conceito de kino-eye (cine-olho)
proposto por Dziga Vertov, foi prevalecente, mas que a virada para o sécu-
lo XXI viu reemergir com força um paradigma representacional tido como
pré-cinemático, baseado em imagens criadas pelo artista, o qual o autor
chama de kino-brush (cine-pincel). Em outras palavras, Manovich sugere
que o aporte de tecnologias digitais no cinema contemporâneo viabilizou
o resgate do cinema de animação e de técnicas não-automatizadas de au-
toração de imagens, reacomodando todos estes no mainstream do cinema
– o sucesso dos filmes de animação contemporâneos, no caso de estúdios
como Disney-Pixar ou Fox Animation, bem como a emergência do machi-
nima enquanto gênero cinematográfico talvez indiquem a pertinência de
tais observações. Em sua conclusão, “do cine-olho ao cine-pincel” (“from
kino-eye to kino-brush”), Manovich afirma que, atualmente:

55 L. Manovich, What is Digital Cinema? em P. Lunenfeld, op. cit., p. 175.

245
246

A mutabilidade dos dados digitais obstaculiza


o valor dos registros cinematográficos como
documentos da realidade. Em retrospecto, nós
podemos ver que o regime de realismo visual
do século XX, resultado do registro automático
da realidade visual, foi apenas uma exceção, um
acidente isolado na história da representação vi-
sual, a qual sempre envolveu, e agora novamente
envolve, a construção manual de imagens. O ci-
nema torna-se um ramo particular da pintura – a
pintura no tempo. Não mais um cine-olho, mas
um cine-pincel.56

Em função de meu escopo principal, não tratarei aqui de desenvolver


nem tampouco criticar as observações de Manovich, mas devo salientar
que tais discussões talvez possam favorecer uma eventual transmutação
do conceito de fotogenia para o território dos videogames. No lugar do pa-
radigma indexical, entram em cena atualmente conceitos como perceptual
realism (realismo perceptual)57, seeing-in58 e likeness (semelhança)59, mais
afeitos a aspectos como analogia e iconicidade do que ao caráter indexical
(ou de traço) tão prevalecente no pensamento realista cinematográfico
por muitos anos.

56 Ibidem, p. 192.
57 G. Currie, op. cit.; S. Prince, op. cit.
58 Seeing-in é um conceito introduzido por Richard Wollheim em Art and its Objects, retomado por Currie:
“Describing our capacity to recognize what is depicted in a Picture, Richard Wollheim has spoken of seeing-in. We
see the Duke of Wellington in the Picture Just as we see the face in the clouds or the figure in the frosted window
pane. Seeing-in is a psychological phenomenon, a mental capacity we contingently possess” (Descrevendo
nossa capacidade de reconhecer o que é retratado em uma pintura, Richard Wollheim tem falado de seeing-in.
Vemos o Duke de Wellington em uma pintura exatamente como vemos o rosto nas nuvens ou a figura em uma
vidraça de janela congelada. Seeing-in é um fenômeno psicológico, uma capacidade mental que nós possuímos
contigencialmente), ver G. Currie, op. cit., p. 90.
59 Ibidem.

HARUN FAROCKI : PROGRAMANDO O VISÍVEL


SOBRE UMA POSSÍVEL FOTOGENIA NOS VIDEOGAMES

Gregory Currie, por exemplo, argumenta que a semelhança pode ser


uma versão defensável do realismo cinematográfico. O autor defende
também a ideia de que deve haver estilos cinematográficos mais realistas
que outros no sentido de um realismo apoiado na semelhança – o plano-
-sequência e a profundidade de campo seriam alguns dos exemplos mais
notáveis60. O conceito de semelhança reivindicado por Currie está no
cerne de sua proposta de realismo perceptual. Ele explica que sistemas de
representação naturalmente generativos, como a fotografia e o cinema,
funcionam por meio da exploração de nossa capacidade visual de reco-
nhecer os objetos representados, e assim a experiência de reconhecer a
fotografia de um cavalo é, em termos significativos, idêntica à experiência
de se reconhecer um cavalo ao vivo. É esse tipo de realismo que Currie
denomina realismo perceptual, sendo razoável supor que o mesmo seja
válido e aplicável ao contexto dos videogames, igualmente sistemas de
representação naturalmente generativos. Inversamente, em casos de
sistemas de representação que não sejam naturalmente generativos, mas
que, ao contrário, operem por convenção (como o caso da língua natural,
ou da literatura), verifica-se pouco ou nenhum nível de realismo percep-
tual61. Para Currie: “representações são perceptualmente realistas quando
elas compartilham propriedades perceptuais significativas com as coisas
que elas representam”62.
Tais conceitos ou categorias parecem melhor equipadas para a inves-
tigação de fenômenos cinemáticos mais amplos, tais como as séries de TV
ou os videogames contemporâneos. Minha hipótese aqui é a de que, com
o enfraquecimento ou simples revisão do paradigma indexical, com vistas
a adaptá-lo ou superá-lo em função das tecnologias digitais de síntese de

60 Ibidem, p. 79.
61 Ibidem, p. 90.
62 Ibidem, p. 111.

247
248

imagem, o próprio conceito epsteiniano de fotogenia também pode ser


revisado e flexibilizado, tendo atenuada sua relação com a natureza da ima-
gem fotográfica em favor de uma variedade mais ampla de modalidades de
representação. Nesse sentido, a fotogenia originalmente epsteiniana, uma
vez transportada para a análise de videogames, poderia referir-se a uma
classe de imagens não necessariamente indexical, e não necessariamente
fugidia: o movimento da imagem gerada em computador é determinado
por algoritmos, sendo portanto estritamente previsto e passível de ser con-
trolado. Todavia, como fica o movimento dos corpos no mundo real? Não
estão também submetidos a leis físicas conhecidas, determinantes de sua
ocorrência, duração e variação? A título de provocação: em termos de “fo-
togenia”, qual a diferença entre as folhas que balançam no pano de fundo
de O lanche do bêbe e as que farfalham nos galhos da árvore de Anno 1701?
Se a transposição do conceito epsteiniano de fotogenia ( já suficiente-
mente controverso na história do cinema) puder ser experimentada neste
momento, podemos supor que, mais ou menos a partir de 2006 (com Anno
1701, entre outros jogos), os videogames consolidam sua própria “versão”
de fotogenia. Afinal, não seria a sensação de Méliès, diante de O lanche do
bebê, mais ou menos análoga à de um jogador que se encanta com a mobi-
lidade de objetos representados digitalmente no espaço diegético de um vi-
deogame? Objetos estes por vezes sem função narrativa alguma, como uma
garrafa a ser quebrada, um arbusto balançando ao vento ou um simples
barômetro sobre um piano taciturno em algum game de suspense? A lem-
brança do barômetro, análogo a qualquer outro objeto prosaico que even-
tualmente habite um cômodo digitalmente representado, me estimula a
pensar também mais profundamente no que significa (ou pode significar)
o realismo no território dos videogames, na esteira mesma do pensamento
de Roland Barthes acerca do “efeito de real”, uma qualidade então baseada

HARUN FAROCKI : PROGRAMANDO O VISÍVEL


SOBRE UMA POSSÍVEL FOTOGENIA NOS VIDEOGAMES

na investigação do “inessencial” na narrativa de Gustave Flaubert63. Afinal,


como podemos pensar, a partir de Barthes, um “efeito de real” nos video-
games? Não ouso arriscar qualquer resposta neste momento, igualmente
em função de minhas limitações de espaço e tempo, porém insisto em dizer
que os elementos “inessenciais”, em todo e qualquer videogame contem-
porâneo, desempenham funções e deflagram sensações no jogador muito
menos triviais do que se costuma imaginar. Em larga medida, creio ser esta
a reflexão provocada por Farocki em Paralelo I-IV.
A narradora de Paralelo I observa que “[e]m trinta anos, o salto de um
desenho por linhas retas para uma imagem que dificilmente se distingue
de imagens fotográficas cinematográficas reais” (2’47” – 2’59”) se efetiva
na história dos videogames. Refere-se ao período de tempo entre Mistery
House e Anno 1701, de 1980 a 2006. Jogos como The Legend of Zelda, nos
quais todos os objetos são ostensivamente quadriculados, construídos
a partir de pixels maiores (em retrospecto, mais “grosseiros”), sugerem
que a “modernidade pictórica” nos videogames teria surgido com o nas-
cimento dessa tecnologia, e por analogia antes que os cinemas cubistas,
futuristas ou o cinéma pur de René Clair, Fernand Léger, Hans Richter ou
Viking Eggeling deixassem sua marca na história do cinema. A narradora
de Paralelo I prossegue afirmando que:

Em 1980, apenas linhas verticais e horizontais


podiam ser usadas (3’02” – 3’07”). E em 1986,
todas as figuras tinham de ser formadas por qua-
drados (3’12” – 3’18”). As folhas e os galhos mal
aprenderam a se mexer e já se pergunta se eles
se mexem com muita rigidez (3’32” – 3’41”). Tal-

63 R. Barthes, O rumor da língua, p. 190.

249
250

vez um galho fino devesse se curvar mais do que


um grosso (3’45” – 3’50”). No cinema há o vento
que sopra, e o vento soprado por uma máquina
de vento (3’56” – 4’02”). Nas imagens de com-
putador existe apenas um tipo de vento (4’03” –
4’08”). Um novo construtivismo (4’08” – 4’11”).

Construtivismo, aqui, é a senha para pensarmos o videogame como


uma forma de arte que já teria nascido sob o signo das vanguardas. A nar-
radora de Paralelo I prossegue dizendo que:

Aqui temos uma chama composta por quadrados


(4’56” – 4’59”). Dizem que naquela época só po-
diam criar objetos de quadrados (5’ – 5’04”). Da
mesma forma como os egípcios só conseguiam
desenhar as pessoas de perfil (5’05” – 5’11”).

A desconstrução de uma abordagem teleológica da história dos video-


games fica sugerida em outra fala da narradora, quando ela relembra que
“[a] maioria dos pintores da idade moderna rejeita a história oficial de que
a arte representativa antiga era limitada e progrediu apenas mais tarde, de-
pois de alguns revezes, até o advento da fotografia” (6’08” – 6’21”). Assim,
à guisa de uma conjectura entre outras, podemos supor que o videogame
teria nascido “suprematista” – lembremos de Adventure –, revertendo o
caminho percorrido por Kazímir Malévitch em em seu trabalho Quadrado
preto sobre fundo branco, pintado entre 1913 e 1915. Videogames como Pong
ou Adventure teriam assim uma dívida inconteste com o supermatismo de
Malévitch, ainda que por motivos essencialmente tecnológicos ou infraes-
truturais. Talvez não à toa Farocki tenha optado por quadros menores que

HARUN FAROCKI : PROGRAMANDO O VISÍVEL


SOBRE UMA POSSÍVEL FOTOGENIA NOS VIDEOGAMES

a tela habitual de cinema ou vídeo em alguns episódios de seu Paralelo I-IV,


quadrados isolados ou em pares, contendo imagens recortadas, subordi-
nadas ao todo. A interface de Paralelo I é suprematista nesse sentido, e em
negativo: trata-se do quadrado, agora com imagens em movimento e sono-
rizadas, sobre fundo preto. O layout de Paralelo I é posteriormente abando-
nado no episódio II, quando as imagens extraídas dos videogames ocupam
a totalidade do quadro, mas retomado em Paralelo III.
Ao se deter sobre a representação da água, entre 07’26” e 09’06”,
Paralelo I acaba invocando o problema da representação da luz. Afinal, a
representação da água, enquanto superfície reflexiva, parece depender
substancialmente da representação da luz em ambientes virtuais digitais,
como sempre dependeu na pintura. Quanto mais bem tratada a luz, mais
valorizada a água, e isso ao longo de toda a história dos videogames, dos
mais esquemáticos aos mais realistas-naturalistas. A tese segundo a qual
os videogames teriam percorrido, num curto período de tempo, um cami-
nho reverso ao da arte pictórica dos últimos mil anos, parece definitiva-
mente expressa na seguinte passagem da narração:

Os criadores de imagens geradas por computa-


dor não precisaram esperar milhares de anos pela
Renascença (8’36” – 8’41”). Desde o princípio
suas imagens eram intimamente associadas ao
trabalho de técnicos e cientistas (8’43” – 8’50”).
Essas imagens também mostram o desenvolvi-
mento da forma simbólica ao realismo fílmico,
da abstração ao concretismo (8’56” – 9’05”).

251
252

A partir de então, Farocki se concentra numa comparação mais deti-


da entre “a água no cinema” e “a água nos videogames” - numa reflexão
que nos faz lembrar de Imagens do mundo e inscrições da guerra, quando o
cineasta se deteve sobre um laboratório de mecânica das ondas, no qual
uma máquina de ondulação de fluidos produzia simulações de um fe-
nômeno natural64. Diferente da “água no cinema” (aquela representada
numa imagem fotoquímica, cinematográfica), faltaria à “água digital” dos
videogames uma “substância”. A “água nos videogames” seria apenas uma
superfície – superfície reflexiva, vale a pena ressaltar –, revelada enquan-
to tal pela “câmera virtual”, ou pelo simples ponto de vista que penetra a
representação de uma massa líquida. Conforme explica a narração:

Aqui a espuma espirra para cima em cada onda


(09’08” – 09’13”). Aparentemente, há algo im-
pedindo o fluxo debaixo da superfície (09’17”
– 09’21”). Num filme de ficção veríamos esse
efeito de vários ângulos se a espuma fosse uma
pista para algo, como um barco afundado ou um
caixão de concreto (09’25” – 09’38”). A câmera
virtual pode mergulhar nessas águas, mas não há
fundo do mar a ser visto (09’42” – 09’48”). As ro-
chas flutuam na superfície da água, lembrando a
criança que rasga o boneco para investigar o mis-
tério da representação (09’55” – 10’05”).

Após seu “mergulho” nas águas dos videogames, Farocki sobe aos
céus dos ambientes virtuais digitais a partir dos 10’47” de Paralelo I. Dos

64 Cf. D.N. Rodowick, op. cit., p. 74.

HARUN FAROCKI : PROGRAMANDO O VISÍVEL


SOBRE UMA POSSÍVEL FOTOGENIA NOS VIDEOGAMES

11’16” aos 14’14”, Paralelo I concentra-se no trabalho de um jovem desig-


ner, demiurgo de um mundo virtual que começa por povoar de nuvens o
simulacro de céu azul em sua tela de computador. Até os 13’45” de Paralelo
I, o jovem se dedica a organizar as nuvens – sua forma, tamanho, aspecto,
configuração, distribuição e perspectiva –, para em seguida brindá-las
com movimento. O movimento das nuvens sob o céu azul – movimento
equivalente ao das folhas das árvores de Anno 1701, ou ao das ondas em
simulações do oceano – é talvez análogo, em sua fotogenia, ao balançar
das folhas das árvores em O lanche do bebê. Novamente, uma fotogenia
entra em jogo. O jovem profissional dedica-se igualmente a manipular o
movimento das nuvens, agora realistas ou mesmo hiper-realistas, e que
em jogos como Super Mario Bros. (Nintendo, 1985) e outros limitavam-se
a pequenas massas brancas, com alguns pontos de sombra, deslocando-se
horizontalmente na tela de videogames visivelmente pixelados. Demons-
tra então a narradora de Paralelo I: “Estas são nuvens formadas por qua-
drados” (14’37” – 14’39”).
A ideia de Walter Benjamin (2000), sobrevivente em pensadores do
cinema como Bazin, de acordo com a qual a fotografia teria liberado as
artes pictóricas do compromisso com a representação da realidade, é
devidamente parafraseada no fim do filme de Farocki. Nesse momento,
a narradora sugere que as imagens crescentemente realistas dos video-
games talvez venham a superar o cinema em sua vocação figurativa e
representacional (uma vocação “naturalista-ilusionista”, fartamente
explorada pela grande indústria do audiovisual, ou ainda “realista”, em
termos bazinianos), liberando-o para outras aspirações. Finalmente, aos
14’55”, Paralelo I coloca lado a lado dois planos de céus com nuvens, um
cinematográfico (à direita), outro retirado de um videogame (à esquerda).
A narradora explica:

253
254

De acordo com a lenda os desenhos de frutas do


grego Zeuxis eram tão realistas que pássaros vi-
nham em grupos para bicá-los (14’42” – 14’52”).
Nuvens criadas por um computador e nuvens
fotografadas por uma câmera (14’57” – 15’03”).
A imagem tremulante à direita revela que ela
vem de uma câmera (15’04” – 15’08”). Talvez
as imagens de computador assumirão funções
previamente desempenhadas pelo filme (15’09”
– 15’15”). Talvez isso libere o filme para outras
funções (15’16” – 15’19”). As imagens de compu-
tador tentam atingir a qualidade das imagens de
filme (15’20” – 15’25”). Elas querem superá-las,
deixá-las para trás (15’26” – 15’30”). Os criado-
res das imagens geradas por computador não
querem atrair bandos de pássaros gregos (15’34”
– 15’40”). O seu paraíso deve ser habitado por
criaturas de sua própria criação (15’40” – 15’45”).

Paralelo I termina assim por sugerir uma suposta autonomia da ima-


gem virtual, própria dos videogames, que talvez não aspire nem ao trompe
l’oeil nem ao hiper-realismo, mas a uma refundação do mundo baseada
na recriação de seus habitantes e, quem sabe até, de seus espectadores.
Por fim, gostaria de repetir que, em Paralelo I, Farocki parece refazer, face
à imagem própria dos videogames, o percurso de Epstein face à imagem
cinematográfica. Suponho que, em relação aos videogames, tenha se
abatido sobre Farocki um fascínio análogo àquele exercido pela imagem
cinematográfica sobre Méliès, Delluc, mas especialmente Epstein. Creio
que ao longo de toda a obra Paralelo I-IV, mas especificamente no episódio

HARUN FAROCKI : PROGRAMANDO O VISÍVEL


SOBRE UMA POSSÍVEL FOTOGENIA NOS VIDEOGAMES

I, Farocki sugere uma fotogenia própria dos videogames, característica de


uma nova maneira de se ver o mundo.
Por ocasião da escrita deste texto, dois novos videogames eram lan-
çados no mercado: Pokémon Go (Niantic, Inc., julho de 2016) e No Man’s
Sky (Hello Games, agosto de 2016.). Para uso em celulares e beneficiando-
-se da tecnologia de realidade aumentada (augmented reality), Pokémon
Go tem levado milhões de jogadores às ruas, em vários países, para caçar
monstrinhos da franquia Pokémon que surgem sobrepondo-se à realidade
dos mais variados ambientes públicos ou privados. No Man’s Sky, por sua
vez, lançado para plataformas Playstation 4 e Microsoft Windows, prome-
te um jogo infindável, com uma narrativa potencialmente infinita. Com
enredo baseado em exploração espacial, No Man’s Sky tenciona simular
um universo inteiro para seu jogador, por meio de um algoritmo poderoso
que promete mais de 18 quintilhões de planetas passíveis de exploração
por parte do herói-astronauta. Como um jogo do tipo “primeira pessoa”
e “open world survival game”, No Man’s Sky capitaliza sobre ideias já deli-
neadas e desenvolvidas em jogos como a série Grand Theft Auto ou Spore
(Maxis, 2008). Como é possível supor, as reflexões encetadas por Farocki
em Paralelo I-IV estão apenas começando.

255
256

BIBLIOGRAFIA
files/38427/38427-pdf.pdf?session_id=2e353b1a7b9e58fa
AUMONT, Jacques. As teorias dos cineastas. 2ed. f24c283beade3342fd8a5085>
Campinas: Papirus, 2008. _______. The World As Will And Idea, v. 2. 6ed. London:
AUMONT, Jacques; MARIE, Michel. Dicionário teórico e Kegan Paul, Trench, Trübner & Co., 1909. Disponível
crítico de cinema. 3 ed. Campinas: Papirus, 2007. em: <https://www.gutenberg.org/files/40097/40097-pdf.
BENJAMIN, Walter. A obra de arte na época de sua pdf?session_id=2e353b1a7b9e58faf24c283beade3342f
reprodutibilidade técnica. In: LIMA, Luiz Costa (org.). d8a5085>.
Teoria da cultura de massa. São Paulo: Paz e Terra, 2000. _______. The World As Will And Idea, v. 3. 6ed. London:
BARTHES, Roland. O rumor da língua. 3ed. São Paulo: Kegan Paul, Trench, Trübner & Co., 1909. Disponível
Martins Fontes, 2012. em: <https://www.gutenberg.org/files/40868/40868-pdf.
BAZIN, André. O realismo impossível. Belo Horizonte: pdf?session_id=2e353b1a7b9e58faf24c283beade3342f
Autêntica, 2016. d8a5085>.
BATEMAN, Chris (ed.). Game Writing: Narrative Skills STANTON, Richard. A Brief History of Video Games: From
for Videogames. Boston: Cengage Learning, 2006. Atari to Xbox One. London: Robinson, 2015.
CURRIE, Gregory. Image and Mind: Film, Philosophy, and TURKLE, Sherry. Video Games and Computer Holding
Cognitive Science. Cambridge: Cambridge University Power. In: WARDRIP-FRUIN, Noah; MONTFORT,
Press, 1995. Nick. (eds.). The New Media Reader. Cambridge: The
EPSTEIN, Jean. Écrits sur le cinéma: 1921-1953. Paris: MIT Press, 2003.
Seghers, 1975. TURVEY, Malcolm. Epstein, Bergson and Vision. In:
HARRIGAN, Pat; WARDRIP-FRUIN, Noah. Third TRIFONOVA, Temenuga (ed.). European Film Theory.
Person: Authoring and Exploring Vast Narratives. New York: Routledge, 2008.
Cambridge: The MIT Press, 2009. XAVIER, Ismail. Maquinações do olhar: A cinefilia
______. Second Person: Role-Playing and Story in Games como ver além na imanência. In: MÉDOLA, Ana Sílvia;
and Playable Media. Cambridge: The MIT Press, 2007. ARAÚJO, Denise; BRUNO, Fernanda (orgs.). Livro da
JENKINS, Henry. Game Design as Narrative XV Compós: Imagem, visibilidade e cultura midiática. Porto
Architecture. In: WARDRIP-FRUIN, Noah; Alegre: Sulina, 2007.
MONTFORT, Nick. (Eds.). The New Media Reader. WARDRIP-FRUIN, Noah; MONTFORT, Nick. (eds.).
Cambridge: The MIT Press, 2003. The New Media Reader. Cambridge: The MIT Press,
JOURNOT, Marie-Thérèse. Vocabulário de Cinema. 2003.
Lisboa: Edições 70, 2005. WARDRIP-FRUIN, Noah; HARRIGAN, Pat. First Person:
KELLER, Sarah. Introduction. In: KELLER, Sarah; New Media as Story, Performance, and Game. Cambridge:
PAUL, Jason N. (Eds.) Jean Epstein: Critical Essays and The MIT Press, 2004.
New Translations. Amsterdam: Amsterdam University
Press, 2012.
MANOVICH, Lev. Software Takes Command. New York:
Bloomsbury Academic, 2013.
______. The Language of New Media. Cambridge: The
MIT Press, 2001.
______. What is Digital Cinema? In: LUNENFELD,
Peter (ed.). The Digital Dialectic: New Essays on New
Media. Cambridge/London: The MIT Press, 2000.
MANOVICH, Lev; KRATKY, Andreas. Soft Cinema:
Navigating The Database. Cambridge: The MIT Press,
2005.
PRINCE, Stephen. True Lies: Perceptual Realism,
Digital Images, and Film Theory. Film Quarterly, v. 49, n.
3, Spring, 1996.
RODOWICK, D.N. A consciência liberada de Harun
Farocki. In: SOBRINHO, Gilberto Alexandre (org.).
Cinemas em redes: tecnologia, estética e política na era
digital. Campinas: Papirus, 2016.
SCHOPENHAUER, Arthur. The World As Will And Idea,
v. 1. 7ed. London: Kegan Paul, Trench, Trübner & Co.,
1909. Disponível em: <https://www.gutenberg.org/

HARUN FAROCKI : PROGRAMANDO O VISÍVEL


SOBRE UMA POSSÍVEL FOTOGENIA NOS VIDEOGAMES

257
258

ON A POSSIBLE
PHOTOGENIC IN
VIDEO GAMES:
THE PROPOSAL
OF PARALLEL
I-IV (2012-2014),
BY HARUN
FAROCKI
ALFREDO SUPPIA
HARUN FAROCKI : PROGRAMANDO O VISÍVEL
ON A POSSIBLE PHOTOGENIC IN VIDEO GAMES

The emotional power of video games


draws heavily on the computer power within
that supports a simulated world and a
meditative environment.1

In “Harun Farocki’s Liberated Consciousness”, David Rodowick (2016)


revisits Farocki’s three most famous works, presenting them as funda-
mental inflection points in an analysis of the power and originality of
the liberating ethics of seeing inscribed in the career of the Czech-born
German artist. Rodowick is referring to The Inextinguishable Fire (1969),
Images of the World and Inscriptions of War (1989) and Serious Games
(2010). After commenting on the three works, Rodowick observes:

digital modeling transforms and amplifies


the stakes of the historical game.From photog-
raphy to digital simulation, Farocki shows how
the action space of the image has undergone a
radical change. The automated bombardment
photographs of World War II aim to preserve
a record of past destruction in a flood of singu-
lar images—snapshots of sequential time, like
film—in which all the information that the im-
age can ever reveal is fully present in it. The fu-
ture of the image is that of the discovery of new

1 S. Turkle, Video Games and Computer Holding Power, in N. Wardrip-Fruin; N. Montfort (eds.), The New Media
Reader, p. 511.

259
260

kinds of intelligibility, which lay dormant until


new wills to knowledge and new frames of refer-
ence bring its data forward. The transition from
the photographic record to real-time 3-D2 2

According to Rodowick, “In every one of his works, Farocki asks us to


pose again the question, What is an Image?, or better, What is a human
image? [...] Farocki asks us to reconsider how every image provokes both
an intelligence and ethics of seeing”3. If simulation is considered to be
the key theme or tutorial in Images of the World and Inscriptions of War
and The Inextinguishable Fire, in Serious Games, Farocki begins to more
rigidly scrutinize digitally computerized simulation. Serious Games, a
digital installation divided into four parts or chapters, is based on material
collected from military training centers treating soldiers with Post-Trau-
matic Stress Disorder in Twentynine Palms, California. The therapy is
based on exposing soldiers to recreated traumatic wartime situations via
virtual reality simulations. With the exception of Serious Games II: three
deaths, all of the other chapters in the series consist of contiguous images
in an interface where Farocki collates interactive digital images and docu-
mentary records (video-graphics) of ex-soldiers undergoing therapy for
post-traumatic stress. Rodowick says that “Indeed the key question here
is how to understand simulation as a newly central variant in Farocki’s
philosophy of the Image, and as an expansion of his audiovisual writing
through re-combinatory montage”4. The ethical and aesthetic experiment
conducted by Farocki in Serious Games, in 2010, is further developed in

2 D.N. Rodowick, A consciência liberada de Harun Farocki, in G.A. Sobrinho (org.), Cinemas em redes, p. 77. We would like to
thank the author for letting us have access to the English version of his conference.

3 Ibidem, p. 69.

4 Ibidem, p. 75.

HARUN FAROCKI : PROGRAMANDO O VISÍVEL


ON A POSSIBLE PHOTOGENIC IN VIDEO GAMES

one of the director’s posterior works that is absent in the analytic arc pro-
posed by Rodowick. This work is the Parallel I-IV (2012-2014) series, one
of the artist’s last works. Still relatively unknown, this video installation
piece was brought to Brazil for the first time by curator Jane de Almeida
for the exhibition Programming the Visible: Harun Farocki, which ran
from January 28 to March 27 at the Paço das Artes in São Paulo.
Parallel I-IV (2012-2014) by Harun Farocki can be understood as
a rehearsal film55 in four episodes, geared towards an aspect which has
drawn my attention for nearly seven years, ever since I first heard of the
computer game Heavy Rain (Quantic Dream; Sony Computer Entertain-
ment, 2010), released for Play-Station 3. An example of an artifact residing
in the borderland between the domains of video game and cinema, Heavy
Rain functions as an interactive film in which the player takes on the roles
of characters in a detective story drama. Heavy Rain reminds me of Hell:
A Cyberpunk Thriller (Take-Two Interactive Software; Game Tek, 1994),
an RPG style “point and click” adventure game for PC. Hell gained notori-
ety because it was one of the first games released in CD-Rom which used
dialogue and high resolution graphics, similar to another title of its era,
Bloodnet (Microprose, 1993), another cyberpunk role playing style video
game. As in an interactive film, the player in Hell investigates a futuristic
police conspiracy using a virtual space where he or she must act and en-
gage with characters “digitally incarnated” by actors such as Dennis Hop-
per, Grace Jones, Stephanie Seymour and Geoffrey Holder. Seymour and

5 Classifying Farocki’s work is almost always an unpleasant and troublesome task. Here I intend to explore a probable essayist
dimension of Farocki’s work, in contrast to more specific problematizations such as those expounded upon by D.N. Rodowick.
For Rodowick, “Farocki observed, reported, critiqued, analyzed, and deconstructed, sometimes in his own voice and other
times strategically deploying the voice of others in a free indirect relation. It is tempting to say that Farocki worked in the genre
of the essay film, though this might be too small and vague a category to contain the inventive breadth of his moving image
works, nor can they be considered straight-forwardly documentary in any restrictive sense.” Ibidem, p. 69.

261
262

Holder appear in live action images in the game, while other actors, like
Hopper and Jones, lend their voices to avatars. The drama of Hell takes
place in 2095 in a dystopian future where the US is under the control of
a fascist theocracy called the “Hand of God,” which has the capability of
sending individuals deemed to be criminals and insurgents to hell. Some
of these individuals, however, are able to return to tell their story.
In Hell, we see the entrance of professional cinema actors into the
videogame market for the first time. Its increasing complex narrative is
heavily inspired by the tradition of Hollywood script writing and recycles
prior ideas such as the schematic Adventure, considered to be the first
action-adventure video game, which was created by Warren Robinett
and commercially released in 1979 for the Atari 2600 console. Adventure
consists of a 2D graphic version of William Crowther’s original Colossal
Cave Adventure (1975-1976), which in turn was an adaptation of popular
RPGs like Dungeons & Dragons for a computer environment. Adventure
also enabled the hero to use a collection of items, with the player deciding
which item to use at any given moment using only the joystick, instead of
having to insert text based commands – the collection of items for player
use had existed in Colossal Cave Adventure but became more intuitive
with Adventure. At the time, Atari did not give credit to its designers/
programmers. Furthermore, Adventure was the first game to feature a
well-known “easter egg”6 – in this case, a room (in the game) where one
could read “Created by Warren Robinett”. It is not surprising that a book
like Game Writing: Narrative Skills for Videogames, complied by Chris
Bateman and focused on teaching game creation (game design), contains
so many references to film studies, especially in its first three chapters.

6 In computer jargon an “Easter egg” is a hidden item that can be found in any type of virtual system, including songs, films,


video games, etc.

HARUN FAROCKI : PROGRAMANDO O VISÍVEL


ON A POSSIBLE PHOTOGENIC IN VIDEO GAMES

Accordingly, we can say that a nascent theory of video game scripts was
nothing more than an adaptation of a certain “theory”7 of film scripts8.
Heavy Rain, Hell and Adventure, among others, have heightened
my curiosity, at least since 2009, with respect to a possible parallel his-
tory or juxtaposition of cinema and video games. My hypothesis is that
there are many commonalities between the history of cinematic style and
the history of video game style. Even when the history of cinematic style
and the history of video games diverge, their differences seem equally
instigative and significant to me. It is as if the history of video games has
been a repetition, at various moments, of the history of film - sometimes
as farce, sometimes as tragedy, at times advancing in fast forward and at
other times moving in unexpected ways or even in reverse. It is important
to note that this hypothesis or idea is far from being new or original, espe-
cially when taking into account the work, at times more or less explicit, of
various authors such as Manovich9, Jenkins10, Wardrip-Fruin and Mont-
fort11, Manovich and Kratky1212, Bateman1313, Wardrip-Fruin and Harri-
gan14, Harrigan and Wardrip-Fruin15 or Stanton16.

7 In quotations because maybe this body of knowledge has not gone so far.


8 Film script theory, in turn, is heavily indebted to literature and drama.

9 L. Manovich, The Language of New Media; and L. Manovich, What is Digital Cinema? in P. Lunenfeld (ed.), The Digital


Dialectic.

10 H. Jenkins, Game Design as Narrative Architecture, in N. Wardrip-Fruin; N. Montfort (eds.), The New Media Reader.

11 H. Jenkins, Game Design as Narrative Architecture, in N. Wardrip-Fruin; N. Montfort (eds.), The New Media Reader.
12 L . Manovich; A. Kratky, Soft Cinema.
13 C. Bateman (ed.), Game Writing.
14 N. Wardrip-Fruin; P. Harrigan, First Person.
15P. Harrigan; N. Wardrip-Fruin, Second Person; P. Harrigan; N. Wardrip-Fruin, Third Person.

16 R. Stanton, A Brief History of Video Games

263
264

In the same way that we are accustomed to scrutinizing the his-


tory of cinema (understood here, above all, as a history of film style),
which stems from the compartmentalization of movements, schools and
periods (e.g. classical or modern cinema) as well as “authors”, I would like
to propose that the same can be done in relation to the history of video
games. For example, when considering different approaches to the notion
of authorship, we should keep in mind successful game industry series
such as Metal Gear Solid by Hideo Kokima, as noted by Stanton17. We can
also possibly identify a classical, a modern and even a post-modern period
in the history of video games, even though these periods are not exactly
equivalent to those of the history of cinema and, accordingly, are not con-
fined to the same chronological periods. They are analogous, not identi-
cal. With the history of video games, in juxtaposition (or in comparison)
to a history of cinema, “modernity” may have appeared before its “clas-
sical” period; in other words, in videogames, what we can understand as
“classical” – according to a cinematic paradigm – may have appeared after
the first wave of modernist driven videogame texts. This is the hypothesis
that I share here. Perhaps the history of videogames is to the history of
cinema as the history of cinema is to the arts preceding the advent of pho-
tography in motion (the moving image), such as literature, theater and,
above all, painting. Nevertheless, through a certain perspective, it prob-
ably does not make sense today to separate film from video game since
both are artifacts or manifestations of a vast territory which we could call
expanded cinema, cinematic arts or simply audiovisual media. In any case,
I believe that a more arresting and deeper investigation into the parallel
histories of video games and cinema will still come to fruition, even if only
to finally overcome the comparison. Henry Jenkins, for example, observes

17Ibidem, p. 277.

HARUN FAROCKI : PROGRAMANDO O VISÍVEL


ON A POSSIBLE PHOTOGENIC IN VIDEO GAMES

that the application of cinema theory to games can be overly crude, gener-
ally failing to recognize the more profound differences between the two
forms of media18. A parallel history of cinema is also justified, among other
reasons, by the fact that the games industry largely incorporates cinemat-
ographic language and tradition in its products, as well as various aspects
from the audiovisual industry’s production system. For at least 30 years,
many movie launches have been followed by video game launches and vice
versa, showing that both products (film and game) are thought of in tan-
dem. And this is precisely what Harun Farocki does in Parallel I-IV with
his impactful investigation into the cinema-video game parallel. In fact,
his exploration of this parallel juxtaposes, with video games serving as his
starting point, the histories of cinema and painting, with the ultimate goal
of better understanding the fascination of contemporary art and culture
with video games. It is as if Farocki, intuitively or not, cinematographically
investigates the proposal put forth by Jenkins, for whom spatiality is con-
sidered a key factor for a new understanding of the relation between video
games and narratives (and, by extension, video games and cinema), which
is based on the notion that game designers would perhaps be better story
tellers than narrative architects1919.
In an attempt to reconcile two theoretical fronts – that of the
ludologists, whose focus falls on the mechanics of the act of playing, and
that of the narratologists, who are interested in the study of video games
in the larger context of narrative media2020 – Henry Jenkins proposes a
borderline approach to understanding the domain existing between the
territories of ludology and narratology, respecting the peculiarities of vid-

18H. Jenkins, op. cit., p. 119.


19Ibidem, p. 121.
20Ibidem, p. 118.

265
266

eo games and examining them less as mere histories and more as spaces
abounding with narrative possibilities21.
As Sherry Turkle reminds us, by 1982, people (in this case, the
American middle class) were already spending more money on video
games than on cinema and music combined22. And, by 1983, the computer
had become so engrained in contemporary life that Time magazine de-
cided to put it on its cover in the usual place of the man or woman of the
year23. In large measure, Farocki’s work Parallel I-IV was also informed by
the holding power of computers, conforming to Turkle’s proposal:

Video games are a window into a new form of in-


timacy with machines which is characteristic of
the nascent culture of the computer. The special
relationship that players establish with video
games has elements in common with the inter-
action with other types of computers. The power
of attraction of video games, its nearly hypnotic
fascinations, and the computer holding power.
[…] In the heart of computer culture is the idea
of built, rule-governed worlds.24

Turkle also observes that video games offer yet another promise con-
nected to the very presence of the computer that goes beyond the “built

21 Ibidem, p. 119
22S. Turkle, op. cit., p. 500.
23Ibidem.
24 Ibidem, p. 501.

HARUN FAROCKI : PROGRAMANDO O VISÍVEL


ON A POSSIBLE PHOTOGENIC IN VIDEO GAMES

worlds, strictly governed by rules. It is the promise of perfection”25. The


promise of perfection appears to be another crucial point on the horizon
of reflections engendered by Harun Farocki in Parallel I-IV.
In Parallel I, Farocki bases his investigation of the video game
universe on a given typical iconography which is primarly concerned with
the symbols of the four elements: earth, fire, water and air. Parallel I be-
gins by commenting on the representation of trees in video games (0’0”-
4’55”), followed by the representation of fire (4’56”-6’39”), water (6’40”
– 10’46”) and finally air (10’47” – 15’46”). In summary, it is an investigation
of nature’s elements in the digital universe of computer games, or simply
in contemporary computer graphics, from the implicit point of view of the
filmmaker or film artist.
Parallel II, in some ways, seems to be (intentionally or not) in-
spired by the philosopher Arthur Schopenhauer. This can be perceived
in the voice-over narration (in the voice of Cynthia Beatt), which poses
questions such as “Does the world exist if I’m not watching it?” (00’08” –
00’12”). Schopenhaur suggests the idleness of such an inquiry – one which
inhabits the most ordinary human fear of death:

The terrors of death depend for the most part


upon the false illusion that now the ego vanishes
and the world remains. But rather is the oppo-
site the case; the world vanishes, but the inmost
kernel of the ego, the supporter and producer of
that subject, in whose idea alone the world has
its existence, remains. With the brain the intel-
lect perishes, and with the intellect the objective

25Ibidem, p. 511.

267
268

world, its mere idea. That in other brains, after-


wards as before, a similar world lives and moves
is, with reference to the intellect which perishes,
a matter of indifference.26

Video games, Parallel II suggests, evoke the perspective of a child on a


train or car journey: “Everything that passes by has been put there only for
me” (00’30” – 00’34”). “Appearing out of the emptiness, and then disap-
pearing again into emptiness” (00’35” – 00’41”), says the narrator. Shortly
afterwards, the problem of borders appears – borders of the world, of
perception, of reality – inseparable from the preceding indignation about
whether the world exists if it is not observed. The cowboy in Red Dead Re-
demption (Rockstar, 2010), galloping quickly through American old west
landscapes, sets the scene for the narrator to ask: “Where does this world
end?”(01’19” – 01’20”). To which she herself responds: “This world ap-
pears infinite. A world generated by the gaze which falls upon it” (01’30”
– 01’36”). Parallel II embarks on a reflection on presence and its borders.
We can conjecture, therefore, that video games, from the perspective of
Parallel II, offer a second version of the “meta-physical experiment” pro-
posed by Shopenhauer27, to the extent that we can merely change the word
“world” in the philosopher’s formulation to “game” – as if we were trying
to imagine the game universe without our presence:

Let any one try to present vividly to his mind


the time, in any case not far distant, when he
will be dead. Then he thinks himself away and

26 A. Schopenhauer, The World As Will And Idea, v. 3, p. 289-290.



27 Ibidem, p. 272.

HARUN FAROCKI : PROGRAMANDO O VISÍVEL


ON A POSSIBLE PHOTOGENIC IN VIDEO GAMES

lets the [game] world go on existing; but soon,


to his own astonishment, he will discover that
he was nevertheless still there. For he intended
to present the [game] world to his mind without
himself; but the ego is the immediate element in
consciousness, through which alone the [game]
world is brought about, and for which alone it
exists. This centre of all existence, this kernel of
all reality, is to be abolished, and yet the [game]
world is to go on existing; it is a thought which
can be conceived in the abstract, but not re-
alised.28

Schopenhauer goes on to affirm:

But we start from the principle that what


is different between the exterior to me and the
in-me, while spatial, resides only in the phe-
nomenon, not in the thing in itself, and that,
however, not in the absolute truth, so we see in
the loss of individuality only the loss of a phe-
nomenon, however only an apparent loss. For
more reality that has that difference in empiri-
cal conscious, even so, from the metaphysical
point of view, the sentences: “I succumb, but
the world loses” and “The world succumbs but

28 Ibidem.

269
270

I last”, at the bottom are rightly diverse.29

In this sense, Parallel II moves beyond the “I play therefore I am” (a


parody of the Cartesian cogito ergo sum) to something more along the
lines of “the world exists because I play.”
Parallel II is a film about virtual/digital cartographies. It expands
upon the questions raised in episodes I and II by concentrating on the
objects’ “skin”. André Bazin has once referred to Jean Renoir as the
“greatest French director”, a filmmaker whose camera is able to “touch”
the “skin of things”. “A thousand examples can illustrate this marvelous
sensibility to physical reality and tactile objects and their means. Renoir’s
films are made with the skin of things. Where this happens, an object’s
staging can so often be a caress”30. In Parallel III, Farocki investigates what
exists beneath the “skin” of the objects that live in the mise-en-scène of
videogames - but he only finds emptiness. The “cameras” of videogames
(needless to say, there are no cameras in the traditional sense) penetrate
objects to demonstrate that, if on the outside a granite pedestal appears
to be solid and heavy, and resistant to the bullets of a machine gun, on the
inside it behaves like a transparent cube, light and diaphanous without
any substance besides that which marks the straight lines of its shape.
Similary, the sea is also cited as only a surface, a fabric or cellophane paper
that trembles over nothingness. The same can be applied to the soil, be-
low which there is no representation of earth. Are video games, therefore,
an art of outlines and surfaces, another replication of the scenographic
cities of low budget Westerns?
In Parallel IV, Farocki investigates interactivity as a simulacrum

29 Ibidem, p. 138.
30 A. Bazin, O realismo impossível, p. 110.

HARUN FAROCKI : PROGRAMANDO O VISÍVEL


ON A POSSIBLE PHOTOGENIC IN VIDEO GAMES

of free choice. His focus is on the characters of games such as Assassin’s


Creed (Ubisoft, 2013), Grand Theft Auto IV (Rockstar, 2008) and Grand
Theft Auto V (Rockstar, 2013), or L.A. Noire (Rockstar, 2011). As Stanton
observes: “In video games the players have to follow a path that was pro-
jected by the developers. Any illusion of choice is exactly that.”31 Tacitly
starting from this premise and moving forwards to analyze video games
noted for their “illusion of free choice”, the voice-over narration in Paral-
lel IV begins by saying that “the hero is thrown into his world” (00’11” –
00’15”). “The hero has no parents and no teachers” (00’42” – 00’46”). “He
has to learn by himself which rules are valid” (00’47” – 00’50”). In a cer-
tain manner, Farocki’s work properly illustrates Turkle’s thoughts on the
identification processes provoked by video games as well as the implicit
relations between the author (of the game in question) and the player:

When you play a video game, you enter into


the world of the programmers who created it.
You have to do more than identify with a char-
acter on the screen. You have to act for this. The
identification by means of action has a special
hold. Like practicing a sport, it puts the people
into a mental state of high tension, extremely fo-
cused.32

Accordingly, Parallel IV investigates a series of possible actions:


“pushing/bumping”, “protest/request for help”, “assistance”, or “pull-
ing out a gun”. Under a semi-Hobbesian perspective, each action of the

31 R. Stanton, op. cit., p. 283


32 S. Turkle, op. cit., p. 509.

271
272

hero-character is met with a reaction by the supporting actors. However,


the variety and amplitude of these reactions to the hero’s world of actions
depends, as always in the history of video games, on the potential of the
hardware or software, or the complexity of the algorithm. With its greater
or lesser limitations, the algorithm ends up reinserting a tragic dimen-
sion into the game, as is seen with the store clerk character in Grand Theft
Auto, cited in Parallel IV, who cannot definitively leave the store even
when confronted by the hero pointing a gun at her. As explained by the
voice-over in Parallel IV,

the saleslady has a short memory. As soon as she is


outside the door, she forgets that the hero point-
ed a gun at her. She returns to the store, is threat-
ened, and flees the store again. If she is threatened
she must leave the store. When she is outside, she
must return to the store again. This tragic constel-
lation reveals to the hero the limitations of human
freedom of action. (07’40” – 09’04”)

In light of the infinite questions provoked by Parallel I-IV and given


the limited scope of this work, I limit myself in this article to a single hy-
pothesis: the work of Farocki as an investigation into a possible “photogé-
nie” in video games. Photogénie, here, is understood in the terms of Jean
Epstein3333. Sarah Keller explains that the

Photogénie, which for Epstein occurs in brief


flashes, means the quality that the filming of an

33J. Epstein, Écrits sur le cinéma: 1921-1953.

HARUN FAROCKI : PROGRAMANDO O VISÍVEL


ON A POSSIBLE PHOTOGENIC IN VIDEO GAMES

object confers to this same object, a quality par-


ticularly photographic (with all of its effects) and
cinematic (in virtue of its mobile nature) which
enables us to see the given object in a new light.34

When Turkle observed, in 1984, that “new generations of computer


graphics will allow game characters to have more realistic gestures and
facial expressions”35, the author was predicting the advance of the pho-
togénie as a fundamental category in the aesthetics of video games. Ac-
cordingly, I will now try to link Epstein’s thinking on cinema to Farocki’s
reflections on video games, using the concept of the photogénie as the
nexus for my argumentation and taking into account the limits and adap-
tations implied in the transposition of an initially photographic/cinemat-
ographic concept to the context of digital media, most notably of video
games or images of synthesis.

PHOTOGÉNIE IN VIDEO GAMES? ON FAROCKI’S


PARALLEL I-IV

Parallel I begins with a discussion of Mystery House (Sierra En-


tertainment, 1980), the first adventure game based on text accompanied
by images. Designed by Ken and Roberta Williams, Mystery House was
inspired by William Crowther’s Colossal Cave Adventure36. Here, Farocki
concentrates on one specific detail of Mystery House, the representa-
tion of a tree that does not seem to have a functional role in the game and
appears static next to the representation of a house which is the main di-


34 S. Keller, Introduction, in S. Keller; J.N. Paul (eds.), Jean Epstein: Critical Essays and New Translations, p. 25
35 S. Turkle, op. cit., p. 506.
36 R. Stanton, op. cit., p. 65.

273
274

egetic space into which the player enters. With respect to the tree in Mys-
tery House, Farocki embarks on an chronological investigation of the rep-
resentation of trees in various video games. An image from Pitfall (1982)
follows an image from Mystery House to illustrate his argument. In Pitfall,
which was made for the Atari console, the trees are static and restricted
to the backdrop. However, it is the trees’ small variations in positioning
and disposition that inform the player that he can move throughout the
forest. Veins on tree trunks and some nuance in terms of light and shad-
ows over treetops only appear two years later, for the first time, in King’s
Quest (Sierra Entertainment, 1984), albeit in a still very rudimentary
form. Parallel I progresses by demonstrating that in The Legend of Zelda
(Nintendo 1986) squared trees with more pronounced shading multiply
on the screen, while in Archipelagos (Prism/Astral Software, 1989), maybe
for the first time, the trees are given a true narrative function in the game
beyond being mere ornamentation or part of the set designs.
Nevertheless, contrary to what Parallel I seems to suggest regard-
ing the history of video games since Pitfall, trees in games have a less obvi-
ous function than mere decoration. In fact, trees in video games have had,
most often, the purpose of rendering the movement of characters. They
dictate the player’s progress along a diegetic virtual territory. It is the
trees, in their immobility, that, alternating or multiplying themselves with
minute variations in form and positioning on the game screen, suggest a
“territory in exploration” that moves beyond the bi-dimensional screen of
the electronic monitor. There is nothing trivial about this function: with-
out the trees (understood here as “digital representations of trees”), vid-
eo games may have never advanced beyond Space War, the first computer
game created by MIT at the beginning of the 1960s, or Pong (Atari, 1972),

HARUN FAROCKI : PROGRAMANDO O VISÍVEL


ON A POSSIBLE PHOTOGENIC IN VIDEO GAMES

the first profitable video game in history, created by Nolan Bushnell37. In


any case, Parallel I proceeds to recall that, in the 1990s, the (virtual) wind
blew through the leaves causing them to shake in Secret of Mana (Square
Co., 1993), while in Elder Scrolls: Arena (Bethesda Softworks, 1994), the
river water flowed beside a tree that is static but still superb with its rich
shadows and textures. In Anno 1602 (Sunflowers Interactive, 1998), the
trees multiply with more significant variations in color, shading and for-
mat thanks to repetition and varied configurations of groupings in a very
limited number of models, something that we can envision as a tool analo-
gous to the concept of linguistic recursion. Thus far, only the animals
move; the trees continue static. Finally, in Anno 1701 (Blue Byte Mainz/
Sunflowers Interactive, 2006), a tree gains movement. According to the
narration in Parallel I: “Now the leaves sway lightly in the wind. Birds fly
through the image, some of them just as shadows” (2’14” – 2’24”). The at-
tention to detail in the “digital tree” from Mystery House to Anno 1701 is
especially curious if we remember what George Méliès says about the tree
in the background of Le repas de bébé (The Baby’s Meal, 1895), the famous
short film by the Lumière brothers: “Au cinéma, les feuilles bougent” (In
film, the leaves shake). Ismail Xavier explains that, for Méliés:

The enchantment that was projected on the


screen was not at its center, where a family scene
was recorded, but deep in the background, where
the moving image made visible something that
was fleeting, the movement of the leaves, which

37 Bushnell, a fan of Space War and ex MIT student, founded Atari to commercialize Pong, the first game that could be played
in a domestic environment and not in a computer lab (like Space War), thanks to the fact that it was a gadget that was much

smaller than a pinball machine

275
276

until then had not been possible to see in the


theatrical experience, where the so-called “back-
drop” brought a design, a painting, in short a fixed
image, evoking an environment but not the live
feeling of its presence and movement.38

Xavier points out that, even today, Méliés’ statement still elicits the
question: after all, what really is cinema? Is it the scene of the bourgeois
family around the table? Or, is it the capturing of the movement of leaves in
the wind? The following assertion put forth by Xavier, which has as its foun-
dation Méliès’ observations on the Lumière brothers’ film, can also effec-
tively serve Farocki’s investigation into the digital representation of trees
from Mystery House to Anno 1701:

Here the moving image makes one feel the


presence of a moment that is not the center of
a drama, the inflection point of a life, but any
moment that gains interest in its singularity
precisely because it is ephemeral, not because
it is the synthesis or culminating point of a
process or because it is an inaugural moment,
not even because it symbolizes a transcendent
principle.39

38 I. Xavier, Maquinac ões do olhar: A cinefilia como ver além na imanência, in A.S. Médola; D. Araújo; F. Bruno (orgs.),
Livro da XV Compós, p. 24.
39 Ibidem, p. 25.

HARUN FAROCKI : PROGRAMANDO O VISÍVEL


ON A POSSIBLE PHOTOGENIC IN VIDEO GAMES

By addressing Méliès’ ideas, Xavier revisits the term photogénie first


employed by Louis Delluc, but most importantly by Jean Epstein, who
would go on to theorize more profoundly on the concept. Xavier contin-
ues by stating that:

The moving image is therefore seen as the cap-


ture (and re-creation) of movement, and its
greatest effects can come from situations in
which, in the midst of a continuous evolution of
things, a disturbance occurs that highlights an
event, bringing to light a detail that conveys the
difference. The object, person or nature, every-
thing that is in motion and within it, produces
a singular image that awakens emotion, a new
sense of knowing. This is the property of cinema
that Luis Delluc baptized as photogénie in 1919:
an inflection in the movement that celebrates
an instant in its instability, because nothing is,
everything is becoming, as is revealed by the
close-ups of faces, by furtive gestures and by the
details of things. Photogénie is not only in the
background; it can be at the center of the scene.40

With this in mind, I wonder if all Xavier’s observations on the fascina-

40 Ibidem, p. 26.

277
278

tion with capturing and reproducing movement in cinema could not be


transposed to the context of video games due to the respective propor-
tions and specificities involved. Do the meaning and same observations
persist if we change the words “film” and “cinema” in the passages above
to the word “video game”? I also ask myself, again, if the history of video
games does not reenact part of the trajectory of cinema, which in turn
leads me to think more carefully about the controversy in Jean Epstein’s
photogénie. Could we investigate a supposed photogénie that is charac-
teristic of video games or simply juxtapose this cinematographic concept
with an analysis of video games? Epstein once said:

Don’t say the obstacle and the limit make the


art, the limp which cultivates its crutch. Cinema
proves its error. It is entirely movement, without
obligation of stability or equilibrium. Photogé-
nie, among all the other sensory logarithms of
reality, is mobility41.

The term “photogénie” (which literally means “production of light”)


came into use for the first time in 1851 to refer to objects that produce light
or, more precisely, that reflect light well enough to make an impression on
the photographic plate. With the perfecting of photographic techniques
and the invention of more efficient emulsions in terms of photosensitiv-
ity, the photogénie began to designate, progressively, a certain quality of
light production on the part of the objects and bodies photographed. At

41 J. Epstein apud J. Aumont, As teorias dos cineastas, p. 92, my italics.

HARUN FAROCKI : PROGRAMANDO O VISÍVEL


ON A POSSIBLE PHOTOGENIC IN VIDEO GAMES

that moment, what was understood as photogénie was the object, in gen-
eral a face, which had a pleasing appearance when photographed; that is,
an object that is valued by photography, which in turn reveals unexpected,
enchanting and poetic aspects of an object, qualities virtually inacces-
sible to the naked eye42. In the aesthetic conception of the vanguard, as
in Louis Delluc, but more particularly in Jean Epstein, “the photogénie
constitutes a sensitive increase of reality through its filming, which can be
obtained by slow motion, by illumination or by great design”43. Especially
in Epstein, the photogénie – a term that is abstract and never proven or
defined in an unequivocal manner – is confused with a “great mystery”
that accounts for the “sensory and sensitive increase of reality through its
filming”44. Jacques Aumont and Michel Marie, for example, link the idea
of photogénie to the ontological concept of the photographic image pres-
ent in the thoughts of Sigfried Kracauer: “who speaks of the revelation of
‘things normally unseen’ as a kind of essence of this image”45. In “Bonjour
Cinema”, from 1921, Epstein proposes that the photogénie should be the
opposite of the literary:

A beautiful face is of something’s taste. I recog-


nize it as a musical phrase with threats of feel-
ings that accompany it, specific ones […] Our
eye, without extensive practice, cannot discover
it directly. A camera’s objective focuses on it,


42 J. Aumont; M. Marie, Dicionário teórico e crítico de cinema, p. 136.

43 M.-Th. Journot, Vocabulário de cinema, p. 74.


44 J. Aumont; M. Marie, op. cit., p. 136.
45 Ibidem, p. 136.

279
280

drains it and distils the photogenic through its


focal planes. Like the other, this vision has its op-
tics.46

In his writings from the 1930s and the post war era, Epstein begins to
confer a philosophic and psychological dimension to the term photogé-
nie. Aumont explains that, according to Epstein’s reflections, “Cinema
reveals something of the interior of the filmed subjects: this takes part in
the revelation of the photogénie (and even its essence).”47 Aumont goes
on to explain aspects that, to me, seem fundamental when considering the
thoughts and ideas provoked by Farocki’s Parallel I-IV. Jacques Aumont
comments on Epstein’s photogénie as follows:

The interesting thing is the almost naive belief


in cinema as a new, different mode of thought.
In addition to the habitual mode, founded in the
common perception, there is a possibility of a
new way of thinking based on the filmed percep-
tion, with its laws and virtualities. Born at the
turn of the Century, Epstein did not ignore the
importance of the dream as “other” thinking.
What approximated Cinema to the dream, for
him, is its common opposition to the ordinary
way of thinking, especially its reversibility, plas-


46 J. Epstein apud J. Aumont, op. cit., p. 91-92.


47 J. Aumont, op. cit., p. 70.

HARUN FAROCKI : PROGRAMANDO O VISÍVEL


ON A POSSIBLE PHOTOGENIC IN VIDEO GAMES

ticity of space, time and causality. This other way


of perceiving and thinking about the world is no
less interesting or pertinent than the ordinary
way.48

In his purposeful digression about the movement of trees and water in


Parallel I and his investigation and “revelation” of the nature of objects in
Parallel II, Farocki proposes that in the wake of the common way of think-
ing and subsequently “another way of thinking based on filmed perspec-
tive, with its laws and virtualities”, there has arisen a third way of thinking
– one even more contemporary and equally indebted to the dream – which
is now formulated by video games. Farocki retraces Epstein’s trajectory
one more time, investigating an “other way to perceive and think about
the world” which is no less relevant or interesting than the ways that came
before it, i.e. the habitual mode and the cinematographic mode. Epstein
says: “with the notion of the photogénie, the idea of art-cinema is born
because, to better define the undefinable photogénie that we are talking
about, the photogénie is to cinema what color is to painting, volume is
to sculpture – a specific element of this art”49. According to Aumont, the
photogénie would therefore be the virtus artistica of cinema50. Could the
photogénie or, in a more specific sense, a photoludogénie, also be a virtus
artistica of video games, the most overwhelming and growing form of art
that has flourished since the beginning of the XXI Century? It is clear that,
as Xavier explains, the photogénie in Epstein corresponds to a “moment

48 Ibidem, p. 71-72.

49 J. Epstein apud J. Aumont, op. cit., p. 92.

50 J. Aumont, op. cit., p. 92.

281
282

of vision”. “A capacity, exclusive to cinema, to reveal the poetic aspect of


the things on the screen, this poetry that is in the sudden palpitating of the
leaves, as reiterated in the reflection that amplified the reach of Méliès’
words, which have become an emblematic reference.”51 Xavier continues:

The poetic here is in the genuine image, un-


expected, new, against the cliché; the image that
frees us from rational control – a clear, pre-ver-
bal experience of the moment. […] For Epstein
and thinkers attuned to his way of understand-
ing the novelty of cinema, however, the narrative
is a cage, a syntax that domesticates the gaze and
allows one to perceive only what is inserted in
the chain of actions and reactions that compose
the sphere of the drama. Photogénie, to the con-
trary, is the valorization of the fleeting, of see-
ing what the simple syntax and concatenation
repress. That is, for the existence of the photo-
génie, belief in the image is fundamental, in the
revelation of a presence (not a symbol, not a sign
of a language that supposes a system).52

In fact, due to Epstein’s “revelationist” orientation in his investigation


of cinema’s specificity, we have to question if such a photogénie could be


51 I. Xavier, op. cit., p. 26.

52 Ibidem, p. 26-27.

HARUN FAROCKI : PROGRAMANDO O VISÍVEL


ON A POSSIBLE PHOTOGENIC IN VIDEO GAMES

thought of in the scope of images of synthesis, devoid of a more obvious


link to the empirical world and 100% generated in a computer environ-
ment by means of algorithms. Malcolm Turvey proposes that beyond the
two most well-known traditions of cinematic thought, modernism (or
formalism) and realism, there is still a third tradition that he calls “revela-
tionism,” which is affiliated with four European authors born at the end
of the 19th Century: Jean Epstein, Dziga Vertov, Siegfried Kracauer and
Béla Balázs. Since Epstein’s thought is built on “revelationist” theory, in
the terminology of Turvey, his work takes inspiration from the idea that
human vision is limited, incapable of seeing the true nature of reality. Ac-
cordingly, the director can reveal truths that are inaccessible to the naked
eye, and due to the fact that the camera is a machine independent of hu-
man intentions, Epstein and other “revelationists” place their hopes in
the cinema’s power to unveil a wider and richer reality than that which is
perceivable with our immediate vision53. It is natural to suppose, however,
that the indexical paradigm, which is based on an understanding of the
photographic and cinematographic image as the bearer of incontestable
traces of reality, ought to have been reasonably influential over the think-
ing of authors such as Kracauer or Epstein, as well as on the development
of concepts such as the photogénie. Yet we can ask if, faced with repeated
revisions of the indexical paradigm54, a revised version of Epstein’s photo-
génie would represent a good starting point for possibly adapting orbital
concepts to this same indexical paradigm or to the wider realist line of cin-
ematic thinking as a way of reinvigorating contemporary thought on the
macro-domain of sounds and images in motion. After all, according to the


53 M. Turvey, “Epstein, Bergson and Vision”, in T. Trifonova (ed.), European Film Theory, p. 93-94.
54 See G. Currie, Image and Mind; and S. Prince, True Lies: Perceptual Realism, Digital Images, and Film Theory, Film


Quarterly, v. 49, n. 3.

283
284

works of authors such as Lev Manovich (2000), the frontiers between the
cinematographic image, which is more indexical in nature, and computer
graphics imagery (CGI) have become increasingly fuzzy and indistinct.
Manovich proposes that:

Seen in this context, the manual construction


of images in digital cinema represents a return
to nineteenth century pre-cinematic practices,
when images were hand-painted and hand-ani-
mated. At the turn of the twentieth century, cin-
ema was to delegate these manual techniques to
animation and define itself as a recording medi-
um. As cinema enters the digital age, these tech-
niques are again becoming commonplace in the
filmmaking process. Consequently, cinema can
no longer be clearly distinguished from anima-
tion. It is no longer an indexical media technol-
ogy but, rather, a sub-genre of painting.55

Manovich observes that for the greater part of the 20th Century the in-
dexical paradigm (which is best illustrated by the concept of kino-eye pro-
posed by Dziga Vertov) prevailed. However, the turn of the 21st Century
saw the strong reemergence of a pre-cinematic representational paradigm
which Manovich calls kino-brush. In other words, Manovich suggests that
digital technologies in contemporary cinema recovered animated cinema
and non-automated techniques of image creation, securing their position
in today’s mainstream cinema – the success of contemporary animation
films, as is the case of studios like Disney-Pixar or Fox Animation, as well


55 L. Manovich, What is Digital Cinema? in P. Lunenfeld, op. cit., p. 175.

HARUN FAROCKI : PROGRAMANDO O VISÍVEL


ON A POSSIBLE PHOTOGENIC IN VIDEO GAMES

as the emergence of machinima as a cinematographic genre, perhaps indi-


cates the pertinence of these observations. In his conclusion “from kino-
eye to kino-brush”, Manovich asserts that currently:

The mutability of digital data impairs the val-


ue of cinema recordings as documents of reality.
In retrospect, we can see that twentieth century
cinema’s regime of visual realism, the result of
automatically recording visual reality, was only
an exception, an isolated accident in the his-
tory of visual representation which has always
involved, and now again involves the manual
construction of images. Cinema becomes a par-
ticular branch of painting - painting in time. No
longer a kino-eye, but a kino-brush.56

Given the the limited scope of this article, I will not further dis-
cuss Manovich’s observations here but, instead, emphasize that such
discussions could favor a possible transmutation of the concept of
photogénie into the territory of video games. In lieu of the indexical
paradigm,concepts such as perceptual realism57, seeing-in58 and likeness

56 Ibidem, p. 192.

57 G. Currie, op. cit.; S. Prince, op. cit.
58 Seeing-in is a concept introduced by Richard Wolheim in Art and its Objects taken up by Curie: “Describing our capacity to
recognize what is depicted in a picture, Richard Wollheim has spoken of seeing-in. We see the Duke of Wellington in the picture
Just as we see the face in the clouds or the figure in the frosted window pane. Seeing-in is a psychological phenomenon, a mental


capacity we contingently possess”, see G. Currie, op. cit., p. 90.

285
286

59
may be employed in a contemporary discussion on film, videogames and
realism. Such concepts are more attuned to aspects like analogy and ico-
nicity than the indexical paradigm that had been so prevalent in cinematic
realist theories for so many years. Gregory Currie argues that similarity,
or likeness, could be a defensible version of cinematographic realism. The
author also defends the idea that there should be cinematic styles which
are more realist than others, in the sense of a realism deeply-rooted in
similarity – the long shot and the depth of field are some of the most no-
table examples60. The concept of similarity reintroduced by Currie is at
the core of his proposal of perceptual realism. He explains that naturally
regenerative systems of representation, such as photography and cinema,
function by means of exploring our visual capacity to recognize represent-
ed objects, and in this way the experience of recognizing a photograph of
a horse is, in significant terms, identical to the experience of recognizing a
live horse. It is this type of realism that Currie denominates as perceptual
realism, and it is reasonable to suppose that the same would be as equally
valid and applicable in the context of videogames as it would be for natu-
rally generative representation systems. Inversely, in cases of systems of
representation that are not naturally generative, but operate by conven-
tion (such as the case of natural language or literature), we see little to no
degree of perceptual realism61. For Currie: “(...) representations are per-
ceptually realist when they share significant perceptive qualities with the
things they represent.”62
Such concepts and categories seem better equipped for an in-

59 Ibidem.
60 Ibidem, p. 79.
61 Ibidem, p. 90.

62 Ibidem, p. 111.

HARUN FAROCKI : PROGRAMANDO O VISÍVEL


ON A POSSIBLE PHOTOGENIC IN VIDEO GAMES

vestigation of wider cinematic phenomena, such as TV series or contem-


porary video games. My hypothesis here is that, with the weakening or
simple revision of the indexical paradigm, with the intention of adapting
or tailoring it to make it correspond with digital technologies or image
synthesis, the very Epsteinian concept of photogénie can also be revised
and made more flexible in terms of its relationship with the nature of the
photographic image, attenuating this relationship in favor of a wider va-
riety of representative modalities. In this sense, the originally Epstenian
photogénie, once transposed to the analysis of video games, can refer to a
class of images that are neither necessarily indexical nor necessarily fleet-
ing – the movement of the computer generated image is determined by
algorithms, hence remaining strictly predictable and controllable. Yet, is
the movement of bodies in the real world, not also submitted to known
physical laws which determine their occurrence, duration and variation?
Here is the provocation: in terms of “photogénie”, what is the difference
between the leaves that shake in the background of The Baby’s Meal and
those that tremble on the tree branches in Anno 1701?
If we can now envision the possible transposition of the Epstei-
nian concept of photogénie (already sufficiently controversial in film
history) into the field of videogame theory and criticism, we can also sup-
pose that around 2006 (with Anno 1701, among other games) video games
consolidated their own version of photogénie. After all, would Méliès’
sensation when viewing The Baby’s Meal not be somewhat comparable to
that of a player who becomes enchanted by the mobility of digitally rep-
resented objects in the diegetic space of a video game? Do objects, such as
a bottle being broken, a bush shaking in the wind or a simple metronome
ticking back and forth on a taciturn piano in a suspenseful game not have
any narrative function whatsoever? The memory of the metronome, com-
parable to any other prosaic object that occasionally inhabits a digitally

287
288

represented room, prompts me to think more deeply about what realism


in the territory of video games actually means (or does not mean), espe-
cially when considering Ronald Barthes’ reflections on the “effect of the
real”, a quality derived from Gustave Flaubert’s investigation of the “ines-
sential” in a given narrative 63. Ultimately, how can we understand, resort-
ing to Barthes as our point of departure, a “real effect” in video games?
I do not dare risk offering any response to this question here due to the
limited scope of this work. However, I do insist on asserting that the “ines-
sential” elements found in all and any contemporary video game perform
functions and trigger sensations in the player that are much less trivial
than what we are accostumed to thinking. To a large extent, I believe that
this is a major idea put forth by Farocki in Parallel I-IV.
The narrator in Parallel I observes that “within thirty years, the
leap from a drawing to an image that can barely be distinguished from
real cinematographic photographic images” (2’47” – 2’59”) became real
in the history of video games. This refers to the period of time between
Mystery House and Anno 1701, from 1980 to 2006. Games like The Legend
of Zelda, in which all of the objects are essentially four sided and built
from larger pixels (in hindsight, making them cruder), imply that “picto-
rial modernity” in video games would have arisen from the birth of this
technology and, for analogical purposes, before the cubist cinema, futur-
ist cinema and cinema pur of René Clair, Fernand Léger, Hans Richter, or
Viking Eggeling left their mark on the history of cinema. In other words,
videogames were born in conventionalism, abstraction and fiction, and
only later would they come to be figurative, mimetic and narrative. As op-
posed to the history of film, there is no equivalent to the Lumière brothers
and their documentary like imagery in the history of video games. The


63 R. Barthes, O rumor da língua, p. 190.

HARUN FAROCKI : PROGRAMANDO O VISÍVEL


ON A POSSIBLE PHOTOGENIC IN VIDEO GAMES

narrator in Parallel I states that:

Back in 1980, only vertical and horizontal lines


could be used (3’02” – 3’07”). And back in 1986,
every shape had to be formed from squares
(3’12” – 3’18”). The leaves and branches have
barely learned to move and already the question
is whether they move too steadily (3’32” – 3’41”).
Perhaps a thin branch should bend more than
a thick one (3’45” – 3’50”). In cinema there is
wind that blows, and the wind blown by a wind
machine (3’56” – 4’02”). With computer images,
there is only one kind of wind (4’03” – 4’08”). A
new Constructivism (4’08” – 4’11”).

Constructivism here is key to thinking of the video game as an avant-


garde form of art. The narrator of Parallel I continues by saying: “Here is
a flame made of squares (4’56” – 4’59”). They say: back then they could
only make objects from squares. (5’ – 5’04”). The same way one says:
the Egyptians could only draw people in profile (5’05” – 5’11”)”. The de-
construction of a teleological approach to the history of video games is
suggested in another conversation by the narrator, when she recalls that
“most painters of the Modern Age rejected the official story that old rep-
resentative art was limited and advanced later after some setbacks, right
up to photography” (6’08” – 6’21”). Thus, under the guise of conjecture,
we can suppose that the video game was born “Suprematist” – one may
recall Adventure – reverting back to the path taken by Kazimir Malevitch

289
290

in his work The Black Square (a black square over a white background),
painted between 1913 and 1915. Accordingly, video games such as Pong
or Adventure are also indebted to the Suprematism of Malevitch, even if
only for essentially technological or infrastructural reasons. Perhaps it is
not by chance that Farocki opted for smaller frames instead of the typical
film and video frames in some of the episodes of his Parallel I-IV, with the
frames isolated or in pairs, containing cut images like pieces in a puzzle.
The interface of Parallel I is Suprematist in this sense, albeit in reverse,
now with frames of audiovisual images over a black background. While
the layout of Parallel I is abandoned in episode II, where images extracted
from video games come to occupy the totality of the screen, the Supre-
matist nature of the layout returns in Parallel III.
With its representation of water from 07’26” to 09’06”, Parallel I
evokes a problem related to the representation of light. After all, the rep-
resentation of water, as a reflective surface, appears to depend consider-
ably on the representation of light in virtual digital environments, as has
always been the case with painting. The better treatment the light is given,
the more valued the water becomes, which has held true for the entire
history of video games, from the most schematic to the most realistic-
naturalistic. The thesis that, during their short period of existence, video
games have followed a reverse trajectory from that of the pictorial arts of
the last 1000 years is definitively expressed in the following narrative pas-
sage:

The creators of computer imagery didn’t have


to wait thousands of years for the Renaissance
(8’36” – 8’41”). Right from the start, their imagery
was closely associated with the work of techni-

HARUN FAROCKI : PROGRAMANDO O VISÍVEL


ON A POSSIBLE PHOTOGENIC IN VIDEO GAMES

cians and scientists (8’43” – 8’50”). These images


also show the development from a symbolic form
to filmic realism, from abstraction to concretism
(8’56” – 9’05”).

Departing from this idea, Farocki concentrates on a more detailed


comparison between water in cinema and water in video games – a reflec-
tion that makes us recall Images from the World and Inscriptions of War
when the filmmaker hovers over a mechanical wave laboratory, where
a machine produces fluid waves simulating the natural phenomenon64.
Unlike the water in cinema (here represented in a photochemical, cin-
ematographic image), a substance is lacking in the “digital water” of video
games. The “video game water” is only a surface – a reflective surface,
which is worth reiterating – revealed as such by the “virtual camera” or by
the simple point of view that penetrates the representation of the liquid
mass. According to the voice-over narration:

Here the foam splashes straight upwards with


each wave (09’08” – 09’13”). Apparently, there
is something blocking the flow directly below
the surface. (09’17” – 09’21”). In a fiction film,
we would view this effect from various perspec-
tives, if the splashing foam was supposed to be a
clue of something, like a sinking boat sinking or
a concrete coffin (09’25” – 09’38”). The virtual
camera could dive into these waters, but there is
no ocean to be seen (09’42” – 09’48”). The rocks


64 Cf. Rodowick, op. cit., p. 74.

291
292

float on the water’s surface, reminiscent of the


child who cuts open a doll to probe the mystery
of representation (09’55” – 10’05”).

After diving into the waters of video games, Farocki rises up to the
sky of virtual environments, starting at 10’47” in Parallel I. From 11’16” to
14’14”, Parallel I shifts its focus to the work of a young designer, demiurge
of a virtual world that begins with him populating the simulacrum of a
blue sky seen on his computer screen with clouds. Until 13’45” in Paral-
lel I, the young digital designer organizes the clouds – their shape, size,
aspects, configuration, distribution and perspective – so that afterwards
he can give them movement. The movement of the clouds over the blue
sky – movement equivalent to the leaves of the trees in Anno 1701 or the
waves in the ocean simulations – is perhaps analogous in its photogénie
to the shaking of the leaves in The Baby’s Meal. Once again, the photo-
génie comes into play. The young professional equally devotes himself
to manipulating the movement of the clouds, now in a realist or even
hyper-realist fashion, as opposed to games such a Super Mario Brothers
(Nintendo, 1985), where the clouds are limited to small white masses with
some points of shade, dislocating themselves horizontally on the visu-
ally pixelated video game screen. The narrator of Parallel I says, “Here are
clouds formed by squares” (14’37” – 14’39”).
Following the tradition of thinkers such as Walter Benjamin (ac-
cording to whom photography would have freed the pictorial arts from
their commitment to the representation of reality) and Andre Bazin (with
his ontology of the photographic image and film realism), this line of
thought is eventually paraphrased at the end of Farocki’s film, when the
narrator suggests that the increasingly realistic images of video games
might surpass cinema in their figurative and representational power (a

HARUN FAROCKI : PROGRAMANDO O VISÍVEL


“naturalist-illusionist” power, largely explored by the audiovisual indus-
try, and still “realist” in Bazinian terms), freeing film in favor of other as-
pirations. Accordingly, at 14’55”, Parallel I displays, side by side, two kinds
of moving images featuring clouds – one cinematic, the other from a video
game. The narrator explains:

According to legend, the Greek Zeuxis’ could


make drawings of fruit so realistic that birds
flocked by to peck at them.. Clouds created by a
computer and clouds photographed by a camera.
The flickering image on the right reveals that it
is from a camera. Maybe the computer images
will assume functions that were previously held
by film. Maybe that will liberate film for other
things. The computer images try to achieve the
effect of film images. They want to surpass them,
leave them far behind. The creators of computer
images do not want to attract flocks of Greek
birds. Their heaven should be populated
by creatures of their own design (14’42” – 15’45”).

Parallel I ends like this, suggesting a supposed autonomy of digital


imagery that is specific to videogames, that maybe aspires to be neither a
trompe l’oeil nor hyperrealism, but instead a re-foundation of the world
based on the re-creation of its inhabitants – and even its spectators. Thus,
while scrutinizing the power of videogames, Farocki seems to revisit the
same path that Epstein followed when investigating the power of cinema.
I suspect that Farocki’s initial feelings towards videogames may have
been, in essence, very similar to Méliès’, Delluc’s and especially Epstein’s

293
294

fascination with the cinematic image. I believe that throughout the en-
tirety of the series Parallel I-IV, but even more specifically in episode I,
Farocki suggests a photogénie specific to video games, a new form of pho-
togénie, characteristic of a new way of seeing the world.
While preparing this text, two new video games were launched
on the market: Pokémon Go (Niantic, Inc., July 2016) and No Man’s Sky
(Hello Games, August 2016). For use on cellphones and benefitting from
augmented reality technology, Pokémon Go has brought millions of play-
ers into the streets in various countries to hunt little monsters from the
Pokémon franchise, which appear superimposed onto the reality of the
most varied public and private environments. No Man’s Sky, launched
for both PlayStation 4 and Microsoft Windows platforms, promotes an
endless game with a potentially infinite narrative. With a story based on
space exploration, No Man’s Sky tries to simulate an entire universe for its
player by means of a powerful algorithm that promises more than 18 quin-
tillion possible planets waiting to be explored by the hero-astronaut. In a
“first person” and “open world survival game” style, No Man’s Sky capital-
izes on ideas that were delineated and developed in games like the Grand
Theft Auto series and Spore (Maxis, 2008). Thus, it becomes logical to
surmise that certain reflections on the contemporary ethics and aesthet-
ics of computer imagery, some of which are put forth by Farocki in Parallel
I-IV, are only just beginning to come to fruition.

HARUN FAROCKI : PROGRAMANDO O VISÍVEL


TÍTULO DO TEXTO

BIBLIOGRAPHY

BIBLIOGRAPHY Project Gutenberg]. Available at: <https://www.guten-berg.


AUMONT, Jacques. (2008). As Teorias dos Cineastas. 2ed. org/files/40097/40097-pdf.pdf?session_id=2e353b1a7b
Campinas: Papirus. 9e58faf24c283beade3342fd8a5085>.
AUMONT, Jacques; MARIE, Michel. (2007). Dicionário _______. (2011c) The World As Will And Idea v. 3. Available
Teórico e Crítico de Cinema. 3 ed. Campinas: Papirus. BEN- at: <https://www.gutenberg.org/files/40868/40868-pdf.
JAMIN, Walter. (2000). A Obra de Arte na Época de Sua pdf?session_id=2e353b1a7b9e58faf24c283beade3342fd
Reprodutibilidade Técnica. In: LIMA, Luiz Costa (org.). 8a5085>.
Teoria da Cultura de Massa. São Paulo: Paz e Terra. STANTON, Richard. (2015). A Brief History of Video
BARTHES, Roland. (2012). O Rumor da Língua. 3ed. São Games: From Atari to Xbox One. London: Robinson.
Paulo: Martins Fontes. TURKLE, Sherry. (2003). Video Games and Computer
BAZIN, André. (2016). O Realismo Impossível. Belo Hori- Holding Power. In: WARDRIP-FRUIN, Noah; MONT-
zonte: Autêntica. FORT, Nick. (eds.). The New Media Reader. Cambridge: The
BATEMAN, Chris (ed.). (2006). Game Writing: Narrative MIT Press.
Skills for Videogames. Boston: Cengage Learning. CURRIE, TURVEY, Malcolm. (2008). Epstein, Bergson and Vision.
Gregory. (1995). Image and Mind: Film, Phi-losophy, and In: TRIFONOVA, Temenuga (ed.). European Film The-ory.
Cognitive Science. Cambridge: Cambridge University Press. New York: Routledge.
EPSTEIN, Jean. (1975). Écrits sur le Cinéma: 1921-1953. XAVIER, Ismail. (2007). Maquinac ões do Olhar: A Cinefi-
Paris: Seghers. lia Como Ver Além na Imanência. In: MÉDOLA, Ana Sílvia;
HARRIGAN, Pat; WARDRIP-FRUIN, Noah. (2009). ARAÚJO, Denise; BRUNO, Fernanda (orgs.). Livro da XV
Third Person: Authoring and Exploring Vast Narratives. Compós: Imagem, Visibilidade e Cultura Midiática. Porto
Cambridge: The MIT Press. Alegre: Sulina.
______. (2007). Second Person: Role-Playing and Story in WARDRIP-FRUIN, Noah; MONTFORT, Nick. (eds.).
Games and Playable Media. Cambridge: The MIT Press. (2003). The New Media Reader. Cambridge: The MIT Press.
JENKINS, Henry. (2003). Game Design as Narrative Archi- WARDRIP-FRUIN, Noah; HARRIGAN, Pat. (2004). First
tecture. In: WARDRIP-FRUIN, Noah; MONTFORT, Nick. Person: New Media as Story, Performance, and Game.
(Eds.). The New Media Reader. Cambridge: The MIT Press. Cambridge: The MIT Press.
JOURNOT, Marie-Thérèse. (2005). Vocabulário de Cine-
ma. Lisboa: Edições 70.
KELLER, Sarah. (2012). Introduction. In: KELLER, Sarah;
PAUL, Jason N. (Eds.) Jean Epstein: Critical Essays and
New Translations. Amsterdam: Amsterdam University
Press.
MANOVICH, Lev. (2013). Software Takes Command. New
York: Bloomsbury Academic.
______. (2001). The Language of New Media. Cambridge:
The MIT Press.
______. (2000). What is Digital Cinema? In: LUNEN-
FELD, Peter (ed.). The Digital Dialectic: New Essays on
New Media. Cambridge/London: The MIT Press. MA-
NOVICH, Lev; KRATKY, Andreas. (2005). Soft Cine-ma:
Navigating The Database. Cambridge: The MIT Press.
PRINCE, Stephen. (1996). True Lies: Perceptual Realism,
Digital Images, and Film Theory. Film Quarterly, v. 49, n.
3, Spring.
RODOWICK, D. N. “A consciência liberada de Harun Faro-
cki”. In: SOBRINHO, Gilberto Alexandre (org.). Cinemas
em Redes: Tecnologia, Estética e Política na Era Digital.
Campinas: Papirus, 2016, pp. 67-78.
SCHOPENHAUER, Arthur. (2011a). The World As
Will And Idea, v. 1 [E-book Project Gutenberg]. Available
at: <https://www.gutenberg.org/files/38427/38427-pdf.
pdf?session_id=2e353b1a7b9e58faf24c283beade3342fd
8a5085>
_______. (2011b) The World As Will And Idea v. 2. [E-book

295
296

HARUN FAROCKI : PROGRAMANDO O VISÍVEL


INTERFACE

INTERFACE
HARUN FAROCKI

297
298

Legendas em português da 0007 00:00:46:17 00:00:50:22


instalação Interface (1995) O interessante aqui é
com narração de Farocki. que há duas imagens
simultâneas,
0001 00:00:14:16 00:00:16:18
Atualmente, 0008 00:00:51:03 00:00:53:21
não escrevo nem uma palavra, uma associada à outra.

0002 00:00:17:00 00:00:19:14 0009 00:00:58:22 00:01:01:20


se não houver uma imagem Paul Cozighian fez
simultaneamente na tela. esta gravação em Bucareste,

0003 00:00:20:05 00:00:22:11 0010 00:01:02:05 00:01:07:05


Ou, melhor, em ambas as telas. no dia 21 de dezembro de 1989,
pouco antes do início da
0004 00:00:33:04 00:00:35:02 revolução.
Este é um local de trabalho,
0011 00:01:08:16 00:01:10:11
0005 00:00:35:04 00:00:38:21 Com sua câmera,
uma mesa de edição, para
processamento de imagens e 0012 00:01:10:13 00:01:13:16
sons. ele estabeleceu uma conexão
entre o televisor e a rua.
0006 00:00:39:13 00:00:45:05
O painel de controle, o aparelho 0013 00:01:20:20 00:01:24:18
de reprodução, o gravador. Na tela, Ceausescu,
fazendo um pronunciamento,

HARUN FAROCKI : PROGRAMANDO O VISÍVEL


INTERFACE

0014 00:01:25:04 00:01:28:15 0020 00:02:13:16 00:02:17:00


a exemplo de tantos outros “Transmissão ao vivo”,
nos últimos vinte e cinco anos. até que Ceausescu prosseguisse.

0015 00:01:29:14 00:01:33:04 0022 00:02:25:03 00:02:27:08


Na rua, homens e mulheres Essa interferência,
indo embora, essa interrupção,

0016 00:01:33:06 00:01:35:15 0023 00:02:27:18 00:02:29:19


antes mesmo do término do teria sido um sinal de rebelião?
discurso.
0024 00:02:30:21 00:02:34:22
0017 00:01:37:00 00:01:40:21 Paul Cozighian moveu a câmera
Momentos antes, do televisor para a janela.
algo pareceu incomodar
Ceausescu, 0025 00:02:35:04 00:02:38:23
E confrontou a imagem oficial
0018 00:01:41:10 00:01:47:08 com a imagem da rua:
algo que a câmera não mostrou.
Ele parou de falar, 0025 00:02:35:04 00:02:38:23
imagem e contra-imagem.
0019 00:01:47:10 00:01:50:13
e a TV governamental 0027 00:02:42:21 00:02:47:06
interrompeu a transmissão. Era o momento de abandonar
o televisor e de ir para a rua.
0020 00:02:13:16 00:02:17:00
Por mais de um minuto, 0028 00:02:48:02 00:02:51:01
viram-se somente estes dizeres: A lente da câmera
focalizou a rua,

299
300

0029 00:02:51:11 00:02:54:02 onde simplesmente se copia


na esperança de uma fita para a outra,
de que lá tivesse acontecido
algo. 0037 00:03:41:09 00:03:44:21
fazendo-se um corte virtual,
0030 00:03:00:01 00:03:05:04 em vez de um corte real.
Com esse gesto, a rua foi
predestinada a ser um campo 0037 00:03:41:09 00:03:44:21
fértil. Quando trabalho na edição,
coloco a ponta dos dedos
0031 00:03:08:14 00:03:10:02
Um feitiço. 0039 00:03:53:04 00:03:59:04
sobre a fita em movimento,
0032 00:03:11:16 00:03:13:08 para sentir o ponto de emenda
Um feitiço.
0040 00:03:59:09 00:04:01:16
0033 00:03:20:20 00:03:24:14 antes de vê-lo ou ouvi-lo.
Quando se trata de processar
um filme, não um vídeo, 0041 00:04:05:11 00:04:10:20
Esse gesto indica uma acurada
0034 00:03:25:01 00:03:29:00 percepção ou sensibilidade tátil.
é preciso fazer um corte real
no filme, ou na fita sonora. 0042 00:04:11:24 00:04:14:21
A mão quase não teve contato
0035 00:03:35:11 00:03:37:24 com o objeto
É diferente da edição de um
vídeo, 0043 00:04:14:23 00:04:17:05
e mesmo assim o identificou.
0036 00:03:38:01 00:03:40:22

HARUN FAROCKI : PROGRAMANDO O VISÍVEL


INTERFACE

0044 00:04:21:10 00:04:24:24


No trabalho com vídeo, 0051 00:05:03:08 00:05:08:23
não toco na fita, Esta mesa de edição tem duas
telas,
0045 00:04:25:01 00:04:29:23 para mostrar se combinam duas
simplesmente aperto botões. imagens
Essa também é uma atividade
tátil. 0052 00:05:09:00 00:05:12:06
que deverão aparecer
0046 00:04:38:17 00:04:41:01 sequencialmente em um filme.
Este é o gesto
de contar dinheiro. 0053 00:05:14:11 00:05:16:11
Esta imagem combina
0047 00:04:41:08 00:04:43:11 com esta outra?
É provável que seja assim,
0054 00:05:19:17 00:05:22:10
0048 00:04:43:13 00:04:48:17 Esta imagem completa esta?
porque a sensibilidade tátil é
crucial 0055 00:05:23:13 00:05:26:12
para contar dinheiro com Esta imagem se exclui
precisão. diante da outra?

0049 00:04:49:24 00:04:52:10 0056 00:05:28:12 00:05:33:12


Com uma cédula, Pode-se interpretar essa
pode-se evidenciar dualidade
como uma imagem comentando
0050 00:04:52:12 00:04:56:08 outra.
como a essência
pouco coincide com a aparência.

301
302

0057 00:05:33:19 00:05:37:20 0064 00:06:20:07 00:06:24:05


Até hoje, as imagens eram crimes dos imperialistas
comentadas americanos
com palavras ou música. contra mim e meu vilarejo.
0065 00:06:25:11 00:06:29:14
0058 00:05:38:15 00:05:40:17 No dia 31 de março de 1966,
Aqui, imagens comentam por volta das dezesseis horas,
imagens.
0066 00:06:29:16 00:06:32:13
0059 00:05:53:16 00:05:57:01 eu estava lavando a louça
Foi assim que comecei
um filme em 1969. 0067 00:06:32:15 00:06:36:11
e ouvi barulho de aviões.
0060 00:06:04:03 00:06:07:15 Corri para o abrigo.
Um depoimento perante
o Tribunal Vietnã em 0068 00:06:36:13 00:06:39:04
Estocolmo. Mal havia saído pela porta,
fui surpreendido
0061 00:06:09:05 00:06:11:10
Meu nome é Thai Bihn Dan. 0069 00:06:39:06 00:06:42:13
pela explosão de uma bomba de
0062 00:06:11:23 00:06:15:21 napalm
Sou vietnamita bem próxima de mim.
e nasci em 1949.
0070 00:06:43:05 00:06:47:09
0063 00:06:17:08 00:06:20:05 As chamas me envolveram
Quero denunciar aqui, com um calor insuportável.
perante este tribunal,

HARUN FAROCKI : PROGRAMANDO O VISÍVEL


INTERFACE

0071 00:06:47:15 00:06:49:09 0079 00:07:19:06 00:07:20:24


Depois, desmaiei. vocês fecharão os olhos.

0072 00:06:50:23 00:06:55:18 0080 00:07:21:13 00:07:24:21


O napalm queimou meu rosto, Primeiro, fecharão os olhos
braços e pernas. diante das fotos,

0073 00:06:56:09 00:06:58:23 0081 00:07:25:12 00:07:29:15


Minha casa também foi depois,, fecharão os olhos
queimada. diante da lembrança,

0074 00:07:00:14 00:07:03:00 0082 00:07:29:24 00:07:33:22


Após treze dias inconsciente, depois fecharão os olhos
diante dos fatos,
0075 00:07:03:02 00:07:06:15
acordei em um hospital da FLN. 0083 00:07:35:02 00:07:38:15
depois, fecharão os olhos
0076 00:07:09:20 00:07:12:08 diante do contexto.
Como podemos demonstrar
os efeitos do napalm 0084 00:07:40:06 00:07:43:02
Se lhes mostrarmos uma pessoa
0077 00:07:12:10 00:07:15:02 com ferimentos por napalm,
e mostrar os ferimentos
por ele provocados? 0085 00:07:43:08 00:07:45:02
vamos ferir seus sentimentos.
0078 00:07:16:10 00:07:19:04
Se lhes mostrarmos uma foto 0086 00:07:45:21 00:07:49:13
de ferimentos por napalm, Se ferirmos seus sentimentos,
vai lhes parecer

303
304

0087 00:07:49:15 00:07:52:03 0094 00:08:24:17 00:08:28:20


que os estamos expondo Ao final da narrativa,
ao napalm, o autor se queima
intencionalmente,
0088 00:07:52:05 00:07:53:23
a suas próprias custas. 0095 00:08:28:22 00:08:31:17
mas em um só local de sua pele.
0089 00:07:55:17 00:08:00:14
Só podemos dar-lhes uma vaga 0096 00:08:32:10 00:08:35:17
noção Aqui também somente
de como o napalm age. um elo pontual com o mundo
real.
0090 00:08:05:09 00:08:09:14
Um cigarro queima a uma 0097 00:08:38:08 00:08:42:01
temperatura O autor se compara com um
de cerca de quatrocentos graus. animal
dos laboratórios de pesquisas.
0091 00:08:09:24 00:08:13:15
Napalm queima com um calor 0098 00:08:42:17 00:08:46:05
de três mil graus. Assim, equipara o local de
trabalho
0092 00:08:15:20 00:08:19:05 com um laboratório.
Duas imagens
que têm algo em comum: 0099 00:08:50:16 00:08:52:19
O que acontece
0093 00:08:19:21 00:08:22:14 em uma mesa de edição:
esse pode ser o ponto de partida
para um filme.

HARUN FAROCKI : PROGRAMANDO O VISÍVEL


INTERFACE

0100 00:08:52:21 00:08:55:09 0107 00:09:29:17 00:09:34:08


isso pode ser comparado “Quando o mar quebra na praia,
a um estudo científico? irregular, mas não
desregradamente,
0101 00:08:56:22 00:09:00:24
Uma mesa de edição é local 0108 00:09:36:05 00:09:38:04
de experimentos científicos? seu movimento atrai nosso
0102 00:09:04:19 00:09:07:09 olhar,
Segundo os conceitos científicos
da era moderna, 0109 00:09:38:23 00:09:41:07
sem, contudo, prendê-lo,
0103 00:09:07:11 00:09:11:22 mas libertando pensamentos.”
a mão do cientista não deve
interferir em um processo. 0110 00:09:49:03 00:09:52:04
Esta é uma representação
0104 00:09:11:24 00:09:16:01 da empresa química Dow
Enquanto durar o experimento, Chemical.
o cientista é mero intelecto.
0111 00:09:53:02 00:09:56:13
0105 00:09:19:10 00:09:21:00 As imagens dizem
Aqui vemos um experimento que um laboratório não é assim.
feito em laboratório.
0112 00:09:57:08 00:09:59:10
0106 00:09:21:02 00:09:25:02 Químicos não falam assim.
Este é o tanque de um instituto
para pesquisa de ondas 0113 00:09:59:19 00:10:03:17
marítimas. As pessoas que trabalham aqui
não falam assim.

305
306

0114 00:10:04:22 00:10:07:21 0121 00:10:39:21 00:10:42:00


Essas não são reproduções. recombinando.
São modelos.
0122 00:10:45:06 00:10:49:23
0115 00:10:09:03 00:10:12:23 Essas imagens também dizem:
Por favor, encaminhe os uma estação de trabalho não é
documentos assim.
necessários a meu assistente.
0123 00:10:51:01 00:10:55:02
0116 00:10:13:24 00:10:15:02 Essa não é a representação,
É como eu digo. mas o modelo de uma mesa de
edição.
0117 00:10:15:04 00:10:18:04
Uma grande empresa química 0124 00:10:57:01 00:11:00:03
é como um brinquedo de blocos, Quando filmei isso,
há quase vinte anos,
0118 00:10:18:06 00:10:20:16
Você pode montar 0125 00:11:00:13 00:11:03:07
O mundo inteiro com eles. a maioria das pessoas
ainda tinha seu emprego
0119 00:10:25:10 00:10:29:09
Repetidas vezes ilustrei 0126 00:11:03:09 00:11:05:20
o local de trabalho do autor. nas grandes fábricas e
escritórios.
0120 00:10:33:18 00:10:38:16
Aqui está o autor, com os 0127 00:11:06:01 00:11:08:08
recursos Assim, meu trabalho individual
da montagem, fazendo
mudanças,

HARUN FAROCKI : PROGRAMANDO O VISÍVEL


INTERFACE

0128 00:11:08:10 00:11:10:24 0135 00:12:07:22 00:12:10:23


estava na contramão Durante mais de um ano
da sociedade operária. coletei e estudei

0129 00:11:12:07 00:11:16:07 0136 00:12:11:00 00:12:16:06


Nesse ínterim, a sociedade fabril imagens sobre o tema
voltou-se contra si mesma. “operários saindo da fábrica”.

0130 00:11:26:10 00:11:30:18 0137 00:12:18:18 00:12:24:08


À esquerda, a primeira cena Qual seria o objetivo dessa
da história do filme: análise?
Deve haver um objetivo afinal de
0131 00:11:31:05 00:11:34:20 contas
operários e operárias
saindo de uma fábrica, 0138 00:12:27:11 00:12:30:19
Pensemos na visão do
0132 00:11:35:08 00:11:38:10 historiador,
no caso, uma fábrica do historiador de arte.
que produz artigos fotográficos.
0139 00:12:31:16 00:12:34:11
0133 00:11:40:19 00:11:43:22 Seu olhar percorre
À direita, milhares de obras
imagens de cem anos atrás,
0140 00:12:34:19 00:12:40:00
0134 00:11:44:02 00:11:48:02 e descobre algo novo
que repetem, modificam nessa figura, o jovem de Crítios.
e atualizam a primeira cena.

307
308

0141 00:12:44:19 00:12:48:05 0147 00:13:13:02 00:13:17:17


Pela primeira vez, pernas e pés Talvez, poderíamos dizer que
não recebem o mesmo peso: essa é
a representação do cidadão
0142 00:12:49:14 00:12:52:06 isonômico,
o corpo descansa
sobre a perna esquerda. 0148 00:13:17:19 00:13:20:22
apesar de não expressar
0143 00:12:52:16 00:12:55:07 tanto a igualdade,
Consequentemente,
o quadril direito está mais baixo, 0149 00:13:21:07 00:13:26:03
e, sim, a liberdade
0144 00:12:55:14 00:12:59:16 e a mobilidade.
assim como o ombro direito.
A cabeça, voltada levemente 0150 00:13:35:16 00:13:39:23
para o lado. Isso porque a escultura grega
se caracteriza mais pela
0145 00:13:03:03 00:13:07:11 expressão
Um relaxamento,
capaz também de criar tensão. 0151 00:13:40:00 00:13:44:16
da igualdade, do tipo.
0146 00:13:08:24 00:13:11:16 Mas agora de uma maneira
O ser humano é visto diferente.
de forma diferente, ele é
diferente. 0152 00:13:44:22 00:13:48:16
Não se enfoca a peculiaridade
do cidadão isonômico,

HARUN FAROCKI : PROGRAMANDO O VISÍVEL


INTERFACE

0153 00:13:48:18 00:13:51:15 0160 00:14:48:19 00:14:51:01


mas o ser humano os textos que deveriam
como aparece agora: acompanhá-las.

0154 00:13:51:17 00:13:55:19 0161 00:14:51:07 00:14:54:09


experiente pela influência Eu falava com as imagens
de forças opostas, e escutava o que elas me diziam.

0155 00:13:56:08 00:13:58:08 0162 00:15:11:09 00:15:14:23


como a isonômica polis. Foi assim que comecei um filme,
em 1977.
0156 00:14:11:20 00:14:16:09
Foi editando esse filme 0163 00:15:19:05 00:15:22:07
que compreendi, pela primeira Como não receberia dinheiro
vez, para fazer esse filme,

0157 00:14:16:22 00:14:20:15 0164 00:15:22:22 00:15:25:13


como observar as imagens tive que procurar outros
despretensiosamente, trabalhos.
sequencialmente,
0165 00:15:26:16 00:15:30:10
0158 00:14:20:17 00:14:24:05 Os recursos vieram da indústria
até a construção do filme da cultura, como de costume.
acontecer por si.
0166 00:15:32:04 00:15:36:11
0159 00:14:45:04 00:14:48:14 Na parede, a cruz.
Mais tarde aprendi Talvez um gráfico de
a deduzir das imagens coordenadas.

309
310

0167 00:15:37:09 00:15:40:21 0175 00:16:11:04 00:16:15:24


Coordenadas existem Aqui, o autor insere um texto
para determinar a posição. que lhe foi fornecido pela
história.
0168 00:15:41:07 00:15:43:23
Aqui, as imagens seriam 0176 00:16:17:12 00:16:21:19
as medidas determinantes. “Em 1917, quando era
enfermeira
0169 00:15:47:07 00:15:50:17 da Cruz Vermelha no front,
Logo a seguir vemos o autor
desocupando a mesa, 0177 00:16:21:21 00:16:23:15
eu perguntava aos soldados
0170 00:15:51:02 00:15:53:03
até surgir uma superfície limpa. 0178 00:16:23:17 00:16:26:17
por que combatiam
0171 00:15:53:20 00:15:56:08 e por que morriam.”
Não branca como uma tela,
mas preta. 0179 00:16:29:07 00:16:32:09
O roteiro, ou seja,
0172 00:15:59:15 00:16:03:07 o texto da história,
O roteiro salta da mesa do autor
para dentro da cena do filme, 0180 00:16:32:11 00:16:34:21
volta a aparecer
0173 00:16:03:18 00:16:05:11 no final do filme.
um salto no tempo, 0181 00:16:35:10 00:16:39:05
Agora, a enfermeira da Cruz
0174 00:16:05:13 00:16:08:24 Vermelha
para 1917, um ano ocupa o lugar do autor.
de guerra e de revolução.

HARUN FAROCKI : PROGRAMANDO O VISÍVEL


INTERFACE

0182 00:16:44:16 00:16:49:13 0189 00:17:20:10 00:17:23:07


Nessa segunda guerra, as experiências que vivenciava
que começou por volta de 1933, nas muitas horas, dias e anos

0183 00:16:50:17 00:16:54:17 0190 00:17:23:09 00:17:26:13


aqueles que morriam nada em que trabalhava
tinham na minha mesa de edição,
para dizer aos sobreviventes.
0191 00:17:28:00 00:17:30:07
0184 00:16:56:00 00:16:57:24 assim como os matemáticos
O motivo de sua morte dificilmente encontram alguém

0185 00:16:58:13 00:17:01:22 0192 00:17:30:19 00:17:33:12


deveria ter sido aprendido a quem possam contar seus
na guerra anterior. feitos.

0186 00:17:06:16 00:17:09:10 0193 00:17:36:21 00:17:40:24


Nesta guerra, deixo em branco Aqui, sou visto transferindo
as páginas do meu diário. cada cena de um dos meus
filmes
0187 00:17:09:24 00:17:12:04
Estou desmotivada para 0194 00:17:41:01 00:17:43:19
aprender. de uma fita para outra.

0188 00:17:17:22 00:17:20:08 0195 00:17:44:14 00:17:47:13


Às vezes me parecia que jamais Seleciono doze quadros
poderia compartilhar com de cada tomada
alguém

311
312

0196 00:17:48:07 00:17:51:14 0203 00:18:28:02 00:18:33:03


e reproduzo somente alguns séculos antes,
meio segundo de cada uma. quando a Europa irrompeu no
mundo.
0197 00:17:57:08 00:18:03:00
Sendo esse um processo 0204 00:18:37:18 00:18:39:19
demorado, Mas, quando o filme foi
posso falar sobre outras coisas. inventado,

0198 00:18:08:16 00:18:11:04 0205 00:18:40:00 00:18:42:20


Metáfora significa transferência. já quase não havia mais espaços
em branco no mapa.
0199 00:18:11:18 00:18:14:19
Aqui estou transferindo 0206 00:18:50:20 00:18:53:23
imagem um para imagem dois. Aqui está um primeiro resultado
da nossa transferência analítica.
0200 00:18:19:12 00:18:22:00
Quando o cinema foi inventado, 0207 00:19:00:03 00:19:05:12
há cem anos,
Nota-se no filme aqui montado
0201 00:18:22:10 00:18:24:22 uma sequência de imagens
isso aconteceu com um atraso inertes,
de vários séculos.
0208 00:19:06:06 00:19:10:01
0202 00:18:25:21 00:18:28:00 seguida de imagens com
A imagem fotográfica movimento,
deveria ter sido inventada depois novamente estáticas,

HARUN FAROCKI : PROGRAMANDO O VISÍVEL


INTERFACE

0209 00:19:10:06 00:19:11:24 0217 00:20:07:12 00:20:09:17


e assim por diante. sem que eu esteja
em uma mesa de edição.
0210 00:19:12:01 00:19:14:16
As imagens com movimento 0218 00:20:11:06 00:20:14:07
não são acompanhadas de Escrevo sobre as imagens
textos. e leio algo nelas.

0211 00:19:31:15 00:19:34:21 0219 00:20:18:15 00:20:20:19


Aqui, sou visto transferindo Atualmente estou pensando
as imagens animadas desse filme em um filme

0212 00:19:35:04 00:19:37:12 0220 00:20:20:21 00:20:23:12


de uma fita para outra, sobre codificação e
decodificação
0213 00:19:38:05 00:19:41:02 de mensagens.
reproduzindo três segundos
de cada tomada. 0221 00:20:24:04 00:20:28:03
Códigos secretos são usados
0214 00:19:54:07 00:19:56:15 por amantes e militares.
Como esse é
um processo demorado, 0222 00:20:30:01 00:20:33:22
Este é o codificador dos
0215 00:19:57:00 00:19:59:24 alemães,
podemos falar de outras coisas. chamado “Enigma”.

0216 00:20:05:02 00:20:07:10 0223 00:20:35:04 00:20:38:04


Atualmente, nem consigo Esta máquina codifica
pensar em um filme, de acordo com um programa.

313
314

0224 00:20:41:17 00:20:47:01 0230 00:21:15:04 00:21:18:09


Ao teclar uma determinada que foi fundamental para
letra, o desenvolvimento dos
libera-se um impulso elétrico computadores.
que,
0231 00:21:20:16 00:21:25:00
0225 00:20:47:08 00:20:51:04 Alan Turing gostava de encarar
dependendo da posição dos o intelecto humano como
cilindros, máquina.
segue um caminho diferente

0226 00:20:51:13 00:20:54:11 0232 00:21:25:20 00:21:28:07


e faz acender outra letra. Ele próprio queria
pensar como uma máquina.
0227 00:20:58:00 00:21:00:13
Na Segunda Guerra Mundial, 0233 00:21:31:02 00:21:34:07
os ingleses conseguiram E, A, M,

0228 00:21:00:15 00:21:03:23 0234 00:21:36:08 00:21:39:12


fabricar uma máquina E, X, P,
que quebrava os códigos dos
alemães. 0235 00:21:40:16 00:21:43:12
E, U, F,
0229 00:21:10:15 00:21:14:17
Para isso construíram, sob 0236 00:21:44:12 00:21:47:11
direção M, J, M,
de Alan Turing, uma
megacalculadora, 0237 00:21:48:05 00:21:49:23
N, A.
HARUN FAROCKI : PROGRAMANDO O VISÍVEL
INTERFACE

0238 00:21:57:03 00:22:00:13 0245 00:22:29:05 00:22:34:01


Este é mais um resultado ou engrenagens de máquinas de
de nossa transferência analítica. jogos,
não em engrenagens de
0239 00:22:03:11 00:22:06:15 codificadores,
Pode-se notar
que as imagens se repetem, 0246 00:22:34:15 00:22:37:11
que definem determinada
0240 00:22:06:17 00:22:08:23 transposição.
seguindo as regras
de uma permutação.
0247 00:22:52:17 00:22:56:04
0241 00:22:10:13 00:22:14:20 Aqui vemos o autor
Quando montei este filme, folheando um livro
utilizei um programa simples,
0248 00:22:56:06 00:22:58:13
0242 00:22:15:14 00:22:19:02 com fotos de mulheres
onde as imagens são argelinas.
combinadas
e recombinadas. 0249 00:23:03:23 00:23:06:06
Rostos que eram cobertos por
0243 00:22:20:07 00:22:22:11 véus.
Um programa determina a
sequência. 0250 00:23:08:09 00:23:11:10
O véu cobre a boca,
0244 00:22:25:12 00:22:28:19 o nariz e as faces,
Naquela ocasião pensei
nas regras da composição 0251 00:23:12:07 00:23:13:19
musical, deixando os olhos à mostra.
315
316

0252 00:23:16:03 00:23:19:01


Com sua mão,
ele cobre partes dos rostos

0253 00:23:19:13 00:23:22:03


e assim determina
diferentes enquadramentos.

0254 00:23:36:17 00:23:39:07


Não se trata aqui da biografia
de Alan Turing,

0255 00:23:40:02 00:23:43:12


nem de um filme de espionagem
ou contra-espionagem.

0256 00:23:45:01 00:23:48:14


Esta mesa de edição
seria talvez um codificador,

0257 00:23:49:01 00:23:51:12

ou um decodificador?

0258 00:23:52:21 00:23:57:19


Trata-se de decodificar um
segredo,
ou de mantê-lo?

HARUN FAROCKI : PROGRAMANDO O VISÍVEL


INTERFACE

317
318

INTERFACE
HARUN FAROCKI

HARUN FAROCKI : PROGRAMANDO O VISÍVEL


INTERFACE

Subtitles in English of the 0007 00:00:46:17 00:00:50:22


installation Interface (1995) and The thing is...
narration by Farocki. that there are two images seen at
the same time –
0001 00:00:14:16 00:00:16:18
I can hardly 0008 00:00:51:03 00:00:53:21
write a word these days one image
In relation to the other
0002 00:00:17:00 00:00:19:14
if there isn’t an image 0009 00:00:58:22 00:01:01:20
on the screen at the same time Paul Cozighian shot
This footage in Bucharest
0003 00:00:20:05 00:00:22:11
actually: on both screens 0010 00:01:02:05 00:01:07:05
on December 21, 1989
0004 00:00:33:04 00:00:35:02 shortly before the revolution
This is a work station, began

0005 00:00:35:04 00:00:38:21 0011 00:01:08:16 00:01:10:11


an editing station With his camera
for the reworking of images and He established a connection
sounds
0012 00:01:10:13 00:01:13:16
0006 00:00:39:13 00:00:45:05 Between the TV set
The control desk; And the street
the player; the recorder.
0013 00:01:20:20 00:01:24:18
On the screen Ceausescu –
holding a political rally,

319
320

0014 00:01:25:04 00:01:28:15 For over a minute,


like so many Viewers saw only
in the past 25 years This “livre transmission” notice

0015 00:01:29:14 00:01:33:04 0020 00:02:13:16 00:02:17:00


On the street, Before Ceausescu continued
men and women walking away,

0016 00:01:33:06 00:01:35:15 0022 00:02:25:03 00:02:27:08


even though This disturbance,
The rally hasn’t ended. this interruption

0017 00:01:37:00 00:01:40:21 0023 00:02:27:18 00:02:29:19


Moments before, something was it a sign of revolt?
had disturbed Ceausescu
0024 00:02:30:21 00:02:34:22
0018 00:01:41:10 00:01:47:08 Cozighian moved his camera
something not captured from
by the camera the TV screen to the window
He paused in the middle of
speaking 0025 00:02:35:04 00:02:38:23
He juxtaposed the official image
0019 00:01:47:10 00:01:50:13 with the street image:
and the government TV station
Interrupted its broadcast 0025 00:02:35:04 00:02:38:23
Image with counter-image
0020 00:02:13:16 00:02:17:00

HARUN FAROCKI : PROGRAMANDO O VISÍVEL


INTERFACE

0027 00:02:42:21 00:02:47:06 0034 00:03:25:01 00:03:29:00


It was now time You have to make an actual cut
To abandon the TV set In the image or sound strip.
And go into the streets.
0035 00:03:35:11 00:03:37:24
0028 00:02:48:02 00:02:51:01 As opposed to video editing.
The camera eye
Trained itself on the street 0036 00:03:38:01 00:03:40:22
Where you simply copy
0029 00:02:51:11 00:02:54:02 From one tape to the next,
In the hope that
Something might happen there. 0037 00:03:41:09 00:03:44:21
Making an imaginary cut
0030 00:03:00:01 00:03:05:04 And not a real one.
With this gesture,
The street was called on 0037 00:03:41:09 00:03:44:21
To turn into a productive While working
location. At the film editing table

0031 00:03:08:14 00:03:10:02 0039 00:03:53:04 00:03:59:04


An incantation. I keep the tip of my finger on
The running image or sound reel
0032 00:03:11:16 00:03:13:08 To feel the cut or the glue
An incantation
0040 00:03:59:09 00:04:01:16
0033 00:03:20:20 00:03:24:14 Before I see it or hear it
When working with film instead
of video,

321
322

0041 00:04:05:11 00:04:10:20 0048 00:04:43:13 00:04:48:17


This is a gesture indicating “fine Because we need
perception” or “sensitivity” The subtlety of the fingertips
To count money with the
0042 00:04:11:24 00:04:14:21 necessary precision
The hand had almost
no contact with the object, 0049 00:04:49:24 00:04:52:10
With a bill,
0043 00:04:14:23 00:04:17:05 It becomes particularly clear
But perceived it nonetheless.
0050 00:04:52:12 00:04:56:08
0044 00:04:21:10 00:04:24:24 How little essence
When working with video, And appearance coincide
I don’t touch the tape,
0051 00:05:03:08 00:05:08:23
0045 00:04:25:01 00:04:29:23 This editing station
I only push buttons. Has two screens,
Another activity for the To see whether two images fit
fingertips. well together

0046 00:04:38:17 00:04:41:01 0052 00:05:09:00 00:05:12:06


Here we have the gesture Which are to appear in seguence
Of counting money, in a film.

0047 00:04:41:08 00:04:43:11 0053 00:05:14:11 00:05:16:11


Which is probably done like this Does this image
Go with that one?

HARUN FAROCKI : PROGRAMANDO O VISÍVEL


INTERFACE

0054 00:05:19:17 00:05:22:10 0061 00:06:09:05 00:06:11:10


Does this image My name is Thai Bihn Dan.
Offer itself to that one?
0062 00:06:11:23 00:06:15:21
0055 00:05:23:13 00:05:26:12 I am of Vietnamese nationality,
Does this image Born in 1949.
close itself off from that one?
0063 00:06:17:08 00:06:20:05
0056 00:05:28:12 00:05:33:12 I would like to denounce
We can grasp this duality American imperialist crimes
By suggesting that one image
comments on the other 0064 00:06:20:07 00:06:24:05
Committed against me
0057 00:05:33:19 00:05:37:20 And my village before this
To date only words, or tribunal
sometimes music, comment on
images. 0065 00:06:25:11 00:06:29:14
On March 31, 1966,
0058 00:05:38:15 00:05:40:17 Around 4 p.M.
Here images comment on
images. 0066 00:06:29:16 00:06:32:13
Just as I was
0059 00:05:53:16 00:05:57:01 Washing the dishes,
This is how
I began a film in 1969: 0067 00:06:32:15 00:06:36:11
I heard the sound of airplanes.
0060 00:06:04:03 00:06:07:15 I rushed out to the shelter,
Testimony before the
Vietnam tribunal in Stockholm.

323
324

0068 00:06:36:13 00:06:39:04 0076 00:07:09:20 00:07:12:08


But I had barely How can we show you
Made it through the door napalm in operation

0069 00:06:39:06 00:06:42:13 0077 00:07:12:10 00:07:15:02


When a napalm bomb And how can we show you
Exploded almost next to me. napalm injuries?

0070 00:06:43:05 00:06:47:09 0078 00:07:16:10 00:07:19:04


The flames engulfed me from If we show you
all sides, with unbearable heat a picture of napalm injuries,

0071 00:06:47:15 00:06:49:09 0079 00:07:19:06 00:07:20:24


Then I lost consciousness You will close your eyes

0072 00:06:50:23 00:06:55:18 0080 00:07:21:13 00:07:24:21


The napalm burned my face, First you will
both arms and legs. close your eyes to the pictures,

0073 00:06:56:09 00:06:58:23 0081 00:07:25:12 00:07:29:15


My house was also burned down Then you will
close your eyes to their memory,
0074 00:07:00:14 00:07:03:00
After being unconscious 0082 00:07:29:24 00:07:33:22
for thirteen days, Then you will
close your eyes to the facts,
0075 00:07:03:02 00:07:06:15
I woke up
in a NLF hospital bed

HARUN FAROCKI : PROGRAMANDO O VISÍVEL


INTERFACE

0083 00:07:35:02 00:07:38:15 0090 00:08:05:09 00:08:09:14


Then you will A cigarette burns
close your eyes to the context. at 400 degrees –

0084 00:07:40:06 00:07:43:02 0091 00:08:09:24 00:08:13:15


If we show you a person Napalm burns at a heat of
with napalm injuries, around 3000 degrees.

0085 00:07:43:08 00:07:45:02 0092 00:08:15:20 00:08:19:05


We will hurt your feelings Two images in a relationship
with each other:
0086 00:07:45:21 00:07:49:13
If we hurt your feelings, 0093 00:08:19:21 00:08:22:14
Then it will seem to you That can be
The beginning of a new film.
0087 00:07:49:15 00:07:52:03
That we are 0094 00:08:24:17 00:08:28:20
exposing you to napalm – When he’s done speaking,
the author burns himself,
0088 00:07:52:05 00:07:53:23
To your detriment 0095 00:08:28:22 00:08:31:17
Although only in a single spot.
0089 00:07:55:17 00:08:00:14
We can only give you 0096 00:08:32:10 00:08:35:17
a very weak representation Here also, only one point
of napalm’s effect relates to the real world.

325
326

0097 00:08:38:08 00:08:42:01 0104 00:09:11:24 00:09:16:01


The author compares himself During the course of the
To an animal in a research experiment,
laboratory. the scientist is purely intellect.

0098 00:08:42:17 00:08:46:05 0105 00:09:19:10 00:09:21:00


He equates his workplace Here is a laboratory experiment,
with a laboratory the experimental pool

0099 00:08:50:16 00:08:52:19 0106 00:09:21:02 00:09:25:02


The work at an editing station: In an institute for the
exploration of ocean waves.
0100 00:08:52:21 00:08:55:09
Can it be equated with a 0107 00:09:29:17 00:09:34:08
scientific study? “The sea unfurling on the shore,
irregular but not haphazard,
0101 00:08:56:22 00:09:00:24
Are Scientific experiments 0108 00:09:36:05 00:09:38:04
conducted at an editing station? Binds one’s view
With its movement,
0102 00:09:04:19 00:09:07:09
According to the scientific 0109 00:09:38:23 00:09:41:07
concept of the modern age, Without capturing it ,
Thus setting thoughts free.”
0103 00:09:07:11 00:09:11:22
The scientist’s hand is not 0110 00:09:49:03 00:09:52:04
allowed to interfere in a This is a portrayal of the
procedure. Dow chemical company

HARUN FAROCKI : PROGRAMANDO O VISÍVEL


INTERFACE

0111 00:09:53:02 00:09:56:13 0119 00:10:25:10 00:10:29:09


The images say: a laboratory Again and again, I depicted
Looks nothing like this. the author’s workplace.

0112 00:09:57:08 00:09:59:10 0120 00:10:33:18 00:10:38:16


Chemists don’t speak like this; Here the author
as he uses montage to invert
0113 00:09:59:19 00:10:03:17 images,
The people who work for this
company don’t speak like this. 0121 00:10:39:21 00:10:42:00
and recombine them
0114 00:10:04:22 00:10:07:21
Those are not portrayals; 0122 00:10:45:06 00:10:49:23
they’re models. These images also say:
A work station doesn’t look like
0115 00:10:09:03 00:10:12:23 this.
Please forward all the
necessary files to my assistant. 0123 00:10:51:01 00:10:55:02
This isn’t a depiction of
0116 00:10:13:24 00:10:15:02 an editing station – it’s a model.
As I said,
0124 00:10:57:01 00:11:00:03
0117 00:10:15:04 00:10:18:04 When I filmed this,
A large chemical company is like nearly 20 years ago now,
a set of building blocks
0125 00:11:00:13 00:11:03:07
0118 00:10:18:06 00:10:20:16 most people’s
You can build up workplace was still
the entire world with it.

327
328

0126 00:11:03:09 00:11:05:20 0133 00:11:40:19 00:11:43:22


In one of the big factories And on the right: images
or office buildings, from the following 100 years

0127 00:11:06:01 00:11:08:08 0134 00:11:44:02 00:11:48:02


So that my solitary workplace that repeat, adapt and
further develop the first motif.
0128 00:11:08:10 00:11:10:24
Represented a turn 0135 00:12:07:22 00:12:10:23
away from factory society. For over a year,
I collected and studied
0129 00:11:12:07 00:11:16:07
In the meantime, factory society 0136 00:12:11:00 00:12:16:06
has turned against itself. Film sequences with the motif
“workers leaving the factory.”
0130 00:11:26:10 00:11:30:18
On the left, the earliest motif 0137 00:12:18:18 00:12:24:08
from the history of film: What could be the aim of that
visual study?
0131 00:11:31:05 00:11:34:20 Must there be an aim at all
Working men and women
leaving a factory, 0138 00:12:27:11 00:12:30:19
Think about the view of the
0132 00:11:35:08 00:11:38:10 historian, the art historian.
In this case, a factory
for photographic materials. 0139 00:12:31:16 00:12:34:11
His eye roams
over thousands of statues

HARUN FAROCKI : PROGRAMANDO O VISÍVEL


INTERFACE

0140 00:12:34:19 00:12:40:00 0147 00:13:13:02 00:13:17:17


and discovers Perhaps we could say
something new in this figure, that the boy represents
in this boy by Critios – the isonomic citizen,

0141 00:12:44:19 00:12:48:05 0148 00:13:17:19 00:13:20:22


For the first time, the legs and although it’s not so much
feet are not equally weighted: equality but rather freedom

0142 00:12:49:14 00:12:52:06 0149 00:13:21:07 00:13:26:03


the body weight and the mobility it provides
rests on the left leg – that he expresses.

0143 00:12:52:16 00:12:55:07 0150 00:13:35:16 00:13:39:23


consequently, Greek sculpture
the right hip is a bit sunken, is normally concerned

0144 00:12:55:14 00:12:59:16 0151 00:13:40:00 00:13:44:16


The right shoulder too; the With the formation of
head turns slightly to the side. similarities: of types
But in a new and different way.
0145 00:13:03:03 00:13:07:11
Calmness, capable 0152 00:13:44:22 00:13:48:16
of tension at the same time. The peculiarity of the isonomic
citizen is not at issue here,
0146 00:13:08:24 00:13:11:16
The human being is seen 0153 00:13:48:18 00:13:51:15
differently: he is different. but rather the human being
as he has now emerged:

329
330

0154 00:13:51:17 00:13:55:19 0161 00:14:51:07 00:14:54:09


Embedded in a field I spoke to the images
of opposing forces, and heard things from them.

0155 00:13:56:08 00:13:58:08 0162 00:15:11:09 00:15:14:23


like the isonomic Polis. This is how
I began a film in 1977:
0156 00:14:11:20 00:14:16:09
It was while editing this film 0163 00:15:19:05 00:15:22:07
that I first understood Because I couldn’t get
any money to make this film,
0157 00:14:16:22 00:14:20:15
how to view images 0164 00:15:22:22 00:15:25:13
unintentionally, in one swoop, I had to earn it at other jobs.

0158 00:14:20:17 00:14:24:05 0165 00:15:26:16 00:15:30:10


until the blueprint of the film I earned it in
unfolded on its own. the cultural industry. As usual.

0159 00:14:45:04 00:14:48:14 0166 00:15:32:04 00:15:36:11


Later I learned On the wall: the cross,
how to reclaim from the images perhaps a coordinate graph

0160 00:14:48:19 00:14:51:01 0167 00:15:37:09 00:15:40:21


the text Coordinates serve
that would accompany them. to determine a position –

HARUN FAROCKI : PROGRAMANDO O VISÍVEL


INTERFACE

0168 00:15:41:07 00:15:43:23 0175 00:16:11:04 00:16:15:24


in this case, images were The author brings to life a text
to measure that determination. handed down to him from
history.
0169 00:15:47:07 00:15:50:17
Right after that, we see the 0176 00:16:17:12 00:16:21:19
author as he clears his table “When I was a Red Cross nurse
on the Western front in 1917,
0170 00:15:51:02 00:15:53:03
until there’s nothing 0177 00:16:21:21 00:16:23:15
but a clear surface. I asked the soldiers

0171 00:15:53:20 00:15:56:08 0178 00:16:23:17 00:16:26:17


Not white like a screen, What they were fighting
but black. and dying for.

0172 00:15:59:15 00:16:03:07 0179 00:16:29:07 00:16:32:09


The script jumps from the desk The screenplay,
into the scenes of the film. or the textbook of history:

0173 00:16:03:18 00:16:05:11 0180 00:16:32:11 00:16:34:21


A jump back in time, it returns at the end of the film.

0174 00:16:05:13 00:16:08:24 0181 00:16:35:10 00:16:39:05


Into the war The nurse has now been moved
and revolution year of 1917. to the author’s position.

331
332

0182 00:16:44:16 00:16:49:13 0190 00:17:23:09 00:17:26:13


In this second war, Which I would never be able
which began no later than 1933, to share with anyone else.

0183 00:16:50:17 00:16:54:17 0191 00:17:28:00 00:17:30:07


Those who died had nothing Like mathematicians
more to say to those who lived. Who can’t find anyone

0184 00:16:56:00 00:16:57:24 0192 00:17:30:19 00:17:33:12


Why they died, to tell about their work.

0185 00:16:58:13 00:17:01:22 0193 00:17:36:21 00:17:40:24


Could have been learned Here I am at work, transferring
from the last war. every shot from a film

0186 00:17:06:16 00:17:09:10 0194 00:17:41:01 00:17:43:19


In this war, from one tape to another
my diary remains empty.
0195 00:17:44:14 00:17:47:13
0187 00:17:09:24 00:17:12:04 I only take 12 frames from each
Learning is discouraged. shot,

0188 00:17:17:22 00:17:20:08 0196 00:17:48:07 00:17:51:14


It often seemed and I reproduce
that I was experiencing things half a second from each shot.

0189 00:17:20:10 00:17:23:07


In the hours, days and years
at the editing table

HARUN FAROCKI : PROGRAMANDO O VISÍVEL


INTERFACE

0197 00:17:57:08 00:18:03:00 0204 00:18:37:18 00:18:39:19


This is a lengthy process, so I But when film was invented,
can talk
about other things. 0205 00:18:40:00 00:18:42:20
there were hardly any
0198 00:18:08:16 00:18:11:04 white patches left on the map.
Metaphor means to transfer.
0206 00:18:50:20 00:18:53:23
0199 00:18:11:18 00:18:14:19 Here is the initial outcome
I’m transferring Of our analytic transfer.
from image 1 to image 2 here.
0207 00:19:00:03 00:19:05:12
0200 00:18:19:12 00:18:22:00 It’s evident
When cinema was invented that the film summarized here
100 years ago, contains a sequence of still
images,
0201 00:18:22:10 00:18:24:22
It came 0208 00:19:06:06 00:19:10:01
a few centuries too late. followed by a sequence of
moving
0202 00:18:25:21 00:18:28:00 images; then stills again,
We really should have
invented the photographic 0209 00:19:10:06 00:19:11:24
image and so on.

0203 00:18:28:02 00:18:33:03 0210 00:19:12:01 00:19:14:16


a few centuries before, The moving images
as Europe was breaking out into have no accompanying text.
the rest of the world.

333
334

0211 00:19:31:15 00:19:34:21 0218 00:20:11:06 00:20:14:07


Here I am at work, transferring I write into the images and
the moving images of this film then read something out of
them.
0212 00:19:35:04 00:19:37:12
from one tape to another, 0219 00:20:18:15 00:20:20:19
At the moment I’m toying
0213 00:19:38:05 00:19:41:02 with the idea of a film
whereby I reproduce
3 seconds from each shot. 0220 00:20:20:21 00:20:23:12
About encoding
0214 00:19:54:07 00:19:56:15 and decoding messages.
This is a lengthy process
0221 00:20:24:04 00:20:28:03
0215 00:19:57:00 00:19:59:24 Secret codes are used by lovers,
so we can talk about other as well as by the military.
things.
0222 00:20:30:01 00:20:33:22
0216 00:20:05:02 00:20:07:10 This is the German
Today I can barely think encoding machine “Enigma.”
through a new film
0223 00:20:35:04 00:20:38:04
0217 00:20:07:12 00:20:09:17 The machine encodes
If I’m not according to a program.
at the editing station.

HARUN FAROCKI : PROGRAMANDO O VISÍVEL


INTERFACE

0224 00:20:41:17 00:20:47:01 0230 00:21:15:04 00:21:18:09


When you type Which was critical to the
a letter into the machine, development of the computer.
You set off
an electrical impulse 0231 00:21:20:16 00:21:25:00
Turing delighted in perceiving
0225 00:20:47:08 00:20:51:04 human intellect as a machine.
that travels
along a certain path 0232 00:21:25:20 00:21:28:07
Depending on He wanted to think
the cylinder positions like a machine himself.

0226 00:20:51:13 00:20:54:11 0233 00:21:31:02 00:21:34:07


And leads to the illumination E, A, M,
of different letters.
0234 00:21:36:08 00:21:39:12
0227 00:20:58:00 00:21:00:13 E, X, P
During the second world war
the English succeeded 0235 00:21:40:16 00:21:43:12
E, U, F,
0228 00:21:00:15 00:21:03:23
In building a machine capable 0236 00:21:44:12 00:21:47:11
of breaking the German code. M, J, M,

0229 00:21:10:15 00:21:14:17 0237 00:21:48:05 00:21:49:23


Led by Alan Turing, N, A.
they built a mega-calculator

335
336

0238 00:21:57:03 00:22:00:13 0245 00:22:29:05 00:22:34:01


Here is the next outcome Or of the wheels in a slot
of our analytic transfer: machine –
Not about the rotors in an
0239 00:22:03:11 00:22:06:15 encoder
It’s evident that
the shots repeat themselves 0246 00:22:34:15 00:22:37:11
That determine
0240 00:22:06:17 00:22:08:23 the transposition of a letter.
According to
the rules of permutation. 0247 00:22:52:17 00:22:56:04
Here you see the author
0241 00:22:10:13 00:22:14:20 as he pages through a book
When I assembled this film,
I based it on a simple program, 0248 00:22:56:06 00:22:58:13
With pictures of Algerian
0242 00:22:15:14 00:22:19:02 women.
By which the shots would be
Combined and recombined. 0249 00:23:03:23 00:23:06:06
Faces that have
0243 00:22:20:07 00:22:22:11 worn the veil till now.
A program provides order.
0250 00:23:08:09 00:23:11:10
0244 00:22:25:12 00:22:28:19 The veil covers the mouth,
At that time I was thinking of nose and cheeks,
the compositional rules of
music 0251 00:23:12:07 00:23:13:19
And leaves the eyes free.

HARUN FAROCKI : PROGRAMANDO O VISÍVEL


INTERFACE

0252 00:23:16:03 00:23:19:01


With his hand he covers up
a part of the face

0253 00:23:19:13 00:23:22:03


And thereby
establishes a new frame

0254 00:23:36:17 00:23:39:07


Alan Turing’s biography
isn’t the issue;

0255 00:23:40:02 00:23:43:12


Nor a film about espionage
or counterespionage.

0256 00:23:45:01 00:23:48:14


Might this editing station
be an encoder,

0257 00:23:49:01 00:23:51:12


or a decoder?

0258 00:23:52:21 00:23:57:19


Is it about decoding
a secret, or keeping it?

337
338

Harun Farocki (1944-2014), artista e cineasta alemão, nascido na


República Tcheca, realizou cerca de 120 obras entre filmes e instalações
que questionam as imagens de forma bastante original e crítica. Dentre
suas obras destacam-se O fogo inextinguível (1969); Imagens do mundo e
inscrições da guerra (1988) e instalações como Interface (1995), Jogos sérios
(2014) e Paralelo I-IV (2010-2014).

Harun Farocki (1944-2014), German artist and filmmaker, was born in the
Czech Republic. Beginning in 1967, he made around 120 audiovisual works
(among them films and installations) that sought to question the practice
of image-making in a highly original and critical manner. Highlights from
his body of work include films such as The Inextinguishable Fire (1969) and
Images of the World and the Inscription of War (1988) and installations like
Interface (1995), Serious Games (2014), and Parallel I-IV (2010-2014).

COLABORADORES
Contributors

Alfredo Suppia é professor do Departamento de Cinema (DECINE) e


do Programa de Pós-graduação em Multimeios da Universidade Estadual
de Campinas (UNICAMP). É membro da Sociedade Brasileira para os
Estudos de Cinema e Audiovisual (SOCINE) e da Science Fiction Research
Association (SFRA), autor de A metrópole replicante: construindo um
diálogo entre Metropolis e Blade Runner (Juiz de Fora: ed. UFJF, 2011),
Cinemas Independentes: Cartografias para um fenômeno audiovisual
global (Juiz de Fora: Ed. UFJF, 2013), Atmosfera rarefeita: a ficção científica
no cinema brasileiro (São Paulo: Devir, 2013), entre outras publicações.
Alfredo Suppia is Professor in the Department of Cinema (DECINE) and
in the Graduate Program of Multimedia Studies at the State University
of Campinas (UNICAMP). He is a member of the Brazilian Society for
Cinema and Audiovisual Studies (SOCINE) and of the Science Fiction
Research Association (SFRA). He has authored the books A metrópole
replicante: construindo um diálogo entre Metropolis e Blade Runner (UFJF,
2011), Cinemas Independentes: Cartografias para um fenômeno audiovisual
global (UFJF, 2013), and Atmosfera rarefeita: a ficção científica no cinema
brasileiro (Devir, 2013), among other publications.

Erika Balsom é professora de estudos de cinema e artes liberais no


King’s College de Londres, especializada em estudos sobre a imagem em
movimento na arte. Ela é autora de Exhibiting Cinema in Contemporary Art
(Amsterdam University Press, 2013) e co-editora de Documentary Across
Disciplines (MIT Press, 2016). Seu próximo livro, After Unicity: A History
of Film and Video Art in Circulation será lançado pela Columbia University
Press em 2017. Ela é colaboradora frequente das revistas Artforum e
Sight and Sound e tem publicado amplamente em revistas acadêmicas e
catálogos de exposições.

Erika Balsom is Senior Lecturer in Film Studies and Liberal Arts at King’s
College London, specializing in the study of the moving image in art.
She is the author of Exhibiting Cinema in Contemporary Art (Amsterdam
University Press, 2013) and the co-editor of Documentary Across Disciplines
(MIT Press, 2016). Her next book, After Uniqueness: A History of Film and
Video Art in Circulation, will be published by Columbia University Press
in 2017. She is a frequent contributor to the journals Artforum and Sight
and Sound, and she has also published widely in academic journals and in
exhibition catalogues.

339
340

Jane de Almeida é professora da PUC/SP e da Pós-graduação em


Educação, Arte e História da Cultura do Mackenzie-SP, onde coordena o
Laboratório de Artes Cinemáticas (LabCine) e desenvolve pesquisas sobre
cinema, novas tecnologias e arte contemporânea. Ela foi visiting fellow
da Universidade de Harvard e professora visitante da Universidade da
Califórnia de San Diego. Curadora de exposições tais como: Bispo do Rosário:
Ordenação e Vertigem (CCBB, 2003); Alexander Kluge (CCBB São Paulo e
Brasília); e Harun Farocki: programando o visível (Paço das Artes, 2016).
Organizou os livros Grupo Dziga Vertov (Witz Edições, 2005); e Alexander
Kluge: O Quinto Ato (CosacNaify, 2007), entre outras publicações.

Jane de Almeida is Professor at PUC/SP and Graduate School Professor


of Education, Art and Cultural History at Mackenzie-SP, where she
coordinates the Cinematic Arts Laboratory (LabCine) and develops
studies of cinema, new technologies, and contemporary art. She was
a Visiting Fellow at Harvard University and a Visiting Professor at the
University of California, San Diego. She has curated exhibitions such as:
Bispo do Rosário: Ordering and Vertigo (Centro Cultural Banco do Brasil,
2007); Alexander Kluge (CCBB São Paulo and Brasília, 2007); and Harun
Farocki: Programming The Visible (Paço das Artes, 2016). She organized and
edited the books Dziga Vertov Group (Witz Edições, 2005); and Alexander
Kluge: O Quinto Ato (Cosac Naify, 2007), among other publications.

Patricia Moran é professora do Curso Superior do Audiovisual e


programa de pós graduação em Meios e Processos Audiovisuais ECA/USP.
Diretora do CINUSP Paulo Emílio. Pesquisa Performances Audiovisuais
em tempo real com heterogêneas poéticas, tema sobre o qual tem escrito,
organizado livros e eventos. Dirigiu diversos curtas narrativos, não-
narrativos, documentários e vídeos exibidos e premiados em diversos
festivais. Ela é coordenadora (com Janaina Patrocinio) de livros como
Machinima (Pró-Reitoria de Cultura e Extensão da USP, 2011).

Patricia Moran is Professor of the Superior Audiovisual Course and


Graduate Program in Audiovisual Processes at ECA/USP and the director
of CINUSP Paulo Emilio. She conducts research on real-time audiovisual
performances with heterogeneous poetics, a theme about which she has
written and edited books as well as organized events. She has directed
several short narrative, non-narrative, documentary, and video works
that have screened and been awarded prizes at diverse festivals. She is
the editor (with Janaina Patrocinio) of books including Machinima (Pró-
Reitoria de Cultura e Extensão da USP, 2011).

Priscila Arantes é diretora artística e curadora do Paço das Artes,


equipamento da Secretaria de Estado da Cultura, desde 2007, e professora
da graduação e pós graduação da PUC/SP no curso Arte: História, Crítica
e Curadoria. É pós-doutora pela Pennsylvania State University (EUA),
autora de Arte@ Mídia: perspectivas da estética digital (Ed.Senac/Fapesp,
2007), Arte – História, Crítica e Curadoria (EDUC, 2014), e Reescrituras da
arte contemporânea: história, arquivo e mídia (Editora Sulina, 2015). Dentre
suas curadorias destacam-se: Arquivo Vivo (2013); Abrigo de paisagem/
Veículo de passagem(2015); de Rodrigo Braga; e ISSOÉOSSODISSO
(2016), de Lenora de Barros.

Priscila Arantes is the Artistic Director and curator of the Paço das Artes,
an institution linked to the São Paulo State Secretary of Culture, since
2007. She is also a professor in the undergraduate and graduate course Art:
History, Critics and Curatorship at PUC/SP. She did a post-doctorate at
Pennsylvania State University (U.S.A.) and she is the author of Arte@Mí-

341
342

dia: perspectivas da estética digital (Ed. Senac/Fapesp, 2007), Arte – História,


Crítica e Curadoria (EDUC, 2014), and Re/Escritura(s) da arte contem-
porânea: história, arquivo e mídia (Sulinas, 2015). She has curated exhibi-
tions such as: Arquivo Vivo (2013); Abrigo de paisagem/Veículo de passagem
(2015), from the artist Rodrigo Braga; and ISSOÉOSSODISSO (2016), from
the artist Lenora de Barros.

Sergio Nesteriuk é doutor em Comunicação e Semiótica (PUC-SP).


Foi videomaker e produtor artístico e cultural no Museu da Imagem e
do Som (MIS) de São Paulo e na Fundação Memorial da América Latina.
Atualmente, é professor na Universidade Anhembi Morumbi, onde atua
também junto ao Programa de Pós-Graduação em Design. É consultor de
roteiro e dramaturgia do Programa de Fomento à Produção e Teledifusão
de Séries de Animação Brasileiras – ANIMATV. Realizador independente
nas áreas de produção sonora, audiovisual e hipermídia, é autor de
Dramaturgia de Série de Animação.

Sergio Nesteriuk holds a doctorate in Communications and Semiot-


ics from PUC-SP. He has made videos and acted as a producer of artistic
and cultural events through the Museum of Image and Sound (MIS)
and through the Latin America Memorial Foundation, both of them in
São Paulo. He is currently a professor at Anhembi Morumbi University,
where he also works in the graduate program in Design. He is addition-
ally a script and storytelling consultant for the Programa de Fomento à
Produção e Teledifusão de Séries de Animação Brasileiras – ANIMATV
(Program for Fostering Production and Broadcasting of Brazilian Ani-
mated Series). He works independently in the fields of sound, audiovisual,
and hypermedia production, and is the author of Dramaturgia de Série de
Animação (Storytelling in Animated Series).
Thomas Elsaesser professor emérito no Departamento de Mídia e
Cultura da Universidade de Amsterdã e ensina na Universidade Columbia
desde 2013. Suas pesquisas versam sobre história e teoria do cinema,
cinema alemão e europeu, novas mídias e instalações. É autor de livros
German Cinema: Terror and Trauma: Cultural Memory Since 1945
(Routledge, 2013); (com Malte Hagener) Film Theory: An Introduction
Through the Senses (Routledge, 2015). É o organizador de Harun Farocki:
Working on the Sightlines (Amsterdam Univ. Press, 2004).

Thomas Elsaesser is Professor Emeritus in the Department of


Media and Culture at the University of Amsterdam and has taught at
Columbia University since 2013. His research examines the history
of film theory, German and other European cinema traditions, new
media, and installations. He is the author of books such as (with Malte
Hagener) German Cinema: Terror and Trauma: Cultural Memory Since 1945
(Routledge, 2013) and Film Theory: An Introduction Through the Senses
(Routledge, 2015). He also edited the book Harun Farocki: Working on the
Sight-lines (Amsterdam University Press, 2004).

343
CRÉDITOS
Credits

GOVERNO DO ESTADO DE SÃO


PAULO
São Paulo State Government

Governador do Estado de São Paulo Conselheiros


São Paulo State Governor Board Members
Geraldo Alckmin Cecília Ribeiro, Marcello Hallake,
Max Perlingeiro, Nilton Guedes,
Secretário de Estado da Cultura Renata Letícia
State Secretary of Culture
Marcelo Mattos Araujo Diretor Executivo
Executive Director
Coordenadora da Unidade de André Sturm
Preservação do Patrimônio
Museológico Diretor Administrativo-Financeiro
Coordinator of the Museological Financial Management Director
Patrimony Unit Jacques Kann
Renata Vieira da Motta

PAÇO DAS ARTES


ORGANIZAÇÃO SOCIAL DE
CULTURA
Paço das Artes Social Cultural
Organization

CONSELHO DE ADMINISTRAÇÃO
Administrative Board

Presidente President
Antônio Hermann

Vice-Presidente Vice President


James Sinclair
PAÇO DAS ARTES Anderson S. Moraes da Silva
Moises dos Santos Silva
Diretora Artística e Curadora  Renan Leonardo de Jesus
Artistic Director and Curator Salvador Febronio S. Filho
Priscila Arantes
Núcleo de Projetos
Núcleo de Comunicação Projects Nucleus
Communications Nucleus
Carolina Ferreira Coordenadora
Coordinator
Núcleo de Documentação Larissa Souto
Documentation Nucleus
Natália Fabrício Lima Equipe
Núcleo Educativo Team
Education Nucleus Mariana Sesma
Vanessa Rodrigues
Coordenadora
Coordinator Núcleo Receptivo
Christiana de Moraes e Silva Reception Nucleus
João da Silva Lourenço [Índio]
Equipe Maria Soraya Ximenes 
Team
Thiago Dombrowski Secretária da Diretoria Artística
Artistic Direction Secretary
Núcleo de Montagem Lívia Caroline da Silva
Assembly Nucleus

Coordenadora
Coordinator
Maria Gonçalves da Silva

Equipe
Team
Aldo P. R. Filho
Alexandre Oliveira Rodrigues
Harun Farocki: CONSELHO CIENTÍFICO
Programando o visível DA COLEÇÃO CINUSP
Harun Farocki: Scientific Board of the
Programming the Visible CINUSP Collection
Exposição realizada de 28 de janeiro
a 27 de março de 2016 no Paço das Consuelo Lins
Artes - Av. da Universidade, 1 - Cidade Universidade Federal do Rio de Janeiro
Universitária.
Exhibition held from January 28th – Cristian Borges
March 27th, 2016 at Paço das Artes Universidade de São Paulo
Av. da Universidade, 1 - Cidade
Universitária, São Paulo. João Luis Vieira
Universidade Federal Fluminense
Artista
Artist Jorge La Ferla
Harun Farocki Universidad de Buenos Aires

Curadora Laura Mulvey


Curator Birbeck, University of London
Jane de Almeida
Oliver Fahle
Design gráfico e identidade visual Ruhr-Universität Bochum
Graphic Design and Visual Identity
Guilherme Falcão Robert Stam
New York University
Expografia
Expography Steve Dixon
Henrique Gabbo Torres La Salle College of the Arts

Equipamentos audiovisuais
Audiovisual Equipment
Fusionáudio

Realização
Realization
Paço das Artes
COLEÇÃO CINUSP
1. ROBERT BRESSON (2011)
Daniel Ifanger, Rafael Nantes e Ricardo Miyada (Orgs.)

2. MACHINIMA (2012)
Patrícia Moran e Janaína Patrocínio (Orgs.)

3. JONAS MEKAS (2013)


Patrícia Mourão (Org.)

4. MONDO TARANTINO (2013)


Marcos Kurtinaitis (Org.)

5. ŽELIMIR ŽILNIK E A BLACK WAVE (2014)


Alfredo Suppia e Henrique Figueiredo (Orgs.)

6. QUEBRADA? - CINEMA, VÍDEO E LUTAS SOCIAIS (2014)


Wilq Vicente (Org.)

7. REALISMO FANTASMAGÓRICO (2015)


Cecília Mello (Org.)

8. CINEGRID: FUTUROS CINEMÁTICOS (2016)


Jane de Almeida, Thiago de André e Cícero Inácio da Silva (Orgs.)

9. CINEMA E CORPO (2016)


Ana Cristina Zimmermann e Soraia Chung Saura (Orgs.)

10. PAULO EMÍLIO: LEGADO CRÍTICO (2016)


Thiago Almeida e Nayara Xavier (Orgs.)

11. HARUN FAROCKI:


PROGRAMANDO O VISÍVEL (2017)
Jane de Almeida, Patrícia Moran e Priscila Arantes (Orgs.)
9 789788 562580

Você também pode gostar