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Aprovado: 28/07/2019
Volume 9. Número 1 (abril/2020). p. 81-100 - ISSN 2238-9377
Revista indexada no Latindex e Diadorim/IBICT
Resumo
O artigo apresenta o procedimento teórico-experimental que vem sendo utilizado para
avaliação das pontes pertencentes à uma malha ferroviária brasileira. Esse procedimento, foi
empregado em quinze obras de artes especiais e tem fornecido subsídios importantes para a
priorização das intervenções nessas estruturas. A investigação teórico-experimental inclui o
levantamento geométrico, inspeção, caracterização dos materiais, instrumentação,
monitoramento e ensaios dinâmicos com veículos de prova. Nesse trabalho, são apresentados,
também os principais resultados aos aspectos dinâmicos das estruturas, frequência natural e
amplificação dinâmica, e estimativa da vida residual à fadiga. O procedimento proposto vem
sendo utilizado e aprimorado, aumentando, assim, a confiabilidade da infraestrutura do
sistema de transporte ferroviário.
Palavras-chave: identificação estrutural; avaliação estrutural; fadiga; pontes; ferrovia.
Abstract
The paper presents the theoretical-experimental procedure that has been used to evaluate
bridges, belonging to the network of a Brazilian railway. This procedure has been used in
fifteen special artworks and has provided important subsidies for the prioritization of
interventions in these structures. The theoretical-experimental investigation includes the
geometric survey, inspection, extraction of testimonies for characterization of the materials,
instrumentation, monitoring and dynamic tests with test vehicles. In the development of the
paper are presented, but in detail, the main results to the dynamic aspects of the structures,
natural frequency and dynamic amplification, and estimated residual fatigue life. The proposed
procedure has been used and improved, thus increasing the reliability of the infrastructure of
the rail transport system.
Keywords: structural identification; structural assessment; fatigue; bridges; railway.
* Autor correspondente
1 Introdução
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Com a desestatização e concessão da malha férrea para empresas privadas, muito se
perdeu sobre documentos técnicos e históricos das estruturas, tornando ainda mais
complexa a inferência do desempenho estrutural dessas obras de arte especiais. Desta
forma, um procedimento de avaliação estrutural deve ser desenvolvido, não somente
com a finalidade de avaliação das condições estruturais atuais das pontes ferroviárias,
mas também permitindo a priorização e a quantificação das intervenções, e o
estabelecimento de estratégias de manutenção, aumentando a confiabilidade e,
consequentemente, a segurança operacional.
Sabe-se que qualquer estrutura possui modos de vibração, cada um deles associado a
uma frequência natural. De forma simplificada, esses modos de vibração podem ser
entendidos como as possíveis maneiras que a estrutura pode oscilar em torno de uma
posição referencial. Matematicamente, trata-se de um problema de autovetores
(modos de vibrar) associados a autovalores (frequências naturais). (CLOUGH e
PENZIEN, 1993)
Considerando uma ponte como sistema, para passar de uma situação deformada para
outra, em um determinado intervalo de tempo, essa ponte é sujeita a um determinado
campo de forças elásticas, forças de inércia e amortecimento, provocando a sua
vibração. Por exemplo, à medida que um veículo progride sobre uma ponte, sua
estrutura deforma-se modificando o perfil inicialmente horizontal. Essa alteração
traduz-se em deslocamento da roda do veículo e consequente deslocamento da
suspensão, que, por sua vez, resultam em forças elásticas e de amortecimento que
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atuam diretamente sobre a massa do veículo, provocando a sua vibração e
consequente alteração da força de interação entre a ponte e o veículo. (CALÇADA,
2001)
Para o caso das pontes ferroviárias, muitos fatores podem afetar a distribuição das
energias entre ponte e veículo, tais como as massas dos veículos, as irregularidades
geométricas da linha férrea, a presença de defeitos no trilho e veículos, as ações do
vento, a frenagem, a demarragem e a presença de outros veículos. Essas vibrações
induzidas pela passagem de veículos sobre estruturas de pontes provocam esforços ou
deslocamentos na estrutura que, de forma geral, são maiores que aqueles aplicados
pelo carregamento estático. Este fenômeno é designado por amplificação dinâmica.
(CALÇADA, 2001)
Atualmente, o caráter dinâmico da resposta das pontes ao tráfego ferroviário pode ser
determinado por meio do método proposto por PAULTRE et al. (1992). A Figura 1
representa a resposta estática de uma ponte ou viaduto quando da passagem de um
veículo em uma velocidade muito baixa (denominada quase estática) e a resposta
dinâmica, obtida da passagem a uma velocidade significativa de um veículo isolado
sobre seu vão.
(1)
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Na avaliação da capacidade de carga de pontes e viadutos existentes, há três
alternativas possíveis para a obtenção do DAF: utilizar coeficientes dinâmicos obtidos
de normas e códigos; realizar análises dinâmicas completas por via numérica; ou
considerar valores de amplificações dinâmicas decorrentes de carregamentos efetivos
de tráfego normais ou controlados por meio das medidas dos efeitos estruturais, como
por exemplo, deslocamentos e deformações específicas (PAULTRE et al., 1992).
Os valores recomendados por normas e códigos são adotados tomando-se como base
certas condições de execução e de operação das pontes, e que nem sempre
correspondem à realidade. Nas estruturas de pontes ferroviárias, normalmente as
solicitações dinâmicas são consideradas por coeficientes de majoração da carga
estática. As normas brasileiras e referências internacionais que tratam do cálculo
estrutural de pontes, consideram as cargas dinâmicas por meio de coeficientes de
impacto.
O método i) fornece os melhores resultados, uma vez que está associado à obtenção
de respostas diretamente medidas na estrutura, porém acarreta impactos
operacionais à circulação de trem e maiores custos de execução. O procedimento ii)
fornece bons resultados, no entanto, quando ocorrem fenômenos de ressonância,
torna-se difícil separar a parte estática de parte dinâmica devido a necessidade de
adotar filtros eficazes. Já o iii) está relacionado às dificuldades de se obter o
comportamento real da estrutura no modelo numérico, bem como o desconhecimento
das cargas atuantes e ao fato de não reproduzir todos os fatores contribuintes, como
exemplo os defeitos da via e dos vagões. (PIMENTEL, 2008)
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princípio de funcionalidade de cada transdutor, esses respondem de maneira
diferenciada em função da frequência que são solicitados. Logo, a determinação do
DAF por meio do deslocamento (decorrente da integração do sinal de aceleração) ou
da deformação específica, pode influenciar os resultados.
3 Fenômeno da fadiga
Para determinar a vida residual à fadiga de pontes ferroviárias, são utilizadas as séries
temporais das tensões estáticas e as resultantes das passagens dos comboios para
cada velocidade sobre a estrutura da ponte em questão. Em seguida, esses valores são
comparados com a resistência à fadiga dada pelas curvas S-N (Stress range – S;
Number of cycles – N), que especificam a resistência à fadiga de um material
submetido a ciclos de tensão de amplitude constantes. Se a amplitude dos ciclos é
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variável, o desempenho é estudado por meio da hipótese de Palmgreen-Miner e o
dano de Miner.
(2)
Para investigações do dano à fadiga, a Equação 2 pode ser aplicada a múltiplas faixas
de tensão de um espectro ou histograma de tensões, como ilustrado na Figura 2. Dessa
forma, a resistência à fadiga Ni é definida por meio do método de classificação
baseada nas curvas S-N. Quando o dano de Miner DM é igual a um, indica a ocorrência
de falha.
Figura 2 - Gráfico S-N para o cálculo da acumulação de danos (KUHN et al., 2008)
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Estas curvas variam em função do detalhe estrutural, quando se consideram as
tensões nominais, e das configurações de soldadura, quando se consideram tensões
geométricas (MARQUES et al., 2010).
No caso das pontes ferroviárias, o aumento das cargas por eixo de tráfego, da
quantidade de veículos em circulação – e consequente aumento de ciclos de
carregamento – e das velocidades operacionais registradas nos últimos anos justificam
a crescente preocupação com essas estruturas em relação ao estado limite de fadiga.
O modelo numérico preliminar da ponte foi elaborado por meio das informações do
levantamento geométrico e caracterização dos materiais. A partir desse modelo, foram
determinados, para as solicitações típicas, os pontos da estrutura submetidos às
máximas tensões normais e também aqueles submetidos às máximas variações de
tensões, definindo-se os pontos de instalação dos extensômetros segundo as
respectivas direções principais. Também a partir do modelo numérico preliminar,
determinou-se os pontos de maiores deslocamentos para a instalação dos
acelerômetros. Com base nessas análises prévias era elaborado o plano de
instrumentação, que incluía ainda, eventualmente, sensores de temperatura,
transdutores de deslocamento e inclinômetros. De forma geral, foram utilizados
sensores e transdutores elétricos.
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pontes, com o objetivo de medir o efeito dinâmico do carregamento das composições
de forma independente das amplificações dinâmicas da estrutura.
Dessa forma, a avaliação da segurança estrutural foi realizada por meio das respostas
estruturais medidas na condição de serviço das pontes, ou seja, caracterizando
quantitativamente o desempenho estrutural efetivo dessas obras de arte especiais.
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A etapa de avaliação da capacidade estrutural prescindiu, então, de prévio ajuste do
modelo numérico, utilizando-se as informações coletadas na inspeção e no
monitoramento da estrutura (model updating). Ela foi realizada para, no mínimo, três
situações de carregamento: o tráfego atual, considerando as características dos
veículos ferroviários que operam no trecho analisado, e seus carregamentos, obtidos
da amostragem monitorada durante os ensaios dinâmicos; o trem-tipo atual,
considerando as distâncias entre eixos dos veículos ferroviários típicos do trecho
analisado e a sua tolerância máxima de carga por eixo para os carregamentos; e o
trem-tipo futuro, definido pela concessionária da ferrovia.
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Após a avaliação da capacidade estrutura e da vida residual à fadiga eram identificados
os elementos a serem reforçados, bem como a avaliação da viabilidade de sua
execução. É importante ressaltar que no caso particular de estruturas ferroviárias, a
avaliação da viabilidade de se reforçar um elemento vai muito além da questão
estrutural. Deve-se realizar, também, a avaliação do impacto operacional, que pode ter
como resultado elevadas horas de intervalos operacionais, aumento do tempo de
circulação, maior disponibilização de equipagens, perda de eficiência energética,
dentre outros (Junqueira et al., 2017).
5 Resultados
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Após a etapa de inspeção, a estrutura foi instrumentada tomando-se como referência
o plano proposto. Quando necessária a investigação de algum dano conhecido, o plano
de instrumentação era revisado com o objetivo de avaliar as suas causas e
consequências. A monitoração das estruturas contemplou não somente o tráfego
normal da ferrovia, mas também, em alguns casos, o tráfego de uma composição de
teste, com características conhecidas, variando-se a velocidade, e, até mesmo, as
condições ideais de carregamento, de elementos dos vagões (rodas e molas), e da via
permanente.
Nas situações em que foi possível utilizar o trem de teste com velocidade controlada
nas obras instrumentadas, foram obtidos os fatores de amplificação dinâmica (DAF)
para cada velocidade. Na Figura 5 são apresentados os valores máximos do fator de
amplificação dinâmica (DAF), medidos em campo, em função do vão teórico das
pontes. Também foram plotadas, no gráfico, as curvas dos coeficientes de impacto
previstos na norma ABNT NBR 7187:2003 e no manual da AREMA:2013.
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ressaltar que, ao estudar a interação veículo e ponte, outros parâmetros também
podem afetar os resultados, tais como a rigidez da estrutura e as propriedades
inerciais do veículo e da ponte (YANG et al., 1995).
A linha de tendência foi calculada com uma correlação 70,9%, o que pode ser
considerada satisfatória para estimativas dos valores de frequência natural em função
do vão teórico para pontes ferroviárias.
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comparada com a curva (Equação 4) recomendada pelo CEB209 (1991), e também com
as equações propostas por RODRIGUES et al. (2011), conforme Equação 5,
desenvolvida a partir de resultados observados em pontes rodoviárias brasileiras, e por
BACHMANN et al. (1995), conforme Equação 6, determinada a partir de dados de 224
pontes rodoviárias. Também foram plotadas as curvas de dispersão superior e inferior
para as pontes ferroviárias, considerando o valor da correlação obtida na linha de
tendência da Equação 3.
(4)
(6)
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Para vãos superiores a aproximadamente 25 metros, a curva proposta neste estudo,
baseada nos dados das pontes ferroviárias, se mostrou praticamente coincidente com
a curva proposta por BACHMANN et al. (1995) e intermediária aos demais valores de
referência.
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Também foi estimada a vida residual à fadiga das pontes e viadutos ferroviários,
conforme apresentado na Figura 7.
Figura 7 - Estimativa da idade e vida residual à fadiga para os trens-tipos atual e futuro
para as pontes e viadutos ferroviários
As estimativas de vida residual superiores a 100 anos foram limitadas a este valor,
visto que, usualmente, e em acordo com o FIB-55 (FIB, 2010) e a ISO 2394:2012,
estruturas de pontes e viadutos devem ser projetadas para uma vida útil de 100 anos.
Assim, sugere-se que, atingida a idade limite, essas estruturas sejam reavaliadas.
6 Conclusões
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materiais e processos de construção, à danificação ao longo do tempo e às ações que
essa estrutura estará submetida. Os valores recomendados por normas e códigos são
adotados tomando-se como base certas condições de execução e de operação das
pontes, e que nem sempre correspondem à realidade. No caso da avaliação de
estruturas existentes, é possível reduzir essas incertezas por meio do conhecimento
das propriedades e característica dinâmicas das pontes, com a finalidade de melhor
representar as estruturas em seu estado atual.
Nesse sentido, o procedimento proposto vem sendo empregado por meio da análise
teórico-experimental em uma operadora de um trecho de malha ferroviária brasileira,
como forma de reduzir as incertezas durante o processo de avaliação da segurança
estrutural de pontes ferroviárias existentes.
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ferroviários ao longo da sua vida, avaliando as suas características e propriedades dos
materiais de acordo com o seu estado atual. Uma estrutura não deve ser somente
segura e útil às suas condições iniciais de implantação, mas também deve ter
resistência suficiente contra a deterioração, ou seja, não só a resistência intrínseca do
início da vida útil deve atender aos critérios de projeto, mas também deve ser
desenvolvida uma estratégia de manutenção (FIB, 2010).
7 Referências bibliográficas
INTERNATIONAL FEDERATION FOR STRUCTURAL CONCRETE - FIB. Model Code 2010. First
complete draft, Volume 1, Bulletin 55, Germany, 2010.
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MARQUES, F. CINHA, A. FERNANDES, A. CAETANO, E. MAGALHÃES, F. Evaluation of dynamic
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