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Astronomia, navegação e agricultura na poesia arcaica grega

prof. Rogério G. de Campos

Na Ilíada de Homero encontramos referências celestes, tais como a das constelações,


que participam do movimento de formação cósmica e descrição de cidades:

“As Plêiades, as Híades1 e o forte Órion”( Ilíada, XVIII, 486)

A terra, o céu, o mar, o sol infatigável, a lua plena, as constelações, tudo quanto aparece no céu e o Oceano
geram, num só movimento, duas cidades de belos mortais (duo poíese póleis merópon anthópon kalás. XVIII, v.490-
491). As divindades têm seu quinhão no surgimento do mundo e são partícipes também na formação da pólis. A terra
é vista, ao cabo da descrição das duas cidades, como um grande escudo, ao redor do qual circula a “grande força do
rio Oceano” (XVIII potamoîo mega sthénos Okeanoîo v.606). Nesse cosmo homérico, a terra em forma de escudo, o
céu, o mar, as constelações e o grande rio Oceano, fonte de todas as águas, são elementos primordiais da formação do
universo, da cidade e do homem nela inserido.
Nos Trabalhos e Dias de Hesíodo, recolhemos outras valiosas referências celestes ligadas à época da
colheita da vinha e aos ventos que tornavam a navegação penosa.

(Hesíodo, Erga kai Hemera: Trabalhos e Dias, v.609-623)

Quando Órion e Sírios chegam ao meio do


Céu, e a Aurora de dedos rosados olha para Arturo,
ó Perses, recolhe em tua casa todos os cachos de uva,
expõe ao sol de dez dias e também durante dez noites,
Cinco inteiramente às escuras, então no sexto dia
na vasilha transborda o presente do multi-regozijante
Dioniso, logo em seguida
As Plêiades, as Híades e o forte Órion2
Imergem, então lembra estar a safra propícia.
E que seja plena dos frutos da terra.
Se te agarra o desejo da navegação difícil,
Quando as Plêiades e a força robusta de Órion
Caem em fuga para o nebuloso mar,
E movem o sopro de todos os ventos,
Então não deves tomar nenhuma nau pelo mar de vinho
Mas recorda de trabalhar a terra como te digo.
(Erga kai Hemera: Trabalhos e Dias, v.609-623)

Cuando Orión y Sirio lleguen a la mitad del Urano, y cuando


Eos la de los dedos rosados mire a Arctiro,
¡oh Perses! guarda tus uvas en tu morada;
Cuando Orión y Sirio lleguen a la mitad del Urano,
y cuando Eos la de los dedos rosados mire a Arctiro,
¡oh Perses! guarda tus uvas en tu morada;
y exponlas a la luz de Helios durante diez dias y otras tantas noches.
Ponlas a la sombra durante cinco días, y al sexto, encierra en los vasos esos
dones de Dionisos que inspira la alegría.
Cuando las Pléyades, las Hiadas y la fuerza de Orión
hayan desaparecido, acuérdate de que ha
llegado el momento de labrar,
y así será consagrado todo el año a los trabajos de la tierra.
Si se apodera de ti el deseo de la navegación peligrosa,
teme la época en que las Pléyades,
huyendo de la fuerza terrible de Orion,
caen en el negro mar. En verdad que entonces se
desencadenan los soplos de vientos numerosos.
No dejes ya mucho tiempo tus naves en el negro
mar; acuérdate, antes bien, de trabajar la tierra, como te aconsejo.

1 As pluviosas. Sete estrelas da cabeça da constelação de Touro.


2 Verso idêntico ao verso de Homero na Ilíada acima citado.
Lorsque Orion et Sirius seront parvenus jusqu'au milieu du ciel, et
que l'Aurore aux doigts de rose contemplera Arcture, ô Persès !
cueille tous les raisins et apporte-les dans ta demeure ; expose-les
au soleil dix jours et dix nuits. Conserve-les à l'ombre pendant cinq
jours, et le sixième, renferme dans les vases ces présents du joyeux
Bacchus. Quand les Pléiades, les Hyades et l'impétueux Orion auront
disparu, rappelle-toi que c'est la saison du labourage. Qu'ainsi
l'année soit remplie tout entière par des travaux champêtres.

Si le désir de la périlleuse navigation s'est emparé de ton âme,


redoute l'époque où les Pléiades, fuyant l'impétueux Orion, se
plongent dans le sombre Océan ; alors se déchaîne le souffle de tous
les vents ; n'expose pas tes navires aux fureurs de la mer
ténébreuse. Souviens-toi plutôt, comme je te le conseille, de
travailler la terre ; tire le vaisseau sur le continent et assujettis-le de
tous côtés avec des pierres qui arrêteront la violence des vents
humides.

A menção ao visível no céu em Hesíodo indica a forte relação do pensamento e das


práticas arcaicas com a percepção do que chamamos natureza celeste. Vemos que em Hesíodo a
marcação do tempo pelo movimento dos astros organiza elementos fundamentais da cidade, as
atividades agrícolas e a navegação.
A presença dos astros e do céu também é muito forte na tragédia, o que nos sugere uma
longa duração desse aspecto cósmico no pensamento arcaico e clássico. Entretanto, esse traço
cósmico parece um pouco modificado na tragédia, mantendo a sua forte carga física e
astronômica, de calendário que ordena as atividades agrícolas e náuticas, mas ganhando, por
outro lado, uma carga alegórica.

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