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LAUDO ANTROPOLÓGICO

A OCUPAÇÃO INDÍGENA NA TI ZORÓ

Perito: JOÃO DAL POZ NETO, Dr.

Processo no. 2005.36.00.016788-5


Classe 1300 – Ação Ordinária / Serviços Públicos
Objeto: Desapropriação Indireta – Intervenção na Propriedade - Administrativo
Autor: Agro Pecuária Sul de Aripuanã Ltda
Réus: União Federal e Fundação Nacional do Índio – FUNAI/MT
Observação: Dec 94.088/1987 / Indígenas Zorós
3ª Vara da Justiça Federal - Seção do Estado de Mato Grosso

Cuiabá, MT

fevereiro de 2016
Laudo antropológico – Processo 2001.36.00.001508-9
1ª Vara da Justiça Federal - Mato Grosso

ÍNDICE

INTRODUÇÃO............................................................................ 3

OS POVOS TUPI-MONDÉ ................................................................. 9

A OCUPAÇÃO INDÍGENA ............................................................... 19

A TERRA INDÍGENA ZORÓ............................................................. 49

O POVO ZORÓ E OS RECURSOS NATURAIS ........................................ 74

BIBLIOGRAFIA CONSULTADA ......................................................... 97

ANEXOS ................................................................................ 117

FOTOGRAFIAS ................................................................ 118

MAPAS ......................................................................... 131


1. ÁREAS INDÍGENAS NO NOROESTE DE MATO GROSSO ........................ 132
2. MAPA DO TERRITÓRIO TRADICIONAL ZORÓ .................................. 133
3. A OCUPAÇÃO INDÍGENA NA TI ZORÓ......................................... 134

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Laudo antropológico – Processo 2001.36.00.001508-9
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INTRODUÇÃO

Este laudo traz os resultados da perícia antropológica realizada no cumprimento


do mandado expedido na ação de Desapropriação Indireta - Processo no.
2005.36.00.016788-5, da 3ª Vara da Justiça Federal de Primeiro Grau em Mato Grosso,
que a AGRO PECUÁRIA SUL DE ARIPUANÃ LTDA move contra UNIÃO FEDERAL e
FUNDAÇÃO NACIONAL DO ÍNDIO – FUNAI. Na ação a autora pleiteia ressarcimento “a
título de perdas e danos” em razão da interdição em 1973 e declaração e demarcação
em 1987 pelas requeridas da “Área Indígena Zoró”, uma vez que tais atos
administrativos incluíram parcialmente os lotes de terras adquiridos pela autora - os
títulos definitivos foram emitidos no ano de 1961 a terceiros pelo Departamento de
Terras e Colonização (DTC) do Estado de Mato Grosso (conforme a petição inicial, fls. 3
a 30 autos), a saber:

- gleba (a): área de 2.723,8667 hectares, remanescente do título definitivo


emitido em favor de Euclides Marques do Vale, em 26/01/1961;

- gleba (b): área de 20.000,00 hectares, oriunda dos títulos definitivos emitidos
em favor de Gregório Ramos da Paixão e de Manoel José de Siqueira Filho, na mesma
data;

- glebas (c) e (e): áreas de 1.815,00 hectares e de 3.345,00 hectares,


respectivamente, remanescentes do título definitivo emitido em favor de João Benedito
Barreto Neto, na mesma data;

- gleba (f): área de 6.169,00 hectares, remanescente dos títulos definitivos


emitidos em favor de Enildes Veruga e Donato Teixeira Silva;

- gleba (g): área de 20.000,00 hectares, oriunda dos títulos definitivos emitidos
em favor de Celina de Moraes e Fábio Firmino Leite, em 26/01/1961.

Foram formulados à perícia antropológica quinze quesitos pela autora, fls. 319-
321, e oito pela União Federal e FUNAI, às fls. 323-325. O perito foi nomeado às fls.
894 dos autos. A audiência para início dos trabalhos periciais foi marcada para 14 de
outubro de 2015, às 14:00 horas. Além do perito nomeado, compareceram Luciano
Márcio Gazzani, agente de indigenismo, na qualidade de representante do assistente

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técnico da FUNAI, José Eduardo Fernandes Moreira da Costa, e a advogada Renata


Prado de Araújo, representante da autora. Na ocasião, o perito informou os
representantes das partes sobre o cronograma da vistoria in loco, com início previsto
para 19 de outubro do corrente, desde a cidade de Ji-Paraná, RO, onde está a sede da
Coordenação Regional da FUNAI que assiste a Terra Indígena Zoró. O prazo estipulado
para realização dos trabalhos foi de 60 dias, posteriormente estendido, conforme
despacho às fls. 929 dos autos.

Figura 1: A situação da área sub judice (hachurada)

A petição inicial da autora, às fls. 3-30 dos autos, circunscreve-se à denominada


Terra Indígena Zoró e aos atos administrativos a ela relacionados (em particular, o
Decreto 81.587, de 19 de abril de 1978, publicado no D.O.U. de 20/04/1978, que
interditou a referida área; o Decreto 94.088, de 11 de março de 1987, publicado no
D.O.U. de 12/03/1987, que declarou a ocupação indígena sobre a mesma; o Registro
de Matrícula 31.352, junto ao 6º. Cartório de Registro de Imóveis de Cuiabá da Área
Indígena Zoró; e o Decreto 265, de 29 de outubro de 1991, publicado no DOU de
30/10/91, que homologou a demarcação administrativa da área Zoró, com 355.789
hectares). Os lotes de terras da autora dispõem-se na chamada “Gleba JK”, cujas

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parcelas foram alienadas pelo Departamento de Terras e Colonização (DTC) do Estado


de Mato Grosso nos idos de 1950 e 1960. Deste modo, para atender plenamente ao
conteúdo dos quesitos postos ao perito antropológico, o presente laudo deverá,
necessariamente, tratar da ocupação indígena e demais aspectos relevantes, bem
como assinalar os eventos históricos e os procedimentos conexos adotados pelo poder
público.

A vistoria in loco efetuou-se entre 19 e 28 de outubro de 2015, período


despendido nos deslocamentos entre Cuiabá e Ji-Paraná, em contatos com os setores
responsáveis das administrações da FUNAI de Ji-Paraná e de Cuiabá e em visitas às
aldeias e entrevistas realizadas na TI Zoró.

Para o planejamento das atividades de campo, foram efetivados contatos


prévios com a Coordenação Regional da FUNAI/Ji-Paraná, através do ex-coordenador
Vicente Batista Filho, do atual coordenador Walter Rocha Meira e do coordenador
substituto William Nunes S. Junior, com a APIZ - Associação do Povo Indígena Zoró, na
pessoa de seu presidente Tiago Kapawandu Zoró, e com a técnica de ensino da FUNAI
e vereadora de Rondolândia, Lígia Neiva. Para acompanhar os trabalhos de vistoria, a
FUNAI indicou o chefe da CTL Tennesson Gonçalves de Oliveira, e a APIZ o
representante Panderewop Zoró.

No dia 19 de outubro (segunda-feira) às 9 hs, o perito se reuniu com


Tennesson Gonçalves, Ligia Neiva e Panderewop Zoró na sede da FUNAI em Ji-Paraná,
situada na Av. Maringá, 2268, Bairro Nova Brasília. Após esclarecimentos sobre os
objetivos do trabalho a ser realizado, foi elaborado um plano de viagem de visitas e
entrevistas em aldeias selecionadas, tendo presente a situação geográfica da área sub
judice, conforme o mapa apensado ao processo pela parte autora. A FUNAI colocou à
disposição para a viagem uma camionete (Ford Ranger 3.0, placa NBS-0723), sob
responsabilidade do chefe da CTL, enquanto o perito encarregou-se dos demais itens
necessários. Na oportunidade, foram encaminhadas solicitações à SESAI dos dados
censitários recentes dos Zorós e ao SEGAT/FUNAI-Ji-Paraná das coordenadas
geográficas das aldeias na TI Zoró.

No dia 20 de outubro (terça-feira), de manhã, saímos o funcionário da FUNAI e


o perito em direção Rondolândia, levando de carona a linguista Aguida Aparecida Gava
(UFMT/UNEMAT); ali embarcaram Panderewop e Luiz Kunhawop. O trajeto para a TI
Zoró seguiu pelas cidades de Ministro Andreazza e Pacarana. Chegamos na aldeia Zawã

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Kej/Barreira (coordenadas S 10˚ 57’ 31,58” W 60˚ 53’ 52,31”) por volta das 18:30 hs,
quando fomos informados que os caciques e demais lideranças nos esperavam na
Aldeia-Escola Zarup Wej. Passamos na aldeia Paraíso da Serra, de Miguel Zan
(coordenadas S 10˚ 48’ 21,80” W 60˚ 43’ 31,14”), e finalmente chegamos na Aldeia-
Escola (coordenadas S 10˚ 39’ 33,03” W 60˚ 34’ 19,15”) por volta das 21 hs, onde
pernoitamos.

No dia 21 de outubro (quarta-feira), de manhã, participamos da reunião


organizada pelos caciques e lideranças no auditório da Escola, quando esclarecemos os
motivos e objetivos da perícia. A reunião foi coordenada pelo professor Waratã Zoró, e
contou com a presença de alunos, que ali cumpriam uma etapa intensiva de aulas,
seus familiares e demais interessados. Os mais velhos e algumas lideranças
representativas (Wam, Mantiazap, Palyã, Paulo, Raimundo Betabi etc.) prestaram
depoimentos que foram gravados; e, com base em um grande mapa que desenharam
na louça branca, detalharam a ocupação atual e antiga da área pelos Zorós (ver
fotografia em anexo). A tarde, após o almoço, Tennesson, Panderewop e o perito
seguiram para a aldeia Tamali Syn (coordenadas S 10˚ 29’ 07,77” W 60˚ 41’ 41,88”),
aonde chegamos às 19:25 hs. No trajeto, passamos pelas aldeias Santa Cruz
(coordenadas S 10˚ 42’ 18,92” W 60˚ 34’ 45,94”), Casa Verde (coordenadas S 10˚ 51’
12,54” W 60˚ 46’ 34,79”), Abesewap (coordenadas S 10˚ 44’ 05,55” W 60˚ 44’
17,31”), Duãjurej/Serrinha (coordenadas S 10˚ 35’ 57,59” W 60˚ 42’ 34,26”) e
Barãjurej/Seringal/Apeti (coordenadas S 10˚ 33’ 51,89” W 60˚ 42’ 08,03”).

Na manhã do dia 22 de outubro (quinta-feira), reunidos no pátio da aldeia


Tamali Syn, com a participação de Marcos Zarkupep, Marilza, Luisa, Pedro, Wam,
Helena, Fátima, Jonas Kira e Ana Lúcia, fizemos um levantamento das várias atividades
produtivas desenvolvidas na aldeia (agricultura, caça, pesca, coleta etc.) e os locais
que são explorados rotineiramente no entorno. Em seguida, visitamos a roça de Marcos
Zarkupep. De lá, com breves paradas nas aldeias Seringal, Serrinha, Abesewap, Casa
Verde, Guwã Puxurej (coordenadas S 10˚ 53’ 27,40” W 60˚ 48’ 41,11”) e Zawã
Kej/Barreira, retornamos para Rondolândia onde pernoitamos.

No dia 23 de outubro (sexta-feira), nos dirigimos para a aldeia Anguj Tapua


(coordenadas S 10˚ 39’ 04,75” W 61˚ 07’ 41,78”), à margem direita do rio Branco
(afluente do rio Roosevelt), chegando lá pouco antes do meio-dia. Encontramos os
homens levantando uma cerca para a travessia do rio Branco cinquenta de cabeças de

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gado que adquiriram de uma fazenda próxima. Cruzamos o rio na balsa recém-
reformada para chegar na aldeia, a cerca de 500 metros da margem direita do rio
Branco. Durante o descanso para o almoço, recolhemos informações sobre as várias
atividades produtivas desenvolvidas na aldeia e os locais que são explorados no
entorno, com a colaboração de Geraldo Chambi, Caio e Marcio Kijãzap. À tarde,
retornamos a Ji-Paraná, e no caminho paramos na aldeia Ikolen dos Gaviões para
conversar com Catarino Sebirop, mas este se encontrava ausente. Chegamos em Ji-
Paraná cerca de 17:30 hs, dando por encerrada esta etapa de vistoria pericial.

Os documentos compulsados para deslindar a ocupação tradicional indígena


(ver Bibliografia consultada) provêm, em sua maior parte, do Serviço de Arquivos do
Museu do Índio, no Rio de Janeiro (onde se encontram microfilmados os Arquivos do
SPI – Serviço de Proteção aos Índios, 1910–1967; das Comissões Telegráficas e de
Fronteiras, 1890-1935; e do Conselho Nacional de Proteção aos Índios, 1939-1967), do
Departamento de Documentação da FUNAI, em Brasília (que detém os processos de
identificação das terras indígenas e os relatórios de atividades do órgão indigenista
federal); e do meu acervo pessoal, que inclui recortes de jornal e relatórios diversos.
Registros acurados dos acontecimentos nos anos 1970 a 1980 devem-se ao fotógrafo
Jesco von Puttkamer, que acompanhou as ações da FUNAI na região; seus diários e
fotografias pertencem ao Acervo do Instituto Goiano de Pré-História e Antropologia, da
Universidade Católica de Goiás, em Goiânia.

A este cabedal de documentos pode-se, ainda, acrescentar os vários laudos


periciais histórico-antropológicos que, desde a década de 1980, examinaram a situação
fundiária dos Zorós à luz das demandas submetidas ao poder judiciário federal. Na
medida em que trazem dados e argumentos valiosos para resolver as questões postas
no presente caso, destaco as perícias efetivadas pela antropóloga Denise Maldi, nas
ações movidas por ADAIR VIEIRA MAIA E OUTROS - Processo 20.840-7, 2ª Vara/MT e
pelo ESPÓLIO DE TSUGUIO TANAKA - Processo 000.032-9 (Ação Ordinária 88.6283-0,
1ª Vara/DF). A estes, acrescenta-se o Processo no. 2001.36.00.001508-9, da 1ª Vara
da Justiça Federal de Primeiro Grau em Mato Grosso, originada da Ação Ordinária –
Processo 90.00.06514-3, da 13ª Vara da Justiça Federal de Primeiro Grau no Distrito
Federal, movida por COLONIZADORA AMAZONIA BRASILEIRA S/A E AGROPECUÁRIA
RIO ROOSEVELT S/A, cujo laudo esteve a cargo do presente perito, no qual se
examinavam glebas à leste das ora sub judice. Os extensos dados então colhidos irão
nos servir para solucionar, parcialmente, alguns dos quesitos aqui propostos – por esta

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razão, tomarei livremente seus resultados e alguns excertos daquele laudo. Naquela
vistoria e na presente, a posição geográfica das aldeias, capoeiras e outros locais
relevantes foi obtida através de um aparelho GPS, modelo Garmin.

Para facilitar a leitura, procurei reunir as informações mais relevantes e os


quesitos em quatro tópicos: o primeiro sobre os povos Tupi-Mondé, aos quais os Zorós
são aparentados; o segundo com os dados históricos da ocupação indígena; o terceiro,
o histórico do processo de demarcação da Terra Indígena Zoró, na qual se insere
parcialmente a área em litígio; o último, o modo de vida dos Zorós e o uso que fazem
dos recursos naturais. Os mapas em anexo foram elaborados, para fins desta perícia, a
partir dos dados colhidos nas fontes documentais que a subsidiaram e no transcurso
dos trabalhos de campo.

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OS POVOS TUPI-MONDÉ

Quesitos da União Federal e FUNAI


3. Quais os indivíduos de origem ameríndia que habitam a Terra Indígena Zoró?

Quesitos da Agro P ecuária Sul de Aripuanã Ltda


3. Existem índios isolados nas propriedades da Autora e a que grupo indígena pertencem? Qual
a filiação cultural e linguística dos mesmos?

Na Terra Indígena em questão – e, em consequência, nos lotes de terras


adquiridos pela autora que nela incidem – habitam os Zorós, um povo indígena que a si
mesmo se denomina Pangyjej. Rigorosamente, eles não podem ser classificados nos
dias de hoje como “isolados”, visto que foram contatados por peões da fazenda
Castanhal e por funcionários da FUNAI em 1977, como abaixo se descreve, e há
décadas se relacionam extensamente com os demais segmentos da sociedade
brasileira e suas variadas instituições. Para melhor situá-los no contexto regional,
seguem uns breves comentários acerca da bibliografia etnográfica e lingüística que
focaliza este povo indígena e as seus congêneres da vizinhança.

Devo notar que, de início, os vários grupos indígenas da família Tupi-Mondé que
habitavam essa região noroeste de Mato Grosso e leste de Rondônia foram
confundidos sob uma mesma denominação - “Cinta Larga” ou “Cinturão Largo” -,
provavelmente devido ao fato de todos usarem algum tipo de cinto e de semelhanças
entre suas grandes malocas oblongas. Não obstante, a leitura cautelosa do noticiário
da imprensa e dos relatórios oficiais produzidos até os primeiros anos da década de
1970 permite-nos deslindar com exatidão as distintas etnias a que estes se referem,
assim como atribuir diretamente a cada uma delas os respectivos eventos históricos.

É preciso dizer, entretanto, que a existência de diferentes etnias na região foi


desde logo apontada pelos intérpretes do povo Gavião, contratados para auxiliar as
expedições de “atração e pacificação” da FUNAI em fins dos anos 1960. Os Gaviões
(Ikolen), nas imediações do Igarapé Lourdes, a oeste, em Rondônia, já se encontravam
em contato com seringueiros há algumas décadas. Os sertanistas do órgão oficial,
todavia, só mais tarde deram-se conta da complexa realidade étnica que ali se
observava; e assim teriam se equivocado, segundo um dos intérpretes, ao vulgarizar a
designação “Suruí” para os “Paíter’ite” (Chiappino, 1975, p. 8) – estes índios hoje

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habitam a TI Sete de Setembro, ao sul da região em tela. E, para o caso que aqui nos
interessa, foram também os funcionários da FUNAI que, ao ouvir o que diziam seus
tenazes inimigos Suruís, consagraram a designação que hoje identifica os “Zorós”, à
época conhecidos pelos regionais sob a alcunha de “Cabeças-Secas”. Segundo o
jornalista Cesarion Praxedes, que visitou em 1977 o acampamento da FUNAI às
margens do rio Branco (afluente da margem esquerda do rio Roosevelt) e publicou
reportagens sobre o contato com os Zorós na revista Manchete (“Zorós: os últimos
guerreiros”, na edição de 12 de novembro de 1977, p. 4-11) e na Revista Geográfica
Universal (“Primeiro encontro com os índios Zorós”, no número 38, 1977, p. 68-79):

“Zoró é o nome que ficou da denominação monshoro, utilizada pelos suruís para
designar seus vizinhos e inimigos (...). Monshoro é uma palavra depreciativa que os
suruís não explicam direito o significado. Com o tempo, foi abreviada para shoro e, por
fim, zoró”.

O médico Jean Chiappino (1975, p. 8, 18), que no ano de 1972 conviveu


durante cinco meses com os Cintas-Largas (no posto Roosevelt) e os Suruís (área Sete
de Setembro), anotou que estes chamavam de “Mojur” os seus inimigos hereditários
situados à nordeste. A si próprios os Zorós designam-se por “Pangyjej”, de acordo com
a grafia adotada para as línguas Tupi-Mondé, muito embora tenham assimilado a
denominação que rapidamente se difundiu no contexto de suas relações com a
sociedade nacional, que é hoje utilizada, inclusive, como sobrenome nos registros de
nascimento e outros documentos pessoais.

De modo que, por exclusão, o rótulo “Cinta-Larga” restou exclusivamente


àqueles que, então, adornavam-se com um cinto rígido confeccionado com a
entrecasca da árvore toari. Na documentação existente, os Cintas-Largas foram
também chamados de “selvícolas do Aripuanã”, “Iamé”, “Inhami” e “Cinturão Largo”.
Em sua própria língua, vinculada à família Tupi-Mondé, não dispõem propriamente de
qualquer autodenominação, embora usem referir-se a si pelo termo pãzerej, que
traduziria por “nossa gente”, ou pãnõj, “nós mesmos”.

A multiplicidade de grupos Tupi que vivem ou viveram na região em foco


chamou a atenção de vários pesquisadores. Aryon Rodrigues (1964, p. 103) observou
que quase todas as famílias lingüísticas do tronco Tupi concentravam-se na região do
alto Madeira, e sugeriu que o “centro de difusão do Proto-Tupi” deveria ser procurado
na área do Guaporé. Em uma classificação renovada, Rodrigues (1974, p. 53) dividiu o
tronco Tupi em oito famílias, das quais cinco são faladas exclusivamente na região

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considerada, a saber, Arikém, Tupari, Rama-rama, Mondé e Puruborá. Uma sexta, a


família Tupi-Guarani, está aqui representada pelos Kawahíb. Em Rondônia e noroeste
de Mato Grosso, é preciso notar, os povos Tupi apresentam diferenças não apenas de
cunho lingüístico, mas também dessemelhanças culturais que merecem atenção.

Figura 2: Os Tupi-Mondé e seus vizinhos

Quanto à filiação lingüística, além das línguas Zoró e Cinta-Larga, os demais


representantes da família Tupi-Mondé são as línguas Gavião, Salamãi (Sanamaiká ou
Mondé), Suruí, Aruá e Aruaxi (Rodrigues, 1986); e provavelmente também a língua
Kepkiriwat, de um povo que a Comissão Rondon encontrou em 1913 no vale do
Pimenta Bueno, um dos formadores do rio Ji-Paraná (Rondon, 1916, p. 152-156;
Rondon & Faria, 1948; Lévi-Strauss, 1994, p. 167) e a língua dos Arara do Guariba (Dal
Poz, 1995). Os dados sobre os Aruás, os Aruaxis, os Salamãis (Mondé) e os
Kepkiriwates diluíram-se desde a década de 50; seus remanescentes teriam sido

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transferidos para as margens do rio Guaporé e outros rincões. Por sua vez, os Cintas-
Largas, os Gaviões e os Zorós falam línguas mutuamente compreensíveis, apesar de
fortes diferenças dialetais. Segundo o lingüista Denny Moore (1984, p. 9; ver também
Chiappino, 1975, p. 9), a língua Suruí é a que mais se distancia das demais da família,
não sendo entendida, exceto umas poucas palavras, pelos falantes das três anteriores.

Visto que não se encontrou, até o momento, outro povo de língua Tupi-Mondé
fora da região dos afluentes da margem direita do alto Madeira (Rondônia e noroeste
de Mato Grosso), os especialistas consideram este fato uma prova da antigüidade da
ocupação da região pelos povos desta família linguística. De acordo com o antropólogo
Gilio Brunelli (1987, p. 151), as pesquisas etno-lingüísticas permitem estimar a origem
do processo de diversificação das línguas Tupi-Mondé em cerca de 200 ou 300 anos
atrás, quando alguns grupos “proto-tupi-mondé”, eventualmente retomando áreas já
ocupadas por outros grupos da mesma família, deslocaram-se a montante ao longo dos
rios Aripuanã e Roosevelt.

Em 1938 Lévi-Strauss visitou um grupo de vinte e cinco índios “Mundé” no alto


rio Pimenta Bueno, atual estado de Rondônia, até então não mencionados na literatura
etnográfica (Lévi-Strauss, 1955, p. 374-385). Uma pequena aldeia Salamãi, liderada
pelo capitão Telêmaco, foi localizada no início da década de 40 na margem direita do
rio Pimenta Bueno pela Turma de Exploração do Oeste de Mato Grosso, do SPI; com
eles conviviam alguns Massacá e Canoê. Na mesma ocasião, à margem direita do rio
Apidiá, havia uma aldeia Massacá comandada pelo capitão de nome “Mundé”. Pouco
mais que um vocabulário foi então registrado pelo encarregado da expedição, o
tenente Estanislau Zack (1943). Por sua vez, o inspetor do SPI Moacyr Xerez (1946)
publicou um vocabulário, que atribuiu aos “Mondés”, sem informações adicionais;
trata-se, sem dúvida, de uma língua da hoje designada família Tupi-Mondé. Anos
depois, a missionária Wanda Hanke encontrou os “Mondés” no alto Guaporé, para onde
três famílias haviam sido removidas, e recolheu uma lista de palavras e dados
etnográficos superficiais (Hanke, 1950).

Posteriormente, a lingüista Etta Becker-Donner entrevistou vários deles no


posto indígena Ricardo Franco (atual área indígena Guaporé), indicando serem eles os
“Salamay” oriundos do rio Pimenta Bueno, mais propriamente de sua confluência com
o rio Barão de Melgaço - na região existiriam ainda, disseram eles, outras aldeias de
índios “selvagens”. Becker-Donner (1955, p. 291-296) apresentou um sugestivo

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sumário do modo de vida Salamãi, dispondo unicamente de dados obtidos na sede do


posto do SPI. Alguns costumes por ela descritos, como o uso de rapé pelos xamãs, são
compartilhados pelos grupos da família Tupari, mas não pelos demais Tupi-Mondés.

No que diz respeito aos Aruás e Aruaxis, o etnólogo alemão H. E. Snethlage


encontrou os primeiros no seringal São Luis, no rio Branco do Guaporé, e os segundos,
nas cabeceiras do mesmo rio (Snethlage, 1937 apud Loukotka, 1963, p. 44). Mais
recentemente, o missionário Campbell (1968 apud Moore, 1984, p. 9) recolheu uma
lista de palavras junto a moradores da área indígena Rio Branco (situada às margens
do rio Branco, afluente do rio Guaporé), e Mindlin (1997) registrou mitos narrados por
Awünaru Odete Aruá, morador da área indígena Guaporé.

Os índios Gaviões (ou Ikolen), chamados por Harald Schultz erroneamente de


“Digüt” (na tradução, “esconderijo de caça”, tão-somente o nome próprio de um de
seus informantes) habitam atualmente a TI Igarapé Lourdes, na margem direita do Ji-
Paraná, onde estão também os Araras (da família lingüística Rama-rama). Em 1913 o
coronel Cândido Rondon visitou algumas de suas aldeias nas cabeceiras do rio Tarumã,
afluente do rio Ji-Paraná, na região da serra da Providência; denominou-os então de
“Urumi” (Rondon & Faria, 1948, p. 211-213; algumas fotos foram publicadas em
Rondon, 1946, p. 155-160). O etnógrafo Schultz, que os visitou na década de 50, a
serviço da equipe de pesquisa do SPI, informa que os Gaviões aproximaram-se na seca
de 1953 de um grupo de caucheiros para obter “ferramentas e outros objetos”
(Schultz, 1955). A presença dos caucheiros teria atraído grupos sucessivos,
abandonando suas malocas para trabalhar na extração do látex. A situação veio a se
estabilizar com a chegada de missionários das Novas Tribos e funcionários do SPI, a
partir de meados dos anos 60.

Quanto à bibliografia, a língua Gavião foi estudada por Denny Moore (1984),
que realizou uma descrição do sistema gramatical, a primeira realmente exaustiva de
uma língua Tupi-Mondé. Os antropólogos noruegueses Lars Løvold e Elizabeth Forseth,
do Instituto de Antropologia Social de Oslo, desenvolveram pesquisas sobre sua
cosmologia e organização social entre 1980 e 1981 (Løvold & Forseth, 1984; Løvold,
1983; 1984a; 1984b); na ocasião tiveram ainda o privilégio de observar os recém
contatados Zorós, que então buscaram refúgio na área dos Gaviões para fugir de
ataques dos Suruís. Um livro de mitos foi organizado pela antropóloga Betty Mindlin,
com a colaboração de narradores Gaviões (Mindlin et alii, 2001).

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Laudo antropológico – Processo 2001.36.00.001508-9
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Na década de 1960, a inauguração da estrada ligando Cuiabá a Porto Velho


acirrou os conflitos entre índios e seringueiros, garimpeiros e posseiros – e logo,
empresas de mineração e firmas de colonização. No trecho entre Vilhena a Ji-Paraná,
em Rondônia, os ataques indígenas a vilas, colocações de seringueiros e turmas de
garimpeiros chegaram ao noticiário da imprensa nacional, em particular os casos
envolvendo acusações de prática de canibalismo. Ao já combalido Serviço de Proteção
aos Índios, que em seguida seria substituído pela FUNAI, impôs-se a tarefa de
“pacificação” dos temidos “Cinturão Largo” (Arquivos do SPI: microfilmes 42, 43, 44,
45, 217, 236, 247, 248, 249 e 344). Um levantamento aéreo realizado por Horst Stute
(1967), da Missão Novas Tribos, localizou os agrupamentos mais significativos dos
Suruís, Cintas-Largas e Zorós (no relatório e no mapa em anexo, estes últimos
aparecem designados de “Suruí” – voltarei a este ponto adiante).

As operações de “pacificação”, iniciadas em 1966, mostraram-se


descoordenadas e insuficientes em meio à invasão generalizada do território indígena
por garimpeiros e colonos. Os desacertos, omissões e conivência do órgão indigenista
(SPI e, em seguida, FUNAI) foram desastrosos, e o caso suruí pode ser tomado como
exemplar quanto à atuação do órgão indigenista. O médico Jean Chiappino (1975), que
visitou a região em 1972, testemunhou a tragédia dos Suruís: sua população foi
estimada inicialmente em quinhentos indivíduos, mas três anos após os primeiros
contatos liderados pelos sertanistas Francisco Meireles e seu filho Apoena Meirelles
estava reduzida à metade - dizimada por epidemias de gripe e sarampo, com suas
terras já irremediavelmente invadidas por colonos, posseiros e grileiros.

A bibliografia sobre os Suruís (Paiter), que habitam a TI Sete de Setembro, é


ainda escassa. Os missionários Willem e Carolyn Bontkes, do Summer Institute of
Linguistics estudaram a sua língua (Bontkes, 1978, apud Moore 1984, p. 8) e
obtiveram alguns poucos dados sobre organização social e parentesco (Bontkes, 1974).
Os missionários Lori Altmann e Roberto Zwetsch (1980), da IECLB - Igreja Evangélica
de Confissão Luterana, traçaram um histórico dos contatos e um relato sumário de
suas observações ao longo de um ano de permanência entre eles. Betty Mindlin, que os
pesquisou entre 1979 e 1983, apresentou uma descrição despretensiosa do modo de
vida Suruí, na qual destacou o sistema de nominação e a instituição ritual de metades
(Mindlin 1985). Um livro de mitos foi organizado pela mesma autora (Mindlin et alii,
1996). Os Suruís foram ainda estudados por Carlos Coimbra (1985), interessado em
ecologia humana, e por Leda Leonel (1984), quanto à arquitetura e ao meio-ambiente.

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Nos últimos anos, novas pesquisas vêm sendo divulgadas, a exemplo de Pucci, 2009;
Yvinec, 2011; Romero, 2014; entre outros.

Quanto aos Cintas-Largas, em meados do século XX eles se encontravam


distribuídos em vários grupos locais, ocupando a vasta região que vai das cabeceiras
dos rios Aripuanã e Roosevelt, nas proximidades da atual cidade de Vilhena, até as
margens dos rios Guariba e Branco, afluentes da margem esquerda do rio Aripuanã
(Dal Poz, 1991; 2004). Quatro áreas administrativas foram reconhecidas para os
Cintas-Largas - o Parque do Aripuanã, a TI Roosevelt, a TI Serra Morena e a TI
Aripuanã -, compreendendo uma extensão total de mais de 2,7 milhões de hectares.

Figura 3: Localização dos povos indígenas


(Dal Poz, 1988, p. 170)

Até meados do século passado, um estado de guerra incessante contrapunha os


grupos locais cintas-largas aos povos indígenas vizinhos: os Suruís, os Zorós, os
Rikbaktsas, os Enawene-Nawes e os Nambikwaras eram os seus inimigos mais
freqüentes. Reproduzo a seguir o que já escrevi em outro lugar:

“Os Suruí, a sudoeste, a quem os Cinta Larga chamam de Jorey, eram os ‘inimigos
hereditários’, como notou Chiappino (1975) (...) Quanto aos Zoró, ou Jeikípey, a oeste,
ataques e atos canibais teriam pontuado o itinerário da migração que estes
empreenderam para o sul no início do século (Brunelli, 1986). E outras escaramuças,
ocorridas há mais de 30 anos, estão igualmente presentes na memória dos próprios
Cinta Larga, como constatei na área Aripuanã” (Dal Poz, 1998, p. 168).

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Os primeiros contatos pacíficos com garimpeiros ocorreram em fins de 1968, às


margens do rio Roosevelt. Na fronteira leste do seu território, que alcançava o rio
Juruena, os Cintas-Largas disputavam a hegemonia com os índios Rikbaktsas (ou
“Canoeiros”), os Enawene-Nawes (chamados também “Salumãs”) e os Nambikwaras.
No entanto, os atritos intertribais seriam obscurecidos pela invasão crescente dos
territórios indígenas por firmas seringalistas, levas de garimpeiros e empresas de
mineração, contra os quais os índios se defrontariam daí em diante. Ganharam
proporções alarmantes, então, as operações destinadas a “limpar a área”, organizadas
principalmente pelos seringalistas, que exterminaram várias aldeias cintas-largas
daquela região. Em seu livro sobre a pacificação dos Rikbaktsas, que também
enfrentaram as frentes extrativistas, e em uma entrevista ao jornal “O Estado de São
Paulo”, na edição de 11/06/75, o padre jesuíta João Dornstauder historiou as várias
expedições de extermínio que os seringalistas, a partir do rio Juruena, promoveram nos
anos de 1959, 1960 e 1962 (Dornstauder, 1975; Faerman, 1975). Dentre os muitos
assaltos às aldeias cintas-largas, um destes crimes, conhecido como o “Massacre do
Paralelo 11”, ganhou repercussão na imprensa nacional e internacional, e gerou na
época denúncias sobre a prática de genocídio contra os povos indígenas no Brasil
(Globo, 1966a; Globo, 1966b).

Em dezembro de 1968, contudo, um grupo cinta-larga confraternizou com


garimpeiros no rio Roosevelt. Nos meses seguintes novas visitas aconteceriam.
Pensando tratar-se da mesma etnia que já freqüentava o posto Sete de Setembro
(esta, que foi depois denominada “Suruí”), a FUNAI procurou então afastar os
garimpeiros e instalou no local o subposto Roosevelt (na seção sul da atual TI
Roosevelt), aproveitando a curta pista de pouso e os barracões construídos pelos
garimpeiros. O médico e etnólogo Jean Chiappino, que, entre julho e dezembro de
1972, visitou os Cintas-Largas que viviam no posto Roosevelt e em uma aldeia nas
proximidades da foz do rio Capitão Cardoso, verificou que os que ali estavam eram
remanescentes “de um grupo mais importante que consistia em cerca de cem pessoas,
que foram dizimadas por uma epidemia um ano antes (...) em circunstâncias (...)
dramáticas” (Chiappino, 1975, p. 9). A criação do posto Serra Morena, às margens do
rio Aripuanã deu-se de maneira semelhante: tratava-se de um acampamento de
garimpeiros, dotado de uma pista de pouso, desalojado pela FUNAI após vários
ataques dos Cintas-Largas. Daí em diante, os contatos se sucederam em número
crescente, e algumas famílias indígenas passaram a residir neste posto junto aos

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Laudo antropológico – Processo 2001.36.00.001508-9
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funcionários. Quanto aos Cintas-Largas que tinham suas aldeias ao norte, na região
dos rios Branco e Guariba (atual TI Aripuanã), estes se mantiveram em guerra contra
os seringueiros desde a década de 1950, época em que adquiriram os primeiros
instrumentos de metal. Mas em janeiro de 1974, eles tomaram a iniciativa de
estabelecer relações pacíficas com os moradores da vila Aripuanã - quando narram a
visita, os Cintas-Largas dizem que seu objetivo era obter ferramentas - dabekara
veribate, os machados e terçados estavam acabando (Dal Poz, 1991).

Carmen Junqueira estudou o grupo da Serra Morena de 1978 a 1981. Suas


pesquisas buscavam a compreensão do modo de vida e uma avaliação da política
indigenista, ou seja, as relações do Estado brasileiro com as populações indígenas
(Junqueira, 1984a; 1984/85). A autora também acompanhou, nos anos seguintes, os
impactos sobre a população indígena decorrentes da implantação do Programa
Polonoroeste (Junqueira, 1983; 1984b; 1984c; Junqueira & Mindlin, 1983; 1986).
Dentre seus trabalhos, sobressai um primeiro relatório datilografado, onde a autora
esboça o quadro da vida cotidiana dos Cintas-Largas, destacando as atividades de caça
e coleta, a composição dos grupos, as formas de socialização dos seus membros, as
regras de casamento e as relações entre os grupos locais, registrando ainda os
interesses econômicos suscitados pelo contato e a prática indigenista do posto da
FUNAI (Junqueira, 1981), e uma publicação recente, sobre sexualidade e vida familiar
(Junqueira, 2002). A narrativa de Richard Chapelle (Chapelle, 1979) de uma excursão a
uma aldeia próxima ao rio Eugênia em 1978, para filmar os costumes nativos, tem
pouco valor etnográfico. Priscilla Ermel (Ermel, 1988) estudou a musicologia cinta-
larga, na área Roosevelt. Destaca-se ainda a singular coletânea de mitos e histórias
narrados por Pichuvy Cinta Larga (Pichuvy, 1988). Já as pesquisas etnológicas que
entre eles empreendi desde 1980 resultaram na dissertação de mestrado sobre o ritual
da festa (Dal Poz, 1991), na tese sobre o parentesco, política e economia (2004) e em
dois artigos já publicados (Dal Poz, 1993; 1998), um que trata das simetrias estruturais
entre rito e mito e o outro, das relações entre os Cintas-Largas e a sociedade nacional.
Pesquisas lingüísticas foram empreendidas pelo casal de missionários Clive e Patricia
Sandberg, do Summer Institute, na área indígena Roosevelt, a partir de 1971: além de
um pequeno dicionário (C. & P.Sandberg, 1978), eles estabeleceram uma ortografia
provisória para a língua Cinta Larga e descreveram alguns aspectos de sua gramática
(C. Sandberg, 1976; P. Sandberg, 1976; 1979/1980).

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Os Zorós (Pangyjej) que habitam a TI Zoró, dos quais trata este laudo
antropológico, foram o último dos povos Tupi-Mondé a se aproximar das frentes
regionais: em 1977 eles saíram ao encontro de “peões” da fazenda Castanhal, às
margens do rio Branco, afluente do Roosevelt. Depois, em outubro daquele ano, uma
expedição da FUNAI, auxiliada por índios Gaviões, Cintas-Largas e Suruís, foi contatá-
los na sede dessa fazenda (Praxedes, 1977a; 1997b; Silva 1986a) – os eventos do
contato e as informações demográficas serão detalhados nos tópicos adiante. O
cotidiano da vida no posto e, especialmente, a atuação dos funcionários da FUNAI
foram aspectos abordados por Roberto Gambini (1983; 1984a; 1987), que visitou os
Zorós na qualidade de membro da equipe FIPE/USP de avaliação do Programa
Polonoroeste e foi o responsável pelo relatório de identificação da área Zoró (Gambini,
1984b). O antropólogo Gilio Brunelli estudou a etnomedicina Zoró e as transformações
que este sistema sofreu através do contato com a sociedade nacional, bem como
incursionou pela noção de pessoa e a cosmologia, as restrições alimentares, as práticas
terapêuticas e a farmacopéia. O mesmo autor discutiu ainda outros temas pertinentes
às questões que nos interessam neste laudo: um ensaio de etnohistória, no qual a
narrativa das guerras e migrações põe em questão a identidade dos grupos Zoró
(1986); uma análise das relações entre o sistema cosmológico e os hábitos alimentares
(1988a); e algumas notas sobre o complexo do xamanismo (1988b). Sua colega Sophie
Cloutier apresentou dados interessantes acerca da musicologia zoró e o processo de
conversão dos índios ao evangelismo (Cloutier, 1987; 1988a; 1988b)

Por fim, os Arara do Guariba, como são chamados pela população regional
(município de Aripuanã), seriam provavelmente remanescentes de uma frente
avançada dos Cintas-Largas ou outro grupo Tupi-Mondé, ao norte, que se desagregou
ao se deparar com a empresa seringalista três ou quatro décadas atrás. O relatório da
Diocese de Ji-Paraná (Valdez, 1984) traz a sua localização, um pequeno vocabulário e
alguns dados sobre as poucas famílias que vivem hoje como seringueiros, dispersas em
várias colocações naquela região. Tive a oportunidade de levantar alguns relatos sobre
suas relações com a sociedade regional (Dal Poz, 1995).

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A OCUPAÇÃO INDÍGENA

Quesitos da União Federal e FUNAI


4. De quando remonta a ocupação dos indígenas na Terra Indígena Zoró?

Quesitos da Agro P ecuária Sul de Aripuanã Ltda


4. Histórico de ocupação da terra indígena de acordo com a memória do grupo étnico
envolvido?
7. Quando se deu o contato com os sedizentes índios isolados? (...) Quando os índios isolados
perderam a posse das terras da Autora? Quem ocupa a área atualmente? De quando data essa
ocupação?

A Constituição Federal de 1988 ao reconhecer aos índios os “direitos originários


sobre as terras que tradicionalmente ocupam”, caracterizou-as como “as por eles
habitadas em caráter permanente, as utilizadas para suas atividades produtivas, as
imprescritíveis à preservação dos recursos ambientais necessários a seu bem-estar e as
necessárias a sua reprodução física e cultural, segundo seus usos, costumes e
tradições” (artigo 231, parágrafo 1º). A fórmula encontrada pelos legisladores, que
confirma e especifica em termos inequívocos a natureza e a abrangência da “posse
indígena”, cujo amparo constitucional remonta às Constituições de 1934 e
subseqüentes, tem entre outros méritos o de guardar uma notável semelhança com o
conceito antropológico de habitat indígena, qual seja, uma relação cultural e
historicamente constituída entre uma sociedade e um dado espaço geográfico.

O habitat ou território indígena, portanto, não se pode confundir com outras


modalidades de posse ou propriedade também sancionadas pela legislação brasileira.
Segundo os ensinamentos do jurista João Mendes Júnior no início do século XX, trata-
se o indigenato de um “título congênito”, um “domínio a reconhecer e direito originário
e preliminarmente reservado” (Mendes Júnior, 1912, p. 58-59). No processo de
identificação e caracterização de um território indígena, destarte, há de se averiguar as
formas singulares de uso dos recursos naturais ali existentes pela população
respectiva, a organização social e a distribuição espacial dos seus contingentes
demográficos, os vínculos morais e mitológicos que mantém com certo conjunto de
acidentes geográficos, a percepção histórica de sua continuidade nos mesmos locais
onde viveram e morreram seus antepassados, uma convicção genuína de um porvir
enquanto sociedade culturalmente distinta.

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Laudo antropológico – Processo 2001.36.00.001508-9
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No caso dos Zorós, sobre os quais versa a presente perícia, tal questão deve ser
deslindada considerando-se, ao menos, as seguintes variáveis: a) a maneira como
interpretam suas origens históricas e mitológicas e seu enraizamento territorial; b) o
modelo social que ordena a distribuição territorial dos grupos locais e suas relações
internas; c) a localização de suas aldeias e os seus reordenamentos espaciais, tanto em
razão da exaustão dos recursos naturais nas proximidades como a emergência de
novas alianças ou conflitos internos ou com agências e segmentos da sociedade
nacional; d) as técnicas e as práticas que utilizam na exploração dos recursos naturais,
em particular as atividades agrícolas, de caça, de pesca, de coleta e, modernamente,
de extração comercial de produtos florestais e de minérios e a criação de bovinos.

Figura 4: Os Zorós entre 1900 e 1930


(Brunelli, 1986a, p. 13)

Tendo presente que tais características definem, em termos bastante objetivos,


a territorialidade zoró, impõe-se a conclusão de que a área sub judice deve ser
reconhecida enquanto parcela das terras tradicionalmente ocupadas pelos índios Zorós.

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Laudo antropológico – Processo 2001.36.00.001508-9
1ª Vara da Justiça Federal - Mato Grosso

Na verdade, a ocupação indígena na TI Zoró reputa-se imemorial, na medida em que a


presença dos Zorós nos vales dos rios Roosevelt e seus afluentes remonta a uma época
anterior à documentação porventura existente para a região circunvizinha. Vejamos, a
seguir, os elementos que sustentam esta conclusão.

Os informantes Zorós relataram ao antropólogo Gilio Brunelli (1986a, p. 7-9)


que, há muito tempo atrás, seus ancestrais erguiam suas malocas nas imediações da
embocadura do rio Aripuanã, distribuídos em vários grupos locais. Contudo, já nas
primeiras décadas do século XX haviam se deslocado a montante, abrindo caminho à
força entre os Araras e outros povos agricultores ali estabelecidos, acercando-se então
aos poucos do território que hoje ocupam. E que, nessa migração ao sul, a certa altura
os Zorós se depararam com os grupos Cinta-Larga que habitavam acima da confluência
do rio Branco com o rio Roosevelt.

Figura 5: Os Zorós e seus vizinhos


(Brunelli, 1986a, p. 15)

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As escaramuças com os Cintas-Largas acirraram-se em ambas as margens


deste rio, quando afinal os Zorós impuseram-se aos oponentes (Brunelli, 1986a, p. 12):

“Um velho guerreiro recorda ainda de uma das batalhas em que participou. Na aldeia
zoró, outros se lembram desta batalha porque seus pais dela participaram. Esta batalha
[ver no croquis acima o local assinalado] opôs um grupo zoró, os Njoiki Wey, ao último
grupo cinta larga que se encontrava ainda no território compreendido entre o rio
Roosevelt e o Branco, os Ngotchurey. (...) A batalha terminou por uma brilhante vitória
dos Njoiki Wey, que, ao que parece, estava nesse momento aliado aos zoró Pewey e,
na falta de uma melhor identificação, aos zoró Kirey. Conta-se que os Ngotchurey
foram derrotados, mortos e comidos pelos Zoró; alguns sobreviventes lograram a duras
penas cruzar o rio Roosevelt e buscar refúgio junto a outros grupos cinta larga que
habitavam mais a leste e mais ao sul. Assim que, há mais de cinqüenta anos [ou seja,
em meados da década de 1930] os grupos zoró tornaram os donos de uma larga
porção do rio Roosevelt, cujo limite meridional alcançava o território dos grupos suruí
mais setentrionais” (Brunelli, 1986a, p. 12).

O movimento dos grupos zorós veio a cessar quando, por volta da década de
1930, estes se chocaram ao sul com outros grupos cintas-largas e com os Suruís, bem
mais numerosos – conforme ilustra o croquis acima. Em meados do século XX,
portanto, os Zorós ocupavam um território contínuo que se estendia desde a margem
direita do rio Roosevelt até os córregos que formam o rio Madeirinha, tendo como
confrontantes os Cintas-Largas a leste, os Suruís ao sul, os Gaviões a sudoeste e oeste
e os Araras a noroeste. Tal disposição espacial revela-se, inclusive, na toponímia e no
conhecimento geográfico acurado sobre toda a região, dos quais a tabela abaixo serve
de exemplo:

português zoró
rio Madeira Sere xi
rio Ji-Paraná Op xi
rio Madeirinha I Pokajã xi
rio Aripuanã Abolopwa xi
rio Roosevelt I Kabe Pewa xi
rio Branco (afl. do Roosevelt) Baribej xi
Ribeirão Watalã xi
rio Cigano Palyã xi
rio Tiroteio Boriri Ka xi
rio Quatorze de Abril I Kabe Tỹ xi
rio Canaã Zat Kot xi
rio Vera Cruz Paji Xã xi
Tabela 1: A toponímia hidrográfica zoró

Por ocasião da vistoria pericial, reunidos na Escola Zarup Wej, em 21/10/2015,


foram registrados alguns depoimentos de anciãos e outros representantes indígenas,
conforme abaixo, que asseveram de modo firme a presença longeva dos Zorós nas

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terras do interflúvio do rio Roosevelt e seu afluente rio Branco, bem como em ambas
as margens destes rios. As falas foram traduzidas pelo professor indígena Edílson
Waratã:

Wam (ancião com mais de 80 anos; morador da aldeia Tamali Syn): “Eu sou o mais
velho do povo Zoró. Eu nasci aqui, o meu pai morava aqui. Esse título que ele (a parte
autora) está falando que marcou, foi em cima de nossa terra. A gente viu acontecer, os
não-índios vieram, por isso que a gente foi lá, afastou daqui, para onde hoje está o
pessoal da aldeia Central (Bubyrej). Eu vi acontecer a abertura da estrada, onde
estamos andando agora. Eu vi o pessoal montando essas fazendas, Muiraquitã, Peralta,
Castanhal. Eles mataram a gente, os brancos mataram a gente. Por isso falo que é
nossa terra. Eu não vim de lá de fora, eu não vim de outro país. Eu nasci aqui, o meu
pai morava aqui.”

Luiz Matianzap (cerca de 74 anos; cacique da aldeia Zawã Kej/Barreira): “O fazendeiro


fala que comprou essa terra. Eu respondo a ele: eu nunca comprei minha terra, a terra
já era nossa, do meu pai, do meu avô, dos meus antepassados. Nossos antepassados
morreram aqui. Nós moramos em cima da terra deles (dos parentes antepassados).
Essa beirada do rio toda é nossa. Esse quadrado aonde foi demarcado (a TI Zoró), do
lado do rio Branco, vocês chamam rio Branco, aquele que vocês chamam de Ribeirão e
até o rio Quatorze de Abril, esse centro é nosso! Nós não viemos de outro país comprar
essa terra. Eu presenciei a abertura da estrada, a abertura dessas fazendas, eu ouvi
tratores, barulhos diferentes, e aquele helicóptero estava andando aqui na área, e
avião mesmo. Eu presenciei esses acontecimentos antigamente.”

Sagapuga (cerca de 74 anos; cacique da aldeia Webaj Karej): “Quando (antigamente) a


gente morava aqui, era livre, não tinha ninguém (exceto os Zorós), não tinha brancos.
Quando eu era moço, não tinha ninguém, a gente andava no rio, rio pra cima e pra
baixo, e andava no meio desse mato, era fechado. Não tinham chegado os brancos
ainda, antes da abertura dessa estrada. Eu andava livre, chegava naquele rio Branco,
aquele Ribeirão, andava tudo. Por isso que eu falo pra você, (antes) não tinha ninguém
nessa terra (exceto os Zorós). Eu vi quando o pessoal (os brancos) chegou aqui.”

Edílson Waratã (cerca de 44 anos; professor indígena): “O Ribeirão chama Watalã xi. O
rio Branco chama Baribej xi. O Roosevelt, I Kabe Pewa xi. O Quatorze de Abril, I Kabe
Ty. Eles sabem todos os rios. Aquele rio Tiroteio, Boriri Ka xi. Todos os rios colocaram
nome, qualquer córrego dentro da nossa área tem nome.”

Pepuj (cerca de 71 anos; cacique da aldeia Ikarej): “Eu mandei eles desenharem as
aldeias antigas (no mapa que foi apresentado na lousa, ver em anexo ), tá dentro
desse mapa aí, está tudo localizado. Algumas aldeias mudaram de nome, outras
permaneceu o nome antigo. Está tudo desenhado aí. (...). Até as aldeias que existiam
fora da área que foi demarcada, nas fazendas Peralta, Castanhal, Roosevelt e
Muiraquitã. Era tudo conhecido deles, é nosso.
Eu sou daqui mesmo, eu não estou contando história do meu pai, eu presenciei que
aqui era só nosso, não tinha ninguém, não tinha jara (brancos) nada. Só moravam
índios, nós, os Suruís, os Cintas-Largas, os Gaviões. Esses grupos que moravam aqui.
Não tinha jara. Não tinha barulho, de carro, caçador. Não tinha, só nós. Vivia livre,
andando em todo lugar.”

Denivaldo Pãlyajut (cerca de 62 anos; morador da aldeia Duãjurej/Serrinha): “Os


antigos andavam até Pimenta Bueno, conhecia o rio Madeira, o Ji-Paraná. Eles
viajavam, atravessavam de barco ou a pé. Tudo que a gente conhece, não era
separado, não tinha nome de Rondônia ou Mato Grosso. Era uma terra só. Andava até

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o rio Madeira. A gente viu brancos chegando, e ficamos só com um pedacinho, que a
FUNAI demarcou para nós. Não tinha mais pra onde a gente correr. Pra todo lado está
cheio de fazendeiro” (Depoimentos prestados em 21/10/2015)

De acordo com Brunelli (1986a, p. 22; 1987a, p. 160), entre a década de 1950
e fins da década de 1960 os Zorós dispunham de nove ou dez grupos locais,
distribuídos em quinze ou dezesseis malocas, e uma população que se contava entre
1.000 a 1.500 pessoas: os Nzabeap Wey com três malocas, os Pangeyen Tere com
cinco malocas, os Njoiki Wey, os Njei Wey, os Pama-kangym Ey, os Mantchin Ey, os Ii-
andarey, os Pewey, os Angoiey e, provavelmente, os Kirey, com uma maloca cada. No
mapa elaborado na lousa, sob a supervisão de Pepuj, constam inúmeras aldeias
antigas, distribuídas no triângulo formado pelos rios Roosevelt e seu afluente rio
Branco. Veremos adiante outras informações sobre a localização das aldeias zorós
antigas e atuais.

A partir dos anos 1960, todavia, a exploração mineral e o incentivo oficial à


colonização daquela região do Brasil, para fins de produção agrícola e pastoril, cingiram
os grupos Zorós ao triângulo formado pelos rios Roosevelt e Branco (Brunelli 1986a, p.
14-17; Almeida, 1966). A partir da cidade de Ji-Paraná (então vila de Rondônia)
seringueiros, caucheiros e garimpeiros lançaram incursões contra aldeias zorós situadas
nas imediações do rio Branco, das quais algumas foram totalmente dizimadas
(Albuquerque, 1969, p. 2-4, 7). De um acampamento zoró atacado em 1963 apenas
uma menina sobreviveu, raptada pelo chefe dos seringueiros (Santos, R. V., 1991, p.
51). Há pouco mais de dez anos atrás, ela reencontrou seus parentes zorós, e passou a
residir junto a eles. O mesmo se passava no setor oriental, ao longo do rio Roosevelt,
onde os Zorós foram forçados a ceder largas porções suas terras em favor das
fazendas de gado (Brunelli, 1987a, p. 194-195).

Dentre os muitos confrontos com as frentes de expansão, destacam-se


sobremodo: a leste, contra a fazenda Muiraquitã; a oeste, contra os peões da fazenda
Castanhal; e a sudeste, contra os Suruís, empurrados em direção ao norte por
posseiros que avançavam sobre suas terras. Com efeito, segundo os Zorós, os atritos
com os “brancos” no local da atual fazenda Castanha motivaram o refluxo de várias
famílias para as imediações do rio Quatorze de Abril. Conforme o depoimento de Luiz
Matianzap, por ocasião da vistoria pericial:

Luiz Matianzap: A gente morava assim. Vocês perguntam por que morou do outro lado
também? A gente morava assim, deixava esse lado livre, pra crescer os animais, os

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1ª Vara da Justiça Federal - Mato Grosso

peixes voltarem, o mato crescer, a capoeira crescer. Depois de um tempo, voltava para
aquele lugar. Os animais, anta, jacamim, paca, já voltaram, os peixes já voltaram. Por
isso que nós fazíamos assim, atravessava para o outro lado do rio Branco, ficava mais
ou menos uns vinte anos pra lá, e depois voltava para reabrir as mesmas aldeias.
Voltava a morar nas mesmas aldeias, enquanto lá do outro lado estava recuperando. É
assim que nós vivíamos.
Foi quando estávamos neste lado (direito do rio Branco), um pouco ainda ficou lá, a
fazenda Castanhal veio. O pessoal que ficou fechado lá, eles passaram na marra para
atravessar para o lado de cá, saiu pra cá. Antes do contato, quando o fazendeiro
montou aquela fazenda Castanhal. A gente brigou muito lá, e o fazendeiro atacava a
gente, e a gente atacava também. E não deu, não adiantou nada. Até hoje a fazenda
Castanhal está lá. Assim que aconteceu. Enquanto eles estavam esperando recuperar
as aldeias lá, os brancos vieram, e trancaram eles (o grupo zoró) lá.

O jornalista Praxedes (1977b, p. 75), à época dos primeiros contatos entre os


Zorós e os sertanistas da FUNAI, obteve as seguintes informações acerca dos conflitos
na fazenda Castanhal:

“Os Zorós construíram malocas nas proximidades do rio Branco, depois que
abandonaram as margens do rio Roosevelt onde antes viviam – por causa do
aparecimento de fazendas na área. Fugindo em direção ao rio Branco, os Zorós
encontraram outra fazenda que estava sendo aberta na margem oeste. A situação dos
índios ficou crítica: não poderiam subir em direção à cabeceira do rio por causa dos
Suruís, mas também não poderiam seguir o caminho das águas por causa dos
brancos.”

A documentação histórica, o noticiário jornalístico, as fontes bibliográficas, os


depoimentos de antigos moradores e os relatos indígenas, todos concorrem
verdadeiramente no sentido de testemunhar que, até meados do século XX, o domínio
indígena nesse extenso território situado entre os rios Roosevelt e seu afluente rio
Branco era inquestionável, a despeito das agressões e os conflitos causados pelo
avanço de seringais e fazendas ou incursões de garimpeiros. Os embates com as
chamadas “frentes pioneiras” da sociedade brasileira, decisivamente, servem de
marcos históricos no tocante à ocupação indígena e, por conseguinte, trazem maior
precisão ao reconhecimento das fronteiras territoriais do povo indígena em questão.
Desta perspectiva, a cronologia a seguir pretende não somente circunstanciar as
relações entre os Zorós e a sociedade nacional, mas sobretudo evidenciar a extensão e
os limites do habitat indígena tradicional.

A notícia mais remota vem do aventureiro Antônio Pires de Campos que, no ano
de 1727, atravessou a chapada dos Parecis (Campos, 1862). Tendo atingido o rio
Juruena, fronteira oeste do que chamou “Reino dos Parecis”, deparou-se com a
“nação” dos “Cavihis” que, pela sua localização e pelos dados etnográficos fornecidos

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por Pires de Campos, poderia ser algum dos povos Tupi-Mondé. Afora este provável
primeiro registro histórico, não foi possível encontrar para os séculos XVIII e XIX outros
vestígios nos documentos disponíveis. A ausência de informação explica-se, com efeito,
pelo completo isolamento em que os Zoró e demais povos Tupi-Mondé subsistiram em
seus habitats por todo aquele período histórico. O processo de colonização no Centro-
Oeste e sul da Amazônia, com efeito, passou ao largo da região banhada pelos rios
Aripuanã, Roosevelt e Ji-Paraná, tributários da bacia do rio Madeira. Apenas a partir da
segunda metade do século XIX, tendo início o “ciclo da borracha” que atraiu peruanos
e cearenses para a exploração dos seringais nativos, os afluentes do Madeira, como o
Marmelos, o Manicoré, o baixo Aripuanã e o Machado (ou Ji-Paraná), passariam a ser
percorridos e ocupados economicamente.

Figura 6: As linhas telegráficas da Comissão Rondon

A criação da Comissão de Linhas Telegráficas Estratégicas de Mato Grosso ao


Amazonas (a conhecida Comissão Rondon), por ato do presidente Afonso Pena em
1907, ofereceu um impulso adicional à ocupação sistemática e permanente do noroeste

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Laudo antropológico – Processo 2001.36.00.001508-9
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do então imenso Estado de Mato Grosso: além de estender o telégrafo, abrir estradas
estratégicas, executar trabalhos geográficos, botânicos e mineralógicos, a Comissão
ainda se encarregou de “pacificar” as populações indígenas em seu percurso.

Entre outros empreendimentos, a Comissão organizou a Expedição Roosevelt-


Rondon, que conjugava o interesse do ex-presidente norte-americano Theodore
Roosevelt em obter exemplares da fauna sul-americana para o American Museum of
Natural History, de New York e a intenção do governo brasileiro em prestar-lhe uma
homenagem. O então coronel Cândido Rondon planejou um itinerário pelos sertões de
Mato Grosso que finalizaria com o levantamento do “rio da Dúvida”, logo rebatizado de
rio Roosevelt, cujo curso e confluência eram então desconhecidos (Roosevelt, 1943;
Rondon, 1916). O reconhecimento daquele rio teve início em 27 de fevereiro de 1914,
descendo os expedicionários desde suas cabeceiras nas proximidades da estação
telegráfica Vilhena. A viagem, bastante acidentada devido às muitas cachoeiras e
corredeiras, permitiu concluir que se tratava do mesmo rio Castanha (ou Castanho),
como era conhecido pelos seringueiros aquele afluente do Aripuanã.

A Expedição, que cruzou o território ocupado pelos Cintas-Largas e Zorós,


encontrou em seu percurso inúmeros sinais da proximidade dos índios. Rondon atribuiu
aos moradores do curso superior do rio a designação de “Navaitê”, um grupo inimigo
de que falavam os Nambikwara (Rondon, 1916, p. 63-65). Numa ocasião, afastando-se
o coronel cerca de um quilômetro da margem direita, pouco abaixo da recém
denominada cachoeira do Simplício, os índios flecharam seu cachorro, obrigando-o a
disparar em sinal de advertência (Roosevelt, 1943, p. 251-252). E logo abaixo do rio
Kermit, os expedicionários chegaram a uma “aldeia de índios pescadores”, com três
palhoças baixas e oblongas, mas que se achava abandonada (idem, p. 258); ao coronel
Rondon, estas se assemelhavam às dos “Urumis” (moradores do vale do Ji-Paraná,
hoje denominados Gaviões, da família Tupi-Mondé, ver acima):

“começamos a encontrar vestígios recentes dos índios. Primeiro, foi um tapiri, feito
segundo o tipo usado pelos Urumis e Pauatês, tribos do Gy-Paraná; depois, foi um
conjunto de três ranchos, pequenos e baixos, de forma abaulada, inteiramente
cobertos e fechados por folhas de palmeira. (...). Do exame de todas estas cousas,
porém, o que mais me interessava, era a indicação de se acharem os índios do rio
Roosevelt relacionados com as tribos do Gy-Paraná” (Rondon, 1916, p. 76-77).

Mais abaixo, encontraram ainda outras aldeias, também temporariamente


desabitadas. Eram evidências firmes da existência de uma numerosa população
indígena nas redondezas. Por sua vez, as primeiras colocações de seringueiros foram

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Laudo antropológico – Processo 2001.36.00.001508-9
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encontradas somente no médio curso do rio, quase trinta quilômetros abaixo da foz do
então denominado rio Quatorze de Abril, afluente da margem esquerda. Seus
moradores disseram ao ex-presidente Roosevelt que não conseguiam subir além de um
trecho de grandes corredeiras, “em face da hostilidade dos índios” (Roosevelt, 1943, p.
257). Vez ou outra, estes lhes apareciam ora num lugar, ora noutro diferente:

“Há tempos, eles apareceram e foram recebidos a tiro, numa barraca acima da
propriedade do Honorato. A represália não se fez esperar, e a conseqüência dela foi o
dono daquela barraca, um caboclo chamado Manoel Vieira, cair ferido por golpes de
flecha. (...) O pânico causado pela nossa chegada mostra claramente o grau de tensão
nervosa em que vive aquela gente, constantemente atormentada pela expectativa de
ver surgir do interior do sertão os guerreiros indígenas” (Rondon, 1916, p. 102).

Acerca da área em questão, o coronel Rondon recolheu comentários valiosos


sobre os moradores indígenas do rio Branco, o principal afluente da margem esquerda
do rio Roosevelt:

“assinala-se a existência de um grupo no rio Branco, do qual não conseguiu outras


notícias senão a de serem as suas flechas mal feitas e portanto nada parecidas com as
dos Urumis, que as têm muito artísticas e bem trabalhadas. Além disso, são guerreiros
esforçados, e hostilizam os seringueiros que procuram invadir os seus domínios”
(Rondon, 1916, p. 106).

Nos anos seguintes, somente notícias esparsas e fragmentadas sobre os grupos


indígenas da região em tela vão aparecer, relatando conflitos com as frentes pioneiras.
Os documentos que elucidam este período procedem dos Arquivos do Serviço de
Proteção aos Índios - SPI, atualmente sob a guarda do Serviço de Arquivos do Museu
do Índio, no Rio de Janeiro (RJ). Indico abaixo alguns fatos mais relevantes, de modo a
delimitar a extensão do território ocupado pelos Zorós.

Em 1932 o subdelegado de Polícia, José N. Ferreira, informou sobre a chegada


em Prainha (município de Borba, Estado do Amazonas) de índios ditos “Suruí”,
procedentes do rio Roosevelt (Ferreira, 1932). Outras informações sobre os grupos
indígenas da bacia do Aripuanã, ao sul da divisa Mato Grosso – Amazonas, constam do
Relatório do inspetor Carlos Eugênio Chauvin, referente ao ano de 1941 (SPI -
Inspetoria do Amazonas e Acre, 1942, p. 4-7).

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Laudo antropológico – Processo 2001.36.00.001508-9
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Figura 7: A Expedição Roosevelt-Rondon


(Roosevelt, 1943, p. 314/315)

Nestes e mesmo em documentos muito posteriores, persiste certa confusão


quanto aos nomes com que vão sendo referidas as diversas etnias presentes na região,
que se justifica pelo desconhecimento dos adventícios acerca daquelas populações
indígenas. Os dados históricos que trazem, todavia, são suficientes para atestar a

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Laudo antropológico – Processo 2001.36.00.001508-9
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ocupação indígena, ao mesmo tempo em que relatam a abertura de seringais e a


incorporação, forçada na maioria dos casos, da mão-de-obra indígena. Exemplos
ilustrativos dessa incorporação são os hoje denominados “Arara do Aripuanã” e “Arara
do Guariba”, sendo este na verdade um grupo de língua Tupi-Mondé que se
desintegrou em meio aos seringais que se instalaram no rio Guariba (Dal Poz, 1995).

Ainda no setor norte do território dos Cintas-Largas, em fins da década de 1950


o padre salesiano Vítor Hugo testemunhou que os seringueiros do rio Aripuanã não se
atreviam acima da cachoeira Dardanellos, por temor aos índios “Inhamis” (os Cintas-
Largas) que promoviam “terríveis correrias”. Já no vale do rio Roosevelt, reinavam “os
antropófagos Cuchi-Miraybwa no alto Rio Branco (afluente do Rio Roosevelt), e os
Suruĩns nas matas da margem direita desse mesmo afluente” – na realidade, estes os
Suruís e aqueles os Zorós (Hugo, 1959, p. 263-264).

A série de conflitos descritos pelo missionário corresponde à reação vigorosa


dos guerreiros indígenas à crescente invasão de seu habitat pelos seringueiros. Já em
1949 um funcionário do SPI informava ao chefe da 9a. Inspetoria Regional, sediada em
Porto Velho, que os índios vinham danificando as “lavouras” nos arredores de Pimenta
Bueno, Barão de Melgaço e Cacoal (SPI – 9a. IR, 1949). Em 1951 uma tropa de
garimpeiros, a serviço do seringalista Marcos da Luz, foi atacada pelos índios nas
imediações do rio Roosevelt, próximo à estação telegráfica José Bonifácio. Dois
garimpeiros morreram e diversos animais foram abatidos (Campos, 1951). No ano
seguinte, os índios voltaram a atacar no rio Roosevelt um comboio do mesmo
seringalista, matando Durvalino Ferreira, flechando o tropeiro Arcino Marcos e
auxiliares e abatendo bois e muares que carregavam mercadorias (França, 1952). O
fato ganhou as páginas do diário carioca “A Manhã” e chegou a provocar a reação do
governador do então Território do Guaporé (Hosannah, 1952).

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Figura 8: A ocupação indígena no início do século XX


(Roquette-Pinto, [1917] 1974, p. 33-34)

Em 1954 o encarregado do posto Pirineus de Souza telegrafou à sede do SPI


em Cuiabá comunicando que “índios Tupi” haviam atacado a estação José Bonifácio,
mas foram repelidos com a ajuda dos Nambikwara que lá estavam. Destes, seis
morreram e o guarda-fios Flávio Cordovil Pessoa foi flechado; dos atacantes, um teria
morrido e os outros “fugiram ofendidos” (França, 1954). Em dezembro de 1959 os
índios assaltaram o acampamento João de Deus, distante dez quilômetros da estação
José Bonifácio, vitimando um rapaz Nambikwara de dezessete anos, filho do guarda-
fios José Pedroso. O incidente foi investigado pela 9a. I.R. do SPI, que deslocou o
auxiliar Afonso J. de Azevedo. Seu relatório confirma que os atacantes foram cerca de
cento e cinqüenta índios “Cinturão Largo”, como eram conhecidos localmente (Azevedo
Jr., 1960a). Este auxiliar, aproveitando a viagem a Barão de Melgaço, apresentou um

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relatório para orientar os trabalhos do SPI na região do alto Ji-Paraná, em vista da


construção da rodovia federal. Sobre os “Cinturão Largo”, acrescentou então que
habitavam os rios Roosevelt e Juruena (Azevedo Jr., 1960b).

Efetivamente, com a conclusão das obras da estrada Cuiabá - Porto Velho, no


ano seguinte, recrudesceram os ataques indígenas aos povoados, colocações de
seringueiros e acampamentos de garimpeiros: Acerca do plano de trabalho para o
exercício de 1964, no qual considerava a instalação de sete postos de atração uma
medida de caráter urgente para a defesa dos grupos indígenas do Território de
Rondônia, o chefe da Inspetoria do SPI em Porto Velho alegava um quadro dramático
de conflitos entre as frentes pioneiras e os índios:

“não só pelo grande desenvolvimento que estão sofrendo as pesquisas de minérios,


principalmente a cassiterita, nas zonas habitadas por índios hostis ou arredios, como
também as explorações de produtos da flora, aliados ao trânsito permanente da
rodovia BR-29/Brasília-Acre, que aumenta diariamente o contingente daqueles que
procuram este Território ávidos de lucros fáceis proporcionados por tais explorações,
fazendo com que dia a dia aumente os conflitos entre brancos e índios, os primeiros
dispostos a obterem os maiores lucros possíveis de tais trabalhos, não importando os
meios (...); por outro lado, vamos encontrar os índios revidando a essas invasões em
defesa não só da terra que por direito lhes pertence, como também em defesa do seu
alimento natural, ou seja, caça, pesca, castanha, e o mais importante de tudo a
preservação da família” (9a. Inind/SPI, Porto Velho-RO, 13/10/1964, in MI/Sedoc F.
043 Plan. 495).

Logo no início de 1961 o diretor do Departamento de Correios e Telégrafos -


DCT (Regional de Rondônia) oficiava ao chefe da 9a. Inspetoria Regional do SPI
solicitando providências para garantir a vida dos guarda-fios devido às sucessivas
hostilidades dos índios - no caso, os “Cinturão Largo” haviam ateado fogo na estação
José Bonifácio e os funcionários retiraram-se para Vilhena (Azevedo, 1961). Ainda na
região de Vilhena os índios feriram uma menina em 1963, que veio a falecer na Santa
Casa de Cuiabá (SPI – 6a.-IR, 1963). Porém, no ano de 1965 uma visita dos Cintas-
Largas surpreendeu os moradores daquela vila: desarmados, sessenta índios
acamparam nas proximidades do posto telegráfico, trocaram presentes e assistiram
uma partida de futebol (Correio do Povo, 1965). O SPI deslocou o agente Antônio Leite
ao local, porém os índios já haviam partido. No ano seguinte, entretanto, uma nova
visita dos Cintas-Largas a Vilhena degenerou em violência e mortes (Globo, 1966c;
1966d; Jornal do Brasil, 1966).

Tais conflitos, decerto, não eram fatos isolados. Na década de 1960 dava-se um
novo ritmo à migração e à ocupação econômica de Rondônia e oeste de Mato Grosso:

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de início, a construção da estrada BR-364 (ligando Cuiabá a Porto Velho), em seguida,


o assédio de garimpeiros e empresas de mineração às reservas de cassiterita, diamante
e ouro e, por fim, a convergência de interesses governamentais e privados na
colonização e exploração agropecuária da região. Em particular, o Estado de Mato
Grosso promovia a alienação acelerada das terras do então extenso município de
Aripuanã (Moreno, 2007) e gestionava para efetivar a sua administração local - embora
o município tenha sido criado em 1943, os prefeitos nomeados mantinham-se sediados
na capital (Furquim, 1966). Tudo isto aumentava as pressões sobre os territórios
indígenas, situação que levou o órgão de proteção aos índios a organizar expedições de
“pacificação” com o objetivo de neutralizar a resistência indígena aos invasores e,
assim, confinar os Suruís, Cintas-Largas e Zorós em áreas delimitadas. Sobretudo,
teriam sido os conflitos envolvendo índios e garimpeiros que fizeram deslanchar as
“expedições de pacificação”, segundo afirmou José de Queirós Campos, então
presidente da FUNAI (Fundação Nacional do Índio) – o novo órgão que em 1967
substituiu o já combalido SPI (Campos, 1969).

Ainda em 1966 o prefeito Amaury Furquim deu início à estrada que ligaria a BR-
364 à sede do município de Aripuanã (denominada AR-1 e BR-172; hoje rodovia MT-
319), e mandou construir uma pista de pouso de apoio na foz do rio Vinte e Um, o
chamado “Campo 21”. No ano seguinte, por sua vez, o seringalista Antônio Junqueira
determinou a abertura de uma pista a oito quilômetros da margem direita do rio
Aripuanã, para depois abandoná-la e construir a pista que, anos depois, serviria ao
posto da FUNAI na área Serra Morena.

Em março de 1968 o chefe da 9a. Inspetoria, José de Mello Fiuza, oficiou ao


diretor do órgão indigenista, tenente-coronel Heleno A. Dias Nunes, que levas de
garimpeiros recém chegados a Vilhena estavam planejando ataques de grandes
proporções aos Cintas-Largas do rio Aripuanã (Fiuza, 1968a). Dois meses depois, uma
turma de sete homens que fazia pesquisa mineral, contratada pelo seringalista José
Milton de Andrade Rios, foi cercada por cerca de duzentos guerreiros indígenas nas
imediações do rio Roosevelt. Os garimpeiros, fortemente armados, mataram dez índios
e perderam apenas o mateiro de apelido Paraguaio (Fiuza, 1968b; Estado de São
Paulo, 1968). No mesmo mês, a leste, os Cinta-Larga atacaram o acampamento de
Raul Moreda (“Raul Espanhol”, empreiteiro de garimpo afamado na região) no Campo
21 (Moreda, 1968; Globo, 1968).

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Laudo antropológico – Processo 2001.36.00.001508-9
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As providências não se fizeram tardar: o prefeito municipal informou


prontamente ao chefe da Casa Militar do Estado sobre o ataque às margens do rio
Aripuanã (Furquim, 1968). O Governo do Estado entrou em entendimentos com a
FUNAI para consolidar um plano de “pacificação” dos Cintas-Largas, com a colaboração
estadual e municipal. O plano, denominado “Operação Cinta Larga”, ficou sob o
comando geral de Hélio Bucker, chefe da 6a. Inspetoria da FUNAI (Campos, 1968;
Estado de São Paulo, 24/05/68).

A Operação desdobrou-se em duas frentes. A primeira, liderada pelo sertanista


Francisco Meirelles, concentrou seus esforços na região de Riozinho e Cacoal, em
Rondônia, resultando no contato com os índios Suruís que ali viviam. Antes, porém,
Meirelles sobrevoou toda a região, acompanhado do inspetor Hélio Bucker:

“Em avião posto à nossa disposição pelo Senhor Governador do Estado de Mato
Grosso, sobrevoamos a região matogrossense habitada pelos referidos índios (Cinta-
Larga), ou seja os vales do Aripuanã e do Roosevelt. Localizamos então, vinte e uma
(21) aldeias de índios, sendo que vinte (20) pertencem à tribo dos 'Cinta Larga' e uma
(1) à dos 'Nambiquara', localizada no rio Camararé. As aldeias dos citados índios
existentes no Território de Rondônia, já haviam sido localizadas através de um bom
'croquis', onde as situavam com precisão” (Meirelles, 1968).

O croquis a que alude Meirelles foi elaborado por missionários das Novas Tribos
(Stute, 1967; ver próximo tópico). A segunda frente da Operação Cinta Larga foi
encetada pelo sertanista João Américo Peret e visava atingir os índios do vale do
Aripuanã. Segundo os sertanistas, estimava-se um total de cinco mil índios na região
(Globo, 1968b). Com base nas informações do inspetor Bucker e do prefeito de
Aripuanã e o que anotaram missionários e pilotos, o sertanista Peret encaminhou ao
Departamento do Patrimônio Indígena da FUNAI croquis indicando as aldeias cintas-
largas já avistadas, e sugeriu medidas de interdição (Peret, 1968a; 1969). Em seguida,
sobrevoou a região considerada, a convite do prefeito Furquim, identificando outras
aldeias e visitando acampamentos de garimpeiros.

Ao lado das atividades de campo, algumas medidas administrativas buscaram


resguardar as terras indígenas e oferecer segurança à atuação das equipes de
“pacificação” da FUNAI, como a interdição em 1968 e a criação em 1969 do parque do
Aripuanã, medidas essas que serão abordadas no próximo tópico do laudo (ver
também o mapa em anexo, “As áreas indígenas no noroeste de Mato Grosso”).

Em dezembro de 1968 um grupo cinta-larga confraternizou com garimpeiros no


rio Roosevelt. Nos meses seguintes novas visitas aconteceriam. Pensando tratar-se da

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Laudo antropológico – Processo 2001.36.00.001508-9
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mesma etnia que já freqüentava o posto Sete de Setembro (esta, depois denominada
“Suruí”, como dissemos acima), a FUNAI procurou então afastar os garimpeiros e
instalou no local o subposto Roosevelt (na seção sul da atual área Roosevelt),
aproveitando a curta pista de pouso e os barracões construídos pelos garimpeiros. Em
fins de 1971, porém, os Cintas-Largas romperam as relações amistosas e mataram os
dois funcionários da FUNAI que ali se encontravam, o chefe do subposto e ex-jornalista
Possidônio Bastos e o rádio-telegrafista Acrísio Lima, e incendiaram as instalações
(Jornal do Brasil, 1971). O médico e etnólogo Jean Chiappino, que, entre julho e
dezembro de 1972, visitou os Cintas-Largas que viviam no posto Roosevelt e em uma
aldeia nas proximidades da foz do rio Capitão Cardoso, verificou que os que ali
estavam eram remanescentes “de um grupo mais importante que consistia em cerca
de cem pessoas, que foram dizimadas por uma epidemia um ano antes (...) em
circunstâncias (...) dramáticas” (Chiappino, 1975, p. 9).

Muito embora a presença dos Suruís, Cintas-Largas e Zorós nos vales dos rios
Roosevelt e Aripuanã estivesse claramente atestada, conforme os levantamentos
efetuados, entre outros, pelos sertanistas João A. Peret e Francisco Meirelles e o
fotógrafo J. von Puttkamer, o governo do Estado de Mato Grosso acelerou a alienação
e a colonização das terras do município de Aripuanã, e pressionava o próprio governo
federal para reduzir os limites das áreas indígenas já reconhecidas. Com efeito, em
1974 o parque do Aripuanã foi reduzido à metade, restando duas áreas contíguas
provisoriamente interditadas (ver tópico abaixo). Com o mesmo objetivo, o Estado
reservou terras devolutas para a CODEMAT, através da Lei Estadual 3.743, de 31 de
março de 1976, destinadas à implantação do Projeto Juína – uma área ainda ocupada
pelos grupos cinta-larga do rio Vermelho (Tolksdorf, 1976).

No diz respeito aos Zorós, foi apenas em outubro de 1977, à margem do rio
Branco, que uma expedição da FUNAI - sob o comando dos sertanistas Apoena
Meirelles e José do Carmo Santana (“Zé Bell”) - viria a com eles confraternizar. As
primeiras tentativas de contato com os então denominados “índios suruis” do alto rio
Branco (na verdade, os Zorós) partiram do encarregado do SPI do posto Igarapé
Lourdes, Constantino Marques de Almeida, com a cooperação de índios Gaviões – em
fevereiro de 1967 aqueles fizeram uma visita à aldeia na ausência destes – os
moradores participavam de uma festa na aldeia Arara (Almeida, 1966; 1967;
Albuquerque, 1969).

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Laudo antropológico – Processo 2001.36.00.001508-9
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Em março de 1975 a FUNAI noticiara que a “atração de um grupo indígena


ainda desconhecido”, que a população regional chamava de “Cabeça Seca” e os Suruís
de “Zoró”, seria a próxima missão do sertanista Apoena Meirelles (“Os desconhecidos
Zoró”, Informativo da FUNAI, n. 13, 1975, p. 24-28; Jornal do Brasil, 1974; Estado de
São Paulo, 1974b). Entre setembro e outubro de 1973, uma turma de mais de trinta
guerreiros Zorós havia atacado uma família Suruís que pescava a oito quilômetros do
posto Sete de Setembro, matando Ivanoa, sua esposa e a filha (Jesco, Diários de
Campo II, 1972-1976, p. 862-863). O Informativo da FUNAI (1975) publicou a foto de
uma aldeia zoró, vendo-se em plano maior uma típica grande casa oblonga. Dentre as
providências determinadas pela Coordenação da Amazônia, um dos órgãos de
planejamento da FUNAI, o sertanista deveria localizar as demais aldeias por sobrevôo –
já se conhecia a posição de uma das aldeias, situada na margem direita do rio Fortuna,
a setenta quilômetros distante do posto Sete de Setembro. Estimava-se, então, uma
população entre quinhentas a oitocentas pessoas, distribuída em, ao menos, oito
aldeias (Estado de São Paulo, 1975a; 1975c).

Todavia, apenas em 1976 os trabalhos de contato seriam levados adiante,


quando Apoena Meirelles assumiu novamente a direção do Parque do Aripuanã. No
mês de maio, acompanhado da jornalista Eliana Lucena, o sertanista Apoena Meirelles
realizou uma inspeção no Parque do Aripuanã, em cumprimento à Portaria
414/P/FUNAI, de 7/05/76 (BA 23) e um sobrevôo das “aldeias dos índios cabeças-secas
ainda arredios” (Estado de São Paulo, 1976a). No relatório que encaminhou ao
presidente da FUNAI, o sertanista assinalou a posição de aldeias, traçou uma primeira
proposta para a interdição das terras ocupadas pelos Zorós (ver tópico seguinte) e
propôs um plano para a expedição de atração:

“EXPEDIÇÃO DE ATRAÇÃO AOS MONSHORO/ZORÓ


Localizamos as malocas dos índios entre as cabeceiras do igarapé Tiroteio com a
margem direita do Rio Branco, em número de 8, cujo formato de construção é parecido
com a dos Suruis. Não acredito que esses índios sejam menos de 800 (oitocentos) e
posso afirmar que será sem dúvida um trabalho difícil e demorado, levando em
consideração o que esses índios vem sofrendo no confronto com as frentes de
expansão que penetram em todos os sentidos naquela área. (...)
PLANO DE PENETRAÇÃO
1) Descer o Rio Branco até as proximidades da Fazenda Castanhal, partindo daí por
terra até onde encontrarmos vestígios de índios, ou seja, acampamentos de caça que
serão utilizados como tapiris [para colocação de brindes].
2) Descer o Rio Branco até sua confluência com o Roosevelt, subir o Roosevelt e iniciar
o trabalho de atração das cabeceiras do 14 de Abril, atraindo os índios desde o início
para o interior da área interditada.

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Laudo antropológico – Processo 2001.36.00.001508-9
1ª Vara da Justiça Federal - Mato Grosso

3) Tendo em vista que os Cabeça-Seca são tradicionais inimigos dos Suruis, é


necessário um contato permanente entre a F. A. [Frente de Atração] e o Posto Sete de
Setembro, tendo em vista que caso tenhamos êxito, os Zorós poderão aparecer no Sete
de Setembro para confraternização com todo mundo. Os Suruis e o encarregado do
Posto serão devidamente instruídos e preparados para tal situação” (Meirelles, 1976).

No dia 23 de agosto do mesmo ano, o sertanista Zé Bell realizou um amplo


sobrevôo do território zoró, acompanhado pelo fotógrafo Jesco von Puttkamer.
Rumaram para a foz do rio Tiroteio no rio Roosevelt e subiram aquele, avistando então
as primeiras aldeias:

“Havia duas clareiras de duas novas aldeias com duas a três malocas no meio de uma
área desmatada há pouco. Porém as pessoas correram, escondendo-se do avião. Estes
índios são hostis, tendo matado recentemente vários homens brancos. Uns poucos
minutos depois, nós vimos duas outras aldeias com malocas mais velhas – já nas
cabeceiras do rio Branco. Os índios aqui são hostis também, e tentaram esconder-se do
avião (em suas casas). Apenas os cachorros permaneceram do lado de fora.
Em torno de uma das casas, nós pudemos ver centenas de taquaras de flecha, secando
no sol. Por que estão fazendo assim tantas flechas? Para guerra, obviamente. Porém
eles irão combater intrusos brancos, ou voltar de novo e atacar seus parentes no posto
Sete de Setembro?
Nós sabíamos que mais ao norte nós encontraríamos outras aldeias, porém estava tão
enevoado e cheio de fumaça [de queimadas nas fazendas ao sul e a oeste das terras
dos Zorós]”. (Puttkamer, Diários de Campo III, 1975-1976, p. 293).

Um plano de atração melhor detalhado foi encaminhado por Apoena Meirelles,


em 27 de junho de 1977, ao diretor do Departamento Geral de Operações da FUNAI,
no qual complementa as informações e propostas anteriores e solicita a “interdição da
área onde habitam os Zorós, para fim de atração”, a alocação de recursos para
estruturar a Frente de Atração e a instalação de um posto de atração na região do rio
Quatorze de Abril (Martins, 1976; Globo, 1976):

“Os índios Zorós (...) habitam entre a margem direita do rio Branco, e a margem
esquerda do Ig. Tiroteio, quando fazem incursões até o 14 de Abril, afluente da
margem esquerda do rio Roosevelt.
A necessidade da abertura de uma Frente de Atração prende-se a fatores externos, ou
seja, a pressão cada vez maior de Agro-pecuárias e colonos que chegam a Rondônia
forma um círculo que aos poucos vai se fechando em torno dos índios Zorós.
Outro fator a ser observado é que a área onde habitam os índios Zorós não foi
abrangida por nenhum decreto de interdição ou reserva, o que permitiu muita
especulação por parte de pessoas interessadas em terras. (...)
Pressionados os Zorós não podem sair para o 7 de Setembro devido aos Suruis, seus
tradicionais inimigos (...) Em direção ao Cap. Cardoso não podem ir também devido aos
Cinta-Larga, e restam a eles então, darem contato esporádico com as fazendas
Castanhal e Roosevale, o que não deixa de ser uma temeridade” (Meirelles, 1977a).

Em janeiro de 1977 a FUNAI anunciou que uma expedição, composta por


quinze sertanistas, sob a chefia de José do Carmo Santana, ex-diretor do Parque do

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Laudo antropológico – Processo 2001.36.00.001508-9
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Aripuanã, seria lançada em março do mesmo ano para “contactar cerca de 800 índios
zorós ou cabeças-secas” (Estado de São Paulo, 1977a; Jornal de Brasília, 1977), para
evitar que entrassem em choque “com fazendeiros e seringalistas que avançam, a cada
dia, em direção às suas terras, situadas nas cabeceiras dos rios Branco e 14 de abril”
(Folha de São Paulo, 1977a). Segundo este último jornal:

“Reunidos em oito aldeamentos, próximo ao igarapé Tiroteio – antigo garimpo de


cassiterita – os Zorós, ou cabeças-secas – como são conhecidos por causa do corte de
cabelo que usam, estão sendo incomodados pela expansão de grandes fazendas agro-
pecuárias que avançam em direção às suas terras, o que torna urgente o contato para
prepará-los para o choque entre civilizações que fatalmente ocorrerá, dentro de poucos
anos” (Folha de São Paulo, 1977a).

A partida da expedição aos Zorós, todavia, adiada seguidas vezes, deu-se afinal
no mês de outubro de 1977 (Globo, 1977; Folha de São Paulo, 1977b; 1977c; Estado
de São Paulo, 1977a; 1977c), após um novo sobrevôo da área, como informou o Jornal
da Tarde, em 13/10/1977:

“O primeiro sinal foi promissor: quando o sertanista Apoena Meirelles sobrevoou


algumas aldeias dos índios zoros-cabeças-secas, no domingo passado, eles não
demonstraram qualquer temor. E mais ainda: eles até deixaram que suas mulheres
saíssem das malocas para acenarem para o avião. Assim, ontem o sertanista Apoena
saiu com uma expedição rumo às terras ocupadas pelos zoros. Esses índios habitam
várias aldeias nas proximidades do rio Branco” (Jornal da Tarde, 1977).

O jornalista Cesarion Praxedes, que acompanhava a expedição da FUNAI,


relatou em duas reportagens (na revista Manchete e na Revista Geográfica Universal),
ilustradas com várias fotografias, os trabalhos realizados pela expedição da FUNAI e os
primeiros contatos amistosos que manteve com os Zorós, das quais transcrevo os
trechos a seguir:

“Em outubro passado [do ano de 1977], à margem do rio Branco, em Mato Grosso,
aconteceu o primeiro contato dos índios zorós com a cultura branca. E, como eles
viviam em estado inteiramente primitivo, o encontro da expedição da FUNAI com os
indígenas foi precedido por dezoito dias de angústia e espera. Durante todo o tempo
em que a equipe esteve na região dos índios, promovendo expedições na selva e pelo
rio, os zorós observaram sem se aproximarem. Somente quando tiveram certeza que os
invasores eram pacíficos é que resolveram visitar o acampamento. Chegaram
desarmados, com mulheres e crianças, numa clara demonstração de que estavam em
missão de paz. Eram apenas vinte, embora o número de malocas existentes faça supor
uma tribo de aproximadamente 350 indígenas. (...)
O pequeno monomotor sobrevoava a maloca pela segunda vez, quando apareceu um
grupo de índios para observar a estranha e barulhenta máquina voadora que invadia o
seu mundo [a fotografia da aldeia está em Praxedes, 1977b, p. 71-72]. Desde nossa
chegada a Vila de Rondônia [Ji-Paraná, RO], cinco dias antes, aquela era a primeira vez

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que víamos os zorós, uma das últimas tribos ainda em estado inteiramente primitivo na
Amazônia.
O objetivo do vôo era dar ao sertanista Apoena Meireles uma visão geral da localização
das malocas e uma avaliação do número de índios que vivem na área. Meireles, 28
anos, era responsável pela expedição que tentaria o primeiro contato com esses
indígenas, que vivem entre os rios Branco e Roosevelt, no oeste de Mato Grosso, nas
proximidades da fronteira com o Território de Rondônia. A região, inteiramente coberta
pela floresta amazônica, vem sendo ocupada por fazendeiros, o que obrigou a FUNAI a
promover a expedição para contatar e preparar os índios para o convívio com a
civilização. (...)
Apoena instalou seu acampamento à margem do rio Branco, próximo da fazenda
Castanhal. Faziam parte da equipe, além de Meireles, os técnicos indigenistas José do
Carmo Santana (Zé Bel) e Hugo Pedro da Silva, três peões contratados em Vila de
Rondônia, três índios suruís, dois gaviões, um cinta-larga e um xavante. Os índios
foram levados para servir como intérpretes, já que uma de suas línguas deveria ser
parecida com a dos zorós. Acreditava-se que os suruís pudessem entender bem os
zorós [o que, se viu depois, não foi possível, pois as línguas zoró e suruí, ainda que da
mesma família, se distanciam bastante], embora houvesse uma certa apreensão em
relação a esse encontro: as duas tribos sempre foram inimigas. (...).
Partindo do acampamento, uma picada foi aberta na direção dos caminhos que os
zorós utilizam durante suas caçadas. Alguns presentes deixados na picada tinham a
finalidade de atrair os indígenas. Mas Meireles não pretendia ficar parado ali, esperando
que eles aparecessem, já que o contato prometia ser fácil e rápido.
Os zorós construíram malocas nas proximidades do rio Branco, depois que
abandonaram as margens do rio Roosevelt - onde viviam - por causa do aparecimento
de fazendas na área. Fugindo em direção ao rio Branco, os zorós encontraram uma
outra fazenda que estava sendo aberta na margem oposta. A situação dos índios ficou
crítica: não poderiam subir em direção à cabeceira do rio por causa dos suruís, mas
também não poderiam seguir o caminho das águas por causa dos brancos. (...).
Cercados, os zorós, ao chegarem à margem do rio Branco, resolveram atacar os
empregados da fazenda Castanhal: em dois ataques mataram três trabalhadores e
feriram bastante um quarto. (...) Os irmãos José e Miguel Fortes, proprietários da
Castanhal, ordenaram que nenhum mal fosse feito aos índios. Apenas determinaram
que os peões passassem a trabalhar em grupo, sempre com uma espingarda à mostra,
para deixar claro que também possuíam armas.
Em 1972 Apoena e Zé Bel haviam descido o rio Branco e não encontraram vestígio dos
zorós. Sabiam no entanto da existência dos indígenas nas cercanias do rio Roosevelt, e
por esse motivo pediram a interdição daquela faixa de terra entre os dois rios – o que
não aconteceu.
O aparecimento dos cabeças-secas na Castanhal – apesar de provocar mortes entre os
peões – teve aspectos positivos. Como não tiveram represália pelos ataques, os
indígenas passaram a observar os trabalhadores de longe, e no início deste ano um
grupo de vinte surgiu na beira do rio e acenou para o barqueiro Roque Nunes. Roque,
ao ver que o grupo estava desarmado, atravessou o rio e se aproximou dos índios.
‘Quando saltei da canoa’, conta, ‘não sabia quem tremia mais de medo, se eu ou os
índios. ‘Depois desse encontro cerca de oitenta zorós visitaram a fazenda, mas,
passado um certo tempo voltaram a desaparecer.
Apoena Meireles pretendia contatar no início o grupo que tinha surgido na Castanhal,
para, através dele, chegar aos habitantes das malocas mais afastadas. Como já
tínhamos sobrevoado dez malocas [aldeias], estimávamos que mais de 350 índios
viveriam na região, sendo que a maioria – principalmente os que vivem próximo ao rio
Tiroteio, um afluente do Roosevelt – tem evitado qualquer aproximação com os
brancos.
Acompanhados de Roque Nunes e Gustavo Luís de Almeida, que tinham feito um bom
relacionamento com o grupo de zorós que visitou a fazenda Castanhal, seguimos para
as malocas mais próximas. Acreditava-se que elas ficavam a quatro horas de

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caminhada na selva, mas somente depois de onze horas, em ritmo acelerado,


conseguimos alcançá-las. As malocas que visitamos estavam vazias. Os índios tinham
plantado a roça e saído pela selva caçando. Deixamos presentes, como espelhos,
facões, panelas e anzóis, e fomos embora. (...) Em linha reta, numa medição feita de
avião, o percurso tinha trinta quilômetros, o que nos fez estimar a distância por terra
em sessenta quilômetros.
Depois de um dia de descanso no acampamento, subimos o rio Branco na esperança de
encontrar algum grupo de zorós pescando. Por causa do grande número de corredeiras
– o que nos obrigava a arrastar as canoas em longos trechos -, a subida do rio levou
um dia e meio e foi tão penosa quanto a caminhada anterior. Encontramos muitos
vestígios dos cabeças-secas, mas não chegamos a ver nenhum deles. Resolvemos
então regressar e aguardar uns dias no acampamento antes de outra investida. Mas
não foi preciso esperar muito. Os zorós encontraram os presentes e seguiram a picada
aberta a partir da trilha deles. A estratégia tinha surtido efeito. Os zorós chegaram [no
dia 22 de outubro] ao acampamento desarmados, pois haviam deixado suas flechas
escondidas na selva para demonstrar que estavam em missão de paz.
Quatro índios adultos se aproximaram em primeiro lugar. Depois, quando já estavam
inteiramente à vontade, apareceram uma mulher e uma criança, até então escondidas
observando o encontro. O contato acontecera depois de dezoito dias de angustiante
expectativa. Mas aquele dia reservava outra surpresa. Roque Nunes encontrou outro
grupo de zorós à margem do rio, do qual faziam parte alguns índios que o conheciam
da fazenda e chamaram por ele. Zé Bel subiu o rio com Hugo para buscá-lo, enquanto
Apoena entretinha os que haviam chegado por conta própria ao acampamento.
Dos índios que Apoena levou, apenas os gaviões e o cinta-larga entenderam a língua a
língua dos zorós, o que desmentia a versão de uma antiga união desses indígenas com
os suruís. Durante o contato, Apoena apresentou as duas tribos, pedindo que
acabassem com a rivalidade. Com as pazes feitas, Itabira, um suruí que nos
acompanhava, subiu o rio com os zorós, quando eles partiram.
Altos e gentis, alguns índios alcançavam 1,75 metros de altura. Durante as duas horas
e meia que passaram conosco no acampamento, os zorós se comportaram de uma
maneira impressionante. Não mexiam em nada sem pedir autorização. Queiram saber o
nome de tudo e de todos. Os gaviões e o cinta-larga não tiveram sossego: traduziam e
explicavam o tempo todo. Os zorós queiram as novidades como presentes, mas foram
os facões, espelhos, panelas e anzóis os utensílios que fizeram mais sucesso entre eles”
(Praxedes, 1977).

Em entrevista à Revista de Atualidade Indígena (1978), Apoena Meirelles


declarou que “as malocas ficavam a mais ou menos 50 quilômetros dos limites da
fazenda, na margem esquerda do rio Branco”, e acrescentou:

“Após seis horas de caminhada encontraram uma maloca abandonada. Pelo que
puderam observar, seus moradores a haviam deixado há bastante tempo. Convencidos
disso, prosseguiram na caminhada. Andaram ainda umas cinco horas quando voltaram
a encontrar outra maloca, desta vez com sinais evidentes de que fora abandonada há
dois dias. Soube depois que um japonês fizera uma picada desde o rio Roosevelt, já se
preparando para grilar as terras.
- Por isso os índios fugiram – disse Apoena. Esse caminho passava a um quilômetro da
maloca. Quando fomos até a picada, o japonês desaparecera, talvez alertado pelas
notícias de que nos encaminhávamos para o local. Resolvemos não ir adiante no
caminho, pois do contrário estaríamos fazendo o mesmo que o aventureiro japonês.
O grupo de Apoena resolveu então voltar para o acampamento, mas antes , deixaram
alguns presentes na maloca, como facas, machados e facões. Havia certeza de que os
índios voltariam, pois na fuga deixaram redes armadas e milho plantado na roça,
vestígios claros da fuga apressada.

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- Não aproveitamos o caminho feito pelo japonês. Fizemos o nosso e, de trecho em


trecho, deixamos presentes. Dez dias mais tarde fomos surpreendidos com a presença
dos Zoró em nosso acampamento. Esse grupo era todo formado de guerreiros. Dias
depois apareceram as mulheres. Nessa ocasião fomos convidados para visitar as
malocas – mais ou menos 11 – localizadas nas cabeceiras do Tiroteio. Deixamos para
visitá-las em julho, quando voltamos para completar nosso trabalho de aproximação”
(Revista de Atualidade Indígena, 1978, p. 5-8; ver fotografias em anexo).

No relatório que apresentou ao presidente da FUNAI, o sertanista Apoena


Meirelles informou ainda que:

“A nossa expedição percorrera mais de 200 kms a pé, estivemos nas cabeceiras do
igarapé Tiroteio, Canaã, enfim em quase todas as malocas dos índios Zorós, e fizemos
duas etapas de penetração pelo rio Branco, onde chegamos nos limites da reserva do
Posto Indígena 7 de Setembro (limite leste)” (Meirelles, 1977b, p. 1).

No interesse de uma resposta esclarecedora aos quesitos deste tópico, devo


salientar que o curso médio do igarapé Canaã, onde o zeloso funcionário da FUNAI
visitou “malocas dos índios Zorós” em 1977, percorre justamente o interior dos lotes
adquiridos pela parte autora na chamada Gleba JK. Justifica-se assim a assertiva, que
abriu este tópico, de que a área ora sub judice corresponde a terras tradicionalmente
ocupadas pelos Zorós. Com efeito, eles jamais perderam a posse efetiva dessas terras,
o que pode ser demonstrado pela localização nelas de aldeias antigas - por exemplo,
Zap Kalãlyrej, Way Pixiwej, Burat Kap Xij, Berakawej, Wat Kuwyrej, I Mabia, Ikiraiej,
Zap Pulirej, Bagasu Kyrej, Zat Kut Xij, Sum, Pakup Ibij e Manguj Kywej, no sentido foz
às cabeceiras do rio Canaã (ver “Mapa do território tradicional zoró”, elaborado sob a
supervisão do ancião Pepuj, em anexo) -, e de aldeias atuais, como Anguj Tapua e
Abesewap (ver mapa anexo, “A ocupação indígena na TI Zoró”).

Temendo os efeitos prejudiciais do contato destes “isolados” com as frentes de


expansão econômica na região, o sertanista Meirelles insistiu junto à direção superior
da FUNAI sobre a necessidade de implantar uma base de operações na margem direita
do rio Quatorze de Abril, com o objetivo de fiscalizar o rio Tiroteio, contatar os demais
Zorós e prestar assistência aos Cintas-Largas do rio Capitão Cardoso, e defendeu a
demarcação das terras ocupadas pelos Zorós na margem direita do rio Branco:

“Senhor Presidente, os contatos com os Zorós vieram desmentir aquelas pessoas da


própria FUNAI, que desejariam que eles não existissem. Existem e devido ao número
de índios, necessitarão permanecer onde estão, portanto, uma reserva deverá ser
criada, na margem direita do rio Branco. Não pretendo transferir os Zorós para a
reserva do Roosevelt, a Lei 6.001 garante ao índio a posse da terra onde ele habita.

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Portanto, vamos defender sejam quais forem os riscos, a permanência dos índios Zorós
onde estão e aqueles que desejarem a transferência dos índios que o façam, pois nós
não concordamos com essa solução.
A FUNAI, Sr. Presidente, e nós não entendemos até hoje, pois em 1974 nós já
havíamos pedido a interdição da margem direita do rio Branco para os Zorós, mantém
interditada a margem esquerda, e onde os Zorós estão, não existe nenhum ato nesse
sentido. Na margem esquerda do rio Branco, só existem os Gaviões e Araras, do PI
Lourdes, que já estão com a sua reserva demarcada.
Para que não ocorra aos Zorós o fim trágico dos Suruís, atraídos em 1969, e que só
quase dez anos depois a FUNAI resolveu demarcar suas terras, já então invadidas,
griladas, é necessário que já no próximo ano a reserva para os Zorós seja criada, e,
devidamente demarcada. Proposta nesse sentido enviaremos a V. Excia. após terminar
o levantamento total da área” (Meirelles, 1977b, p. 5; ver tb. Estado de São Paulo,
1977d; ).

Transcorridos apenas dois meses do contato com a expedição da FUNAI, a


imprensa já noticiava que uma grave epidemia de gripe havia acometido os Zorós.
Maria de Lourdes Santana, viúva do sertanista Zé Bell, junto com quem esteve por
duas temporadas no acampamento da FUNAI à margem do rio Branco, entrevistada
em dezembro de 1988 pelo indigenista Ivar Busatto, da OPAN – Operação Amazônia
Nativa, comentou que os Zorós contraíram gripe e malária dos peões da fazenda
Castanhal (eram mais de trezentos trabalhando em derrubadas e na formação de
pastagens) e que muitos vieram a falecer nos meses seguintes aos primeiros contatos
(Busatto, 1988).

O médico José Américo, da 8a. Delegacia Regional da FUNAI, julgava que


colonos japoneses, que entravam na área pelo norte de Mato Grosso, ou empregados
da fazenda Castanhal houvessem-na transmitido ao grupo indígena:

“Aproximadamente 80 índios já estão com gripe, e o médico pretende vaciná-los antes


que os demais sejam contaminados. Para isso ele tenta conseguir um helicóptero,
porque as distâncias entre as aldeias são grandes, e por terra o trabalho levaria muito
tempo para a locomoção da equipe de socorro de uma aldeia a outra” (Estado de São
Paulo, 1977e).

Em meados do ano seguinte, uma família zoró que acampava num local
próximo à atual aldeia Zawã Kej Alakit (Barreira) - a poucas centenas de metros
adiante da divisa sul da TI Zoró – foi atacada pelos Suruís, armados com espingardas.
Morreram então um homem, uma mulher, um velho, uma mocinha e uma criança. A
tocaia aconteceu, segundo relataram os próprios Suruís aos funcionários da FUNAI,
num “ato de vingança contra os zorós que há dois anos mataram uma família inteira de
suruís” (Estado de São Paulo, 1978a; Chapelle, 1979, p. 216-220).

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Laudo antropológico – Processo 2001.36.00.001508-9
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Conseqüência imediata do conflito com os Suruís, cerca de duzentos Zorós (em


torno de metade da população estimada, portanto), deixaram a área interditada havia
pouco (Decreto n. 81.587, de 19 de abril de 1978; ver próximo tópico) com receio de
um novo ataque, e buscaram refúgio junto aos Gaviões, na TI Igarapé Lourdes, a
cento e cinqüenta quilômetros a oeste e trinta dias de caminhada. Os sertanistas
Apoena Meirelles e Zé Bell foram designados, então, para um levantamento aéreo das
aldeias zorós na área interditada, com o objetivo de avaliar a extensão do êxodo (Folha
da Tarde, 1978; Estado de São Paulo, 1978b; 1978c).

Em outubro, contudo, noticiava-se o retorno de trezentos Zorós para seu


território original. Os funcionários da FUNAI, segundo o jornal O Estado de São Paulo
(1978c), preocupavam-se com dois aspectos da questão: “as razões que levaram os
zorós a abandonar Lourdes, onde se encontravam há três meses, e a possibilidade de
que a volta da tribo possa representar algum ato de represália contra os seus inimigos
naturais, os suruís”. Cogitava-se, de acordo com o delegado da FUNAI Délcio Vieira,
que a volta dos Zorós representava “o reinício da fixação nos mesmos locais em que
antes se encontravam até o massacre e que estejam voltando com a intenção de se
vingarem” (Estado de São Paulo, 1978c).

Estimada inicialmente em oitocentas pessoas, distribuídas em mais de dez


aldeias, a população zoró não contava nem com a metade desse número um ano
depois dos primeiros contatos amistosos em outubro do ano anterior – caso seja
verdade que menos de quatrocentas teriam sido, então, vacinadas pela equipe da
FUNAI (Silva, 1986a).

Embora curta, a estadia nas terras dos Gaviões, donde retornaram poucos
meses depois, foi marcante para os Zorós: depararam-se com os religiosos
fundamentalistas norte-americanos da Missão Novas Tribos e, sobretudo, foram
afetados por epidemias de malária e hepatite que vitimaram vários deles (Brunelli,
1987, p. 203; Forseth & Lovøld, 1984, p. 18).

De volta ao seu território, os Zorós foram reunidos pelos funcionários da FUNAI


numa única aldeia, situada a quinze quilômetros à leste do rio Branco. Neste local
permaneceram até maio de 1980, quando novamente a maior parte deles buscou
refúgio junto aos Gaviões da área Igarapé Lourdes. Desta feita, conforme atestaram os
antropólogos noruegueses Elisabeth Forseth e Lars Lovøld que ali realizavam suas
pesquisas, a razão foram os abusos de mulheres e os maus tratos por funcionários da

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FUNAI lotados na Frente de Atração Zoró - dois deles foram removidos pouco depois
desses fatos (Forseth & Lovøld, 1984, p. 18; Cloutier, 1988, p. 12; Gambini, 1983, p.
7).

Segundo os Zorós, um pequeno grupo permaneceu em sua aldeia, Bobyrej (a


atual aldeia “Central”, onde estava localizado o posto da FUNAI), enquanto a maior
parte deles dirigiu-se para a área Igarapé Lourdes. Foi durante essa segunda
temporada, de cerca de um ano, que os Zorós foram “convertidos” ao conjunto de
crenças cristãs professadas pelos missionários das Novas Tribos. Os missionários,
ademais, dispunham de remédios e prestaram o atendimento à saúde de que os Zorós
careciam naquele momento (Brunelli, 1987, p. 204; Cloutier, 1988). Com efeito, desde
os primeiros contatos com os peões da fazenda Castanhal em 1976 até fins de 1979,
registrou-se cerca de quarenta e quatro óbitos, metade dos quais de pessoas com
trinta anos ou mais, vitimadas por coqueluche, doenças venéreas, tuberculose, gripe e
pneumonia (Forseth & Lovøld, 1984, p. 17; Brunelli, 1987, p. 204).

Haviam se passado poucos meses desde a chegada na área Igarapé Lourdes,


quando um sertanista da FUNAI conseguiu recambiar algumas famílias ao posto da
Frente de Atração Zoró. E em maio de 1981, a maioria dos Zorós retornou ao seu
território tradicional, tendo a FUNAI organizado no local um pequeno ambulatório, com
a presença eventual de um auxiliar de saúde (Brunelli, 1987, p. 205).

O novo encarregado da Frente de Atração, por sua vez, daria início a um


desmedido programa de roças comunitárias, que exigia o engajamento diário de todos
os homens da comunidade, visando a sua transformação de eminentes caçadores-
coletores em lavradores sedentários. Este regime impositivo de trabalho agrícola foi
observado em agosto de 1981 pelos antropólogos noruegueses:

“O chefe [de posto da FUNAI] não deixou ninguém caçar durante a semana. Em
conseqüência comeram conservas [enlatados] cada dia útil, o que provavelmente era
caro para a FUNAI e não muito saudável para os índios. Além disso, esta prática criou
problemas para as mulheres e as crianças que foram privadas de carne e de peixe. Os
homens tinham que fazer serviço, e a comida da FUNAI era ‘só para os trabalhadores’.
Só nos domingos era permitido caçar – e aí tinham que ter sorte! Então, um efeito do
projeto era de reduzir consideravelmente o valor nutritivo da alimentação das mulheres
e das crianças” (Forseth & Lovøld, 1984, p. 19)

Ainda mais danosos, enfatizou o antropólogo Marcio Silva (1986a), foram os


efeitos colaterais da sedentarização imposta pela FUNAI. O posto onde se aglutinavam
os Zorós estava no setor noroeste da área interditada, bem distante do eixo da estrada

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do Condomínio Lunardelli que a cruzava de sul a leste. Favorecendo interesses


particulares (a passagem de gado, entre outras coisas) de uns poucos grandes
proprietários de fazendas localizadas mais ao norte, entre os rios Roosevelt e Guariba,
o então presidente da FUNAI, general Ismarth de Araújo, consentiu na construção da
estrada pelo Condomínio Lunardelli, sob a enganosa alegação de que aquela zona seria
oportunamente desinterditada (Gambini, 1984a, p. 296). O Condomínio congregava,
entre outros, o Grupo Ometto, o Grupo Parizotto, o Banco Meridional do Brasil, a
Agropecuária Central e a Companhia Vale do Rio Roosevelt. De início, o trânsito foi
controlado por uma porteira no limite sul da área interditada; com a sua retirada, a
estrada tornou-se a principal via de entrada de invasores e grileiros, que passaram a
controlar uma vasta extensão da área indígena.

Figura 9: O cerco das fazendas e as invasões na área Zoró


(Gambini, 1984b, p. 7)

Com efeito, como argumentou o antropólogo, a invasão desenfreada da área


interditada era um desfecho previsível:

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Laudo antropológico – Processo 2001.36.00.001508-9
1ª Vara da Justiça Federal - Mato Grosso

“Mas se antigamente os Zoró podiam promover a vigilância de suas terras durante as


expedições de caça e coleta, com a implantação das roças deixaram de fazê-lo.
Proteger o território passou a ser impossível, já que deviam trabalhar de segunda a
sexta-feira, em tempo integral, nas grandes roças comunitárias organizadas pela
FUNAI. Sábado passou a ser o único dia livre para as atividades individuais, já que os
Zoró passaram a guardar os domingos para os cultos e as orações ao Deus branco
ensinado pelos missionários norte-americanos. Em resumo, a FUNAI permitiu a
construção de uma estrada em suas terras, não exerceu o controle de suas fronteiras,
não procurou impedir o ingresso e o estabelecimento de cerca de alguns milhares de
invasores (os números [...] variam de 2500 a 5000 pessoas na área, segundo
levantamentos feitos em outubro de 1986), e impôs aos Zoró um novo tipo de ordem
social que impossibilitou a este povo de exercer, por conta própria, a proteção de seus
domínios territoriais. Paralelamente, a Missão norte-americana ‘Novas Tribos do Brasil’
os ensinava a serem tementes a Deus, praticantes da Virtude e do Amor ao próximo, e
esperançosos na Graça Divina e na Salvação” (Silva, 1986, p. 5).

Figura 10: A ocupação territorial dos Zorós


(Gambini, 1984b, p. 19)

Não obstante o excesso de atividades agrícolas a que se sujeitavam os Zorós,


na visita à área em 1983 o antropólogo Roberto Gambini, a quem coube o

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Laudo antropológico – Processo 2001.36.00.001508-9
1ª Vara da Justiça Federal - Mato Grosso

acompanhamento deste quadro pela equipe FIPE/USP de avaliação do Programa


Polonoroeste, registrou a existência de nove aldeias antigas e seis acampamentos de
caça e pesca, em vários pontos da área, a distâncias variadas, utilizados pelos grupos
familiares - Carequinha, a três horas a pé; Jacaré, quatro horas; João Grande, seis
horas; Paiô, duas horas; Tatu, um dia a pé; e Za’ap, também um dia (Gambini, 1983,
p. 13). Convém notar, em atenção às questões colocadas ao exame pericial, que a
aldeia de Za’ap, conforme o croquis abaixo elaborado por Gambini, encontrava-se
localizada dentro dos limites dos títulos adquiridos pela autora na década de 1970, que
são objeto da presente ação judicial.

Figura 11: Acampamentos de caça e pesca dos Zorós em 1983


(Gambini, 1983, p. 9)

Na mesma oportunidade, Gambini relacionou as várias fazendas e propriedades


no entorno da área Zoró: ao norte, as fazendas Mudança e Santa Maria, as terras de
Armando Peralta e a fazenda Concisa, a mais antiga; a oeste, as fazendas Castanhal,
Rio Branco e Santa Silva; a leste, as fazendas Vale do Rio Roosevelt e Muiraquitã.
Segundo ele, embora distantes, os Zorós acostumaram-se a visitá-las com certa
regularidade:

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Laudo antropológico – Processo 2001.36.00.001508-9
1ª Vara da Justiça Federal - Mato Grosso

“Os índios freqüentemente visitam as fazendas mais próximas, especialmente esta


última [Muiraquitã] e a Castanhal. Comem e dormem nelas em suas visitas, compram
alguma coisa nos armazéns com o dinheiro proveniente da venda de seu artesanato
pelo chefe [de posto] em Porto Velho, pegam laranjas e sentem-se muito atraídos pelo
que vêem. Não parece de modo algum que percebam essas fazendas como ameaça a
suas terras ou sua integridade cultural; antes, muitos deles gostariam de poder
trabalhar nelas, tendo já se oferecido para tanto. O trajar do peão e o desenho de sua
casa já são uma influência integrada pelos índios, assim como o desejo de possuir o
que os colonos possuem, do rádio ao relógio e à linguagem” (Gambini, 1983, p. 10-11).

Acerca destes fatos iniciais do contato, registrei por ocasião da vistoria pericial o
seguinte depomento do professor indígena Edílson Waratã:

Waratã: “Isso aí eu acompanhei, quando era criança, meu pai ia lá visitar eles, eu ia lá
com ele também. Tinha muita gente, trabalhadores com machado. Isso eu
acompanhei, eu vi. No tempo do contato, antes não. Atravessou dentro da área. Eu
tinha uns dez anos. Eu presenciei, eu fui junto com meu pai no barraco do cara; ele
pegou o revolver, ele atirou perto dele, pá pá pá... Descarregou o revolver e ele riu
depois” (depoimento prestado em 21/10/2016).

Neste tópico procuramos verificar a localização territorial da população Zoró e,


ao mesmo tempo, analisar suas relações com os segmentos da sociedade nacional que
ali se apresentaram, enfocando os conflitos e os primeiros contatos amistosos que
travaram. Em resumo, a longa exposição desses eventos históricos veio a consolidar as
evidências da ocupação tradicional exercida pelos Zorós sobre Terra Indígena Zoró e
suas adjacências. Em particular, a área sub judice, que se estende das margens do rio
Branco ao curso médio do igarapé Canaã, encontra-se integralmente inserida no
território tradicional zoró – embora, apenas parcialmente com relação a TI Zoró
demarcada. Veremos no próximo tópico que o processo de regularização da TI
abrangeu tão-somente uma parcela das terras de ocupação tradicional dos Zorós.

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Laudo antropológico – Processo 2001.36.00.001508-9
1ª Vara da Justiça Federal - Mato Grosso

A TERRA INDÍGENA ZORÓ

Quesitos da União Federal e FUNAI


1. A Terra Indígena Zoró encontra-se demarcada e homologada por ato do Presidente da
República, como se área de ocupação tradicional e permanente indígena?
2. Caso positivo o quesito anterior, a área sub judice encontra-se total ou parcialmente inserida
nos limites demarcados da área reservada aos silvícolas?
7. Em face das respostas aos quesitos anteriores é possível afirmar que o território delimitado
como sendo a Terra Indígena Zoró são terras tradicionalmente ocupadas por indígenas, em
especial as áreas rurais sub judice?

Quesitos da Agro P ecuária Sul de Aripuanã Ltda


1. Descrever, em breve relatório, as áreas da Autora, indicar as benfeitorias existentes ou,
projetos de manejo florestal sustentado, ou, ainda, licença(s) de desmatamento se
existentes(s)?
2. Há quanto tempo a Autora explora tais áreas? Identificação e censo de eventuais ocupantes
não índios? Informações sobre a natureza da ocupação, com identificação dos títulos de posse
e/ou domínio eventualmente existentes?
7. (...) Em função de possível alteração, e afora a área que atualmente ocupam, pode-se definir
a extensão das terras necessárias ao seu bem estar e à sua reprodução física e cultural? Quais
os conflitos existentes? (...). Há títulos incidentes sobre as áreas mencionadas na petição
inicial?

As terras sub judice, de acordo com os documentos e mapa ajuntados aos


autos, encontram-se parcialmente inseridas nos limites da Terra Indígena Zoró - a
situação dos imóveis, com base nessas informações e em cópia da Carta Cadastral do
município de Aripuanã, elaborada pelo INTERMAT, cuja consulta a Coordenação
Regional da FUNAI em Cuiabá gentilmente possibilitou (ver figura abaixo), foi
transposta para os mapas anexos. A TI Zoró, como já esclarecemos no tópico anterior,
é habitada pelos índios de mesmo nome (Pangyjej, em sua própria língua). Os
processos de reconhecimento da ocupação indígena dessa área tiveram início ainda na
década de 1960; contudo, apenas chegaram a seu termo na década de 1990 – cfe.
Processo FUNAI/BSB/11265/78, incluso nos presentes autos às fls. 433-798. Para
responder aos quesitos deste tópico, foi preciso coligir uma série de documentos
oficiais e dados cartográficos, provenientes de diversas fontes, em relação aos quais se
pode avaliar a pertinência dos trâmites administrativos que levaram à identificação e à
demarcação da TI Zoró.

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Laudo antropológico – Processo 2001.36.00.001508-9
1ª Vara da Justiça Federal - Mato Grosso

A primeira providência para resguardar o habitat tradicional dos índios, na


região noroeste de Mato Grosso veio com a Resolução 761, de 26 de junho de 1918,
através da qual o Governo do Estado reservou vinte e cinco mil hectares “nas
adjacências de cada uma das estações telegráficas de Nambiquaras, Vilhena e José
Bonifácio”; esta última, com efeito, encontra-se hoje resguardada no perímetro do
Parque Indígena do Aripuanã.

Quase meio século depois, uma medida mais abrangente configurou-se no


Edital de 1o de julho de 1966, assinado pelo inspetor Hélio Jorge Bucker, então chefe
da 6a. Inspetoria do SPI, sediada em Cuiabá (MT), e publicado no Diário Oficial do
Estado de Mato Grosso em 14/07/66, que declarava área indígena a “circunscrita entre
os paralelos 12 e 11 e meridianos 59 e 60, vertentes do rio Aripuanã”, interditando-a à
penetração de elementos estranhos; e aduzia que os procedimentos para a pacificação
dos índios teriam “a finalidade de assegurar-lhes a sobrevivência presentemente
resiamente ameaçada por incursões de civilizados”. Segundo o Edital, as terras dos
índios eram “de suas propriedades, não só por ser o seu habitat natural, como também
por força do mandamento Constitucional contido no art. 216” (SPI - 6a. Inspetoria
Regional, 1966).

De maneira simétrica, através do Edital de 30 de maio de 1968, o chefe da 9a.


Inspetoria da FUNAI (Porto Velho, RO), José de Mello Fiúza, declarou interditadas as
terras indígenas contíguas entre os paralelos 11º e 12º e meridianos 60º e 61º, pelos
mesmos motivos. Sobre as áreas então resguardadas havia referências consistentes
acerca da presença ali dos Cintas-Largas – devemos notar que, de início, o rótulo
“Cinta-Larga” abrangia tanto os atuais Cintas-Largas como também os Suruís e os
Zorós. As áreas descritas pelos editais da 6a. Inspetoria do SPI (1966) e da 9a. IR da
FUNAI (1968) - situadas entre os paralelos 11º e 12º e os meridianos 59º e 61º -
englobavam em seu perímetro, parcialmente, as atuais Terras Indígenas Serra Morena,
Roosevelt e Aripuanã e a maior parte do Parque do Aripuanã (estas e as demais
medidas administrativas citadas a seguir estão delineadas no mapa anexo “Áreas
indígenas no noroeste de Mato Grosso”).

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Laudo antropológico – Processo 2001.36.00.001508-9
1ª Vara da Justiça Federal - Mato Grosso

Figura 12: Carta Cadastral do município de Aripuanã, MT


(INTERMAT, 1997)

Os vários conflitos que sucediam na região assinalavam a reação violenta dos


Suruís, Cintas-Largas e Zorós às inúmeras tentativas de invasão de seu território
tradicional. Entretanto, não obstante as suspensões temporárias em 1951, 1956 e
1961, devido a denúncias de corrupção e irregularidades (Moreno, 2007, p. 135), o
Departamento de Terras e Colonização do Estado de Mato Grosso não interrompeu a
expedição de títulos definitivos “de compra e venda” de lotes plotados nos altos cursos
das bacias do Roosevelt e do Aripuanã - é evidente que, à época, não haveria
condições para sua mensuração e demarcação topográfica em campo, menos ainda a
sua efetiva exploração econômica, seja por não existirem acessos regulares a esses
locais, seja em razão do risco de um ataque dos Zorós e demais povos indígenas que
ali viviam. É o que se observa no tocante aos documentos carreados para os autos,
através dos quais a autora da presente ação reivindica a propriedade de lotes na
denominada “Gleba JK”, cujos respectivos títulos definitivos foram expedidos pelo
Estado de Mato Grosso, em favor dos primeiros adquirentes, todos na mesma data de
26 de janeiro de 1961, a saber:

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Laudo antropológico – Processo 2001.36.00.001508-9
1ª Vara da Justiça Federal - Mato Grosso

a) Lote de 10 mil hectares adquirido do Estado de Mato Grosso por Celina de


Moraes, que o passou a Fouad Youssef Makari em 02/12/64 (transcrição 25.969, RGI
do 2º. Ofício de Cuiabá, MT); adquirido por Labib Tuma em 14/10/1966; deste, por Leo
Wallace Cochrane Junior em 24/01/1974; e, finalmente, por Armando Santos de
Almeida em 08/07/1976, que o cedeu para integralizar o capital social da Agro Pecuária
Sul do Aripuanã Ltda em 15/06/1979;

b) Lote de 10 mil hectares adquirido do Estado de Mato Grosso por Fábio


Firmino Leite, que o passou a Fouad Youssef Makari em 02/12/64 (transcrição 25.967,
RGI do 2º. Ofício de Cuiabá, MT); deste por Elias Buchala em 14/10/1966; deste, por
Leo Wallace Cochrane Junior em 24/01/1974; e, finalmente, por Armando Santos de
Almeida em 08/07/1976, que o cedeu para integralizar o capital social da Agro Pecuária
Sul do Aripuanã Ltda em 15/06/1979;

c) Lote de 10 mil hectares adquirido do Estado de Mato Grosso por João


Benedito Barreto Neto, que o passou a Fouad Youssef Makari em 02/12/64 (transcrição
25.957, RGI do 2º. Ofício de Cuiabá, MT); deste, por Elias Buchala em 14/10/1966;
deste, por Leo Wallace Cochrane Junior em 24/01/1974; e, finalmente, por Armando
Santos de Almeida em 08/07/1976, que o cedeu para integralizar o capital social da
Agro Pecuária Sul do Aripuanã Ltda em 15/06/1979;

d) Lote de 10 mil hectares adquirido do Estado de Mato Grosso por Euclides


Marques do Vale, que o passou a Fouad Youssef Makari em 02/12/64 (transcrição
25.956, RGI do 2º. Ofício de Cuiabá, MT); deste, por Ramez Abou Rizk em 24/10/1973;
e, finalmente, por Armando Santos de Almeida em 08/07/1976, que o cedeu para
integralizar o capital social da Agro Pecuária Sul do Aripuanã Ltda em 15/06/1979;

e) Lote de 10 mil hectares adquirido do Estado de Mato Grosso por Gregório


Ramos da Paixão, que o passou a Chukri Makari em 02/12/64 (transcrição 25.963, RGI
do 2º. Ofício de Cuiabá, MT); adquirido por Elias Buchala em 14/10/1966; deste, por
Leo Wallace Cochrane Junior em 24/01/1974; e, finalmente, por Armando Santos de
Almeida em 08/07/1976, que o cedeu para integralizar o capital social da Agro Pecuária
Sul do Aripuanã Ltda em 15/06/1979;

f) Lote de 10 mil hectares adquirido do Estado de Mato Grosso por Manoel José
de Siqueira Filho, que o passou a Chukri Makari em 02/12/64 (transcrição 25.968, RGI

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Laudo antropológico – Processo 2001.36.00.001508-9
1ª Vara da Justiça Federal - Mato Grosso

do 2º. Ofício de Cuiabá, MT); deste, por Ramez Abou Rizk em 24/10/1973; e,
finalmente, por Armando Santos de Almeida em 08/07/1976, que o cedeu para
integralizar o capital social da Agro Pecuária Sul do Aripuanã Ltda em 15/06/1979.

Não consta dos autos a transcrição do título definitivo de “compra e venda”


emitido pelo Departamento de Terras e Colonização em favor de Donato Teixeira da
Silva, que integra a Área “F” (cfe. fls. 6-7 e 63-63v dos autos), da qual parte foi
alienada para a CANORPA – Cooperativa Agropecuária Centro Norte do Paraná em
1984 – segundo a autora, remanesceriam 6.169 hectares sobrepostos à TI Zoró.

Não obstante, apenas em 1966 o SPI daria início aos trabalhos de “pacificação”
dos índios hostis, com a instalação de um posto-base em Vilhena, para apoiar as
expedições, e a realização de sobrevôos de reconhecimento e localização das aldeias
dos “Cintas-Largas” (Bucker, 1966b). Entre os rios Eugênia, Divisa e Capitão Cardoso
uma aldeia é logo avistada (Breves, 1966). E em março de 1967, Horst Stute (1967) da
Missão Novas Tribos do Brasil sobrevoou a região ao norte de Vilhena e a leste da vila
de Rondônia (hoje Ji-Paraná), oportunidade em que avistou várias aldeias, as quais
atribuiu aos Suruís e aos Cintas-Largas (na verdade, algumas das aldeias eram dos
Zorós):

- uma vila de quatro malocas grandes e roças entre o igarapé Tarumã e o rio
Branco;

- uma vila de cinco malocas compridas com várias roças ao redor, a quinze
quilômetros oeste do rio Branco;

- uma vila de dezesseis malocas grandes com três roças muito grandes, a
cinqüenta quilômetros a nordeste de Pimenta Bueno, na cabeceira do Riozinho;

- uma maloca grande e uma menor numa roça, entre o rio Roosevelt e o rio
Capitão Cardoso;

- duas roças com uma maloca cada, a leste do rio Capitão Cardoso e norte do
ribeirão da Divisa;

- e uma roça com duas casas, no ribeirão da Divisa, cerca de trinta e cinco
quilômetros a leste do rio Capitão Cardoso.

Segundo Stute (1967), as casas indígenas a leste do rio Roosevelt distinguiam-


se pela entrada lateral, ao passo que nas demais, a oeste, a entrada estava numa de

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Laudo antropológico – Processo 2001.36.00.001508-9
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suas extremidades - o que evidencia que se tratava de povos distintos. Considerando a


existência de outras aldeias mais a leste, o missionário estimou em dois mil a
população indígena da região. Posteriormente, os sertanistas da FUNAI irão avaliar em
cinco mil, um total que incluía também os Suruís e os Zorós (Jornal do Brasil, 1971).

No croquis abaixo, elaborado pelo missionário, observamos as malocas


localizadas entre o rio Quatorze de Abril e o rio Branco, justamente a região onde estão
plotados os títulos adquiridos pela autora.

Figura 13: Levantamento aéreo das aldeias, 1967


(Stute, 1967)

De acordo com os relatórios da FUNAI, foram os conflitos envolvendo índios e


garimpeiros que fizeram deslanchar as “expedições de pacificação”. Em maio de 1968
os Cintas-Largas atacaram o acampamento do garimpeiro Raul Espanhol, instalado no
Campo 21, na margem direita do rio Aripuanã. O prefeito municipal informou
prontamente ao chefe da Casa Militar do Estado, e o Governo estadual entrou em
entendimentos com a FUNAI para um plano de “pacificação” dos Cintas-Largas. Como
registramos no tópico anterior, uma das frentes da Operação Cinta Larga foi encetada
pelo sertanista João Américo Peret e visava atingir os índios do vale do Aripuanã, e a
outra, liderada pelo sertanista Francisco Meirelles, concentrou seus esforços na região
de Riozinho e Cacoal, em Rondônia, resultando no contato com os índios Suruís que ali
viviam.

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Laudo antropológico – Processo 2001.36.00.001508-9
1ª Vara da Justiça Federal - Mato Grosso

Ao lado dos trabalhos de campo, outras medidas legais buscavam definir as


terras indígenas e, ao mesmo tempo, proporcionar maior segurança à atuação das
equipes de “pacificação”. Em 16 de julho de 1968 o presidente Costa e Silva assinou o
Decreto 62.995 (publicado no DOU em 18/07/68), interditando “para efeito das
providências de pacificação das tribos indígenas Cintas Largas e Nambikwaras” a área
compreendida, grosso modo, nos seguintes limites: ao norte, uma linha reta no sentido
leste, a partir da foz do igarapé Jacutinga; ao sul, a estrada BR-364; a leste, o rio
Juruena; e a oeste, o rio Roosevelt. No ano seguinte, o parque do Aripuanã foi criado
pelo Decreto 64.860, de 23 de julho de 1969 (publicado no DOU em 24/07/69),
atendendo aos mesmos limites da área interditada anteriormente, “com a característica
principal de área reservada aos índios Cintas-Largas e Nambikwara, para os efeitos do
artigo 186 da Constituição”. Com isto, resguardava-se uma parcela significativa do
território cinta-larga, possibilitando à FUNAI desenvolver seus trabalhos de pacificação.

Figura 14: A redução do parque do Aripuanã em 1974

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Laudo antropológico – Processo 2001.36.00.001508-9
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No entanto, a reboque das pressões regionais, o governo federal decidiu


posteriormente reduzir o parque do Aripuanã em cinqüenta por cento de sua área
inicial, através do Decreto 73.563 de 24 de janeiro de 1974 (publicado no DOU em
25/01/74). Como o decreto que reduziu o parque deixou desguarnecidas as aldeias dos
Gaviões, dos Araras, dos Suruís, dos Zorós e também de grupos Cintas-Largas, foram
simultaneamente interditadas duas áreas pelo Decreto 73.562 de 24 de janeiro de
1974, uma a oeste e outra a leste do Parque do Aripuanã. Nos termos desse decreto, a
Área I correspondia a uma grande extensão situada entre a margem esquerda do rio
Roosevelt e o rio Ji-Paraná, que englobava uma pequena porção da área ora sub judice
(ver a posição dos lotes titulados no mapa anexo “Áreas indígenas no noroeste de Mato
Grosso”). Na minuta de memorial descritivo que enviou ao superintendente
administrativo do órgão, em 12 de outubro de 1972, que correspondia à Área I do
Decreto 73.562/76, o delegado da 8a. DR da FUNAI Waldirene dos Santos Monteiro
sublinhara que se tratava de:

“uma área de terras de presença dos indígenas, das tribos Gavião, Arara, Suruis e Orós
[Zorós] (...), a fim de, por decreto do Excelentíssimo Senhor Presidente da República,
ser transformada em reserva e Parque Indígena, considerando que, na localidade se
encontram várias famílias de silvícolas e como usufrutuários, por força do estatuído no
art. 198, da Constituição da República, devem ser preservados e incorporados,
lentamente à comunidade nacional” (Monteiro, 1972).

Por sua vez, o Decreto 77.033, de 15 de janeiro de 1976 (publicado no DOU em


16/01/76), renovou a interdição das áreas descritas pelo Decreto 73.562/74, para fins
de sua demarcação administrativa, atribuindo-a então à FUNAI. Na Exposição de
Motivos que justificava este novo decreto, o ministro do Interior Maurício Rangel
argumentou que a FUNAI, “diante de circunstâncias de conveniência administrativa e,
também, em virtude dos princípios da política indigenista que vem desenvolvendo,
considera que a transferência, pretendida há dois anos, se mostra, hoje, inexeqüível,
sendo de todo recomendável a manutenção dos grupos indígenas na região do seu
habitat” (Rangel Reis, 1975) Tal reconhecimento da ocupação indígena, entretanto,
sofreria retrocessos acentuados nas disposições seguintes.

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Laudo antropológico – Processo 2001.36.00.001508-9
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Figura 15: Áreas interditadas pelo Decreto 73.562, em 1974

O governo do Estado de Mato Grosso, açodado pelas demandas de alienação e


colonização das terras públicas, continuou a pressionar para reduzir ainda mais os
limites das terras indígenas. E, ao mesmo tempo, reservara as terras devolutas do
município de Aripuanã para a CODEMAT, através da Lei Estadual 3.743, de 31 de
março de 1976, para a implantação do Projeto Juína, enquanto construía a estrada
ligando-o a Vilhena (RO). Em razão desses interesses, o governo federal veio a declarar
sem efeito a interdição da maior parte da Área II pelo Decreto 78.109 de 22 de julho
de 1976 (publicado no DOU em 23/07/76), restringindo os Cintas-Largas da Serra
Morena e adjacências a uma área contígua ao parque do Aripuanã, limitada ao norte
pelo rio Porquinhos (Furquim) e a leste por uma linha reta que parte da confluência do
córrego da Marcação.

No ano seguinte, o Decreto 80.169, de 16 de agosto de 1977 (publicado no


DOU em 17/08/77), e o Decreto 80.422, de 28 de setembro do mesmo ano (DOU,
29/09/77), inexplicavelmente duplicados, declaram sem efeito a interdição de uma
mesma fração ao sul da Área I. Para o que aqui nos interessa, o trecho entre os rios
Quatorze de Abril e Tiroteio, incluído na atual TI Zoró, permaneceu sob o regime de
interdição. Nos ofícios em que encaminhou as minutas de decreto ao ministro do
Interior, o presidente da FUNAI Ismarth de Araújo Oliveira esclarecia que o órgão já
havia dado início às “providências de demarcação administrativa, das áreas

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Laudo antropológico – Processo 2001.36.00.001508-9
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efetivamente ocupadas pelos silvícolas na região” e que a área remanescente


permaneceria sob interdição “pelo fato da existência dos índios Zorós ainda arredios”
(Araújo de Oliveira, 1975).

A oeste do rio Roosevelt, as sucessivas invasões das terras indígenas foram


suscitadas, entre outros motivos, pela confusa política de assentamentos do INCRA em
Rondônia e, na esfera particular, pelo projeto da colonizadora Itaporanga (ou Irmãos
Melhorança, sediada em Espigão d’Oeste, RO), que ali teria loteado mais de um milhão
de hectares nas décadas de 1960 e 1970 (Estado de São Paulo, 1975b). Colonizadoras
e grupos empresariais, como o Condomínio Lunardelli e outros, incrementaram a
aquisição de terras e os investimentos na região e assediavam os órgãos oficiais em
busca de financiamentos, de autorizações e, no que diz respeito à FUNAI, de certidões
negativas. Violentos conflitos, e várias mortes, opuseram então os Cintas-Largas e
Suruís aos “colonos”, em geral sulistas que migravam na expectativa de obter para si
um pedaço de chão no novo “Eldorado”.

Já no Mato Grosso, segundo a pesquisadora geógrafa Gislaene Moreno, da


Universidade Federal de Mato Grosso, os procedimentos administrativos em curso no
Instituto de Terras de Mato Grosso – INTERMAT eram em tudo análogos aos que
motivaram o fechamento em 1966 do antigo Departamento de Terras e Colonização –
DTC:

“A burla à lei poderia ocorrer durante todo o processo, desde a constituição dos
processos-pilotos das glebas arrecadadas e matriculadas em nome do Estado de Mato
Grosso, na fase preliminar das licitações com a desobediência dos prazos do edital, até
o ‘fechamento’ da concorrência que, normalmente, já tinham candidatos certos,
acobertados por procuradores testas-de-ferro.
Tudo começava com a montagem da vistoria prévia das áreas tidas como devolutas,
quando é imprescindível sua realização, mesmo nas arrecadações sumárias. Por
suposição, a maioria das glebas arrecadadas sumariamente no norte de Mato Grosso,
principalmente nas áreas hoje desmembradas dos municípios de Aripuanã e de Alta
Floresta, foi considerada como devoluta e desocupada, nos próprios gabinetes,
considerando-se serem áreas de mata inexploradas e sem vias fáceis de acesso. Os
mapeamentos das terras quase sempre foram feitos a distância, com recursos da
Cartografia até então disponíveis. Isso era facilmente detectado nos autos de medição,
peça fundamental em qualquer processo de alienação, seja por meio de regularização
seja de venda direta. O perímetro da gleba era delimitado primeiro, a partir do
lançamento de coordenadas geográficas, tendo por base cadastral os mapas de Mato
Grosso editados pelo Departamento de Geografia e Estatística do IBGE. A partir daí
montava-se o memorial descritivo da gleba, que era parcelada, ou melhor, quadriculada
na prancheta, em tamanhos, rumos e distâncias iguais, formando os lotes individuais.
Quando havia ‘urgência’ na conclusão da licitação da área, justificada por interesses
diversos, as áreas eram alienadas com base nessas medições, calculadas, tendo como
referência apenas as linhas das coordenadas geográficas, que certamente, no plano,

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real, continham imprecisões, devido aos poucos recursos cartográficos até então
disponíveis” (Moreno, 2007, p. 255).

É razoável supor, com efeito, que o processo de regularização pelo DTC da


Gleba JK, na qual estão plotados os títulos adquiridos pela autora, seguiu em linhas
gerais este mesmo ”padrão”. De modo que, embora os procedimentos irregulares, o
Estado de Mato Grosso deu seguimento à alienação das terras nos vales dos rios
Roosevelt e Guariba, desprezando as evidências de que se tratavam de áreas de
tradicional ocupação indígena, resguardadas inclusive por medidas de interdição ou
outras. Segundo o relatório da antropóloga Carmen Junqueira, datado de março de
1985:

“Na região compreendida pelos rios Guariba, Roosevelt e Capitão Cardoso há


problemas graves. O Estado de Mato Grosso tem tentado se apossar dessas terras da
União, embora parte delas esteja interditada desde 1968 (...). A Comissão Especial de
Discriminação de Terras Devolutas do Estado de Mato Grosso, do Intermat, relaciona
tanto processos de títulos definitivos como provisórios, expedidos através de licitação,
sobre glebas que incidem na terra indígena, atingindo áreas de aldeias, roças, locais de
caça, pesca e coleta que se distribuem ao longo dos rios Roosevelt e Guariba. Até o
momento, os portadores de títulos não ocuparam a terra” (Junqueira, 1985a, p. 30).

Em razão do agravamento da situação fundiária na região, a FUNAI constituiu


um Grupo de Trabalho em meados de 1975 (Portaria 341/P, de 14/05/1975 – Processo
FUNAI/BSB/3052/75) com o objetivo de verificar as invasões nas áreas interditadas,
identificar os invasores, definir as áreas a serem demarcadas em favor dos índios e
elaborar mapas e memoriais descritivos. O Grupo de Trabalho, coordenado pelo
delegado da 8a. DR da FUNAI, Clodomiro Bloise, e composto pelo antropólogo Alceu
Cotia Mariz, a engenheira agrônoma Gizelda Mata Rego, o advogado Abílio Nascimento
e o agrimensor Heleno Dornellas da Costa, vistoriou postos indígenas e aldeias e
concluiu pela delimitação das áreas Igarapé Lourdes (índios Gaviões), Sete de
Setembro (Suruís) e Roosevelt (Cintas-Largas). Segundo o relatório do antropólogo
Alceu Cotia Mariz, o objetivo da missão era “determinar as terras para a sobrevivência
dos índios desta região e que é de caráter emergencial”; para este fim, o GT atendeu
as seguintes orientações gerais:

“O mais importante (...) é que a extensão territorial necessitada pelos indígenas


obedece rigorosamente - e com bastante reserva – às exigências dos indígenas que
foram consultados, considerando especialmente:
1) A área residencial e administrativa do grupo e da FUNAI;
2) A área de caça, pesca e coleta em geral;
3) A área de obtenção de material para confecção de seus objetos de uso;

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Laudo antropológico – Processo 2001.36.00.001508-9
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4) A área de habitação e perambulação do grupo ainda em estado de isolamento”


(Mariz, 1975, p. 2).

Neste mesmo processo, que consolidou as delimitações das áreas Igarapé


Lourdes, Sete de Setembro e Roosevelt, advertia-se para a existência dos Zorós ainda
isolados, fora das áreas então delimitadas - o sertanista Aimoré Cunha da Silva havia,
recentemente, fotografado cerca de sete aldeias do grupo arredio. Nos
encaminhamentos então adotados, entendeu-se pela necessidade de novos estudos
para “interditar a área dos índios Cabeça-Seca para efeitos de atração dos mesmos”.

Figura 16: Sobrevoo localiza aldeias zorós no rio Tiroteio em 1976


(Alcântara, 1976)

Na vistoria de invasões e de abertura de estradas na Área I (Decreto


73.562/74) realizada em abril de 1976, o administrador substituto do Parque do
Aripuanã, Laercio Cerqueira de Alcântara, entrevistou o então gerente da Fazenda Vale
do Rio Roosevelt, situada à margem direita do rio Roosevelt, e recolheu informações
consistentes sobre a estrada então em construção, que cruzava o território indígena (a
leste da área ora sub judice), e a presença dos índios Zorós nas imediações da foz do
rio Tiroteio (ver croquis acima):

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Laudo antropológico – Processo 2001.36.00.001508-9
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“De posse do relatório do nosso servidor [José Nogueira de Azevedo Sobrinho],


procurei localizar o sr. Otacílio Soares de Souza, engenheiro agrônomo que atualmente
presta serviço como gerente da Fazenda Vale do Rio Roosevelt, o qual indagado pelo
administrador do PQARI sobre a abertura da estrada [então em construção, partindo da
vila de Pimenta Bueno, em Rondônia, até a margem do rio Roosevelt, pouco abaixo do
rio Quatorze de Abril], respondera que a idéia da execução da estrada era de
responsabilidade do sr. Ricardo Lunardelli, que por sua vez empreita a execução do
desmatamento do sr. Riveria. Quanto à participação do grupo Vale do Rio Roosevelt,
juntamente ao sr. Sérgio Prandini, o gerente afirmara que apenas o referido grupo
prestava uma certa colaboração. Neste contato comuniquei àquela gerência que os
trabalhos da abertura da estrada deveriam ser suspensos para efeito de se cumprir as
prerrogativas da Lei 6.001. (...) Ainda indagando ao sr. Otacílio sobre a existência de
indígenas na área da fazenda Rio Roosevelt o mesmo afirmou que segundo
informações de trabalhadores já apareceram índios na margem esquerda do rio
Roosevelt em frente a sede daquele projeto. Estes índios possivelmente pertencem ao
grupo Cabeça-Seca, que atualmente se deslocaram das margens direita do rio Branco,
construindo novas malocas à margem direita do rio Tiroteio, portanto entre este rio e o
igarapé 14 de Abril. As novas malocas distam aproximadamente 20 km da sede daquela
fazenda” (Alcântara, 1976).

Figura 17: Aldeias zorós na década de 1970


(Puttkamer, 1974)

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Laudo antropológico – Processo 2001.36.00.001508-9
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O fotógrafo Jesco von Puttkamer, da National Geographic, que entre 1969 e


1979 documentou o trabalho dos sertanistas da FUNAI e muitas cenas da vida
indígena, várias vezes sobrevoou dos aldeias Cintas-Largas e dos Zorós. Num croquis,
datado de 1974, o fotógrafo havia esboçado um sugestivo croquis das aldeias zorós,
reunindo informações prestadas pelo piloto João Sedlacek (ver figura acima). Em 1976,
acompanhado do sertanista Zé Bell, Puttkamer realizou um amplo sobrevôo do
território zoró, avistando as primeiras aldeias nas cabeceiras do rio Tiroteio (Puttkamer,
Diários de Campo III, 1975-1976, p. 293).

Figura 18: Proposta de interdição da área Zoró, 1976


(Meirelles, 1976)

Uma proposta de interdição do território ocupado pelos Zorós, bem mais


extensa do que a que ficou adiante definida pelo Decreto 81.587/78, foi apresentada
pelo sertanista Apoena Meirelles ao presidente da FUNAI: ao lado dos resultados
obtidos na vistoria que realizou na região em maio de 1976, para fins de elaboração de
um “plano de atração”, a proposta baseou-se nas muitas informações já obtidas sobre
o grupo indígena, destacando-se a existência de cerca de quinze aldeias, distribuídas

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por toda a área, que foram observadas durante os sobrevôos da região (Gambini,
1984a, p. 294). Esta proposta de interdição tomava como limite norte a confluência do
rio Branco com o rio Roosevelt, como limite leste os rios Roosevelt e Quatorze de Abril
e como limite oeste o rio Branco, conforme croquis abaixo. Num primeiro momento, o
presidente da FUNAI, general Ismarth de Araújo Oliveira, havia concordado com tal
proposta de interdição, segundo o jornal O Estado de São Paulo (1976b), muito
embora o objetivo da FUNAI fosse, segundo ele, “promover, nos próximos dois anos, o
contato definitivo com o grupo isolado e transferi-lo para o interior do Parque do
Aripuanã, pois a área onde vivem, próximo ao rio Branco, já está praticamente
ocupada por fazendas”.

Entretanto, o Decreto 82.064, de 3 de agosto de 1978 (publicado no DOU em


4/08/1978), declarou sem efeito a interdição de mais uma parte da Área I (Decreto
73.562/74), ao norte da mesma, medida que permitiu a construção de vias de
penetração e a instalação de empreendimentos, como a fazenda Castanhal dos irmãos
Fortes (justamente situada no trecho ora desinterditado). Com efeito, o ato
administrativo desconsiderava o fato de que a margem esquerda do rio Branco
consistia uma parcela do território de ocupação tradicional de alguns grupos zorós ali
situados (cfe. croquis acima do missionário Horst Stute, 1967; e depoimentos dos
anciãos Zorós, no tópico anterior).

Poucos meses antes, o Decreto 81.587, de 19 de abril de 1978 (publicado no


DOU em 20/04/1978), havia interditado uma parcela, embora expressiva, das terras
ocupadas pelos Zorós, cuja configuração coincide com a da atual TI Zoró, exceto em
seu limite sul, pois a área interditada chegava até a divisa dos estados de Mato Grosso
e Rondônia. Convém observar que os limites então definidos neste decreto não
alcançavam as terras de ocupação indígena tradicional situadas mais ao norte, onde se
instalaram as fazendas Muiraquitã, Peralta e Vale do Rio Roosevelt, nem as situadas na
margem esquerda do rio Branco, onde estava a fazenda Castanhal. De toda maneira, o
decreto veio a guarnecer as terras compreendidas entre os rios Roosevelt e o rio
Branco, onde várias aldeias e acampamentos foram registrados nos anos anteriores –
acerca das quais as fontes de informação compulsadas são unânimes (Brunelli,
1987:197) -, em particular, a margem direita do rio Branco, as imediações do rio
Tiroteio e no médio curso do rio Canaã, onde incidem os títulos adquiridos pela autora
(ver mapa anexo, “As áreas indígenas no noroeste de Mato Grosso”).

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Em 1984 a FUNAI designou um Grupo de Trabalho (Portaria 1.677, de


31/07/1984) para proceder à identificação e à delimitação das terras ocupadas pelos
Zorós, para fins de sua demarcação. Do relatório antropológico, a cargo do antropólogo
Roberto Gambini (1984b; nos presentes autos, às fls. 473-496), destacam-se as
seguintes afirmações quanto ao caráter tradicional da ocupação indígena: a área
interditada Zoró (Decreto 81.587/78) correspondia a uma fração do território original
desses índios (p. 2, 4); na década de 1970, instalaram-se ali empreendimentos
agrícolas que formaram um cinturão em torno do que restou do seu território (p. 2); os
Zorós afirmam que as terras ocupadas por essas fazendas sempre foram suas (p. 4);
toda a área interditada e as glebas ocupadas por fazendas pertenciam aos Zorós
“desde tempos imemoriais, como atestam seus próprios vizinhos Suruí e Cinta Larga”
(p. 9); “Qualquer adulto Zoró pode informar onde se localizam as velhas aldeias em
que residiam antes do contato em 1978” (p. 9); o sertanista Apoena Meirelles
sobrevoou a área em 1977, quando observou cerca de quinze aldeias; como cada
aldeia abrigava trinta a quarenta pessoas, os Zorós seriam mais de quinhentos à época
do contato (p. 9); os adultos falam com fluência sobre locais a grandes distâncias e os
recursos naturais ali existentes e nomeiam pontos de referência, como antigas aldeias,
cemitérios, fatos marcantes, acidentes naturais etc. (p. 17); existem caminhos longos
de dezenas de quilômetros, que levam a locais com abundância de caça, em todas as
direções, a muitos dias de caminhada; durante todo o ano dedicam-se à pesca no rio
Branco e seu afluente Canaã, no Roosevelt e seus afluentes Tiroteio e Quatorze de
Abril (p. 17); e, finalmente, verifica-se que “todo o território compreendido entre os
rios Branco e Roosevelt sempre foi e continua efetivamente sendo utilizado pelos Zorós
tanto para a sua sobrevivência como para a perpetuação de um modo de vida peculiar
às populações amazônicas” (p. 17).

E acrescenta o antropólogo, de modo conclusivo:

“As aldeias distavam horas, às vezes dias de marcha umas das outras, o que evidencia
o raio de território necessário à autonomia e sobrevivência de cada subgrupo. Trata-se
de um tipo de ocupação do espaço nada arbitrário, mas determinado pela possibilidade
de alimentação adequada e distribuição equilibrada por toda a extensão de terra sobre
a qual incidem antiqüíssimos direitos não escritos de soberania. Os índios, caçadores e
coletores, viviam em permanente deslocamento [no interior de seu território],
realizando alianças através de casamentos, visitando-se e constantemente vigiando seu
território. Na região sul da zona interditada, atualmente invadida em decorrência do
picadão aberto pelas fazendas, havia pelo menos três aldeias que conseguimos
identificar: as encabeçadas por Potsanwíp, Zaap-á e Matchianza, distantes
respectivamente cinco, quatro e três dias de marcha da atual aldeia organizada pela
FUNAI. Havia aldeias até recentemente onde hoje estão as fazendas Castanhal e

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Muiraquitã e que a interdição não levou em conta. Essas são provas suficientes da
extensão da ocupação territorial dos Zoró. O que melhor pode comprovar a posse da
terra que a fixação da moradia?” (Gambini, 1984b, p. 9-10).

Dentre as recomendações firmadas no relatório de identificação, temos ainda: a


delimitação da área Zoró com o mesmo perímetro da área interditada pelo Decreto
81.587, de 19/04/1978; a demarcação física da área; o fechamento do picadão que
atravessa a área, ligando Espigão d’Oeste às fazendas da margem direita do rio
Roosevelt; a expulsão dos invasores que penetraram pelo picadão (à época, já havia
inúmeros lotes desmatados); a revogação dos títulos de propriedade incidentes na área
Zoró, eventualmente concedidos a particulares; a adoção de uma política de prevenção
e controle de endemias (Gambini, 1984b, p. 24).

Figura 19: A delimitação da área Zoró (FUNAI, 1984)

Desde 1983 a área Zoró vinha sofrendo uma intensa invasão, capitaneada pelo
grileiro Américo Minotti e outros tantos, que vendiam lotes e instigavam dezenas de
famílias de Roriundas ndônia a ocupar as terras indígenas devassadas pela estrada que

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saía de Espigão d’Oeste em direção à fazenda Muiraquitã, a leste da área sub judice.
Desde fins de 1984, a FUNAI pôs-se a acompanhar os desdobramentos da invasão
crescente, que utilizava a estrada aberta pelo Condomínio Lunardelli, cujos lotes
marcados e desmatados se espraiavam até a margem esquerda do rio Roosevelt.

Por determinação da Portaria 1.818/E, de 11 de janeiro de 1985, a FUNAI, o


INCRA e o INTERMAT realizaram um levantamento fundiário para identificar os
ocupantes não-índios, levantar as benfeitorias e avaliar a natureza da ocupação ao
longo da estrada. Constatou-se então a presença efetiva de setenta e nove invasores,
dos quais cinqüenta e seis residentes em suas posses (com derrubadas, pequenas
lavouras e pastagens em formação). Havia, entretanto, um grande número de lotes já
marcados, que provavelmente aguardavam o período da seca que se aproximava; e
uma cooperativa (CANORPA – Cooperativa Agrícola Norte do Paraná), cujo objetivo era
colonizar uma área de vinte e quatro mil hectares (Santos et alii, 1985).

Figura 20: A invasão na área Zoró


(Gambini, 1987)

Em agosto de 1985, cada vez mais apreensivos em razão da invasão de seu


território, guerreiros Zorós munidos de arco e flecha efetuaram uma expedição de
advertência, e capturaram três invasores, detidos na aldeia por alguns dias – nesta
ocasião, os Zorós tomaram ciência de que os invasores eram mais numerosos que

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imaginavam. “Demarcando lotes em terras alheias e inventando propriedades


inexistentes”, assim florescia na área uma verdadeira indústria de grilagem e
especulação fundiária, de acordo com os antropólogos Brunelli & Cloutier (1987). As
negociações para a liberação dos reféns, inclusive com a participação do delegado
regional da FUNAI de Porto Velho, foram concluídas com a promessa de retirada de
todos os invasores da área Zoró, concentrados no então denominado “Núcleo Quatorze
de Abril”.

Ainda em 1985, a FUNAI contratou os serviços do DSG – Departamento de


Serviço Geográfico do Exército para a realização dos trabalhos de demarcação física da
área Zoró, conforme os limites descritos no Decreto 81.587/78. Todavia, agravava-se
ano a ano o quadro de tensão e conflitos, bem como a sua repercussão na imprensa
nacional e internacional. A oeste, os invasores alcançaram, inclusive, uma parte da
área sub judice, o lote cujo título definitivo foi originalmente emitido em favor de Celina
de Moraes. As manchetes a seguir ilustram o desenrolar dos acontecimentos para os
anos de 1986 a 1988:

ANO DE 1986
“Índios preparam-se para guerra em Rondônia” (Correio Braziliense, 5/9/1986); “Cidade
nasce no meio de área indígena” (Jornal do Brasil, 15/9/1986); “Agrava-se a situação
entre posseiros e índios Zorós” (Diário de Cuiabá, 12/10/1986); “Nenhuma definição
quanto à reserva dos índios Zoró” (Jornal do Dia, 15/10/1986); “Aripuanã: zorós podem
atacar a qualquer hora” (Estado de Mato Grosso,18/10/1986); “Os Zoró avisam que a
paciência acabou” (O Imparcial, 19/10/1986); “Conflito entre os Zoró e colonos
preocupa as autoridades do Estado” (Diário de Cuiabá, 30/10/1986); “Área Zoró em
troca de votos” (Porantim, novembro 1986); “Grupo interministerial vai analisar o caso
dos Zoró” (Diário de Cuiabá, 5/11/1986);
ANO DE 1987
“Área zoró é delimitada, mas continua invadida:” (Porantim, abril 1987); “Paraíso da
Serra: posseiros pedem socorro” (Diário de Cuiabá, 29/8/1987); “Impasse entre índios
e brancos pode se agravar” (O Estado de Mato Grosso, 1/9/1987); “Funai admite que
funcionários possam estar armando os Zoró” (Jornal do Dia, 1/9/1987); “Novo conflito
na área dos Zoró” (Diário de Cuiabá, 5/9/1987); “Índios Zoró voltam a pedir a retirada
dos posseiros” (Jornal do Dia, 5/9/1987); “Kazu quer indenização para posseiros de
Paraíso da Serra” (Tribuna Cuiabana, 13/9/1987); “Kazu em 'Guerra Santa' contra os
Zoró” (Tribuna Cuiabana, 17/9/1987);
ANO DE 1988
“Políticos convidam sem-terra a invadirem área Zoró” (Jornal do Norte – Cacoal,
19/3/1988); “PF vai para área de conflito entre índios e posseiros” (Folha de São Paulo,
18/10/1988); “Conflito entre índios e posseiros faz seis desaparecidos” (Folha de São
Paulo, 19/10/1988); “Índios zoró escapam de emboscada em Mato Grosso; cacique
está desaparecido” (Folha de São Paulo, 20/10/1988); “Funai investiga tiroteio em
reserva zoró; índios planejam invadir sede” (Folha de São Paulo, 23/10/1988); “Polícia
Federal encontra o corpo do ex-cacique Yaminer” (Diário de Cuiabá, 4/11/1988); “Funai
encontra corpo do cacique desaparecido depois de confronto” (Folha de São Paulo,
4/11/1988); “Matadores dos índios têm mandado de prisão” (O Estado de Mato Grosso,

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5/11/1988); “Índios Zoró prendem seis invasores” (Diário de Cuiabá, 22/11/1988); “No
MT, posseiros vão deixar terras dos índios Zoró” (Folha de São Paulo, 7/12/1988).

Num primeiro momento, muito embora as tentativas de aliciamento, os líderes


Zorós adotaram várias iniciativas próprias e cordiais para recuperar seu território, como
uma comitiva que se deslocou em setembro de 1986 a Cuiabá para expor a questão
diretamente às autoridades constituídas (Gambini, 1987). Os invasores, entretanto,
constituíram um advogado que requereu a exclusão de cento e vinte mil hectares da
área Zoró, já desmatados e ocupados com benfeitorias diversas (Silva, 1986b). Por sua
vez, os poderes públicos estaduais introduziram ainda mais incerteza ao conturbado
processo de regularização fundiária, com a oficialização do distrito de “Paraíso da
Serra” dentro da área indígena Zoró, em abril de 1987, através da Lei estadual 5.112,
de 9/04/1987. À época, mais de cem famílias residiam no núcleo urbano em formação.

Em meio a um quadro caótico, a delimitação da área Zoró foi finalmente


aprovada pelo Grupo de Trabalho Interministerial (Decreto 88.118/83) em 19 de
fevereiro de 1987 e, em seguida, declarada de ocupação dos Zorós pelo Decreto n.
94.088, de 11 de março de 1987 (publicado no DOU de 12/03/1987), registrada em
Cartório e inscrita no Serviço de Patrimônio da União, já que a demarcação física havia
sido concluída ainda em 1985 pelo DSG-Exército. Tais medidas, sem dúvida, devem-se
em parte às fortes pressões sobre o governo brasileiro exercidas através do Banco
Mundial, que financiava o Programa Polonoroeste (o Polonoroeste incluía um
Componente Indígena, responsável, entre outras questões, pela regularização fundiária
das terras indígenas de Mato Grosso e Rondônia).

Contudo, os órgãos governamentais, especialmente a FUNAI, o então MIRAD –


Ministério da Reforma e do Desenvolvimento Agrário e o INTERMAT – Instituto de
Terras de Mato Grosso, não executaram a necessária desintrusão da área indígena. O
descaso incentivou ainda mais a ação de grileiros; em 1988 já eram mais de
quinhentas famílias de posseiros, concentradas no núcleo urbano de Paraíso da Serra.
Madeireiras passaram também a extrair ilegalmente mogno e cerejeira das terras
indígenas, segundo noticiaram vários jornais.

Apesar das reivindicações e viagens dos Zorós, a FUNAI limitou-se a instalar


uma precária barreira policial na entrada da área. Cansados de esperar uma solução do
governo, então, alguns Zorós passaram a negociar diretamente com os invasores,
recebendo para isso mercadorias, alguns remédios e muitas promessas. A permanência

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dos posseiros, no entanto, vinha afetando os grupos indígenas vizinhos, pois a invasão
ameaçava alastrar-se pelas áreas Roosevelt, Aripuanã e Sete de Setembro.

Em outubro de 1988, guerreiros Cintas-Largas, Suruís, Gaviões e Araras


reuniram-se para retirar madeireiros e posseiros que já abriam novas estradas,
retalhando ainda mais a área indígena. A caravana de centenas de índios através do
território Zoró pretendia, tão-somente, convencer os invasores a abandonar as terras
indígenas. Todavia, no dia 16 daquele mês os invasores assassinaram o velho Yamner
Suruí, de aproximados 68 anos. Após advertirem madeireiros que abriam uma nova
estrada, os índios já retornavam em pequenos grupos para suas aldeias quando foram
perseguidos e emboscados por pistoleiros em um jeep e uma camionete. Os índios
buscaram a proteção na mata, mas os pistoleiros alvejaram o velho Yamner pelas
costas. Guiados pelas informações prestadas por José Antonio da Silva, que confessou
ter participado da chacina, duas semanas depois os policiais federais localizaram o
cadáver completamente carbonizado, jogado na mata à beira da estrada, a oito
quilômetros de Paraíso da Serra.

O inquérito policial apresentou seis acusados, e solicitou a sua prisão


preventiva, e nomeou um sétimo que, porém, havia sido assassinado no final daquele
ano; contudo, não foram indiciados nenhum dos possíveis mandantes, para os quais
trabalhavam alguns dos pistoleiros citados. Em sua denúncia, o procurador Roberto
Cavalcante sustentou que o crime fora motivado pelo desejo de usurpação do
patrimônio indígena, cabendo então seu julgamento ao fórum federal, no que foi
atendido pelo Juiz Federal da 1a. Vara de Mato Grosso, Dr. Mário Mendes.

Enfim, o Decreto 265, de 29 de outubro de 1991 (publicado no DOU de


30/10/91) veio a homologar a demarcação administrativa da área Zoró, com a
extensão de 355.789 hectares. Quanto à sua desintrusão, apenas foi solucionada em
meados de 1992 com a retirada dos invasores, reassentados mais ao norte no mesmo
município de Aripuanã (nos projetos Lontra e Filinto Müller). Mais uma vez, mostrou-se
decisivo o posicionamento do Banco Mundial e de outras agências multilaterais, que
então elaboravam o Programa Prodeagro, para a solução do impasse que se arrastava
há quase dez anos.

Não obstante, os representantes Zorós consultados durante a vistoria pericial


observaram que trechos extensos de suas terras tradicionais não foram incluídos na
área demarcada – em particular, as regiões da margem esquerda do rio Branco e a da

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divisa norte, onde antes dos contatos amistosos em 1977 estavam localizadas várias
aldeias antigas – razão pela qual o espaço geográfico da TI Zoró vem se mostrando,
cada vez mais, insuficiente para suas necessidades mais básicas, como moradia e
produção de alimentos:

Paulo Apeti (cerca de 61 anos): “O povo está aumentando, por isso que nós vamos
precisar de área livre. Essa área já está lotada já. Em vários lugares tem aldeias, as
aldeias estão ocupando toda a beirada. Vai ficar pequeno pra nós viver. Por isso esse
cara (a parte autora) não pode mexer nossa área, ele não pode querer pra ele nossa
terra. A gente precisa muita área”.

Na mesma ocasião, o funcionário da FUNAI Tennesson Gonçalves de Oliveira


comentou que tanto os Zorós quanto os Gaviões haviam encaminhado à FUNAI
reivindicação acerca do “território deles que ficou fora da demarcação”, e que o
processo estaria em estudo na direção do órgão em Brasília.

Resumindo aqui a resposta aos quesitos deste tópico, temos que a Terra
Indígena Zoró encontra-se regularmente demarcada e homologada, e lá habitam de
forma permanente os índios Zorós, que a utilizam integralmente para sua reprodução
física e sócio-cultural. A região noroeste de Mato Grosso e sul de Rondônia vêm sendo
ocupada pelos grupos da família lingüística Tupi-Mondé (Cinta-Larga, Suruí, Zoró e
Gavião) desde épocas muito remotas, cuja datação precisa exigiria pesquisas
arqueológicas de vulto. Parece suficiente, contudo, para que se comprove a ocupação
indígena tradicional de forma inequívoca, uma inspeção cuidadosa das referências
extraídas da extensa documentação histórica, jornalística e administrativa. Entre outros
detalhes relevantes, esclarece-se nelas o fato de que as frentes pioneiras da sociedade
nacional, ao adentrar a região dos vales do Roosevelt, do Aripuanã e do Juruena nas
primeiras décadas do século XX, ali já encontraram uma numerosa população indígena
composta de várias etnias, dentre as quais a hoje denominada Zoró.

Os relatos dos informantes indígenas e os registros históricos disponíveis, que


acima apresentei extensamente, por conseguinte, permitem demonstrar cabalmente
que a TI Zoró, em foco na presente perícia, constitui-se em uma parcela significativa
do território que tradicionalmente os Zorós ocupavam, e que continuam a ocupar.

Todavia, o Estado de Mato Grosso persistiu por décadas no processo de


alienação das terras na região das bacias dos rios Roosevelt e Aripuanã, como se
devolutas fossem - de acordo com a Relação Nominal elaborada pela Divisão de

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Cartografia e Fotointerpretação do INTERMAT, em 2/10/1980, foram identificados 60


Títulos incidentes na então área interditada Zoró (Decreto 81.587, de 19 de abril de
1978), dos quais 29 incidindo totalmente e 31 parcialmente (Processo
FUNAI/BSB/11265/78, às fls. 558-559 dos presentes autos). De fato, como ficou
rigorosamente esclarecido, quando o Estado de Mato Grosso expediu nos anos 1950 e
1960 os títulos definitivos dos lotes ora sub judice e de outros lotes contíguos, os
grupos locais zorós detinham a ocupação plena e arcaica de toda aquela região das
imediações dos rios Branco (e seus afluentes da margem direita Canaã e Zaicondi) e
Roosevelt (e seus afluentes da margem esquerda Tiroteio e Quatorze de Abril).

A região somente foi alcançada pelas frentes pioneiras da sociedade nacional no


início do século passado, ainda assim de forma esporádica. Em parte seu isolamento
resultou da extrema hostilidade com que os Cintas-Largas, os Suruís e os Zorós
confrontavam os invasores de suas terras. A presença de seringueiros, garimpeiros,
colonos ou mesmo aventureiros era praticamente nula naquela região antes da década
de 1960. Foi a construção da estrada Cuiabá-Porto Velho que, de fato, que viabilizou o
acesso e as atividades das empresas de mineração, firmas de colonização,
agropecuárias, grileiros e posseiros, que então passaram a disputar aquelas terras aos
índios. O avanço sobre o território que estes ocupavam acarretaria, fatalmente,
seguidos conflitos entre os índios e as frentes econômicas. É então que, por dever de
ofício, o órgão indigenista deu início aos trabalhos de “pacificação” da numerosa
população indígena que vivia nos vales do Aripuanã e do Roosevelt.

Sob todos os aspectos, portanto, a demarcação e homologação da TI Zoró


resguardou uma parcela importante do território de ocupação imemorial dos Zorós,
visto que a sua presença entre o rio Branco (afluente do rio Roosevelt) e o rio
Roosevelt remete a um tempo anterior a qualquer documentação porventura existente
para as terras circunvizinhas. Como anotei acima, parte deles se afastou por dois
curtos períodos (em 1978 e em 1980) da região do rio Branco (afluente do rio
Roosevelt), em busca de refúgio temporário entre os Gaviões da TI Igarapé Lourdes.
Da mesma maneira, a invasão crescente de seu território por grileiros, posseiros e
madeireiros, ao longo da década de 1980, cerceou-lhes o pleno usufruto da zona
sudeste da TI Zoró, afinal restabelecido com a desintrusão efetivada em 1992.

Diante das evidências apresentadas, enfim, concluímos que as glebas sub judice
são parte integrante do território zoró mais amplo, seja de um ponto de vista mítico e

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Laudo antropológico – Processo 2001.36.00.001508-9
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cultural, seja pela localização histórica de suas aldeias, seja em razão da ocupação
atual destas terras por um contingente demográfico expressivo (os dados populacionais
encontram-se no próximo tópico). Quanto aos dez títulos definitivos adquiridos pela
autora a terceiros na década de 1970, por sua vez, nove deles estão sobrepostos total
ou parcialmente aos limites demarcados e homologados da TI Zoró (cfe. mapa em
anexo, “A ocupação indígena na TI Zoró”, elaborado com base nas coordenadas
disponíveis nos autos e no Mapa Cadastral da Divisão de Cartografia e
Fotointerpretação do INTERMAT, datado de 15/10/1980, com auxílio do aplicativo
Google Earth) – e, nestes termos, as partes sobrepostas da área sub judice
configuram-se inequivocamente como terras de ocupação tradicional dos índios Zorós,
a saber:

1) Lote de 10 mil hectares adquirido do Estado de Mato Grosso por Celina de


Moraes: totalmente inserido na TI Zoró;

2) Lote de 10 mil hectares adquirido do Estado de Mato Grosso por Fábio


Firmino Leite: totalmente inserido na TI Zoró;

3) Lote de 10 mil hectares adquirido do Estado de Mato Grosso por João


Benedito Barreto Neto: totalmente inserido na TI Zoró;

4) Lote de 10 mil hectares adquirido do Estado de Mato Grosso por Euclides


Marques do Vale: totalmente inserido na TI Zoró;

5) Lote de 10 mil hectares adquirido do Estado de Mato Grosso por Gregório


Ramos da Paixão: totalmente inserido na TI Zoró;

6) Lote de 10 mil hectares adquirido do Estado de Mato Grosso por Manoel José
de Siqueira Filho: totalmente inserido na TI Zoró;

7) Lote de 10 mil hectares adquirido do Estado de Mato Grosso por Donato


Teixeira da Silva: parcialmente inserido na TI Zoró;

8) Lote de 10 mil hectares adquirido do Estado de Mato Grosso por Enildes


Veruga: parcialmente inserido na TI Zoró;

9) Lote de 10 mil hectares adquirido do Estado de Mato Grosso por Antônio


José de Almeida: parcialmente inserido na TI Zoró;

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Laudo antropológico – Processo 2001.36.00.001508-9
1ª Vara da Justiça Federal - Mato Grosso

10) Lote de 10 mil hectares adquirido do Estado de Mato Grosso por José
Augusto de Figueiredo: não inserido na TI Zoró.

No decorrer da vistoria pericial e dos levantamentos posteriores, não se


encontrou evidências ou informações relevantes acerca de benfeitorias ou quaisquer
outras atividades ali desempenhadas pela autora nos lotes por ela adquiridos na
década de 1970. A título de ilustração, há de se observar que, na própria Escritura
relativa a uma área de 7.276,13 hectares, desmembrada em 14/07/1983 do Título
Definitivo emitido em nome de Euclides Marques do Vale, inserida no Processo
FUNAI/BSB/11265/78 (às fls. 470 dos presentes autos), consta expressamente a
anotação cartorial de que o imóvel destacado “não possui benfeitorias”. No mesmo
sentido, inexistem na TI Zoró outros moradores, senão os Zorós e seus familiares e
eventuais agentes públicos que ali prestam serviços de educação e saúde.

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O POVO ZORÓ E OS RECURSOS NATURAIS

Quesitos da União Federal e FUNAI


5. Os índios utilizam as terras da Terra Indígena Zoró para apropriação dos meios
indispensáveis à sua sobrevivência física e cultural e de que forma?
6. A Terra Indígena Zoró é importante para a sobrevivência física e dos grupos indígenas e seus
respectivos sub grupos?
8. Que os senhores peritos formulem outras considerações que tiverem por pertinentes.

Quesitos da Agro P ecuária Sul de Aripuanã Ltda


5. Se positiva a resposta ao quesito anterior, dividem-se, tais índios isolados, internamente, em
subgrupos? Tais subgrupos podem se cindir? Em caso de cisão, o novo subgrupo permanece no
mesmo local? Mudando-se, instalam-se em média a que distância do outro grupo? Que locais
costumam percorrer em caso de deslocamento?
6. Existem lideranças internas? Tais lideranças são questionadas? As questões quanto à
liderança podem acarretar cisão do grupo? Cindindo-se o grupo, o novo subgrupo desloca-se da
área? A que distância do outro grupo instala-se, em média?
7. (...) Com esse contato, a organização econômica e social do grupo se altera? (...).Quais as
benfeitorias, plantações, árvores existentes no local? (...).
8. Descrição da(s) aldeia(s) porventura existentes, com a respectiva população (censo
demográfico) e localização (distribuição espacial da população)? Explicitação dos critérios do
grupo para localização, construção e permanência da(s) aldeias ocupadas e o tempo em que se
encontra(m) na atual(ais) localização(ões)?
9. Descrição das atividades produtivas desenvolvidas pelo grupo, com a identificação,
localização e dimensão das áreas utilizadas para esse fim?
10. Descrição das características da economia desenvolvida pelo(s) grupo(s), das alterações
eventualmente ocorridas na economia tradicional a partir do contato com a sociedade
envolvente e do modo como se processam tais alterações?
11. Descrição das relações sócio-econômico-culturais com outros grupos indígenas e com a
sociedade envolvente?
12. Fornecer dados sobre as taxas de natalidade e de mortalidade do(s) grupo(s) nos últimos
anos, com indicação, na hipótese de identificação de fatores de desequilíbrio de tais taxas e
projeção relativa ao crescimento populacional do(s) grupos(s)?
13. Descrição dos aspectos cosmológicos do grupo, das áreas de usos rituais, cemitérios,
lugares sagrados, sítios arqueológicos etc. explicitando a relação de tais áreas com a situação
atual e como se objetiva essa relação em caso concreto?
14. Identificação e descrição das áreas necessárias à reprodução física e cultural do grupo
indígena, explicitando as razões pelas quais são elas necessárias ao referido fim?
15. Outros esclarecimentos úteis?

Neste tópico enfocaremos a organização social, os contingentes demográficos, a


situação das aldeias atuais e os usos que os Zorós fazem dos recursos naturais,
necessários à sua reprodução sócio-cultural e à sua subsistência, bem como certos

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aspectos sociais e culturais mais relevantes. No que diz respeito aos dados etnográficos
sobre os Zoró, além do que foi observado e registrado em campo, compulsei os
estudos levados a cabo por Gambini (1984b), Maldi (1994) e Brunelli (1989).

De acordo com Maldi (1994; ver também Brunelli, 1987a), a sociedade zoró
apresentava-se sob a forma de grupos locais (ou aldeias), de dimensões variadas
(entre algumas dezenas e, talvez, pouco mais de uma centena de pessoas), que
ocupavam diferentes pontos do território tradicional e eram dotados de autonomia
política e econômica. Na ausência de uma autoridade ou poder político centralizado,
não eram incomuns no passado eventuais cisões, disputas e refregas; todavia, laços de
parentesco e obrigações rituais e festivas favoreciam a manutenção de relações de
aliança e cooperação. Do mesmo modo, contribuíam as funções xamânicas, para as
quais costumavam recorrer a grandes chefes, amplamente reconhecidos e requisitados.

Cada grupo local compunha-se de uma a várias famílias extensas – uma


unidade de consangüíneos e afins -, reunidas em torno de um homem de prestígio
(zapijaj, o dono-da-casa). De acordo com a antropóloga Denise Maldi:

“Cada grupo local era formado por famílias extensas – um grupo de consangüíneos e
afins reunidos em torno de um homem de prestígio – o fundador – e habitava um local
nominado e conhecido dos demais. (...)
A unidade local abrigava-se na grande casa coletiva, a ‘maloca’. Em função de pressões
demográficas, esses grupos eram flutuantes, isto é, podiam se dissolver e novos eram
formados. (...) A dimensão demográfica de cada maloca podia variar de 80 a 150
pessoas – cifras muito comuns nesse tipo de organização social.
A maloca abrigava também os mortos: os Zoró não tinham cemitérios, mas enterravam
os mortos dentro das malocas, o que lhes conferia um caráter sagrado” (Maldi, 1994, p.
182-183).

No período anterior ao contato, uma aldeia zoró comportava, normalmente, de


uma a três grandes malocas oblongas, os roçados a pouca distância e as trilhas de
caça que dali partiam radialmente. A filiação a tais grupos locais, ainda hoje,
reconhece-se através da linha paterna. Por sua vez, para os jovens casais a residência
uxorilocal, ao menos temporária, pautava-se pelas obrigações e os serviços que o
marido devia prestar ao seu sogro – exigência de pouco alcance, na verdade, dada a
predileção por casamentos endogâmicos, entre membros de um mesmo grupo local.

A escolha matrimonial entre graus próximos, em larga medida, resulta do


próprio regime de alianças que caracteriza o sistema de parentesco que ali vigora. Os
Zorós consideram incestuosa a união de primos paralelos (filhos de irmãos de mesmo
sexo), reais ou classificatórios; todavia, privilegiam duas outras modalidades

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“consangüíneas”: segundo Brunelli (1989), em meados dos anos 1980 um terço dos
casos estudados correspondia a casamentos avunculares (entre tio materno e
sobrinha) e um terço a casamentos de primos cruzados (entre filhos de irmãos de sexo
oposto), reais ou classificatórios, o restante não parecia implicar em relações
significativas. O sistema de parentesco zoró, em seus traços principais, assemelha-se
aos dos demais povos tupis-mondés, reconhecidos pela inflexão matrimonial avuncular
e suas projeções oblíquas na terminologia. Contudo, há evidência de alterações
recentes que sugerem uma tendência à equalização geracional (em particular, o uso de
um único termo para o tio materno e a tia paterna, kutkut), e uma preferência mais
acentuada por casamentos entre primos cruzados. Para ego masculino, os demais
termos vocativos são: avôs e avós, de ambos os lados, kutkut; pai e irmão do pai,
papa; mãe e irmã da mãe, ngaj; irmã e primas paralelas, mbat, e irmão e primos
paralelos, zano; filhos próprios e filhos do irmão, netup (m) e wajit (f); sobrinhos
(filhos da irmã) e primos cruzados patrilaterais (filhos da irmã do pai), opep (m) e õzaj
(f); primos cruzados matrilaterais (filhos do irmão da mãe), ma-kaman (“filhos dos
outros”, ou seja, quase não-parentes); e netos, nzerat.

Por volta da década de 1960, os Zorós compunham-se de nove ou dez grupos


locais, distribuídos em quinze ou dezesseis malocas, e uma população de quase mil
pessoas: os Zabeap Wej com três malocas, os Pangyjej Tere com cinco malocas, os
Joiki Wej, os Jej Wej, os Pama-Kangyn Ej, os Maxin Ej, os Ii-Andarej, os Pewej, os
Angojej e, provavelmente, os Kirej, cada um destes com somente uma maloca
(Brunelli, 1987a; 1989). No inventário que conduziu em 1992, com a ajuda de
informantes mais velhos, a antropóloga Denise Maldi (1992) identificou quarenta e sete
antigas aldeias, dentre os diversos grupos locais, por todo o território zoró (ver croquis
abaixo). Destas, oito aqui nos interessam por se situarem na ora área sub judice, entre
a margem esquerda do rio Roosevelt e a margem direita do rio Branco (ver croquis
abaixo; a listagem foi publicada em Maldi, 1994, p. 198-200), a saber:

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Nome da aldeia Tradução Localização

Do’ei não traduzido médio Canaã


Zaptchan-ku-uei casa boa acima da anterior
Barandô-tchi seringal próximo da foz do Canaã
Goiuêna-uên terra boa abaixo da foz do Canaã
Zaicondi homônimo do rio cabeceira do rio homônimo
Yara-uá-nêm-uê ? acima da anterior
Pangô-wenei aldeia central acima da anterior, área de serras
a meio caminho, entre o Roosevelt e o Branco, local
Dôe-uei ?
das serras

Tabela 2: Aldeamentos zorós à esquerda do rio Roosevelt


(Maldi, 1994, p. 199-200)

Com relação aos deslocamentos populacionais de então, como ilustração,


vejamos estes eventos descritos por aldi: em fins da década de 1950 a aldeia
Wentagá-tchi localizava-se na margem esquerda do rio Roosevelt, acima da foz do
afluente Quatorze de Abril; por volta de 1966, este grupo estava nas cabeceiras do rio
Tiroteio, na aldeia Ü-pê-urei, do qual surgiram outras aldeias que se expandiram até o
rio Zacoindi:

“A aldeia Ü-pê-urei, no Tiroteio, concentrou a maioria dos grupos locais na época


próxima ao contato (...).
Durante o período de abertura do picadão, a partir da fazenda Muiraquitã, havia sete
grandes malocas nas cabeceiras do rio Canaã, variando de 2 a 5 km de distância entre
si. Os índios viam os brancos, mas os brancos não viam os índios, já que esses os
observavam trabalhar, sem contudo interferirem.
Em 1967 havia 6 malocas grandes nas cabeceiras do Tiroteio e 3 malocas grandes no
Zacoindi.
Sertanistas da FUNAI deixaram presentes na aldeia Boborei, que estava desocupada,
porque o último grupo a viver lá havia se deslocado para as cabeceiras do Zacoindi.
Havia ainda outro grupo no aldeamento Pacôuandô, na margem esquerda do alto rio
Branco, abrigados em duas grandes malocas e bem distantes, portanto, das demais”
(Maldi, 1994, p. 201-202).

Para os tupis-mondés, em geral, as aldeias antigas ou abandonadas constituem


uma espécie de cemitério, em razão dos seus costumes funerários – entre os quais, a
restrição a dizer o nome dos mortos. Eles eram sepultados no interior da casa,
enrolados na rede, a pouco mais de um metro de fundura; seus pertences eram
destruídos e os animais domésticos, sacrificados. Por esta a razão, encontram-se
muitos afloramentos de cacos de cerâmica e instrumentos líticos nos locais
anteriormente habitados. De modo que as capoeiras de antigas aldeias, que atestam a
ocupação indígena ancestral, apresentam-se aos Zorós como um substrato que atualiza
a memória histórica e as tradições que receberam de seus avoengos que ali viveram.

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Figura 21: Aldeamentos zorós de 1900 a 1980


(Maldi, 1994, p. 196)

Suas roças, em geral, situavam-se nas imediações das aldeias. Os homens


derrubavam a mata e preparavam o terreno, enquanto as mulheres respondiam pelo
plantio e pela colheita. Cultivavam sobretudo espécies de mandioca mansa, feijão,
amendoim, diferentes tubérculos, banana, algodão, tabaco, pimenta etc. A mandioca
brava e o milho eram cultivados em quantidades maiores, tanto para o consumo de
alimentos sólidos como para a fabricação das bebidas.

Atividade marcadamente masculina, os Zorós praticavam a caça somente


durante o período diurno; sós ou em grupo, com esmerados arcos e flechas,
percorriam trilhas costumeiras nos arredores das aldeias, explorando assim uma zona
circular de cinco a quinze quilômetros de raio. Os meninos, desde muito cedo,
brincavam com miniaturas de arcos e flechas, um treino progressivo para a vida adulta.

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Já adolescentes, mostravam-se hábeis no seu uso e fabricação, além dos


conhecimentos sobre os hábitos animais e a floresta em geral. Havia diversas
interdições ao consumo da caça abatida, e apenas os mais velhos podiam alimentar-se
de todas as espécies animais, com exceção de felinos, veados e urubus. Durante a
estação seca, sobretudo, organizavam grandes pescarias coletivas, batendo timbó nos
pequenos cursos d’água, vasculhando lagos quase secos ou flechando nos grandes
rios.

Conforme demonstrou o perito antropólogo Darci Pivetta, no laudo que


apresentou acerca de um imóvel situado na TI Aripuanã (Processo 93.00.01751-9, da
1ª Vara da Justiça Federal, Seção de Mato Grosso), estima-se que na Floresta
Amazônica o território de caça e pesca utilizado por cada aldeia indígena corresponda a
uma circunferência de 282,7 mil hectares, posto que o “raio de dispersão” dos
caçadores chega a alcançar 30 quilômetros em média, Vejamos os croquis abaixo que
ilustraram sua exposição do caso:

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Figura 22: O território de caça de uma aldeia


(Pivetta, 1996)

Dado o número e a distribuição das aldeias na TI Aripuanã, bem como a


situação que vigorava no passado, aquele perito argumentou, de modo convincente,
que toda a extensão de 752.649 hectares demarcados em favor dos Cintas-Largas
eram de fato indispensáveis para a manutenção das suas atividades de caça. E
acrescentou:

“Considere-se que a cada três ou cinco anos há troca de aldeia, cujo retorno ocorre
após 25 a 30 anos, quando então a mata, bem como a fauna, está refeita. São
necessários então quatro espaços territoriais idênticos até o retorno ao mesmo local.
Com isso tem-se uma idéia aproximada do território necessário para uma sociedade de
caçadores. A caça é uma atividade constante para o abastecimento de proteínas, daí o
esgotamento pelo uso de 3 a 5 anos” (Pivetta, 1996, p. 77-78).

Se realizarmos o mesmo exercício com relação à TI Zoró, veremos que a


totalidade de sua extensão é absolutamente imprescindível à continuidade das
atividades de caça e pesca praticadas pelos Zorós. Restrições territoriais impostas às

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terras indígenas (bem como a passagem de estradas, como hoje se observa em ambas
as áreas) têm implicado não apenas em maior disputa de caçadores e aldeias por
espaço e oportunidades, mas sobretudo uma ameaça efetiva à reprodução e a
manutenção do atual estoque de recursos cinegéticos naquele ecossistema.

Figura 23: A ocupação do território Zoró


(Gambini, 1984b, p. 19)

No croquis acima o antropólogo Gambini (1984b) assentou os locais de caça,


pesca, extração de argila, coleta de frutos e matérias primas, posicionando também as
nove aldeias em que os Zorós habitavam por ocasião dos primeiros contatos:
Posanwip, Za’ap, Maxianzap, Porena, Tandaro, Pajo, Pago-Awa, Xoryt e uma segunda
também denominada Posanwip - alguns desses nomes, ao que parece, referem-se aos
respectivos chefes das aldeias. As aldeias distavam horas, ou mesmo dias de

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caminhada umas das outras. Tal forma de distribuição espacial assegurava um uso
equilibrado dos recursos naturais disponíveis, além de autonomia política. Como
explicou Luiz Matianzap, por ocasião da vistoria pericial, através do método de pousio
das áreas mais intensamente exploradas era possível assegurar a sua ampla
recuperação ecológica, dando ensejo a um novo ciclo de ocupação humana:

“A gente morava assim. Vocês perguntam por que morou do outro lado também? A
gente morava assim, deixava esse lado livre, pra crescer os animais, os peixes
voltarem, o mato crescer, a capoeira crescer. Depois de um tempo, voltava para aquele
lugar. Os animais, anta, jacamim, paca, já voltaram, os peixes já voltaram. Por isso que
nós fazíamos assim, atravessava para o outro lado do rio Branco, ficava mais ou menos
uns vinte anos pra lá, e depois voltava para reabrir as mesmas aldeias. Voltava a morar
nas mesmas aldeias, enquanto lá do outro lado estava recuperando. É assim que nós
vivíamos” (Luiz Matianzap, 21/10/2015).

Segundo Gambini (1984b, p. 18), os deslocamentos das aldeias, a cada quatro


ou cinco anos, deviam-se à escassez de caça no raio de dispersão dos caçadores
(calculado em aproximadamente trinta quilômetros), sendo necessário certo rodízio
entre espaços ecológicos para assegurar a recomposição da fauna. Da mesma maneira,
os deslocamentos se impunham com relação a outros itens da coleta:

“Os caniços usados no fabrico de flechas não são facilmente encontráveis, sendo
necessários até vários dias de caminhada para se atingir os raros pontos em que
crescem. E assim com todos os demais elementos coletados, de frutos silvestres até
mel (absolutamente essencial à dieta), barro para as panelas, ervas e cipós medicinais,
resinas, etc. A extração do recurso natural, não sendo predatória, pressupõe um
período de repouso das fontes para evitar o esgotamento e garantir a continuidade
dessa forma típica de produção econômica” (Gambini, 1984, p. 18).

Todavia, quando retornaram do Igarapé Lourdes, os Zorós foram aglutinados


no posto da Frente de Atração da FUNAI, erguido em 1978 nas proximidades da antiga
aldeia Bubyrej, a quinze quilômetros da margem direita do rio Branco; ali
permaneceram até 1992 quando todos os invasores foram retirados da área
demarcada. Por mais de seis anos, o chefe de posto Natalício Maia serviu-lhes de
capataz geral, deliberadamente impedindo-os de deambularem por seu território, ao
mesmo tempo em que cultos evangélicos ganhavam maior regularidade (Hargreaves,
1992). À época, tão-somente, costumavam visitar as fazendas mais próximas,
especialmente a Muiraquitã e a Castanhal, onde comiam, dormiam e compravam algum
suprimento com o dinheiro da venda de artesanato. O antropólogo Roberto Gambini,
da equipe de avaliação do Programa Polonoroeste, que ali esteve em 1983, observou
que o chefe de posto tomara a si a organização das principais atividades diárias.

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Homens e jovens (num total de 45) foram submetidos a um estafante regime semanal,
para aprender a “trabalhar como branco”:

“Antes das 7 horas, já são convocados os que se demoram em suas casas. Tomado o
café na cozinha, a um sinal do chefe, partem todos em fila, bota de borracha, chapéu
de palha e facão na mão. Às 11:30, assoviando como nhambu, chama a turma para o
almoço [arroz, feijão e macarrão]. À tarde há mais quatro horas de trabalho” (Gambini,
1983).

A disciplina imposta aos Zorós tinha por objetivos a expansão desmesurada das
áreas cultivadas nas imediações posto e a abertura de uma estrada até a fazenda
Castanhal. Em 1984 a área desmatada já alcançava 40 alqueires, ainda que os
excedentes de milho, arroz e outros produtos fossem desperdiçados, porque não havia
formas de escoamento. De certa maneira, a compulsão ao trabalho, tal qual uma “ética
protestante”, prestava-se antes de tudo à reafirmação cotidiana da autoridade da
FUNAI, um exemplo eficaz de sua missão civilizatória. As atividades de caça e coleta
limitavam-se aos sábados; os domingos estavam reservados ao culto evangélico. Às
sextas-feiras o chefe de posto comandava a distribuição dos brindes semanais, apenas
aos mais assíduos ao “trabalho coletivo”: algumas pilhas, sabão, quatro espoletas,
umas 50 gramas de pólvora, chumbo, querosene, sal. Efeito direto de tal regime de
trabalho, a dieta de mulheres e crianças reduzia-se a mandioca e milho, pois o almoço
na cozinha do posto era servido apenas aos homens que trabalhavam. Segundo o
antropólogo Gambini (1983):

“O índio agora recebe ordens para trabalhar em sua própria terra, em roças que não
escolheu, em quantidades que não planejou, a troco de brindes e de um excesso de
grãos que não pode consumir e não sabe vender.”

Nesta mesma direção, a tendência à “urbanização” da aldeia, desmembrando a


população em famílias nucleares, em casas quadrangulares dispostas ortogonalmente,
de piso elevado e cozinha em anexo, que refletia as mudanças que ocorriam na própria
organização social.

Em setembro de 1984, havia trinta e cinco unidades residenciais no posto da


Frente de Atração, sendo quatro malocas e trinta e uma casas quadradas, com
variação de 2 a 11 pessoas por unidade, e média de 4,9 (Brunelli & Valle, 1984). Já em
1992, a aldeia compunha-se de duas malocas e sessenta e uma casinhas rústicas, com
cozinhas anexas, em forma de arruamento (Hargreaves, 1992).

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Figura 24: A urbe zoró em 1984


(Gambini, 1984b)

Por volta de 1985, alguns Zorós empregaram-se na extração de borracha, com


o objetivo de auferir dinheiro para a compra de mercadorias de consumo. Os
resultados, porém, nunca foram muito significativos. Da mesma maneira, uns poucos
artigos artesanais negociados ocasionalmente com funcionários da FUNAI ou regionais,
com retorno pouco expressivo. De maior monta, e efeitos duradouros, o envolvimento
dos Zorós na exploração comercial da madeira, associados a firmas madeireiras que ali
atuavam à margem das leis florestais e fiscais.

Tão logo retirados os invasores no início da década de 1990, os Zorós


apossaram-se das casas abandonadas, retomando um padrão residencial de grupos
menores. Concomitante, deu-se início à exploração madeireira, desta feita com o
beneplácito dos próprios índios – os madeireiros forçaram a retirada da barreira de
fiscalização e contavam com a conivência dos agentes da FUNAI e do IBAMA. Durante
aquela década, o comércio de madeira ganhou o status de principal atividade

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econômica, através da qual os Zoró adquiriam alimentos, viabilizavam a compra de


veículos e combustível, abriam estradas e construíam casas e instalações nas aldeias.
Num primeiro momento, cerca de metade da população foi residir na Barreira (a atual
aldeia Zawã Kej Alakit). Pouco depois, outras aldeias intermediárias foram surgindo,
aproveitando os eixos das estradas que cruzam a área (Hargreaves, 1993). A frota de
veículos cresceu bastante: em 1993, após um ano de “economia da madeira” já
possuíam um pequeno caminhão, três camionetes e dois carros de passeio. Parte dos
recursos foi investido na compra de gado, para ocupar os quase cinqüenta mil hectares
de pastos já formados.

A interdição das atividades madeireiras na área Zoró, a partir do segundo


semestre de 1993, deu-se depois da operação de apreensão de madeira pela Polícia
Federal, FUNAI e os próprios Zorós, com o apoio decisivo do Ministério Público Federal.
A partir daí, intensificou-se o movimento de rearticulação dos grupos locais, com a
fundação de várias aldeias novas e a retomada ou adaptação de um padrão tradicional
de organização social, a partir de pequenas unidades mais autônomas, distribuídas em
todo o território.

Na tabela e no gráfico abaixo temos a série histórica de dados disponíveis sobre


a população zoró, recenseada por diversos pesquisadores. Observamos que, aapós a
brusca queda nos primeiros anos do contato, população zoró cresceu a taxas elevadas
nas últimas três décadas, em torno de 4,3% ao ano. Ao que parece, se os últimos
dados estão corretos, a taxa de crescimento vem decaindo aos poucos, e estaria mais
próxima da média nacional, em torno de 2,2%. Na última década, a média de
nascimentos foi de 35,1 por mil habitantes/ano; e a taxa de mortalidade oscilou entre
1,5 e 6,4 óbitos por mil habitantes/ano.

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Ano Pop. Local Fonte


1977 350 Praxedes, 1977
1980 175 Igarapé Lourdes Moore, 1981
152 F. A. Zoró
1981 Projeto Rondon/UFMT, 1981
36 Igarapé Lourdes
175 F. A. Zoró
1983 Gambini, 1983
32 Igarapé Lourdes
169 F. A. Zoró Brunelli & Vallee, 1984; Brunelli & Cloutier,
1984
34 Igarapé Lourdes 1986
194 F. A. Zoró
1985 Brunelli & Cloutier, 1986
34 Igarapé Lourdes
1987 211 F. A. Zoró Gambini, 1987
1987 14 Igarapé Lourdes Moore, 1987
1988 200 F. A. Zoró Coimbra & Santos, 1989
1989 218 Zoró FUNAI, apud CEDI 1991
237 Zoró
1992 Hargreaves, 1993
20 Igarapé Lourdes
2000 400 T. I. Zoró FUNAI apud ISA, 2000
2003 464 T. I. Zoró FUNASA, apud ISA, 2006
2006 540 T. I. Zoró Associação Pangyjej, 2006
2008 599 T. I. Zoró FUNAI/CGDC - AER Ji-Paraná
2015 673 T. I. Zoró SESAI, 2015

Tabela 3: Série histórica da demografia zoró

Figura 25: Dinâmica demográfica zoró, 1977-2015

De acordo com os dados de novembro de 2015, fornecidos pela SESAI –


Secretaria Especial de Saúde Indígena, os Zorós contam agora com vinte e cinco
aldeias, nas quais residem 672 pessoas, conforme a tabela abaixo – é preciso notar,
com relação a este total, que há muitos Zorós em núcleos urbanos e várias famílias
vivendo entre os Gaviões, aqui não computados:

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População
ALDEIA Coordenadas
(nov/2015)
Abesewap 13 10° 44’ 05,55” 60° 44’ 17,31”
Anguj Tapua (Santa Maria) 60 10° 39' 04.75" 61° 07' 41,78"
Barãjurej (Seringal) 10 10°33'51.89 60°42' 08,03"
Bubyrej (Central) 48 10° 28’ 33,99” 60° 56’ 30,20”
Casa Verde (antigo Posto Fiscal) 10° 51’ 12,54” 60° 46’ 34,79”
Duabiyrej (Caneco) 18 10° 19’ 31,94” 60° 44’ 22,22”
Duãjurej (Serrinha) 55 10° 35’ 57,59” 60° 42’ 34,26”
Escola Zarup Wej 14 10° 39’ 33,03” 60° 34’ 19,15”
Escola Zawa Karej 14 10° 24’ 20,38” 61° 01’ 24,95”
Gala Anjut 17
Guwã Puxurej 74 10° 53’ 27,40” 60° 48’ 41,11”
Ikarej 15 10° 53’ 47,27” 60° 52’ 10,88”
Inbepuaxurej 25 10° 12’ 53,23” 60° 53’ 24,82”
Ipe Wyrej 36 10° 31’ 07,87” 60° 51’ 07,09”
Ipisirei 10
Japara 5 10° 52’ 12,84” 60° 47’ 47,68”
Pãjyrawã 20 10° 34’ 02,97” 60° 49’ 09,61”
Paraiso da Serra 23 10° 48' 21,80” 60° 43' 31,14”
Pawanewa 37 10° 24’ 30,92” 61° 01’ 35,10”
Payo 4
Rio Azul (Zawup) 10 10° 24’ 14,16” 61° 01’ 26,91”
Santa Cruz 13 10° 42’ 18,92” 60° 34’ 45,94”
Tamali Syn 77 10° 29’ 07,77” 60° 41’ 41,88”
Webaj Karej 32 10° 54’ 45,00” 60° 51’ 02,29”
Zawã Kej Alakit (Barreira) 42 10° 57' 31,58” 60° 53' 52,31”

Tabela 4: População zoró em novembro de 2015


(SESAI, 2015)

A conversão massiva ao evangelismo fundamentalista, sob a influência da


Missão Novas Tribos do Brasil e de igrejas batistas de Rondônia, levou os Zorós a
abandonar, de maneira abrupta, quase todas as práticas xamânicas, as concepções
cosmológicas e o rico corpus mitológico que compunham o modo de vida tradicional.
Passados poucos anos dos contatos iniciais, até mesmo a investigação destes e de
outros aspectos de suas tradições esbarrava na religião evangélica, como constataram
os antropólogos Brunelli e Vallee (1984).

Cultos, rezas e curas espirituais são hoje ministrados quase diariamente por
pastores indígenas, cujo treinamento e orientação encarregaram-se os missionários da
MNTB, ora sediados em Ji-Paraná (RO). As narrativas bíblicas, traduzidas e
memorizadas na língua materna, são evocadas em sermões e solenidades públicas,
bem como servem aos novos juízos morais e preenchem a conversação doméstica.
Ápice do processo de transfiguração por que passa a cultura zoró, os batismos

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coletivos, por meio da imersão dos iniciandos em lagos ou rios, assinalam a


substituição do demiurgo Gorá, o inventor do mundo, dos homens e dos bens culturais
para os povos tupis-mondés, pelo Deus cristão professado pelos evangélicos batistas.

Já no início da década de 1980, impressionou o antropólogo Gambini (1983) o


empobrecimento cultural generalizado. Um único ritual substituia os anteriores: o culto
protestante, monótono e repetitivo - passagens do Gênese, louvores a Jesus Cristo,
hinos em língua Zoró. Quatro anos depois, o mesmo antropólogo (Gambini, 1987)
encontrou-os mais fervorosos ainda, sendo os cultos realizados diariamente. Liderados
por um pastor zoró, os “crentes” compartilham relatos bíblicos, confissões públicas,
testemunhos de fé, hinos, passes de mão e atendimento a doentes. Impactados pela
nova religião e pela convivência com outros índios cristianizados, os Zorós acataram
inúmeras intromissões diretas em sua ordem social e em sua cultura: os pajés foram
afastados de suas funções, a poligamia foi proibida, e as práticas cotidianas estão
agora submetidas ao escrutínio de uma estreita noção de pecado, que os obriga ao uso
de roupas, interdita rituais, festas, instrumentos musicais, adereços e, sobretudo, a
ingestão de bebidas fermentadas.

Ao lado disto, um acelerado processo de mudanças sociais, culturais e


econômicas irrompeu nos últimos anos, no seio de um conturbado contexto regional e
nacional, e alcançou indistintamente todos os povos tupis-mondés. Entre outros
aspectos relevantes, a função de zapijaj (o “dono-da-casa” ou cacique) tem ampliado
seu alcance político e econômico, e responde agora a novas atribuições e a obrigações
antes exercidas pela FUNAI. Todos os líderes indígenas locais envolveram-se, em maior
ou menor proporção, nos negócios com madeireiras para, em troca do mogno, do
cedro e da cerejeira, adquirir veículos, abrir estradas, derrubar e plantar roças
mecanizadas, instalar energia e antenas parabólicas nos postos e aldeias, comprar
casas nas cidades vizinhas etc.

Desde 1987, quando diversos contratos irregulares foram assinados pela própria
FUNAI, as áreas indígenas na região noroeste de Mato Grosso e sul de Rondônia foram
escancaradas à exploração ilegal de madeira, envolvendo funcionários e fazendo
sucumbir a resistência das lideranças indígenas. Embora os contratos tenham sido logo
embargados pela Justiça Federal e pelo Tribunal de Contas da União, as atividades
ilícitas prosseguiram, crescendo ano a ano em volume e alcançando mais grupos
indígenas e novas áreas de exploração. As instâncias locais da FUNAI e dos demais

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órgãos governamentais mantiveram-se omissas e, na maior parte das vezes,


coniventes e corrompidas. As práticas rotineiras de extorsão, sob variadas formas,
sujeitaram dirigentes e servidores públicos aos interesses predatórios de madeireiros e,
ultimamente, de empreiteiros do garimpo e contrabandistas. Estima-se que a maior
parte da madeira extraída nos municípios de Juína, Aripuanã e Rondolândia, nas duas
últimas décadas do século passado, tenha saído das terras indígenas. As firmas
madeireiras ali agiram com desenvoltura por quase vinte anos - sem planos de manejo
ou medidas de controle ambiental, sempre dispuseram, todavia, das indispensáveis
autorizações e guias fiscais para o transporte, o comércio interestadual e a exportação
das tábuas e toras de mogno, cerejeira, angelim, ipê e demais madeiras nobres dali
extraídas.

Em todos os sentidos, os resultados são trágicos. O prolongado processo de


aliciamento das lideranças e das comunidades Cintas-Largas, Suruís e Zorós, com
certeza, incrementou a dependência e o consumismo. Alcoolismo, drogas, prostituição,
desnutrição, desagregação social e o aumento da mortalidade, inclusive por acidentes
de veículo, solaparam a vida comunitária e as tradições culturais, conforme
amplamente veiculado na imprensa.

Como reação a este quadro, as lideranças zorós mobilizaram novas formas de


organização, destacando-se a Associação do Povo Indígena Zoró (APIZ), mais
conhecida como Associação Pangyjej, fundada em 1995 e registrada em 1997. Junto a
outras organizações indígenas, a APIZ envolveu-se na execução do Componente
Indígena do Programa Planafloro, o Plano Agropecuário e Florestal financiado pelo
Banco Mundial, voltado ao desenvolvimento sustentável do Estado de Rondônia. De
forma participativa, a Associação elaborou o projeto “Sócio Econômico e Cultural do
Povo Zoró”, com ênfase nos consórcios agroflorestais com essências frutíferas e
florestais e na produção de um documentário que retratou o povo e arte dos Zorós,
além de atividades de capacitação em associativismo.

Como principal linha de ação, contudo, a Associação Pangyjej tem buscado


contrapor-se ao assédio de madeireiros e outros interessados nas riquezas das terras
indígenas. Só muito recentemente os órgãos públicos responsáveis tomaram medidas
mais eficazes para coibir o aliciamento, bem como os danos ambientais e o esbulho do
patrimônio público decorrentes.

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Um cenário da situação dos Zorós quanto ao uso dos recursos naturais de sua
área foi elaborado em 2003 e 2004pelo GERA, um núcleo de pesquisa da Universidade
Federal de Mato Grosso, com o objetivo de subsidiar programas regionais a serem
apoiados pelo PNUD – Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento. No
relatório apresentado por Mendes do Santos (2004), destacava-se a decisão dos Zorós
em manter uma barreira e uma equipe permanente de fiscais para impedir a evasão e
o roubo de madeira de suas terras. Ao mesmo tempo, os Zorós assinaram um acordo
com os condôminos da APROVALE (a denominação atual do “Condomínio Lunardelli”) e
com a fazenda Peralta para a utilização por estes das estradas que atendem aos
mesmos, cruzando a área indígena. Em troca da concessão de uso das estradas, cujo
tráfego os fiscais Zorós controlavam, a Associação Pangyjej recebia bens diversos –
como cabeças de gado, veículos e combustível. Ademais, várias aldeias utilizam agora
as pastagens formadas pelos posseiros para a prática de criação de gado, construindo
pequenos currais e cercas próximo das residências.

Ao mesmo tempo, várias aldeias estão utilizando as pastagens formadas pelos


posseiros para manter pequenos rebanhos, construindo currais e cercas perto das
residências. No entanto, devido à inexperiência no trato do gado, inicialmente algumas
aldeias firmaram contratos com pecuaristas da região, para uso das pastagens para
criação e engorda de gado; em contrapartida, os pecuaristas comprometiam-se com as
benfeitorias necessárias e com o pagamento anual em bezerros, bem como a
capacitação de vaqueiros zorós. Em 2003, estavam em execução cerca de cinco
contratos, envolvendo aldeias próximas às pastagens. Tal situação alterou-se nos
últimos anos, e vem crescendo o rebanho próprio em algumas aldeias: na Paraíso da
Serra, o cacique Miguel Zan informou que possuem mais de 500 cabeças; e na Anguj
Tapu, situada na área ora sub judice, observei a construção de cercas para receber 50
cabeças que haviam adquirido de um fazendeiro vizinho.

Com o apoio de um projeto proposto por PNUD e FEMA/MT, a Associação


Pangyjej vem desenvolvendo um sistema de coleta e comercialização de castanha-do-
Brasil, contando com o empenho entusiasmado de quase todas as aldeias. Na safra de
2002-2003, os Zorós comercializaram cerca de 40 toneladas de castanha em casca, ao
preço de R$ 0,60 a R$ 0,80 o quilo; já a safra seguinte alcançou 60 toneladas,
comercializada a R$ 1,00 o quilo. Segundo Mendes dos Santos (2004, p. 39-40), o
volume de castanha coletado e comercializado pelos Zorós constituía, no estado de
Mato Grosso, o “mais significativo empreendimento do ramo”. Entre 2005 e 2012, a

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APIZ movimentou mais de um milhão de reais em recursos de empréstimo do


Programa de Aquisição de Alimentos (PAA) da CONAB, o que permitiu pagar preços
melhores aos próprios castanheiros zorós (Pacto das Águas, 2013, p. 24). Na safra
2014/2015, segundo me informaram por ocasião da vistoria pericial, a produção total
somou 80 toneladas, e a previsão é aumentar para 100 toneladas em 2015/2016. Em
particular, na aldeia Anguj Tapu, situada no setor oeste da área ora sub judice, foram
colhidas 250 sacas de castanha - algo entre 15 a 20 toneladas.

Noutra direção, a Associação Pangyjej iniciou uma parceira com o Programa de


Artesanato Indígena da FUNAI/ARTINDIA, para a comercialização regular de itens da
cultura material. A produção e a venda de artesanato, neste caso, favoreceram uma
maior autonomia das mulheres na obtenção e na aplicação da renda familiar.

A educação escolar teve início em 1989, na aldeia Bubyrej (“Central”), já com


professores indígenas. À época, os professores se valiam de cartilhas na língua Gavião;
entre 1991 e 1994, o pastor luterano Ismael Tressmann, a lingüística Ruth Montserrat
e o professor Waratã Zoró formularam uma nova proposta ortográfica e um livro de
textos com histórias do povo Zoró (Tressmann, 1994). Naquele ano havia apenas duas
escolas nas aldeias maiores; em 2005, já eram dez, além da escola pólo Zawã Karej.
Inaugurada no segundo semestre de 2002, esta Aldeia Escola possui um complexo de
construções em estilo tupi-mondé, entre salas de aula, refeitório, alojamentos e
banheiros, que atende cerca de oitenta alunos do primeiro ciclo do ensino fundamental
em regime de alternância, parte do mês estudando em período integral, parte em suas
aldeias de origem. De lá para cá, outras escolas entraram em funcionamento, inclusive
a nova escola polo na Aldeia Escola Zarup Wej, também em regime de alternância,
para o atendimento dos alunos das ,ldeias próximas ao rio Branco.

A introdução de inúmeros objetos de consumo e de roupas, nas últimas


décadas, resultou em alterações substantivas no ritmo de vida e nas atividades a que
se dedicam hoje os membros das comunidades indígenas, como pude observar nas
aldeias zorós que visitei durante os trabalhos periciais. Ainda assim, são de extrema
importância certas matérias primas que empregam em seus artefatos, as quais se
encontram desigualmente distribuídas nos seus territórios - destas, os vários tipos de
palha, a taquara, a taboca para ponta de flecha e o fruto da xikaba para os colares
merecem destaque.

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Do ponto de vista dos recursos naturais e seus usos pelos Zorós, por
conseguinte, a ocupação indígena caracteriza-se levando em conta os seguintes itens:
os locais de moradia; os terrenos das roças e capoeiras; os territórios de caça; os rios e
córregos onde pescam e batem timbó; as concentrações de castanheiras e de outras
fruteiras do seu cardápio de coleta; os trechos da floresta que oferecem as matérias
primas vegetais que utilizam, principalmente palhas, enviras, pequenos cocos,
taquaras, madeiras especiais para arcos e flechas, resinas, xikaba etc.; os nichos
ecológicos onde vicejam as plantas de sua farmacopéia; os morros e as serras mais
áridas onde encontram as colméias de abelha, fontes de mel silvestre; e, além de
outros recursos de uso tradicional, agora as reservas de madeira que estão
eventualmente explorando com fins comerciais e as pastagens onde apascentam
pequenos rebanhos. Muito embora não exaustiva, esta listagem de recursos e de locais
necessários à subsistência e à reprodução sócio-cultural dos dos Zorós proporciona um
mapeamento adequado de sua ocupação territorial atual. Além dessas utilidades
materiais, temos ainda os locais referidos nos relatos míticos, os sítios de antigas
aldeias, os cemitérios e as capoeiras, que são os marcos históricos que consagram no
espaço geográfico as tradições, os feitos e as glórias dos antepassados.

Para melhor compreender as formas e a extensão da ocupação atual da TI


Zoró, fiz entrevistas e anotações nas aldeias Tamali Syn e Anguj Tapua acerca das
atividades agrícolas, de coleta, de caça e de pesca, buscando estimar as distâncias em
quilômetros relativas a roças, fruteiras, pesqueiros e trilhas e acampamentos de caça.
Na aldeia Tamali Syn, visitada em 22/10/2015, estavam presentes na reunião: Wam
(90 anos), Helena Tiganzyp (82 anos), Jonas Kira (56 anos), Luiza Kalyazip (55 anos),
Marcos Zarkupep (36 anos), Fátima Bag Salap (32 anos), Pedro Zapui (43 anos,) Ana
Lúcia Xipabep (36 anos), Marilza Galakumbau (29 anos). Em resumo, os recursos
naturais utilizados distribuem-se no entorno da aldeia, a distâncias que variam de
poucas centenas de metros a até 30 quilômetros, conforme abaixo:

Agricultura: Há várias roças atuais, situadas entre 0,5 e 1,5 quilômetros. Além
da roça comunitária, cada família tem uma roça particular. Utilizam o terreno
desmatado por dois anos seguidos; e retornam às capoeiras, após um período de
pousio de poucos anos.

Coleta: Extraem palha de babaçu para a cobertura das casas de vários lugares
ao redor, a sul e a oeste, entre 2 a 3 quilômetros. A palha de buriti serve de enfeite

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nas festas. A taquara é obtida na serra, perto da aldeia Guwã Puxurej. Para açaí,
patoá, buriti, mel, etc., a melhor região é a noroeste, cerca de 3 quilômetros. Tiram
timbó (para pesca) ao sul e a noroeste, entre 10 a 20 quilômetros.

Castanha: Há muitos coletores. Algumas colocações estão distantes de 25 a 30


quilômetros da aldeia, e as famílias ficam acampadas 2 a 3 semanas na época da
coleta, entre novembro e final de dezembro; uma pequena quantidade remanescente
pode ser recolhida até fevereiro.

Caça: Caçam em todos os lados ao redor da aldeia, explorando o entorno de 5 a


até 20 quilômetros. A leste, os caçadores percorrem o rio Tiroteio. Alguns jovens vão
de moto para caçar; os mais velhos seguem a pé. Usam arcos e flechas, porque a
munição de espingarda é difícil de obter.

Pesca: Pescam no rio Tiroteio e no rio Roosevelt; a oeste, alguns pescam no rio
Branco situado a grande distância a oeste.

Figura 26: Croquis do uso dos recursos naturais na aldeia Tamali Syn, 2015

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No croquis com as informações da aldeia Tamali Syn, acima, foram destacados:


1) a zona das roças (círculo mais escuro); 2) a zona de coleta de palhas, frutase mel
(cinza médio); 3) a zona de coleta de castanha e de caça (cinza claro); e 4) os locais
de pesca e de coleta de taquara (setas).

Na aldeia Anguj Tapua, no dia 23/10/2015, estavam presentes na entrevista


Marcio Kajazap (35 anos), Geraldo Chambi (42 anos), Caio Xipuanzap (33 anos) e
outros moradores. Os recursos naturais utilizados -se no entorno da aldeia a distância
estende-se até 30 quilômetros, conforme abaixo:

Agricultura: Os roçados estão a cerca de 2 quilômetros, em vários lugares ao


sul, a este e a oeste (mandioca, milho, milho duro, batata, cará, banana, amendoim,
inhame, arroz, feijão, marãjia, cana, mamão, algodão).

Coleta: Palha de babaçu, de 5 a 10 quilômetros ao sul e ao norte. Taquara, na


divisa da TI Sete de Setembro e próximo à aldeia Barreira; ponta de flecha tiram 10
quilômetros rio acima. Frutas e mel apanham longe, 10 quilômetros – patoá, buriti,
jatobá, cacau. Tucum e tucumã, para fazer colar, tiram mais perto; mas a fruta xikaba,
buscam na margem direita do rio Roosevelt, nas terras dos Cintas-Largas. Óleo de
copaíba extraem longe, a distâncias de 15 a 30 quilômetros.

Pesca: Pescam pelo rio Branco, acima até a divisa com a TI Sete de Setembro
(Suruí) e abaixo vão descendo até a fazenda Castanhal, cerca de 20 quilômetros.

Caça: Andam até 15 quilômetros nas caçadas cotidianas no entorno. Quando


acampam, frequentam três locais nas direções sul, oeste e norte, distantes mais de 30
quilômetros.

Castanha: Exploram colocações ao sul, a oeste e ao norte, distantes até 30


quilômetros. Cada família explora uma colocação (ver nas Fotografias o croquis das
colocações de castanha, desenhado por Caio no chão). Na safra 2014/2015 a aldeia
coletou cerca de 20 toneladas.

Aldeias antigas: Existem capoeiras de duas aldeias antigas nas proximidades da


aldeia atual, a leste; lá encontraram muitos cacos de cerâmica. Nas redondezas da
fazenda Castanhal encontraram pilões, panelas etc., em grande quantidade.

No croquis abaixo do uso dos recursos naturais na aldeia Anguj Tapua, da


mesma maneira, destacam-se: 1) a zona das roças (círculo mais escuro); 2) a zona de

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coleta de palhas, frutas e mel (cinza médio); 3) a zona de coleta de castanha e de caça
(cinza claro); e 4) os locais de pesca e de coleta de taquara (setas). Pode-se observar,
assim, que uma grande extensão do setor oeste da área ora sub judice encontra-se
sobreposta às zonas de uso dos recursos naturais da aldeia Anguj Tapua – quanto às
demais parcelas da área em litígio, estas correspondem às zonas de uso da aldeia
Abesewap e demais aldeias das imediações.

Figura 27: Croquis do uso dos recursos naturais na aldeia Anguj Tapua, 2015

Em síntese, como procurei esclarecer, a fauna, a flora, os solos, os cursos


d’água etc., que compõem os ecossistemas TI Zoró, proporcionam uma variedade de
recursos naturais que são utilizados na atualidade pelos grupos locais Zorós, assim
como o eram no passado, para a obtenção de matérias primas e a produção de
alimentos e artefatos necessários à sua reprodução social e econômica, a partir dos
parâmetros culturais que os singularizam. A caça, a pesca, a coleta, a agricultura e, nos
dias de hoje, a coleta de castanha, a criação de gado e a extração de madeira

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constituem as suas principais atividades produtivas, que se desdobram por todo o


espaço geográfico da Terra Indígena demarcada.

Enfim, de acordo com os parâmetros antropológicos que foram apontados ao


longo deste tópico, é possível afirmar que os índios Zorós utilizam integralmente a TI
Zoró, de onde obtêm os meios indispensáveis à sua subsistência, às suas expressões
culturais e à reprodução de sua ordem social, segundo os usos, costumes e tradições.

Cuiabá, 1 de fevereiro de 2016

João Dal Poz Neto


perito antropológico

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BIBLIOGRAFIA CONSULTADA

Alcântara, Laercio Cerqueira de


1976 Relatório n. 003/PQARI/76, do administrador substituto do PQARI (Processo
FUNAI/BSB/04248/76, p. 1-21). FUNAI: Porto Velho, 22/04/1976; anexos
relatórios e croquis.
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para fins de atração de grupos indígenas, as áreas que discrimina no Estado de
Mato Grosso e no Território Federal de Rondônia.
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Parque Indígena Aripuanã e dá outras providências.
1976a Decreto n. 77.033, de 15 de janeiro (DOU, 16/01/76). Altera o Decreto n.
73.562, de 24 de janeiro de 1974, mantendo, para fins de demarcação
administrativa, as áreas descritas naquele Decreto e dá outras providências.
1976b Decreto n. 78.109, de 22 de julho (DOU, 23/07/76). Declara sem efeito a
interdição de parte da área a que se refere o Decreto n. 73.562, de 24 de
janeiro de 1974.
1977a Decreto n. 80.169, de 16 de agosto (DOU, 17/08/77). Declara sem efeito a
interdição de parte da área a que se refere o Decreto n. 73.562, de 24 de
janeiro de 1974, e dá outras providências.
1977b Decreto n. 80.422, de 28 de setembro (DOU, 29/09/77). Declara sem efeito a
interdição de parte da área a que se refere o Decreto n. 73.562, de 24 de
janeiro de 1974, e dá outras providências.
1978a Decreto n. 81.587, de 19 de abril de 1978 (DOU, 20/04/1978). Declara
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município de Aripuanã - MT, e dá outras providências.
1978b Decreto n. 82.064, de 3 de agosto (DOU, 4/08/78). Declara sem efeito a
interdição de parte da área a que se refere o Decreto n. 73.562, de 24 de
janeiro de 1974, e dá outras providências.

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102
Laudo antropológico – Processo 2001.36.00.001508-9
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Jornal de Brasília
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Jornal do Brasil
1966 “Invasão de garimpeiros é que fêz os Cintas Largas atacarem Pôsto de
Vilhena”, 27 de maio.
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1968 “Expedição Cinta-Larga faz os primeiros contatos com índios”. Edição de 21 de
dezembro, 1º caderno, p. 6.
1969a “Cintas-largas se aproximam e trocam presentes com brancos”, 11 de maio.
1969a “Cintas-largas se aproximam e trocam presentes com brancos”, 11 de maio.
1969b “Cinta-larga gosta de brancos mas prefere tê-los distantes”, 19 de outubro.
1969b “Cinta-larga gosta de brancos mas prefere tê-los distantes”, 19 de outubro.
1971 “Invasão selvagem do branco põe em pânico cintas-largas”. Edição de 12 e 13
de dezembro.
1971 “Invasão selvagem do branco põe em pânico cintas-largas”, 12-13 de
dezembro.
1972 “Funai prevê ataque de cintas-largas porque brancos invadem terras”, 5 de
março.
1972 “Funai prevê ataque de cintas-largas porque brancos invadem terras”, 5 de
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1974 “FUNAI tem 4 tribos a identificar”. Edição de 1 de abril.
1976 “Índia civilizada reconhece chefe”, 23 de julho.
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1986 “Índios expulsam fazendeiros”. Edição de 4 de janeiro.
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ANEXOS

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FOTOGRAFIAS

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1ª Vara da Justiça Federal - Mato Grosso

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1ª Vara da Justiça Federal - Mato Grosso

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MAPAS

1. ÁREAS INDÍGENAS NO NOROESTE DE MATO GROSSO

2. MAPA DO TERRITÓRIO TRADICIONAL ZORÓ

3. A OCUPAÇÃO INDÍGENA NA TI ZORÓ

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1. ÁREAS INDÍGENAS NO NOROESTE DE MATO GROSSO

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1ª Vara da Justiça Federal - Mato Grosso

2. MAPA DO TERRITÓRIO TRADICIONAL ZORÓ

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3. A OCUPAÇÃO INDÍGENA NA TI ZORÓ

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