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DIVERGÊNCIA DE
ENTENDIMENTO ENTRE
ÓRGÃOS LOCAIS DO SISTEMA
JURÍDICO DO ESTADO DO RIO
DE JANEIRO. SUBMISSÃO DA
QUESTÃO À D. PROCURADORIA
GERAL DO ESTADO, NOS
TERMOS DO ART. 4º, IV DA LEI
ESTADUAL Nº 5.414, DE 19 DE
MARÇO DE 2009 E DO ART. 6º, §
2º DO DECRETO ESTADUAL Nº
40.500/2007. TOMBAMENTO
PROVISÓRIO. TERREIRO DA
GOMEIA. PROCEDIMENTO
PREVISTO NA LEI ESTADUAL Nº
509/1981 E NO DECRETO
ESTADUAL Nº 5.808/1982.
INTERVENÇÃO DECISÓRIA
ANÔMALA EM MOMENTO
PROCESSUAL IMPRÓPRIO DO
EXMO. SR. GOVERNADOR DO
ESTADO. NEGATIVA DE
TOMBAMENTO PROVISÓRIO
POR FATORES ECONÔMICOS.
CONSIDERAÇÕES
I – RELATÓRIO
A presente consulta é formulada à douta Procuradoria Geral do Estado, nos termos do art. 4º,
IV da Lei Estadual nº 5.414, de 19 de março de 2009 e do art. 6º, § 2º do Decreto Estadual nº 40.500, de 01
de janeiro de 2007, tendo em vista a divergência de entendimento entre a Assessoria Jurídica da Secretaria
de Estado de Cultura e Economia Criativa – ASSJUR/SECEC e a Assessoria Jurídica da Secretaria de
Estado da Casa Civil – ASJUR/SECC (despacho doc. SEI 9808705), apta a gerar impacto para a
administração pública estadual, no bojo do processo administrativo nº E-18/007/760/2019.
O mencionado expediente foi instaurado para tombamento do Terreiro da Gomeia,
Manifestação 619 (13066166) SEI E-18/007/760/2019 / pg. 1
localizado na Avenida Prefeito Braulino de Matos Reis, nº 360, Vila Leopoldina, no município de
Duque de Caxias/RJ, após solicitações da sociedade civil fluminense (fls. 04/09).
Às fls. 11/116, o Departamento de Pesquisa e Documentação apresentou pesquisa histórica do
Terreiro e manifestou-se favoravelmente ao tombamento (fls. 117).
No doc. 8612547, consta parecer favorável do Departamento do Patrimônio Imaterial do
Inepac, recomendando o tombamento do Terreiro da Gomeia “Manso Bantuqueno ngomessa Kat’espero
Gomeia da Nação Kongo / Angola”.
Posteriormente, o Departamento de Patrimônio Cultural e Natural – DCPN apresentou
pesquisa e parecer técnico favorável ao tombamento provisório (doc. 8658708).
Em seguida, foram juntados aos autos minuta de Edital de Tombamento Provisório do Terreno
da Gomeia (doc. 8663153) e minuta de Ato de Tombamento Provisório (doc. 8711892).
Os autos foram encaminhados à Secretária de Estado de Cultura e Economia Criativa (doc.
8712106) e, em seguida, à Secretaria de Estado da Casa Civil, para ciência do Exmo. Sr. Governador do
Estado, nos termos do art. 5º da Lei Estadual nº 509, de 03 de dezembro de 1981 (doc. 8770747).
Na Secretaria de Estado da Casa Civil, o processo foi remetido à Assessoria Jurídica da
Pasta, para análise e parecer das minutas (doc. 9574416).
Em sua manifestação (doc. 9808705), a ASJUR/SECC destacou que a atribuição para o
exame das minutas de edital de tombamento e de ato de tombamento provisório é da Assessoria Jurídica da
Secretaria de Estado de Cultura e Economia Criativa – ASJUR/SECEC.
Inobstante, destacou que o tombamento de determinado bem, ainda que provisório, atrai para
o ente tombador deveres concretos para com a conservação do mesmo (art. 19 da Lei nº 509, de 03 de
dezembro de 1981), gerando risco de eventuais gastos para a Administração Pública estadual. Ademais,
frisou que em oportunidades anteriores, quando da ciência de processo de tombamento provisório, o
Exmo. Sr. Governador interviu no feito para indeferir de plano o tombamento por conta dos riscos
econômicos da responsabilidade subsidiária pela conservação do bem.
Entendeu, por fim, que os autos deveriam ser remetidos à ASSJUR/SECEC, para análise das
minutas e, que fosse procedimentalizada a ciência do Governador a respeito do tombamento provisório,
oportunidade em que se decidirá se haverá ou não intervenção decisória na fase de tombamento provisório.
É o relatório.
II – FUNDAMENTOS JURÍDICOS
A preservação do patrimônio cultural como política pública de Estado teve seu pontapé inicial
na Revolução Francesa, oportunidade em que os bens do clero e da nobreza foram confiscados pelo Poder
Público, sendo alojados, em sua maioria, em museus. Para tanto, criou-se um método para preparar o
inventário dos bens confiscados, bem como todo o procedimento de administração dos bens. Originaram-se,
assim, os procedimentos iniciais de preservação do patrimônio cultural.
A Constituição brasileira de 1934 foi a primeira Carta Magna a citar a proteção do patrimônio
histórico-cultural, sendo posteriormente editado o Decreto-lei nº 25, de 30 de novembro de 1937, que trata
Dessa forma, ainda que não seja um elemento explícito constante na Lei estadual n° 509/81 e no
Decreto estadual n° 5.808/82, legítima a consideração do risco financeiro quando da deliberação
política do ato de tombamento. Nesse sentido, inclusive, esta assessoria tem conhecimento de que,
em oportunidades anteriores, quando da ciência de processo de tombamento provisório, entendeu
por bem o Exmo. Sr. Governador, no exercício do seu "juízo preliminar e discricionário" (art. 5º
da Lei Estadual nº 509/81) intervir no feito e indeferir de plano o tombamento por conta dos
riscos econômicos da responsabilidade subsidiária da conservação do bem.
Registra-se que a intervenção governamental na referida fase processual é anômala, vez que, a
princípio, o juízo discricionário do Exmo. Sr. Governador dar-se-ia quando do exame do
tombamento definitivo. De toda sorte, considerando a competência governamental de direção
superior do Poder Executivo estadual, bem como sua expressa competência para deliberação
quanto ao tombamento definitivo, não se vislumbra qualquer ilegalidade na interferência
antecipada a luz de seu juízo político e discricionário.
Noutro giro, sem embargo desse juízo político, pertinente esclarecer que não há óbices
estritamente jurídicos para o prosseguimento da etapa provisória do tombamento, na forma dos
diplomas normativos supracitados.
Ante o exposto, figura necessário que a Chefia de Gabinete procedimentalize a ciência Exmo. Sr.
Governador a respeito do tombamento provisório pretendido nos autos, oportunidade em que se
decidirá, em juízo discricionário, se procederá a intervenção anômala na atual etapa do processo de
tombamento, sustando do prosseguimento da medida. (Grifo nosso)
Como se vê, a orientação da Assessoria Jurídica da Secretaria de Estado da Casa Civil é pela
negativa do tombamento provisório do imóvel pelo Governador, no exercício de seu poder hierárquico. Como
se percebe, entretanto, na própria manifestação, a d. Assessoria Jurídica reconhece que a intervenção
decisória do Governador em sede de tombamento provisório é anômala. Pois bem, por anômalo
entende-se algo irregular ou fora do comum. É qualidade daquilo que se opõe à ordem natural das coisas.
Data máxima vênia, causa-nos incômodo que no mesmo ato em que se afirma que não
deveria haver intervenção do Governador nesta fase do processo, haja, efetivamente, ingerência no exercício
ordinário e regular do poder de polícia do Inepac.
Explico. No âmbito do Estado do Rio de Janeiro, o procedimento para tombamento de bens é
disciplinado pela Lei Estadual nº 509, de 03 de dezembro de 1981, que dispõe sobre o Conselho Estadual de
Art. 5º - O processo de tombamento será iniciado pelo Instituto Estadual do Patrimônio Cultural,
da Secretaria de Estado de Educação e Cultura, mediante as seguintes normas de procedimento:
I - identificado o bem a ser tombado, o Instituto solicitará ao Secretário de Estado de Educação e
Cultura que dê ciência prévia ao Governador, para que seja determinado o tombamento provisório
do bem;
II - o tombamento provisório será comunicado ao proprietário mediante notificação;
III - processo, com toda a documentação relativa ao fato, será remetido ao CET que opinará pelo
tombamento definitivo ou pela denegação do pedido de tombamento;
IV - o Presidente do CET encaminhará o processo, com o Parecer do Conselho, ao Secretário
Estadual de Educação e Cultura;
V - o Secretário de Estado de Educação e Cultura, com prévia autorização do Governador, decidirá:
a) pelo tombamento definitivo;
b) pela denegação do pedido, tornando-se sem efeito o tombamento provisório.
1. A Secretaria de Estado de Cultura e Economia Criativa deve dar ciência ao Governador do Estado
da abertura de processo de tombamento de bem integrante do patrimônio histórico e cultural do Estado
do Rio de Janeiro;
2. Após, o procedimento é efetivamente iniciado pelo Inepac. O Inepac tomba provisoriamente o
bem, através de ato de seu Diretor, devidamente motivado consoante as razões técnicas
constantes do processo administrativo de tombamento.
3. Extrato do Ato de Tombamento Provisório é publicado no Diário Oficial do Estado do Rio de Janeiro,
consoante as razões técnicas constantes do processo de tombamento, na forma do artigo 5º da Lei
Estadual 509/1981;
4. O Inepac comunica o proprietário acerca do tombamento provisório;
5. O processo é encaminhado ao Conselho Estadual de Tombamento para deliberação e parecer
acerca do tombamento definitivo;
6. O processo é devolvido à SECEC e encaminhado pela Secretária de Estado de Cultura e Economia
Criativa para o Governador do Estado para análise acerca do tombamento definitivo;
7. Caso o Governador denegue o pedido de tombamento definitivo, a decisão deverá ser acolhida pela
SECEC;
7. 1 Caso o Governador autorize o tombamento, cabe à Secretária de Estado de Cultura e
Economia Criativa decidir sobre o tombamento definitivo ou não do bem.
Art. 19. O proprietário de coisa tombada, que não dispuser de recursos para proceder às obras de
conservação e reparação que a mesma requerer, levará ao conhecimento do Serviço do Patrimônio
Histórico e Artístico Nacional a necessidade das mencionadas obras, sob pena de multa
correspondente ao dobro da importância em que for avaliado o dano sofrido pela mesma coisa.
§ 1º Recebida a comunicação, e consideradas necessárias as obras, o diretor do Serviço do
Patrimônio Histórico e Artístico Nacional mandará executá-las, a expensas da União, devendo as
mesmas serem iniciadas dentro do prazo de seis meses, ou providenciará para que seja feita a
desapropriação da coisa.
§ 2º À falta de qualquer das providências previstas no parágrafo anterior, poderá o proprietário
requerer que seja cancelado o tombamento da coisa.
§ 3º Uma vez que verifique haver urgência na realização de obras e conservação ou reparação em
qualquer coisa tombada, poderá o Serviço do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional tomar a
iniciativa de projetá-las e executá-las, a expensas da União, independentemente da comunicação a
que alude este artigo, por parte do proprietário.
Ocorre que, com as devidas vênias, parece-nos que houve certa confusão na forma como a
ideia de responsabilidade solidária foi apresentada no despacho de doc. 9808705. À vista dos julgados
colacionados pela douta Assessoria Jurídica, poder-se-ia chegar à desacertada conclusão de que o ente
tombador sempre poderia ser diretamente executado pelos custos econômicos com a conservação do bem,
ainda que o proprietário tenha condições econômicas de fazê-lo. Isso, porque a responsabilidade entre eles
seria solidária.
Todavia, não é essa a interpretação que deve ser dada à questão. Não se pode negar que o
ente tombador é solidariamente responsável com o proprietário em seu dever de conservação do bem
tombado, pois tal múnus decorre de seu dever constitucional de promoção e proteção do patrimônio
cultural[6]. Entretanto, não se pode confundir essa responsabilidade com a responsabilidade patrimonial do
Estado pela conservação desses bens, que será, via de regra, subsidiária.
Explica-se: a responsabilidade pelo custeio das obras necessárias à manutenção e
conservação do bem tombado é primariamente de seu proprietário. Somente a insuficiência de recursos deste
é que afastará a subsidiariedade, justificando a execução patrimonial direta do ente tombador. Para que isso
ocorra, contudo, é necessário que haja efetiva comprovação da incapacidade econômico-financeira do
proprietário, como visto anteriormente.
Nesse sentido, o Egrégio Superior Tribunal de Justiça já se pronunciou classificando a hipótese
prevista no art. 19 do Decreto-Lei nº 25/37 como de responsabilidade civil de imputação solidária e
execução subsidiária.
Em termos patrimoniais, portanto, depreende-se que o ente tombador somente será executado
de forma subsidiária, nas hipóteses em que o proprietário do bem tombado comprovadamente não tiver
Manifestação 619 (13066166) SEI E-18/007/760/2019 / pg. 9
condições financeiras para arcar com os custos de conservação/manutenção do bem. Não parece razoável,
portanto, inviabilizar o tombamento provisório em virtude de um eventual dispêndio de recursos pelo
Estado, circunstância incerta, que pode inclusive sequer acontecer.
A própria ASJUR/SECC afirma que o tombamento envolve a POSSIBILIDADE (frise-se) de
assunção de despesas pelo Poder Público. Ademais, data máxima vênia, a argumentação utilizada para
sugerir o “indeferimento” do tombamento provisório é demasiadamente genérica.
Ainda que se acolha que o fundamento da intervenção do Governador é o exercício de seu
poder hierárquico, importante alertar que, nos termos do art. 13 da Lei Estadual nº 5.427/2009[8], a
avocação temporária de competência atribuída a órgão hierarquicamente inferior será admitida, em caráter
excepcional e por motivos relevantes devidamente justificados.
Ora, parece-nos não ter sido demonstrada qualquer circunstância concreta que comprove que
o proprietário do bem não possui condições financeiras de arcar com os reparos necessários à sua
conservação, circunstância que atrairia a responsabilidade patrimonial do Estado. Pelo contrário, recusa-se o
tombamento provisório com base exclusivamente em um juízo hipotético, sem que tenha sido
promovido qualquer estudo técnico em relação à existência de custos ou não para o Estado do Rio
de Janeiro. Não se verifica, por conseguinte, a motivação necessária e suficiente para justificar a avocação de
competência e o “indeferimento” do tombamento provisório.
Além disso, faz-se imprescindível destacar que podem ser realizadas políticas públicas voltadas
à conservação e manutenção dos imóveis tombados sem qualquer custo para a Administração Pública, por
intermédio de parcerias e, caso o bem tombado seja público, através de contraprestações pela utilização do
imóvel, sendo esta última já utilizada em alguns equipamentos desta Secretaria.
Conclui-se, portanto, que um interesse público secundário da Fazenda Pública de não ser
onerada com os custos que eventualmente o tombamento de um bem acarrete não pode se sobrepor ao
interesse público primário de proteção do patrimônio cultural, que é, acima de tudo, uma obrigação
constitucional, cujo descumprimento pode gerar, inclusive, a responsabilização do Administrador Público.
Como bem salientado nos tópicos anteriores, o art. 216, § 1º da Constituição Federal impõe
ao Poder Público a obrigação de preservar e tutelar o patrimônio cultural, sendo certo que o próprio
constituinte elenca, em rol exemplificativo, alguns dos instrumentos de que deve se valer o gestor para dar
concretude ao comando constitucional. Vejamos:
Art. 216. Constituem patrimônio cultural brasileiro os bens de natureza material e imaterial,
tomados individualmente ou em conjunto, portadores de referência à identidade, à ação, à memória
dos diferentes grupos formadores da sociedade brasileira, nos quais se incluem:
I - as formas de expressão;
II - os modos de criar, fazer e viver;
III - as criações científicas, artísticas e tecnológicas;
IV - as obras, objetos, documentos, edificações e demais espaços destinados às manifestações
artístico-culturais;
V - os conjuntos urbanos e sítios de valor histórico, paisagístico, artístico, arqueológico,
paleontológico, ecológico e científico.
§ 1º O Poder Público, com a colaboração da comunidade, promoverá e protegerá o patrimônio
cultural brasileiro, por meio de inventários, registros, vigilância, tombamento e desapropriação, e
de outras formas de acautelamento e preservação.
Art. 11. Constitui ato de improbidade administrativa que atenta contra os princípios da
administração pública qualquer ação ou omissão que viole os deveres de honestidade,
imparcialidade, legalidade, e lealdade às instituições, e notadamente:
II - retardar ou deixar de praticar, indevidamente, ato de ofício.
Art. 12. Independentemente das sanções penais, civis e administrativas previstas na legislação
específica, está o responsável pelo ato de improbidade sujeito às seguintes cominações, que
podem ser aplicadas isolada ou cumulativamente, de acordo com a gravidade do fato:
III - na hipótese do art. 11, ressarcimento integral do dano, se houver, perda da função pública,
suspensão dos direitos políticos de três a cinco anos, pagamento de multa civil de até cem vezes o
Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados,
do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade,
moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte: (...)
§ 4º Os atos de improbidade administrativa importarão a suspensão dos direitos políticos, a perda
da função pública, a indisponibilidade dos bens e o ressarcimento ao erário, na forma e gradação
previstas em lei, sem prejuízo da ação penal cabível.
Outrossim, importante alertar que a negativa de tombamento por fatores econômicos pode,
inclusive, surtir o efeito reverso do pretendido, gerando maiores custos para a Administração Pública do que
esta eventualmente teria caso tivesse procedido ao tombamento do bem.
Explica-se. Nas palavras de José Eduardo Ramos Rodrigues e Marcos Paulo Miranda, “o
tombamento é um ato administrativo que declara um valor cultural preexistente, declaração que pode não ter
sido efetivada pelo Poder Público, apesar do interesse cultural do bem, seja por falta de tempo, por erro,
culpa ou dolo. Nesse caso, impõe-se a propositura de ação civil pública como já consagrado pelo
entendimento de nossos tribunais[10]”.
Isso significa que o Poder Judiciário pode determinar, com força coercitiva, que o Poder
Público adote as medidas necessárias à preservação e conservação de bem cultural, ainda que não tenha sido
este formalmente tombado pelo ente. Ademais, há até mesmo precedente reconhecendo a possibilidade de
que o Estado seja judicialmente compelido a proceder ao tombamento do bem. Vejamos:
No presente caso, o bem cultural, que, ao que tudo indica, terá seu tombamento provisório
negado pelo Chefe do Poder Executivo, pode vir a ser objeto de posterior ação judicial, em que se pleiteia seu
tombamento ou a realização das medidas necessárias à sua conservação. Em sendo condenado o Estado na
demanda, é possível que, em função do decurso do tempo e eventual inércia do proprietário, o bem venha a
sofrer degradações em seu estado de conservação.
Ora, se o argumento da douta Assessoria Jurídica da Secretaria de Estado da Casa Civil é de
que não deve ser efetuado o tombamento provisório do bem porque tal medida acarretaria despesas que não
se compactuam com a realidade econômica do Estado do Rio de Janeiro, maiores gastos adviriam de uma
posterior condenação pelo Poder Judiciário a arcar com as despesas de conservação de um bem em
estado possivelmente mais precário.
É de se destacar, por fim, que as possibilidades de que tal cenário se torne realidade não são
remotas, uma vez que os órgãos de controle, sobretudo o Ministério Público Federal, vêm atuando
incessantemente na fiscalização dos deveres de proteção e promoção do patrimônio cultural
protegido pela Secretaria de Estado de Cultura e Economia Criativa.
Diante de todo o exposto, pede-se vênia para discordar das manifestações da d. Assessoria
Jurídica da Casa Civil, concluindo que:
Atenciosamente,
[1] MURGUIA, Eduardo Ismael; YASSUDA, Silvia Nathaly. Patrimônio histórico-cultural: critérios
para o tombamento de bibliotecas pelo IPHAN. Perspectivas em Ciência da Informação. Vol. 12,
Número 3, Belo Horizonte, set./dez. 2007. Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?
script=sci_arttext&pid=S1413-99362007000300006&lang=pt> Acesso em 26.01.2021.
[2] SOUZA, Sergio Linhares Miguel de; CARVALHO, Evandro Luiz de (org). Patrimônio Cultural:
Educação para o patrimônio cultural. Rio de Janeiro: Instituto Estadual de Patrimônio Cultural,
2014, p. 27.
[3] DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. 23ª ed. São Paulo: Atlas, 2010, p. 139.
§ 1º - O tombamento poderá ser total ou parcial, especificando-se no segundo caso, com a maior
§ 3º - Serão inscritos nos livros estaduais os bens situados no território da Guanabara e tombados
pelo órgão federal competente.
[5] CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de Direito Administrativo. 33 ed. São Paulo:
Atlas, 2019, p. 173.
[6] CRFB/1988. Art. 216. Constituem patrimônio cultural brasileiro os bens de natureza material e
imaterial, tomados individualmente ou em conjunto, portadores de referência à identidade, à ação,
à memória dos diferentes grupos formadores da sociedade brasileira, nos quais se incluem: I - as
formas de expressão; II - os modos de criar, fazer e viver; III - as criações científicas, artísticas e
tecnológicas; IV - as obras, objetos, documentos, edificações e demais espaços destinados às
manifestações artístico-culturais; V - os conjuntos urbanos e sítios de valor histórico, paisagístico,
artístico, arqueológico, paleontológico, ecológico e científico.
[7] STJ, REsp nº 1.791.098/RJ, 2ª T., Rel. Min. Herman Benjamin, julg. 23.4.2019, publ. 02.8.2019.
[8] Lei Estadual nº 5.427, de 01 de abril de 2009. Estabelece normas sobre atos e processos
administrativos no âmbito do Estado do Rio de Janeiro.
Art. 13. Será permitida, em caráter excepcional e por motivos relevantes devidamente justificados,
a avocação temporária de competência atribuída a órgão hierarquicamente inferior, observados
os princípios previstos no art. 2º desta Lei.
[9] Art. 15. É vedada a cassação de direitos políticos, cuja perda ou suspensão só se dará nos
casos de:
IV - recusa de cumprir obrigação a todos imposta ou prestação alternativa, nos termos do art. 5º,
VIII;
[10] RODRIGUES, José Eduardo Ramos; MIRANDA, Marcos Paulo de Souza. Estudos de Direito
do Patrimônio Cultural. Belo Horizonte: Fórum, 2012.
[11] TJGO, DGJ 437259-27.2008.8.09.0011, Rel. Des. Elizabeth Maria da Silva, publ. 16.12.2011.
[12] TJSP, Apel. Cív. nº 19.539-5, 1ª Câm. De Dir. Público, Rel. Des. Scarance Fernandes, julg.
19.5.1988.
[13] TJRS, Ag. Int. nº 599327285, 4ª C.C., Rel. Des. Vasco Della Giustina, julg. 19.4.2000.
[15] TJMG, Ag. nº 000.335.443-8/00, 7ª C.C., Rel. Des. Wander Marotta, julg. 5.5.2003.
[16] TJSP, Ag. Int. nº 292.905-5/5-00, 8ª Câm. de Dir. Público, Rel. Des. Teresa Ramos Marques,
julg. 12.2.2003 (unanimidade).
Documento assinado eletronicamente por Mauricio Jorge Pereira Mota, Assessor Chefe, em
02/02/2021, às 13:11, conforme horário oficial de Brasília, com fundamento nos art. 21º e 22º do
Decreto nº 46.730, de 9 de agosto de 2019.
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Telefone: - http://www.cultura.rj.gov.br/