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,. PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO,


COMARCA DENITE R_ÓI - N ON A VARA_C_iV_F. I .
Processo n°. 0049177-05.2012.8.19.0002

SENTENÇA

Cuida-se de Ação de Desapropriação Indireta c/c


Indenização movida pelo FRANCISCO XAVIER DA CRUZ NUNES em face do
• MUNICÍPIO DE NITERÓI. Narra que possui desde 1988 um lote de terreno de n°
001, da quadra 299, com frente para a Rua 145, inscrito sob o n° 071.770-2, no lote
denominado "Bairro Piratininga".Informa que a propriedade está situada na área da
Praia do Sossego, considerada área de vegetação original de restinga da cidade, e no
ano de 2002, a Lei Municipal 1.968/02, instituiu essa área como Monumento Natural,
limitando os seus direitos inerentes à propriedade. Salienta que com a ação dá
municipalidade, não pôde construir edificações, ou ao menos vender a outra pessoa.
Requer a procedência dos pedidos, para condenar o réu ao pagamento de indenização
a titulo de desapropriação indireta, no mínimo valor de R$ 77.747,41, além dos
honorários advocatícios.

Instruem a inicial os documentos de fls. 10/103.

Contestação do réu às fls. 110/128. Preliminarmente, pugna


por sua ilegitimidade passiva, alegando ser a União responsável pelo local, na forma
• do Código Florestal. Afirma que o local está inserido em encosta, e as suas proteções
vêm desde o momento da aquisição da propriedade. No mérito, alega a prejudicial de
prescrição, bem como informa que apenas criou uma limitação administrativa, sem
interferir na posse do autor, sem pretender tomar-lhe a propriedade Requer o
acolhimento da preliminar, e subsidiariamente a improcedência dos pedidos, com a
condenação do autor nos ônus de sucumbência. O réu juntou a peça de bloqueio os
documentos de fls. 129/136.

Réplica às fls. 138/150.

Manifestação do MP às fls. 1521153 afirmando não existir


interesse no presente feito.
PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO
COMARCA DE NITERÓI -NONA VARA CÍ_VSi.
Processo W. 0049177-05.20 12.8.19.0002
Decisão de fls. 154 determinando a produção de prova
pericial.

Laudo as fls. 194/204.

É O RELATÓRIO.

DECIDO.

Impõe-se o julgamento antecipado do processo, fazendo-o na


forma do artigo 355, inciso 1, do CPC.

No tocante a preliminar de ilegitimidade passiva arguida pelo


Município, conheço-a para rejeitá-la. O objeto da lide diz respeito à Lei Municipal de
n° 1.968/02, a qual limitou o Autor a exercer os seus direitos inerentes à propriedade,
não havendo de se falar em sua ilegitimidade passiva por ser terra pertencente à
União, posto que a referida legislação foi a causadora da pretensão autoral.

Em relação a preliminar de prescrição, igualmente conheço-a


para rejeitá-la. A prescrição aplicada no caso não é a mesma da usucapião
extraordinária de 05 (cinco) anos, posto que a presente demanda trata-se de
indenização decorrente de desapropriação indireta, ressaltando-se que a Lei
Municipal de n° 1.968/02, foi publicada em 2002. Nesse sentido, a Súmula n° 119 do
STJ: "A ação de desapropriação indireta prescreve em vinte anos".

• No mérito, não assiste razão à parte autora.

Cuida-se a área em questão de uma Reserva Florestal, logo,


de domínio público e protegido por lei.

A Constituição Federal, de 1988, em seu artigo 225, § 4 0 ,

declarou a Mata Atlântica e a Zona Costeira como Património Nacional.

O Código Florestal Brasileiro foi instituído pela Lei Federal


n° 4.775, de 15/09/1965, estabelecendo-se no artigo 2° que ficam declaradas pelo só
efeito da lei as Áreas de Preservação Permanente, as áreas de restinga.

Tendo em vista a aquisição da propriedade pelo autor ter se


consumado em 30/09/1988, ou seja, na vigência da Constituição Federal de 1967, já à
época deveria ter respeitado a legislação ambiental.
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' PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO
_ _ ARCADE NITER ÓI - NONA VARA_CIVRI,
CO_M
Processo n°. 0049177-05.2012.8.19.0002
Ademais, a Lei Federal de n° 7.666/79, recepcionada pela
Constituição Federal de 1988, em seu art. 3% parágrafo único, inciso IV, não admite o
parcelamento do solo para fins urbanos em terrenos onde as condições geológicas não
aconselham a edificação.

A propriedade do Autor, na Praia do Sossego, no bairro de


Piratininga, está inserida na Mata Atlântica e também na Zona Costeira.

A Lei Orgânica de Niterói instituiu Praia do Sossego como


Área de Proteção Ambiental — APA, em seu art. 323, inciso III.

• Pelo Decreto Federal n° 99.574/90, ficou proibido o corte e


respectiva exploração da vegetação nativa da Mata Atlântica.

Outrossim, a Lei Federal de n° 6.902/1981, em seu artigo 9%


permite o Poder Executivo local estabelecer normas para limitar ou proibir ações que
possam causar dano às APAs, in verbis:

"Art. 9° Em cada Área de Proteção Ambiental, dentro dos


princípios constitucionais que regem o exercicio do direito de
propriedade, o Poder Executivo estabelecerá normas,
limitando ou proibindo:
a) a implantação e o funcionamento de indústrias
potencialmente poluidoras, capazes de afetar mananciais de
água;
b) a realização de obras de terraplenagem e a abertura de
canais, quando essas iniciativas importarem em sensível
alteração das condições ecológicas locais;
c) o exercicio de atividades capazes de provocar uma
acelerada erosão das terras e%u um acentuado
assoreamento das coleções hídricas;
d) o exercicio de atividades que ameacem extinguir na área
protegida as espécies raras da biota regional".

Dessa forma, a Lei Municipal de n° 458/83, em seus artigos


2° e o parágrafo único do art. 3°, por força da referida legislação federal, assegurou as
limitações e/ou proibições na APA do bairro de Piratininga, sendo revogada pelo
Plano Diretor de Niterói, em 1992, aumentando os limites das áreas de proteção
ambiental, transformando-se em "APA das Lagunas e Florestas de Niterói", não
deixando de incluir a Praia do Sossego como tal.
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L 1.

PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO


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Processo W. 0049177-05.2012.8.19.0002
Destarte, todos os imóveis que estão localizados na Praia do
Sossego, incluído pelo Governo Federal como Reserva da Biosfera (Ia Mata Atlântica
e erigida à categoria de Patrimônio Nacional, desde a publicação da Constituição
Federal (1988) sofrem a limitação de uso, gozo, desmatamento e exploração,
proibidas edificações ou parcelamento do solo, posto que toda a floresta é
considerada de preservação permanente.

Bem verdade que o Poder Público ao tomar essa iniciativa


que visa manter o microclima e a biodiversidade da Mata Atlântica, deve sempre
indenizar o titular do direito, cuja propriedade foi abrangida pela limitação de se
pretende fazer loteamento, plantações, edificações ou empreendimentos em geral.
Cuida-se este de tema pacífico em nossos tribunais.

Contudo, de acordo com a análise do histórico das regras


legais e acima expostas, e compreendendo os aspectos ambientais que envolvem a
Praia do Sossego como área de Preservação Ambiental integrante da Reserva da
Biosfera da Mata Atlântica, um Patrimônio Nacional, restou que o impedimento de
agressão da fauna e da floresta, do ponto de vista legal, advém desde a Constituição
Federal de 1988, e não apenas depois da Lei Municipal de n° 1.968/02, inexistindo,
portanto, o dever estatal de indenizar.

Isto posto, julgo improcedente o pedido inicial, e condeno o


autor no pagamento de custas, despesas do processo e honorários de 5% sobre o valor
da causa. Se entender o autor que fora a União a primeira responsável pela limitação
administrativa, poderá contra este ente público tentar a reparação do dano causado.

Q Niterói, 29 de janei o 2019.

ALEXANDRE ED ARDO SCISINIO


Juiz d Direito

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