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EXCELENTÍSSIMO SENHOR JUIZ DA ___ VARA CÍVEL DA COMARCA DE

BETIM/MG

MORADOR, sem endereço eletrônico, vem, mui


respeitosamente, por meio de seu advogado que, no fim, assina, apresentar

AÇÃO ORDINÁRIA

face a VALE S/A, pessoa jurídica de direito privado, inscrita no Cadastro Nacional de
Pessoas Jurídicas sob o nº 33.592.510/0001-54, com sede na Praia de Botafogo, n° 186 -
Torre Oscar Niemeyer, 9º andar, bairro Botafogo, Rio de Janeiro/RJ, CEP 22250-145,
conforme fatos e direitos abaixo expostos.

I - PRELIMINARMENTE
I.1 - DA CITAÇÃO DA RÉ – CITAÇÃO ELETRÔNICA

Nos termos do que dispõe o artigo 246, do CPC/15, bem como o que foi
definido no Aviso nº. 36/CGJ/2020, a Ré deve ser citada obrigatoriamente por correio
eletrônico.

Portanto, requer a citação eletrônica da Ré.

I.2 – DA JUSTIÇA GRATUITA

Como se vê da documentação anexa, o Autor não tem renda suficiente para


arcar com as custas processuais sem prejuízo de seu sustento e de sua família.

Assim, e no termo do que dispõe o artigo 98 do CPC/15, requer a concessão


das benesses da justiça gratuita.

II - SINOPSE

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II.1 - HISTÓRICO PREGRESSO - A TRAGÉDIA DE BRUMADINHO – O MAR
DE LAMA - CONSEQUÊNCIAS

Na data do dia 25 de janeiro do ano de 2019, o país foi alarmado com um


fato noticiado a nível mundial: O rompimento de barragens na mina Córrego de Feijão,
na cidade de Brumadinho, relacionado ao Complexo Paraopeba II. As referidas
barragens, assim como a própria mina em si, são de responsabilidade da empresa Vale
S.A.

Milhões de toneladas em metros cúbicos de rejeitos de mineração foram


derramados brutalmente pelo vale do Rio Paraopeba, levando morte e destruição até o
município de Curvelo.

O “mar de lama”, como ficou conhecida a tragédia, obliterou a região


atingida como um todo, causando danos ambientais, prejuízos financeiros e, além de
tudo, ceifou vidas. Duzentas e setenta e duas pessoas faleceram tragicamente em
decorrência direta ao desastre. Não se pode mesurar as perdas definitivas, já que não se
pode precificar vidas.

Contudo, buscou-se as reparações devidas, e o Poder Público não se


manteve inerte: acordos judiciais, multas ambientais, indenizações, doações e, inclusive,
a alteração legislativa.

A promulgação da Lei 14.066/2020, que altera a Lei 12.334/2010, busca


evitar que tragédias como a de Brumadinho voltem a se repetir, vez que proibiu,
expressamente a utilização de barragens de mineração a montante, como vemos in
verbis:

Art. 2º-A. Fica proibida a construção ou o alteamento de barragem de


mineração pelo método a montante.
 
§ 1º Entende-se por alteamento a montante a metodologia construtiva
de barragem em que os diques de contenção se apoiam sobre o próprio
rejeito ou sedimento previamente lançado e depositado.
 
§ 2º O empreendedor deve concluir a descaracterização da barragem
construída ou alteada pelo método a montante até 25 de fevereiro de
2022, considerada a solução técnica exigida pela entidade que regula e

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fiscaliza a atividade minerária e pela autoridade licenciadora do
Sistema Nacional do Meio Ambiente (Sisnama).

Inclusive, neste mesmo sentido, o Estado de Minas Gerais promulgou a Lei


Ordinária 23.291/19, que dispõe sobre as barragens a montante no território mineiro,
mas também traz a ordem expressa de sua descaracterização, como se vê do seu artigo
13, e parágrafos, in verbis:

Art. 13 Fica vedada a concessão de licença ambiental para operação


ou ampliação de barragens destinadas à acumulação ou à disposição
final ou temporária de rejeitos ou resíduos industriais ou de mineração
que utilizem o método de alteamento a montante.

§ 1º O empreendedor fica obrigado a promover a descaracterização


das barragens inativas de contenção de rejeitos ou resíduos que
utilizem ou que tenham utilizado o método de alteamento a montante,
na forma do regulamento do órgão ambiental competente.

§ 2º O empreendedor responsável por barragem alteada pelo método a


montante atualmente em operação promoverá, em até três anos
contados da data de publicação desta lei, a migração para tecnologia
alternativa de acumulação ou disposição de rejeitos e resíduos e a
descaracterização da barragem, na forma do regulamento do órgão
ambiental competente.

§ 3º Considera-se barragem descaracterizada, para fins do disposto


neste artigo, aquela que não opera como estrutura de contenção de
sedimentos ou rejeitos, não possuindo características de barragem,
sendo destinada a outra finalidade.

§ 4º A reutilização, para fins industriais, dos sedimentos ou rejeitos


decorrentes da descaracterização será objeto de licenciamento
ambiental, observado o disposto no caput do art. 6º desta lei.

Houve ainda a definição das Zonas de Autossalvamento, as quais são


regiões imediatamente a jusante das barragens, em que se considera não haver tempo
suficiente para uma adequada intervenção dos serviços e agentes de proteção civil em
caso de rompimento. Tais zonas estão previstas na mesma Lei Federal, de nº. 12.334/10,
em seu artigo 1º, inciso IX.

Portanto, são notáveis todas as tentativas de reparação perpetradas, inclusive


pela própria Vale S.A., mas as consequências do ocorrido ainda permanecem, e
certamente ecoarão por muito tempo.

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II.2 - DA PRESENTE LIDE – BAIRRO CITROLÂNDIA – OMISSÕES E
ILÍCITOS PRATICADOS POR PARTE DA RÉ – DA SITUAÇÃO DA PARTE
AUTORAL ENQUANTO RESIDENTE A BEIRA DO RIO PARAOPEBA

No caso concreto, e como se vê do preâmbulo desta peça exordial, o Autor é


residente com sua companheira em imóvel de sua titularidade, situado à Rua Boa
Esperança, nº. 106, Betim/MG, CEP 32.641-598, localizado à beira do Rio Paraopeba,
como vemos do mapa abaixo:

Portanto, fato é que o imóvel do Autor está em local afetado diretamente


pelo rompimento da barragem em Brumadinho.

A celeuma, entretanto, é instalada considerando tudo o que foi exposto


anteriormente: desde o terrível acidente em Brumadinho, o mar de lama, bem como os
boletins e reportagens informando sobre barragens e acidentes. Tudo isto corrobora em
prejuízos para com o Autor.

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Pois, por ser residente em uma região afetada no caso de rompimento de
barragens, fato é que o imóvel do Autor resta desvalorizado EM FUNÇÃO DE ESTAR
A BEIRA DO RIO PARAOPEBA.

Além do mais, há o fato de que a Ré viola, frontalmente, dispositivo legal,


qual seja, a Lei Ordinária Estadual 23.291/19, que dispõe sobre as barragens a montante
no território mineiro, mas também traz a ordem expressa de sua descaracterização.

Isto, somado à conduta pregressa da Ré, tendo em memória os fatos


ocorridos no terrível evento denominado Mar de Lama, resultam em dano ao Autor e
responsabilidade civil para a Ré.

Por fim, o Autor vem a este Excelso Pretório com o fito de ser indenizado,
considerando o dano percebido contra si, praticado pela Ré, e conforme direito que será
exposto na sequência.

III - DO DIREITO
III.1 - DA RESPONSABILIDADE OBJETIVA DA RÉ – OPERAÇÕES DE
MINERAÇÃO – TEORIA DO RISCO INTEGRAL

Conforme se depreende dos atos constitutivos da Ré, esta opera no ramo de


mineração, ramo este de enorme importância, mas também que arrasta atrás de si
titânicas consequências.

É em função disso que a legislação pátria reconhece que a responsabilização


por danos em decorrência de operações minerárias é de caráter objetivo, segundo
colacionamos abaixo o disposto no artigo 14, §, da Lei Federal 6.938/81 que assim
dispõe, in verbis:

Art. 14 ...
§ 1º - Sem obstar a aplicação das penalidades previstas neste artigo, é
o poluidor obrigado, independentemente da existência de culpa, a
indenizar ou reparar os danos causados ao meio ambiente e a terceiros,
afetados por sua atividade. O Ministério Público da União e dos
Estados terá legitimidade para propor ação de responsabilidade civil e
criminal, por danos causados ao meio ambiente.

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Inclusive, a partir de tal dispositivo, temos a hermenêutica doutrinária
denominada teoria do risco integral. Tal teoria é uma doutrina jurídica que se aplica em
casos de responsabilidade civil, especialmente em casos de danos ambientais e acidentes
de trabalho. Segundo essa teoria, o causador do dano deve ser responsabilizado
independentemente de sua culpa, uma vez que se beneficia da atividade que gerou o
risco.

Essa teoria foi desenvolvida para solucionar problemas de responsabilidade


civil em situações em que o dano é decorrente de atividades que, por sua própria
natureza, apresentam um alto grau de risco, como a exploração de energia nuclear,
transporte de produtos químicos perigosos, construção de barragens e mineração, como
é o caso específico da Ré.

A doutrina reconhece que, nessas situações, é impossível evitar


completamente o risco de dano, mesmo que sejam tomadas todas as medidas de
segurança possíveis. Dessa forma, a responsabilidade pelo dano deve ser atribuída ao
responsável pela atividade que gerou o risco, independentemente de sua culpa. Neste
sentido, e segundo COLOMBO1:

A submissão à teoria integral permite que o poluidor assuma todo o


risco de sua atividade, desde que provado a existência do nexo causal
entre o dano e a fonte poluidora.

Em outras palavras, isto implica dizer que, se alguma pessoa, seja ela física
ou jurídica, ou empreendimento, é causador de um dano ou degradação ambiental,
deverá ela suportar a responsabilização civil ambiental, respaldada na teoria objetiva e
do risco integral, além de ser solidária àqueles que contribuíram para tais danos.

Além do mais, o ilícito persiste, uma vez que o Estado de Minas Gerais
promulgou a Lei Ordinária 23.291/19, que dispõe sobre as barragens a montante no
território mineiro, mas também traz a ordem expressa de sua descaracterização, como se
vê do seu artigo 13, e parágrafos, in verbis:
1
COLOMBO, Silvana Raquel Brendler. A responsabilidade civil no direito ambiental. In: Âmbito
Jurídico, Rio Grande, IX, n. 35, dez. 2006. Disponível em: Âmbito Jurídico - Educação jurídica gratuita e
de qualidade (ambitojuridico.com.br) . Acessado em: 01/03/2023

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Art. 13 Fica vedada a concessão de licença ambiental para operação
ou ampliação de barragens destinadas à acumulação ou à disposição
final ou temporária de rejeitos ou resíduos industriais ou de mineração
que utilizem o método de alteamento a montante.

§ 1º O empreendedor fica obrigado a promover a descaracterização


das barragens inativas de contenção de rejeitos ou resíduos que
utilizem ou que tenham utilizado o método de alteamento a montante,
na forma do regulamento do órgão ambiental competente.

§ 2º O empreendedor responsável por barragem alteada pelo método a


montante atualmente em operação promoverá, em até três anos
contados da data de publicação desta lei, a migração para tecnologia
alternativa de acumulação ou disposição de rejeitos e resíduos e a
descaracterização da barragem, na forma do regulamento do órgão
ambiental competente.

§ 3º Considera-se barragem descaracterizada, para fins do disposto


neste artigo, aquela que não opera como estrutura de contenção de
sedimentos ou rejeitos, não possuindo características de barragem,
sendo destinada a outra finalidade.

§ 4º A reutilização, para fins industriais, dos sedimentos ou rejeitos


decorrentes da descaracterização será objeto de licenciamento
ambiental, observado o disposto no caput do art. 6º desta lei.

Ocorre que nenhuma das barragens foi descomissionada até o momento, de


maneira que a Ré incorre em ilícito.

Nesta toada, a jurisprudência brasileira converge, como vemos de julgado


do Superior Tribunal de Justiça, o qual ecoa a incidência da teoria do risco integral,
cabendo a mera demonstração do nexo causal, como colacionamos abaixo:

RESPONSABILIDADE CIVIL POR DANO AMBIENTAL.


RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA.
ART. 543-C DO CPC. DANOS DECORRENTES DO
ROMPIMENTO DE BARRAGEM. ACIDENTE AMBIENTAL
OCORRIDO, EM JANEIRO DE 2007, NOS MUNICÍPIOS DE
MIRAÍ E MURIAÉ, ESTADO DE MINAS GERAIS. TEORIA DO
RISCO INTEGRAL. NEXO DE CAUSALIDADE.
1. Para fins do art. 543-C do Código de Processo Civil: a) a
responsabilidade por dano ambiental é objetiva, informada pela teoria
do risco integral, sendo o nexo de causalidade o fator aglutinante que
permite que o risco se integre na unidade do ato, sendo descabida a
invocação, pela empresa responsável pelo dano ambiental, de
excludentes de responsabilidade civil para afastar sua obrigação de
indenizar; b) em decorrência do acidente, a empresa deve recompor os
danos materiais e morais causados e c) na fixação da indenização por
danos morais, recomendável que o arbitramento seja feito caso a caso

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e com moderação, proporcionalmente ao grau de culpa, ao nível
socioeconômico do autor, e, ainda, ao porte da empresa, orientando-se
o juiz pelos critérios sugeridos pela doutrina e jurisprudência, com
razoabilidade, valendo-se de sua experiência e bom senso, atento à
realidade da vida e às peculiaridades de cada caso, de modo que, de
um lado, não haja enriquecimento sem causa de quem recebe a
indenização e, de outro, haja efetiva compensação pelos danos morais
experimentados por aquele que fora lesado.
2. No caso concreto, recurso especial a que se nega provimento.
(REsp n. 1.374.284/MG, relator Ministro Luis Felipe Salomão,
Segunda Seção, julgado em 27/8/2014, DJe de 5/9/2014.)

Portanto, a demonstração do nexo causal será o único condão a apontar o


direito pleiteado, vez que a teoria do risco integral encampa a obrigação de indenizar
objetivamente.

III.2 - DO DANO MATERIAL – DESVALORIZAÇÃO DE IMÓVEL EM


RAZÃO DE OPERAÇÕES MINERÁRIAS – NEXO DE CASUALIDADE –
PROVA PERICIAL

Ao tratar da reparação em danos, a legislação civilista assim dispõe:

Art. 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou


imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que
exclusivamente moral, comete ato ilícito.

Art. 927. Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a
outrem, fica obrigado a repará-lo.
Parágrafo único. Haverá obrigação de reparar o dano,
independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou
quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano
implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem.

Segundo lições de ROSENVALD2, a responsabilidade civil advém da


convivência em sociedade, onde é exigido de todos um dever negativo de não causar
danos a esfera jurídica de terceiros. Ainda, sobre os dispositivos citados em retro:

Caso haja a violação do dever de abstenção, mediante a lesão a um


direito alheio, que possa ser atribuída a uma conduta antijurídica
voluntária ou involuntária, mesmo a uma atividade de risco lícita com
potencialidade lesiva, incidirá a responsabilidade extracontratual, a
teor do exposto nos artigos 186, 187 e 927 do Código Civil. Se o dano
puder ser imputado a uma pessoa ou a um responsável, o ordenamento
2
ROSENVALD, Nelson; FARIAS, Cristiano Chaves de. Direito das Obrigações. 4ª edição. Editora
Lumen Juris, Rio de Janeiro, 2010. Pág. 94.

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não admitirá como razoável que a vítima tenha que suportar a lesão.
Assim, surgirá a obrigação de indenizar, em regra pela prestação de
indenização do equivalente pecuniário. (grifo nosso)

Em resumo, o dever de indenizar advém da responsabilidade civil,


considerando o nexo de causalidade entre o agente, o dano e a vítima que experimenta o
dano. Em sede de responsabilidade civil, ofensor e ofendido não estavam previamente
ligados por relação jurídica, de maneira que a reparação advém da violação de deveres
gerais de respeito aos bens e direitos alheios.

No caso concreto, e conforme exaustivamente demonstrado no tópico


precedente, a Ré, sendo mineradora, subsume-se à teoria do risco integral, de maneira
que a sua responsabilidade é objetiva cabendo, meramente, a demonstração do nexo
causal. Sobre isto, temos a jurisprudência colacionada abaixo:

EMENTA: AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO DE


INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS.
ROMPIMENTO DA BARRAGEM DO CÓRREGO DO FEIJÃO, EM
BRUMADINHO. DANOS MATERIAIS POR DESVALORIZAÇÃO
DO IMÓVEL. EXTINÇÃO PARCIAL. ILEGITIMIDADE ATIVA.
AFASTADA. TEORIA DA ASSERÇÃO.
POSSUIDOR/PROPRIETÁRIO. RECURSO PROVIDO.
- A legitimidade da parte decorre da titularidade dos interesses em
conflito e deve ser analisada de forma abstrata, desvinculada de
apreciação probatória e da discussão sobre o mérito.
- Sendo a alegação dos autores de que são possuidores e proprietários,
apresentando, para tanto, contrato de compra e venda reconhecido em
cartório, revela-se abstratamente a legitimidade ativa para pleitear os
danos patrimoniais fundados na desvalorização do imóvel.
- Possui legitimidade ativa para postular indenização por danos
materiais o proprietário ou o possuidor de bem imóvel que sofrer ato
ilícito.
- Recurso provido.  (TJMG -  Agravo de Instrumento-Cv
1.0000.22.138659-2/001, Relator(a): Des.(a) Narciso Alvarenga
Monteiro de Castro (JD Convocado) , Câmara Justiça 4.0 - Cível Pri,
julgamento em 13/02/2023, publicação da súmula em 14/02/2023)

Sobre a demonstração do nexo de causalidade, no caso aqui trazido a lume é


possível aponta-lo mediante prova pericial, que irá demonstrar não apenas qual é o valor
do dano material experimentado, mas que a desvalorização do imóvel objeto é
decorrente diretamente de sua localização em zona de autossalvamento de
responsabilidade da Ré. Sobre isto, o Tribunal de Justiça tem firme posicionamento,
como apontamos abaixo:

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EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO INDENIZATÓRIA -
ROMPIMENTO DA BARRAGEM DE REJEITOS DA MINA
CÓRREGO DO FEIJÃO, EM BRUMADINHO - PRELIMINARES -
INÉPCIA DA INICIAL - INOCORRÊNCIA INTERESSE DE AGIR
- DIREITO INDIVIDUAL HOMOGÊNEO NÃO SUJEITO À AÇÃO
COLETIVA PROPOSTA - LEGITIMIDADE ATIVA - TEORIA DA
ASSERÇÃO - RESPONSABILIDADE OBJETIVA - TEORIA DO
RISCO INTEGRAL - INDENIZAÇÃO PELA DESVALORIZAÇÃO
DE IMÓVEL SITUADO EM BRUMADINHO - AUSÊNCIA DE
COMPROVAÇÃO - INDENIZAÇÃO INDEVIDA. I - O ajuizamento
de demanda coletiva não obsta que a parte busque, por meio de ação
individual, o reconhecimento do seu direito, visto que não há a
ocorrência de litispendência ou de conexão, podendo, portanto,
coexistirem ações individuais correlatas à demanda coletiva, não
havendo que ser falar em falta de interesse da agir. IV- Há
legitimidade ativa quando o autor, em ação de conhecimento versando
sobre indenização individual, e não de cumprimento de acordo
firmado em ação coletiva em decorrência dos danos causados à
coletividade, não pleiteia direito difuso, mas apenas a condenação da
requerida ao pagamento da quantia que entende devida. V- É
incontroverso que a mineradora ré causou grave dano ambiental em
razão do rompimento da Barragem I da Mina Córrego do Feijão, em
Brumadinho, cabendo, entretanto, à vítima a comprovação dos danos
individuais experimentados, dos quais pretende reparação, e do nexo
de causalidade. VII- Em se tratando da desvalorização de imóveis,
impõe-se uma análise/averiguação por quem possui expertise no
assunto (arquiteto/engenheiro ou corretor), não se prestando a tanto
apenas os documentos que indicam tal fato. VI- Não tendo a parte
autora se desincumbido de produzir a prova pericial necessária para
apuração da existência, qualificação, quantificação e extensão dos
danos materiais alegados, impõe-se a manutenção da sentença que
julgou improcedente seu pedido de indenização pela alegada
desvalorização do seu imóvel, em razão da tragédia de Brumadinho.
(TJMG - Apelação Cível  1.0000.22.075611-8/001, Relator(a): Des.(a)
João Cancio , 18ª CÂMARA CÍVEL, julgamento em 30/08/2022,
publicação da súmula em 30/08/2022) – grifo nosso.

Adiante, e como apontado anteriormente, a conduta da Ré e o acidente


ocorrido em Brumadinho vêm trazendo enormes prejuízos e insegurança a população,
principalmente aqueles residentes próximos ao Rio Paraopeba.

Considerando, portanto, que o Autor é o legítimo possuidor do imóvel


objeto da presente lide, a prova pericial será capaz de demonstrar a desvalorização
imobiliária em função da desídia da Ré, surgindo, consequentemente, o dever de
indenizar.

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Isto porque, em análise a ação civil pública, instaurada pelo Ministério
Público, de nº. 5000053.16-2019.8.13.0090, aponta que o ocorrido em Brumadinho
afetou, diretamente, o mercado imobiliário da região, como colacionamos abaixo:

A desvalorização imobiliária também foi identificada pela


Subsecretaria de Meio Ambiente do município de Fortuna de Minas
em ofício ao Ministério Público, o que será detalhado em tópico
específico neste documento. Situações dessa natureza também foram
verificadas em outros municípios atingidos, como, por exemplo, o
caso de morador do município de Esmeraldas.
O morador disse que os proprietários dos ranchos/chalés/sítios na
beira do rio, estão preocupados com a desvalorização de seus imóveis
no caso de futura venda. Relatou que estava negociando a venda de
seu rancho e que após o rompimento, a possível a compradora desistiu
do negócio. (Relatório CIMOS, 09 de abril de 2019, Bairro Taquara,
Esmeraldas). A região do entorno do lago da UHE de Retiro baixo,
localizado entre os municípios de Curvelo e Pompéu, é marcada pela
existência de diversos por chacreamentos e condomínios rurais, que
atraiam pessoas interessadas em residir no entorno do lago pela sua
beleza cênica. O mercado imobiliário estava em franca expansão.

Com o rompimento, pelo fato de o lago servir como local de


deposição de grande parte dos rejeitos, a desvalorização dos imóveis
foi avassaladora, e toda a cadeia econômica relacionada à expansão
imobiliária estagnou e entrou em severo declínio. Os diversos
proprietários que estavam construindo na região pararam suas obras.
A cadeia relacionada à Construção Civil, foi duramente prejudicada,
afetando desde os trabalhadores autônomos até os comerciantes de
material de construção.

A partir dos relatos e notícias é possível observar que, dentre as


consequências do Desastre da Vale, incluem-se a desvalorização e a
dificuldade de comercializar imóveis em diversos municípios
banhados pelo rio Paraopeba. Situação que tem deixado as pessoas
atingidas ainda mais apreensivas em relação ao futuro.

Segundo se vê das notícias veiculadas na mídia, é muito claro que a


população, como um todo, tem conhecimento do sofrimento daqueles que vivem na
região do Vale do Paraopeba, degradando o interesse nos imóveis localizados naquelas
área, dilapidando, portanto, o patrimônio do Autor, sendo este o dano experimentado
por ele. O mercado imobiliário segue prejudicado.

Há de se ressaltar, ainda, que o dano existe independente de haver


negociação para a venda o imóvel o que não vem ao caso. Isto porque o ponto a ser
demonstrado, aqui, é que o imóvel do Autor resta desvalorizado em função da conduta
da Ré, em latente dano material, resultando em responsabilização civil.

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Assim, o Autor busca a reparação por danos materiais, a serem apurados
mediante prova pericial a tempo e modo, contra a Ré.

IV – DOS PEDIDOS E REQUERIMENTOS

Considerando tudo o que foi exposto, o Autor pede pela condenação da Ré


em danos materiais, considerando a desvalorização decorrente do fato de que seu
imóvel está localizado próximo ao Rio Paraopeba, e o rompimento da barragem em
Brumadinho, bem como a conduta desidiosa e ilícita da Ré corrobora com a sensação de
insegurança, causando da dilapidação do patrimônio do Autor.

Para tanto, o Autor ainda requer:

1) A citação da Ré de forma eletrônica, nos termos do que dispõe o artigo


246, do CPC/15, e Aviso nº. 36/CGJ/2020, para que apresente resposta
ou então sofra os efeitos da decretação da revelia;

2) a concessão das benesses da gratuidade da justiça, vez que o Autor não


possui condições de arcar com as despesas processuais sem prejuízo de
seu sustento e de sua família;

3) a produção de prova pericial e documental, a iniciar pelos documentos


acostados a esta exordial; e

Dá a causa o valor de R$ 50.000,00 (cinquenta mil reais).

Belo Horizonte, 05 de julho de 2023.

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