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A Santa Aliança - Cinco Séculos de Espionagem No Vaticano (PDFDrive)
A Santa Aliança - Cinco Séculos de Espionagem No Vaticano (PDFDrive)
Frattini
A SANTA
ALIANÇA
CINCO SÉCULOS DE
ESPIONAGEM DO VATICANO
Formatação/Conversão ePub: Reliquia
Tradução: Serafim Ferreira
Título: A SANTA ALIANÇA - CINCO SÉCULOS DE ESPIONAGEM DO VATICANO
Autor: Eric Frattini
Título original: La Santa Alianza - Cinco siglos de espionaje Vaticano Tradução: Serafim Ferreira
Capa: Campo das Letras
Fotografia da capa: Jeff J. Mitchell - Cordon Press © Eric Frattini, 2004
© CAMPO DAS LETRAS - Editores, S. A., 2005
Rua D. Manuel II, 33 - 5. ° 4050-345 Porto Telef.: 226 080 870 - Fax: 226 080 880
E-mail: campo.letras@mail.teIepac.pt
Site: www.campo-letras.pt
Impressão: Raínho & Neves, Lda/Santa Maria da Feira 1ª edição: Outubro de 2005
3ª edição, revista: Janeiro de 2006
Depósito legal n. °: 233231/05
ISBN: 972-610-984-1
Código de barras: 9789726109846
Coleção: Campo da Atualidade - 87 Código do livro: 1.02.087
Eric Frattini (Lima, 1963) é jornalista. Foi correspondente da Cadena Ser, do
jornal Cinco Dias e do Canal Plus no Médio Oriente. Entre as suas obras,
destacam-se Cuestiones para la Paz – Entre Ia sombra de Alá y Ia estreita de
David (1992), La Entrevista, et Arte y Ia Ciência (1994), Tiburones de La
Comunicación. Grandes líderes dos grupos multimedia (1996), Osama bin
Laden, La Espada de Alá (2001) e Secretos Vaticanos (2003). Atualmente é
colaborador de programa “Cada dia” na Antena Televisión.
Desde 1566, ano em que foi criado o serviço de espionagem do Vaticano, até aos
nossos dias, a Santa Aliança e a sua contra-espionagem viram-se envolvidas em
assassinatos, venda de armas, financiamento de ditaduras, fuga de criminosos de
guerra nazis e falências bancárias. Tudo em nome de Deus e da fé católica e por
ordem do Sumo Pontífice.
A Santa Aliança é um ensaio surpreendente que relata cinco séculos de
operações encobertas do serviço de espionagem pontifício.
“Se o Papa ordena liquidar alguém na defesa da fé, faz-se isso sem fazer
perguntas. Ele é a voz de Deus e nós [a Santa Aliança] somos a mão executora”.
Cardeal Paluzzo Paluzzi, chefe da Santa Aliança, século XVII.
Ao Hugo, o mais valioso para mim, por estar sempre presente e me dar o seu
amor em cada dia da sua vida …
A Silvia, pelo seu amor e incondicional apoio em tudo o que faço …
A minha Mãe, por estar sempre a apoiar-me e a animar-me …
“Em cada operação de espionagem existe o que está acima e o que está por baixo
da escrita. Por cima está o que alguém faz de acordo com as normas. Por baixo
está a forma como alguém deve fazer o trabalho.”
John Le Carré, Um Espião Perfeito.
Sumário
Agradecimentos
Introdução
1
Entre a Reforma e uma nova aliança (1566-1570)
2
Os anos obscuros (1570-1587)
3
Tempos de aventura (1587-1605)
4
Novos horizontes (1605-1644)
5
A era da expansão (1644-1691)
6
Época de intrigas (1691-1721)
7
O governo dos breves (1721-1775)
8
A ascensão e queda das águias (1775-1823)
9
O tempo dos espiões (1823-1878)
10
A associação dos ímpios (1878-1914)
11
O cavaleiro do Apocalipse (1914-1917)
12
Intrigas pela paz (1917-1922)
13
A era dos ditadores (1922-1934)
14
A ascensão do terror (1934-1940)
15
O fim dos mil anos (1940-1945)
16
“Odessa” e o “Corredor vaticano” (1946-1958)
17
As novas alianças (1958-1976)
18
“Vaticano S. A.” e os negócios de Deus (1976-1978)
19
A hora dos assassinos (1979-1982)
20
Os anos polacos (1982-2005)
Epílogo
Anexo
Relação dos papas desde a criação da Santa Aliança
Bibliografia
Agradecimentos
As fontes que me prestaram uma ajuda inestimável e cujos nomes preferi que
não aparecessem neste livro.
As fontes que me prestaram uma ajuda inestimável e me pediram para não ser
citadas neste livro.
Aos arquivistas e bibliotecários que trabalham nas mais de trinta e nove
instituições de catorze países que eu consultei. Sem a facilidade na consulta de
muitos documentos, não poderia ter escrito este livro.
A Tuhviah Friedman, diretor do Institute of Documentation for the Investigation
of Nazi War Crimes, em Haifa (Israel), por me ter facilitado toda a
documentação acerca das relações do Vaticano com a Alemanha nazi, a
informação sobre as relações de membros da hierarquia vaticana na evasão de
criminosos de guerra nazis, e os expedientes habilidosos de altos responsáveis
nazis que mantiveram contactos com Pio XII durante a ocupação da Itália.
A Alison Weir, pela sua magnífica documentação sobre o reinado de Maria
Stuart e a sua época.
A Dorothee Lottmann-Kaeseler, diretora do Active Museum of Ger-man Jewish
History, em Wiesbaden, República Federal da Alemanha.
A Debbie Weierman, do quartel-general do FBI em Washington D. C, por me
permitir o livre acesso aos documentos sobre a presidência de Ronald Reagan.
A Lee Strickland, coordenador do Gabinete de Informação da Agência Central
de Inteligência (CIA), em Washington D. C, por me permitir o livre acesso aos
documentos sobre a intervenção dos Estados Unidos na Polónia.
A William B. Black Júnior, subdiretor do Serviço Central de Segurança da
Agência de Segurança Nacional (NSA), em Fort Meade (Maryland).
A David M. Cheney, por me permitir consultar os seus magníficos e bem
documentados arquivos históricos sobre a hierarquia católica e a Cúria Romana.
Sem eles, teria sido difícil escrever este livro.
A Javier Soriano Abellán, pela sua inestimável ajuda no momento de classificar
o material fotográfico que aparece neste livro.
A Marisol Blanco-Soler, José Miguel Carrillo de Albornoz, Marisa González
Serna, Soledad Abellán e Javier Soriano, pelo empréstimo de manuscritos que
para mim eram difíceis de encontrar.
A José Manuel Vidal, pelos seus admiráveis conselhos de erudito e por ter
realizado a dura tarefa de ler o manuscrito.
A Juan Torres, por me ajudar a proteger este texto dos ataques informáticos, e a
SET127 por não tê-lo conseguido.
A Manuel Fernandez Alvarez, um verdadeiro mestre, pelo que aprendi ao ler o
seu livro Felipe II y su tiempo.
A Luis Arbaíza Blanco-Soler, não sei se devo ou não agradecer-lhe o estímulo
dado no Verão de 2003 para escrever este livro. De qualquer modo, também lhe
agradeço.
A Olga Adeva, pelo carinho com que sempre trata os meus textos.
A Pilar Cortés, a minha editora, por acreditar nesta história e em mim.
E, por último, e muito em especial, um agradecimento a todas as pessoas e
organismos que me colocaram entraves, barreiras e dificuldades para evitar que
este livro fosse o que é hoje. Foi isso que me permitiu agudizar o sentido de
curiosidade e, portanto, a minha investigação.
A todos, o meu mais humilde e sincero agradecimento. Uma parte deste livro é
de todos eles.
Introdução
O Papado, a suprema autoridade da Igreja Católica, é a mais antiga organização
do Mundo e a única instituição que floresceu na Idade Média. Foi um ator
privilegiado no Renascimento, foi um dos protagonistas da Reforma e da Contra-
Reforma, da Revolução Francesa e da era industrial, da ascensão e queda do
comunismo. Ao longo dos séculos, os papas, com base na sua famosa
“infalibilidade”, centralizaram o impacto social que os acontecimentos históricos
produziam em todo o Mundo. O historiador Thomas Babington, no seu estudo
sobre a história do protestantismo, afirmava que os papas souberam centralizar a
Igreja, assim como souberam amortecer o seu impacto nos eventos históricos.
Este autor acentuava mesmo a habilidade da Igreja para se apropriar ou se
adaptar aos novos movimentos sociais que se formaram durante os séculos.
O imperador Napoleão Bonaparte considerava o Papado como “um dos melhores
ofícios do Mundo”, e Adolf Hitler dizia ser “um dos mais perigosos e delicados
da política mundial”. Napoleão comparava a força de um único papa com a força
de um exército de duzentos mil homens. Na verdade, o Papado atuou sempre
com duas caras ao longo de toda a História: a de cabeça da Igreja Católica em
todo o Mundo e a de uma das maiores organizações políticas do planeta. Por um
lado, os papas abençoavam os seus fiéis, por outro, recebiam embaixadores e
chefes de Estado de diversos países e enviavam núncios e legados em missões
especiais.
Este poder levou muita gente a encarar os papas mais como “pais dos príncipes”
do que como “vigários de Cristo”. Os pontífices clamavam desde o século VIII a
primazia e a jurisdição universal para os seus atos, até que, em 1931, com a
criação da Rádio Vaticano, se tornou possível essa primazia e essa jurisdição ao
estabelecer um permanente contacto com o Mundo. Ao longo da Reforma,
Lutero atacava o Papado como um mal humano desnecessário. O historiador
católico Lorde Acton criticava a excessiva centralização do Papado e, após uma
viagem a Roma, afirmava que “o poder corrupto e o poder absoluto corrompem
absolutamente”.
A história da Santa Aliança – o serviço de espionagem do Vaticano – não pode
ser relatada sem se contar a história dos papas e a história dos papas não pode ser
descrita sem se contar a história da Igreja Católica. O que está claro é que sem o
catolicismo o papa não existiria e, como disse Paulo VI na sua encíclica
Ecclesiam suam, “sem o papa a Igreja Católica talvez não fosse católica”. O que
é realmente verdade é que sem o poder real que os papas tiveram não existiria a
Santa Aliança ou o Sodalitium Pianum, a contra-espionagem. Ambos fizeram
parte dessa engrenagem que ajudaram a construir: a Santa Aliança desde a sua
fundação em 1566 por ordem do papa Pio V e o Sodalitium Pianum (S. P.) desde
a sua criação em 1913 por ordem do papa Pio X.
Um outro historiador, Cario Castiglioni, autor de uma das melhores
enciclopédias sobre os papas, chegou a escrever: “A tripla tiara que os pontífices
usam simboliza, sem dúvida, o poder destes no céu, na terra e no mundo terreno
(underworld)”. É fácil explicar esta afirmação: no céu, o papa tem Deus, na
terra, o papa basta-se a si mesmo e na clandestinidade (undenvorld{1}) o papa
tem a Santa Aliança.
Apesar de a autoridade papal se ter alterado com as modernizações e renovações,
tanto políticas como económicas, os interesses da Igreja foram sempre o motivo
pelo qual se movimentaram os espiões do Vaticano. Os peritos vaticanistas
asseguram que a Igreja e as estruturas papais nunca abandonaram a sua imagem
de Império, ao mesmo tempo que observam que os aspectos de culto pela figura
de um imperador foram simplesmente transferidos para a figura do papa.
Os quarenta papas que governaram, ou melhor, “reinaram” desde a criação da
Santa Aliança, desde Pio V até João Paulo II, tiveram de se confrontar com as
descristianizações e cismas, revoluções e ditadores, colonizações e expulsões,
perseguições e atentados, guerras civis e guerras mundiais, assassínios e
sequestros. A política dos papas era um objetivo e a Santa Aliança apenas um
poderoso instrumento para a levar a cabo. Do século XVI ao século XVIII, os
inimigos com os quais o Papado e a Santa Aliança tiveram realmente de se
debater foram os liberalismos, os constitucionalismos, as democracias, os
republicanismos ou os socialismos. Mas nos séculos XIX e XX esses inimigos
converteram-se em darwinismo, americanismo, modernismo, racismo, fascismo,
comunismo, totalitarismo ou revolução sexual. No século XXI será a intromissão
dos cientistas nas próprias questões religiosas, o bloco político único, a
superpopulação, o feminismo ou o agnosticismo social.
Este fato vem demonstrar que, muitas vezes, a política vaticana e o seu serviço
secreto andaram em paralelo, utilizando diferentes métodos com o único
propósito de alcançar um mesmo objetivo. Por um lado, o papa negociava a
paralisação de medidas contrárias a Roma e, por outro, a Santa Aliança e a
“Ordem Negra” intervinham na destruição dos seus inimigos.
David Rizzio, Lamberto Macchi, Roberto Ridolfi, William Parry, James
Fitzmaurice, Marco António Massia, Giulio Alberoni, Alexandre de Médicis,
Giulio Guarnieri, Tebaldo Fieschi, Charles Tournon, John Bell ou Giovanni
DaNicoIa foram alguns dos agentes da Santa Aliança que, através das suas
operações, mudaram o curso da História desde meados do século XVI até ao
século XXI.
Ludovico Ludovisi, Lorenzo Maggaloti, Olimpia Maidalchini, Sforza
Pallavicino, Paluzzo Paluzzi, Bartolomeo Pacca, Giovanni Battista Caprara,
Annibale Albani, Pietro Fumasoni Biondi ou Luigi Poggi foram alguns dos
poderosos chefes da espionagem pontifícia que decidiram e realizaram, sempre
em defesa da fé, várias operações encobertas, crimes políticos e de Estado ou
meras “Iiquidações” de figuras secundárias que interferiam na política do papa
vigente e na de Deus no mundo.
Foram assassinados reis, envenenados diplomatas, apoiados grupos em conflito
como norma da diplomacia pontifícia, fecharam-se os olhos a catástrofes e
holocaustos, foram financiados grupos terroristas e ditadores sul-americanos,
protegeram-se criminosos de guerra e lavou-se dinheiro da Máfia, manipularam-
se mercados financeiros e falências bancárias, condenaram-se os conflitos
enquanto se vendiam armas aos combatentes, e tudo isso em nome de Deus. A
Santa Aliança e o Sodalitium Pianum foram os seus instrumentos.
Desde que o inquisidor Pio V, santificado anos depois, fundou a espionagem do
Vaticano no século XVI com o único objetivo de acabar com a vida da herege
Isabel I da Inglaterra e de apoiar a católica Maria Stuart, o Estado Vaticano
nunca reconheceu a existência da Santa Aliança ou da contra-espionagem, o
Sodalitium Pianum, embora se possa dizer que as suas operações foram um
“segredo público”. Simon Wiesenthal, o famoso caça-nazis, disse numa
entrevista que “o melhor e mais efetivo serviço de espionagem que eu conheço
no Mundo é o do Vaticano”. O cardeal Luigi Poggi, que era conhecido como “o
espião do Papa” (João Paulo II), foi quem levou a cabo uma das maiores
modernizações da Santa Aliança devido aos estreitos contactos com o Mossad
israelita. Graças à sua importância, o serviço secreto israelita pôde desarticular
um atentado contra a primeira-ministra Golda Meir na sua visita a Itália. Poggi
seria também o responsável por utilizar os fundos do Vaticano necessários,
através do IOR de Paul Marcinkus, para financiar o sindicato “Solidariedade”
dirigido por Lech Walesa, que seria uma operação conjunta entre a CIA de
William Casey e a Santa Aliança.
Nos seus cinco séculos de história, a extensa sombra da Santa Aliança tornou-se
visível nas lutas contra a rainha Isabel I da Inglaterra ou na carnificina na noite
de São Bartolomeu; na aventura da Armada Invencível, no assassínio de
Guilherme de Orange e do rei Henrique IV de França; na Guerra de Sucessão
espanhola ou na crise com a França dos cardeais Richelieu e Mazarino; no
atentado contra o rei dom José I de Portugal; na 15 Revolução Francesa e em
Austerlitz; na ascensão e queda de Napoleão, na guerra de Cuba e na de
Secessão americana; nas relações secretas com o kaiser Guilherme II durante a
Primeira Guerra Mundial ou com Adolf Hitler na Segunda Guerra Mundial; com
o “Oiro da Croácia” e com a organização “Odessa”; na luta contra o grupo
terrorista “Setembro Negro”, Carlos o Chacal ou o comunismo; nas obscuras
finanças do IOR e nas muito mais obscuras relações com a Maçonaria, a Máfia e
o tráfico de armas; na criação de empresas financeiras em paraísos fiscais ou no
financiamento de ditadores de direita como Anastasio Somoza ou Jorge Videla.
Durante os últimos cinco séculos da sua existência, as sociedades secretas
dependentes da Santa Aliança, como o “Circulo Octogonus” ou a “Ordem
Negra”, realizaram várias operações encobertas para serviços de espionagem de
outros países, como o Mossad israelita ou a CIA norte-americana. Enquanto
lutavam contra um inimigo claro, o terrorismo árabe ou o “maléfico”
comunismo, a Santa Aliança adaptou-se aos tempos e às situações que marcaram
os Sumos Pontífices, porque, como disse um dia o todo – poderoso cardeal
Paluzzo Paluzzi, chefe da Santa Aliança em meados do século XVII, “se o Papa
ordena liquidar alguém na defesa da fé, faz-se isso sem fazer perguntas. Ele é a
voz de Deus e nós [a Santa Aliança] somos a sua mão executora”.
Este livro é apenas um breve “trajeto”, feito durante cinco séculos de história,
através das operações encobertas do poderoso serviço de espionagem do Estado
da Cidade do Vaticano. Os sacerdotes-agentes do serviço de espionagem papal, a
Santa Aliança, e da contra-espionagem, o Sodalitium Pianum, mataram,
roubaram, conspiraram e atraiçoaram em nome de Deus e da fé católica às
ordens do Sumo Pontífice. Os espiões do papa foram o símbolo perfeito da
simbiose sob cujo lema atuaram: “Pela Cruz e pela Espada”. Todos os fatos que
nestas páginas se relatam são reais, tal como o são todas as personagens que
nelas se referem.
EI Tamaral, 2004
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