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Ciganos mágicos da natureza


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Ciganos mágicos da natureza

CIGANO
S

MÁGICOS
DA
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Ciganos mágicos da natureza

NATUREZA
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Ciganos mágicos da natureza

EDITORA IMPÉRIO DA CULTURA LTDA


Autoria:
Batista D’ Obaluayê

Capa:
Batista D’ Obaluayê

Editor:
Editora Império da Cultura

Revisão de textos:
Editora Império da Cultura

Composição:
Batista D’ Obaluayê

Editoração:
Editora Império da Cultura

Rio de Janeiro – RJ – Brasil


2000

ISBN 85.86896.16-0
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Ciganos mágicos da natureza


Proibido a reprodução total ou parcial desta obra, de qualquer forma ou por
qualquer meio eletrônico, mecânico, inclusive através de processos
Xerográficos, sem permissão expressa do Autor ou Editor. Lei nº 9.610 de
19.02.98.
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Ciganos mágicos da natureza

CIGANOS MAGICOS DA NATUREZA

1ª Edição

Rio de Janeiro / Brasil

Editora Império da Cultura

2012
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ORIGEM CIGANA
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Estudar-se a origem de um povo, sua formação


e desenvolvimento como estrutura social, religiosa,
econômica e política, este estudo baseia-se
fundamentalmente em documentos ou registros
escritos, que ao lado de outros elementos como ruína
da arquitetura da época, pinturas, armas, túmulos,
recintos que surgem ter sido usados como sacros,
objetos os mais diversos, especialmente de uso
doméstico, recompõem toda a narrativa de um
conjunto de indivíduos que habitam a mesma região,
ficando subordinados às mesmas leis e partilhando
dos mesmos hábitos e costumes.

A mais importante fonte de referência é a


narrativa escrita encontrada até então, das mais
diversas formas, inclusive em templos, santuários e
outros locais devocionais, que eram provavelmente
considerados sagrados e onde são encontradas marcas
de rituais e altares de oferendas aos deuses.

É muito difícil definir a verdadeira origem do


povo cigano, assim como sua reconstituição histórica
desde os seus primórdios, com um número suficiente
de dados para garantir sua autenticidade. Pôr tanto
sua origem é ainda baseada em conjecturas,
similaridades ou suposições.
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Baseado nos estudos e pesquisas até então, a
hipótese mais acertada é que o povo cigano teve seu
berço na civilização da Índia antiga. Estudiosos e
pesquisadores comparam o sânscrito, que era o
idioma usado na linguagem escrita e falada na índia,
um dos mais antigos idiomas do mundo, com o
idioma falado pelos ciganos e encontraram um sem-
número de palavras com o mesmo significado, daí
então a conclusão que o povo cigano se originou na
índia.

Assim como para os hindus, para os Ciganos a


religiosidade é muito forte e norteia muito de seu
comportamento, impondo normas e fundamentos
importantes, que devem ser respeitados e obedecidos.

Não há como negar, que tanto o povo hindu


como o povo cigano possuem sentimentos muito
fortes sobre religião, as leis divinas, suas execução,
procedimentos, infrações com as resultantes
conseqüentes.

Um dos fatos que mais chama atenção para a


provável origem indiana do povo cigano é a santa por
quem nutrem o mais devotado amor e respeito,
chamada Santa Sara Kali.

Santa Sara Kali, é também venerada pelo povo


hindu como uma deusa, que consideram como a Mãe
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Mater., a Sombra da Morte. Segundo as lendas


sua pele é negra tal como Shiva, que é uma das
pessoas da Trindade Divina para os indianos
( Braman, Vishnu e Shilva ).

Segundo ainda as lendas essa deusa exprime


com muita clareza sua natureza feminina, o princípio
maternal que gera e nutre a vida, tal aspecto positivo
não necessita de maior ênfase.

Kali é a forma feminina da palavra Kala, que


significa “ tempo ” - princípio que tudo gera e tudo
aniquila, em cujo fluxo tudo que ingressa na
existência esvai-se de novo, depois de expirar o breve
fascínio da vida cuja partilha ele efetua.

Para os ciganos, Sara, a santa venerada, possui


a pele negra, daí ser conhecida como Sara Kali, a
negra, num paralelismo claro com a deusa hindu.

Sara distribui bênçãos ao povo, patrocina a


família, os acampamentos, os alimentos e também
tem força destruidora, aniquilando os poderes
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negativos e os malefícios que passam assolar a nação


cigana.

O gosto pôr alguns hábitos, como a dança e a


função ritualística da mesma em várias situações, a
forma recatada das vestes das mulheres não expondo
o corpo, também podem ser considerados outras
similaridades entre os hindus e os ciganos, reforçando
a tese da origem indiana do povo cigano.

Os ciganos teriam se originado numa outra


parte qualquer do mundo e rumado para a Índia, onde
teriam ficado estabelecidos pôr séculos, o que
explicaria tantas semelhanças, inclusive quanto ao
idioma sânscrito.

Eles teriam também assimilado a linguagem


escrita dos indianos.

Assim como determinados povos


desapareceram quase que misteriosamente, como o
Inca ( Peru ) e o Maia e o Asteca ( México ), outros
surgiram de maneira não menos misteriosa, como o
cigano.
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Nas migrações existe o desejo do novo, da


realização de mudanças, de um diferente e mais
propício local onde deitar raízes e criar família em
paz e segurança, ou fazer os negócios prosperarem,
ou ainda poder desfrutar os avanços culturais de
outras regiões e povos, sua modernidade, progresso,
tecnologia e ciência, e democracia.

Baseado em alguns desses fatos, podemos


supor que num passado muito remoto, o povo cigano
também iniciou uma caminhada em busca de novas
terras onde pudessem viver com liberdade, mantendo
seus hábitos e costumes originais, liberdade que lhe
permitiria sua perpetuação, a sobrevivência de seus
valores e de seus direitos como seres humanos livres.

Nômade, que é talvez uma das características


mais expressivas de sua estrutura social e a melhor
maneira que encontrou de manter viva sua tradição ao
longo do tempo.

O nômade é o mais amplo sentido de liberdade.


Esse povo não tem nenhum apego a nenhum lugar em
especial, não deita raízes que não possam ser
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arrancadas quando o desejo de ganhar estrada
acontecer.

O povo Nômade não se preocupam com o


possuir, mas com o viver. O mais importante para
esse povo é se sentir livre como o vento, e poder estar
em um lugar quando o sol nasce e em outro bem
diferente quando chega o poente. Só o presente é tão
importante para eles. O passado é experiência e
vivência já conquistadas e o futuro, uma expectativa
aventureira, que ele entrega ao Poder Maior.

Esse povo ciganos são nômades pôr excelência,


não têm pátria, são universais. As famílias possuem
um profundo sentido de união e solidariedade entre
si.

Se esse comportamento não fosse exercitado,


talvez o povo cigano já estivesse extinto, pois pela
sua maneira peculiar de viver, pelo seu nomadismo,
pôr seus costumes particulares pouco convencionais,
pois o povo cigano é vista com desconfiança e receio
pelos demais povos, os não-ciganos, que muitas vezes
atacam, praticando injustiças, emprestando-lhe má
fama e a reputação de ladrões.

O povo cigano, não se esforçam pôr quebrar as


barreiras, que os separam dos demais povos, talvez
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pôr saberem que se abrirem os limites de seus
acompanhamentos aos gadjôs ou não-ciganos,
também chamados de gadjês, a mescla dos povos será
inevitável, as tradições perderão sua pureza, os
costumes e hábitos serão modificados, os princípios e
valores de tal maneira modificados, que mantém
características e traços dos pais, mas são diferentes,
ficando pouco a pouco mais distantes das fontes
originais, que pôr sua vez – gradativamente – vão se
apagando sob o riso da extinção total.

A principal maneira de os ciganos se manterem


unidos, vivos, com suas tradições preservadas é o

idioma universalmente falada pôr eles, o ROMANÊ


OU RUMANEZ, que é uma linguagem própria e
exclusiva.

Essa linguagem é a forma que os mesmos


identificam-se ao se encontrarem, com absoluta
certeza que trata-se de fato de verdadeiros ciganos,
pois esse idioma não é ensinado a pessoas que não
são ciganos de fato e direito.

Pois é expressamente proibido, ensinar o


idioma a pessoas não ciganas, não fieis à tradição.
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O romanê é uma língua ágrafa, ou seja, uma
língua ou um idioma sem a forma escrita. Portanto,
para sua perpetuação o romanê conta somente com a
transmissão oral de uma geração para a outra, de pai
para filho.

Não existem registros que ensinem uma


linguagem, que não tem sequer uma apresentação
gráfica definida, pois se os ciganos tivessem se
originado na Índia teríamos os caracteres sânscritos,
mas como encontramos ciganos em quase todas as
partes do mundo, o romanê poderia Ter os caracteres
da escrita russa, ou egípcia, latina, grega, árabe ou
outra qualquer.

Todos os seus costumes, ensinamentos,


conhecimentos culturais bem como o idioma,
dependem exclusivamente da transmissão oral, que
são passados de geração para geração.

O povo cigano, é conhecedor de seus limites,


respeitando assim os direitos e liberdade dos outros;
portanto, tem assegurado legitimamente o mesmo
direito.

Uma das principais maneiras de os ciganos se


manterem unidos, vivos, com suas tradições
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preservadas é o idioma universalmente falado pôr
eles, o ROMANÊ ou RUMANEZ, que é uma
linguagem própria e exclusiva.

O sedentarismo não atrai os ciganos, muito ao


contrário. Em razão de seu jeito nômade de viver,
não costumam ficar muito tempo na mesma região, o
que não facilita a mescla nem a assimilação dos
costumes locais. Quando se estabelecem pôr um
período mais longo, as freqüentam a escola pôr um
curto tempo, o suficiente para aprender o básico. Ou
seja aprendem apenas a ler e escrever o idioma do
país local e a fazer as operações matemáticas mais
simples.

Afinal, onde a tecnologia ocupa lugar de


destaque, há necessidade de conhecimentos mínimos
que garantem a comunicação, o entendimento das
regras mais simples de convivência social, pois –
quando maiores – precisarão destes conhecimentos
para desempenharem as tarefas do mundo moderno e
com isto ganhar a vida honestamente.

Os ciganos podem parecer ter atitudes egoísta,


mas eles acreditam que somente podem ser felizes
entre ciganos, ou que, se um cigano for viver a vida
de um gadjô, será infeliz.
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Esse povo é muito orgulhoso de suas origens,


de sua maneira de viver, de seus princípios e valores
e uma das coisas que mais entristece um cigano é ver
um outro envergonhar-se de ser cigano.

Em tempos anteriores, os ciganos executavam


tarefas simples, mas consideradas como fundamentais
para vida da época como ferreiro, tacheiros, artesãos
e pequenos comerciantes. Sendo hábeis cavalheiros
dedicavam-se também à criação, adestramento e ao
comércio de cavalos.

Devido a convivência com a modernidade, o


aumento progressivo das cidades e de suas
populações, com a conseqüente e gradativa
diminuição das áreas livres e sem proprietários, os
ciganos foram ficando cada vez mais limitados em
suas andanças, tornando-se mais sedentários ou
passando a morar mais tempo no mesmo lugar. Assim
as profissões mais freqüentes são as do comércio e as
ligadas às artes, principalmente à música.
Compositores, cantores, músicos, dançarinos, surgem
com suas melodias. Os mesmos apresentam, festas,
eventos especiais são pôr outra animados pôr grupos,
que apresentam o folclore cigano, entusiasmante e
encantador.
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Devido ao desenvolvimento deste trabalho,


fizeram e ainda fazem parte de troupes circenses, uma
vez que o mundo do circo sempre mudando de lugar,
levando alegria e beleza, combina perfeitamente com
o pensamento e sentimento ciganos.

A leitura das cartas e das mãos pelas mulheres


ciganas também rende dinheiro, porém essa atividade
não é considerada uma atividade profissional, como
veremos melhor adiante, mas um ato devocional à fé
cigana.

O povo cigano vive preocupado em manter sua


dignidade, honestidade e honradez, não sendo
procedente a reputação de ladrões que lhe é imputada.
Fama esta, que deriva da má informação, ignorância e
sobretudo do marcante preconceito que os demais
povos nutrem pelos ciganos.

Esse povo foi no passado taxado de ladrões de


cavalos e de crianças. É claro que entre os ciganos
como entre outros povos existem aqueles que fogem
às leis, tanto ciganos como universais, praticando atos
condenáveis.
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Contudo eles não ficam impunes, sendo
julgados pelos Tribunais de Justiça ciganos.

É publico e notório que todo povo é perfeito e


íntegro pôr definição e o que muitas vezes claudica e
peca não é o povo, mas o ser humano, que carrega
falhas, imperfeições e aspectos de caráter e moral
negativos. Como em qualquer povo entre os ciganos
também existem pessoas que merecem a punição da
justiça dos homens.

Porém se fizermos uma estatística comparativa


e guardada nas devidas proporções, veremos que o
índice de criminalidade entre os ciganos é muitíssimo
baixo, pois, acima de tudo, o povo cigano são
fortemente tementes das leis de Deus.

A liberdade e a interação com a natureza


constituem bens do mais alto valor e estima, para os
ciganos, esse comportamento os motiva a
obedecerem a um código de ética e moral, até
rigoroso.

Quando um cigano infringe as leis é convocado


o Tribunal de Justiça cigano ou o Chris-Romani,
formado pôr ciganos idosos ou pelos mais velhos do
grupo, para julgar os infratores, o que fazem com o
mais alto sentido de responsabilidade e respeito.
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A sociedade cigana é eminentemente patriarcal,


o poder e autoridade são exclusividade dos homens.

O Chis-Romani é falado totalmente em


romanê, e nele somente os homens podem se
manifestar.

Nela a mulher fica colocada num plano


subordinado à fala masculina e esta subordinação é
vista como natural pelas ciganas, que aceitam
espontânea e tranqüilamente sua situação secundária
ou menor, pôr assim dizer.

Na mesa cigana comem primeiro os homens,


que gostam de ser servidos e cuidados com absoluta
prioridade. Ás mulheres cabe outras
responsabilidades, como nas funções adivinharias,
cobradas, onde entregam todo o lucro conseguido aos
homens.

Apesar das mulheres serem vistas como


companheiras, não possuem direitos e nos desacertos
familiares elas são geralmente culpadas ou
responsabilizadas pelos problemas.
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A modernidade e o sedentarismo vêm mudando
muitos destes aspectos do comportamento cigano,
mesmo assim a mulher continua ocupando um lugar
secundário, devendo obedecer plenamente o pai ou
esposo.
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O
COMANDO FAMILIAR
E OS
CASAIS CIGANOS
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O comando familiar é exercido de maneira


completa e responsável pelo homem. Ele é o líder e a
ele competem a proteção, a segurança e o sustento da
família. Exerce as tarefas mais pesadas, que exigem
a força física dos homens como a edificação dos
acompanhamentos.

É ele quem fala pela família e resolve as


situações mais difíceis. A mulher e os filhos o
respeitam como máxima autoridade e lhe são
inteiramente subordinados.

São os homens que resolvem as pendências,


acertam o casamento dos filhos, destino das viagens e
se reúnem em conselhos para deliberarem sobre
assuntos abrangentes e comuns ao clã.

As mulheres ciganas não trabalham fora do lar


e quando vão às ruas para ler a sorte esta tarefa é
entendida como um cumprimento de tradições e não
como parte do sustento da família, apesar de elas
entregarem aos maridos todo o dinheiro conseguido.
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Os ciganos formam casais legítimos unidos


pelos laços do patrimônio, não fazendo parte de seus
costumes viveram amasiados ou aceitarem o
concubinato. Vivem juntos geralmente até a morte e
raramente entre eles separações ou divórcios, que
somente acontecem se existir uma razão muitíssimo
grave e se for essa a decisão do Tribunal reunido para
julgar a questão. Caso um dos cônjuges não goste
do outro, não há nada a fazer, a não ser muita
paciência e tolerância para manter a vida em comum.

Para os ciganos, marido e mulher, são muito


reservados e discretos em público, não trocando
nenhum tipo de carinho, que possa ser entendido
como intimidade, que é vivida somente em absoluta
privacidade. Isto não significa que não existe amor
entre eles, porem revela uma atitude de respeito à
comunidade e especialmente um arraigado temor da
maledicência humana, das más línguas e dos
comentários desairosos. Em contrapartida, eles são
muito amorosos com as crianças e revelam um
particular carinho pelos idosos, desvelando-se em
atenções para com ambos.
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A companheira cigana está sempre na


retaguarda do marido e disposta a servi-lo
prontamente até nas futilidade, com discrição e total
subserviência. A ela compete, como esposa e mãe
cuidar da casa, educar e zelar pelos filhos, ajudar as
outras mulheres, servir e cuidar dos sogros como se
fossem seus pais. Não discute, opina raramente e em
particular e acalma os lado, recebe do marido em
público um trato digno e respeitoso, mas que revele
claramente a liderança masculina.

A esposa cigana não mente ao marido, não


oculta fatos e procura ter um comportamento
exemplar, fazendo a defesa do mesmo inclusive nas
situações em que ele não tem razão. Uma cigana não
traz a vergonha para sua tenda, pois isso significa um
desastre.

Ambos, marido e mulher, respeitam a lar como


recinto sagrado e não discutem na frente dos outros,
tampouco dos filhos.
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A MULHER CIGANA
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Enquanto o homem apresenta o esteio e o braço


forte da família, a mulher significa o lado terno e de
proteção espiritual dos lares ciganos. Embora esteja
hierarquicamente situada num patamar inferior em
relação aos homens, ela é vista e tratada com respeito
pôr ser ela quem desempenha um dos papéis mais
importantes na estrutura da família, o de mãe. A
geração de filhos representa uma função ou condição
fundamental para a perpetuação da vida cigana, daí
ser a maternidade estimulada pelos mais velhos, que
pôr ocasião de cada nascimento sentem assegurada a
continuidade do clã e festejam efusivamente cada
nascimento.

Cabe às mulheres desde cedo cuidarem das


tarefas do lar, tornando-o mais aconchegante e
confortável possível, seja o lar paterno, seja o seu
próprio com o marido. As meninas ficam sempre ao
redor da mãe auxiliando nos trabalhos da casa,
ajudando a cuidar dos irmãos menores e aprendendo
as tradições e costumes como a execução da dança, a
leitura das cartas e das mãos, a realização dos rituais
e cerimônias, os preceitos religiosos.
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A mulher cigana deve ser dotada de


características forte para superar uma vida
contentemente em movimento, enfrentando as
estradas, as intempéries, as dificuldades próprias de
suas moradias precárias, mas que devem ser
compostas da melhor forma possível para agradar os
demais membros da família, exercitar suas tarefas de
educadora dos filhos, assumindo, inclusive,
praticamente toda a responsabilidade pôr seus atos.

Se uma criança ou um jovem cigano sai dos


eixos, tem um comportamento inadequado ou
procede mal, geralmente a mulher é responsabilizada
por tais feitos. Os homens entregam a tarefa de
criação das crianças inteiramente às mulheres, pouco
se importando em saber quais as dificuldades que elas
possam encontrar para cuidá-los, criá-los e ampará-
los.

Paralelamente a um lado forte, que até pôr


força das circunstâncias necessita ser vigoroso e
dotado de energia, a mulher cigana tem seu lado
feminino marcadamente atraente, colorido e sensual.
Aliás, quando pensamos em ciganos, a primeira
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imagem que nos vem à mente é a destas mulheres
vestidas com roupas longas e cheias de cor, de
cabelos escuros apanhados pôr lenços coloridos,
muitas jóias ao redor do pescoço, dos punhos e
argolas de ouro penduradas nas orelhas. Elas
sobressaem sempre que lembramos dos ciganos,
servindo imagem masculina como pano de fundo
para estas mulheres graciosas.

Para ter valor, inclusive para arranjos


matrimoniais, já que é o pai do noivo que paga uma
espécie de dote ao pai da jovem quando se realizam
as bodas ( o valor do dote fixado em moeda corrente,
ou ouro, ou então animais, é acertado no dia do
pedido oficial de noivado e pago no dia do casamento
), a mulher cigana deve saber cozinhar, cuidar da
casa, dançar, dirigir as cerimônias rituais e saber ler a
sorte. Ela deve ser de preferência bonita, ter encantos
e ser dotada de atrativos. Caso ela não reuna estes
elementos terá pouco valor e talvez somente casa se
houver algum tipo de conveniência para o pai do
noivo, como ter um pai influente, rico ou com poder
de liderança.

A cigana se casa muito jovem, geralmente ao


redor dos quinze anos e deve ser virgem, condição –
aliás – considerada fundamental para o matrimônio.
A virgindade será avaliada pelas mulheres mais
velhas, pelas mães dos noivos e pela matriarca do clã
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no dia do casamento, sendo a mãe da noiva
festivamente cumprimentada caso a filha seja virgem
como pede a tradição. Se a jovem, o que é muito
raro, já tiver tido experiência sexual e não for virgem,
será severamente castigada, o casamento desfeito e
deverá haver reparação aos pais do noivo, se constitui
numa perfeita desgraça a perda da virgindade e a
festa do casamento pode se transformar num funeral.
Em razão de tão sérias conseqüências as jovens
ciganas se guardam da qualquer contato físico, não
permitindo que um jovem ou um homem lhes encoste
sequer a mão.

As mulheres casadas também são muito


pudicas, não dando liberdade para que qualquer
homem as toque ou faça qualquer demonstração de
afeto físico. Até mesmo com seus maridos elas são
bastante recatadas, em especial em público, pois
como já dissemos, os ciganos temem os falatórios
maldosos, as más línguas.

Contudo, apesar destas atitudes cautelosas


tanto as jovens como as mulheres casadas são muito
faceiras, insinuantes e provocantes, em particular
quando dançam. Elas usam a dança como
instrumento de sedução, além da função da dança
propriamente dita, ou seja, diversão, demonstração de
alegria e parte obrigatória das festividades. Festa de
ciganos sem música e dança não é festa, e eles são
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muito festeiros, não perdendo nenhuma oportunidade


de tocar seus violões, acordeões, violinos, cantar e
dançar entusiasmadamente agitado pandeiros e
batendo palmas, que acreditam ser uma forma de
espantar a negatividade, abrindo espaço para a
positividade.

As ciganas não costumam cortar os cabelos,


pois crêem que nos cabelos está uma grande
quantidade de força. Se os cortarem estarão perdendo
energia e atraindo a má sorte. Este costume é
bastante comum entre os povos orientais, inclusive na
Índia, onde pressupõem-se que os ciganos tenham se
originado e nos recorda a história de Sanção e Dalila,
que a Bíblia nos relata: Sanção perdeu totalmente
suas forças consideradas imbatíveis ao Ter os longos
cabelos cortados traiçoeiramente pôr Dalila.

O pensamento que os cabelos são


depositários de energia, não deixa de fazer sentido;
como sabemos, no alto da cabeça está o chacra
coronário, sede da energia mais espiritualizada e de
ligação com as forças divinas. Pôr extensão, os
cabelos ficariam impregnados com esta energia da
mais alta qualidade.
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Muito da sua feminilidade é depositada nas


vestimentas. As saias longas, muitas vezes várias
delas sobrepostas, coloridas e enfeitadas pôr rendas,
fitas e laços, ajudam as ciganas a manterem o recato,
não expondo desnecessariamente o corpo e dão graça
aos rodopios da dança. O resguardo com o corpo é
de fundamental importância para o povo cigano, que
entende que a sedução, o encantamento deve ser
natural pelo rosto, pelos gestos, pelo andar, pela
habilidade e graça na dança e não pôr se mostrar o
corpo. Segundo os ciganos, o corpo deve ser revelado
na privacidade para ter realmente valor.

A mulher cigana não se prostitui, fato que é


rigorosamente observado. A prostituição é falta
grave e em nenhuma hipótese é aceita no povo
cigano.
Se uma cigana se prostituísse estaria não só
infringindo um dos preceitos mais rigorosos, visto na
verdade como um mandamento de lei, mas trazendo a
desonra para seu lar paterno ou conjugal, ou ambos.

As mulheres ciganas não precisam deste meio


para ganhar dinheiro, pois possuem o Dom da
adivinhação, Dom este entendido como natural e
divino. Além disso, seus familiares homens ou o
cônjuge devem ser suficientes para sustentar toda a
família com dignidade. A prostituição também não é
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aceita como falha de caráter ou desvio de


personalidade, caso a mulher busque o prazer no sexo
fora do casamento.

Outro fato da cultura cigana encarado com


seriedade e respeito é a fidelidade entre os casais, não
se admitindo nem para os homens tampouco para as
mulheres as relações extraconjugais. O homem deve
se manter fiel à sua esposa e vice-versa e esta conduta
não muda mesmo que o casamento seja malsucedido,
um desastre ou não prazeroso. Novos casamentos são
possíveis caso exista a morte de um dos cônjuges e
mesmo assim a realização do segundo matrimônio
passará pelo crivo de detalhadas observações.

O povo cigano, apesar de muito alegre,


festeiro e sob vários prismas folgazão, leva muito a
sério suas relações humanas e seus preceitos.
Quando o fato pede brincadeiras, música,
contentamento, são absolutamente brincalhões,
porém, quando o fato é sério, talvez eles sejam até
demasiadamente severos e rigorosos.

Os homens também gostam de dançar, havendo


danças somente masculinas com passos que lembram
muito as danças gregas e russas, marcados, vigorosos
e cadenciados, mas que as mulheres acompanham
fazendo uma roda em torno deles, batendo palmas,
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chamando a energia positiva, mas não participam da


dança.

O lenço da cabeça prendendo parte dos cabelos


é designativo das mulheres casadas. As solteiras
enfeitam seus cabemos com guirlandas de flores ou
tiaras. Jóias também podem ser usadas tanto pelas
solteiras quanto pelas casadas nas tiaras e lenços
numa demonstração do poderio econômico do clã.

O povo cigano, em especial os clãs maiores,


possuem uma situação econômica muito boa. Dada
sua característica nômade, sua riqueza não era
baseada em bens imóveis, como terras, pôr exemplo,
mas no acúmulo de jóias e moedas de ouro, com as
quais adquiriam o que necessitavam, realizavam suas
transações comerciais, pagavam o dote de casamento
– enfim, geriam sua vida de negócios.

Para um povo sempre em movimento esta era a


forma perfeita de acumularem riquezas, riquezas que
valem, aliás, em qualquer lugar do mundo e em
qualquer tempo. Ótimos comerciantes lugar do
mundo e em qualquer tempo. Ótimos comerciantes,
capazes de barganhar, comprar, trocar e vender, o
máximo que lhes podia acontecer de mal no relativo a
dinheiro – ouro, para sermos mais exatos – era serem
roubados ou furtados, o que era muito raro, pois uma
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das maneiras mais seguras de carregarem suas


fortunas, ao menos uma pequena parte, capaz de
socorrê-los numa emergência, era mandar incrustar o
ouro nos dentes. Mesmo que precisassem largar tudo
às pressas para fugir de alguma situação de perigo
levariam ouro suficiente para recomeçar onde fossem
parar.

Daí tanto os homens quanto as mulheres terem


dentes incrustados com ouro e usarem jóias autênticas
no dia-a-dia. Cada família do clã possuía sua quota
particular de riqueza, mas a quantia mais substancial
do clã ficava guardada em lugar seguro, geralmente
próximo ao acampamento para que caso fossem
assaltados ou pilhados pôr salteadores, poderem
voltar posteriormente e resgatar seu patrimônio. O
lugar onde eram depositados seus bens era altamente
secreto e somente as lideranças masculinas
conheciam este lugar. Está claro que a modernidade
mudou muitos destes costumes, porém o ouro
continua sendo o grande sinônimo do poder
econômico cigano.
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AS
CRIANÇAS CIGANAS
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As crianças representam na verdade o maior


tesouro da nação universal cigana, pois são elas que
garantem a sobrevivência e a perpetuação deste povo
milenar. Cada bebê que nasce é festejado
efusivamente e passa pôr rituais de prosperidade e
proteção, porem é importante frisar que os ciganos
amam verdadeiramente suas crianças e não as vêem
somente como aqueles que vão garantir, que seu povo
avance pelos tempos futuros. Elas são realmente
amadas de maneira verdadeira, sem egoísmo ou
interesse.

Elas vivem em total liberdade, brincando,


interagindo com a natureza, desfrutando todas as
regalias do mundo infantil, porém passam boa parte
do tempo com os mais velhos, em especial com os
idosos, para aprenderem desde cedo os costumes e as
tradições.

Este convívio com os mais velhos e sábios do


clã garantem que elas conheçam perfeitamente bem
seu povo, suas maneiras e hábitos, dando-lhes o
correto e real valor e acima de tudo aprendendo desde
pequeninos a amar seus irmãos da raça. Esta criação
livre e ao mesmo tempo com regras que ao ficarem
jovens ou adultos não se desgarrem de seu povo
passando a viver como gadjês.
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Ciganos mágicos da natureza

Elas acompanham seus pais em todas as


ocasiões e participam dos rituais e festividades. Não
são excluídas das conversas dos adultos, tampouco
dos momentos mais sérios, para que tenham uma
perfeita compreensão do mundo, da vida e da
realidade. Esta é a maneira encontrada pelos ciganos
para assegurarem a seus pequenos os valores reais,
impedindo que eles vivam num mundo ilusório e
fantasioso, que fatalmente um dia irá trazer-lhes
decepções e mágoas, que pôr sua vez poderão causar
revoltas e desajustes.

As crianças são amadas e respeitadas, não


sendo criadas dentro dos padrões convencionais de
que criança tem hora certa para dormir, para comer,
para brincar e assim pôr diante. Elas ficam
completamente integradas na comunidade e seguem
os hábitos dos mais velhos, daí nunca se sentirem
rejeitadas ou esquecidas. Também não existem
segredos para elas. Recebem respostas a todas as
suas perguntas, representando estas respostas a mais
certa realidade. Os mais velhos são muito liberais
com suas crianças, conversando bastante com elas,
porém não devemos entendê-los como tolerantes para
com maus hábitos, desregramentos, inconveniências
ou atitudes que possam trazer algum dano a seu
limitado e natural entendimento infantil.
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Ciganos mágicos da natureza

Eles respeitam as crianças e não são


promíscuos com elas.

Elas têm toda liberdade de expressão, de


manifestação e são chamadas á atenção ou
repreendidas sempre com comedimento e explicações
claras sobre o que não fizeram de certo.

Os ciganos não têm uma índole violenta, muito


ao contrário. Quando nervosos ou estressados com
algo procuram uma forma de extravasar suas

emoções, que não inclui o espancamento violência


física quando necessitam de repreensão.

Possuem livre acesso a todo o acampamento e


em seus lares podem tocar em tudo para terem o
mais amplo contato com os objetos a fatos do mundo,
e desta maneira, o conseqüente conhecimento.
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Ciganos mágicos da natureza


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Ciganos mágicos da natureza

FAMA EM ROUBO DE
CRIANÇAS
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Ciganos mágicos da natureza


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Ciganos mágicos da natureza

É importante lembrar que os ciganos levaram


esta injusta fama imerecidamente e talvez ainda hoje
existam pessoas que julgam tal balela como verdade.
Contudo, como todo fato, mesmo mentiroso, tem sua
explicação, julgamos conveniente oferecer uma,
mesmo porque seria injusto escrever-se um texto
sobre ciganos e não mencionar este assunto.

Em tempos atrás, que infelizmente não são tão


antigos assim, dois ou três séculos atrás, quando
alguma jovem de família rica, em especial da nobreza
ficava grávida fora do casamento, isto significava
uma terrível vergonha e desonra para a família. A
desgraça se abatia sobre os castelos nobres ou lares
abastados, que encaravam a virgindade como
essencial para a realização de matrimônio ricos e de
conveniência política ou econômica. Então o que
faziam? As jovens escondidas em conventos, em
lugares muito retirados enquanto durasse o período da
gestação e uma explicação convincente qualquer
oferecida à sociedade local para justificar o
temporário desaparecimento da jovem.

O que fazer com a criança depois de nascida?


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Ciganos mágicos da natureza

Este era o aspecto crucial da questão. Os bebês


destas jovens e mesmo pequenos bastardos, filhos
ilegítimos nascidos de uniões proibidas, eram
entregues a quem os pudesse criar guardando com
absoluto sigilo sua origem.

Como na época caravanas ciganas eram


freqüentes em terras da Europa onde aconteciam tais
( desgraças ), nada mais conveniente e seguro do que
dá-los às mulheres ciganas para que as levassem em
suas andanças pelo mundo. Estes pequenos “ frutos
do pecado ’’ eram portanto voluntariamente
entregues aos ciganos pôr seus responsáveis, que os
aceitavam pôr amor e porque delas ficavam
compadecidos. É claro que uma generosa bolsa com
moedas de ouro era entregue como forma de
pagamento pôr tal serviço às velhas ciganas. E iam
embora os grupos ciganos levando em sua companhia
crianças totalmente diferentes das suas. Eles de pele
morena, olhos e cabelos escuros tratando como filhos,
pequenos de tez muito clara, olho azuis e cabelos
louros.

As pessoas da época sabiam que os ciganos


adotavam estas crianças rejeitadas, mas a
maledicência humana era (como ainda é
infelizmente) muito maior e os acusavam de
roubarem crianças. De sua atitude meritória,
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Ciganos mágicos da natureza

maldosamente adulterada pelas más línguas, nasceu


esta enganosa fama, que persiste até os dias atuais,
lamentavelmente.

Um fato que merece realce é que os ciganos


amam profundamente suas crianças e as crianças em
geral, pôr verem nelas pequenas luzes encarnadas.
Eles não as abandonam, rejeitam, escondem ou
colocam em colégios ou orfanatos para serem criadas.
Mesmo aquelas nascidas de algum “ acidente ’’
merecem pôr parte de todo o clã, amor, dedicação e
respeito.

As crianças são vistas como o maior tesouro


dos povos ciganos, sua sucessão, a garantia da
sobrevivência de suas tradições e que o sangue
cigano continuará pelos séculos afora como existiu
em eras passadas.

Nenhum povo cigano sobrevive se deixar


morrer suas crianças de fome, maus-tratos, abandono
à própria sorte e especialmente pôr falta de amor, o
amor maior que sustenta nas horas difíceis.
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Ciganos mágicos da natureza


No passado pôr sua condição estritamente
nômade, os ciganos não costumavam registrar suas
crianças legalmente em cartório.

Atualmente, pôr estarem cada vez mais


sedentários, fixando suas moradias em locais abertos,
mas bastante próximos das cidades, passaram
registrá-las. Esta atitude, apesar de ferir de certa
forma as tradições, contribui para que os ciganos
sejam vistos de uma forma mais simpática pelos não-
ciganos e ajuda a retirar-lhes a má e errônea fama de
ladrões de crianças.
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Ciganos mágicos da natureza

OS
REPRESENTANTES
DA
SABEDORIA
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Ciganos mágicos da natureza


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Ciganos mágicos da natureza


Talvez em todo o clã cigano sejam os idosos os
merecedores da mais alta estima e respeito. Eles são
vistos e tratados como os detentores da sabedoria, da
experiência de vida acumulada como sendo a voz do
conhecimento aprendido na prática da vida do dia-a-
dia.

Responsáveis pela transmissão oral dos


ensinamentos e tradições, eles são considerados os
mais sábios, o passado vivo e manda a tradição que
os mais jovens lhes beijam as mãos em sinal de
respeito.

Possuem lugar de destaque nas festividades e


cerimônias, atuando também como conselheiros e
consultores nos tribunais de justiça. Quando o
problema que abraça uma família cigana é mais sério,
intrincado ou de resolução que signifique
conseqüências importantes para o clã, é a palavra dos
idosos que fala mais alto.

Eles são cuidados com desvelo e tratados com


toda a dignidade pelos demais. Esta forma de
tratamento faz com que se mantenham lúcidos até o
final de suas vidas, pois nada é mais doentio para
uma pessoa idosa de qualquer sociedade do que ser
tratada como um resto, uma pessoa inútil e sem valor,
um fardo a ser carregados pelos mais jovens.
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Ciganos mágicos da natureza

Assim como nunca abandonam os velhos, os


ciganos também nunca abandonam suas crianças, os
mestres das gerações futuras.
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Ciganos mágicos da natureza

AS
VESTIMENTAS
CIGANAS
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Ciganos mágicos da natureza


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Ciganos mágicos da natureza

As vestimentas representam um dos aspectos mais


importantes da cultura cigana, quiçá sua marca
registrada, pois além do significado próprio das
vestes dentro dos costumes ciganos, traduzem
também uma obediência às tradições do passado e
uma das formas de mantê-las vivas ao longo do
tempo.

Estudando a história dos povos podemos


observar que grande parte deles vão abrindo mão de
seus costumes com o contato cada vez mais fácil e
mais freqüente entre as diferentes culturas, e uma das
primeiras coisas de que se abre mão é a maneira de se
vestir, como se ela não fosse importante e um dos
mais acentuados diferenciais.

Tem-se a impressão de que todos desejam ser


iguais, inclusive nas vestimentas. Se pôr um lado isto
representa um aspecto positivo de igualdade, pôr
outro lado significa uma negação do passado, muitas
vezes tão rico em pequenos detalhes, detalhes que
traduzem a leitura da arquitetura deste povo.

Os ciganos são pessoas que prezam o suficiente


sua história e primam pôr mantê-la viva, inclusive no
que diz respeito às vestimentas.
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Ciganos mágicos da natureza

As mulheres usam suas saias longas,


geralmente até os tornozelos, numa demonstração
clara de recato e ao mesmo tempo de sedução.
Acham desnecessário expor o corpo no pressuposto
de que tudo que é muito fácil automaticamente é
desvalorizado.

As roupas não possuem decotes ousadas, as


saias são rodadas e fartas, usando as ciganas mais
ricas várias saias sobrepostas. O grande atrativo das
poupas das mulheres é o forte colorido presente nas
diversas peças. Usam varias cores simultaneamente,
procurando combiná-las com bom gosto. De suas
roupas podemos dizer tudo, menos que sejam
monótonas.

Xales ornados de franjas, fitas, rendas, laços


compõem o vestuário feminino com graça e encanto.
As mulheres ciganas são muito vaidosas e faceiras,
usando a disposição das roupas para fascinarem. De
aba larga e lenços no pescoço à moda COUBOY. As
peças de ouro finalizam a figura masculina.
58
As cores são encaradas sob seu significado
simbólico e este significado é aplicado tanto às vezes
masculinas, quanto às vezes femininas. Assim, o
vermelho simboliza a energia do fogo purificador e é
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Ciganos mágicos da natureza


usado para afastar as más influencias e a
negatividade; o amarelo traduz a riqueza, a
vivacidade, a inteligência; o verde traz o simbolismo
de cura, da esperança, da renovação da vida tal como
acontece na primavera, que transborda de verde e
cores mil após o frio e o rigor do inverno.

O povo cigano associa ao azul ao céu onde


residem os espíritos guardiões e a Virgem Maria
recoberta pôr seu manto azul; esta cor traz a
tranqüilidade e a paz das esferas superiores. O cinza
é visto como uma cor perigosa e aziaga, o branco
como a pureza das crianças, dos anjos protetores e
como outra cor representativa da Imaculada e dos
estados virginais. O preto é usado como uma cor
complementar ou de fundo, e raramente veremos um
cigano ou cigana totalmente vestido de preto, que é
uma cor apropriada aos funerais e estreitamente
associada ao luto, embora eles não tenham pôr habito
vestir o luto ou trajarem-se completamente de negro
para indicarem viuvez ou luto por um parente. O
preto é reservado para os rituais de magia, junto com
o branco e o vermelho.

Sem duvida, para os não-ciganos ou gadjês


( também gadjôs ou gadjís ) a maneira como os
ciganos se trajam é estranha, pouco prática,
desconfortável ou excessivamente colorida e vistosa.
Mas este povo de origem misteriosa e de vida com
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Ciganos mágicos da natureza


hábitos e costumes não menos misteriosos, diferentes
ou intrigantes, o estranho deverá ser a extrema
simplicidade e despojamento das vestimentas não-
ciganas, provavelmente tidas como de mau gosto e,
acima de tudo, muito pobres.

Andar sem calçados também faz parte do


misticismo cigano, que acreditam que esta é uma
maneira de descarregar a energia negativa na terra, ao
mesmo tempo propiciando a entrada da energia
positiva proveniente do céu, do sol, da lua e das
estrelas. Pessoalmente partilhamos deste ponto de
vista cigano, pois uma das maneiras mais simples e
rápida de limpar os corpos físico, mental e espiritual
é fazendo um contato direto com a Mãe-Terra através
dos pés ou andando simplesmente descalços. Quem
duvidar ou achar esta afirmação uma bobagem, que
faça um tete; quando se sentir desanimado, etc, e tal
tire os sapatos e ande descalço na terra. Verá que em
pouco tempo o ânimo se renovará, uma nova energia
fluirá trazendo bem-estar e um novo estado
de espirito. Se ainda assim, achar que é pura
coincidência ... não faz mal. O mais importante é que
você se sinta bem! Provavelmente, o seu tempo de
entender o lado oculto e magico das coisas ainda não
chegou, mas ele chegará um dia, com certeza.
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Ciganos mágicos da natureza


É importante lembrar que este não é um
comportamento particularmente cigano, mas vários
povos de diferentes culturas, especialmente no

Oriente, também têm por habito andarem algumas


horas por dia sem calçados, ou então usarem
sapatinhos de tecido bem leve, que somente protege
os pés, mas não os isolam do solo em termos de
energia. Para os que desejarem manter sempre alto o
nível de energia pelo contato com a aconselho os
calçados com solado de couro; o plástico e a borracha
são perfeitos isolastes.
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Ciganos mágicos da natureza


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Ciganos mágicos da natureza

O COMANDO
FAMILIAR E OS CASAIS
CIGANOS
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Ciganos mágicos da natureza


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Ciganos mágicos da natureza

O comando familiar é exercido de maneira


completa e responsável pelo homem. Ele é o líder e a
ele competem a proteção, a segurança e o sustento da
família. Exerce as tarefas mais pesadas, que exigem
a força física dos homens como a edificação dos
acompanhamentos. É ele quem fala pela família e
resolve as situações mais difíceis. A mulher e os
filhos o respeitam como máxima autoridade e lhe são
inteiramente subordinados.

São os homens que resolvem as pendências,


acertam o casamento dos filhos, destino das viagens e
se reúnem em conselhos para deliberarem sobre
assuntos abrangentes e comuns ao clã.

As mulheres ciganas não trabalham fora do lar


e quando vão às ruas para ler a sorte esta tarefa é
entendida como um cumprimento de tradições e não
como parte do sustento da família, apesar de elas
entregarem aos maridos todo o dinheiro conseguido.

Os ciganos formam casais legítimos unidos


pelos laços do patrimônio, não fazendo parte de seus
costumes viveram amasiados ou aceitarem o
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Ciganos mágicos da natureza


concubinato. Vivem juntos geralmente até a morte e
raramente entre eles separações ou divórcios, que
somente acontecem se existir uma razão muitíssimo
grave e se for essa a decisão do Tribunal reunido para

julgar a questão. Caso um dos cônjuges não goste


do outro, não há nada a fazer, a não ser muita
paciência e tolerância para manter a vida em comum.

Para os ciganos, marido e mulher, são muito


reservados e discretos em público, não trocando
nenhum tipo tipo de carinho, que possa ser entendido
como intimidade, que é vivida somente em absoluta
privacidade. Isto não significa que não existe amor
entre eles, porem revela uma atitude de respeito à
comunidade e especialmente um arraigado temor da
maledicência humana, das más línguas e dos
comentários desairosos. Em contrapartida, eles são
muito amorosos com as crianças e revelam um
particular carinho pelos idosos, desvelando-se em
atenções para com ambos.

A companheira cigana está sempre na


retaguarda do marido e disposta a servi-lo
prontamente até nas futilidade, com discrição e total
subserviência. A ela compete, como esposa e mãe
cuidar da casa, educar e zelar pelos filhos, ajudar as
outras mulheres, servir e cuidar dos sogros como se
fossem seus pais. Não discute, opina raramente e em
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Ciganos mágicos da natureza


particular e acalma os lado, recebe do marido em
público um trato digno e respeitoso, mas que revele
claramente a liderança masculina.

A esposa cigana não mente ao marido, não


oculta fatos e procura ter um comportamento
exemplar, fazendo a defesa do mesmo inclusive nas
situações em que ele não tem razão. Uma cigana não
traz a vergonha para sua tenda, pois isso significa um
desastre.

Ambos, marido e mulher, respeitam a lar como


recinto sagrado e não discutem na frente dos outros,
tampouco dos filhos.
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Ciganos mágicos da natureza


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Ciganos mágicos da natureza

AS CRIANÇAS
CIGANAS
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Ciganos mágicos da natureza


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Ciganos mágicos da natureza

As crianças representam na verdade o maior


tesouro da nação universal cigana, pois são elas que
garantem a sobrevivência e a perpetuação deste povo
milenar. Cada bebê que nasce é festejado
efusivamente e passa por rituais de prosperidade e
proteção, porem é importante frisar que os ciganos
amam verdadeiramente suas crianças e não as vêem
somente como aqueles que vão garantir, que seu povo
avance pelos tempos futuros. Elas são realmente
amadas de maneira verdadeira, sem egoísmo ou
interesse.

Elas vivem em total liberdade, brincando,


interagindo com a natureza, desfrutando todas as
regalias do mundo infantil, porém passam boa parte
do tempo com os mais velhos, em especial com os
idosos, para aprenderem desde cedo os costumes e as
tradições.

Este convívio com os mais velhos e sábios do


clã garantem que elas conheçam perfeitamente bem
seu povo, suas maneiras e hábitos, dando-lhes o
correto e real valor e acima de tudo aprendendo desde
pequeninos a amar seus irmãos da raça. Esta criação
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Ciganos mágicos da natureza


livre e ao mesmo tempo com regras que ao ficarem
jovens ou adultos não se desgarrem de seu povo
passando a viver como gadjês.

Elas acompanham seus pais em todas as


ocasiões e participam dos rituais e festividades. Não
são excluídas das conversas dos adultos, tampouco
dos momentos mais sérios, para que tenham uma
perfeita compreensão do mundo, da vida e da
realidade. Esta é a maneira encontrada pelos ciganos
para assegurarem a seus pequenos os valores reais,
impedindo que eles vivam num mundo ilusório e
fantasioso, que fatalmente um dia irá trazer-lhes
decepções e mágoas, que por sua vez poderão causar
revoltas e desajustes.

As crianças são amadas e respeitadas, não


sendo criadas dentro dos padrões convencionais de
que criança tem hora certa para dormir, para comer,
para brincar e assim por diante. Elas ficam
completamente integradas na comunidade e seguem
os hábitos dos mais velhos, daí nunca se sentirem
rejeitadas ou esquecidas. Também não existem
segredos para elas. Recebem respostas a todas as
suas perguntas, representando estas respostas a mais
certa realidade. Os mais velhos são muito liberais
com suas crianças, conversando bastante com elas,
porém não devemos entendê-los como tolerantes para
77

Ciganos mágicos da natureza


com maus hábitos, desregramentos, inconveniências
ou atitudes que possam trazer algum dano a seu
limitado e natural entendimento infantil.

Eles respeitam as crianças e não são


promíscuos com elas.

Elas têm toda liberdade de expressão, de


manifestação e são chamadas á atenção ou
repreendidas sempre com comedimento e explicações
claras sobre o que não fizeram de certo.

Os ciganos não têm uma índole violenta, muito


ao contrário. Quando nervosos ou estressados com
algo procuram uma forma de extravasar suas
emoções, que não inclui o espancamento violência
física quando necessitam de repreensão.

Possuem livre acesso a todo o acampamento e


em seus lares podem tocar em tudo para terem o
mais amplo contato com os objetos a fatos do mundo,
e desta maneira, o conseqüente conhecimento.
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Ciganos mágicos da natureza


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Ciganos mágicos da natureza

OS
REPRESENTANTES
DA SABEDORIA
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Ciganos mágicos da natureza


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Ciganos mágicos da natureza

Talvez em todo o clã cigano sejam os idosos os


merecedores da mais alta estima e respeito. Eles são
vistos e tratados como os detentores da sabedoria, da
experiência de vida acumulada como sendo a voz do
conhecimento aprendido na prática da vida do dia-a-
dia.

Responsáveis pela transmissão oral dos


ensinamentos e tradições, eles são considerados os
mais sábios, o passado vivo e manda a tradição que
os mais jovens lhes beijam as mãos em sinal de
respeito.

Possuem lugar de destaque nas festividades e


cerimônias, atuando também como conselheiros e
consultores nos tribunais de justiça. Quando o
problema que abraça uma família cigana é mais sério,
intrincado ou de resolução que signifique
conseqüências importantes para o clã, é a palavra dos
idosos que fala mais alto.

Eles são cuidados com desvelo e tratados com


toda a dignidade pelos demais. Esta forma de
tratamento faz com que se mantenham lúcidos até o
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Ciganos mágicos da natureza


final de suas vidas, pois nada é mais doentio para
uma pessoa idosa de qualquer sociedade do que ser
tratada como um resto, uma pessoa inútil e sem valor,
um fardo a ser carregados pelos mais jovens.

Assim como nunca abandonam os velhos, os


ciganos também nunca abandonam suas crianças, os
mestres das gerações futuras.
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Ciganos mágicos da natureza

DANÇA CIGANA
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Ciganos mágicos da natureza


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Ciganos mágicos da natureza

Desde tempos imemoriais, a dança aparece de


maneira marcante na historia de todos os povos,
mesmo aqueles considerados primitivos ou
selvagens, representando uma parte ativa e de
importância na estrutura social e religiosa dos
mesmos.

Talvez ela faça parte do projeto intrínseco dos


seres, ou seja, quando a maioria dos seres, em
especial o humano esta sendo gerado fica mergulhado
no liquido amniótico com uma dose praticamente
boa de liberdade, podendo executar uma série de
movimentos soltos, de caráter absolutamente
individual e único e que podem ser entendidos como
um bailado.

Então se deixarmos a imaginação correr solto


podemos afirmar que os seres executam o importante
bailado da vida ainda no ventre materno, daí
afirmamos que o ser humano dança por que possui
na sua arquitetura fundamental o gosto por esta
expressão ou manifestação de vida.
86

Ciganos mágicos da natureza


Analisando as culturas das diferentes
populações do mundo veremos que o homem dança
basicamente por duas razões; porque está feliz e quer
festejar, brincar, se divertir ou porque está querendo
agradar aos deuses para poder contar com seus

benefícios e benções. Desta maneira a dança pode


ser entendida como um fato ligado ao prazer e ao
culto religioso, uma forma de liberar as emoções
interiores, de dar vazão aos sentimentos e intimas
necessidades através dos movimentos corporais.

É claro que a dança, para ser autêntica e


verdadeira, deve ser algo mais do que simples
movimentos do corpo. Quando temos somente os
movimentos corporais aliados a uma boa dose de
raciocínio, equilíbrio, e sangue frio, temos as
acrobacias e as verdadeiras danças suplanta qualquer
execução acrobática, pois deve envolver o coração, os
sentimentos e a alma de quem dança. Daí que os
grandes dançarinos e dançarinos que podem ser
considerados completos, excelentes e até perfeitos,
são raros, uma vez que devem aliar a técnica racial ou
a marcação dos passos e movimentos no que se
convencionou chamar coreografia, a um ótimo
preparo físico, além da expressão mais transparente
de seus profundos sentimentos e espiritualidade, ou
alma.
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Ciganos mágicos da natureza


A dança pode ser executada de maneira
solitária, em par ou em grupo, de forma profissional
ou amadora, clássica ou moderna, mas em qualquer
dos jeitos de expressá-la o dançarino ou dançarinos
envolvidos devem reunir as qualidades citadas
anteriormente: técnica, preparo físico e alma ou amor
pela dança.

Enquanto nas danças por prazer ou por arte


existem a expressão individual e livre ou a marcação
do coreógrafo, nas danças religiosas ou rituais está
presente o valor invocativo por graças ou de
agradecimento por bênçãos recebidas.

As tribos indígenas do Brasil e da América do


Norte são exemplos ótimos de povos que dançavam e
ainda dançam ( os poucos remanescentes destes
povos) em ritos e cerimônias ofertadas aos deuses.
Capazes de ficar horas a fio, geralmente em roda,
marcando e cadenciando passos, eles testemunhavam
sua fé aos poderes divinos, rogando por colheitas
fartas, caça abundante, a chuva salvadora, ou então
para afastar os demônios e os maus espíritos da
aldeia. Dançam também para se fortalecerem para as
guerras e contendas, mas como estas são também
dedicadas aos deuses, que lhes ofertam a coragem, a
destreza e a tenacidade para a luta, podemos
considera-las igualmente como danças rituais.
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Ciganos mágicos da natureza


Os povos ciganos têm na dança uma de suas
mais vivas e exuberantes formas de expressão,
tirando dos passos, dos volteios do corpo, do rodar de
suas saias, do maneio de suas cabeças e mãos, uma
alegria contagiante e uma vivacidade talvez única.

Acompanhados pela musica de seus


instrumentos, pelo bater das castanholas, do som das
palmas que espantam a negatividade, das batidas
secas de seus pés no chão, eles cantam e dançam, sem
obedecerem a uma coreografia rígida, ou regras
exatas, pois os ciganos geralmente dançam com alma
e a alma suplanta toda e qualquer norma ou regra.
Portanto, não podemos falar que existe uma dança
cigana, mas uma forma de dançar do povo cigano,
que é leve, livre, criativa, insinuante e cheia de ardor
e calor humanos.

As mulheres ciganas quando dançam,


especialmente nas festas e cerimônias, usam suas
melhores roupas e jóias, saias fartas e coloridas, que
emprestam às danças uma beleza própria, cheia de
graça, pois elas ao executarem os movimentos, em
diversos momentos seguram parte da saia com a mão
fazendo surgir um festival de cores das diferentes
saias que estão por baixo da saia principal. Contanto,
o recato é permanente. As mulheres e jovens ciganas
não exibem desnecessariamente o corpo mesmo
quando dançam. Assim, não volteiam o corpo em
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Ciganos mágicos da natureza


movimentos circulares amplos e quando o fazem
protegem as pernas com suas saias numa execução
bastante inteligente.

A dança cigana feminina tem muita parecença


com a árabe e a hindu. Os movimentos do corpo são
baseadas da cintura para cima, meneios de ombros e
inclinação da cabeça para trás, o que chama a atenção
para os cabelos, geralmente soltos e longos. Os
braços e as mãos trabalham na frente do corpo ou
levantados em direção do alto da cabeça, sendo que
uma das principais habilidades reside no girar
insinuante e caprichoso dos punhos, mãos e dedos,
aparentemente fáceis, mas na verdade de difícil
execução. Largo sorriso, brilho nos olhos e
verdadeiro prazer pela dança estão sempre presentes
nesta composição de alegria e prazer pontuada de um
forte poder de sedução e atração. A cigana não deve
dançar por obrigação, mas pelo prazer da dança e esta
condição é exibida para que ela possa ser considerada
completa e de valor, inclusive para ser escolhida para
um bom casamento.

Todos estes aspectos lembram bastante os


bailados árabes com uma importante diferença, que é
bastante comum nas danças da índia e outros países
como Japão, China, Coréia, Tailândia. Esta diferença
90

Ciganos mágicos da natureza


consiste em que a dança é executada quase todo o
tempo de frente para os espectadores ou
circunstantes. Podem existir movimentos circulares,
mas são breves, discretos e não chamativos.
Considera-se pouco educado e de mau gosto dançar

de costas para a platéia, e uma forma pouco


respeitosa para com os idosos. Os poderes de atenção
durante a dança não estão centrados necessariamente
no corpo, mas no rosto, na graça e vivacidade dos
movimentos, e no colorido e exuberância das roupas.
A mulher cigana usa a dança como arte de sedução,
mas vale-se de todo um conjunto de fatos que não seu
corpo, considerado como digno do maior respeito e
recato.

Dependendo do país de origem, as ciganas


podem dançar segurando objetos como pandeiros
ornamentados com longas fitas multicores, lenços
esvoaçantes, leques ou flores. Estes elementos
empresam mais beleza à dança, enriquecendo a
coreografia.

Os homens quando dançam com as mulheres


apenas reforçam com sua presença as figuras
femininas. Dançam separados, não existindo toque
ou contato físico entre eles. Nas danças em grupo é
mantido o respeito entre mulheres e homens, sendo
que os homens preferencialmente dançam em grupos
91

Ciganos mágicos da natureza


somente masculinos, numa dança vibrante, máscula,
com passos muito marcados, que requerem muita
agilidade e grande condicionamento físico. Os
bailados masculinos lembram as danças gregas com
os braços estendidos nos ombros dos vizinhos e

movimentos de pernas para as laterais do corpo. Nos


fazemos lembrar também as danças russas quando se
exige um ótimo treinamento físico para a execução
dos passos, que são mais chegados ao malabarismo
ou acrobacia do que a uma simples dança
propriamente dita.

Quando os ciganos dançam nas festas, a dança


é livre, sem regras. Cada um se diverte como quer,
nunca esquecendo o recato e os limites entre homens
e mulheres. Já nas danças cerimoniais ou rituais
existe maior formalidade, os movimentos são mais
singelos, curtos e lentos, a expressão do rosto é seria
e as cores das roupas mais sóbrias, pois o importante
é o fundamento do ritual, que em geral é a entrega de
oferendas à natureza, tida como uma força divina,
protetora e doadora de benções. A natureza é uma
das referências mais importantes para o povo cigano.

A dança é aprendida desde a mais tenra


infância e não existe idade limite para se dançar. Na
ótica de uma visão mágica podemos afirmar que a
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Ciganos mágicos da natureza


vida cigana é uma dança permanente. Mudam os
movimentos, mas e exercia da dança permanente viva
atuante e fascinantemente apaixonada em cada passo,
mesmo que de caminhada, de um cigano.
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Ciganos mágicos da natureza

OS

CIGANOS

E A RELIGIÃO
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Ciganos mágicos da natureza


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Ciganos mágicos da natureza

Apesar de guardarem a sete chaves o segredo


sua verdadeira religião e os preceitos religiosos que
atendem às suas tradições, os ciganos – até para se
defenderem das perseguições aos considerados
pagãos ou infiéis -, costumavam e ainda adotam o
costume de se converterem à religião dominante do
país onde fixam suas moradias. Assim, como a maior
parte dos ciganos vivem em países particularmente
católicos, eles se declaram seguidores da fé, o que
sem dúvida facilita suas andanças por terras européias
e de muitos países católicos das América.

Se, além de atormentados e acossados por seus


costumes impares, sua vida errante, seu modo de vida
fechado aos não – ciganos pechas de ladrões,
falsários , charlatões, eles também acumulassem uma
perseguição por causa da religião, com certeza eles
teriam suas vidas muitíssimo mais complicadas. Daí,
numa atitude bastante inteligente, que não diríamos
forçadas ou falsas, adotarem os fundamentos
católicos, pelo menos para uma grande platéia
mundial.
96

Ciganos mágicos da natureza


Na verdade, porém, os ciganos passaram por
processo sincrético, procurando fundir suas crenças
e divindades das terras de origem com outras
doutrinas, reunindo-as num única sistema religioso,
tal como fizeram os povos africanos que aportaram

em terras do Brasil como escravos. Os negros


procedentes da África eram severamente castigados
pelos feitores das fazendas brasileiras se cultuassem
suas verdadeiras divindades. Que fizeram, então, para
se livrarem das chibatadas e até da morte?

Colocaram santos católicos a modo de disfarce


de suas reais divindades, os orixás, apaziguando a ira
dos feitores e dos senhores de engenho e ganhando
inclusive, de certa maneira, a simpatia dos padres da
época, tão íntimos dos donos de terras – afinal, aquela
negrada infiel tinha cedido aos apelos da verdadeira
fé.

À guisa de um pequeno adendo podemos


acrescentar que esta é a origem das religiões Afro no
Brasil, agremiação religiosa que enfeixa fundamentos
africanos autênticos com preceitos e imagens de
santos católicos, à diferença do candomblé, que é o
culto africano sem nenhuma miscigenação, ou seja,
verdadeiro, puro, tal como se originou na Mãe -
África.
97

Ciganos mágicos da natureza


Os ciganos apesar de se declararem fiéis
seguidores da fé católica, adotando muitos de seus
preceitos, mandamentos e festas religiosas, como a
comemoração profundamente respeitosa da Semana
Santa, também traziam suas divindades femininas e

masculinas pagãs e que não se acomodavam às


religiões cristãs. Então, que fizeram? O mesmo que
os negros escravos no Brasil, indo buscar numa figura
feminina considerada Santa e cristã católica, Sara ou
Santa Sara, sua mais venerada padroeira.

Eles podem continuar acreditando em outros


princípios, como o da reencarnação por exemplo,
que absolutamente, que absolutamente não se
enquadra, pelo menos oficialmente, nos dogmas
católicos.

Crendo na reencarnação aceitam o mundo dos


espíritos, bons e maus a que rendem oferendas, nas
forças da natureza como manifestações de
divindades, na roda dos círculos cármicos e na
ausência de um Paraíso e de um Inferno determinados
como o destino final de toda alma vivente na face da
terra após a morte do corpo físico.

Também por acreditarem que o espirito volta


em nova vestimenta carnal e nova vida ou
encarnação para acertarem dívidas pendentes em
98

Ciganos mágicos da natureza


vidas passadas, procuram viver da melhor maneira
possível. Afinal, sabem ou crêem que se agirem mal,
voltarão tantas vezes quantas necessárias para colocar
em ordem suas pendências geradas pela má ação,
mau pensamento, más palavras e sentimentos.

O povo cigano crê em um só Deus, pai


soberano e generoso e doador do livre - arbítrio a
todos os seus filhos, indistintamente.

Conhecerem a lei de causa e efeito, da ação e


reação, assumindo suas dores e sofrimentos como
geradas por eles mesmos, ou seja, que o ser humano
sofre em razão de seus incorretos pensamentos,
sentimentos, palavras ou ações. Desta maneira é
através de suas leis, as leis de Deus. Sob o ponto de
vista religioso é um povo austero e severo, punindo
duramente os infratores das leis humanas e divinas.
Com isto, queremos dizer que eles não transferem
para Deus a responsabilidade pelo castigo por seus
erros e faltas.

Deus é venerado sempre por sua


magnanimidade, grandeza e fonte eterna e
inesgotável de perdão.
99

Ciganos mágicos da natureza

SANTA SARA KALI


100

Ciganos mágicos da natureza


101

Ciganos mágicos da natureza

De acordo com relatos lendários, antes do ano


50 depois de Cristo, uma embarcação teria cruzado os
mares a partir de terras da Palestina, levando a bordo
para fugir das perseguições de Roma aos primeiros
cristãos, um grupo de personagens bíblicos: Maria
Jacobina ou Jacobé, irmã de Maria, Mãe de Jesus,
Maria Salomé, Mãe dos apóstolos Tiago e João,
Maria Madalena, Marta, Lázaro, Maximino e Sara,
uma negra, serve destas mulheres santas.

Embora bastante discutível a viabilidade desta


proeza marítima, o fato é que a embarcação teria
aportado a uma pequena ilhota a dois quilômetros a
leste do estuário do Petit-Rhône situada em águas do
Mediterrâneo. Nesta ilhota está construída a cidade
de Saintes Maries de la Mer erguida na foz do rio
Ródano, região da Provença, sul da França.

Sara teria sido uma das primeiras convertidas


ao cristianismo e morrido a serviço de suas
companheiras de viagem. Já outras lendas contam
que Sara já habitava a Camargue quando a
embarcação chegou com as santas e que Sara teria se
102

Ciganos mágicos da natureza


apiedado das exiladas oferecendo-lhes ajuda
incondicional. Lendas narram que Sara teria sido
uma sacerdotisa do deus Mitra ou uma divindade
feminina de origem celta ligada à Terra; outras

narram que ela foi uma rainha egípcia ou africana, o


que explicaria sua pele negra.

Considerada pela Igreja Católica como uma


santa de culto local, pois nunca passou pelos
processos regulares de canonização, Sara está ligada
à historia das tradições cristãs da Idade Media e o
assim chamado culto às virgens negras, santidades
femininas de pele negra veneradas pelos fiéis
católicos em igrejas, que posteriormente se
transformam em locais de peregrinação ( Norte Dame
de Montserrat; de la Negrette; de Liesse; des Mures;
de Marseille; e outras) principalmente na Espanha e
França.

Não se conhece a razão exata que levou o povo


cigano a eleger Santa Sara como a sua padroeira. O
certo é que ela é a mais venerada santa para os
ciganos, a quem dirigem suas súplicas e apelos, além
de oferecerem festas e ritos de agradecimento pelas
graças recebidas.
103

Ciganos mágicos da natureza


Todo acompanhamento cigano conduz uma
estátua da virgem negra depositando-a num altar de
uma das tendas cercada por velas acesas, muito
incenso, flores, frutas e alimentos.

Contam as lendas que os restos mortais de Sara


foram encontrados por rei em 1448 e depositados na
cripta da pequena igreja de Saint- Michel, que
também recebe fraternalmente em seu altar-mor um
sarcófago pagão do século III e uma pedra do altar do
deus Mitra, igualmente pagão, de origem oriental. No
mesmo local em Saintes Maries de la Mer estão
depositados os despojos de Maria Jacobina e Maria
Salomé.

No Brasil, sua padroeira, Nossa Senhora


Aparecida em razão da pele negra como Santa Sara,
recebe homenagens e devoção do povo cigano, que
festejam o dia 12 de outubro, dia de Nossa Senhora
Aparecida como um dia de festa nacional também
para os ciganos.

É importante frisar, que Santa Sara é uma


nossa Senhora Aparecida outra Santa Sara é uma e
Nossa Senhora Aparecida outra, não devendo haver
confusão entre elas, pois mesmo para os ciganos elas
são santas negras e virgens, mas distintas.
104

Ciganos mágicos da natureza


105

Ciganos mágicos da natureza

A FESTA DE SANTA

SARA KALI EM

SAINTES MARIES DE

LA MER (FRANÇA)
106

Ciganos mágicos da natureza


107

Ciganos mágicos da natureza

Saintes Maries de la Mer é a denominação


francesa para Santas Marias de Mar e é nesta pequena
cidade do litoral sul da França, que se realiza todos os
anos, nos dias 24 e 25 de Maio a festa em louvor de
Santa Sara, embora também Jacobina e Salomé sejam
lembradas e homenageadas, Sara em especial no dia
24 e as duas outras no dia 25.

As vésperas do dia 24 de Maio, milhares de


quase todas as regiões da Europa, África, Oriente e
dos quatros cantos do mundo começaram a chegar em
Saintes Maries de la Mer, alguns ainda viajando em
suas carroças pintadas com cores fortes, mas a
grande maioria em seus confortáveis carros-reboque,
automóveis luxuosos e caminhonetes possantes.

Aos poucos vão tomando conta das ruazinhas


da pequena cidade e das redondezas, como a faixa do
cais do porto e das praias, que quase uma semana
antes do dia 24 de Maio já fica tomada pelos grupos
alegres, que se reúnem ao redor das fogueiras
108

Ciganos mágicos da natureza


armadas em plena rua por uma especial permissão da
prefeitura local.

Muita música, comida, bebida e danças tomam


conta das ruas da litorânea cidade francesa, com os
ciganos se reencontrando, conversando horas a fio,
matando as saudades dos parentes a amigos.

Vestidos com suas melhores roupas festejam noite


adentro, promovendo durante o dia cavalgadas,
corridas de touro e diversos tipos de jogos
presenciados pelos olhares curiosos dos gadjês ou
não - ciganos, que nesta rara oportunidade podem
observar mais de perto todo o encanto de um povo
que transborda de nostalgia de tempos passados
quando eram em maior número e mais freqüentes os
grandes encontros. Infelizmente, porem este clima de
nostalgia que chama ao presente um passado tão rico
em historias dura os poucos dias da festa de Santa
Sara.

Mostrando as diversas procedências chegam os


gitanos da Espanha, Portugal e França, os boêmios da
Alemanha, os gypsies da Itália, os rom da
Europa oriental e outros das minorias espalhadas pelo
mundo, cada grupo trazendo suas melodias, suas
bebidas e comidas típicas, mas todos com uma
formidável dose de alegria e espírito de celebração a
Sara.
109

Ciganos mágicos da natureza

Apesar de tudo e todos lembrarem uma festa


pagã, o objetivo é um só; reverenciar e cultuar Santa
Sara, uma Santa católica de origem obscura e
histórica não menos confusa. Eles vão pagar
promessas a Sara e pedir por bênçãos protetoras até a
festa no ano seguinte. Os ciganos desfilam frente aos

despojos de Santa Sara guardados na cripta da igreja,


onde um número interminável de velas devocionais
são acesas transformando a cripta numa autentica
câmara ardente.

Preces, ladainhas entrecortadas com choros às


vezes copiosos e barulhentos se elevam no local onde
Sara tem seus restos mortais guardados e é tal o clima
de devoção, de amor à santa, que chega às raias da
comoção geral com alguns indivíduos perdendo o
domínio da consciência e entrando em transe
mediúnico, dando passagem a entidades e divindades
ciganas, aos pés das quais se prostram em atitude de
respeito e veneração os demais.

O transe muitas vezes é quase coletivo, com as


pessoas se agarrando à estátua da santa recoberta por
mantos riquíssimos de tecidos raros, bordados com
fios de ouro e coberta de jóias. Uma coroa de ouro e
pedrarias adorna a cabeça da santa, intocada e segura
de roubo e furto, quase como se ela quisesse
110

Ciganos mágicos da natureza


desmentir a má fama de ladrões de seus fervorosos
seguidores.

DIA 24 DE MAIO

Na madrugada do dia 24 de Maio a cripta


transforma-se numa verdadeira câmara ardente, tal o

número de velas acesas em seu interior, o que eleva a


temperatura a graus praticamente insuportáveis.
Aumenta o volume das orações, os pedidos dos fiéis.

As manifestações de fé prosseguem até às


quinze horas da tarde do dia 24, quando a santa é
colocada em um andor e conduzida em procissão até
o mar Saintes Maries de la Mer.

A imagem vai pelas ruas protegida pelos


cavaleiros da Ordem de São Jorge, uma confraria
cristã não-cigana fundada em 1512. Montados em
seus cavalos brancos, trajados de negro e carregando
na mão direita uma longa lança, os cavaleiros de São
Jorge mantêm a ordem pública, guardando a santa
dos mais fanáticos e de possíveis baderneiros.

Esta é uma procissão de tal maneira festiva,


que pouco lembra a seriedade das procissões
católicas tradicionais.
111

Ciganos mágicos da natureza


Em seguida a procissão faz o caminho de volta,
retornando Santa Sara à sua igreja onde prosseguem
a visitarão, as orações e as oferendas de velas.

NO DIA 25 DE MAIO

Na tarde de 25 de Maio é a vez das santas


brancas, Maria Jacobina e Maria Salomé visitarem o
mar em procissão. Contudo, esta não tem o fascínio
da de Sara e é realmente uma festa complemente
cristã, embora acompanhada por muitos ciganos.

Finda a procissão de Santa Jacobina e Salomé,


os ciganos pagam tributos à igreja Católica em
agradecimento pela acolhida e proteção a sua Santa
Sara. Reunidos no interior da igreja em
agradecimento pela acolhida e proteção de sua Santa
Sara. Reunidos no interior da Igreja de Nossa
Senhora do Mar, entoam cânticos religiosos, cantam
ave - Marias e fazem discursos, apaixonados, que
testemunham a maternal proteção de Santa Sara.
Renovam suas promessas, fazem suas últimas preces
e partem durante as horas que se seguem em
caravanas.
112

Ciganos mágicos da natureza

Saintes Maries de la Mer volta também à sua


habitual quietude, acolhendo os turistas ocasionais
que a visitam, Certamente, os mais sensíveis, ainda
sentem nos dias que seguem as festividades em
homenagem a Santa Sara e às Santas Maria Jacobina
e Maria Salomé, um clima de magia, de

encantamento e devoção, que toma conta desta


pequena cidade francesa. Muitos talvez não
compreendam a nostalgia que abraça as ruas de
Saintes Maries de la Mer. São as saudades dos
ciganos que partiram deixando para trás a imagem de
sua amorável Santa. Nos rastros dos ciganos a poeira
de nostalgia, mas no coração de cada um a imagem
viva e maternal de Santa Sara Kali, a padroeira do
povo.
113

Ciganos mágicos da natureza

BANHO

DA

PROSPERIDADE
114

Ciganos mágicos da natureza


115

Ciganos mágicos da natureza

Dos países da Europa Central, especialmente


Hungria e Áustria, vem um antigo costume cigano,
que se estendeu posteriormente aos ciganos de várias
partes do mundo, costume este que vem sendo
engolido pela modernidade, como tantos outros,
infelizmente. Dizemos “ infelizmente’’ porque este
ritual do banho da prosperidade é cercado de muita
beleza, além de um profundo sentido místico.
Contudo, este é o preço que o povo cigano para pelo
sedentarismo quando fatalmente se mistura aos não -
ciganos possuidores de diferentes hábitos e costumes.

O nomadismo, apesar de parecer dispersivo,


incerto e aventureiro, reforça os laços com o passado,
com a ancestralidade e com as tradições dos
antepassados; as famílias que viajam juntas são mais
unidas, mais solidarias e também mais isoladas dos
costumes dos gadjês, daí conseguirem preservar com
fidelidade os seus passando-os quase intatos para as
gerações seguintes.
116

Ciganos mágicos da natureza

Logo que o bebê cigano nasce, geralmente


ainda dentro da primeira semana de vida, é preparado
o banho da prosperidade ou o banho da sorte para o
pequeno cigano ou cigana.

Os preparativos são realizados pela mãe do bebê e


pelas demais mulheres do clã, pois um bebê
representa para todos, indistintamente, homens e
mulheres, a garantia da continuidade de seu povo.

Após um rápido banho higiênico, o bebê é


transferido para outra bacia contendo água pura, as
jóias de família, pétalas de rosas brancas e algumas
gotas de mel. Enquanto o bebê é banhado por sua
mãe, todas as mulheres rezam, em especial a mãe do
bebê, velhas orações herdadas de seu dos
antepassados.

O clima durante o banho é de uma alegria


reverente, pois se espera – e por isso se reza - , que o
banho surta o efeito magico desejado. Após o banho
todos se reúnem para dançar, comer, beber e cantar
desejando longa prospera vida ao bebê, felizes por
terem cumprido mais uma vez um ritual talvez
milenar, de desejos positivos ao pequeno ser, nas
117

Ciganos mágicos da natureza


mãos do qual se deposita a esperança da continuidade
do clã e do próprio povo cigano.

LIGAÇÃO ESPIRITUAL

ENTRE
118

Ciganos mágicos da natureza

A MÃE E SEU BEBÊ


119

Ciganos mágicos da natureza

Todas as pessoas possuem um nome próprio


através do qual são conhecidas pelos demais. Este
nome é devidamente registrado em cartório na
denominada certidão de nascimento, que é o primeiro
documento que identifica um cidadão. Na cerimônia
católica do batismo este mesmo nome será repetido
pelo padre ou oficiante, ficando a partir deste
momento o bebê devidamente identificado perante as
leis dos homens e as leis de Deus, uma vez que o
batismo é um sacramento obrigatório para todo
cristão católico.

Até aí, em nada é diferente um cigano de um


não-cigano, pois os bebês ciganos atualmente
também são registrado em cartório e levados à pia
batismal. Contudo os ciganos possuem além do
120

Ciganos mágicos da natureza


nome oficial, um outro nome absolutamente secreto,
que é escolhido por sua mãe e soprado em seus
ouvidos nos primeiros instantes após o nascimento.

Este nome secreto somente será conhecido pela


mãe, não sendo registrado ou comentado com
ninguém. A própria pessoa nunca saberá qual é este
nome mantido em total sigilo, unicamente por sua
mãe. Então, qual o valor deste nome ou para que ele
serve?

O povo cigano acredita que este nome secreto é


a ligação espiritual entre a mãe e seu bebê e sempre
que ela precisar apelar às forças divinas em favor de
seu filho ou filha usará este nome secreto nas suas
invocações. É importante frisar que este nome
somente é usado para situações bastante difíceis ou
complicadas para a criança, em especial apelos em
favor de proteção.
Ele nunca é usado displicentemente, por
brincadeira ou para apelos banais, e morre junto com
a mãe cigana.
121

Ciganos mágicos da natureza

SIMBOLISMO
122

Ciganos mágicos da natureza

DOS ELEMENTOS

NO RITUAL
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Ciganos mágicos da natureza

A água para simboliza a própria vida. Este


líquido vital e imprescindível à vida, quando usado
para um banho traduz também o sentido da
purificação, da limpeza natural do corpo físico e do
corpo áurico e do livramento das faltas cometidas no
passado, num sentido cármico da faltas, tanto que a
água usada durante o batismo carrega o simbolismo
da purificação do pecado original herdado de Adão e
Eva e que todo ser vivente herda, querendo ou não,
segundo os dogmas da Igreja Católica.

As jóias significam o desejo de que o bebê seja


rico, próspero e bem – sucedido financeiramente.

As pétalas de rosas brancas expressam a


vontade de que o bebê tenha uma vida bela,
124

Ciganos mágicos da natureza


perfumada, bem – sucedida no amor, e acima de tudo,
tenha uma vida repleta de paz ( o simbolismo da cor
branca).

As gotas de mel traduzem o desejo de que


aquele novo e pequeno ser tenha uma vida tranqüila,
doce, livre de sofrimento e dores, que o livrarão
consequentemente de doenças.

Vida longa, purificada, rica e próspera, cheia


de amor e paz sustentada por uma saúde perfeita é o

significado abrangente do banho da prosperidade ou


da sorte.

Este banho é um belo ritual revestido por um


simbolismo amplo e profundo ( não esquecer a força
das orações ) e, com certeza, uma maneira
maravilhosa de começar a vida.
125

Ciganos mágicos da natureza

O VALOR

FUNDAMENTAL

DA NATUREZA
126

Ciganos mágicos da natureza


127

Ciganos mágicos da natureza

A integração dos ciganos com a natureza é


permanente, obrigatória sob um ponto de vista e
imprescindível sob outro. Dizemos que é obrigatória
pois com sua vida andarilha, suas caravanas muitas
vezes viajando sem rumo absolutamente
determinado, sua ânsia constante de viver de modo
livre e aventureiro, onde mais montar suas barracas,
arranjar seus acampamentos, arrumar suas bagagens
pelo menos durante um certo período de tempo, senão
a céu aberto, “ dentro’’ da natureza, tudo muito
próximo a rios, cachoeiras ou outros remansos de
água – doce, de que eles necessitam para cozinhar,
lavar as roupas, se banharem? Seria praticamente
impossível armarem suas tendas nas praças das
aldeias, num canto qualquer de uma rua vilarejo, no
adro de uma igreja, ou qualquer outro lugar
128

Ciganos mágicos da natureza


pertencente à arquitetura social de uma população
não-cigana, de onde provavelmente seriam expulsos
pela autoridade policial ou execrados pelas pessoas
do lugar a tal ponto que teriam de levantar
acampamento em busca de nova terra.

Por todos esses fatos e pelos conseqüentes de


uma maneira de viver nômade, é bastante fácil
compreender a obrigatoriedade do convívio
entre os ciganos e a natureza. É como se um fosse

praticamente obrigado a viver com outro e não da


natureza propriamente dita, como é obvio deduzir.

Contudo, mesmo para os ciganos que


abandonam a vida nômade, estabelecendo-se tal
como qualquer gadjê numa habitação convencional
das cidades, geralmente de alvenaria, rica e
confortável, que demonstra com clareza a
prosperidade financeira de seus moradores ( os
ciganos que se tornam sedentários são geralmente
abastados), o convívio com a natureza continua
imprescindível, tanto que muitos, em particular os
mais idosos, possuem paralelamente às suas
luxuosas casas, uma verdejante área isolada e
protegida dos olheiros curiosos onde armam suas
tendas da mesma maneira que seus ancestrais.
129

Ciganos mágicos da natureza


Muitos até moram nestas barracas, abrindo mão do
conforto e da segurança das moradias tradicionais ou
convencionais.

E por tudo isso? Por que esta relação tão


estreita com a natureza? Por que buscar mesmo sem
uma aparente necessidade esta grandeza tida como
Mãe.

A natureza é generosa doadora da própria


sobrevivência cigana. Nela o povo cigano busca os
mais variados tipos de alimentos e a água, líquido

preciosos de sustentação da vida. É verdade que,


quando passam pelas cidades, compram gêneros
alimentícios, tecidos, ferramentas e outros bens
necessários mas na natureza que referenciam o
principal apoio de vida.

Todavia, o povo cigano não entende a natureza


somente como a doadora dos elementos fundamentais
como alimentos e água, mas como uma fonte
magnifica e inesgotável de energia. Aí começa o lado
mágico da natureza cigana por assim dizer, o
fundamento etéreo da vida, o lado abstrato muitas
vezes não compreendido racionalmente pelos
próprios ciganos.
130

Ciganos mágicos da natureza


Eles entendem até intuitivamente em vários
aspectos, que a natureza é que fornece a vitalidade, o
frescor da vida renovada a cada dia do ponto de vista
da troca energética. Do céu, dos astros do
firmamento, do Sol, da Lua em suas diferentes fases,
desce a energia positiva de Deus, a força divina que
mantém o homem em pé, apto ao trabalho, às
caminhadas, a geração de filhos e a todos os tipos de
alegrias, sensações, emoções e sentimentos. A terra,
o solo onde pisam propositadamente sem sapatos é a
Mãe-Terra, que recebe sem recusas e sempre aberta
todas as energias negativas, os temores, as angústias

de um povo tantas vezes perseguido, as tristezas e os


desconsolo que maltratam a alma e o coração.

A terra abençoada, que recebe sem reclamos os


despejos daqueles que dormem nos braços da morte,
transformando-os em novas formas de vida.

Os ciganos não são politeístas. Adoram e


veneram um só Deus, mas tal como vários povos que
viveram e vivem em estreito contato com a natureza,
vêem as naturais manifestações desta como
divindades. Assim, além dos astros do céu,
abençoam e pedem bênçãos à chuva, às águas dos
rios, das cascatas, riachos, cachoeiras, às árvores das
131

Ciganos mágicos da natureza


matas, respeitando os trovões, a força devastadora
dos rios e o fogo, que aquece, protege e purifica.

Os ciganos admiram os pássaros, as flores, os


animais, toda a forma de vida que brota da natureza,
pois entendem que tudo e todos são maneiras de Deus
se revelar aos homens, sendo tratados portanto com
carinho e respeito.
Eles compreendem que o ar é energia vital, o
elemento vivificante da vida e oram para que as
ventanias, tufões e vendavais não destruam seus
acampamentos de que os ciganos temem as águas do
mar, o que é uma perfeita bobagem. Eles singraram

os mares nos tempos das colonizações, inclusive a


brasileira, em caravelas e muitos deles viviam nestas
embarcações como prisioneiros condenados
colocando a força de seus braços nos remos, que
moviam estes barcos.

A verdade é que as águas salgadas não tinham


serventia para beber, cozinhar, lavar as roupas, etc.,
então eles procuravam ficar sempre próximos a locais
de água – doce. Segundo seu conceito mágico da
natureza os ciganos reverenciam as águas do mar e as
deidades que nelas habitam.

No Brasil, Iemanjá, a rainha do mar, é


homenageada também pelo povo cigano, que sempre
132

Ciganos mágicos da natureza


que pode e também no dia 31 de dezembro leva
flores, velas e champanhe à Mãe Janaina, pedindo
suas benções e proteção. Muitos trabalham de
magia são feitos nas areias do mar e outros tantos
entregues nas águas do mar para que Iemanjá tome
conta.

Os ciganos respeitam e reverenciam os quatro


elementos, terra, água, ar e fogo, cultuando os
elementais ligados a estes elementos. Eles podem
não chamar os elementais pelos nomes tão em voga
atualmente (gnomos, duendes, fadas, sílfides,
salamandras, ondinas, nereidas), mas admitem sua

existência e importância. Sendo místicos do jeito que


são, não deixariam de reconhecer nos elementos e nos
elementais, uma força extraordinária, real e
auxiliadora, tanto que nos seus trabalhos mágicos não
deixam de pedir permissão a eles e oferecer-lhes
presentes como oferendas de agradecimento ou
pedidos de ajuda para o fortalecimento e realização
de seus desejos.

O povo cigano também acreditam em


presságios e avisos provenientes da natureza e de
seus elementos. Na verdade, eles são muito
inteligentes a ponto de identificarem as mensagens
oriundas das forças naturais e tomarem seus cuidados
e prevenções.
133

Ciganos mágicos da natureza

Eles são meteorologistas natos não


necessitando de instrumentos e outras sofisticações
para saber quando vai chegar uma tempestade, uma
nevasca ou um sol de rachar.

Sabem reconhecer quando há água por perto,


ou viagem prosseguirá em terreno árido e seco.
Pressentem os perigos das selvas, das matas pelos
movimentos dos animais, pela revoada dos pássaros o
outros sons peculiares da natureza.

É sábio o povo que sabe ouvir a natureza, convivendo


com ela pacífica e respeitosamente, e nisto o povo
cigano é mestre. O convívio entre o cigano e a
natureza é tão estreito e harmonioso, que de certa
forma podemos dizer que um cigano é uma das
manifestações da Mãe natureza ou a Natureza
travestida na forma humana, sinônimos, mãe e filho,
ou ainda, numa expressão mais abrangente, uma
autêntica família.

A natureza tão vasta, enigmática, imprevisível,


rica em tesouros imensuráveis, intrigante, curiosa,
onde todas as forças e todos os fatos convivem numa
natural harmonia e perfeito equilíbrio, desde que não
agredida, mutilada, desfalcada, machucada e outros
134

Ciganos mágicos da natureza


tantos termos equivalentes, por seu maior predador, o
homem, que na sua mais completa e profunda
ignorância não entende que não está agredindo outro
senão a si próprio, que não está matando a natureza,
que tem o poder de se recompor, mas a si mesmo,
uma estrutura de matéria orgânica absolutamente
fantástica, maravilhosa e milimetricamente bem
pensada pelo Criador, mas perecível da podridão
irrecuperável.

O povo cigano tem muitas das qualidades da


Natureza como sucedidas por herança, quiçá como
natureza de berço ou origem, e é certo que cada

cigano autêntico se esforça muito, especialmente nos


tempos atuais convulsionados pela modernidade
tecnológica, por deixar para as gerações seguintes
todos os valores e ensinamentos desta herança
bendita ofertada gratuitamente pela Natureza, aqui
entendida no seu aspecto divino ou representativa
digna de uma das faces de Deus.
135

Ciganos mágicos da natureza

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