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AUL A

INI CI AL

CONHECIMENTOS PRÉVIOS

E APRESENTAÇÃO DO

MATERIAL DE PESQUISA
1 O que é

gramática?

Do grego “grammatiké”: a arte de escrever ou ler. Atualmente,

significa sistematização dos fatos da língua.

Seu enfoque pode ser variado, a depender do intuito do estudioso e

do enfoque dado por ele. Por exemplo:

○ A gramática histórica (ou diacrônica) estuda a história da língua,

debruçando-se sobre a origem e a evolução de determinado

sistema linguístico;

○ A gramática comparativa estuda as diferenças e semelhanças

entre as línguas, especialmente as derivadas do mesmo tronco;

○ A gramática descritiva (ou sincrônica) estuda o mecanismo pelo

qual uma língua se constrói em dado momento da história;

○ A gramática normativa é a própria gramática descritiva do

registro culto escrito, utilizada com intenção didática.

A base sobre a qual se constrói a gramática normativa é o uso culto

(daí falar-se em “norma culta”). Assim, estudiosos, pessoas conceituadas

e grandes escritores são os que norteiam a criação do padrão de uso da

língua. É em torno de suas obras que se constrói o ideal de bem falar e

escrever.

Nas palavras de Evanildo Bechara:

“Cabe à gramática normativa, que é uma das disciplinas com

finalidade pedagógica, elencar os fatos recomendados como modelares

da exemplaridade idiomática para serem utilizados em circunstâncias

especiais do convívio social. A gramática normativa recomenda como se

deve falar e escrever segundo o uso e a autoridade dos escritores corretos

e dos gramáticos e dicionaristas esclarecidos.”

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A gramática normativa se divide formalmente em:

○ Fonética: estuda os fonemas ou sons que formam palavras, sua

correta pronúncia (ortoépia), correta grafia (ortografia) e correta

acentuação (prosódia);

○ Morfologia: estuda a estrutura, a formação, a classificação e a

flexão das palavras;

○ Sintaxe: estuda o emprego das classes gramaticais e suas funções,

bem como as relações de regência, concordância, colocação que

elas mantêm entre si na estruturação da oração e nas relações

entre orações.

Essa divisão é de caráter eminentemente didático e não corresponde

a distinções naturais da língua.

2 Por que

estudar gramática?

O estudo da gramática não costuma ser benquisto pela maioria das

pessoas. Parte disso se deve à não compreensão de sua finalidade: entendê-la

como uma soma de regrinhas arbitrárias é esvaziar-lhe completamente a

razão de ser.

Gramática é originalmente a “arte de inventar símbolos e combiná-los

para expressar pensamento” (Mirian Joseph). Ela prescreve como combinar

palavras de modo a formar corretamente as frases.

No Medievo, seu estudo era acompanhado do da retórica e da lógica,

cujos conceitos vale a pena apresentar:

○ Retórica: comunicação, por meio de símbolos, das ideias relativas

à realidade. Ela prescreve a melhor forma de combinar frases em

parágrafos e estes numa composição, que apresente unidade,

coerência e ênfase desejada, bem como clareza, vigor e beleza.

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○ Lógica: arte de pensar; prescreve como combinar conceitos em

juízos e estes em silogismos e cadeias de raciocínio de modo a

obter a verdade.

Juntas, essas três artes – o Trivium – desenvolvem as faculdades

básicas do espírito e libertam a inteligência da ignorância, preparando o

indivíduo para o caminho da sabedoria.

Modernamente, o estudo do que se chama “gramática” envolve, em

grande parte, a retórica e mesmo a lógica. A análise dos fatos modelares

da língua inclui muito mais do que apenas a correta combinação de

símbolos para expressão do pensamento. Durante o estudo, fala-se sobre

as qualidades de um bom texto, o que envolve, por exemplo, coerência


e coesão, concisão, ênfase, figuras de linguagem etc. Esses tópicos, aliás,

são encontrados na maior parte das gramáticas normativas modernas, ou

seja, percebe-se que o estudo da chamada “gramática” passou e envolver

também o de vários elementos retóricos e mesmo lógicos.

Apesar disso, ressalta-se que o englobamento da retórica e da

lógica pela gramática não substitui o ensino individual de tais ramos do

conhecimento, cujo estudo aprofundado é de indiscutível valia.

De toda forma, independentemente da nomenclatura, não faria


sentido fatiar as artes do Trivium: um estudo que separe a técnica gramatical

de seu efetivo emprego é completamente vazio. É como ter em mãos uma


complexa e eficiente ferramenta, mas não saber como operá-la.

Como todo estudo normativo, a gramática exige memorização

de informações e regras, cujo objetivo é desenvolver uma comunicação

exemplar, dentro do que melhor existe no padrão culto da língua. Visa-se

ao ajuste da escrita àquilo que de melhor se produz na literatura culta.

Trata-se de ponte inegável com a boa literatura produzida em todas as

épocas, permitindo que o lapso de tempo entre as produções literárias não

nos afaste de nossos melhores autores e de nossa identidade cultural.

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Assim, essa arte passa longe de ser um amontoado de regrinhas

aleatórias; é um esteio da melhor comunicação, um padrão de excelência

quanto ao emprego da palavra.

“Quem escreve de maneira displicente confessa, com isso, antes

de tudo, que ele mesmo não atribui grande valor a seus pensamentos.

Pois apenas a partir da convicção da verdade e importância de nossos

pensamentos, surge o entusiasmo que é exigido para buscar sempre, com

incansável perseverança, a expressão mais clara, mais bela e mais vigorosa”,

escreveu Schopenhauer.

Dado que o pensamento humano se constrói por meio da linguagem

e que os homens se comunicam entre si também por meio dela, seu


polimento há de ser constante.

Cuidar da expressão é cuidar dos próprios pensamentos, garantindo

que eles sejam formulados e transmitidos da melhor forma possível.

Evidentemente, o aperfeiçoamento de tal faculdade enseja ascensão social,

mas tal efeito é secundário. Antes disso, disciplina a mente e traz polimento

ao espírito. Entregar-se ao estudo da gramática é, enfim, polir-se.

3 Quais são os

objetivos do Curso?

Desenvolver o estudo da gramática normativa da língua portuguesa,

compreendendo, por meio de análises textuais, seu verdadeiro fim.

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4 Quais benefícios podemos auferir

a partir da conclusão do Curso?

Melhora do raciocínio, disciplina e permeabilidade da mente para o

estudo, melhora do entendimento do que se lê e da capacidade de escrever,

desenvolvimento da articulação entre as ideias, possibilidade de ascensão

profissional.

5 Para que servem

os dicionários e como usá-los?

De acordo com o Dicionário Michaelis, o vocábulo “dicionário” quer

dizer “coleção, parcial ou completa, das unidades lexicais de uma língua

(palavras, locuções, afixos etc.), em geral dispostas em ordem alfabética,

com ou sem significação equivalente, assim como sinônimos, antônimos,

classe gramatical, etimologia etc., na mesma ou em outra língua”.

São livros que se dispõem a fazer, portanto, um inventário abrangente

dos termos da língua, seus significados e empregos.

É claro que, dado o dinamismo da língua e a velocidade com que

ela se expande e modifica, há limitações naturais que lhes são impingidas.

É justamente o que reconhece Aurélio Buarque no prefácio de seu Novo

Aurélio (3ª impressão):

“Pretendeu-se fazer um dicionário médio, ou inframédio, etimológico,

com razoável contingente vocabular (bem mais de cem mil verbetes e

subverbetes), atualizado (dentro dos seus limites), atento não só à língua

dos escritores (muito especialmente os modernos, mas sem desprezo, que

seria pueril, dos clássicos), senão também à língua dos jornalistas e revistas,

do teatro, do rádio e televisão, ao falar do povo, aos linguajares diversos –

regionais, jocosos, depreciativos, profissionais, giriescos...”

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O próprio dicionarista reconhece, portanto, tratar-se de um dicionário

“médio” ou “inframédio”, revelando a natural e esperada impossibilidade de

se registrarem todos os verbetes existentes na língua.

A fonte para a produção de um dicionário é abrangente, a fim de

captar as tendências da língua. Ainda no Prefácio, explica Aurélio:

“Entre os autores, dos mais desvairados gêneros, figuram com

certa frequência os cronistas, por se mostrarem, em maior ou menor

grau, bons espelhos da língua viva. São, aliás, vários deles, mestres da

prosa dos nossos dias. Nem foi esquecida outra classe de autores: a dos

letristas de sambas, marchas, canções. Eles – tal como, até certo ponto,

também os cronistas –, além de captarem a criação linguística popular,


não raro são, ainda por cima, criadores, inventores de palavras.

Injusto seria deixar de recorrer aos comentaristas políticos,

econômicos etc., aos repórteres, aos noticiaristas – desde os mais

qualificados colaboradores, de vária espécie, de jornais e revistas, até

aos mais modestos, aos focas anônimos, aos que fazem a cozinha da

profissão.”

6 O que são a

Academia Brasileira de Letras e o VOLP?

Academia Brasileira de Letras (ABL) é uma instituição cultural

privada, inaugurada em 20 de julho de 1897 e sediada no Rio de Janeiro,

cujo objetivo é o cultivo da língua e da literatura nacional.

Entre os primeiros integrantes, estavam Machado de Assis, Olavo

Bilac, Rui Barbosa e Joaquim Nabuco. O número de membros é sempre 40,

e a entrada de novos só ocorre com a morte de algum acadêmico.

Entre notáveis atividades da ABL, está a edição do VOLP – Vocabulário

Ortográfico da Língua Portuguesa –, espécie de dicionário que lista palavras

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reconhecidas oficialmente como pertencentes à língua portuguesa, bem

como lhes fornece a grafia oficial. Seu objetivo, no entanto, difere do dos

dicionários comuns, uma vez que ele não explica o significado dos termos

registrados, mas apresenta sua grafia indicada, seu gênero, sua categoria

morfológica, eventualmente sua pronúncia correta etc. É o VOLP que

oficialmente registra a ortografia das palavras da língua portuguesa do

Brasil.

Abaixo, vê-se exemplo de pesquisa no VOLP. Em “inexorável” ( =

rigoroso, inflexível), esclarece-se que a pronúncia-padrão é de /z/. Em “xerox”,

apresentam-se a dupla possibilidade de grafia e a correta pronúncia do x

final: /cs/.

Pesquisa de “inexorável” no site do VOLP

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Pesquisa de “xerox” no site do VOLP

Observação importante:

Não raro, há divergências entre os próprios dicionários ou entre alguns


dicionários e o VOLP, o que não deve causar estranhamento ao usuário da

língua. Catalogar o léxico enquanto a língua ainda vive e se transforma não

poderia ser missão completamente uniforme. Cabe ao estudioso pesquisar

sempre, buscando o melhor e mais primoroso emprego das palavras.

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7 O que é o

Novo Acordo Ortográfico da Língua


Portuguesa?

“A existência de duas ortografias oficiais da língua portuguesa, a

lusitana e a brasileira, tem sido considerada como largamente prejudicial

para a unidade intercontinental do português e para seu prestígio no

Mundo.” (Anexo II)

Esse é precisamente o argumento de abertura da Nota Explicativa do

Acordo Ortográfico. Desde 1931, quando foi aprovado o primeiro acordo entre

Brasil e Portugal, houve inúmeras tentativas de unificar as grafias, todas

malsucedidas pelo desrespeito às peculiaridades de cada país no emprego

da língua. A unificação ortográfica absoluta, embora ideal, passava longe

de se concretizar, uma vez que vias administrativas jamais conseguiram

transpor artificialmente as diferenças inegáveis entre os países.

Feita tal constatação, o último Acordo Ortográfico (Decreto de 29

de setembro de 2008) adaptou seu escopo, surgindo com o intuito não de

unificar tudo o que já existia, mas de acautelar a grafia futura, especialmente

porque, além de Brasil e Portugal, entraram no debate os países africanos


oficialmente falantes de português: Angola, Cabo Verde, Guiné-Bissau,

Moçambique e São Tomé e Príncipe. Justifica o documento do Acordo:

“Com a emergência de cinco novos países lusófonos, os fatores

de desagregação da unidade essencial da língua portuguesa far-se-ão

sentir com mais acuidade (...) Nesse sentido, importa, pois, consagrar

uma versão de unificação ortográfica que fixe e delimite as diferenças

atualmente existentes e previna contra a desagregação ortográfica da

língua portuguesa.”

Ressalta-se que, apesar de o decreto ser de 2008, o acordo em si é de

1990. O Timor-Leste tornou-se signatário em 2004.

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Estima-se terem sido unificados 98% do léxico, o que certamente já

representa um avanço.

Algumas divergências foram mantidas (de acentuação gráfica –

bebê e bebé, acadêmico e académico etc. são formas aceitas e registradas

oficialmente –; preservação de consoante muda – carácter e caráter, facto

e fato etc. são também formas registradas oficialmente), mas substancial

parte se unificou.

As principais alterações incidiram sobre a colocação do hífen, a

acentuação de alguns vocábulos, o emprego de maiúsculas e minúsculas e

o trema (o qual foi, em regra, abolido).

Fazem-se, com razão, algumas críticas à Reforma, como a

manutenção de hífen em “exceções consagradas pelo uso”, sem que haja

um critério objetivo para medir o que é “consagrado”. No entanto, trata-se de

um documento oficial, cujas alterações devem ser seguidas, especialmente

na produção de documentos oficiais e acadêmicos, dada a necessidade de

padronização.

8 Que

livros didáticos escolher?

O melhor livro de gramática normativa é aquele que, apresentando

a teoria correta, consegue ser mais bem entendido pelo leitor.

Algumas gramáticas (como as de Rocha Lima e Paschoal Cegalla)

expõem a matéria de forma extraordinariamente didática, sem preocupação

com divergências muitas vezes de cunho puramente acadêmico. Outros,

por sua vez, adentram nessas discussões e balizam o debate (Napoleão

Mendes, Evanildo Bechara, Amini Hauy e Celso Cunha – este último um

pouco menos).

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Há livros específicos para determinados fins:

○ A vírgula, de Celso Luft, por exemplo, fala apenas sobre o tema

do título;

○ Manual de Redação Jurídica, de José Maria da Costa, debruça-se

sobre as dificuldades linguísticas do profissional de Direito;

○ Dicionário de Questões Vernáculas, de Napoleão Mendes;

Dicionário de Dificuldades da Língua Portuguesa, de Cegalla; e

Não Tropece na Língua, de Maria Tereza Piacentini, tratam das

dificuldades cotidianas no uso da língua;

○ “A Gramática”, de Fernando Pestana, traz a teoria gramatical com

apresentação das divergências entre os autores. Embora voltada

para concurso, é útil a todos;

○ Dicionário de Regência Verbal e Dicionário de Regência Nominal,

de Celso Luft, debruçam-se exclusivamente sobre o estudo da

regência de nomes e verbos;

○ Comunicação em Prosa Moderna, de Othon Garcia, aborda

técnicas de boa escrita.

Enfim, cada livro traz sua colaboração para o polimento do

conhecimento.

Para um estudo inicial, sugerem-se Gramática Normativa da Língua

Portuguesa, de Rocha Lima; Novíssima Gramática da Língua Portuguesa,

de Domingos Paschoal Cegalla; “A Gramática”, de Fernando Pestana, e

“Nova Gramática do Português Contemporâneo”, de Celso Cunha.

Não é necessário que o aluno adquira todos eles; basta escolher

aquele com cuja linguagem mais se identifique.

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9 O que é a

Nomenclatura Gramatical Brasileira?

Até a metade do século XX, era caótica a teoria gramatical da

língua portuguesa. Tamanhas eram as subdivisões nas classificações dos

fatos linguísticos, que gramáticos se perdiam e se desencontravam, cada

um desenvolvendo suas próprias teorias, sem muita preocupação com a

unidade e a coesão gramatical.

Ciente de tal realidade, em 1957, o então Ministro da Educação e

Cultura, Clóvis Salgado, convocou professores do Colégio Pedro II para

elaboração do Anteprojeto de Simplificação da Nomenclatura Gramatical

Brasileira, cujo objetivo era padronizar a nomenclatura técnica empregada

nos estudos de gramática normativa.

Argumentou sensatamente o Ministro à época: “Um dos empecilhos

maiores, se não o maior, à eficiência do emprego da língua portuguesa reside

na complexidade e falta de padronização da nomenclatura gramatical em

uso nas escolas e na literatura didática”.

A portaria de nº 36 de 1959 recomentou expressamente que a

Nomenclatura Gramatical Brasileira fosse adotada no ensino programático


da língua portuguesa nos estabelecimentos de ensino.

Embora tenha sido importante passo rumo à unificação da

nomenclatura técnica, fato é que a multiplicidade de conceituação e análise

não cessou. A mera adoção da terminologia prescrita no documento não

impediu a proliferação de obras com análises distintas e frequentemente

inconciliáveis.

O objetivo deste Curso, no entanto, não é explicitar as divergências,

tampouco confundir o aluno com os pontos de maior impasse teórico, mas,

sim, apresentar as classificações pacíficas e as que, não sendo pacíficas,

sejam majoritárias e razoáveis.

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AU L A 1

MORFOLOGIA E

SUBSTANTIVO
MORFOLOGIA
(do grego “morphê” = forma + “logia” = estudo)
A morfologia é a parte da Gramática que estuda as palavras quanto a

sua estrutura e formação, a suas flexões e a sua classificação.

Quando se analisa a palavra “inútil” e diz-se, por exemplo, que 1) ela

tem um prefixo (-in); 2) se trata de um adjetivo; e 3) pode ir para o plural

(“inúteis”), essas considerações são todas de ordem morfológica, pois estão

se debruçando sobre a construção da palavra.

Quanto à ideia e forma que carregam, as palavras se dividem em dez

classes gramaticais. Classes são, portanto, grupos de palavras classificadas

de acordo com a ideia e a estrutura que encerram. São elas: substantivo,

adjetivo, artigo, pronome, numeral, verbo, advérbio, conjunção, preposição

e interjeição.

As mais importantes, entre essas classes, são o substantivo e o verbo,

porque são elas a base da frase, como se verá.

Passemos à análise de cada uma.

Substantivo
Como o próprio nome diz, “substantivo” é a classe gramatical

responsável pela nomeação do que tem substância, ou seja, do que tem

existência, seja real (parede, raiz), seja imaginária (fada, sereia, anjo), seja

concreta (lápis, árvore, pão), seja abstrata (verdade, carisma, sofisticação),

seja animada (gato, macieira, homem), seja inanimada (pedra, ar).

Em torno do substantivo, gravitam quatro classes: artigo, adjetivo,

numeral e pronome, sobre as quais se falará posteriormente.

O substantivo flexiona varia em gênero, número e grau. Exemplo:

leitão/leitoa (variação em gênero), leitões (variação em número) e leitãozinho,

megaleitão (variação em grau).

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Ressalta-se que qualquer palavra pode tornar-se substantivo, o que

geralmente ocorre com a anteposição de um determinante: artigo, adjetivo,

pronome ou numeral.

“Entre o psicanalista e o doente, o mais perigoso é o psicanalista.”

(Nelson Rodrigues)

Note como “psicanalista” e “doente” nomeiam as pessoas em si, não

apenas expressam uma característica delas. Essa percepção é reforçada

pela presença do artigo definido “o”.

Agora compare:

A paciente doente tratou-se com o médico psicanalista.

Aqui, “doente” passa a ser característica de “paciente” e “psicanalista”

passa a ser característica de “médico”. Os substantivos, portanto, na última

frase, são “paciente” e “médico”.

Compare:

“O jovem tem todos os defeitos do adulto e mais um: — o da

imaturidade.” (Nelson Rodrigues)

O aluno jovem fez uma pergunta perspicaz.

No primeiro caso, “jovem” é substantivo, ao passo que, no segundo,


adjetivo.

Por fim, analise:

Eu que me aguente comigo e com os comigos de mim. (Fernando

Pessoa)

Cidadezinha qualquer

“Casas entre bananeiras

mulheres entre laranjeiras


pomar amor cantar.

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Um homem vai devagar.

Um cachorro vai devagar.

Um burro vai devagar.

Devagar... as janelas olham.

Eta vida besta, meu Deus.”

Carlos Drummond de Andrade, Alguma Poesia.

Note como a primeira estrofe explora basicamente os substantivos

para a formação da imagem e das sensações na cabeça do leitor.

Observação: Podem-se nominalizar verbos, o que é de grande valia

para a estilística do texto.

Analise:

Mudar o material das embalagens foi uma forma de a empresa

solucionar um problema, para fabricar seus produtos de maneira a atender

ao que o mercado exigiu. Quando a novidade chegou, houve grande

entusiasmo do público.

A mudança no material das embalagens foi uma solução

encontrada pela empresa, para que a fabricação de seus produtos


atendesse às exigências do mercado. Com a chegada da novidade, houve

grande entusiasmo do público.

Mais exemplos de nominalizações de verbos: tolerar, tolerância;


pescar – pescaria; ler – leitura; participar – participação; ceder – cessão;

surgir – surgimento; acessar – acesso etc.

Classificação dos substantivos


Quanto à significação, podem ser: próprios ou comuns, abstratos ou

concretos, coletivos.

Quanto à estrutura e formação, podem ser: simples ou compostos,

primitivos ou derivados.

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Próprios ou comuns
Comuns são aqueles que designam todos os seres de uma mesma

espécie, por compartilharem a mesma essência: bar, criança, livro, vida, rua,

quadrado, deus

Coletivos, ou seja, palavras que, mesmo no singular, representam um

grupo de seres da mesma espécie: cáfila (camelos), esquadrilha (aviões),

povo (pessoas) etc.

Próprios são aqueles que designam um ser específico de uma

espécie, ou seja, ressaltam a individualidade: Rua do Lazer, Ulisses, Goiânia,

Neosaldina, Deus.

Obs.: A parte da lexicografia que trata o estudo dos nomes próprios

é a onomástica.

Ressalta-se que um substantivo próprio pode virar comum e vice-

versa, num processo denominado “derivação imprópria”:

Quero comprar um panamá antes de viajar. (=chapéu)

Não seja um dom casmurro, tire a carranca! (=mal-humorado)

Os Oliveiras se acham poderosos na cidade.

Analise:

“O Tejo é mais belo que o rio que corre pela minha aldeia,

Mas o Tejo não é mais belo que o rio que corre pela minha aldeia

Porque o Tejo não é o rio que corre pela minha aldeia,

O Tejo tem grandes navios

E navega nele ainda,

Para aqueles que veem em tudo o que lá não está,

A memória das naus.

O Tejo desce de Espanha

E o Tejo entra no mar em Portugal.

Toda a gente sabe isso.

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Mas poucos sabem qual é o rio da minha aldeia

E para onde ele vai

E donde ele vem.

E por isso, porque pertence a menos gente,

É mais livre e maior o rio da minha aldeia.

Pelo Tejo vai-se para o Mundo.

Para além do Tejo há a América

E a fortuna daqueles que a encontram.

Ninguém nunca pensou no que há para além

Do rio da minha aldeia.

O rio da minha aldeia não faz pensar em nada

Quem está ao pé dele está só ao pé dele.”

“O Guardador de Rebanhos”.

In Poemas de Alberto Caeiro. Fernando Pessoa

Refletindo a respeito do poema, poderia alguém dizer “Há tantos

tejos há no mundo, e todos eles são menos valiosos que o rio de minha

aldeia...”. Nesse caso, estaria transformando um substantivo próprio em

comum.

Abstratos ou concretos
Concretos são aqueles que têm subsistência própria, ou seja, que

existem por si sós, seja no mundo material, seja no mundo imaginário: livro,

povo, cidade, fada, Deus, Diabo, alma, fantasma.

Abstratos são aqueles que dependem de outros seres para existir;

nomeiam qualidades, ações, estados, sentimentos resultados de ações,

propriedades, concepções: ironia, fama, beijo, luto, interpretação, fé.

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“Aqueles homens gotejantes de suor, bêbados de calor,

desvairados de insolação a quebrarem, a espicaçarem, a torturarem a pedra,

pareciam um punhado de demônios revoltados na sua impotência contra o

impassível gigante que os contemplava com desprezo [...]”

(Aluísio Azevedo, O Cortiço, de 1890)

Substantivos concretos: homens, suor, pedra, demônios, gigante

Substantivos abstratos: calor, insolação, desprezo

Analise:

“Uma noite destas, vindo da cidade para o Engenho Novo,

encontrei num trem da Central um rapaz aqui do bairro, que eu conheço

de vista e de chapéu. Cumprimentou-me, sentou-se ao pé de mim, falou da

lua e dos ministros, e acabou recitando-me versos.”

(Machado de Assis, Dom Casmurro)

O efeito de sentido é obtido pela quebra de paralelismo entre

substantivos abstrato e concerto (no primeiro caso) e entre substantivos

concretos de natureza muito distinta (no segundo caso).

Simples ou compostos
Simples são os que apresentam apenas um radical: flor, boi, água.

Compostos são os que apresentam mais de um radical: flor-de-lis,

aguardente, peixe-boi, bom-dia.

Primitivos ou derivados
Primitivos são os que se apresentam, em regra, sem prefixo ou sufixo.

É deles que se derivam outros substantivos: agulha, pedra, chapéu.

Derivados são os que apresentam, em regra, prefixo e/ou sufixo:

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infelicidade (deriva-se de feliz), agulheiro (deriva-se de agulha), chapelaria

(deriva-se de chapéu).

Analise parte de um texto escrito pelo autor contemporâneo Eduardo

Affonso e perceba a construção de substantivos compostos e derivados:

“[...]

Sabe quando você vai na caixa de bombom e só sobrou o crocante?

Quando chega no lugar onde deixou o carro, e o carro não está lá? Quando

vai tomar o resto do refrigerante ou da água com gás, e já não tem mais gás

nenhum?

Isso tinha que ter um nome. “Vacúnia”, talvez. Ou “orfância”, quem

sabe.

E como não dar nome ao momento devastador em que você vai

dar o segundo beijo e o(a) curitibano(a) vira a cara, e te deixa no ar? Sim,

não bastasse o frio, em Curitiba são avaros de beijos. É um só, e com muito

favor. Você fica com a boca em bico a um palmo da face da criatura, sem

chão, sem rumo, sem jeito, sem razão de viver, sem ter onde se enfiar. Um

“precipismo” — dos brabos.

“Repugnasco”. O misto de nojo, inapetência e vergonha alheia


que te invade quando alguém repete, com ares de pretensa dignidade e

indignação social, seus mantras ideológicos.

“Remordência”. A impotência diante da impossibilidade de recuar


dois minutos no tempo quando uma pessoa por quem você não estava

minimamente interessado te dá um pé na bunda, sem dó nem piedade — e

você só esperava uma oportunidade para terminar a coisa decentemente.

“Deserfúgio”. O momento em que o orgasmo estava vindo, estava

vindo, estava ali para acontecer, e resolve mudar de ideia, pegar um retorno,

passar outra hora.

[...]

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Porque tudo tinha que ter nome. Um nome torna o sentimento

mais gerenciável. Lhe dá um formato anatomicamente compatível,

facilitando o encaixe e a aceitação.

Imagine se a inveja não tivesse sido batizada, e você ficasse se

remoendo sem saber o que era aquele ácido a te corroer por dentro. Ou se o

ciúme não tivesse um nome próprio, e a gente o confundisse com a inveja,

o despeito, a paranoia — ou mesmo com a vacúnia e o precipismo. [...]”

(Eduardo Affonso, TORSCHLUSSPANIK)

Flexões do substantivo
“Flexão”, gramaticalmente falando, significa variação de forma. Na
língua portuguesa, os substantivos podem flexionar em razão de gênero,

número e grau.

Flexão de gênero
Os substantivos podem ser masculinos ou femininos. Ressalta-se que

essa distinção se refere apenas e tão somente a um aspecto gramatical, não

biológico. Não se confunde gênero da palavra com sexo (tampouco com

gênero) de seres humanos. Vale a pena fazer uma pequena retomada histórica.

Na língua latina, havia três gêneros gramaticais: masculino, feminino

e neutro. Por evolução natural do idioma e analogia entre terminações,

o neutro latino foi incorporado às palavras de gênero masculino (as

terminações mais frequentes eram -us [masculino], -a [feminino] e -um

[neutro]. O chamado gênero complexo, que agrupa substantivos de gêneros

diferentes, era indicado em latim pelo neutro). Ainda há um resquício de

palavras neutras em português, como aquilo, tudo, algo, isso, isto, mas são

raríssimas.

Modernamente, quando alguém diz, por exemplo “Para ser

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procurador do estado, o cidadão deve prestar concurso”, sabe-se

intuitivamente que a afirmativa se refere a qualquer pessoa, seja do gênero

masculino, seja do feminino, porque tanto a palavra “cidadão” como

“procurador” estão sendo usadas em sua acepção neutra.

No entanto, se alguém construir a mesma frase com as palavras

“procuradora” e “cidadã”, a ideia limita-se à esfera das pessoas de gênero

feminino. Ou seja, em português, a marca que em regra distingue o gênero

é a feminina.

Ainda assim, inúmeras palavras não seguem um padrão específico

de gênero: o/a motorista (palavra terminada em -a, mas que pode referir-se

a qualquer ser humano); a pessoa (palavra feminina, mas que pode referir-se
a qualquer ser humano); o bosque (palavra masculina terminada em -e); a

ponte (palavra feminina terminada em -e); o/a gerente (palavra terminada

em -e, mas que pode referir-se a qualquer ser humano) etc.

Passemos à classificação de gênero das palavras:

Substantivos biformes: mudam de forma para indicar os gêneros:

o ateu/a ateia; o poeta/a poetisa; o monge/a monja; o czar/a czarina; o

embaixador/a embaixatriz; o cavaleiro/a amazona; o cavalheiro/a dama; o

boi/a vaca; o zangão/a abelha.

Note que, nos últimos casos, ocorre heteronímia, ou seja, o feminino

se expressa com radical diferente daquele do masculino.

Substantivos uniformes: apresentam apenas uma forma para indicar

os gêneros. Podem ser:

○ Comuns de dois: distinguem-se pela presença de um

determinante: o/a dentista; dois/duas jovens; outro/outra colega;

um/uma agente.

○ Sobrecomuns: não se alteram na forma nem no determinante: o

algoz; uma vítima; criatura estranha; pessoa bela.

○ Epicenos: designam, em apenas uma forma, animais e plantas:

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a barata, a cobra, rouxinol, o pinheiro, o musgo. Para designação

de gênero, usam-se os adjetivos “macho” e “fêmea”: cobra macho,

cobra fêmea.

Algumas dificuldades: o presidente/ a presidenta; o general/a

generala; o coronel/a coronela; o sargento/a sargenta; o mestre/a mestra; o

soldado, a soldada (mas: o/a agente, o/a vidente, o/a gerente, o/a regente);

a libido; a musse; o champanha; o dó; o matiz; o gengibre; o/a diabetes;

o/a usucapião; o/a travesti; o/a personagem.

Atenção à mudança de sentido: a caixa/o caixa; cabeça/o cabeça; a

grama/o grama; a rádio/o rádio etc.

Flexão de número
Os substantivos podem, em regra, apresentar-se no singular (quando

se referirem a um ente ou a um grupo de entes) ou no plural (quando houver

mais um ente ou grupo de entes). A esse acidente gramatical dá-se o nome

de flexão de número.

A marca do plural é a letra s: vidas, cadernos, dores, bandos etc.

Poucos são os substantivos que fogem a isso: o lápis azul/ os lápis

azuis; o ônibus grande/os ônibus grandes; o tórax aberto/ os tórax abertos.

São inúmeras as regras de pluralização dos substantivos. Algumas

notáveis:

Degraus, troféus, chapéus, avós, caracteres, ureteres, hambúrgueres,

gravidezes, arrozes, gizes, ases, adeuses, anciãos/anciões/anciães, escrivães,

corrimão/corrimões ou corrimãos.

Observações:

○ Pluralizam-se siglas apenas com o acréscimo de -s: CDs, IPTUs,

IPVAs, DNAs, ONGs etc.

○ O plural das letras do alfabeto se dá com o ascréscimo de -s a seu

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nome ou duplicação da letra que se quer pluralizar: os ás/os aa, os

bês/ os bb, os cês/os cc, os erres/os rr.

○ O substantivo presente na locução adjetiva vai para o plural

quando der ideia de mais de um elemento: tabuleiro de jogos,

par de sapatos, fábrica de meias. Mas: taças de vidro, sócios da

empresa, impostos de renda.

○ Alguns substantivos só se usam no plural (pluralia tantum):

as algemas, as costas, os parabéns, as felicitações, os óculos, as

condolências, os pêsames.

○ Plurais de substantivos abstratos – como “saudades”, “ciúmes”,

“felicidades” – tendem a expressar a permanência, a intensidade

dessas emoções. Tais palavras podem ser usadas no plural ou

no singular, ainda que não seja essa a regra com substantivos

abstratos (“caridade”, “fortaleza”, “prudência” etc.).

○ É muito comum que o singular tome o lugar do plural, num

processo metonímico:

A vida das pessoas é dura.

Versos íntimos

“Vês! Ninguém assistiu ao formidável

Enterro de tua última quimera.

Somente a Ingratidão - esta pantera -

Foi tua companheira inseparável!

Acostuma-te à lama que te espera!

O Homem, que, nesta terra miserável,

Mora, entre feras, sente inevitável

Necessidade de também ser fera.


[...]”

(Augusto dos Anjos)

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Plural de compostos

Nos compostos, a regra geral é que substantivos, adjetivos e numerais

variem: cachorros-quentes (subst. + adj.), primeiros-ministros (num. + subst.),

ares-condicionados (subst. + adj.), curtas-metragens (adj. + subst.).

As demais classes, em regra, não variam: abaixo-assinados (adv. +

adj.), guarda-roupas (verbo + subst.), ave-marias (interj. + subst.), alto-falantes

(adv. + adj).

Alguns casos que merecem atenção:

○ Compostos não separados por hífen seguem as regras dos simples:

girassóis, pontapés, mandachuvas etc.

○ Nos compostos com hífen, se o segundo substantivo delimitar o

primeiro, indicando semelhança, tipo ou finalidade, só o primeiro

elemento varia ou ambos: pombos-correio(s), bombas-relógios(s),

bananas-maçã(s), públicos-alvo(s).

○ Se houver preposição entre substantivos, só o primeiro varia: pés

de moleque, pores do sol, calcanhares de aquiles.

Flexão de grau
Podem os substantivos apresentar-se em tamanho aumentado ou

diminuído, o que se reconhece como flexão de grau.

Essas variações podem ocorrer na forma analítica (com o auxílio

de um adjetivo): festa grande, filme gigante, computador imenso, pessoa

minúscula, cadeira miúda, jardim pequeno.

Podem, ainda, ocorrer na forma sintética, geralmente com o

auxílio de sufixos: barcaça, corpanzil, dramalhão, cabeçorra, papelzinho,

gorducho, engenhoca, chuvisco, barbicha, poemeto.

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Observação:

Substantivos terminados em -s e -z fazem diminutivo com -inho,

mantendo-se o -s ou o -z da palavra de origem:

lápis + inho(s) – lapisinho

pires + inho – piresinho

país + inho – paisinho

rapaz + inho – rapazinho

Mas, se a palavra de origem não tiver -s ou -z, o diminutivo será com -z:

pai + zinho – paizinho

flor + zinha – florzinha

Estilisticamente, pode a flexão de grau ser de grande valia:

Tende infinita piedade dos vendedores de passarinhos

Que em suas alminhas claras deixam a lágrima e a

incompreensão

E tende piedade também, menor embora, dos vendedores de

balcão

Que amam as freguesas e saem de noite, quem sabe onde

vão...

(O desespero da piedade, Vinicius de Moraes)

Note como “balcão” é um falso aumentativo. Muitas são as palavras

assim: galinha, vizinho, portão, pastilha, caixão. Algumas já foram tidas

como flexionadas no aumentativo, mas perderam essa noção.

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AU L A 2

ADJETIVO
Adjetivo
Adjetivo é, em essência, um modificador do substantivo (ou de um

equivalente a substantivo). Serve para indicar-lhe qualidade, propriedade,

condição ou estado.

Na passagem abaixo, trecho de um soneto dedicado ao corpo

feminino, Cruz e Souza se vale abundantemente do poder semântico dos

adjetivos:

Ó Mãos ebúrneas, Mãos de claros veios,

esquisitas tulipas delicadas,

lânguidas Mãos sutis e abandonadas,

finas e brancas, no esplendor dos seios.

Mãos etéricas, diáfanas, de enleios,

de eflúvios e de graças perfumadas,

relíquias imortais de eras sagradas

de antigos templos de relíquias cheios.

Mais adiante, estudar-se-ão as orações adjetivas, mas desde já se

ressalta que elas têm valor adjetivo (daí seu nome). Por exemplo, no texto

de Cruz e Souza, “relíquias imortais” equivale a “relíquias que não morrem”,

ou seja, a oração adjetiva “que não morrem” equivale semanticamente ao

adjetivo “imortais”.

A relação entre substantivo e adjetivo é bastante estreita. Um pode

facilmente virar o outro, a depender do contexto e da intencionalidade

discursiva. Veja:

Mais vale ter um cachorro amigo que um amigo cachorro. (ditado

popular)

Os alunos do 9º ano são mais crianças (=infantis) do que parecem

ser.

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Foi explorando exatamente isso que Machado de Assis iniciou

Memórias Póstumas de Brás Cubas assim:

“Algum tempo hesitei se devia abrir estas memórias pelo

princípio ou pelo fim, isto é, se poria em primeiro lugar o meu nascimento

ou a minha morte. Suposto o uso vulgar seja começar pelo nascimento,

duas considerações me levaram a adotar diferente método: a primeira é

que eu não sou propriamente um autor defunto, mas um defunto autor,

para quem a campa foi outro berço; a segunda é que o escrito ficaria

assim mais galante e mais novo.”

Note como, em “autor defunto”, o substantivo “autor” é caracterizado

por ser “defunto” –– ou seja, tem-se um autor cuja característica é ser


“defunto” (morto) –, ao passo que, em “defunto autor”, tem-se, ao contrário,

um “defunto” cuja característica é ser “autor”. Isso acontece porque a

qualidade do ser é concebida com grande independência, a ponto de não

raramente denominar o próprio ser.

Com tal descrição, Machado de Assis deixa claro que não se trata de

um autor que já morreu (morto), mas de um defunto que virou autor, daí o

ineditismo da obra.

Frequentemente, retira-se o próprio substantivo e o adjetivo é vira

substantivo no contexto: o velho, aquele maldoso, três espertos etc.

Classificação dos adjetivos

Primitivo ou derivado
Primitivo é aquele sem prefixo nem sufixo: capô cinza, sorriso torto,

roupa formal.

Derivado é o que apresenta prefixo e/ou sufixo: tom acinzentado,

caminho tortuoso, contrato formalizado.

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Simples ou composto
Simples é o que só apresenta um radical: homem mudo, nação

portuguesa, caso cirúrgico.

Composto é o que apresenta mais de um radical: cidadão surdo-

mudo, império luso-brasileiro, procedimento médico-cirúrgico.

Os adjetivos podem indicar nacionalidade (pátria, lugar, procedência),

casos em que são chamados pátrios (ou gentílicos): homem brasileiro,

acordo luso-americano, cidadão senegalês, mercado asiático, milho

goiano.

Para a formação de pátrios compostos, preferem-se primeiro as

formas curtas e contraídas ou mais antigas. Havendo igualdade silábica,

prefere-se a ordem alfabética.

Exemplos: empresas franco-teuto-brasileiras, acordo nipo-hispano-

dinamarquês, culturas afro-brasilo-espanholas, documento fino-ítalo-

australiano.

Algumas formas contratas:

Austro – Áustria

Dano – Dinamarca

Sino – China

Anglo – Inglaterra

Ásio – Ásia

Brasilo – Brasil

Fino – Finlândia

Euro – Europa

Franco – França

Teuto ou germano – Alemanha

Greco – Grécia

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Hispano – Espanha

Ítalo – Itália

Luso – Portugal

Nipo – Japão

A escolha dos adjetivos expressa frequentemente carga subjetiva e

avaliativa de quem os usa. É fundamental sopesar de maneira parcimoniosa

o contexto de uso. Analise a diferença de abordagem do mesmo veículo de

comunicação.

Locução adjetiva
Trata-se de um grupo de vocábulos composto de preposição ou

locução prepositiva mais núcleo substantivo (ou substantivado), com valor


adjetivo. Quase sempre – mas não sempre – pode ser substituído por um

adjetivo correspondente:

“Ao verme que primeiro roeu as frias carnes do meu cadáver

dedico como saudosa lembrança estas Memórias Póstumas.”

“Obra de finado. Escrevi-a com a pena da galhofa e a tinta da

melancolia, e não é difícil antever o que poderá sair desse conúbio.”

(Memórias Póstumas de Brás Cubas)

Note as locuções modificadoras dos substantivos acima (“carnes”,

“obra”, “pena” e “tinta”).

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Observação: O adjetivo “difícil”, por sua vez, modifica toda a

construção “antever o que poderá sair desse conúbio”.

Os adjetivos e locuções adjetivas podem modificar outras classes de

caráter nominal que não o substantivo:

Aqueles da sala 1 foram embora.

Eles são de casa.

Os três eram competentes.

Por fim, analise:

“Os slogans, as figuras, os jingles e os logotipos da propaganda

povoam a imaginação do homem de hoje exatamente como outrora os

anjos e demônios, heróis e duendes do imaginário tradicional. Eles formam

o vocabulário básico com o qual o habitante das grandes cidades expressa

seus desejos, aspirações e temores.”

(O jardim das aflições, Olavo de Carvalho)

Curioso perceber a dinâmica na passagem anterior: “do homem de

hoje” é locução adjetiva de “imaginação”, ao passo que “de hoje” é locução

adjetiva de “homem”; “do imaginário tradicional” é locução adjetiva que,

embora expressa uma única vez, refere-se claramente aos substantivos

“anjos”, “demônios”, “heróis” e “duendes”.

Variações
Podem os adjetivos variar em gênero, número e grau.

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Gênero
Uniforme: homem/mulher capaz, inteligente, cruel, simples.

Biforme: homem vazio/ mulher vazia, homem judeu/mulher judia,

homem mau/mulher má.

Curiosidade: “Trabalhadora” é substantivo (a trabalhadora da fábrica

chegou); “trabalhadeira” é adjetivo (a mulher trabalhadeira chegou).

Nos adjetivos compostos, apenas o último elemento varia em gênero

(ou em gênero e número, como veremos a seguir):

Lentes côncavo-convexas, atividade lúdico-instrutiva, calça

amarelo-escura.

Exceção: surdo-mudo – a criança surda-muda.

Número
O adjetivo varia normalmente, em regra com o acréscimo de s, para

concordar com a palavra à qual se refere:

Vinho encorpado/vinhos encorpados, cenário pitoresco/cenários

pitorescos.

Atenção: Ele ficou só (sozinho)/ Eles ficaram sós (sozinhos).

Mas: Ele ficou a sós. Eles ficaram a sós. (“A sós” é expressão adverbial

invariável)

Quando se usa um substantivo como adjetivo, ele fica invariável (não

vai para o plural), o que é muito como quando há referência a cores, ocasião

em que se pressupõe a expressão “cor de”: tintas creme, tons pastel, blusas

gelo, livros laranja (mas “alaranjados”), luvas pérola (mas “peroladas”),

cobertores cinza.

O mesmo raciocínio se estende aos adjetivos compostos, quando


o último elemento é um substantivo referente ao adjetivo anterior:

blusas branco-gelo, tintas vermelho-sangue, camisas verde-abacate,

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gravatas amarelo-palha.

A flexão em número dos adjetivos compostos é complexa e encontra

discordâncias mesmo entre estudiosos. Em regra, dá-se com a variação

apenas do último elemento, o qual concorda com o termo substantivo ao

qual o adjetivo inteiro se refere: pássaros azul-claros, olhos castanho-escuros,

bandeiras verde-amarelas.

Grau
Variação de grau é a intensificação do valor do adjetivo, seja por um

advérbio, seja por um afixo. Tal variação gradual pode ocorrer tanto em uma

estrutura comparativa como em uma superlativa. Na passagem abaixo,

Machado de Assis se vale do superlativo com sufixo ao descrever José Dias:

CAPÍTULO IV / UM DEVER AMARÍSSIMO!

José Dias amava os superlativos. Era um modo de dar feição

monumental às ideias; não as havendo, servia a prolongar as frases. [...]

Levantou-se com o passo vagaroso do costume, não aquele

vagar arrastado dos preguiçosos, mas um vagar calculado e deduzido, um

silogismo completo, a premissa antes da consequência, a consequência


antes da conclusão. Um dever amaríssimo!

(Machado de Assis, Dom Casmurro)

Alguns superlativos absolutos podem trazer dúvida. Exemplos:

Sério, frio, necessário, precário (adjetivos terminados em -io):

seriíssimo, friíssimo, necessariíssimo, precariíssimo. (Celso Cunha ressalta a

admissão desses adjetivos com um só i.)

Notável, amável, móvel (-vel vira -bil): notabilíssimo, amabilíssimo,

mobilíssimo.

Feroz, feliz, voraz (desaparece o -z): ferocíssimo, felicíssimo, velocíssimo.

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Bom, vão, pagão (terminados em -m e -ão): boníssimo, vaníssimo,

paganíssimo.

mísero, célebre, áspero, livre (terminados em -ro e -re): misérrimo,

celebérrimo, aspérrimo, libérrimo.

Algumas formas latinas antigas convivem com as formas modernas

(estas sempre terminadas em -íssimo). Exemplos:

Ágil – agílimo ou agilíssimo

Amargo – amaríssimo ou amarguíssimo

Baixo – Ínfimo ou baixíssimo

Doce – dulcíssimo ou docíssimo

Humilde – humílimo ou humildíssimo

Magro – macérrimo ou magríssimo (“magérrimo” é forma coloquial,

de acordo com a maior parte dos estudiosos)

Nobre – nobilíssimo ou nobríssimo

Pobre – paupérrimo ou pobríssimo

Recente – nupérrimo ou recentíssimo

Abaixo, nota-se grau comparativo de adjetivo e de verbo nas partes

destacadas. A passagem é interessante para distinguir tais fenômenos:

“Eu adoro todas as coisas

E o meu coração é um albergue aberto toda a noite.

Tenho pela vida um interesse ávido

Que busca compreendê-la sentindo-a muito.

Amo tudo, animo tudo, empresto humanidade a tudo,

Aos homens e às pedras, às almas e às máquinas.

Para aumentar com isso a minha personalidade.

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Pertenço a tudo para pertencer cada vez mais a mim próprio

E a minha ambição era trazer o universo ao colo

Como uma criança a quem a ama beija.

Eu amo todas as coisas, umas mais do que as outras —

Não nenhuma mais do que outra, mas sempre mais as que

estou vendo

Do que as que vi ou verei.

Nada para mim é tão belo como o movimento e as sensações.

A vida é uma grande feira e tudo são barracas e saltimbancos.

Penso nisto, enterneço-me mas não sossego nunca.”

(Livro de Versos, Fernando Pessoa como Álvaro de Campos)

Note como, no verso “Nada para mim é tão belo como o movimento

e as sensações”, trabalha-se com o grau comparativo do adjetivo “belo”, ou

seja, compara-se a incidência de tal característica (“belo”) sobre os termos

“nada” e “o movimento e as sensações”.

Ressalta-se, por fim, que os adjetivos bom, mau, grande e pequeno

têm formas especiais de comparativo de superioridade:

Bom – melhor

Mau – pior

Grande – maior

Pequeno – menor

Assim, no Brasil, não se diz “Este conto é mais pequeno (do) que

aquele”, mas sim “Este conto é menor (do) que aquele”. No entanto, caso se

estejam contrapondo qualidades, é possível fazer tais construções:

O cartorário era mais bom (do) que propriamente inteligente.

O sofá mostrou-se mais grande (do) que confortável.

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AU L A 3

ARTIGO
Artigo
O artigo faz referência a toda uma classe ou espécie, seja de maneira

definida, determinada, precisa; seja de maneira indefinida, vaga, imprecisa.

No primeiro caso, usam-se os artigos o, a, os, as. No segundo, os

artigos um, uma, uns, umas.

O artigo antecede o substantivo e, na maioria das vezes, transforma

a palavra que o sucede em substantivo (quando, evidentemente, já não o

for), num processo de derivação imprópria. No poema de Cora Coralina, a

interjeição “ai” transforma-se em substantivo:

Meu pai

Nada lhe dei nas mãos.

Nem um beijo,

Uma oração, um triste ai.

Eu era tão pequena!...

E fiquei sempre pequenina na grande

falta que faz meu pai.

(Cora Coralina)

ESTILÍSTICA

Estilisticamente, pode o artigo ser de grande valia. O definido tem


como função primordial indicar indivíduos conhecidos ou já mencionados,

ao passo que o indefinido propõe indivíduos desconhecidos, não

mencionados.

No sermão da Sexagésima, Padre Antônio Viera se vale claramente

de tal recurso:

Mas dir-me-eis: Padre, os pregadores de hoje não pregam o

Evangelho? Não pregam as Sagradas Escrituras? Pois como não pregam

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a palavra de Deus? Esse é o mal. Pregam palavras de Deus, mas não

pregam a palavra de Deus. [...] As palavras de Deus, pregadas no sentido

em que Deus as disse, são palavras de Deus; mas pregadas no sentido

que nós queremos, não são palavras de Deus, antes podem ser palavras

do Demónio.

(Padre Antônio Vieira, Sermão da Sexagésima)

“A palavra de Deus” é insubstituível, não obstante possam os

pregadores distorcer seu sentido, e quem exprime linguisticamente essa

verdade incontornável é o artigo definido “a”.

Além de individualizar o ser, pode ainda o artigo definido indicar


proximidade, razão pela qual não é indicado diante de personalidades

célebres, especialmente quando forem históricas:

Ninguém resistia aos encantos de Cleópatra. (Não “da” Cleópatra)

Napoleão Mendes de Almeida contribuiu inestimavelmente para a

gramática de nossa língua. (Não “o” Napoleão Mendes de Almeida)

Mas:

A Mariana e o Pedro chegaram atrasados de novo? (Os artigos

ressaltam familiaridade – seu emprego é facultativo e depende da região.)

O necessário Napoleão Mendes Mendes de Almeida apareceu na hora

certa para fazer os questionamentos certos. (Ao se inserir um especificador

[“necessário”], o artigo passa a ser obrigatório.)

Enquanto a função primordial do definido é a individualização, a do

indefinido é a generalização ou a indeterminação.

Um bom rato precisa saber se proteger dos gatos. (Nota-se a

generalização de “bom rato”.)

Um homem abordou-me na rua hoje para vender lotes. (Nota-se a

falta de familiaridade.)

No último exemplo, caso se fosse falar novamente sobre a pessoa

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que fez a abordagem, usar-se-ia “o homem” (não mais “um homem”), uma

vez que já seria alguém conhecido do receptor, pois já foi introduzido no

discurso do emissor.

Além dos já mencionados, alguns usos dos artigos definido e

indefinido merecem registro. Comecemos pelo definido:

– Deve ser utilizado antes de pronome possessivo substantivo (que

substitui o substantivo), mas é facultativo diante de pronome possessivo

adjetivo (que acompanha o substantivo):

Ele disse palavras de consolo a (ou aos) meus pais, mas não aos seus.

Ele disse palavras de consolo a (ou às) minhas irmãs, mas não às suas.

– Indica a totalidade de uma espécie:

O pior cego é o surdo. Tirem o som de uma paisagem e não haverá

mais paisagem.”

(Nelson Rodrigues, “Flor de obsessão: as 100 melhores frases de

Nelson Rodrigues”)

– Não é usado quando se pretende sentido genérico de substantivo:

Não costumo ir a eventos de gala.

Não costumo ir a festas de gala.

– Pode aparecer em posições diferentes quando há estruturas

superlativas:

Hei de percorrer os caminhos mais retos na vida.

Hei de percorrer caminhos os mais retos na vida. (Cuidado: Não se diz

“os caminhos os mais retos”.)

– Diante de topônimos (nomes de lugar, como continentes, rios,

mares, desertos, países, regiões etc.), pode ou não aparecer, a depender do

que se consagrou:

Na Espanha, a sesta é cultural.

Moro em Goiás. (Não no Goiás)

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Ó mar salgado, quanto do teu sal

São lágrimas de Portugal! (Não do Portugal)

Por te cruzarmos, quantas mães choraram,

Quantos filhos em vão rezaram!

(...)

Para aprofundar o estudo, veja o que diz o site do Senado:

Nomes de cidades: em geral, não se usa artigo com nomes de

cidades e ilhas: Brasília, Buenos Aires, São Paulo, Florianópolis, Ilha Grande.

Nomes derivados de substantivos comuns mantêm o artigo: o Rio de

Janeiro, o Porto, o Cairo. Com Recife, o artigo é facultativo. A Secom adota

o Recife, no Recife.

Está em dúvida?

Dica: pesquise no dicionário o adjetivo gentílico (mato-grossense

ou recifense, por exemplo). O verbete dirá “... procedente de” (sem artigo)

ou “procedente do” e “da”; relativo “a” (sem artigo) ou relativo “à” e “ao”. O

Dicionário Aurélio, por exemplo, define “do Recife”.

Também mantêm o artigo algumas ilhas, como: a Sicília, a Sardenha,


a Madeira, a Groenlândia, a Córsega.

Nomes de estados brasileiros: o nome de alguns estados brasileiros

não aceita artigo. Antes de Alagoas e Minas Gerais, o artigo é facultativo. A

Secom adota sem artigo.

Use sem artigo: Alagoas, Goiás, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul,

Minas Gerais, Pernambuco, Rondônia, Roraima, Santa Catarina, São Paulo

e Sergipe.

Não use: O senador elogia balança comercial do Mato Grosso.

Use: O governador de Mato Grosso vem ao Senado.

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Os demais estados exigem o artigo: o Acre, o Amapá, o Amazonas,

a Bahia, o Ceará, o Espírito Santo, o Maranhão, o Pará, a Paraíba, o Paraná,

o Piauí, o Rio de Janeiro, o Rio Grande do Norte, o Rio Grande do Sul, o

Tocantins. Também use artigo com o nome do Distrito Federal.

Nomes de países, regiões e continentes: geralmente são

acompanhados de artigo definido: o Afeganistão, a África do Sul, a Albânia,

a Alemanha, a Arábia Saudita, a Argélia, as Bahamas, o Brasil, o Butão, o

Canadá, o Chade, o Chipre, o Djibuti, os Emirados Árabes Unidos, os Estados

Unidos, a Guatemala, a Guiana, a Guiné, a Guiné-Bissau, a Guiné Equatorial,

o Iêmen, o Kiribati, o Kuwait, o Laos, o Lesoto, o Malaui, o Mali, o Níger, o

Senegal, a Suazilândia, a Região Sul, a Região Serrana, os Andes, a Antártida,

a Oceania.

Alguns países, porém, não aceitam o artigo.

Use com as preposições de e em: Andorra, Angola, Antígua e Barbuda,

Bangladesh, Barbados, Belize, Benin, Botsuana, Brunei, Burkina Fasso,

Burundi, Cabo Verde, Camarões, Cingapura, Comores (Ilhas Comores),

Cuba, Dominica, El Salvador, Eritreia, Fiji, Gâmbia, Gana, Granada, Honduras,

Israel, Liechtenstein, Luxemburgo, Macau, Madagascar, Malta, Marrocos,

Maurício, Mianmar, Moçambique, Mônaco, Montenegro, Nauru, Omã, Palau,

Papua-Nova Guiné, Portugal, Ruanda, Samoa, San Marino, Santa Lúcia, São

Cristóvão e Névis, São Tomé e Príncipe, São Vicente e Granadinas, Seicheles,

Serra Leoa, Sri Lanka, Taiwan, Timor Leste, Tonga, Trinidad e Tobago, Tuvalu,

Uganda, Zâmbia, Zimbábue.

CRE aprova indicações para embaixadas no Azerbaijão e no Cabo Verde

CRE aprova indicações para embaixadas no Azerbaijão e em Cabo Verde

Indicações para embaixadas na Hungria e Dominica são aprovadas

pela CRE.

Indicações para embaixadas na Hungria e na Dominica são aprovadas

pela CRE.

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Comissão examina indicações para embaixadas brasileiras em

Botsuana e Eslováquia.

Comissão examina indicações para embaixadas brasileiras em

Botsuana e na Eslováquia.

Nomes de acidentes geográficos: em geral, pedem artigo nomes de

rios, lagos, oceanos, mares, montanhas, serras, desertos, vulcões: o Rio São

Francisco, o São Francisco, o Atlântico, o Mediterrâneo, o Mar Vermelho,

o Titicaca, a Serra do Cipó, o Himalaia, os Andes, o Saara, o Puyehue, o

Villarrica. Use o mesmo critério para constelações: o Cruzeiro do Sul, o

Triângulo Austral.

– Usa-se diante de dias da semana e de horas, nas expressões

adverbiais de tempo:

Aos sábados, hei de descansar.

Ao meio-dia, a cidade parou.

Às sete horas, começa a reunião.

Ressalta-se, no entanto, que é comum a supressão de artigo e

preposição nesse tipo de caso: Sábado, hei de descansar.

– É usado depois de “ambos”, quando há elemento posterior:

Ambos os meus alunos são candidatos à presidência.

– Usa-se após o pronome “todo” para indicar inteireza; sem o artigo,

“todo” significará “qualquer”:

Toda a sala estava cheirando mal. (=A sala inteira)

Toda sala desta casa é decorada com fotografias. (=Quaisquer salas

que se observem nesta casa)

“Toda mulher bonita é um pouco a namorada lésbica de si


mesma.” (Nelson Rodrigues)

“Toda unanimidade é burra. Quem pensa com a unanimidade

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não precisa pensar.” (Nelson Rodrigues)

Abordemos alguns usos de artigo indefinido:

– Pode indicar depreciação:

Ah! Esse cara tem me consumido

A mim e a tudo que eu quis

Com seus olhinhos infantis

Como os olhos de um bandido

Ele está na minha vida porque quer

Eu estou pra o que der e vier

Ele chega ao anoitecer

Quando vem a madrugada ele some

Ele é quem quer

Ele é o homem

Eu sou apenas uma mulher

(Caetano Veloso, Esse cara)

Nos dois últimos versos, note a força semântica da contraposição do

artigo definido com o artigo indefinido. O indefinido marca depreciação.

– Pode indicar ênfase (positiva ou negativa):

Ele tem um jeito para tratar de assuntos delicados!

– Pode indicar aproximação:

Chegaremos umas oito e meia.

Por fim, convém fazer três pontuações sobre esta classe gramatical:

1) Não se faz contração com preposição quando há sujeito de infinitivo:

Está na hora de o rapaz ir.

No caso de o assunto ser abordado, desconversarei.

A probabilidade de a candidata ser eleita é pequena.

2) Caso o artigo faça parte do título de alguma obra, pode-se evitar a

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contração com a preposição antecedente ou usar apóstrofo (caso previsto

pelo Novo Acordo):

Li tais versos n’Os Lusíadas.

Li tais versos em Os Lusíadas.

2) É fundamental atentar ao papel expressivo do artigo, pois sua

presença ou ausência eventualmente pode comprometer o que se pretende

com o texto. Veja:

Foi premiado o cinema argentino e japonês.

Da maneira como se escreveu, dá-se a impressão de estar falando

a respeito de um único cinema, o qual ao mesmo tempo é argentino e

japonês. Para evitar possíveis mal-entendidos, há formas de reescrita, como:

Foi premiado o cinema nipo-argentino. (Com o emprego do adjetivo

composto, fica evidente que há, entre Japão e Argentina, colaboração para a

produção de filmes, ou seja, o cinema em questão tem duas nacionalidades.)

Foram premiados o cinema argentino e o japonês (Note a repetição

do artigo. No segundo caso, a presença de “o” subentende a palavra “cinema”,

ou seja, o [cinema] japonês.)

Foram premiados os cinemas argentino e japonês.

3) Ao contrário do que se costuma pensar, é plenamente possível

haver contração de artigo indefinido com preposição:

Saí dum quarto cheio de gente.

Numa das vezes em que ele me ligou, eu não estava em casa.

Mas de repente fiquei fria: tinha entendido. A mulher continuava

a falar. Então tirei da bolsa os dois mil cruzeiros e com horror de mim

passei-os à mulher. Esta não hesitou um segundo, pegou-os, meteu-os

num bolso invisível entre o que me pareceram inúmeras saias, quase

derrubando na sua rapidez o menino-menina.

(Clarice Lispector, As caridades odiosas)

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AU L A 4

NUMERAL
Numeral
Numeral é a classe gramatical responsável por indicar quantidade,

expressa de forma absoluta (cardinal), fracionária (fracionário), multiplicativa

(multiplicativo) ou ordenadora (ordinal).

Cardinais: zero, um, dois, três, quatro, cinco...

Ordinais: primeiro, segundo, terceiro, quarto, quinto...

Multiplicativos: dobro/duplo/dúplice, triplo/tríplice, quádruplo,

quíntuplo...

Fracionários: meio/metade, terço, quarto, quinto...

Assim como o adjetivo, é uma classe intimamente ligada ao

substantivo, podendo acompanhá-lo ou substituí-lo.

Sete anos de pastor Jacob servia

Labão, pai de Raquel, serrana bela;

mas não servia ao pai, servia a ela,

e a ela só por prêmio pretendia.

(Camões)

Trata-se, no caso, de numeral cardinal adjetivo, uma vez que

acompanha o substantivo “anos”. Se se dissesse, por exemplo:

“Dos sete, três foram de grande sofrimento”,

os numerais “sete” e “três” carregariam em si mesmos a ideia do

substantivo “anos”. Seriam, portanto, numerais substantivos.

Por derivação imprópria, porém, pode ocorrer de virarem verdadeiros

substantivos. Isso acontece quando não indicarem quantidade exata no

contexto, mas sim a denominação dos próprios números:

O número dez me dá sorte.

O três é um numeral atrelado ao divino.

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O aluno inadvertidamente transformou um zero num dez no

campo da nota.

Convém ressaltar que, para não confundir o numeral “um” com o

artigo indefinido “um”, basta atentar ao inegável caráter quantitativo

presente quando se fala em numeral:

Comprei não uma, mas duas bolsas. (numeral)

Quantos filhos tenho? Apenas um. (numeral)

Existe apenas e tão somente um Deus. (numeral)

Ele era apenas um autor mediano. (artigo indefinido)

Encontrei um ex-aluno hoje. (artigo indefinido)

Assim como os substantivos coletivos, há também numerais coletivos,

responsáveis por indicar quantia exata de seres ou coisas: quarentena, biênio,

semestre, século, dúzia, quarteto etc. Muitos são os autores que classificam

tais palavras como substantivos coletivos, não numerais.

A respeito de seu emprego prático, algumas observações úteis sobre

numerais precisam ser feitas:

1) Milhão, milhar, trilhão etc. são considerados numerais ou


substantivos e, portanto, determinam a concordância dos determinantes:

Os três milhões de pessoas votaram a favor da reforma.

Há hoje uns três bilhões e meio de mulheres no mundo.

Ainda faltam alguns milhares de páginas para ele terminar o livro.

2) “Meio”, quando numeral (indicando “metade”), concorda com o

substantivo ao qual se refere:

Quero apenas meia laranja. (metade da laranja)

Já é meio-dia e meia. (meia hora)

No entanto, quando advérbio – indicando intensidade – não varia:

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Fiquei meio ressabiada com esta história. (um pouco ressabiada,

não “metade” ressabiada)

3) Frequentemente, o valor semântico dos numerais vai muito além

da simples quantificação. Ao dizer que determinado bem é de “quinta

categoria”, pretende-se diminuir-lhe o valor; se, no entanto, é de “primeira

categoria”, amplia-se seu valor. Embora numerais não sejam variáveis,

podem sê-lo, quando funcionam como verdadeiros adjetivos. Exemplo:

“primeiríssima” categoria (variação de grau, no caso).

Na passagem abaixo, Cristo valeu-se de hipérbole (figura de

linguagem que indica o exagero) por meio dos numerais:

Então Pedro, aproximando-se dele, disse: Senhor, até quantas

vezes pecará meu irmão contra mim, e eu lhe perdoarei? Até sete?

Jesus lhe disse:

Não te digo até sete; mas até setenta vezes sete.

(Mateus 18:21–35)

4) A grafia de numerais cardinais por extenso é feita da seguinte

forma:

2.456.256 = dois milhões, quatrocentos e cinquenta e seis mil,

duzentos e cinquenta e seis

2.456.200 = dois milhões, quatrocentos e cinquenta e seis mil e

duzentos

Sendo o número muito extenso, modernamente usa-se a vírgula:

Foi recebido 1,4 milhão de reais.

5) Emprega-se numeral ordinal para o primeiro dia do mês: 1º

(primeiro) de abril é o Dia da Mentira.

6) Para designar datas, admite-se mais de uma forma: o evento

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ocorrerá em dois de abril/aos dois de abril/no dia dois de abril/aos dois dias

do mês de abril.

7) Para designar horas, grafa-se da seguinte forma: 19h40min6s

(dezenove horas, quarenta minutos e seis segundos).

8) A leitura de porcentagens pode ser feita de duas formas:

83,47%: oitenta e três inteiros e quarenta e sete centésimos por cento

Ou

oitenta e três vírgula quarenta e sete por cento.

9) Não se emprega ponto para indicação de data: 1999, 2021, 1789 etc.

Nos demais casos, emprega-se: Pagaram-me os R$1.400 que me deviam.

10) As formas “catorze” e “quatorze” são devidamente registradas e

aceitas.

11) Não se usa “um” antes de mil: Isto custou mil reais (não “um” mil

reais).

12) Atente à concordância do numeral “zero”. Por ser a ausência de

elementos, não há razão para que o substantivo vá para o plural: Ontem fez

zero grau; aquilo está à distância de zero metro dele; o objeto custou zero

real.

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AU L A 5

PRONOME
Pronome
Pronome é a classe gramatical responsável por denotar os seres

ou substituí-los dentro e fora do discurso. Trata-se de palavras dotadas de

caráter dêitico, uma vez que mostram os seres em vez de conceituá-los.

Dessa forma, os pronomes têm significação dependente do contexto.

Obs.: “Discurso” é a “comunicação oral ou escrita que pressupõe um

locutor e um interlocutor”. (Michaelis)

No poema abaixo, por exemplo, Mário Quintana se vale de inúmeros

pronomes, os quais somente denotam um referente claro quando colocados

no contexto: “eu” e “meu” referem-se ao autor (Mário), “todos”, “esses”, “que”

e “eles” referem-se aos indivíduos que estão atravancando o caminho dele.

Poeminho do Contra

Todos esses que aí estão

Atravancando meu caminho,

Eles passarão...

Eu passarinho!

(Mário Quintana)

Assim como outras classes já estudadas, também os pronomes

podem ser substantivos (quando substituem os substantivos ou palavras

com valor substantivo) ou adjetivos (quando acompanham os substantivos

ou palavras com valor substantivo).

No poema acima, por exemplo, “meu” é pronome que acompanha

o substantivo “caminho”, portanto se trata de pronome adjetivo; já “eu”

substitui a própria pessoa do autor, logo se trata de pronome substantivo.

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Classificação dos pronomes
Os pronomes podem ser pessoais, possessivos, demonstrativos,

relativos, indefinidos e interrogativos.

Pronomes pessoais
São aqueles que designam as pessoas do discurso (emissor, receptor

e referente/assunto). Podem ser do caso reto ou do caso oblíquo.

São do caso reto aqueles que, por via de regra, funcionam como

sujeito do verbo, embora também possam funcionar como predicativo do

sujeito, aposto, vocativo e objeto direto, como se verá mais profundamente


na parte destinada à sintaxe.

São do caso oblíquo, por sua vez, os que funcionam majoritariamente

como complemento verbal ou nominal, embora possam desempenhar

inúmeras outras funções. Veja:

Nós (sujeito) somos pecadores.

Santa Maria, mãe de Deus, rogai por nós (complemento), pecadores,

agora e na hora da nossa morte.

No primeiro caso, “nós” é sujeito do verbo “ser”. Trata-se, portanto,

de pronome pessoal do caso reto. No segundo caso, quem roga, roga

por alguém, “por nós” é expressão que complementa o sentido do verbo,


tratando-se, pois, de pronome pessoal do caso oblíquo.

Veja o quadro:

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Os pronomes oblíquos átonos não são regidos por preposição, ao

passo que os tônicos o são. No exemplo anterior, “nós” é oblíquo tônico

regido pela preposição “por” (rogai por nós). Observe:

Não me convidaram pra esta festa pobre. (Cazuza)

Não convidaram a mim pra esta festa pobre.

Nos dois casos, os pronomes “me” e “mim” complementam o sentido

do verbo “convidar”. Note como, para que se use o pronome tônico “mim”, é

necessário haver uma preposição (no caso, preposição a). O pronome átono

dispensa esse emprego.

Convém ressaltar que os pronomes pessoais do caso reto (eu, tu, ele,

nós, vós, eles) não podem vir preposicionados, de maneira que construções

como “Entre eu e tu nunca houve amizade” estão erradas do ponto de vista

normativo. A construção deveria ser “Entre mim e ti nunca houve amizade”.

Se, no entanto, os pronomes estiverem funcionando como sujeito, aí,

sim, podem aparecer em sua forma reta: “Entre eu sair e tu saíres, prefiro

que eu o faça”. Veja como Fernando Pessoa sempre se vale do oblíquo

tônico mim após preposição:

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Longe de mim em mim existo.

Entre mim e o que sou há escuridão.

Mas não há nada, salvo tudo sem mim.

(Fernando Pessoa)

Exatamente pelo mesmo motivo, a gramática normativa

majoritariamente não tolera construções como “A hora dela ir embora

chegou” ou “Pelo fato dele ter muitos inimigos, decidiu se mudar”. Para

figurar como sujeito de infinitivo, os pronomes não devem aparecer

contraídos com preposições. Logo, prefere-se:

A hora de ela ir embora chegou.

Pelo fato de ele ter muito inimigos, decidiu se mudar.

Pensei em ele levar as compras, não eu.

Plural de modéstia

É muito comum substituir-se o emprego do pronome “eu” pelo “nós”,

com o fim de imprimir tom menos pessoal e mais modesto ao discurso.

Como bem pontua Celso Cunha em sua Gramática,

“Não devemos nos esquecer de que as palavras que designam

sentimentos exagerados da própria personalidade começam sempre

por ego, que era a forma latina do pronome eu: egoísmo, egocêntrico,

ególatra, egotismo.”

O texto abaixo explica a origem dessa prática e conta como ela se

incorporou a nossa cultura.

O PLURAL DE MODÉSTIA OU PLURAL MAJESTÁTICO

Você já deve ter visto algum político usar construções como

“Agradecemos por sua confiança e nos comprometemos a fazer um

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ótimo mandato”, não é mesmo? Se ele está falando em nome próprio,

qual a lógica de usar a 1ª pessoa do plural (“nós”)?

Trata-se do egrégio, do insigne, do ilustre plural majestático,

mais conhecido hoje como plural de modéstia. É no mínimo curioso o

mesmo fenômeno linguístico ter dois nomes que, numa rasa análise,

parecem referir-se a eventos opostos, afinal “majestático” remete a

nobreza e “modéstia”, a humildade.

Convém aqui primeiro definir o que de fato é “modéstia”: a

palavra vem do latim “modestus” e significa “falta de vaidade em relação

às próprias qualidades” (Caldas Aulete); “parcimônia ou moderação

diante das circunstâncias, dos deveres etc.; sobriedade” (Michaelis). Ou


seja, modéstia é irmã da singeleza, da humildade. No entanto, este é um

daqueles curiosos casos em que um vocábulo, de tanto ser usado em

sentido irônico, acaba passando para o falante o sentido exatamente

oposto ao seu: é muito comum que alguém ostensivo e desumilde seja

zombeteiramente tachado de “modesto”: “Sou o homem mais belo do

planeta”. ”Uau! Quanta modéstia!”. Às vezes, a ironia se instala no espírito

com mais força que a literalidade. Nuances da língua...

Voltando ao assunto: o hábito de usar “nós” no lugar de “eu”

surgiu nos altos escalões da Igreja, visando transmitir humildade e

solidariedade (daí o “de modéstia”), pois passava a imagem de se estar

“dividindo” com o povo a responsabilidade pelos bons feitos. O interlocutor,

assim, sentia-se parte das realizações sobre as quais se falava.

Com o tempo, a expressão começou a designar justamente o

contrário disso, transmitindo imagem de grandeza e majestade (daí o

“majestático”). Era como se imperadores e nobres tivessem o poder e a

glória de falar em nome de todo o povo. De certa forma, um efeito colateral

dessa construção era que o povo se sentia parte das nobres conquistas:

“Nós conquistamos os povos inimigos” certamente fazia com que um

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prosaico cidadão se visse como um nobre cavaleiro da távola.

Modernamente, ensina-se que o plural de modéstia é capaz de

retirar a carga impositiva e personalista da fala. Há sentido, por exemplo,

em que o juiz condenador de um réu fale no plural, visto que ele representa

o próprio Estado naquele ato. Da mesma maneira, um palestrante pode

tornar o discurso mais próximo e envolvente, conferindo ar de troca de

experiências à ocasião.

No entanto, faz bem ter cautela, pois pode ser visto com maus

olhos, a depender de quem o emprega. Pouca coisa é tão desagradável

quanto a completa incompatibilidade entre a linguagem escolhida e a

realidade cognoscível por olhos atentos. Se o indivíduo for claramente


marqueteiro e dissimulado, o plural de modéstia pode aumentar ainda

mais o grau de incredulidade do interlocutor.

O fato é que a fronteira entre modéstia e majestade nem sempre

é clara.

(Texto publicado por Lara Brenner na página Língua e Tradição,

no Facebook)

Ainda para fazer referência a si mesmo ou a um grupo de pessoas,

tem sido cada vez mais comum o uso da expressão “a gente”). Trata-se, no

entanto, de expressão coloquial, que deve ser evitada em situações formais.

Quando usada, é fundamental que se faça a concordância na terceira pessoa

do singular. Construções como “A gente somos inútil” (música do Ultraje a

Rigor) devem ser evitadas. Diga-se: A gente é inútil.

De forma semelhante à que ocorre com o plural majestático (ou de

modéstia), usa-se, ainda, o chamado plural de cerimônia, que consiste em

empregar a 2ª pessoa do plural (vós) para indicar tratamento respeitoso e

cerimonioso a uma pessoa ou a mais de uma pessoa. É exatamente o que

ocorre na oração Pai Nosso:

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Pai Nosso, que (vós) estais no Céu,

santificado seja o vosso Nome,

venha a nós o vosso Reino,

seja feita a vossa vontade

assim na terra como no Céu.

A Bíblia inteira é marcada pela presença do plural de cerimônia.

Note que não apenas o pronome reto “vós” é empregado, mas também o

possessivo “vosso” e suas variações.

Nos dias atuais, no entanto, quase não se usa o pronome “vós”, que

foi substituído por “vocês” em praticamente todas as situações.

Por fim, ainda no que diz respeito à modéstia, é fundamental ter

discernimento para falar de si mesmo na terceira pessoa. A estratégia é

bem-vinda quando se fazem requerimentos à pessoa a quem se dirige, caso

em que o discurso assume tom cortês. É exatamente o que faz Policarpo

Quaresma quando peticiona à Câmara dos Deputados. Embora ele mesmo

tenha escrito e enviado as palavras, autorreferencia-se em 3ª pessoa:

POLICARPO

“Policarpo Quaresma, cidadão brasileiro, funcionário público,


certo de que a língua portuguesa é emprestada ao Brasil; certo também

de que, por esse fato, o falar e o escrever em geral, sobretudo no campo

das letras, se veem na humilhante contingência de sofrer continuamente

censuras ásperas dos proprietários da língua; sabendo além, que dentro

do nosso país os autores e os escritores, com especialidade os gramáticos,

não se entendem no tocante à correção gramatical, vendo-se diariamente

surgir azedas polêmicas entre os mais profundos estudiosos do nosso

idioma – usando do direito que lhe confere a Constituição, vem pedir

que o Congresso Nacional decrete o tupi-guarani como língua oficial e

nacional do povo brasileiro.

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O suplicante, deixando de parte os argumentos históricos que

militam em favor de sua ideia, pede vênia para lembrar que a língua é a

mais alta manifestação da inteligência de um povo, é a sua criação mais

viva e original; e, portanto, a emancipação política do país requer como

complemento e consequência a sua emancipação idiomática.

Demais, Senhores Congressistas, o tupi-guarani, língua

originalíssima, aglutinante, é a única capaz de traduzir as nossas belezas,

de pôr-nos em relação com a nossa natureza e adaptar-se perfeitamente

aos nossos órgãos vocais e cerebrais, por ser criação de povos que aqui

viveram e ainda vivem, portanto possuidores da organização fisiológica

e psicológica para que tendemos, evitando-se dessa forma as estéreis

controvérsias gramaticais, oriundas de uma difícil adaptação de uma

língua de outra região à nossa organização cerebral e ao nosso aparelho

vocal – controvérsias que tanto empecem o progresso da nossa cultura

literária, científica e filosófica.

Seguro de que a sabedoria dos legisladores saberá encontrar

meios para realizar semelhante medida, e cônscio de que a Câmara e o

Senado pesarão o seu alcance e utilidade

P. e E.2 deferimento.”

Semelhante comportamento, no entanto, pode soar pedante ou

causar profundo estranhamento ao ouvinte em outras circunstâncias.

Quando Pelé, falando de si mesmo, diz “Pelé foi um grande jogador”, a

sensação que se tem é, no mínimo, desagradável.

Eventualmente, essa prática confere ar de autoridade, como ocorre

quando o pai de Teresa, infeliz personagem de Amor de Perdição, diz à filha:

Vais hoje dar a mão de esposa a teu primo Baltasar, minha filha.

É preciso que te deixes cegamente levar pela mão de teu pai. Logo que

deres este passo difícil, conhecerás que a tua felicidade é daquelas que

precisam ser impostas pela violência. Mas repara, minha querida filha,

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que a violência de um pai é sempre amor.

Algumas pontuações merecem destaque quanto ao emprego dos

pronomes pessoais:

1) A expressão “para mim” (e semelhantes) pode aparecer

tranquilamente diante de verbo no infinitivo, contanto que não esteja

ocupando função de sujeito:

Não foi fácil para mim compreender toda a teoria.

No caso, o sujeito de “compreender” não é “mim”. A oração está

na ordem inversa. Colocando-a na ordem direta, percebe-se com mais

facilidade como a estrutura está absolutamente correta:

Compreender toda a teoria não foi fácil para mim.

Diferente, no entanto, é uma construção como “Separei várias tintas

para mim testar qual fica melhor”. Nesse caso, o sujeito de testar é “mim”, o

que a norma-padrão não abona. Corrigindo, teríamos: Separei várias tintas

para EU testar qual fica melhor. Agora, sim, colocou-se um pronome pessoal

do caso reto na função de sujeito, que lhe cabe por definição.

2) Se a preposição que antecede os pronomes oblíquos tônicos

é “com”, resultam as formas “comigo”, “contigo”, “consigo”, “conosco” e

“convosco” (oriundos das formas latinas mecum, tecum, secum, nobiscum,

vobiscum).

As formas “com vós” e “com nós” permanecem, quando

acompanhados de todos, mesmos, próprios, outros ou de algum numeral,

aposto ou alguma oração adjetiva, não se contraindo com a preposição.

Veja:

A paz esteja conosco.

A paz esteja com nós todos/com nós dois/com nós mesmos/com

nós, que somos irmãos.

3) Os pronomes si e consigo são essencialmente reflexivos, ou seja,

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seu emprego é adequado quando se refere ao próprio sujeito da ação.

Admitem, inclusive, os pronomes de reforço “mesmos” e “próprios” (e as

variações deles):

As turmas conversaram entre si (mesmas). (Não “entre elas”)

Ele fez pouco caso de si (próprio). (Não dele mesmo)

Cada um consigo é triste. (Fernando Pessoa)

Não se diz, portanto, “Preciso falar consigo”, mas, sim, “Preciso falar

com você”, nem “Trouxe um vinho para si”, mas “Trouxe um vinho para

você”.

4) Numa sequência de pronomes pessoais do caso reto ou destes

com substantivos, não há precisamente uma regra quanto à ordem. Por


elegância, no entanto, coloca-se o outro à frente:

O estagiário e eu fomos responsáveis por este belo parecer.

Ele e eu fomos responsáveis por este belo parecer.

Se, no entanto, a situação for desagradável, elegante é fazer

justamente o contrário:

Eu e o estagiário assumimos a culpa por este erro.

Ele e eu assumimos a culpa por este erro.

5) Por ênfase, podem-se empregar dois pronomes oblíquos num

pleonasmo correto e bem-vindo:

Conhece-te a ti mesmo. (Sócrates)

A mim, quando vejo um morto, a morte parece-me uma partida.

O cadáver dá-me a impressão de um trajo que se deixou. Alguém se foi

embora e não precisou de levar aquele fato único que vestira!

(Fernando Pessoa)

Na seção de sintaxe, falar-se-á com mais profundidade sobre a

função sintática dos pronomes pessoais, especialmente sobre seu correto

emprego, e a correta colocação dos átonos.

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Pronomes de tratamento
Denominam-se pronomes de tratamento certas palavras ou

expressões que valem por verdadeiros pronomes pessoais, pois fazem

alusão às pessoas do discurso, o que ocorre, em grande parte das vezes, de

maneira cerimoniosa.

Exemplos: você, senhor, senhorita, Vossa Excelência, Sua Santidade

etc. (Os dois últimos expressam cerimônia.)

Obs.: Existe caloroso debate quanto à classificação de tais palavras

como pronomes de tratamento ou formas de tratamento, distinção que

não se fará neste material.

Vejam-se alguns pronomes e os casos de seu emprego:

Vossa Senhoria: pessoas com grau de prestígio maior, como:

funcionários públicos graduados, coronel, major etc.


Vossa Excelência: pessoas com alta autoridade, militares e políticos,

como: juízes de direito, desembargadores, promotores de justiça,

vereadores, prefeitos, deputados, senadores, ministros, governadores de

Estado.
Vossa Santidade: papa.
Vossa Majestade: reis, rainhas, imperadores.
Vossa Alteza: duques, arquiduques, príncipes, princesas.
Vossa Magnificência: reitores de universidade.

Usa-se “Vossa” quando se fala diretamente com a pessoa e “Sua”

quando se fala sobre ela:

Vossa Excelência (você) precisa de algo?

Sabe se Sua Excelência (ele) deixou-me algum recado?

Duas peculiaridades interessantes dos pronomes de tratamento:

1) embora se refiram à 2ª pessoa do discurso, trabalham com

verbos e pronomes na terceira pessoa do discurso. Trata-se de verdadeiro

idiotismo, ou seja, um comportamento aceito pela gramática normativa,

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mas que não encontra nenhuma análise satisfatória;

2) apesar de serem formas femininas, ensejam concordância com o

sexo da pessoa à qual se referem. Na prática:

Vossa Excelência, o juiz de Silvânia, apareceu no gabinete bem-

vestido.

Sua Santidade está calado.

Pronomes possessivos
Pronomes possessivos indicam o que cabe ou pertence às pessoas

do discurso: meu(s), minha(s), teu(s), tua(s), seu(s), sua(s), nosso(s), nossa(s),

vosso(s), vossa(s).

Eles concordam em gênero e número com a coisa possuída:

Nosso céu tem mais estrelas,

Nossas várzeas têm mais flores,

Nossos bosques têm mais vida,

Nossa vida mais amores.

(Obs.: Não “nossas vidas”)

(Gonçalves Dias, Canção do Exílio)

Muitas são as possibilidades de sentido que assumem os possessivos,

a depender sempre do contexto:

Passei por meus apertos de dinheiro. (indefinição)

Ele deve ter seus seis filhos. (aproximação)

Cantou uma de suas músicas sacras durante a missa. (hábito)

Minha senhora, como posso ajudá-la? (respeito)

Meu velho, aonde iremos hoje? (intimidade)

Eventualmente, pronomes oblíquos átonos assumem valor de

possessivos:

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[...] a lagarta viscosa, a muriçoca doida, que esvoaçava havia muito

tempo em torno do corpo dele, assanhando-lhe os desejos, acordando-lhe

as fibras embambecidas pela saudade da terra, picando-lhe as artérias, para

lhe cuspir dentro do sangue uma centelha daquele amor [...] (O Cortiço)

Note, na passagem, como o pronome lhe indica posse: assanhando

seus desejos, acordando suas fibras, picando as suas artérias, cuspindo uma

centelha dentro de seu sangue.

É importante atentar sempre ao pronome “seu”, uma vez que, por se

referir à terceira pessoa do singular e do plural, pode causar ambiguidade.

Por exemplo:

O pai conversava com o filho sobre suas estratégias para o setor

de serviços.

Estratégias de quem? Do pai? Do filho? Dos dois? De uma terceira

pessoa? Para resolver o imbróglio, lança-se mão de alguns artifícios

linguísticos:

O pai conversava com o filho sobre as estratégias deles, pai e filho,

para o setor de serviços.

O pai conversava com o filho sobre as estratégias dele, pai, para o

setor de serviços.

O pai conversava com o filho sobre as estratégias dele, filho, para

o setor de serviços.

O pai conversava com o filho sobre as estratégias dele, fulano (ex.:

Alberto), para o setor de serviços.

Observação: Outras poderiam ser as soluções linguísticas para retirar

a ambiguidade.

O emprego de artigo definido é facultativo antes de pronomes

possessivos adjetivos (ou seja, que acompanham substantivos ou palavras

substantivadas):

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Fecho, cansado, as portas das minhas janelas. (Fernando

Pessoa usa artigo definido “as” antes do possessivo “minhas”)

Minha terra tem primores,

Que tais não encontro eu cá. (Gonçalves Dias já prefere não usar

o artigo antes do possessivo “minha”.)

No entanto, se o pronome for substantivo, o artigo é obrigatório:

(A) Minha terra tem primores que a sua não tem. (Não se diria

simplesmente “que sua não tem”.)

Pronomes demonstrativos
São aqueles que situam a posição espacial, temporal ou textual de
uma coisa ou ser em relação às outras pessoas do discurso. São pronomes

demonstrativos:

Este, esse, aquele, isto, isso, aquilo, o (=aquele), a (=aquela), mesmo,

próprio, semelhante, tal (e as variações deles).

Falemos de cada um separadamente:

* Mesmo, próprio: conferem reforço de identidade:

Um banho morno, em que se demorou, não serviu para

acalmar-lhe os nervos, muito pelo contrário. Arrepiava-se ao perpassar

da esponja, ao sentir suas próprias mãos; a água tépida irritava-a como

se fosse um contato humano estranho.

(A carne, Júlio Ribeiro)

Merece atenção a concordância de tais pronomes:

Elas próprias fizeram o trabalho.

Os homens mesmos explicaram o caso.

A mesma pessoa que atendeu você me atendeu também. (Note

que, junto do artigo “a”, adquire valor de “exata”)

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E-BOOK BP GRAMÁTICA NORMATIVA DA LÍNGUA PORTUGUESA
Observação: Muito se tem empregado o pronome “mesmo”

indiscriminadamente, em construções como “As secretárias reuniram-se

na copa. As mesmas decidiram pedir aumento”. Para a maioria esmagadora

dos gramáticos, essa construção não é adequada à norma-padrão. Quando,

no entanto, for sinônimo de “a mesma coisa”, o pronome cabe bem: As

secretárias reuniram-se na copa, e, mais tarde, os zeladores fizeram o

mesmo (a mesma coisa).

* Tal, semelhante: são demonstrativos quando sinônimos de este,

isto, aquilo, aquele:

Lenita comia quase sempre só na vastíssima varanda; depois de

almoçar ou de jantar ia conversar com o coronel, e fazia esforços incríveis

para conseguir fazer-se ouvir da velha [esposa do coronel Barbosa] que,

resignada e risonha, aumentava com a mão trêmula a concha da orelha

para apanhar as palavras. Tal (=Esse, semelhante) entretenimento

cansava a moça, e ela recolhia-se logo aos seus cômodos para ler, para

procurar distrair-se. Tomava um livro, deixava; tomava outro, deixava; era

impossível a leitura.

(Júlio Ribeiro, A Carne)

As explicações foram confusas e sem nexo. O aluno jamais

entenderia semelhantes (=aqueles, tais) enigmas.

* o(s), a(s): são demonstrativos quando substituíveis por aquele,


aquilo, isso, isto. Funcionam sempre como pronomes substantivos:

O sacerdote da direita é recém-chegado; o (=aquele) da

esquerda, antigo de casa.

Toda a sala estava suja; a dona bem o percebeu (=percebeu isso).

Noto à margem do (=daquilo) que li o (=aquilo) que julguei que

senti.

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E-BOOK BP GRAMÁTICA NORMATIVA DA LÍNGUA PORTUGUESA
Releio e digo: “Fui eu?” 

Deus sabe, porque o (=isto) escreveu.

(Fernando Pessoa)

Os pronomes demonstrativos este, esse e aquele (e todas as variações

deles), bem como isto, isso e aquilo analisam-se de três perspectivas:

espacial, temporal e textual.

ESPACIAL

* este(a/s), isto: indicam proximidade do falante. Podem ainda ser

usados em referências que o autor faz ao próprio texto:

Esta turma aqui ainda não começou o ano letivo.

Morrer... quando este mundo é um paraíso,

E a alma um cisne de douradas plumas:

Não! 

(Castro Alves)

Há algum tempo, hesitei se devia abrir estas memórias pelo

princípio ou pelo fim, isto é, se poria em primeiro lugar o meu nascimento

ou a minha morte.

(Machado de Assis, Memórias Póstumas de Brás Cubas)

* Esse (a/s), isso: indicam distanciamento do falante e/ou proximidade

daquele com quem se fala:

Essas escolhas que você fez me parecem as melhores.

* Aquele (a/s), aquilo: indicam algo ou alguém distante do ouvinte e

do falante:

Algo me diz que aquele sofá não combinará com a sala.

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Comum na literatura. Distância no tempo e no espaço

Lenita abriu os olhos. Atraiu-lhe as vistas o brilho suave do metal

ferido pela luz.

Ergueu-se, acercou-se da mesa, fitou com atenção a estátua:

aqueles braços, aquelas pernas, aqueles músculos ressaltantes,

aqueles tendões retesados, aquela virilidade, aquela robustez,

impressionaram-na de modo estranho.

Dezenas de vezes tinha ela estudado e admirado esse primor

anatômico em todas as suas minudências cruas, em todos os nadas que

constituem a perfeição artística, e nunca experimentara o que então

experimentava.

(Júlio Ribeiro, A Carne).

TEMPORAL

* este(a/s): referem-se a tempo presente, passado recente ou futuro:

Esta é a hora de nós irmos embora.

Este ano está sendo de grandes testes psicológicos.

Esta festa de ontem foi épica.

* Esse (a/s): indicam passado recente ou futuro:

Essas últimas horas foram exaustivas.

Estes próximos dias serão de grande trabalho.

* Aquele (a/s): passado ou tempo distante, vago:

Aqueles tempos de Cristo foram de luz e crueldade.

Se lá no assento etéreo, onde subiste

Memória desta vida se consente,

Não te esqueças daquele amor ardente

Que já nos olhos meus tão puro viste.

(Camões)

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Observação:

Com alguma frequência, os pronomes demonstrativos não se

separam por linhas rigorosas de demarcação; há certa liberdade admitida

gramaticalmente em seu uso. É o que defendem gramáticos de ponta,

como Rocha Lima, Celso Cunha e Bechara. Sobre o assunto, pondera Celso

Cunha:

“Estas distinções que nos oferece o sistema ternário dos

demonstrativos em português não são, porém, rigorosamente obedecidas

na prática. Com frequência, na linguagem animada, nos transportamos

pelo pensamento a regiões ou épocas distantes, a fim de nos referirmos

a pessoas ou objetos que nos interessam particularmente como se

estivéssemos em sua presença. Linguisticamente, esta aproximação

mental traduz-se pelo emprego do pronome este (esta, isto) onde seria

de esperar esse ou aquele.”

Essa não distinção se nota em vários textos, inclusive de grandes

autores, como Drummond. Em Poema das Sete Faces, emprega “esse” no

lugar de “este” e “essa” no lugar de “esta” ou “aquela”:

Eu não devia te dizer

Mas essa lua

Mas esse conhaque

Botam a gente comovido como o diabo.

(Carlos Drummond, Poema das Sete Faces)

TEXTUAL

Também dentro do texto, os pronomes demonstrativos este, esse,

aquele e as variações de cada um podem ser de grande valia para fazer

referências endofóricas catafóricas ou anafóricas.

* Este(a/s), isto: Referem-se ao que ainda será dito (valor catafórico).

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Muitos gramáticos admitem, ainda, a possibilidade de que retomem o que

já se disse:

Jantei e fui a casa. Lá achei uma caixa de charutos. [...] Entendi,

abri-a e tirei este bilhete: Meu B...Desconfiam de nós [...] (Machado de

Assis, Memórias Póstumas de Brás Cubas)

O juiz tomou a pior decisão. Esta feria o direito de defesa do réu.

* Esse (a/s), isso: Referem-se sempre a algo já dito (valor anafórico):

Não cultiveis sistemas, extravagâncias e singularidades. Por

esse meio lucraríeis a néscia reputação de originais; mas nunca a de

sábios, doutos, ou conscienciosos.

Não militeis em partidos, dando à política o que deveis à

imparcialidade. Dessa maneira venderíeis as almas e famas ao demônio

da ambição, da intriga e da servidão às paixões mais detestáveis.

(Rui Barbosa, Oração aos Moços)

Caso haja dois elementos, “aquele” retoma o mais distante e “este”, o

mais próximo:

Bem poucas ilusões  desde o começo podíamos nutrir.

Apesar de tal ser o destino imediato da  nossa causa, não a podemos

desamparar. Quando praticamos uma boa ação, não sabemos se é para

hoje ou para quando. O caso é que os seus frutos podem ser tardios, mas

são certos. Uns plantam a semente da couve para o prato de amanhã;

outros, a semente do carvalho para o abrigo ao futuro. Aqueles cavam

para si mesmos. Estes lavram para o seu país, para a felicidade dos seus

descendentes, para o benefício do gênero humano. (Rui Barbosa, em

discurso no Senado)

A prudência não impede a coragem nem esta (coragem) anula

aquela (prudência).

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Nada impede a retomada de apenas um dos dois elementos

anteriores:

E daí a pouco apareciam ajudantes gratuitos para os arranjos

do jantar, tanto do lado da das Dores, como do lado da Rita Baiana. O

Albino encarregou-se de varrer e arrumar a casa desta, entretanto que a

mulata ia para o fogão preparar seus quitutes do Norte. (Aluísio Azevedo,

O Cortiço)

Querendo-se retomar ambos, aplica-se a regra geral da anáfora:

A prudência não impede a coragem. Essas convivem dentro de

todo ser.

Os pronomes demonstrativos apresentam valores estilísticos aferíveis


dentro do contexto. Veja:

Se acaso me quiseres

Sou dessas mulheres que só dizem sim

Por uma coisa à-toa, uma noitada boa

Um cinema, um botequim

(Chico Buarque, Folhetim)

Isso não passa de uma besta quadrada!

Foi uma jornada daquelas...

Tem um decote pequeno,

Um ar modesto e tranquilo;

Mas vá-se lá descobrir

Coisa pior do que aquilo!

(Fernando Pessoa)

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Pronomes indefinidos
Referem-se à terceira pessoa do discurso, indicando quantidade

incerta ou identidade indeterminada. Podem ser variáveis ou invariáveis.

Exemplos de variáveis: algum, nenhum, todo, outro, quanto, muito,

pouco, certo, vário, tanto, qualquer, bastante, um, algum.

Exemplos de invariáveis: alguém, ninguém, tudo, nada, outrem, cada,

algo, mais, menos.

Por esta porta entrarão todos os convidados.

Tudo isto que o Sol toca é o nosso reino. [...] O tempo de um rei

governar nasce e se põe como o Sol.

(O Rei Leão)

Entre os semeadores do Evangelho há uns que saem a semear,

há outros que semeiam sem sair. Os que saem a semear são os que vão

pregar à Índia, à China, ao Japão; os que semeiam sem sair são os que se

contentam com pregar na pátria. Todos terão sua razão, mas tudo tem

sua conta. 

(Padre Antônio Vieira, Sermão aos Peixes)

Perceba como os pronomes sublinhados carregam ideia de

indefinição, quantidade indefinida, e referem-se à 3ª pessoa do discurso.

Podem ainda aparecer sob a forma de locuções pronominais, ou seja,

grupo de vocábulos com valor de pronome indefinido: seja qual for, cada

qual, quem quer que, cada um, cada qual etc.:

Cada qual com suas loucuras.

Só de cinco temos escrituras; mas a diferença com que

escreveram, como sabem os doutos, é admirável. As penas todas eram

tiradas das asas daquela pomba divina; mas o estilo tão diverso, tão

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particular e tão próprio de cada um, que bem mostra que era seu. (Padre

Antônio Vieira, Sermão da Sexagésima)

Algumas observações sobre pronomes indefinidos são fundamentais:

Observações práticas

1) Não se confundem os pronomes “mais” e “menos” com os advérbios

“mais” e “menos”:

Espera-se mais graça que desgraça. (“Mais” é pronome, pois indefine

“graça”, um substantivo)

Espero que você goste mais daqui do que de lá. (“Mais” é advérbio,

pois modifica o verbo “gostar”)

2) “Bastante” e “nenhum”, como pronomes indefinidos, variam

normalmente:

Não encontrei nenhuns documentos na gaveta.

Tenho escrito bastantes crônicas. (=muitas crônicas)

Convidei bastantes parentes para a festa (=muitos parentes).

Obs.: É diferente de dizer Convidei parentes bastantes para a festa

(=parentes suficientes)

3) “Nem um” refere-se à unidade, “nenhum” é termo que generaliza

a negação:

Não tenho nenhum celular. = não tenho celular algum

Não tenho nem um celular, que dirá dois. Um = numeral

Não fiz nem uma coisa nem outra. Um = pronome indefinido

Não é incomum haver situações em que “nenhum” e “nem um”

caibam corretamente. Haverá apenas leve diferença de sentido. Observe:

Não venho nenhum amigo à festa dele. = Não veio amigo algum; há

aqui uma negativa generalizada.

Não veio nem um amigo à festa dele. = Não veio nem um único

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E-BOOK BP GRAMÁTICA NORMATIVA DA LÍNGUA PORTUGUESA
amigo; há aqui ênfase de caráter quantitativo.

Ambas as construções são possíveis e corretas.

4) “Nenhum” pode ser reforçado normalmente por advérbios de

negação: Não fiz nenhum esforço para carregar o sofá. Nunca ninguém

me disse isso.

Aliás nada há de errado com a dupla negação em língua portuguesa.

Ela marca um reforço da ideia:

“Não sou nada. Nunca serei nada, não posso querer ser nada. À

parte isso, tenho em mim todos os sonhos do mundo.” 

Falhei em tudo. Como não fiz propósito nenhum, talvez tudo

fosse nada.

(Fernando Pessoa, como Álvaro de Campos, Tabacaria)

5) “Todo”, no singular, quando junto a artigo ou pronome

demonstrativo, significa “inteiro”; sem artigo, significa “qualquer”:

Nem todo estado aceita sua carteira de motorista. (= nem todos os

estados, ou seja, não é qualquer estado que aceita.)

Nem todo o estado aceita sua carteira de motorista. (= não é o estado


inteiro que aceita, apenas uma parte.)

6) O pronome indefinido “cada” sempre acompanha um substantivo

ou um numeral. Não são normativas, portanto, construções como

As pastas de dente custaram 10 reais cada.

Resolve-se a questão assim:

As pastas de dente custaram 10 reais cada uma ou

Cada pasta de dente custou 10 reais.

7) As palavras “fulano”, “beltrano” e “sicrano” são, segundo o Volp

e dicionários, substantivos, não pronomes indefinidos, embora tenham

dinâmica muito semelhante à destes. A propósito, veja-se texto sobre a

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E-BOOK BP GRAMÁTICA NORMATIVA DA LÍNGUA PORTUGUESA
origem dessas palavras:

Fulano, beltrano e... sicrano?

Analisar a digital das palavras é entender a história que carregam.

Fulano, beltrano e sicrano – essas palavras esquisitas que usamos

para fofocar – têm origens distintas. São vistas como siamesas hoje, mas

não o são de fato, como nos conta um exame detalhado de DNA.

Fulano tem procedência certa: do árabe “fulân”, era pronome

demonstrativo sinônimo de “tal”, usado em construções como “fulano

vizinho” (tal vizinho) e “fulana refeição” (tal refeição), por exemplo. Os

espanhóis – influenciados pelos mouros – falavam assim no século 13, mas,

quando a expressão passou para o português, veio como substantivo.

Beltrano, por sua vez, vem do nome próprio Beltrão (oriundo do

francês Bertrand). Dizem os etimólogos que o nome era muito famoso

nas novelas de cavalaria e, de tão comum, acabou-se tornando, de fato,

um substantivo comum. De “Beltrão” para “beltrano” foi um pulo, por

clara influência da terminação de “fulano”.

Já “sicrano” tem um DNA bem apagado. Sua digital se perdeu no

desenrolar corrosivo do tempo. A origem é bastante controvertida: há

quem diga vir do árabe “sicrán”, que significa “bêbado”; há quem defenda

ser o desfiguramento de um nome próprio, como ocorreu com “beltrano”;

há quem avente provir do latim “securu”; por fim, há quem rogue ser uma

mistureba de “zutrano” e “citano”, palavras espanholas equivalentes a

“fulano” e “beltrano”.

O que se nota, por esse belo conto de fadas etimológico, é que

nenhum deles se registra como substantivo próprio, ao contrário do que

se costuma imaginar. Falando de maneira simples: fulano, beltrano e

sicrano não são nomes de pessoas específicas, mas substantivos comuns

referentes a indivíduos, como são as palavras “pessoa” e “humano”, por

exemplo. Pode-se concluir, por isso, que: 1) nenhuma delas se grafa com

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E-BOOK BP GRAMÁTICA NORMATIVA DA LÍNGUA PORTUGUESA
letra maiúscula, como assevera claramente o Acordo Ortográfico; 2) não

há margem para adaptações criativas, como o uso de “ciclano” no lugar

de “sicrano”.

É claro que tudo isso é a norma-padrão sendo o que é: normativa.

Nada impede que a palavra “ciclano” evolua formalmente e deixe de

viver na clandestinidade, irmanando-se a “sicrano” de forma digna. Por

enquanto, dicionários definem tal vocábulo apenas como um grupo de

hidrocarbonetos saturados. Faz sentido estar saturado, o pobre “ciclano”.

Tantos anos vivendo à margem do reconhecimento não faz bem a

ninguém.

(Lara Brenner para a página Língua e Tradição, no Facebook)

Pronomes interrogativos
São aqueles empregados em interrogativas diretas (com ponto de

interrogação) ou indiretas (sem ponto de interrogação). São eles: que, qual

(quais), quem, quanto (a/s).

A entonação nas interrogativas diretas é ascendente; nas indiretas,

descendente. Estas trabalham com verbos como desejar, querer, saber,

perguntar, ignorar, verificar, responder etc.:

Quem é esse navegador? (Pergunta direta)

Não sei quem é esse navegador. (Pergunta indireta)

Por qual caminho devemos passar? (Pergunta direta)

Verificarei por qual caminho devemos passar. (Pergunta indireta)

Comendo alegremente perguntavam, 

Pela Arábica língua, [...]

Quem eram, de que terra, [...]

Ou que partes do mar corrido tinham.

Os fortes Lusitanos lhe tornavam

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As discretas respostas, que convinham:

“Os Portugueses somos do Ocidente,

Imos buscando as terras do Oriente.

(Camões, Os Lusíadas)

Pronomes relativos
São aqueles que se referem a termo antecedente explícito,

substituindo-o. Essa função pode ser desempenhada por que, o qual (e

suas flexões), quem, quanto, onde, cujo, como e quando. Veja:

Quadrilha

João amava Teresa que amava Raimundo

que amava Maria que amava Joaquim que amava Lili,

que não amava ninguém.

João foi para os Estados Unidos, Teresa para o convento,

Raimundo morreu de desastre, Maria ficou para tia,

Joaquim suicidou-se e Lili casou com J. Pinto Fernandes

que não tinha entrado na história.

(Carlos Drummond)

- O qual, a qual, os quais, as quais: ajudam a evitar ambiguidades e

queísmos (repetição excessiva da palavra “que”).

O depoimento da testemunha, que revirou o processo, finalmente

ocorreu.

Quem revirou o processo? Agora observe:

O depoimento da testemunha, a qual revirou o processo, finalmente

ocorreu.

O depoimento da testemunha, o qual revirou o processo, finalmente

ocorreu.

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E-BOOK BP GRAMÁTICA NORMATIVA DA LÍNGUA PORTUGUESA
- Que: é relativo quando permutável por o qual, a qual, os quais, as

quais. Refere-se a pessoa ou coisa.

O recurso, que foi claramente redigido às pressas, ficou ruim.

Obs.: Em prol do bom movimento rítmico, bons gramáticos

recomendam usar o pronome “o qual” em detrimento do “que” quando

precedido de locução prepositiva ou preposição de duas ou mais sílabas:

O verão durante o qual atuei naquele caso de homicídio deixou

suas marcas.

(E não “durante que”.)

Houve perdas apesar das quais nós vencemos.

(E não “apesar de que”.)

Eu sumi a procuração mediante a qual você me passou poderes.

(E não “mediante que”.)

- Quem: sempre precedido de preposição, refere-se a pessoas ou

seres personificados.

Seixas, apesar da revolução que se nele se havia operado nos

últimos seis meses, ainda não gastara de todo seus hábitos de homem

da sociedade para quem a vida é uma série de etiquetas e cerimônias,

regradas pelo uso.

(José de Alencar, Senhora)

Durante essas pausas, Aurélia observava o marido, e assistia

comovida à transformação que se fora operando aquele caráter, outrora

frágil, mundano e volúbil, a quem uma salutar influência restituía

gradualmente a sua natureza generosa.

(José de Alencar, Senhora)

- Onde, aonde, donde: utilizados quando o antecedente for lugar

(físico ou virtual). Dispensa a preposição “em”.

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E-BOOK BP GRAMÁTICA NORMATIVA DA LÍNGUA PORTUGUESA
Voltou a seu apartamento, onde havia esquecido as chaves.

O comandante olhou para o sítio donde Mariana se atirara, e

viu, enleado ao cordame, o avental, e à flor da água, um rolo de papéis,

que os marujos recolheram da lancha. (Camilo Castelo Branco, Amor de

Perdição)

Não, não sei isto, nem outra coisa, nem coisa nenhuma... 

E, no fundo do meu espírito, onde sonho o que sonhei, 

Nos campos últimos da alma, onde memoro sem causa 

Fogem desmantelados, últimos restos 

Da ilusão fina. (Fernando Pessoa)

O velhinho subiu ao sobrado, donde voltou logo munido de

um par de óculos verdes, que usara outrora por causa dum ameaço de

oftalmia. (José de Alencar, Senhora)

Obs.: A escola (n)onde estudo é boa. (O “nonde” caiu em desuso.

Usa-se apenas “onde” nesse caso)

Atenção!

Evite usar “onde” para referências que não sejam a lugares físicos ou
virtuais:

Não suporto pegadinhas de rua onde o humor se faz com base no

desespero de alguém.

Prefira “...em que/nas quais o humor se faz com base no desespero

de alguém”.

Foi justamente aquele o momento onde ele decidiu mudar.

Prefira “...em que ele decidiu mudar”.

A médica era habilidosa e atenciosa, onde conquistou o coração

dos pacientes.

Prefira “...razão pela qual conquistou o coração dos pacientes”.

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E-BOOK BP GRAMÁTICA NORMATIVA DA LÍNGUA PORTUGUESA
- Cujo, cuja, cujos, cujas: indicam posse ou pertinência e concordam

com a palavra posterior.

A sentença, cujo teor claramente fere a norma penal, deve ser

reformada.

Já não eram trinta, mas trezentas pessoas que acompanhavam

o barbeiro, cuja alcunha familiar deve ser mencionada, porque ela deu

nome à revolta; chamavam-lhe o Canjica. (Machado de Assis, O Alienista)

Os pés [...] eram resguardados por um par de sapatos cujas

fivelas não passavam de um simples e modesto latão. (Machado de Assis,

O Alienista)

- Quanto(a)(s): como relativos, vêm antecedidos de tudo, todos, todas,

que podem ser ocultados.

Tudo quanto fiz foi em vão.

Explico tantas vezes quantas forem necessárias.

- Quando: como relativo, refere-se apenas a tempo e dispensa

preposição.

Os momentos quando o réu saiu da sala foram tensos.

- Como: na função de pronome relativo, tem como antecedente

nome denotador de modo (maneira, forma, jeito) e pode ser substituído

por “segundo o(a) qual”, “pelo(a) qual”.

Estou observando a maneira como você se porta.

A forma como se entreolharam deixou evidente que o Juiz e o

Promotor estavam de acordo.

O alienista disse-lhe confidencialmente que esse digno homem

não estava no perfeito equilíbrio das faculdades mentais, à vista do modo

como dissipava os cabedais. (Machado de Assis, O Alienista)

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E-BOOK BP GRAMÁTICA NORMATIVA DA LÍNGUA PORTUGUESA
O bom emprego dos pronomes relativos está diretamente atrelado

ao domínio de regência. Analise alguns exemplos:

E corriam sem temor de serem vistos, porque os outros tinham

dobrado o outeiro, em cujo vale corria a estrada. (Camilo Castelo Branco,

Amor de Perdição)

Muitos entenderam que o alienista merecia uma especial

manifestação e deram-lhe um baile, ao qual se seguiram outros bailes e

jantares. (Machado de Assis, O Alienista)

Havia em cima da mesa uma caixa de jogo, donde Aurélia

tirou um baralho, com que se entreteve a fazer sortes. (José de Alencar,


Senhora)

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EXERCÍCIOS E RESPOSTAS

CADERNO 1
Exercícios

Substantivo, adjetivo, pronome, numeral e artigo.

Questão 1

Explique gramaticalmente o que possibilitou a resposta de Snoopy

na tira abaixo.

Questão 2

Os exercícios a seguir são relativos à primeira estrofe de “Oh retrato

da Morte, oh noite amiga”, de Bocage, poeta português, representante do

arcadismo lusitano.

Oh retrato da Morte, oh Noite amiga,

Por cuja escuridão suspiro há tanto!

Calada testemunha de meu pranto,

De meus desgostos secretária antiga

Pois manda Amor que a ti somente os diga

Dá-lhes pio agasalho no teu manto;

Ouve-os, como costumas, ouve, enquanto

Dorme a cruel que a delirar me obriga.

3
E-BOOK BP GRAMÁTICA NORMATIVA DA LÍNGUA PORTUGUESA
E vós, ó cortesãos da escuridade,

Fantasmas vagos, mochos piadores,

Inimigos, como eu, da claridade!

Em bandos acudi aos meus clamores;

Quero a vossa medonha sociedade,

Quero fartar o meu coração de horrores.

a) Dê a classe gramatical de “Morte” e “Noite” e explique por que tais

vocábulos foram grafados com letras maiúsculas.

b) Explique o emprego do pronome relativo “cuja”, presente no

segundo verso.

c) Veja a definição de “amiga” no dicionário Michaelis:

Substantivo feminino: Mulher ligada por laços de amizade a pessoa,

animal ou coisa: Amiga dos filhos. Amiga dos animais e das artes.

No contexto do poema, a palavra “amiga” é, de fato, empregada

como substantivo? Justifique.

d) O que o poeta quer dizer com “de meus desgostos secretária

antiga”?

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Questão 3

Os exercícios desta questão são sobre a crônica a seguir, escrita por

Otto Lara Resende:

VISTA CANSADA

Acho que foi o Hemingway quem disse que olhava cada coisa à sua

volta como se a visse pela última vez. Pela última ou pela primeira vez? Pela

primeira vez foi outro escritor quem disse. Essa ideia de olhar pela última

vez tem algo de deprimente. Olhar de despedida, de quem não crê que a

vida continua, não admira que o Hemingway tenha acabado como acabou.

Se eu morrer, morre comigo um certo modo de ver, disse o poeta.

Um poeta é só isto: um certo modo de ver. O diabo é que, de tanto ver, a

gente banaliza o olhar. Vê não-vendo. Experimente ver pela primeira vez o

que você vê todo dia, sem ver. Parece fácil, mas não é. O que nos cerca, o

que nos é familiar, já não desperta curiosidade. O campo visual da nossa

rotina é como um vazio.

Você sai todo dia, por exemplo, pela mesma porta. Se alguém lhe

perguntar o que é que você vê no seu caminho, você não sabe. De tanto ver,

você não vê. Sei de um profissional que passou 32 anos a fio pelo mesmo

hall do prédio do seu escritório. Lá estava sempre, pontualíssimo, o mesmo

porteiro. Dava-lhe bom-dia e às vezes lhe passava um recado ou uma

correspondência. Um dia o porteiro cometeu a descortesia de falecer.

Como era ele? Sua cara? Sua voz? Como se vestia? Não fazia a mínima

ideia. Em 32 anos, nunca o viu. Para ser notado, o porteiro teve que morrer.

Se um dia no seu lugar estivesse uma girafa, cumprindo o rito, pode ser

também que ninguém desse por sua ausência. O hábito suja os olhos e lhes

baixa a voltagem. Mas há sempre o que ver. Gente, coisas, bichos. E vemos?

Não, não vemos.

Uma criança vê o que o adulto não vê. Tem olhos atentos e limpos

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para o espetáculo do mundo. O poeta é capaz de ver pela primeira vez o que,

de fato, ninguém vê. Há pai que nunca viu o próprio filho. Marido que nunca

viu a própria mulher, isso existe às pampas. Nossos olhos se gastam no dia

a dia, opacos. É por aí que se instala no coração o monstro da indiferença.

a) Releia a passagem:

“Lá estava sempre, pontualíssimo, o mesmo porteiro. Dava-lhe

bom-dia e às vezes lhe passava um recado ou uma correspondência. Um

dia o porteiro cometeu a descortesia de falecer.”

Dê a classificação do adjetivo sublinhado quanto ao grau e explique

por que o autor optou pela utilização nessa flexão.

b) Releia:

“Como era ele? Sua cara? Sua voz? Como se vestia? Não fazia a

mínima ideia. Em 32 anos, nunca o viu. Para ser notado, o porteiro teve

que morrer. Se um dia no seu lugar estivesse uma girafa, cumprindo o

rito, pode ser também que ninguém desse por sua ausência. O hábito

suja os olhos e lhes baixa a voltagem. Mas há sempre o que ver. Gente,

coisas, bichos. E vemos? Não, não vemos.”

Explique, morfológica e semanticamente, de que maneira a escolha

da palavra sublinhada ajuda a construir o argumento do autor.

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c) Releia:

“Se eu morrer, morre comigo um certo modo de ver, disse o poeta.

Um poeta é só isto: um certo modo de ver.”

Classifique morfologicamente a palavra sublinhada e justifique seu

uso.

Questão 4

Os exercícios a seguir são sobre o soneto A Carolina, de Machado de

Assis, que o escreveu após o falecimento de sua esposa, a qual deu o nome

ao poema.

A CAROLINA

Querida, ao pé do leito derradeiro

Em que descansas dessa longa vida,

Aqui venho e virei, pobre querida,

Trazer-te o coração do companheiro.

Pulsa-lhe aquele afeto verdadeiro

Que, a despeito de toda a humana lida,

Fez a nossa existência apetecida

E num recanto pôs um mundo inteiro.

Trago-te flores, — restos arrancados

Da terra que nos viu passar unidos

E ora mortos nos deixa e separados.

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Que eu, se tenho nos olhos malferidos

Pensamentos de vida formulados,

São pensamentos idos e vividos.

Publicado no livro Relíquias de Casa Velha (1906).

In: ASSIS, Machado de. Obra completa. Org. Afrânio Coutinho.

Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 1994. v.3, p.313. (Biblioteca luso-brasileira. Série

brasileira

a) Releia:

Querida, ao pé do leito derradeiro

Em que descansas dessa longa vida,


Aqui venho e virei, pobre querida,

Trazer-te o coração do companheiro.

O adjetivo “pobre” é usado em seu sentido literal? Justifique.

b) Justifique a construção “em que” (verso 2) e dê duas outras

possibilidades de construções cabíveis.

c) No primeiro verso da segunda estrofe, lê-se: Pulsa-lhe aquele

afeto verdadeiro. A quem se refere o pronome oblíquo átono “lhe” e qual é

sua função semântica?

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d) Ainda quanto ao verso “Pulsa-lhe aquele afeto verdadeiro”,

classifique morfologicamente a palavra “aquele” e justifique a escolha do

autor por essa palavra.

e) Releia:

Pulsa-lhe aquele afeto verdadeiro

Que, a despeito de toda a humana lida,

Fez a nossa existência apetecida

Qual é a expressão retomada pelo pronome relativo “que”?

O que o autor quer dizer com “a despeito de toda a humana lida,

Fez a nossa existência apetecida”?

f) Se, no segmento “Trago-te flores”, o autor desejasse empregar um

pronome oblíquo tônico no lugar de um átono, como ficaria a construção?

Justifique.

g) Releia:

Trago-te flores, — restos arrancados

Da terra que nos viu passar unidos

E ora mortos nos deixa e separados.

A quem se referem os adjetivos “mortos” e “separados”?

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Questão 5

Leia o texto para responder às questões.

PRA MIM BRINCAR

Não há nada mais gostoso do que o mim sujeito de verbo no

infinitivo. Pra mim brincar. As cariocas que não sabem gramática falam

assim. Todos os brasileiros deviam de querer falar como as cariocas que não

sabem gramática.

– As palavras mais feias da língua portuguesa são quiçá, alhures

e miúde.

BANDEIRA, Manuel. Seleta em prosa e verso. Org: Emanuel de

Moraes. 4ª ed.

Rio de Janeiro, José Olympio, 1986. p. 19.

a) O poeta se refere a um desvio gramatical muito comum. Explique

gramaticalmente por que a construção “para mim brincar” não é correta.

b) Qual é o significado das palavras tidas pelo autor como as mais

feias da língua portuguesa?

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Questão 6

Leia a piada para responder às questões.

O diretor de uma empresa contrata um detetive particular para

investigar o sócio.

– Siga o Pereira durante uma semana para saber o que ele está

fazendo. Aquilo tem tipo de safado.

Uma semana depois o detetive retorna e conta:

– O Pereira sai de sua empresa ao meio-dia, pega o seu carro, vai

à sua casa almoçar, namora a sua mulher, fuma um dos seus charutos e

regressa para o trabalho.

O diretor comenta, satisfeito:

– Ah, bom. Tudo bem, então.

O detetive pergunta:

– Posso tratá-lo por tu?

– Claro.

– Então, vou contar a história de novo. O Pereira sai ao meio-dia, pega

o teu carro, vai à tua casa almoçar, namora a tua mulher, fuma um dos teus

charutos e regressa para o trabalho.

a) Utilizando o conceito de pronomes, explique o que gera o humor

da história.

b) Por que o diretor da empresa usa o pronome demonstrativo

“aquilo” ao final de sua primeira fala?

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Questão 7

Leia a tira.

Perceba que, para fugir da pergunta de Eddie, Hagar se vale de

um artifício da língua portuguesa, ao interpretar de forma conveniente a

primeira fala de seu funcionário (“Posso fazer uma pergunta?”). Utilizando

seus conhecimentos sobre classes gramaticais, explique o que Eddie quis

dizer no primeiro balão e como Hagar interpretou essa pergunta.

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Respostas

Questão 1

Sally usa o artigo indefinido “um” para se referir a Snoopy, dando a

entender que se trata de um cachorro desconhecido dos moradores da casa,

visto que mostrar falta de familiaridade é justamente uma das funções dos

indefinidos. Já Snoopy, em sua resposta, se vale do artigo definido “o”, o qual

deixa evidente que ele é um cachorro conhecido da família e, mais do que

isso, é o único (ou pelo menos o mais importante) cão daquela residência.

Questão 2

a) Trata-se de substantivos. Foram grafados com maiúsculas porque,

embora sejam correntemente substantivos comuns, são tratados pelo autor

como próprios, pois ele os entende como representantes de verdadeiras

pessoas (figura de linguagem chamada personificação). Esse processo

de mudança na classificação morfológica da palavra se chama derivação

imprópria. No caso, deixam de ser substantivos comuns e passam a ser

próprios.

No poema, Bocage diz que a Noite é o retrato da Morte. Ele dialoga

com a Noite, dividindo com ela suas angústias, afloradas pelo fato de se

sentir perto da Morte.

b) Existe relação de pertencimento: a escuridão pertence à Noite,

logo é pertinente o emprego do pronome relativo “cuja”.

Nota-se que ele concorda com “escuridão”, pois tal pronome, embora

retome o nome anterior (Noite amiga), realmente deve concordar com o

nome posterior (escuridão).

No contexto, quem suspira, suspira POR alguma coisa, daí a

justificativa da preposição “por” em “por cuja escuridão suspiro há tanto.

Ou seja: o autor suspira PELA escuridão da Noite.

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c) Não. No poema, ocorre processo de derivação imprópria (quando

há mudança de classificação morfológica de uma palavra, a depender

do contexto). A palavra “amiga” não é empregada para designar um ser,

mas, sim, para caracterizar o substantivo “Noite”. Funciona, portanto, como

verdadeiro adjetivo.

d) Um dos sentidos de “secretária”, já em desuso, é, conforme dicionário

Michaelis, “Mulher que guarda segredos de outrem”. No poema, a Noite

guarda os segredos do autor, sendo, portanto, sua verdadeira confidente.

Questão 3

a) O adjetivo está no grau superlativo (especificamente, superlativo


absoluto sintético). O autor escolhe essa flexão para ressaltar a pontualidade

do porteiro, evidenciando como ele estava sempre presente no edifício,

embora não fosse notado pelo profissional sobre o qual o autor fala.

b) O autor escolhe um substantivo cujo referente é um animal,

formando, assim, imagem completamente deslocada da realidade de um

escritório. Dessa forma, causa estranheza ao leitor, levando-o a compreender

a extremidade de seu argumento: o profissional era tão desatento, que não

veria o porteiro, ainda que ele absurdamente fosse uma girafa.

c) Trata-se de um pronome demonstrativo, escolhido pelo autor para

projetar uma ideia (movimento catafórico). No caso, o autor apresenta a

definição de poeta (“um certo modo de ver”) depois do pronome “isto”.

Questão 4

a) Não, o sentido literal seria “sem dinheiro”, o que nada tem a ver

com o poema. Trata-se de uso metafórico, dada a anteposição do adjetivo

ao substantivo “querida” e, é claro, dado o contexto. No poema, “pobre”

expressa o apreço e carinho do autor por sua amada, bem como indica seu

lamento pela partida dela.

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b) Querida, ao pé do leito derradeiro

Em que descansas dessa longa vida,

A preposição “em” é cabível pelo fato de que, no contexto, quem

descansa, descansa EM algum lugar. O pronome relativo “que” retoma “leito

derradeiro”. Poder-se-ia substituir a expressão por “no qual” ou “onde”.

c) O pronome oblíquo átono “lhe” remete à terceira pessoa do

discurso. Durante todo o texto, o autor se refere à amada chamando-a pela

segunda pessoa (tu), de maneira que já se exclui a possibilidade de “lhe” ser

referente a ela.

No caso, “lhe” tem valor possessivo. Poderia ser substituído por:

aquele afeto verdadeiro pulsa no coração do companheiro (ou seja, em


seu coração). Como o autor acabara de fazer referência ao coração do

companheiro (ou seja, a seu próprio coração), infere-se que o afeto a que se

refere é aquele que ali (em seu coração) pulsa.

d) Trata-se de pronome demonstrativo escolhido para revelar certo

distanciamento temporal, uma vez que o afeto do qual fala é de longa data

conhecido por Carolina. É como se ele dissesse “aquele afeto que há anos tu

tanto conheces ainda aqui permanece”.

e) O pronome relativo “que” retoma “aquele afeto verdadeiro”. Assim,

ele diz que o afeto verdadeiro de seu próprio coração fez a existência deles

apetecida (ou seja, desejada, pretendida), apesar da lida (ou seja, do trabalho,

do esforço, do labor) humana. Em outras palavras: apesar da sofrida existência

humana, o afeto de seu próprio coração pela amada Carolina fez com que a

existência deles como casal fosse desejada, agradável, pretendida por ele.)

f) Trago flores a ti (ou para ti). Seria necessária a inserção de a ou para

porque os pronomes oblíquos tônicos (como ti) trabalham necessariamente


acompanhados por preposições.

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g) Ambos os adjetivos se referem a “nós” (Carolina e o autor). Em

outras palavras, o autor diz que a terra os viu passar unidos, mas agora ela

os deixa mortos e separados. Ao usar tais adjetivos no plural, o autor deixa

claro que a separação deles pela morte também o matou.

Questão 5

a) O pronome “mim” é pessoal oblíquo tônico, categoria que não

funciona como sujeito. Os pronomes que desempenham papel de sujeito

são os pessoais do caso reto (eu, tu, ele/ela, nós, vós, eles/elas). No caso, a

estrutura deveria ser “para eu brincar”.

b) De acordo com o Dicionário Aulete:

Quiçá: talvez, provavelmente;

Alhures: em outro lugar;

Miúde: com frequência; repetidas vezes; a miúdo.

Questão 6

a) O humor é gerado pelo fato de o pronome possessivo “seu” poder

se referir tanto à pessoa sobre a qual se fala (Pereira) como à pessoa com

a qual se fala (o diretor da empresa). Isso acontece porque o detetive

começou a história tratando seu interlocutor pode “você”. Os pronomes de

tratamento (como é o caso de “você”) trabalham com verbos e pronomes da

terceira pessoa, embora se refiram à segunda pessoa do discurso. Trata-se

de um idiotismo da língua portuguesa, ou seja, um fenômeno não explicável

logicamente, porém já consolidado no idioma.

b) Para manifestar desprezo pelo indivíduo sobre o qual falava.

Questão 7

Eddie usou a palavra “uma” como artigo indefinido, querendo saber

se poderia fazer uma pergunta qualquer, ainda não especificada (uma

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vez que ainda não feita). A resposta de Hagar no último quadrinho deixa

evidente que ele convenientemente tomou tal artigo indefinido “uma”

como um numeral, de maneira que Eddie só poderia fazer uma única

pergunta. Dessa forma, conseguiu se esquivar do segundo questionamento

de Eddie (“Quando vou receber algum pagamento?”), o qual era o que

verdadeiramente interessava no contexto, mas de que Hagar queria se

esquivar.

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EXERCÍCIOS E RESPOSTAS

PRONOMES
Exercícios

Seguem alguns exercícios. Posteriormente, no capítulo de regência,

voltar-se-á ao assunto.

Questão 01

Preencha as lacunas com o pronome correto.

a) Eu fiz o relatório semanal ____________________ você pediu.

b) Esta é a estratégia digital ____________________ eu preciso.

c) A cidade X, ____________________ ruas estão mal asfaltadas, recebeu


o Governador de São Paulo.

d) O restaurante X, ____________________ trabalham os melhores chefs

de cozinha do Brasil, está contratando garçons.

e) Encontrei hoje um antigo professor ____________________ esposa

tornou-se presidente da minha empresa.

f) No trabalho, eu me reporto diretamente ao supervisor de

marketing, ____________________ me referi durante a reunião de hoje.

g) O estado ____________________ venho se chama Goiás.

h) Quaisquer detalhes ____________________ você se lembrar serão

fundamentais nesta ação.

i) Os aspectos processuais ____________________ ele fez alusão são

relevantes.

j) O caso ____________________ estou preocupada ainda não apareceu

na televisão.

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k) As companhias ____________________ eu ando são boas, não se

preocupe!

l) Estive solitária em toda a festa ____________________ você dormiu!

m) As histórias ____________________ eu costumo sorrir não são tão

engraçadas assim.

n) A partir do instante ____________________ cheguei, todos ficaram

em silêncio.

o) O apartamento ____________________ resido não pode ser

penhorado.

Questão 02

Complete as lacunas abaixo utilizando o pronome relativo CUJO.

Faça as devidas adequações.

a) Aquela é a vítima ___________________ ligações foram ilegalmente

interceptadas.

b) Este é o político ___________________ projeto foi aprovado.

c) Aquele é o professor ___________________ aula nem todos participam.

d) Esta é a comentarista política ___________________ capacidade

todos confiam.

e) Aquele é o jornalista ___________________ ideias não concordo.

f) São estes os participantes  ___________________ ideias sempre

lutamos.

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g) Morreu ontem o jurista ___________________ livros fiz alusão em

meu artigo.

h) Ele é um colaborador, ___________________ ajuda vamos, sem dúvida

alguma, precisar.

i) Este é um argumento  ___________________ força tenho muita

confiança.

j) O homem ___________________ olhos passa a verdade jamais

conseguirá dela desviar.

Questão 03

Preencha com onde, aonde, donde:

a) Todos os quartos ____________________ nos hospedamos da última

vez estão ocupados.

b) Os restaurantes ____________________ vamos com mais frequência

são o Bartolomeu e o Meze.

c) Há labirintos ____________________ é difícil sairmos ilesos.

d) O prédio ____________________ você está se dirigindo não é o correto.

e) A cidade ____________________ vim se chama Guapó.

f) A cidade ____________________ estamos nos dirigindo é famosa por

sediar crimes bárbaros.

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Questão 04

Corrija:

a) O resultado que eu não tenho controle sobre ele sairá amanhã.

b) Todas as pessoas que se espera algo delas em algum momento

decepcionam.

c) Felizes são os filhos que os pais deles os deixam alçar os próprios

voos.

d) Este é o ato que eu falei dele ontem.

e) Procuro não me preocupar com questões que eu não detenho

entendimento sobre.

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Respostas

Questão 01

a) que / o qual

b) de que / da qual

c) cujas

d) onde / no qual / em que

e) cuja

f) ao qual / a quem / a que

g) donde / do qual / de que

h) dos quais / de que

i) aos quais / a que

j) com que / com o qual

k) com as quais / com que

l) em que / durante a qual

m) das quais / de que

n) quando / em que / no qual

o) onde / em que / no qual

Questão 02

a) cujas

b) cujo

c) de cuja

d) em cuja

e) com cujas

f) por cujas / contra cujas / a favor de cujas

g) a cujos

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h) de cuja

i) em cuja

j) por cujos / diante de cujos / em frente a cujos

Questão 03

a) onde

b) aonde

c) donde / de onde

d) aonde

e) donde / de onde

f) aonde

Questão 04

a) O resultado sobre o qual não tenho controle sairá amanhã.

b) Todas as pessoas de quem/de que/das quais se espera algo em

algum momento decepcionam.

c) Felizes são os filhos cujos pais os deixam alçar os próprios voos.

d) Este é o ato sobre o qual eu falei ontem.

e) Procuro não me preocupar com questões sobre as quais eu não

detenho entendimento.

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AU L A 7

ADVÉRBIO
Advérbio
Fundamentalmente, o advérbio é um modificador do verbo, daí seu

nome: ad (junto a) + verbum.

Exemplo: Hoje, começa a primavera.

Na frase acima, a palavra “hoje” indica a circunstância temporal

referente ao verbo “começar”.

Expressões e locuções adverbiais


A locução adverbial é aquela construção fixa, cristalizada

gramaticalmente, que equivale a um advérbio. Já a expressão adverbial

é um conjunto de palavras que ocasionalmente exerce a referida função.


Observe:

Começou a gritar de repente. (locução adverbial de tempo)

Retornei do centro de Goiânia um pouco antes do almoço.

(expressões adverbiais de lugar e de tempo, respectivamente)

Analise:

Hoje em dia, as pessoas criam opiniões como animais de

estimação, sucedâneos do afeto humano. Quanto às minhas, trato-as a

pão e água, ginástica sueca e chibatadas, levando muitas delas à morte

por definhamento, a outras estrangulando no berço ou esmagando-as a


golpes de fatos que as desmentem: fico com as que sobrevivem.

(Olavo de Carvalho, O Jardim das Aflições)

De acordo com a NGB, os advérbios (bem como as locuções e

expressões adverbiais) classificam-se como:

○ de lugar: abaixo, acima, longe, perto, dentro (de longe, à direita,


por perto, entre a cruz e a espada)

○ de tempo: nunca, agora, entrementes, sempre, jamais, outrora,

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antigamente, enfim (à tarde, de manhã, em breve, certa vez, de

vez em quando, de tempos em tempos)

○ de modo: devagar, mal, suavemente, outrossim (de propósito, do

mesmo modo, em vão, pouco a pouco, com amor)

○ de negação: não, sequer, nem ([nem] sequer, em nenhuma

hipótese, de forma nenhuma)

○ de afirmação: sim, certamente, efetivamente (sem dúvida, de

fato, com certeza)

○ de dúvida: talvez, quiçá, porventura, por acaso (por acaso, por

ventura)

○ de intensidade: muito, assaz, bastante, tão, quão, menos, meio,

todo, pouco, quase, sobremaneira (em excesso)

Observação: A lista é apenas exemplificativa, não taxativa.

Veja na prática:

Mas, já que o demônio nos dá doutrina, quero-lhe eu dar um

quinau. Vem cá, demônio, outra vez. Tu sábio? Tu astuto? Tu tentador?

Vai-te daí, que não sabes tentar. Se tu querias que Cristo se ajoelhasse
diante de ti, e souberas negociar, tu o renderas. Vais-lhe oferecer a Cristo

mundos? Oh! que ignorância! Se quando lhe davas um mundo, lhe tiraras

uma alma, logo o tinhas de joelhos a teus pés. Assim aconteceu.

Apenas a título de curiosidade literária, leia o restante do parágrafo:

Quando Judas estava na Ceia, já o diabo estava em Judas: Cum

jam diabolus misisset in cor ut traderet eum Judas. - Vendo Cristo que o

demônio lhe levava aquela alma, põe-se de joelhos aos pés de Judas, para

lhos lavar, e para o converter. Tá, Senhor meu, reparai no que fazeis: não

vedes que o demônio está assentado no coração de Judas? Não vedes

que em Judas está revestido o demônio, e vós mesmo o dissestes: Unus

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ex vobis diabolus est? - Pois, será bem que Cristo esteja ajoelhado aos

pés do demônio? Cristo ajoelhado aos pés de Judas, assombro é, pasmo

é; mas Cristo ajoelhado, Cristo de joelhos diante do diabo? Sim. Quando

lhe oferecia o mundo, não o pôde conseguir; tanto que lhe quis levar uma

alma, logo o teve a seus pés. Para que acabemos de entender os homens

cegos, que vale mais a alma de cada um de nós que todo um mundo. As

coisas estimam-se e avaliam-se pelo que custam. Que lhe custou a Cristo

uma alma, e que lhe custou o mundo? O mundo custou-lhe uma palavra:

Ipse dixit, et facta sunt- uma alma custou-lhe a vida, e o sangue todo. Pois,

se o mundo custa uma só palavra de Deus, e a alma custa todo o sangue

de Deus, julgai se vale mais uma alma que todo o mundo. Assim o julga

Cristo, e assim o não pode deixar de confessar o mesmo demônio. E só

nós somos tão baixos estimadores de nossas almas, que lhas vendemos

pelo preço que vós sabeis.

(Padre Antônio Vieira, Sermão da primeira dominga da quaresma)

Apesar da restrita lista da NGB, sabe-se que os advérbios (assim como

as locuções e expressões adverbiais) podem ter muitas outras classificações

semânticas. Veja apenas alguns exemplos:

○ Causa:

O homem se assustou com todo o alvoroço.

De tanto caminhar, fizeram-se bolhas em meu pé.

○ Condição:

A testemunha só vai falar com permissão do advogado.

Ainda que eu falasse a língua dos homens

E falasse a língua dos anjos

Sem amor, eu nada seria.

(Legião Urbana, com base na Carta aos Coríntios)

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○ Meio

Viajamos de barco.

Por meio dos investimentos, os cientistas puderam concluir a

pesquisa.

Observação: Note a diferença: Após os investimentos, os cientistas

puderam concluir a pesquisa. (tempo, não meio)

○ Concessão

Apesar da chuva, chegamos a tempo.

Passei no concurso, não obstante todas as dificuldades.

○ Finalidade

Viajaremos a trabalho.

Para nosso desenvolvimento, tivemos que abrir mão de muita coisa.

○ Exclusão

Só responderemos a uma pergunta.

Afora os percalços aéreos, viajar me fez bem.

○ Matéria

Ergui com tijolos amarelos os muros.

Fabricamos com fibra natural estes tecidos.

○ Companhia

Fui ao cinema com meus filhos.

O Secretário fez a reunião sem seus assessores.

A lista é longa e merece um estudo detalhado, caso se queira

mergulhar na complexidade dos advérbios. Para que se tenha ideia, o

professor Fernando Pestana divide-os em advérbios de: afirmação, negação,

modo, tempo, lugar, dúvida, intensidade (esses previstos pela NGB),

causa, concessão, conformidade, finalidade, condição, meio, instrumento,

assunto, companhia, preço, quantidade, referência, ordem, medida, peso,

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matéria, proporção, reciprocidade, substituição, favor, exclusão, inclusão,

consequência/conclusão. E mesmo esse estudioso afirma haver outras

classificações, que dependem do contexto para que sejam feitas.

Note-se que a classificação semântica do advérbio depende do

contexto. Além disso, é bastante comum que a mesma palavra, dependendo

do contexto, mude de classe gramatical. Analise:

O coral canta mal. (advérbio de modo)

Após a cirurgia, Pedro mal consegue se levantar. (advérbio de “quase

negação”)

Mal chegou o coral, e todos se levantaram para aplaudir. (conjunção


temporal)

Estamos absolutamente perdidos nesta estrada. (advérbio de

intensidade)

Pensa em ter filhos? Absolutamente. Não imagino minha vida sem

filhos! (advérbio de afirmação)

Pensa em ter filhos? Absolutamente. Nem me imagino cuidando

de crianças. (advérbio de negação)

Estou só em casa, sem companhia nenhuma. (adjetivo, sinônimo de

“sozinho”)

Só responderei a uma pergunta. (advérbio de exclusão)

Falávamos sobre você, aí ele me contou que vocês dois já tiveram

um caso. (advérbio de tempo)

Eu jamais moraria aí. (advérbio de lugar)

Embora em essência seja um modificador do verbo, ele pode ainda

se ligar ao adjetivo ou a outro advérbio, exprimindo, na maioria das vezes,

intensidade (embora não apenas). Veja:

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Fiquei completamente imóvel. (intensidade)

A criança mostrou-se tão feliz! (intensidade)

Quão agradáveis foram aquelas férias! (intensidade)

Chegue mais tarde. (intensidade)

Comprei um tecido quimicamente tratado. (modo)

Não raramente, esqueço-me das coisas. (negação)

Evito maus hábitos moralmente viciantes. (modo)

“Meus diálogos são realmente pobres.

Só eu sei o trabalho que me dá empobrecê-los.” (afirmação ou

intensidade)

(Nelson Rodrigues)

O Anel de Vidro

Aquele pequenino anel que tu me deste,

— Ai de mim — era vidro e logo se quebrou

Assim também o eterno amor que prometeste,

— Eterno! era bem [=muito] pouco e cedo se acabou.

(Manuel Bandeira)

Ressalta-se que o advérbio é uma classe gramatical invariável. Assim,

diga:

Você é menos paciente do que parece. (não “menas”)

Minha esposa está todo preocupada com essa questão. (não “toda”)

Fiquei meio assustada com o crime que presenciei. (não “meia”)

Apenas a título de aprofundamento, vale dizer não serem poucos

os autores que apresentam o advérbio como uma classe que extrapola a

mera relação com verbos, adjetivos e advérbios. Inúmeros são os exemplos

comprobatórios disso:

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Pessoas assim são raras.

Eles chamaram muito poucas pessoas para a festa.

Quase dez partidos figuram nas eleições nacionais.

Muito embora a audiência tenha sido tranquila, o advogado se

exasperou.

Observações:

a) Havendo mais de um advérbio terminado em -mente, pode-se

deixar o sufixo apenas no último:

Riu alta, nervosa e compulsivamente.

Se vos querem comprar a casa, o canavial, o escravo, ou o cavalo,

não lhe pondes um preço muito levantado, e não o vendeis muito bem

vendido? Pois, se a vossa casa, e tudo o que nela tendes, o não quereis

dar, senão pelo que vale, a vossa alma, que vale mais que o mundo todo,

a vossa alma, que custou tanto como o sangue de Jesus Cristo, por que a

haveis de vender tão vil e tão baixamente?

(Padre Antônio Vieira, Sermão da primeira dominga da quaresma)

b) São advérbios de interrogação aqueles empregados em

interrogações diretas ou indiretas:

Onde estariam meus sapatos?

Não sei como faremos isso.

Quando nos veremos?

c) É muito comum que adjetivos funcionem como advérbios.

Eles falam baixo (em vez de “baixamente”);

Esta cerveja desce redondo (em vez de “redondamente”);

Lancei a bola errado (em vez de “erradamente”).

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Pensando em construções assim, Rui Barbosa (ninguém menos que

Rui Barbosa!) defendeu “independente” no lugar de “independentemente”

quando da redação do Projeto do Código Civil. Em 1903, dirigiu-se aos

senadores da Comissão do Código Civil, fazendo inúmeras ponderações,

muitas de ordem gramatical. Em resposta ao gramático Ernesto Ribeiro,

que lhe aconselhou abolir “independente” como advérbio, disse Rui:

“[...] é muito da nossa língua evitar os largos advérbios em -mente,

substituindo-os pelos adjetivos adverbialmente empregados.”

Para exemplificar, citou trechos de “Obras”, de Filinto Elysio: ‘Fácil se

vê’; ‘Comeu fino, bebeu largo’. ‘Direito se encaminha’. ‘Brando o atalha’. ‘Sem

pranto um avarento raro acaba’. ‘Folgado dançariam nelas quatrocentas


pessoas’.

Citou, ainda, ‘Nova Floresta’, de Pe. Bernardes: ‘Procedia mais discreto,

portando-se impertinente, pouco nacional procede, quis portar-se fiel’.

Como se nota, portanto, além de não ser uma novidade linguística,

adjetivos que funcionam como advérbios deixam o texto mais enxuto.

Apesar disso, parece não haver, no registro culto escrito, muita adesão

dessa prática. Mesmo várias leis e códigos brasileiros, quando deixaram

passar um pobre “independente”, acabaram procedendo à correção em


suas atualizações posteriores.

d) É comum que, na linguagem coloquial, reforce-se o sentido dos


advérbios por meio de sua repetição ou da colocação de algum afixo.

Ainda com o fito de reforçar coloquialmente, é comum haver construções

inventivas:

Chego aí já, já.

Logo, logo, começaremos o trabalho.

Acordei cedaço. Acordei supercedo.

Fulano fala pelos cotovelos.

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Ah, eu era rapaz, eu era rapaz naquele tempo! E às vezes me

julgava importante porque no jornal que levava para casa, além de

reportagens ou notas que eu escrevera sem assinar, ia uma crônica ou

artigo com o meu nome. O jornal e o pão estariam bem cedinho na porta de

cada lar; e dentro do meu coração eu recebi a lição de humildade daquele

homem entre todos útil e entre todos alegre; “não é ninguém, é o padeiro!”

E assobiava pelas escadas. (Rubem Braga, O Padeiro)

e) Antes de particípio, empregam-se “mais bem” e “mais mal”, não

“melhor” ou “pior”, de acordo com a gramática normativa clássica:

Meu relato foi mais bem escrito que o seu. (não “melhor escrito”)

Por ser o mais mal regado, aquele jardim não floresceu. (não “pior

cuidado”)

f) Necessário tomar cuidado com a perda de acento ocorrente

quando se transforma um adjetivo acentuado num advérbio terminado em

-mente: economicamente, criticamente, nitidamente etc.

g) O Volp não registra o advérbio de ordem “segundamente”. O

dicionário Aulete o faz:

h) O chamado grau superlativo intensivo, o qual expressa os limites

das possibilidades, tem estrutura fixa. Assim:

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Chegamos o mais cedo possível para a festa.

Fomos o mais diligentes possível.

Vestiu a blusa o menos quente possível.

A ordem pode-se inverter: Fomos diligentes o mais possível.

Palavras denotativas
De acordo com a professora Amini Hauy, palavras e locuções

denotativas “são as palavras e expressões de situação que, paralelamente à

informação, acrescentam ao discurso a participação crítica ou emocional do

falante. Caracterizam-se por não terem, assim como a interjeição, nenhuma

função sintática, ao contrário das demais classes de palavras”.

De acordo com a NGB, as palavras denotativas classificam-se como

de: inclusão, exclusão, designação, realce, retificação, situação. Veja:

Traga dois pães, aliás, três! (retificação)

Só as criaturas que nunca escreveram (exclusão)

Cartas de amor

É que são (realce)


Ridículas.

(Fernando Pessoa como Álvaro de Campos)

Eis o mistério da fé.

Eis-me aqui perante todos vocês. (designação)

O dinheiro compra tudo. Até amor verdadeiro. (inclusão)

(Nelson Rodrigues)

Sobre o assunto, pontua Celso Cunha: “Como vemos, tais palavras

não devem ser incluídas entre os advérbios. Não modificam o verbo,

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nem o adjetivo nem outro advérbio. São por vezes de classificação

extremamente difícil.”

Existe muita divergência entre os próprios gramáticos a respeito de

como encaixar as palavras denotativas.

Valor discursivo
É fundamental notarmos que os advérbios e palavras denotativas

frequentemente exprimem envolvimento afetivo do emissor com a

mensagem:

Lamentavelmente, teremos de nos mudar desta casa.

Grandes são os desertos e tudo é deserto, 

Salvo erro, naturalmente. 

Pobre da alma humana com oásis só no deserto ao lado!

(Fernando Pessoa como Álvaro de Campos)

Já me vejo na estação até aqui simples metáfora.

Sou uma pessoa perfeitamente apresentável.

Vê-se — dizem — que tenho vivido no estrangeiro.

Os meus modos são de homem educado, evidentemente.

Pego na mala, rejeitando o moço, como a um vício vil.

(Fernando Pessoa como Álvaro de Campos)

Madrugada

Do fundo de meu quarto, do fundo

de meu corpo

clandestino

ouço (não vejo) ouço

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crescer no osso e no músculo da noite

a noite

a noite ocidental obscenamente acesa

sobre meu país dividido em classes

(Ferreira Gullar)

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AU L A 6

VERBO
Verbo
A palavra “verbo” advém do latim “verbu(m)” e significava

originalmente “palavra”. Dela, advêm cognatos como “verborragia”,

“averbar”, “verboso”, “verbete”, “verve” etc.

Partindo-se desse sentido amplo é que se compreende o começo

do evangelho de São João:

No princípio era o Verbo, e o Verbo estava com Deus, e o Verbo

era Deus. Ele estava no princípio com Deus. Todas as coisas foram feitas

por ele, e sem ele nada do que foi feito se fez. Nele estava a vida, e a vida

era a luz dos homens. (João, 1:1-5)

Deus, portanto, era o próprio Verbo, a palavra, a linguagem, a razão.

Em grego: o logos.

Apenas com o passar do tempo, seu conceito passou a ser mais

restrito. Verbo, linguisticamente, é a classe gramatical que designa ação

ou processo, estado, mudança de estado ou fenômeno da natureza. Ele

trabalha essencialmente dentro de uma perspectiva temporal e pode ser

conjugado. Veja:

Choveu ontem pela manhã. (fenômeno da natureza, passado)

A sua intelectualidade, tal como seu corpo, desabrochara

(processo, passado) inesperadamente, atingindo de súbito, em pleno

desenvolvimento, uma lucidez que a deliciava e surpreendia (ação,

passado). Não a comovera tanto a revolução física. Como que naquele

instante o mundo inteiro se despia à sua vista, de improviso esclarecida,

patenteando-lhe todos os segredos de suas paixões. [...] Sorriu. E no seu

sorriso já havia garras.

(Aluísio Azevedo, O Cortiço)

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Vou-me embora pra Pasárgada (ação, presente)

Lá sou amigo do rei (estado, presente)

Lá tenho a mulher que eu quero (presente; posse e volição)

Na cama que escolherei (ação, futuro)

(Manuel Bandeira, Vou-me embora para Pasárgada)

A definição tradicional, no entanto, deixa escapar outras funções

semânticas do verbo, como existência, conveniência, necessidade,

passividade etc. Veja:

Quero ganhar a aposta. (desejo/volição)

Preciso ganhar a aposta. (necessidade)

Ele sofreu um derrame. (passividade)

Convém que eles cheguem a tempo. (conveniência)

As casas espiam os homens

que correm atrás de mulheres.

A tarde talvez fosse azul,

não houvesse tantos desejos. (existência)

(Carlos Drummond, Poema de Sete Faces)

O verbo, quando no infinitivo, termina em -ar (dizemos que é de

primeira conjugação), -er (dizemos que é de segunda conjugação) e -ir


(dizemos que é de terceira conjugação): cantar, beber e partir ilustram

esses finais. O infinitivo é a única forma verbal que não apresenta nenhuma

noção temporal.

Obs.: Há ainda verbos terminados em -or, todos derivados do verbo

“pôr”. “Pôr” é, por sua vez, de segunda conjugação, advindo do latim

“poner(e)”.

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Verbo é uma classe gramatical que flexiona bastante, ou seja, varia

muito sua estrutura. Estudemos inicialmente as flexões de modo, tempo,

número e pessoa.

Flexão de modo
O modo é a maneira pela qual o verbo indica a atitude da pessoa

que fala quanto ao fato que enuncia.

São três os modos: indicativo, subjuntivo e imperativo.

O modo indicativo é a expressão categórica, definida, real do juízo,

seja este negativo, afirmativo ou interrogativo. Ele está ligado à constatação

da realidade de um fato. Exemplo:

(O Globo)

Veja como “aponta” e “é” são verbos que indicam um fato

devidamente constatado.

Mesmo que se perguntasse algo como “O documento do Coaf

aponta transferências do dono da Precisa para o ex-diretor da Petros?”, o

indivíduo que pergunta estaria atrás de obter resposta quanto a um fato

categórico e definido.

O modo imperativo, por sua vez, expressa, como o próprio nome

diz, império (mando, comando). Pode, ainda, indicar exortação, pedido ou

súplica. Exemplo:

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Prêmio Faz Diferença: Conheça os indicados em 14 categorias e

vote aqui. (Jornal O Globo)

[...] Toma um fósforo. Acende teu cigarro!

O beijo, amigo, é a véspera do escarro,

A mão que afaga é a mesma que apedreja.

Se alguém causa inda pena a tua chaga,

Apedreja essa mão vil que te afaga,

Escarra nessa boca que te beija!

(Augusto dos Anjos, Versos Íntimos)

Semanticamente, pode ocorrer de o verbo não aparecer no modo


imperativo, mas, ainda assim, exprimir seu valor. São formas supletivas do

imperativo. Veja:

6º mandamento: Não matarás. (verbo no futuro do presente

indicando ordem)

Passar bem! (Verbo no infinitivo indicando desejo.)

Todo mundo caminhando! Caminhando! (Verbo no gerúndio

indicando ordem.)

Amar a Deus sobre todas as coisas. (Verbo no infinitivo exprimindo

uma prescrição de cunho religioso.)

O modo subjuntivo indica que o verbo não tem sentido caso não

venha subordinado a outro verbo, do qual será dependente para perfeita

compreensão. Ou seja, “subjuntivo” tem esse nome porque expressa o

modo de um verbo que se subjuga a outro.

Em termos de sentido, expressa possibilidade, dúvida,

indeterminação. Veja a diferença:

Sei que ele faz terapia. (“Faz” expressa uma constatação da realidade.

Trata-se de modo indicativo.)

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Espero que ele faça terapia. (“Faça” reforça um desejo de algo que

pode vir a se concretizar ou não. Daí ser o modo subjuntivo também

conhecido como modo da possibilidade.)

Em orações adjetivas e substantivas (as quais estudaremos com

profundidade mais à frente, mas que já podem ser intuídas desde já), o

subjuntivo muda o sentido das estruturas:

Entendo que a conduta é caso de expulsão. (Percepção certa, o fato

propende para a realização.)

Entendo que a conduta seja caso de expulsão. (Percepção duvidosa,

expressa suposição.)

Não conheço quem costura este tipo de roupa. (Fato certo: há pessoas

que costuram, mas eu não as conheço.)

Não conheço quem costure este tipo de roupa. (Fato duvidoso: talvez

nem existam pessoas que costurem o tipo de roupa em questão.)

Bendito seja o mesmo sol de outras terras que faz meus irmãos

todos homens. (Fernando Pessoa) (Fato certo: o sol de outras terras

indubitavelmente faz os irmãos todos homens.)

Art. 30 [...] § 1º Aquele que tiver direito à posse provisória, mas não

puder prestar a garantia exigida neste artigo, será excluído, mantendo-se

os bens que lhe deviam caber sob a administração do curador, ou de

outro herdeiro designado pelo juiz, e que preste essa garantia. (Código

Civil) (Fato possível: indica condição para que algo ocorra.)

Observação: “Andam por aí a construir ‘Você quer que eu faço’,

‘Você quer que eu vou?’ – o que jamais devemos tolerar, a menos que

desejemos conspurcar o nosso idioma de uma vez para sempre. É de rigor

em português o emprego do subjuntivo nas orações que se subordinam a

verbos que indicam desejo, vontade (verba voluntatis): ele aconselha que

eu vá (aconselhava que eu fosse), ele admite que eu vá (admitiu que eu

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tivesse ido), ele concede que eu vá (teria concedido que eu tivesse ido),

consinto que padeçam (consenti que padecessem), convenho que ele seja

bom (convim que ele fosse bom), ele deixa que eu venda (deixava que eu

vendesse), ele deseja que eu fique (desejaria que eu ficasse) [...]”. (Napoleão

Mendes de Almeida)

Há ainda outros casos de emprego do modo subjuntivo, sobre

os quais se falará mais à frente, quando forem estudadas orações

subordinadas.

Flexão de tempo
É a flexão que visa a indicar o tempo, a época em que se realiza

o fato expresso pelo verbo em relação ao momento da fala. Ela reflete a

capacidade do ser humano de criar uma linha do discurso, situando o

verbo no tempo.

São três os tempos verbais naturais: passado, presente e futuro.

Quando se flexiona um verbo no tempo, é impossível não lhe notar também

o modo verbal. É por isso que sempre se diz, por exemplo, “presente do

subjuntivo”, “futuro do indicativo”, “pretérito imperfeito do subjuntivo” etc.,

ou seja, há sempre a percepção de um tempo atrelada à percepção de um

modo.

A tabela abaixo conjuga o verbo “estudar” na primeira pessoa do

singular (eu), em tempos e modos diferentes. Compare:

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Mais à frente, falaremos sobre a formação dos tempos verbais.

Flexão de número
É a variação que ocorrer para expressar singular ou plural. O verbo

está no singular quando se refere a uma só pessoa ou coisa e, no plural,

quando a mais de uma pessoa ou coisa.

Singular: estudo, estudas, estuda

Plural: estudamos, estudais, estudam

Flexão de pessoa
É a variação que ocorre em função das pessoas gramaticais do

sujeito:

Eu amo, tu amas, ele ama, nós amamos, vós amais, eles amam

Como se pode notar, as flexões de número e pessoa caminham

juntas. Ao dizer “amas”, sabe-se, pela letra -s, que o verbo está na 2ª pessoa

do singular.

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As desinências número-pessoais e modo-temporais registram as

flexões do verbo, embora elas nem sempre estejam presentes. A título de

curiosidade, analise a estrutura de alguns verbos:

Era como se, na alma da cidade,

Profundamente lúbrica e revolta,

Mostrando as carnes, uma besta solta

Soltasse o berro da animalidade.

(Augusto dos Anjos, As cismas do destino)

Em soltasse, solt é radical, a é vogal temática (o verbo “soltar” é de 1ª

conjugação), sse é desinência modo-temporal (indica que o verbo está no

pretérito imperfeito [tempo] do subjuntivo [modo]).

Comeremos do mesmo pão?

Em comeremos, com é radical, e é vogal temática (o verbo “comer”

é de segunda conjugação), re é desinência modo-temporal (indica que

o verbo está no futuro do modo indicativo) e mos é desinência número-

pessoal (indica que o verbo se refere à primeira pessoa do plural).

As desinências nem sempre estão presentes. Veja:

Eu te amo porque te amo,

Não precisas ser amante,

e nem sempre sabes sê-lo.

(Carlos Drummond de Andrade, As sem-razões do amor)

Em “amo”, o am é o radical, o o é desinência número-pessoal (indica

que se trata da primeira pessoa do singular: eu). Note que não aparecem a

vogal temática nem a desinência modo-temporal.

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Formas nominais
Chamam-se formas nominais o infinitivo, o gerúndio e o particípio.

São assim chamadas porque se comportam como nomes em certos

contextos, quando desempenham funções próprias do substantivo, do

adjetivo ou do advérbio.

O infinitivo (terminações -ar, - er, -ir, -or) expressa o conteúdo do

verbo em sua potência; muitas vezes, seu conteúdo aproxima-se do de um

substantivo. É nessa forma “crua”, de indeterminação e generalidade, que

os verbos aparecem nos dicionários.

Um barco parece ser um objecto cujo fim é navegar; mas o seu fim

não é navegar, senão chegar a um porto. Nós encontrámo-nos navegando,


sem a ideia do porto a que nos deveríamos acolher. Reproduzimos assim,

na espécie dolorosa, a fórmula aventureira dos argonautas: navegar é

preciso, viver não é preciso. (Fernando Pessoa)

O gerúndio (terminação -ndo) expressa o processo verbal em curso.

Ele exerce seu valor de verbo em locuções verbais e nas orações reduzidas.

Além disso, pode desempenhar tanto função de adjetivo como de advérbio.

Serviu-me água fervendo.

[...]

É uma grande pena que não se possa

estar ao mesmo tempo nos dois lugares!

[...]

Ou isto ou aquilo: ou isto ou aquilo…

e vivo escolhendo o dia inteiro!

[...]

Mas não consegui entender ainda

qual é melhor: se é isto ou aquilo.

(Cecília Meireles)

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– Fabiano, você é um homem, exclamou em voz alta. [...]

Olhou em torno, com receio de que, fora os meninos, alguém

tivesse percebido a frase imprudente. Corrigiu-a, murmurando:

– Você é um bicho, Fabiano.

(Vidas Secas, Graciliano Ramos)

O meu olhar é nítido como um girassol.

Tenho o costume de andar pelas estradas

Olhando para a direita e para a esquerda,

E de vez em quando olhando para trás...

E o que vejo a cada momento

É aquilo que nunca antes eu tinha visto,

E eu sei dar por isso muito bem...

(“O Guardador de Rebanhos”. In Poemas de Alberto Caeiro.

Fernando Pessoa)

Como se explica que o meu maior medo seja exatamente o de

ir vivendo o que for sendo? como é que se explica que eu não tolere ver,

só porque a vida não é o que eu pensava e sim outra – como se antes eu

tivesse sabido o que era! Por que é que ver é uma tal desorganização?

(Clarice Lispector, A Paixão Segundo G.H.)

Litania

Nunca nos realizamos.

Somos dois abismos – um poço fitando o céu. (Fernando Pessoa)

O particípio (terminação em -do, normalmente), por sua vez,

apresenta o resultado do processo verbal quando indica ação praticada

por alguém. Porém, funciona como adjetivo, quando caracterizador de

substantivo, e, por vezes, como o próprio substantivo.

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O bem que não chegou a ser possuído,

Perdido causa tanto sentimento,

Que, faltando-lhe a causa do tormento,

Faz ser maior tormento o padecido.

Sentir o bem logrado, e já perdido,

Mágoa será do próprio entendimento;

Porém, o bem que perde um pensamento

Não deixa a outro bem restituído.

[...]

(Gregório de Matos, Obra Poética. Defende-se o bem que se

perdeu.)

Amar o perdido

deixa confundido

este coração.

(Memória, Carlos Drummond)

Sei ter o pasmo essencial

Que tem uma criança se, ao nascer,

Reparasse que nascera deveras...

Sinto-me nascido a cada momento

Para a eterna novidade do Mundo...

(“O Guardador de Rebanhos”. In Poemas de Alberto Caeiro.

Fernando Pessoa)

São onze horas da manhã no Brasil. É agora. Trata-se

exatamente de agora. Agora é o tempo inchado até os limites. Onze

horas não têm profundidade. Onze horas está cheio das onze horas até

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as bordas do copo verde. O tempo freme como um balão parado. O ar

fertilizado e arfante. (Clarice Lispector, A Paixão Segundo G.H.)

Ave Maria, cheia de graça,

o Senhor é convosco,

bendita sois vós entre as mulheres

e bendito é o fruto do vosso ventre, Jesus.

(Ave Maria, oração cristã)

Só que não nos falávamos mais. Ela era mais digna do que eu

havia pensado: conseguido o dinheiro, nada mais quis me contar. E nem


eu pude mais fazer festas ao menino vestido de menina. Pois qualquer

agrado seria agora de meu direito: eu o havia pago de antemão.

(Clarice Lispector, As caridades odiosas)

E eu te farei as vontades

Direi meias verdades sempre à meia luz

E te farei, vaidoso, supor

Que és o maior e que me possuis

Mas na manhã seguinte

Não conta até vinte, te afasta de mim

Pois já não vales nada, és página virada

Descartada do meu folhetim

(Folhetim, Chico Buarque)

Achei que ele já tivesse comprado o jantar.

Feito o jantar, teremos apenas de arrumar a mesa. (= Quando o

jantar for feito)

O edifício foi construído pela empresa de meu avô.

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E-BOOK BP GRAMÁTICA NORMATIVA DA LÍNGUA PORTUGUESA
Inúmeras são as considerações pertinentes às formas nominais do

verbo, as quais este material não pretende esgotar. Eis um assunto que

merece incursão destemida nas folhas de gramáticas normativas.

De toda forma, seguem observações importantes e úteis a respeito

delas:

1) É necessário tomar cuidado com o gerundismo

O gerúndio, como visto, expressa, por via de regra, continuidade no

tempo. Comumente, no entanto, usa-se essa forma nominal, ao lado do

verbo “ir” e do verbo “estar”, em construções que exprimem atos pontuais,

incompatíveis com a noção continuativa de gerúndio. Por exemplo:

Pela manhã, eu vou estar ligando para o médico e marcando

minha consulta.

Você pode estar me passando seus dados, por favor?

Note-se que as ações de ligar, passar e marcar são pontuais, não se

desdobram no tempo, de maneira que sua melhor escrita seria:

Pela manhã, ligarei para o médico e marcarei minha consulta.

Você pode me passar seus dados, por favor?

A provável razão do gerundismo na língua portuguesa é a má

correspondência com o inglês. Uma frase como “I´ll be sending the

curriculum soon” costuma ser traduzida literalmente na forma: “Vou estar

mandando o currículo brevemente”, quando deveria ser “Vou mandar (ou

mandarei) o currículo brevemente”.

2) Mesmo que bem empregado, o excesso de gerúndio deixa o

texto pesado e arrastado. Por exemplo:

O homem desacelerou seu passo, caminhando lentamente,

percebendo o barulho que o cercava, fazendo a criança que estava a seu

lado assustar-se, chorando muito, claramente a fim de ser carregada no

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colo pelo homem, esperando proteção.

Agora compare:

O homem desacelerou seu passo, caminhando lentamente ao

perceber o barulho que o cercava. Isso fez a criança que estava a seu lado

assustar-se e chorar muito. Claramente, ela esperava ser carregada no colo

pelo homem para se sentir protegida.

Note como a reestruturação das frases faz com que fiquem mais

leves e menos cansativas.

3) Não se confunde o infinitivo com o futuro do subjuntivo. O

futuro do subjuntivo é um tempo verbal; o infinitivo, uma forma nominal. É

bem verdade que com frequência coincidem formalmente, mas, como já

se disse, o emprego de um verbo irregular esclarece a dúvida. Analise:

Quando ele chegar, estarei pronta.

Seria “chegar” infinitivo ou flexão no futuro do subjuntivo? Para tirar

a prova, basta usar um verbo irregular no lugar:

Quando ele vier aqui/propuser o acordo/vir o filme/fizer o dever etc.

Nota-se, portanto, que os verbos irregulares usados claramente não

têm coincidência no infinitivo, de maneira que, pode-se concluir, trata-se de

verbos flexionados no futuro do subjuntivo, assim como o verbo “chegar”.

Agora veja:

Chegar atrasado não é algo que eu goste de fazer.

Substituindo por verbos irregulares, perceba como eles de fato estão

no infinitivo:

Vir ao teatro não é algo que eu goste de fazer/Propor um acordo não

é algo que eu goste de fazer/Ver um filme não é algo que eu goste de fazer.

4) O infinitivo pode ser pessoal ou impessoal. Será impessoal

quando estiver em seu máximo de generalização, não se referindo a um

sujeito especialmente. Será pessoal quando estiver ligado a um sujeito.

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E-BOOK BP GRAMÁTICA NORMATIVA DA LÍNGUA PORTUGUESA
Analise:

Não chores, meu filho;

Não chores, que a vida

É luta renhida:

Viver é lutar.

A vida é combate,

Que os fracos abate,

Que os fortes, os bravos

Só pode exaltar.

(Gonçalves Dias, Canção do Tamoio)

No excerto acima, por exemplo, “viver” e “lutar” são infinitivos

impessoais, uma vez que se referem ao ato em si, sem atribuí-lo a alguém

especial. Já “exaltar”, por sua vez, faz parte da locução verbal “pode exaltar”.

Em casos assim, apenas o verbo auxiliar (“pode”, no caso) se flexiona

quando necessário. O infinitivo permanece não flexionado. Exemplo: Os

presentes podem fazer o teste em dupla.

O fato de um milhão de pessoas participarem dos mesmos

vícios não os transforma em virtudes. (Gustavo Corção)

Na passagem de Corção, o infinitivo “participarem” refere-se a

“pessoas”. O infinitivo se flexiona normalmente se houver sujeito que assim

exija. Veja as desinências número-pessoais em destaque.

Comprei o chá para eu beber.

Comprei o chá para tu beberes.

Comprei o chá para ele beber.

Comprei o chá para nós bebermos.

Comprei o chá para vós beberdes.

Comprei o chá para eles beberem.

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E-BOOK BP GRAMÁTICA NORMATIVA DA LÍNGUA PORTUGUESA
5) Muito comuns são as dúvidas envolvendo infinitivo flexionado

ou não. Por exemplo: Eles se esforçaram para entender a matéria ou para

entenderem a matéria?

A questão não é simples. As gramáticas comumente divergem entre

si ou dão dupla possibilidade de uso, a depender do contexto.

A propósito do assunto, Napoleão Mendes de Almeida, sempre crítico

severo dos problemas linguísticos injustificados, assevera:

Por que dizer “A tendência dos modernos estudiosos da língua é

reconhecer que não há regras fixas e definidas a propósito do assunto?”

Ora, sejamos mais sinceros e digamos: A conjugação do infinitivo é a

maior prova de putrefação do nosso idioma ou, para maior suavidade,

é consequência de confusão com o futuro do subjuntivo ou, ainda mais

delicadamente, é resultante necessária da falta de escolas. Se em

nenhum idioma provindo do latim o infinitivo é conjugado, como dizer

que precisamos conjugar o infinitivo no nosso?

Fazendo-se o cotejo de várias gramáticas normativas, é razoável

depreender o que se segue.

Flexiona-se o infinitivo:

1) Quando o sujeito estiver claramente expresso:

Estranho é nós não fazermos barulho quando nosso time vence.

Até tu fazeres trinta anos, moraremos aqui.

2) Quando o sujeito não está expresso, mas se quer dar a

conhecê-lo pela desinência.

É hora de começarmos os trabalhos.

Necessário se faz introduzires o assunto logo.

Caso se escrevesse “começar” e “introduzir”, não se saberia se essas

ações seriam referentes a alguém especificamente. Ao pessoalizar o

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infinitivo por meio das desinências, sabemos a quem ele se refere.

3) Quando a frase tem verbos com sujeitos diferentes:

Falei sobre o desejo de almoçarmos fora.

Repare como o sujeito de “falar” é “eu”, mas o de “almoçarmos” é

“nós”.

Se o sujeito for o mesmo, a flexão do infinitivo é desnecessária,

embora seja possível. Abaixo, “nós” é sujeito tanto de “falamos” (nós falamos)

como de “almoçar” (nós almoçarmos):

Falamos sobre o desejo de almoçar/almoçarmos fora.

Não se flexiona o infinitivo:

1) Nas locuções verbais:

Vamos passar o dia aqui.

Os moços começaram a dançar.

2) Quando o sujeito do infinitivo é um pronome oblíquo átono ou

um substantivo e há verbos sensitivos (ver, ouvir, sentir e semelhantes) ou

causativos (mandar, deixar, fazer e semelhantes). São as famosas orações

infinitivo-latinas:

Não nos deixeis cair em tentação. (Pai Nosso, oração cristã)

Então disse Jesus: “Deixem vir a mim as crianças e não as

impeçam; pois o Reino dos céus pertence aos que são semelhantes a

elas”. (Matheus, 19:14)

Observação: Quando o substantivo sujeito do infinitivo é plural,

admite-se a flexão em prol da clareza (embora a contragosto do professor

Napoleão):

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Vi os navios que partiam desaparecer/desaparecerem no

horizonte.

Senti suas mãos roçar/roçarem as minhas.

Vi teus vestidos brilharem [brilhar]

sem qualquer clarão do dia. (Cecília Meireles)

Como se pode perceber, trata-se de questão melindrosa, que

comporta certa liberdade em prol da clareza textual. Casos nada raros

como “Os leitores têm possibilidade de consultar/consultarem o dicionário”

podem causar dúvida, e a melhor diretriz para saná-los deve ser a clareza.

Não sendo a flexão do infinitivo útil à clareza, melhor deixá-lo não flexionado

(Os leitores têm possibilidade de consultar o dicionário).

A respeito do assunto, assevera Celso Cunha, citando Said Ali: “Como

vemos, ‘a escolha da forma infinitiva depende de cogitarmos somente da

ação ou do intuito ou necessidade de pormos em evidência o agente da

ação’ (Said Ali). No primeiro caso, preferimos o infinitivo não flexionado;

no segundo, o flexionado. Trata-se, pois, de um emprego seletivo, mais do

terreno da estilística do que, propriamente, da gramática”.

Lúcida é a conclusão do mestre Napoleão Mendes, que resume

praticamente tudo o que se estudou:

Não flexionemos o infinitivo quando nenhuma necessidade virmos

de o conjugar: “Prepararam-se para MORRER”, “Precisávamos cavar o

chão para OBTER água”, “Cometemos tais atrocidades para AGRADAR

aos chefes”, “Obrigando-os por via de tormento a RESTITUIR” aquilo que

tinham ocupado”, “Convidam os homens a PERSEVERAR”, “Não temos

tempo nem papel para TRATAR do assunto”, “A linguagem é o meio de

que dispomos para, através das palavras, EXPRIMIR o nosso pensamento”.

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E-BOOK BP GRAMÁTICA NORMATIVA DA LÍNGUA PORTUGUESA
Locução verbal
Locução ou perífrase verbal é, nas palavras do professor Fernando

Pestana, “um grupo de verbos que geralmente tem uma só unidade de

sentido, como se fosse um só verbo. Ela é formada por verbo(s) auxiliar(es) +

verbo principal (o principal é sempre o último da locução, aparecendo nas

formas de infinitivo, gerúndio ou particípio)”. É o principal que carrega o

significado fundamental da locução. Veja:

Vou ir à sua casa hoje.

Sorria! Você está sendo filmado.

A dívida deve começar a ser paga antes que sejas preso.

O professor ficou rodeado de alunos.

Se o paciente não tivesse se atrasado, eu teria chegado a tempo.

Pedro disse que tinha tido um sonho estranho.

Continue a estudar. Continue estudando.

Acabei de deixar o copo sobre a mesa.

Há de haver quem resolva isto.

“Lamento não ter podido dar aos humildes tudo o que eu

desejava.” (Getúlio Vargas)

Observação: Como se pode perceber pelas frases “Acabei de deixar

[...]” e “Continue a estudar”, o verbo auxiliar às vezes se liga ao principal por

meio de uma preposição.

Inúmeras são as considerações pertinentes à formação da locução

verbal; nem sempre é fácil identificar se o que há é uma locução verbal

ou são verbos “autônomos” colocados lado a lado. É interessante notar

como o verbo auxiliar (ou os verbos auxiliares) pode ter funções diversas:

auxiliares de aspecto (acurativos), auxiliares de modo (modais) etc. A

respeito do assunto, leia o material complementar, que traz as minuciosas

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E-BOOK BP GRAMÁTICA NORMATIVA DA LÍNGUA PORTUGUESA
considerações do professor Fernando Pestana sobre o assunto.

Vozes verbais
A voz verbal é a forma em que o verbo (ou locução verbal) de ação se

mostra ao indicar se o sujeito pratica e/ou sofre a ação verbal. Para que se

fale em voz verbal, portanto, é preciso que 1) estejamos diante de um verbo

de ação; 2) o verbo em questão tenha sujeito.

Voz ativa
Ocorre quando a forma do verbo ou da locução verbal indica uma

ação praticada pelo sujeito. Fala-se, então, em sujeito agente:

Iracema recosta-se langue ao punho da rede; seus olhos negros e

fúlgidos, ternos olhos de sabiá, buscam o estrangeiro e lhe entram n’alma.

O cristão sorri; a virgem palpita; como o saí, fascinado pela serpente,

vai declinando o lascivo talhe, que se debruça enfim sobre o peito do

guerreiro. Já o estrangeiro a preme ao seio; e o lábio ávido busca o lábio

que o espera, para celebrar nesse ádito d’alma o himeneu do amor. (José

de Alencar, Iracema)

Fulano resolveu tomar uma atitude.

Tive de sair da sala correndo.

A comunidade já havia/tinha programado a festa, quando a chuva

caiu.

Observação: Embora haja divergência, para a maior parte dos

gramáticos, não há voz ativa quando o conteúdo semântico do verbo indica

passividade, como em: levou um soco, sofreu um acidente, recebeu uma

proposta etc. Evanildo Bechara, no entanto, diz que esse argumento faz

confundir voz passiva com verbo de sentido passivo (passividade).

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Pondera a professora Amini Hauy: “Não têm flexão de voz, portanto,

os verbos impessoais e os de ligação; aqueles [impessoais] porque não têm

sujeito, e estes [de ligação], porque não indicam ação (indicam estado).

Também não indicam ação, por exemplo, sofrer, merecer, receber, ganhar”.

Assim, por exemplo, uma construção como a seguinte, presente na

primeira frase, não está na voz ativa:

– Estrangeiro, Iracema não pode ser tua serva. É ela quem

guarda o segredo da jurema e o mistério do sonho. Sua mão fabrica para

o Pajé a bebida de Tupã. (José de Alencar, Iracema)

Nas duas outras frases, “guarda” e “fabrica” estão na voz ativa, pois

expressam uma ação.

Voz passiva
Ocorre quando a forma do verbo ou da locução verbal indica que o

sujeito sofre a ação verbal. Fala-se, então, em sujeito paciente.

Ela pode se construir de duas maneiras:

1) Voz passiva analítica: ocorre com o verbo auxiliar de passiva (ser

- passiva de ação, estar -passiva de estado, ficar – passiva de mudança de

estado) + particípio. O agente da passiva pode estar presente ou não.

Eu estou profundamente tocada.

Eu estou profundamente tocada por esta música.

Eu sempre fico profundamente tocada por esta música.

Estava a Terra em montes, revestida

De verdes ervas e árvores floridas,

Dando pasto diverso e dando vida

Às alimárias nela produzidas.

A clara forma ali estava esculpida

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Das Águas, entre a terra desparzidas,

De pescados criando vários modos,

Com seu humor mantendo os corpos todos.

(Os Lusíadas, Luís de Camões, Canto Sexto)

Pensei que a casa havia sido invadida pelos ladrões.

Observações:

- Repare a diferença das duas estruturas abaixo.

A sala é apertada.

A mão da mãe é apertada com força pelo filho.

No primeiro caso, “apertada” é apenas um adjetivo que expressa

uma qualidade da sala. No segundo, “apertada” faz parte de uma locução

verbal (é apertada) que indica voz passiva, uma vez que a mão da mãe está

sofrendo a ação de ser apertada.

- Analise a passagem abaixo, percebendo como, embora

aparentemente semelhantes, as locuções verbais destacadas estão em

vozes diferentes.

Mais tarde um pouco, cerca de um ano depois, o padre viria sem

ser pelo órgão e, mais tarde ainda, eu poderia desmontar o instrumento

porque dois ou três anos de trabalhos árduos tinham encontrado razão de


ser em um só minuto, tinham sido superambundantemente resgatados

com um pedaço de pão.

(Gustavo Corção, A descoberta do outro)

2) Voz passiva sintética: verbo transitivo direto ou direto e indireto

na 3ª pessoa do singular ou do plural seguido do pronome “se” apassivador.

Intimaram-se as testemunhas.

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Iniciou-se o trabalho com devoção.

Estudaremos a voz passiva sintética com mais profundidade em

análise sintática, quando falarmos de tipos de sujeito e de concordância

verbal. Por ora, importa-nos mais reconhecer aquilo que efetivamente

caracteriza a voz passiva em geral.

Voz reflexiva
Ocorre quando o sujeito é, ao mesmo tempo, agente e paciente da

ação. Sua ocorrência se dá com o auxílio de um pronome reflexivo. Veja:

Nós nos prejudicamos quando fazemos algo assim.

Ela se maquiou com cuidado.

Tu te enxergas neste espelho?

Um bom jeito de analisar a presença da voz reflexiva é averiguar a

possibilidade de acrescer “a mim mesmo”, “a ti mesmo”, “a nós mesmos”, “a

si mesmos” etc.

Note que, nos casos acima, seria possível que a ação recaísse sobre

outra pessoa (é possível prejudicar outrem, por exemplo), mas recai sobre

o sujeito.

Note, ainda, que a conjugação do verbo na voz reflexiva é sempre

acompanhada de pronome também reflexivo.

No poema de Gonçalves Dias, tal comportamento do verbo “banhar”

fica claro.

O CANTO DO ÍNDIO

Quando o sol vai dentro d’água

Seus ardores sepultar,

Quando os pássaros nos bosques

Principiam a trinar;

Eu a vi, que se banhava...

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Era bela, ó Deuses, bela,

Como a fonte cristalina,

Como luz de meiga estrela.

[...]

(DIAS, Gonçalves. Primeiros cantos.)

Atenção!

Não basta que se possa empregar “a mim mesmo” e outras formas

semelhantes para que seja voz reflexiva. É preciso que o sujeito seja agente

e paciente da ação. Na passagem abaixo, por exemplo, isso não ocorre:

Perdi alguma coisa que me era essencial, e que já não me


é mais. Não me é necessária, assim como se eu tivesse perdido uma

terceira perna que até então me impossibilitava de andar, mas que fazia

de mim um tripé estável. (Clarice Lispector, A paixão segundo G.H.)

Nem mesmo se pode falar em “voz” na passagem acima, já que o

verbo “ser” não expressa uma ação.

A voz reflexiva pode ser recíproca, o que ocorre quando há dois ou

mais seres praticando a mesma ação verbal um ao outro.

Abraçaram-se longamente.

Feriram-se com armas brancas.

Note como, fora de contexto, as frases anteriores podem ser ambíguas,

daí se poder usar uma estrutura de reforço, como:

Feriram-se a si mesmos com armas brancas (ou simplesmente

Feriram a si mesmos).

Feriram-se uns aos outros com armas brancas (ou simplesmente

Feriram uns aos outros com armas brancas).

Abraçaram-se a si mesmos longamente. (ou simplesmente

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Abraçaram a si mesmos.)

Feriram um ao outro com armas brancas. (ou simplesmente

Feriram um ao outro.)

Verbos pronominais
Essencialmente pronominais são aqueles verbos que sempre

aparecem acompanhados de um pronome oblíquo átono em sua

conjugação, o qual constitui parte integrante do verbo e não expressa

necessariamente ação reflexiva. É como se o pronome fosse parte do radical

do verbo.

Alguns essencialmente pronominais: arrepender-se, atrever-se,

candidatar-se, dignar-se, engalfinhar-se, esforçar-se, persignar-se,

queixar-se, refugiar-se, suicidar-se, tornar-se, abster-se, apaixonar-se etc.

Não se diz, por exemplo, que alguém “tornou” professor, mas, sim,

que “se tornou” professor. Veja:

Queixei-me de dor quando ele pisou meu pé.

Apaixonaram-se pela matéria.

Nós nos esforçamos para obter bons resultados.

João amava Teresa que amava Raimundo

que amava Maria que amava Joaquim que amava Lili

que não amava ninguém.

João foi pra os Estados Unidos, Teresa para o convento,

Raimundo morreu de desastre, Maria ficou para tia,

Joaquim suicidou-se e Lili casou com J. Pinto Fernandes

que não tinha entrado na história.

(Carlos Drummond de Andrade, Quadrilha)

Vários verbos, por sua vez, são acidentalmente pronominais, ou seja,

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podem ser conjugados eventualmente com pronomes oblíquos átonos.

Exemplos: concentrar-se, enganar-se, sentar-se, vacinar-se, alegrar-se,

apoderar-se etc. Os exemplos abaixo são do dicionário Michaelis:

O povoado alegra o vale. A fé alegra e conforta. Alegrou-se com a

volta do filho.

Engana-se de propósito por não suportar a realidade. Não quer

enfrentar os fatos e só faz enganar.

O homem não podia sentar devido ao ferimento. A criança preferiu

sentar-se a ficar no colo da mãe. Enfim, a filha conseguiu sentar a mãe

já idosa.

Veja a diferença no emprego do verbo nos cartazes a seguir:

Formação do imperativo e uniformidade de tratamento


Uma das mais extensas e extenuantes partes do estudo verbal é
a formação dos tempos verbais. Por absoluta ausência de tempo hábil,

este material (este curso) não tratará do assunto, mas disponibilizaremos

material extra de autoria do professor Fernando Pestana para aqueles que

quiserem estudar mais a fundo.

De toda forma, não podemos nos furtar de dois pontos fundamentais:

a formação do imperativo e a uniformidade de tratamento das pessoas do

discurso.

É muito comum que o falante se pergunte cotidianamente se

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E-BOOK BP GRAMÁTICA NORMATIVA DA LÍNGUA PORTUGUESA
o correto é “arraste para cima” ou “arrasta para cima”, “siga os sinais” ou

“segue os sinais”, “faça o exercício” ou “faz o exercício”, “não começa” ou

“não comece” etc. Essas dúvidas são todas relativas ao emprego do modo

imperativo.

Há dois tipos de imperativo: o afirmativo e o negativo. O primeiro

expressa uma ordem, sugestão, conselho de caráter positivo; e o segundo, a

mesma coisa, mas de caráter negativo.

Para construir os imperativos e o presente do subjuntivo, parte-se do

presente do indicativo, chamado de tempo primitivo.

Veja o presente do indicativo dos verbos “voltar” (1ª conjugação),

“correr” (2ª conjugação) e “partir” (3ª conjugação):

Presente do indicativo
Eu volto
Tu voltas
Ele volta
Nós voltamos
Vós voltais
Eles voltam

Presente do indicativo
Eu corro
Tu corres
Ele corre
Nós corremos
Vós correis
Eles correm

Presente do indicativo
Eu parto
Tu partes
Ele parte
Nós partimos
Vós partis
Eles partem

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Em sequência, constrói-se o presente do subjuntivo, o que ocorre da

seguinte maneira:

Nos verbos de 1ª conjugação, trabalha-se com o final -e:

Presente do Imperativo Presente do Imperativo


indicativo afirmativo subjuntivo negativo
Eu volto Que eu volte
Tu voltas Que tu voltes
Ele volta Que ele volte
Nós voltamos Que nós
voltemos
Vós voltais Que vós volteis
Eles voltam Que eles voltem

Nos verbos de 2ª conjugação, trabalha-se com final -a:

Presente do Imperativo Presente do Imperativo


indicativo afirmativo subjuntivo negativo
Eu corro Que eu corra
Tu corres Que tu corras
Ele corre Que ele corra
Nós corremos Que nós
corramos
Vós correis Que vós corrais
Eles correm Que eles corram

Nos verbos de 3ª conjugação, trabalha-se com final -a:

Presente do Imperativo Presente do Imperativo


indicativo afirmativo subjuntivo negativo
Eu parto Que eu parta
Tu partes Que tu partas
Ele parte Que ele parta
Nós partimos Que nós
partamos
Vós partis Que vós partais
Eles partem Que eles partam

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E-BOOK BP GRAMÁTICA NORMATIVA DA LÍNGUA PORTUGUESA
Para a construção do imperativo afirmativo, basta retirar-se o -s das

segundas pessoas (tu e vós) do presente do indicativo e copiar as demais

pessoas do presente do subjuntivo. Não há primeira pessoa no imperativo

pela simples impossibilidade de se dar uma ordem a si mesmo.

Para a construção do imperativo negativo de todas as conjugações,

basta copiar todo o presente do subjuntivo.

Nas terceiras pessoas dos imperativos, trocam-se o “ele” por “você”

e o “eles” por “vocês”. Como já se viu em outro momento, a conjugação

dos pronomes de tratamento (inclusive “você”) é idêntica à das terceiras

pessoas.

Por mera questão didática, escrevem-se os pronomes após o verbo


nos imperativos.

Presente do Imperativo Presente do Imperativo


indicativo afirmativo subjuntivo negativo
Eu volto --- Que eu volte ---
Tu voltas (-s) Volta tu Que tu voltes Não voltes tu
Ele volta Volte você Que ele volte Não volte você
Nós voltamos Voltemos nós Que nós voltemos Não voltemos nós
Vós voltais (-s) Voltai vós Que vós volteis Não volteis vós
Eles voltam Voltem vocês Que eles voltem Não voltem vocês

Presente do Imperativo Presente do Imperativo


indicativo afirmativo subjuntivo negativo
Eu corro --- Que eu corra ---
Tu corres (-s) Corre tu Que tu corras Não corras tu
Ele corre Corra você Que ele corra Não corra você
Nós corremos Corramos nós Que nós corramos Não corramos nós
Vós correis (-s) Correi vós Que vós corrais Não corrais vós
Eles correm Corram vocês Que eles corram Não corram vocês

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Presente do Imperativo Presente do Imperativo
indicativo afirmativo subjuntivo negativo
Eu parto --- Que eu parta ---
Tu partes (-s) Parte tu Que tu partas Não partas tu
Ele parte Parta você Que ele parta Não parta você
Nós partimos Partamos nós Que nós partamos Não partamos nós
Vós partis (-s) Parti vós Que vós partais Não partais vós
Eles partem Partam vocês Que eles partam Não partam vocês

Compreendendo-se essa formação, fica fácil perceber que uma frase

como “Corre! Você está atrasado!” mistura 2ª e 3ª pessoas: enquanto se está

chamando a pessoa por “você”, está-se usando o imperativo “corre”, que é

para “tu”. Procedendo-se à uniformização, tem-se:

Corra! Você está atrasado!

Corre! Tu estás atrasado!

Vejamos mais alguns exemplos com falta de uniformidade:

Você bebeu pouca água; bebe mais!

Não se precipita ou vai acabar se arrependendo!

Procedendo-se à uniformização:

Você bebeu pouca água; beba mais! Ou Tu bebeste pouca água;

bebe mais!

Não se precipite ou vai acabar se arrependendo! Ou Não te precipites

ou vais acabar te arrependendo!

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E-BOOK BP GRAMÁTICA NORMATIVA DA LÍNGUA PORTUGUESA
Venha para a Caixa você também! Ou Vem para a Caixa tu também!

Aproveitando-se a construção da tabela anterior, vale a pena ressaltar

que o emprego do subjuntivo também é frequentemente feito de forma

errada.

O subjuntivo aparece, por via de regra, em orações subordinadas

(estudaremos mais adiante, em sintaxe), e orações optativas. Veja:

Que Deus te guie!

Espero que não aconteça algo sério.

É fundamental que se tomem medidas urgentemente.

É comum que se diga erradamente “Quer que eu faço isto para


você?” em vez de “Quer que eu faça isto para você?”. Note que, no caso,

a oração “que eu faça isto para você” é subordinada à oração “Quer”. Veja

outros exemplos:

Você precisa que eu compro o almoço? (Corrigindo: que eu compre)

Necessitamos que ele corta a grama para nós. (Corrigindo: que ele

corte)

Classificação dos verbos


Quanto a suas características morfossintáticas, os verbos podem

ser classificados como regulares, irregulares, anômalos, defectivos e

abundantes.

a) Regulares são aqueles que seguem um paradigma, ou seja, um

modelo, de conjugação. Por exemplo: o pretérito imperfeito do subjuntivo

de verbos regulares de 2ª conjugação segue sempre a mesma lógica: se eu

sofresse, se eu conhecesse, se eu comesse, se eu concedesse, mas... Se eu

fizesse (não “fazesse”). Ou seja, o verbo “fazer” não é regular nesse tempo

verbal, pois não segue o paradigma.

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E-BOOK BP GRAMÁTICA NORMATIVA DA LÍNGUA PORTUGUESA
b) Irregulares são aqueles que não seguem um paradigma regular,

seja porque seu radical se altera, seja porque sua desinência se altera. É o

caso dos verbos dar, estar, fazer, pedir etc.

Veja:

Eu amo, eu canto, eu nado, mas... Eu estou (não “esto”).

Eu sofro, eu corro, eu bebo, mas... Eu faço (não “fazo”).

Mais à frente neste material – ainda neste módulo – trataremos de

alguns verbos irregulares especialmente espinhosos.

c) Anômalos são aqueles tão instáveis, que nem sequer possuem

radical. São apenas dois: ser e ir.

Analise o comportamento do verbo “ser”: Eu sou, tu és, ele é... Eu fui,

tu foste, ele foi... Eu serei, tu serás, ele será....Eu era, tu eras, ele era...

Analise o comportamento do verbo “ir”: Eu vou, tu vais, ele vai...Eu fui,

tu foste, ele foi...Eu irei, tu irás, ele irá...Eu ia, tu ias, ele ia.

Observação: Ia X iria

Ele iria caminhar, mas desistiu por causa da chuva. (Iria = futuro do
pretérito)

Antigamente, ele ia caminhar ao meio-dia, mas agora vai às 11h. (Ia =


pretérito imperfeito)

d) Defectivos são aqueles cuja conjugação não é completa. São

simplesmente inexistentes em alguma conjugação.

É o caso dos verbos demolir, feder, explodir, reaver etc. Não se diz,

por exemplo, eu “fedo”, eu “explodo”, eu “reavo”ou ele “reave”.

Mais à frente neste material – ainda neste módulo – trataremos de

alguns verbos defectivos especialmente espinhosos.

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E-BOOK BP GRAMÁTICA NORMATIVA DA LÍNGUA PORTUGUESA
Sobre o assunto, pondera Celso Cunha em sua Gramática:

“[...] Outras vezes o desuso de uma forma verbal é ocasionado

por sua pronúncia desagradável ou por prestar-se a confusão com uma

forma de outro verbo, de emprego mais frequente. A razões de ordem

eufônica atribui-se, por exemplo, a falta da 1ª pessoa do singular do

presente do indicativo e, consequentemente, de todas as pessoas do

presente do subjuntivo do verbo abolir; pela homofonia com formas do

verbo falar, justifica-se a inexistência das formas rizotônicas do verbo

falir. Mas, como a própria caracterização do que é agradável ao ouvido

é sempre difícil, pois está condicionada ao gosto pessoal, há frequentes

discordâncias entre os gramáticos em estabelecer os casos de lacuna

verbal aconselhados por motivos eufônicos. Não raro, não se vislumbra

mesmo razão maior do que o simples desuso de uma forma para que ela

continue sendo evitada pelos que falam ou escrevem.”

e) Abundantes são aqueles que apresentam mais de uma forma na

mesma flexão. Veja:

Nós hemos/havemos de tomar boas decisões.

O governo construi/constrói pontes frágeis e com materiais de baixa

qualidade.

Dize com quem andas/Diz com quem andas

Essa dupla possibilidade ocorre principalmente no particípio. É muito

comum haver dúvidas como “pagado ou pago?”, “imprimido ou impresso”

etc.?

No particípio, as formas regulares (terminadas em -ado e -ido) são

empregadas após os verbos auxiliares ter e haver:

Apesar de o cliente já ter pagado a fatura do cartão, o banco

notificou-o, fazendo nova cobrança.

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E-BOOK BP GRAMÁTICA NORMATIVA DA LÍNGUA PORTUGUESA
Nos Estados Unidos, ele havia pegado prisão perpétua quando a

nova lei foi sancionada.

Quando o chefe chegou, o subordinado já havia imprimido a folha.

Todos já tinham aceitado o acordo, quando o empresário mudou de

ideia.

O trabalhador tem ganhado honestamente seu dinheiro nos últimos

anos.

Pensou-se que a vítima havia morrido durante o assalto.

Na voz passiva construída com os auxiliares ser, estar e ficar, bem

como nas locuções de tempo composto na voz passiva (ter/haver + sido +

particípio), usam-se as formas irregulares (não terminadas em -ado e -ido)

quando o verbo as possui. Além disso, pode haver variação de gênero e

número:

A conta foi paga pelo cliente.

O ladrão foi pego em flagrante.

O ladrão tinha sido pego em flagrante, mas fugiu.

A folha será impressa pelo subordinado.

O acordo foi aceito por todos.

Finalmente a folha ficou impressa.

O dinheiro foi ganho honestamente.

A testemunha será morta caso não haja proteção a ela.

Atenção!

Os verbos trazer, chegar, abrir, cobrir, comprar e escrever não são

abundantes!

Eu tinha chegado pela manhã.

(Jamais “chego”)

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A casa foi devidamente comprada pela parte, mas descobriu-se que

se tratava de fraude.

(Jamais “compra”)

O pacote foi trazido na hora certa.

(Jamais “trago”)

A oferta da empresa A foi coberta pela da empresa B.

(Jamais “cobrida”)

A ata deve ser escrita à mão.

(Jamais “escrevida”)

Se eu soubesse que era você, teria aberto a porta.

(Jamais “abrido”)

É fundamental darmos a devida atenção a tais verbos, pois eles são

traiçoeiros. Aqui, não nos preocuparemos muito com o nome dos tempos

verbais nem com a apresentação de todas as flexões dos verbos, mas com

o emprego prático de alguns casos específicos. Passemos a alguns verbos

irregulares:

VERBO PÔR E SEUS DERIVADOS


A dinâmica do verbo pôr estende-se a todos os terminados em -or:
compor, dispor, sobrepor, antepor, depor, entrepor, expor, justapor, pospor,

repor, apor etc.

Presente do indicativo: eu ponho, tu pões, ele põe, nós pomos, vós

pondes, eles põem

Pretérito perfeito do indicativo: eu pus, tu puseste, ele pôs, nós

pusemos, vós pusestes, eles puseram

Pretérito imperfeito do indicativo: eu punha, tu punhas, ele punha,

nós púnhamos, vós púnheis, eles punham

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Futuro do pretérito do indicativo: eu poria, tu porias, ele poria, nós

poríamos, vós poríeis, eles poriam

Presente do subjuntivo: que eu ponha, que tu ponhas, que ele ponha,

que nós ponhamos, que vós ponhais, que eles ponham

Pretérito imperfeito do subjuntivo: se eu pusesse, se tu pusesses, se

ele pusesse, se nós puséssemos, se vós pusésseis, se eles pusessem

Futuro do subjuntivo: quando eu puser, quando tu puseres, quando

ele puser, quando nós pusermos, quando vós puserdes, quando eles

puserem

Imperativo afirmativo: põe tu, ponha você, ponhamos nós, ponde

vós, ponham vocês

Imperativo negativo: não ponhas tu, não ponha você, não ponhamos

nós, não ponhais vós, não ponham vocês

Exemplos:

É fundamental que nós aponhamos nossa assinatura ao final do

contrato.

Se o assistente de acusação se dispusesse a falar, poderíamos

esclarecer melhor a situação.

Quando nós repusermos o estoque, entraremos em contato.

Componhamos novas estratégias para melhorar nossa peça.

VERBO VIR E SEUS DERIVADOS


A dinâmica do verbo vir estende-se a todos os seus derivados: advir,

convir, desavir (=indispor) intervir, provir, sobrevir etc.

Presente do indicativo: eu venho, tu vens, ele vem, nós vimos, vós

vindes, eles vêm

Pretérito perfeito do indicativo: eu vim, tu vieste, ele veio, nós viemos,

vós viestes, eles vieram

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Presente do subjuntivo: que eu venha, que tu venhas, que ele venha,

que nós venhamos, que vós venhais, que eles venham

Pretérito imperfeito do subjuntivo: se eu viesse, se tu viesses, se ele

viesse, se nós viéssemos, se vós viésseis, se eles viessem

Futuro do subjuntivo: quando eu vier, quando tu vieres, quando ele

vier, quando nós viermos, quando vós vierdes, quando eles vierem

Imperativo afirmativo: vem tu, venha você, venhamos nós, vinde vós,

venham vocês

Imperativo negativo: não venhas tu, não venha você, não venhamos

nós, não venhais vós, não venham vocês

Exemplos:

O oficial deve vir aqui logo pela manhã.

É fundamental que nós intervenhamos nesta discussão, pois ela

pode ser mortal.

A testemunha agiu da maneira que convinha; se conviesse outra

forma, assim ela faria.

Quando nós viermos até o local, daremos mais instruções.

Eu provenho de uma cidade pequena.

Você pode vir aqui, por favor?

Ele há de convir que estas ameaças não são necessárias.

A partilha dos bens desaveio os irmãos.

VERBO VER E SEUS DERIVADOS


A dinâmica do verbo ver estende-se a todos os seus derivados:

antever, prever, rever etc.

Presente do indicativo: eu vejo, tu vês, ele vê, nós vemos, vós vedes,

eles veem

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Presente do subjuntivo: que eu veja, que tu vejas, que ele veja, que

nós vejamos, que vós vejais, que eles vejam

Futuro do subjuntivo: quando eu vir, quando tu vires, quando ele vir,

quando nós virmos, quando vós virdes, quando eles virem

Imperativo afirmativo: vê tu, veja você, vejamos nós, vede vós, vejam

vocês

Imperativo negativo: não vejas tu, não veja você, não vejamos nós,

não vejais vós, não vejam vocês

Exemplos:

É muito importante antevermos as possíveis estratégias da parte

contrária.

Para que nós revejamos os argumentos antes de apresentá-los,

precisaremos de uma reunião.

Quando os jurados virem as provas, não terão dúvida.

Os desembargadores raramente reveem casos como este.

Se você vir o vídeo que eu vi, pensará como eu.

Observação 1:

O verbo prover (= fornecer, receber e deferir [recurso]) não é derivado

do verbo ver, embora eventualmente coincidam em algumas conjugações.

Veja:

Presente do indicativo: eu provejo, tu provês, ele provê, nós

provemos, vós provedes, eles proveem

Pretérito perfeito do indicativo: eu provi, tu proveste, ele proveu, nós

provemos, vós provestes, eles proveram

Pretérito imperfeito do indicativo: eu provia, tu provias, ele provia,


nós províamos, vós províeis, eles proviam

Presente do subjuntivo: que eu proveja, que tu provejas, que ele

proveja, que nós provejamos, que vós provejais, que eles provejam

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Futuro do subjuntivo: quando eu prover, quando tu proveres,

quando ele prover, quando nós provermos, quando vós proverdes, quando

eles proverem

Exemplos:

Esperamos que o magistrado proveja o recurso que interpusemos

ontem. De toda forma, se ele não prover, estudaremos a possibilidade de

interpor embargos.

Por anos, o autor proveu sua esposa de condições para que ela não

trabalhasse e tivesse boa qualidade de vida.

Quando ele se prover de recursos humanos suficientes como

assessor, poderemos cogitar sua promoção.

Observação 2:

Precaver(-se) também não é derivado do verbo ver. Trata-se de verbo

defectivo, o qual não se conjuga em determinadas flexões.

Presente do indicativo: nós (nos) precavemos, vós (vos) precaveis

Imperativo afirmativo: precavei(-vos) vós

Imperativo negativo: -

Presente do subjuntivo: -

Os demais tempos existem normalmente.

Exemplos:

Se eles não se precaverem, serão pegos de surpresa pelos

argumentos ministeriais.

Nós nos precavemos e instalamos câmeras em todo o escritório.

Observação: São erradas construções como “Ele que se precavenha”,

“Eu me precavejo sempre que possível” etc. Nesses casos, sugere-se usar

os verbos “prevenir” ou “acautelar”: Ele que se previna/acautele, “Eu me

previno/acautelo sempre que possível”.

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VERBO TER E SEUS DERIVADOS
A dinâmica do verbo ter estende-se a todos os seus derivados:

abster-se, ater-se, deter, entreter, manter, obter, reter etc.

Presente do indicativo: eu tenho, tu tens, ele tem, nós temos, vós

tendes, eles têm

Pretérito perfeito do indicativo: eu tive, tu tiveste, ele teve, nós

tivemos, vós tivestes, eles tiveram

Pretérito imperfeito do indicativo: eu tinha, tu tinhas, ele tinha, nós

tínhamos, vós tínheis, eles tinham

Presente do subjuntivo: que eu tenha, que tu tenhas, que ele tenha,

que nós tenhamos, que vós tenhais, que eles tenham

Pretérito imperfeito do subjuntivo: se eu tivesse, se tu tivesses, se ele

tivesse, se nós tivéssemos, se vós tivésseis, se eles tivessem

Futuro do subjuntivo: quando eu tiver, quando tu tiveres, quando ele

tiver, quando nós tivermos, quando vós tiverdes, quando eles tiverem

Imperativo afirmativo: tem tu, tenha você, tenhamos nós, tende vós,

tenham vocês

Imperativo negativo: não tenhas tu, não tenha você, não tenhamos

nós, não tenhais vós, não tenham vocês

Exemplos:

O cliente tem bons advogados.

Os clientes têm bons advogados.

Eu me entretive por horas analisando os documentos.

Nós nos mantivemos ocupados durante toda a manhã.

Se o policial o detivesse sem mandado, seria investigado.

Quando o delegado obtiver mais provas, finalizará o inquérito.

Caso nós nos abstenhamos/abstivermos de votar, deixaremos nas

mãos de quem vota o nosso futuro político.

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VERBOS TERMINADOS EM -EAR
Pentear, estrear, passear, presentear, custear, recear, frear etc.

Presente do indicativo: eu custeio, tu custeias, ele custeia, nós

custeamos, vós custeais, eles custeiam

Pretérito perfeito do indicativo: eu custeei, tu custeaste, ele custeou,

nós custeamos, vós custeastes, eles custearam

Presente do subjuntivo: que eu custeie, que tu custeies, que ele

custeie, que nós custeemos, que vós custeeis, que eles custeiem

Imperativo afirmativo: custeia tu, custeie você, custeemos nós,

custeai vós, custeiem vocês

Imperativo negativo: não custeies tu, não custeie você, não


custeemos nós, não custeeis vós, não custeiem vocês

Exemplos:

Infelizmente, nós não freamos o carro a tempo de evitar o acidente.

Eles receiam entrar no rol de investigados.

O advogado estreou com muita competência no tribunal do júri.

VERBOS TERMINADOS EM -IAR


Verbos como variar, avaliar, copiar, maquiar, adiar, arriar (=fazer

descer) são regulares. Veja o presente do indicativo:

Presente do indicativo: eu vario, tu varias, ele varia, nós variamos, vós

variais, eles variam

No entanto, há 5 verbos para os quais é preciso dar atenção especial,

pois se comportam de forma diferente: mediar, ansiar, remediar, incendiar,

odiar. Veja:

Presente do indicativo: Eu medeio, tu medeias, ele medeia, nós

mediamos, vós mediais, eles medeiam

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Presente do subjuntivo: Que eu medeie, que tu medeies, que ele

medeie, que nós mediemos, que vós medieis, que eles medeiem

Imperativo afirmativo: medeia tu, medeie você, mediemos nós,

mediai vós, medeiem vocês

Imperativo negativo: não medeies tu, não medeie você, não

mediemos nós, não medieis vós, não medeiem vocês

Exemplos:

É importante que ele não se remedeie, mas que procure um médico.

Caso eu intermedeie a reunião, ouvirei as duas partes sem tempo

cronometrado.

Anseio por nova postura do governo.

Quem é honesto sempre remedeia as injustiças.

Observação: O verbo mobiliar recebe acento agudo na sílaba “bi”

em algumas flexões:

Presente do indicativo: Eu mobílio, tu mobílias, ele mobília, nós

mobiliamos, vós mobiliais, eles mobíliam

Presente do subjuntivo: Que eu mobílie, que tu mobílies, que ele

mobílie, que nós mobiliemos, que vós mobilieis, que eles mobíliem

VERBO QUERER
Futuro do presente: eu quererei, tu quererás, ele quererá, nós

quereremos, vós querereis, eles quererão

Futuro do pretérito do indicativo: eu quereria, tu quererias, ele

quereria, nós quereríamos, vós quereríeis, eles quereriam

Presente do subjuntivo: que eu queira, que tu queiras, que ele


queira, que nós queiramos, que vós queirais, que eles queiram

Pretérito imperfeito do subjuntivo: se eu quisesse, se tu quisesses,

se ele quisesse, se nós quiséssemos, se vós quisésseis, se eles quisessem

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Futuro do subjuntivo: quando eu quiser, quando tu quiseres,

quando ele quiser, quando nós quisermos, quando vós quiserdes, quando

eles quiserem

Imperativo afirmativo: quer(e) tu, queira você, queiramos nós, querei

vós, queiram vocês

Imperativo negativo: não queiras tu, não queira você, não queiramos

nós, não queirais vós, não queiram vocês

Exemplos:

Queiramos sempre polir nossas peças processuais.

Na semana que vem, ele provavelmente não quererá viajar, pois


estará cansado.

Quando nós quisermos adquirir um imóvel, entraremos em contato.

Talvez eles não queiram opor embargos.

Eu quereria viajar agora, se não fosse a pandemia.

Atenção!

O verbo requerer não é derivado do verbo querer. Veja:

Presente do indicativo: eu requeiro, tu requeres, ele requer, nós


requeremos, vós requereis, eles requerem

Pretérito perfeito do indicativo: eu requeri, tu requereste, ele

requereu, nós requeremos, vós requerestes, eles requereram

Exemplos:

Eu requeiro astreintes em algumas de minhas iniciais.

O advogado requereu novas provas.

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VERBOS HAVER E REAVER
O verbo reaver é derivado do verbo haver, porém só se conjuga nas

formas em que o verbo mantiver a letra “v”, ou seja, reaver é um verbo

defectivo.

Presente do indicativo: eu hei, tu hás, ele há, nós hemos/havemos,

vós heis/haveis, eles hão

Pretérito perfeito do indicativo: eu houve, tu houveste, ele houve,

nós houvemos, vós houvestes, eles houveram

Presente do subjuntivo: que eu haja, que tu hajas, que ele haja, que

nós hajamos, que vós hajais, que eles hajam

Pretérito imperfeito do subjuntivo: se eu houvesse, se tu houvesses,

se ele houvesse, se nós houvéssemos, se vós houvésseis, se eles houvessem

Futuro do subjuntivo: quando eu houver, quando tu houveres,

quando ele houver, quando nós houvermos, quando vós houverdes, quando

eles houverem

Exemplos:

Com muita briga na justiça, os herdeiros reouveram a fortuna deixada

pelo pai.

Se nós reouvermos o direito ao voto na empresa, elegeremos fulano.

O patrão é uma pessoa difícil, por isso eu hei-me quase sempre com

os empregados.

Os empregados nunca se houveram bem com o patrão.

VERBO LIDAR
O verbo lidar não é derivado do verbo dar.

Presente do indicativo: eu lido, tu lidas, ele lida, nós lidamos, vós

lidais, eles lidam

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Pretérito perfeito do indicativo: eu lidei, tu lidaste, ele lidou, nós

lidamos, vós lidastes, eles lidaram

Presente do subjuntivo: que eu lide, que tu lides, que ele lide, que

nós lidemos, que vós lideis, que eles lidem

Pretérito imperfeito do subjuntivo: se eu lidasse, se tu lidasses, se

ele lidasse, se nós lidássemos, se vós lidásseis, se eles lidassem

Futuro do subjuntivo: quando eu lidar, quando tu lidares, quando ele

lidar, quando nós lidarmos, quando vós lidardes, quando eles lidarem

Exemplos:

Se nós lidássemos melhor com a corte, talvez ela ouvisse nosso


argumento com mais boa vontade.

Quando eu lidar com casos como esse, posso fazer parceria com

você.

VERBO VIGER
É defectivo em algumas de suas primeiras pessoas.

Presente do indicativo: -, tu viges, ele vige, nós vigemos, vós vigeis,

eles vigem

Pretérito perfeito do indicativo: eu vigi, tu vigeste, ele vigeu, nós

vigemos, vós vigestes, eles vigeram

Pretérito imperfeito do indicativo: eu vigia, tu vigias, ele vigia, nós

vigíamos, vós vigíeis, eles vigiam

Futuro do presente do indicativo: eu vigerei, tu vigerás, ele vigerá,

nós vigeremos, vós vigereis, eles vigerão

Futuro do pretérito do indicativo: eu vigeria, tu vigerias, ele vigeria,

nós vigeríamos, vós vigeríeis, eles vigeriam

Presente do subjuntivo: -

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Pretérito imperfeito do subjuntivo: se eu vigesse, se tu vigesses, se

ele vigesse, se nós vigêssemos, se vós vigêsseis, se eles vigessem

Futuro do subjuntivo: quando eu viger, quando tu vigeres, quando

ele viger, quando nós vigermos, quando vós vigerdes, quando eles vigerem

Exemplos:

Se o prazo viger até março, será possível cumprir o combinado.

Por anos, vigeram medidas pouco eficientes para o controle a praga

nas lavouras.

O prazo já está vigendo?

VERBOS ADVERTIR, ADERIR, AFERIR, COMPETIR,


DIVERGIR, DIGERIR, DISCERNIR, EXPELIR, INTERFERIR, GERIR,
INGERIR, IMPELIR, PRETERIR E REPELIR
Presente do indicativo: eu divirjo, tu diverges, ele diverge, nós

divergimos, vós divergis, eles divergem

Presente do subjuntivo: que eu divirja, que tu divirjas, que ele divirja,

que nós divirjamos, que vós divirjais, que eles divirjam

Pretérito imperfeito do subjuntivo: se eu divergisse, se tu


divergisses, se ele divergisse, se nós divergíssemos, se vós divergísseis, se

eles divergissem

Imperativo afirmativo: diverge tu, divirja você, divirjamos nós, divergi

vós, divirjam vocês

Imperativo negativo: não divirjas tu, não divirja você, não divirjamos

nós, não divirjais vós, não divirjam vocês

Exemplos:

Nunca compito com meus próprios colegas de escritório por

clientes. Os honorários aqui são todos divididos.

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Esperemos que ele gira bem os negócios da família.

É preciso que nós afiramos nossa pressão agora.

Caso ele pretira nosso candidato, precisamos ter um plano B.

Quando o estagiário chegar, advirta-o de que ele deixou o

computador ligado ontem.

Por favor, não me compila a fazer coisas que não domino ainda.

VERBOS MEDIR, PEDIR, DESPEDIR, EXPEDIR, REEXPEDIR,


IMPEDIR
Presente do indicativo: eu expeço, tu expedes, ele expede, nós

expedimos, vós expedis, eles expedem

Presente do subjuntivo: que eu expeça, que tu expeças, que ele

expeça, que nós expeçamos, que vós expeçais, que eles expeçam

Imperativo afirmativo: expede tu, expeça você, expeçamos nós,

expedi vós, expeçam vocês

Imperativo negativo: não expeças tu, não expeça você, não

expeçamos nós, não expeçais vós, não expeçam vocês

Exemplos:

Meça melhor as palavras para fazer a sustentação oral. O tom foi

muito pesado.

Por favor, reexpeçam os ofícios aos cartórios.

Diariamente, impeço pessoas de serem executadas indevidamente.

VERBOS ARGUIR E REDARGUIR


Presente do indicativo: eu arguo, tu arguis, ele argui, nós arguimos,

vós arguis, eles arguem

Pretérito perfeito do indicativo: eu arguí, tu arguíste, ele arguiu, nós

arguímos, vós arguistes, eles arguíram

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Presente do subjuntivo: que eu argua, que tu arguas, que ele argua,

que nós arguamos, que vós arguais que eles arguam

Futuro do subjuntivo: quando eu arguir, quando tu arguíres, quando

ele arguir, quando nós arguirmos, quando vós arguirdes, quando eles

arguírem

Imperativo afirmativo: argui tu, argua você, arguamos nós, arguí vós,

arguam vocês

Exemplos:

Espero sinceramente que ele não redargua as acusações que

fizemos, pois há provas de tudo.

Para que nós arguamos com mais segurança, precisamos estudar o

assunto profundamente.

No momento em que eles arguírem inocência, mostrarei a filmagem

feita no prédio.

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AU L A 8

PREPOSIÇÃO
Preposição
Preposição (do latim prae = diante de + positionem = posição) é a

palavra invariável que conecta dois termos – um regente (subordinante) e

um regido (subordinado). Analise:

Chegou de Goiânia.

Caminhei contra a luz.

Parou ante o muro.

Para a compreensão do valor semântico da preposição, o contexto

é fundamental, ou seja, seu sentido intrínseco revela-se contextualmente.

Veja a diferença:

Lutar por Pedro, lutar contra Pedro, lutar com Pedro, Lutar para

Pedro, lutar sem Pedro.

Por Cristo, com Cristo, em Cristo,

a vós, Deus Pai todo-poderoso, na unidade do Espírito Santo,

toda a honra e toda a glória,

agora e para sempre.

(Doxologia final – Oração Eucarística)

Por = Através de Cristo, damos glória ao Pai (Ele é o caminho);

Com = Ele quem dá glória ao pai, nós participamos da glória com Ele;

Em = “Dentro” dEle, em comunhão com Cristo.

Note-se que, na citação da Doxologia final, as preposições não estão

entre dois termos, mas iniciando as estruturas. Isso só acontece porque

os adjuntos adverbiais por elas introduzidos estão deslocados. Na ordem

direta, teríamos:

(Nós damos) Toda honra e toda a glória a vós, Deus Pai todo-

poderoso, por Cristo, com Cristo, em Cristo, na unidade do Espírito Santo,

agora e para sempre.

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Para que se compreenda melhor, observe um caso mais simples:

Até amanhã, eu terminarei a tarefa. (Ordem indireta)

Eu terminarei a tarefa até amanhã. (Ordem direta)

Na ordem direta dos termos, portanto, fica evidente a função

conectiva da preposição (no caso, conecta o adjunto adverbial “até amanhã”

ao restante da frase).

Observação importante: Não se preocupe, estudaremos os termos

da oração mais para frente no curso.

Em alguns casos, a preposição apresenta um sentido próprio

bastante fraco – ou até inexistente – e servirá apenas como elemento de

conexão.

Exemplo: Havereis de comprar, Luís de Camões, cara a cara etc.

Sobre o valor semântico das preposições, assevera Celso Cunha, em

pontuação interessantíssima:

“Comparando as frases:

Viajarei com Pedro

Concordo com você,

observamos que, em ambas, a preposição com tem como

antecedente uma forma verbal (viajei e concordo), ligada por ela a um

consequente, que, no primeiro caso, é um termo acessório (com Pedro =

adjunto adverbial) e, no segundo, um termo integrante (com você = objeto

indireto) da oração.

A preposição com exprime, fundamentalmente, a ideia de

‘associação’, ‘companhia’. E esta ideia básica, sentimo-la muito mais intensa

no primeiro exemplo (Viajei com Pedro) do que no segundo (Concordo

com você). Aqui, o uso da partícula com após o verbo concordar, por ser

construção já fixada no idioma, provoca um esvaecimento do conteúdo

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significativo da ‘associação’, ‘companhia’, em favor da função relacional

pura.

Costuma-se nesses casos desprezar o sentido da preposição

e considerá-la um simples elo sintático, vazio de conteúdo nocional.

Cumpre, no entanto, salientar que as relações sintáticas que se fazem

por intermédio de preposição obrigatória selecionam determinadas

preposições exatamente por causa de seu significado básico. Assim, o

verbo concordar elege a preposição com em virtude das afinidades que

existem entre o sentido do próprio verbo e a ideia de ‘associação’ inerente a

com. O objeto indireto, que em geral é introduzido pelas preposições a ou

para, corresponde a um ‘movimento em direção a’, coincidente com a base

significativa daquelas preposições.

Completamente distinto é o caso do objeto direto preposicionado,

em que o emprego da preposição não obrigatória transmite à relação

um vigor novo, pois o reforço que advém do conteúdo significativo da

preposição é sempre um elemento intensificador da relação do verbo-

objeto:

Conhecer da natureza quando seja mister, para adorar com

discernimento a Deus. (R. Barbosa, EDS, 653).

Em resumo: a maior ou menor intensidade significativa da

preposição depende do tipo de relação sintática por ela estabelecida.”

Muitas vezes, são as preposições fundamentais. Leia este texto de

Manoel de Barros:

Quando a Vó me recebeu nas férias, ela me apresentou aos

amigos: Este é meu neto. Ele foi estudar no Rio e voltou de ateu. Ela disse

que eu voltei de ateu. Aquela preposição deslocada me fantasiava de

ateu. Como quem dissesse no Carnaval: aquele menino está fantasiado

de palhaço. Minha avó entendia de regências verbais. Ela falava de sério.

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Mas todo-mundo  riu. Porque aquela preposição deslocada podia fazer

de uma informação um chiste. E fez. E mais: eu acho que buscar a beleza

nas palavras é uma solenidade de amor. E pode ser instrumento de rir.

De outra feita, no meio da pelada um menino gritou: Disilimina esse,

Cabeludinho. Eu não disiliminei ninguém. Mas aquele verbo novo trouxe

um perfume de poesia à nossa quadra. Aprendi  nessas férias a brincar

de palavras mais do que trabalhar com elas. Comecei a não gostar de

palavra engavetada. Aquela que não pode mudar de lugar. Aprendi a

gostar  mais das palavras pelo que elas entoam do que pelo que elas

informam. Por depois ouvi um vaqueiro a cantar com saudade: Ai morena,

não me escreve / que eu não sei a ler. Aquele a preposto ao verbo ler, ao

meu ouvir, ampliava a solidão do vaqueiro.

(Manoel de Barros, Memórias inventadas: a infância)

As preposições podem conectar palavras entre si, palavras a orações,

ou orações entre si:

Irei a Roma (“a” conecta o verbo “Irei” à palavra “Roma”.)

Pão de queijo (“de” conecta as palavras “pão” e “queijo”.)

Estudei para finalmente aprender (“para” conecta as orações

“estudei” e “aprender”.)

Classificação
As preposições podem ser essenciais ou acidentais.

As essenciais são as preposições propriamente ditas:

a, ante, após, até, com, contra, de, desde, em, entre, para, perante,

por, sem, sob, sobre, trás

Exemplos de uso:

Eles hão de fazer uma reunião sobre o assunto.

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Perante o cenário inesperado, a gestora traçou boas estratégias de

gestão.

Em tempos de pandemia, não se pode agir sem comedimento.

Sob a terra ou sobre ela, a plantação dá mostras de saúde.

As acidentais pertencem a outras classes gramaticais, mas

eventualmente têm valor de preposição. Algumas delas:

Conforme, como, exceto, mesmo, durante, senão.

Exemplos de uso:

Tenho-o como pai.

Nada senti senão medo.

Durante o dia, dormiram profundamente.

Locuções prepositivas
Locuções prepositivas são um conjunto de palavras, de valor

prepositivo, que se finaliza com preposição essencial (de, com, a).

Alguns exemplos: a fim de, de encontro a, ao encontro de, além de,

devido a, por trás de, sob pena de, embaixo de, em cima de, além de, aquém

de, quanto a, de acordo com, em conformidade com.

Exemplos de uso:

Jamais agirei em conformidade com uma mentira.

Os alunos foram de encontro às orientações.

Os alunos foram ao encontro das orientações.

O resultado foi aquém do esperado.

Leia o parágrafo abaixo, procurando identificar as preposições e sua

função semântica:

Lá se tinha ficado o Josias, na sua cova à beira da estrada com

uma cruz de dois paus amarrados, feita pelo pai.

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Ficou em paz. Não tinha mais que chorar de fome, estrada afora.

Não tinha mais alguns anos de miséria à frente da vida, para cair depois

no mesmo buraco, à sombra da mesma cruz.

Cordulina, no entanto, queria-o vivo. Embora sofrendo, mas em

pé, andando junto dela, chorando de fome, brigando com os outros.

(Rachel de Queiroz, O Quinze)

Resposta:

Lá se tinha ficado o Josias, na sua cova (em – lugar) à beira da

estrada (à beira de – lugar), com (com – proximidade/companhia) uma cruz

de dois paus amarrados (de – matéria), feita pelo pai (por – agente).

Ficou em paz (em – estado). Não tinha mais que chorar (que

– ligação entre “ter” + infinitivo, caráter relacional) de fome (de – causa),

estrada afora. Não tinha mais alguns anos de miséria (de – característica)

à frente da vida (à frente de – tempo), para cair (para – consequência

[ilógica]) depois no mesmo buraco (em – lugar), à sombra da mesma cruz

(à sombra de – lugar).

Cordulina, no entanto, queria-o vivo. Embora sofrendo, mas em

pé (em – modo), andando junto dela (junto de – companhia), chorando

de fome (de – causa), brigando com os outros (com – introdução do

complemento do verbo “brigar”, caráter relacional).

(Rachel de Queiroz, O Quinze)

Observações

1) Por seu caráter subordinante, a preposição essencial leva os

pronomes pessoais para sua forma oblíqua tônica (lembrando: as formas

retas não podem funcionar como elementos subordinados):

Isso depende de mim. (Não de “eu”)

A notícia chegou até mim. (Não “até eu”)

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Tenho uma novidade para ti. (Não “para tu”)

Entre mim e ti, não há competição. (Não entre “eu e tu”)

No entanto, caso haja um verbo do qual o pronome seja sujeito,

deve-se usar o pronome reto:

Repetiram a notícia até eu entender seu sentido.

2) A forma “pra” é própria da linguagem coloquial. Formalmente,

usa-se “para”.

3) Algumas preposições podem-se combinar ou contrair com outras

palavras:

Fique neste cômodo. (em + este = neste)

Daqui sairão os futuros presidentes. (de + aqui = daqui)

Irei aonde você for. (a + onde = aonde)

Resisti aos encantos dela. (a + os = aos)

Refiro-me àquele tópico. (a + aquele = àquele)

Vá à padaria, por favor. (a + a = à)

Vim dum belo mosteiro. (de + um = dum)

Lembrando o que já se viu anteriormente: Não se contrai a preposição

“de” com artigo nenhum quando há verbo no infinitivo. Logo: Antes de ele

sair, quer falar com você. (Não “dele sair”)

4) Comumente, a preposição não é exigida por um termo, mas pode

aparecer por razões estilísticas. Bechara, por exemplo, cita “cumprir com o

dever” como uma construção em que a preposição “acentua a ideia de zelo

ou boa vontade para executar algo”.

Outro exemplo: “arrancar da espada”, quando o de enfatiza a “ideia

de uso do objeto”.

Mais exemplos: Procurei por você em todo lugar; Comeremos do

pão e beberemos do vinho.

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5) Quando a preposição for exigida mais de uma vez, pode-se

omiti-la, contanto que não se prejudique o contexto. Veja:

Falei com o vizinho e (com) a vizinha. (A omissão não interfere no

sentido pretendido.)

Dedicatória aos poetas e (aos) pintores da cidade. (A omissão interfere

diretamente no sentido.)

6) Os verbos chegar, ir, voltar, levar não trabalham com a preposição

em, mas com as preposições a ou para: Vou para o prédio, Voltamos à

escola, Levei-a para a estação, Chegastes ao topo.

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AU L A 9

CONJUNÇÃO
Conjunção
Conjunção (do latim conjunctus, “unido, ligado”) é a classe gramatical

que relaciona duas orações ou dois termos semelhantes da mesma oração.

Com raras exceções, a conjunção carrega em si um sentido próprio. Veja:

Para acabar as coisas, é preciso começar a fazê-las. Parece

óbvio, mas falta-te tantas vezes esta simples decisão. E...como satanás se

alegra com a tua ineficácia.

(Josemaria Escrivá)

Note como as palavras marcadas (mas e e) articulam respectivamente

relação de adversidade e de adição.

Estudar ou trabalhar: eis a questão.

Perceba como a palavra ou estabelece uma escolha entre os

infinitivos estudar e trabalhar.

Classificação
Podem ser coordenativas ou subordinativas.

As coordenativas, de acordo com Amini Hauy, conectam duas

palavras da mesma classe ou valor gramatical e mesma função sintática

[ou ainda duas orações]: substantivo, substantivo (ou equivalentes, isto é:


pronome substantivo/substantivo ou locução substantiva etc.); com igual

ocorrência: adjetivo/adjetivo; pronome/pronome; preposição/preposição;

advérbio/advérbio; verbo/verbo etc. Em geral, são as conjunções aditivas,

adversativas ou alternativas que, além de ligarem orações (verbo/verbo),

relacionam quaisquer termos de mesma classe ou valor gramatical e

função sintática.

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Exemplos:

Qualquer um e nós (locução pronominal – pronome)

Corpo e alma (substantivo – substantivo)

Ou eles chegarão a tempo, ou não entrarão. (oração coordenada

sindética – oração coordenada sindética)

Já as conjunções (ou locuções conjuntivas) subordinativas

introduzem orações subordinadas, ou seja, orações que sintaticamente

dependem de uma principal.

Exemplos:

Já que a escola está fechada, faremos a aula em casa. (oração

subordinada adverbial causal – oração principal)

Apenas espero que ele me ligue de volta. (oração principal – oração

subordinada substantiva objetiva direta)

No primeiro caso, “já que” é locução subordinativa adverbial causal

e, no segundo, “que” é conjunção subordinativa integrante.

Quanto às semelhanças e diferenças entre conjunções e preposições,

convém pontuar o seguinte, a título de esclarecimento: ambas podem ligar


palavras ou orações. Agora atenção:

○ As preposições (e locuções prepositivas) estabelecem relação de

subordinação sempre; quando introduzem orações, estas são

sempre reduzidas.

○ Já as conjunções, quando conectam palavras, são sempre

coordenativas. Quando conectam orações, podem ser

coordenativas ou subordinativas. Sendo subordinativas, jamais

serão reduzidas (caso forem, tratar-se-á de preposição, não de

conjunção).

Essas diferenças serão pontuadas quando se falar em sintaxe.

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Alguns exemplos de conjunções na prática:

“Todo amor é eterno e (coordinativa aditiva), se (subordinativa

adverbial condicional) acaba, não era amor.” (Nelson Rodrigues)

“Invejo a burrice, porque (subordinativa adverbial causal) é

eterna.” (Nelson Rodrigues)

“O cristão amou a filha do sertão, como (subordinativa adverbial

comparativa) nos primeiros dias, quando (subordinativa adverbial

temporal) parece que (subordinativa integrante) o tempo nunca poderá

estancar o coração. Mas (coordenativa adversativa) breves sóis bastaram

para murchar aquelas flores de uma alma exilada da pátria.


O imbu, filho da serra, se (subordinativa adverbial condicional)

nasce na várzea porque (subordinativa adverbial causal) o vento ou

(coordenativa alternativa) as aves trouxeram a semente, vinga, achando

boa terra e fresca sombra; talvez um dia cope a verde folhagem e enflore.

Mas (coordenativa adversativa) basta um sopro do mar, para tudo

murchar. As folhas lastram o chão; as flores, leva-as a brisa.” (José de

Alencar, Iracema)

Observações:

1) É frequente que uma conjunção (ou locução conjuntiva) tenha

mais de um sentido, o qual somente se esclarecerá no contexto. Veja alguns

exemplos:

Desde que cheguei, não falaram de outro assunto, senão o pedido

de demissão do chefe. (conjunção adverbial temporal)

Dede que nos alimentemos bem, ganharemos massa magra.

(conjunção adverbial condicional)

Se bebermos mais, passaremos mal. (conjunção adverbial

condicional)

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Não sei se esta é uma boa ideia. (conjunção integrante)

A equipe deve agir como ordenou o superior. (adverbial conformativa)

Como Pedro se atrasou, passei outra pessoa à sua frente. (adverbial

causal)

2) A conjunção e é particularmente polissêmica. Não raro, nem

sequer chega a ser uma conjunção.

E você por acaso acredita nele? (palavra denotativa de assunto)

Estudou como nunca e obteve seu primeiro dez. (valor conclusivo =

portanto)

Tomei todas as precauções, e peguei a doença. (valor adversativo =

mas)

Preciso chamar meu filho e dar uma explicação séria sobre este

assunto. (finalidade = para)

Abaixo, nota-se a riqueza da referida palavra:

Nas conversas gerais, a morte é tratada como se fosse, por

exemplo, um triângulo esférico e (oposição de ideias) não como uma

intensa realidade que ronda pela sala em torno de nossos corpos. É coisa

que acontece com parentes afastados e (conecta oraçõa) que elimina

periodicamente personagens de destaque na política e na literatura

(conecta palavras); e por isso, quando nos cai perto e cobre de lividez o
rosto da esposa, nosso primeiro sentimento é de absoluto espanto, como

se, apesar de todas as enormes cifras demográficas, aquele fenômeno

fosse ímpar no mundo. Cada morte é terrivelmente inesperada. 

(Gustavo Corção, A descoberta do outro)

Segundo o professor Fernando Pestana: “A conjunção e, além desses

valores, pode indicar sequenciação temporal, isso ocorre quando o papel

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dela é apenas ligar dois eventos sucessivos: Depois da ferrenha discussão,

Maria fechou o rosto e João foi para o quarto em seguida”.

Ainda sobre a referida conjunção, ressalta-se que pode ela aparecer

após ponto, a fim de lhe ressaltar o sentido, como faz Clarice:

Será preciso coragem para fazer o que vou fazer: dizer. E me

arriscar à enorme surpresa que sentirei com a pobreza da coisa dita.

Mal a direi, e terei que acrescentar: não é isso, não é isso! Mas é preciso

também não ter medo do ridículo, eu sempre preferi o menos ao mais por

medo também do ridículo: é que há também o dilaceramento do pudor.

(Clarice Lispector, A paixão segundo G.H.)

3) É bastante comum que a relação de sentido entre as orações seja

capturada pelo usuário da língua sem que haja uma conjunção. No entanto,

colocando-a, a relação se esclarece. Veja:

Vestiu-se inadequadamente e proferiu muitos palavrões: foi

despedido sumariamente do emprego.

Embora não haja uma conjunção explícita, a segunda oração expressa

claramente uma conclusão, de maneira que poderia ser introduzida por

“por isso”, “portanto”, “logo” etc.

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AU L A 10

INTERJEIÇÃO
Interjeição

A palavra “interjeição” provém do latim “interjectio” – “ato de lançar

ou colocar entre”, de INTER, “no meio, entre”, mais JACERE, “jogar, atirar,

lançar”.

É a expressão da linguagem afetiva com que se exprimem estados

de emoção, sensações e estados de espírito. Seu caráter é quase sempre

exclamativo, embora possa aparecer interrogativamente (acompanhada de

interrogação) ou reflexivamente (acompanhada de reticências). É comum

vê-la isolada também por simples vírgula(s).

As verdadeiras interjeições não apresentam caráter vocabular, ou

seja, não são lexicalizadas. É o caso de hum, ei, eita, eba, opa, ué, ufa, tchau,
olá, hein, bis, tchau.

Fora as interjeições tradicionais, a verdade é que qualquer palavra –

ou mesmo frase – proferida com tom exclamativo, em caráter emocional,

pode se tornar uma interjeição:

Cuidado! (Advertência)

Obrigado! (Agradecimento)

Nossa! (Espanto)

Quê? (Incredulidade)

Viva! (Comemoração)

Bravo! (Aprovação)

Tomara! (Desejo)

Perdão! (Desculpa)

Xô! (Afugentamento)

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Locução interjetiva

São expressões de valor interjetivo:

Ai de mim!

Sangue de Jesus tem poder!

Ora bolas!

Ô de casa...

Que raios?

Que horror!

Sem dúvida!

Por seu caráter afetivo e expressivo, as interjeições aparecem

constantemente em poemas, músicas, orações, prosas e textos literários

em geral, conferindo a eles expressividade. Alguns exemplos:

Com açúcar, com afeto

Fiz seu doce predileto

Pra você parar em casa

Qual o quê!

Com seu terno mais bonito

Você sai, não acredito

Quando diz que não se atrasa

(Chico Buarque, Com açúcar, com afeto)

Quem me dera ouvir de alguém a voz humana

Que confessasse não um pecado, mas uma infâmia;

Que contasse, não uma violência, mas uma cobardia!

Não, são todos o Ideal, se os oiço e me falam.

Quem há neste largo mundo que me confesse que uma vez

foi vil?

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Ó príncipes, meus irmãos,

Arre, estou farto de semideuses!

Onde é que há gente no mundo?

(Fernando Pessoa, Poema em linha reta)

Salve, Rainha, 

mãe de misericórdia, 

vida, doçura, esperança nossa, salve! 

A Vós bradamos, 

os degredados filhos de Eva. 

A Vós suspiramos, gemendo e chorando, 

neste vale de lágrimas. 

Eia, pois, advogada nossa, 

esses Vossos olhos misericordiosos 

a nós volvei. 

E, depois deste desterro, 

nos mostrai Jesus, bendito fruto 

do Vosso ventre. 

Ó clemente, ó piedosa, 

ó doce Virgem Maria. 

Rogai por nós, Santa Mãe de Deus, 

para que sejamos dignos das promessas de Cristo.

(Salve Rainha, oração católica)

Observações

1) Após interjeição seguida de exclamação (ou interrogação, ou

reticências), usa-se letra minúscula:

Ah! que bom você ter vindo!

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2) Ó e Oh são interjeições com funções diferentes.

Oh expressa admiração, alegria, tristeza: Oh! esta é uma excelente

notícia!

Ó expressa apelo e aparece em vocativos: Ó Deus, que dor!

3) Sobre a grafia de algumas interjeições, ressalta Evanildo Bechara:

“certos sons vocálicos na escrita se representam de maneira convencional

ah!, oh!, hui!, hum!; o h no final pode marcar uma aspiração, alheia ao

sistema do português.

4) Alguns autores classificam as onomatopeias como fossem

interjeições. Tal classificação, no entanto, não parece a melhor, uma vez

que a natureza delas é diferente: enquanto a onomatopeia é uma figura de

linguagem que visa reproduzir sons de coisas e ações, a interjeição visa a

exprimir graficamente emoções e sentimentos humanos.

Sobre o assunto, pondera o Dicionário Houaiss:

«[existem interjeições] que apresentam sons articulados, com

fonemas que fazem parte do sistema da língua (ai, eba, ei, epa, oba,

opa, ui, xi etc.) e cujo caráter vocabular é mais definido, tendo uso

bastante generalizado e convencionado, embora algumas guardem

espontaneidade e expressividade bastante marcadas, como ai e ui (gritos

de dor, excitação); este tipo de interj. incorpora-se, de certo modo, ao


repertório comunicativo da língua, passando a fazer parte do vocabulário

desta.»

[...]

«[há interjeições] que praticamente não apresentam caráter

vocabular, já por serem constituídas de sons inarticulados, ou que não


fazem parte dos fonemas da língua, já por serem formadas por sequências

de fonemas que não ocorrem em outras palavras; tais interjeições são, de

certo modo, o limite da língua, pois, embora sejam emissões acústicas

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realizadas com o aparelho fonador e tenham função expressiva e

comunicativa, estão fora do sistema fonológico, assemelhando-se mais,

a este respeito, a elementos não linguísticos ou supralinguísticos como

os gestos, a entonação etc. (algumas dessas interjeições chegam a ter

uso relativamente convencional; além disso, podem ou não receber

representação gráfica mais ou menos padronizada): ó (vocativo); oh

(espanto etc.); x/ch (som do ch, para pedir silêncio); hm ou hm-hm ou

ham-ham ou hum-hum (representação do ruído que se faz ao pigarrear

para chamar a atenção sobre si, quando não se é notado, ou para sugerir

ironicamente que algo que foi dito não é verdadeiro); ha (desprezo, riso

etc.); hã (interrogação, surpresa).

Deve-se notar que as onomatopeias, embora sejam um recurso

expressivo associado à linguagem, diferenciam-se deste tipo de interj., pois

não traduzem um estado emocional; pode-se legitimamente considerar

a representação gráfica ou a imitação das interjeições deste tipo como

onomatopaicas (pois imitam sons, e não palavras, e podem estar inseridas

em um encadeamento frasal: morreu sem dizer ah/sem fazer um ah

sequer), mas sua realização espontânea na fala, ainda que onomatopaica

ou imitativa, é tipicamente interjetiva [...]; dentre as interjeições deste tipo,

[...] [incluem-se] aquelas que, além de ter uso relativamente convencional,

recebem representação gráfica padronizada e são compatíveis com as

regularidades da língua (p. ex., psiu [onomatopeia do som /ps/, us. para

chamar alguém ou pedir silêncio]; já, p. ex., pf [expressão de desprezo]

ou ts ou tsc [ruído que se faz com a língua no céu da boca, para exprimir

contrariedade ou reprovação] não se registraram) [...].»’

Fonte: Ciberdúvidas da Língua Portuguesa, https://ciberduvidas.

iscte-iul.pt/consultorio/perguntas/a-interjeicao-ai/23514 [consultado em
18-01-2022]

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AU L A 11

OS PORQUÊS
Os porquês

1) “Porque” (conjunção explicativa ou causal)

Possui o mesmo valor semântico de pois, uma vez que, tendo em

vista que. É utilizado para explicar ou mostrar a causa de alguma coisa.

Exemplo: Ele não foi buscá-la porque (uma vez que) não teve tempo.

Observação: Pode acontecer de vir no começo da frase: Porque

(uma vez que) não teve tempo de se trocar, foi com a roupa suja mesmo.

2) “Porquê” (substantivo) – É utilizado como sinônimo de razão,

motivo e geralmente vem antecedido por algum determinante (como

artigo, pronome ou numeral).

Exemplos:

Não há um porquê (motivo) para a ausência de minha mãe aqui.

Seus porquês (suas razões) não convenceram.

3) “Por que” pode ser empregado nas seguintes situações:

a) Por (preposição) + que (pronome interrogativo) valor adverbial

interrogativa

É utilizado geralmente no início de perguntas e equivale a por qual

razão, por qual motivo.

Exemplo: Por que (por qual motivo/razão) você não veio me buscar?

Às vezes, aparece no meio da pergunta direta.

Exemplo: Ele não disse por que (por qual motivo/razão) não veio me

buscar?

A pergunta pode, ainda, ser feita de forma indireta (sem ponto de

interrogação).

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Exemplo: Juliana deseja saber por que (por qual motivo/razão) eu

dormi tão cedo.

Caso haja um termo intercalado após “por que”, ele não deve ser

acentuado.

Não entendi por que, após tanto esforço, pretendem mudar o escopo

do projeto.

b) Por (preposição) + que (pronome relativo) – É utilizado como

sinônimo de pelo(a)(s) qual(is).

Exemplos:

A situação por que (pela qual) passamos foi difícil.

“Só eu sei as esquinas por que (pelas quais) passei.”

c) Por (preposição exigida por um termo) + que (conjunção

integrante)

Ansiamos por que o palestrante esclarecesse seu ponto de vista.

d) Por (preposição) + que (pronome indefinido), equivalendo a “por

qual”:

Estou curioso para saber por que motivo nossas malas não chegaram.

Perguntaram-me por que razão decidi lecionar.

Mas por que cargas d’água ainda estamos aqui? (“por que diabos”,

“por que raios”)

Pode acontecer de a palavra “motivo” ou “razão” estar subentendida:

  O empresário recusou-se a ter uma rede social, daí por que seu

produto caiu em esquecimento.

(Ou seja: daí a razão pela qual o produto caiu em esquecimento)

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4) “Por quê” (preposição + pronome interrogativo tônico)

Assim como “por que”, também é sinônimo de “por qual razão”.

No entanto, é utilizado geralmente ao final de frase (interrogativa direta

ou indireta), antes de marca final de pontuação (ponto final, interrogação,

exclamação) ou de reticências.

Exemplos:

Não vou lhe contar por quê.

Ele fez isso por quê?

Sei que ela está em silêncio há horas, mas não aconselho que você

lhe pergunte novamente por quê!

Ele me deu uma má resposta e eu não entendi por quê...

Mesmo que constitua uma frase isolada, caso haja referência clara

no contexto, também se grafa “por quê”.

Você deixou todas as roupas espalhadas pela casa. Por quê?

Precisamos nos unir e fazer um abaixo-assinado. Por quê? Porque, se

agirmos juntos, nossas chances são maiores.

Embora seja raro, pode ocorrer de o “quê” tônico ocorrer no meio da


frase.

Não sei por quê, mas tenho a impressão de que a ideia não dará certo.

A duquesa apareceu aos prantos no jornal. Como todos indagaram

por quê, ela não teve outra saída senão explicar-se.

 Sei quando há acento nas palavras. Explicar por quê é que são elas.

(=...explicar por que há acento nas palavras...)

 Sabemos que ele se mudou de país, mas revelar por quê ele não vai.

(=revelar por que ele mudou de país)

São sempre certeiras as observações colhidas pelo professor José

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Maria da Costa. Algumas delas:

Arnaldo Niskier - ao que parece com razão, já que não é

apenas no fim da frase que o que adquire tonicidade - é um pouco mais

abrangente, para não apenas possibilitar essa grafia com acento no fim

da frase, mas também em casos intermediários, em que há pausa, mas

no meio da frase, antes, por exemplo, de uma vírgula, ou mesmo de um

ponto e vírgula: “Por quê (separado e com acento) é usado em perguntas

quando vem seguido imediatamente por uma pausa”. Ex.: “O advogado

não sabe por quê, nem como, nem quando a causa foi perdida”.

Atento a essa circunstância, observa Celso Pedro Luft que, muito

embora o Acordo Ortográfico se retira ao que acentua apenas no fim da

frase, o certo é que, exatamente pela igual circunstância de que ele se

torna tônico, “a rigor, pelo mesmo motivo, se devia acentuar o que em

qualquer pausa (vírgula, ponto-e-vírgula)”.

Anote-se, por fim, que essas quatro distinções (porquê, porque,

por que, por quê) acham-se regularmente abonadas pelas regras de

ortografia e acentuação de nosso idioma, bem como pelo Vocabulário

Ortográfico da Língua Portuguesa, da Academia Brasileira de Letras,

órgão oficialmente incumbido de definir quais as palavras integrantes


de nosso léxico, além de sua correta grafia e acentuação.

Além disso, também a 1ª observação da 14ª regra da alínea


43 de acentuação gráfica das instruções do Formulário Ortográfico,

unanimemente aprovadas pela Academia Brasileira de Letras em sessão

de 12 de agosto de 1943, ao referir-se ao emprego do “acento circunflexo

para distinguir de certos homógrafos inacentuados as palavras que têm

e ou o fechados”, ordena que se acentue “porquê (quando é substantivo

ou vem no fim da frase)”, para distinguir de “porque (conjunção)”.

Em termos históricos, vale aditar, com Silveira Bueno, que “o fato

de empregarmos, diferentemente grafados, porque e por que, é muito

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recente”, com o que se buscou “indicar as funções diversas da palavra até

então sempre escrita num vocábulo só - porque”.

José Maria da Costa, em https://www.migalhas.com.br/coluna/

gramatigalhas/15581/porque

Os porquês na prática

Eu canto porque o instante existe

e a minha vida está completa.

Não sou alegre nem sou triste:

sou poeta.

(Cecília Meireles)

“Gosto de dizer. Direi melhor: gosto de palavrar. As palavras são

para mim corpos tocáveis, sereias visíveis, sensualidades incorporadas.

Talvez porque a sensualidade real não tem para mim interesse de

nenhuma espécie – nem sequer mental ou de sonho –, transmudou-

se-me o desejo para aquilo que em mim cria ritmos verbais, ou os escuta

de outros. Estremeço se dizem bem.”

(Livro do Desassossego, Fernando Pessoa)

Exercícios em aula

_______________________ fiz dieta, consegui emagrecer 20 kg.

Ainda não compreendemos o _______________________ de ela ter

desistido do curso.

Soube das desilusões amorosas _______________________ você passou


ao longo da vida.

Não consigo baixar o aplicativo, não sei _______________________ !

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Seu irmão já explicou _______________________ deixou de falar comigo?

Nos embargos, o advogado pediu ao juiz que fundamentasse

melhor os _______________________ motivadores da decisão.

Durante a viagem, _______________________ caminhei com pressa,

acabei torcendo o tornozelo.

Não vou ao baile e já expliquei _______________________.

As pessoas entenderam sua explicação _______________________ ela

foi clara e objetiva.

Todas as causas _______________________ briguei eram nobres.

A prova foi cancelada? _______________________?

Você saiu sem se explicar. Sugiro que volte e diga a ela

_______________________ .

Os cantores irão de avião simplesmente _______________________ está

chovendo?

Alguém já comentou _______________________ o céu está cheio de

fumaça?

Faremos o serviço _______________________ só assim será possível

ganhar o dinheiro de que precisamos.

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AU L A 12

SENÃO OU SE NÃO?
SENÃO OU SE NÃO?

“Senão” pode ter vários significados. Veja:

a) Do contrário

Sugiro que não me ligue mais, senão (=do contrário) bloquearei seu

número.

b) A não ser

Nunca uso vestido brilhoso, senão (=a não ser) em situações muito

formais.

c) Mas também

A audiência transcorreu de forma não apenas tranquila, senão (=mas

também) agradável.

d) Mas sim (ou simplesmente “mas”)

Não pretendo fazer prova para a Procuradoria da República, senão

(=mas sim) para a Procuradoria do Estado.

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O objetivo da bronca não foi assustar a criança, senão (=mas) educá-la.

“Se não”, por sua vez, significa “caso não”. “Se” é uma conjunção

condicional (introduz uma condição para que algo ocorra).

Se não (=caso não) estivesse tão sem tempo, convidá-lo-ia para

tomarmos um café.

A confusão acontece porque, não raramente, ambas as formas

cabem, dada sua semelhança de sentido.

Veja:

Sugiro que ele venha até aqui imediatamente, senão (=do contrário)

o juiz determinará condução coercitiva.

Sugiro que ele venha até aqui imediatamente; se não (=caso não), o

juiz determinará condução coercitiva.

No último caso, a vírgula após “se não” marca tanto a supressão do

verbo como a circunstância de condição: se não <vier>, o juiz determinará

condução coercitiva.

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AU L A 13

SINTAXE
SINTAXE

“Sintaxe” advém do grego “syntaxis”, passada para o latim, e significa

literalmente “ato de colocar em ordem, de arranjar”, formada por SYN-,

“junto”, mais TASSEIN, “ordenar, arrumar”.

A sintaxe estuda o emprego das classes de palavras e as relações

de regência, concordância e colocação que elas mantêm entre si, na

estruturação das orações, e as relações que se estabelecem dentro do

período. (Amini Boainain Hauy)

Falar em estudo do “emprego das classes de palavras” significa tratar

de sua ordem, do arranjo que elas estabelecem entre si e da função que

desempenham dentro da oração.

Fazer uma análise sintática é, portanto, entender a dinâmica, as

possibilidades e os mecanismos de construção da oração, percebendo as

implicações semânticas daí decorrentes.

Observação: “Morfossintaxe” é o estudo simultâneo da morfologia e

da sintaxe, ou seja, das classes gramaticais e suas funções sintáticas.

Para que se proceda ao estudo da análise sintática, deve-se

estabelecer o conceito de frase, oração e período.

• Frase é todo enunciado com sentido completo. Inicia-se com

letra maiúscula e finaliza-se com ponto (qualquer que seja ele).

Nas palavras de Maria Helena Moura Neves:

Unidade significativa da interação verbal produzida com um

propósito comunicativo definido: declarar, interrogar, ordenar, exclamar.

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Pode ser declarativa, interrogativa, exclamativa, imperativa, optativa.

Abaixo, há apenas uma frase em cada enunciado:

A vida é muito mais variada, anárquica e imprevisível do que

sonham os ideólogos. (Paulo Francis)

Já chegamos?

Fora!

• Oração é a estrutura sintática formada com a presença de um

verbo ou locução verbal.

Leia:

Veja, Lorena, aqui na mesa este anjinho vale tanto quanto o peso

de papel sem papel ou aquele cinzeiro sem cinza, quer dizer, não

tem sentido nenhum. Quando olhamos para as coisas, quando

tocamos nelas, é que começam a viver como nós, muito mais

importantes do que nós, porque continuam. (Lygia Fagundes Telles,

Os objetos – Antes do baile verde)

Na passagem citada, há tantas orações quantas são os verbos

marcados, ou seja, há 7 orações. No entanto, como só há 2 marcações


de ponto, há duas frases apenas.

Observação: “Quer dizer” e “é” (na expressão “é que”) não ensejam

orações. No primeiro caso, trata-se de locução denotativa usada para

introduzir um esclarecimento sobre algo. No segundo, “é que” é mera

locução expletiva de realce.

• Período é uma frase constituída de uma ou mais orações.

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Leia:

O certo é que todas essas coisas, carinhos, atenções, obséquios,

fizeram em mim uma transformação, que o natural sentimento da

mocidade ajudou e completou. Imaginam, creio eu?

- Não.

- O alferes eliminou o homem. Durante alguns dias, as duas

naturezas equilibraram-se; mas não tardou que a primitiva cedesse à

outra; ficou-me uma parte mínima de humanidade. Aconteceu então

que a alma exterior, que era dantes o sol, o ar, o campo, os olhos das

moças, mudou de natureza e passou a ser a cortesia e os rapapés da

casa, tudo o que me falava do posto, nada do que me falava do homem.

A única parte do cidadão que ficou comigo foi aquela que entendia com

o exercício da patente; a outra dispersou-se no ar e no passado. (Machado

de Assis, O Espelho)

No último parágrafo do trecho, há 15 orações (“passou a ser” é locução

verbal e enseja apenas uma oração) e 4 frases.

A primeira frase (“O alferes eliminou o homem”) contém apenas uma

oração. Chama-se, portanto, período simples. Todo período simples é uma

oração absoluta.

Já a segunda frase do trecho (Durante alguns dias[...]humanidade)

tem três orações. Quando há mais de uma oração no período, ele se chama

período composto.

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Termos da oração

Dado o conceito de oração, passemos a seu estudo aprofundado.

Chamam-se termos os elementos gramaticais que compõem as

orações. São eles:

{
simples
composto
1) Sujeito
indeterminado
oração sem sujeitos

2) Predicado
{ verbal
nominal
verbo-nominal

Sintaticamente, o verbo pode ser:

a) de ligação, quando haverá um predicativo do sujeito.

b) intransitivo

c) transitivo direto, quando haverá um objeto direto

d) transitivo indireto, quando haverá um objeto indireto

e) transitivo direto e indireto, quando haverá objetos direto e indireto.

3) Complemento
{ verbal

nominal { objeto direto

objeto indireto

{
adnominal
4) Adjunto
adverbial

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5) Aposto

6) Vocativo

7) Agente da passiva

Analisemos separadamente os termos:

1) Sujeito

O Sujeito é a pessoa do verbo, o ser sobre o qual se faz uma declaração;

é em sua função que se flexiona o verbo da oração.

O sujeito é expresso por um ou mais núcleos substantivos (ou

substantivados), ou equivalentes de substantivo, como, por exemplo,

pronomes pessoais, pronomes substantivos, numerais [substantivos],

orações substantivas, subordinadas ou reduzidas. (Amini Hauy)

Veja:

O alferes eliminou o homem. (Machado de Assis, O Espelho)

As grandes convivências estão a um milímetro do tédio. (Nelson

Rodrigues)

Engenhosos são os malabarismos da consciência.

[...] o sol trazia dissolvido na sua luz algum veneno misterioso

que [pronome relativo retomando “algum veneno misterioso”] vencia os

cuidados mais pacientes, ressequia a frescura das irrigações, esterilizava

o poder nutritivo do caroço com tanto custo obtido. (Rachel de Queiroz, O

Quinze)

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Classificações do sujeito

• Simples: tem apenas um núcleo.

Você acha Maria Inês bonita, mamãe? (Lygia Fagundes Telles, O

Menino)

Amar é dar razão a quem não tem. (Nelson Rodrigues)

Depois os dois deram-se os braços como há muito tempo não se

usava dar. (Chico Buarque, Valsinha)

Foi concedida, após inúmeros pedidos por parte do Autor, a

guarda da filha.

A maior desgraça da democracia é trazer à tona a força numérica

dos idiotas, que são a maioria da humanidade. (Nelson Rodrigues)

• Composto: tem mais de um núcleo.

Foram vendidas a casa e a cobertura no mesmo contrato.

A experiência de mil gerações, a guerra, a propaganda espírita,

as epidemias não conseguem nos reconciliar com a morte porque, dentro

de nós, muito em nosso íntimo, esperamos que ela seja vencida. A morte

é inimiga e imprópria. Há um modo divertido de falar na morte, entre

anedotas e piscadelas de olho, estando todos convictos que aquele

fenômeno tem qualquer coisa de subversivo e obsceno: adivinhamos nele

a suprema pornografia. (Gustavo Corção, A descoberta do outro)

Pode ocorrer de o sujeito – seja simples, seja composto – vir

subentendido, mas facilmente identificado pelo contexto ou pela

desinência, caso em que se diz ser o sujeito elíptico ou oculto.

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Observação: “Elipse” vem do grego elleipsis, passado para o latim, e

significa “supressão”. Analise:

[Nós] Chegamos tarde.

Vem, por favor não evites [tu]

Meu amor, meus convites,

Minha dor, meus apelos

[Eu] Vou te envolver nos cabelos

Vem perder-te [tu] em meus braços

Pelo amor de Deus!

(Chico Buarque, Sem fantasia)

Essa supressão pode ser de grande valia estilística, como se nota em

Construção, de Chico Buarque:

Amou daquela vez como se fosse a última

Beijou sua mulher como se fosse a última

E cada filho seu como se fosse o único

E atravessou a rua com seu passo tímido

Subiu a construção como se fosse máquina

Ergueu no patamar quatro paredes sólidas

Tijolo com tijolo num desenho mágico

Seus olhos embotados de cimento e lágrima

Sentou pra descansar como se fosse sábado

Comeu feijão com arroz como se fosse um príncipe

Bebeu e soluçou como se fosse um náufrago

Dançou e gargalhou como se ouvisse música

E tropeçou no céu como se fosse um bêbado

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E flutuou no ar como se fosse um pássaro

E se acabou no chão feito um pacote flácido

Agonizou no meio do passeio público

Morreu na contramão atrapalhando o tráfego

Observações: Comumente, o sujeito é simples, mas se liga pela

conjunção “e”, formando uma expressão de uma só ideia. Não se flexiona o

verbo, nesse caso:

“Lei e Ordem” é um seriado norte-americano.

“Casseta e Planeta” me fazia rir.

Pode ocorrer, por razões de ênfase, de o sujeito ser pleonástico:

Todos esses que aí estão

Atravancando meu caminho,

Eles passarão...

Eu passarinho!

(Mário Quintana)

• Indeterminado: ocorre quando não se quer ou não se pode

explicitar o sujeito. Ocorre de duas maneiras:

a) Quando há verbo na terceira pessoa do plural, sem referência a

um termo explícito presente no texto.

Falaram mal de você lá fora.

Se, depois de eu morrer, quiserem escrever a minha biografia,

Não há nada mais simples.

Tem só duas datas — a da minha nascença e a da minha morte.

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Entre uma e outra coisa todos os dias são meus.

(Fernando Pessoa como Alberto Caeiro)

Observação: Se o texto der clara referência, não se tratará de

sujeito indeterminado.

Exemplo: Todos os palestrantes chegaram no horário. Esperaram

apenas 5 minutos e logo começaram a palestra.

Nesse caso, os verbos sublinhados têm sujeito elíptico (todos os

palestrantes).

b) Verbo (de ligação, intransitivo, transitivo direto seguido de

preposição ou transitivo indireto) na terceira pessoa do singular + índice

de indeterminação do sujeito:

Pelo Tejo, vai-se para o Mundo. (Fernando Pessoa)

Lá em casa, sempre se falou muito alto.

Observações:

1) Quando se usa um pronome indefinido como sujeito, não


se pode dizer que há sujeito indeterminado. Embora a ideia seja de

indeterminação, o sujeito está escrito. Não se pode esquecer de que a

análise sintática se fundamenta na sintaxe. Exemplo:

Ninguém me perguntou nada.

Tudo era apenas uma brincadeira e foi crescendo, crescendo,

me absorvendo... (Peninha)

2) É muito comum, na linguagem coloquial, trabalhar-se com a


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ideia de indefinição do sujeito:

A morte é sempre um enigma. Você, quando se depara com a morte,

provavelmente nem sabe que se trata dela. Aí você embarca sem saber

quem está levando você nem para onde você vai.

A gente é muito engraçado, né? Adora ser paparicado, mas tem a

maior dificuldade para servir.

Note como, nos exemplos acima, “você” e “a gente” referem-se a um

sujeito psicologicamente indeterminado. Sintaticamente, no entanto, são

sujeitos simples determinados.

Oração sem sujeito

Algumas construções específicas se apresentam sem sujeito, o que

ocorre na presença dos chamados verbos impessoais. Não havendo sujeito,

não há razão para se flexionar o verbo para o plural. Seguem os principais

casos de oração sem sujeito:

a) “Haver” no sentido de existir, ocorrer e acontecer:

Houve muitos boatos sobre o sumiço da garota.

Haverá dias de paz nesta casa?

Havia cochichos por todo lado.

Observação 1: Nas locuções verbais, essa impessoalidade é transferida

ao verbo auxiliar:

Pode haver manifestações contra o aborto na Paulista hoje.

Deve haver festas organizadas pela Prefeitura nos próximos dias.

Creio que, depois do derradeiro sono, há de haver trevas e luzes.

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Observação 2: Os verbos “existir”, “ocorrer” e “acontecer” são pessoais

e se flexionam normalmente, inclusive quando compõem locuções verbais:

Aconteceram fenômenos naturais não explicados aqui nesta terra.

Devem ocorrer festas organizadas pela Prefeitura nos próximos dias.

Creio que, depois do derradeiro sono, hão de existir trevas e luzes.

Observação 3: O emprego do verbo “ter” no sentido de “haver” é

informal. Nesse caso, mantém-se a impessoalidade: Terá dias de paz nesta

casa? Tinha cochichos por todo lado.

b) “Fazer” indicando tempo ou aspectos naturais. Nesse caso, assim

como no anterior, a impessoalidade se transmite à locução verbal, quando

houver:

Faz seis anos que não nos vemos.

Nesta cidade fez verões intensos nas últimas décadas.

Vai fazer verões intensos nos próximos anos.

c) Verbos que indicam fenômenos da natureza.

Choveu, ventou, relampejou e nevou ontem perto da costa.

Amanheceu um pouco mais tarde hoje.

Observação: Caso esses verbos sejam empregados em sentido

figurado, terão sujeito normalmente. Exemplos: Choveram elogios ao

cantor. Meu sorriso amanheceu feliz por saber que meu marido chegaria

logo. Nos casos anteriores, “elogios” e “meu sorriso” são sujeitos. Não se trata

de orações sem sujeito, portanto.

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Atenção especial merece o verbo “ser”. Mesmo sendo impessoal quando

indica hora, data, e distância, ele se flexiona:

São seis da manhã.

Daqui até lá são seis quilômetros.

Amanhã já são trinta de março.

2) Predicado

É a declaração que se faz sobre o sujeito (quando há sujeito). Sempre

apresenta um verbo (ou locução verbal). Veja:

“Sou o vosso verdadeiro pai.” (Machado de Assis, A Igreja do Diabo)

“A misantropia pode tomar aspecto de caridade.” (Machado de Assis,

A Igreja do Diabo)

“Todas as formas de respeito foram condenadas por ele.” (Machado de

Assis, A Igreja do Diabo)

Esperavam os professores que o salário aumentasse.

Para que se possa classificar o predicado, é preciso compreender melhor

os termos que o compõem. Passemos a eles.

3) Verbo de ligação e predicativo do sujeito

Verbo de ligação é aquele que serve para relacionar o sujeito com seu

predicativo. São tidos como “vazios” pela gramática tradicional. Os principais

são: ser, estar, permanecer, ficar, continuar, tornar-se, transformar-se, parecer.

Predicativo do sujeito, por sua vez, é um termo que expressa qualidade,

estado ou condição do sujeito. Trata-se, portanto, de um atributo. Seu núcleo

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pode ser um adjetivo, um substantivo, um numeral, um pronome ou uma

palavra substantivada. Análise:

A padaria é meu lugar favorito.

Você parece faminta.

Fátima ficou arrepiada com a notícia.

Sua aula foi dez.

“É”, “parece”, “ficou” e “foi” são verbos de ligação. “Meu lugar favorito”,

“faminta”, “arrepiada com a notícia” e “dez” são predicativos do sujeito.

Como o verbo de ligação é apenas relacional, diz-se que o predicado,

nesses casos, não é verbal, mas, sim, nominal, pois o termo mais importante

é o predicativo. O verbo, como se disse, é vazio.

“É meu lugar favorito”, “parece faminta”, “ficou arrepiada com

a notícia” e “foi dez” são, portanto, predicados nominais, e o núcleo do

predicado, nesses quatro casos, é o predicativo do sujeito.

Ressalta-se que o predicativo do sujeito pode aparecer sem que haja

um verbo de ligação. Não é raro que figurem ao lado de verbos de ação:

Ele e eu assistimos ao filme esperançosos. (“Assistir” é verbo de ação;

“esperançosos” é predicativo do sujeito “ele e eu”.)

“Sozinho, no cais deserto, a esta manhã de Verão,

Olho pro lado da barra, olho pro Indefinido” (Fernando Pessoa)

(“Olho” é verbo de ação; “sozinho” é predicativo do sujeito elíptico

“eu”.)

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A mãe dos adolescentes caminhou ansiosa pela praia. (“Caminhar” é

verbo de ação; “ansiosa” é predicativo do sujeito “A mãe dos adolescentes”.)

4) Verbo intransitivo

Verbo intransitivo é aquele que, dentro do contexto, não exige um

complemento. Análise:

José Rodolfo morreu ontem pela manhã.

Os bailarinos dançaram mesmo sem música.

Cheirou a comida feita por ele.

Perceba como os verbos até podem ser acompanhados por adjuntos

adverbiais (que expressam circunstância), mas não pedem complemento.

Tradicionalmente, considera-se que os verbos indicadores de

deslocamento ou moradia são intransitivos, pois são acompanhados de

adjunto adverbial de lugar. Essa costuma ser uma dúvida muito comum,

pois o adjunto adverbial de lugar pode facilmente se confundir com um

complemento verbal. Veja:

“Moro num país tropical.”

Voltamos ao lugar de origem.

Note que, acima, a pergunta que se faz é “onde?” (ou “aonde?”), não “o

quê?”, de maneira que os termos “num país tropical” e “ao lugar de origem”

expressam circunstância de lugar, não se tratando, portanto, de objeto.

Nos exemplos anteriores, não há verbo de ligação nem predicativo, e o

núcleo do predicado são verbos que expressam ação (morar e voltar). Assim,

em ambos os casos, temos predicados verbais.

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5) Verbo transitivo direto e objeto direto

Verbo transitivo direto é aquele que, dentro do contexto, exige um

complemento sem preposição obrigatória. A esse complemento dá-se o nome

de objeto direto.

Finalmente, recuperei minha saúde. (Recuperei – VTD; minha saúde –

OD)

Chocolate nós só comemos aos finais de semana. (Comemos – VTD;

chocolate – OD)

Note que poderíamos substituir o objeto por um pronome, o qual

continuaria exercendo função de objeto. Veja: Finalmente, recuperei minha

saúde – Finalmente, recuperei-a. (Recuperei – VTD, a – OD)

Nos exemplos anteriores, não há predicativo nem verbos de ligação. Os

verbos empregados são de ação (recuperar e comer), de maneira que falamos

em predicado verbal.

6) Verbo transitivo indireto e objeto indireto

É aquele que exige um complemento com preposição obrigatória. A

esse complemento dá-se o nome de objeto indireto.

Concordo com meus pais a respeito da viagem. (Concordo – VTI; com

meus pais – OI)

Ele acreditou em minhas palavras. (Acreditou – VTI; em minhas palavras

– OI)

É raro, mas pode acontecer de um verbo ter dois objetos indiretos.

Exemplo: Contribua com suas aulas para nosso projeto de caridade. A esses

verbos, dá-se o nome de birrelativos.


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Nos exemplos anteriores, não há verbo de ligação nem predicativo.

Os verbos presentes são de ação (concordar e acreditar), de maneira que o

predicado é, portanto, verbal.

7) Verbo transitivo direto e indireto

Verbo transitivo direto e indireto – também chamado de bitransitivo – é

aquele que exige tanto complemento com preposição (objeto indireto) como

complemento sem preposição (objeto direto).

Assinei o jornal para você. (Assinei – VTDI; o jornal – OD, para você – OI)

Comunicamos o falecimento do diretor ao time. (Comunicamos – VTDI;

o falecimento do diretor – OD; ao time – OI)

Meus pais compraram um carro para meu irmão. (Compraram – VTDI;

um carro – VTD; para meu irmão – VTI)

Nos exemplos anteriores, não há verbo de ligação nem predicativo. Os

verbos apresentados não são vazios de sentido (assinar, comunicar, comprar).

Os predicados são, portanto, verbais.

Observações sobre objetos:

a) Pronomes podem funcionar como objetos tranquilamente:

Por que ele me expulsou da reunião? (me – OD)

Levei-os ao show no ano passado. (os – OD)

Fiz-lhe uma sobremesa deliciosa. (lhe - OI)

Eu te tenho como amigo. (te – OD, como amigo – PO)

b) O objeto direto eventualmente pode aparecer preposicionado. Nesse

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caso, não é o verbo que pede a preposição, mas ela aparece por algum motivo

relacionado a clareza ou a ênfase. Vejamos alguns casos:

Não convidei a ele. (a ele – OD preposicionado)

Convidei o palestrante a quem admiro. (a quem – OD preposicionado)

Amar a Deus sobre todas as coisas. (a Deus – OD preposicionado)

Façamos com que nossos filhos sejam fortes. (com que nossos filhos

sejam fortes – OD preposicionado)

Comemos do mesmo pão e bebemos do mesmo vinho. (do mesmo pão

e do mesmo vinho – ODs preposicionados)

c) Chama-se objeto direto pleonástico o pronome oblíquo átono que

retoma um objeto direto já apresentado no começo da oração:

Essas aulas, fi-las durante o fim de semana.

“Essas dificuldades, nós as temos. Mas não falei do encantamento de

lidar com uma língua que não foi aprofundada. O que recebi de herança não me

chega. Se eu fosse muda e também não pudesse escrever, e me perguntassem

a que língua eu queria pertencer, eu diria: inglês, que é preciso e belo.” (Clarice

Lispector)

Tudo o que ele construiu, quem o lembra?

A mim me parece inadequado esse comportamento.

d) Chama-se objeto direto interno aquele que aparece com uma palavra

cognada ou pertencente ao mesmo campo semântico do verbo.

Ele chorou um choro de gratidão.

“E sorria um sorriso pontual” (Chico Buarque)

Cochilei um sono dos justos hoje.


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8) Predicativo do objeto

Aparece nas construções em que um dos núcleos é um verbo transitivo

(direto ou indireto). O predicativo do objeto refere-se ao complemento desse

verbo e não faz parte desse complemento. Muitas vezes (nem sempre), trata-se

de uma condição imposta ao objeto pelo sujeito.

Um bom jeito de se verificar a presença do predicativo do objeto é

substituir o objeto por um pronome. Se o predicativo não “entrar” no pronome

e ficar de fora, trata-se efetivamente de um predicativo do objeto. Veja:

O sacerdote julgou o momento inadequado. (O sacerdote julgou-o

inadequado. Julgou - VTD; o momento – OD; inadequado – PO. Note que

“inadequado” é uma percepção do sujeito a respeito do objeto.)

Preciso dos meus irmãos sãos e salvos. (Preciso deles sãos e salvos. Preciso

– VTI; dos meus irmãos – OI; sãos e salvos – PO. Note que “sãos e salvos” é uma

necessidade do sujeito quanto ao objeto.)

“Génio? Neste momento

Cem mil cérebros se concebem em sonho génios” (Fernando Pessoa)

(Concebem – VTD; se – OD; génios – PO)

O bom líder faz forte sua equipe. (O bom líder a faz forte. Faz – VTD; sua

equipe – OD; forte – PO. Note que “forte” é uma mudança imposta pelo sujeito

ao objeto.)

Os concurseiros consideraram a prova razoavelmente difícil. (Os

consurseiros consideraram-na razoavelmente difícil. (consideraram - VTD; a

prova – OD; razoavelmente difícil – PO. Note que “razoavelmente difícil” é uma

percepção do sujeito sobre o objeto.)

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Nos casos anteriores, há tanto verbos de ação (julgar, precisar,

conceber, fazer e considerar) como predicativos do objeto (inadequado, sãos

e salvos, génios, forte, razoavelmente difícil). Nesse caso, dizemos tratar-se de

predicado verbo-nominal. Aliás, vale anotar: sempre que há um predicativo do

objeto, o predicado é verbo-nominal.

9) Complemento nominal

Trata-se de um termo que complementa o sentido de um substantivo,

adjetivo ou advérbio transitivo (ou seja, que pede complemento). O

complemento nominal vem sempre preposicionado e compõe outro termo

sintático.

Temos medo de seu retorno. (de seu retorno – CN de “medo”)

A luta contra nossos vícios exige esforço diário. (contra nossos vícios –

CN de “luta”)

Farei as malas, independentemente de sua opinião. (de sua opinião –

CN de “independentemente”)

Esse comportamento não é favorável à sua imagem. (à sua imagem –

CN de “favorável”)

Estou certo de nossa vitória. (de nossa vitória – CN de “certo”)

Pronomes oblíquos podem funcionar como complementos nominais.

Veja:

A campanha foi útil a mim. A campanha foi-me útil. (“a mim” e “me”

complementam o sentido do adjetivo “útil”).

10) Agente da passiva

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Relembre o que é voz passiva: são aquelas construções em que o verbo

de ação indica que o sujeito sofre a ação verbal. Nesses casos, o sujeito se

chama paciente e o praticante da ação, quando aparece, se chama agente da

passiva. Veja:

A escultura foi revestida de um veludo verde.

Note como a estrutura está na voz passiva analítica: o sujeito “as

escultura” sofre a ação verbal. Nesse caso, “foi revestida” é locução verbal e

“de um veludo verde” é agente da passiva justamente porque pratica a ação

dentro da voz passiva.

Passando para a voz ativa, teríamos:

Um veludo verde revestiu a escultura.

Veja como, passando da passiva para a ativa, o agente da passiva vira

sujeito e o sujeito vira objeto direto.

Mais exemplos:

Estão proibidas pela diretoria as transações com bitcoins.

Estive rodeado por/de fãs por toda a noite.

“Ao mesmo tempo que imaginário, era um mundo de se comer com os

dentes, um mundo de volumosas dálias e tulipas. Os troncos eram percorridos

por parasitas folhudas, o abraço era macio, colado.” (Clarice Lispector)

Observação: Pode ocorrer de o agente da passiva não aparecer. Nesse

caso, o praticante da ação é oculto. Note a diferença:

A cidade foi arruinada. (Na ativa: Arruinaram a cidade – sujeito

indeterminado)

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A cidade foi arruinada pelos bárbaros. (Na ativa – Os bárbaros arruinaram

a cidade – sujeito simples)

11) Adjunto adnominal

Trata-se de um termo que caracteriza um núcleo nominal, restringindo-o

ou determinando-o. O adjunto adnominal sempre faz parte da mesma função

do núcleo ao qual ele se refere. Analise:

Os meus dois irmãos mais novos moram na mesma cidade.

Na frase anterior, o sujeito é “Os meus dois irmãos mais novos”. O núcleo

é “irmãos”; os demais termos são adjuntos adnominais. “Na mesma cidade” é

adjunto adverbial, cujo núcleo é “cidade”; o pronome “mesma” e o artigo “a”

(presente em “na”) são adjuntos adnominais.

Chamamos as trinta primeiras sorteadas do dia.

Na frase anterior, “chamamos” é verbo transitivo direto; “as trinta


primeiras sorteadas do dia” é objeto direto, cujo núcleo é “sorteadas”. Os demais

elementos do objeto são adjuntos adnominais.

“tenho em mim todos os sonhos do mundo.” (Fernando Pessoa)

Na frase anterior, o verbo “ter” é transitivo direto; “todos os sonhos do

mundo” é objeto direto. O núcleo do objeto direto é “sonhos”. As demais palavras

do objeto direto (sublinhadas na frase) são adjuntos adnominais do núcleo

“sonho”.

“Todos os meus conhecidos têm sido campeões em tudo.” (Fernando

Pessoa)

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Na frase anterior, “todos os meus conhecidos” é sujeito da locução “têm

sido”. O núcleo do sujeito é “conhecidos”. As demais palavras do sujeito são

adjuntos adnominais. “Campeões em tudo” é predicativo do sujeito. O núcleo

do predicativo é “campeões”; “em tudo” é complemento nominal (“em tudo”

complementa “campeões”, pois quem é campeão é campeão em algo).

Observação importante: É fundamental ressaltar como muitas vezes o

contexto é importante para a percepção da diferença entre adjunto adnominal

e predicativo. Por exemplo:

Encontrei as vítimas mortas.

Se o sujeito já sabia que as vítimas estavam mortas, “mortas” é um

adjunto adnominal (encontrei-as). Se ele não sabia, “mortas” é um predicativo

do objeto (encontrei-as mortas).

Note, portanto, que o adjunto adnominal denota o máximo de aderência

do nome ao adjetivo, ao passo que o predicativo dissocia fortemente a qualidade

para colocá-la em relevo.

Outra observação importante: Diferenciar adjunto adnominal de

complemento nominal não é difícil. Quando eles parecem se confundir, basta

observar o seguinte: o complemento nominal tem caráter paciente, ao passo

que o adjunto adnominal tem caráter agente. Veja:

Todos repudiaram a atitude da secretária. (da secretária = adjunto

adnominal. Ela pratica a atitude.)

Todos repudiaram a morte da secretária. (da secretária = complemento

nominal. Ela sofreu a morte.)

Note que, não raramente, a frase é ambígua, deixando impossível

perceber se se trata de complemento ou adjunto:

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A escolha dos alunos foi certeira. (Os alunos escolheram algo ou foram

escolhidos? No primeiro caso, adjunto adnominal; no segundo, complemento

nominal.)

12) Adjunto adnominal

Termo da oração formado por uma ou mais palavras, responsável por

exercer a mesma função de um advérbio.

Sem sentimento nenhum, olhei a cena. (ADV de modo)

Venho de uma terra distante. (ADV de lugar)

O evento ocorreu no último dia 2. (ADV de tempo)

Irei de carro. (ADV de meio)

Fizemos a reunião, embora com atraso. (ADV de concessão)

Realizaste o plano conforme a lei? (ADV de conformidade)

Falemos acerca deste problema. (ADV de assunto)

A mulher padeceu de frio. (ADV de causa)

13) Aposto

Trata-se de um termo substantivo (ou equivalente) que esclarece,

especifica ou caracteriza um núcleo também substantivo ao qual se refere

(chamado fundamental). O aposto e o fundamental designam sempre o mesmo

ser, ideia, objeto ou fato e, por isso, equivalem-se. Assim, um pode substituir o

outro.

“A vida, essa coisa enorme, é que prende tudo e tudo une.” (Fernando

Pessoa) – aposto explicativo

Ele é Pedro, meu amigo de infância. – aposto explicativo

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Começou o mês de maio. – aposto restritivo

Meu cachorro Bono fugiu de casa. – aposto restritivo ou especificativo

“Nós nunca nos realizamos.

Somos dois abismos – um poço fitando o céu.” (Fernando Pessoa) –

aposto oracional

Serão todos bem-vindos: alunos, professores, diretores e monitores. –

aposto enumerativo

Foram feitas grandes descobertas – por exemplo: a energia elétrica e

o aquecimento solar. – aposto enumerativo

Pasta de dente, escova de dente, algodão, absorvente, tudo serviu para

ajudarmos as famílias carentes. – aposto recapitulativo ou resumitivo

Para uma alma se converter por meio de um sermão, há-de haver três

concursos: há-de concorrer o pregador com a doutrina, persuadindo; há-de

concorrer o ouvinte com o entendimento, percebendo; há-de concorrer Deus

com a graça, alumiando. (Pe. Antônio Vieira) – aposto enumerativo

Foi decretado feriado, o que nos deixou indignados. – aposto oracional

“Eu, filho do carbono e do amoníaco,

Monstro de escuridão e rutilância,

Sofro, desde a epigênese da infância,

A influência má dos signos do zodíaco.” – aposto explicativo (Augusto

dos Anjos)

14) Vocativo

Do latim vocativus (vocare = chamar) é o chamamemtno, a invocação,

a interpelação do ser com quem se fala (2ª pessoa do discurso).

Esse termo pode-se deslocar pela oração e é quase sempre marcado

por vírgula (eventualmente por exclamação, interrogação ou reticências).

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“Ó mar salgado, quanto de teu sal são lágrimas de Portugal?” (Fernando

Pessoa)

Deus, tende piedade de nós.

É verdade, Carla, tudo aquilo que disseram?

Ora, meu povo, quando vamos todos nos ver?

Bom dia, senhora, tudo bem?

Oi, alunos. Vamos começar?

Por fim, vale dizer que, tradicionalmente, os termos da oração se classificam

assim:

Essenciais: sujeito e predicado

Integrantes: objetos direto e indireto, complemento nominal e agente da

passiva

Acessórios: adjunto adverbial, adjunto adnominal, aposto

O vocativo não entra na classificação anterior.

Apenas a título de curiosidade: o predicativo do sujeito, quando está num

predicado nominal, é um termo essencial. Quando faz parte de um predicado

verbo-nominal, é um termo acessório. O predicativo do objeto, por sua vez, é tido

como um termo integrante. Grande parte dos autores, no entanto, nem sequer

faz essas menções.

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AU L A 1 3

EXERCÍCIOS E RESPOSTAS

PRONOME APASSIVADOR E

ÍNDICE DE INDETERMINAÇÃO
Exercícios

Identifique a função do pronome “se” e corrija o enunciado,

se necessário.

a) Nunca se viu tamanha censura nas redes sociais.

b) Nunca se viram tamanhas ações de censura nas redes sociais.

c) Nesta empresa, capacita-se novos funcionários com frequência.

d) Infelizmente, não se podem contar com jurados num tribunal.

e) Idealizam-se vidas sem problema quando não se conhecem

os outros.

f) Aceitam-se cheques.

g) Trata-se de duas ações de alimentos.

h) Precisa-se de novos funcionários.

i) Gosta-se de sapatos confortáveis.

j) Os funcionários me disseram que, na fábrica, espera-se novos

uniformes.

3
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k) Duvida-se de políticos profissionais.

l) Não se pode confiar em pessoas polidas demais.

m) Em Goiânia, vive-se bem.

4
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Gabarito:

a) Nunca se viu tamanha censura nas redes sociais. (PA. Frase correta)

b) Nunca se viram tamanhas ações de censura nas redes sociais. (PA.

Frase correta)

c) Nesta empresa, capacita-se novos funcionários com frequência.

(PA. Frase incorreta. Deveria ser “capacitam-se”. Passando-se para a voz

passiva analítica, teríamos, “Novos funcionários são capacitados”.)

d) Infelizmente, não se podem contar com jurados num tribunal.

(IIS. Frase incorreta. Deveria ser “pode contar”, pois “com jurados” é apenas

objeto indireto, não sujeito.)

e) Idealizam-se vidas sem problema quando não se conhecem os

outros. (PA em ambos os casos. Frase correta)

f) Aceitam-se cheques. (PA. Frase correta)

g) Trata-se de casos diferentes. (IIS. Frase correta)

h) Precisa-se de novos funcionários. (IIS. Frase correta)

i) Gosta-se de sapatos confortáveis. (IIS. Frase correta)

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j) Os funcionários me disseram que, na fábrica, espera-se novos

uniformes. (PA. Frase incorreta. Deveria ser “esperam-se”. Passando-se para

a voz passiva analítica, teríamos, “Novos uniformes são esperados”.)

k) Duvida-se de políticos profissionais. (IIS. Frase correta)

l) Não se pode confiar em pessoas polidas demais. (IIS. Frase correta)

m) Em Goiânia, vive-se bem. (IIS. Frase correta)

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AU L A 1 3

ÍNDICE DE INDETERMINAÇÃO

X PRONOME APASSIVADOR
Como já se disse, a palavra “se” pode desempenhar inúmeras

funções dentro da língua portuguesa (veja o arquivo anexo, retirado do

livro A Gramática para Concursos Públicos, de Fernando Pestana).

Para completar nosso estudo de sujeitos, vejamos o “se” como

pronome apassivador e índice de indeterminação.

Pronome apassivador
O pronome apassivador “se” acompanha sempre VTD ou VTDI na

terceira pessoa do singular ou do plural (ser singular ou plural depende de

qual é o sujeito). Forma-se, assim, voz passiva sintética, a qual quase sempre

pode se desdobrar em passiva analítica.

Observe:

A cozinheira comprou os ingredientes da receita. (Voz ativa)

Os ingredientes da receita foram comprados pela cozinheira. (Voz

passiva analítica)

Os ingredientes da receita foram comprados. (Voz passiva analítica

sem o agente da passiva)

Compraram-se os ingredientes da receita. (Voz passiva sintética)

Note que, na voz passiva, “os ingredientes da receita” é termo que

exerce função de SUJEITO. Essa é precisamente a razão pela qual o verbo

“comprar” aparece flexionado (compraram-se).

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Ambas as construções na voz passiva só são possíveis porque

estamos na presença de um verbo transitivo direto (comprar). Assim, o que

era objeto direto na voz ativa (“os ingredientes da receita”) vira sujeito na voz

passiva – tanto na analítica como na sintética.

Em outras palavras, o pronome apassivador só existe quando o verbo

é transitivo direto ou transitivo direto e indireto na voz ativa, pois só assim

haverá um objeto direto capaz de virar sujeito na voz passiva.

Mais exemplos:

Vendem-se casas. – Casas são vendidas.

Compram-se apartamentos. – Apartamentos são comprados.

Fazem-se unhas neste local. – Unhas são feitas neste local.

Soube que se concederam todos os pedidos que você fez. – Soube

que todos os pedidos que você fez foram concedidos.

Eles disseram que aqui se filmariam as cenas de terror. – Eles

disseram que aqui as cenas de terror foram filmadas as cenas de terror.

Arquivem-se os autos. = Sejam os autos arquivados.

Construir-se-ão viadutos na cidade de Goiânia. – Viadutos serão

construídos na cidade de Goiânia.

Ouviram-se inúmeros tiros quando do assalto. – Inúmeros tiros

foram ouvidos quando do assalto.

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Devem-se resolver rapidamente as pendências cartorárias. – As

pendências cartorárias devem ser resolvidas rapidamente.

Veja que, nesses casos todos, não se sabe quem é o praticante da

ação, uma vez que com raras exceções (que geralmente remontam à

literatura clássica), a voz passiva sintética é incompatível com a presença do

agente da passiva.

Agora note a diferença:

Trata-se de casos sérios. = De casos sérios são tratados???

É raro o dia em que não se assiste a desentendimentos neste

podcast. = É raro o dia em que desentendimentos não são assistidos...????

Precisa-se de assessores com experiência. = De assessores com

experiência são precisados????

Procedeu-se às devidas investigações após os crimes do ano

passado. = As devidas investigações foram procedidas??????

Nos casos acima, não é possível a transposição para a voz passiva

analítica por um motivo muito simples: as construções não estão na voz

passiva. O pronome “se”, no caso, é índice de indeterminação do sujeito.

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Índice de indeterminação do sujeito

O índice de indeterminação (ou pronome de indeterminação)

acompanha VL, VI ou VTI e sempre aparece na 3ª pessoa do singular, sem

sujeito explícito. Nesses casos, não é possível passar a oração para a voz

passiva analítica, permanecendo ela na voz ativa.

Na minha terra, é-se mais calmo. (Alguém é mais calmo, só não se

sabe quem.)

Precisa-se de garçonetes. (Alguém precisa, só não se sabe quem.)

Não acredito que se more bem nestas regiões tão ruidosas.

(Alguém não mora bem. Só não se sabe quem.)

Sua vez. Nas frases abaixo, identifique se o pronome “se” é índice de

indeterminação ou pronome apassivador.

Entrega-se o material no mesmo dia da compra.

Imagino que, nesta pequena cidade, sonhe-se com água encanada


e esgoto.

Soube que, neste prédio, alugam-se escritórios.

Na família de meu marido, briga-se por qualquer coisa.

Fica-se mais confortável nesta poltrona do que naquela.

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AUL A 1 4

ESTUDO DAS ORAÇÕES


Estudo das orações

Nas últimas aulas, estudamos os termos da oração, ou seja, analisamos

internamente que elementos sintáticos podem compô-la. Lembrando que,

quando a oração está sozinha dentro do período, chamamo-la de absoluta;

o período que só contém uma oração, chamamo-lo de período simples.

A partir de agora, analisaremos a relação entre as orações: entre si,

elas podem ser coordenadas ou subordinadas.

Coordenação e Subordinação

Termos sintáticos coordenados são aqueles que se colocam lado a

lado, desempenhando a mesma função.

Veja: (A melhor maneira de viajar é sentir)

“Ocupa de toda a tua força e de todo o teu poder quente

Meu coração a ti aberto!”

(Fernando Pessoa)

“[...]sou um globo

De chamas explosivas buscando Deus e queimando

A crosta dos meus sentidos, o muro da minha lógica,

A minha inteligência limitadora e gelada.”

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Note como, no primeiro exemplo, os adjuntos adverbiais

encontram-se lado a lado, desempenhando ambos a mesma função

(adjunto adverbial de modo).

No segundo exemplo, há várias coordenações: entre as orações

reduzidas de gerúndio (buscando Deus e queimando...), entre os

complementos de “queimando” (a crosta dos meus sentidos, o muro da

minha lógica, a minha inteligência limitadora e gelada) e entre os dois

adjuntos adnominais de “inteligência” (limitadora e gelada).

O mesmo raciocínio se aplica às orações. São coordenadas entre si as

orações que, estando no mesmo período, são sintaticamente independentes

entre si. Em outras palavras: uma oração fica simplesmente ao lado da outra,

sem que nenhuma exerça função sintática sobre a outra.

Veja:

“E agora, José? A festa acabou, a luz apagou, o povo sumiu, a noite

esfriou, e agora José?” 

(Carlos Drummond de Andrade)

As orações “A festa acabou”, “a luz apagou”, “o povo sumiu” e “a noite


esfriou” são colocadas lado a lado (ao que se dá o nome de justaposição),

sem que uma exerça função sintática sobre a outra. Como não apresentam

conectivo entre si, dizemos que são assindéticas (síndeto = conjunção, logo

“assindéticas” significa “sem conjunção”).

“E agora, José” não é uma oração, pois não apresenta verbo.

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Mais um exemplo:

“Eu canto porque o instante existe

e a minha vida está completa.

Não sou alegre nem sou triste:

sou poeta.”

(Cecília Meireles)

As duas últimas orações são coordenadas entre si. No entanto, perceba

como se trata de uma independência apenas sintática. Semanticamente,

a oração “sou poeta” claramente serve para explicar, esclarecer a oração

anterior. Ela não explica um termo da oração anterior, mas a oração inteira.

Assim, embora sintaticamente sejam coordenadas, há certo grau de

dependência semântica.

Agora note a diferença:

Espero que meus pais venham.

No período anterior, a oração “que meus pais venham” funciona

como objeto direto do verbo “esperar”. Se ela exerce uma função sintática,

dizemos tratar-se de uma oração subordinada. A oração “espero”, por sua

vez, é chamada de principal.

São subordinadas as orações que não possuem autonomia

gramatical, isto é, aquelas que estabelecem uma relação de dependência

com a oração principal.

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Outro exemplo:

“Só é lutador quem sabe lutar consigo mesmo.”

(Carlos Drummond de Andrade)

Na frase anterior, a oração “quem sabe lutar consigo mesmo” é

sujeito do predicado “é lutador” (“só” é palavra denotativa de inclusão). Na

ordem direta, teríamos:

Só quem sabe lutar consigo mesmo é lutador.

Novamente: se a oração sublinhada exerce função sintática, logo

dizemos tratar-se de oração subordinada. “Só é lutador” é oração principal.

Orações Coordenadas

As coordenadas podem ser assindéticas (quando aparecem sem

conjunção, caso em que são chamadas de justapostas) ou sindéticas


(quando ligadas por conjunção).

As sindéticas são classificadas como: aditivas, adversativas,

alternativas, conclusivas e explicativas. Vejamos cada uma delas:

Aditivas: expressam adição, soma, e são iniciadas por conjunção

aditiva (e, nem, mas [precedido de não só]);

Adversativas: expressam oposição, adversidade, e são iniciadas

por conjunção adversativa (mas, porém, contudo, entretanto, no entanto,

todavia);

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Alternativas: expressam alternância ou exclusão, e são iniciadas por

conjunção alternativa (ou, ou...ou, ora...ora, quer...quer, seja...seja).

Conclusivas: expressam conclusão e são iniciadas por conjunção

conclusiva (logo, portanto, por isso, pois [após o verbo], por conseguinte).

Explicativas: expressam explicação, justificativa, e são iniciadas por

conjunção explicativa (porque, pois, porquanto, que).

Vejamos alguns exemplos:

“Quero vivê-lo em cada vão momento

E em louvor hei de espalhar meu canto

E rir meu riso e derramar meu pranto

Ao seu pesar ou seu contentamento.”

As orações sublinhadas são coordenadas sindéticas adversativas. A

primeira oração é coordenada assindética.

Observação: Havendo sujeitos diferentes, vários são os autores que

defendem o emprego da vírgula antes da conjunção “e”, veja:

“Os adjetivos passam, e os substantivos ficam.” (Machado de Assis,

Balas de Estalo)

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“Afinal, a melhor maneira de viajar é sentir.

Sentir tudo de todas as maneiras.

Sentir tudo excessivamente

Porque todas as coisas são, em verdade excessivas

E toda a realidade é um excesso, uma violência,

Uma alucinação extraordinariamente nítida [...]”

(Fernando Pessoa)

A primeira oração sublinhada é coordenada sindética explicativa. A

segunda é coordenada sindética aditiva.

“Tende piedade, Senhor, de todas as mulheres

Que ninguém mais merece tanto amor e amizade

Que ninguém mais deseja tanto poesia e sinceridade

Que ninguém mais precisa tanto de alegria e serenidade.”

(Vinicius de Moraes)

As orações sublinhadas são coordenadas sindéticas explicativas.

A primeira da estrofe é coordenada assindética.

Ora nos movíamos com lentidão, ora caminhávamos com presteza.

As duas orações são coordenadas sindéticas alternativas.

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Os ônibus estavam lotados, por isso me atrasei tanto.

A oração sublinhada é coordenada sindética conclusiva. A primeira

é coordenada assindética.

Foi preciso não só fazer esforço, mas também desenvolver uma

técnica para carregar o piano.

A primeira oração é coordenada assindética. A segunda é

coordenada sindética aditiva.

Paralelismos semântico e sintático

“A ideias similares deve corresponder forma verbal similar. Isso é

o que se costuma chamar paralelismo ou simetria de construção. Trata-se

de uma diretriz, mas diretriz extremamente eficaz, que muitas vezes

saneia a frase, evitando construções incorretas, algumas, inadequadas,

outras.” (Othon Garcia)

Um bom texto, de maneira geral, é marcado por estruturas paralelas,

ou seja, construções regulares, correspondentes, tanto do ponto de vista

sintático como do semântico. Analise:

“A troca de algumas peças do armário, ou na forma como você

organiza suas roupas, pode fazer com que a possibilidade de combinações

aumente bastante.”

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Estão-se comparando dois elementos de natureza diferente (peças

e forma), rompendo o que se chama de paralelismo semântico; ademais,

a comparação é, por si mesma, estranha, pois se inicia com preposições

diferentes (de e em). A essa ruptura da estrutura textual, dá-se o nome de

quebra do paralelismo sintático.

Reescrita:

“A troca de algumas peças do armário ou a mudança na

organização das roupas pode fazer com que sua possibilidade de

combinações aumente bastante.”

Note como, agora, comparam-se dois substantivos abstratos (troca

e mudança).

Outra possibilidade:

“Trocar algumas peças do armário ou mudar a organização das

roupas pode fazer com que sua possibilidade de combinações aumente

bastante.”

Aqui, coordenam-se dois verbos no infinitivo: trocar e mudar.

Analise:

“O aumento do dólar resulta das incertezas relativas à estabilidade

política do país, como também das recentes declarações do Presidente.”

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No caso anterior, nota-se haver ruptura da coesão estrutural: usa-se

“como também” sem antes empregar a outra parte da locução conjuntiva

(não só...como também). Novamente, quebra do paralelismo sintático.

Corrigindo:

“O aumento do dólar resulta não só das incertezas relativas à

estabilidade política do país, como também das recentes declarações do

Presidente.”

Vejamos mais alguns exemplos com quebra de paralelismo tanto

semântico como sintático:

Como o curso de oratória vai me ajudar?

Você vai descobrir como e por onde começar da forma correta.

Os segredos para demonstrar suas ideias com clareza, objetividade;

Como ser mais convincente, ter maior capacidade persuasiva;

Habilidades que melhoram a sua postura profissional e te tornam

uma autoridade respeitada. 

Como apresentar mais segurança ao ser questionado por

clientes/colegas.

Como ser mais produtivo, imprimindo velocidade na explicação

de suas ideias.

Reescrita, uniformizando-se especialmente o início dos tópicos:

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Como o curso de oratória vai me ajudar?

Você descobrirá:

Como e por onde começar da forma correta;

Quais são os segredos para demonstrar suas ideias com clareza

e objetividade;

Como ser mais convincente e ter maior capacidade persuasiva;

Quais habilidades desenvolver para que sua postura profissional

transmita autoridade; 

Como apresentar mais segurança ao ser questionado por

clientes/colegas;

Como explicar melhor suas ideias.

“As atividades favoritas de meus filhos são equitação, natação e

fazer escalada.”

Reescrevendo:

“As atividades favoritas de meus filhos são equitação, natação e

escalada.”

“Existe uma enorme diferença entre candidatos e vagas

disponíveis no mercado.”

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Reescrevendo:

“Existe uma enorme diferença entre a quantidade de candidatos e

a de vagas disponíveis no mercado.”

“É plenamente possível exercitar-se todos os dias, seja na academia,

ou em parques.”

Reescrevendo: É plenamente possível exercitar-se todos os dias, seja

na academia, seja em parques.

“De um lado, a economia mostra melhoras. Além disso, ainda não

reconquistou investidores alemães.”

Reescrevendo: “De um lado, a economia mostra melhoras; de outro,


ainda não reconquistou investidores alemães.”

“A seleção brasileira enfrentará a Alemanha na semifinal.”

Reescrevendo:

“A seleção brasileira enfrentará a alemã na semifinal.”

Ou ainda:

“O Brasil enfrentará a Alemanha na semifinal.”

Observação: Quando dois ou mais elementos estão coordenados e o

primeiro está introduzido por preposição, pode ocorrer o seguinte:

Temos direito a suco e refrigerante.

Temos direito a suco e a refrigerante.

Temos direito ao suco e ao refrigerante.

Temos direito ao suco e refrigerante.

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Por fim, convém dizer que a quebra de paralelismo pode ser um

recurso de estilo muito bem-vindo, quando ocorre intencionalmente e de

forma bem construída:

“Ou a mulher é fria ou morde. Sem dentada não há amor possível.”

(Nelson Rodrigues)

“Marcela amou-me durante quinze meses e onze contos de réis.”

(Machado de Assis, em Memórias Póstumas de Brás Cubas)

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Como já se disse anteriormente, a coordenação trabalha com

estruturas de função ou valor sintático equivalente, a subordinação

estabelece relação de dependência entre tais funções.

As subordinadas podem exercer função de substantivo, adjetivo ou

advérbio, daí serem classificadas como subordinadas substantivas, adjetivas

ou adverbiais.

Orações subordinadas substantivas

Veja:

Espero nosso encontro.

Espero que eu encontre você.

Note como tanto “nosso encontro” como “que eu encontre você”

complementam o sentido do verbo “esperar”. “Nosso encontro” é um objeto

direto cujo núcleo é o substantivo “encontro”. Na segunda frase, esse termo

nominal foi substituído por uma oração, a qual chamamos de subordinada

substantiva (pois exerce função sintática própria de substantivo, como se

pôde perceber).

Assim, as orações subordinadas substantivas são aquelas que exercem

função sintática própria de substantivo em relação à oração principal.

Podem ser: subjetivas, objetivas diretas, objetivas indiretas,

completivas nominais, apositivas e predicativas do sujeito.

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Essa classificação segue o previsto pela Nomenclatura Gramatical

Brasileira (NGB), mas pode-se ainda dizer da existência das predicativas do

objeto, adjuntivas adnominais e agentivas, que não mencionaremos neste

material.

As orações subordinadas substantivas são geralmente introduzidas

por conjunções subordinativas integrantes (que e se), mas podem, ainda,

ser introduzidas por pronomes de interrogação (que, qual, quem, quanto),

pronomes indefinidos (quem, quanto), advérbios de interrogação (onde,

quando, como, por que) e advérbio de intensidade (quão).

Ressalta-se que não é preciso decorar esses conectivos que

introduzem as orações, mas entender sua função dentro delas.

Falemos sobre cada uma das classificações.

Subjetivas

Exercem função de sujeito.

Parece que os convidados se atrasarão.

Note que “que os convidados se atrasarão” é aquilo que parece;

trata-se do sujeito de “parecer”. Poder-se-ia dizer “isto parece”. O verbo

“parecer” é intransitivo. “Que” é conjunção subordinativa integrante.

Não foi dito se é preciso trocarmos de roupa agora.

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“Se é preciso trocarmos de roupa agora” é o que não foi dito.

Poder-se-ia dizer “Isto não foi dito”. A construção está na voz passiva. Não

se conhece o agente da passiva, ou seja, não se sabe quem disse. “Se” é

conjunção subordinativa integrante.

“Depois, quando jovem, em Belo Horizonte, eu sentia muito a

dificuldade de aproximação com as moças. Era proibido olhar para as

mulheres.” (Última entrevista de Carlos Drummond, Folha de São Paulo)

A oração sublinhada encontra-se reduzida de infinitivo (oração

subordinada substantiva subjetiva reduzida de infinitivo). Em seu modo

desenvolvido, teríamos: Era proibido que se olhasse para as mulheres. Nesse

caso, “que” seria uma conjunção subordinativa integrante. Poder-se-ia dizer

“Era proibido isto”.

Note que, em todos os exemplos anteriores, o pronome “isto”

desempenha função de sujeito.

Objetivas diretas

Exercem função de objeto direto.

“O senhor teve uma infância feliz?” Drummond – “Não sei se pode

chamar de feliz a infância, porque há sempre aqueles traumas da falta de

entendimento com os adultos, o mistério da vida que a gente não decifra.

Eu acho que uma criança pode ser tão feliz ou tão infeliz quanto um adulto

[pode ser]”. (Última entrevista de Carlos Drummond, Folha de São Paulo)

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As orações sublinhadas são objetivas diretas. A primeira completa o

sentido de “sei” e a segunda completa o sentido de “acho”. Poder-se-ia dizer

“Não sei isto” e “Eu acho isto” (sendo “isto” objeto direto). “Que” e “se” são

conjunções subordinativas integrantes. “Quanto um adulto” é uma oração

subordinada adverbial comparativa (estudaremos mais à frente).

Não vejo como o artista pode influenciar na sociedade brasileira.

(Última entrevista de Carlos Drummond, Folha de São Paulo)

A oração sublinhada é objetiva direta. “Não vejo” é a oração principal.

No caso, a objetiva direta é introduzida pelo advérbio de interrogação “como”.

Objetivas indiretas

Exercem função de objeto indireto.

Anseio por que consigamos melhores resultados.

Lembre-me de que preciso corrigir sua prova.

Nos exemplos anteriores, as orações sublinhadas completam o

sentido dos verbos “ansiar” e “lembrar-se” e são introduzidas por preposição.

Completivas nominais

Exercem função de complemento nominal.

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Refiro-me à esperança de que o evento não seja cancelado.

O verbo “referir-se” pede objeto indireto (à esperança de que o evento

não seja cancelado). Dentro desse objeto, o substantivo “esperança” pede

um complemento: quem tem esperança, tem esperança de algo. A oração

“de que o evento não seja cancelado” completa o sentido de “esperança”.

Trata-se, portanto, de uma oração subordinada substantiva completiva

nominal.

Veja que, assim como os complementos nominais, as orações

completivas nominais sempre integram outra função sintática. No caso, ela

se encontra dentro do objeto indireto do verbo “referir-se”.

“E a sua adolescência, como foi?” Drummond – “Tumultuada.

Depois da expulsão do colégio jesuíta, fui morar em pensão, em Belo

Horizonte. Tive a sorte de encontrar os melhores amigos da minha vida.”

(Última entrevista de Carlos Drummond, Folha de São Paulo)

Note o seguinte: o verbo “ter” pede o objeto direto “a sorte de


encontrar os melhores amigos da minha vida”. Dentro desse objeto, há o

substantivo “sorte”, o qual, por sua vez, pede um complemento nominal.

Quem tem sorte, nesse contexto, tem sorte de algo. A oração “de encontrar

os melhores amigos da minha vida” completa o sentido de “sorte”. Trata-se

de uma oração subordinada substantiva completiva nominal reduzida de

infinitivo, a qual se encontra dentro do objeto direto do verbo “ter”.

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Predicativas do sujeito

Exercem função de predicativo do sujeito.

A grande dúvida é se podemos mesmo sair.

Note como a estrutura já é sua conhecida: sujeito “A grande dúvida”

+ verbo de ligação (é) + predicativo do sujeito “se podemos mesmo sair”.

“Tornar-te-ás só quem tu sempre foste.

O que te os deuses dão, dão no começo. [...]

Contenta-te com seres quem não podes

Deixar de ser.” (Fernando Pessoa)

Nas duas orações predicativas sublinhadas, o sujeito é elíptico “tu”.

No primeiro caso, o verbo de ligação é “tornar-se”; no segundo, é “ser”. Ainda

no segundo caso, perceba como a oração predicativa encontra-se dentro do

objeto indireto “com seres quem não podes deixar de ser”, o qual completa

o sentido de “contenta-te”.

Apositivas

Exercem função de aposto.

Esta é minha maior motivação: que nossos f ilhos cresçam bons

e justos.

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A oração sublinhada visa a esclarecer o substantivo “motivação”

e tem com ele equivalência semântica, sendo, portanto, um aposto de

“motivação”. A primeira oração é a principal.

A grande preocupação dela – que pudesse viajar logo – infelizmente

se mostrou válida.

A oração sublinhada visa a esclarecer o substantivo “preocupação”

e tem com ele equivalência semântica. A oração principal é “A grande

preocupação dela infelizmente se mostrou válida”.

Observação: Como bem pontua o professor Celso Cunha, a gramática

de nosso idioma permite perfeitamente a omissão da conjunção integrante

“que” depois de certos verbos que exprimem ordem, desejo ou súplica. Essa

supressão é bastante elegante, inclusive.

É conveniente seja feito novo acordo.

Requer sejam tomadas novas medidas.

Penso seria terrível se você desistisse.

Subordinadas substantivas justapostas

Como já se disse, embora as orações subordinadas substantivas

desenvolvidas sejam geralmente introduzidas por conjunção integrante,

podem também não ser. Nesse caso, são chamadas de orações

subordinadas substantivas justapostas. Elas podem iniciar com pronomes

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de interrogação (que, qual, quem, quanto), pronomes indefinidos (quem,

quanto), advérbios de interrogação (onde, quando, como, por que) e

advérbio de intensidade (quão). Podem, ainda, iniciar sem nenhum tipo

de conectivo. Veja alguns exemplos:

Toda unanimidade é burra. Quem pensa com a unanimidade

não precisa pensar. (Nelson Rodrigues) (Oração subordinada substantiva

subjetiva justaposta)

Que seu coração palpite por mim um minuto por dia é quanto

basta a um amor que não busca nem as venturas do gozo, nem as galas
da publicidade. (Machado de Assis, Confissões de uma moça viúva) (Oração

subordinada substantiva predicativa justaposta)

Nunca conheci quem tivesse levado porrada.

Todos os meus conhecidos têm sido campeões em tudo. (Fernando

Pessoa) (Oração subordinada substantiva objetiva direta justaposta)

Muitos não sabem propriamente distinguir a originalidade da

excentricidade: uma caracteriza o génio, outra manifesta o louco.

(Fernando Pessoa) (Duas orações coordenadas que, juntas, compõem uma

estrutura subordinada substantiva apositiva justaposta)

Você já sabe onde vai morar? (Oração subordinada substantiva

objetiva direta justaposta)

Estou convencido, neste caso, de como devemos proceder. (Oração

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subordinada substantiva completiva nominal justaposta)

Só é verdadeiramente senhor do mundo quem está acima de suas

glórias fofas e das suas ambições estéreis. (Machado de Assis) (Oração

subordinada substantiva subjetiva justaposta)

Orações subordinadas adjetivas

Analise:

Preciso de uma roupa colorida.

Preciso de uma roupa que tenha cor.

Note como, no segundo caso, substituímos o adjetivo “colorida” pela

oração “que tenha cor”.

É justamente esta a função das orações subordinadas adjetivas:


exercer função sintática própria de adjetivo em relação à oração principal.

As adjetivas têm duas características fundamentais: iniciam-se,

quando desenvolvidas, com pronomes relativos (que, quem, o qual, cujo,

quanto, onde, como, quando) e sempre exercem função sintática de adjunto


adnominal. Assim como os adjuntos adnominais, essas orações sempre se

posicionam dentro de outras funções sintáticas.

Quanto à classificação, podem ser explicativas ou restritivas. Essa

distinção é evidenciada visivelmente pela pontuação, como se verá a seguir.

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Explicativas

Explicam o termo antecedente (que pode ser nome ou pronome) e

são marcadas por vírgula(s), travessão(ões) ou parênteses.

Os meus filhos, que estudam para concurso, saíram-se bem na

última prova.

Pedro tem uma forte síndrome do pânico (contra a qual luta há anos).

Drummond – A minha obra literária foi determinada pela

circunstância de eu ser mineiro. Mineiro do interior de Minas, uma região

de mineração, onde a dificuldade de comunicação era maior do que em

outras zonas do Estado. (Entrevista de Drummond à Folha de São Paulo)

Tio Juca – a quem serei eternamente grata pela ajuda – faleceu na

tarde de quinta passada.

O homem, que, nesta terra miserável, mora entre feras, sente a

inevitável necessidade de também ser fera. (Augusto dos Anjos)

Arre, estou farto de semideuses!

Onde é que há gente no mundo?

Então sou só eu que é vil e erróneo nesta terra?

Poderão as mulheres não os terem amado,

Podem ter sido traídos — mas ridículos nunca!

E eu, que tenho sido ridículo sem ter sido traído,

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Como posso eu falar com os meus superiores sem titubear?

Eu, que tenho sido vil, literalmente vil,

Vil no sentido mesquinho e infame da vileza.(Fernando Pessoa)

Restritivas

A vida é cheia de obrigações que a gente cumpre, por mais vontade

que tenha de infringir deslavadamente. (Machado de Assis, Dom Casmurro)

Art. 85. São crimes de responsabilidade os atos do Presidente da

República que atentem contra a Constituição Federal.

(Constituição da República)

Quem me dera ouvir de alguém a voz humana

Que confessasse não um pecado, mas uma infâmia;

Que contasse não uma violência, mas uma cobardia!

Não, são todos o Ideal, se os oiço e me falam. (Fernando Pessoa)

Há escritores (ai de nós!) cujo maior título é uma pontualidade

ou uma atitude: estar escrevendo. Vivem num particípio presente que

não participa de um presente. Estão na literatura como os generais

na ativa. Reformados, vai-se-lhes o prestígio; mortos, fica um registro

nos almanaques e outro na sepultura. Há no mundo dois mundos, um

de pedra e outro de neblina: geologia e meteorologia. Na literatura há

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também montanhas e brisas. Os livros que encontramos são, na maior

parte, como as correntes de ar; e sua leitura tem a brevidade e o enfado

de uma gripe. Leu-se; sofreu-se; acabou-se. (Gustavo Corção, Reflexões

inúteis sobre escritores inúteis)

Assim como as substantivas, as adjetivas também podem ser

justapostas, o que vai ocorrer quando elas não forem iniciadas por

pronomes relativos, mas, sim, por pronomes interrogativos (que, quem,

qual, quanto) ou advérbios interrogativos (onde, como, quando, por que).

Ainda temos os tapetes de quando morávamos em nosso

primeiro apartamento.

As conquistas de quem se esforçou verdadeiramente são bem

mais saborosas.

Observações:

1) Note que há diferença quando se diz, por exemplo:

Meu filho que estuda piano é adolescente.

Meu filho, que estuda piano, é adolescente.

No segundo caso, por se tratar de adjetiva explicativa, a pessoa tem

apenas um filho ou o contexto deixa evidente que se está falando daquele

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filho especificamente. No primeiro caso, por se tratar de adjetiva restritiva,

ela tem mais de um filho, mas ressalta que apenas o que estuda piano

é adolescente.

2) Como já se disse em outro momento deste material, é fundamental

observar a regência nas orações adjetivas. Exemplos:

Finalmente nos livramos das roupas de cujos modelos não gostamos.

As marcas brasileiras contra cujos valores eu me posiciono não

entram na minha casa.

As pessoas de quem/das quais/de que falei acabam de chegar.

O que é a esperança, para o senhor? Drummond – Um fio muito

fino, ao qual eu me agarro para não morrer desesperado.

Sugere-se revisar o capítulo sobre pronomes relativos.

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Orações subordinadas adverbiais

As orações subordinadas adverbiais funcionam como verdadeiros

adjuntos adverbiais em relação à oração principal. Isso significa que, assim

como os adjuntos adverbiais, elas exprimem circunstâncias diversas. Elas

são introduzidas por conjunções ou locuções subordinativas adverbiais.

Observe:

Ismália

Quando Ismália enlouqueceu,

Pôs-se na torre a sonhar...

Viu uma lua no céu,

Viu outra lua no mar.

No sonho em que se perdeu,

Banhou-se toda em luar...

Queria subir ao céu,

Queria descer ao mar...

E, no desvario seu,

Na torre pôs-se a cantar...

Estava perto do céu,

Estava longe do mar...

E como um anjo pendeu

As asas para voar...

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Queria a lua do céu,

Queria a lua do mar...

As asas que Deus lhe deu

Ruflaram de par em par...

Sua alma subiu ao céu,

Seu corpo desceu ao mar...

(Aphonsus de Guimarães, Ismália )

Os trechos sublinhados exprimem circunstância: na primeira oração

(Quando Ismália enlouqueceu), temos uma circunstância temporal, ou seja,

ela pôs-se a sonhar exatamente no instante em que enlouqueceu. Nesse

caso, a conjunção que introduz a oração é “quando” (conjunção temporal) e

a oração em si se chama subordinada adverbial temporal.

A segunda oração sublinhada trabalha com um verbo elíptico:

E, como um anjo [pende], [Ismália] pendeu as asas para voar. O fato de

esse verbo estar elíptico não invalida o fato de se tratar de uma oração. No

presente caso, ela indica comparação (entre a forma como um anjo pende

e a forma como Ismália pende), daí dizermos que como um anjo [pende] é

uma oração subordinada adverbial comparativa.

Vale dizer que esta matéria é fundamental para o bom

desenvolvimento da coesão textual. Conhecer os conectivos aqui

apresentados sem dúvida faz com que o usuário do idioma articule muito

melhor seus pensamentos por meio de palavras.

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De acordo com a Nomenclatura Gramatical Brasileira, há 9 tipos

de orações adverbiais: causais, consecutivas, condicionais, concessivas,

conformativas, comparativas, finais, proporcionais, temporais.

1) Causais

Exprimem causa, razão do pensamento expresso na oração principal.

Conjunções e locuções conjuntivas causais: que (= porque), porque,

como (=porque), visto que, já que

Como a professora se atrasou, os alunos decidiram ir embora.

Tudo terminaria bem, visto que estávamos prontos.

Eu me dispus a ajudá-lo, mas, já que você chegou, ajude-o você!

2) Consecutivas

Exprimem consequência, efeito, resultado da oração principal.

Conjunções e locuções conjuntivas consecutivas: que (quando

ligado a uma expressão de natureza intensiva presente na oração

principal, como tão, tanto, tal, tamanho), de maneira que, de modo que,

de sorte que, de tal modo que, de tal maneira que

Entendi seu ponto de vista, de maneira que retificarei o meu próprio.

Ficou em casa, de sorte que pôde ver a passeata de sua janela.

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E ali dançaram tanta dança

Que a vizinhança toda despertou

E foi tanta felicidade

Que toda cidade se iluminou

E foram tantos beijos loucos

Tantos gritos roucos como não se ouvia mais

Que o mundo compreendeu

E o dia amanheceu em paz

(Chico Buarque, Valsinha)

Eventualmente, o termo intensivo (tão, tamanho etc.) fica elíptico.

Exemplo: Bebia, que era uma lástima. Ou seja: Bebia [tanto], que era uma

lástima. Outro exemplo: É triste, que faz chorar. Ou seja: É [tão] triste, que

faz chorar.

3) Condicionais

Exprimem principalmente condição para que se realize ou deixe

de se realizar o que se declara na principal. Podem, ainda, exprimir ideia

de hipótese, eventualidade.

Conjunções e locuções conjuntivas condicionais: se, caso (jamais

“se caso”), contanto que, sem que, a menos que

Caso nós nos atrasemos, pode ligar para a polícia.

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Estrutura-se bem o trabalho, contanto que haja planejamento.

Não permita Deus que eu morra,

Sem que eu volte para lá;

Sem que desfrute os primores

Que não encontro por cá;

Sem qu’inda aviste as palmeiras,

Onde canta o Sabiá.

(Gonçalves Dias, Canção do Exílio)

No caso do poema acima, as orações condicionais têm, em seu

interior, orações subordinadas adjetivas (que não encontro por cá, onde

canta o Sabiá). Esse tipo de ocorrência é bastante comum, uma vez que,
como já estudado, as orações adjetivas são sempre parte de alguma função

sintática, pois funcionam como adjuntos adnominais.

A gente sentava num banco, cinco ou seis sujeitos se espremiam,

para ver quem caía do banco primeiro. Era bom, era gostoso. Naquele

tempo não tinha gelo, eletricidade, cinema, automóvel. Mas a gente vivia

muito bem e não sentia falta de nada. Hoje, se a televisão for suspensa, a

criança morre de desgosto. (Carlos Drummond de Andrade, em entrevista

para a Folha de São Paulo)

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4) Concessivas

Exprimem concessão, ou seja, um fato que se concede, se admite,

opondo-se à oração principal. Nesse caso, o conteúdo da oração concessiva

exprime um obstáculo insuficiente para modificar ou impedir o conteúdo

da principal.

Conjunções e locuções conjuntivas concessivas: embora, mesmo

que, apesar de que, conquanto, posto que

Observação: É bastante comum que se empregue a locução

conjuntiva “posto que” com valor causal. Tal não é a lição, no entanto, dos

autores clássicos.

Sairemos ao meio-dia, mesmo que as malas não estejam prontas.

A moça, conquanto fosse solitária, amava a própria vida.

Ainda que eu falasse as línguas dos homens e dos anjos, e não

tivesse amor, seria como o metal que soa ou como o címbalo que retine.

E ainda que tivesse o dom de profecia, e conhecesse todos os

mistérios e toda a ciência, e ainda que tivesse toda fé, de maneira tal

que transportasse os montes, e não tivesse amor, nada seria.

E ainda que distribuísse todos os meus bens para sustento dos

pobres, e ainda que entregasse o meu corpo para ser queimado, e não

tivesse amor, nada disso me aproveitaria.

(São Paulo, Carta aos Coríntios)

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5) Conformativas

Exprimem acordo ou conformidade do conteúdo presente na

subordinada em relação ao conteúdo presente na principal.

Conjunções e locuções conjuntivas conformativas: conforme, como,

segundo, consoante

Procedemos conforme nos foi pedido.

Consoantediz o professor Olavo de Carvalho, “Eis a que se resume

a famosa rebeldia do adolescente: amor ao mais forte que o despreza,

desprezo pelo mais fraco que o ama”.

6) Comparativas

São as orações que exprimem um ser com que se compara o ser da

oração principal.

Conjunções e locuções conjuntivas comparativas: como, tal qual,

qual, tal como

O lugar fedia tal qual você descreveu.

O garoto agiu como se estivesse numa festa.

A noite fecundava o ovo dos vícios

Animais. Do carvão da treva imensa

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Caía um ar danado de doença

Sobre a cara geral dos edifícios!

Tal uma horda feroz de cães famintos,

Atravessando uma estação deserta,

Uivava dentro do eu, com a boca aberta,

A matilha espantada dos instintos!

(Augusto dos Anjos, As cismas do destino)

Tende piedade da mulher no instante do parto

Onde ela é como a água explodindo em convulsão

Onde ela é como a terra vomitando cólera

Onde ela é como a lua parindo desilusão.

(Vinicius de Moraes, O desespero da piedade)

Note que, no último caso, o verbo está subentendido: Onde ela é

como [é] a água explodindo em convulsão. É bastante comum que o verbo

esteja elíptico nas comparativas. Exemplo: Ninguém treinou tanto quanto

Ricardo [treinou].

Essa elipse, inclusive, pode trazer alguns desentendimentos. Veja a

piada abaixo, que se constrói a partir de tal recurso:

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O ser humano come mais banana do que macacos. Quer ver?

Quantos macacos você comeu na última semana?

Note que poderíamos interpretar da seguinte forma: “O ser humano

come mais banana do que [ele come] macacos” ou então “O ser humano

come mais banana do que macacos [comem bananas]”.

A confusão ocorre justamente pela elipse dos termos na

oração comparativa.

As comparações podem ainda ser quantitativas. Nesse caso, as

principais locuções conjuntivas são tanto/tão...como/quanto, mais...que/do

que, menos...que/do que.

Um homem pode saber mais do que muitos [sabem], mas nunca

mais do que todos [sabem].

Dormir nesta cama é tão desconfortável quanto dormir no chão.

7) Finais

Exprimem finalidade, objetivo da oração principal.

Conjunções e locuções conjuntivas finais: para que, a fim de que,

porque (=para que), que (=para que)

Fiz sinal que se calasse. [=para que se calasse]

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Faça tudo o que puder porque tais encrencas sejam evitadas. [para

que tais encrencas...]

A fim de que sejamos amigos, precisaremos acertar algumas arestas.

E a Constituinte? Drummond – Eu gostaria muito que ela fosse

realmente uma Constituinte. Mas vejo pouca probabilidade de se formar

um grupo realmente poderoso e consciente, que seja de bons patriotas,

para que possa fazer uma boa Constituição.

8) Proporcionais

Expressam proporção. O fato trazido pela oração subordinada

exprime fato que aumenta ou diminui na mesma proporção do fato

declarado na principal.

Locuções conjuntivas proporcionais: à medida que, à proporção

que, tanto mais...quanto mais, tanto mais...quanto menos, tanto menos...

quanto mais.

Ela se sentia melhor, à medida que cantava. (Observação: Jamais “na

medida que” ou “na medida em que”)

Quanto mais eu sinta, quanto mais eu sinta como várias pessoas,

Quanto mais personalidades eu tiver,

Quanto mais intensamente, estridentemente as tiver,

Quanto mais simultaneamente sentir com todas elas,

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Quanto mais unificadamente diverso, dispersadamente atento,

Estiver, sentir, viver, for,

Mais possuirei a existência total do universo,

Mais completo serei pelo espaço inteiro fora,

Mais análogo serei a Deus, seja ele quem for,

Porque, seja ele quem for, com certeza que é Tudo,

E fora d’EIe há só EIe, e Tudo para Ele é pouco.

(Fernando Pessoa)

Ressalta-se que, no exemplo anterior, as orações subordinadas

proporcionais são as segundas (introduzidas por “mais”), pois são elas que

expressam os fatos proporcionalmente vinculados aos presente nas outras

orações (principais).

9) Temporais

Expressam tempo de realização do fato expresso na principal.

Conjunções e locuções conjuntivas: quando, antes que, logo que,

mal (=quando), assim que, eis que, até que

Quando os gatos saem, os ratos fazem a festa.

Iniciei meus trabalhos mal ele saiu de casa.

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Estaremos juntos até que a morte nos separe.

Vai-se a primeira pomba despertada…

Vai-se outra mais… mais outra… enfim dezenas

De pombas vão-se dos pombais, apenas

Raia sanguínea e fresca a madrugada.

E à tarde, quando a rígida nortada

Sopra, aos pombais de novo elas, serenas,

Ruflando as asas, sacudindo as penas,

Voltam todas em bando e em revoada.

(Raimundo Correia, As Pombas)

Observações finais:

1) As orações adverbiais, assim como as substantivas e adjetivas,

podem ser justapostas:

Não conseguiram respirar, tão assustados estavam. (oração

subordinada adverbial causal justaposta)

Foi difícil diferenciá-los, tamanha era a semelhança entre ambos.

(oração subordinada adverbial causal justaposta)

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Fizessem esforço real, teriam conseguido entender o mapa. (oração

subordinada adverbial condicional justaposta)

2) A NGB não registra formalmente as orações adverbiais locativas,

modais e de companhia, as quais, no entanto, são bastante comuns. Veja:

Não pode haver bom resultado onde tudo é brincadeira. (oração

subordinada adverbial locativa)

O psicopata agiu mansamente, sem que ninguém notasse seu plano.

(oração subordinada adverbial modal)

Onde me espetam, fico. (Machado de Assis, Um apólogo) (oração

subordinada adverbial locativa)

Irei ao cinema com quem quiser me acompanhar. (oração

subordinada adverbial de companhia)

Vale dizer, de toda forma, que outros tipos de circunstâncias

podem aparecer sob a forma de orações, as quais eventualmente não são

classificadas formalmente pela NGB. O contexto deve ser sempre levado

em conta.

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