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Prof. Dr. Lauri Emílio Wirth
Orientador e Presidente da Banca Examinadora
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Prof. Dr. Lauri Emílio Wirth
Coordenador do Programa de Pós-Graduação
INTRODUÇÃO .................................................................................................. 12
1 “EU NÃO CONHEÇO SANTIDADE QUE NÃO SEJA SOCIAL”: ASPECTOS DA
SENSIBILIDADE SOCIAL EM JOHN WESLEY .............................................. 16
1.1 Preocupação social: Um compromisso público de John Wesley .............. 19
1.1.1 Graça Social: uma crítica wesleyana sobre as exclusões sociais .................... 21
1.1.2 Santidade social para erradicar as desigualdades sociais ............................... 24
1.1.3 O espírito da teologia wesleyana e o metodismo no Brasil? ............................ 31
1.1.4 Utilizar o pensamento teológico Wesleyano para reforçar o que? .................... 32
1.2 Espiritualidade neoliberal e a negação dos subalternos no Brasil .............. 34
1.3 Wesley, os pobres e a teologia wesleyana latino-americana ....................... 40
1.4 Crises e impactos teológicos no metodismo brasileiro ............................... 41
1.4.1 Os resquícios teológicos do metodismo estadunidense no Brasil .................... 43
1.4.2 Superação teológica e pastoral do metodismo brasileiro é possível? .............. 45
1.4.3 Divergências e conflitos do conservadorismo no metodismo brasileiro ........... 47
2 O NEOLIBERALISMO: HISTÓRIAS E IMPLICAÇÕES .................................. 50
2.1 Raízes neoliberais na sociedade .................................................................. 54
2.1.1 Principais teóricos do neoliberalismo .............................................................. 55
2.1.1 Friedrich August von Hayek ............................................................................. 56
2.1.2 Milton Friedman ............................................................................................... 57
2.1.3 Sociedade de Mont-Pèlerin ............................................................................. 58
2.2 A implantação do pensamento neoliberal na América Latina .................... 58
2.2.1 Neoliberalismo em terras brasileiras ................................................................ 60
2.2.2 Os efeitos colaterais do neoliberalismo no Brasil ............................................. 64
2.2.3 Críticas ao sistema econômico neoliberal ........................................................ 68
3 NEOLIBERALISMO EM CONFRONTO COM A SENSIBILIDADE SOCIAL
WESLEYANA NO METODISMO BRASILEIRO .............................................. 72
3.1 A cultura do consumo apoderando-se do campo religioso ....................... 73
3.1.1 O mundo e as religiões em crise na sociedade neoliberal ............................... 75
3.1.2 A sacralização do mercado e a inversão dos direitos sociais .......................... 78
3.1.3 A inversão do conceito de justiça social e suas consequências ...................... 81
3.2 Religião Social: Um caminho teológico para o metodismo brasileiro ...... 83
3.2.1 Wesley o indivíduo e a salvação social no século XVIII ................................... 85
3.2.2 Sensibilidade social: A identidade teológica Wesleyana .................................. 88
3.2.3 História e contribuição do Credo social à Igreja Metodista brasileira ............... 90
3.3 Metodismo no Brasil: negar o mercado ou a sensibilidade social? ........... 93
3.4 O social como projeto salvífíco de Deus no Brasil ...................................... 96
CONSIDERAÇÕES FINAIS .......................................................................... 100
REFERÊNCIAS ............................................................................................. 103
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INTRODUÇÃO
O tema que será apresentado é de interesse e para ser mais exato é uma
obsessão do autor compreendêlo, justamente por sua complexidade que envolve este
movimento religioso chamado metodismo, integrante do “protestantismo de missão”.
Outro motivo para aprofundar esta pesquisa é que este mesmo grupo religioso faz
parte da história de vida do autor, desde os seus três anos de idade. Pois é neste solo
que estão as raízes de sua vida religiosa e sua relação com a história do metodismo
no Brasil. Desta realidade brotaram alegrias e os conflitos, satisfações, frustações que
foram aumentando ao longo do tempo.
Mas quando este caminho começou a embaraçar-me, surgiram muitas
amizades profundas e da mesma forma distanciamentos dolorosos. Devido ao clamor
e luta por justiça social na sociedade capitalista e por trabalhar para erradicar as
inúmeras desigualdades sociais existentes entre nós.
A discussão sobre este tema aborda a tensão teológica, missiológica e pastoral
no seio do metodismo brasileiro. Ao longo do tempo, foram feitas inúmeras tentativas
para a igreja metodista no Brasil se aproximar do pensamento teológico do seu
fundador histórico, John Wesley, especialmente a um dos elementos essenciais da
sua concepção teológica: a sensibilidade social.
A motivação para esta pesquisa surgiu da necessidade de se investigar o
porquê da igreja metodista no Brasil se silenciar e ter se distanciado de uma das suas
principais bases teológicas, e isso num país marcado por contrastes de exclusão e
desigualdade social. Assim, o desenvolvimento da dissertação se dá pela vivência
acadêmica e também no cotidiano do labor ministerial.
Pessoalmente o autor, que hoje é pastor da Igreja Metodista em Cornélio
Procópio – Paraná vivenciou um contato com um grupo de metodistas em 1995, ano
em que sua cidade, Jandaia do Sul – localizada no norte do PR decretou estado de
calamidade pública por uma situação anormal, provocada por um forte temporal de
chuva de granizo que causou grandes danos e prejuízos à cidade.
Essa experiência trouxe sua mãe a conhecer a Igreja Metodista, na década de
noventa. Os metodistas tinham uma ênfase nacional neste período: “comunidade
missionaria a serviço do povo”, foi por ela que o autor e sua mãe foram salvos e
resgatados. Na época eles moravam numa das periferias da cidade, que foram mais
13
afetadas pela tempestade, por conta que todos os telhados desta vila eram cobertos
de telhas de Eternit, fibrocimento ondulada que foram totalmente destruídas.
O cenário de destruição tornou-se pior, quando sua avó que estava cuidando
do autor no momento do temporal, sofreu um enfarto abraçada com o mesmo,
embaixo de uma pequena mesinha de madeira de peroba. Foi essa mesinha que os
protegeu das grandes pedras, porém infelizmente a sua avó faleceu momentos após
o temporal passar.
Esta é a história que fez o autor se interessar por um dos aspectos essenciais
da teologia wesleyana. Imagine uma criança, abraçada com a sua avó, enfartando um
grande perigo e, após a tempestade cessar, serem acolhidos por um grupo religioso
que mal conheciam. Pois bem, foi assim que conheceram a Igreja Metodista brasileira.
Em um dos momentos mais difíceis e dolorosos da vida, o grupo aplicava a sua
teologia em sua missão local, “somos sensíveis ao sofrimento humano e assumimos
um compromisso em acolher e cuidar dos moradores dos bairros mais atingidos da
cidade”. Esse foi um trecho da fala dos fiéis da Igreja Metodista na época para a mãe
do autor. Com o passar do tempo, o autor viria a entender que a atitude daquela
comunidade expressava a fidelidade bíblico-teológico-histórico-pastoral da tradição
wesleyana, um conceito chave do pensamento teológico de John Wesley, qual seja,
a salvação social de grupos subalternos na sociedade.
Assim sendo, a pesquisa suscitou o seguinte questionamento: O que está
acontecendo na sociedade que tem conduzido o movimento metodista no campo
religioso brasileiro a se distanciar, nas últimas décadas, da prática teológica,
missionária e pastoral do seu fundador histórico? Um dos aspectos centrais do
pensamento wesleyano é o de que todos somos “sociais”, em essência, e que a
religião deveria ser vista também por esse viés.
Para responder essa questão, a pesquisa se desenvolve em três capítulos,
além desta introdução. No primeiro capítulo analisamos a contribuição wesleyana no
campo teológico, se referindo ao reconhecimento de que grande parte da dinâmica e
vigor de John Wesley nasceu da coerência que está entrelaçada com as dimensões
materiais, sociais e pessoais. Nosso ponto de partida é sobre a vida e obra de John
Wesley, em textos significativos que discutem a densidade histórica do metodismo
nascente com diversos teólogos que interpretam a herança metodista no contexto
brasileiro.
14
1
“John Wesley faz sínteses, em geral, acrescentando algo na sua visão modificada pelas práxis, ou
seja, seu pensamento teológico foi transformado ao longo de sua história de vida, após conhecer outras
realidades teológicas e sociais” (JOSGRILBERG, 2009, p. 48).
18
influência dos pais da igreja, talvez essa perspectiva cumpriu apenas a função de
resgatar a teologia wesleyana colocada no século XIX e começo do século XX.
Para não romantizarmos, apontaremos que Wesley não teve os “pés na terra”
e a “cabeça nas nuvens”. Suas sínteses são elaboradas a partir de suas relações
sociais, por isso, não podemos nos iludir ou esperar uma coerência absoluta, até em
seus escritos. Encontramos margem para várias interpretações, às vezes
contraditórias. Por isso, é preciso reconhecer as incoerências e imperfeições da vida.
De forma idêntica isso acontece nas sínteses de Wesley.
Mesmo incompletas, elas foram suficientes para arquitetar seu caminho.
“Nunca passou pela cabeça de Wesley, ser um revolucionário ou reformador social,
mas o mesmo pregava sobre a importância do social para a salvação humana”,
(JOSGRILBERG, 2009, p. 49).
Para Josgrilberg (2009), o caminho teológico retratado em suas sínteses foi
buscar um novo caminho que se confirmasse na prática, assim ele estava longe do
dualismo luterano entre razão e fé. Ele se aproximou mais perto de uma perspectiva
anglicana, temperada pelo arminianismo, que buscou entender o mundo e o ser
humano, a sociedade e o indivíduo, sustentados e confrontados com a experiência e
explicados pela prática do caminhar pessoal, comunitário e social.
A fim de ultrapassar e entender algumas insuficiências em que descrevem o
social em Wesley podemos indicar como exemplo, que metodistas se utilizam do
Credo social da igreja, tratando-o com viés doutrinal apenas para fins evangelísticos.
Além das sínteses teológicas wesleyanas é necessário, mapear a gênese das ideias
do indivíduo e do social que motivaram o fundador do movimento metodista. A partir
de uma prática coerente da sua cosmovisão que conseguiremos ler suas sínteses que
contemplam as relações de um indivíduo com a sociedade.
Contudo é importante ressaltar que não se trata de revisitar uma teologia
perfeita ou acabada, muito pelo o contrário, a mesma deve estar em constante
avaliação, reconhecendo sempre suas limitações com o tempo e o contexto de sua
aplicação teológica, mas o que se destaca na trajetória de Wesley é sua preocupação
e sua presença social, mesmo que de cunho assistencial em obras como Escolas,
bibliotecas públicas, publicações, atendimento médico aos necessitados, socorro aos
pobres (famintos, viúvas, órfãos, pessoas desempregadas), manifestações públicas,
denunciando à escravidão, e muitas outras formas (JOSGRILBERG, 2009, p. 50).
19
É por este viés que nasce o metodismo na Inglaterra do século XVIII, período
marcado pelas questões sociais e por um cristianismo conhecido pela sua esterilidade
20
2
Max Weber fala em "poderoso revival do Metodismo", na Inglaterra.
21
fase em que viveu a tentação de interiorização e fuga e foi advertido sobre os perigos
da negação do aspecto social da fé (SOUZA, 2019, p. 20-22).
Com isso, surge a ênfase nas questões sociais na tradição metodista, o
conceito “social” é uma das marcas que caracterizam o metodismo por conta que
aparecem com muita frequência e com significados variados. John Wesley, por
exemplo, falou sobre a “religião social” da “santificação social”, e sobre a expressão
“Graça social” (RENDERS, 2006, p. 26).
3
“A soteriologia social é parecida com um tecido que acompanha a topografia sócio-econômica e
religiosa da época, procurando caminhos para a superação dos seus impasses, da sua desesperança
e irresponsabilidade em relação aos pobres. Wesley parte para a análise do efeito de diversas
soteriologias dos seus dias no cotidiano, as quais são marcadas pela demorada transição entre a época
medieval e a modernidade. Entendemos a soteriologia social como eixo principal da teologia de John
Wesley que se manifesta numa típica antropologia, cristologia, pneumatologia, escatologia, eclesiologia
e soteriológica, que caracterizou sua teologia nos aspectos comunitários, sinergéticos e públicos no
comprometimento com os pobres” (RENDERS, 2006, p. 24).
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Isso se evidencia numa advertência aos metodistas que começavam a ficar ricos, para
que deixassem de crer que são melhores que as pessoas em situação de
necessidade, fazendo as seguintes críticas a respeito da forma que a economia os
estava influenciando a viverem uma religiosidade solitária e egoísta, segundo Ribeiro
(2015, p. 91):
[...] John Wesley, faz outras fortes críticas aos ricos que “deixam de dar
dinheiro aos pobres a fim de comprar veneno [coisas vãs] para si ou ainda os
que guardam dinheiro em cofres ao mesmo tempo em que alguns irmãos
pobres passam por necessidades [...] são loucos e cruéis. Wesley destaca
ainda que a grande maioria deles [dos ricos] está debaixo da maldição
especial de Deus, posto que segundo o teor geral de suas vidas não somente
estão roubando a Deus, mas também os pobres. Wesley, baseado na
referência bíblica de Mateus 25.40 (“Quando fizeres a um desses pequeninos
a mim fizestes”), enfatiza a importância de se “dar aos pobres com intenção
pura e com retidão de coração”. Inspirado em Provérbios 19.17 (“Quem dá
aos pobres empresta a Iahweh”) relativiza a posse dos bens materiais e
destaca em plano maior a solidariedade e a recompensa escatológica.
Essa citação nos dá uma ideia da realidade em que viviam os subalternos que
inspiravam a sensibilidade social wesleyana. É esse o chão que determina a porta de
entrada da leitura teológica de Wesley. Neste sentido, o movimento metodista
primitivo tinha como característica se aproximar das realidades sociais, entender a
realidade, pois a vida, em sua concretude, com suas mazelas e dissabores, é o lugar
onde se articula e se entretece a prática pastoral e a teológica do movimento
metodista. Porta de entrada que toma em conta as necessidades concretas da vida
diária, dos grupos sociais mais afetados e marginalizados na sociedade.
Depreende-se que estas realidades são dinâmicas e que os irmãos Wesley
buscavam estar em sintonia e presença com o lugar social dos subalternos. Na citação
acima, é nítido que a prática pastoral procurou ouvir os silêncios, as dores, os
gemidos, os suspiros daqueles/as que estão mais vulneráveis na sociedade,
revelando que a teologia, no pensamento teológico de John Wesley, exige um
exercício de suspeita e sensibilidade para escutar e sentir as realidades sociais.
26
4
Diante deste conceito é necessário estabelecer aqui uma diferença entre “economia com mercado” e
“economia de mercado”. Economias pré-capitalistas são economias com mercado, onde o mercado
exerce uma função secundária na esfera econômica da sociedade. A produção de bens, em sua grande
parte, não é destinada primeiramente ao mercado, mas sim para a satisfação das necessidades da
comunidade. Isto é, o valor de uso – a utilidade – dos produtos tem prioridade sobre o valor de troca.
Nesse tipo de sociedade, membros da comunidade não são abandonados à fome em nome da
racionalidade econômica (SUNG, 2014, p. 293).
5
Uma “economia de mercado” é um sistema econômico controlado, regulado e dirigido apenas por
mercados; a ordem na produção e distribuição dos bens é confiada a esse mecanismo autor regulável.
Uma economia desse tipo se origina da expectativa de que os seres humanos se comprometem de
maneira a atingir o máximo de ganhos monetários (POLANYI, 1980, p. 81).
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não deveriam ser distribuídos na lógica de mercado, mas a questão é que a lógica
deste sistema não foi elaborada para acolher todos e sim alguns, e para isso é
necessário o sacrifício de muitos para a acumulação de capital de poucos.
Deste modo, a cada dia que se passa aumentam as desigualdades sociais e
os necessitados são deixados do lado de fora e tornam-se vítimas do sistema. Na
sociedade de mercado, não há nada que não possa em princípio ser distribuído como
mercadoria, como objeto de comércio, tudo está à venda.
Precisamos urgentemente pensar seriamente a respeito da relação entre
teologia e economia e os pressupostos teológicos dos quais o capitalismo se utiliza
para legitimar seus interesses, para entendermos que não há vida sem comida,
bebida, roupa, casa, saúde, liberdade e afeto/acolhimento, pois aqueles que não
podem pagar ou contribuir serão submetidos à condição de exclusão social.
O modelo econômico capitalista é difundido no mundo como único caminho
para salvação, suas leis são elaboradas pelo deus-mercado, a cada dia torna-se uma
espécie de dogma da religião capitalista, tendo um caráter inquestionável. Com isso,
essa ideologia estabelece apenas uma condição para os que não têm acesso ao
mercado: a morte. Dito de outra maneira, quem não segue a lógica do mercado está
condicionado à morte. Isto porque para se ter acesso ao mercado sagrado que
proporciona vida, necessita-se de dinheiro. Logo, estar na condição de excluído do
mercado é o mesmo que não poder usufruir do desenvolvimento econômico e social
(SUNG, 2008).
Mas somente aqueles e aquelas que são impulsionados pelo amor e compaixão
para com o próximo serão capazes de compartilhar e doar-se. Falamos daqueles que
entregam suas vidas para defender a dignidade humana que está ameaçada pelos
mecanismos de morte do sistema e esses que se intrometem na discussão sobre a
economia, em nome da fé, para que ela esteja a serviço de todos os seres humanos.
Com isso, a concepção desses e dessas é gerada pelo Deus da vida que defende a
vida ameaçada (SUNG, 2010, p. 26).
Numa época de crise, como a que estamos vivenciando, percebemos que
existem possibilidades e caminhos alternativos para rompermos com está logica
desumana que tem afetado a vida de muitos. A teologia Wesleyana foi fundamental
para responder ao seu contexto, mesmo diante das ambiguidades do movimento que
existem até os dias atuais. Mas se a Graça de Deus é um dom, é gratuita para todos
e todas, algo imerecido, algo que vem de Deus ao nosso encontro, para transformar
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todas as realidades e fazer que sejamos guiados pelo Espírito de Deus, que seja
assim, que a usemos para que não haja nenhuma vida humana em situação de
opressão social.
Foi pela Graça de Deus que John Wesley percebeu que a salvação
ultrapassava as questões individuais, espirituais e privadas e alcançava também as
questões sociais, ou seja, ele ampliou a sua visão até nas dimensões sociais e
históricas. Para Wesley, a salvação implica no reconhecimento das realidades sociais
como uma condição necessária à prática da fé (SOUZA, 2019, p. 23).
Agora podemos entender a insistência de John Wesley com o movimento
metodista primitivo na Inglaterra, a fé no Deus de Jesus Cristo e sua santidade social
pressupõe uma proposta de organização econômica para que não exista mais
nenhum necessitado na sociedade sejam elas, crianças, adolescentes, jovens,
homens, mulheres e idosos nesta condição.
O movimento liderado por John Wesley praticava um princípio da tradição
bíblica chamado Ato de Compartilhar que tinha como objetivo colocar tudo em comum,
na possibilidade de cada um em dividir, segundo as necessidades de cada um, para
que seja extinta nas relações sociais esta condição de desigualdade e exclusão na
sociedade. Assim descreve Josgrilberg (1993, p. 51-52), sobre as obras de
misericórdia como meios prudenciais da Graça de Deus:
Estas marcas prudenciais são descritas como “Social grace” “Graça social”.
Assim, o metodismo primitivo era orientado por John Wesley a incluir as “obras de
misericórdia”, compreendidas como ações que buscavam beneficiar, acolher e
compartilhar vida com o próximo. Ou seja, os meios da graça se desdobravam em
“relacionamentos de solidariedade” (RENDERS, 2006, p. 355).
Por isso, que “ações sociais”, em sua perspectiva, não tinham relações com a
visão dos reformadores nomeada de “Justiça das obras”, onde o objetivo era de
ganhar a Graça de Deus através das boas obras. Ação social, para o movimento
metodista tem outro sentido. Significa ser transformado no encontro com outras
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pessoas, não se tratava apenas como uma via de mão única, caminhando da pessoa
cristã bem-intencionada ao outro, sob pressão e marginalizado. A forma que John
Wesley entendia era que neste encontro algo acontecia, o praticante de misericórdia
também era transformado no encontro com seus irmãos e irmãs e com o próprio Deus
que está intimamente ligado ao encontro com o outro (RIEGER, 2012, p. 40).
Sem dúvida, os desafios diante de uma sociedade entrelaçada com a economia
de mercado são imensos, “Uma vez dito que fora do mercado não há salvação”, se
faz necessário criticar essa tese que é um dos passos de confrontação para o
impedimento do estabelecimento de tal ideologia (MEEKS, 2002, p. 9).
De acordo com esta lógica, de que fora do mercado não há salvação,
conforme o dogma do neoliberalismo teríamos que conhecer o funcionamento do
sistema de mercado em sua plenitude. Como esse conhecimento pleno não é
possível, não podemos ter certeza de que o mercado gerará o bem necessário para
sociedade. O fato é que essa racionalidade econômica que surge como salvação não
solucionou os problemas sociais de uma grande parcela da comunidade humana.
Segundo os fiéis cegos do neoliberalismo, a deficiência do mercado é culpa dos
sujeitos que em nome das metas sociais impedem a liberdade total do sagrado, o
deus-mercado.
Sendo assim, falta de fé no fundamentalismo de livre-mercado desponta como
diabólico, pois impede a plena manifestação deste sagrado. Este modelo econômico
que foi imposto às sociedades, é contra o ato de compartilhar a vida em todos os seus
aspectos, sua política se revela como uma economia inclinada à vantagem individual,
ou seja, ao lucro e a sua maximização. Nesse âmbito tudo vira mercadoria a serviço
do lucro, inclusive a pessoa humana. E para isso, o lucro é o elemento mágico para
legitimar e apoiar a possibilidade de explorar, violentar, massacrar e exterminar a
humanidade.
Neste sistema econômico vigente, o bem real é individual, logo, toda forma
comunitária deve ser extirpada em prol do privado, e a instrumentalização para atingir
tal objetivo chama-se livre-mercado. Para isso, deve haver um terreno propício para o
assentamento dessa instrumentalização, o Estado não pode intervir, deve-se reduzi-
lo ao mínimo e que prevaleça a única lei da demanda e da oferta que é o coração do
comércio, e que tudo possa ser considerado mercadoria (SELLA, 2003, p. 142).
Dito isto, percebe-se que o neoliberalismo se apresenta como uma fé idolátrica,
porque atribui traços divinos a uma instituição humana, e mesmo que tal instituição
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A sua reflexão nos ajuda a colocarmos os nossos pés no chão, porque quando
tentamos resgatar uma tradição religiosa devemos nos lembrar que talvez ela é há
muito tempo indesejada por alguns setores da igreja, é o caso dos grupos
conservadores que lideram e controlam grande parte das instituições protestantes no
Brasil. Portanto, quando apontamos que a teologia wesleyana tem uma contribuição
para o metodismo hoje é por causa da responsabilidade social.
No caso, o que nos importa muito mais é o espírito da teologia e da prática de
Wesley do que um conjunto fixado e descontextualizado de seu pensamento
teológico. No campo teológico, a necessidade metodológica que os interessados e
interessadas em responsabilidade social necessitam é de recriar e não resgatar o
metodismo no Brasil.
pastorais com uma metodologia própria. Claudio de Oliveira Ribeiro (2015, p. 17)
destaca a presença dos atuais grupos que formam a Igreja Metodista:
país uma espiritualidade que se identifica apenas com a benção de Deus com bens
materiais e um tipo de avivalismo individualista.
Agora o nosso intuito é de compreender a parte conceitual do neoliberalismo,
assim como, os seus pressupostos teológicos, justamente porque muitos acreditam
até os dias atuais que a economia é uma ciência moderna, que não tem relação com
a ética social, e muito menos com a teologia, onde a própria deveria tratar apenas de
assuntos “celestiais”. A grande questão é que a ciência econômica está diretamente
amparada em pressupostos teológicos, exatamente porque a economia aborda
questões relativas à vida humana e social. Deste modo, o estudo nomeará esses
pressupostos teológicos da atual ordem econômica como uma espécie de
espiritualidade neoliberal, analisando suas causas e intenções (SUNG, 2010, p. 26).
Portanto, a economia neoliberal inserida na sociedade de modo geral,
apresenta-se como possível solução salvífica para o desenvolvimento econômico em
diversos países do mundo, inclusive no Brasil. As consequências são perceptíveis nas
diferentes crises sociais, com seus mecanismos de negação da ética social e dos
direitos humanos. Nisto o mundo enfrenta inúmeros desafios como a crise ambiental;
a concentração de renda, que tem provocado a maior desigualdade e exclusão social
da história. Assim descreve o teólogo católico, Jung Mo Sung (2018, p. 41),
especialista em teologia e economia:
6
Ludwig von Mises foi renomado líder da Escola Austríaca de pensamento econômico.
7
O conteúdo desse mito alude à promessa de amplificar a toda comunidade humana o padrão de
consumo das elites dos países hegemônicos. Porém nas entrelinhas desse comprometimento, o padrão
de consumo da elite dos países pobres torna-se inquestionáveis, visto que esses países orientam toda
a produção industrial no modelo de substituição de importações. E ao inviabilizar o questionamento, o
38
mito pode se absolutizar, consequentemente o paraíso terrestre almejado por uma minoria pode
resultar no estabelecimento de um inferno para uma parcela considerável, em que o mecanismo
vitimador se mantem operante e os sacrifícios de vidas humanas que emanam de suas engrenagens
permanecem justificáveis (SUNG, 2008).
8
Essa recomendação ética dos ditos socialistas, e também da socialdemocracia da primeira metade
do século XX, é que os interesses da sociedade devem estar acima dos interesses individuais, que a
solidariedade entre os membros da sociedade deve prevalecer sobre os instintos egoístas do indivíduo.
Essa é a base ética da socialdemocracia dos primeiros tempos do socialismo. Assim como a noção de
justiça social e da dívida social (SUNG, 2018, p. 76).
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vida digna. Portanto, se aceitarmos essa condição que não exista uma justa
distribuição de bens econômicos a partir da qual se possa criticar a forma que o
mercado distribui os direitos econômicos atuais, as pessoas não terão acesso aos
seus direitos sociais para a sua sobrevivência. Logo, o sistema econômico não tem o
dever ou a obrigação com a dívida social, assim programas sociais financiados por
impostos em nome da justiça social, não passarão de roubo e serão vistos como
injustiças para com os ricos. Veja, vivemos uma inversão ético-espiritual, onde o
neoliberalismo com sua fé, culpabiliza a todos (SUNG, 2018, p. 80).
Assim, o mercado, glorificado dentro desta corrente, apresenta-se como utopia,
já que os seus patronos não tateiam o mercado real, não partindo de cogitações
empíricas – concorrência perfeita. Esta, por sua vez, não pode ser perfeita, visto que
se fosse não haveria necessidade de concorrermos uns com outros. Desta forma, é
evidente que se trata de um mercado idealizado e não de um mercado concreto. Este
devaneio chamado livre mercado não existe entre os seres humanos. Posto que é
uma elaboração teórica, e não palpável. E este poderia ter êxito somente em um
mundo supra-humano, todavia, não pode funcionar no mundo dos seres humanos
(HINKELAMMERT, 1988).
Estamos falando de uma ideologia que teve o potencial de penetrar no íntimo
do ser humano – maneira de sentir, olhar e avaliar o mundo. Ela, com sua maneira
condicionadora, aponta o que vale e o que não vale a pena, tirando nosso poder de
decisão, alterando nossa maneira de viver e capaz até de sequestrar os aspectos da
religião, nossos princípios éticos e sociais. Por isso, se não quisermos ser as suas
próximas vítimas, ou seus colaboradores, devemos desmascarar essa máquina
ceifadora de vidas, causadora de drásticas e cruéis consequências desumanizadoras,
(AMERÍNDIA, 1998, p. 48).
Por fim, se a noção de dignidade humana está sendo negada pela redução do
ser humano pelo sistema econômico, e seus instrumentos de opressão que visam
apenas atingir os seus interesses e fins neoliberais, o único caminho que temos é
defender a dignidade da grande parcela da população, daqueles e daquelas que estão
sendo oprimidos/as. A neutralidade nesta altura do jogo não pode ser aceita, se não
nos tornaremos aliados na negação dos direitos humanos, e sem dúvida da maior das
injustiças atuais: a desigualdade social, acompanhada da exclusão socioeconômica,
símbolo da globalização capitalista atual.
40
A grande questão é que Wesley entendeu a sua missão para renovar a igreja,
como uma tarefa vinculada à prática pastoral. Por isso, a teologia wesleyana possui
uma relação entre teoria e prática. Já a teologia latino-americana é conhecida por sua
reflexão que nasceu em meados dos anos de 1960, dentro das igrejas evangélicas e
41
depois se expandiu para o catolicismo. Essa teologia buscou responder também aos
desafios sociais urgentes, como o aumento da pobreza e do sofrimento humano.
Diante de um cenário de problemas políticos e eclesiais, essa perspectiva
teológica sempre procurou contribuir para uma sociedade mais justa e o compromisso
com as pessoas mais pobres na vida das instituições eclesiásticas, tratando a
educação e reflexão teológica como inseridas na sociedade. Contudo, essa noção de
fé nunca foi algo novo no século XX. Esta compreensão está na vida de toda história
da comunidade cristã, mesmo quando tratada como uma teologia marginal.
Na história do movimento metodista do século XVIII, é visível a sensibilidade
em relação ao sofrimento humano, às realidades sociais ocasionadas pela pobreza e
pela escravidão. Nascia, assim, uma teologia para responder e defender os direitos
socioeconômicos dos pobres, uma característica que imprimiu e revelou John Wesley
em seus escritos e traços bibliográficos (RIBEIRO, 2015, p. 20).
Essa visão do evangelho influenciou vários grupos metodistas, especialmente
no Brasil, deixando experiências memoráveis, contribuições de inúmeras pessoas que
merecem ser respeitadas e estudadas com afinco. Não podemos nos esquecer das
obras como o do Instituto Central do Povo, localizado no Rio de Janeiro, e o
envolvimento de metodistas nos movimentos e organizações ecumênicas nacionais,
continentais e mundiais.
Segundo Ribeiro (2015), nomes como Hugh Clarence Tucker, Guaracy Silveira,
Sante Uberto Barbieri, Almir dos Santos e tantos outros, eram na primeira metade do
século XX e na década de 1960, metodistas relevantes de uma teologia latino-
americana. Achamos justo mencionar uma contribuição do metodismo para a teologia
latino-americana, embora sabendo que a teologia latino-americana da libertação foi
destaque em outros espaços religiosos, como nas instituições católicas.
Como se sabe, o final dos anos de 1970 e o início dos anos de 80 foram de
oportunidades singulares para a renovação teológica e pastoral no Brasil e
em outros países da América Latina. O ambiente metodista foi um palco
privilegiado desse processo. A compreensão da missão como preocupação
ampla com o povo, considerando as questões sociais, econômicas e políticas
que marcam a sua vida, o interesse pela participação leiga na vida eclesial,
pela renovação cúltica e teológica, e por uma face mais popular para a igreja,
voltada para o Reino de Deus, marcaram entre outros aspectos, o anseio por
um metodismo mais “wesleyano” e brasileiro e menos sectário e intimista,
como a influência norte-americana havia deixado desde os primeiros
missionários no século XIX (RIBEIRO, 2015, p. 24).
A disputa que ocorre no campo religioso revela esses traços obscuros. Neste
período setores da Igreja metodista, obcecados pelo crescimento numérico, aplicaram
modelos eclesiais em total desconexão com a identidade confessional wesleyana e a
própria trajetória que estava sendo construída para o metodismo no Brasil.
O crescimento das Igrejas neopentecostais, com práticas e estratégias
totalmente alinhadas à sociedade de mercado, ganha facilmente espaço no contexto
metodista. Pesquisas apontam que a perspectiva teológica que aplica estudos bíblicos
e teológicos é preterida e substituída por bandas musicais, shows profissionalmente
arquitetados com testemunhos que exaltam a teologia da prosperidade. Ao longo do
tempo, a teologia wesleyana foi sendo diluída para atender à atmosfera religiosa
dominante nas igrejas locais (SOUZA, 2011, p. 162).
inúmeras vezes, se imiscuem questões pessoais. Souza (2011) discorre que existem
os que defendem uma urgente necessidade de cultivar as raízes confessionais,
considerando os atuais desafios existe os que acreditam que não se deve alterar uma
estrutura eclesiástica alinhada com a lógica do mercado religioso, porque está
contribuindo para o “aumento do quadro de membros”.
Sem dúvida, a dinâmica pelo poder continuará existindo. O que ficou nítido
foram os inúmeros motivos que levaram a Igreja Metodista a flexibilizar ou melhor a
negociar sua narrativa teológica no Brasil. A visão de constituir em Igreja: Comunidade
Missionária a serviço do povo” como previa o tema que por mais de uma década, em
1991, orientou os metodistas espalhados pelo Brasil, foi substituído para sustentar a
sobrevivência da Igreja metodista no disputado campo religioso brasileiro, ou era a
fidelidade a sensibilidade social da herança do fundador histórico ou a sua
permanência denominacional entre as igrejas evangélicas no país, o grupo religioso
liderado por grande maioria do setor conservador, escolheu a segunda opção.
50
9
Termo designado para identificar a religião como um objeto de escolha, envolvendo bens e serviços
religiosos passíveis de serem produzidos e consumidos pelos agentes inseridos no mercado religioso
(IANNACCONE, 1992, p. 124).
10
Trataremos no texto o conceito de ídolo e idolatria justamente por sua vinculação à manipulação de
símbolos religiosos para criar sujeições, legitimar opressões e apoiar poderes dominadores na
organização do convívio humano (ASSMANN; HINKELAMMERT, 1989, p. 11).
52
foram formadas por uma espécie de dogma que foi implantado por alguns
economistas que tinham a intenção de aproximar os conceitos do liberalismo clássico
frente ao Estado regulador e assistencialista.
Em outro momento, se caracterizou e optou pela liberdade de mercado,
demarcando o Estado e suas fronteiras, causando sua limitação. Por isso, quando nos
referimos ao prefixo “neo” não se trata apenas de princípios novos, mas da
prestabilidade dos ideais liberais em períodos novos. E geralmente os estudiosos/as
procuram entender o sistema neoliberal como uma ideologia ou cosmovisão, ou seja,
uma forma de ver e julgar o mundo social.
Por isso, o pensamento neoliberal é um movimento intelectual extremamente
organizado e composto por políticas ratificadas por governos neoconservadores 11,
que se contrapõe ao Estado intervencionista e do bem-estar social, aplicadas
especialmente a partir da segunda metade dos anos 70, onde tinha como objetivo
retomar a proposta econômica baseada nos princípios ortodoxos do liberalismo, quer
dizer, às orientações da economia clássica como válvula de escape da crise pela qual
passavam as sociedades.
Como vimos, esse conjunto de definições está entrelaçado entre si na medida
em que sugestionam o regresso a um modelo econômico ideal. A princípio atualizam
e propagam valores do pensamento liberal e conservador dos séculos XVIII e XIX.
Para que essa ideologia seja desmistificada, é indispensável recordarmos que um dos
principais pilares do neoliberalismo é sobre a sua teoria que busca limitar a
capacidade humana de entender as realidades complexas. Com isso, os teóricos
neoliberais partem da tese de que não temos capacidade de saber ou conhecer
totalmente os tecidos do sistema econômico (SUNG, 2015, p. 43).
Essa é uma das principais razões por que defendem a não interferência do
Estado na economia. Ademais, anseiam a volta a uma forma de organização
econômica que teria sido estabelecida brevemente, na metade do século XIX. Assim,
sugere Moraes (2001), que poderíamos dizer que o liberalismo clássico foi de certo
modo a ideologia prima do capitalismo.
E, sinteticamente, poderíamos dizer que a ideia vital é que as relações
econômicas de mercado são a singular maneira de distribuição dos bens, que
conserva o equilíbrio entre a demanda crescente e uma oferta. Partindo desse
11
Em 1979, Margaret Thatcher, na Inglaterra; em 1980, Reagan, nos EUA; em 1982, Helmut Kohl, na
Alemanha.
53
12
Adam Smith foi filósofo e economista escocês do século XVIII.
13
Segundo o sistema da liberdade natural, ao soberano cabem apenas três deveres; três deveres, por
certo, de grande relevância, mas simples e inteligíveis ao entendimento comum: primeiro, o dever de
proteger a sociedade contra a violência e a invasão de outros países independentes; segundo, o dever
de proteger, na medida do possível, cada membro da sociedade contra a injustiça e a opressão de
qualquer outro membro da mesma, ou seja, o dever de implantar uma administração judicial exata; e,
terceiro, o dever de criar e manter certas obras e instituições públicas que jamais algum indivíduo ou
um pequeno contingente de indivíduos poderia ter interesse em criar e manter, já que o lucro jamais
poderia compensar o gasto de um indivíduo ou de um pequeno contingente de indivíduos, embora
muitas vezes ele possa até compensar em maior grau o gasto de uma grande sociedade (SMITH,
1983).
55
14
É um livro famoso de Hayek. Seu conteúdo é de um enfrentamento direcionado “aos socialistas de
todos os partidos”. Nele há um ataque explicito ao planejamento, à intervenção do Estado na economia,
à ação dos sindicatos e a organismos sociais. Ademais, Hayek versa que a política intervencionista do
56
estado conduz ao totalitarismo político e suscita catastróficos efeitos econômicos, dado que
impossibilita o desempenho da economia de mercado, da competição criadora (MORAES, 2001).
15
A Escola de Chicago é uma escola de pensamento econômico que salvaguarda o livre mercado.
57
16
New Deal: programas implementados nos Estados unidos, sob o governo de Roosevelt, visando
reformar a economia estadunidense, e amparar os que foram afetados pela Grande Depressão; Welfare
State: Estado do Bem-estar – o Estado assegura padrões mínimos de educação, saúde, habitação,
renda e seguridade social.
58
17
Comandante chefe do exército chileno, encabeçou o golpe de 11 de setembro de 1973, que destituiu
o governo de Salvador Allende. Depois do bombardeio de La Moneda, o poder foi assumido por uma
Junta Militar de Governo liderada por Pinochet, sendo nomeado Chefe Supremo da Nação, em 27 de
junho de 1974. Em 17 de dezembro, chega ao cargo de Presidente da República.
18
O economista Sergio de Castro foi um dos três primeiros estudantes da Universidade Católica, que
foi contemplado com uma bolsa de estudos para cursar economia na Universidade de Chicago,
tornando-se o mais influente dos intelectuais Chicago boys.
19
Intitulação atribuída ao grupo de jovens economistas chilenos, de vertente liberal, instruídos na
Universidade de Chicago que posteriormente contribuíra para elaboração da política econômica do
ditador Pinochet.
60
20
Serviço de inteligência estadunidense – Central Intelligence Agency.
21
Diplomata estadunidense que exerceu um singular papel na política externa dos Estado Unidos, entre
1968 e 1976.
22
Fundador do Partido Socialista do Chile, que tentou estabelecer o socialismo por meios democráticos.
Governou a nação chilena de 1970 a 1973, quando foi destituído do cargo por um golpe militar.
23
O Estado Desenvolvimentista é como um tipo ideal, aquele em que uma elite política, orientada por
ideais desenvolvimentistas e incentivada por um contexto internacional ameaçador, é capaz de forjar
uma aliança política de modo a sustentar um processo de construção institucional e de formação de
uma burocracia econômica que seja, ao mesmo tempo, suficientemente coesa, socialmente inserida,
com autonomia e capacidade para formular e implementar uma política de industrialização que redefina,
no longo prazo, a estrutura econômica de um país (PERISSINOTTO, 2014).
24
Em 15 de março de 1985, assumiu a presidência da república interinamente, devido a enfermidade
de Tancredo Neves e, com o falecimento do mesmo, em 21 de abril, foi efetivado no cargo.
61
25
Criou o Partido da Reconstrução Nacional, elegeu-se presidente da República em 1989, após vencer
Luís Inácio Lula da Silva, do Partido dos Trabalhadores, no segundo turno eleitoral. Em 2 de outubro
de 1992, foi deposto temporariamente da presidência da República. Renunciou ao cargo de presidente
em 29 de dezembro de 1992, data da sessão de julgamento do processo de impedimento no Senado,
que o tornou inelegível por oito anos.
62
governo Collor, foi uma investida político-econômica que concretizou sua campanha,
na época chamada Diretrizes de Ação do Governo Fernando Collor de Mello26.
Sua iniciativa política visou colocar o Estado à serviço da iniciativa privada,
conduzindo o país a implantar uma espécie de modernização estatal ou projeto de
reconstrução Nacional27. Com as portas abertas para as propostas neoliberais, ficou
viável o desmantelamento do Estado, para que não prejudicasse as relações
econômicas. Foi neste período que o Brasil aceitou um profundo processo de
privatização do Estado, propondo uma abrangente reforma administrativa no
programa federal de desregulamentação e o programa nacional de desestatização.
Nesta abertura aos fundamentos neoliberais foi instalado no Brasil pela gestão do
governo Collor a erradicação da inflação, sustentada pelo Plano de Estabilização 28.
Neste pacote ampliavam-se outras medidas, com pesos semelhantes, que passaram
a dar existência ao seu assentamento.
As propostas que se sobressaíram foram a de desregulação da economia, que
pretendia à supressão do Estado, e ao mesmo tempo, sobre a economia e sobre a
relação capital-trabalho, com vistas à absolutização da liberdade dos mercados; a
destituição do Estado como gestor produtivo, que resultou no esfacelamento das
empresas estatais, delegando à esfera estatal apenas a atividade de prover uma
educação básica e saúde pública, em outras palavras, conferindo-lhe a
responsabilidade por serviços essências de utilidade pública, reduzindo o Estado ao
mínimo, (PORTO, 2009, p. 55).
Laura Soares (2002) descreve que depois da iniciativa de implantar o Plano
real, em 1990, Fernando Henrique Cardoso 29 tornava-se democraticamente
presidente do Brasil, e nesta segunda fase as propostas neoliberais, em pouco tempo
mostravam seus impactos, sobretudo sociais.
26
O documento apresenta suas propostas de candidato e sua profissão de fé de presidente eleito. Os
grandes temas de seu programa são: democracia e cidadania; a inflação como inimigo maior; a reforma
do Estado e a modernização econômica; a preocupação ecológica; o desafio da dívida social; e a
posição do Brasil no mundo contemporâneo (COLLOR, 1990).
27
Documento publicado depois do primeiro ano de mandato. O projeto foi uma reprodução necessária
dos ideais escudados no decurso da campanha eleitoral. A proposta de gestão introduzia como ponto
basilar, o anelo da população brasileira por transformações profundas. Ademais, anexava uma
concepção do que seria o Brasil moderno e das condições de realizar o salto qualitativo na vida nacional
(COLLOR, 2008).
28
O Plano de Estabilização conhecido também por Plano Collor foi formado por diversas medidas
provisórias e outros documentos legais, tendo como pontos fundamentais: o ajuste fiscal, a reforma
monetária e a política de rendas.
29
Candidato à presidência da República, elegeu-se no primeiro turno eleitoral, em 3 de outubro de
1994, tendo obtido 54,3% dos votos válidos. Reelegeu-se presidente da República em 1998.
63
30
A intenção da reforma foi possibilitar que a administração pública se torne mais eficaz. Em
contrapartida, ela intenciona garantir estabilidade para o Plano Real, refreando o desperdício e
racionalizar o gasto público. Dessa forma, o governo evita que os gastos amplifiquem, corroendo os
recursos do Estado (CARDOSO, 1995).
64
31
Promessas feitas em sua campanha presidencial, era da “mão direita” espalmada, mostrando as
metas de sua gestão.
32
Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira foi uma arrecadação que incidiu sobre todas
as movimentações bancárias — com exceção nas negociações de ações na Bolsa, saques de
aposentadorias, seguro-desemprego, salários e transferências entre contas correntes de mesma
titularidade — e perdurou no Brasil por uma década.
66
33
Movimento Sem Terra.
34
Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura.
35
Central Única dos Trabalhadores.
68
não acolher a proposta neoliberal. Diante desta condição, Assmann (1994) expõe que
o sujeito que se opõe à ideologia neoliberal, sentirá as retaliações do deus-mercado,
com suas pressões, incertezas, dúvidas e debilitamento para outras possibilidades.
Por isso, a necessidade de combater o argumento desta ideologia que teve
capacidade de introduzir-se no mais íntimo do ser humano – na maneira de sentir,
avaliar e olhar o mundo. Com sua visão hegemônica, o mercado impõe o que vale e
o que não vale apena, retirando o poder de escolha e decisão, modificando totalmente
nossa forma de viver, interferindo em nossas estruturas sociais. Portanto, precisamos
nos posicionar para não sermos as próximas vítimas, ou seus apoiadores precisamos
urgente derrubar este sistema ceifador da vida humana, causadora de drásticas
consequências desumanizadoras.
Para que tal desmascaramento aconteça, é necessário ter em mente que um
dos sustentáculos desta ideologia hegemônica é a sua tese sobre a incapacidade
humana de entender a complexidade de um sistema econômico. Assim sendo, não
devemos intervir – em nome das metas sociais –, pois tal intromissão poderia resultar
em ineficiência e crises econômicas. Desta forma, o sujeito deve se manter inerte
diante dessa estrutura intrincada que conhecemos como mercado.
Porém, este pilar revela uma fissura que deve ser investigada minuciosamente,
pois se é verdade que: não podemos compreender todos os elementos que compõem
o sistema de mercado, como poderíamos seguir em fé, crendo que irá proporcionar
os melhores frutos para uma sociedade?
O fato é que essa complexidade incompreensível para racionalidade humana,
que surge como salvação, não solucionou os problemas sociais de uma grande
parcela da comunidade humana, isso segundo os fiéis cegos do neoliberalismo, por
culpa dos sujeitos que em nome das metas sociais impedem a liberdade total do
sagrado, o mercado. Sendo assim, falta de fé no fundamentalismo de livre-mercado
desponta como diabólico, pois impede a plena manifestação deste sagrado.
Criticar essa tese que fora do mercado não há salvação, é um dos passos de
confrontação para o impedimento do estabelecimento de tal ideologia. E seguindo
essa lógica, de que não podemos conhecer o funcionamento do sistema de mercado
em sua plenitude, não podemos ter certeza de que o mercado gerará o bem
necessário para sociedade (SUNG, 2005).
Este modelo econômico imposto às sociedades, mediante sua política e seu
horizonte cultural religioso, revela-se como uma economia inclinada à vantagem
71
individual, ou seja, ao lucro e a sua maximização. Nesse âmbito tudo vira mercadoria
a serviço do lucro, inclusive a pessoa humana. O lucro, por sua vez, legitima a
possibilidade de explorar, violentar, massacrar e exterminar a humanidade.
Neste sistema econômico, o bem real é individual, logo, toda forma comunitária
deve ser extirpada em prol do privado, e a instrumentalização para atingir tal objetivo
chama-se livre-mercado. Para isso, deve haver um terreno propício para o
assentamento dessa instrumentalização, o Estado não pode intervir, deve-se reduzi-
lo ao mínimo e que prevaleça a única lei da demanda e da oferta que é o coração do
comércio, e que tudo possa ser considerado mercadoria (SELLA, 2003).
Dito isto, percebe-se que o neoliberalismo se apresenta como fé idolátrica,
porque atribui traços divinos a uma instituição humana, e mesmo que tal instituição
esteja no patamar do sagrado, devemos reafirmar em atitude de resistência que
nenhuma realidade humana é eterna e absoluta, por mais onipotente que seja. Nós
como luzes que faíscam no caos, salientamos que “o novo ainda pode e vai nascer”
(SUNG, 2005).
72
realização plena da missão de viver e anunciar o Reino de Deus, ou seja, quanto mais
fiéis a igreja tiver mais crescerá o Reino de Deus.
Portanto, estamos diante de uma fórmula institucional capitalista que despreza
as realidades sociais seja elas quais forem, porque o que importa é o crescimento do
capital institucional, e para ela outras realidades e pautas não interessam. A noção de
sensibilidade social no pensamento teológico de John Wesley tem uma relação com
os direitos humanos. Diante de uma sociedade organizada por uma racionalidade
econômica privada, o conceito de justiça social requer que os grupos subalternos
sejam incluídos para ter acesso a recursos financeiros gerados pela sociedade para
livrarem-se da situação de exclusão social e extrema pobreza.
Por esta razão, o tema da sensibilidade social encontrado na teologia
wesleyana está entrelaçado com a justiça social, um fenômeno abordado em muitos
grupos religiosos. Portanto, foi claro para o fundador do movimento metodista inglês
que ao assumir um compromisso com a fé e o chamado de seguir Jesus de Nazaré,
seria de responsabilidade da religião cristã a busca por amar o próximo e lutar para
que todos na sociedade possam viver dignamente – sensibilidade social – é para a
teologia wesleyana um compromisso público de sinalizar o Reino de Deus na terra.
Entretanto, é nítido que a política econômica de perspectiva liberal foi
transformada de tal forma que hoje o termo – neoliberal – transformou-se em uma
prática natural nas sociedades de mercado (GALVÃO, 1997, p. 45). Começamos a
entender o sufocamento teológico ou até mesmo a exclusão de uma das identidades
do metodismo primitivo: a sensibilidade social no metodismo brasileiro. Apostamos
que este princípio segue sendo negado por conta das tendências do mercado religioso
e a luta para manter a organização institucional de pé no disputado campo religioso
brasileiro.
Portanto, é sobre esta visão de mundo que aprofundaremos neste tópico que o
autor aponta que tem modificado as relações humanas e seus valores, levando o ser
humano a negociar constantemente seus valores éticos, o que muda é a condição,
por exemplo, de ter mais poder econômico e o seu modo de expressá-lo e justificá-lo
para manter a sua reverência. No capitalismo, o critério último de valorização é o
sucesso econômico e sua capacidade de ostentação. Além disso, essa cultura tem a
capacidade de invadir todos os campos da vida social, e até mesmo o campo religioso.
Assim, procuraremos observar como essa cultura dominante na sociedade
penetra no campo religioso, que a cada dia tem mostrado a sua ostentação de
riquezas, exposta nas construções de templos e sedes religiosas.
Com isso, fica nítido que as autoridades dessas religiões ou igrejas,
inconscientemente ou não, podem estar reproduzindo essa cultura de consumo como
um estilo de vida na vida de seus fiéis, acreditando que estão sendo privilegiados ou
abençoados por Deus, mas na verdade são as mãos sangrentas da economia de
mercado.
A crise financeira de 2008, que teve início nos Estados Unidos e depois
atingiu a economia real, estendendo-se para a Europa e os países
emergentes, desencadeou uma onda de políticas de austeridade com graves
consequências humanas. Seus efeitos foram falências, desemprego
(atingindo dramaticamente os jovens), redução de salários, precarização do
trabalho, endividamento público e privado, desmonte de serviços públicos,
aumento da desigualdade social, dificuldades econômicas e sofrimento
social. Nessa conjuntura, a maioria da população, incluindo a classe média,
sofreu com declínio econômico e escalada da incerteza, levando a um
descontentamento generalizado e a uma insatisfação com o sistema
econômico, solapando especialmente o argumento a favor do neoliberalismo
e seu culto do mercado autorregulado (GERBAUDO, 2017, p. 47).
relação às políticas públicas que defendem a justiça social. Portanto, a cada dia
percebemos que as pautas sobre justiça social e direitos humanos têm sofrido ataques
nas suas propostas para uma sociedade mais justa. A proposta Hayekiana é fazer
uma inversão no sentindo original do conceito de justiça social, apresentando-a de
uma maneira completamente diferente na sociedade (HAYEK, 2013, p. 259).
Atualmente, a economia de mercado é vista como um organismo separado do
mundo humano, livre de qualquer valor de juízo ético ou de ser até mesmo
questionada, assumindo assim um caráter “divino ou sagrado”. Isto significa que o
mercado é sagrado tornando-se um ídolo soberano e indomável. E é justamente por
ser separado que o sagrado serve de sustentáculo para ordem social vigente. Ludwig
von Mises36 faz isso com o mercado, com a intenção de transcender o sistema
capitalista alicerçado no mito do desenvolvimento 37, lhe atribuindo traços divinos, ou
melhor, a qualidade de sagrado (SUNG, 2018, p. 51).
Porém, o mito do desenvolvimento entra em crise, onde o próprio mito
necessitou de ser revisado na sua romântica proposta para a sociedade consumista
e buscou dar mais direção e sentido em suas causas. Assim, o novo mito neoliberal
rompe com uma das peculiaridades do mito do desenvolvimento e o mito do progresso
moderno. Se antes o ser humano tinha a principal função de construir o caminho do
progresso na sociedade e o mito do desenvolvimento a capacidade humana de criar
e aplicar conhecimentos científicos para a sua melhoria, colocando o ser humano
como sujeito de sua própria história, agora o novo mito neoliberal rompe com essa
noção de que o ser humano, com seus potenciais, pode fazer este caminho (SUNG,
2018, p. 74).
Nesta nova proposta, o discípulo de Ludwig von Mises, o também austríaco
Friedrich August von Hayek, destaca que para a humanidade obter a salvação é
fundamental que assumamos o mercado como único caminho, porque não existe
outra possibilidade, ou seja, todos teremos que compartilhar a mesma fé no mercado,
senão morreremos. Deste modo, todos devem optar pelo deus-mercado e rejeitar
36
Ludwig von Mises foi renomado líder da Escola Austríaca de pensamento econômico.
37
O conteúdo desse mito alude à promessa de amplificar a toda comunidade humana o padrão de
consumo das elites dos países hegemônicos. Porém nas entrelinhas desse comprometimento, o padrão
de consumo da elite dos países pobres torna-se inquestionável, visto que esses países orientam toda
a produção industrial no modelo de substituição de importações. E ao inviabilizar o questionamento, o
mito pode se absolutizar, consequentemente o paraíso terrestre almejado por uma minoria pode
resultar no estabelecimento de um inferno para uma parcela considerável, em que o mecanismo
vitimador se mantem operante e os sacrifícios de vidas humanas que emanam de suas engrenagens
permanecem justificáveis (SUNG, 2008).
80
38
Essa recomendação ética dos ditos socialistas, e também da socialdemocracia da primeira metade
do século XX, é que os interesses da sociedade devem estar acima dos interesses individuais, que a
solidariedade entre os membros da sociedade deve prevalecer sobre os instintos egoístas do indivíduo.
Essa é a base ética da socialdemocracia dos primeiros tempos do socialismo. Assim como a noção de
justiça social e da dívida social (SUNG, 2018, p. 76).
81
mundo supra-humano, todavia, não pode funcionar no mundo dos seres humanos
(HINKELAMMERT, 1988).
Estamos falando de uma ideologia que teve o potencial de penetrar no íntimo
do ser humano – maneira de sentir, olhar e avaliar o mundo. Ela, com sua maneira
condicionadora, aponta o que vale e o que não vale a pena, tirando nosso poder de
decisão, alterando nossa maneira de viver.
É capaz até de sequestrar aspectos da religião, nossos princípios éticos e
sociais. Por isso, se não quisermos ser as suas próximas vítimas, ou seus
colaboradores, devemos desmascarar essa máquina ceifadora de vidas, causadora
de drásticas e cruéis consequências desumanizadoras (AMERÍNDIA, 1998).
Por fim, se a noção de dignidade humana está sendo negada pela redução do
ser humano pelo sistema econômico, e seus instrumentos de opressão que visam
apenas atingir os seus interesses e fins neoliberais, o único caminho que temos é
defender a dignidade da grande parcela da população, daqueles e daquelas que estão
sendo oprimidos/as. A neutralidade nesta altura do jogo não pode ser aceita, se não
nos tornaremos aliados na negação dos direitos humanos, e sem dúvida da maior das
injustiças atuais, qual seja, a desigualdade social, acompanhada da exclusão
socioeconômica, símbolo da globalização capitalista atual.
A partir de uma prática coerente com sua visão, Wesley faz uma síntese nas
relações do indivíduo com a sociedade. Basta atentarmos para a amplitude
da preocupação wesleyana e sua presença social. O significado de indivíduo
e de social no século XVIII é anterior aos desenvolvidos pela sociologia e pela
economia política (JOSGRILBERG, 2009, p. 48).
No contato com a vida concreta dos grupos marginalizados a sua vida pessoal,
teológica/pastoral tornava-se confrontada com as realidades encontradas. Fazendo o
mesmo a se indignar face ao processo de marginalização e exclusão presente na vida
do povo inglês pobre de sua época. Pesquisas apontam, que o social foi uma marca
na sua vida pública, principalmente para romper com o processo de individuação da
sociedade. É notório que a individuação neste período era desenvolvida com o
84
Pelo seu valor, deveria ser apto a superar as limitações impostas pelas
antigas limitações de nascimento e de hierarquia tradicional, divina ou não. O
valor do indivíduo é exaltado e a sociedade seria o fundo no qual o indivíduo
deveria se afirmar e desenvolver suas virtudes. Pouco se explicita, na
sociedade como um todo, o fator de conflitos e tensões que a estrutura social
impõe ao indivíduo, como trabalho e a propriedade. Pouco se reconhece que
essa imposição social se torna um instrumento de dominação social nas
mãos dos indivíduos e classe burguesa na nova situação (JOSGRILBERG,
2009, p. 52).
mobilidade social na sociedade. Assim, todos devem estar preparados para superar
todo tipo de limitação social. Nisto, o valor do indivíduo é exaltado se o mesmo afirmar
e desenvolver as virtudes econômicas.
A grande questão é que não poderia questionar os conflitos e as tensões que
esse modelo de sociedade criou na estrutura social inglesa. Justamente, pela sua
imposição social que manipulou e tornou-se uma ferramenta de dominação social
pelos indivíduos da classe burguesa para sustentar o crescimento econômico.
É neste contexto que John Wesley observa os equívocos desta sociedade e a
consciência sobre os males que a nova sociedade burguesa traria ao corpo social
inglês e que inclusive a religião como mecanismo dela, já sofria o início de um
processo de emburguesamento, acarretando uma gigante diferenciação social que
justificava as classes, a dominação, a escravidão, o egoísmo, e a luxúria, tornando-se
um solo para brotar e desenvolver o aspecto social de sua teologia que rompeu com
à lógica econômica da burguesia inglesa.
Essa foi a concepção de humanidade burguesa que fez Wesley ser contra na
Inglaterra, justamente porque não se sabia quanto esse ideal poderia ser um
instrumento social de opressão e de como ela trataria o indivíduo na sociedade. É
esse ideal que Adam Smith, defende a chamada livre competição comercial e os
interesses individuais como uma ordem natural na sociedade.
O conceito de individualidade burguesa como força motora das relações sociais
foi presente nos pensadores do século XVII e XVIII. Pensadores como: Hobbes,
Locke, Hume, Adam Smith etc. John Wesley, não fica indiferente a esses
desdobramentos. No lado oposto, Rousseau defendia uma revolução para garantir os
direitos, roubados pela sociedade corruptora dos indivíduos.
Entre outros fisiocratas que defendiam uma economia mais agrária para
sociedade inglesa. Portanto, Wesley teve uma visão de um arminiano do século XVIII,
87
pastoral e público em John Wesley, é que o social é o cenário para aplicar o projeto
salvífico de Deus na humanidade.
Portanto, foi esta visão teológica que o movimento wesleyano viveu para resistir
ao dualismo indivíduo-sociedade sobre as tendências individualistas modernas. O
social em Wesley é teológico, a sua preocupação social foi para com a educação a
saúde popular e com a condição geral dos pobres.
Com isso, a sensibilidade social é uma declaração pública da dimensão da
Bíblia, da fé, da Igreja. Esta visão foi uma necessidade e continua sendo fundamental
hoje, principalmente porque essa herança da teologia wesleyana é escusa ou
inconsistente e abandonada pelos setores da Igreja metodista no Brasil.
O social mostra o horizonte metodista de uma religião que tem a obrigação de
ser sensível às questões sociais na sociedade brasileira. Época marcada pela
privatização neoliberal, que revela que as instituições religiosas visam apenas
administrar a experiência religiosa para transformar em bens de consumo e tais
instituições atuam como prestadoras, privadas, de serviço religioso à semelhança de
empresas privadas. Vemos então que cresce o processo de emburguesamento da
Igreja, que está em total contradição com o pensamento social wesleyano.
É evidente que o Credo Social faz mais justiça à obra pastoral e social de
John Wesley como um dos pioneiros do metodismo na Inglaterra e no mundo
todo. Precisamente na repercussão social da pregação de Wesley e dos
leigos do metodismo primitivo é que se pode avaliar a amplitude de sua visão
do evangelho e dos problemas humanos. Sua luta incessante contra a
corrupção política, a luxúria e avareza dos ricos, o desemprego, a escravidão,
a guerra e sua desumanidade, a escola como privilégio de minoria, o
alcoolismo como força de degeneração da personalidade é que mostram a
visão social do pioneiro do metodismo (IGREJA METODISTA, 1999, p. 13).
Se o que nós entendemos por justiça social é nada mais do que injustiça para
com os ricos; se a solidariedade em favor dos pobres nada mais é do que
inveja transfigurada; e se a indiferença para com pessoas que morrem de
fome é expressão de sentimento nobre de quem conhece e aceita a
verdadeira justiça do mercado, estamos em uma completa confusão ética.
Talvez seja exatamente por isso que Hayek e outros insistem que devemos
deixar as discussões sobre ética fora da economia, e somente buscar a
eficiência no mercado; ou, em termos mais precisos, subordinar a ética aos
limites e direcionamentos do mercado livre. O que significa reduzir a ética às
regras de comportamento que maximizem a eficiência do mercado.
O movimento metodista não deveria rejeitar sua herança teológica que está
entrelaçada com a ética social. A Igreja Metodista está entre o jogo de aceitar ou
rejeitar seu elemento teológico, pastoral e ético. Se rejeitar a ética social contida na
teologia wesleyana a sua resposta estará vinculada aos ideais econômicos que
colocam a vida humana como referência última, tornado o campo econômico e sua
eficiência sua principal missão. Mas como poderá jugar eticamente a situação de
desigualdade, pobreza e exclusão social no Brasil?
Vale lembrar, que um dos papeis da Religião Social em John Wesley é
interpretar as realidades sociais e suas realidades interpessoais que visam diferenciar
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o bem do mal, o inocente e o culpado entre outros tipos de avaliação para analisar o
que é bom e ruim para a sobrevivência humana.
A lógica mercadológica na qual, agora, a igreja está inserida produz um
aumento das necessidades e desejos das pessoas e, com isso, o mercado religioso
busca produzir práticas e discursos religiosos para atender os desejos dos fiéis e
movimentar o mercado. Subsequentemente, a demanda das organizações religiosas
tem maior flexibilidade para criar e mudar seus produtos para adequá-los à demanda
que os sujeitos religiosos buscam para se sentirem satisfeitos.
Desse modo, o mercado religioso, para ganhar e manter-se, irá competir para
obter a maior fidelização possível de fiéis no mercado religioso e, consequentemente,
as igrejas se utilizarão de estratégias para promoverem o crescimento do número de
fiéis e mantê-los. Uma das razões para o crescimento dos fiéis seria a satisfação dos
membros pertencentes à igreja com os serviços oferecidos pelas organizações
religiosas; e, para isso ocorrer, é necessário que estes serviços sejam cada vez mais
especializados.
As condições sociais e econômicas foram determinantes para Wesley aplicar
os elementos teológicos/pastorais, característicos mediante a opção pelos pobres,
suas carências e necessidades. É diante deste cenário de negação da ética e da
justiça social que ocorre a formação da teologia de Wesley (TRACY, 1992, p. 30).
como cristo andou na terra, por isso, foi reconhecido também como o “teólogo do
povo”, como salienta (MEEKS, 1995, p. 10).
Enfim, Wesley desenvolveu uma teologia para servir o povo, em especial os
mais necessitados e excluídos pela Igreja da Inglaterra e pelos grupos religiosos da
época. Pessoas que foram extremamente culpabilizadas e ignoradas pela lógica
econômica da época. O movimento wesleyano, teve muita audácia para pensar em
novos caminhos para reformar principalmente a Igreja e a nação inglesa, acarretando
um efeito duplo na sociedade, segundo Hempton (2005, p. 207):
Milhões adotaram a mensagem metodista, mas ela foi rejeitada por mais
milhões ainda. Seja onde for que o metodismo tenha criado raízes,
especialmente na primeira década da sua existência, mas, independente do
lugar, os interesses sociais econômicos e políticos estabelecidos oprimiram-
no vigorosamente. Superiores sociais estimularam a oposição contra ele,
temendo que o entusiasmo religioso fosse a parteira do deslocamento social.
Na época John Wesley e o povo inglês buscaram sonhar com uma espécie de
ascendência social. Na verdade, Wesley acreditava que o modelo econômico da
época teria a capacidade de incluir todos do sistema para desfrutarem e terem uma
vida dignamente. Sabemos, que o ideal econômico de sua época não introduziu os
pobres para terem uma vida eminente na estrutura social. Atualmente, no Brasil a
economia de mercado ameaça também classes sociais mais elevadas
economicamente. Isso nos ajuda a pensar sobre a crescente flexibilidade das classes
média e classe média-baixa brasileira, no consumo de uma espiritualidade mística,
entusiasta e quietista em suas comunidades.
O metodismo brasileiro deverá optar pelo seu elemento-chave para negar a
sacrificialidade neoliberal ou se aliançar com a racionalidade econômica. Servir as
duas propostas é contraditório e inviável. Se abraçar o ideal teológico neoliberal a
proposta da tradição wesleyana será completamente rejeitada teologicamente e
pastoralmente no país, e também seria uma declaração pública da Igreja Metodista
no Brasil que a sensibilidade social está enterrada junto com John Wesley.
Diante de um país que está vivendo uma crise social que está levando a cada
dia mais o maior número de pessoas a viverem abaixo da linha da pobreza, isto nos
indica que os problemas sociais precisam ser confrontados. A grande questão, é que
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Mais do que isto, o cuidado com a salvação espiritual não teria nada a ver
com os problemas corporais, isto é, com os sofrimentos da maioria da
população brasileira, que é pobre. Pois os pobres sofrem em razão das
carências materiais, como falta de alimentação adequada, falta ou péssimas
condições de moradia, falta de alimentação adequada, falta ou péssimas
condições de moradia, falta de assistência médica (para cuidar do corpo), e
outras coisas semelhantes. Não que os pobres também não tenham
problemas ditos “espirituais” ou emocionais. Porém, estes problemas não
surgem do fato de serem pobres, mas de serem pessoas que vivem no
mundo. Quando se diz que Deus se revelou e se fez homem para salvar os
seres humanos, isto é, para salvar-lhes a alma e que isto não tem nada a ver
com os sofrimentos provocados pelos problemas materiais, afirma-se que
Deus não se importa com centenas de milhares de crianças que morrem
anualmente de fome ou por falta de moradia. Que Deus não se sensibiliza
diante do choro de uma criança que passa fome ou da mãe que sofre por não
poder comprar o leite de seu filho. Com isso, afirma-se que Deus é insensível
(SUNG, 1995, p. 14).
Esta visão teológica ganha espaço nas instituições religiosas todos os dias e
sustenta a ideia neoliberal de insensibilidade social. Por esta razão, seria um grave
erro teológico de grupos cristãos apoiarem e sustentarem essa proposta, porque Deus
se sensibiliza com o sofrimento dos seus filhos, a salvação que ele proporciona está
também entrelaçada em salvar a humanidade e seus problemas sociais.
Se grupos religiosos no Brasil concordarem com a perspectiva teológica do
mercado, o cinismo religioso servirá apenas para camuflar a atual crise social e tirar a
responsabilidade do neoliberalismo e sua lógica que exige sacrifícios de vidas
humanas. E pior, a religião passaria apoiar a culpabilidade que a racionalidade
econômica impõe sobre as vítimas que não obtém os resultados esperados. Nisto,
vemos uma realidade em que a maioria das instituições religiosas, não se sentem
mais nada pelo sofrimento dos pobres no Brasil.
Na verdade, vivemos uma realidade onde as instituições estão integradas no
mercado e têm uma consciência tranquila diante da atual crise social, diante da
intranquilidade social é como se elas não tivessem nada a ver com essa triste
realidade. A insensibilidade social é produzida pelo neoliberalismo. Mas como é
possível instituições religiosas espalhadas por este país serem insensíveis diante da
extrema pobreza que aumentou significantemente no país? Como dizermos que
somos religiosos que buscam amar o próximo e não se importar diante desta realidade
social invertida e cruelmente gritante na sociedade (SUNG, 1995, p. 79).
Essa insensibilidade social, diante dos sofrimentos dos excluídos pelo mercado
revela a vitória desta nova “espiritualidade”: amar o próximo é defender os interesses
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CONSIDERAÇÕES FINAIS
resumem a discutir conceitos abstratos e distantes das realidades sociais são apenas
teologias vazias de espírito, incapazes de cuidar de vidas e comunidades.
O testemunho social foi constante na percepção missionária do movimento
wesleyano. A disciplina social que o metodismo nascente teve revela a identidade da
teologia metodista para os desafios urgentes hoje no Brasil. O movimento metodista
liderando por Wesley lutou contra a escassez de alimentos; denunciou a escravidão;
se opôs à guerra; buscou reformar o sistema educacional e prisional; denunciou o luxo
e a ganância, como as desigualdades visíveis na revolução industrial, apontou
caminhos para a solução da pobreza e do desemprego; escreveu livros para a
medicina popular; cuidou dos enfermos; inclusive criou ambulatórios; representando
assim um convite para a prática missionária atual do movimento metodista brasileiro
para não se acomodar enquanto a fome e as desigualdades, as injustiças e a
destruição do meio ambiente, sejam realidades presentes em nosso país.
Em razão disso, reconhecemos a relação entre o sistema econômico e a noção
central de dignidade humana. O reconhecimento da dignidade humana só acontece
quando os direitos sociais são assegurados. E como observamos, esses direitos
sociais são negados pelo novo mito do capitalismo para sustentar a sua lógica
sacrificial. Consequentemente, quando buscamos alterar os valores e as condições
econômicas, é necessário não nos esquecermos de lutarmos e resistirmos
diariamente para que a noção de dignidade humana de todos os seres humanos seja
socialmente assegurada, e se torne parte do consenso social, político e religioso. E
por isso, que os metodistas no Brasil, tem uma missão fundamental e importante com
a prática social de sua teologia no país.
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