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UNIVERSIDADE METODISTA DE SÃO PAULO


FACULDADE DE HUMANIDADES E DIREITO
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM CIÊNCIAS DA
RELIGIÃO

A IGREJA DO NAZARENO: DOS PRIMÓRDIOS (1895)


AO CINQUENTENÁRIO NO BRASIL (2008)

por
Jefferson Rodrigues de Oliveira

São Bernardo do Campo


2011
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UNIVERSIDADE METODISTA DE SÃO PAULO


FACULDADE DE HUMANIDADES E DIREITO
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM CIÊNCIAS DA
RELIGIÃO

A IGREJA DO NAZARENO: DOS PRIMÓRDIOS (1895)


AO CINQUENTENÁRIO NO BRASIL (2008)

por
Jefferson Rodrigues de Oliveira

Orientador: Prof. Dr. Leonildo Silveira Campos

Área: Ciências Sociais e Religião

Dissertação apresentada em cumprimento parcial às


exigências do Programa de Pós-Graduação em Ciências
da Religião, para obtenção do grau de Mestre.

São Bernardo do Campo


2011
2

FICHA CATALOGRÁFICA

Ol4i Oliveira, Jefferson Rodrigues de


A igreja do Nazareno: dos primórdios (1895) ao cinqüentenário no Brasil
(2008) / Jefferson Rodrigues de Oliveira -- São Bernardo do Campo, 2011.

155fl.

Dissertação (Mestrado em Ciências da Religião) – Faculdade de


Humanidades e Direito, Programa de Pós Ciências da Religião da
Universidade Metodista de São Paulo, São Bernardo do Campo
Bibliografia

Orientação de: Leonildo Silveira Campos.

1. Santidade - Doutrina bíblica 2. Igreja do Nazareno - Brasil - História


I. Título
CDD 287.9909
3

A dissertação de mestrado, sob o título “A Igreja do Nazareno: dos primórdios


(1895) ao cinquentenário no Brasil (2008).”, elaborada por Jefferson Rodrigues
de Oliveira foi apresentada e aprovada em 05 de abril de 2011, perante a banca
composta pelo Prof. Dr. Leonildo Silveira Campos (Presidente/UMESP), Profª.
Drª Sandra Duarte de Souza (Titular/UMESP) e Profª. Drª. Eliane Moura Silva
(Titular/UNICAMP).

______________________________________________
Prof. Dr. Leonildo Silveira Campos
Orientador e Presidente da Banca Examinadora

_______________________________________________
Prof. Dr. Jung Mo Sung
Coordenador do Programa de Pós-Graduação

Programa: Ciências da Religião

Área de Concentração: Ciências Sociais e Religião

Linha de Pesquisa: Instituições e Movimento Religioso


4

À Simone, ao Nathan e ao Daniel com amor.


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AGRADECIMENTOS

 A todos aqueles que diretamente contribuíram para realização desse trabalho, em


especial, a Jesus Cristo, Criador da vida e Senhor da força, à Josélia pela inspiração da
vitória, à Simone pela inspiração da paciência, ao Nathan pela inspiração da amizade,
ao Daniel pela inspiração da alegria.
 Ao Instituto Ecumênico de Pós Graduação (IEPG) pela bolsa concedida, durante o
primeiro ano do Curso, à Ana Maria pela paciência e boa vontade em fazer com que
essa ajuda chegasse a minhas mãos e à Coordenação acadêmica, pela contribuição e
informações administrativas.
 Aos reverendos Dilo Palhares, que me facultou acesso a importantes documentos da
Igreja do Nazareno e ao Geraldo Nunes, reitor da Faculdade Nazarena do Brasil, pela
acolhida nas viagens de pesquisa de campo e às bibliotecárias dessa instituição que me
facultaram preciosos materiais de pesquisa.
 Ao Delegado Francisco Carvalho Martins e à Delegada Marisa de Oliveira Costa, da
Polícia Civil de Minas Gerais, que me possibilitaram tempo para empreender-me nas
pesquisas.
 Aos ilustres professores do Programa de Pós-graduação em Ciências da Religião da
UMESP que, de forma magnífica, trouxeram-me importantes conhecimentos sobre as
religiões.
 Dedico especial agradecimento ao Doutor Leonildo Silveira Campos, meu orientador,
que com seu vastíssimo conhecimento, competência e grande paciência, conduziu-me
até à conclusão deste trabalho.
 Aos colegas da casa dos estudantes e aos amigos Max, Alex, Rubens, Altair e Val, os
quais me fizeram sentir, em São Paulo, a verdadeira hospitalidade mineira.
 À Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Ensino Superior (CAPES), pela
concessão da bolsa nos dois últimos semestres do Curso.
6

Há uma tendência de anular o passado...


Quando tentamos anular o passado, nós anulamos com antecedência,
de antemão o nosso futuro.
Joaquim Antônio Lima
(Primeiro Superintendente distrital da Igreja do Nazareno no Brasil, 1961.)
7

OLIVEIRA, Jefferson Rodrigues de. A Igreja do Nazareno: dos primórdios (1895) ao


cinquentenário no Brasil. (2008): Dissertação de Mestrado, Universidade Metodista de São
Paulo – UMESP, São Bernardo do Campo, 2011.

RESUMO

Este trabalho é uma descrição e análise sócio-histórica da Igreja do Nazareno nos aspectos
mais importantes que contribuíram para sua inserção e expansão no Brasil. Descrevemos a
trajetória formativa dessa Igreja nos Estados Unidos, partindo das considerações histórico-
sociológicas dos valores teológicos que ela agrega, como o Arminianismo, a tradição
wesleyana e a doutrina da santidade. Buscamos entender, primordialmente, como se deu o
processo de inserção e expansão da Igreja do Nazareno no Brasil, sua estrutura de governo,
sua prática litúrgica, a formação de pastores, a forma de agregação de membros e a relação
que se estabelece entre esses pastores e os membros. O estudo sobre essa denominação ainda
é incipiente no meio acadêmico brasileiro, assim, buscamos suplantar a ausência de
informações sobre ela, nesse meio. Portanto, ressaltamos os aspectos de um enfoque sócio
histórico institucional que podem se distanciar da forma eclesial como os próprios nazarenos
compreendem sua denominação. Na abordagem desse objeto, enfatizamos a pesquisa
bibliográfica, a análise documental, a utilização de recursos audiovisuais, bem como a
observação participante. Este trabalho possibilitou o entendimento de que a Igreja do
Nazareno, desde seus primórdios, conduz sua prática pela distinção no meio protestante em
que se insere. No caso do Brasil, em que existem muitas outras denominações, a Igreja se
firma sobre sua principal distinção, a doutrina da santidade, a qual, por um enfoque da teoria
das economias religiosas, tem servido de produto para atender determinado nicho do mercado
religioso brasileiro.

Palavras-chave: Movimento de santidade, Doutrina da santidade, Igreja do Nazareno, Igreja


do Nazareno no Brasil.
8

OLIVEIRA, Jefferson Rodrigues. The Church of the Nazarene: the beginning (1895) of the
fiftieth anniversary in Brazil (2008). Master‟s thesis - Methodist University of São Paulo -
UMESP, São Bernardo do Campo, 2011.

ABSTRACT

This thesis is a description and a socio-historical analysis of Church of the Nazarene in all
major aspects that contributed to its insertion and expansion in Brazil. We describe the
formative history of this church in the United States, drawing on historical and sociological
considerations of theological values that it brings, as arminianism, the wesleyan tradition and
the doctrine of holiness. We try to understand, primarily, as was the process of integration and
expansion of the Church of the Nazarene in Brazil, its governance, its liturgical practice, the
training of pastors, the form of aggregation of members and the relationship established
between these pastors and members. The study of that denomination is still incipient in the
Brazilian academic, so we try to overcome the lack of information about it in the medium.
Therefore, we emphasize the aspects of a socio-historical institutional approach that can
distance themselves form the Church as the Nazarenes understand their own denomination. In
addressing this subject, we emphasize the literature, documentary analysis, use of audiovisual
resources, as well as participant observation. This work enabled the understanding that the
Church of the Nazarene, from its beginnings, the practice follows the distinction between
Protestant in which it operates. In the case of Brazil, where there are many others
denominations, the Church has been firmed on its main distinction, the doctrine of holiness,
which, by a focus on the theory of religious economies, has served as a product to meet
specific market niche Brazilian religious.

Keywords: Holiness Movement, the Doctrine of Holiness, Church of the Nazarene, the
Nazarene Church in Brazil.
9

SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ...................................................................................................................... 10

CAPÍTULO 1 .......................................................................................................................... 18
ANTECEDENTES SOCIORRELIGIOSOS DA FORMAÇÃO DA IGREJA DO
NAZARENO ........................................................................................................................... 18
Introdução ................................................................................................................................. 18
1.1 Esclarecendo a relação entre uma perspectiva sociológica e a eclesiologia....................... 20
1.2 O arminianismo .................................................................................................................. 24
1.3 O arminianismo na Inglaterra ............................................................................................. 27
1.4 A tradição wesleyana .......................................................................................................... 29
1.5. O reavivamento wesleyano ................................................................................................ 32
1.6 Doutrina da Santidade ........................................................................................................ 34
1.7 O Movimento de Santidade ................................................................................................ 38
Conclusão ................................................................................................................................. 55

CAPÍTULO 2 .......................................................................................................................... 57
A IGREJA DO NAZARENO ................................................................................................ 57
Introdução ................................................................................................................................. 57
2.1 Phineas Bresee (1838-1915) ............................................................................................... 57
2.2 As Associações e Igrejas formativas da Igreja do Nazareno .............................................. 66
2.2.1 A formação da Associação das Igrejas Pentecostais da América (AIPA). .............. 66
2.2.2 A formação da Igreja de Cristo em Santidade (ICS) ............................................... 68
2.2.3 A união da Igreja do Nazareno com a AIPA e a ICS ............................................... 71
2.2.4 A consolidação da Igreja do Nazareno: uma interpretação weberiana .................. 77
2.3 A Estrutura de poder na Igreja do Nazareno ...................................................................... 81
2.4 A Mídia Nazarena ............................................................................................................... 93
Conclusão ................................................................................................................................. 98

CAPÍTULO 3 ........................................................................................................................ 100


A IGREJA DO NAZARENO NO BRASIL ....................................................................... 100
Introdução ............................................................................................................................... 100
3.1 A Igreja do Nazareno: sua trajetória de Cabo Verde ao Brasil. ....................................... 101
3.2 A inserção da Igreja do Nazareno no Brasil ..................................................................... 107
3.3 A Igreja do Nazareno vista a partir da economia das trocas religiosas ............................ 117
3.4 A Atualidade da Igreja do Nazareno no Brasil ................................................................. 121
3.5 O Pastorado Nazareno ...................................................................................................... 125
3.6. Cultos e Práticas Nazarenas ............................................................................................. 132
Conclusão ............................................................................................................................... 140

CONCLUSÃO....................................................................................................................... 142
BIBLIOGRAFIA .................................................................................................................. 151
10

INTRODUÇÃO

A Igreja do Nazareno é uma instituição religiosa que surgiu do Movimento de


santidade nos Estados Unidos, no final do Século XIX. Em seu Manual -2009-2013-
(IGREJA DO NAZARENO/MANUAL 2009-2013, 2009, p. 14) ela se apresenta como uma
Igreja protestante, cujas maiores heranças são a tradição armínio-wesleyana e a doutrina da
santidade. O aparecimento da Igreja do Nazareno se deu em meio ao contexto de convulsões
sócio-religiosas do período posterior à Guerra de Secessão estadunidense (1861-1865), em
que as denominações1 presentes pareciam não atender as demandas religiosas nem adaptar
suas práticas às contingências da sociedade da época. A Igreja do Nazareno se consolidou
como expressão nacional de um movimento que buscava atrelar as práticas religiosas às
necessidades sociais, tais como: prestar assistência aos pobres, aos viciados, combater a
escravidão e promover um estilo de vida regrado. Esse movimento foi chamado de
Movimento de santidade ou Movimento “holiness”, do qual a Igreja do Nazareno tornou-se
herdeira.

A prática dos fundadores da Igreja do Nazareno de se voltarem para as questões


sociais, em meio ao crescimento urbano, trouxe divergência com outras denominações,
principalmente, com alguns ramos do metodismo que não viam nas ações sociais uma
alternativa para os problemas causados pelo desenvolvimento das cidades e, assim, sentiram o
esvaziamento de suas igrejas causado pela adesão a um cristianismo mais prático e de
valorização dos seres humanos. O Movimento de santidade foi primordialmente voltado aos
mais carentes e excluídos, que buscavam aderir a ele como forma de promoção social e
religiosa. A adesão à doutrina da santidade proporcionava a todos um novo condicionamento
religioso pela purificação dos pecados e um novo “status” social por ingressarem em um
ambiente de liberdade e igualdade.
1
Segundo Mendonça, o protestantismo norte americano desenvolveu o fenômeno religioso chamado
denominacionalismo. Esse fundamentou uma nova base social civil-religiosa que caracterizava pela associação
voluntária às igrejas e que por sua forma expandia o ideal puritano. Cada denominação tinha um propósito ou
intenção fundamentada em doutrinas teológicas específicas que por sua vez propugnavam um chamado divino
específico. A palavra denominação implica um grupo vinculado a uma instituição maior, a afirmação básica é
que a Igreja verdadeira não se identifica com nenhum desses grupos em particular, com isso nenhuma
denominação afirma representar toda Igreja de Cristo em particular. Nenhuma denominação insiste que as outras
Igrejas são falsas e que a sociedade deveria se submeter aos seus regulamentos eclesiásticos. (Cf. MENDONÇA,
Antônio Gouvêa. 1984, p. 45- 46.)
11

A consolidação da Igreja do Nazareno como maior expressão nacional do Movimento


de santidade nos Estados Unidos decorreu da união de vários grupos e igrejas de santidade
naquele país. Essa união visou à estruturação institucional em uma única igreja, que
harmonizasse a ação e o pensamento das principais lideranças envolvidas com o Movimento
de santidade oriundas de todas as regiões dos Estados Unidos. Esse processo refletiu na forma
de governo representativa formada por vários níveis hierárquicos de poder. Essa estrutura
organizacional expandiu-se pelo mundo, chegando em 1901 nas Ilhas de Cabo Verde de onde
vieram os principais missionários que implantaram a Igreja do Nazareno no Brasil, a partir de
1958.

O estudo dos primórdios da formação da Igreja do Nazareno até seu cinquentenário no


Brasil visa, sobretudo, a compreensão do que é a Igreja do Nazareno, quais foram os
principais aspectos sociorreligiosos que contribuíram para seu surgimento, como se formou
sua estrutura de poder, como foi sua difusão pelo mundo, como se deu sua chegada ao Brasil,
como se consolidou nesse país e que diferencial ela traz em meio ao cenário religioso no
Brasil. A fim de responder a essas questões, iniciamos com o enfoque nos antecedentes
formativos da Igreja do Nazareno os quais a própria Igreja assume como herdeira desses
movimentos e aspectos teológicos, a saber: o arminianismo, a tradição wesleyana, o
Movimento de santidade e a doutrina da santidade. A abordagem desses aspectos é feita no
capítulo I, no qual se enfatiza as condições sociais e religiosas em que se desenvolveram esses
conceitos. Mesmo tendo eles grande valor teológico, partimos da premissa que nenhum
constructo humano é apriorístico e não tenha ligação com a realidade em que surgiu.

O segundo capítulo aborda a formação da Igreja do Nazareno em si, descreve a ação


dos pioneiros nazarenos nos Estados Unidos, destacando a figura de Phineas Bresee. Nesse
capítulo, tratamos, também, do surgimento da Associação das Igrejas Pentecostais da América
e da Igreja de Cristo em Santidade que se uniram à congregação da Igreja do Nazareno para
formarem a maior expressão institucional do Movimento de santidade nos Estados Unidos, a
Igreja do Nazareno. Assim, destacamos os dois processos de formação da Igreja do Nazareno.
Primeiro, aquele em que ela surge como uma congregação do Movimento de santidade, em
1895 e, segundo, aquele em que ela surge como expressão nacional e institucional desse
movimento, em 1908. O processo de consolidação da Igreja do Nazareno, como expressão
nacional do Movimento de santidade nos Estados Unidos, desenvolveu uma estrutura
hierárquica de governo representativo que possibilitou a ela organizar inserções em várias
12

partes fora dos Estados Unidos, tornando uma das principais instituições promotoras da
mensagem de santidade no mundo.

Enfatizamos, nesse capítulo, o papel que a mídia exerceu na Igreja do Nazareno.


Desde os primeiros anos em que se tornou expressão nacional do Movimento de santidade, os
princípios nazarenos foram difundidos pela mídia escrita. A literatura de santidade tornou essa
Igreja conhecida de um extremo ao outro dos Estados Unidos, ao mesmo tempo, foi um fator
importante para sua expansão em áreas mundiais. A Mídia radiofônica nazarena, em muitos
casos, precedeu a ação missionária da Igreja pelo mundo. Pela análise desses aspectos,
procuramos mostrar que o recurso midiático foi fator preponderante para se legitimar não
apenas as ações externas da Igreja, mas, principalmente, criar um vínculo de coordenação
entre os vários grupos que a compuseram, a fim de alcançarem uma expressão unilateral do
Movimento de santidade nos Estados Unidos e fora dele, principalmente, em decorrência da
forte internacionalização que a Igreja do Nazareno já apresentava na segunda metade do
Século XX. Abordamos o processo de consolidação da Igreja do Nazareno nos Estados
Unidos, a partir de uma perspectiva weberiana, a fim de mostrar o processo de mudança de
uma dominação carismática para a dominação burocrática-legal decorrente da rotinização de
atividades e das novas gerações de Superintendentes gerais que passaram a direcionar as
ações dessa Igreja.

No capítulo terceiro, tratamos da Igreja do Nazareno no Brasil. Iniciamos com o


estudo de seu desenvolvimento desde Cabo Verde, porque através dessas Ilhas se deu o
percurso que os nazarenos fizeram para se chegar ao Brasil. Os principais pioneiros nazarenos
tiveram uma passagem importante em Cabo Verde e por meio dessa experiência implantaram
a Igreja em território brasileiro. José Zito e Joaquim Antônio Lima foram cabo-verdianos que
tiveram papel preponderante nesse processo de inserção e expansão e Earl Mosteller,
missionário americano que esteve nas Ilhas por 12 anos antes de vir ao Brasil, é, oficialmente,
o fundador da Igreja do Nazareno no país. Nesse capítulo, desenvolvemos o processo de
inserção da Igreja na cidade de Campinas e sua expansão para outros centros urbanos, como
Belo Horizonte, Brasília, Rio de Janeiro e São Paulo. Destacamos que esse processo foi
construído sobre as estratégias de utilização dos espaços midiáticos radiofônicos e escritos,
bem como, pela busca de alinhamento político que proporcionaram à Igreja do Nazareno
rápido estabelecimento nas cidades escolhidas.
13

Em perspectiva teológica, defendemos a ideia de que a Igreja do Nazareno procurou se


distinguir das outras denominações no cenário religioso brasileiro, por meio da doutrina da
santidade. Essa doutrina, tratada em termos do arcabouço teórico da economia das trocas
religiosas, deu a essa Igreja a chamada vantagem comparativa, ou seja, a doutrina da
santidade foi um produto mercadológico distinto entre os demais produtos religiosos em
circulação no mercado brasileiro. A Igreja do Nazareno atendia a um nicho de mercado
formado por aqueles que se sentiam insatisfeitos com as igrejas das quais faziam parte e por
pessoas que buscavam uma forma diferenciada do cristianismo protestante não vista nas
igrejas estabelecidas no eixo de inserção da Igreja do Nazareno no Brasil.

A teoria das economias religiosas, utilizada como arcabouço nesta pesquisa, distingue
da abordagem mercantilista da religião em que esta é vista dentro de uma lógica em que as
igrejas mudam seus padrões de comportamento para atender ao mercado de clientes
religiosos. Nessa perspectiva mercantilista, as igrejas utilizam de técnicas e procedimentos do
mercado para atrair os fiéis. Estruturas de marketing, gestão, negócios e de administração são
utilizadas na busca de se consolidarem no mercado religioso. Ao contrário, a teoria das
economias religiosas considera a lógica do mercado, mas não enfoca a mercantilização da
religião. Essa teoria percebe as igrejas como instituições que estão inseridas na competição
para ofertar produtos religiosos, mas que não mudam seus padrões para alcançar as pessoas e
sim buscam atender uma demanda já definida. Em síntese, as diferenças entre as
denominações criam um mercado de produtos religiosos que estão em concorrência perfeita,
devido à quebra do monopólio religioso da Igreja Católica. Cada igreja busca seu nicho
religioso sem alterar ou buscar outras formas teológicas para atender o público, visto que para
os proponentes dessa teoria não é possível a uma única instituição religiosa atender toda a
demanda.

A Igreja do Nazareno, com seu produto diferenciado da santificação, orienta-se para


aqueles que visam ao aperfeiçoamento, isso é, a doutrina da santidade é uma expressão
teológica que suplanta a simples justificação, pois é um ato posterior a ela. Assim,
intrinsecamente, está destinada às pessoas que já tiveram uma experiência da vida religiosa
dentro das denominações protestantes. O produto religioso da santificação atende, então,
àqueles membros das igrejas que, inconformados com elas, buscam novos caminhos, ou
então, atende àqueles que não veem nas membresias dessas igrejas uma mudança substancial
de estilo de vida, a ponto de não quererem experimentar a crença dessas pessoas. A doutrina
14

da santidade é endereçada ao chamado aperfeiçoamento dos santos, nicho do mercado


religioso pouco vislumbrado por outras instituições religiosas.

Ao mesmo tempo em que assim caracterizamos a doutrina da santidade na perspectiva


da teoria das economias religiosas, podemos observar que a inserção da Igreja do Nazareno no
Brasil foi mais uma tentativa de se estabelecer enquanto instituição do que se empenhar no
chamado processo de evangelismo em si. A Igreja não se inseriu em um ambiente pagão ou a-
religioso, pelo contrário, muitas outras denominações já haviam se estabelecido nos grandes
centros, de forma que, ela não buscou centros pioneiros de missões, mas o seu
estabelecimento em um meio repleto de outras instituições religiosas protestantes. A
estratégia de Mosteller foi buscar os centros desenvolvidos culturalmente para que as pessoas
que se afiliassem à Igreja do Nazareno pudessem assimilar mais rapidamente a doutrina da
santidade. Além disso, Mosteller procurou se alinhar politicamente às autoridades para obter
apoio às ações da Igreja. Tais condicionamentos remetem que o objetivo principal da inserção
da Igreja do Nazareno no Brasil foi, primeiro, se estabelecer institucionalmente e, segundo,
atender a uma demanda teológica não atendida por outras instituições presentes no Brasil.
Dessa forma, a inserção da Igreja do Nazareno no Brasil não foi uma forma de contra-cultura,
mas de assimilação de todos os elementos que lhe pudessem ser propícios ao seu
desenvolvimento no país.

Este estudo da Igreja do Nazareno visa também qualificá-la em temos de suas práticas
litúrgicas, de formação pastoral, de agregação de membros e de suas crenças básicas.
Portanto, aborda aspectos como a centralidade da Bíblia, a dominação carismática pastoral
sobre a membresia e a relação burocrática-legal na hierarquia da Igreja. Esses aspectos
ressaltam a extensão da influência da Igreja sobre os seus membros, que é percebida além do
âmbito meramente eclesial. A figura do pastor adquire proeminência frente às demais
lideranças e sobre qualquer pessoa na Igreja, com isso, suas decisões passam a efeito
normativo referendado pelo poder da Bíblia. Aliás, a centralidade que a Bíblia tem na Igreja
do Nazareno decorre de sua condição como a Palavra de Deus e da interpretação que o pastor
lhe dá. Não é comum questionar os atos e discursos do pastor se ambos forem interpretados a
luz da Palavra de Deus. Essa interpretação é dada com autoridade pelo pastor, portanto, há
uma simbiose entre a Palavra de Deus e a palavra do pastor.

Decorre disso, que o pastor, conforme a concepção tomada de Jean-Paul Willaime


(2003), torna-se um tipo de clérigo, que assume papéis específicos de manutenção da ordem
15

eclesiástica, da qual a Bíblia é o principal instrumento de legitimação. Figuras bíblicas que


enaltecem o caráter de liderança são constantemente comparadas aos pastores nazarenos.
Ocorre uma sacralização da figura do pastor em relação aos membros das igrejas, de modo
que os intentos pastorais geralmente são alcançados. Essa condição somente é perdida,
quando o pastor perde o carisma da mensagem. Fora isso, a membresia nazarena está
suscetível de incorrer em práticas das mais variadas, somente controladas pela dominação
burocrática-legal da hierarquia da Igreja.

Em todos esses aspectos, este trabalho procura suplantar a falta de conhecimento sobre
a Igreja do Nazareno, trazendo ao conhecimento público as características formativas e
essenciais dessa Igreja, por meio do estudo da questão de como foi o processo de formação e
consolidação da Igreja do Nazareno até o ano de seu cinquentenário no Brasil. Em
decorrência desta problematização, apresentamos como hipótese principal, que o processo de
inserção da Igreja do Nazareno no Brasil se deu como resposta à falta de uma instituição no
cenário protestante brasileiro que vinculasse sua mensagem diretamente ao aperfeiçoamento
dos já convertidos. Assim, apontamos que, a inserção e expansão da Igreja do Nazareno no
Brasil visaram cobrir um lapso dogmático que nem as Igrejas clássicas e nem as pentecostais
suplantaram com suas mensagens e doutrinas. A Igreja do Nazareno visualizou o cenário
religioso brasileiro em termos das economias religiosas, ou seja, um ambiente de concorrência
em que seria necessário um fortalecimento institucional, ao invés de uma prática evangelística
pulverizada. Mesmo que entendamos que a doutrina da santificação propugnada pela Igreja do
Nazareno não se originou com ela e nem é exclusividade dela, os nazarenos entendem que o
Movimento de santidade se desvaneceu no âmago de outras denominações que a princípio
haviam aderido à doutrina da santidade.

Assim como nos Estados Unidos se buscou uma organização centralizada que
preservasse e difundisse a mensagem da santidade proveniente do Movimento holiness, assim
os nazarenos buscaram implantar uma instituição eclesial no Brasil que difundisse a
perspectiva original da santidade. Podemos aventar tal hipótese, pela necessidade apresentada
pelo casal Stegemoeller, nazarenos residentes no Brasil, de solicitar à direção da Igreja nos
Estados Unidos a vinda de missionários para implantação da Igreja no Brasil, bem como,
apesar da ausência da Igreja do Nazareno no país, José Zito, um de seus pioneiros, não ter se
filiado às Igrejas Congregação Cristã no Brasil, Presbiteriana, Metodista ou qualquer outra,
enquanto a Igreja do Nazareno não se estabeleceu em terras brasileiras.
16

A doutrina da santidade é patente em toda a forma de argumentação para consolidação


da Igreja do Nazareno no Brasil, resta avaliarmos qual o ganho ou perda essa doutrina trouxe
para sua afirmação no contexto religioso brasileiro. Pela dificuldade que temos para
harmonizá-la dentro das categorias do protestantismo brasileiro, ressaltamos que seus valores
essenciais ainda são bem distintos das demais instituições religiosas no país, até mesmo
daquelas oriundas do Movimento de santidade. Tal hipótese se revela nas reiteradas vezes que
periódicos, boletins, artigos, apostilas, organogramas, etc., oriundos dessa Igreja, insistem em
mostrar o vínculo distintivo dessa denominação com a doutrina da santidade.

Por fim, ressaltamos que, o foco desse estudo é a descrição e análise da formação e
expansão de uma instituição religiosa que visa a se estabelecer em um cenário protestante
diversificado. Portanto, esse estudo atende a uma lógica institucional da fundação,
desenvolvimento e reprodução de uma organização religiosa, baseado na perspectiva da
sociologia da Religião de Max Weber (2004), François Houtart (1994) e Thomaz O‟Dea
(1969) e na especificidade de sua inserção em um mercado religioso plural abordado pela
teoria das economias religiosas. Para não perdermos os aspectos bíblicos e teológicos
pertinentes a essa instituição, buscamos o diálogo com o ramo da Teologia denominado de
eclesiologia.

No aspecto metodológico, priorizamos a análise dos documentos da Igreja, como


manuais, atas, correspondências, ofícios, revistas e jornais, bem como, a análise de material
audiovisual, contidos em fitas VHS e em CDs. Efetuamos pesquisas em seminários nazarenos
e na Faculdade Nazarena do Brasil. Empenhamos visitas à Igreja do Nazareno central em
Campinas e em outras Igrejas dos Estados de São Paulo, Rio de Janeiro, Minas Gerais e
Goiás. Coletamos informações, por meio eletrônico, junto às Igrejas das outras regiões do
Brasil e dialogamos com importantes lideranças dessa Igreja no Brasil, a fim de obtermos
esclarecimentos e informações não disponíveis em documentos. Utilizamos também da
observação participante e do diálogo com leigos nazarenos para melhor caracterizarmos o
objeto dessa pesquisa

Entendemos que, apesar da singularidade da Igreja do Nazareno, seu estudo pode ser
proveitoso para aqueles que percebem que os fatos que a envolvem são semelhantes aos que
envolvem outras igrejas protestantes e que os aspectos abordados nesse estudo podem ser uma
contribuição para aqueles que desejam embrenhar nos caminhos da pesquisa sobre outras
17

igrejas. A partir dessas considerações, mostramos a seguir, no primeiro capítulo, a descrição e


análise dos movimentos e fatos que formaram o campo ideológico da Igreja do Nazareno.
18

CAPÍTULO 1

ANTECEDENTES SOCIORRELIGIOSOS DA FORMAÇÃO DA


IGREJA DO NAZARENO

Introdução

Esse capítulo enfoca os antecedentes sociorreligiosos que contribuíram para a


formação da Igreja do Nazareno, no final do Século XIX. Nele, procuramos descrever e
analisar os principais fatores que a própria Igreja do Nazareno define como essenciais em sua
formação, conforme está estabelecido em seu Manual -2009-2013- (IGREJA DO
NAZARENO/MANUAL 2009-2013, 2009.). Trataremos, portanto, das descrições analíticas
do arminianismo, principalmente, na sua expressão inglesa; da tradição wesleyana, da
doutrina da santidade e do Movimento de santidade ocorrido nos Estados Unidos, no Século
XIX.

A Igreja do Nazareno é uma instituição religiosa fundamentada nos princípios da


Reforma Protestante. Surgida nos Estados Unidos no final do Século XIX, ela se considera
herdeira da doutrina wesleyana de santidade que se difundiu nesse país através do Movimento
de santidade, ou Movimento holiness como também é conhecido. Essa instituição foi
inicialmente denominada de Igreja do Nazareno, a partir da congregação fundada pelo Pastor
metodista Phineas Franklin Bresee (1838-1915) e pelo médico, também metodista, Joseph
Pomeroy Widney (1841-1938), em 30 de outubro de 1895, na cidade de Los Angeles.

Segundo Timothy L. Smith ([195-], p. 123-126), Bresee e Widney, antes de fundarem


a Igreja do Nazareno, haviam se associado à Missão Peniel, uma missão que prestava
assistência aos pobres em meio o crescimento urbano estadunidense. Enquanto estava
vinculado à Missão Peniel, Bresee requereu sua renovação como ministro da Igreja Metodista,
que lhe foi negada, ocasião em que se desligou dessa Igreja. Após algum tempo, também se
desligou da Missão Peniel por divergências com seus líderes. Bresee e Widney alugaram um
espaço na Rua South Main nº 317 (IGREJA DO NAZARENO/MANUAL 1997-2001, 1997,
19

p. 18) e anunciaram os mesmos serviços de auxílio aos pobres, denominando esse espaço de
Nazareno, por entenderem que era o nome que mais identificava Jesus Cristo com os pobres.
O crescimento das atividades na South Main fez surgir a Igreja do Nazareno.

A incipiente Igreja do Nazareno cada vez mais se imbricava com os princípios do


Movimento de santidade. Aliás, o seu pressuposto de um cristianismo social advinha desse
movimento que se solidificava cada vez mais por meio da organização de grupos
independentes de santidade que se espalharam pelos Estados Unidos. Entre eles, estavam a
Associação de Igrejas Pentecostais da América (1887) e a Igreja de Cristo em Santidade
(1894). Em 1896, a Associação das Igrejas Pentecostais da América e a Associação Central
Evangélica de Santidade uniram-se, mantendo o nome da primeira associação, cujo principal
expoente era o pastor Hiram Reynolds. (IGREJA DO NAZARENO/MANUAL 1997-2001,
1997, p. 17). No final do ano de 1907, essa Associação uniu-se em Chicago à Igreja do
Nazareno. Reynolds e Phineas Bresee foram eleitos os Superintendentes gerais da Igreja do
Nazareno. Durante o ano de 1908, o Superintendente geral assistente e antes evangelista da
Igreja Cristã de Santidade, Christian Wismer Ruth promoveu a união desta com a Igreja do
Nazareno, dando origem à Igreja Pentecostal do Nazareno, em 13 de Outubro em Pilot Point,
Texas. Tal data é a oficialmente aceita como a da fundação da Igreja Pentecostal do Nazareno,
cujo nome foi mudado na Assembleia geral de 1919, para Igreja do Nazareno. (IGREJA DO
NAZARENO/MANUAL 1997-2001, 1997, p. 20).

A Igreja do Nazareno, mesmo antes de sua data oficial de fundação já efetuava o


trabalho missionário em outras regiões, como na Índia e alguns países de América Central. No
Brasil, a Igreja se estabeleceu depois de consolidada teológica e administrativamente nos
Estados Unidos. Sandro José Hayakawa Cunha (2007, p. 30) descreve a chegada de alguns
missionários da Igreja do Nazareno no Brasil. Ele afirma que o desembarque, no Porto de
Santos, do pastor nazareno de Cabo Verde, José Zito de Oliveira, em julho de 1956, foi o
início da história nazarena no Brasil. Todavia, antes dessa data, já havia membros leigos
nazarenos habitando no país, mas que vieram com objetivos trabalhistas e não devido a uma
ação missionária da Igreja do Nazareno no Brasil. Segundo relatos de alguns líderes dessa
Igreja, o mesmo aconteceu com José Zito que viera ao Brasil para trabalhar e não por
mandado oficial da Igreja para atuar como missionário.

Oficialmente, a Igreja do Nazareno chegou ao Brasil em 1958, por meio do reverendo


Earl Elwood Mosteller e de sua esposa Gladys Marie Parker Mosteller e, pouco depois, com a
20

vinda do casal de missionários Charles e Joana Gates. Earl Mosteller e Charles Gates, com
suas respectivas esposas e filhos, chegaram ao Brasil a pedido do casal Stegemoller que havia
enviado uma carta à sede da Igreja do Nazareno nos Estados Unidos solicitando missionários
para instalarem a Igreja do Nazareno no território brasileiro. Os Stegemoller vieram a trabalho
em uma indústria de tratores e máquinas pesadas em Campinas, o que significa que não
vieram ao Brasil a serviço da Igreja. Outros missionários e novos adeptos da Igreja do
Nazareno fizeram com que essa se espalhasse para outros Estados e cidades nos poucos meses
posteriores, como é o caso de Minas Gerais, Rio de Janeiro, São Paulo e Distrito Federal.
Cinquenta anos depois, a Igreja do Nazareno encontra-se em todas as regiões do Brasil com
aproximadamente 90 mil membros. (IGREJA DO NAZARENO/AGENDA, 2009.).

1.1 Esclarecendo a relação entre uma perspectiva sociológica e a eclesiologia

A breve explanação que fizemos sobre a Igreja do Nazareno tenta mostrar como a
formação institucional é dependente do ambiente sócio-histórico que a circunscreve, portanto
o estudo do processo formativo da Igreja do Nazareno servirá dos arcabouços teóricos que
privilegiam a institucionalização dos movimentos religiosos, uma vez que buscamos, neste
capítulo, o entendimento do processo formativo de uma instituição: a Igreja do Nazareno.
Tomamos, portanto, na análise desse objeto os condicionamentos sócio-históricos mais
importantes que contribuíram para o surgimento dessa Igreja. Esses condicionamentos são
retratados, como já dissemos, a partir das próprias concepções que a Igreja entende como
essenciais à sua formação, portanto as definições de arminianismo, da tradição wesleyana e do
Movimento de santidade nos Estados Unidos sustentam a abordagem deste capítulo. Assim, a
forma de análise que propomos é uma simbiose entre a abordagem da Sociologia da Religião
sobre as instituições religiosas2 e a eclesiologia, visto que os aspectos sociais de formação da
Igreja estão intrinsecamente ligados aos fatores teológicos que ela adota, ou seja, há uma
interpretação teológica dos eventos sociais no âmbito da Igreja do Nazareno.

A eclesiologia é um ramo da teologia cristã que estuda a Igreja e suas doutrinas.


Conforme Alister Edgar McGrath (2005, p. 543), a eclesiologia busca responder à questão

2
Nesse aspecto, tomamos como referência teórica as perspectivas sociológicas da religião de Francois Houtart
(1994) e Thomaz O‟Dea (1969).
21

básica: O que é a Igreja? Dessa forma, essa disciplina estuda uma instituição de cunho
burocrático formal, mas também de valor simbólico espiritual. Na perspectiva de uma
eclesiologia protestante, tem-se que a Reforma Protestante (1517) se iniciou dentro da visão
do que seria a Igreja, visto que de imediato, contradizia os princípios hierárquicos,
burocráticos e teológicos da Igreja Católica Romana. Para Lutero, a Igreja Católica havia
perdido o direito de ser considerada a autêntica igreja cristã por haver se distanciado da
doutrina da graça3.

Segundo Walter Altmann (1994), Lutero fazia distinção entre a igreja externa e igreja
interna, isso é, a igreja enquanto instituição humana e comunidade mística espiritual. No
entanto, essa separação não era tão patente; são “dimensões que se dão sempre em
simultaneidade, não como entidades compartimentadas.” (ALTMANN, 1994, p. 126). Mesmo
assim, Lutero apresentou contundente crítica à Igreja institucional. Para ele, “o que se crê não
é corporal nem visível. Todos nós vemos a Igreja Romana exterior. Por esta razão, ela não
pode ser a verdadeira Igreja, que é crida e é uma comunidade ou assembleia dos santos na fé”.
(LUTERO, 1987. p. 378).

A diferenciação proposta por Lutero estava no conceito utilizado para designar a


natureza da igreja, mas não para torná-la intocável do ponto de vista das críticas. As críticas
de Lutero se voltavam para a parte visível da Igreja expressa nas figuras do clero. Essa crítica
ao clero não visava o esvaziamento do significado religioso da igreja, nem o aniquilamento de
seu papel social. Com isso, não se desprezavam os parâmetros espirituais dela, nem se
criticava sua influência religiosa, mas a forma como o clero a levava a imiscuir nas questões
temporais. Esse aspecto se comprova pela utilização que Lutero fazia dos argumentos
teológicos e religiosos para fundamentar sua crítica ao clero e sustentar a ação dos príncipes
no meio eclesial.

Se a eclesiologia é o estudo da Igreja, tanto no âmbito institucional como


transcendental, cabe definirmos o que se entende por Igreja neste trabalho. A palavra
“ekklesia” remetia à assembleia dos cidadãos livres da pólis grega para fazerem eleições. No
sentido bíblico do Antigo Testamento, as reuniões que ganharam conotações provenientes dos

3
A graça é um conceito teológico extraído da interpretação bíblica, no qual expressa o favor incondicional de
Deus para com os seres humanos, independente desses o conhecerem ou amá-lo. Na perspectiva luterana, a graça
suprime a intervenção eclesiástica para que os seres humanos se relacionem com Deus. (Cf. GRENZ;
GURETZKI; NORDLING, 2002, In: GRAÇA)
22

preceitos de Javé, ou em torno dele, eram traduzidas como igreja, conforme estipula a versão
dos setenta4. Segundo Edward Schillebeeckx (1989, p. 60), os primeiros cristãos aproveitaram
dessa concepção e adotaram-na para se referir à reunião de fiéis aos preceitos de Jesus Cristo
em determinado local e também para as várias comunidades cristãs existentes em uma cidade,
ou espalhadas no mundo.

No caso do protestantismo, o conceito de igreja foi definido, por extensão, aos adeptos
do princípio luterano: somente pela graça, somente pela fé e somente pelas escrituras. Os
quais implicaram na singela definição encontrada nos artigos de Esmalcada5 em que a Igreja é
os cordeirinhos que ouvem a voz de seu pastor. Daí, Altmann (1994. p. 124) ressalta que “há
na compreensão de Igreja em Lutero, uma dimensão de forte crítica institucional. Excluída
está também de antemão a predominância de uma hierarquia eclesiástica”. Pelos princípios de
Schillebeck e de Lutero, entendemos que a Igreja protestante se estabelece em um
fundamento transcendente e subjetivo e em outro material histórico. Isso traz a necessidade de
uma abordagem social e eclesiológica e, nesse aspecto, visualizamos a Igreja do Nazareno no
Brasil por intermédio das relações burocráticas e pelas relações com o sagrado refletido na
supremacia da Bíblia e da prédica pastoral como padrão prescritivo na Igreja e na condução
dos membros nazarenos.

O que ressaltamos é a impossibilidade ou a dificuldade de se fazer um estudo


sociológico da Igreja do Nazareno sem levarmos em conta sua inseparabilidade com o valor
simbólico da Bíblia. Teólogos modernos como Friedrich Schleiermacher, Rudolf Bultmann,
Barth entre outros sustentavam a inseparabilidade da igreja das Escrituras, bem como a
primazia dessa na padronização de outras formas eclesiásticas. Conforme ressalta Hugh R.
Mackintosh (2004. p. 71), mesmo para Schleiermacher, que via a necessidade de uma maior
flexibilidade da dogmática, não se percebe a alternativa de outra medida da verdade sobre a
pregação ou confissões da igreja que fosse diversa da interpretação da Palavra de Deus. Por
meio dela, pode-se julgar tanto o passado como o presente. Nesse aspecto, tomamos o
pensamento de Claude Geffré (2004. p. 14) que retrata bem o valor da Bíblia nas igrejas

4
Versão dos setenta ou septuaginta refere-se à tradução do Antigo Testamento hebraico para o latim. Segundo a
tradição essa versão foi feita por setenta e dois rabinos que, sem se conhecerem, traduziram a Torá sem se
contradizerem.

5
Conforme Earle E. Cairns (1995), a liga Esmalcádica era uma organização formada por Príncipes protestantes
para defesa mútua contra os católicos, no ano de 1531.
23

protestantes. “o que é transmitido não é apenas um texto do passado, ou um acontecimento do


passado, mas uma realidade sempre atual”. Assim, ressaltamos que um estudo simplesmente
sociológico da Igreja do Nazareno não traria a realidade que envolve suas relações, se
desconsideramos a legitimidade que as construções teológicas trazem às suas práticas.

Dessa forma, acreditamos que quaisquer que sejam as proposições utilizadas para se
definir uma igreja, o papel escriturístico é essencial, isso é, podemos pensar uma igreja com
muitos, poucos e até com um membro, podemos entendê-la com práticas ortodoxas ou
heterodoxas, com variadas formas de governo etc.. Contudo, todos esses aspectos se
submetem e são legitimados por uma avaliação bíblica. Qualquer que seja a forma ou
conteúdo de uma igreja de linha protestante evangélica são eles fundados ou referendados
pela interpretação que se tem das Escrituras Sagradas, ela torna-se o padrão normativo-
prescritivo de uma instituição religiosa do ramo protestante. C. William Fischer ([19--]), no
prefácio de seu livro, Porque sou nazareno e não Católico Romano, Espírita, Testemunha de
Jeová, Mormón e Adventista do 7º dia, estipula que o padrão nazareno de interpretação
da Bíblia é o valor principal de diferenciação em relação às outras instituições e não há
qualquer outro critério que a suplante.

Muitas observações e convicções tornaram esta obra uma tarefa compulsória, e mais
que necessária: a sagaz camuflagem da heresia, no empregar um vocabulário,
respeitável e ortodoxo [...] Se este livro criar o orgulho ou a arrogância
denominacional (dos nazarenos), terá falhado no seu propósito. Se criar ou alargar
uma caridosa compreensão naqueles cujas mentes estão distorcidas, e ao mesmo
tempo patentear tais distorções à reveladora luz do ‘Assim diz o Senhor’(da Bíblia)
e propiciar a todos que o lerem compaixão mais profunda para guiarem os
enganados aos caminhos da retidão e da verdadeira fé, terá provado que isso é obra
do Espírito. E nesta medida, e somente nesta medida, este volume será útil a todos
quantos o lerem e também agradável Àquele em cujo nome foi escrito. (FISHER,
([19--]), p. 6,7 grifo nosso).

Buscamos destacar com esse ponto, que os condicionamentos sociais que influenciam
na constituição de uma igreja são, em grande medida, referendados por alguma forma de
interpretação bíblica. O surgimento da Igreja do Nazareno é visto por seus adeptos como
resultado de uma interpretação escriturística do contexto sócio-histórico feita por seus
pioneiros. Nesse aspecto, pode parecer paradoxal a concordância que aqui se tem com as
origens sociais das denominações cristãs proposta por Helmut Richard Niebuhr (1992, p. 16)
que não se prende à interpretação ortodoxa do denominacionalismo cristão, que “considera os
credos oficiais das igrejas portadores da explicação das origens e do caráter das diferenças
vigentes” entre as várias igrejas. No entanto, propomos, como sutil diferença à abordagem de
24

Niebuhr, o fato de não se entender o credo de forma ontológica, ou seja, como algo distinto da
realidade cotidiana, simplesmente baseada nos ditames teológicos. Dessa forma, podemos
entender o credo não como um preceito de origem transcendente, mas como resultado da
forma de se perceber a realidade que é traduzida, ou é interpretada para e pela linguagem
religiosa, que se institucionaliza nas igrejas.

Evidentemente, não desconhecemos os momentos críticos que a Bíblia ou a dogmática


passaram ao longo da história. No entanto, percebemos que qualquer que fosse o embate entre
ciência e dogma que interferisse na vida das igrejas protestantes não se resultou na perda da
centralidade das Escrituras no meio eclesial. Seja como forma apologética ou crítica, o lugar
de destaque da Bíblia não se desvaneceu no seio das igrejas. Com isso, destacamos que os
acontecimentos sócio-históricos exigiram e exigem das igrejas e movimentos religiosos uma
postura retroativa fundamentada nos princípios de interpretação escriturísticos que
diferenciam as igrejas entre si. Os acontecimentos sociais seriam, nesse aspecto, o ponto de
ativação das vertentes teológicas. Os pioneiros da Igreja do Nazareno perceberam a realidade
circundante e traduziram-na em termos que consubstanciaram no arcabouço teológico que
sustentou o aparecimento e fortalecimento institucional da Igreja do Nazareno, no final do
século XIX, os quais veremos a seguir.

1.2 O arminianismo

A Igreja do Nazareno se define como arminiana. Essa ideia remete ao século XVI e
aos ensinos do teólogo holandês Jacobus Arminius (1560-1609). Armínio nasceu em
Oudewater e estudou na Universidade de Leiden e Genebra. Nesta, se empenhou a estudar o
calvinismo sob as orientações do sucessor de Calvino, Teodoro Beza. Ao terminar os estudos,
Armínio voltou para a Holanda e assumiu como pastor uma igreja em Amsterdã, nesse tempo,
conheceu as idéias de Dirk Koornhert, também teólogo, que combatia as idéias do calvinismo.
Armínio de imediato colocou-se contrário a Koornhert, mas aprofundando-se em seus estudos
verificou a plausibilidade dos argumentos do teólogo de Amsterdã e passou a adotá-los.
Segundo José Gonçalves Salvador ([19--], p. 23), Koornhert, desde 1544, “vinha atacando as
idéias de Calvino na Suíça. No conceito de Koornhert, todas as formas de religião deviam ser
toleradas, mas, ao externar seu ponto de vista, feriu uma das doutrinas fundamentais do
calvinismo, único sistema que o Estado favorecia”.
25

O calvinismo ganhou ascendência nos Países Baixos em 1560, quando começaram a


surgir as primeiras confissões de fé redigidas pelo pastor Guido de Brés, por meio das quais o
calvinismo organizou-se em igrejas. Os cinco pontos que resumem a doutrina calvinista são
assim expostos, conforme Mcgrath (2005): a) total depravação da natureza pecadora do ser
humano; b) eleição incondicional, pois os seres humanos não são predestinados pelo critério
dos próprios méritos; c) Cristo morreu somente para salvação dos eleitos; d) os eleitos são
inevitavelmente chamados e redimidos; e) os que são eleitos por Deus não podem abandonar
esse chamado.

O pensamento de Armínio não surgiu em um vácuo social. Os Países Baixos, em


decorrência das guerras contra o domínio espanhol, criaram uma mentalidade social que
prezava pela liberdade política e religiosa, tudo isso ainda era contornado por intensas
atividades comerciais que propiciavam o intercâmbio não somente de mercadorias, mas
também de ideias. O ponto crucial da discussão entre Armínio e os calvinistas era a forma
como estes tratavam a doutrina da dupla predestinação que dizia haver os eleitos e, por
consequência, também os perdidos. No entanto, a morte prematura de Armínio impossibilitou
a conclusão do debate que foi retomado pelos arminianos, principalmente, depois de
sucessivas perseguições na Holanda, em decorrência das doutrinas que promulgavam. Em
síntese, a doutrina da dupla predestinação estabelecia que o tornar-se justo, ou a justificação, é
uma condição adquirida somente pela vontade divina, ou seja, aquele que é justificado e
tornou-se, por consequência, salvo do castigo eterno, foi escolhido por Deus. Logo, os salvos
seriam inoperantes na própria salvação, pois esta não dependia deles, mas do favor divino em
escolhê-los.

Os “remonstrantes”6 alegavam que a salvação, por intermédio de Jesus Cristo, estava


disponível a todos e não somente àqueles que de antemão foram escolhidos por Deus. O
sacrifício de Cristo era, pois, de caráter universal e tanto os crentes como os não crentes eram
responsáveis por sua salvação. Daí o manifesto desses arminianos “remonstrantes”:

Deus, por meio de um eterno e imutável decreto em Cristo, antes da existência do


mundo, determinou-se a eleger para a vida eterna, dentre a raça humana pecadora e
caída, todos aqueles que, por meio da graça de Deus, crêem em Jesus Cristo e

6
Essa designação surgiu quando um grupo de pastores adeptos das ideias de Armínio viu se intensificar as
perseguições contra suas práticas e ideias, principalmente, em decorrência das ações impetradas pelo docente da
Universidade de Leiden, Francisco Gomaro. Em decorrência de tal fato, esses pastores assinaram um documento
intitulado de o protesto ou “remonstranza” que rechaçava ainda mais o calvinismo.
26

perseveram na fé e na obediência.... Cristo, o salvador do mundo, morreu por todos


os seres humanos, obtendo dessa forma, pela sua morte na cruz a reconciliação e
perdão para todos, de tal maneira, entretanto, que apenas aqueles que são fiéis
realmente desfrutam disso. (MCGRATH, 2005, p. 535).

Para os arminianos, o calvinismo coloca Deus como autor do pecado, embora não
negassem, de todo, o chamado dos salvos semelhante à eleição. Os arminianos não
corroboravam, contudo, com um decreto divino arbitrário de escolha dos salvos, pois se assim
fosse os não salvos também seriam decorrentes da escolha de Deus e, para eles, ninguém foi
chamado para a perdição. Os “remonstrantes” acreditavam que nenhum ser humano por suas
próprias forças podia alcançar a Deus, esse, por intermédio de sua graça, é que chegava até os
homens, mas isso não significava que somente alguns tinham a sorte de serem alcançados. A
partir da aproximação de Deus é que os seres humanos poderiam escolher se seguiriam ou não
os ditames da divindade, mas todos os seres humanos poderiam ter essa escolha.

Os questionamentos à doutrina da dupla eleição não trouxe apenas uma nova


concepção teológica, mas disseminou a responsabilidade humana também nas questões
religiosas, até então tratadas por uma hierarquia de cunho transcendental. Com o
arminianismo, os desfechos da ação humana estavam ligados à própria conduta humana e não
como imposição de uma ordem superior. O livre arbítrio tornou-se possibilidade de atenuar
todos os resquícios de ostentação eclesiástica do período anterior à Reforma que ainda
vigoravam no norte da Europa. O individualismo que procurava abandonar o espírito
corporativo, o hedonismo baseado na autossatisfação contra a ascese medieval, o
antropocentrismo e o humanismo promovidos pelo renascimento pareciam ganhar sua maior
expressão religiosa por meio dos pressupostos arminianos.

As controvérsias entre arminianos e calvinistas tiveram, oficialmente, um fim quando


da promulgação do Sínodo de Dort7 reunido em 1618-1619, no qual se aprovou os cinco
artigos contrários à representação dos “remonstrantes” feita 1610. Propomos no quadro
abaixo o seguinte paralelo entre as propostas arminianas e calvinistas discutidas no Sínodo de
Dort:

7
Conforme Grenz, Guretzki e Nordling (2002, p. 123), o Sínodo de Dort foi uma assembleia das igrejas
reformadas dos Países Baixos, convocada em Dort em 1618-1619, para tratar politicamente da separação entre a
igreja e o Estado e teologicamente da questão arminiana. O Sínodo se posicionou contra o arminianismo e
estabeleceu bases que confirmavam a doutrina da depravação total da humanidade.
27

QUADRO 1: Paralelo entre as propostas Arminianas e Calvinistas no Sínodo de Dort.


Arminianos Calvinistas
Eleição condicional. Eleição incondicional.

Expiação universal. Expiação limitada.


Incapacidade natural de fazer o bem fora da Incapacidade natural ou depravação total. A
Graça divina. regeneração deve preceder a conversão.
Graça preventiva ineficaz, conforme a Graça irresistível, o ser humano a quem Deus a
vontade do pecador. outorga será salvo.
Perseverança condicional, os seres humanos Perseverança final, segurança eterna
podem decair da Graça e perecerem sem incondicional.
salvação.

Segundo H. Orton Wiley e Paul T. Culbertson ([19--], p. 167.), o que se estabeleceu


do arminianismo foi que a obra salvadora de Deus é destinada a toda humanidade, não é um
ato arbitrário de Deus para garantir a salvação de alguns e a condenação de outros, mas um
ato destinado a todos os homens que respondem ao chamado para a salvação. Portanto,
eleição e predestinação se diferenciam no fato de que “a eleição implica escolha, enquanto a
predestinação não”. Dessa forma, os eleitos são escolhidos por Deus, mas não,
necessariamente, têm que aceitar essa escolha para a salvação, se afirmativamente aceitarem-
na, por meio da fé, serão então considerados os predestinados. A predestinação é o plano
divino pelo qual se leva a termo a eleição. Os pontos mencionados no quadro1 tiveram grande
influência no cristianismo europeu, quando os seguidores de Armínio foram depostos de seus
cargos na Holanda e disseminaram-se para outras regiões, principalmente para a Inglaterra.

1.3 O arminianismo na Inglaterra

Um dos primeiros passos para que a perspectiva arminiana se tornasse futuramente um


dos fundamentos do processo formativo da Igreja do Nazareno foi sua inserção no contexto
sóciorreligioso da Inglaterra. O contexto religioso em que se deparou foi de uma reforma
iniciada por Henrique VIII (1509-1547) que sofreu oscilações entre os movimentos
reformadores posteriores e a manutenção do catolicismo, por não se ter havido uma ruptura
drástica com o este último. Segundo, Haroldo Mendes, ([199-], p. 5) “Henrique VIII não
fundou uma nova igreja, mas simplesmente separou a igreja que já existia na Inglaterra da
tutela e controle romanos por razões políticas, econômicas, religiosas e até pessoais”. Essa
28

nova conjuntura religiosa, no aspecto institucional, passou a ser denominada de Igreja


Anglicana. No entanto, a separação entre as diversas vertentes religiosas e a Igreja na
Inglaterra somente passou a ganhar contornos definidos quando esta se aproximou do
calvinismo no reinado de Eduardo VI e com a ascensão ao trono de Elizabeth I (1558-1603)
que sucedeu à Maria Tudor, esta de tendências católicas. A rainha Elizabeth I, afeita ao
anglicanismo, perseguiu os católicos e consolidou o anglicanismo na Inglaterra.

Traçando um breve percurso do protestantismo na Inglaterra, posterior a Henrique


VIII, percebemos que o puritanismo8 se tornara uma força teológica e política nesse país. Em
1643, o Parlamento convocou a Assembleia de Westminster, composta por teólogos
puritanos. Essa assembleia definiu uma confissão de fé, considerada como credo da Igreja,
além de definir sua disciplina e liturgia, ratificando assim o sistema presbiteriano. No entanto,
as crises entre o Parlamento e o rei Carlos I, além das dissidências de outras formas religiosas
tais como, batistas, congregacionalistas, que desejavam liberdade religiosa, impediram que os
propósitos da Assembléia de Westminster fossem estabelecidos de fato. Nessa época,
apareceu a Sociedade dos Amigos ou Quakers questionando as formas de governo
eclesiástico, os sacramentos, e o culto. Conforme Robert Hasting Nichols, (1981, p. 208), eles
propunham que a igreja deveria ser dirigida e instruída pelo Espírito Santo e não deveria
haver formas de governo fixo nas igrejas.

Esse ambiente plural permitiu ao arminianismo penetrar e desenvolver no território


inglês sem significativas oposições. A doutrina proveniente da Holanda foi assimilada tanto
por anglo-católicos, como pelos latitudinários, ou seja, por aqueles pertencentes à Igreja
Anglicana e eram afeitos ao romanismo e por aqueles que buscavam argumentos racionais nas
discussões religiosas. Segundo Salvador,([19--]) havia espaço para o arminianismo e o
calvinismo na Inglaterra sem que isso implicasse em confronto. Ele cita que:

O Bispo Burnet em 1699, deu um novo impulso às tendências arminianas quando


publicou sua obra “exposição dos trinta e nove artigos” dedicada ao rei Guilherme
III. Nela ao interpretar o artigo XVII que fala da predestinação deu lhe sentido
arminiano e lhe atribuiu igual validez ao calvinista. Quer dizer que tanto importava
um quanto outro. Ambos podiam ser aceitos. Havia lugar na Igreja para as duas
posições. (SALVADOR, [19--])

8
Puritanismo foi um movimento de reforma que a princípio buscava “purificar” a Igreja da Inglaterra após a
Reforma inglesa. Os puritanos acabaram concentrando-se na purificação dos indivíduos e da sociedade por meio
da reforma da igreja e do Estado de acordo com princípios bíblicos. Defendiam uma teologia das alianças e
tinham a convicção de que as escrituras estavam devidamente investidas de autoridade para a conduta do
indivíduo e para a organização da Igreja. (In: GRENZ, GURETZKI, NORDLING. 2002, p. 111).
29

No século XVIII, a doutrina da Igreja Anglicana ainda se mostrava com fortes


tendências calvinistas, no entanto, o clero passou por transformações significativas: cada vez
mais se mostrava arminiano em suas concepções. É importante ressaltarmos nesse ponto, que
já nessa época, John Wesley (1703-1791), o iniciador do movimento metodista, fazia parte
dos quadros oficiais da Igreja Anglicana e assistiu essa importante alteração na estrutura
eclesiástica. E não apenas a ela, mas também às importantes transformações sociais causadas
pela incipiente Revolução Industrial e sua consequente influência em outros campos como da
economia, política e da vida urbana, as quais prontamente afetaram a postura de Wesley, ao
ponto de seus seguidores constituírem uma tradição wesleyana. Essa junção armínio-
wesleyana é um dos pontos fundamentais da institucionalização da Igreja do Nazareno, a qual
ela preza veementemente. Esse aspecto é o que destacamos a seguir.

1.4 A tradição wesleyana

A Igreja do Nazareno sustenta em sua declaração histórica que um dos pontos no qual se
alicerça é o movimento wesleyano e, particularmente, o movimento de reavivamento ocorrido
no Século XVIII. Nessa parte, destacamos, portanto, em quais condições sociais e religiosas
esse movimento surgiu, bem como, quais foram os fatores que contribuíram para a
emergência de João Wesley no cenário protestante inglês e qual foi a contribuição do
wesleyanismo para o surgimento da Igreja do Nazareno como instituição nacional, nos
Estados Unidos, no início do século XX.

Vimos nas páginas precedentes que a monarquia inglesa teve um papel decisivo no que
concerne ao aspecto religioso. No entanto, esse papel se deslocou para outras áreas que
influenciaram radicalmente a postura dos religiosos ingleses. O fortalecimento do Estado
absoluto possibilitou um recrudescimento das atividades comerciais, bem como um aporte de
inovações tecnológicas que deram à Inglaterra o pioneirismo na formação de uma sociedade
capitalista, bem como um impressionante desenvolvimento industrial que veio a se consolidar
na chamada Revolução Industrial.

Para Paul Singer (1991), a economia de mercado é bastante antiga. Desde tempos bem
remotos as sociedades organizavam sua economia produzindo bens que eram trocados em
locais específicos denominados de feiras ou mercado. A produção era artesanal e em cada
30

cidade os produtores se organizavam em corporações de ofício para evitarem a concorrência


mútua. Singer aponta que o capitalismo é também uma economia de mercado, mas com
características próprias que seguiram várias etapas desde o manufatureiro até o industrial, cujo
controle mundial estava sob a Inglaterra.

A Revolução Industrial no final do século XVIII propiciou a emergência do


capitalismo industrial cuja estratégia de expansão baseava-se na unificação dos mercados
locais e nacionais e na livre iniciativa, pondo em questão as práticas corporativas. Esse
aspecto econômico trouxe a formulação de doutrinas de cunho liberais, individualistas tanto
econômica quanto políticas, que também influenciaram no contexto religioso, sobretudo, ao
se perceber que na esfera eclesial já havia uma doutrina que amparava a liberdade do
indivíduo: o arminianismo.

Evidentemente, a Revolução Industrial trouxe novas formas de organização social,


muitas delas consubstanciaram em problemas sociais graves. A predominância do trabalho
assalariado e o aumento dos ritmos para aumentar a produção fez com que os detentores dos
meios de produção investissem no trabalho feminino e infantil ao mesmo tempo em que
requeriam dos homens maior carga horária na produção de bens. Esse aspecto trouxe uma
instabilidade social, que se configurava em problemas de diversos matizes: falta de habitação,
disseminação de doenças, desagregação familiar, mendicância, alcoolismo, prostituição,
pobreza, etc.. Tudo isso como consequência do alto contingente populacional que afluía para
os centros urbanos em busca de trabalho.

Conforme destaca Geoval Jacinto da Silva (2009, p. 35), “O modo de se viver e pensar
modificou rápida e radicalmente em todos os lugares onde ocorreu o processo de
industrialização”. Esse aspecto também não passou despercebido no transcurso do
protestantismo inglês. A forma como o clérigo anglicano João Wesley respondeu a esses
problemas e conduziu a intervenção da Igreja no âmbito social para combatê-los foi bastante
significativo para o processo de formação institucional da Igreja do Nazareno na primeira
década do Século XX.
31

Desde antes da publicação dos 39 artigos9, a presença arminiana já se manifestava


oficialmente nos círculos eclesiais da Igreja Anglicana. A transição do calvinismo para o
arminianismo estava quase que completa, quando da ascensão de George I ao reinado da
Inglaterra (1714-1727). Segundo Salvador ([19--]), “a maior prova disso encontra-se sem
dúvida na obra escrita pelo Bispo George Bull: a harmonia apostólica”. Ela disseminava a
ideia que a fé cristã não consistia apenas em cumprir os ensinamentos dos evangelhos, mas
deveria se ter o desejo de ser bom. Esse desejo é desígnio humano. Bull asseverava também a
participação humana no perdão dos pecados, pois entendia que o perdão divino era
consequência do arrependimento do pecador, o ato divino é uma consequência das ações
humanas.

A doutrina arminiana desde cedo fez parte da vida de João Wesley. Seus pais Samuel e
Suzana concordavam com as ideias arminianas de Bull e, paulatinamente, foram inculcando-
as em seus filhos. No ano de1725, Wesley ainda questionava os ensinamentos calvinistas,
conforme uma carta enviada a sua mãe. Deve-se notar o teor da resposta dada por Susana.

Se tivesse decretado infalivelmente desde a eternidade que certa parte da


humanidade se salvaria e ninguém mais e uma maioria nascesse para a morte eterna,
sem mesmo a possibilidade de evitar estaria isto de acordo com a justiça divina?[...]
que Deus fosse o autor do pecado e da injustiça é uma contradição das ideias mais
claras que temos da natureza e perfeição divinas. (a resposta de Susana foi que) Essa
doutrina, como mantida pelos calvinistas rígidos, é muito horripilante e deve ser
odiada, porque diretamente acusa ao Deus eterno. (Wesley e Susana apud
SALVADOR, [19--]).

A valorização do ser humano no aspecto teológico foi, da mesma forma, motivo de


valorização no aspecto social. As distorções causadas pela Revolução Industrial requeria uma
resposta pungente da Igreja. A frouxidão e o conformismo apresentados pelos clérigos da
Igreja Anglicana iam de encontro ao estabelecimento das propostas arminianas em seu
âmbito. Assim como não cabia aos seres humanos subserviência irrestrita no campo religioso,
assim não caberia na sociedade. O arminianismo wesleyano se voltou contra a situação
degradante em que se submetia a sociedade. Segundo Mildred Bangs Wynkoop (1983, p. 68),
Armínio havia liberado a fé da prisão dos decretos, mas coube a Wesley tornar essa fé
emancipada. A assertiva luterana da justificação por meio da fé estava agora rigidamente
acompanhada da santificação pela fé, pela qual se deu um novo significado ético à vida cristã.

9
Cf. Cairns (1995, p. 271), os 39 artigos são uma revisão doutrinária, de forte ênfase calvinista, do Livro de
Oração Comum. Foram aceitos como credo da Igreja Anglicana, pelo Parlamento inglês, no ano de 1563.
32

Essa se tornara mais que uma afirmação intelectual ou uma dádiva de Deus, pois conclamava
os seres humanos à responsabilidade de um novo modo de vida.

Desse posicionamento surgiu um movimento de renovação que atingia tanto as


camadas sociais quanto a religiosa, que passou a ser denominado de avivamento wesleyano.
Para Wynkoop, (1983, p. 68) a maior contribuição para a teologia, realizada por João Wesley,
foi a expansão da doutrina arminiana para a vida cotidiana dos cristãos, por meio do
reavivamento. Esse movimento situa-se no rol daqueles que os nazarenos se reconhecem
como herdeiros, dando origem ao processo formativo de sua Igreja. Esse movimento é o que
caracterizaremos a seguir.

1.5. O reavivamento wesleyano

O avivamento wesleyano é tratado na literatura corrente com restrita ênfase no ponto


de vista teológico. Nessa parte, procuramos entender esse movimento a partir dos
condicionamentos sociais que lhe permitiram o aparecimento e sua expansão pela Inglaterra.
A forma como é visto no meio eclesial caracteriza-se por ser um movimento direcionado pelo
Espírito Santo e que abarcava desde o pietismo10 alemão, no fim do século XVII até o grande
despertamento nos Estados Unidos no Século XVIII. Conforme caracterizou Richard P.
Heitzenrater (2006, p. 97).

A Inglaterra, no período inicial do movimento do reavivamento11, estava ainda sob


uma fase incipiente do industrialismo, mas já se verificava algumas desordens sociais em
consequência da passagem do capitalismo manufatureiro para o industrial. A Inglaterra nessa
época era a principal produtora de tecido do mundo, isso em virtude da expropriação dos
trabalhadores rurais dos meios de subsistência, através dos cercamentos, “enclosures” que se

10
C.f. Mcgrath (2005, p. 118), O termo pietismo deriva da palavra latina “pietas” que é melhor traduzida por
devoção e religiosidade, talvez originada da obra “pia desideria” (1675) de Philipp Jacob Spener. O movimento
pietista pode ser visto como uma reação contrária ao formalismo e ortodoxia doutrinária apresentada pelo
luteranismo. Buscava, pois, uma fé relacionada com os aspectos intimistas da natureza humana é a “religião do
coração”. Para Mcgrath, João Wesley está entre os representantes desse movimento e o introduziu na Inglaterra.

11
Alguns autores denominam esse período de reavivamento ao invés de avivamento, tal fato se dá em
decorrência desses estudiosos considerarem ou não o ineditismo do movimento no contexto em que se instala.
Para Heitzenrater, o autor chave nessa análise, o movimento de avivamento wesleyano foi precedido por outros
de igual natureza, por isso denomina-o de reavivamento.
33

caracterizavam pelos cercamentos dos campos para a criação de ovelhas que forneciam lã
para as manufaturas têxteis. Os cercamentos produziram uma agricultura cada vez mais
voltada para o mercado, as atividades agrárias começavam a entrar na rota de abastecimento
da incipiente classe trabalhadora, dificultando a produção e encaminhamento dos gêneros
alimentícios para sustento dos trabalhadores no campo. A atuação, em conjunto, desses
fatores tornava a vida no campo cada vez mais insustentável. Segundo Singer,

Os cercamentos representaram tão somente o aspecto mais espetacular, por assim


dizer, oficial e político de um processo geral que fez crescer as fazendas, diminuiu
relativamente o número de fazendeiros e alijou os aldeões da posse da terra [...].
Essa concentração (da propriedade fundiária) ocorreu em campos abertos ou
cercados, entre cercamentos novos e antigos, através de expropriação, vendas
forçadas ou voluntárias e principalmente nos grandes tratos de terra que haviam sido
colocadas sob cultivo. O fenômeno teria levado ao empobrecimento uma população
estável e foi catastrófico para uma população que crescia rapidamente. (SINGER,
1994. p.37).

Esse impacto nas condições da vida campesina produziu um contingente populacional


sem recursos que se voltava para as cidades em busca de subsistência. O sistema de trabalho e
o modo de vida das pessoas foram alterados consideravelmente, pois antes habituadas ao meio
rural, tiveram de se adaptar a uma maneira de viver urbana. As cidades, antes voltadas para as
práticas básicas do comércio, agora se converteram em núcleos de concorrência pela
sobrevivência, onde multidões se acotovelavam pelas ruas. Essa mudança social, em
decorrência de uma Revolução Industrial incipiente, não apenas passou a ditar o ritmo diário
das pessoas; mas, conforme destaca Edgar de Decca (1999), produziu-se uma profunda
modificação na vida das pessoas, na maneira de se trabalhar, de se viver, de se relacionar com
os outros, de se divertir e, enfim, surgiu uma nova forma de se compreender o mundo.

Para tentar amenizar os impactos do processo em curso, o Parlamento Inglês criou a


lei dos pobres, por ela se concedia auxílio financeiro à gama de desapropriados, mas obrigava
aos homens prestarem serviços em asilos e albergues, ao mesmo tempo em que as crianças
não trabalhadoras tinham de frequentar as escolas. Em contrapartida a essa lei, algumas outras
leis e decretos culpavam os camponeses desapropriados e não inseridos nas fábricas por sua
própria condição. Assim muitas formas legais proibiam e puniam a vadiagem com castigos
públicos, prisões e em alguns casos até com a pena de morte.

No meio dessa turbulência social, o reavivamento wesleyano, caracterizado por


pregações itinerantes, ao ar livre e de difusão de uma religiosidade mais intimista de
influência pietista, alcançou milhares de ouvintes, muitos dos quais em estado de pobreza
34

decorrente do processo industrial. Dessa forma, as mensagens de reavivamento eram dirigidas


a eles. Elas apontavam as mazelas da conjuntura social que constrangiam os seres humanos à
indigência. Conforme destaca Paulo Tarso de Lockmann (2008), em um dos sermões de
Wesley,

A pobreza não traz consigo coisa pior que o fazer com que os homens se tornem à
mofa. Mas, não é a falta de alimento pior do que isso? Deus proclamou como
maldição sobre o homem o fato de que ele deveria „ganhar o pão do suor do seu
rosto‟. Mas, quantos há neste país cristão que trabalham e suam e, afinal, não têm
senão que lutar contra a tristeza e a fome? Não é triste para alguém, depois de um
dia pesado de trabalho, chegar à sua casa pobre, suja e sem conforto, e não encontrar
pelo menos o alimento necessário à reparação de suas energias gastas? Refleti, vós
que tendes vida tranquila na terra e de nada tendes necessidade, senão de olhos para
ver e de ouvidos para ouvir e de coração para entender o quanto Deus vos tem feito,
quão terrível é procurar o pão diariamente e não achá-lo! [...] Rogo a Deus que
permita, antes de morrer, levantar a voz mais uma vez, como um toque de trombeta,
para alertar os que acumulam dinheiro e não dão roupas, nem onde recostar a
cabeça. Por que sofrem tanto? (Wesley apud. LOCKMANN, 2008, p. 44-
45).

Esse aspecto mostra que a mensagem wesleyana de avivamento atendia aos anseios
daqueles fatigados pela condição social. Dessa forma, o grande número de ouvintes
identificava-se com a mensagem wesleyana que se tornava oposta à condição da igreja oficial,
cuja importante parcela do clero estava arrolada entre os que se beneficiavam da exploração
das massas.

1.6 Doutrina da Santidade

A palavra santidade usada no meio eclesial tem sua origem na Bíblia e significa santo,
sagrado, aquilo que é separado, puro. (GRENZ; GURETZKI; NORDLING. 2002, p. 121).
Assim, a santidade é vista como um atributo de Deus, qualidade do povo hebreu que se separa
dos pagãos, ou dos costumes mundanos. Também denota a separação de coisas e pessoas para
o serviço de culto a Deus, tais como o sacerdote, candelabro, óleo, oferendas. De uma forma
geral, o conceito de sagrado e seus cognatos assumiram significado daquilo que é dedicado a
Deus. No entanto, cabe discorrermos sobre o processo de assimilação do conceito de
santidade na doutrina wesleyana de perfeição cristã que a Igreja do Nazareno adota como sua
principal vertente.
35

Para J. Kenneth Grider (1991, p. 19), a raiz hebraica “KDSH” traduzida para santidade
se usa 830 vezes no Antigo Testamento, mas os eruditos não têm certeza quanto à história
etimológica da palavra, mesmo assim, poucos discordam do seu sentido de separação.
Contudo, sua tradução que significa santidade não tem originalmente nenhuma conotação
ética. Grider (1991, p. 19) afirma que essa conotação era também dada às prostitutas que
exerciam seus ofícios nos templos pagãos como forma de serviço aos deuses e deusas da
fertilidade. “elas não eram santas no sentido ético, como se entenderia no contexto bíblico,
lhes chamavam „santas‟ porque eram pessoas separadas para um uso especial de seus deuses”.
De acordo com o mesmo autor, no meio do povo hebreu já se poderia se aventar o conteúdo
ético para “KDSH” aplicado às pessoas, cujos requisitos éticos se implicavam nos requisitos
de pureza para os animais que se haviam de usar para os sacrifícios no tabernáculo.

O verbo equivalente ao “KDSH” utilizado no Novo Testamento (N. T) é “hagiadzo” que


se traduz como santidade, significando tornar-se santo. Inclui a ideia original do Antigo
Testamento de separação, ainda que ressalta, com muita frequência, “o limpar ou purificar a
partir de um ponto de vista moral” (GRIDER, 1991, p. 20). Vários usos do termo com seus
sinônimos indicam a ideia de separação para o uso de Deus no N. T.. Contudo, tal qual
aparece no Evangelho de João, esse termo assume os sentido de depuração do pecado
original12. Dessa forma, “No Novo Testamento, a santidade adquire um sentido de pureza
ética ou libertação do pecado”. (GRENZ, GURETZKI, NORDLING, 2002, p. 121).

O outro termo que necessita esclarecimentos na abordagem da doutrina da santidade é o


chamado batismo com o Espírito Santo. Esse termo, também, tirado da Bíblia tem seu
significado teológico na ação que se confere ao Espírito Santo de se unir ao crente, é uma
união mística que em alguns casos é manifestada pelos chamados dons de cura, milagres,
profecias, etc., muitas vezes promovidos pelos pentecostais. Ainda que Wesley não
identificasse, necessariamente, a inteira santificação com o batismo no Espírito Santo13, tinha

12
Pecado Original é um termo teológico que faz menção ao processo inicial que desencadeou a proliferação do
pecado a toda humanidade. Segundo o relato bíblico esse pecado iniciou com os personagens Adão e Eva que,
desobedecendo a Deus, comeram o fruto da árvore do bem e do mal, sendo, por isso, expulsos do paraíso.

13
Batismo no Espírito Santo é uma expressão bíblico-teológica que significa a forma sobrenatural, pela qual o
cristão recebe a presença ou os dons do Espírito Santo. No meio eclesial ganhou várias vertentes e valorização,
principalmente, no ramo pentecostal em que os dons de se fazer milagres, de curar e falar línguas estranhas, por
exemplo, significam formas de comprovação de que o fiel foi batizado com o Espírito Santo.
36

em mente que a inteira santificação é obra de Deus, portanto ação direta do Espírito Santo,
pois somente Deus teria a capacidade de erradicar dos seres humanos o pecado original.

A ação divina de perdoar os pecados e transformar a essência humana ganhou no meio


eclesial o nome genérico de justificação. Essa é uma doutrina capital da teologia cristã,
porque transige em todos os ramos da teologia e é o princípio de entendimento da relação
divino-humana na cosmovisão cristã. A justificação é entendida como ato divino de se tornar
alguém justo. No âmbito bíblico e eclesial é entendida como a transformação dos seres
humanos pecadores em seres humanos justos. Tal fato decorre da aceitação humana de ser a
morte de Jesus na cruz e o derramamento de seu sangue o único meio dos seres humanos
pecadores se reconciliarem com o Deus justo. Por meio dessa aceitação, a explicação
teológica cristã afirma que Deus declara o pecador doravante como justo.

Segundo Wiley e Culbertson ([19--]. p. 180.), a Bíblia apontam três sentidos para a
palavra justo. O primeiro aplica-se àquele que é pessoalmente justo e contra o qual não há
acusação nenhuma, essa é a justificação pessoal. O segundo é aplicado para aquele que foi
acusado de alguma transgressão, mas nada foi provado, é a justificação legal. O terceiro faz
menção àquele que é culpado, acusado e condenado, mas pelo sacrifício de Cristo é perdoado
e declarado justo por Deus. Para grande parte das igrejas do ramo protestante, nesta última
justificação ocorre o processo de regeneração, no sentido restrito de um novo nascimento, e
de filiação cristã que se tornam o objetivo da vida cristã. Pela declaração de justiça, os crentes
se relacionam com Deus e têm um lugar garantido no céu no findar da vida terrena.

Wesley, no entanto, entendia a justificação não como fim da vida cristã, mas como meio
para obtê-la. Ele entendia o ato regenerativo como importante mudança na alma daquele que
cria, sem a justificação não haveria regeneração, porém esse ato não trazia a plenitude da vida
cristã, era apenas o começo dela. As mudanças espirituais e morais trazidas pela regeneração
não tiravam os desejos corporais que militavam contra a nova espiritualidade, apenas por um
ato secundário da parte de Deus poderiam os seres humanos dominar a si mesmos, ou seja,
por meio da santificação. Segundo Wesley, a regeneração é o princípio da vida santa, por isso
está vinculada à santificação. No entanto, cabe distinguirmos a regeneração como santificação
inicial, que purifica os seres humanos daqueles atos impuros e depravados que se cometeu ao
longo da vida. Por assim dizer, a justificação e a consequente regeneração livram os seres
humanos dos pecados cometidos, mas não da origem desses pecados, que é o pecado original.
37

A ineficácia da justificação contra o pecado original tornou necessária à obtenção de um


novo recurso que pusesse fim a raiz de todos os males. Para Wesley, tal recurso é a inteira
santificação ou perfeição cristã proveniente da segunda obra da graça, mediada pelo Espírito
Santo. Segundo Wiley e Culbertson ([19--]. p. 167.), existem vários sinônimos para a inteira
santificação, cada um deles ressalta um aspecto desse ato. A inteira santificação exprime a
plenitude da salvação do pecado destacando a limpeza de todo o pecado, inclusive do original.
O termo segunda obra da graça ressalta o ato distintivo do ato da justificação que é a primeira
obra da graça; já a expressão perfeição cristã destaca o estado consumado do caráter cristão.
Esse último sentido parece ser o que caracterizou o movimento wesleyano de reavivamento
quando propôs aos crentes uma vida de integridade espiritual, moral e ética.

O termo santidade se refere ao estado ou condição daquele que passou pela experiência
da inteira santificação. Os pressupostos morais e éticos dessa doutrina trouxeram ao
cristianismo reformado um novo padrão comportamental que respondia de forma mais
veemente o quadro social que vivia a Inglaterra do final do Século XVIII. Para Clóvis Pinto
de Castro (2008, p. 258), a compreensão wesleyana da santificação se “desenvolve na inter-
relação humana. A justificação pressupõe um ato de fé pessoal e intransferível; a santificação
implica na existência do outro, do próximo, tanto no nível comunitário eclesiástico como no
espaço público”. Com isso ressaltamos que a santificação é, também, um evento social que,
conforme afirma J. Kenneth Grider (1991), é um ensino doutrinário que em muito ultrapassou
o provincialismo teológico do metodismo conforme afirmava alguns estudiosos.

É importante notarmos que, mesmo que Wesley não excluísse a perfeição cristã da vida
em sociedade e, mesmo que essa tenha um reflexo social importante, sua origem está
intrínseca aos seres humanos na relação com a divindade. Com isso, a forma que Castro
(2008) aponta está mais para a consequência social da santificação e para sua certificação do
que para sua origem. A santificação, para Wesley, é obra oriunda da graça divina, porém,
dentro de uma perspectiva arminiana, ela decorre da condição humana querer alcançar a sua
finalidade: a santidade. Portanto, a santificação é o ato de se tornar alguém ou algo
santificado, uma vez santificado esse alguém ou algo está em santidade. No caso dos seres
humanos, as relações interpessoais demonstram se alguém é ou não santo, mas não
determinam essa condição, uma vez que muitos santificados se voltaram contra as estruturas e
prática sociais. Dessa forma, em Wesley, a santidade é social, mas pode não ser societal “não
38

há santidade que não seja santidade social; reduzir o cristianismo tão somente a uma
expressão solitária é destruí-lo.” (Wesley apud CASTRO, 2009, p. 259).

A simbiose entre o arminianismo e a perspectiva wesleyana produziu o que mais tarde


chamou-se de wesleyanismo, esse movimento, além de dar origem à organização da Igreja
Metodista, disseminou a doutrina da santidade levando o arminianismo a sua maior
popularidade, ao ponto desse tema ter se tornado recorrente entre os estudantes universitários
da Inglaterra que escreviam inúmeras monografias sobre ele. (GRIDER, 1991, p. 14). Nos
últimos anos de sua vida, Wesley publicou uma revista intitulada “the Arminian Magazine”
ressaltando os pontos arminianos que foram proibidos na Holanda. Essa foi uma contribuição
importante, principalmente pelo fato de que exportara aos Estados Unidos o forte fundamento
do metodismo sobre a liberdade humana, o qual possibilitou um efervescente crescimento no
oeste americano, cujas raízes se fixaram na congregação dos nazarenos em Los Angeles.

A reinterpretação da doutrina da santidade dada por João Wesley, colocando-a na


perspectiva social, decorreu das condições sociais na Inglaterra do Século XVIII. A forma
inusitada com que Wesley se apropriou de um termo bíblico para fazer frente às
desigualdades sociais ao mesmo tempo em que chamava os fiéis à responsabilidade de
transformação dessa realidade foram os parâmetros para que, no final do Século XIX e início
do Século XX, nos Estados Unidos, reemergisse essa doutrina no chamado Movimento de
santidade ou “holiness” do qual trataremos a seguir.

1.7 O Movimento de Santidade

Durante a vida de João Wesley, alguns pastores na Inglaterra fizeram sérias objeções à
difusão da doutrina da santidade no território e colônias inglesas. Esse quadro de objeções
também foi verificado nos Estados Unidos, onde a maioria dos ministros metodistas
estadunidenses, por querer ressaltar as diferenças com o metodismo inglês após o
reconhecimento da independência das treze colônias, negligenciava a doutrina da inteira
santificação. Segundo M. E. Redford (1995, p. 10), o crescimento do número dos metodistas e
o apego de seus bispos ao ambiente cultural dos Estados Unidos contribuíram para que
aqueles que ainda pregavam a santidade fossem perseguidos por aqueles que haviam se
39

esquecido dela e também fossem colocados à parte nos trabalhos das igrejas, quando não
expulsos delas.

Embora podemos entender os movimentos de reavivamento ou despertamento em


diversas fases, tal como propõe William G. Mcloughlin (1978, p. 10-11), a fase que nos
interessa, ou que especificamente, enfatiza a doutrina da santidade é aquela do segundo e
terceiro grandes despertamentos, no século XIX. Neste século, surgiu um movimento que
procurou resgatar a doutrina da santidade, nos Estados Unidos. Esse movimento foi
denominado de Movimento de santidade e iniciou por volta do ano 1835 passando por
distintas fases. Na fase inicial, o Movimento de santidade caracterizou pela participação dos
leigos metodistas e pelas participações presbiteriana e congregacional de Oberlin. Na fase
mediana e final, o avivamento de santidade ou Movimento de santidade teve seu período
áureo entre 1858-1888 (SMITH, [195-]). Nesse período, os Estados Unidos estavam, também,
em convulsão social, como a Inglaterra do final do Século XVIII. Segundo René Remond
(1989, p. 41-47), nos anos posteriores a sua independência (1776), os Estados Unidos
conheceram um grande crescimento populacional, territorial e econômico. Paralelamente à
ampliação de suas fronteiras, gamas de imigrantes vindos, principalmente, da Inglaterra,
França, Países Baixos que fugiam da fome e das perseguições religiosas e políticas, formavam
um pluralismo de ideias e práticas.

A peculiaridade da religiosidade formada nas colônias americanas contribuiu para o


surgimento de um metodismo distinto do europeu, cujo desenvolvimento propiciou o
aparecimento do Movimento de santidade. A fim de que possamos caracterizá-lo em todos os
seus aspectos e suas dimensões, inicialmente, esboçamos um breve panorama das condições
enfrentadas pelo protestantismo nos Estados Unidos considerando, principalmente, as
características de um ambiente religioso plural decorrente da chegada das várias instituições
religiosas que emergiram da Reforma e se consolidaram após a Paz de Westfália, em 1648. O
Movimento de santidade nasceu nesse contexto plural e de certa forma tentou ser uma
alternativa a ele.

O aspecto distintivo do protestantismo estadunidense decorreu do distanciamento


europeu, da ausência de um corpo burocrático eclesial rigoroso, do engajamento leigo, e dos
diversos tipos de protestantismos que se fixaram nas 13 colônias. Esse fato deu a essas
colônias uma característica própria no ambiente religioso antes da independência. A maioria
dos protestantes que se estabeleceu em terras norte-americanas era de origem calvinista ou
40

anglicana vinda através de companhias privadas que recebiam concessões para explorar esse
território colonial inglês. A Igreja Anglicana se tornou a igreja oficial em grande parte das 13
colônias, mas houve espaços para os congregacionalistas, presbiterianos e batistas que se
estabeleceram em sua maioria nas colônias de Nova Inglaterra, Salém e Providence
respectivamente (NICHOLS, 1981, p. 261-267).

Uma das práticas que se tornou comum entre os protestantes nas colônias inglesas da
América foi o avivamento. Esses movimentos de renovação espiritual emergiam,
normalmente, em tempos de crise. No início eram espontâneos, não organizados e de cunho
rural, depois passaram a acontecer com mais frequência em meios urbanos com o acirramento
do processo de urbanização e industrialização, com o aumento populacional e com a
degradação moral e os conflitos separatistas. (CAIRNS, 1995, p. 316). Jonathan Edwards,
Theodore Frelinghuysen e George Whitefield estão entre os maiores avivalistas do Século
XVIII na América. Apesar de alguns aspectos que esses movimentos trouxeram para as
igrejas e a sociedade, como o ensino moral nos lares, no trabalho e no lazer, criação de
universidades como Princeton, Columbia, Hampden-Sydney, além da criação de casas de
abrigo e orfanatos, (CAIRNS, 1995, p. 318), houve reações contrárias e divisões entre as
igrejas decorrentes desses movimentos avivalistas.

Destacamos que os movimentos de avivamento foram uma resposta não apenas às


condições intrinsecamente religiosas protestantes, mas buscavam reagir a uma condição social
estabelecida. Poder-se-ia atribuir a esse fato que a condição social era definida pelo
protestantismo, uma vez que a maioria da população colonial era protestante e, nesse caso,
toda a ação religiosa teria impactos na vida social e vice-versa. No entanto, as desavenças
ocorridas entre os protestantes, na forma em que eles intervinham em outras esferas não
estritamente religiosas descartam a possibilidade de um unilateralismo religioso nas colônias.
Dessa forma, os movimentos de avivamento não se caracterizavam pela simples rejeição a um
estilo de vida dito secular, mas ressaltavam a obrigação das igrejas se posicionarem contra
esse estilo, a fim de enfatizar suas autonomias frente à realidade social.

As divergências entre o estilo de vida religioso e secular foram fortalecidas pela


ocupação de novas regiões, o que incentivou o crescimento da economia. Os fazendeiros
estabelecidos no oeste se dedicavam à produção de cereais e à criação de gado para o
consumo da população oeste-litorânea, com isso o oeste tornou-se o principal celeiro do
mercado interno. Além disso, a necessidade de melhor intercâmbio entre as regiões
41

intensificou a indústria nortista de barcos a vapor, a construção de canais fluviais e de estradas


férreas. Contudo, o incremento industrial e as inovações da indústria fluvial criaram um
desequilíbrio entre leste e oeste, pois colonizadores recorriam aos empréstimos junto aos
banqueiros da costa leste para adquirir mais terras, mas com a cobrança de altos juros
trabalhavam anos a fio sem conseguirem pagar suas dívidas. Essa situação foi base de
ressentimentos de lado a lado. (RÉMOND, 1989, p. 52).

Ao mesmo tempo, a situação entre norte e sul também se tornara bastante conflituosa.
Por muitos anos, as condições socioeconômicas do sul permitiram o seu domínio na política,
mas, em meados do século XIX, os sulistas estavam sendo superados pelos nortistas. Criou se
entre eles, acordos políticos que serviam para administrar seus interesses, no entanto as
diferenças econômicas entre o sul agrário e o norte industrializado trouxeram sérias questões
que não foram suplantadas para a manutenção das boas relações. Dentre as diversas questões
como as tarifárias, gastos de investimentos em infraestrutura de transporte e a organização dos
Estados do oeste, essa última teve papel crucial, uma vez que o norte tendia a tolerar a
escravidão no sul, mas com a extensão desta para os novos Estados do oeste, viu-se ameaçado
em seu poderio político porque temia que esses Estados viessem a ter uma organização
semelhante ao sul e os seus representantes no Congresso fortalecessem o poderio político dos
sulistas nas eleições de 1860. (RÉMOND, 1989, p. 55-59).

Em meio a essas tensões entre norte e sul, o debate sobre o escravismo tornou-se ponto
culminante que nem os sulistas nem os nortistas conseguiram superar. Segundo Rémond,
(1989, p. 59-66) as circunstâncias se agravaram quando o norte foi atingido por uma
depressão econômica devido à queda nos investimentos e nos depósitos bancários feitos por
investidores europeus e pela especulação desenfreada no setor de construção de estradas de
ferro. Além disso, a vitória nas eleições de 1860, de Abraham Lincoln nortista, abolicionista e
republicano e, portanto, contrário aos interesses dos sulistas levou a que esses deixassem a
União para organizarem um novo país, Os Estados Confederados da América. A Guerra Civil
americana veio à tona com bastante violência, teve um custo de mais de 600 mil mortos e
terminou com o esmagamento do sul pelas tropas do norte.

Todos esses acontecimentos envolveram as igrejas estadunidenses que já vinham


passando por transformações desde a luta de independência. Essas igrejas que se
desenvolveram a partir da noção nacional agora se dividiam em consequência do conflito
separatista. O fim da Guerra de Secessão não trouxe o fim da mentalidade de secessão. A esse
42

ambiente hostil, vinculou-se um forte crescimento urbano e industrial de forma que a


migração em massa tornou-se um grande problema para as cidades e igrejas, estas por verem
diminuídos seus frequentadores, aquelas por não oferecerem estrutura para agregar novos
contingentes populacionais. Além disso, muitas igrejas se dividiram surgindo a Confederação
Batista do Sul, Igrejas Presbiterianas e Metodistas do Norte e do Sul, entre outras.

O comércio e as indústrias atraíram milhares de jovens de seus ambientes rurais para


os grandes centros urbanos. Nesses centros, os jovens viviam de forma degradante, seja pela
falta de emprego e em estado de mendicância ou pela imersão em vícios, como o alcoolismo,
prostituição e roubos. A imigração católica romana também mudou a situação de cidades
como Cleveland e Chicago, as barreiras religiosas e de linguagem intensificaram as más
relações entre empregados e patrões. A agricultura se convertia em empresa especuladora, tal
qual como acontecia na Inglaterra do século XVIII, a utilização de novas máquinas obrigava
os imigrantes assim como os nativos a se dirigirem para o oeste em busca de fortuna. Segundo
Timothy Smith, ([195-], p. 13) milhões de hectares do outro lado do Mississipi foram
submetidos aos efeitos dos arados. Isso desencadeou uma superprodução de produtos
agrícolas trazendo uma depressão crônica que aumentou as suspeitas dos camponeses para
com os ricos, criando-se uma nova separação de classes.

Ao vislumbrar o início do Século XX, esses efeitos se fizeram mais notórios. O


governo federal tentou com suas leis restringir a imigração católica do sul e do leste da
Europa; os negros dos Estados do sul migraram em grande número para cidades como Detroit,
Chicago, Indianápolis, Nova Iorque e Filadélfia, disparando as tensões sociais. A educação
em massa e os reflexos do anonimato da vida urbana fizeram com que muitos jovens
deixassem as restrições paternas desviando-se dos antigos valores e comportamentos ditados
por suas tradições. Universidades como Havard, Yale, John Hopkins e Chicago introduziram
e fizeram populares as teorias da origem e natureza do homem, possibilitando
questionamentos sobre as relações sociais, a moralidade e a religião, desafiando o ponto de
vista protestante anteriormente estabelecido. A formação de técnicos e cientistas causou
impacto sobre as formas clericais de compreensão da vida.

Além desses aspectos, outro fato importante começava a tomar expressão, as igrejas
protestantes começaram a adotar os métodos seculares na busca por mais fiéis e para sua
expansão, de forma que suas ações eclesiais assemelhavam às organizações e empresas de
negócios. Ao mesmo tempo, preocupações de cunho social, tais como aquelas relativas aos
43

problemas causados pela urbanização e a marginalização urbana passaram a ser pauta


principal nos sermões e práticas eclesiais. O foco nas questões sociais rechaçou as doutrinas
antigas e os velhos avivamentos foram logo esquecidos pela camada leiga. Dessa forma,
tornava-se iminente a emergência de um movimento que propugnasse a volta ao cristianismo
puro, santo, separado dos valores e dos condicionamentos impostos pela visão secular.

O início desse movimento se deu nas reuniões metodistas, segundo Smith ([195-]),
através do pastor John C. Mcclintock, membro do comitê de celebração do centenário de sua
denominação, em 1866. Mcclintock dizia ser a perfeição cristã o tema central da Bíblia e
promoveu reuniões semanais de santidade que durante o ano de comemoração do centenário
multiplicaram em muitas cidades. O casal Palmer, seguidor de Mcclintock, promoveu
reuniões e conferências campestres nos Estados de Nova Iorque, Michigan e Ilinois. Ao
mesmo tempo, John S. Inskip, pastor metodista, dirigiu uma série de conferências que
culminou em um grande avivamento campestre para promoção da santidade em 1867. As
reuniões campestres de santidade avançaram nos anos seguintes. Em 1869, foi criado os
primeiros periódicos voltados ao movimento de santidade, “The christian standard” e o
“Home Jornal” dirigidos por John Inskip. No ano seguinte, William Mcdonald fundou uma
revista mensal, “The advocate of holiness”, daí uma contínua publicação de jornais e revistas
se espalharam pelos Estados Unidos. (SMITH, [195-], p.19.).

Os encontros campestres tiveram apoio de grande parte dos pastores e bispos de outras
igrejas. No entanto, cabe ressaltarmos, que sua disseminação se deve à ação leiga. Durante a
maior parte do século XIX, a colonização foi um fator preponderante na condição
estadunidense. O fluxo migratório contou em grande parte com a participação das igrejas
protestantes, fiéis itinerantes cavalgavam pelos caminhos do oeste e, depois da Guerra de
Secessão, por todo o território daquele país. Com pouco vínculo institucional, os leigos
celebravam cultos religiosos, construíam escolas e templos que posteriormente eram usados
pelas igrejas. Após o conflito separatista, o papel leigo foi redefinido pelas grandes reuniões,
que traziam o vínculo institucional de evangelização de massa, ou seja, visava-se não apenas
introduzir uma visão religiosa de conversão ou regeneração, mas uma perspectiva que trazia o
patrocínio de uma denominação ou de grupos denominacionais que diferenciavam entre si.

A Igreja Metodista da América, estabelecida em 1784, quando Wesley permitiu a


ordenação de dois ministros como metodistas, em face ao grande êxodo dos bispos anglicanos
da América, após o reconhecimento inglês de sua independência, foi a que primeiro propagou
44

a ideia de santidade nos Estados Unidos, por meio da evangelização campestre. Segundo
Diane Leclerc, (2004, p. 28) “no início estes metodistas americanos eram extremamente fiéis
à pessoa e à teologia de John Wesley. Mas passou apenas uma geração, para que a palavra
„pai‟, que era usada quando se fazia alguma referência a Wesley, mudasse para „fundador‟”.
Esses metodistas quiseram tornar-se independentes dos padrões britânicos do metodismo.
Essa mudança não foi apenas eclesiástica, mas significava a influência do contexto no qual
estavam inseridas as igrejas estadunidenses. (LECLERC, 2004.).

Essas mudanças trouxeram também modificações na maneira como a teologia


wesleyana estava articulada. No principio, do que seria mais tarde conhecido como
Movimento americano da santidade, havia uma grande ênfase na doutrina da perfeição cristã
na Igreja Metodista, seus primeiros líderes partilhavam a doutrina com os leigos da forma
como receberam da tradição inglesa. Nathan Bangs, que foi o responsável pela preparação de
novos pastores metodistas na América, juntamente com outros eruditos lançaram em Boston
(1839) o Guia da perfeição cristã, uma revista editada por Timothy Merritt, que teve como
objetivo divulgar a doutrina da santidade. (SMITH, [195-], p. 62). Esse lançamento teve
também o mérito de ser um dos primeiros eventos que propiciou o desenvolvimento do
Movimento de santidade nos Estados Unidos.

No ano de 1835, a iniciante prática do Movimento de santidade já podia ser constada


através do casal Phoebe e Walter Palmer. Phoebe Palmer, uma das principais figuras do
Movimento de santidade, é conhecida como a matriarca desse movimento. Conforme os
dados biográficos divulgados por Leclerc (2004), Phoebe Worrall nasceu numa família
metodista americana. O seu pai, Henry Worrall, transferiu-se para os Estados Unidos logo
depois da Guerra da Independência, por admiração aos ideais propugnados pelos americanos.
Henry Worrall casou-se com Dorthea Wade, que também era uma metodista devota. Apesar
de Phoebe Worrall ter recebido instrução escolar apenas no nível de educação primária,
desenvolveu habilmente um estilo literário peculiar, que veio a ser de grande valor nos anos
subsequentes quando seus trabalhos escritos a fizeram conhecida por milhares de leitores.
Segundo Leclerc (2004), aos 19 anos de idade, Phoebe Worrall casou-se com Walter C.
Palmer, um médico na cidade de Nova York. A boa situação financeira do casal Palmer veio a
patrocinar seu esforço cristão nas campanhas evangelísticas pelos Estados Unidos, Canadá,
Ilhas Britânicas, que foram essenciais ao Movimento de santidade.
45

A perda de três filhos levou Phoebe Palmer a ingressar na vida religiosa, em 1837.
Adepta do metodismo, sua vocação influenciou a vida de milhares de pessoas. Juntamente
com sua irmã Sarah Lankford, Palmer liderou as chamadas reuniões de terças-feiras em sua
casa. Para muitos, esse é considerado o lugar em que nasceu o Movimento de santidade.
Leclerc (2004) considera que em muitos aspectos, Phoebe Palmer não era uma mulher típica,
dos meados do século XIX. Por essa consideração de Leclerc, entendemos a figura de Phoebe
como alguém que está em posição de vanguarda em relação à sociedade em que vive. De fato,
Phoebe demonstrou isso ao assumir uma condição de liderança eclesiástica geralmente
atribuída aos homens e de iniciar um movimento ainda questionado em sua época. A própria
frustração de Phoebe em alcançar a experiência da santidade instantaneamente, por causa da
complexidade transmitida através da pregação metodista, deu-lhe grande ímpeto para fazer
com que a doutrina fosse accessível aos leigos. Conhecida por criar a fórmula dos três passos,
uma síntese que reduziu a termos simples aquilo que podia ser uma busca complicada e
perplexa da santidade, Phoebe Palmer escreveu dezenas de livros e junto com seu esposo
compraram e editaram o Guia da perfeição cristã, até 1903. Ambos também criaram postos
de assistência aos pobres, pelos quais as obras de caridade femininas foram reconhecidas.

Assim, o Movimento de santidade buscava resgatar aqueles que, pelas transformações


sociais, deixaram as regras das igrejas ou não mais faziam parte destas. A temperança, depois
a abstinência e diversas proibições contra o jogo e o alcoolismo foram os principais temas
abordados pelos mentores, pregadores e escritores do Movimento de santidade, sobretudo, nas
reuniões campestres. Essas características do contexto estadunidense remetem à consideração
que o Movimento de santidade visou à superação de uma sociedade urbana em que as
condições eclesiais da época não podiam suplantar. Nesse caso, esse movimento surgiu contra
a ineficácia eclesial de transformação do mundo14. Conforme Leclerc (2004), a santidade
existe não somente para os indivíduos em si, ou seja, ela, conforme percebida por esse escritor
nazareno, transige entre uma transformação de atitudes individuais e uma transformação
social.

A santidade, portanto, não é apenas uma profissão de fé, mas uma necessidade social.
Contudo, suas características intrínsecas terminantemente bíblicas, “histórica, tecida

14
O termo mundo é aqui entendido, em conotação bíblico-teológica, como o ambiente externo à influência e
ditames das igrejas. Esse termo assemelha-se, neste caso, àquilo que é secular, profano, digno de conversão aos
preceitos das igrejas.
46

firmemente no tecido da ortodoxia cristã desde o princípio” (LECLERC, 2004) reforça o


princípio de que as condições sociais influenciam em grande medida nas construções e
interpretações bíblicas e teológicas. Dessa forma, o Movimento de santidade foi uma resposta
às condições sociais, mas também à condição eclesial vigente, que parecia aceitar,
complacentemente, a condição urbana que corrompia a condição humana.

Cabe ressaltarmos, que nem todo o Movimento de santidade teve características


metodistas. Um movimento iniciado na Faculdade Oberlin foi um desses diferenciados que
entendiam a perfeição cristã sobre uma base calvinista. O reavivamento calvinista do século
XIX encontrou a doutrina tradicional wesleyana sobre a perfeição cristã na Faculdade
Oberlin, em Ohio. Oberlin foi fundada em 1834, em uma época que o pensamento
abolicionista crescia cada vez mais pelos Estados Unidos e estava com muita frequência
diretamente ligada ao fervor religioso. Em Cincinati, no Seminário Teológico Lane, havia
muitos debates tratando da questão escravista. Lyman Beecher, diretor do seminário, instituiu
uma agenda de reforma social que propunha uma ação abolicionista mais gradual. Essa
postura de Beecher causou desentendimentos com outros seminaristas, principalmente com
Theodore Weld, que insistiam em uma postura abolicionista mais radical. Weld e seus colegas
puseram isso em prática, por meio de uma maior convivência com seus colegas negros em
relações sociais compartilhadas e de igualdade.

As associações dos alunos do Seminário Lane com os negros, inclusive fora do


seminário, causaram tumulto na cidade e parte da população pressionou os líderes do
seminário a reagirem contra tal fato. A tentativa dos cidadãos de Cincinati era de proibir e
fazer com que os alunos cessassem as demonstrações de sentimentalismo abolicionista em
público e parassem com todas as discussões ou conversas sobre a abolição da escravidão nas
salas de aula e entre o corpo docente. Quarenta estudantes saíram da faculdade em sinal de
protesto e fundaram, posteriormente, uma escola com o nome de Instituto Oberlin, que tinha
uma agenda reformadora totalmente abolicionista e manifestava uma forte convicção sobre a
igualdade humana. Os ex-alunos de Lane entraram em contato com Asa Mahan, um dos
dirigentes desse seminário que na época os apoiava, para se juntarem no Instituto Oberlin.
Asa Mahan concordou em ser o primeiro diretor da Escola. Muitos outros alunos veteranos de
Lane com quase 300 outros estudantes do primeiro ano seguiram Mahan para Oberlin, que
passou admitir, além dos negros, as mulheres na formação para o serviço eclesial. Entre elas
47

estava Antonette Brown que foi ordenada ao ministério15 pastoral em 1853, a primeira mulher
formalmente ordenada na história que se tem notícia. (GRIDER,1991, p. 16)

Os principais expoentes e promotores da doutrina da santidade em Oberlin foram


Charles G. Finney e Asa Mahan. Em 1862, Mahan apresentou uma série de conferências na
Universidade de Adrian divulgando o material que publicaria em 1870 com o título de “The
baptism of the holy Ghost”. Esse livro trazia como temática central a doutrina da Santidade e
teve grande impacto de divulgação dessa doutrina não apenas nos Estados Unidos, mas na
Inglaterra e grande parte da Europa. Charles G. Finney que era pastor, evangelista e professor
divulgou vários dos ensinos sobre a santificação no jornal “Oberlin Evangelis”. Finney
tornou, segundo GRIDER (1991, p. 67), numa das figuras religiosas de maior importância no
século XIX.

A teologia de Oberlin não estava desligada da sua agenda social. Calvinistas como
Charles Finney e Mahan estavam atentos ao novo tema de evangelismo que estava se
espalhando pelos Estados Unidos, Canadá e Grã-Bretanha, a saber: a inteira santificação.
Segundo Leclerc (2004), os calvinistas rejeitavam a relação que se dizia necessária entre a
doutrina da perfeição cristã e o metodismo. A partir daí, começaram a pregar uma nova
síntese do calvinismo e da santificação que se tornou conhecida como Nova Teologia ou Novo
Calvinismo. No entanto, houve reações extremas, principalmente, pelas denominações
calvinistas mais tradicionais, pois a teologia de Oberlin mostrava-se completamente otimista
sobre a mudança pessoal e social que pode acontecer através da santificação. Alguns sugerem
que o declínio do radicalismo de Oberlin, depois de Finney e Mahan, está diretamente ligado
à sua volta à teologia calvinista mais tradicional que está longe do perfeccionismo do século
XIX. Outros sugerem que o reavivamento de Oberlin declinou após 1842, ano em que Elder
Jacob Knapp, evangelista batista, foi banido de Boston e se tornou membro do Instituo
Oberlin, cujos pastores sofreram diversos ataques por seu suposto fanatismo.

Outra doutrina alternativa ao Movimento de santidade metodista partiu da primeira


conferência em Keswick, na Inglaterra, entre 1873 e 1875. A sua significância histórica é
encontrada na sua reinterpretação em relação à doutrina da inteira santificação que as igrejas
relacionadas com o metodismo, do final do século XIX, mantinham. Em vez de enfatizar a

15
A palavra ministério faz referência ao trabalho realizado nas igrejas ou fora delas, cuja designação para esse
trabalho procede de Deus ou de alguém que exerce autoridade divina. Por exemplo, aqueles que exercem o ofício
de pastor têm o ministério pastoral.
48

erradicação do pecado, como se encontra no perfeccionismo metodista, os doutrinários de


Keswick como Robert e Hannah Whitall Smith, e W. E. Boardman deram ênfase à chamada
vida cristã mais elevada. Calvinistas keswickianos, assim como os wesleyanos, enfatizavam
um momento distinto de total consagração, mas eles se diferenciavam naquilo que
acreditavam, isto é, que o poder da natureza humana afastado da divindade é contrário à
presença do Espírito Santo, portanto, não pode haver uma limpeza total do ser humano.
Posteriormente, houve tentativas de cooperação entre os wesleyanos e os keswickianos, mas
quando a teologia de Keswick se tornou muito associada com a escatologia16 e menos
interessada na reforma social esse distanciamento aumentou. (LECLERC, 2004.).

O Movimento da santidade também fez conexões diretas com a reforma social. As


igrejas de santidade, desde o início estavam associadas com a abolição, a temperança, e a
ordenação de mulheres. A doutrina da inteira santificação, bem como as cruzadas contra a
prática da escravização, da incontinência à bebida e contra a pobreza despertaram grande
confiança entre os leigos de que os males do mundo haviam de desaparecer. (SMITH, [195-],
p. 29). Porém, no meio eclesial, quando o fervor da doutrina da santidade tornou-se
proeminente nas campanhas evangelísticas e acampamentos, alguns leigos metodistas
voltaram insatisfeitos às suas igrejas. As denominações que se estabeleceram em
consequência disso passaram a ser conhecidas como separadas, ou seja, aquelas que saíram
do metodismo com o propósito de enfatizarem o poder transformador da experiência da
inteira santificação. Essas foram denominadas de igrejas “holiness”.

Segundo Smith ([195-]), o principal fator que motivou a separação dos líderes do
Movimento de santidade de suas respectivas igrejas foi a participação desses líderes em
trabalhos sociais e de assistência de cunho denominacional. Alguns desses líderes deram
respaldo ao trabalho com os pobres e excluídos das grandes cidades, produzindo, assim, uma
gama de convertidos que se sentiam desconfortáveis nas igrejas existentes.
Consequentemente, surgiram diversas congregações independentes. Desde o período das
grandes cruzadas e encontros evangelísticos produzidos por Phoebe Palmer e Charles Finney,
em que se pregava contra a escravidão e se construíram casas de apoio aos pobres e asilos nos
bairros de Nova Iorque, a doutrina da santidade havia compelido a muitos para assistirem a
esse contingente de necessitados. A fundação de hospitais, asilos, casas de recuperação,

16
Segundo McGrath, a escatologia é parte da Teologia cristã destinada ao estudo das últimas coisas, como a
ressurreição, inferno e vida eterna. (MCGRATH, 2005, p. 652.).
49

orfanatos, casas de desabrigados, etc., ajudaram a muitos obterem uma melhor condição de
sobrevivência. Assim, aqueles que integravam o trabalho social de santidade ou eram
atendidos por ele percebiam novas razões para rechaçar o formalismo das igrejas. Com isso,
foram criados centros de adoração para esse contingente que, principalmente, após 1880 era
marginalizado nos grandes centros urbanos dos Estados Unidos.

O Movimento de santidade foi bastante significativo nos meios metodistas, cujos


bispos incentivavam constantemente o cuidado para com os necessitados e estabeleceram
trabalhos de assistência denominados de missões. Apesar disso, esses bispos advertiam contra
a formação de liderança leiga daqueles que professavam a santificação, uma vez que em
ocasiões já vistas, transformavam essas missões em congregações independentes de santidade.
Conforme declara Smith ([195-], p. 55), entre essas congregações estava a Igreja do
Nazareno. Christian Wismer Ruth, um dos co-fundadores da Igreja do Nazareno, afirmou que
uma dessas missões a “Mission Union” era uma instituição agressiva sustentada pelo povo de
santidade de várias igrejas. Dessa forma, a suspeita contra o caráter separatista do Movimento
de santidade começou a ser percebido entre os vários oficiais eclesiásticos das denominações
tradicionais.

Muitos fiéis antigos das igrejas tradicionais, bem como os iniciantes começaram a
seguir essas congregações. Os bispos metodistas notaram essa crescente debandada de seus
fiéis para as organizações de santidade e buscaram reagir adotando dois posicionamentos. O
primeiro visou rechaçar veementemente o que se pregava nos grupos de santidade enfatizando
o caráter denominacional e a autoridade episcopal sobre as decisões dos leigos, essa reação
não surtiu muito efeito e em pouco tempo esses líderes e suas igrejas se encontravam mais
enfraquecidos. O segundo posicionamento se caracterizou pela adesão de alguns bispos
metodistas aos parâmetros do Movimento de santidade, mas sem que se desqualificasse o
padrão denominacional.

Conforme Smith ([195-], p. 16-30), mesmo que as pregações sobre a segunda obra da
Graça tivessem em muito criticado a autoridade episcopal, alguns bispos metodistas
procuraram adaptar-se ao Movimento de santidade, a fim de que suas perdas fossem menores.
Dessa forma, começaram a investir em atividades missionárias e evangelísticas um tanto
quanto distantes das rigorosas disciplinas metodistas. Entre 1895 e 1905, muitos bispos do
norte e do sul patrocinaram campanhas para conscientizar pastores e leigos para a busca da
doutrina do amor perfeito. Contudo, tais campanhas refletiram resultados adversos, visto que
50

em muitas reuniões campestres, as suspeitas contra a hierarquia iam-se aumentando. A Igreja


Metodista Espicopal, a Igreja Metodista Episcopal do Sul e outras igrejas do ramo metodista
foram logo divididas em grupos metodistas “holiness” e “anti holiness”.

A liberdade expressa pelo Movimento de santidade propiciou as mais variadas


contingências, desde aquelas entendidas, pelas principais lideranças deste movimento, como
adequadas àquelas consideradas mais extremas. Com isso, a reação de alguns líderes foi de
reforçar o Movimento de santidade em seu aspecto organizacional. Consequentemente, esse
Movimento passava a ser cada vez mais institucionalizado e independente das igrejas
tradicionais, fazendo aprofundar as raízes do sectarismo nos Estados Unidos do Século XIX.
Destacamos, contudo, que o sectarismo causado pelo Movimento de santidade não diz
respeito apenas ao conteúdo eclesiástico, mas também em relação às questões sociais mais
pungentes que perpassaram os Estados Unidos daquele Século, tais como a escravidão e a
pobreza. O surgimento das questões de âmbito social como a pobreza, o consumo de bebidas
alcoólicas, a falta de habitação e a discriminação social não somente perpassaram, mas
também influenciaram consideravelmente a pauta religiosa americana no decurso da primeira
metade do Século XIX e logo após a Guerra de Secessão, ao ponto de algumas vezes se
suplantar as questões da salvação pessoal do pecado por essas questões de cunho social.
(SMITH, 1957, p. 148).

No último período do Movimento de santidade, a palavra pentecostal começou a ser


usada quase como sinônimo de santidade. Muitas das novas igrejas que se formavam a partir
dos encontros de avivamentos e as várias associações de santidade passaram a adotar esse
adjetivo em seus nomes. Esse fato decorreu da ligação que se fez da inteira santificação com o
chamado batismo no Espírito Santo. Essa ligação produziu diferentes vertentes dentro do
próprio Movimento de santidade. Para Redford (1995, p. 11), distinguiram-se dois
importantes grupos dentro do Movimento “holiness”, aquele representado pelos pentecostais
que valorizavam a experiência extática e aquele representado pelos que se aproximavam da
prática metodista menos centrado nas experiências carismáticas.

O entendimento da doutrina da santidade herdada pela Igreja do Nazareno baseou-se,


principalmente, na explanação de John Allen Wood (1828-1905). Wood foi um evangelista do
Movimento de santidade saído das fileiras do metodismo, aos 32 anos escreveu o livro, O
Perfeito amor ([196-]). Nele, Wood ensinou que a inteira santificação é produzida pelo
batismo com o Espírito Santo e que há um derramamento instantâneo do poder celestial sobre
51

o fiel, contudo não significava mero recebimento dos dons celestiais, mas total expurgo do
pecado original. Phineas Bresee foi grandemente influenciado por Wood. Em 1886, ambos se
reuniram na Igreja Metodista, que Bresee pastoreava, para compartilharem do entendimento
que o Espírito Santo efetuava a inteira santificação. Tal era a adesão de Bresee sobre os
ensinamentos de Wood, que este fora convidado para pregar na primeira reunião anual de
santidade, ocorrida no ano de 1895, que foi também a reunião de inauguração da Igreja do
Nazareno em Los Angeles. A partir daí, a crença de que o Espírito Santo realiza
instantaneamente a santificação passou a ser ponto inquestionável na doutrina da Igreja do
Nazareno.

Os diversos matizes do Movimento de Santidade espalharam novas e distintas


experiências cristãs dentro das igrejas já estabelecidas dos Estados Unidos. De norte a sul, de
leste a oeste o Movimento de santidade foi-se consolidando nas estruturas eclesiais e na
formação de novos grupos. Entre esses vários grupos, destacamos aqueles que, de uma forma
ou de outra, entraram na constituição da Igreja do Nazareno, portanto a formação dessa
instituição atendeu ao caráter que até então não se percebia no final do século XIX. A Igreja
do Nazareno, contrariamente aos movimentos cismáticos que se espalharam pelas igrejas,
principalmente, pela Igreja Metodista, originou-se da união de diversos grupos de santidade.
Conforme destaca Riley e Oster ([19--], p. 53), entre os fundadores da Igreja do Nazareno
Bresee era metodista, William Howard Hoople era batista, Edward F. Walker e J.O.
McClurkan eram presbiterianos, Aaron Merritt Hills, congregacionalista, além de co-
fundadores adventistas e quaqueres. (SMITH, [195-], p. 148).

Esse aglomerado de perspectivas foi possível devido ao Movimento de santidade se


voltar mais para a ação social e a chamada vida espiritual dinâmica do que para a ortodoxia da
doutrina. Dessa forma, esse Movimento se distanciou de questões fundamentalistas da Bíblia
para se fixar na segunda obra da graça que era seu maior imperativo. A fixação nesse ponto
decorria de que a segunda obra da graça era imprescindível para a mudança integral do
comportamento humano, portanto a ênfase no anti-catolicismo, nas questões abolicionistas, no
papel da mulher na vida eclesial, no viver metódico contra os vícios, jogos e prostituição
seriam não o meio de alcançar a santidade, mas consequência dessa santidade na vida dos
fiéis.

Cabe ressaltarmos, que essa perspectiva, conforme destacam Smith ([195-]), Riley e
Oster ([19--]), entre outros, está estritamente voltada para valorização da Igreja do Nazareno
52

no Movimento de santidade e não traduz a diversidade das questões nem os embates dentro
desse Movimento. Por isso, é verificada a posição, interessante para a história oficial dessa
Igreja, que o despontamento dos diversos grupos de santidade deveu-se mais pela localidade
onde emergiam e pela ausência de uma estrutura comum que os unificasse do que pela falta
de consenso nas questões que abordavam. Os historiadores nazarenos consideram que houve
dissensões no Movimento de santidade, porém, estas se relacionavam em grande parte com os
temas de cunho espiritual, como por exemplo, a questão da obtenção da santidade de forma
instantânea ou não, que de certa forma não acarretava maiores contratempos de ordem prática.
Assim, esses historiadores minimizavam as contradições do Movimento de santidade.

Os grupos de santidade que se formaram no final do século XIX e início do século XX


somente passaram a ser uma expressão nacional, a partir do momento em que contribuíram
para a formação de uma instituição de âmbito nacional. O entendimento do processo
formativo da Igreja do Nazareno segue a lógica da percepção da necessidade que os grupos de
santidade tinham de se consolidarem como expressão nacional e unificadora que somente
tornou-se efetiva no aparecimento da Igreja do Nazareno, em 1908. Entretanto, poderia se
pensar que as Associações de santidade já traziam em seu âmago o projeto unificador do
Movimento de santidade, contudo tais associações se caracterizavam mais pela adesão pessoal
dos pastores e líderes do que uma adesão institucional. Antes dessa institucionalização
nacional do Movimento de santidade, havia líderes de determinadas igrejas que aderiram a
esse Movimento, enquanto outros das mesmas igrejas o renegavam e contra aqueles
combatiam, portanto o aspecto de unificação nacional do Movimento de santidade era uma
prioridade que estava em vias de ser realizada com a Igreja do Nazareno. Na página seguinte,
apresentamos um quadro contendo algumas instituições do Movimento de Santidade, nos
Estados Unidos, que contribuíram futuramente, para o surgimento da Igreja do Nazareno,
como expressão nacional desse Movimento.
53

QUADRO 2: Grupos de Santidade nos Estados Unidos (Segunda Metade do Século


XIX).
Ano Instituição Fundador/União
1887 Igreja Evangelica do Povo - Rhode Island. Rev. F. A. Hillery.
1888 Igreja Missão - Massachusetts. Rev. C. Howard Davis.
1890 Associação Central Evangélica de Santidade - Nova União das duas Igrejas acima e
Inglaterra outros grupos de Santidade de Nova
Inglaterra.
1894 Tabernáculo Pentecostal da Avenida Útica - Brooklyn, Rev. W. H. Hoople.
Nova Iorque.
1895 Igrejas Pentecostais da América. União desse grupo com duas outras
Congregações de Santidades.
1896 Associação das Igrejas Pentecostais da América - Nova União da Associação Central
Iorque. Evangélica de Santidade com as
Igrejas Pentecostais da América.

1895 Primeira Igreja do Nazareno - Califórnia. Dr. Phineas Franklin Bresee


1888 Primeira Igreja de Santidade – Texas Rev.Thomas Rogers Dennis Rogers
1894 Igreja do Novo Testamento - Tennessee Rev. R.L. Harris
1898 Missão Pentecostal - Tennessee Rev. J.O. McClurkan
1901 Igreja Independente de Santidade – Texas Rev. C. B. Jerningan

1905 Igreja de Santidade de Cristo - Texas. União da Igreja do Novo


Testamento de Cristo com a Igreja
Independente de Santidade

Legenda:

Mov Movimento “Holiness” no Leste dos Estados Unidos

Movimento “Holiness” no Oeste dos Estados Unidos.

Movimento “Holiness” no Sul dos Estados Unidos.

O acontecimento das grandes reuniões de avivamento possibilitou o surgimento de


uma série de pregadores que eram chamados para o campo de evangelização. Segundo um
desses pregadores, Charles Brougher Jerningan (1919), os membros das igrejas tradicionais
mudavam radicalmente seus comportamentos quando ouviam as pregações de santidade.
Muitos restituíam aquilo que deviam, heranças eram corretamente partilhadas, fumantes
abandonavam o uso do tabaco, as mulheres despojavam-se de roupas espalhafatosas e das
joias vistosas. Para Jernigan (1919), em seu livro, “Pionerr days of the holiness movement in
the southwest”, onde houvesse uma pregação sobre santidade ali haveria um poderoso agitar
espiritual que raramente se viu. Não obstante essa visão romantizada de Jerningan, esse novo
54

estilo de pregação e seu decorrente modo de vida provocaram a indignação daqueles


pertencentes às igrejas tradicionais que relutavam em aceitar a proposta do Movimento de
santidade. Segundo esse mesmo autor, pregadores e membros da santidade sofreram diversos
reveses, muitos foram expulsos de suas igrejas, ou rechaçados sob vários atos de violência
como, perseguições, apedrejamentos, agressões com ovos podres, etc.. Enquanto pregavam,
os arreios de seus cavalos eram cortados de modo que perdiam as montarias, as caudas de
seus animais eram raspadas, as cordas das tendas onde ocorriam os cultos eram cortadas,
tendas eram queimadas, cães eram instigados sobre eles e soltos nas casas-igrejas. “Esses
cães, muitas vezes, os feriam ao ponto de os fazerem rolarem no chão e gritarem de dor, ao
mesmo tempo em que crianças zombavam deles chamando-os de cachorros loucos”.
(JERNIGAN, 1919, p. 11, tradução livre.).

Os pregadores de santidade eram acusados também de praticarem sexo livre em


decorrência da pregação do amor livre, muitos foram perseguidos por acusação de fugirem
com mulheres casadas, ou de praticarem roubos em outras cidades. O clima de terror que se
estabeleceu sobre aqueles que pregavam e aceitavam a doutrina da santidade se estabeleceu a
tal ponto, “que muitos fiéis e clérigos das igrejas tradicionais evitavam até de olhar para eles
com o receio de serem hipnotizados”. (JERNINGAN, 1919, p. 11, tradução livre.) Contudo,
tais fatos não impediram o processo de fortalecimento e institucionalização do Movimento de
santidade que continuava se espalhando pelo território estadunidense, sobretudo em
decorrência dos periódicos de divulgação desse Movimento que se expandia pelos Estados.

O surgimento dessas instituições de santidade, ocorrido nas últimas décadas do século


XIX, cada vez mais reforçou a necessidade de se criar uma organização que representasse e
unificasse os interesses daqueles que criam e professavam a doutrina da santidade. As
denominações de santidade, diferenciadas em sua forma de inserção social, foram
sucessivamente aparecendo segundo diversos critérios. A Igreja Metodista Livre, por
exemplo, foi organizada em 1860, a partir da concepção de que ser livre implicava no
posicionamento de ser contrário à escravatura e que se opunham à prática comum nas igrejas
de venda de lugares de assento para angariar fundos, o que levava os pobres a ficarem fora
das igrejas ou em bancos atrás do santuário. Tomamos também como exemplo, O Exército da
Salvação, fundado por William e Catherine Booth, esta instituição era explícita no seu
compromisso com a doutrina da santidade e na prática da reforma social forjada para ajudar
os pobres. Diferentemente, a Igreja de Deus que foi fundada por Daniel S. Warner, em 1881,
55

tinha a mesma mensagem de santidade, porém assumia, veementemente, uma posição


antisectária, ou antidenominacional. Segundo Leclerc (2004), esse foi o motivo pelo qual
Warner deixou a associação ligada à Associação Nacional para a Promoção da Santidade para
se juntar à Associação Cristã da Santidade, nos anos mais recentes.

Conclusão

Os aspectos abordados neste capítulo mostraram que o Movimento de santidade não se


justifica e nem se explica apenas pela utilização do adjetivo, santidade, em instituições que
desagregaram das tradicionais igrejas estadunidenses. As questões de cunho teológico e social
influenciaram na profusão de critérios avaliativos na formação e consolidação das instituições
de santidade. Contudo, as diferenças percebidas dentro do Movimento de santidade ressaltam
que ele foi além de um cristianismo tradicional para procurar as causas do sofrimento
humano. O impacto desse Movimento fundamentou campanhas para a reconstrução social e
criação de novas relações econômicas sobre um padrão cristão. Os resultados, provenientes
em grande medida do crescimento urbano, fizeram com que a mensagem de santificação se
adaptasse aos condicionamentos sociais mediante a ênfase na compaixão pelos pobres e
marginalizados sociais e a ênfase na liberdade humana, que combateu o escravismo,
condicionando leigos e clérigos a pensarem as condições sociais na perspectiva do Evangelho,
fundamentando as raízes do cristianismo social.

Cabe destacarmos, para efeitos de esclarecimento, que o Movimento de santidade


passou por algumas transformações importantes ao longo da história. No período pós Segunda
Guerra, por exemplo, esse movimento sofreu algumas rupturas internas em que se buscava
uma separação entre as igrejas e o estilo de vida estadunidense. Cisões e fusões das igrejas de
santidade tradicionais caracterizaram esse Movimento de santidade contemporâneo, que
destacava a condição humana na terra como mera peregrinação, daí em muitas dessas igrejas a
adoção do adjetivo peregrino, tal como aparece na cisão da Igreja do Nazareno que deu
origem à Igreja Peregrina do Nazareno. No entanto, por não ser esse o objeto desta pesquisa
não nos aprofundamos nessa variação do movimento, definido como Movimento de santidade
conservador.
56

As bases sociorreligiosas da Igreja do Nazareno surgiram em meio a importantes


debates na Europa nos século XVI e XVIII. O aparecimento do arminianismo no contexto
holandês, difundindo a liberdade política e religiosa, foi consequência do desenvolvimento de
uma mentalidade social advinda das guerras da Holanda contra o domínio espanhol e das
crescentes relações econômicas no país. Esses fatos possibilitaram aos protestantes holandeses
questionarem os princípios calvinistas da predestinação que, para alguns, cerceavam a
liberdade humana. O aparecimento da doutrina arminiana configurou-se como representação
no cenário religioso das formas de emancipação que se verificava em outros setores sociais.

Do mesmo modo, o surgimento do movimento de reavivamento wesleyano foi uma


forma de despertamento religioso popular que induziu as massas camponesas a uma condição
de emancipação da condição estabelecida pela Revolução Industrial. Em meio às turbulências
sociais, a forma de pregações livres e a difusão de uma religiosidade menos formal e mais
intimista possibilitou aos camponeses visualizarem sua emancipação das formas opressoras
econômicas e religiosas. Nesse aspecto, a mensagem wesleyana de avivamento atendia aos
anseios daqueles que eram fatigados pelas condições sociorreligiosas da época.

Esse vínculo emancipatório entre o arminianismo e o movimento de avivamento


wesleyano possibilitou a origem de uma doutrina armínio-wesleyana, que combatia tanto a
submissão humana às contingências sociorreligosas, quanto a estrutura enrijecida das igrejas
da época. Essa doutrina armínio-wesleyana, consubstanciada na doutrina da santidade, é o
principal fundamento teológico do qual a Igreja do Nazareno se apropriou e faz questão de
divulgar.

O percurso traçado até aqui, no qual caracterizamos as condições sociorreligiosas do


arminianismo, da tradição wesleyana e do Movimento de santidade, ganha importância no
conhecimento da fundamentação e consolidação da Igreja do Nazareno, no início do século
XX, bem como no entendimento de sua inserção e expansão no território brasileiro, uma vez
que tais condicionamentos subsidiaram a forma particular de atuação dessa instituição no
campo religioso brasileiro. A consolidação dessa Instituição é o assunto do capítulo posterior.
57

CAPÍTULO 2

A IGREJA DO NAZARENO

Introdução

O processo histórico de formação da Igreja do Nazareno foi abrangente e complexo,


de forma que se torna necessário uma abordagem seletiva dos acontecimentos que
culminaram com seu surgimento. Nesse capítulo, abordamos o processo histórico de formação
da Igreja do Nazareno enquanto congregação fundada por Phineas Bresee, no final do século
XIX, e como uma instituição nacional, nos Estados Unidos, que visou consolidar, difundir e,
principalmente, unificar as várias vertentes que se formaram no seio do Movimento de
santidade. Tratamos, portanto, da biografia do seu principal fundador Phineas Bresee, da
formação da Associação das Igrejas Pentecostais da América e da Igreja de Cristo em
Santidade, que foram instituições basilares que se uniram sob a designação de Igreja do
Nazareno, em 1908, a fim de formarem uma instituição nacional e até internacional de
santidade, com sua difusão pelo território estadunidense e pelas áreas mundiais. Além do
estudo desse processo histórico, analisaremos a estrutura de poder governamental que se
consolidou na Igreja do Nazareno.

2.1 Phineas Bresee (1838-1915)

A Igreja do Nazareno, enquanto expressão nacional do Movimento de santidade surgiu


em 1908, a partir da união de associações e igrejas de santidade dos Estados Unidos. Dentre
seus fundadores destaca-se o metodista Phineas Franklin Bresee que fora moldado pelo
Movimento de santidade, no oeste estadunidense, sob o direcionamento das associações de
santidade. Phineas Bresee nasceu em 31 de dezembro de 1838, em Franklin um condado de
Delawere oeste do Estado de Nova York. O segundo dos três filhos de Phineas Philip e
Susana Brown Bresee foi criado desde cedo nos princípios do cristianismo protestante.
58

Quando jovem seus pais se mudaram para o povoado de Devenport, próximo a Franklin, onde
se converteu em 1856. Pouco depois, recebeu licença como exortador, o primeiro nível para
se alcançar o ofício pastoral na Igreja Metodista Episcopal. Em 1857, seus pais mudaram para
Millersburg, em Iowa, na região central dos Estados Unidos. “Bresee logo se deu conta de que
Iowa carecia de pregadores” (SMITH, [195-], p. 105). No ano de 1859, Phineas Bresee foi
ordenado ministro pelo bispo Matthew Simpson e ordenado a presbítero, em 1861, pelo então
Bispo Levi Scott. Em 1860, retornou à Nova Iorque e casou com Mary F. Hibbard pertencente
a uma influente família metodista. Bresee, em anos posteriores, serviu às Igrejas Metodistas
da comunidade holandesa de Pella, East Des Moines, Chariton, Read Oak e participou de
alguns circuitos de pregação em Grinnel e Galesburg, entre outros. (SMITH, [195-], p.105).

Phineas Bresee pediu sua transferência de Pella, no ano de seu ordenamento a


presbítero, pois não concordava com o tráfico de escravos e suas convicções contra a
escravidão tornaram-se uma afronta aos habitantes daquele lugar. As ideias abolicionistas e de
valorização dos seres humanos que aprendeu em Nova Iorque ainda estavam bem presentes
em sua memória. Como resposta ao seu pedido de transferência, Bresee foi enviado para o
circuito de Galesburg, que era um percurso definido entre povoados e cidades, onde os
pastores exerciam a prédica. O envio de Bresee a esse circuito, a principio não lhe agradou,
mas logo foi transformado por ele em um desafio a cumprir. Smith relata as palavras de
Bresee quanto a esse fato, “devo continuar; devo ir, assim vivo ou morto. Pensei que o Senhor
me ajudaria, mas se não me ajudasse deveria ir de toda a maneira (...) estava desesperado”
(Bresee, apud SMITH, [195-], p. 105). Galesburg foi um circuito próspero para Bresee, em
um só ano, recebeu 140 novos membros, comprou uma casa pastoral cômoda e adquiriu dois
cavalos e uma carruagem para viagens, conforme relatou Smith ([195-], p. 105).

O sucesso de Phineas Bresee em Galesburg trouxe reconhecimento no meio metodista,


tanto que, quando tinha 23 anos de idade, foi pastor em Des Moines. Desde então, a
capacidade empreendedora de Bresee o colocava em destaque frente aos seus colegas
pastores. Dessa forma, foi ganhando a confiança dos leigos e da liderança da Igreja a ponto de
ser eleito Delegado geral na Conferência geral reunida em Nova Iorque em 1872,
contribuindo, então, para que Gilbert Haven, um abolicionista, alcançasse o posto de bispo.
Em Red Oak, Bresee organizou seu primeiro acampamento local, no qual levou centenas de
pessoas de todas as camadas sociais à conversão.
59

O fato que os nazarenos tomam como precioso na vida de Bresee foi sua experiência
da inteira santificação que ocorreu em 1866 em Chariton, Iowa. Segundo E.A. Girvin (1916,
p. 50), Bresee havia passado por um período de intensas dúvidas em que a ambição, impulsos
de ira e orgulho haviam revelado sua verdadeira condição espiritual. Bresee declarara que:

Parecia que duvidava de tudo. Pensei que era questão intelectual, por tanto procurei
encontrar a resposta. Pensei que provavelmente havia entrado tão jovem ao
ministério que nunca havia encontrado resposta para as grandes questões do ser, de
Deus, do destino, do pecado e da expiação; portanto me dei à tarefa de responder a
essas perguntas (...) minhas dúvida não se dissiparam. (Bresee apud. GIRVIN,
1916, p.50, tradução livre).

Em uma reunião de oração em Chariton, Bresee caiu de joelhos no altar de sua própria
igreja pedindo a Cristo que satisfizesse suas petições. Para ele, foi esse o momento em que
Deus lhe tirou todo o aspecto de mundanidade manifestados na ira, orgulho e dúvidas que
tivera. Bresee recordou que naquela noite se deu conta de que as condições de dúvidas eram
morais em vez de intelectuais e que a dúvida era parte de sua carnalidade. (GIRVIN, 1916, p.
51). Bresee passou a considerar esse acontecimento como o momento de sua santificação.

Em 1883, Bresee requereu transferência para a conferência do sul da Califórnia, talvez


não com pensamentos altivos no serviço pastoral, mas por motivos econômicos. Isso se deveu
ao fato de que quando estava em Des Moines, Phineas Bresee conheceu o reverendo Joseph
Knotts, membro da Igreja Metodista de Council Buffs, que estava aposentado do serviço
pastoral e se aventurava em negócios comerciais. Em 1875, Knotts foi designado Cônsul dos
Estados Unidos em Chihuahua, México. Nesse tempo, adquiriu uma grande quantidade de
ações em minas de ouro. Em seu retorno aos Estados Unidos, associou-se com alguns
capitalistas de reputação nacional e nomeou seu amigo Phineas Bresee para a direção de
várias de suas corporações. Em 1879, Bresee pediu designação para uma pequena Igreja em
Creston, Iowa, talvez com a intenção de obter mais tempo para se dedicar aos negócios de
Knotts. (SMITH, [195-], p. 108-109).

Alguns anos mais tarde, Bresee voltou para Council Buffs, a fim de pastorear a Igreja
em que Knotts era membro proeminente. Bresee, querendo fundar uma nova congregação em
uma região opulenta da cidade, envidou esforços e recursos para tal finalidade, no entanto, em
1883, o rio Missouri transbordou e inundou grande parte da região que Phineas desejava. No
mesmo ano, Knotts recebera a notícia que trabalhadores em sua mina, em Parral, haviam feito
uma detonação que cobriu grande parte dos túneis, destruindo máquinas e ferramentas de alto
60

custo, que inviabilizaram o uso dessa mina. Consequentemente, Bresee se achou em ruína
financeira e decidiu-se mudar para o Estado da Califórnia.

Bresee resolveu não mais se envolver com negócios, mas apenas trabalhar na sua
vocação pastoral. Ele, sua esposa e filhos saíram de Council Buffs por meio de doações
recebidas. No domingo seguinte, Bresee foi convidado para pregar na Primeira Igreja
Metodista de Los Angeles, da qual poucas semanas depois viria a se tornar pastor. Foi nessa
Igreja que Bresee entrou em contato com um grupo de leigos que professavam a santificação,
seu líder era Leslie F. Gay, que emprestava sua casa para o encontro semanal de promoção da
santidade. Leslie se esforçara para que a Conferência dos líderes metodistas da Califórnia do
sul se alinhasse com o Movimento de santidade. Em dezembro de 1883, a Convenção do
distrito metodista de Los Angeles selecionou Gay, Bresee, R.W.C. Farmsworth e outros dois
pastores para formarem uma comissão que estabelecesse correspondência com a Associação
Nacional de Santidade para que essa se instalasse também em Los Angeles. Isto implicou nos
convites feitos a William Mc Donald presidente da Associação e a George D. Watson para
uma série de avivamentos na cidade. (SMITH. [195-], p. 111)

William Mc Donald e George D. Watson realizaram cultos durante três semanas na


Igreja que Bresee pastoreava, este relatou a seus amigos uma experiência que guardava
consigo: que estando na casa pastoral de Des Moines, obteve uma visão que acreditava ser o
batismo com o Espírito Santo e a partir disso seu ministério se tornou profícuo naquela Igreja
em Iowa. Devido a isso, Phineas Bresee passou a promover a doutrina da santidade, sem,
contudo, mudar sua forma de pregação para não suscitar oposições contra o Movimento de
santidade ainda incipiente na Califórnia. O receio de Bresee se justifica no fato de que,
mesmo nos anos posteriores, o metodismo californiano ainda não havia aceitado
completamente a doutrina da santidade na forma como muitos dos adeptos do Movimento
“holiness” propunham. Bresee queria evitar que qualquer ato irrefletido pudesse impedir a
instalação desse movimento no Estado.

R.W.C. Farmsworth, que era redator do “The Southern California Methodist


Quartely”, uma revista trimestral, passou a divulgar ideias favoráveis ao Movimento de
santidade. Nas colunas da revista, informava sobre reuniões de avivamentos de santidade
regularmente, imprimia as leituras bíblicas de Leslie F. Gay e também divulgava os artigos e
pregações de Phineas Bresee. Nessa mesma revista, no entanto, ressaltava-se a necessidade
dos fiéis serem leais às denominações. Arabella E. Widney, que anos mais tarde viria ser
61

membro fundador da Igreja do Nazareno em Los Angeles, escrevia que as divisões na igreja
não eram para a glória de Deus. Aqueles que assumiram a liderança do Movimento de
santidade, na Califórnia, exerciam ao mesmo tempo posições influentes no metodismo local.
Um desses eminentes, Joseph Pomeroy Widney, membro da primeira Igreja Metodista de Los
Angeles, médico e reitor da Universidade do Sul da Califórnia, uniu-se às ideias de santidade
de Bresee e seus companheiros. Widney tornou-se importante figura na formação da Igreja do
Nazareno.

Em 1886, Phineas Bresee foi transferido para Pasadena. O templo ainda estava sendo
construído e o número de membros era de 130. Bresee iniciou campanhas, a fim de chamar os
trabalhadores para as reuniões o que acarretou a duplicação de membros. No segundo ano, em
Pasadena, 250 pessoas se uniram à Igreja de Bresee. (SMITH, [195-], p. 115). Na
impossibilidade de acomodar novos membros no templo, construiu-se um tabernáculo, pelo
que Bresee informou que sua igreja tinha 700 membros e seu salário era de US$ 4.350,00
dólares, mais do que recebia o principal ministro da Primeira Igreja de Los Angeles (SMITH.
[195-], p.115). A doutrina da santidade se expandia não somente pelas ações de Bresee, outros
membros da Conferência para a santidade foram ganhando espaço em outros meios. Mc
Donald e seus colaboradores, como J. A. Wood, dirigiram avivamentos por toda a Califórnia.
Leslie Gay tornou-se membro da Associação Nacional de Santidade em 1887, era o único
membro leigo da costa ocidental dos Estados Unidos a fazer parte da Associação. Além disso,
Gay alcançou o mais alto grau possível para um leigo metodista ao fazer parte da Conferência
geral de 1888.

Bresee serviu em Pasadena até ser nomeado presbítero presidente do distrito de Los
Angeles. Isso possibilitou o fortalecimento dos encontros de avivamentos em sua
circunscrição, ao mesmo tempo possibilitou a Bresee inserir o Movimento de santidade em
lugares não eclesiásticos, como nas faculdades e nas casas de leigos. Desde o ano de 1884,
Bresee fazia parte da Junta de diretores da Universidade do Sul da Califórnia. Em 1892, ele e
Joseph Widney resolveram salvar essa instituição da ruína financeira que estava prestes a
cobri-la. Widney, que havia assumido a reitoria nesse mesmo ano, se apercebeu da dívida de
US$ 18 mil doláres da Escola de Artes Liberais. O primeiro projeto de Widney foi formar
uma Junta separada para essa escola, a fim de sanar a dívida e também aproveitar a ocasião
para aproximá-la dos líderes eclesiásticos do metodismo californiano. Bresee foi eleito o
presidente dessa nova Junta e salientou que o sentimento dela era de que a Faculdade
62

alcançasse um alto nível de condição espiritual, tanto quanto as normas elevadas de


capacitação acadêmica. (SMITH, [195-], p. 121). Em 1894, a Universidade do Sul da
Califórnia havia reestabelecido o equilíbrio em suas contas.

Joseph Widney, sua esposa e sua filha Arabela eram, há algum tempo, ativos nos
esforços evangelísticos promovidos pelos metodistas juntos aos pobres e necessitados.
Arabela e sua mãe organizaram obras assistenciais na Carolina do Sul em 1889. Phineas
Bresee e Joseph Widney foram membros da primeira Junta executiva e ambos eram
favoráveis ao processo do proibicionismo. Esse foi um processo disseminado nas grandes
cidades estadunidenses que visava combater o uso de bebidas alcóolicas, a frequência às casas
de jogos e aos salões de bar. Widney serviu como chefe da liga contra salões de bar na cidade
e foi candidato a prefeito, no ano de 1894, com a proposta de difundir o proibicionismo.
Widney era um cidadão honrado nos meios sociais dos quais participava e sua indescritível
vontade de ajudar os pobres e necessitados o levou a intensificar suas ações sociais de
assistência, expandindo, por todas as classes e meios, a doutrina da santidade à qual era afeito.
Dessa forma, se uniu à Missão Peniel.

A Missão Peniel era uma instituição de assistência fundada e dirigida pelo casal
Theodore Pollock Ferguson (1853-1920) e Maine Ferguson Payne (1850-1920). Essa missão
foi inicialmente criada com o nome de Missão Los Angeles e era sustentada por verbas vindas
da Inglaterra. (SMITH, [195-], p. 56). Theodore Ferguson se converteu no ano 1875, em
Oberlin, através da pregação do evangelista Charles Finney. A partir daí, tornou-se pregador
itinerante, após dizer ter recebido a experiência da santificação. Widney, que era membro da
Missão, estava convencido da capacidade de Bresee na condução das questões da
Universidade do Sul da Califórnia e incentivou o casal Ferguson a chamar seu amigo Bresee
para compor os quadros da Missão Peniel. (SMITH, [195-], p. 56).

O casal Ferguson chamou Phineas Bresee para se engajar no trabalho da missão. A


princípio, ele recusou o convite por estar envolvido em Los Angeles e bem estabelecido ali,
ocupando o púlpito de uma das maiores igrejas da região. Por ser o representante da Igreja
Metodista na Conferência geral, Bresee pregava com frequência nas reuniões campestres
dessa Igreja. Para Smith ([195-], pp.55-57), o clamor dos necessitados, bem como o interesse
em uma livre cruzada de santidade pesou na decisão de Bresee em trabalhar na Missão.
Bresee pediu autorização de seus superiores para conceder-lhe uma designação regular para a
Missão Peniel, mas o bispo que presidia a Conferência anual da Califórnia do sul, em 1894,
63

negou-lhe essa concessão. Bresee não abrigava a ideia de se separar da Igreja Metodista, no
entanto, informalmente, dedicou-se a colaborar com a Missão. (SMITH, [195-], p. 57).

Segundo Smith ([195-], p. 124), a declaração de princípios da Missão Peniel, redigida


por Bresee, defendia uma organização de obreiros que permitiria às pessoas não afiliadas a
nenhuma denominação considerá-la como sua casa espiritual. O periódico metodista no
Estado, “California Christian Advocate” entendeu que Bresee intencionava organizar uma
Igreja Metodista independente, mas, conforme afirma Smith, o que se pretendia, de fato, era
evitar o sectarismo decorrente da afiliação de pessoas que não tivessem ligação com as
igrejas. Bresee entendia que essa política impossibilitaria que muitas pessoas pobres tivessem
acesso às igrejas, e o que ele mais prezava era seu programa de evangelização dos pobres, ao
mesmo tempo em que isso o afastava dos metodistas. Conforme salientou o “California
Christian Advocate”, a missão Peniel não tinha o endosso da maioria dos pastores metodistas
(Smith, [195-], p. 124). Havia uma divisão eclesiástica e não teológica entre a Missão Peniel e
os metodistas tradicionais.

Em 1894, Phineas Bresee participou da inauguração do edifício da Missão Peniel Hall,


em Los Angeles. Lá, estavam presentes também, o médico Joseph Widney e Jonh Wood. Este
era evangelista de Massachusetts e membro da Associação Nacional de Santidade e com sua
teologia influenciou grandemente a Phineas Bresee. Na primeira edição do periódico mensal
“Peniel Herald”, Bresee declarou:

Nossa primeira tarefa consiste em ganhar aos que nos assistem na Igreja; a
gente da rua e dos lugares onde não chega a luz das igrejas ou pouco os
alcança. Especialmente temos de ganhar os necessitados para a cruz de
cristo convencendo-os por meio da ajuda e simpatia cristã. Nossa tarefa
inclui também pregar e ensinar o evangelho de salvação completa; mostrar
o bendito privilégio dos crentes em Cristo Jesus e fazê-los santos e
aperfeiçoá-los em amor. (Bresee apud SMITH. [195-], p. 58,
tradução livre).

Dessa forma, a ação social da santidade tinha um compromisso patente de difundir o


evangelho entre os pobres e necessitados, mas que não se expressava no conceito
denominacional. Por sua vez, Bresee e muitos outros líderes de santidade entendiam que
alguns leigos exageravam na prática de santidade, trazendo um extremismo que chegava, não
raramente, ao fanatismo. Bresee, o casal Ferguson e demais líderes da Missão Peniel viram a
necessidade de preparar tanto os membros da Missão, que não vinham de nenhuma igreja,
como aqueles que eram advindos delas. Surgiu daí, uma declaração de fé da Missão propondo
64

a simbiose entre a perspectiva interdenominacional da Missão com a perspectiva de uma


congregação independente. Assim, a Missão atenderia aqueles que ainda não haviam rompido
os laços com as igrejas tradicionais e também aqueles que buscavam romper com esses laços,
visando à construção de uma igreja própria. Igualmente, não apenas a Missão Peniel, mas
outras que surgiram assumiram uma identidade paradoxal de não ser uma igreja propriamente
dita, nem apenas uma missão em si.

Em 1895, Widney se licenciou da Universidade do Sul da Califórnia para estudar no


leste do país. Nesse mesmo ano, Bresee se envolvia em discussões com o casal Ferguson.
Sem o amigo por perto para conciliar as diferenças, as relações foram se desgastando. O ápice
dos desentendimentos ocorreu pela não aceitação de Bresee da participação de moças nos
trabalhos de resgates em bares, prostíbulos e similares. Após uma viagem de evangelismo
campal pela Associação Nacional de Santidade, no meio-oeste dos Estados Unidos, Bresee
retornou para a Missão Peniel, porém foi convidado pelo casal Ferguson a abandoná-la. Dessa
forma, “o homem que deixara os púlpitos metodistas para ministrar aos pobres estava sem
lugar de pregar” (SMITH, [195-], p. 126).

Widney, que mudou seus planos durante aquele verão, talvez pela situação que se
estabeleceu em Peniel, também se desligou da Missão. Bresee e Widney em comum acordo
resolveram formar uma nova organização que provesse uma casa espiritual para os
necessitados. Bresee e Widney alugaram um espaço na Rua South Main, número 317, no
edifício Red Men’ Hall e anunciaram o primeiro serviço para o domingo, dia 6 de outubro de
1895. Naquele dia, Phineas Bresee pregou pela manhã o texto bíblico do profeta Jeremias e,
posteriormente, declarou que a única coisa nova que havia nessa nova organização era sua
determinação de pregar o evangelho aos necessitados e dar-lhes uma igreja que pudessem
considerar como sua. Conforme Smith ([195-], p. 127, tradução livre), “A ideia de que para os
pobres o trabalho de missão era o mais adequado havia caído por terra”.

Após duas semanas de reuniões em South Main, 80 pessoas se uniram para fundar a
Igreja do Nazareno. Além dos familiares de Bresee e Widney estavam presentes antigos
amigos de Bresee, como Leslie F. Gay e sua esposa. Widney pregou nesse dia e explicou o
motivo de terem denominado aquele lugar de Igreja do Nazareno. A palavra, nazareno, lhe
havia ocorrido pela manhã e depois de uma noite de oração, oportunamente, lhe pareceu que
ela simbolizava a missão humilde e laboriosa de Jesus Cristo, o qual escolhera o mesmo nome
65

para si, nome que servia de escárnio de seus inimigos e esperança para quem o clamava.
(SMITH, [195-], p. 127).

A reação dos metodistas em relação a fundação da Igreja do Nazareno se mostrou


amistosa. O periódico “California Christian Advocate”, em sua edição dos dias 19, 23 e 30 de
outubro de 1895, apenas declarou sentir pesar pelo afastamento de Bresse e Widney dos
quadros da Igreja e que não entendia o motivo de tal separação e nem creditava sabedoria
nessa atitude, mas considerava sinceros Widney e Bresee. (SMITH.[195-], p.129).

O primeiro Manual da Igreja do Nazareno (1898) expressava o seguinte sobre os


propósitos da nova organização:

Seguindo claramente o chamado de Deus para o cuidado no seu serviço e


na conversão dos pecadores, na santificação dos crentes e na edificação da
santidade daqueles que estão sobre o nosso cuidado, nós associamos,
juntamente com a Igreja de Deus, sob o nome de Igreja do Nazareno.
Procuramos a simplicidade do poder pentecostal da Igreja primitiva do
Novo Testamento. O campo de trabalho pelo qual somos chamados são os
negligenciados bairros da cidade e onde mais pessoas e almas perdidas
procuram perdão e purificação do pecado. Nós intentamos fazer este
trabalho através das agências de missões, serviços evangelísticos, visitações
de casa em casa, cuidando do pobre, confortando o doente. Para este fim,
nós nos esforçamos pessoalmente para andar com Deus e incitar outros
também a fazê-lo. (IGREJA DO NAZARENO/MANUAL 1898,
1995, p. 13, tradução livre)

Assim, destacamos na formação da Igreja do Nazareno sua ênfase no trabalho social,


em vista a atender aos necessitados dos centros urbanos. Esse aspecto permitiu o crescimento
rápido da membresia da Igreja, que logo necessitou mudar suas instalações para um lugar
mais amplo. Isso aconteceu em 1896, quando a congregação se mudou para Los Angeles no
“board tabernacle”. Desde esse tempo, Bresee já buscava a simplicidade na construção dos
templos, para não sobrecarregar financeiramente os pobres e para que esses não se sentissem
constrangidos na visitação aos templos e na participação dos cultos. Segundo W. T. Purkiser
(1983, p.26), esse crescimento possibilitou à Igreja alcançar em menos de uma década 26
congregações organizadas, quatro em Los Angeles, seis espalhadas pela Califórnia do sul, três
no norte do Estado, cinco em Washington, oito em Illinois e Estados vizinhos. Cidades
importantes dos Estados Unidos, como Chicago, Seattle, Berkeley, Salt Lake entre outras já
contavam com a presença da Igreja do Nazareno no início do século XX. A Igreja do
Nazareno, juntamente com seu principal fundador, se transformou em importante referência
do Movimento de santidade. No entanto, tal importância ganhou expressão nacional, a partir
da união com outros grupos de santidade.
66

2.2 As Associações e Igrejas formativas da Igreja do Nazareno

Depois de sua formação, no ano de 1895, em Los Angeles, a Igreja do Nazareno se


envolveu em várias alianças que abarcaram uma gama significativa de associações de
santidade e igrejas, o que lhe possibilitou alcançar todo o território dos Estados Unidos e até
fora dele. A partir dessas alianças, a Igreja do Nazareno se consolidou como uma das mais
importantes instituições do Movimento de Santidade. Daí a importância de registrarmos a
formação da Associação das Igrejas Pentecostais da América e da Igreja de Cristo de
Santidade consideradas as duas mais importantes organizações de santidade que uniram à
congregação da Igreja do Nazareno e lhe deram o “status” de instituição nacional de
santidade.

2.2.1 A formação da Associação das Igrejas Pentecostais da América (AIPA).

Os avivamentos de santidade tiveram características distintas quanto ao meio rural ou


urbano em que se localizavam. No meio rural, a interpretação da doutrina da santidade
enfatizava os aspectos de cunho emocional, se expressava em normas rígidas de vestimentas e
condutas e se mostrava pouco voltadas para a autoridade e disciplina eclesiásticas. Tal fato
pode ser atribuído a grande participação leiga na difusão dessa doutrina nas pequenas
comunidades. O de tipo urbano, mais intelectualizado e menos zeloso quanto ao simples
padrão externo de santidade, se centralizou nas regras e autoridade da Igreja. Smith ([195-], p.
30) aponta os principais fatores que eram avaliados na decisão dos fiéis de sair ou permanecer
sob o ordenamento eclesiástico das denominações tradicionais: a oposição dos líderes
eclesiásticos para com as associações independentes de santidade, a descrença à legitimidade
do Movimento causado pelos supostos atos de fanatismo atribuídos àqueles que eram
vinculados às associações de santidade, as diversas campanhas contra a doutrina da santidade
ocorridas na última década do século XIX e, por último, a crescente atividade de pregadores
de santidade nas grandes cidades com ênfase nas missões de resgate e trabalho social.

O fluxo de membros nas igrejas tradicionais foi constante e desorganizado. Surgiram


vários grupos e congregações independentes que, paradoxalmente, algumas vezes voltavam a
se unir a essas igrejas. As divisões ocorridas nas igrejas dos Estados Unidos, em decorrência
das adesões ou combate ao Movimento de santidade, criaram a necessidade dos adeptos desse
67

Movimento se organizarem em formas institucionais, a fim de acolherem os banidos das


igrejas tradicionais e assistirem aqueles que delas não faziam parte. Ao mesmo tempo, essa
institucionalização evitaria as dissensões quanto ao conteúdo teológico do Movimento e se
difundiria a doutrina da santidade de forma mais eficaz. No que concerne à formação da
Igreja do Nazareno, enquanto expressão institucionalizada e nacional de santidade, o processo
de consolidação das estruturas organizacionais “holiness” tem maior importância nas últimas
décadas do século XIX, quando no meio-oeste estadunidense surgiram várias instituições de
santidade.

Dentre essas instituições de santidade, duas foram fundamentais para a consolidação


da Igreja do Nazareno enquanto expressão nacional do Movimento de santidade: Associação
de Igrejas Pentecostais da América e a Igreja de Cristo em Santidade. A Associação de Igrejas
Pentecostais da América se formou a partir de acontecimentos na Igreja do Povo, em South
Providence, Rodhe Island, em 1887. O pastor dessa Igreja Metodista, T. J. Everett afeito à
doutrina da inteira santificação, foi sucedido por E. D. Hall, que se desentendeu com os fiéis
de sua igreja, entre eles, o responsável pela Escola Dominical, Fred A. Hillery. George E.
Perry, um pregador local, organizou em sua casa serviços de orações, em pouco tempo a
assistência aumentou ao ponto de ter que escolher outra pessoa para dirigir os trabalhos. Fred
A. Hillery foi, então, escolhido como responsável, em uma eleição realizada no ano de 1886.
Nesse ano, as reuniões foram denominadas de Associação de Santidade em South Providence.
As reuniões ocorriam todas as sextas feira quando não havia ofícios nas demais igrejas.

O pastor E. D. Hall não apoiou o trabalho da Associação e, além disso, advertiu a


Hillery quanto às atuações dele no grupo. As tragédias envolvendo a Igreja do Povo, como o
incêndio que a desvastou, provocou a debandada de membros para a Associação de Hillery,
Consequentemente, Hillery foi expulso da Igreja Metodista do Povo, mas na prática a tinha
tomado, pois os membros dessa igreja estavam agora subordinados a ele. Em pouco mais de
um ano, a Associação de Santidade de South Providence agregou-se a outras igrejas em Rock,
Pawtucket e Lynn. Em 1890, originou-se desses grupos a “Associação Central Evangélica de
Santidade com igrejas em Rodhe Island, New Hampshire e Massachussetts.” (IGREJA DO
NAZARENO/MANUAL 1997-2001, 1997, p. 16). A Associação era formada tanto por
separatistas quanto por leais às Igrejas, principalmente às metodistas.

Na cidade de Nova Iorque, o filho de um rico comerciante chamado William Howard


Hoople se converteu na Igreja Metodista Episcopal. Howard conheceu Charles Bevier,
68

maestro do coral na Igreja Metodista do Brooklyn. Fervorosos na doutrina da santidade,


Charles e Hoople iniciaram uma missão em um velho salão na Avendia Schenactady, em
1894. Com o crescimento dessa missão, passou a ser chamada de Tabernáculo da Avenida
Útica e, pouco antes do natal de 1894, ali se originou a Associação de Santidade do Estado de
Nova Iorque, tendo como presidente Charles Bevier, e vice-presidente William Howard
Hoople. Essa associação era denominacional e teve a participação e o apoio de pastores
metodistas durante todo o ano de 1895. Nesse mesmo ano, agregaram-se à Associação nova-
iorquina, a Igreja Pentecostal da Avenida Bedford e o Tabernáculo Pentecostal Emanuel. Com
essa união, a Associação de Santidade de Nova Iorque passou a ser denominada de
Associação das Igrejas Pentecostais da América. (SMITH, [195-], p. 85-89).

Segundo Smith ([195-], p. 70), os pastores metodistas O. J Copeland, Hiram F.


Reynolds e seu irmão E. E. Reynolds fundaram a Associação de Santidade em Vermont, que
passou a dar assistência nos trabalhos no Brooklyn. Copeland desligou-se da Igreja Metodista
no ano de 1895. Hiram Reynolds percebia que seus convertidos sofriam oposições por parte
dos pastores metodistas contrários ao Movimento de santidade, com isso, seguiu os passos de
seu amigo Copeland e também deixou as fileiras do metodismo. Em 12 de Dezembro de
1896, em meio a reunião envolvendo H. F. Reynolds, Hoople, Coperland entre outros, foi
estabelecida a união da Associação Central Evangélica de Santidade com a Associação das
Igrejas Pentecostais da América, mantendo-se o nome dessa última. (IGREJA DO
NAZARENO/MANUAL 2009-2013, 2009, p. 16.). Essa Associação prosperou muito durante
os seis anos seguintes, o número de congregações cresceu, vários centros urbanos foram
alcançados, programas missionário, tanto no âmbito interno quanto externo, foram
estimulados. Hiram F. Reynolds foi o principal mentor na formação da Associação
Pentecostal da América e importante personagem na extensão nacional da Igreja do Nazareno,
a partir do ano de 1907.

2.2.2 A formação da Igreja de Cristo em Santidade (ICS)

Um segundo grupo que se uniu à Igreja do Nazareno foi a Igreja de Cristo em


Santidade. Segundo Smith ([195-], p. 176), a Guerra Civil americana deixou sérias marcas no
sul do País. As dificuldades econômicas e o conflito que sofreu essa região durante o longo
período de reconstrução não foram facilmente suplantados. No ano de 1890, deu-se início os
69

movimentos de contestações de camponeses que foram repelidos pelos grandes fazendeiros e


caciques políticos criando uma atmosfera de contestação e desigualdades de cunho
econômicos e raciais. O grande desenvolvimento do norte não foi reproduzido no sul do país.
Qualquer que fosse o lugar, no sul do país, sempre se buscava as igrejas tradicionais para
servir de amparo. Com isso, a ideia de santificação pela fé foi de difícil aceitação, pois o
evangelismo do sul seguia a tradição rural e antiga do pré-Guerra. O principal fator que
diferenciou o Movimento de santidade nessa região foi que a Igreja Metodista Episcopal do
sul jamais aceitou plenamente a doutrina da inteira santificação. Por isso, quando o
Movimento de santidade se expandiu por intermédio de igrejas e Associações de Santidade,
no final do século XIX, as lideranças eclesiásticas tradicionais se opuseram a eles
veementemente, principalmente, no Texas, Tennesse e Kentucky. Consequentemente, vários
pregadores perderam seus cargos sem poder continuar no serviço eclesial, a não ser que o
fizessem de forma independente. Os pastores e pregadores estavam submetidos à autoridade
eclesiástica, de modo que todo o serviço realizado em circunscrição alheia era proibido, se
não houvesse a devida autorização da autoridade eclesiástica.

Robert Lee Harris conhecido como, o evangelista vaqueiro, depois de dirigir alguns
trabalhos no continente africano voltou para os Estados Unidos e se uniu à Igreja Metodista
Episcopal do sul. Harris celebrava serviços no oeste de Tennesse, mas não era pastor oficial
de nenhuma igreja. Em Novembro de 1893, a Conferência da Igreja Metodista Episcopal do
sul declarou que os pregadores autônomos desvinculados das igrejas deveriam ser proibidos e
que não se deveria dar-lhes ajuda financeira. Dessa forma, Harris anunciou seu afastamento
da Igreja Metodista do sul e se mudou para Memphis, onde iniciou uma reunião de oração,
levantando uma tenda de campanha para avivamento durante os três meses. Harris estimulou
as mulheres a pregarem em sua ausência e combatia as seitas e denominações alegando que
ambas não tinham base escriturística. Em 1894, Harris começou uma congregação de 14
membros e deu a ela o nome de Igreja Novo Testamento de Cristo. Segundo Smith ([195-], p.
178), antes de sua morte, Harris deixou um panfleto descrevendo o governo e as doutrinas da
Igreja Novo Testamento, que entre outras regras, estipulava o direito da congregação expulsar
membros, enviar missionários e ordenar seus próprios bispos. Harris permitiu também o
batismo por efusão e a promulgação da doutrina da santidade na congregação. Porém, essa se
mostrava distante da perspectiva do Movimento de santidade que começava a se organizar. A
congregação de Harris, após sua morte se estendeu pelo oeste de Tennesse, Arkansas,
70

Alabama e Texas sob a direção das mulheres pregadoras, principalmente, Mary Lee Harris
sua esposa.

A liderança da Igreja Novo Testamento sempre se opôs ao denominacionalismo, no


entanto, as questões de como sustentar a congregação e os pastores fizeram com que o
denominacionalismo entrasse na pauta das discussões. A forma conciliar que se estabeleceu
nessa Igreja discutiu, ao longo dos anos, essa questão até que, em 1903 e 1904, William E.
Fischer, um dos líderes, estabeleceu a união com a Igreja Independente da Santidade adotando
um caráter denominacionalista. Esse fato não impediu que a Igreja de Harris promovesse
grandes encontros campais de avivamentos que, não raro, atraía inclusive pregadores e
membros da Igreja Metodista Episcopal do sul, cujos púlpitos serviram como, testemunha das
muitas mensagens de santificação. Contra tal fato, originaram-se campanhas que expulsaram
não poucos pregadores e membros de seus quadros. Desses, alguns se encaixaram no rol de
membros e pregadores da Igreja Metodista Episcopal do norte que, se aproveitando da
ocasião, arregimentou outros, vindos das reuniões e avivamentos campestres.

Conforme Smith ([195-], p. 197), no ano de 1894, o pastor E. C. Dejernett da Igreja


Metodista do sul, em Commerce, Texas, pediu autorização para realizar uma obra
evangelística. Em Greenville, Dejernett realizou celebrações campestres que originaram-se na
comunidade Peniel, essa comunidade foi a base para o surgimento da Associação de
Santidade do Texas. Dejernett foi expulso da Igreja Metodista Episcopal do sul por haver
pregado na Igreja Metodista do norte, em Atlanta, sob o protesto do pastor da congregação
local do sul. Dejernett, ao perceber o crescimento da Associação de Santidade do Texas,
convocou, juntamente com Charles Brougher Jerningan, uma convenção e reuniões de
santidade, alegando o propósito de estabelecer um lugar para o povo de santidade no sul.
Jerningan contribui para o aparecimento de uma igreja de santidade em Van Alstyne, Texas,
que se uniu com a Igreja Apostólica de Santidade e deu origem à Igreja Independente de
Santidade, em 1901, que já havia se unido à Igreja do Novo Testamento, fundada por Harris.

A Igreja Independente de Santidade não tinha ainda uma estrutura organizacional


permanente e, durante algum tempo, não foi capaz de prover essa estrutura. Jerningan viu, na
união com a Igreja do Novo Testamento, a oportunidade de se estabelecer um lugar
denominacional que acolhesse todo o povo de santidade do sul. A reunião anual da
Associação de Santidade do Texas, em 1903, possibilitou o encontro entre Jernigan e William
E. Fischer, líder da Igreja do Novo Testamento, no oeste do Texas. Segundo Smith ([195-], p.
71

197) “encontraram tão pouca diferença entre os dois movimentos que acordaram consumar
uma união”. Em 1904, Fischer e Jerningan aprovaram a recomendação de união que ocorreria
no mês de novembro, em Rising Star, dando origem à Igreja de Cristo em Santidade.

2.2.3 A união da Igreja do Nazareno com a AIPA e a ICS

Como esboçamos anteriormente, a Igreja do Nazareno se uniu à Associação das


Igrejas Pentecostais da América e à Igreja de Cristo em Santidade para se consolidar como a
maior representante do Movimento de santidade nos Estados Unidos no início do século XX.
Esse processo de unificação ocorreu devido ao crescente número dos grupos de santidade que
produziu uma série de variadas alterações nas estruturas eclesiásticas e eclesiais tradicionais,
de forma que se torna difícil atribuir a eles um conjunto uniforme e unívoco de suas
características. Essa pluralidade foi ressaltada por muitos líderes do Movimento de santidade
que viam a separação dos grupos por vários aspectos: geográficos, eclesiásticos, doutrinários,
entre outros. Alguns desses líderes entendiam que apenas a aceitação da segunda obra da
graça e as perseguições que esses grupos sofriam eram os únicos pontos em comum entre as
matizes do Movimento de santidade. Tal consideração vinha da percepção dessas lideranças
entenderem o Movimento de santidade como uma expressão livre da vida religiosa e que sua
falta de unidade era o motivo de se alcançar todas as igrejas. No entanto, a unificação se fez
necessária em decorrência dos vários prejuízos que as convicções dos adeptos da santidade
submetiam pastores, membros e instituições frente à reação das igrejas tradicionais.

As uniões que se estabeleciam em algumas partes serviram para que se acreditasse na


possibilidade de uma união nacional dos grupos de santidade. Porém, a maioria das alianças
houve em decorrência dos líderes de santidade desejarem a permanência de suas membresias
em suas igrejas de origem. As congregações independentes e as denominações que criaram
surgiram, de fato, da não aceitação de suas propostas frente às lideranças tradicionais
estabelecidas, foi uma forma de unificar propostas para fazer frente às desavenças com as
denominações tradicionais. Isso demonstra que o Movimento de santidade não nasceu de uma
mera atitude independentista, mas de uma visão teológica que buscava aprimorar as ações das
denominações tradicionais, sobretudo, frente às questões sociais, que se recrudesceram com a
Guerra Civil.
72

A necessidade de maior alcance do trabalho social dos grupos de santidade, bem como
sua afirmação no cenário religioso estadunidense, foram os principais motivos que levaram a
Igreja do Nazareno a se aliar à Associação das Igrejas Pentecostais da América. O contato
inicial entre a Associação Pentecostal e a Igreja do Nazareno se deu através de George Morse,
responsável por algumas reuniões campestres no leste. Em 1896, Morse visitou Los Angeles e
contribuiu com 100 dólares para a construção do tabernáculo da Igreja do Nazareno,
despertando a atenção de Bresee para os trabalhos de santidade no outro extremo dos Estados
Unidos. J. W. Goodwing, pregador de Nova Inglaterra, se mudou para o oeste dos Estados
Unidos e publicou em um periódico um artigo sobre as similaridades entre a Igreja do
Nazareno e Associação das Igrejas Pentecostais. Em 1906, o conselho da Associação dessas
Igrejas decidiu convidar Phineas Bresee para a reunião anual no mês de Abril. Bresee não
compareceu, mas enviou uma carta que abriu o caminho para encontros futuros. (SMITH.
[195-], p. 199).

Christian Wismer Ruth, um evangelista de santidade, se uniu à Igreja do Nazareno, em


1901. Por meio de seu trabalho evangelístico teve contato com os líderes da Associação
Pentecostal no leste. Phineas Bresee nomeou Ruth como Superintendente geral assistente e o
autorizou a negociar diretamente com os líderes da Associação. Ruth visitou Nova Inglaterra,
em 1906, para realizar uma reunião de avivamento na Igreja de John Wesley, em Nova
Iorque, onde havia de se reunir o Comitê Missionário da Associação Pentecostal. No dia 27 de
Junho, Ruth se reuniu com lideranças da Associação e os convidou a visitar a Igreja do
Nazareno, em Los Angeles. Segundo Redford (1995, p. 44), os reverendos John M. Short, H.
M. Brown e A. B. Riggs, da Associação Pentecostal, foram convidados a participarem da 11ª
Assembleia anual da Igreja do Nazareno, como delegados irmãos.

Ruth relatou esses fatos e os pontos comuns que havia entre as duas instituições à
Phineas Bresee. Essas notícias alegraram Bresee que afirmou que se caso houvesse a
concretização da união, haveria de estabelecer “um lugar central que unisse todas as
organizações que buscam o mesmo fim” (NAZARENE MESSENGER, 1906, p. 67. Tradução
livre.). Esses delegados foram pastores metodistas como Bresee e ambos já tinham
experiência na organização de igrejas. Na Assembleia da Igreja do Nazareno, os três reis
magos, como Phineas os chamou, ficaram impressionados com a devoção, doutrina e prática
na Igreja do Nazareno. Tal foi o efeito, que juntos resolveram traçar os planos de união das
instituições. Bresee, Ruth e W.C. Wilson foram os representantes nazarenos no comitê para
73

formar as bases da união. As questões em relação às propriedades de cada instituição e as


questões de governo foram os principais pontos de desavença.

Ambas as instituições tinham uma Superintendência limitada, mas na Igreja do


Nazareno o poder laico estava disseminado na estrutura de poder, de modo que a autoridade
do Superintendente era mais de cunho pessoal que institucional. O Manual da Igreja do
Nazareno de 1898 (IGREJA DO NAZARENO/MANUAL 1898, 1995, p. 15-17) definia que
os grupos locais haveriam de ordenar seus próprios ministros e o Superintendente geral
somente daria seu voto de aprovação, sem muito poder de sanção. Como exigência para a
união, a Assembleia de 1903 restringiu a atuação leiga na escolha dos pastores. Ficou
decidido, também, que os Superintendentes de distrito se sujeitariam a uma Junta consultiva
composta de pastores e leigos, a qual seria eleita pela Assembleia geral.

Desfeitos os pontos divergentes, as instituições acordaram quanto à doutrina, à


Superintendência geral, membresia e administração das propriedades. Porém, faltava
considerar a soberania das congregações sobre a Associação Pentecostal, uma vez que Bresee
planejava criar uma igreja nacional e não mais uma associação delas. Os representantes das
duas instituições decidiram que cada congregação, já pertencente à Associação, poderia
manter sua soberania quanto à escolha de seus pastores e manejo deles, mas aquelas que se
agregassem depois seriam submetidas ao governo que se estabeleceria da união das
instituições. Em Outubro de 1907, os representantes da Igreja do Nazareno e da Associação
das Igrejas Pentecostais da América reuniram-se em Assembleia geral e estabeleceram o
documento que consolidava a união. Essa união passou a ser denominada de Igreja
Pentecostal do Nazareno. Hiram F. Reynolds e Phineas Franklin Bresee foram eleitos seus
primeiros Superintendentes gerais. A consolidação da Igreja Pentecostal do Nazareno
principiava a unir os grupos de santidade do norte, leste e oeste dos Estados Unidos, restava
agora unir-se aos grupos do sul. (SMITH, [195-], p.247-251).

Nesses mesmos anos de diálogo, para a fundação da Igreja Pentecostal do Nazareno,


seus representantes convidaram Jerningan e outros líderes, fundadores da Igreja de Cristo em
Santidade, para participarem de suas reuniões. As delegações do sul haviam participado da
elaboração doutrinária e de governo da Igreja Pentecostal do Nazareno. Jernigan relatou que
todos os requisitos que os delegados do sul pretendiam foram-lhes outorgados. (SMITH.
[195-], p. 249.). Esse fato estimulou Jerningan e seus companheiros a abandonarem o
congregacionalismo da Igreja de Cristo em Santidade para se unirem às outras duas igrejas.
74

Um comitê se reuniu, em Dallas, para se comparar os manuais e regras gerais, da Igreja


Pentecostal do Nazareno e da Igreja de Cristo em Santidade, a fim de aceitarem a provável
união. A comissão da Igreja de Cristo pediu que alguns artigos fossem alterados,
principalmente, aqueles relativos ao uso do tabaco, temperança e regras disciplinares, a fim de
torna-los mais rigorosos. Nesse ínterim, os líderes da Igreja de Cristo em Santidade preferiram
aguardar os resultados. Dessa forma, no ano da união da Associação Pentecostal com a Igreja
do Nazareno, a Igreja de Cristo em Santidade preferiu se limitar a ter uma atuação mais
discreta. A reunião que decidiria a união dessas Igrejas foi marcada para Pilot Point, Texas,
no ano de 1908.

Esse intervalo permitiu que Phineas Bresee se reunisse com o reitor da Universidade
do Texas, Edgar P. Ellyson, ministro dos Quaqueres, vinculado ao Movimento de santidade.
Ele convidou C.W Ruth para o acampamento de avivamento, em janeiro de 1908, no Texas,
convidou, também, Bresee para pregar alguns dias na Universidade do Texas. Bresee pregou
na Capela do Colégio Peniel, anexa àquela Universidade. Em sua pregação, Bresee chamou
todos os ouvintes para se unirem à Igreja Pentecostal do Nazareno, no Texas. Muitos
ouvintes, inclusive Ellyson e sua esposa, chegaram ao altar. A partir daí, mediante a formação
de uma Junta consultiva, Ellyson se tornou Superintendente e sua esposa pastora da Igreja
Pentecostal do Nazareno.

Segundo Smith ([195-], p. 254), no mês de outubro de 1908, realizou-se a reunião


entre as lideranças da Igreja Pentecostal do Nazareno e da Igreja de Cristo em Santidade em
uma grande tenda em Pilot Point. Os pontos colocados por Charles Jerningan foram
discutidos pelas lideranças presentes. Em meio a grandes debates, muitos haviam perdido a
esperança da união. Bresee estimulava a união uma vez que “havia captado a visão de uma
denominação nacional de santidade que havia de ligar uma linha completa de igrejas e
missões em cada cidade da nação” (SMITH. [195-], p. 254). Na manhã do dia 13 de Outubro
de 1908, a Igreja de Cristo em Santidade se uniu à Igreja Pentecostal do Nazareno. Dessa
forma, a nova instituição, que resguardara o antigo nome de Igreja Pentecostal do Nazareno, o
qual, em 1919, passou a ser Igreja do Nazareno, tornou-se a maior representante do
Movimento de santidade nos Estados Unidos, com representantes do norte e sul, leste e oeste
daquele país. (SMITH, [195-], p. 256-257).

A Assembleia de Pilot Point se tonou um importante marco das novas tendências das
associações e igrejas independentes de santidade que passaram a se organizar em uma
75

perspectiva institucional independente. Pilot Point passou a ser um marco simbólico como
ruptura dos obstáculos que se erigiram no decorrer da Guerra de Secessão, por meio da
valorização de camponeses e citadinos, contra as formas de escravidão, na valorização da
mulher, e contra todas as formas de isolacionismo entre o norte e o sul. Ao mesmo tempo, a
formação de uma Igreja, com base nacional, possibilitou ao Movimento de santidade
considerar suas diferenças e se posicionar frente às contradições internas e externas, sem se
excluir os grupos divergentes, permitindo o alcance das diversas manifestações eclesiásticas e
teológicas no território estadunidense.

Outro aspecto que ressaltamos é que as decisões de Pilot Point não se limitaram aos
Estados Unidos. As consequências da formação da Igreja Pentecostal do Nazareno se
estenderam ao exterior, sobretudo, na consolidação de projetos missionários anteriormente
traçados e na agregação de várias igrejas e movimentos na Europa, Asia, África e América. A
Igreja do Nazareno, a partir de sua estrutura organizacional única, possibilitou a consolidação
e expansão do Movimento de santidade em áreas antes inimagináveis.

A movimentação de grupos e movimentos que resultaram no surgimento da atual


fisionomia da Igreja do Nazareno pode ser observada, de uma forma didática, no quadro da
página seguinte, conforme extraído do arquivo dessa Igreja.
76

QUADRO 3: Origens e fusões institucionais na formação da Igreja do


Nazareno

Fonte: Igreja do Nazareno-Nazarene Archives. 2010.


77

2.2.4 A consolidação da Igreja do Nazareno: uma interpretação weberiana

O processo de consolidação da Igreja do Nazareno, que possibilitou sua expansão,


caracterizou-se, sociologicamente, por aquilo que Max Weber (1922) denominou de
transposição de poderes, ou seja, a passagem do poder tradicional e afetivo para aquele de
cunho mais institucionalizado: o poder legal. Weber (2004), em seus estudos da sociedade,
aponta três tipos fundamentais das ações humanas: a ação tradicional subordinada aos
costumes e hábitos; a ação afetiva que é guiada pelas paixões e emoções e a ação racional
caracterizada pela instrumentalidade e voltada para um fim utilitário, implicando adequação
entre os fins e os meios. Weber (2004) afirma que as relações humanas em grande parte são
relações de dominação. Para ele, mesmo onde a dominação é pouco notada como, por
exemplo, na manutenção de um idioma como oficial, ou na forma estereotipada de se
comunicar, a expressão de domínio exerce sua influência. A dominação, para Weber (2004, p.
187), é um caso especial de poder. Este é definido como “a possibilidade de impor ao
comportamento de terceiros a vontade própria” essa possibilidade pode ser expressa das
formas mais diversas.

Weber relaciona as condições das ações humanas tradicional, afetiva e racional com as
formas de dominação, surgindo as legitimidades para o exercício do poder. Dessa forma,
fundamentam-se a dominação tradicional, a dominação carismática e a dominação legal. A
dominação tradicional se legitima sobre o caráter sagrado da tradição, na qual os indivíduos
mais idosos, ou aqueles guardiões da tradição desempenham um papel social crucial. O
sentido patriarcal se impõe para satisfação das necessidades cotidianas e recorrentes, pelos
meios normais e habituais. Para Weber (1922, p. 4), “obedece-se à pessoa por força da sua
dignidade própria, santificada pela tradição”.

Na dominação carismática, o poder concentra-se naquele que é dotado de qualidades


excepcionais, portadores de dons físicos e espirituais não comuns, ou não acessíveis a todos.
Conforme Michel Lallement (2008, p. 274), “a obediência a esses chefes depende de fatores
emocionais que eles são capazes de suscitar, manter e dominar”. Portanto, há uma relação
fundamentada no aspecto afeito para a admiração do mandante e de seus dons. Há uma
“sujeição emocional que é a fonte da rendição pessoal” (Weber, 1922, p.9).

Weber aponta que a dominação carismática busca a satisfação das necessidades que
transcendem as exigências da vida comum. Nas situações de dificuldades de ordem subjetivas
78

como angústia, temor, medo e desvios psicológicos e nas de ordem objetiva como mudanças
políticas, econômicas, religiosas e sociais, o líder carismático surge ou é referendado como
solução dos problemas, que de maneira alguma poderiam ser solucionados por pessoas
comuns, por ser o carisma algo pessoal e, apenas eventualmente em casos especiais, pode ser
transmitido. Por isso, toda estrutura organizacional, administrativa e burocrática é relegada
pela ação carismática.

Na perspectiva carismática, os profissionais especializados, funcionários públicos, e


agentes de uma instituição são ineficazes para suprir a demanda daqueles que buscam os
serviços do líder carismático. Dessa forma, o arcabouço do poder carismático se forma em
oposição a toda espécie de organização administrativa. O sentido da relação que se estabelece
é o do mestre para o discípulo, não se vislumbram carreiras, promoções, salários, nomeações,
nem qualquer outra forma de coação institucional, ou instância controladora a não ser o
próprio carisma. Para Weber, (2004, p. 324) “O portador do carisma assume as tarefas que
considera adequadas e exige obediência e adesão em virtude de sua missão.” O
reconhecimento daqueles a quem dirige é essencial para o sucesso de sua missão.

A última dominação a que Weber faz referência é a dominação burocrático-legal. Ela


se fundamenta no direito e na impessoalidade, por isso é caracterizada, por Weber, como o
poder puro. A ideia que se transmite da dominação legal é que por meio de uma estrutura
burocrática, pode-se criar ou alterar o direito. As relações de poder são impostas pela
autoridade legal, formando-se um corpo de subordinados, os quais são escolhidos, nomeados
ou convocados por um regime estatutário, portanto não se obedece a pessoa em virtude de
uma tradição sagrada ou em virtude do carisma, mas pela regra estabelecida, advinda do
estatuto. Nesse caso “quem ordena obedece também, ao promulgar uma ordem, uma regra, a
lei ou o regulamento”. (WEBER, 1922, p. 2). A superioridade do mandatário está na
impessoalidade do direito, na regra geral aceita por todos, ou por aqueles que, desobedientes,
incorrem em sanções. A especialização, desempenho, competência e hierarquia são termos
que definem os mandatários e subordinados na dominação burocrático-legal.

Esses aspectos da dominação podem ser percebidos na evolução da Igreja do Nazareno


desde 1895 à união em 1908, quando se tornou uma instituição de âmbito nacional. Em
princípio, observamos uma dissensão nas denominações, principalmente, no âmbito das
Igrejas Metodistas, o Movimento de santidade tornou-se uma resposta à languidez e
descomprometimento das denominações em meio às turbulências de diversas ordens do pré e
79

pós Guerra de Secessão e das necessidades sociais. A segunda obra da graça foi mais um
imperativo divino para mudar essas circunstâncias, também vivenciadas na Inglaterra no
tempo de João Wesley. Nesse ponto, pode-se perceber a necessidade do surgimento do líder
carismático que visualiza a inoperância das igrejas e a necessidade dos pobres e
marginalizados, chamando-os para a comunhão dos santos sem quaisquer discriminações.

No caso da Igreja do Nazareno, Phineas Bresee foi esse líder que, com seu discurso
carismático de além justificação, possibilitou aos marginalizados uma segunda chance. Ele
permitiu a visualização de uma esperança tanto para pobres, negros, viúvas e órfãos que não
se encontrava, até então, em grande parte das igrejas tradicionais da época. Bresee não
efetuou uma crítica ao metodismo estadunidense, mas sua adesão ao Movimento de santidade
e ao trabalho social independente na Missão mostrou uma resistência à prática eclesiástica
existente. As ações de Bresee para os desvalidos fizeram-no reconhecido como líder. Em
poucos dias, o salão nazareno achava-se cheio de pessoas. Para muitos, Bresee se transformou
na esperança de uma massa, interpretando os anseios e questionamentos que dela provinham e
os respondendo por meio de suas prédicas. Esta condição carismática parecia ser reforçada
pelo próprio Bresee em suas pregações: “o que devo fazer? Esta pergunta feita em Jerusalém,
a cidade de David, a casa dos profetas, o lugar do templo de Deus. Foi perguntada à sombra
de um eclesiasticismo antigo e contínuo. No escuro onde estava a sombra, tinha uma fresta de
esperança da revelação divina” (BRESEE, 1993, p.14, grifo nosso, tradução livre.). Com
isso, Bresee se auto qualificava como um líder carismático.

A passagem daquele que pode ser denominado de período de dominação carismática


para o de dominação burocrática na Igreja do Nazareno se consolidou com os primeiros anos
da Superintendência geral. Os esforços de Bresee foram essenciais para a união das Igrejas,
mas foram os empenhos de Hiram F. Reynolds que consolidaram estruturalmente a Igreja,
principalmente, em decorrência da debilidade física que Bresee apresentava. O vigor de
Reynolds possibilitou intensas viagens dentro e fora do território estadunidense. A
Superintendência que se estabeleceu nos anos anteriores com Bresee e Reynolds, havia sido
acrescida da presença de Ellysson, por poucos anos, visto que renunciara em 1911 para
assumir a direção da Universidade Nazarena de Pasadena.

A Superintendência geral não exercia de fato um governo sólido na instituição, uma


vez que muitas questões surgiam no processo de unificação da Igreja, pois havia ainda a
dúvida quanto à melhor forma de governo na Igreja, se congregacional ou episcopal. Por sua
80

vez, a Superintendência exercia mais o cargo de supervisão do que de controle. Na


Assembleia de Nashville, em 1911, Bresee, Reynolds e E. F. Walker foram eleitos
Superintendentes gerais. Durante os quatro anos seguintes, Reynolds assumiu quase que
sozinho a liderança da Igreja, ainda sob a desconfiança de alguns líderes das Assembleias
distritais. Na Assembleia de 1915, em Kansas City, Bresee, já muito debilitado, proferiu o
discurso de abertura. Segundo Smith ([195-], p. 287), ele não defendeu uma Superintendência
geral com autoridade legalista, pois reconhecia que a liderança em uma comunidade cristã
descansava na habilidade para persuadir aos homens e às mulheres ao cumprimento de suas
tarefas, com espírito fraterno e não na imposição da lei. A preocupação que Bresee
demonstrava era que a união quanto a organização não implicasse necessariamente em
unidade.

A Assembleia de 1915 decidiu aumentar o número de Superintendentes gerais para


quatro e que cada um residisse em distintas regiões do país, além de que, um deles seria
responsável pelas ações da Igreja no exterior. Essa Assembleia reelegeu Bresee, Reynolds e
Walker e elegeu E.Ellyson, que por não aceitar sua eleição foi substituído por W.C.Wilson, o
Superintendente do distrito do sul da Califórnia. Bresee faleceu no dia 13 de Novembro de
1915, cinco dias após essa Assembleia e Wilson faleceu cinco semanas depois. Os demais
Superintendentes nomearam a John W. Goodwin e o evangelista R.T. Willians como
substitutos. Nos dez anos seguintes, a Superintendência geral consolidou seu governo sobre a
Igreja. Os poderes, funções, funcionários e hierarquias se espalharam na instituição colocando
limites à dominação carismática. Nesse aspecto cabe ressaltarmos que não entendemos a
imposição de limites à dominação carismática como significando sua extinção, mas sim, o
estabelecimento da supremacia da crença na legalidade ao invés da personalidade. Em outras
palavras, há uma rotinização do carisma que o transfere de um indivíduo e passa a repousar
numa função.

Conforme Thomaz F. O‟Dea (1969, p. 56), as organizações religiosas que surgiram de


religiões fundadas trazem uma característica peculiar em que evidenciamos a figura
carismática. Essa figura funda um movimento religioso, mas com sua morte ou
desaparecimento cria-se uma crise de continuidade. A manutenção do carisma exige sua
paradoxal mudança, ou seja, para manter o carisma, após a morte do líder, o grupo de
seguidores faz a adaptação desse carisma às novas condições vividas pelo grupo. Para O‟Dea
(1969), o carisma puro somente existe no processo de origem. As motivações para essas
81

mudanças, segundo O‟Dea (1969), provêm dos interesses dos seguidores em continuar a
comunidade formada pelo fundador, principalmente, o conteúdo da experiência religiosa.
Contudo, quando dissemos que o processo burocrático da instituição não extingue o carisma,
queremos dizer que, no caso da Igreja do Nazareno, a figura do pastor é respeitada por
intermédio do poder carismático que possui, que veio de Cristo, passou pelos Apóstolos,
chegou em Bresee e repousa nos atuais pastores nazarenos. O carisma dos pastores nazarenos
está imbricado na burocracia eclesiástica.

Com isso, procuramos evidenciar que os tipos de dominação apontados por Weber são
formas puras, ou seja, atendem aos tipos-ideais.17 As variações dos tipos de dominação
apresentadas ressaltam que a Igreja do Nazareno, após a consolidação da Superintendência
geral e a morte de Bresee, tornou-se institucionalizada em suas decisões. O padrão burocrático
prevalece, desde então, frente ao tradicional e o carismático, no entanto, esse último ainda
está patente nas relações internas da Igreja, como, por exemplo, na relação entre o leigo e o
pastor. Pelos tipos ideais de dominação, a Igreja do Nazareno assume uma estrutura dialética
de relações de poder. Isto é, a relação entre os oficiais da Igreja se dá em um patamar
burocrático-legal, mas a relação entre pastores e leigos se dá no patamar carismático. O
carisma rotinizou-se na instituição, mas aparece de forma um tanto quanto livre na figura do
pastor nazareno. Pela observação, entendemos que a obediência da membresia ao pastor
repousa no carisma pastoral e não no cargo pastoral. Portanto, a estrutura organizacional
assume essas duas características manifestas nos manuais da Igreja. Tal aspecto será analisado
mais detidamente no capítulo terceiro, por hora, cumpre apresentar a estrutura atual da Igreja
do Nazareno.

2.3 A Estrutura de poder na Igreja do Nazareno

A estrutura de governo da Igreja do Nazareno é conhecida e autorizadamente


divulgada pelas reedições dos manuais da Igreja que se renovam a cada reunião da
Assembleia geral ocorridas, quadrienalmente. Esse documento traz a constituição, a regra de
fé, governo, ministérios e serviço cristão, administração judicial, limites de jurisdição, rituais

17
Segundo Weber, os tipos ideais tem o caráter de utopia que se obtém acentuando pelo pensamento
determinados elementos da realidade. (WEBER, 1965, p. 179). Dessa forma, esses tipos ideais são conceituações
puras que servem de parâmetro para as abordagens, mas não tem constatação empírica.
82

e constituições auxiliares da Igreja do Nazareno. O atual Manual -2009-2013- (IGREJA DO


NAZARENO/MANUAL 2009-2013, 2009.) promulga que a Igreja do Nazareno existe em
três níveis: universal, distrital e local. Na perspectiva de igreja universal, não se entende a
Igreja do Nazareno como uma igreja internacional, presente em todos os continentes do
mundo, mas se refere ao aspecto místico de ser parte da congregação de todos os cristãos na
face da terra. Para facilitar a abordagem, analisamos os níveis hierárquicos e o fluxo do poder,
a partir das esferas locais, a fim de estendê-los ao nível do governo geral.

As Igrejas nazarenas, em toda a parte, obedecem às normas estabelecidas pelo


Manual. Isso significa que em termos hierárquicos e burocráticos, todas têm o mesmo
comportamento. No âmbito local, a autoridade superior é dada pela Junta composta pelo(a)
pastor(a), e os presidentes dos departamentos de Ministério da Escola Dominical e
Discipulado Internacional (MEDI), Missões Nazarenas Internacionais (MNI), Juventude
Nazarena Internacional (JNI) e dos ofícios de Mordomos e Ecônomos. O número de membros
regulares da Junta não pode exceder 25. Os membros dos departamentos são eleitos no início
do ano eclesiástico, que se inicia imediatamente após as Assembleias distritais. Aqueles
ministros ordenados e licenciados, exceto o pastor oficial, que são remunerados pela igreja
local, não podem exercer cargos na Junta. O Manual -2009-2013- (IGREJA DO
NAZARENO/MANUAL 2009-2013, 2009.) não esclarece tal motivo, mas pode-se presumir
que seja para efeito de se evitar o proveito próprio na direção da Igreja.

Entre as diversas regras na constituição da Junta, o Manual -2009-2013- (IGREJA DO


NAZARENO/MANUAL 2009-2013, 2009, p. 73) estipula que somente deverão ser
participantes dela, aqueles que são membros ativos, que professam a experiência da inteira
santificação, que apoiem fielmente a igreja local com assistência regular, com os dízimos,
ofertas e que estejam em harmonia com as doutrinas, regulamentos e práticas da Igreja do
Nazareno. Por uma observação participante, notamos que essas diretrizes são pouco válidas
na prática eclesial nazarena das últimas décadas, uma vez que muitos se tornam membros da
Igreja e por anos não conhecem a doutrina da inteira santificação e nem tão pouco as normas
do Manual, sem levar em conta, que as novas mudanças quadrienais, apesar de não serem tão
substanciais, desestimulam o aprendizado das normas e regras gerais da Igreja.

O Manual da Igreja (IGREJA DO NAZARENO/MANUAL DA IGREJA 2009-2013,


2009.) estabelece que a Junta local é a principal responsável pelas ações administrativas e
normativas nas denominações nazarenas locais. De fato, as igrejas locais estão submetidas às
83

Juntas, no entanto, a figura do pastor ganha destaque sobre qualquer outro componente dessa
Junta. Conforme observamos nos artigos do Manual -2009-2013- (IGREJA DO
NAZARENO/MANUAL DA IGREJA 2009-2013, 2009.), relativos às Juntas, na maioria
deles, os termos como pastor, ministros, autoridade se destacam em suas propostas, sem
contar, que os pastores são, por determinação deste Manual, presidentes das Juntas locais.
Esse aspecto ressalta a proeminência do pastor nazareno sobre o leigo. De qualquer forma, a
participação de leigos nas decisões da Igreja do Nazareno é um aspecto importante na forma
como se busca estabelecer um governo que não seja episcopal nem congregacional. Em
termos de Igreja local, o organograma de poder pode ser entendido da seguinte forma:

QUADRO 4: Organograma de composição do poder local

Na configuração do quadro 4, a figura do pastor destaca-se em relação aos demais


presidentes dos departamentos, isso de fato ocorre na prática cotidiana da Igreja, pela qual
importante parcela das membresia o vê distinto dos demais. Esse fato concorre para a
perspectiva weberiana do carisma, entretanto não vemos explicação para seu destaque nos
estatutos da Igreja a não ser em termos de valorização institucional. Essa mesma
representação de governo que se estabelece no âmbito local, também se apresenta no âmbito
distrital. O distrito é a instância superior às igrejas locais, ele é formado pela totalidade das
igrejas locais de determinada região. Segundo informa o Manual -2009-2013- (IGREJA DO
NAZARENO/MANUAL 2009-2013, 2009, p. 100), “a Assembleia geral organizará em
distritos os membros da igreja. Um distrito é uma entidade formada por igrejas locais
organizadas e interdependentes, para facilitar a missão de cada igreja local através do apoio
84

mútuo, colaboração e partilha de recursos”. Um distrito pode ser dividido, ou se agregar a


outro para formação de um terceiro, conforme decisão da Assembleia geral, referendado pelos
Superintendentes gerais.

Anualmente, ocorre a Assembleia distrital, que é a instância máxima legislativa e


normativa do distrito. Ela é composta pelos presidentes dos departamentos locais, pelos
presidentes dos departamentos distritais, também denominados de MNI, JNI, MEDI
acrescidos do adjetivo distrital. Além desses participantes, há a escolha nas igrejas locais
daqueles que servirão como eleitores, mais comumente chamados de delegados. Conforme o
número de membros em determinada igreja local, define-se o número de delegados. O
Manual -2009-2013- (IGREJA DO NAZARENO/MANUAL 2009-2013, 2009, p. 95) define
dois delegados leigos, para até 50 membros, acrescidos de mais um, em cada 50 membros,
para os distritos com menos de cinco mil membros. Os distritos com mais de cinco mil
membros têm um delegado para cada 50 membros, acrescidos de mais um, em cada grupo de
50 membros. Todos os pastores são membros da Assembleia distrital.

O processo de votação é feito de forma secreta na definição dos cargos e, por vezes,
por aclamação na decisão para se estender o período de vigência do mandato do
Superintendente distrital. Na Assembleia distrital, a escolha do Superintendente e da Junta
Consultiva distrital são as decisões mais importantes. A Assembleia distrital define a
Superintendência distrital, que é o órgão normativo máximo no âmbito do distrito, com
atribuições diversas. A formação da Junta se dá pela eleição de três pastores ordenados e três
membros leigos, o Superintendente distrital é diretamente incluso como membro da Junta,
sem passar pelo processo eletivo de composição dessa Junta.

Entre os membros leigos, são eleitos os participantes da convenção da MNI, MEDI e


JNI distritais. Geralmente, esses membros leigos são os próprios presidentes desses
departamentos distritais. O período de vigência nos cargos é de um ano, exceto para o
Superintendente distrital que poderá ser estendido. A Superintendência distrital, por ser o
órgão máximo decisório no âmbito distrital, transige em todos os níveis das igrejas locais e
em todos os seus departamentos. A Junta distrital é um órgão auxiliar de consulta da
Superintendência, diferentemente da Junta de nível local que é normativa. O organograma de
poder distrital pode ser assim desenhado.
85

QUADRO 5: Organograma de composição do poder distrital.

O maior grau de poder na Igreja do Nazareno corresponde ao nível geral. Essa


estrutura de governo é formada pela Assembleia geral e pela Junta de Superintendentes gerais.
Conforme o Manual -2009-2013- (IGREJA DO NAZARENO/MANUAL 2009-2013, 2009,
p. 121), O órgão detentor da autoridade máxima na Igreja é a Assembleia geral, ela define a
doutrina, legislação e eleições. É presidida pelos Superintendentes gerais e, a cada quatro
anos, se reúne para deliberação. Os componentes dessa Assembleia são os Superintendentes
gerais, os Superintendentes distritais, pastores e leigos de cada distrito, conforme a fase 18 em
que se encontra o desenvolvimento distrital. A participação do Superintendente distrital é
obrigatória, os demais são representantes eleitos no âmbito distrital para servirem como
delegados. É facultada a participação de ex-Superintendentes, reitores de faculdades, diretores
de casas publicadoras e membros eméritos, entre outros, que podem estar presentes com

18
Há distritos de fase1, 2 e 3, são classificados, principalmente, pelo número de membros e por sua
infraestrutura. Segundo o Manual 2009-2013 “Um distrito, de fase 3 pode ser declarado quando existir um
número suficiente de igrejas totalmente organizadas, de ministros ordenados e de membros que justifique tal
designação. Devem evidenciar-se liderança, infraestrutura, responsabilidade orçamental e integridade
doutrinária. Um distrito de fase 3 deve ser capaz de suportar estes encargos e compartilhar os desafios da Grande
Comissão (vocação dos cristãos para evangelizarem outros povos), dentro do panorama global da igreja
internacional. Tal designação será efetuada pela Junta de Superintendentes gerais sob recomendação do
Superintendente geral em jurisdição, após consulta com o diretor do Escritório de Missão Global, diretor
regional e outros indivíduos e Juntas envolvidas na nomeação do Superintendente distrital. (...) diretrizes
mensuráveis devem incluir um mínimo de 20 igrejas organizadas, 1000 membros em plena comunhão e 10
ministros ordenados. Uma Junta consultiva distrital ou uma Junta nacional pode pedir ao Superintendente geral,
em jurisdição, uma exceção a estes critérios.”. (IGREJA DO NAZARENO/MANUAL 2009-2013, 2009. p. 93.).
86

direito a voto na Assembleia geral. Conforme o Manual -2009-2013- (IGREJA DO


NAZARENO/ MANUAL 2009-2013, 2009, p. 122), para até dois mil membros, um ministro
ordenado designado e um leigo19 são indicados. Pelos seguintes 3,5 mil membros, um
ministro ordenado designado e um leigo são adicionados. Cada distrito de fase 2 terá o direito
a um delegado leigo e um delegado ministerial à Assembleia geral, nesse caso, o delegado
ministerial será o próprio Superintendente distrital. Um distrito de fase 1 terá direito a um
delegado não votante à Assembleia geral, que é o Superintendente distrital.

Dentre as várias reponsabilidades da Assembleia geral, as eleições dos


Superintendentes gerais e da Junta geral ganham proeminência. Além dessas, as mudanças
dos manuais a cada quadriênio se destacam. Essas mudanças visam adequar a organização às
contingências das igrejas nazarenas pelo mundo. Os delegados levam propostas de qualquer
natureza que serão debatidas e colocadas em votação, caso aprovadas farão parte do novo
manual. Os Superintendentes gerais são eleitos por indicação da Assembleia e em votação
secreta. Geralmente, elegem-se seis Superintendentes gerais, mas o Manual -2009-2013-
(IGREJA DO NAZARENO/MANUAL 2009-2013, 2009, p.38) estabelece que, podem ser
eleitos tantos quanto sejam necessários. Ao conjunto de Superintendentes, dá se o nome de
Junta de Superintendentes gerais. Os componentes dessa Junta somente poderão ser eleitos se
forem pastores já ordenados e tenham entre 35 e 68 anos de idade.

A Junta geral é outro órgão importante no âmbito geral. Ela é uma corporação situada
em Kansas, cujos membros são representantes das regiões mundiais, eleitos por voto secreto,
em maioria absoluta. Estipula o Manual (IGREJA DO NAZARENO/MANUAL 2009-2013,
2009, p. 132) que nenhuma região terá mais que seis membros nessa Junta, com exceção da
duplicidade decorrente dos presidentes dos departamentos MNI, JNI e MEDI que já fazem
parte da Junta geral. Além desses, são membros da Junta geral o tesoureiro e o secretário da
Igreja do Nazareno. À Junta geral compete estimular que todas as Juntas locais, distritais,
nacionais e regionais sejam guardiãs da santidade cristã segundo, a tradição wesleyana, e
auxilie no desenvolvimento das igrejas nazarenas em todo o mundo. A Junta geral é, não
obstante algumas atribuições administrativas, um importante órgão de defesa doutrinária com
grande inserção nas áreas globais, principalmente, por intermédio da educação do ensino

19
Essas especificações serão tratadas na parte que aborda o ministério pastoral, no próximo capítulo.
87

básico ao universitário, bem como pelo desenvolvimento e divulgação de periódicos


nazarenos e pela repartição de fundos para o evangelismo mundial.

Outro aspecto que ressaltamos na estrutura e fluxo de poder na Igreja do Nazareno é a


sua composição geográfica. Além dos níveis de poder local, distrital e geral, o Manual
(IGREJA DO NAZARENO/MANUAL 2009-2013, 2009.) ressalta que no desenvolvimento
da Igreja do Nazareno permite-se o surgimento de agrupamentos de vários distritos
organizados em áreas geográficas com aspectos sociais, culturais e geográficos comuns. Tais
agrupamentos são denominados de regiões ou áreas. Um conglomerado de distritos nessas
regiões pode assumir certas responsabilidades perante o governo geral da Igreja do Nazareno,
ao constituírem diretores de sub-regiões, ou diretores de área. Dessa forma, alguns distritos
subordinam-se a mais de uma esfera de poder, que outro distrito, com estrutura semelhante,
pode não estar subordinado.

O surgimento dessas áreas possibilita a centralização e gerenciamento de determinada


região e a facilidade de tomada de decisões, sobre um número de distritos inseridos em uma
mesma contingência espacial e cultural. No entanto, pelo aspecto burocrático, as demandas de
cada distrito, individualmente consideradas, podem não ser atendidas. Em termos globais, há
sete regiões mundiais da Igreja do Nazareno: a região da África, Ásia-Pacífico, Canadá e
Estados Unidos, Caribe, Eurásia, México e América Central e América do Sul. Entre os
aspectos já apontados, o Manual 2009-2013- (IGREJA DO NAZARENO/MANUAL 2009-
2013, 2009, p.56) acrescenta que o estabelecimento das regiões visa à implementação de
ações da Igreja em áreas pioneiras e, por meio dos distritos e instituições, desenvolver uma
consciência regional, permitindo reuniões periódicas para se traçar planos e fomentar a
convivência das membresias regionais. O fluxo do poder entre os níveis local, distrital e geral,
que observamos na Igreja do Nazareno, pode ser representado da forma como se segue.
88

QUADRO 6: Fluxograma de poder entre os níveis de governo da Igreja do Nazareno.

Assembleia geral

Junta de Superintendentes gerais

Assembleia distrital

Superintendente distrital

Igreja local

Os dois sentidos mostrados entre as Assembleias (geral e distrital) e os respectivos


Superintendentes decorrem das Assembleias não se realizarem sem o aval dos
Superintendentes. Por isso, mesmo que o Manual da Igreja (IGREJA DO
NAZARENO/MANUAL 2009-2013, 2009.) apresente a Assembleia geral como autoridade
máxima na instituição eclesial, quanto às expressões doutrinárias, legislação e eleições, ela se
personifica na figura dos pastores Superintendentes. Dessa forma, os pastores compõem as
principais lideranças em todos os níveis de governo da Igreja do Nazareno. Não obstante, a
direção da Igreja do Nazareno tenta estabelecer uma dimensão mediana entre o governo
episcopal e congregacional. Assim, se estabelece uma distinção entre a forma de governo
nazarena e as demais denominações, justamente por se entender que o poder governamental é
estabelecido pela mescla entre a prática episcopal e congregacional. (IGREJA DO
NAZARENO/MANUAL 2009-2013, 2009, p. 5). De forma resumida, temos que, no governo
89

episcopal, a autoridade suprema de estabelecer o poder está depositada no corpo clerical. Já


no governo congregacional, o poder é estabelecido a partir do corpo de membros. Na Igreja
do Nazareno, destacamos que, de direito, leigos e pastores gozam da mesma autoridade nos
corpos deliberativos e legislativos da Igreja, porém, de fato, os leigos são submetidos a uma
hierarquia de poder sacralizada pela interpretação das Escrituras pelos próprios pastores.

Mediante esse sistema de governo, os departamentos da Igreja estão voltados para o


serviço eclesial e não cumprem, necessariamente, padrões normativos hierárquicos, mas de
coordenação, visando o melhor atendimento à membresia da Igreja ou aos seus visitantes. O
Ministério de Escola Dominical e Discipulado (MEDI), que coordena a Escola Bíblica
Dominical e Discipulado (EBDI), tem a função primaz de doutrinamento e estudo da Bíblia,
por meio de aulas que ocorrem em classes, geralmente, antes da liturgia de domingo pela
manhã. Em sua maioria, os professores são os próprios membros da Igreja que se
disponibilizam a dar aulas, O preparo para lecionarem nem sempre é exigido a não ser a
responsabilidade com a Igreja, frequência aos cultos, fidelidade nos dízimos e afinidade com
as classes e que estejam em “harmonia total com as doutrinas e constituição da Igreja do
Nazareno” (IGREJA DO NAZARENO, 2004, p. 84). As classes da EBDI são divididas por
faixa etária e não por conhecimento doutrinário ou bíblico do aluno.

Na maioria das Igrejas do Nazareno, utiliza-se, na EBDI, material proveniente da Casa


Publicadora Nazarena. Especificamente, em países de língua portuguesa, utiliza-se a revista O
caminho da verdade, publicação trimestral disponibilizada pelas Igrejas e comprada pelos
alunos. No entanto, materiais de outras editoras podem ser adotados pelo conteúdo bíblico
neles presente, uma vez que não se tem o costume de se atentar para as expressões
doutrinárias latentes ou até mesmo patentes. A escola dominical é um serviço eclesial, não
tem apelo mercadológico ou profissional e não estabelece qualquer sanção ao aluno.
Geralmente, a didática adotada carece de dinamismo e os recursos audiovisuais são primários,
evidenciando um serviço pouco atraente. Por esses motivos, as aulas de escola dominical
deixam de ser, cada vez mais, o propósito de comparecimento dos membros às igrejas,
principalmente, para os jovens que por motivos simples abandonam a frequência a essa
escola.

As Missões Nazarenas Internacionais (MNI) estão nos três níveis de governo


nazareno. Em 1899, a MNI foi fundada por mulheres da Associação das Igrejas Pentecostais
da América. Em 1915, foi oficialmente reconhecida como órgão de nível geral. Inicialmente,
90

era composta somente de mulheres, daí ter sido reconhecida por muitos anos como Sociedade
Missionária de Senhoras (SMS). Seu propósito era estimular o interesse por missões, por
meio de levantamento de fundos para a atividade missionária. A presença de homens como
membros ativos foi admitida em 1952, a partir de então passou a ser chamada de Sociedade
Nazarena de Missões Estrangeiras (SNME) e, em 1972, foi eleito o primeiro homem para o
seu conselho geral. O nome da SNME foi novamente mudado para Sociedade Nazarena de
Missões Mundiais (SNMM), que passou a ser denominada de Missões Nazarenas
Internacionais (MNI), pela Assembleia geral de 2002.

A MNI atua na promoção de missões em qualquer instância de governo eclesiástico e


com qualquer faixa etária. Seus principais membros são o presidente, vice-presidente,
secretário e tesoureiro que são eleitos por votação secreta, para exercício no ano eclesiástico.
Nas Igrejas locais, o trabalho da MNI foca em evangelismos urbanos, na apresentação de
países e suas culturas para as membresias locais e em levantamento de ofertas, como as oferta
de alabastro, para construção de templos, hospitais, escolas, etc.; a oferta de páscoa e a oferta
de gratidão que são enviadas para as áreas mundiais mais necessitadas.

O Fundo de Evangelismo recolhe e distribui as ofertas. Segundo dados apresentados


na Assembleia geral de 2005, o Fundo de Evangelismo Mundial recolheu mais de US$ 270
milhões no quadriênio 2001-2005. (IGREJA DO NAZARENO/JOURNAL TWENTY SIXTH
GENERAL ASSEMBLY, 2005, p. 9) É importante destacarmos, que o Manual veda o uso de
ofertas de missões para o uso local. (IGREJA DO NAZARENO/MANUAL 2009-2013, 2009,
p. 87). Há, também, proibição de apelos financeiros feitos pelas igrejas locais, pelos
presidentes de departamentos para outras igrejas locais, aos seus respectivos presidentes, ou
aos membros, na tentativa de obter dinheiro ou assistência financeira para as necessidades da
igreja local, ou para os interesses que queiram patrocinar. Tal solicitação pode ser feita
somente com anuência e aprovação escrita do Superintendente distrital e pela Junta consultiva
distrital. (IGREJA DO NAZARENO/MANUAL 2009-2013, 2009, p. 88). Qualquer pessoa
membro da Igreja do Nazareno poderá tornar-se membro da MNI local. O direito de votar e
ser votado para a MNI é limitado aos membros da Igreja que tenham 15 anos ou mais.
Faculta-se àqueles que não são membros da Igreja do Nazareno tornarem membros associados
da MNI. (IGREJA DO NAZARENO, 2004, p. 101). Esse fato possibilita que a ajuda ao
trabalho missionário possa vir de outros setores da sociedade não diretamente ligados à Igreja.
91

A Juventude Nazarena Internacional (JNI) é a responsável pelo serviço da Igreja


voltado para jovens com mais de 12 anos de idade. A JNI está presente nos três níveis de
governo da Igreja. No nível local, seu presidente é eleito pela juventude e é aprovado pelo
pastor e pela Junta da Igreja local. Na mesma condição dos outros dois presidentes de
departamentos (MNI e MEDI), o presidente da JNI é também membro da Junta local. O
presidente da JNI distrital é eleito pela Convenção anual da JNI distrital, nela também se
elegem o vice-presidente, secretário e o tesoureiro que, juntamente, com o Superintendente
distrital formam o Conselho distrital da JNI. Determina o Manual (IGREJA DO
NAZARENO/MANUAL 2009-2013, 2009. p. 119) que o presidente da JNI distrital é
membro da Assembleia distrital.

Em todos esses aspectos, a Igreja do Nazareno se apresenta com uma forma


representativa de governo. As instâncias de poder e a divisões departamentais são entendidas
como meios de apoio à Igreja local. Conforme se expressa em seus artigos de governo,
(IGREJA DO NAZARENO/MANUAL 2009-2013, 2009, p. 36), as igrejas locais, plenamente
organizadas, têm autonomia para gerirem-se e a autoridade concedida aos Superintendentes
não interferirá na ação independente delas.

Voltando-nos à perspectiva weberiana de dominação, percebemos que a estrutura


burocrático-legal se manifesta por sua instrumentalidade racional, no qual os meios se
imbricam aos fins, buscando a eficácia da autoridade. Contudo, observamos que a Igreja do
Nazareno ainda resguarda o aspecto tradicional quando infunde sua hierarquia dentro do
âmbito do sagrado, conforme ressalta o Manual -1997-2001- (IGREJA DO
NAZARENO/MANUAL 1997-2001, 1997, p. 5), ao se colocar como afirmação oficial de fé e
prática da igreja, consistente com os ensinamentos das Escrituras, o qual deve ser aceito pelos
nazarenos, a fim de alcançar um viver santo. Assim, a Igreja ressalta a coordenação entre suas
partes, ao invés de salientar os aspectos hierárquicos. Dessa forma, podemos entender o
porquê dela apresentar seu organograma de poder, conforme o quadro seguinte.
92

QUADRO 7: Organograma de poder da Igreja do Nazareno.

Fonte: Manual da Igreja do Nazareno. (IGREJA DO NAZARENO/MANUAL 2009-


2013, 2009, p. 23)

A forma como a Igreja do Nazareno representa toda essa estrutura não esclarece a
hierarquia que se observa entre os diversos órgãos. Podemos inferir pela observação do
quadro acima que, a Igreja local, por exemplo, não está subordinada à Superintendência
distrital e que o nível de poder dessa Igreja é o mesmo dos Superintendentes gerais. Uma
explicação possível para o formato desse quadro de poder é que a Igreja tenta mostrar uma
relação de afinidade entre os órgãos formativos de sua estrutura de poder e não ressaltar o
93

aspecto hierárquico. Não obstante e devido ao que observamos, propusemos o quadro de


fluxograma de poder número 6, na página 86.

É importante salientar que toda a forma de poder é cercada de mecanismos, pelos


quais a forma como se exerce autoridade pode ser legitimada por um período considerável.
Nesse aspecto, permanece na Igreja do Nazareno uma mescla entre o caráter institucional,
sem as influências de motivos pessoais ligados ao sistema burocrático-legal, e um padrão
tradicional de seguimento aos ditames de uma igreja primitiva e ao carisma apostólico. Assim,
há, entre os nazarenos, a consideração da estrutura institucional, mas que está fortalecida pela
tradição e o carisma da liderança, que obteve aquele grau hierárquico por intermédio da
escolha divina. O meio pelo qual a Igreja do Nazareno divulga essa estrutura e a consolida nas
várias regiões em que atua, sem causar conflito com as culturas locais, é o campo midiático.
Tal meio, salientamos a seguir.

2.4 A Mídia Nazarena

A Igreja do Nazareno, desde sua união, partilhava de alguns periódicos com as Igrejas
que a formaram. O “Nazarene Messenger”, “Beulah Christian”, “Pentecostal Advocate” e o
“Holiness Evangel” eram os principais entre os nazarenos. Essa imprensa, no entanto, não era
de propriedade da Igreja como um todo, mas de alguns de seus membros que arrendavam os
serviços para a Igreja. A Assembleia de 1911 decidiu que se formasse uma Junta de
publicações para administrar uma casa central de publicações que forneceria literatura para as
escolas dominicais e administraria os jornais nazarenos. Assim, fundou-se, em Kansas City,
uma casa publicadora, por meio de um projeto de arrecadação de fundos que visava a
obtenção de U$ 50 mil20 dólares para implantação do projeto. Essa arrecadação proporcionou
a compra do “Pentecostal Advocate” em novembro de 1911. Em abril de 1912, foi publicado
a primeira revista da denominação, chamada de o “Herald of Holiness”, sendo esse o ano de
fundação da Casa Nazarena de Publicações (CNP). Os sócios do “Beulah Christian” não
quiseram se unir ao novo empreendimento e solicitaram à Assembleia geral a manutenção do
serviço que prestavam à Igreja, mas tal solicitação não foi aceita. (SMITH, [195-]).

20
Não se sabe o real valor desses montantes ao câmbio atual, mas, por terem sido citados, parece que tinham um
significado expressivo na época.
94

Em 1913, a Junta de Publicações, apesar das crises financeiras que passava, pediu aos
nazarenos de todas as partes que evitassem fundar outras publicações locais que concorressem
com o “Herald of Holiness”. (SMITH, [195-], p. 306). No entanto, o projeto de consolidação
da Casa Nazarena de Publicações pouco avançou, até o ano de 1919, quando um grupo de
santidade, do Tennesse, uniu-se à Igreja do Nazareno e suspendeu sua publicação, chamada
de “Living Water”, para dar respaldo ao “Herald of Holiness”. A partir daí a Junta de
Publicações passou a intensificar cada vez mais a proposta de lealdade denominacional,
proibindo publicações que não fossem da CNP, entre elas, revistas de escolas dominicais,
hinários, propagandas de evangelismo ou jornais de divulgação interna e externa.

As gerações sucessivas de líderes aprofundaram o interesse em órgãos educacionais


dentro da Igreja do Nazareno. Esse fato impulsionou a venda de materiais da Casa Nazarena
de Publicações, que passou a fornecer mais livros para as escolas dominicais, principalmente,
devido à adoção do ensino progressivo, que tornou necessária a produção literária para as
várias séries. Além das escolas infantis, a CNP atendia em grande medida também aos
colégios e universidades ligadas à Igreja. O Comitê geral de Escolas Dominicais havia
adotado um programa para a preparação de mestres para essas escolas. Tal fato possibilitou
que, na Assembleia geral de 1928, a Junta de educação comunicasse o desenvolvimento
contínuo das escolas nazarenas e universidades e um aumento do número de matrículas
próximo de 16%, ao ano. Todo esse desenvolvimento foi acompanhado pela Casa de
Publicações, que naquele ano, havia imprimido nove milhões de artefatos literários (SMITH,
[195-]. p. 377).

O crescimento da Casa de Publicações decorreu também da expansão nazarena pelo


mundo. A publicação da revista missionária, “Other Sheep”, foi um importante instrumento
de alcance missionário e de estímulo à CNP, pois se difundiu por todo o campo missionário
nazareno, que cada vez mais requeria maiores produções. Cabe ressaltarmos, no entanto, que
a produção dessa revista trouxe recursos à Casa Nazarena de Publicações, não por sua venda,
uma vez que o custo de produção era maior que o benefício da venda, porém, essa estratégia
trazia proventos de doações feitas pelas igrejas e missões.

No entanto, a história da CNP não foi apenas de sucesso, conforme afirma W.T.
Purkiser (1983, p. 100), as vendas da CNP tiveram uma queda vertiginosa no ano de 1932, em
meio à Grande Depressão americana, quando se situaram próximo de US$ 218 mil dólares,
um dos valores mais baixos desde sua consolidação. O apoio da Igreja à CNP foi vital para a
95

continuação de suas operações, durante os anos de 1932 a 1936, mais de U$4 mil dólares
foram doados para literatura, o preço da assinatura da revista “Herald of Holiness” diminuiu
para que se aumentassem suas vendas. A Assembleia de 1936 aprovou mais investimentos
para a CNP e garantia financeira. A estabilidade garantida nos tempos da Grande Depressão
possibilitou o crescimento da CNP em tempos mais tranquilos. Smith ([195-], p. 398) ressalta
que até o ano de 1965, a Casa Nazarena de Publicações cresceu ao ponto de abrir sucursais
em Toronto, no Canadá; Pasadena, na Califórnia e ter representações na Inglaterra, Austrália e
África do Sul. Poucos anos antes, as vendas da CNP ultrapassaram o patamar de US$ 3
milhões de dólares. Na Assembleia geral de 2001, foi divulgado que a Casa Nazarena de
Publicações excedeu a venda líquida de 97 milhões de dólares e 25 milhões de impressões ao
ano, o que a consolidava como a maior editora de materiais de santidade do mundo. (IGREJA
DO NAZARENO/JOURNAL TWENTY SIXTH GENERAL ASSEMBLY, 2005, p.10).

A CNP é formada pela Bacon Hill Press, que produz livros teológicos, devocionais e
de liderança cristã; pela Lillenas, companhia publicadora que produz materiais e recursos de
música, pela World Action Publishing Company e Berfoot Ministeries voltadas para produção
de material para escola dominical e recursos audiovisuais para crianças. O Principal periódico
da CNP, a revistas “Herald of Holiness”, passou a ser distribuída em países de língua
portuguesa com o nome de o Arauto da Santidade. Esta revista chegou ao Brasil, em 1965 e
deixou de ser publicada no ano de 199921. Segundo informações da CNP, no Brasil, não se
sabe o motivo de ter se findado essa publicação. No Brasil, a produção literária nazarena
começou alguns meses após o estabelecimento da Igreja no país. A princípio, o trabalho era
manual e consistia basicamente na tradução de livros dos Estados Unidos para o uso dos
seminaristas que os datilografavam. Em 1971, o reverendo Earl Mosteller fundou a Casa
Nazarena de Publicações, em Campinas, sendo a responsável por grande parte do material
gráfico utilizado nas igrejas nazarenas do Brasil.

A Igreja do Nazareno está ainda voltada para outras mídias como a “Nazarene
Networking Comunnications”, que traz notícias das sete áreas internacionais da Igreja do
Nazareno, por meio da rede mundial de computadores e também de periódicos impressos.
Além dessa rede de comunicação, as Igrejas do Nazareno, em sua maior parte, possuem
páginas na internet e muitos pastores ingressam em sites de relacionamentos. Alguns distritos

21
Em 2001, foi publicada uma edição especial do O Arauto da Santidade, mas não tivemos mais notícias de sua
circulação no meio nazareno.
96

também ingressaram nessa mídia e todos os departamentos da Igreja, em todos os níveis


assim o fazem. A Igreja somente faz restrições à utilização de computadores, quando o seu
uso atinge a condição moral e atenta contra a santidade do cristão. “A isto incluirá evitar todos
os tipos de diversão e produções de mídia que produzem, promovem ou focam o violento, o
sensual, o pornográfico, o profano ou o ocultismo” (IGREJA DO NAZARENO/MANUAL
2009-2013, 2009, p. 44). Até a própria Igreja do Nazareno, enquanto expressão institucional
global, possui seu sítio oficial na internet - www.nazarene.org.- e o utiliza não apenas como
divulgação, mas como ferramenta de informação e disseminação de decisões, como é o caso
do sítio da comissão sobre o futuro nazareno, criado pela Junta de Superintendentes gerais.

Logo após a primeira transmissão de um programa de rádio nos Estados Unidos, esse
meio se expandiu proporcionando o surgimento, a partir de 1919, da chamada era do rádio,
que pelo ano de 1921, já contavam com 382 emissoras no país. (ABERT, 2010). Desde muito
cedo, a Igreja do Nazareno atentou para a eficácia do rádio para se alcançar os mais
longínquos lugares e, em 1945, criou o programa de rádio “Showers of Blessing”. O
desenvolvimento da mídia radiofônica na igreja se espalhou pelo mundo, de forma que não se
pode tratar a respeito de seu alcance mundial em poucas páginas. Para se citar como exemplo,
a atuação nazarena no rádio, principalmente, na década de 70 se espalhou para a Espanha,
Portugal, França, Itália Japão, China, Indonésia, Filipinas, Corea, Guatemala, Índia, Inglaterra
e Estados Unidos, conforme destaca Merritt Nielson (1984, p. 16-17).

Os primórdios nazarenos no Rádio, na América Latina, ocorreram na segunda metade


do século XX, com o programa, A Hora Nazarena, transmitido em espanhol. Seu idealizador
foi o diretor executivo do departamento hispânico da Igreja do Nazareno, H. T. Reza. No
começo, o programa entrou em fase de teste pela emissora cristã Rádio HCJB, em Quito, no
Equador. Decidiu-se que, se a transmissão fosse aceita por outras transmissoras, haveria êxito
em continuar a programação. Ao final de um ano, havia 35 emissoras transmitindo A Hora
Nazarena. Esse programa foi transmitido em 750 estações, nos anos de 1971-1972, e foi
gradativamente diminuindo devido à busca que os nazarenos empreenderam por emissoras
mais potentes. O nome, A Hora Nazarena difundiu o nome da Igreja do Nazareno por toda a
América Latina, América Central, América do Sul e Caribe. (NIELSON, 1984, p. 73).
Segundo Nielson (1984), o fato mais importante das transmissões nazarenas na América
Latina foi que em muitos lugares o programa precedeu a incursão dos missionários no
continente, devido ao seu alcance em áreas remotas. A expansão das transmissões nazarenas
97

no Rádio cresceu acentuadamente, o programa A Hora Nazarena foi introduzido na República


Dominicana, Venezuela, Equador, Paraguai e Jamaica antes da chegada da Igreja nesses
lugares. A transmissão do programa possibilitou uma melhor receptividade das autoridades
locais aos pioneiros nazarenos, bem como facilitou a aquisição de bens e propriedades nesses
lugares, promovendo, assim, o processo de inserção da Igreja nos países que o ouviam.

A Hora Nazarena era um programa de 15 minutos diários e trazia em sua programação


hinos, orações e pregações. Frequentemente, convidavam-se outros pastores nazarenos de
países diferentes para entrevistas ou pregações, a fim de criar uma identidade da membresia
dessas igrejas com o programa e para que se ampliasse a base de ouvintes não nazarenos que
pudessem, sem muito esforço missionário, fazer parte do rol de membros da Igreja. Dentre as
dificuldades apresentadas na produção do programa estavam as diretivas do programa, que em
grande parte eram produzidas em Kansas. Essas diretivas dificultavam a interação dos
pastores apresentadores com os ouvintes. A Hora Nazarena buscou descentralizar-se da
produção estadunidense, por isso, nos anos 1978 e 1979, a direção latino-americana do
programa buscou parceria com o Seminário Nazareno das Américas em Costa Rica que, a
partir de 1981, passou a produzir o programa, além de desenvolver um centro de
especialidades na área de produção radiofônica para os seminaristas. É importante
destacarmos, que A Hora Nazarena foi um programa radiofônico desenvolvido pela Igreja do
Nazareno em âmbito internacional. A demanda nessas áreas mundiais exigiu que as
transmissões fossem feitas não apenas para os centros urbanos, mas também para as
localidades rurais. Com isso, foram desenvolvidas produções com os chamados idiomas
oficiais, mas também em linguagens e dialetos locais como o Marathi, Criollo, Kekchí y
Pokomochi, Zulu e Tamil. (NIELSON,1984). A Hora Nazarena também foi transmitida e
produzida no Brasil. Esse aspecto será tratado no próximo capítulo.

A estrutura de Governo da Igreja do Nazareno e a utilização da mídia, como forma de


difundir e distinguir a sua estrutura e teologia, se adaptam aos ditames da institucionalização,
conforme estipula François Houtart (1994). Para ele, “quando se institucionalizam certas
práticas simbólicas, estas se reproduzem inclusive em culturas onde a base do símbolo é
totalmente diferente”. (HOUTART, 1994, p. 76). Assim, a Igreja do Nazareno procurou se
difundir paulatinamente, adaptando suas formas nas culturas mais diversas. O processo de
consolidação da estrutura nazarena ocorreu mais pela busca de coordenação entre as partes
constituintes do que pelo conflito de interesse. Isso não quer dizer que não houvesse interesses
98

conflitantes, mas a perspectiva que se instaurou no processo de formação e consolidação da


Igreja do Nazareno foi a busca por unificar as ações. Conforme Bruno Théret (2003), o
institucionalismo sociológico considera a origem das instituições como forma de responder
questões de coordenação. Esse é o caso que parece ser tanto em relação à origem da Igreja do
Nazareno, como solução para unificar o Movimento de santidade disperso em várias
denominações, quanto à sua estrutura de poder interno que, baseada na representatividade e
nas inúmeras repartições internas, torna-se uma tentativa de coordenar os papeis de clérigos e
leigos. Assim, toda a estrutura de poder da Igreja do Nazareno se apresenta como cognitiva22
e não normativa. Desse aspecto, pode-se ter mais uma explicação para se entender o porquê
da Igreja do Nazareno apresentar seu organograma de poder da forma como se faz.

Conclusão

A formação da Igreja do Nazareno, no final do século XIX, decorreu da preocupação


de alguns leigos e clérigos metodistas em responder de forma efetiva a efervescência social
que emergiu nos Estados Unidos nos anos próximos e, principalmente, após a Guerra de
Secessão. O Movimento de santidade do qual se originou a Igreja do Nazareno pode ser
compreendido como consequência da languidez que se estabeleceu nas Igrejas
denominacionais incapazes de responder aos apelos das classes menos favorecidas pelas
contingências sociais do crescimento urbano. Trabalhadores desempregados, escravos,
viciados, mães solteiras, entre outros, passaram a ver no Movimento de santidade uma forma
de reinserção social e de prática religiosa em um país de maioria protestante. A liberdade e a
possibilidade de se alcançar uma condição socialmente favorável, pelo simples processo de
santificação, criou nas igrejas tradicionais a perda de controle sobre seus membros, que
evadiam para as igrejas de santidade, sem contar a evasão de pastores que não podiam
conciliar entre o sagrado domesticado tradicional e o sagrado selvagem do Movimento de
santidade.

22
Conforme Bruno Théret, instituição em base cognitiva significa instituição cujos fundamentos são ideias e
crenças. Volta-se ao lembrete de que, aqui, se trabalha com a lógica weberiana de tipos ideais, o que significa
que na realidade não se pode pensar nem a Igreja do Nazareno nem qualquer outra instituição como uma
instituição pura. Isso é, trata-se da predominância de um fator e não de um reducionismo a ele.
99

A união das igrejas e dos grupos de santidade que originaram a Igreja do Nazareno,
como expressão nacional de santidade, significou a centralização do Movimento de santidade
para se fazer frente aos ataques das denominações tradicionais. Ao mesmo tempo, possibilitou
a coordenação de tarefas necessárias para as práticas sociais, pois se voltava mais às questões
sociais do que essas denominações tradicionais. A institucionalização da Igreja do Nazareno,
no entanto, substituiu a liderança carismática original de Phineas Bresee pela estrutura
burocrático-legal, centrada na participação clerical, que tenta o resgate da liderança
carismática, por meio da sacralização de sua estrutura de poder em bases escriturísticas. Essa
estrutura é fortalecida pela base midiática da Igreja do Nazareno que se expande pelo mundo,
por meio do Rádio, da Internet e da Televisão.

Basicamente com essa organização, a Igreja do Nazareno se expandiu pelo mundo e


alterou a configuração de sua membresia que passou de igreja nacional para
internacionalizada. A manutenção do arcabouço governamental não mudou em nenhuma
dessas áreas mundiais, mas ganhou contornos próprios, conforme o padrão cultural de cada
lugar. Conforme se disse, na 22ª Assembleia geral, em 1989: “das escassas centenas vindas
apenas de alguns estados norte-americanos, houve, na 22ª Assembleia, representantes de 263
distritos, organizados em 81 áreas mundiais, esperando-se congregações de até 50.000
pessoas” (O ARAUTO DA SANTIDADE, p. 2, jan., 1990.). Essa expansão alcançou o Brasil
na segunda metade do século XX, da qual trataremos no próximo capítulo.
100

CAPÍTULO 3

A IGREJA DO NAZARENO NO BRASIL

Introdução

A Igreja do Nazareno chegou ao território brasileiro pelos missionários estadunidenses


que se instalaram em Cabo Verde, a partir da obra missionária de João Dias. (O ARAUTO
DA SANTIDADE, p. 10, ago., 1974.). O estabelecimento da Igreja do Nazareno naquele país
ajudou em sua inserção no Brasil, na medida em que as semelhanças entre essas duas nações,
proporcionado pelo cabedal da cultura portuguesa e pela semelhança linguística incentivaram
os missionários americanos e os cabo-verdianos, já acostumados com esse ambiente, a virem
para as terras brasileiras. Portanto, a chegada da Igreja no Nazareno no Brasil não se deu
dentro do percurso direto dos Estados Unidos para o Brasil, mas foi mediado pelas missões de
Cabo Verde.

Por esse fato, a formação da Igreja do Nazareno em Cabo Verde é importante para se
compreender a inserção e expansão da Igreja do Nazareno no Brasil, o qual se caracteriza por
um ambiente religioso protestante multivariado, em que diversas denominações já haviam se
instalado. Dessa forma, descrevemos e analisamos, neste capítulo, o estabelecimento da Igreja
do Nazareno em Campinas, sua expansão para os Estados de Minas Gerais e Rio de Janeiro,
ao mesmo tempo em que, esboçamos o panorama dessa Igreja nas demais regiões do Brasil.

A base teórica para compreendermos esse processo é a teoria da escolha racional da


religião elaborada por Rodney Stark, Roger Finke e Laurence Iannaccone (1997), também
conhecida por teoria das economias religiosas. Ela aponta para o fato que a agregação de
membros, em meio a múltiplas escolhas religiosas, se deu pelos aspectos dialéticos de ganhos
e perdas, portanto, utilizamos desta, para destacarmos as características distintivas da Igreja
do Nazareno em relação às outras denominações protestantes. Além desses apontamentos,
procuramos caracterizar a Igreja do Nazareno quanto aos seus aspectos doutrinários,
litúrgicos, de formação de pastores e de formação da membresia.
101

3.1 A Igreja do Nazareno: sua trajetória de Cabo Verde ao Brasil.

Na história missionária23 da Igreja do Nazareno, o fator mais decisivo foi a criação de


um órgão centralizado que se responsabilizasse pela sua expansão mundial. Dois dos três
principais corpos constitutivos da Igreja do Nazareno já haviam estabelecido missões em
outros países, mas as divergências quanto a extrapolação das fronteiras para divulgar o
evangelho tornaram-se cada vez mais intensas. Desde 1895, a Associação das Igrejas
Pentecostais da América já havia formado um comitê para as missões e constituído, em 1899,
a Sociedade Missionária de Senhoras. (O ARAUTO DA SANTIDADE, p. 10, out., 1990.). A
Igreja do Nazareno, desde seu tempo no Red’mens Hall, dava pouca ênfase às missões. Na
Assembleia geral de 1905, contudo, Bresee enfatizou que a tarefa primordial dos nazarenos
era cristianizar a cristandade e salvar assim os Estados Unidos para depois converter os
pagãos. (SMITH, [195-]). Esse pensamento de Bresee foi fortemente contestado pelos líderes
do comitê missionário da Assembleia, que decidiram premiar as igrejas locais que dessem os
dízimos do total de suas entradas para a obra missionária no exterior. Hiram F. Reynolds foi o
responsável por organizar um programa central de missões, mesmo porque já estava
envolvido com o projeto missionário da Associação Pentecostal.

Dessa forma, a Igreja do Nazareno, logo que consolidou sua união, já se apresentava
como uma igreja internacional. Hiram F. Reynolds expandiu a Associação das Igrejas
Pentecostais da América para regiões como a Índia, África, Caribe e América Central, ainda
nos primeiros anos de formação dessa Associação. Essas regiões de missões passaram sob a
administração da Igreja do Nazareno que já surgiu envolvida com questões nacionais e
internacionais. Leslie F. Gay e H. F. Reynolds foram os que mais contribuíram para a criação
de um órgão que centralizasse os assuntos e decisões relativos às missões. (SMITH, [195-], p.
291). A Assembleia geral de 1911 sancionou a administração central para missões
estabelecendo Reynolds como secretário de missões. Ele consolidou os campos missionários
anteriores à união das Igrejas e expandiu para outras áreas o trabalho missionário. Dentre

23
Segundo Roberto E. Zwetsch, “o termo missão vem do latim missio, que por sua vez, corresponde ao verbo
apostéllein, de onde temos a palavra apóstolo, em português. Todas essas palavras têm em comum o seguinte:
significam „envio‟. Missão significa etimologicamente, envio. Alguém é enviado por outra pessoa para realizar
alguma ação ou entregar alguma mensagem”. (ZWETSCH, 2005, p. 197). O termo missão é entendido aqui
como um termo eclesial usado para referir a um trabalho de uma Igreja em uma área que ela ainda não se
estabeleceu. Aqueles que se dedicam a promover o trabalho eclesial nessas regiões são chamados de
missionários.
102

esses campos missionários, a missão nazarena ocorrida nas Ilhas de Cabo Verde, em 1901,
tem especial relevância para o surgimento da Igreja do Nazareno no Brasil.

O período definido pela Igreja do Nazareno como o início de suas missões


internacionais é dado a partir de 1898, na Índia e, posteriormente, alcançou as Ilhas de Cabo
Verde, em 1901; Canadá e o Caribe, em 1902; México, em 1903; Guatemala, em 1904; Japão,
em 1905 e Argentina, em 1909. Notamos, então, que a Igreja do Nazareno, bem cedo, já se
fazia representar em quase todos os continentes. No entanto, a sua inserção nessas áreas não
foi necessariamente um trabalho pioneiro de sua parte, mas utilizou como estratégia se
aproximar daqueles que já pregavam a mensagem wesleyana de santidade nesses lugares.
Assim, os nacionais tiveram um trabalho essencial na expansão do serviço missionário da
Igreja. “Por volta do ano de 1936 à proporção entre obreiros nacionais e missionários da
Igreja do Nazareno, através do mundo, era de cinco para um” (IGREJA DO
NAZARENO/MANUAL 1997-2001, 1997. p. 23).

Nos mais de 100 anos de história missionária nazarena é particularmente importante o


processo de consolidação dessa Igreja nas Ilhas de Cabo Verde, para a compreensão de sua
chegada ao Brasil. Cabo Verde é um arquipélago composto de 10 ilhas, situado no Oceano
Atlântico, aproximadamente 640 km a oeste do território continental africano. Nove das dez
ilhas são habitadas e foram colonizadas pelos portugueses. Colonizadores da Itália e Espanha,
escravos da África, prisioneiros civis e políticos e judeus fugitivos da inquisição também
vieram ou foram trazidos para este país, segundo afirma Antônio Depina (2009, p. 34). Cabo
Verde se tornou um ponto importante para navegantes e navios de cargas pela proximidade
com a Europa e o leste da América. Isso possibilitou o fluxo de imigrantes tanto dos Estados
Unidos para Cabo Verde quanto de Cabo Verde para os Estados Unidos. Alguns cabo-
verdianos aproveitavam esse fluxo e se fixavam nos Estados Unidos em busca de melhores
condições econômicas. Entre eles estava João José Dias (1873-1964). Conforme Antônio
Barbosa Vasconcelos (2008), João Dias nasceu na ilha cabo-verdiana de Brava e foi
consagrado ao serviço pastoral em novembro de 1900, nos Estados Unidos. No ano seguinte,
Dias iniciou o trabalho missionário na Ilha de Brava, quando começou suas pregações
itinerantes.

Dias fez parte de um processo em que grande parte daqueles que saíam do arquipélago
para os Estados Unidos retornava convertido ao protestantismo e começava a disseminá-lo em
sua própria região, onde o catolicismo havia se tornado a religião oficial. Conforme descreve
103

Francisco Xavier Ferreira (1972, p. 33), o artigo 130º do Código Penal português da época
determinava que aquele que faltasse respeito à religião do reino, Católica, Apostólica,
Romana, seria condenado à pena de prisão correcional até dois anos e multa, conforme a
renda do infrator. Desrespeitar o catolicismo, nesse caso, significava injuriá-lo em qualquer de
seus dogmas ou culto. Isso, por meio de atos, palavras ou escritos, ou de fazer prosélitos para
religiões diferentes. A restrição atingia também quem tentasse realizar sermões públicos.

Dias fincou as raízes daquela que viria a ser a Igreja do Nazareno naquelas ilhas. Logo
no princípio, quando se tornou um cristão evangélico nos Estados Unidos, a Associação das
Igrejas Pentecostais da América lhe ofereceu US$16,00 dólares ao mês para retornar a Cabo
Verde para servir como pregador (DIAZ, 1924, p. 13). Assim, ele retornou a Cabo Verde
onde encontrou um pequeno grupo de evangélicos que se reunia em casas, devido à proibição
definida no Código Penal português. No entanto, Dias não considerou as proibições do
Código e levou o evangelho às ruas, como consequência, foi levado à prisão e lá sofreu
torturas e em várias ocasiões esteve próximo à morte. (DEPINA, 2009, p. 35).

A proclamação da República portuguesa, em cinco de outubro de 1910, afetou a vida


nas colônias e trouxe novas perspectivas para o quadro religioso na Ilha de Cabo Verde,
principalmente, em decorrência da revogação do artigo 130º do Código Penal, em 1911.
(DEPINA, 2009, p. 45). Os delitos antes mencionados contra o catolicismo, agora, estavam
restritos somente se ocorressem dentro dos templos. Além disso, o ultraje a qualquer religião
e seus servidores seria tratado na forma da lei. Com a perda da condição do catolicismo como
religião oficial e exclusiva nas Ilhas, os serviços religiosos de João Dias ganharam impulso.
Por volta de 1916, Dias concluiu a reforma de uma casa que adquiriu em 1909, na vila de
Nova Sintra, em Brava. Rapidamente, as reuniões, nessa casa, obtiveram uma centena de
membros, sendo esse o primeiro templo nazareno em Cabo Verde, conhecido como a Igreja
do Nazareno de Ponta Achada.

Em 1914, Hiram F. Reynolds chegou ao arquipélago de Cabo Verde vindo do Brasil 24,
mas não visitou a Ilha de Brava, em decorrência da eclosão da Primeira Guerra Mundial.
Encontrando-se com João Dias, Reynolds sugeriu-lhe a expansão da Igreja de Cabo Verde e
prometeu-lhe enviar missionários. Somente em 1933, quando Hiram não mais era

24
A menção dessa visita do Superintendente geral Hiram F. Reynolds ao Brasil somente foi encontrada em
Francisco Xavier Ferreira.( 1972, p. 51).
104

Superintendente, C. S. Jenkins e sua esposa Pérola Jenkins foram enviados para Cabo Verde.
Passados cinco anos do estabelecimento do casal Jenkins em Cabo Verde, João e sua esposa,
Joana, se aposentaram do trabalho missionário, em 1938. Nesse ano, a Igreja do Nazareno já
estava consolidada e se espalhou por toda parte do território cabo-verdiano. (FERREIRA,
1972).

No ano de 1936, a Igreja do Nazareno substituiu João Dias e esposa pelo reverendo
Everette D. Howard e sua esposa Garnet Howard, considerados o segundo casal de
missionários da Igreja do Nazareno em Cabo Verde, uma vez que, Dias era considerado
missionário por ter sido enviado pela Igreja nos Estados Unidos e o casal Jenkins e outros
missionários, que anteriormente lá estiveram, eram considerados visitantes. Os Howards
vieram para Cabo Verde por insistência própria, visto que o Superintendente de missões
negou-lhes a vinda por falta de recursos. Segundo relata Earl Mosteller, quando o
Superintendente disse não haver recursos, Howard alegou que, baseado em um livro,
mantinha suas esperanças de ir a Cabo Verde, naquele instante, retirou da bolsa o livro,
intitulado Fé que alcança e disse que com ele havia aprendido a ter fé. (IGREJA DO
NAZARENO/ENTREVISTA EARL MOSTELLER, [199-]). Esse fato sensibilizou
profundamente o Superintendente de missões que era o autor do livro. Dessa forma, o
Superintendente de missões empenhou em conseguir fundos para a viagem dos Howards que
aconteceu em 1936.

Ferreira (1972) descreve o trabalho desses missionários em Cabo Verde como um dos
mais produtivos para o crescimento do evangelho na Ilha. Howard e sua esposa fizeram uma
cruzada evangelística pelo arquipélago, da Ilha de Brava à ilha do Fogo, passando por São
Vicente em 1938. O Superintendente geral da Igreja os convenceu a fixarem na cidade de
Praia, Capital de Cabo Verde. (VASCONCELOS, 2008.). Segundo Vasconcelos (2008), nesse
período, houve grande desenvolvimento da ação missionária em todo o arquipélago de Cabo
Verde, principalmente, devido à vinda de novos missionários e à conversão de muitos
caboverdianos. Em 1939, chegou o casal Samuel Clifford Gay e Charlotte Munn, o casal Earl
e Gladys Mosteller e a enfermeira Lydia Wilke chegaram em 1946, Ernest e Jessie Eades
chegaram em 1948. No entanto, o trabalho missionário tornaria mais efetivo a partir da
chegada, em S. Vicente, em 1953, do rev. J. Elton e Margaret Wood, que organizaram o
Seminário Nazareno de Cabo Verde. A partir de então, Cabo Verde se tornaria autônoma na
condução dos negócios da Igreja do Nazareno, que em 1956 formou sua primeira turma de
105

pastores no arquipélago. O reverendo Roy Malcolm e sua esposa Glória Henck chegaram em
1958, ano em que os Mostellers foram transferidos para o Brasil.

O missionário Earl Elwood Mosteller e sua esposa, Gladys Marie Parker Mosteller,
foram designados pela Superintendência geral da Igreja do Nazareno para Cabo Verde, no ano
de 1944, mas somente chegaram às Ilhas, no ano de 1946. Até sua chegada ao arquipélago
nesse ano, o casal foi para Massachusetts, a fim de conviver com a comunidade de
portugueses, muitos deles cabo-verdianos, para aprender o idioma e os costumes das Ilhas. O
trabalho dos Mostellers nas Ilhas foi profícuo, apesar das resistências e dos ataques por
apedrejamentos que constantemente sofriam por parte da Igreja e dos fiéis católicos. (IGREJA
DO NAZARENO/ENTREVISTA ELTON WOOD, [199-]). Com a chegada dos Mostellers, a
Igreja do Nazareno construiu diversos edifícios para templos, residências pastorais e
instalações diversas, visando atender melhor aos pastores e ao crescente aumento do número
de fiéis que agregavam à Igreja. No final da década de 50, os Mostellers e o casal Wood
deram início à construção do Seminário Teológico Nazareno de Cabo Verde e da construção
da Editora nazarena nas Ilhas. (O ARAUTO DA SANTIDADE, p. 27, jul., 1989.)

A Igreja do Nazareno não se limitou a trazer benfeitorias apenas para os fiéis


protestantes. Mosteller relata (IGREJA DO NAZARENO/ENTREVISTA EARL
MOSTELLER, [199-]), que alguns evangélicos, fugindo do comunismo na Europa,
adquiriram um barco para irem para a América do Sul, ao chegarem a Cabo Verde, houve
desavenças entre eles e o empreendimento da viagem foi abandonado. A Igreja do Nazareno
aproveitou a ocasião e comprou deles o barco, dando-lhe o nome de Boas Novas. Mais tarde o
rico filho de um senador dos Estados Unidos que adquiriu um barco de luxo chegou a Cabo
Verde, mas como o barco era de bandeira estadunidense todas as vezes que zarpava era
obrigado a pagar U$100 dólares ao governo português. Irritado com a situação, o filho do
senador vendeu o barco aos nazarenos que mudaram a sua bandeira e o chamaram de Novas
de Alegria. Esses barcos eram os únicos motorizados das Ilhas e a grande demanda de pessoas
que os utilizava era, frequentemente, levada a aceitar a mensagem de santidade pregada pela
Igreja. O trabalho dos Mostellers foi notável pela infraestrutura eclesiástica que estabeleceu
nas Ilhas e pelo número de fiéis que se agregava à Igreja. Conforme o próprio Mosteller, das
25 maiores escolas dominicais da Igreja do Nazareno no mundo, cinco estavam em Cabo
Verde e aquela que havia implantado na Ilha de São Vicente era a maior de todas elas, com
mais de mil alunos. (IGREJA DO NAZARENO/ENTREVISTA EARL MOSTELLER, [199-
106

]). Foi com esse cabedal que os Mostellers deixaram Cabo Verde e chegaram ao Brasil em
1958.

Entre os nacionais cabo-verdianos empenhados no estabelecimento da Igreja do


Nazareno em Cabo Verde, destacamos Francisco Xavier Ferreira (1909-1984) e Ilídio Santa
Rita Silva (1913-2006), ambos tornaram-se cristãos ainda no tempo de João Dias. Ferreira
ingressou no ministério pastoral em 1942 e foi o primeiro cabo-verdiano eleito
Superintendente distrital no país (O ARAUTO DA SANTIDADE, p. 18, jun., 1985.) e
também mentor de José Zito de Oliveira, um dos primeiros nazarenos em terras brasileiras.
Segundo Paul S. Dayhoff (2010), Ilídio Silva foi o responsável pela conversão de Joaquim
Antônio Lima, o segundo Superintendente distrital da Igreja no Brasil e um dos pioneiros da
Igreja do Nazareno nesse país. Em 1961, Ilídio se mudou para New Bedford, Massachusetts, e
iniciou uma igreja para os cabo-verdianos nos Estados Unidos, onde pastoreou durante 11
anos. (DAYHOFF. 2010). Outro importante nome cabo-verdiano a destacar é o do reverendo
Jorge de Barros, ele se tornou bastante influente na Igreja do Nazareno no Brasil, foi o diretor
responsável para a produção do Arauto de Santidade em língua portuguesa e diretor e escritor
da revista, O Caminho da Verdade, que há mais de 30 anos tem sido usada nas classes de
escolas dominicais brasileiras.

Esses missionários, juntamente com a liderança nativa da ilha, consolidaram a Igreja


do Nazareno como importante expressão protestante nesse arquipélago. Os resultados obtidos,
desde o pioneirismo de João Dias aos últimos missionários, se expressa na presença cabo-
verdiana na Igreja do Nazareno que alcançou o mundo. Atualmente, vários nazarenos de Cabo
Verde estão comprometidos com o trabalho missionário em Portugal, Açores, Senegal,
França, Holanda, Indonésia e, principalmente, no Brasil. Esses aspectos missiológicos não são
apenas expressões de uma visão pessoal e de desprendimento dos missionários nazarenos,
mas se constituem como consequência da institucionalização da Igreja do Nazareno para se
fazer presente em áreas já ocupadas por outras instituições cristãs protestantes.

Conforme dados de 2004, a Igreja do Nazareno constatou mais de 800 mil membros
nas áreas mundiais, com um crescimento quadrienal de 14,9%, totalizando a agregação de
mais de 25 mil membros por ano. (IGREJA DO NAZARENO/JOURNAL TWENTY SIXTH
GENERAL ASSEMBLY, 2005, p. 773). A partir dessa constatação, a Igreja do Nazareno
tornou-se, de fato, uma Igreja internacional, haja vista a maioria de sua membresia estar
situada fora do território estadunidense. Na última década, o crescimento em áreas mundiais
107

tornou-se mais patente, alcançando 155 áreas internacionais, o que significa em termos
percentuais, que 60% dos nazarenos e 80% de suas Igrejas são resultado das missões
estrangeiras. (IGREJA DO NAZARENO/WORLD MISSION, 2010.).

3.2 A inserção da Igreja do Nazareno no Brasil

Como vimos, a Igreja do Nazareno chegou oficialmente ao Brasil depois de


consolidada sua estrutura de governo e doutrina. Os pioneiros que se estabeleceram nesse país
chegaram antes de 1958, considerada a data oficial de chegada da Igreja do Nazareno no
Brasil. Nesse percurso de inserção e desenvolvimento, a participação de pastores e
missionários, que vieram de Cabo Verde, foi essencial, pois eles adquiriram terrenos,
evangelizaram, formaram pastores, construíram templos e escolas, bem como, consolidaram a
estrutura governamental da Igreja em solo brasileiro.

Sandro José Hayakawa Cunha (2007) descreve o processo de chegada dos nazarenos
ao Brasil com riqueza de detalhes. Segundo ele, o primeiro a chegar ao Brasil foi o pastor José
Zito de Oliveira, em 1956, mas muitos outros nazarenos estiveram antes no Brasil. Contudo,
nenhum desses veio com a intenção de estabelecer a Igreja, mas vieram para trabalhar em
firmas multinacionais ou até por turismo. Nem mesmo a chegada de José Zito de Oliveira ao
país foi considerada a data oficial de estabelecimento da Igreja, uma vez que não era um
missionário nazareno enviado ao Brasil e nem fazia parte do clero nazareno, mas sim um
leigo que a princípio se estabeleceu no país por outros motivos.

José Zito Oliveira nasceu em 1922, na cidade de Ribeira Grande, na ilha de Santo
Antão, em Cabo Verde e se converteu25, aos 29 anos de idade. A sua decisão ocorreu por
ocasião da pregação de um ex-padre que fazia parte do clero nazareno. José Zito foi batizado
pelo rev. Ilídio Silva, ainda em 1951, frequentou a Igreja em Santo Antão, fazendo serviços na
biblioteca, até tornar-se professor na escola dominical. “Sem que Rev. José Zito tivesse
percebido, o Rev. Ilídio já havia começado o processo de discipulado, oferecendo
oportunidades de ministério” (CUNHA, 2005, p. 20).

25
Conversão é a palavra usada para aqueles que se aderem a uma religião, ou se tornam membros de uma igreja.
108

Quando o reverendo Ilídio partiu para Massachusetts, Francisco Xavier Ferreira


assumiu o pastorado em Santo Antão. Nesse período, o envolvimento de José Zito com os
trabalhos da Igreja aumentava a ponto de muitas vezes substituir o rev. Ferreira na exposição
dos sermões. Nessa época, os Mostellers eram os responsáveis por formar os novos pastores
nazarenos em Cabo Verde, porém o Seminário Nazareno em Cabo Verde ficava na Ilha de
São Vicente, distante de Santo Antão. Essa condição impedia José Zito de efetivar o seu
desejo de se tornar pastor por não poder se deslocar para São Vicente. Além disso, o
Seminário dificultava a entrada de alunos solteiros, o que desestimulou o ingresso de José
Zito ao Seminário cabo-verdiano.

O missionário Mosteller resolveu iniciar José Zito no Seminário, sem que isso
implicasse necessariamente na presença física de Zito no Seminário. Para isso, Mosteller
implantou um processo de aprendizagem à distância. Ele enviava livros junto com tarefas para
que Zito exercitasse e os devolvesse para correção. Cunha (2005, p. 21) afirma que, apesar de
efetivo o aprendizado de Zito, não era o que esse esperava, uma vez que desejava
disponibilidade integral nos serviços da Igreja e que fosse mantido por eles, sem a
necessidade de se envolver com trabalhos seculares. “Se ele continuasse estudando, mas
trabalhando secularmente, até poderia se formar, mas não da forma ideal. Ele (Zito) queria
estudar em um seminário bíblico.” (CUNHA, 2005, p. 33).

O desejo de José Zito foi, então, de emigrar para a Argentina, com o intuito de se
tornar seminarista no Instituto Bíblico Nazareno de Buenos Aires, que admitia alunos
solteiros. Joaquim Antônio Lima, seu parente, era aluno daquele seminário e incentivou Zito a
estudar. Segundo Cunha (2005, p. 22), o interesse de Joaquim Lima para a ida de Zito para
aquele país era de outra natureza, uma vez que Lima estava desejoso de se casar com a cabo-
verdiana Guilhermina, mas impossibilitado de deixar a Argentina, concedeu uma procuração a
José Zito, perante as autoridades cabo-verdianas, para que o representasse no casamento com
Guilhermina. Com essa procuração, Zito representou Lima diante das autoridades de Cabo
Verde, que celebraram o casamento. A intenção de Lima era que Zito trouxesse Guilhermina
para a Argentina, para que de fato seu casamento se realizasse. Em 1956, José Zito embarcou
para Lisboa na tentativa de encontrar um navio que viesse para a América do Sul. Nesse
mesmo ano, Zito e Guilhermina chegaram a Buenos, mas Zito ficou detido no navio por
suspeita de possuir uma doença nos olhos. Passado alguns dias, Zito foi novamente conduzido
para Portugal.
109

Antônio Manoel de Oliveira, irmão de José Zito, morava em São Paulo e financiou
uma nova viagem para seu irmão de Lisboa para Santos. Em Julho de 1956, Zito chegou a
Santos, desde então, passou a procurar uma igreja que pudesse frequentar. Dirigiu-se à Igreja
Congregação Cristã no Brasil, mas o costume do cumprimento com beijos não o agradou e
desistiu de frequentar aquela Congregação, mas, periodicamente, assistia aos cultos em outras
denominações. Contudo, de nenhuma delas tornou-se membro, seu dízimo era enviado para
Cabo Verde, demonstrando o vínculo que ainda mantinha com a Igreja do Nazareno.
(CUNHA, 2005, pp. 30-31). José Zito teve uma participação importante nos primórdios da
Igreja do Nazareno no Brasil, envolveu na implantação da 1ª Igreja do Nazareno em
Campinas, bem como na sua expansão para Minas Gerais e Distrito Federal. Ele foi o
primeiro aluno em formação pastoral no Brasil.

A participação efetiva de José Zito no processo de inserção da Igreja Nazareno no


Brasil é considerada por alguns nazarenos como o fato pioneiro do estabelecimento dessa
Igreja em solo brasileiro. No entanto, esse fato é relegado pela história oficial da Igreja,
apesar das considerações que os nazarenos têm aos importantes serviços prestados por José
Zito. Suspeitamos que a ausência da atuação de Zito na história oficial da Igreja decorra do
fato de que a sua chegada ao Brasil, ocorreu muito mais por interesses pessoais do que por
motivações missionárias. Além do que, sua etnia africana e negra poderia ter colaborado para
que seu papel de pioneiro nazareno no Brasil fosse substituído pela visão estereotipada do
herói branco estadunidense.

O início da Igreja do Nazareno no Brasil se deu às voltas das comemorações do


Jubileu de Ouro do seu surgimento nos Estados Unidos. O Superintendente geral, com
jurisdição na América do Sul, G.B. Williamson e o Superintendente da América do Sul,
Honorato Reza visitaram o Brasil, em 1957, para aqui implantar os trabalhos nazarenos.
(IGREJA DO NAZARENO/ ENTREVISTA JOAQUIM ANTÔNIO LIMA, [199-]). A
história da inserção nazarena em território brasileiro é divulgada na mídia escrita e
informatizada de suas várias Igrejas, a partir da chegada do casal estadunidense Ervin e
Marjorie Stegemoeller ao Brasil. Ambos eram membros da Igreja do Nazareno em Indiana,
nos Estados Unidos, e lá atuavam como professores de escola dominical. (IGREJA DO
NAZARENO/ENTREVISTA CASAL STEGEMOELLER, 1995.). Ervin veio ao Brasil para
trabalhar em uma multinacional de máquinas pesadas em Campinas e por sentirem falta da
comunhão nazarena, haviam enviado uma carta à sede da Igreja em Kansas City, nos Estados
110

Unidos, solicitando missionários para instalarem a Igreja do Nazareno no Brasil. (CUNHA,


2005, p. 31).

Entre os possíveis missionários designados para o Brasil estavam aqueles


estabelecidos em Cabo Verde, o reverendo Everette Dewey Howard ou o reverendo. Earl
Elwood Mosteller. As chances de vir para o Brasil caíam mais sobre Mosteller, por ser
Howard Superintendente em Cabo Verde. De fato, a Superintendência geral decidiu pela
vinda dos Mostellers, sobretudo, pelo trabalho que havia executado em Cabo Verde. Segundo
Cunha, (2005, p. 32), os Mostellers chegaram ao Porto de Santos e foram recepcionados por
José Zito, que estava no Brasil havia mais de dois anos. Nessa época, Zito trabalhava em uma
empresa do setor alimentício, na cidade de Santo André, Earl Mosteller o convidou para
ajudar no trabalho de implantação da denominação no Brasil.

Antes de chegarem a Santos, os Mostellers haviam estado em Recife e Salvador e já


observavam as cidades brasileiras para implantarem a Igreja do Nazareno. Segundo Mosteller,
o Superintendente geral havia dito que não se prendesse em determinado lugar, enquanto não
tivesse a oportunidade de ganhar conhecimento do campo missionário. (IGREJA DO
NAZARENO/ENTREVISTA EARL MOSTELLER, [199-]). Por isso, o casal Mosteller
empreendeu viagens, durante seis meses, a Porto Alegre, São Paulo, Santos, Campinas, Rio
de Janeiro, Belo Horizonte, Goiânia e Brasília, a fim de escolher o melhor lugar para se
instalar a Igreja do Nazareno no Brasil. Cabe destacarmos que, segundo William Read (1969,
p. 77-79.), o quadro religioso brasileiro apresentava, no início da década de 60, uma taxa de
crescimento de 104% dos membros das Igrejas evangélicas no Brasil, o número de membros
ativos dessas igrejas ultrapassava os três milhões. O crescimento anual de evangélicos no
Brasil chegou aos 11% de 1960-67, enquanto a população total cresceu 3,4% no mesmo
período. Em uma população de mais de 70 milhões, medida pelo censo de 1960.
Evidentemente, o número de membros ativos nas Igrejas evangélicas não chegava a 5% da
população da época, mas esse quadro não significava uma necessidade primordial de se
implantar a Igreja do Nazareno no Brasil, principalmente em um grande centro.

Mesmo assim, a escolha de Earl Mosteller foi por Campinas, devido aos seguintes
fatores: a presença dos Stegemoellers ali seria útil no trabalho de implantação da Igreja;
Campinas era uma cidade universitária, o que favoreceria a formação de pastores mais
rapidamente do que com pessoas não alfabetizadas ou com menor grau de instrução; a
proximidade da cidade com os grandes centros urbanos e também com cidades do interior
111

facilitaria a chegada de jovens para a formação da membresia e como mão de obra na


expansão eclesial. Além desses, Mosteller considerou Campinas uma cidade limpa, segura e
iluminada com um bom padrão cultural, o que livraria os futuros missionários e pastores de
sofrerem agressões, como já tinha presenciado em Cabo Verde. (IGREJA DO
NAZARENO/ENTREVISTA EARL MOSTELLER, 1993.).

A segunda leva de missionários oficiais da denominação a chegar ao Brasil foi a


família Gates. Charles Wise Gates e sua esposa Roma Joanne Gates chegaram poucas
semanas depois da família Mosteller e também se estabeleceram em Campinas, sob os
cuidados dos Stegemoellers. A futura Igreja do Nazareno no Brasil iniciou-se dos encontros
realizados na casa dos Stegemoellers, no final de 1958. O primeiro culto oficial foi realizado
no dia 12 de Outubro de 1958. Segundo o boletim informativo do Jubileu nazareno no Brasil,
(IGREJA DO NAZARENO/BOLETIM INFORMATIVO, jul., 2008.), havia 12 pessoas
presentes entre elas, uma família de leigos, que não deve ter sido contada entre os presentes,
visto que as famílias dos missionários Mosteller, Gates e a do casal Stegemoeller já
alcançavam o número total de presentes no culto.

Os encontros na casa dos Stegemoellers atraíam cada vez mais os brasileiros, Earl
Mosteller e Charles Gates viram a necessidade de se ter um salão maior em que pudessem
realizar os cultos. Segundo Mosteller, ele e Gates empreenderam uma procura por um salão
que comportasse 200 pessoas, mas não encontraram, por isso fizeram um tabernáculo portátil
para a realização dos cultos evangelísticos, até o aluguel de um salão na Avenida Francisco
Glicério, esse foi o primeiro templo nazareno no Brasil. (IGREJA DO
NAZARENO/ENTREVISTA EARL MOSTELLER, [199-]). A inauguração desse templo, no
ano de 1959, foi um evento marcante na cidade. A estratégia de Mosteller foi a divulgação
incessante da chegada da Igreja naquele lugar, foram confeccionados mais de 10 mil folhetos
evangelísticos, veiculou-se 25 anúncios de rádios em três dias, um avião sobrevoava o centro
campineiro, jogando 135 mil folhetos para uma cidade de aproximadamente 200 mil pessoas,
o Exército se fez presente com sua banda, o Prefeito e representantes do governo estadual
prestigiaram o evento. Tudo isso seguia o ponto de vista de Mosteller de que antes de ganhar
a pessoa para Cristo era preciso ganhar sua atenção. (IGREJA DO
NAZARENO/ENTREVISTA EARL MOSTELLER, [199-]). Com isso o crescimento da
Igreja do Nazareno em Campinas foi patente.
112

Mosteller afirma que o motivo de tal crescimento foi o acesso que a Igreja teve aos
meios de comunicação. Segundo ele, a Igreja do Nazareno teve 10 vezes mais espaços
gratuitos nos jornais que todas as outras denominações juntas, incluindo a Igreja Católica.
(IGREJA DO NAZARENO/ENTREVISTA EARL MOSTELLER, [199-]). Esse fato facilitou
a vinda de muitas pessoas aos cultos evangelísticos que os nazarenos promoviam. Não apenas
os jornais foram utilizados pela Igreja, havia anúncios no rádio e televisão de modo que a
Igreja atingia todas as camadas sociais, as quais passaram a compor sua membresia. Segundo
Joaquim Antônio Lima, em 1960, Campinas não chegava a 250 mil habitantes, os prédios
podiam ser contados nos dedos, com isso a chegada da Igreja do Nazareno foi impactante para
toda cidade. (IGREJA DO NAZARENO/ENTREVISTA JOAQUIM ANTÔNIO LIMA, [199-
]). Essa visão de Lima não é corroborada por dados estatísticos da cidade de Campinas nessa
época, conforme apresenta o estudo de Cláudia Gomes Siqueira (2008). Contudo ilustra a
forma romantizada e aceita pela liderança nazarena, de como se transmite o discurso de
chegada da Igreja do Nazareno no Brasil.

A equipe missionária formada pelas famílias Mostellers e Gates foi reforçada, em


1959, com a chegada de William Ronald Denton e Sarah Ellen Byrd Denton. Os Dentons
haviam servido na Bolívia, Argentina e Uruguai e foram responsáveis pela expansão da Igreja
do Nazareno para Belo Horizonte e Distrito Federal, no final dos anos 50 e início dos anos 60
respectivamente. (CUNHA, 2005, p. 34). O trabalho dos Dentons, em Belo Horizonte, durou
até a implantação da primeira Igreja do Nazareno, no Bairro Barroca, quando, no início de
1960, mudaram-se para o Distrito Federal, aproveitando-se da oportunidade advinda da
construção da nova Capital Federal. Assim, os Dentons adquiriram lotes na futura capital a
preços módicos, para construção de igrejas e escolas. (IGREJA DO
NAZARENO/ENTREVISTA MOSTELLER, 1993.). Os Dentons foram substituídos por
Charles e Joana Gates que se fixaram em Minas Gerais até o ano de 1964, ambos contaram
com a ajuda do recém-formado José Zito que já auxiliava os trabalhos em Minas Gerais desde
sua implantação em 1959. Os Gates promoveram a expansão da Igreja para outros bairros da
capital mineira, até se retirarem desse Estado para assumirem a reitoria do Seminário do
Instituto Bíblico Nazareno (SIBIN), inaugurado, em 1962, na cidade de Campinas. Dessa
forma, a Igreja do Nazareno alcançou a região central do país, ainda nos primeiros anos de
sua inserção em terras brasileiras. (IGREJA DO NAZARENO/ENTREVISTA CHARLES
GATES, [199-]).
113

No Estado do Rio de Janeiro, a Igreja do Nazareno surgiu mediante contato do


reverendo Mosteller com pastor presbiteriano Souza Lima. Este participava de um encontro
de líderes em Campinas e tomou conhecimento da nova denominação que se estabeleceu na
cidade. Ao conhecer o trabalho e a doutrina nazarena, Souza Lima os divulgou para o casal
Josué e Damaris Filgueiras, presbiterianos, proprietários do Colégio Filgueiras, no Rio de
Janeiro. Souza Lima intermediou a implantação de uma capela nazarena no Colégio, dirigida
pelos missionários estadunidenses James e Carolina Kratz, que chegaram ao Brasil, em 1960.
O casal Kratz iniciou os trabalhos nazarenos no Rio de Janeiro, em 1966 e pouco tempo
depois, havia adquirido o Colégio Filgueiras. (IGREJA DO NAZARENO/BREVE
HISTÓRIA, 2009).

Earl Mosteller afirmou que o surgimento da Igreja do Nazareno no Rio de Janeiro foi
resultado de um amplo esforço propagandístico com importante veiculação dos cultos em
programas de televisão e rádios (IGREJA DO NAZARENO/ENTREVISTA EARL
MOSTELLER, 1993). Esse empenho midiático foi o responsável pela consolidação desse
distrito, no final de década de 80. Segundo Amadeu Teixeira, o primeiro Superintendente do
distrito Rio de Janeiro, o crescimento distrital está associado à visibilidade da Igreja na mídia.
O programa A Hora Nazarena, transmitido diariamente pela Rádio Melodia, atraiu centenas
de novos membros para a Igreja. Jornais da cidade fizeram reportagens sobre o impacto da
Igreja do Nazareno no Estado do Rio de Janeiro e programas de TV entrevistaram membros
da Igreja, bem como o próprio Superintendente distrital, para saber o que é a Igreja do
Nazareno. (O ARAUTO DA SANTIDADE, p. 27, mai., 1989.). Além disso, trabalhos sociais
como a criação do Ambulatório Nazareno, na Baixada Fluminense, atraiu o interesse de
autoridades políticas, que passaram a apoiar a Igreja do Nazareno.

No desenvolvimento da Igreja do Nazareno no Estado de São Paulo, desempenhou um


importante papel o caboverdiano, Joaquim Antônio Lima. Convertido à Igreja do Nazareno
em 1945, Lima foi para a Argentina em companhia do pai e lá entrou para o Seminário
Teológico Nazareno. Quando estava cursando o terceiro ano, em 1957, o Superintendente
geral, que havia estado no Brasil, o convidou para auxiliar na implantação da Igreja do
Nazareno neste país, assim que se formasse. Em 1959, Lima concluiu seu curso, mas por
necessidade de pastores na Argentina foi para o sul deste país. Quando os Mostellers
chegaram ao Brasil, foram informados do convite feito a Joaquim Lima e entraram em contato
com ele. Em 1960, Lima desembarcou no Brasil e passou a auxiliar os missionários
114

estadunidenses na Igreja de Campinas. Após um ano, foi enviado para Osasco, onde ficou até
1964.

A primeira Assembleia distrital no Brasil foi realizada em 1961, com um pouco mais
de uma dezena de pessoas, (IGREJA DO NAZARENO/ENTREVISTA JOAQUIM
ANTÔNIO LIMA, [199-]). Passados alguns anos, o Brasil deixou de ser uma área pioneira
para ser um distrito regular de grau 3, isso deu origem a uma Junta distrital formada por
pastores nacionais. No início da década de 70, com a saída dos Mostellers para Portugal,
Joaquim Lima foi escolhido Superintendente distrital e criou o distrito regular do Sudeste,
formado pelos Estados de São Paulo, Rio de Janeiro, Minas Gerais e Distrito Federal. Em
1982, na XXIII Assembleia distrital, o distrito Sudeste foi desmembrado em distrito regular
Rio-São Paulo e distrito de missão26 Minas e Centro-Oeste. Passados quatro anos, houve nova
divisão entre os distritos originando mais quatro novos distritos: Rio de Janeiro, São Paulo,
Minas Gerais e Goiás-Distrito Federal. Os pastores Joaquim Lima, Amadeu Teixeira, Dilo
Palhares e o missionário Robert Collins foram os respectivos Superintendentes distritais (O
ARAUTO DA SANTIDADE, pp. 26-27, set., 1986.).

As divisões territoriais não acabaram por aí. Na década de 80, outros distritos
surgiram, como o Sudeste Paulista, Nordeste Paulista, distrito Paulistano, distrito Nordeste e
áreas pioneiras em várias regiões brasileiras. (O ARAUTO DA SANTIDADE, p.27, ago.,
1988.). Essas divisões ocorreram pelo crescimento da membresia nazarena nessas regiões. Em
Campinas, por exemplo, a Igreja do Nazareno adquiriu o prédio do cinema São José, a fim de
comportar todos os fiéis que frequentavam os cultos no antigo templo, cuja estimativa era de
quase duas mil pessoas, na metade da década de 80. (O ARAUTO DA SANTIDADE, p. 26,
jan., 1986.). A estratégia de dividir para crescer tornou-se frequente na prática nazarena de se
expandir pelo território nacional. Além disso, essas divisões possibilitaram que cada distrito
percebesse sua singularidade e tratasse seus problemas de forma particular. Assim, o
desenvolvimento nazareno pelo país levou em consideração as peculiaridades socioreligiosas
regionais, no processo de implantação da doutrina da santidade no Brasil. Sobre isso, escreveu
Louie E. Bustle, diretor regional da Igreja do Nazareno para a América do Sul, no ano de
1989:

26
Distritos missão são aqueles que ainda não ganharam autonomia de gerir seus próprios negócios sem a ajuda
de outras instância, no caso, não ganharam a condição de distrito grau 3.
115

Há trinta anos que começou a obra da Igreja do Nazareno em Campinas, Brasil, sala
de visitas da cidade de São Paulo. A Igreja do Nazareno tem progredido bem na
cidade de Campinas e outros lugares, mas tem sido difícil plantar igrejas na
complexa cidade de São Paulo. O trabalho tem sido custoso e as pessoas difíceis de
alcançar, pois encontram-se entrincheiradas nos apartamentos de andares altos (...).
A área de maior interesse é o treino de novos pastores. O plano não é trazer pastores
de fora de São Paulo, mas usar aqueles que foram chamados para pregar, bem como
leigos que desejem começar novas congregações já formadas (sic). Foi criado um
novo distrito na cidade de São Paulo. Com este novo distrito, os nazarenos de São
Paulo podem fazer as próprias decisões e estratégias para alcançar a sua grande
cidade (...). Oremos todos que Deus ajude a fazer um grande impacto de Santidade
na cidade de São Paulo. (BUSTLE, Louie. in: O ARAUTO DA
SANTIDADE, p. 7, ago., 1989.).

Conforme registrou o primeiro Superintendente do distrito Paulistano, Adalberto C.


Leite, a estratégia de proliferação de distritos trouxe importantes avanços à Igreja do
Nazareno no Brasil. O distrito Paulistano em poucos meses já consolidava trabalhos
previamente estabelecidos em São Bernardo do Campo, Santo André, Mauá, Vila Lutécia e
Cidade Patriarca, bem como se proliferavam núcleos nazarenos em várias cidades da grande
São Paulo, através de igrejas caseiras. (O ARAUTO DA SANTIDADE, p. 27, mai., 1989.).

Desde a chegada dos Mostellers ao Brasil, a Igreja do Nazareno buscou se empreender


pela vastidão do seu território. Essa perspectiva já se apresentava no desejo de Mosteller
estabelecer mil igrejas até o ano de 1988. (IGREJA DO NAZARENO/40 ANOS DE
BRASIL, 1998.). Mosteller explicou a ocorrência desse fato, dizendo que no início da década
de 70, havia estudado o crescimento das igrejas carismáticas no Brasil e uma delas havia
alcançado 250 igrejas em 15 anos. Ao perceber esse dado, Mosteller acreditou que a Igreja do
Nazareno teria melhores condições de alcançar números maiores. Para tanto, ele propôs mil
igrejas em 30 anos. Aqui não se sabe à qual Igreja, especificamente, Mosteller se referiu, mas
a partir das considerações de William Read et al, (1969, p. 81) o crescimento carismático ou
pentecostal no Brasil, pelo menos no que se refere às Assembleias de Deus e à Congregação
Cristã no Brasil, pode ter sido impulsionado pela forma descentralizada de igrejas-mães, ou
seja, as Igrejas da Assembleia de Deus com mais de 500 membros ativos gerenciam
determinadas áreas chamadas de ministérios, o que permite a formação de redes de igrejas
menores que ganham capilaridade em várias regiões, possibilitando a filiação rápida de novos
membros. No caso da Congregação Cristã no Brasil, Read (1969, p. 82) aponta que essa
denominação, rapidamente, se instalou em bairros industriais ou próxima a eles, na cidade de
São Paulo. De forma que, quase 60% dos batismos efetuados anualmente ocorriam nesse
Estado. Esses fatos, em comparação à Igreja do Nazareno, apontam que a recente inserção da
Igreja do Nazareno no Brasil não permitiu a ela uma ação descentralizada que lhe desse
116

autonomia de ação em cada região, tal como ocorreu nas Assembleias de Deus. Além disso,
se apresentava ainda muito centralizada e dependente das resoluções dos Estados Unidos.
Quanto a sua forma de inserção, buscou mais sua estruturação organizacional que o
evangelismo propriamente dito. Assim conforme, ressaltou Mosteller, passados mais de
trinta anos a Igreja do Nazareno não alcançou nem 300 Igrejas. (IGREJA DO
NAZARENO/ENTREVISTA EARL MOSTELLER, 1993.). Segundo Mosteller, o que
impediu esse crescimento foi a demora na elaboração de uma produção literária de
evangelismo pela Igreja no Brasil. O Arauto da Santidade surgiu 12 anos após a implantação
da primeira Igreja no Brasil, além disso, seu conteúdo era pouco voltado para o evangelismo e
não apresentava as vantagens que a doutrina da santidade trazia em relação às outras igrejas.
(IGREJA DO NAZARENO/ENTREVISTA EARL MOSTELLER, 1993). Mesmo com pouca
ênfase evangelística, a revista O Arauto da Santidade foi um importante instrumento de
divulgação doutrinária da Igreja, ao ponto, de se estabelecerem metas para promoção da
revista nas igrejas. A principal meta era alcançar a assinatura de 25% da membresia de cada
Igreja. (O ARAUTO DA SANTIDADE, jan., 1986.).

A estratégia de expansão usada pela Igreja do Nazareno no Brasil era alcançar as


grandes cidades e implantar ali uma infraestrutura que se expandisse para as cidades menores.
A consideração de Mosteller que a Igreja do Nazareno tinha mais a oferecer do que as igrejas
carismáticas, que apresentavam um crescimento considerável no Brasil, fez com que os
líderes nazarenos pensassem o crescimento da Igreja atrelado ao uso das mídias. Em muitos
distritos, o programa A Hora Nazarena foi essencial, não somente para divulgação de seus
trabalhos, mas como divulgação da própria Igreja e de sua identidade em meio às outras
denominações. Conforme disse Joaquim Lima, na implantação do distrito Nordeste Paulista:

Deus nos tem abençoado muito. O nosso programa de rádio, ao vivo, “A


Hora Nazarena” todos os domingos das 21,30 ás 21,55 horas; a coluna num
dos jornais da cidade, mostrando o que cremos e pregamos; e todos os
meios possíveis têm sido usados para criarmos o nosso espaço no contexto
das muitas igrejas desta cidade, o que já é uma realidade desafiadora. Um
autêntico romance ministerial! (O ARAUTO DA SANTIDADE, p.
26 abr., 1989.)

A característica primordial da expansão nazarena no Brasil foi o destaque de suas


diferenças em relação às outras denominações e a apresentação da doutrina da santidade como
principal fator para a agregação de seus primeiros fiéis. A inserção da Igreja do Nazareno, em
um contexto religioso em que já havia muitas outras denominações protestantes, motivou os
nazarenos a salientarem as vantagens que sua instituição tinha em relação às demais
117

denominações. A Igreja visou proporcionar aos futuros nazarenos possibilidades não


disponíveis em outras igrejas. Estas considerações salientam a forma racional como se
utilizam os bens religiosos. Dessa forma, a inserção e a expansão da Igreja do Nazareno no
Brasil podem ser explicadas com base da teoria da escolha racional da religião de Rodney
Stark, Laurence Iannaccone e Roger Finke, principalmente, a partir do artigo, Desregulating
religion, publicado em 1997.

3.3 A Igreja do Nazareno vista a partir da economia das trocas religiosas

A teoria da escolha racional da religião é também conhecida como teoria das


economias religiosas. Nela se atribui a dinâmica das religiões associadas a um mercado
religioso e às escolhas racionais. A lógica que se atribui a essa teoria não é a da
mercantilização da religião, como poderia se supor, mas a da relevância de uma concepção
mercadológica nas relações religiosas. Com isso, ela não enfatiza que as instituições religiosas
devam desenvolver gestão empresarial, gestão de marketing ou qualquer outro recurso do
mercado para seu crescimento. Isso, contudo, pode acontecer se for considerado os aspectos
religiosos, como bens a serem disponibilizados às pessoas. Segundo Alejandro Frigerio, as
maiores críticas que o modelo tem recebido no nível conceitual e no debate internacional,
referem-se a seus pressupostos sobre o comportamento dos indivíduos e porque eles realizam
uma determinada escolha racional. (FRIGERIO, 2008, p. 19).

Rodney Stark e William Bainbridge, no livro, Teoria da Religião (2008) apontam que
as religiões se desenvolvem a partir de interações humanas simples e, é basilar, que os seres
humanos busquem o que percebem ser recompensas e evitam o que percebem ser custos. Para
Stark, recompensa é aquilo que incorre em um custo para se obtê-la e os custos são aquilo que
os seres humanos tentam evitar. (STARK E BAINBRIDGE, 2008, p. 37). Dessa forma, os
seres humanos em interação religiosa avaliam suas ações em termos de recompensa e custos.
Essa avaliação é definida como escolha racional. Stark destaca, que há uma concorrência
humana para se obter recompensas, visto que as demandas não são cobertas pelas ofertas dos
bens religiosos. Isso define que nem todos podem ser recompensados nas relações religiosas
(STARK E BAINBRIDGE, 2008, p. 42). Essas considerações levam ao entendimento da
escolha racional como a ação que dentro de determinados limites de informação e
compreensão e, motivadas por gostos e preferências induzem os seres humanos para as
118

escolhas. Esses fatores favoráveis e desfavoráveis são postos em avaliação, desencadeando


uma escolha racional. Assim, essa teoria permite inferir que o principal motor da vida
religiosa dos indivíduos é a avaliação. (FRIGERIO, 2008, p. 20). A partir dessa compreensão,
podemos explicar o constante trânsito religioso que os fiéis das várias denominações
empreendem entre as igrejas, pois eles tendem a maximizar as recompensas.

A definição de economia religiosa adotada por Stark e Finke (2000, pp. 37-38) aponta
que as economias religiosas são o conjunto das atividades religiosas de uma sociedade. Nele
se incluem os fiéis que representam a parte da demanda e um conjunto de instituições que
produzem os produtos religiosos. Caracterizando melhor, temos as doutrinas e práticas como
bens, ou produtos religiosos, que são oferecidos pelas instituições definindo a oferta. A
relação que se estabelece entre essas partes define o mercado religioso. Para Stark e Finke
(2000), o mercado é formado de vários segmentos cada um deles representando as diversas
preferências. Nessa perspectiva, o mercado se caracteriza pelo pluralismo religioso, não
submetido a nenhuma regulação. Assim, segundo Frigerio (2008, p. 23), “uma economia
religiosa não regulada ou impulsionada pelos setores do Estado levará ao crescimento da
pluralidade religiosa”, tal fato ocorreu no Brasil desde a implantação da República.

Outro ponto básico proposto por Stark e Finke é que na relação economia e religião a
demanda religiosa muda pouco, é segmentada, mas estável, com isso a principal propulsão
das mudanças religiosas são as transformações na oferta. Dessa forma, os teóricos da
economia religiosa entendem que o pluralismo religioso sempre existiu, mas o monopólio da
Igreja Católica, fundamentado na força do Estado, não permitiu a diversidade. Atualmente, a
quebra desse monopólio nada mais fez do que evidenciar essa condição, possibilitando a
demanda religiosa escorrer para outras instituições. Com isso, presumem-se os teóricos da
escolha racional, que não há um processo de secularização da religião, mas uma
desregulamentação do mercado religioso. Isso é, passou-se do monopólio à aproximação do
mecanismo de concorrência perfeita27. Contudo, a demanda por bens simbólicos diferentes, a
partir da perda da hegemonia católica no mundo, cresceu, mas no último século não mais
sofreu variações substanciais.

27
Concorrência perfeita é um termo das Ciências Econômicas que define o mercado regido por suas próprias
regras, sendo que as relações entre a oferta e demanda de um produto se estabelecem por uma variedade de
firmas e uma variedade de consumidores de modo que nenhum deles isoladamente pode definir as regras.
119

Nesse caso, a lógica mercadológica na eficácia das denominações religiosas não está
na luta para obter uma clientela diversa de suas doutrinas e práticas, mas no atendimento de
um nicho religioso que essas denominações possam cobrir. Consequentemente, os princípios
de marketing evangelístico e satisfação de clientes para obter novos fiéis, vindos de fora das
igrejas, não surte o resultado esperado. Conforme destaca Frigerio (2008, p. 24), “nada na
teoria supõe que prover a religião vigorosa e eficazmente implique racionalização,
burocratização ou gestão empresarial, mas principalmente, a capacidade de gerar
compromisso por parte de seus integrantes”. O atendimento religioso se volta para o ambiente
cada vez mais específico, de busca por nichos de mercado. Disso, nasce a crítica aos teóricos
da mercantilização da religião que afirmam estarem as igrejas mudando suas teologias,
doutrinas e rituais para atender às demandas do mercado religioso. Contradizendo esse
posicionamento, os teóricos da escolha racional estabelecem que as igrejas não mudam, mas
especializam-se, visto que não se pode alcançar todos os setores do mercado.

Essa perspectiva teórica da escolha racional sobre o cenário religioso brasileiro


possibilita entender que a inserção da Igreja do Nazareno no Brasil ocorreu em um ambiente
religioso de concorrência perfeita. Isto é, os possíveis entraves à sua inserção e consolidação
no território brasileiro não se configuraram em torno de embates teológicos com outras
instituições eclesiais, mas, sobretudo, na tentativa de aceitação popular de sua doutrina. Esses
posicionamentos dos teóricos da escolha racional da religião se aplicam à perspectiva da
inserção e expansão da Igreja do Nazareno no Brasil, como pontos de confluência entre as
origens de sua formação nos Estados Unidos e as distinções que ela estabeleceu em relação
aos ramos do protestantismo.

A singular fixação na teologia da santidade parece ser o motivo pelo qual a Igreja do
Nazareno adquire certa fidelidade dos seus membros. Assim, na ausência de uma pesquisa
sobre o trânsito religioso nas denominações nazarenas, inferimos, a partir da observação
participante, que a mobilidade dos nazarenos para outras denominações não é significativa e
que até mesmo em tempos de crise, em alguma de suas igrejas, o que observamos foi o
deslocamento dos nazarenos para outra igreja nazarena e não para outra denominação. A
aderência à santificação como um produto diferenciado voltou-se para atender também a uma
parcela de cristãos presentes em outras denominações que não se contentavam com o básico
da salvação cristã. Além disso, a Igreja do Nazareno tentou mostrar, aos não afiliados a
120

qualquer denominação, que possuía um diferencial que os levaria a uma condição superior
àqueles que compunham a membresia de outras igrejas.

Portanto, o processo de inserção e consolidação da Igreja do Nazareno no Brasil


decorreu em virtude de se atender uma demanda específica do campo religioso brasileiro, não
contemplado por outras denominações. Em vias de sua inserção em território brasileiro e, até
mesmo na atualidade, pouco se conhecia da doutrina de santidade da qual a Igreja do
Nazareno tornou a principal expressão no Brasil. Desse aspecto, podemos salientar a pouca
similaridade com as inserções no território brasileiro de outras denominações que visavam,
principalmente, à conversão dos brasileiros. Ao que parece, o desejo dos líderes nazarenos de
implantar igrejas em um ambiente já tomado por outras denominações e, na sua maioria, em
centros urbanos, mostra que a ênfase primordial dos nazarenos era se consolidar entre as
instituições religiosas do país e não buscar um campo evangelístico ainda não explorado. A
Igreja se ateve, primeiramente, ao aspecto de estabelecer uma mensagem doutrinária
diferenciada de aperfeiçoamento dos santos ao invés de cumprir projetos especificamente
evangelísticos, dado à inserção em lugares que muitas outras denominações já se encontravam
e ao fato de se estabelecer, no Brasil, apenas no final da década de 50.

As características da inserção e expansão da Igreja do Nazareno no Brasil assinalam


para uma compreensão sociológica do termo santidade, que remete para uma fundamentação
teórica, na qual a apropriação do constructo teológico da santidade pela Igreja do Nazareno
assumiu o valor de um bem mercadológico. Nesse aspecto, a doutrina da santidade ganhou
destaque como um produto nazareno. A expressão Santidade ao Senhor cunhada no emblema
da Igreja superou a condição de um simples lema bíblico, para evidenciar uma proposta de
estilo de vida daqueles que compõem o seu rol de membros. Mesmo tomada da tradição
wesleyana, a santidade ganhou destaque pelo modo como os nazarenos a compreenderam.
Assim a Igreja do Nazareno tornou-se proponente de uma mensagem de renovação espiritual
não apenas de seus próprios fiéis, mas também daqueles de outras denominações.

A doutrina da santidade faz parte de um sistema simbólico que legitimou e continua


legitimando a ação da Igreja do Nazareno no ambiente protestante brasileiro. A percepção dos
líderes nazarenos das relações de forças e interesses existentes no cenário religioso brasileiro
motivou-os a intensificarem as estratégias de divulgação das peculiaridades da Igreja pelas
mídias, um marketing religioso. Isso demostrava o interesse de se sobressair frente às
contingências do jogo de forças do ambiente religioso brasileiro, cujos espaços não se
121

alcançariam por mera sorte, mas por imperativos técnicos, contudo buscando um nicho de
mercado que atendesse ao imperativo da santidade. Nesse sentido, a origem, inserção e
expansão da Igreja do Nazareno no Brasil se estabeleceram como promoção de bens
religiosos em um mercado de escolha racional.

Dessa forma, mesmo no cenário religioso estadunidense, o surgimento da Igreja do


Nazareno se deu mediante a promoção de um bem simbólico doutrinário, que se apresentava
como solução ao mal social da época em que as demais igrejas se mostravam ineficazes para
combater. Conforme destacou Leonildo Silveira Campos, (2005, p. 105), a grande
efervescência nos Estados Unidos, dos últimos 35 anos do século XIX, foi marcada pelo
impacto da Guerra Civil, libertação dos escravos negros, tensões raciais, crise prolongada do
mundo da agricultura no sul do país, mobilidade populacional causada pelo processo de
industrialização e pela chegada de milhões de imigrantes brancos europeus. Na resposta a essa
situação, a Igreja do Nazareno lá se constituiu pela promoção da doutrina da santidade.

O diferencial promovido por essa doutrina, nos Estados Unidos, possibilitou aos
nazarenos o alcance de um nicho sociorreligioso que não encontrava respostas às suas
aspirações nas demais denominações, nem mesmo naquelas que pregavam a santidade, mas
das quais a lideranças nazarenas faziam questão de se diferenciar, por entenderem a pouca
profundidade com que tratavam essa doutrina. Com base na teoria da escolha racional,
percebemos a doutrina da santidade não apenas como um aspecto teológico e doutrinário da
Igreja do Nazareno, mas como um produto mercadológico que trouxe a ela um importante
diferencial na inserção e consolidação no cenário religioso brasileiro, com uma oferta
religiosa diferenciada, que, vista pela própria Igreja, não se dispunha entre as denominações
no Brasil.

3.4 A Atualidade da Igreja do Nazareno no Brasil

Passados vinte anos de inserção da Igreja do Nazareno no Brasil, já havia se


estabelecido 24 Igrejas do Nazareno nas principais regiões metropolitanas do país. Cinco
igrejas, em Belo Horizonte; quatro, no Distrito Federal; cinco, em Campinas; cinco no Rio de
Janeiro e cinco, em São Paulo.
122

A Igreja do Nazareno no Brasil ganhou sua condição como área central nos primeiros
anos do Século XXI, isso significou sua “independência administrativa em relação à América
do Sul e Estados Unidos” (NAZARENO, 2004, p. 4). Essa autonomia da Igreja no Brasil
originou a sub-região Brasil, coordenada pelo pastor titular da Igreja Central de Campinas,
Aguiar Valvassoura. O projeto de expansão da Igreja traçado por Aguiar visava à implantação
de uma Igreja do Nazareno em todas as cidades brasileiras com mais de 500 mil habitantes.
(NAZARENO, 2004, p. 4). Segundo Valvassoura, a Igreja do Nazareno, no Brasil, apresenta
uma concentração de 65% de seus membros em Campinas, havendo a necessidade de
descentralização dos trabalhos pelo Brasil. Em decorrência dessa constatação, foram criadas
três áreas administrativas no país, a Área Norte/Nordeste, a Área Central e a Área Sul. A
primeira e a última são compostas por 4 distritos cada, a Área Central é formada por 9
distritos. A melhor infraestrutura da Igreja está situada na Área Central que atende os Estados
de São Paulo, Minas Gerais, Rio de Janeiro e Espírito Santo. Nela concentram-se as duas
maiores Igreja do Nazareno no Brasil, Campinas e Mesquita, com a soma de quase 100 mil
membros. O distrito Sudeste Paulista é o mais desenvolvido dos distritos, nele situam a Casa
Publicadora Nazarena do Brasil e a Faculdade Nazarena. Este distrito representa os lugares de
maior concentração de nazarenos no país.

Um importante órgão de fundamentação da estrutura nazarena no Brasil foi o


Seminário e Instituto Bíblico do Brasil (SIBIN), que ganhou maior expressão ao ser
inaugurado o campus de Barão Geraldo, em Campinas, no ano de 1977. Nesse ano, a Igreja
do Nazareno no Brasil estava sobre a superintendência de Joaquim Antônio Lima. O
reverendo Elton Wood, que veio de Cabo Verde, onde já havia instalado o primeiro Seminário
Nazareno em país de língua portuguesa inaugurou esse campus. O seminário proveu as igrejas
nazarenas com pastores e seminaristas, através do lema: Deus chama; o SIBIN prepara. No
final da década de 80, quando se multiplicaram os distritos nazarenos no Brasil, o SIBIN foi
elevado ao nível universitário e passou a ter suas atividades descentralizadas em 11 distritos
nazarenos (O ARAUTO DA SANTIDADE, p. 3, nov., 1989.). O crescimento do SIBIN em
décadas futuras originou outros nomes, caracterizando seu desenvolvimento, a partir daí,
passou a ser Seminário Teológico Nazareno do Brasil (STNB), depois Faculdade Teológica
Nazarena (FTN) e por fim Faculdade Nazarena do Brasil (FNB). No ano de 2007, a Igreja do
Nazareno protocolou, junto ao Ministério da Educação do Brasil, a solicitação de
credenciamento para o funcionamento da FNB como instituição do ensino superior brasileiro.
Na comemoração dos 50 anos no Brasil, a FNB foi inaugurada oficialmente, fazendo parte
123

das 58 instituições de ensino superior da Igreja do Nazareno espalhadas em 40 países. A FNB


oferece os cursos de Administração, Licenciatura em Música, Pedagogia e Teologia.
(IGREJA DO NAZARENO/INFORMATIVO DA FACULDADE NAZARENA DO
BRASIL, 2008, p. 2-3).

Ressaltamos que, não obstante o surgimento da FNB, os seminários distritais para


formação específica de pastores ainda existem. Há, contudo, um projeto para que esses
seminários sejam polos de extensão da Faculdade Nazarena do Brasil espalhados pelo país,
além dos já existentes núcleos de Estudos Teológicos Descentralizados (ETED). Para efeitos
formais, o sistema educacional nazareno no Brasil é formado pelo Seminário Teológico
Nazareno do Brasil e pela Faculdade Nazarena do Brasil que atendem por volta de mil alunos
matriculados. (IGREJA DO NAZARENO/AGENDA, 2009.).

A mídia nazarena no Brasil ganhou espaço desde a implantação do programa A Hora


Nazarena. Esse programa era transmitido pela Rádio Transmundial às segundas, quartas e
sextas em ondas curtas, que são de maior alcance, mas perdem facilmente o sinal. Algumas
outras emissoras, como a Rádio Melodia, no Rio de Janeiro e a Rádio Clube de Ribeirão Preto
também transmitiam o programa A Hora Nazarena. Esses programas eram produzidos pelos
reverendos Jorge Barros e Joaquim Lima, o Superintendente distrital no Brasil e do distrito
Nordeste Paulista, nos anos 70 e 80. Geraldo Nunes Filho, (1994) em entrevista com o
reverendo Joaquim Lima, apontou que não existia nenhuma estratégia nacional unificada do
uso do rádio como instrumento que contribuísse para o desenvolvimento e o crescimento das
Igrejas nazarenas locais. A ausência de um centro radiofônico no Brasil tornou a produção do
programa A Hora Nazarena um trabalho pouco profissional realizado pelos voluntários da
Igreja, principalmente, pelo Superintendente distrital que deixava seus afazeres na Igreja e na
superintendência para suprir essa falta.

Atualmente, a Igreja do Nazareno atua na mídia radiofônica mundial através das


Transmissões de Missão Mundial (TMM) que, além da mídia televisiva e informatizada, atua
como um agregado de Rádios espalhadas pelo mundo. No Brasil, a TMM é coordenada pelo
pastor Paulo Neto, ele utiliza-se da estrutura radiofônica do distrito Sudeste Paulista e da
Rádio Nazaradio, que funciona desde agosto de 2009, para a produção radiofônica nazarena
no país. Há programas voltados para as mulheres, jovens e adolescentes que são reproduzidos
e disponibilizados às Igrejas via serviço postal. Além da Nazarádio, existem algumas
webrádios espalhadas nas Igrejas como a Rádio Som do Céu da Igreja do Nazareno no Rio
124

Grande do Norte, a Rádio Naza Rio da Igreja do Nazareno de Nilópolis e a Rádio Nazarena
Memorial, em Campinas, entre outras.

Destacamos que, não existe um centro radiofônico na Igreja do Nazareno no Brasil,


conforme já desejava, desde 1994, o atual reitor da Faculdade Nazarena do Brasil, Geraldo
Nunes Filho. Contudo, já existe empenho dessa Faculdade para o estabelecimento de um
curso superior em midialogia, bem como, já está em andamento a construção de um estúdio
de Rádio e TV nas dependências da FNB, como projeto para se produzir um maior
desenvolvimento da Igreja do Nazareno do Brasil na área das mídias. Desde o ano de 2003, a
Igreja do Nazareno produz o programa Opção de Vida, transmitido em canal aberto para mais
de 90 cidades do Estado de São Paulo e adjacências. Com essas ferramentas midiáticas, a
Igreja do Nazareno busca maior visibilidade no cenário religioso brasileiro, fortalecendo as
metas traçadas de se alcançar 100 mil membros no ano de seu centenário. (IGREJA DO
NAZARENO/BOLETIM INFORMATIVO, 2008.).

Além da mídia radiofônica, a Igreja do Nazareno investe contundentemente em


periódicos, jornais e boletins de informação. Algumas Igrejas tem individualmente produzido
revistas informativas, como a Figueira, produzida pela Igreja de Valinhos, com a tiragem de
dois mil exemplares que são distribuídos para todos os distritos, mas foca suas matérias no
distrito São Paulo. Em termos nacionais, a Igreja do Nazareno no Brasil passou a produzir a
revista Nazareno, com a tiragem de 20 mil exemplares e com distribuição trimestral. Apesar
de ser voltada a todas as Igrejas do Nazareno no Brasil, a divulgação dessa revista ainda é
deficitária e não tem alcançado a maioria das Igrejas. Percebemos, ainda, a publicação de
inúmeros boletins informativos dos distritos, igrejas, seminários e instituições nazarenas como
a FNB. Muitas dessas publicações são impressas em gráficas particulares, trazendo um gasto
excedente, que não haveria caso fossem impressas no parque gráfico da Casa Nazarena de
Publicações. Assim, a pulverização desses periódicos, mesmo que atenda as demandas locais,
transmite a ideia de uma falta de estratégia nacional e unificada para tornar a Igreja do
Nazareno no Brasil mais visível no cenário nacional.

Outro aspecto importante para se entender a atualidade da Igreja do Nazareno no


Brasil passa pela prática pastoral e pela influência que o pastor exerce na condução da
membresia. A figura do pastor nazareno é essencial na instituição e ela define os contornos
que a igreja nazarena brasileira tem tomado no limiar de seu centenário. Por isso trataremos
esse assunto a seguir.
125

3.5 O Pastorado Nazareno

Em diversos meios e em diferentes estruturas de governo eclesial protestante uma


figura emerge entre as demais: o pastor. Mesmo que o consideremos sob vários aspectos, as
abordagens sobre ofício pastoral aparecem ainda intrínsecas às avaliações teológicas. Sem
desqualificarmos essa abordagem, mas buscando, sobretudo, alternativas, analisamos o ofício
pastoral nazareno, a partir de uma perspectiva sociológica. Buscamos entender os critérios de
legitimidade desse ofício perante a membresia da Igreja do Nazareno, a partir do exame de
sua formação, crescimento e consolidação na tomada de decisões no corpo eclesial. A
observação que temos é que o ofício pastoral na Igreja do Nazareno ascendeu a uma posição
em que não se percebem diretrizes traçadas nessa instituição que ultrapassem seu domínio.
Assim, analisamos as características do ofício pastoral na Igreja do Nazareno, desde sua
formação no Seminário Nazareno, a inserção nos ofícios institucionais, a construção e
legitimação da autoridade pastoral nessa instituição e os efeitos que esses aspectos
representam na coletividade nazarena, a ponto de não pensarmos em uma práxis dessa Igreja
dissociada da centralidade hegemônica pastoral.

O Manual da Igreja do Nazareno (IGREJA DO NAZARENO/MANUAL 2009-2013,


2009, p. 6) reconhece que todos os seus membros leigos, ou não, possuem a mesma
autoridade nos corpos deliberativos e legislativos da Igreja. Isso possibilita um equilíbrio
efetivo na distribuição de poderes, o qual é visto pela Igreja como oportunidade de
participação e serviço na instituição. Portanto, ao leigo nazareno seria facultada uma condição
semelhante à dos pastores, exceto, no que diz respeito às condições como pregador. Apesar
disso, somente aos presbíteros, ou chamados ministros ordenados pela Igreja se atribui a
representatividade da Igreja. Essa representatividade se mostra já no âmbito local, em que o
pastor de cada Igreja é membro obrigatório das Juntas administrativas e nelas assume o papel
de presidente. Dessa forma, o pastor da Igreja local não precisa do processo eleitoral para se
ingressar na Junta e suas atuações são independentes de qualquer decisão da membresia. Isso
significa, que por mais democrático que possa ser o processo eletivo da Junta, a
democratização desse processo depende da atuação do pastor. Conforme cita o Manual -1997-
2001- “a perpetuidade e a eficiência da Igreja do Nazareno muito dependem da qualidade
espiritual, do caráter e do modo de vida dos seus ministros” (IGREJA DO
NAZARENO/MANUAL 1997-2001, 1997, p. 152). Destacamos que todos esses aspectos
relativos aos pastores dizem respeito também às pastoras nazarenas.
126

O pastor é um presbítero definido pela Igreja como aquele que recebeu uma vocação
divina para pregar e utilizar seus dons no serviço eclesial e eclesiástico. Esses dons são
demonstrados e realçados pelo treinamento adequado e pela experiência nos trabalhos
executados na instituição. A posse efetiva no cargo de pastor se dá pelo ato solene da
ordenação. Nela, o pastor é integralmente investido de autoridade para desempenhar suas
funções. A Igreja do Nazareno reconhece apenas a ordem dos presbíteros investida de
autoridade para exercer a pregação. Essa é uma ordem permanente na igreja e por ela se
governa, administra e realiza os sacramentos do batismo, da ceia28 e do matrimônio. Essas
funções sacramentais conferem ao pastor a condição de iniciar e manter o fiel na vida cristã e,
por uma perspectiva temporal, mantê-lo na instituição eclesial.

A formação do pastor nazareno ordenado se dá primeiramente por aquilo que é


designado vocação pastoral, ou o chamado divino para o exercício de pastor nas Igrejas, tal
função engloba, principalmente, dirigir uma igreja local no exercício da prédica, administrar
bens eclesiásticos e realizar os sacramentos. Conforme promulga o Manual -2009-2013-, todo
candidato ao pastorado deverá ser primeiramente examinado quanto à sua experiência pessoal
de vida cristã, seu conhecimento das doutrinas bíblicas e das normas da Igreja, mesmo que
seja apenas para obter uma licença pelas Juntas locais ou de credenciamento distrital, sem ser
ordenado. (IGREJA DO NAZARENO/MANUAL 2009-2013, 2009, p. 166). Um pastor
licenciado é aquele cuja chamada e dons ministeriais foram reconhecidos, formalmente, pela
Assembleia distrital, através da concessão de uma licença ministerial, autorizando-o para uma
esfera mais ampla de serviço do que aqueles pastores licenciados pelas Juntas locais. Esta
licença, normalmente, representa um passo para ordenação como presbítero. O tempo em que
um pastor licenciado passa a presbítero depende do cumprimento das matérias no seminário.

Os candidatos ao pastorado ingressam no seminário nazareno ao cumprir etapas em


suas vidas cotidianas na Igreja. Independente dos anos de conversão e, após o cumprimento
do rito do batismo, o candidato ao pastorado manifesta seu desejo pessoal em ingressar no
ministério pastoral. Depois dessa decisão pessoal, ele ingressa no Seminário Teológico
Nazareno e cumpre quatro anos de estudos de disciplinas bíblicas e teológicas. Não se exige
do candidato ao pastorado nenhum nível de escolaridade. Para a Igreja, o chamado é divino e

28
A chamada Ceia do Senhor é um rito símbólico em que os membros da Igreja se reúnem, uma vez ao mês,
para comerem o pão e beberem o vinho, os quais são entendidos pelos nazarenos como os símbolos do corpo e
do sangue de Cristo na crucificação.
127

Deus o sustentará nessa empreitada. Contudo, há aplicações de critérios distintos para


avaliação da produção dos candidatos no seminário. No entanto, dos seminaristas requer-se
um nível básico de aprendizado, verificado por meio de trabalhos, leituras, exercícios em
grupo, ou individuais e provas escritas e orais para sua aprovação e credenciamento como
pastor nazareno. Ao fim dos quatro anos de estudo, os seminaristas passam por exames
elaborados pela Junta de Credenciamento que lhes confere a credencial para a ordenação.
Uma vez ordenados, podem assumir ou auxiliar o trabalho pastoral em qualquer das Igrejas do
Nazareno. Essas prerrogativas, afirmadas pelas lideranças como dadas por intermédio da
vontade divina, são reforçadas e legitimadas pela instituição. Com isso, o que lhes é conferido
por uma perspectiva espiritual se atrela à perspectiva institucional. Dessa forma, o pastor
assume a liderança institucional porque antes alcançou as prerrogativas espirituais que se
enrijeceram no percurso histórico da Igreja.

A relação entre o pastor e a instituição se dá por via dupla, ou seja, a instituição


reconhece o chamado divino ao pastorado e o pastor assume a liderança para perpetuar as
diretrizes institucionais e doutrinárias, o que o identifica como um tipo de clérigo, como
profissional do religioso, conforme declara Jean-Paul Willaime (2003, p. 121). Assim, o
pastor assume um profissionalismo institucional, pelo fato de exercer “incontestavelmente um
ofício na medida em que se entrega a uma atividade da qual tira seus meios de subsistência e
que lhe confere uma ordenação profissional” (WILLAIME, 2003, p. 121). A distinção
estabelecida entre o pastor nazareno e os leigos decorre do aval institucional pois, ainda que
alguém assuma ter o chamado divino ao ministério pastoral, somente ganhará legitimidade
junto à Igreja que o reconhece. Portanto, a ordenação pastoral na Igreja do Nazareno cumpre a
percepção de Willaime (2003, p. 134), que o ministério pastoral é indispensável à vida da
Igreja, uma vez que tem um caráter funcional para ela.

Alguns nazarenos afirmam que o processo como se constitui o pastorado na Igreja do


Nazareno decorre de sua forma de governo. A forma de governo da Igreja do Nazareno é a
representativa, conforme define sua constituição. A representatividade significa que a Igreja
evita os extremos de outras formas de governo como episcopado de um lado e o
congregacionalismo do outro. Observamos, no entanto, que a forma de governo pouco
interfere na hegemonia pastoral nazarena. Se caso a hegemonia pastoral fosse dependente da
forma de governo, o episcopado reforçaria essa tendência, ao caso que no congregacionalismo
essa figura não existiria. Se não é a forma de governo institucional que dá prerrogativas ao
128

pastor nazareno, é necessário entendermos em que se fundamenta a autoridade pastoral, isso


é, qual é a influência que a instituição eclesial e o pastorado exercem na coletividade para que
ambas sejam aceitas como autoridade.

Desde a Reforma luterana, os fiéis são colocados em posição de sacerdotes, ou seja,


não necessitam de intermediários para que se alcancem a salvação divina, portanto, nesse
caso, não necessitariam de uma autoridade humana que lhes fosse sagrada. Conforme
ressaltou Altmann (1994, p. 32) sobre a conclamação que Lutero fez aos leigos políticos da
Alemanha para efetuarem reformas eclesiásticas e sociais, advertindo-os que essa missão lhes
caberia como sacerdotes, pelo batismo e pela fé, ou seja, pela descoberta do sacerdócio real e
universal dos batizados. Assim a condição sacerdotal estava disponível a todos e não apenas
aos clérigos. Essa distinção entre sacerdotes e leigos, principalmente no âmbito das
prerrogativas espirituais permanece no âmbito da Igreja do Nazareno.

A relação entre os pastores e leigos nazarenos demonstra desde o princípio um


posicionamento contrário à perspectiva do movimento reformador luterano em não criar uma
distinção entre o clero e o laicato. Em direção inversa, essa distinção ganhou contornos bem
definidos na Igreja do Nazareno. O valor do ofício pastoral, na concepção geral de fiéis e
líderes nazarenos, suplanta a vocação leiga. Em termos práticos, a influência pastoral sobre a
condução da Igreja supera a influência de toda a membresia. Segundo se observa no discurso
proferido por Jim L. Bond, Superintendente geral na 26ª Assembleia geral da Igreja do
Nazareno, este ressaltava a necessidade do desenvolvimento dos líderes, pois “o sucesso de
toda empresa, incluindo a igreja, cresce e cai com a liderança. Precisamos de líderes em todos
os níveis da Igreja e nenhum líder é mais importante do que o pastor de uma igreja local”.
(BOND, 2001.).

Esses fatos, vistos a luz da perspectiva weberiana de dominação (1922), podem ser
explicados por duas manifestações de legitimação de poder, uma burocrática legal e externa, a
outra carismática e interna. O papel desempenhado pelo pastor nazareno em relação à
organização eclesial é definido em termos hierárquicos. Os níveis de poder devem ser
respeitados por eles na condução da organização, o âmbito eclesiástico externo predomina
sobre o eclesial interno. Assim, a relação que se estabelece entre os pastores em si e a
instituição é a burocrática-legal, visando o aperfeiçoamento institucional e o alcance de
objetivos comuns. A outra relação ocorre entre os pastores e membros de suas igrejas. Nessa,
os pastores são percebidos como orientadores espirituais, instituídos de um poder divino, o
129

qual os torna responsáveis pelos sucessos e fracassos no cotidiano da Igreja. Percebemos essa
relação ainda como carismática, apesar de estar no âmbito institucional. Assim apelamos para
a consideração weberiana do tipo ideal que não se mostra de fato como realidade pura.

A membresia nazarena, em sua maioria, entende ser o pastor o anjo da Igreja


conforme ressalta a Bíblia, no livro de Apocalipse29. O poderio do pastor se estabelece por
uma relação de proximidade, interna à condução da Igreja, que é legitimada pelo carisma.
Nesse aspecto, as decisões pastorais são menos contestadas quanto mais se manifesta seu
carisma diante da membresia. A condução da igreja é legitimada pelo poder divino. Com isso,
o único mecanismo capaz de deter uma provável manipulação pastoral sobre a membresia
vem da própria estrutura hierárquica externa. Sendo o pastor uma espécie de guardião da
instituição, somente em casos em que se questiona a dominação carismática, geralmente,
devido a uma conduta que a membresia considera moralmente inapropriada, a instituição
toma as devidas providências.

A dominação carismática exercida pelo pastor nazareno conduz a membresia da Igreja


a muitos tipos de esforços, desde os mais triviais como de manutenção do templo, serviços de
eletricistas, faxinas, depósitos bancários, serviços de cozinha, àqueles de maior risco como
evangelismo em área de tráfico, visitas aos presídios, visitas aos hospitais e missões em
regiões distantes. O poder pastoral, não raramente, remete à sacralidade das coisas comuns.
Isto é, os aspectos comuns da vida cotidiana são tratados na perspectiva do sagrado. Por
exemplo, a perda de um emprego pode ser resolvida por dias de jejum e oração, a compra de
um carro é uma dádiva de Deus, o resultado de um exame implica uma atitude de oração
diária ou a falta dela. Com isso, o poder pastoral não se limita apenas ao âmbito eclesial, mas
se estende para outros tipos de relações, como familiares, profissionais, afetivas, etc. Essa
apropriação do sagrado para efeito secular decorre da legitimidade pastoral por meio de sua
prédica. Disto, surge a necessidade de deslocamento do fiel à Igreja para o encontro pessoal
com o pastor para, assim, obter as dádivas divinas.

Sem querermos aprofundar no extenso debate sobre a secularização, é importante


entendermos a perspectiva apontada por Emílio Villafane (2009). Segundo ele, os termos
secularismo, secularização e secularidade representam formas de questionamento do fato

29
Conforme se percebe na Bíblia Sagrada, o livro do Apocalipse, nos capítulos 2,3 e 4, faz referência aos anjos
das igrejas, sem, contudo, deixar claro a relação que se possa estabelecer entre aqueles e a figura dos pastores
das igrejas atuais.
130

religioso frente a três aspectos respectivamente: pensamento científico, civilização moderna e


autonomia dos indivíduos. O termo secularismo traz a contestação radical de que a religião já
deixou de ser válida como explicação no mundo das ciências. Já, a secularização apresenta
qual é o posicionamento da religião frente à cultura moderna, o que pode caracterizar até
mesmo uma postura profana pela religião não apresentar expressões que lhe são específicas.
A secularidade destaca a emancipação do individuo frente à heteronomia da Igreja. Esses três
aspectos, segundo Villafane (2009), consistem na substituição da relação vertical divino-
humano, para a horizontal humano-humano, devido às impossibilidades apresentadas pela
religião com as transformações da Idade Moderna. Ao se tratar de secularismo, Villafane
(2009) enfatiza as transformações do lugar da religião na modernidade, que se caracteriza por
uma sociedade que se baseia na ciência e na técnica, relegando os mitos e os ritos e
permitindo aos indivíduos se emanciparem cada vez mais dos valores religiosos. Embora
Villafane (2009) apresente distinções entre o secularismo, secularização e secularidade, a
ideia básica é a da perda da exclusividade da Igreja na condução da vida humana.

Entendemos que a perspectiva de Villafane (2009) parece não se consolidar na relação


entre o pastor e membros da Igreja do Nazareno. Nesta, a figura do pastor é
sobrenaturalmente instaurada, ou seja, o pastor nazareno não é um simples pregador, ele é
visto pelos membros como servo da divindade e o guia espiritual da coletividade. Isso aponta
que a racionalidade criada pelo pastor e sua legitimidade fortalecida pela estrutura eclesiástica
o tornam protegido da crítica leiga, que não percebe claramente os erros e enganos que o
envolvem. Ao mesmo tempo, essa blindagem pastoral isenta a instituição. Nesse aspecto,
podemos compreender o porquê dos erros e enganos serem tratados de forma privativa à
liderança e distantes da coletividade, ainda que muitas vezes se refiram a essa. Na Igreja do
Nazareno, quando um pastor comete erros graves, ele é afastado do ministério pela autoridade
que lhe é superior, mas, normalmente não se divulga o motivo desse afastamento. O tempo
desse afastamento é ditado pelos Superintendentes distritais ou gerais. Todo o processo que
envolve a repreensão ou punição de um pastor é mantido em sigilo, a menos que o pastor saia
da instituição e passe a difamar o nome dela. Percebemos que o pastor nazareno é parte
fundamental na consolidação da Igreja tanto no sentido eclesiástico como eclesial, contudo,
sua ação ganha maior capilaridade enquanto parte do culto nazareno.

A liderança consubstanciada na figura do pastor nazareno permite que sua prédica


aborde vários pontos que, em alguns casos, podem até se opor. Contudo, de modo algum,
131

deve ultrapassar os limites doutrinários da instituição. Dessa forma, o discurso pastoral exerce
uma forma de coesão ideológica30 em torno da instituição eclesial. Nesse aspecto, a percepção
que os leigos têm da instituição e do pastor assume contornos inteiramente transcendentais,
criando nesses dois últimos uma camada que somente será quebrada se for patente à
contradição com a Bíblia. A centralidade da prédica não é apenas um exercício de reflexão
espiritual, mas um importante mecanismo de condução das massas no interesse da instituição.

A percepção dos leigos baseia-se, sobretudo, nos termos bíblico-teológicos que


demonstram o valor simbólico transcendental atribuído às instituições eclesiais e aos pastores.
As expressões como templo, casa de Deus, povo de Deus, casa de oração, santuário, homem
de Deus, anjo da igreja, sacerdote, etc. salientam que o “status” institucional e pastoral mais
do que aceitos, devem ser reverenciados. Não obstante, devemos esclarecer que, não fazemos
aqui uma abordagem axiológica. Isso é, por serem as instituições eclesiais ou o ofício pastoral
legitimados na prédica, não significa, necessariamente, que essa é utilizada para fins escusos.
O que destacamos é o uso da prédica na consolidação da instituição e da hegemonia pastoral.
Com isso, entendemos que pastor e a instituição eclesial formam um único sistema que cria
valores, atitudes e crenças vistas pelos leigos como únicas e verdadeiras.

Inferimos que a tradição teológica influencia de forma significativa na construção


ideológica das Igrejas do Nazareno. Por meio da observação participante, pudemos constatar
que a construção simbólica nas Igrejas do Nazareno passa a ser um subproduto de sua
teologia. Essa provê o discurso de símbolos aceitáveis na coletividade. Esse aspecto pode ser
estendido para outras denominações. O simbolismo criado pela teologia da prosperidade, por
exemplo, impregna nos fiéis valores de mercado que são sacralizados na prédica. No caso da
Igreja do Nazareno, a base teológica é a santificação, pela qual todo o crente, que foi
regenerado, precisa ainda ser libertado do pecado por uma segunda obra de santificação, tal
teologia leva o fiel a uma atitude intimista de pouca valorização dos bens materiais e da vida
de prazer. Tal teologia é pouco atrativa ao cenário protestante brasileiro, sendo a Igreja do
Nazareno uma das poucas instituições eclesiais a tê-la em distinção. Assim, esse diferencial
teológico se traduz na prédica pastoral que fortalece a crença de que os seres humanos,
mesmo os crentes, são incompletos em sua essência, necessitando da intervenção divina por
meio da santificação, para alcançar o patamar desejado. Essa doutrina nazarena pode ser

30
Cf. Willaime, uma ideologia é um corpo de crenças reconhecidas como legitimas em função de uma
racionalidade vigente. (Willaime, 1985, p. 130).
132

pouco atraente no contexto do protestantismo brasileiro, dificultando a expansão dessa Igreja,


mas, por outro lado, garante uma maior adesão daqueles que fazem parte dela,
consequentemente, favorecendo um menor trânsito religioso de sua membresia.

A relação instituição–pastor, na Igreja do Nazareno, salienta uma funcionalidade


pouco vista em outras instituições, por se influenciarem concomitantemente no
comportamento dos fiéis, em vários âmbitos de suas vidas. Os ensinamentos pastorais
extrapolam ritos e liturgias para se estabelecerem no dia-a-dia do fiel, cujas práticas são
referenciadas pela aproximação ou distanciamento ao aprendizado que se teve na igreja. Além
disso, é comum entre os pastores nazarenos utilizarem-se da concordância divina para
almejarem seus intentos. O compromisso de aceitação da prédica e de qualquer outro anúncio
ou evento, aprovado pela instituição eclesial, deve ser imediatamente referendado pela
divindade, através do amém31 da coletividade. O amém significa o comprometimento da
membresia perante a divindade, assim, essa membresia, dificilmente, se escusará de suas
responsabilidades. Queremos dizer que a influência dos pastores sobre a membresia é, de uma
forma geral, perceptível em várias situações. Atribuímos esse fato ao caráter distinto de porta-
voz e defensor das coisas sagradas que a Igreja do Nazareno confere aos seus pastores e
pastoras.

Esses fatos da condição pastoral podem ser refutados por muitos como de pouca
relevância no âmbito de uma análise sociológica. No entanto, ao percebermos os efeitos da
ideologia pastoral nazarena em determinados processos sociais, como em eleições, por
exemplo, em que candidatos se apresentam ou se afiliam às Igrejas, oportunamente, a fim de
obterem votos, poderemos notar, que a ideologia das instituições eclesiais e de seus pastores
são capazes de direcionar vários e importantes processos sociais, sem estarem intrinsecamente
ligados a eles.

3.6. Cultos e Práticas Nazarenas

A liturgia nazarena é chamada de culto, ela ocorre em seu formato mais tradicional aos
domingos, geralmente, pelas manhãs e às noites. Há outras formas de encontros nas igrejas

31
Expressão litúrgica muito utilizada após declarações feitas pelos pastores ou algum membro da coletividade.
Significa, assim seja, buscando a concordância da divindade com os compromissos assumidos pelos humanos.
133

nazarenas, denominadas de cultos, mas que não atendem ao padrão de culto formal da Igreja.
O encontro de jovens e o culto de estudo bíblico são alguns desses cultos informais. A
centralidade do culto nazareno se fundamenta na Bíblia e na autoridade pastoral. O carisma
da mensagem legitima ou deslegitima as ações da membresia, ao ponto da Bíblia, denominada
de Palavra de Deus, se tornar o único ponto de referência e avaliação de todas as coisas.
Conforme destaca Willaime (2003, p. 137), “a verdade servida pelos clérigos se afirma na
pregação da palavra e não na hierarquia eclesiástica e nos ritos que ela proporciona”.

O culto nazareno se inicia com uma oração proferida pelo pastor ou algum membro da
denominação. Após essa oração, são entoadas músicas do hinário nazareno Louvor e
Adoração, cujos cânticos são mais melodiosos e com letras extensas. Segundo o prefácio
desse hinário,

Para que o canto seja aceitável, ele deve ser inteligente e entoado com reverência. A
Linguagem e o espírito dos hinos de uma congregação traduzem a profundidade da
experiência religiosa dos que a compõem, por isso se diz com frequência que depois
da Bíblia, é o hinário o recurso vital no desenvolvimento da fé cristã. (IGREJA
DO NAZARENO/LOUVOR E ADORAÇÃO, 1982.)

Um dos hinários mais antigo usado pela Igreja do Nazareno no Brasil é o Graça e
Devoção que foi compilado por uma Comissão de Música designada pela Assembleia distrital
da Igreja. (IGREJA DO NAZARENO/GRAÇA E DEVOÇÃO, [19--]) Ele é composto de 120
hinos extraídos de outros importantes hinários utilizados por outras denominações, entre
outros, da Harpa Cristã, Cantor Cristão e Cancioneiro Salvacionista. O hinário Graça e
Devoção foi substituído pelo hinário Louvor e Adoração que até os dias de hoje é o utilizado
pelos nazarenos. Segundo afirmam seus editores, ele resultou dos esforços de pesquisa
realizados por várias pessoas que “examinaram todos os hinários, publicados em português;
consultaram técnicos e músicos; escutaram a ministros e a leigos; sentiram o espírito peculiar
de congregações; e recomendaram o conteúdo, a teologia, a música, o estilo e a forma dessa
obra” (IGREJA DO NAZARENO/LOUVOR E ADORAÇÃO, 1982.). Esse hinário é
composto de 478 hinos e mais uma parte contendo as leituras congregacionais que são, por
vezes, lidas pelos pastores e, ou fiéis durante os cultos.

Outros estilos musicais podem ser entoados nos cultos e não se faz restrições quanto
ao uso de qualquer instrumento. As músicas são escolhidas por aqueles responsáveis pelo
direcionamento do chamado louvor, que é o tempo dedicado aos cânticos. Os fiéis podem
sugerir as músicas, conforme a ocasião. No entanto, essa prática é mais utilizada em igrejas
134

pequenas, para não se atrapalhar o andamento do culto. As restrições que se faz a alguma
música se dão pela percepção da incompatibilidade da letra com a doutrina, ou com os
ensinos bíblicos difundidos pela Igreja. Até que se perceba essa incompatibilidade, não se faz
nenhuma restrição a elas.

Na Igreja do Nazareno, o culto passa por várias fases, desde momentos reflexivos e
comedidos às situações de exaltação. Geralmente, esses momentos são dependentes do tipo de
prédica e da condução do pastor. Contudo, é um culto diferenciado do estilo pentecostal em
que a efusão atribuída ao Espírito Santo produz manifestações de diversas naturezas. No culto
nazareno, as manifestações emocionais, mais exaltadas são, de certa forma, proibidas. Os
chamados dons do Espírito não se manifestam com veemência durante os cultos. As
manifestações de curas, profecias, revelações, glossolalia são formalmente desestimuladas.
No entanto, já percebemos em algumas igrejas locais um formato pentecostal dos cultos em
relação aos dons. Esse fato é determinado pelo estilo particular do pastor, mas não é aceito
pelo corpo de líderes da Igreja do Nazareno.

A leitura da Bíblia e a prédica são essenciais ao culto. Os pastores dispõem de


aproximadamente uma hora para sua pregação. Conforme o pastor, essa prédica pode ter a
participação dos ouvintes, contudo é ele que conduz a mensagem. Todos os fatos apresentados
devem ser fundamentados pela Bíblia, sejam eles coerentes ou não com a interpretação dada.
Isso é, a mensagem que se prega deve estar contida na Bíblia independente de que sua
interpretação esteja correta, ou não. Caso haja alguma divergência de interpretação entre a
mensagem pastoral e o entendimento do ouvinte, é comum estes interpelarem o pastor, após o
culto, para esclarecerem suas dúvidas. Nesse caso, há uma preponderância da interpretação
pastoral sobre a leiga. De forma alguma, os questionamentos são feitos durante o culto.

Os pontos teológicos fundamentais da Igreja do Nazareno se estabelecem no


Catecismo Nazareno (IGREJA DO NAZARENO/CATECISMO NAZARENO, 1986.). As
crenças básicas dessa Igreja começam pela revelação divina que significa a comunicação
sobrenatural da verdade de Deus aos seres humanos. Para os nazarenos, a razão humana é
insuficiente para direcionar a humanidade e para alcançar a divindade, por isso se estabeleceu
a revelação divina. Essa revelação está dada na Bíblia, como vimos, a concepção da Bíblia
como Palavra de Deus é fundamental para os nazarenos, porque contém os escritos
divinamente dados para se construir a fé cristã. Por isso, a Bíblia tem proeminência na Igreja
do Nazareno, todas as práticas devem ser referendadas por ela e por meio da sua interpretação
135

se conduz as ações da membresia. Não há nessa Igreja um livro que a substitua. O próprio
Manual -1997-2001- a declara como guia supremo. (IGREJA DO NAZARENO/MANUAL
1997-2001, 1997, p. 6). Outro fundamento da fé nazarena se encontra nos escritos da igreja
cristã. Os Credos da Igreja antiga são tomados como pontos doutrinários a serem observados
e expressam uma declaração solene de fé, que contém as verdades que os nazarenos devem
crer.

Dentre os ritos tomados da tradição cristã, a Igreja do Nazareno preserva o Batismo


que se dá pela imersão do prosélito, nas águas. Significa o ato público de inserção do novo
convertido à fé cristã. Antes desse ato, o prosélito deve fazer uma declaração pública de sua
mudança de vida. Caso venha de outra igreja protestante e já tenha sido batizado, o egresso
não se rebatiza, se vier da Igreja Católica ou de outra religião deve ser imerso. O Batismo
infantil é permitido desde que os pais ou responsáveis pela criança o aceitem. Porém, não é
comum o batismo infantil na Igreja do Nazareno. Quando uma criança nasce no ambiente
nazareno, ela passa pela cerimônia da dedicação, que significa que os pais professam a fé
cristã e desejam que seu filho ou filha também a professem. Nesse ato, podem ser
apresentados os padrinhos que não necessariamente precisam ser cristãos.

O rito da eucaristia, comumente chamado se Santa Ceia é realizado pelo menos uma
vez por mês. Na maioria das Igrejas do Nazareno ocorre no primeiro domingo de cada mês.
Consiste em uma pequena refeição com pão e vinho, não fermentado, que simbolizam o corpo
e o sangue de Jesus Cristo dado para a salvação dos fiéis. É comum participarem da Santa
Ceia somente aqueles que foram batizados, no entanto, se observa a participação de pessoas
recém-chegadas à Igreja e de crianças nessa cerimônia. Essa participação é vedada ou
consentida conforme a disposição pastoral. A cerimônia da Santa Ceia é introduzida por
leituras bíblicas e dizeres propostos pelo Manual da Igreja (IGREJA DO
NAZARENO/MANUAL 2009-2013, 2009, p. 208).

Os posicionamentos da Igreja do Nazareno em relação às diversas práticas sociais e


questões contemporâneas seguem as orientações do Manual. Em relação ao matrimônio, a
Igreja o enfatiza como uma instituição sagrada, ela se opõe à sua dissolução, mas permite a
realização de um novo casamento, caso haja rompimento do primeiro vínculo. Não há
restrições feitas àqueles que adquirem um novo matrimônio. Quanto ao aborto, a Igreja se
opõe a ele quando feito de forma induzida, mas em condições especiais e orientados por
conselho médico e cristão podem ser realizados. O entendimento nazareno é que a vida
136

começa na concepção, portanto, deve ser valorizada desde esse momento. A Igreja se opõe a
qualquer uso de engenharia genética que promova injustiça social, despreza a dignidade da
pessoa ou tenta alcançar superioridade racial, intelectual ou social sobre outros. (IGREJA DO
NAZARENO/MANUAL 2009-2013, 2009, p. 48).

A sexualidade é também um tema tratado pelo Manual da Igreja. Nele se expressa o


entendimento da Igreja sobre esse assunto. Para a Igreja do Nazareno, a sexualidade perde o
seu propósito quando tratada como um fim em si mesma, quando vulgarizada pela prática da
prostituição, ou quando assume interesses sexuais pornográficos ou perversos. A Igreja
considera que toda forma de sexualidade humana, ocorrida fora do pacto do casamento
heterossexual, é uma distorção da santidade e da beleza que Deus delegou a ela. Assim, a
Igreja do Nazareno considera a homossexualidade como uma das formas pelas quais se
perverte a sexualidade humana. “Reconhecemos a profundidade da perversão que leva a atos
de homossexualidade, mas afirmamos a posição bíblica de que tais atos são pecaminosos e
sujeitos à ira de Deus.” (IGREJA DO NAZARENO/MANUAL 2009-2013, 2009. p. 50).

Percebemos que a Igreja do Nazareno desenvolve suas ações por meio de atos de
interpretação sustentados em um arcabouço bíblico normativo que se correlacionam à situação
presente. Dessa forma, ela define seus posicionamentos a partir do entendimento de sua
missão ou de sua finalidade de existência. Teologicamente, a missão da Igreja do Nazareno é
de adoração a Deus, que se traduz, sociologicamente, no desenvolvimento de suas ações, em
âmbito local, tomando como base o contexto e o sentido primário da adoração. (O ARAUTO
DA SANTIDADE, p. 16, 2001.). Em termos práticos, significa a aderência aos princípios
divinos transmitidos pela Bíblia e sua posterior vinculação à vida cotidiana das pessoas.
Portanto, a Igreja do Nazareno se posiciona em relação a qualquer assunto que lhe é proposto.
Nessa infinidade, optamos por destacar a prática nazarena em relação à liberdade humana, a
eutanásia, discriminação, o ministério feminino, a guerra e o serviço militar, privilegiando
algumas questões não tratadas no âmbito institucional de parte das igrejas protestantes.

A liberdade humana é tratada como liberdade religiosa e política, a Igreja recomenda


que os governantes políticos de todos os níveis de governo sejam eleitos e que desempenhem
suas funções respondendo somente a Deus e ao eleitorado, para desempenhar um cargo
público de confiança. Dessa forma, a Igreja propugna os valores democráticos e opõe-se ao
tráfico de influências. Ao mesmo tempo, rechaça a violação desses princípios por qualquer
grupo religioso. (IGREJA DO NAZARENO, 2004, p. 76).
137

A eutanásia, como término intencional da vida por qualquer motivo que alivie a dor, é
incompatível com a fé cristã e, historicamente, é rejeitada pela igreja cristã. A Igreja entende
que a eutanásia reforça a arrogância humana de determinar o fim da vida, por isso se opõe a
todos os esforços de sua legalização. No entanto, ao se perceber o fim da vida, não se deve
utilizar de meios de seu prolongamento. Estes posicionamentos aplicam-se as pessoas que
estejam em estado vegetativo, em que qualquer artifício usado não causará expectativa de
regresso à saúde. Dessa forma, a Igreja se mostra veementemente contrária às formas de
abreviação da vida e também de seu prolongamento, quando não se manifesta qualquer
indício de recuperação de saúde. (IGREJA DO NAZARENO, 2004, p. 72).

A Igreja do Nazareno reitera seu posicionamento de combater e rechaçar toda forma


de discriminação racial. Para os nazarenos, todos os seres humanos procederam de um mesmo
sangue, assim, todos independente da raça, cor, gênero ou crença devem ser tratados em
igualdade. Com igual possibilidade de acesso à educação, às instituições de qualquer natureza
e com amplas possibilidades profissional ou econômica. A Igreja percebe a discriminação
como uma afronta às relações humanas. Assim, exorta seus membros a examinarem,
humildemente, sua conduta para com os diferentes. (IGREJA DO NAZARENO, 2004, p. 73).
Não obstante essa consideração da Igreja, observamos que o número de pastores negros é
diminuto em relação aos pastores brancos, no entanto não se atribui a isso um processo
discriminatório específico da instituição, uma vez que não há ressalvas a ascensão dos negros
a qualquer trabalho ou nível de governo na Igreja. O mesmo se dá em relação à membresia, há
igrejas nazarenas em que essa membresia é, predominantemente, branca, em outras,
predominantemente, negra. Esse fato é condicionado por uma estrutura social e não
institucional.

Nesse ponto destacamos o ministério feminino na Igreja. Os nazarenos não fazem


nenhuma distinção em relação ao ministério masculino. Eles apoiam o direito das mulheres
usarem suas qualificações no desenvolvimento da Igreja. Assim a Igreja afirma o direito
histórico das mulheres elegerem e serem eleitas a qualquer um dos cargos da Igreja. As
condições de gênero não impedem a atuação feminina na Igreja do Nazareno. Portanto, uma
vez qualificadas para algum ministério podem se apresentar a eles sem qualquer
constrangimento, inclusive aos cargos de liderança e de Superintendente geral. (IGREJA DO
NAZARENO, 2004, p. 75). No entanto, essa perspectiva ganhou sustentação após um período
de resistência às mulheres assumirem cargos ministeriais, especialmente, no final da década
138

de 50, conforme atesta Richard W. Houseal Jr. (1995, p. 23). Segundo ele, muitos
observadores acreditam que o número das mulheres que assumem o pastorado na Igreja do
Nazareno tem diminuído.

Observamos que, no Brasil, o número de mulheres na participação dos trabalhos na


Igreja do Nazareno é significativo apenas nas escolas dominicais, em que elas atuam como
professoras, e nas Missões Nazarenas Internacionais que foi tradicionalmente, até os anos 80,
uma sociedade de mulheres. Observamos que, a proporção da atuação feminina, na liderança
e pastorado nazarenos, em relação à masculina, na Igreja ainda é bem diminuta, haja vista que
a maioria da membresia nazarena é composta de mulheres. Segundo Houseal Jr. (1995, p. 59),
em dados dos Estados Unidos, no ano de 1925, as mulheres representavam 12,2% do
pastorado nazareno. Em 1955, elas alcançaram o maior número total de pastores do sexo
feminino, 234, mas em termos percentuais havia diminuído para 6,2% em relação ao total de
pastores. A partir do ano de 1955, o número de pastoras tem diminuído de forma constante
enquanto o número de pastores do sexo masculino continuou a aumentar. Em 1995, as
mulheres representavam apenas 6,7% do total de ministros credenciados. A análise de
Houseal Jr. revelou que as mulheres trabalham em maior proporção nos distritos que são
menores em tamanho. Estes distritos menores têm alguma dificuldade em atrair os pastores
que almejam visibilidade para o seu crescimento na Igreja. Em contrapartida, esses distritos
são aceitos pelas pastoras que buscam apenas uma forma de se estabelecerem na instituição.

Esclarecemos que os dados da participação feminina na Igreja do Nazareno tomados


dos Estados Unidos servem apenas para projetarmos o que se observa na Igreja do Nazareno
no Brasil. A ausência de dados estatísticos no Brasil, que traça o perfil da participação das
pastoras na Igreja não escondem que o número dessas é bem inferior aos dos pastores.
Conforme observação em dados das áreas sul, central e norte/nordeste da Igreja do Nazareno,
podemos afirmar que o número de pastoras não alcança 20% do número de pastores. Não há,
por exemplo, nenhuma Superintendente distrital ou diretora de área na Igreja do Nazareno do
Brasil.

Outra questão não menos polêmica é o posicionamento que a Igreja do Nazareno se


manifesta em relação à guerra e ao serviço militar. A Igreja do Nazareno compreende que a
busca da paz é dever da Igreja e que em todos os casos deve promover os meios de obtê-la
entre as nações. Contudo, ela reconhece que existem outros imperativos que têm conduzido as
nações para a guerra, como defenderem seus ideais, suas liberdades e suas existências.
139

Mesmo empenhada na causa da paz, a Igreja recorre à consciência de seus membros quanto à
participação no serviço militar, em caso de guerra. Da mesma forma, requer para os seus
membros que não desejam se alistar, a mesma isenção que têm as instituições anti-bélicas.
(IGREJA DO NAZARENO, 2004, p. 77-76). O posicionamento da Igreja do Nazareno em
promover a cultura de paz vai, algumas vezes, de encontro às expectativas dos Estados. No
entanto, entendemos que é estratégia da Igreja do Nazareno evitar o confronto com as
autoridades estatais, ao delegar à consciência de seus membros a participação nas forças
armadas.

Os posicionamentos da Igreja do Nazareno em relação às várias situações expressam


em ações e práticas que privilegiam a condição digna de vida dos seres humanos. Contudo,
percebemos que, a instituição evita entrar em pontos de vistas polêmicos. Os exemplos acima
mostram que para cada situação, a Igreja aponta para mais de uma possibilidade. Esse aspecto
ressalta a perspectiva conciliatória que a Igreja assume nas diversas situações que empreende.
Mas, ao mesmo tempo, pode demonstrar uma postura menos incisiva em questões cruciais, ou
certo alinhamento a instituições que lhe são benéficas. Nesse ponto, se remete a um fato
observado em entrevistas de Earl Mosteller, no Brasil. Em uma delas, Mosteller referiu-se a
sua ida para Portugal, no ano de 1973, em sua partida procurou junto a algumas autoridades
brasileiras cartas de apresentação que pudesse facilitar seu trabalho em Portugal. Mosteller
alegava que havia sido benéfico a algumas autoridades brasileiras, ressaltou que tinha bons
contatos com Laudo Natel e com Ademar de Barros, ex-governadores desse Estado. Ambos
lhes concederam as cartas de apresentação. (IGREJA DO NAZARENO/ENTREVISTA
EARL MOSTELLER, 1993.). Outras aproximações com autoridades nacionais podem ser
observadas como ocorre em Cabo Verde, em que a Igreja tem boa aceitação e certa influência
no governo daquele país, constatado pelas não poucas vezes em que os presidentes e
representantes do governo de Cabo-Verde prestigiam os eventos nazarenos e nas sucessivas
vezes que as lideranças nazarenas reúnem-se com este governo. Esses fatos mostram que a
Igreja do Nazareno alinha-se com determinadas situações que por sua vez podem ser
definidoras de seus posicionamentos.
140

Conclusão

Este capítulo destacou que a chegada da Igreja do Nazareno no Brasil se deu por
intermédio de sua inserção nas Ilhas de Cabo Verde, muitos missionários cabo-verdianos, ou
que de lá vieram, tiveram participação decisiva na chegada da Igreja ao Brasil. A inserção
nazarena no território brasileiro, no final da década de 50, em um cenário religioso em que já
havia muitas denominações, exigiu de Earl Mosteller um espírito empreendedor que desse à
Igreja maior visibilidade em relação às outras denominações. A tendência de se buscar, na
mídia, o meio mais eficaz de se promover a Igreja resultou na rápida aceitação dos
campineiros da nova perspectiva religiosa que a Igreja do Nazareno propunha. A necessidade
que o casal Stegemoeller percebeu de se implantar a Igreja no Brasil, junto com a não filiação
deles e de José Zito às outras denominações, mostra que a Igreja do Nazareno realmente trazia
um diferencial em relação às outras denominações que não era satisfeito por nenhuma delas.

Dentre as inúmeras possibilidades teóricas de se explicar a inserção nazarena no


Brasil, optou-se por aquela que pudesse relevar os aspectos de concorrência religiosa sem
incluir, especificamente, o fenômeno religioso no âmbito da mercantilização. A percepção da
teoria da economia das trocas religiosas, ou seja, dos fundamentos mercadológicos na ação
das Igrejas permitiu entendermos a vantagem comparativa que a Igreja do Nazareno possuía
no cenário protestante brasileiro. Essa vantagem, traduzida na visão teológica como doutrina
da santidade, trouxe importantes adesões à Igreja. A estratégia de se implantar as Igrejas do
Nazareno nos grandes centros para expandi-las, posteriormente, em outras áreas, denota a
preocupação da liderança nazarena de primeiro tornar conhecida a Igreja, para depois
direcioná-la ao evangelismo. A ação de Mosteller, em aproveitar as oportunidades e
direcionar os missionários para as cidades centrais no Brasil, possibilitou a difusão nazarena
para outros Estados e a posterior formação dos distritos, para se suplantar as diferenças
regionais. Assim, logo se efetivou no Brasil a forma de governo da Igreja internacional que
possibilitou melhor coordenação da expansão da Igreja no país. Entre aqueles que se
destacaram na consolidação da Igreja no Brasil, estão os cabo-verdianos, José Zito e Joaquim
Lima, sendo esse último eleito o no país.

O destaque dado à centralidade do pastor nazareno visou ressaltar o papel dos pastores
nazarenos na condução de processos sociais intrínsecos e extrínsecos à Igreja, a partir de uma
abordagem em que buscamos entender as causas e consequências dessa centralidade.
141

Entendemos, por essa avaliação, que os aspectos que colaboram com a hegemonia do pastor
frente à coletividade eclesial não estão diretamente ligados à estrutura organizacional ou à
forma de governo da Igreja, mas sim, à construção ideológica das instituições eclesiais
promovidas também pela prédica pastoral.

Mostramos que a forma estrutural da Igreja do Nazareno já é concebida na


centralidade do pastor desde as instâncias inferiores às superiores. Em nenhum nível estrutural
dessa Igreja o pastor é relegado. Salientamos, que devido ao baixo nível de exigência ao
ingresso no pastorado nazareno, o pré-requisito de inserção a esse ofício eclesial se
fundamenta na vontade pessoal e na adesão aos princípios teológicos expressos pela Igreja. A
teologia é vista como subsídio à prédica pastoral, que fortalece a instituição, que, por sua vez,
legitima o pastor. Essa duplicidade harmônica cria uma funcionalidade pouco observada em
outras instituições.

Entendemos que a diferenciação apresentada pelo pastor nazareno reforça sua figura
como um tipo de clérigo, conforme destaca Willaime (2003). Concluímos que, a
proeminência pastoral é independente da forma de governo apresentada pela Igreja e que tal
distinção decorre do papel transcendental que o pastor exerce que é assemelhado aos
sacerdotes e profetas bíblicos. A concepção que o leigo nazareno tem do pastor e da
instituição não consegue se desvencilhar desse aspecto ideológico fortalecido pela prédica
pastoral, o que torna a membresia passível da influência institucional e pastoral em
importantes esferas de sua vida cotidiana.

A caracterização do culto e das práticas nazarenas foi tratada como formas de


entendermos os pontos básicos da práxis nazarena. Notamos que, a Igreja tem dois
sacramentos principais o Batismo e a Ceia do Senhor. Neles, pode haver pontos de
divergências com outras denominações protestantes como o batismo infantil e o simbolismo
do corpo e do sangue Jesus na Ceia. Percebemos, ainda, a interessante proibição de
manifestação dos carismas do Espírito Santo, no culto nazareno, mesmo que os nazarenos não
desacreditem nessas manifestações. Nessa parte do capítulo, procuramos discorrer sobre as
práticas nazarenas apresentando a posição e ação da Igreja quanto a alguns temas.
Verificamos que a Igreja evita uma abordagem polêmica em relação aos temas que lhes são
externos, mas que são, igualmente, polêmicos e que tal fato pode estar relacionado tanto a
uma postura de se evitar conflitos, como pode estar vinculado ao alinhamento que a Igreja do
Nazareno possui com governos e instituições que lhes são benéficas.
142

CONCLUSÃO

O objetivo geral dessa dissertação foi analisar o processo de inserção e expansão da


Igreja do Nazareno no Brasil. Como a consecução desse objetivo não poderia ser alcançada
sem que caracterizássemos amplamente a Igreja do Nazareno, buscamos defini-la, a partir dos
elementos que lhe são mais fundamentais. Nesse ponto, abordamos a construção sócio
teológica da doutrina arminiana, da tradição wesleyana e da doutrina da santidade, salientando
os principais marcos de referência dessa Igreja. Feito isso, procuramos traçar o processo
sócio-histórico de formação dessa Igreja nos Estados Unidos como consequência de um
movimento de renovação espiritual, eclesial e eclesiástico conhecido como Movimento de
santidade.

Essas abordagens foram feitas para entendermos como uma expressão religiosa
informal tornou-se formal e institucionalizada na Igreja do Nazareno. Nesse aspecto, tomamos
de empréstimo as perspectivas da Sociologia da religião, baseadas em Max Weber, François
Houtart e Thomas F. O‟Dea, que tratam da institucionalização das expressões religiosas sob
uma perspectiva de mudança de dominação. Salientamos o desenvolvimento da base material
que possibilitou o aparecimento da Igreja do Nazareno, por meio da mudança da lógica
carismática para a lógica institucional. Nosso foco foi mostrar que o Movimento de Santidade
começou com uma postura carismática, daqueles que se opunham às formas denominacionais
tradicionais de se portar frente às contingências e conflitos sociais nos Estados Unidos do
Século XIX, mas que, com o passar do tempo, houve a perda da influência carismática em
vias de ser substituída pela dominação burocrático-legal.

A análise do surgimento da Igreja do Nazareno, como expressão institucional do


Movimento de Santidade e com bases nos critérios weberianos de dominação, ressaltou a
condição utópica dos tipos-ideais, uma vez que a constatação desses tipos puros não tem lugar
na realidade. Assim, percebemos que a estrutura de poder da Igreja do Nazareno representa
uma forma híbrida de dominação, uma externa, burocrático-legal e outra interna carismática.
Explicamos tal fato por meio do estudo da hierarquia da Igreja formada de Superintendentes
gerais, distritais e pastores locais cujas instâncias de poder há uma forma híbrida de
dominação burocrática legal e de dominação carismática. A primeira, entre os representantes
de cada nível de governo. A segunda, entre os pastores e os membros das igrejas. A relação é
143

externa por ser de um nível para outro, os Superintendentes e pastores se relacionam levando
em consideração os níveis hierárquicos. Já no âmbito interno de cada nível local, há uma
tendência das membresias da Igreja considerarem o pastor como um líder detentor de carisma.
O pastor nazareno é considerado pelas membresias como responsável espiritual na condução
dos fiéis, é uma condução que não se restringe apenas ao meio eclesial, mas ganha contornos
em âmbitos variados como familiar, escolar, afetivo etc..

Percebemos que, mesmo em uma abordagem sócio histórica da Igreja, foi necessário
utilizarmos uma perspectiva eclesiológica para entendermos o valor que os aspectos
teológicos exercem na instituição. Nesse ponto, sentimos a necessidade de um estudo de
referência que conciliasse a teologia com a sociologia, na análise de uma instituição religiosa.
A Sociologia da Religião de Weber, Houtart e O‟dea, ainda que indispensáveis a esse estudo,
não preencheram a lacuna de uma possível Sociologia da Igreja. Deveríamos, por meio dessa
suposta sociologia, compreendermos como constructos estritamente teológicos, como o
conceito de santidade, podem influenciar nas diversas formas de relações sociais. Ou ainda,
porque a centralidade da Bíblia na liturgia define ações como abandono de empregos,
rompimento de namoros, pagamento de dívidas, submissão feminina, relações antissociais,
entre outras.

Dessa forma, procuramos entender a repercussão do aspecto teológico nas relações


sociais dos nazarenos, quando tratamos da figura do pastor e das práticas nazarenas.
Entendemos que há uma forma de sacralização das coisas comuns. Se, por exemplo, for
necessária a obtenção de recursos para a construção de prédios para a Igreja, logo essa é
levada à categoria de obra do Senhor e a doação dos recursos como sacrifício santo. Assim,
enquadramos nesse trabalho um dos sentidos da finalidade da instituição religiosa apresentado
por Houtart que é assegurar atos religiosos eficazes do ponto de vista espiritual e legitimar
seus agentes religiosos. Percebemos que a instituição religiosa cumpre o dever de legitimação,
contudo assegura atos religiosos eficazes sobre qualquer ponto de vista. No caso da Igreja do
Nazareno, a capacidade de direcionar a ação dos fiéis, até mesmo em atividades recreativas,
bem como mobilizar pessoas de diversas classes sociais em um projeto comum, mostram que
a perspectiva teológica não é apenas uma forma de cosmovisão, mas também uma forma de
construir e conduzir as realidades.

O percurso da Igreja do Nazareno, dos Estados Unidos para o Brasil, chamou-nos a


atenção pela intermediação de Cabo Verde. Os pioneiros nazarenos no Brasil viveram antes a
144

experiência de implantação e expansão da Igreja do Nazareno em Cabo Verde. Assim, o


processo de inserção dessa Igreja no Brasil se deu em comparação aos acontecimentos em
Cabo Verde. Earl Mosteller, o fundador da Igreja do Nazareno no Brasil, passou 12 anos de
trabalho nas Ilhas antes de vir para o Brasil. Por isso, vimos a necessidade de se abordar o
desenvolvimento da Igreja naquelas Ilhas, como forma de situar a vinda dos primeiros
missionários ao Brasil, bem como entender determinadas práticas empregadas neste país que
só fazem sentido a luz da ação nazarena em Cabo Verde.

A escolha dos grandes centros urbanos para se implantar a Igreja do Nazareno


decorreu das dificuldades enfrentadas pela Igreja para se estabelecer em um ambiente pouco
desenvolvido culturalmente como o de Cabo Verde. Os pioneiros evitaram acarretar
dificuldades na aprendizagem da doutrina de santidade, conforme houve nas Ilhas. Sobre a
inserção da Igreja do Nazareno no Brasil, notamos que, a preocupação maior foi criar
condições para seu estabelecimento institucional. Os pioneiros visaram implantar o aparato
ideológico, cúltico e organizacional da Igreja, portanto não foi uma ação estritamente
evangelística como ocorreu em Cabo Verde, mas uma forma de se estabelecer em meio às
outras denominações existentes no país.

A estratégia de Earl Mosteller, de buscar no meio midiático o principal recurso de


avanço da Igreja no Brasil, é um importante aspecto do empenho em valorizar
institucionalmente a Igreja desde seu início no Brasil. As pessoas eram chamadas, primeiro,
para a Igreja do Nazareno e se fosse o caso, depois levadas à conversão. A estrutura utilizada
na inauguração do primeiro templo da Igreja, na cidade de Campinas, contou com o apoio da
banda do exército, a presença de autoridades municipais e estaduais e a divulgação na mídia;
além de evidenciarem a perspectiva institucional, mostram o alinhamento da Igreja com as
formas de governo e os padrões sociais da época.

A Igreja do Nazareno no Brasil não se estabeleceu nos moldes de divulgação de uma


contracultura, mas de assimilação aos padrões urbanos brasileiros. Destacamos o caráter
empreendedor e estratégico de Earl Mosteller ao buscar nas elites universitária e política o
apoio para o estabelecimento da Igreja em território brasileiro. Buscar os grandes centros,
naquela época, significava, na prática, o afastamento de uma cultura rudimentar, da falta de
infraestrutura, do analfabetismo, da violência contra os missionários e, de certa forma, da
pobreza. Por esses aspectos, entendemos que a Igreja do Nazareno, no Brasil, contrariamente
ao seu aparecimento nos Estados Unidos, surgiu em conjunção com as elites. Esse fato se
145

comprova pela necessidade que viu Mosteller em buscar cartas de apresentação das
autoridades brasileiras, por seus serviços prestados em benefícios a elas, quando deixou o
Brasil para se estabelecer em Portugal. A relação de amizade entre Mosteller, Laudo Natel,
Ademar de Barros e outras autoridades federais, estaduais e municipais mostram as estratégias
e os tipos de vínculos que a Igreja estabeleceu no início de seus trabalhos no Brasil.

A hipótese principal desse trabalho foi que o processo de inserção da Igreja do


Nazareno no Brasil se deu como resposta à falta de uma instituição no cenário protestante
brasileiro, que vinculasse sua mensagem diretamente àqueles que já faziam parte das igrejas.
Dessa forma, a inserção da Igreja do Nazareno em território brasileiro possibilitou a cobertura
de um lapso dogmático que nem as Igrejas Clássicas e nem as Pentecostais suplantaram com
sua mensagem e doutrina. Essa hipótese se tornou menos refutável ao percebermos que a
Igreja do Nazareno não apresentava nenhuma outra diferença substancial em relação às outras
Igrejas protestantes já instaladas no país. Assim, a tentativa de se comprovar essa hipótese
passou pela abordagem dos motivos que levariam a Igreja do Nazareno a se estabelecer no
Brasil.

O primeiro motivo seria bíblico-teológico, isso é, a necessidade de se expandir o reino


de Deus em terras brasileiras. Contudo, vimos que o ambiente religioso brasileiro já estava
composto por muitas denominações protestantes, refutando a necessidade urgente dessa
expansão. Essa consideração faria melhor sentido, se no campo missionário brasileiro, no
início da década de 60, não houvesse considerável número de outras denominações, mas
conforme se constatou, nessa época, houve uma taxa de crescimento de 104% dos membros
das Igrejas evangélicas no Brasil, o número de membros ativos dessas igrejas ultrapassava os
três milhões. O crescimento anual de evangélicos no Brasil chegou aos 11% de 1960-67,
enquanto a população total cresceu 3,4% no mesmo período.

Destacamos que esse quadro estatístico não significava uma necessidade primordial de
se implantar a Igreja do Nazareno no Brasil mesmo porque, o quadro estatístico dos
protestantes no Brasil deveria ser bem menos animador no ano de 1914, quando o
Superintendente geral Hiram Reynolds visitou o Brasil, contudo, somente decorridos quase
meio século de sua visita, a Igreja do Nazareno chegou ao Brasil. Esse panorama da
composição dos evangélicos no Brasil e o decurso de tempo em se estabelecer em território
brasileiro mostram que a emergência de se expandir o reino de Deus no Brasil não foi o foco
da implantação dos nazarenos nesse país.
146

Portanto, o segundo motivo, expresso na necessidade de expansão institucional e de


expansão dos valores ideológicos da Igreja do Nazareno, parece ser mais plausível do que o
primeiro. A busca pela inserção em centros urbanos caracterizou-se por ser uma maneira mais
rápida de se divulgar a doutrina da santidade. A fixação por cidades universitárias mostra que
o eixo de ação estava voltado preferencialmente para os jovens com um nível de estudo
adequado para a rápida compreensão dessa doutrina. Os primeiros nazarenos no Brasil não se
preocupavam, primordialmente, com a divulgação dos rudimentos do cristianismo, mas com
aspectos teológicos mais elaborados que provessem uma condição que não protelasse a
formação das novas lideranças no Brasil. Assim, a ideia era prover, o quanto antes possível,
um quadro de profissionais que estruturasse a Igreja no Brasil e fosse capaz de expandi-la no
território brasileiro por sua identificação entre os nacionais.

Estritamente vinculado ao segundo, está o terceiro motivo que é a necessidade de se


estabelecer no mercado religioso brasileiro. Conforme vimos pela teoria das economias
religiosas, as igrejas atuam em um mercado religioso em que a Igreja Católica perdeu o seu
monopólio. Esse mercado é caracterizado basicamente pelo mecanismo de concorrência
perfeita em que os próprios agentes do mercado definem seu comportamento. Assim,
conforme vimos, as economias religiosas estão caracterizadas por um ambiente de pluralismo
religioso em que há uma variedade de firmas e de produtos. Essa variedade significa maior
liberdade e igualdade social para se inserir nas igrejas. Portanto, as igrejas atuam como
firmas, não pela lógica simplista do lucro, mas pela lógica da satisfação das necessidades, em
que a religião se converte em um objeto de escolha e de produção.

As formas religiosas podem ser analisadas a partir de uma lógica da economia e não
da mercantilização. Essa sutil diferença é percebida pela teoria das economias religiosas ao
ressaltar as possibilidades de escolhas na religião em contrapartida à mercantilização, que
ressalta a religião como mero produto de consumo. A religião oferecer um produto é bem
diferente dela mesma ser o produto. Visto de forma mais simples e clara, o vendedor não
precisa se vender para efetuar a venda. Dessa forma, as igrejas, no mercado religioso, não se
modificam para atender a amplitude do mercado, mas se especializam em determinado ponto
teológico para atender um nicho específico do mercado religioso. Aliás, os teóricos das
economias religiosas supõem que não há variações significativas nas demandas por um
produto e sim, na oferta dele. Portanto, é a ação das Igrejas que definem o mercado religioso.
147

A Igreja do Nazareno no Brasil apresentou a doutrina da santidade como produto


altamente diferenciado no mercado religioso. Isso deu a ela uma vantagem comparativa em
relação às demais instituições, visto que não apenas propunha o básico da vida cristã que é a
justificação, mas algo que distinguiria os fiéis, a santificação. Com isso, a Igreja atraia fiéis de
outras Igrejas, ou aqueles que se afastaram delas. O nicho da demanda nazarena era maior em
relação às outras igrejas, fato que possibilitou seu rápido crescimento no início de sua
inserção no Brasil, mesmo sendo bem tardio seu estabelecimento no país, se comparado com
a maioria das Igrejas oriundas dos movimentos missionários no Brasil.

Destacamos, como um ponto de refutação da hipótese apresentada, que mesmo sendo


a mensagem de santidade o diferencial da Igreja frente às outras denominações, observamos
que poucos leigos nazarenos conhecem-na profundamente ou fixam-se nela em sua vida
eclesial, ainda que sofram influências dela. De fato, o atrativo maior que a Igreja exerce sobre
os iniciantes é a forma litúrgica e o estilo geralmente mais comedido das prédicas. As
manifestações individuais dos chamados carismas são restringidas pela ordem no culto que
não é rigorosamente engessada, como na liturgia anglicana, por exemplo, mas sofre
importante fiscalização pastoral. Entendemos que a ordem cúltica nazarena está orientada pela
doutrina de santidade, com traços de uma liturgia mais tradicional e comedida, mas também
em alguns casos, com traços do pentecostalismo. Contudo, desde o ano de 1919, quando
deixou de ser Igreja Pentecostal do Nazareno, essa denominação procurou deixar claro suas
diferenças com o ramo pentecostal.

Notamos também, que a doutrina da santidade que foi importante para o crescimento
nazareno nas décadas de 60 e 70, no Brasil, não parece ser mais um atrativo para arregimentar
novos fiéis, nem atrair aqueles de outras denominações, nessa primeira década do século XXI.
Apesar dos quadros estatísticos apresentados pela Igreja mostrarem um crescimento
considerável de membros, a prática de evidenciar essa doutrina parece se arrefecer. Há, no
meio nazareno, Igrejas que se assemelham aos estilos clássico, pentecostal e até
neopentecostal do protestantismo. As Igrejas do distrito Minas Gerais, que têm um estilo de
culto mais participativo, propenso ao estilo pentecostal e que estão situadas em bairros com
população de menor poder aquisitivo e com baixo nível de escolaridade, são as que mais têm
crescido com membros vindos de outras denominações. Esse fato demonstra que nessas
Igrejas nazarenas o crescimento é dado não pela compreensão de uma doutrina diferenciada,
mas justamente o contrário, pela falta dessa distinção.
148

Cabe ressaltarmos que esses aspectos são deduzidos de alguns dados estatísticos
apresentados pelos distritos no Brasil, contudo, observamos a discrepância entre os números
apresentados em algumas estatísticas. A membresia de uma Igreja do nazareno é formada pela
soma de membros ativos, associados e inativos que fazem parte da MNI, JNI ou dos
departamentos infantis. Muitas igrejas apontam um total de membros que não confere com o
somatório em cada departamento, trazendo dúvidas quanto à totalidade de membros ou sobre
as estatísticas desses departamentos. Por intermédio da observação participante, por exemplo,
percebemos que em uma dessas Igrejas do distrito Minas Gerais, o número de membros da
JNI e de crianças não condizia com os dados estatísticos apresentados na Vigésima Segunda
Assembleia distrital de Minas Gerais, no ano de 2007. (IGREJA DO
NAZARENO/VIGÉSIMA SEGUNDA ASSEMBLÉIA DISTRITAL, 2007.). Da mesma
forma, os dados de crescimento da Igreja no Brasil, contidos na agenda da Igreja do ano de
2009, não condizem com os números de aquisição de novos membros de ano para ano, pelo
simples erro de cálculo aritmético. Portanto, os dados estatísticos da Igreja do Nazareno no
Brasil são imprecisos não podendo deles fazer uma análise conclusiva.

Outro aspecto relevante desse trabalho foi o destaque dado à figura do pastor
nazareno. Aqui, buscamos definir o processo de construção dessa hegemonia na instituição.
Utilizamos da perspectiva de Jean Paul Willaime que foi essencial para se ressaltar o papel
dos pastores nazarenos na condução de processos sociais intrínsecos e extrínsecos à Igreja.
Entendemos, por essa avaliação, que os aspectos que colaboram com a hegemonia do pastor
frente à coletividade eclesial não estão diretamente ligados à estrutura organizacional ou à
forma de governo da Igreja, mas são definidos por construção ideológica da instituição que
promove a figura do pastor. Ao mesmo tempo, o pastor trabalha como guardião da instituição,
por meio de sua prédica e poder de coerção sobre a membresia da Igreja.

Assim, mostramos que a forma estrutural da Igreja do Nazareno já é concebida na


centralidade do pastor desde as instâncias inferiores às superiores. Em nenhum nível estrutural
dessa Igreja o pastor é relegado. Observamos que, devido ao baixo nível de exigência ao
ingresso no pastorado nazareno, o pré-requisito de inserção a esse ofício eclesial se
fundamenta na vontade pessoal e na adesão aos princípios teológicos expressos pela Igreja. A
teologia é vista como subsídio à doutrina e ensinada a partir desta, portanto, os ensinos na
formação pastoral visam fortalecer a instituição. Uma vez ordenado, o pastor atua como
defensor da Igreja, que por sua vez o legitima em suas ações. Os possíveis conflitos entre a
149

instituição e o pastor são solucionados nas esferas hierárquicas superiores e, geralmente, a


membresia desconhece o teor de qualquer sanção aplicada aos seus pastores. É prática, na
Igreja, o afastamento do pastor de suas atividades de liderança na Igreja até a solução do
problema que causou seu afastamento. Contudo, a figura do pastor é preservada e pouco se
noticia sobre os desvios de conduta. A duplicidade harmônica entre Igreja e pastor cria uma
funcionalidade pouco observada em outras instituições.

Devido a esse aspecto de dupla blindagem, notamos um fato importante no


desenvolvimento desta pesquisa, principalmente, na coleta de dados referentes a ela. O autor
desse trabalho é membro da Igreja do Nazareno desde o ano de 1987 e a observação
participante que se realizou decorre desses anos. Vários foram os contatos, a fim de se obter
informações oficiais sobre a denominação e documentos de auxílio na pesquisa. Notamos que
a Igreja não possui um centro de documentação no Brasil e que as informações sobre ela são
na maioria acervos particulares de difícil acesso. Na tentativa de buscarmos essas fontes
documentais, percebemos, sobretudo, o receio de algumas lideranças em disponibilizá-las em
virtude de se publicar um trabalho que viesse a macular a imagem dessa Igreja. As
informações publicadas sobre ela, a maioria da Casa Nazarena de Publicações, são de cunho
devocional e apologético dificultando o trabalho acadêmico de análise social. Assim, a análise
sociológica que empreendemos corre o risco de ser mal vista por aqueles que consideram a
Igreja do Nazareno uma instituição perfeita.

O intuito dessa análise sociológica foi apresentar a Igreja do Nazareno como uma
instituição não desvinculada das contingências sociais que envolvem qualquer ação humana.
E mais, foi uma tentativa de mostrá-la descoberta dos aspectos intrinsecamente bíblicos e
teológicos que escamoteiam as verdadeiras intenções institucionais. O argumento da
sacralização exposto nesse trabalho não teve como intenção entrar na discussão do processo
de secularização, mas apenas demonstrar uma prática observável na Igreja do Nazareno, sem
que se discutisse se certa ou errada. Assim o termo sacralização foi tomado como
transferência do entendimento das coisas comuns, seculares para o âmbito do teológico e
bíblico, dando a essas coisas comuns uma aparência de sagrado. Essa prática legitima as
ações da Igreja, em que os anjos que a governam nada mais fazem que obedecer as
ordenanças divinas que lhes chegam e esforçam para que todos os seus seguidores as
cumpram.
150

Por fim, esclarecemos que, uma abordagem sociológica, ainda que pareça
inconveniente a algumas lideranças nazarenas, não visa a uma crítica, mas ao aprofundamento
do conhecimento sobre a instituição que por vezes passa despercebido na construção de sua
história. Poucos são os nazarenos que sabem, por exemplo, que sua Igreja nasceu da prática
de assistência aos pobres, na busca de dar dignidade aos excluídos, do desejo de emancipar
escravos e mulheres. Poucos nazarenos sabem que a chegada de sua Igreja ao Brasil requereu
uma atitude desprendida, empreendedora e de renúncia de seus pioneiros, cujos exemplos são
essenciais para gerar a confiança naqueles que se unem e se unirão a ela, os quais são e serão
baluartes da permanência dessa Igreja através dos séculos. Assim, ainda que sintético, esse
trabalho é uma forma de contribuição para aqueles que desejam conhecer a Igreja do
Nazareno por uma perspectiva ainda pouco explorada.
151

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