Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
por
Jefferson Rodrigues de Oliveira
por
Jefferson Rodrigues de Oliveira
FICHA CATALOGRÁFICA
155fl.
______________________________________________
Prof. Dr. Leonildo Silveira Campos
Orientador e Presidente da Banca Examinadora
_______________________________________________
Prof. Dr. Jung Mo Sung
Coordenador do Programa de Pós-Graduação
AGRADECIMENTOS
RESUMO
Este trabalho é uma descrição e análise sócio-histórica da Igreja do Nazareno nos aspectos
mais importantes que contribuíram para sua inserção e expansão no Brasil. Descrevemos a
trajetória formativa dessa Igreja nos Estados Unidos, partindo das considerações histórico-
sociológicas dos valores teológicos que ela agrega, como o Arminianismo, a tradição
wesleyana e a doutrina da santidade. Buscamos entender, primordialmente, como se deu o
processo de inserção e expansão da Igreja do Nazareno no Brasil, sua estrutura de governo,
sua prática litúrgica, a formação de pastores, a forma de agregação de membros e a relação
que se estabelece entre esses pastores e os membros. O estudo sobre essa denominação ainda
é incipiente no meio acadêmico brasileiro, assim, buscamos suplantar a ausência de
informações sobre ela, nesse meio. Portanto, ressaltamos os aspectos de um enfoque sócio
histórico institucional que podem se distanciar da forma eclesial como os próprios nazarenos
compreendem sua denominação. Na abordagem desse objeto, enfatizamos a pesquisa
bibliográfica, a análise documental, a utilização de recursos audiovisuais, bem como a
observação participante. Este trabalho possibilitou o entendimento de que a Igreja do
Nazareno, desde seus primórdios, conduz sua prática pela distinção no meio protestante em
que se insere. No caso do Brasil, em que existem muitas outras denominações, a Igreja se
firma sobre sua principal distinção, a doutrina da santidade, a qual, por um enfoque da teoria
das economias religiosas, tem servido de produto para atender determinado nicho do mercado
religioso brasileiro.
OLIVEIRA, Jefferson Rodrigues. The Church of the Nazarene: the beginning (1895) of the
fiftieth anniversary in Brazil (2008). Master‟s thesis - Methodist University of São Paulo -
UMESP, São Bernardo do Campo, 2011.
ABSTRACT
This thesis is a description and a socio-historical analysis of Church of the Nazarene in all
major aspects that contributed to its insertion and expansion in Brazil. We describe the
formative history of this church in the United States, drawing on historical and sociological
considerations of theological values that it brings, as arminianism, the wesleyan tradition and
the doctrine of holiness. We try to understand, primarily, as was the process of integration and
expansion of the Church of the Nazarene in Brazil, its governance, its liturgical practice, the
training of pastors, the form of aggregation of members and the relationship established
between these pastors and members. The study of that denomination is still incipient in the
Brazilian academic, so we try to overcome the lack of information about it in the medium.
Therefore, we emphasize the aspects of a socio-historical institutional approach that can
distance themselves form the Church as the Nazarenes understand their own denomination. In
addressing this subject, we emphasize the literature, documentary analysis, use of audiovisual
resources, as well as participant observation. This work enabled the understanding that the
Church of the Nazarene, from its beginnings, the practice follows the distinction between
Protestant in which it operates. In the case of Brazil, where there are many others
denominations, the Church has been firmed on its main distinction, the doctrine of holiness,
which, by a focus on the theory of religious economies, has served as a product to meet
specific market niche Brazilian religious.
Keywords: Holiness Movement, the Doctrine of Holiness, Church of the Nazarene, the
Nazarene Church in Brazil.
9
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO ...................................................................................................................... 10
CAPÍTULO 1 .......................................................................................................................... 18
ANTECEDENTES SOCIORRELIGIOSOS DA FORMAÇÃO DA IGREJA DO
NAZARENO ........................................................................................................................... 18
Introdução ................................................................................................................................. 18
1.1 Esclarecendo a relação entre uma perspectiva sociológica e a eclesiologia....................... 20
1.2 O arminianismo .................................................................................................................. 24
1.3 O arminianismo na Inglaterra ............................................................................................. 27
1.4 A tradição wesleyana .......................................................................................................... 29
1.5. O reavivamento wesleyano ................................................................................................ 32
1.6 Doutrina da Santidade ........................................................................................................ 34
1.7 O Movimento de Santidade ................................................................................................ 38
Conclusão ................................................................................................................................. 55
CAPÍTULO 2 .......................................................................................................................... 57
A IGREJA DO NAZARENO ................................................................................................ 57
Introdução ................................................................................................................................. 57
2.1 Phineas Bresee (1838-1915) ............................................................................................... 57
2.2 As Associações e Igrejas formativas da Igreja do Nazareno .............................................. 66
2.2.1 A formação da Associação das Igrejas Pentecostais da América (AIPA). .............. 66
2.2.2 A formação da Igreja de Cristo em Santidade (ICS) ............................................... 68
2.2.3 A união da Igreja do Nazareno com a AIPA e a ICS ............................................... 71
2.2.4 A consolidação da Igreja do Nazareno: uma interpretação weberiana .................. 77
2.3 A Estrutura de poder na Igreja do Nazareno ...................................................................... 81
2.4 A Mídia Nazarena ............................................................................................................... 93
Conclusão ................................................................................................................................. 98
CONCLUSÃO....................................................................................................................... 142
BIBLIOGRAFIA .................................................................................................................. 151
10
INTRODUÇÃO
partes fora dos Estados Unidos, tornando uma das principais instituições promotoras da
mensagem de santidade no mundo.
A teoria das economias religiosas, utilizada como arcabouço nesta pesquisa, distingue
da abordagem mercantilista da religião em que esta é vista dentro de uma lógica em que as
igrejas mudam seus padrões de comportamento para atender ao mercado de clientes
religiosos. Nessa perspectiva mercantilista, as igrejas utilizam de técnicas e procedimentos do
mercado para atrair os fiéis. Estruturas de marketing, gestão, negócios e de administração são
utilizadas na busca de se consolidarem no mercado religioso. Ao contrário, a teoria das
economias religiosas considera a lógica do mercado, mas não enfoca a mercantilização da
religião. Essa teoria percebe as igrejas como instituições que estão inseridas na competição
para ofertar produtos religiosos, mas que não mudam seus padrões para alcançar as pessoas e
sim buscam atender uma demanda já definida. Em síntese, as diferenças entre as
denominações criam um mercado de produtos religiosos que estão em concorrência perfeita,
devido à quebra do monopólio religioso da Igreja Católica. Cada igreja busca seu nicho
religioso sem alterar ou buscar outras formas teológicas para atender o público, visto que para
os proponentes dessa teoria não é possível a uma única instituição religiosa atender toda a
demanda.
Este estudo da Igreja do Nazareno visa também qualificá-la em temos de suas práticas
litúrgicas, de formação pastoral, de agregação de membros e de suas crenças básicas.
Portanto, aborda aspectos como a centralidade da Bíblia, a dominação carismática pastoral
sobre a membresia e a relação burocrática-legal na hierarquia da Igreja. Esses aspectos
ressaltam a extensão da influência da Igreja sobre os seus membros, que é percebida além do
âmbito meramente eclesial. A figura do pastor adquire proeminência frente às demais
lideranças e sobre qualquer pessoa na Igreja, com isso, suas decisões passam a efeito
normativo referendado pelo poder da Bíblia. Aliás, a centralidade que a Bíblia tem na Igreja
do Nazareno decorre de sua condição como a Palavra de Deus e da interpretação que o pastor
lhe dá. Não é comum questionar os atos e discursos do pastor se ambos forem interpretados a
luz da Palavra de Deus. Essa interpretação é dada com autoridade pelo pastor, portanto, há
uma simbiose entre a Palavra de Deus e a palavra do pastor.
Em todos esses aspectos, este trabalho procura suplantar a falta de conhecimento sobre
a Igreja do Nazareno, trazendo ao conhecimento público as características formativas e
essenciais dessa Igreja, por meio do estudo da questão de como foi o processo de formação e
consolidação da Igreja do Nazareno até o ano de seu cinquentenário no Brasil. Em
decorrência desta problematização, apresentamos como hipótese principal, que o processo de
inserção da Igreja do Nazareno no Brasil se deu como resposta à falta de uma instituição no
cenário protestante brasileiro que vinculasse sua mensagem diretamente ao aperfeiçoamento
dos já convertidos. Assim, apontamos que, a inserção e expansão da Igreja do Nazareno no
Brasil visaram cobrir um lapso dogmático que nem as Igrejas clássicas e nem as pentecostais
suplantaram com suas mensagens e doutrinas. A Igreja do Nazareno visualizou o cenário
religioso brasileiro em termos das economias religiosas, ou seja, um ambiente de concorrência
em que seria necessário um fortalecimento institucional, ao invés de uma prática evangelística
pulverizada. Mesmo que entendamos que a doutrina da santificação propugnada pela Igreja do
Nazareno não se originou com ela e nem é exclusividade dela, os nazarenos entendem que o
Movimento de santidade se desvaneceu no âmago de outras denominações que a princípio
haviam aderido à doutrina da santidade.
Assim como nos Estados Unidos se buscou uma organização centralizada que
preservasse e difundisse a mensagem da santidade proveniente do Movimento holiness, assim
os nazarenos buscaram implantar uma instituição eclesial no Brasil que difundisse a
perspectiva original da santidade. Podemos aventar tal hipótese, pela necessidade apresentada
pelo casal Stegemoeller, nazarenos residentes no Brasil, de solicitar à direção da Igreja nos
Estados Unidos a vinda de missionários para implantação da Igreja no Brasil, bem como,
apesar da ausência da Igreja do Nazareno no país, José Zito, um de seus pioneiros, não ter se
filiado às Igrejas Congregação Cristã no Brasil, Presbiteriana, Metodista ou qualquer outra,
enquanto a Igreja do Nazareno não se estabeleceu em terras brasileiras.
16
Por fim, ressaltamos que, o foco desse estudo é a descrição e análise da formação e
expansão de uma instituição religiosa que visa a se estabelecer em um cenário protestante
diversificado. Portanto, esse estudo atende a uma lógica institucional da fundação,
desenvolvimento e reprodução de uma organização religiosa, baseado na perspectiva da
sociologia da Religião de Max Weber (2004), François Houtart (1994) e Thomaz O‟Dea
(1969) e na especificidade de sua inserção em um mercado religioso plural abordado pela
teoria das economias religiosas. Para não perdermos os aspectos bíblicos e teológicos
pertinentes a essa instituição, buscamos o diálogo com o ramo da Teologia denominado de
eclesiologia.
Entendemos que, apesar da singularidade da Igreja do Nazareno, seu estudo pode ser
proveitoso para aqueles que percebem que os fatos que a envolvem são semelhantes aos que
envolvem outras igrejas protestantes e que os aspectos abordados nesse estudo podem ser uma
contribuição para aqueles que desejam embrenhar nos caminhos da pesquisa sobre outras
17
CAPÍTULO 1
Introdução
p. 18) e anunciaram os mesmos serviços de auxílio aos pobres, denominando esse espaço de
Nazareno, por entenderem que era o nome que mais identificava Jesus Cristo com os pobres.
O crescimento das atividades na South Main fez surgir a Igreja do Nazareno.
vinda do casal de missionários Charles e Joana Gates. Earl Mosteller e Charles Gates, com
suas respectivas esposas e filhos, chegaram ao Brasil a pedido do casal Stegemoller que havia
enviado uma carta à sede da Igreja do Nazareno nos Estados Unidos solicitando missionários
para instalarem a Igreja do Nazareno no território brasileiro. Os Stegemoller vieram a trabalho
em uma indústria de tratores e máquinas pesadas em Campinas, o que significa que não
vieram ao Brasil a serviço da Igreja. Outros missionários e novos adeptos da Igreja do
Nazareno fizeram com que essa se espalhasse para outros Estados e cidades nos poucos meses
posteriores, como é o caso de Minas Gerais, Rio de Janeiro, São Paulo e Distrito Federal.
Cinquenta anos depois, a Igreja do Nazareno encontra-se em todas as regiões do Brasil com
aproximadamente 90 mil membros. (IGREJA DO NAZARENO/AGENDA, 2009.).
A breve explanação que fizemos sobre a Igreja do Nazareno tenta mostrar como a
formação institucional é dependente do ambiente sócio-histórico que a circunscreve, portanto
o estudo do processo formativo da Igreja do Nazareno servirá dos arcabouços teóricos que
privilegiam a institucionalização dos movimentos religiosos, uma vez que buscamos, neste
capítulo, o entendimento do processo formativo de uma instituição: a Igreja do Nazareno.
Tomamos, portanto, na análise desse objeto os condicionamentos sócio-históricos mais
importantes que contribuíram para o surgimento dessa Igreja. Esses condicionamentos são
retratados, como já dissemos, a partir das próprias concepções que a Igreja entende como
essenciais à sua formação, portanto as definições de arminianismo, da tradição wesleyana e do
Movimento de santidade nos Estados Unidos sustentam a abordagem deste capítulo. Assim, a
forma de análise que propomos é uma simbiose entre a abordagem da Sociologia da Religião
sobre as instituições religiosas2 e a eclesiologia, visto que os aspectos sociais de formação da
Igreja estão intrinsecamente ligados aos fatores teológicos que ela adota, ou seja, há uma
interpretação teológica dos eventos sociais no âmbito da Igreja do Nazareno.
2
Nesse aspecto, tomamos como referência teórica as perspectivas sociológicas da religião de Francois Houtart
(1994) e Thomaz O‟Dea (1969).
21
básica: O que é a Igreja? Dessa forma, essa disciplina estuda uma instituição de cunho
burocrático formal, mas também de valor simbólico espiritual. Na perspectiva de uma
eclesiologia protestante, tem-se que a Reforma Protestante (1517) se iniciou dentro da visão
do que seria a Igreja, visto que de imediato, contradizia os princípios hierárquicos,
burocráticos e teológicos da Igreja Católica Romana. Para Lutero, a Igreja Católica havia
perdido o direito de ser considerada a autêntica igreja cristã por haver se distanciado da
doutrina da graça3.
Segundo Walter Altmann (1994), Lutero fazia distinção entre a igreja externa e igreja
interna, isso é, a igreja enquanto instituição humana e comunidade mística espiritual. No
entanto, essa separação não era tão patente; são “dimensões que se dão sempre em
simultaneidade, não como entidades compartimentadas.” (ALTMANN, 1994, p. 126). Mesmo
assim, Lutero apresentou contundente crítica à Igreja institucional. Para ele, “o que se crê não
é corporal nem visível. Todos nós vemos a Igreja Romana exterior. Por esta razão, ela não
pode ser a verdadeira Igreja, que é crida e é uma comunidade ou assembleia dos santos na fé”.
(LUTERO, 1987. p. 378).
3
A graça é um conceito teológico extraído da interpretação bíblica, no qual expressa o favor incondicional de
Deus para com os seres humanos, independente desses o conhecerem ou amá-lo. Na perspectiva luterana, a graça
suprime a intervenção eclesiástica para que os seres humanos se relacionem com Deus. (Cf. GRENZ;
GURETZKI; NORDLING, 2002, In: GRAÇA)
22
preceitos de Javé, ou em torno dele, eram traduzidas como igreja, conforme estipula a versão
dos setenta4. Segundo Edward Schillebeeckx (1989, p. 60), os primeiros cristãos aproveitaram
dessa concepção e adotaram-na para se referir à reunião de fiéis aos preceitos de Jesus Cristo
em determinado local e também para as várias comunidades cristãs existentes em uma cidade,
ou espalhadas no mundo.
No caso do protestantismo, o conceito de igreja foi definido, por extensão, aos adeptos
do princípio luterano: somente pela graça, somente pela fé e somente pelas escrituras. Os
quais implicaram na singela definição encontrada nos artigos de Esmalcada5 em que a Igreja é
os cordeirinhos que ouvem a voz de seu pastor. Daí, Altmann (1994. p. 124) ressalta que “há
na compreensão de Igreja em Lutero, uma dimensão de forte crítica institucional. Excluída
está também de antemão a predominância de uma hierarquia eclesiástica”. Pelos princípios de
Schillebeck e de Lutero, entendemos que a Igreja protestante se estabelece em um
fundamento transcendente e subjetivo e em outro material histórico. Isso traz a necessidade de
uma abordagem social e eclesiológica e, nesse aspecto, visualizamos a Igreja do Nazareno no
Brasil por intermédio das relações burocráticas e pelas relações com o sagrado refletido na
supremacia da Bíblia e da prédica pastoral como padrão prescritivo na Igreja e na condução
dos membros nazarenos.
4
Versão dos setenta ou septuaginta refere-se à tradução do Antigo Testamento hebraico para o latim. Segundo a
tradição essa versão foi feita por setenta e dois rabinos que, sem se conhecerem, traduziram a Torá sem se
contradizerem.
5
Conforme Earle E. Cairns (1995), a liga Esmalcádica era uma organização formada por Príncipes protestantes
para defesa mútua contra os católicos, no ano de 1531.
23
Dessa forma, acreditamos que quaisquer que sejam as proposições utilizadas para se
definir uma igreja, o papel escriturístico é essencial, isso é, podemos pensar uma igreja com
muitos, poucos e até com um membro, podemos entendê-la com práticas ortodoxas ou
heterodoxas, com variadas formas de governo etc.. Contudo, todos esses aspectos se
submetem e são legitimados por uma avaliação bíblica. Qualquer que seja a forma ou
conteúdo de uma igreja de linha protestante evangélica são eles fundados ou referendados
pela interpretação que se tem das Escrituras Sagradas, ela torna-se o padrão normativo-
prescritivo de uma instituição religiosa do ramo protestante. C. William Fischer ([19--]), no
prefácio de seu livro, Porque sou nazareno e não Católico Romano, Espírita, Testemunha de
Jeová, Mormón e Adventista do 7º dia, estipula que o padrão nazareno de interpretação
da Bíblia é o valor principal de diferenciação em relação às outras instituições e não há
qualquer outro critério que a suplante.
Muitas observações e convicções tornaram esta obra uma tarefa compulsória, e mais
que necessária: a sagaz camuflagem da heresia, no empregar um vocabulário,
respeitável e ortodoxo [...] Se este livro criar o orgulho ou a arrogância
denominacional (dos nazarenos), terá falhado no seu propósito. Se criar ou alargar
uma caridosa compreensão naqueles cujas mentes estão distorcidas, e ao mesmo
tempo patentear tais distorções à reveladora luz do ‘Assim diz o Senhor’(da Bíblia)
e propiciar a todos que o lerem compaixão mais profunda para guiarem os
enganados aos caminhos da retidão e da verdadeira fé, terá provado que isso é obra
do Espírito. E nesta medida, e somente nesta medida, este volume será útil a todos
quantos o lerem e também agradável Àquele em cujo nome foi escrito. (FISHER,
([19--]), p. 6,7 grifo nosso).
Buscamos destacar com esse ponto, que os condicionamentos sociais que influenciam
na constituição de uma igreja são, em grande medida, referendados por alguma forma de
interpretação bíblica. O surgimento da Igreja do Nazareno é visto por seus adeptos como
resultado de uma interpretação escriturística do contexto sócio-histórico feita por seus
pioneiros. Nesse aspecto, pode parecer paradoxal a concordância que aqui se tem com as
origens sociais das denominações cristãs proposta por Helmut Richard Niebuhr (1992, p. 16)
que não se prende à interpretação ortodoxa do denominacionalismo cristão, que “considera os
credos oficiais das igrejas portadores da explicação das origens e do caráter das diferenças
vigentes” entre as várias igrejas. No entanto, propomos, como sutil diferença à abordagem de
24
Niebuhr, o fato de não se entender o credo de forma ontológica, ou seja, como algo distinto da
realidade cotidiana, simplesmente baseada nos ditames teológicos. Dessa forma, podemos
entender o credo não como um preceito de origem transcendente, mas como resultado da
forma de se perceber a realidade que é traduzida, ou é interpretada para e pela linguagem
religiosa, que se institucionaliza nas igrejas.
1.2 O arminianismo
A Igreja do Nazareno se define como arminiana. Essa ideia remete ao século XVI e
aos ensinos do teólogo holandês Jacobus Arminius (1560-1609). Armínio nasceu em
Oudewater e estudou na Universidade de Leiden e Genebra. Nesta, se empenhou a estudar o
calvinismo sob as orientações do sucessor de Calvino, Teodoro Beza. Ao terminar os estudos,
Armínio voltou para a Holanda e assumiu como pastor uma igreja em Amsterdã, nesse tempo,
conheceu as idéias de Dirk Koornhert, também teólogo, que combatia as idéias do calvinismo.
Armínio de imediato colocou-se contrário a Koornhert, mas aprofundando-se em seus estudos
verificou a plausibilidade dos argumentos do teólogo de Amsterdã e passou a adotá-los.
Segundo José Gonçalves Salvador ([19--], p. 23), Koornhert, desde 1544, “vinha atacando as
idéias de Calvino na Suíça. No conceito de Koornhert, todas as formas de religião deviam ser
toleradas, mas, ao externar seu ponto de vista, feriu uma das doutrinas fundamentais do
calvinismo, único sistema que o Estado favorecia”.
25
6
Essa designação surgiu quando um grupo de pastores adeptos das ideias de Armínio viu se intensificar as
perseguições contra suas práticas e ideias, principalmente, em decorrência das ações impetradas pelo docente da
Universidade de Leiden, Francisco Gomaro. Em decorrência de tal fato, esses pastores assinaram um documento
intitulado de o protesto ou “remonstranza” que rechaçava ainda mais o calvinismo.
26
Para os arminianos, o calvinismo coloca Deus como autor do pecado, embora não
negassem, de todo, o chamado dos salvos semelhante à eleição. Os arminianos não
corroboravam, contudo, com um decreto divino arbitrário de escolha dos salvos, pois se assim
fosse os não salvos também seriam decorrentes da escolha de Deus e, para eles, ninguém foi
chamado para a perdição. Os “remonstrantes” acreditavam que nenhum ser humano por suas
próprias forças podia alcançar a Deus, esse, por intermédio de sua graça, é que chegava até os
homens, mas isso não significava que somente alguns tinham a sorte de serem alcançados. A
partir da aproximação de Deus é que os seres humanos poderiam escolher se seguiriam ou não
os ditames da divindade, mas todos os seres humanos poderiam ter essa escolha.
7
Conforme Grenz, Guretzki e Nordling (2002, p. 123), o Sínodo de Dort foi uma assembleia das igrejas
reformadas dos Países Baixos, convocada em Dort em 1618-1619, para tratar politicamente da separação entre a
igreja e o Estado e teologicamente da questão arminiana. O Sínodo se posicionou contra o arminianismo e
estabeleceu bases que confirmavam a doutrina da depravação total da humanidade.
27
8
Puritanismo foi um movimento de reforma que a princípio buscava “purificar” a Igreja da Inglaterra após a
Reforma inglesa. Os puritanos acabaram concentrando-se na purificação dos indivíduos e da sociedade por meio
da reforma da igreja e do Estado de acordo com princípios bíblicos. Defendiam uma teologia das alianças e
tinham a convicção de que as escrituras estavam devidamente investidas de autoridade para a conduta do
indivíduo e para a organização da Igreja. (In: GRENZ, GURETZKI, NORDLING. 2002, p. 111).
29
A Igreja do Nazareno sustenta em sua declaração histórica que um dos pontos no qual se
alicerça é o movimento wesleyano e, particularmente, o movimento de reavivamento ocorrido
no Século XVIII. Nessa parte, destacamos, portanto, em quais condições sociais e religiosas
esse movimento surgiu, bem como, quais foram os fatores que contribuíram para a
emergência de João Wesley no cenário protestante inglês e qual foi a contribuição do
wesleyanismo para o surgimento da Igreja do Nazareno como instituição nacional, nos
Estados Unidos, no início do século XX.
Vimos nas páginas precedentes que a monarquia inglesa teve um papel decisivo no que
concerne ao aspecto religioso. No entanto, esse papel se deslocou para outras áreas que
influenciaram radicalmente a postura dos religiosos ingleses. O fortalecimento do Estado
absoluto possibilitou um recrudescimento das atividades comerciais, bem como um aporte de
inovações tecnológicas que deram à Inglaterra o pioneirismo na formação de uma sociedade
capitalista, bem como um impressionante desenvolvimento industrial que veio a se consolidar
na chamada Revolução Industrial.
Para Paul Singer (1991), a economia de mercado é bastante antiga. Desde tempos bem
remotos as sociedades organizavam sua economia produzindo bens que eram trocados em
locais específicos denominados de feiras ou mercado. A produção era artesanal e em cada
30
Conforme destaca Geoval Jacinto da Silva (2009, p. 35), “O modo de se viver e pensar
modificou rápida e radicalmente em todos os lugares onde ocorreu o processo de
industrialização”. Esse aspecto também não passou despercebido no transcurso do
protestantismo inglês. A forma como o clérigo anglicano João Wesley respondeu a esses
problemas e conduziu a intervenção da Igreja no âmbito social para combatê-los foi bastante
significativo para o processo de formação institucional da Igreja do Nazareno na primeira
década do Século XX.
31
A doutrina arminiana desde cedo fez parte da vida de João Wesley. Seus pais Samuel e
Suzana concordavam com as ideias arminianas de Bull e, paulatinamente, foram inculcando-
as em seus filhos. No ano de1725, Wesley ainda questionava os ensinamentos calvinistas,
conforme uma carta enviada a sua mãe. Deve-se notar o teor da resposta dada por Susana.
9
Cf. Cairns (1995, p. 271), os 39 artigos são uma revisão doutrinária, de forte ênfase calvinista, do Livro de
Oração Comum. Foram aceitos como credo da Igreja Anglicana, pelo Parlamento inglês, no ano de 1563.
32
Essa se tornara mais que uma afirmação intelectual ou uma dádiva de Deus, pois conclamava
os seres humanos à responsabilidade de um novo modo de vida.
10
C.f. Mcgrath (2005, p. 118), O termo pietismo deriva da palavra latina “pietas” que é melhor traduzida por
devoção e religiosidade, talvez originada da obra “pia desideria” (1675) de Philipp Jacob Spener. O movimento
pietista pode ser visto como uma reação contrária ao formalismo e ortodoxia doutrinária apresentada pelo
luteranismo. Buscava, pois, uma fé relacionada com os aspectos intimistas da natureza humana é a “religião do
coração”. Para Mcgrath, João Wesley está entre os representantes desse movimento e o introduziu na Inglaterra.
11
Alguns autores denominam esse período de reavivamento ao invés de avivamento, tal fato se dá em
decorrência desses estudiosos considerarem ou não o ineditismo do movimento no contexto em que se instala.
Para Heitzenrater, o autor chave nessa análise, o movimento de avivamento wesleyano foi precedido por outros
de igual natureza, por isso denomina-o de reavivamento.
33
caracterizavam pelos cercamentos dos campos para a criação de ovelhas que forneciam lã
para as manufaturas têxteis. Os cercamentos produziram uma agricultura cada vez mais
voltada para o mercado, as atividades agrárias começavam a entrar na rota de abastecimento
da incipiente classe trabalhadora, dificultando a produção e encaminhamento dos gêneros
alimentícios para sustento dos trabalhadores no campo. A atuação, em conjunto, desses
fatores tornava a vida no campo cada vez mais insustentável. Segundo Singer,
A pobreza não traz consigo coisa pior que o fazer com que os homens se tornem à
mofa. Mas, não é a falta de alimento pior do que isso? Deus proclamou como
maldição sobre o homem o fato de que ele deveria „ganhar o pão do suor do seu
rosto‟. Mas, quantos há neste país cristão que trabalham e suam e, afinal, não têm
senão que lutar contra a tristeza e a fome? Não é triste para alguém, depois de um
dia pesado de trabalho, chegar à sua casa pobre, suja e sem conforto, e não encontrar
pelo menos o alimento necessário à reparação de suas energias gastas? Refleti, vós
que tendes vida tranquila na terra e de nada tendes necessidade, senão de olhos para
ver e de ouvidos para ouvir e de coração para entender o quanto Deus vos tem feito,
quão terrível é procurar o pão diariamente e não achá-lo! [...] Rogo a Deus que
permita, antes de morrer, levantar a voz mais uma vez, como um toque de trombeta,
para alertar os que acumulam dinheiro e não dão roupas, nem onde recostar a
cabeça. Por que sofrem tanto? (Wesley apud. LOCKMANN, 2008, p. 44-
45).
Esse aspecto mostra que a mensagem wesleyana de avivamento atendia aos anseios
daqueles fatigados pela condição social. Dessa forma, o grande número de ouvintes
identificava-se com a mensagem wesleyana que se tornava oposta à condição da igreja oficial,
cuja importante parcela do clero estava arrolada entre os que se beneficiavam da exploração
das massas.
A palavra santidade usada no meio eclesial tem sua origem na Bíblia e significa santo,
sagrado, aquilo que é separado, puro. (GRENZ; GURETZKI; NORDLING. 2002, p. 121).
Assim, a santidade é vista como um atributo de Deus, qualidade do povo hebreu que se separa
dos pagãos, ou dos costumes mundanos. Também denota a separação de coisas e pessoas para
o serviço de culto a Deus, tais como o sacerdote, candelabro, óleo, oferendas. De uma forma
geral, o conceito de sagrado e seus cognatos assumiram significado daquilo que é dedicado a
Deus. No entanto, cabe discorrermos sobre o processo de assimilação do conceito de
santidade na doutrina wesleyana de perfeição cristã que a Igreja do Nazareno adota como sua
principal vertente.
35
Para J. Kenneth Grider (1991, p. 19), a raiz hebraica “KDSH” traduzida para santidade
se usa 830 vezes no Antigo Testamento, mas os eruditos não têm certeza quanto à história
etimológica da palavra, mesmo assim, poucos discordam do seu sentido de separação.
Contudo, sua tradução que significa santidade não tem originalmente nenhuma conotação
ética. Grider (1991, p. 19) afirma que essa conotação era também dada às prostitutas que
exerciam seus ofícios nos templos pagãos como forma de serviço aos deuses e deusas da
fertilidade. “elas não eram santas no sentido ético, como se entenderia no contexto bíblico,
lhes chamavam „santas‟ porque eram pessoas separadas para um uso especial de seus deuses”.
De acordo com o mesmo autor, no meio do povo hebreu já se poderia se aventar o conteúdo
ético para “KDSH” aplicado às pessoas, cujos requisitos éticos se implicavam nos requisitos
de pureza para os animais que se haviam de usar para os sacrifícios no tabernáculo.
12
Pecado Original é um termo teológico que faz menção ao processo inicial que desencadeou a proliferação do
pecado a toda humanidade. Segundo o relato bíblico esse pecado iniciou com os personagens Adão e Eva que,
desobedecendo a Deus, comeram o fruto da árvore do bem e do mal, sendo, por isso, expulsos do paraíso.
13
Batismo no Espírito Santo é uma expressão bíblico-teológica que significa a forma sobrenatural, pela qual o
cristão recebe a presença ou os dons do Espírito Santo. No meio eclesial ganhou várias vertentes e valorização,
principalmente, no ramo pentecostal em que os dons de se fazer milagres, de curar e falar línguas estranhas, por
exemplo, significam formas de comprovação de que o fiel foi batizado com o Espírito Santo.
36
em mente que a inteira santificação é obra de Deus, portanto ação direta do Espírito Santo,
pois somente Deus teria a capacidade de erradicar dos seres humanos o pecado original.
Segundo Wiley e Culbertson ([19--]. p. 180.), a Bíblia apontam três sentidos para a
palavra justo. O primeiro aplica-se àquele que é pessoalmente justo e contra o qual não há
acusação nenhuma, essa é a justificação pessoal. O segundo é aplicado para aquele que foi
acusado de alguma transgressão, mas nada foi provado, é a justificação legal. O terceiro faz
menção àquele que é culpado, acusado e condenado, mas pelo sacrifício de Cristo é perdoado
e declarado justo por Deus. Para grande parte das igrejas do ramo protestante, nesta última
justificação ocorre o processo de regeneração, no sentido restrito de um novo nascimento, e
de filiação cristã que se tornam o objetivo da vida cristã. Pela declaração de justiça, os crentes
se relacionam com Deus e têm um lugar garantido no céu no findar da vida terrena.
Wesley, no entanto, entendia a justificação não como fim da vida cristã, mas como meio
para obtê-la. Ele entendia o ato regenerativo como importante mudança na alma daquele que
cria, sem a justificação não haveria regeneração, porém esse ato não trazia a plenitude da vida
cristã, era apenas o começo dela. As mudanças espirituais e morais trazidas pela regeneração
não tiravam os desejos corporais que militavam contra a nova espiritualidade, apenas por um
ato secundário da parte de Deus poderiam os seres humanos dominar a si mesmos, ou seja,
por meio da santificação. Segundo Wesley, a regeneração é o princípio da vida santa, por isso
está vinculada à santificação. No entanto, cabe distinguirmos a regeneração como santificação
inicial, que purifica os seres humanos daqueles atos impuros e depravados que se cometeu ao
longo da vida. Por assim dizer, a justificação e a consequente regeneração livram os seres
humanos dos pecados cometidos, mas não da origem desses pecados, que é o pecado original.
37
O termo santidade se refere ao estado ou condição daquele que passou pela experiência
da inteira santificação. Os pressupostos morais e éticos dessa doutrina trouxeram ao
cristianismo reformado um novo padrão comportamental que respondia de forma mais
veemente o quadro social que vivia a Inglaterra do final do Século XVIII. Para Clóvis Pinto
de Castro (2008, p. 258), a compreensão wesleyana da santificação se “desenvolve na inter-
relação humana. A justificação pressupõe um ato de fé pessoal e intransferível; a santificação
implica na existência do outro, do próximo, tanto no nível comunitário eclesiástico como no
espaço público”. Com isso ressaltamos que a santificação é, também, um evento social que,
conforme afirma J. Kenneth Grider (1991), é um ensino doutrinário que em muito ultrapassou
o provincialismo teológico do metodismo conforme afirmava alguns estudiosos.
É importante notarmos que, mesmo que Wesley não excluísse a perfeição cristã da vida
em sociedade e, mesmo que essa tenha um reflexo social importante, sua origem está
intrínseca aos seres humanos na relação com a divindade. Com isso, a forma que Castro
(2008) aponta está mais para a consequência social da santificação e para sua certificação do
que para sua origem. A santificação, para Wesley, é obra oriunda da graça divina, porém,
dentro de uma perspectiva arminiana, ela decorre da condição humana querer alcançar a sua
finalidade: a santidade. Portanto, a santificação é o ato de se tornar alguém ou algo
santificado, uma vez santificado esse alguém ou algo está em santidade. No caso dos seres
humanos, as relações interpessoais demonstram se alguém é ou não santo, mas não
determinam essa condição, uma vez que muitos santificados se voltaram contra as estruturas e
prática sociais. Dessa forma, em Wesley, a santidade é social, mas pode não ser societal “não
38
há santidade que não seja santidade social; reduzir o cristianismo tão somente a uma
expressão solitária é destruí-lo.” (Wesley apud CASTRO, 2009, p. 259).
Durante a vida de João Wesley, alguns pastores na Inglaterra fizeram sérias objeções à
difusão da doutrina da santidade no território e colônias inglesas. Esse quadro de objeções
também foi verificado nos Estados Unidos, onde a maioria dos ministros metodistas
estadunidenses, por querer ressaltar as diferenças com o metodismo inglês após o
reconhecimento da independência das treze colônias, negligenciava a doutrina da inteira
santificação. Segundo M. E. Redford (1995, p. 10), o crescimento do número dos metodistas e
o apego de seus bispos ao ambiente cultural dos Estados Unidos contribuíram para que
aqueles que ainda pregavam a santidade fossem perseguidos por aqueles que haviam se
39
esquecido dela e também fossem colocados à parte nos trabalhos das igrejas, quando não
expulsos delas.
anglicana vinda através de companhias privadas que recebiam concessões para explorar esse
território colonial inglês. A Igreja Anglicana se tornou a igreja oficial em grande parte das 13
colônias, mas houve espaços para os congregacionalistas, presbiterianos e batistas que se
estabeleceram em sua maioria nas colônias de Nova Inglaterra, Salém e Providence
respectivamente (NICHOLS, 1981, p. 261-267).
Uma das práticas que se tornou comum entre os protestantes nas colônias inglesas da
América foi o avivamento. Esses movimentos de renovação espiritual emergiam,
normalmente, em tempos de crise. No início eram espontâneos, não organizados e de cunho
rural, depois passaram a acontecer com mais frequência em meios urbanos com o acirramento
do processo de urbanização e industrialização, com o aumento populacional e com a
degradação moral e os conflitos separatistas. (CAIRNS, 1995, p. 316). Jonathan Edwards,
Theodore Frelinghuysen e George Whitefield estão entre os maiores avivalistas do Século
XVIII na América. Apesar de alguns aspectos que esses movimentos trouxeram para as
igrejas e a sociedade, como o ensino moral nos lares, no trabalho e no lazer, criação de
universidades como Princeton, Columbia, Hampden-Sydney, além da criação de casas de
abrigo e orfanatos, (CAIRNS, 1995, p. 318), houve reações contrárias e divisões entre as
igrejas decorrentes desses movimentos avivalistas.
Ao mesmo tempo, a situação entre norte e sul também se tornara bastante conflituosa.
Por muitos anos, as condições socioeconômicas do sul permitiram o seu domínio na política,
mas, em meados do século XIX, os sulistas estavam sendo superados pelos nortistas. Criou se
entre eles, acordos políticos que serviam para administrar seus interesses, no entanto as
diferenças econômicas entre o sul agrário e o norte industrializado trouxeram sérias questões
que não foram suplantadas para a manutenção das boas relações. Dentre as diversas questões
como as tarifárias, gastos de investimentos em infraestrutura de transporte e a organização dos
Estados do oeste, essa última teve papel crucial, uma vez que o norte tendia a tolerar a
escravidão no sul, mas com a extensão desta para os novos Estados do oeste, viu-se ameaçado
em seu poderio político porque temia que esses Estados viessem a ter uma organização
semelhante ao sul e os seus representantes no Congresso fortalecessem o poderio político dos
sulistas nas eleições de 1860. (RÉMOND, 1989, p. 55-59).
Em meio a essas tensões entre norte e sul, o debate sobre o escravismo tornou-se ponto
culminante que nem os sulistas nem os nortistas conseguiram superar. Segundo Rémond,
(1989, p. 59-66) as circunstâncias se agravaram quando o norte foi atingido por uma
depressão econômica devido à queda nos investimentos e nos depósitos bancários feitos por
investidores europeus e pela especulação desenfreada no setor de construção de estradas de
ferro. Além disso, a vitória nas eleições de 1860, de Abraham Lincoln nortista, abolicionista e
republicano e, portanto, contrário aos interesses dos sulistas levou a que esses deixassem a
União para organizarem um novo país, Os Estados Confederados da América. A Guerra Civil
americana veio à tona com bastante violência, teve um custo de mais de 600 mil mortos e
terminou com o esmagamento do sul pelas tropas do norte.
Além desses aspectos, outro fato importante começava a tomar expressão, as igrejas
protestantes começaram a adotar os métodos seculares na busca por mais fiéis e para sua
expansão, de forma que suas ações eclesiais assemelhavam às organizações e empresas de
negócios. Ao mesmo tempo, preocupações de cunho social, tais como aquelas relativas aos
43
O início desse movimento se deu nas reuniões metodistas, segundo Smith ([195-]),
através do pastor John C. Mcclintock, membro do comitê de celebração do centenário de sua
denominação, em 1866. Mcclintock dizia ser a perfeição cristã o tema central da Bíblia e
promoveu reuniões semanais de santidade que durante o ano de comemoração do centenário
multiplicaram em muitas cidades. O casal Palmer, seguidor de Mcclintock, promoveu
reuniões e conferências campestres nos Estados de Nova Iorque, Michigan e Ilinois. Ao
mesmo tempo, John S. Inskip, pastor metodista, dirigiu uma série de conferências que
culminou em um grande avivamento campestre para promoção da santidade em 1867. As
reuniões campestres de santidade avançaram nos anos seguintes. Em 1869, foi criado os
primeiros periódicos voltados ao movimento de santidade, “The christian standard” e o
“Home Jornal” dirigidos por John Inskip. No ano seguinte, William Mcdonald fundou uma
revista mensal, “The advocate of holiness”, daí uma contínua publicação de jornais e revistas
se espalharam pelos Estados Unidos. (SMITH, [195-], p.19.).
Os encontros campestres tiveram apoio de grande parte dos pastores e bispos de outras
igrejas. No entanto, cabe ressaltarmos, que sua disseminação se deve à ação leiga. Durante a
maior parte do século XIX, a colonização foi um fator preponderante na condição
estadunidense. O fluxo migratório contou em grande parte com a participação das igrejas
protestantes, fiéis itinerantes cavalgavam pelos caminhos do oeste e, depois da Guerra de
Secessão, por todo o território daquele país. Com pouco vínculo institucional, os leigos
celebravam cultos religiosos, construíam escolas e templos que posteriormente eram usados
pelas igrejas. Após o conflito separatista, o papel leigo foi redefinido pelas grandes reuniões,
que traziam o vínculo institucional de evangelização de massa, ou seja, visava-se não apenas
introduzir uma visão religiosa de conversão ou regeneração, mas uma perspectiva que trazia o
patrocínio de uma denominação ou de grupos denominacionais que diferenciavam entre si.
a ideia de santidade nos Estados Unidos, por meio da evangelização campestre. Segundo
Diane Leclerc, (2004, p. 28) “no início estes metodistas americanos eram extremamente fiéis
à pessoa e à teologia de John Wesley. Mas passou apenas uma geração, para que a palavra
„pai‟, que era usada quando se fazia alguma referência a Wesley, mudasse para „fundador‟”.
Esses metodistas quiseram tornar-se independentes dos padrões britânicos do metodismo.
Essa mudança não foi apenas eclesiástica, mas significava a influência do contexto no qual
estavam inseridas as igrejas estadunidenses. (LECLERC, 2004.).
A perda de três filhos levou Phoebe Palmer a ingressar na vida religiosa, em 1837.
Adepta do metodismo, sua vocação influenciou a vida de milhares de pessoas. Juntamente
com sua irmã Sarah Lankford, Palmer liderou as chamadas reuniões de terças-feiras em sua
casa. Para muitos, esse é considerado o lugar em que nasceu o Movimento de santidade.
Leclerc (2004) considera que em muitos aspectos, Phoebe Palmer não era uma mulher típica,
dos meados do século XIX. Por essa consideração de Leclerc, entendemos a figura de Phoebe
como alguém que está em posição de vanguarda em relação à sociedade em que vive. De fato,
Phoebe demonstrou isso ao assumir uma condição de liderança eclesiástica geralmente
atribuída aos homens e de iniciar um movimento ainda questionado em sua época. A própria
frustração de Phoebe em alcançar a experiência da santidade instantaneamente, por causa da
complexidade transmitida através da pregação metodista, deu-lhe grande ímpeto para fazer
com que a doutrina fosse accessível aos leigos. Conhecida por criar a fórmula dos três passos,
uma síntese que reduziu a termos simples aquilo que podia ser uma busca complicada e
perplexa da santidade, Phoebe Palmer escreveu dezenas de livros e junto com seu esposo
compraram e editaram o Guia da perfeição cristã, até 1903. Ambos também criaram postos
de assistência aos pobres, pelos quais as obras de caridade femininas foram reconhecidas.
A santidade, portanto, não é apenas uma profissão de fé, mas uma necessidade social.
Contudo, suas características intrínsecas terminantemente bíblicas, “histórica, tecida
14
O termo mundo é aqui entendido, em conotação bíblico-teológica, como o ambiente externo à influência e
ditames das igrejas. Esse termo assemelha-se, neste caso, àquilo que é secular, profano, digno de conversão aos
preceitos das igrejas.
46
estava Antonette Brown que foi ordenada ao ministério15 pastoral em 1853, a primeira mulher
formalmente ordenada na história que se tem notícia. (GRIDER,1991, p. 16)
A teologia de Oberlin não estava desligada da sua agenda social. Calvinistas como
Charles Finney e Mahan estavam atentos ao novo tema de evangelismo que estava se
espalhando pelos Estados Unidos, Canadá e Grã-Bretanha, a saber: a inteira santificação.
Segundo Leclerc (2004), os calvinistas rejeitavam a relação que se dizia necessária entre a
doutrina da perfeição cristã e o metodismo. A partir daí, começaram a pregar uma nova
síntese do calvinismo e da santificação que se tornou conhecida como Nova Teologia ou Novo
Calvinismo. No entanto, houve reações extremas, principalmente, pelas denominações
calvinistas mais tradicionais, pois a teologia de Oberlin mostrava-se completamente otimista
sobre a mudança pessoal e social que pode acontecer através da santificação. Alguns sugerem
que o declínio do radicalismo de Oberlin, depois de Finney e Mahan, está diretamente ligado
à sua volta à teologia calvinista mais tradicional que está longe do perfeccionismo do século
XIX. Outros sugerem que o reavivamento de Oberlin declinou após 1842, ano em que Elder
Jacob Knapp, evangelista batista, foi banido de Boston e se tornou membro do Instituo
Oberlin, cujos pastores sofreram diversos ataques por seu suposto fanatismo.
15
A palavra ministério faz referência ao trabalho realizado nas igrejas ou fora delas, cuja designação para esse
trabalho procede de Deus ou de alguém que exerce autoridade divina. Por exemplo, aqueles que exercem o ofício
de pastor têm o ministério pastoral.
48
Segundo Smith ([195-]), o principal fator que motivou a separação dos líderes do
Movimento de santidade de suas respectivas igrejas foi a participação desses líderes em
trabalhos sociais e de assistência de cunho denominacional. Alguns desses líderes deram
respaldo ao trabalho com os pobres e excluídos das grandes cidades, produzindo, assim, uma
gama de convertidos que se sentiam desconfortáveis nas igrejas existentes.
Consequentemente, surgiram diversas congregações independentes. Desde o período das
grandes cruzadas e encontros evangelísticos produzidos por Phoebe Palmer e Charles Finney,
em que se pregava contra a escravidão e se construíram casas de apoio aos pobres e asilos nos
bairros de Nova Iorque, a doutrina da santidade havia compelido a muitos para assistirem a
esse contingente de necessitados. A fundação de hospitais, asilos, casas de recuperação,
16
Segundo McGrath, a escatologia é parte da Teologia cristã destinada ao estudo das últimas coisas, como a
ressurreição, inferno e vida eterna. (MCGRATH, 2005, p. 652.).
49
orfanatos, casas de desabrigados, etc., ajudaram a muitos obterem uma melhor condição de
sobrevivência. Assim, aqueles que integravam o trabalho social de santidade ou eram
atendidos por ele percebiam novas razões para rechaçar o formalismo das igrejas. Com isso,
foram criados centros de adoração para esse contingente que, principalmente, após 1880 era
marginalizado nos grandes centros urbanos dos Estados Unidos.
Muitos fiéis antigos das igrejas tradicionais, bem como os iniciantes começaram a
seguir essas congregações. Os bispos metodistas notaram essa crescente debandada de seus
fiéis para as organizações de santidade e buscaram reagir adotando dois posicionamentos. O
primeiro visou rechaçar veementemente o que se pregava nos grupos de santidade enfatizando
o caráter denominacional e a autoridade episcopal sobre as decisões dos leigos, essa reação
não surtiu muito efeito e em pouco tempo esses líderes e suas igrejas se encontravam mais
enfraquecidos. O segundo posicionamento se caracterizou pela adesão de alguns bispos
metodistas aos parâmetros do Movimento de santidade, mas sem que se desqualificasse o
padrão denominacional.
Conforme Smith ([195-], p. 16-30), mesmo que as pregações sobre a segunda obra da
Graça tivessem em muito criticado a autoridade episcopal, alguns bispos metodistas
procuraram adaptar-se ao Movimento de santidade, a fim de que suas perdas fossem menores.
Dessa forma, começaram a investir em atividades missionárias e evangelísticas um tanto
quanto distantes das rigorosas disciplinas metodistas. Entre 1895 e 1905, muitos bispos do
norte e do sul patrocinaram campanhas para conscientizar pastores e leigos para a busca da
doutrina do amor perfeito. Contudo, tais campanhas refletiram resultados adversos, visto que
50
o fiel, contudo não significava mero recebimento dos dons celestiais, mas total expurgo do
pecado original. Phineas Bresee foi grandemente influenciado por Wood. Em 1886, ambos se
reuniram na Igreja Metodista, que Bresee pastoreava, para compartilharem do entendimento
que o Espírito Santo efetuava a inteira santificação. Tal era a adesão de Bresee sobre os
ensinamentos de Wood, que este fora convidado para pregar na primeira reunião anual de
santidade, ocorrida no ano de 1895, que foi também a reunião de inauguração da Igreja do
Nazareno em Los Angeles. A partir daí, a crença de que o Espírito Santo realiza
instantaneamente a santificação passou a ser ponto inquestionável na doutrina da Igreja do
Nazareno.
Cabe ressaltarmos, que essa perspectiva, conforme destacam Smith ([195-]), Riley e
Oster ([19--]), entre outros, está estritamente voltada para valorização da Igreja do Nazareno
52
no Movimento de santidade e não traduz a diversidade das questões nem os embates dentro
desse Movimento. Por isso, é verificada a posição, interessante para a história oficial dessa
Igreja, que o despontamento dos diversos grupos de santidade deveu-se mais pela localidade
onde emergiam e pela ausência de uma estrutura comum que os unificasse do que pela falta
de consenso nas questões que abordavam. Os historiadores nazarenos consideram que houve
dissensões no Movimento de santidade, porém, estas se relacionavam em grande parte com os
temas de cunho espiritual, como por exemplo, a questão da obtenção da santidade de forma
instantânea ou não, que de certa forma não acarretava maiores contratempos de ordem prática.
Assim, esses historiadores minimizavam as contradições do Movimento de santidade.
Legenda:
Conclusão
CAPÍTULO 2
A IGREJA DO NAZARENO
Introdução
Quando jovem seus pais se mudaram para o povoado de Devenport, próximo a Franklin, onde
se converteu em 1856. Pouco depois, recebeu licença como exortador, o primeiro nível para
se alcançar o ofício pastoral na Igreja Metodista Episcopal. Em 1857, seus pais mudaram para
Millersburg, em Iowa, na região central dos Estados Unidos. “Bresee logo se deu conta de que
Iowa carecia de pregadores” (SMITH, [195-], p. 105). No ano de 1859, Phineas Bresee foi
ordenado ministro pelo bispo Matthew Simpson e ordenado a presbítero, em 1861, pelo então
Bispo Levi Scott. Em 1860, retornou à Nova Iorque e casou com Mary F. Hibbard pertencente
a uma influente família metodista. Bresee, em anos posteriores, serviu às Igrejas Metodistas
da comunidade holandesa de Pella, East Des Moines, Chariton, Read Oak e participou de
alguns circuitos de pregação em Grinnel e Galesburg, entre outros. (SMITH, [195-], p.105).
O fato que os nazarenos tomam como precioso na vida de Bresee foi sua experiência
da inteira santificação que ocorreu em 1866 em Chariton, Iowa. Segundo E.A. Girvin (1916,
p. 50), Bresee havia passado por um período de intensas dúvidas em que a ambição, impulsos
de ira e orgulho haviam revelado sua verdadeira condição espiritual. Bresee declarara que:
Parecia que duvidava de tudo. Pensei que era questão intelectual, por tanto procurei
encontrar a resposta. Pensei que provavelmente havia entrado tão jovem ao
ministério que nunca havia encontrado resposta para as grandes questões do ser, de
Deus, do destino, do pecado e da expiação; portanto me dei à tarefa de responder a
essas perguntas (...) minhas dúvida não se dissiparam. (Bresee apud. GIRVIN,
1916, p.50, tradução livre).
Em uma reunião de oração em Chariton, Bresee caiu de joelhos no altar de sua própria
igreja pedindo a Cristo que satisfizesse suas petições. Para ele, foi esse o momento em que
Deus lhe tirou todo o aspecto de mundanidade manifestados na ira, orgulho e dúvidas que
tivera. Bresee recordou que naquela noite se deu conta de que as condições de dúvidas eram
morais em vez de intelectuais e que a dúvida era parte de sua carnalidade. (GIRVIN, 1916, p.
51). Bresee passou a considerar esse acontecimento como o momento de sua santificação.
Alguns anos mais tarde, Bresee voltou para Council Buffs, a fim de pastorear a Igreja
em que Knotts era membro proeminente. Bresee, querendo fundar uma nova congregação em
uma região opulenta da cidade, envidou esforços e recursos para tal finalidade, no entanto, em
1883, o rio Missouri transbordou e inundou grande parte da região que Phineas desejava. No
mesmo ano, Knotts recebera a notícia que trabalhadores em sua mina, em Parral, haviam feito
uma detonação que cobriu grande parte dos túneis, destruindo máquinas e ferramentas de alto
60
custo, que inviabilizaram o uso dessa mina. Consequentemente, Bresee se achou em ruína
financeira e decidiu-se mudar para o Estado da Califórnia.
Bresee resolveu não mais se envolver com negócios, mas apenas trabalhar na sua
vocação pastoral. Ele, sua esposa e filhos saíram de Council Buffs por meio de doações
recebidas. No domingo seguinte, Bresee foi convidado para pregar na Primeira Igreja
Metodista de Los Angeles, da qual poucas semanas depois viria a se tornar pastor. Foi nessa
Igreja que Bresee entrou em contato com um grupo de leigos que professavam a santificação,
seu líder era Leslie F. Gay, que emprestava sua casa para o encontro semanal de promoção da
santidade. Leslie se esforçara para que a Conferência dos líderes metodistas da Califórnia do
sul se alinhasse com o Movimento de santidade. Em dezembro de 1883, a Convenção do
distrito metodista de Los Angeles selecionou Gay, Bresee, R.W.C. Farmsworth e outros dois
pastores para formarem uma comissão que estabelecesse correspondência com a Associação
Nacional de Santidade para que essa se instalasse também em Los Angeles. Isto implicou nos
convites feitos a William Mc Donald presidente da Associação e a George D. Watson para
uma série de avivamentos na cidade. (SMITH. [195-], p. 111)
membro fundador da Igreja do Nazareno em Los Angeles, escrevia que as divisões na igreja
não eram para a glória de Deus. Aqueles que assumiram a liderança do Movimento de
santidade, na Califórnia, exerciam ao mesmo tempo posições influentes no metodismo local.
Um desses eminentes, Joseph Pomeroy Widney, membro da primeira Igreja Metodista de Los
Angeles, médico e reitor da Universidade do Sul da Califórnia, uniu-se às ideias de santidade
de Bresee e seus companheiros. Widney tornou-se importante figura na formação da Igreja do
Nazareno.
Em 1886, Phineas Bresee foi transferido para Pasadena. O templo ainda estava sendo
construído e o número de membros era de 130. Bresee iniciou campanhas, a fim de chamar os
trabalhadores para as reuniões o que acarretou a duplicação de membros. No segundo ano, em
Pasadena, 250 pessoas se uniram à Igreja de Bresee. (SMITH, [195-], p. 115). Na
impossibilidade de acomodar novos membros no templo, construiu-se um tabernáculo, pelo
que Bresee informou que sua igreja tinha 700 membros e seu salário era de US$ 4.350,00
dólares, mais do que recebia o principal ministro da Primeira Igreja de Los Angeles (SMITH.
[195-], p.115). A doutrina da santidade se expandia não somente pelas ações de Bresee, outros
membros da Conferência para a santidade foram ganhando espaço em outros meios. Mc
Donald e seus colaboradores, como J. A. Wood, dirigiram avivamentos por toda a Califórnia.
Leslie Gay tornou-se membro da Associação Nacional de Santidade em 1887, era o único
membro leigo da costa ocidental dos Estados Unidos a fazer parte da Associação. Além disso,
Gay alcançou o mais alto grau possível para um leigo metodista ao fazer parte da Conferência
geral de 1888.
Bresee serviu em Pasadena até ser nomeado presbítero presidente do distrito de Los
Angeles. Isso possibilitou o fortalecimento dos encontros de avivamentos em sua
circunscrição, ao mesmo tempo possibilitou a Bresee inserir o Movimento de santidade em
lugares não eclesiásticos, como nas faculdades e nas casas de leigos. Desde o ano de 1884,
Bresee fazia parte da Junta de diretores da Universidade do Sul da Califórnia. Em 1892, ele e
Joseph Widney resolveram salvar essa instituição da ruína financeira que estava prestes a
cobri-la. Widney, que havia assumido a reitoria nesse mesmo ano, se apercebeu da dívida de
US$ 18 mil doláres da Escola de Artes Liberais. O primeiro projeto de Widney foi formar
uma Junta separada para essa escola, a fim de sanar a dívida e também aproveitar a ocasião
para aproximá-la dos líderes eclesiásticos do metodismo californiano. Bresee foi eleito o
presidente dessa nova Junta e salientou que o sentimento dela era de que a Faculdade
62
Joseph Widney, sua esposa e sua filha Arabela eram, há algum tempo, ativos nos
esforços evangelísticos promovidos pelos metodistas juntos aos pobres e necessitados.
Arabela e sua mãe organizaram obras assistenciais na Carolina do Sul em 1889. Phineas
Bresee e Joseph Widney foram membros da primeira Junta executiva e ambos eram
favoráveis ao processo do proibicionismo. Esse foi um processo disseminado nas grandes
cidades estadunidenses que visava combater o uso de bebidas alcóolicas, a frequência às casas
de jogos e aos salões de bar. Widney serviu como chefe da liga contra salões de bar na cidade
e foi candidato a prefeito, no ano de 1894, com a proposta de difundir o proibicionismo.
Widney era um cidadão honrado nos meios sociais dos quais participava e sua indescritível
vontade de ajudar os pobres e necessitados o levou a intensificar suas ações sociais de
assistência, expandindo, por todas as classes e meios, a doutrina da santidade à qual era afeito.
Dessa forma, se uniu à Missão Peniel.
A Missão Peniel era uma instituição de assistência fundada e dirigida pelo casal
Theodore Pollock Ferguson (1853-1920) e Maine Ferguson Payne (1850-1920). Essa missão
foi inicialmente criada com o nome de Missão Los Angeles e era sustentada por verbas vindas
da Inglaterra. (SMITH, [195-], p. 56). Theodore Ferguson se converteu no ano 1875, em
Oberlin, através da pregação do evangelista Charles Finney. A partir daí, tornou-se pregador
itinerante, após dizer ter recebido a experiência da santificação. Widney, que era membro da
Missão, estava convencido da capacidade de Bresee na condução das questões da
Universidade do Sul da Califórnia e incentivou o casal Ferguson a chamar seu amigo Bresee
para compor os quadros da Missão Peniel. (SMITH, [195-], p. 56).
negou-lhe essa concessão. Bresee não abrigava a ideia de se separar da Igreja Metodista, no
entanto, informalmente, dedicou-se a colaborar com a Missão. (SMITH, [195-], p. 57).
Nossa primeira tarefa consiste em ganhar aos que nos assistem na Igreja; a
gente da rua e dos lugares onde não chega a luz das igrejas ou pouco os
alcança. Especialmente temos de ganhar os necessitados para a cruz de
cristo convencendo-os por meio da ajuda e simpatia cristã. Nossa tarefa
inclui também pregar e ensinar o evangelho de salvação completa; mostrar
o bendito privilégio dos crentes em Cristo Jesus e fazê-los santos e
aperfeiçoá-los em amor. (Bresee apud SMITH. [195-], p. 58,
tradução livre).
Widney, que mudou seus planos durante aquele verão, talvez pela situação que se
estabeleceu em Peniel, também se desligou da Missão. Bresee e Widney em comum acordo
resolveram formar uma nova organização que provesse uma casa espiritual para os
necessitados. Bresee e Widney alugaram um espaço na Rua South Main, número 317, no
edifício Red Men’ Hall e anunciaram o primeiro serviço para o domingo, dia 6 de outubro de
1895. Naquele dia, Phineas Bresee pregou pela manhã o texto bíblico do profeta Jeremias e,
posteriormente, declarou que a única coisa nova que havia nessa nova organização era sua
determinação de pregar o evangelho aos necessitados e dar-lhes uma igreja que pudessem
considerar como sua. Conforme Smith ([195-], p. 127, tradução livre), “A ideia de que para os
pobres o trabalho de missão era o mais adequado havia caído por terra”.
Após duas semanas de reuniões em South Main, 80 pessoas se uniram para fundar a
Igreja do Nazareno. Além dos familiares de Bresee e Widney estavam presentes antigos
amigos de Bresee, como Leslie F. Gay e sua esposa. Widney pregou nesse dia e explicou o
motivo de terem denominado aquele lugar de Igreja do Nazareno. A palavra, nazareno, lhe
havia ocorrido pela manhã e depois de uma noite de oração, oportunamente, lhe pareceu que
ela simbolizava a missão humilde e laboriosa de Jesus Cristo, o qual escolhera o mesmo nome
65
para si, nome que servia de escárnio de seus inimigos e esperança para quem o clamava.
(SMITH, [195-], p. 127).
Robert Lee Harris conhecido como, o evangelista vaqueiro, depois de dirigir alguns
trabalhos no continente africano voltou para os Estados Unidos e se uniu à Igreja Metodista
Episcopal do sul. Harris celebrava serviços no oeste de Tennesse, mas não era pastor oficial
de nenhuma igreja. Em Novembro de 1893, a Conferência da Igreja Metodista Episcopal do
sul declarou que os pregadores autônomos desvinculados das igrejas deveriam ser proibidos e
que não se deveria dar-lhes ajuda financeira. Dessa forma, Harris anunciou seu afastamento
da Igreja Metodista do sul e se mudou para Memphis, onde iniciou uma reunião de oração,
levantando uma tenda de campanha para avivamento durante os três meses. Harris estimulou
as mulheres a pregarem em sua ausência e combatia as seitas e denominações alegando que
ambas não tinham base escriturística. Em 1894, Harris começou uma congregação de 14
membros e deu a ela o nome de Igreja Novo Testamento de Cristo. Segundo Smith ([195-], p.
178), antes de sua morte, Harris deixou um panfleto descrevendo o governo e as doutrinas da
Igreja Novo Testamento, que entre outras regras, estipulava o direito da congregação expulsar
membros, enviar missionários e ordenar seus próprios bispos. Harris permitiu também o
batismo por efusão e a promulgação da doutrina da santidade na congregação. Porém, essa se
mostrava distante da perspectiva do Movimento de santidade que começava a se organizar. A
congregação de Harris, após sua morte se estendeu pelo oeste de Tennesse, Arkansas,
70
Alabama e Texas sob a direção das mulheres pregadoras, principalmente, Mary Lee Harris
sua esposa.
197) “encontraram tão pouca diferença entre os dois movimentos que acordaram consumar
uma união”. Em 1904, Fischer e Jerningan aprovaram a recomendação de união que ocorreria
no mês de novembro, em Rising Star, dando origem à Igreja de Cristo em Santidade.
A necessidade de maior alcance do trabalho social dos grupos de santidade, bem como
sua afirmação no cenário religioso estadunidense, foram os principais motivos que levaram a
Igreja do Nazareno a se aliar à Associação das Igrejas Pentecostais da América. O contato
inicial entre a Associação Pentecostal e a Igreja do Nazareno se deu através de George Morse,
responsável por algumas reuniões campestres no leste. Em 1896, Morse visitou Los Angeles e
contribuiu com 100 dólares para a construção do tabernáculo da Igreja do Nazareno,
despertando a atenção de Bresee para os trabalhos de santidade no outro extremo dos Estados
Unidos. J. W. Goodwing, pregador de Nova Inglaterra, se mudou para o oeste dos Estados
Unidos e publicou em um periódico um artigo sobre as similaridades entre a Igreja do
Nazareno e Associação das Igrejas Pentecostais. Em 1906, o conselho da Associação dessas
Igrejas decidiu convidar Phineas Bresee para a reunião anual no mês de Abril. Bresee não
compareceu, mas enviou uma carta que abriu o caminho para encontros futuros. (SMITH.
[195-], p. 199).
Ruth relatou esses fatos e os pontos comuns que havia entre as duas instituições à
Phineas Bresee. Essas notícias alegraram Bresee que afirmou que se caso houvesse a
concretização da união, haveria de estabelecer “um lugar central que unisse todas as
organizações que buscam o mesmo fim” (NAZARENE MESSENGER, 1906, p. 67. Tradução
livre.). Esses delegados foram pastores metodistas como Bresee e ambos já tinham
experiência na organização de igrejas. Na Assembleia da Igreja do Nazareno, os três reis
magos, como Phineas os chamou, ficaram impressionados com a devoção, doutrina e prática
na Igreja do Nazareno. Tal foi o efeito, que juntos resolveram traçar os planos de união das
instituições. Bresee, Ruth e W.C. Wilson foram os representantes nazarenos no comitê para
73
Esse intervalo permitiu que Phineas Bresee se reunisse com o reitor da Universidade
do Texas, Edgar P. Ellyson, ministro dos Quaqueres, vinculado ao Movimento de santidade.
Ele convidou C.W Ruth para o acampamento de avivamento, em janeiro de 1908, no Texas,
convidou, também, Bresee para pregar alguns dias na Universidade do Texas. Bresee pregou
na Capela do Colégio Peniel, anexa àquela Universidade. Em sua pregação, Bresee chamou
todos os ouvintes para se unirem à Igreja Pentecostal do Nazareno, no Texas. Muitos
ouvintes, inclusive Ellyson e sua esposa, chegaram ao altar. A partir daí, mediante a formação
de uma Junta consultiva, Ellyson se tornou Superintendente e sua esposa pastora da Igreja
Pentecostal do Nazareno.
A Assembleia de Pilot Point se tonou um importante marco das novas tendências das
associações e igrejas independentes de santidade que passaram a se organizar em uma
75
perspectiva institucional independente. Pilot Point passou a ser um marco simbólico como
ruptura dos obstáculos que se erigiram no decorrer da Guerra de Secessão, por meio da
valorização de camponeses e citadinos, contra as formas de escravidão, na valorização da
mulher, e contra todas as formas de isolacionismo entre o norte e o sul. Ao mesmo tempo, a
formação de uma Igreja, com base nacional, possibilitou ao Movimento de santidade
considerar suas diferenças e se posicionar frente às contradições internas e externas, sem se
excluir os grupos divergentes, permitindo o alcance das diversas manifestações eclesiásticas e
teológicas no território estadunidense.
Outro aspecto que ressaltamos é que as decisões de Pilot Point não se limitaram aos
Estados Unidos. As consequências da formação da Igreja Pentecostal do Nazareno se
estenderam ao exterior, sobretudo, na consolidação de projetos missionários anteriormente
traçados e na agregação de várias igrejas e movimentos na Europa, Asia, África e América. A
Igreja do Nazareno, a partir de sua estrutura organizacional única, possibilitou a consolidação
e expansão do Movimento de santidade em áreas antes inimagináveis.
Weber relaciona as condições das ações humanas tradicional, afetiva e racional com as
formas de dominação, surgindo as legitimidades para o exercício do poder. Dessa forma,
fundamentam-se a dominação tradicional, a dominação carismática e a dominação legal. A
dominação tradicional se legitima sobre o caráter sagrado da tradição, na qual os indivíduos
mais idosos, ou aqueles guardiões da tradição desempenham um papel social crucial. O
sentido patriarcal se impõe para satisfação das necessidades cotidianas e recorrentes, pelos
meios normais e habituais. Para Weber (1922, p. 4), “obedece-se à pessoa por força da sua
dignidade própria, santificada pela tradição”.
Weber aponta que a dominação carismática busca a satisfação das necessidades que
transcendem as exigências da vida comum. Nas situações de dificuldades de ordem subjetivas
78
como angústia, temor, medo e desvios psicológicos e nas de ordem objetiva como mudanças
políticas, econômicas, religiosas e sociais, o líder carismático surge ou é referendado como
solução dos problemas, que de maneira alguma poderiam ser solucionados por pessoas
comuns, por ser o carisma algo pessoal e, apenas eventualmente em casos especiais, pode ser
transmitido. Por isso, toda estrutura organizacional, administrativa e burocrática é relegada
pela ação carismática.
pós Guerra de Secessão e das necessidades sociais. A segunda obra da graça foi mais um
imperativo divino para mudar essas circunstâncias, também vivenciadas na Inglaterra no
tempo de João Wesley. Nesse ponto, pode-se perceber a necessidade do surgimento do líder
carismático que visualiza a inoperância das igrejas e a necessidade dos pobres e
marginalizados, chamando-os para a comunhão dos santos sem quaisquer discriminações.
No caso da Igreja do Nazareno, Phineas Bresee foi esse líder que, com seu discurso
carismático de além justificação, possibilitou aos marginalizados uma segunda chance. Ele
permitiu a visualização de uma esperança tanto para pobres, negros, viúvas e órfãos que não
se encontrava, até então, em grande parte das igrejas tradicionais da época. Bresee não
efetuou uma crítica ao metodismo estadunidense, mas sua adesão ao Movimento de santidade
e ao trabalho social independente na Missão mostrou uma resistência à prática eclesiástica
existente. As ações de Bresee para os desvalidos fizeram-no reconhecido como líder. Em
poucos dias, o salão nazareno achava-se cheio de pessoas. Para muitos, Bresee se transformou
na esperança de uma massa, interpretando os anseios e questionamentos que dela provinham e
os respondendo por meio de suas prédicas. Esta condição carismática parecia ser reforçada
pelo próprio Bresee em suas pregações: “o que devo fazer? Esta pergunta feita em Jerusalém,
a cidade de David, a casa dos profetas, o lugar do templo de Deus. Foi perguntada à sombra
de um eclesiasticismo antigo e contínuo. No escuro onde estava a sombra, tinha uma fresta de
esperança da revelação divina” (BRESEE, 1993, p.14, grifo nosso, tradução livre.). Com
isso, Bresee se auto qualificava como um líder carismático.
mudanças, segundo O‟Dea (1969), provêm dos interesses dos seguidores em continuar a
comunidade formada pelo fundador, principalmente, o conteúdo da experiência religiosa.
Contudo, quando dissemos que o processo burocrático da instituição não extingue o carisma,
queremos dizer que, no caso da Igreja do Nazareno, a figura do pastor é respeitada por
intermédio do poder carismático que possui, que veio de Cristo, passou pelos Apóstolos,
chegou em Bresee e repousa nos atuais pastores nazarenos. O carisma dos pastores nazarenos
está imbricado na burocracia eclesiástica.
Com isso, procuramos evidenciar que os tipos de dominação apontados por Weber são
formas puras, ou seja, atendem aos tipos-ideais.17 As variações dos tipos de dominação
apresentadas ressaltam que a Igreja do Nazareno, após a consolidação da Superintendência
geral e a morte de Bresee, tornou-se institucionalizada em suas decisões. O padrão burocrático
prevalece, desde então, frente ao tradicional e o carismático, no entanto, esse último ainda
está patente nas relações internas da Igreja, como, por exemplo, na relação entre o leigo e o
pastor. Pelos tipos ideais de dominação, a Igreja do Nazareno assume uma estrutura dialética
de relações de poder. Isto é, a relação entre os oficiais da Igreja se dá em um patamar
burocrático-legal, mas a relação entre pastores e leigos se dá no patamar carismático. O
carisma rotinizou-se na instituição, mas aparece de forma um tanto quanto livre na figura do
pastor nazareno. Pela observação, entendemos que a obediência da membresia ao pastor
repousa no carisma pastoral e não no cargo pastoral. Portanto, a estrutura organizacional
assume essas duas características manifestas nos manuais da Igreja. Tal aspecto será analisado
mais detidamente no capítulo terceiro, por hora, cumpre apresentar a estrutura atual da Igreja
do Nazareno.
17
Segundo Weber, os tipos ideais tem o caráter de utopia que se obtém acentuando pelo pensamento
determinados elementos da realidade. (WEBER, 1965, p. 179). Dessa forma, esses tipos ideais são conceituações
puras que servem de parâmetro para as abordagens, mas não tem constatação empírica.
82
Juntas, no entanto, a figura do pastor ganha destaque sobre qualquer outro componente dessa
Junta. Conforme observamos nos artigos do Manual -2009-2013- (IGREJA DO
NAZARENO/MANUAL DA IGREJA 2009-2013, 2009.), relativos às Juntas, na maioria
deles, os termos como pastor, ministros, autoridade se destacam em suas propostas, sem
contar, que os pastores são, por determinação deste Manual, presidentes das Juntas locais.
Esse aspecto ressalta a proeminência do pastor nazareno sobre o leigo. De qualquer forma, a
participação de leigos nas decisões da Igreja do Nazareno é um aspecto importante na forma
como se busca estabelecer um governo que não seja episcopal nem congregacional. Em
termos de Igreja local, o organograma de poder pode ser entendido da seguinte forma:
O processo de votação é feito de forma secreta na definição dos cargos e, por vezes,
por aclamação na decisão para se estender o período de vigência do mandato do
Superintendente distrital. Na Assembleia distrital, a escolha do Superintendente e da Junta
Consultiva distrital são as decisões mais importantes. A Assembleia distrital define a
Superintendência distrital, que é o órgão normativo máximo no âmbito do distrito, com
atribuições diversas. A formação da Junta se dá pela eleição de três pastores ordenados e três
membros leigos, o Superintendente distrital é diretamente incluso como membro da Junta,
sem passar pelo processo eletivo de composição dessa Junta.
18
Há distritos de fase1, 2 e 3, são classificados, principalmente, pelo número de membros e por sua
infraestrutura. Segundo o Manual 2009-2013 “Um distrito, de fase 3 pode ser declarado quando existir um
número suficiente de igrejas totalmente organizadas, de ministros ordenados e de membros que justifique tal
designação. Devem evidenciar-se liderança, infraestrutura, responsabilidade orçamental e integridade
doutrinária. Um distrito de fase 3 deve ser capaz de suportar estes encargos e compartilhar os desafios da Grande
Comissão (vocação dos cristãos para evangelizarem outros povos), dentro do panorama global da igreja
internacional. Tal designação será efetuada pela Junta de Superintendentes gerais sob recomendação do
Superintendente geral em jurisdição, após consulta com o diretor do Escritório de Missão Global, diretor
regional e outros indivíduos e Juntas envolvidas na nomeação do Superintendente distrital. (...) diretrizes
mensuráveis devem incluir um mínimo de 20 igrejas organizadas, 1000 membros em plena comunhão e 10
ministros ordenados. Uma Junta consultiva distrital ou uma Junta nacional pode pedir ao Superintendente geral,
em jurisdição, uma exceção a estes critérios.”. (IGREJA DO NAZARENO/MANUAL 2009-2013, 2009. p. 93.).
86
A Junta geral é outro órgão importante no âmbito geral. Ela é uma corporação situada
em Kansas, cujos membros são representantes das regiões mundiais, eleitos por voto secreto,
em maioria absoluta. Estipula o Manual (IGREJA DO NAZARENO/MANUAL 2009-2013,
2009, p. 132) que nenhuma região terá mais que seis membros nessa Junta, com exceção da
duplicidade decorrente dos presidentes dos departamentos MNI, JNI e MEDI que já fazem
parte da Junta geral. Além desses, são membros da Junta geral o tesoureiro e o secretário da
Igreja do Nazareno. À Junta geral compete estimular que todas as Juntas locais, distritais,
nacionais e regionais sejam guardiãs da santidade cristã segundo, a tradição wesleyana, e
auxilie no desenvolvimento das igrejas nazarenas em todo o mundo. A Junta geral é, não
obstante algumas atribuições administrativas, um importante órgão de defesa doutrinária com
grande inserção nas áreas globais, principalmente, por intermédio da educação do ensino
19
Essas especificações serão tratadas na parte que aborda o ministério pastoral, no próximo capítulo.
87
Assembleia geral
Assembleia distrital
Superintendente distrital
Igreja local
era composta somente de mulheres, daí ter sido reconhecida por muitos anos como Sociedade
Missionária de Senhoras (SMS). Seu propósito era estimular o interesse por missões, por
meio de levantamento de fundos para a atividade missionária. A presença de homens como
membros ativos foi admitida em 1952, a partir de então passou a ser chamada de Sociedade
Nazarena de Missões Estrangeiras (SNME) e, em 1972, foi eleito o primeiro homem para o
seu conselho geral. O nome da SNME foi novamente mudado para Sociedade Nazarena de
Missões Mundiais (SNMM), que passou a ser denominada de Missões Nazarenas
Internacionais (MNI), pela Assembleia geral de 2002.
A forma como a Igreja do Nazareno representa toda essa estrutura não esclarece a
hierarquia que se observa entre os diversos órgãos. Podemos inferir pela observação do
quadro acima que, a Igreja local, por exemplo, não está subordinada à Superintendência
distrital e que o nível de poder dessa Igreja é o mesmo dos Superintendentes gerais. Uma
explicação possível para o formato desse quadro de poder é que a Igreja tenta mostrar uma
relação de afinidade entre os órgãos formativos de sua estrutura de poder e não ressaltar o
93
A Igreja do Nazareno, desde sua união, partilhava de alguns periódicos com as Igrejas
que a formaram. O “Nazarene Messenger”, “Beulah Christian”, “Pentecostal Advocate” e o
“Holiness Evangel” eram os principais entre os nazarenos. Essa imprensa, no entanto, não era
de propriedade da Igreja como um todo, mas de alguns de seus membros que arrendavam os
serviços para a Igreja. A Assembleia de 1911 decidiu que se formasse uma Junta de
publicações para administrar uma casa central de publicações que forneceria literatura para as
escolas dominicais e administraria os jornais nazarenos. Assim, fundou-se, em Kansas City,
uma casa publicadora, por meio de um projeto de arrecadação de fundos que visava a
obtenção de U$ 50 mil20 dólares para implantação do projeto. Essa arrecadação proporcionou
a compra do “Pentecostal Advocate” em novembro de 1911. Em abril de 1912, foi publicado
a primeira revista da denominação, chamada de o “Herald of Holiness”, sendo esse o ano de
fundação da Casa Nazarena de Publicações (CNP). Os sócios do “Beulah Christian” não
quiseram se unir ao novo empreendimento e solicitaram à Assembleia geral a manutenção do
serviço que prestavam à Igreja, mas tal solicitação não foi aceita. (SMITH, [195-]).
20
Não se sabe o real valor desses montantes ao câmbio atual, mas, por terem sido citados, parece que tinham um
significado expressivo na época.
94
Em 1913, a Junta de Publicações, apesar das crises financeiras que passava, pediu aos
nazarenos de todas as partes que evitassem fundar outras publicações locais que concorressem
com o “Herald of Holiness”. (SMITH, [195-], p. 306). No entanto, o projeto de consolidação
da Casa Nazarena de Publicações pouco avançou, até o ano de 1919, quando um grupo de
santidade, do Tennesse, uniu-se à Igreja do Nazareno e suspendeu sua publicação, chamada
de “Living Water”, para dar respaldo ao “Herald of Holiness”. A partir daí a Junta de
Publicações passou a intensificar cada vez mais a proposta de lealdade denominacional,
proibindo publicações que não fossem da CNP, entre elas, revistas de escolas dominicais,
hinários, propagandas de evangelismo ou jornais de divulgação interna e externa.
No entanto, a história da CNP não foi apenas de sucesso, conforme afirma W.T.
Purkiser (1983, p. 100), as vendas da CNP tiveram uma queda vertiginosa no ano de 1932, em
meio à Grande Depressão americana, quando se situaram próximo de US$ 218 mil dólares,
um dos valores mais baixos desde sua consolidação. O apoio da Igreja à CNP foi vital para a
95
continuação de suas operações, durante os anos de 1932 a 1936, mais de U$4 mil dólares
foram doados para literatura, o preço da assinatura da revista “Herald of Holiness” diminuiu
para que se aumentassem suas vendas. A Assembleia de 1936 aprovou mais investimentos
para a CNP e garantia financeira. A estabilidade garantida nos tempos da Grande Depressão
possibilitou o crescimento da CNP em tempos mais tranquilos. Smith ([195-], p. 398) ressalta
que até o ano de 1965, a Casa Nazarena de Publicações cresceu ao ponto de abrir sucursais
em Toronto, no Canadá; Pasadena, na Califórnia e ter representações na Inglaterra, Austrália e
África do Sul. Poucos anos antes, as vendas da CNP ultrapassaram o patamar de US$ 3
milhões de dólares. Na Assembleia geral de 2001, foi divulgado que a Casa Nazarena de
Publicações excedeu a venda líquida de 97 milhões de dólares e 25 milhões de impressões ao
ano, o que a consolidava como a maior editora de materiais de santidade do mundo. (IGREJA
DO NAZARENO/JOURNAL TWENTY SIXTH GENERAL ASSEMBLY, 2005, p.10).
A CNP é formada pela Bacon Hill Press, que produz livros teológicos, devocionais e
de liderança cristã; pela Lillenas, companhia publicadora que produz materiais e recursos de
música, pela World Action Publishing Company e Berfoot Ministeries voltadas para produção
de material para escola dominical e recursos audiovisuais para crianças. O Principal periódico
da CNP, a revistas “Herald of Holiness”, passou a ser distribuída em países de língua
portuguesa com o nome de o Arauto da Santidade. Esta revista chegou ao Brasil, em 1965 e
deixou de ser publicada no ano de 199921. Segundo informações da CNP, no Brasil, não se
sabe o motivo de ter se findado essa publicação. No Brasil, a produção literária nazarena
começou alguns meses após o estabelecimento da Igreja no país. A princípio, o trabalho era
manual e consistia basicamente na tradução de livros dos Estados Unidos para o uso dos
seminaristas que os datilografavam. Em 1971, o reverendo Earl Mosteller fundou a Casa
Nazarena de Publicações, em Campinas, sendo a responsável por grande parte do material
gráfico utilizado nas igrejas nazarenas do Brasil.
A Igreja do Nazareno está ainda voltada para outras mídias como a “Nazarene
Networking Comunnications”, que traz notícias das sete áreas internacionais da Igreja do
Nazareno, por meio da rede mundial de computadores e também de periódicos impressos.
Além dessa rede de comunicação, as Igrejas do Nazareno, em sua maior parte, possuem
páginas na internet e muitos pastores ingressam em sites de relacionamentos. Alguns distritos
21
Em 2001, foi publicada uma edição especial do O Arauto da Santidade, mas não tivemos mais notícias de sua
circulação no meio nazareno.
96
Logo após a primeira transmissão de um programa de rádio nos Estados Unidos, esse
meio se expandiu proporcionando o surgimento, a partir de 1919, da chamada era do rádio,
que pelo ano de 1921, já contavam com 382 emissoras no país. (ABERT, 2010). Desde muito
cedo, a Igreja do Nazareno atentou para a eficácia do rádio para se alcançar os mais
longínquos lugares e, em 1945, criou o programa de rádio “Showers of Blessing”. O
desenvolvimento da mídia radiofônica na igreja se espalhou pelo mundo, de forma que não se
pode tratar a respeito de seu alcance mundial em poucas páginas. Para se citar como exemplo,
a atuação nazarena no rádio, principalmente, na década de 70 se espalhou para a Espanha,
Portugal, França, Itália Japão, China, Indonésia, Filipinas, Corea, Guatemala, Índia, Inglaterra
e Estados Unidos, conforme destaca Merritt Nielson (1984, p. 16-17).
Conclusão
22
Conforme Bruno Théret, instituição em base cognitiva significa instituição cujos fundamentos são ideias e
crenças. Volta-se ao lembrete de que, aqui, se trabalha com a lógica weberiana de tipos ideais, o que significa
que na realidade não se pode pensar nem a Igreja do Nazareno nem qualquer outra instituição como uma
instituição pura. Isso é, trata-se da predominância de um fator e não de um reducionismo a ele.
99
A união das igrejas e dos grupos de santidade que originaram a Igreja do Nazareno,
como expressão nacional de santidade, significou a centralização do Movimento de santidade
para se fazer frente aos ataques das denominações tradicionais. Ao mesmo tempo, possibilitou
a coordenação de tarefas necessárias para as práticas sociais, pois se voltava mais às questões
sociais do que essas denominações tradicionais. A institucionalização da Igreja do Nazareno,
no entanto, substituiu a liderança carismática original de Phineas Bresee pela estrutura
burocrático-legal, centrada na participação clerical, que tenta o resgate da liderança
carismática, por meio da sacralização de sua estrutura de poder em bases escriturísticas. Essa
estrutura é fortalecida pela base midiática da Igreja do Nazareno que se expande pelo mundo,
por meio do Rádio, da Internet e da Televisão.
CAPÍTULO 3
Introdução
Por esse fato, a formação da Igreja do Nazareno em Cabo Verde é importante para se
compreender a inserção e expansão da Igreja do Nazareno no Brasil, o qual se caracteriza por
um ambiente religioso protestante multivariado, em que diversas denominações já haviam se
instalado. Dessa forma, descrevemos e analisamos, neste capítulo, o estabelecimento da Igreja
do Nazareno em Campinas, sua expansão para os Estados de Minas Gerais e Rio de Janeiro,
ao mesmo tempo em que, esboçamos o panorama dessa Igreja nas demais regiões do Brasil.
Dessa forma, a Igreja do Nazareno, logo que consolidou sua união, já se apresentava
como uma igreja internacional. Hiram F. Reynolds expandiu a Associação das Igrejas
Pentecostais da América para regiões como a Índia, África, Caribe e América Central, ainda
nos primeiros anos de formação dessa Associação. Essas regiões de missões passaram sob a
administração da Igreja do Nazareno que já surgiu envolvida com questões nacionais e
internacionais. Leslie F. Gay e H. F. Reynolds foram os que mais contribuíram para a criação
de um órgão que centralizasse os assuntos e decisões relativos às missões. (SMITH, [195-], p.
291). A Assembleia geral de 1911 sancionou a administração central para missões
estabelecendo Reynolds como secretário de missões. Ele consolidou os campos missionários
anteriores à união das Igrejas e expandiu para outras áreas o trabalho missionário. Dentre
23
Segundo Roberto E. Zwetsch, “o termo missão vem do latim missio, que por sua vez, corresponde ao verbo
apostéllein, de onde temos a palavra apóstolo, em português. Todas essas palavras têm em comum o seguinte:
significam „envio‟. Missão significa etimologicamente, envio. Alguém é enviado por outra pessoa para realizar
alguma ação ou entregar alguma mensagem”. (ZWETSCH, 2005, p. 197). O termo missão é entendido aqui
como um termo eclesial usado para referir a um trabalho de uma Igreja em uma área que ela ainda não se
estabeleceu. Aqueles que se dedicam a promover o trabalho eclesial nessas regiões são chamados de
missionários.
102
esses campos missionários, a missão nazarena ocorrida nas Ilhas de Cabo Verde, em 1901,
tem especial relevância para o surgimento da Igreja do Nazareno no Brasil.
Dias fez parte de um processo em que grande parte daqueles que saíam do arquipélago
para os Estados Unidos retornava convertido ao protestantismo e começava a disseminá-lo em
sua própria região, onde o catolicismo havia se tornado a religião oficial. Conforme descreve
103
Francisco Xavier Ferreira (1972, p. 33), o artigo 130º do Código Penal português da época
determinava que aquele que faltasse respeito à religião do reino, Católica, Apostólica,
Romana, seria condenado à pena de prisão correcional até dois anos e multa, conforme a
renda do infrator. Desrespeitar o catolicismo, nesse caso, significava injuriá-lo em qualquer de
seus dogmas ou culto. Isso, por meio de atos, palavras ou escritos, ou de fazer prosélitos para
religiões diferentes. A restrição atingia também quem tentasse realizar sermões públicos.
Dias fincou as raízes daquela que viria a ser a Igreja do Nazareno naquelas ilhas. Logo
no princípio, quando se tornou um cristão evangélico nos Estados Unidos, a Associação das
Igrejas Pentecostais da América lhe ofereceu US$16,00 dólares ao mês para retornar a Cabo
Verde para servir como pregador (DIAZ, 1924, p. 13). Assim, ele retornou a Cabo Verde
onde encontrou um pequeno grupo de evangélicos que se reunia em casas, devido à proibição
definida no Código Penal português. No entanto, Dias não considerou as proibições do
Código e levou o evangelho às ruas, como consequência, foi levado à prisão e lá sofreu
torturas e em várias ocasiões esteve próximo à morte. (DEPINA, 2009, p. 35).
Em 1914, Hiram F. Reynolds chegou ao arquipélago de Cabo Verde vindo do Brasil 24,
mas não visitou a Ilha de Brava, em decorrência da eclosão da Primeira Guerra Mundial.
Encontrando-se com João Dias, Reynolds sugeriu-lhe a expansão da Igreja de Cabo Verde e
prometeu-lhe enviar missionários. Somente em 1933, quando Hiram não mais era
24
A menção dessa visita do Superintendente geral Hiram F. Reynolds ao Brasil somente foi encontrada em
Francisco Xavier Ferreira.( 1972, p. 51).
104
Superintendente, C. S. Jenkins e sua esposa Pérola Jenkins foram enviados para Cabo Verde.
Passados cinco anos do estabelecimento do casal Jenkins em Cabo Verde, João e sua esposa,
Joana, se aposentaram do trabalho missionário, em 1938. Nesse ano, a Igreja do Nazareno já
estava consolidada e se espalhou por toda parte do território cabo-verdiano. (FERREIRA,
1972).
No ano de 1936, a Igreja do Nazareno substituiu João Dias e esposa pelo reverendo
Everette D. Howard e sua esposa Garnet Howard, considerados o segundo casal de
missionários da Igreja do Nazareno em Cabo Verde, uma vez que, Dias era considerado
missionário por ter sido enviado pela Igreja nos Estados Unidos e o casal Jenkins e outros
missionários, que anteriormente lá estiveram, eram considerados visitantes. Os Howards
vieram para Cabo Verde por insistência própria, visto que o Superintendente de missões
negou-lhes a vinda por falta de recursos. Segundo relata Earl Mosteller, quando o
Superintendente disse não haver recursos, Howard alegou que, baseado em um livro,
mantinha suas esperanças de ir a Cabo Verde, naquele instante, retirou da bolsa o livro,
intitulado Fé que alcança e disse que com ele havia aprendido a ter fé. (IGREJA DO
NAZARENO/ENTREVISTA EARL MOSTELLER, [199-]). Esse fato sensibilizou
profundamente o Superintendente de missões que era o autor do livro. Dessa forma, o
Superintendente de missões empenhou em conseguir fundos para a viagem dos Howards que
aconteceu em 1936.
Ferreira (1972) descreve o trabalho desses missionários em Cabo Verde como um dos
mais produtivos para o crescimento do evangelho na Ilha. Howard e sua esposa fizeram uma
cruzada evangelística pelo arquipélago, da Ilha de Brava à ilha do Fogo, passando por São
Vicente em 1938. O Superintendente geral da Igreja os convenceu a fixarem na cidade de
Praia, Capital de Cabo Verde. (VASCONCELOS, 2008.). Segundo Vasconcelos (2008), nesse
período, houve grande desenvolvimento da ação missionária em todo o arquipélago de Cabo
Verde, principalmente, devido à vinda de novos missionários e à conversão de muitos
caboverdianos. Em 1939, chegou o casal Samuel Clifford Gay e Charlotte Munn, o casal Earl
e Gladys Mosteller e a enfermeira Lydia Wilke chegaram em 1946, Ernest e Jessie Eades
chegaram em 1948. No entanto, o trabalho missionário tornaria mais efetivo a partir da
chegada, em S. Vicente, em 1953, do rev. J. Elton e Margaret Wood, que organizaram o
Seminário Nazareno de Cabo Verde. A partir de então, Cabo Verde se tornaria autônoma na
condução dos negócios da Igreja do Nazareno, que em 1956 formou sua primeira turma de
105
pastores no arquipélago. O reverendo Roy Malcolm e sua esposa Glória Henck chegaram em
1958, ano em que os Mostellers foram transferidos para o Brasil.
O missionário Earl Elwood Mosteller e sua esposa, Gladys Marie Parker Mosteller,
foram designados pela Superintendência geral da Igreja do Nazareno para Cabo Verde, no ano
de 1944, mas somente chegaram às Ilhas, no ano de 1946. Até sua chegada ao arquipélago
nesse ano, o casal foi para Massachusetts, a fim de conviver com a comunidade de
portugueses, muitos deles cabo-verdianos, para aprender o idioma e os costumes das Ilhas. O
trabalho dos Mostellers nas Ilhas foi profícuo, apesar das resistências e dos ataques por
apedrejamentos que constantemente sofriam por parte da Igreja e dos fiéis católicos. (IGREJA
DO NAZARENO/ENTREVISTA ELTON WOOD, [199-]). Com a chegada dos Mostellers, a
Igreja do Nazareno construiu diversos edifícios para templos, residências pastorais e
instalações diversas, visando atender melhor aos pastores e ao crescente aumento do número
de fiéis que agregavam à Igreja. No final da década de 50, os Mostellers e o casal Wood
deram início à construção do Seminário Teológico Nazareno de Cabo Verde e da construção
da Editora nazarena nas Ilhas. (O ARAUTO DA SANTIDADE, p. 27, jul., 1989.)
]). Foi com esse cabedal que os Mostellers deixaram Cabo Verde e chegaram ao Brasil em
1958.
Conforme dados de 2004, a Igreja do Nazareno constatou mais de 800 mil membros
nas áreas mundiais, com um crescimento quadrienal de 14,9%, totalizando a agregação de
mais de 25 mil membros por ano. (IGREJA DO NAZARENO/JOURNAL TWENTY SIXTH
GENERAL ASSEMBLY, 2005, p. 773). A partir dessa constatação, a Igreja do Nazareno
tornou-se, de fato, uma Igreja internacional, haja vista a maioria de sua membresia estar
situada fora do território estadunidense. Na última década, o crescimento em áreas mundiais
107
tornou-se mais patente, alcançando 155 áreas internacionais, o que significa em termos
percentuais, que 60% dos nazarenos e 80% de suas Igrejas são resultado das missões
estrangeiras. (IGREJA DO NAZARENO/WORLD MISSION, 2010.).
Sandro José Hayakawa Cunha (2007) descreve o processo de chegada dos nazarenos
ao Brasil com riqueza de detalhes. Segundo ele, o primeiro a chegar ao Brasil foi o pastor José
Zito de Oliveira, em 1956, mas muitos outros nazarenos estiveram antes no Brasil. Contudo,
nenhum desses veio com a intenção de estabelecer a Igreja, mas vieram para trabalhar em
firmas multinacionais ou até por turismo. Nem mesmo a chegada de José Zito de Oliveira ao
país foi considerada a data oficial de estabelecimento da Igreja, uma vez que não era um
missionário nazareno enviado ao Brasil e nem fazia parte do clero nazareno, mas sim um
leigo que a princípio se estabeleceu no país por outros motivos.
José Zito Oliveira nasceu em 1922, na cidade de Ribeira Grande, na ilha de Santo
Antão, em Cabo Verde e se converteu25, aos 29 anos de idade. A sua decisão ocorreu por
ocasião da pregação de um ex-padre que fazia parte do clero nazareno. José Zito foi batizado
pelo rev. Ilídio Silva, ainda em 1951, frequentou a Igreja em Santo Antão, fazendo serviços na
biblioteca, até tornar-se professor na escola dominical. “Sem que Rev. José Zito tivesse
percebido, o Rev. Ilídio já havia começado o processo de discipulado, oferecendo
oportunidades de ministério” (CUNHA, 2005, p. 20).
25
Conversão é a palavra usada para aqueles que se aderem a uma religião, ou se tornam membros de uma igreja.
108
O missionário Mosteller resolveu iniciar José Zito no Seminário, sem que isso
implicasse necessariamente na presença física de Zito no Seminário. Para isso, Mosteller
implantou um processo de aprendizagem à distância. Ele enviava livros junto com tarefas para
que Zito exercitasse e os devolvesse para correção. Cunha (2005, p. 21) afirma que, apesar de
efetivo o aprendizado de Zito, não era o que esse esperava, uma vez que desejava
disponibilidade integral nos serviços da Igreja e que fosse mantido por eles, sem a
necessidade de se envolver com trabalhos seculares. “Se ele continuasse estudando, mas
trabalhando secularmente, até poderia se formar, mas não da forma ideal. Ele (Zito) queria
estudar em um seminário bíblico.” (CUNHA, 2005, p. 33).
O desejo de José Zito foi, então, de emigrar para a Argentina, com o intuito de se
tornar seminarista no Instituto Bíblico Nazareno de Buenos Aires, que admitia alunos
solteiros. Joaquim Antônio Lima, seu parente, era aluno daquele seminário e incentivou Zito a
estudar. Segundo Cunha (2005, p. 22), o interesse de Joaquim Lima para a ida de Zito para
aquele país era de outra natureza, uma vez que Lima estava desejoso de se casar com a cabo-
verdiana Guilhermina, mas impossibilitado de deixar a Argentina, concedeu uma procuração a
José Zito, perante as autoridades cabo-verdianas, para que o representasse no casamento com
Guilhermina. Com essa procuração, Zito representou Lima diante das autoridades de Cabo
Verde, que celebraram o casamento. A intenção de Lima era que Zito trouxesse Guilhermina
para a Argentina, para que de fato seu casamento se realizasse. Em 1956, José Zito embarcou
para Lisboa na tentativa de encontrar um navio que viesse para a América do Sul. Nesse
mesmo ano, Zito e Guilhermina chegaram a Buenos, mas Zito ficou detido no navio por
suspeita de possuir uma doença nos olhos. Passado alguns dias, Zito foi novamente conduzido
para Portugal.
109
Antônio Manoel de Oliveira, irmão de José Zito, morava em São Paulo e financiou
uma nova viagem para seu irmão de Lisboa para Santos. Em Julho de 1956, Zito chegou a
Santos, desde então, passou a procurar uma igreja que pudesse frequentar. Dirigiu-se à Igreja
Congregação Cristã no Brasil, mas o costume do cumprimento com beijos não o agradou e
desistiu de frequentar aquela Congregação, mas, periodicamente, assistia aos cultos em outras
denominações. Contudo, de nenhuma delas tornou-se membro, seu dízimo era enviado para
Cabo Verde, demonstrando o vínculo que ainda mantinha com a Igreja do Nazareno.
(CUNHA, 2005, pp. 30-31). José Zito teve uma participação importante nos primórdios da
Igreja do Nazareno no Brasil, envolveu na implantação da 1ª Igreja do Nazareno em
Campinas, bem como na sua expansão para Minas Gerais e Distrito Federal. Ele foi o
primeiro aluno em formação pastoral no Brasil.
Mesmo assim, a escolha de Earl Mosteller foi por Campinas, devido aos seguintes
fatores: a presença dos Stegemoellers ali seria útil no trabalho de implantação da Igreja;
Campinas era uma cidade universitária, o que favoreceria a formação de pastores mais
rapidamente do que com pessoas não alfabetizadas ou com menor grau de instrução; a
proximidade da cidade com os grandes centros urbanos e também com cidades do interior
111
Os encontros na casa dos Stegemoellers atraíam cada vez mais os brasileiros, Earl
Mosteller e Charles Gates viram a necessidade de se ter um salão maior em que pudessem
realizar os cultos. Segundo Mosteller, ele e Gates empreenderam uma procura por um salão
que comportasse 200 pessoas, mas não encontraram, por isso fizeram um tabernáculo portátil
para a realização dos cultos evangelísticos, até o aluguel de um salão na Avenida Francisco
Glicério, esse foi o primeiro templo nazareno no Brasil. (IGREJA DO
NAZARENO/ENTREVISTA EARL MOSTELLER, [199-]). A inauguração desse templo, no
ano de 1959, foi um evento marcante na cidade. A estratégia de Mosteller foi a divulgação
incessante da chegada da Igreja naquele lugar, foram confeccionados mais de 10 mil folhetos
evangelísticos, veiculou-se 25 anúncios de rádios em três dias, um avião sobrevoava o centro
campineiro, jogando 135 mil folhetos para uma cidade de aproximadamente 200 mil pessoas,
o Exército se fez presente com sua banda, o Prefeito e representantes do governo estadual
prestigiaram o evento. Tudo isso seguia o ponto de vista de Mosteller de que antes de ganhar
a pessoa para Cristo era preciso ganhar sua atenção. (IGREJA DO
NAZARENO/ENTREVISTA EARL MOSTELLER, [199-]). Com isso o crescimento da
Igreja do Nazareno em Campinas foi patente.
112
Mosteller afirma que o motivo de tal crescimento foi o acesso que a Igreja teve aos
meios de comunicação. Segundo ele, a Igreja do Nazareno teve 10 vezes mais espaços
gratuitos nos jornais que todas as outras denominações juntas, incluindo a Igreja Católica.
(IGREJA DO NAZARENO/ENTREVISTA EARL MOSTELLER, [199-]). Esse fato facilitou
a vinda de muitas pessoas aos cultos evangelísticos que os nazarenos promoviam. Não apenas
os jornais foram utilizados pela Igreja, havia anúncios no rádio e televisão de modo que a
Igreja atingia todas as camadas sociais, as quais passaram a compor sua membresia. Segundo
Joaquim Antônio Lima, em 1960, Campinas não chegava a 250 mil habitantes, os prédios
podiam ser contados nos dedos, com isso a chegada da Igreja do Nazareno foi impactante para
toda cidade. (IGREJA DO NAZARENO/ENTREVISTA JOAQUIM ANTÔNIO LIMA, [199-
]). Essa visão de Lima não é corroborada por dados estatísticos da cidade de Campinas nessa
época, conforme apresenta o estudo de Cláudia Gomes Siqueira (2008). Contudo ilustra a
forma romantizada e aceita pela liderança nazarena, de como se transmite o discurso de
chegada da Igreja do Nazareno no Brasil.
Earl Mosteller afirmou que o surgimento da Igreja do Nazareno no Rio de Janeiro foi
resultado de um amplo esforço propagandístico com importante veiculação dos cultos em
programas de televisão e rádios (IGREJA DO NAZARENO/ENTREVISTA EARL
MOSTELLER, 1993). Esse empenho midiático foi o responsável pela consolidação desse
distrito, no final de década de 80. Segundo Amadeu Teixeira, o primeiro Superintendente do
distrito Rio de Janeiro, o crescimento distrital está associado à visibilidade da Igreja na mídia.
O programa A Hora Nazarena, transmitido diariamente pela Rádio Melodia, atraiu centenas
de novos membros para a Igreja. Jornais da cidade fizeram reportagens sobre o impacto da
Igreja do Nazareno no Estado do Rio de Janeiro e programas de TV entrevistaram membros
da Igreja, bem como o próprio Superintendente distrital, para saber o que é a Igreja do
Nazareno. (O ARAUTO DA SANTIDADE, p. 27, mai., 1989.). Além disso, trabalhos sociais
como a criação do Ambulatório Nazareno, na Baixada Fluminense, atraiu o interesse de
autoridades políticas, que passaram a apoiar a Igreja do Nazareno.
estadunidenses na Igreja de Campinas. Após um ano, foi enviado para Osasco, onde ficou até
1964.
A primeira Assembleia distrital no Brasil foi realizada em 1961, com um pouco mais
de uma dezena de pessoas, (IGREJA DO NAZARENO/ENTREVISTA JOAQUIM
ANTÔNIO LIMA, [199-]). Passados alguns anos, o Brasil deixou de ser uma área pioneira
para ser um distrito regular de grau 3, isso deu origem a uma Junta distrital formada por
pastores nacionais. No início da década de 70, com a saída dos Mostellers para Portugal,
Joaquim Lima foi escolhido Superintendente distrital e criou o distrito regular do Sudeste,
formado pelos Estados de São Paulo, Rio de Janeiro, Minas Gerais e Distrito Federal. Em
1982, na XXIII Assembleia distrital, o distrito Sudeste foi desmembrado em distrito regular
Rio-São Paulo e distrito de missão26 Minas e Centro-Oeste. Passados quatro anos, houve nova
divisão entre os distritos originando mais quatro novos distritos: Rio de Janeiro, São Paulo,
Minas Gerais e Goiás-Distrito Federal. Os pastores Joaquim Lima, Amadeu Teixeira, Dilo
Palhares e o missionário Robert Collins foram os respectivos Superintendentes distritais (O
ARAUTO DA SANTIDADE, pp. 26-27, set., 1986.).
As divisões territoriais não acabaram por aí. Na década de 80, outros distritos
surgiram, como o Sudeste Paulista, Nordeste Paulista, distrito Paulistano, distrito Nordeste e
áreas pioneiras em várias regiões brasileiras. (O ARAUTO DA SANTIDADE, p.27, ago.,
1988.). Essas divisões ocorreram pelo crescimento da membresia nazarena nessas regiões. Em
Campinas, por exemplo, a Igreja do Nazareno adquiriu o prédio do cinema São José, a fim de
comportar todos os fiéis que frequentavam os cultos no antigo templo, cuja estimativa era de
quase duas mil pessoas, na metade da década de 80. (O ARAUTO DA SANTIDADE, p. 26,
jan., 1986.). A estratégia de dividir para crescer tornou-se frequente na prática nazarena de se
expandir pelo território nacional. Além disso, essas divisões possibilitaram que cada distrito
percebesse sua singularidade e tratasse seus problemas de forma particular. Assim, o
desenvolvimento nazareno pelo país levou em consideração as peculiaridades socioreligiosas
regionais, no processo de implantação da doutrina da santidade no Brasil. Sobre isso, escreveu
Louie E. Bustle, diretor regional da Igreja do Nazareno para a América do Sul, no ano de
1989:
26
Distritos missão são aqueles que ainda não ganharam autonomia de gerir seus próprios negócios sem a ajuda
de outras instância, no caso, não ganharam a condição de distrito grau 3.
115
Há trinta anos que começou a obra da Igreja do Nazareno em Campinas, Brasil, sala
de visitas da cidade de São Paulo. A Igreja do Nazareno tem progredido bem na
cidade de Campinas e outros lugares, mas tem sido difícil plantar igrejas na
complexa cidade de São Paulo. O trabalho tem sido custoso e as pessoas difíceis de
alcançar, pois encontram-se entrincheiradas nos apartamentos de andares altos (...).
A área de maior interesse é o treino de novos pastores. O plano não é trazer pastores
de fora de São Paulo, mas usar aqueles que foram chamados para pregar, bem como
leigos que desejem começar novas congregações já formadas (sic). Foi criado um
novo distrito na cidade de São Paulo. Com este novo distrito, os nazarenos de São
Paulo podem fazer as próprias decisões e estratégias para alcançar a sua grande
cidade (...). Oremos todos que Deus ajude a fazer um grande impacto de Santidade
na cidade de São Paulo. (BUSTLE, Louie. in: O ARAUTO DA
SANTIDADE, p. 7, ago., 1989.).
autonomia de ação em cada região, tal como ocorreu nas Assembleias de Deus. Além disso,
se apresentava ainda muito centralizada e dependente das resoluções dos Estados Unidos.
Quanto a sua forma de inserção, buscou mais sua estruturação organizacional que o
evangelismo propriamente dito. Assim conforme, ressaltou Mosteller, passados mais de
trinta anos a Igreja do Nazareno não alcançou nem 300 Igrejas. (IGREJA DO
NAZARENO/ENTREVISTA EARL MOSTELLER, 1993.). Segundo Mosteller, o que
impediu esse crescimento foi a demora na elaboração de uma produção literária de
evangelismo pela Igreja no Brasil. O Arauto da Santidade surgiu 12 anos após a implantação
da primeira Igreja no Brasil, além disso, seu conteúdo era pouco voltado para o evangelismo e
não apresentava as vantagens que a doutrina da santidade trazia em relação às outras igrejas.
(IGREJA DO NAZARENO/ENTREVISTA EARL MOSTELLER, 1993). Mesmo com pouca
ênfase evangelística, a revista O Arauto da Santidade foi um importante instrumento de
divulgação doutrinária da Igreja, ao ponto, de se estabelecerem metas para promoção da
revista nas igrejas. A principal meta era alcançar a assinatura de 25% da membresia de cada
Igreja. (O ARAUTO DA SANTIDADE, jan., 1986.).
Rodney Stark e William Bainbridge, no livro, Teoria da Religião (2008) apontam que
as religiões se desenvolvem a partir de interações humanas simples e, é basilar, que os seres
humanos busquem o que percebem ser recompensas e evitam o que percebem ser custos. Para
Stark, recompensa é aquilo que incorre em um custo para se obtê-la e os custos são aquilo que
os seres humanos tentam evitar. (STARK E BAINBRIDGE, 2008, p. 37). Dessa forma, os
seres humanos em interação religiosa avaliam suas ações em termos de recompensa e custos.
Essa avaliação é definida como escolha racional. Stark destaca, que há uma concorrência
humana para se obter recompensas, visto que as demandas não são cobertas pelas ofertas dos
bens religiosos. Isso define que nem todos podem ser recompensados nas relações religiosas
(STARK E BAINBRIDGE, 2008, p. 42). Essas considerações levam ao entendimento da
escolha racional como a ação que dentro de determinados limites de informação e
compreensão e, motivadas por gostos e preferências induzem os seres humanos para as
118
A definição de economia religiosa adotada por Stark e Finke (2000, pp. 37-38) aponta
que as economias religiosas são o conjunto das atividades religiosas de uma sociedade. Nele
se incluem os fiéis que representam a parte da demanda e um conjunto de instituições que
produzem os produtos religiosos. Caracterizando melhor, temos as doutrinas e práticas como
bens, ou produtos religiosos, que são oferecidos pelas instituições definindo a oferta. A
relação que se estabelece entre essas partes define o mercado religioso. Para Stark e Finke
(2000), o mercado é formado de vários segmentos cada um deles representando as diversas
preferências. Nessa perspectiva, o mercado se caracteriza pelo pluralismo religioso, não
submetido a nenhuma regulação. Assim, segundo Frigerio (2008, p. 23), “uma economia
religiosa não regulada ou impulsionada pelos setores do Estado levará ao crescimento da
pluralidade religiosa”, tal fato ocorreu no Brasil desde a implantação da República.
Outro ponto básico proposto por Stark e Finke é que na relação economia e religião a
demanda religiosa muda pouco, é segmentada, mas estável, com isso a principal propulsão
das mudanças religiosas são as transformações na oferta. Dessa forma, os teóricos da
economia religiosa entendem que o pluralismo religioso sempre existiu, mas o monopólio da
Igreja Católica, fundamentado na força do Estado, não permitiu a diversidade. Atualmente, a
quebra desse monopólio nada mais fez do que evidenciar essa condição, possibilitando a
demanda religiosa escorrer para outras instituições. Com isso, presumem-se os teóricos da
escolha racional, que não há um processo de secularização da religião, mas uma
desregulamentação do mercado religioso. Isso é, passou-se do monopólio à aproximação do
mecanismo de concorrência perfeita27. Contudo, a demanda por bens simbólicos diferentes, a
partir da perda da hegemonia católica no mundo, cresceu, mas no último século não mais
sofreu variações substanciais.
27
Concorrência perfeita é um termo das Ciências Econômicas que define o mercado regido por suas próprias
regras, sendo que as relações entre a oferta e demanda de um produto se estabelecem por uma variedade de
firmas e uma variedade de consumidores de modo que nenhum deles isoladamente pode definir as regras.
119
Nesse caso, a lógica mercadológica na eficácia das denominações religiosas não está
na luta para obter uma clientela diversa de suas doutrinas e práticas, mas no atendimento de
um nicho religioso que essas denominações possam cobrir. Consequentemente, os princípios
de marketing evangelístico e satisfação de clientes para obter novos fiéis, vindos de fora das
igrejas, não surte o resultado esperado. Conforme destaca Frigerio (2008, p. 24), “nada na
teoria supõe que prover a religião vigorosa e eficazmente implique racionalização,
burocratização ou gestão empresarial, mas principalmente, a capacidade de gerar
compromisso por parte de seus integrantes”. O atendimento religioso se volta para o ambiente
cada vez mais específico, de busca por nichos de mercado. Disso, nasce a crítica aos teóricos
da mercantilização da religião que afirmam estarem as igrejas mudando suas teologias,
doutrinas e rituais para atender às demandas do mercado religioso. Contradizendo esse
posicionamento, os teóricos da escolha racional estabelecem que as igrejas não mudam, mas
especializam-se, visto que não se pode alcançar todos os setores do mercado.
A singular fixação na teologia da santidade parece ser o motivo pelo qual a Igreja do
Nazareno adquire certa fidelidade dos seus membros. Assim, na ausência de uma pesquisa
sobre o trânsito religioso nas denominações nazarenas, inferimos, a partir da observação
participante, que a mobilidade dos nazarenos para outras denominações não é significativa e
que até mesmo em tempos de crise, em alguma de suas igrejas, o que observamos foi o
deslocamento dos nazarenos para outra igreja nazarena e não para outra denominação. A
aderência à santificação como um produto diferenciado voltou-se para atender também a uma
parcela de cristãos presentes em outras denominações que não se contentavam com o básico
da salvação cristã. Além disso, a Igreja do Nazareno tentou mostrar, aos não afiliados a
120
qualquer denominação, que possuía um diferencial que os levaria a uma condição superior
àqueles que compunham a membresia de outras igrejas.
alcançariam por mera sorte, mas por imperativos técnicos, contudo buscando um nicho de
mercado que atendesse ao imperativo da santidade. Nesse sentido, a origem, inserção e
expansão da Igreja do Nazareno no Brasil se estabeleceram como promoção de bens
religiosos em um mercado de escolha racional.
O diferencial promovido por essa doutrina, nos Estados Unidos, possibilitou aos
nazarenos o alcance de um nicho sociorreligioso que não encontrava respostas às suas
aspirações nas demais denominações, nem mesmo naquelas que pregavam a santidade, mas
das quais a lideranças nazarenas faziam questão de se diferenciar, por entenderem a pouca
profundidade com que tratavam essa doutrina. Com base na teoria da escolha racional,
percebemos a doutrina da santidade não apenas como um aspecto teológico e doutrinário da
Igreja do Nazareno, mas como um produto mercadológico que trouxe a ela um importante
diferencial na inserção e consolidação no cenário religioso brasileiro, com uma oferta
religiosa diferenciada, que, vista pela própria Igreja, não se dispunha entre as denominações
no Brasil.
A Igreja do Nazareno no Brasil ganhou sua condição como área central nos primeiros
anos do Século XXI, isso significou sua “independência administrativa em relação à América
do Sul e Estados Unidos” (NAZARENO, 2004, p. 4). Essa autonomia da Igreja no Brasil
originou a sub-região Brasil, coordenada pelo pastor titular da Igreja Central de Campinas,
Aguiar Valvassoura. O projeto de expansão da Igreja traçado por Aguiar visava à implantação
de uma Igreja do Nazareno em todas as cidades brasileiras com mais de 500 mil habitantes.
(NAZARENO, 2004, p. 4). Segundo Valvassoura, a Igreja do Nazareno, no Brasil, apresenta
uma concentração de 65% de seus membros em Campinas, havendo a necessidade de
descentralização dos trabalhos pelo Brasil. Em decorrência dessa constatação, foram criadas
três áreas administrativas no país, a Área Norte/Nordeste, a Área Central e a Área Sul. A
primeira e a última são compostas por 4 distritos cada, a Área Central é formada por 9
distritos. A melhor infraestrutura da Igreja está situada na Área Central que atende os Estados
de São Paulo, Minas Gerais, Rio de Janeiro e Espírito Santo. Nela concentram-se as duas
maiores Igreja do Nazareno no Brasil, Campinas e Mesquita, com a soma de quase 100 mil
membros. O distrito Sudeste Paulista é o mais desenvolvido dos distritos, nele situam a Casa
Publicadora Nazarena do Brasil e a Faculdade Nazarena. Este distrito representa os lugares de
maior concentração de nazarenos no país.
Grande do Norte, a Rádio Naza Rio da Igreja do Nazareno de Nilópolis e a Rádio Nazarena
Memorial, em Campinas, entre outras.
O pastor é um presbítero definido pela Igreja como aquele que recebeu uma vocação
divina para pregar e utilizar seus dons no serviço eclesial e eclesiástico. Esses dons são
demonstrados e realçados pelo treinamento adequado e pela experiência nos trabalhos
executados na instituição. A posse efetiva no cargo de pastor se dá pelo ato solene da
ordenação. Nela, o pastor é integralmente investido de autoridade para desempenhar suas
funções. A Igreja do Nazareno reconhece apenas a ordem dos presbíteros investida de
autoridade para exercer a pregação. Essa é uma ordem permanente na igreja e por ela se
governa, administra e realiza os sacramentos do batismo, da ceia28 e do matrimônio. Essas
funções sacramentais conferem ao pastor a condição de iniciar e manter o fiel na vida cristã e,
por uma perspectiva temporal, mantê-lo na instituição eclesial.
28
A chamada Ceia do Senhor é um rito símbólico em que os membros da Igreja se reúnem, uma vez ao mês,
para comerem o pão e beberem o vinho, os quais são entendidos pelos nazarenos como os símbolos do corpo e
do sangue de Cristo na crucificação.
127
Esses fatos, vistos a luz da perspectiva weberiana de dominação (1922), podem ser
explicados por duas manifestações de legitimação de poder, uma burocrática legal e externa, a
outra carismática e interna. O papel desempenhado pelo pastor nazareno em relação à
organização eclesial é definido em termos hierárquicos. Os níveis de poder devem ser
respeitados por eles na condução da organização, o âmbito eclesiástico externo predomina
sobre o eclesial interno. Assim, a relação que se estabelece entre os pastores em si e a
instituição é a burocrática-legal, visando o aperfeiçoamento institucional e o alcance de
objetivos comuns. A outra relação ocorre entre os pastores e membros de suas igrejas. Nessa,
os pastores são percebidos como orientadores espirituais, instituídos de um poder divino, o
129
qual os torna responsáveis pelos sucessos e fracassos no cotidiano da Igreja. Percebemos essa
relação ainda como carismática, apesar de estar no âmbito institucional. Assim apelamos para
a consideração weberiana do tipo ideal que não se mostra de fato como realidade pura.
29
Conforme se percebe na Bíblia Sagrada, o livro do Apocalipse, nos capítulos 2,3 e 4, faz referência aos anjos
das igrejas, sem, contudo, deixar claro a relação que se possa estabelecer entre aqueles e a figura dos pastores
das igrejas atuais.
130
deve ultrapassar os limites doutrinários da instituição. Dessa forma, o discurso pastoral exerce
uma forma de coesão ideológica30 em torno da instituição eclesial. Nesse aspecto, a percepção
que os leigos têm da instituição e do pastor assume contornos inteiramente transcendentais,
criando nesses dois últimos uma camada que somente será quebrada se for patente à
contradição com a Bíblia. A centralidade da prédica não é apenas um exercício de reflexão
espiritual, mas um importante mecanismo de condução das massas no interesse da instituição.
30
Cf. Willaime, uma ideologia é um corpo de crenças reconhecidas como legitimas em função de uma
racionalidade vigente. (Willaime, 1985, p. 130).
132
Esses fatos da condição pastoral podem ser refutados por muitos como de pouca
relevância no âmbito de uma análise sociológica. No entanto, ao percebermos os efeitos da
ideologia pastoral nazarena em determinados processos sociais, como em eleições, por
exemplo, em que candidatos se apresentam ou se afiliam às Igrejas, oportunamente, a fim de
obterem votos, poderemos notar, que a ideologia das instituições eclesiais e de seus pastores
são capazes de direcionar vários e importantes processos sociais, sem estarem intrinsecamente
ligados a eles.
A liturgia nazarena é chamada de culto, ela ocorre em seu formato mais tradicional aos
domingos, geralmente, pelas manhãs e às noites. Há outras formas de encontros nas igrejas
31
Expressão litúrgica muito utilizada após declarações feitas pelos pastores ou algum membro da coletividade.
Significa, assim seja, buscando a concordância da divindade com os compromissos assumidos pelos humanos.
133
nazarenas, denominadas de cultos, mas que não atendem ao padrão de culto formal da Igreja.
O encontro de jovens e o culto de estudo bíblico são alguns desses cultos informais. A
centralidade do culto nazareno se fundamenta na Bíblia e na autoridade pastoral. O carisma
da mensagem legitima ou deslegitima as ações da membresia, ao ponto da Bíblia, denominada
de Palavra de Deus, se tornar o único ponto de referência e avaliação de todas as coisas.
Conforme destaca Willaime (2003, p. 137), “a verdade servida pelos clérigos se afirma na
pregação da palavra e não na hierarquia eclesiástica e nos ritos que ela proporciona”.
O culto nazareno se inicia com uma oração proferida pelo pastor ou algum membro da
denominação. Após essa oração, são entoadas músicas do hinário nazareno Louvor e
Adoração, cujos cânticos são mais melodiosos e com letras extensas. Segundo o prefácio
desse hinário,
Para que o canto seja aceitável, ele deve ser inteligente e entoado com reverência. A
Linguagem e o espírito dos hinos de uma congregação traduzem a profundidade da
experiência religiosa dos que a compõem, por isso se diz com frequência que depois
da Bíblia, é o hinário o recurso vital no desenvolvimento da fé cristã. (IGREJA
DO NAZARENO/LOUVOR E ADORAÇÃO, 1982.)
Um dos hinários mais antigo usado pela Igreja do Nazareno no Brasil é o Graça e
Devoção que foi compilado por uma Comissão de Música designada pela Assembleia distrital
da Igreja. (IGREJA DO NAZARENO/GRAÇA E DEVOÇÃO, [19--]) Ele é composto de 120
hinos extraídos de outros importantes hinários utilizados por outras denominações, entre
outros, da Harpa Cristã, Cantor Cristão e Cancioneiro Salvacionista. O hinário Graça e
Devoção foi substituído pelo hinário Louvor e Adoração que até os dias de hoje é o utilizado
pelos nazarenos. Segundo afirmam seus editores, ele resultou dos esforços de pesquisa
realizados por várias pessoas que “examinaram todos os hinários, publicados em português;
consultaram técnicos e músicos; escutaram a ministros e a leigos; sentiram o espírito peculiar
de congregações; e recomendaram o conteúdo, a teologia, a música, o estilo e a forma dessa
obra” (IGREJA DO NAZARENO/LOUVOR E ADORAÇÃO, 1982.). Esse hinário é
composto de 478 hinos e mais uma parte contendo as leituras congregacionais que são, por
vezes, lidas pelos pastores e, ou fiéis durante os cultos.
Outros estilos musicais podem ser entoados nos cultos e não se faz restrições quanto
ao uso de qualquer instrumento. As músicas são escolhidas por aqueles responsáveis pelo
direcionamento do chamado louvor, que é o tempo dedicado aos cânticos. Os fiéis podem
sugerir as músicas, conforme a ocasião. No entanto, essa prática é mais utilizada em igrejas
134
pequenas, para não se atrapalhar o andamento do culto. As restrições que se faz a alguma
música se dão pela percepção da incompatibilidade da letra com a doutrina, ou com os
ensinos bíblicos difundidos pela Igreja. Até que se perceba essa incompatibilidade, não se faz
nenhuma restrição a elas.
Na Igreja do Nazareno, o culto passa por várias fases, desde momentos reflexivos e
comedidos às situações de exaltação. Geralmente, esses momentos são dependentes do tipo de
prédica e da condução do pastor. Contudo, é um culto diferenciado do estilo pentecostal em
que a efusão atribuída ao Espírito Santo produz manifestações de diversas naturezas. No culto
nazareno, as manifestações emocionais, mais exaltadas são, de certa forma, proibidas. Os
chamados dons do Espírito não se manifestam com veemência durante os cultos. As
manifestações de curas, profecias, revelações, glossolalia são formalmente desestimuladas.
No entanto, já percebemos em algumas igrejas locais um formato pentecostal dos cultos em
relação aos dons. Esse fato é determinado pelo estilo particular do pastor, mas não é aceito
pelo corpo de líderes da Igreja do Nazareno.
se conduz as ações da membresia. Não há nessa Igreja um livro que a substitua. O próprio
Manual -1997-2001- a declara como guia supremo. (IGREJA DO NAZARENO/MANUAL
1997-2001, 1997, p. 6). Outro fundamento da fé nazarena se encontra nos escritos da igreja
cristã. Os Credos da Igreja antiga são tomados como pontos doutrinários a serem observados
e expressam uma declaração solene de fé, que contém as verdades que os nazarenos devem
crer.
O rito da eucaristia, comumente chamado se Santa Ceia é realizado pelo menos uma
vez por mês. Na maioria das Igrejas do Nazareno ocorre no primeiro domingo de cada mês.
Consiste em uma pequena refeição com pão e vinho, não fermentado, que simbolizam o corpo
e o sangue de Jesus Cristo dado para a salvação dos fiéis. É comum participarem da Santa
Ceia somente aqueles que foram batizados, no entanto, se observa a participação de pessoas
recém-chegadas à Igreja e de crianças nessa cerimônia. Essa participação é vedada ou
consentida conforme a disposição pastoral. A cerimônia da Santa Ceia é introduzida por
leituras bíblicas e dizeres propostos pelo Manual da Igreja (IGREJA DO
NAZARENO/MANUAL 2009-2013, 2009, p. 208).
começa na concepção, portanto, deve ser valorizada desde esse momento. A Igreja se opõe a
qualquer uso de engenharia genética que promova injustiça social, despreza a dignidade da
pessoa ou tenta alcançar superioridade racial, intelectual ou social sobre outros. (IGREJA DO
NAZARENO/MANUAL 2009-2013, 2009, p. 48).
Percebemos que a Igreja do Nazareno desenvolve suas ações por meio de atos de
interpretação sustentados em um arcabouço bíblico normativo que se correlacionam à situação
presente. Dessa forma, ela define seus posicionamentos a partir do entendimento de sua
missão ou de sua finalidade de existência. Teologicamente, a missão da Igreja do Nazareno é
de adoração a Deus, que se traduz, sociologicamente, no desenvolvimento de suas ações, em
âmbito local, tomando como base o contexto e o sentido primário da adoração. (O ARAUTO
DA SANTIDADE, p. 16, 2001.). Em termos práticos, significa a aderência aos princípios
divinos transmitidos pela Bíblia e sua posterior vinculação à vida cotidiana das pessoas.
Portanto, a Igreja do Nazareno se posiciona em relação a qualquer assunto que lhe é proposto.
Nessa infinidade, optamos por destacar a prática nazarena em relação à liberdade humana, a
eutanásia, discriminação, o ministério feminino, a guerra e o serviço militar, privilegiando
algumas questões não tratadas no âmbito institucional de parte das igrejas protestantes.
A eutanásia, como término intencional da vida por qualquer motivo que alivie a dor, é
incompatível com a fé cristã e, historicamente, é rejeitada pela igreja cristã. A Igreja entende
que a eutanásia reforça a arrogância humana de determinar o fim da vida, por isso se opõe a
todos os esforços de sua legalização. No entanto, ao se perceber o fim da vida, não se deve
utilizar de meios de seu prolongamento. Estes posicionamentos aplicam-se as pessoas que
estejam em estado vegetativo, em que qualquer artifício usado não causará expectativa de
regresso à saúde. Dessa forma, a Igreja se mostra veementemente contrária às formas de
abreviação da vida e também de seu prolongamento, quando não se manifesta qualquer
indício de recuperação de saúde. (IGREJA DO NAZARENO, 2004, p. 72).
de 50, conforme atesta Richard W. Houseal Jr. (1995, p. 23). Segundo ele, muitos
observadores acreditam que o número das mulheres que assumem o pastorado na Igreja do
Nazareno tem diminuído.
Mesmo empenhada na causa da paz, a Igreja recorre à consciência de seus membros quanto à
participação no serviço militar, em caso de guerra. Da mesma forma, requer para os seus
membros que não desejam se alistar, a mesma isenção que têm as instituições anti-bélicas.
(IGREJA DO NAZARENO, 2004, p. 77-76). O posicionamento da Igreja do Nazareno em
promover a cultura de paz vai, algumas vezes, de encontro às expectativas dos Estados. No
entanto, entendemos que é estratégia da Igreja do Nazareno evitar o confronto com as
autoridades estatais, ao delegar à consciência de seus membros a participação nas forças
armadas.
Conclusão
Este capítulo destacou que a chegada da Igreja do Nazareno no Brasil se deu por
intermédio de sua inserção nas Ilhas de Cabo Verde, muitos missionários cabo-verdianos, ou
que de lá vieram, tiveram participação decisiva na chegada da Igreja ao Brasil. A inserção
nazarena no território brasileiro, no final da década de 50, em um cenário religioso em que já
havia muitas denominações, exigiu de Earl Mosteller um espírito empreendedor que desse à
Igreja maior visibilidade em relação às outras denominações. A tendência de se buscar, na
mídia, o meio mais eficaz de se promover a Igreja resultou na rápida aceitação dos
campineiros da nova perspectiva religiosa que a Igreja do Nazareno propunha. A necessidade
que o casal Stegemoeller percebeu de se implantar a Igreja no Brasil, junto com a não filiação
deles e de José Zito às outras denominações, mostra que a Igreja do Nazareno realmente trazia
um diferencial em relação às outras denominações que não era satisfeito por nenhuma delas.
O destaque dado à centralidade do pastor nazareno visou ressaltar o papel dos pastores
nazarenos na condução de processos sociais intrínsecos e extrínsecos à Igreja, a partir de uma
abordagem em que buscamos entender as causas e consequências dessa centralidade.
141
Entendemos, por essa avaliação, que os aspectos que colaboram com a hegemonia do pastor
frente à coletividade eclesial não estão diretamente ligados à estrutura organizacional ou à
forma de governo da Igreja, mas sim, à construção ideológica das instituições eclesiais
promovidas também pela prédica pastoral.
Entendemos que a diferenciação apresentada pelo pastor nazareno reforça sua figura
como um tipo de clérigo, conforme destaca Willaime (2003). Concluímos que, a
proeminência pastoral é independente da forma de governo apresentada pela Igreja e que tal
distinção decorre do papel transcendental que o pastor exerce que é assemelhado aos
sacerdotes e profetas bíblicos. A concepção que o leigo nazareno tem do pastor e da
instituição não consegue se desvencilhar desse aspecto ideológico fortalecido pela prédica
pastoral, o que torna a membresia passível da influência institucional e pastoral em
importantes esferas de sua vida cotidiana.
CONCLUSÃO
Essas abordagens foram feitas para entendermos como uma expressão religiosa
informal tornou-se formal e institucionalizada na Igreja do Nazareno. Nesse aspecto, tomamos
de empréstimo as perspectivas da Sociologia da religião, baseadas em Max Weber, François
Houtart e Thomas F. O‟Dea, que tratam da institucionalização das expressões religiosas sob
uma perspectiva de mudança de dominação. Salientamos o desenvolvimento da base material
que possibilitou o aparecimento da Igreja do Nazareno, por meio da mudança da lógica
carismática para a lógica institucional. Nosso foco foi mostrar que o Movimento de Santidade
começou com uma postura carismática, daqueles que se opunham às formas denominacionais
tradicionais de se portar frente às contingências e conflitos sociais nos Estados Unidos do
Século XIX, mas que, com o passar do tempo, houve a perda da influência carismática em
vias de ser substituída pela dominação burocrático-legal.
externa por ser de um nível para outro, os Superintendentes e pastores se relacionam levando
em consideração os níveis hierárquicos. Já no âmbito interno de cada nível local, há uma
tendência das membresias da Igreja considerarem o pastor como um líder detentor de carisma.
O pastor nazareno é considerado pelas membresias como responsável espiritual na condução
dos fiéis, é uma condução que não se restringe apenas ao meio eclesial, mas ganha contornos
em âmbitos variados como familiar, escolar, afetivo etc..
Percebemos que, mesmo em uma abordagem sócio histórica da Igreja, foi necessário
utilizarmos uma perspectiva eclesiológica para entendermos o valor que os aspectos
teológicos exercem na instituição. Nesse ponto, sentimos a necessidade de um estudo de
referência que conciliasse a teologia com a sociologia, na análise de uma instituição religiosa.
A Sociologia da Religião de Weber, Houtart e O‟dea, ainda que indispensáveis a esse estudo,
não preencheram a lacuna de uma possível Sociologia da Igreja. Deveríamos, por meio dessa
suposta sociologia, compreendermos como constructos estritamente teológicos, como o
conceito de santidade, podem influenciar nas diversas formas de relações sociais. Ou ainda,
porque a centralidade da Bíblia na liturgia define ações como abandono de empregos,
rompimento de namoros, pagamento de dívidas, submissão feminina, relações antissociais,
entre outras.
comprova pela necessidade que viu Mosteller em buscar cartas de apresentação das
autoridades brasileiras, por seus serviços prestados em benefícios a elas, quando deixou o
Brasil para se estabelecer em Portugal. A relação de amizade entre Mosteller, Laudo Natel,
Ademar de Barros e outras autoridades federais, estaduais e municipais mostram as estratégias
e os tipos de vínculos que a Igreja estabeleceu no início de seus trabalhos no Brasil.
Destacamos que esse quadro estatístico não significava uma necessidade primordial de
se implantar a Igreja do Nazareno no Brasil mesmo porque, o quadro estatístico dos
protestantes no Brasil deveria ser bem menos animador no ano de 1914, quando o
Superintendente geral Hiram Reynolds visitou o Brasil, contudo, somente decorridos quase
meio século de sua visita, a Igreja do Nazareno chegou ao Brasil. Esse panorama da
composição dos evangélicos no Brasil e o decurso de tempo em se estabelecer em território
brasileiro mostram que a emergência de se expandir o reino de Deus no Brasil não foi o foco
da implantação dos nazarenos nesse país.
146
As formas religiosas podem ser analisadas a partir de uma lógica da economia e não
da mercantilização. Essa sutil diferença é percebida pela teoria das economias religiosas ao
ressaltar as possibilidades de escolhas na religião em contrapartida à mercantilização, que
ressalta a religião como mero produto de consumo. A religião oferecer um produto é bem
diferente dela mesma ser o produto. Visto de forma mais simples e clara, o vendedor não
precisa se vender para efetuar a venda. Dessa forma, as igrejas, no mercado religioso, não se
modificam para atender a amplitude do mercado, mas se especializam em determinado ponto
teológico para atender um nicho específico do mercado religioso. Aliás, os teóricos das
economias religiosas supõem que não há variações significativas nas demandas por um
produto e sim, na oferta dele. Portanto, é a ação das Igrejas que definem o mercado religioso.
147
Notamos também, que a doutrina da santidade que foi importante para o crescimento
nazareno nas décadas de 60 e 70, no Brasil, não parece ser mais um atrativo para arregimentar
novos fiéis, nem atrair aqueles de outras denominações, nessa primeira década do século XXI.
Apesar dos quadros estatísticos apresentados pela Igreja mostrarem um crescimento
considerável de membros, a prática de evidenciar essa doutrina parece se arrefecer. Há, no
meio nazareno, Igrejas que se assemelham aos estilos clássico, pentecostal e até
neopentecostal do protestantismo. As Igrejas do distrito Minas Gerais, que têm um estilo de
culto mais participativo, propenso ao estilo pentecostal e que estão situadas em bairros com
população de menor poder aquisitivo e com baixo nível de escolaridade, são as que mais têm
crescido com membros vindos de outras denominações. Esse fato demonstra que nessas
Igrejas nazarenas o crescimento é dado não pela compreensão de uma doutrina diferenciada,
mas justamente o contrário, pela falta dessa distinção.
148
Cabe ressaltarmos que esses aspectos são deduzidos de alguns dados estatísticos
apresentados pelos distritos no Brasil, contudo, observamos a discrepância entre os números
apresentados em algumas estatísticas. A membresia de uma Igreja do nazareno é formada pela
soma de membros ativos, associados e inativos que fazem parte da MNI, JNI ou dos
departamentos infantis. Muitas igrejas apontam um total de membros que não confere com o
somatório em cada departamento, trazendo dúvidas quanto à totalidade de membros ou sobre
as estatísticas desses departamentos. Por intermédio da observação participante, por exemplo,
percebemos que em uma dessas Igrejas do distrito Minas Gerais, o número de membros da
JNI e de crianças não condizia com os dados estatísticos apresentados na Vigésima Segunda
Assembleia distrital de Minas Gerais, no ano de 2007. (IGREJA DO
NAZARENO/VIGÉSIMA SEGUNDA ASSEMBLÉIA DISTRITAL, 2007.). Da mesma
forma, os dados de crescimento da Igreja no Brasil, contidos na agenda da Igreja do ano de
2009, não condizem com os números de aquisição de novos membros de ano para ano, pelo
simples erro de cálculo aritmético. Portanto, os dados estatísticos da Igreja do Nazareno no
Brasil são imprecisos não podendo deles fazer uma análise conclusiva.
Outro aspecto relevante desse trabalho foi o destaque dado à figura do pastor
nazareno. Aqui, buscamos definir o processo de construção dessa hegemonia na instituição.
Utilizamos da perspectiva de Jean Paul Willaime que foi essencial para se ressaltar o papel
dos pastores nazarenos na condução de processos sociais intrínsecos e extrínsecos à Igreja.
Entendemos, por essa avaliação, que os aspectos que colaboram com a hegemonia do pastor
frente à coletividade eclesial não estão diretamente ligados à estrutura organizacional ou à
forma de governo da Igreja, mas são definidos por construção ideológica da instituição que
promove a figura do pastor. Ao mesmo tempo, o pastor trabalha como guardião da instituição,
por meio de sua prédica e poder de coerção sobre a membresia da Igreja.
O intuito dessa análise sociológica foi apresentar a Igreja do Nazareno como uma
instituição não desvinculada das contingências sociais que envolvem qualquer ação humana.
E mais, foi uma tentativa de mostrá-la descoberta dos aspectos intrinsecamente bíblicos e
teológicos que escamoteiam as verdadeiras intenções institucionais. O argumento da
sacralização exposto nesse trabalho não teve como intenção entrar na discussão do processo
de secularização, mas apenas demonstrar uma prática observável na Igreja do Nazareno, sem
que se discutisse se certa ou errada. Assim o termo sacralização foi tomado como
transferência do entendimento das coisas comuns, seculares para o âmbito do teológico e
bíblico, dando a essas coisas comuns uma aparência de sagrado. Essa prática legitima as
ações da Igreja, em que os anjos que a governam nada mais fazem que obedecer as
ordenanças divinas que lhes chegam e esforçam para que todos os seus seguidores as
cumpram.
150
Por fim, esclarecemos que, uma abordagem sociológica, ainda que pareça
inconveniente a algumas lideranças nazarenas, não visa a uma crítica, mas ao aprofundamento
do conhecimento sobre a instituição que por vezes passa despercebido na construção de sua
história. Poucos são os nazarenos que sabem, por exemplo, que sua Igreja nasceu da prática
de assistência aos pobres, na busca de dar dignidade aos excluídos, do desejo de emancipar
escravos e mulheres. Poucos nazarenos sabem que a chegada de sua Igreja ao Brasil requereu
uma atitude desprendida, empreendedora e de renúncia de seus pioneiros, cujos exemplos são
essenciais para gerar a confiança naqueles que se unem e se unirão a ela, os quais são e serão
baluartes da permanência dessa Igreja através dos séculos. Assim, ainda que sintético, esse
trabalho é uma forma de contribuição para aqueles que desejam conhecer a Igreja do
Nazareno por uma perspectiva ainda pouco explorada.
151
BIBLIOGRAFIA
BÍBLIA. Português. Versão revista e atualizada. São Paulo: Sociedade Bíblica do Brasil
2000.
BRESEE, Phineas Franklin. The certainties of Faith. Kansas City: NPH, 1993.
CAIRNS, Earle E. O cristianismo através dos séculos: uma história da igreja cristã. São
Paulo: Vida Nova, 1995.
CASTRO, Clóvis Pinto de. Viver na dimensão do cuidado: a relação entre santidade social e a
vocação pública do metodismo. In: RIBEIRO, Cláudio; et al (orgs.). Prática e teologia na
tradição wesleyana: John Wesley 300 anos. São Bernardo do Campo: Editeo, 2008.
CUNHA, Sandro José Hayakawa. Os Oliveiras: vida e pregação de José Zito Oliveira e Zita
Rocha de Carvalho Oliveira. Braília: [s.n.], 2007.
DIAZ, John. The start of our work in the Cape Verde islands. [Sl.: s.n], 1924.
FISCHER, C. William. Porque sou nazareno: e não Católico Romano, Espírita, Testemunha
de Jeová, Mórmon, Adventista do 7º dia. Campinas: Casa Nazarena de Publicações. [19--?].
152
GRENZ, Stanley J.; GURETZKI, David; NORDLING, Cherith Fee. Dicionário de teologia.
São Paulo: Vida, 2002.
HOUSEAL JR., Richard W. Women clergy in the Nazarene: an analysis of change from 1908
to 1995. Masters of Arts. Kansas City: University of Missouri. 1996.
IGREJA DO NAZARENO. Journal twenty sixth general assembly of the church of the
nazarene. Indianapolis: Jack Stone, Jun. 26, 2005.
IGREJA DO NAZARENO. Vigésima segunda Assembleia distrital: ano estatístico 2007. Belo
Horizonte, [s.n.], 2008.
JERNINGAN, Charles Brougher. Pioneer days of the holiness movement in the southwest.
Kansas City: Pentecostal Nazarene Publishing House, 1919.
LALLEMENT, Michel. História das idéias sociológicas: das origens a Max Weber.
Petrópolis: Vozes, 2008.
LOCKMANN, Paulo Tarso de. Wesley e os pobres. In: RIBEIRO, Claúdio et al. (orgs).
Prática e Teologia na tradição wesleyana: John Wesley 300 anos. São Bernardo do Campo:
Editeo, 2008.
MCLOUGHLIN, William Gerald. Revivals, awakenings and reform. Chicago: The University
of Chicago press, 1978.
MERRILL, BRYAN. The rise of the Church of the Nazarene. Kansas City. Nazarenes
Archives, 1992. il. Color.
NICHOLS, Robert Hasting. História da igreja cristã. São Paulo: Casa Editora Presbiteriana,
1981.
NIEBUHR, H. Richard. As origens sociais das denominações cristãs. São Paulo: ASTE,
1992.
NIELSON, Merritt. Almas salvas y puertas abiertas: El ministério de la Iglesia del Nazareno
através de la radio. Kansas City: Casa Nazarena de Publicaciones, 1984.
PURKISER, W.T. Called unto holiness: the second twenty-five years 1933-58. Kansas City:
NPH, 1983.
REDFORD, M. E.. The rise of the church of the Nazarene. Kansas City: Beacon Hill Press,
1995.
RÉMOND, René. História dos Estados Unidos. São Paulo: Martins fontes, 1989.
RILEY, Juan E.; OSTER, Juan C. Nazarene en la America. del Norte. Kansas City: Casa
Nazarena de Publicaciones, [19--]
SCHILLEBEECHX, Edward. Por uma igreja mais humana. São Paulo: Paulinas, 1989.
SILVA, Geoval Jacinto. Abrindo espaços para a práxis da missão de Deus. São Bernardo do
Campo: [s.n], 2009.
SINGER, Paul. O capitalismo sua evolução sua lógica e sua dinâmica. São Paulo: Moderna,
1991.
SMITH, Timothy Lawrence. La historia de los nazarenos: los años formativos. Kansas City:
NPH, [195-].
STARK, Rodney; FINKE, Roger. Acts of Faith: explaining the human side of religion.
Berkeley: University of California. 2000.
STARK, Rodney; BAINBRIDGE, William Sims. Uma teoria da religião. São Paulo:
Paulinas, 2008.
156
THÉRET, Bruno. As instituições entre as estruturas e as ações. In: Lua Nova. São Paulo, n.
58, 2003. Disponível em: <http://www.scielo.br/pdf/In/n58.pdf>. Acesso em: 17, dez. 2009.
WEBER, Max. Três tipos puros de poder legítimo. [S.l.:s.n], 1922. Artur Morão (trad.).
Disponível em: <htpp://www.lusofia.net> acesso em 14 de fev. 2010.
WILLAIME, Jean-Paul. O pastor protestante como tipo específico de clérigo. In: Estudos de
religião. São Bernardo do Campo: UMESP, ano XVII, n.25, dez. 2003.
WYNKOOP, Mildred Bangs. Bases teológicas de Arminio y Wesley. Kansas City: Casa
Nazarena de Publicaciones, 1983.