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ACONSELHAMENTO
PASTORAL
1998-99
ACONSELHAMENTO PASTORAL
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DEFINIÇÃO
Roll May: Uma profunda compreensão entre pessoas, que resulta numa mudança da
personalidade.
Holman: O processo do aconselhamento é a consideração pessoal, íntima e amigável, de um
problema por parte de duas pessoas, em que ambas estão empenhadas em encontrar uma
solução; mas em que a solução e o programa de acção devem pertencer genuinamente à pessoa
aconselhada, e ser aceite por ela como tal, a despeito de quanto o conselheiro possa ter
contribuído para o processo.
Carl R. Rogers situa o processo de aconselhamento entre as "relações de ajuda", e define estas
como uma relação em que pelo menos uma das partes tem a intenção de promover o
crescimento, desenvolvimento e maturidade da outra; e também melhorar o seu funcionamento e
a maneira como ela encara a vida.
James Mc.Graw: Aconselhamento pastoral é a situação em que o pastor procura numa
atmosfera de amizade e compreensão ajudar uma pessoa a enfrentar o seu problema,
compreendê-lo e chegar a uma solução para o seu bem e para a glória de Deus. (necessidade de
um problema para se estabelecer a relação)
LIMITAÇÕES DO ACONSELHAMENTO
Não é um substituto para a pregação.
Não é um substituto para o altar de oração.
Não é um substituto para os hospitais de doenças mentais.
1. Ser Genuíno e Transparente. Quanto mais genuíno o conselheiro for, maior será a
possibilidade de êxito. Isto significa que o conselheiro precisa de reconhecer os seus próprios
sentimentos, para não apresentar uma fachada e ter uma atitude diferente a um nível mais
profundo da consciência. Ser genuíno, segundo Carl Rogers, inclui a disposição de exprimir
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esses sentimentos e atitudes. Só assim a relação de aconselhamento será uma relação real e
poderá. portanto funcionar. Só encontrando realidade no conselheiro a pessoa poderá buscar a
realidade em si mesma, o que é a base do processo de recuperação e do encontro de soluções.
2. Amar o Indivíduo. Aqui é importante não só o amor agape, mas quanto maior a aceitação da
pessoa aconselhada por parte do conselheiro, e quanto mais este gostar dessa pessoa, mais fácil
será conseguir-se um relacionamento que vai produzir mudanças.
Por aceitação entende-se considerar a pessoa como uma pessoa de valor próprio incondicional,
não importa quais sejam a sua condição, o seu comportamento ou os seus sentimentos. Significa
respeitá-la como uma pessoa independente, com direito aos seus próprios sentimentos, sejam
eles quais forem. Significa também uma aceitação das suas atitudes do momento, mesmo que
sejam negativas e contraditórias. Essa aceitação incondicional cria uma atmosfera de calor
humano e segurança, a qual é indispensável para que o indivíduo se sinta querido e apreciado
como pessoa, característica insubstituível no processo.
3. Saber Escutar. É mais importante saber escutar do que tudo que o conselheiro possa dizer.
Por falar de si mesmo e exprimir os seus sentimentos o aconselhado descobre verdades sobre si
próprio que ele desconhecia ou a que nunca prestara atenção. Também só através do que ele
revela de si mesmo pode o conselheiro ajudá-lo a ver mais profundamente dentro de si mesmo
para encontrar as suas próprias soluções.
4. Ter um Desejo de Compreender. É necessária empatia com os sentimentos e revelações da
pessoa aconselhada. Significa a habilidade de nos pormos no lugar dela e validar esses
sentimentos, vê-los como a pessoa os vê, para que ela possa sentir-se livre para continuar a
explorar o profundo do seu ser
sem receio de ser rejeitada ou condenada. Só assim pode haver um desenvolvimento pessoal
constructivo.
5. Respeitar Sempre a Confidência. O que se passa e tudo que é dito no processo de
aconselhamento é sagrado e estrictamente confidencial. Até os tribunais reconhecem isso. Em
situação alguma deve ser revelado a seja quem for.
O PROCESSO DO ACONSELHAMENTO
PASSOS CARACTERÍSTICOS:
1. O indivíduo pede ajuda ou, se não o faz, o importante é conseguir aproximar-se dele para o
ajudar.
2. A situação é definida. É necessário estruturar as coisas e definir o papel do conselheiro.
Também estabelecer o tempo das sessões e pôr um limite no envolvimento. É bom fazer
isto antes de avançar muito. (Precauções a tomar para evitar situações embaraçosas ou
comprometedoras.)
3. O conselheiro encoraja a livre expressão dos sentimentos em relação ao problema. Cuidado
com a necessidade de satisfazer a curiosidade.
4. O conselheiro reconhece, aceita e ajuda a esclarecer sentimentos negativos.
5. Depois de sentimentos negativos serem totalmente expressos, eles devem ser seguidos por
expressões de impulsos positivos que causam crescimento pessoal.
6. O conselheiro reconhece e aceita esses sentimentos positivos da mesma maneira como fez
com os negativos. Cuidado para não desaprovar ou aprovar demasiado.
7. A seguir vem o passo mais importante para a pessoa aconselhada: compreender-se a si
própria.
8. Começa então um processo de definir possíveis cursos de acção.
9. Seguem-se acções positivas.
10. O indivíduo vai vendo mais claramente à medida que toma as suas decisões e avança com
um comportamento positivo.
11. A personalidade vai integrando mais e mais acções positivas.
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A DISPONIBILIDADE DE UM MINISTRO
Para um ministro, há três tipos de disponibilidade:
1. Disponibilidade oficial, devido ao dever do ofício.
2. Disponibilidade prática: O que acontece no dia a dia, os contactos casuais que são feitos.
3. Disponibilidade psicológica: É algo deliberado. É a nossa habilidade de entrar dentro da
pele dos outros, a nossa aceitação deles como indivíduos. Em cada ser humano há algo
valioso que merece ser salvo (tanto no sentido psicológico como puramente espiritual).
MÉTODOS DE ACONSELHAMENTO
Método Directivo:
1. O conselheiro descobre, diagnostica e trata os problemas do cliente (embora neste processo
tenha a colaboração activa do aconselhado).
2. O conselheiro aceita a maior parte da responsabilidade em resolver o problema.
3. Esta responsabilidade torna-se o foco dos seus esforços.
4. O conselheiro assume a liderança directa das sessões.
5. O conselheiro define o problema.
6. O conselheiro analisa o problema, e o aconselhado limita-se a confirmar a análise, discordar
dela, ou suprir informações adicionais.
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Método Não-Directivo:
1. O foco é posto no indivíduo em vez de ser posto no problema.
2. Providencia uma atmosfera de compreensão na qual se dá o aconselhamento.
3. O conselheiro define as sessões em termos da responsabilidade do aconselhado.
4. O conselheiro procede de maneira a indicar que reconhece os sentimentos ou atitudes do
aconselhado, à medida que vão sendo expressos.
5. O conselheiro responde de maneira a interpretar ou reconhecer os sentimentos ou atitudes
que são expressos de outras maneiras.
6. O conselheiro responde adequadamente às atitudes ou sentimentos expressos.
7. A sessão é dominada por uma preponderância do aconselhado: este é quem mais fala.
8. O conselheiro procura ajudar o aconselhado a reconhecer e compreender os seus
sentimentos, atitudes, e o padrão das suas reacções; e encoraja-o a falar sobre isso.
9. O conselheiro escuta numa maneira paciente e amiga, mas ao mesmo tempo criticando
inteligentemente.
10. O conselheiro não evidencia qualquer espécie de autoridade.
11. O conselheiro não dá conselhos ou sugestões.
12. O conselheiro não argumenta.
COMPREENDENDO O ACONSELHADO
MECANISMOS DE DEFESA
Definição: Certos processos mentais inconscientes que, apesar de todos incorrerem neles em
certo grau, quando exagerados causam problemas ou tornam-se um sintoma de doença
emocional ou mental.
RAZÃO DOS MECANISMOS DE DEFESA:
1. Proteger a personalidade.
2. Satisfazer necessidades emocionais.
3. Resolver tendências em conflicto.
4. Manter a auto-imagem.
5. Aliviar ansiedade.
Os mecanismos de defesa são justamente o que o nome indica. São técnicas inconscientes de
sobrevivência psicológica. São mecanismos de adaptação a uma realidade cruel ou incómoda.
Mas o seu exagero pode causar perturbações graves e distorcer a personalidade e o
relacionamento
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humano.
LISTA DOS MECANISMOS DE DEFESA:
1. Repressão: Processo de excluir da consciência os desejos, impulsos ou pensamentos que
são contrários ao ideal que a pessoa tem de si mesma ou são demasiado dolorosos. É
diferente da supressão, a qual é um mecanismo consciente. Ex: Crianças abusadas
sexualmente e que “esquecem” completamente o que aconteceu, embora lhes cause danos
emocionais.
2. Sublimação: Substituição de uma forma de actividade inaceitável ou destrutiva por uma
que é aceitável ou útil. Ex: assistir a desportos violentos pode ser um meio de sublimação
de tendências violentas.
3. Racionalização: Processo de justificar uma acção questionável com razões aparentemente
legítimas e que sejam satisfatórias. (O alcoólico é mestre na racionalização, para explicar
porque bebe; marido que bate na mulher: “Vê o que me fizeste fazer!”)
4. Compensação: Tentativa de se adaptar a insuficiências ganhando reconhecimento de outras
maneiras. Ex: Pessoa inadequada numa área pode dedicar-se extraordinariamente a outra;
pessoa com um complexo de inferioridade, assume uma atitude de superioridade; pessoa
insegura assume a atitude de que sabe tudo e não admite reparos de terceiros.
5. Simbolismo ou Fetichismo: Uma ideia ou objecto é usado para representar outra ideia ou
objecto: Ex: Pé de coelho, talismãs, relíquias, “security blanket” das crianças, ursinho.
6. Deslocação ou Substituição: Quando um sentimento é transferido de um objecto ou pessoa
bastante importante para um substituto relativamente menos importante. Ex: Criança que
contra a sua vontade tem de cuidar do irmão mais novo, desloca a sua ira para o irmão em
vez de a dirigir aos pais; bater com a porta, dar pontapés em coisas em vez de pessoas, etc.
7. Projecção: Deficiências, desejos, impulsos ou sentimentos negativos que a pessoa não quer
reconhecer como seus e os atribuí a outra pessoa. Ex: Pessoa que se sente inferior julga
que todos a estão a desprezar e ofende-se com facilidade. Pai que suspeita todos os amigos
da filha, possivelmente na juventude era o tipo de pessoa que ele julga esses amigos serem.
8. Identificação: É o inverso da projecção. Em vez de atribuir a outros as nossas
características inaceitáveis, imaginamo-nos com as qualidades de outras pessoas, mas que
não temos: pregar como Billy Graham; cantar como fulana, etc. E podemos começar a agir
como essas pessoas. É a base do culto dos heróis.
9. Escape: esforço para aliviar tensões entregando-se a actividades que dão satisfação ou
prazer. Ex: Fantasias, sonhar acordado, refugiar-se no trabalho, etc.
10. Formação de Reacção: inconscientemente mascarando um impulso inaceitável procurando
afincadamente fazer o contrário. Ex: Mãe super-protectora do filho que não desejava ter.
11. Conversão: impulso negativo expresso inconscientemente por um sintoma físico. Ex:
Criança que não tem o trabalho de casa feito e começa a ter dores de barriga. Uso de
sintomas físicos para chamar a atenção da família, etc.
12. Regressão: Reverter a um comportamento infantil ou dum estádio de desenvolvimento
anterior ao cronologicamente adequado: Chorar inadequadamente, enurese nocturna, etc.
13. Negação: Recusa inconsciente em aceitar a realidade. Ex: Pessoa cujo familiar tem um
cancro avançado e que recusa acreditar que a doença é terminal.
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SAÚDE MENTAL
Saúde mental é algo bastante difícil de definir porque os limites de normalidade e anormalidade
não são claramente definidos e muitas vezes se sobrepõem. Podemos dizer que ninguém é
absolutamente normal, no sentido em que no nosso desenvolvimento aconteceram coisas que nos
fizeram lançar mão de padrões de comportamento ou atitudes mentais que, bem examinados,
não são saudáveis.
Mas desde que esses padrões ou atitudes mentais não prejudiquem o bem-estar emocional ou o
funcionamento do indivíduo na sociedade e na família, ele é considerado normal e saudável.
Portanto, podemos dizer que é normal ser-se um pouco anormal. Mas também é bom
reconhecermos que neste campo todos temos uma ampla margem para melhorar e tentarmos
compreender-nos melhor a nós mesmos e aos outros.
CARACTERÍSTICAS DA SAÚDE MENTAL
Do livro de O. Quentin Hyder, O Manual de Psiquiatria do Cristão, retiramos as seguintes
características da saúde mental, consideradas no contexto de um indivíduo funcionando no seu
ambiente familiar e cultural:
(1) A pessoa mentalmente saudável deve estar em contacto com a realidade e provar isto
comportando-se e reagindo em todas as situações de uma maneira realista.
(2) Isto significa que ele deve ser capaz de funcionar com êxito nas diferentes experiências da
vida, quer dizer, na vida vocacional, social, pessoal e sexual. "Com êxito" significa uma
qualidade de funcionamento que é apropriada e satisfatória tanto para o indivíduo como
para as outras pessoas directamente ou indirectamente envolvidas.
Especificamente, funcionar com êxito consiste em que a pessoa desempenhe bem o seu
trabalho (ou estudos, se for este o caso), tenha a habilidade de fazer e manter algumas
amizades, seja capaz de participar de actividades sociais e de amar e ser amado, estando
bem ajustado nas suas relações interpessoais íntimas.
(3) Quando algo de mau sucede em alguma destas áreas, a pessoa mentalmente saudável
adapta-se à situação com auto-domínio e disciplina. Reage ao desapontamento,
preocupação ou stress duma maneira confiante e não egoísta. Deve ser livre de ansiedade
ou depressão excessivas. A sublimação ou outras formas adequadas de redirigir a sua
energia são maneiras apropriadas de lidar com pressões ou tentações.
(4) Qualquer que seja o seu curso de acção, este não deve ser nem auto-destruidor nem
prejudicial para outras pessoas. O seu funcionamento deve estar dentro dos limites do
controle emocional e da aceitação da responsabilidade pelos seus actos.
(5) A pessoa mentalmente saudável geralmente tem objectivos dignos que tenta alcançar dentro
das regras da sociedade em que vive. Quaisquer que sejam as suas ambições, grandes ou
pequenas, o seu esforço através das batalhas da vida deve proporcionar-lhe um sentido de
propósito e dar-lhe uma certa medida de satisfação, contentamento, felicidade e paz interior.
Para o cristão consagrado, há também uma dimensão espiritual. Para ele, Deus é a realidade
final, e a saúde espiritual e psicológica involve estar em contacto com esta realidade. Os
encontros pessoais do cristão processam-se em três direcções: para dentro, consigo mesmo;
para fora, com os outros; e para cima, com Deus. Saúde total, no homem total, exige um
relacionamento saudável em todas estas três áreas.
É importante notarmos que o conceito de saúde física, mental e espiritual deve ser um conceito
integrado, total. Se uma parte está doente, o ser total é afectado.
ATRASO MENTAL
No princípio da vida vários factores podem contribuir para uma deficiência no desenvolvimento
da inteligência conhecido por atraso mental. Não é uma psicose no sentido exacto, já que não
envolve falta de contacto com a realidade, mas como representa uma função mental anormal,
precisa de ser mencionado aqui.
Acontece antes, durante ou pouco depois do nascimento, mas só é reconhecido por volta do
segundo ano de vida, quando a criança falha em andar ou falar. O baixo grau de inteligência
conduz a um fraco sentido de auto-preservação, uma inabilidade em compreender os padrões
morais e os princípios do comportamento em sociedade.
Diferenças de tratamento
O psicótico precisa de hospitalização, fármaco e psicoterapia, e muitas vezes choques eléctricos.
O neurótico precisa de psicoterapia directiva ou não-directiva, por vezes pequenas doses de
tranquilizantes ou anti-depressivos, e na maior parte dos casos não precisa de hospitalização.
As causas das psicoses variam de doenças cerebrais orgânicas a desiquilíbrios químicos. As
neuroses têm causas psicológicas e espirituais, e também por vezes podem ser causadas por
desiquilíbrios químicos menores que os das psicoses.
As psicoses são classificadas em duas maiores categorias: orgânicas e funcionais.
AS PSICOSES FUNCIONAIS
Estas são as doenças mentais mais sérias. São chamadas funcionais porque ainda não há
evidência absoluta de causas orgânicas ou físicas. A inabilidade do doente funcionar
normalmente é a essência da desordem. Fica sem contacto com a realidade e diz e faz coisas
que mostram esta separação do mundo real em que vive. Isto produz um comportamento
inapropriado.
O que o psicótico diz ou faz revela uma perturbação do pensamento. Ouvindo-o falar por alguns
minutos sem interrupção, verifica-se que ele é incapaz de se concentrar no assunto (perda do
pensamento com um objectivo), a sua mente vagueia (fuga de ideias), ele foge da direccção dos
seus primeiros comentários (pensamento tangencial), anda à roda e nunca chega ao ponto
(pensamento circunferêncial), e pode até não haver qualquer ligação entre uma frase e a seguinte
(perda de associação).
A aparência do psicótico é geralmente muito descuidada em questão de vestuário. A sua atitude
e expressão facial pode ser estranha ou peculiar. Pode ter um ritual compulsivo, normalmente
uma sequência de pequenas acções inofensivas que tem de realizar repetidamente. Ele pode
parecer tenso, ou agitado e incapaz de estar quieto. Pode falar muito depressa, gesticulando,
andando de um lado para outro e mesmo gritar. Por outro lado, pode parecer reservado,
encerrado no silêncio e incapaz de comunicar. Num caso extremo, pode chegar à catatonia:
totalmente estranho ao que o rodeia, possivelmente olhando fixamente para o espaço, sem
responder mesmo a estímulos dolorosos.
Ao lidar com alguém suspeito de ter uma doença mental, observe cuidadosamente o seu discurso
e o seu estado emocional, pois estes darão indicações de quando é necessário intervir para o
ajudar a tratar-se. Por exemplo, o que ele diz revelará a desordem do pensamento, se a produção
e curso desse pensamento é anormalmente lenta ou rápida, se a continuidade não é clara, se ele
continua a repetir a mesma coisa (perseverança) e se de repente pára sem poder continuar
(bloqueio).
O conteúdo do que diz também fornece boas indicações: ele fala de si mesmo em referência a
tudo que menciona (auto-referência ou pensamento autístico)? Está convencido (não
realisticamente) de que é perseguido ou que está sob a influência de forças exteriores
(paranóia)? Queixa-se repetidamente de problemas físicos para os quais não há qualquer
diagnóstico depois de exames completos e cuidadosos (preocupação hipocondríaca)? Ouve
vozes ou vê coisas qeu realmente não existem (alucinações auditivas ou visuais)? Tem
pensamentos suicidas? Este é um ponto muito importante. Não espere até que ele ameace fazer
uma tentativa séria. Mesmo comentários como “Eu estaria melhor morto”, ou “Quem me dera
poder dormir por muito tempo”, deve alertá-lo para a urgência no tratamento.
Considere também o estado emocional do doente. Está muito deprimido, ansioso, perplexo,
irritável, apático, ou invulgarmente animado? O seu estado de espírito muda rapidamente de
elevado para deprimido (mudanças de humor)? Ele pode controlar as suas emoções em ocasiões
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sociais, e o seu estado emocional é consistente com o que está a dizer ou fazer? É apropriado à
ocasião? Há uma discrepância entre o pensamento e o sentimento (afecto inapropriado)?
Vivendo perto de alguém que pode observar durante um certo tempo, há problemas físicos a
considerar: O que é o seu apetite? Tem havido algumas mudanças súbitas de peso? Problemas
com a função intestinal? O interesse ou o desempenho sexual tem mudado em relação ao que
era normal para o indivíduo? Tem dificuldade em conciliar o sono ou conseguir dormir
normalmente? Tem havido uma diminuição de actividade ou perda de interesse em coisas que
antes apreciava? Este tipo de alterações, se não acompanhadas de causas físicas, podem
corresponder a uma depressão psicótica.
Nalgumas psicoses, pode-se notar uma perda da memória tanto para eventos recentes como
distantes. Pode haver alguma desorientação, tal como a inabilidade de o doente dizer a hora ou
o dia, ou onde está, ou quem fala com ele. Pode até não reconhecer pessoas que conheceu bem
durante muitos anos. O seu funcionamento intelectual pode estar seriamente prejudicado e o seu
juízo e compreensão adversamente afectados. Ele pode categoricamente negar que está doente e
que precisa de tratamento, e será necessário objectivamente apontar-lhe as mudanças que se tem
notado, para tentar persuadi-lo a ir ao consultório do psiquiatra ou hospital.
1. ESQUIZOFRENIA
Esta é de longe a psicose funcional mais comum. É uma desorganização séria da personalidade,
em que há uma separação entre o que o doente pensa e o que sente. Por exemplo, ele pode rir-
se ao contar um acontecimento infeliz, ou mostrar emoções rígidas, estereotipadas, não afectadas
por diferentes situações, ou simplesmente ficar apático e sem reacção.
O sinal clássico da esquizofrenia é a perda do processo lógico do pensamento, que em casos
extremos toma a forma de alucinações ou ilusões. Nenhum argumento lógico poderá convencer
o doente de que essas alucinações não são reais. Também ser-lhe-á impossível separar o mundo
real do seu mundo de fantasia. Por vezes ele não consegue separar os seus próprios
pensamentos dos pensamentos dos outros e, no caso extremo, nem sequer o conceito do seu
próprio corpo.
O esquizofrénico não consegue relacionar-se com outros. É-lhe impossível estabelecer amizades
duráveis. Sofre de ambivalência em relação àqueles que lhe são chegados. Não está seguro se
os ama ou odeia, se confia neles ou se tem medo de rejeição. Isto causa-lhe uma inabilidade
crónica de sentir prazer no que faz ou na companhia de amigos ou familiares.
Contudo, a maior parte da vida do esquizofrénico não é passada na crise psicótica, mas num
estado latente ou residual, em que pode funcionar mais ou menos adequadamente. Quando
descompensa, então precisa de voltar para o hospital até equilibrar de novo.
Há quatro tipos principais de esquizofrenia: simplex, hebefrénica, catatónica e paranóide.
Simplex: Aparece na adolescência, caracterizada por apatia, mutismo ou autismo, ambivalência,
falta de expressão, falta de ambição. O doente não consegue encarar as responsabilidades da
vida adulta, fazer amigos, ou manter um emprego.
Hebefrénica: É a mais grave de todas, aparecendo geralmente muito cedo. Consiste numa
desorganização total da personalidade. Causa explosões de ira ou imodéstia, maneirismos,
alucinações. A vida familiar é seriamente afectada.
Catatónica: É uma esquizofrenia reactiva, por vezes devida a condições de stress. Aparece
subitamente, mais no adulto do que no adolescente. Quando sai dos períodos de catatonia pode
ter acessos de violência.
Paranóide: Aparece mais tarde. Causa ilusões de grandiosidade ou de perseguição. Por vezes
há religiosidade excessiva e alucinações. O doente pode tornar-se hostil ou violento porque
outros não correspondem às suas ilusões. Pode chegar ao crime ou assassinato. Porque a
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desorganização da personalidade não é tão acentuada como nos outros casos, alguns passam
despercebidos na sociedade.
Além destes tipos bem definidos, há outros intermédios. Na esquizofrenia de tipo latente a
personalidade é esquizoide, com alguns sintomas, mas o indivíduo pode nunca ter um episódio
psicótico.
2. DESORDENS AFECTIVAS
Em contraste com a esquizofrenia, que é primariamente uma desordem do pensamento, as
psicoses afectivas são desordens do humor ou estado de espírito. Podem ir do júbilo extremo à
depressão. São essas variações de humor que levam à perda de contacto com o ambiente e ao
diagnóstico da psicose. Não parece haver factores claramente precipitantes na maioria dos
casos.
Doenças Maníaco-Depressivas: São caracterizadas por mudanças bruscas do humor. Há três
tipos básicos: Tipo maníaco, tipo depressivo e tipo circular.
O tipo maníaco causa períodos de grande excitação, irritabilidade, falar sem cessar, fuga de
ideias e grande actividade mental e física.
O tipo depressivo tem somente episódios depressivos profundos e redução de todos os
processos mentais e físicos, até podendo levar à letargia. Tanto no tipo maníaco como no
depressivo os doentes podem ter períodos normais entre os episódios.
O tipo circular é o mais comum e apresenta episódios alternados de mania e de depressão.
Durante a fase maníaca, o doente está excitado, dizendo e fazendo o que quer, mesmo de
maneira inconveniente, pode esbanjar dinheiro que não tem, comprar coisas de que não
precisa, escrever cartas grandiosas a pessoas em eminência, conduzir depressa demais, etc.
Mas quando "vem para baixo", fica deprimido, por vezes com tendência ao suicídio.
A psicose maníaco-depressiva pode ser tratada com medicamentos e permitir uma vida
basicamente normal.
Melancolia Involutiva: Tem lugar nos períodos de transição da vida, na menopausa, e em
períodos de involução, tanto para homens como para mulheres. Estas são mais comumente
atingidas, causando-lhes depressão com agitação, preocupações e insomnia. Há grande
preocupação com o físico e suas funções, sentimentos de morte imediata, sentimentos de culpa.
A pessoa tem ilusões de que é responsável pelos males do mundo. O risco de suicídio é grande.
Esta psicose, quando tratada, tem grandes possibilidades de boa recuperação. 80% dos doentes
em hospitais mentais são deste tipo.
3. PARANÓIA
Difere da esquizofrenia paranóica em que a anormalidade básica é uma série de ilusões não
associadas a outras desordens do pensamento. O doente pode imaginar que está a ser observado
ou perseguido, que o querem destruir ou que o estão a influenciar contra a sua vontade. Pode
imaginar-se uma pessoa diferente, geralmente alguém importante, ou que a sua identidade está a
alterar-se por mudanças que ocorrem no seu corpo ou espírito. Fora disso ele é completamente
normal. O prognóstico não é bom, mas psicoterapia prolongada pode ajudar.
4. DEPRESSÃO PSICÓTICA
Começa muitas vezes por uma depressão reactiva a uma perda, como a perda de um ente
querido, perda financeira, etc., mas em vez de recuperar no tempo normal vai-se aprofundando e
prolongando até haver uma perda de contacto com a realidade. Muitas vezes termina em
suicídio. O tratamento com medicamentos, psicoterapia, ou electrochoques pode conduzir a
uma recuperação suficiente para uma vida funcional normal.
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AS NEUROSES
NEUROSE DEPRESSIVA
A depressão é o sintoma psiquiátrico mais comum, e é encontrada em cada estádio da doença
mental, desde a depressão temporária numa pessoa completamente normal que teve uma grande
perda ou desapontamento, à depressão suicida do psicótico. A depressão neurótica ou reactiva
está entre estes dois extremos.
Geralmente é causada por uma perda. Mas em vez do pesar ou desgosto normais, com
recuperação em algumas semanas, instala-se um estado de depressão que incapacita o doente ao
ponto de só querer enroscar-se num canto, fora de todo o contacto humano. Distingue-se da
depresssão psicótica porque não há desorganização do pensamento, ilusões ou alucinações, ou
verdadeira falta de contacto com a realidade.
Os primeiros sintomas são uma expressão de tristeza, perda de interesse pelo trabalho ou por
actvidades de recreio, agitação, irritabilidade fácil, expressões de baixa auto-estima, sentimentos
de insignificância, de desalento, vergonha, auto-recriminação e culpa.
Os efeitos físicos incluem dificuldade em dormir ou excessiva sonolência, fadiga (cansaço sem
esforço que o justifique), multiplas queixas físicas sem sinais objectivos, falta de apetite,
diminuição do desejo sexual, preocupação consigo mesmo, etc.
Causas de depressão: A causa mais frequente é ira auto-destrutiva, isto é, voltada contra o
próprio indivíduo. Há uma raiva ou ressentimento inconscientes, por exemplo, para com um
ente querido que desapareceu. A ambivalência resultante da co-existência de sentimentos de
raiva e de amor não pode ser expressa, porque não é apropriado sentir-se raiva de um ente
querido que morreu. O conflito não pode ser adimitido conscientemente, e é interiorizado,
misturado com sentimentos de culpa, volltando-se contra o próprio indivíduo.
O ponto essencial é que o indivíduo não pode processar os sentimentos de ira ou revolta
adequadamente. Estes, ou imobilizam o seu ego, causando depressão, ou são somatizados
causando problemas psico-somáticos. Se a depressão se intensifica, o doente pode, ao tentar
fugir desse conflito, também fugir da realidade, instaurando-se a psicose; ou tomar o caminho
extremo da ira voltada contra o ego: o suicídio.
Outras causas associadas à depressão são sentimentos de rejeição durante a infância, como por
exemplo aquando do nascimento de um irmão/irmã, ou falta do cuidado dos pais, ou excessiva
severidade destes, tudo isto causando uma baixa auto-estima na criança, que se traduzirá de
tempos a tempos por períodos de depressão aparentemente inexplicáveis.
Qualquer doença física, especialmente prolongada, pode causar uma depressão reactiva.
Doenças orgânicas como tumores cerebrais, ou doenças funcionais como o hipotiroidismo,
podem ser uma causa directa de depressão.
Tratamento: A não ser em casos graves, que precisam de ser hospitalizados, até para minimizar
a possibilidade de suicídio, os anti-depressivos funcionam bem quebrando o círculo vicioso.
Mas a psicoterapia é desejável para tentar reorientar a personalidade e instaurar princípios de
saúde mental que sirvam de prevenção no futuro. Este é um caso em que o método não
directivo é insuficiente, e a princípio o doente precisa de ser "empurrado" para sair da sua
apatia.
NEUROSE ANSIOSA
A ansiedade é o ingrediente principal de todas as neuroses. Pode ser camuflada por diversos
mecanismos de defesa ou ser expressa directamente, provocando a neurose ansiosa. Nesta, há
sentimentos intoleráveis de apreensão, incerteza, angústia, preocupação, perigo, todos sem
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motivo real objectivo. Durante um ataque o doente pode sentir a garganta apertar-se como se
estivesse prestes a morrer, o coração e a respiração aceleram-se, pode haver transpiração
profusa, tremores, nausea, diarreia, etc. O doente sente como se há um desastre iminente, mas
não pode explicar porquê. Em casos extremos ele é tomado de pânico, perde o controle de si
prórpio e o seu comportamento torna-se bizarro.
As causas não são bem conhecidas, mas pode resultar de estímulos, situações ou eventos
aparentemente sem importância que inconscientemente lembram o doente de situações de medo
por que passou na infância. Para se proteger, reprimiu essas memórias e excluiu-as da vida
consciente. Quando o estímulo reaparece, o doente é lembrado inconscientemente da ameaça
séria por que passou, e isto dispara o ataque.
A vida do doente pode ser perturbada seriamente. A repressão em si mesma diminui o sentido
crítico do indivíduo e a sua capacidade de pensar realisticamente e tomar decisões maduras. E
o medo dos ataques, que são inesperados, limita a sua vida e torna-se intolerável.
NEUROSE HISTÉRICA
Neste tipo de neurose, conflitos emocionais causam a perda de uma função física. Exp: Menina
que teve o impulso de bater no pai por este a proibir de sair. Ficou furiosa, mas também
amedrontada pelo seu desejo de agredir o pai. Alguns dias mais tarde acorda com o braço
direito paralizado. Ela converteu o conflito num problema físico. Serve ao mesmo tempo de
auto-castigo (ganho primário) e para atrair a atenção da família (ganho secundário). Mas o
conflito básico continua até poder ser resolvido por intermédio da psicoterapia.
Casos comuns são perda da voz ou da fala, cegueira, surdez, tremores, convulsões, perdas de
sensação, tiques, etc. Geralmente o início destes sintomas é súbito e dramático, e são
desprovidos de base orgânica.
NEUROSES FÓBICAS
As fobias de certo modo são semelhantes à ansiedade, excepto por se focarem num determinado
objecto, lugar ou evento: claustrofobia -- medo de lugares fechados; acrofobia -- medo de
lugares altos; pirofobia -- medo do fogo; nictofobia -- medo do escuro ou da noite; agorafobia
-- medo de espaços abertos ou de multidões.
O doente sabe que não está em perigo real, que o seu receio é irracional, mas não o pode
controlar. Exposto ao estímulo, os seus sintomas são muito parecidos com os descritos para
um ataque agudo de ansiedade. O seu terror pode ser tão grande que ele tenha de modificar a
sua vida ou até prejudicar-se muito para evitar as situações ou coisas que receia: andar de avião
ou elevador, estar numa multidão, subir num escadote, sair de casa, etc.
A neurose fóbica é causada pelo mecanismo de deslocação: situações que ele receia e que lhe
causam ansiedade, mas que reprime do consciente, deslocando o medo para um objecto menos
importante: o objecto da fobia. A sua ansiedade é concentrada nesse objecto ou situação, e
assim pode continuar a sua vida normalmente, desde que com ele não tenha contacto ou a ele
seja exposto.
NEUROSE OBSESSIVO-COMPULSIVA
Uma obsessão é uma ideia ou pensamento que insiste em reaparecer ao nível da consciência,
foge ao controle da vontade, e pode perturbar a rotina diária do doente. Mais perturbadora ainda
é uma cumpulsão, que é uma acção ou ritual repetido constantemente para aliviar a ansiedade.
Um exemplo é a pessoa que precisa de estar sempre a lavar as mãos por causa da sensação de
estarem sujas. Se não tem à sua disposição uma casa de banho para o fazer, tem um ataque de
ansiedade. O doente sabe que não há lógica no que está a fazer, mas é impotente para controlar
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o impulso que o obriga à acção compulsiva. Esta pode tornar-se tão frequente que até o impeça
de trabalhar.
NEUROSE NEURASTÉNICA
Condição em que há uma mistura de sintomas neuróticos: sensações de pressão na cabeça e na
nuca, fraqueza e fadiga geral, sensação difusa de mal estar. A depressão em si é pouco
pronunciada, e pode levar muitos anos e muitas consultas médicas até o doente descobrir que
precisa de tratamento psiquiátrico.
NEUROSE HIPOCONDRÍACA
Semelhante à neurose neurasténica, mas a preocupação com a saúde e as doenças imaginárias é
mais predominante e severa. Os sintomas de que se queixa podem até levar a operações
cirúrgicas desnecessárias.
DESPERSONALIZAÇÃO NEURÓTICA
Consiste numa sensação de irrealidade ou de separação do seu próprio corpo ou do ambiente. É
como se o doente estivesse a ser espectador e a ver-se a si mesmo e ao seu ambiente do lado de
fora. É uma forma de negação da realidade, geralmente de uma situação desagradável, e
acontece em pessoas inseguras, mas de resto normais.
A personalidade psicopática ou anti-social não sofre de neurose ou psicose, mas com frequência
acaba por chegar ao consultório do psiquiatra, ora por sua vontade, ora obrigado pela família ou
pelas autoridades. É uma pessoa básicamente hostil e contra a sociedade. É um desajustado
social, o que o leva a acções imorais ou ilegais, praticadas deliberadamente e sem qualquer
remorso, vergonha, conflito interno ou sentido de responsabilidade. Essas acções dão-lhe
prazer, o que dificulta o redireccionamento da personalidade.
O psicopata sabe perfeitamente distinguir entre o mal e o bem, sabe as implicações dos seus
actos, mas não se importa com as consequências. Quando descoberto, admite as suas acções
mas procura encontrar desculpas para elas, para reduzir o castigo. O que o incomoda é o facto
de ser descoberto, não as más acções que praticou ou o facto de prejudicar ou causar danos a
outras pessoas.
As causas do comportamento anti-social não são bem conhecidas, mas há evidência que muitos
psicopatas provêm de lares disfuncionais ou sofreram privações emocionais em criança,
especialmente nos quatro a cinco primeiros anos de vida, pois este é o período crucial para o
desenvolvimento da consciência social.
Se a criança não tem nos pais um bom padrão de comportamento social com o qual se possa
identificar e imitar, está sujeito mais tarde a ter falhas na sua própria consciência. É necessário
um equilíbrio no amor e na disciplina por parte dos pais. Pouco amor e privação das
necessidades básicas levará a uma tentativa de gratificação imediata, sempre que possível.
Demasiada indulgência ou excesso de atenções levará ao egocentrismo e falta de consideração
pelas necessidades e direitos alheios.
Pais que roubam, mentem e vivem desonestamente causam as mesmas tendências nos filhos, que
portanto não se sentem culpados por estas coisas. Este estillo de vida pode ser passado de
geração a geração, numa sub-cultura criminosa.
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Pais que vivem vidas honestas também podem inconscientemente encorajar nos filhos um
comportamento anti-social por não castigarem as suas transgressões, acharem-lhes graça ou,
secretamente, os desculparem ou aplaudirem, embora digam o contrário.
O psicopata é um indivíduo que não se sente amado e tem pouca capacidade de amar. Tem uma
sensação de não pertença. Sente-se isolado, solitário, e muitas vezes receoso. Isto leva ao
ressentimento e à hostilidade, que se tornam mecanismos protectores da sua personalidade.
A hostilidade está presente não só no psicopata, mas também em pessoas que são psicologicamen-
te normais. Os cristãos não são excepção, e muitos vivem derrotados por albergarem raiva, ódio,
inveja e um desejo de vingança. A hostilidade pode desenvolver-se por muitos anos e tornar-se
parte integrante da personalidade. Cresce como reacção à frustração, amor próprio ferido,
negligência ou rejeição por parte dos pais ou pessoas amadas, ou uma sensação de se ter sido pri-
vado de amor nos anos formativos. Pode também ser causada por falta de oportunidades, perda de
algo ou alguém querido, ou por se ter sido privado de experiências que dão satisfação a outros.
A ira é uma reacção instintiva perante uma agressão e faz parte das reacções primárias preparando
o indivíduo para a defesa ou para a fuga. Como emoção é, portanto, involuntária, e em si mesma
não tem conteúdo moral. O problema moral surge quando a ira é incontrolada e afecta o compor-
tamento, levando à agressividade, ou quando não se permite que a ira seja dissipada.
É necessária uma certa agressividade na vida, mas esta não deve dirigir-se contra as pessoas e os
seus interesses. Na medida justa e quando dirigida na direcção apropriada, um pouco de agres-
sividade ajuda o indivíduo a avançar. Mas a hostilidade é uma agressividade mal dirigida. A
pessoa saudável é capaz de dirigir a sua agressividade para actividades sociais aceitáveis como
desportos e passatempos, e controlar a sua ira com auto-disciplina. O psicopata não o sabe
fazer.
A hostilidade no cristão pode ser tratada se ele chega a compreender as causas do seu comporta-
mento e os recursos à sua disposição através da fé. O cristão deve ser agressivo a favor de Deus,
mas não hostil ao homem. Isto não significa que ele tem de engarrafar a sua natural
agressividade dentro de si mesmo e apresentar uma máscara de passividade e doçura. O cristão
saudável deve ter estas antíteses em equilíbrio na sua personalidade, como vemos na pessoa de
Cristo.
Trabalhando com aqueles para quem a ansiedade, a hostilidade, a privação emocional, a
rejeição, têm sido problemas, devemos tentar repor a verdade do amor de Deus nas suas vidas e
dissipar os conceitos errados e ideias negativas que se têm acumulado durante anos, por vezes
durante uma vida inteira. Aceitação da pessoa, como ela é, ao mesmo tempo que ajudando-a a
compreender a sua personalidade e os seus mecanismos, aliado a uma reafirmação consistente
do amor e das promessas de Deus, é uma arma terapêutica poderosa.
O valor psicológico da fé cristã autêntica ainda não tem sido compreendido e usado até ao limite
das suas possibilidades. Deus é o Deus de toda a cura. Como disse Sir William Osler, médico
famoso do Séc. XIX: "Eu trato; Deus cura". Ele deseja que sejamos saudáveis no corpo e no
espírito, e os princípios cristãos genuínos (não muita coisa que passa por cristianismo mas é só
folclore religioso e por vezes até prejudicial e pouco saudável) são elementos básicos da saúde
mental: confiança, esperança, perdão a nós mesmos e ao próximo, deixar de olhar para as faltas
do passado e prosseguir para o futuro com uma nova atitude, o amor a Deus a nós mesmos e ao
próximo, a generosidade, a honestidade connosco mesmos e com outros, que se deveria traduzir
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por transparência e aceitação da realidade, tudo isto são princípios inestimáveis de prevenção de
perturbações mentais e de cura nos casos em que estas existem.
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O PROBLEMA DA ANSIEDADE
3. Quando sujeito ao stress da fadiga, monotonia ou enfado, realize primeiro as tarefas difíceis.
Deixe as mais agradáveis para o fim. Tome intervalos curtos para relaxar ou distrair-se.
Evite comer em excesso (para os não crentes: evite beber álcool, especialmente quando sob
stress). Estes são métodos destrutivos de fuga ao stress.
4. O trabalho pode ser adictivo. O trabalho é saudável, mas deve haver um equilíbrio entre o
trabalho e o recreio para uma vida emocional equilibrada. Desenvolva hobbies ou
interesses que lhe dêm prazer e que possa antecipar com expectativa quando o trabalho
acabar. Use bem o seu tempo: tempo para trabalhar, tempo para descansar e tempo para
brincar ou divertir-se.
5. Durma o tempo suficiente. Para o adulto, um mínimo de sete horas de sono são necessárias,
embora o ideal sejam oito horas. O adolescente precisa mesmo das oito horas. Não vá para
a cama num estado de agitação emocional, preocupação ou tensão. Esqueça os problemas
do dia e faça as pazes com o seu cônjuge antes de ir para a cama (consigo próprio também).
Evite comprimidos para dormir.
6. Fale dos seus problemas com outra pessoa. Procure o conselho de um membro da família
ou o seu ministro, mesmo que pense que eles não podem ajudar. Você poderá ficar
surpreendido. Não receie buscar ajuda profissional se for necessário.
7. Providencie para que as suas férias sejam um tempo de mudança completa da sua rotina
diária. Podem ser activas, porque o importante é que sejam diferentes. Se o médico o
aconselhar, não receie tirar uns dias de folga. É preferível perder uns dias de trabalho a
ficar profundamente doente.
8. Visite o seu médico regularmente (uma vez por ano) para verificar a sua saúde. Faça
exercício regular. Mantenha um bom peso.
9. Acima de tudo, cuide da sua vida espiritual. A confiança em Deus e no Seu cuidado, e uma
boa vida espiritual devem ser os maiores antídotos contra a ansiedade e uma fonte de
inspiração, encorajamento e conforto.
A culpa é uma sensação desconfortável. É uma mistura de muitas emoções e pensamentos que
destroem a paz interior. Em parte é o reconhecimento de que algo tem sido feito que é errado;
em parte é medo do castigo; é vergonha, mágoa ou remorso. É ressentimento e hostilidade para
com a figura de autoridade contra quem o mal tem sido praticado. É um sentimento de baixa
auto-estima e de inferioridade.
A culpa leva à alienação, não só dos outros, mas de si mesmo por causa da discrepância entre o
que uma pessoa realmente é e o que gostaria de ser. Isso leva à solidão e isolamento. Por isso a
culpa também significa depressão e ansiedade.
Em muitos casos a culpa é parcialmente verdadeira e parcialmente falsa. Todos estes factores e,
em casos individuais, muitos outros, estão emaranhados nos pensamentos conscientes e
inconscientes e nos sentimentos da pessoa que se sente culpada.
No caso do crente, a situação ainda é pior por uma separação temporária da comunhão com
Deus. No caso de culpa falsa há a crença errónea de que existe tal separação, mesmo quando
isto não é verdade.
Sentimentos de culpa são muito comuns. Não é exagero dizer que mais de metade dos crentes
com problemas emocionais sofrem de sentimentos de culpa como parte dos seus sintomas.
Muitas vezes este é o problema principal, sem que eles o saibam. Isto vem à mistura com ódio
interiorizado contra si mesmo e dificuldade em se perdoar ou receber o perdão divino.
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Muitas pessoas que não são crentes e não professam o Cristianismo também podem ter
sentimentos de culpa como origem da sua depressão, ansiedade ou baixa auto-estima. Assim
como o medo do futuro traz ansiedade, preocupação quanto ao passado e medo de qualquer tipo
de retribuição leva a sentimentos de culpa com necessidade de auto-punição.
Relação Entre a Culpa e Sintomas Físicos: A doença física é muitas vezes considerada uma
forma de punição, um produto de sentimentos de culpa por algum erro ou pecado do passado.
Falhas, desonestidade, egoísmo -- infectando a mente por anos e anos -- levam a sentimentos de
culpa que manietam e mesmo destroem a paz interior. Podem não só provocar doença física
como também impedir a sua cura, pois inconscientemente a doença é vista como um justo
castigo. Muitas vezes, se o sofrimento físico é removido por tratamento médico, aparece logo
outro problema para o substituir. Psicologicamente é mais fácil lidar com a dor física do que
com a culpa que tem sido reprimida. E muitas vezes a dor não é tanto física, mas um auto-
conceito distorcido.
Sentimentos de culpa podem fazer uma pessoa bonita sentir-se feia; inadequada em muitas áreas
quando a pessoa tem muita habilidade; fraca quando afinal é forte; inferior ou inaceitável aos
outros quando afinal os amigos a estimam e a têm em grande apreço. Até que a pessoa desperte,
ou que a psicoterapia a possa ajudar a reconhecer os seus mecanismos de defesa, não se livrará
do peso da culpa e do sofrimento por ela causado.
A Consciência e o Super-Ego: Em termos dos mecanismos psicológicos envolvidos, o
sentimento de culpa deriva da consciência ou super-ego. A consciência é o conhecimento inato
do bem e do mal, presente em graus variáveis em cada ser humano.
O super-ego, primeiramente descrito por Freud, é o componente da personalidade que se
desenvolve na infância com a finalidade de controlar o comportamento. É moldado pelas
limitações impostas e pela condenação feita pelas figuras de autoridade na vida da criança,
geralmente os pais. O seu propósito é evitar que o ego responda sem reservas às exigências do
id, a natureza básica com os seus impulsos de agressividade e de sexualidade. Tem por fim
evitar dano tanto à própria pessoa como à sociedade em que vive.
A vida demasiado livre e sem as restrições do super-ego leva a acções mais tarde lamentadas.
Mas quando se cresce num ambiente demasiado rigoroso, um lar demasiado restritivo,
desenvolve-se um super-ego demasiado forte, rígido, que não permite expressões saudáveis das
tendências naturais. São disso exemplos os grupos religiosos extremistas que pela sua excessiva
escrupulosidade levam a conflitos intermináveis: não só conflitos entre pessoas, mas também
conflitos íntimos devido a falsos sentimentos de culpa por não se poder satisfazer padrões
inatingíveis.
Culpa Verdadeira e Culpa Falsa: O psicoanalista gosta de pensar que toda a culpa é falsa pois
ele não aceita um padrão absoluto determinado por Deus. Por isso ele considera que só há actos
saudáveis, actos com que o indivíduo se sente bem, e actos que não são saudáveis ou que são
prejudiciais ao indivíduo ou a terceiros.
A base da sua terapia é fazer ao indivíduo aceitar os factos como parte do passado e sentir-se em
paz com eles. O comportamento é definido em termos relativos e não absolutos. O paciente
precisa simplesmente compreender por que se sente da maneira como se sente, e não se deixar
perturbar.
Infelizmente, esta abordagem não corresponde à verdade da natureza humana. E este tipo de
pensamento pode ser prejudicial ao cristão. Cremos que há uma grande diferença entre a culpa
verdadeira e a falsa, e temos de aprender a diferenciá-las. A culpa verdadeira é a experiência
subjectiva de alguém que tem quebrado a lei de Deus ou a lei dos homens. Não há nada falso
em relação a isso.
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Quebrar as leis de uma comunidade é um crime, e tem sanções apropriadas. O criminoso que
não foi descoberto vive no terror de o vir a ser. Quebrar as leis de Deus é chamado pecado e, a
não ser que haja arrependimento, perdão e reconciliação com Ele, é punido pela separação
eterna da Pessoa de Deus. Só o perdão e a reconciliação podem remover a culpa verdadeira. A
psicoterapia é absolutamente ineficaz (Isa. 57:20-21).
Como ministros do Evangelho, é nossa responsabilidade e prerrogativa poder apontar o caminho
da reconciliação para o peso de culpa verdadeira que muitas pessoas carregam, e apontar para o
perdão ilimitado através de Cristo. Ele é a solução para a culpa e n'Ele há verdadeira libertação.
Precisamos como Igreja ser a comunidade redentora que Deus deseja que sejamos.
Mas há muitos que carregam um peso extraordinário de falsa culpa, culpa que nada tem a ver
com os padrões divinos e provém somente de um super-ego exagerado e dos padrões
inatingíveis que outros, ou o próprio indivíduo se impôs a si mesmo. A culpa verdadeira vem da
convicção divina, a culpa falsa provém das sugestões humanas. Quanto mais dependermos dos
homens e dos seus padrões, maior o peso da culpa falsa. Quanto mais dependermos de Deus,
mais livres seremos de ambos os tipos de culpa.
Causas da Culpa Falsa: Como dissemos acima, provém de um super-ego demasiado
preponderante. Lares com exigências exageradas, pais que não encorajam os filhos mas só os
condenam, repreendem e acusam, fazem-nos crescer sem um padrão saudável. Disciplina
adequada e proporcional, remove o sentimento de culpa; mas a intransigência aumenta-o
extraordinariamente. A criança cresce com a ideia de que só a perfeição absoluta é aceitável, e
como não consegue alcançar essa perfeição, sente-se culpado e inferior.
Mesmo depois de adulto, essa pessoa ainda se culpa por tudo e por nada, por coisas que estão
completamente fora do seu controle. Levará a vida inteira tentando agradar aos outros, por
vezes até prejudicando-se a si mesmo. Não podendo abandonar esse padrão de comportamento,
ficará zangado consigo mesmo, e essa zanga se tornará em depressão. Outro mecanismo pelo
qual a depressão se pode instaurar é pela baixa auto-estima e sentimentos de inferioridade e de
pouco valor próprio. Tudo isto pode levar a sintomas psico-somáticos.
Solução para a Culpa Falsa: Precisamos repôr nas nossas mentes a verdade de Deus e dos Seus
padrões, no sentido de obter a libertação da culpa falsa. Precisamos de diferenciar entre os
requisitos divinos e as exigências do próximo, entre os absolutos de Deus e a nossa área de
responsabilidade pessoal. Ao termos consciência de não haver quebrado nenhuma das leis de
Deus (I João 3:20-21), devemos recusar a culpa falsa, a qual é uma arma poderosa do inimigo
para trazer desânimo e fracasso espiritual.
Como ministros, devemos ajudar o nosso povo a viver com os olhos em Cristo e não uns nos
outros; caso contrário, a igreja pode tornar-se uma fonte inesgotável de culpa falsa, com
consequências desastrosas para o Reino de Deus e a criação de um ambiente emocionalmente
pouco saudável para aqueles que nela vivem e se desenvolvem.
Quando alguém tem vivido por longo tempo com um super-ego exagerado e inflexivel,
habituado a interiorizar culpas falsas, levará tempo e bastante esforço a reprogramar-se e a
aprender a apreciar a vida e o que de bom Deus tem criado para a Sua criatura. Precisará de
treino e disciplina mental para recusar, à medida que aparecem, as sugestões condenatórias da
sua mente, repondo-as com as verdades das Escrituras. Precisará de perdoar a si próprio os
pecados do passado de que se tenha arrependido e recebido perdão divino; pois muito
provavelmente a lembrança desses episódios reaparecerão de tempos a tempos em termos de
auto-recriminação. Embora saiba que Deus perdoou, terá dificuldade em se perdoar a si mesmo.
O ministério do perdão é algo importante para ser feito no trabalho do altar. Devemos afirmar
aos penitentes o perdão de Deus quando o arrependimento é sincero e o coração está contrito.
Devemos realçar que, se Deus perdoa e esquece, quem somos nós para continuarmos a
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ACONSELHANDO NA DOENÇA
Quando alguém está doente, a enfermidade não afecta somente a parte física, mas todo o ser. O
doente sofre de três maneiras: física, emocional e espiritualmente. O ser humano reage como
um todo, e não podemos separar esses componentes, que se interpenetram.
O pastor precisa de ter em mente este facto para poder ministrar adequadamente.
1. Componente físico -- O doente está debilitado, pode cansar-se facilmente. As visitas não
devem ser demoradas. Não se deve conversar demasiado, nem de coisas demasiado
profundas. Devem-se evitar conversas que vão trazer preocupação ao enfermo.
Lembremo-nos que doentes são sensíveis ao ruído. Devemos falar em voz baixa e não dar
gargalhadas ruidosas. Se uma pessoa foi operada, é possível que rir lhe cause dor. Cuidado
para não lhe aumentarmos o desconforto,causando-lhe riso.
Assentar-se na cama ou encostar-se a ela, fazendo-a estremecer, pode também causar dor.
O doente pode ser sensível à trepidação de qualquer género.
Cuidado com odores. Perfumes activos ou outro tipo de odores podem incomodar quando
se está doente.
2. Componente emocional -- Este é ainda mais importante. O doente pode estar receoso pela
doença. Não sabe quando tempo vai durar e quais as consequências. Pode recear pelo
emprego, ou pelas responsabilidades no trabalho, que precisam de ser enfrentadas. Ou pelo
trabalho acumulado quando voltar.
Pode ter preocupações financeiras quanto às despesas do hospital e do tratamento. Também
por salário perdido. Preocupação com a família, especialmente se estiver internado e se
tem filhos pequenos. É um tempo de fragilidade emocional.
O doente pode estar a sentir pena de si mesmo, e esta é uma altura em que tem todo o
direito de o fazer. Pode estar ressentido pela doença, desanimado e até deprimido. É um
tempo de incerteza e de fragilidade emocional.
3. Componente espiritual -- Somos representantes de Cristo. Devemos visitar o doente nesta
capacidade, não para o entreter ou para o "distrair". A oração é sempre apropriada, e
ocasionalmente também a leitura de uma passagem que dê conforto. Devemos orar mesmo
que a pessoa esteja em coma ou inconsciente, pois é possível que oiça. Cuidado com as
conversas tidas ao pé de uma pessoa nestas condições, pela mesma razão.
Passagens que podem ajudar: Rom. 8:18-28; I Ped. 1:3-12; Fil. 4:4-13; Isa. 53:1-6; Sal.
103:1-14; Sal. 27: 1- 14; Luc. 10: 38-42; Luc. 1: 39-64
Devemos. . .
-- Falar com o doente de coisas agradáveis.
-- Ser bons ouvintes, se o doente quer falar da sua doença e dos seus problemas, mas não
prolongar nem forçar isso.
-- Procurar ter um espírito de optimismo dentro do razoável.
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-- Dar ao doente algo que lhe cause uma boa expectativa, tal como dizer-lhe quando voltaremos
para o ver. (É importante cumprir, para não o decepcionar.)
-- Ajudá-lo a evitar a preocupação -- assuntos que precisam de ser ultimados, etc. Devemos
oferecer-nos para ajudá-lo com pormenores, como trazer-lhe coisas de que precise, olhar
pela família, trazer-lhe material de leitura, etc. Como minstros, seremos alvo de maior
confiança do que outras pessoas, e o doente poderá querer confiar-nos assuntos que não
confiaria a outros.
-- Lembrar-nos que a visita não deve ser demasiado longa. Estar atentos a sinais de cansaço,
sono ou desconforto. Evitemos ter muita gente ao mesmo tempo no quarto do doente.
Também este pode ter necessidades fisiológicas enquanto estamos a visitar e ter vergonha de
dizer.
-- Se há sinais de que o doente está com dores, devemos deixá-lo logo que possível.
-- Lembremo-nos de que quando uma pessoa é admitida ao hospital, tem muitas visitas, mas
depois, se a doença é prolongada, elas começam a rarear. O nosso apoio deve ser consistente.
Não Devemos. . .
-- Falar de outras pessoas com a mesma doença, especialmente se os resultados foram maus.
-- Criticar o tratamento que está a ser feito.
-- Insistir por informação acerca da doença, ou de qual o problema do enfermo. Ele tem direito
à privacidade.
-- Trazer más notícias. Trazer-lhe as nossas próprias preocupações ou dificuldades.
-- Falar ou rir alto. Entabular grandes conversas com os outros visitantes.
-- Trazer comida ao doente, excepto com autorização do pessoal do hospital.
-- Visitar quando se tem uma constipação ou dor de garganta, pois podemos passá-la ao doente.
-- Trazer crianças ao hospital.
DOENÇAS INCURÁVEIS
Muita investigação tem sido feita quanto às reacções dos doentes crónicos, incuráveis, e
moribundos. Hoje sabemos que há um processo natural que é comum a todos, e o ministro deve
estar alertado para este processo, para ajudar o seu povo a passar por ele convenientemente.
A reacção para com as doenças incuráveis, terminais, e para com a morte, não é diferente da
reacção que o ser humano tem para com qualquer perigo, desapontamento ou perda; é só uma
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questão de grau. Saber os estádios por que passa uma pessoa, e ajudá-la a passar esses estádios,
será contribuir para a sua saúde mental e paz interior.
Quando o processo não se realiza completamente, não há verdadeira paz e o indivíduo sofre
mais do que se tivesse passado pelo processo. Isto foi primeiro estudado pela Dra. Elizabeth
Cubler Ross, que se tornou famosa pelas suas descobertas neste campo. No livro On Death and
Dying, ela descreve cinco estádios por que passam os doentes:
1. Negação e Isolamento: A mente humana faz tudo para não reconhecer e aceitar as coisas
más que estão acontecendo. Isto diz respeito ao doente em si e à família também. O
pensamento é, "Deve ser engano", "Não deve ser verdade", "Não tenho quaisquer sintomas",
"Isto deve ser tal e tal coisa... não o que estão a dizer", etc. A pessoa tem uma sensação de
irrealidade, não acredita que realmente o que está a acontecer está mesmo a acontecer.
Procede como se nada fosse, como se, ignorando o problema, ele vai desaparecer. A pessoa
não encara o problema, não age de acordo com o que sabe ser verdade.
Nesta fase, o nosso papel deve ser, gentilmente ajudar a pessoa a encarar a realidade.
Lembremo-nos de que, excepto em RARÍSSIMAS excepções, a verdade é sempre mais
saudável e preferível à mentira. A maior parte das mentiras piedosas podem parecer
piedosas, mas causam mais problemas no futuro, não são saudáveis, e roubam os indivíduos
do seu direito de saber a verdade acerca de si mesmos e do que lhes diz respeito.
Como ministros, devemos estar abertos a dizer às pessoas a verdade da sua situação, se elas
mostram um desejo de a saber; mesmo que outros a estejam a encobrir. Em Cabo Verde é
um problema delicado por causa da atitude tradicional para com as doenças incuráveis e
para com a morte, mas realmente esta é uma situação pouco saudável e que os profissionais
mellhor fariam se tentassem modificar.
O papel da família e dos entes queridos devia ser tentar levar a pessoa a encarar a realidade
com confiança em Deus, e passar pelo processo completo, chegando à aceitação e à paz.
Embora haja uma conspiração de silêncio ou de mentira à volta do doente, este muito
provavelmente, por sentir o seu estado, no fundo sabe o que está a acontecer. Mesmo com a
tendência à negação, a pessoa sabe, e ficará isolada pela mentira. Coisas que quereria saber,
não tem coragem de perguntar; coisas que quereria dizer antes de morrer, não pode. Essa
pessoa morre no isolamento emocional, e é a pior maneira de morrer, sendo enganada e
enganando os outros por ter de fingir que não sabe a verdade.
2. Ressentimento e Ira: O ressentimento pode ser dirigido a qualquer pessoa e a todos:
família, médicos, amigos, até Deus. A pessoa sente que há uma injustiça a ser cometida,
compara-se com outras pessoas que "mereciam" mais essa sorte do que ela. Sente-se traída
por Deus, se é crente fiel, especialmente se tem ideias de que Deus dá imunidade ao crente
contra os problemas que afectam os não crentes.
O nosso papel neste estádio é dar amor, carinho, e apoiar a pessoa o mais possível.
Precisamos nós mesmos de ter uma sólida teologia do sofrimento, para nos sentirmos
seguros da graça e amor de Deus, para podermos transmitir isso e não nos sentirmos
ameaçados com a revolta, hostilidade ou ressentimento para com Deus que vemos no doente
ou sua família.
Esta não é a oportunidade de repreender ou nos zangarmos com a pessoa pelos sentimentos
expressos. É sim a oportunidade de dar compreensão e empatia: "Acho que se eu estivesse
no seu caso, sentiria a mesma coisa; realmente não podemos compreender como Deus
permite que estas coisas aconteçam. Mas uma coisa eu sei: Ele nos ama pois isso Ele já
provou, sacrificando o Seu próprio Filho e não lhe poupando o sofrimento por nossa causa."
Ou então: "Deve doer muito, o que você está a sentir. Eu não sei, porque nunca passei por
algo semelhante; deixe todos esses sentimentos virem para fora. Se está zangado com
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Deus, diga-Lhe isso. Ele é um Deus de amor, e Ele certamente compreenderá os seus
sentimentos, que são bem humanos."
O problema é quando tentamos armar-nos em defensores de Deus, encontrar explicações,
dar conforto que realmente não é conforto, etc. É preferível estar com a pessoa e sofrer
com ela calado, se não sabemos que dizer, do que dizer a coisa errada. Talvez só segurar a
mão, se for apropriado (cuidado com gestos que podem ser mal interpretados entre sexos
opostos).
3. Negociação: O ressentimento começa a passar, e há um surto de energia para tentar obter
ajuda. O doente começa a pensar em coisas que pode fazer para evitar o desfecho: "Se eu
levar uma vida mais saudável, talvez o problema desapareça"; "se eu for mais fiel a Deus,
Ele me vai curar"; "Se eu usar este remédio caseiro..." (é a fase explorada pelos charlatães
e pelas panaceias universais: raiz disto ou daquilo... curou tal e tal pessoa).
Como crentes na cura divina, temos de ter muito cuidado para não estarmos a alimentar
falsas esperanças nos crentes. A atitude deve ser: "Se Deus quiser, Ele pode curar". Isto é
tudo que a fé nos dá autorização de dizer. Dizer: Eu tenho fé que este ou aquele vai ser
curado, é ultrapassar a nossa prerrogativa, pois Deus não nos garante que esta ou aquela
pessoa é curada.
Quando oramos pelos doentes, devemos sempre ter em mente que Deus é soberano, e que
pode ser Sua vontade não curar a pessoa neste mundo, mas levá-la para a eternidade.
Precisamos de não alimentar a fase da negociação, a coberto de pseudo-fé, para o doente
poder prosseguir para a fase seguinte. Se ele não o fizer, o processo ficará incompleto e não
há paz e aceitação da vontade divina.
Entre crentes, esta é a fase em que muitos ficam, e o que muitos consideram fé é
simplesmente um agarrar-se a este processo de negociação. Não só o doente passa por ele,
mas também a família, os amigos e a igreja.
Como ministros, deve ser nosso papel, enquando continuamos orando e anunciando o poder
de Deus, não deixar que se instaure uma atitude pouco saudável, com expectativas irreais.
Estas causarão mais dano à igreja e às pessoas envolvidas, quando aquilo que estamos
pedindo a Deus e de que nos convencemos a nós mesmos que receberíamos não se realiza (o
auto-convencimento não tem nada a ver com a fé, é parte da nossa fuga à realidade e do
processo de "negociar" com Deus).
4. Depressão -- Quando nada está a funcionar, a realidade começa a impor-se, e a depressão
instaura-se. O doente fica sem forças para reagir, não pode sorrir. O peso da depressão
pode ser grande. Esta vem de (1) Perdas do passado: o sofrimento por que ele já passou, e
mesmo outras perdas antigas; (2) A perda que ele vai sofrer. A pessoa está consciente do
que vai acontecer, e a perspectiva não é agradável.
Neste ponto não é nosso papel tentar animar a pessoa, pois não funciona (E. Cubler Ross).
É preferível chorar com ela, falar da perda, acompanhar a pessoa na sua dor e participar
dela. Ajudemos a pessoa a sentir que a sua depressão é absolutamente justificada.
Como ministros, há sempre uma palavra de esperança que pode ser dita, mas cuidado para
que não pereça balofa ou fácil demais. Continuemos afirmando o cuidado e amor de Deus,
e que Ele não nos desampara mesmo quando permite a tragédia. Ajudemos a pessoa a
agarrar-se à fé. Mas cuidado para que as nossas palavras não pareçam acusações indirectas
de falta de fé ou de um testemunho indeciso. Só a pessoa que está a passar pelo sofrimento
sabe a sua extensão e intensidade.
5. Aceitação -- Se o processo tem-se desenvolvido normalmente, por fim virá a aceitação. A
pessoa já não está deprimida ou zangada. Quer descansar. Encarará a morte como um
26
alívio e um descanso. Nesta fase, a família é quem precisa de muita ajuda. Eles estarão
possivelmente nalgum dos estádios anteriores, e diferentes membros poderão estar em
estádios diferentes. Por exemplo, algum pode estar em fase de negação, e outro já estar em
fase de negociação.
Durante todo o processo, mas especialmente quando o fim se aproxima, precisamos
ministrar a essa família, que também está a passar pelas mesmas fases, embora num
"horário" diferente, pois, como dissemos atrás, este processo é comum a todos que sofreram
ou sabem que vão sofrer uma perda: morte, divórcio, quebra de um namoro ou
compromisso, perda financeira, etc.
É bom também sabermos que há possibilidade de regredir durante o processo. Isto significa
que uma pessoa que já tinha passado por uma fase pode voltar a ela em qualquer altura.
Algém que já estava em negociação ou depressão, pode voltar ao ressentimento ou até à
negação. E por vezes há uma mistura, de modo que as fases não são completamente
separadas.
6. Perda prolongada dos padrões normais de comportamento: estilo de vida fora do habitual,
como o uso de álcool, vida desregrada (estes podem estar relacionados com auto-punição).
Falta de iniciativa em construir um relacionamento social normal.
7. Depressão agitada: Impossibilidade de dormir, tensão física.
A maneira como uma pessoa se relaciona com a memória dum ente querido que faleceu também
se processa em fases:
1. Idealização do falecido.
2. Imagem mais realista.
3. A tensão é liberta e a pessoa vê as coisas por um prisma correcto.
1. Não tente "mantê-los na linha": "Não chores tanto", não funciona. É melhor: "Eu sei que a
dor é muita. Isto é terrível. Não sei como consegue aguentar, só a graça de Deus".
2. Não tente distraí-los ou desviá-los do assunto. Se querem falar do assunto, deixe-os fazê-lo.
Algumas pessoas terão a necessidade de repetir as mesmas coisas vez após vez. Isto lhes dá
conforto.
3. Não receie falar do falecido, e por favor, refira-se a ele pelo nome e não como "falecido",
"que Deus tenha", etc. A pessoa não perdeu o nome por ter morrido.
4. Não tenha medo das lágrimas, suas ou dos outros. Elas são salutares, e vale mais chorar
agora do que ter uma reacção retardada e pouco saudável.
5. Deixe-os falar. O mais importante não é você saber o que dizer, mas que eles possam
expressar os seus sentimentos.
6. Não argumente.
7. Deixe-os apoiar-se em si. Eles precisam de força e você tem-na para dar.
8. Comunique, não se isole. Visite-os com frequência (Cuidado com viúvas, leve a sua
esposa, se é casado, ou outra irmã consigo).
9. Ajude com pequenas acções concretas: "Alguém a quem você quer que eu telefone?" "Já
notificou os parentes?" Pode arranjar pessoas na igreja para ajudar no funeral: homens da
igreja para carregar o caixão, senhoras para trazer comida à família, etc.
10. Ajude a pôr ordem nas coisas.
11. Deixe-os cuidar de si mesmos. "Deixe-os fazer algo por si mesmos, e estarão quase
curados. Deixe-os fazer algo por mais alguém, e estarão mesmo curados."
12. Quando as coisas serenarem, e o "público" tiver desaparecido, é quando a sua presença
será muito importante. Precisarão de conversar. Há muitos sentimentos ainda não
resolvidos. Você poderá ajudá-los a resolvê-los e a encontrar a paz.
Ele estará no céu? Esta pergunta é difícil em casos de não-crentes, ou de pessoas cuja
espiritualidade era duvidosa. Mas podemos sempre dizer: "Uma coisa que sabemos é que Deus
o ama, e ele está nas mãos de um Deus misericordioso".
DEPENDÊNCIA E CO-DEPENDÊNCIA
Definição
Qualquer substância ou elemento que rouba a pessoa da sua autonomia, e sem a qual não se
pode viver sem se instaurar um estado de profunda carência física ou psicológica: álcool,
diversas drogas, tabaco, cafeína, alimentos em excesso, relacionamentos pouco saudáveis, etc.
A noção de vício é muito mais vasta do que parece à primeira vista. Há muitos comportamentos
aceites socialmente que bem examinados são verdadeiras dependências ou vícios.
ALCOOLISMO E DROGA
Colocados na mesma categoria. O álcool é uma droga, a mais usada no mundo. Efeitos
semelhantes, mas mais lentos. Contudo grandemente desastrosos quando se instaura a
dependência. Nos E.U.A. constitui o problema mental mais comum:
-- 6 vezes mais frequente do que o cancro
-- 11 vezes mais frequente que a tuberculose
-- Economicamente: gasta-se mais em álcool do que em gasolina para automóveis. Metade
da população usa o álcool.
A Dinâmica da Dependência
O álcool causa uma sensação de bem-estar, de euforia, a pessoa está no topo do mundo, tudo é
côr-de-rosa; as inibições caem, desaparecem os complexos, e o indivíduo sente-se todo
poderoso. Há um relaxamento agradável, uma sensação de calor humano, os companheiros
formam uma grande irmandade. Esses efeitos são tanto mais pronunciados quanto maior a
predisposição para o abuso.
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O álcool começa a ser usado pelas sensações boas que provoca. Os efeitos repetem-se mas, com
o andar dos tempos, as doses têm de ser aumentadas para conseguir os mesmos resultados. Mas
depois de passar o efeito, começa a vir uma sensação desagradável: desconforto físico, a
"ressaca"; desconforto emocional, sentido de desaprovação pessoal e social. O indivíduo
começa a lançar mão da racionalização para desculpar o seu comportamento, e vai perdendo a
objectividade. Entretanto, descobre que o desconforto é curado por nova dose do veneno, o que
provoca um ciclo vicioso de conforto e desconforto. Estabeleceu-se a dependência, o indivíduo
não consegue deixar de beber em excesso.
O alcoólico não tem de passar a maior parte do tempo embriagado para ser considerado
alcoólico. Um alcoólico é um indivíduo cujo hábito de beber interfere frequente ou
contínuamente com aspectos importantes da sua vida (suas rotinas, trabalho, etc.), ou suas
relacões interpessoais.
Noção de Co-Dependência
Co-dependência é o termo usado para designar a doença e o conjunto de alterações emocionais
que afectam os que convivem com o alcoólico. Destes, o cônjuge e os filhos são os mais
afectados. Sofrem pelas consequências directas: perda de emprego do alcoólico, esbanjamento
do salário, estigma social, perda de amigos e do relacionamento social normal. Sofrem também
pelas consequências indirectas, derivadas do próprio comportamento do alcoólico:
imprevisibilidade, mudanças de humor e de temperamento, abuso verbal e físico,
irresponsabilidade, ansiedade pelo bem-estar, saúde ou segurança do alcoólico, etc.
Nos últimos anos, esses efeitos, especialmente sobre os filhos do alcoólico ou crianças que
vivem no mesmo agregado familiar, têm sido estudados em profundidade e muitos bons livros
têm sido escritos sobre o assunto.
A Dinâmica da Co-Dependência
Os filhos (e também cônjuges) do alcoólico têm em comum uma baixa auto-estima. Isto não é
de surpreender, uma vez que as condições necessárias para desenvolver na criança uma auto-
estima saudável: (1) afecto ou calor por parte dos pais; (2) limites claramente definidos; (3)
tratamento respeitoso, estão ausentes ou são inconsistentes no lar em que existe alcoolismo,
violência, ou abuso de qualquer ordem.
Nos lares onde há alcoolismo, o comportamento do alcoólico está afectado pela substância, e
afecta directamente as crianças; e o comportamento do progenitor não alcoólico está afectado
pela sua reacção ao alcoólico, sobrando pouca energia emocional para a satisfação consistente
das necessidades das crianças, que assim se tornam vítimas inocentes da situação. Portanto, são
duplamente prejudicadas: pelo comportamento do próprio alcoólico e pelo comportamento do
cônjuge não alcoólico que por seu lado está também está afectado pelo primeiro.
É no relacionamento normal entre pais e filhos que estes encontram a sensação de segurança,
auto-estima, e capacidade de lidar com os complexos problemas emocionais que vai
encontrando. As crianças desenvolvem confiança em si mesmas, iniciativa, e a habilidade de
enfrentar a adversidade se são tratadas com respeito e encontram um sistema de valores,
exigências e directrizes consistentes. O desenvolvimento da auto-confiança vem de um
ambiente bem estruturado, com exigências adequadas, em vez de um ambiente permissivo e
plena liberdade de explorar tudo sem direcção.
As crianças com uma boa auto-estima consideram-se pessoas com êxito, não têm medo de
enfrentar a vida, estão livres de ansiedade e de sintomas psico-somáticos e podem
realisticamente avaliar as suas habilidades. Têm confiança em que os seus esforços serão bem
sucedidos, embora tenham consciência plena das suas limitações. Pessoas com uma boa auto-
estima são abertas, relacionam-se bem socialmente e esperam ser bem recebidas. Aceitam bem
os outros e geralmente são aceites por eles.
Por outro lado, os indivíduos com uma auto-estima baixa ficam facilmente desencorajados e
deprimidos. Sentem-se isolados, que não são amados e que não podem ser amados. Não
conseguem exprimir-se bem. Estão tão preocupados com a sua auto-imagem, e o seu nível de
ansiedade é tão elevado, que a sua capacidade de auto-realização é muito baixa.
O filho do alcoólico ou vítima de ambientes abusivos não consegue mudar a sua baixa auto-
estima ou a percepção que tem de si mesmo; isto, a despeito da sua idade, capacidade,
instrução, cargos desempenhados, situações de proeminência, etc. Este estigma acompanha-o
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pela vida fora, até que haja alguma forma de intervenção. A maneira como ele se vê a si mesmo
não muda e não é influenciada por circunstâncias positivas que a vida lhe possa oferecer.
Por causa de tudo o que ficou dito acima, os adultos filhos de alcoólicos têm algumas
características em comum que determinam o seu comportamento:
1. Intimamente, perguntam-se a si mesmos o que é um comportamento "normal". Falta-lhes
um padrão, pontos de referência.
2. Têm dificuldade em seguir um projecto do princípio ao fim. Falta-lhes consistência.
3. Podem ter a tendência de mentir, quando seria igualmente fácil dizer a verdade.
4. Julgam-se a si mesmos sem misericórdia, isto é, são duros para consigo mesmos.
5. Têm dificuldade em divertir-se ou sentir-se relaxados ou gozar um tempo agradável.
6. Tomam-se a si mesmos demasiado a sério. Não sabem rir-se de si mesmos.
7. Têm dificuldades em estabelecer relações de intimidade. Relações amorosas podem ser um
desastre, caracterizando-se por muitas tentativas falhadas ou medo de encetá-las.
8. Reagem a mudanças sobre as quais não têm controle.
9. Constantemente procuram a aprovação e a afirmação dos outros. Precisam disso por causa
da sua insegurança.
10. Geralmente sentem que são diferentes das outras pessoas.
11. Ou são super-responsáveis ou super-irresponsáveis.
12. São extremamente leais, mesmo em face da evidência que tal lealdade não é merecida.
13. São impulsivos. Tendem a comprometer-se com acções em que não pensaram seriamente,
sem considerar alternativas ou consequências. Essa impulsividade leva à confusão,
desagrado consigo mesmos, e perda de controle sobre o seu ambiente. E causa uma gande
perda de energia para tentar endireitar as consequências.
Estas características que temos visto acompanham os adultos filhos de alcoólicos pela vida fora,
estigmatizando-os e muitas vezes roubando-lhes a capacidade de serem felizes; a não ser que,
conscientes de que têm um problema, procurem ajuda profissional.
O PROBLEMA DA DROGA
Tudo que se disse para o álcool aplica-se também à droga, multiplicado cem vezes. O que
chamamos droga são substâncias mais potentes, com um grau de habituação muito mais rápido.
Algumas substâncias podem escravizar ao serem usadas pela primeira vez.
Há um mito de que certas drogas podem ser controladas e as pessoas podem usá-las ou não a seu
bel-prazer, mas a verdade é que são elas que controlam as pessoas.
A apetência pela droga e a necessidade imperiosa do seu uso -- a carência física e emocional que
provocam se a dose habitual não é usada, com necessidade de a aumentar com o tempo, leva a
todas as espécies de problemas sociais -- roubo, prostituição, homicídio -- pois é preciso custear
o hábito a todo o custo. Os valores começam a ficar distorcidos. A necessidade da droga torna-
se o que há de mais importante no mundo -- mais do que estudos, emprego, família ou outros
entes queridos.
Entetanto o corpo e a mente são arruinados muito mais rapidamente do que pelo álcool. Toda a
vida é prejudicada. A parte emocional deteriora-se. Aliás, as pessoas que indulgem nestes
comportamentos muitas vezes são filhos de alcoólicos ou provenientes de lares disfuncionais e
que, por esse mesmo motivo, já tinham problemas emocionais mais ou menos graves. O que o
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Prevenção e Ajuda
O que pode a Igreja fazer para ajudar a evitar que os jovens sejam atraídos e enfeitiçados pela
dependência?
Em primeiro lugar, estamos no caminho certo quando colocamos perante o nosso povo o ideal
da abstinência total quanto ao álcool e drogas. Já vimos que uma pessoa pode ficar dependente
da droga a primeira vez que a usa. E numa cultura em que o álcool é tão usado socialmente,
sendo a base da maior parte das celebrações sociais, todos os que têm a propensão genética, uma
vez expostos, terão a possibilidade de vir a ser alcoólicos.
Precisamos de educar mais o nosso povo e simpatizantes nas razões das nossas regras de
disciplina. Precisamos de alertar os nossos jovens e falar mais destes assuntos e de outros que
ainda são um pouco tabú no nosso meio. Precisamos de informar e esclarecer seriamente.
Mas também precisamos de trabalhar no "terreno", ajudar o nosso povo a ganhar a força interior
que servirá de antídoto contra a tentação. Neste ponto, o melhor caminho é ajudar os nossos
jovens com o problema da insegurança. Para isso precisamos de ajudá-los a criar uma imagem
saudável de si mesmos, caracterizada pela auto-estima numa perspectiva cristã -- indivíduos de
valor, úteis, amados, porque Deus assim afirma na Sua Palavra. Indivíduos especiais, criados à
imagem do Criador, para uma vida digna e que reflicta a glória de Deus. Precisamos de criar
nos nossos jovens um desejo de excelência que não aceite nada menos do que essa dignidade que
Deus quer ver em cada ser humano. Em vez de os diminuir, devemos ajudá-los a desenvolver
todas s suas potencialidades e dar-lhes um ambiente em que possam encontrar uma pressão de
grupo positiva que os ajude a manter-se na senda do bem nesses anos formativos em que é tão
fácil sucumbir à influência dos companheiros.
Quando estudámos os problemas mentais vimos que um dos principais segredos da saúde ou
higiene mental é uma aceitação e vivência da realidade. O indivíduo que tem paz interior é
aquele que se conhece a si mesmo e vive em contacto com a sua realidade, não só interior, mas
também com a realidade que o rodeia.
CONHECIMENTO DE SI PRÓPRIO
Infelizmente, no desenvolvimento da personalidade, várias barreiras são criadas ao auto-
conhecimento. Os mecanismos de defesa que estudámos anteriormente mais não são do que
atitudes inconscientes que tendem a proteger a personalidade em situações de desvantagem ou
sofrimento. Ao desenvolver-se a criança, quando o ambiente é agreste, ou quando ela percebe
esse ambiente como sendo agreste, inconscientemente lança mão desses mecanismos para evitar
que o seu eu seja demasiado ferido ou possa ser destruído.
Um exemplo do que acima foi dito é a criança que sofre privações excessivas, emocionais ou de
outra ordem: pode abrigar-se no sonho, no devaneio, sonhando acordada e imaginando que a
situação é diferente (escape). Com a prática, ela acostuma-se a evadir a realidade. Como adulta,
ela viverá num mundo de fantasia, sempre alheia às verdadeiras circunstâncias que a rodeiam,
com atitudes por vezes bem inapropriadas, reconhecidas por todos à sua volta menos por ela,
pois é incapaz de ver a realidade em que está inserida..
Se examinarmos um por um os mecanismos de defesa, vemos que todos têm por traço comum o
facto de não corresponderem à realidade. E é o uso continuado e exagerado desses mecanismos
pela vida fora que causa problemas a nível pessoal e também de comunicação, a nível interpes-
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soal. Para obter uma personalidade equilibrada e bom relacionamento interpessoal, é essencial,
portanto, estar em contacto e harmonia com a realidade interior e a realidade exterior: viver e
dizer a verdade tanto em relação a si próprio como ao mundo que o rodeia.
Quando lançamos mão dos mecanismos de defesa, estamos a deixar que um número de inverda-
des entrem nos nossos esquemas mentais. Na verdade, esses mecanismos, como vimos acima,
são todos compostos de falsidades que foram usadas como protecção. A criança negligenciada,
por exemplo, ainda não tem maturidade para reconhecer o que se passa à sua volta, e ser-lhe-ia
impossível dizer: "Meus pais são duas pessoas imaturas e incapazes de atender às minhas neces-
sidades." Ao invés, o que ela inconscientemente diz a si mesma é: "Algo deve estar errado
comigo para que meus pais não queiram dar-me o que eu preciso". E assim desloca a frustração
contra os pais para si mesma, lançando a semente da baixa auto-estima.
Quando a personalidade tem sido bastante agredida, o processo de readquirir paz e harmonia
interior tem de passar pelo caminho penoso de "desprogramar" todas essas falsidades que têm
sido "programadas" no nosso sistema, e substituí-las com a verdade. Como cristãos, temos uma
fonte inesgotável de ajuda na Palavra de Deus, se a soubermos usar bem, pois ela é a Fonte da
Verdade. Cristo disse: "Conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará" (João 8:32). Ele é a
verdade. E a igreja e os ministros bem farão em treinar o povo em reconhecer a verdade, viver a
verdade, dizer a verdade a si próprios e aos outros, essas verdades emocionais que todos temos a
tendência de escamotear e ocultar de nós mesmos.
Exemplos de Falsidades Que Repetimos a Nós Mesmos e Como as Corrigir (na maior parte das
vezes esse diálogo traduz-se mais por sentimentos negativos do que por palavras. Mas precisa-
mos descobrir o conceito errado por trás do sentimento negativo, para o podermos corrigir, já
que o sentimento é fruto do conceito, e não o contrário):
"Sou um falhado e não valho nada" (impotência e incapacidade). A verdade é que aos olhos de
Deus não há falhados. As coisas podem não me ter corrido bem, mas há sempre a possibi-
lidade de tentar outra vez e fazer algo diferente na vida. Com a ajuda de Deus eu posso
mudar o curso da minha vida.
"Sem uma relação amorosa, a vida não tem sentido" (necessidade de amor romântico, sensação
de se ser uma pessoa incompleta). A verdade é que o sentido da vida não deve estar fora de
mim, mas no meu relacionamento com Deus e na minha estabilidade interior.
"Se o meu marido (ou esposa) fosse assim ou assado, eu seria então feliz" (necessidade de con-
trole; sensação de que a felicidade depende do que os outros fazem) – A minha felicidade
depende de mim somente, não dos outros. Não preciso de os controlar. Não os posso
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mudar, mas posso controlar os meus estados de alma e ser uma pessoa feliz. Sou
responsável por mim mesmo e pela maneira como reago aos outros e como me sinto.
"Se eu cantasse como a minha irmã, as pessoas gostariam mais de mim" (sentimento de
inferioridade por comparação com outros) – O meu valor pessoal não depende do que
posso ou não fazer, mas do meu carácter. Habilidades ou talentos não definem quem eu
sou, e não devo estar a comparar-me com os outros. Vou ser quem Deus quer que eu seja.
Se Ele quisesse que eu fosse cantora ter-me-ia dado uma boa voz.
"Eu não consigo fazer nada certo" (exageros e generalizações depreciativas). Já cometi um erro.
Bem, isto quer dizer que não sou perfeito, o que eu sei muito bem. Mas vou ter cuidado
para ver se não erro outra vez. Mas se mesmo assim acontecer, não é o fim do mundo.
"Não vou aceitar esta tarefa porque é difícil. Se eu falhar será terrível, pois vão pensar mal de
mim" (medo de falhar / preocupação com a opinião alheia) Se eu não tentar nunca saberei
se poderei fazer ou não este trabalho. Se eu falhar, não é terrível. Terrível é nunca tentar
com medo de falhar.
"Eu não posso desagradar a esta pessoa, pois ela deixará de gostar de mim. Especialmente,
como cristão, isso seria terrível" (necessidade de agradar). Eu tenho de fazer o que é certo.
Se esta pessoa não gostar quando estou a fazer o que é certo, o problema é dela. Não posso
tomar sobre mim a responsabilidade de agradar a toda a gente e tentar fazer que todo o
mundo goste de mim. Aliás, mesmo que eu tentasse não conseguiria. Nem sequer Cristo
conseguiu!
"A minha namorada / esposa / marido não faz automaticamente o que me agrada, portanto não
me ama de verdade” (sentir-se rejeitado por as nossas necessidades não serem automati-
camente supridas por outros). O amor não dá a ninguém o dom de clarividência para
saberem o que nos agrada. Só pela comunicação poderemos saber o que agrada um ao
outro. Eu não posso esperar que o meu. . . adivinhe o que eu quero. Vou pedir-lhe!
"Eu sou como sou e não vou mudar" (se mudar deixo de ser quem sou). Deus dá-me a capa-
cidade de reconhecer os meus erros e defeitos e poder melhorar. Eu vou usar todas as
oportunidades de tentar melhorar não só pessoalmente, como também o meu
relacionamento em família /trabalho / igreja, etc.
"Eu sei que tenho peso a mais, mas não posso passar sem. . . (necessidde absoluta de qualquer
coisa: sensação de sofrimento se privado de qualquer coisa – dependência). Fui criado para
ser livre, e não me devo deixar dominar por qualquer coisa. Posso viver sem isto. Um dos
frutos do Espírito é a moderação e eu devo aprender a ser moderado (a) no que como para
bem da minha saúde. (Aplica-se a café demais, chá, coca-cola, etc. etc.)
"Preciso de ter os meus desejos satisfeitos. Se me contrariam, significa que não gostam de mim”
(rejeição por os outros não fazerem o que eu quero) O amor, a amizade ou o apreço mútuo
não significa que os outros têm de concordar comigo e fazer o que eu quero. Na vida
haverá muitas alturas em que as coisas não serão como eu quero, mesmo quando eu tenho
razão. A minha satisfação não depende de os outros fazerem o que eu quero ou
concordarem comigo.
Todos nós conhecemos a cena: O marido entra e a esposa está amuada. Ele nota-o logo à
entrada da porta. Pergunta: --"Aconteceu alguma coisas? Estás aborrecida?" -- "Eu? Não, que
ideia!" Mas esquiva-se ao beijo que ele lhe quer dar e com maus modos atira o avental para
cima de uma cadeira. Há mais de uma hora que ele devia ter chegado, o almoço está frio, ela
vai ficar atrasada para uma reunião que tem nessa tarde. Sente-se miserável e acha que ele não
tem consideração por ela! No entanto é incapaz de exprimir o que sente. Distraído, ele não
prossegue a conversa, engole o almoço rapidamente sem qualquer explicação acerca do atraso.
Ela sai a correr para a reunião. Quando se encontam à noite o ambiente é tenso. Ao mínimo
reparo, ela explode. Na frustração, as coisas são exageradas, e o que é dito está muito longe de
corresponder à realidade. Há um duelo de palavras na tentativa de cada um provar que tem mais
razão de queixa do que o outro. O amor é ferido. Duas pessoas conseguiram fazer-se
miseráveis, desnecessariamente. . . se tão somente soubessem comunicar.
A maior parte das pessoas, mesmo pessoas de boa moral e até crentes, andam à volta da verdade
sem saber ou poder comunicá-la. Mentiras ou meias verdades são ditas sem nos apercebermos
delas; por vezes, o que é pior, são ditas intencionalmente, por hábito ou por conveniência, para
protecção do eu, criando uma barreira entre as pessoas e alienando-as umas das outras.
Como vimos anteriormente, o primeiro passo a dar para a boa comunicação é aprendermos a
dizer a verdade a nós próprios. Deixarmos de culpar outros pelos nossos problemas, assumir a
responsabilidade do que fazemos e sentimos, deixar de nos culpar por coisas pelas quais não
somos culpados, enfim, sendo honestos conosco mesmos através do nosso diálogo interno.
O segundo passo para a boa comunicação é saber dizer a verdade uns aos outros. Assim como a
verdade dita a nós mesmos é libertadora e necessária à higiene mental, a verdade entre as
pessoas cria um ambiente são, evita feridas e leva a um aprofundamento no relacionamento e à
verdadeira intimidade. Realmente, não há intimidade espiritual nem emocional sem a verdade.
Toda a amargura, e ira, e cólera, e gritaria, e blasfémias e toda a malícia seja tirada de
entre vós. Antes sede uns para com os outros benignos, misericordiosos, perdoando-
vos uns aos outros, como também Deus vos perdoou em Cristo.
Deixar a mentira e falar a verdade significa ser honestos em tudo que dizemos, e dizer
exactamente o que desejamos dizer, em comunicação franca e honesta. Em vez disso, muitas
pessoas:
1. Nunca expressam exactamente os seus desejos.
Muitos só se expressam com rodeios que tornam impossível saber-se exactamente o que
desejam ou o que pensam. Mas depois ficam aborrecidos se não se corresponde ao que
querem.
2. Usam perguntas para mascarar desejos que devem ser expressos abertamente.
"Não gostarias de ir dar um passeio?", realmente exprime: "Eu gostaria de ir dar um
passeio e gostaria que fosses comigo". Perguntas devem ser usadas quando precisamos
de informação sobre um assunto e não para exprimir desejos. Estes devem ser
expressos aberta e honestamente.
3. Usam tu quando deviam usar eu.
"Tu podias ir ao culto hoje", devia ser: "Eu gostaria que fosses ao culto hoje."
4. Tentam fazer outrem sentir-se culpado para conseguirem o que querem (manipulação).
"Tua tia pode morrer sem a veres." "Se eu fosse importante para ti. . .”
5. Usam adjectivos, rótulos e expressões que diminuem a pessoa.
"Tu és desimportado." "A família pra ti está sempre em último lugar."
6. Usam linguagem que significa obrigação ou necessidade moral em vez de um simples
pedido.
"Devias ir já fazer o almoço". "Devias ir visitar a Tia Augusta".
7. Não exprimem sentimentos positivos em relação à outra pessoa.
Precisamos de aprender a exprimir gratidão, apreço e admiração uns para com os
outros, especialmente nos relacionamentos que são estreitos. Fazêmo-lo para os de fora
mas muitas vezes não para os que se relacionam de perto connosco.
8. Comunicam por acções e não por palavras.
Portas espancadas, gestos bruscos para mostrar desagrado, nunca deviam substituir a
comunicação verbal adequada para se dizer o que se sente.
Muitos problemas de relacionamento vêm do facto de muitas pessoas pensarem sinceramente que:
Nunca devem dizer o que sentem ou pensam a não ser que seja positivo e agradável aos
outros.
Nunca devem dizer "Eu estou magoado".
Nunca devem dizer "Eu estou zangado".
Nunca devem dizer "Eu estou a sentir-me inseguro ".
Nunca devem dizer "Eu estou confuso".
Nunca devem revelar os seus temores e insuficiência. Antes, devem sempre parecer em
controle da situação. Pensam que se outros conhecessem esses sentimentos de insegurança
perder-lhes-iam o respeito.
Nunca devem usar a palavra eu por ser egoísta e egocentrista.
São os únicos que têm sentimentos negativos.
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fazer). A manipulação diz: "Eu gostaria que Maria fizesse isto, mas se eu lhe pedir ela nunca
vai concordar. Portanto tenho de encontrar uma maneira de ela o fazer sem eu lhe pedir".
O problema com a manipulação é que é uma tentativa de controlar os outros sem honestidade e
sem termos o direito de o fazer. Deus e só Deus tem o direito de controlar outros adultos, e Ele
mesmo respeita o seu direito de escolha.
Há várias maneiras de manipular os outros: pela criação de falsa culpa, por declarações que
implicam obrigação ("devias..."), pela ocultação de factos, por meias verdades, pelo uso de
terceiras pessoas, etc. Invariavelmente, a manipulação destrói a intimidade, pois é a negação da
verdadeira intimidade. Cria ressentimentos quando a pessoa reconhece que foi manipulada.
Também cria um clima de falta de confiança, pois a pessoa que foi manipulada uma vez fica
com receio de o ser outra vez pelo mesmo indivíduo. Essa pessoa fica sempre no alerta, e assim
levanta-se uma barreira à comunicação.
Precisamos de aprender a pedir o que queremos directamente, e há 3 boas razões para isso:
(1) Saber pedir polidamente o que queremos é a maneira de falar a verdade em amor:
(2) O relacionamento íntimo entre as pessoas só se pode desenvolver se elas aprenderem a
expressar claramente o que desejam.
(3) Quando o comportamento de alguém nos incomoda, é importante sabermos pedir que esse
comportamento pare ou seja modificado. Só assim poderemos relacionar-nos bem.
3. Dizer sim quando se quer dizer não. Há pessoas que se sentem culpadas por dizer não,
por isso muitas vezes dizem sim, quando gostariam de dizer não; só para ficarem depois
zangadas consigo mesmas. São pessoas que vivem sobrecarregadas por exigências feitas por
terceiros: família, amigos, igreja, etc. Não ousam desagradar ou contrariar alguém
abertamente, não sabem dizer não, mesmo quando reconhecem que o que se lhes está a pedir
não é justo ou razoável.
É interessante que as pessoas que assim procedem muitas vezes têm um mau relacionamento na
intimidade. Por violarem constantemente a sua vontade têm uma baixa auto-estima,
descontando com um comportamento muito abaixo do ideal naqueles que lhes estão perto e com
quem não fazem cerimónia ou a quem não sentem necessidade de agradar.
Muitas vezes são pessoas infelizes, mal humoradas, deprimidas, que se sentem miseráveis,
embora o resto do mundo (fora da intimidade) pense que são pessoas extraordinárias pois estão
sempre de acordo com tudo que se quer delas, e fazem tudo que se lhes pede.
Há uma ideia nalguns círculos religiosos de que devemos sempre procurar agradar aos outros e
não nos opôr a ninguém ou causar desagrado, mesmo quando o seu procedimento não é correcto
para conosco. Nada está mais longe da verdade. Devemos, sim, dizer a verdade em amor. Isto
nos levará muitas vezes a desagradar aos demais. Mas foi isso mesmo que Cristo fez (João
118;23). Se a Sua preocupação tivesse sido agradar, nunca teria ido à Cruz. Ele soube
corresponder aos pedidos de milhares de pessoas, mas também soube dizer não quando os
pedidos não deviam ser correspondidos: Lucas 12:13-14, Mar. 8:33.
4. Ir pelo mundo fora dizendo aos outros os seus defeitos e problemas. Não temos sido
colocados neste mundo para o endireitar, e Deus não nos tem delegado a responsabilidade de
modificar o nosso semelhante.
Pessoas há que na ânsia de dizer a verdade pensam que lhes cabe o ministério de denunciar todo
o mal que vêm nos outros. Isto é orgulho espiritual, presunção e muitas vezes juízo infundado.
Há situações em que pessoas podem beneficiar do nosso conselho ou ajuda, mas devem ser elas
a pedi-lo. A não ser que a situação nos diga respeito, não temos o direito de chegar para acusar,
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Devemos lembrar-nos que a lei do amor não inclui necessariamente satisfazer os desejos ou
caprichos dos outros. Por vezes, até, o amor manda que lhes resistamos. Muitos dos "deves" ou
"devias" que nos dizem não são mais do que desejos que nos são dirigidos indirectamente e que
nada têm a ver com a vontade divina para as nossas vidas: a única lei a que realmente estamos
sujeitos. Devemos saber distinguir quando os desejos dos outros são verdadeiras necessidades,
as quais, não as satisfazendo, violamos a lei do amor, ou quando são meras conveniências ou a
tentativa de imposição dos seus desejos a nós; neste caso somos livres para escolher aceder a
eles ou não, conforme preferirmos, sem um sentimento de obrigação.
É interessante que a prática da oração baseia-se no princípio de pedir directamente. Tanto Jesus
como Paulo estimularam o hábito de pedirmos a Deus o que precisamos: "Pedi e dar-se-vos-á,
buscai e achareis, batei e abrir-se-vos-á" ( Luc. 11:9); "Não estejais inquietos por coisa alguma:
antes as vossas petições sejam em tudo conhecidas diante de Deus. . .(Fil. 4:6). Semelhante-
mente, Tiago acusa os crentes de não receberem por não pedirem, ou pedirem de modo egoísta:
". . . nada tendes porque não pedis; pedis, e não recebeis, porque pedis mal, para o gastardes em
vossos deleites" (4:2b-3)
O que se aplica ao nosso relacionamento com Deus aplica-se também neste caso ao nosso
relacionamento com o próximo. Precisamos de aprender a pedir o que desejamos, a ser
razoáveis nos nossos pedidos, a pedir directamente, e a saber aceitar uma recusa se a pessoa a
quem pedirmos algo não quiser fazer o que pedimos. É o seu direito, e isso geralmente não tem
nada a ver com a amizade ou o amor.
Antes de terminarmos este ponto, precisamos de uma nota de bom senso: claro que não
podemos nem devemos sempre expressar todos os nossos desejos. Muitas vezes isso não é
apropriado. Se alguém nos convida para jantar em sua casa, ao servir-nos a refeição, não
podemos dizer-lhe: "Eu preferia que me fizesse um bife". O que temos estado a tratar é de
satisfazer imposições alheias ou sufocar os nossos desejos por não os sabermos expressar,
esperando que os outros os adivinhem, trazendo muita frustração à nossa vida e tensão ao nosso
relacionamento.
2. Saber dizer não e recusar ser manipulado. Esta é a contrapartida do ponto anterior.
Quando falamos a verdade em amor, devemos sentir-nos livres para dizer não quando não
queremos algo, e também estar alerta para não sermos manipulados. Isto não significa que
vamos fechar-nos aos outros e virar as costas às suas necessidades genuínas e desejos válidos.
Mas podemos e devemos resistir pedidos que são meras imposições e caprichos de pessoas que
nos tentam manipular para fazermos o que querem que façamos, e que não temos o mínimo
desejo de fazer. Nestas alturas, a solução é simplesmente dizer não.
Quantas pessoas se encontram apanhadas por compromissos que não têm o mínimo desejo de
satisfazer, por não terem dito "não" a alguém que os encurralou num beco sem saída: "Tens
alguma coisa para fazer no domingo à tarde?" E depois de terem respondido negativamente e
ouvirem o convite, percorrem freneticamente todos os caminhos do seu cérebro em busca de
uma desculpa que os livre do compromisso iminente; só por não saberem dizer honestamente:
"Desculpa, mas eu prefiro não aceitar o teu convite. Fica para outra oportunidade".
Quando alguém é manipulado, fica uma sensação desagradável, porque a cedência involuntária à
manipulação viola a vontade do indivíduo; isto causa um ressentimento inconsciente que corrói
o relacionamento. Há muitas maneiras de recusar ser manipulado, mas todas se baseiam em
clarificar as coisas antes de dizer "sim"; e exprimir directamente o que sentimos, não acedendo
a algo com que não estamos de acordo.
3. Procurar ver o que há de verdade na crítica contra nós e admiti-lo abertamente.
Quando falámos de atacar e defender-se, deixámos para apresentar mais tarde a solução para o
caso de sermos atacados. Devemos lembrar-nos de que a crítica contra nós pode ter fundamento
e, portanto, não a devemos desprezar. Ao invés, devemos tentar ver o que há de verdade na
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crítica, para podermos melhorar. Por isso o primeiro passo é saber escutar o que a outra pessoa
está a dizer, e ver se há algo de verdade nisso. Neste caso, devemos admiti-lo abertamente, o
que clarificará a situação. Parte de dizer a verdade em amor é justamente saber dizer: "Tem
razão, eu enganei-me". Quando, embora conscientes de que nos enganámos ou falhámos,
tentamos justificar-nos, estamos a faltar à verdade e a tentar camuflar o nosso erro. A melhor
maneira de desarmar a crítica é concordar com ela em tudo que tenha de válido.
4. Aprender a expressar directamente quando estamos magoados ou aborrecidos por
causa do comportamento de alguém para conosco. Confrontar alguém com um procedimento
que nos é ofensivo é para a maioria das pessoas muito difícil. Mas esta é uma tarefa espinhosa
mas necessária ao bom relacionamento: seja de patrão-empregado, colegas entre si, familiares,
etc.
Sempre que haja qualquer tipo de relacionamento: profissional, de amizade, sentimental, etc.,
situações podem surgir que precisam de esclarecimento, em que as pessoas se podem magoar
umas às outras, e em que têm de definir os limites do que desejam na maneira de serem tratadas.
Quando o patrão usa linguagem imprópria para se dirigir aos empregados, é altura de calma e
respeitosamente estes lhe fazerem saber o que sentem com tal tratamento, e que desejam que ele
pare o tratamento inadequado. Semelhantemente, quando o empregado não está cumprindo o
seu dever, é altura de o patrão o confrontar com o facto e pedir que o dever seja cumprido.
Podemos transpôr estes dois exemplos para centenas de casos em que o melhor é honesta e
directamente exprimir os nossos sentimentos.
ACONSELHAMENTO PRÉ-MATRIMONIAL
Filhos de lares disfuncionais (atenção a lares de pais solteiros, lares onde haja ou
tenha havido alcoolismo ou abuso de qualquer espécie).
Valores nos lares de origem: morais, espirituais, etc.
Condições financeiras que podem causar atitudes diferentes no futuro.
Nivelamento social.
II. Auto-imagem (Como se vêem a si próprios. Auto-aceitação ou não)
III. Como o outro é visto. Realismo ou idealização do outro. (Consciência dos defeitos
próprios e mútuos). Atenção ao perfeccionismo.
IV. Conceito de família: como cada um "vê" a sua futura família funcionando (Realismo ou
idealização):
Dependência: Círculos separados ou círculos sobrepostos. Interesses comuns.
Divisão de trabalho no lar. Ambos trabalhando fora de casa?
Expectativas: Conceito de submissão. "Hidden agenda" ("agenda oculta").
Conceito de felicidade.
V. Comunicação: Existe boa comunicação? Sabem comunicar tanto os pontos positivos
como os negativos? Ajudar a desenvolver melhores técnicas de comunicação.
Abertura e honestidade. Saber dar e receber amor.
VI. Sexualidade: Nível de compreensão, abertura para discutir receios, quaisquer perguntas.
Planos quanto a filhos, contracepção.
VII. Finanças: Avaliar atitudes para com o dinheiro. Planear um orçamento (Ideia realista do
custo de vida?) Discutir modelos de manejo do dinheiro. Ajuda a familiares? Ambos
conscientes das necessidades? Prática do dízimo. Poupança para emergências.
VIII. Sogros. Relacionamento com as famílias de origem depois do casamento. Identificar
pontos de tensão. Ajudar a definir um relacionamento saudável. "Deixar pai e mãe"
(corte do cordão umbilical)
IX. Valores espirituais. Espiritualidade no lar. Culto doméstico. Prática de orar juntos desde
antes do casamento (cuidado com a sensação de intimidade).
X. Qualquer assunto em particular que preocupe os noivos. Dizer-lhes para escrever durante
a semana, para não se esquecerem e se poder discutir nas sessões.