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LEANDRO HENRIQUE DOS SANTOS

A PRESENÇA DOS INGLESES


EM PASSAGEM DE MARIANA
1819 - 1924

Hotepesteel by Rozembergue
MEMÓRIA DA PRESENÇA DOS INGLESES
EM PASSAGEM DE MARIANA
DEVE SER PRESERVADA

“Só se ama o que se conhece”


Está é uma reportagem especial do jornal O ESPETO publicada em forma de livro com apoio a
ACAM, Associação de Caçadores de Assombração de Mariana que tem a missão de promover a cultura.
www.acammg.com.br

Autor: Leandro Henrique dos Santos


Diagramação, pesquisa de imagens e arte : Rozembergue Alex Teixeira
Capa: Rozembergue Alex Teixeira
Imagens da capa: Federação Imperial: Mapa mostrando a extensão do Império Britânico em 1886.
Litografia colorida. Publicado por Maclure & Co. como um suplemento para The Graphic, 24 de julho de
1886.
Foto capa : ruina frente da igreja anglicana dos ingleses em Passagem de Mariana 2017. Acervo banco de
imagens Jornal O Espeto.

A PRESENÇA DOS INGLESES

EM PASSAGEM DE MARIANA

1819-1924

Julho de 2018 : 1ª Edição.


Todos os direitos desta edição reservados à
O JORNAL O ESPETO
Redação : Rua Olimpío Diniz nº269. Passagem de Mariana.
CEP: 35421-000 Mariana MG.
www.jornaloespeto.com.br
Email: oespeto@gmail.com
Tel: 031-3558-4660
Acima roda gigante usada para puxar minério e vagões.
Foto abaixo lápide no cemitério dos ingleses em Passagem
SUMÁRIO

I. A presença dos Ingleses em Passagem de Mariana...................................07

II. Os Ingleses.....................................................................................................08

III. Império Britânico; mapa de 1886.................................................................10

IV. Um império em movimento...........................................................................11

V. Inglaterra e Portugal......................................................................................12

VI. Inglaterra e Brasil..........................................................................................13

VII. Primeira igreja protestante em Minas Gerais ............................................14

VIII. Ingleses em Passagem............................................................................16

IX. Os Ingleses no poder: Mariana gevernada pelo diretor da mina Bawden....17

X. Herança dos Ingleses.....................................................................................18

XI. Visita de Dom Pedro II e a Imperatriz do Brasil a mina de Passagem.........19

XII. Influência doa Ingleses no dialeto mineiro “uai sô” (why sir)......................20

XIII. Jess Martin; memórias de uma iglesa em Passagem..............................21

XIV. Trabalho nas minas....................................................................................24

XV. Os ingleses e a guerra do Paraguai............................................................26

XVI Venda da mina para os brasileiros reinvenção do império Britânico..........28


06

Barra de ouro produzida na mina de Passagem : 1832

A libra em ouro ou Soberano: libra inglesa em ouro de 1821 utilizada na práti-


ca como reserva de valor a usar no futuro e não como moeda de troca inglesa.
07

“There´s a will, there´s a way”

Existe vontade, existe um jeito. Provérbio inglês

A presença dos ingleses em Passagem de Mariana

“A história é a mestra da vida”, esse ditado popular revela a mais pura verdade.
Através do estudo da história podemos aprender como se deu a construção da nossa civilização e o
processo de como adquirirmos nossa identidade cultural, criando um senso de pertencimento, de ligação com
a cidade e comunidade que moramos. Ninguém ama aquilo que não conhece. Ninguém luta por aquilo que não
valoriza.
Aprender com a nossa história é muito importante para nosso presente. Por isso nosso passado está em
construção, nada muda mais que o passado, pois por ele justificamos ações no presente.
Para isso deve servir este livro, para que podemos entender a importância de nosso patrimônio histórico e
cultural que faz de Passagem de Mariana um lugar especial.
As ruínas da Igreja Anglicana e seu cemitério fazem parte do nosso patrimônio histórico e cultural
ainda que não reconhecido oficialmente, o que reflete em seu estado de abandono.
Não há ocasião melhor para lançar esta obra a público do que na comemoração dos 322 anos do
distrito de Passagem de Mariana.
II 08
Os Ingleses

Desde que o mundo é mundo impérios conquistam terras e são des-


truídos, a Assíria, Babilônia, Egito, Grécia, Bizâncio, Cartago, Roma,
Pérsia e muitos outros. Alguns duraram muito tempo como o Império
Romano, outros em pouco tempo se ergueram e desapareceram como
o Império Huno de Àtila ou como o império de Alexandre o Grande.
Mas deixaram suas marcas na História, como cidades, monumentos,
evoluções tecnológicas que se iniciaram e desenvolveram para permitir
futuras invenções em várias áreas, como na medicina, política, cons-
truções e na navegação. Ao final da Idade Média, entre 1400 e 1500 foi
possível construção de navios resistentes e de tamanho suficiente para
iniciar as chamadas grandes navegações; descobrimentos e colonização
de novas terras e povos.
O pequenino Portugal saiu na frente na Europa devido a esco-
la naval de Sagres. As grandes caravelas cruzaram grandes distâncias
transportando centenas de pessoas com animais, alimentos, produtos e
armas. A China já tinha tecnologia para as grandes navegações e com
uma grande esquadra atravessava os mares porém não foram adiante.
A Espanha também seguiu os passos de Portugal.
No final do século XVI o mundo tinha duas grandes superpo-
tências com colônias na América e na África; Portugal e Espanha, isso com o apoio da Igreja Católica. Logo ou-
tros países também se lançaram nesta lucrativa empreitada, como a Holanda, França e a Inglaterra e outros. Por
interesses comerciais ou por motivos de perseguição religiosa muitos preferiram arriscar a sorte e ir morar em
colônias recém descobertas. Quem financiava essas navegações eram os reis, mas na Inglaterra comerciantes
se uniram e criaram companhias, como a Companhia das Índias Ocidentais, Companhia das Índias Orientais,
Companhia da África. Como consequência os ingleses estavam presentes em várias partes do mundo, e desco-
briram que era mais fácil comercializar quando tinham poder político para apoiar seus interesses. Começaram
a se aliar e criar colônias, criaram uma área de atuação que veio a ser o maior império que o mundo já viu.
Entre 1800 e 1900 os ingleses ocupavam ¼ do mundo, uma a cada quatro pessoas moravam em área controlada
pela Inglaterra, isso fora a área de influência. Índia, África do Sul, parte da China, Austrália, Indonésia, Estados
Unidos, Canada, Nigéria, Nova Zelândia, Birmânia, Guiana Inglesa, ilhas no Caribe e muitas outras.
Se o mundo antigo foi dominado pelos romanos de onde herdamos nossa língua e muitos costumes; o mundo
moderno foi influenciado pelo Império Britânico que chegou no seu auge a ocupar um quarto do planeta, com
um população proporcional. As distâncias eram enormes, por exemplo, da Inglaterra para Austrália eram cerca
de 13 meses de viagem, passando por vários locais para abastecimento, como África do Sul e Índia.
Tamanho da marinha Inglesa: Em 1775 por ano eram transportadas 320 mil toneladas de carga pela
marinha inglesa. No mesmo ano a França e Espanha transportavam o volume de 200 mil toneladas de carga
em seus navios. Em 1810 a marinha inglesa transportou 700 mil toneladas de carga, porém a França e Espanha
diminuíram o volume. A religião impulsiona o império Britânico. Nem só o comércio movia os ingleses; as
muitas associações religiosas, atuavam como se fossem hoje ONGs, os missionários atuavam em vários países
e realizavam várias campanhas como contra a escravidão, que foi abolida em 1772 na Inglaterra. Mas não no
Império Britânico. Em 1807 cerca de 10 mil pessoas de Manchester assinaram uma petição ao Governo
Inglês solicitando fim do comércio de escravos, o que foi atendido e esse comércio foi abolido de todo impé-
rio Britânico. E a marinha real se propôs a aprender todos navios transportando escravos de qualquer nação,
espalhando os navios de guerra pela África e Ásia. Os governos de Espanha e Portugal foram coagidos a ado-
tar medidas contra a escravidão. Só os Estados Unidos desafiavam a Inglaterra e continuaram a transportar
pessoas para serem vendidas como escravos. Também faziam guerra de aniquilação contra seus índios nativos,
desrespeitando tratados feitos pelos ingleses para preservar áreas para a população nativa.
09

A campanha abolicionista continuava pelas sociedades missionárias e pregadores iam a todas Igrejas dis-
tribuindo bandeiras onde estava escrito “Não sou eu um homem e um irmão?”. Enfim aos poucos cada vez
mais territórios governados pelos ingleses foram abolindo a escravidão até que em 1833 a escravidão tornou-se
ilegal em todo Império Britânico.
Porém os missionários não queriam só abolir a escravidão mas pregar a fé cristã protestante anglicana em re-
giões isoladas em missões arriscadas. Um exemplo desse esforço foi a tradução da Bíblia para a língua “maiori”
falada pelos nativos da Nova Zelândia por Henry Miller em 1823, que construiu a primeira Igreja protestante
anglicana naquele país. Aconteceram também casos de violência, como em 1865 quando houve uma dispu-
ta entre os nativos da Nova Zelândia, tentando intervir o missionário Carl Volkner foi decapitado, e o chefe
maiori comeu seus dois olhos e bebeu seu sangue dentro da Igreja. Em 1824 o missionário Willian Threlfall foi
esquartejado na cidade do Cabo, África do Sul.
Na Índia, na Pérsia (hoje Irã), Nigéria, China, na Arábia, na Austrália, em todos os lugares do Império foram
os missionários para levar o evangelho, estudando idiomas mapeando regiões.
Em 1853 Dr. Living Stone um médico missionário percorreu 500 quilômetros no centro da África e ba-
tizou as cataratas descobertas com o nome da Rainha Vitória, assim buscava apoio para continuar seu trabalho.
Hoje existem mais Igrejas só na Nigéria do que na Inglaterra inteira graças os missionários.
Em 1866 o imperador Teodoro da Abissínia prendeu missionários. Uma missão diplomática foi envida
mas foi também presa. Então a Rainha Vitória usando a moderna rede de telégrafos ordena em 1867 que o
exercito mais próximo liberte os reféns. 13 mil soldados ingleses e indianos marcharam para lá acompanhados
de sete mil camelos, 44 elefantes e 26 mil acompanhantes e carregadores levando canhões, metralhadoras, pe-
los 650 Km adentro da África até a fortaleza. Na luta mais de mil homens do Imperador Teodoro foram mortos
e dois mil ficaram feridos. Até o Imperador cometeu suicídio. Do lado inglês apenas 25 soldados da tropa ingle-
sa ficaram feridos, nem um morto. Tamanha diferença se deve ao poder de fogo e avanço tecnológico militar.
Na Índia os missionários fizeram campanha contra o sati. O costume do sati consistia em matar a mu-
lher durante o enterro do marido, pois seria uma prova de amor a viúva ser queimada viva nesse dia. Muitas
eram amarradas e jogadas ao fogo. O parlamento inglês aprovou lei proibindo essa prática em 1856, sob forte
pressão pois geralmente os ingleses não influenciavam os costumes de onde ocupavam.
10
III

Império Britânico; mapa de 1886

A marinha britânica era a força do Im-


pério. Ao projetar navios fortes e resistentes,
chamadas de galés ou caravelas, os ingleses
atravessam distâncias gigantes pelo mundo.
Para ir para a Austrália eram necessários 8 me-
ses de viagem.
Antes dos melhoramentos nos navios a
viagem para Austrália durava 11 meses !
Navios levavam cargas e armas para o
Japão, Àfrica do Sul, Egito, India, China. Uma
viagem para o Brasil durava 30 dias.
Com a maior marinha do mundo os
ingleses comercializavam mas também caça-
vam os piratas e constantemente estavam en-
volvidos em guerras.
Pode-se afirmar que a primeira globali-
zação começou nos anos 1800, quando as via-
gens começaram a ser mais seguras e rápidas,
apesar de continuarem a ser perigosas e não
muito salutares.
IV 11

Um Império em movimento : Pessoas viajavam por


muitos países a procura de oportunidades e estudo

Devido a sua grande


extenção territorial, que ocu-
pava 1/4 do mundo em 1886,
os súditos do Império Britâ-
nico eram muito diferentes
em vários aspectos. Além
disso sua área de inflência
econômica atraía pessoas de
todo mundo para trabalhar
ou estudar nas universida-
des.
Um exemplo disso é
Passagem, que recebeu imi-
grantes de toda Europa.
Diferente da época
do Brasil Colônia onde era
proibida a entrada de estran-
geiros.
Com a revolução In-
dustrial máquinas e produtos
começaram a surgir, como os
vagões nas mina da Passa-
gem foto ao lado e uso de di-
namite nas Minas do Morro
Santo Antônio, foto acima.
V
12
Inglaterra e Portugal
Portugal foi um dos primeiras nações que formalizou aliança com os ingleses.
Em 1373 foi assinado o Tratado de Windsor que é a mais antiga aliança diplomática do mundo ainda
em vigor. Foi assinado após os ingleses lutarem ao lado da Casa de Avis na batalha de Aljubarrota e com o
sentido de renovar a Aliança Anglo-Portuguesa estabelecida pelos dois países formando um pacto de amizade
perpetua.
Durante o reinado de Henrique VII (1509-1547) e principalmente no de Elizabete I (1558-1603), os ingleses
começam a se lançar destemidamente sobre os mares longínquos, dos quais vão conquistando colônias.
É a própria Rainha Virgem que incentiva e estimula as famosas expedições de: Hawkins, Drake, Frobisher,
Raleigh, Davis e muitos outros corsários, contrariando as determinações Papais e tratados.
A sujeição de Portugal a Espanha em 1580, acaba envolvendo o Brasil na guerra pelo domínio de colônias entre
Felipe II e os ingleses, que passam a atacar o litoral brasileiro.
Os espanhóis prepararam uma grande armada com centenas de navios, cavalos e canhões para atacar e
invadir a Inglaterra, porém na travessia a frota foi pega por uma grande tempestade que afundou todos navios
e salvou os ingleses de uma invasão.
Na véspera do natal de 1582 o capitão John Davis com doze caravelas, com quase mil ingleses, saqueia Santos,
aproveitando a hora exata que todos estavam na Igreja assistindo a missa, e levaram todo o ouro achado, além
de queimar os cinco engenhos de açúcar e todas as casas. No dia 26 de agosto de 1591 o mesmo capitão John
Davis saqueia e queima a cidade de Cabo Frio, vendendo os habitantes como escravos depois. Esse capitão foi
morto por piratas japoneses em dezembro de 1605 no mar de Sumatra na Índia, enquanto realizava mais um
saque para sua Majestade.
Ao se livrar do domínio espanhol que durou cerca de 60 anos, Portugal já fazia alianças comercias com
a Inglaterra, tendo um relação amistosa.
Reforçando essa amizade e interesses em comum em 1703 foi assinado o Tratado de Methuen, também refe-
rido como Tratado dos Panos e Vinhos, assinado em 27 de Dezembro daquele ano. Foram seus negociadores
o embaixador extraordinário britânico John Methuen, por parte da Rainha Ana da Grã-Bretanha, e D. Manuel
Teles da Silva, marquês de Alegrete. Portugal vendia o seu vinho para a Inglaterra e comprava tecidos feitos
pela florescente indústria têxtil inglesa.

Napoleão Bonaparte invade Portugal


Em 1800 Napoleão Bonaparte, imperador da França lutava na Europa e conquistava vários reinos, uti-
lizando em seus exércitos homens de todas origens, alemães, russos, suíços, suecos, italianos, etc. Se Napoleão
dominava a terra, a Inglaterra dominava o mar. Portugal se mantinha neutro na guerra, mas pressionado a to-
mar partido. Ao ver invadir a Espanha e prender a família real inteira Dom João VI rei de Portugal pensou que
seria o próximo na lista. Embarcou com escolta dos ingleses em janeiro de 1808 para o Brasil sem lutar contra
as tropas francesas chefiadas pelo General Junot, que liderava o exército de Napoleão. Quando os franceses
chegaram na capital portuguesa os soldados estavam cansados, maltrapilhos e famintos. Nem tinham cavalos
mais pois estes já tinham sido comidos. E sem os cavalos e burros pra puxar, os canhões foram deixados pra
trás. Na pressa para fugir para os barcos foi esquecido o Arcebispo do Porto. Sobre Dom João rei de Portugal,
Napoleão disse “foi o único que consegui me enganar”.
Ficou encarregado para receber o general francês Junot um engenheiro alemão chamado Wilhein Lud-
vig von Eschwegue. Formado em engenharia de Minas, ele foi contratado para procurar metais em Portugal,
mas teve que ficar e receber os franceses que saquearam o que puderam. Coube aos ingleses nos anos seguintes
expulsarem os franceses de Portugal.
Dom João trouxe com ele para o Brasil toda corte portuguesa, 10 mil pessoas. Ao aportar no Brasil ele
sabia que seus aliados também queriam dividir sua colônia, e Dom João foi obrigado a abrir os portos para
as nações amigas, ou seja a Inglaterra e seus produtos, a partir daí Brasil seria também área de influência do
Império Britânico não oficial. Um rei acuado sem exército, fugido da sua terra, não tinha escolha.
IV
13
Inglaterra e Brasil
Assim começa a relação da Inglaterra com o Brasil. A Inglaterra di-
tava e Dom João oficializava. Logo chegavam cientistas e pesquisadores
ingleses empolgados com um vasto e rico território ainda desconheci-
do. Os cidadãos ingleses no Brasil não estavam sujeitos as leis locais,
mas só poderiam ser julgados por tribunais formados por ingleses de
acordo com sua lei, assim era em todas colônias inglesas. Ou seja Brasil
informalmente fazia parte do império Britânico, pois com o mundo
dividido entre Napoleão e o resto, qual resistência um rei fugido sem
exército poderia fazer? Com colônias em Angola, Moçambique, Guiné
Bissau na África, até em Timor Leste na Ásia, ser aliado de Portugal foi
excelente para a Inglaterra, porém o que queriam mesmo era explorar
as minas de ouro de Minas Gerais. Quebrado, Dom João encontrou
uma solução fácil pra fazer uma grana extra e formalizar alianças: co-
brava por concessão de títulos: conde disso, visconde daquilo, barão
era o mais usado. Um ditado da época “entra cão e sai barão”. E o enge-
nheiro alemão Willien Ludvig von Eschwegue virou barão ao chegar de
Portugal. Lá se dizia que precisava-se de 300 anos de serviço a família
real para virar conde, aqui precisava de 300 contos de reis. Apenas quatro dias no Brasil, em 28 de janeiro de
1808, em Salvador, Dom João assinou o Decreto de Abertura dos Portos às Nações Amigas. Na prática abria
o comercio para os ingleses. Já em 1810 Dom João assinou dois tratados : Tratado de Comércio e Navegação ,
onde concede vantagens e privilégios comerciais a um já favorecido império Britânico e o Tratado de Alian-
ça e Amizade para extinguir o tráfico negreiro e acabar de forma gradual com a escravidão no Brasil. Esse
tratado de Aliança e Amizade também foi importante pois além de estabelecer a primeira restrição ao tráfico
de escravos e oficializar aliança comercial, estabeleceu os direitos dos ingleses de serem julgados por tribunal
britânico e de exercer sua religião no Brasil, permitindo construção de Igrejas e cemitérios da fé anglicana.
No ano seguinte, 1811, foi construído o Cemitério inglês e Igreja no bairro da Gamboa, Rio de Janeiro.
Em 1814 foi construído em Recife, 1816 em São Luis Maranhão. Após a compra das minas de ouro em 1819
foram construídos em Passagem de Mariana um cemitério ao lado da Igreja Anglicana e também um hospi-
tal. Depois de Passagem foi construído um cemitério e Igreja em Nova Lima. Sobre a data da construção do
cemitério e da Igreja dos Ingleses não foi possível localizar a data de sua abertura (não localizamos qualquer
pedido de aforamento de terreno para este fim específico junto à documentação da Câmara de Mariana).
Mas desde 1820 ocorriam enterros neste local segundo mapa do cemitério. Em 1867, por exemplo, Richard
Burton, famoso viajante inglês, acompanhou o sepultamento da sogra de Mr. Symons, superintendente da
Anglo-Brazilian Gold Mining Company – Cf. BURTON, Richard Francis. Op. cit. 1976, p. 286.
Atualmente, o cemitério e a igreja encontram-se em ruínas. (Pesquisa Prof. Rafael Souza).
No mapa do cemitério percebemos então que as leis e o tratamento que eram aplicados em todo vasto
Império Britânico eram também aplicados aqui, e o Brasil passou a ser parte do Império Britânico de modo
informal, do jeito que os ingleses gostavam, apoiavam um rei que mantinha a fidelidade da população e man-
davam nele nos bastidores Um exemplo disso, pesquisado pelo historiador Prof. Rafael Souza foi Richard
William Hodge. Inglês, capitão da Mina da Passagem; ele era filho de Richard Hodge e Rebecca Hodge; casado
com Emily Hodge, também inglesa, filha de Joseph Henry Harry e Elizabeth Mary. Eles tinham cinco filhos:
Lívia Jane Hodge, nascida no dia 15 de junho de 1896, Wilfford Hodge, nascido no dia 2 de outubro de 1899
e Ethel Hodge, nascida no dia 16 de abril de 1902, Edwin Hodge, nascido no dia 11 de novembro de 1904 e
Alda Hodge nascida no dia 26 de abril de 1907. Ao registrar sua primeira filha em Passagem declarou que “faz
este registro em cumprimento das leis em vigor e que também pelas forças das leis em vigor deseja que sua
filha já referida e na melhor forma de direito fique pertencendo as bandeiras britânicas, isto é, como súdita
inglesa como assim pertence o seu pae declarante” – Cf. Arquivo do Cartório de Registro Civil de Passagem
de Mariana. Livro de Registro de Nascimentos n. 1A, f. 66 e 66v. Ou seja podemos perceber no registro em
Cartório que deixam claro a lei vigente no tratado da Amizade entre Portugal e Inglaterra.
VII 14

Primeira Igreja protestante de Minas Gerais


A Igreja Anglicana e seu cemitério são marcos da presença dos ingleses em Passagem. Todo esse
livro foi escrito para explicar porque e como eles foram construídos aqui.
Com data de construção de 1820, um ano depois da compra da mina pelos ingleses. A Igreja tem
estilo gótico, e tinha um lindo jardim na sua frente. Porém quando os ingleses venderam a Mina em 1924,
cada vez mais ela foi relegada ao abandono até ter suas telhas roubadas, portas, janelas. As sepulturas foram
violadas. Hoje resiste bravamente de pé. Uma árvore nasceu próximo a uma parede lateral. Um lugar tão
representativo de nossa história está relegado ao esquecimento. O caminho amplo que leva Igreja, atraves-
sando a plantação de chá hoje está com mato, o que não impede a passagem mas demonstra que precisa-
mos recinhecer o valor de nossa história e transformar o local em um parque arqueológico municipal .

Mapa do cemitério dos ingleses em Passagem de Mariana, situado ao lado da Igreja Anglicana. En-
terros são regisgrados desde 1840 no mapa até a venda da mina em 1924.
Local hoje carece de zelo e reconhecimento do poder público para não virar somente história.
Está enterrado ali Sir Thomas Bawden, presidente da Câmara de Mariana, ele foi condecorado pela
Rainha Vitória com o título de Sir pelos seus serviços ao Império Britânico.
15

Igreja Anglicana dos ingleses em Passa-


gem de Mariana e cemitério foram pontos de en-
contro e confraternização com a comunidade,
onde além de cerimônias religiosas eram realiza-
dos“ pic-nics ” .
Em muitos dos cerca de 50 túmulos exis-
tentes trazem nas lápides de mármore os nomes
das pessoas alí enterradas, como Anne Gifford,
que morreu de trabalho de parto em 1901. Está
escrito na lápide:
“Em memória da amada Annie, querida e amada
esposa de Henry J. Gifford, que partiu desta vida
em Julho, 17, idade 34 anos. Sua Vontade seja fei-
ta.”
Henry Ford era engenheiro na Mina da
Passagem.

VIII 16

Os Ingleses em Passagem
Pelo tratado de Tratados de Aliança, Amizade, Comércio e Navegação assinado em 26 de fevereiro de
1810 aos britânicos passaram a ter direitos de comercializar e serem julgados só por tribunal britânico. Previa
o direito também de construir igrejas e abrir cemitérios próprios, garantido pelos artigos XI e XII desse acor-
do.
Em 11 de fevereiro de 1814 foi instalada na Praça Tiradentes em Ouro Preto, a “Geological Royal Society
Cornwall”. Designaram o engenheiro de Minas e representante o Sr. Willian Jory F. R. S. Henwood para vir a
Minas e enviar informes sobre as perspectivas da mineração aurífera na região. Ele publicou comunicados
sobre o Morro Santo Antônio, Passagem, Mina de Antônio Pereira, Socorro, Vila Rica, e descreve as lavras do
Morro Sant’ana, Morro Velho, Itabira, Água Quente, Gongo Sôco e Brucutu.
Logo os acionistas ingleses comprariam várias minas, como a Mina da Passagem, mina Santana, Nova Lima,
Cata Altas, e outras.
E claro que o geólogo alemão Willian Ludvig von Escwegue veio para o Brasil rodar e pesquisar o interior.
Dezenas de viajantes ingleses passaram por aqui, mapeando, pesquisando, coletando.
Ao chegar foi enviado junto com os ingleses para explorar as minas. Ele fez parte da primeira sociedade mi-
neradora do Brasil em 12 de março de 1819, junto com ingleses para explorar a mina da Passagem, tornando-
-a mais lucrativa. Ele modernizou, com a ajuda dos ingleses, a mina, transformando os pequenos tuneis em
galerias, colocando carrinhos e trilhos para puxar minério, e instalando máquinas a ar para perfurar e puxar
os vagões. Também trouxe imigrantes de outras nacionalidades para trabalhar, já que os ingleses não pode-
riam ter escravos. Uma solução era alugar escravos, porém preferia-se contratar trabalhadores experientes
de outras minas da Europa; vieram alemães, espanhóis, italianos, portugueses, russos. Quando Napoleão foi
derrotado pelos ingleses, muitos de seus soldados foram contratados para vir para Passagem.
Foram criadas a Vila Portuguesa, Vila Espanhola, Fundão onde moravam os italianos, e a Vila Alemã
(hoje com nome de Vila São Vicente). E diversas casas foram construídas para abrigar essa gente, principal-
mente os ingleses. Uma solução foi a construção de barracões grandes, para moradia de até 15 famílias, ape-
lidados de Bom Será (morando juntos bom será que não briguem). Existia o Bom Será dos solteiros e o Bom
Será dos Casados.
Entre 1819 com a compra da mina pelos ingleses e 1924 com a venda da mina aos banqueiros Guimarães,
nesse tempo Passagem virou um caldeirão cultural, onde diversas nacionalidades conviviam e nos bares fala-
vam-se em várias línguas. Até chineses os ingleses trouxeram para iniciar o plantio de chá ainda hoje vemos
as plantações nas áreas em volta do atual campo do Esporte Clube 29 de junho.

Pesquisa histórica Prof. Dr. Rafael Souza.


IX 17

Os ingleses no poder : Mariana governada pelo


Diretor da Mina Bawden Thomaz Bawden

Com cerca de quatro mil empregados a mina era a única grande empregadora da região. Tanto poder
econômico logo se transformou em poder político. Um dos diretores da Mina Thomas Bawden foi eleito vere-
ador várias vezes e presidente da Câmara de Mariana nos anos de 1890 a 1894. Naquela época só os considera-
dos “homens bons” ( quem tinha posse e renda) podiam votar. Não existia o cargo de prefeito, nem o de Juiz.
Eram os vereadores que administravam a cidade e julgavam os crimes. A cadeia era na Câmara. Os três poderes
se resumiam num só, diferente de hoje. E ninguém recebia por estes serviços, mas era um privilégio assumir o
cargo de vereador devido ao jogo de poder local.
Thomas Bawden elegeu seu filho vereador também e depois este se tornou Senador por Minas Gerais.
Exerceu um mandato na época do Império e outro depois de proclamada a República.
Foi condecorado como “Sir” pela rainha Vitória da Inglaterra. Está enterrado no cemitério da Igreja
Anglicana em Passagem de Mariana. Muitos especialistas continuaram a chegar em Passagem para montar
modernas máquinas a ar, que funcionam até hoje puxando o carrinho da Mina! Em Passagem foi fundado o
primeiro sindicato do Brasil por iniciativa dos italianos, chamado Mútuo Socorro, que ajudava as famílias dos
mineiros mortos na mina por acidentes ou doenças.
A Igreja Anglicana e seu cemitério são o primeiro torrão de terra da fé protestantes anglicana em
Minas Gerais, para que os ingleses e extrangeiros como franceses e alemães pudessem professar sua religião.
Construída em estilo gótico a Igreja Anglicana em Passagem demonstra mesmo em ruínas a sua beleza. Hoje
falta-lhe apenas o telhado e a porta.No cemitério lindas lápides esculpidas em mármores com ornamentos em
flores, podemos ler epitáfios em inglês , existem cerca de 50 túmulos e muitos foram revirados por caçadores
de relíquias.
Em 1862 os ingleses compraram as minas no Morro Santana e Maquiné, aumentando a exploração do
ouro, conduzida pelo capitão Thomas Treolar. Da presença dos ingleses em Passagem, encontram-se alguns
descendentes, como Doriedson Rolland, filho de José Peter Rolland, Cid Archibald, Dona Laysla e muitos ou-
tros.. Ainda Passagem pode-se vangloriar-se de ter um dos primeiros campos de futebol e tênis de Minas pois
estes esportes foram trazidos pelos ingleses!
X 18

HERANÇA DOS INGLESES :


Primeiro campo de futebol de Minas ,
primeiro hospital com raio X do Brasil,
Primeira Igreja protestante de Minas
Primeiro Sindicato de Minas

Os Ingleses construíram um hospital em meados de 1850, onde foi instalado o primeiro aparelho de
raio X do Brasil, oriundo da Inglaterra. Construíram sua Igreja para seus cultos de fé protestante anglicana, e
um cemitério onde foram enterrados 50 pessoas de fé protestante, ingleses e alemães.
Construíram um campo de futebol onde é o pátio da Mina. Os ingleses foram pioneiros no futebol no
Brasil, o campo de Passagem foi o primeiro de Minas Gerais. Também construíram em Passagem um campo
de tênis, também o primeiro de Minas. Construíram um clube para bailes e festas.
Os trabalhadores da Mina devido aos muitos italianos, que eram os mais numerosos, criaram um sin-
dicato chamado Mútuo Socorro, e uma banda, depois chamada de Banda São Sebastião que até hoje alegra
Passagem e é motivo de muita alegria . O sindicato Múto Socorro hoje chama-se Clube Sorriso da Infância.

Hospital, situado na “Rua do hospital “ em Passagem. Restam só ruínas.

Associação Mútuo Socorro, hoje Clube Sorriso da Infância. Primeiro Sindicato.


XI 19

VISITA DE DOM PEDRO II E A IMPERATRIZ


DO BRASIL EM PASSAGEM E MARIANA

D. Pedro II e Dona Teresa Cristina visitaram as minas de Morro Velho, do Morro Sant’Anna e de Pas-
sagem em abril de 1881.
Visitou as Igrejas de Mariana também, sendo recebido pelo Arcebispo. O coral da Igreja Anglicana o
recebeu com uma linda canção “Abide with me” .
No caso de Passagem, desceu ao subsolo da Mina onde permaneceu durante uma hora acompanhado
por Robey Patridge, Robert Wandeborn e Monchot (provavelmente o médico Jorge Thorton Mochet). Regis-
trou que a mina era esgotada por meio de bomba hidráulica, pois a água tinha sido causa da interrupção dos
trabalhos e que viu um “trabalhador separar facilmente o ouro, que logo pintou, na bateia”. Sua obra é impor-
tante, pois situa-se na fase de transição da Anglo-Brazilian Gold Mining Company (encerrada em 1873) para
a The Ouro Preto Gold Mines of Brazil Limited (iniciada em 1884) – Cf. DOM PEDRO II (1957, p. 69-118).
Pesquisa Prof. Rafael Souza.
Foi servido um jantar ao som de uma pequena orquestra improvisada no fundo da Mina de Passagem
para o Imperador Dom Pedro II e sua comitiva.
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INFLUÊNCIA DOS INGLESES NO DIALETO


MINEIRO : UAI SÔ ( WHY SIR )
Os ingleses tinham dois times de futebol que contava com mais de 30 integrantes cada.
Temos ainda diversas expressões que foram incorporadas ao português brasileiro, como “for all”, festas onde
todos podiam ir, e hoje chama-se de “forró” pelo menos ouvi essa história e gostei.
A expressão típica dos mineiros “uai” vem do inglês “why” que significa “por que?”, foi assimilada ao
nosso vocabulário após mais de cem anos de convívio, partiu de Passagem!
O bairro de Mariana chamado Gogô é nome inglês, vem de “go” que significa vamos, o nome da região
toda era Vamos Vamos, nome do minerador Antônio Vamos Vamos, nome comprido e difícil para os ingleses
pronunciarem, logo traduziram para “Go Go” ( vamos em inglês) , que virou Gogô!
Chulé vem de “shoes less” sem sapato. “Boot” veio bota, de “hungry” veio rango, “Leader” virou líder,
“chap” virou chapa, amigo, “hello” virou alô, garden virou jardim, “whell” virou roela, “chaulf ” para chaula,
pá, “train” – trem, Short também, “boy” era bocha e Office boy continua hoje ainda, até o ding – dong das
campainhas!
Ainda há o “madam” de madame, “W.C” de “Water Closet” – cabine, cômodo de água – banheiro. Até
o gute gute que muitos falam ao ver um bebê vem do inglês “cute cute”, que significa “que gracinha”.
O sô, vem do “sir”, senhor nobre, inglês . Ao ver os ingleses tratarem seus superiores por Sir logo apor-
tuguesaram para Sô. Dái Sô Zé, Sô Jão, Sô Antônio etc.
Botton virou botão, constipate - constipado, wagon-vagão, brochet - broche, band - banda, Shit signifi-
ca merda, por isso quando algo dá errado falamos Shiiiii !
Lunch é almoço em inglês, mas virou lanche para nós. Por falar em almoço os portugueses tinham o
hábito de comer com as mãos usando apenas uma faca. Foram os ingleses que introduziram os talheres e a
etiqueta na mesa. Aos mãos eram lavadas numa tigela, que foi abolida com o uso dos talheres e guardanapo.
Além da língua e costumes, como a plantação e uso de chás existente em Passagem. Por falar em mesa, quem
não gosta de um “pudding” ? Ou de um beef? Ou uma pancake ? Jello virou gelatina. Cake virou queca. Casse-
role ficou casserole. Spatula virou espátula. Muitas novidades trazidas pelos ingleses ficaram.
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JESS MARTIN :
MEMÓRIAS DE UMA INGLESA EM PASSAGEM
Jess Maud Martin nasceu na Inglaterra e escreveu suas lembranças retratando a vida dos ingleses em
Passagem escrita entre os anos de 1888 a 1906, que sua família gentilmente enviou ao jornal O ESPETO para
ser publicado o que um dia ainda esperamos fazer em momento propício.
Era comum os ingleses escreverem memórias, e também educar as mulheres o que os portugueses
não achavam necessário. Estava na moda no começo do século passado os clubes de leitura, onde as pessoas
se reuniam para ler uma para as outras e comentar sobre literatura.
Pelo exemplo das inglesas que sabiam ler e escrever as mulheres brasileiras também se interessavam.
Jess veio com sua mãe, seu pai Martin, diretor da Mina de Ouro de Passagem e seu irmão Dick Martin para
Passagem, onde residiram na casa grande, sendo seu pai diretor da Mina de ouro.
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ESTRADA DE FERRO: A instalação da ferrovia no Brasil foi feita com financiamento inglês e
com mão de obra e tecnologia inglesa. Os ingleses da mina de Passagem pressionaram para a ferrovia chegar
até Mariana onde poderiam receber máquinas e transportar ouro. A estação de Passagem tem até um quarto
revestido com aço usado para guarda o ouro esperando o trem chegar. Foto inauguração da estação de Maria-
na,1914.

CONFLITOS: Aconteceram vários conflitos sendo o mais grave relatado por Jess em suas memórias
uma briga entre brasileiros e italianos em que o batalhão do exército de Ouro Preto teve que intervir.
Também aconteceu uma greve e um protesto dos italianos que planejavam dinamitar a Casa Grande,
porém um alemão entregou o plano e para não ser preso e entregar os amigos o italiano se matou.

ACIDENTE: Em 1914, dia 08 de dezembro aconteceu uma grande imundação na Mina da Passagem,
matando muitos, porém só 18 corpos foram encontrados. De todo Brasil chegavam bombas para esvaziar a
mina e resgatar os mineiros. Um sobrevivente saiu no bairro da Chácara em Mariana e outros na região do
bairro Santo Antônio. Um daqueles que tentou salvar os companheiros foi José Pizzatti, irmão da minha avó,
que desceu no carrinho para avisar os companheiros do perigo da enchente mas não deu tempo de voltar.
Seis corpos foram enterrados lado a lado no cemitério Paroquial em Passagem, hoje estão sem identificação e
como muitas famílias mudaram poucos sabem da localização exata dos túmulos, como o Sr. Benedito Viana,
que desde criança trabalhou na Mina. Deixar o registro desses túmulos é mostrar que tragédias se repetem na
mineração. A gora com a reorganização do cemitério não sabemos se estes túmulos seram mantidos.
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ILUMINAÇÃO ELÉTRICA: com a modernização proporcionada pelos ingleses Passagem foi a


primeira vila de Minas a ter energia elétrica nas ruas, substituindo os antigos lampiões, e nas casas. E de graça
até 1988. A energia também era vendida para Mariana e Ouro Preto.

ARSÊNICO, CHÁ, PRATA E OURO: Os ingleses exploravam além do ouro os subprodu-


tos da mineração, o arsênico e a prata. O arsênico, de nome comercial “Formiga Branca”, era usado para fazer
o veneno para matar pragas, hoje a fábrica se encontra em ruínas ao lado do Ribeirão do Carmo no paredão
do Mata Cavalos, mas sua grande chaminé projeta sua imponência. O chá era também comercializado e muito
apreciado.
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TRABALHO NAS MINAS

Planta da Mina da Passagem e mineiros


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Era comum trabalhar sem camisa e sem equipamentos de segurança. Devido ao pó da perfuração da rocha
entre 10 e 15 anos a silicose atacava o pulmões e matava muitos mineiros
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OS INGLESES E A GUERRA DO PARAGUAI

“VAMOS PARA A GUERRA MOSTRAR QUE MINEIRO TAMBÉM É BOM DE TIRO”

Voluntários de Mariana e Ouro Preto vão lutar na guerra do Paraguai

Solteiros são dispensados do trabalho nas minas para se alistarem


Voluntários se juntam em Mariana para benção do bispo e seguem para
Ouro Preto de onde partiram para a guerra. Total : 6.784

Solano Lopez ditador do Paraguai atacou duas cidades do Mato Grosso e Rio Grande
do Sul, saqueando e matando inocentes. Depois invadiu a provincia de Corrientes na Argenti-
na. A resposta do Brasil demorou para chegar, pois o exército era pequeno mal armado e mal
treinado. Dom Pedro II recorreu aos ingleses para adquirir armamentos, uniformes, canhões,
munição e um empréstimo para alimentar. Mais de 50 mil brasileiros morreram no mais san-
grendo conflito da América do Sul.
Por várias vezes a Inglaterra tentou intermediar um acorco com Paraguai para evitar
que a guerra acontecesse, sem êxito. Devido a tensões no Uruguai, onde Brasil e Argentina
apoiavam um governo recém formado, Paraguai resolveu interferir para garantir que seus
aliados ficassem no poder.
Com exército melhor e maior, os paraguaios não imaginaram que a guerra duraria seis
anos, porém no final da guerra Paraguai estava arrasado e usando até crianças como soldados.
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Na foto abaixo vemos partida das primeiras brigadas do Exército Brasileiro de Ouro Preto, então capital de
Minas, para Mato Grosso. Era a resposta à ofensiva paraguaia na região, no final de 1864.
Se alistaram como voluntários 6.784 mineiros, de Montes Claros, Barbacena, Ouro Preto, Passagem,
Mariana, Pitangui, Paracatu, e Pedra Azul.
O primeiro regimento foi formado com forças somadas de Ouro Preto e Mariana. E foram a guerra
defender o Brasil da invasão do Paraguai.
Lutaram em Itororó, Lomas Valentinas, Peribuy.
Ao voltar o exército não seria o mesmo. E os escravos que foram lutar foi prometida a liberdade, po-
rém ser escravo liberto era um desafio.

Tropas de Mariana, Passagem, Ouro Preto e outras
cidades aguardando para seguir para o Paraguai na praça Tiradentes,
somando 6.784 voluntários . Muitos morreriam na viagem.
Sebastião Estrella morador da rua Dom Veloso em Passagem, voltou da guerra sem um braço
e foi condecorado tenente.
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VENDA DA MINA PARA OS BRASILEIROS :


REINVENÇÃO DO IMPÉRIO BRITÂNICO
Em 27 de março 1927, depois de mais de um século de mineração, o último diretor das minas, o inglês
Sir Arthur Ben Susan, vendeu-as para a família Guimarães. O filho de Ben Susan, chamando Artur Mineiro,
em homenagem a Minas, aos seis anos morreu com um coice de cavalo, ele desgostou-se e quis ir embora. Co-
meçou uma nova fase para Passagem de Mariana e nas décadas seguintes os imigrantes faziam o caminho de
volta, indo para outras partes do Império ou Sul do Brasil.
Mas deixaram para trás toda uma história, construções e suas influências, que se não preservadas um
dia podem ser só história. Por isso a importância de criar o parque dos ingleses e não deixar que a Igreja e o
Cemitério que eram abertos a visitação pública sejam devorados pelo mato e descaso, mas sim, que sejam con-
servados e valorizados como local de memória em nome da cultural e da identidade local.
Uma pergunta surge implacavelmente: como o Império Britânico conseguiu se manter ? A resposta é
que os ingleses para ficar com o Império resolveram abrir mão dele. Como assim ? A Inglaterra aprendeu que
para poder usufruir de seus aliados e colônias deveria deixar que eles se auto governassem, assim não teriam
mais guerras de indepência como aconteceu nos Estados Unidos.
Ou seja, aconteceu uma jogada de mestre: o Império Britânico criou em suas colônias, territórios e
possessões um sistema de Governo nos moldes da Inglaterra, com representação popular eleita, com poder ju-
diciário local independente de Londres, para que eles pudessem ter a liberdade de escolher seus destinos, julgar
seus casos, mas sempre aliados dos ingleses. Aliado era um parceiro comercial e militar quando necessário. As
Guerras Mundias provaram a importância desses aliados, pois batalhões de voluntários da Austrália, Nigéria,
India, etc, foram lutar pelos mares e na Europa lado a lado dos ingleses garantindo a vitória.
A chamada Comunidade Britânica foi fundada em 1931, reúne 54 países integrantes, ex-colônias, me-
nos os Estados Unidos que nunca participaram. Zimbábue foi a única nação expulsa por não adotar práticas
democráticas de governo. Moçambique, antiga colônia portuguesa faz parte pois teve grande contato com o
Império Britânico desde que Dom João selou o acordo de “amizade” com a Inglaterra em 1810. Os ingleses
abriram os portos não só do Brasil, mas de todas colônias. Abrir os portos é o mesmo que abrir as portas.
Os principais objetivos da Comunidade Britânica são o estabelecimento do regime político democráti-
co, desenvolvimento socioeconômico, garantia dos direitos humanos, promover a paz, benefícios comerciais e
assistência educacional nos países membros com intercâmbio de estudantes em universidades.
A organização oferece apoio técnico e científico aos membros mais pobres em áreas como agricultura,
indústria, energia, saúde e educação. Desde 1991, a Comunidade Britânica monitora eleições a pedido dos
governos para que possíveis fraudes eleitorais não ocorram.
Nesses 54 países que integram a associação existem, aproximadamente, 2 bilhões de habitantes, cor-
respondendo à cerca de um terço da população mundial. As atividades econômicas dessas nações também
são expressivas no cenário global: atualmente os países da Comunidade Britânica representam 30% de todo o
comércio mundial.
O poder político do Império Britânico hoje é simbolico, mas comercialmente continua forte como
nunca.
Percebam toda história para explicar algumas contruções em ruínas em Passagem !
Que essa história sirva para valorização do parque dos Ingleses que nossas autoridades sejam competentes
para preservar e tombar este local como ponto de cultura regional. “There´s a will there´s a way”, há vontade
há um jeito. Provérbio inglês.
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1819
1924
12 de março de 1819 : Compra da Mina da Passagem por sociedade comercial inglesa
27 de março de 1924 ; Venda da Mina de Passagem para os banqueiros Guimarães
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MEMÓRIA DA PRESENÇA DOS INGLESES


EM PASSAGEM DE MARIANA
DEVE SER PRESERVADA

“Só se ama o que se conhece”


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