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M A N O E L V I A N A

PARANAGUÁ
NA
HISTÓRIA
E NA
TRADIÇÃO
Digitalizado para PDF por 316FF
20100121

1971
PROF. NELSON DE FREITAS BARBOSA —

QUE SEMPRE CUIDOU, COM CARINHO,

'EDUCAÇÃO E CULTURA" DE NOSSA TERRA,

A NOSSA GRATIDÃO!
A ILUSTRE CÂMARA DE VEREADORES,

PELAS HOMENAGENS E DEFERÊNCIAS

QUE SEMPRE RECEBI DO

"PODER LEGISLATIVO",

OS NOSSOS AGRADECIMENTOS SINCEROS


AO "CONSELHO MUNICIPAL DE CULTURA"

ÓRGÃO REPRESENTATIVO DA CULTURA

E DAS "TRADIÇÕES" DE PARANAGUÁ,

NA PESSOA DO SEU PRESIDENTE

— Dr. JOSÉ DE MELO —

OS NOSSOS SINCEROS AGRADECIMENTOS !


PREFÁCIO

Vinte e sete, dos anos de minha vida, até aqui, fui aluno.
Tenho presentes na lembrança todos meus professores.
Tanto lhes devo que não poderia ser diferente.
Cada qual, na sua especialidade, contribuiu para minha formação moral e
intelectual.
Desde os primeiros contados com as letras do alfabeto ao estudo das Ciências
Jurídicas, senti-me sempre atraído pelos mestres. Em cada um busquei saber e
em todos encontrei muito mais. Não seria difícil, por isso, escrever sobre os que
por quase três décadas, nas longas jornadas escolares, participaram do meu convívio.
Referir-se, agora, neste prefácio, a um professor que não foi meu, mas que
me permite gozar de sua amizade por trinta e cinco longos anos, não será por
certo a mesma coisa.
Mestre, amigo incondicional, patrão que pagou o meu primeiro ordenado
quando lecionava em seu Liceu nos idos de 1941, MANOEL VIANA, inegavelmente,
foi quem mais contribuiu para que eu conquistasse, nos bancos escolares e na
sociedade, o lugar que me estava reservado por Deus e se constituiria na alavanca
propulsora que me conduziria ao Palácio Visconde de Nacar por duas vezes.
Por isso tudo, não poderia deixar de aceitar seu convite para prefaciar "Para-
naguá na História e na Tradição".
Autodidata, Manoel Viana, nosso Manoelito, por mais de cinqüenta anos de-
dicou-se integralmente ao magistério. Viveu intensamente a vida de um profes-
sor e pela sua escola passaram personalidades que ocuparam e ocupam ainda hoje
posições de destaque nos mais variados setores, das atividades humanas, não só de
Paranaguá mas do Estado, afirmando-se existirem muitos pelo Brasil afora, hoje
altas patentes das Forças Armadas e também donos de outras invejáveis posições.
Este livro, editado pela Prefeitura Municipal de Paranaguá, sob os auspícios do
Conselho Municipal de Cultura, vem à luz quando seu autor, já aposentado, de-
cidiu-se a publicar o resultado de suas pesquisas e transmitir à posteridade muito
do que não fora ainda escrito mas que conhece graças ao testemunho de familiares
e contemporâneos de sua juventude.
O autor num estilo todo pessoal, característico de quem tudo estudou e de tudo
conhece, atem-se a sua terra.
Escreve história e reaviva lendas quase esquecidas.
Um dos fundadores do Instituto Histórico e Geográfico de Paranaguá e do
Centro de Letras de Paranaguá, está entre os historiadores vivos que mais conhece
sua terra.
Foi professor do primário e "lente" de Latim no Ginásio.
Mestre no craion, inúmeros os desenhos que tem espalhado entre seus ex-alunos.
Pianista, é dos melhores entre os que interpretam Cazuza. Musicógrafo, dedica-
se atualmente a musicalização do nosso esquecido folclore.
Decorador, sempre está presente quando solicitado pelas sociedades para pre-
parar seus salões para os festejos carnavalescos e quando de outras importantes
comemorações.
Poeta, por certo se imortalizará ao publicar "Os Brasiliadas".
Teatrólogo, a cada ano oferece peças que são encenadas pelos Grupos Amadores
da cidade.
Historiador, em seus escritos revela sempre fatos novos nunca referidos pelos
autores conhecidos.
Foi pianista nos teatros princesinos ao tempo do cinema mudo e hoje é figura
de destaque nas reuniões lítero-musicais da Sociedade Amigos da Música e da
Cultura de Paranaguá.
Orador, em suas palestras discorre com facilidade, tanto sobre temas onde se
destacam os personagens que enriqueceram a história pátria, quanto ás figuras
ilustres que forjaram o nascimento deste Estado.
Conhece a Paranaguá que foi dos Carijós, de Peneda, de Gabriel de Lara, dos
Corrêas, dos Pereiras, do Visconde de Nacar, tanto quanto à cidade de hoje, de
todos nós, com seu Porto majestoso, armazéns e silos gigantescos e nascendo
para o ciclo da industrialização.
Manoel Viana, nesta obra, ao recapitular acontecimentos históricos verificados
nestes quatro séculos de Paranaguá, enriquece-os com passagens até então des-
conhecidas .
Embora esteja vivendo só neste século, viaja ao passado com uma facilidade
que agrada a todos os que o ouvem e agora poderão deleitar-se na leitura.
Do "regulo matador", da Ilha da Cotinga, revive acontecimentos quase esque-
cidos, até chegar próximo destes dias, da nossa Paranaguá sem Campo Grande,
sem Estrada Velha do Rocio, sem bondinho, sem trapiches, sem a riqueza da Corte
Imperial, sem Festas do Divino, sem noites de serestas, sem noitadas no Santa
Cecilia ou no Variedades.
"Paranaguá na História e na Tradição" é um novo registro, para a História
que será escrita por outros, da passagem nesta vida, por estas terras de "Pernagoá",
do seu ilustre autor professor Manoel Viana, que por certo se imortalizará — se
não por tudo que representa — como o exemplo de uma vida devotada inteiramente
ao magistério.
MANOELITO, como carinhosamente é conhecido, é para nós um sinônimo de
professor, de mestre-escola como gosta de ser chamado MANOEL VIANA, inte-
lectual ilustre que o Itiberê viu nascer.

Paranaguá, 7 de junho de 1976.

NELSON DE FREITAS BARBOSA

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APRESENTAÇÃO

"MAGISTRA VITAE HISTORIA EST"

Sendo a "Mestra da Vida" (segundo Cícero), ela nos ensina a


cultuar o pretérito, alertando sobre os erros e virtudes dos nossos
ancestrais; nos incentivando e aconselhando, também, a deixar à
posteridade tudo o que sabemos do passado de nossa terra e de nos-
sa gente, como uma continuação dos que nos antecederam — faróis
a iluminar a estrada, suave às vezes, mas quase sempre ladeirenta
da vida de um povo.

Estudando e escrevendo a ''História" de PARANAGUÁ, encon-


tramos lances tristes e alegres; normais e psicológicos, bem como.
discretos e gozados. Alguns, ainda, que, por mais que afirmemos,
parecem inverossímeis, dadas as circunstâncias em que se reali-
zaram.

Mas, PARANAGUÁ já foi tida como "terra das grandes coisas"!


logo, o impossível torna-se, às vezes, possível.

Assim pensando, resolvemos deixar para vocês, conterrâneos,


em nossa linguagem simples (que sempre foi), tudo aquilo que ad-
quirimos através dos nossos 52 anos de magistério; sem acrescentar
nada que pudesse deturpar ou inverter a História de nossa terra.

Se mais não foi possível, as nossas desculpas.

O AUTOR

PARANAGUÁ, l.o de janeiro de 1975.

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FUNDAÇÃO DE PARANAGUÁ

Entre as cidades do P A R A N Á , P A R A N A G U Á merece um des


taque todo especial, dadas as circunstâncias de como foi fundada
e, principalmente, quanto aos fatores sociais, econômicos, culturais
e religiosos.
Senão vejamos:
Estávamos no ano de 1550 (metade do século X V I ) . São Vi-
cente e Cananéia, vilas primevas de então menino B R A S I L ; com
uma população intensa e alimentação mínima, estavam com a pro-
dução insuficiente para o consumo interno de sua gente.
Saem, pois, algumas canoas com aventureiros (Domingos Pe-
neda, Diogo de Unhate, velho bandeirante) e outros, ávidos de tudo
conhecer, e mais ainda, encontrar meios de um sustento mais se-
guro.
Costeiam as praias de Ararapira e Superagüi e, em plena baía,
ficam extasiados ante tamanha beleza. Procuram um lugar de
pouso e, por intuição, acercam-se da majestosa ilha fronte^a ao
continente. Principiam logo a construir as primeiras habitações e
fundam assim um núcleo ao sopé do m o r r o . . .
E sabem o que isso significou ?. . . O início do P A R A N Á ! . . .
Aí ficaram quase duas décadas, cheias de impecilhos e de di-
ficuldades.
Fundando o primeiro "arraial", trataram de conquistar a ami-
zade da tribo "carijó", que habitava toda a margem esquerda do
rio "Taquaré" (depois rio da Vila e hoje Itiberê).
Foi nessa histórica e secular "Cotinga" de nossos ancestrais que
surgiu o primeiro povoado de brancos, nele chantando-se o marco
civilizador da terra paranaense...
Depois de 20 anos de lutas e apreensões, passaram, esses he
róicos pioneiros, à terra firme, na costeira direita da baía.
Acontece, porém, que a terra habitada por essa valente tribo,
já possuía o gracioso nome de " P E R N A G O Á " (grande mar redon-
d o ) , dado pela raça audaz.
Nome que, com os anos, sofreu a corruptela de P A R A N A G U Á
(Pernagoá — Parnagoá — Parnaguá — Paranaguá).
Essa Aldeia, já então de brancos e de índios, foi fundada du-
rante a época da mineração, e com ela, a modesta Capelinha con-
sagrada a Nossa Senhora do Rosário, em 1578.
li
D O M I N G O S P E N E D A — o chefe — natural de São Paulo; ho-
mem regulo e matador; foi o fundador de Paranaguá (conforme
consta da cópia fotostática do Códice do Museu Britânico n.°
13.983). Ele, com os demais pioneiros, fizeram a navegação dos
rios, que depois se chamaram, dos Almeidas, dos Correias e do Gua-
raguaçu, até as suas nascentes; encontrando muito "ouro"; o pri-
meiro em terras brasileiras...
Desde o ano de 1578, que as "minas" de P A R A N A G U Á esta-
vam em franca atividade na exploração do ouro; tendo sido, nesse
ano, remetidas ao Cardeal D. Henrique — rei de Portugal — as pri-
meiras amostras do precioso metal achado no B R A S I L (um frasco
cheio dele — "memória histórica" de Vieira dos Santos).
Depois, vieram as explorações das minas de Tagaçaba, Açun-
guí, Faisqueira, Cubatão e outras. Com esse feliz resultado, P A -
R A N A G U Á se tornou a povoação mais florescente da costa Sul do
Pais.
Os primeiros povoadores de P A R A N A G U Á formavam um
núcleo de certa significação social; alguns se elevando com grande
distinção, não só pela sua origem como pelo seu passado. Era pe-
queno esse núcleo social, pois apenas 15 nomes figuram no primei-
ro "Termo de ajuntamento". Porém, gente boa, com antepassados
ilustres e respeitáveis. Portanto, já existia elemento social, enri-
quecendo com a extração do ouro.
Em 1603, Salvador Correia de Sá, procurador do donatário da
Capitania de Santo Amaro e seu Capitão-mór e loco-tenente, deu
regimento às minas. Dez anos mais tarde, e'as tiveram novo re-
gimento, passado nas cortes de Valadolí.

CONSIDERAÇÕES

D O M I N G O S G O N Ç A L V E S PENEDA foi um chefe temido e obe-


decido por aquela legião de selvagens. E temos de convir que, para
lidar com os índios daquela época, só homens de uma tempera de
aço a toda p r o v a . . .
Se algo de mal fez ele, compensado foi por ter fundado a nossa
Pernagoá de outrora; iniciado a civilização dos carijós e preparado
a populosa Aldeia para poder receber o "Pelourinho" —- símbolo da
Lei e da Justiça — e mais tarde o título de " V I L A " ; desejo de todos.
P E N E D A não foi um Juiz formado; pouco estudo teve; apenas
um homem rude. Todavia, procurou manter a Justiça, a seu modo,
é verdade, numa povoação ainda sem Leis e sem controle adminis-
trativo. Foi mau; implacável mesmo. Contudo, era a única solu-
ção para lidar com o gentío e mesmo com a massa i g n a r a . . . Em
tais circunstâncias, qualquer outro faria assim. É só por o caso
em s i . . .
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Portanto, D O M I N G O S PENEDA, o temido pioneiro, apesar de
todos os atos violentos (próprios da época), tem seu valor incon
testável.
Fundando a Aldeia de P A R A N A G U Á , lançou a "semente" da
civilização, do labor e do progresso. Ela foi boa; vingou e deu
frutos. Mas o solo indígena também foi dadivoso. Ambos se com-
pletaram — terra e semente — numa união fraterna e indis-
solúvel ! . . .

SÉCULO ÁUREO

Os anos iam correndo e P A R A N A G U Á , a povoação mais meri-


dional, estendendo-se até ao Rio da Prata, possuía já a sua "Casa
de Fundição", a terceira do Brasil, em 1697, na rua do Colégio, para
nela se fundir e quintar o que se tirasse das minas de seu Município,
bem como dos Campos Gerais de Curitiba e de São José dos Pinhais.
Assim, todo o ouro em bruto, para aqui convergia, a fim de
ser fundido e tirada a quinta parte pertencente à Real Fazenda.
O Provedor das Minas controlava essa mineração, evitando os
desvios muito comuns. Essa extração de catas e faisqueiras, em-
bora rudimentar, através de bateias nos rios, durou seguramente
um século.
Apurava-se mais ou menos 20 gramas diárias do preciso
metal. E, para o conhecimento de vocês, podemos dizer com segu-
rança que, mais de 200 arrobas de ouro foram extraídas das Minas
de P A R A N A G U Á , nesse secu'o áureo. Tirando-se então a quinta
parte que de direito pertencia ao rei de Portugal (40 arrobas), as
restantes (160 arrobas), passavam a pertencer aos mineradores.
Daí as fortunas que se fizeram no passado, quando apenas 15 ou
20 pessoas (ou pouco mais) formavam o pequeno núcleo social do
populoso aldeiamento.
Caso curioso: Os Provedores de Minas, que foram muitos,
nenhum ficou rico. E note-se que era um cargo muito cobiçado,
devido as vantagens que tinham e a posição que ocupavam esses
Provedores.
São os reveses da s o r t e . . .

O GRANDE POVOADOR

O ano de 1640 veio encontrar a Aldeia de P A R A N A G U Á com


um fidalgo de linhagem castelhana — G A B R I E L DE L A R A —
paulista de grande valor. Viera ele com uma importante missão,
e esta não era outra senão a de ser o Capitão Povoador da terra
carijó.
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Chegando em 1640, encontrou a povoação em franco progresso;
reconhecendo então o valor de D O M I N G O S PENEDA. Sentiu-se
feliz, assistindo o trabalho fecundo dos primeiros paranaguaras.
Tomando as rédeas do Governo, como Capitão Povoador, tra-
tou de pedir e conseguiu a ereção do "Pelourinho" símbolo da
Justiça Real. Ato esse realizado aos 6 de janeiro de 1646, por
ordem do Governador do Rio de Janeiro — Duarte Correia Vas-
queanes.
Continuou pedindo, até que, em 1648, conseguiu o "foral" da-
tado de 29 de julho, dado pelo rei de Portugal — D. JOÃO IV —
elevando a Aldeia de P A R A N A G U Á à categoria de " V I L A " e juris-
dição sobre todas as terras chamadadas de S A N T A N A e que eram
as 40 léguas de costa e sertões correspondentes.
Mas a "Carta Regia" só chegou a P A R A N A G U Á em 26 de
dezembro desse mesmo ano. G A B R I E L DE L A R A convoca os ho-
mens bons e o povo em geral, a comparecer à sua residência e lê
a célebre "Carta Regia".
Instalada oficialmente a " V I L A DE NOSSA SENHORA DO
R O S Á R I O de P A R A N A G U Á (que nessa época pertencia à Capita-
nia Feudal de Santo Amaro, da qual era donatário Pero Lopes de
Sousa), o progresso aumentou, com a vinda de mais gente de
Santos, São Vicente e Cananéia.
Em 9 de janeiro de 1649, criou G A B R I E L DE L A R A a Vereança
e mais outras Leis.
O sentimento nativista começa então a se formar. No setor
econômico, a farinha de mandioca, principal produto da terra,
passa a ser exportada para o Rio de Janeiro.

FATO HISTÓRICO

Bastante curioso e pouco conhecido, este fato histórico passou-


se em 1654 (seis anos depois da fundação da V I L A ) .
O Conde da Ilha do Príncipe e o Marquês de Cascais, viviam
em contenda, na sucessão da Capitania de Santo Amaro (cujo
donatário — Pero Lopes de Sousa — havia naufragado na foz do
Rio da P r a t a ) .
Em 1655, aos 25 de fevereiro, a Câmara Municipal de P A R A -
N A G U Á deu posse ao Conde da Ilha do Príncipe ( D . Luiz Car-
neiro) . Em 8 de março, foi lavrado o Auto de posse dado ao Capi-
tão Mór e Ouvidor — Diogo Vaz de Escobar — como representante
do Conde (posse essa dada passivamente e sem nenhuma contra-
dição) .
Em 1656, o Marquês de Cascais ( D . Álvaro Pires de Castro)
tentou repelir ao Conde e, para conseguir o seu intento, separou o
Termo de P A R A N A G U Á , criando outra Capitania, diversa das de
Santo Amaro e São Vicente, com o apelido de Parnaguá; nomean-
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do G A B R I E L DE L A R A como Capitão Mór, Ouvidor e Alcaide Mór
da V I L A (dada a influência política, e social desse personagem).
A Câmara, entretanto, relutou em dar posse a L A R A nos deter-
minados postos.
Nesse ínterim (1659), veio uma "ordem" ao Provedor das Minas
(Pedro de Souza Pereira) determinando que fossem remetidas para
a guerra contra os holandeses, em Pernambuco, as companhias de
índios carijós que se achavam empregados nas Minas.
Essa "ordem" revoltou a população da V I L A , que, amotinada,
intimou ao Provedor que não cumprisse tal intimação. O próprio
G A B R I E L DE L A R A , com seu prestígio, conseguiu acalmar os âni-
mos, prometendo não permitir a retirada dos índios; pois sabia ficar
despovoada e desguarnecida a V I L A , além de parar o serviço da
mineração.
Mas, tendo ciência (1660) de que o Capitão Mór de Itanhaém
— Antonio Barbosa do Soto Maior — vinha pessoalmente executar
essa "ordem", a Câmara Municipal fez uma Vereança, na qual foi
lavrado um "Auto de Posse" e, em seguida, incorporada, dirigiu-se
à casa de G A B R I E L DE L A R A , empossando-o como Capitão Mór,
Ouvidor e Alcaide Mór da V I L A . Isso, aos 15 de maio de 1660
( L A R A : loco-tentente do Marquês de Cascais).
Assim desse modo, ficou a V I L A DE P A R A N A G U Á com "dois
capitães mores"; caso inédito nos anais da História do Brasil.
Em 30 de novembro desse ano, chegou a P A R A N A G U Á o Go-
vernador do Rio de Janeiro — Salvador Correia de Sá e Benevides
— em visita à V I L A e em inspeção às "minas de ouro".
Pôde então observar que o escasso rendimento da mineração
era devido a contenda entre os herdeiros de Pero Lopes de Souza,
através de seus prepostos, pertubando com isso a vida econômica
da V I L A .
Resolveu então, que a mesma se conservasse em nome del-rei
de Portugal, da mesma forma como se tinha criada. Resolveu
ainda, que não se reconhecesse o direito dos donatários pleiteantes
à sua posse, visto haver dúvidas quanto aos seus direitos.
Entretanto, permitiu que a V I L A continuasse constituída de
todos os órgãos políticos: O Legislativo — representado pela Câ-
mara Municipal; O Judiciário — pela Justiça Ordinária; O Execu-
tivo — pelo Capitão Mór e Alcaide Mór.
Dessa data em diante, G A B R I E L DE L A R A , em seus editais,
assinava: "Povoador da Vila de Nossa Senhora do Rosário de Pa-
ranaguá, em nome de Sua Alteza Real e com os mesmos poderes
de lugar-tenente e Procurador do Marquês de Cascais, na V I L A de
40 léguas da parte Sul" (Essa era a extensão da costa que se pre-
tendia fosse correspondente à doação feita a Pero Lopes de Souza).
Com o passar do tempo o sentimento nativista foi criando
corpo, e era natural, para o desenvolvimento da indústria e agri-
cultura.
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E, finalizando: em 1948, quando do "tricentenário de eleva-
ção de Aldeia de P A R A N A G U Á à categoria de " V I L A " , as autori-
dades do Estado conseguiram, através do Conselho Britânico dc
Rio de Janeiro, uma cópia fotostática do Códice do Museu Britâ-
nico sob n. 13.981, no qual diz: "ESTA V I L L A F O I F U N D A D A P O R
DOMINGOS PENEDA, N A T U R A L DA V I L L A DE SAO P A U L O .
H O M E M REGULO E M A T A D O R " .
" N . S. DO R O Z A R I O DE P A R N A G O À , CUJA V I L L A HÉ CA-
BEÇA DE C O M A R C A " . .. etc. etc.
Portanto, diante desse "documento", nada mais se pode dizer
contrariamente.
D O M I N G O A S PENEDA, seu fundador; embora conhecido como
R E G U L O E M A T A D O R , foi um chefe temido, mas respeitado e
obedecido por uma legião de selvícolas, que viam nele a Justiça de
"olho por olho e dente por dente". Era a L E I DA F O R Ç A a manter
disciplina entre selvagens e aventureiros de má índole aqui apor-
tados.
Usou a força bruta; contudo, preparou o povo para a civiliza-
ção que viria d e p o i s . . .
A ele, com todos os seus defeitos, mas também com suas quali-
dades, o nosso reconhecimento ! . . .

GABRIEL DE LARA

Fidalgo de escol, de cultura e valor, aqui chegado em 1640.


encontrou a Aldeia preparada para receber a civilização. Portanto,
fácil lhe foi governá-la. Mas note-se que o título de Capitão Povoa-
dor se referia a todas as terras que daqui partiam até ao Sul.
Esse o significado.
A ele, pois, o civilizador e criador das Leis, a nossa gratidão.

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BARTOLOMEU DE TORALES
(O MOÇO)

Este fidalgo espanhol, que viveu mais de sessenta anos em


nossa P A R A N A G U Á , era filho do nobre castelhano — Bartolomeu
de Torales, o velho — que, vindo da Espanha para o Paraguai,
acabou mudando-se para o B R A S I L , vindo residir em São Paulo
com sua esposa e seus dois filhos Bartolomeu, o moço, e Maria.
B A R T O L O M E U , O MOÇO, casou-se em São Paulo, com M A R I A
DE GOIS, filha do bandeirante Antonio Raposo e de Isabel de Gois,
para aqui veio em 1630, atraído pela fama do ouro descoberto em
P A R A N A G U Á , fixando residência muito antes da ereção do Pelou-
rinho e da elevação do Povoado a V I L A .
Alguns anos depois, requereu ele uma "sesmaria" de terras no
local que já vinha ocupando há muito tempo.
O despacho do Capitão Mór de São Vicente — Manoel Pereira
Lobo — datado de 20 de junho de 1648, foi favorável. Portanto,
um mês antes da elevação de P A R A N A G U Á a categoria de V I L A ,
B A R T O L O M E U DE T O R A L E S , O MOÇO, já se tornara proprietá-
rio da "sesmaria" requerida, a qual se estendia desde o Imboguaçú,
com irente para a baía, até Jacareí, e fundos para o rio Taquare
e Serra da Prata. A frente do terreno tinha 18 quilômetros de
extensão e abrangia, não só as terras do atual Distrito de Alexan-
dra, como também as de alguns bairros da V I L A .
Esse fato prova, também, cabalmente, não ser G A B R I E L DE
L A R A o fundador de Paranaguá. Senão, vejamos:
A carta de T O R A L E S , pedindo a "sesmaria de terras", diz
assim: " . . . sendo morador da nova povoação de Paranaguá, que
ajudou a povoar, descobrindo minas de ouro nos seus recôncavos,
e sendo dos primeiros p o v o a d o r e s . . . e t c . . . e t c . . .
Quando ele diz no requerimento: QUE AJUDOU A P O V O A R ,
dá claramente a entender que, quando aqui chegou, em 1630, já
encontrou uma povoação com moradores descendentes dos que
haviam se estabelecido na ilha da C O T I N G A .
B A R T O L O M E U DE T O R A L E S era um fidalgo de origem es-
panhola e, se viera com sua família, certame(nte que trouxera
agregado e escravos. Além do mais, deveria ter trazido homens
19
O 1.° VIGÁRIO DA VILA

1
Em uma vereança que fez a Câmara Municipa , a 23 de janeiro
de 1655, compareceu a ela o padre Dionísio de Melo Cabral, 1.° vi-
gário encomendado depois de ereta a Vila, requerendo aos verea-
dores lhe mandassem dar um pescador, conforme o ajuste que com
ele haviam feito. Pois, o negro que o povo lho havia dado, era
um homem doente.
A. esse requerimento, o povo respondeu que, se o escravo não
servia, entregasse-o ao seu antigo dono.
É que a Câmara Municipal havia se comprometido com o vigá-
rio ao pagamento de RR 60$000 (sessenta mil réis) anuais, para
realizar todos os ofícios religiosos durante um ano; mais 24 alquei-
res de farinha de mandioca (para o seu sustento), bem como um
pescador para o servir, também nesse ano.
A Câmara então, obrigou-se a dar ao padre, em cada mês, um
pescador tirado dentre o povo.
Em 4 de setembro de 1656, outro vereança foi feita, para re-
novar o ajuste com o padre Dionísio; visto ter acabalo o tempo
de um ano em que dera assistência espiritual ao povo da Vila.
Concordou, pois, a Câmara, em renovar o contrato por mais um
ano; a contar de 5 de outubro de 1656.
Como se pode observar, eram os Governo Municipais que con-
tratavam e pagavam aos padres vigários, para ministrar à popu-
lação todas as funções religosas necessárias a educação desse
mesmo povo.
Às vezes, quando as Vilas estavam em má situação financeira,
as Câmaras solicitavam o auxílio do rei de Portugal. Os padres
eram então pagos pelos cofres reais.
É que a Religião Católica, nos tempos coloniais e durante os
dois Impérios, estava ligada ao Estado.

22
A FONTE VELHA

Também chamada "Fonte de Cima", tem ela sua origem num


olho d'agua que serviu, há séculos, à taba carijó localizada na
baixada do antigo e desaparecido "Campo Grande".
Quando os moradores da Cotinga, chefiados por D O M I N G O S
PENEDA, passaram para o continente, à margem esquerda do rio
Taquaré, procuraram logo o chapadão onde se achava o "olho
d'agua" usado pelos carijós.
Os anos se escoando e a população branca aumentando. Tor-
nava-se necessário um represamento da água que corria para o
rio Taquaré.
Mas isso só veio acontecer, depois da chegada de Gabriel de
Lara. E tanto é verdade que, em uma vereança de 10 de abril de
1655, o procurador da Câmara expôs aos "edis" ser necessário
mandar-se limpar o caminho da Fonte da Gamboa (como também
era chamada).
Aliás, "Gamboa" não é verdadeiramente o nome; pois quer
dizer: "fruto do gamboeiro" (marmeleiro), embora também se dê
esse nome a um trecho de rio em que as água param, aparentando
um pequeno lago.
O certo é "Cambôa" — esteiro que enche com o fluxo da maré
e fica seco com o refluxo; formando um pequeno lago artificial à
beira mar; servindo para apanhar pequenos peixes.
Os primeiros povoadores brancos deram esse nome porque o
local da Fonte era um curral indígena para a apanha de peixes,
que presos ficavam com a vasante da maré.
Os índios costumavam dizer: "vamos camboar — pegar peixes
presos.
Esse caminho da Cambôa ficou pronto e limpo aos 4 de abril
de 1656 e passou a chamar-se rua da Fonte (hoje Conselheiro
Sinimbú).
Nesse ano de 1656, houve outra vereança, para se tratar então
do represamento da água em um reservatório, a fim de suprir a
população, que havia aumentado bastante. Além disso, não havia,
na época, outro manancial, e a água dos poços era salôbre.
A obra foi confiada a Roque Dias e João Gonçalves Peneda
(este último parece ter sido filho de Domingos P e n e d a ) ; A M B O S
23
prometeram aprontá-la em um mês. De fato, ficou pronta em
30 dias.
Não foi, porém, um trabalho perfeito, porque, um ano depois
(1657), teve a Câmara que entregar a empreitada a um pedreiro
mais competente, para construir o reservatório, fechado em forma
de abóbada, tendo, na parede fronteira ao rio, uma janelinha por
onde um operário pudesse entrar para fazer, mensalmente, a lim-
peza interna.
Segundo o contrato, o empreiteiro daria os escravos para con-
duzir as pedras, o saibro e a cal; bem como colocaria a bica de
pedra e os ladrões, para escoar o excesso d'agua.
Esse reservatório se alonga em galeria, para proteger o veio
d'agua que jorra sem cessar; não se sabendo de onde vem.
Essa admirável obra ficou pronta em agosto de 1658, e, até
hoje, passados 318 anos, ela continua firme na sua estrutura; come
também jamais faltou água, apesar das estiagens que, às vezes,
nos a t a c a m . . .
E o nome do e m p r e i t e i r o ? . . . Não foi possível g u a r d a r . . .
Perdeu-se com o passar dos a n o s . . .
A título de curiosidade, sabem por quanto saiu ela ? Por 50
patacas ! Cada pataca valia $ 320 reis, ou seja 16 vinténs (moeda
de cobre). Portanto, RS 16$000 (dezesseis mil réis da antiga
moeda).
Passaram mais 55 anos e, numa nova vereança de 26 de de-
zembro de 1714, cuidou-se de uma nova arquitetura. Foi contra-
tado o mestre-pedreiro — Agostinho da Silva Gomes — para emol-
durá-la com um bonito frontespício e com paredões baixos, que
contornam toda a Fonte.
Construída em 1658 e emoldurada em 1714, continua perfeita
até aos nossos dias ! É a mais antiga construção de P A R A N A G U Á
e que vem resistindo ao tempo inexorável que tudo consome.
Também é curioso saber que, em 1860, navios de alto bordo
(da época) entravam pela embocadura do rio Itiberê e vinham fazer
aguada em nossa Fonte Velha !
Em 1885, a "Broconot", canhoneira da Marinha de Guerra
Imperial, ancorou em pleno Itiberê, bem defronte ao Mercado!
Em 1859, foi construído o "chafariz", com duas torneiras gran-
des, de cobre. Um bom trabalho do empreiteiro — Joaquim Lopes
Ribeiro Bahia.
Em 1866, aos 23 de janeiro, inauguração e abertura das "tor-
neiras" do "chafariz" e entrega das mesmas à servidão pública.
Hoje, passados 110 anos, as duas grandes torneiras desaparece-
ram inexplicavelmente da F O N T E V E L H A . . . É de se lastimar ! . . .
Durante 200 anos os "aguadeiros" traziam água da Fonte às
casas de família, cobrando um tostão (100 réis) por barrilzinho.
Era uma carroça com um barril deitado, tendo uma grande tor-
neira. A carroça, puxada por um burro, percorria a Vila e depois
24
Cidade, parando nas casas dos fregueses, com o fim de supri-los da
água necessária ao consumo da família. E caso curioso: os burri-
cos, de tão habituados a esse trabalho diário, já sabiam onde parar,
talvez por instinto. E creiam, sem exagero, podemos afirmar.
Quanto à água para os banhos e lavagem das casas, aproveita-
va-se a água das chuvas, através das calhas, em pipas, nos quin-
tais. Isso porque, ainda não se enceravam os soalhos das casas.
Esse costume higiênico veio muito mais tarde.
Era um gosto ouvir-se o "aguadeiro" gritar na porta das casas:
"ói a água" ! . . .
Em 1914, o benemérito Dr. Caetano Munhoz da Rocha, então
Prefeito Municipal, inaugurou a "rede de água e esgoto" em nossa
terra. Foi o maior dos presentes que ele deu a P A R A N A G U Á .
Dessa data em diante, a querida " F O N T E V E L H A " ficou ao
abandono. Desapareceram os "aguadeiros". Ela passou então a
servir aos humildes, os quais ainda não tinham água encanada em
seus lares.
Hoje, é uma "relíquia" da Cidade; um "Patrimônio Histórico",
que muito engrandece nossa terra.
A ladeira dessa tradicional Fonte é toda calçada com pedras
trazidas da África. Vinham como "lastro", no porão, junto com
os negros escravos. Serviram para os primeiros calçamentos da
VILA.

25
UMA RENHIDA LIDE MUNICIPAL

Em 1669 — O Capitão Mor Gabriel de Lara havia doado, por


"sesmaria" as ilhas R A S A e da C O T I N G A , ao Capitão João Velozo
de Miranda, que nela residia. Mas, em 1675, verificando o erro, a
Câmara Municipal fez, a 15 de abril, uma vereança, na qual com-
pareceram Gabriel de Lara e João Velozo de Miranda. Foi então
explicado a ambos que as ditas ilhas eram bens do Conselho, fican-
do, assim, nula a "Carta de Data". Como os dois interessados con-
cordassem pacificamente, foi lavrado um Termo. (Prov. Pires Par-
dinho).
Houve, depois, renhida lide judicial entre a Câmara Municipal
e Manoel de Lemos Conde; continuando, mais tarde, com seu filho
A. Morato. Eis o fato:
A primeira demarcação dos terrenos do Rossío, que pertenciam
ao Conselho, foi feita em 30 de dezembro de 1654. A Câmara gozou,
assim, dessa posse, até o ano de 1675, sem que ninguém impug-
nasse.
Acontece que Manoel de Lemos Conde tinha, nesse Rossío, 750
braças de terra, dadas por "Carta de Data". Quis ele então, mali-
ciosamente, usurpar mais partes dos terrenos do Conselho. Para
isso, mandou arrancar, às ocultas, os primeiros marcos divisórios
e, com seus estratagemas, procurou iludir aos camaristas (vereado-
r e s ) , obtendo novas medições a seu belo prazer, ficando assim com
a posse delas.
Quando a Câmara quis entrar no domínio dos seus primeiros
limites, não mais pode fazer, porque Lemos Conde se opôs, lançan-
do contra ela uma ação judicial. Essa luta durou mais de 60 A N O S ;
passando de pai para filho.
Só em 1721 é que terminou o litígio; quando o Dr. Rafael Pires
Pardinho, no seu provimento, ordenou que, depois de ser dada a
sentença final, a Câmara Municipal tornasse a demarcar o Rossío
conforme julgasse melhor.
(Este histórico foi extraído dos Provimentos do Dr. Rafael P.
Pardinho).

26
MANOEL DE LEMOS CONDE OU A MINA DE PRATA

1674 — Nessa época, M A N O E L DE LEMOS CONDE, servia em


P A R A N A G U Á , como Provedor das Minas. Nesse mesmo ano, veio,
em inspeção, o Administrador Geral da Repartição do Sul — Ca-
pitão Mor Agostinho do Figueiredo — para averiguar sobre o des-
cobrimento da "Mina de Prata", que se dizia existir.
Alguns meses depois, escreveu uma carta a Manoel de Lemos
Conde, elogiando-o pelo zelo no Serviço e Fazenda de sua Alteza, e
combinando irem juntos às paragens da Serra, para verificar a tal
"Mina de Prata !".
Manoel de Lemos Conde, na qualidade de Provedor das Minas,
havia criado certos obstáculos, opondo-se, com isso, às roubalheiras
de alguns senhores importantes da V I L A , quanto ao "ouro" dos
quintos reais.
Tais senhores, enraivecidos, denunciam habilmente, com infâ-
mias e calúnias, ao Ouvidor Geral da Capitania do Rio de Janeiro
— Pedro de Unhão Castelo Branco — que o castigou severamente,
demitindo-o do cargo de Provedor das Minas.
Nesse ínterim, Lemos Conde recebe uma carta do rei, pedindo
notícias sobre o rendimento das Minas e em que estado elas se acha-
vam, pois há muito que nada sabia das mesmas.
Lemos Conde, responde a carta do rei, defendendo-se das ca-
lúnias e intrigas que sofrerá e comunica ter descoberto "Prata" na
serra de São João (atual serra da P r a t a ) . O rei então, de posse da
alviçareira notícia; reconhecendo sua inocência; escreve uma "car-
ta regia" a Pedro de Unhão Castelo Branco, obrigando-o a vir a P A -
R A N A G U Á , repor o Provedor das Minas de Ouro — Manoel de L e -
mos Conde — no seu cargo, bem como os demais oficiais que com
ele trabalhavam. Lemos Conde foi também indenizado, junto com
seus auxiliares.
Porém, o ódio e o rancor de Pedro de Unhão, de Dom Rodrigo
e dos demais senhores importantes da Vila, recrudeceu. Não po-
dendo desabafar, dadas as circunstâncias, esperaram a oportuni
dade. E ela v e i o . . . Manoel de Lemos Conde ficou esperando as
ordens do rei, quanto à descoberta da Mina de Prata, que, no seu
modo de pensar, daria a ele, Lemos, o título de "Administrador".
Infelizmente, nova desilusão s o f r e u . . .
27
Logo depois, chega a P A R A N A G U Á uma "Comissão", chefiada
por Dom Rodrigo de Castelo Branco (parente de Pedro de Unhão
Castelo B r a n c o ) , a fim de organizar uma grande expedição para
bater a Serra, onde Lemos Conde dizia haver Mina de Prata.
Essa expedição transpôs a Serra do Mar, chegando até aos
campos de Curitiba, nada encontrando de p r a t a . . . Um ano per-
dido e um grande trabalho também perdido e, mais que tudo, gran-
des despesas
Um aparte:
Não é possível explorar-se a Serra da Prata, da Limeira, da Ca-
navieira e outras, em apenas um ano. E isso três séculos atrás ! . . .
(Essas serras são todas ramificações da Cordilheira do Mar, e abran-
g e : Guaraqueçaba, Morretes, P A R A N A G U Á e Guaratuba).
Só para as três primeiras — Canavieira, Limeira e da Prata —
seria preciso um prazo de 2 a 3 anos para explorá-las.
Logo, não foi uma exploração minuciosa, e sim, superficial.
Entretanto, Lemos Conde sabia onde estava o "veio"; mas, pre-
feriu calar, porque compreendeu logo que nada iria ganhar; nem
mesmo o cargo de administrador...
Com essa atitude, cavou a sua pópria ruína; que era o que seus
inimigos desejavam. Assim sendo, calou, e calou de verdade; mes-
mo sabendo o que o futuro lhe r e s e r v a v a . . .

A expedição, totalmente fracassada, acirrou ainda mais os


ódios de seus inimigos, dando-lhes mais força para derrotá-lo com-
pletamente.
Chegando de volta à Vila (abril de 1680), Dom Rodrigues de
Castelo Branco depôs, imediatamente, Lemos Conde, do cargo de
Provedor das Minas; prendeu-o e enviou-o para Santos; seqües-
trando em seguida os seus bens.
Lemos Conde, desesperado por se achar preso e incomunicável,
finda os seus dias numa masmorra, degolando-se...
Seu espólio, que montou em RS 793$860 (setecentos e noventa
e três mil, oitocentos e sessenta réis), foi depois recebido por seus
familiares, devido ao recurso impetrado junto ao Juízo dos Feitos
da Fazenda.
CONSIDERANDOS:
— Manoel de Lemos Conde foi acusado de falta cometida na arre-
cadação ou aplicação dos quintos reais. Todavia, morreu, dei-
xando apenas a quantia de RS 793$860. Como pode ser isso ? . . .
Logo, as razões foram outras: O Segredo. Sim, o s e g r e d o . . .
— O Administrador Geral da Repartição do Sul — Capitão Mor
Agostinho de Figueiredo — havia ido à Mina com Lemos Conde,
a fim de verificar e constatar a existência dela. Por que, após
a morte de Lemos Conde, não foi explorá-la ? Por medo às Leis
28
severas ? Por ter esquecido o lugar exato ? Por ter feito um
juramento ?
O fato é que, existiam duas pessoas conhecedoras da Mina: Le-
mos Conde e F i g u e i r e d o . . . Logo, algum motivo h o u v e . . .
— E seu filho — Antonio Morato — Não houve, também, tempo de
Lemos Conde revelar-lhe o segredo Se Morato sabia, por que
silenciou ?
Medo ? Sim, m e d o . . .

A eterna "bola de borracha"... Vai à parede e volta ! . . .


Em 1681 — Dom Rodrigo de Castelo Branco foi nomeado ad-
ministrador das Minas do Brasil. Arrogante e atrevido, como era,
quis se apropriar dos "roteiros" das Minas de Sabarábuçú... e caiu
morto, varado por uma bala de t r a b u c o . . .
Assim termina a história do malogrado Provedor das Minas —
Manoel de Lemos Conde — e do seu maior inimigo — Dom Ro-
drigo . . .
Dias depois da morte de Dom Rodrigo de Castelo Branco, che-
gou uma "carta regia", demitindo-o.
Mais tarde, veio outra, confiscando-lhe os b e n s . . .
O eterno "choque de retorno" ! . . .

29
A ERMIDA DE N. S. DAS MERCÊS

Foi construída pelo Provedor das Minas de P A R A N A G U Á —


Capitão Manoel de Lemos Conde.
Ele obteve do vigário geral — Francisco da Silveira Reis —
administrador do bispado do Rio de Janeiro — licença para edificar
uma "ermida" no outeiro da Cotinga, à vista de P A R A N A G U Á , em
1.° de junho de 1677.
Essa "capelinha" teve uma vida efêmera. Apenas 22 anos;
embora com grande devoção dos moradores e fiéis que vinham da
Vila.
Em 1699, veio, em visita ordinária, a P A R A N A G U Á , o padre
João de Souza da Fonseca (visitador do bispado) que, inconsidera-
damente e sem as circunstâncias de direito e de constituição, auto-
rizou a demolição da "ermida".
A N T O N I O M O R A T O , filho de Manoel de Lemos Conde, de-
moliu-a em 1699.
O material, porém (portas, janelas, vigas, etc.) seria aprovei-
tado para a construção de outra igrejinha, na Vila, à Rua da Cam-
bôa (depois Rua da Fonte e hoje, Conselheiro Sinimbu). Ela teve
início no ano de 1700, pelo mesmo Antonio Morato, Teria também
a invocação de N. S. das Mercês; criando-se, além disso, uma Ir-
mandade.
Supõe-se que, talvez tenha sido nessa igrejinha o início da Or-
dem Terceira do Seráfico São Francisco da Penitência.
1704 — Em agosto desse ano, a Câmara Municipal fez uma
promessa à Religião da Companhia de Jesus, em nome do povo pa-
ranaguara, para a fundação de um Colégio e Convento, na Vila.
Em 1708 — Antonio Morato e sua mulher, que se intitulavam
protetores da nova capela de N. S. das Mercês; em 14 de junho,
doaram-na, com a fábrica e imagens e mais metade da ilha da
Cotinga, aos padres da Cia. de Jesus.
Essa oferta ficou nula, porquanto, não mais tinham direito,
devido as esmolas angariadas entre o povo para a construção da
capela. Quanto à Cotinga, muito menos direito. Pois não podiam
alienar bens da Coroa, sem obter a Provisão de sua majestade.
Também ficou nula a oferta.

i0
A VIRGEM DO ROSSÍO NA HISTÓRIA E NA LENDA

"Contos" .. .há quem os conte de mil e variadas f o r m a s . . .


Uns, são fantásticos, criados pela imaginação fértil do homem;
como soem ser os das "mil e uma noites".
Outros, tirados da vida real — ora trágicos, ora alegres — tra-
zem o leitor, que os aprecia, em constante espectativa...
Também os há de fundo histórico, que, quando feitos corn
lisura, muito contribuem na vida de uma nação; quer quanto aos
fatos em si, quer quanto à parte moral que e n c e r r a . . .
Para alguns, porém, os "contos" são massantes, quando deles
se precisam datas. Todavia, quando baseados na história de um
povo, as "datas" são imprescindíveis, e os mínimos detalhes, muito
mais ainda.

Foi quase nos fins do século X V I I . . . Corria o ano de 1680,


aproximadamente. Na costeira do Rossío, da Vila de N. S. do Ro-
sário de P A R A N A G U Á , moravam humildes pescadores que viviam
do que o mar lhes dava nos dias de bonança.
Uma noite — era no mês de novembro — numa dessas calma-
rias de verão, estavam eles a lidar com suas redes, já lançadas ao
mar por várias vezes, sem pegar um único peixe.
Parecia, a eles, pobres infelizes, que Deus os havia esquecido
de todo, não lembrando também os filhinhos que, em casa, tinham
fome.
Desanimados e mesmo sem esperança de conseguir ao menos
um pequeno lanço para o sustento da família, já pensavam em vol-
tar à terra.
Mas, a persistência e a calma do nosso modesto praieiro é bem
peculiar.
Resolveram pois, lançar mais uma vez, e dessa feita, talvez por
instinto, sobre a parte do mar onde a lua lançava seus raios argên-
teos, mais parecendo um punhado de prata a se balouçar na for-
mosa baía.
Fascinados pelo belo espetáculo, lançaram-na ao mar, com a
alma ainda crente, num derradeiro fio de esperança. Alguns mi-
nutos passaram, ouvindo apenas o marulhar constante das peque-
31
ninas ondas, com uma sensação inexplicável. Puxaram-na por fim
e, sentindo-a leve, perceberam que nada haviam pescado. Todavia,
ela trazia algo pequeno que, entre as malhas, não se podia reco-
nhecer; mas que, aberta a rede na canoa, depararam com uma pe-
quena imagem da Virgem do Rosário.
Atônitos, na sua ingênua simplicidade, não sabiam o que fa-
zer. .. Um dos praieiros, o mais velho, mais sensato; mais calmo:
tomou o "caso" como bom aviso: Era "Nossa Senhora" que vinha
em seu auxílio ! . . .
Colocaram a "imagem" no fundo da canoa e novamente lança-
ram a rede ao mar; esse mesmo mar que lhes tinha sido tão in-
grato . . .
Mas, oh surpresa! Dessa vez, a rede vinha pejada de pei-
xes ! . . A pesca seria abundante ! . . . Milagre de Maria Santís-
sima ! . . .
A "Virgem", que seria do "Rossío", havia feito seu primeiro
milagre ! . . .

Trouxeram, os pescadores, a "imagem" para a terra, a fim de


venerá-la na sua rudez de caboclos. Chamar-se-ia " N . S. do Rosário
do Rossío", por ter sido achada nesse arrabalde: a costeira do Ros-
sío da V i l a . . .
No lugar onde hoje se ergue o atual Templo, morava, há muito,
um velho preto africano, conhecido por "Pai Berê", que, ao saber
do extraordinário e precioso achado, prontificou-se a fazer uma
"igrejinha" de sapé, junto à sua choupana.
Aceita a idéia, entregaram os pescadores, a "imagem" ao velho
"Pai B e r ê " . . .
Dias depois, Ela passou a morar na sua primeira habitação:
Um humilde templo de pau-a-pique, feito pelas calosas mãos de
um negro da África — o bom velhinho "Pai B e r ê " . . .
O ancião, talvez com a nostalgia que lhe invadia a alma pura,
resolveu fazer, todos os domingos, um "terço" em louvor à Santinha
do Rossío, para o qual acorriam todos os moradores das redondezas.
Os primeiros milagres logo se fizeram sentir e, em pouco tem-
po, essa fama correu de choça em choça, incentivando, mais e mais,
o culto fervoroso daquelas almas simples que, nas suas aflições, re-
corriam, com ardente fé, ao patrocínio da "Senhora do R o s s í o " . . .

Anos mais tarde, por morte do velho "Pai Berê", a imagem


passou a pertencer ao Alferes — Faustino José da Silva Borges —
proprietário do terreno em que fora construída a "igrejinha", e que
também vinha exercendo as funções de zelador.
32
Estava ele construindo, desde 1797, a nova "capela", com as
esmolas dos devotos, sem contudo conseguir terminá-la (devido os
seus minguados recursos), quando a Providência veio em seu au-
xílio.
Morava em Antonina um tal Simão Cardoso Pazes — Sargento
Mor da Vila — que possuía um escravo de estimação, por nome
"Agostinho", considerado uma valiosa peça.
Adoece o escravo, e o Sargento Mor que não queria perdê-lo,
aplica todos os recursos da medicina de então, sem nada conseguir.
Desanimado, resolve fazer uma "promessa" por escrito, à Vir-
gem do Rossío; implorando a cura do seu escravo e prometendo,
tão logo ele sarasse, mandá-lo-ia trabalhar de graça durante 6 me-
ses, na construção da capela. Essa "promessa" foi escrita e enviada
ao zelador Faustino, em P A R A N A G U Á .
Opera-se o milagre ! — Agostinho fica bom. O Zelador recla-
ma o cumprimento da "promessa". Porém o Sargento Mor, em A n -
tonina, nem mais se lembra; procurando sempre evasivas. Entre
tanto, sem se esperar, ele vem a morrer repentinamente, em 1806.
O Zelador reclama em "juízo" a dívida do Sargento Mor e ga-
nha a questão, recebendo dos bens deixados pelo morto, uma quan-
tia correspondente aos 6 meses de trabalho servil prometido. Com
esse dinheiro, pode comprar material e continuar a construção da
Igrejinha, que só ficou pronta em 1813.

Dessa data em diante, a fama dos seus milagres se espalhou


pela Vila, abrangendo também Morretes, Antonina e Porto de Ci-
ma. Foi mais além; correu toda a costa de São Paulo, bem como
o litoral catarinense.
Era uma fascinação irresistível, uma fé inquebrantável que to-
dos sentiam pela Santinha do R o s s í o . . .
A " f é " , pregada pelo Rabí da Galiléia, operava o "milagre", e
eles são tantos, que se não sabe como c o m e ç a r . . .
— Às vezes, um abastado senhor, entrevado, gemia em seu leito de
dor. A medicina fizera tudo para minorar seu sofrimento; em
vão...
Chegava-se a preta velha, escrava de confiança da casa e, timi
damente falava à patroa: "Sinhá, mecê deixa eu í no Rossío pedi à
Nossa Sinhóra pela saúde do patrão ?
— Vai, mãe preta, e pede à Virgem Santíssima que não nos desam-
pare. . .
E o milagre se realiziava ! . . .
— Outras, uma infeliz criança a se estorcer nos espasmos da ago-
nia . . .
Corria a velha africana ao Rossío e, com o olhar súplice; a voz
entrecortada pelos soluços; pedia, de joelhos, a "vida" para aquele
33
ente querido, que era o enlevo da família e a luz dos olhos de mãe
preta...
Operava-se o milagre ! . . . A mucama era feliz; podia, nova-
mente, acalentar o belo "nhonhozinho" b r a n c o . . .
— Outras vezes ainda; intrépidos marujos, em alto mar, a lutar
heroicamente, com as ondas encapeladas pela tempestade... O
navio quase a sossobrar... e eles, por fim, sentindo-se mesqui-
nhos ante as forças prepotentes da N a t u r e z a . . . uns átomos nas
dobras do I n f i n i t o . . . Clamavam pela Virgem: "Senhora do
Rossío, piedade para nós" ! . . .
Novo e mais forte milagre ! Calmo retornava-se o mar; ventos
abrandando... céu de chumbo desaparecendo... e o azul do infi-
nito voltando a dar alento ao coração da intrépida marujada ! . . .
Dias depois, via-se já no decantado arrabalde, a tripulação can-
sada, em procura do modesto S a n t u á r i o . . . Lá, ante aos pés dó
altar, perante aquela imagem pequenina, que simboliza a fé arden-
te e tudo o que há de mais caro para o crente — almas simples, que
a solidão tornou fortes e retemperadas — estavam eles, agradecen-
do o favor recebido, a graça alcançada...
1
E assim foi se espalhando a notícia dos mi agres obtidos, por
toda a costa meridional do País.
De todos os recantos vinha gente implorar, aos pés da Virgem,
lenitivo aos seus sofrimentos...
— Em 1813, ficou terminada a primeira capela de N. S. do Ro-
sário do Rossío de P A R A N A G U Á , sob a proteção do vigário — frei
Manuel de São Tomaz — que a recebeu do antigo zelador. Ben-
zendo-a, o vigário entregou-a ao culto do povo.
Sua festa continuou a ser realizada na primeira quinzena de
novembro, época em que foi encontrada a imagem; não se sabendo
ao certo a data exata. Sua primeira novena sempre teve início na
primeira sexta-feira depois de finados (É o que há de mais positivo).
Os anos foram passando e o Rossío se tornando o enlevo da
gente do lugar. O modesto e pequenino templo era também o en-
canto dos poetas da terra, que nele tinham as suas mais emocio-
nantes inspirações...
Fernando Amaro de Miranda, cantava o seu "Rossío querido".
Júlia da Costa, longe da terra natal, evocava, nos seus versos, o sin-
gelo Santuário. Leôncio Correia, em suas poesias, lembrando o
Rossío de sua mocidade, suplicava lenitivo às suas máguas àquela
que sempre foi a medianeira entre Deus e o homem.
E num misto de fé e devoção, o atraente arrabalde se foi tor-
nando cada vez mais poético e mais querido dos paranaguaras...

Assim, foi a simples igrejinha passando por várias transforma-


ções, em épocas diversas, e suas festas sofreram também a evolução
dos tempos.
34
Às novenas, que já se faziam com brilho, iam os devotos e ro-
meiros a pé ou em carrocinhas, pela maravilhosa "Estrada Velha
do Rossío", toda ladeada de frondosas árvores, abrandando assim,
pela sábia mão da Natureza, os rigores do verão, nas tardes cálidas
de novembro.
Essa inesquecível "estrada", hoje desaparecida pela força do
progresso, tinha início no famoso " A l t o " (onde hoje se acha o Co-
légio São José). A Rua "Gabriel de Lara", ainda não existia. A l -
cançamos quando ela foi traçada e depois baixada quase um metro
e meio, para formar o leito de rua que hoje tem.
Lá pelos anos de 1862, apareceu outro meio de transporte: O
vaporzinho "Marumbí" e mais tarde o "Iguaçu". Davam eles um
encanto tamanho, nas suas curtas viagens; saindo do "Largo Gli-
cério". às margens do lendário Itiberê, até à frente da igrejinha,
no Rossío.
— Veio, a seguir, a moda do transporte a cavalo. Reuniam-se,
no inolvidável "Campo Grande", os elementos da fina flor para-
naguara, e partiam juntos, galopando com garbo, em demanda do
já tradicional Rossío. As damas da alta roda também iam, vestin-
do à "amazonas" (saia própria, com "anquinhas"; nada de "culo-
t e s " ) . Montavam de "banda" (com montaria própria), como se
usava na época. Esses trajes, em geral, vinham da Corte (Rio de
Janeiro). É que o luxo estava ganhando terreno.
Os da classe média e os humildes, iam como lhes era possível.
Pois a fé que possuíam estava acima do luxo e continuava cada vez
mais firme. — De 1883 para cá, o célebre " A l t o " foi perdendo ani-
mação.
Inaugurada a "Estrada de Ferro P A R A N A G U A - C u r i t i b a " , a
Companhia estabeleceu trens para conduzir os devotos e romeiros.
Partiam eles da Estação local, até a Estação D. P E D R O I I . O trem
parava então no antigo Porto Dágua. Tinha-se, porém, que cami-
nhar um pequeno trecho a pé.
Só em 1892 é que surgiu o "Bonde a vapor"; o célebre e tão
decantado "Bondinho".
Ele fazia as delícias da petizada irrequieta de nossa terra. Nesse
tempo a "maquinazinha", puxando 8 ou 9 carros também peque-
nos, ao chegar ao Porto D. Pedro I I , ía margeando a praia, tor-
nando assim mais atraente o passeio ao querido a r r a b a l d e . . .
Às 4 (quatro) horas da tarde saía a Banda de Música, a —
"charanga", como diziam os maldosos, percorrendo as ruas da ci-
dade, rumo à rua da praia (hoje, General Carneiro), entre os pré-
dios do "Matias Bonn" e "Paulo Vianna". Ali, término da Rua
Barradas (hoje Mal. Alberto de A b r e u ) , estacionavam os bondinhos
puxados pela maquinazinha que, pela pequenês, tornavam-se in-
teressantes.
De vez em quando alguns apitos punham a população em pol-
vorosa. Era nesse momento que o coração do paranaguara come-
35
cava a pulsar mais forte; no desejo incontido de ir ao Rossío, e, mau
grado as preocupações, ía mesmo ! . . . Que prazer tão grande a
gente sentia, inexplicável mesmo ! Só os remanescentes desse bom
tempo podem compreender tal s e n t i m e n t o . . .
Também, diga-se de passagem, não havia, naqueles idos, os
atrativos da moderna geração.
Lá chegados, viam-se as pretas velhas com suas cestas tibás de
apetitosos petiscos: pastéis e bolinhos de camarão à moda da época:
broínhas, siquilhos, balas de coco; tudo feito em casa; cestinhas
caprichosamente ornamentadas e cheias de doces; os refrigerantes
"gengibirra", "capilé", "caldo de cana" ( g a r a p a ) , eram as únicas
bebidas daqueles tempos. Aparecia também o tucum — prazer da
criançada. A cerveja veio mais tarde. Haviam ainda as modestas
barraquinhas com o bom café torrado em c a s a . . . tudo a contrastar
com os finos trajes das senhoras e mocinhas casadouras. Quanta
saudade (para nós velhos) desse tempinho tão b o m . . .
O luxo continuava imperando nas altas camadas; nem pare-
cendo que se ía a uma festa campestre, tal o requinte do belo sexo.
Mas a nossa vingança era grande, quando as fagulhas da ma-
quinazinha em movimento iam queimar os espaventados chapéus
de gase e vestidos de cetim das recatadas donzelas bem repimpadas
nos incômodos bancos dos pequenos carros apinhados de gente. Os
"pingentes", já os havia naquela época.
De quando em quando, um dos carros descarrilava ! . . . Sal
tavam todos para pô-lo novamente nos trilhos (bitola estreita) e
isso competia aos homens, que o faziam com todo o prazer, para se
prosearem perante as garotas. Como ríamos gostosamente com
tais cenas que se repetiam constantemente ! . . .
Esse meio de transporte era fácil e divertido; contudo, a festa
ia, aos poucos, perdendo o atrativo, devido a precipitação do regres-
so; pois a volta tornava-se um verdadeiro problema. A maioria do
povo deixava a igreja antes mesmo de terminar a função religiosa
a fim de arranjar um bom lugar nos gozados bondinhos.
Tudo passa na vida, e eles também passaram...
— Hoje o transporte é feito por meio de ônibus e táxis, sem o
atropelo dos tempos que se foram. Muita barraca com quinquilha-
rias, pechisbeques, fazendo concorrência ao comércio varejista da
cidade.
Pouco existe da antiga "Festa", é verdade; porém, o culto à
Santinha do Rossío continua o mesmo.
Aos 29 de junho de 1902, foi colocada a pedra fundamental do
atual Santuário, que, com os anos que se seguiram, embora moro-
sos, foi tomando vulto. Sua torre foi inaugurada a 30 de maio de
1920, e seu altar batizado no dia 4 de novembro de 1922. Nessa
a
ocasião foi cantada, pela distinta dama — D . Rosita Bastos da
Rocha — a maravilhosa e inesquecível " A V E M A R I S S T E L L A " ,
composição do maestro — João Gomes Raposo.
36
Em 1929, foram festeiros: G U I M A R Ã E S & CIA.. Nessa Festa
foi executado, pela primeira vez, com grande orquestra, durante
as novenas e na missa solene, o " H I N O A V I R G E M DO R O S S Í O " ;
composição do maestro José Itiberê de Lima e letra de Leocádio
Correia. Executou-o, no órgão, o próprio autor. O solo esteve a
cargo da Exma. Sra. Rosita Bastos da Rocha, esposa do ilustre clí-
nico, Dr. Belmiro Saldanha da Rocha.
a
D . Rosita, durante os 27 anos que residiu em Paranaguá, criou
e dirigiu o "coro" de moças, para cantar na igreja. Com sua admi-
rável voz de soprano, tornou-se uma figura imprescindível, tanto
nas festas religiosas, como sociais e filantrópicas.
— Em 1939, por ocasião do "Jubileu Mariano", foi a imagem
da Virgem do Rossío levada em visita à capital paranaense; depois
de 259 anos passados na quietude e sossego do litoral carijó. Uma
"comissão" especial veio buscá-la; levando-a em "trem especial".
Uma verdadeira apoteose a sua chegada. Nunca um "estadista" ou
"homem de letras" recebeu tamanhas homenagens. Uma extraor-
dinária "procissão", com milhares de devotos partiu da Estação da
Estrada de Ferro, a caminho da Catedral. À sua chegada, do alto
da escadaria do templo, falou em nome de nossa P A R A N A G U Á , um
seu filho ilustre — Genaro Régis — o qual, numa admirável inspi-
ração, assim se expressou:
"Povo de Curitiba, nós, da terra paranaguara, vos confiamos
esta "imagem milagrosa". Cuidai bem e v e l a i ! pois Ela é a nossa
padroeira ! É a " P A D R O E I R A DO P A R A N Á ! ! !".
Impossível descrever o efeito causado e os minutos que se se-
guiram a essas palavras mágicas: " P A D R O E I R A DO P A R A N Á " ! . . .
Um nunca acabar de vivas e de palmas ! . . .
Calou fundo na alma crente do povo. E o epíteto ficou, como
um testemunho vivo do quanto pode a voz do povo, que é, no dizer
popular: a voz de DEUS !
Genaro Régis teve uma feliz visão. A ele essa glória de um
"batismo" por inspiração. Glória essa que passará aos anais da
"História da terra carijó".
No memorável ano de 1948, quando do Jubileu de prata do Ar-
cebispo do Paraná, vieram, novamente, os filhos da "terra dos pi-
nheirais", buscá-la, a fim de presidir ao I Congresso Mariano do
Paraná.
Nova e mais empolgante apoteose ! Verdadeira e dignificante
demonstração de fé jamais vista em Curitiba. Essa visita durou de
4 a 16 de abril. Já então consagrada pelo povo paranaense como
sua "Padroeira", valeu tão justa quão significante prerrogativa.

Dezembro — " N A T A L " — Festa do Lar. Mês em que ao mundo


veio o filho de DEUS feito homem; nascido da Virgem de Nazaré, a
Mãe por excelência, sempre amada de todo o cristão.
37
Maria, Virgem-Mãe, que, na forma de imagem, é cultuada em
todos os lares cristãos, sempre foi venerada pelo paranaguara sob
a invocação de "Senhora do Rossío".
Mês em que de todos os recantos do planeta saem preces de
louvor ao Menino-Deus, P A R A N A G U Á foi abalada pelo maior golpe
que poderia ferir um povo c r e n t e . . . a imagem da Virgem do Rossío
sacrilegamente roubada do seu altar, da sua igreja, da sua P A R A -
N A G U Á , do povo paranaense... Como e com que fim ? . . .
Inexplicável fato desgraçadamente registrado nos anais da his-
tória religiosa do P a r a n á . . . E jamais se descobriu o malsinado
autor...
Abalo moral nos lares católicos; tristeza na alma dos crentes'
impressão de mal-estar no espírito dos tolerantes...
E o Rossío da velha P A R A N A G U Á , tão decantado pelos poetas
de todos os tempos, continuará na mente das gerações vindouras
com uma impressionante interrogação, onde a dúvida jamais se
apagará...
Era uma vez um punhado de almas simples; um velho Pai Berê;
uma pequenina imagem achada nas águas calmas de uma formosa
baía; um tosco templo de pau-a-pique; promessas. . . milagres. . .
corações agradecidos... um mundo de felicidades. . .
Ura Rossío encantado que nasceu e viveu áureos anos de sorrisos
e lágrimas de fervorosos crentes; mas, passando, como tudo passa
na vida, deixou uma saudade bem doída no coração daqueles que
ainda viverão para contar aos pósteros, com incontida mágoa, a
"história" tão amargamente ocorrida naquele tristonho d i a . . .
Já vão quase 300 anos de um passado cheio de fé; dessa fé que
remove montanhas; dessa fé que tudo salva, e, com eles, a angus-
tiosa recordação de uma "imagem" que era tudo para n ó s . . . Uma
dádiva de DEUS à terra paranaguara, e que talvez não volte
mais...
1949 — Quarto mês do calendário Juliano.
Dia 6 — Manhã de abril, límpida e solarenta; dessas que a
vetusta P A R A N A G U Á sabe presentear aos forasteiros, a cidade soer-
gue-se em alvoroço para receber uma esplêndida visita e um "mi-
m o " sem igual; um facsimile da antiga imagem, ofertado à terra
carijó, pelo Arcebispo do P a r a n á ! . . .
E no bucólico arrabalde paranaguara voltou a reinar a grande
e poderosa Mãe dos aflitos — M A R I A S A N T Í S S I M A — simbolizada
naquela pequena imagem sob a invocação de "Senhora do Rossío" !
E a P A R A N A G U Á de todos os tempos retornou a viver seus
áureos dias de fé e devoção; assim como o tri-centenário Rossío con-
tinuará vivo, através da tradição, na alma de nossa gente, pelos
séculos em fora ! . . .

38
O COLÉGIO DOS JESUÍTAS

Falar em Escola ou Colégio, é falar da cultura de um povo. A


mais modesta cidade, por pequena que seja; interessando-se pelo
"ensino" de seu povo, está dando a conhecer de que é culta, ou, pelo
menos, assim o deseja ser.
O "ensino" traz luz, e trazendo luz, aclara a mente de todo o
ser humano.
Todos têm inteligência; uns mais, outros menos. Porém, a fa-
culdade de assimilação de certas criaturas, faz com que as tenha-
mos em um nível mais elevado, de respeito e de admiração.
Mas, voltando às Escolas ou Colégios, P A R A N A G U Á sempre
pugnou pe"o melhor. Haja visto o que ainda resta do que foi o
excelente Colégio dos Jesuítas.
E é dele que iremos falar com a maior consideração possível.
C documento mais antigo que prova o nascimento da admirá-
vel "Casa" e depois, do magnífico "Colégio", é a petição da Câmara
Municipal de P A R A N A G U Á , unida à representação do seu povo,
solicitando do Provincial da Companhia de Jesus, no Rio de Janei-
ro, a vinda de 6 jesuítas (padres religiosos da mesma Companhia),
"prometendo lhes fazer Colégio, para "suas residências, à custa do
povo; dar-lhes dinheiro para a compra de escravos e doações de
terras para os seus estabelecimentos de agricultura; uma vez que
dessem eles aulas de Ensino Primário e de Latinidade, bem como
ensinassem à mocidade os dogmas da Religião".
Esse "documento", na "Memória Histórica" de Antonio Vieira
dos Santos, data de 1690; embora a Companhia de Jesus, em Porto
Alegre, assinale a 10 de setembro de 1682.
Deve haver engano; talvez de impressão; é o que pensamos.
Entanto, a julgar essas duas datas, damos por mais certa a dos
Jesuítas, que sempre foram muito organizados em suas documen-
tações.
De qualquer maneira, essa "petição" é a prova cabal de que
P A R A N A G U Á queria os jesuítas como mestres para os seus filhos.
Várias petições foram enviadas a el rei, ao Provincial e ao Ge-
ral. E sinceramente, os paranaguaras nunca puderam compreen-
der a razão de tanta demora, para um assunto de vital interesse
ao Município.

39
Só em 1699 é que o Provincial da Companhia de Jesus, aten-
dendo às representações da Câmara e do povo de P A R A N A G U Á ,
resolveu mandar alguns jesuítas para entabolar conversações com
a Câmara que, nessa ocasião, lhes entregou seis ( 6 ) escrituras para
seus estabelecimentos na V I L A .
Em 1704 — (agosto) "A Câmara fez "promessa", em nome do
povo, à Religião da Companhia de Jesus, para que a mesma fun-
dasse um Convento na V I L A , doando-lhe cem (100) braças de ter-
reno, no sítio da ribanceira, para fazer, também, o seu Colégio".
Ainda em 1704 — Aos 14 de agosto; em uma carta de agradeci-
mento da Câmara ao Provincial da Missão, pedia que permaneces-
sem na V I L A o Superior e seu companheiro, a fim de administrar
as obras.
Em 1708 — aos 14 de maio, foi, enfim, fundada a "Casa" do
jesuítas, com a chegada dos padres A N T O N I O DA CRUZ e T O M Á S
DE A Q U I N O , recebidos com grandes festas e demonstrações de re-
gozijo na V I L A . Essa data marcou a fundação da "Casa Escolar",
quando então começaram a dar suas aulas (os jesuítas não per-
diam tempo) muito antes de ficar pronto o grande monumento: O
"COLÉGIO DOS J E S U Í T A S " !
Infelizmente, nem sempre as coisas são como a gente q u e r . . .
Em 1709 — O Ouvidor da Repartição do Sul — Dr. João Saraiva de
Carvalho —oficiou de Santos, em 3 de fevereiro, à Câmara Muni-
cipal, para que ela não consentisse principiar as obras do Colégio,
sem que primeiro se obtivesse permissão de sua majestade. No
entanto, que se fosse arrecadando o material para a mesma obra;
pois bem próxima estava a ocasião de ser feita.
Todavia, a "Casa escolar" continuava com as aulas ministradas
pelos ilustres p a d r e s . . .
Em 1711 — Os oficiais da Câmara (vereadores) pediram, no-
vamente, a el rei a licença necessária para construir o Colégio.
Em 1714 — A Câmara retorna a oficiar ao Geral da Compa-
nhia, nesse sentido. Outras petições foram enviadas. E o silêncio
continuava...
Os anos iam passando; como também as aulas da "Casa esco-
lar" iam progredindo. Tanto que, em 1730, os paranaguaras pe-
diram aos jesuítas que, além do "Externato", criassem um "In-
ternato".
De fato, os alunos, nessa época, não mais se contentavam em
só se formar em "letras". Queriam também "virtude"; tanto assim
que (seis) 6 alunos já viviam como "internos" na "casa", que logo
se transformou em um "Seminário".
Só em 1738 é que o rei de Portugal se dignou conceder a licen-
ça para a construção do Colégio.
Parece incrível que um rei possa levar 30 anos para dar a ne-
cessária licença à construção de um Colégio ! . . . Um verdadeiro
absurdo...
40
Em 1739 — Na vereança de 2 de dezembro, compareceu o padre
Antonio da Cruz, bem como as pessoas da Governança, para resol-
verem sobre a encantada obra há 30 anos paralizada.
Faltava, porém, o material arrecadado (O mesmo havia sido
dado para as obras do Hospício).
Em vista do acontecido, o padre Antonio da Cruz perguntou
aos presentes se queriam concorrer com ajuda de custo para o pros-
seguimento das obras do Colégio. Todos responderam estar de
acordo.
Alguns, então, prometeram dar canoas com pedras e escravos
para o trabalho; outros, dinheiro; outros ainda, o que pudessem.
Dessa forma, em 1739, pôde-se dar continuação ao levanta-
mento do importante edifício.
E a notável "Casa escolar" de P A R A N A G U Á erigiu-se canoni-
camente em "Colégio", aos 10 de dezembro de 1752 !
Entretanto, a transferência para o novo edifício foi em 1754.
Só em 1755, aos 19 de março, dia de São José, é que se deu a
inauguração oficial do austero COLÉGIO DOS JESUÍTAS, com
Missa Solene e T E - D E U M ; além das festas populares que se fize-
ram na V I L A .
E com razão; pois, os benefícios que P A R A N A G U Á iria receber
(na época), seriam de grande valia, dada a cultura desses notáveis
mestres.
Infelizmente, mais uma vez, e com bastante pesar, nem tudo
é como a gente q u e r . . .
A Lei Pombalina, expulsando os jesuítas do Brasil, fez com que
tais mestres, educadores de mérito, fossem obrigados a deixar P A -
R A N A G U Á , com imenso prejuízo da infância e da juventude tão
carente de sadios ensinamentos; depois de 50 anos de labuta e sa-
crifícios em prol da instrução em nossa t e r r a . . .
Essa expulsão deu-se em 1759, decretada pelo poderoso e pre-
potente Marquês de Pombal, ministro do rei D. José I.
P A R A N A G U Á sentiu imensamente a saída desses educadores,
que tantos benefícios vinha trazendo à nossa gente.

CONSIDERANDOS

Fazendo-se um balanço da ação jesuítica no Brasil, não pode-


mos negar que eles foram o amparo dos indígenas, contra a cruel-
dade dos Governantes; da ambição incontida dos colonos; dos maus
tratos dados pelos "senhores de engenhos".
Foram eles, também, os protetores dos infelizes negros cativos
durante a escravidão no Brasil.
Em P A R A N A G U Á , como educadores, foram excelentes mestres,
além de admiráveis conselheiros.
A CESAR O QUE É DE CESAR. . .
41
A "PESTE GRANDE'

As "epidemias", para os antigos, eram consideradas como sen-


do um "Castigo Divino"; a ira de DEUS contra os h o m e n s . . .
As graves enfermidades também eram assim julgadas. Isso,
nos tempos em que os "magos" e "sacerdotes" salientavam-se na
arte de curar; pois somente eles possuiam rudimentos da maravi-
lhosa ciência.
Foi, pois, um desses tais "castigos do céu" que aconteceu em
nossa P A R A N A G U Á , assolando a velha terra, quase nos fins do
século X V I I , e dando origem a este curioso conto que passamos
a relatar:
Calmo e lento corria o ano fatídico de 1686, na simplória e
risonha V I L A de P A R A N A G U Á . Estávamos no alegre mês de maio
— o mês de Maria —, aproveitando, com a avidez de quem detesta
o inverno, o tão afamado veranico de maio do litoral.
Transcrevemos o que diz V I E I R A DOS S A N T O S , em sua admi-
rável "Memória Histórica":
"O ano de 1686 foi o mais calamitoso que teve a costa brasi-
leira. A Justiça Divina quis enviar um severo castigo a todos os
seus habitantes, com a mais espantosa peste, de que não há me-
mória houvesse outra igual. Era denominada — "peste da bicha".
Apareceu em Pernambuco e veio caminhando ao longo da costa,
até chegar em P A R A N A G U Á , onde chamaram de — "PESTE
G R A N D E " . Essa peste era tão ativa e mortífera, que, em breves
dias dava a morte a famílias inteiras, sem que desse tempo de ex-
perimentar remédios de Medicina. Os doentes não tinham um só
instante de repouso. Notavam-se os mais ameaçadores sintomas.
Em alguns, a doença aparecia com calor tépido e pulso sossegado;
em outros, vinha com delírios, ânsia e grande febre. Mas expira-
vam todos lançando copioso sangue pela boca. Alguns davam aos
enfermos a bebida do cozimento da "erva do bicho". Mas esse
"chá" fazia com eles lançassem, pelos vômitos e evacuações, uns
bichos cabeludos à semelhança das lagartas das hortas. Mesmo
assim, os doentes não escapavam da morte. Era outra peste seme-
lhante à "cólera morbus" moderna.
As cidades mais atingidas foram Recife, Salvador, Cananéia e
PARANAGUÁ.
42
Soube-se depois, que o mal começara em RECIFE, devido a um
tanoeiro que abrira algumas barricas de carne, vindas de São Tomé.
Carnes essas, talvez deterioradas (é o que se presume). O tanoeiro
foi a primeira vítima. Esse mal, então, se espalhou com tal rapidez
que, passada uma semana, estava alastrado em toda a Capitania, e
no fim de um mês, ceifara quase duas mil pessoas (segundo Vieira
dos Santos).
Na B A H I A , a negra enfermidade mortífera foi tão grande que,
não havendo mais lugar no Cemitério de Salvador, enterravam as
vítimas nos adros das igrejas.
Os sinos não mais foram tocados nas igrejas, para não aumen-
tar o terror que se apoderara da população.
Em Cananéia, essa peste foi tão violenta que chegou a ceifar
famílias inteiras, deixando o povo aterrorizado...
Em P A R A N A G U Á , esse terrível flagelo, que tantas vidas levou
ria sua faina devastadora, o sopro da morte foi cruel, trazendo o
luto e a dor aos l a r e s . . .
A Medicina daques tempos, em nossa terra, era impotente para
debelar o mal a que denominaram — "peste grande".
De fato, na maioria dos casos, os sintomas eram ameaçadores
e de forma aguda e violenta; com febre, delírio, ânsias e vômitos
e fortes dores no estômago. Noutros, porém, surgia apenas um
calor tépido e pulso lento e retardado. Entretanto, todos os en-
fermos sucumbiam, deitando muito sangue pela boca, debaixo de
horríveis d o r e s . . .
Chamavam também a "peste da bicha", porque, dando-se aos
doentes a bebida feita com o cozimento da "erva do bicho", esta
fazia com que as pobres vítimas expelissem, nos vômitos e dejeções,
uns bichos cabeludos, semelhantes às lagartas das h o r t a s . . .
Mesmo assim, as criaturas atacadas do mal, não escapavam à
cruel morte. Parecia não mais acabar tal situação...
O povo, desorientado, sem mais saber o que fazer, num último
recurso, realizou uma "procissão de penitência" com a imagem de
Nossa Senhora do R o s á r i o . . .
Ou "milagre" ou obra do acaso, o certo é que, depois da pas-
sagem da padroeira da V I L A , pelas suas desoladas ruas, a "peste"
foi diminuindo de intensidade, até desaparecer por completo.
No entanto, a dor, a tristeza e a saudade perduraram, por
muito tempo, no coração dos desolados paranaguaras daquelas
eras; chorando a perda irreparável dos seus entes queridos.
Mas, como tudo passa na ampulheta do tempo, a tristonha
V I L A foi lentamente voltando ao seu antigo estado habitual de
trabalho; guardando apenas as reminiscências de dias amargurados
em tempos que já vão longe. ..

43
CONSIDERANDOS:

Diz o respeitado historiador, Antonio Vieira dos Santos, no


seu histórico, que sabemos verdadeiro:
'•Alguns davam aos enfermos a bebida do cozimento da "erva
do bicho".
"Mas esse "chá" fazia com que eles lançassem, pelos vômitos e
evacuações, uns bichos cabeludos à semelhança das largatas das
hortas". . .
Sinceramente, nunca pudemos nos conformar com isso. Tal
vez, um dia, possam os pósteros ilucidar melhor àqueles que virão
depois deles.
O fato de se relatar uma "epidemia" é coisa tão natural, que,
raramente se traz à História, a não ser quando há razões para isso.
Este, veio, justamente, pelo nosso inconformismo no caso em
questão.

44
A IGREJA DE SÃO BENEDITO

Contar uma História Real, baseada na vida social e religiosa


de uma grei, nem sempre é fácil, dada a lisura com que se deve
fazer.
Vêm as pesquisas em fontes seguras e, os contos, via de regra,
se tornam enfadonhos.
Todavia, continuemos a falar de História; algo simples e ver-
dadeiro, mas muito nossa; nascida às margens do lendário Itiberê:
Corria o ano de 1710. As obras da então "Ermida de N. S. das
Mercês" estavam quase prontas.
Foi quando um grupo de homens humildes resolveu fundar a
Irmandade de São Benedito; logo aceita por um grande número
de operários.
Terminado o templo em 1712, colocaram a imagem de São
Benedito no altar-mór e, a imagem de N. S. das Mercês, no altar à
esquerda, r e l e g a d a . . . ao esquecimento...
Ficou assim a imagem de SÂO B E N E D I T O como Orágo da
igreja e, com o correr dos anos, seu legítimo dono.
Desde então, essa imagem se tornou o grande "ídolo" dos es-
cravos africanos aqui chegados; imagem venerada com carinho e
amor pelos pobres negros cativos, que, em meio ao sofrimento,
encontravam, no santo preto, um lenitivo às suas máguas e
dores...
Os anos continuaram a passar. Morre Antonio Morato; desa-
parecem todos os seus descendentes. As gerações também conti-
nuaram passando, e, com elas, a E S C R A V I D Ã O !
O 13 de maio trouxe a liberdade tão almejada para todos os
brasileiros de coração bem formado. Derrubou-se um Trono, para
a salvação de uma raça oprimida. Era a única s o l u ç ã o . . .
Surge a R E P Ú B L I C A , e com ela, o desaparecimento das cas-
t a s ! . . . A D E M O C R A C I A impera. Todos são iguais perante a L e i !
Tudo mudou.
E a Irmandade de S Ã O B E N E D I T O , por força das circunstân-
cias, também mudou; tomou corpo e firmou-se perante o povo
paranaguara, adquirindo sua personalidade jurídica.
Tornou-se uma Sociedade de Assistência Social (para ajuda à
família do sócio falecido).
45
Por muitos anos os "irmãos" da modesta Irmandade percor-
riam, nos domingos, as ruas da Cidade, com uma sacola, a pedir
esmolas para sustentar sua igreja. Diziam eles, ao penetrar no
corredor das casas: " P A R A AS CERAS DE SÃO B E N E D I T O " ! . . .
Esse costume tornou-se tradicional; tanto que as famílias, já
habituadas, guardavam um ou dois "tostões" (100 reis) para os
"irmãos" quando apareciam aos domingos.
Muito assisti a essa tocante cena, tão ao gosto da gente de
nossa P A R A N A G U Á a n t i g a . . . São passagens para jamais se
esquecer...
a
Mas, veio a l . Guerra Mundial (1914-1918) e, como era de se
esperar, as dificuldades de vida começaram a surgir. Essa tradição
desapareceu para sempre.
Em 1952, o I N S T I T U T O H I S T Ó R I C O E G E O G R Á F I C O DE
P A R A N A G U Á , em ofício dirigido à Diretoria da benemérita Irman-
dade, pedia, fosse removida, para o interior do Templo, a lápide
tumular de A N T O N I O M O R A T O — fundador da igreja — a fim
de evitar o desgaste, pelo tempo, dos dizeres da inscrição existente.
No dia 27 de dezembro de 1952, às 10 horas da manhã, presen-
tes os provedores (atual e futuro) — Pedro Tomás e Adelino Go-
mes — respectivamente; Dr. Joaquim Tramujas, presidente do Ins-
tituto; Vicente Nascimento Júnior, secretário; Manoel Viana,
tesoureiro; demais mesários e irmãos da Irmandade; deu-se a
transladação da "lápide" tumular do seu fundador, bem como ds
uma outra pedra, sem inscrições, mas esculpida de arabescos, para
o interior do Templo e embutidas numa das paredes à esquerda.
Solicitação justa do Instituto Histórico e Geográfico de nossa
terra, empenhado em que se conserve e não se desgaste, nem se
disperse o patrimônio histórico e arqueológico da Cidade.
No local de onde foram arrancadas as ditas pedras, dispôs a
Irmandade outras lajes provisórias, até que, obtida a licença Muni-
cipal, se proceda a escavação para a busca dos despojos mortais do
fundador e sua transladação, também, para um jazigo, na parede
onde foi assentada a pedra.
Esse ato histórico, no trabalho de remoção, terminou às 11
horas. Em seguida, foi lavrado um "termo", em duas vias, assina-
do por todos os presentes: Uma, para o "arquivo" da Irmandade,
e outra, para o "arquivo" do Instituto. Infelizmente, não fomos
compreendidos...
Com o "tombamento" da igreja, a "lápide" tumular voltou a
ser recolocada fora do Templo, um pouco mais ao l a d o . . .

FATO CURIOSO:

A N T O N I O M O R A T O , em vida, pedira que, após sua morte,


passados 5 anos, seus despojos fossem retirados do Cemitério e
enterrados à porta principal da entrada da igreja; para que os fiéis.
46
ao passar por cima dos seus "ossos", pudessem dele se lembrar e
por ele o r a r . . . (iso foi f e i t o ) .
Ao 17 dias do mês de março de 1955, em entendimentos ante-
riores com a Irmandade de S A Ò B E N E D I T O , o Instituto Histórico
e Geográfico de P A R A N A G U Á , por sua Diretoria, conseguiu retirar
a imagem de N. S. das MERCÊS do velho templo e levá-la, em
"procissão marítima", para a C O T I N G A , em sua nova "ermida",
reconstruída sobre os alicerces da primitiva; com autorização do
Sr. Arcebispo po Paraná e sob os auspícios do então Governador
do Paraná — Dr. Bento Munhoz da Rocha Neto.
O Sr. Arcebispo acompanhou a "procissão marítima" em todo
o seu trajeto, subindo o "morro" e benzendo a Capela.
A Irmandade de S Ã O B E N E D I T O fez questão absoluta de levar
o "andor" com a imagem, desde a sua igreja até ao "outeiro" da
Cotinga, recolocando-a no seu novo "altar".

A igreja de SÃO B E N E D I T O é modesta, em suas linhas arqui-


tetônicas de colonial brasileiro.
Ela tem prestado, em todas as épocas, um auxílio espiritual e
manterial muito grande à classe humilde. Com "irmãos" de todas
as classes sociais, é, presentemente, o amparo das menos favoreci-
dos da sorte.
A Irmandade é muito bem organizada. Por morte de um
"irmão", a família recebe o numerário necessário para o seu fune-
ral. Seus "terços" são rezados constantemente. Suas "novenas"
tem início no dia 23 de dezembro e a "festa" é celebrada no dia 1.°
de janeiro de todos os anos, com a "missa cantada" pela manhã e
"procissão" à tarde; encerrando-se com um "terço" e cantos.
Essa tradição já tem 264 anos, e é difícil tirar da alma de um
povo simples (quanto à data de sua festa) aquilo que se acha entra-
nhado em seu coração, através dos séculos...
Grande mérito têm tido os seus sucessivos diretores e prove-
dores em defesa de tão útil instituição. Respeito e admiração é
o que recebem eles do povo de P A R A N A G U Á .
Hoje, com o tombamento de sua igreja, restaurada pela Divi-
são do Patrimônio Histórico e Artístico do Departamento da Secre-
taria de Educação e Cultura do Estado do Paraná, os pósteros ja-
mais verão ruir as paredes do edificante Templo.
Os seus duzentos e sessenta e quatro anos são uma tradição
inconteste para a terra carijó — a nossa querida P A R A N A G U Á .
AVE, A E T E R N U M T E M P L U M !!!

47
MILAGRE OU ACASO ?
(O NAVIO PIRATA)

Todos conhecem a história do naufrágio do "navio pirata", na


ponta da ilha da Cotinga (ponta da cruz, como é chamada) e que
vinha em perseguição de um "galeão mercante". Estão também a
par do êxito das pesquisas feitas nestes últimos anos. Entretanto,
poucos sabem do dramático episódio setecentista que se desenrolou
no seio da sociedade paranaguara daquela época; seus lances e ati-
tudes tomadas, nas 24 horas de pavor da indefesa V I L A .
É sobre esse episódio, tão vivo quanto real, que iremos relatar,
com a mais absoluta lisura:
Um "galeão francês", forte veleiro de alto bordo, fazia a via-
gem de além-mar, percorrendo toda a costa atlântica da América
Meridional. Sulcava ele as águas brasileiras, desejoso de chegar
sem tardança às ibéricas praias do velho mundo. Carregado de
metal precioso, vinha de volta de Valparaiso do Chile.
Ao defrontar a barra da baía de P A R A N A G U Á (que um ano
antes conhecera), procurou entrar; pois sabia estar sendo seguido
por um "corsário francês". Além disso, precisava fazer aguada e
suprir-se de alimentos. Como estava escurecendo, ancorou do lado
de cá da ilha da Cotinga; esperando o amanhecer, para então atra-
car no porto de N.S. do Rosário (fim da rua João R e g i s ) .
Corria o ano de 1718 e estávamos a 8 de março. A esse tempo
também sulcava os mares da América do Sul um célebre "corsário
Francês", malfadado navio de piratas, que tantos males vinha cau-
sando às embarcações pacíficas e ordeiras da costa brasílica.
Esse traiçoeiro lobo do mar há muito que vinha perseguindo
o belo "galeão" e, v e n d o o entrar em nossa baía, tratou de fazer
o mesmo, entrando também pela barra do Sul; indo fundear,
porém, do lado de fora da mesma ilha, devido a vazante da maré e
mesmo por já ser noite.
Queria dar "caça" ao veleiro carregado de prata, pois a presa
era boa.
Agora, era questão de horas; ela não poderia escapar, de modo
algum; pois estava ao seu alcance.
Mas a tripulação do "galeão", percebendo que o "corsário" já
se achava do outro lado da ilha; avaliando a gravidade do perigo;
que a qualquer momento haveria o inevitável assalto; tratou de
48
levantar ferros, apressadamente, vindo se refugiar, com o navio,
no porto de N. S. do Rosário. Desembarcando, os tripulantes tra-
taram de avisar a pacífica população.
Não se pode descrever, mas é possível avaliar, a noite de terror
por que passaram os moradores da indefesa V I L A .
Nessa horrível vigília, pensavam em tudo, dispostos a fazer
alguma c o i s a . . . porém, o q u e ? . . . Desnorteados; atarantados;
sem a mínima defesa; era de desesperar a situação da nossa
gente...
Não se achavam exercitados e nem armas tinham para uma
urgente quão necessária defensiva. Entretanto, precisavam fazer
algo, e algo mais que chorar e implorar aos c é u s . . . Mas em vão.
Nada lhes ocorria à m e n t e . . .
Assistiriam passivos, impotentes e apavorados, a triste "caça"
ao "galeão" e a carnificina a b o r d o . . . depois, o lamentável "saque"
à desprotegida V I L A . . . Por fim, a inevitável e desgraçada sorte
que lhes estava reservada...
E assim a noite foi se escoando, cruel e desesperadora...
queixumes... l a m e n t o s . . . frases sem n e x o . . . e um nunca acabar
de promessas...

t
Surge a manhã do dia 9; linda, límpida e calma, como sabem
ser as manhãs de fim de verão no litoral! Nem uma aragem so-
prada do mar. A extraordinária Natureza como que parada,
parecia esperar, em êxtase, o próximo desenrolar da horrenda tra-
gédia . . .
Quietude absoluta; ar morno e sossegado; Sol de Outono, ra-
diante, majestoso ! . . .
Dia maravilhosamente belo, como a desafiar a angústia que
oprimia o peito da gente de nossa t e r r a . . .
As horas iam correndo e . . . as preces a u m e n t a n d o . . . 9 horas,
o Sol mais radiante a i n d a . . . meio dia — sol a p i n o . . . corações
alanceados por uma tristeza i n f i n d a . . . ardentes e sinceras ora-
ções .. pensamentos elevados ao céu, numa derradeira súplica,
humilde, justa e clamorosa... Angustiada V I L A . . . Angustiada
gente...
Subitamente, como que iluminado por um clarão Divino, aquele
punhado de povo lembra-se da sua Padroeira — NOSSA S E N H O R A
DO R O S Á R I O — e, instintivamente levado por uma estranha força
oculta, corre à sua igrejinha, coloca a imagem num modesto andor
e sai em "procissão", com as mais fervorosas preces, num último
e supremo esforço. ..
" M A R I A S A N T Í S S I M A " , a mãe do Salvador do Mundo; a pode-
rosa medianeira entre DEUS e o homem; simbolizada naquela ima-
gem; haveria de salvar o seu humilde povo tão crente e tão
devote...
49
A tarde ía avançando, sempre límpida e serena; afagada pela
brisa que, ao passar, levava aos céus os queixumes daquelas almas
feridas. A "procissão" percorria a rua da praia em toda sua ex-
tensão; ouvindo-se apenas o rezar da "ladainha"...
Nessa ocasião, a tripulação do "navio pirata", aproveitando a
enchente da maré, levanta ferros e procura fazer a manobra. Mas,
oh ! força oculta da Natureza ! O céu começa a enuviar-se; escurece
repentinamente; surgem os primeiros relâmpagos, como também
os primeiros pingos d'agua começam a cair. Forma-se uma tro-
voada ao rumo do Sudoeste; cresce rapidamente e desencadeia-se
a tempestade, impetuosa, v i o l e n t a . . . e, antes que o "corsário" ti-
vesse tempo de evitar o perigo (pois nesse meio tempo ele entrara
no rio I t i b e r ê ) , foi impelido, pela força misteriosa do vento e da
traiçoeira enchente da maré, ao encontro dos escolhos que ficam à
flor d'agua, na "ponta da c r u z " . . . arrombando o c o s t a d o . . .
. . . Momento d e p o i s . . . n a u f r a g a v a . . .
Mas a gente da V I L A , numa eloqüente demonstraão de fé; com
todo o temporal que abalava céus e terras; ouvindo o ribombar dos
trovões; indiferente às faíscas que se cruzavam no espaço, conti-
nuava acompanhando a "procissão", pelas poucas ruas tortuosas,
num desafio às forças prepotentes da N a t u r e z a . . .
Com os olhos marejados de lágrimas, que se misturavam com
a forte chuva que caia torrencialmente, aquele punhado de gente
continuava acompanhando a sua Padroeira — a Senhora do Rosá-
rio — consoladora dos a f l i t o s . . . rezando o "terço" fervorosamente !

Aos poucos tudo foi calmando; o vento mais brando; o céu


cinzento desaparecendo... e o azul do infinito surgindo, como que
a dar alento e confiança ao coração dos paranaguaras ! . . .
A "procissão"recolhia-s e à igrejinha e, os devotos, ajoelhados,
agradeciam, humildes, o milagre alcançado: O navio p i r a t a . . . ao
fundo de nossa b a í a . . .
"Milagre" ? . . . "Acaso" ? . . . Quem poderá julgar ? ! . . .

Ao escurecer dessa tarde, alcançaram a praia alguns pretos


catives que haviam sido tomados ao sair da Baía; bem como oito
( 8 ) deles furtados pelos piratas. Talvez os únicos sobreviventes.
Na praia também foram achadas duas ( 2 ) espingardas, um
cano de outra, bem como um alfange. Nada mais apareceu.
Dos piratas, nada se soube. Talvez aportassem às nossas ilhas,
que são inúmeras, e por ali ficassem...

50
CONSIDERAÇÕES

Caso estranho e inexplicável, nos faz pensar:


Por que razão salvaram-se todos os escravos e nenhum pirata
apareceu à praia ? . . . Por que estes haviam de perecer, estando
tão perto da costa, e mais ainda, da ilha da Cotinga.
Por que razão também escaparam os velhos africanos, quando
a morte, para eles, seria um descanso, dada a vida que, novamente,
iriam levar ? Milagre ? . . . Mas, se era, para eles continuarem no
sofrimento do triste cativeiro ? . . . E os piratas ? . . .
As trovoadas, no verão, são freqüentes no litoral. Essa, po-
rém, foi rápida e rapidamente passou... Milagre ? . . . Acaso ? . . .
Mais uma v e z . . . a poderosa e sábia Providência, mostrando ao
homem quanto ele é "nada" neste U n i v e r s o . . .
Para o homem "crente", o "milagre" é a forma por sem dúvida
aceitável, como sucesso extraordinário, e raro.
Para o "descrente", ou tolerante, apenas uma obra do "aca-
so". . .

Dias depois, partia, do nosso pequeno porto, o galeão francês,


cuja tripulação, antes da partida, havia ido à igrejinha do Rosário,
olhar à imagem da Santa, a fim de lhe tributar uma eterna gra-
tidão ! . . .
Rumo à Europa, singrando os mares do Atlântico, o belo ve-
leiro levava um pugilo de almas rudes, mas sinceras — crentes e
descrentes — porém, no seu espírito afeito às aventuras, a semente
da dúvida ficou ! . . .
Hoje, depois de 258 anos, na marcha incessante da civilização,
essas reminiscências continuam a nos fazer cismar: "Milagre" ?
"Acaso"? É difícil responder... Contudo, ambos alegram o co-
ração e impressionam bem forte a imaginação fantasista do homem
crente ou descrente...
História verídica, porém, difícil de ser analisada, dadas as cir-
cunstâncias de como se r e a l i z a r a m . . .
Milagre ? Acaso ?
Que julguem os leitores.

51
A FORTALEZA DA BARRA

Governava a Vila de P A R A N A G U Á , o 7.° Capitão Mor — A N -


DRÉ GONÇALVES P I N H E I R O — e estávamos no ano de 1718,
quando se deu o célebre naufrágio do navio pirata francês, que
vinha em perseguição do galeão francês comandado por Monsieur
de Boloret (fato já narrado).
O Ouvidor — Rafael Pires Pardinho — já havia participado
ao rei D. João V, sobre esse episódio.
Dez anos depois, em 1728, um outro navio francês, comandado
por um tal de Charles Chavel de Valerot, entra em nossa Barra,
sem licença e sem respeitar os sinais feitos. Queria fazer aguada
e também refrescar-se.
Intimado a sair, não atendeu às ordens dadas.
Ignorando-se, fosse ou não outro "corsário", um grupo de va-
lentes paranaguaras, comandados pelo capitão Lara, foi-lhe ao en-
contro, numa Sumaca (veleiro de 2 mastros), disposto a lutar.
Valerot tentou fugir, porém, não mais deu tempo. E o capi-
tão Lara, com seus voluntários, conseguiu aprisioná-lo, já fora da
Barra...
Esses "dois episódios", importantes, deram motivo a que se to-
massem sérias providências.
O Capitão Mor — André Gonçalves Pinheiro — sem tino admi-
nistrativo e sem prática de comando, nada fazia.
A C Â M A R A M U N I C I P A L , com isso, revoltou-se e as representa-
ções, pedindo providências ao rei, não se fizeram esperar.
Em 1732, foi nomeado outro Capitão Mor — Anastácio de Frei-
tas Trancoso ( 8 . ° ) .
Em janeiro de 1734, teve ele notícia de que uma embarcação
suspeita rondava a nossa costa. Imediatamente mandou colocar
duas "ronqueiras" na ilha das baleias, a fim de dar o alarme, quan-
do preciso. Também mandou por uma peça de artilharia na Barra
e outra no Cubatão, para rebaterem ao sinal, caso alguma embar-
cação de vela redonda tentasse entrar na Barra. Essas foram as
primeiras providências. Também não mais se fez o "recrutamen-
to", para não deixar a V I L A desguarnecida de homens novos e for-
tes. Contudo, essa defesa não era suficiente. Teria que se cons-
truir, muito logo, uma Fortaleza.
52
Com a transferência da Capital, da Bahia para o Rio de Janei-
ro, que então passou a ser sede do Vice-Reinado, em 27 de janeiro
de 1765; bem como o restabelecimento da Capitania de São Paulo,
nessa mesma data; pôde-se cogitar da construção de um Forte em
P A R A N A G U Á . Mas, os anos foram-se escoando...
Ainda em 1765, vem ao Brasil o Capitão General — D. Luiz An-
tonio de Souza Botelho Mourão — Morgado de Mateus; nomeado
Governador da Capitania de São Paulo.
Nesse mesmo ano, aos 28 de dezembro, os vereadores se reuni-
ram para tratar do assunto; Aprovar as ordens do General da Ca-
pitania, quanto à construção de uma Fortaleza na ilha da Baleia
(hoje Ilha do M e l ) , à entrada da Barra. Seria feita com o auxílio
do Governo e com a contribuição do povo.
Os paranaguaras, porém, pelos anos passados, já haviam es-
quecido as representações escritas e as solicitações feitas para a
defesa da terra; não concordaram com essa contribuição mone-
tária. Alegaram a situação precária dos habitantes da V I L A .
Em fevereiro de 1766, numa nova portaria do Governador da
Capitania de São Paulo, estranhava ele a negativa dos paranagua-
ras, para um obra que vinha defender, não só a V I L A , como o pró-
prio País; pois era P A R A N A G U Á um dos portos principais da Ca-
pitania.
Por todo esse ano as discussões continuaram, sem um resul-
tado satisfatório.
Nova vereança se fez, com 76 pessoas presentes; todos homens
de bem e mais os vereadores; para acertar a situação... e, nada
ficou resolvido.
Então, o Capitão General pediu a presença de uma "comissão"
de P A R A N A G U Á , para se entender pessoalmente com ele.
Resultado: A Comissão foi, e, voltou mudada; concordando em
ajudar, não só em dinheiro, como também com escravos para o
trabalho.
Em 1767, veio, por fim, o Coronel Afonso Botelho de Sam Paio
e Souza, parente do Governador, trazendo Rs 400$000 (quatrocen-
tos mil réis) da Real Fazenda, que, juntando com os Rs 250$000
(duzentos e cinqüenta mil réis) oferecidos pela Câmara Municipal
e mais o auxílio dos homens de bem da V I L A , pode ele dar início
às obras da Fortaleza, aos 19 de janeiro de 1767.
A escolha do lugar estava entre o morro da Baleia e o morro
das conchas. D. Afonso Botelho, acabou escolhendo o local no
morro da Baleia, que é a nossa Ilha do Mel de hoje, por achar me-
lhor em todos os pontos de vista.
Esse homem de fibra dedicou-se de corpo e alma a essa impor-
tante obra. Nada lhe faltou para o andamento do trabalho, feito
com 50 operários; pois teve sempre o inteiro apoio do Governador.
Três anos levou, de labor ininterrupto, para o levantamento
da Fortaleza. Contudo, havia dificuldade no alojamento para si
53
e para os auxiliares, na parte de escrituração. Ele queria e teve
sempre o controle de todo o serviço.
Sugeriu então, ao Capitão General da Capitania de São Paulo,
a ocupação do Convento dos Jesuítas, abandonado desde 1760, para
essa finalidade. Como tivesse aprovação do Morgado de Mateus,
manctou abrir 4 janelas na parte superior do Convento, a fim de
dar bastante luz aos empregados no trabalho de escrituração, dese-
nhos, e t c . Ficou também morando no próprio edifício, para ins-
pecionar e controlar melhor o serviço dos funcionários.
Todavia, com o correr dos meses, D. Afonso Botelho sentiu o
peso do seu trabalho e refletiu que havia necessidade de um sub-
-gerente para ajudá-lo na administração. Em 21 de agosto de 1768,
através da Câmara Municipal, conseguiu a nomeação do Alferes
Custódio Martins de Araújo, para o cargo de Almoxarife das obras
da F O R T A L E Z A ; aos 9 de setembro tomou posse.
O Capitão General deu, ainda, ordens a D. Afonso Botelho,
para que o Corpo de Tropa aquartelado na V I L A não ficasse na
inativa, mas fosse exercitado e depois distribuído pelos recôncavos.
Em uma das cartas do Governador a D. Afonso Eotelho, pedia
ele que aprontasse logo a "Capela" da F O R T A L E Z A , a fim de que
os moradores da ilha pudessem assistir missas. Dizia também que
a invocação da igrejinha fosse a de N. S. dos Prazeres (padroeira da
sua herdade de Mateus, em P o r t u g a l ) . Quanto ao nome do FOR-
T E , poderia ser " F O R T A L E Z A N. S. DOS P R A Z E R E S " ; ou, se ele
( D . Afonso Botelho) quisesse poderia também chamar-se " F O R T A -
L E Z A D. L U I Z " .
( A eterna vaidade humana ! . . . ) .
Mas D. Afonso Botelho fazia ouvidos de mercador; compreen-
dia e calava. Mas suas respostas, não tocava no assunto.
Nessa mesma carta, dizia D. L U I Z : "Que a primeira missa seja
cantada e no dia de São João; pois eu mandarei, de São Paulo, um
Capelão para esse ofício".
E por f i m : "Deveis mandar buscar a imagem de N. S. dos Pra-
zeres, que se acha na Fazenda dos padres Jesuítas, no Superagüí".
— Essa "imagem" foi, mais tarde, retirada da Capela, pelo Ma-
jor — Joaquim Ferreira Barbosa — quando deixou a F O R T A L E Z A ,
depois do "combate de Cormorant". Hoje, acha-se em mãos dos
descendentes do bravo militar.
Em 14 de janeiro de 1769, vieram mais 3.000 cruzados, para o
pagamento das obras da mesma.
Estava ela equipada com 6 canhões; 2 de calibre 23; 2 de ca-
libre 18 e 2 de calibre 12.
Em 23 de abril de 1769, os " C A N H Õ E S " salvaram pela primeira
vez !
Em 1770, vieram mais 2.000 cruzados, para os gastos finais.
A bandeira da F O R T A L E Z A teve como modelo, a do "Forte da
Barra Grande", de Santos.
54
Essa imponente obra arquitetônica, com suas muralhas de
granito; com 5 baluartes e trabalhos de cantaria, ficou pronta no
mês de março de 1770 !
Por cima do grande e pesado portão de entrada foi colocado c
"escudo", com as armas do reino português, e, mais abaixo, o "bra-
são" dos "Botelho", perpetuando os dois grandes nomes: D. L U I Z
A N T O N I O DE SOUZA B O T E L H O M O U R Ã O — Morgado de Mateus
— e D. Afonso Botelho de Sam Paio e Souza.
À esquerda do portão foi colocada também outra pedra no tér-
mino da construção, com os seguintes dizeres:
1770 — " R E I N A N D O EM P O R T U G A L O SERENÍSSIMO SE-
NHOR D. JOSÉ I, M A N D O U F A Z E R ESTA F O R T A L E Z A O ILUS-
T R Í S S I M O E E X C E L E N T Í S S I M O SENHOR D. L U I Z A N T O N I O DE
SOUZA B O T E L H O M O U R Ã O , SENHOR DA V I L A DE OVELHA,
M O R G A D O DE M A T E U S , F I D A L G O DA CASA DE SUA MAJES-
T A D E , COMENDADOR DA O R D E M DE CRISTO, G O V E R N A D O R
DA F O R T A L E Z A DE V I A N N A , G O V E R N A D O R E C A P I T Ã O GE-
N E R A L DESTA C A P I T A N I A D E SÃO P A U L O , N O A N O 4 ° D O SEU
G O V E R N O , DE 1769".
Onze contos, ouro (Rs 11.000$000) custou a construção da
F O R T A L E Z A DA B A R R A , na Ilha do Mel (não contando o auxílio
da Câmara Municipal e dos homens bons da V I L A ) . Essa quantia,
200 anos atrás, era uma verdadeira fortuna.

CONSIDERANDO:

O nome do construtor — A F O N S O B O T E L H O DE S A M P A I O
E SOUZA — nem uma palavra de e l o g i o . . . apenas o brasão dos
" B O T E L H O " , para se fazer lembrado.. . Assim eram as coisas da-
queles tempos. . .

Mas o Presidente da Câmara, Juiz Ordinário — JOÃO P I -


N H E I R O — em sessão, teceu os maiores elogios ao ajudante de
Ordens — D. Afonso Botelho de Sam Paio e Souza — pelo grande
trabalho que teve na construção do F O R T E da Ilha do Mel, e man-
dou que se constasse em Ata, com um voto de louvor.
Sempre aparece alguém que sabe reconhecer os verdadeiros
valores.

Ano de 1777 — D. José I, rei de Portugal, havia falecido. Caí-


ra, portanto, o poder do 1.° ministro — Marquês de Pombal.
55
A Capitania de São Paulo já estava sendo governada por Mar-
tini Lopes Lobo Saldanha, que, com a queda pombalina, tratou de
desfazer tudo o que seu antecessor fizera.
Em 1790, as peças de artilharia foram retiradas da Fortaleza
da Barra de P A R A N A G U Á e recolhidas ao Forte da Barra Grande
de Santos, por ordem do Conde de Sarzedas. A t o esse praticado
pelo sargento mor, Francisco João Monteiro, que se tornara into-
lerável na V I L A ; praticando toda sorte de arbitrariedades.
Felizmente, esses tempos difíceis passaram.
Em 1802, o novo Governador da Capitania de São Paulo, não
se soube por que, teve a idéia de mandar reconstruir a Fortaleza
de N. S. dos Prazeres.
Esse gesto agradou bastante ao sargento mor — Ricardo Car-
neiro dos Santos — que, entusiasmado, escreveu ao Governador,
oferecendo-se para fazer esse trabalho de reedificação, gratuita-
mente.
Tal oferecimento foi tendo impecilhos de todos os modos; che-
gando a tal ponto que o sargento mor acabou desistindo da idéia.
Passaram-se 13 anos, num esquecimento c o m p l e t o . . .
Em 1815, tomou posse o 15.° e último Capitão Mor de P A R A -
N A G U Á — Manoel Antonio Pereira — e, seu primeiro ato foi oficiar
ao Governador de São Paulo — Conde da Palma — dizendo que a
V I L A DE P A R A N A G U Á estava sem a mínima defesa; pois a For-
taleza da Barra achava-se em ruína.
Nesse meio tempo o coronel — José Vitorino da Rocha — tam-
bém havia oficiado ao Governador Geral, dizendo que não podia
atender o seu pedido, de colocar na bandeira do Forte as Armas de
Portugal, porque dessa Fortaleza só existiam as muralhas.
Em 1819, quatro anos depois, é que o Coronel — José Vitorino
da Rocha — recebeu do Governador Geral — Afonso Furtado de
Mendonça — um ofício, ordenando-lhe que mandasse limpar o in-
terior da Fortaleza, para ver em que estado se achava e então to-
mar as necessárias providências.
Ainda em 1819, o Governador da Capitania de São Paulo es-
creveu ao sargento mor de P A R A N A G U Á , perguntando-lhe se ain-
da estava disposto a fazer a obra de reedificação do Forte; já que,
em 1802, se oferecera gratuitamente.
Ricardo Carneiro dos Santos, ainda magoado oom o pouco caso
do Governador, respondeu dizendo que, depois de 17 anos, já esque-
cera tal oferecimento. Agora, só aceitaria, mediante as seguintes
condições: Patente, para si, de Tenente Coronel adido ao Estado
Maior do Exército; bem como Mercê do "Hábito de Cristo".
O Governador da Capitania achou justas as condições impos-
tas, concordando plenamente. Assim, as obras tiveram início ain-
da nesse ano de 1819.
56
Em 13 de maio de 1820, pronta a Capela, a imagem de N. S.
dos Prazeres foi levada em procissão marítima, de P A R A N A G U Á
até a Ilha do Mel e, na Fortaleza, recolocada em seu altar, na
Capela.
Grandes festas promoveu o sargento mor no Forte, com missa
cantada, salva de 21 tiros e culminando com um "jantar" no seu
Quartel, para mais de 80 pessoas presentes.
Somente aos 27 de maio de 1821 é que ficou concluída a reedi-
ficação da "Fortaleza de N. S. dos Prazeres" da Barra de P A R A N A -
G U Á , na Ilha do Mel; inclusive os 12 canhões, que voltaram de
Santos, por ordem do Governador da Capitania, e recolocados nos
seus respectivos lugares.
Esse F O R T E voltou, assim, a ser o que fora no ano de 1770, e
veio a marcar, 80 anos depois, isto é, em 1850, uma das páginas
mais brilhantes da História de P A R A N A G U Á — "O C O M B A T E DO
C O R M O R A N T " !. . .

57
IRMANDADE DE N. S. DO ROSÁRIO
(250 ANOS)

T ã o velha quanto a História de nossa terra, é a Irmandade de


N. S. do Rosário de P A R A N A G U Á .
Esta "Confraria", fundada em 1725, foi, como todas as Asso-
ciações Religiosas daqueles tempos, um baluarte para o catolicismo
da época, estando ligada à Sociedade paranaguara, apesar do seu
cunho religioso.
Isso porque, sendo a religião católica, oficial e obrigatória, as
Associações desse gênero eram compostas de pessoas de maior des-
taque social, intelectual e financeiro da V I L A .
Esta Irmandade compunha-se de: Um Juiz ou Juíza; um Es-
crivão, um Tesoureiro e um Procurador; 12 irmãos de mesa e de-
mais irmãos simples (número ilimitado).
O JUIZ ou J U Í Z A — pagava, anualmente Rs 8$000
O E S C R I V Ã O , T E S O U R E I R O e P R O C U R A D O R . . Rs 4$000
Os irmãos de mesa Rs 2 patacas
Os irmãos simples Rs 1 pataca
(Uma pataca eqüivalia a 16 vinténs ou Rs $320 réis — dinheiro
de cobre).
A Igreja Matriz, hoje C A T E D R A L , como todos sabem, foi fun-
dada em 1578, na época da mineração, (de acordo com a pesquisa
feita no Livro Tombo da Matriz em 1936), pelo então Vigário da
Paróquia — padre JOSÉ A D A M O — juntamente com o historiador
VICENTE N A S C I M E N T O JUNIOR.
O venerando Vigário mandou esculpir, no lado esquerdo da
Torre, os seguintes dizeres:

T E M P L U M HOC
A E D I F I C A T U M
15 7 8
E X O R N A T U M
19 3 6

(O íntegro vigário — padre JOSÉ A D A M O — jamais mandaria


esculpir tais dizeres, se não tivesse absoluta certeza; pois, uma
"data" em História, é de primordial importância).
58
A velha Confraria do Rosário, criada 77 anos depois da eleva-
ção do Povoado a V I L A , teve, de fato, início no ano de 1725.
Em 1732, criaram também a Irmandade do "Santíssimo Sacra-
mento", e, em 1756, a de "São Miguel e das Almas"; ambas de curta
duração.
Nesse ano de 1725, a velha "capela" ameaçava ruínas (pois já
tinha 147 anos de existência), pelo que a Câmara Municipal re-
presentou junto ao rei de Portugal, a fim de que os necessários re-
paros fossem executados com ajuda de custo dos "cofres reais".
Estávamos nos meados desse ano de 1725. A V I L A , tendo à
frente o Capitão-Mor — A N D R É G O N Ç A L V E S P I N H E I R O — acha-
va-se nos primórdios de sua civilização. A religião católica sendo
oficial e obrigatória, as Irmandades se tornavam necessárias, como
parte integrante da vida social da V I L A .
Já haviam decorrido 79 anos da ereção do Pelourinho. Era
tempo de se criar uma "Irmandade" que, naqueles tempos tinha
um valor extraordinário. Foi quando os homens de maior influên-
cia local se reuniram na sacristia da velha igreja e, presididos pelo
vigário da Vara — C R I S T Ó V Ã O DA COSTA O L I V E I R A — funda-
ram a " I R M A N D A D E DE N. S. DO R O S Á R I O DE P A R A N A G U Á "
(conforme já ficou d i t o ) .
Os Estatutos, aprovados pelo bispo do Rio de Janeiro — D. An-
tonio de Guadalupe — chegaram a P A R A N A G U Á em 16 de junho
de 1727, bem como o "Compromisso" da Associação.

Em 1835, estava a velha Matriz novamente necessitada de ur


gentes obras. A Câmara Municipal oficiou ao Presidente da Pro-
víncia, pedindo providências, enviando também o orçamento, que
montava em Rs 5.200$000 alegando ser necessário conservar essa
igreja, que era a mais antiga da Capitania do Sul.
Em junho desse mesmo ano veio a resposta do Presidente, di-
zendo não poder dispender mais que Rs 1.000$000 que poderia ser
empregado nos reparos de maior urgência.
Foi então quando vários cidadãos da V I L A ofereceram, por em-
préstimo e sem juros, a importância de Rs 960$000 para auxiliar as
obras.
As funções religiosas passaram a ser feitas, provisoriamente,
na Igreja da Ordem I I I de São Francisco das Chagas, bem como
as reuniões da histórica Irmandade, no Consistório da mesma.
Só em dezembro de 1843 (5 anos depois) é que ficaram prontas
as obras da Matriz. Como houvesse um saldo; ele foi aplicado na
confecção de um "nicho" para colocar a imagem da Padroeira. No-
vamente as reuniões voltaram a ser feitas na velha Matriz.
Em 1849, tinha a Confraria nada menos de 1.053 irmãos. Era
também muito rica; possuindo em mãos de particulares, a juros de
59
Lei, a quantia de Rs 1.280$000 (um conto e duzentos e oitenta mil
réis). Era muito dinheiro para a época.
O mais antigo Livro de Atas da Irmandade ainda existe e data
de 11 de dezembro de 1854, pagando de resíduos e capelas Rs 2$320
(dois mil trezentos e vinte reis) de selos, ao escrivão — Manoel
Alves da Silva. Esse livro está rubricado pelo Juiz Municipal de
órfãos — João Ladislau Japí-Assú de Figueiredo e Mello.
Nesse ano de 1854, a Confraria compunha-se dos seguintes
membros diretores:
JUIZ — João Gonçalves Guimarães.
T E S O U R E I R O — João da Silva Arouca.
E S C R I V Ã O — Francisco Gode Fredo.
V I G Á R I O — padre Albino José da Cruz.
I R M Ã O S DE MESA — Albino José Martins de Souza, Leonardo
dos Santos, Antonio Pereira da Costa, José Pinto de Amorim,
Joaquim Antonio Alves Cordeiro, José da Costa, Manoel A l -
ves da Silva e João da Silva Arouca.
Seus bens de raiz, nessa época, constavam de:
— Duas casas de morada, na Rua do Ouvidor (canto da M a t r i z ) ,
doadas em Testamento à Irmandade, pelo finado padre — An-
tonio P. Gonçalves.
— Uma dita, na Rua Direita, n.° 32, doada em Testamento pela
finada — Catarina Maria do Espírito Santo, sob condição de
não vendê-la.
— Outra dita, na Rua Direita, n.° 2, doada por Ana Gonçalves Cor-
deiro, cujo aluguel seria aplicado no asseio e decoração do A l -
tar-mór.
— Ainda outra dita, na Rua Direita, n.° 23, doada em Testamento
pela finada — Catarina da Silva Passos.
— Um lote de terras no rio dos Correias, Distrito desta Cidade, o
qual confinava com o rio denominado — Rio da V I L A — (hoje
Itiberê)

Para as Festas da Padroeira, elegia-se um JUIZ ou uma JUÍZA.


No ano de 1859, alterando um artigo dos Estatutos, elegeram-
-se um JUIZ e tambm uma JUÍZA, visto ser a Confraria composta
de homens e de mulheres. Alteração essa aprovada pelas autori-
dades competentes.
Fatos interessantes eram registrados nas reuniões dessa Asso-
ciação religiosa.
Em uma Sessão realizada a 17 de março de 1861, sob a Presi-
dência do irmão — JUIZ Antonio da Costa Ramalho — cogitou-se
de um assunto muito importante:
— "Doação" que fez a irmã — Joana Rodrigues França — em
1766 (em dinheiro), à Irmandade, sob condição de se mandar rezar
50 missas por ano, em intenção de sua alma.
60
O Dr. JUIZ de Capelas pediu à Mesa que pusesse em discussão
o assunto. Ficou resolvido, por unanimidade, que se desligassem
de tal obrigação; pois a Confraria vinha cumprindo, há 95 anos, tão
oneroso ônus; montando ele já em Rs 1.600$000 (um conto e seis-
centos mil réis) ! . . .

— Na Sessão de 9 de novembro de 1862, foi lido um requerimen-


to de vários irmãos, pedindo que as "missas" de sábado fossem so-
lenizadas com "música" (banda), pelo mestre de Capela — Fran-
cisco Ignácio dos Santos — mediante a quantia de Rs 100$000
anuais (cem mil réis).

Tomou a palavra o irmão — Ermelino Pereira da Costa — Te-


soureiro e Regente de uma das "músicas" (uma das bandas) da
Cidaüe, oferecendo-se para solenizar, com a sua "música", gratui-
tamente, as tais "missas", poupando assim essa quantia de Rs
100$000 em benefício da Irmandade. Oferta essa logo aceita.

— Em outra Sessão realizada no dia 24 de janeiro de 1864, re-


clamaram os irmãos sobre a Lei estabelecida, de não mais se per-
mitir enterrar na igreja os irmãos falecidos. Queriam então uma
parte do Cemitério que ficava ao lado da Matriz (como haviam
concedido à Irmandade do S. S. Sacramento). O pedido foi aceito.

(Quando foi construído o atual Cemitério de N. S. do Carmo,


as ossadas desse antigo Cemitério, foram transladadas para
lá. Aliás, o que se pode encontrar. Ficou então o terreno,
por alguns anos desocupado. No início deste século, foi cons-
truído o Colégio N. S. do Carmo, pelos padres "carmelitas".
Depois vieram os padres "josefinos", que, fazendo novas re-
formas, continuaram na faina da Instrução Primária e Edu-
cação Religiosa. Hoje, com a vinda dos padres "redentoris-
tas", novas e melhores reformas foram feitas; erguendo-se o
atual prédio do moderno "Colégio Paroquial N. S. do Rosá-
rio", muito bem instalado).

— Um caso bastante curioso se passou na reunião de 8 de abril


de 1866, e que deu o que falar por muito tempo na Cidade.
A S S U N T O : "Os brincos de brilhantes de N. S. do Rosário" !. ..

Presidia a sessão o JUIZ — Antonio José de Lima — o qual


apresentou "diversos documentos" remetidos pelo Dr. JUIZ de Ca-
pelas — João Antonio de Barros Junior — a fim de que a Mesa
deliberasse sobre o "desaparecimento" de "um par de brincos" per-
tencentes à N. S. Rosário, e que se achavam em poder do irmão —
Manoel Antonio Alves. Ora, esse irmão havia sido Tesoureiro da
61
Confraria e ainda guardava os tais "brincos"; por q u e ? . . . Ines-
peradamente "eles" desapareceram e o mesmo cidadão não soube
explicar como isso aconteceu...
Situação ambígua para os irmãos de Mesa. Contudo, o assun-
to em questão entrou em discussão. Tomaram a palavra os seguin-
tes irmãos: Manoel Alves da Silva; Antonio Luiz do Nascimento;
José Gonçalves Lobo; Carlos Augusto César Plaisant e Ermelino
Pereira da Costa. Todos declararam achar o irmão — Manoel An-
tonio Alves — incapaz de lançar mão de qualquer objeto que lhe
não pertencesse, quanto mais os "brincos" de Nossa Senhora do
Rosário...
A Mesa declarou então ter conhecimento das boas qualidades
que ornavam à pessoa do irmão "Alves", visto ser honesto, bom
pai de família e bom irmão da Irmandade, o qual já prestara sérios
e bons serviços quando Tesoureiro. Agradeceu, por fim, ao Dr.
JUIZ de Capelas, pela maneira como vinha tratando dos negócios
concernentes à Confraria. Assim sendo, hipotecavam toda a con-
sideração e respeito ao JUIZ R E T O E JUSTICEIRO.
Em discussão final, na questão dos "brincos", todos os irmãos,
por unanimidade de votos, declararam não haver culpabilidade al-
guma, porquanto, reconheciam nele as qualidades já mencionadas.
Lavraram a Ata; todos assinaram e . . . ficou assim "o dito pelo
não d i t o " . . . ( ? ! )
— Em uma das últimas reuniões, a 3 de outubro de 1872 (tal-
vez ú l t i m a ) , a Irmandade recebeu um ofício do Sr. João Gonçalves
de Araújo Triste, ofertando um "sino", grande, para substituir ac
que se achava partido na torre da Matriz. O Sr. Triste dizia já ter
encarregado ao Sr. Manoel Antonio Guimarães (comendador) de
mandar vir de Braga, em Portugal, o referido sino. A Mesa deli-
berou oficiar-se ao dito Sr. agradecendo tão valiosa quão espon-
tânea oferta.
Essa última Ata (do livro rubricado pelo Juiz Municipal de
órfãos — João Ladislau Japí-Assu de Figueiredo Mello) traz assi-
naturas importantes, como as do JUIZ da Irmandade — Joaquim
Pinto de Almeida; do Escrivão — Ricardo Antonio da Costa; do
Vigário — Albino José da Cruz; e dos demais mesários, como a de
João Estêvão da Silva (um dos fundadores do Club Litterario), com
descendentes diretos (netos) ainda em Paranaguá, e a de Cândido
José Ribeiro, avô dos descendentes da Família Anibal Ribeiro. Ou-
tros mais, cuja descendência não pudemos achar.
— De 1872 para cá, nada mais se encontrou nos arquivos dessa
poderosa Irmandade que, em 1867, possuía "ações" do Banco do
Brasil, compradas diretamente no Rio de Janeiro; além de "jóias"
e "alfaias".
62
Os últimos "mesários", no ano de 1872, foram:

C Â N D I D O JOSÉ R I B E I R O
MANOEL ALVES D A S I L V A
B E R N A R D I N O PEDRO DE SOUZA
A L B I N O JOSÉ DA C U N H A
ANTONIO LUIZ BITTENCOURT
C I R E N O JOSÉ P E R E I R A
M A N O E L A N T O N I O ALVES
JOÃO ESTEVÃO DA S I L V A
JOÃO F R A N C I S C O P E D R O
JOÃO P I N H E I R O DOS SANTOS
JOSÉ ERNESTO B O R O U S S E A U X
JOAQUIM P I N T O D E A L M E I D A
R I C A R D O A N T O N I O D A COSTA
F E R N A N D O ALVES DE VASCONCELOS.

Dessa data em diante, a Confraria foi entrando em d e c l í n i o . . .


Com o advento da R E P Ú B L I C A , o Estado seperou-se da Igreja. E,
não mais havendo obrigatoriedade quanto ao culto religioso, os
homens de maior prestígio no cenário político-religioso da cidade
foram se afastando da religião católica, até deixá-la completamen-
te (salvo raras exceções). A Confraria então, sem esse "apoio",
caiu no esquecimento total.
Setenta e um (71) anos passaram no ostracismo; até que, um
dia, por uma feliz idéia do então vigário — padre José Adamo — foi
reerguida a Irmandade de N. S. do Rosário de Paranaguá, aos 22
de setembro de 1943, cuja nova Diretoria ficou assim constituída:

P R E S I D E N T E — Sra. Dolores Varese Veiga (falecida).


VICE — Sra. Donaide Pires Arantes.
a
l . S E C R E T A R I A — Sra. Nair Santos Porto.
a
2. " — Sra Alaíde Sousa Hartog.
a
l . T E S O U R E I R A — Sra. Anita Guimarães Soares Gomes.
a
2. " — Sra. Zulmira Barusso.

Uma Confraria fundada em 1725, portanto, há 250 anos pas-


sados, revive ainda devido a vontade férrea de um pugilo de dis-
tintas damas que, forçoso é dizer, têm o dever moral de manter
de pé, tão tradicional instituição Pia.
Hoje, são apenas "senhoras" que dirigem essa Irmandadade.
São decorridos 250 anos ! V i v e r . . . r e v i v e r . . . Reminiscências
de um passado tão cheio de f é ! Dessa fé que tudo salva e que
permanece e permacerá sempre no coração das criaturas ! . . .

63
A IGREJA DA ORDEM III

Ae terra paranaguara sempre foi simples (embora com classe),


a começar pelas suas igrejas, que jamais tiveram suntuosidade.
A Catedral (antiga M a t r i z ) ; a igreja de São Benedito; a igreja
da Ordem I I I , e a igreja do Rossío; todas em suas linhas modestas,
nunca foram ornadas de ouro e prata.
A IGREJA DA O R D E M I I I DE SÃO F R A N C I S C O DAS CHA-
G A S , foi ereta em 1741; apenas no seu corpo central. Mais tarde
foi aumentada.
Tinha ela o seu "pátio" na frente e ao lado esquerdo. No
lado direito estava o Cemitério da Irmandade. O pátio da frente
ia até às ribanceiras do rio Taquaré. A pequena torre foi cons-
truída em 1841 e inagurada em 1842, juntamente com o sino nabo.
Em 1842, os cidadãos — João da Cunha Mendes Guimarães e
Antonio Luiz do Nascimento — requereram os terrenos de Marinha
fronteiros à igreja da Ordem. A Câmara Municipal se opôs, ale-
gando que tal terreno para a construção de prédios, tiraria a bele-
za da igreja e do pátio. A própria Irmandade da Ordem I I I pro-
curou defender os seus direitos de "posse imemorial sobre todo o
espaço".
Foi então concedido apenas o aforamento do terreno que fica-
va na rua da praia (terreno de m a r i n h a ) . Na parte alta (no
barranco) a Irmandade mandou construir um paredão; marcando
assim o terreno do pátio. Mais tarde, por força de Lei, no alhinhá-
mento da atual rua 15, esse discutido "pátio" desapareceu, para
dar continuidade à rua 15, levantando-se, na divisão da rua, um
muro com gradil de ferro, que existe ainda uma parte.
Ficou apenas o "pátio" à esquerda, até hoje conservado. Tinha
ele uma escada de 4 degraus, que ficava para a rua Prisciliano
Corrêa (e não como atualmente está), por onde entravam os es-
cravos com as "cadeirinhas", trazendo nelas as senhoras da alta
sociedade; pois essa igreja mantinha uma Irmandade, composta
somente de senhores e senhoras da nobreza paranaguara. Era, por
assim dizer, a igreja dos ricos.
Nesse pequeno "pátio", que era, na época, todo cimentado (e
não g r a m a d o ) , ficavam as "cadeirinhas" com os escravos, à espera
do término da missa.
64
Do lado direito havia o "Cemitério da Irmandade" (como já
dissemos), único e exclusivamente para nele serem enterrados os
"irmãos" dessa rica Instituição.
Esse "templo", em estilo colonial brasileiro, é simples, como
também já dissemos. Entretanto, foi freqüentado, no passado, pela
fina flor da sociedade paranaguara e era privativo dos "irmãos"
da Irmandade.
Com o passar dos anos, os homens que dirigiam essa Confraria
foram desaparecendo e, com a mudança de regime, em 1889, deu-
se o fato, idêntico ao da Confraria do Rosário; acrescendo ainda a
queda das "castas". Com a mudança desse novo regime em que
"todos são iguais perante a L e i " , a sociedade foi passando por uma
transformação muito grande, trazendo consigo uma série de fatos
próprios da evolução.
A igreja da Ordem I I I , que vivia em função da sua rica Irman-
dade, não tendo mais apoio dos seus irmãos, caiu no abandono
total...
Apenas, pela "Festa de Páscoa", na quinta feira de "endoen-
ças", saia a procissão do "Senhor dos Passos" da igreja da Ordem,
a se encontrar com a procissão de "Nossa Senhora das Dores", no
largo da "Nhá Dodó" (no largo da rua 15). Era a célebre "pro-
cissão do encontro", como a chamavam.
Ainda por algum tempo (quando aqui estavam os padres jose-
finas) fazia-se em outubro, o "tríduo" em louvor de São Francisco
das Chagas, com missa solene, procissão e Te Deum.
Estas últimas solenidades pudemos alcançar. Depois, tudo
acabou...
Mais alguns anos; quando menos se esperava, uma "turma de
vândalos", alta noite, conseguiu por fogo na velha igreja, queiman-
do os altares e as i m a g e n s . . .
Hoje, restaurada pelo Patrimônio Histórico, acha-se completa-
mente destituída de altares e de i m a g e n s . . .

Um verdadeiro fato histórico ficou nos anais da Igreja da Or-


dem I I I do seráfico Francisco das Chagas.
JOANA DE G U S M Ã O , nascida em Santos, Estado de São Paulo,
na ano de 1688, havia ido a uma festa religiosa, junto com o
esposo, na Vila de Iguape e, aos pés do altar mór, jurara que, caso
ficasse viúva, dedicaria o resto de sua vida à prática da Caridade.
Com isso acontecesse mais cedo do que esperava, passou a
peregrinar, a pé, pedindo esmolas para os pobres.
Alongando mais as suas peregrinações, foi até F L O R I A N Ó -
P O L I S ; lá permanecendo alguns dias. Procurou então ali fundar
uma capela: a "capela do menino Deus", com as esmolas que an-
gariava nas suas andanças pelas vilas conhecidas.
65
De uma feita; vindo a P A R A N A G U Á , a fim de ratificar a sua
"profissão de fé", que desejava ardentemente, andava ela pelas ruas
de nossa Vila, de sandálias, sem meias, e com as vestes feitas de
"aniagem", a pedir esmolas para a sua "capela do menino Deus",
em Florianópolis.
Dias depois, essa admirável criatura, mais conhecida pelo povo
como "mulher santa", recebia o "habito de freira", na Igreja da
Ordem I I I de P A R A N A G U Á , no ano de 1745. Solene ato celebrado
pelo Superior da Ordem Seráfica, que para isso tinha plenos
poderes.
Foi uma cerimônia tocante, solene e inédita em nossa t e r r a . . .
Assim levou ela, muitos anos, nessa vida de peregrinações, de
Santos a Florianópolis; sempre esmolando em favor de sua querida
capela.
E tão grande foi o seu trabalho que, aos 80 anos, não mais
podendo peregrinar, devido às enfermidades causadas pelas viagens
a pé, penitências e privações, resolveu ensinar a ler e escrever às
crianças pobres da redondeza. Assim levou o resto de sua vida;
morrendo ao 92 anos.
Pois bem; essa "mulher santa", como a chamavam, era "irmã"
do notável Estadista — A L E X A N D R E DE G U S M Ã O — e do grande
sacerdote, o célebre B A R T O L O M E U DE G U S M Ã O , conhecido come
o "padre voador" ! . . .

66
A CONTENDA DOS LIMITES

Portugal e Espanha ainda viviam em contenda, sobre os limi-


tes de 1750. Como essas dissenções entre as cortes de Lisboa e Madri,
quanto às demarcações divisórias da América do Sul, não chega-
vam a um acordo, a Espanha resolveu armar uma poderosa Es-
quadra, ao mando de D. Pedro de Cevalos, e enviou-a ao Sul do
Brasil, a fim de apossar-se da Ilha de Santa Catarina, que, sem
resistência, foi tomada a 2 de fevereiro re 1772.
Esse insucesso alarmou sobremodo toda a Capitania de São
Paulo. O Governador tratou logo de fortificar todas as Vilas do
litoral.
Em P A R A N A G U Á , foram cavadas "trincheiras", que se esten-
diam desde as ribanceiras do Estaleiro até as barrancas do Campo
Grande, à beira-mar, para impedir o possível assalto dos espanhóis,
caso viessem até nossa terra.
As trincheiras foram feitas de grossos troncos de árvores en-
trelaçadas e tinham dois portões. Do lado de fora fizeram largos
fossos. Do lado de dentro, no Estaleiro, fronteiro à ilha da Co-
tinga, foi levantado um "Fortim" de pedra e cal e nele colocadas
12 peças de artilharia bem como um mastro para hastear a ban-
deira nacional (bandeira portuguesa).
Na desembocadura do rio Taquaré, entre a Cotinga e o Esta-
leiro, cruzaram grossas amarras de troncos de árvores, para im-
pedir a entrada das embarcações inimigas.
Na Fortaleza da Barra, colocaram mais peças de artilharia.
Na Barra do Sul, foram postas algumas ronqueiras, a fim de dar
o sinal de chegada do inimigo.
Ainda outra peça de artilharia foi colocada no Cubatão, para,
no caso de invasão por Guaratuba, pudesse também dar o sinal.
Enfim, tudo ficou preparado à espera dos espanhóis...

Consta que, nessas fortificações, trabalhou-se mais de 2 anos.


Criaram um "almoxarifado", no Colégio dos Jesuítas, e man-
daram comprar farinhas e mantimentos no Cubatão de Morretes,
a fim de alimentar a tropa e auxiliares aquartelados na V I L A .
67
Foi construído um grande Armazém nos Barreiros, para de-
pósito das mercadorias, que depois vinham a P A R A N A G U Á , por
meio de uma "lanchinha" e descarregadas no Colégio dos Jesuítas,
onde se achava o depósito geral para a distribuição à tropa.
P A R A N A G U Á ficou então transformada em uma praça de
guerra...
Trabalho verdadeiramente inútil, porquanto, os espanhóis con-
tentaram-se apenas com a Ilha de Santa Catarina, na qual fizeram
grandes reforços no Forte. Também, tudo inutilmente, porque não
chegou a ter a ofensiva portuguesa...
A 30 de julho de 1778, foi assinado o "Tratado de Santo Ilde-
fonso". Os espanhóis evacuaram Santa Catarina, deixando na Ilha
todo o material bélico.
Em 4 de agosto do mesmo ano, o Coronel Francisco Antonio
da Veiga Cabral tomou posse dessa Ilha, ficando até 5 de junho
de 1779.
Em P A R A N A G U Á , as trincheiras foram destruídas; os fossos
entupidos; as pedras do Fortim aproveitadas para outras obras da
Câmara Municipal.
A Fortaleza da Barra ficou intacta, porém, completamente
abandonada...
Eis no que deu a "Contenda dos L i m i t e s " . . . Tantos gastos
sem nenhum proveito.

08
A SEMANA SANTA E O CINTURIÃO

As festas da Semana Santa, em P A R A N A G U Á , no século pas-


sado, eram realizadas com muita dramaticidade, dando-se um
cunho real, nas principais cerimônias, com figuras vivas; impres-
sionando sobremaneira a massa inculta, ingênua e ignorante da-
queles idos tempos.
As "beatas", então, amaldiçoavam as pessoas que se prestavam
a representar os papéis de inimigos de JESUS, demonstrando com
isso ignorância total do que era uma representação religiosa.
Na última sexta-feira, anterior à Semana Santa, havia o ofício
do "Calvário"; armando-se na Matriz (da nave ao altar-mór) um
grande monte, coberto de musgo, imitando o "Gólgota". Um enor-
me pano branco separava esse quadro vivo do corpo da igreja.
O pregador, vindo de fora, falando muito bem, fazia o panigi-
rico da vida do Nazareno e, quando chegava no ato da crucificação,
dizia algumas palavras sobre o C R I S T O pregado à cruz (tudo isso
do alto do púlpito). Nesse instante, o pano caía e via-se o "Monte
Calvário" (por sinal muito bem f e i t o ) , tendo no cimo a imagem de
JESUS crucificado, em tamanho natural; aos seus pés, uma figura
viva de moça com os cabeços soltos, abraçada à cruz, representando
Maria Madalena; à direita, a imagem de Maria ( N . S. das Dores)
com as sete lanças no peito (representando as 7 dores); à esquerda,
a figura viva de um garoto, com o braço estendido e a mão apon-
tando à imagem do crucificado, representando também a figura do
apóstolo João.

Em verdade, era uma cena emocionante e muito bonita, que


assistimos por quase sessenta anos. Hoje, desapareceu completa-
mente.
No domingo de Ramos, representavam a entrada triunfal de
JESUS em Jerusalém. Era feita pelos sacerdotes. No fim das ce-
rimônias, distribuíam "palmas bentas" aos fiéis (essas palmas eram
muito bem trançadas e decoradas; um verdadeiro trabalho de ar-
tesanato) .
Na Semana Santa — segunda e terça-feira — realizavam-se as
"via-sacras", com fiéis todos de preto.
69
QUARTA-FEIRA DE TREVAS

Sobre as cerimônias dessa noite, relataremos o seguinte:


O grande naturalista francês — A U G U S T O DE S A I N T ' H I L A I -
RE — ao visitar o B R A S I L , esteve em P A R A N A G U Á , alguns dias e
assistiu as cerimônias de uma "quarta-feira de trevas". Isso, a 30
de março de 1820; portanto, a 156 anos atrás.
Disse ele, referindo-se a essa procissão à noite:
"O povo avançava lentamente, acompanhando uma enorme
cruz, ladeada de duas lanternas acesas, que não davam senão uma
luz fraquíssima; recitava preces com voz soturna e, de distância
em distância, parava. Todos ajoelhavam, beijando a terra. Essa
procissão tinha algo de lúgubre".
Isso ele escreveu num livro que publicou sobre "Coisas do Bra-
sil", referindo-se a P A R A N A G U Á .
Entretanto, o então vigário da Paróquia houve por bem elimi-
nar essa procissão e o fez acertadamente (devido a certos atos de
vandalismo e maledicência).
Alcançamos, porém, o ofício das trevas de outra maneira:
A igreja às escuras; apenas 13 velas acesas num grande casti-
çal de prata, sobre a mesa do altar-mór. À proporção que o sacer-
dote ía falando, em latim, uma das velas era apagada. No final,
ficava somente acesa a vela do centro, representando o C R I S T O
abandonado pelos apóstolos. A í , terminava a função.
Essa cerimônia também foi cortada. Isso porque, havia um
grupo de "canalhas e descrentes" que, levando um punhado dn
prega-fraldas e alfinetes, pregava as armadas mangas dos vestidos
de uma devota com a de outra. Na escuridão do templo, ninguém
percebia esse ato de maldade. Como a função litúrgica era assis-
tida de joelhos, pode-se avaliar os aborrecimentos causados quando
as senhoras se levantavam ao término da c e r i m ô n i a . . .
Que o indivíduo não acreditasse nos rituais dos antigos tem-
plos, era natural; o pensamento é livre. O que não se podia con-
cordar era a falta de "respeito à pessoa humana" e às "religiões";
pois todas elas só mandam praticar o bem, como um verdadeiro
freio à sociedade...

QUINTA-FEIRA DE ENDOENÇAS

Diversas funções litúrgicas, durante o dia. Às 7 horas da noite,


havia o "lavapés". No meio do corpo da igreja colocavam uma
grande mesa com rica toalha de linho. Sobre ela, baixelas de pra-
ta; uma grande salva com 12 pães; uma bacia de prata e um jarro
com água. Eram escolhidos 12 velhinhos bem pobres, para servi-
rem de apóstolos. Na parede à direita, armavam um tablado, com
altura de um metro; colocando bancos para os apóstolos sentar
(velhinhos). Vinham eles da sacristia, em fila, vestidos a caráter
70
(com os pés bem lavados, é c l a r o ! . . . ) . Subiam a escadinha do
tablado; sentavam e esperavam a função. Daí a instantes chegava
o sacerdote com mais dois padres. Estes, pegavam a bacia e o jarro
com água; subiam, com o sacerdote, ao tablado e começava a ceri-
mônia: derramavam um pouco dágua sobre os pés dos velhinhos,
enxugando-os em seguida, com uma toalha. Davam-lhes, depois,
um pão.
Uma representação viva da "ceia de Cristo", quando JESUS
lavou os pés dos seus apóstolos, dando um exemplo de humildade.
Terminada a função, voltavam os velhinhos para a sacristia, a
tirar suas vestes de apóstolos e voltar para o seu tugúrio, com a
recomendação de voltar no dia seguinte para a procissão do enterro.
Passados alguns anos, os velhinhos (apóstolos) foram substi-
tuídos por crianças.
Havia também, não só durante o dia, mas durante toda a noite
de quinta-feita santa, a "guarda do Santíssimo", até às 9 horas de
sexta-feira, quando, na missa inacabada, levantavam um grande
pano preto, que cobria todo o altar-mór.

SEXTA-FEIRA SANTA

As funções litúrgicas desse dia, com a adoração da cruz ainda


são celebradas, embora com mais simplicidade.
Às quatro horas da tarde, daqueles tempos, o corpo ( i m a g e m )
do "Senhor Morto" ficava exposto até às 8 da noite, quando então
se realizava a "procissão do enterro". Nela ía a imagem de N. S.
das Dores; as figuras vivas de "Maria Madalena"; das três mulhe-
res santas entoando os "Heus"; mais a Verônica que, de espaço a
espaço, subindo numa pequena escada, mostrava à multidão, um
pano onde se via estampado o rosto do Nazareno; pano esse com
que enxugara o rosto de JESUS (segundo a tradição) e que nele
ficara estampado. Cantava ela os versículos " O " VOS, O M N E S . . .
Iam também os pobres velhinhos, representando os apóstolos —
um verdadeiro sacrifício para essas humildes criaturas...
Parece-nos que a maior parte dessas cenas ainda se repetem.
Era costume, naqueles idos tempos, apresentar-se um "CEN-
T U R I Ã O " , personagem bíblico que a tradição evangélica diz ter
dado ele o golpe mortal no C R I S T O crucificado. ía a caráter, com
a roupa de um centurião romano; não lhe faltando o capacete, o
escudo e a lança.
Porém, havia, todos os anos, dificuldades em se arranjar uma
pessoa para representar esse odiento miliciano.
Nas camadas altas, ninguém se sujeitava; achando humilhante
tal personagem. Entre o povo, também era difícil, pois o indivíduo
que representasse tal papel, ficava odiado e repudiado por todos
os católicos.
O único recurso foi apelar-se para os escravos. Então a Ir-
mandade do "Rosário", todos os anos, pedia a um dos senhores de
71
escravos, o empréstimo de um forte negro cativo, para representar
essa execrada criatura — O C E N T U R I Ã O .
Essa procissão também tinha algo de lúgubre (como bem disse
o naturalista Saint'Hilaire), pois os cânticos, soturnos, eram ver-
dadeiras lamentações.
De acordo com o ritual da época, de vez em quando a procissão
parava, e o C E N T U R I Ã O , que sempre ía ao lado do caixão do "Se-
nhor Morto", alçava a lança, fazendo menção de ferir a imagem do
C R I S T O deitado no esquife. Esse gesto causava horror às "beatas"
que, amaldiçoando o C E N T U R I Ã O , rogava as maiores pragas sobre
o coitado do e s c r a v o . . .
Hoje, tudo acabou. Apenas a simples procissão do enterro.

Um dia apareceu em P A R A N A G U Á , não se sabe de onde, um


tal de A N T O N I O B O T E L H O , português, alto, gordo e bem forte
como um touro. De cabeça rapada à escovinha, dava a impressão
de um gladiador romano.
Veio a Festa de Páscoa. O vigário da Paróquia lembrou-se do
tal português e, conversando com os irmãos da Irmandade do Ro-
sário, acertaram convidar A N T O N I O B O T E L H O para representar
o papel de C E N T U R I Ã O , na Semana Santa. O português aceitou
de pronto e com satisfação. Daí por diante, todos os anos, fazia
ele esse papel e com perfeição.
Tornou-se, assim, antipático ao "zé povo", recebendo a alcunha
de C E N T U R I Ã O .
Todos sabiam da necessidade da presença do velho B O T E L H O
na lugubre cerimônia de sexta-feira santa; por isso toleravam-no.
Contudo, ninguém queria amizade com ele.
B O T E L H O pouco se importava com isso, nem com o seu ape-
lido. Sentia-se até vaidoso com esse papel, que interpretava ma-
ravilhosamente. Sabia, também, das pragas que o vulgo lhe ro-
gava, prognosticando um triste fim de vida. Não era supersticioso.
Mas, de tanto ouvir as imprecações das "beatas", bem como os
impropérios do vulgo quando pelas ruas passava, começou a se im-
pressionar verdadeiramente. Então, os primeiros sinais de desiqui-
líbrio mental se fizeram sentir. Estava, aos poucos, perdendo o use
da r a z ã o . . . E, um dia, numa triste manhã do ano de 1874, os mo-
radores da Rua da Misericórdia (hoje Rua Dr. Leocádio) acorda-
ram aos gritos de u'a mulher. . . A N T O N I O B O T E L H O , que mo-
rava numa velha casa, onde hoje se acham os prédios de n.°s 41 e
43, assassinara a esposa, a f a c a d a s . . .
Trancando-se depois por dentro, ficou ao lado do cadaver e,
aos gritos, ameaçava matar, com a faca que tinha nas mãos, quem
se atrevesse em arrombar a porta de sua casa.
72
Os vizinhos de parede-meia, arrancando alguns sarrafos, pre-
senciaram, pelas aberturas das tábuas, a sangrenta c e n a . . . sem
nada poder fazer.
O povo, que se aglomerara em frente à casa, cercou-a. Mas o
desiquilibrado, percebendo, fugiu pelos fundos do quintal, atraves-
sando o campo (atual praça Eufrásio Correia), entrou pelo cami-
nho do Rossío.
(O caminho do Rossío, naqueles tempos, começava onde hoje
se acha o prédio do Colégio "São José).
A turba, revoltada, saiu atrás, em 'ouça perseguição; até que
um marítimo, moço de convés de uma escuna ancorada no rio Iti-
berê, conseguiu alcançá-lo, desfechando-lhe uma paulada certeira
na cabeça.
B O T E L H O caiu desmaiado e os primeiros homens que chega-
ram, conseguiram amarrá-lo e trazê-Io preso. A N T O N I O BOTE-
L H O , porém, estava indiferente... havia perdido completamente
o uso da r a z ã o . . .
Meses depois, morria na cadeia velha da Rua 15, o último cen-
turião das procissões de sexta-feira santa, e, com ele, a tradição do
legionário romano.

EM TEMPO:

Na última sexta-feira, antes da semana santa, às 7 horas da


noite, saia da igreja Matriz a procissão de N. S. das Dores, e, da
igreja da Ordem, a do Senhor dos Passos. Encontravam-se no largo
de Nhá Dodó, na rua 15. Era a procissão do "encontro" (Maria
e Jesus). Nesse Largo, um padre fazia uma "prática" alusiva ao
encontro de Maria com JESUS, quando o Mestre seguia o caminho
do Calvário.
De volta à Matriz, realizava-se a alegoria do "Monte Calvário",
como atrás ficou dito.

SÁBADO DE ALELUIA

No sábado de Aleluia, desde às 8 horas, realizavam-se as ceri-


mônias da "bênção do fogo", etc. até às 11 horas, com a missa de
Aleluia, ao repicar festivo dos sinos.
Depois, vinha a parte profana: Jogavam do alto da Torre da
Matriz um boneco de pano, muito bem feito, tamanho de um ho-
mem; representando o "Judas", traidor do Mestre.
A criançada, de todas as camadas sociais, já esperava no pátio
da Matriz, para malhá-lo e depois queimá-lo, numa alegria frené-
tica própria da idade.
São cenas que, por mais que passem os anos, quem assistiu e
brincou, jamais esquece...
73
Também, naqueles tempos, o "esporte" ainda não havia avas-
salado as Vilas do litoral. Poucos eram os divertimentos para a
infância e juventude. Desde cedo a mocidade paranaguara culti-
vava apenas a educação intelectual (literatura e poesia).
O "futebol", tão querido de nossa gente, só começou em 1913,
com a fundação do "Paranaguá Futebol Clube" e do "Rio Branco
Esporte Clube".
a
Só depois de " I . Grande Guerra" (1914 a 1918) é que a Edu-
cação Física, e o esporte em geral, começaram a entrar em nossas
escolas.
Hoje, felizmente, cultiva-se de tudo em nossa terra. As moda-
lidades do esporte são muitas e a população aumentou bastante.
Apenas as "regatas" ficaram no rol das coisas esquecidas...
mas, um dia voltarão ! . . .
O "sábado de aleluia" também era comemorado, em todos os
clubes recreativos, com um grande baile. No presente, isso já é
raro.

Mas, vamos ao final:

DOMINGO DE PÁSCOA
Raras são as casas que não comemoram esse dia com um lauto
almoço, ou pelo menos, um almoço melhorzinho.
Õs presentes de "ovos de Páscoa" também já se enraizaram em
toda parte.
Entretanto, tudo passa... e a maioria das funções religiosas
da Semana Santa, também passaram... Assim é tudo na vida
terrena...

74
O PRIMEIRO GRITO DE EMANCIPAÇÃO

Falar-se da Emancipação político-administrativa do Estado do


P A R A N A , é falar-se de P A R A N A G U Á . E por que ? Porque, os ideais
a
de emancipação da 5. Comarca, tiveram início nesta terra que,
como sabemos, foi o berço de todo o Paraná.
Nos começos do século X I X , já definida a nossa extensão ter-
ritorial, as Câmara Municipais de todo o País, cansadas de sofrer
o cerceamento de suas liberdade locais, se bem almejavam, melhor
pediam, e com insistência, a sua autonomia, dado o espírito loca-
lista brasileiro completamente antagônico ao da Metrópole.
Em P A R A N A G U Á , terra máter do P A R A N Á , esses ideais deve-
riam vingar e vingaram mesmo; embora nos primórdios houvesse
dificuldades, como veremos:
Era desejo ardente, não só da Câmara Municipal, como de
todos os habitantes desta V I L A , que esta Comarca fosse separada
da Província de São Paulo, por se achar o seu povo bastante ma-
goado e cansado de suportar o despotismo e as arbitrariedades do
Governo Militar Municipal sob os comandos do sargento mór —
Fernando Gomes Pereira da Silva — e do coronel — José Vitorino
da Rocha — bem como de alguns Ouvidores e Juizes de Fora.
O Comércio e a pequena agricultura estavam peiados pela má
adminstração; as Rendas Públicas mal fiscalizadas; as hostilidades
e a prepotência dos representantes do Governo da Capitania, e
vários outros fatores, levaram os paranaguaras a lutar pela eman-
cipação da Comarca de P A R A N A G U Á .
Assim sendo, em julho de 1811, a Câmara, compenetrada da
situação do seu povo, fez uma "representação" ao príncipe regente
— D. JOÃO VT — solicitando a tão desejada autonomia.
O príncipe ouviu as súplicas da Câmara, porém, mandou a
"representação" ao Governo da Província de São Paulo, para
informar.
Este, por sua vez, endereçou-a aos governantes de P A R A N A -
G U Á , exigindo os necessários esclarecimentos.
Mas, o tal coronel José Vitorino da Rocha havia tido um atrito
com a Câmara Municipal. Motivo:
As "fumaças de duchas" que se costumavam fazer na igreja
(incensar), durante as festas nacionais, sempre foram dadas pela
Câmara. Mas o coronel Vitorino quis ter a preferência. Como não
75
lhe fosse concedida tal honraria, criou ele uma atmosfera de in-
tranqüilidade na V I L A ; passando a viver em constante conflito
com o Legislativo.
Nesse ínterim, chega a tal "representação" do Governo Paulis-
ta. Foi a conta. O coronel e o sargento mór, como vingança, é
claro, deram uma "informação" bem desfavorável e contrária
mesmo, ao que a Câmara requeria.
Assim sendo, a "representação" datada de 13 de julho de 1811,
voltando ao Rio de Janeiro, foi arquivada na Secretaria de Estado.
Passaram-se 10 anos no mais frio esquecimento, fazendo com
que a Câmara e o povo paranaguara se convencessem de que suas
súplicas jamais seriam atendidas. Ficou apenas a esperança de
uma possível oportunidade. E, ela chegou ! . . .
D. JOÃO VT, que havia fugido para o Brasil, em 1808, com a
família real, por ter Napoleão Bonaparte mandado invadir Portu-
gal, aqui ficou 13 anos; elevando o Brasil a Reino Unido ao de
Portugal e Algarve.
Em 1821, porém, rompe uma revolução no reino português.
D. JOÃO V I , então, parte às pressas, a fim de abafá-la, e
consegue. Isso, em abril.
Em julho, os reis, o Conselho e a Câmara lusitana, bem como
o povo, foram obrigados a jurar as bases da Constituição Portu-
guesa.
No Brasil, como era de se esperar, em todas as Vilas e Cidades,
as Câmaras Municipais fizeram o mesmo.
Em P A R A N A G U Á , foi marcado o dia 15 de julho de 1821, para
se fazer esse "juramento".
Foi então quando os homens de valor da V I L A , que vinham
suportando resignados, há 10 A N O S as perseguições, resolveram
aproveitar essa "data" para intentar uma separação, pelos termos
legais, usando de sua soberania; não com vistas de rebeldia ao
príncipe D. Pedro, mas para atender as justas súplicas dos parana-
guaras; proclamando também, nessa ocasião, a emancipação polí-
tica de toda a Comarca.
Nesse firme propósito, arquitetaram tudo em sigilo. Porém,
precisavam de um cidadão enérgico e desembaraçado, amante de
seu torrão e com a necessária intrepidez de um h e r ó i . . .
Lembraram-se então do capitão da Guarda do Regimento de
Milícia F L O R I A N O B E N T O V I A N A — oficial condecorado com o
hábito da Imperial Ordem da Rosa; único que poderia se desen-
cumbir de tão importante missão.
Assim sendo, na véspera do dia 15, alguns cidadãos e o sar-
gento-mór de ordenanças — Francisco Gonçalves Rocha — bem
como o capitão Inácio Lustosa de Andrade — dirigiram-se à casa
de F L O R I A N O B E N T O V I A I N A e expuseram a situação vexatória
por que passavam, com as arbitrariedades e despotismos praticados
pelos dois comandantes militares da V I L A . Eram, entre outras
78
razões, mais fortes, os rapazes recrutados, quase todos o amparo
de suas famílias. Além de tudo, as grandes somas de capitais desta
Comarca, que seguiam, anualmente, para o Depósito da Junta da
Fazenda; ficando a mesma Comarca esgotada de moeda girável,
etc. etc. Por fim, disseram:
"SE VOCÊ QUISER D A R O B R A D O DE SEPARAÇÃO, NÓS
TODOS D E N T R O DA C Â M A R A O A P O I A R E M O S E F I C A R E M O S
DESMEMBRADOS DE SÃO P A U L O " .
O herói então respondeu:
"CONHEÇO D E M A I S O QUE ME E X P Õ E M ; SE EM M I M
ESTA O B E M DA M I N H A " P Á T R I A " , EU, ÀS HORAS COMPE-
T E N T E S , A M A N H Ã , D A R E I O B R A D O DE C O N V I T E P A R A A
NOSSA S E P A R A Ç Ã O DE SÃO P A U L O ; C O N T A N T O QUE ME N Ã O
ENGANEM".
No solene dia, 15 de julho de 1821; estando o Batalhão da
Guarda Nacional postado em frente ao Paço Municipal, bem como
o povo em geral, a Câmara Municipal reunida, com a presença do
Juiz de Fora — Dr. Antonio de Azevedo Melo e Carvalho — foram
chamadas todas as Autoridades Oficiais de Patente e cidadãos res-
peitáveis, a fim de jurar as Bases da Constituição decretadas pelas
Cortes de Lisboa, as quais garantiriam assim os direitos e proprie-
dades dos cidadãos, bem como a segurança individual. Juntamen-
te deveriam jurar obediência ao Governo destacado na Capital da
Província de São Paulo.
Depois de prestado o juramento, lavrado o Termo e assinado
por todos os presentes (57 pessoas), os oficiais voltaram aos seus
postos.
Então o Juiz da Fora, acompanhado pelos membros da Câ-
mara (com o real estandarte), dirigiu-se à sacada do Paço e pro-
feriu, em voz alta, a fórmula do Juramento à tropa e ao povo; os
quais responderam:
"ASSIM O JURAMOS" !
Seguiram-se os vivas à Religião, à Constituição e ao rei D.
JOÃO V I .
Foi quando F L O R I A N O B E N T O V I A N A deu um passo à frente
do Batalhão e falou, também em voz alta:
— " I L U S T R Í S S I M O S SENHORES, T E M O S C O N C L U Í D O C O M
NOSSO J U R A M E N T O DE F I D E L I D A D E ; A G O R A QUEREMOS
QUE SE NOMEIE UM GOVERNO P R O V I S Ó R I O P A R A QUE NOS
GOVERNE EM SEPARADO DA P R O V Í N C I A ; T O R N A M - S E OS
NOSSOS RECURSOS MOROSOS, E A S S I M , CHEIOS DE DESES
PEROS, PEDIMOS QUE SE DÊ P A R T E DE T U D O À SUA M A -
JESTADE".
Respondeu o Dr. Juiz de Fora:
— " A I N D A N Ã O É T E M P O ; COM V A G A R SE HÁ DE SE RE-
P R E S E N T A R A SUA MAJESTADE".
O herói não se conformou, replicando:
77
— "O R E M É D I O LOGO SE A P L I C A AO M A L QUANDO ELE
APARECE; P O R T A N T O , N A O HÁ OCASIÃO M E L H O R E N E M
MAIS OPORTUNA". ..
Excusado é dizer a reação que se fez sentir entre as autorida-
des presentes, que logo se mostraram contrários ao pedido. A
própria voz do Juiz fez com que nada mais se dissesse...
Os "separatistas", de quem o herói B E N T O esperava inteiro
apoio, mantiveram-se mudos durante todo o i n c i d e n t e . . . uns ver-
dadeiros covardes. Não tiveram a coragem, nem ombridade para
se manifestar publicamente... Uns p o l t r õ e s . . . Se o tivessem feito,
talvez pudessem ter um resultado feliz.

Foi assim fracassada a primeira tentativa de emancipação


político-administrativa de nossa P A R A N A G U Á , e de toda a Co-
marca . . .
Este grande acontecimento, chamado " C O N J U R A S E P A R A -
T I S T A " , é um fato memorável e digno de ser recordado em todos
os tempos.

Alguns invejosos, como não poderia deixar de ter, procuraram


levar o fato ao Governo de sua Majestade; denegrindo-o e fugindo
à real verdade.
Foi então mandado, por ordem do Governo, o Desembargador
— Dr. José de Azevedo Cabral — para abrir inquérito sobre o
acontecimento. Este achou que nada de culpável havia contra o
patriota F L O R I A N O B E N T O V I A N A o qual representava apenas a
vontade do povo em pugnar pela emancipação de P A R A N A G U Á ,
a
que era a cabeça da 5. Comarca de São Paulo.
O processo foi arquivado e tudo voltou ao normal na V I L A .
Os anos foram passando e, como ninguém perde por esperar,
os paianaguaras esperaram. Os paranaguaras são pacientes por
natureza, e a paciência é a mãe de todas as v i r t u d e s . . .
Chega o ano de 1822. Rompe a Independência do B R A S I L .
Passados os primeiros tempos tormentosos e voltando a calma ao
País, tornam os homens de P A R A N A G U Á e de todo o planalto
(destacadamente o capitão F L O R I A N O B E N T O V I A N A , Manoel
Francisco Correia Junior, Francisco de Paula Silva Gomes e outros),
a solicitar, em repetidas "petições", a emancipação de todo o
PARANÁ.
As discussões e debates, no Parlamento do Império, duraram
10 anos. Finalmente, aos 29 de agosto de 1853, foi aprovado o
encantado "projeto de L e i " , criado pelo Senador — Honório Her-
meto Carneiro Leão (que depois foi Marquês do Paraná) — dando
aos paranaenses a sua autonomia política !
78
A Instalação da nova Provícia realizou-se em C U R I T I B A , aos
19 de dezembro de 1853, com a presença de Autoridades e povo.
Nessa ocasião foi empossado o primeiro Presidente do P A R A -
NÁ — Conselheiro Zacar'as de Gois e Vasconcelos — que guiou,
com grande tino administrativo, os primeiros passos da terra dos
pinheirais !
Constituida a Assembléia Legislativa Provincial, sua primeira
Lei, datada de 26 de julho de 1854, estabeleceu a Cidade de C U R I -
T I B A como Capital da nova Província !
Já estamos com 123 anos de independência! E tudo começou
em P A R A N A G U Á . . .
Eis porque dissemos que, falar-se de Emancipação político-
administrativa do nosso Estado, é falar-se de P A R A N A G U Á ; por-
que, todas as idéias e realizações de valor no P A R A N Á , nos anos
que passaram, tiveram origem na fonte máter, que é esta terra
carijó de nossos antepassados — a nossa P A R A N A G U Á ! . . .

79
LEALDADE DE ESCRAVOS

1825, deu-se um memorável fato, completamente ignorado


pelos paranaguaras de hoje.
É um episódio que, pelas circunstâncias de como se realizou,
não poderíamos deixar de relatar em nosso livro; dado o espírito
de lealdade e amor ao dono, que tinham certos escravos, no passado.
Estávamos a 10 de dezembro, quando as "sumacas" Aurora e
Menália, duas pequenas embarcações veleiras, de dois mastros, fo-
ram atacadas e tomadas por um Corsário pirata de Lavalleja.
Essas duas embarcações, pertencentes aos cidadãos — Capitão
Manoel Antonio Pereira (Capitão M ó r ) e Leandro José da Costa —
vinham do Rio de Janeiro, carregadas de mercadorias (fazendas e
armarinhos), quando foram apresadas pelos piratas desse Corsário,
quase ao entrar na Barra de P A R A N A G U Á . Puseram uma peque-
na guarnição de piratas em cada uma das sumacas e tocaram-nas
para os mares do Sul.
Mas, na noite seguinte ( 1 1 ) , os escravos do Capitão Mor Ma-
noel Antonio Pereira e de Leandro José da Costa, que estavam na
sumaca Aurora, resolveram retomar o veleiro, armando, para isso,
um plano. Quando os demais piratas dormiam; eles mataram, à
machadinha e de surpresa, o que estava no "leme", lançando-o ao
mar; o mesmo fizeram com o que estava de "vigia". Os demais
piratas que dormiam, foram desarmados e jogados no porão do
navio, fechando imediatamente as escotilhas. Depois, aproveitan-
do a escuridão da noite, desgarram-se do Corsário e voltam a P A -
RANAGUÁ.
Levaram oito dias em alto mar, até alcançar a nossa Barra.
A 19 de dezembro, atracaram no porto; felizes pela ação que
haviam praticado; sem se lembrar do que lhes pudesse acontecer.
Talvez não fossem castigados; mas continuariam no c a t i v e i r o . . .
Entanto, a população recebeu-os com alegria, cheia de admi-
ração pelo ato, que julgaram de bravura. Eles recuperaram a em-
barcação do Capitão Mor, conseguindo assim salvar a "mercadoria"
que vinha do Rio de Janeiro para os negociantes da V I L A .
O Imperador, D. P E D R O I, ao saber desse extraordinário epi-
sódio, mandou, através do Governador da Província de São Paulo,
que os Senhores desses escravos lhes dessem Carta de Alforria.
80
Ordenou também que os referidos escravos comparecessem à
sua real presença; inclusive o de nome A N T O N I O , pertencente ao
sargento mor — Manoel Francisco Correia, por ser o que mais se
distinguiu naquela brilhante façanha; ordenando ainda ao Dr. Juiz
de Fora, que fizesse passar, através do dono, Carta de Alforria ao
preto A N T O N I O .
Por fim, depois de tudo cumprido, fossem os tais escravos re-
metidos ao Ministro da Marinha. (Provavelmente, para serem
aproveitados).

Por essa admirável ação, pode-se avaliar a grandeza dalma doí


pretos cativos; seu desprendimento total da vida e, mais que tudo
(como já dissemos), a lealdade e o amor aos seus Senhores (quan
do estes sabiam ser humanos ! . . . ) .

81
A ILHA DOS VALADARES

Tão velha quanto P A R A N A G U Á é a nossa Ilha dos V A L A -


DARES.
Situada à margem direita do rio Itiberê, continua apenas sen-
do habitada pelos nossos praieiros e pescadores, na luta pela so-
brevivência. Entanto, ladeada pelos rios Itiberê e dos Correias, é
salubre e bem arejada; terra boa e enxuta, deveria ser o mais belo
arrabalde de nossa P A R A N A G U Á . Porém, tal não acontece, devido
certas dificuldades. Não quanto à travessia, que é simples e com
uma distância de 400 metros; mas pela falta de um bom desem-
barcadouro.
Verdade seja dito que, hoje, a condução é feita através de lan-
chas a gasolina, que resolvem, em boa parte, o transporte dos seus
modestos moradores. Todavia, dentro de pouco tempo, o trans-
porte será feito por meio de "barcas", tipo "cantareira" do Rio de
Janeiro. Quanto ao desembarcadouro, tem que ser adequado; ter-
reno firme; uma pequena praça e algum calçamento.
O atual Governo Municipal muito tem feito por essa ilha. Haja
visto a instalação de luz elétrica e encanamento dágua; dois fato-
res importantes, de imprescindível necessidade em qualquer locali-
dade, por pequena que seja. O Prefeito Municipal já fez muito.
Outros, continuarão a sua obra. E temos certeza que a encanta-
dora Ilha dos Valadares terá um futuro promissor.
Mas, falando nesta Ilha, tão querida para nós paranaguaras,
ela nos lembra um passado bem t r i s t e . . .
Nas primeiras décadas do século passado, os "navios negrei-
ros", quando vinham carregados de "escravos", barra a dentro,
desembarcavam essas infelizes criaturas no Superagüí; no Vara-
douro, e na ilha das Peças; sempre às ocultas da fiscalização ma-
rítima. Depois então é que vinham ao nosso porto descarregar as
mercadorias importadas. E de tal modo o faziam, que nenhuma
suspeita despertava; tirando, assim, a responsabilidade das auto-
ridades locais.
À noite, em pequenas embarcações, com todo o cuidado, esses
"escravos" eram trazidos para a nossa ilha fronteira, onde havia
um entreposto apropriado à compra dos mesmos.
82
No dia seguinte, vinham os "traficantes" à V I L A , a fim de ne-
gociar com os "escravagistas" da terra. Vendida essa "mercado-
ria humana", era então transportada, à noite, para c á . . .
E quem eram esses "traficantes" que se dedicavam a esse co-
mércio já considerado "ilícito" ? Eram uns homens de sobrenome
"Valadares"...
Nessa ilha, era sabido, morava uma família, muito antiga, de
sobrenome "Valadares". Gente de posses. Os homens, porém, não
tinham grande notoriedade; devido se prestarem a esse vergonhoso
comércio. Razão porque, na "Genealogia Paranaguara", na lista
dos "homens de bem", não consta pessoa alguma com esse sobre-
nome (o que está errado, porquanto, os "escravagistas" da terra
que recompravam esses "escravos", não eram melhores que os "Va-
ladares") .
O B S E R V E M : Os "traficantes" vendiam a "mercadoria huma-
na" aos "Valadares". Estes, revendiam aos "escravagistas" da ter-
ra ! . . . Vender ou revender, não é a mesma coisa ? . . . A eterna
vaidade humana ! . . .

Só depois da extinção total do tráfico negreiro é que a família


"Valadares" saiu de P A R A N A G U Á , deixando a ilha que, não tendo
alcunha, já era conhecida e chamada por esse nome: " V A L A D A -
RES". . .
Isso contava o velho mestre — A L F R E D O A L V E S DA S I L V A
— professor do saudoso historiador — Vicente Nascimento Júnior.
Dizia também, esse mestre-escola, que, quando Secretário da
Loja Maçônica capitulada " P E R S E V E R A N Ç A " , havia ido, em co-
missão, com outros diretores, ao Hotel, cumprimentar o Coronel
H E N R I Q U E V A L A D A R E S , então Secretário Geral do "Grande
Oriente do Brasil"; que viera a P A R A N A G U Á para um Congresso
da Maçonaria, em 1888, e que dele ouvira estas textuais palavras:
" V I M , COM PRAZER, V I S I T A R A T E R R A DE MEUS AVÓS".
Episódio este, jamais esquecido por Vicente Nascimento Junior;
confirmando assim o cognome dado à nossa ilha: " V A L A D A R E S " !
Portanto: Que se não menospreze uns em favor de outros.

83
OS DEFENSORES DA INDEPENDÊNCIA E
A IRMANDADE DA MISERICÓRDIA

Quando D. P E D R O I abdicou, em 1831, em favor do seu filho


D. P E D R O DE A L C Â N T A R A , que contava apenas 6 anos de idade,
nosso País ficou entregue a uma R E G Ê N C I A T R I N A , sofrendo as
hostilidades dos adversários, políticos ferrenhos.
O Partido Português, aqui no Brasil, bastante forte, pretendia
tornar a nossa Pátria ao antigo estado de Colônia.
Este era o perigo que ameaçava ruir os alicerces de nossa inde-
pendência. Os brasileiros, não se conformando com tal idéia, uni-
ram-se, de Norte a Sul, inquebráveis como um feixe de v a r a s . . .
P A R A N A G U Á , sempre atenta aos movimentos políticos, preci-
sava fazer alguma coisa. Foi então quando um grupo de 48 para-
naguaras se reuniu, a fim de fundar um Partido Político, também
forte e coeso, que recebeu logo o nome de "SOCIEDADE P A T R I Ó -
T I C A DOS DEFENSORES DA I N D E P E N D Ê N C I A E L I B E R D A D E
CONSTITUCIONAL".
Presidiu a Sessão preparatória, que se realizou no dia 9 de ou-
tubro, de 1831, o JUIZ DE F O R A — Dr. Joaquim Teixeira Peixoto
— que aqui residia há 4 anos.
Foi eleito seu 1.° Presidente o cidadão Joaquim Antonio Gui-
marães. Os DEFENSORES DA I N D E P E N D Ê N C I A teriam que es-
tar atentos a qualquer movimento de levante na V I L A .
Na Assembléia de 1.° de novembro desse ano, tratou-se de se
revisar os Estatutos, para se lhe acrescentar um novo artigo: Cria-
ção de um H O S P I T A L , tão logo fosse possível.
Em 29 de setembro de 1833, a Diretoria, em Assembléia Geral,
resolveu não festejar o aniversário da Sociedade, conforme man-
davam os Estatutos. O dinheiro em caixa, que importava em Rs
431$980 (quatrocentos e trinta e um mil, novecentos e oitenta réis),
seria aplicado em víveres e remédios aos enfermos necessitados.
Idéia maravilhosa dos dirigentes da Sociedade.
Em 1835, já estando bem firme o Sistema Regencial, portanto,
não havendo mais perigo de uma mudança de regime que viesse
abalar os alicerces do Império Brasileiro, o comendador Manoel
Francisco Correia Junior, convocando uma Assembléia Geral, a 26
de julho, apresentou a seguinte proposta: Transformar a "Socie-
84
dade Patriótica dos Defensores da Independência", em " I R M A N -
DADE DA M I S E R I C Ó R D I A " !. . .
Gesto edificante, que mereceu aprovação de todos os sócios
presentes com uma vibrante salva de palmas, repercutindo satisfa-
toriamente em toda a V I L A .
Oficiado ao bispo de São Paulo e à Assembléia Provincial, teve
aprovação imediata. Pode então a nova Irmandade gozar dos be-
nefícios da Lei Provincial de 23 de março desse mesmo ano. Tinha
porém que escolher uma Capela provisória para servir de centro às
reuniões, até que se pudesse terminar a construção da igreja do
Colégio dos Jesuítas, que, com a saída desses abnegados sacerdotes,
ficara inacabada. Na mesma reunião, ficou resolvido que se daria
contínua assistência aos enfermos pobres, até ser possível a ins-
talação do H O S P I T A L .
Em outra reunião, datada de 5 de outubro, o comendador Cor-
reia Junior propôs nomear-se uma comissão de 3 membros, para
redigir o Compromisso da Irmandade, baseado nos moldes de sua
organização congênere de São Paulo. Foram então nomeados os
padres João Crisóstomo de Oliveira Salgado. Vicente Ferreira de
Oliveira e Vicente Pinheiro.
Aos 6 de dezembro essa comissão apresentou o projeto que, de-
pois de lido em sessão, foi enviado ao bispo diocesano e à Assem-
bléia, para a final aprovação.
Em outra sessão realizada aos 9 de outubro, foi lida a Provisão
da diocese, em que dava o parecer favorável ao Compromisso, bem
como lidas também as leis provinciais n.°s 27 e 30, de São Paulo,
com aprovação e autorização para que a Irmandade pudesse ter
em bens de raiz até a quantia de Rs 40.000$000 (quarenta contos
de réis).
Assim surgiu a Santa Casa de Misericórdia de P A R A N A G U Á ,
em 1835 !

IRMANDADE DA MISERICÓRDIA

A eleição da primeira Mesa, deu-se a 7 de dezembro de 1835.


No dia 8, realizou-se a solene missa de instalação. No dia 11, en-
tão, a posse da Mesa eleita, cujo 1.° Provedor foi o tenente Coronel
Manoel Francisco Correia.
Como o principal objetivo da Irmandade era a criação de um
H O S P I T A L , na sessão seguinte foi nomeada uma comissão para
procurar e indicar um prédio apropriado à instalação do H O S P I T A L
provisório.
Foi indicado o prédio que ficava na rua que seguia reta ao
Arsenal (Largo Glicério), hoje, fim da Rua 15 de Novembro, e per-
tencente ao tenente coronel Manoel Francisco Correia. Este então
alugou-o pela quantia de Rs 120$000 (cento e vinte mil réis) anuais.
Foi a primeira instalação do H O S P I T A L , embora por pouco
tempo.
85
Para que possamos continuar a narrar os vários episódios por
que passou a Irmandade da Misericórdia, teremos que volver a 120
anos atrás.

A CAPELA DO SENHOR BOM JESUS DOS PERDÕES

Estávamos em 1710. Um devoto do Senhor Bom Jesus dos


Perdões, desejando erigir uma "Capela" ao santo de sua devoção,
associou-se a vários outros fiéis e requereu à Câmara Municipal,
um terreno devoluto, compreendendo uma quadra com 28 braças,
a fim de construir a referida Capela.
Aprovado o requerimento, a Câmara concedeu o terreno, por
despacho de 20 de dezembro de 1710. Ainda em 27 desse mês, pas-
sou a "carta de data", emitida a favor de JOSÉ D A S I L V A B A R R O S
(assim se chamava o tal devoto), para a posse do referido terreno,
sob condição de construir a igrejinha no mais curto prazo possível.
(Essa quadra pertence hoje à C A I X A ECONÔMICA FEDERAL,
onde se acha instalada, bem como o Posto de gasolina A t l a n t i c ) .
A Capela foi ereta em 1712, com a Provisão do bispo do Rio de
Janeiro, e ficava onde hoje se acha também o Posto Atlantic, no
Ângulo direito. Seu interior, muito bem decorado, tinha o Cristo
pregado à cruz no altar-mór. Nas paredes laterais, mais dois al-
tares.
Passaram-se alguns anos e, falecido o seu protetor — José da
Silva Barros — a viúva tornou-se herdeira, não só da Capela como
de todo o terreno. Mas, embora desses bens ficasse dona, permitiu
ela que os demais fiéis continuassem administrando a igreja e reali-
zando o seu culto. E tanto assim se fez, que, dentro de pouco tem-
po foi escolhido, por eleição, o Capitão Gaspar Gonçalves de Mo-
rais, como "2.° protetor da Capela".
Mas em 1755, teve ele que lutar contra os religiosos francisca-
nos que, tendo casa na V I L A , requereram à Câmara Municipal, o
referido terreno da Capela, a fim de construir o seu Convento. Jul
gavam eles que, não estando demarcado o terreno, e muito menos
cercado, poderiam conseguir a Carta de Data e, construído o Con-
vento, ficariam também com a Capela.
A questão foi a Juízo Eclesiástico; tendo decidido a sentença o
Vigário da Vara — padre Francisco de Meira Colaço — que deu
ganho de causa ao protetor da Capela — Gaspar Gonçalves de Mo-
rais e seus fiéis.
Entretanto, a Capela do Bom Jesus dos Perdões continuou
sendo o alvo da cobiça de outras Irmandades; tudo devido ao ter-
reno abandonado. Durante 30 anos foi ela emprestada à Irman-
dade da Ordem I I I de São Francisco das Chagas, para o seu culto
divino; enquanto faziam reparos na sua igreja.
Em 1782, foi, também, emprestada à Irmandade de São Bene-
dito, até ser restaurado o seu templo, o qual ficou pronto em 1796.
8G
Nessa data, a Irmandade de São Benedito sendo obrigada a deixar
a Capela, teve que assinar um "termo de desistência" de todos os
objetos do "culto" e que estavam em seu poder.
Os anos continuaram se escoando e os seus protetores se suce-
dendo; até que, em 1828, seu último protetor — José Antonio Pe-
reira — resolveu mandar fazer um "frontespício" novo na frente
da Capela, pois ela ainda tinha um velho alpendre. Como não ha-
via dinheiro em caixa, recorreu ele a uma "subscrição" pública.
Concluída a obra, em 1829, orçou em Rs 800$000 (oitocentos mil
réis) e o dinheiro adquirido na subscrição não era suficiente para
o pagamento da obra. Uma situação precária para ele; pois a
Capela só possuía os objetos do culto e o terreno ao lado, que nada
produzia...
. . .Agora é que poderemos continuar a narrativa da I R M A N -
DADE DA M I S E R I C Ó R D I A . Estamos, então, novamente no ano
de 1836.
A continuação da construção da inacabada igreja do Colégio
dos Jesuítas, não mais interessava à I R M A N D A D E DA M I S E R I -
C Ó R D I A . Isso porque, há muito que ela vinha ocupando, por em-
préstimo, a "Capela do Senhor Bom Jesus dos Perdões"; arcando,
para isso, com todas as despesas de conservação e manutenção do
culto divino.
Depois de concluído o frontespício da Capela; como quase to-
dos os cidadãos de posse e posição social e intelectual, que haviam
contribuído com os maiores donativos, eram irmãos da I R M A N -
DADE DA M I S E R I C Ó R D I A . P E N S A R A M , esses irmãos, que o ter-
reno abandonado a mais de 100 anos, bem poderia servir para a
construção do seu H O S P I T A L .
Em 1834 (dois anos antes), esse terreno havia sido aproveitado
para enterrar as vítimas de uma epidemia de "varíola" que assolara
a VILA.
Os habitantes, supersticiosos como sempre, tinham pavor de
passar por perto do terreno, principalmente à noite, pretendendo
ver "visões". Diziam eles que esse improvisado "cemitério" não
fora "benzido" e que, em aberto, servindo de pasto aos animais sol-
tos, tornava-se maldito; além de ser uma profanação àqueles que
ali se achavam sepultados. Ninguém, pois, queria morar nas suas
redondezas. Comentavam que, depois da meia-noite, as almas das
criaturas ali enterradas, viviam gemendo por não terem sido se-
pultadas no "campo s a n t o " . . .
Essa superstição do "zé povo" veio contribuir para o pensa-
mento, agora mais forte, da ocupação desse terreno em favor do tão
desejado H O S P I T A L . Era de interesse coletivo acabar com essa
ilusória fama. Além de tudo, também era voz geral de que esse
terreno, bem como a Capela, deviam ser doados à I R M A N D A D E
DA M I S E R I C Ó R D I A .
«7
Dessa forma, ainda em 1836, já extinta a família do 1.° pro-
tetor e dono — José da Silva Barros — e os demais protetores, um
a um desaparecidos; os vigários da Vara e Visitadores aconselha-
ram aos irmãos da Irmandade que fizessem um acordo com o últi-
mo protetor — José Antonio Pereira — a fim de que o mesmo pas-
sasse a escritura de "posse" da Capela e do terreno para a I R M A N -
DADE DA M I S E R I C Ó R D I A , cuja finalidade era construir o seu
H O S P I T A L em favor da pobreza desamparada da V I L A . Fizeram
compreendê-lo que, por sua morte, seria possível uma outra Insti-
tuição de fora conseguir, através da Câmara, esses bens de raiz
para a construção de um Convento (como já havia acontecido em
tempos passados). Então, se era para acontecer, mais cedo ou mais
tarde; que fosse já, porém, em benefício da V I L A . E que melhor
do que um H O S P I T A L ? !. . .

José Antonio Pereira, seu último protetor, teve, talvez, o gesto


mais altruístico de sua vida ! Concordou, sem nenhum obstáculo
e até satisfeito.
Tudo acertado e com o consentimento da Autoridade eclesiás-
tica, foi passada a "escritura de posse perpétua" da Capela do Bom
Jesus dos Perdões, com o terreno anexo, à I R M A N D A D E D A M I -
SERICÓRDIA ! . . .
Em 1838, deu-se início à construção do tão almejado H O S P I -
T A L , com o beneplácito da Câmara, da Autoridade eclesiástica e
do Juiz de Capelas. Recebeu também todo o apoio oficial do Go-
verno Provincial, que doou, nessa ocasião, pela Lei n.° 30, de 31 de
março desse ano, como primeiro auxílio, a quantia de Rs 2:000$000
(dois contos de réis) !
A. Irmandade contraiu, ainda, com a Sociedade Maçônica
"União Paranagüense", um empréstimo também de Rs 2:000$000
para pagar em prestações mensais de Rs 100S000 (cem mil réis),
sem juros.
Em 1839, os gastos já montavam em Rs 3:704$000 e não se
contando com os donativos em materiais de construção e serviços
gratuitos doados pelos irmãos de maiores posses. Mas tudo isso
não era o suficiente. Então, em sessão de 2 de janeiro de 1841, pre-
cisando a Irmandade de mais dinheiro, requereu à Assembléia Pro-
vincial um novo auxílio.
Meses depois, veio ordem do Presidente da Província ao Ins-
petor da Alfândega, para entregar mais Rs 2:000S000 à Irmandade
da Misericórdia, a fim de terminar a obra.
O H O S P I T A L , tinha a frente para a Rua Marechal Deodoro e
o lado direito, em toda a extensão da quadra, para a Rua Dr. Leo-
cádio. Ficou pronto no fim do ano de 1841; recebendo então o no-
me do; " I R M A N D A D E DA S A N T A CASA DE M I S E R I C Ó D I A " .
88
E ali permaneceu até o ano de 1900, prestando inestimáveis
serviços à pobreza. Os doentes recebiam alimentação, remedios'e
assistência médica. Estava realizado um dos sonhos dos parana-
guaras!...
Com o correr dos anos, os provedores e irmãos de Mesa, foram
compreendendo a necessidade de mudar o H O S P I T A L do centro da
já então Cidade, para um lugar mais calmo e mais isolado, em be-
nefício dos pobres enfermos. De 1841 a 1899, muitos fatos foram
se registrando. E a idéia de mudança foi crescendo nas diversas
provedorias; esperando-se apenas uma oportunidade. E ela, por
fim, se apresentou; conseguindo-se um bom terreno no antigo Cam-
po Grande.
As primeiras A T A S contarão detalhadamente os acontecimen-
tos e a evolução desse abençoado A s i l o . . .

"ATA DA INAUGURAÇÃO DO EDIFÍCIO FEITO PARA ASILO"

"Aos treis dias do mês de junho de mil e novecentos, reunidos


os irmãos abaixo assinados, grande número de irmãs e devotas, teve
lugar a transladação da Padroeira do H O S P I T A L — N. S. da Con-
ceição — da Capela do Bom Jesus dos Perdões, para a Capela pro-
visória do novo H O S P I T A L . Ali chegados, foi a Padroeira colocada
no nicho do Altar-Mór, sendo em seguMa benta a Capela e todo o
edifício; depois celebrada a missa inaugural". "Esteve presente a
todos estes atos o Sr. padre Sebastião Gastaud, vigário da Paró-
quia, em tudo auxiliado pelo Capelão".
"Este edifício foi construído com o auxílio do Estado, na admi-
nistração do Dr. Vicente Machado da Silva Lima e José dos Santos
Andrade; Sendo secretários de Finanças — Luiz Antonio Xavier, o
de Obras Públicas — Cândido Ferreira de Abreu. Pelo Município,
com o subsídio do Prefeito e com diversas doações. Concorreram
com os "fogos" para a procissão, o irmão Adriano Ribeiro Rosado,
e com o "andor" e outras despesas, o irmão Provedor".
"Nada mais havendo a tratar-se, foi dito pelo irmão Provedor,
que o médico deste H O S P I T A L — Dr. Petit Carneiro — ofertou di
versos quadros, com os nomes das Enfermarias, farmácia e sala de
operações, os quais foram colocados nos respectivos lugares. Eu,
Júlio Teodorico Guimarães, Escrivão, lavrei a presente A T A e tam-
bém assino".

João Guilherme Guimarães — Provedor.


Júlio Teodorico Guimarães — Escrivão.
Alfredo dos Santos Correia — Tesoureiro.
Policarpo Pinheiro — Mordomo do H O S P I T A L .
Adriano Ribeiro Rosado — Mordomo dos presos pobres.
Leandro Dacheux Nascimento — Andador.
Seguem-se mais (94) noventa e quatro assinaturas.
89
Outra A T A histórica, que achamos interessante transcrevê-la:

"ATA DA REUNIÃO DA IRMANDADE PARA RECEPÇÃO DA


IMAGEM DE NOSSO SENHOR JESUS CRISTO, OFERECIDA POR
D. MANOEL ADANO, DE BUENOS AIRES, A SANTA CASA DE
MISERICÓRDIA DESTA CIDADE".

"Aos onze dias do mês de julho do ano de mil novecentos e um,


nesta cidade de P A R A N A G U Á e com as formalidades solenes da re-
ligião católica, foi recebida na Capela da Santa Casa de Misericór-
dia, uma imagem de Nosso Senhor Jesus Cristo, valiosa e preciosís-
sima oferta do abastado negociante da praça de Buenos Aires, D.
Manoel Adano, chefe da Empresa Marítima Adano". "A imagem
foi transportada de Buenos Aires até este porto, pelo vapor argen-
tino "Mercúrio" da mesma Empresa; será ainda ela conduzida do
mesmo vapor até ao portão da Santa Casa, pela oficialidade de bor-
;
do e demais tripulantes. Na ocas ão da solene bênção da imagem,
que foi celebrada na igreja Matriz desta cidade, serviram de para-
a
ninfos a Exma. Irmã — D . Maria José Fonseca Lobo — esposa do
irmão coronel Sebastião de Sant'Ana Lobo, e o ofertante — D. Ma-
noel Adano — representado no ato pelo Sr. Cristóforo G. Dabino-
vich, capitão do referido vapor. "Depois da solene bênção e do so-
lene Tedeum, seguiu a sagrada imagem, sob a invocação de "Bom
Jesus dos Enfermos", para a capela da Santa Casa, onde foi rece-
bida por grande número de famílias, com cânticos em seu louvor;
achando-se nesse momento um irmão da Santa Casa distribuindo
carne verde e pães aos pobres; oferta ainda de D. Manoel Adano e
dos padeiros de nossa praça, Srs. José da Silveira Borges, Modesto
Cordeiro e Antonio Vinhas". "Foram aclamados: Irmão benfeitor
— D. Manoel Adano; irmãos remidos — Srs. Cristóforo G. Dabino-
vich — comandante do vapor "Mercúrio" e Vicco Ferragute, 1.°
maquinista do mesmo vapor. Também foi consignado em A T A um
a
voto de agradecimento à Exma. Sra. Professora D . Ludovica Ca-
viglia Bório; ao Sr. José Mateus Gambús; etc., e t c .
Em sessão de 19 de janeiro de 1902, o irmão provedor Manoel
Bonifácio Carneiro falou sobre o edifício do antigo H O S P I T A L , a
fim de ser o mesmo preparado para nele se instalar o " C O L É G I O
SÃO JOSÉ", para a educação de meninas e dirigido por "irmãs" da
Congregação de São José, cuja matriz é em Curitiba.
Tomando a palavra, o irmão Manoel Rodrigues Vianna disse
que votava pela autorização da despesa necessária à instalação do
referido Colégio, cuja criação a Irmandade estava moralmente com-
prometida, desde que ocupara o estabelecimento — Asilo do Campo
Grande — para o seu H O S P I T A L , quando estava o mesmo desti-
nado a fim mui d i v e r s o . . .
Foi então preparado, o antigo H O S P I T A L , em um prédio con-
digno para nele ser instalado o "Colégio São José", padrão de glória
90
para o Magistério Particular da Cidade. Lavrado em A T A em ja-
neiro de 1903 (dia 19).
Daí por diante, continuou o trabalho maravilhoso da Santa
Casa de Misericórdia de P A R A N A G U Á , em favor dos "enfermos"
desafortunados, tratados pelas abençoadas mãos das "irmãs de ca-
ridade".
Hoje, essa grande casa hospitalar, com seus 141 anos de exis-
tência, tomou um novo rumo, o que é muito justo, dado ao pro-
gresso da humanidade.
Tudo evolui, e a Santa Casa de Misericórdia também teria que
evoluir. Tudo se modifica, e as inovações vão surgindo dia a d i a . . .
para melhor, é claro.
Mas os seus dirigentes que jamais esqueçam e muito menos
falhem nos "ideais" a que se propuseram os seus inesquecíveis fun-
dadores ! . . .
Que jamais falte um "pavilhão" para abrigar os "enfermos des-
validos da sorte" ! . . .

91
A MAÇONARIA DE PARANAGUÁ

Em 1837, foi criada, em P A R A N A G U Á , uma Loja Maçônica


capitulada "União Paranagüense". A primeira que surgiu em nos-
sa terra.
Seus fundadores foram: Manoel Francisco Correia Junior, Ma-
noel Antonio Pereira Junior e José Joaquim da Cunha Vianna.
Sua inauguração deu-se no dia 21 de março, em um prédio
alugado, na rua do Fogo (hoje, Vieira dos Santos), muito bem de-
corado e adaptado às suas finalidades.
Durante 10 anos a LOJA funcionou nesse local; com aquela
regularidade que sempre lhe foi peculiar.
Em 1847. essa Sociedade Secreta mudou-se para o edifício pró-
prio, mandado construir na rua da Misericórdia, com todo o con-
forto, a fim de continuar nas finalidades a que se propunha.
Suas sessões, secretas, de caráter filantrópico, eram celebradas,
com todo o ritual, à noite, de acordo com os seus Estatutos.
Essa respeitável LOJA, composta de elementos da fina flor da
sociedade paranaguara, funcionou por muitos anos em nossa terra.
Não sabemos como terminou, ou, se deu origem a uma outra
LOJA, que veio depois.

Em 1864, foi fundada em P A R A N A G U Á , a LOJA benemérita,


capitulada " P E R S E V E R A N Ç A " , por elementos de cultura e de ca-
ráter de nossa terra.
Ela existe até hoje, prestando sempre os seus inigualáveis ser-
viços à Cidade.
Pouco sabemos dessa filantrópica sociedade secreta de P A R A -
N A G U Á . Entretanto, nos grandes transes por que tem passado o
nosso País, ela sempre esteve alerta, ajudando-o a vencer os impe-
cilhos que se apresentaram.
Na "Independência do Brasil" e na "Proclamação da Repúbli-
ca", a Maçonaria do Brasil (Grande Oriente) prestou inestimáveis
serviços à nossa Pátria.
A M A Ç O N A R I A , segundo a definição do Manual Alemão
" H A N D B U C H " , assim se expressa:
92
"A Maçonaria é uma atividade empreendida por homens inti-
mamente ligados, que, empregando formas simbólicas, tiradas do
ofício de Pedreiro e da Arquitetura, trabalham pelo bem-estar da
Humanidade, esforçando-se por melhorar-se e melhorar os demais,
com o objetivo de constituir uma ligação universal da Humanidade,
da que crêem ser atualmente uma pequena representação".
Como a evolução social da Humanidade é um fato, a Maçonaria
do ano 3000 A.C. era bem diferente da atual. Essa Ordem sofreu
várias alterações, sem contudo deixar de conservar a sua estrutura
fundamental.
As catástrofes, as guerras, as revoluções, mudaram bastante a
face do nosso Planeta. Mas nos dias atuais, no recesso das " L O -
JAS", os "filhos da Viúva" (como costumam chamar os maçonsl
muito têm feito em prol da reconstrução moral, social e política do
mundo, duramente sacudido pelas últimas guerras.
Na " A B O L I Ç Ã O DA E S C R A V A T U R A " a LOJA PERSEVERAN-
ÇA de P A R A N A G U Á , muito trabalhou pelos filhos de escravos,
comprando-lhes a liberdade.
Em 1887, foi fundado em P A R A N A G U Á , o "Clube Republica-
no", por um grupo de "maçons", para a propaganda abolicionista e
republicana, ao mesmo tempo.
Por esses fatos pode-se avaliar o quanto foi útil a Maçonaria
em nossa terra. Ela sempre amparou as viúvas e os órfãos; pois,
nos tempos passados não havia os Institutos de Previdência Social.
Hoje, com todas as facilidades e auxílios que o G O V E R N O FE-
D E R A L dá ao operariado, tais dificuldades foram sanadas. Entre-
tanto, a Maçonaria continua, anonimamente, praticando a C A R I -
DADE, como sempre o fez; seguindo os preceitos do D I V I N O MES-
T R E : "Dê com a direita; mas que a esquerda jamais saiba" ! . . .
Eis porque, curiosos como somos, sempre gostamos de tudo co-
nhecer e, desta feita, a História da Maçonaria. Nada mais belo do
que se ter: Fraternidade e Solidariedade Humana! Só isso com-
pensa a existência ! . . .

93
POLÍTICA E RELIGIÃO

Quanto à política do País, este velho rincão acompanhava com


verdadeiro patriotismo e, tanto assim era que, ao fazer-se a cam-
panha a favor da maioridade do jovem D. PEDRO DE A L C Â N T A -
R A , P A R A N A G U Á tomou parte ativa e apaixonada através dos 2
partidos então existentes: CONSERVADORES (os cascudos) e L I -
B E R A I S (os saquaremas); prevalecendo, como maioria, os partida
rios da maioridade do Príncipe.
Havia, porém, muita lealdade, respeito e honestidade na poli
tica da época. Quando tomavam uma atitude, faziam-na às claras
Embora politicamente inimigos, em Sociedade, mantinham a cor-
dialidade necessária à ética social.
Nessa luta de idéias, a repercussão foi grande, e não era para
menos. Isso porque P A R A N A G U Á sempre abrigou homens de va-
lor moral e intelectual, os quais tomavam parte em todos os acon-
tecimentos políticos e históricos do País; mau grado o abandono
em que viviam as V I L A S do passado.
As "eleições", eram realizadas no Consistório da igreja Matriz,
a fim de tornar mais "solene" e respeitado esse "ato", por parte dos
2 partidos, que assim se defrontavam, nessa luta, em plena Casa
de D e u s . . .
Bem simples era o "Sistema Eleitoral". Os "votantes", cida-
dãos maiores de idade, sabendo ler e escrever e possuindo renda ou
profissão honesta; elegiam os "eleitores", homens também capazes
e de maior notoriedade pelo saber e austeridade de costumes. Es-
tes, então, (os eleitores), elegiam os "vereadores", os "deputados
provinciais" e os "deputados Gerais".
Para esses tempos, que vão longe, em que a percentagem de
analfabetos era enormíssima, e o brasileiro, por isso mesmo, não
estava ainda com o espírito amadurecido para tais escolhas, foi, de
fato, o processo mais acertado.
Assim sendo, os "votantes" elegiam o "colégio eleitoral", e este
escolhia, por sua vez, com segurança, aqueles que seriam destina-
dos a legislar para as Câmaras Municipais, para as Províncias e
para o Império.
Esse "Colégio Eleitoral" era composto do que havia de melhor
e mais representativo entre os elementos de projeção da V I L A (aqui
94
em P A R A N A G U Á ) , cuja população, na época, não passava de 2.000
almas. Apenas 16 "eleitores", e isso mesmo dividido entre os dois
"partidos".

Um fato, talvez inédito nos anais da História Política do País,


é digno de ser registrado neste esboço histórico:
Em 1839, desapareceu da Sacristia da igreja Matriz, uma "Ur-
na" "eleitoral" ! . . . Esse roubo abalou sensivelmente a opinião
pública que, embora não tivesse parte ativa na questão, estava ha-
bituada a admirar e respeitar os chefes p o l í t i c o s . . .
Escusado é dizer que a tal "Urna" jamais foi encontrada.. ,
mas o "roubo" ficou memorável na História de P A R A N A G U Á ! . . .

Outro fato, também interessante, pelos dados que deu, quanto


à vida social e econômica da Cidade (1840).
Com a "Revolução" rompida em Sorocaba, a Câmara Muni-
cipal de P A R A N A G U Á se reuniu em "sessão especial", para lavrar
um protesto contra a rebeldia do coronel Rafael Tobias de Aguiar,
chefe dos revoltosos.
Solidarizando-se com o Governo Imperial, a Câmara enviou um
ofício ao Imperador D. P E D R O II e, aproveitando a ocasião pediu
a
o desmembramento da 5. Comarca, para formação da "Província
do P a r a n á " . . .
É curioso o tal "documento", pois, retrata fielmente a vida
social e econômica de nossa gente. Eis o que diz ele:
"Este Município consta de 12.000 a 13.000 habitantes. A popu-
lação da cidade não vai além de 7.000 almas. Entretanto, já possui
nível cultural bastante elevado, com a fundação de uma "Casa de
espetáculos" etc. e t c . . .
De fato, desde 1839 datava a fundação do " T E A T R O P A R A N A -
GÜENSE", por uma Sociedade formada de conceituados cidadãos...

95
O TEATRO PARANAGÜENSE

Até fins do século passado, a vida social de P A R A N A G U Á se


resumiia nas festas religiosas, no Teatro e nas reuniões familiares
(os serões do passado).
O T E A T R O , em P A R A N A G U Á , teve sua fase áurea em 1840.
De fato, a fundação do T E A T R O P A R A N A G Ü E N S E data de 1839.
Começou assim: Um grupo de cidadãos respeitáveis resolveu
fundar uma Sociedade Teatral, a fim de tornar a vida paranaguará
mais social e também mais cultural.
Não havendo outras festas que não fossem as "religiosas, tor-
nava-se necessário a criação de uma casa de Espetáculos.
Esses conceituados cidadãos, depois de muito procurar um local
bem apropriado, sobretudo central, resolveram comprar um grupo
de 5 casas velhas na esquina da rua do Ouvidor com a Conselheiro
Barradas (hoje, Faria Sobrinho com Mal. Alberto de A b r e u ) . Essas
casas velhas, pertencentes ao Sr. José Ricardo, iam, da esquina até
a
a casa da saudosa D . Alcília Melo.
Tratado o preço por Rs 400$000 (quatrocentos mil réis), a
serem pagos com o lucro líquido dos espetáculos, foram as mesmas
demolidas, para se dar início ao novo prédio; cuja obra foi dirigida
pelo riograndense Francisco Soares Vianna.
Os diretores e fundadores foram: Com. Manoel Francisco Cor-
reia Junior; Com. Manoel Antonio Guimarães; Capitão Mor Manoel
Antonio Pereira; Ten-Cel. Manoel Francisco Correia; Sargento Mor
João Antonio Santos; que emprestaram o dinheiro para a constru-
ção. Houve também duas subscrições para ajudar nas demais des-
pesas.
A inauguração foi no domingo de "páscoa" de 1840, com uma
bela representação (um drama e uma comédia). O Teatro estava
lotado!
A platéia e a geral eram de bancos toscos. Os camarotes, nu-
merados, não tinham cadeiras; vinham de casa.
Os espetáculos foram se realizando normalmente, a cargo de
um Grêmio de amadores.
Nas festividades nacionais, as senhoras se apresentavam com
trajes de luxo. Os homens, muito bem trajados, procuravam imitar
a Corte. Levavam enfim , uma vida de ostentação e grandeza.
96
As "peças teatrais" levadas à cena, eram muito bem represen-
tadas. Os camarotes pertenciam aos sócios do Tetatro. Os espe-
táculos tinham início às 6 horas da tarde (depois das ave-marias)
e se prolongavam até 11 horas ou meia noite.
Era interessante apreciar-se o movimento da V I L A , nesses dias
de "representação". A última refeição era feita às 5 horas da
tarde, para que as famílias pudessem se dirigir ao Teatro antes das
6 horas.
Aquelas que tinham os lugares reservados, eram acompanha-
das de escravos que levavam as "cadeiras" para os seus camarotes.
As pretas velhas então, carregavam um cesto com comida, para a
ceia, que faziam num dos intervalos dos velhos dramalhões tão a
gosto daquela gente. E como gostavam de "ceiar" no teatro ? ! . . .
Devia ser divertido ver-se as madamas e donzelas pegando, com os
dedinhos delicados, as coxinhas de galinha e os bolinhos de cama-
rão (sim, porque, devia ser isso, para comerem em toscos e duros
bancos, sem mesa, em um salão à p a r t e ) .
Depois, voltavam ao salão de espetáculos, para assistir outra
peça (pois levavam sempre à cena, duas peças: uma comédia e
um d r a m a ) .
Que gostosura ( ? ! ) , ficar sentado durante 5 a 6 horas nas
incômodas cadeiras ! ! ! . . . para assistir os tais dramalhões ? ! . . .
(Mas, diziam eles: tudo o que dá prazer, regala a v i d a ! . . . ) .
E observe-se que, o Teatro, naqueles tempos (quase um século
e meio) tinha o mesmo entusiasmo que o "futebol" dos nossos dias.
E eram assim as festas teatrais da nossa P A R A N A G U Á do pas-
sado . . .
A propósito, contaremos um fato verídico, que se deu numa
dessas funções teatrais. Fato esse tão curioso quanto raro, e que
ficou também nos anais da História social da então cidadezinha.
Estávamos no ano de 1862.
Aportara a estas plagas, em março, o novo Inspetor da Alfân-
dega; um tal de Manoel Augusto Figueiredo; indivíduo péssimo e
intolerante; mal educado e com idéias estapafúrdias. Tantas ele
fez que, a reação não se fez esperar. A Sociedade paranaguara
passou, então, a desprezá-lo totalmente, como um indesejável; até
que um incidente grave foi criado.
Em uma noite de gala, em que o Teatro Paranagüense levava
à cena uma bela peça teatral, o malcriado homenzinho, que não
fora convidado propositadamente, resolveu ir até à porta do Teatro,
disposto a entrar.
O porteiro, porém, que já estava prevenido, barrou-lhe a en-
trada, dizendo, o senhor não pode entrar.
— Por que ?
— Porque não tem convite. O espetáculo é só para convidados.
— Mas eu entro !
— Não entra, não senhor!
97
— Sou o Inspetor da Alfândega !
— Tenho ordens expressas de não deixá-lo entrar ! . . .
— Mas eu quero entrar, e vou entrar ! berrava em altas vozes
o escandaloso h o m e n z i n h o . . .
As famílias, no recinto do Teatro, já estavam ficando apreen-
sivas, pois, ouviram tudo o que o energúmeno esbravejara...
O Presidente da Sociedade Teatral foi então à porta e fez sentir
ao mal educado que o espetáculo daquela noite era só para convi-
dados.
Nessa ocasião, vem correndo, lá de dentro dos bastidores, o
'galã" da peça (ótimo artista amador, que viera do Rio de Janeiro
a convite da Sociedade, para interpretar o papel principal) e diz:
"Se o senhor inspetor, que é meu amigo particular, não entrar, não
representarei o meu "papel no drama" ! . . .
R e s u l t a d o . . . O Presidente, homem calmo e sensato, para evi-
tar escândalo maior, cedeu; a fim de não ter que evacuar o Teatro;
o que seria de l a s t i m a r . . .
No dia seguinte, o tal "galã amador" foi dispensado sem mais
preâmbulos. P o r é m . . . já estava empregado na Alfândega, no-
meado pelo indesejável inspetor.

98
O ESTULTO INSPETOR DA ALFÂNDEGA

Como todos sabem, o tal de Manoel Augusto de Figueiredo


aportará a estas plagas, em março de 1862, como inspetor da
Alfândega, demonstrando, de início, ser um indivíduo péssimo, into-
lerante, mal educado e com idéias estapafúrdias.
De início, dissemos, começou por maltratar os funcionários
aduaneiros, exigindo que os mesmos, quando chamados ao gabinete
do inspetor, se perfilassem marcialmente e, ao se retirar, não lhe
dessem as costas, e sim, saíssem de frente, recuando até à porta,
quando então deviam fazer uma reverência (como se faziam aos
reis).
Ora, esse sujeitinho devia ter algum complexo, para ser tão
boçal e tão ignorante a esse ponto. Caiu logo no ridículo.
Como era de se esperar, o paranaguára não perdeu tempo,
fazendo a tal "gozação" das exigências ridículas do tolo e incoerente
inspetorzinho frustrado.
Ele fazia as suas façanhas, apenas com os pobres dos funcio-
nários, os quais sujeitavam-se, por medo às suspensões, que eram
nunca menos de 15 d i a s . . .
Mas o paranaguára, cá de fora, não perdoava. Crítico e satí-
rico como sempre, trazia o homenzinho de "canto chorado", com
as críticas as mais gozadas possíveis.
Mas, depois do escândalo provocado à porta do Teatro, e o des-
prezo com que todos o trataram, o caldo entornou, e o 4.° escritu-
rariozinho do Rio de Janeiro começou com as represálias, maltra-
tando também os despachantes aduaneiros, inclusive os próprios
comerciantes que costumavam ir à Alfândega tratar dos seus
interesses.
Com isso, a reação dos nossos conterrâneos foi maior ainda.
E, como não houvesse a "Imprensa", recorreram eles ao meio mais
conhecido, o "Pasquim", espécie de jornal ou papel manuscrito, que
era afixado nos lugares públicos e de maior fraqüência do povo.
Como todos apreciavam o verso, apelou-se para eles, e foi quan-
do, numa das vezes, surgiu o "Pasquim" com versos satíricos, mor-
dazes mesmo, reduzindo o energúmeno inspetorzinho, já bem ava-
calhado, a zero. ..
99
Houve quem guardasse, como curiosidade, por vários anos,
alguns "versos", como lembrança dos "nove meses", de martírio
para uns, e de gozação para outros (nove meses levou apenas o
inspetor em nossa t e r r a ) .
O mundo é assim mesmo; tem de tudo. E o melhor é que a
variedade satisfaz a todos os gostos.
Aqui transcrevemos alguns deles:

O F I Q U E I R E D O SUPÕE, E S T U L T O ,
QUE TODOS DELE T E M MEDO.
AI F I G U E I R E D O ! AI F I G U E I R E D O !
PENSAS T U SER G R A N D E V U L T O ,
Q U A N D O ÉS SIMPLES BADAMÉCO,
POIS N Ã O PASSAS DE UM BONECO,
F A Z E A T R O U X A E V A I - T E EMBORA
E QUE TE LEVE O R E I DO A V E R N O ,
O F A Z E N D O EM BOA HORA,
P A R A A CORTE OU P A R A O I N F E R N O !

A fim de resolver o situação periclitante na Alfândega, veio de


C U R I T I B A um Sr. Cavalcante, inspetor da Tesouraria da Província,
para harmonizar tudo. Assim foi feito; porém, tão logo o Sr. Ca-
valcante voltou à Curitiba, o inspetorzinho recomeçou com as sus
pensões. É claro que também os "versinhos" r e c o m e ç a r a m . . .

N E S T A S E M A N A PASSADA;
HOUVE G R A N D E B A R U L H A D A ;
N A A D U A N A D A CIDADE;
PORÉM NÃO É NOVIDADE;
PORQUE LÁ AS SUSPENSÕES;
A N D A M MESMO AOS EMPURRÕES.
DEPOIS DO SENHOR " A C Á C I O " ,
V E I O T O D O ESSE " F R A C Á C I O "
NAQUELA REPARTIÇÃO.
E N Ã O SEI POR QUE" R A Z Ã O
OS HOMENS DA G O V E R N A N Ç A
NÃO FAZEM A L I MUDANÇA.

( N O T A — O senhor "Acácio" — Demétrio Acácio Fernandes


da Cruz — foi o antecessor do tal Figueiredo. Um inspetor de
ótimas qualidades morais e intelectuais; uma antítese deste
último).
Quanto mais os meses passavam, mais insuportável se tornava
o homenzinho.
A Sociedade paranaguára passou então a desprezá-lo total-
mente, como um indesejável. Ninguém o cumprimentava nas ruas,
como se fosse ele um tipo vulgar na cidade.
100
Ficou ,o inspetorzinho, apenas 9 meses em P A R A N A G U Á , po-
rém, completamente isolado.
Felizmente, a 17 de dezembro de 1862, foi demitido do cargo
em comissão. Deixou a nossa terra sem ouvir ao menos uma "boa
viagem" do mais simples funcionário aduaneiro.
E assim, a Cidade ficou saneada, com a saída desse mau
elemento.

101
O 5 DE FEVEREIRO"

Relembrando os áureos tempos do Brasil Império, vemos que


as V I L A S do passado receberam o "Foral" de "Cidade", pelo seu
progresso material e cultural; seu desenvolvimento na agricultura,
indústria e comércio.
E ainda hoje se vê, lugarejos que eram, a 30 e 40 anos passados,
são, atualmente, importantes cidades, e que cidades! E tudo isso
devido a agricultura, que é um dos fatores preponderantes no pro-
gresso de um País.
Mas, quanto a P A R A N A G U Á e Curitiba, foi outra a causa.
Elas foram elevadas a esse predicamento, pela dedicação e lealdade
à Monarquia do 2.° Império.
Sendo P A R A N A G U Á , no século passado, a mais importante
a
V I L A da 5. Comarca de São Paulo; arrecadadora também da maior
renda; ela e Curitiba prestaram o apoio e auxílio possíveis, em
material humano e de guerra, ao Governo Imperial, quando da
Revolução Farroupilha que assolou toda a Província do Rio Grande
do Sul.
Em 1840, governava a Província de São Paulo o célebre Barão
de Monte Alegre; estadista do 1.° Império e homem de grande pres-
tígio na política.
Esse cargo de muita responsabilidade, porque São Paulo confi-
nava com o Rio Grande do Sul; Província conflagrada pela revo-
lução que rompera em Porto Alegre, em 1835, a fim de depor o
então Presidente, que, segundo os revoltosos, fazia uma péssima
administração, além da grande perseguição aos liberais.
Esse Presidente e o Comandante das Armas fugiram para a
cidade do Rio Grande, transferindo para lá a Capital da Provín-
cia...
Depois, como era de se esperar, a Revolução tomou outro rumo;
devido as divergências de idéias dentro da própria P r o v í n c i a . . .
Estávamos no tempo do 2.° Império; já com D. P E D R O à
frente Tínhamos, porém, um 'Governo centralizado", isto é, os
presidentes das Províncias não eram eleitos ou escolhidos pelo povo
e assim, vinham do "Centro" nomeados pelo Imperador.
As pessoas mais influentes na política não concordavam com
essa forma de Governo. Queriam que o nosso País tivesse um "GO-
102
V E R N O F E D E R A D O " , como veio a ter, mais tarde, com a procla-
mação da República.
No Rio Grande do Sul, com mais esses ideais difundidos, foi
a gota d'agua suficiente para rebentar a Revolução F a r r o u p i l h a . . .
Eis porque temia-se e com razão, uma possível invasão em
nossa Comarca.
Sabia-se que as forças revolucionárias, comandadas por Bento
Gonçalves da Silva e Davi Canabarro, haviam proclamado a " R e -
pública de Piratinim". Sabia-se ainda que a Província de Santa
Catarina havia sido invandida pelo conhecido guerreiro "Gari-
baldi", o qual, apoderando-se da Vila de Laguna, fundara a "Repú-
blica Juliana" (que durou apenas 4 meses).
Daí o perigo que ameaçava o nascente Império. Daí a grande
responsabilidade do Presidente da Porvíncia de São Paulo em con-
ter essa onda revoltosa de brasileiros.
Sabia ele que, invadido o território, hoje paranaense, São Paulo
e Rio de Janeiro seriam presa fácil para os caudilhos que, derru-
bando o Trono, estenderiam a todo o País a República proclamada
em Piratinim, cujo presidente era Bento Gonçalves da S i l v a . . .
Nessa situação periclitante, o Barão de Monte Alegre procurou
então um amigo em quem pudesse confiar o seu plano de ação.
A escolha, aliás, acertadíssima, recaiu sobre o ardoroso monar-
quista — João da Mota Machado —. Ele, apesar de ser político,
dedicava-se ao comércio de "muares", viajando entre São Paulo e
Rio Grande do Sul.
a
Era, pois, conhecedor de toda a 5. Comarca, além de amigo de
quase todos os habitantes da futura Província do nosso Paraná, os
quais, sabia, a maior parte estava favorável ao movimento caudilho.
Ademais, os tropeiros, principalmente, admiravam muito os
gaúchos.
João da Mota Machado tratou logo de organizar a defesa de
nossa P A R A N A G U Á e de Curitiba, como baluartes que eram ao Sul
da Província de São Paulo; reunindo o elemento humano e bas
tante material bélico. O mesmo fazendo em Rio Negro.
E não ficou só nisso o trabalho, porque, nas suas andanças, a
cavalo, percorria ele todo o sertão paranaense, visitando as Fazen •
das e povoados e, nessas ocasiões, incutia no espírito dos sertanejos,
a fidelidade ao 2.° Imperador do Brasil; fazendo-os compreender os
prejuízos de uma revolução no País. E nesse ponto, ele estava
certo.
Mota Machado tinha lábia, como todo o bom político e, na
sua linguagem simples, convencia todo o paranaense do sertão e,
mais ainda, os fazendeiros; que eram todos seus amigos.
Prometia, _embora vagamente, a criação de nossa Província
separada de São Paulo. Porém, quanto aos paranaguáras e curi-
tibanos, afirmava categoricamente, que, as duas Vilas seriam ele-
vadas à categoria de "Cidades".
103
P A R A N A G U Á e Curitiba conservaram-se, de fato, fiéis à causa
do Império, cooperando em tudo, na medida do possível.
Uma das provas dessa fidelidade ao Governo Imperial, foi o
fato registrado em P A R A N A G U Á , nesse período de revolução.
Aos 31 de outubro de 1839, a improvisada Marinha de Guerra
Gaúcha, enviou dois "lanchões" a P A R A N A G U Á , a fim de atacar e
tomar a V I L A .
Depois de haverem dado corso em toda a costa paranaense e
paulista, atacando e apresando pequenos barcos que faziam o co-
mércio entre P A R A N A G U Á , Santos e Rio de Janeiro, tentaram a
invasão em nossa baía.
Mas a Fortaleza da Barra (na ilha do M e l ) , que estava de
prontidão, repeliu energicamente a invasão, com disparos de
canhão; fazendo com que os dois "lanchões" virassem de bordo 3
procurassem abrigo na enseada do Farol das Conchas (o saco das
conchas, como é conhecido); ficando assim fora do alcance dos
canhões. Porém, um contingente do Forte, bem armado, em um
escalér a remos, preparou-se para dar caça e abordar os dois lanções
que estavam parados devido a calmaria.
Nessa ocasião, caiu um vento de Noroeste que, soprando forte,
facilitou a saída rápida das barcaças, e a maré, que também estava
de vasante, ajudou ainda mais a salvar os atacantes que, com gran-
de rapidez, fugiram barra à f ó r a . . .
Em 1842, a Revolução Farroupilha estava quase extinta. Isso
devido a ação pacificadora e persuasiva do grande Duque de Caxias.
Os gaúchos, apesar de considerados rebeldes, eram brasileiros!
Mostraram sempre, bravura e dedicação à sua causa; principal-
mente na fase final, quando tiveram de enfrentar as tropas impe-
riais, com irmãos mais fortes.
Foi quando se deu o "episódio" que ficou imorredouro na His-
tória de nossa Pátria:
— Um chefe militar argentino Ditador Rosas — aproveitando
a situação, mandou um emissário" oferecer ao chefe revolucionário,
uma ajuda ao seu cansado exército (pois, pretendia, com isso,
entrar com sua tropa no território riograndense).
Nesse momento, revoltado, mas impassível, compreendendo o
jogo e pensando na Pátria Comum, D A V I C A N A B A R R O , com alti-
vez e desdém, respondeu ao "emissário":
— "Senhor, antes de mais nada, EU SOU UM B R A S I L E I R O !
Brigo com meus irmãos apenas por um ideal! mas ELES SÃO
MEUS I R M Ã O S ! . . . Assim sendo, voltai ao vosso comandante e
dizei que, "o primeiro soldado que pisar o solo riograndense, dará
o sangue com o qual assinarei a P A Z DA D E R R O T A com o Governo
I m p e r i a l ! " Se ele tentar colocar o seu exército em nossa fronteira,
sofrerá amargamente, porque encontrará os "soldados rebeldes de
Piratinim", mas SOLDADOS B R A S I L E I R O S , lutando, ombro a
ombro, com os SEUS I R M Ã O S , os soldados de sua Majestade o
104
Senhor D. P E D R O I I ! Estaremos unidos, novamente, por um
único ideal — A DEFESA DO SOLO P Á T R I O " !. ..
Imediatamente firmou com C A X I A S , a P A Z DE PONCHO
VERDE, pondo fim a Revolução Farroupilha, em 1845. Não houve
vencedor nem vencido ! . . .

Desculpem os leitores se fugi um pouco à finalidade do assunto.


Mas, esta página da História Pátria é tão edificante, que não pude
deixar de contar a v o c ê s . . .
Estávamos falando sobre o "5 de fevereiro" e iremos continuar:
Em 1842, a Revolução estava quase no final. Havia, pois, che-
gado o momento da "recompensa" prometida do fiel amigo — João
da Mota Machado — pelo apoio e lealdade das duas Vilas.
JOÃO DA M O T A M A C H A D O , foi agraciado pelo Imperador,
com o título de "Barão de Antonina" e, mais tarde, eleito Senador
do Império.
P A R A N A G U Á e C U R I T I B A receberam então o DECRETO bai-
xado pelo Barão de Monte Alegre, elevando-as à categoria de "Ci-
dades" ! Decreto esse, de 5 de fevereiro de 1842. Esse predica-
mento foi conferido como "prêmio" pela "dedicação, lealdade e
fidelidade" ao Monarca D. P E D R O I I .

Convém lembrar o nome do Comendador — Manoel Francisco


Correia Júnior — Comandante da Guarda Nacional, que muito
trabalhou na defesa das duas Vilas, bem como, no envio rápido de
tropas para a Vila de Rio Negro (ponto estratégico no interior),
onde havia o perigo de invasão.
O denodado Comendador deveria ter recebido uma honraria do
Governo Imperial. Infelizmente, tal não aconteceu... talvez in-
junções p o l í t i c a s . . . Mas, são coisas da v i d a . . . Entretanto, P A R A -
N A G U Á soube reconhecer !

Num retrospecto rápido, podemos observar que a Província de


São Paulo, ao instalar a sua primeira Assembléia Legislativa, em
1836, tratou de sistematizar as finanças municipais, quanto à re-
ceita e despesa dos seus 46 municípios.
a
Acontece que, 6 deles faziam parte da 5. Comarca (hoje Es-
tado do P a r a n á ) . Assim é que as rendas orçamentárias destes 6
municípios, no ano de 1836, foram assim classificadas:
105
1.° lugar — P A R A N A G U Á 1:068$000
2.° " — ANTONINA 600$000
3.0 » _ CURITIBA 410$000
4.o " _ CASTRO 370$000
5.° " — LAPA 230Ç000
6.o " _ GUARATUBA ÍOOÇOOO

T O T A L 2:778$000

(Dois contos setecentos e setenta e oito mil réis).

E 18 anos depois, isto é, em 1854, quando estes municípios, já


em número de sete, faziam parte da Província do Paraná, a renda
foi bem diferente. Senão, vejamos:

1.° lugar — P A R A N A G U Á 4:000$000


2.o " CURITIBA 3:360$000
3o " _ CASTRO 2:275$000
4.° " — LAPA 906$000
5.0 " _ ANTONINA 617Ç000
6.0 » _ MORRETES 460$000
7.o » _ GUARATUBA 162$000

T O T A L 11:780S000

(Onze contos setecentos e oitenta mil réis..

Vê-se então, uma diferença de Rs 9:002S000 que, para os tem-


pos morosos do passado (naqueles tempos não havia inflação), foi
um avanço muito grande. Em 1854, o P A R A N Á contava com:
Duas (2) cidades: P A R A N A G U Á e C U R I T I B A ; sete ( 7 ) vilas:
Antonina, Castro Lapa, Morretes, Guaratuba, Guarapuava e São
José dos Pinhais; 6 freguesias: Palmeira, Campo Largo, Ponta
Grossa, Rio Negro, Palmas e Tibagi; 3 capelas: Guaraqueçaba,
Araucária e Iguaçu.
No início de nossa emancipação, os principais produtos para-
naenses eram: o arroz, o mate e a madeira.
Hoje, podemos dizer, sem exageros; temos de tudo !
Os resultados positivos, em todos os tempos, deve-se à operosi-
dade dos paranaenses, na miscigenação constante, bem como ao
importante trabalho dos vários administradores.
Zacarias de Gois e Vasconcelos, foi, por sem dúvida, um exce-
lente Presidente; pois, além de sua cultura jurídica, tinha muito
tino administrativo. Todos esses predicados o tornaram grande.
Soube governar bem o P A R A N Á e não há quem não o reconheça.
106
Ele foi tudo isso. Entretanto, um outro que fosse, faria o
mesmo, porquanto, não faltavam estadistas eméritos no 2.° Império.
Ele fez muito pelo P A R A N Á . Mas. . . por P A R A N A G U Á , nada
que merecesse a nossa gratidão. Nada, mesmo, por nossa terra.
Muito pelo contrário; prejudicou-a e bastante...
E observem os leitores, que se não vê uma praça ou uma sim-
ples rua com o seu nome, aqui em P A R A N A G U Á . E por que ?
Porque os paranaguáras do passado sempre guardaram mágoa do
ilustre Presidente. Pagaram com o desprezo, o mal que procurou
nos fazer. E assim, nada lhe ficamos d e v e n d o . . .
Os anos foram passando e por fim a justiça se fez a nosso favor.
Sejamos justos, apesar de tudo, e continuemos reconhecendo o
que de bom o Presidente Zacarias fez pelo P A R A N Á (com exceção
da terra carijó !)
A História, para ser "História", tem que ser real.
E assim o fizemos.

CURIOSIDADES

DAVÍ CANABARRO
Seu nome verdadeiro era — D A V Í JOSÉ M A R T I N S . Ele adotou o
sobrenome de C A N A B A R R O , em 1835; quando substituiu a Bento
Gonçalves da Silva, como chefe supremo dos Farrapos. Ele repeliu
a proposta de auxílio do ditador Rosas e firmou com Caxias a Paz
de Poncho Verde, pondo fim à revolução em 1845. (Dicionário Enci-
clopédico Brasileiro — de Álvaro Magalhães — vol. I — pág. 369).

107
ACONTECIMENTOS RAROS E INÉDITOS
DE PARANAGUÁ

Há casos passados em nossa terra que contados, parecem inve-


rossímeis; muitos deles até, inacreditáveis.
Entretanto, podem crer os meus conterrâneos que muito pes-
quisamos, antes de passá-los ao papel; para que vocês e os que hão
de vir, possam avaliar o que foi esta nossa P A R A N A G U Á , no pas-
sado que vai l o n g e . . .
Comecemos com

O LADRÃO ARREPENDIDO

Estávamos no ano 1844; sendo Inspetor da Alfândega de Para-


naguá o Dr. João Crisóstomo Pupo; homem íntegro e acatado pela
população de nossa terra.
A Alfândega, nessa época, funcionava no velho prédio do Colé-
gio dos Jesuítas; adatado para esse fim.
O "cofre" da repartição ficava isolado numa sala contígua a
da Tesouraria, onde só entrava o Inspetor, quando ía depositar ou
retirar dinheiro.
No dia 13 de fevereiro desse ano, pela manhã, o Inspetor teve
que abrir o "cofre" para retirar dinheiro, a fim de fazer as transa-
ções necessárias da Tesouraria. Tudo em ordem.
No dia 14, adoeceu, ficando 7 dias de molho em casa. No dia 21,
já bem melhor, voltou à repartição e seu trabalho continuou nor-
malmente. Como não houvesse entrado dinheiro, não foi preciso
ir ao "cofre". E assim passaram-se mais 3 dias.
No dia 24, tendo que recolher certa arrecadação; ao chegar
ao "cofre", encontrou-o vazio e aberto; apenas com a porta encos-
tada. . .
O ilustre senhor perdeu o controle e, atacado por uma crise de
nervos, começou a gritar como um louco.
Todos os funcionários correram ao local para saber o que es-
tava acontecendo. O próprio JUIZ M U N I C I P A L , que morava no
sobrado ao lado (fim da ladeira para o mercado), ouvindo os gritos,
também acudiu ao local. Acalmaram o Inspetor'e, em seguida,
depois de ouví-lo minuciosamente, trataram de fazer o "corpo de
108
delito". Ficou constatado, então, achar-se o "cofre" aberto; tendo
numa fechadura, sinais de ter sido forçado; ou, com outra chave,
ou com algum outro instrumento.
O roubo foi avaliado em Rs 32:229$000 (trinta e dois contos,
duzentos e vinte nove mil réis), muito dinheiro para a é p o c a ! . . .
Treis dias infernais passou o Inspetor em sua casa, sem poder
dormir, e até sem se alimentar. E não era para m e n o s . . .
Mas, no dia 27, às 7 horas da manhã, batem à porta de sua
casa. O Inspetor vai abri-]a. Era o "amanuense". Vinha comu-
nicar que o "porteiro" da Alfândega, ao abrir a porta de sua casa
para ir ao Mercado, achara um pedaço de papel, mal escrito, colo-
cado debaixo da porta, dizendo:
" O D I N H E I R O R O U B A D O ESTÁ N O P Á T I O D A A L F Â N D E -
GA".
Quase em seguida, chega o seu amigo, fiador — Joaquim Amé-
rico Guimarães — apresentando também um outro pedaço de papel
colocado por debaixo da porta de sua casa, e com os mesmos
dizeres...
O Inspetor não acreditou muito, pensando fosse uma brinca-
deira de mau gosto. Contudo, mandou que fosse aberta a Alfân-
dega, mas que ninguém nela entrasse, até ele chegar.
A essa hora toda a cidade já sabia dos bilhetes. De forma que,
quando o Inspetor chegou com as autoridades, a onda de curiosos
estava enorme.
Entraram no pátio e, lá estava o embrulho no chão. Aberto
na presença do Juiz Municipal e das demais autoridades, continha
o pacote a quantia de Rs 31:614$000 (trinta e um contos seiscentos
e catorze mil réis), faltando apenas a importância de Rs 615$000
(seiscentos e quinze mil r é i s ) .
A polícia procurou descobrir como foi feito o roubo; mas era
muito difícil, naqueles tempos, uma rigorosa investigação.
O Inspetor não duvidou de funcionário algum. O fato, porém,
de não se notar sinais de arrombamento, deixava dúvidas.
Mais tarde, descobriu-se que uma das janelas ficara aberta e
que o porteiro costumava deixar a chave da porta do quarto onde
se achava o "cofre", escondida debaixo de um b a n c o . . .
No inquérito policial ficou constatado que o ladrão se intro-
duzira no edifício e se ocultara em algum lugar escuro, esperando
a noite para poder agir. Ainda mais; que o "cofre" era muito fácil
de ser aberto, porque as fechaduras do mesmo eram feitas de ferro
fundido. E nada mais se fez. . . "O processo" foi, por fim, arqui-
vado . . .

109
M a s . . . o ladrão arrependeu-se e resolveu devolver quase toda
a quantia roubada ! É incrível esse fato e, talvez inédito na "his-
tória dos crimes ! . . . Porém, ele se realizou; ficou comprovado. E
o "palco" dessa "comédia" foi a Alfândega de P A R A N A G U Á ! . . .
De fato, foi um "bom ladrão" ! "Um ladrão arrependido" !
Ficou apenas com um pouquinho do dinheiro !
Esses "bons tempos" não voltam mais ! . . . S ó . . . na novela do
'Pecado Capital", com o "bom C A R L A O " ! ! ! . . .

110
AS FAÇANHAS DO PADRE (rREGÓRIO

Em 1841, chegara o novo vigário de P A R A N A G U Á — padre


Gregório José Lopes Nunes — vindo com "carta de naturalização",
de 26 de novembro de 1838; passada pelo Regente do Império, em
nome do Imperador. Era ele natural da Ilha da Madeira (Portu-
gal).
Político ferrenho, em suas campanhas, dava muito trabalho aos
adversários; pois, em vez de cuidar das coisas da igreja, dedicava-se
mais à política. Por essa razão, ninguém o apreciava. Muito pelo
contrário, destestavam-no.
O padrezinho era tão ruim que, em 30 de novembro de 1841, o
povo não o suportando mais, fez uma "representação" à Câmara
Municipal, com 43 assinaturas, de autoridades civis e militares e
homens de bem da terra, pedindo não fosse o padre Gergório no-
meado "vigário colado" da igreja Matriz, devido o seu mau proce-
dimento e péssimos costumes.
A Câmara oficiou então ao Presidente da Província de São
Paulo, encaminhando a "representação'.
a
Como passassem 3 meses sem a mínima resposta, seguiu a 2 .
"representação", em 12 de fevereiro de 1842, pedindo dar outro des-
tino ao tal padre Gregório. Ainda nenhuma resposta !
a
Em 13 de março, seguiu, por fim, a 3. "representação", bem
mais forte que as anteriores. Também sem nenhum resultado.
a
Finalmente, seguiu a 4 "representação", aos 4 de maio, pe-
dindo ao Presidente da Província enviá-la a Sua Majestade, por-
quanto, as súplicas não tinham sido atendidas; nem pelo bispo dio-
cesano, o qual não dava a mínima atenção ao caso.
O próprio Partido, do qual ele fazia parte, taxando-o de louco,
pediu a retirada do padre Gregório da Paróquia de P A R A N A G U Á .
N a d a . . . Nada mesmo ! . . .
O leitor há de admirar por que nenhuma das 4 "representa-
ções" foram aceitas, nem o u v i d a s . . .
Ou as mesmas não foram bem explícitas (nos mínimos deta-
lhes) ou se o foram, o bispo e demais autoridades não quiseram ou
não puderam acreditar; achando o "caso" inverossímel, em se tra-
tando de um p a d r e . . .
ill
Ambas as hipóteses são aceitas. E o leitor também pensará
assim ! Entanto, o caso foi verídico, na mais pura expressão da
verdade ! . . .
O tal "caso" do padre resume-se no seguinte:
O padre Gregório costumava aterrorizar os paroquianos com
certos "atos", que, só um louco poderia f a z e r . . .
Quase todos os dias, pela manhã aparecia em uma das janelas
da Torre da Matriz; saia por ela e, encostando-se à parede, cami-
nhava de lado pelo estreito friso, circulando a Torre, até encontrar
a outra janela, pela qual entrava. Parecia um verdadeiro trape-
zista de c i r c o . . .
O povo, no adro da igreja, apreciava a cena; mas, irritado, e
oom toda a razão. Algumas mulheres chegavam a desmaiar de
susto, pensando no padre que podia se despencar daquela altura,
despedaçado no passeio... e não era para menos.
Não se podia admitir tamanha insensatez em um homem de
certa cultura que, além do mais, era um guia espiritual. Só mesmo
um desiquilibrado mental produziria tal inconsciência de perigo.
Assim pensavam os homens de bem, como toda a população sensata.
Julgaram outros, também sensatos, que, se não era desiquilí-
brio mental; talvez o padre quisesse, com isso, atemorizar os fiéis,
obrigando-os a obedecê-lo sem r e s t r i ç ã o . . .
Excusado é dizer que, as 4 "representações" jamais foram aten-
didas, como atrás ficou dito, julgando (as autoridades e o próprio
bispo) essa façanha diabólica, nada mais que um golpe político dos
seus adversários, uma vez que o padre era duro de roer na po-
lítica. . .
Mas tudo tem um fim. Nessa ocasião rompeu a célebre "revo-
lução" em Sorocaba, contra o Governo Imperial. As coisas muda-
ram e ninguém mais se preocupou com o "caso".
O padre Gregório, vendo que o povo não mais ligava à sua
maluquice, desistiu do seu malabarismo ridículo e tudo caiu no
esquecimento.

Mas o fato diabólico passou à História de P A R A N A G U Á .

112
O "CORMORANT" E SUA HISTÓRIA

O dia 29 de junho de 1850, foi assinalado pela "entrada" do


navio de guerra da marinha real inglesa — C O R M O R A N T — (corvo
marinho) na baía de P A R A N A G U Á , a fim de capturar alguns dos
nossos pequenos navios ancorados no porto, apenas pela simples
suspeita de que os mesmos faziam o tráfico de n e g r o s . . . Um ver-
dadeiro atentado ao Direito Internacional!...
A marinha real inglesa, na época, a maior potência naval do
mundo, arrogava-se em " P A L M A T Ó R I A DO M U N D O " , invadindo
águas territoriais alheias, sob pretexto de violação do "tratado"
existente entre o Brasil e a Inglaterra.
Todo o mal, nesse acontecimento de 1850, foi a ousadia do
capitão SCHOMBERG, não respeitando as "leis" vigentes em nosso
País.
Tudo muito certo que se fizesse tal policiamento com rigor.
Porém, efetuar esse "policiamento" dentro de nossas águas territo-
riais ?!. .. Então para que servia o "Direito Internacional" ? . . .
Mas vamos além: Dentro de nossa baía e de nosso porto ?. ..
Isso era forte d e m a i s . . . Essa a razão pela qual houve o "desagravo"
de 1. de julho de 1850, em P A R A N A G U Á .
Patrulhava os mares do Atlântico, contra o tráfico negreiro, o
cruzador "Cormorant", navio britânico misto (a vela e a v a p o r ) ,
com 5 mastros, armado de peças de calibre 80. Sua tripulação se
compunha de 200 marujos, comandados pelo capitão Herbert
Schomberg.
Este "homem do mar", tendo notícia de que a costa paulista
era a mais movimentada pelo tráfico negreiro (e nós pertencíamos
ainda à Província de São P a u l o ) ; mais ainda, que dias antes haviam
chegado vários navios em nosso porto, vindos de Angola e Moçam-
bique, resolveu o audacioso e prepotente comandante entrar em
nossa baía e apresar os tais navios, que julgava serem negreiros, por
terem vindo da África.
Eram eles:
Os brigues — "Astro", "Seria" e "Dona Ana"; a barca "Rufina"
e as galeras "Conclusão" e "Campeadora".
Todavia, se vinham da África, não quer isso dizer que fossem
"negreiros", porquanto, o nosso País mantinha comércio com as
113
colônias portuguesas da costa africana, de onde recebíamos vários
produtos.
Esses navios estavam ancorados na enseada da Cotinga, nc
porto do Alemão, já faziam dias. Estávamos, pois, a 29 de junho.
Os tripulantes do "Cormorant", ao se aproximar da ponta da
ilha do Mel, acenaram a dois pescadores que costeavam a ilha —
Manoel Felipe Santiago e Benedito Santiago — a fim de servir-lhes
de práticos. Apenas Manoel Felipe foi a bordo, indicando o rumo a
seguir e guiando o navio, barra a dentro, até a Ponta da Figueira,
na Cotinga. Aí foi que percebeu o logro em que caíra, mas já era
tarde...
Os ingleses, armados de clavinas, desembarcaram em 3 esca-
léres e se dirigiram ao Porto do Alemão (que ficava p e r t o ) , onde
se achavam fundeados os nossos navios.
Antes de abordar o brigue "Bona Ana", descarregaram suas
clavinas, para amedrontar a nossa tripulação. Depois, sacando os
sabres, tomaram esse brigue, abrindo logo as escotilhas para ver se
haviam escravos no porão. Nada ! Em seguida foram ao "Sereia",
varejando tudo; também nada encontrando.
Nesse ínterim, o capitão — José Francisco do Nascimento — no
intento de impedir que os ingleses se apoderassem do brigue
"Astro", do qual era comandante, mandou fazer, rapidamente, um
grande rombo no casco do seu navio, afundando-o no próprio Porto
do Alemão. .. Sabia ele que cs ingleses, apoderando-se do barco,
como costumavam fazer, tratariam de incorporá-lo à frota inglesa
mercante. Daí a sua atitude.
O capitão Schomberg, então, ficou ainda mais desconfiado com
o gesto do comandante do brigue "Astro"; achando que esse capitão,
para ocultar o crime, houvesse, como o afundamento do barco, afo-
gado todos os negros que nele vinham e que deviam estar no porão.
Essa hipótese não é verdadeira, porquanto, estando os navios
há dias atracados; se tivessem escravos, já os teriam deixado nas
ilhas.
Sim, porque, em nosso porto, jamais entraram navios negreiros.
Esses, quando vinham, deixavam a "carga humana" nas ilhas de-
sertas; para que, depois os "compradores" fossem buscá-la. Isso
é o que há de verdade.
A fiscalização, quanto à escravatura, era verdadeiramente
cumprida. Não se podia, porém, controlar as ilhas. Na escuridão
da noite, no mar, tudo é p o s s í v e l . . .
Ficou, portanto, fora de dúvida o crime emputado por Schom-
berg ao capitão José Francisco do Nascimento, comandante do
brigue "Astro".
Nos outros navios também nada foi encontrado que pudesse
comprometer os armadores. Assim mesmo o capitão Schomberg,
comandante do "Cormorant", apresou-os. Contudo, como não pu-
desse rebocá-los todos; apenas levou os brigues "Dona A n a " e "Se-
114
reia" e a galera "Campeadora"; sentindo ter perdido o barco
"Astro", por ter ele 170 toneladas.
Caindo a noite, o "Cormorant" ficou na enseada com os navios
apresados. Permaneceu ainda todo o dia 30 de junho, para que
desse tempo do oficial de bordo — tenente Kantzow — desenhar a
cena da apreensão dos navios brasileiros, isso para melhor docu-
mentação.
É claro que, com esse apresamento, as manifestações de pro-
testo se fizeram sentir por parte das autoridades locais, que, num
escaler, se dirigiram ao brigue "Dona Ana", a fim de falar aos
nossos marinheiros. Não conseguiram chegar perto, porque os in-
gleses impediram, de armas nas mãos; ameaçando de morte às
nossas autoridades, caso tentassem atracar.
O guarda-mor, o fiscal da Alfândega e os guardas aduaneiros,
resolveram então ir ao "Cormorant", para falar ao comandante
Schomberg. Este os tratou com grosseria, dizendo: "Venho a este
porto para apresar as embarcações negreiras".
— Responderam os nossos: "Não há razão para isso, porquanto
nada foi encontrado".
Schomberg, percebendo que os paranaguaras tinham razão,
cortou a conversa, respondendo com brutalidade: "Estou autorizado
pelo meu almirante — Barrington Raynolds — e não tenho que dar
satisfação às autoridades do seu país". Depois, dirigindo-se ao fis-
cal da Alfândega, disse mais: "Não tenho que ver com a Alfândega
do Brasil". Entregou ao guarda-mor um ofício (feito na véspera)
endereçado ao comandante da força militar sediada em P A R A N A -
G U Á , e retirou-se...
Depois dessa malfadada visita ao "Cormorant", o guarda-mor,
o fiscal da Alfândega e os guardas aduaneiros voltaram à terra,
acabrunhados por nada conseguirem f a z e r . . .
Lembraram-se que deviam entregar o "ofício" ao Juiz Munici-
pal — Dr. Filastro Nunes Pires — que desculpou-se, alegando ser
apenas uma autoridade Judiciária.
Foram ao delegado de polícia — José Francisco Barroso —
este mandou-os ao mais antigo comandante da Guarda Nacional
— Manoel Antonio Guimarães (futuro barão e depois visconde),
que nem quis ler o tal "ofício", para não assumir qualquer respon-
sabilidade. Apenas aconselhou que tivessem prudência e que
fossem falar ao comandante da Fortaleza — major Joaquim Fer-
reira Barbosa — para resolver o caso.
— Perguntaram-lhe: "Que devemos fazer com o "ofício" do
com. Schomberg" ?
— "Coloquem no Correio, que alguém há de recebê-lo" (disse
ele com ironia).
Diante da atitude das autoridades locais, que não queriam
assumir a responsabilidade devida, mostrando com isso a sua
inépcia, o grupo revoltado, juntamente com a tripulação dos navios
115
apresados (26 ao todo) se reuniu nessa tarde e resolveu ir à
noite (de 29 para 30), à Fortaleza da ilha do Mel, falar com o
comandante •— capitão Joaquim Ferreira Barbosa — e convence-
lo a canhonear o "Cormorant" quando saísse do porto com os
navios nacionais apresados.
Às 9 horas da noite, sairam do cais da rua da praia, em 2
lanchas, 2 botes e 3 canoas, debaixo de chuva e vento. Passaram
longe do "Cormorant", sem ser vistos e chegaram de madrugada na
ponta da ilha. Aí desembarcaram e seguiram a pé até a Fortaleza.
Estava amanhecendo quando lá chegaram.
Como sabiam do mau estado do Forte, levaram carpinteiros,
ferragens, pólvora e até balas, t'radas do depósito que existia no
Colégio Velho dos Jesuítas. Lá chegados, o comandante Ferreira
Barbosa ficou surpreendido com essa atitude heróica. Admirou a
coragem desses paranaguaras; porém, fê-los compreender não ser
possível atirar contra um navio de guerra inglês, sem uma ordem
superior. Sofreria ele um Conselho de Guerra.
Mas os rapazes pareciam loucos e não queriam compreender a
1
responsabilidade; que tal "ato" acarretaria em prejuízo do oficia
do Exército. Eles estavam dispostos a fazer qualquer coisa.
O comandante tornou a falar, alegando que a Fortaleza estava
desmantelada; portanto, incapaz de resistir a meia hora de " f o g o "
contra o cruzador "Cormorant". Não era possível, e ele não iria
permitir tal atitude louca.
A "turma", entretanto, cortou todas as dificuldades, dizendo
que, o material principal — pólvora e balas — ali estavam; homens
e carpinteiros, também. Portanto, ele teria que c e d e r . . .
O comandante — Joaquim Ferreira Barbosa — nada mais ten-
do para argumentar, acabou cedendo, sob uma condição: Queria
um "documento" assinado por todos os 26 heróis, isentando o
comandante do Forte de toda e qualquer responsabilidade. A con-
dição foi logo aceita.
Em 24 horas, tudo ficou pronto para a desafronta à ofensa.
O próprio comandante, já contagiado, nesse curto tempo, deu no
ções de artilharia e manejo dos "canhões", aos rapazes.
Até as filhas do comandante do Forte procuraram ajudar, de
tão entusiasmadas que estavam e, sem nenhum receio, rasgaram
muitas roupas brancas (íntimas) suas, em tiras, para, no caso de
feridos, poderem trabalhar como enfermeiras.
Nessa agitada noite de 30; tudo pronto; logo depois da meia
noite, os rapazes fizeram um pequeno repouso, para poderem se
achar em condições no drama que iriam tomar parte na manhã
do dia 1.° de julho ! . . .
O manejo do canhão mais potente ficou a cargo do artilheiro
improvisado — Antonio José de Medeiros — e preparado para isso.
Amanheceu o dia 1.°. Todos levantados; cada um assumiu o
seu posto.
116
Foi então içado o pavilhão nacional no Bastão do Forte, ao som
de vivas ao Imperador, ao Exército e à Pátria Brasileira.
As horas correndo; o dia nublado. Um vigia no alto do Monte,
onde se encosta o Forte, daria o sinal de alarme.
Às 10 horas em ponto o vigia gritou: "Cormorant" à vista !
O cruzador inglês descia para a Barra, arrastando os nossos
três navios apresados...
O comandante, imediatamente, equipou uma canoa com o sar-
gento da Guarda Nacional — Tomás José de Oliveira — levando um
ofício ao capitão do "Cormorant", declarando ter ordem do Governo
Imperial para não permitir a saída dos barcos nacionais apresados,
sob pena de fazer fogo contra o invasor.
Essa mensagem não chegou ao destino, porque, quando a canoa
quis abordar ao navio inglês, o comandante mandou fazer fogo de
fuzilaria contra a pequena embarcação, obrigando-a a voltar.
As hostilidades estavam iniciadas. Um tiro de pólvora seca
partiu da Fortaleza, como aviso.
O comandante do "Cormorant", sem diminuir a marcha, ao
passar em frente à Fortaleza, ordenou que expedissem um tiro alvo
sobre os rochedos do morro, pensando com isso apavorar os heróis.
Foi quando o capitão Ferreira Barbosa deu o grito de "atirar" !
Mas que visassem as rodas e o leme do cruzador, bem como a linha
d ' a g u a dos barcos apresados, a fim de inutilizá-los.
Os velhos canhões da Fortaleza estrondaram e, com tanta feli-
cidade, que um projétil danificou-lhe a popa, matando um ma-
rinheiro e ferindo um outro; o segundo projétil alcançou a roda
propulsora de bambordo do navio britânico.
Enquanto o "Cormorant" passava ao alcance da Fortaleza, as
balas choviam sobre ele; algumas atingindo os navios apresados...
Foi um combate intenso, porém de pequena duração (das 10,10
às 10,50); 40 minutos de fogo sem cessar. Às 11 horas os invasores
cessaram fogo. O Forte continuou até mais algum tempo; só
parando quando viram os patriotas que o inimigo estava fora do
alcance dos velhos c a n h õ e s . . .
Os estragos do "Cormorant" foram grandes. Ele foi se arras-
tando, sem uma das rodas propulsora, levado pela maré vasante;
indo fundear no "saco das conchas", para reparar os danos recebi-
dos e sepultar no oceano o infeliz marinheiro.
Com os disparos da Fortaleza, os brigues "Sereia" e "Dona
Ana" ficaram inutilizados e, não podendo atravessar o Atlântico,
os ingleses puseram-lhes fogo. Aproveitaram somente a galera
"Campeadora" e foram barra à f o r a . . .
Quanto à Fortaleza, nesses 40 minutos de fogo intenso, sua
artilharia ficou completamente inutilizada, pelo próprio esforço do
combate; pois os canhões já estavam bastante v e l h o s . . .
Valeu a pena o sacrifício. Fora desagravado esse audacioso
atentado à nossa terra.
Quanto à nossa gente, nem um ferimento causado pelo inimigo.
117
Os rapazes voltaram, felizes da vida, para a sua velha P A R A -
N A G U Á , e os pais, mais felizes ainda, por não terem perdido os
seus entes queridos. O sacrifício foi, de fato, compensado.
E foi a primeira vez que um vaso de guerra da marinha real
inglesa recebeu no seu costado projétis brasileiros de uma velha
Fortaleza de Paranaguá, em sinal de protesto contra o abuso da
"força" ! . . .
Hoje, passados 126 anos, dirão os leitores: "Mas, sendo peri-
gosa a entrada da "Barra de P A R A N A G U Á " , bem como a própria
baia, como pôde o "Cormorant" entrar sem prático" ?
É nesse particular que iremos chegar, ilucidando o fato.
O prático — Manoel Felipe Santiago — com seu irmão Bene-
dito Santiago, costeava a ilha, como já foi dito no início, em dire-
ção à "casa dos práticos", no farol das conchas. Como estava de
"plantão"; vendo os sinais dados pelos ingleses no cruzador para
entrar em nossa Barra; deixou seu irmão em terra e foi a bordo do
mesmo, a fim de cumprir o seu dever, como prático, guiando o
malfadado navio até ao nosso porto.
Assistindo os lances dramáticos por que passara a nossa gente,
compreendeu, tarde demais, o erro que cometera involuntariamen-
te. . .
Ficou retido no cruzador; sendo obrigado a guiá-lo de volta,
no dia 1.° de julho; mas não o deixaram saltar no Farol (Nunca se
soube o m o t i v o ) . Só depois de muito pedir, humildemente, solta-
ram o pobre prático na "praia grande" de Santos.
Ele, sem o saber e sem o querer, representou um triste papel
que, felizmente, não foi tido como o de um traidor, porquanto,
quando pegou o navio, ignorava a sua finalidade.
O Governo Imperial, sim, teve sérios problemas e grandes abor-
recimentos com o "caso Cormorant"; sendo obrigado a dar satis-
fações à Inglaterra, desculpando-se de todos os modos. Surgiram
inquéritos, explicações, troca de notas, etc.
Por fim, o episódio acabou caindo no olvido, e nunca mais se
ouviu falar no caso. Também, nenhum historiador teve coragem
de projetar esse importante "episódio" em seus livros. E por q u e ? . . .
Talvez fizesse parte do acordo: Esquecer, desde que nada se
publicasse sobre o fato; para não ridicularizar a orgulhosa Ingla-
terra.
Só depois de 100 anos é que o erudito historiador — Dr. D A V I D
C A R N E I R O — publicou uma importante obra: "A H I S T Ó R I A DO
I N C I D E N T E C O R M O R A N T " , episódio histórico que muito nos au-
xiliou e que deve ser lido por todos os brasileiros.
Os leitores avaliem: Apenas 26 jovens, eivados de são patrio-
tismo, conspirarem e porem em prática um audacioso projeto.
Apoderarem-se de uma Fortaleza, cujo comandante acabou aderin-
do ao movimento, e,por fim, bombardearem um vaso de guerra
inglês ?!. ..
118
Certos ou errados; foi uma admirável página de civismo, que
todo o paranaguara deve conhecer; para se orgulhar dos "feitos"
de seus antepassados: " A DEFESA DO SOLO P Á T R I O " ! . . .

Vários historiadores de mérito fizeram juizo temerário, quanto


à atitude do comandante do brigue "Astro' — José Francisco do
Nascimento — afundando esse navio que, segundo eles, deveria
estar com escravos no porão.
Discordamos desse modo de pensar e fazemos nossos conside-
randos :
]
O comandante S C H O M B E R G foi precipitado, impu sivo e
mesmo leviano, em apresar os nossos navios, sem ter certeza abso-
luta de serem eles "negreiros"; isso porque:

1.° — Porque nada foi encontrado de "carga humana". Apenas


muitos víveres para alimento da tripulação.
2.° — Porque os tais navios já estavam, há dias, atracados no
porto. Se tivessem trazido essa "carga humana", teriam
deixado nas ilhas desertas.
3.° — Porque, jamais entrou um "navio negreiro" em nosso porto.
A fiscalização era perfeita; apenas no porto.
4.° — Porque, quando isso acontecia; antes de atracar no porto; o
navio deixava essa "carga humana" nas ilhas desertas
conhecidas dos escravagistas (compradores), que, ma's,
tarde, iam buscá-la.
5.° — Quantos às tais ilhas, não era possível uma fiscalização:
porquanto, não havia na Cidade um policiamento adequado
para essa finalidade.

Assim sendo; nada havia que pudesse comprometer o Governo


Municipal, como também os Armadores. (Embora saibamos que
os "escravagistas", poderosos como eram, procuravam, por todos 05
meios, ludibriar o " F i s c o " ) .
Oficialmente, porém, estava tudo dentro da Lei.
No que nós nos batemos é quanto ao juizo errôneo do afunda-
mento do navio "Astro", quanto à "carga h u m a n a " . . . Isso não
podemos aceitar.
EM T E M P O : Em a tarde de 30 de junho, o Juiz Municipal --
Dr. Filastro Nunes Pires — enviou um "ofício de protesto" ao co-
mandante do "Cormorant", censurando o ato leviano e indigno do
capitão Schomberg em capturar 3 navios nacionais, dentro do seu
próprio porto; violando assim, os princípios de "direito interna-
cional", e t c . . .
A resposta não se fez esperar.
119
O comandante Herbert Schomberg, respondendo ao ofício do
Juiz Municipal de P A R A N A G U Á , disse apenas que estava "execu-
tando ordens estritas recebidas do comandante e chefe da esquadra
britânica nesta parte, a quem não perderia o tempo de fazer refe-
rência sobre o seu protesto.
Marinheiros do "Cormorant" levaram essa resposta e, tão logo
voltaram dessa missão, na madrugada de 1.° de julho, o "Cormo-
rant zarpou do nosso porto, com os navios apresados.

O major — Joaquim Ferreira Barbosa — nasceu em São Paulo,


em 1783. Veio para P A R A N A G U Á em 1831, a fim de comandar a
Fortaleza da Barra. Aqui casou com uma parenta de Monsenhor
Celso e Brasílio Itiberê da Cunha. Nasceram-lhe 5 filhos: 4 meni-
nas e um menino. Em 1847 foi a Capitão. Muito ajudou, com
Manoel Francisco Correia Junior, na Revolução Farroupilha.
Não teria enfrentado, sozinho, o caso "Cormorant". Contudo,
não deixou de atender ao pedido dos heróicos rapazes paranagua-
ras, assumindo toda a responsabilidade. Seus filhos foram admi-
ráveis nesse combate, ajudando em tudo o que lhes era possível
fazer.
Passado o "episódio", foi elogiado pelo Presidente da Província.
Recebeu também as homenagens do Parlamento.
Contudo, foi chamado a São Paulo para responder Conselho de
Guerra. Seguindo com seus 5 filhos para a Província; a filha mais
velha levou consigo a imagem de N. S. dos Prazeres (como prote-
ção).
Verdade seja que o capitão Joaquim Ferreira Barbosa não foi
condenado. Mas também não recebeu promoção. Apenas desti-
tuído do cargo de comandante da Fortaleza da Barra e passou logo
a
à 3 . classe do Exército. Pediu então a sua "reforma" e foi viver
no interior; onde veio a falecer no dia 23 de setembro de 1864, com
a idade de 81 anos, amargurado e desiludido com a incompreensão
dos homens. P A R A N A G U Á , porém, não o esqueceu.
Para que a posteridade jamais esqueça os heróis deste episódio
épico, passaremos a recordá-los; numa "Homenagem Póstuma"
àqueles que souberam honrar sua Pátria, quando afrontada pelo
inimigo: O comandante do Forte e os 26 moços, cheios de vida
e de são patriotismo ! ! ! . . .

— Capitão J O A Q U I M F E R R E I R A B A R B O S A — comandante do
Forte.
01 — JOSÉ F R A N C I S C O DO N A S I M E N T O — comandante do
navio "Astro".
02 — A N T O N I O PASCO AL F R U G O N I — mestre do brigue "Se-
reia".
120
03 — P I L O T O T E I X E I R A — comandante do brigue "Dona Ana".
04 — P A U L O D I A S CARDOSO — comandante da galera "Cam-
peadora".
05 — Tenente M A N O E L R I C A R D O C A R N E I R O .
06 — Tenente JOAQUIM C A E T A N O DE SOUZA.
07 — P R E V I S T O GONÇALVES DA FONSECA COLUMBIA.
08 — M A N O E L L U I Z FERNANDES.
09 — A N T O N I O JOSÉ DE MEDEIROS.
10 — B E N T O A N T O N I O DE MENEZES.
11 — L I N O DE SOUZA F E R R E I R A .
12 — A N T O N I O C R I S T Ó V Ã O DA S I L V A .
13 -- JOSÉ CÁRDENAS DO A M A R A L .
14 _ C A E T A N O JOSÉ DE SOUZA
15 _ CUSTÓDIO BORGES.
16 — A N T O N I O JOSÉ DA COSTA JUNIOR.
17 — F R A N C I S C O PIRES.
18 — A N T O N I O GONÇALVES PENDÃO.
19 — V Í T O R DA S I L V A FREIRE.
20 — M A N O E L JOSÉ DE O L I V E I R A .
21 — S A L V A D O R DO P R A D O .
22 — JOSÉ DA CRUZ.
23 — JOÃO F E L I C I A N O DOS SANTOS.
24 — I Z I D O R O MARQUES L E A L .
25 — CARLOS SILVESTRE.
26 — M A N O E L F R A N C I S C O G R I L L O .
Estes nomes ilustres ficarão imorredouros na História de
PARANAGUÁ!

121
APONTAMENTOS HISTÓRICOS E DESCRITIVOS
DA CIDADE DE PARANAGUÁ

Esse foi o título do trabalho histórico publicado em 1863, por


D E M É T R I O A C Á C I O FERNANDES DA CRUZ, que esteve em P A -
R A N A G U Á em 1860, como Inspetor da Alfândega, cargo em co-
missão, aqui permanecendo durante 15 meses.
Culto e educado, fez logo sólidas amizades, angariando a sim-
patia de todas as camadas sociais, tanto como Inspetor ou como
simples cidadão de uma grei.
Como gostava de História, resolveu escrever sobre nossa terra
e nossa gente, nos seus vários aspectos, político, econômico, social
e religioso; assim como seus usos e costumes.
Para completar melhor a sua obra, tratou de vasculhar os ar-
quives da Câmara Municipal, colhendo bastante material dos ori-
ginais inéditos de Antonio Vieira dos Santos.
Demétrio Acácio Fernandes da Cruz não plagiou a obra de
Vieira dos Santos; absolutamente. Apenas colheu os dados neces-
sários (como fazem todos os historiadores nas suas pesquisas), para
incluir no seu trabalho, feito através do que viu e ouviu da gente
paranaguára, nas várias fases de sua vida.
De volta ao Rio de Janeiro, publicou o seu livro, intitulado
"Apontamentos Históricos e Descritivos da Cidade de P A R A N A -
GUÁ".
Demétrio Acácio fez um ótimo trabalho, com comentários cer-
tos e muita perspicácia, complementando assim, a obra de Vieira
dos Santos, numa década de 1850 a 1860.
Em 1863, a redação do jornal — "Comércio do Paraná" — rece-
beu um exemplar do interessante livro e transcreveu-o em folhetins.
Foi assim que viemos a saber dessa publicação; pois o Sr. De-
métrio Acácio, que parece ter feito sólidas amizades em nossa terra,
não se lembrou dos amigos que aqui deixou. Esqueceu-os com
muita facilidade.
Dizemos isso, porque, não nos consta ter o autor enviado al-
guns exemplares àqueles que sempre o consideraram como um
distinto e culto cidadão.
Muito interessante os seus comentários, quanto à vida de nossa
terra e de nossa gente. Diz ele:
122
,-
É de admirar os hábitos da população e o seu pendor para as
artes e ciências. Muito luxo. A elegância dos homens; o espírito
das mulheres, que são críticas, satíricas; muito galanteadoras, dan-
çando regularmente bem. O luxo excessivo não condiz com a
pobreza da classe h u m i l d e " . . .
Todavia, achamos que ele foi um tanto exagerado quanto aos
adjetivos; pois a mulher paranaguara sempre foi, via de regra, sim-
ples e muito circunspecta. Enfim, foi o modo de pensar do autor.
Entretanto, prestou ele um grande serviço a P A R A N A G U Á , co-
lhendo dados históricos de grande valia.
Escrevendo os seus "Apontamentos", na década de 1850 a 1860,
colaborou com o pai de nosso História — Antonio Vieira dos Santos
— cuja importante obra foi encerrada em 1847.

123
UMA TRAGÉDIA EM PLENO OCEANO

Embora P A R A N A G U Á não tenha sido paloo dessa tragédia,


entanto, abrigou, por alguns dias, as três vítimas que, felizes, goza-
ram das delícias de nossa terra de 100 anos atrás; sem jamais
supor que. deixando nossas plagas, horas depois, seriam sacrificadas
ignominiosamente...
Estávamos em o ano de 1862.
Vindo de Montevidéu, aqui chegou, aos 19 de agosto, o brigue
inglês " W I N T O R P " ; veleiro bem equipado para 260 toneladas, a
fim de carregar madeiras para o Rio da Prata. Vinha consignado
diretamente ao Sr. Manoel Antonio Guimarães.
Ancorou ele no porto do Alemão, na Cotinga, onde ficou alguns
dias. Sua tripulação compunha-se de 8 homens, comandados pelo
capitão inglês — Mister L Í P A R I ; mais o piloto — Mister EV.
JONES, e a esposa do comandante — Mitress E M A — inglesa muito
jovem e bela. Onze pessoas ao todo.
O comandante L Í P A R I , já um tanto maduro, gostando bas-
tante de beber, pouco ligava à esposa; deixando-a entregue aos
cuidados do jovem piloto Mister JONES.
Ancorado na Cotinga, a espera de poder entrar no rio Itiberê, o
veleiro inglês dava folga aos tripulantes.
O comandante passava as horas no seu camarote, com a botija
de "genebra" ao lado.
O piloto, como era de se esperar, acompanhava a jovem E M A
esposa do comandante, nos passeios pela mataria da Cotinga.
A marinhagem, nessas horas de folga, também se divertia, no
convés, contando anedotas e . . . criticando, com malícia, os tais
passeios pela mataria da C o t i n g a . . . e nisso ficava.
Dias depois, o mercante entrava nas águas do rio Itiberê, an-
corando para o carregamento.
Assim passaram mais alguns dias, pois o trabalho manual dos
operários era demorado.
À noite, enquanto o comandante curtia a "carraspana" no seu
camarote, os dois — E M A e JONES — aproveitavam o luar para
dar os seus passeios pelas silenciosas ruas de nossa P A R A N A G U Á ,
enlevados pelo amor que nascera entre ambos; não se importando
com a claridade mortiça dos lampiões, nem com alguns notívagos
124
que de vez em quando, surgiam para testemunhar esse amor clan-
destino de dois jovens i n g l e s e s . . .
Entre a tripulação havia um tal L E S S A N D R O P E T R A N E , aus-
tríaco, carpinteiro de bordo.
Toda a tripulação sabia desse escandaloso idílio. Mas, para
que se incomodar, se o próprio comandante nada via de mal nessa
intimidade do piloto com sua esposa ? ! . . .
Quem, porém não se conformava com o caso era o carpinteiro
P E T R A N E que louco de paixão e roído de ciúmes pela bela E M A ,
e ainda de ódio pelo piloto e comandante, havia jurado a si mesmo
e aos marujos, dar cabo deles na primeira oportunidade.
Aos 5 de setembro, o brigue foi despachado e, no dia seguinte,
6, zarpou bem cedo, caminho da Barra e rumo ao Rio da Prata,
com velas a todo o pano.
A noite chegou por fim. Já bem tarde; quando apenas 3 ho-
mens cuidavam do leme e do velame e os demais dormiam, LES-
S A N D R O P E T R A N E , às escondidas, penetrou no camarote do capi-
tão L Í P A R I , que dormia profundamente e, com a machadinha de
bordo, desfechou um golpe mortal sobre a cabeça do inditoso co-
mandante. . .
Depois, foi ao camarote do piloto e também, a facadas, matou
os dois amantes que juntos d o r m i a m . . . E, para completar a sua
monstruosidade, saciou os seus instintos sexuais no corpo já sem
vida da infeliz mulher. .. Três crimes consumados e um ato
hediondo...
L E S S A N D R O , ainda possesso, voltou ao camarote do coman-
dante e pegou duas pistolas, com as quais, ameaçou aos três ma-
rinheiros de serviço e mais dois que vinham chegando. Contudo,
foi pegado de surpresa pelos outros dois que conseguiram tirar-lhe
as armas e algemá-lo.
O veleiro, com a falta do comandante e do piloto, ficou a vagar
sem rumo certo em pleno oceano. Horas depois, nas alturas da
costa de Santa Catarina, esses marujos encontraram, por sorte,
uma barca nacional, por nome "Ligeira", que vinha do Sul para o
Rio de Janeiro. Contando eles ao comandante o monstruoso crime,
o capitão cedeu o seu contra-mestre — Sabino Gonçalves — que
levou o " W I N T O R P " até ao porto do Rio Grande.
Lá chegados, entregaram, esses arrasados tripulantes, o exe-
crável assassino ao cônsul inglês.
Recolhido à cadeia pública, foi, daí a dias, embarcado no vapor
"Brasil", com destino ao Rio de Janeiro. Durante a viagem deu
o que fazer. Certa noite, no porão do navio, conseguiu livrar-se
das algemas (não se soube como) e começou a gritar, dizendo que
o navio fazia água. Um marinheiro desceu ao porão para verificar
o acidente e foi agredido pelo assassino, que pretendia escapar, lan-
çando-se ao mar. Felizmente outros marujos acudiram à luta tra-
125
vada e conseguiram subjugá-lo, amarrando-o de tal forma que não
mais pudesse escapar.
Chegando ao Rio de Janeiro, foi imediatamente enviado para
a Inglaterra, juntamente com as 7 testemunhas para relatar o
hediondo crime premeditado em P A R A N A G U Á e posto em prática
em alto mar.
O criminoso tudo confessou. Condenado pelo Tribunal Marí-
timo de Londres, foi enforcado no dia 30 de dezembro de 1862, às
8 horas da manhã na praça em frente à prisão de Winchester.
Os jornais da época, comentando os três assssinatos e o mons-
truoso crime, qualificaram de "torpeza sem precedente, realizada
entre um homem sem alma e um corpo sem vida; um crime sem
nome'!...

E P A R A N A G U Á , cuja tragédia tanto abalou o espírito público


daqueles tempos, quase foi palco desse hediondo c r i m e . . .

126
OS CANHÕES DA BARRANCA

A velha cadeia de P A R A N A G U Á , sobrado colonial de esquina


hoje desaparecida, ficava no local onde hoje estão as ruínas do
"Palais Royal", bem em frente ao jardim "Leocádio Pereira", com
o busto do "Professor Cleto".
Esse jardim, de frente à lúgubre cadeia, era, há 80 anos pas-
sados, uma "barranca"; seguindo-se daí uma ladeira, que ia até ao
mercado, onde estão, ainda firmes, os tamarindeiros.
No término dessa ladeira é que ficava o cais de desembarque.
Na célebre "barranca" estiveram colocados dois "canhões",
como guardas da Cidade. E só duas vezes eles ali apareceram,
para soltar de suas bocas as "balas" de alegria e de t r i s t e z a . . .
Quando terminou a guerra do Paraguai, em 1870, foi no então
cais da rua da praia que desembarcaram os soldados paranaenses.
Na ocasião desse desembarque, os "dois canhões' soltaram suas
"balas" em regozijo à volta dos heróis aos seus lares.
A cidade inteira, reunida ali no cais, assistiu, embevecida, a
saudação desses "canhões", como testemunho vivo da Pátria agra-
decida !
Foi essa a primeira vez que "eles" soltaram de suas bocas o
fogo da paz ! . . . Cena de civismo tão sugestiva, calando fundo na
alma do povo de nossa terra.
Passados alguns dias, não mais se viu essas duas peças de arti-
lharia na célebre "barranca". Talvez tivessem ficado na velha
cadeia.
O País então entrou em calma e a paz reinou, por quase duas
décadas, para a felicidade dos brasileiros.
Com a libertação dos escravos, em 1888, e conseqüente procla-
mação da República, em 1889, os partidos políticos se agitaram
também em nossa P A R A N A G U Á . O Brasil, livre da escravidão, feia
nódoa que manchou a nossa terra, estava também liberto da deca-
dente monarquia.
M a s . . . fato notório; os "canhões da barranca" não apareceram
para saudar esses dois eventos, que tanto abalaram a Nação Brasi-
leira, mudando completamente a vida social, política e econômica
do País ?! Por que ? Todos nós sabemos.. . Não é preciso d i z e r . . .

127
As agitações continuaram, até 1894, quando a Esquadra Fede-
ralista. comandada pelo almirante — Custódio de Melo — entrou
em nossa baía e, na manhã de 16 de janeiro, desembarcou e tomou
completamente a C i d a d e . . .
a
Foi então quandos os "dois canhões" reapareceram, pela 2 .
vez, na "barranca", em defesa de P A R A N A G U Á e da R E P Ú B L I -
CA ! . . .
A. noite de 15 para 16 de janeiro ficou marcada na História de
nossa terra, pelo ribombar dos "dois canhões", que, a todo o custo,
procuravam deter os revoltosos...
Nessa segunda vez, porém, de suas bocas saíram o fogo da
g u e r r a . . . Tudo em v ã o . . . Ao amanhecer do dia 16, os "canhões"
emudeceram. .. A Cidade estava já em poder dos revolucionários
federalistas...
. . . Os "canhões" emudeceram para sempre. .. e, para sempre,
também, desapareceram de P A R A N A G U Á . . .
Os anos continuaram passando; as gerações se sucendendo, e
os históricos "canhões" ? . . . onde teriam ido parar ? . . .
Ninguém viu, ninguém s o u b e . . . mas "eles" s u m i r a m . . .
A "ladeira", com o tempo, também desaparaceu, dando lugar
ao "Mercado de frutas", que hoje é só do bom cafezinho das manhãs
e dos gostosos petiscos feitos por hábeis cozinheiras ( N o centro
desse Mercado é que estava o "Pelourinho").
Na "barranca", uma plataforma foi feita. Nela temos hoje
um singelo jardim, ostentando apenas algumas palmeiras reais;
porém, engalanado com o busto do emérito "Professor C L E T O " .
Como seria edificante se, de cada lado desse histórico jardim,
palco de luta final entre irmãos de u'a mesma Pátria, estivessem
os "dois canhões" desaparecidos, como um marco sagrado, lembran-
do sempre as duas únicas vezes em que, de suas bocas saíram o
fogo da "paz e o fogo da " g u e r r a " . . .
Governos passados não souberam guardar o "patrimônio his-
tórico" desta quatrocentona C i d a d e . . .
Sim, "quatrocentona", porque, em 1978 (portanto, dentro de
2 anos), a nossa Catedral completará 4 séculos de existência. E,
naqueles tempos, quando surgia uma povoação, surgia também
uma "igrejinha", como símbolo da crença de um povo.
A igrejinha de N. S. do Rosário de P A R A N A G U Á , ou melhor,
da Capitania de Nossa Senhora do Rosário de P A R A N A G U Á , foi
construída em 1578 !!!
E será que a geração atual irá esquecer o 4.° centenário desse
marco luminoso de fé ? ! . . . Fiquemos na expectativa ! . . .
M a s . . . onde teriam ido parar os "dois canhões" históricos da
desaparecida "barranca" ?. .. Talvez, um dia, ainda se s a i b a . . .

128
O CLUB LITTERARIO
(1872)

Brasão de desvanecimento para a nossa gente é o velho e


fidalgo "Club Litterario", expoente máximo da Sociedade Parana-
guara.
Nascido como por encanto, em 1872, pelo milagre de 12 após-
tolos da cultura moral e intelectual, ainda hoje conserva os traços
firmes de sua fidalguia incontestável.
Paradigma perfeito de uma velha tradição, foi o ideal, através
dos seus 104 anos de inestimável existência, dos 12 sonhadores.
Sonhar e construir; construir e colher os frutos do trabalho,
foi sempre o seu escopo.
Nos tempos que vão longe, em que a Província do P A R A N A
mantinha apenas a Instrução Primária, o Club Litterario criava o
seu "Curso de Preparatórios" (português, francês, inglês, geografia,
história, retórica e poética). Avalie o leitor o que era o velho Club
no passado...
As atividades literárias continuaram sempre, como um farol
de possante claridade, a iluminar as inteligências lúcidas dos filhos
da terra carijó.
Baluarte na orientação da boa "prata da casa", punha em des-
taque o apurado gosto artístico dos seus associados, num requinte
de arte e luxo, como símbolo de comprovada c u l t u r a . . . Assim pas-
saram os anos, cheios de festas deslumbrantes, deixando sempre
um rastro de grande esplendor.
Com o correr do tempo; sofrendo a influência das modernas
gerações, passou a cuidar com mais carinho de sua parte recreativa.
Diziam os seus diretores: "Os bailes fazem parte da civilização
e, portanto, da educação coletiva'. E com razão. Haja visto as
grandes festas e os grandes carnavais de outrora, em que os salões
do fidalgo Club se enchiam de luzes e enfeites, para comemorar as
festas de "Momo", com os 3 bailes carnavalescos...

129
Seus fundadores, de saudosa memória, foram:

01 — F R A N C I S C O JOSÉ M A C H A D O DA S I L V A
02 — B A R N A B É DE C A R V A L H A E S P I N H E I R O
03 — JOÃO ENGÊNIO GONÇALVES MARQUES
04 — C O N S T A N T E DE SOUZA P I N T O
05 — M A N O E L RODRIGUES V I A N N A
06 — JOAQUIM P I N T O DE A M O R I M
07 — A D E L I O P I N T O DE A M O R I M
08 — M A N O E L C O R R E I A DE F R E I T A S
09 — JOÃO ESTEVÃO DA S I L V A
10 — JOSÉ A L B I N O D A S DORES
11 — M A N O E L F A U S T O DO N A S C I M E N T O
12 — JOAQUIM P E R E I R A DA COSTA.

Sua primeira Diretoria, composta de 6 membros, ficou assim


constituida:

Presidente — BARNABÉ DE C A R V A L H A E S P I N H E I R O
Vice-Presidente — JOÃO EUGÊNIO G O N Ç A L V E S MARQUES
1.° Secretário — JOSÉ A L B I N O DAS DORES
2° Secretário — C O N S T A N T E DE SOUZA P I N T O
Tesoureiro — G A B R I E L S A T U R N I N O M A R T I N S
Orador — JOSÉ C L E T O DA S I L V A .

No "Livro do Mérito" constam os nomes de 3 distintas damas


que receberam títulos honoríficos:

D. M A R I A JÚLIA DA S I L V A N A S C I M E N T O — Sócia honorá-


ria; em 1889.
D. L U D O V I C A C A V I G L I A B Ó R I O — Sócia honorária; em 1901.
D. C E L I N A DA S I L V A C O R R E I A — Sócia benfeitora; em 1920.

Merecimentos esses, pelos relevantes serviços prestados à So-


ciedade Paranaguára e em particular ao tradicional Club Litterario,
Plêiade admirável de conferencistas e oradores de rara inteli-
gência e comprovada cultura perlustrou os humbrais desse solar
tão nosso, enriquecendo-o com seus dotes de sólida instrução.
U m dos seus presidentes — DR. A N Í B A L R I B E I R O F I L H O —
( 7 8 . ° ) , salientou-se com uma obra prima: " H I S T Ó R I A DO CLUB
L I T T E R A R I O " ; escrevendo os 100 anos de lutas, sacrifícios e glórias
dessa fidalga Sociedade.
É um livro de muito valor para a nossa P A R A N A G U Á , e que
bem retrata a inteligência e cultura sólida do seu autor.
A " H I S T Ó R I A DO CLUB L I T T E R A R I O " é um verdadeiro mo-
numento histórico da vida social, cultural e artística da tradicional
Sociedade, e, por sem dúvida, da vida de nossa gente e de nossos
ancestrais.
130
D. PEDRO II EM PARANAGUÁ
SUA HISTÓRICA VIAGEM

A vinda de D. P E D R O II ao Paraná, deve-se muito à "Com-


pagnie Chemins de Fer Brésilien". Apesar do Monarca desejar
conhecer a terra dos pinheirais, por simpatia ou por qualquer outro
motivo, não se pode negar que foi a construção da Estrada de Ferro
a "mola mestra para trazer sua Majestade ao Paraná e, por conse-
guinte, a P A R A N A G U Á .
Essa premeditada viagem tornou-se, por fim, em realidade.
Assim, um dia, o jornal de Curitiba, "19 de dezembro", deu esta
pequena nota:
Notícias da "Corte" dão como provável a viagem de S . M . o
Imperador a esta Província, por ocasião de se inaugurar os tra-
balhos de construção da Estrada de Ferro de P A R A N A G U Á a esta
Capital".
A "Gazeta de Notícias" do Rio, deu, logo depois, a notícia final:
" S S . M M . I I seguem amanhã (17) para a Província do Paraná, a
bordo do paquete "Rio Grande", sob o comando do Capitão de
Fragata — José Alvim'.
De fato, S S . M M . I I sairam da Corte no dia 17 dê maio de 1880,
às oito (8) horas da manhã, com a seguinte comitiva:
Conselheiro Dr. Manoel Buarque de Macedo — Ministro da
Agricultura.
Almirante Joaquim Marques Lisboa — Visconde de Tamandaré
(camarista d e S . M . ) .
Vice Almirante Artur Silveira da Mota — Barão de Jaceguai.
Dr. Antonio Teixeira da Rocha — Barão de Macéio (médico
da Casa I m p e r i a l ) .
Comendador Conselheiro Antonio José Alves de Araújo —
Deputado Provincial.
Desembargador Conselheiro José Caetano de Andrade Pinto —
(veador de S . M . ) .
D. Leopoldina Werna de Magalhães Barbosa — (dama de hon-
ra da Imperatriz).
Os representantes da Imprensa Carioca:
J. Tinôco — do "Jornal do Comércio".
José Carlos de Carvalho — da "Gazeta de Notícias".
Ernesto Matoso — do "Cruzeiro".
131
Vinha também nessa comitiva, o Dr. Joaquim Pizzaro — lente
da Escola de Medicina do Rio de Janeirdo (de Botânica) — convi-
dado especial do Imperador. Veio ainda o Sr. J. Gonçalves — Ge-
rente, designado pela Companhia de Navegação.
O navio Imperial "Rio Grande" veio comboiado pela corveta
"Guanabara" e fundeou no ancoradouro da Cotinga.
Ao passar em frente à "Fortaleza da Barra", foi saudado com
uma salva de 21 tiros.
Os dois pequenos navios já estavam esperando no ancoradouro.
Eram eles: O "Iguaçu", ricamente ornamentado, sob o comando do
Capitão de Mar e Guerra — Fonseca — levando o Presidente da
Província — Dr. Manoel Pinto de Souza Dantas Filho — o Sr. Ma-
noel Antonio Guimarães (Barão de N á c a r ) ; o Sr. Manoel Ricardo
Carneiro (Presidente da C â m a r a ) ; o Sr. Capitão dos Portos e de-
mais autoridades, bem como três distintas damas da Cidade. Ele
atracou a estibordo, a fim de fazer o transbordo de S S . M M . I I e
respectiva comitiva.
O "Marumbí" com 300 cidadãos paranaguaras de todas as
classes sociais, levava também uma banda de música que, ao se
aproximar do navio Imperial, rompeu com o Hino Nacional. Eram
6 horas.
Feito o transbordo, os dois vapores seguiram rumo ao cais, na
rua da Praia (Ladeira da Independência; hoje Presciliano Correia),
ricamente ornamentado.
SS. M M . II pisaram, enfim no solo paranaense, às 6 e meia da
tarde, e P A R A N A G U Á , grandemente honrada, os recebeu com
carinho.
Os habitantes da Cidade (para mais de 2.500 pessoas) acha-
vam-se aglomerados em toda a extensão do cais, ovacionando os
Imperadores.
Foi uma recepção condigna e muito sugestiva. Estavam pre-
sentes 21 garotas, de branco e com faixas a tiracolo, trazendo os
nomes dos 21 municípios que tinha o P A R A N Á naquela época.
Elas, no desembarque dos Monarcas, espargiram flores sobre os
augustos soberanos. Cena muito bonita.
A Câmara Municipal, incorporada, deu-lhes as boas vindas,
entregando, nessa ocasião, as "chaves da Cidade".
Terminadas as saudações e os cumprimentos, os Imperadores
seguiram, com sua comitiva, autoridades e povo, pela rua da Praia,
subindo a rua Ipiranga (hoje Mal. Alberto de Abreu) até a esquina
da Capela do Bom Jesus; entrando na rua Direita, até a Matriz,
onde foi celebrado um " T e Deum" em ação de graças pela boa via-
gem que fizeram.
Grande foi o entusiasmo durante o trajeto, pois, além da honra,
era um caso inédito essa visita imperial. Viam-se flores no leito
das ruas. Nas janelas das melhores residências, ricas colchas e
132
tapetes, enfeitando-as. Luminárias também nos principais edifí-
cios (era a moda da época).
Terminada a função religiosa, seguiu o cortejo até ao palácio
do Barão de Nacar, luxuosamente preparado para hospedar os
Monarcas e sua comitiva.
Nessa noite foi servido um banquete a S S . M M . I I , sua comitiva,
algumas autoridades e aos parentes do Barão de Nacar.
Nesse grande jantar, o jornalista Ernesto Matoso, redator do
"Cruzeiro", em seus apontamentos, relata o seguinte episódio:
"Após o jantar em casa do Barão de Nacar; jantar esse em que
éramos cento e poucas pessoas à mesa; por ocasião da "cham-
panha", o Barão brindando os seus augustos hospedes, fez notar
ao Imperador que, das cento e tantas pessoas presentes ao ban-
quete, exceção feita de SS. M M . II e sua comitiva, bem como algu-
mas autoridades, as demais eram seus filhos, noras, genros e netos".
Nesse mesmo jantar, D. P E D R O I I , em palestra com o Presi-
dente da Câmara — Manoel Ricardo Carneiro — genro do Barão
de Nacar, falou sobre o incidente do "Cormorant' e perguntou-lhe:
—• O senhor foi um do grupo dos "26 paranaguaras" que se
arrojaram a combater o cruzador "Cormorant" ?
— Tenho essa honra, respondeu calmamente o velho Ricardo
Carneiro, e V. Majestade há de convir em que não me poderia furtar
de tomar parte nela, como um brasileiro que me prezo de ser.
— Pois saiba, replicou o Imperador, que esse incidente me
causou muitas dores de cabeça, muitas preocupações e desassos-
segos.
— Faço idéia ! . . . retrucou o patriota paranaguara sorrindo.
Mas V. Majestade por certo faria o mesmo se aqui estivesse.
D. P E D R O não contestou essa afirmativa. Pelo contrário,
apreciou bastante a firmeza de caráter de Manoel Ricardo Carneiro.
E tanto é verdade que, meses depois, esse cidadão, Presidente da
Câmara, recebia o título de "Comendador da R o s a " !
São episódios que jamais se esquecem...

No dia seguinte ( 1 9 ) , às 7 horas da manhã os Monarcas, com


sua comitiva, visitaram a Matriz do Rosário, onde fizeram suas
orações; depois foram ao Paço da Câmara; à Alfândega (no Colé-
gio dos Jesuítas); à Fonte Velha; à velha Cadeia; ao Largo do
Mercado; ao Telégrafo; ao local da futura Estação da Estrada de
Ferro e à Companhia de Aprendizes Marinheiros.
Depois do almoço, visitou as Escolas e a Santa Casa de Mise-
ricórdia localizada ao lado da Capela do Bom Jesus dos Perdões,
percorrendo as enfermarias e conversando com os enfermos. Ao se
retirar, deixou, para esse Hospital de Caridade, a quantia de Rs
500$000 (quinhentos mil réis). A seguir, fez uma visita especial
ao "Club Litterario" acompanhado de sua comitiva e das autori-
133
dades da Província do Paraná. Recebido pela Diretoria, à entrada
da sede social, o augusto visitante foi levado até ao salão nobre,
onde um grupo de associados o esperava. Nessa ocasião foi sau-
dado pelo consócio João Eugênio Gonçalves Marques, que, ao ter-
minar a sua oração, pediu ao Imperador que se dignasse aceitar o
Título de "Sócio Honorário" do fidalgo Club. D. P E D R O apreciou
muito a valiosa Biblioteca da Sociedade e palestrou com todos os
sócios presentes. Ao se retirar, deixou no "Livro de Visitas", as
suas impressões sobre a tradicional Sociedade.
Às 6 horas da tarde, foi assistir ao solene Te Deum, mandado
celebrar pela Câmara Municipal.
Às 8 horas, no palácio do Nacar, deu recepção ao Corpo Con-
sular da Província, apesar do grande temporal que desabou sobre a
Cidade.
Às 9 horas da noite, o Monarca foi assistir ao grande "baile
de gala" que a Câmara Municipal também lhe oferecera. A Impe-
ratriz não compareceu por achar-se indisposta. A sua comitiva
compareceu, bem como o Presidente da Província e seus convidados.
Houve trocas de discursos, mas todos lacônicos. O belo sexo se fez
representar em número bastante elevado, entre senhoras e senho-
rinhas da alta sociedade.
Segundo os cronistas, deu para se observar bem o elevado grau
de cultura, educação social e polidez da sociedade paranaguára
dessa época. Não foi surpresa, porque, P A R A N A G U Á , pelo seu povo,
sempre soube obsequiar os ilustres forasteiros que a visitam. Isso
já esta na índole do povo.
É que esta terra tem 400 anos de vida e, 300 anos de vida social
e política. E isto é muito importante na vida de uma g r e i . . .
O Imperador distribuiu esmolas na Cidade; aos pobres e para
algumas instituições.
Muito agradou ao Monarca o seguinte edital do Legislativo:
"A Câmara Municipal desta Cidade de Paranaguá, faz saber
aos habitantes do seu Município que, em comemoração da visita
de S S . M M . I I a esta Cidade, se denominem: "Rua da I M P E R A -
T R I Z " — à antiga rua Direita e, "Rua do I M P E R A D O R " — à atual
rua Paissandú; ficando a rua Rosa denominada — Rua Paissandú.
Do que, para constar, mandei lavrar o presente, que será afi-
xado e publicado pela imprensa.
Paço da Câmara Municipal de Paranaguá, em sessão extra-
ordinária".
aa) Manoel Ricardo Carneiro
Presidente

No dia seguinte ( 2 0 ) , às 6 horas da manhã, partiram os augus-


tos imperantes, com a comitiva, para a cidade de Antonina, trans-
portando-se do vapor "Iguaçu" para o paquete "Rio Grande";
134
sendo acompanhados àquela cidade pelas autoridades paranagua-
ras e suas distintas senhoras.
M a s . . . e a inauguração da Estrada de Ferro ? . . .
E o grande almoço de 200 talheres oferecido pela Companhia
a SS.MM. ?...
Iremos saber nos comentários que vêm em seguida (de Ernesto
Matoso):

"O Sr. de Lahante, representante da então "Compagnie Impe-


r i a l des Chemins de Fer du Brésil", quando na Corte, em princí-
pios de maio, havia procurado o Ministro Buarque de Macedo e o
Imperador, para saber o itinerário de S S . M M . e conhecer exata-
mente o dia designado para a inauguração dos trabalhos da fer-
rovia.
D. P E D R O II havia-lhe dito de entender-se com o Ministro das
"Obras Públicas", que lho fixaria.
O Conselheiro Buarque, por sua vez, sem consultar o Monarca
sobre o itinerário, deixou essa organização aos cuidados do Presi-
dente da Província, como era muito natural.
Em P A R A N A G U Á , no dia 18, pouco antes do jantar, foi apre-
sentado a S.M. o programa preparado pelo Presidente da Província.
D. P E D R O I I , que não havia sido consultado previamente, en-
tendeu patentear quanto mal andou o Presidente da Província
assim procedendo e, sem tirte nem guarte, alterou todo o pragra-
ma da excursão, começando por fazer a inauguração dos trabalhos
da Estrada de Ferro na sua volta e não no dia seguinte, como estava
marcada, e bem assim em vez de sair muito cedo, no dia 20, dire-
tamente para Curitiba, iria antes visitar a cidade de Antonina e
dormiria em caminho para chegar no dia imediato à Capital da
Província.
D. P E D R O sempre solícito em mostrar que não cedia a mais
insignificante parcela de suas prerrogativas, ou talvez com o in-
justificado receio de que aceitando um itinerário organizado sem
o seu prévio consentimento, fizessem dúvidas no espírito público
sobre a sua soberania, ou por outro qualquer motivo só dele conhe-
cido, alterou profundamente tudo quanto haviam feito o Dr. Ma-
noel Dantas Filho e a comissão de festejos, a despeito de todas as
razões e dos extraordinários embaraços em que os colocava, como
por exemplo, determinar que se dormisse na Serra da Graciosa, no
ponto denominado Rio do Meio, onde só existia um rancho de tropas
e uma casa de negócio, uma venda pertencente a uma velha, viúva,
e uma outra casa menos confortável".

135
O Sr. Lahante, que já havia marcado o "almoço" para o dia
19; sabendo da alteração do Programa, ficou desnorteado.
É que havia sido encomendado à "Casa Leão", do Rio de Ja-
neiro, para essa data, o tal banquete de 200 talheres a ser ofere-
cido pela Companhia Francesa a S S . M M . I I .
Que fazer então ? Pediu uma audiência ao Imperador e solici-
tou humildemente para que o almoço e a inauguração fossem efe-
tuados no dia 19; que ele se dignasse aceitar.
D. P E D R O foi decisivo; não voltou atrás à sua alteração. Faria
a inauguração no seu retorno do interior da Província, e seria no
dia 5 de junho. Ele falou, estava falado ! . . .
Excusado é dizer que o desapontamento foi g e r a l . . . mas, nin-
guém deu um p i o . . .
A inauguração ficou então definitivamente marcada para a
sua volta, no dia 5.
Quanto ao "almoço", ajustado por 30.000$000 (trinta contos
de r é i s ) , foi saboreado por todos os trabalhadores da E s t r a d a ! . . .
Que desilusão...
Está, pois, certo o provérbio: "O bocado não é para quem se
faz, e sim para quem o come ! ! ! . . .

E os 3 representantes da Imprensa carioca ? Esses foram


cruéis com a nossa gente. Entre outras críticas, duas delas demons-
traram bem a educação desses cronistas.

Dizia a "Revista Ilustrada":

" . . . Mas, foi sobretudo ao saltarmos em terra, que nos rega-


lamos de festas e de orações. Os "indígenas", que já estavam à
nossa espera, vieram logo receber-nos cheios do mais justificado
júbilo, e de "bandas" pouco justificáveis por sua desafinação. As
paranaenses, alegres e viçosas, agitavam seus lenços; os parana-
enses, todos em grande gala, davam sinceros e correspondidos vivas.
Não cabiam em si de contentes... nem nas suas casacas, de tão
apertadas. Eles ficaram inchados com a minha visita e a de
S S . M M . Beijaram a mão à Sra. Imperatriz, com grandes reverên-
cias e muitas mesuras. Achei bonito i s s o . . . O Imperador não deu
a mão a beijar. Nem eu. Não achas que fiz bem, imitando o meu
soberano?
— Certamente ! A modéstia é uma virtude".

136
Outra, bem ferina, também da "Revista Ilustrada":

"Ofereceram-nos ontem um baile, que S S . M M . aceitaram com


especial agrado e eu também. Esteve esplêndido... Infelizmente a
Imperatriz não pôde comparecer por ligeiros incômodos. Ainda
assim, a concorrência foi extraordinária dentro e fora do edifício
— fora então ! . . .
O Imperador dançou especialmente com as senhoras casadas.
Neste ponto eu divergi dele, dando preferência às solteiras, aliás
bem interessantes — que boquinhas têm elas ! Parece que é o
hábito de chupar o Mate na b o m b a . . . Vê se te habituas, Margot, a
também tomar na c u i a " . . .

Essas críticas sarcásticas demonstraram bem o caráter da-


queles cronistas da época, quanto à retribuição do trato que tiveram
aqui pelos "indígenas" paranaguaras...

Depois de dois dias passados em P A R A N A G U Á , seguiram os


Monarcas à cidade de Antonina, permanecendo algumas horas na
casa do comendador Antonio Alves de Araújo — até ser preparado
o "camboio" que deveria conduzir os Imperadores à Capital da
Província. Chegaram às 8,30 da manhã em Antonina e partiram às
11 horas.
Uma longa e penosa viagem foi a subida da Serra. O pouso
foi no lugar demoninado "Rio do Meio". A comitiva sofreu bastante
durante essa horrível noite. E, para culminar, a chuva não cessava
de cair.
Às 6 horas da manhã do dia 21, pôs-se a caminho a caravana
imperial; chegando a Curitiba às 3 horas da tarde, hospedando-se
no palacete do capitalista português Antonio Martins Franco.
Passados 3 dias de festa em Curitiba, partiram para a Vila de
Campo Largo, hospedando-se na casa do Capitão Olinto Mendes
(isso no dia 24).
No dia seguinte (25) seguiram viagem; pois tinham de per-
correr as 70 léguas dos Campos Gerais em 6 dias.
A 25 de maio, apesar do frio que fazia, continuaram a viagem,
rumo à Palmeira, chegando às 5 horas da tarde. Hospedaram-se
então no solar da Baronesa do Tibagi, viúva do Barão do Tibagi
No dia 26, seguiram a Ponta Grossa, chegando à tarde. SS.MM.
e o Visconde de Tamandaré ficaram como hospedes do Major Do-
mingos Ferreira Pinto (depois Barão de Guaraúna). A comitiva,
na casa do Sr. Teixeira Alves.
No dia 28, pela manhã, partiram para Castro, chegando às 2
horas da tarde. A hospedagem foi na residência do Juiz de Direito
— Dr. Manoel da Cunha Lopes de Vasconcelos. Regressaram à
Ponta Grossa (isso no dia 29).
137
No dia 30, desceram à Palmeira, pela manhã, hospedando-se
ainda no solar da Baronesa do Tibagi.
Aceitando o convite para visitar a cidade da Lapa, S S . M M . e
a comitiva partiram no dia 31, pela manhã, àquela localidade.
Foi a mais tormentosa viagem. A estrada era péssima. Felizmente
os Monarcas e uma parte da comitiva alcançaram a Lapa ao escu-
recer. Porém 3 carruagens perderam-se das demais e ficaram 4
horas nos campos gerais, em plena escuridão e ainda com chuva,
para completar o medo e sofrimento. Só alta noite é que conse-
guiram chegar à cidade. S S . M M . e os demais hospedes não ha-
viam jantado, esperando os que se haviam perdido. Ficaram todos
hospedados na residência do Coronel Davi dos Santos Pacheco
(depois Barão dos Campos Gerais). O dia 1.° de junho foi todo de
visitas e audiência. À noite, regressaram à Curitiba, chegando alta
madrugada. As autoridades estavam esperando.
O dia 2 foi de grandes festas na Capital.
No dia 3, pela manhã, os Monarcas e a comitiva deixaram
Curitiba, rumo à cidade de Morretes.
O povo de Porto de Cima esperava que a Caravana Imperial,
ao passar pelo lugarejo, parasse uma meia hora, a fim de receber
as homenagens dos seus habitantes. Mas isso não aconteceu, por-
que o Imperador ignorava tal recepção. Assim sendo, a caravana
passou direta, chegando em Morretes às 6 horas da tarde.
Já instalado na residência do Juiz Municipal do Termo — Joa-
quim José Alves — veio a saber da decepção que causara àquela
gente boa. Então, pela manhã do dia seguinte, foi fazer uma visita
especial àquela Vila. Ficou assim sanado o incidente. O resto do
dia — visitas e audiências.
No dia 4 de junho, às 2 horas da tarde, os Imperadores e a comi-
tiva rumaram para Antonina, hospedando-se, mais uma vez, na
residência do comendador Antonio Alves de Araújo. Ainda nessa
tarde, em Antonina, fez várias visitas e recebeu as manifestações de
apreço daquele extraordinário povo.
No dia seguinte ( 5 ) , bem cedo, foi assistir a sondagem no porto.
D. P E D R O mandau sondar, tanto o canal como os baixíos e pedras
que ali existem espalhadas. Achavam-se presentes, nessa ocasião,
o Imperador; o Almirante Tamandaré; o Presidente da Província;
alguns oficiais de Marinha; o capataz da Capitania e dois práticos.
Levaram 3 horas nessa sondagem. Às 9 horas regressaram à terra.
Às 10 horas, almoçaram todos na residência do comendador Alves.
Ao meio dia em ponto, S S . M M . e comitiva embarcaram no vapor
"Iguaçu", que os transportou a bordo do paquete "Rio Grande".
As pessoas de destaque de Antonina, bem como algumas senho-
ras, acompanharam os Imperadores até P A R A N A G U Á .
Ao se aproximar de nossa Cidade, o vapor "Marumbi" foi-lhes
ao encontro, ao som do Hino Nacional. Feito o transbordo, ruma-
ram os dois vapores para o nosso cais, que regorgitava de gente.
138
S S . M M . I I e comitiva desembarcaram e, seguidas de autori-
dades e povo, seguiram pela rua hoje Presciliano Correia até ao
local da inauguração.
Num Pavilhão, todo ornamentado, estava a "pedra fundamen-
tal", que iria receber a bênção. Realizada a cerimônia, pelo sacer-
dote presente, foi a mesma levada por D. P E D R O I I , o Ministro da
Agricultura, o Presidente da Província e o Presidente da Câmara
Municipal, ao local já designado (onde se acha, ainda hoje, a
Estação de c a r g a ) .
Foi uma solenidade muito significativa e de muito valor para
a época — ligar a Capital ao Litoral. Estava assim lançada a
"pedra fundamental", que marcava a inauguração da primeira
Estação Urbana da Estrada de Ferro " P A R A N A G U Á - C U R I T I B A " !
Terminado esse rápido "ato", o povo rompeu em estrepitosos
v i v a s ! O "foguetório" espocou no ar, e a "banda" rompeu numa
expressiva m a r c h a . . .
O que chamou a atenção de todos os presentes foi o tempo
"record" da inauguração: apenas 15 m i n u t o s ! . . . Quando, em
outras festas idênticas, levavam quase 2 horas para tal realização.
São coisas raras, que só o Imperador poderia f a z e r . . .
Tudo terminado, os Monarcas, comitiva e convidados dirigiram-
-se para o palacete do Barão de Nacar ao grande jantar. Esse
banquete, segundo os cronistas visitantes, foi suntuoso.
A nota mais elegante e simpática, foi o "convite" que os Im-
peradores fizeram às pessoas gradas que os acompanharam desde
Curitiba, Morretes e Antonina até P A R A N A G U Á , para sentarem-se
à mesa de S S . M M . Igual convite foi feito às pessoas importantes
e mais destacadas de nossa terra.
Nesse grandioso "banquete", muitas "gafes" foram cometidas,
parecendo até "piadas". Mas convenhamos: o meio social e fino
de P A R A N A G U Á , naquela época, era restrito; pequeno mesmo. De
modo que, para que se pudesse contar com mais gente para os
festejos, foram convidadas pessoas que, embora da classe média,
tinham já certo traquejo social e eram merecedoras de todo o res-
peito pelas qualidades morais que possuíam. Daí, certos "ditos"
irrefletidos, que se tornaram gozados e marcados para "todo e
sempre" ! . . .
Poderíamos citar algumas, que muito fizeram rir aos presentes,
porém, não desejamos ferir suscetibilidades... É melhor assim.
Cinco horas da tarde. Terminado o lauto jantar, embarque
dos augustos soberanos e comitiva, entre delirantes manifestações
do povo.
Ao "bota fora", a bordo do paquete "Rio Grande", compare-
ceram todas as autoridades locais e de fora.
Nessa tarde partia o navio imperial, levando a seu bordo os
augustos Monarcas e sua comitiva, rumo à Capital do Império. . .

139
No dia 30, desceram à Palmeira, pela manhã, hospedando-se
ainda no solar da Baronesa do Tibagi.
Aceitando o convite para visitar a cidade da Lapa, S S . M M . e
a comitiva partiram no dia 31, pela manhã, àquela localidade.
Foi a mais tormentosa viagem. A estrada era péssima. Felizmente
os Monarcas e uma parte da comitiva alcançaram a Lapa ao escu-
recer. Porém 3 carruagens perderam-se das demais e ficaram 4
horas nos campos gerais, em plena escuridão e ainda com chuva,
para completar o medo e sofrimento. Só alta noite é que conse-
guiram chegar à cidade. S S . M M . e os demais hospedes não ha-
viam jantado, esperando os que se haviam perdido. Ficaram todos
hospedados na residência do Coronel Davi dos Santos Pacheco
(depois Barão dos Campos Gerais). O dia 1.° de junho foi todo de
visitas e audiência. À noite, regressaram à Curitiba, chegando alta
madrugada. As autoridades estavam esperando.
O dia 2 foi de grandes festas na Capital.
No dia 3, pela manhã, os Monarcas e a comitiva deixaram
Curitiba, rumo à cidade de Morretes.
O povo de Porto de Cima esperava que a Caravana Imperial,
ao passar pelo lugarejo, parasse uma meia hora, a fim de receber
as homenagens dos seus habitantes. Mas isso não aconteceu, por-
que o Imperador ignorava tal recepção. Assim sendo, a caravana
passou direta, chegando em Morretes às 6 horas da tarde.
Já instalado na residência do Juiz Municipal do Termo — Joa-
quim José Alves — veio a saber da decepção que causara àquela
gente boa. Então, pela manhã do dia seguinte, foi fazer uma visita
especial àquela Vila. Ficou assim sanado o incidente. O resto do
dia — visitas e audiências.
No dia 4 de junho, às 2 horas da tarde, os Imperadores e a comi-
tiva rumaram para Antonina, hospedando-se, mais uma vez, na
residência do comendador Antonio Alves de Araújo. Ainda nessa
tarde, em Antonina, fez várias visitas e recebeu as manifestações de
apreço daquele extraordinário povo.
No dia seguinte ( 5 ) , bem cedo, foi assistir a sondagem no porto.
D. P E D R O mandau sondar, tanto o canal como os baixíos e pedras
que ali existem espalhadas. Achavam-se presentes, nessa ocasião,
o Imperador; o Almirante Tamandaré; o Presidente da Província;
alguns oficiais de Marinha; o capataz da Capitania e dois práticos.
Levaram 3 horas nessa sondagem. Às 9 horas regressaram à terra.
Às 10 horas, almoçaram todos na residência do comendador Alves.
Ao meio dia em ponto, S S . M M . e comitiva embarcaram no vapor
"Iguaçu", que os transportou a bordo do paquete "Rio Grande".
As pessoas de destaque de Antonina, bem como algumas senho-
ras, acompanharam os Imperadores até P A R A N A G U Á .
Ao se aproximar de nossa Cidade, o vapor "Marumbi" foi-lhes
ao encontro, ao som do Hino Nacional. Feito o transbordo, ruma-
ram os dois vapores para o nosso cais, que regorgitava de gente.
138
S S . M M . I I e comitiva desembarcaram e, seguidas de autori-
dades e povo, seguiram pela rua hoje Presciliano Correia até ao
local da inauguração.
Num Pavilhão, todo ornamentado, estava a "pedra fundamen-
tal", que iria receber a bênção. Realizada a cerimônia, pelo sacer-
dote presente, foi a mesma levada por D. P E D R O I I , o Ministro da
Agricultura, o Presidente da Província e o Presidente da Câmara
Municipal, ao local já designado (onde se acha, ainda hoje, a
Estação de c a r g a ) .
Foi uma solenidade muito significativa e de muito valor para
a época — ligar a Capital ao Litoral. Estava assim lançada a
"pedra fundamental", que marcava a inauguração da primeira
Estação Urbana da Estrada de Ferro " P A R A N A G U Á - C U R I T T B A " !
Terminado esse rápido "ato", o povo rompeu em estrepitosos
v i v a s ! O "foguetório" espocou no ar, e a "banda" rompeu numa
expressiva m a r c h a . . .
O que chamou a atenção de todos os presentes foi o tempo
"record" da inauguração: apenas 15 m i n u t o s ! . . . Quando, em
outras festas idênticas, levavam quase 2 horas para tal realização.
São coisas raras, que só o Imperador poderia f a z e r . . .
Tudo terminado, os Monarcas, comitiva e convidados dirigiram-
-se para o palacete do Barão de Nacar ao grande jantar. Esse
banquete, segundo os cronistas visitantes, foi suntuoso.
A nota mais elegante e simpática, foi o "convite" que os Im-
peradores fizeram às pessoas gradas que os acompanharam desde
Curitiba, Morretes e Antonina até P A R A N A G U Á , para sentarem-se
à mesa de S S . M M . Igual convite foi feito às pessoas importantes
e mais destacadas de nossa terra.
Nesse grandioso "banquete", muitas "gafes" foram cometidas,
parecendo até "piadas". Mas convenhamos: o meio social e fino
de P A R A N A G U Á , naquela época, era restrito; pequeno mesmo. De
modo que, para que se pudesse contar com mais gente para os
festejos, foram convidadas pessoas que, embora da classe média,
tinham já certo traquejo social e eram merecedoras de todo o res-
peito pelas qualidades morais que possuíam. Daí, certos "ditos"
irrefletidos, que se tornaram gozados e marcados para "todo e
sempre" ! . . .
Poderíamos citar algumas, que muito fizeram rir aos presentes,
porém, não desejamos ferir suscetibilidades... É melhor assim.
Cinco horas da tarde. Terminado o lauto jantar, embarque
dos augustos soberanos e comitiva, entre delirantes manifestações
do povo.
Ao "bota fora", a bordo do paquete "Rio Grande", compare-
ceram todas as autoridades locais e de fora.
Nessa tarde partia o navio imperial, levando a seu bordo os
augustos Monarcas e sua comitiva, rumo à Capital do Império. . .

139
E ainda nessa noite de 5 de junho, após a partiaa de S S . M M . I I
para a Corte, a fina flor da Sociedade de P A R A N A G U Á promoveu
um grandioso "baile" para festejar a inaguração da futura Estação
da Estrada de Ferro, que iria ligar P A R A N A G U Á a C U R I T I B A .
Estiveram presentes a essa esplêndida festa, o Presidente da
Província e demais pessoas de destaque da Capital que vieram ao
bota fora dos Monarcas; o Barão de Nacar e o que havia de mais
distinto na Cidade.
Era uma (1) hora da madrugada, quando foi servida uma
lauta "ceia". Nessa ocasião levantaram-se muitos brindes aos au-
gustos Soberanos, e não podia ser de outra forma. Bela noitada,
que prolongou-se até às 3 horas da madrugada, animada do prin-
cípio ao fim.
Esse "baile" foi realizado na residência do Dr. Leocádio José
Correia. Ele e sua Exma. Sra. estiveram acima de todos os elogios.
Assim terminou a História da visita dos Imperadores do Brasil
ao nosso Paraná, e, mais que tudo, à nossa P A R A N A G U Á . . .
Era uma vez uma civilizada Cidade litorânea; um povo edu-
cado e hospitaleiro; uma visita Imperial e um "buquê" de sauda-
des . . . que deixaram, através de 96 anos, um suave perfume de
tudo o que se viu e ouviu dos nossos ancestrais.

140
A ESTRADA DE FERRO "PARANAGUÁ — CURITIBA"

Elevada à categoria de V I L A , por carta regia de 29 de julho


de 1648, P A R A N A G U Á sentia a necessidade de uma rápida comu-
nicação com "serra acima".
Õ acesso ao primeiro planalto só era conhecido dos nossos ca-
rijós e isso mesmo por ínvios caminhos.
Mas o homem civilizado do litoral não descansou enquanto não
conseguiu vencer essa maravilhosa "Serra do mar".
Começaram então as "bandeiras" paranaguaras, que, saindo
do Rossio da V I L A , em canoas., até Barreiros, entravam no rio
Nhundiaquara (rio a c i m a ) , até alcançar Porto de Cima. Daí, pela
picada do Itupava, ladeando o rio S. JOÃO, conseguiam transpor o
Cadeado. Em seguida, montanha a dentro, iam sair em S. José dos
Pinhais, e por fim, C U R I T I B A .
Era esse o penoso caminho até o Planalto, e por muitos anos
assim o foi. Razão do "porquê" a necessidade de um novo e rá-
pido acesso aos campos curitibanos. E assim passaram-se quase
3 séculos...
Aberta a Estrada da Graciosa, por Antonina; veio a se observar,
com o tempo, que tal via de comunicação não satisfazia completa-
mente ao progresso que, embora lento, já se vinha fazendo sentir.
O recurso seria mesmo a "viação férrea"; a exemplo da Estrada de
Ferro "Rio-Petrópolis".
E quanto mais os anos passavam, tanto mais necessária se tor-
nava essa ligação entre o litoral e o planalto. A visão dos mais
capacitados não se enganava e previa o grande futuro do então
mais novo Estado da União: O P A R A N Á . Seria a "viação férrea"
a única s o l u ç ã o . . . E ela veio ! Veio de fato; trazendo os benefí-
cios do escoamento mais rápido da produção do Estado; naqueles
tempos de 1880 — 1885.
O próprio Antonio Rebouças, que se notabilizara na constru-
ção da Estrada da Graciosa, compreendeu que o melhor seria a
construção de uma Estrada de Ferro entre Antonina e Curitiba;
tratando então de obter uma "concessão" para tal fim.
Nesse mesmo tempo, em P A R A N A G U Á , 3 homens de fibra tra-
balhavam com a mesma finalidade — Engenheiros: Pedro Aloys
Scherer, José Gonçalves Pêssego Júnior e José Maria da Silva
Lemos — conseguindo também uma concessão; primeiro com ga-
141
ran tia de juros da Província, para um segmento, e depois com
garantia de juros da Nação, para a Estrada de Ferro de P A R A N A -
GUÁ a CURITIBA.
Naqueles tempos havia, no litoral, duas correntes políticas
muito fortes: a dos CORREIAS, em P A R A N A G U Á , e as dos A R A U -
JOS, em Antonina e Morretes.
O problema esteve em debate algum tempo. Por fim, venceu
o concessão Scherer-Pêssego Júnior. Isso porque, a corrente mais
forte, na Corte, era a dos C O R R E I A S .
Foi constituída a " C H E M I N S DE F E R B R É S I L I E N S " , para
explorar a concessão da Estrada, dividida em 3 secções distintas:
a
A l . — com 42 Km — de P A R A N A G U Á a Morretes.
a
A 2 . •— com 38 Km — de Morretes a Roça Nova.
a
A 3 . — com 30 Km — de Roça Nova a Curitiba.
a
A l . secção — Alagadiça , insalubre e cheia de manga^s.
a
A 2 . secção — Transposição da Cordilheira.
a
A 3. secção — Região do Planalto.
a
Na 2 . secção, a mais difícil e de um arrojo a toda prova, deve-
-se à competência do engenheiro brasileiro — Dr. JOÃO T E I X E I R A
SOARES — que, assumindo a direção no Km 45, conseguiu levar
até ao fim, com uma precisão de pasmar, essa maravilhosa obra,
que é, por sem dúvida, a glória, da Engenharia Brasileira !
Em 1886, o horário dos trens era: de 5 horas para a subida, e
de 4 horas e 30 minutos para a descida. Hoje esse horário é feito
em muito menos tempo.
Quanto à parte financeira, os resultados foram sempre ótimos.
Sua administração, perfeita e com muito rigor, era feita por funcio-
nários da "Chemin de Fer" todos franceses.
Custou, essa fabulosa construção, pouco mais de Rs 11.000$000
(onze contos de réis, o u r o ) .
Inaugurada essa "jóia de aço", trataram de construir o ramal
Morretes — Antonina; com 16 Km de extensão.

Os primeiros concessionários da Estrada de Ferro P A R A N A -


G U Á - C U R I T I B A foram: PÊSSEGO JÚNIOR e S I L V A L E M O S ; que
têm o mérito de serem os primeiros também a dar essa valiosa
colaboração. Contudo, outros ainda cooperaram e muito para o
bom êxito de tão grandiosa obra.
Um deles — Comendador B E R N A R D O P I N T O DE O L I V E I R A
— português riquíssimo e de fina educação, culto e viajado, que
veio residir em P A R A N A G U Á , como sócio da firma "Miro & Olivei-
ra", teve a sua parcela de ajuda. Chamavam-no de "comendador
Manchester", por viver elogiando sempre a Inglaterra. Sendo ele
142
íntimo amigo do "Conselheiro Sinimbú" (João Luiz Vieira Can-
sação de Sinimbú), muito cooperou nessa importante realização,
procurando convencer o Conselheiro do Império a dar seu "parecer"
favorável à grandiosa obra da Estrada de Ferro, e que a mesma
tivesse início em P A R A N A G U Á .
Tendo, depois, transferido sua residência para o Rio de Ja-
neiro, o Comendador continuou trabalhando pela aspiração dos
paranaguaras...

A t é 1880, o atual Porto D. P E D R O II era cheio de mangais e


mata virgem; chamando-se "Porto do Gato", porque no local onde
se acha a pequena Estação, morava um pescador por nome — José
da Silva Gato — (parente do bandeirante Borba G a t o ) , em sua
modesta casa, com seu pequeno p o r t o . . .

Chegara o grande dia do lançamento da "pedra fundamental"


(5 de junho de 1880), tão esperada por toda a população de P A -
RANAGUÁ.
D. P E D R O I I , que estava de regresso de sua viagem ao interior
do P A R A N Á , desembarcara, pouco antes, achando-se presente no
local às 3 horas em ponto; dando, imediatamente, início à cerimô-
nia, que foi rápida; 15 minutos ! . . .
Estava assim lançada a "pedra fundamental" da futura Esta-
ção que iria ligar P A R A N A G U Á à C U R I T I B A .
O sonho dos paranaguaras estava realizado!

143
A "REPÚBLICA" E O "CLUBE REPUBLICANO"

A semente primeira da " D E M O C R A C I A " , no P A R A N A , chan-


tou-se em nossa P A R A N A G U Á ; no fértil campo do jornal hebdo-
madário " O P E R Á R I O DA L I B E R D A D E " , fundado em 1870.
Apesar de ser, esse semanário, um propagandista da abolição
do cativeiro, suas colunas traziam artigos violentos contra o regime
da Monarquia decadente.
Paranaguaras ilustres, eivados de são patriotismo pelo ideal
democrático, foram verdadeiros baluartes desse ansiado regime no
PARANÁ.
Essa propaganda republicana continuou mais ferrenha com a
fundação de outro jornal em P A R A N A G U Á — "O L I V R E P A R A N Á "
— em 1883. Foram seus dirigentes os republicanos — F E R N A N D O
M A C H A D O S I M A S , JOÃO EUGÊNIO M A C H A D O L I M A e G U I -
L H E R M E JOSÉ L E I T E . — Seu "slogan", bastante forte, era:
" P O V O ! TU PARECES PEQUENO PORQUE ESTÁS DE JOELHOS!
LEVANTA-TE !!!"
As perseguições não se fizeram esperar... Mas os republicanos
paranaguaras, sempre idealistas, não esmoreceram no principal
objetivo: Atacar com energia o já então arcaico sistema imperial.
E o faziam, com seus veementes artigos doutrinários, através das
colunas do brilhante jornal da terra — " O L I V R E P A R A N Á " (Que
fibra de h o m e n s ! . . . ) .
Colaboraram ainda, nessa época, os entusiastas republicanos
— JOAQUIM SOARES GOMES, A L B I N O JOSÉ DA S I L V A e NES-
T O R V Í T O R DOS SANTOS — com seus ataques jornalísticos, que
eram. pode-se dizer, verdadeiras catilinárias" ! . . .

Entra o ano de 1887 e, com ele, a propaganda abolicionista e


republicana, ao mesmo tempo, cada vez mais acentuada. Tanto
que, aos 21 de agosto desse ano de 1887, um grupo de "maçons"
da Loja capitulada " P E R S E V E R A N Ç A " de P A R A N A G U Á , reuniu-se
no pavimento superior do sobrado n. 37 da então rua do Imperador
(hoje rua 15 de novembro) para fundar o "CLUBE R E P U B L I C A -
N O " , de natureza profana, com o fim preconcebido de aliciar aos
propósitos da " O R D E M " , os elementos que iriam agir de perto no
espírito do povo (a "massa" sempre pesou na balança).
146
A tradicional " A T A " da instalação do velho Clube é, ao mesmo
tempo, um manifesto republicano e maçônico ! E por que ? Por-
que foi firmado unicamente por membros dessa admirável " L O J A " !
Justifica plenamente esta assertiva, a " A T A " de fundação,
quando diz:

"Presentes os cidadãos abaixo assinados, declaram aderir fran-


camente ao "manifesto" de 3 de dezembro de 1870 e desligar-se
completamente de qualquer compromisso que até hoje tenham
mantido com Partidos Monárquicos Constitucionais, fazendo esta
declaração espontaneamente e debaixo de sua palavra de honra, e,
para maior clareza, o secretário procedeu à leitura do "manifesto"
de 3 de dezembro de 1870, para que todos os cidadãos presentes
conhecessem perfeitamente as idéias de que, como na declaração
acima se vê, tornavam-se aderentes. E achando-se de acordo, per-
feitamente, com o que do "manifesto" consta, e resolvidos a cum-
prir aquilo a que com a declaração acima se obrigam, todos os
presentes subscrevem-se:
Fernando Machado Simas, Nestor Vitor dos Santos, Guilherme
José Leite, Julio César Fernandes Peixoto, José Ferreira de Cam-
pos, Benedito Antonio Guilherme, Francisco José de Souza, José
Gonçalves Lobo, Teobaldo Dacheux, Cezalpino Luiz Pereira, Ger-
mano Augusto Pirath, Manoel Figueira Neto, Manoel Lucas Evan-
gelista, Luiz Mariano de Oliveira, Geraldo Divise, Joaquim Gui-
lherme da Silva".

A seguir, passou-se à eleição para Presidente e Secretário pro-


visórios, sendo eleitos, para Presidente provisório — G U I L H E R M E
JOSÉ L E I T E ; para Secretário provisório — N E S T O R V I T O R DOS
SANTOS.
Lembrou então o Presidente eleito que, havendo necessidade
de se elaborar os Estatutos, nomeava os cidadãos — G U I L H E R M E
JOSÉ L E I T E , NESTOR V I T O R DOS SANTOS e F R A N C I S C O JOSÉ
DE SOUZA, para esse fim e apresentá-los na próxima sessão.
Lembrou ainda que estando próxima a Eleição para Deputados
Provinciais e fazendo parte da disciplina republicana, uma eleição
prévia para a escolha do seu candidato, seria de bom alvitre que o
CLUBE R E P U B L I C A N O , recém-instalado, desse "sinal de evidên-
cia", lançando também o seu "candidato".
Sendo a proposta aprovada, foi procedida a eleição, saindo
vencedor o sócio "Dr. JORGE D E S M A R A I S " .
Foi assim eleito o Dr. JORGE D E S M A R A I S , candidato pelo
CLUBE R E P U B L I C A N O de P A R A N A G U Á , para Deputado Provin-
cial.
A fibra e o destemor daquela gente eram verdadeiramente fora
de série (em plena Monarquia!).

147
Depois da fundação dessa velha Sociedade, com as "conferên-
cias" em sua sede social, a campanha republicana tornou-se mais
intensa, mau grado as perseguições que se faziam sentir de vez em
quando.
Conferências, as mais brilhantes, eram realizadas no tradicio-
nal CLUBE, salientando-se o verbo ardente do grande idealista
republicano — M A N O E L C O R R E I A D E F R E I T A S — que, tendo
apenas o Curso Primário em P A R A N A G U Á , galgou a deputação,
sendo eleito Deputado Estadual e depois Deputado Federal, pelo
P A R A N Á , ao primeiro Congresso Constituinte; como também eleito
!
a Vice-Governador do Estado do P A R A N Á . É que o gen al parana-
guara vivia devorando os livros; fazia estudo de Gabinete. Foi um
auto didata e também um cérebro p r i v i l e g i a d o . . .
Ainda em 1887, depois da fundação do CLUBE R E P U B L I C A N O ,
o ardoroso jornalista — F E R N A N D O M A C H A D O S I M A S — mu-
dou-se para o Rio de Janeiro, dadas as perseguições por que passou,
inclusive prisão, por injúrias publicadas no seu jornal (segundo os
monarquistas).
Com essa mudança, terminou a vida do " L I V R E P A R A N Á " e,
C O R R E I A D E F R E I T A S , sem esse "timão" tratou, de influir no
ânimo de A L B I N O S I L V A para a fundação de um novo jornal —
"PÁTRIA LIVRE".
A L B I N O JOSÉ DA S I L V A , velho republicano, também de gran-
de valor, lançou então o novo jornal — P Á T R I A L I V R E — em
1888, tendo a felicidade de ver o seu jornal vitorioso, com o golpe
de 15 de novembro de 1889 !. ..
E o " P Á T R I A L I V R E " continuou, daí por diante, firme, ado-
tando o novo lema:
"A R E P Ú B L I C A E R A O NOSSO I D E A L ; A G O R A , O NOSSO
DEVER É T R A B A L H A R P O R E L A " !
Foi, pois, P A R A N A G U Á que, através dos seus diletos filhos,
marcou, com orgulho, as duas maiores etapas políticas na H I S T Ó -
R I A D O P A R A N Á , durante a propaganda abolicionista e republi-
cana !
A P R I M E I R A E T A P A — marcada pela campanha abolicionista,
na libertação total dos escravos, foi iniciada pelo jornal — "OPE-
R Á R I O DÁ L I B E R D A D E " — em 1870; 18 anos antes da " L E I
ÁUREA".
A S E G U N D A E T A P A — assinalada com a campanha de-
mocrática pela República no B R A S I L , através do jornal — "O
L I V R E P A R A N Á " — em 1883, e depois em 1888, com o " P Á T R I A
L I V R E " . Portanto, em pleno regime imperial; numa época em
que as perseguições políticas eram ferrenhas e imperdoáveis.
Naqueles tempos, falar-se em R E P Ú B L I C A , ou pior ainda, de-
sejar-se um GOVERNO L I V R E , DO POVO P A R A O POVO, era uma
temeridade e mesmo uma insensatez, devido às conseqüências fu-
nestas . ..
148
Entanto, os paranaguaras da época não se amedrontavam
ante o poderio monárquico !. .. Tinham "fibra de heróis" ! . . .
Sua Fortaleza, inexpugnável, era o CLUBE R E P U B L I C A N O ,
Sociedade com lídima influência política na terra carijó; compro-
vando assim o grande auxiliar patriótico que foi ele na H I S T Ó R I A
de nossa P A R A N A G U Á e refletindo em todo o P A R A N Á .
Terminada a campanha política e implantada a R E P Ú B L I C A
em nosseo P A Í S , teve ainda o CLUBE R E P U B L I C A N O muitas lutas
no terreno político.
Começou por empenhar-se na consolidação dos verdadeiros
princípios democráticos. Depois, harmonizar as dissenções nasci-
das no seio da Sociedade, com a dissidência de um grupo de asso-
ciados.
Felizmente, acabaram se entendendo e, por fim, cerraram todos
numa só fileira em torno do Partido triunfante.
Estava terminada a grande "missão política" desse pugilo de
homens com firmeza de caráter que a nossa P A R A N A G U Á possuía.

E o CLUBE R E P U B L I C A N O ?

Os autênticos republicanos paranaguaras, como havia acabado


a sua missão, fizeram uma Assembléia Geral para resolver sobre o
destino do "Clube Republicano"; uma vez que a razão de sua exis-
tência havia terminado (com a consolidação da República).
Alguém, nessa reunião, deu uma sugestão: transformá-lo em
uma Sociedade recreativa. Todos apoiaram a genial idéia. Foi
então alterado, em parte, os Estatutos, excluindo completamente a
política.
Quanto ao nome, continuaria o mesmo (como lembrança do
passado); apenas acrescentando a palavra "Recreativo".
Ficou assim transformada essa Sociedade política (cuja fina-
lidade era salvaguardar a nossa República), em um Clube de diver-
sões, com o nome "CLUBE R E P U B L I C A N O R E C R E A T I V O " .
Os sócios do antigo " C L U B E " passaram também a fazer parte
da novel Sociedade.
O interessante, nessa transformação, é que, todos os associados
do Clube Político apoiaram a idéia, que julgaram feliz.
As festividades nele realizadas começaram a ser constantes e
com muito brilho. Isso porque, o novo Clube era mais modesto;
sendo, portanto, fácil a vinda dos rapazes para o seu seio. Daí, o
tornar-se ele mais alegre e com mais partidas dançantes (Onde
está a mocidade, está a v i d a ) .
Em 1890, em uma Assembléia Geral Extraordinária, os associa-
dos do Clube Republicano Recreativo concordaram em que se acei-
tasse a "fusão" da Sociedade "Os Voltijadores da Época", em razão
149
da mesma estar em sérias dificuldades; sem Estatutos e, portanto,
sem personalidade jurídica.
O querido Clube Republicano (o mais democrata) levou muitos
anos sem ter sua "sede própria". E é difícil uma Sociedade assim
se manter.
Entretanto, ele veio atravessando o tempo e conseguiu, por fim,
a tão almejada "sede própria", embora um tanto pequena.
Hoje, com seus 89 anos de existência bem vivida, conseguiu
mais uma etapa, e esta muito importante para a vida do Clube:
Terá, dentro de um ano, a sua "Nova Sede"; com mais o campo
para o "Esporte" em todas as suas modalidades. A sua bela "pis-
cina" torná-lo-á completo.
Uma Sociedade assim constituída; com um passado histórico
tão brilhante; jamais poderá ser esquecida pelos filhos desta P A R A -
N A G U Á de 400 anos !
Jamais desaparecerá, porque faz parte integrante da vida polí-
tica e social da terra carijó!
Viverá eternamente, para gáudio dos paranaguaras que amam
sua terra e que aqui envelhecem, acompanhando o progresso verti-
ginoso do seu torrão natal.
Salve, Clube Republicano Recreativo !!!
Que os paranaguaras jamais o esqueçam ! . . .

150
OS VOLTIJADORES DA ÉPOCA

No ano de 1887, havia surgido em P A R A N A G U Á , uma Socie-


dade por nome — V O L T I J A D O R E S DA ÉPOCA — fundada por um
grupo de rapazes mais modestos que, não podendo integrar no
quadro social do Club Litterario, por motivos financeiros, e talvez
por outras causas, resolveu procurar um meio de ter os diverti-
mentos desse longínquo tempo, e que eram os bailes e as represen-
tações teatrais.

De fato, o quadro social do Club Litterario era composto de


elementos selecionados, que formavam a aristocracia paranaguara
O Clube Republicano, por sua vez, destinado a fins políticos,
não interessava a essa juventude sadia de poucos e minguados re-
cursos.
Os moços daquela época, que não tinham tradição de família
e nem pequena fortuna que lhes pudesse dar uma posição definida
no meio social da Cidade, sofriam com a falta de uma Sociedade
mais modesta.
Daí, a lembrança de fundarem um Clube para seu regalo, e
que foi o dos "Voltijadores da época"; localizado nos baixos do so-
brado do Sr. Camilo Antonio Laines (hoje, bela residência do con-
ceituado cidadão Sr. Antonio T e m p o r ã o ) , à rua Faria Sobrinho.
Nas alegres reuniões, além dos bailes, constavam, da noitada,
as representações teatrais, como fonte de instrução para a moci-
dade. E havia, de fato, um bom corpo cênico.
É preciso lembrar ao leitor que, naqueles idos tempos, não havia
o "Cinema", nem o "Futebol", ou qualquer outra modalidade de
divertimento. Portanto; o "Teatro" era ó forte da época.
As reuniões, promovidas pela recente Sociedade, compunham-
-se de duas partes:
A primeira: T E A T R O — representações de dramas, comédias,
monólogos e recitativos; cujo linguajar, passava pela censura rígi-
da, em todos os pontos de vista.
A segunda: B A I L E — esplêndidas noitadas, que iam até alta
madrugada. (Três horas da manhã, no m á x i m o ) .
A representações, como era de praxe, começavam às 6 horas
da tarde e iam até às 9 horas; quando então se dava início ao baile.
151
À meia-noite, o conjunto musical, sob a regência do maestro,
conhecido por "Manoel Z é " , fazia uma parada; para dar lugar ao
"chá", servido pelos sócios, em bandejas, no salão de danças. As
senhoras e senhorinhas, sentadas em cadeiras encostadas às pare-
des do salão, tomavam o gostoso "chá" com fatias de "pão de ovos".
Depois, recomeçavam as danças, sempre na maior animação. Assim
eram as festas da Sociedade V O L T I J A D O R E S DA ÉPOCA.

A mocidade de hoje talvez ache isso pueril. Entretanto, é pre-


ciso que se saiba serem esses os costumes da época. Devemos res-
peitar os usos e costumes dos nossos antepassados; desde que esses
mesmos "usos e costumes" não tenham atentado contra a moral.
Não nos esqueçamos que "A História é a mestra da vida". Daqui
a 50 anos (ou talvez menos), que dirão as futuras gerações da mo-
cidade atual ?!.. . Rirão?. . . Talvez sim, talvez não. ..

Como a Sociedade não possuía Estatutos, andava sempre em


dificuldades financeiras. Para quase todas as festas, os sócios reu-
niam-se em Assembléia e, arranjavam o dinheiro necessários às
despesas.
E assim iam levando o seu Clube; sempre alegres e diverti-
dos . . .
A Sociedade também teve os seus fatos interessantes e dignos
de nota:
Certa vez, veio a P A R A N A G U Á a célebre artista, muito conhe-
cida — P E P A R U I Z — cantora de variedades (muito em m o d a ) ,
que, nas suas canções e cançonetas bem apimentadas, bem como
no malicioso requebrado do seu corpo, escandalizou a recatada pla-
téia paranaguára, que não gostou, mas engoliu ! . . . (O falso pudor
imperava naqueles tempos).
Na parte teatral, os amadores faziam questão absoluta em
tomar parte nos dramas e comédias.
Faziam parte do Teatro os amadores:
Henrique Dacheux, Leandro Dacheux, Nicolau Dacheux, Otá-
vio Branco, Eurípedes Branco, Francisco Timóteo Simas, Henrique
Veiga, Manoel Clarício de Oliveira, João Bernardino, Francisco Gui-
marães, João Estevão Junior, Manoel Maia Junior, Antonio Carlos
da Silva, Manoel Hermógenes Vidal, Joaquim de Amorim (que era
o "ponto").
Alguns deles eram sócios do Club Litterario. Entretanto, ali
estavam, por gostarem de representar; amavam o Teatro. Era o
fascínio pelos dramalhões (como se tem hoje pelo futebol). Tudo
muda neste mundo.

152
Em 1890, estando a Sociedade em sérias dificuldades, sem po-
per solucionar os seus problemas, reuniu-se em Assembléia e resol-
veu fazer "fusão" com o Clube Republicano Recreativo: Sociedade
bem organizada e com personalidade jurídica e que, passada a
fase da República, havia se transformado em um Clube Recreativo.

Aceita a "proposta" pelos sócios do Republicano; terminou,


nessa fusão, a vida efêmera dos V O L T I J A D O R E S DA ÉPOCA !. ..
Vida efêmera, é verdade; mas muito bem vivida!

153
OS "BONDINHOS" DE PARANAGUÁ

Foi em 1893 a inauguração da "linha de bondes" de P A R A N A -


G U Á ao Rossio.
Os trabalhos dessa "Empresa de Transportes" tiveram início
em abril de 1892 e, quase no fim do ano fizeram a primeira expe-
riência com a pequena locomotiva, a percorrer algumas ruas, já
com os trilhos assentados.
É claro que esse grande acontecimento provocou alegria geral
na Cidade e, o resultado foi o "foguetório" !!!
O paranaguara, em suas festas, jamais passou sem os "foguetes
(e ainda não passa sem eles). Isso já está na índole do povo.
Portanto, soltar foguetes nesse memorável dia, era muito na-
tural, dada a alegria do povo por esse progresso; pois vinha trazer
mais conforto para todos, mormente para o comércio, quanto à
rapidez dos transportes, naqueles tempos.
No dia 7 de dezembro de 1893, estava tudo pronto para a inau-
guração. A pequena locomotiva, com a força de 20 HP, soltando
baforadas de fumaça, partiu às 6 horas da tarde do largo do Mer-
cado, puxando apenas dois vagões levando autoridades e convida-
dos especiais, rumo ao Rossio, em sua viagem inaugural!
Foi um sucesso esse grande acontecimento, e não era para
menos.
A população estava eufórica e, em todas as camadas sociais a
"boca engulia a orelha", como se costumava dizer, tal a satisfação
íntima que todos s e n t i a m . . .
É que o povo já pensava como ia ser gostosa a viagem às nove-
nas da Festa do Rossio (e não se enganou) !
Aos domingos a gente sentia um prazer muito grande ir de
bondinho dar um passeio ao R o s s i o . . . quanta saudade desses bons
tempos...
Em 1894, no período revolucionário, os bondinhos passaram a
fazer parte da História de P A R A N A G U Á , pois, as idas e voltas dos
oficiais e graduados revoltosos, nos bondinhos, durante os meses de
janeiro a abril, foram muitas, montando a despesa em Rs 5:010$000
(cinco contos e dez mil r é i s ) . Essa quantia nunca foi paga, porque,
os Feder alistas, abandonando a Cidade da noite para o dia, não
saldaram ou não puderam saldar essa d í v i d a . . . Eles estavam sem
dinheiro. . . Essa é a verdade.
154
Com os anos, as "máquinas a vapor" bastante gastas, foram
postas de lado, por se acharem imprestáveis. Ficaram apenas os
"bondinhos a burro", que continuaram servindo a população até
1938... quando foram vencidos e . . . substituídos pelos "ônibus",
"táxis" e " c a m i n h õ e s " . . .
Tudo passa na v i d a . . . e os "bondinhos" também passaram...
cairam de moda, pela força do progresso...
Mas não podemos negar os inestimáveis serviços que eles pres-
taram aos paranaguaras da época, durante 45 anos. Eles tiveram,
de fato, a sua é p o c a . . .
E é preciso que se diga; nos deram muita alegria ! . . .

155
A INVASÃO FEDERALISTA EM PARANAGUÁ

Falar sobre a Revolução Federalista, é relembrar dias amargos


por que passou a nossa terra. Sim, porque P A R A N A G U Á foi o
palco da célebre tomada de 15 de janeiro de 1894...
Embora alguns historiadores tenham feito referências sobre os
episódios aqui ocorridos, raros os que se alongaram nos detalhes
mais importantes, imprescindíveis mesmo à História do P A R A N Á ,
nessa grande luta i n g l ó r i a . . .
Muito se tem falado sobre os acontecimentos realizados em
Florianópolis, em Curitiba e na legendária Lapa; aliás com muita
propriedade. Mas, em P A R A N A G U Á , quase nada se há dito.
Todos sabem do fatídico dia 20 de maio, em que foram sacrifi-
cados seis paranaenses de valor; entre eles, o Barão do Cerro Azul
(Ildefonso Pereira Correia) e o respeitável cidadão Presciliano da
Silva C o r r e i a . . . (ambos p a r a n a g u a r a s ) . . . p o r é m . . . isso foi depois
da retirada dos revoltosos...
Relatemos então o que ouvimos de nossos pais, do saudoso co-
ronel Agostinho Pereira Alves e do inesquecível historiador amigo
Vicente Nascimento Junior; testemunhas oculares de tão tristes
acontecimentos...
A Revolução Federalista havia rompido, em 1893, nos campos
do Rio Grande do Sul, preocupando bastante o Governo da Repú-
blica.
O levante da esquadra, nesse mesmo ano no Rio de Janeiro,
chefiada pelo Contra-Almirante — Custódio José de Melo — veio
piorar a situação; pois os revoltosos se apoderaram dos navios mer-
cantes que se achavam ancorados no porto e cruzaram a Barra, em
direção ao Sul; ao encontro das Forças Federalistas.
Ao passar em São Francisco do Sul, inutilizaram a rede tele
gráfica. Continuando a marcha, surgiram na Barra do Norte da
ilha do Desterro (hoje Florianópolis.. Contornaram a ilha e entra-
ram pela Barra do Sul; obrigando as Forças Legais a se render.
Os revolucionários, de posse da ilha, instituíram o Governo Provi-
sório da República, nomeando como chefe o Capitão de Mar e
Guerra — Frederico Guilherme de L o r e n a . . .

156
Para que o leitor possa compreender que, no próprio Estado
do Rio Grande do Sul havia a corrente fiel ao Governo Legal, pas-
saremos a relatar, com a devida vênia, as palavras do eminente
historiador — Professor Walter Spalding:
"Quando os federalistas em armas, chefiados por G U M E R C I N -
DO S A R A I V A , acossados pelas circunstâncias, resolveram, contra
a opinião de alguns chefes militares, atravessar Santa Catarina,
invadir o Paraná e levar, se possível, suas hostes até ao Rio de
Janeiro com intuito de derrubar o Marechal F L O R I A N O , papel sa-
liente desempenhou no ataque às Forças Revolucionárias a
" B R I G A D A M I L I T A R D O ESTADO D O R I O G R A N D E D O SUL".
Infelizmente, para L E G A L I D A D E , a Milícia Gaúcha, apesar de
aguerrida, valente e resistente, pouco pôde fazer, pois tudo ou quase
tudo lhe faltava, graças à incúria em que a deixou o próprio
Governo".

Em vista desses acontecimentos, o G O V E R N O L E G A L tomou


as necessárias providências, a fim de defender o litoral paranaense.
É então quando a nossa P A R A N A G U Á aparece no cenário dessa
guerra civil.
Foi logo convocada, em nossa terra, a Guarda Nacional, com
400 homens de Infantaria, sem nenhum adestramento militar; mas
assim era preciso. Esse efetivo foi distribuído em 4 companhias:
A P R I M E I R A — era comandada pelo oficial honorário do Exér-
cito — Capitão Randolfo Gomes Veiga.
Havia também 3 peças " K r u p p " 7 5 , de tiro lento, com a res-
pectiva guarnição. Estavam elas postadas em toda a orla costeira.
a
A l . peça foi colocada nas imediações da "casa baleada".
a
A 2 . na então "chácara do Barão".
a
A 3 . onde se acha hoje o prédio da antiga Alfândega.
Essas três guarnições ficaram de prontidão, a espera da Es-
quadra revoltosa.
Os "oposicionistas" locais, simpáticos à causa Federalista, pro-
curaram entrar, ocultamente, em contato com os soldados da
Guarda Nacional e incutir no ânimo deles a idéia de um movimento
local. Assim, quando a Esquadra revoltosa entrasse em nosso
porto, a Cidade não seria bombardeada. Apenas tomada sem re-
sistência. Foi um trabalho de sapa feito no maior sigilo. No dia
aprazado, os soldados se revoltariam, aderindo à revolta. Estava
pois, tudo pronto. ..
Veio, por fim, um "emissário" do Sul, trazendo, para os oposi-
cionistas, a notícia de que os "navios federalistas" chegariam à
nossa baía na madrugada de 11 de janeiro de 1894. Assim sendo,
logo depois da meia noite dessa data marcada, os soldados da Arti-
lharia, não mais se contendo, revoltaram-se, prendendo os 4 oficiais
que os comandavam — tenentes Anibal Carneiro, Antonio Bitten-
court, Henrique Veiga e Antonio Tupinambá Bittencourt — por
157
não aderirem a esse movimento de revolta. Foram eles recolhidos
à "chácara do Joaquim Lucinda" (casa baleada) e presos sob
guarda. (Essa chácara era de propriedade da Família Sant'Ana
Lobo).
A seguir, os artilheiros e demais soldados rumaram para a
;
C dade até a Cadeia Pública, intimando a Guarda a se render.
(A Cadeia era um velho sobrado colonial, com paredes de mais
de meio metro de largura, situado à rua 15 de novembro, bem em
frente ao jardim "Leocádio Pereira", onde está o busto do professor
Cleto. Prédio que depois foi demolido e no local, levantado o "Palais
Royal", hoje também em ruínas).
Repelidos energicamente pelo Batalhão de Guarda, retornaram
à Costeira, que ficou sendo o seu reduto.
A repressão do Governo Estadual começou então desse mo-
mento em diante, fazendo descer tropas de Curitiba para eliminar
os revoltosos locais. Chegou logo o batalhão "23 de novembro",
comandado pelo 1.° Tenente Domingos Nascimento; a Artilharia do
Exército sob o comando do Capitão Faria de Albuquerque; tudo
isso pela manhã.
Além disso, o delegado de polícia — Capitão Narciso de Azevedo
— com suas praças, começou a fazer prisões, recolhendo à Cadela
Pública todos os paranaguaras suspeitos de aderirem à revolta local.
Foram presos 110 cidadãos. Os principais elementos conside-
rados os mais perigoso para o Governo, foram recolhidos a uma
sala separada e eram em número de 42. Os demais suspeitos fica-
ram detidos em outras s a l a s . . .
E tudo isso aconteceu, porque, a Esquadra revoltosa esperada
nessa madrugada de 11, não c h e g a r a . . . Devia ter havido algum
i m p e c i l h o . . . e de fato, houve. Fora o mau tempo em São Fran-
cisco do Sul. Não foi possível sair Barra à f o r a . . .
Mas, continuemos:
Ao meio dia, a tropa governista, já aquartelada, partiu da
Cadeia, puxada pela Banda "Progresso Musical", para o ataque aos
revoltosos da Costeira. A guarnição local da Guarda Nacional que
se mantivera fiel ao Governo, também acompanhou.
Seria o fim dos nossos infelizes paranaguaras que se achavam
encurralados na Casa B a l e a d a . . .
O ataque então começou, e a resistência, firme ! . . .
Esses acontecimentos para os lados da Costeira, deixaram a
população bastante alarmada e mesmo apavorada. O Comércio,
como era de se esperar, fechou as suas portas.
A Cidade então, num ambiente de terror, tornou-se uma ver-
dadeira praça de guerra.
O dia se escoara; entrou a noite e a resistência foi curta; por-
quanto, sem o auxílio que esperavam dos Federalistas, os revoltosos
locais nada mais podiam f a z e r . . . Mas não se e n t r e g a r a m ! . . . Fu-
giram, através dos mangais que existiam para os lados do "porto do
G a t o " (hoje, o Porto D. P E D R O I I ) .
158
Os 4 oficiais presos, com a fuga dos revoltosos, também esca
param, aproveitando-se da confusão.
O dia 12, foi todo de trabalho, no preparo de trincheiras, desde
baleada até ao Rossio.
As tropas legalistas se entrincheiraram então em toda essa orla
marítima, a espera da Esquadra revoltosa, que devia chegar a qual-
quer momento.
Na manhã do dia 13, o semáforo do morro da Cotinga, com
suas bandeiras, deu o sinal da aproximação dos navios de guerra
federalistas...
A população mais apavorada ficou. Quanto às forças legais,
esse fato tornou a situação mais complicada.
Com essa notícia, o Dr. G A S T A O CERJAT, diretor da Com-
panhia Francesa da Estrada de Ferro, içou a bandeira francesa na
fachada da Estação local.
Entanto, nesse dia, os navios fundearam na enseada das Con-
chas; tomaram o Farol das Conchas e depois a Fortaleza da Barra,
cujo comandante — Major José Ricardo da Cruz — natural de
Morretes, achava-se em nossa Cidade.
No dia 14, vieram ancorar na ilha das Cobras; só levantando
ferro no dia 15, para atacar a Cidade (isso pela m a n h ã ) . Coman-
dava a Esquadra o valente Contra-Almirante — Custódio José de
Melo.
Às 7 horas desse dia 15, o semáforo da Cotinga ainda pôde
anunciar o movimento dos 3 navios. Pouco depois, apareceram eles
na Ponta da Cruz, e, já a descoberto, continuaram sua marcha em
direção do Rossio. Ao passar bem em frente da "chácara do Lu-
cinda", os 3 canhões de terra abriram fogo.
Nessa ocasião, o comandante do cruzador "República", que já
estava esperando por esse ataque-defesa, ordenou a resposta com
os possantes canhões de sua artilharia, em certeiras pontarias con-
tra os entrincheiramentos e a célebre "chácara"; pois que ficavam
a menos de uma milha dos grossos canhões da Esquadra, cujos tiros
feriram a Cidade em alguns pontos; principalmente no desapare-
cido "Campo Grande" e na Fonte Velha.
U m a das granadas matou dois jovens — José Rufino, marce-
neiro e músico, com 18 anos de idade, e Olívio Teófilo, pintor, com
16 anos. Ambos fugiam da Cidade e já se achavam no Campo
Grande. Foram as únicas vítimas civis.
Um popular de meia idade, por nome Manoel, que também se
achava nas imediações do Campo Grande; ao assistir esse desastre
e ouvir o estrando dos canhões, perdeu completamente o uso da
razão. Viveu ele ainda por muitos anos; percorrendo as ruas da
Cidade a dizer: P U M B U M (imitando os tiros dos canhões). Cha-
mavam-no : :Mané Pum Bum". Conheci-o m u i t o . . .
Continuemos porém a narrativa:
159
O grande ruído produzido pelo tiroteio, apavorou e sobressaltou
ainda mais os habitantes; abalando também, em parte, o ardor da
d e f e s a . . . Houve então um período de tréguas de 4 horas.
Nesse espaço de tempo, as famílias que não puderam sair da
Cidade, refugiaram-se no sobrado do Capitão T I A G O P E R E I R A DE
A Z E V E D O — Cônsul do Uruguai — como único abrigo. As mais
importantes ficaram no pavimento superior; as demais, no pavi-
mento térreo.
Meus pais, com meus dois irmãos (Braulio, de 6 anos e Alfredo,
de 5 anos), mais meu tio Antonio de 10 anos, abrigaram-se no pa-
vimento térreo desse sobrado. Minha mãe, sentada numa cadeira,
com os dois filhos no cólo; meu tio sentado no chão e meu pai de
pé, passaram assim a noite, sem se poder mexer, dado o grande
número de pessoas ali recolhidas. Além de tudo, o tiroteio ensur-
decedor durante toda essa memorável noite de pavor, amedrontava
mais ainda as senhoras ali abrigadas. Ninguém podia dormir e
nem rezar, tal o estado de alma de cada pessoa...
Minha mãe jamais pôde esquecer essa horrível noite de 15 para
16 de j a n e i r o . . . e quando me contava os pormenores (por várias
vezes), fazia as suas ponderações: "por que tanta luta entre ir-
mãos" ? "Acaso não somos filhos da mesma Pátria" . . .

O cruzador "República"era comandado pelo Capitão-Tenente


— Cândido dos Santos Lara — e nele vinha o comandante em
chefe da Esquadra —• Contra-Almirante Custódio José de Melo -—.
O cruzador "Urano", sob o comando do 1.° Tenente Francisco Cé-
sar da Costa Mendes (filho de P A R A N A G U Á ) , e o cruzador-auxiliar
"Esperança", comandado pelo 1. Tenente da reserva Álvaro Ribeiro
Graça.
Nessa manhã histórica de 15 de janeiro, chega o General Pego
Junior, comandante do Distrito Militar. Vinha de Curitiba para
fortalecer a resistência; sendo recebido, na histórica chácara, aos
gritos de "viva a República" ! . . .
A Esquadra Federalista havia fundeado próxima à ilha do
Gererê, esperando pelo cruzador auxiliar "Iris", que trazia do Sul
a tropa de desembarque. Vinha ele sob o comando do 1.° Tenente
Franscisco de Matos; passando bem ao largo da Costeira, a fim de
juntar-se aos demais.
Foi surpresa para os legalistas, pois o semáforo da Cotinga não
havia anunciado. É que, aos primeiros disparos dos canhões da
Esquadra, o sinaleiro, apavorado, fugira, deixando as bandeiras no
topo do m a s t r o . . .
Essa tropa de desembarque era formada pelo 25.° Batalhão de
Infantaria do Exército, da Guarnição do Desterro, comandada pelo
Coronel Canto; mais o Batalhão Catarinense de patriotas "Fernan-
160
do Machado", comandado pelo 1.° Tenente João Nepomuceno da
Costa Filho (Tenente Costinha, como o c h a m a v a m ) ; Batalhão este,
que também aderira ao movimento Federalista...
Comandava a resistência, na Costeira, o Coronel Eugênio de
Melo, chefe da Guarnição. Difícil seria o desembarque, pois a de-
fesa estava bem guarnecida.
Eram 3 horas da t a r d e . . .
O Almirante Custódio de Melo, percebendo que a defesa estava
forte e que seria muito difícil a entrada, usou de um estratagema.
Fez proa para Antonina; dando a entender que, desanimado de
tomar P A R A N A G U Á , iria desembarcar a tropa naquela cidade des-
guarnecida.
O General Pego Junior não percebeu o plano do inimigo e,
sem mais demora, envia, rapidamente, mais de metade da tropa de
defesa, pelo trem, para Antonina, a fim de impedir o desembarque.
Foi o c a o s . . .
A Esquadra, que se achava escondida por detrás da ilha, per-
cebeu o rumor do trem, na sua passagem em Alexandra, e, já pre-
parada, voltou a todo o vapor, para reatacar o reduto da Costeira,
cuja guarnição fora reduzida pela m e t a d e . . . A luta recomeçou,
pela noite a dentro e se prolongou até a madrugada de 16; quando
os revoltosos conseguiram desembarcar...
A guarnição de terra começou o recuo, até à Cadeia, seu último
reduto de resistência... Os canhões da barranca haviam cessado
de t r o a r . . . pela segunda e última v e z . . .
Preso o comandante Eugênio de Melo, os revoltosos ocuparam
inteiramente a Cidade.
A Cadeia estava guarnecida com apenas 20 praças, além do
Capitão Garcia. Essas 20 praças eram o resto do Batalhão "Frei
Caneca" de São Paulo, retirado de P A R A N A G U Á pelo General Pego
Junior, para ir em defesa de Antonina.
O comandante — Capitão Garcia — vendo-se sitiado, foi falar
aos prisioneiros, pedindo-lhes a garantia de sua pessoa, libertando •
-os em seguida. Nessa ocasião, o Coronel Teófilo Soares Gomes, em
nome dos demais presos, prometeu-lhe a garantia pessoal solicitada.
Nesse meio tempo, já subia as escadas da velha Cadeia o revo-
lucionário — 2. Tenente Roberto Le Coq de Oliveira — que recebeu
das mãos do Capitão Garcia as chaves das prisões.
Abertas as grades, os prisioneiros paranaguaras, simpatizantes
dos Federalistas, sairam às ruas dando vivas à Revolução.

Com a rendição e ocupação da Cidade, bem como a libertação


dos prisioneiros, as coisas mudaram completamente.
Começaram então as prisões dos legalistas. E era natural.
Nesse dia 16, ainda pela manhã; estando toda a Cidade tomada
pelos revoltosos; o comandante da praça mandou um oficial à re-
161
sidência do Capitão Tiago Pereira de Azevedo, a fim de avisar as
famílias ali abrigadas, que podiam se recolher aos seus lares, sem
preocupações; que nada lhes aconteceria.
De fato, a calma veio novamente reinar em nossa PARANA-
GUÁ.

O jornal do Estado "A República", órgão do Governo, de 16 de


janeiro, deu esta notícia:

"CHEGOU O N T E M AO P O R T O DE P A R A N A G U Á , A ESQUA-
D R A N E G R A , AO M A N D O DO B A N D I T I S M O DE CUSTÓDIO DE
M E L O E DO E X - N E U T R O DA I L H A DAS " C O B R A S " ; (Esse ex-
-neutro era o bravo Almirante Luiz FeUpe Saldanha da G a m a i .
A T É A H O R A EM QUE ESCREVEMOS, N Ã O C O N S E G U I R A M OS
REBELDES D A R DESEMBARQUE N A Q U E L A CIDADE M A R I N H A ,
G R A Ç A S AO ESFORÇO DE SUA V A L E N T E G U A R N I Ç A O " .

Notícia inverídica, porque, P A R A N A G U Á , desde essa manhã de 16,


achava-se em poder dos Federalistas.

E é preciso que se diga, a bem da verdade, salvo as prisões dos


políticos legalistas (o que era justo, dadas as circunstâncias em
que se achavam), nenhuma arbitrariedade houve durante os três
meses e sete dias em que aqui estiveram os Federalistas.
Apenas o comandante da praça pediu a cada família que cola-
borasse com a comida a um ou dois soldados revolucionários (café
da manhã, almoço e j a n t a r ) . Em casa de meus pais, somente um
sargento fazia essas refeições. Nas demais casas, a mesma coisa.
Nas casas dos graúdos, só os oficiais.
Foi a única coisa que eles pediram à população. E era justo,
pois não tinham dinheiro para sustentar a tropa; apenas uma
parte dela.
Não nos esqueçamos que, só as famílias oposicionistas e sim-
patizantes dos Federalistas é que concordaram em ajudar aos sol-
dados com a alimentação pedida.
Quanto ao mais, houve uma verdadeira disciplina por parte de
todas as praças de pré e também dos oficiais. O respeito às famí-
lias foi extraordinário. É preciso que isso seja dito,, para que não
se julgue mal de todos os nossos irmãos do Rio Grande do Sul.
Ninguém escreveu sobre os fatos realizados em P A R A N A G U Á ,
durante a ocupação Federalista, porque não era permitido elogiar
qualquer ato bom por parte dos revoltosos; nem mesmo tocar-se de
leve nesse assunto. Os anos foram passando e o caso caiu no
esquecimento.
162
Ultimamente é que os escritores vem se interessando pelo
assunto.
Como estamos escrevendo sobre P A R A N A G U Á NA H I S T Ó R I A
E NA T R A D I Ç Ã O nos lembramos de trazer à tona esse interessante
episódio de 82 anos atrás.
Sabemos, entretanto, que em Rio Negro não foi a s s i m . . .
A carnificina, por parte da tropa de Gumercindo Saraiva, foi
impiedosa... de estarrecer... (isso com respeito à população).
Em P A R A N A G U Á , a população nada sofreu, como já dissemos.
Lembremo-nos então do "provérbio":
"OS DEDOS DAS MÃOS N Ã O SÃO I G U A I S " ! . . .
No dia 20, Curitiba foi tomada e ocupada pelos Federalistas.
A cidade da Lapa, porém, resistiu heroicamente, até o dia 9 de
fevereiro; caindo por fim às mãos dos revoltosos, com a morte do
General Ernesto Gomes Carneiro.

Para que o leitor possa avaliar o quanto eram desvairadas as


paixões políticas daquela época (isso quanto aos civis), passaremos
a contar um fato que, se fosse levado a efeito, traria o luto para
mais de 35 famílias de P A R A N A G U Á :
— Quando se deu o levante local, na madrugada de 11 de
janeiro, pelas guarnições que se revoltaram; depois de debelado
esse levante, pelas forças legais que desceram de Curitiba; houve
alguém, ou alguns legalistas de alma negra que, daqui de P A R A N A -
G U Á , telegrafaram ao Ministro da Guerra — General Antonio
Enéias Gustavo Galvão — pedindo autorização para o "fuzilamen-
t o " de 35 paranaguaras oposicionistas que se achavam presos na
Cadeia, desde a manhã do dia 1 1 ! . . .
A resposta desse miserável telegrama veio assim redigida:
"PODEIS F A Z Ê - L O APÓS CONSELHO DE G U E R R A , QUE O
GOVERNO T U D O A P R O V A R Á " .
Quanto ódio minava o coração impedernido de certos parana-
guaras legalistas...
A sorte dos nossos oposicionistas foi a Esquadra Revolucionária
ter chegado a t e m p o . . .
E se a legalidade tivesse vencido naquela ocasião ? . . .
Já pensaram na sorte dos nossos 110 paranaguaras simpati-
zantes dos revolucionários ? ! . . .
Vocês poderão avaliar, pelo doloroso episódio do "quilômetro"
65.
Os Federalistas ficaram em P A R A N A G U Á , num período de 3
meses e 7 dias, sem causar danos à Cidade; até o dia 23 de abril,
quando desapareceram da noite para o dia. Foram avisados em
tempo...
No dia 24 de abril, quando da "retomada" da Cidade pela Es-
quadra Florianista comandada pelo Almirante reformado — Jerô-
163
nimo Francisco Gonçalves — os Federalistas não mais aqui esta-
vam; tinham deixado nossa terra. Apenas dois oficiais que, não
sendo revoltosos, deixaram-se ficar na Cidade, sem preocupações.
Eram eles: Major C O L Ô N I A e Tenente N O L A S C O ; mas as forças
legais, nada ouvindo e nada perdoando, armaram-lhes uma cilada
e, ambos presos, foram fuzilados, atrás do Cemitério (paredão dos
fundos), na madrugada de 20 de maio de 1894...
Depois de retomada, as perseguições não se f z e r a m esperar..
A crueldade foi e n o r m e . . . E aí é que veio o sofrimento e o luto
para a nossa gente. ,. Tantas vidas úteis ceifadas... Essas cruel-
dades culminaram com o doloroso episódio do quilômetro 65 ! . . .
Ninguém mais ignora o bárbaro fuzilamento, no quilômetro
65 da Estrada de Ferro P A R AN A G U Á - C U R I T I B A, dos ilustres para-
naenses I L D E F O N S O P E R E I R A C O R R E I A (Barão do Cerro A z u l ) ,
P R E S C I L I A N O DA S I L V A CORRÊA, JOSÉ LOURENCO SCHLE •
DER, JOSÉ J O A Q U I M F E R R E I R A DE M O U R A , B A L B I N O CAR-
N E I R O DE MENDONÇA, LOURENCO R O D R I G O DE M A T T O S
GUEDES (os dois primeiros, filhos de P A R A N A G U Á ) . ..
Foi a página mais negra dessa Revolução, porquanto, as víti-
mas, sem o querer, haviam sido implicadas na trama do movimento
revolucionário...
Esse "capítulo" da "retomada" foi tão cruel e diabólico, quanto
às "paixões políticas" que avassalavam o País. É tão triste que não
vale a pena r e c o r d a r . . . apenas fica na História, como aviso às
futuras gerações sobre os resultados sempre funestos de uma
Revolução ! . . .
Mas, deixemos esses fatos deploráveis e falemos sobre um inte-
ressante episódio dessa época revolucionária, que, além de demons-
trar a lealdade e fidelidade ao Governo Legal, provou a sua firmeza
de caráter.
— O Sr. J O A Q U I M G U I L H E R M E DA S I L V A , cidadão concei-
tuadíssimo na Cidade, era, nesse ano de 1894, Tesoureiro da Alfân-
dega de P A R A N A G U Á . O "homem dos dinheiros do País"; por-
tanto, de inteira confiança do Tesouro Nacional.
— Rompe a Revolução Federalista. O Governo se vê às voltas
com o Almirante Custódio José de Melo, no levante da Esquadra
em 1893, no Rio de Janeiro.
— Em a noite de 10 de janeiro, o Tesoureiro, esperando, como
todos, a chegada das forças revolucionárias e temendo um assalto
à Alfândega (Essa Repartição Federal da Fazenda funcionava no
velho Convento dos Jesuítas) vai até lá e retira do "cofre" todo o
dinheiro depositado; deixando apenas algumas "patacas" (moedas
de cobre). Teve porém o cuidado de deixar consignado, no livro
competente, o envio dessa quantia ao Tesouro Nacional, no Rio de
Janeiro.
— Chegando em casa, pega a panela de barro (de fazer bar-
reado) e deposita nela todo o dinheiro retirado do "cofre" da Tesou-
164
raria. Tapa muito bem e enterra num dos canteiros do jardim de
sua residência. E note-se; tudo feito à noite, a fim de evitar sus-
peitas.
— Já então despreocupado, trata de descansar; aguardando os
acontecimentos do dia seguinte.
— Pela manhã, soube da revolta da artilharia local, nessa ma-
drugada. Depois, a repressão pelas forças legais, e por fim, a prisão
de 110 suspeitos; entre eles, 35 declaradamente oposicionistas.
Ficando estes últimos, incomunicáveis.
— Na madrugada de 15 para 16 de janeiro de 1894, os revolu-
cionários tomam P A R A N A G U Á .
— No dia 16, o Sr. J O A Q U I M G U I L H E R M E DA S I L V A recebe
em sua casa a visita do comandante dos Federalistas, pedindo que
o levasse até a Tesouraria, para lhe entregar todo o dinheiro qua
houvesse no "cofre".
— Excusado é dizer que o Tesoureiro, lá chegado, desculpou-se,
dizendo já tê-lo enviado, dias antes, ao Rio de Janeiro.
— Nem por isso sua casa deixou de ser revistada, com era de
se esperar; mas nada foi e n c o n t r a d o . . .
— Passados 3 meses e 7 dias, as Forças do Marechal Floriano
Peixoto retomam a nossa P A R A N A G U Á .
— O Sr. J O A Q U I M G U I L H E R M E recebe outra visita: a do
novo comandante das Forças da Legalidade. Este, pede também
para acompanhá-lo até a Alfândega, a fim de lhe ser entregue todo
o dinheiro que deve estar no "cofre" da Tesouraria.
— O Sr. J O A Q U I M G U I L H E R M E , então, conta primeiro, o
"caso", com todos os seus pormenores, ao comandante e demais ofi-
ciais presentes, que o ouvem admirados da feliz idéia que teve.
Depois, vai com eles ao jardim e, com toda a calma, desenterra a
célebre "panela" (não com barreado), m a s . . . com cédulas e moe-
das de ouro e de prata. Por fim, retira o conteúdo e entrega-o ao
representante d a L e i ! . . .
Este episódio, com seu lado interessante, tem seu ponto de vista
psicológico, mostrando o caráter da criatura cônscia de sua res-
ponsabilidade ! . . . Assim eram os homens do passado, em nossa
terra...

Mais tarde; passada a onda de perseguições; quando a velha


P A R A N A G U Á entrou novamente na sua calma cotidiana, o cidadão:
J O A Q U I M G U I L H E R M E D A S I L V A — contava aos seus amigos,
no tradicional "paredão" da igreja da Ordem, o fato e a idéia feliz
que tivera; gozando, por fim, da "peça que pregara aos Federalis-
tas . . .

165
CONSIDERANDOS:

Recordando os episódios da Revolução Federalista, em P A R A -


N A G U Á , observamos que, entre dois "partidos" que se digladiam
por um Governo na mãos; não cabe a nenhum deles julgar o
adversário. Isso porque, cada um deles tem as suas convicções e
as defende com o mesmo ardor.
A Revolução Federalista, se vitoriosa fosse, veríamos um Go-
verno de vinganças e desforras; um sem número de horrores e de
ódios tremendos contra os v e n c i d o s . . .
Como não venceu; vimos indivíduos (legalistas) que perderam
toda a noção de sentimento humano; verdadeiras feras, sedentas
também de ódio i m p l a c á v e l . . .
E, para que os pósteros jamais esqueçam que, mais de 35 para-
naguaras, por serem simpatizantes à Revolução Federalista, iriam
ser fuzilados (a pedido de alguns paranaguaras legalistas); deixa-
mos, neste simples mas verídico episódio, os nomes dos heróicos ci-
dadãos (os que pudemos achar em nossas pesquisas), como uma
homenagem póstuma àqueles que também tinham um ideal; que
amavam sua Pátria; que também eram bons brasileiros !!!
"Mathias Bohn — Joaquim Soares Rodrigues — Saturnino
Pereira da Costa — Alcides Augusto Pereira — Luiz Vitorino Pi-
canço — José Gonçalves Lobo — Cândido de Oliveira Salgado —
Praxedes Oliveira Salgado — Narciso França — Vergilio França —
Militão Pereira Alves — Nicoiau Mader — Francisco José de Oli-
veira — Felipe Paiva — Ildefonso Luiz Marques — João Luiz Mar-
ques — João Ferreira Arantes — Juvenal Ferreira Arantes — João
Fernandes Donato — José Ferreira de Campos — João Clímaco
Pombo — Benedito Souza Guimarães — Ricardo Costa Junior —
Dr. Generoso Marques — Dr. José Beviláqua — Aquiles Alves dos
Santos — Patrício Thomaz Seguiz — Dr. Evangelista Espíndola —
Manoel Clarício de Oliveira — João Balduino Alves Cordeiro —
Francisco Agostinho de Souza e Melo — José Gonçalves da Silva
Bastos — Vicente Montepoliciano do Nascimento — Manoel Rodri-
gues Vianna — Teófilo Soares Gomes (natural de Antonina e que,
sendo elemento de projeção na política daquela cidade, fora trans-
ferido, pelo Governo, para P A R A N A G U Á , como medida de segu-
rança)".

Ainda se vê na última das palmeiras do jardim "Leocádio Pe-


reira", a que dá para o lado da ladeira "19 de dezembro", a cicatriz
deixada por um bala, a uns 10 metros de altura. Ela é um marco
vivo desse acontecimento que deixou traços indeléveis, tão dolorosos
em muitas famílias de nossa P A R A N A G U Á .
166
É que o "tiroteio" na "barranca", em frente à Cadeia velha,
foi, de fato feio até a tomada f i n a l . . .

No passado, entre dois partidos políticos que se digladiavam,


os chefes apenas não se cumprimentavam; mas, atrás dos basti-
dores, tinham os seus "capangas' de alma embotada e coração im-
pedernido que, sem dó nem piedade, praticavam toda sorte de
barbáries...
Felizmente, tudo isso foi passando. Hoje, o homem já vai
compreendendo que, a verdadeira superioridade consiste em saber
dominar-se e ter um modo firme e correto de pesar os fatos, pri-
meiro; agindo, depois, sem paixões nem interesses pessoais.
Não pode mais haver questões de orgulho e de vinganças entre
i r m ã o s . . . filhos de u'a mesma Pátria ! . . .
Que todas as criaturas compreendam isso.

167
GRÊMIO "BRIZA DA MARINHA"

Foi no ano de 1895. Genuinamente paranaguara era a Socie-


dade de então. Não havendo outros divertimentos que não fossem
os bailes, os saraus e o Teatro; reuniam-se as moças daquela época
(vovós de hoje, se ainda houverem), aos domingos, em casa de uma
determinada família e aí passavam a tarde, dançando e se diver-
tindo com o "jogo de prendas", brinquedo muito comum nos salões
daquele tempo. É claro que os rapazes se faziam presentes.
Eram assim divertidos e alegres os domingos da velha P A R A -
N A G U Á de outrora.
Um dia, numa dessas tardes cálidas de domingo de março, três
senhorinhas, as mais entusiasmadas, resolveram fundar um
" G R Ê M I O " ; uma sociedade dançante constituída.
Nesse fim de século, a mulher já podia ter um pouquinho mais
de liberdade, embora controlada pelos pais e irmãos mais velhos
(A evolução dos povos é um f a t o ) .
Excusado é dizer que a idéia foi aceita com grande satisfação.
Ouviram-se várias opiniões. Por fim, marcaram outro domingo
para tratar das bases da novel agremiação; seus Estatutos; nome
do Grêmio; Diretoria e baile inaugural.
Veio esse domingo e, com ele, o entusiasmo das "baileiras"
inquietas e palradoras. Reunidas novamente em casa da Sra. Her-
mínia Ferreira dos Santos, esposa do Sr. Theodorico Júlio dos San-
tos (mais tarde Prefeito Municipal), assentaram as bases da agre-
miação e, por escolha da referida Senhora, chamar-se-ia "SOCIE-
DADE D A N Ç A N T E B R I Z A DA M A R I N H A " !
Sua primeira Diretoria, por aclamação, foi a seguinte:
Presidente — A D É L I A D A R I A ALVES DA S I L V A
Vice — A S T R O G I L D A S A N T A N A
Secretária — M A R I A M A G D A L E N A DE SOUZA
Tesoureira — Z U L M I R A DA S I L V A
Oradora — A G R I P I N A NEVES.

Eleita a sua primeira Diretoria, tratou-se de marcar o dia para


a sua posse, bem como o baile inaugural. Foi marcado para a
noite de 24 de março, que ficou sendo a data de sua fundação.
Com que ansiedade esperaram, suas fundadoras e dirigentes,
pelo "baile inaugural" !. .. Sonhavam até com as valsas brilhantes
168
que, nos salões de antigamente, eram dançadas em compasso ligei-
ro, cujos pares, em rodopíos vertiginosos; sentiam a volúpia de
valsar...
Chegou o dia tão esperado. À tardinha, já estavam as nossas
vovós numa azáfama constante, a lidar com seus vestidos azuis
cheios de laços de fitas, de pufes e r e n d õ e s . . .
A posse e o baile, seriam nos salões do Club Litterario.
As dirigentes haviam escolhido, como distintivo do Grêmio, a
côr azul-claro; o emblema — uma âncora bordada a ouro num
laço de fita azul e branca — e colocada sobre o ombro esquerdo,
completava o traje a z u l . . .
Às 8 horas da noite, estavam todas em casa da Presidente; es-
perando os rapazes que viriam com a Banda Musical da "Sociedade
dos Empregados do Comércio", a fim de levá-las ao Club.
Às oito e meia, saiu a passeata. Na frente vinha a Diretoria,
trazendo um rico estandarte azul e branco, todo bordado a ouro.
A seguir, as demais sócias, ladeadas pelos guapos rapazes que, or-
gulhosos de sua missão, acendiam "fogos de bangala", numa ale-
gria e entusiasmo sem par. Fechava o conjunto, a Banda Musical,
que era composta de elementos da Sociedade; abrilhantando assim
os festejos do Grênio, numa cooperação espontânea. Fazia gosto
ver a distinção das moças e o garbo dos rapazes, a percorrer as
ruas da Cidade, em direção ao Club Litterario. (Era a primeira
Sociedade feminina que nascia em nossa terra !)
Lá chegados, já se achava a postos a "Banda Musical Operá-
ria", do maestro João Raposo, pronta para dar início aos festejos,
com a peça musical "Briza da Marinha", valsa composta especial-
mente para o Grêmio, por D. Hermínia Ferreira dos Santos.
Nove horas — Sessão magna e posse da primeira Diretoria.
Dez horas — início do baile, com uma "quadrilha" marcada em
francês. Seguiram-se as demais danças, prolongadas até às 3 da
madrugada.
Estava firmado o Grêmio; restando que suas diretoras levassem
à frente, a fim de prolongar a sua existência.

Uma das festas que se revestiu de brilho foi a do 2.° aniversário


e que se realizou no sobrado n. 1 do largo da Matriz (junto à casa
de Monsenhor Celso); residência do Sr. Afonso de Camargo Pen-
teado (gentilmente cedido pela distinta f a m í l i a ) .

Sua Diretoria empossada foi a seguinte:


Presidente — M A R I A T E R E Z A SOARES
Vice — I S A U R A S A N T A N A
a
l . Secretária — A D E L I A D A R I A A L V E S DA S I L V A
2.» Secretária — F R A N C I S C A M A I A
169
Tesoureira — N Í S S I A P I N T O
Oradora — D É L F I C A R I B E I R O
Procuradora — I S A U R A SOUZA.

Seu 3.° aniversário foi comemorado nos salões do Club Litte-


rario com o mesmo brilho dos anos anteriores.
À meia noite, como era de praxe, correu o "chá" com as fatias
de pão-de-ló, no s a l ã o . . . que bons tempos. .. Eram assim as festas
de outrora.
Em 1899, reuniram-se as componentes da "Briza da Marinha",
em sessão extraordinária, a fim de mandar imprimir seus Estatutos.
Avaliem vocês; "Estatutos" de um "Grêmio feminino", como
se fosse uma dessas sociedades com personalidade j u r í d i c a ! . . .
Ainda existe um "exemplar" (por nós guardado); hoje, no
Instituto Histórico da Cidade; servindo de documento comprovante.

Suas diretoras, nesse ano, foram:

Presidente — T E R E Z A P E R E I R A
Vice — M A R I A I G N E Z MARQUES
a
l . Secretária — E R N E S T I N A B I T T E N C O U R T
a
2 Secretária — M A R I A DAS NEVES P E R E I R A
Tesoureira — A L A T Í D I A M O R A I S M O R E I R A
Oradora — I S A U R A SOUZA
(Sem procuradora na ocasião).

De acordo com os Estatutos, o Grêmio devia proporcionar, às


associadas, uma partida dançante mensal; realizada em casa de
uma das sócias porque não havia sede própria. Os aniversários,
porém, seriam comemorados na sede do Club Litterario.
Os festejos do 6.° aniversário (24 de março de 1901), foram
magníficos; programa muito bem elaborado.

Sua Diretoria estava assim constituída:


Presidente — H O R M E Z I N D A C O S T A
Vice —- M A T H I L D E DE ARAÚJO V I A N N A
a
l . Secretária — A L A T Í D I A M O R A I S M O R E I R A
a
2 Secretária — L E O P O L D I N A X I S T O
a
I Tesoureira — A L B E R T I N A SOARES R O D R I G U E S
Oradora — M A R I A C A N D I D A V I D A L .

O 7.° aniversário dessa simpática agremiação não foi come-


morado no dia 24 de março, devido uma epidemia que grassou na
Cidade. Realizou-se no dia 3 de maio.
170
As diretoras mandaram imprimir uns "carnets" muito mimo-
sos, onde constavam as "peças" que iriam ser executadas durante
o baile.
Distribuídos entre as associadas, trataram elas de tomar nota
dos nomes dos "admiradores e prediletos" com quem teriam de dan-
çar (Era de bom tom ter-se um carnet" num baile de partida).
Após a sessão magna, rompeu, como "ouverture", a fantasia
do imortal V E R D I — "O T R O V A D O R " —. A seguir, como sempre,
a "quadrilha" marcada em francês e depois, as contradanças. Foi
uma das última festas do Grêmio, nesse ano de 1902, cujas dire-
toras eram:

Presidente — O T Á V I A SIMAS
Vice — M A T H I L D E DE ARAÚJO V I A N N A
a
l . Secretária — A D E L I N A CORRÊA (professora)
a
2 Secretária — M A R I A JOAQUINA M O R E I R A
Tesoureira — A L C Í D I A M E L O
Oradora — I S A U R A S Y D N E Y .

E assim viveu mais três anos esse inesquecível Grêmio, propor-


cionando sempre ótimas partidas; noitadas felizes às suas compo-
nentes. Lindos bailes com as soberbas quadrilhas, saltitantes
polkas, elegantes schottiscks, interessantes mazurcas e habanêras
e lindas valsas ligeiras que eram a sensação dos "mancebos" ele-
gantes e "donzelas" tentadoras...
Depois de uma década de existência, desapareceu do cenário
social de nossa P A R A N A G U Á , a "Sociedade Dançante Briza da
Marinha"...

171
CLUBE OPERÁRIO RECREATIVO E BENEFICENTE

Pouco se sabe desse antigo e desaparecido Clube, fundado aos


9 de janeiro de 1897.
Alcançamos ainda por vários anos, no sobrado n. 93 da rua
Direita. Prédio alugado; hoje em ruínas.
Era um Clube modesto, porém, com muita disciplina e sobre
tudo muita moral; merecendo todo o respeito da Sociedade para-
naguará.
Nos bailes de Carnaval e de Aleluia, ao terminar os festejos no
Litterario e no Republicano, a rapaziada ia terminar a noitada no
velho Clube Operário; mas, debaixo daquela "disciplina se'etense" !
E ai daquele que não andasse direito !. ..
Antigamente, nos bailes de "partida", havia o "mestre-sala", a
quem competia a responsabilidade do salão de danças — pequenas
irregularidades, como, "pares efetivos" (não dançar mais de duas
peças com a mesma d a m a ) , pares muito colados, atender a
"Banda" ou "Orquestra" e marcar a "Quadrilha". (Isso em qual-
quer Clube recreativo).
E, por falar em "Quadrilha", lembramo-nos de um interessante
fato ocorrido num baile do Clube Operário: o mestre-sala — seu
João de tal — (esquecemos o seu sobrenome), na marcação de uma
"Quadrilha", ao pedir repetição, disse com ênfase: "o trefoí"
(pronunciado como está escrito) no seu "francês arrevesado"...
Resultado: dessa data em diante ninguém mais o conhecia senão
pelo apelido de Seu João Trefoí" (coisas de nossa P A R A N A G U Á ) . . .
Os dados que pudemos colher, na pesquisa, vão aqui registra-
dos:
"O Clube Operário Recreativo e Beneficente, é uma Sociedade
Recreativa e Beneficente; possuindo uma "Caixa" com a finalidade
de angariar fundos, através de seus associados; concorrendo cada
um, além da mensalidade de Rs 1$000, com mais Rs 1$000 (um mil
réis) para a "Caixa". A família do sócio falecido receberá uma
determinada quantia para os seus funerais. O sócio enfermo terá
também direito a uma diária de Rs 2$000 (dois mil réis), desde que
prove, com atestado médico, o seu estado de saúde".
— Inegavelmente, a finalidade era filantrópica.
172
Sua primeira Diretoria (se não nos enganamos) foi a seguinte:
Presidente — ULYSSES J O A Q U I M C H I C H O R R O
Secretário — T E M I S T H O C L E S B A R T H O L O M E U
Tesoureiro — G A L D I N O F. G L Ü C K
Orador — JULIO T H E O D O R I C O G U I M A R Ã E S .

Com o passar dos anos, a Sociedade foi se firmando cada vez


mais. A t é que, um dia, na recusa da Diretoria, para a entrada de
um novo sócio aqui chegado de pouco (Sr. João Salvador dos Santos
— novo Secretário da Inspetoria de Saúde dos Portos — homem ae
muita cultura), única e exclusivamente por ser ele de côr; um
grupo de ótimos sócios, desgostoso com esse gesto de racismo tolo,
afastou-se da Sociedade, pedindo demissão. E, para demonstrar
sua repulsa contra o modo de pensar da então Diretoria, fundou
uma nova Sociedade, por nome " C L U B E D E M O C R A T A " , que ainda
existe sendo também uma Sociedade Recreativa e bem organizada.
Com essa dissidência, o Clube Operário enfraqueceu de tal
modo que, dentro de pouco tempo desapareceu do cenário social da
Cidade.
Não tendo sede própria, foi o f i m . .. E tudo causado por uma
Diretoria pouco esclarecida...

173
O "JOGO DAS FLORES" EM PARANAGUÁ

Em nossa P A R A N A G U Á , quanto à sua História, existem fatos


tão interessantes e cheios de um humorismo tal, que é impossível
deixarmos passar despercebidos, a ponto de cair no rol das coisas
esquecidas.
Torna-se agradável recordar certos incidentes, tão gozados
quanto jocosos; ligando Sociedades com pessoas locais e estranhas
ao torrão natal.
A vida do nosso Club Litterario, por exemplo, está intimamente
ligada à História de nossa quatrocentona terra e o fato que vamos
contar teve por cenário esta velha Sociedade de tão caras tradições.
Apareceu em P A R A N A G U Á , não se sabe de onde, um tal senhor
" F I L ó " ; homem bem apresentável e de pouca instrução, porém
muito vivo, inteligente, maneiroso e sobretudo perspicaz.
Aqui se radicou e por algum tempo permaneceu entre n ó s . . .
O "jogo do bicho", instituído na última década do século passado,
no Rio de Janeiro, pelo Barão de Drummond, tinha a finalidade de
conseguir recursos para manter o Jardim Zoológico.
Muito logo se espalhou por todos os Estados do Brasil; entra-
nhando-se na alma dos brasileiros, como o futebol, e não mais saiu.
Em P A R A N A G U Á , esse " j o g o " também se infiltrou em todas as
camadas sociais, mas, de forma bem diferente; em vez de "bichos",
eram "flores".
Pois bem. Esse tal de "seu F I L ó " , baixando em nossa terra
e daqui gostando, resolveu criar o "JOGO DAS F L O R E S " local,
cuja extração diária seria feita, não pela Loteria Federal, e sim
por meio de um sorteio todo especial por ele criado.
Não sabemos se esse "JOGO D A S F L O R E S " existiu em alguma
outra cidade do Brasil. Aqui, ele foi um fato verídico e por sinal
muito apreciado e divertido.
Era assim: O nome da "flor", a juizo do banqueiro, era escrito
em uma pequena lousa dupla ( a n t i g a ) . Em uma face, a flor; na
outra face, o número correspondente a ela. Fechada a lousa e co-
locada dentro de uma caixa de madeira, hermeticamente fechada à
chave, era lacrada e sobre o lacre um sinete especial. Isso tudo,
feito pela manhã e com o maior cuidado. Depois a caixa ficava
suspensa na sacada de um prédio com frente para a rua hoje Faria
Sobrinho, até às 6 horas da tarde; quando então se procedia ao
174
arriamento da mesma e sua abertura. Parte esta, feita na presen-
ça dos interessados e curiosos.
E sabem os leitores onde era feita essa operação ? Numa das
salas do Club Litterario.
A aberutra da "caixa" era feita por seu F1LÓ, concessionário
do "jogo", com a permissão do Presidente do Club que consentiu
fossem as extrações efetuadas na sede social numa das salas; com
algumas vantagens oferecidas ao Litterario (a exemplo do "barato"
do jogo, dos nossos dias, nos clubes, para a sobrevivência dos
mesmos).
Seu F I L ó havia também alugado uma porta dos baixos do
Club, para montar a sua banca e fazer o seu joguinho inocente.
Sim, porque, da forma com que a "caixa" estava preparada, impos-
sível se tornava uma qualquer trapaça.
Afora isso, ele espalhava pela Cidade "palpites" charadísticos
em forma de quadrinhas; emprestando a cada um deles, certo
cunho de hilaridade, a fim de atrair jogadores, os quais, passavam
horas entretendo-se com os tais "palpites".
Como é natural em todo o jogo, poucos acertavam. E quando
isso acontecia, a notícia corria célere pelos quatro cantos da Ci-
dade. Os afortunados então se viam em "palpos de aranha" para
dar explicações sobre os truques usados...
Assim iam correndo os dias nesse divertimento que, embora
meio inocente, movimentando toda a população, ia também enchen-
do os bolsos do sabido F I L ó . Pois o " Z é povo", apesar de perder
quase sempre, não deixava de jogar; esvaziando aos poucos, do seu
pé de meia, os magros "tostões" juntados com tanto sacrifício.
Perdia, mas se divertia. Era o fascínio pelo jogo (como sempre f o i ) .
Custava cada bilhete a quantia de Rs 1$000 (um mil réis) e
recebia-se de prêmio Rs 20$000 (vinte mil réis), hoje, Cr$0,02 !
Além das charadàs-palpites dadas ao povo, desde pela manhã,
pelo espertalhão F I L Ó , atirava ele, ainda, palpites mais claros e,
por vezes, chegava a declarar o nome da flor e o número escrito na
lousa; mas tudo em forma de "quadrinhas".
Esse estratagema trazia verdadeiro embaraço aos interessados,
os quais, não podiam acreditar estivesse o "banqueiro" fornecendo
armas contra si próprio.
E o jogo se tornara tão interessante que até na alta camada
social penetrou valendo.
Certa vez, uma distinta dama que se achava à sacada de sua
residência, ao ver passar o matreiro F I L ó a cavalo, pediu-lhe um
"palpite" para aquele dia. O velho lambareiro, como sempre, res-
pondeu: "A SENHORA O T E M EM B A I X O DE V Ó S " ! Ela rubori-
zou-se e saiu da sacada. Contudo, curiosa como todas as mulheres,
tratou de verificar o que poderia estar "em baixo de si" e que
coincidisse com o nome de uma flor. Nada. Por mais que desse
tratos à cuca; fizesse deduções; não chegava a uma conclusão. Can-
175
sada de raciocinar, jogou a esmo alguns mil réis numa flor qualquer,
esperando ter sorte.
À noite, quando a "caixa" foi aberta, pôde ela constatar que o
palpite tinha sido ótimo; pois o número sorteado coincidia exata-
mente com o de sua casa, cuja placa numérica da porta da rua fi-
cava bem "em baixo" da sacada em que ela se achava pela manhã
Embora desapontada por não ter raciocinado melhor, achou graça
no tal palpite; mas, continuou jogando, e com prazer.
Eram essas surpresas que faziam com que o povo e os granfinos
jogassem diariamente.
Creiam os leitores, que esse "jogo das flores" era um verda-
deiro divertimento para P A R A N A G U Á e, ao mesmo tempo, uma
higiene mental para aqueles que trabalhavam de sol a sol ou em
seus escritórios.
De outra feita, uma senhora lendo uma das "quadrinhas-palpi-
tes", observou que o assunto era sobre Roma e que no final do últi-
mo verso falava de uma velha que calçara as chinelas invertidas.
Ela então raciocinou: calçar as chinelas invertidas, é trocá-las do
pé direito para o esquerdo. Que também Roma invertida, isto é,
da direita para a esquerda, ficava Amor ! Confiante no seu racio-
cínio, contou às amigas vizinhas o caso e jogou no "amor-perfeito".
À noite, o resultado: "Amor perfeito" ! Ganhou ela Rs 40$000 e,
as vizinhas também ! . . .
Assim era o "jogo das flores" em P A R A N A G U Á ; uns ganhando
e outros perdendo. Só o vivaldino F I L Ó é que nunca perdia; en-
chendo os bolsos, continuava a dar palpites com piadas pesadas que,
as mais das vezes, causavam sérios aborrecimentos às damas vicia-
das nesse "joguinho i n o c e n t e " . . .
Mas, um dia, e foi o mais célebre da "temporada florista", che-
gou o fim. O fim de tudo quanto é bom ou m a u . . .
Existia uma Mercearia localizada num outro pavimento térreo
do Club Litterario, pegado à porta da Banca do seu F I L Ó , cuja
divisão era de madeira.
O dono da Mercearia tinha um caixeiro de confiança por nome
— A N T O N I O H O R Á C I O DA S I L V A — que costumava abrir o ne-
gócio pela manhã e fechá-lo à tarde, às 6 horas. Esse rapaz, filho
da terra, cansado de tanto perder, vivia pensando como havia de
arranjar um meio de ganhar na certa e acabou tendo uma idéia
genial. Daria uma "lavagem" no banqueiro.
Arquitetou o plano e tratou de pô-lo em prática. Antes, porém,
procurou observar bem o lugar onde ficava a mesa e a cadeira do
seu F I L Ó , quando o mesmo ia escrever na lousa o nome da flor e o
respectivo número. A tarde (6 horas), fechou a Mercearia e, como
não havia jogado, mandou-se.
Tarde da noite, enquanto apopulação da Cidade dormia tran-
qüilamente; naqueles bons tempos de pacatez e confiança no pró-
ximo, o nosso herói H O R Á C I O sai de casa e vem até à Mercearia,
abre a porta, entra e tranca-se por dentro. Acende a vela que leva-
176
ra e põe mãos à obra. Vai aos fundos do Armazém e, oom uma púa
que também levara, faz um "furo" na parede de madeira que se-
para o compartimento do seu F I L ó e por esse orifício pôde ver per-
feitamente a mesa do banqueiro na qaul costumava trabalhar,
todas as manhãs. Não esqueceu de levar alguns pães para comer
com a sardinha que tirara da prateleira; pois sabia que tinha de
passar a noite a l i . . .
Verdadeiro sacrifício, dormir no chão. Mas valia a pena, por-
que a compensação seria grande. Então, antegozando o êxito que
iria obter; o pensamento no que faria com tanto dinheiro, esque-
ceu-se das horas e o tempo escoou-se.
Amanhece o dia. A N T O N I O H O R Á C I O , que quase não dor-
mira, desperta e espera com ansiedade o momento tão desejado.
Seis horas da manhã! O relógio da velha Matriz dá as suas
6 badaladas. É dia claro. Daí a 5 minutos, abrem a porta da
Banca, fecham-na por dentro. Ouvem-se os passos dos sapatos de
sola grossa, bem nítidos aos fundos do compartimento. É o velho
F I L ó que acaba de chegar para o trabalho de todas as m a n h ã s . . .
O coração do A N T O N I O H O R Á C I O bate forte; a comoção é
grande. Irá ganhar uma f o r t u n a . . . Mas é preciso ter calma, e ele
a tem de s o b r a . . . Com o peito arfando, vai até ao lugar e vê, pelo
orifício que havia feito na madeira, seu F I L Ó já sentado, pegar a
lousa, abrí-la e escrever na mesma o nome da flor e o número cor-
respondente. Vê depois, ela sendo colocada na "caixa", chaveada
e lacrada com o competente sinete. Depois, vê-o sair e trancar a
porta. Nesse momento H O R Á C I O sabe que seu F I L Ó foi até à
porta do Club, para entrar e colocar, na sacada da janela a ben-
dita caixa". Ele então sai do esconderijo e vai escutar, junto à
porta da Mercearia, a descida na escada rangedora e o bater da
porta ao ser trancada. Ouve ainda os passos a se sumirem e por
fim o silêncio.
Mais 2 minutos e H O R Á C I O abre a porta do Armazém, sai e
tranca-o, seguindo para o Mercado, a fim de tomar o bom cafezinho
com as gostosas bananas encapadas. Nunca em sua vida ele tomou
um café com tanto prazer. É que está com a alma alvoroçada e
feliz, pelo ótimo resultado de seu plano inteligentemente arqui-
tetado. . .
Às 8 horas foi para o trabalho e, mais tarde entrou na Banca
do seu F I L ó e atochou no H E L I O T R Ó P I O n. 7, gastando no jogo
todas as economias que tinha. Seu F I L Ó estranhou; pois sabia que
H O R Á C I O era pobre e não podia jogar assim. Ficou desconfiado,
mas nada disse.
Entretanto, o nosso herói ao sair para o almoço, não se con-
tendo (e aí foi o seu m a l ) , contou, sigilosamente, o caso a alguns
amigos íntimos para que também ganhassem, pedindo porém todo
o segredo. Estes, forçosamente, contaram em suas casas. Resul-
tado: já podemos d e d u z i r . . .
177
Ao cair da tarde, foi uma verdadeira "corrida" dos jogadores
em procura do banqueiro, para comprar bilhetes do H E L I O T R Ó P I O .
"Seu F I L ó , entretanto, não deu a mínima demonstração de
inquietude. Mostrou-se calmo até às 5 horas, quando fechou a
Banca, indo jantar.
Em quase todos os lares essa refeição foi alegre como nunca.
Só falavam na "lavagem" que ia ser dada ao espertalhão banqueiro.
Havia chegado, diziam todos, o dia da "caça". Era o melhor "prato"
do ano ! . . .
Seis horas ! badalou o velho relógio da Matriz. O povo apinha-
va-se na rua do Club (Antigo prédio da rua Faria Sobrinho); que-
ria ver "Seu F I L Ó " de tanga; pois a essa hora não havia parana-
guara que ignorasse o jocoso caso. Todos queriam rir a custa do
velho banqueiro...
Na escadaria e no próprio salão do Club era grande o aglome-
rado de gente. Eterna maldade humana ! . . .
Seis e cinco minutos. Chega "Seu F I L Ó " , bem calmo; sobe
as escadas e encaminha-se para o salão onde se acha suspensa a
encantada "caixa". Firme e sem vacilar, segura a corda e, vaga-
rosamente, a "caixa" vai descendo, descendo... Ans^dade ge-
r a l ! . . . Silêncio absoluto ! . . . A "caixa" é colocada sobre a mesa.
O banqueiro, então, com toda a fleuma, quebra o lacre, abre vaga-
rosamente a "caixa", retira a lousa e desdobra-a... mas, oh de-
cepção ! . . . Desaponto g e r a l ! . . . O nome da flor e o número eram
outros. .. bem diferentes do que vira o A N T O N I O H O R Á C I O . . .
Ouviu-se um sussurro de r e v o l t a . . . Todos os olhares foram
para o pobre H O R Á C I O e seu F I L Ó . Quiseram protestar; porém,
com que provas ? . . . A não ser que o plano fosse denunciado... e
seria uma fraude ! . . .
Assim sendo, nada puderam fazer, a não ser, calar e a c e i t a r . . .
O caso é que o malandro seu F I L Ó , raposa matreira, ficou com
os bolsos "recheados" e, nessa mesma noite, sumiu; com medo a
uma r e v a n c h e . . . Desapareceu como havia chegado. Ninguém viu.
Contudo, ele sumiu ! . . .

Era uma vez, um divertido ano de 1897; um inocente "jogo das


flores" e um espertalhão " F I L Ó " em nossa P A R A N A G U Á ! ! ! . . .

CONSIDERANDOS:

Nunca soubemos se foi real a "história" contada pelo A N T O N I O


H O R Á C I O , porque, ninguém o viu entrar e nem sair do Armazém
alta madrugada. Se esteve espiando, talvez se enganasse quanto à
flor e ao número; pois o orifício feito com uma "púa" devia ser
178
pequeno; portanto, difícil de ser lido ao longe e ainda mais, à luz
de uma v e l a . . .
É possível também que seu F I L Ó , vivo como era, tivesse obser-
vado, por acaso, o "furo" na parede e qualquer ruído no Armazém.
Escreveu então o nome H E L I O T R Ó P I O n. 7 e saiu da mesa para
que, se alguém estivesse espiando pelo orifício, visse bem o nome
e o número na lousa. Depois, voltou e mudou t u d o . . .
Qualquer das hopóteses é aceita (ou qualquer o u t r a ) .
Assim sendo, o leitor que julgue.
Entretanto, se o A N T O N I O H O R Á C I O falou a verdade, o "tru-
que" do seu F I L ó ficou sendo uma "incógnita" difícil de resolver,
ou sem nenhuma solução . . .
E esse interessante "fato" ficou na História de nossa P A R A N A -
GUÁ !

179
A "PONTE" NA ILHA DOS VALADARES

Em anos que já vão longe (seguramente em 1898), um simpló-


rio barbeiro, por nome — M A N O E L C Â N D I D O F E R N A N D E S —
com quase nenhuma instrução, arvorou-se em "escritor" e "poeta";
escrevendo um punhado de contos absurdos e de maus versos, nos
quais falava sobre as belezas da Ilha dos Valadares.
Sugeria ele a "construção de uma "ponte"; a aqual durante
a noite, os namorados pudessem atravessá-la, trocando juras de
amor.
E o mais interessante é que, M A N O E L C Â N D I D O não era um
tipo vulgar de rua. Tinha uma certa educação e trajava-se bem;
com um dinheirinho guardado. Contudo, tornou-se popular, de-
vido a mania da "ponte" que ligasse P A R A N A G U Á ao Valadares.
E com essa idéia fixa, resolveu reunir todos os seus trabalhos
(contos e versos) e mandou imprimi-los, publicando assim um
"livro". (Talvez por insistência de algum maldoso).
O caso é que, um mês depois, saia o seu livro com o título
estapafúrdio: " A N T E S T A R D E DO QUE N U N C A " !
Distribuiu-os depois aos amigos e admiradores (como julgava
tê-los) sem saber que estava caindo no ridículo.
;

Até o poeta L E Ô N C I O C O R R E I A , que na época redigia um


"Jornal" em Curitiba, recebeu um exemplar das gozadas e mal fei-
tas produções e, dando uma notícia no Jornal, dizia que lastimava
não ser o título às avessas. Que, ao em vez de " A N T E S T A R D E DO
QUE N U N C A " , deveria ser: " A N T E S N U N C A DO QUE T A R D E " ! . ..
Pela crítica de L E Ô N C I O C O R R E I A os leitores poderão avaliar
o que foi esse montão de asneiras reunidas.
A Cidade toda riu e ridicularizou cruelmente o coitado do sim-
plório homem que, aos poucos, começou a compreender a amarga
realidade.
Com o cérebro em desalinho, como já andava, logo depois
adoeceu; vindo a falecer repentinamente.

Na época, a idéia de uma "ponte" ao Valadares, era uma utopia.


Hoje, passados 78 anos, não mais se pode duvidar. A Ilha atual-
mente, já tem "água encanada" e também "luz elétrica'. E por que
não uma "ponte" ? Tudo é possível.

180
Para os lados do Cidrão, fundos da Sede Campestre do Club
Litterario, a largura do rio é de mais ou menos 20 metros e, nas
marés baixas, passa-se a pé, com água pelos joelhos.
De qualquer forma, a "semente" foi lançada pelo inditoso Ma-
noel Cândido. Ela pode ainda germinar; dadas as circunstâncias
de se incrementar o turismo em nossa terra.
Quanto ao "livro, o autor devia estar em começo de desequilí-
brio mental. Alguém, lendo as suas "produções", maldosamente
incentivou-o a publciá-las, para depois poder gozar com o ridculo
do pobre homem.
Os "contos" são excêntricos. Num deles o autor fala sobre
uma jovem morta que, levada ao Cemitério, antes de ser sepultada,
acorda-se ,senta-se no caixão e despede-se de suas a m i g a s . . . (Salvo
se a jovem estava em estado de catalepsia e acordou no Cemitério).
Conto absurdo.
Quanto aos "versos" sobre a "ponte", pudemos coletar alguns.
Eles são de "pé quebrado", mas têm sentido.

T O M A R A QUE HOJE N Ã O CHOVA


E AMANHÃ FACA LUAR.
E U QUERO D A R U M P A S S E I O
P R A S BANDAS D O V A L A D A R ,

QUEM DERA QUE U M A PONTE,


QUE NO F U T U R O SE VÊ,
ME; DESSE E AO MEU B E M P A S S A G E M ,
SOBRE O R I O I T I B E R Ê .

P O R ESSA P O N T E EU E ELA,
N U M A N O I T E DE L U A R ,
F A R Í A M O S U M PASSEIO
NA ILHA DO VALADAR.

Não são trovas perfeitas; apenas quadrinhas, que revelam ser


o barbeiro um homem inteligente, mas sem instrução.
Na sua humildade e simplicidade, fez o que pôde. Melhor faria,
se tivesse encontrado alguém que lhe ensinasse a maneira certa de
fazer as suas poesias.
Entretanto, isso não aconteceu. Unicamente o prazer de zom-
bar, de espezinhar... A eterna maldade h u m a n a . . .
Quanto a "ponte", ele s o n h o u . . . e foi um sonho lindo, pas-
seando com o seu "bem" numa noite de luar ! . . .
E, se esse "sonho", algum dia, vier a se tornar realidade, por
certo chamar-se-á " P O N T E M A N O E L C Â N D I D O F E R N A N D E S " .
Será uma homenagem que se prestará a esse humilde sonha-
dor, que, um dia, procurou cantar a sua terra. . .
181
A PRAÇA "FERNANDO AMARO"

Quern hoje passeia pela elegante e moderna praça "Fernando


Amaro", jamais poderá imaginar o que foi aquele logradouro
público.
Em tempos que vão longe, essa praça não passava de um largo,
sem calçamento. Apenas um areai, onde se armavam os "circos"
que, constantemente vinham a P A R A N A G U Á .
Essas companhias circenses traziam sempre um grupo de tra-
pezistas e malabaristas extraordinários, com mulheres muito boni-
tas, vestidas com suas roupas de malhas bem justas, como sempre
fizeram; deixando a rapaziada da época bem assanhada ao ponto
de mandar flores às artistas.
E isso era muito natural, porque um rapaz naqueles tempos
para falar com u'a moça na rua, tornava-se difícil, porquanto, elas
saiam sempre acompanhadas. Daí, apenas os cumprimentos com
olhares ternos; nada m a i s . . . Essa a razão dos bailes para os ne-
cessários encontros "tête a tête" e, assim mesmo, com discreção ! . . .
Logo, ao chegar um "circo" à Cidade, com as bonitas trape-
zistas liberais dando-lhes "tréla", era a conta; mandavam eles,
como retribuição flores e mais flores ! . . .
Mas continuemos. A quadra da rua das Mortes (hoje, Faria
Sobrinho) ficava de frente para o lado direito da praça e era for-
mada de casas bem modestas, todas de beirai.
A quadra onde hoje se acha instalado o elegante prédio do
Club Litterario, pertencia ao Sr. Caetano Henrique Gomes, o qual
havia construído um casarão (4 paredes e telhado) destinado a ser
o futuro "Teatro São Caetano". Desistindo da idéia, cedeu, nos
primeiros tempos, à "Empresa de Bondes", para servir de caserna.
Depois, aos clubes carnavalescos. Por fim, doou esse terreno e o
imóvel à Irmandade de Santa Casa de Misericórdia (em 1895).
A Irmandade, precisando de dinheiro, vendeu o prédio inaca-
bado ao construtor Sr. João Batista Freceiro.
Meses depois, a Diretoria do Club Litterario entrou em enten-
dimentos com o novo proprietário, Sr. Freceiro; comprou-lhe o
terreno e o imóvel; terminou a obra inacabada, adaptando-a às ne-
cessidades da Sociedade. Ficava ele de frente para o Largo Cônego
Alcedino. A entrada, porém, na rua Faria Sobrinho, como ainda
hoje é. Mais tarde, nos fundos, foi feito um alpendre bem largo,

182
tipo de um bar, para que os sócios pudessem deliciar-se com refri-
gerantes nas cálidas tardes e noites de verão. O resto do terreno
fronteiro à praça, foi aproveitado para um bonito jardim com ban-
cos e muitas palmeiras. Era murado, com grades de ferro e um
bem acabado portão também de ferro, com frente para a praça.
Esse jardim aos domingos era procurado pela mocidade para encon-
tros e divertimentos da época.
Do outro lado, em frente à praça, a bela residência do Sr.
Alfredo Engênio de Souza, com um jardim ao lado e uma pequena
"torre' à guisa de minarête.
Ao lado esquerdo, o final da rua da Misericórdia (hoje, Dr.
Leocádio).
É então quando começa a história de nossa pracinha.
Estávamos no ano de 1903; época em que foi instalada a "luz
elétrica" na cidade.
A Prefeitura Municipal, diante de um fato tão importante, re-
solveu por bem mandar ajardinar a praça, que depois levou o nome
de "Praça Fernando Amaro". Esse trabalho ficou a cargo do Sr,
Randclfo Veiga (chefe dos fiscais); um hábil artista em decoração.
Seu Randolfo, como o conheciam, dirigiu todo o trabalho de
terraplenagem e de ajardinamento preparação dos canteiros (com
flores ! ) , bem como a construção de um "coreto" de madeira, sim-
ples e sem cobertura, mas muito bonitinho, com um poste e uma
lâmpada, no meio.
Ficou florida a praça; uma tetéia. Esse trabalho levou 4 anos.
Foi inaugurada em 1907, pelo 50.° aniversário de falecimento do
primeiro vate paranaguara — F E R N A N D O A M A R O DE M I R A N D A
— na mais justa das homenagens, a quem levou a curta existência
cantando sua terra.

Com esse melhoramento, a Cidade tomou uma feição melhor;


dando boa impressão para quem vinha de Curitiba, cuja Estação
estava localizada onde hoje se acha o velho prédio para cargas e
bagagens da Estrada de Ferro.
A nossa Cidade, nessa época, tinha poucos recursos; mas há
muito que possuía uma Sociedade requintada, composta de homens
esclarecidos, de cultura e de educação. E foi devido a esses inte-
lectuais de outrora, formando essa "Sociedade civilizada" e culta,
cheia de tantos preconceitos sociais, que P A R A N A G U Á recebeu a
alcunha de "berço da civilização paranaense". Título bem mere-
cido, porque foi realmente aqui que a vida social, política e cultu-
ral do P A R A N Á teve o seu início; subindo depois para Curitiba e
se ramificando por todos os recantos da terra das araucárias.
Hoje, passados tantos anos, vemos nossa querida "praça" trans-
formada em um belo j a r d i m . . . g r a m a d o . . . muito aprazível
mesmo, porém. .. sem flores !. ..
183
Assim é ela nos nossos dias; apenas com as velhas árvores
amigas que nos dão sombra.
E o paranaguára, crítico e humorista como sempre, olhando
aos milhares de pedrinhas (petit pavê) que calçam os seus passeios
e canteiros, já arranjou um apelido bem adequado para a "praça
sem flores": " S E L V A DE P E D R A S " ! . . .
Talvez assim seja melhor, pois as crianças de hoje (com exce-
ções) são destruidoras... verdadeiros g a f a n h o t o s . . . e é pena.
Observa-se isso na iluminação das ruas mais afastadas, em que
as lâmpadas são, diariamente quebradas com e s t i l i n g u e . . .
Serão os homens ? . . . Claro que não.
Ainda dias atrás, vimos crianças correndo pelo gramado da
p r a ç a . . . como se estivessem num campo de f u t e b o l . . . e de quem
é a culpa ?
O leitor já compreendeu ! . . .

Assim sendo, temos que nos conformar com as "praças sem


flores", até que os gafanhotos sejam educados ! . . .
Como tudo é mudável na face da Terra; épocas melhores virão
para os paranaguaras, com uma geração mais sadia. Aí então ha-
verá flores em todas as p r a ç a s . . .

184
USOS E COSTUMES DO PASSADO

As festas religiosas, nos dois séculos passados, faziam parte da


vida social, política e econômica de P A R A N A G U Á . Isso porque,
sendo a religião católica oficial e obrigatória nos tempos coloniais,
bem como nos dois Impérios (conforme já dissemos), as associações
religiosas se compunham de pessoas de maior destaque da V I L A .
Ainda não havia o " E S P O R T E " , como complemento da educa-
ção de um povo. Logo, as reuniões dos rapazes eram as "tertúlias",
muito comum naqueles tempos. Eles se reuniam para estudar al-
guma coisa útil, principalmente a literatura e a poesia.
Quanto às moças, eram as "tardes domingueiras" os seus di-
vertimentos. Reunidas em uma casa de família, passavam essa
tarde dançando e fazendo os "jogos de prendas". É claro que,
junto com os rapazes.
Nessas reuniões, então, começavam os namoros; porém, vigia-
dos sempre pelo "olho clínico" da dona da casa e mais algumas
mamães que, quase sempre, estavam presentes. A vigilância era
grande; contudo, quando havia oportunidade, eles l u d i b r i a v a m . . .
e sabiam como fazer!
Não os censuramos; muito pelo contrário; achamos que tais
'casos" eram naturais e necessários (e também humanos ! ) ; já que
esses "pares" não tinham outra oportunidade de se entender e se
conhecer melhor.
Assim sendo, as festas religiosas, como não podia deixar de ser.
eram ansiosamente esperadas pela mocidade do passado; pois nelas
podiam ter um contato mais direto para as uniões futuras...
A " F E S T A DO E S P I R I T O S A N T O " , realizada entre junho e
julho, era a mais esperada, pelo brilho com que se revestia. Du-
rante as novenas, às 6 horas da tarde, saiam as moças (convidadas)
da casa dos noveneiros, levando as "bandeiras do divino" (vermelha
e branca), ladeadas pelos rapazes que não cabiam em si de conten-
tes, rumo à igreja. A banda de música, atrás, ia tocando as suas
marchas e valsas. Os moços acendiam "fogos de bengala" para
iluminar as ruas. Era de fato uma verdadeira festa para aqueles
longínquos tempos. Terminada a novena, voltavam eles, também
em passeata, para a casa dos noveneiros; quando então davam
início ao sarau, que ia até meia-noite, durante os nove dias.

18f>
No domingo da Festa, saia o cortejo da casa do "Festeiro", com
a "Bandeira vermelha" levada por um grupo de moças e rapazes e
ambos se dirigiam à casa da "Festeira", onde já se encontrava
outro grupo de jovens que, com a "Bandeira branca", também saia
a juntar-se aos recém-chegados. Assim, todos juntos em passeata,
dirigiam-se à igreja Matriz para assistir a solene missa cantada,
às 11 horas, com a bênção das Bandeiras.
Terminada a função religiosa, voltavam eles, ainda em passea-
ta, às residências dos "festeiros, quando então era servido o grande
almoço" nas duas residências.
A tarde, 5 horas, realizava-se a tradicional "procissão" e a se-
guir, o Te Deum com a bênção do Santíssimo.
À noite, 8 horas, os esperados "bailes" nas casas dos festeiros,
cujas danças iam até às 3 horas da madrugada. E assim termi-
nava a tradicional " F E S T A DO E S P Í R I T O S A N T O " . . .

Nos encontros dessa grande Festa é que nasciam os romances


de amor das dengosas "donzelas" com os "mancebos" de flor na
lapela.
Os noivados vinham a seguir, culminando com as núpcias ! . . .
Esses costumes chegaram até 1914. Mas, oom o começo da pri-
meira grande guerra mundial (1914 — 1918), essa bela festa reli-
giosa desaparaceu para sempre.

Nas festas de P Á S C O A , porém, já não havia a facilidade desses


encontros, porque, durante a Semana Santa, as moças não saiam
de casa. As funções litúrgicas eram só para os casais. As senho-
ras só podiam ir à igreja vestidas de preto; sendo obrigatório esse
luto, como uma homenagem ao sofrimento, agonia e morte do
CRISTO.
A "guarda do Santíssimo' era feita das 10 horas da manhã de
Quinta-feira Santa, até Sexta-feira da Paixão, às 10 horas também
da manhã.
Durante a noite de quinta-feira essa "guarda" era feita pelos
homens, em grupos, de hora em hora. (Terminou, por justos
motivos).
A quarta-feira de "trevas" também acabou. Achamos que foi
uma boa medida. Aliás, já falamos sobre isso.
Temos observado que as festas religiosas (de Páscoa) nestes
últimos anos, tem sido feitas mais no interior dos templos e sem
aparatos. Os tempos são outros. ..

186
As festas "juninas" do passado tinham outro sabor na simpli-
cidade dos folguedos. Brinquedos com os pingos de cera no copo
d'agua; dentes de alho plantados nos jardins; cantigas folclóricas;
simples jogos de salão e outros divertimentos juninos. Havia poesia
em t u d o . . .
E os traques, os buscapés, as pistolinhas, as rodinhas de acesso,
as minhocas, os foguetes de lágrimas e tantos outros fogos de arti-
fício ! . . .
Felizmente alguns desses folguedos ainda são conservados...

A " F E S T A DO R O S S I O " cujo novenário sempre teve início na


primeira sexta-feira depois de finados (guardando a tradição), era
um encanto na simplicidade dos seus divertimentos — passeios a
cavalo: em charretes; em embarcações marítimas pelo rio Itiberê e
sua baia; em trens da Estrada de Ferro, e nos célebres "bondi-
nhos" . .. Estes últimos, uma gostosura de passeio ! . . . Enfim, tan-
tas as distrações desta festa, nos tempos que se foram, completa-
mente desconhecidas da geração atual (salvo por ouvir dizer) que.
se esmiuçá-las fossemos, veríamos serem elas tão boas quanto as
várias modalidades do Esporte dos dias atuais.

E os "Grêmios dramáticos" tão ao gosto da época, a darem


espetáculos bimensais cansativos ?!
Mas a mocidade daqueles tempos gostava. Não se importava
com os duros bancos e cadeiras, nem com os dramalhões (embora
bem representados) de 4 a 6 horas de teatro. Para essa juventude
não havia coisa melhor.

O " N A T A L " — comemoração do nascimento de JESUS — era


festejado com simplicidade e alegria. Armavam-se os "presépios"
(lapinhas) com todo o carinho e esperavam-se as "pastorinhas"
que vinham visitar o Menino Deus e cantar louvores a Ele (folclore
puro).
Depois, as célebres "ceias", com a presença dos parentes e
amigos, numa união fraterna tão bem compreendida ! . . .
O "pinheirinho" e o "Papai-Noel" vieram muito mais tarde.
Foram trazidos pelos alemães quando imigraram para o Brasil.
A nossa festa genuinamente brasileira sempre foi a do " N A -
T A L " , com os "presépios", as "pastorinhas" e as lautas "ceias";
a melhor e a mais linda do ano ! . . .
Ainda se guarda alguma coisa do passado, e esse pouquinho
deve ser conservado.

187
Nos dias presentes, ninguém mais quer saber de "tradições".
Porém, um País sem "tradições", é um País decadente; um País em
ruína; um País m o r t o . . .
Mui acertadamente dizia Alexandre Herculano: "A falta de
amor ao passado; às velhas tradições e coisas da Pátria, é indício
certo da morte da nacionalidade e, por conseqüência, do estado de-
cadente e da ruína de um p o v o " . . . É preciso que a mocidade atual
compreenda isso.
Felizmente, ainda não está de tudo perdido. Uma grande parte
da juventude é boa e sadia, e dela muito se espera nos dias futuros.
Aguardemos.

188
FOLCLORE

ORIGEM

A palavra " F O L C L O R E " vem de dois vocábulos saxônicos:

F O L K — que significa "povo".


L O R E — quer dizer "sabedoria", "ciência".

É pois, a "sabedoria do povo".


Segundo a definição de Francis Lee Utley, a palavra F O L C L O -
RE é " L I T E R A T U R A O R A L M E N T E T R A N S M I T I D A " .
Dizem os folcloristas que "os homens de letras não devem re-
pudiar o F O L C L O R E . Devem, sim, separá-lo da Antropologia".
O estudo dessa " L I E R A T U R A ORALMENTE: T R A N S M I T I D A "
é, por sem dúvida um assunto altamente respeitável. Melhor de-
finido, é uma subcultura.
A música de origem popular, é tão digna de estudo, quanto
as canções dos grandes mestres e compositores.
O F O L C L O R E é então uma verdadeira "tradição oral", trans-
mitida por palavra de boca. Assim sendo, sempre que se cante uma
canção antiga de "ninar", ou se dance certas danças antigas, ai
está ele dominando
Os povos antigos sempre tiveram suas crenças nos usos e cos-
tumes; suas lendas e mitos; cantos e contos populares; estórias,
bem como suas superstições, a fazer parte da vida social, política
e econômica.
A Alemanha cultivava, desde 1778, suas tradições, editando
livros de contos populares; poesias lendárias e trabalhos de mito-
logia.
Só em 1846 é que apareceu, pela primeira vez, a palavra " F O L -
C L O R E " no Athenoeum inglês.
Mais tarde, as nações latinas começaram também suas investi-
gações folcloristas.
Na Espanha, em 1881, criou-se uma "Biblioteca das tradições
espanholas".
Na Itália, apareceu De Gubernatis a interessar-se por esse
assunto.
189
Em Portugal, tivemos vários escritores que se dedicaram a
esse estudo, como, Garret, Palmeirim, Leite de Vasconcelos, Adolfo
Coelho, etc.
No Brasil, então, a número desses folcloristas é grande, como:
Sílvio Romero, João Ribeiro, Macedo Soares, Osório Duque Estrada,
José de Alencar e outros; todos publicando interessantes trabalhos
sobre o assunto.
Hoje, não há intelectual que não se interesse por esse ramo da
Antropologia. Sociedades têm sido fundadas, a fim de coletar as
tradições populares; os cantos; os corais tão apreciados; as cantigas
de rua.
Quanto aos "provérbios", é comum vê-los nos pará-choques dos
caminhões.
No início, os colecionadores faziam essas investigações mais
por diletantismo, procurando embelezar e mesmo modernizar as
narrativas.
Assim, os mitos, costumes e superstições eram encarados mais
como curiosidades. Hoje em dia, o folclorista é fiel e escrupuloso
na reprodução.
E dessa forma, o F O L C L O R E prestará ainda grandes serviços
à História, fornecendo-Ihe documentos sobre o estado de espírito
dos povos chegados já a um certo grau de cultura. ..
No Paraná, o F O L C L O R E tem sido bastante pesquisado pelo
professor — Dr. Loureiro Fernandes — especialista nessa matéria.
Seu trabalho, produtivo, especialmente na Lapa, com as " C O N G A -
D A S " . continuou em Paranaguá.
Em nosso "MUSEU ARQUEOLÓGICO E A R T E S P O P U L A R E S " ,
esse extraordinário folclorista montou os "personagens das conga-
das", cujas festas continuam a ser realizadas, todos os anos, na
cidade da Lapa.

FANDANGO

P A R A N A G U Á tem, ainda hoje, o célebre " F A N D A N G O " ,


dançado pelos praieiros e pescadores de nossas ilhas. Entanto,
está prestes a desaparecer; pois, a mocidade cabocla dos sítios,
ao ser convocada para prestar o "Serviço Militar", quando
termina esse ato de civismo, não mais quer voltar ao lar. E, se
acaso retorna, desinteressa-se completamente das danças e cantos
de sua gente. Diz ele com desprezo: F A N D A N G O ? . . . Já era ! . . .
É que, como soldado, tomou todos os hábitos da C a p i t a l . . .
De origem espanhola, é o " F A N D A N G O " uma dança trazida
pelos aventureiros espanhóis, que, no passado, se espalharam pelos
recôncavos do nosso litoral. E, como era natural, sentindo nostal-
gia, procuravam recordar a pátria distante com danças de sua
terra. Então, em contato com os seivícolas, cuja dança também

190
era de roda, eles acabaram formando o " F A N D A N G O P A R A N A -
G U A R A " , que é um misto do Fandango espanhol com as danças
dos nossos índios c a r i j ó s . . .
Três séculos passaram, e nesse correr de anos, o " F A N D A N G O "
tornou-se a única dança do nosso caboclo litorâneo, folclórica por
excelência, com mais de 20 coreografias e música própria, um tanto
monótona, é verdade, mas típica. O sapateado é bonito, porém,
muito difícil.
A mocidade estudantil paranaguara conseguiu ensaiar algumas
coreografias. Caso leve avante essa idéia, é possível que ainda
tenhamos essa dança tradicional em nossa Cidade. Esperemos
então...

O BARREADO

É a verdadeira comida típica do litoral paranaense, que passou


dos sítios dos pescadores através dos anos, para a Cidade. Hoje é
tido como um excelente prato. Realmente é muito saboroso.
Consiste em cozinhar a carne, com toicinho e todo os tempe-
ros, em uma panela de barro com tampa e barreada com farinha
de mandioca e água fria (feita u'a massa) a fim de não escapar o
vapor. Isso durante 12 a 15 horas, em fogo lento, para não queimar.
Aberta a panela, ao espocar de foguetes (que fazem parte do
ritual) esse "barreado" é comido com farinha de mandioca, arroz
ou pãc e bananas.
Sua origem perde-se na História dos tempos. Sabe-se apenas
que somente em P A R A N A G U Á , Morretes, Antonina, Guaraqueçaba
e Guaratuba preparam-no há mais de 200 anos. E é interessante
dizer que, em nenhuma outra parte do País se fala ou se conhece
tal comida tão apreciada. De fato, é tradicional em todo o litoral
paranaense. E mais interessante ainda é que, só no Carnaval se
preparava esse gostoso prato típico de nossa terra. Hoje, é comum
prepará-lo em qualquer época do ano e tido como uma comida fina.
Entretanto, é tradicional comê-lo no "domingo e terça-feira" do
"Carnaval", como dissemos, ao espocar dos f o g u e t e s . . .
É possível que esse prato já seja conhecido em alguns Estados;
pois, muitas famílias que aqui moraram, ao voltar aos seus pagos,
levaram a "receita" . (A verdade, porém, é que daqui saiu).
É o caso das comidas baianas, que presentemente se comem em
todos os Estados brasileiros. Mas de lá sairam.

HISTÓRICO

Contavam os antigos que os primeiros filhos de índias com


portugueses (mamelucos e depois caboclos), quando vinham à
V I L A trazer os produtos da lavoura de seus patrões, aí ficavam para

191
almoçar, comendo na cozinha; ao provar o "guisado" comum feito
em casa, gostaram tanto que resolveram preparar esse prato no
sítio em que viviam; de acordo com suas posses. Compravam então
a carne de peito (a mais barata) e cozinhavam com toicinho e todos
os temperos que conheciam; isso por várias horas, a fim de amolecer
bem a carne. Porém, como o cozido secava depressa, devido o
vapor que saia, tamparam a panela e passaram u'a massa feita de
farinha de mandioca com água ao redor, para não mais escapar o
vapor. Deu certo a idéia que tiveram.
Todavia, só faziam esse cozido pelo Carnaval, porquanto, du-
rante o ano comiam apenas peixe com farinha, como faziam seus
antepassados. É que, nessa época, a carne de gado era muito cara
para eles.
Como gostavam de dançar o "fandango" nos quatro dias de
Carnaval, preparavam o tal "guisado' para comer durante essas
quatro noites, tomando sempre a sua "caninha".
Esse hábito tornou-se tradicional através dos anos. Por fim,
veio para a V I L A , mas com o nome de "barreado"; assim chamado
porque barreavam a panela de barro com a tal massa de farinha
com água f r i a . . .
Como certas famílias austeras e cheias de preconceitos não
queriam que seus filhos se contaminassem com os folguedos carna-
valescos, que julgavam imorais, iam sempre passar esses dias mo-
mescos nos "sítios" onde tinham suas casas e plantações cuidadas
pelos caboclos, seus empregados; ali ficando, às vezes, uma semana.
Não tendo o que fazer no sítio, saiam visitar as famílias cabo-
clas nos seus humildes casebres.
Quiseram então provar o "guisado" cozido em panela de barro,
tampada e barreada. Gostaram muito; convencendo-se que, de
fato, a comida assim preparada,tornava-se mais gostosa.
A o voltar à V I L A , as donas de casa resolveram fazer o mesmo
com o guisado caboclo; preparando-o da mesma forma e achando
interessante a idéia do praieiro em barrear a panela e dar o nome
de "barreado" à comida assim feita. A imitação é própria da cria-
tura humana. Daí o fazerem também só pelo Carnaval, a exemplo
dos pescadores.
As mudanças sociais e econômicas foram surgindo, de forma
que, as famílias já não mais saiam da V I L A durante o três dias
carnavalescos. As famílias começaram então a freqüentar os tais
bailes momescos; porém, até a meia noite.
Somando a tudo isso, tínhamos a vida da mulher — dona de
casa — que só podia pensar em "prendas domésticas". Então, nas
visitas às comadres e amigas; enquanto os maridos falavam de
"política" que tanto os fascinava, elas, as "Amelias" do passado,
trocavam idéias sobre "arte culinária" e, é claro, a comida barreada
à moda cabocla vinha à baila, como um interessante prato para
agradar aos maridos. Diziam elas (na sua ingenuidade): "Homem
e peixe só se prende pela boca" (Provérbio da sabedoria popular).
192
E o melhor (ou p i o r ) é que as esposas devotadas em excesso, incu-
tiam no espírito das ingênuas filhas, ser essa a maneira de segurar
os maridos "rueiros" em casa ! . . .
Mas, voltando ao assunto. A "receita" do "barreado" logo se
espalhou por toda a V I L A e aos demais vilarejos do litoral.
E assim correram mansamente 200 a n o s . . .
Essa é a " V E R S Ã O " dos nossos ancestrais. Como a panela era
de barro, costumavam dizer (imitando o nosso caboclo): Vamos
"barrear" a panela, para não sair o vapor nem o cheiro dos tem-
peros.
Assim sendo, está certo o apelido " B A R R E A D O " feito na pa-
nela de barro, barreada com a massa de farinha de mandioca com
água f r i a . . .

Analisando-se bem o caso, vemos que, de fato, há um cunho de


verdade em toda a História.
Pode-se então dizer que, o " B A R R E A D O " , pela forma com que
é feito, torna-se o verdadeiro "precursor" da "panela de pres-
são" ! . . .

Enfim, todo esse caudal de contos heróicos e populares, baladas,


lendas, canções, jogos, crenças, superstições, trocadilhos, ditos po-
pulares, provérbios, danças e comidas típicas; tudo é F O L C L O R E ;
pois designa a sabedoria tradicional do povo.
Portanto, para os indivíduos como para as nações, há o dever
precípuo de recordar e honrar as virtudes de seus maiores, fazendo
reviver no presente os bons exemplos legados pelo passado.
Conclui-se então que, cultivar os estudos folclóricos, fazendo
pesquisas, na sua beleza simples, filtrando-os no seu primitivismo,
é realizar um verdadeiro trabalho patriótico.
Eis porque o Instituto Brasileiro de Educação, Ciência e
Cultura — ó r g ã o da UNESCO — diante da necessidade do seu
cultivo, fixou a data de 22 de agosto como o " D I A DO F O L C L O R E "
em todo o Território Nacional.
Essa data foi depois oficializada pelo ex-Presidente da Repú-
blica — General Humberto Castelo Branco — em 1965.

193
OS SAMBAQUÍS E OS SAMBAQUIBAS

SAMBAQUtS

São enormes depósitos de berbigões, cascas de ostras, ameijoas,


conchas, mexilhões e outros mariscos deixados por uma raça pri-
mitiva que aqui existia, quando da invasão dos "tupís-guaranís",
vindos do Oeste.

SAMBAQUIBAS

Eram os aborígenes, tribos selvagens do período pré-histórico


(homens dos sambaquís — segundo o grande historiador parana-
ense Ermelino de L e ã o ) , que se estendiam desde Cabo Frio até
Santa Catarina, e que foram expulsos do seu habitat pelos tupís-
-guaranís, vindos dos Andes do Peru e da Bolívia; os quais, vencidos
e quase exterminados, foram se refugiar nas montanhas e sertões
do País.
Nesses grandes depósitos conchíferos foram encontrados fêmu-
res, calotas cranianas e outros ossos, cujo exame fisiométrico com-
provam a grande diferença entre essas duas raças. Fato curioso
que ainda é problema dos estudiosos da pré-história brasileira; pois
ainda muito se tem a estudar.
Há também a hipótese de uma origem natural, provocada por
convulsões telúricas que arrancaram do fundo do mar tais casca-
lhos, depositando-os por fim ao longo do litoral. Teoria há muito
desprezada.
É qúe a razão e o bom senso força-nos a crer serem de origem
artificial, deixada pelos selvagens que viviam na orla marítima e
que, alimentando-se desses mariscos, iam depositando as cascas em
um determinado lugar; aproveitando também para, nesses depó-
sitos, enterrar os seus mortos com suas armas; pois sabiam que
nessas ostreiras os animais selvagens não iriam desenterrar os ca-
dáveres, com medo de cortar as patas.
Tais costumes não eram dos tupís-guaranís, porquanto, estes,
colocavam seus mortos de cócoras (posisão do feto ao nascer), den-
tro de um grande vaso de barro, tampando-o e enterrando em cova
aberta para tal fim. Esses panelões com tampa eram as "urnas"
para os seus falecidos e chamavam-se "igaçabas"; peças essas ex-
194
postas em nosso museu arqueológico. Tal diferença de rito fune-
rário vem provar a existência de uma raça primitiva em nosso li-
toral, talvez, de 5 a 10 mil anos a t r á s . . .
A maioria dos historiadores nada fala sobre essa raça primitiva,
cujos mortos eram enterrados nos "sambaquís". Apenas discorrem
eles sobre os "tupís-guaranís", cujo rito consistia em enterrar seus
entes queridos em covas, dentro das "igaçabas"; vasos de barro até
hoje encontrados nas antigas aldeias tupis.
Logo, as ossadas e armas achadas nos "sambaquís",nada mais
são que despojos dessa primitiva raça, que o grande historiador
Ermelino de Leão qualificou de "sambaquibas'.
Portanto, não há mais dúvida sobre a primitiva população da
América do Sul. E.a veio da Ásia, passando pelo estreito de Bering,
que, em certa época do ano (inverno) congela de tal maneira, que
dá passagem, a pé firme, para o nosso continente. Essas hordas
humanas, penetrando na América do Norte, em várias épocas,
foram descendo e se espalhando pela América Central e, por fim,
em toda a América do Sul. Isso, talvez, há mais de 5 mil anos
antes da chegada de Colombo ao Novo Continente. Tais bandos
não tinham objetivo certo; iam se fixando nas regiões que mais
lhes agradavam (opinião dos mais abalizados historiadores).
É também possível que outros bandos saídos da Oceania, em
balsas ou jangadas, fossem arrastados pelas correntes marítimas e
viessem ter à costa ocidental do Continente Sul-Americano.
Essas hordas se espalharam por todo o litoral, mormente nas
regiões de muita pesca e caça. Algumas desceram mais ao Sul e,
atraídas pela abundância de mariscos, aqui se fixaram em vários
pontos; trazendo, da terra de origem, a tradição de sepultar os seus
mortos sob montes de cescalhos (para que certos animais ferozes
não os desenterrassem), fazendo o mesmo em nosso litoral; pro-
vando com isso terem vindo de regiões litorâneas onde exerciam
também a pesca.
Um tanto ou bastante indolentes, esses grupos iam formando
suas tabas e, para facilitar a pesca, aprisionavam os peixes em cer-
cados, a que davam o nome de "camboas". Camboar era mais
fácil para eles, pois os peixes já estavam presos nas camboas. Esses
sambaquibas, que deram origem aos sambaquís, deviam ser de ori-
gem malaia, segundo os mais entendidos historiadores. Seus an-
cestrais eram chamados "fueguidos", que quer dizer "pescadores".
Os sambaquibas (mesolíticos — período da pedra lascada e
polida) tinham a estatura de 1,60 m mais ou menos; cabeça chata;
nariz chato; pele escura (côr de cuia); cabelos ásperos e escorridos,
bem como lábios grossos. Ele se identifica do seguinte modo:

1.°) — Uma das primeiras raças que, penetrando na América,


dirigiu-se depois para a região tropical.
2.°) — Raça com atividade milenar; apenas interrompida pela
invasão e conquista de outra raça mais forte.
195
3.°) — Admitindo-se, fosse o "carijó", ao tempo da coloniza-
ção portuguesa, um cruzamento das raças — samba-
quibas e tupis.

Certos historiadores mais entendidos julgam ser o "botocudo"


o descendente do "sambaquiba". E até que a P A L E O N T O L O G I A
revele essa questão sob novos aspectos, continuaremos a ver no
"botocudo" de hoje, a perfeita semelhança com o homem dos
"sambaquís".
Quanto à raça conquistadora — "Tupí-Guarani" — vinda dos
andes Peruanos e Bolivianos; dominando completamente os "sam-
baquibas"; conseguiu exterminá-los, quase que totalmente.
Os que puderam escapar à sanha dos conquistadores, submete-
ram-se como escravos; acabando por fundir-se com eles.
Desse cruzamento (segundo os entendidos) deve ter surgido o
nosso "carijó", aqui encontrado na época do des:obrimento do
Brasil.
Ele, vendo os "sambaquís", por instinto natural, continuou de-
positando as cascas de ostras e demais mariscos sobre essas ostrei-
ras. Seus mortos, porém, eram colocados nas "igaçabas", com os
objetos de estimação e depois enterrados em determinados lugares.
Quanto ao "camboar", em vez de colocar vários paus a pique
com pequenos intervalos para deixar passar apenas a água da maré
vazante, prendendo assim os peixes no lagamar, como faziam os
sambaquibas (muito indolentes); os "carijós", mais civilizalos, te-
ciam as "redes de arrasto", como ainda hoje fazem os nossos cabo-
clos pescadores, seus descendentes diretos.
É preciso que se faça justiça ao nosso caboclo do litoral, com o
elogio que ele merece:
O nosso praieiro é um forte; conformado com a sorte adversa;
pouco físico, mas de uma resistência orgânica a toda prova; com
instrução mínima, porém vivo e inteligente como poucos; com uma
qualidade incrível para o artesanato; impassível quando maltra-
tado; não ofende a quem quer que seja. É extraordinário o nosso
pescador...
O nosso respeito e a nossa admiração.

196
OS CARIJÓS

Sabe-se que, de todos os índios do litoral do nosso País, os mais


brandos eram os "carijós", que habitavam toda a costa do Paraná
e parte de Santa Catarina, isto é, desde Cananéia até São Francisco
do Sul.
De fato, os "carijós" eram dóceis e amigos quando tratados
com brandura e estima; porém hostis e indomáveis quando des-
confiavam ser falsa essa amizade.
Não se deixavam escravizar, lutando e resistindo de arco e
flecha nas mãos. Contudo, quando percebiam que os brancos eram
superiores em tudo, tratavam de fugir, a fim de não serem subju-
gados ao trabalho da cata do o u r o . . .
Assim agiam os nossos "carijós" e desse modo procederam
quando da chegada dos brancos chefiados por Domingos Peneda
que, depois de mais de uma década na ilha da Cotinga, conseguiram
se localizar no continente, à margem esquerda do rio Taquaré, en-
trando em boa paz com os selvícolas.
O cacique "Taquaré" (nome do chefe da tribo e também do
rio) assim o permitiu, desde que vivessem todos em paz,
Com o passar dos anos, na incessante cata do ouro, sentiu-se
a falta de braços para esse trabalho. A única forma de se resolver
a situação seria a de obrigar os índios a trabalhar (como escravos,
é claro) na procura do precioso metal.
Como os indígenas não concordassem com essa humilhante
situação, começaram os primeiros atritos; aumentando cada vez
mais, até se tornar em luta declarada.
Esse estado de coisas então ficou intolerável com a vinda de
Heleodoro Ébano que, escravizando algumas dezenas de índios, con-
duziu-os ao Rio de Janeiro.
Foi o bastante para por os "carijós" em pé de guerra.
Assim sendo, Jerônimo Leitão resolveu organizar uma "ban-
deira" com o fim de guerreá-los; entretanto, não chegou a vir, com
receio dos índios "tupiães" de São Vicente, que ameaçavam atacar
a Vila de São Paulo.
Jerônimo Leitão tomou então outra atitude, mandando um
"branco" valente até P A R A N A G U Á , para negociar a "paz" com os
"carijós". Escusado é dizer que esse emissário nunca mais voltou.
Isso foi em 1585.
197
Querem, alguns historiadores, que esse 'branco", que nunca se
soube o nome, deveria ter sido um destemido, de muita coragem;
talvez um Domingos Peneda. .. hipótese nada aceitável, porquanto,
esse intrépido aventureiro viera com Diogo de Unhate e outros, por
volta de 1550.
O caso é que, depois da vinda desse desconhecido, os "carijós"
se acalmaram; mas, ficando sempre de sobreaviso, desconfiados
como e r a m . . .
Apesar da aliança feita com os brancos, a tribo do nosso litoral,
duvidando da honestidade deles e esperando novas surpresas, foi
aos poucos se retraindo, abandonando o litoral e tomando o rumo
do sertão, em direção ao Norte; ficando apenas uma pequena parte
da tribo já domesticada que, não mais tendo coragem de enfren-
tar a selva, continuou na terra, escravizada, na triste faina da
mineração...
Em 1606, o sertanista — Afonso Sardinha — organizou tam-
bém uma "bandeira" para vir comerciar com os nossos "carijós";
porém o procurador da Câmara de São Paulo, desconfiado dos ocul-
tos intentos desse bandeirante, não consentiu tal expedição, para
que a paz continuasse firme entre brancos e índios.
Contudo, o êxodo dos "carijós", embora lento, continuou, até
o total desaparecimento, num rumo ignorado.
O historiador — Ermelino de Leão — supõe ter sido em "Jaca-
reí" a taba do grande cacique "Taquaré", chefe dessa também
grande Nação.
Foi o historiador — Cunha Matos — quem nos revelou o para-
deiro dos "carijós", através da Revista do Instituto Histórico Bra
sileiro (tomo X X X V I I ) — ano de 1864 — com a publicação da
"Corografia Histórica da Província de Goiás". Fala ele sobre a
existência de "carijós", encontrados em 1824, nos sertões de Goiás,
ao Norte, na divisa com Piauí. Neste Estado há uma Vila (hoje
talvez cidade) por nome "Parnaguá", bem como um rio com esse
nome banhando a mesma Vila.
Esses índios, que talvez ainda existam descendentes, não eram
oriundos daquela localidade. Surgiram no início do século (1700).
emigrados do Sul; provavelmente por meio do rio Paraná, subindo
em pirogas até as suas cabeceiras e daí, nas bacias do Tocantins
e Araguaia, localizando-se no Piauí.
É bastante curioso que nessa região tenham aparecido tais
índioa "carijós", e que, mais tarde, uma Vila e um rio recebessem
esse nome de Parnaguá.
Devem então ter sido os "carijós" do nosso litoral que, lá che-
gados, deram esse nome em recordação à terra de origem. (Salvo
um melhor j u i z o ) .
Eis oomo terminaram os valentes "carijós" do litoral parana-
guara. Sempre foram livres e . . . livres quiseram f i c a r ! . . .
A liberdade é inata no coração de cada c r i a t u r a ! . . .

198
CAPITÂES-MORES
CAPITÃES MORES

P A R A N A G U Á , surgindo no Continente em 1578, época da mi-


neração e da fundação da Capela sob a invocação de N. S. do
Rosário; ainda com sua pequena povoação; viu, pela primeira vez,
o seu povoador — G A B R I E L DE L A R A — em 1640, quando aqui
chegou. Viu a ereção do "Pelourinho", emblema da Lei, em 1646.
Viu, por fim, a elevação do seu já grande povoado a V I L A .

Seus Capitães-mores fizeram-na feliz, na governança; atrain-


do aventureiros fascinados pela notícia de "ouro" (o 1.° que saiu
do Brasil). Estes, também, pelo trabalho, lhes deram progresso;
firmando-lhe o conceito como V I L A próspera.

O primeiro deles governou 34 anos.

Gabriel de Lara 1.° Capitão-mór de 1648 a 1682.


Thomaz F. de Oliveira . . . . 2.° em 1683.
Gaspar Teixeira de Azevedo 3.° em 1689.
Francisco da S. Magalhães 4.° em 1692.
João Rodrigues de França .. 5.° em 1707.
Antonio Garcia 6.° em 1716.
André Gonçalves Pinheiro 7.° em 1717.
Anastácio de F. Trancoso . . 8.° em 1732.
D. João Francisco Laynes 9.° em 1743.
Rodrigo Félix Martins 10.° em 1751.
Antonio de Souza Pereira . . 11.° em 1762.
Antonio Ferreira Mattoso . . 12.° em 1763.
Manoel Nunes Lima 13.° em 1766.
José Carneiro dos Santos .. 14.° em 1766.
Manoel Antonio Pereira . . . 15.° de 1815 a 1833.

OBS.: José Carneiro dos Santos, governou 3 anos — de 1766 a 1769.


Obteve então segunda patente. Depois, a jurisdição passou
a ser em São Paulo, com Capitães-generais, até 1814. Em
1815 foi nomeado o último Capitão-mór, até 1833; quando
foi extinto o cargo, por força da Lei.

201
O ÚLTIMO CAPITÃO-MÓR

Descendentes de família de pequena nobreza rural, de Gui-


marães, Conselho de Tafe, no Arcebispado de Braga, chegaram a
P A R A N A G U Á , ao 15 de agosto de 1796, os bragantinos — M A N O E L
A N T O N I O P E R E I R A e seu irmão A N T O N I O JOSÉ P E R E I R A —
onde fixaram residência.
Já bem estabelizado na vida, casou-se o respeitável varão —
M A N O E L A N T O N I O P E R E I R A — aqui em P A R A N A G U Á , no dia
8 de janeiro de 1805, com a distinta dama D. L E O C Á D I A A N T O N I A
DA C O S T A , filha do Sargento-mór Manoel Antonio da Costa No-
gueira e de D. Maria Clara de Assumpção Lanoya (pelo lado ma-
terno D. L E O C Á D I A era descendente dos duques de L a n o y a ) .
Desse consórcio nasceram 12 filhos, entre os quais o Major
Antonio Pereira da Costa (pai do velho João Regis Pereira da Costa,
de saudosa m e m ó r i a ) .
Sua descendência é tão grande que seria preciso, para descre-
vê-la, centenas de páginas.

Foram seus filhos:

F R A N C I S C O A N T O N I O P E R E I R A — (1807). Foi Sargento-


-mór.
M A R I A C L A R A P E R E I R A DE L E Ã O — (1809).
M A N O E L A N T O N I O P E R E I R A — (1811).
A N T O N I O P E R E I R A DA COSTA — (1813). Foi Sargento-mór
(avô do Sr. T o n h á ) .
F R A N C I S C A A N T O N I A P E R E I R A C O R R E I A — (1815).
L E O C Á D I A P E R E I R A C H O P I T É I A — (1817).
JOSÉ A N T O N I O P E R E I R A — (1818).
G E R T R U D E S P E R E I R A C O R R E I A — (1819).
C A R O L I N A P E R E I R A T E I X E I R A — (1824) .
A N N A P E R E I R A CORDEIRO — (1826).
A G O S T I N H O (Falecido com 3 anos) — (1829).
M A R I A D O M I N G A S (Faleceu com poucos meses) — (1830).

Dessa ilustre estirpe, destacamos 3 nomes que tanto dignifi-


caram P A R A N A G U Á ; 3 netos do honrado Capitão-mór, que se des-
tacaram por tudo o que fizeram de útil na vida social, cultural e
política de nossa terra.

202
Foram eles:
L E O C Á D I O P E R E I R A DA COSTA — brilhante jornalista, que
fundou o 2° jornal de P A R A N A G U Á — "O COMÉRCIO DO P A -
R A N Á " , em 1862, com a colaboração de vários idealistas.
D R . L E O C Á D I O JOSÉ C O R R E I A — médico humanitário de
raras virtudes; orador brilhante e de cultura invulgar; médico dos
pobres, que, através de seus fihos, P A R A N A G U Á venera e bendiz.
JOÃO R E G I S P E R E I R A DA COSTA — literato de fina tempera
e cultura sólida; crítico literário.

Os 7 bisnetos:
A N T O N I O M O R A I S P E R E I R A D A COSTA ( T o n h á ) , G E N A R O
REGIS, A U G U S T O REGIS, M A R I A (Sinhara), L A U R A , H I P Ó L I T A
( L i l i t a ) e A N T H E R O R E G I S (brilhante jornalista), todos nascidos
em P A R A N A G U Á .

Trisnetos do lado paterno: (16)


a
R A C H E L — (grande prof. de piano) e E L I S E U (filhos de
Tonhá).
SAMUEL, SARA, JOÃO, S A U L e R E G I N A (filhos de Augusto).
M A R I A , HUGO e JOAQUINA (filhos de Sinhara).
JOÃO e M A R I L E N A (filhos de Anthero).
CARLOS EDUARDO, A R T H U R , R O S A M A R I A e M A R I A HE-
L E N A (filhos de L i l i t a ) .

Trisnetos de outro ramo materno:


L Ê N I O e T O N H A Z I N H O (Tonhá Arantes) filhos de Telênio
Arantes.

Trisnetos de outro ramo materno:


CARLOS, A L I C E , F L Á V I O , C L É L I A , CÉLIA, CELSO e CLÉA
(filhos de Flávio L ü c k ) .

Dos tetranetos conhecidos: (13)


H A R L E Y H A R C E Y e S I L E N Y ) f i l h o s de Tonhá Arantes).
A N T O N I O SÉRGIO (filho de Carlos L ü c k ) .
C R I S T I N A B E A T R I Z (filha de Célia — João E. S i l v a ) .
C É L I A e A L B A (filhas de Flávio Lück Junior).
CELSO, M A R I A C R I S T I N A e R A U L (filhos de Celso L ü c k ) .
W L A D M I R , V Â N I A e H U M B E R T O (filsos de Wilfredo Rúbele
— CLÉA).

Essa é uma pequena parte da "árvore genealógica" do respei-


tável cidadão — M A N O E L A N T O N I O P E R E I R A — último Capitão-
-mór e primeiro Prefeito de nossa P A R A N A G U Á .
Esse digno e honrado português, nos 61 anos que viveu em
nossa terra, muito fez pela então V I L A , merecendo a consideração
dos paranaguaras.

203
Nasceu ele na Freguesia de Ribeiros, Comarca de Guimarães;
filho de Antonio José de Magalhães e de D. Mariana de Oliveira.
Conseguiu fazer apenas o curso primário. Mas como queria
vencer na vida e tinha poucos recursos, resolveu emigrar para o
Brasil com seu irmão Antonio. Tinha ele então 14 anos quando
aqui chegou.
Com esforço próprio, trabalhando muito, conseguiu o seu ideal
— bens de fortuna e posição social. Casando com 23 anos.
Tornou-se um forte negociante; mas teve outras atividades:
Foi Juiz Municipal e também assistente da "Casa do T r o c o " de
moedas de cobre; tomou parte ativa, trabalhando intensamente
durante a "Guerra dos Farrapos', para impedir que os revolucio
a
nários invadissem a 5. Comarca.
Inteligente, tenaz e enérgico; prático e metódico; conseguiu
vencer todos os obstáculos que se lhe apresentaram; tanto na vida
comercial como nos cargos públicos.
Por Alvará de 28 de abril de 1823, do Imperador do Brasil — D.
Pedro I, foi armado " C A V A L H E I R O PROFESSO NA O R D E M DE
C R I S T O " o honrado cidadão M A N O E L A N T O N I O P E R E I R A . Ato
esse realizado na igreja Matriz de N. S. do Rosário, com toda a
solenidade. Por essa distinção do Imperador, pode-se avaliar o
prestígio que tinha esse Capitão-mór, em nossa t e r r a . . .
Faleceu — M A N O E L A N T O N I O P E R E I R A — em sua querida
P A R A N A G U Á (nova Pátria de adoção, como a chamava), aos 21
de maio de 1857, com 75 anos de idade; tendo a felicidade de ver
a
a nossa Cidade e toda a 5. Comarca, desmembrada de São
Paulo!...
Sua morte abalou profundamente a população paranaguara;
pois o ilustre morto era muito estimado e mesmo querido de toda
a nossa gente.
Ao seu sepultamento, presentes estavam os homens de todas as
camadas sociais, numa demonstração eloqüente de carinho e res-
peito por quem soube, na terra, pautar por uma linha de retidão
de c a r á t e r . . .
Dos 15 Capitães-mores que governaram P A R A N A G U Á , só pu-
demos biografar o último, em vista de ainda existirem seus descen-
dentes diretos em nossa terra.
M A N O E L A N T O N I O P E R E I R A , foi, pois, o 15.° e último Ca-
pitão-mór de P A R A N A G U Á ; governando 18 anos — de 1815 a 1833
— quando então São Paulo tornando-se P R O V Í N C I A , nossa terra
a
passou a fazer parte, como cabeça da 5. Comarca.
Extinto o cargo, por força da Lei, o ilustre ex-Capitão-mór foi
nomeado 1.° Prefeito de P A R A N A G U Á , por Portaria de 28 de agosto
de 1833, do Presidente da Província de São Paulo.
M A N O E L A N T O N I O P E R E I R A foi, verdadeiramente, um res-
peitável e probo cidadão paranaguara, de adoção, como ilustres têm
sido os seus descendentes.
204
OS TRÊS PODERES

EXECUTIVO

LEGISLATIVO

JUDICIÁRIO
OS PODERES MUNICIPAIS

A Capitania de N.S. do Rosário de Paranaguá, criada pelo Mar-


quês de Cascais — D. L U I Z A T A Y D E DE C A S T R O N O R O N H A E
SOUZA — a ele pertencia, como herdeiro do 1.° Donatário da Capi-
tania de Santo Amaro (Pero Lopes de Souza) até 1711. Ano em
que vendeu à Coroa Portuguesa as 50 léguas de costa (das 80 em
que consistia a doação), pela importância de 40.000 cruzados em
um só pagamento e mais 4.000 cruzados de luvas.

Entanto, desde 1648, com a elevação do povoado a V I L A , já


havia um Governo próprio, com a criação de Juizes Ordinários,
Capitão-mór e Ouvidor geral, bem como Vereadores.

Contudo, certas leis e ordens eram emanadas de São Paulo,


assim como as nomeações.

E assim a V I L A continuou, com seus Capitães-mores, até 1833;


quando São Paulo passou à categoria de Província. Nessa ocasião,
o cargo de Capitão-mór foi extinto, por força de Lei. Então, o
Presidente da Província de São Paulo nomeou o 1.° Prefeito de
P A R A N A G U Á , na pessoa do último Capitão-mór — Manoel Antonio
Pereira.

Em 1853, com a criação da Província do Paraná, foram nomea-


dos os Juizes Ordinários (cargo equivalente ao de Prefeito Muni-
cipal) para administrar e dirigir os destinos da Cidade.

Com o advento da República é que surgiram os "Prefeitos"


"Municipais" propriamente ditos.

Temos tido então, no regime republicano, os seguintes Pre-


feitos:

PODER E X E C U T I V O M U N I C I P A L

1.° Prefeito — Comendador JOÃO G U I L H E R M E G U I M A R Ã E S


Eleito para o quatriênio 1892 a 1896. Reeeito para
o quatriênio 1896 a 1900. Completou os dois man-
datos.

207
2.° Prefeito — Coronel T H E O D O R I C O JULIO DOS S A N T O S

Eleito para o quatriênio 1900 a 1904. Reeleito para


o quatriênio 1904 a 1908. No período deste último,
em virtude da Lei (nomeação), foi nomeado por
ato do Governo do Estado. Exonerou-se em
fevereiro de 1908.

3.° Prefeito — Coronel JOÃO ESTEVÃO DA S I L V A

Nomeado por ato do Governo do Estado, em feve-


reiro de 1908. Deixou o cargo em 21 de setembro
de 1908. Foi restabelecida a Lei do mandato por
eleição.

4.0 Prefeito — DR. C A E T A N O M U N H O Z DA ROCHA

Eleito para o quatriênio 1908 a 1912. Reeleito para


o quatriênio 1912 a 1916. Resignou o cargo em 15
de novembro de 1915. Verdadeiro paradigma em
todos os setores de sua grande administração.

5.° Prefeito — Coronel JOSÉ G O N Ç A L V E S LOBO

Assumiu o cargo em 15 de novembro de 1915, na


qualidade de substituto legal. Eleito para o qua-
triênio 1916 a 1920. Reeleito para o quatriênio
1920 a 1924. Resignou o cargo em 9 de dezembro
de 1922.

6.° Prefeito — DR. F R A N C I S C O A C C I O L Y R. DA COSTA

Assumiu o cargo em 9 de dezembro de 1922, como


substituto legal, até 21 de setembro de 1924. Em
virtude da Lei em vigor, foi nomeado em setembro
de 1924, por ato do Governo do Estado. Pediu
exoneração em 15 de setembro de 1927.

7.° Prefeito — Capitão de Corveta D I D I O I R A T I M A F O N S O DA


COSTA
Nomeado em setembro de 1927, por ato do Governo
do Estado. Restabelecida a Lei, foi eleito em 21 de
julho de 1928. Não terminou o mandato, por ter
sido afastado pela revolução vencedora em 24 de
outubro de 1930. Durante esse período revolucio-
nário foram nomeados "interventores".

208
INTERVENTORES DE PARANAGUÁ
(1930 - 1947)

Durante a Ditadura, o período Presidencial e novamente a


Ditadura, foram nomeados os seguintes interventores:

1.° Interventor — A G O S T I N H O P E R E I R A ALVES


Apenas dias; até 18 de novembro de 1930.

2.° Interventor — 1.° Ten. C H R I S T O V Ã O V I E I R A DA COSTA


De 18 de novembro de 1930 até 6 de julho de
1931.

3.° Interventor — JOÃO HENRIQUE C O S T A R D


De 6 de julho de 1931 até 13 de abril de 1932.

4.° Interventor — DR. O D I L O N M Ã D E R


De 13 de abril de 1932 até 1.° de agosto do
mesmo ano.

5.° Interventor — CARLOS ERNESTO S C H U L T Z


De 1.° de agosto de 1932 até 22 de setembro do
mesmo ano.

6.° Interventor — F R A N C I S C O T O V A R
De 22 de setembro de 1932 até 24 de abril
de 1934.

7.° Interventor — Capitão JOSÉ SCHELEDER


De 24 de abril de 1934 até 5 de maio de 1934.

8.° Interventor — C L A U D I O N O R N A S C I M E N T O
De 5 de maio de 1934 até 29 de setembro de
1935.

9.o Interventor — R O G E R M A R A V A L H A S
De 29 de setembro de 1935 até fins do ano de
1936.
10.° Interventor — A G O S T I N H O P E R E I R A ALVES
Do ano de 1937 até 26 de abril de 1938.
209
11.° Interventor — P A U L O CUNHA F R A N C O
De 26 de abril de 1938 até 14 de novembro de
1945.

12.0 interventor — V I C E N T E N A S C I M E N T O JUNIOR


De 14 de novembro de 1945 até 9 de março de
1946.

13.° Interventor — P A U L O CUNHA F R A N C O


De 9 de março de 1946 até 5 de junho do
mesmo ano.

14.° Interventor — A C R Í S I O G U I M A R Ã E S
De 5 de junho de 1946 até 24 de abril de 1947.

8.° Prefeito — JOÃO E U G Ê N I O COMINÉSE


Eleito para o quatriênio 1947 a 1951. Completou
todo o seu mandato.

9.° Prefeito —• DR. ROQUE V E R N A L H A


Eleito para o quatriênio 1951 a 1955. Faleceu
antes de completar o mandato. (Foi cruelmente
assassinado).

10.° Prefeito — JOÃO E U G Ê N I O COMINÉSE


Eleito para o quatriênio 1955 a 1959. Completou
todo o seu mandato.

11.° Prefeito — DR. J O A Q U I M T R A M U J A S


Eleito para o quatriênio 1959 a 1963. Completou
também todo o seu mandato. Foi um ótimo
administrador.

12.° Prefeito — B R A S Í L I O A B U D
Eleito para o quatriênio 1963 a 1967,aos 3 de outu-
bro de 1963. Tomou posse a 8 de dezembro do
mesmo ano; governando até 17 de abril de 1964;
data em que foi cassado pela Revolução Vence-
dora em 31 de março de 1964.

13.° Prefeito — Professor N E L S O N DE F R E I T A S B A R B O S A


Vice-Prefeito em fevereiro de 1964, por voto dos
vereadores em eleição indireta. Tomou posse do
cargo a 11 de abril do mesmo ano. Seis dias de
pois, a 17, foi empossado no cargo de Prefeito;
governando até 31 de janeiro de 1969. Fez uma
ótima administração, principalmente no setor da
Educação e Ensino.

210
14.o Prefeito — C O N S T A N T I N O JOÃO K O T Z I A S
Eleito para o quatriênio 1969 a 1973; tomando
posse a 31 de janeiro de 1969. Governou apenas
três meses, por ter sido cassado o seu mandato
pela Revolução Vencedora de 1964.

15.° Prefeito — DR. N I L O L Á Z A R O ABUD


Vice-Prefeito em fevereiro de 1969. Três meses
depois, foi empossado no cargo de Prefeito, duran-
te quatro meses, até a chegada do novo Prefeito
Interventor.

16. Prefeito — General de Divisão R - l JOÃO DA S I L V A R E B E L L O


Interventor nomeado pelo SR. P R E S I D E N T E DA
R E P Ú B L I C A . Foi o primeiro Interventor Federal
no Município de P A R A N A G U Á após a Revolução
Vencedora de 31 de março de 1964. Tomou posse
a 12 de agosto de 1969, governando desde essa
data até 30 de janeiro de 1973. Fez uma ótima
administração.

17.° Prefeito — Professor N E L S O N DE F R E I T A S B A R B O S A


Eleito para o quatriênio 1973 a 1977. Seu man-
dato terminará a 30 de janeiro de 1977. T e m
feito uma ótima administração; mormente quan-
to à Educa e Cultura.

Vice Prefeito — DR. N I L S O N CARDOSO DE M I R A N D A


Eleito a 15 de novembro de 1972. Tomou posse a
31 de janeiro de 1973. Assumiu a Prefeitura, na
ausência do atual Prefeito, durante 10 dias — de
10 a 20 de agosto de 1973. Deixará o cargo de
Vice Prefito a 31 de janeiro de 1977.

211
PODER LEGISLATIVO MUNICIPAL

Teve início com a elevação de P A R A N A G U Á à categoria de


VILA.
Aos 26 de dezembro, quando G A B R I E L DE L A R A mandou to-
car "caixa" na porta de sua residência e leu, aos habitantes da
povoação ali reunida, a "Carta Regia" datada de 29 de julho de
1648 e chegada naquele 26 de dezembro, perguntou a todos se havia
algum embargo a fazer. Eles responderam que "não". Apenas
queriam que o Capitão-mór fizesse logo a "eleição" para que pu-
desse haver "justiça" em a nova V I L A .

Foi feito o "Termo de Eleição", com a escolha dos seguintes


eleitores:

1) Capitão JOÃO G O N Ç A L V E S P E N E D A
2) Capitão JOÃO M A C I E L B A S A M
3) Capitão C R Y S O S T O M O A L V E S
4) ESTEVAM DIFONTES
5) JOÃO G O N Ç A L V E S M A R T I N S
6) DOMINGOS PEREIRA
7) P E D R O DE U Z E D A
8) Pedro A N D R É M A G A L H Ã E S .

No dia seguinte (27) foi feita a eleição dos "oficiais" que de-
veriam servir na Câmara, durante o ano de 1649.
Dois JUÍZES, três VEREADORES, um P R O C U R A D O R DO
CONSELHO, um E S C R I V Ã O . Sairam eleitos:

Juiz — JOÃO G O N Ç A L V E S P E N E D A
Juiz — P E D R O DE U Z E D A
Vereador — D O M I N G O S P E R E I R A
Vereador — A N D R É M A G A L H Ã E S
Vereador — M A N O E L COELHO
Escrivão — A N T O N I O DE L A R A .
Procurador do Conselho — D I O G O DE B R A G A .

No dia 9 de janeiro de 1649, depois do juramento dos "Santos


Evangelhos", esses sete oficiais da Justiça foram empossados.

212
Surgiu assim a primeira C Â M A R A M U N I C I P A L DE P A R A N A -
G U Á , aos 9 de janeiro de 1649 ! . . .
Seria enfadonho continuar a dar, minuciosamente, o nome de
todos os JUÍZES e V E R E A D O R E S desde aqueles tempos. ..
Isso poderá ser feito, mas, num trabalho todo especial da
CÂMARA.
Citaremos então, apenas os nomes dos seus "presidentes",
tanto na época do I M P É R I O como na R E P Ú B L I C A .

PODER L E G I S L A T I V O M U N I C I P A L

Presidentes da C Â M A R A M U N I C I P A L de P A R A N A G U Á depois
da instalação da Província do P A R A N Á .

Durante o I M P É R I O :

1.° Presidente — Ricardo G. Cordeiro — ano de 1853.


2.° " — João Cândido Correia — de 1854 a 1856.
3.o » _ Manoel A. Guimarães — de 1857 a 1860,
4.° " — Caetano de Souza Pinto — de 1861 a 1868
(reeleito).
5.° " — Manoel Leocádio d'Oliveira — de 1869 a 1872.
6.° " — Manoel A. Guimarães — de 1873 a 1876
(barão — 1876).
7.° " — Manoel Ricardo Carneiro — de 1877 a 1880.
8.° " — Manoel A. Guimarães — de 1881 a 1884
(visconde).
9.° — Joaquim Mariano Ferreira — de 1884 a 1885
(eleito).
10.° — Arthur Ferreira de Abreu — em 1885.
11.° " — João Estevão da Silva —- em 1886.
12.° " — João G. Guimarães — de 1887 a 1888.
13.° " — Theodorico J. dos Santos — em 1889.

Em 1889, rompeu a R E P Ú B L I C A no B R A S I L , no dia 15 de


novembro.
O regime republicano não impediu que as C Â M A R A S , no País,
continuassem a funicionar.

LEGISLATIVO REPUBLICANO

1.° Presidente — Theodorico J. dos Santos — de 1889 a 1890.


(Presidente da Intendência — 22/1/1890).
2.° " — Mathias Bohn — em 1891.
3.° — Theodorico J. dos Santos — também em 1891.
4.° — Manoel F. de Souza — em 1892.
5.° — João G. Guimarães — de 1892 a 1896.
6.° — Bento Munhoz da Rocha — também em 1896.

213
7.° " — Manoel Bonifácio Carneiro — de 1897 a 1900.
8.° " — João Estevão da Silva — de 1900 a 1901.
9.° " — Polycarpo José Pinheiro — de 1901 a 1902.
10.° " — João Estevão da Silva — de 1902 a 1903.
11.° — Polycarpo José Pinheiro — de 1903 a 1904.
12.° " — Moysés R. de Andrade — de 1904 a 1905.
13.° — Polycarpo José Pinheiro — de 1905 a 1906.
14.° " — Domingos S. da Costa — de 1906 a 1907.
15.° — Polycarpo José Pinheiro — de 1907 a 1908.
16.° " — Dr. Antonio J. de S. Lobo — de 1908 a 1912.
17.° " — Alberto Gomes Veiga — de 1912 a 1914.
18.° " — Thiago Pereira de Azevedo — de 1914 a 1915.
19.° — Domingos S. da Costa — de 1916 a 1922.
20.° " — Ceciliano da Silva Corrêa — de 1922 a 1923.
21.° — Aníbal Dias de Paiva — de 1923 a 1925.
22.° — Alípio Cornélio dos Santos — de 1925 a 1928.
23.° " — José Gonçalves Lobo — de 1928 a 1929.
24.° — Manoel Hermógenes Vidal — de 1929 a 1930.
25.° — José Gonçalves Lobo — em 1930.
Com a Revolução de 24 de outubro de 1930 a C Â M A R A fechou.
Só em 1947, com a queda do regime ditatorial, ela voltou a fun-
cionar.

LEGISLATIVO MUNICIPAL
(Após a queda do regime ditatorial)
19 4 7
26.° " — Dr. Roque Vernalha — de 1947 a 1951.
27.° " — Dr. João Ferraz de Campos — em 1951.
28.° " — Dr. Joaquim Tramujas — de 1951 a 1955.
29.° — Antonio Morais P. da Costa — em 1955.
30.° " — Dr. Nelson Buffara — de 1955 a 1957.
31.° " — João Fernandes — de 1957 a 1958.
32.° " — Jorge Elisio P. Marcondes — em 1958.
33.° " — Dr. Ewaldo Seeling — de 1958 a 1959.
34.° " — Dr. Nelson Buffara — de 1959 a 1967.
35.° " — Dr. Alceu Maron — de 1967 a 1971.
36.° " — Antonio Julio M. Lima —< de 1971 a 1973.
37.° " — Dr. João Jacob B. Filho — de 1973 a 1975.
38.° " — Sylvio Drummond — de 1975 a 1977.

Atual L E G I S L A T I V O :
Presidente — S Y L V I O D R U M M O N D
Vereadores — DR. JOSÉ M A R T I N S D O C A R M O (1)
— DR. JOÃO JACOB BERBERE F I L H O (2)
— DR. I S A M I M O R I T A (3)
— DR. A R T H U R M I R A N D A R A M O S (4 )

214
— DR. C M O S E G U I B E R T O P. T R A M U J A S ( 5 )
— PROF. O Z I E L T A V A R E S P R A D O ( 6)
— TSUTOMO FURUZAWA ( 7)
— CHAFIC F A R A H (8)
— PEDRO C L A R O CHAVES (9 )
— A N T O N I O C A M I L O DO N. JUNIOR (10)
— A N T O N I O CARLOS A B U D (11)
— FRANCISCO CABRAL (12)
— I D I L I O MENDES (13)
— N I L T O N ABEL DE L I M A (14)

"REGALIAS DA CÂMARA"

Fato interessante e curioso mesmo, é digno de ser conhecido


por todo o paranaguara, e por que não dizer ? de todo o paranaense.
Aqui fica, transcrito na íntegra: (Vieira do Santos - pág. 119).
"1726 — 275 — A Câmara em 26 de maio de 1726 fez uma
representação a Sua Real Majestade, pedindo lhe concedesse os pri-
vilégios que tinha a Câmara da Cidade do P O R T O do teor seguinte.
— Representa a Vossa Real Majestade o Senado da Câmara de
Nossa Senhora do Rosário da V I L A de P E R N A G O A hoje cabeça
de C O M A R C A , o desejo de ser enobrecido e honrado com os magní-
ficos privilégios e isenções com que Vossa Majestade foi servido,
enobrecer e honrar o Senado da Câmara da Cidade do P O R T O ,
e se o Senado dessa Cidade com a sua deligência e zelo no Real
Serviço se fez merecedor de receber tão grandes dons, também o
desta V I L A se tem mostrado diligente e zeloso no Real Serviço;
socorrendo atualmente com mantimentos de farinha e peixe à Ci-
dade de São Paulo, Vila de Santos, Rio de Janeiro, Nova Colônia
do Sacramento e muitas vezes a Bahia em tal forma que; sem o
socorro que daqui vai para essas partes, mal se poderiam muito à
sua vontade sustentar e conservar; no que fiado este Senado, e
muito mais na benevolência de Vossa Majestade, espera ser enobre-
cido e honrado, como foi o do P O R T O , e assim animado crescerá
em nós, cada vez mais a diligência e zelo de nos entregarmos todos
e em tudo ao Real Serviço de Vossa Majestade que DEUS guarde
por muitos anos — Dado em Câmara aos 20 de maio det 1726".

"1730 — 291 — Provisão de 1.° de setembro de 1730 dei Rei


Dom João 5.° passada pelo seu Conselho Ultramarino, concedendo
à Câmara de P A R N A G U Á , os privilégios, foros, grandezas, liber-
dades e regalias que tinha a Câmara da Cidade do P O R T O , confir-
mando igualmente a outra Provisão de 6 de Julho de 1725; para
se não fazer nenhum recrutamento em P A R N A G U Á " .
( A finalidade era de não desfalcar a V I L A , de homens, para
uma pronta defesa, caso fosse necessário).

21íi
PODER JUDICIÁRIO

A JUSTIÇA, em nossa PARANAGUÁ, instalou-se no dia 6 de


janeiro de 1648, com a ereção do "Pelourinho", símbolo da Lei.
Surgiram, primeiro, os "Juizes Ordinários".
Depois, com a vinda em eorreição, do Ouvidor de São Paulo
— Desembargador DR. RAFAEL PIRES PARDINHO — criando os
seus "Provimentos", organizou-se, ofic'almente a JUSTIÇA.
Era, o Dr. Rafael Pires Pardinho: Cavaleiro "Professo da
Ordem de São Tiago"; do "Desembargo de Sua Majestade"; "De-
sembargador da Relação e Casa da Cidade do Porto"; "Ouvidor
Geral" de São Paulo e sua Capitania .
Homem de grande cultura e capacidade administrativa; com
os seus 178 "Provimentos", lançou as bases para a distribuição da
JUSTIÇA. Foram eles os sustentáculos para a organização judi-
cial; normas para as várias Justiças, inclusive o culto Divino.
Mais tarde, D. JOÃO V confirmou esses Provimentos, dando-
-lhes o nome de "PROVISÃO REGIA".
Em 1723, foi criada a Ouvidoria de PARANAGUÁ, sendo no-
meado como primeiro Ouvidor o DR. ANTONIO ALVES LAN HAS
PEIXOTO; empossado aos 14 de março de 1724...
O Governador da Capitania de São Paulo achou por bem
fazer a divisão da Capitania em "duas Comarcas" — a de São
Paulo e a de PARANAGUÁ. Termo lavrado em 10 de fevereiro de
1725, na presença dos Ouvidores Gerais Dr. Francisco da Cunha
Lobo e Dr. Antonio Alves Lanhas Peixoto, mais Juizes e Oficiais
da Câmara. Fez ele ciente a todos que Sua Majestade houve por
bem concordar em fazer essa divisão, devido as distâncias em que
ficavam as vilas do Sul para resolver suas causas, tanto civis como
criminais, sendo também um verdadeiro sacrifício para um único
Ouvidor Geral poder fazer as suas correições.
Como PARANAGUÁ ficava ao Sul, deviam juntar a ela as vilas
da marinha que mais perto estivessem, para comodidade dos mo-
radores.
Que repartissem as vilas entre as duas Comarcas, como bem
lhes aprouvessem.
PARANAGUÁ ficou então com jurisdição nas vilas de Iguape,
Cananéia, São Francisco do Sul, Ilha de Santa Catarina, Laguna,
até ao Rio da Prata. Em Serra acima — a Vila de N. S. da Luz
216
dos Pinhais de Curitiba, até as Furnas, e daí por diante, as terras
que viessem a ser descobertas...
Por isso tudo, pode-se avaliar o que foi P A R A N A G U Á no sé-
culo X V I I I e a sua grande influência na formação do B R A S I L
Meridional.
Sua O U V I D O R I A , criada em 1724, funcionou em nossa terra
até 1812 (88 anos), quando, por Carta Regia, sua sede foi transfe-
rida para Curitiba.
a
Além disso, foi a cabeça da 5. Comarca de São Paulo e a que
mais renda lhe proporcionava até 1853.
Com a emancipação política do P A R A N Á ; instalada a Provín-
cia em Curitiba em 1853; meses depois foi decretada a Lei n.° 02
de 26 de julho de 1854, criando 3 Comarcas: uma no Litoral e duas
no Planalto.
a
A l . — C O M A R C A DE C U R I T I B A — abrangendo São José
dos Pinhais e Vila do Príncipe.
a
A 2. — C O M A R C A — DE P A R A N A G U Á — abrangendo Mor-
retes, Antonina e Guaratuba.
a
A 3 — C O M A R C A DE C A S T R O — abrangendo também Gua-
rapuava.

Em 1853, em toda a Província do Paraná, havia um único


JUIZ DE D I R E I T O para atender todo o território paranaense; ver-
dadeiro sacrifício para o Magistrado. ..
Atualmente, a organização do Judiciário está perfeita em todo
o nosso E S T A D O . Só em P A R A N A G U Á temos 3 JUÍZES DE D I -
R E I T O e 3 P R O M O T O R E S PÚBLICOS.
Os três " P O D E R E S " vêm acompanhando a velha Cidade desde
o início de sua vida política e social, jurídica e administrativa.
O " P O D E R J U D I C I Á R I O " nasceu com a ereção do "PELOU-
R I N H O " , símbolo da L E I e da JUSTIÇA, a 6 de janeiro de 1646.
O "PODER E X E C U T I V O " surgiu com a " C A R T A R E G I A " ,
datada de 29 de julho de 1648, de D. JOÃO I V .
O "PODER L E G I S L A T I V O " ocorreu com a eleição e posse da
" C Â M A R A " , no dia 9 de janeiro de 1649.
São 4 séculos de vida, desta P A R A N A G U Á de tantas e tão
caras tradições!...
O "PODER J U D I C I Á R I O " , atualmente em P A R A N A G U Á , se
compõe de 3 juizes:
DR. R U I F E R N A N D O DE O L I V E I R A — Juiz da Vara Cível
e Diretor do Fórum.
DR. V E R Í S S I M O GONÇALVES P E R E I R A N E T T O — Juiz da
Vara do Crime.
f
DR. I R L A N P R O A M A N N ARCO-VERDE — Ju z da Vara de
Família e Menores.

217
MESTRES
MAGISTÉRIO PARANAGUARA

A primeira Escola, em P A R A N A G U Á , de que há memória, data


do ano de 1708, com a fundação da " C A S A DOS J E S U Í T A S " em
14 de maio. Essa data marca também a fundação da " C A S A ES-
C O L A R " por eles dirigida. O " C O L É G I O " e o " C O N V E N T O " fica-
ram prontos mais tarde.
É de se crer, que antes dessa data, houvessem professores parti-
culares lecionando no Vilarejo; pois não se pode admitir que os ho-
mens de bem e de posses, na terra, deixassem os filhos em completo
analfabetismo. Teriam que, pelo menos, aprender a ler e escrever
com os vigários da Paróquia ou com algumas pessoas mais ou
menos instruídas que para cá vieram.
Não há dados para se comprovar; porém, qualquer um de nó-3
só pode pensar desse modo. Tivemos, então, os seguintes mestres:

1708 — P A D R E S JESUÍTAS — fundando a "Casa Escolar", que


durou 50 anos; desde 1708 até 1758. ótimos educadores.
1768 — P A D R E I G N Á C I O P I N T O DA CONCEIÇÃO — prof. Régio
de Gramática Latina; nomeado por Provisão de 6 de se-
tembro (do Rio de Janeiro).
1788 — F R A N C I S C O I G N Á C I O DO A M A R A L G U R G E L — profes-
sor de curso primário e de catecismo; com ordenado anual
de Rs 120$000. Nomeado por Provisão Regia de 28 de
abril. Um dos melhores mestres da época.
1789 — JOSÉ CARLOS DE A L M E I D A JORDÃO — professor de
Gramática Latina. Provisão de 15 de junho, com ordena-
do anual de Rs 300$000.
1791 — M A N O E L L O B O DE A L B E R T I M L A N Ó I A — prof, subs-
tituto de Amaral Gurgel, que seguiu de mudança par?.
São Paulo.
1810 — JOSÉ CARLOS DE A L M E I D A JORDÃO — reintegrado no
cargo por mais 6 anos. Um ótimo professor.
1817 — L U I Z M A R I A N O DE P E L O S A — prof, de Gramática La-
tina. Nomeado por Provisão de 14 de agosto.
1819 — B E R N A R D I N O JOSÉ A L V E S DOS REIS — prof, de Gra-
mática Latina. Nomeado por Provisão de 9 de agosto.
1826 — H I L D E B R A N D O G R E G O R I A N O DA CUNHA G A M I T O —
professor do curso primário. Vereança de 27 de ma'o.

221
1835 — F R A N C I S C O F E L I X DA S I L V A — professor particular.
Escola primária, para meninos e meninas.
1835 — Lei Provincial n.° 35 de 18 de março, referendada pelo
Presidente da Província — José Cezário de Miranda Ri-
beiro. — Artigo único — Os professores de primeiras letras
poderão castigar, moderadamente, cs seus alunos, quando
as penas morais forem ineficazes.
1849 — JESSIC JAMES — (com sua filha W i l l i e ) — Colégio par-
ticular, com externato, seminternato e internato. Grande
Colégio.
1855 — A L Z I R A L O B O S I M P L Í C I O — Professora com Escola Par-
ticular. Era mãe do Dr. Nilo Cairo, de saudosa memória.
1859 — JOSÉ C L E T O DA S I L V A — professor público, primário.
Manteve também um Colégio Particular.
1860 — D E M É T R I A DO N A S C I M E N T O Y L A V I N I A — (uruguaia)
professora com Escola Particular. Chamavam-na mestra
Dedé. Lecionou durante 30 anos, voltando depois ao seu
país.
1864 — M A R I A B E R N A R D A P I N T O C O R D E I R O — professora
particular e depois pública. Lecionou durante 24 anos.
Chamavam-na mestra Lica. Em 1888 mudou-se para
Curitiba.
1872 — M A R I A JÚLIA DA S I L V A N A S C I M E N T O — professora
particular e depois pública. Lecionou até 1897, quando
se aposentou.
1872 — A L Z I R A V A R G A S — professora particular. Lecionou al-
guns anos em P A R A N A G U Á . Voltou depois para Curitiba.
1874 — M A R I A T H E O D O R A DOS ANJOS — professora particular
para desasnar crianças. Sua Escola ficava quase em
frente da Escola Paroquial. Com alargamento da praça,
a casa desapareceu; era a primeira casa da rua Vieira dos
Santos (esquina). Chamavam-na "mestra Mariquinha
Theodora". Nas férias das demais escolas, os pais man-
davam os filhos estudar com ela, para não ficarem enco-
modando em casa. Já bem velha e doente, às vezes lecio-
nava do próprio leito, e isso fez até os últimos dias de
vida. Foi u'a mestra abnegada.
1874 — E L I S A T A V A R E S — professora particular. Morava na
rua Mal. Alberto de Abreu. Lecionou durante vários syios,
principalmente prendas domésticas. Era especialista em
trabalhos de agulha.
1874 — M A R I A R O S A DOS S A N T O S A N D R A D E e seu esposo
JOÃO B A P T I S T A P E R E I R A DE A N D R A D E — ambos pro •
fessores, lecionaram por vários anos no lugar denominado
R I B E I R Ã O , Município de P A R A N A G U Á . Ela, em 1877,
prestou exame de suficiência em Curitiba e trabalhou por
mais de 30 anos.

222
1878 — M A R I A B E N E D I T A CORDEIRO P I N T O — professora
particular no Rossío (era sua vocação). Em 1886, pres-
tou exame de suficiência em Curitiba sendo nomeada para
a Escola Mista do Rossío. Depois, lecionou em Alexandra,
Guaraqueçaba e por fim veio para a Cidade. Trabalhou
durante 24 anos, quando então se posentou, mudando-se
para Curitiba. A mestra M A R I A era avó do grande pro-
fessor D A R I O N O G U E I R A DOS S A N T O S que, por muitos
anos lecionou, junto com sua esposa, D. P O M P Í L I A , na
Escola Normal de P A R A N A G U Á .
1880 — C A E T A N A F E L I X DA S I L V A — professora particular,
lecionou longos anos. Solteira; morava com suas quatro
irmãs, também solteiras; inclusive um irmão solteiro.
Caso típico na sua Escola: Os alunos ficavam sentados em
uma "esteira" e a mestra, numa cadeira, com a "palma-
tória" e a "vara de marmelo" nas mãos, fazia as crianças
cantar a "tabuada" e soletrar, musicalmente, as pala-
vras . . . e os alunos o b e d e c i a m . . .
1883 — L E O C Á D I A R O C H A — Começou lecionando em Antonina;
vindo depois para P A R A N A G U Á , onde trabalhou durante
22 anos, como professora particular.
1884 — P A U L I N A A L V E S — professora particular. Lecionou em
P A R A N A G U Á , durante 20 anos no Rossio.
1884 — L U I Z A C O R R E I A N E T O — professora particular. Lecio-
nou alguns anos em P A R A N A G U Á . Logo depois casou-
-se, mudando-se para Curitiba, onde continuou dando
aulas.
a
1885 — JOSÉ A G O S T I N H O DOS S A N T O S — mestre da l . Ca-
deira, para o sexo masculino. Lecionou vários anos. Era
pai do General Agostinho dos Santos e irmão da mestra
M A R I A ROSA DOS SANTOS A N D R A D E .
1887 — S E R A F I N A P E R E I R A ALVES DE A R A Ú J O — professora
particular. Lecionou durante 40 anos no arrabalde do
Rossio.
1888 — JOSEFINA DOS ANJOS N E P O M U C E N O — lecionou vários
anos na Escola promíscua de Piaçagüera.
1888 — L U I Z A JACOB H U I e F R A N C I S C A H U I (mestra Chiqui-
nha) — ambas irmãs; lecionaram durante mais de 40
anos, particularmente.
1889 — A N T O N I A P E R E I R A S A I Ã O — professora pública e par-
ticular. Lecionou longos anos. Afastada, após a revolução
federalista. Mais tarde foi reintegrada no cargo, até sua
aposentadoria. D. Antoninha foi uma grande mestra,
grangeando a amizade dcs seus alunos. Era irmã do sau-
doso JOÃO REGIS P E R E I R A DA COSTA; de D. M A R I A
R. P E R E I R A A R A N T E S ; da primeira esposa do Cel. SE-
B A S T I Ã O S A N T ' A N A L O B O e outros: todos netos do últi-
mo C A P I T Ã O MÓR de P A R A N A G U Á .

223
1889 — I A I Á GONÇALVES P E R E I R A — lecionou alguns anos em
P A R A N A G U Á , mudando-se depois para São Paulo.
1890 — M A R I A DAS DORES L A I N E S — professora pública e par-
ticu^r. lecionou vários anos em P A R A N A G U Á
1890 — L U D O V I C A C A V I G L I A B Ó R I O — professora normalista,
nascida em T U R I N ( I t á l i a ) . Veio para o Brasil em 1889.
Em 1890, já casada, abriu uma Escola (Co'egio Ludovica
B ó r i o ) . Lecionou durante 29 anos.
1894 — A L E X I N A H E N R I Q U E T A DESLANDES DE SOUZA —
professora pública; lecionou durante 20 anos, em Guará-
tuba, depois em P A R A N A G U Á . Aposentou-se em 1914,
mudando-se para Santos. Todos os seus filhos, parana-
guaras, não moram mais aqui.
1894 — E L E U S I N A P L A I S A N T DE SOUZA — viúva aos 27 anos,
começou a lecionar. Grande professora; além do curso
primário e complementar ,ensinava francês, piano e pin-
tura, e isso o fez durante 46 anos. Deixou de trabalhar
em 1940, devido a falta de visão. Mestra durante tantos
anos, salientou-se, não só pelos seus dotes de cultura, mas
também pela sua capacidade didática. Conhecia-a muito
e sempre admirei essa extraordinária professora. Criou
ela, duas sobrinhas, Déa e Ariadne. Esta última — Ariadne
— ainda vive e foi sua grande auxiliar no afamado
Colégio "Plaisant", de tanto prestígio no passado.
1894 — F R A N C I S C A A N D R A D E (D. Chiquinha Andrade) — pro-
fessora pública, que lecionou durante 40 anos, até 1934.
quando se aposentou. Ficou sozinha no mundo e levou
9 anos enferma, porém, de pé, andando sempre. É que,
perdendo todos os seus, acabou ficando um tanto desequi-
librada. Conheci muito a mestra D. Chiquinha, po's fre-
qüentava a minha casa. Bastante inteligente e culta, era
' afilhada e sobrinha do saudoso sacerdote Monsenhor Celso
Itiberê da Cunha e do grande diplomata e músico Brasílio
Itiberê da Cunha. Faleceu ela em 1943.
1898 — F R A N C I S C A BORGES — (mestra Chiquinha Borges) de
família cearense, lecionou longos anos em P A R A N A G U Á
Faleceu em 1944.
1898 — JÚLIA DE O L I V E I R A E S I L V A — prestou exame de sufi-
ciência em 1898, sendo nomeada professora em Piaçagüe-
ra; depois para o Imboguaçú, Imbocuí, Barra do Sul e
Alexandra. Aposentou-se em 1924, com 26 anos de ma-
gistério público.
1917 — B A L B I N A CRUZ — Lecionou 14 anos gratuitamente; por
vocação. Por morte do marido (Emílio C r u z ) , passou a
cobrar dos alunos, apenas Rs 3$000 (três mil réis) de
mensalidade, a fim de poder se sustentar. Mais tarde, o
Prefeito —< Paulo da Cunha Franco — sabendo de sua si-
tuação, nomeou-a professora municipal, leiga. Gesto no-
224
bre do então Prefeito, procurando ajudar quem levou 14
anos a dar aulas às crianças, sem remuneração.
1918 — A D E L I N A M I R A N D A C O R R E I A — professora auxiliar do
Colégio Plaisant, trabalhando no primeiro Jardim da In-
fância Particular da Cidade. Mais tarde, estabeleceu-se,
organizando o seu próprio "Jardim" que lecionou ainda
por mais 12 anos, quando faleceu. D. Adelina tinha pen-
dor para a poesia, tendo composto alguns versos.
1919 — E S T E L A F R E C E I R O M I R A N D A — tendo prestado con-
curso, foi nomeada como professora, para o Porto D. Pedro
I I ; lecionando 17 anos, até 1936, quando se aposentou.
Foi uma grande mestra.

Vários professores lecionaram em P A R A N A G U Á , no fim do


século passado e foram brilhantes no magistério paranaguara,
Não podemos esquecer tais mestres, que tantos bnefícios trou-
xeram à nossa terra. Entre tantos, lembremos:
JÚLIO T H E O D O R I C O G U I M A R Ã E S e seu irmão H E R C Í L I O
G U I M A R Ã E S , foram grandes mestres em nossa terra. O professor
JÚLIO trabalhava em três turnos e lecionava por vocação; gran-
geando a estima, a consideração e o respeito de toda a comunidade.
Mais tarde, ele e o irmão mudaram-se para Curitiba, fundando um
grande Colégio, que ganhou fama na época.
Outros mestres como DÉCIO DA C O S T A L O B O , A N T O N I O
M O R A I S P E R E I R A DA COSTA (o velho T o n h á ) , L I N D O L P H O
P I R E S DA ROCHA POMBO, V Í T O R G R E I N e o professor N A T I V I -
D A D E , também brilharam, como mestres que foram e dos bons.
Neste século XX tivemos, no início, uma plêiade magnífica de
brilhantes educadores — astros aue fulguraram nos céus de
PARANAGUÁ:
B E N E D I T O N I C O L A U DOS SANTOS, JOSÉ B U S N A R D O .
JOSÉ BORGES, B E R N A R D I N O CAROPRESO, A D E L A I D E CARDO-
SO P I N T O , HELENA V I A N N A S U N D I N e R A N D O L F O A R Z U A —
mestres de gabarito em todos os sentidos.

Ainda nos fins do século passado tivemos uma grande profes-


sora:

1872 — M A R I A JULIA DA S I L V A N A S C I M E N T O — professora


particular; lecionava na própria casa onde morava (rua
da Imperatriz n. 1, hoje Marechal Deodoro). Era mãe do
nosso grande historiador: V I C E N T E N A S C I M E N T O JÚ-
N I O R . — Em 1874, foi nomeada professora pública, depois
de ter prestado exames de suficiência em Curitiba. Lecio-
nou durante 8 anos em Guaratuba (para o sexo feminino).
Em 1882, foi removida para P A R A N A G U Á , até 1894, quan-
do foi exonerada, após a revolução federalista. Em 1896,
foi reintegrada no cargo, lecionando até 1897, quando se
aposentou.

225
Ainda em 1892, o Club Litterario conferiu-lhe o "Diploma" ae
"sócia honorária", pelos relevantes serviços prestados à Instrução
Pública.
Ela muito auxiliou na formação da Biblioteca do Club Litte-
rario, que ainda estava em fase de organização.
Essa mestra recebia, constantemente, os livros didáticos pu-
blicados pelo grande professor da época: Dr. A B Í L I O CESAR BOR-
GES, para distribuir, gratuitamente aos seus alunos.
Era ela uma autodidata; lecionando por vocação. Muito culta
e educada, tornou-se bastante considerada no meio social em que
vivia. Foi, de fato, uma grande mestra.

226
UM COLÉGIO PARTICULAR FEMININO

No ano de 1849, surgiu em P A R A N A G U Á um grande Colégio


Particular Feminino, de Instrução Primária, dirigido pela profes-
sora JESSIC JAMES e sua filha.
Esse Colégio, localizado à rua da Bôa Vista, hoje Visconde de
Nacar (pouco adiante da Prefeitura), não tinha número limitado
de alunas. Recebia todas as mocinhas e meninas que quisessem
aprender, enquanto permitissem as forças da Diretora e o prédio
comportasse. As educandas podiam ser: internas, seminternas e
externas.
I N T E R N A S — residiriam no próprio estabelecimento de ensino.
S E M I N T E R N A S — passariam o dia na Escola e dormiriam em
suas casas.
E X T E R N A S — freqüentariam apenas as aulas.

As matérias eram as seguintes:


Doutrina Cristã — Caligrafia — Leitura — Aritmética — Lín-
guas — portuguesa, francesa e inglesa, gramaticalmente — Geo-
grafia — História — Desenho — Música — Piano — Danças —
Prendas domésticas.
Para as alunas que quisessem aprender apenas música e piano,
seria feito um contrato à parte.
Os domingos e feriados, eram dedicados ao recreio no Colégio.
A semana Santa e o Natal, seriam considerados como época de
férias. Nos dias santos, as alunas poderiam passar em suas resi-
dências.

As internas deveriam trazer:

Uma marquesa (cama) com seus pertences; um móvel para


colocar suas roupas; uma bacia para banho e outra para lavar o
rosto; um copo, uma escova de dentes e outra de unhas; uma te-
soura para cortar unhas; um pente fino e outro de alisar; uma
caixinha para guardar pentes ;escovas, sabonetes, alfinetes e de-
mais pertences miúdos. Trariam também um dedal, agulheiro,
tesoura; um saco para guardar a costura e uma cadeira.
Qualquer objeto a ser entregue às alunas, teria que passar
pelas mãos da Diretora, e isso no horário das 4 às 6 da tarde, a
fim de não interromper os estudos das mesmas.

227
O Colégio assegurava o maior asseio e a mais delicada atenção
às alunas. Quanto à alimentação, seria abundante e sobretudo
sadia...
Foi realmente um Colégio "modelo" em P A R A N A G U Á ; pois as
alunas, meninas e moças, tinham uma educação social e cultural
bem aprimorada; tornando-se, dessa maneira, verdadeiras damas
de salão. Razão porque, o historiador Demétrio Acácio Fernandes
da Cruz tanto elogiou, nessa época, nos seus apontamentos histó
ricos, a mulher paranaguara, dizendo ser ela muito espirituosa e
de fino trato, dada a sua graça, elegância e maneira aristocrática.
Por vários anos manteve-se firme o extraordinário Colégio.
Mas, como tudo cansa e tende, na vida, a desaparecer; ele também
desapareceu; pois Madame JESSIC e sua filha cansaram e, não
podendo mais agüentar, devido a estafa, mudaram-se de P A R A -
NAGUÁ. ..
Deixaram elas uma grande lacuna, por muito tempo, na vida
social e cultural do belo sexo paranaguara.
Só mais tarde, com a vinda das professoras Ludovica Caviglia
Bório, Eleusina de Souza Plaisant e as irmãs do Colégio São José,
essa falta foi suprida satisfatoriamente.
Grandes benefícios trouxeram para a nossa Cidade esses três
grandes Educandários. O Colégio Ludovica Bório, por 30 anos; o
Colégio Plaisant por 45 longos anos (ambos desaparec dos) e o
Colégio São José, com 63 anos, ainda se conserva firme e bem
acreditado.

P A R A N A G U Á tem sido feliz no setor e d u c a c i o n a l ! . . .

228
UM GRANDE MESTRE

Caracterizar uma Escc^a Primária do século passado, é falar


de u'a modesta sala de aula com toscos bancos, pouca iluminação
e pouco ar; é falar do material didático quase nulo e de nenhuma
motivação. Entretanto, é também falar do comportamento das
criaturinhas desde 7 anos até aos adolescentes te'rando os 16;
muita disciplina e respeito e muito amor ao estudo.
É ainda, falar dos velhos mestres com aquela cultura gerai,
que, ensinando o Curso Primário, adiantavam-se em ministrar as
matérias do Ginásio de hoje, aos jovens de 15 e 16 anos.
A criança aprendia de verdade e, mau grado a rigidez do mes-
tre-escola, ela formava o seu caráter nos moldes da educação da
época.
Valia a pena conversar com os jovens do passado. Havia serie-
dade nas ações, compreensão mútua e, sobretudo, aquilo tão ne-
cessário ao homem: o respeito à pessoa humana. Isto é muito im-
portante nos dias de hoje.
O mestre-escola, austero como sempre, era um varão de gran-
des virtudes; merecedor de todo o respeito e consideração de uma
grei.
Assim eram eles, nos tempos que já vão l o n g e . . . E, recor-
dando tais criaturas — grandes sacerdotes na arte difícil de ensi-
nar — exemplifiquemos um professor do passado, um extraordiná-
rio mestre-escola que, pelos seus dons de espírito e abnegação;
seus dotes de cultura e conhecimentos gerais; sua firmeza de cará-
ter, era considerado o mestre mais nobre, mais culto e mais hu-
mano — JOSÉ CLETO DA S I L V A ,
Nasceu, esse ilustre paranaguara, aos 24 de outubro de 1843.
a
Filho de José Cleto da Silva e de D . Maria Rosa da Silva (pobres
e humildes), não pôde transferir-se para Curitiba, a fim de conti-
nuar os estudos e aperfeiçoá-los.
Terminando o Curso Primário, que na época era importante,
o qual fez com brilhantismo, mereceu o 1.° lugar, recebendo como
"prêmio" do Governo Estadual, a nomeação de "auxiliar de ensino"
em Paranaguá.
Considerado "aluno-mestre", começou a lecionar com 16 anos
de idade. JOSÉ C L E T O DA S I L V A tornou-se então um ativo e es-
forçado educador, em todos os sentidos. Verdadeiro auto-didata,
229
fazendo estudo de gabinete, revelou-se um admirável sacerdote do
saber.
Estimadíssimo pelos alunos, grangeou a confiança da popu-
lação e a amizade das pessoas de bem.
De espírito combativo, porém com linha, defendia, pela I m -
prensa, seus sonhos de liberdade, quanto à situação dos pobres
escravos. (Nobres ideais daqueles grandes brasileiros ! ) .
Em sua "sala de aula", ensinando sempre a verdade, pregava
a igualdade entre os homens. Todos nós, dizia ele: "somos iguais
perante Deus ! . . .
Seus alunos, que eram muitos, entre brancos e pretos, adora-
vam-no e seguiam com ardor suas idéias libertárias.
Na força ainda de um Governo Imperial e em plena escravi-
dão, repelia, com veemência, tal forma de vida para os pobres
escravos.
Defensor desses sofredores, não se conformava com a grande
mancha que enodoava o solo pátrio.
1
Pregando, em aula, a liberdade de tais criaturas, fazia senta '
um garoto branco junto a um negrinho, exemplificando assim a
iguaMade entre as criaturas (como fazia o N A Z A R E N O entre o
povo de Israel). Mas como era de se esperar, numa Sociedade cheia
de preconceitos e regidez de costumes, uma onda de descontenta-
mento dos puritanos pais começou a se levantar contra as idéias
libertadoras do mestre.
O professor C L E T O porém não se deixou abater; continuou
firme em seus propósitos. Aos sábados, como era de costume, as
crianças iam assistir a missa e Te-Deum, acompanhadas pelo
mestre; isso em todas as escolas. Ele então, aproveitando a ocasião,
colocava, na formatura, um menino branco ao lado de um garoto
preto, bem como um rico junto a um pobre. Essa formação partia
da Escola, pelas ruas da Cidade, em demanda da igreja Matriz,
cantando a "Ladainha".
O "Zé povinho", que não perdia a oportunidade de criticar os
ricaços, fazia os mais escandalosos comentários, gozando os puri-
tanos da época, senhores de regular escravatura.
De volta da missa, o velho mestre fazia uma pequena preleção,
simples mas convincente, explicando que, perante DEUS, todos são
iguais ! Não havendo preconceitos de raça ou de côr. E, isso tudo,
acontecendo em pleno 2.° Império ! Que fibra de homem ! . . .
Excusado é dizer, a revolta incontida dos pais, ricos e impor-
tantes, diante de tal humilhação a que seus filhos eram expostos
(assim julgavam eles).
A política, pois, entrou em ação, e o velho professor teve que
deixar a sua querida Paranaguá, transferindo-se para União da
Vitória. Então, naquela terra hispitaleira, ainda sem instrução, o
professor JOSÉ C L E T O DA S I L V A , funda a primeira Escola e o
primeiro Internato ! Foi isso em 1895 ! . . .
230
O professor Cleto foi o precursor da instrução em União da
Vitória e lá criou raízes, vivendo os seus últimos anos de v i d a . . .
Esse grande mestre, iniciando-se no Magistério com apenas
16 anos, trabalhou, só em Paranaguá, 36 anos. De 1859 a 1895.
Nesta última data, transferiu-se, por motivos políticos, para União
da Vitória. Tinha ele 52 anos, quando teve que deixar seu berço
natal, devido a vaidade ferida de certos papais r i c o s . . .
Quanta maldade h u m a n a . . . e, quanta mágua levou esse ines-
quecível mestre para o túmulo ! . . . Falecendo a 24 de fevereiro
de 1912.

231
"LUDOVICA CAVIGLIA BÓRIO"

UMA GRANDE MESTRA !

Professora Normalista, nascida em Turim ( I t á l i a ) , em 1865,


aos 25 de outubro, onde estudou e se formou.
Veio para o Brasil em 1889, em companhia de seu noivo, o
Sr. João Baptista Bório.
Seu Bório, como o chamavam, de origem italiana, há muito
residindo em Paranaguá, com sua bem montada "Barbearia", era
muito estimado na Cidade, principalmente pela fina flor da socie-
dade paranaguara; formando toda ela a sua melhor freguezia.
Viúvo duas vezes, teve, do 1.° matrimônio, dois filhos: Celes-
tino e Secundino, e destes, 3 netos: Atílio, Janguito e Olavo. Este
último tocava violino com muito gosto e sentimento.
Seu Bório, então, casou em segundas núpcias, com uma irmã
do velho e honrado Anibal Dias de Paiva.
a
Enviuvando pela 2 . vez, resolveu dar um passeio à sua que-
rida Itália, deixando os filhos à testa dos seus negócios.
Chegando ao seu país e visitando a linda cidade — Turim — lá
conheceu a sua prima Ludovica Caviglia Bório e, um romance de
amor nasceu entre os dois.
Parece que a família dela não apoiava o casamento devido a
questão de classe social (Ludovica era sobrinha de um bispo e
descendente de tradicional f a m í l i a ) .
Mas o amor está acima de tudo na vida! Ambos resolveram
fugir para o Brasil e aqui casar.
Assim fizeram; casando a bordo do navio em que viajavam,
para depois confirmar em Paranaguá.
Aqui chegados, seu Bório levou a esposa-noiva para a casa do
abastado negociante Sr. Miguel Veiga e sua esposa D. Arminda,
onde ficou hospedada até o dia do casamento. Dona Mindoca (como
era chamada) tratou-a com todo o carinho, reconhecendo nela um
caráter ilibado e moça de fino trato. Enquanto isso, seu Bório tra-
tava cie preparar os papéis para o seu casamento, que se realizou
oito dias depois, na residência da família Miguel Veiga.
O casal então tratou de cuidar da sua nova vida. Ele com sua
tesoura e navalha, a trabalhar na "barbearia". Ela, professora, com
conhecimentos gerais; falando corretamente o italiano e o francês
e conhecendo também o latim; fácil lhe foi aprender o nosso idioma,
232
recebendo aulas do vigário da Paróquia, do Juiz de Direito e do
Promotor Público (todos amigos do seu m a r i d o ) ; dentro de um
ano, estava ela falando bem o português.
Aí é que começa a sua vida cultural em Paranaguá; abrindo
uma escola particlar, que recebeu o nome de Colégio "Ludovica
Bório". Começou então a receber alunos para o Ensino Primário e
prendas domésticas. Em pouco tempo, tornou-se um Colégio misto
e de muita fama.
Pianista formada pelo Conservatório de Turim, começou tam-
bém a lecionar piano, preparando assim ótimas pianistas para os
festivais que realizava no Club Litterario, todos os anos.
Organizava concertos, que faziam as delícias dos paranaguaras
amantes da música. Começou a colaborar nos jornais da terra, com
muita facilidade e em bom português.
Seus serviços intelectuais e artísticos prestados a Paranaguá,
foram tantos que, o Club Litterario, padrão de glória da Cidade,
em sessão solene, conferiu-lhe o título de "Sócia Honorária", pelos
relevantes serviços prestados ao meio social e ao próprio Club.
D. V I C A sentiu muito deixar a sua pátria, seus parentes e
amigos. Mas fez, aqui, um vasto círculo de amizades verdadeiras,
que bem compensaram o que ficou na velha Itália.
Depois de 30 anos de Magistério Particular e de Arte, mudou-se,
em 1919, para Curitiba, devido o seu estado de saúde, continuando
porém a lecionar apenas piano. Alguns anos depois, em 1930, foi
residir em São Francisco do Sul, na casa de sua afilhada predileta,
Maria da Graça Franco (Gracinha), grande pianista e uma de suas
melhores alunas. Lá, veio a falecer em 1934, com 69 anos de idade
e já viúva.
Ludovica Caviglia Bório foi uma extraordinária professora, que
a velha Paranaguá recebeu de braços abertos, e que ela, em troca,
nos 30 anos que aqui viveu, muito fez pelas artes e pelo ensino de
a
seus filhos. Foi uma estrela de l . grandeza, irradiando a luz do
saber!...
Paranaguá homenageou-a, dando o nome da ínsigne mestra
a uma das ruas da Cidade.

PROFESSOR R A N D O L F O A R Z U A

Lecionando quase 30 anos, deu de si tudo o que pôde quanto


ao Magistério que abraçou por vocação. Professor público e parti-
cular, trabalhou também na Escola Paroquial N. S. do Rosário, por
vários anos.
Foi, depois, nomeado professor de Música do Colégio Estadual
"JOSÉ B O N I F Á C I O " ; organizando magníficas festas artísticas com
os alunos daque'e acreditado Estabelecimento de Ensino Médio.
Lecionou também "português" no Ginásio; pois era muito compe-
tente e bastante culto.

233
Deixou ainda cedo este mundo. Mas os anos que viveu, apro-
veitou bem na prática do mestrado. Foi um grande mestre e um
grande músico (pianista). Dedicou o vida inteira ao Magistério de
sua terra. Verdadeiro amigo de seus alunos, ao ponto de, às vezes,
discutir com os colegas, em defesa dos seus discípulos. Jamais re-
provou um estudante (e isso dizia com ufania).
Como pianista — excelente na execução. Sabia dar um colo-
rido especial às peças que tocava, com perfeição. Não havia quem
não gostasse de ouví-lo tocar piano; mormente em se tratando de
música popular brasileira. Tinha a grande facilidade de executar
qualquer música que se lhe apresentasse de primeira vista. Foi um
verdadeiro cultor da música e um excelente professor.

A D E L A I D E CARDOSO P I N T O

Professora pública e particular. Veio nomeada para P A R A N A -


G U Á , aqui lecionando quase 30 anos. Trabalhou também na Esco a
Paroquial N. S. do Rosário, onde a conhecemos.
Foi uma grande professora, com aquela dedicação própria dos
antigos mestres. Abraçando o Magistério, fez jús ao conceito em
que era t.'da em nossa terra como mestra estimada. Depois de apo-
sentada, ainda viveu muitos anos, rodeada de seus queridos netos.

HELENA V I A N A SUNDIN

Veio residir em P A R A N A G U Á ; aqui estudando e se formando


na Escola Normal "Dr. Caetano Munhoz da Rocha".
Foi logo nomeada para o Grupo Anexo à Escola Normal; pas-
sando também a lecionar na Escola Paroquial N. S. do Rosário.
Em pouco tempo fez sua ascenção no Magistério; tornando-se
uma verdadeira mestra, Foi depois nomeada para a Escola Nor-
mal Secundária e ainda para a Escola Técnica de Comércio.
A professora Helena era estimadíssima pelos seus alunos: po'£>
além de competente e mais que tudo boa, sabia compreendê-los.
Inegavelmente, foi uma grande educadora.
Já aposentada; teve morte trágica, devido a um acidente em
Curitiba.
Seu falecimento foi bastante sentido na Cidade.
:
Helena Viana Sundin também era musicista; tocava "flauta
muito bem. Dada a sua grande modéstia, não gostava de tocar em
público. A sua "flauta" acha-se em nosso Museu Histórico. Seu
nome jamais será esquecido.

234
ELOINA DE CAMARGO V I A N N A

Professora normalista. Tão logo formada, veio nomeada para


a nossa terra. Casando com o estimado cidadão: Álvaro Vianna,
farmacêutico de muito conceito na Cidade.
D. Eloina, de qualidades morais e espirituais bem elevadas, aqui
radicou-se: dedicando sua vida ao lar e ao Magistério público e
particular. Mais tarde passou a lecionar na Escola Normal. Boa e
meiga para com seus alunos, grangeou logo o apreço de todos os
que por suas mãos passaram. Trabalhando até bem pouco tempo;
mesmo depois de aposentada; era procurada pelos a"unos para re-
ceber seus conhecimentos de Matemática. Por morte de seu esposo,
deixou de dar aulas particulares. Grande mestra que foi.
Para a felicidade da sua família e dos que a consideram, ela
está bem de saúde, por graça de Deus. Essa educadora ficará na
História de P A R A N A G U Á .

C O L É G I O SÃO JOSÉ

Em 1903, instalou-se em P A R A N A G U Á o Educandário "São


José", dirigido por competentes irmãs de caridade.
Esse importante Estabelecimento de Ensmo; esteio da Religião
Católica em nossa terra, teve como primeira superiora " M E R E
E U F R Á S I A " . As demais mestras, anônimas como sempre, tudo
deram de si em prol desse grande Colégio.
Verdadeiras abnegadas essas "irmãs mestras", não se pode
negar, tudo têm feito de bom e útil para a educação feminina.
Instaladas, nos primeiros anos, no antigo prédio da "Santa
Casa de Misericórdia", tiveram elas também meninos até a idade
de 7 anos.
Tempos depois, deixaram de dar aulas aos travessos parana-
guaras; ficando apenas com o curso feminino.
Hoje, instalado em magnífico prédio próprio, esse Educandário
vem prestando inestimáveis serviços à cultura de nossa Cidade.

COLÉGIO E S T A D U A L "JOSÉ B O N I F Á C I O "

Estabelecimento de Ensino do 1.° e 2.° graus, mantido pelo


Governo do Estado, vem prestando relevantes serviços à causa da
Instrução em nossa P A R A N A G U Á .
Com um corpo docente à altura e com mais de 3.000 alunos
matriculados, pode-se avaliar os benefícios que tem prestado à
população paranaguára.
Modelar "Casa de Ensino", é o Colégio Estadual "José Boni-
fácio", um padrão de glória para a nossa terra.

235
I N S T I T U T O DE EDUCAÇÃO

Antiga Escola Normal Secundária; hoje — I N S T I T U T O D7:


EDUCAÇÃO "DR. C A E T A N O MUNHOZ DA R O C H A " — excelente
Educandário, com um bem formado corpo docente, a preparar
"professores primários". Esse afamado Estabelecimento de Ensino
é mantido pelo Governo Estadual.

COLÉGIO E S T A D U A L C O M E R C I A L

Colégio Estadual Comercial " A L B E R T O GOMES V E I G A " .


Colégio cuja finalidade é preparar os jovens para o Comércio (con-
tadores), formando-os em Contabilidade. Modelar Estabelecimento
de Ensino Técnico que muito honra a nossa P A R A N A G U Á . É man-
tido também pelo Governo do Estado.

COLÉGIO ITIBERÊ

Outro Educandário Particular, com Ginásio e Escola Norma':


muito procurado pela juventude estudiosa de nossa terra. O Colé-
gio I T I B E R Ê é de propriedade da distinta professora — A L C I O N E
C O R R E I A DE F R E I T A S — sua ilustre Diretora, que muito bem
trabalhado para tornar cada vez melhor o seu importante Estabe-
lecimento de Ensino.

GINÁSIO LEÃO X I I I

É, o Ginásio Leão X I I I , um Educandário de muita fama em


nossa Cidade. Com um corpo docente composto de ótimos profes-
sores, tornou-se um Estabelecimento de Ensino muito procurado
pelos bons estudantes. Ele é um baluarte da região católica em
PARANAGUÁ.

F U N D A Ç Ã O FACULDADE E S T A D U A L DE F I L O S O F I A ,
CIÊNCIAS E L E T R A S DE P A R A N A G U Á

Estabelecimento Superior de Ensino, com um Corpo Docente


de primeira ordem; de conceito bastante elevado. Merece o respeito
e a consideração do povo paranaguara, que vê nessa Casa de Ins-
trução um verdadeiro "Templo do Saber" para os estudantes que
querem realmente aprender.

236
19 7 6

ESTABELECIMENTOS PARTICULARES

F U N D A Ç Ã O F A C U L D A D E DE F I L O S O F I A ( E S T A D U A L )
D I R E T O R : Professor Leônidas Boutin
PROFESSORES: 50
A L U N O S : 635

01 — COLÉGIO " S Ã O JOSÉ"


D I R E T O R A : Professora Antenesca Michellin
PROFESSORES: 25
A U N O S : 429

02 — COLÉGIO " I T I B E R Ê "


D I R E T O R A : Alcyone Correia Defreitas
PROFESSORES: 25
A L U N O S : 600

03 — G I N Á S I O " L E Ã O X I I I "
D I R E T O R : Padre Michael Thomas Slieehan
PROFESSORES: 15
A L U N O S : 150

04 — ESCOLA P A R O Q U I A L "NOSSA SENHORA DO R O S Á R I O "


D I R E T O R A : Neide P. G. de Freitas
PROFESSORES: 20
A L U N O S : 496

05 — C E N T R O E D U C A C I O N A L " P E I X I N H O S A P E C A "
D I R E T O R A : Niva Salgado de Oliveira
PROFESSORES: 26
A L U N O S : 280

06 — J A R D I M DA I N F Â N C I A " T I A N I L Z A "
D I R E T O R A : Nilsa B. do Nascimento
PROFESSORES: 09
A L U N O S : 170

07 — ESCOLA A D V E N T I S T A "DUQUE DE C A X I A S "


D I R E T O R : Abelardo Moralles
PROFESSORES: 02
A L U N O S : 66

ESTABELECIMENTOS PARTICULARES
TOTAL:
PROFESSORES: 172
A L U N O S : 2.826

237
19 7 6

ESTABELECIMENTOS DE ENSINO ESTADUAIS


a a
ENSINO DE l.o G R A U ( 5 a 8 . ) e 2.° G R A U

01 — COLÉGIO E S T A D U A L "JOSÉ B O N I F Á C I O "


D I R E T O R : José Carlos Tramujas Rohn
PROFESSORES: 82
A L U N O S : 1.865
02 ----- I N S T I T U T O E S T A D U A L DE EDUCAÇÃO
"DR. C A E T A N O MUNHOZ D A R O C H A "
D I R E T O R G E R A L : Alceu de Oliveira Toledo
D I R E T O R A : Neide Cury da Paz
PROFESSORES: 82
A L U N O S : 1.865
03 — COLÉGIO E S T A D U A L C O M E R C I A L
" A L B E R T O GOMES V E I G A "
D I R E T O R : Elcio do Nascimento
PROFESSORES: 15
A L U N O S : 370
04 — G R U P O ESCOLAR "ESTADOS UNIDOS DA A M É R I C A "
D I R E T O R A : Rosi Calonassi Bonetto
PROFESSORES: 23
A L U N O S : 782
E S T A B E L E C I M E N T O DE l.o G R A U E TÉCNICO
PROFISSIONAL
D I R E T O R : João Kraechychyn
PROFESSORES: 08
A L U N O S : 170
( S E N A I - Centro de Formação Profissional de Parannaguá).

a a
E N S I N O D E 1.° G R A U ( l . a 4 séries) E S T A D U A L

01 — I N S T I T U T O E S T A D U A L DE EDUCAÇÃO
"DR. C A E T A N O MUNHOZ D A R O C H A "
D I R E T O R G E R A L : Alceu de Oliveira Toledo
D I R E T O R A : Mercedes Macedo Lima
PROFESSORES: 30
A L U N O S : 293
02 — ESCOLA " D I D I O A U G U S T O DE C A M A R G O V I A N N A '
D I R E T O R A : Maria Aparecida de Camargo V. Scacalossi
PROFESSORES: 15
A L U N O S : 239
238
03 — ESCOLA "PROFESSOR R A N D O L F O A R Z U A
D I R E T O R A : Zuleima C. Pinto
PROFESSORES: 29
A L U N O S : 341

04 — ESCOLA " C I D A L I A REBELLO G O M E S "


D I R E T O R A : Ozilia B. de Andrade
PROFESSORES: 23
A L U N O S : 351

05 — ESCOLA "DR. ROQUE V E R N A L H A "


D I R E T O R A : Enedina Maria do Pilar C. Silva
PROFESSORES: 26
A L U N O S : 278

06 — ESCOLA " F A R I A S O B R I N H O "


D I R E T O R A : Rosa Maria S. Temporão
PROFESSORES: 20
A L U N O S : 152

07 — ESCOLA " H E L E N A V I A N A S U N D I N "


D I R E T O R A : Heleodete Pedrosa
PROFESSORES: 35
A L U N O S : 346

08 — C O M P L E X O ESCOLAR "ESTADOS UNIDOS


DA AMÉRICA"
D I R E T O R A : Rosi C. Bonetto
PROFESSORES: 43
A L U N O S : 441

09 — ESCOLA "DR, BENTO MUNHOZ DA R O C H A N E T O "


D I R E T O R A : Edite C. de Farias
PROFESSORES: 15
A L U N O S : 229

10 — ESCOLA " V I L A G U A R A N I "


D I R E T O R A : Maria das Dores T. Xavier
PROFESSORES: 15
A L U N O S : 193

11 — ESCOLA "JOÃO G U I L H E R M E G U I M A R Ã E S "


D I R E T O R A : Nüta de Moura
PROFESSORES: 42
A L U N O S : 568

12 — G R U P O ESCOLAR N O T U R N O DA C O S T E I R A (Supletivo)
D I R E T O R A : Izabel M. da Silva
PROFESSORES: 13
A L U N O S : 210

239
ESTABELECIMENTOS DE ENSINO ESTADUAIS
a a
(5 8. e 2 ° G R A U )
a

Professores 210
Alunos 5.052
a a
(I a4 )
Professores 306
Alunos 3.641

TOTAL GERAL

Professores 516
Alunos 8.693

ESTABELECIMENTOS DE ENSINO MUNICIPAIS

Nome do Estabelecimento Alunos Prof.

01 Unidade Escolar M. Presidente Kennedy 782 38


02 — Unidade Escolar M. Vila São Francisco 164 9
03 — Unidade Escolar M. Liceu Manoel Viana 222 15
04 — Unidade Escolar M. Nestor Vitor 440 19
05 —, Unidade Escolar M. Jardim América 69 2
06 — Unidade Escolar M. Luiz Vaz de Camões 458 26
07 — Unidade Escolar M. Alexandra 266 13
08 — Unidade Escolar C. Excepcional 57 15
09 — Unidade Escolar M. Floresta 407 18
10 —, Unidade Escolar M. Hugo Pereira Corrêa 864 42
11 — Unidade Escolar M. Pres. Costa e Silva 655 40
12 — Unidade Escolar M. Vila São José 101 3
CO

13 — Unidade Escolar M. Nascimento Junior 193


14 — Unidade Escolar M. Pres. Castelo Branco 679 36
15 — Escola Municipal de Amparo 56 1
16 — Escola Municipal de Barrancos 19 1
17 — Escola Municipal de Costeirinha 14 1
18 — Escola Municipal de Eufrasina 61
19 — Escola Municipal Prof. Eulalia M. Silva 15 1
20 — Escola Municipal José das Dores Camargo 37 1
21 — Escola Municipal de Maciel 23 1
22 — Escola Municipal Colônia Maria Luiza 25 1
23
a
— Escola Municipal Prof. Maria T. R. Silva 38 2

240
Nome do Estabelecimento Alunos Prof.

24 — Escola Municipal de Medeiros 9 1


25 —> Escola Municipal de Morro Inglês 29 1
26 — Escola Municipal de Nova Brasília 34 1
27 — Escola Municipal de Piaçagüera 18 1
28 — Escola Municipal de Ponta do Oeste 21 1
29 — Escola Municipal de Ponta Ubá 39 1
30 — Escola Municipal de São Luiz 13 1
31 — Escola Municipal de Santa Cruz 29 1
32 — Escola Municipal de Shangri-lá 27 1
33 — Escola Municipal de Tambarutaca 46 1
34 — Escola Municipal de Toral 59 2
35 — Escola Municipal 29 de Julho 18 1
36 — Escola Municipal 31 de Março 31 1
37 — Escola Municipal de Colônia Pereira 18 1
38 — Escola Municipal de Quintilha 35 1
39 —i Escola Municipal de Prainha 43 1

T O T A L

Escolas Particulares Alunos 2.826 Professores 172


Escoas Estaduais Alunos 8.693 Professores 517
Escolas Municipais Alunos 6.114 Professores 311

São, portanto, 17.633 estudantes, nas várias idades, que fre-


qüentam as escolas particulares, estaduais e municipais neste ano
de 1976. É um bom índice.
Das 39 escolas públicas municipais, 14 foram fundadas du-
rante as duas gestões do atual Prefeito — Nelson de Freitas Bar-
bosa — não se contando o aumento de salas de aula nos vários
grupos. Inegavelmente, é trabalhar pela educação de um povo.
Fato interessante. A contagem de professores deu exatamente
1.000
São, então, 1.000 mestres a transmitir conhecimentos às várias
escolas de nossa P A R A N A G U Á .

P . S . — O Dr. Joaquim Tramujas, quando prefeito, construiu o


" G I N Á S I O DE E S P O R T E S " . E quanto tem ele servido às
gerações que estão se s u c e d e n d o ? ! . . . O "esporte" tam-
bém é cultura ! . . . Não precisamos dizer m a i s . . .

241
HOMENS ILUSTRES
COMENDADOR MANOEL FRANCISCO CORREIA JÚNIOR

Nasceu esse ilustre varão no ano de 1809, em Paranaguá. Era


filho do Conselheiro Manoel Francisco Correia, o Velho, e de D.
Maria Joaquina da Trindade.
Sua vida foi toda dedicada ao torão natal, pois muito cedo
entrou para a política, dedicando-se de corpo e alma.
Em 1826, ajudou a criar a "SOCIEDADE P A T R I Ó T I C A DOS
DEFENSORES DA I N D E P E N D Ê N C I A E DA L I B E R D A D E CONS-
T I T U C I O N A L " . Sociedade essa que depois transformou-se em
I R M A N D A D E D A M I S E R I C Ó R D I A ; sendo hoje a nossa S A N T A
C A S A DE M I S E R I C Ó R D I A . E note-se, foi idéia sua, em transfor-
mar essa Sociedade de caráter político, em Sociedade Filantrópica.
Iniciativa que calou bem fundo no ânimo dos associados, e mais
ainda em todo o povo da V I L A .
a
Fundou, com outros paranaguaras, em 1837, a l . LOJA M A -
ÇÔNICA capitulada " U N I Ã O P A R A N A G Ü E N S E " (l.a também do
Paraná).
Durante a "Guerra dos Farrapos", foi-lhe confiado o comando
da Guarda Nacional da V I L A .
a
Muito trabalhou para que a nossa 5. Comarca fosse desmem-
brada de São Paulo e se transformasse em P R O V Í N C I A DO P A -
R A N Á (sendo ele o "principal dos precursores imediatos").
Com a revolução rompida em Sorocaba, em que a Câmara
Municipal de Paranaguá se reuniu em Sessão Especial para lavrar
um protesto contra a rebeldia daqueles brasileiros, C O R R E I A
J U N I O R tratou de criar, armar e fardar um batalhão legalista
(particular), mantendo-o à sua custa; caso fosse preciso mandá-lo
marchar contra os revoltosos...
Tudo isso fez, esperando a promessa do Barão de Monte
Alegre, quanto à emancipação. Entretanto, o velho Barão só cum-
priu parte do prometido, elevando P A R A N A G U Á e C U R I T I B A à
categoria de cidades...
Correia Junior sofreu muitas injustiças e mesmo perseguições,
ao ponto de mudar-se para Porto de Cima, onde tinha o seu En-
genho.
Esse idealista ilustre perdeu toda a sua fortuna, na luta que
travou, junto com outros idealistas, para conseguir a emancipação
política do nosso Paraná. E, no fim, só teve desenganos. Morreu
desgostoso, em 1857.
Mas Paranaguá soube, mais tarde, reconhecer os seus méritos,
elevando-o ao pedestal que sempre fez jus, erigindo-lhe um monu-
mento em frente à rua que tem o seu nome.

245
DR. MANOEL FRANCISCO CORREIA NETO

Conselheiro do Império, nasceu esse eminente cidadão nesta


querida Paranaguá, no dia 1.° de novembro de 1831.
Seus genitores, Comendador Manoel Francisco Correia Junior
(o moço) e D. Francisca Antonia Pereira, tão logo terminou ele o
curso primário, mandaram-no interno para o Colégio "Freese" em
Nova Friburgo, a fim de cursar o propedêutico.
T ã o brilhantes foram os seus exames finais, que o embaixador
da Rússia — Conde Lomonosoff — estando presente aos exames
orais, ofertou-lhe um livro, fazendo os maiores elogios.
Seu mestre — John H. Freese — entusiasmado com esse resul-
tado, ofereceu-lhe uma "enciclopédia', com esta dedicatória
"Oferecido ao meu jovem amigo — Manoel Francisco Correia
Neto — primeiro estudante do meu Colégio, com o desejo e a espe-
rança de que ele honrará seu nome, sua Pátria e a Humanidade".
Deixando o Colégio "Freese", matriculou-se no 4.° ano do Co-
légio Pedro I I .
Em 1848, formou-se bacharel em letras, aos 18 anos de idade.
Em 1849, matriculou-se no Curso Jurídico da Faculdade de S.
Paulo.
Em 1853, formou-se em Direito, com 23 anos de idade, e, em
vez de seguir a carreira liberal, preferiu o funcionalismo público;
tendo subido rapidamente.
Em 1854, foi nomeado oficial de gabinete da Secretaria da
Fazenda.
Em 1859, promovido a chefe de Secretaria, como oficial de ga-
binete de vários ministros.
Em 1862, foi nomeado presidente da Província de Pernambuco,
dada a confiança que merecia por parte do Marquês de Olinda.
Em 1869, foi eleito deputado geral pela Província do Paraná e,
em 1870, chefe da Diretoria de Estatística, levantou o primeiro
recenseamento do Império.
Em 1873, instituiu as conferências populajres da Escola da
Glória. A elas compareceu o Imperador, bem como as altas perso-
nalidades da Corte, tanto da política como das letras.
Na Câmara dos Deputados, muito cooperou na campanha par-
lamentar a favor da Lei de 28 de setembro (Lei do Ventre L i v r e ) .
Por essa razão, o Visconde do Rio Rio Branco, que lhe era muito
grato por esse valioso concurso, convidou-o para o alto cargo de
Ministro dos Negócios Estrangeiros.
Naqueles tempos a situação de nosso país nada estava a de-
jar. Isso porque, várias reclamações haviam sido feitas por súditos

246
estrangeiros, durante a guerra do Paraguai. Também a situação
não era boa no Rio da Prata.
Foi quando o vice-presidente da Argentina enviou ao Brasil o
ex-comandante dos exércitos aliados na guerra do Paraguai — Ge-
neral Bartolomeu Mitre — em missão extraordinária.
O Brasil, não havia concordado com os desejos de conquista
da Argentina. E para corroborar a sua negativa, celebrou a paz
com o Paraguai (em separado), garantindo-lhe a independência.
O ministro plenipotentiary argentino, sabedor desse acordo,
reclamou, usando uma expressão bastante oíensiva ao nosso Go-
verno, que, através do ministro Correia Neto, exigiu uma retrata-
ção imed'ata. Ato que o Governo Argentino não deu a mínima
satisfação; sendo então cortadas as relações diplomáticas, com o
afastamento dos embaixadores.
Quando o general Mitre chegou ao Rio de Janeiro, as relações
já estavam rompidas. Contudo ele procurou obter uma reconci-
liação com o ministro Correia Neto e com o Visconde do Rio Branco;
sem resultado. Mas o velho general não desistiu e, contrariando
as ordens do vice-presidente argentino, transigiu com habilidade;
conseguindo evitar uma nova guerra contra seu país.
Nem bem havia terminado esse intrincado caso, quando um
outro mais forte surge para o nosso ministro.
Terminada a guerra Alemanha X França em 1871, com a vitó-
ria dos germanos, o chance"er — Príncipe de Bismarck — fez uma
forte reclamaçã.o ao governo brasileiro, com respeito à colonização
alemã no Rio Grande do Sul.
5
O m n i s t r o Corre a Neto, achando improcedente tal reclama-
ção, enviou um "memorandum" ao governo alemão, desfazendo as
"acusações" e "censuras" quanto à colonização; advertindo ser
conveniente que o ministro da Alemanha, em nosso país — Conde
Solms — não mais voltasse ao exercício de suas funções na Corte,
pois que era ele o único responsável por tais acusações. O chanceler
alemão — Otto von Bismack — conhecido como o "chanceler de
ferro", queimou-se na parada e ameaçou bombardear o Brasil com
a voz dos canhões da sua poderosa esquadra.
A resposta do Ministro Correia Neto não se fez esperar, di-
zendo' "A luta entre o Brasil e a Alemanha será como a de um
cordeiro e um leão mas pode V. Alteza ficar certo de que não en-
contrará calados, em nossos portos, os nossos canhões".
O chanceler Bismarck, ao em vez de se irritar, achou graça na
resposta, admirando-se da coragem do nosso ministro, dando-lhe
razão.
Resultado: acabou condecorando o nosso ministro com a
"cruz-de-ferro de Guilherme I.
Em 1873, pediu demissão da Pasta, por não concordar com os
provimentos da Legação de Londres, por achar prejudicial ao país
que, representantes do Império, ao contraírem empréstimos, acei-
tassem percentagem sem autorização legal.

247
Em 1874, fundou a Associação Protetora da Instrução e ins-
talou também a primeira Escola Normal do Brasil, dirigindo-a por
algum tempo.
Em 1877, na Regência da princesa Isabel, foi nomeado Senador
do Império, pelo Paraná, na vaga do Barão de Antonina; tendo sido,
na época, o mais moço dos Senadores; pois tinha apenas 46 anos
de idade. Dessa data em diante, dedicou-se, exclusivamente a esse
cargo. Continuando na campanha contra o analfabetismo, cons-
truiu a Escola "Senador Correia Neto".
Em 1879, extinta a Diretoria Geral de Estatística, pediu a
sua aposentadoria, com ordenado proporcional.
Em 1883, fundou a Sociedade de Geografia do Rio de Janeiro,
e a Associação Mantenedora do Museu Escolar.
Em 1886, inaugurou o Asilo "Santa Isabel", como presidente
que era da Associação Protetora da Infância Desamparada.
Ainda nesse ano de 1886, foi nomeado Conselheiro de Estado.
Foi também presidente da Sociedade Amante da Instrução,
bem como da Sociedade Auxiliadora da Indústria Nacional.
Fundador e Presidente da Sociedade Humanitária Paranaense;
quando ela foi dissolvida, Correia Neto propôs em plenário, doai-
os "haveres" da mesma à Câmara Municipal de Paranaguá, para
a construção de uma "Casa Escolar" que receberia o nome de
"Humanitária Paranaense"; sendo aceito por todos os consócios.
A Câmara de Paranaguá, ao inaugurá-la, deu-lhe o nome de
"Casa Escolar Senador Correia".
Entretanto, Correia Neto quando soube, não concordou; pe-
dindo que fosse mudado, mantendo o nome de "Humanitária Pa-
ranaense", conforme havia sido escolhido pelos antigos associados.
Sendo convidado por D. Pedro II para exercer o cargo de Vea-
dor da Casa Imperial, bem como aceitar o título de "Visconde de
Curitiba", declinou respeitosamente dessa honraria.
Como o Imperador insistisse, ele perguntou ao Monarca:
— "Aos seus olhos, vale menos o Conselheiro Correia Neto, do
que o Visconde de Curitiba ?
— Claro que não, respondeu D. Pedro.
— Então, Majestade, prefiro morrer com o nome do meu hon-
rado p a i . . . "
Quase no fim do Império, foi, novamente, convidado pelo Im-
perador para organizar um Gabinete Ministerial, desde que esco-
lhesse dois ministros militares. Ele também declinou da distinção,
alegando não concordar com a escolha de militares, visto estarem
eles em conflito com o Trono. Fez também sentir que seria preju-
dicial ao Governo Imperial.
Foi então escolhido Afonso Celso, que organizou o Gabinete
com ministros militares, mas nem tempo teve de ler na Câmara o
seu programa. A sedição militar derrubou o Trono, com a revolta
que se transformou rapidamente em "revolução republicana"...
Coréia Neto não se e n g a n a r a . . .
248
Com a queda do Império, Correia Neto ficou no esquecimento
até o ano de 1892.
Entretanto, foi vice-presidente do Instituto Histórico e Geo-
gráfico Brasileiro, desde 1891 a 1904.
Em janeiro de 1893, foi nomeado presidente do Tribunal de
Contas da República e permaneceu nesse cargo apenas um ano.
Em 1894, foi demitido pelo Marechal Floriano Peixoto. Fato
bastante desagradável para o ilustre paranaguara. Mas, algo pior
e doloroso estava reservado para s i . . . o brutal fuzilamento de seu
irmão Ildefonso Pereira Correia — Barão do Serro Azul — junto
com seu primo — Presciliano da Silva Corrêa — e mais quatro
paranaenses — José Lourenço Schleder, José Joaquim Ferreira de
Moura, Lourenço Rodrigo de Matos Guedes e Balbino Carneiro de
Mendonça — todos inocentes no caso em questão. Foi na verdade,
um bárbaro atentado aos direitos humanos, porque as vítimas ja-
mais puderam se d e f e n d e r . . . executadas sem julgamento; pois,
arrancadas do aconchego de seus lares, às 10 horas da noite, foram
encarcerados como traidores; para depois (no dia 20 de maio de
1894), serem embarcadas em um trem; destino a Paranaguá, com
a desculpa de que seguiriam ao Rio de Janeiro, a fim de serem
julgadas. .. porém tal não aconteceu. . . chegadas ao quilômetro
65, o trem parou e as vítimas obrigadas a desembarcar... e, de
costas, receberam uma saraivada de b a l a s . . . caindo todas no Pico
d o Diabo ! . . .
Esse monstruoso atentado abalou consideravelmente a popu-
lação paranaguara, que chorou amargamente a perda dos seus
conterrâneos — Ldefonso e Presciliano — homens dignos de toda a
estima, consideração e respeito.
E o Senador Correia Neto ? Poderão avaliar o estado de alma
dessa criatura que, além de tudo, nada podia fazer, nem falar;
dada a situação em que se encontrava todo o p a í s . . . Foi para ele.
doloroso d e m a i s . . .
Foi então, quando, num desabafo, escreveu uma carta ao Pre-
feito de Paranaguá — Comendador João Guilherme Guimarães —
da qual transcrevemos o seguinte tópico:
"Pode a culpa desse negro atentado recair sobre o Brasil e os
brasileiros ? Ah ! se assim fora, não restaria outro alvitre senão
cobrir o rosto com um manto de vergonha e fugir e f u g i r . . . para
longe, muito l o n g e . . . a justiça não consente que a história respon-
sabilize os brasileiros por esse canibalismo que nos arranca da
alma brados da mais veemente r e p r o v a ç ã o " . . .
Passados aqueles tristes meses de tormento e instabilidade,
voltou o amargurado Conselheiro Correia Neto a trabalhar e, daí
em diante, com mais intensidade, pela instrução pública. E são
tantos os benefícios que trouxe para o setor educacional, que seria
difícil enumerá-los todos.
Por fim, aderinho à República, ocupou o cargo de presidente
do Banco do Brasil e do Loide Brasileiro.
249
Mais tarde voltou a presidir o Tribunal de Contas, restituido
que foi a esse importante cargo exercendo-o até a data do seu
falecimento.
O Conselheiro Manoel Francisco Correia Neto, deixou este
mundo, com toda a lucidez de espírito, no dia 11 de julho de 1905.
Deixou ele vários trabalhos impressos.
Ainda moço, publicou o romance —• "Mistério de Botafogo".
Também dramatizou um romance alemão. Foi nessa época que ele
se dedicou com afinco à "hipno ogia" (estudo acerca do sono).
Ocupava a tribuna quase que diariamente; tanto que, seus
inimigos políticos, para espezinhá-lo, apelidaram-no de o "Eterno
falador".
E Correia Neto, indiferente a esses ataques que julgava impro-
cedentes, transformou essa alcunha em o "Eterno defensor dos di-
reitos do povo".
Nas várias escolas que fundou, \ ia-se nas salas de aula a sua
notável frase: "SE TODOS N Â O P O D E M T E R T A L E N T O , TODOS
SÃO O B R I G A D O S A T E R C A R Á T E R " ! Frase esta, gravada depois
em medalha, espalhou-se por todo o país, servindo como tema de
redação e com prêmios aos escolares.
Era casado com D. Mariana Ribeiro de Almeida, e teve dela
4 filhos: Mariana, Manoel Francisco, Maria Elisa e Eduardo.
Na visita que fez a princesa Isabel e seu consorte ao Paraná,
aqui encontrou o Senador Correia Neto, que também viera visitar
o seu torrão natal.
Por ter uma vida metódica, pôde, em todos os cargos que ocu-
pou, exercê-los com muita eficiência.
Dada a estima que o Imperador lhe tinha; quando no exílio,
sempre manteve correspondência com ele.
O Conselheiro Correia Neto sempre dizia ter sido a sua maio/
alegria em difundir o ensino nas escolas que fundara. Tanto que,
a si próprio se chamava: "SOU UM O P E R Á R I O , E M B O R A OBS-
CURO, DA C I V I L I Z A Ç Ã O DE M I N H A P Á T R I A " !
Essa a razão pela qual aderira à República: continuar a pres-
tas os seus serviços ao Brasil!
Pertenceu, o Conselheiro, a todos os I N S T I T U T O S , ASSOCIA-
ÇÕES, A C A D E M I A S C I E N T Í F I C A S OU L I T E R Á R I A S de todo o
país e também do estrangeiro.
Além da "cruz-de-ferro" de Guilherme I (Imperador da Ale-
manha) , fez jus à "grã cruz da ordem da Conceição da Vila Viçosa"
e com a 'cruz do hábito de Cristo" ( P o r t u g a l ) ; com a "ordem de
Carlos I I I " (Espanha), com a "coroa de ferro" ( Á u s t r i a ) , com a
'coroa de Sant'Ana" (Rússia), e com a "Comenda da Ordem da
Rosa', do Brasil.
Ó desejo e a esperança do velho mestre John H. Freese reali-
zara-se ! . . .
Manoel Francisco Correia Neto honrou seu nome, sua Pátria
e a Humanidade !. ..

250
DR. MANOEL EUFRÁSIO CORREIA

Nasceu, esse ilustre estadista, a 16 de agosto de 1839, aqui em


P A R A N A G U Á ; tendo casado duas vezes com duas filhas do Vis-
conde de Nacar.
Em 1858, com 19 anos de idade, iniciou seus estudos superiores
na Faculdade de Direito de Recife; cursando até o 3.° ano.
Mudou-se depois para São Paulo, onde se formou em 1862, com
25 anos, na Faculdade de Direito de São Paulo.
Apesar de tão pouco tempo em Recife, deixou um grande cír-
culo de amigos, que sempre se honraram com sua amizade.
Tão logo diplomado, voltou para sua terra natal,, a fim de se
dedicar à advocacia. Mas, atraído pela "política', lançou-se de
corpo e alma ao seu partido — a oposição — angariando, com isso,
o ódio e as perseguições dos seus adversários governistas.
Assim sendo, para evitar os perigos a que estava exposto, au-
sentou-se, por algum tempo, de sua P A R A N A G U Á .
Voltou mais tarde, quando, uma mudança de situação polí-
tica lhe ofereceu garantias de segurança.
Dedicou-se então à profissão de advogado, exercendo-a com
muita lisura e distinção; porém, continuou na política, que era o
seu fraco.
Advogado culto, viu no jornalismo o seu campo de ação. Foi
então, aos poucos, ganhando a confiança dos seus amigos e correli-
gionários, até alcançar o honroso posto — Chefe do seu partido.
Foi, depois, nomeado Chefe de Polícia de Santa Catarina, e
por fim, eleito Deputado à Assembléia Geral, em 1872; não desmen-
tindo a confiança que nele depositavam os homens do seu partido.
Sempre altivo e independente, era escravo de suas opiniões e
não transigia, nem mesmo com os companheiros de partido.
Orador fluente e correto; lógico e valente; pausado e metódico;
quanto mais poderoso fosse o adversário, tanto mais intransigente
ele se tornava. Com isso, firmou para si o crédito de "valente lu-
tador da tribuna" !
Nessa época a Câmara respeitava o poder do deputado — Barão
do Rio Branco — que era o mais temível adversário governista.
O jovem Dr. Msnoel Eufrásio Correia não se intimidou. Opo-
sicionista valente, não deu tréguas ao ferrenho estadista brasileiro
— R I O B R A N C O — Este, reconhecendo os méritos de Eufrásio
Correia, disse um dia:

251
"É B A S T E N T E AGRESTE O T A L D E P U T A D O , M A S T E M
MUITO TALENTO" !

Ser censurado e ao mesmo tempo elogiado por um eminente


julgador é uma grande honra.
Um fato muito importante deu-se com um seu parente pró-
ximo: Os dois representantes do P A R A N Á eram: O Dr. Manoel
Francisco Correia (depois senador) e Dr. Manoel Eufrásio Correia.
Esses dois parlamentares, além de primos, eram muito amigos.
Pois bem; o Dr. Manoel Eufrásio (da oposição) deixou de lado os
sentimentos de homem particular, para sobrepor o de político. É
que, na eleição para Presidente da Câmara, era candidato, por parte
do Governo, o Dr. Manoel Francisco Correia, político mais velho
em idade e na vida pública.
O Dr. Manoel Eufrásio Correia deixou de votar no seu primo
e amigo íntimo, para dar o voto ao candidato da o p o s i ç ã o . . . Para
ele, a política estava acima de t u d o . . .
Ainda temos mais um traço do seu caráter, quando pelo Par-
lamento passou: Nos parlamentares de quase todos os países esca-
pam, às vezes palavras e mesmo frases ofensivas que devido a irre-
flexão, causam cenas bem agitadas. É que, nas várias vezes em
que essas cenas se deram, o Dr. Manoel Eufrásio Correia, quando
presente, levantava-se indignado, ficando ao lado do ofendido;
fosse ele ou não do seu partido. Isso porque, devido à sua forma-
ção moral, jamais ofendeu um seu inimigo político.
Daí o seu prestígio e o respeito que por ele tinham os homens
de ambos os partidos.
Quase no fim de sua existência terrena, o Ministério, na últi-
ma sessão do Parlamento, escolheu-o e convidou-o para o honroso
cargo de Presidente da Província do P A R Á .
Nesse meio tempo, o Presidente da Província de Pernambuco
— Dr. Pedro Vicente de Azevedo — pede demissão do cargo.
Foi então consultado o Dr. Manoel Eufrásio Correia, se acei-
taria esse mesmo cargo em Pernambuco.
Aceitou ele este último; pois já havia passado 3 anos, quando
estudante de Direto, em Recife. Além de tudo, tinha grandes ami-
zades naquela Província. Foi assim nomeado, a 24 de outubro de
1887, por Carta Imperial, Presidente da Província de P E R N A M -
BUCO Ele chegou ao RECIFE no dia 6 de novembro e, no dia
seguinte ( 7 ) assumiu o cargo.
Infelizmente seus dias estavam contados. Seu Governo, de paz
e harmonia foi só de 3 meses.
Naqueles tempos em que o rigor se fazia sentir entre os parti-
dos, o Dr. Manoel Eufrásio só aplicava a benevolência. Jamais
usou vinganças contra o partido oposto. Pelo contrário, procurava
apaziguar as discórdias intestinas daquela grande Província. Re-
zão porque, nos 3 meses de Governo conseguiu conquistar a estima
geral dos pernambucanos.

252
Podem ficar certos os leitores que não há o mínimo exagero
nas nossas p a l a v r a s . . .

No 25 de janeiro de 1888, apareceram os primeiros sintomas da


moléstia, No dia 27, eles se agravaram. E, por incrível que pareça,
nesse mesmo dia sua esposa apareceu com os mesmos sintomas.
Os médicos tiveram então que separá-los. Porém, a doença agra-
vou-se apenas nele, que, no dia 3 de fevereiro entrou em c o m a . . .
falecendo no dia 4 . . .
Falar das exéquias realizadas, é impossível, tal a imponência
de que se revestiu.
Só depois do 7.° dia é que sua esposa, já fora de perigo, veio a
saber do desenlace...
O Dr. Manoel Eufrásio Correia, desde que assumiu o Governo
da Província de P E R N A M B U C O , sempre dizia em suas palestras
com os amigos: "DAR-ME-EI POR M U I T O F E L I Z DE M O R R E R NA
F O R M O S A T E R R A DE P E R N A M B U C O , CASO N Ã O ME P E R M I T A
A SORTE F E C H A R OS OLHOS NO MEU P A R A N Á ESTREMECI-
D O " (Palavras textuais).
Tinha-se realizado um dos seus desejos...
Foram apenas 49 anos de vida intensiva, mas toda ela dedi-
cada à sua terra natal, ao P A R A N Á e ao B R A S I L .

253
ITIBERÊ

Antigo " T A Q U A R É " ou " R I O D A V I L A " . Palavra posta em


uso pelo querido Dr. Leocádio José Correia, por ter sido encon-
trado, em Paranaguá, um antiquíssimo documento que provava
ser essa palavra a primitiva denominação do nosso lendário rio.
Verdade ou não, a dúvida ficou.
O certo é que, o Dr. João Manoel da Cunha, antigo proprietário
do prédio onde morava, era um brilhante piamsta e esteta de valor
Esse advogado ilustre, talvez fascinado pela alcunha do decantado
rio, fez questão de acrescentar ao nome dos filhos, a palavra má-
gica — I T I B E R Ê — tão querida do paranaguara. ..
Foi assim que surgiu na ilustre família — João Manoel da
Cunha — o tradicional nome " I T I B E R Ê " . ..
E o vé^ho solar, com 200 anos de existência, tombado pelo Pa-
trimônio do Estado, foi desapropriado e restaurado, pelo então
Prefeito Municipal — General João da Silva Rebelo — recebendo
o nome de "Casa de Monsenhor Celso". No dia 24 de julho de 1973,
o atual Prefeito — Professor Nelson de Freitas Barbosa — instalou,
nessa tradicional casa, o Conselho Municipal de Cultura.
Ficou assim perpetuado, na História de Paranaguá, o solar que
serviu de "berço" a dois eminentes paranaguaras: M O N S E N H O R
CELSO I T I B E R Ê DA C U N H A e Dr. B R A S Í L I O I T I B E R Ê DA
CUNHA.

U M G R A N D E SACERDOTE

MONSENHOR CELSO ITIBERÊ DA CUNHA

Verdadeiro sacerdote, que tanto dignificou sua terra e todo o


Paraná. Nasceu ele aos 11 de setembro de 1849, na velha e tradi-
cional casa do Largo da Matriz.
Sua infância foi risonha, mas sempre votada às coisas de Deus.
As primeiras letras e o primário ele os fez com o ilustrado pai, o
qual para dar melhor educação aos filhos, mudou-se para Curitiba.
Com pendores para a carreira eclesiástica, Celso Itiberê da
Cuna matriculou-se, em 1868, no Seminário Episcopal de São Paulo,
onde se ordenou. Aos 7 de setembro de 1873, veio rezar sua pri-
254
meira "Missa" em Curitiba. Nomeado vigário de Cerro Azul, ali
ficou algum tempo, mas, atendendo a várias localidades. Em 1901,
foi escolhido como vigário da Arquidiocese de Curitiba. Mais
tarde, elevado ao cargo de Cônego Honorário da Catedral Metro-
politana, fez jus a esse título com rara dedicação e extraordinário
zelo.
Rejeitou sempre vários cargos de alta categoria, única exclu-
sivamente, para não se afastar dos seus familiares e mais ainda,
dos seus paroquianos, aos quais devotava um verdadeiro amor de
pai espiritual. Pastor que, com a brandura e suavidade de suas
palavras, a todos cativava.
Muito trabalhou pela sua Igreja e, a tal ponto que, os não
católicos, embora cristãos, sentiam-se atraídos pelos seus "sermões",
indo ao Templo apenas para ouví-lo.
De caráter ilibado e manso de coração, sentia-se feliz quando
5
se achava junto aos humildes, po s era seu maior apanágio a
CARIDADE!
Os curitibanos, ao batizarem os filhos, faziam questão que
fosse ele o celebrante. Até os noivos, ao casar, queriam receber a
bênção dada pelo bandoso sacerdote. Era o fascínio que o povo
sentia por esse enviado de DEUS. Todos o queriam; todos o esti-
mavam, e cada vez mais, à medida que os anos iam alvejando as
honradas c ã s . . .
E ele, o humilde vigário de Curitiba de outrora, continuava
em suas andanças pelas ruas da Cidade Sorriso, a socorrer os aflitos
e os inválidos em seu leito de d o r . . . Dor que se tornava em prazer,
quando, entre o lusco-fusco dos míseros quartos, aparecia a figura
desse iluminado servo de DEUS A D E R R A M A R BÊNÇÃOS e distri-
buir óbulos com as sagradas mãos ! . . . Isto, senhores, é dignifi-
cante ! . . .
Marco glorioso do passado, não havia, na bela Capital parana-
ense, quem não o conhecesse. Hoje, tornou-se uma relíquia dos
tempos idos, sempre belos de l e m b r a r . . .
Fechou os olhos para sempre aos 11 de julho de 1930, na sua
tão querida Curitiba. Ao baixar à sepultura, abundante messe de
orações o acompanharam e, o que se tornou mais tocante foi ver-se
ricos £ pobres, em união fraterna, fazendo alas à sua passagem e
vertendo lágrimas sentidas de saudade por esse "Anjo do Senhor"
que na Terra a n d o u ! . . . Benção do Céu aos eleitos do Grande
Pai!...
O pensamento humano, às vezes, se compraz na evocação do
passado... A Sabedoria sem sentimento, é fonte sem á g u a . . . Mon-
senhor Celso era a Sabedoria com verdadeiro sentimento ! . . .
Para se encontrar a água da vida, é preciso amar, sentir, viver
para o próximo e dele se compadecer... Monsenhor Celso era tudo
isso ! . . .
O homem que ama seus semelhantes, ama a Natureza e, aman-
do-a, adora a DEUS !. .. Monsenhor Celso, amando seus semelhan-

25o
tes, amava a Natureza e, também amando-a, adorava ao Cria-
dor ! . . .
Onde irradia a luz, aí está DEUS ! . . . Monsenhor Celso, irra-
diando a luz da Bondade, do Amor, da Caridade e do Perdão,
sempre esteve com DEUS no coração ! . . .
Glória, pois, a esse admirável pastor de almas ! . . .

U M E M B A I X A D O R MÚSICO

BRASÍLIO ITIBERÊ DA CUNHA

Esse extraordinário artista nasceu a 1.° de agosto de 1846.


a
Eram seus pais — Dr. João Manoel da Cunha e D . Maria Louren-
ça Munhoz da Cunha. Fez as primeiras letras, bem como os pri-
meiros anos de música aqui em Paranaguá, com seu velho pai; por
sinal um grande pianista. Terminando os preparatórios em Curi-
tiba, seguiu para São Paulo, a fim de fazer o Curso Superior. Em
1870, recebeu o grau de bacharel em Direito, pela Faculdade de
Direito de São Paulo.
Um ano depois, seguia, no Rio de Janeiro, a carreira dplomá-
tica; o ideal de toda sua vida. Estava fadado a vencer, com esforço
próprio e inteligência de escol. Dentro de pouco tempo, estava
a
adido de l . classe na Legação de Berlim; mas pouco temoo ficou.
Foi então nomeado como Secretário da Legação, junto ao
Q U I R I N A L permanecendo 10 anos em R O M A . Grande músico que
era, aproveitou esse tempo para se aperfeiçoar nos estudos de piano.
(Na I t á l i a ) .
Serviu depois no V A T I C A N O , em P A R I S e em B R U X E L A S ,
realizando memoráveis concertos na própria Embaixada.
Proclamada a República, -voltou para o Brasil, até que a situa-
ção normalizasse.
Consolidada a República em nosso País, foi nomeado Ministro
na Bolívia e depois no Perú. Mais tarde foi transferido para o
Paraguai. Em 1907, sua nomeação foi feita para Portugal.
Por fim, foi removido para Berlim, como Ministro Plenipo-
tenciário na Alemanha, onde permaneceu até 1913, quando veio a
falecer aos 11 de agosto. Seu corpo, embalsamado, foi transladado
para o Brasil, com todas as honras de Ministro. Chegando a Para-
naguá, foi velado durante a noite, na Capelinha do "Bom Jesus dos
Perdões" (hoje desaparecida). No dia seguinte, em trem especial,
foi levado a Curitiba, onde se deu a inumação.
Esse grande artista e diplomata era casado com D. Leopoldina
Itiberê da Cunha (nascida no Paraguai). Diplomata e grande
músico, sempre que vinha a Curitiba em visita aos familiares,
chegava até Paranaguá e, no Club Litterario, em reunião íntima
com os amigos, executava algumas de suas composições.
256
Em 1901, realizou ele um concerto de piano no Club Litterario;
primeiro e único em sua terra natal. Isso mesmo por insistência
da professora D. Ludovica Bório, que o admirava como grande ar-
tista que era. Brasílio Itiberê, que não era intérprete, aceitou o
convite e deliciou a Sociedade paranaguara com a execução de suas
admiráveis composições. E nessa célebre noite de 18 de agosto,
após o concerto, recebeu do fidalgo Club Litterario, o Título de
Sócio Honorário, perante a seleta assistência.
Brasílio Itiberê da Cunha não era concertista e sim grande
compositor. Razão porque jamais deu concertos. Ele executava
suas composições em reuniões íntimas e principalmente nas noites
de Arte que realizava na Embaixada, onde se salientava como ex-
poente máximo na execução de suas maravilhosas composições.
Foi um Diplomata de valor e um compositor emérito. E tão
conhecido estava em quase toda a Europa que, certa noite, em sua
Embaixada em Roma, conseguiu reunir três grandes pianistas da
época: F R A N Z L I S Z T , A N T O N I O R U B I N S T E I N e G I O V A N 1
SGAMBATTI!. ..
Deixou um vasto número de composições musicais; entre e.as,
a " S E R T A N E J A " , com motivos falcloricos paranaenses. Grasílio
Itiberê da Cunha representa, de fato, uma das glórias do Brasil
do passado.

257
DR. JOÃO TEIXEIRA SOARES

Esse ilustre patrício, descendente de uma das mais respeitá-


veis e tradicionais famílias de Minas Gerais, nasceu a 13 de outubro
de 1848, na cidade de Formiga, daquele grande Estado.
Seus estudos de humanidades foram feitos no antigo Calégio
Kopke de Petrópohs e depois no Seminário de Congonhas, em
Campos.
Fez um bonito Curso de Engenharia, diplomando-se com a
láurea de bacharel em Matemáticas e carta de engenheiro civil,
em 1872.
Tão logo formado, entrou para o quadro de funcionários da
Estrada de Ferro Central do Brasil (antiga D. Pedro II (, como en-
genheiro auxiliar.
Desde 1870 que o desenvolvimento econômico e político vinha
se fazendo sentir em todo o País, mormente nas vias de comunica-
ções e transportes marítimos e fluviais. Foram então essas vias de
comunicações do que se mais cuidou.
E foi nessa época que surgiu também a figura do brilhante
engenheiro, como uma das mentalidades mais cultas no campo
ferroviário; pois tinha o Dr. Teixeira Soares percorrido todas as
etapas de sua carreira nessa Estrada de Ferro. Por fim, foi convi-
dado para dirigir, como chefe, os trabalhos da Estrada de Ferro
"Curitiba-Paranaguá"; obra essa considerada a mais importante
da Engenharia Brasileira.
E é preciso notar-se que as maiores sumidades técnicas euro-
péias acharam quase que impossível esse audacioso traçado. En-
tanto, Teixeira Soares, assumindo a direção integral dos trabalhos
da Companhia, tornou em realidade esse "sonho" acalentado pelos
paranaguaras, e tido, pelos estrangeiros, como um traçado impos-
sível de ser executado.
Hoje, é a "jóia" da engenharia brasileira (na viação férrea),
num trabalho de 90 anos ininterruptos.
Custou essa grandiosa obra, pouco mais de 11.000 contos,
ouro. Sua construção levou 5 anos, de 1881 a 1885, e tudo se deveu
a esse grande homem.
Outra importante obra foi a construção da "Estrada de Ferro
São Paulo-Rio Grande", por ele dirigida. E foi devido ao seu pres-
tígio que o Brasil conseguiu obter os elementos financeiros para a
consecução desse outro também importante empreendimento.
258
A "Estrada de Ferro Noroeste de Brasil", outro sonho dos pau-
listas, deve-se ainda a esse mesmo prestígio do notável engenheiro
que, como Diretor, levou a bom termo mais essa importante em-
preitada. . .
O Dr. Teixeira Soares fundou o Clube de Engenharia do Rio
de Janeiro, tendo sido o seu 1.° Presidente.
A Sociedade de Engenheiros Civis de França, 1881, elegeu-o
como seu membro. O mesmo fizeram a Sociedade de Engenheiros
Coloniais de França, e a Sociedade de Geografia de Paris.
Em 1883, foi eleito, também membro do Instituto de Engenhei-
ros Civis de Londres.
Apesar de sua idade, pensava sempre nos modernos processos
de transporte, como, futuras estradas de rodagem, hoje tão neces-
sárias.
Esperava-se muito ainda desse cérebro privilegiado; porém a
morte o pegou de surpresa em Paris ( F r a n ç a ) , onde se achava a
serviço do Brasil, em 27 de agosto de 1927, com 79 anos de idade.
Sua morte foi bastante sentida nos meios culturais e cientí-
ficos, pelo valor que possuía esse extraordinário homem de núme-
ros.
O DR. JOÃO T E I X E I R A SOARES teve, contudo, a felicidade
de receber em vida grandes e justas homenagens. Foi condecorado,
no Brasil, por D. P E D R O I I , com a comenda da Ordem da Rosa,
e também no estrangeiro, pelos governos de vários países.
Essas consagrações, tão merecidas, tanto no Brasil como em
vários países europeus, foram a maior fortuna que legou aos seus
descendentes.

259
NESTOR VITOR DOS SANTOS

Esse ilustre paranaguara nasceu aos 12 de abril de 1868. Era


filho de Joaquim dos Santos e de D. Maria Mendonça dos Santos.
Estudou com o grande mestre José Cleto da Silva, até a idade
de 15 anos, quando se mudou para Curitiba, a fim de fazer os pre-
paratórios no Instituto Paranaense, em 1883.
Na Capital, lançou-se na política, trabalhando pela libertação
dos escravos.
Em 1887, já em Paranaguá, tomou parte na fundação do Clube
Republicano. Voltou a Curitiba, em 1888, onde ficou por algum
tempo.
Em 1890, convidado pelo então Governador do Estado — Dr.
Américo Lobo L. Pereira — para o cargo de oficial de gabinete, de-
clinou do convite. Independente como era, preferiu o jornalismo,
chefiando o jornal oposicionista — "Diário do Paraná".
Membro da Academia Paranaense de Letras, foi também eleito
Deputado Estadual.
Aborrecido com a política, resolveu viajar pelo interior de
Santa Catarina.
Regressando a Paranaguá; ficou por pouco tempo, mudando-se
logo depois para o Rio de Janeiro. Tentou a Escola Politécnica;
porém, logo deixou.
Dedicou-se ao Magistério, lecionando Português, Francês e His-
tória do Brasil no Ginásio Nacional, sendo também vice-diretor
desse internato. Deus aulas no Lyceé Français. Foi tradutor e
revisor da antiga Livraria Garnier. Funcionário do Consulado do
Brasil, em Paris, ficou até o ano de 1905; voltando por fim ao Rio
de Janeiro, de onde não mais saiu.
Inúmeros foram os cargos que exerceu, sendo difícil enume-
rá-los todos.
Nestor Vitor traduziu a obra de Maurice Maeterlinck, "A Sabe-
doria e o Destino" e levou-lhe o primeiro exemplar.
Foi crítico da Revista "Os Anais". Fundador da L I G A B R A S I -
L E I R A PELOS A L I A D O S , da qual era Secretário.
Em 1918, foi feito Oficial da Ordem da " C O R O A DA BÉL-
G I C A " , pelo Rei-Herói Alberto. Logo depois, em 1919, condecorado
com a " O R D E M DE L E O P O L D O " , da Bélgica. Ainda em 1923, foi
feito "Cavalheiro da Legião de Honra da França". Nesse ano de

260
1923, conseguiu publicar a primeira edição de " O B R A S C O M P L E -
T A S DE CRUZ E SOUZA', de quem tinha sido muito amigo.
Em 1926, foi crítico literário de "O G L O B O " , desde a sua
fundação. Iríamos longe, citando todos os cargos que ocupou.
Uma grande lacuna se fez sentir nos meios culturais do País,
quando de seu infausto desaparecimento aos 13 de outubro de 1932.
Paranaguá também sentiu a imensa perda do seu dileto e ilustre
filho. . . Mas, em 1968, comemorando o primeiro centenário de seu
nascimento, grandes festas foram realizadas em sua terra natal,
culminando com a inauguração do seu "busto", bem defronte à
rua que já tinha o seu nome.
Esses festejos realizaram-se, não no dia 12 de abril, e sim no
dia 14 de maio, por motivo de força maior.
Encerrando as festividades, foi realizada, às 8,30 horas da
noite, uma Sessão Magna no salão nobre do Club Litterario.
Após a apresentação de números musicais, o Dr. Bento Munhoz
da Rocha Neto saudou os membros do Conselho Federal de Cul-
tura — José Cândido de Andrade Muricy e Martins Pereira, bem
como as autoridades presentes. Dada a palavra ao conferencista —•
José Cândido de Andrade Muricy — amigo e contemporâneo do
homenageado, discorreu ele sobre a vida e a obra de N E S T O R V Í -
T O R , o grande filho de Paranaguá. Foi uma bela peça oratória!
Para finalizar, foi cantado o Hino de N. S. do Rossio, pelo Coral
"Diva Vidal", sob a regência da professora Rachel de Souza Pe-
reira da Costa (música de maestro José Itiberê del Lima e letra do
poeta Leocádio Pereira, ambos filhos de Paranaguá).
Que melhor "homenagem póstuma" se poderia prestar a esse
insigne paranaguára — N E S T O R V I T O R DOS SANTOS ?!
E nós, sentindo tudo isso, não poderíamos deixar de trazer,
para o nosso modesto livro, esse personagem que tanto honrou a
sua terra natal. Seria uma falta que jamais perdoaríamos a nós
mesmos.
Esa grande honra que sentimos, faz com que transcrevamos um
pouco do muito que ele produziu de belo.
Seus sonetos são de muita profundidade.

Eis um deles:

MORTE PÓSTUMA

Desse nós vemos; lá se vão na vida,


Olhos vagos, sonâmbulos, calados;
O passo é a inconsciência repetida,
E sons que tem como que emprestados.

— Dia de luz. — Respiração contida


Para encontrá-los despreocupados,
Aí vem a morte, estúpida e bandida,
Rangendo em seco os dentes descarnados.

261
Mas embalde ela chega, embalde os chama;
Ali não acha nem de longe aqueles
Grandes assombros que aonde vai derrama!

E abre espantada os cavos olhos tortos;


Vê que eles têm os olhos vítreos, que e l e s . . .
Eles já estão há muito tempo mortos!

Ainda um outro:

ESTRELA

— Que procuras no céu calado e aváro ?


Nos meus olhos, — mentindo-me disseste, —
Achavas outro céu sereno e claro,
Que de uma luz mais meiga se reveste.

— Vejo as estrelas, vejo-as e comparo,


Correndo toda a abóbada celeste.
Quero encontrar um mundo estranho e raro
A branca estrela de onde tu vieste.

Mas como podes distingui-la, quando


Elas são tantas, tantas, e se, ao vê-las,
Nossos olhos perturbam-se, baixando !

— Guia-me os passos uma fé segura;


Há de ser dentre todas as estrelas
A iluminada de uma luz mais pura.
Temos esta jóia:

PARANAGUÁ
(Recordação da infância)

Minha saudosa Paranaguá,


De maresia e de boninas,
Jaboticabas e juá !
— Lavadeiras cantam na fonte,
— Da escola voltam as meninas.
— Que serra azul fecha o horizonte !
— Velhos gaiatos, maldizentes...
— Que maravilha o pôr do S o l !
— As avozinhas, excelentes...
Quem há que se esqueça de quanto
Viveu, nessas horas divinas
Da infância, ou em riso ou em pranto

262
UM GRANDE AMIGO DE PARANAGUÁ

"A M O R T E N I V E L A A TODOS. A R R A S T A E ENVOLVE A


UM T E M P O , OS QUE P E R D U R A M NA BONDADE E OS QUE
EXPLODIRAM NO ÓDIO". ..
Quanta profundidade expressa nesta frase, em tão boa hora
dita pelo grande sociólogo Bento Munhoz da Rocha Neto ! . . .
Só os grandes de coração assim pensam; assim a g e m . . .
As minhas despretenciosas palavras são, hoje, dedicadas ao
eminente paranaense, de saudosa memória — D R . C A E T A N O
M U N H O Z DA R O C H A — o grande amigo de Paranaguá; grande
mesmo. Homem culto e de larga visão, sabia dicernir o Bem do
Mal, num senso de justiça a toda prova, tanto na vida pública como
particular.
Seu espírito de solidariedade aos companheiros de 'partido",
ele sabia dar e sempre os trouxe bem vivo. Desde moço, soube ser
amigo de verdade.
De temperamento independente, sempre foi austero nas suas
várias administrações, no tocante à conduta moral.
Quanto à sua vida privada, jamais deu satisfação a quem quer
que fosse; tendo sempre aversão e indiferença ao julgamento alheio,
desde que estivesse bem com sua consciência.
Um episódio da sua vida de estudante dá-nos um exemplo bem
eloqüente do seu caráter: Durante o curso de medicina, alguns
colegas seus meteram-se em complicações, sem as temer. Munhoz
da Rocha nada tinha a ver com essa revolta ecadêmica; tanto que,
se dependesse dele, as teria evitado. Entretanto, na hora H, foi
solidário, e lá se foi com a turma para a Bahia, a fazer o seu 2.°
ano de medicina, vivendo o mesmo destino dos colegas.
Nos menores detalhes, nota-se perfeitamente sua inteireza de
caráter. Haja vista um outro episódio passado em nossa terra,
quando ainda Prefeito: Em 1915, em abril enviou ele sua mensa-
gem à Câmara Municipal de Paranaguá, justificando a aplicação
dada ao empréstimo de 1200 contos que havia contraído, em 1913,
com o Governo do Estado. Gesto muito raro naqueles tempos.
Em 1920, como Presidente do Estado, iniciou a publicação
diária dos balancetes do Tesouro Estadual, no jornal "A República",
exibindo o movimento financeiro do seu Governo.
Essa demonstração, nos primeiros tempos, de Governo, era or-
ganizada por ele mesmo; só deixando de o fazer, quando os funcio-
263
nários do Estado se habituaram às disposições e normas por ele
traçadas.
:
No campo da ass stência social, teve a primazia. Nunca deixou
de atender aos vários setores da administração, dando um sentido
novo e humano.
Compreendendo que o Estado devia intervir diretamente na
assistência social do povo paranaense, criou instituições oficiais
para essa assistência aos velhos desamparados e à infância desa-
brigada, como o "Asilo São Vicente de Paulo" e o "Orfanato São
Luís".
Sua consciência de médico ainda não estava satisfeita, pois
sabia que dois grandes males não podiam continuar se propagando
em nosso Estado. Criou então o "Leprosário São Roque", em Pi-
raquara e o "Sanatório para tuberculosos", na Lapa. Dando-lhe,
oportunidade da cura, o Estado evitava, com isso, o contágio de
famílias inteiras, que viviam em total promiscuidade.
E era para os pobres que ele procurava olhar e ajudar. E isso
sempre o fez com aquela sensibilidade que lhe era peculiar. É como
acertadamente classificou o seu grande filho Dr. Bento Munhoz da
Rocha: "Munhoz da Rocha foi um precursor de uma intensa assis-
tência social no Brasil; foi um precursor do que hoje se faz em
escala maior; do que hoje, governo e sociedade, compreeedem, ao
menos, que é preciso fazer".
Nacionalista ferrenho; um episódio, um tanto violento, retrata
perfeitamente o seu caráter; Numa visita que fez a Curitiba, um
Embaixador de uma certa Nação da Europa Central, queria, por
todos os meios, conseguir do Governo do Paraná, além das terras
dadas gratuitamente, um auxílio financeiro para os imigrantes que
desejavam vir para o nosso Estado. No decorrer da reunião, o Em-
baixador soltou uma indireta, dizendo que o Presidente de um outro
Estado brasileiro amparava e estimulava, por todos os meios, a imi-
gração oriunda do seu país.
O Dr. C A E T A N O , compreendeu a indireta e replicou no mesmo
instante: "Pois eu considero criminoso o governo que subvencione
a imigração estrangeira, enquanto houver no país um único brasi-
leiro que reclame uma escola ou uma estrada".
Poderão os leitores avaliar o efeito que surtiu no ambiente ?
Felizmente houve presença de espírito por parte das autoridades
presentes, que, mudando de assunto, formaram grupos separados
e o incidente passou, sem se tocar mais nisso.
Munhoz da Rocha, durante o seu Governo no Paraná, cercou-
-se daqueles que eram do seu partido político; muito justo e natu-
ral, pois sendo seus amigos, neles podia confiar. Entretanto, ja-
mais permitiu caprichos dos mesmos. Ele tinha, como disse o seu
grande filho Dr. Bento: "O S E N T I D O JUSTO DA A U T O R I D A D E " .
Munhoz da Rocha nunca usou violência, e podia, se o quisesse.
E, tanto isso é verdade, que o jornalista oposicionista — Caio Ma-
chado — chamou-o de: " P R E S I D E N T E QUE N Ã O FEZ USO DO
SÍTIO".
264
Isso é admirável num Governante que tinha, no momento, a
faca e o queijo na mão (o país estava em "estado de sítio" — no
Governo Artur Bernardes).
— Fato interessante e digno de encômios é o que passaremos
a contar: Um "jornal" de fora do Estado, quando da posse na Pre-
sidência do Paraná enviou repórteres e fotógrafos para acompanhar
e documentar as cerimônias a serem realizadas. Ninguém, porém,
como era natural, lembrou-se de perguntar o preço dessa reporta-
gem. Passaram-se vários dias e, como era de se esperar também,
veio a conta, e que "conta" ! 7.500$000 (sete contos e quinhentos)!
Naqueles tempos era uma grande soma. Munhoz da Rocha deu a
seguinte despacho no requerimento: " I N D E F E R I D O " . N Â O A U -
T O R I Z E I E N Ã O A U T O R I Z A R E I DESPESAS DESSA N A T U R E Z A " .
Com essa recusa, o Jornal em questão não teve dúvidas; tratou
de ridicularizar e desmoralizar o Governo Paranaense. Mas o Dr.
C A E T A N O imperturbável, nada falou, nem providenciou. Deu o
desprezo, continuando na sua norma de conduta, na sua moral
inatacável. Se o Jornal o criticava, é porque ele andava certo.
Pois sabia que, quando a Imprensa tece elogios a uma pessoa, é
porque alguma co^sa q u e r . . .
— Outro fato se deu com um fazendeiro do Norte Paraná,
que havia fundado um Jornal Independente em Curitiba. Indo
falar ao Presidente, prometeu fazer críticas serenas, elogiando os
atos bons e apontando as falhas e os abusos, quase sempre igno-
rados do Chefe do Governo.
Dr. C A E T A N O , com aquele sorriso discreto, foi respondendo:
"É M U I T O L O U V Á V E L A SUA I N I C I A T I V A , M A S É PRECISO
D A R O U T R O NOME A SUA P U B L I C A Ç Ã O , PORQUE, JORNAL, É
JUSTAMENTE O C O N T R Á R I O DE T U D O O QUE VOCÊ D I S S E " . ..
— Em uma cidade do interior, um delegado de polícia andava
cometendo arbitrariedades e abusos. Uma comissão então, com-
posta do melhor elemento do lugar, foi a Palácio falar ao Presi-
dente, a fim de expor a situação, fazendo a sua queixa. M U N H O Z
DA R O C H A atendeu com atenção, ouvindo a justa reclamação.
Pediu, por fim, que voltassem os queixosos à sua terra e fizessem
uma representação por escrito; que ele, Governador puniria o rele-
gado, removendo-o também. A comissão voltou eufórica e, antes
de redigir a representação, reuniu-se aos demais elementos quere-
lantes e juntos usaram de vio'encia, prendendo o delegado e expul-
sando-o do lugar. Dr. C A E T A N O , sabendo do ocorrido, apoiou o
delegado, mandando-o voltar ao cargo. Só depois de 3 meses é que
resolveu removê-lo. Uma verdadeira lição de mestre contra a
violência.
— Outro caso ocorrido no seu Governo: Prisão dos agentes da
polícia do Rio de Janeiro.
O país estava em "estado de sítio". Vieram então uns agentes
:
da polícia do D strito Federal e, sem se apresentar ao Presidente
do Estado, vasculharam a cidade e fizeram algumas prisões arbi-
trárias.
265
M U N H O Z DA R O C H A não hesitou. Deu ordem para soltar os
presos e prender os agentes, mandando-os depôs de volta até Ita-
raré. Não admitiu, em absoluto, tais arbitrariedades.
Só mais tarde é que veio um delegado credenciado para tal
fim; apresentando-se antes ao chefe do Executivo. O Presidente
então, deu-lhe todo o apoio na pesquisa do inquérito. Resultado:
Improcedência da d e n ú n c i a . . .
Que grande prestígio tinha esse respeitável Governador de Es-
tado ! Independente em suas ações; homem de fibra; o DR. CAE-
T A N O M U N H O Z DA R O C H A foi um forte. Já nos últimos anos
de sua existência terrena sofreu os embates da vida; lances adversos
da sorte pela maldade humana. Mas não se dobrou, nem se aba-
teu ! Sua consciência estava tranqüila.
Em tudo o que fez pelo Paraná, e principalmente por Parana-
guá, deixou sempre marcado o traço de sua personalidade incon-
fundível.
Exemplar chefe de família, numerosa como era, a morte o
buscou com 65 anos de idade, deixando 11 filhos menores com difi-
culdades financeiras quase sem solução.
DR. C A E T A N O M U N H O Z DA R O C H A nasceu em Antonina,
aos 14 de maio de 1879. Era filho do Ten-Cel. Bento Munhoz da
Rocha e de Maria Leocádia Munhoz da Rocha.
Muito criança, foi para Curitiba, onde fez o curso primário.
Depois seguiu para São Paulo, a fim de fazer o Curso de Humani-
dades, no Colégio S. Luís, na cidade de Itú; Colégio esse dirigido
por Jesuítas.
Seu pai, com grandes posses, mandou-o estudar na Escola do
Medicina do Rio de Janeiro, formando-se médico com a idade de
23 anos. Voltando, por fim, para Paranaguá, em 1902.
Um fato muito importante e significativo, relacionado com
sua vida (e testemunhado por minha mãe, que nesse dia se achava
em visita à sua genitora), deu-se no dia de sua chegada ao torrão
a
amigo. D . Maricota, sua extremosa mãe, dama de sentimentos
nobres, de grandeza dalma e caridade cristã, distribuiu, a todos
os pobres que foram à sua casa, uma prata de 2$000 (dois mil réis),
(muito dinheiro para aquela época), como agradecimento a Deus,
pela formatura do seu adorado filho ! . . .
Como foi comovente aquele q u a d r o . . . uma centena de velhi-
nhos de nossa cidade agradecendo, à grande dama, a dádiva rece-
bida ! . . . Cenas como essa, são raras, mormente nos tempos atuais.
Talvez os seus descendentes ignorem tal particularidade, que
reputo de muita importância, pois retrata perfeitamente o caráter
e o coração magnânimo dessa admirável criatura.
O DR. C A E T A N O clinicou em Paranaguá, talvez uns três anos;
tendo abandonado a medicina, depois de ter perdido a sua primeira
filhinha. Fundou então a firma " M U N H O Z DA R O C H A & I R M Ã O " .
Deixou também muito logo, para se lançar na carreira política,
que abraçou de corpo e alma, numa ascenção extraordinária.
266
Foi Prefeito de Paranaguá, por dois quatriênios; realizando
obras de vulto, como: Canalização de água em 1914 e rede de es-
gotos em 1915. Serviços esses funcionando a 60 anos. Calçamento
de ruas e abertura de avenidas; além de uma enorme série de
melhoramentos.
Terminando os 8 anos de Prefeitura, foi eleito Deputado ao
Congresso Legislativo do Estado. Ocupou os cargos de Secretário
da Fazenda, Agricultura e Obras Públicas. Eleito Presidente do
Estado, por duas vezes, prestou inestimáveis serviços ao Paraná
Iniciou também as Obras do Porto de Paranaguá.
Foi o 1.° Presidente a dar amparo ao funcionário público,
criando o Seguro de Vida e melhor ando-lhe os vencimentos, que,
até então, ou quase sempre, eram pagos, digo, recebidos em apóli-
ces ou bônus.
Quanto à Instrução Pública, não há termos que sirvam para
engrandecer o seu valor.
Existindo, na época, apenas o G I N Á S I O P A R A N A E N S E e a
ESCOLA N O R M A L (isso em Curitiba), M U N H O Z DA R O C H A criou
Escolas Normais de Ponta Grossa e Paranaguá, como um marco da
ampliação do Ensino Secundário do Estado.
Eleito Senador, conseguiu, dentro da Lei, tudo o que queria e
podia para o nosso Paraná, e também para Paranaguá.
Pode, um homem dessa tempera; com toda essa personalidade
marcante e com tal bagagem de serviços prestados ao Estado, e
particularmente à Paranaguá, ser esquecido por uma grei ?
JAMAIS ! . . .
A ESCOLA N O R M A L DR. C A E T A N O MUNHOZ DA ROCHA
não esquece o seu patrono, comemorando, todos os anos, a data do
nascimento. E, como já se tornou tradição, jamais esquecerá !
DR. C A E T A N O MUNHOZ DA ROCHA foi um verdadeiro amigo
de nossa terra; razão por que, merece a nossa admiração e o nosso
profundo respeito.
P A R A N O G U Á sempre soube ser grata aos seus V E R D A D E I R O S
AMIGOS ! . . .

267
VICENTE NASCIMENTO JÚNIOR

Desaparecido do convívio dos vivos, há 18 anos; falar-se do que


ele foi na vida, é uma obrigação, um imperativo que .se faz neces-
sário a quem tanto fez por Paranaguá. Nascido a 24 de janeiro de
1880, em Guaratuba, era filho de Vicente Montepoiiciano Nasci-
mento e de D. Maria Júlia da Silva Nascimento.
Foi aluno na escola primária de sua genitora, onde aprendeu
a ler e escrever; passando depois a escola do velho professor —
Alfredo Alves da Silva — que o preparou para os exames finais.
Foi um auto didata, porquanto, só conseguiu fazer o curso primá-
rio. O comércio foi, então, a sua primeira escola da vida.
Mudando para a Capital do Estado, pendeu para o jornalismo,
começando pela seção de reportagem. Sua facilidade foi tanta nas
lides jornalísticas que, exercendo suas atividades no "Diário da
Tarde" e na "A República", muito cedo chegou a redator-secretário
da "Tribuna" e depois diretor do "Comércio do Paraná".
Iniciou sua vida pública como oficial de gabinete da Secreta-
ria de Agricultura.
Mais tarde foi residir em Antonina, sendo convidado para se-
cretariar a Prefeitura e a Câmara Municipal. Nessa ocasião, fun-
dou o 1° jornal diário daquela cidade: "O Município".
Escolhido também para acompanhar a Missão " Y O N O S U K E
Y A M A D A " até " C A C A T Ú " , a fim de fundar a primeira colônia
japonesa.
Combatido pela "Imprensa" da Capital, sobre essa colonização,
que julgava ser impossível uma assimilação com a sociedade brasi-
leira, Nascimento Júnior procurou defender seu ponto de vista, sob
os aspectos sociológicos e etnográficos, alegando ser essa raça ni-
pônica muito inteligente e de grande produtividade. E aí está, no
presente, confirmada a sua assertiva quanto à colonização japo-
nesa, que tem se revelado especialmente no setentrião paranaense,
e também em nosso litoral.
O japonês, além de inteligente, e trabalhador, tem uma grande
qualidade: é obediente às leis do nosso país (dizia-nos ele) e nós
concordamos.
Resultado: A capital nipônica, através de uma de suas revis-
tas, em Tókio, publicou todos os "artigos" do insígne historiador,
vertidos e m japonês ! . . .
268
Foi uma vitória e uma glória para o nosso mestre de história
do litoral.
Por fim, voltou o velho historiador para a sua querida Para-
naguá, aqui tomando, de início, as rédeas da redação do "Diário
do Comércio".
O nosso convívio, com essa figura impar, surgiu no dia em que,
juntamente com o Dr. Hugo Pereira Corrêa, tratamos dos primei-
ros passos para a fundação do "Instituto Histoórico e Geográfico de
Paranaguá". Éramos uma tríade idealista, reunindo-nos todas as
noites no "Café do Uébe", à rua Prisciliano Corrêa, a fim de se
discutir sobre o almejado " I N S T I T U T O " , até se tornar uma reali-
dade. Foi então que comecei a conhecer melhor o extraordinário
mestre da "História" de nossa terra. Muito aprendi com tão admi-
rável criatura que, nascida em Guaratuba, aqui se criou e se
educou.
Durante a época da Interventoria do Estado (1945), assumiu o
honroso cargo de P R E F E I T O M U N I C I P A L DE P A R A N A G U Á , por
nomeação do então Interventor Dr. Clotário Portugal.
Fato curioso e interessante:
Quando nomeado "SÓCIO H O N O R Á R I O " do vetusto e tradi-
cional "Club Litterario", no seu discurso, disse: " N Ã O ME É SUR-
PRESA T A L D I S T I N Ç Ã O , P O R Q U A N T O , ANOS A T R Á S , M I N H A
G E N I T O R A T A M B É M SUBIU O S DEGRAUS DESTA F I D A L G A
SOCIEDADE, P A R A RECEBER I G U A L " D I P L O M A " E C O M OS
MESMOS M O T I V O S : " R E L E V A N T E S SERVIÇOS P R E S T A D O S A
P A R A N A G U Á , COMO EDUCADORA QUE F O I " .
Nomeado depois, Secretário Geral de nossa Prefeitura Muni-
cipal, aposentou-se em 1948, com 33 anos de inestimáveis serviços
públicos prestados ao Município e ao Estado.
Sócio honorário do " R O T A R Y CLUB DE P A R A N A G U Á " , tam-
bém pelos grandes serviços prestados à História de nossa terra.
Sócio das inúmeras Sociedades Culturais da Capital do Estado.
Colaborou em dezenas de revistas científicas e literárias do país.
Cronista de vastos recursos, publicou vários folhetos, opúscu-
los, monografias, entre eles: "A T O M A D A DE P A R A N A G U Á NA
G U E R R A C I V I L DE 1894"; "O COMBATE DO C O R M O R A N T " ;
" C O R R E I A D E F R E I T A S " ; " B Á R B A R A HELEODORA"; " A CON-
Q U I S T A DO I T I B E R Ê " (Peça em 4 atos e comemorativa do 3.°
centenário da fundação do Município de P a r a n a g u á ) ; trabalhos,
todos, de grande valor histórico.
O Instituto Histórico e Geográfico de Paranaguá (menina dos
seus olhos) era tudo para ele; dedicando-se de corpo e alma.
Idealizador e fundador do seu Sodalício, não sossegou enquanto
não viu essa instituição firmada no conceito de suas congêneres.
V I C E N T E N A S C I M E N T O JÚNIOR conseguiu fundar 3 Insti-
tutos nas cidades mais antigas do Estado.
Em 1954, nos dias 8, 9 e 10, uma Comissão chefiada por ele,
foi à cidade da Lapa fundar o Instituto Histórico e Geográfico da
Lapa.
269
Ainda nesse mesmo ano, aos 6 de junho, essa mesma comissão
foi oferecer a primeira bandeira municipal da Lapa ao seu Prefeito.
No dia 13 de fevereiro de 1955, nova comissão, também chefia-
da por ele, foi à P A L M E I R A fundar ainda o I N S T I T U T O H I S T Ó -
R I C O E G E O G R Á F I C O DA P A L M E I R A e também entregar a sua
primeira bandeira municipal.
Em 1955, aos 21 de abril, mais outra comissão por ele chefiada
foi à vizinha cidade de Morretes, fundar o Instituto histórico e
Geográfico de Morretes.
Dos 3 I N S T I T U T O S por ele fundados, parece-nos que só o da
P A L M E I R A conseguiu vingar.
Eis o que foi a vida pública do confrade e amigo Vicente Nas-
cimento Júnior em nossa Paranaguá.
Faleceu, esse ilustre historiador, em Curitiba, a 4 de fevereiro
de 1958. Seu corpo foi trazido para Paranaguá e sepultado na
tarde desse mesmo dia, com acompanhamento de grande massa
popular e das mais destacadas figuras da sociedade local.
Foram 78 anos de vida, dedicados ao estudo da História; 78
anos de trabalho fecundo em prol de sua Paranaguá e do Estado.
O I N S T I T U T O H I S T Ó R I C O E G E O G R Á F I C O DE P A R A N A -
G U Á , hoje, é uma realidade, e isso devemos ao grande mestre —
V I C E N T E N A S C I M E N T O JÚNIOR — há 18 anos desaparecido do
rol dos vivos.
Todavia, seu espírito estará sempre presente, porque a chama
que ele trazia no coração, passou para nós, e mais que tudo, porque
ele era e será sempre o próprio I N S T I T U T O ! . . .

270
DR. ZENON PEREIRA LEITE
Nasceu, esse ilustre paranaguara, no dia 13 de março de 1889.
Seus pais: Guilherme José Leite e D. Esther Ferreira Leite.
Z E N O N L E I T E fez seu curso primário, uma parte em P A R A -
N A G U Á e outra em Curitiba, terminando em 1901. Foi, depois,
para o Rio de Janeiro, a fim de fazer Curso de Humanidades.
Em 1913, matriculou-se na FacuMade de Direito do Paraná;
interrompendo, logo depois por motivos particulares. Em 1931,
continuou na mesma Faculdade; terminando porém na Faculdade
de Direito de Florianópolis, bacharelando-se em Ciências Jurídicas
e Sociais, em 1937.
Fez concurso para a Fazenda Nacional, sendo logo nomeado
como escriturário da Alfândega de P A R A N A G U Á . Ocupou o cargo,
em comissão, de Inspetor da Alfândega de Uruguaiana, de Pelotas,
de Florianópolis e de Porto Alegre, quando então se aposentou.
Esteve também, em comissão, em Foz do Iguaçu e em Antonina.
Escreveu vários trabalhos literários e históricos e mesmo sobre
Administração Fazendária; publicados na Imprensa do Rio de Ja-
neiro do Rio Grande do Sul e do Paraná.
Dirigiu o Jornal "O Estudo" e depois a Revista "O I T I B E R Ê " ,
sendo seu fundador.
Z E N O N L E I T E era casado com D. Hilda Correia Leite e deixou
os seguintes filhos: Hilnon, Maria do Rosário, Guilherme, Hilda e
Margct.
Finou-se em Porto Alegre, já aposentado e bem idoso. Sua
morte foi bastante sentida nos meios intelectuais.
Foi membro efetivo da Associação Brasileira de Imprensa; da
da Associação Riograndense de Imprensa e do Instituto Genealó-
gico Brasileiro.
Sócio correspondente do Instituto Histórico e Geográfico de
Santa Catarina e do Paraná; da Societé Bibliographique de Paris
e da Union Ibero Americana de Madri.
Sócio correspondente dos Centros de Santa Catarina e do Pa-
raná (Centro de L e t r a s ) .
Sócio Benfeitor e Presidente do Club Litterario de P A R A N A -
GUÁ.
Fundador do Centro de Letras de P A R A N A G U Á .
Fundador e 1.° Presidente do Instituto Histórico e Geográfico
de P A R A N A G U Á .
Z E N O N nunca esqueceu sua terra natal; vindo, sempre que
podia, passar suas férias no torrão onde nascera.
O ilustre varão sempre honrou a sua querida P A R A N A G U Á .

271
MÉDICOS HUMANITÁRIOS
DR. LEOCÁDIO JOSÉ CORREIA

Há criaturas que a este mundo vêm com uma única finali-


dade — Servir; servir sempre, até o fim da vida terrestre ! . . .
De um altruismo à toda prova, essas criaturas, enquanto vi-
vem neste planeta, estão sempre com o coração e a razão afeitos
a tudo o que é bom e nobre.
De uma abnegação sem par, neste mundo Terra, enquanto o
espírito se acha preso à matéria, procuram imitar o mais possível
o rabí da Galiléia !. . . Amam, e amam indiscriminadamente; da-
q u e ^ forma que só o Cristo soube f a z e r . . .
— E por que tanta abnegação, tanto carinho e tanto amor, se,
ao mundo vêm como qualquer um de nós ? . . .
•— Os iluminados são assim !. .. Vêm para amar e servir ! . . .
E amam e s e r v e m . . . Às grandes almas, os grandes corações ! . . .

Nasceu o Dr. L E O C Á D I O JOSÉ C O R R E I A no feliz dia 16 de


fevereiro de 1848, à rua da Misericórdia. Essa rua leva hoje o
seu nome.
Seus pais — Manoel José Correia e D. Gertrudes Pereira Cor-
reia — ótimas criaturas, agradeceram a Deus essa preciosa dádiva.
Leocádio José Correia, quando menino, foi muito travesso; tra-
vessuras infantis, próprias de toda criança inteligente.
Captando facilmente a amizade dos seus colegas, sempre foi o
primeiro da classe, sem jamais se envaidecer e sem criar invejosos;
pois todos o estimavam. Assim foi o seu curso primário, cheio de
alegria e de felicidade.
O curso secundário foi feito com brilhantismo, causando admi-
ração aos mestres.
Seus pais, felizes, achavam que ele, pela inteligência precoce,
deveria dar um bom pregador. Assim sendo, fizeram-no ingressar
no Seminário de São Paulo.
Os anos foram passando e L E O C Á D I O foi sentindo que não
era o sacerdócio a sua vocação. Desistiu, pois, para seguir a car-
reira que, depois, compreendeu ser ela o seu verdadeiro ideal.
Em 1869, entrou para a Faculdade de Medicina, tornando-se,
em todo o curso, estimado, admirado e respeitado, não só pelos
colegas, como também pelos mestres.
275
O grande professor da época — Torres Homem — não cessava
de comentar com os demais mestres sobre o acadêmico prodígio.
Assim foi todo o tempo em que esteve como estudante. Ben-
quisto por todos, continuava naquela modéstia que ihe era peculiar
Em 1873, formado em Medicina, veio para sua terra natal.
Aqui começou então a luta do médico pela vida dos seus semelhan-
tes. Foram 13 anos de sacrifícios e lutas incessantes.
Não sabemos como esse admirável esculápio podia conciliar a
medicina com os vários ramos da atividade humana. Senão,
vejamos:
Foi Inspetor de Saúde do Porto de Paranaguá; médico da San-
ta Casa de Misericórdia; Inspetor Escolar. Entrou para a política,
pois era de se esperar que assim o fizesse, brilhante como era na
tribuna. Anti-escravagista, batia-se ardentemente, através dos
jornais, pela libertação dos escravos. Com todas essas responsabi-
lidades, é de se avaliar o quanto lhe custava, em trabalho, para
dar conta de tudo.
Na política os adversários surgiram logo. E, caso interessante,
desapareciam como por encanto !. .. E, por que ?. .. Porque o Dr.
L E O C Á D I O , além de grande médico, merecia a confiança absoluta
de toda a população paranaguara; isso, em todas as camadas
sociais ! . . .
Acontecia, então, adoecer um seu adversário político ou alguém
de sua família. As doenças tornam o indivíduo humilde; tiram-lhe
a personalidade e tudo o que possa haver de orgulho e de amor-
próprio.
Os adversários mandavam chamá-lo, fosse para si ou para os
seus familiares. .. Aí é que estava o segredo do Dr. L E O C Á D I O ;
estudioso e competente; com uma inspiração quase sobrenatural
quanto aos diagnósticos que fazia, sua presença tornava-se im-
prescindível nos leitos de dor. O Dr. L E O C Á D I O ia atender ao
doente, com uma solicitude de pai, chegando às vezes a passar a
noite ao lado do enfermo !. ..
Gesto dignificante, porque, nada cobrava de quem quer que
fosse (rico ou pobre) !. . . Com isso ia-se tornando um semi-Deus
aos olhos da população ! . . . Eis o segredo do iluminado, se assim
pode-se dizer.
E saibam os leitores que, aqui em Paranaguá, os partidos polí-
ticos, naqueles áureos tempos, degladiavam-se impiedosamente,
rompendo-se até sólidas amizades. Essa é uma verdade irrefutável.
E o grande médico, que fazia da sua profissão um verdadeiro
sacerdócio ia vencendo tudo e todos, sempre com aquela modéstia
inegualável...
Mais tarde, eleito deputado provincial, brilhou no Congresso.
E ainda tinha tempo para a vida social e intelectual. Nas grandes
festas — bailes e reuniões de arte — estava ele presente, como fi-
gura de destaque e de real v a ^ r . E tudo isso ainda foi pouco.

276
Gostando do jornalismo e de versejar, era fino poeta, orador e
jornalista de mérito.
E no Teatro, então ?!
A platéia paranaguara, nessa época, culta e exigente, era
respeitada pelos artistas que aqui aportavam.
O Dr. L E O C Á D I O estimulava aos rapazes a escrever peças tea-
trais, orientando-os e depois ensaiando-os. Um deles, seu primo —
Leôncio Correia — entusiasmado e mesmo influenciado pelo Dr.
L E O C Á D I O , escereveu uma peça teatral por nome: "Talento e
ouro", que foi levada à cena no antigo Teatro Santa Celina, com
grande êxito.
Foi essa a época áurea de Paranaguá, que se tornara também
um dos centros literários do nosso país. E tudo isso se deveu, em
parte, ao Dr. L E O C Á D I O .
Fatos interessantes se deram na sua vida cotidiana. Um deles
muito sensibilizou aos que assistiram:
Chegara a Paranaguá o " C I R C O F E R R A Z " , muito boa com-
panhia circense. Foi logo armado na praça (hoje Fernando
Amaro).
O paranaguara sempre gostou de circos; de forma que, à noite,
antes mesmo de começar o espetáculo, ele já se achava lotado.
As 8 horas deu-se início à função cem a entrada do palhaço
que, com seu "respeitável público" e suas piruetas, começou a fazer
perguntas. Eram charadas para o público decifrar. Soltou ele a
a a
l . charada. Um espectador respondeu com exatidão. Fez a 2 , ;
a a a
depois a 3. , a 4 . e a 5 . Todas respondidas com segurança.
O palhaço, intrigado com a facilidade das respostas, dirigiu-se
ao público, dizendo: Respeitável assistência, a voz que respondeu às
minhas charadas, não me é estranha. O distinto cavalheiro po-
deria fazer o obséquio de se identificar ?
Alguém que estava entre amigos, na geral, levantou-se e falou
claramente: Sou L E O C Á D I O JOSÉ C O R R E I A .
O palhaço agradeceu e, depois de terminado o seu número,
mudou de roupa e foi até a geral, onde se achava o ilustre médico.
Ambos se abraçaram e ficaram algum tempo a conversar.
Lugar pequeno, como era então Paranaguá, todos queriam
saber a razão daquele encontro. No dia seguinte, o prato do dia:
O Dr. L E O C Á D I O e o palhaço Polidóro haviam sido colegas na
Faculdade de Medicina. Por circunstâncias da sorte, Polidóro não
conseguira se f o r m a r . . . coisas da v i d a . . .
Quando da sua formatura, a tese de doutorando versou sobre a
" L I T O T R Í C I A " (operação cirúrgica que consiste em triturar os
cálculos localizados na bexiga ou na uretra). Foi uma tese que
mereceu louvores.
Tão logo formado, casou com sua prima — Carmela Cisneiros
Correia. Dessa união vieram 3 filhos: Leocádio, Lucídio e Clara
Alves de Araújo.

277
Deixou, o Dr. L E O C Á D I O , este mundo e a sua Paranaguá, no
triste dia 18 de maio de 1886, depois de 3 dias de sofrimento...
Paranaguá cobriu-se de verdadeiro luto. Milhares de parana-
guaras acompanharam o seu ídolo até a derradeira morada e mui-
tas lágrimas verteram por quem soube amar sua terra e sua gente,
nos 13 anos que viveu como médico e como artista...
E a gratidão da cidade ? . . .
G R A T I D Ã O , Paranaguá sempre teve, tem e terá por esse
semi-Deus — faísca da Divindade, que atravessou tão rápida o céu
desta terra ! . . .
O DR. L E O C Á D I O JOSÉ C O R R E I A E S T A R Á SEMPRE NO
CORAÇÃO DOS P A R A N A G U A R A S N A T O S E DE ADOÇÃO !!!
E o que temos no recôndito do nosso coração, ninguém pode
tirar !
Haverá homenagem maior que essa ? ! . . .
Fala bem alto o Cemitério Municipal de Paranaguá, na sua
eterna e significativa mudez ! ! ! . . .

DR. JOSÉ JUSTINO DE MELLO


Dr. Mello, como o chamavam, foi um desses médicos que apor-
tando em nossa terra, trouxe consigo a chama do amor ao próximo
e a esperança para ser lançada no coração das criaturas.
Nasceu ele em Diamantina (Minas Gerais). Com uma inteli-
gência privilegiada, conseguiu, com apenas 21 anos, formar-se
médico, pela Faculdade de Medicina do Rio de Janeiro.
Quis, pela sua vocação, vir para o Sul e, preferindo o interior,
veio parar em Antonina, onde clinicou durante 10 anos, com aquela
abnegação peculiar aos médicos humanitários.
Lá, contraiu núpcias com D. Guilhermina da Costa, nascendc-
Ihe cinco filhos. Enviuvando cedo, casou novamente, com sua
cunhada D. Francilina da Costa. Desse 2.° matrimônio, vieram 3
filhos: José, João e Alcídia.
Ve^o de mudança para P A R A N A G U Á , nos fins do século pas-
sado. Sua chegada foi de grande alegria para a população, que
já o conhecia de nome pelo que havia feito em Antonina.
Esse benemérito médico muito trabalhou contra as doenças
contagiosas — febre amarela, varíola e peste bubônica — moléstias
epidêmicas que constantemente assolavam a nossa terra, ceifando
centenas de vidas.
Quando os jornais davam a notícia do aparecimento delas na
Bahia e Rio de Jane^o, as famílias abastadas fugiam da Cidade,

278
para os sítios onde tinham suas casas e chácaras com plantações;
lá ficando, um, dois ou três meses, até cessar o mal.
Na Cidade só ficavam, a classe média, os pobres e indigentes;
além das autoridades, do padre e do médico. Este, como verdadeiro
sacerdote, ia aliviando as dores físicas das criaturas que estavam
aos seus cuidados.
O Dr. Mello, com aquela bondade que lhe era peculiar, com o
perigo da própria vida, fazia o que era possível naqueles difíceis
tempos.
Uma epidemia de varíola que grassou em nossa terra, no ano
de 1889, foi impressionante. O abnegado médico, para debelar o
mal, fez o impossível dia e noite, atendendo os doentes, numa dedi-
cação a toda prova.
Foram tão grandes os seus serviços prestados à população, que
o Prefeito e a Câmara, em sessão solene, prestaram-lhe uma home-
nagem, oferecendo, na ocasião, uma significativa medalha de ouro,
como gratidão pelo muito que fez durante o surto epidêmico na
Cidade.
Dr. Mello foi, muito tempo, médico da Prefeitura; nomeação
feita pelo Prefeito João Guilherme Guimarães. Foi também Ins-
petor de Saúde dos Portos. Outra homenagem recebeu ele dos seus
amigos e clientes: um retrato seu a óleo, pintado pelo grande ar-
tista Alfredo Andersen, e que lhe foi ofertado aos 19 de março de
1895, data do seu natalício.
D. Alcídia Mello, tão conhecida nossa e de toda a população,
como pianista e diretora do 1.° Jardim da Infância, era a sua últi-
ma filha.
Quando da campanha de vacinação antivariólica, muito lutou
o Dr. Mello, para que o povo inculto aceitasse a vacina.
Sempre morou em casa alugada (sobrado hoje do Clube De-
mocrata), pois foi pobre; isso devido ao seu nobre coração em
praticar a caridade. Um ano antes de falecer, foi atacado de para-
lisia nas duas pernas. Sofreu muito; mas não deixou de clinicar,
atendendo em sua própria casa; principalmente aos pobres.
Finou-se no dia 11 de outubro de 1906, sem o mínimo amparo
para sua família. Entretanto foi cercado da consideração e res-
peito da gente paranaguara, que, numa subscrição espontânea,
angariou dinheiro para os funerais e para a família e n l u t a d a . . .
Extremoso, como sempre foi, na nobilitante missão de curar,
era chamado o "pai dos pobres" (a exemplo do querido Dr. Leo-
cádio).
Não podíamos, pois, passar sem dizer, às gerações futuras,
quem foi esse paradigma da caridade ! . . .

270
DR. JOÃO COELHO MOREIRA
Grande médico, que aqui chegou pelos idos de 1900, como Sub-
-Inspetor de "Saúde dos Portos do Estado do Paraná".
Baiano, de coração aberto ao sofrimento alheio, jamais cobroa
de sua grande clientela pobre.
Sua esposa — D. Laura Bandeira Moreira — dama de senti-
mentos nobres e altruísticos, era, na época, considerada a "mãe dos
pobres", pelo muito que fazia em prol dos necessitados.
Se ainda existir alguém que conheceu esse extraordinário casai,
poderá confirmar as nossas palavras.
Ambos católicos fervorosos, muito ajudaram a Paróquia de
Paranaguá que, na época, sofra a indiferença do povo, principal-
mente do elemento homem.
Há muito falecidos, deram eles grande apoio moral e financeiro
à religião que abraçaram, e isso durante o tempo em que viveram
em nossa terra.
Seus filhos: N E L S O N (oficial do Exército, já falecido) e Edméa
(viúva com 3 filhos), atualmente funcionária pública, aqui se cria-
ram e se educaram, na fase mais bela da vida — a juventude.
O DR. M O R E I R A morou em Paranaguá, com a família, de 1900
a 1920, quando, por motivo de saúde, pediu transferência para a
B A H I A , sua terra natal.
A saída desse bondoso casal deixou uma lacuna muito grande
para a cidade, não só no setor religioso, como na classe humilde
que sempre recebeu o auxílio financeiro e espiritual.
O D R . M O R E I R A e D. L A U R A , durante o tempo em que aqui
moraram, foram verdadeiros amigos de nossa gente.
A eles, o nosso preito de saudade.

DR. BELMIRO SALDANHA DA ROCHA


DR. B E L M I R O , outro grande médico, que chegou em Parana-
guá no ano de 1908, com sua esposa — D. R O S I T A — e o filho
N E L S O N (nascido em Jaguariaíva).
O DR. B E L M I R O veio nomeado médico da Prefeitura Munici-
pal, atendendo os funcionários municipais, desde 1908 até 1917,
quando pediu a sua demissão.
Foi então nomeado médico-ajudante da Sub-Inspetoria de
Saúde dos Portos do Estado do Paraná, de 1912 a 1922.
Nomeado depois, Sub-Inspetor da mesma Repartição, desde
1922 até 1935, data em que essa Sub-Inspetoria foi extinta.
280
Foi também por muitos anos, médico da Escola de Aprendizes
Marinheiros, até sua extinção.
Durante os 27 anos de residência em Paranaguá, nasceram-lhe
os 6 filhos: Ruth, Eurico, Raul Hugo, Maria Helena e Adolfo.
Nesses 27 anos de convívio em nossa terra, no exercício de sua
profissão, fez clínica geral, sem jamais cobrar de sua clientela
humilde. Tinha ele um grande coração afeito à prática do bem.
De sorriso franco e leal, possuía um vasto círculo de amizades
que muito o admiravam.
Por vários anos Provedor da Santa Casa de Misericórdia, c'ini-
cava tambm gratuitamente (Naqueles tempos não havia quartos
particulares e sim enfermaria para indigentes).
Probo e bastante conceituado, jamais contraiu immizades; pois
era estimado por toda a população.
Sua esposa — D. R O S I T A — católica por excelência, tinha
uma voz de soprano, maravilhosa. Cantava no " C O R O " da antiga
igreja matriz e na do Rossio fazendo sempre o sólo. Sem exageros,
era uma voz marav^hosa.
É preciso que se saiba que, antigamente havia em Paranaguá
o famoso " C O R P O C A N T O R U M " , criado e dirigido pelo então vi-
gário da Paróquia — padre José Adamo -— que possui a voz de
barítono e conhecia música. Eram músicas sacras muito lindas e
muito bem ensaiadas; encantavam a todos os que ouviam.
Nas demais festas sociais e artísticas, D. R O S I T A era solici-
tada, como um elementos imprescindível às horas de arte que se
faziam e ainda se fazem em nossa terra.
Em virtude da extinção da Sub-Inspetoria de Saúde dos Portos
do Estado do Paraná, em 1935, foi o Dr. Belmiro transferido como
Inspetor de Saúde do Porto do Rio Grande, no Estado do Rio
Grande do Sul.
Saída muito sentida pela população. E foi outra lacuna que
ficou na seio da sociedade paranaguara.
O casal B E L M I R O - R O S I T A (já falecidos), continua sendo lem-
brado pelos paranaguaras que com eles conviveram; pois no campo
cultural, social e filantrópico da cidade, foram extraordinários, da-
das as festas beneficentes que ambos promoviam.
Suas presenças sempre foram atuantes em todos os setores da
vida social e cultura de nossa Paranaguá.
Fomos testemunhas de todos os seus atos filantrópicos em
nossa terra. E a Santa Casa de Misericórdia muito deve a tão
digno casal.
Que o digam as dignas irmãs de caridade que lá trabalharam.
Ao casal, a nossa imorredoura gratição.

281
DR. ARTHUR JOSÉ DE BASTOS
Médico baiano, aqui esteve por três vezes, clinicando particu-
larmente.
Foi um ótimo médico, por excelência humanitário; principal-
mente para a classe humilde.
Muito independente, sofreu sempre com a pressão da política
da época, pois era ele apolítico.
Foi ele quem, na última epidemia de "peste bubônica", deu o
alarme da doença em nossa terra, prevenindo as famílias amigas
como deviam proceder.
Teve uma forte discussão sobre esse caso, com um grande polí-
tico da cidade, chamando-o de pessimista e alarmista quanto à
doença.
Entanto, o Dr. Bastos estava c e r t o . . .
Foi ele um médico de gabarito, estrela de primeira grandeza
que passou pelo céu de P A R A N A G U Á , deixando, como muitos
outros, um rastro luminoso.
Homem íntegro, vivia para a sua clínica e para sua família.
sua esposa D. Julita e seus filhos: Áurea, Edmundo, Iaiá e João.
A ele a nossa gratidão, por tudo o que fez de bom em nossa
terra, durante o tempo que aqui residiu.

282
POETAS E POETISAS

DO

PASSADO
FERNANDO AMARO DE MIRANDA

Novembro, mês de finados, também o foi do simples e modesto


cantor conterrâneo Fernando Amaro de Miranda — criatura digna
e respeitável, que deixou o rol dos vivos num dia triste, como triste
foi sua alma.
Retratá-lo, não é muito fácil. Entretanto, o morretense — J.
Morais de tradicional família, em um artigo publicado em 1887,
disse, com bastante eficiência:
"Conheci, pessoalmente, Fernando Amaro. Eu tinha, quando
ele morreu, mais ou menos seis anos de idade; mas lembro-me per-
feitamente do seu todo, porque ele freqüentava assiduamente a
nossa casa. Era alto, elegante; tinha a tez rosada e usava toda a
barba, que era negra. Um moço bonito de figura e de maneiras
simpáticas. Gostava muito de conversar, rir, brincar e dançar com
moças. Sabia preparar uma "soirée" prestando-se com muito gosto
para arranjar a sala, fazer convites e distribuir o chá. Foi ele
quem enfeitou a sala de nossa casa para o baile oferecido ao Dr.
Zacarias de Gois e Vasconcelos, quando este cidadão veio inaugu-
rar a nossa Província. Apesar do Presidente ter passado por Anto-
nina, o baile realizou-se, a instâncias de Fernando Amaro".
"O dia de sua morte foi de imenso pesar para a população
daquela cidade (então Vila de Morretes). Ele era, ali, extremamen-
te benquistò e estimado. Ninguém acreditava em tão triste acon-
tecimento. Morreu em casa de um seu íntimo amigo, Vicente
Loyola. Muitos anos depois, achou-se, nessa casa, em um caixote
aberto, entre papéis velhos e sem valor, três manuscritos seus:
sendo dois cadernos de versos e um caderno contendo um começo
de drama. Tive os três cadernos em meu poder, durante muito
tempo e hoje estão na Biblioteca Pública de Curitiba, para onde os
mandei no fim da administração "Taunay" (Presidente Dr. Alfredo
d'Escragnole T a u n a y ) , juntamente com alguns livros".
"Fernando Amaro publicou muitas de suas produções — prosa
e verso — em um pequeno jornal que havia em Santos".
Em outro artigo, também publicado, escreveu o Sr. J. Morais:
"Acho que há engano na data da morte de Fernando Amaro,
porquanto, no dia 15 de novembro de 1857, o Juiz Municipal res-
pectivo expediu uma portaria ao escrivão — Santos Souza — man-
dando-o intimar a Vicente Ferreira de Loyola para prestar jura-
285
mento de inventariante dos bens desse finado, e, a Antonio Gon-
çalves do Nascimento e José Antonio de Medeiro para depositários
dos mesmos bens".
"A ter, Fernando Amaro, falecido nesse dia, é preciso confessar
que houve demasiado zelo e pressa em se tomar essas providências".
"Sou de opinião que ele faleceu no dia 14 de novembro de 1857
e sepultado no dia 15; o que é confirmado pelas datas das contas
de despesas para o seu funeral, que têm — 15 de novembro de 1857
— e não podiam nem deviam ser prestadas no mesmo dia do
falecimento".
"Entre os seus bens arrecadados, incluindo as mercadorias do
seu negócio, figuram: " U m Parnaso Lusitano, uma Mitologia, uma
arte poética, um livro dos amores, duas revistas mensa's ( A c a y a b a ) ,
um livro de ciências, cinco livros escritos contendo obras do
mesmo". "O lote composto de um volume de poesias (Pulsações
de minha alma) e de um drama em 4 atos e um quadro (Triunfo
dos agredidos), foi avaliado por 20$000 e arrematado em praça pú-
blica por Rs 51$000 por Antonio Luiz Gomes, velho rábula que
aqui havia, conhecido pela alcunha de Manêta. O bilhete de depó-
sito, na Coletoria desta Vila, da quantia de Rs 51,000, importância
do lote arrematado, diz assim: O Sr. Antonio Luiz Gomes depositou
nesta Coletoria a quantia de Rs 51,000, proveniente de gêneros que
arrematou, pertencentes ao espólio de Fernando Amaro de Mi-
randa".
"Seu espólio montou em Rs 2.254$480 (dois contos duzentos e
cinqüenta e quatro mil e quatrocentos e oitenta r é i s ) .
"O poeta fumava charutos e tinha bonita letra. Era nego-
ciante a varejo, no Largo da Parada e tinha casa de comissões.
Parece, entretanto, que nunca fez coisa alguma, porque, em vez de
cuidar do seu balcão, e de agradar a freguezia, cuidava mais de
conviver com as "musas" e de agradar as moças b o n i t a s . . . s^m,
porque era apaixonado por bailes. Era também secretário da
Prefeitura, digo, Câmara Municipal desta Vila. Gostava de passar
bem e vestia-se corretamente à moda do tempo".
"A última vez que o vi, poucos dias antes de sua morte, vestia
com elegância — calça, colete e fraque de linho branco — e calçava
sapatos de verniz, muito novos. Nessa ocasião, tratava de arranjar
uma "soirée" para essa noite e pedia a meu pai que lhe cedesse a
casa para tal fim. A "soirée" realizou-se e, durante ela, Fernando
Amaro esteve alegre, expansivo como costumava e dançou muito.
Antes disso, tratando de obter doces para o chá, ele fez rir aos que
o ouviam, dizendo com graça que — doces para as moças e bolachas
para os h o m e n s . . . "
"Insisto nestas particularidades e minúcias, apenas para provar
que Fernando Amaro, em vez de ter o espírito taciturno e frio,
como talvez alguém julgue, era galhofeiro, espirituoso e pândego,
como hoje se diz".
286
Nestor Vitor, escrevendo uma vez, em 1887, qualquer coisa
sobre o poeta paranaense, disse: "Sobre Fernando Amaro, as infor-
mações que tenho são bem poucas, quase todas extraídas dos seus
versos". "Sei que ele era paranaense, que foi guarda livros, que
aqui esteve, e esteve em Morretes, em Curitiba, e que morreu moço
ainda". Além disso, não ignoro que ele teve amizade int'ma com
um José Vitorino da Silva Azevedo, de quem eu possuo um volume
de versos chatos, volume já um tanto dilacerado. "Este José Vito-
rino foi, em seus tempos, muito acatado aqui pela Província, onde
casou-se, segundo se infere de uma poesia a ele oferecida pelo nosso
Miranda. "Era português, segundo consta-me; tinha seu verniz
artístico, e foi de certo devido a ele que o Fernando pôde ler o
Castilho, o Soares dos Passos, o Bulhão Pato e outros que de vez
em quando cita. "É, pouco mais ou menos, o que sei; mas é fácil
o caminho para chegar-se adiante. "Ele ofereceu versos ao José
Pinheiro, ao comendador Alves de Araújo (a este muitos) e a outras
pessoas que já não vivem: mas destes que ainda podem falar,
poder-se-ia colher larga notícia e, quiçá, o seu retrato".
O poeta, em seus versos, queixa-se constantemente de não ter
tido estudos, nem convívio que lhe fosse útil, dizendo que escreve
"por gosto" e não para "passar por vate".
;
E s aí o que pudemos colher, através de novas pesquisas, sobre
o primeiro poeta paranaguara, que nasceu a 24 de junho de 1831
e deixou este mundo no ano de 1857, aos 14 de novembro, na vi-
zinha cidade de Morretes, com apenas 26 anos de idade, levando
para o túmulo o seu incompreendido amor (segundo várias crôni-
cas, com muitas controvérsias).
Morreu, F E R N A N D O A M A R O DE M I R A N D A , como quase todos
os poetas — moço — deixando aos pósteros os seus tristes e sen-
tidos versos cheios de tanta mágua. Nas suas poesias, ele sempre
extravasou o que lhe ia na alma insatisfeita; contrariamente à vida
que levava na sociedade morretense em que se criou (através da
fonte fidedigna do velho e honrado Sr. J. M o r a i s ) .
Isso tudo nos leva a pensar em dupla personalidade (salvo um
melhor j u i z o ) . Observemos a bela poesia do nosso vate:

DESCRENÇA E CRENÇA

Males pungiam-me a alma,


Na manhã fagueira e calma,
Em que vos fui visitar
Na vossa santa ermidinha
Do Rocio à beira mar.

ódios, senhora, eu não tinha;


Máguas sim, mas não horror,
Daqueles que me feriram
E daquelas que me traíram
Em paga de um puro amor.
287
Dos homens já nada espero,
Que me foi o mundo fero;
A parca estende-me um véu !
Tristes foram meus amores,
Pobre de mim, mãe do céu!

Tende pena destas dores,


Que acerba me foi a sorte.
Se a vida só deu-me pranto,
Enxugai no vosso manto
Meus olhos, depois da morte.

Um contraste perfeito. A que se atribuir ? Dupla persona-


lidade ? . . .
Pensamos que não. Talvez (e é mais que provável) que a
sociedade local tão cheia de preconceitos, não aceitasse o homem
como poeta que, além de pouca instrução, não tinha um pomposo
nome de família. A própria mocidade não o compreendia (ou não
queria compreendê-lo), zombando dos seus v e r s o s . . .
Explica-se isso perfeitamente: F E R N A N D O A M A R O perdeu
seu pai ainda criança ;indo morar, com sua velha mãe, em Mor-
retes, sob a proteção de seu padrinho — Manoel Gonçalves Mar-
ques — homem de posses e de grande influência política naquela
Vila. Assim sendo, lá cresceu e se fez moço, sob o calor humano
daquela gente boa e amiga.
É claro que F E R N A N D O A M A R O vinha sempre rever a terra
mater que tanto amava. Mas, quando sentiu a incompreensão e
indiferença de seus conterrâneos, afastou-se, guardando no íntimo
de sua alma a dor de uma cruel desilução... (zombavam do poeta
que vivia absorto com as "musas").
Como todos sabem, ele havia saído criança daqui; não criara
raízes na terra n a t a l . . . e nem era de família t r a d i c i o n a l . . . Eis
a razão.
E tanto isso deve ser verdade que, só depois de 50 anos de sua
morte (passadas três gerações), a sociedade paranaguara (em
1907) resolveu realizar uma "sessão literária" em comemoração ao
50.° aniversário de falecimento do "primeiro poeta da terra carijó"
— F E R N A N D O A M A R O DE M I R A N D A — sendo, nessa ocasião,
distribuída uma " P O L I A N T É I A " (coleção de seus versos), como
homenagem ao seu primeiro trovador. Assim é a v i d a . . .
F E R N A N D O A M A R O DE M I R A N D A cantou de fato a sua
P A R A N A G U Á , porém, sempre com aquela mágua, jamais esque-
cida. . .
Nas sextilhas que se seguem, observa-se claramente o seu
pesar:

288
"Quero sofrer duras penas,
Só assim terei centenas
Destes meus acerbos cantos,
Sentidos, mas desprezados
Por esses que, bronzeados,
Se riem de alheios prantos'.

"De que me vale esta vida.


Oh ! meu Deus, tão combatida?!
De cruéis ingratidões ?!
Viverei só pra mostrar,
Que os males sei suportar,
Desses feros corações ! . . . "

( B R O N Z E A D O S — no sentido de duros insensíveis, para faci-


litar a r i m a ) .

Felizmente os paranaguaras de 1907 souberam reconhecer o


seu valor.

São maravilhosos estes seus versos:

"Em tempos passados um fogo divino


Senhor desta mente, me deu o trovar.
E agora no peito nasceu-me outro fogo,
Que o gelo da morte só pode apagar !"

P A R A N A G U Á , através da Prefeitura Municipal, prestou-lhe


significativa homenagem, dando ao mais encantador jardim da
Cidade (embora sem flores. . . ) , o nome de " P R A Ç A F E R N A N D O
A M A R O " , consagrando assim a memória do " P A I DA P O E S I A
PARANAGUARA".

Um dos mais belos sonetos, dedicado a uma de suas namoradas,


é o que vamos transcrever:

A A R M I A

Nessa hora fatal em que partiste,


ó deidade do céu baixada ao mundo,
Não deste fé do meu pesar profundo,
Não deste fé do quanto estava triste !

Que culto o amor votava-te no fundo


Do coração que ao padecer resiste !
Porém, ármia, meu anjo, tu não viste
O mal do bardo de que chama é oriundo.
289
Hás de te finar também,
Sem ter no peito um gemido,
Que possa remir-se à fé.

Na cruel verdade destes maravilhosos versos, o leitor avaliara


a firmeza de caráter da saudosa e inesquecível poetisa.

Nesta outra poesia a inspirada cantora extravasa o que lhe


vai na alma; o desespero do seu viver amargurado. É um sufocado
grito de:

MEDO E PENA

Tenho medo do raio da alvorada


Que na fronte me pousa alegremente,
Tenho medo da sombra do crepúsculo
Que nas cismas me lança tristemente.

Tenho pena dos dias azulados


Na manhã de meus anos olorosa.
Quando as sombras da noite sonolentas
Se espreguiçam na selva pavorosa.

Tenho medo da vida e mocidade


Que me pulsa a ferver no coração;
Tenho pena do tempo que se escoa,
Tenho medo, meu Deus, da solidão.

Da nitente alvorada tenho pena,


O vôo seu quisera equilibrar;
Tenho pena das aves que modulam
Na palmeira deserta o seu trinar.

Tenho pena de tudo ! Até dos sonhos


Que vêm lentos pousar em meu cismar;
Dos prestígios dourados de criança,
Da luz baça e trisfconha do luar.

Tenho medo de tudo que é presente,


Tenho pena de tudo que é passado;
— O presente é uma flor cheia de espinhos,
O passado — um perfume evaporado.

Tenho pena da b r s a matutina


Que no seio dos mares estremece;
Tenho pena da luz enamorada
Que no centro dos bosques desparece.
292
Tenho medo da morte, e tenho pena
Desta nuvem dourada que me alenta,
Da gentil mocidade que me cinge,
E que em berço de musgo me acalenta.

Tenho medo que a flor de minha vida


Vá tombada na lousa emurchecer;
Tenho medo da voz da tempestade,
Tenho medo, meu Deus, do escurecer.

Tenho medo de tudo que é presente,


Tenho pena de tudo que é passado;
— O presente é uma flor cheia de espinhos,
O passado — um perfume evaporado.

Até 1868, ela foi feliz. Em plena pujança de seus 24 anos,


muito produziu, com aquela confiança no porvir.
Ao casar, contra a sua vontade, começou a sua desilusão. E
isso era de se esperar, esposando um homem muito mais velho e
sem instrução; apenas rico. Para u'a mulher inteligente e culta
e com alma de artista, essa união seria desastrosa. Entretanto,
JÚLIA DA COSTA foi forte. Fiel ao seu marido, agüentou firme
até a sua morte.
Em 1880, com seus 36 anos, achava-se exausta e já sem cora-
gem para continuar a lutar. Seu único alento era a correspon-
dência que mantinha com o seu amor platônico. Ambos sofriam.
Em 1892, deu-se o falecimento de seu marido. J Ú L I A DA
C O S T A estava com 48 anos. Contudo, dado ao sofrimento moral,
a saúde bastante abalada e a visão seriamente enfraquecida, pare-
cia mais velha do que realmente era. Apenas lúcida, continuava a
escrever, vivendo de reminiscências.
Em 1910, J Ú L I A DA COSTA recebeu a visita dos jornalistas —
Alberico Figueira e Domingos Duarte Veloso. Não foi sem difi-
culdade que os dois intelectuais conseguiam ser recebidos, É que
a velha poetisa, bastante abatida pelo sofrimento, já se achava sem
vista e com pouca lucidez de espírito, não lhes dando a mínima im-
portância. Enquanto os dois amigos falaram de seus versos, das
suas lindas produções, ela ouvia com a maior indiferença. Quando
porém tocaram em Paranaguá, a memória da doente se lhe avivou
de tal maneira que começou a discorrer sobre a velha terra natal
do seu tempo; relembrando o Campo Grande, o saudoso Caminho
Velho do Rossio, o manso Itiberê, bem como os aspectos sociais da
inesquecível P a r a n a g u á . . . Embora compassadamente falando, sua
voz se tornou trêmula ao lembrar a sua terra amada, Não esque-
ceu de perguntar aos dois visitantes se haviam conhecido o poeta
Fernando Amaro e José Morais.
Na despedida, ao apertar a mão de Dorrvngos Duarte Veloso,
percebeu, pelo sotaque, ser português; disse: "Sempre fui grande
293
admiradora de Guerra Junqueiro e de Antero de Quental!" (Foram
suas últimas palavras).
Já na porta da rua, ao agradecerem à companheira e amiga
da poetisa, ouviram dela estas palavras: "Estou surpresa por ouvir
D. J Ú L I A falar tanto. Isso é raro, porque passa todo o tempo num
verdadeiro mutismo".

No ano seguinte, deixou este mundo, na velha cidade de São


Francisco do Sul, sua pátria adotiva, como costumava dizer, aos
12 de julho de 1911, com 67 anos de i d a d e . . .
Foi u'a mulher de fibra, porquanto, infeliz no casamento;
amando platonicamente; jamais deu um passo em falso que pu-
desse diminuí-la perante o esposo. Mulher bela, simpática, ele-
gante; cabelos loiros e lindos olhos azuis; quem poderia esperar
que tivesse tão triste fim ? ! . . .
J Ú L I A DA C O S T A havia publicado, em anos passados, em São
Francisco, do^s opúsculos mal impressos, contendo suas produções.
Em 1913, após sua morte, um pugilo de amigos — Dario Veloso,
Leocádio Correia, Euclides Bandeira e Sebastião Paraná •—• num
gesto altruístico, resolveram reeditar essa preciosa obra, em dois
volumes e com o mesmo título: " F L O R E S D I S P E R S A S " .
Graças a esse extraordinário quarteto, tivemos a felicidade de
possuir as belas poesias da sempre lembrada poetisa paranaguara.
Além de tantos dotes JÚLIA DA C O S T A era extremamente
modesta. E essa peculiaridade também se observa na brilhante
poesia:

A O A U T O R DAS R I M A S D E OURO

Teus versos são belos, poeta gigante,


Mas eu, a i ! Não posso guardá-los aqui.
Teus versos são belos, mas eu não os quero,
Pois rimas douradas não são para mi.

Te afasta e caminha. Sou pobre, já disse,


Não tenho cultura, não posso cantar.
— Aceito a "grinalda", mas palmas de glória
Não posso, não devo com elas me ornar.

A vida do bardo traduz-se num r s o ,


Não deve o poeta negrumes amar;
Pois tudo que é belo, que é nobre, que é grande
Lhe traz mil enlevos que o fazem sonhar.

A brisa que passa lhe ameiga a existência;


As aves que cantam lhe falam de amores;
O sol que rutila promete-lhe sonhos;
A mata cheirosa dulcíssimas flores.
294
Só tu, bardo ignoto, desfolhas mil flores
Em triste caminho que a luz desconhece !
És jovem, não sabes que os gênios não vivem
Em furnas sombrias que a noite escurece ?

Aceito a "grinalda" — mas louros e cantos


Não posso, não devo — não devo colher !
— Portanto consente que as palmas de glória
Nas asas da brisa te torne a volver.

P A R A N A G U Á , através da Prefeitura Municipal, prestou-lhe


merecida homenagem, dando o seu nome a uma das principais
ruas da Cidade.
,. Fez mais ainda. Levantou uma Herna num dos cantos da
Praça Fernando Amaro, onde se acham guardados os seus restos
mortais; como um testemunho vivo de gratidão por quem viveu
1
cantando os encantos de sua terra nata .
E o Centro de Letras de Paranaguá incluiu-a honrosamente
entre seus numes tutelares; prova de reconhecimento e admiração
pela trovadora paranaguara; primeira poetisa de nossa terra e do
Paraná.

MAIA JÚNIOR
Grande e inspirado poeta da velha Paranaguá, foi Manoel
Gonçalves Maia Júnior.
Aqui nascido, aos 22 de outubro de 1863, era filho de Manoel
Gonçalves Maia e de D. Maria Josefina Maia.
Conheci-o, sempre como funcionário de nossa Aduana, probo
e íntegro. Jornalista de mérito, vários anos trabalhou em nossa
Imprensa.
Poeta dos bons, viveu sempre no aconchego do lar; na s'mpii-
cidade de sua vida um tanto obscura, dedicada ao seu labor na
Alfândega e, mais que tudo, à poesia, sua única razão de viver.
Seus versos, de uma delicadeza sem par, provam o quanto esta
criatura amou e sofreu. Quantas desilusões feriram sua alma de
artista; quantos sonhos desfeitos...
Desconhecido das três últimas gerações, trazemo-lo para o pre-
sente, a fim de apresentá-lo como o poeta que soube amar e sonhar,
viver e sofrer sem um lamento.
Trancrevendo seus adimráveis sonetos, nada ma's fazemos que
prestar-lhe a homenagem merecida, que sempre fez jus.
295
Vejamos esta jóia:

MEU P R I M E I R O A M O R

Eu amei com amor tão puro e santo


De minha mãe a divinal candura,
Que para mim era a maior ventura
Ouvir a voz sonora do seu canto.

Se a aflição e a dor me torturavam


Fazendo-me sentir males estranhos,
O seu zelo e carinho eram tamanhos
Que os sofrimentos todos melhoravam.

Um dia adoeceu. De porta em porta,


Procurou-se recurso. Foi baldado,
Porque, ao fim de algum tempo, estava morta.

Foi tão grande a explosão de minha dor,


Que eu enfermei de tanto haver chorado,
Porque foi esse o meu primeiro amor!

Nesta outra jó^a se observa a resignação personificada:

S A U D A D E S

As noites de luar têm os seus brilhos,


Que as grandes dores como que refletem;
Os orvalhos são lágrimas que vertem
As mães saudosas que deixaram filhos.

Tudo nas fala de passadas eras,


Que se findaram para não voltar;
Desfazendo de vez o grande aHar
De gozos, esperanças e quimeras.

Que tristeza sem fim me invade o ser!


Na vasta exibição de tanta coisa,
Eu sempre embevecido julgo ver

Em cada estrela que aparece e brilha


O protetor olhar de minha esposa,
E o carinhoso olhar de minha filha.

* * *
Crente na existência de Deus e da alma, o espiritualismo era
o seu escopo. Neste belo soneto o vate se revela:

293
A VERDADEIRA VIDA

O crente se concentra para orar,


Quando sente tristeza indefinida.
O ateu sem ter a calma refletida,
Como um simples bebê põe-se a chorar.

A alma, essa partícula integrante


De cada ser, de cada criatura,
Fica presa, do berço à sepultura,
Sem poder libertar-se um só instante.

Serena, sofredora e integrante


Confia no princípio de igualdade,
Para não ser a eterna penitente.

E na esperança, assim, quase perdida,


O espírito aspira a liberdade,
Para ir viver a verdadeira v i d a !

Iríamos longe, se tivéssemos de transcrever a coletânea deste


resignado poeta que amou de verdade e . . . sofreu, sorrindo ! . . .

LEÔNCIO CORREIA
Tanto se há dito de L E Ô N C I O C O R R E I A , que pouco nos restou
para falar sobre tão ilustre personagem.
Que foi Deputado Estadual e Federal; Diretor da Instrução
Pública do Paraná; Diretor do Ginásio Fluminense; Delegado Fis-
cal dos estabelecimentos de Ensino; professor de História da Escola
Normal; Diretor Geral da Imprensa Nacional; Diretor do Diário
Oficial; Diretor da Instrução Pública do Rio de Janeiro; Diretor do
Ginásio Nacional (hoje Colégio Pedro I I ) , não mais é novidade.
Dizer também que pertenceu a sociedades literárias, como:
Academia Paranaense de Letras; Academia Carioca de Letras;
Instituto Histórico e Geográfico de Paranaguá; Instituto, Geográ-
fico e Etnográfico do Paraná; Academia de Letras "José de Alen-
car"; Centro de Letras do Paraná; Instituto Brasileiro de Cultura;
dizer tudo isso, é repetir o que penas brlhantes já descreveram em
linguagem escorreita.
Diremos somente que, este poeta e prosador nasceu em Para-
naguá, em 1.° de setembro de 1865. Filho de João Pereira Correia
e de D. Carolina Pereira Correia, fez o curso primário na sua que-
rida Paranaguá; seguindo depois para Curitiba, a fim de cursar
humanidades no Instituto Paranaense. Já moço, mudou-se para o
297
Rio de Janeiro, onde fixou residência, lá vivendo mais de 50 anos.
Diplomou-se depois em Ciências Jurídicas e Sociais na Faculdade de
Direito de Niterói.
L E Ô N C I O C O R R E I A levou assim uma vida de intenso labor
literário, tomando arte em todos os movimentos nacionais, como
jornalista e orador. Tomou parte, em sua terra, na campanha da
Abolição e da República. Esteve ao lado de Gomes Carneiro, no
cerco da Lapa, em 1894.
Sua personalidade foi toda formada em Paranaguá, pois daqui
saiu homem feito.
:
Embora tivesse continuado seus estudos no Rio de Jane ro,
jamais deixou de ter contato direto com sua terra natal, onde cos-
tumava visitar amiúde.
Seus trabalhos literários e poéticos, de muito valor, dizem bem
do que foi o grande paranaguara.
Ao nosso modo de pensar, um indivíduo que sai criança de sua
terra natal e jamais volta a revê-la, nem ao menos recordá-la em
seus versos, não merece que seus conterrâneos o coloquem em um
pedestal de glória.
Felizmente, L E Ô N C I O C O R R E I A jamais esqueceu o torrão
onde nasceu, vindo, quase todos os anos visitá-la, enquanto suas
forças o permitiram; pois faleceu aos 19 de junho de 1950, com
85 anos de idade.
L E Ô N C I O C O R R E I A deu, em seus trabalhos literários, um
rumo todo seu, porque, sendo, ao mesmo tempo parnasiano e lírico,
seguia mais o ecletismo, por condizer com o seu eu. Os seus
versos confirmarão a nossa assertiva. Ei-los:

MINHA CRENÇA
4
Padre ! eu cre o que existe alguma coisa acima
D'isso que abrange o nosso olhar;
E que canta uma força harmoniosa, que anima
— Doce como uma rima —
A terra, o mundo sublunar.

Eu me considerara um ente desgraçado


Se, velando a luz de vastos céus —
Dentro em mim não vivesse o cântico sagrado
Que, como um grande brado
íntimo, diz que existe Deus.

Pois, se vejo uma flor, ou olho uma montanha,


Pergunto assim: quem foi que à flor
Deu do sutil perfume a linguagem estranha,
Dando altura tamanha
Ao monte — abrigo do condor ?
298
Derramo o meu olhar em torno; e, vejo, mudo,
A palpitar de gratição
Pelo Grande Senhor — a i ! tudo, tudo, tudo:
O bravo oceano rudo,
O astro do céu e a erva do chão !

Olhai, homens sem f é ! as árvores gigantes,


No cemitério os mausoléus,
Torres de catedrais e montanhas distantes,
E roseirais fragrantes,
São mãos erguidas para os céus !

Só nós homens ! só nós andamos pelo mundo


Com os nossos braços para o chão;
É porque, homens ! só nós trazemos o profundo,
Atroz ódio iracundo
Dentro do nosso coração !

Ser justo, e puro, e bom ! Que mais serena glória,


Suave como a luz do luar,
Nós podemos, a Deus, em nossa trajetória,
Pela vida ilusória,
Oferecer em santo altar ?

Padre ! é bem singular; mais a crença me ensina


(A crença é o riso de Jesus)
Que a augusta, a excelsa luz que o Universo ilumina,
É a que jorra, divina,
Dos braços santos de uma cruz ! . , .

* * *

IN EXTREMIS...

Tôrvo, mesto, sombrio, as barbas branqueadas


Como fios de prata ao peito derramadas;
O olhar fixo e parado, o cotovelo ao joelho,
E o queixo à mão, cismava o pensativo v e l h o . . .
Via, através da dor que o peito seu invade
O olímpico luar de sua mocidade
Lembrava-lhe o esplendor dos primitivos anos
Tudo quanto o rodeava: o céu azul, os planos
Campos verdes sem fim beijando os horizontes,
A solene altivez dos alterosos montes
Longínquos, o cantar das aves infinitas,
E o suave rumor dos leques e das chitas
Que produzem ao passar pelas folhas ao v e n t o . . .
E escapou-lhe da boca um surdo e atroz lamento.
Faiscava no alto o sol. ..

299
"Eu julgava que tinha
Um olhar que era meu, e uma alma que era minha !
Fui um louco: adorei uma m u l h e r . . . quem ha-de
Deixar de acreditar, Deus ! na fatalidade ?
Foi um sonho esse amor, um sonho de ventura,
Fora muito melhor o horror da sepultura...
E esta recordação mata-me lentamente;
Pois qual o coração humano que não sente,
O peso de uma dor ciclópica, infinita,
Ante a queda infernal de anjo que o céu habita ?
C h o r e i . . . e o turbilhão das lágriimas choradas
Cravaram-se no céu como rosas nevadas;
No amplo seio de Deus, sob esse ideal disfarce.
Foram pérolas d'alma, uma a uma engastar-se...
E elas hoje vieram extravagar c o m i g o . . .
Que na terra não têm mais dedicado amigo".
De súbito calou-se.

E no seu rosto havia


Essa triste expressão, essa expressão sombria
Da inenarrável dor que quando a alma avassala
Torna-se inda maior num lábio, que se cala.

Vai declinando a tarde. Aos poucos a n o i t e c e . . .


Pelo tranqüilo azul a lua resplandece
Como um sonho de Deus flutuando no espaço,
Como um riso de Mãe dando a um filho devasso
Seu piedoso perdão; e nas barbas do velho,
Sublime nele como as folhas do Evangelho
Dançam raios da lua e os raios das estrelas
Sem que ele, o sonhador eterno, possa v ê - l a s . . .

* * *
EM MINHA TERRA

Olho o mar e olho o céu, e entre os céus e entre os mares


Pára a minh'alma, e há nela um aroma sagrado;
Todo esse eflúvio ideal dos místicos cantares
Vibra-me dentro, como um eco do passado.

Do tempo que passo tudo me fala, tudo


Traz-me recordações da áurea e primeira idade;
Como é doce cismar, reconcentrado e mudo,
Nas formosas manhãs da nossa virgmdade !
Na casa onde nasci entro todos os dias;
É a mesma, bem sei; mas que enorme mudança!
É que as salas estão tristemente vazias
Dos risos de meu pai, quando eu era criança.

Se a voz de minha Mãe inda nela ressoa


É que a vejo também todos os dias, vendo
Nela um riso de Deus, tão compassiva e boa
As minha dores vai em seu seio acolhendo !

O calmo Itiberê, onde mil travessuras


Quando criança fiz, dá-me tanta saudade!
E a silenciosa paz destas noites escuras
Como me faz lembrar da declinada idade !

Que hecatombes brutais ! que combates medonhos


Tenho tido na vida ! ante eles tem morrido
O sabor virginal dos meus primeiros sonhos,
No sombrio esplendor de um sol amortecido.

E, ah ! se não fosseis vós, meus caros companheiros


E a minha doce irmã e a minha mãe, acaso
Poderia eu vencer tantos despenhadeiros ?
Pode uma flor viçar na solidão de um vaso ?

Companheiros leais ! daqueles belos tempos


Da escola eu guardo ainda uma lembrança viva;
Os risos não são mais que simples passatempos
Para apagar da dor o espectro, que se aviva.

Maldito o coração que veloz não palpita


Ante as recordações puras da adolescência;
Que consolo melhor do que essa folha escrita
Na vida com a luz dos risos da inocência ?

Sinto-me aqui feliz, e minh'alma se expraia,


E dilata-se toda em ondas de harmonias,
Como a vaga que vem no côncavo da praia
Cantando umas canções de estranhas utopias.

Aqui minha ambição é pequena e sem preço;


Peço a Deus que conserve a meu lado em outono
Eterno minha Mãe e minha irmã, e peço
À terra um leito para o derradeiro s o n o . . .

* * *
301
S O N E T O

De lendas e de histórias é tecida,


— Lendas cheias de aromas e doçura,
História em que o céu canta e fulgura —
A beleza de toda a tua vida.

Da Santa Virgem do Rocio a ermida,


Em que à Fé a Esperança se mistura,
É a voz da crença imaculada e pura,
Numa casta harmonia indefinida.

Tu, berço de meus pais, meu berço amado,


Se um canto de tua terra me reservas,
Nele terei meu sono sossegado.

Que eu sonho o sonho ideal dos sonhadores,


Desejo palpitar nas tuas ervas,
Se não puder desabrochar nas flores!

% ^

M A E

Mãe ! Minha mãe ! na augusta claridade


Dos teus olhos tranqüilos e radiosos
Ri-se Deus; e, se Deus não rir, quem há-de
Rir, ó Santa ! por olhos tão piedosos ?

Como as estrelas pela imensidade


Desenrolam-se neles dons formosos
Dessa alma, e os vejo, Mãe — com que saudade,
Com que sabor de beijos lacrimosos!

Tu, que a vida me dando, Mãe, me deste


Parte da tua, e o teu amor, que enlaça
Meu ser, como uma faixa azul celeste,

Sei que darias, com um sorriso doce


Para salvar teu filho da desgraça
A própria vida, se preciso fosse.

% * *
L E Ô N C I O C O R R E I A lançou várias obras como: " F L O R E S
A G R E S T E S " , (sua estréia); poesias: " V O L A T A S " e " P E R F I S " ;
crônicas: " P A N Ó P L I A S " ; " B O Ê M I A DO M E U T E M P O " e " M E U
P A R A N Á " (esta última com versos); os documentários: " V U L T O S
302
E F A T O S DO I M P É R I O E DA R E P Ú B L I C A " e "A VERDADE SO-
BRE O 15 DE N O V E M B R O " ; bem como conferências: " P A L E S -
T R A S E P A R L E N D A S " , etc.
Ele fez parte da " D É C A D A DE O U R O " , entre 1880 a 1890, em
que Paranaguá, com seus ilustres varões, brilhou como um verda-
deiro centro de cultura.

NATALIA CORDEIRO DOS SANTOS


Nasceu está protegida das musas, a 25 de dezembro de 1898,
em nossa Paranaguá. Filha do probo e conceituado cidadão, João
Balduino Cordeiro e de D. Amélia Cordeiro, muito aproveitou
N A T A L I N A no convívio de seu pai; homem inteligente que, pelo
esforço próprio, conseguiu galgar um lugar ao Sol.
N A T A L I N A , desde menina, revelou uma inteligência precoce,
tomando parte em todos os festivais escolares da época.
Fez os cursos Primário e Complementar no então afamado
"Colégio Plaisant".
Criatura privilegiada pelos dotes artísticos, foi depois convi-
dada para lecionar desenho e pintura no referido Colégio.
Moça feita, seu verdadeiro pendor foi para a arte de poetar.
É quando surge a suave poesia:

S A U D A D E S ! . . .

Saudades ! . . . suspiros d'alma,


Que a alma alenta e conforta
Relembrando em doce calma
Uma esperança já morta.

S a u d a d e s ! . . . fluído divino,
Eflúvios do coração
Meigo afeto peregrino
Avivando uma a f e i ç ã o . . .

Lembrança d'alma querida


Que a morte de nós separa...
Que consola e nos a m p a r a . . .
Nos dissabores da vida.

Saudades ! . . . elos sagrados


Que o nosso ser liga a alguém,
E em pensamentos também,
Faz que vivamos lembrados .
303
Vem depois o belo soneto, que, nos parece, ser dedicado ao
grande mestre Dario Veloso:

O FILÓSOFO

Quer a doutrina expondo a seus Irmãos,


Ou do Mestre os preceitos ensinando,
Converte-lhe a palavra os corações,
Onde as idéias sãs vão germinando.

É mestre pelo exemplo, e, sendo puro,


Pode a todos falar de fronte erguida !
Não tendo nunca um pensamento impuro,
Jamais a uma vingança deu guarida!

Dentro do lar, em íntimas tertúlias,


A sua voz nos arrebata e enleva,
Como no alor de uma sentida dúlia.

Busca vencer os feitos da Grécia;


É luz de Amor, ,que, iluminando a treva,
Lembra o esplendor dos místicos da Grécia !

* * *
Outro soneto que nos emociona sobremaneira; pois, além do
acrisolado amor pela sua avozinha, parece que a nossa poetisa
pressentia que a vida lhe seria curta; que logo deixaria todos os
seus entes q u e r i d o s . . .
Casou-se aos 19 anos, a 27 de dezembro de 1917 e, aos 22 de
novembro de 1918, com apenas 20 anos, deixou este mundo. Não
pôde aproveitar as belezas da v i d a . . .

A V O Z I N H A

AVOZINHA, PARTINDO, BEM AMADA,


Levaste toda essa alegria minha;
Deixaste-me na vida, amargurada,
Deixaste-me, e te foste tão sozinha!

Quanta tristeza viva. concentrada,


Desde que me deixaste, ó a v o z i n h a ! . . .
Tornou-se para mim vida pesada,
A vida boa que era a vida minha.

Consola-me a lembrança que és feliz,


Nesse mundo de amor e de piedade,
Para onde breve irei —• tudo o prediz. ..
304
Tudo o prediz, avó, de tal maneira.
Que sinto uma indizível ansiedade,
Por essa grande Pátria verdadeira.

* * *
Temos agora uma Barcarola, cantada pelas "sócias" do "Grê-
mio Miosótis", em um festival realizado nos salões do "Clube Re-
publicano", no ano de 1917. O baile foi à marinheira, razão do
significado da letra. A música, composição do maestro João Gomes
Raposo, não pudemos encontrá-la.

Observem a delicadeza desta letra:

B A R C A R O L A

O nosso brigue é ligeiro,


Como igual outro não há;
Quando sulca as águas mansas
Da nossa Paranaguá.

Quando a Cotinga assinala,


A entrada do "Bergantim",
A cidade veste gala,
Promove alegre festim ! . . .

Murmura a brisa fagueira,


Na transparência do ar
Gemendo brandos queixumes,
Como os soluços do mar ! . . .

As ondas que se sucedem,


Após uma, outra desmaia,
Beijando meiga, serena,
Alvas areias da praia ! . . .

Vogai, marujos, que a vida


É galera que conduz
A plaga desconhecida,
De um mundo todo de luz ! . . .

ESTRIBILHO
Cantemos, que a vida é breve
Como o orvalho das m a n h ã s . . .
Cantemos, que o canto é doce,
Como as carícias louças ! . . .

* * *
305
Ainda este pequeno soneto:

P R E C E

I
Tu que durante o dia
me acompanhaste, vem,
Senhor ! e sê também
Do meu sono o v i g i a . . .

II
Minha alma só confia
em T i , Supremo Bem !
Vem ter comigo, vem
fazer-me c o m p a n h i a . . .

III
Eu sei, eu reconheço
Que nada te mereço
Oh ! vítima da Cruz.

rv
Sou pobre serva, enfim,
mas, tem pena de m i m . . .
eu te amo, Jesus !

* * *
São palavras de N A T A L I N A CORDEIRO este trecho que vamos
transcrever:

"Não é artista somente aquele que produz belas e admiráveis


páginas de arte, no verso, na prosa, no ritmo ou na tela; também
o é, aquele que sabe compreendê-la e sentir, nas diversas emotivi-
dades da alma".
a
Num discurso, no fim da guerra mundial ( l . ) , disse ela, num
arroubo de intensa alegria:

"Sejamos pela paz ! . . . Pela paz universal, pela paz das na-
ções, pela paz dos povos europeus, pela nossa paz, pela paz dos
nossos lares, porque, cada dia que fluir a paz, será para nós um
dia de júbilo, de risos e de festa".

Eis o que foi a curta existência da poetisa peranaguara —


N A T A L I N A CORDEIRO DOS SANTOS.

306
ADA DIAS DE PAIVA MACAGGI BRUNO LOBO
Nasceu, A D A M A C A G G I , no solar dos Paivas, na Ponta do
Caju, aos 29 de maio de 1906. Filha de Narciso Macaggi (genovês)
e de Maria Dias de Paiva (brasileira).
Desde pequena, foi uma revelação; cantava, declamava e deco-
rava tudo com facilidade. Aos 5 anos começou os primeiros rudi-
mentos de música com sua mãe. Aprendeu o francês e italiano
com seu pai (grande p i n t o r ) . Aos 7 anos, com sua irmã Eugênia
( G e n i ) , deram ambas audição de piano no Club Litterario, a quatro
mãos, tocando trechos das óperas "Lúcia de Lamemour" e "Cava-
laria Rusticana". Aos 13 anos já escrevia poesias, que eram publi-
cadas no jornal "Gazeta do P o v o " , usando pseudônimo; até que
um dia o Dr. Plácido e Silva, proprietário do referido Jornal, lhe
disse: "Olhe, menina, você é uma revelação poética; não precisa
usar pseudônimo; assine-os". Ada, modesta e simples como sem-
pre foi, achou que era cedo para isso. Mas no dia seguinte era
publicado um soneto seu, assinado. Nessa ocasião, suas colegas
mornalistas prestaram-lhe uma homenagem.
A D A fez o Curso Primário e Complementar no "Col. Ludovica
Bório" aqui em Paranaguá. Seus pais mudando-se depois para
Curitiba, ela pode continuar os estudos, cursando a "Escola
Normal".
Continuando a escrever crônicas, contos e versos, conseguiu
publicar em 1923,0 seu primeiro livro de poesias intitulado " V O Z E S
EFÊMERAS".
Mudando-se depois para o Rio de Janeiro, colaborou na Revis-
ta da Semana, "Vida Doméstica", "Fon-Fon", "Cruzeiro" e em di-
versos jornais. Enviava também colaboração para Curitiba e espe-
cialmente para Paranaguá ("Itiberê" e posteriormente " M a r i n h a " ) .
Com sua irmã Maria ( N e n ê ) , também escritora, viviam so-
mente de rendimentos literários. Logo depois contraiu núpcias
com o Dr. João Bruno Lobo, de cujo casamento veio uma filha.
Curiosa e ávida de saber, A D A estudou ainda o inglês e o es-
panhol e antes de falecer estava aprendendo o alemão.
Publicou ainda dos livros de contos: "Água parada" e " T a ç a "
e, em vésperas de morrer, foi publicada a sua obra prima "ímpetos"
(poesias), premiado com "menção honrosa" pela Academia de L e -
tras do Brasil.
Deixou uma biblioteca escolhida e fina.
Em um "Concurso Nacional de Puericultura", entre mais de
1.000 candidatas inscritas, A D A obteve a primeira colocação. R e -
cusou, porém, o prêmio (exercício de alta função pública), afir-
mando que: "fiz o Concurso para aprender mais alguma coisa".
Para tristeza nossa, a poetisa veio a falecer, repentinamente,
no dia 12 de novembro de 1947, com 41 anos de idade. Relativa-
mente moça, sua carreira literária foi brilhante.
307
De sua família, parece-me, só existem 3 irmãos: Raul Macaggi.
Geni Macaggi e Maria Macaggi ( N e n ê ) .
Paranaguá homenageou-a, dando seu nome a uma de suas
ruas. Entretanto, ela merece ainda mais.
A D A nunca esqueceu sua Paranaguá. Em muitos de seus tra-
balhos literários sempre lembrou a terrinha amada.

São dela as admiráveis poesias:

P A R A S E M P R E

Ouve rolar o pranto amargo em que me inundo,


Ele fala por mim, que não sei mais q u e r e r . . .
Põe entre nós, azul, o oceano profundo
Em toda a imensidade, ajuda-me a esquecer!

Eu fui tão má, tão bom tu foste ! assim, no mundo


É inútil nossa união; iríamos sofrer
O martírio sem par de penetrar ao fundo
Os nossos corações, sem nunca os compreender.

Não me procures mais ! parte, assim é preciso.


Eu, que fui de teu sonho a ilusão mais querida,
Hei de ter, na saudade, o mais triste sorriso.

Quero que o teu amor se torne em cinzas, crê,


Pois sei que deve ser, no livro da tua vida,
A folha que se volta e que não mais se lê ! . . .

* * *

M I N H A R E L I G I Ã O

Não é num grave templo, abóbadas pintadas,


Muitas velas ardendo em altares formosos,
Ante imagem do Cristo e santos silenciosos,
Que eu rendo culto a Deus, com rezas decoradas.

O meu Templo é o infinito, é a própria Natureza,


Tendo o céu por altar e as estrelas por velas,
Nesse Templo de vida as rezas são mais belas,
Esse Templo é que encerra a Verdade e a Beleza.

E nessa vasta Igreja as músicas suaves


Do órgão que alça a voz em preces fervorosas,
São o meigo ciciar das brisas perfumosas,
Os soluços do oceano e o trinado das aves.
308
Perante o Altar do céu eu me ajoelho e crente,
As minha orações são hinos de louvor,
Que eu ergo em pensamento aos pés do Criador,
Que deu luz às estrelas e prateou o crescente.

Adoro Deus olhando o sol que a vida encerra,


Que brilha esplendoroso e vivifica e aquece
A natureza toda, e que doirando tece
Uma trama de luz, a envolver a terra.

E considero a obra de Deus em toda a parte,


Ou galgando a amplidão, quando, às vezes, num sonho,
Nas coisas do Infinito o pensamento ponho,
Nos anéis de Saturno e nos sinais de Marte;

Ou estendendo o olhar em derredor do mundo,


A tudo que me cerca, a tudo que diviso,
Nesta terra onde vive a lágrima e o sorriso;
Nesta terra onde tudo é mistério p r o f u n d o . . .

Na vida que palpita e se revela em t u d o !


Na estrela a reluzir, no verme que se arrasta,
No grãozinho de pó ou na planície vasta,
No mar que ruge irado e no rochedo mudo;

No perfume do cravo e na altivez da rosa,


No regato a correr, a água pura e cantante,
Entre as pedras do chão, inquieto, serpenteante,
Num lago muito azul, numa mulher formosa;

Na nuvem misteriosa a matizar o céu,


Na relva a enverdecer o chão como um tapete,
Na flor que, debruçada, o fruto são promete,
Na cascata a cair como um brilhante véu;

Na semente que a terra encobre no seu seio,


E apresenta depois metamorfoseada,
De tão pequena que era em árvore formada,
Alçando em verde prece os ramos, num a n s e i o . . .

É louvando e envolvendo em grandiosa oração,


Isso tudo que a vida estende aos olhos meus,
Que eu canto a minha prece e rendo culto a Deus!
O amor à Natureza é a minha religião.

* * *
309
D O R
(Poemeto)

Oh ! Dor! Tens sido sempre a minha companheira,


companheira fiel da minha vida inteira !
O teu estranho vulto ensombrou o meu berço,
e é o teu vulto sombrio que canta no meu verso.
Tenho-te junto a mim, sobre mim teu olhar,
sem teus golpes temer, sem tua mão receiar.
Sinto-me forte ó Dor, porque me acostumaste
a ver-te junto a mim. Meu coração tomaste
E a teu modo fizeste um novo coração,
apto para afrentar da vida a maldição.
De minha Fantasia as tuas mãos invisíveis
cortam os surtos vãos, irreais, impossíveis.
A alegria que engana, a alegria que mente,
ao teu beijo de gelo esvai-se l e n t a m e n t e . . .
Tu a afastas de mim no teu grande egoísmo,
e eu, mais perto de ti, no teu vulto me abismo.
Amo-te assim, amiga implacável e fria,
porque és mais verdadeira e leal que a alegria!
Com que estranho prazer me entrego aos teus abraços,
esmagando a minha alma entre os teus fortes braços !
Ao teu longo abraçar minha alma se transforma
e às torturas cruéis da vida se conforma.
De mãos dadas contigo a vida vejo-a nua,
sem sonho, sem disfarces, e à majestade tua
Vejo curvar-se o mundo, imolar-se a ventura;
porque tu és a força animadora e pura,
Porque nos gestos teus de mágoas não iludes,
oh ! soberana Mãe de todas as virtudes !
Tua eterna presença é quase uma alegria
para mim que te adoro, oh ! companheira fria!
És parte do meu ser, tenho-te desde o berço,
tu és a côr, a rima, a vida do meu verso !
* * *
Inegavelmente, Ada Macaggi Bruno Lobo, foi uma brilhante
poetisa e como poucas, soube sentir a vida em todo o seu esplendor.
Verdade seja que, um tanto arrebatada no seu modo de pensar e
agir com seus sentimentos íntimos. Contudo, foi uma glrande
poetisa. Os verdadeiros artistas são assim.

310
MÚSICOS
JOSÉ ITIBERÊ DE LIMA
(CAZUZA)

Saudoso musicista e compositor conterrâneo, foi um predes-


tinado. Nasceu ele aos 25 dias de abril do ano de 1891, à rua Faria
Sobrinho n.° 10. Era filho do Mestre de Banda, Sr. Caetano José
de lima e de sua esposa D. Anfilóquia de Miranda Lima, ambos
nascidos em Paranaguá. Seus irmãos — Hemitério, Anibal e Joa-
quim — também eram músicos e há muito falecidos.
Seu velho pai, considerado o melhor músico da época, deu-lhe
os primeiros ensinamentos de teoria musical.
Passou depois a receber aulas de piano com a mus'cista Dona
Alcídia Ribeiro de Sousa, professora da terra.
Mais tarde continuou os estudos com a saudosa maestrina.
professora italiana Ludovica Caviglia Bório. E foi com esta pro-
fessora que se aperfeiçoou.
Não se formou em "piano", como era seu desejo, porque, sendo
pobre e tendo perdido o velho pai muito cedo, não possu'a recursos
para se transferir ao Rio de Janeiro, a fim de cursar o "Conserva-
tório de Música". Além disso, tinha ainda sua extremosa mãe para
sustentar.
Não recebeu "diploma", todavia, foi um grande conhecedor do
teclado, um grande músico e, sobretudo, um ótimo mestre. Seu
"diploma" foi a consagração do povo de sua terra, através de suas
composições.
Tornou-se assim um eterno sofredor; frustrado no que de mais
caro lhe era na vida — a divina arte de E u t e r p e . . .
Ficou, pois, JOSÉ I T I B E R Ê DE L I M A , preso a Paranaguá,
pelas circunstâncias da sorte. Assim mesmo, com grande pendor
para a "música popular" e facilidade para compor, nas inspirações
constantes, começou desde cedo a escrever suas melodias, todas re-
passadas de tristeza.
Eram composições belíssimas, que faziam as delícias da moci-
dade do seu tempo. Não havia quem não apreciasse as valsas de
"Cazuza", como o chamavam na intimidade.
Doente, desde muito moço, lutava com a sorte, sempre adversa,
que lhe não dava, pelo menos, a saúde. Mas era resignado e muito.
Quanto mais sofria, tanto mais brotavam daquele cérebro pri-
vilegiado as mais lindas inspirações; verdadeiras catadupas de
313
melodias. Com isso, tornava-se cada vez mais querido da gente de
sua terra.
Moço já, minado pela doença que o consumia aos poucos, não
podia realizar os sonhos que povoam a mente da juventude — amar
e ser a m a d o . . . Calcava as paixões no recôndito de seu coração
amargurado. Desabafava porém na música, que era, por assim
dizer, o seu consolo e a sua razão ainda de v i v e r . . .
Nos célebres carnavais de outrora, que tanto sucesso alcança-
ram na velha Paranaguá, era o " C A Z U Z A " quem compunha os
"sambas" e "marchas" para os "blocos carnavalescos" que se
organizavam nas Sociedades, durante o tríduo momesco. Esses
"blocos" é que davam vida aos bailes, sendo esperados com muita
curiosidade. Note-se que o rádio ainda não havia aparecido.
C A Z U Z A era, então, tudo para a mocidade de sua terra que,
em três gerações, viveu sob o influxo das melodias de tão inspirado
compositor.
Regeu ele diversas "Orquestras" que se organizaram em Para-
naguá, quando apenas o Teatro e a Música eram a única distração
de nossa gente paranaguara. Partiturava qualquer música que se
lhe pedissem, fazendo os mais difíceis transportes, pois tinha bas-
tante conhecimentos de harmonia e contraponto.
O "Centro Musical", desaparecido, faz alguns anos e que mar-
cou época em nossa terra, encontrou no maestro um verdadeiro
baluarte.
Quando da vinda de cantores e violinistas e mesmo Compa-
nhias de Operetas à nossa Cidade, era Itiberê de L i m a o procurado
para fazer os acompanhamentos ao piano. E é de se notar que não
eram cantores populares como os de hoje. Tratava-se de cantores
de óperas, cujas partituras, de difícil execução, requeriam muita
técnica e muita leitura de música.
Em 1907, aos 2 de abril, no Teatro "Santa Celina", acompanhou
ao piano o maior flautista brasileiro da época — " P A T Á P I O SIL-
V A " — sendo elogiado, pelo artista, o jovem pianista que contava
apenas 16 anos de idade ! . . .
Por várias vezes foi ao Rio de Janeiro, a fim de procurar me-
lhoras para seu estado de saúde, que cada vez mais se agravara.
Seus amigos, que eram muitos, sempre o ajudaram nos transes
mais difíceis de sua amargurada existência.
Suas músicas impressas, todas elas foram dedicadas aos amigos
e familiares dos mesmos, como gratidão pelo muito que deles
recebeu.
Costumava também dedicar uma "valsa" a cada uma de suas
alunas, e isso o fez até o fim de sua vida. Deixou porém muita
música apenas escrita do próprio punho, sem ter podido publicá-
-las, (Algumas eu as possuo e entregarei ao Instituto Histórico)
Sua última composição foi a valsa " E N I S E " , dedicada à filha
de um ilustre facultativo que res'diu algum tempo nesta Cidade
e foi seu particular amigo. Essa "valsa" ele a escreveu em março
de 1935, dois meses antes de sua partida para o a l é m . . .
314
Finou-se o humilde maestro aos 16 de maio de 1935, na sua
modesta casinha da rua Faria Sobbrinho, em frente ao Club Litte-
rario (hoje desaparecida). Tinha então 44 anos de idade.
De sua família, restam alguns sobrinhos, todos filhos da terra
e não mais residindo na Cidade. Entre eles, destacam-se: Dr.
Brasílio de Lima e a professora Nely Miranda de Lima Madureira.
Esta última, criada pelo maestro e sua extremosa mãe, desde tenra
idade, tornou-se uma grande pianista.
José Itiberê de Lima não escreveu somente músicas populares.
Compôs várias "berceuses", "minuetos", "gavotas", valsas de con-
certo, bem como algumas operetas. Seu vasto repertório, parece-
-me, foi doado à "Banda Militar do Estado". Restam as que foram
impressas e alguns originais a nós oferecidos, e que guardamos com
acurado cuidado.
I T I B E R Ê DE L I M A era um triste, razão porque, suas compo-
sições são todas repassadas de grande sentimentalismo.
De alma romântica, pois sua primeira e única paixão deu-se
aos 18 anos (e com uma linda m o r e n a ) , encontrou ele na música
um vasto campo, fecundo mesmo, nos seus diversos motivos.
Mas, onde o maestro atingiu a culminância de sua inspiração
artística foi no " H I N O " que compos em honra à Virgem Maria,
sob a invocação de "Nossa Senhora do Rossio", inspirado na grande
fé que sentia pela excelsa Padroeira do Paraná ! Seus acordes são
a expressão viva e pura de um coração alanceado por uma infinda
amargura. A melodia é repassada de uma dor pungente, só com-
preendida por quem s o f r e . . .
Nesse " H I N O " ele sintetizou tudo o que fez nos 30 anos de vida
artística. Foi como que um grito da alma proferido em a noite
escura do seu v i v e r . . . seus sofrimentos e sobretudo a resignação
ante a sorte ingrata ao lhe negar a felicidade a l m e j a d a . . . Mas ele
amou, sentiu e viveu através de sua arte, culminando com o " H I N O
À V I R G E M DO R O S S I O " que foi a sua verdadeira consagração.
Disse alguém mui acertadamente: "Os artistas não morrem !
Vivem eternamente através de suas produções" !
JOSÉ I T I B E R Ê DE L I M A não morreu. Suas inesquecíveis
composições o farão viver eternamente na História de Paranaguá!

ANÍBAL DE LIMA
Pistonista de valor, foi um bom mestre de Banda. Dirigiu
muitas Orquestras e Bandas de Música. Também orquestrava
muito bem. Era irmão de José Itiberê de Lima e viveu muito mais
que este.

315
CAETANO JOSÉ DE LIMA
Grande mestre de Banda e professor de instrumentos musicais
de sopro. Dirigiu muitas Bandas em Paranaguá e ensinou ao filho
toda a teoria musical que conhecia, pois era pai de José Itiberê de
Lima.

JOÃO GOMES RAPOZO


Catarinense de nascimento e paranaguara de coração, pois
aqui viveu mais de 30 anos. Enviuvando com duas filhas, aqui
casou em segundas núpcias. Exímio violinista; regente de Orques-
tra; mestre de Banda e professor de violino. Bom compositor, dei-
xou muitas produções musicais, entre elas o Hino do Clube Repu-
blicano. Faleceu há alguns anos atrás, já bem velho. Ele compôs
também o H I N O de Paranaguá.

316
PINTORES
OS NOSSOS PINTORES

Ao escrevermos sobre a divina arte de transportar para a "tela"


a Natureza em todo o seu esplendor, incluindo o homem, obra-prima
dessa mesma Natureza, não podemos deixar de citar os artistas
que aqui nasceram e os que em nossa terra viveram por um pu-
nhado de anos; mestres do pincel a honrar Paranaguá com seus
magníficos trabalhos.

IRIA CÂNDIDO CORREIA


Exaltar esta culta figura feminina descendente das mais ilus-
tres famílias paranaguaras, é prestar uma homenagem à primeira
pintora paranaense.
Artista de raro valor, nasceu I R I A C O R R E I A aos 20 de outu-
bro de 1839, no antigo sobradinho da rua Conselheiro Barradas;
hoje, Marechal Alberto de Abreu. Era filha do T t e . Cel. Joaquim
Cândido Correia (filho do Correia Velho) e de Dona Damiana
Correia (carioca).
Além de pintora, ótima pianista e excelente professora de pia-
no; cultivando também as letras. Foi, sem favor, o protótipo da
mulher culta de seu tempo, em Paranaguá.
Seus inúmeros quadros, quase todos a óleo, estão esparsos e
fora da cidade, e, por incrível que pareça, não temos um único em
nosso Museu Regional ou mesmo em mãos particulares. Todos eles
acham-se em poder de amigos e familiares não residentes em Pa-
ranaguá. Isto justifica-se: Descendentes de Família de costumes
rígidos, Iria, com mais duas irmãs — Carolina e Damiana — fica-
ram solteiras. Seu único irmão — Tasso — promotor público,
também não casou. Não deixaram, por isso, descendentes diretos;
apenas parentes em 2° grau, em Curitiba e Rio. É claro que, para
lá, seus trabalhos foram desviados. Sabemos, entretanto, que dois
ótimos quadros estão no Museu do Dr. Davi Carneiro; sendo um,
o retrato do avô da pintora, e o outro, o de "Santa Terezinha de
Jesus".
Aos 10 anos de idade (1849), Iria entrou para o então afamado
Colégio Particular das professoras JESSICA e V I L L I E JAMES;
norte-americanas que para cá vieram, a pedido das mais distintas
310
famílias da terra. Nele, fez ela o curso completo de piano e adquiriu
também os conhecimentos técnicos de "desenho e pintura".
Foi colega da poetisa J Ú L I A DA COSTA, da qual se tornou sua
amiga. Estudaram ambas, nesse grande Colégio, tudo o que era
possível à mulher daqueles tempos.
Mais tarde, já mocinha, continuou seus estudos com a pintora
francesa — M A D A M E T O U L O I S — então residente em Paranaguá;
aprimorando assim seus dotes artísticos.
Já formada, educou mais de uma geração de moças na arte
de tocar piano. Porém, seu pendor sempre foi para a "pintura".
Tendo sido uma bonita e culta mulher, é de admirar não se
ter casado. Talvez, devido aos preconceitos sociais da época, não
encontrasse o seu ideal, ou mesmo quem a compreendesse. Viveu
para a música e especialmente para a p i n t u r a . . .
I R I A C O R R E I A morreu cedo; com 48 anos de idade, em 1887,
sem nunca ter saído de Paranaguá.
Suas irmãs, porém, faleceram bem idosas. Conheci-as m u i t °
bem, pois ia constantemente comprar balas em sua residência (elas
faziam "balas de canela" muito gostosas, para vender). Sua es-
crava •— Juvência — liberta, foi mais tarde minha empregada. As
duas velhinhas quase nada tinham já no fim da v i d a . . .
Família tradicional e de princípios austeros, extinguiu-se com-
pletamente em Paranaguá, sem ter deixado um único descendente.
Todavia, o nome ficou, pois I R I A C O R R E I A soube perpetuá-lo
maravilhosamente, através de seus belos quadros.
Inegavelmente, foi ela uma grande pintora, e a primeira do
Paraná.

ALFREDO ANDERSEN

O PAI DA PINTURA PARANAENSE

Naceu, Alfredo Andersen, em Cristianssand, na Noruega, aos


3 dias de novembro de 1860.
Aos 12 anos, desenhando com regular perfeição, o Reitor da sua
Escola aconselhou aos pais a mandá-lo estudar pintura, tal o seu
pendor artístico.
Já mocinho, foi à Itália, deslumbrando-se com as obras de
arte que viu. Porém, devido à falta de recursos, não pode matri-
cular-se numa Academia. Em 1879, ganhou um Concurso da Acade-
mia Real de Belas Artes de Copenhague. Tornou-se logo professor
de Desenho, adotando o modelo vivo.
Com saudades da Pátria, voltou a Cristianssand, abrindo então
um Atelier. Concorreu em várias exposições e com êxito, sendo
seus quadros vendidos facilmente.
320
Em 1889, fez um longo cruzeiro, percorrendo alguns países
da Europa, a fim de conhecer novas raças e nova gente.
Em 1892, resolveu embarcar para a América, visitando o México
e Paraíba do Norte (no Brasil). Descendo, desembarcou em nossa
Paranaguá, devido o navio em que viajava estar avarado, necessi-
tando de urgentes reparos, ficando em nosso Estaleiro.
Simpatizando com nossa terra, pensou em ficar alguns meses
para conhecer seus habitantes, bem como sua história; seguindo
por fim até Buenos Aires.
Mas, aconteceu o inesperado. Gostou de Paranaguá e foi fi-
cando. Fez boas amizades e resolveu fixar residência por algum
tempo. Instalou-se então no Porto d'Agua e montou seu Atelier;
permanecendo até 1903, quando se mudou para Curitiba.
Na Capital do Estado, pode melhor se expandir, abrindo sua
Escola de Desenho e Pintura. Ensinou, então, como um grande
mestre, orientando os alunos na beleza da arte pictórica e deixando
que cada um seguisse a sua inclinação.
Sempde tolerante, quanto ao pendor de cada um, jamais exigiu
Escolas. Apenas pedia aos discípulos que não fugissem da verdade.
Alfredo Andersen tornou-se um verdadeiro paranaense, pois
trocou sua Pátria pela nossa. Aqui (em Cuirtiba) ficou, amou,
sofreu, lutou e, por fim m o r r e u . . . E ele fez mais que ficar, por-
quanto, fundou a "pintura paranaense", enriquecendo ao Paraná,
com um grupo de artistas, seus alunos, que hoje o glorificam.
Alfredo Andersen recebeu, no dia 3 de novembro de 1931, data
do seu natalício, no salão nobre da Municipalidade Curitibana, o
precioso documento, em pergaminho, outorgando-lhe o título de
Cidadão de Curitiba, pelos relevantes serviços prestados à Arte, no
Paraná !
Parece-me que foi a única cidade, no Brasil, que prestou, em
vida, homenagem desse teor, a um pintor estrangeiro, no passado.
Curitiba tem esse orgulho e essa g l ó r i a . . .
Faleceu o grande artista, no dia 9 de agosto de 1935, na sua
residência-atelier, à rua Conselheiro Carrão, 336, em Curitiba, dei-
xando centenas de alunos, que até hoje lembram, com saudade, o
mestre-amigo ! . . .
Seu melhor discípulo foi F R E D . L A N G E DE M O R R E T E S . Ou-
tro aluno destacado foi T H E O D O R O DE B O N A . Uma outra aluna
que se salientou foi M A R I A A M E L I A ASSUMPÇÂO, pintora de na-
tureza morta. Também foram seus discípulos, com muito valor,
Anibal Scheleder, Gustavo Kopp, Ghelfi, Traple e Freyesleben.
Andersen morreu pobre, como quase todos os grandes artistas;
pois, os vários Governos que passaram, durante sua vida em Curi-
tiba, jamais o a j u d a r a m . . . apenas promessas e mais promessas.. .
Morreu o velho mestre, sem ter alcançado seu único ideal:
A A C A D E M I A DE BELAS A R T E S DO P A R A N Á , sob sua direção. . .
321
Entretanto, para compensar a incúria dos governos passados,
seus amigos muito o ajudaram; pois nunca lhe faltaram alunos.
Andersen vivia mais da venda de seus quadros, nas várias expo-
sições que f e z . . .
Porém, falemos um pouco mais desse grande artista em nossa
terra. Nos 10 anos que permaneceu em nossa Paranaguá, fez gran-
;
des amigos; pintando dezenas de quadros; retrates de casa s os
mais destacados da cidade. O Instituto Histórico e Geográfico de
Paranaguá, no seu Museu Regional, guarda, com carinho, várias
telas — retratos de pessoas de destaque do passado.
Paranaguá jamais esqueceu o grande acervo por ele deixado.

NARCISO MACAGGI
Pintor italiano, que aqui fixou residência, ligando-se pelo ma-
trimônio com D. Maria Dias de Paiva (irmã do conceituado cida-
dão Anibal Dias de Paiva, proprietário da antiga Fábrica de F o g o s ) .
Seus filhes, todos aqui nascidos, muito lhe honraram o nome.
Seu filho, Mario Macaggi, de saudosa memória, também foi um
artista no pincel; além de folclorista de valor, de nossas coisas e de
nossa gente. Raul Macaggi, para felicidade de seus familiares e
de seus amigos, ainda está forte e bem de saúde. É um cidadão
de grandes dotes morais e espirituais.

N A R C I S O M A C A G G I foi realmente um grande pintor. Seus


trabalhos foram esparsos. O antigo prédio da Maçonaria foi por
ele decorado, com pinturas belíssimas. O antigo teto da velha
igreja matriz (hoje Catedral) atestava o seu valor como pintor.
Conhecemos várias telas dele, por sinal, retratos e muito bons.
Lembramo-nos de uma exposição no Colégio "Ludovica Bório", em
que o artista expôs algumas telas, que muito nos impressionaram,
principalmente o seu auto-retrato.
Já velho, com 50 anos, mudou-se para Curitiba, que talvez lhe
desse melhores oportunidades. Trabalhou em uma das Secretarias
do Estado.
Sentindo-se cansado e doente, veio passar uns tempos em casa
de seu filho, aqui falecendo.
Foi um lutador, como todo o verdadeiro artista, sofrendo as
agruras da vida e da incompreensão dos homens.
Verdadeiro artista, como pintor, foi de grande valor.

322
RAFAEL LOPES DA SILVA
O NOSSO PINTOR DO PRESENTE
Quem não conhece o pintor R A F A E L S I L V A , em Paranaguá ? !
Para alegria nossa, ainda vive o genial artista !
R A F A E L S I L V A , nasceu em Guaraqueçaba, aos 24 dias do mês
de outubro de 1904; filho de Antonio Lopes da Silva e de Dona
Albina Calado da Silva; esta, falecida com 21 anos de idade, ó r f ã o
de mãe, muio cedo, criou-se com o velho pai e sua madrasta, ótima
como segunda mãe.
Veio para Paranaguá com 12 anos. Aqui mora, portanto, há
50 ancs. Uma existência de lutas e desenganos, existência essa
dedicada exclusivamente a pintar o belo.
Começou a desenhar, quando criança, na Escola, com aquele
pendor só próprio dos verdadeiros artistas. Guarda ele uma recor-
dação viva e intensa daqueles que foram seus mestres primários
na velha terrinha.
9
Em 1926, quando servia ao Exército, no 9 R . A . M . em Curitiba,
começou então a pintar verdadeiramente; deixando no Quartel
diversos trabalhos murais. Terminando o seu tempo de Serviço
Militar, voltou para Paranaguá e aqui ficou, dedicando-se exclu-
sivamente à pintura a óleo; pois era seu sonho de artista em pleno
vigor dos seus 23 anos.
Um dia (estávamos em 1928), cai, por acaso, uma tela sua às
mãos do então Prefeito Municipal — Comandante Dídio Costa — .
O Chefe do Executivo Municipal manda chamá-lo e, cumprimen-
tando-o pelo trabalho, promete arranjar através da Câmara Mu-
nicipal, uma "bolsa de estudos".
Semanas depois, recebia R A F A E L , da Câmara, a prometida
"bolsa" por 5 anos; 3 anos de estudos com o velho A L F R E D O A N -
DERSEN, em Curitiba e depois, 2 anos no Conservatório do Rio
de Janeiro.
Infelizmente, rompe a Revolução de 1930. Com a mudança do
Regime, foi-lhe cortada a dourada " b o l s a " . . . Maguado e incom-
preendido, no tocante à sua aspiração, R A F A E L não desanima.
Conformando-se com o pouco que teve de aulas (quase 2 anos)
com o "Pai da Pintura Paranaense", volta novamente a Paranaguá
e aqui se dedica, de corpo e alma, à arte de transportar para a tela,
paragens e r e t r a t o s . . .
É, portanto, em 1930, que começa a sua verdadeira carreira
artística. Impressionista clássico, pintou centenas de quadros, cuja
maioria se acha fora da cidade. Apesar dessa grande saída, ainda
se encontram muitiss'mos deles nas mãos de paranaguaras ilus-
tres, que ciosamente guardam em suas salas, como verdadeiras pre-
ciosidades. Dois trabalhos seus se acham fora do País. Um, na
França e outro no Paraguai.
Há alguns anos, houve, na Inglaterra, uma exposição de pin-
turas sob motivos da "França livre" (a Embaixada, no Brasil, era
323
quem se encarregava de coletar os quadros). R A F A E L pintou,
então, o retrato do General Degaulle (uma alegoria), tendo no
fundo a bandeira da França Livre com a cruz de Lorena, e enviou-o
à Embaixada, para seguir junto com os demais quadros já coleta-
dos. Entretanto, isso não aconteceu, porque a tela trazia a assi-
natura do pintor, e, de acordo com as bases da exposição, não era
permitido, em hipótese alguma, assinar. R A F A E L não ficou aborre-
cido nem triste; deu o fato como encerrado.
Passaram-se dois anos, quando, um dia, recebe ele uma carta
da Embaixada francesa, pedindo permissão para oferecer o "qua-
dro" em questão ao Presidente da FRANÇA, RAFAEL, num gesto
de desprendimento, responde ao pedido, deixando a citada "tela" à
disposição da referida E m b a i x a d a ! . . .
É ser, de fato, desprendido ! . . . Mas, assim pensam os verda-
deiros artistas...
Mais tarde, foi-lhe encomendado um quadro a óleo, para ser
oferecido ao Presidente do Paraguai. R A F A E L pinta um dos inte-
riores do Convento dos Jesuitas. Trabalho perfeito. Essa tela
acha-se em poder do General Stroesner, em Assumption.
Entre os quadros espalhados pela cidade, destacam-se dois:
"A ceia de Cristo", uma obra prima, propriedade do Dr. Anibal
Ribeiro Filho; o segundo quadro, alusivo à criação do Município de
Paranaguá, é propriedade da Prefeitura e acha-se no gabinete do
chefe do Executivo; representa a "Leitura da Carta Regia"; outra
obra prima e de fundo histórico.
R A F A E L é de fato um espírito privilegiado em matéria de arte.
É casado com dona Natália Costa Silva e tem duas filhas: Zilca e
Carmen Lúcia, ambas professoras. Há bem pouco tempo recebeu
da Câmara Municipal de Paranaguá, uma medalha de ouro "Honra
ao Mérito", prêmio pelos relevantes serviços prestados à cidade,
como pintor emérito. Já fez duas exposições em Paranaguá e logo
fará a terceira era Curitiba. Atualmente está lecionando "Desenho
e Pintura" numa das salas do Conselho Municipal de Cultura,
contratado pela Prefeitura Municipal. Ministra ele os conhecimen-
tos que possui à juventude paranaguara, orientando-a na Arte de
desenhar e de pintar.
É possível que, para o futuro, tenhamos em nossa terra outros
tantos artistas, como o foram Iria Correia e Narciso Macaggi, e
ainda o é o nosso atual professor de desenho e pintura.
R A F A E L , hoje, é feliz, apesar dos seus 70 janeiros cheios de
desilusões e de lutas. É feliz porque tem seus discípulos, aos quais
i pode transmitir os conhecimentos técnicos da divina arte de trans-
por para a "tela" toda a beleza da maravilhosa Natureza ! . . .
Feliz de quem pode dar algo de bom e útil aos seus seme-
lhantes ! . . .
P A R A N A G U Á também é feliz, porque sabe reconhecer, em
vida, o valor de cada um de seus diletos filhos. . .
324
I

IMPRENSA
A IMPRENSA PARANAENSE

9
A I M P R E N S A , no P A R A N Á , surgiu com a vinda do l Presi-
dente da Província — Dr. Zacarias de Gois e Vasconcelos.
Entre os vários auxuiares de sua adnrnistração, veio o jorna-
lista Cândido Martins Lopes, trazendo uma pequena "Tipografia",
que tratou de montá-la em Curitiba.
9 9
Em l de abril de 1854, surgiu nas plagas paranaenses o l
jornal "DEZENOVE DE D E Z E M B R O " , órgão oficial do Governo.
No início, semanário; depois, 3 vezes por semana, e por fim,
diário. Manteve-se até 1889 (36 anos).

A IMPRENSA PARANAGUARA
Como não podia deixar de ser, P A R A N A G U Á procurou também
ter o seu jornal. E ele surgiu 6 anos depois, redigido pelo Dr.
M A N O E L A L V E S DE A R A Ú J O , paranaguara brilhante; pois, além
de chegar a ser o chefe supremo do antigo Partido Liberal, foi
eleito Vice-Presidente da Província do Paraná e mais tarde seu depu-
tado; culminando com o elevado cargo de Ministro e Conselheiro
da Coroa.
Comecemos então com esse elustre paranaguara:

1 — 1860: "O P A R A N Á " — redigido pelo Dr. Manoel Alves de


Araújo. Teve porém vida efêmera. Foi o precursor de nossa
Imprensa.
9
2 — 1862: "O COMÉRCIO DO P A R A N Á " — em l de janeiro, re-
digido pelo talento de Leocádio Pereira da Costa, com a
colaboração dos idealistas Timóteo de Simas, José F. Pi-
nheiro, Machado Lima, Antonio Ribeiro de Macedo, José
Morais e Manoel Negrão.
3 — 1864: "O P O V O " — em 18 de agosto. Redatores diversos.
Ignora-se quem o redigiu.
4 — 1867: "A P H E N I X " — em janeiro, redigido pela pena bri-
;
lhante dos Drs. Manoel Eufrásio Corre a e Filastro Nunes
Pires. Jornal conservador; hebdomadário.
327
5 — 1867: " I M P R E N S A L I V R E " — em janeiro, redigido por
Fernando Simas.
6 — 1869: "O B A R B E I R O " redigido pelo jornalista Barros Jú-
nior. Teve vida efêmera.
7 — 1870: "O C O N S E R V A D O R " — ignora-se quem o redigiu e
;
os dema s colaboradores.
8 _ 1870: " O P E R Á R I O DA L I B E R D A D E " — redigido por Bar-
ros Júnior. De vida efêmera. Deixou tradição, por ser de-
mocrático.
9 — 1873 "ECHO L I T T E R A R I O ' ' — órgão do Club Litterario,,
com diversos redatores.
10 — 1874 "ECHO DA L I B E R D A D E " — ignora-se o redator e o
mês em que surgiu.
11 — 1875 " G A Z E T A DO P A R A N Á " — ignora-se quem o redigiu,
bem como o mês em que apareceu.
12 — 1879 "A I N F Â N C I A " — desconhecendo-se o redator e o
corpo de colaboradores.
13 — 1879 ECHO DO P A R A N Á " — redigido por Florêncio
Vianna, com a colaboração de Leocádio Correia, João Eu-
gênio, Manoel do Rosário, Ramos Figueira, Lúcio Pereira
e José Cleto da Silva.
14 — 1880: "O COR DE R O S A " — redigido por Octaviano Branco,
9
em l de julho; de vida efêmera.
15 — 1880: "ECHO DA M A R I N H A " — redigido por Lindolpho
Pombo; com vida efêmera.
16 — 1881: "O C O R R E I O DO P A R A N Á " — surgiu em outubro.
Ignora-se quem o redigiu.
17 — 1881: " C L U B DO C O M M E R C I O " — órgão da Associação
dos Empregados do Commercio.
18 — 1881: "O F U T U R O " — surgiu em 3 de outubro, redigido
por Felippe Marinho. Teve vida efêmera.
19 — 1882: "O G U T T E M B E R G " — surgiu em agosto, redigido
por Virgilio Vianna. Teve também vida efêmera.
20 — 1882: "O I T I B E R Ê " — órgão do Club Litterario, redigido
pelo Dr. Leocádio Correia.
21 — 1882: "O N O T I C I A D O R " — ignora-se quem o redigiu e foi
de pouca duração.
22 — 1882: "O P H A R O L " — ignora-se também quem o redigiu.
Teve pouca duração.
23 — 1882: "A V I O L E T A " — surgiu em 10 de fevereiro, redigido
por Lúcio Pereira e Manoel Felipe de Araújo. Existe uma
coleção no Instituto Histórico e Geográfico de Paranaguá.
24 — 1883: "O P A I N E L " — redigido por Manoel Correia. Igno-
ra-se em que mês saiu.
25 — 1883: " L I V R E P A R A N Á " — surgiu em 7 de julho, redigi-
do por Fernando Simas, em colaboração com Guilherme
Leite e José Eugênio Machado Lima.
328
26 — 1883: "O P R O G R E S S O " — surgiu em 24 de março, igno-
rando-se o seu redator.
27 — 1886 "O C O M M E R C I A L " — surgiu em 23 de julho, redi-
gido por Manoel Marinho.
28 — 1887: "ECHO DA M A R I N H A " — (2* fase), redigido por
Manoel Marinho.
29 — 1887: " S I N H Á " — redigido por João Regis Pereira da Costa.
Teve vida efêmera.
30 — 1888: "A A U R O R A " — surgiu em 18 de maio, redigido por
Rocha Pombo.
31 — 1888: " T R E Z E DE M A I O " — surgiu a 15 de junho, redigido
por Manoel Felippe de Araújo.
32 — 1888: "A L U Z " — surgiu em dezembro, redigido por Ho-
nório Décio da Costa Lobo.
33 — 1889: " P Á T R I A L I V R E " — surgiu em 18 de dezembro, re-
digido por Albino Silva.
34 — 1889: "A E S C O L A " — ignora-se quem o redigiu, bem como
em que mês surgiu.
35 — 1889: "A E S C O V A " — redigido por João Pombo. Ignora-se
em que mês surgiu.
36 — 1889: "A O R D E M " — surgiu em 13 de junho, redigido por
Manoel Felippe de Araújo.
37 — 1889: " A R A Z Ã O " — redigido por José Pereira Guimarães.
Ignora-se em que mês surgiu.
38 — 1889: "O T R O M B E T A " — redigido por Clarindo Oliveira.
Quanto ao mês em que apareceu, nada se sabe.
9
39 — 1889: "O B I L O N T R A " — surgiu em l de fevereiro, ó r g ã o
da Sociedade Carnavalesca "Os Bilontras".
40 — 1889: "O V I G I L A N T E " — redigido por Virgilio Vianna.
9
Iginora-se em que mês saiu o l número.
41 — 1889: "O P O R V I R " — jornal manuscrito. Foram diversos
colaboradores.
42 — 1889: "O C R A V O " — jornal manuscrito, redigido por di-
versos colaboradores.
43 — 1890 "O SÉCULO" — surgiu em 27 de março, redigido pelo
Dr. João Evangelista Espindola.
44 — 1890: " I D É A N O V A " — surgiu em maio. Ignora-se porém
quem foi seu redator.
45 — 1891: "A VOZ DA E S C O L A " — redigido pelo jornalista
9
Lindolfo Pombo. Ignora-se quando saiu o l número.
46 1891: " G A Z E T A DO C O M M E R C I O " — surgiu a 4 de ja-
neiro.. Redator ignorado.
47 — 1891: " L E I T U R A P O P U L A R " — surgiu em 20 de setembro,
redigido por Albino Silva.
48 — 1892: "O A B A N O " — surgiu em 17 de janeiro, redigido por
Militão Pereira e Euripedes Branco.
329
49 — 1892: "O P H A R O L " — Jornal Espírita, com diversos cola-
9
boradores. Ignora-se quando saiu o l número.
50 — 1892: "A S E N T I N E L A " — redatores diversos. Ignora-se
9
porém a saída do l número.
51 — 1892: "O T E M P O " — surgiu em 10 de julho, com diversos
Colaboradores.
9
52 — 1893: "O C O M M E R C I O " — surgiu a l de janeiro. Órgão
da Livraria de João Baptista Bório.
53 — 1893: "A C R Y S A L I D A " — surgiu em 15 de janeiro, re-
digido por José Matias Ferreira de Abreu.
54 — 1893: "A P R I M A V E R A " — redigido por Ricardo Costa
Júnior, ignorando-se os colaboradoes.
55 — 1894: "O SÉCULO" — surgiu como órgão federalista, du-
rante a ocupação de Paranaguá pelos revoltosos.
56 — 1894: "FÉ E S P Í R I T A " — surgiu em 15 de setembro, redi-
gido por João Moaes Pereira Gomes.
9
57 — 1896: "A VOZ DA V E R D A D E " — surgiu em l de outubro,
redigido também por João Moaes Pereira Gomes.
58 — 1897: "O B O U Q U E T " — redatores, Lúcio Silveira, Pedro
Scherer Filho e João Baptista Bório.
59 — 1897: "A V E R V E " — redatores Hipólito Pereira, Santa Rita
Júnior e Generoso Borges.
60 — 1897: " P A R A N A G U Á " — surgiu em 14 de julho. Proprie-
dade de C. Eugênio & Cia.
61 — 1897: "O C O N S T I T U C I O N A L " — surgiu a 21 de julho. Re-
datores diversos.
62 — 1897: "A V E R D A D E " , redigido por Hipólito Pereira. Reda-
tores diversos.
63 — 1897: "A N A Ç Ã O " — surgiu em 15 de setembro, redigido
pelo Dr. Costa Carvalho.
64 — 1897: "A F É R U L A " — surgiu em 18 de setembro, redigido
por Olegário Lisboa.
65 — 1900: "O A T H L E T A " — redatores, Olegário Lisboa e Anto-
nio Rodrigues, ó r g ã o da Associação Paranagüense (Assoc.
Com.).
66 — 1900: " T R I B U N A P A R A N A G Ü E N S E " — surgiu em 1.° de
julho, redigido pelo poeta e jornalista Maia Júnior.
67 — 1900: " C L U B R E P U B L I C A N O " — jornal redigido por A l -
berico Figueira, ó r g ã o do Club Republicano.
68 — 1900: " A L M A N A K DE P A R A N A G U Á " — (Topográfico, no-
ticioso, literário, histórico e estatístico). Redatores, Honório
Décio da Costa Lobo e Manoel do Rosário Corrêa.
69 — 1902: "O P A L H A Ç O " — redigido pelo jornalista e literato
Zenon Pereira Leite.
70 — 1902: "O D E M O C R A T A " — redigido pelo Dr. Sant'Ana e
vários colaboradores.
330
71 1903: "O E S T U D O " — Jornal manuscrito, redigido pelo
intelectual Zenon Pereira Leite.
72 1903: "CLUB O P E R Á R I O R E C R E A T I V O " — órgão do Club
Operário.
73 1903: "O L I B E R A L " — redigido por Cassiano Nascimento.
74 '1903: "A F L O R E S T A " — redigido por João Camargo.
75 1903: "O Í N D I O " — redigido por José Bellegard.
76 1903: " A P Á T R I A " — Jornal escolar. Ignora-se o redator.
77 1903: " L E I T U R A " — redigido por Atílio Bório.
78 1903: "O L I B E R A L " — redigido por Octaviano Branco.
79 1903: "O L U A R " — redigido por Cassiano Ozório.
80 1904: "A L U T A " — redatores, Arnaldo Dâmaso, Amého
Santa Rita, Antonio Sant'Ana Lobo ( T o n h á ) , Alberico Fi-
gueira.
81 1904: "O B I L O N T R A " — Jornal carnavalesco, redigido por
Alberico Figueira.
82 1904: " E S P A D A A Z U L " — Jornal carnavalesco de Clarindo
Oliveira.
83 1905: " O P A L C O " — Jornal do Grêmio "Arthur de Aze-
vedo", red'gido por Eurípedes Branco. Colaboradores, os
amadores do grêmio teatral.
84 1905 "O T H E A T R O " — Jornal redigido por Silvério Cunha.
85 1905 "O R O C I O " — Jornal dedicado a N. S. do Rocio.
86 1905 "O P Y R I L A M P O " — red'gido por Clarindo Oliveira.
87 1905 " C L U B R E P U B L I C A N O " — Revista, redigida por A l -
berico Figueira e vários colaboradores.
88 1906 "O E S P I Ã O " — Redatores diversos.
89 1907 "O M E R C A N T I L " — redigido por Hermógenes S. Reis.
90 1907 "O J A N O T A " — Jornal redigido por Lúcio Silveira.
91 1907 " P A R A N A G U Á " — ó r g ã o do Clube "Sepilho Cortan-
te". Redator — Pau da Gaita. Gerente — Rabo de Tatu.
(Crítico, satírico).
92 1908 "A E P O C H A " — ó r g ã o da municipalidade (político).
93 1908 "O M O V I M E N T O " — por diversos colaboradores.
94 1908 " P H A R M A C I A B R A Z I L E I R A " — Jornal de proprie-
dade do farmacêutico Adelio Correia; lançado em julho.
95 1910: "CORREIO DA S E M A N A " - diversos colaboradores.
96 1910: " F O L H A DE N O T Í C I A S " - redatores diversos,
97 1911: " B O L E T I M M U N I C I P A L " para os atos da Câmara.
98 1911: "CORREIO DA M A R I N H A " - redigido por Domin-
gos Manso.
99 1911: "O C O N S T I T U C I O N A L " Redator chefe: Thimo-
ter; de Paula.
100 1911: "O P H A R O L " — Redatores: Aluizio de Abreu e Celso
de Souza.
101 1912: " D I Á R I O DO C O M M E R C I O " — surgiu em 6 de ja-
neiro. Redigido pelo Dr. Francisco Accioly Rodrigues da
331
Costa. Colaboradores diversos. Tem, portanto, 64 anos de
vida.
102 — 1914: " O V I G I L A N T E " — Jornal católico. Vários colabo-
radores.
103 —• 1914: " P A Z E L U Z " — Jornal espírita. Propriedade do
Centro.
104 — 1914: "O R I S O " — Humorístico. Vários colaboradores.
105 — 1915: "O B I B E L O T " — Humorístico. Redatores, Newton
Souza e Braulio Viana.
106 — 1915: "O M Y O S O T I S " — Humorístico. Redator A. M.
Correia.
107 — 1915 "O M A R T E L O " — Humorístico. Redator A. Souza.
108 — 1915 "O S P O R T " — Esportivo. Diretor Augusto Bentim.
109 — 1916 "O T O S T Ã O " — Humorístico. Colaboradores di-
versos.
110 — 1916: "A É P O C A " — Redatores: Aluizio de Abreu e Se-
vero Rocha.
111 — S/data — " J O R N A L E V A N G É L I C O " — Redator: Samuel
Pires de Mello. (Apareceu nesse ano de 1916).
112 — 1916: "A N O T Í C I A " — Redatores: Aurino Dutra e João
Dias Rocha.
113 — 1917 "O J O R N A L " — Redigido por Roberto Barroso.
114 — 1917 " E R O S " — Colaboradores diversos.
115 — 1917 "O N A C I O N A L " — Jornal cívico, da 1* Guerra
Mundial. Redator: Roberto Barroso.
116 — 1917: "O M E Z " — Revista — Redator: L. Gonzaga. Pro-
prietário: Álvaro David.
117 — 1918: "O T A N G O " — Colaboradores diversos. (Humo-
rístico) .
118 — 1918: " G U I A DA M A R I N H A " — Revista — Prop.: Álvaro
David.
119 — 1919: "O I T I B E R Ê " — Revista — ( 1 * fase). Prop.: Club
Litterario. Redator: Dr. Accioly, João Regis P. Costa, Maia
Junior e Zenon Leite.
120 — 1919 " Q U I N Z E N A I L U S T R A D A " — Prop.: Álvaro David.
121 — 1919 "O P R O P A G A N D I S T A " — Redator: Aluizio de Abreu.
122 — 1919 "A C R U Z A D A " — Revista — Redatores: Roberto
Barroso e João Vianna.
123 — 1920: "O R I S O " — Redator: Aluizio de Abreu (Humorís-
tico) .
124 — 1920: " S O C I O C R A T A " — ó r g ã o dedicado ao proletariado
(6* fase). Redator: Magnus Sondhal.
125 — 1921 "A VOZ DO P O V O " — Colaboradores diversos.
126 — 1924 "A S E M A N A " — Redator: Álvaro David.
127 — 1924 ' A L M A N A Q U E DO L I T O R A L " — Edição do "Itiberê".
Redatores: Zenon Leite e Aluizio de Abreu.
332
128 — 1925: "O ECHO" — Jornal crítico e humorístico. Redator:
Diamantino Marques Junior.
129 — 1925: "O S A N T U Á R I O " — surgiu a 15 de novembro. Re-
vista comemorativa da Festa do Rossio.
130 — 1925: "A A U R O R A " — ó r g ã o da Escola Intermediária.
131 — 1927: " P Á G I N A " — semanário — Redator: Diamantino
Marques Jr.
132 — 1927: "O BEIJO" — Redator: N. Araújo.
133 — 1927: "O P H A R O L " — Jornal de otimistas para os pessi-
mistas. Redator: Leo Lins.
134 — 1928: "A L U T A " — Órsrão do Centro Literário "Fernando
Amaro". Redatores: José Pereira Neves e Ascanio Borges.
135 — 1928: " S A N T U A R I U M " — Revista da Paróquia, dedicada
a N. S. do Rossio. Diretor: Padre José Adamo.
136 — 1930: "O E S P O R T E " — Suplemento semanário de "O I T I -
BERÊ". Redatores: Zenon Leite e Francisco Canziani.
137 — 1930: "O B A N H I S T A " — ó r g ã o dos Banhistas da Ilha do
Mel. Redator: Zé da Praia.
138 — 1932: " R E V I S T A DO I N S T I T U T O H I S T Ó R I C O " — Redato-
res: Vicente Nascimento Junior. Bernardino Pereira Neto
?
e João Salvador dos Santos. ( 1 fase).
139 — 1933: " B O L E T I M " — órsrão da União dos Proprietários
de Imóveis.
140 — 1933: "A VOZ DA E S C O L A " — ó r g ã o dos alunos do Anexo
E. Normal.
141 — 1934: "O I T I B E R Ê " — Colaboradores diversos.
142 _ 1934: "O POCTO NA "HISTÓRIA NA T R A D I Ç Ã O E NA
P O E S I A " . Redator incógnito. (Revista).
143 — 1935: " P O L Y A N T H É A " — Organizada uelo escrivão Nasci-
9
mento Jr. — l Centenário da Santa Casa C1835 — 1935).
144 — 1936: " B O L E T I M " — Associação Comercial de Paranaguá.
145 — 1936: "A T R I B U N A " — Semanário. Redator: Bento de Oli-
veira Rocha.
146 — 1937: " M A R I N H A " — Revista — Aluizio Ferreira de Abreu
e Anacyr Ferreira de Abreu.
147 — 1938: "A S C E N A " — Revista do Circo Teatro Romano (mar-
ç o ) . Redator: F. Colman — Diretor Luiz Agnollmo.
148 — 1939: " R O C I O " — Revista, n.especial — Edição de "Mari-
nha". Dedicada a N. S. do Rocio.
149 _ 1939; " B O L E T I M " — do Rotary Club. Colaboradores di-
versos.
150 — 1939: "O P O R T U Á R I O " — Redator: Benjamin Pinto. Di-
retor Moreira e Silva.
151 — 1940: "O C A R N A V A L " — Colaboradores diversos. (Carna-
valesco) .
333
152 — 1941: " N E P T U N O " — Jornal da Escola "Manoel Ribas", na
Ilha das Cobras. Redatores: Jurandir Alves e Paulo Fa-
gundes.
153 — 1947: " T R I B U N A DO L I T O R A L " — Redator Antero Regis
P. da Costa.
154 — 1947: " B O L E T I M A N U A L " — Órgão da Igreja Batista. Re-
dator; Pastor J. Martins Rodrigues.
155 — 1947: "A VOZ DO E S T U D A N T E " — redigido por Príarno
Cardoso da Veiga Júnior, ó r g ã o dos alunos do Colégio Es-
tadual "José Bonifácio" de Paranaguá. (Outubro).
156 — 1948: " A L B U M DO T R I C E N T E N Á R I O " — Colaboadores
diversos.
157 — 1953: " J U R Y " — Revista. Diretor: Dimitry Ochrmovicz.
158 - 1953: " R E V I S T A DO I N S T I T U T O H I S T Ó R I C O " — Reda-
tores: Dr. Anibal Ribeiro Filho, Nascimento Junior e Manoel
Viana (2^ fase).
159 — 1953: "JORNAL DO A N E X O " — Diretor: Lizandro Floriano
Filho.
160 — 1954: " M O N I T O R C O M E R C I A L " — ó r g ã o da Associação
Comercial. Redatores: Nascimento Junior e Ernani Car-
doso.
161 — 1955: " A Ç Ã O " — Redatores: Antonio José Sant'Ana Lobo
Neto e Augusto Foes.
162 — 1955: "O I T I B E R Ê " — (2^ fase) — Revista. Redator chefe,
Anthero Regis Pereira da Costa; Diretor: João Regis Pe-
reira da Costa (o n e t o ) .
163 — 1957: "O SÉCULO" — Revista — Órgão da Associação Atlé-
tica Banco do Brasil. Diretor: José Maranhão.
164 — 1957: "29 de Julho" — Diretor: Bruno Schokal.
165 — 1958: " R E V I S T A " — ó r g ã o do Colégio Estadual "José Bo-
nifácio" e Escola Normal "Dr. Caetano Munhoz da Rocha."
166 — 1959: " T R I B U N A DE P A R A N A G U Á " — Diretor: Hélio
Moura.
167 — 1959: " M A R R E T A " — ó r g ã o do Grêmio Estudantil Para-
naguara.
168 — 1959: "A G A R R A " — Órgão do Lions Clube (1? e 2? fase).
Diretor: Dr. Roberto Fontes.
169 — 1960: " G U I A T U R Í S T I C O I N F O R M A T I V O " — Diretor:
Aziz Mansur.
170 — 1960: "O I M P A R C I A L " — surgiu em 10 de janeiro. Seu
primeiro Diretor: Fernando Korkievicz. Com 16 anos de
vida, ainda continua em sua trajetória. Seu atual Diretor:
Azor Jordão Cavalheiro.
171 — 1960: "O N O T I C I Á R I O " — Diretor: Walmor Targa.
172 — 1963: " L I T O R A L A C A D Ê M I C O " — Diretores: João M. Ba-
tista e M. Nascimento.
334
173 — 1963: " E V O L U Ç Ã O " — Diretores: Aziz Mansur e M. Nas-
cimento.
174 — 1963: " R E V I S T A " — ó r g ã o do Centro de Letras "Leôncio
Correia".
175 — 1964: "JORNAL DE P A R A N A G U Á " — Colaboradores di-
versos.
176 — 1964: "A VOZ DO I T I B E R Ê " — Diretores: Acrísio Guima-
rães Filho e Emir Roth.
177 — 1964: " L I T O R A L E S P O R T I V O " — Diretores: Hélio Fru-
mento e João Lima.
178 — 1965: " P O R T O S DO P A R A N Á " — Revista — Órgão da Ad-
ministração dos Portes de Paranaguá e Antonina.
179 — 1965: " F O L H A S DO L I T O R A L " — Jornal — Diretor res-
ponsável: J. M. Batista.
180 — 1966: "O F A C H O " — Boletim — ó r g ã o do Clube Olímpico.
181 — 1967: "O SÃO JOSÉ" — Colaboradores: alunas da Col. São
José.
182 — 1967: "O L Í D E R " — Colab. alunos da Faculdades de Filo-
sofia. Funda. Neusa S. Oliveira, Adélia H. Barros, Roberto
H. Barros, Orlando Langowinski, Vera Beatriz R. Lango-
winski, Vitorio Lopes, Mirna Torrens, Gerson Muller, Ha-
milton R. Silva e Wanderlei Farias.
183 — 1968: " J O R N A L DO L I T O R A L " — Diretor: Rubens Foes.
184 — 1969: " C L A R I M P O R T U Á R I O " — Órgão dos portuários.
Colab. diversos.
185 — 1967: " B O L E T I M M U N I C I P A L " — Atos e Resoluções do
Executivo e Legislativo — Departamento de Turismo e Di-
vulgação.
186 — 1970: " A V A N T E M O C I D A D E " — ó r g ã o oficial Mocid. Cruz
Evangelização.
187 — 1972: "O R E V E L A D O R " — Redator: Wanderley S. Pinhei-
ro. Colaboradores: alunos do Curso Científico do Col. Est.
"José Bonifácio".
188 — 1973: " C I D A D E " — Surgiu em maio, tendo como Diretor
Financeiro: Ilio Grego Venet e Diretor de Redação: Eros
Gutierrez.
189 — 1973: " T U R I S M O — L I T O R A L DO P A R A N Á " — Editora
"EDISUL".
190 — 1973: "CADERNOS DE A R T E S E T R A D I Ç Õ E S P O P U L A -
R E S " — ó r g ã o do Museu de Arqueologia e Artes Populares.
191 — 1973: " J O R N A L DO P O R T O " — Redator: Clarício Correia,
Assessor de Relações Públicas da A P P A .
192 — 1974: "A P A T R U L H A " — Órgão dos Escoteiros de Para-
naguá. Redator: Ivan Lapoli Filho.

335
SOCIEDADES


GRÊMIO RECREATIVO "IRIS"

Corria o ano de 1910. Tempos de calma, sonhos, devaneios.


Paranaguá, já então mais modificada, mantinha ainda algo
de seu passado: Divertimentos familiares, como, pique-niques, sa-
raus e bailes. Estes dois últimos, então, continuavam a ter a
primazia.
O "cinema" ainda não havia avassalado os diversos campos
de diversões; razão por que os "saraus" e "bailes" continuavam
a ser o enlevo e atração da mocidade daquela época.
As tímidas garotas e cs circunspectos rapazes só aspiravam
por uma bela noitada, ao som de excelente orquestra. E não tinham
mesmo noutra coisa em que pensar. Os bailes eram, portanto, o
único meio possível e viável à expansão dos pares enamorados.
Começavam os dois com um pequeno "flirt" e as consecutivas
partidas dançantes se incumbiam do resto •— noivados.. . b o d a s . . .
— a eterna e admirável canção para ninar ! . . .
As Sociedades e Grêmios, portanto, eram indispensáveis nessa
época ainda de c a l m a . . .
Ora, com o desaparecimento da "Sociedade Dançante Briza
da Marinha", desde 1905, encontrava-se nossa Paranaguá, já há 5
anos, sem uma agremiação feminina congênere; o que era de estra-
nhar e mesmo de lamentar.
Estávamos nos primeiros dias de julho de 1910.
A residência do saudoso Sr. Carlos Eugênio de Souza, na antiga
rua Conselheiro Barradas (hoje Mal. Alberto de Abreu) era um
dos pontos de reunião mais freqüentados pelo belo sexo. Daí, a idéia
que tiveram essas cabecinhas jovens, de criar um novo Grêmio.
Seria o ideal. Assim, numa noite (estávamos a 9 de j u l h o ) , du-
rante um dos serões costumeiros, depois de muito discutir sobre o
assunto, resolveram elas tornar em realidade esse "sonho". Sur-
giria enfim um novo Grêmio. Marcaram pois para o dia seguinte,
uma reunião na mesma casa, a fim de tratar dos primeiros passos
da futura agremiação, cujo nome já haviam escolhido.
No dia 10, à tardinha, reunidas em número de 27, fizeram sua
primeira reunião, assentando as bases da nova Sociedade.
O nome escolhido e aceito por unanimidade seria: G R Ê M I O
R E C R E A T I V O " I R I S " . Seu baile inaugural realizar-se-ia em a
noite de 17 de julho. Faltava apenas sua Diretoria.
339
A " A T A " da instalação do Grêmio foi a seguinte:

"Aos 10 dias do mês de julho de 1910, na residência do Sr.


Carlos Eugênio de Souza, reunidas as senhorinhas abaixo assi-
nadas, fundou-se o G R Ê M I O R E C R E A T I V O " I R I S " e elegeu-se
a sua Diretoria que ficou assim constituída: Presidente —
A N N A P I N H E I R O ; Vice-Presidente — M A R I A JOAQUINA
M O R E I R A ( Q U I N C A ) ; 1* Secretária — N A T A L I A SOUZA;
2^ Secretária — J Ú L I A S A N T O S ; 1* Tesoureira: L E O N I N A L.
A R A Ú J O ; 2^ Tesoureira — S A R A C A R N E I R O ; Oradora —
M A R I A E M Í L I A A R Z U A ; Procuradora — A L I C E FRECCEIRO.
A Sociedade propõe-se a dar partidas mensais dançantes e
promover concertos musicais, sempre que for possível. Ficou
adotado como distintivo social as cores branca e lilaz. As sócias
obrigam-se ao pagamento de mensalidade de um mil réis
(Rs 1$000) e a jóia de cinco mil réis (Rs 5$000), com exceção
das que assinam a presente A T A , que ficam consideradas só-
cias fundadoras. A Diretoria eleita deliberou que o baile inau-
gural realizar-se-á no dia 17 do corrente, para o que serão
solicitados os salões do Clube Republicano e deliberou também
que as "soirées" serão cada mês em um Clube, uma vez que as
Diretorias dos mesmos cedam os seus salões. Para o baile
inaugural, ficou combinado cada sócia concorrer com o do-
nativo que estiver ao seu alcance. Nada mais havendo a tra-
tar-se, lavrou-se a presente Ata, que vai assinada pela Dire-
toria e pelas sócias fundadoras. Eu, Natália Souza, a escrevi e
assino". Paranaguá, 10 de julho de 1910. (a) NATÁLIA
SOUZA ( 1 ^ Secretária).

Nota — A Procuradora não assinou a A t a de instalação por


se achar ausente. Seguem-se as assinaturas das sócias funda-
doras, em número de 19 e que se achavam presentes na reu-
nião de fundação. São elas: Consuelo de Souza, Maria José
Pinheiro, Maria Rosa da Cruz, Sara Villela dos Santos, Balbina
Azevedo, Clotilde Gonçalves, Nazira Baleche, Leonidia Belle-
gard, Mariane Baleche, Nina Figueira, Eugenia Ribeiro, Ada-
zilla Raposo, Conceição Moreira, Maria C. Regis, Oarmen
Vianna, Adelaide Alves, Laura Regis, Carmen Souza, Welfrida
Lacerda.

Ao todo, 27 sócias fundadoras, incluindo os membros da Di-


retoria.
Terminada a sessão, esses corações jovens só se preocuparam
com o baile inaugural, antegozando já as lindas "toiletes", a pas-
seata, o Clube, os admiradores e prediletos. Tinham a alma repleta
de ilusões, nessa quadra da vida em que tudo é encantamento;
nessa quadra em que o amor — soberano do mundo — domina por
completo a mocidade.
340
Chegou enfim o dia 17. Às 7 horas da noite, estavam todas
no sobrado do Sr. Policarpo Pinheiro, tio da presidente. Oito horas
— saíram elas em passeata com o tradicional estandarte, acom-
panhadas pelos rapazes e a Banda de Música. Nove horas —
tomada de posse da primeira Diretoria, com sessão magna. Oração
pela oradora — Maria Emilia Arzua. Encerrada a sessão, a Or-
questra executou o " H i n o " do Grêmio (composição do mestro
João Gomes R a p o z o ) . Seguiu-se por fim o ótimo "concerto" ela-
borado pela inesquecível mestra — D. Ludovica Caviglia Bório —
tomando parte nele as suas alunas, na maioria, sócias da agre-
miação.
Terminado o concerto, deu-se início ao baile com a linda valsa
" I R I S " , composição do maestro José Itiberê de Lima. Seguiram-se
as demais contradanças. Assim foi a primeira noitada do simpá-
tico Grêmio "íris" — muitas flores — muita música, muito riso,
— muita alegria ! . . .
Muitas outras festas vieram, para gáudio de suas associadas.
Os anos foram passando e o Grêmio sempre firme nas mãos
de competentes diretoras. Porém, tudo acaba, porque tudo cansa.
9
O baile à fantasia, em 1959, ainda foi um sucesso; mas o 4 9
aniversário foi comemorado sem o brilho dos anos anteriores. Re-
sultado: depois de 49 anos de existência, suas últimas diretoras
não mais quiseram ou não mais puderam continuar com essa
responsabilidade...
Talvez, porque o "esporte" começasse a avassalar, com seus
atrativos, todos os campos de divertimentos da época. O certo é que
o querido Grêmio desapareceu do cenário social de nossa Para-
naguá . . .
Raciocinando-se com critério, observa-se que, um Clube social
ou recreativo, nos tempos atuais, com sede própria, é difícil man-
tê-lo apenas com as mensalidades dos sócios. É preciso que haja
outras rendas.
Assim foi o Grêmio "íris", sem sede e com um número limi-
tado de s ó c i o s . . .
Entretanto, valeu a pena sua existência de 49 anos em Pa-
ranaguá; pois muito prazer e alegria proporcionou à mocidade
d e então ! . . .

GRÊMIO CRISANTEMO
Surgiu em 1913 e sua primeira presidente foi a então Sta. Ma-
rienne Beleche. Era filiado ao Clube Republicano, mas teve vida
efêmera. Durou apenas dois anos. Em seu lugar surgiu o "Grêmio
Myosetis", em 1915.

341
GRÊMIO MYOSOTIS
Esse simpático Grêmio nasceu em 1915, também filiado ao
Clube Republicano. Muitos bailes famosos promoveram suas várias
diretorias. Também muitas festas artísticas foram levadas a efeito
durante mais de duas décadas.

GRÊMIO PRIMAVERA
Filiado ao Clube Operário Recreativo Beneficente, esse "Grê-
mio" surgiu em 1915. Seus bailes, sempre animados, rmrto diver-
tiram os seus associados, dando movimento à vida social do mo-
desto Clube da rua Direita.
Sua primeira presidente foi a Srta. Maria da Luz Chichorro.

Os "Grêmios Recreativos", após a "República", tornaram-se


necessários à Sociedade Brasileira; pois eram o único divertimento
de nossa juventude. E isso foi até a "revolução de 1930". Daí para
cá, o esporte tomou conta.

CLUB TEUTO BRASILEIRO RECREATIVO


O Club Teuto Brasileiro, fundado em 7 de setembro de 1936,
teve poucos anos de vida. Agremiação composta de brasileiros e
alemães, sempre procurou promover festividades acs seus asso-
ciados, como, bailes, convescotes e outras diversões próprias da
época.
Sua sede era na rua Direita (antigo prédio do Clube Operário).
Com a declaração de guerra, pelo Brasil, ao Eixo Roma-Berlim,
c clube foi obrigado a fechar e desapareceu para sempre.

CLUB DE NATAÇÃO E REGATAS


"COMANDANTE SANTA RITTA"

Este Club foi fundado a 7 de setembro de 1919, com sede pró-


9
pria no Largo Glicério n 5.
Ele ainda existe, porém, praticando o esporte — futebol de
salão — e com ele vem se mantendo.
342
Atualmente, um grupo de abnegados resolveu levantar o Club,
e a campanha tem sido tão grande, que já conseguiu quatro ótimas
embarcações.
0 "Club Santa Ritta" então, levantar-se-á do marasmo em que
ficou durante alguns anos.
Sua Diretoria, para essa reorganização, executiva e adminis-
trativa, está assim constituída:
Presidente: Adriano Gustavo Vidal; Secretário: Jair China;
Diretor do Esporte: Antonio Benedito Cunha.
Para conhecimento da geração atual, transcrevemos vários
trechos da A T A da primeira Sessão da Assembléia Geral realizada
às 20 horas do dia 8 de setembro do ano de 1919, para a instalação
do referido Club.

"Às vinte horas do dia oito de setembro de mil novecentos e de-


zenove, no salão nobre do Clube Republicano, gentilmente ce-
dido por sua Diretoria, achavam-se presentes os senhores: Dr.
Antenor Coelho, Cel. José Gonçalves Lobo, sr. João Henrique
Costard, Joaquim do Amaral e Mello, José Lucas Evangelista,
José Ferreira, Antonio Correia de Souza, José Tramujas, Ber-
nardino Souza, Genaro Regis, Caetano Lucas Evangelista, Ar-
thur Godoy, Severo Cavalcanti Rocha, Arthur Correia de Lima,
Anibal Ribeiro, Othilio Gomes da Cruz, Evandro de Oliveira,
Benedito Wenceslau Carneiro, Heitor Santos, Luiz Torres, Alta-
mirano Pereira, Olavo Bório, Docilo Silva, Marcelino Rivelis,
Souzipather Vianna, Antonio Romualdo Vidal, Agripino Pican-
ço, Manoel Nunes Barranco e José Lobo Junior. ( 2 9 ) .

Pelo Dr. Antenor Coelho (que na qualidade de um dos inicia-


dores do referido Club, assumiu interinamente a presidên-
cia) foi declarado o fim a que se destinava aquela reunião e,
para demonstrar o acolhimento que teve a sua idéia em formar
nesta cidade um Club de natação e regatas, apresentava, em
poucos dias de trabalho, uma relação de adeptos daqueles es-
portes, de cuja relação verificou-se uma cifra de Rs 1:185$000
subscrita pelos srs. (seguem-se 137 assinaturas).
9
Aberta a Sessão inaugural, procedeu-se a eleição da sua l Di-
retoria, verificando-se o seguinte resultado: Presidente Ho-
norário: Cap. Rogério Siqueira; Presidente: Dr. Antenor Coe-
9
lho; Vice-Presidente: Alípio Cornelio dos Santos; l Secretário:
9 9
Arthur Lima; 2 Secretário: Olavo Bório; l Tesoureiro: Acrisio
9
Guimarães; 2 Tesoureiro: Docilo Silva; Diretor de Regatas:
Cap. Frederco Soledade; Vice-Diretor: Souzipather Vianna;
Diretor de Natação: João Savas Joanidis.
A seguir, houve a posse.
343
O Presidente eleito expôs as razões pelas quais foi escolhido o
nome "Comandante Santa Ritta"; visto ser ele filho desta
terra, a quem deixou gratíssimas recordações. Posto em vota-
ção, foi o nome aprovado. Diversos pareceres foram apresen-
tados e aprovados:

Considerar sócios fundadores sem isenção do pagamento de


mensalidades, todos os senhores que subscreveram a lista de
adesão. Nomear uma comissão para elaborar os Estatutos,
sendo eleitos os consócios: Zenon Pereira Leite, Dr. Francisco
Accioly e Dr. João Henrique Costard. Escolhidas as cores do
distintivo da sociedade: vermelha e branca.
Nada mais havendo a tratar, foi encerrada a Sessão, cuja A T A
9
foi lavrada pelo 2 secretário Olavo Bório. Seguem-se as assi-
9
naturas: ( a ) Olavo Bório — 2 Secretário, ( a ) Antenor Coelho
— Presidente, ( a ) Souzipather Vianna — Vice Diretor de Re-
gatas, ( a ) Arthur Lima — 1° Secretário".

Assim foi a fundação do Club de Natação e Negatas "Com.


Santa Ritta". Seus Estatutos ((possuímos um exemplar) foram
muito bem elaborados.
Hoje, a reorganização está sendo feita com carinho e sua
atuante Diretoria cuida de conseguir da CONFEDERAÇÃO B R A -
S I L E I R A DE DESPORTO, a vinda para P A R A N A G U Á , da "Fede-
ração Paranaense de Remo".
Já fazem parte dessa "Federação" o Club de Natação e Re-
gatas, o Iate Clube, o Club Litterario, o Clube Olímpico e o Seletão.
Parabéns, tradicional Club de nossa P A R A N A G U Á !
Esperamos assistir, muito em breve, as formidáveis "regatas'
em no nosso querido rio I T I B E R Ê ! . . .

INSTITUTO HISTÓRICO E GEOGRÁFICO


DE PARANAGUÁ
MAGISTRA VITAE HISTORIA EST
A H I S T O R I O É A M E S T R A DA V I D A

Imorredoura frase criada pelo talento de CÍCERO, serviu de


"tema" à palestra de três idealistas que, animados em seus propó-
sitos, esperavam vencer na empreitada que se propunham realizar.
Chefiava o "trio" a figura ímpar de V I C E N T E N A S C I M E N T O
JUNIOR, historiador de mérito incontestável, a quem nossa P A R A -
N A G U Á muito deve e jamais deixará de lhe tributar o preito de
gratidão a que sempre fez jús.
344
Coadjuvado por HUGO P E R E I R A CORRÊA e M A N O E L V I A N A ,
resolveu Nascimento Junior criar uma Sociedade Cultural, tendo
por base os estudos históricos e geográficos em ligação com o pas-
sado de nossa terra.
E o "trio" assim constituído, contando com o apoio de mais
de uma dezena de companheiros amigos, pensou e agiu. Agindo,
criou um "Sodalício" que recebeu o nome de " I N S T I T U T O H I S -
T Ó R I C O E G E O G R Á F I C O DE P A R A N A G U Á " . Isso aos 26 dias de
setembro de 1931.
Quarenta e cinco (45) anos já são passados, cheios de lutas e
de percalços, mas vencidos com galhardia pelo muito que há feito.
Em sua "primeira fase", que foi curta, não deixou de ter seu
brilho, apesar da divergência de idéias políticas reinante então,
não só em nossa terra, como em todo o País, obrigando o I N S T I -
T U T O a suspender, por algum tempo, as "sessões" que tão bri-
lhantemente vinham sendo realizadas.
Além do "trio" Nascimento Junior, Hugo Pereira Corrêa e Ma-
noel Viana, foram fundadores os confrades: Z E N O N P E R E I R A
L E I T E , B E R N A R D I N O P E R E I R A N E T O , A R Í SANTOS, L U I Z
T O R R E S , JOÃO S A L V A D O R DOS SANTOS, G E N A R O REGIS,
SEVERO C A N Z I A N I e D A R I O N O G U E I R A DOS SANTOS.
Foram recepcionados logo depois, c Dr. Vitor Lobo, sr. Belmiro
Saldanha da Rocha, Cel. José Gonçalves Lobo, João Henrique
Gostard, Carlos Neuffert e Eurípedes Branco.
Em 1932, entraram mais os confrades Alfredo Budant, Hilária
Fernandes, Adelaide Cardoso Pinto, Amaria de Oliveira, Eduardo de
Queiroz Bastos e o Dr. Antonio de Siqueira Gusso.
Dessa pleiade brilhante, 15 deles já deixaram, há muito, o rol
dos vivos.
De sua "Revista", apenas dois números chegaram a sair e
com trabalhos de real valor.
O 1° número — de janeiro a março de 1932.
O 2° número — de abril a junho do mesmo ano; com farto
documentário.
Depois vieram — a "Revolução de 32"; a célebre "Ditadura";
os diversos "levantes" e "intentonas"; trazendo a família brasileira
em constante desasscssego e apreensão.
Esses fatores de convulsão social muito influíram na vida do
nosso Sodalício, fazendo-o cair num marasmo e quase no frio es-
quecimento.
Mas a chama no coração de Nascimento Junior não deixou
morrer o seu " I N S T I T U T O " ; aquilo que ele idealizara e com tanto
carinho havia tornado realidade; o maior sonho de sua vida, como
sempre dizia. Pois, como todos nós sabemos, N A S C I M E N T O JU-
N I O R era o próprio I N S T I T U T O .
345
Jamais houve paranaguara que amasse tanto sua terra, através
da História, como esse insigne historiador. Foi um marco luminoso
na vida de nossa P A R A N A G U Á , durante sua trajetória neste velho
planeta.

O ano de 1948, entrou pleno de alegria e trabalho em nosso


torrão natal, para comemorar seu tricentenário de fundação polí-
tica e social. A terra "carijó" se engalana para celebrar seu progra-
ma de festejos por tão grande efeméride. E o I N S T I T U T O H I S T Ó -
R I C O , o nosso querido Sodalício não podia deixar de dizer "presente"
a esse evento.
Ultimam-se os preparativos para o tão esperado dia 29 de julho.
Instala-se com brilho o 1° Congresso Estadual de História e
Geografia, trazendo de Curitiba uma luzida pleiade de intelectuais
paranaenses, bem como de outros Estados. O I N S T I T U T O H I S T Ó -
R I C O E G E O G R Á F I C O DE P A R A N A G U Á , patrocinando esse no-
tável acontecimento, inicia os trabalhos com o confrade Genaro
Regis na Presidência e Hugo Pereira Corrêa como Secretário Geral.
São magníficas as sessões realizadas no salão nobre da Câ-
mara Municipal. Os congressistas, em seus múltiplos trabalhos em
plenário, demonstram grande capacidade nos estudos de História
e Geografia.
Encerra-se o Congresso e o I N S T I T U T O marca uma das pá-
ginas mais brilhantes de sua vida nos então 17 anos de existência.
Passam-se mais 4 anos de completo esquecimento. Apenas o
brasido envolto em cinzas dizia que o fogo não se extinguira, porque
N A S C I M E N T O J U N I O R continuava alerta. Ele, já o dissemos, era
o próprio I N S T I T U T O . Estava de pé, embora idoso, mas ainda
firme.
Assim é que, em 1952, P A R A N A G U Á assiste, comovida, o velho
sábio a percorrer as ruas da cidade, em busca de adesões para o
reerguimento de sua agremiação. A brasa, escondida entre as
cinzas, foi reavivada pelo hálito do extraordinário mestre, e o
I N S T I T U T O de nossa terra é levantado pelas suas trêmulas mãos,
para não mais cair. V I C E N T E N A S C I M E N T O J U N I O R vencera ! . . .
Realiza-se então, aos 23 de setembro de 1952, a primeira reunião
da 2^ fase, no salão nobre do Club Litterário, com a presença dos
antigos membros: Vicente Nascimento Junior, Manoel Viana, Joa-
quim Tramujas, Genaro Regis, Anibal Ribeiro Filho, Vidal Va-
nhoni, Didio Augusto de Camargo Vianna, Antonio Morais Pe-
reira da Costa, Sully da Rosa Vilarinho, Carolina Ressetti, Helena
Viana Sundin e Laura Bittencourt.
Procede-se, por aclamação, a eleição da nova Diretoria, cujo
mandato será de 3 anos.
Foram aclamados, por unanimidade:
346
Presidente: Dr. Joaquim Tramujas; Vice-Presidente: Genaro
9
Regis; 1? Secretário: Vicente Nascimento Junior; 2 Secretário:
Sully da Rosa Vilarinho; Tesoureiro: Manoel Viana; Bibliotecário:
Dr. Anibal Ribeiro Filho; Relator do Tombo: Dr. Anibal Ribeiro
Filho.
A Diretoria eleita tomou posse no dia 26 do mesmo mês.
Setembro de 1956 — JUBILEU DE P R A T A do nosso INS-
TITUTO !
Realizou-se um " S E M I N Á R I O DE ESTUDOS", nos dias 24, 25
e 26, com ótimas palestras e conferências; recepções de novos sócios
e um bem elaborado programa de músicas, a cargo das academias
locais, sob a competente direção das professoras Maria José dos
Santos Alves, Rachel de Souza Pereira da Costa, Malvina Barleta
Cordeiro e Nilza de Sá Anastácio.
Fizeram-se presentes, durante o conclave, as delegações da
L A P A e de MORRETES,
Ficou instituído, nessa ocasião, o "lema" do nosso I N S T I T U T O :
"CIÊNCIA, A R T E E C I V I S M O " .

HUMANITÁRIA PARANAENSE
O atual prédio próprio do I.H.G.P. foi, primitivamente, uma
"casa escolar"...
Nos fins do século passado, existia uma sociedade de auxílio
às famílias e se intitulava " A S S O C I A Ç Ã O H U M A N I T Á R I A PA-
R A N A E N S E " (a exemplo dos atuais Institutos de Previdência).
Extinta, em 1895, essa Associação, em sua última sessão deli-
berativa, de 17 de agosto, resolveu doar os "fundos" da Sociedade
para a construção de uma "Escola" em P A R A N A G U Á , sob as se-
guintes condições:
a) — Construir o prédio.
b) — Exame do prédio pelo Secretário de Obras Públicas e
informação de que o Governo do Estado o aceitaria para "Escola".
Era Prefeito da Cidade — Cel. João Guilherme Guimarães —.
Não querendo o chefe do Executivo perder essa doação, abre, ime-
diatamente, concorrência pública para a construção do prédio, e
duas propostas se apresentaram; ambas assinadas pelo cidadão
João Batitsa Freceiro (construtor). A l * — Aproveitando as pare-
des do edifício em ruínas denominado "igreja dos jesuítas", à rua
15 de Novembro; pela quantia de 12.000$000 (doze contos de réis).
A 2* — Demolindo a antiga igreja e construindo, no mesmo lugar,
um novo prédio pela importância de Rs 16.000$000.
O Prefeito leva o assunto em pauta para o Legislativo, opi-
nando pela 2* proposta, que é logo aceita.
A obra foi autorizada e o prédio, construído, ainda com abati-
mento, pela quantia de Rs 15.000$000 !
347
Assim, aos 15 de junho de 1896, inaugura-se a "Escola" com a
denominação de " H U M A N I T Á R I A P A R A N A E N S E " !
A Escola esteve, por algum tempo, sob a direção da professora
D. Olivia Pereira Alves.
No dia 14 de agosto, a Câmara Municipal recebia, da ex-
Associação, por intermédio da Firma Siqueira & Cia. o auxílio de
Rs 10.100$000, devendo a Municipalidade entrar com o restante
(4.900$000) além das despesas de gradil, muro e passeio.
Foram correndo os anos. Fundada a Escola Normal "Dr. Cae-
tano Munhoz da Rocha"; fecharam, não se sabe porque, a "Huma-
nitária Paranaense", e os alunos se dispersaram pelos Grupos Es-
colares recém-criados; inclusive ao Grupo Anexo à Escola Normal.
A velha Casa Escolar ficou ao abandono. Nesse interim, o
Estado resolveu criar os "Centros de Saúde". Como era de se espe-
rar, P A R A N A G U Á foi aquinhoada. Mas precisava de um prédio
apropriado para tal fim. Lembraram-se então da velha "Huma-
nitária Paranaense". A Prefeitura Municipal recorre ao Legis-
lativo e este dôa ao E S T A D O o abandonado prédio escolar para nele
ser instalado o Centro de Saúde (depois de sofrer uma restauração
completa e adaptável às finalidades).
Mais alguns anos, e o prédio torna-se pequeno. Muda-se o
Centro de Saúde para outro local. Volta a velha casa escolar ao
descaso e, com o tempo, passa a ser o valhacouto de ébrios e no-
tívagos.
É quando então o nosso Presidente — Dr. Joaquim Tramujas
— oficia ao Diretor Geral dos Centros de Saúde, pedindo para ins-
talar no velho prédio em caráter provisório, o nosso I N S T I T U T O
HISTÓRICO.
Vindo o consentimento, ali nos instalamos comodamente, sem
mais preocupações.
Isso foi no ano de 1960. O nosso Presidente, como sempre oti-
mista, dizia: "Daqui não mais sairemos".
Nós, porém, pessimistas, estávamos sempre preocupados, pen-
sando que a qualquer momento poderíamos ser intimados a deixar
a casa...
Foi quando nos lembramos de fundar um pequeno "Museu
Histórico Geográfico", anexo ao I N S T I T U T O , para com isso firmar
melhor a nossa estabilidade na velha casa.
Como tínhamos, em nosso L I C E U , quatro armários cheios de
objetos antigos, falamos ao Dr. Joaquim Tramujas sobre nossa idéia;
alegando que, com um pequeno Museu, seria mais difícil a nossa
retirada do velho prédio.
O ilustre Presidente compreendendo o nosso ponto de vista,
apoiou-nos inteiramente; dando-nos, ainda, um livro por si ru-
bricado, para que registrássemos nele as ofertas recebidas que iría-
mos solicitar.
348
De fato, foram doadas ao I N S T I T U T O muitas peças de valor,
bem como livros e jornais importantes.
E foi assim que surgiu, como por encanto, o nosso modesto
"Museu histórico Regional", que inauguramos em seguida.
As doações continuam, espontâneas, enriquecendo cada vez
mais o patrimônio do I N S T I T U T O .
O seu atual "arquivo" é de um valor inestimável, com obras
importantes, só encontradas nos grandes Museus.
Hoje, com o grande acervo que o mesmo possui, e com a com-
petente direção do seu atual Diretor Perpétuo — Dr. Anibal Ri-
beiro Filho — o nosso "Museu Histórico Regional" pesa na balança
das "coisas de valor" que a nossa querida P A R A N A G U Á ainda
possui...

Depois do trabalho compensador, ficamos mais descansados,


apenas aguardando os acontecimentos.
O nosso Presidente Perpétuo — Dr. Joaquim Tramujas — não
perdia as esperanças, dizendo-nos sempre: "Não deixarei a Presi-
dência enquanto não conseguir ver este "prédio" doado ao nosso
INSTITUTO".
Esperávamos uma oportunidade e, ela chegou. Sobe ao Legis-
lativo Estadual o nosso caro confrade — Dr. Vidal Vanoni — que,
como bom paranaguara, apresenta na C Â M A R A DOS DEPUTADOS,
a pedido do Dr. J O A Q U I M T R A M U J A S , um ante-projeto, doando
ao I N S T I T U T O H I S T Ó R I C O E G E O G R Á F I C O DE P A R A N A G U Á o
velho e antigo prédio do Grupo Escolar, mais tarde Centro de
Saúde.
O ante-projeto transforma-se em Lei e em seguida recebe a
sansão do Chefe do Executivo Estadual. O Dr. Tramujas havia
alcançado o seu i d e a l ! . . .
A inauguração de nossa Casa de Estudos, inclusive o Museu
Histórico Regional (há muito instalado), realizou-se aos 30 de no-
vembro de 1963, às 12 horas; estando presente ao ato o Sr. Gover-
nador do Estado, acompanhado de inúmeras autoridades.
O Cel. N E I B R A G A , ao cortar a fita simbólica, deu por inau-
gurada a Sede própria do I.H.G.P.
Nessa oportunidade, foi-nos oferecido, pelo pesquisador — Dr.
Fernando Bittencourt — um dos "canhões" do "Navio-Pirata",
naufragado na desembocadura do rio Itiberê, há 258 anos, ou seja,
em 1718, e, que, atualmente está sendo pesquisado, a fim de se
retirar as "peças" de valor histórico que o mesmo navio contém.
Foi-nos ofertada também a pequena imagem de Nossa Senhora
(original) encontrada no referido navio.
349
Esses dois presentes históricos vieram enriquecer o ncsso Museu
Histórico, diariamente visitado por estudiosos de quase todos cs
recantos do Brasil.
O I.H.G.P. ganhara uma Sede, mas era preciso restaurá-la, c
isso o fez o Dr. Joaquim Tramujas, conseguindo uma "verba" para
a reconstrução da mesma.

É difícil manter-se uma Sociedade sem sua sede própria, mor-


mente nos tempos atuais e mais ainda, em se tratando de organiza-
ções de fundo cultural ou científico.
O I.H.G.P. foi uma exceção à regra, pois, vivendo 32 anos em
prédios emprestados, conseguiu sobreviver, e isso devemos a três
grandes vultos:
V I C E N T E N A S C I M E N T O JUNIOR — Idealizadcr e fundador
do I N S T I T U T O ; foi um grande historiador e admirável pesquisador.
Enfim, foi ele o próprio I N S T I T U T O .
DR. J O A Q U I M T R A M U J A S — Conseguiu a "doação" do pré-
dio e sua restauração, a fim de que esta Sociedade pudesse so-
breviver.
PROF. N E L S O N DE F R E I T A S B A R B O S A — Como Prefeito,
em suas duas gestões, procurou amparar, financeiramente, este
Sodalício, com a publicação de "obras" que muito honram nossa
terra.
Esses três valores foram a "alavanca mestra" desta "Casa de
Estudos" que hoje é uma realidade.

a
A 2. ERMIDA DE N. S. DAS MERCÊS
Como todos sabem, o Morro da " C O T I N G A " é o marco de civi-
lização do nosso Estado. Já dissemos em diversas palestras: " A L I
NASCEU O P A R A N Á ; D A L I S U R G I U P A R A N A G U Á " .
E nessa " C O T I N G A " , de tão gratas recordações, foi construída,
em 1677, uma igrejinha pelo então administrador das Minas de P A -
R A N A G U Á — Manoel de Lemos Conde •— . Essa ermida, sob a invo-
cação de N. S. das Mercês (imagem de pedra mandada vir de Por-
t u g a l ) , teve vida efêmera; pois, Antonio Morato, filho de Lemos
Conde, após a morte do pai, demoliu-a; isso em 1700.
Passaram-se os tempos (278 anos). Um dia (estávamos no
ano de 1955) era Governador do Estado o ilustre paranaguara —
Dr. Bento Munhoz da Rocha Neto — conversando com um não me-
nos ilustre filho da terra — Eugênio José de Souza — na ocasião
Secretário da Fazenda, falávamos sobre pontos turísticos na Cidade.
Lembramo-nos da desaparecida Capelinha das Mercês e pedimos
350
fosse ele (o Sr. Genico) portador de tão justa aspiração junto ao
Governador, seu particular amigo.
Pedíamos a reconstrução da antiga ermida. A resposta não se
fez esperar. O Sr. Gen'co então nos trouxe: "Diga ao professor
Viana que, se o Instituto Histórico e Geográfico conseguir retirar
a imagem de N. S. das Mercês da igreja de São Benedito, eu re-
construirei uma nova ermida no Morro da secular C O T I N G A " (jul-
gava ele, o Governador, ser difícil conseguir da Irmandade a reti-
rada dessa i m a g e m ) .
Entusiasmados, pedimos logo uma entrevista à Irmandade de
São Benedito, e, com mais o Dr. Tramujas, Presidente e Nascimento
Junior, Secretário, nos dirigimos ao Consistório da velha igreja e
entramos em entendimento com sua Diretoria, expondo as razões
do nosso pedido.
A Diretoria, que já sabia do que se tratava, através do velho
Nascimento, nos recebeu amavelmente, dizendo: "Os senhores do
I N S T I T U T O preparem a festa, que nós iremos levar a "imagem"
até l á " . . .
Marcada a transladação para o dia 17 de março, às 9 horas
9
(20 aniversário do cais do P o r t o ) , realizou-se a "procissão do re-
torno", encabeçada pela Irmandade de São Benedito toda incor-
porada e também com grande acompanhamento. O Arcebispo D.
Manoel da Silveira Delboux veio especialmente de Curitiba, espe-
rando a procissão no "rebocador". Na Cotinga, acompanhou a
procissão, subindo o morro com ela. No alto do morro, recebendo
a "chave' 'das mãos do superintendente do Porto — Dr. João
Guimarães da Costa — abriu a porta da ermida, deu a bênção e
entregou-a ao culto do p o v o . . .
Hoje, a igrejinha é também um marco de civilização cristã, na
terra que DOMINGOS PENEDA desbravou e G A B R I E L DE L A R A
civilizou — a nossa querida P A R A N A G U Á ! ! ! . . .
Mais uma glória para o Instituto Histórico e Geográfico de
Paranaguá.

"PARANAGUÁ COUNTRY CLUB"


Lá pelos idos de 1930, vindo do Rio de Janeiro, chegou a P A R A -
N A G U Á o Dr. C A N T U Á R I A G U I M A R Ã E S , Diretor do Serviço de
Emigração. Homem culto e amante do esporte, tratou logo de criar
uma Sociedade Esportiva, que recebeu o nome de " P A R A N A G U Á
C O U N T R Y CLUB".
Conseguiu, em seguida, através da Prefeitura Municipal e L e -
gislativo, o terreno, hoje de propriedade do Clube Olímpico.
L o g o depois, foi dado início à sede e a seguir, o "rink" para a
"patinação". Encontrou ele a receptividade do povo paranaguara.
351
Começou, mais tarde, a ensinar o "Hockey" aos rapazes (que
já haviam aprendido, com ele, a patinar muito b e m ) ; formando,
dentro de pouco tempo, o "Quadro de Hockey" do P A R A N A G U Á
C O U N T R Y CLUB.
O "Hockey", jogo um tanto bruto, mas de muita sensação, agra-
dou sobremaneira aos esportistas, tomando um grande impulso.
Tanto que, a 15 de julho de 1931, foi a S A N T O S , como convidado
especial, o Quadro de Hockey do Paranaguá Country Club, para
inaugurar a Quadra do Atlântico Club de Santos, jogando nessa
ocasião, com o quadro campeão de São Paulo. Perdeu, é verdade,
mas teve a honra de jogar com o melhor Quadro de Hockey do
Brasil.
Tudo ia muito bem, com o quadro de associados cada vez mais
crescente e a mocidade ainda mais entusiasmada.
Havia sido, também, iniciada a prática do "Tênis"; esporte,
naquela época, mais usado pelas pessoas de posses, dadas as des-
pesas que davam.
Um dia, porém o Dr. Cantuária Guimarães é chamado ao Rio
de Janeiro e, não mais voltou, por ter sido transferido.
O Club, então, sem o seu grande orientador, ficou acéfalo.
Diante dessa situação, os sócios mais antigos resolveram tomar as
rédeas do abandonado Club; transformando-o em uma nova So-
ciedade, que recebeu o nome de "CLUBE O L Í M P I C O DE P A R A -
NAGUÁ" !
E foi assim que, do desaparecido "Country Club", surgiu a
grande e simpática Sociedade; "CLUBE O L Í M P I C O DE P A R A -
NAGUÁ".
O "Quadro de Hockey" do "Paranaguá Country Club" estava
assim constituído: Eolo de Oliveira; Glasir Machado Lima; Jefferson
Costa; Henrique Gutierrez; Eurico Bastos da Rocha; Gustavo Bu-
chholz.

CLUBE OLÍMPICO DE PARANAGUÁ


O Clube Olímpico de P A R A N A G U Á surgiu aos 6 dias do mês
de janeiro de 1937, com 43 sócios fundadores, que tudo fizeram para
que a novel Sociedade se firmasse perante nossa Comuna.
Os anos se sucedendo; novos sócios aparecendo, e o Clube sem-
pre se impondo no seio da sociedade paranaguara.
Hoje, com quase 40 anos de existência bem vivida, vem de-
monstrando do quanto é capaz através do seu quadro social como
Sociedade recreativa e esportiva. Sua primeira Diretoria foi a se-
guinte:
Presidente: João Eugênio Comines; Vice-Presidente: Dr. Anto-
nio de Souza Artigas; 1"? Secretário: Dr. João Ferraz de Campos;
9 9
2 Secretário: Eloy Picanço Cardoso; l Tesoureiro: Olavo Meister;
352
9
2 Tesoureiro: Jorge Elísio P. Marcondes; Diretor Social: Vinícius
Ribas Brasil; Diretor de Esporte: Waldemiro P. Gomes.
E assim vem vivendo o "mais simpático", com seus 39 anos;
promovendo ótimas festividades aos associados.
O "Tênis", modalidade de "esporte granfino", que havia co-
meçado no tempo do antigo Country Club, continuou ainda por
vários anos e com os mesmos jogadores.
A presença desse apreciado esporte ficou registrado no Clube
pelos diversos torneios aqui realizados. Um deles, realizado em
9
Curitiba, passamos a transcrever do — "Eport Ulustrado" n 116,
de 27/6/1940.
" T Ê N I S NO P A R A N Á — O Clube Olympico de Paranaguá su-
perou o Graciosa Country Club.
O Club Olympico de Paranaguá, dando início a um torneio
tenístico com o Graciosa Country Club de Curitiba, estreou nas
quadras da Avenida Graciosa apresentando uma turma bem trei-
nada, que, embora não tivesse demonstrado suas verdadeiras possi-
bilidades, cumpriu ótima performance.
A vitória da representação "paranaguense" constituiu surpreza,
pois, embora se esperasse uma bôa demonstração, considerava-se di-
fícil um triunfo, que veio dar-lhe a primeira vantagem na conquista
do troféu instituído pelo Country".
Esse acontecimento ficou registrado nos "anais" do Clube Olím-
pico de Paranaguá.
As duas piscinas construídas, para gáudio de seus associados,
preencheram a lacuna existente.
É o simpático Olímpico o mais animado dos clubes; isso por-
que, nas suas alegres noitadas, são os "coroas" que dão vida e ani-
mação ! E, apesar dos janeiros, "eles" vão até o Sol raiar ! . . .
Salve, Madureza Olímpica ! ! ! . . .

ANTONIO VIEIRA DOS SANTOS


O MESTRE DE NOSSA HISTÓRIA

A N T O N I O V I E I R A DOS SANTOS, nasceu na cidade do Porto


( P o r t u g a l ) . Veio para o Brasil com 13 anos (tendo nascido a 12
de dezembro de 1784), chegando ao Rio de Janeiro em 1797).
Veio para P A R A N A G U Á em 1798, aqui casando em 1804, com
D. Maria Ferreira de Oliveira.
Sua vida, aqui no Brasil, foi muito agitada. Lutou muito e
sofreu bastante. Deixamos, porém, de relatar, por ser triste demais.
Apenas diremos o que de bom e útil fez ele.
Seus melhores trabalhos:
353
1?) — Memória Histórica da Cidade de P A R A N A G U Á .
2?) — Idem da cidade de Morretes.
3°) — Idem, idem da cidade de Antonina.
40) — Estudo genealógico das famílias — Freires e Franças.
9
5 ) — Astrologia Celestial — seus efeitos e causas.
69) — Estudo sobre o ensino do Salterio (instrumento
musical).
9
7 ) — Memória dos acontecimentos mais notáveis da vida
do autor.
8°) — Correspondência Epistolar.
Em julho de 1849 — Remeteu para a Câmara de Antonia, ao
Capitão Antonio José Leide Mendes, a "Memória Histórica de An-
tonina".
9
Em maio de 1851 — Remeteu à Câmara de Morretes o l volu-
me da "Memória Histórica de Morretes". A Câmara agradeceu, gra-
tificando-o com a quantia de Rs 200$000 (duzentos mil réis).
Em maio de 1850 — Remeteu à Câmara de P A R A N A G U Á , por
intermédio de Vicente Ferreira Martins, o 1° volume da "Memória
Histórica, Cronológica, Topográfica e Descritiva da Cidade de P A -
R A N A G U Á " . A Câmara, agradecendo a oferta, remeteu-lhe a im-
portância de Rs 400$000 (quatrocentos mil réis) como gratificação.

Como sabemos, Antonio Vieira dos Santos, escrevendo a nossa


História, desde os primórdios de 1550, estendeu-se até 13 de abril de
1850, quando relata as "representações" de P A R A N A G U Á , Curitiba,
Antonina e Morretes, levando conhecimento da Assembléia Legis-
lativa a necessidade de ser esta 5* Comarca elevada à categoria
de Província, separada inteiramente de São Paulo.
Já estava bastante doente quando enviou sua "obra" à Câ-
mara de nossa terra. Faleceu ele a 4 de julho de 1854, na cidade de
Morretes, com 70 anos.
Aconteceu, porém, que, não sendo logo impressa, talvez por
falta de verba a obra (manuscrito) desapareceu do Arquivo da Câ-
mara. . .
Só depois de 60 anos, isto é, em 1909 é que se conseguiu
9
achá-la. Foi então decretada a publicação, por Lei n 164 de 30 de
agosto de 1909, da Câmara e sancionada pelo Prefeito Municipal —
Dr. Caetano Munhoz da Rocha.
Entretanto, ainda por falta de verba, continuou a mesma no
olvido por mais alguns anos.
Finalmente, em 1921, por decreto n"? 16 de 9 de abril, o então
Prefeito — José Gonçalves Lobo — mandou editar, pela primeira
vez, o trabalho organizado sobre o passado de P A R A N A G U Á , escrito
por Antonio Vieira dos Santos.
354
Veio assim à luz, no ano de 1922, centenário de nossa Inde-
pendência, a " M E M Ó R I A H I S T Ó R I C A DA CIDADE DE P A R A -
NAGUÁ" !
Em 1948, no Governo do Prefeito — João Eugênio Cominese —
saiu a 2* edição, em comemoração ao 3° centenário da criação do
Município de P A R A N A G U Á por Carta Regia de 29 de julho de
1648, do rei de Portugal — D. JOÃO I V .

OBSERVAÇÃO:

A data de 29 de julho de 1648 assinala a elevação do Povoado


de P A R A N A G U Á à categoria de V I L A . Note-se que a Carta Regia diz:
"Que os habitantes da pcvoação se reunissem para eleger os seus
primeiros vereadores' !

P A R A N A G U Á há muito que existia ! ! ! . . .

O TIRO DE GUERRA "99"


Os "tiros de guerra" em nosso País, foram criados em 1910, a
fim de preparar "reservistas" para a Nação, sem que preciso fosse
afastar os jovens de sua terra natal para irem servir nas capitais
ou nas cidades onde houvesse unidades do Exército.
P A R A N A G U Á também teve o seu "Tiro de Guerra" e essa mo-
dalidade de "serviço militar" foi criada em 1911, recebendo o nome
de " T i r o de Guerra 99". Durante alguns anos preparou, o nosso
" T i r o 99", várias gerações de reserv'stas para o Exército Nacional.
Em 1917, o Ministro da Guerra resolveu fazer uma "concen-
tração" dos Tiros de Guerra e, para isso, convocou todas essas
unidades existentes no Brasil a se reunirem na cidade do Rio de
Janeiro.
P A R A N A G U Á , como sempre, atendeu ao "chamado militar" e
lá foi o nosso Tirro 99 fazer "bonito" na Capital do País. Foi co-
mandado pelo 1.° Tenente Manoel Henrique Gomes (paranaguara,
hoje falecido como General).
Embarcou, essa Companhia formada de 3 pelotões, no dia 2
de setembro pela manhã, por via-férrea, rumo a Curitiba; levando
também uma "banda de tambores" e um "serviço de saúde"; inclu-
sive uma "banda musical", a f i n a d a . . . embora pequena.

Essa "tropa" estava assim organizada:

Comandante — 1.° Tenente Manoel Henrique Gomes (parana-


guara, hoje, falecido como G e n e r a l ) .
Comandante do 1.° pelotão — 2.° Tenente José Tomaz do Nas-
cimento.
355
Comandante do 2.° pelotão — 2.° Tenente Romão Rocha.
Comandante do 3.° pelotão — 2.° Tenente Claudionor Nasci-
mento.
Comandante da banda de tambores — Sargento Manoel Vitor
da Costa ( N . G a b r i e l ) .
Corneteiro-mór — César Fagundes.
Serviço de Saúde — Farmacêutico Álvado Vianna.
Sargento Auxiliar — Braúüo Vianna.
Mestre da Banda — Sargento Anibal de Lima.
Porta Bandeira — Levy Vitorino Picanço.
(A Bandeira, de seda, bordada a mão, foi oferecida pelo Grê-
mio í r i s ) .
No dia seguinte ( 3 ) , junto com o "Tiro 19" de Curitiba, ruma-
ram ao Rio de Janeiro, lá chegando no dia 4, a meia no^te.
Excusado é dizer que a "Colônia Paranaense" estava na "Es-
tação" esperando os conterrâneos para lhes dar as boas-vindas.
No dia 6, os tiros de guerra fizeram exercícios no Campo de
S. Cristóvão; salientando-se o "Tiro 99" em 1.° lugar, pelo garbo e
a
disciplina. Ficando então agregado à 3 . Brigada de Infantaria.
No dia 7 de setembro, às 6 horas da manhã, estavam todos os
"Tiros" na Quinta da Boa Vista ,aguardando a grande parada.
Mas, o que ninguém esperava, foi a grande surpresa ! O "Tiro
de Guerra" de Paranaguá passou a puxar o desfile, como fila-testa ;
a
à frente da 3 . Brigada de Infantaria !. ..
O Capitão Alberto Leschaud, comandante do "Tiro 11" de
Santos e o Capitão Murici, comandante do "Tiro 19" de Curitiba,
protestaram, alegando não poder o "99" puxar o desfile, por ser el i
apenas uma simples c o m p a n h i a . . . Mas tiveram que se confor-
mar. . . Era ordem d o Q . G . . . .
Passada a "revista" a toda a tropa, pelo Presidente da Repú-
blica — Dr. Wenceslau Braz; Ministro da Guerra — General Ma-
riano Magalhães; Ministro da Marinha — Almirante Alexandrino
de Alencar; a Brigada, com o "99" à frente e o resto da tropa, desfi-
laram frente ao "palanque oficial" debaixo de estrondosas palmas
dos presentes e da massa p o p u l a r . . .
No dia 8, os atiradores receberam os cumprimentos do General
Setembrino de Carvalho e dos ilustres paranaguaras — General
Alberto de Abreu e o General Guedes Alcoforado.
No dia 10, embarcou o " T i r o 99", rumo a P A R A N A G U Á , aqui
chegando no dia 12, às 9 horas da manhã, sob os calorosos aplausos
de nossa população.
Muitas festas se fizeram em homenagem aos "atiradores do
99". E, por muitos anos ainda, manteve-se forme esse "Tiro de
Guerra", acabando por se e x t i n g u i r . . .
Hoje, são apenas recordações do passado brilhante do "Tiro
99", que tanta alegria deu à nossa P A R A N A G U Á , quando dos seus
;
desfiles pelas ruas da c dade. .. Tudo passa m e s m o . . .

356
CLUBE ATLÉTICO SELETO
Foi fundado a 7 de junho de 1926, por um grupo de jovens
esportistas. Sua finalidade era o "futebol"; mas seria também
recreativo.

Seus fundadores foram:

Geraldo Cavagnari, José Tramujas Junior (Juquinha), Satur-


nino Cárdenas (Satuca), José Marques Cordeiro ( D u d ú ) , Bene-
dito Marques Cordeiro ( N i t o ) , Antonio Ramos, Antonio Fernandes
Filho ( T ô n i c o ) , Honorío da Costa Lobo ( N o r i t o ) , Elpidio Silva e
Egberto Hilário Ribeiro (Quiquito).
Esse Clube passou por fases bem difíceis, mas foi se mantendo.

Sua primeira Diretoria foi a seguinte:

P R E S I D E N T E — Geraldo Cavagnari.
S E C R E T Á R I O — José Marques Cordeiro.
T E S O U R E I R O — José Tramujas Junior.
Capitão do Time — Elpidio Silva.
Seu primeiro nome foi "SELETO ESPORTE CLUBE", conser-
vando-se com ele durante 20 anos, sempre lutando com as maiores
dificuldades.
Foi quando surgiu um fato importante, na Cidade, que veio
levantar o Seleto de sua quase extinção.
Em 1946, fechou, em P A R A N A G U Á ,a Agência do D . N . C .
(Departamento Nacional do C a f é ) . O "Chibe Atlético D . N . C . " ,
fundado em 1940, pelo seu Agente — Orlando Matos — e demais
funcionários graduados, teria que se extinguir, pois o passivo da
sociedade fotibolística já montava a casa dos 350 c o n t o s . . .
Foi quando o Sr. Orlando Matos procurou o Presidente do
Seleto: Dr. Joaquim Tramujas — e propôs a fusão dos dois clubes
(isso em 1946), entregando ao Seleto o seu único patromônio —
Estádio Orlando Matos.
Depois de muitos debates, foi aceita a proposta, mas, sob a
condição: O Seleto conservaria o seu nome e passaria a chamar-se
"CLUBE A T L É T I C O SELETO", condição aceita imediatamente...
Mais alguns anos e o "Salão de Festas" do Clube Atlético Seleto
não mais comportava o número de sócios.
O então Presidente Dr. José Francisco Linhares e os irmãos
Airton e Hamilton Chaves (trio incomparável) tiveram a feliz idéia
de adquirir uma nova sede fora da área do Estádio, a fim de am-
pliar suas instlações, para dar aos assciados outras recreações.
Compraram então um prédio, com terreno ao lado, do Sr. Man-
fredo Cominese e aí instalaram o "Parque Social Seletão", inaugu-
rado a 24 de janeiro de 1970; com ótimas instalações sanitárias,
duas ótimas piscinas, campo para o futebol de pelada e outros jo-
357
gos, excelente "bar" e outros melhoramentos para maior conforto
dos associados.
Hoje, essa grande Sociedade é um padrão de glória para os
seletenses ! Valeu todo o sacrifício dos seus diretores ! . . .
Atualmente, sua excelente Diretoria está assim constituída:
Presidente: Dr. José Francisco Linhares; Vice-Presidente: Aír-
ton Claro Claves; Secretários: Ivo Gabriel da Silva e Edmir de
Oliveira; Tesoureiros: Luiz Rocha e Arthur Mendes; Diretor de Pa-
trimônio: Hamilton Claro Chaves; Diretor Social: Nelson Lúcio
Ferraz; Presidente do Conselho Deliberativo: José Delfim Vila Real.
Diretor de Promoções: Janí Miranda Raucher; Diretor Geral de
Esportes; Diamantino Francisco; Diretor de Relações Públicas:
Ivaní Marés da Costa.
Departamento Social: — Antonio Temporão, Oswaldo Gabriel,
Josemir Pereira, Deny Bindo e Amilton Aquin.
Departamento de Natação: — Manoel Henrique Mesquita.
Departamento de Esportes Parque Social — Djalma Munster.
Departamento de Divulgação — Airton Poli, Nelson L. Ferrei-
ra e Celso Chichorro Oliveira.
Departamento de Futebol Profissional — Joaquim Tramujas
Filho, Cesar A. T. Samwais, Luiz A. Ilipronti e Aquiles R. Santos.
No cinqüentenário do Clube, realizado aos 7 dias de junho de
1976, grandes festividades foram levadas a efeito.
Salve, grande Clube ! . . .

358
LENDAS

i
A LENDA DAS ROSAS LOUCAS

Estávamos no ano de 1680.


A Costeira do Rossío, da Vila de Nossa Senhora do Rosário de
P A R A N A G U Á , era habitada por humildes pescadores que viviam
do que o mar lhes dava, nas noites calmas daquele arrabalde.
Vendiam eles uma parte da pesca (o melhor p e i x e ) ; o resto
ficava para o sustento da família.
Corria o mês de novembro. Uma noite, na calmaria do verão,
estavam eles nas suas canoas ao largo da baía, com suas redes nas
águas, à espera de uma boa pescaria.
Por um desses acasos, olhando o céu recamado de estrelas,
um deles viu que, de uma delas descia um facho luminoso até a
grande moita de "rosas loucas" nascidas na barranca da baía, e que
aai a minutos desaparecia; isso por várias vezes. Chamou então a
atenção dos companheiros, os quais presenciaram o fato.
Comentando o acontecimento nos seus lares, quando voltaram
da faina noturna, acharam, uns, de bom aviso; outros, porém, mais
medrosos, alegaram o prenuncio de grandes males.
E o fenômeno continuou por várias noites, até que os praieiros
tomaram uma decisão: decepar a moita das "rosas loucas". E num
domingo, pela manhã, com facão, enxada e foice, começaram a
devastação. Mas, quando estavam na metade do trabalho, depara-
ram com uma pequenina imagem da Virgem mãe de Jesus, bem
no lugar onde, todas as noites descia o facho luminoso.
O alvoroço foi grande entre aquela gente i n c u l t a . . .
Um preto velho, por nome P A I BERÊ, que ali também morava,
pediu para fazer uma igrejinha de pau-a-pique, coberta de palha,
a fim de colocar a imagem num altar e ficar como guarda do
achado. Todos os pescadores concordaram.
No mesmo lugar, P A I BERÊ fez um ranchinho em forma de
ermida e todos os domingos os moradores rezavam o "terço", pela
manhã e à tarde.
A notícia espalhou-se logo pela Vila e a curiosidade do povo
não se fez esperar; a princípio, para ver; depois, para crer.
Os anos foram passando e a devoção crescendo. Os pedidos
e os milagres também foram surgindo, até chegar aos nossos dias;
tornando-se por fim, uma tradição.
361
Hoje, passados 296 anos (quase 3 séculos), a devoção perma-
nece firme e a crença ainda maior, como uma bênção do céu.
Um povo crente é feliz ! . . .

CONSIDERANDOS:

Embora uma "lenda", tem algo de verdade, quanto aos pesca-


dores e principalmente ao P A I BERÊ.
O que temos, porém, de verdade, é o achado nas malhas da
rede (caso muito natural), a construção da igrejinha de sapé e os
"terços" domingueiros. Isto tudo, através dos anos, tornou-se
uma verdadeira tradição.

LENDA DA MUDANÇA
Uma outra "lenda" conta que os "maiorais" da terra queriam a
imagem da Santinha na Vila (por lhes ser mais cômodo, é c l a r o ) ;
trouxeram-na, pois, para a nossa Matriz.
No dia seguinte, não estava mais no altar; sendo encontrada
no altar do Rossío.
Por diversas vezes trouxeram-na para a Matriz, e todas essas
vezes ela desaparecia; sendo sempre encontrada no R o s s í o . . .
O vigário então, ponderou aos fiéis que a imagem queria mes-
mo ficar no lugar onde foi achada. O povo concordou e não mais
tiraram-na do seu querido Rossío.
As "lendas" são assim. A l g o de misterioso e inverossimel...
A fantasia popular é o fator preponderante...

A CABEÇA DO ENFORCADO, NA FONTE VELHA


( L E N D A )

A Fonte da Cambôa é aureolada, como tudo o que é antigo, de


uma "lenda", que data da "escravidão".
Um escravo africano, matara o seu amo, lá pelos lados do I m -
bocuí, devido aos maus tratos que há muito vinha sofrendo.
Levado ao Júri, foi o infeliz condenado à morte, sumaria-
mente, sendo daí há dias enforcado.
Era uso na época, quanto aos escravos, depois de enforcado,
cortar-se a cabeça da vítima e colocá-la num poste, em um lugar
362
bem visível e que fosse freqüentado pelos pretos, a fim de servir de
exemplo a esses infelizes cativos.
O poste com a cabeça do enforcado foi colocado na Fonte da
Cambôa por ser o local diário do vaivém dos negros.
Os escravos, que iam à Fonte buscar água para os seus amos,
quando chegavam na ladeira, baixavam a cabeça, para não olhar
àquele crâneo pendurado.. o pavor lhes invadia a alma cheia de
crendices...
Tinham eles verdadeiro horror de descer a ladeira ao anoitecer,
pois dizia-se que a visão do corpo sem cabeça vagava, desde o
escurecer, até alta madrugada, enlouquecendo as pessoas que por
ali passassem...
Para os senhores de escravos essa "lenda" era um meio seguro
de obrigar os cativos ao trabalho; ameaçando-os, caso vadiassem,
de mandá-los à Fonte durante a n o i t e . . .
Essa "lenda" continuou viva desde o século X V I I (tempos
coloniais), até 1888, quando foi proclamada a abolição da escra-
vatura (a maior nódoa que o B R A S I L guarda em sua História).
Com a Independência do nosso País, muitas Leis foram re-
vogadas. Assim, o crânio dali desapareceu, sepultado que f o i . . .
Hoje, depois de 300 anos, nem mais se fala nisso, e poucos, se
ainda existem, poderão lembrar.
Atualmente o lugar é aprazível, sendo muito visitado pelos
turistas.

O PINHEIRO E A PALMEIRA
( L E N D A )

Conta uma antiga lenda indígena da terra paranista, que,


certa vez, um forte e destemido índio do planalto, filho de audaz
Cacique, pediu ao pai para descer a Serra a fim de conhecer o mar
que tanto desejava.
Ao chegar ao litoral, junto aos carijós, seus amigos, acabou co-
nhecendo e se tomando de amores por uma linda indiazinha mo-
rena, tisnada pelo Sol.
Amaram-se apaixonadamente e resolveram se casar, obtendo o
consentimento dos pais dela.
Para dar a grande notícia ao velho pai Tinguí e pedir-lhe a
benção, volta o valente índio aos seus pagos, feliz da vida.
Mas, o rude pagé, feiticeiro mau, cujo filho morria de amores
e se vira desprezado pela indiazinha carijó, não se conformando
com tal união a ser feita com o índio tinguí, resolveu castigá-los,
invocando os espíritos do mal para que transformasse o jovem par
em duas pedras; mostrando assim a sua f o r ç a . . .
363
Os carijós, desolados com a perda de tão querida irmã, recorre-
ram a Tupã, o grande protetor de sua raça.
O Grande Pai veio então em seu auxílio; porém, não podendo
tirar de todo, o poder desse encantamento de Anhangá, a que am-
bos os amantes estavam condenados; conseguiu apenas atenuar o
mal, transfoimando-os em duas bonitas e simbólicas árvores.
Ao bravo índio, deu-lhe a forma de um ereto e viril "pinheiro".
A bela e mimosa indiazinha, a de uma esbelta e graciosa "pal-
meira" . . .
Então, quando sopra o vento de terra, traz os suspiros do
elegante "pinheiro" bem-amada...
Quando, porém, a brisa-marinha sussurra na copa da delgada
"palmeira", leva de volta os queixumes da bela enamorada. . .
E foi assim que surgiu o "Pinheiro" no planalto e a "Palmeira"
no litoral. .. Correram os anos; a raça carijó se cruzou com o "cara
branca" e nasceu o P A R A N Á ! . . .

A CAVEIRINHA
( L E N D A )

Pouco conhecida é a lenda da "caveirinha".


Um escravo muito tagarela, vinha da Fonte Velha, trazendo um
pote dágua à cabeça. Ao atravessar o "Campo Grande", viu, en-
costado a uma velha figueira, um esqueleto humano.
Meio assustado, porém, por brincadeira e com vontade de falar,
arriscou-se a dizer ao esqueleto:
— Caveirinha, quem te mato ?
— Foi a "língua"; ouviu ele o esqueleto responder.
•— Achando graça, tornou a perguntar:
— Caveirinha, quem te mato ?
•— Ea resposta não se fez esperar:
— Foi a " l í n g u a " . . .
— Fez o negro a pergunta pela terceira vez; a mesma res-
posta ouviu:
— Caveirinha, quem te mato ?
— Foi a " l í n g u a " . . .
O escravo, então, apressou o passo, não por medo, mas para
chegar mais cedo à casa do amo; pois estava doidinho para soltar
a língua, como sempre fazia, mentindo descaradamente.
Tão logo deixou o pote com água na cozinha, foi, lépido, até a
senzala nos fundos do quintal, para contar o caso aos companhei-
ros de cativeiro, que havia falado com uma "caveira".
Alguns começaram a rir, gozando o escravo linguarudo. Ou-
tros, nem deram atenção; pois já conheciam as manhas e mentiras
do negro. Mas um deles, muito crédulo, aventurou-se a contar ao
amo a façanha do negro marombado, como diziam todos.
364
O patrão, cansado de saber das invencionices do escravo, man-
dou-o chamar. Ele veio todo lampeiro. O patrão então perguntou:
— Que estória é essa do esqueleto falar, seu negro sem ver-
gonha ?
— Meu amo, eu juro que oví a caveira f a l á . . .
— Você não perde o costume de soltar a língua. Não se
emenda mesmo.
— Mas eu vi a caveira e oví ela falá. Eu juro que não tô
mentindo. Ela tá l á . . .
— Você é um descarado. Não sabe que um esqueleto não tem
vida ? Como então poderia ele falar ? . . .
— Falô, sim sinhô, meu amo. Eu tô dizendo a verdade. Mecê
pode aquerditá. Desta veis eu não tô mentindo.
— Jura em nome de Deus ?
— Juro, por nosso Sinhô !
— Pois bem. Nós iremos ao Campo Grande. Queremos ver esse
esqueleto se ainda lá está e também ouví-lo falar com você. Mas
fique certo do seguinte: Se o esqueleto ainda lá estiver e não res-
ponder à sua pergunta, eu mandarei amarrá-lo ao tronco da fi-
gueira, junto ao esqueleto, para receber 100 chicotadas, a fim de
nunca mais m e n t i r . . .
E lá se foram todos, patrão, empregados e escravos, onde, de
fato, encontraram um esqueleto encostado a uma figueira, no tal
Campo Grande.
— Agora, disse o patrão: Fale, negro sem vergonha; fale
com ela.
— E o preto, já meio amedrontado; Caveirinha, quem te
mato ? . . . Nada; o esqueleto não respondia. Tornou a perguntar:
Caveirinha, meu bem, quem te mato ? . . . Nem uma palavra. O ne-
gro, temendo já o castigo que ia receber e que por certo não agüen-
taria, começou a implorar: Caveirinha, minha boa amiguinha, diga,
por favô, quem te matô. Diga, senão eu vô apanha m u i t o . . . O si-
lêncio continuava...
— Pessoal, falou o patrão, amarrem esse marombado ao tronco
da figueira e . . . executem as minhas ordens. E foi-se com os de-
mais escravos.
O pobre escravo não agüentou o s u p l í c i o . . . m o r r e u . . . Já era
noite quando isso aconteceu.
Depois que os empregados foram embora, deixando o preto
amarrado ao tronco da árvore, ouviu-se uma voz (a voz do es-
queleto) : "Eu não te disse que, quem me matou foi a língua ? ! . . .
Isso aconteceu no tempo da escravatura. Contavam os negros
em suas senzalas, à noite.

PROVÉRBIO:
"Quem sempre mente, vergonha não sente e a morte está
sempre preseite".
365
PARANAGUÁ

B R I L H A N T E H I S T Ó R I A E M ÉPOCAS D I S T A N T E S .
DOCES R E M I N I S C Ê N C I A S DE T U D O O QUE SE OUVIU
DE NOSSOS A N T E P A S S A D O S
CIDADE "CARIJÓ", CUJOS P R I M E I R O S F I L H O S ,
DE T E Z Q U E I M A D A PELAS A R D E N T I A S DAS L O N G A S
ESTIAGENS, D E S B R A V A N D O SEU SOLO R I C O E
DADIVOSO, C I V I L I Z A R A M - N A .
ELA, EM T R O C A , A T R A V É S DOS SÉCULOS,
CONQUISTOU-LHES O C O R A Ç Ã O !

T O R R Ã O CARIJÓ, L U G A R SEDUTOR,
QUE O Í N D I O CHAMOU DE " P A R A N A G U Á " !
M O D E S T A E F E L I Z , NA R A Ç A E NA COR,
D O T E U CORAÇÃO, N U M GESTO D E A M O R ,
FIZESTE NASCER O T E U " P A R A N Á " !. . .

P A R A N A G U Á , SETEMBRO, 1976.

366
'PRINCESA CARIJÓ"

(Paranaguá)

"Cidade Carijó", do litoral "Princesa",


Como toda mulher, tem natural encanto;
Modesta no trajar, singela na beleza,
Descende dos "Tupis", a raça de nobreza,
Valente e varonil que lutas nos deu tanto.

Origem do seu nome, orgulho duma raça,


Aos seus morenos pés o "grande mar redondo"
Beijando de mansinho, em contrição e graça,
Ao sopro perenal da brisa que perpassa
E traz, como troféu, queixumes lá do C o n g o . . .

Lendário e doce rio junto a seu peito arfando


O manso "Taquaré", o belo enamorado,
Em seu dolente curso, as águas marulhando,
Vai, amorosamente, aos poucos refrescando
O seu moreno cólo ardente e r e q u e i m a d o . . .

Cingindo-lhe a cabeça um fúlgido diadema


De "Prata", a serra ao longe em vasta "Cordilheira"
Ostenta com orgulho o seu maior emblema:
"Gigante adormecido" em plácido "Sistema"
"Gigante secular" da terra brasileira!

Com carijós vivendo, há muito que se via


Na costa parnanguara os iberos intrusos.
Hans Staden, o grande, em livros referia,
Quinhentos e quarenta e nove já dizia
Que no "Superagüí" falara com dois lusos.

Mais tarde, um escrivão da "Câmara Paulista",


Velho "Diogo de Unhatte", assim, se lho chamara,
Seiscentos e catorze — o tempo que já dista,
Requereu Sesmaria em terra paranista,
Batalhas alegou, com carijós travara.
367
Da brasileira gente, um bravo aventureiro,
É Domingos Peneda, intrépido aportando,
O regulo valente, em glórias verdadeiro,
Vai desbravando o mato em solo brasileiro,
Nas plagas carijós — P A R A N A G U Á fundando !

A guarda secular — "Cotinga" sobranceira,


Histórica por ter "ermida" levantada
Por brava gente lusa em ilha hospitaleira,
A dádiva recebe em festa alviçareira,
"Senhora das Mercês" — A Santa consagrada.

Tão logo em terra firme, um templo levantaram


Esses fortes varões de raça aventureira.
A linda "Capelinha", erguida, dedicaram
Quinhentos e setenta e oito — consagraram
À "Virgem do Rosário", mística padroeira!

Aurífera jazida em terra dadivosa,


Amostras de filões ao reino lusitano
Daqui se foi, partida em proporção rendosa,
Fazendo com que a "Corte" cúpida, inveiosa,
Mandasse um "Provedor de Minas", um tirano.

Dum ibero fidalgo, eterna enamorada,


A civilização aos poucos foi bebendo.
Então tornou-se bela e aí foi-lhe fadada
A glória desta gente assim predestinada
Fantástica visão. "Gabriel de Lara" tendo !

Fidalgo de valor, temperamento de aço,


Educa a linda "aldeia" e torna-a fascinante.
E pede "Lara" então a "El-Rei" lá no seu "Paço'
Que faça, por mercê, em " V i l a " este pedaço
De terra do Brasil mui rico e vice jante !

Num eloqüente gesto o luso rei concede


O título de " V i l a " à terra parnanguara !
E assim P A R A N A G U Á , vivíssima recebe
Com júbilo, co'amor, o gran favor que deve
Ao bravo "Povoador", ao bom "Gabriel de Lara"

A memorável data é feito assinalado


Da civilização, o seu sinal primeiro.
Seiscentos e quarenta e oito, celebrado
No mês de julho, foi em vinte nove, dado
Em troca desse amor ao luso forasteiro...
Mais tarde quando então já velho e bem cansado.
Sua alma se evolara ao páramo celeste,
À terra deu seu corpo inerte, enregelado,,
A terra que ele amara e dela foi amado,
Num holocausto vivo à morada terrestre. ..

Muito tempo passou e a "Carijó Princesa"


Tisnada pelo sol das longas ardentías,,
Tornou-se do seu povo a "deusa da beleza",
A forma divinal da própria natureza
Nos seus encantos mil — segredos e m a g i a s !

Princesa cativante, aos poucos foi-se unindo


Ao rude coração dos rudes povoadores,
Os quais, às gerações futuras transmitindo
O amor pelo seu berço, em elo forte e lindo
Fizeram deste céu — recanto de esplendores !

Diletos filhos seus em breve conquistaram


Diadema de "Cidade" em festa, riso e flores
Em oitocentos e quarenta e dois marcaram
Na vida deste "chão" que tanto sublimaram,
Que é tudo para nós, numa visão de a m o r e s . . .

Essa época marcou nova era de grandeza


Em tudo que ensoberba cm fúlgidos primores.
Na música foi bela em mágica realeza;
Nas letras sublimou em mística beleza;
Não cessam de clamar os bardos trovadores!

Da raça dos "Tupis" "Princesa" descendente,


"Cidade Carijó", por teus filhos ufanos,
Numa visão feliz, amando ardentemente,
Eu viverei por ti, cantando eternamente,
Nestes "cem versos" meus, por teus "trezentos anos" ! . . .

Paranaguá, 29 de julho de 1948.

369
ÍNDICE

Pág.

01 — Homenagem ao Prefeito Municipal 3


02 — Homenagem à Câmara Municipal 4
03 — Homenagem ao Conselho Municipal de Cultura 5
6
04 — Homenagem aos meus pais
05 — Prefácio (Prof. Nelson de Freitas Barbosa) 7
06 — Apresentação 9
07 — Fundação de PARANAGUÁ 11
08 — Domingos Peneda e Gabriel de Lara 17
09 — Bartolomeu de Torales (o moço) 19
10 — O 1.° vigário da VILA 22
11 — A Fonte Velha 23
12 — Uma renhida lide Municipal 23
13 — Manoel de Lemos Conde 27
14 — A Ermida de N. S. das Mercês 30
15 — A Virgem do Rossio na História e na Lenda 3i
16 — o Colégio dos Jesuítas 39
17 — A Peste Grande 42
18 — A Igreja de São Benedito 45
19 — Milagre ou Acaso ? (o navio pirata) 48
20 — A Fortaleza da Barra 52
21 — A Irmandade de N. S. do Rosário 53
22 — A Igreja da Ordem III 64
23 — A Contenda dos Limites 57
24 — A Semana Santa e o Cinturião 69
25 — O 1.° Grito de Emancipação 75
26 — Lealdade de escravos 80
27 — A Ilha dos Valadares 32
28 — Os Defensores da Independência 84
29 — A Irmandade da Misericórdia 85
30 — A Maçonaria de PARANAGUÁ 92
31 — Política e Religião 94
32 — O Teatro "Paranagüense" 96
33 — O estulto Inspetor da Alfândega 99

371
34 — O 5 de fevereiro 102
35 — Acontecimentos raros e inéditos (o ladrão arrependido) 108
36 — Idem, Idem (as façanhas do padre Gregório) Ill
37 — O Cormorant e sua História 113
38 — Apontamentos históricos e descritivos de PARANAGUÁ 122
39 — Uma tragédia em pleno Oceano 124
40 — Os "canhões da barranca" 127
41 — O Club Litterario 129
42 — D. PEDRO II e sua viagem ao PARANÁ 131
43 — A Estrada de Ferro "PARANAGUÁ-CURITIBA" 141
44 _ A viagem de D. ISABEL a "Redentora" 144
45 — A República e o Clube Republicano 146
46 — Os "Voltij adores da Época" 151
47 _ Os "Bondinhos" de PARANAGUÁ 154
48 — A "Invasão Federalista" em PARANAGUÁ 155
49 — O Grêmio "Brisa da Marinha" 168
50 — O Clube Operário Recreativo e Beneficente 172
51 — O "jogo das flores" em PARANAGUÁ 174
52 — A ponte na Ilha dos Valadares 180
53 — a praça "Fernando Amaro" 182
54 — Usos e costumes do passado 185
55 — FOLCLORE ,. 189
56 — O "Fandango" 190
57 — O "Barreado" . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 191
58 — Os "sambaquís" e os "sanibaquibas" 194
59 — Os Carijós 197
60 — Os "Capitães-mores" 201
61 — O último "Capitão-Mór" 202
62 — Os "Três Poderes" 207
63 — O "Poder Executivo" 207
64 — O "Poder Legislativo" 212
65 — O "Poder Judiciário" 216
66 — O Magistério paranaguara 221
67 — Professora Maria Julia da Silva Nascimento 225
68 — Um Colégio Particular Feminino 227
69 — Professor José Cleto da Silva (um grande mestre) 229
70 — Professora Ludovica Caviglia Bório 232
71 — Professor Randolfo Arzua 233
72 — Professora Adelaide Cardoso Pinto 234
73 — Professora Helena Viana Sundin 234
74 — Professora Heloina de Camargo Vianna 233
75 — Colégio São José 235
76 — Colégio Estadual "José Bonifácio" 235
77 — Instituto Estadual de Educação "Dr. Caetano M. Rocha" 236
78 — Colégio Estadual Comercial "Alberto G. Veiga" 236
79 — Colégio "Itiberê" 236
80 — Ginásio "Leão XIII" 236
81 — Fundação Faculdade Estadual F. C L . PARANAGUÁ 236

372
82 — Estabelecimentos de Ensino Particulares 237
83 — Estabelecimentos de Ensino Estaduais 238
84 — Estabelecimentos de E n i n o Municipais 240
85 — Comendador Manoel Francisco Correia Júnior 245
86 — Dr. Manoel Francisco Correia Neto 248
87 — Dr. Manoel Eufrásio Correia 251
88 — "ITIBERÊ" ...... 251
89 — Um grande sacerdote (Monsenhor Celso) .... 254
90 — Uma Embaixador músico (Brasílio Itiberê) 256
91 — Dr. João Teixeira Soares 258
92 — Nestor Vitor dos Santos 260
93 — Um grande amigo de PARANAGUÁ (Dr. Caetano) 263
94 — Vicente Nascimento Júnior 268
95 — Zenon Pereira Leite 271
96 — Dr. Leocádio José Correia 275
97 — Dr. José Justino de Melo 278
98 - Dr. João Coelho Moreira 280
99 — Dr. Belmiro Saldanha da Rocha 280
100 — Dr. Arthur José de Bastos 282
101 — Fernando Amaro de Miranda 285
102 — Julia da Costa 290
103 — Maia Júnior 295
104 — Leôncio Correia 297
105 — Natalina Cordeiro Santos 303
106 — Ada Dias de Paiva Macaggi Bruno Lobo 307
107 — José Itiberê de Lima 313
108 — Mestres de Bandas 315
109 — Iria Cândido Correia 31'J
110 — Alfredo Andersen 320
111 — Narciso Macaggi 322
112 — Rafael Lopes da Silva 323
113 — Imprensa paranaguara 327
114 — Grêmio Recreativo "íris" (e outros) 339
115 — Club de Natação e Regatas "Com. Santa Rita" 342
116 — Instituto Histórico e Geográfico 344
a
117 — A 2. Ermida de N. S. das Mercês 350
118 — PARANAGUÁ Country Club 351
119 — Clube Olímpico de Paranaguá 352
120 — Antonio Vieira dos Santos (O mestre de nossa História) 353
121 — O Tiro de Guerra "99" 355
122 — Clube Atético Seleto 357
123 — Lenda das "Rosas Loucas" 36.1
124 — '"A Mudança" (lenda) 362
125 — "A Cabeça do Enforcado" (lenda) 362
126 — "O Pinheiro e a Palmeira" (lenda) 363
127 — "A Caveirinha" (lenda) 364
3 6 3
128 — "PARANAGUÁ"
129 — "PRINCESA CARIJÓ" (poema) 367
373
B I B L I O G R A F I A

Obras Consultadas:

ANTONIO VIEIRA DOS SANTOS — "Memória Histórica de Paranaguá".

FRANCISCO NEGRÃO — "Genealogia Paranaense". (6 volumes).

DR. ERMELINO LEÃO — "Dicionário Histórico e Geográfico do Paraná".


(5 volumes).

DR. DAVI CARNEIRO — "D. PEDRO II na Província do Paraná".

JORN. ALFREDO ROMÁRIO MARTINS — "Paranaguá" e "História do


Paraná".

ALBERICO FIGUEIRA — "Como se fez a propaganda da República em


Paranaguá".

CEL. ALCIBÍADES CEZAR PLAISANT — "Scenario Paranaense".

PROF. WALTER SPALDING — "A invasão federaüsta no Paraná".

JORN. VICENTE MONTEPOLICIANO NASCIMENTO JÚNIOR — "Gabriel


de Lara" e a "Tomada de Paranaguá".

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