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INTRODUÇÃO
1
Escrevivência de Conceição Evaristo
A fim de evidenciar como essas mulheres, negras, pobres, educadas, de
diferentes gerações, realizam o mesmo – e imprescindível – movimento de
resistência/insurgência epistêmica aos modos de pensar/agir instituídos pelos cânones
literário e historiográfico, e mais que isso, como são importantes para que outros(as)
intelectuais negros(as) mantenham-se firme na luta pelos seus espaços, e que, como
elas, saiam da subalternidade, e tornem-se autores das suas obras e protagonistas das
suas histórias, transgressores da identidade que há muito é delineada à luz dos ideias
coloniais de escravidão do povo negro.
O marco transgressor no que tange a produção literária negra e diaspórica, foi a
publicação do romance Úrsula (1859), por Maria Firmina dos Reis, o qual possui o
seguinte prólogo:
Sei que pouco vale este romance, porque escrito por uma mulher, e mulher
brasileira, de educação acanhada e sem o trato e a conversação dos homens
ilustrados, que aconselham, que discutem e que corrigem; com uma instrução
misérrima, apenas conhecendo a língua de seus pais, e pouco lida, o seu
cabedal intelectual é quase nulo.
Então por que o publicas? – perguntará o leitor
Como uma tentativa [...]
Deixai pois que a minha Úrsula, tímida e acanhada, sem dotes da natureza,
nem enfeites e louçanias de arte, caminhe entre vós.
Sendo, então, o trabalho de Maria o reflexo do que os negros vivem desde o período
da escravidão: a intolerância, a rejeição. Significando que “a eles recai o peso da
marginalização, da criminalidade imposta e/ou insinuada, da dúvida, da decência e
da honestidade. É novamente a estereotipagem.” Azevedo e Melo (2017)
Essa estereotipagem repercute na protagonista para além: por ser negra e pobre, ela
sofre; mas por ser mulher, numa sociedade fundamentada pelo patriarcalismo – que
confere ao homem o privilégio e o poder; enquanto a mulher, a dependência e
desvantagem. Esse sistema de menorização oprime diariamente muitas Marias –
entendidas aqui como representação feminina de outras mulheres – dispostas em um
patamar abaixo, radicalizado pelo preconceito.
O machismo visto acima, fundamento do patriarcado, é representado no abandono
paterno – o homem, ex-companheiro da Maria, escolheu abandonar sua mulher e seu
filho, fazendo com que a responsabilidade de criar, educar e sustentar a criança
recaísse duplamente à mulher. De modo que, mais uma vez, a mulher seja
compreendida como a única encarregada na criação do filho. Para comprovar que o
abandono é recorrente, tem-se, na ficção, o relato de que Maria teve outros dois
filhos, mas que não estava com ninguém.
Acreditamos que, ao trazer para uma discussão os imaginários individuais e
coletivos que perpassam os discursos destas “vozes mulheres”, possibilitamos o
fortalecimento dos estudos do gênero, das identidades e das alteridades
1. Diáspora
Referências
https://blogs.opovo.com.br/leiturasdabel/2017/11/30/homens-e-brancos-tem-maior-
fatia-no-mercado-editorial-desde-1965/
https://www1.folha.uol.com.br/fsp/mais/fs2310200508.htm
https://www.escrevendoofuturo.org.br/conteudo/noticias/sobre-o programa/artigo/2850/a-
voz-e-a-letra-das-mulheres-escritoras
https://jornal.usp.br/radio-usp/dados-do-ibge-mostram-que-54-da-populacao-brasileira-
e-negra/
https://jornal.usp.br/radio-usp/dados-do-ibge-mostram-que-54-da-populacao-brasileira-
e-negra/