Você está na página 1de 20

1 Uma nova Igreja para

um jovem bispo

A Maringá de ontem olha para quem a contemplaria 50 anos depois...


No aeroporto, multidão aguarda chegada do primeiro bispo.
Alice era professora da rede estadual de ensino e, pela manhã, lecionava no Grupo Escolar de Jardinó-
polis (SP), para onde viajava diariamente. Com a mãe e com Maria, sua irmã, igualmente solteira e professora,
residia na casa paroquial, no centro de Ribeirão Preto, em companhia de Jaime, o irmão, cura da catedral. As
três ocupavam o mesmo quarto, outro servia ao padre, ficando o terceiro para alguma visita.
Oitavo dos 14 filhos do casal João Amélio Coelho e Guilhermina Cunha Coelho, Jaime tinha nascido
em Franca (SP), no dia 26 de julho de 1916. Ordenado padre em 7 de dezembro de 1941, foi nomeado,
no início de 1942, coadjutor da catedral. De início, morou com tia Lola (Judite, casada com Luiz Cunha,
irmão de sua mãe). Seis meses depois, os pais deixaram Franca mudando-se, com as filhas solteiras Maria,
Odila, Alice e Wanda, para Ribeirão Preto, onde alugaram uma casa. Padre Jaime foi morar com eles. Dois
anos depois, Odila e Wanda já casadas, recebeu a nomeação de cura da catedral. Passou então a ocupar a
modesta casa canônica na qual acolheu a família. Ao casal destinou-se um quarto; outro, às irmãs Maria e
Alice, cabendo ao pároco o terceiro. Após a morte do pai, em 23 de novembro de 1955, a mãe reuniu-se às
filhas no mesmo aposento.
Naquele dia 7 de dezembro de 1956, ao descer do ônibus, Alice ouviu sinos que repicavam anunciando
fato novo. Passava pouco do meio-dia. “Deve ter morrido alguém importante”, pensou. Mas logo se conven-
ceu de que seria outra a razão, pois o toque era festivo, não de luto. “Talvez seja pela festa de Nossa Senhora,
amanhã” corrigiu para si mesma. “Vai ver, já estão anunciando desde hoje”. Satisfeita com a explicação, cami-
nhou para a casa, não muito distante.
Ao entrar, deu com a sobrinha Ângela batendo na porta do banheiro. Filha de Odila, casada com Pau-
lo Biagini, a menina de quatro anos geralmente era confiada, durante o dia, aos cuidados de uma das avós,
enquanto os pais trabalhavam; ele, como secretário da Faculdade de Medicina; ela, funcionária municipal da
área da saúde. Ao deparar com a pequena, do lado de fora, chamando pela avó, Alice imaginou-as em algum
jogo de esconde-esconde. “Está brincando com a vovó, querida?” Mas não se tratava de brincadeira. A criança
esclareceu: “A vovó tá lá dentro chorando, porque o tio padre virou bispo”.
Não demorou e chegaram Odila e Paulo que, de volta ao trabalho, após o almoço, davam sempre uma
rápida olhada na filha. Ângela passou-lhes o mesmo recado. Enquanto isso, Alice insistia junto à porta tran-
cada: “Abra, mamãe. Em vez de ficar aí chorando, a senhora devia estar feliz. Imagine que honra ter um filho
bispo!” Mas levou algum tempo para dona Guilhermina aparecer e explicar, enquanto enxugava os olhos, a
razão do pranto: “Agora o Jaime vai deixar a gente e mudar para longe”. Nem ela nem nenhum dos outros
25

Os 50 anos da Diocese de Maringá


fazia idéia do rumo dessa tal Maringá para onde fora nomeado o cura da catedral.
Em minutos, a casa se encheu de gente. O telefone não deu trégua pelo resto do dia. Cumprimentos
chegavam de todo canto. Até o final da tarde, recordam dom Jaime e as irmãs, a mãe continuou meio “fora
do ar”. Recebia felicitações, atendia as pessoas, sorria, mas demonstrava não entender bem o que estava acon-
tecendo. Volta e meia, perguntava: “Para onde mesmo ele vai?” Só à noite conseguiu superar os efeitos da
notícia e voltou a tomar pé da situação.1
Naquela manhã, o bispo de Ribeirão Preto chamara monsenhor Jaime ao telefone: “Se você tem almoço
programado para hoje, desmarque. Quero que venha almoçar comigo”. Imaginando tratar-se de gentileza
pela ocorrência, nesse dia, do seu 15º aniversário de ordenação sacerdotal, o cura teve a surpresa de, ao che-
gar, ver-se rodeado por um grupo de colegas convidados, como ele, pelo bispo. Pontualmente ao meio-dia,
dom Luís do Amaral Mousinho, simpático nordestino, sempre a irradiar bom humor e paixão pela Igreja,
levantou-se e pediu a atenção dos presentes: “Quero ser o primeiro a dar a notícia da nomeação e também
a cumprimentar o novo bispo de Maringá, monsenhor Jaime”. Depois do emocionado abraço, sob palmas
calorosas de todos, encaminhou-se ao telefone para comunicar à mãe dele a feliz notícia. A avó de Ângela
prorrompeu em choro e trancou-se no banheiro.
Oito dias antes, em 29 de novembro, saindo da catedral, a caminho de casa para o almoço, monsenhor
Jaime passara, conforme o costume, pelo palácio episcopal para apanhar a correspondência que o correio lá
entregava. Chamou-lhe a atenção uma carta da Nunciatura Apostólica do Brasil, sediada no Rio de Janeiro,
então capital do país. Mesmo nos dias atuais provoca sobressalto em qualquer padre abrir carta remetida
pela nunciatura e deparar com um segundo envelope lacrado, onde se lê em pequeno retângulo vermelho:
“Pessoal – Reservada – Sob segredo pontifício”. Não é praxe o núncio apostólico escrever para os milhares
de presbíteros espalhados pelo vasto território nacional. Menos ainda, tratando-se de correspondência cujo
conteúdo só o papa autoriza revelar. Na época, o sigilo vinha reservado ao antigo Santo Ofício, nome atual
da Congregação para a Doutrina da Fé. Gerava clima de pesado mistério e, no destinatário, uma ansiedade
cheia de respeitoso temor.
Com o coração aos pulos, leu e releu várias vezes para certificar-se de que seus olhos não mentiam.
Não havia possibilidade de engano. Embora sentisse como um soco a lhe golpear o estômago, era verdade. O
ofício dizia mesmo que ele tinha sido eleito bispo da Igreja (Carta 1).
O impacto provocou reação tão forte que, passado meio século, dom Jaime recorda em pormenores:
“Na hora, senti que o mundo ia acabar. A única idéia que me ocorreu foi dirigir-me ao seminário, onde tra-
balhava cônego Horácio Longo, meu confessor. Eu só conseguia chorar. Perguntei-lhe que resposta dar ao
núncio”. Consultado com antecedência, evidentemente, como sempre faz a nunciatura apostólica a respeito
dos candidatos a bispo, cônego Horácio divertia-se com a aflição de penitente. Rindo gostosamente, deu sua
orientação: “Mas é claro que sua resposta vai ser afirmativa. Tem que aceitar, sim”. O arcebispo relembra:
“Voltei para casa, tentei disfarçar como pude e passei a esperar ansioso pelo término do sigilo pontifício,
aquele peso que me sufocava o peito”.
Não era pequena a desolação do pobre cura. Com quarenta anos, seria um dos mais jovens membros
do episcopado brasileiro. Embora, à época, se escolhessem candidatos mais novos do que hoje – em especial
depois do pontificado de João Paulo II –, ainda assim, raramente a Igreja alçava à dignidade episcopal alguém
com menos de quarenta e cinco, cinqüenta anos. Exercendo o ministério em Ribeirão Preto, onde trabalhava
desde a ordenação, Jaime tinha motivos para se considerar realizado. Benquisto pelo povo, pelos colegas e
pelo bispo, fiel à Igreja e à própria vocação, zeloso, bom orador, culto, respeitado, procurador da construção
do famoso seminário menor de Brodósqui (SP), futuro referencial de seminário para o Brasil, diretor diocesa-
no da Obra das Vocações Sacerdotais, querido pela família com a qual desfrutava a ventura de conviver, reunia
tudo que compõe a idéia de homem feliz. De quem não prevê mudança brusca de rumo no caminho que

1 Informações familiares fornecidas por Alice Coelho Sproesser, irmã de dom Jaime Luiz Coelho, na residência deste, em Maringá,
em 10 de janeiro de 2006.
26

A Igreja que brotou da mata


Carta 1 O núncio apostólico dá ciência a mons. Jaime de sua nomeação episcopal
(LOMBARDI, 1956, 1 f.).

vai trilhando. Aquilo vinha desmontar todos os sonhos até então construídos. A convocação do Santo Padre
atingiu-o com força igual à da imprevista ordem de Javé a Abraão: “Sai da tua terra, da tua parentela e da casa
de teu pai, para a terra que te mostrarei” (GÊNESIS 12, 1). Sentia-se útil à Igreja, abençoado no presbitério
de Ribeirão Preto. Por outro lado, não havia como escapar aos desígnios de Deus manifestos pelos legítimos
intérpretes de sua vontade, particularmente pelo bispo de Roma.
Ainda no dia 29 de novembro, lida a carta da nunciatura, uma curiosidade cheia de medo o fez con-
sultar o mapa, investindo largo tempo no inútil esforço de localizar a cidade na qual viveria o resto dos seus
dias. Maringá era por demais nova para figurar em mapas com mais de cinco anos, caso daquele que tinha em
mãos. Naquele tempo, em toda Ribeirão Preto, como, de resto, possivelmente em todo o Brasil, ninguém
conseguiria localizar em mapa aquela que seria denominada “cidade-canção”. Voltou o pensamento para dom
Manuel da Silveira D’Elboux, o venerado mestre que o acompanhava desde o Seminário Central do Ipiranga,
em São Paulo. De suas mãos recebera, em Ribeirão Preto, a ordenação presbiteral, quando ele era ainda bispo
auxiliar de dom Alberto José Gonçalves. Bispo diocesano desde 1946, dom Manuel fora, em 1950, transferi-
do para o Paraná, onde presidia, como arcebispo, a Província Eclesiástica de Curitiba. “Sem dúvida, ele deve
27

Os 50 anos da Diocese de Maringá


estar por detrás disso”, imaginou. “Mas o querido dom Manuel não calcula o terremoto que provocou em
minha vida”.
Nos dias seguintes, o futuro bispo passou a revelar, segundo Alice, uma tristeza cuja causa ela não con-
seguia identificar. “Andava quieto, sorria pouco e parecia alheio ao que acontecia à sua volta. Achei melhor
não comentar nada para não preocupar ainda mais a mamãe”. Outra mudança anotada foi o súbito interesse
do irmão pelo próprio guarda-roupa, preocupação antes nunca demonstrada. “Mandou fazer muita roupa
nova, especialmente camisas brancas, que chegavam a casa em grande quantidade. Eu não dizia nada, mas me
perguntava o motivo. Só mais tarde compreendi que ele já estava preparando a mudança, prevendo que em
Maringá não ia encontrar as facilidades que Ribeirão oferecia”.
O telegrama de resposta solicitado pelo núncio foi enviado na mesma tarde de 29 de novembro, dia em
recebeu o ofício procedente do Rio. Seguiu também, no mesmo dia, a carta de confirmação na qual o eleito
aceitava a missão imposta (Carta 2).
Novo ofício da nunciatura datado de 5 de dezembro, mas possivelmente postado antes, no Rio – na
época, dois dias incompletos representavam prazo demasiado curto para correspondência entre o Rio de
Janeiro e Ribeirão Preto –, fixava em 7 de dezembro a data para conhecimento público da sua nomeação
episcopal (Carta 3).
Monsenhor Jaime o recebeu das mãos de dom Mousinho, após o anúncio feito por ele da eleição, às
12h00 desse dia 7. Inegavelmente, o desejo de, por primeiro, revelar a notícia tinha levado o bispo a intercep-
tar-lhe a correspondência, só a entregando depois de cumprimentá-lo com emoção e carinho.
Apenas na sua posse como bispo, já em Maringá, no dia 24 de março de 1957, com a leitura protocolar
e a entrega em suas mãos, veio tomar conhecimento do teor da bula de Pio XII que criara, há mais de um ano,
as dioceses de Londrina e Maringá, no Paraná. O texto oficial da Carta Apostólica Latissimas partire Ecclesias,
redigida em elegante latim, estabelecia:

CONSTITUIÇÕES APOSTÓLICAS
Diocese de Jacarezinho (diocese de Londrina – diocese de Maringá)

Da Diocese de Jacarezinho desmembram-se algumas regiões, das quais se formam


duas dioceses, chamadas de Londrina e de Maringá

PIO BISPO
Servo dos servos de Deus
Para perpétua memória
Julgamos, antes de tudo, nosso dever dividir Igrejas muito extensas e circunscrevê-las
a limites mais convenientes: nada é mais premente nem importante que proporcio-
nar a todas as pessoas que se orgulham do nome cristão um caminho mais seguro
de salvação, bem como providenciar-lhes todos os proveitos e benefícios da religião
católica. Quando, pois, tomamos conhecimento de que o venerável Irmão Armando
Lombardi, Arcebispo de Cesaréia e Núncio Apostólico na República do Brasil, so-
licitou a esta Sé Romana que, dividida a Igreja de Jacarezinho, fossem constituídas
duas dioceses, a fim de que os dignos habitantes do Norte do Paraná, no Brasil, não
ficassem privados dos necessários cuidados pastorais; e de que com isso concordam
Geraldo de Proença Sigaud, Bispo de Jacarezinho, assim como Manuel da Silveira
D’Elboux, Arcebispo de Curitiba e os outros Ordinários locais da Província Eclesi-
ástica de Curitiba, de bom grado atendemos o pedido encaminhado. Por isso, tendo
ouvido o parecer dos nossos Irmãos Cardeais da Santa Igreja Romana encarregados
dos Negócios Consistoriais, depois de atentamente estudado o assunto e havendo
unanimidade por parte daqueles que têm ou julgam ter algum direito nesta divi-
são de regiões e de bens, fazendo uso do Nosso poder supremo, estabelecemos o
que segue. Separamos da diocese de Jacarezinho o território que compreende os
municípios conhecidos como: Londrina, Alvorada, Apucarana, Arapongas, Araru-
va, Astorga, Bela Vista, Cambé, Catugi, Centenário, Faxinal, Florestópolis, Ibiporã,
Jaguapitã, Lupionópolis, Porecatu, 1º de Maio, Rolândia, Sabáudia, Santo Inácio
28

A Igreja que brotou da mata


Carta 2 Resposta do eleito à carta do núncio
apostólico (COELHO, 1956, 1 f.).

Carta 3 O núncio apostólico comunica o fim do segredo pontifício 29


(LOMBARDI, 1956b, 1 f.).
Os 50 anos da Diocese de Maringá
e Sertanópolis; do conjunto por eles formado criamos a diocese a ser chamada de
Londrina, que constará dos mesmos municípios que enumeramos, com seus respec-
tivos limites; sua sede episcopal será a cidade de Londrina, e a cátedra da autoridade
pontifical, estabelecida na igreja do Sagrado Coração de Jesus que, por isso, gozará
da dignidade de sé catedral. Igualmente, da mesma diocese de Jacarezinho sepa-
ramos a região compreendida pelos municípios de Maringá, Alto Paraná, Jandaia,
Mandaguaçu, Mandaguari, Marialva, Nova Esperança, Paranavaí e a reunimos em
forma de nova diocese denominada de Maringá, circunscrita pelos mesmos limites
que demarcam estes municípios; a cidade sede, evidentemente, será Maringá, na qual
o Bispo terá o seu domicílio, em cuja igreja de Nossa Senhora da Glória instalará a
sua cátedra pontifícia; por isso ela gozará da honra das igrejas catedrais. Portanto os
Sagrados Pastores das dioceses de Londrina e de Maringá terão todos os direitos,
poderes, honras e insígnias que se atribuem a todos os Bispos de igual dignidade; por
outro lado, estarão sujeitos aos mesmos encargos e obrigações. Quanto à metrópole
à qual doravante estarão subordinadas como sufragâneas as novas dioceses, decreta-
mos que seja a Igreja de Curitiba, a cujo Arcebispo estarão adscritos os Prelados que
citamos. Mas como o crescimento de cada uma das novas Igrejas, assim como sua
fecundidade, dependem, em boa parte, da seleção e formação de jovens que, ao con-
siderar a fertilíssima seara das almas, desejam alistar-se em o número dos operários do
Evangelho, queremos que em cada uma destas dioceses logo se construa, segundo a
norma do Direito e de acordo com as leis promulgadas pela Sagrada Congregação de
seminários e universidades de estudo, um seminário de ensino pelo menos fundamen-
tal, do qual sejam oportunamente escolhidos jovens que serão encaminhados a esta
venerável Cidade, junto ao Pontifício Colégio Pio Brasileiro, para serem devidamente
formados em filosofia e teologia. Igualmente, é nossa vontade que em cada diocese
recém erigida haja um Colégio de Cônegos que nos assuntos mais importantes das
Igrejas auxilie o Bispo com seu conselho, trabalho e competência; enquanto isso
não for possível, pelas tradicionais Cartas Apostólicas, permitimos que em lugar de
Cônegos sejam nomeados Consultores Diocesanos, segundo o cân. 423 do Código
de Direito Canônico. Formam a chamada Mesa episcopal das novas dioceses sejam
os rendimentos de cada uma das Cúrias, sejam os bens e ofertas espontaneamente
doados pelos fiéis, seja o dote oferecido pela República do Brasil, seja, finalmente, a
parte de propriedades e de recursos que na divisão proporcional da mesa de Jacare-
zinho couber, segundo o cân. 1500, a essas dioceses. Da mesma forma, seja regido
pelas normas do Direito Canônico tudo o que diz respeito ao governo e à administra-
ção das Igrejas, à eleição do Vigário Capitular, quando a Sede estiver vaga, e outros
assuntos deste gênero. Queremos, por fim, que, no momento em que for executada
esta nossa Carta, os clérigos que vivem legalmente no território descrito por ela con-
siderem-se pertencentes à mesma diocese; e que igualmente todos os documentos e
registros que, de qualquer forma, se refiram às novas Sedes, sejam enviados pela dio-
cese de Jacarezinho às Cúrias das mesmas para serem cuidadosamente conservados
em arquivo. Ao que estabelecemos nesta Carta dará cumprimento o venerável Irmão
Armando Lombardi, acima mencionado, ou aquele que, por ocasião de sua execução,
estiver à frente da Nunciatura Apostólica do Brasil, podendo para isso delegar poder
a outro homem, desde que investido da dignidade eclesiástica. Àquele, porém, que
cumprir tal encargo, impomos a obrigação de redigir os documentos de ereção das
dioceses e deles remeter, o quanto antes, cópias à Sagrada Congregação Consistorial.
É nossa vontade que esta Carta tenha eficácia hoje e para o futuro; que as disposições
nela exaradas sejam religiosamente cumpridas por aqueles que a isso estão obrigados,
e assim elas obtenham os seus efeitos. Nenhuma disposição contrária, de qualquer
natureza, tem poder de obstar o cumprimento destas Letras; por este documento
derrogamo-las todas. Em razão disso, se alguém, revestido de qualquer autoridade,
consciente ou inconscientemente, agir contra o estabelecido por Nós, determinamos
que isso seja considerado nulo e sem valor. A ninguém ainda seja permitido alterar
ou destruir este documento que expressa Nossa vontade; antes, às cópias e partes
destas Letras, impressas tipograficamente ou redigidas a mão, que levarem o selo de
alguém revestido da dignidade eclesiástica e, ao mesmo tempo, forem reconhecidas
30

A Igreja que brotou da mata


por um tabelião público, deverá ser prestada a mesma fé que se daria à apresentação
desta Carta. Se alguém rejeitar ou, de qualquer modo, recusar estes Nossos decretos
em geral, saiba que incorrerá nas penas cominadas pelo Direito àqueles que recusam
cumprir ordens dos Sumos Pontífices.
Dado em Roma, junto de São Pedro, no primeiro dia do mês de fevereiro do ano do
Senhor de mil novecentos e cinqüenta e seis, décimo sétimo do Nosso Pontificado.

Diocese de Maringá CELSO Cardeal COSTANTINI


Chanceler da S. Igreja Romana

01/02/1956
+ Fr. ADEODATO I. Cardeal PIAZZA
Secretário da S. Congr. Consistorial
Hamleto Tondini
Diretor da Chancelaria Apostólica
Bernardo De Felicis César Federici
Protonotário apostólico Protonotário apostólico (PIO XII, 1956d, p. 486-488).2

Mapa 1 Diocese de Maringá no dia de sua criação, 01/02/1956; à epoca compreendia


apenas oito municípios.

2 Uma das primeiras providências do bispo de Maringá foi adquirir, através da nunciatura, toda a coleção da “Acta Apostolicae Sedis”,
órgão oficial da Santa Sé, o que levou dom Armando Lombardi a observar que Maringá talvez fosse então a única diocese brasileira
a possuir a coleção completa desse acervo documental. Até o final de seu governo diocesano, em 1997, dom Jaime continuou assi-
nando a publicação, tendo o cuidado de encadernar os fascículos em volumes anuais. A Cúria Metropolitana de Maringá guarda em
seu arquivo a série completa cujo primeiro volume foi publicado em 1909.
31

Os 50 anos da Diocese de Maringá


Acompanhando a bula de criação, foram entregues ao bispo de Maringá também duas cartas pontifícias:
a da sua nomeação, e outra, dirigida ao clero e fiéis recomendando-lhes aceitação do novo pastor. Por último,
foi-lhe passado às mãos ainda o decreto de execução, emitido pela Nunciatura Apostólica; todos documentos
redigidos originariamente em latim. Anunciam fatos ou estabelecem disposições que, a seguir, são franquea-
das ao conhecimento geral.3

Bula de nomeação episcopal


PIO Bispo, Servo dos Servos de Deus (Carta 4),

ao dileto filho Jaime Luiz Coelho, Cura da Catedral de Ribeirão Preto, primeiro Bispo
eleito da Diocese de Maringá, saudação e bênção apostólica. É nosso dever atender às
necessidades da Diocese de Maringá, criada no dia primeiro de fevereiro do corrente,
através da Bula “Latissimas partire”, até agora desprovida de seu pastor. Ouvido, pois,
o parecer dos Nossos Veneráveis Irmãos Cardeais encarregados dos Negócios Con-
sistoriais da Santa Igreja Romana, pela Nossa Autoridade apostólica, elegemos-Te,
dileto filho, para Bispo e Pastor da mesma Sé Catedral de Maringá, que constituímos
sufragânea da Arquidiocese de Curitiba. Entregamos-Te, portanto, o governo e a
administração desta Diocese no que se refere tanto aos assuntos religiosos quanto
aos bens temporais, ao mesmo tempo em que Te conferimos os direitos e as honras,
os ofícios e as obrigações anexas a este digníssimo múnus. Para Tua comodidade,
concedemos-Te o direito de seres devidamente sagrado fora da Cidade Eterna por
um Bispo digno, de acordo com a Tua preferência, assistido por dois outros, todos
em comunhão com a Sé Romana; a esse venerável Irmão, que para isso escolheres,
por estas Nossas Letras, conferimos a delegação. Queremos, além disso, que antes da
sagração e da tomada de posse da diocese, perante algum Bispo em comunhão com
a Sé Romana, faças a profissão de fé católica e o juramento tanto de fidelidade a Nós
e aos Pontífices Romanos quanto contra os erros dos Modernistas, de acordo com as
fórmulas prescritas; deles enviarás com presteza à Sagrada Congregação Consistorial
cópias com assinaturas e carimbos teus e do outro bispo. Se não fizeres o juramento
nem emitires a profissão de fé, tanto a Tua pessoa quanto o Bispo que Te sagrar incor-
rerão ambos nas penas cominadas pelo Direito. Quanto ao benefício que tiveste até
hoje, como Cura da Catedral de Ribeirão Preto, ordenamos, conforme o Direito, seja
tido como vago, devendo ser preenchido por Nós e por esta Sé Apostólica. Dito isto,
dileto filho, fazemos votos a Deus de todo o coração para que, propício, fecunde o
Teu trabalho, Te guarde a Ti e aos Teus fiéis. Dado em Roma junto de São Pedro, no
dia três de dezembro do ano do Senhor de mil novecentos e cinqüenta e seis, décimo
oitavo do Nosso Pontificado.

Celso Cardeal Costantini,


Chanceler da Santa Igreja Romana
Hamleto Tondini,
Diretor da Chancelaria Apostólica
Alberto Serafini
Protonotário Apostólico
Silvio Sericano
Protonotário Apostólico (PIO XII, 1956b, 1 f.).

3 Bula = escrito solene ou carta aberta provida de sinete de chumbo, em geral de forma redonda, que se prende ao documento ou carta
32 atestando-lhe a autenticidade.

A Igreja que brotou da mata


Carta 4 Bula do papa Pio XII nomeando mons. Jaime Luiz Coelho primeiro bispo de Maringá (PIO XII, 1956b, 1 f.).

33

Os 50 anos da Diocese de Maringá


Carta ao clero e fiéis da nova diocese
PIO Bispo, Servo dos Servos de Deus,
aos amados filhos, do clero e do povo da cidade e da diocese de Maringá, saudação e
bênção apostólica. Com muita alegria vos comunicamos ter dado hoje à vossa diocese de
Maringá, que criamos pelas Cartas apostólicas “Latissimas partire”, no dia primeiro de
fevereiro do corrente ano, o seu primeiro Bispo. Ouvidos os Nossos veneráveis Irmãos
Cardeais da Santa Igreja Romana encarregados dos Negócios Consistoriais para reger e
governar aquela Sede, por Nossa autoridade elegemos Bispo e Pastor o dileto Filho Jaime
Luiz Coelho, até agora Cura da Catedral de Ribeirão Preto. Exortamo-vos, Filhos queri-
dos, a que com piedosa reverência o recebais como vosso Bispo e com sincera obediência
o sigais. Se assim fielmente vos comportardes, não temos dúvida de que a novel Igreja
de Maringá muito rapidamente crescerá, com a ajuda de Deus, cheia de vigor. Dito isto,
ao Ordinário que até agora rege vossa diocese, recomendamos sejam estas Nossas Letras
lidas publicamente na Catedral logo que, depois de recebidas, o clero e o povo celebrem
um dia festivo de preceito. Dado em Roma, junto a São Pedro, no dia três de dezembro
de mil novecentos e cinqüenta e seis, décimo oitavo do Nosso Pontificado.

Celso Cardeal Costantini,


Chanceler da Santa Igreja Romana
Hamleto Tondini,
Diretor da Chancelaria Apostólica
Alberto Serafini
Protonotário Apostólico
Silvio Sericano
Protonotário Apostólico (PIO XII, 1956a, 1 f.).

Carta a dom Manuel da Silveira D’Elboux


PIO Bispo, Servo dos Servos de Deus,
ao venerável Irmão Arcebispo de Curitiba, saudação e bênção apostólica. No exercício
de Nosso ministério, nomeamos hoje o bispo da Sé episcopal de Maringá, que pela
Nossa Carta “Latissimas partire”, criamos no dia 1º de fevereiro deste ano e submete-
mos à tua metrópole como diocese sufragânea. Ouvidos os Nossos veneráveis Irmãos
Cardeais da Santa Igreja Romana encarregados dos Negócios Consistoriais, com a au-
toridade suprema de Nosso ofício nomeamos o dileto Filho Jaime Luiz Coelho, até
agora Cura da igreja catedral de Ribeirão Preto. Comunicando-te esta decisão, reco-
mendamos, venerável Irmão, que recebas este novo Bispo sufragâneo e, com amorosa
solicitude, o ajudes sempre que pedir o teu conselho. Na certeza de teu atendimento
a este pedido, manifestamos-te Nossa gratidão, formulando votos de bênçãos celestes
para ti e para teus fiéis. Dado em Roma, junto a São Pedro, no dia três de dezembro de
mil novecentos e cinqüenta e seis, décimo oitavo do Nosso Pontificado.

Celso Cardeal Costantini,


Chanceler da Santa Igreja Romana
Hamleto Tondini,
Diretor da Chancelaria Apostólica
Alberto Serafini
Protonotário Apostólico
Silvio Sericano
Protonotário Apostólico (PIO XII, 1956c, 1 f.).4

4 O texto original em latim é conservado em quadro exposto na sala de visitas da residência de dom Jaime Luiz Coelho.
34

A Igreja que brotou da mata


Carta 5 O papa comunica a dom Manuel da Silveira D’Elboux, então arcebispo metropolitano de Curitiba, a eleição do
bispo de Maringá (PIO XII, 1956c, 1 f.).

35

Os 50 anos da Diocese de Maringá


Decreto de execução da bula papal
ARMANDO LOMBARDI
por Mercê de Deus e da Santa Sé Apostólica
Arcebispo Tit. de Cesaréia de Felipe
Núncio Apostólico no Brasil
N. 7608

O Sumo Pontífice, por Divina Providência Papa Pio XII, para prover com solicitude
o bem espiritual dos fiéis cristãos do Norte do Paraná, no Brasil, criou, no dia 1º de
fevereiro de 1956, a diocese de Maringá.
Cabendo ao Núncio Apostólico do Brasil a execução de tudo o que dispõe aquela
Bula, Nós, Armando Lombardi, por mercê de Deus e da Sé Apostólica, bispo titular de
Cesaréia de Filipe, desejoso de pôr em prática o mandato pontifício e exercer fielmente
as faculdades a nós concedidas, pelo nosso presente Decreto de Execução, decretamos,
estabelecemos e mandamos o seguinte:
Primeiro: Desmembramos e separamos da diocese de Jacarezinho todo o território
ocupado pelos municípios enumerados na citada Bula Apostólica: Maringá, Alto Para-
ná, Jandaia do Sul, Mandaguaçu, Mandaguari, Marialva, Nova Esperança, Paranavaí.
Como nestes últimos tempos outros municípios foram criados e deles desmembrados,
a saber: Bom Sucesso, Cruzeiro do Sul, Floraí, Loanda, Nova Londrina, Paraíso do
Norte, Paranacity, Querência do Norte, Santa Cruz do Monte Castelo, Santa Isabel do
Ivaí, São Carlos do Ivaí, São João do Caiuá, São Jorge, São Pedro do Ivaí, Tamboara,
Terra Rica, também estes e outros municípios que deles se desmembrem igualmente
desmembramos e separamos. Do território completo destes municípios erigimos e de-
claramos ereta a nova diocese chamada de Maringá, cujos limites se definem e circuns-
crevem pelos mesmos limites do conjunto dos municípios acima mencionados.
Segundo: Ordenamos que o bispo da diocese estabeleça sua sede e domicílio na cidade
de Maringá, colocando a cátedra episcopal na igreja da mesma cidade dedicada a Nossa
Senhora da Glória, que automaticamente elevamos à dignidade de Catedral, conceden-
do-lhe as honras, direitos e privilégios que competem às outras igrejas catedrais.
Terceiro: Estabelecemos também que a diocese de Maringá seja sufragânea da Igreja de
Curitiba; igualmente, que o bispo de Maringá permaneça juridicamente subordinado
ao arcebispo metropolitano de Curitiba.
Quarto: Estabelecemos que, o mais cedo possível, o bispo de Maringá crie o Cabido
dos Cônegos; enquanto não for possível, em seu lugar, sejam nomeados os Consultores
diocesanos, conforme prescreve o cân. 423 do Código de Direito Canônico.
Quinto: A mesa episcopal constará ou dos rendimentos da Cúria, ou de outras doa-
ções e ofertas dos fiéis, ou de dote oferecido pela cidade ou pelo Estado do Paraná,
ou finalmente dos bens que, após a divisão das propriedades da mesa de Jacarezinho,
couberem proporcionalmente à nova diocese, segundo o cân. 1500 do CDC.
Sexto: Desejamos e mandamos, sob grave encargo de consciência, que o mais breve
possível o bispo de Maringá construa pelo menos o seminário menor, e dele escolha os
melhores jovens para enviá-los ao Pontifício Colégio Pio Brasileiro, em Roma, a fim
de se formaram nas disciplinas de Filosofia e Teologia. Quanto ao seminário maior,
observem-se cuidadosamente as normas exaradas para o Brasil.
Sétimo: Ao entrar em vigor este Nosso Decreto de Execução, ficam incardinados à
diocese de Maringá os clérigos que, de modo regular e em razão do sagrado ministé-
rio, moram no seu território; presumem-se pertencentes à nova diocese os seminaristas
nascidos no seu território, ainda que estudem em outro lugar.
Oitavo: Desejamos, além disso, que, quanto antes, da Cúria de Jacarezinho sejam en-
viados à diocese de Maringá todos os documentos e registros que de alguma forma
digam respeito à nova sede episcopal, aos seus clérigos, fiéis ou bens temporais.
Nono: Por fim, determinamos e prescrevemos que este Nosso Decreto de Execução
passe a vigorar no mesmo instante em que, na igreja Catedral de Maringá ou em outro
lugar por Nós aprovado, o auditor da Nunciatura Apostólica do Brasil, Reverendíssimo
36

A Igreja que brotou da mata


Senhor Mario Pio Gaspari, por nós legitimamente delegado para esta função, publica-
mente der a conhecer a supracitada bula “Latissimas Partire Ecclesias” ao clero e ao
povo presente. Mandamos ainda que do evento seja lavrada a competente Ata, da qual
duas cópias Nos devem ser enviadas.
Observadas as normas do Direito, revogam-se as disposições em contrário.
Dado na cidade do Rio de Janeiro, na Nunciatura Apostólica, a 25 de fevereiro de
1957, festa de São Matias Apóstolo.

a) +Armando Lombardi
Arcebispo de Cesaréia de Filipe e Núncio Apostólico no Brasil
a) Mario Peressian
Secretário da Nunciatura Apostólica (LOMBARDI, 1957b, 3 f.)

Dias depois daquele histórico 7 de dezembro de 1956, o futuro bispo recebeu em casa a visita de padre
Germano José Mayer, palotino alemão, responsável pela paróquia Nossa Senhora da Glória, de Maringá, que
seria elevada à condição de igreja catedral. Pôde enfim apreciar fotos da cidade e receber informações sobre a
nova Igreja que lhe caberia governar. Pela primeira vez, teve o consolo de verificar que Maringá aparecia em
mapa. Pelo menos naquele, aberto à sua frente, publicado pela Colonizadora Sinop, sediada em Maringá, que
padre Germano tivera o cuidado de levar consigo.
O recém-eleito tratou logo de fazer o retiro espiritual disposto pela sabedoria da Igreja, atenta à prepa-
ração dos candidatos a novas responsabilidades, sempre que estão prestes a assumi-las. Recolheu-se, na vizinha
cidade de Batatais (SP), ao Colégio São José, dirigido por padres claretianos, onde tinha estudado no ano de
1931. Era período de férias escolares. Em completo silêncio, isolado de tudo e de todos, consagrou oito dias
à meditação sobre o encargo que estava prestes a assumir. Sentia-se confuso, cheio de medo.
Hoje ainda, em tom de brincadeira, recorda que, ao observar o humilde porteiro do colégio, assaltou-o
um sentimento estranho, talvez inveja: “Ah, como seria bom se eu fosse aquele porteiro. Não estaria nesta
angústia nem precisaria me preocupar com o futuro. A obrigação dele é só atender a porta”. Noutro dia,
absorto em pensamentos, caminhava pelo pátio quando, à distância, viu um cavalo que pastava na maior
tranqüilidade. Pensou na vida do animal e comparou-a com a sua de padre eleito bispo. Veio-lhe à cabeça:
“Que bom se eu fosse aquele cavalo. Não teria que enfrentar o que me espera. Ele, sim, é feliz. Não tem com
que se preocupar”. Depois, arrependido, procurou padre Bento Uriarte, CMF, pedindo-lhe que o ouvisse em
confissão. Queria ser perdoado da inveja que sentira do porteiro e da vontade de ser cavalo.
No dia 19 desse mês, uma quarta-feira, achava-se no Rio de Janeiro para entrevista que agendara com o
núncio apostólico. Antes do encontro, entrou na igreja dos capuchinhos, na Tijuca. Pediu ao porteiro algum
frade para atendê-lo em confissão. – “O senhor prefere um padre velho ou novo?” quis saber o atendente.
– “Não importa, basta que me confesse”. Veio um frade velhinho, que lentamente arrastou os pés até o con-
fessionário. Recorda o primeiro bispo de Maringá: “Prorrompi num choro incontido e só conseguia dizer:
– Padre, eu fui nomeado bispo. Com imensa doçura, o velho frade tentou me consolar: – Meu filho, isso não
é pecado”.

A radical mudança de vida


Dado a público o nome do bispo da diocese criada a 1º de fevereiro de 1956, sua vida converteu-se
numa azáfama de colméia em produção. Os dias seguintes desencadearam uma sucessão de providências capaz
de tirar o fôlego de qualquer mortal. Havia uma montanha de trabalho a ser vencida em brevíssimo espaço de
tempo. Menos mal para quem – mergulhando nas preocupações de ordenação (sagração, dizia-se na época)
episcopal, carta pastoral a ser escrita, documentos a serem impressos (a diocese de Maringá partia da estaca
zero), mudança para o Paraná, posse em Maringá etc. – não conseguia parar um minuto para analisar os de-
safios que estavam por vir. O mesmo não acontecia com os familiares. A despeito das informações otimistas
de padre Germano, as fotos e descrições do lugar só confirmaram os temores sobre a dureza da vida que
aguardava o filho, irmão, tio, cunhado, sobrinho e primo que todos amavam. Evitavam comentar em demasia
37

Os 50 anos da Diocese de Maringá


o assunto, mas, no fundo, sofriam por ele e dele tinham pena. Também o sentiam paroquianos, conhecidos e
amigos que, entretanto, descobriram criativa maneira de amenizar a futura saudade, fazendo chegar ao cura
uma mostra do carinho que lhe dedicavam. Recorda Alice que “congregados marianos, moços e moças, estu-
dantes de faculdade vizinha da casa paroquial, quando passavam na rua, mesmo de noite, em coro cantavam
Maringá, Maringá...”, refrão da melodia composta por Joubert de Carvalho, sucesso nacional de então,
responsável pelo nome conferido à cidade que brotava da floresta norte-paranaense.
A inesperada transferência do padre mexeu também com a vida da mãe e das irmãs, levando-as a apressar
a aquisição de um apartamento no edifício Spadoni, em construção no centro da cidade. No mês de março,
dias antes da posse do novo bispo em Maringá, as três deixaram a casa paroquial. Não podiam ocupar o apar-
tamento, ainda em fase de conclusão. Acomodaram-se na casa de Jupira, outra irmã do bispo, cujo casamento
com Paulo Prado ele havia assistido a 8 de dezembro de 1941, dia seguinte à sua ordenação sacerdotal. Após
quinze anos de casados, Jupira e Nenzico (apelido de Paulo) já tinham os filhos Ana Vera, Paulinho, Eliana e
Cristina, todos crescidos. De repente, a casa passou a acomodar uma família de nove pessoas, em vez de seis.
Só em 15 de agosto daquele ano foi entregue o apartamento no Spadoni. Mas as três não se mudaram logo,
porque Jupira não concordava em que deixassem sua residência. Finalmente, a 1º de outubro, dona Guilher-
mina conseguiu vencer a resistência da filha e se transferiu para o apartamento onde passaria os últimos 24
anos de sua longa existência. “Tenho outros filhos e preciso de um lugar onde recebê-los” foi o argumento
que a mãe usou, recorda Alice. Apesar de fazer questão de um canto seu para acolher os filhos, desde 1957
até sua morte, o Natal ela o passava com o bispo em Maringá. Aos outros, quando se queixavam, respondia:
“Vocês têm esposo(a), têm filhos. Ele não tem ninguém”. Somente a doença, em raríssimas ocasiões, impe-
diu-a de passar em Maringá, com Maria e Alice, as festas de fim de ano.
À semelhança de Agostinho, para quem o amor de Mônica se mostrou decisivo na moldagem da têm-
pera de cristão, de bispo de Hipona e doutor do Ocidente, também o bispo de Maringá recebeu da mãe a
iniciação na fé e o constante acompanhamento em sua vida de pastor, de mestre e pai da Igreja estabelecida em
Maringá. Ela chegou num dos muitos monomotores que, no dia anterior à posse, aterrissaram no poeirento
campo de aviação, pomposamente chamado aeroporto de Maringá que, além desse modelo de aeronave,
recebia só os DC3 da VASP ou da Real Aerovias. Surpreendeu-se com a multidão que aguardava em terra.
“Será que vai chegar algum político no mesmo horário que a gente?” questionavam as filhas. Mas a recepção
era mesmo para elas. Para acolher a mãe do bispo, o bom padre Germano tinha convidado todas as senhoras
da paróquia que pudera contatar. A residência do bispo tinha sido preparada com cuidado. Alunas internas
do Colégio Santa Cruz, na companhia de irmã Iluminada Vandillo Ríos, tinham-se esmerado numa faxina em
regra, fazendo brilhar a nova habitação, agora em condições de receber o novo e ilustre morador.
Todo o ambiente festivo, entretanto, não se estendeu para muito além do dia da posse. A áspera reali-
dade de uma cidade em formação logo se tornou evidente para as assustadas moradoras da Capital do Café,
como era conhecida a Ribeirão Preto da época. Mais tarde, Londrina seria chamada Capital Mundial do Café,
para acentuar a distinção entre ambas.
Ciente de que “quem quer faz, quem não quer manda”, dona Guilhermina não se pôs a choramingar a
falta de serviçais encarregadas dos afazeres domésticos para a residência episcopal. Assumiu com naturalidade
as funções de dona de casa, sem fugir de serviço nenhum reclamado por uma terra em que limpeza não era o
forte. Os mais antigos conservam viva a lembrança do “chora-paulista” (Fig. 1), providencial invenção destas
paragens. Consistia em uma lâmina com o fio voltado para cima, fixada em haste de ferro onde a “vítima”
apoiava as mãos para raspar o barro da sola do calçado. Depois de algumas horas de uso, acumulava-se em-
baixo da lâmina uma montanha de barro, que secava em pouco tempo e exigia remoção completa, sob pena
de anular toda a utilidade do limpa-pés. Depois do primeiro uso, devolver às roupas claras a cor primitiva
parecia missão impossível. Em se tratando de veste branca, aí então era caso perdido: cor original, nunca
mais. Camisa branca de Maringá se conhecia de longe, num simples bater de olhos. O branco aqui obtido
no tanque revelava-se diferente de qualquer outro do resto do mundo. E máquina de lavar era sonho para
décadas mais tarde.
Com invejável disposição para seus 67 anos, a mãe do bispo encarou as tarefas de lavar, passar, cozinhar
38

A Igreja que brotou da mata


Figura 1 “Chora-paulista”, limpa-pés para rapar o barro da sola dos calçados.
Normalmente a base era apenas uma lâmina estreita.

e fazer faxina. Durante o primeiro mês depois da posse, ainda contou com a ajuda de Alice e Odila (Ângela
também ficou) e de Fátima Biagini, cunhada de Odila. Após o retorno delas para Ribeirão Preto, com o
auxílio do garoto José Carlos Pires de Paula, mais tarde seminarista, que vinha depois da aula, ainda por três
meses a mãe comandou os serviços domésticos na casa que nem remotamente lembrava os paços episcopais de
então. Era uma construção baixa de alvenaria na rua Lopes Trovão, quase esquina com avenida Curitiba, sem
luxo e com espaço para o estritamente necessário. Abrigava ainda uma saleta pegada ao escritório do bispo,
que levava o solene apelido de cúria diocesana. Mais tarde, fez-se necessária a construção, na garagem, de um
anexo para, ainda que precariamente, acomodar a cúria.
Por influência do linguajar dos netos, muitos dos quais para Maringá se deslocavam durante as férias,
dona Guilhermina acabou transformando-se na “vó” de padres, de seminaristas e de quantos partilhavam a
casa. Porque dom Jaime deu início em Maringá a um jeito de ser bispo que ninguém tinha visto antes. Derru-
bava barreiras, encurtava distâncias, levava qualquer pessoa a sentir-se acolhida, valorizada, importante. Com
simplicidade, colocava-se à altura do outro, despertando-lhe confiança para uma aproximação sem medo. Era
o avesso do que, muitas vezes, até de forma constrangida, se viam forçados a pôr em prática os bispos daquele
tempo. Presos a um modelo de Igreja de corte piramidal, encastelavam-se numa redoma de distanciamento
do seu clero e, particularmente, dos seus diocesanos, o que lhes reservava, por conseqüência, em muitos casos,
a enervante solidão da autoridade mais temida que amada. Não raro, a atuação do bispo identificava-se com
o exercício de um poder absoluto e discricional. Havia, por certo, quem justificasse tal interpretação. Outros,
ao contrário, faziam de tudo para romper o círculo de isolamento criado pelo cargo. Mas nem deles dependia
modificar por inteiro o quadro. Não se mudam da noite para o dia costumes sedimentados pelo gotejar de
séculos. Assim, ao bispo estava geralmente destinada a sorte do pássaro em gaiola de ouro. O próprio dom
Jaime confessa ter ouvido de dom Mousinho, logo após sua eleição: “Pode ir-se acostumando com a solidão
da vida de bispo. A partir de agora, será ela a sua companheira”.
Em postura revolucionária para a época, o jovem bispo mostrou independência frente aos cânones
ditados pela praxe de uma Igreja pré-conciliar e fielmente observados pela maioria. Desde o primeiro mo-
mento, assumiu o volante de seu próprio veículo, uma “perua” Willys adaptada a partir de um jipe, o bravo
39

Os 50 anos da Diocese de Maringá


utilitário capaz de rasgar barreiros e areões deste bravio Norte do Paraná. Era impensável então um bispo sem
motorista particular. Também não logrou contar com vigário geral, chanceler, secretário, sequer com office-
boy. Acostumados com o que acompanharam por décadas, os maringaenses acabaram por julgar a coisa mais
natural do mundo dar de cara com o bispo no correio, no banco, na farmácia, na rua... De início, denotavam
alguma surpresa. Com o tempo, a reação foi passando a observações do tipo “oi, dom Jaime, bom dia, o se-
nhor por aqui?”. Por fim, a cumprimento rotineiro de pessoas acostumadas a cruzarem em qualquer ponto.
Nesse contexto de relacionamento, novo para os padrões do tempo, padres e seminaristas eram incenti-
vados – embora nem se fizesse necessário – a sentir como sua a casa do bispo. Ninguém marcava hora nem avi-
sava com antecedência. Ia entrando pela porta que encontrasse aberta e se encaminhava ao escritório. Quando
em casa, era ali, debruçado sobre a mesa de trabalho, que invariavelmente ele se achava. Com naturalidade,
erguia os olhos e, num sorriso de boas vindas, acolhia o recém-chegado. Nenhuma estranheza pela entrada de
quem – ele fazia questão de registrar com insistência – era visto como de casa.
Em perfeita consonância com isso, nos períodos por vezes longos de permanência em Maringá, a “vó”
instintivamente assumia o papel de “mãezona”, irradiando sobre todos à sua volta, em especial padres e se-
minaristas, o amistoso clima de família unida. Não há como silenciar a importância dessa mulher vigorosa,
sobretudo naqueles anos de poeira e barro, de mato ainda presente em todos os cantos, de nenhum conforto,
de solidão e, por vezes, de carência até do necessário. A ela, sem favorecimento, justifica aplicar-se o poema
da mulher forte, que encerra o Livro dos Provérbios (PROVÉRBIOS 31, 10-31).
Depois de permanecer em Maringá por quatro meses, a 31 de julho, foi conduzida pelo filho de volta a
Ribeirão, triste por deixá-lo no que considerava um ambiente adverso, quiçá perigoso.
Um episódio trágico veio plantar mais incerteza, verdadeira angústia no seu coração. O país inteiro
foi tomado de horror pelo que divulgaram as agências noticiosas naquele início de julho. No dia primeiro,
o pároco de Quipapá (PE), padre Hosaná de Siqueira e Silva, dirigiu-se ao palácio episcopal de Garanhuns,
sede da diocese, e bateu à porta. Atendido pelo bispo, dom Francisco Expedito Lopes, após discutir com
ele, disparou-lhe três tiros à queima-roupa e fugiu, entregando-se aos monges do Mosteiro de São Bento.
Conduzido às pressas para o hospital, dom Expedito veio a falecer na manhã seguinte. Consternação geral
espalhou-se pelo Brasil e pelo mundo católico. Posteriormente se soube que o padre fora suspenso pelo bispo,
depois de se recusar a afastar da casa paroquial sua prima Maria José Martins com quem tudo indicava manter
um caso amoroso.
Prestes a voltar para casa, apavorada, a “vó” recomendava insistentemente ao filho: “Não brigue com
os seus padres”. Devia considerar não de todo impossível a repetição por aqui do que acabara de ocorrer no
interior de Pernambuco. Garanhuns ela não conhecia, mas de Maringá tinha experiência, após quatro meses
que aqui passara. Ia embora, mas deixava o filho, pesarosa com a guinada de cento e oitenta graus que a vida
familiar tinha sofrido.
É verdade que outros enfrentavam idênticas agruras. Com a diferença, porém, de que tinham abraçado
Maringá por escolha própria, na esperança de fortuna ou de novas oportunidades negadas em outras bandas.
Seu filho, ao contrário, largara o humano sucesso para abraçar o duro encargo de implantar a Igreja numa
área carente de tudo. Por sólidas que fossem sua fé e entrega nas mãos da Providência, mãe nenhuma em tal
condição passaria incólume à dor do distanciamento. Era o que sofria a “vó” na hora de voltar à sua terra e
ambiente de origem.

40

A Igreja que brotou da mata


O que ninguém escreveu
Episódios pitorescos vividos por nossos padres
dos primeiros tempos, alguns já chamados à casa do Pai.

Promessa
Primeiro ano de bispado da cidade de Maringá, 1957. Tempo de muita
chuva e de geadas históricas, que se repetiam com impressionante regula-
ridade. Para as incipientes lavouras de café não havia praga maior. O novo
bispo pede aos fiéis que ajudem na construção do seminário e da catedral.
Faz uma promessa: “Se vocês me ajudarem, eu prometo cinco anos sem
geada”. Muitos comentam que é loucura. Era viva a lembrança de 1953
e 1955. Chega o inverno e, com ele, o pavor. Dia 20 de julho, após uma
semana de chuva, o tempo limpa de repente. Vem a noite. A temperatura
começa a cair sem parar. O céu é uma redoma azul, onde faíscam estrelas
de intenso brilho. Cresce a angústia. À meia-noite, um grupo de pessoas
bate à porta de padre Germano José Mayer: “Padre, abra a igreja. Preci-
samos rezar pra não vir geada”. A oração entra pela fria madrugada. Nin-
guém arreda pé. Quando amanhece, de coração na mão, vão todos espiar
lá fora. Forte cerração encobre a vista. Quando se dissipa, o alívio. Em vez
do manto branco da morte, o mesmo verde de encher os olhos. Como no
dia anterior. Milagre ou não, coragem ou loucura do bispo, só voltou a
gear depois de 1962.

Segurança
Primeira visita a Paranacity, dia 23 de maio de 1957. Havia pratica-
mente só a rua central, leito da estrada para Presidente Prudente, uma des-
cida que dava no areão lá embaixo, antes da subida do outro lado. A igre-
jinha de madeira ficava afastada, à esquerda, na parte baixa. Uma multidão
se junta, no campo de aviação, para recepcionar o visitante. Forma-se o
cortejo, que se move pela rua de terra. Lá atrás, caminha a grande atração
para muitos que nunca tinham visto um bispo assim de pertinho. Querem
aproximar-se, tocá-lo, beijar-lhe o anel. Os responsáveis esforçam-se por
manter a ordem. Ensaiam um cordão de isolamento ao seu redor, tentan-
do protegê-lo do assédio. Não dá muito resultado. Uma senhora tenta, de
um lado e de outro, furar o cerco. O povo se atropela, a poeira levanta,
o calor sufoca. Alidi Ropelato, corpulento e suado, já cansou de pedir,
repetidas vezes, que ela espere até chegar à igreja. A mulher não desiste.
Até que, perdendo a paciência, ele explode: “Ô dona, vá amolar o bispo”.
41

Os 50 anos da Diocese de Maringá


Rito
Numa de suas primeiras visitas pastorais, o novo bispo crismava lá
para as bandas do rio Paraná. Ou, segundo outros, na capela da Vila Silva
Jardim, em Paranacity, na mesma visita do episódio acima. Onde quer
que tenha acontecido, havia gente que não acabava mais, e o calor era
insuportável. Na época, em vez do leve toque no rosto, dom Jaime costu-
mava agraciar o crismando adulto com um sonoro tabefe, que obrigava os
vizinhos a tentar, muitas vezes inutilmente, conter o riso. Nessa ocasião,
ao se aproximar de um nordestino forte, o povo em volta se assanha. O
homem fecha a cara, incomodado por se perceber alvo da atenção geral.
Desferido o tapa, o recém-crismado saca uma peixeira e ameaça: “Ainda
não nasceu homem para me bater na cara”. O pessoal em volta fica gelado.
Ninguém imaginava reação de tal calibre. Intervém, assustada, a turma do
deixa-disso. Foi um custo convencer o homem de que o estranho rito fazia
parte da celebração litúrgica.

Valentia
Dom Jaime encontra-se com o prefeito Américo Dias Ferraz (1957-
1961) a caminho de reunião que o alcaide estava para fazer com os verea-
dores na Câmara Municipal. Com a confiança que tem no amigo, Américo
mostra-lhe dois revólveres: “Vou colocar em cima da mesa para discutir
com eles. Quero ver quem vai ter peito de me enfrentar”. O bispo pede
que lhe entregue as armas e vá de mãos limpas. Insiste, mas nada conse-
gue. O prefeito é osso duro de roer. Mineiro matuto e turrão, pouco lhe
importa agradar ou não as pessoas. Cultiva, por isso, inimizades ferozes.
Pioneiros recordam a surra de “guaiaca” que, numa barbearia, levou de
Aníbal Goulart Maia acompanhado de dois jagunços. Ou de “guasca”,
dada por desconhecidos, a mando de Aníbal, segundo outra versão. Por
vingança, uma turba ensandecida ateou fogo à casa do desafeto. Para de-
sespero da esposa, Dirce de Aguiar Maia, primeira professora de Maringá
e finíssima dama, móveis, documentos, roupas, livros, obras de valor, até
os presentes das crianças comprados para o Natal que se aproximava −
tudo foi consumido, num incalculável prejuízo à família. Episódios dessa
natureza deixavam angustiada a pobre mãe do bispo ao descobrir em que
mundo o filho agora vivia.

Visita
A paróquia de Paranavaí era administrada por frades carmelitas ale-
mães. Acostumados com dom Sigaud residindo na longínqua Jacarezinho,
gozavam de grande autonomia que a proximidade do bispo certamente
faria mudar. Por isso, a criação de bispado em Maringá não lhes trouxe
especial contentamento Desde a primeira visita a Paranavaí, dom Jaime
não se sentiu exatamente bem-vindo. Deixou registrado que, entre todas,
esta foi a paróquia que lhe causou maiores aborrecimentos, acrescentan-
do: “Os frades, com freqüência, conversam em alemão num desejo, quem
42

A Igreja que brotou da mata


sabe, de esconder ao bispo algum assunto ou comentário” (DIOCESE DE
MARINGÁ, 1957a, f. 68). Não era apenas impressão. Consta que após a
visita, frei Ulrico Goewert, com muita franqueza, teria comentado: “Xente
gôsta muito quando bispo vem. Gôsta mais quando bispo vai embôrra”.

Aniversário
Recém-chegado do Japão, padre Miguel Yoshimi Kimura morou, no
começo, em casa de dom Jaime. Sua primeira preocupação foi aprender
a difícil língua do novo país. Por algum tempo, também padre Francisco
Javier Peregrina López, mais tarde vigário de Nova Esperança, morou na
casa do bispo. Pândego, divertia-se ensinando palavras erradas ao pobre
Kimura. Num dos aniversários do bispo, foi-lhe preparada uma festinha no
auditório da Rádio Cultura. Além do salão amarelo do Grande Hotel, era
dos poucos ambientes disponíveis em Maringá para eventos sociais, artísti-
cos ou culturais. O apresentador foi professor José Hiran Salée, que ainda
tocou flauta e dirigiu um coralzinho de alunos seus. Ao piano, responsável
pela parte musical, maestro Aniceto Matti. Presentes os casais Tita-Alfredo
Maluf, Elvira-Durval dos Santos e outros. López pede ao apresentador
um espaço para Kimura, explicando que ele fará uma homenagem a dom
Jaime declamando uma quadrinha, decorada com dificuldade por causa da
língua. Com o respeitoso silêncio da platéia, o “orador” recita algo assim:
“Dom Jaime: Desejo para o senhor / As qualidades do bode: / Além do
forte fedor, / Cabelo, barba e bigode”.

43

Os 50 anos da Diocese de Maringá

Você também pode gostar