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6 Uma Igreja de presença

e sinal do Reino

Irmãs vicentinas: da assistência do Albergue Santa Luíza de Marillac à inclusão social do Núcleo Papa João XXIII.
Não sem razão o papa João XXIII, ao propor, em 1961, a necessária atualização do pensamento de
Leão XIII, qualificou a Igreja como mãe e mestra.1 Ainda que alguns, desconhecendo a história, insistam em
acusá-la de inimiga do progresso, manda a verdade que se lhe reconheça o mérito de promotora do conhe-
cimento num período de ignorância, além de salvadora da cultura do Ocidente no transe de seu de maior
perigo. Tivesse ela assumido outra postura frente às invasões bárbaras, e da cultura, arte, ciência e técnica
legadas pelos criadores do saber ocidental, quiçá não nos restasse mais que cinzas. Quando, nos séculos V e
VI, sobre a Europa central e mediterrânea irromperam hordas deixando atrás de si um rastro de fogo, sangue
e morte, o acervo da cultura clássica foi preservado não pelas armas dos palácios dos reis, mas pela diligência
das catedrais e dos mosteiros.
Num período carente de ensino, coube à Igreja democratizar o saber criando escolas para estudantes
pobres junto às cátedras episcopais. Mais tarde, à sua sombra igualmente nasceram as universidades (UNI-
VERSIDADE, 1967, p. 496), começando por Bolonha (1119), seguida por Paris, a mais célebre, fundada
em 1150 e regulamentada em 1215, Oxford (1168), Colônia, Pádua, onde lecionou Santo Antônio (1195-
1231), Salamanca (1220), Cambridge (1224), Lovaina (1245) e incontáveis outras. Observa Daniel-Rops
que esse esforço de salvaguarda intelectual “não tinha como fim a pesquisa do conhecimento”. Foi uma ação
desinteressada de homens da Igreja que, “trabalhando com o cérebro e com os músculos, não tiveram em vis-
ta a satisfação pessoal, mas a glória de Deus”, à qual, como todos os esforços humanos, subordinavam as ativi-
dades da inteligência: “a cultura estava submetida à religião”. Também na investigação teológica, filosófica ou
científica a Igreja cultiva como único escopo o bom desempenho de sua missão específica, que é evangelizar.

Não haveria conhecimentos escriturísticos nem bela liturgia sem o conhecimento do


latim; não haveria verdadeira fé sem um estudo sério dos livros sagrados e dos Padres.
Compreendendo isso, os papas, os bispos e os abades dos mosteiros empenharam-se
em salvaguardar a cultura numa sociedade que tinha por ela o mais completo desprezo.
Mais ainda: o que a Igreja compreendeu também foi que não podia defender a sua cau-
sa sem estar armada para os combates da inteligência [...] e bastou que alguns homens,

1 Mater et Magistra designa a encíclica sobre “a evolução da questão social à luz da doutrina cristã”. Data de 15 de maio de 1961, 70º
aniversário da Rerum Novarum, pioneira e base do pensamento social da Igreja.
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nos seus conventos, tivessem cultivado essa idéia, para que grandes autores pagãos
fossem salvos do naufrágio [...] Do século XI ao século XIV, salvo raríssimas exceções,
toda a cultura se manterá fundamentalmente religiosa: as pessoas dedicadas ao ensino
e às letras serão quase inteiramente da Igreja e procurar-se-á manter a orientação pro-
priamente cristã da atividade intelectual até o momento em que ela começar a querer
considerar-se autônoma e a pretender passar sem a fé (ROPS, 1993, p. 337-338).

“Mãe e mestra”, a Igreja de Cristo teve sempre muito a peito o desempenho de sua função educadora.
Não há uma crônica de trabalho missionário que não aponte, como atividade primeira em favor dos habitan-
tes locais a fundação de uma escola bem como o cultivo de hábitos de higiene, alimentação, abastecimento
de água, enfermagem, economia doméstica, agricultura, irrigação, adubação, criação de animais, seleção de
sementes, eletrificação, carpintaria, construção de casas e silos... Ao lado de agente da religião, o missionário
católico se fez invariavelmente reconhecer como promotor do progresso e da melhoria de vida da comunida-
de. O início da missão católica assinala invariavelmente a abertura de uma escola e de um ambulatório, antes
até que de uma capela. Traduzindo o Evangelho por “boa notícia” do amor de Deus endereçado a seus filhos,
a Igreja empenha-se em tornar visível a salvação, partindo das situações de vida em que eles se acham.
À semelhança dos antigos desbravadores que aqui vieram fincar seu rancho, também o primeiro bispo
não fechou os olhos aos clamores de uma região pioneira e inculta para cujo desenvolvimento urgia investir,
antes de tudo, na educação. Lembrado de que entre as funções do bispo figura também a de mestre da fé,
muito cedo se inquietou com a escassez de colaboradores para o aprimoramento do ensino escolar, reconheci-
damente precário: entendia que sem instrução não havia como assegurar aos diocesanos uma fé robusta capaz
de transformá-los em praticantes de uma religião esclarecida.

A obra da educação
Não precisou partir da estaca zero. Alguma presença da Igreja na área da educação já encontrou implan-
tada, embora de forma incipiente. Muito mais não se podia esperar de uma cidade ainda por completar dez
anos. No meio da mata em que brotava, não seria plausível esperar grande entusiasmo por estudo. Mais ur-
gente era trabalhar como um mouro para sobreviver. Das mesmas privações comungavam educadores, derru-
badores de mato e plantadores de café. Poucos estabelecimentos de ensino o bispo de Jacarezinho conseguiu
implantar. Além do pioneiro colégio Santa Cruz, em Maringá – a escola paroquial de Mandaguaçu era dirigida
pela mesma congregação religiosa – e de colégios católicos em Mandaguari e em Alto Paraná, funcionava
ainda, em prédio da Avenida Tiradentes, esquina com Rua Pedro Álvares Cabral, em Maringá, sob direção de
padre Cleto Altoé, um ginásio diocesano e uma escola técnica de comércio. Na 10ª reunião ordinária do seu
conselho diocesano, realizada em 26 de janeiro de 1955, dom Sigaud comunicou aos conselheiros a intenção
de adquirir o ginásio de Maringá. A ata registra: “S. Excia. viu-se obrigado a adquirir o Ginásio de Maringá
para a Diocese, a fim de que não caísse em mãos de protestantes.” (DIOCESE DE JACARÉZINHO, 1948,
f. 9). O prédio tinha sido inaugurado em 13 de maio de 1952, com autorização para funcionar concedida
pela portaria estadual nº 852, de 27 de setembro do mesmo ano. Contava com 197 alunos e permaneceu sob
direção de Anthero Chaves Santos desde a abertura até 15 de agosto de 1954, quando foi vendido à Mitra
Diocesana de Jacarezinho (REIS, 2004, p. 69). Esclarece o professor Geraldo Altoé – à época, já residente
em Maringá e, apesar do sobrenome, sem parentesco com padre Cleto –, que Zaqueu de Mello, proprietário
de colégio em Londrina, pretendia comprá-lo para fazer dele extensão de sua atividade educacional de cunho
marcadamente evangélico. “Protestante”, em meados do século passado, carregava para a grei católica um
travo de desconfiança, hoje felizmente superado, que correspondia a sentimento igual da outra parte. Para
diretor do agora ginásio diocesano, a escolha recaiu com naturalidade sobre o capixaba Altoé, de vez que fora
admitido na diocese como ex-salesiano, portanto egresso de um instituto religioso voltado à educação. Além
do encargo, prestava auxílio ao vigário da Santíssima Trindade, a paróquia do centro da cidade. Foi ainda ad-
quirido o direito de funcionamento, no mesmo prédio, da escola técnica de comércio. Conforme informação
de dom Armando Cirio, já naquela época havia intenção por parte do bispo de Jacarezinho de entregar aos
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irmãos maristas o ginásio adquirido pela diocese. Nove meses após sua chegada, em dezembro de 1957, dom
Jaime, ex-aluno marista, conseguiu trazer os religiosos da congregação fundada por Marcelino Champagnat,
cujo nome identifica a rua do atual Colégio Marista.2 Levado pela ânsia de oferecer a crianças, adolescentes,
jovens e adultos uma formação cristã, o bispo jamais demonstrou cansaço no cuidado de dotar a diocese de
mais e mais irmãs para cuidar do ensino e, mais que isso, da educação em sentido pleno.
A missão de educadora da infância e da juventude, sobretudo a partir da Idade Moderna, cumpriu-a a
Igreja, de forma privilegiada, através de institutos religiosos nascidos da visão de mulheres e homens de Deus
atentos às necessidades das novas gerações. Compreende-se, por essa razão, que o trabalho desenvolvido por
educadores católicos concentre-se, em larga escala, nas mãos de religiosos e de religiosas.
Em Maringá não foi diferente. Cônscios da responsabilidade de mestres da fé, tanto dom Sigaud, ao
tempo da pertença a Jacarezinho, quanto dom Jaime, atuando em Maringá desde março de 1957, nenhum
dos dois deixou escapar oportunidade de para cá trazer quantos educadores pudesse conseguir.
Dom de Deus à multiforme vitalidade de sua Igreja, a consagração religiosa não se restringe, porém, à
educação. Religiosas e religiosos, na gama de sinais da atuação do Espírito, de muitos modos testemunham
o Reino anunciado pelo Senhor. Manifestam, na simplicidade de vida e na entrega aos valores eternos, a
transitoriedade do tempo presente. A partir da instalação da nova diocese, também nesta parte do Paraná,
distintos carismas da vida consagrada mostraram-se bem-vindos. Cronologicamente, a Igreja de Maringá os
foi recebendo conforme segue:
Em 1957: primeiros passos que levaram, mais tarde, à criação do Colégio Santo Inácio. A CMNP doara
à paróquia um terreno para construção de uma escola paroquial. Os padres da paróquia São José pediram
à Alemanha que enviasse, para organizar a escola, uma irmã da mesma congregação das que aqui se encon-
travam. Cinco missionárias do Santo Nome de Maria, as primeiras a enfrentar uma Maringá menina, tinham
chegado em 1956, com a missão de cuidar de pobres sertanejos doentes na precaríssima casa de saúde aberta
pelos irmãos instalados em Maringá no ano de 1953. As heróicas alemãs, todas jovens e todas Marias, confor-
me o costume do seu instituto religioso, eram: Maria Conradine, cujo nome civil era Agnes Huning (†1983);
Maria Conrada, ou Anna Gebina Janssen (†2000); Maria Antonella, nascida Maria Christine Spreckelmeyer
(†2005); Maria Sturmia, nome religioso de Anna Eleonor Hohmann (†2006); Maria Callista (Maria Paula Im
Moore), e Maria Dietlinde (Maria Adelheid Ginten). Nenhuma retornou à pátria de origem. A brasileiros que
jamais tinham antes conhecido ofereceram não apenas seu trabalho; deram mais: a juventude, o entusiasmo,
a saúde, o amor, numa palavra, a vida.
Com a promessa de uma irmã para a escola, o vigário, padre Osvaldo Rambo, SJ, já no dia 1º de março,
animou-se a abri-la, tornando-se o diretor. Para organizá-la contou com a colaboração da professora Alfia Pul-
zato. Em 10 de agosto chegou irmã Maria Jutta (Anna Berta Agnes Kuntny) que, no início de 1958, assumiu
a direção interna cabendo a irmã Maria Sturmia dirigir o Jardim da Infância. Mas seus estudos, cumpridos na
Alemanha, levaram tempo para o reconhecimento do MEC. Rambo (1957-1960) e o sucessor, padre Fran-
cisco Boesing, responderam oficialmente pela escola enquanto o trabalho educacional era responsabilidade
das irmãs, que foram crescendo em número e atendendo às exigências da legislação brasileira. Em 12 de de-
zembro de 1960, contrato celebrado com a diocese de Maringá transferiu a Escola Santo Inácio à propriedade
das religiosas. De escola passou a ginásio, depois a escola normal colegial, para finalmente tornar-se Colégio
Santo Inácio, responsável por inscrever o nome de irmã Jutta na galeria das maiores educadoras que Maringá
se orgulha de ter conhecido em todos os tempos.
As cinco irmãs que, muito dispostas e ansiosas, naquele 12 de junho de 1956, pisaram pela primeira vez
o solo vermelho de uma cidade nascente, passado meio século, multiplicaram-se às dezenas. Encontramo-las
sempre mais comprometidas com o carisma missionário que as impulsiona para regiões mais necessitadas e

2 A Rua Pedro Álvares Cabral, pela lei municipal nº 207/62, de 23 de abril de 1962, teve o nome alterado para Padre Marcelino
Champagnat. Depois da canonização de Champagnat, através da lei nº 4820/99, de 25 de junho de 1999, a denominação oficial
passou a São Marcelino Champagnat, embora as placas registrem apenas Rua Marcelino Champagnat.
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Missionárias do Santo Nome de Maria – as primeiras irmãs chegadas em Cinqüentenário das Irmãs do Santo Nome de Maria, em 2006 – irmãs
1956. A partir da esquerda: irmãs Conrada, Conradine, Antonella, padre Adelinde, Juta, Edita, Petronela e Dietlinde (irmã Maria), a única de 1956
Amândio Fritzen, SJ, irmãs Calista, Dietlinde e Sturmia. ainda em atividade, na residência de dom Jaime.

distantes. Na diocese, além do Colégio Santo Inácio, espalham seu serviço por sete comunidades:
- Casa Provincial Maria Missionária – sede do governo provincial, que coordena a vida de todas as casas
da congregação no Brasil e no Paraguai;
- Centro de Espiritualidade Rainha da Paz, ambiente perfeito para retiros espirituais de toda a região;
- Noviciado Rainha da Paz, onde as noviças da congregação cumprem o tempo de formação preparan-
do-se para a consagração religiosa;
- Lar Rainha da Paz, para as irmãs idosas, que são cuidadas com carinho recebendo atendimento em
todas as necessidades;
- Creche Menino Jesus, fundada em 1970, reconhecida de utilidade pública federal, a primeira a fun-
cionar em Maringá, construída com ajuda de Brescia, a italiana cidade-irmã de Maringá;
- Comunidade Mãe da Esperança, casa de encontros e
- Comunidade Nossa Senhora das Graças, no município de Sarandi onde, depois de colaborarem na
pastoral paroquial desde 1957, a partir de 1989 vêm cuidando de crianças carentes.

Nas fileiras da congregação do Santo Nome de Maria mais de uma vez a Igreja de Maringá foi buscar
irmãs para pesados encargos em áreas como catequese, Seminário Arquidiocesano, espiritualidade, formação
de agentes, vida paroquial etc. Dentre aquelas que, desde o ano de 1971, se estabeleceram ou se formaram
em Maringá, muitas vêm sendo encaminhadas a novos serviços em Ubiratã, Campina da Lagoa e Sarandi, no
Paraná, além de Mato Grosso, Amazonas, Tocantins e Paraguai.
Ainda em 1957: por carta, dom Jaime iniciou entendimentos com o médico Álvaro Barcellos Sant’Ana,
residente no Rio de Janeiro, para aquisição de uma área de sua propriedade, em Maringá, que compreendia
toda a quadra delimitada pelas avenidas Curitiba e Rio Branco, Rua Luiz Gama e Praça Manuel Ribas. O
terreno continha antigo hospital de madeira desativado. Era intenção do bispo abrir, de frente para a Praça
Manuel Ribas, um espaço destinado à adoração perpétua do Santíssimo Sacramento. Convidou a Congrega-
ção das Irmãs Missionárias de Jesus Crucificado, nas quais pensava, já antes da posse, para ali, num primeiro
momento, abrirem um pensionato. A congregação, fundada em 1928, pelo bispo de Campinas, dom Fran-
cisco de Campos Barreto (1920-1941), expandiu-se rapidamente, alcançando até o Rio Grande do Sul onde
fundou nova província. No ano de 1952 eram já 1012 irmãs estabelecidas em 59 casas por todo o Brasil. Em
resposta ao bispo, datada de 1º de julho de 1957, a madre geral, com sede em Campinas, prometeu enviar
irmãs no final do mês seguinte; o prédio foi então alugado pela diocese e, aos 15 de agosto daquele ano, foi
fundada a Casa Nossa Senhora da Glória. As primeiras cinco religiosas chegaram no dia 27 e no dia 30 desse
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mês, ocorrendo a instalação da casa no dia 2 de setembro. Com menos de dois meses, no dia 29 de outubro,
foi fundada a Obra dos Tabernáculos, entregue à direção das religiosas, que receberam a colaboração de se-
nhoras da sociedade local. No início de 1959 as irmãs abriram o Jardim São José, jardim da infância, além de
uma escola de curso primário para meninas, impossibilitadas de estudar no Colégio Marista, que só admitia
estudantes do sexo masculino. Nesse ano a congregação adquiriu o imóvel através de empréstimo bancário
conseguido e avalizado pelo bispo, que se mostrou feliz, conforme confessou, em “abençoar o Jardim São
José que, ao lado do Ginásio Santa Cruz e do Ginásio Marista, irá orientar sadiamente as crianças na verda-
deira formação para a vida”. Com o tempo, além do pensionato, as irmãs diversificaram os cursos ministrados
para aprimoramento da juventude feminina, além da Obra do Berço, fundada por dom Jaime, que teve ali,
por décadas, sua sede. O humilde jardim da infância converteu-se no Colégio Nossa Senhora da Glória, a
meio caminho entre os colégios Santa Cruz e Marista. Mais tarde, foi construída ampla residência de alve-
naria para as irmãs, com recursos aportados por católicos italianos através da fraternidade Maringá-Brescia.
No final dos anos 80, incapaz de prover de novas religiosas a casa de Maringá, a direção provincial, sediada
no Rio Grande do Sul, resolver abrir mão da propriedade. Vendeu a parte da área confrontante com a Rua
Luiz Gama. Desfez-se, por fim, do restante do imóvel, inclusive da antiga casa das irmãs, que foi convertida
em restaurante. Diversamente do que imaginou o primeiro bispo, a face da quadra aberta à praça, em vez de
capela de adoração perpétua, passou a ostentar uma casa noturna. No início de seu governo arquidiocesano
(1997-2002), dom Murilo tomou conhecimento do desagrado de dom Jaime com a alienação levada a efeito
pelas irmãs, particularmente da residência para cuja construção ele conseguira na Itália o numerário investido.
Propôs então Krieger que a congregação ressarcisse a arquidiocese da importância aí utilizada. Através de
carta, consultou Giuseppe Inselvini, coordenador italiano do “gemellagio”, sobre a possibilidade de empregar
o valor oferecido por Brescia – R$ 36.000,00 (trinta e seis mil reais) calculados, que o governo provincial
da congregação concordou em devolver – na reforma da antiga ADAR, cuja adaptação estava em curso para
abrigar o CEPA – Centro de Pastoral da Arquidiocese, providência que todos vinham, há tempo, reclamando.
Às Missionárias de Jesus Crucificado foi facultado parcelar o débito. As obras do CEPA tiveram início em
1999, com grande empenho do coordenador de pastoral, padre Luiz Antônio Bento, vindo a ocorrer sua
inauguração no dia 21 de setembro de 2002.
Em 1958: incomodado pela ignorância religiosa do rebanho, com capital reunido por alguns congre-
gados marianos, dom Jaime inaugurou, no dia 29 de junho de 1958, uma livraria católica em Maringá. Aos
responsáveis, contudo, faltava experiência no ramo. Por isso, o bispo solicitou à Pia Sociedade Filhas de São
Paulo, sediada na capital paulista, que abrisse casa em Maringá. Com menos de cinco meses, em 4 de novem-
bro, as primeiras paulinas assumiram a livraria católica. A diocese recebeu, dessa forma, novo impulso para o
crescimento na fé através dos meios de comunicação da época. As irmãs passaram a acompanhar o bispo nas
visitas pastorais, deslocando-se até os rincões do fim de mundo que eram as barrancas do rio Paraná. Ajuda-
vam-no na preparação das crismas e na celebração eucarística, divulgavam a Palavra de Deus, ofereciam livros
de catequese e de piedade, revistas e folhetos de formação cristã. A elas se devem incontáveis semanas bíblicas,
semanas da imprensa e vocacionais; assessoria a grupos de reflexão; estudos sobre catequese, liturgia e Sagrada
Escritura; aprofundamento de temas de vida pastoral, de comunicação social etc. A Livraria São Paulo tornou-
se referencial na divulgação de grandes eventos da Igreja Católica destinados ao grande público.
Em 1959: teve início o Colégio Nossa Senhora da Esperança, em Nova Esperança, sob responsabilidade
das Apóstolas do Sagrado Coração de Jesus. As mesmas irmãs, no governo de dom Murilo, assumiram obra
assistencial em Floresta, cidade vizinha de Maringá. Também é de 1959 a fundação do Colégio Nossa Senho-
ra Aparecida, em Paraíso do Norte, dirigido pelas Filhas da Caridade de São Vicente de Paulo, que chegaram
à cidade de Maringá em 1960 para dirigir o albergue assumido pela diocese. Ainda no ano de 1960 aconteceu
a abertura do Colégio São Vicente de Paulo, em Paranavaí, dirigido pelas mesmas irmãs. Um grupo delas, du-
rante alguns meses, prestou serviço no Hospital Santa Rita, que então abria as portas em Maringá. Por inicia-
tiva de senhoras do chamado Clube da Amizade, em 1963 começou a funcionar em Maringá uma instituição
para meninos carentes, chamada Lar Escola da Criança. Nesse mesmo ano as irmãs vicentinas aceitaram cuidar
da instituição. Tempos depois, foram substituídas por outras religiosas, as Damas da Instrução Cristã. Estas,
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por sua vez, transferiram a direção às Missionárias do Santo Nome
de Maria, que cuidaram da obra provisoriamente até ela ser confiada
às irmãs Murialdinas de São José. Desde quando foi inaugurado, em
9 de novembro de 1972, o Núcleo Social Papa João XXIII, situado
na Vila Vardelina, em Maringá, vem sendo dirigido pelas Filhas da
Caridade, as conhecidas irmãs vicentinas.
Em 1960: abriu-se o Colégio São Francisco de Assis, em Man-
daguaçu, assumido pelas Damas da Instrução Cristã, após retorno a
Maringá das irmãs carmelitas de Vedruna, que cuidavam da escola
paroquial. As novas religiosas provinham de Recife, onde se situa a
Bênção da primeira Livraria São Paulo, das Paulinas,
em 17 dezembro 1958.
sede da congregação no Brasil. Em Santa Isabel do Ivaí, no ano de
1961, assumiram o Colégio Sagrado Coração de Jesus. Sete anos
depois de sua chegada ao Paraná, abriram casa em Maringá, inician-
do, em setembro de 1967, a construção do Colégio Regina Mundi,
que em 1984 se tornou sede da Província do Sul da congregação,
agora com duas províncias brasileiras. O ano de 1992 marcou o
início de construção da Casa de Formação Cenáculo e do Centro de
Evangelização Santa Inês, na Estrada Bom Sucesso, bairro Cidade
Alta 2, onde se desenvolvem atividades de formação e espiritualida-
de. Também em 1960, mais precisamente no dia 15 de fevereiro,
dom Jaime requereu à Secretaria de Estado da Educação e Cultura a
nomeação para diretor da Escola Mista São José, instituição privada
de ensino, direcionada preferencialmente aos filhos e netos de japo-
neses, mantida pela SOCEMA – Sociedade Cultural e Esportiva de
Maringá, precursora da associação ACEMA – Associação Cultural e
Esportiva de Maringá de hoje. Conforme o antigo secretário Issao
Hiratomi, os dirigentes escolheram o bispo em razão da sua amiza-
de com a Colônia Japonesa, além de que seu nome conferia inegável
prestígio à escola. Por mais de dez anos ele se manteve no cargo de
diretor. A Escola Mista São José funcionava no nº 143 da Rua Eva-
risto da Veiga, tendo mais tarde aberto filial na Zona 4, localizada
no prédio de nº 338 da Rua Joaquim Nabuco.
Em 1961: abertura do Grupo Escolar Ipiranga, na Zona 7,
em Maringá, confiado às Missionárias de Santo Antônio Maria Cla-
ret, precursor do atual Colégio Estadual Ipiranga. Por mais de dez
meses, de 6 de setembro de 1964 a 11 de julho de 1965, para
as celebrações litúrgicas, os fiéis da paróquia Santa Maria Goretti
acorriam ao colégio, enquanto se construía o salão onde funcionou
a primeira igreja matriz. As mesmas irmãs claretianas, desde 1959,
vinham cuidando da residência episcopal, de onde se afastaram em
1968. Ofereceram também valiosa colaboração, desde 1962 até
1969, ao funcionamento do Seminário Diocesano Nossa Senhora
da Glória no qual trabalharam sem descanso.
Em 1962: lançamento, no dia 2 de setembro, da pedra funda-
mental do Colégio São Francisco Xavier, junto à Missão Nipo-bra-
sileira. Quase quatro anos mais tarde, no dia 29 de janeiro de 1966,
Visita pastoral às comunidades das ilhas do rio o colégio abriu suas portas como Externato São Francisco Xavier,
Paraná, na divisa com Mato Grosso (hoje, Mato Grosso
do Sul). As irmãs sempre acompanhavam o bispo nas sob direção das Irmãzinhas da Imaculada Conceição, originárias da
visitas pastorais. Província São José da congregação, sediada na época em Sorocaba.
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Tendo-se reduzido o número de irmãs, em 1979 o imóvel foi devolvido à diocese de Maringá, que o confiou
à direção da professora Eiko Suguimoto Iwata. Apesar das dificuldades de pessoal, atendendo pedido do
Centro Cultural e Social São Francisco Xavier, para encargos pastorais na catequese, liturgia, formação de
lideranças e no atendimento da secretaria paroquial, a congregação destinou irmãs que formaram a chamada
“Comunidade Rainha dos Apóstolos”, acomodada em residência adquirida não longe da sede paroquial.
No governo de dom Murilo Krieger, em 16 de dezembro de 1997, o colégio passou à responsabilidade da
paróquia Menino Jesus de Praga e São Francisco Xavier, tendo como diretor o pároco, padre Sidney Fabril.
Decisiva para transformação da antiga escola de madeira no moderno edifício de hoje foi a ajuda de católicos
japoneses, levantada pelos heróicos missionários monsenhores Miguel Yoshimi Kimura e Pedro Ryo Tanaka,
de saudosa memória. A partir de 1º de janeiro de 2002, o colégio recebeu a professora Eliza Mitie Shiozaki
como diretora.
Em 1963: o Rotary Clube de Maringá solicitou religiosas para dirigir o Lar dos Velhinhos cujo primei-
ro pavilhão acabara de construir. Dom Jaime recorreu às mesmas Irmãzinhas da Imaculada Conceição, que
enviaram as primeiras irmãs. Também no ano de 1963 teve início, em Jandaia do Sul, o Colégio São José, das
Passionistas de São Paulo da Cruz.
Em 1964: começou a funcionar o Colégio Santa Edwiges, em Loanda, dirigido pelas religiosas Filhas
de Nossa Senhora do Monte Calvário. No mesmo ano houve a abertura do Colégio Santa Inês, em Nova
Londrina, pelo qual se responsabilizaram as Franciscanas da Imaculada Conceição de Maria, de Bonlanden,
congregação já presente em Alto Paraná.
Em 1965: foi dado início ao Colégio Anjos Custódios, em Marialva, das irmãs da Congregação dos
Santos Anjos Custódios, ainda em modesta escola paroquial. Liderada pela batalhadora irmã Margarita Sastre,
a comunidade de Marialva se uniu para levantar o colégio atual. No final dos anos 80, na Vila Brasil, por es-
forço de uma religiosa da comunidade, foi fundado um centro social para crianças e adolescentes. É ainda do
ano de 1965 o Colégio Santa Cruz, na cidade de Santa Cruz do Monte Castelo, sob direção das Dominicanas
da Beata Imelda.
Em 1966: criado o Colégio Santa Maria, em São Jorge do Ivaí, a cargo das religiosas do Instituto da
Beatíssima Virgem Maria. Infelizmente, o reduzido número de alunos inviabilizou o empreendimento. Para
fugir ao pagamento de mensalidades, os pais preferiam colocar os filhos na escola pública. Assim, o colégio das
irmãs teve curta duração, fechando as portas pouco depois de inaugurado. No mesmo ano começou a funcio-
nar o Colégio Nossa Senhora do Carmo, em Graciosa, confiado à direção das religiosas Carmelitas Missionárias
de Santa Teresa do Menino Jesus, mesma congregação que no ano seguinte assumiu em Paranavaí o Colégio
Nossa Senhora Aparecida. Também é deste ano a vinda para Maringá das religiosas de São Carlos de Lyon,
das quais irmãs Josette Barthélemy, Jeanne Gaudin, Teresa Rocha e Sônia Poubel foram as primeiras, tendo
chegado no dia 19 de março de 1966 para assumir a ADAR – Associação Diocesana de Assistência Rural. Além
da direção da casa destinada a treinamento de agricultores, desenvolviam um leque de ações como catequese,
alfabetização de adultos, cursos de corte e costura, tecelagem, pintura etc. A partir de 1980, deixando o prédio
da ADAR para uso da paróquia Santo Antônio de Pádua, as irmãs assumiram a direção da Cúria Metropolita-
na exercendo ainda em bairros eficiente trabalho nos campos da catequese, formação de grupos de reflexão,
atendimento a doentes etc. A congregação abriu seu noviciado em Maringá, no dia 13 de junho de 1978. Em
1999, inaugurou o Centro de Educação Infantil Carlos Démia, no bairro Borba Gato, que iniciou as aulas em
7 de fevereiro de 2000. Carlos Démia é o nome do sacerdote francês fundador da congregação.
Com a criação, em 20 de janeiro de 1968, da diocese de Paranavaí, deixaram de pertencer à diocese de
Maringá as paróquias de Alto Paraná, Graciosa, Loanda, Nova Londrina, Paraíso do Norte, Paranavaí, Santa
Cruz do Monte Castelo e Santa Isabel do Ivaí.
Em 1973: as Murialdinas de São José chegaram a Maringá no dia 14 de março. A pedido de dom Jaime,
em janeiro desse ano, o cura da catedral, monsenhor Sidney Luiz Zanettini, esteve, juntamente com dom
Benedito Zorzi, na sede provincial da congregação, situada em Fazenda Souza, distrito de Caxias do Sul, para
convidá-las a assumir o Lar Escola da Criança. As murialdinas receberam a instituição da qual provisoriamente

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cuidavam as Missionárias do Santo Nome de Maria. Além desse inestimável serviço, religiosas do mesmo
instituto cuidam ainda da paróquia de Nossa Senhora Mãe de Deus, em Presidente Castelo Branco. O aten-
dimento sacramental é prestado pelo pároco da vizinha paróquia de Atalaia, mas o restante trabalho pastoral,
com excelente resultado, repousa nos ombros das religiosas.
A entrega de uma paróquia aos cuidados pastorais de religiosas, prática comum em outras regiões do
Brasil desde a iniciativa pioneira de Nísia Floresta (RN) no final dos anos 60, verificou-se na arquidiocese de
Maringá, pela primeira vez, na comunidade de Inajá. No dia 7 de junho de 1981, dois anos após a saída do
último padre, a paróquia recebeu as encarregadas paroquiais, quatro religiosas da Ordem da Companhia de
Maria Nossa Senhora, conhecidas como irmãs da Companhia de Maria. Meses depois, no dia 3 de novembro
do mesmo ano, faleceu irmã Iracema Osório. As três restantes, irmãs Genny Ferrari, Aparecida da Silva e Le-
onilda Romano da Silva, com ajuda ocasional de irmã Isabel Garez Caballero, continuaram até 2 de abril de
1990, quando deixaram a comunidade, para tristeza dos fiéis que delas ainda hoje sentem saudades. Sucede-
ram-nas as irmãs da Congregação de São João Batista, que assumiram a paróquia no dia 29 de junho de 1990,
respondendo por sua vida pastoral até o dia 9 de fevereiro de 1992, quando então se transferiram à paróquia
Bom Pastor, em Mandaguari, como auxiliares no trabalho pastoral. Aí abriram um centro para “evangelizar,
educar e promover”, conforme o carisma da congregação.
Em 1998: já no governo de dom Murilo, na primeira quinzena de dezembro, veio estabelecer-se em
Maringá a congregação da Pia União das Irmãs da Copiosa Redenção Mãe da Divina Graça para um trabalho
de recuperação de jovens do sexo feminino vítimas de drogas, além de ajuda a moças solteiras grávidas não
aceitas pela família.
Em 2001: tomaram posse, no dia 11 de fevereiro, para trabalho pastoral na paróquia Cristo Bom Pastor,
em Paiçandu, as irmãs diocesanas de Cristo Pastor. Duas semanas após, no dia 25, repetiu-se o fato na capela
Santa Terezinha da Vila Guadiana, na paróquia e município de Mandaguaçu, agora com a posse de religiosas
da Congregação das Irmãs Filhas de Sant’Ana, que se entregaram a atividade pastoral semelhante. As mesmas
irmãs Filhas de Sant’Ana iniciaram, no dia 18 de agosto de 2006, um trabalho de ajuda pastoral na paróquia
de Ivatuba. O atendimento sacramental é prestado pelo pároco de Doutor Camargo e Ivatuba, a cuja respon-
sabilidade estão confiadas ambas as paróquias.
Maringá abriga ainda centros de formação que se inserem na vasta missão educadora da Igreja. Tanto
para o presbitério diocesano como para a vida consagrada, segundo o carisma de cada instituto religioso,
foram criadas instituições que atestam o cuidado da Igreja na formação de agentes especiais da evangelização,
sejam ministros ordenados ou não. Neste rol apontam-se:
- o Noviciado São Luiz Gonzaga, dos irmãos da Misericórdia de Maria Auxiliadora, instalado em Ma-
ringá no dia 31 de julho de 1957, conforme decreto de 27 de maio de 1957, protocolo nº 3845/57,
da Sagrada Congregação dos Religiosos. Por determinação do Conselho Geral da Congregação,
no ano de 1959 erigiu-se também o noviciado de Porto Alegre. Em 1962, ambos foram reunidos
na capital gaúcha em noviciado único, fechando-se o de Maringá. No ano de 1972, foi o mesmo
transferido de Porto Alegre para Maringá, onde permaneceu até 2004. Nesse ano, os superiores
decidiram deslocá-lo para a Alemanha, onde presentemente se encontra;
- o Seminário Menor Imaculada Conceição, da Ordem dos frades da Bem-aventurada Virgem Maria
do Monte Carmelo (padres carmelitas), fundado em 1959, na cidade de Graciosa, vizinha de Para-
navaí;
- o Noviciado Rainha da Paz, das Irmãs Missionárias do Santo Nome de Maria, em Maringá. No dia
25 de março de 1958 foram admitidas as primeiras postulantes, mas só a 17 de outubro de 1959 seria
iniciada, junto à igreja São José, a casa para as noviças. O prédio do noviciado, na chácara adquirida
pela congregação, foi começado em 1963 e aberto no dia 22 de maio de 1964. Trinta anos depois,
o noviciado transferiu-se para novo prédio na mesma chácara, mudando-se, no dia 31 de dezembro
de 2006, para o Jardim São Silvestre, na Rua Pioneiro Domingos Danhoni, 938;
- o Noviciado Nossa Senhora Aparecida, das Carmelitas da Caridade de Vedruna, aberto no ano de

182

A Igreja que brotou da mata


1961, em Maringá e transferido, em agosto de 1971, para Campinas;
- o extensamente relatado Seminário Menor Diocesano Nossa Senhora da Glória, de Maringá, inicia-
do em 1962; 3
- o Noviciado São Carlos, das irmãs de São Carlos de Lyon, no Recanto Pascal, situado às margens
da rodovia, na saída de Maringá para Campo Mourão, que teve início a 13 de junho de 1978, e, por
último,
- o Seminário Santo Agostinho, da Ordem dos Agostinianos Recoletos, para seus postulantes na etapa
de Filosofia, iniciado com a chegada à Maringá, em 27 de janeiro de 2002, do primeiro formador.

Em Mandaguari, liderada pela paróquia Nossa Senhora Aparecida, além da Escola Primária São Tarcísio
(1961), foram criados: Escola Paroquial São Vicente Pallotti, em 1963; Ginásio e Colégio Industrial e Agríco-
la Rainha dos Apóstolos, em 1968, e Centro de Treinamento Profissional, que iniciou em 1971, todas obras
com a marca do dinamismo de padre Max Kaufmann, SAC. Não obstante sua personalidade forte que lhe
dificultava, às vezes, ajustar-se às normas da Igreja diocesana, padre Max exerceu em Mandaguari um trabalho
religioso-educativo de extraordinário alcance.
Dos atuais colégios a parcela maior partiu de começo bastante humilde, quase sempre em construções
de madeira que, no decorrer dos anos, foram-se fortalecendo com a generosa colaboração dos fiéis das comu-
nidades atendidas. As congregações religiosas voltadas à educação direcionaram seu trabalho, nos primeiros
tempos, preferencialmente à infância e à adolescência femininas. É compreensível, considerando o ambiente
árduo da lavoura e o ensino deficiente das escolas públicas dos primeiros tempos. Muitas vezes o “colégio”
das irmãs não ia além de despojadas salas de madeira onde valentes educadoras ministravam as primeiras
letras, complementando o conteúdo escolar com noções básicas para a formação individual, familiar e social
da mulher.
Manda a verdade que se afirme, também na área da educação, o pioneirismo de dom Jaime. A ele se
deve a instalação de todos os estabelecimentos católicos de ensino durante os quarenta anos de seu governo
diocesano. Mais ainda: um recuo às origens leva a descobri-lo na implantação da maior universidade da região,
a Universidade Estadual de Maringá, bem assim da Pontifícia Universidade Católica do Paraná aqui.
A PUC-PR estabeleceu sua presença em Maringá no ano de 2004, quando ofereceu à comunidade os
dois primeiros cursos de Nutrição e Enfermagem, iniciando as aulas no dia 14 de fevereiro. Fruto de longos
entendimentos mantidos entre a Província Eclesiástica de Maringá e a direção da PUC-PR, em 2006 foi aber-
to o curso de Filosofia. Cumpridas as formalidades da legislação, veio a público, depois de ansiosa espera das
dioceses interessadas, a autorização para o curso de Filosofia:

GABINETE DO MINISTRO

Portaria Nº 810, de 28 de março de 2006

O Ministro de Estado da Educação etc. resolve:


Art. 1º Autorizar o funcionamento do curso de Filosofia, licenciatura, a ser ministrado
no campus fora da sede localizado na cidade de Maringá, no Estado do Paraná, pela
Pontifícia Universidade Católica do Paraná, mantida pela Associação Paranaense de
Cultura – APC, ambas com sede na cidade de Curitiba, no Estado do Paraná.
Art. 2º Esta Portaria entra em vigor na data de sua publicação.
FERNANDO HADDAD (BRASIL, 2006, p. 15).

Nos dias 4 e 5 de fevereiro, ainda no aguardo da autorização ministerial, realizaram-se as provas do

3 Não religioso, evidentemente, mas aqui incluído como integrante das iniciativas da Igreja voltadas à educação em Maringá. Nos
vários seminários diocesanos espalhados por todo o Brasil, não poucos cidadãos encontraram o primeiro impulso para alavancar a
escalada do saber e da solidez de princípios, rumo à sua realização profissional e cidadã.
183

Os 50 anos da Diocese de Maringá


concurso vestibular para ingresso na PUC-PR. Publicada a portaria na quarta-feira, dia 28, da última semana
de março, o início oficial do curso de Filosofia aconteceu no dia 3 de abril de 2006. Ainda de forma tempo-
rária, a PUC-PR câmpus de Maringá estabeleceu-se no Colégio Marista, mais precisamente no novo anexo
erguido na Avenida Tiradentes, nº 963. As instalações definitivas ocuparão área própria, já adquirida, de 26
alqueires, ou 62,92ha, no final das Avenidas Guaiapó e Tuiuti. Com essa prova de confiança na potencialidade
da região onde foi ansiosamente aguardada, a PUC-PR escreve mais um capítulo da sua história, que dignifica
a lembrança de dom Manuel da Silveira D’Elboux.
Desde sua chegada ao Paraná, ele já alimentava o sonho da Universidade Católica de Curitiba (FEDAL-
TO, 1956, f. 347). Quando, enfim, se ofereceram condições, a 14 de março de 1959, criou não a univer-
sidade da capital, mas a Universidade Católica do Paraná: fez questão de inscrever como seu beneficiário o
Estado inteiro, assim como associar à sua fundação todo o episcopado paranaense. Com a grandeza de alma
que o caracterizava, repartiu os méritos da criação com dom Jerônimo Mazzarotto e dom Inácio Krause,
seus bispos auxiliares; dom Antônio Mazzarotto, bispo de Ponta Grossa; dom Geraldo Sigaud, bispo de Ja-
carezinho; dom Manoel Koenner, bispo-prelado de Foz do Iguaçu; dom Carlos Eduardo de Sabóia Bandeira
de Mello, bispo-prelado de Palmas; dom Geraldo Fernandes, bispo de Londrina, e dom Jaime Luiz Coelho,
bispo de Maringá. Pelo decreto nº 48.232, de 17 de maio de 1960, a universidade recebeu reconhecimento
do Governo Federal. Em 1973 passou ao comando da Província Marista do Brasil Centro-Sul, do Instituto
dos Irmãos Maristas das Escolas. Mercê dos serviços prestados à sociedade e à Igreja, em 8 de novembro de
1985 foi elevada pela Santa Sé à condição de “pontifícia”, passando a se inserir no rol das mais prestigiadas
universidades católicas do Brasil.
Voltando no tempo, vale recordar que em seus planos de colonização, a CMNP mostrou interesse tam-
bém pela educação dos filhos dos pioneiros que vinham comprar as terras postas à venda. Lembra o primeiro
bispo de Maringá que a Companhia reservou

amplas áreas na cidade de Maringá para os diversos Estabelecimentos de Ensino. Na


Zona 2, a 09 de setembro de 1951, lançava a pedra fundamental do “Colégio Marin-
gá”, sendo o mesmo inaugurado oficialmente a 10 de maio de 1952, 5º aniversário
da cidade, sendo 1º Diretor o Professor Anthero Alfredo Chaves Santos. No dia 24
de agosto de 1954 a Mitra Diocesana de Jacarezinho assume a Direção do Colégio na
pessoa do Padre Cleto Altoé. Instalada a Diocese de Maringá em 1957, Dom Jaime
conseguiu a colaboração dos Irmãos Maristas para a Direção do Colégio, que o assu-
miram a 09 de dezembro de 1957, contando com os esforços do Irmão Vitor Floriano.
A 10 de janeiro de 1958 chegam os primeiros Irmãos Maristas: Irmão Estevão José,
Diretor e Irmãos Marcos e Zenon (COELHO, 1982, p. 100).

184
Ginásio Maringá construído pela CMNP, adquirido pela diocese de Jacarezinho, antigo prédio do Colégio Marista.
A Igreja que brotou da mata
Assim que os irmãos assumiram o colégio, seu diretor, padre Cleto Altoé, retornou a Jaciguá (ES), pró-
ximo de Cachoeiro de Itapemirim, de onde viera para Jacarezinho, antes da criação da diocese de Maringá. A
escola técnica de comércio permaneceu ainda sob direção da diocese, tendo como diretor o bispo e continu-
ando, como curso noturno, a funcionar no mesmo prédio, agora transformado em Colégio Marista.4
A presença dos irmãos maristas foi decisiva para a abertura da PUC-PR câmpus de Maringá. Ao recebê-
los aqui, no início de 1958, nem em sonho dom Jaime poderia prever que estava, naquele instante, lançando
em solo maringaense a semente inicial da Pontifícia Universidade Católica do Paraná.
Além do colégio e da PUC-PR, os irmãos estabeleceram parceria com o Núcleo Social Papa XXIII,
responsabilizando-se por um Centro Social Marista para crianças e adolescentes, para suas famílias e comuni-
dade, segundo o espírito do fundador São Marcelino Champagnat.
Em relação à Universidade Estadual de Maringá, a participação do bispo foi mais clara e direta. Ao
tempo de sua posse, para as autoridades estaduais Maringá representava pouco mais que um celeiro de votos,
perdido no meio do mato, distante da capital para onde se voltava quase exclusiva a atenção dos governantes.
O deputado estadual maringaense Néo Alves Martins procurou junto ao bispo o apoio que julgava importan-
te para a criação de um curso superior, o primeiro que se instalaria na cidade onde só havia ensino até o nível
médio. No relatório referente ao ano de 1959, enviado à nunciatura apostólica com data de 10 de janeiro
de 1960, dom Jaime escreveu que “por motivos políticos desejava um deputado local criar uma Faculdade
Estadual de Filosofia, Ciências e Letras” (COELHO, Maringá, 1961, f. 2). Com olhar posto no futuro, que
projetava a cidade como pólo comercial de vasta região, o bispo inclinava-se bem mais para a abertura de
uma Faculdade de Ciências Econômicas em cuja implantação decidiu investir todo o seu prestígio. Sua opção
acabou por triunfar: a lei estadual nº 4070, de 28 de agosto de 1959, criou a FECEM − Faculdade Estadual
de Ciências Econômicas de Maringá. Atendendo pedido feito pelo governador Moysés Lupion, dom Jaime
aceitou o cargo de primeiro diretor, para o qual foi nomeado pelo decreto governamental nº 25.606, de 21
de setembro de 1959. Teve a seu lado o professor Geraldo Altoé, designado secretário. A 15 de outubro do
mesmo ano, no gabinete do secretário estadual da Educação Nivon Weigert, em Curitiba, tomou posse do
cargo. Os meses seguintes foram gastos nas providências necessárias à instalação dos cursos. O reconheci-
mento da escola pelo Governo Federal veio pelo decreto nº 48.431, datado de 27 de junho de 1960. No dia
20 de setembro do mesmo ano aconteceu a instalação oficial seguida de provas classificatórias e matrículas
de alunos para o ano letivo de 1961. A faculdade começou por funcionar no prédio do Colégio Marista, à
época na Avenida Tiradentes, mudando-se depois para o pavimento superior do atual Instituto Estadual de
Educação, de onde, por fim, se transferiu ao atual câmpus da UEM. Por exigência da Secretaria de Estado
da Educação, o diretor devia também ministrar aulas, motivo que levou o bispo a introduzir no currículo a
cadeira, antes inexistente, de Ética e Sociologia, da qual se tornou professor. Era sua preocupação assegurar
à primeira escola de nível superior em Maringá uma orientação cristã. O primeiro curso, oferecido em 1961,
foi o de Economia, que entre 1961 e 1963 matriculou um total de 89 alunos. No dia 14 de janeiro de 1965
houve a solene colação de grau da primeira turma, graduada no final do ano letivo de 1964. Quatro anos mais
tarde, tinha início o processo da criação oficial da Universidade Estadual de Maringá.
Dom Jaime foi diretor da FECEM desde sua criação até 1962, quando, pela portaria 5.369/62, passou
o cargo a doutor Zeferino Mozatto Krukowski. Por conta de impreteríveis encargos, que o forçavam a pro-
longados afastamentos da cidade − visitas pastorais a todas as paróquias e, particularmente, presença exigida

4 A CMNP construiu o Colégio Maringá (chamado Ginásio Maringá na época da transferência à diocese de Jacarezinho), tornan-
do-se credora da importância despendida na construção. É o prédio de pavimento único, com 50m de fachada, ainda em uso na
Avenida Tiradentes, nº 963, na esquina com a Rua Marcelino Champagnat. Não tendo saldado inteiramente o débito, o professor
Anthero vendeu a escola, passando o compromisso à Mitra Diocesana de Jacarezinho. Com a criação da diocese de Maringá, em
1956, a ela foi transferida a dívida restante que, por sua vez, os irmãos maristas, estabelecidos em Maringá, assumiram e quitaram
junto à Companhia.
185

Os 50 anos da Diocese de Maringá


nas sessões do Concílio Ecumênico Vaticano II, em Roma5 −, dom Jaime indicou para substituí-lo na cadei-
ra de Ética e Sociologia o cura da catedral, padre Benedito Vieira Telles, que foi nomeado pelo decreto nº
11.765, de 18 de maio de 1963, para exercer interinamente o cargo de assistente de ensino superior, função
na qual Telles foi empossado no mesmo dia da nomeação.

Consagração religiosa, sinal do Reino


Também em outras áreas além da educação vêm, de longa data, fazendo-se presentes os religiosos e as
religiosas na Igreja de Maringá. Ainda não fora criada a diocese e já muitos deles, homens e mulheres, labu-
tavam na seara do Senhor plantada nestas bandas. Com a vinda do primeiro bispo, cresceu a sua presença e se
intensificou em muito a atuação evangelizadora da Igreja através deles.
Na esteira dos abnegados sacerdotes palotinos, jesuítas, capuchinhos, josefinos e carmelitas, que encon-
trou em 1957, dom Jaime esforçou-se por conseguir outros institutos religiosos dispostos a repartir com o
reduzido clero diocesano a evangelização do povo de Deus aqui assentado. Nem sempre obteve êxito, sujei-
tando-se, por vezes, a situações no mínimo risíveis. Como em 1961, quando padres dominicanos malteses,
desejosos de deixar a paróquia que ocupavam no vizinho Mato Grosso (ainda não existia Mato Grosso do
Sul), pediram paróquia nesta diocese. O bispo ofereceu-lhes Santa Cruz do Monte Castelo. Depois de visitá-
la, em pouco elegante trocadilho, deram-lhe a resposta: “Mato por mato, nós ficamos no Mato Grosso”.
Para o nem sempre harmonioso relacionamento com um ou outro religioso daqueles tempos o bispo
apresenta a justificativa do grande distanciamento da sede episcopal. Jacarezinho, na época, encontrava-se
não apenas longe, mas praticamente inacessível a qualquer meio de comunicação. No cultivo de esparsos e
burocráticos encontros com o pastor da diocese, padres assumiam, às vezes, postura de autoridade absoluta
na paróquia. Agora, forçados a contatos freqüentes com um bispo não tão distante, estranhavam a mudança.
Dom Jaime deu-se conta de situações incômodas que se arrastavam há anos. Frades havia que davam, segundo
ele, interpretação interesseira ao cânon 621 do antigo Código de Direito Canônico, sobre o direito de arre-
cadar esmolas em toda a diocese. Numa paróquia, imóveis doados à Igreja foram escriturados em nome da
ordem religiosa, quando os doadores tinham pensado, evidentemente, oferecê-los à comunidade eclesial do
lugar. De outra, queixava-se o bispo, saíram vários seminaristas para o seminário da congregação, enquanto
para o seminário diocesano, nem um só. Além disso, por ser uma diocese nascente, Maringá atraía clérigos
religiosos dispostos a passar ao clero secular, provocando pendência com este ou aquele governo religioso
provincial. Resultou daí que ao bispo foi aplicada a pecha de hostil ao clero regular, acusação que por largo
tempo dificultou a colaboração deste na diocese.
Ainda que em proporção menor do que outras, a Igreja de Maringá, não só nos anos primeiros, mas
ainda hoje, evidencia a riqueza eclesial que lhe empresta o testemunho da vida consagrada.
No ano de 1990, por iniciativa pessoal e com recursos próprios, monsenhor Gerhard Schneider come-
çou a levantar em área de sua propriedade, próxima ao Horto Florestal de Maringá, uma construção visando
enriquecer Maringá com o testemunho da vida monástica. A obra, que recebeu o nome de “Mosteiro da Re-
denção”, foi inaugurada em 31 de maio de 1992. Depois de meses de contatos tentados com comunidades de
várias partes do Brasil para assumi-la, a 11 de junho, onze dias depois da inauguração, ocuparam a casa, pro-
cedentes de São José do Rio Pardo (SP), os primeiros religiosos da Congregação de São Bernardo da Ordem
Cisterciense. No entanto, por carência de vocações em seu mosteiro de origem, apenas oito meses mais tarde,
foram daqui retirados e encaminhados à Itália.6 Embora desativado, o mosteiro continuou sendo em Maringá
um centro de peregrinação e espaço de recolhimento para fiéis não só da cidade mas também da vizinhança.

5 Sessões do Concílio designam os quatro períodos em que os bispos estiveram reunidos em Roma para as discussões conciliares: de 11
de outubro a 8 de dezembro de 1962; de 29 de setembro a 4 de dezembro de 1963; de 14 de setembro a 21 de novembro de 1964,
e de 14 de setembro a 8 de dezembro de 1965. De todas dom Jaime participou integralmente.

6 A queda no número de monges verificou-se na Itália, berço da fundação brasileira. Para lá foram então transferidos os que aqui se
encontravam há menos de um ano, provocando o fechamento da casa.
186

A Igreja que brotou da mata


Em 1998 foi reaberto, com o nome de “Mosteiro Nossa Senhora da Redenção”, ocupado, desta vez, por
beneditinos da Fraternidade Beneditina Mãe da Divina Providência. Por três anos os monges sustentaram em
Maringá saudável experiência de vida contemplativa da qual se beneficiaram indivíduos e grupos cristãos. No
final de 2000, também por deficiência de pessoal, acabaram retornando à casa-mãe, em Nova Lima (MG).
Com o advento, em 1997, do segundo arcebispo de Maringá, dom Murilo Sebastião Ramos Krieger,
originário da Congregação dos Sacerdotes do Sagrado Coração de Jesus, a arquidiocese de Maringá acolheu
novos institutos religiosos de padres e de irmãs. Em Maringá foram criadas três novas paróquias confiadas a
congregações religiosas de sacerdotes.
São Bonifácio, a primeira, nasceu junto à antiga fazenda de mesmo nome, tendo recebido da Sociedade
do Apostolado Católico o terreno onde está construída a igreja paroquial. Foi criada em 20 de dezembro de
1998, quando ocupou, como matriz provisória, a capela na margem da Avenida Anel Viário Prefeito Sincler
Sambatti. Nasceu confiada à congregação palotina que, para regê-la, designou padre Luiz Braz de Rezende,
SAC. Aproximadamente seis anos durou a administração de Rezende, dela se afastando no final de 2005. De-
volvida à arquidiocese, a paróquia foi entregue, no dia 18 de fevereiro de 2006, à responsabilidade de padre
José Aparecido de Miranda, do presbitério diocesano.
Outra paróquia sob cuidado de religiosos tem como área o Jardim Itaipu e está dedicada a Santa Rita
de Cássia. Começou como quase-paróquia, em 1º de maio de 1999, aos cuidados de padre Luiz Gonçalves
Knupp. Quando, em 25 de março de 2001, foi elevada ao nível de paróquia, passou à responsabilidade da
Congregação das Escolas de Caridade – Instituto Cavanis, fundação religiosa de origem italiana que se dedica
a adolescentes e jovens carentes. A congregação indicou como pároco padre Edmilson Mendes, CEC, que,
além do atendimento à comunidade, cuida da implantação de obra educativa para a qual foi adquirido de
monsenhor Gerhard Schneider terreno junto ao hoje desativado mosteiro.
Absorvendo a parcela maior do Maringá Velho, a terceira paróquia criada para religiosos recebeu o
nome de Santa Joaquina de Vedruna. Seu templo de funcionamento provisório foi a capela Santa Cruz, pri-
meira igreja urbana de Maringá. Preparada por padre Manoel Silva Filho, teve sua fundação no dia 21 de maio
de 2000, sendo confiada à Congregação da Ressurreição de Nosso Senhor Jesus Cristo, conhecida como dos
padres ressurrecionistas. O primeiro, o polonês Andrzej Krzyzanowski, CR, esteve à frente da paróquia até 17
de dezembro de 2001, quando foi sucedido por padre Flávio Augusto Bittencourt Aguiar, CR. Este causou
dificuldades para os paroquianos por causa da disposição manifesta de, segundo suas próprias palavras, “criar
a consciência de paróquia religiosa e não diocesana”. No final de 2004, os padres ressurrecionistas devolveram
a paróquia, e o arcebispo nomeou padre Sidney Fabril administrador paroquial; depois, pároco, a partir de 25
de novembro de 2005.
Completando o quadro de presbíteros religiosos com atuação na arquidiocese de Maringá, registre-se a
presença dos frades da Ordem dos Agostinianos Recoletos – OAR, Vicariato do Brasil da Província de Santo
Tomás de Vilanova. Celebrado no ano 2000, o XXX Capítulo Provincial pediu a abertura, no Brasil, de um
postulantado para os estudantes de Filosofia que, ao mesmo tempo, servisse de casa de acolhida aos membros
da Ordem. Nos últimos meses desse ano, o vigário provincial, frei Miguel Hernández com seus conselheiros
visitaram vários lugares, decidindo-se por Maringá. No dia 24 de abril de 2001 foram recebidos por dom Mu-
rilo, que manifestou interesse na abertura da fundação. Foram adquiridos dois lotes na cidade; um, com casa
construída, para residência dos 12 primeiros seminaristas; outro, para construção de seminário próprio, que
seria iniciado. Em janeiro de 2002 chegaram os dois primeiros padres, frei José Lorenzo Gómez, formador,
no dia 27, e frei Sebastián Olalla del Rio, prior, no dia 30. A bênção da pedra fundamental da nova casa foi
oficiada no dia 28 de agosto, festa de Santo Agostinho. Sob responsabilidade da Construtora Catamarã, de
Maringá, as obras seguiram num ritmo intenso a ponto de, no dia 5 de dezembro de 2003, ter sido possível ao
arcebispo dom João Braz de Aviz, sucessor de dom Murilo, inaugurar o monumental Seminário Santo Agosti-
nho, localizado na Avenida Pioneiro João Pereira, 1027, no Jardim Indaiá. Além da formação dos estudantes
na etapa da Filosofia, foi projetado também para grandes encontros da Ordem, não apenas do Brasil, mas até
do exterior. Numa feliz coincidência, o endereço do Seminário Santo Agostinho aponta o prolongamento da
mesma picada aberta no mato, por onde entrou, em 1958, padre André Torres, quando dava os primeiros
187

Os 50 anos da Diocese de Maringá


passos para a construção do Seminário Diocesano Nossa Senhora da Glória.
Quanto à presença da mulher consagrada, a Igreja de Maringá tem sobejas razões de agradecer o teste-
munho de centenas de religiosas que trabalharam e trabalham pelo Reino de Deus. Muitas aqui encontraram
o final de seus dias, não sem antes terem dado o melhor das próprias forças para o crescimento da Igreja de
Cristo. No cemitério-jardim do Noviciado Rainha da Paz, situado no lote 63 da Rua Distrito Federal, ao lado
de sete padres e de seis irmãos, o número maior de túmulos, exatamente vinte e três,7 guarda os restos de
santas mulheres a quem jamais será tributado o justo reconhecimento.

Os religiosos, junto ao arcebispo, na celebração do Dia do Religioso de 2005,


na catedral basílica Nossa Senhora da Glória.

O serviço aos pobres


Desde o Antigo Testamento, soa forte na Bíblia a recomendação de cuidado com o órfão, a viúva e
o estrangeiro. Para a Igreja de Cristo, ainda no tempo apostólico, apresentou-se o desafio do atendimento
às viúvas de origem grega, que levou os Doze a instituírem os “diáconos das mesas” (ATOS 6, 1-6). O
apóstolo Paulo mobilizou colaboradores para uma coleta solidária entre as Igrejas da gentilidade com o fim

7 A contagem foi feita pelo autor destas notas no dia 29 de agosto de 2006. Dentre os padres sepultados (Raimundo Le Goff, Mathias
Jorge, Friedrich (Fritz) J. K. Gerkens, Pedro Ryo Tanaka, Levi de Oliveira Silva, Aparecido Reis de Lima e Wagner dos Santos) os dois
últimos não trabalharam na diocese, mas têm em Maringá suas famílias. Os irmãos religiosos falecidos pertenceram aos maristas e
aos enfermeiros da Santa Casa. Além das 23 religiosas sepultadas, outras três da congregação das Irmãzinhas da Imaculada Conceição
tiveram os restos mortais trasladados para Nova Trento (SC), onde a congregação construiu jazigo próprio.
188

A Igreja que brotou da mata


de socorrer a penúria da comunidade de Jerusalém (2CORÍNTIOS, 8-9). Embora pontilhada de aspectos
romanescos, a biografia do diácono Lourenço († 258), celebrado no dia 10 de agosto, comprova o zelo com
que na Igreja de Roma eram assistidos os pobres. Os Santos Padres unanimemente pregam o cuidado de
Deus para com esses filhos especiais, recordando o dever que têm os cristãos de jamais mostrarem indiferença
pela sua sorte.
Assim, ao logo da história, a Igreja nunca descurou a lei do amor, que assumiu as características cul-
turais, temporais e locais das comunidades onde se implantava. Nas frentes de pioneirismo, via de regra, o
amor cristão se traduziu, como foi lembrado, por iniciativas nas áreas da educação e da saúde, cabendo a
institutos religiosos femininos e masculinos o papel de desbravadores dos novos campos de presença eclesial.
Na Maringá dos anos 50, a contribuição da Igreja Católica apareceu através das irmãs Carmelitas da Caridade
de Vedruna (1952), no setor da educação, e dos irmãos da Misericórdia de Maria Auxiliadora (1953), depois
também com as irmãs Missionárias do Santo Nome de Maria (1956), no campo da saúde.
Se a aceitação das freiras professoras recebeu entusiasmo e aprovação unânime por parte das pessoas do
lugar, o mesmo não se pode dizer do trabalho inicial dos irmãos. Desprovida de atendimento médico que,
além de precário, era inalcançável ao seu bolso, a população pobre, maioria absoluta dos que aqui viviam,
acolheu-os com alegria, sem dúvida; não assim a totalidade dos profissionais da saúde. Houve ensaios de cer-
ceamento ao seu trabalho, não sempre motivados pela defesa do melhor para o povo. Justifica-se plenamente
coibir por todos os meios o exercício ilegal da medicina; dos médicos se espera que o façam, abrindo os olhos
da população e denunciando charlatães às autoridades. Não era, porém, o caso em tela. Os irmãos jamais
pretenderam passar por médicos. Apresentavam-se como enfermeiros que a séria formação e prática em hos-
pitais alemães capacitavam acima de quaisquer outros encontráveis nestas paragens. O problema, no fundo,
girava em torno dos ganhos financeiros a que, por vocação, aqueles dedicados religiosos não se prendiam, ao
contrário de médicos, evidentemente não todos, para quem o exercício da medicina fazia-se automaticamente
acompanhar da busca de prestígio e riqueza. Alguns ofereceram apoio aos irmãos, prestando atendimento
aos doentes no humilde ambulatório, além de colaborar para a fundação, a 12 de junho de 1954, daquela
que viria tornar-se, numa vasta região, a única casa de saúde acessível aos pobres. Na falta de prédio melhor,
a “santa casa” original de Maringá instalou-se num velho salão de baile reformado, na mesma Vila Operária
onde permanece até hoje.

Uma clínica como a Santa Casa, erigida na Operária, foi um avanço de Maringá no
trato com a pobreza, e a Igreja Católica teve papel vital nessa obra. Os religiosos ale-
mães fundadores da casa viram na vila humilde uma fecunda oportunidade para exercer
seu ofício na ajuda ao próximo. Todos os irmãos tinham formação profissional na área
médica, e às vezes passavam as noites em claro cuidando dos enfermos, seja do bairro,
seja de outras localidades. A Santa Casa, como é conhecida popularmente, não se res-
tringia às suas atribuições hospitalares; fornecia alimentação gratuita ao povo carente,
ampliando o seu campo assistencial (MARINGÁ, 2002, p. 106-107).

Em maio de 1957, dois meses depois de sua posse, dom Jaime recebeu uma comissão encabeçada por
médicos da cidade, que a ele se dirigiu mostrando interesse de criar um grande hospital regional. São palavras
suas sobre a intenção que percebeu em alguns profissionais, por detrás da proposta apresentada:

A conclusão que tirei: ‘matar’ a Santa Casa, e a construção de novo Hospital, com o
Bispo à frente das obras. Depois de tudo pronto, far-se-ia uma placa de homenagem
aos membros da Comissão, e o Hospital seria entregue à classe médica. É claro que a
minha resposta seria uma negativa; eu lhes propus: se os Srs. quiserem ‘transformar’ a
Santa Casa em um grande Hospital, estou pronto, continuando o mesmo como uma
obra da Igreja e sob sua direção. Vamos aguardar os resultados... (DIOCESE DE MA-
RINGÁ, 1957a, f. 48, grifo do autor).

189

Os 50 anos da Diocese de Maringá


Santa Casa de Maringá no final dos
anos 50. Chegados em setembro 1953,
no início os irmãos atendiam em
instalações precárias.

Mas os problemas não ficaram de todo sanados nesse encontro. A idéia do bispo não parece ter suscitado
muito interesse na classe médica de então. No dia 11 de setembro, “devido às críticas e restrições à Santa Casa”,
conforme referiu, dom Jaime convocou a Sociedade Médica local para uma reunião no Grande Hotel Maringá.
Era o mais nobre palco para solenidades e eventos de peso. Na oportunidade, deixou claro: “as portas da Santa
Casa estão abertas a todos os Srs. Médicos, contanto que saibam respeitar o Código de Moral Médica.” Apro-
veitou para agradecer “a colaboração efetiva de todos” (DIOCESE DE MARINGÁ, 1957a, f. 63).
Ao longo de todo o seu episcopado, continuou mantendo a postura de defensor da Santa Casa por ver
nela real prestadora de serviço aos doentes pobres. Quase nenhum hospital da época atendia pessoas incapazes
de pagar pelo tratamento. Não poucas vezes, por rádio ou jornal, o bispo sustentou acalorado debate com
figuras “importantes” no esforço de garantir à Igreja, através da Santa Casa, o elementar direito de prestar
socorro médico a pessoas necessitadas.
Devido à atuação não só competente, mas carinhosa das irmãs, nos primeiros tempos a Santa Casa por
pouco não monopolizou por inteiro o atendimento a parturientes da cidade e da região. A excelente qualidade
dos serviços oferecidos desde os primórdios levou à conquista de um feito extraordinário: em 2003, quando foi
celebrado o cinqüentenário da chegada dos irmãos a Maringá, nada menos do que dois terços das crianças aqui
nascidas tinham vindo ao mundo na maternidade da Santa Casa. Pelo espaço de quase 50 anos, até em horas
perdidas da noite, inclusive de domingos, irmã Maria Callista, enquanto teve forças, pôde ser vista ocupada na
maternidade ou no berçário. Em suas experientes mãos nasceram mais de 25.000 crianças. Mais de 300 muni-
cípios paranaenses têm população inferior a essa cifra.8 À razão de 1,36 parto por dia, não é impossível que irmã
Callista tenha superado as marcas mais expressivas de conceituados obstetras deste imenso país.
Depois de 17 anos de atendimento, em especial à população menos aquinhoada de posses, a diocese
viu-se impossibilitada de prosseguir na função de mantenedora da Santa Casa de Misericórdia. Impunham-se
mudanças no prédio de madeira, que clamava por reformas inadiáveis, além do alcance financeiro da Mitra Dio-
cesana. O bispo decidiu abdicar, em favor da Congregação dos Irmãos da Misericórdia de Maria Auxiliadora,
da posse da área de terras e das instalações existentes do hospital e do noviciado dos religiosos. A transferência
de propriedade, por doação sem ônus, foi celebrada no dia 24 de maio de 1971, e a congregação dos irmãos
deu à casa de saúde o novo nome de Hospital e Maternidade Maria Auxiliadora – Santa Casa de Maringá.
Desde o final dos anos 40, praticamente desde seu nascimento, a cidade de Maringá acostumou-se com
o espetáculo de gente indo e vindo em busca de emprego. No início, eram trabalhadores rurais, sem outra
qualificação além dos próprios braços, atrás de alguma colocação nas muitas propriedades de café que se
abriam com a derrubada do mato. Perambulavam pela cidade e, como não dispunham de dinheiro, também

8 O número representa 75,19% do total de 399 municípios do Estado. Entre os nascidos na maternidade da Santa Casa de Maringá
figura o ex-prefeito e deputado federal Ricardo Barros.
190

A Igreja que brotou da mata


não conseguiam hospedagem nos poucos hotéis existentes. Ao chegar, dom Jaime encontrou funcionando na
cidade um “albergue”; na verdade, modesta hospedaria de madeira sem conforto, mantida pelo poder público
estadual, onde os necessitados recebiam atendimento sofrível. Condoído dessa parte infeliz do seu rebanho,
em 1958 iniciou entendimentos com os responsáveis do FATR – Fundo de Assistência ao Trabalhador Rural,
precursor do FUNRURAL, sobre a possibilidade de transferir para a Igreja Católica o cuidado da instituição.
Em 27 de março de 1959, as Filhas da Caridade de São Vicente de Paulo vieram dirigir a obra que, por causa
da co-fundadora da congregação (junto com São Vicente de Paulo), recebeu o nome de Albergue Santa Luiza
de Marillac. O primeiro grupo era formado por irmãs Sebastiana Domingues, Ivone Nazari e Delfina Gretter.
Ao longo de seus quase 50 anos nas mãos da Igreja, foi recebendo reformas e melhoramentos, ampliando-se
sempre mais, a ponto de hoje oferecer instalações e atendimento dificilmente igualados por instituição oficial
destinada à mesma clientela. O albergue conta, é verdade, com apoio do poder público, em nível, contudo,
muito inferior às necessidades. Além do atendimento durante as 24 horas do dia, prestado pelas irmãs residen-
tes na casa, existe uma diretoria e um prestimoso grupo de voluntários, em número superior a uma centena,
que trabalham movidos unicamente por amor cristão. Funcionários remunerados, alguns pela Prefeitura Mu-
nicipal, outros pelo próprio albergue, colaboram no atendimento aos pobres, oferecendo cuidados de higiene,
alimentação, pernoite, roupas, calçados, medicamentos, além de assistência social para encaminhamento na
solução de problemas individuais como saúde mental, internamento hospitalar, procura de familiares, retorno
à região de origem etc. São ainda proporcionados serviços de aconselhamento em situações difíceis e de orien-
tação espiritual. Com uma clientela diária girando por volta de 100 pessoas, ou mais de 2500 pobres acolhidos
por mês, o albergue vem ultimamente assistindo uma média superior a 30.000 clientes/ano.9
Ao lado de dom Jaime, a antiga diretora do albergue, irmã Salomé Dets, fiel discípula de São Vicente
de Paulo cujo amor aos pobres imitou com perfeição, é reconhecida como responsável pela mais importante
obra de promoção humana da Igreja maringaense. Nos anos 60, distribuindo comida e carinho a pessoas
carentes da Vila Vardelina, a incansável religiosa decidiu empreender ação concreta para, se não resolver, ao
menos minorar o sofrimento de famílias que se amontoavam em barracos nos terrenos baldios daquele peda-
ço esquecido da cidade. Passou a contatar pessoas de formação cristã, dispostas a empreender esforços para
viabilizar a nobre iniciativa. Após estudo da situação e análise de possibilidades, em 1970, dom Jaime tratou
de obter apoio junto do “Segretariato Centrale Opere di Papa Giovanni”, entidade de católicos italianos seus
amigos, criada para prestar ajuda a obras sociais da Igreja em Maringá. Na gestão do prefeito Adriano Valente,
a municipalidade cedeu o terreno. Para substituir os barracos foi organizado um mutirão de construção das
casas, aproveitando a madeira do desmanche da antiga catedral, de escolas estaduais e municipais, e de casas
da zona rural esvaziadas pela nova fase agrícola da região, doadas pelos proprietários.
Em reunião promovida por dom Jaime e irmã Salomé com um grupo de pessoas convidadas, no dia 30
de setembro de 1972, ficou decidida a criação de uma entidade para promoção humana e reintegração social
das famílias moradoras da Vila Vardelina, selecionadas pelos critérios de baixo poder aquisitivo, carência de
casa própria e elevado número de filhos, às quais se pretendia oferecer inclusão social e possibilidade de aqui-
sição da casa própria. No dia 9 de dezembro de 1972, com o lema “Promoção humana com fraternidade em
busca da cidadania” surgiu o Núcleo Social Papa João XXIII, voltado à restauração do vínculo familiar, com
cursos de formação em vista de trabalho qualificado, aumento de renda e moradia digna.
Pela lei ordinária municipal nº 2555/89, sancionada pelo prefeito Ricardo Barros em 6 de julho do
mesmo ano, foi feita doação à Mitra Diocesana de Maringá dos lotes de terras nº 31 e 32 da Gleba Patri-
mônio Maringá, com área medindo 27.420m², “destinados exclusivamente a receber edificações de casas
populares para abrigo de pessoas carentes, escolas e creches do Núcleo Social Papa João XXIII”. No dia 10
de novembro de 1989 a Prefeitura Municipal outorgou à Mitra Diocesana de Maringá a escritura da área
doada. Foi o reconhecimento público da decisiva participação da diocese de Maringá num dos programas

9 Dados recentes: ano de 2003 = 38.200 pessoas atendidas; em 2004 = 30.270; ano de 2005 = 36.374. No 1º semestre de 2006 pas-
saram pelo albergue 16.697 pessoas (14.822 homens, 1.028 mulheres, 803 idosos e 44 crianças).
191

Os 50 anos da Diocese de Maringá


Núcleo Social de mais alto significado para a reintegração social de pessoas antes
submetidas a condições indignas de moradia e sustento.
Papa João XXIII
Não se passou meio ano do recebimento da escritura do terre-
no e, já no dia 6 de maio de 1990, o Núcleo pôde inaugurar a esco-
la profissionalizante montada com recursos provindos dos católicos
italianos. Embora tenha, em anos anteriores, trabalhado com um
número maior de cursos, hoje o Núcleo mantém cinco, todos de
nível profissional e boa aceitação no mercado de trabalho: marcena-
ria, corte e costura, costura industrial, manicure e cabeleireiro, além
de trabalhos artesanais como bordado, pintura, tecelagem etc.
No dia 5 de abril de 2003 os irmãos Maristas das Escolas,
Marcenaria através da Obra Social Marista, assumiram a educação de crianças e
adolescentes, em sistema de comodato por um espaço de 20 anos.
Assim, o Núcleo abriga atualmente o Centro Social Marista Irmão
Beno Tomasoni para apoio sócio-educativo em meio aberto a crian-
ças e adolescentes de 7 a 17 anos de idade.
Em 2006 o conjunto de residências oferecidas pelo Núcleo al-
cançava um total de 70, metade das quais em alvenaria, caminhando
para a substituição total das construções de madeira remanescentes.
Com a participação de benfeitores locais, de paróquias da arquidio-
Ateliê de costura industrial. cese e com recursos provenientes de parcerias, as casas antigas vão
cedendo espaço a construções novas mais sólidas, mais higiênicas
e de melhor aparência. As famílias recebem acompanhamento das
irmãs Filhas da Caridade de São Vicente de Paulo por um prazo
de cinco anos, tempo em que deverão vencer as etapas para sua
ressocialização, transferindo-se, ao fim, para sua casa própria cujo
terreno e material deverão ter custeado pela poupança que, de for-
ma criativa, a família é orientada a acumular nesse período. Segun-
do a coordenadora, irmã Adiles Maria Guardalben, menos de 10%
das famílias mostram-se incapazes de cumprir a meta proposta. Até
Escola de cabeleireiro.
agosto de 2006 o Núcleo Social Papa João XXIII tinha contabili-
zado mais de 550 (quinhentas e cinqüenta) famílias reintegradas à
vida social, com trabalho, renda e casa própria. Apesar de modestos,
no universo dos mais de 300.000 habitantes da cidade, não deixam
de ser números significativos, que por si mesmos falam do alcance
social e humano de uma obra de 34 anos incompletos.
Além dos fundadores e das irmãs, responsáveis, 24 horas por
dia, pelo funcionamento, o Núcleo é obra do amor também de
uma legião de beneméritos voluntários como Hugo e Loretti Ho-
Ateliê de artesanato.
ffmann, Osvaldo Pereira Alves, Antonio Frigo, Eduardo José da
Costa Carvalho, Plínio Mocchi, Mauri de Oliveira Brito e uma série
interminável de outros. Os amigos e benfeitores todos, na verdade,
só Deus os pode contar.10

10 Em 8 de julho de 2006, o casal Loretti-Hugo Hoffmann, com mais de 20 anos de


dedicação ao Núcleo, foi agraciado com a comenda Pro Ecclesia et Pontifice, con-
cedida pelo papa Bento XVI a pedido de dom Jaime, que quis assim homenagear
todos os voluntários, parceiros e amigos da entidade, sem os quais de tudo que
Entrega de nova casa. foi feito nada teria sido alcançado.
192

A Igreja que brotou da mata


Ainda que não traga solução definitiva às mazelas da comunidade, sendo, em conseqüência, acusada de
assistencialismo, não há como desconhecer o profundo significado da assistência prestada pela Igreja Católica
através de fiéis movidos, acima da mera solidariedade humana, pelo amor de Jesus Cristo. Desde o início da
diocese de Maringá, cristãos sensíveis ao ideal de Antonio Frederico Ozanam (1813-1853) fundaram em
várias paróquias a Sociedade São Vicente de Paulo, multiplicando conferências vicentinas de adultos e jovens,
que prestam a famílias carentes benefícios de ordem espiritual, psicológica e material. Em todas as comunida-
des onde atuam, a palavra “vicentino” é sinônimo de alguém preocupado com o irmão carente. O trabalho
mais sério dos confrades vicentinos consiste não na doação de coisas materiais, mas na visita domiciliar que
tem por objetivo conhecer “in loco” a família assistida. Há também os asilos confiados ao seu zelo, que não
se convertem em “depósitos” de velhos: aproximam-se de lares onde os internos recebem respeito e carinho.
Asilos cuidados por vicentinos encontram-se em Maringá, em Jandaia do Sul, Mandaguari, Marialva, Manda-
guaçu, Nova Esperança, Cruzeiro do Sul, Paranacity, Ourizona e São Jorge do Ivaí.

O 5º Encontro de presidentes da Sociedade de São Vicente de Paulo, em Mandaguari, no dia 27 de julho de 1975.

Em Maringá funciona também o Lar dos Velhinhos, fundado pelo Rotary Club e entregue à Congrega-
ção das Irmãzinhas da Imaculada Conceição que, desde 8 de maio de 1966, conta com o amoroso trabalho
dessas religiosas. Com muito trabalho elas o ampliaram até alcançar as atuais condições de atendimento aos
“vovôs” e às “vovós”, como carinhosamente os chama irmã Firmina Maria, diretora há mais de quatro décadas.
Desde 1968 as irmãs recebem o reforço de voluntários do chamado Grupo de Serviço São José.
Muitas obras de assistência social e também de promoção humana foram ou são desenvolvidas por ins-
piração da Igreja Católica em Maringá e região. Na impossibilidade de relacionar de forma completa tudo o
que se implantou nesses 50 anos, é oportuno citar alguns sinais da ação de uma Igreja servidora presente em
nosso meio, como:
• Obra do Berço de Maringá, destinada ao atendimento de gestantes carentes, com orientação para o
parto e preparação de enxovais para recém-nascidos. Quando de sua fundação, foi dirigida pelas Mis-
sionárias de Jesus Crucificado. Com a saída destas, permaneceu desativada por muitos anos até que,
no dia 13 de fevereiro de 1997, foi reassumida pela paróquia Cristo Ressuscitado. Na mesma linha e
com o mesmo espírito deve lembrar-se o Roupeiro Santa Rita de Cássia.
• Lar Escola da Criança, fundado por senhoras pioneiras do Clube da Amizade, que abre nova pers-
pectiva de vida humana e cristã a crianças, adolescentes, jovens e a famílias empobrecidas através da
193

Os 50 anos da Diocese de Maringá


educação, de cursos profissionalizantes, de parcerias com o Ministério Público do Trabalho, Pro-
curadoria Regional do Trabalho, CESUMAR – Centro Universitário de Maringá e 20 empresas
contratantes de adolescentes. Desde o início, foi entregue aos cuidados de congregações religiosas
femininas e vem sendo exemplarmente gerido pelas irmãs Murialdinas de São José.
• Cáritas Diocesana, organizada em 1961, ainda quando a preocupação maior da Cáritas era voltada à
distribuição de alimentos (1956-63); esteve presente em 9 paróquias da diocese até a década de 80.
• Creche Menino Jesus, creche Monsenhor Kimura e obras semelhantes, confiadas a religiosas e tam-
bém a voluntários católicos leigos, que vêm prestando trabalho de reconhecida excelência.
• Grupo Lebret, fundado por irmã Jeanne Gaudin, integrante do primeiro grupo das irmãs da Con-
gregação de São Carlos de Lyon, vindas em 1966 para assumir a ADAR – Associação Diocesana de
Assistência Rural. O historiador Reginaldo Benedito Dias entende que a situação política da época
direcionou, posteriormente, muitos de seus membros para as fileiras do PCBR. Conforme sua apre-
ciação, o Grupo Lebret

formou-se entre os estudantes do Colégio Gastão Vidigal, um dos maiores da cidade.


Coordenado por uma freira, a irmã Jane, esse grupo inspirava-se nas concepções do
Padre Lebret. Não se tratava de uma organização política, mas de um trabalho que,
visando à promoção humana, debatia a origem das desigualdades sociais e da miséria e
temas afins. Trabalho que merece registro foi um levantamento sociológico junto aos
moradores da Vila Mandacaru, uma das mais pobres da cidade. Em termos de opção
partidária, o PCBR, constituído em Maringá no início de 1969, foi o desaguadouro
dessa militância estudantil (DIAS, 2001, p. 199).

Irmã Jeanne teve a ventura de se reunir a jovens portadores de uma generosidade raramente encontrável
mesmo em pessoas dessa idade. Transmitindo-lhes o entusiasmo de uma fé engajada, ajudou-os a descobri-
rem a dimensão social do Evangelho. Seu amor aos pobres não era montado sobre discursos, mas vivido com
as pessoas de carne e osso do Mandacaru. Entre os muitos que compuseram o Grupo Lebret, recordam-se
nomes como Licínio Lima, irmãos Rosemeire e Walter Coimbra de Campos, Nadir dos Santos Vaz, Guiomar
Germani, Washington Castilho, Maria de Jesus Cano, Renato Rua de Almeida, Katsuko Nakano, Basílio
Bacarin, Deise Deffune, José Benedito Pires Trindade, Deise Barros, Elpídio Serra e sua irmã Neusa, Judite
Barbosa, Neusa Casagrande e muitos outros. Infelizmente, irmã Jeanne, gravemente enferma, deixou Marin-
gá no dia 2 de junho de 1967, voltando à França para tratamento de saúde, vindo a falecer no início de 1969.
O Grupo Lebret recebeu, então, no segundo semestre de 1967, assistência de padre Orivaldo Robles, que
lecionava Filosofia no curso clássico do Colégio Gastão Vidigal para vários de seus integrantes. Chegando,
no início de fevereiro de 1968, padre Antônio de Pádua Almeida, a partir de março, acompanhou o grupo
pelo espaço de aproximados oito meses. A intervenção policial do dia 12 de outubro de 1968 no congresso
da UNE celebrado em Ibiúna (SP) praticamente assinou a sentença de morte para aquele punhado de jovens
idealistas que Maringá produziu. “O fracasso do 30º Congresso da UNE foi a gota que faltava para empurrar
os estudantes da clandestinidade para a ilegalidade”, opina enviado especial da “Folha de São Paulo” (SILVA,
1993). Com a entrada em vigor do AI-5, em dezembro de 1968, os componentes do Grupo Lebret disper-
saram-se, buscando cada qual uma forma de participação nos rumos da comunidade local ou do país. Uma
parte optou por participação política em agremiações de esquerda que surgiram naquele período, algumas até
radicais e de práticas não inteiramente conformes aos princípios do Evangelho.
• Obra de Assistência Social Nossa Senhora do Rosário, chamada, de início, Vila Papa João XXIII,
fundada em Floresta por padre Antonio Luigi Martinelli em 1970, com decidido apoio de católicos
de Brescia, na Itália, que começou como orfanato. A partir de 30 de maio de 1998, já no governo
arquidiocesano de dom Murilo, confiada às religiosas do Instituto das Apóstolas do Sagrado Coração
de Jesus, direcionou suas atividades no rumo de uma escola de ofícios, de reforço escolar, de forma-
ção e entretenimento para crianças carentes.
194

A Igreja que brotou da mata


Grupo Lebret, 1967/1968: jovens cristãos com participação sócio-política corajosa num tempo de perigo.

• Centro Social Madre Rafaela Ybarra, de Marialva, iniciado em 1986 pelo corajoso impulso de irmã
Rosa Celeste Parede Hamilton, construído com apoio da comunidade local e ajuda dos organismos
católicos “Misereor” (Alemanha), “Manos Unidas” (Espanha) e “Drei König” (Áustria). Desenvol-
ve suas atividades junto de pessoas carentes da Vila Brasil, Vila Messias, Vila Antônia e Conjunto
João de Barro. Começou como catequese de bairro e hoje oferece chance de vida melhor a crianças e
adolescentes de ambos os sexos através de reforço escolar e de cursos de formação para o trabalho.
• Instituto Promocional Jesus Nazareno, das irmãs da Congregação de São João Batista, estabelecidas
desde 16 de junho de 1992, em Mandaguari, na paróquia Bom Pastor, onde, além de auxílio no
trabalho paroquial, promovem cursos de artes e ofícios, atividades educativas e socializadoras para
pessoas de menor poder aquisitivo.
• PROMEC – Proteção ao Menor Carente de Sarandi, fundada em 1989 por irmã Antona Dröge, das
Missionárias do Santo Nome de Maria. Com ajuda de católicos alemães do “Adveniat” foi constru-
ído o prédio situado na Avenida Jaçanã, 941 onde mais de 100 crianças da 1ª à 5ª série do ensino
fundamental recebem reforço escolar no contra-turno de aulas, além de cursos de informática, arte-
sanato, de recreação etc. De início, funcionaram cursos de eletricidade, serralheria, panificação etc.
que, por força do Estatuto da Criança e do Adolescente, foi preciso desativar. A obra é dirigida pelas
religiosas da mesma congregação da falecida irmã Antona.

Como o fermento na massa


Foram incontáveis, no decorrer desses 50 anos, em todas as comunidades da diocese, as ações caritativas
ao lado de projetos de verdadeira promoção humana e cidadania, quer iniciadas por lideranças católicas, quer
exercidas em parceria com o poder público, com entidades de classe ou com grupos voluntários da sociedade.
Essa marca de Igreja encarnada no concreto da vida – em vez de alienada em falsa platitude isenta de proble-
mas – Maringá recebeu daquele que a plasmou a partir de 1957. Por seu exemplo e palavra os fiéis cristãos
foram orientados no rumo de um cristianismo de mão na massa, chamado a atuar num mundo que é preciso
transformar segundo os critérios do Evangelho. Muita gente, quem sabe ansiosa de uma Igreja alheia às refre-
gas da vida, vez por outra estranhou posições tomadas pelo bispo que jamais recuou diante de desafios.
No mês de outubro de 1957, menos de sete meses depois da posse, ele acusava a inquietude que lhe
causavam jovens e professores sem vínculo maior com a Igreja. Nos dias 10 e 15 desse mês, anotou de pró-
prio punho:
195

Os 50 anos da Diocese de Maringá


Tivemos, em casa, uma reunião com alguns moços não pertencentes a Associações Re-
ligiosas. O nosso intuito é dar-lhes um amparo, especialmente àquêles que vivem longe
de suas famílias. Pretendemos fundar uma associação com o nome: Centro Cultural da
Juventude Maringaense. Vamos fazer o estatuto e procurar realizar o programa traçado
[...] Dia do Professor: Na Santa Missa falei sôbre o desejo de fundar o Centro do Pro-
fessorado Católico (DIOCESE DE MARINGÁ, 1957, f. 67-68).

Sem condição de seguir adiante, o Centro Cultural da Juventude, ficou apenas no desejo do bispo que,
em compensação, teve seu nome ligado ao nascimento da UMES – União Maringaense dos Estudantes Secun-
dários. Não existindo curso superior na cidade, Carlos Alberto Borges, presidente do grêmio estudantil da es-
cola técnica de comércio (que pertencia à diocese e funcionava no prédio do Colégio Marista), representava os
estudantes do nível mais “adiantado” de Maringá. Decidido a dar à população estudantil maior consciência de
classe e poder de representação, convocou todos os colégios para a assembléia de fundação da UMES. Apesar
da euforia pelo primeiro título de campeão mundial de futebol, conquistado pelo Brasil ao meio-dia,11 o antigo
Cine Maringá, na avenida Getúlio Vargas, recebeu, na tarde daquele 29 de junho de 1958, uma multidão de
estudantes. A ata de fundação da entidade estudantil de Maringá conserva, entre outras, a assinatura de dom
Jaime Luiz Coelho, bispo diocesano, que também apoiou o anseio de uma sede para a nova entidade. Borges
tinha em mente uma UMES de forte presença na área cultural, social, esportiva e de lazer para os estudantes
da cidade. Mas a construção da sede representou verdadeira aventura, bem mais difícil do que previra. Doutor
Hermann Moraes Barros, diretor-gerente da CMNP, morava em São Paulo e vinha, em avião particular, qua-
se toda semana, inspecionar obras de Londrina, Maringá e Cianorte. Da parte da CMNP havia interesse de
vender toda a área loteada. Era importante, por isso, que os proprietários não retardassem o levantamento de
construções nos lotes adquiridos. Contudo, associações profissionais de Maringá beneficiadas com doação de
áreas para suas sedes, demoravam a construir, causando desagrado à direção da Companhia. Sabendo que os
estudantes também queriam pedir um terreno, Barros não se deixava encontrar com facilidade. Acompanhado
de uns cinqüenta colegas, Borges postou-se então no escritório da CMNP, à espera do diretor-gerente. Não
houve como deixar de receber a delegação. O presidente da UMES propôs: “Doutor Hermann, o senhor não
precisa fazer a doação agora. Só escriture o terreno para a UMES quando tivermos a sede pronta”.12 Venceu.
A Companhia cedeu o terreno da Avenida Cerro Azul, em frente à Câmara Municipal de Maringá, escolhido
pelos estudantes entre outros dois propostos, por causa da proximidade, na época, com o Colégio Gastão
Vidigal. O prédio, terceiro no lado esquerdo da avenida, no abandono a que foi relegado, nem vagamente
lembra as memoráveis discussões cívicas dos anos 60, quando ali funcionou o único restaurante acessível aos
bolsos estudantis. Campanhas, rifas, bailes, promoções de todo tipo foram empreendidos para levantá-lo e,
dessa forma, assegurar a posse do terreno. A construção, moderna para a época, foi erguida a partir de planta
doada pelo engenheiro Luty Vicente Kasprowicz, e sólida bastante para resistir às intempéries e ao descaso das
décadas seguintes. Inaugurada em 1960, com a presença do governador eleito Ney Braga e de dom Jaime, até
hoje não conseguiu a escritura de doação da CMNP que, no entanto, continua assegurando à UMES sua posse
e uso, sem jamais ter deixado de respeitar a palavra empenhada pelo diretor-gerente daquela época.
O Centro do Professorado Católico sucumbiu depois de pouca duração; os professores interessados em
vínculo associativo preferiram fortalecer a própria entidade classista, a APP – Associação dos Professores do
Paraná, criada na capital, em 26 de abril 1947, que ainda ensaiava os primeiros passos no Norte do Paraná.
Ao conseguir a doação, na saída de Maringá em direção a Paranavaí, de cinco alqueires paulistas para a
construção do seminário diocesano, o bispo não abriu mão da antiga área de um alqueire, mais precisamente
de 23.747,00m², ao lado do cemitério municipal, previamente reservado pela empresa colonizadora para essa

11 Sem televisão, as partidas eram acompanhadas pelo rádio, na voz de locutores famosos como Pedro Luís, Edson Leite e outros. Por
causa do fuso horário, a final entre Brasil e Suécia começou às 11h do Rio, hora oficial do Brasil, à época.

12 Depoimento oral ao autor destas notas, em Maringá, no dia 13 de setembro de 2006.


196

A Igreja que brotou da mata


finalidade. Dela obteve a autorização de dar novo destino à área, redirecionando-o para instalação do cha-
mado Clube da Juventude com o qual pretendia beneficiar famílias de posses modestas, incapazes de se asso-
ciarem aos outros clubes em formação na época. Não lhe parecia justo que numa cidade carente de diversão,
como era então Maringá, só gente abastada pudesse dar aos filhos um ambiente saudável de lazer. Devido,
no entanto, ao período de incertezas que o país viria a atravessar pouco depois, somado à crise inflacionária
que se seguiu, a agremiação gozou de vida efêmera. Suas instalações modestas, sem uso por longo período,
foram cedidas para emprego nas atividades diocesanas do Cursilho de Cristandade, do Movimento Jovem e
do Movimento Familiar Cristão, recebendo, no período de 1975 a 2000, intensa utilização. Com o passar
do tempo e o irrefreável crescimento urbano, ao final do governo de dom Jaime, o terreno indiviso passou a
interromper a Rua Estácio de Sá, obstruindo seu avanço para o lado sul da cidade. O poder público munici-
pal expressou desejo de que a arquidiocese franqueasse o prolongamento da rua, solucionando o incômodo
impasse. Na gestão de dom Murilo foram iniciados entendimentos com a CMNP para invalidar a cláusula
de reversão que onerava a escritura original de doação. Só em 2001 foi alcançado o objetivo, mediante de-
volução à Companhia de 7214,10m² exigidos pelos seus diretores. A arquidiocese de Maringá cedeu ainda à
Prefeitura do Município de Maringá, em troca da quitação de impostos municipais e outros encargos, uma
área de 2877,22m² destinada a obras de arruamento no local para desafogo da rua estrangulada. Posterior-
mente, no governo do terceiro arcebispo, dom João Braz de Aviz, em 24 de março de 2003, após licitação
para conseguir o maior valor possível, foi desmembrada para venda à Itaocara Construções Civis Ltda. área
correspondente a 3237,48m², permanecendo ainda a Mitra de Maringá legítima proprietária dos remanes-
centes 10.428,20m².
Desde seu primeiro dia em Maringá, o bispo vindo de Ribeirão Preto assumiu como sua esta terra,
fazendo-se dela defensor até com empenho maior do que outros aqui chegados bem antes em busca de in-
vestimento seguro e construção de vida nova. Um dos dissabores iniciais foi sua percepção de que o Norte
do Paraná quase nada significava para os donos do poder que geriam, lá na capital, os destinos de um Estado
cujas fronteiras, na prática, não iam além dos Campos Gerais. Doía-lhe ver o descaso oficial para com tudo
que acontecia acima dos primeiros contrafortes da Serra do Cadeado. Procedente da terra paulista, onde um
desenvolvimento harmonicamente distribuído estendera a todos os recantos a presença do governo, o fogoso
bispo começou a acalentar com simpatia o sonho, por muitos também nutrido, de uma nova Unidade da
Federação a ser criada, o Estado do Paranapanema, com capital em Londrina. Não sentiu constrangimento
de advogar a causa, absurda para muita gente; não para ele a quem um bom projeto dava ânimo para lutar
até sozinho. Não imaginava que a idéia despertasse intervenção do velho mestre, dom Manuel, arcebispo de
Curitiba, para quem se foram queixar autoridades curitibanas, a começar pelo governador Moysés Lupion.
Num sorriso que comprova mais respeito que arrependimento, dom Jaime admite: “Dom Manuel me deu
um ‘pito’ e mandou não falar mais sobre o Estado do Paranapanema”.
No dia 18 de outubro de 1958 tomou parte ativa na chamada “Marcha da Produção”, colocando-se ao
lado dos cafeicultores, que exigiam do Governo Federal melhores preços para sua produção e mais assistên-
cia à lavoura cafeeira. Aborrecidos pelo desprezo com que se sentiam tratados, em poucos dias, milhares de
homens do campo se juntaram e decidiram levar suas reivindicações diretamente ao presidente da República.
Formou-se uma caravana integrada por centenas de veículos preparados para sair de Maringá naquele memo-
rável 18 de outubro.
Chegava ao clímax uma crise que se desenrolava havia tempo. No começo do mês, o arcebispo de
Curitiba fora informado da inquietude que geravam na capital notícias chegadas do interior do Estado. Espe-
rava-se dele que refreasse o ímpeto, acima de todos, do bispo de Maringá. No dia 10 de outubro, anotando
a mão “Confidencial”, no alto à direita, dom Manuel escreveu a dom Jaime revelando suas preocupações
(Carta 11).

197

Os 50 anos da Diocese de Maringá


Carta 11 - Dom Manuel escreve a dom Jaime sobre a Marcha da Produção (D´ELBOUX, 1958, 1 f.).

Não eram destituídas de fundamento as previsões do comandante da 5ª Região Militar. Além do arce-
bispo, outras instâncias devem ter sido mobilizadas. Atentos ao descontentamento que ameaçava expandir-se
mais, e orientados de cima, com certeza, por seus superiores, em Maringá, o juiz Zeferino Krukowski e um
capitão do exército tentaram demover dom Jaime da intenção de marchar com os agricultores. Inútil. O bispo
não arredou pé, integrando-se à comitiva que partiu para o Rio de Janeiro, capital federal na época, aonde
os cafeicultores pretendiam fazer chegar suas reclamações. O Ministério da Justiça classificou a marcha como
“movimento subversivo” e enquadrou-a nas sanções da Lei de Segurança Nacional. Na véspera do dia 18, um
batalhão do 13º Regimento de Infantaria, da cidade de Ponta Grossa, acampou nas imediações do km 115 da
antiga estrada oficial, em área do atual município de Sarandi. A comitiva com o bispo à frente foi detida por
soldados armados de fuzis e metralhadoras. Sem permissão de continuar, viu-se forçada a tomar o caminho
de volta. Não obstante a curteza da marcha, ela alcançou repercussão nacional. Numa época sem televisão,
Maringá encheu-se de repórteres dos maiores jornais e emissoras de rádio, que carregaram até os mais altos
gabinetes da República a insatisfação dos produtores do Norte paranaense. A ordem vinda do Rio era taxa-
198

A Igreja que brotou da mata


tiva: impedir, por todos os meios, que a insatisfação dos produtores rurais atravessasse o rio Paranapanema,
atingindo o Estado de São Paulo e, daí, se alastrasse para outras regiões cafeeiras como Espírito Santo e Minas
Gerais. Tropas foram mobilizadas com ordens, segundo se informou na época, de dinamitar, se preciso fosse,
a ponte entre Cambará (PR) e Ourinhos (SP), assim como de destruir as balsas para travessia do rio nos mu-
nicípios paranaenses de Alvorada do Sul e de Santo Inácio.
Só no dia 30 de outubro, depois de tudo serenado, teve dom Jaime ocasião de responder a carta do arce-
bispo de Curitiba. E o fez numa linguagem que nem remotamente deixou transparecer a tensão daqueles dias:

Caríssimo Dom Manuel


In omnibus Christus!

Peço a V. Excia. abençoar-me.


Já devia ter respondido a última carta de V. Excia., que falava da Marcha da Produção.
Assim que a recebi, quis ir até aí, contudo, as reuniões realizadas aqui, a cada momento,
me impediram. Tentei telefonar, mas as linhas estavam cortadas. Mas, Dom Manuel,
graças a Deus, parece que tudo acabou bem. Sei que V. Excia. deve ter ficado preocu-
pado, pois os jornais davam os noticiários mais desencontrados. Quando se realizou a
reunião em Maringá, no dia seguinte chamei os líderes do movimento e mostrei-lhes o
meu desaponto pela linguagem usada. Prometerem, porém, guardar melhores atitudes
e pediram que os continuasse apoiando, o que fiz, mas com a ressalva imposta, como
V. Excia lerá neste boletim. De fato, a situação do café aqui, principalmente para o pe-
queno lavrador, é dolorosa. Dá pena ver como ficam preocupados com a falta de preço.
Trabalham tanto para pouca recompensa. E são justamente êles os que mais nos ajudam.
Por êles, pois, mais que pelos outros, é que tomei posição nesse movimento. Mas, agora
tudo passou, e se o Govêrno declarou não ser a Marcha da Produção o meio adequado
para se resolver a questão, vamos esperar que êle resolva pelo meio que tem em vista.
Por aqui tudo está em paz. Há movimento de pequenas reuniões de líderes. Quanto ao
mais, tudo em ordem. Peço a V. Excia que me desculpe a demora desta resposta. Logo
no dia 22 iniciei uma visita pastoral, e por isso atrasei a correspondência. [...]
Sobre as eleições, lamento que nenhum dos candidatos apontados pela Federação te-
nha sido eleito. Acho, dom Manuel, que deveríamos pensar de outro modo. Aqui
houve propaganda aberta a favor de candidatos comunistas, divorcistas, com trabalho
intenso em seu favor, e nós não podemos fazer nada às claras pelos bons candidatos,
para não ferirmos os outros. Agora vem a eleição para governador e novos prefeitos,
vereadores, etc. Se numa reunião dos Bispos nós tratássemos disso, creio que se alcan-
çaria alguma coisa. Enfim, estou pelas orientações de V. Excia. O trabalho que agora
o Pe. Alberton13 começou, mas cujo fim não foi muito feliz, pois marcou aqui em
Maringá, justamente quando não era mais permitido falar em política partidária, uma
reunião nesse sentido, poderá surtir muito efeito, se for realizada com antecedência e
bem programada. [...]
Pedindo uma grande bênção e orações, confesso-me etc. (COELHO, 1958, 1 f.).

Na campanha eleitoral de 1960 pela sucessão do governador Lupion, o bispo de Maringá manifestou-se
publicamente pelo candidato Ney Aminthas de Barros Braga, do PDC, contra os outros dois, Nelson Macu-
lan, do PTB, e Plínio Franco Ferreira da Costa, apoiado pelo governador, em coligação partidária liderada
pelo PSD. Braga era admirador do ideal “Economia e Humanismo”, desenvolvido pelo padre dominicano
francês Louis Joseph Lebret (1847-1966) cujos estudos nas áreas da economia, do humanismo e do desen-
volvimento exerceram larga influência no pensamento social católico brasileiro de então. Descontente com
o governo de Lupion, que não queria ver continuado por Plínio, e não reconhecendo, por outro lado, em
Maculan qualidades mínimas de governo, dom Jaime adotou postura política que surpreendeu e também des-

13 Pe. Valério Alberton, SJ, então diretor da Federação das Congregações Marianas no Paraná.
199

Os 50 anos da Diocese de Maringá


gostou muita gente: valeu-se de todas as oportunidades que apareciam para, em conversas pessoais, apontar
o nome de Ney Braga como seu candidato preferido, argumentando sobre a conveniência de votar no seu
nome. Ney conseguiu eleger-se governador, não escondendo jamais seu reconhecimento ao apoio de dom
Jaime, que considerou decisivo para sua vitória.
Em 13 de agosto de 1961, juntamente com os bispos de Londrina, de Campo Mourão e de Jacarezi-
nho, o bispo fundou em Maringá a FAP – Frente Agrária Paranaense com o objetivo de combater a infiltração
comunista no meio rural e de repudiar a presença do então deputado federal Francisco Julião, fundador das
Ligas Camponesas, que tencionava “lançar a subversão no meio rural”. O nascimento da FAP não se deu
sem atropelos. Pelo contrário. O dia foi escolhido a dedo para coincidir com o II Congresso de Lavradores
e Trabalhadores Rurais do Paraná realizado em Maringá, nos dias 12-15 de agosto de 1961, em que a figura
mais importante seria o parlamentar pernambucano. Da parte católica, entendia-se que

era preciso lançar o movimento publicamente com a maior repercussão possível. Ora,
os militantes comunistas haviam planejado para o mês de agosto, em Maringá um
‘congresso de trabalhadores rurais’, do qual deveria participar o grande líder das ligas
camponesas do Nordeste, Francisco Julião. Aos olhos dos católicos, ele viria para ‘in-
sultar os trabalhadores rurais e incitá-los à revolta’, difundindo ‘suas idéias esquerdistas
e comunistas’. De fato, isso significaria a entrada das ligas de Julião na região, conside-
rada uma área sensível devido à grande concentração de trabalhadores rurais oriundos
do Nordeste. Os dirigentes da Igreja, indignados, consideraram o evento como uma
afronta comunista. Era a gota d’água que faria transbordar a paciência cristã e um bom
pretexto para desencadear o movimento dos bispos. Mas uma dura prova aguardava o
principiante movimento cristão (SILVA, 2006, p. 224-225).14

Numa época de nervos à flor da pele, não houve como evitar o choque entre representantes da Igreja
– padres, congregados marianos, alunos de colégios católicos – e militantes do Partidão. A polícia foi cha-
mada: “o coronel mandou descer o cacete... freira apanhou, padre apanhou, todo mundo apanhou... veio
bomba, jatos de água, veio o corpo de bombeiros. Virou uma praça de guerra; quebra-pau, um confronto
terrível”, contaria mais tarde um dos participantes do congresso de trabalhadores rurais ao professor Ângelo
Priori (2001, p. 175), que escreveu sobre o episódio. As versões apresentadas pelo lado católico são distintas,
embora não haja como esconder que estudantes e congregados marianos tiveram uma reação feroz, absoluta-
mente inesperada pelos congressistas do PCB.

Como um furacão, por onde Julião passava, havia conflito. A sua chegada ao aeroporto
de Maringá foi esperada com impaciência pelos militantes das Congregações Marianas.
Dom Jaime tinha preparado ‘o povo católico’ para que não deixasse o avião pousar.
Apesar disso, Julião conseguiu chegar até o Congresso dos sindicalistas do PCB. Se-
gundo um padre, o confronto começou logo na sessão de abertura da reunião, quando
alguns estudantes questionaram Julião, no momento em que ele expunha suas visões
sobre a reforma agrária. O conferencista recusou a polêmica e os estudantes foram
‘expulsos do local’. À tarde, durante o desfile da FAP, em nome de Deus, o Congresso
dos ‘vermelhos’ foi cercado e agredido. O padre Osvaldo Rambo relatou: ‘Um grupo
de marianos já foram... na frente (do lugar) da reunião deles, já começaram a... mexer
com eles, a incomodá-los, atirando pedras pra dentro, vaiando, gritando. [...] O padre
André Torres, que levava uma carabina em baixo da batina, comandava um ‘bando de
garotos’ nas ruas, ‘provocando tumultos nas ruas e pedindo justiça para os campone-
ses’. Puseram fogo nos cartazes. Eles vieram ‘para quebrar tudo’, para ‘acabar com o

14 O autor traz também a opinião contrária de padre Osvaldo Rambo, para quem foram os comunistas que marcaram o congresso,
depois de anunciada a fundação da FAP: “quando os comunistas souberam da nossa reunião grande pra fundar a Frente Agrária Para-
naense, eles também começaram a organizar uma concentração, uma reunião de esquerdistas e de comunistas... a quatro quarteirões,
num salão... mesmo dia, mesmas horas” (SILVA, 2006, p. 227).
200

A Igreja que brotou da mata


que eles chamavam de comunistas’. Para fazer isso, a Igreja tinha instruído os jovens
do Colégio Marista de Maringá, cerca de 3.000 estudantes (sic) e mais de 30 padres
(SILVA, 2006, p. 239-241; PRIORI, 2001, p. 173).

Admitindo, embora, alguma dose de verdade nos relatos que Silva e Priori ouviram, é preciso descontar
exageros compreensivelmente criados pela paixão da hora. Só em mente exaltada ou alheia aos fatos caberia
admitir que em 1961 o Colégio Marista de Maringá tivesse 3.000 alunos adolescentes e jovens − ninguém
convocaria crianças para confronto dessa natureza15 −, que na praça houvesse 30 padres juntos, que sob a veste
clerical padre André carregasse uma carabina. Era impossível um padre portar arma sob a batina pela simples e
boa razão, referida por dom Jaime, testemunha ocular, de que os padres, naquele dia, prevendo o confronto,
se apresentaram em trajes civis. Por outro lado, não eram 30, mas três apenas misturados aos manifestantes:
padres Osvaldo Rambo, André José Torres e Francisco Peregrina Lopes. Somados alunos do Marista e da Es-
cola Técnica de Comércio, que funcionava à noite no mesmo prédio, dificilmente alcançariam três centenas.
O PCB mobilizava-se junto aos camponeses sempre se adaptando às peculiaridades locais. Principal mote
das ligas camponesas no Nordeste brasileiro, o discurso da reforma agrária não se apresentava tão sedutor no
Norte do Paraná onde os latifúndios, em 1961, eram extremamente raros: a colonização empreendida pela
CMNP tinha privilegiado a pequena e a média propriedade. Em vista disso, a campanha desencadeada pelos
comunistas, mais que tudo, visava criar sindicatos de trabalhadores rurais com diretorias fiéis ao PCB. Depois,
seriam unificados numa confederação que lhes garantisse a orientação ideológica do campesinato norte-parana-
ense. A FAP nasceu com o claro propósito de barrar o avanço do comunismo na área rural. A mobilização dos
bispos revestia um cunho ideológico: tratava-se, na verdade, de defender a fé cristã do ataque de uma doutrina
materialista e atéia. Por isso, entre suas principais atividades estava a criação dos mesmos sindicatos, mas entre-
gues à coordenação de pessoas cristãs. Eram objetivos da Frente Agrária Paranaense, lançada pelos bispos:

1. Formação de líderes sindicais rurais;


2. Criação de sindicatos de orientação cristã;
3. Criação de cooperativas para os pequenos proprietários rurais;
4. Assistência educacional, religiosa e moral;
5. Assistência médico-hospitalar ao trabalhador rural, entre outros pontos [...] Para a igre-
ja, esse movimento não poderia mostrar fraqueza: ‘ou a FAP nasce com força, ou bem não
precisa nascer’, diziam os bispos norte-paranaenses. O padre Osvaldo Rambo, na época
vigário da paróquia São José da Vila Operária, foi encarregado pela diocese de Maringá
para ser o assessor eclesiástico da FAP e preparar toda a organização material do evento.
Dom Jaime Luiz Coelho ficou encarregado de contatar e convidar o máximo possível de
autoridades municipais, estaduais e federais, a fim de prestigiar o acontecimento [...] Os
bispos tinham uma missão histórica: organizar os trabalhadores rurais e salvá-los – como
inocentes que eram e, portanto, suscetíveis a ideologias estranhas – da influência dos co-
munistas que, se aproveitando da situação de desespero em que se encontrava o homem
do campo, os tornavam presa fácil aos ataques ‘desses agentes de Moscou’. E para isso
precisavam combater qualquer iniciativa ‘desses agentes’, como era o caso, por exemplo,
do II Congresso de Trabalhadores Rurais, que estava acontecendo em Maringá” [...] Se
aqueles foram anos conturbados, pelo menos tivemos uma intensa participação e discus-
são em torno dos problemas dos trabalhadores rurais. Excluídos da política e da cidadania
até os anos 50, estes surgiram com um vigor e uma aparente capacidade de organização
social jamais conhecida, até então, na história do Brasil. Sem dúvida, mesmo com as
diferenças e as disputas ideológicas, traduzidas muitas vezes em confrontos e violências,
a Igreja Católica e o PCB tiveram importância fundamental no processo de organização
dos trabalhadores rurais na década de 60 (PRIORI, 2001, p. 161-177).

15 Depois de 45 anos, em 31 de outubro de 2006, o Colégio Marista de Maringá, incluindo as crianças da Educação Infantil, contava
1.644 (mil, seiscentos e quarenta e quatro) alunos, conforme resposta da secretaria do Colégio a consulta do autor deste relato.
201

Os 50 anos da Diocese de Maringá


Frente Agrária Paranaense, 1961

O enterro simbólico do deputado comunista Francisco Julião.

Francisco Julião, o primeiro sentado. Ao A tropa de policiais que reprimiu com violência o
microfone, Armando de Lima Uchoa, prefeito de confronto nas ruas de Maringá.
Nova Esperança.

A FAP é pioneira na fundação, dentro do Estado do Paraná, dos sindicatos de trabalhadores rurais. Em
1969 contavam-se no Estado do Paraná mais de 100 sindicatos fundados por ela ou sob sua inspiração, um
trabalho desenvolvido, na diocese de Maringá e região, de forma muito intensa, por padre André José Torres
e também por padre Osvaldo Rambo, da paróquia São José. Heller da Silva apresenta números diferentes.
Para ele, quando em 1964 os militares tomaram o poder, os sindicatos fundados por católicos seriam 46, ou
ainda 41, senão 35 apenas, enquanto havia 86 sindicatos dos comunistas (SILVA, 2006, p. 258). Para levar a
termo o programa da Frente Agrária Paranaense, Rambo ainda fundou, em 1964, a Cooperativa Agrícola de
Maringá, destinada a pequenos proprietários rurais, com abrangência de 37 municípios. Da cooperativa era
ele o diretor-presidente, cabendo a seu primo Arno Wilibaldo Vier, dentista e agricultor, o cargo de diretor-
gerente. À semelhança de Priori, também Heller da Silva reconhece ao PCB e à Igreja Católica um papel de
capital importância na história do sindicalismo rural:

Apesar de suas diferenças ideológicas, seus discursos sobre a postura sindical se apro-
ximavam: devoção, disponibilidade e desinteresse eram constantes. Entretanto, para
a maioria destes militantes (sejam cristãos ou marxistas) suas atividades podiam tra-
zer-lhes um capital social e um capital cultural-formal, praticamente inacessível por
outros caminhos. [...] Semelhante aos sindicatos comunistas, o ponto de referência
dos católicos era sempre a observância da legalidade e dos direitos dos lavradores. As
suas divergências começavam, porém, na definição do que era direito e do que não
era. O conjunto de pontos de contato entre os dois sindicatos permitia, para além dos
conflitos, a aparição de uma espécie de cumplicidade entre um certo número de agen-
tes posicionados em campos antagônicos. [...] Apesar do papel desempenhado pelos
202

A Igreja que brotou da mata


adeptos locais do PCB – secundados pelos militantes católicos –, o norte do Paraná foi
e ainda é o berço esquecido do sindicalismo rural não só desse estado, mas também do
Brasil (SILVA, 2006, p. 271).

No ano de 1965, dom Jaime criou em Maringá a ADAR – Associação Diocesana de Assistência Rural,
obra promocional em benefício do homem do campo ao qual oferecia cursos de tratorista, de administrador
rural, formação em liderança sindical, plantio, adubação, técnicas de colheita e silagem etc., além de outros
cursos, especialmente voltados a pessoas do sexo feminino, como artes culinárias, corte e costura, alfabetiza-
ção de adultos, higiene, puericultura etc. A obra não desfrutou de vida longa. Irmã Jeanne Gaudin, principal
animadora do trabalho da ADAR, adoeceu gravemente e retirou-se para a França em 1967. A nova situação
política, por outro lado, estendeu seus reflexos também à vida do homem do campo, inviabilizando os pro-
jetos da ADAR.

ADAR, obra inaugurada em 1965 para promover a população rural da diocese.

A partir de 1964, com a entrada em cena dos governos militares, mudou radicalmente o panorama
agrícola do país e, por conseqüência, do Norte do Estado. Os anos 70 assistiram o surgimento da conveniente
ilusão do “milagre econômico”. Em nome do crescimento do bolo da renda nacional, a agricultura brasileira
foi entregue à economia de mercado, que passou a privilegiar de forma quase absoluta a produção para o
comércio exportador. Alargaram-se enormemente as fronteiras agrícolas transformando o Brasil no paraíso
das grandes empresas produtoras de insumos agrícolas em escala planetária. A geada de 1975 terminou por
sepultar inteiramente qualquer resquício da monocultura cafeeira que dera início à exploração agrícola da re-
gião, quarenta anos antes. Para alcançar o posto de um dos maiores produtores de grãos em que se converteu,
o Paraná viu-se forçado a abandonar a agricultura familiar praticada em pequenas propriedades, que fora um
dos traços mais marcantes do cultivo da terra naqueles não tão distantes, mas hoje definitivamente passados
tempos pioneiros.
Exemplo, um entre muitos, do engajamento da Igreja em causas sociais deu-se na greve dos operários da
Cia. Norpa Industrial, em 1968, seguidos, depois, pelos colegas da Cia. Cruzeiro. Conta Reginaldo Dias:

No domingo, 07 de outubro, os operários das duas indústrias [...] fizeram um ato pú-
blico, no qual receberam solidariedade de sindicatos, associações estudantis e membros
do clero [...] O impasse persistiu, na medida em que a empresa recusou a proposta e
ameaçou promover demissão em massa, caso a greve não cessasse até as 16 horas da-
quele dia. Entrou em cena, então, o bispo da cidade que, tendo manifestado solidarie-
203

Os 50 anos da Diocese de Maringá


dade ao movimento foi convidado pelos grevistas para servir de mediador.
A solução, no entanto, não foi imediata. A direção da Cia. Norpa não foi persuadida
pelo mediador que, por sua vez, incorporou-se ao acampamento montado pelos gre-
vistas. Na barraca o bispo afirmou às autoridades policiais que cessara o diálogo e que
se colocaria ao lado dos operários (DIAS, 2001, p. 211).16

Misturado aos trabalhadores no acampamento montado diante da fábrica, de batina preta, faixa roxa
e cruz peitoral, o bispo dirigiu-se aos policiais: “Se vocês entrarem aqui para espancar os operários, vão ter
que bater em mim também.” Não houve violência, mas as negociações com a empresa foram penosas e não
de todo satisfatórias para os trabalhadores, apesar da mediação da autoridade episcopal. Mais do que ganhos
financeiros, contudo, valeu o testemunho de solidariedade da Igreja a pobres operários numa greve que o
próprio comando constatou incapaz de manter-se por mais tempo.
Ainda que menos visíveis, nem por isso de menor valor, também em outras áreas de atividade humana se
fez sentir a presença fraterna da Igreja de Maringá. No dia 24 de novembro de 1978, “O Diário” estampava
em primeira página a manchete: “Após 15 anos Maringá e região ganham hoje junta de Conciliação e Julga-
mento”. O texto historiava a longa participação de dom Jaime na conquista, que pode assim resumir-se:
Em 1967 o Sindicato dos Empregados do Comércio de Maringá deu entrada em processo adminis-
trativo (prot. nº TST-3-177/67) no Tribunal Superior do Trabalho, à época com sede no Rio de Janeiro,
pleiteando a criação da Junta de Conciliação e Julgamento na Comarca de Maringá. No dia 14 de outubro
de 1968, aproveitando audiência com o presidente Arthur da Costa e Silva, em Brasília, para tratar da TV
Cultura de Maringá, referendando o pedido do Sindicato dos Empregados do Comércio de Maringá, dom
Jaime entregou ofício solicitando a criação da Junta na cidade. Thelio da Costa Monteiro, presidente do Tri-
bunal Superior do Trabalho, em 20 de março de 1969 enviou a dom Jaime ofício (prot. TST-3-177/67-GP
123/69) informando andamento do processo, que aguardava apenas informações pedidas ao juiz da Comarca
de Maringá, Cyro Maurício Crema (este respondeu, no dia 31, ressaltando “o interesse do bispo diocesano
de Maringá pela criação da esperada Junta de Conciliação e Julgamento de Maringá”). Jarbas Passarinho, mi-
nistro do Trabalho, em visita a Maringá, no dia 26 do mesmo mês recebeu em mãos um ofício no qual dom
Jaime reforçava o anseio de Maringá e região pela criação da Junta, aproveitando para pedir sua oportuna
influência. Em 20 de junho, o presidente do Tribunal Superior do Trabalho informou ao bispo ter encami-
nhado, com parecer favorável, ao ministro da Justiça, o prot. nº TST-3-177/67, recomendando a criação da
Junta, com jurisdição sobre as vizinhas comarcas de Mandaguaçu e de Marialva. Três dias depois, telegrama
de João Zoghbi, diretor geral do TRISEC, informava a dom Jaime que o processo tinha sido encaminhado
ao Ministério da Justiça, onde recebera o nº MJ 18885.
As coisas, porém, movimentam-se devagar nos escaninhos da burocracia de Brasília. Somente no dia 24
de novembro de 1978 se instalou a Junta de Conciliação e Julgamento na Comarca de Maringá com compe-
tência sobre 36 cidades da região, compreendendo, além de Maringá, os municípios: Alto Paraná, Astorga,
Atalaia, Colorado, Cruzeiro do Sul, Doutor Camargo, Engenheiro Beltrão, Fênix, Floraí, Floresta, Flórida,
Guaraci, Iguaraçu, Itambé, Ivatuba, Japurá, Jussara, Lobato, Mandaguaçu, Mandaguari, Marialva, Munhoz
de Melo, Nossa Senhora das Graças, Nova Esperança, Ourizona, Paiçandu, Paranacity, Presidente Castelo
Branco, Quinta do Sol, Santa Fé, São Carlos do Ivaí, São Jorge, São Tomé, Terra Boa e Uniflor. O juiz que
assumiu a Junta de Maringá, Ismael Gonzalez, recepcionado, às 9h30, no aeroporto pelo prefeito João Pauli-
no Vieira Filho, autoridades e lideranças sindicais, dali se dirigiu diretamente à residência de dom Jaime, cuja
participação foi intensa e decisiva para o objetivo alcançado (APÓS..., 1978, p.1-2).17
No campo político eleitoral, a campanha para prefeito do município deu a conhecer, em 1968, um

16 Os membros do clero a que Dias se refere eram padres Almeida e Orivaldo, ligados ao Grupo Lebret, que moravam na residência
episcopal. A pedido do comando da greve, convidaram o bispo para dialogar com operários e patrões.

17 Os “15 anos” da manchete contaram-se provavelmente a partir da ditadura militar, implantada no início de 1964.
204

A Igreja que brotou da mata


bispo de Maringá ainda mais comprometido com a política do que o fora, oito anos antes, no pleito para
escolha de governador do Estado. Forçados a engolir um bipartidarismo esdrúxulo em que os ideólogos
do regime militar imaginavam engessar todas as correntes políticas do país, os eleitores maringaenses foram
chamados a decidir entre ARENA – que apresentou João Paulino Vieira / Rodolfo Purpur, na chapa 1,
e Ardinal Ribas / Helenton Borba Cortes, na chapa 2 – e MDB, de chapa única, composta por Adriano
José Valente / Renato Bernardi. Registre-se, em respeito à verdade, que dom Jaime em momento algum
emitiu pronunciamento público nem subiu em palanque. Descontente com a gestão anterior de João Pau-
lino (1961-1964) por divergências quanto à Santa Casa, construção da catedral e outros temas, o bispo
esforçou-se quanto pôde para negar-lhe um segundo mandato: das duas chapas do partido oficial, a sua era
a mais forte. Ainda há quem recorde o bordão criado por Joe Silva, locutor oficial dos comícios do MDB:
“Essa não deu, ARENA!” De fato, não deu. Reunindo todos os descontentamentos que o sistema vigen-
te conseguia nutrir, o certo é que o MDB, por força do episcopal apoio ou independente dele, alcançou
19.471 votos (55,7%), enquanto, com duas legendas, a ARENA obteve 15.459, ou 44,3% de todos os
votos válidos (ALCÂNTARA, 2001, p. 258). Na segunda gestão de João Paulino (1977-1983), o relacio-
namento entre prefeito e bispo transcorreu em clima de colaboração e entendimento. Quando da eleição
de Said Felício Ferreira (1983-1988), dom Jaime, embora participando de forma menos visível, não se re-
cusou, ainda uma vez, a tornar clara sua posição em vista daquilo que julgava o melhor para a comunidade
nos quatro anos seguintes.
A participação na política partidária, contudo, trouxe-lhe mais dissabores que alegria. Em carta ao
arcebispo de Curitiba, referindo-se ao relacionamento com os políticos locais, confessou: “Vivemos em boa
harmonia. Não vivo, é claro, atrás dos políticos, bajulando-os, e nem faço mais nada por êles como fiz pelo
Ney (Braga). Basta a lição” (COELHO, 1966, 1 f.). Tantas foram, desde 1960, as vezes em que bateram à
sua porta políticos de todos os naipes, de todas as regiões do Paraná e até de outros Estados, ansiosos pelos
dividendos eleitorais a auferir com o seu prestígio, tantas, igualmente, as esperanças frustradas por homens
públicos de todo o país que, afinal, desiludido e cansado, o já arcebispo de Maringá decidiu: “Mesmo que
Jesus Cristo se candidate a algum cargo público, não receberá apoio meu”.
Pelo envolvimento em episódios que afetavam a sorte dos seus diocesanos não podia ele escapar à
atenção das autoridades ciosas da “segurança pública”, sobretudo depois da edição do AI-5 (13 de dezembro
de 1968), quando se abriram de vez as portas da repressão. Sua pasta, de nº 02064 no Arquivo Público do
Estado do Paraná, traz anotações hoje risíveis, mas consideradas importantes por autoridades da época:

Em 20-01-70 – É proprietário do jornal Folha do Norte do Pr. Onde foram feitos


comentarios dúbios sobre as forças Armadas e o govêrno. Parece que o jornal está
arrendado. Dom Jaime por suas atitudes parece ser “progressista”. Consta que por se
julgar destratado no Quartel da 4ª Cia Inf., disse ao professôr Renato Bernardi que
era uma pena não ter acontecido antes de terminar a procissão de 6ª Feira Sta porque
assim êle, Bispo, teria acabado com a turma de Apucarana. Na missa de Domingo de
Ramos comparou Che Guevara a Cristo. (V.Pasta 2ª Sec.5ª RM).
Em 06/09/77 – Conf. Doc. Min. Ex. 2ª Seção, o fichado pertence a Igreja Progres-
sista do Norte do Paraná, Engajou-se sem reservas no “Progressismo fazendo cons-
tantes criticas ao governos (sic), no sistema e nas autoridades. (V/P Igreja Católica).
Em 08/12/77 – Conf. Folha de São Paulo de 05/10/77, o fichado afirmou que
recebeu correspl do Vaticano contendo exemplar do jornal “Voz Operária”, órgão
central do PCB, e exemplares procedentes de Tóquio e de Roma, sendo que um dos
artigos comenta que “comunistas e cristão (sic) no Brasil estão unidos no memo (sic)
combate pela democracia e pelo progresso da justiça social. (V/P MARINGÁ).
26/05/81 – Conf. O Est. do Paraná de 23/10/80, o nominado participou da reu-
nião realizada onde todos os bispos da Região Sul II da CNBB e a Comissão de
Justiça e Paz do Pr., organizaram para emitir uma nota de solidariedade ao Padre
Vito Miracapillo, que teve sua expulsão decretada pelo presidente da República. O
nominado representou o bispo de Cornélio Procópio dom Domingos Wisniewski. O
205

Os 50 anos da Diocese de Maringá


nominado entre outros assinou a nota. (V/P-CNBB) (ARQUIVO PÚBLICO DO
PARANÁ, 1970-1981, f. 1-3).18

Quem atravessou os chamados “anos de chumbo” recorda o clima de desconfiança que dominou o país,
subitamente convertido em imenso salão sob controle de um onisciente “big brother” que tudo anotava, re-
gistrava e guardava como prova contra os cidadãos. Fosse qual fosse a profissão exercida ou o cargo ocupado,
a pessoa corria perigo de ser rotulada de subversiva, bastando não agradar aos senhores do poder. Denúncia
gratuita, motivada por vingança, inveja ou antipatia, era suficiente para comprometer a vida de quem nunca
sonhara estar sob suspeita. Pelo menos um membro do presbitério de Maringá teve, naquele tempo, sorte
igual à do bispo. O Arquivo Público do Paraná guarda pasta nº 03120, com documentos e informações refe-
rentes a “Orivaldo Robles – padre”, onde consta ofício de 6 de março de 1969 do chefe do SNI, agência de
Curitiba, ao delegado da DOPS/PR cuja resposta foi dada em 30 de agosto do mesmo ano:

1. Esta Agência teve conhecimento de que o Padre Oriovaldo (sic) Robles, da Paró-
quia de Maringá-PR, em suas pregações dominicais, critica o Exmº Sr Presidente da
República e as Fôrças Armadas, como corruptas; atua no meio estudantil; é pregador
do amor livre (sic), e, finalmente, que a população de Maringá repudia a sua atuação.
2. Em face do expôsto, tenho a honra de me dirigir a V.S. para solicitar informações
quanto: veracidade dos fatos apontados; caso se confirmem, ampliar; dados de qua-
lificação, antecedentes políticos e ideológicos da pessoa referida e outros dados [...].
Em resposta [...] informo que, quanto à ideologia política do Padre Orivaldo Robles,
a mesma é francamente para a esquerda, pois o referido sacerdote, quando dos seus
sermões, se aproveitava para atacar às Forças Armadas, porém somente assim proce-
dia quando os mesmos não eram irradiados, e, quando tivemos conhecimento de tais
discursos, foi justamente na ocasião em que V.S. enviou um agente para conseguir a
gravação dos mesmos. Outrossim, informo à V.S., que o Padre Oswaldo (sic) Robles,
é grande amigo do estudante Francisco Timbó de Souza elemento este fichado nesta
Especializada como Subversivo, com o qual mantém sempre contato (ARQUIVO PÚ-
BLICO DO PARANÁ, 1969-1973, f. 9, 1).19

Apesar de constar, na certidão expedida em 12 de abril de 1971, pela Delegacia de Ordem Política e
Social de Curitiba, que “não figura o requerente como indiciado em Inquérito Criminal por infração à Segu-
rança Nacional, inexistindo ainda decreto judicial de prisão preventiva”, Robles foi excluído do corpo docente
do Ginásio Estadual Maria José Rocha Braga e também da Escola Normal Regional Claudino dos Santos,
ambos na cidade de Paranacity, nos quais lecionava, e por cuja paróquia respondia na época. Na Inspetoria
Regional de Ensino, em São João do Caiuá, aonde foi chamado no dia 4 de junho de 1971, recebeu comu-
nicação da inspetora Anirce Bolter Veltrini de que estava proibido de lecionar em estabelecimentos oficiais
de ensino. Conquanto tivesse Antônio Tortato, prefeito de Paranacity, de todas as formas, envidado esforços

18 A alusão à 4ª Cia. Inf. de Apucarana refere-se, provavelmente, à visita feita por dom Jaime àquele quartel, em 1969, para exigir a sol-
tura de A. A. de Assis, poeta e jornalista de Maringá, brutalmente arrancado da cama, de madrugada, por soldados fardados daquela
Cia. e para lá conduzido sob suspeita de atividade subversiva. Um jovem ativista de política estudantil, natural de São Fidélis (RJ),
como Assis, tinha sido detido no Sudoeste do Paraná com seu endereço no bolso, passado provavelmente por algum conterrâneo
conhecido de ambos. Sobre os exemplares de “Voz Operária”, pela imprensa dom Jaime denunciou a manobra, alertando para o
falso envio do jornal pelo Vaticano, que tinha o evidente propósito de comprometer a Igreja Católica perante o governo brasileiro.
Os informes são respostas a pedidos de renovação de passaporte. A certidão fornecida pela Delegacia de Ordem Política e Social
reconhece não haver “indiciamento do requerente em inquérito criminal por infração à Segurança Nacional nem decreto de prisão
preventiva” (ARQUIVO PÚBLICO DO PARANÁ, 1969-1973, f. 13).

19 O autor destas notas fez pedido da documentação existente a seu respeito e também de padre Almeida e irmã Jeanne. Em e-mail de
23 de março de 2006, a Sala de Pesquisa do Arquivo Público do Estado, de Curitiba, respondeu: “Encontramos dossiê individual do
Pe. Orivaldo Robles contendo ofícios de 1969, requerimentos para magistério estadual, certidão para fins de magistério, atestado de
conduta. O dossiê 2956 – cx. 447 contém 14 páginas. Os outros nomes, Pe. Antonio de Pádua Almeida e Irmã Jeanne Gaudin, não
possuem documentação”.
206

A Igreja que brotou da mata


junto a autoridades estaduais para reverter o quadro, as providências não surtiram efeito. Tornou-se impossí-
vel mudar disposições estabelecidas por Curitiba. Assim que regressou de Roma, onde se encontrava quando
da proibição feita ao pároco de Paranacity, dom Jaime escreveu cartas, nos dias 4 e 5 de agosto de 1971, ao
chefe da agência regional do SNI e ao comandante da 5ª Região Militar, ambos da capital do Estado, mani-
festando estranheza por não ter sido comunicado, conforme suas palavras, de importante “informação que,
penso, como Bispo da Igreja nesta Circunscrição Eclesiástica de Maringá, devo saber”. Acrescentou ainda nas
cartas a ambos: “[...] surpreende-me a atitude tomada, a não ser que haja outros motivos que desconheço, e
tão graves, que gostaria de saber” (COELHO, 1971, 2 f.).
A resposta dada pelas duas autoridades militares remeteu o assunto à Secretaria de Educação e Cultura
do Estado, a cuja exclusiva responsabilidade, conforme informaram, estava afeta a medida tomada. Em via-
gem, dias mais tarde, à capital do Estado, dom Jaime procurou Haroldo Carvalhido, secretário daquela pasta,
obtendo dele a explicação de que bastava Robles ter na DOPS a ficha com os informes anotados para lhe acar-
retar imediata interdição ao magistério estadual. Desde 1971, de fato, e já se passaram 35 anos, nunca mais
o “nominado” (para usar o jargão dos órgãos de informação do período), ministrou única aula remunerada
em escola pública.
Entrevistado pelo O Diário em 12 de novembro de 2006, o advogado e jornalista pernambucano Laér-
cio Souto Maior, uma das maiores vítimas, entre nós, da repressão dos anos de chumbo, declarou:

Depois disso [cerco, em outubro de 1968, de estudantes a comício de Paulo Pimentel e ame-
aça de intervenção da Polícia Militar], logo em seguida, no mês de dezembro, foi decre-
tado o AI-5 e, na mesma semana, eu e mais dois maringaenses fomos convocados pelo
DOPS. Eu fiquei quase um dia detido. Quem eram esses três maringaenses? Eu, Francisco
de Souza e o padre Orivaldo Robles (SOUTO MAIOR, 2006, p. D5, grifo nosso).

Na caminhada de quatro décadas à frente da Igreja de Maringá, o primeiro bispo firmou-se como con-
dutor de sua Igreja no rumo do crescimento espiritual, sem descuido do aprimoramento cultural, moral, eco-
nômico e social do povo que lhe coube dirigir. Deixou impressa a marca de uma Igreja voltada à evangelização
de pessoas de carne e osso, participantes do mundo real e contraditório em que vivemos. Nunca se cansou de
incentivar padres, religiosos e fiéis cristãos leigos a se inserirem nos desafios concretos da sua comunidade em
vista do bem-estar, da paz e da convivência harmônica entre os cidadãos.
Por toda a extensão da arquidiocese de Maringá, embora com falhas decorrentes da natureza humana,
desde há muito, vem fazendo-se ouvir a voz da Igreja na defesa dos menos favorecidos e na luta por vida digna
para todos. Não em nome de ideologias nem de interesses políticos, mas por seu compromisso com o Evange-
lho de Cristo, a Igreja Católica enfrenta – e entre nós os exemplos estão à mostra, bastando ter olhos para ver
– delicadas questões como o desemprego e a falta de oportunidades para as novas gerações; o déficit habita-
cional; as carências no campo da educação, da saúde e da segurança; o agronegócio que esmaga a agricultura
familiar; o aviltamento dos preços dos produtos agrícolas; a insegurança dos pequenos agricultores diante
de intempéries e malogro de safras; o direito ao repouso dominical de cortadores de cana, no campo, e de
comerciários, na cidade; a insegurança dos assentados do MST; a incerteza dos trabalhadores sazonais (bóias-
frias); a falta de indústrias de transformação que gerem mão-de-obra próxima ao produtor; o esvaziamento
dos pequenos municípios; a exploração da mulher e do menor; a corrupção de muitos que detêm o poder em
qualquer nível; a injusta retribuição do trabalho... e uma interminável série de inquietações suportadas pela
maioria da população. Se elas incidem sobre a vida de homens e mulheres preocupados com o bem de todos
os cidadãos, aos membros da Igreja não são, de forma nenhuma, indiferentes. Ao contrário:

As alegrias e as esperanças, as tristezas e as angústias dos homens de hoje, sobretudo


dos pobres e de todos os que sofrem, são também as alegrias e as esperanças, as tristezas
e as angústias dos discípulos de Cristo. Não se encontra nada verdadeiramente humano
que não lhes ressoe no coração. Com efeito, a sua comunidade se constitui de homens
207

Os 50 anos da Diocese de Maringá


que, reunidos em Cristo, são dirigidos pelo Espírito Santo, na sua peregrinação para o
Reino do Pai. Eles aceitaram a mensagem da salvação que deve ser proposta a todos.
Portanto, a comunidade cristã se sente verdadeiramente solidária com o gênero huma-
no e com sua história (LG 1).

Atenta às orientações da CNBB, a Igreja de Deus de Maringá esmerou-se, em especial nas décadas de
1970-1980, por converter-se em Igreja servidora, como proposto, à época, na chamada linha 6 do Plano
de Pastoral de Conjunto,20 e hoje, nas quatro exigências da evangelização inculturada. Desde os primeiros
lampejos da inspirada contribuição latino-americana que foram as CEBs – Comunidades Eclesiais de Base, a
diocese de Maringá, ao lado de outras do Paraná, abraçou com fervor essa “uma nova forma de ser Igreja” e
dispôs-se a caminhar em busca de outra sociedade possível. Na esteira aberta pelo Concílio Vaticano II, por
Medellín e Puebla, o Paraná foi alertado para modalidades de inserção da fé na vida que antes não eram postas
em prática. Em sintonia de pensamento e trabalho com o Regional Sul II da CNBB, a Igreja maringaense não
estranhou comprometer-se com as situações e os reclamos vivos do seu povo.
Embora não falte quem, por desinformação ou malícia, insista em classificá-las de forma diversa, é opor-
tuno ressaltar a validade de celebrações populares como a Romaria do Trabalhador e Romaria da Terra, além
de organismo como a CPT – Comissão Pastoral da Terra, muitas vezes acusada de contrária ao Evangelho.
Às três se liga de forma indissociável, na nossa arquidiocese, o nome de padre Zenildo Meggiato.21 Com-
prometido com a causa da terra e do trabalhador rural, ele não se ocupa com estéreis discussões de gabinete,
mas enfrenta corajosamente as causas do sofrimento de irmãos excluídos de uma sociedade injusta. Seu en-
volvimento com a pobreza não se traduz em discurso ideológico, mas em exemplo de despojamento pessoal
e comunhão com os fracos. Incompreendido, processado várias vezes, ameaçado de morte, não se cansa nem
desanima. Em nosso meio, Meggiato afirma-se como liderança evangelicamente solidária com o homem do
campo do Paraná e do Brasil.

20ª Romaria da Terra do Paraná, realizada em São Pedro do Ivaí, no dia 21 de agosto de 2005.

20 O histórico PPC, elaborado pelo episcopado brasileiro para o qüinqüênio 1966-1970, direcionava a ação da Igreja para seis linhas: 1.
unidade visível, 2. missão, 3. catequese, 4. liturgia, 5. ecumenismo e 6. presença no mundo. Em maio de 2004, foi relançado como
nº 77 da série “documentos da cnbb” (coleção azul).

21 A arquidiocese de Maringá realizou, em 1º de maio de 2006, a 17ª Romaria do Trabalhador. A Romaria da Terra de 2006 foi a 21ª
promovida no Paraná. A CPT, entidade nacional ligada à CNBB, foi fundada em 1975. Na cidade paranaense de Cascavel aconte-
ceu, em janeiro de 1984, o primeiro encontro do MST – Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra.
208

A Igreja que brotou da mata


Se, em tempos passados, por causa de séculos de uma prática apenas “espiritual” e intimista do catoli-
cismo, ações desse tipo eram vistas como estranhas à fé, com o passar dos anos foram impondo-se, na medida
em que se firmou a consciência de sua ligação com a fé traduzida em obras. Hoje ações transformadoras da
sociedade não conflitam com os gestos “religiosos” tradicionais de missa, confissão, catequese, liturgia, reu-
nião de grupo, leitura da Bíblia, oração e devoção popular: terço, via-sacra, novena, procissão, coroação de
Nossa Senhora etc.
Em todos os agrupamentos humanos da diocese, desde o seu primeiro momento, lideranças católicas
somaram-se às forças vivas da sociedade civil no reconhecimento da responsabilidade social comum. Fiéis
cristãos leigos sempre foram instruídos a não se omitirem frente às obrigações de cidadãos do mundo criado
por Deus para ser morada de todos. Temas de justiça social, participação popular, direitos humanos, cidada-
nia em vários níveis, ecologia, defesa do meio ambiente etc. vêm sendo desenvolvidos com naturalidade nas
paróquias e nas comunidades menores. Fiéis católicos, em maior ou menor grau, comprovam interesse pela
formação da consciência política e social, como se viu na freqüência à Escola de Formação de Fé e Política,
fundada em 1996, pelo CEPAT – Centro de Pesquisas e Apoio aos Trabalhadores, com respaldo do Regional
Sul II da CNBB. O mesmo se nota no estudo das Semanas Sociais promovidas pela CNBB Nacional e em
momentos marcantes da Igreja arquidiocesana. Relatam-se casos de pioneirismo da Igreja em processos des-
tinados a agregar valor ao produto do trabalho e a aumentar a renda familiar, a melhorar as condições de vida
de trabalhadores e de suas famílias através de ações de higiene, saneamento, horta, coleta seletiva de lixo etc.
Há que ressaltar a ação da Pastoral da Saúde e da Pastoral da Criança, importantes agentes transformadores da
vida das pessoas. Esta última, nascida em Florestópolis, na vizinha arquidiocese de Londrina e alicerçada em
estrutura ágil e eficaz, irradia sua presença transformadora para praticamente todas as paróquias da arquidio-
cese de Maringá. Ainda que políticos inescrupulosos ou pessoas desonestas volta e meia tentem pegar carona
nos méritos do seu trabalho exemplar, a Pastoral da Criança nasceu e se conserva genuína obra evangelizadora
da Igreja Católica dentro da exigência do serviço.
Muitas entidades civis vicejam em Maringá e região, nascidas da inspiração de cristãos leigos conscientes
ou por eles integradas, com ganhos reais na qualidade de vida das pessoas e da comunidade. Assim o Movi-
mento Voz e Vez da Mulher; o MECUM – Movimento Ecumênico de Maringá; a ASSINDI – Associação
Indigenista de Maringá, fundada a 19 de abril de 2000, pela liderança de Darcy Dias de Souza, com meritório
trabalho junto a índios da etnia Kaingang e Guarani; a Associação União e Consciência Negra; os Amigos do
HU – Hospital Universitário cujo primeiro coordenador foi o arcebispo dom Murilo, sucedido por doutor
Aníbal Bianchini da Rocha, o “jardineiro” de Maringá; associações, sindicatos, entidades de classe, clubes de
serviço, ONGs etc. O respeito de que a Igreja Católica se fez merecedora tem alicerce no valor de figuras
respeitáveis do seu grêmio, à frente das quais elevam-se dom Jaime, dom Murilo, dom João, dom Anuar...
Vez por outra, em episódios que jogam com o destino da população inteira ou de grupos, quando a exigência
é de alguém confiável, seus representantes são lembrados para função de comando ou de arbitragem. Não
certamente por causa de poder econômico ou político, que a Igreja não possui, mas com base no patrimônio
de respeito e credibilidade construído por sua presença voltada unicamente à evangelização.
Nas eleições municipais de Maringá em 1996, além de, entre dezenas de candidatos a vereador, indicar
sete que considerou dignos do voto de eleitores católicos, a Igreja promoveu ainda, através do Conselho
Arquidiocesano de Leigos, no auditório Dona Guilhermina, ao lado da Cúria Metropolitana, no dia 4 de
setembro, um histórico debate do qual participaram os nove candidatos a prefeito do município. O evento,
realizado pela primeira vez na cidade, foi definido como “o maior e mais importante acontecimento político
do ano, pelo menos para os leigos da Igreja que está em Maringá” (LEAL, 1996, p. 5). Pelo acatamento que
conquistou com a seriedade de suas propostas acima de interesses pequenos, outra vez a Igreja Católica foi
solicitada, no governo arquidiocesano de dom Murilo, em 14 de setembro de 2000, a conduzir novo encon-
tro político que ficou conhecido como o debate da Igreja Católica. Por mais de três horas, como acontecera
quatro anos antes, também nove candidatos à prefeitura municipal, agora no plenário da Câmara Municipal,
discutiram suas propostas num clima de respeito e civismo. Grupos de candidatos a vereador, em várias paró-
quias, tiveram oportunidade, em condições de igualdade, de dialogar com os eleitores para tornarem conhe-
209

Os 50 anos da Diocese de Maringá


cida sua plataforma legislativa. As grandes questões levadas a debate popular invariavelmente encontram eco
no coração da Igreja que está em Maringá.
No atual desafio proposto às famílias pelo criminoso universo das drogas, embora incapaz de alcançar sua
erradicação, a Igreja Católica vem desenvolvendo o mais consistente programa de recuperação de dependentes
químicos praticado na região. Em agosto de 1995, depois que o procurou a mãe de um jovem internado em
Franca para tratamento da dependência, dom Jaime repartiu com padre Júlio Antônio da Silva, cura da cate-
dral, sua angústia de pastor diante do problema. Com voluntários reunidos nos colégios católicos e no Insti-
tuto de Educação, padre Júlio formou um grupo disposto a discutir providências. Sob inspiração do NAREV
– Associação Núcleo de Apoio e Recuperação da Vida, da cidade de Franca, decidiu-se pela criação em Maringá
de organismo semelhante. Em reunião havida no salão paroquial da igreja de Cristo Ressuscitado, no dia 3 de
março de 1997, foi criada a Associação Maringá Apoiando a Recuperação de Vidas – MAREV, destinada a re-
alizar o mesmo trabalho de Franca, fundamentado sobre o tripé espiritualidade, disciplina e laborterapia. Papel
importante desempenhou um grupo de fiéis da catedral, existente desde 1992, batizado de Projeto Mais Vida,
que promovia acampamentos, encontros de revitalização do ser-pessoa, retiros espirituais, acompanhamento
personalizado etc. Para obtenção do espaço físico necessário à implantação do centro de terapia foi fundamen-
tal a generosidade de padre Gerhard Schneider, proprietário de uma chácara, o “Recanto Patmos”, com área de
cinco alqueires paulistas, distante 18km do centro de Maringá, que foi por ele doada à instituição. O MAREV
tem sua sede urbana na Rua Lopes Trovão, 395, na mesma residência em que dom Jaime se instalou em 1957,
quando chegou a Maringá. O prédio precisou sofrer algumas adaptações para servir como Casa de Apoio “São
Francisco de Assis”, nome atual, inaugurada pelo arcebispo de Maringá no dia 5 de junho de 2000. Aí se orga-
nizam a administração e a triagem, sendo também acolhidas as famílias dos dependentes.
O MAREV desfruta hoje do reconhecimento de utilidade pública municipal (Lei nº 4675/98), esta-
dual (Lei nº 13.091/2001) e federal (Portaria nº 725/2001), tendo obtido no CNAS – Conselho Nacional
de Assistência Social o registro nº R0047/2003, ao qual acompanhou o certificado nº CCEAS0026/2003,
renovável a cada triênio. Para o bom êxito do trabalho requer-se o comprometimento da família, que recebe
a orientação do Grupo de Amor Exigente Paulo de Tarso, fundado em Maringá em 8 de junho de 1995,
entidade de apoio familiar aos dependentes em fase de tratamento. Desde sua fundação até julho de 2006,
o MAREV conseguiu devolver à sociedade 983 (novecentos e oitenta e três) homens saudáveis, muitos dos
quais já beiravam perigosamente a autodestruição.
Pela dedicação manifestada a pessoas carentes, em 1996, Schneider recebeu da Prefeitura do Município
de Maringá concessão para uso de um terreno de quase dez alqueires paulistas, situado no distrito de Iguate-
mi, no qual implantou duas obras às quais chamou “recantos”. No “Recanto Mundo Jovem” são acolhidos
por volta de 25 adolescentes do sexo masculino, com idade entre 14 e 18 anos, vítimas de drogas, aos quais
é proporcionado tratamento. Em agosto de 1999, ex-dependentes recuperados pelo MAREV passaram a
colaborar no trabalho ali desenvolvido. A segunda obra, “Recanto da Esperança” destina-se a abrigar andari-
lhos do sexo masculino que perambulam pela cidade, sem família nem residência. Aos cerca de 30 assistidos
é devolvida a auto-estima através do sustento que conseguem com o trabalho agrícola, abrindo possibilidade
para sua reintegração social e religiosa. Um terceiro recanto, próximo à Penitenciária Estadual de Maringá,
na Estrada Bandeirantes, Schneider denominou “Recanto da Fraternidade – Plantando Vidas”. Em terreno
também cedido pela prefeitura municipal, com área aproximada de sete alqueires paulistas, abrigam-se ex-
presidiários e dependentes químicos em processo de ressocialização e tratamento. O trabalho é dirigido por
fiéis cristãos leigos voluntários e conta com a colaboração de profissionais da área.
Assim como do NAREV de Franca surgiu o MAREV de Maringá, também este gerou prole sadia. Na
esteira dos bons resultados colhidos nasceram APREV – Associação Prudentina Recuperando Vidas, de Presi-
dente Prudente (SP), e CIAREV – Associação Cianorte Apoiando e Recuperando Vidas, de Cianorte (PR).
Dom Murilo tornou-se responsável por novos passos na caminhada de uma Igreja que encontrou dis-
posta, apesar das naturais falhas, a servir aos irmãos. Por sua iniciativa, religiosas da Copiosa Redenção para cá
vieram no dia 12 de dezembro de 1998, com o propósito de atender jovens do sexo feminino, dependentes
químicas e gestantes grávidas. A fim de acolhê-las a arquidiocese alugou uma residência na Gleba Maringá, pró-
210

A Igreja que brotou da mata


xima do trevo de saída para Paranavaí, à qual foi dado o nome de Casa de Nazaré. A voluntária italiana doutora
Maria Concetta Filizzola, de profunda vida cristã, que freqüentemente visita seus familiares em Maringá, co-
municou ao arcebispo o desejo de construir uma obra de socorro a jovens que, ao engravidarem, sem estrutura
para isso, tornavam-se vítimas de rejeição e preconceito. Com dinheiro próprio e colaboração de católicos da
Ordem Franciscana Secular Italiana das regiões de Basilicata e Salerno, além das paróquias de San Costantino
di Rivello, Lagonegro, Potenza, Lauria, Sapri Scario e Eboli, e também de Maringá, reuniu a quase totalidade
dos recursos necessários à construção. O terreno foi obtido por doação da Prefeitura do Município de Maringá.
Terminada a obra, ainda que seus objetivos originais não coincidissem inteiramente com os da Casa de Nazaré,
Concetta concordou em ceder-lhe as novas instalações, na Rua Rio Samambaia, nº 1161, conjunto Itaparica.
Em sua nova versão e endereço, a Casa de Nazaré foi inaugurada no dia 4 de agosto de 2000.
Ainda no campo do serviço ao mundo, que a Igreja entende como exigência da evangelização, no dia
11 de outubro de 1999, um grupo de pessoas preocupadas com a falta de leitos nos hospitais de Maringá para
atendimento aos portadores do vírus HIV/AIDS, dirigiu-se a dom Murilo na tentativa de obter algum tipo
de ajuda. Na catedral, padre Júlio era testemunha de idêntica preocupação revelada pelo grupo da promoção
humana de sua comunidade paroquial. Lançou, por isso, aos fiéis o desafio de ver construída na cidade uma
casa de apoio aos portadores do vírus HIV. Com o empenho de um decidido voluntariado, sobretudo femi-
nino, e a colaboração do poder público municipal, no dia 7 de julho de 2001 foi possível inaugurar a primeira
etapa da Casa de Emaús – Centro de Apoio ao Portador do Vírus HIV/AIDS. Ela nasceu sob a luz da expe-
riência de fé dos discípulos que descobriram o Senhor na pessoa do desconhecido que com eles caminhava
(LUCAS 24, 12-35). A iniciativa pretende recuperar a dignidade do portador, oferecendo-lhe suporte nos
níveis humano, espiritual e psicológico, garantindo melhora das condições de vida e, conseqüentemente, do
tempo de sobrevida. Trata-se, como é fácil perceber, de proposta de serviço numa área em que se deterioram
a solidariedade e a dignidade dos clientes e de seus familiares. Muitos se encontram desamparados e em situ-
ação que desestimula o auto-cuidado, negligenciando até o tratamento. Os atendidos pertencem, na maioria,
às faixas mais carentes da população. São os que mais sofrem, porque a doença os torna frágeis física, moral e
psicologicamente. Muitos já perderam o emprego, não dispõem de fonte de renda nem de sustentáculo fami-
liar. São mais de 200 pessoas cuja situação afeta igualmente as suas famílias. Além das ações oferecidas pelos
organismos oficiais da área de saúde pública, a casa se vale também de parcerias com universidades locais em
várias modalidades de atendimento. Sua área de abrangência compreende os municípios de Maringá, Sarandi,
Paiçandu, Santa Fé, Nossa Senhora das Graças, Fênix, Marialva, Nova Esperança, Astorga, Floresta, além de
outros 20 municípios. O espírito que anima o trabalho reside, porém, mais que tudo, no amor de voluntários,
como Dirce Maria Bernardi Henriques, falecida a 17 de julho de 2006. A Casa de Emaús – Centro de Apoio,
confiada à Sociedade Beneficente Estrela da Manhã, está localizada na Rua Professora Letícia de Paula Moli-
nari, 239, esquina com Rua Ana Cordeiro Dias, no Jardim Imperial, em Maringá.
Na 21ª assembléia geral do povo de Deus da arquidiocese de Maringá, realizada em 15 de novembro
de 2003, no Colégio Regina Mundi, o arcebispo dom João Braz de Aviz apresentou o trabalho de Jaime
Graciano Trintin, integrante do Conselho Arquidiocesano de Pastoral em nome da Comissão de Serviço,
doutor em Economia e professor na Universidade Estadual de Maringá. Trintin elaborou pesquisa abrangente
sobre a evolução dos 399 municípios paranaenses quanto ao IDH (Índice de Desenvolvimento Humano),
apontando potencialidades e carências de cada um. Pelo valor científico do estudo, a assembléia o adotou, nos
municípios abrangidos pela arquidiocese, como instrumental de conhecimento da realidade em vista da ação
evangelizadora da Igreja.
Em 2006, um grupo de padres do clero diocesano juntamente com lideranças leigas de várias paróquias
criou a ARAS – Associação de Reflexão e Ação Social, ligada à Comissão de Serviço em nível arquidiocesano.
São seus objetivos:
• Contribuir com a inclusão e a eqüidade dos indivíduos e grupos excluídos.
• Promover o trabalho em rede no que se refere às ações sociais em funcionamento nas diversas comu-
nidades paroquiais.

211

Os 50 anos da Diocese de Maringá


Nos dias 22 e 23 de julho, no CEPA – Centro de Pastoral da Arquidiocese, em Maringá, a ARAS, da
Comissão de Serviço arquidiocesana, promoveu a 1ª Conferência Arquidiocesana para Ações Sociais com o
objetivo de estudar inclusão social, Doutrina Social da Igreja, políticas públicas e experiências institucionais.
A Igreja presente em Maringá manifesta assim seu engajamento com a sorte daqueles para quem se
sente enviada. Comprova sua convicção de que o Evangelho se prega também através do serviço prestado
aos irmãos.
As obras acima relacionadas, convém repetir, estão longe de esgotar a ação da Igreja arquidiocesana
nessa área. É difícil encontrar uma só paróquia, um instituto religioso masculino ou feminino, um colégio
católico, um grupo de fiéis cristãos leigos que não responda por algum gesto de solidariedade, de socorro
imediato, de assistência ou de promoção humana transformadora da vida. Não se trata de simples comisera-
ção ou reação emocional diante da dor humana. O envolvimento dos cristãos traduz o corolário da fé que
praticam; é conseqüência natural do seguimento daquele que veio “não para ser servido, mas para servir” (cf.
MARCOS 10, 45).
Antonio Facci, pioneiro de Maringá e escritor, observou, há não muito tempo, que Maringá se constitui
em cidade diferente de todas as outras de igual porte. Não só pela exuberância de uma arborização que ainda
preserva parte do verde da mata original. Não só pela pujança de seu comércio, que chegou a ostentar, faz
algum tempo, o posto de segunda praça atacadista do Brasil, atrás apenas de São Paulo. Não só pelo número
de universidades e cursos superiores, que hoje atraem estudantes do Brasil inteiro e de países vizinhos. Acima
de tudo, Maringá é diferente porque, sessenta anos depois de nascida, mantém elevado nível de solidariedade,
como acontecia entre os primeiros moradores. As dezenas de obras beneficentes, multiplicadas e visíveis por
todos os cantos, refletem a marca de um sofrido começo, quando os habitantes daquela boca de mato culti-
vavam laços fortes de união, sob pena de sucumbirem às agruras do meio. Não se podia estiolar o espírito de
família que os tornava não só unidos, mas responsáveis um pelo outro, e todos, pela cidade que era sua.
Em outros lugares esse calor de vida se perdeu. Não em Maringá. Por uma razão historicamente inegá-
vel, segundo Facci. Porque Maringá teve o privilégio de acolher um homem que lhe ensinou, pelo exemplo
de anos seguidos, a abrir o coração para as necessidades do outro. Mais ainda: ele transmitiu uma lição que
Maringá incorporou à sua experiência de vida: a lição de que o outro não é estranho, é irmão. Esse homem
se chama dom Jaime Luiz Coelho.22
Para confirmar, quando a ACIM – Associação Comercial e Industrial de Maringá, no dia 6 de agosto
de 2003, entregou a primeira comenda Américo Marques Dias, criada para comemorar seu cinqüentenário,
o presidente Ariovaldo Costa Paulo confessou que não encontrou dificuldade em escolher o homenageado.
Não podia ser outro: “se Maringá é hoje uma cidade unida e comprometida, dom Jaime foi o responsável por
isso” (PAULO, 2003, 3 f.).

A evangelização em nova fase


Convencida de que o Evangelho deve ser pregado “de cima dos telhados” (MATEUS 10, 27), ao longo
de seus vinte séculos, por divina assistência, a Igreja foi premiada com exímios mestres da palavra. Ela recebe o
alento do Espírito de Deus presente em Jesus de Nazaré, Palavra encarnada do Pai, que as multidões ouviam
fascinadas (cf. LUCAS 4, 15.32). Na esteira de Paulo, apóstolo dos gentios, e vigoroso artífice da palavra,
arautos da mensagem cristã em número incontável multiplicaram-se até os extremos da terra. Cada país onde
foi plantada a semente da fé cristã colheu com fartura os frutos de conversão suscitados por fiéis anunciadores
do Evangelho.
Com o advento, especialmente a partir da Idade Moderna, dos novos recursos de comunicação, a co-
munidade eclesial deixou-se convencer não só das vantagens senão da imprescindível necessidade de utilizá-
los a serviço da evangelização, sua tarefa primeira por mandato do Senhor.
A Igreja oficialmente presente em Maringá a partir da segunda metade do século XX mereceu de Deus

22 Observação feita ao autor destas notas após missa na igreja Santa Maria Goretti, em Maringá, no dia 19 de maio de 2006.
212

A Igreja que brotou da mata


o privilégio de ser governada, nos seus 50 anos de existência, por quatro pastores sensíveis ao emprego dos
modernos veículos de comunicação de massa para a transmissão da palavra divina.
Não muitos dias depois da chegada do primeiro bispo, os diretores da Rádio Cultura de Maringá fran-
quearam-lhe a emissora, insistindo em que ocupasse o microfone mais ouvido na cidade de então. Superados
os embaraços da radical mudança que experimentara em sua vida, quatro meses passados, já no dia 23 de julho,
dom Jaime deu início à fala diária das dezoito horas, a que deu o nome de “Por um Mundo Melhor”. O pro-
grama tornou-se um marco do rádio maringaense, alcançando altos índices de audiência por décadas a fio. Até
os recantos mais afastados da diocese chegava a palavra do pastor. Nos dias mais longos, muitos moradores do
sítio, ainda no eito, acompanhavam o programa no radinho de pilha. Garantir um pronunciamento diário de
quinze minutos, no entanto, significava não pequeno desafio para quem tinha a presença reclamada em todos
os cantos da vastidão da diocese. Quando se encontrava na sede, sua casa era centro de peregrinação de pessoas
com problemas às vezes alheios à sua função: levavam ao pé da letra, quem sabe, a expressão “Vá queixar-se ao
bispo”. Nem sempre havia como ocupar pessoalmente a cabine da emissora. Por isso, desde o início, ajudaram-
-no congregados marianos, filhas de Maria, seminaristas em férias, padres, quando os havia disponíveis, mas
o espaço do fim de tarde na Rádio Cultura não permaneceu vazio; ao contrário, marcou uma época histórica
de atuação da Igreja Católica no rádio. Morando na residência episcopal, padres Antonio de Pádua Almeida
e Orivaldo Robles, coordenadores de pastoral nomeados em 1968, sem faltar uma única semana, por mais de
dois anos mantiveram, às segundas-feiras, um “Por um Mundo Melhor” destinado aos jovens, valendo-se da
larga audiência do “programa do bispo”.23 Por espaço superior a dez anos, a mesma Rádio Cultura de Maringá
transmitiu aos domingos, na catedral – habitualmente na voz do locutor Ademar Schiavone – a missa das
9h00, que ocupava a programação matinal da emissora antes do prestigiado “Clube do Caçula”.
Há mais de 48 ininterruptos anos, Maringá e região têm oportunidade de ler o artigo dominical de
dom Jaime em jornais da cidade. Foi no dia 1º de janeiro de 1958 que, pela primeira vez, a coluna apareceu
no O Jornal, cujo diretor-proprietário era o jornalista Ivens Lagoano Pacheco. Depois, por quase 16 anos,
continuou na Folha do Norte, que estampou seu primeiro artigo em 30 de setembro de 1962; o último apa-
receu no dia 30 de julho de 1978. Desde então, é veiculado pelo O Diário, desde o dia 24 de setembro de
1978 até hoje.24 Nesse período, ascendem a mais de três mil as matérias produzidas apenas para publicação em
jornais maringaenses. Encontraram espaço em outros periódicos brasileiros, ao longo de vários anos, centenas
de escritos seus na Gazeta do Povo,25 Voz do Paraná e Correio de Notícias, de Curitiba; na Folha de Londrina,
da Capital Mundial do Café; em A Tribuna de Maringá e Jornal do Povo, de Maringá, no Diário do Noroeste,
de Paranavaí, além de jornais de outras cidades. Até o L’Osservatore Romano, órgão oficioso da Santa Sé,
veiculou matéria de sua lavra.
A Folha do Norte do Paraná, mais conhecida por Folha do Norte inclui-se entre as muitas iniciativas
do espírito empreendedor do primeiro bispo de Maringá. No alvorecer dos anos 60 ensaiaram-se os passos
iniciais daquele que seria, na época, o segundo maior jornal do Norte paranaense, abaixo apenas da Folha de
Londrina, do grupo Milanez. Constituiu-se em 1961 uma empresa de capital aberto, a Editora Folha do Nor-
te do Paraná S.A., sociedade anônima aberta com controle acionário privado, destinada à “edição de jornais,

23 Nesse ano, o autor destas notas ouviu de operários da antiga SANBRA – Sociedade Algodoeira do Nordeste Brasileiro que, depois
de bater o ponto, muitos ouviam o programa no seu radinho de pilha para só depois pedalarem a bicicleta de volta para casa. O pro-
grama jovem só terminou com a saída de Almeida para dois anos de estudos em Roma, e a transferência de Robles para Paranacity.

24 “O Jornal” foi fundado em 1953 por Manoel Silveira; seu editor era Ivens Lagoano Pacheco que, no início de 1957, se tornou
diretor-proprietário. Nos anos 60, foi assumido por Ardinal Ribas, que lhe mudou o nome para “O Jornal de Maringá”, mas a se-
gunda parte aparecia em letras menores, fazendo com que fosse chamado, de forma abreviada, pelo antigo nome. A mesma redução
aconteceu com a “Folha do Norte do Paraná”, chamada popularmente “Folha do Norte”, ou simplesmente “Folha”. O atual “O
Diário do Norte do Paraná” é chamado “O Diário”, tout court. Quanto aos outros matutinos atuais da cidade, o “Jornal do Povo” se
inscreve na linha sucessória do pioneiro “O Jornal”, como seu legítimo herdeiro, enquanto o “Hoje” nasceu como “Hoje Maringá”.

25 Em dezembro de 2005, sem explicação, a Gazeta do Povo deixou de publicar o artigo semanal que, por convite do diretor, dr. Fran-
cisco da Cunha Pereira Filho, dom Jaime escrevia desde os anos 70.
213

Os 50 anos da Diocese de Maringá


periódicos, livros e manuais”, registrada na Junta Comercial do Paraná, onde consta o dia 28 de setembro de
1961 como o início das atividades. Não era intenção do bispo, seu fundador, alcançar ganho financeiro, polí-
tico ou de qualquer outra natureza, senão, conforme suas palavras, unicamente “ter um meio de comunicação
do Evangelho, da Palavra de Deus, neste Norte do Paraná”. Renda financeira, se eventualmente a empresa
viesse a gerar alguma, seria destinada “à construção do Seminário Diocesano de Maringá”, sua preocupação
maior. Um grupo de corretores admitidos por padre André José Torres, encarregado de montar o empreen-
dimento, percorreu toda a região colocando ações no mercado para levantar o capital necessário à montagem
da empresa, que visava não lucro, mas sustento do seminário. No dia 25 de setembro de 1962, veio a lume a
edição nº 1 do novo diário cuja apresentação lembrava o vespertino Última Hora (1951-1971), um marco da
imprensa nacional, fundado pelo combativo jornalista Samuel Wainer. A Folha entrou em cena em momento
de turbulência no país, após a renúncia do presidente Jânio Quadros e na efervescência das chamadas reformas
de base, que provocavam contínua mobilização de operários, estudantes, trabalhadores rurais, sindicalistas
etc. Não por acaso, pouco depois de um ano, eclodiu a chamada Revolução de 31 de março de 1964. No
ambiente eclesial, por outro lado, respiravam-se os ares do Concílio Ecumênico Vaticano II (1962-1965)
que, para muita gente, convidava a transformar em tabula rasa tudo o que até então fora posto em prática na
Igreja Católica Romana.
Para a Folha do Norte representou uma quadra de preocupações intensas, de heroísmo até, como pou-
cas vividas naqueles conturbados tempos. Dificuldades fundamentalmente geradas pelo primitivismo de uma
região pioneira – carência de mão de obra capacitada, deficiente manutenção de máquinas, atraso no forne-
cimento de papel de imprensa, aliadas a inúmeras outras – obrigaram, não raro, o diretor presidente a deixar
suas funções de bispo diocesano para, num piscar de olhos, transformar-se em redator, revisor, diagramador...
O professor universitário Elpídio Serra, que fez seu noviciado jornalístico na Folha do Norte, recorda que, vez
por outra, dom Jaime via-se compelido a dividir com um grupo de jovens inexperientes a redação da Avenida
Duque de Caxias, que mantinha as luzes acesas, madrugada adentro.
Alheio, no entanto, ao nobre propósito de difundir o Evangelho, o inexorável avanço tecnológico
acabaria por ferir de morte um jornal erguido e sustentado com imensa garra. Houve necessidade de investir
ingente capital num diário que após três anos viu sua impressão superada pelo advento de novas técnicas. As
máquinas de linotipo e a gigantesca rotativa, que ocupava uma sala inteira do prédio, tornaram-se obsoletas na
era do off-set que veio para ficar e, sem pedir licença, impôs-se até ao emergente jornalismo do interior. Fazer
jornal com maquinário defasado revelou-se tarefa antieconômica, inviável. Ao mesmo tempo, não havia como
captar recursos para modernizar o parque gráfico da Folha. No final de 1965, depois de meses na Cidade
do Vaticano, onde participou da última sessão do Concílio, no retorno a Maringá, dom Jaime encontrou as
finanças da diocese em situação delicada. Esgotara-se a capacidade de endividamento, o que inviabilizava o
levantamento de empréstimo de qualquer importância, mínima que fosse. Com amargura, viu-se forçado a
arrendar à Rede Paranaense de Rádio o jornal da diocese, com o qual ansiosamente sonhara e até ali conse-
guira manter com bravura.
Propriedade da Mitra Diocesana de Maringá, funcionando sob arrendamento, a Folha do Norte pros-
seguiu, ainda por vários anos, passando às mãos de sucessivos grupos arrendatários, até finalmente encerrar as
atividades, na assembléia geral extraordinária, levada a termo no dia 24 de novembro de 1977, para dissolução
da sociedade cuja ata encontra-se arquivada na Junta Comercial do Paraná, sob registro nº 125066, deferido
em 22 de junho de 1978. Pelo espaço de quase vinte anos a Mitra Arquidiocesana de Maringá manteve-se
aberta a possíveis reivindicações de acionistas, até o parecer conclusivo de 5 de janeiro de 1999, que definiu:
“A sociedade não existe mais como pessoa jurídica, seus registros estão todos extintos e não constam débi-
tos fiscais e/ou contribuições parafiscais em aberto e quanto ao saldo existente em Caderneta de Poupança
reserva-se o direito ao maior acionista decidir”. Com base na conclusão, após publicação legal da dissolução
da Editora Folha do Norte do Paraná, e não se tendo apresentado acionista nenhum para reclamar direitos, no
dia 17 de fevereiro de 1999, dom Jaime Luiz Coelho, diretor-presidente da extinta, repassou a dom Murilo
Krieger, arcebispo metropolitano de Maringá, a importância de R$ 13.286,83 (treze mil, duzentos e oitenta e
seis reais, e oitenta e três centavos), correspondente ao saldo da caderneta de poupança da qual a sociedade era
214

A Igreja que brotou da mata


titular, depois de saldadas com a CODIPLAN – Contabilidade e Planejamento S/C Ltda., todas as despesas
administrativas da dissolução societária. No dia seguinte, Krieger fez chegar às mãos de padre Nelson Apare-
cido Maia, reitor do Seminário Arquidiocesano Nossa Senhora da Glória de Maringá, o cheque nº 096413,
do Banco Real, no valor do saldo de poupança acima, cumprindo assim o objetivo para o qual fora fundada a
Editora Folha do Norte do Paraná, em 1961.26
Encerrou-se, dessa forma, vibrante etapa do jornalismo da jovem cidade, que acalentou o sonho de uma
tribuna independente a proclamar os princípios cristãos de justiça e de verdade, revelando, ao mesmo tempo,
a face de uma Igreja comprometida com o seu tempo, disposta a servir-se dos meios de comunicação para
anunciar o Evangelho.
No arquivo pessoal do primeiro bispo de Maringá, mantido no 4º piso da catedral, conserva-se a cole-
ção completa da Folha do Norte impressa, desde o primeiro número, de 25 de setembro de 1962, até à edição
nº 3.305, de 30 de junho de 1974. De coleção semelhante dom Jaime fez doação à Universidade Estadual de
Maringá, para memória documental de um período histórico de nossa cidade.

Folha do Norte do Paraná

Primeira edição, 25 de setembro de 1962. Última edição, 30 de junho de 1974.

26 Documentos disponíveis na Cúria Metropolitana de Maringá, na Avenida Tiradentes, 740.


215

Os 50 anos da Diocese de Maringá


Também na gênese da televisão em Maringá a Igreja Católica fez sentir sua presença não por prepo-
tência, mas pelo desempenho do bispo como líder religioso e cidadão comprometido com os interesses da
comunidade. Quando, no final dos anos 60, o Norte do Paraná só conhecia a TV Coroados, de Londrina,
pessoas do ramo anteviram a possibilidade de vultosos lucros à disposição de quem chegasse primeiro na
instalação de novo canal de TV para cobrir o imenso campo do Noroeste paranaense. Ainda nos anos iniciais
do Grupo Paulo Pimentel, hoje autodefinido como “um dos maiores complexos de comunicação do Sul do
país”, conta-se que seu fundador teria revelado: “Jornal é bom negócio, mas o que dá dinheiro mesmo é
televisão”. A cidade de Maringá oferecia-se como base natural para implantação da segunda emissora de TV
do Norte do Paraná.
Descontente com a mobilização de dois grupos, que entendia representar interesses alheios à cidade
– Empresa TV O Jornal de Maringá Ltda. e Televisão Ivaí Ltda. –, dom Jaime pôs-se a contatar empresá-
rios para a formação de um terceiro consórcio integrado só por maringaenses, com o objetivo de disputar a
concessão de um canal de TV para Maringá. No dia 1º de junho de 1968 constituiu-se a empresa Televisão
Cultura de Maringá Ltda., formada por brasileiros natos, todos residentes e atuantes em Maringá, com o
propósito de obter direito à “instalação de estações televisoras nesta cidade de Maringá”, tendo por objeti-
vos “fins educacionais, cívicos e patrióticos”. A TV Cultura de Maringá apresentava diretoria composta por
dom Jaime Luiz Coelho, diretor-presidente; Samuel Silveira, diretor-superintendente, e Joaquim Dutra, di-
retor-gerente. O contrato social foi arquivado na Junta Comercial do Estado do Paraná sob nº 90.735, por
despacho em sessão de 12 de junho de 1968. O grupo era composto por 25 cidadãos maringaenses: dom
Jaime Luiz Coelho, Samuel Silveira, Joaquim Dutra, Francisco Dias Rocamora, Carlos Piovezan Filho, Paulo
Okamoto, Wilson Saenz Surita, José Sanches Filho, Antônio Augusto de Assis, Célio Verolli, Wlademir Pipi-
no, Antônio Guilherme Schreiner, Ulisses Bruder, Atair Niero, José Gonçalves de Britto, Antenor Matiolli,
Jancer Nunes Reinaldet, Rodolfo Purpur, José Dutra, Oswaldo José Rodrigues, Hélio Moreira, Ermelindo
Bolfer, Jasson Rodrigues de Figueiredo, Alcides Parizotto e Donaldi Serra. Em audiência, na capital federal,
com o presidente Arthur da Costa e Silva, no dia 14 de outubro de 1968, acompanhado por Joaquim Dutra
e Ulisses Bruder, dom Jaime advogou ardorosamente a conveniência de a nova empresa ser contemplada com
a concessão. Depois disso, inclusive com apoio dos bispos de Campo Mourão, dom Eliseu Simões Mendes,
e de Paranavaí, dom Benjamin de Sousa Gomes, continuou com pertinácia a sustentar, em todas as áreas, o
pleito do grupo de Maringá.
O segundo canal de TV da região foi criado no dia 26 de julho de 1969, em Apucarana, com o nome de
TV Tibagi e concedido ao Grupo Paulo Pimentel. Atualmente, é afiliado ao Sistema Brasileiro de Televisão.
A partir de então, intensificaram-se as atividades para a implantação da emissora de TV em Maringá,
que foi conseguida, finalmente, através do decreto federal nº 70.814, de 7 de julho de 1972. Não obstante
a aprovação recebida, a TV Cultura teria ainda que enfrentar dificuldades suscitadas pelos grupos preteridos,
que tentaram, por várias formas, obstruir a sua instalação.
No dia 25 de junho de 1974, junto ao DENTEL – Departamento Nacional de Telecomunicações foi
solicitada alteração do contrato social para admissão de três sócios de Curitiba, doutores Francisco Cunha Pe-
reira (que assumiu a função de diretor-gerente, até então exercida por Joaquim Dutra), Edmundo Lemanski
e Adolpho de Oliveira Franco, os quais adquiriram os direitos de dezessete antigos cotistas, ficando a nova
sociedade composta por onze sócios, oito de Maringá e três de Curitiba. Em 30 de agosto de 1975, deu-se a
conhecer a programação da TV Cultura de Maringá. Menos de um mês mais tarde, no dia 25 de setembro,
aconteceu a inauguração oficial da TV Cultura, canal 8 de Maringá.
Por apenas alguns meses o bispo permaneceu à frente da TV Cultura de Maringá como diretor-presi-
dente. A nova configuração da empresa fez com que seu posto fosse ocupado por empresários do setor de co-
municação. Nova alteração contratual, em 25 de julho de 1978, admitiu como sócio, com quantidade maior
de quotas, o empresário José Roberto Marinho, do Rio de Janeiro, integrante da Rede Globo de Televisão
da qual a TV Cultura passou a afiliada.
Apesar do gigantismo da Rede Globo, dom Jaime garantiu à diocese a franquia, na emissora de Marin-

216

A Igreja que brotou da mata


gá, de cinco minutos diários de formação doutrinária e também da missa televisionada nas manhãs de domin-
go, púlpitos eletrônicos que, pelo espaço de 31 anos, a Igreja Católica utilizou em benefício da comunidade.
De surpresa, representantes da Rede Paranaense de Comunicação agendaram, para o dia 3 de novembro de
2006, reunião com dom Jaime, dom Anuar e com o vigário geral, para entregar carta datada de 23 de outubro
e assinada por Edmundo Lemanski – diretor presidente, comunicando:

Tendo em vista a necessidade de compatibilizarmos nossa grade de programação com


a grade de programação da Rede Globo e das demais emissoras que integram a Rede
Paranaense de Comunicação – RPC, vimos pela presente informar a Vossa Excelência
que, a partir de 01 de janeiro de 2007, a TV Cultura não mais poderá exibir os pro-
gramas religiosos que atualmente são veiculados no início da manhã (LEMANSKI,
2006, 1 f.).

Com a habitual franqueza, dom Jaime lamentou o que definiu como subserviência da TV Cultura de
Maringá à todo-poderosa matriz do Rio. Inútil. Os emissários disseram: “Não viemos dialogar; viemos trazer
esta solução já tomada”.
A determinação fechou o espaço que a Igreja Católica, co-fundadora em Maringá da TV Cultura, con-
seguiu manter desde 1974 para veicular sua mensagem evangelizadora.

Os atuais veículos da arquidiocese


Concluído um ciclo intensivo de linguagem áudio-visual e comunicação da fé que fez, em dezembro de
1984, na Universidade Católica de Lyon (França), padre Gerhard Schneider decidiu implantar em Maringá
um canal de televisão para servir à missão evangelizadora da Igreja. Contou para esse propósito com o efetivo
apoio do arcebispo que, em 6 de agosto de 1987, constituiu a “Fundação Cultural Nossa Senhora de Lour-
des de Maringá”, pessoa jurídica de direito privado sem fins lucrativos, com sede na Avenida Rio Branco, nº
1000, destinada a promover atividades educativas, culturais e religiosas através do rádio e da televisão. Por
sua nacionalidade alemã, não podendo assumir cargos na entidade, a presidência da fundação foi confiada
a dom Jaime Luiz Coelho que, posteriormente, em 26 de dezembro de 1988, transferiu o cargo a cônego
Ângelo Banki, pároco em Paiçandu, cidade vizinha de Maringá. Com recursos pessoais e ajuda de amigos da
Alemanha, sobretudo de sua irmã Maria Louise, Schneider instalou junto à casa paroquial da paróquia do
Cristo Ressuscitado, no alto da Zona 5, em Maringá, estúdios e torre que no dia 24 de dezembro de 1988
receberam a bênção do arcebispo. Assim começava a TV Horizonte UHF, que se tornaria conhecida como
“TV do padre”. No princípio de janeiro de 1989, Edison Pereira, da sucursal maringaense da Folha de Lon-
drina, escreveu:

No quintal do padre Geraldo Schneider tem um pé de abóbora e uma torre de televi-


são. É a TV Educativa de Maringá, inaugurada em silêncio e sem pompas. Instalando
um conversor de VHF é possível sintonizar a melhor programação educativa do Brasil.
Na TV do padre, a alma do negócio não é a propaganda (PEREIRA, 1989, p. 17).

Depois de extenuante movimentação junto a órgãos públicos especialmente de Curitiba e Brasília,


Schneider viu recompensada sua luta por um canal de televisão, ao receber correspondência da FUNTEVÊ
– Fundação Centro Brasileiro de TV Educativa, do Ministério da Educação, enviada em 12 de julho de 1989,
que lhe comunicava a anuência ao pedido da retransmissão de sua programação para Maringá. Essa atividade
foi desenvolvida pela TV Horizonte por espaço de quase seis anos consecutivos. Passado esse período − em
que veiculou conteúdo da TVE do Rio de Janeiro −, a TV Horizonte, canal 31 UHF, de Maringá, inaugurou
nova fase em 1º de maio de 1995, passando a transmitir, com início às 9h00, programação da Rede Vida,
diretamente de São Paulo, via satélite para Maringá e região. Não satisfeito, Schneider deu novo passo visando
transformar sua concessão em geradora de programas locais, voltando a percorrer, para isso, o interminável
217

Os 50 anos da Diocese de Maringá


périplo por gabinetes oficiais. Obstinado, conseguiu que o presidente Fernando Henrique Cardoso assinasse
decreto que “outorga concessão à Fundação Cultural Nossa Senhora de Lourdes de Maringá, para executar
serviço de radiodifusão de sons e imagens (televisão), com fins exclusivamente educativos, na cidade de Ma-
ringá, Estado do Paraná”. O texto do documento presidencial veio publicado no Diário Oficial da União nº
127, de terça-feira, 7 de julho de 1998.
Obrigada, pela existência em Belo Horizonte de canal homônimo, a mudar a marca de fantasia, a
TV Horizonte de Maringá, em função da chegada do ano 2000, alterou seu nome para TV 3º Milênio. No
governo arquidiocesano de dom João Braz de Aviz, terceiro arcebispo de Maringá, Schneider entregou à
arquidiocese a emissora de televisão que criara e que, até então, tinha comandado praticamente sozinho.
Como havia necessidade de ajustes à nova situação, a arquidiocese recorreu à competência e ao espírito
cristão do advogado Irivaldo Joaquim de Souza que, a partir de 22 de julho de 2003, desenvolveu as ne-
cessárias negociações junto aos órgãos competentes. A Fundação Cultural Nossa Senhora de Lourdes – TV
3º Milênio sofreu reformulação completa. Para gerir seus destinos na nova fase houve necessidade de outra
diretoria executiva, que foi integrada por Souza no cargo de diretor-presidente; César Ribeiro de Castro,
diretor-superintendente; Nelson Rodrigues da Silva, diretor-administrativo e financeiro; Alípio Vaz Afonso,
diretor-técnico, e padre Edmilson Mendes, diretor de programação. Foram também eleitos outros membros
para o conselho de programação e para o conselho curador. Deste último é membro vitalício dom Jaime
Luiz Coelho, e membro nato, o arcebispo metropolitano de Maringá. Levantamento da situação da TV 3º
Milênio concluiu pela urgência de investimentos de razoável monta para garantir à televisão da arquidiocese
condições mínimas de funcionamento. Na reunião do clero de 21 de agosto de 2003, o diretor-presidente
expôs o panorama de momento da TV 3º Milênio. Obteve das paróquias contribuição em dinheiro para fazer
frente às necessidades mais prementes de reforma das instalações, aquisição de móveis e equipamentos, além
da contratação de funcionários suficientemente qualificados. A partir da gestão de Souza, descortinou-se novo
tempo de presença e atuação da TV criada por Schneider na missão evangelizadora da Igreja em Maringá. No
dia 16 de julho de 2004, procedente de Brasília, onde fora empossado como arcebispo a 27 de março, dom
João Braz de Aviz procedeu à

inauguração das novas instalações da TV 3º Milênio, mantida pela Igreja Católica atra-
vés da Fundação Nossa Senhora de Lourdes. Com 250 m² de área construída, as novas
instalações comportam estúdio, sala de edição, sala de redação, duas salas de espera
com camarim, guarita e sala de reuniões, ambientes climatizados e com revestimentos
acústicos, de acordo com normas técnicas que visam principalmente preservar a quali-
dade de som e imagem da emissora (SERRA, 2004, p. 6-7).

A TV 3º Milênio iniciou o ano de 2006 com 24 horas de transmissão, das quais três contam com pro-
gramação diária local. O restante do tempo é ocupado por retransmissão de programas da TV Século 21, de
propriedade da Associação do Senhor Jesus, com sede em Valinhos (SP). Com essa medida, a arquidiocese
pretende cumprir mais fielmente os objetivos para os quais implantou a emissora. Em reunião no dia 19 de
agosto de 2006, o Conselho Curador aprovou a aquisição de novos equipamentos e a inclusão de melhorias
na prestação dos serviços da emissora.
Entre os veículos de comunicação da Igreja de Maringá também consta um jornal impresso mensalmen-
te. Sua origem remonta a 1995. Depois de insistentes pedidos das lideranças, que voltavam a cada assembléia
anual da paróquia, no mês de maio daquele ano, a comunidade paroquial Santa Maria Goretti, de Maringá,
iniciou a publicação de um tablóide mensal de 12 páginas, ao qual chamou Santa Menina. Por três anos, o
modesto mensário cumpriu sua missão, noticiando e comentando igualmente os acontecimentos da Igreja
arquidiocesana.
Como sucessor do primeiro arcebispo de Maringá, dom Murilo Krieger assumiu o governo da arqui-
diocese em julho de 1997, revelando-se, desde o começo, um entusiasta dos meios de comunicação de massa.
Uma de suas primeiras preocupações foi dotar a Igreja de Maringá de um jornal. Ao tomar conhecimento
218

A Igreja que brotou da mata


do veículo impresso da paróquia Santa Maria Goretti, pensou alargar sua cobertura para toda a arquidiocese.
Com a concordância dos responsáveis, o antigo jornal paroquial tornou-se arquidiocesano, tendo seu nome
alterado para Maringá Missão. É o próprio dom Murilo quem conta:

Ao assumir a arquidiocese de Maringá, senti a necessidade de ter, a serviço dessa Igre-


ja Particular, um jornal que evangelizasse e motivasse outros a fazê-lo; que unisse as
paróquias, as pastorais e os movimentos; que tornasse conhecidos os projetos arqui-
diocesanos e comunicasse o que estaria sendo feito para o bem de todos. Queria, en-
fim, um jornal como o “Santa Menina”, mas para toda a arquidiocese. Não demorou
muito para perguntar-me: Por que não o “Santa Menina” como jornal da arquidiocese
de Maringá? [...] A resposta da paróquia Santa Maria Goretti veio rápida e positiva:
concordava em tudo, em vista do bem da arquidiocese [...] Dados esses passos, aí está
“Maringá Missão” (KRIEGER, 1998, p. 1).

Desde 1998, de fevereiro a dezembro, onze meses por ano, com 12 páginas – excepcionalmente com
16, ou com inclusão de algum encarte –, o tablóide é oferecido nas igrejas paroquiais para distribuição gra-
tuita aos fiéis. Das 2.000 unidades que imprimia ao tempo de jornal paroquial, atualmente a tiragem alcança
19.000 exemplares, na tentativa de prestar à Igreja arquidiocesana um serviço de informação e, quanto pos-
sível, também de formação, colaborando na tarefa de evangelizar. Com serviço voluntário prestado desde
o primeiro dia, a mesma equipe que em 1995 iniciou o Santa Menina prossegue ao longo de 130 edições,
totalizando, no mês do cinqüentenário de instalação da diocese de Maringá, a marca de 1.926.000 exemplares
impressos. Desde sua criação até abril de 2005, Maringá Missão continuou administrativamente ligado à paró-
quia Santa Maria Goretti. Por decreto de dom Anuar Battisti, sucessor de dom João Braz de Aviz, no dia 27
de maio desse ano, foi finalmente elevado a jornal da arquidiocese, na condição de atividade não lucrativa ca-
racterizando serviço prestado pela arquidiocese de Maringá para ser distribuído nas paróquias que a integram,
tendo por sede a Cúria Metropolitana, situada na Avenida Tiradentes, nº 740, em Maringá. Como origem
dos recursos financeiros para impressão e funcionamento do jornal o documento especificou a importância
advinda do rateio dos custos entre as diversas paróquias, na proporção da quantidade de exemplares utiliza-
dos por cada uma, além de possíveis ofertas de patrocínio. O decreto de criação, na realidade, fora preparado
ainda no governo de Aviz que, pela brevidade de sua permanência à frente da arquidiocese, acabou não lhe
apondo a sua assinatura.27
Outra iniciativa, ainda na área da comunicação, desejada por dom Murilo em sua gestão à frente da Igreja
de Maringá, foi a aquisição de uma emissora de rádio para levar mais longe a mensagem de Deus. Admirador
do bom trabalho realizado pela Rádio Santana, de Ponta Grossa, sua diocese anterior, dispôs-se a implantar
algo parecido no Norte do Paraná. No seu entender, o rádio continua a representar, especialmente nas comu-
nidades do interior, um dos mais eficientes instrumentos de formação de opinião e de comportamento.
Vencida a demorada fase de busca e discussão com diversos empresários do setor, optou pela Rádio
Colméia de Mandaguaçu Ltda., emissora de rádio AM, de propriedade do grupo formado por Basílio Za-
nusso, Marcos Antonio Rocco e Antonio Saes, com sede na vizinha cidade de mesmo nome, que, após ouvir
o Colégio de Consultores, comprou para a Igreja arquidiocesana. Constituiu, no dia 12 de abril de 1999,
a Fundação Cultural Nossa Senhora da Glória de Maringá como sua mantenedora. A ata de instalação foi
registrada no dia 16 de junho do mesmo ano, sob nº 3801, no livro A-5 do Registro Civil de Pessoas Ju-
rídicas de Maringá. O pagamento dos R$ 200.000,00 (duzentos mil reais), valor da emissora estabelecido
pelos proprietários, obedeceu a prazos acordados compatíveis com a situação financeira da arquidiocese.
Substancial parcela da importância, na forma de doação, aportaram as congregações dos irmãos Maristas das
Escolas e dos irmãos da Misericórdia de Maria Auxiliadora por meio de seus governos provinciais. O restante

27 O jornal “Maringá Missão” é enviado a leitores amigos de praticamente todos os Estados do Brasil e de países como Itália, França,
Alemanha, Holanda, Portugal, Peru, Argentina, Costa do Marfim e outros.
219

Os 50 anos da Diocese de Maringá


foi integralizado com ofertas conseguidas junto de paróquias, além do empréstimo efetuado pela Mitra Ar-
quidiocesana de Maringá, no valor de R$ 30.000,00 (trinta mil reais), a ser futuramente quitado pela nova
emissora de rádio. À frente da empresa postou-se com muita disposição padre Manoel Silva Filho, assessor da
PASCOM – Pastoral da Comunicação, que se converteu em alma e coração da emissora. Sob sua liderança,
a agora conhecida simplesmente como Rádio Colméia, sintonizada em 1170 KHZ, teve a potência de seu
transmissor elevada para 5000 watts, vindo a firmar-se como muito popular em todo o Estado e uma das líde-
res de audiência. À semelhança da fala radiofônica do bispo em tempos passados, também a programação da
Rádio Colméia é, não raro, seguida hoje, desde a boléia de suas máquinas agrícolas, por agricultores enquanto
trabalham nos campos. Afiliada à RCR – Rede Católica de Rádio, permanece por 24 horas no ar, podendo
ser ouvida também online em todo o mundo, pela Internet. Há informações confiáveis de sua audiência em
países da América Latina e até do Leste europeu. O prédio que abrigará as novas instalações da Rádio Colméia
encontra-se em fase de conclusão.
No seu tempo de arcebispo de Maringá, ao lado do artigo mensal no jornal Maringá Missão, dom Mu-
rilo manteve a colaboração que já vinha prestando ao Brasil Cristão, revista mensal da Associação do Senhor
Jesus; ao Mensageiro do Coração de Jesus, do Apostolado da Oração, além de artigo semanal que passou a
escrever para os maringaenses O Jornal do Povo e O Diário, respectivamente aos domingos e às quintas-feiras.
Sustentou ainda semanalmente um programa radiofônico gravado para a Rede Milícia Sat, além de programa
semanal e missa mensal na TV Cultura da cidade.
O arcebispo dom João Braz de Aviz julgou particularmente oportuno o grande evento que foi a assem-
bléia arquidiocesana de pastoral celebrada a 15 de novembro de 2003, no Colégio Regina Mundi, para lançar
o serviço de comunicação da Igreja de Maringá. Aproveitando a presença de 335 pessoas, líderes representa-
tivos de todas as paróquias, pastorais, serviços e movimentos eclesiais, anunciou oficialmente na assembléia a
abertura do portal da arquidiocese de Maringá na Internet. Trata-se de novo espaço de comunicação onde os
internautas têm acesso a informações sobre a vida da Igreja Católica presente nesta parte do Paraná. Vários
canais colocam à disposição dos interessados respostas às questões mais comuns como nomes, endereços,
atividades, celebrações, horários, artigos, mensagens, reflexão sobre a palavra de Deus etc. O portal integra
o chamado SIAM – Serviço de Informações da Arquidiocese de Maringá, que reúne os outros três veículos
de comunicação: a estação geradora TV 3º Milênio canal 31 UHF, a Rádio Colméia AM e o jornal mensal
Maringá Missão. O serviço pode ser acessado em www.arquimaringa.org.br, síntese dos serviços criados para
estabelecer maior comunhão entre os membros do povo de Deus reunido sob a condução do arcebispo de
Maringá. Quatro paróquias da arquidiocese abrigam no portal os seus próprios sites.
Na continuidade dos passos empreendidos pelos antecessores, também dom Anuar Battisti prossegue
mantendo fidelidade ao uso de todos os espaços franqueados pela mídia à mensagem cristã. Maringá e região
habituaram-se à participação do arcebispo no artigo das quintas-feiras de O Diário, no programa semanal e na
missa da TV Cultura (enquanto duraram, porque no final de 2006, foram cancelados pela emissora), no artigo
mensal do jornal Maringá Missão, além de freqüente participação na Rádio Colméia e na TV 3º Milênio. Não
só o arcebispo, mas igualmente sacerdotes e cristãos leigos marcam a participação da Igreja arquidiocesana
nos veículos de comunicação de massa. Algumas paróquias dão-se ao trabalho de imprimir mensalmente
boletim próprio, contribuindo para o fortalecimento dos laços de comunhão entre seus fiéis. Há ainda em
operação três rádios comunitárias ligadas a comunidades paroquiais.
Quem volta sua lembrança para 1956, ano em que Pio XII criou uma diocese quase no meio do mato
– ainda se promovia derrubada de árvores centenárias, fazia-se queimada e destoca para plantio de café, lama e
poeira alastravam-se por todo canto – há que se convencer da presença do Espírito Santo, alma da Igreja, que
também aqui inflamou os pregoeiros do Reino atentos, há vinte séculos, à ordem que ressoa, sempre nova e
com recurso a novos métodos de anúncio: “Ide e fazei discípulos” (MATEUS 28, 19).

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A Igreja que brotou da mata


Memória, quase história

Mensagem à menina que virou senhora

Nem existias e, à distância, cantávamos o teu nome.

Foto: Neide Luize - 03/05/1997.


Sem te conhecer, já te amávamos.
Estranho modo de começar a vida. As outras nascem
antes, tornando-se conhecidas depois. Singular que és, esco-
lheste o caminho inverso.
Ainda não nascida, elevou-te à fama o poeta ao cantar
a dor presente da distante amada. Sem saber, traçava o teu
destino, atrelando-o à canção, à poesia, ao amor. Prenunciava
a sedução que exerces, na saudade de quem de ti se afasta.
Nasceste cabocla. Menina da roça, não te envergonhou
a humilde origem. Mas, desde então, persegues o ideal da
grandeza. Nos troncos da derrubada, franzina e suja de terra,
não escondias o teu desejo de glória. Insinuante, enredavas
no teu feitiço os que chegavam, espalhando o contágio do teu
anseio de brilho. Maringá no seu cinqüentenário.
Cheirando a mato, te conhecemos menina, vestida de
verde. O mesmo traje vistoso que, passado meio século, ostentas com graça. Cinqüenta anos
não lograram destruir nem o frescor da tua beleza nem o encanto da tua mocidade. No teu
viço de senhora, manténs a formosura dos primeiros tempos.
Continuas cabocla, mas ainda elegante. Não perdeste a simplicidade de outros tempos.
Preservas a ternura das amizades antigas, ofereces teu regaço quente à fusão da sorte daqueles
que velaram teu sono de criança.
Que saudade da garotinha que embalamos no berço de mato e chão batido! Que nos
garantia uma união de meninos vivendo juntos, olhando-nos de frente e sorrindo sem disfar-
ce. Era o tempo em que tudo partilhávamos. O pão era branco; o dia, claro; a palavra, direta.
Sentíamo-nos abertos e puros, animados de coragem para enxugarmos o suor uns dos outros.
Estendíamos as mãos com transparência e as apertávamos sem medo. Não havia susto em nos-
sas noites nem desconfiança em nosso olhar.
Que sabor doce de vida provou quem te acompanha desde a infância!
Uma nuvem negra tolda agora de incerteza o nosso céu. Não te magoes, mas é preciso
te acautelar. Antes que, distraída, consintas que te arrebatem o que possuis de mais precioso.
 Até quando te manterás a mesma que despertou o nosso amor? Quanto vai durar a ter-
nura que ofereces? É doloroso pensar que um dia talvez te tornes outra. Movida pelo orgulho,
quem sabe resolvas preferir a ilusão das altas rodas, onde mentira é norma de agir, e falsidade,
moeda de troca.
Quem garante que não desprezarás a pureza de outrora, tornando-te a megera fria em
que se converteram tantas? Que não choraremos a dor de ver-te seca e envelhecida pela ambi-
ção de lucros vis?
Ao nasceres, teu destino foi marcado pela canção, pela poesia, pelo amor. Não te desen-
caminhes, menina querida de ontem. Não te afastes da trilha dos que te fizeram crescer. Não
transformes em morte a vida buscada por quantos a ti aportaram, na esperança de te verem
única. Não apagues o sol dos dias de todos os que te amamos tanto (ROBLES, 1997b, p. 9).

221

Os 50 anos da Diocese de Maringá


O que ninguém escreveu
Episódios pitorescos vividos por nossos padres
dos primeiros tempos, alguns já chamados à casa do Pai.

Tabefe
Desde antes do incêndio que destruiu a linda igreja de madeira, pa-
dre Adelino Fórmolo era o vigário de Santo Antônio, na vila do mesmo
nome. Gaúcho emprestado pela diocese de Caxias do Sul, era dono de rara
simpatia e incrível facilidade de fazer amigos. Mas que ninguém o tirasse
do sério. Num sábado santo, data em que a liturgia da Igreja não prevê ce-
lebração nenhuma, na escadaria da matriz, um senhor lhe pede que batize
uma criança. Responde que nesse dia é impossível, terá que ser em outra
ocasião. O homem insiste. O padre torna a explicar. Se a criança estivesse
doente, haveria motivo, mas não era o caso. A conversa sobe alguns deci-
béis, proporcionais à insistência do pedido. Adelino desiste. Está retirando-
-se, quando ouve um palavrão cabeludo. Volta-se como um raio: “Você
não repete o que falou”. O homem não se intimida: “Filho da...” O resto
é dito já no pó da rua, aonde o lança inesperado sopapo estalado na orelha.
Ele vai queixar-se ao bispo. Literalmente. Não demora, dom Jaime manda
chamar o padre: “Adelino, onde já se viu uma coisa dessas? Você é padre,
um homem de Deus. Tem cabimento agredir um paroquiano?”. Ele aceita
humilde a episcopal reprimenda. A alguns colegas confidencia mais tarde:
“O bispo está certo. Tinha que me chamar atenção mesmo. Mas o cara me
chamou de fdp. Se chamar de novo, eu bato outra vez”.

Cinema
Além de futebol, outra paixão de padre Novaes era cinema. Nas fé-
rias, ele costumava convidar os seminaristas Orivaldo e Geraldo Schneider
para assistir filmes nos cines Maringá e Paraná, raramente no cine Hori-
zonte, na Vila Operária. Nessas ocasiões, vestia batina, porque assim en-
trava de graça. E exigia o mesmo privilégio para os acompanhantes. Uma
vez, no cine Paraná, o trio entrou com a projeção em andamento. De
repente, perceberam que a película era diferente da anunciada. Não era
exatamente pornô, mas continha cenas um tanto ousadas. Novaes virou
bicho. Dirigiu-se à gerência, onde lhe explicaram que o filme previsto, tra-
zido pela Viação Garcia, não tinha chegado, então rodaram outro. Depois
de dizer poucas e boas, chamou os companheiros e retirou-se. Dirigiram-
-se a Marialva. Novaes parou a camionete na frente do cinema: “Vá lá,
222

A Igreja que brotou da mata


Schneider, veja que filme está passando”. A resposta veio rápida: “Vamos
assistir este. Não entendi o título, mas deve ser bom, porque está escrito
Não percam”. Terminaram vendo o pedaço final de uma película no ci-
nema de Mandaguari. Ao seminário só retornaram depois da meia noite,
horário extemporâneo para a época.

Prevenção
Primeiros anos de vida da diocese. Maringá não tinha água tratada.
Dom Jaime apanhou terrível infecção intestinal, uma giardíase que o acom-
panhou por longos e sofridos anos. Para ele as visitas pastorais, que jamais
deixou, passaram a ser um suplício. Perdeu a conta das vezes em que, em
capelas rurais onde estava crismando, ao necessitar de um banheiro, verifi-
cava que simplesmente inexistia tal peça. Comprovou, por amarga experi-
ência, a dolorosa verdade do que é relatado como piada, mas talvez tenha
mesmo acontecido. No sertão baiano um bispo ter-se-ia hospedado em
casa de rico fazendeiro, senhor de muitas terras e gado, mas de cultura pou-
ca e hábitos rudimentares. Não vendo nos aposentos nenhum sinal de sani-
tários, delicadamente o bispo foi informar-se com o anfitrião. O fazendeiro,
chamando-o fora, estendeu o braço e apontou: “Olhe, seu bispo, daqui
até o Piauí o senhor use à vontade”. Por conta das humilhações sofridas,
dom Jaime desenvolveu verdadeira obsessão por sanitários nas residências
dos padres. Sua casa atual, incluindo área de serviço e residência das irmãs,
conta com “apenas” dezesseis. Quando lhe foi apresentada a planta da casa
paroquial de Santa Maria Goretti, aos existentes ele mandou ajuntar outros
três: a casa conta agora com sete sanitários. Diante da exigência do aumen-
to do número de banheiros para a construção da futura casa paroquial de
São Mateus Apóstolo, um dos membros da comissão estranhou: “Lá em
casa tem sete pessoas e só um banheiro. Aqui, para um padre o senhor quer
três.” Mas o bispo não arredou pé: “Ou constroem mais ou não autorizo a
casa paroquial. Nem crio a paróquia”. Foi atendido.

Humor
Padre Adelino Formolo fez um vasto círculo de amigos em Maringá.
Era famoso por seu eterno bom humor. Conhecia invejável repertório de
piadas, muitas de conteúdo bastante apimentado, que prendiam durante
horas seus ouvintes. Em reuniões do clero, aonde ele chegava, logo se for-
mava uma roda. Para localizá-lo bastava ouvir de onde vinham explosões
de gargalhadas. Padre Jorge Scholl, jesuíta da igreja São José, com a serie-
dade dos setenta e poucos anos, certa vez externou seu desagrado: “Não
gosto das piadas de padre Adelino: são todas do umbigo para baixo.” E
Adelino, sem deixar a peteca cair: “Não seja por isso, padre Jorge. O se-
nhor quer que eu conte uma sobre seios?”.

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Os 50 anos da Diocese de Maringá

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