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Empobrecimento tecnológico na indústria
dificulta retomada
O grande drama do setor entre as mil maiores empresas retratadas no ranking anual
do ‘Valor’ está no seu empobrecimento tecnológico, um desafio a mais para a
retomada
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11/4/2019 Empobrecimento tecnológico na indústria dificulta retomada | Eu & | Valor Econômico
Para o economista Paulo César Morceiro, políticas industriais falharam porque não focalizaram na inovação, não
apostaram na exportação e criaram campeões errados — Foto: Silvia Costanti/Valor
O caminho traçado pela Cristália, no entanto, foi como andar na contramão do setor e
da indústria brasileira. A empresa investe em média 4% do seu faturamento líquido em
inovação, tem 107 patentes registradas (mas mais de 300 depositadas), 54% da sua
receita vem de matérias-primas feitas no Brasil e, enquanto grandes farmacêuticas
anunciam o fechamento de suas plantas no país, ela acabou de inaugurar mais uma
fábrica.
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A Calçados Beira Rio também foi o destaque do setor Têxtil, Couro e Vestuário há 18
anos. Desde então, passou de 8 para 12 fábricas, todas no Rio Grande do Sul, e de 5 mil
para 11 mil funcionários, período em que ampliou o peso das exportações para 17% do
faturamento.
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Também em rota contrária a do setor em que atua, que encolheu pressionado pelas
importações e pela falta de competitividade na exportação, a Beira Rio hoje mantém
uma equipe exclusiva para pesquisar o que os consumidores e os influenciadores
estão dizendo nas redes. Com base nesse acompanhamento e ancorada na agilidade
de produção que montou nos últimos anos, faz lançamentos quinzenais para entregar
aquilo com que o consumidor apenas começou a sonhar.
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Ogari Pacheco, da Cristália, atribui crescimento ao fato de 54% do faturamento ser ancorado em produção de matérias-
primas feitas no Brasil — Foto: Luis Ushirobira/Valor
Mas, olhando para dentro da indústria, hoje, nada menos que 36,8% da receita vem de
alimentos, bebidas e fumo, peso que era de 20,2% no ano 2000, enquanto a
contribuição do setor eletroeletrônico encolheu quase 5 pontos, caindo de 8,3% para
apenas 3,8% ao longo desse período, sem falar no quase sumiço da indústria de
informática. Também perderam espaço a indústria de veículos e peças e setores
tradicionais como têxtil, vestuário e calçados, enquanto a indústria relacionada à
exploração de commodities avançou.
Para o professor David Kupfer, da UFRJ, há uma doença industrial no Brasil: “A indústria não consegue evoluir nem no ritmo
da economia brasileira, que está estagnada” — Foto: Ana Paula Paiva/Valor
Parte dessa mudança também reflete a nova metodologia no ranking do “Valor 1000”,
pois em 2000 as informações apresentadas eram oriundas dos balanços individuais
das empresas e em 2018, preferencialmente de balanços consolidados, quando
existentes. Mas não foi só o tamanho das empresas que mudou, pois o perfil também
é completamente diferente e de novo reflete a comoditização da indústria brasileira.
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Segundo Nelson Marconi, da FGV, 50% das vendas industriais são intraindústria: “O Brasil está no caminho de uma
indústria mexicana, de apenas montar produtos” — Foto: Nilani Goettems/Valor
A perda de densidade da indústria começou no fim dos anos 80. Em meados dessa
década, a participação bateu nos 35%, depois caiu fortemente e quase sem parar até a
virada dos anos 90 e 2000, quando atingiu a marca de 14%. Aí se recuperou um pouco,
voltou a quase 18% em 2004, para voltar a cair.
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Depois de ter ensaiado uma recuperação no começo dos anos 2000, a indústria
retomou a trajetória de encolhimento em 2005. Ao longo dos últimos 14 anos, o
câmbio apreciado foi uma realidade constante. Olhando por trimestres, desde o fim de
2005, em mais de 75% do tempo o dólar esteve mais de 10% acima daquele que
poderia ser considerado de equilíbrio para a indústria, segundo metodologia
desenvolvida pelo Centro de Estudos do Novo Desenvolvimento da Fundação Getulio
Vargas (CND-FGV). No decorrer desse longo período de apreciação cambial, a indústria
acabou por aumentar muito a importação de matérias-primas e componentes.
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Ele observa que 50% das vendas industriais são intraindústria, então o próprio setor
compra menos do fabricante nacional e contribui para seu enfraquecimento. “Como
estratégia micro dá para entender, mas isso tem um efeito macro muito ruim, e acabou
se tornando uma armadilha. Eu espero que não, mas o Brasil está no caminho de uma
indústria mexicana, de apenas montar produtos”, diz.
Com mais três economistas, Marconi começou uma pesquisa a partir da hipótese de
que a margem de lucro industrial cairia quando o câmbio estivesse apreciado e
aumentaria com o câmbio depreciado, mas os dados mostraram que ocorreu o
contrário e indústrias de diferentes setores lucraram mais apesar do câmbio fora do
lugar. “Um dos fatores que explica esse resultado foi justamente essa mudança na
composição dos insumos”, diz Marconi.
Hoje, a série histórica da taxa de câmbio mostra que desde meados do ano passado
ela já está em uma situação de maior equilíbrio do ponto de vista industrial. Mas agora
os empresários já estão tão dependentes da importação “que preferem a redução das
tarifas sobre bens importados e a própria abertura”, acrescenta Marconi. O trabalho
concluiu que a troca do fornecedor local pelo do exterior foi mais intensa nos setores
de alta tecnologia. “Então, o problema não é só de redução da demanda, mas de perda
de conteúdo tecnológico, de densidade da produção local.”
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O problema, diz Marconi, não é importar, mas não exportar, pois a indústria no mundo
se organiza em cadeias globais de valor, e o Brasil não deveria ficar só na ponta que
importa, sem agregar valor e sem exportar. Um dos setores mais deficitários é o
farmacêutico, com importações de US$ 8,4 bilhões e exportações de apenas US$ 1,4
bilhão em 2018. No setor, mais de 90% dos insumos são importados.
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“Esse é certamente um diferencial que nos protegeu das oscilações do dólar”, diz ele,
listando também a decisão “desde sempre” de distribuir apenas 10% do lucro aos
acionistas como outra regra que fez diferença na estratégia da empresa. Como o
restante do lucro fica no caixa, ele foi usado para bancar investimentos, ampliações,
aquisições ao longo dos anos. “Do BNDES só pegamos R$ 13 milhões para uma fábrica
que custava R$ 200 milhões”, diz Pacheco, reforçando que nunca deveu dinheiro para
banco algum.
Infelizmente, a aposta da Cristália em agregar valor à sua produção não é regra entre a
indústria brasileira. O professor David Kupfer, da Universidade Federal do Rio de
Janeiro (UFRJ), recorda que o movimento de desindustrialização não é deste século. O
processo de industrialização do Brasil foi interrompido no fim da década de 70 e piorou
com a crise dos anos 80. “E o Brasil nunca mais conseguiu se recuperar e retomar o
processo de desenvolvimento dos ramos industriais de maior valor adicionado e que
dão sustentação ao crescimento”, avalia.
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Brasil. “A indústria não consegue evoluir nem no ritmo da economia brasileira, que está
estagnada. A indústria está involuindo”, resume.
O professor da UFRJ aponta que entre os setores que o Brasil perdeu densidade estão
o segmento automotivo (que chegou a ser um quinto da produção brasileira,
considerando matéria-prima, autopeças e as montadoras), a mecânica (especialmente
bens de capital sob encomenda) e o químico, enquanto o setor eletroeletrônico,
também ausente, nunca existiu de fato no país. O Brasil, diz ele, ainda mantém uma
indústria tradicional bastante grande, com problemas de competitividade diversos,
especialmente porque é a que mais enfrenta a competição asiática - setores têxtil, de
vestuário e calçados.
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A empresa foi destaque no setor no primeiro ranking das melhores do segmento têxtil,
couro e vestuário, em 2001, e ficou na segunda posição no anuário de 2019. Ela conta
que a empresa tem um amplo mix de produtos e que já não trabalha na tradicional
sazonalidade de inverno e verão, sapato fechado e sapato aberto, mas oferece um
leque amplo, capaz de atender às demandas de diferentes públicos e culturas. “Com
isso, hoje, 17% da produção é destinada ao mercado externo, Antes, era 5%”, lembra.
Junto ao trabalho de marca para fidelizar o cliente - além da própria Beira Rio, a
empresa produz os calçados Vizzano e Moleka, entre outros -, a empresa tem feito
investimentos para reduzir o custo de produção e também tornar sua produção “mais
verde”, com reutilização da água da chuva, reaproveitamento de materiais (ela usa
resíduos para palmilhas e solados novos) e telhas translúcidas em todas as fábricas
para poupar energia, entre outras medidas que ao longo dos anos foram permitindo
reduzir custos e manter os calçados em um preço competitivo, sem perda de conforto
e sem abrir mão do design, diz Maribel.
Paulo Morceiro, Nelson Marconi e David Kupfer não descartam a possibilidade de que
a indústria de transformação venha a representar menos de 10% do PIB, mas acham
que é possível recuperar uma parte da densidade perdida na última década e meia,
embora também não tenham muitas ilusões de que o futuro seja “pujante”. Os três
defendem que mecanismos de política industrial são necessários, apesar do desgaste
que programas mal desenhados nos últimos anos ocasionaram.
Paulo Morceiro diz que o longo tempo de desmonte da indústria hoje joga contra sua
recuperação. “Ficou mais difícil, a escala de investimentos necessários é muito grande.
Não dá para pôr uma pazinha onde os países têm colocado caminhões de dinheiro. O
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Marconi também vê falhas nas políticas industriais nos anos 2000. Para ele, faltou foco
na inovação e na exportação, e esse deveria ser o caminho agora. Ele não vê o atual
governo, contudo, fazendo qualquer movimento nesse sentido, embora veja alguns
elementos que podem ajudar a indústria, como câmbio mais competitivo e juros
básicos mais baixos.
Outra ajuda pode vir da reforma tributária. Se ela caminhar no sentido de um imposto
sobre valor agregado que desonere a produção, vai ajudar a competitividade do setor,
pondera o professor da FGV. Mesmo com uma macroeconomia na direção correta, diz,
é preciso ver se o país volta a crescer (há outros elementos jogando contra) e adotar
medidas que incentivem os setores corretos. “Mas agora, ao contrário do passado, o
governo não tem essa crença [da necessidade de uma política industrial].”
Além de não ter a crença, acredita no contrário, lamenta Kupfer. “É preocupante que,
além de não definir boas políticas há muito tempo, o país já não consegue preservar as
instituições necessárias. Estamos passando por um preocupante momento de
desconstrução da política científico-tecnológica brasileira, por desfinanciamento, por
mudança de atribuição de órgãos. Sem alguma capacidade própria de absorção de
tecnologia, de conhecimento, não vamos conseguir dar o salto necessário”, argumenta.
Morceiro lembra que na Coreia, junto a política industrial, o país fez um forte
investimento em educação.
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Os três economistas concordam que uma indústria com mais serviços embutidos é a
base das mudanças que precisam ser incentivadas. A carreira de Paulo Cunha, o PaCu,
executivo que atua no setor de tecnologia da informação há mais de três décadas no
país, é um exemplo dessa transformação necessária, pois o próprio setor de TI é o
retrato do fim da diferença entre o que tradicionalmente se chama de indústria e o
setor de serviços. PaCu trabalhou em empresas como Intel, Motorola e Microsoft e hoje
é o diretor de vendas da Amazon Web Services.
com a privatização das teles, criou um mercado altamente competitivo que permite o
acesso de grande parcela da população - além das próprias empresas - aos serviços
digitais, e há um mercado imenso para ser explorado.
Pelo potencial, explica, o Brasil foi a sexta região do mundo a receber um centro de
computação na nuvem da AWS - hoje são 22 no mundo. “A indústria tradicional pode
ter perdido espaço no PIB, mas há outras indústrias crescendo ancoradas nessa
transformação digital, e talvez a forma como eles se complementam [os setores
tradicionais e os novos] ainda não estejam sendo corretamente medidos”, acrescenta.
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Estes são os 15 países mais ricos do mundo
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