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GRUPOS ESCOLARES:

CULTURA ESCOLAR PRIMÁRIA E ESCOLARIZAÇÃO DA

INFÂNCIA NO BRASIL (1893-1971)

Organização: Diana Gonçalves Vidal


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GRUPOS ESCOLARES:
CULTURA ESCOLAR PRIMÁRIA E ESCOLARIZAÇÃO DA INFÂNCIA NO BRASIL

(1893-1971)

Sumário

Tecendo história (e recriando memória) da escola primária e da infância no


Brasil: os Grupos Escolares em foco, Diana Gonçalves Vidal
1. A contribuição dos estudos sobre Grupos Escolares para a renovação da
história do ensino primário no Brasil, Rosa Fátima de Souza e Luciano Mendes de
Faria Filho
2. A implantação das Escolas Centrais em Portugal, Margarida Felgueiras e
Elizabeth Poubel e Silva
3. Das escolas reunidas ao Grupo Escolar: a escola como repartição pública
de verdade, Antônio de Pádua Carvalho Lopes
4. Grupos Escolares na Paraíba: iniciativas de modernização escolar (1916-
1922), Antonio Carlos Ferreira Pinheiro
5. A emergência dos Grupos Escolares no Maranhão, Diomar das Graças
Motta
6. A escola no espelho: São Paulo e a implantação dos Grupos Escolares no
estado de Sergipe, Jorge Carvalho do Nascimento
7. A educação primária baiana: Grupos Escolares na Penumbra, Lucia
Maria da Franca Rocha e Maria Lêda Ribeiro de Barros
8. O Grupo Escholar Modelo "Augusto severo" e a educação da criança
(Natal-RN, 1908-1913), Marta Maria de Araújo e Keila Cruz Moreira
9. O florescer de uma cultura escolar no ensino público matogrossense,
Elizabeth Poubel e Silva
10. Os Grupos Escolares em Minas Gerais como expressão de uma política
pública: uma perspectiva histórica, José Carlos Souza Araújo
11. Um projeto modernizador: o Grupo Escolar numa cidade de vocação
industrial, Lola Yazbeck
12. Por um modelo escolar modelar: a constituição dos Grupos Escolares no
Distrito Federal em Finais do Século XIX, Sônia Câmara e Raphael Barros

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13. Desfiles patrióticos: memória e cultura cívica dos Grupos escolares de


Curitiba (1903-1971), Marcus Levy Albino Bencostta
14. Grupos escolares na região dos Campos Gerais - PR, Maria Isabel Moura
Nascimento
15. Vitrines da República: os Grupos Escolares em Santa Catarina (1889-
1930), Vera Lucia Gaspar da Silva

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TECENDO HISTÓRIA (E RECRIANDO MEMÓRIA) DA ESCOLA PRIMÁRIA E DA


INFÂNCIA NO BRASIL: OS GRUPOS ESCOLARES EM FOCO.

Diana Gonçalves Vidal1

O pesquisador que se propõe como desafio investigar a cultura escolar


primária e/ou a história da infância brasileira no período republicano depara-se com a
presença freqüente dos Grupos Escolares. Surgidos no corpo das leis desde 1893, em
São Paulo e no Rio de Janeiro, regulamentados e instalados a partir de 1894 no
estado de São Paulo, os Grupos Escolares emergiram ao longo das duas primeiras
décadas republicanas nos estados do Rio de Janeiro (1897); Maranhão e Paraná
(1903); Minas Gerais (1906); Bahia (1908), Rio Grande do Norte, Espírito Santo e
Santa Catarina (1908); Mato Grosso (1910); Sergipe (1911); Paraíba (1916); e Piauí
(1922); e somente foram extintos em 1971, com a promulgação da Lei 5.692.
Acolheram, ao menos, duas gerações de brasileiros em seus bancos e foram
responsáveis pela inserção de uma significativa parcela da população nacional no
universo dos saberes formalizados.
Constituindo-se como escolas graduadas, os Grupos Escolares aglutinavam
em um mesmo edifício as antigas escolas isoladas, organizando a docência em torno
de séries escolares que passavam a corresponder ao ano civil e eram concluídas pela
aprovação ou retenção em exame final. O ensino seriado e seqüencial substituía as
classes de alunos em diferentes níveis de aprendizagem, sob a autoridade única do
professor, e era regulado pela introdução da figura do diretor, oferecendo
organicidade e homogeneidade à escolarização e produzindo uma nova hierarquia
funcional pública.
As matrículas restringiam-se ao início do ano letivo e a freqüência se
apresentava como obrigatória, em geral, para crianças de 7 a 12 anos de idade, o que
concorria para estabelecer uma idade da escola primária coincidente a uma
determinada idade de infância. O caso paulista pode ser tomado como exemplo. Na
legislação educacional do Império, a franja atingida pela escola elementar ia dos 5
anos de idade aos 16 (Lei 54, de 1868). Com a criação dos Grupos Escolares, foi

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Professora de História da Educação na Faculdade de Educação da USP. Coordenadora do Centro de
Memória da Educação e do Núcleo Interdisciplinar de Estudos e Pesquisas em História da Educação
(NIEPHE) na mesma instituição. Atualmente assume a presidência da Sociedade Brasileira de
História da Educação. E-mail: dvidal@usp.br.
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reduzida de 7 aos 12 anos (facultando o ingresso de crianças de 6 anos e de 13 a 16


anos de idade). Paulatinamente, a exigência de observância de classes homogêneas
para o ensino e aprendizagem nas escolas graduadas tendeu a associar idade ideal a
série e a consolidar medidas extraordinárias para a escolarização elementar de alunos
fora das faixas etárias ideais, como as campanhas de alfabetização de jovens e
adultos, iniciadas na década de 1940.
A ligação estreita tecida no âmbito das políticas educativas entre infância e
Grupo Escolar, entretanto, nem sempre se verificou na prática dos sistemas escolares.
A manutenção de escolas isoladas até os nossos dias, a despeito das várias
denominações que recebeu (e recebe); e as dificuldades de implantação das escolas
graduadas nas diversas regiões brasileiras, pelo alto custo que representavam, sendo
muitas vezes substituídas pelas escolas reunidas, que reduziam gastos de instalação,
mas mantinham o modelo multisseriado (Cf. Souza e Faria Filho; Lopes; Motta; e
Rocha e Barros), ou pela resistência oferecida por grupos sociais a um modelo
escolar que supunha o afastamento das crianças do lar (e do trabalho produtivo) e a
supremacia da autoridade da escola (e de seus representantes) (Cf. Souza e Faria
Filho; Lopes; Araujo; e Yazbeck) atestam que a hegemonia pretendida não se
efetivou por completo no território nacional.
Isto não significa afirmar que os Grupos Escolares não se constituíram como
representação (Chartier, 1990) de escola primária para uma substantiva parcela da
população brasileira. O texto de Paulo K. Mourão, citado por José Carlos de Souza
Araujo, indicia a zona de consenso que o modelo de escola graduada havia assumido
no discurso educacional. Referindo-se ao período anterior à reforma João Pinheiro,
de 1906, que criou os Grupos Escolares em Minas Gerais, Mourão explicitava, em
1962, o vigor que o modelo possuía no âmbito das propostas educativas associado à
imagem de eficiência do processo escolar.

Até então, os professores em um exaustivo trabalho, ensinavam em


aulas heterogêneas, onde se reuniam crianças das quatro classes, com
óbvios inconvenientes para a aprendizagem e para esses próprios
mestres que teriam que redobrar esforços para manter em atividade
todos os alunos, sem poderem dispensar, ao mesmo tempo, a sua
atenção para com todas essas divisões. Ainda que empregassem
auxiliares ou utilizassem os próprios alunos mais adiantados para
dirigirem os das primeiras classes, tal como se fazia no tempo do
Império e mesmo na República, a eficiência da aula muito deixava a
desejar.

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Considerar os grupos escolares como tradição inventada da escola primária


no Brasil republicano, apropriando-me da fórmula elaborada por Hobsbawm e
Ranger (1997), pode ser operatório. Implementando um conjunto de práticas rituais e
simbólicas (Cf. Souza e Faria Filho: Lopes: Pinheiro; Nascimento; Bencostta; e
Silva), disseminando-se como imagens em fotografias (Cf. Bencostta; e Silva), e
constituindo-se como monumentos públicos (Cf. Souza e Faria Filho; Lopes;
Pinheiro; Motta; Nascimento; Araújo e Moreira; Poubel e Silva; Araujo; Yazbeck;
Câmara e Barros; Bencostta; Moura Nascimento; e Silva), os Grupos Escolares
fundaram uma representação de ensino primário que não apenas regulou o
comportamento, reencenado cotidianamente, de professores e alunos no interior das
instituições escolares, como disseminou valores e normas sociais (e educacionais).
Assumiu, especialmente nas quatro primeiras décadas republicanas, a posição de
uma escola de verdade (Tyack e Cuban, 1999) a uma parte da sociedade brasileira,
para a qual funcionou como símbolo de coesão e status.
Emergindo na confluência da defesa da escola laica, da liberdade de ensino,
da obrigatoriedade da instrução ensino elementar, do direito à educação e do dever
do Estado e da família em oferecê-la (Cf. Souza e Faria Filho; Lopes; Rocha e
Barros; Araujo e Moura Nascimento), com a difusão dos princípios e práticas
européias e norte-americanas de escolarização, como o método intuitivo ou as lições
de coisa (Cf. Pinheiro; Motta; Nascimento; Araújo e Moreira; Poubel e Silva;
Araujo; Câmara e Barros; e Silva); os Grupos Escolares reuniram os esforços da
ilustração brasileira (Barros, 1959) na propagação de um ideal civilizatório, não raro
eivado de referências cívicas e patrióticas (Cf.. Souza e Faria Filho; Lopes; Pinheiro;
Nascimento; Bencostta; e Silva).
A reorganização administrativa e pedagógica da escola elementar por eles
propiciada incidiu na reordenação dos tempos e espaços escolares; na ampliação do
currículo, contemplando disciplinas de caráter enciclopédico, e na redefinição do
lugar ocupado pela escola no traçado das cidades, posto que os Grupos Escolares se
constituíram como uma realidade essencialmente urbana (Cf. Souza e Faria Filho;
Pinheiro; Motta; Nascimento; Araújo e Moreira; Poubel e Silva; Yazbeck; e Silva).
No entanto, se os Grupos Escolares tiveram uma importância singular na
construção simbólica de escola primária brasileira e na produção da história da
infância no Brasil, não é certo dizer que sua influência foi única no período que se
estendeu até os anos 1970. A essa representação hegemônica de ensino preliminar,

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nos anos 1920, associou-se outra: a Escola Nova. As seguidas reformas da instrução
pública implementadas por Carneiro Leão (1922-1926), Fernando de Azevedo
(1927-1930) e Anísio Teixeira (1931-1935) no Rio de Janeiro; Sampaio Dória
(1920), M.B. Lourenço Filho (1930-1931), Fernando de Azevedo (1933) e Almeida
Jr. (1935-1936) em São Paulo; Francisco Campos (1927-1930) em Minas Gerais;
Carneiro Leão (1928-1930) em Pernambuco; Lourenço Filho (1922-1923) no Ceará;
e Anísio Teixeira (1925-1927) na Bahia constituíram o solo fértil e consolidaram
uma nova forma de organização administrativa e pedagógica do ensino, de
orientação laica, que, não negando as conquistas da escola graduada, apresentava
outros contornos às práticas e saberes escolares. Métodos de projeto, centros de
interesse, sistema platoon foram novos vocábulos incorporados ao exercício da
docência brasileira. A criação do Ministério da Educação e Saúde em 1930 e a
presença nele do educador escolanovista M.B. Lourenço Filho por mais de 40 anos
em diversos cargos técnicos assegurou a disseminação das propostas a todo o
território nacional, ainda que a semântica da Escola Nova não fosse única e as
disputas com educadores católicos acirradas, particularmente depois de 1932.
A expressão ganhou relevo especialmente após a aprovação da reforma
Fernando de Azevedo, em 1927 no Rio de Janeiro. A partir de então, guindado pelo
educador, o termo Escola Nova passou a significar os esforços de renovação escolar,
o novo, em detrimento do passado, do velho. Negava (e relegava ao esquecimento)
as experiências anteriores implementadas no Brasil, constituindo-se como verdadeira
representação da escola elementar. Seu uso no interior do texto do Manifesto dos
Pioneiros, lançado em 1932, consolidou a fortuna (Hameline, 1995) da fórmula:
ideal ao mesmo tempo carente de definição e capaz de aglutinar pessoas e ações.
No entrecruzamento de representações concorrentes de ensino e
aprendizagem escolares foram-se redesenhando os contornos da escola primária
brasileira (e de sua cultura). Por um lado, a força simbólica da forma dos Grupos
Escolares persistia assegurando matizes da cultura escolar primária fundada ao fim
do oitocentos. Por outro, a nova gramática escolanovista lançava desafios ao modelo,
traçando-lhe novos perfis, num processo considerado por Tyack e Cuban (1999)
como hibridação. É interessante destacar que a maioria dos estudos que se debruça
sobre o tema dos Grupos Escolares estabelece como data limite à análise os anos
1930 (Cf. Souza e Faria Filho). Assim o fazem, talvez, por se concentrarem no

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período de sua implantação; ou por perceberem que força do modelo proposto no


final do século XIX apresentava sinais esmaecimento.
Um exemplo da hibridação entre as duas gramáticas pode ser captado na
equivalência entre ensino ativo e escola ativa persistente até atualmente no discurso
educacional. Se a primeira fórmula surgiu no vocabulário educativo nas últimas
décadas oitocentistas e concernia à maneira como os saberes escolares deveriam ser
trazidos ao aluno, supondo a atividade dos professores na realização de experimentos
e no oferecimento de imagens e objetos que concretizassem a aula; a segunda foi
criada apenas em 1917, difundindo-se mundialmente a partir de 1922 (Hameline,
1995), e pretendia deslocar para os alunos o princípio mesmo da ação, relegando-lhes
o papel principal na feitura das tarefas e na descoberta do conhecimento. Era pela
prática dos métodos de projeto e centros de interesse que as crianças deveriam
solucionar problemas e construir experimentos, ainda que sempre orientadas pelos
docentes. Apesar de diversos, os termos não chegaram a ser totalmente deslindados
pelos educadores novos dos anos 1920 e 1930. A importância dos Grupos Escolares
na consagração de uma forma escolar (Vincent, 1980) do ensino primário, que unia
gradação e seriação de conteúdos a método intuitivo, desdobrado em ensino ativo,
parece ter borrado as diferenças e favorecido a aproximação entre as acepções de
escola e ensino ativos.
O entrelaçamento das duas propostas de escolarização revelava, assim, a
atualização de fazeres e saberes educacionais gestados no século XIX, paralelamente
à manutenção de dispositivos que haviam demonstrado eficácia na constituição (e
permanência) do funcionamento escolar, continuando válidos na concepção e prática
dos agentes educativos. Vale sublinhar que os Grupos Escolares desapareceram do
rol das políticas públicas brasileiras, na mesma década em que os principais
defensores da Escola Nova se afastaram das contendas educacionais. M.B. Lourenço
Filho faleceu em 1970, Anísio Teixeira em 1971 e Fernando de Azevedo em 1974.
Curiosamente, haviam aparecido também na mesma década em que os educadores
nasceram: Lourenço Filho em 1897, Anísio Teixeira em 1900 e Fernando de
Azevedo em 1894.
A concorrência das representações de escola e escolarização, no entanto,
promoveria fissuras em algumas idéias-força que haviam norteado a implantação dos
Grupos Escolares. E ficaram evidentes no texto da última Lei de Diretrizes e Bases
da Educação Nacional (9394), promulgada em 1996. A relação idade do aluno/ série/

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ano escolar/ ano civil/ exame final, problematizada parcialmente no Rio de Janeiro,
nos anos 1930, com a reclassificação de séries implantada por Anísio Teixeira, e, em
São Paulo, na década de 1990, com a introdução dos ciclos, propostos por Paulo
Freire; viu-se alterada, na LDB, pela possibilidade da educação básica

organizar-se em séries anuais, períodos semestrais, ciclos, alternância


regular de períodos de estudo, grupos não-seriados, com base na
idade, na competência e em outros critérios, ou por forma diversa de
organização sempre que o interesse do processo de aprendizagem
assim o recomendar (Art. 23).

prevendo, ainda, a “avaliação contínua e cumulativa do desempenho do


aluno, com prevalência dos aspectos quantitativos sobre os qualitativos e dos
resultados ao longo do período sobre os de eventuais provas finais” (Art. 24, inciso
V). Os ajustes propostos pela nova LDB aos tempos da escola primária tornaram-se
enunciáveis no contexto de uma inclusão que atingia mais de 90% da população em
idade escolar. Revelavam o investimento da administração pública em assegurar a
regularidade entre idades da infância e da escola elementar e, simultaneamente,
sinalizavam um certo beneplácito para com as demais faixas etárias.
Entre 1975 e 1999, a matrícula no ensino fundamental no Brasil passou de
19,5 milhões para 36 milhões, apresentando um crescimento superior a 75%. No
mesmo período, a população entre 7 e 14 anos de idade aumentou quase 30%.
Apesar do esforço na ampliação ao atendimento escolar, em torno de 2 milhões (4%)
de crianças e adolescentes nessa faixa etária continuaram fora da escola. O
crescimento da matrícula, entretanto, não representou o fim do analfabetismo. Nos
últimos 30 anos, passamos de uma população analfabeta de mais de 30%, em 1970,
para 13%, em 1996, na zona urbana. Na zona rural, no entanto, o analfabetismo
chegava, em 1990, a 37%. Em geral, os analfabetos, hoje no Brasil, encontram-se na
população com mais de 15 anos de idade, principalmente entre homens e mulheres
com 40 anos ou mais (Mansano Filho et al, 1997).
Se os dados acima podem levar o leitor a considerar o encerramento da era
dos Grupos Escolares, de um ciclo que se estendeu por quase 80 anos na educacional
nacional, e a suspeitar da eficácia de sua implantação, o debate promovido pelos
textos reunidos neste livro recoloca o tema no centro das inquietações acerca dos
estudos sobre cultura escolar primária e história da infância no Brasil. Não apenas
porque se debruça sobre ações pretéritas, restabelecendo vínculos entre passado e

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presente da escolarização brasileira profícuos na compreensão dos desafios


enfrentados pela disseminação da educação elementar em todo o território nacional e
pela (re)construção de uma cultura escolar primária ainda na atualidade; mas,
também, porque problematiza o imediatismo das relações entre ontem e hoje forjado
por análises pragmáticas da história da educação brasileira e diagnósticos, por vezes,
apressados da realidade educacional contemporânea.
Fruto de investigações longas, em geral resultantes de teses e dissertações, e
incidindo sobre diversas regiões brasileiras, os artigos compõem um amplo estado da
arte da pesquisa acerca dos Grupos Escolares no Brasil. O livro reúne uma produção
dispersa e nem sempre acessível, por vezes guardada nas bibliotecas universitárias
espalhadas pelo território nacional. Ao mesmo tempo, exercita o necessário diálogo
com trabalhos similares estrangeiros, acolhendo um texto sobre as Escolas Centrais
portuguesas.
O volume se abre com o artigo elaborado por Rosa Fátima de Souza e
Luciano Mendes de Faria Filho. Nele, os dois autores, considerados referência sobre
a temática no Brasil, efetuam um cuidadoso balanço da produção nacional,
ampliando as indicações bibliográficas, realizadas pela organização deste livro. A
reflexão se estende sobre os desafios enfrentados pelas pesquisas acerca da história
dos Grupos Escolares na articulação com estudos sobre políticas públicas, cultura
escolar primária e infância (ao que agregam as demais instituições de guarda da
criança, como família e asilos, e as condições de sobrevivência, como trabalho).
Alertam Souza e Faria Filho, ainda, para a insuficiência de análises sobre as escolas
graduadas no entendimento da escolarização da população brasileira, propugnando
pelo desenvolvimento de investigações acerca das escolas isoladas e reunidas.
As Escolas Centrais portuguesas são abordadas no segundo capítulo, de
autoria de Margarida Felgueiras e Elizabeth Poubel e Silva. Apesar de destacar a
importância desse modelo escolar na passagem de uma relação direta professor-aluno
para a professor-grupo mediatizada por um aparato burocrático, com a introdução do
ensino simultâneo, do método intuitivo e da organização homogênea das classes,
cujas marcas na educação portuguesa permanecem visíveis; as autoras alertam para a
limitada implantação das Escolas Centrais em Portugal, restritas, em geral, às cidades
de Lisboa e Porto. O texto incita a percepção das aproximações e dos contrastes nas
formas de escolarização inventadas nos dois países e estimula o exercício
comparativo.

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Este convite à comparação, aliás, pode e deve ser estendido aos demais treze
artigos incluídos neste livro. Agrupados por região geográfica, seguindo a ordem
alfabética do nome dos autores, desenham um cenário multifacetado da implantação
dos Grupos Escolares no Brasil. Há seis textos abordando a região Nordeste.
Discorrem sobre os estados do Piauí, Paraíba, Maranhão, Sergipe, Bahia e Rio
Grande do Norte. Um artigo se debruça sobre o Centro-oeste, analisando Mato
Grosso. Três capítulos recobrem o Sudeste, notadamente Minas Gerais e Rio de
Janeiro. Os últimos três textos enfocam a região Sul, privilegiando os estados do
Paraná e Santa Catarina. A simples justaposição das narrativas exibe semelhanças e,
ao mesmo tempo, revela singularidades na criação e instalação dos Grupos Escolares
no território brasileiro.
A importância na interlocução com educadores e a legislação paulista
desponta nos relatos de Antônio de Pádua Lopes, Jorge Carvalho do Nascimento,
Elizabeth Poubel e Silva e Vera Lúcia Gaspar da Silva. A preferência pela instituição
de escolas reunidas às graduadas emerge nos trabalhos de Diomar das Graças Motta,
Lucia Maria Franca Rocha e Maria Lêda Ribeiro de Barros e Antônio Lopes. O
destaque à formação cívica e patriótica tem lugar nos escritos de Jorge Carvalho do
Nascimento, Elizabeth Poubel e Silva, Marcus Albino Bencostta e Vera Lúcia
Gaspar da Silva. As questões atinentes aos ditames políticos e sociais relativos à
implantação dos Grupos Escolares perpassam a argumentação dos vários autores
com maior o menor ênfase.
O estudo de Antônio de Pádua Lopes centra a discussão na constituição da
escola como repartição pública no Piauí, pela criação das Escolas Reunidas e dos
Grupos Escolares. Sua preocupação é demonstrar que a escolha do novo modelo, em
substituição às escolas isoladas ou casas-escola, visava normatizar a organização
administrativa e pedagógica da escola primária conferindo maior homogeneidade a
seus procedimentos. Concorria para isso, a introdução das funções de portaria e
direção, regulando os horários de funcionamento das unidades escolares e
controlando o exercício da docência.
Antonio Carlos Ferreira Pinheiro explora, particularmente, o surgimento do
Primeiro Grupo Escolar, Thomaz Mindello, na Paraíba. Examina as festividades de
sua inauguração em setembro de 1916; as disputas políticas em torno dos custos da
compra do prédio destinado à escola e de sua adaptabilidade ao ensino; e as relações
entre o edifício e o desenho urbano da antiga cidade da Parahyba (atual João Pessoa).

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Analisa, ainda, as aproximações entre Grupos Escolares, urbanização e modernidade


no discurso das elites republicanas das primeiras décadas do século XX e as
propostas de erradicação do analfabetismo então veiculadas.
O artigo de Diomar das Graças Motta discorre sobre os primeiros Grupos
Escolares instituídos em São Luis, interessando-se por sua organização e
funcionamento. Nesse sentido, apresenta o quadro curricular, relata as condições de
matrícula e aprovação em exames para os alunos, e caracteriza o corpo
administrativo e docente das escolas. Destaca que os Grupos Escolares a princípio se
estruturavam em torno de apenas três classes para sete anos de escolaridade e que,
apesar de criados em 1903, até 1919 não possuíam um diretor, mas uma professora-
secretária responsável pela escrituração escolar.
Jorge Carvalho do Nascimento se interroga acerca dos vínculos entre a
implantação dos Grupos Escolares em Sergipe e o sistema educacional em São
Paulo. Lembra que foi após a contratação do professor paulista Carlos da Silveira
como reformador da instrução pública sergipana, em 1909, que se deu a instalação da
primeira escola do gênero no estado, denominada Grupo Escolar Modelo. Faz a
análise incidir, ainda, sobre a estruturação das escolas, dando especial destaque à
formação cívica.
Lucia Maria da Franca Rocha e Maria Lêda Ribeiro de Barros, afirmando a
especificidade do republicanismo baiano, consideram que modelo dos Grupos
Escolares foi pouco disseminado na Bahia até 1930, a despeito de sua lei de criação
remontar a 1895 e do primeiro Grupo ter sido inaugurado possivelmente em 1908.
Esclarecem que, sob o ponto de vista dos prédios escolares, o modelo das Escolas
Reunidas assumiu maior importância no território baiano, especialmente a partir da
reforma da instrução pública efetuada por Anísio Teixeira em 1925.
O Grupo Escolar Modelo "Augusto Severo" é o objeto do artigo de Marta
Maria de Araújo e Keila Cruz Moreira. Primeiro Grupo implantado no Rio Grande
do Norte, inaugurado em espetacular festa pública cívica, dirigido pelo professor
Ezequiel Benigno Vasconcelos Junior, também diretor da Escola Normal, a escola
surgiu como paradigma de inovação pedagógica para as demais instituições escolares
primárias do estado, disseminando as propostas pedagógicas de Pestalozzi e Froebel.
As autoras examinam a influência desse movimento na escolarização da infância
potiguar.

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012

Elizabeth Poubel e Silva demonstra, também, a importância dos educadores


paulistas (Leowigildo Mello e Gustavo Kuhlmann) na estruturação do sistema
educacional mato-grossense nos moldes das escolas graduadas. Detém-se,
particularmente, no estudo da organização administrativa e pedagógica da Escola
Modelo Barão de Melgaço, entre 1910 e 1916, período em que foi dirigida por Mello
(mesmo diretor da Escola Normal de Cuiabá). Servindo à prática das normalistas, a
escola funcionava como exemplo às demais instituições primárias do estado. De
acordo com a autora, nela ensaiavam-se os princípios da pedagogia moderna,
levando em consideração a realidade social e econômica de Mato Grosso.
Os Grupos Escolares em Minas Gerais são abordados pela pena de José
Carlos Souza Araújo que discorre acerca da política educacional mineira, a partir de
1906, ano de implantação das primeiras escolas graduadas no estado. O estudo se
constrói entrecruzando quatro dimensões de análise: os compromissos republicanos
com a educação escolar primária; a instauração dos Grupos Escolares como política
pública; o perfil de João Pinheiro, presidente do Estado entre 1906 e 1908; e a
legislação escolar. Aponta a diminuição do vigor inicial na instalação das escolas
graduadas em Minas a partir de 1915, a despeito do aumento populacional, e indica a
necessidade de contemplar os limites postos pela reforma João Pinheiro e os
obstáculos feitos ao movimento histórico educacional na apreciação da trajetória dos
Grupos Escolares mineiros.
Lola Yazbeck debruça-se também sobre o estado de Minas Gerais,
circunscrevendo seu trabalho à região da Zona da Mata, mas especificamente à
cidade de Juiz de Fora, onde surgiu o primeiro Grupo Escolar mineiro, criado um dia
antes do da capital. Interroga-se sobre o papel das escolas graduadas na socialização
da camada pobre e trabalhadora da população, afirmando que as questões atinentes à
evasão e à repetência nas décadas iniciais do século XX devem ser interpretadas
levando em conta a dependência familiar do trabalho infantil, bem como as
diferentes representações de escola e escolarização partilhadas pelos grupos sociais.
O Rio de Janeiro é o foco do artigo elaborado por Sônia Camara e Raphael
Barros. Os autores analisam o contexto social e político carioca do fim do século
XIX e as sucessivas reorganizações administrativas que a Instrução Pública sofreu no
período. Estendem-se sobre as estratégias criadas pelos Estado para a formação de
professores e instalação escolas-modelos, os Grupos Escolares. Sob sua pena,
emergem dispositivos como diário de classe, a Revista Pedagógica e as Conferências

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013

Pedagógicas Municipais que tinham por objetivo instituir a validade de


procedimentos e métodos adotados pelo magistério no combate ao analfabetismo.
Concluem afirmando que os Grupos Escolares foram extintos a partir de 1914 da
organização do Distrito Federal, não tendo logrado se constituir como modelo de
escola primária no Rio de Janeiro.
Marcus Levy Albino Bencostta investiga os desfiles patrióticos, utilizando a
fotografia como fonte, com o intuito de compreender a constituição de uma cultura
cívica em Curitiba. Percebe os desfiles como festas de celebração à República, que
marcam a memória urbana ao tomar a cidade como cenário. E afirma que ao fazer
uso de meios espetaculares, com profusão de imagens e símbolos, o Estado, por
intermédio dos Grupos Escolares, pretendia inculcar consciências patrióticas nos
futuros cidadãos.
O estado do Paraná também é tematizado por Maria Isabel Moura
Nascimento. A autora explora a instalação dos Grupos Escolares na região dos
Campos Gerais. O foco do estudo se volta para as relações entre a criação das escolas
graduadas e o projeto republicano de educação popular. Examina, ainda, o ensino
privado na região e estabelece conexões com a educação escolar em todo o território
paranaense.
O último capítulo foi redigido por Vera Lucia Gaspar da Silva e versa sobre
os Grupos Escolares em Santa Catarina. A autora procura dar uma visão da
estruturação e funcionamento das escolas graduadas no estado, abarcando na análise
aspectos como tempo e espaços escolares, quadros curriculares, materiais
pedagógicos, dentre outros. Ressalta também a importância do sistema educacional
de São Paulo na organização dos Grupos Escolares catarinenses com a contratação
do educador paulista Orestes Guimarães em 1910 para reformar a instrução pública
estadual.
Os capítulos, brevemente resenhados, realizam uma discussão mais densa e
abrangente do que a traçada acima. Suscitam o entendimento e provocam a reflexão
sobre o lugar dos Grupos Escolares na organização da cultura escolar primária e na
constituição da infância escolar brasileira (e portuguesa), incitando novas vertentes
de pesquisa e análise. No seu conjunto, oferecem um amplo repertório dos estudos
sobre a temática aos investigadores da área de História da Educação, aos docentes e
alunos das Faculdades de Pedagogia e a todos aqueles cuja memória da infância os

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faz percorrer corredores, ver rostos, ouvir risos, correr por pátios de recreio, temer
resultados de exames parciais ou finais, enfim, reviver os tempos do Grupo Escolar.
Fica aqui o convite à leitura. Tenho certeza de ela será instigante e prazerosa.

Referências bibliográficas

BARROS, Roque S. M. de. (1959). A ilustração brasileira e a idéia de


universidade. História e Filosofia da Educação, nr. 2. Boletim nr. 241, São Paulo.

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14
015

A CONTRIBUIÇÃO DOS ESTUDOS SOBRE GRUPOS ESCOLARES PARA A


RENOVAÇÃO DA HISTÓRIA DO ENSINO PRIMÁRIO NO BRASIL

Rosa Fátima de Souza2


Luciano Mendes de Faria Filho3

Qual o significado dos grupos escolares para a compreensão da história do


ensino primário no Brasil? Por que essa modalidade de escola primária tem se
tornado objeto de interesse dos historiadores da educação?
O objetivo deste texto é apresentar questões relativas à produção dos estudos
históricos sobre os grupos escolares realizada na última década, compreendendo um
balanço preliminar e parcial, visto que não recaí sobre uma análise exaustiva de
todos os estudos produzidos. Ao assinalar a contribuição de diferentes autores
buscamos apontar convergências nas investigações, avanços, lacunas e desafios.
A história dos grupos escolares emerge nos anos 90 como fruto do
movimento de renovação dos estudos em história da educação e na confluência de
duas temáticas ou eixos de investigação para os quais se voltaram os historiadores: a
história das instituições educativas e o interesse pela cultura escolar. Pode–se dizer
que essa história significou uma redescoberta do ensino primário investigado com
base em novas abordagens e interpelações epistemológicas e explorado numa
multiplicidade de temas e objetos.
O exame da produção brasileira sobre grupos escolares revela o caráter
acentuadamente regional dos estudos e uma grande preocupação com as origens, isto
é, o momento da implantação dessa modalidade de escola primária em cada estado
resultando, dessa maneira, num grande privilégio ao período relacionado à Primeira
República. Nesse sentido, podem ser identificados dois grupos de estudos: aqueles de
âmbito mais geral voltados para a caracterização dessa modalidade de escola
primária e a reconstituição de sua implantação nos estados, por exemplo, Souza
(1996) em relação ao estado de São Paulo, Faria Filho (1996) em relação a Minas
Gerais (especialmente na cidade de Belo Horizonte), Peres (2000) em relação ao Rio

2
UNESP–Araraquara. E-mail: rosa@fclar.unesp.br
3
UFMG. E-mail: lucianom@ufmg.br
15
016

Grande do Sul, Pinheiro (2002) em relação à Paraíba, Lopes (2001) em relação ao


Piauí, Amâncio (2000) e Reis (2003) em relação ao Mato Grosso, Bencostta (2001) e
Souza (2004) em relação ao Paraná, Ferreira (2002) em relação ao Espírito Santo.4
Num segundo grupo, encontram–se os estudos de natureza monográfica
voltados para uma história institucional focalizando uma escola ou um grupo de
escolas (geralmente o primeiro ou os primeiros grupos escolares instalados em
determinada localidade), por exemplo, Moreira (1997) estuda o primeiro Grupo
Escolar inaugurado em Natal – RN em 1908 (Grupo Escolar Augusto Severo),
Carvalho (2002) analisa a configuração do Grupo Escolar Julio Bueno Brandão
instalado em Uberlândia – MG, em 1911; Oliveira (2002) reconstitui a história do
Grupo Escolar Dezenove de Dezembro criado em Curitiba – PR em 1911; Azevedo
(2003) trata dos seis primeiros grupos escolares criados em Aracaju – SE entre 1911
e 1925, Barroso (1998) trata do Grupo Escolar de Santo Antonio no Rio Grande do
Sul criado em 1922 e Souza (1997 e 1999a) investiga a história do Grupo Escolar
Francisco Glicério e dos sete primeiros grupos escolares instalados em Campinas –
SP entre 1897 e 1925, respectivamente.
Em relação à abordagem, destaca–se a marcante influência da História
Cultural redirecionando o interesse dos pesquisadores para as questões educativas
propriamente ditas, o foco numa história sócio–cultural da educação valorizando os
processos de escolarização, as relações entre práticas e discursos e a escola como
objeto historiográfico.
Outra característica dessa produção é a variedade de fontes de pesquisa. Nos
arquivos públicos, a atenção redobrada em busca de pistas e sinais sobre a vida
escolar possibilitou a exploração de uma documentação antes ignorada – relatórios
de professores, diretores de grupos escolares, de inspetores e delegados de ensino,
provas de alunos, processos administrativos, atas de concurso de professores,
orientações didáticas elaboradas pelos órgãos da administração do ensino, fotografias
escolares, ofícios, correspondências, entre outros documentos. O olhar se debruça
ainda, sobre os periódicos educacionais, a imprensa (jornais locais e de circulação
regional/nacional), livros e manuais escolares, enfim, para a diversidade dos
impressos.

4
Vários grupos de pesquisa no país vêm desenvolvendo estudos sobre a escola primária, Ver, por
exemplo, Carvalho (2003b) e Faria Filho (2002). Veja-se, também, o número 34 da Educação em
Revista (FaE-UFMG), que traz um Dossiê sobre grupos de pesquisa em História da Educação no
Brasil.
16
017

Perseguindo parcos e dispersos rastros do cotidiano das instituições


educativas os pesquisadores têm se voltado para a documentação existente nas
escolas públicas. O encontro com esses rudimentares arquivos escolares (muitos
deles constituindo tão somente um ajuntamento desordenado de fragmentos da
memória casualmente salvaguardados do esquecimento) tem permitido o acesso a
uma documentação administrativa e pedagógica: livros de matrícula, livros ponto, de
licenças, de termos de compromisso, livros de apontamentos sobre o pessoal, livros
de chamada, de ata de fundação, de atas de exames finais, de nomeação e licenças, de
termos de vista de inspetores, mapas de movimento, inventários e correspondências
oficias. Ainda, livros comemorativos, recortes de jornais, atas de reunião de
professores, dados sobre patrono, livro de atas do Centro Cívico, Atas de reunião do
Conselho de Escola, Atas de reuniões de estudo de professoras, Regimento Escolar,
Planejamento de curso, fotografias, entre outros (Cf. Ribeiro, 1992; Souza, 2000b;
Moraes e Alves, 2002; Vidal e Zaia, 2002; Zaia, 2003).

A institucionalização da escola primária

É preciso reconhecer a relevante contribuição que os estudos históricos sobre


os grupos escolares têm trazido para a história do ensino primário e da escola pública
no Brasil. De fato, a história desse nível de ensino foi por muito tempo secundarizada
especialmente se comparada à história das idéias pedagógicas ou mesmo à história
do ensino secundário e superior. Em realidade, até meados da década de 90, a
temática vinha sendo tratada tangencialmente ou abordada correlacionada a outros
objetos de investigação, particularmente no interior das discussões sobre as reformas
educacionais e sobre a história da profissão docente. Em torno das iniciativas do
poder público em prol da educação popular e da democratização do ensino público
encontra–se um grande número de investigações que, de certa maneira,
possibilitaram um lastro de conhecimento sobre o ensino primário no país. Boa parte
desses estudos enfoca as reformas e a inovação educacional no contexto da Primeira
República, por exemplo, Nagle (1974), Tanuri (1979), Paiva (1987), Reis Filho
(1981), Antunha (1976), Peixoto (1983), Carvalho (1989, 2003), Fiori (1991),
Jacomeli (1998), Novaes (2001), Ribeiro (1996).

17
018

Ainda em relação a esse mesmo período histórico, ressaltam–se os estudos


sobre educação e movimento operário e popular: Mazzotti (1987), Guiraldelli (1987),
Jomini (1990), Demartini (1984), Souza (1998).
Para os períodos históricos subseqüentes, a produção historiográfica sobre o
ensino primário é bem menos numerosa. Para o estado de São Paulo, vale ressaltar a
contribuição dos estudos de Pereira (1960), Carvalho (1988), Mitrulis (1993),
Beisiegel (1964), Spósito (1984), Monteiro (1996) que, embora abordando temas
relacionados, possibilitam a contextualização do ensino primário entre 1930 e 1970.
Para o caso de Minas Gerais, ressaltam–se os trabalhos de Paiva e Paixão (2000) e
Peixoto (2000).
Os grupos escolares constituíram–se numa nova modalidade de escola
primária, uma organização escolar mais complexa, racional e moderna. Implantados
no Brasil no início do período republicano, tornaram–se, ao longo do século XX, no
tipo predominante de escola elementar encarnando o sentido mesmo de escola
primária no país. Dessa maneira, a história dos grupos se confunde com a história do
ensino primário e está no centro do processo de institucionalização da escola pública.
No entanto, compreendendo uma história institucional articulando aspectos internos
e externos à escola, os grupos têm posto em questão os dispositivos estáveis que têm
configurado a escola moderna desde meados do século XIX ou como sugere Viñao
Frago (1995) os elementos organizadores que conformam a cultura escolar. É, de
fato, nesse fértil terreno de análise, que essas modelares instituições educativas nos
permitem interrogar e aprofundar o conhecimento acerca da democratização da
escola pública e acerca das permanências e mudanças em educação – a instituição de
novas idéias e práticas e a imperturbável reprodução de procedimentos de ensino ao
longo do tempo, o embate entre o velho e o novo, o tradicional e o moderno em
educação.
Os primeiros estudos específicos sobre a história dos grupos escolares
realizados no país buscaram destacar os elementos constituintes e a singularidade
dessa modalidade de escola primária.
Assim, a tese Dos Pardieiros aos Palácios: forma e cultura escolares em
Belo Horizonte – 1906–1918, (Faria Filho, 1996)5 dedicou–se ao exame da
constituição da rede de educação pública primária na cidade de Belo Horizonte nas

5
Essa tese foi publicada sob o título Dos Pardieiros aos Palácios: cultura escolar e urbana em Belo
Horizonte na Primeira República. Passo Fundo: UPF, 2000.
18
019

primeiras décadas do século XX. Com base nas proposições de Vincent, os grupos
escolares foram concebidos nessa tese como uma nova forma escolar, isto é, o
entendimento da “escola enquanto organização e instituição distinta de outras
instituições (...) uma fase da história da escolarização que conduzirá à instauração de
um aparelho escolar autônomo” (Faria Filho, 1996, p. 25).
Elegendo como foco de análise a cultura escolar nos seus múltiplos
desdobramentos e relações e dando destaque aos sujeitos e às representações que
faziam de suas ações buscou–se demonstrar o movimento da escola que ocorre no
interior do movimento da cidade ressaltando o duplo movimento de produção da
escola que produz também a sociedade.
Em Minas Gerais, os primeiros grupos escolares foram instalados em Belo
Horizonte a partir de 1906 como afirmação do moderno em educação em
substituição ao passado imperial ultrapassado representado pelas escolas isoladas.
Dessa maneira, identificado com a modernidade e constituído pelo agrupamento das
escolas isoladas, a nova forma escolar tinha como essência a “lei econômica da
divisão do trabalho” tão bem percebida pelos reformadores da instrução pública na
época. A relação entre a reorganização da instrução primária e o movimento de
organização do trabalho fabril na sociedade capitalista foram examinados por Faria
Filho (1996) não como transposição de modelos e tecnologias, mas na forma de uma
apropriação ativa.

Isto equivale a dizer, em outras palavras, que o processo de


estabelecimento das relações racionalizadas, do trabalho dividido, da
especialização, do controle no interior do sistema e da unidade de
ensino não obedeceu somente, e em alguns casos, nem
fundamentalmente, aos imperativos da produção fabril. Significou,
isto sim, um longo, complexo e dinâmico processo de incorporação e
recriação, no interior da instrução pública, de uma mentalidade mais
racionalista que vinha se construindo, em todos os âmbitos do social
há pelo menos três séculos. Assim, a racionalização e a divisão do
trabalho, a disciplina e controle do trabalhador, a complexificação do
mundo do trabalho e a desqualificação do trabalhador individual, tanto
criou quanto foi criação da moderna escola brasileira (Faria Filho,
1996, p. 50).

De outro modo, a tese Templos de Civilização: um estudo sobre a


implantação dos grupos escolares no estado de São Paulo – 1890 – 1910 (Souza,

19
020

1996)6, partiu das raízes desse modelo de escola primária relacionando–o com a
escola graduada implantada na Europa e nos Estados Unidos nas décadas finais do
século XIX. Com base nos estudos de Frago (1990), Hamilton (1989), Giollito
(1983) e Cutler (1989), entre outros, tentou–se demonstrar como essa organização
administrativa e pedagógica mais complexa foi se consolidando ao longo da segunda
metade do século XIX resultando em profundas transformações no ensino primário.
A escola primária graduada pressupunha o agrupamento dos alunos mediante a
classificação pelo nível de conhecimento, o edifício escolar dividido em várias salas
de aula, a divisão do trabalho docente, a ordenação do conhecimento em programas
distribuídos em séries, o emprego do ensino simultâneo, o estabelecimento da
jornada escolar e a correspondência entre classe, sala de aula e série. Esse modelo
escolar em circulação, considerado moderno e o mais adequado para a
universalização do ensino primário foi adotado no estado de São Paulo em 1893, no
contexto da reforma da instrução pública calcada na formação de professores
(reforma da Escola Normal e criação da Escola Modelo), na renovação dos métodos
de ensino (emprego do método intuitivo) e na difusão da escola primária (criação de
escolas de diferentes tipos – escolas isoladas, escolas reunidas, escolas noturnas e
grupos escolares – e expansão de vagas) instituindo–se como escola modelar,
símbolo do regime republicano e dos ideais de progresso e civilização.
A Escola Modelo constituiu–se no protótipo de organização dos grupos
escolares em São Paulo. Adotando a mesma ordenação administrativa e didático–
pedagógica das escolas graduadas, ela tornou–se a referência a ser seguida pelas
escolas agrupadas designadas “grupos escolares”.
A expansão dos grupos escolares ocorre progressivamente no estado de São
Paulo acompanhando o desenvolvimento urbano e atingindo crianças provenientes de
vários setores sociais, especialmente das camadas populares. Em pouco tempo eles
se tornaram o tipo predominante de escola primária sobrepujando a matrícula das
escolas isoladas. Em 1929, já haviam sido instalados 297 grupos compreendendo
4.249 classes – 47 encontravam–se localizados na capital e 250 nas cidades do
interior do estado –responsáveis pela matrícula de 191.320 alunos, isto é, cerca de
dois terços dos alunos matriculados nas escolas públicas primárias do estado (Cf.
Souza, 1996, p. 118).

6
Essa tese foi publicada sob o título Templos de Civilização: a implantação da escola primária
graduada no Estado de São Paulo (1890-1910). São Paulo: Editora da Unesp, 1998.
20
021

As duas teses mencionadas acima, tomando como base os relatórios de


inspetores do ensino e diretores de grupos escolares, destacaram as representações
que erigiram o novo modelo de organização escolar como símbolo da modernidade
na instrução pública em dois estados que exerciam a hegemonia política e econômica
no país e se detiveram no exame de vários aspectos da cultura escolar que se
instituía: espaço e tempo, conteúdos e métodos de ensino, material escolar, práticas
educativas.
Partindo de outra abordagem interpretativa, mas ainda tomando os grupos
escolares como objeto de análise, Pinheiro (2002), adotando a perspectiva da longa
duração, pôs em evidência o modelo de organização escolar como recurso para a
compreensão histórica do ensino público primário na Paraíba. O autor identifica a
existência de dois longos períodos históricos na organização escolar paraibana – a
era das cadeiras isoladas e a era dos grupos escolares. A era das cadeiras isoladas
compreenderia o período de 1873, implantação da primeira “aula–régia”, até 1915. A
era dos grupos escolares corresponderia ao período de 1916 até os dias atuais,
quando esse tipo de organização escolar torna–se dominante.
A inovação representada pelos grupos escolares significou profundas
transformações na organização e constituição dos sistemas estaduais de ensino
público no país. O novo modelo de escola exigia altos investimentos, pois
pressupunha a edificação de espaços próprios e adequados para o funcionamento das
escolas, professores habilitados, mobiliário moderno e abundante material didático.
A racionalidade e uniformidade perpassava todos os aspectos da ordenação escolar,
desde o agrupamento homogêneo das crianças (alunos) em turmas mediante a
classificação pelo grau de conhecimento consolidando a noção de classe e série, o
estabelecimento de programas de ensino (distribuição ordenada das atividades e
saberes escolares), a atribuição de cada classe a um professor, a adoção de uma
estrutura burocrática hierarquizada – uma rede de poderes, de vigilância e de controle
envolvendo professores, diretores, porteiros, serventes, inspetores, delegados e
diretores do ensino. Perpassava também a ordem disciplinar impingida aos alunos –
asseio, ordem, obediência, prêmios e castigos.
Recentemente, outros estudos sobre grupos escolares, Peres (2000), Lopes
(2001), Reis (2003), Souza (2004), Carvalho (2002), têm posto em evidência a forma
pela qual o modelo de instrução primária fundamentada na formação de professores,
na renovação dos métodos de ensino e na implantação de novas instituições

21
022

educativas foi se difundindo pelo Brasil apresentando uma certa uniformidade e


padronização no que diz respeito às finalidades da educação escolar e aos princípios
de organização. Por todas as regiões do país verificam–se semelhanças nas
representações e nas práticas discursivas em torno da importância política e social da
instrução pública vinculada às expectativas de desenvolvimento econômico, de
progresso, de modernização e de manutenção do regime republicano. Políticos,
intelectuais, reformadores e profissionais da educação pública dos mais recônditos
cantos do país voltaram–se, no início do século XX, para o grande empreendimento
de modernização e disseminação da educação pública, vista como possibilidade de
superação do atraso e como elemento de constituição da nacionalidade. Ressonâncias
de um amplo projeto civilizador, de ordenação social, moralização dos costumes, de
disciplinarização da classe trabalhadora e de inculcação de valores cívico–
patrióticos.
No entanto, a despeito desses elementos comuns, os estudos têm indicado
peculiaridades relevantes no processo de institucionalização da escola primária. Essa
relativa homogeneidade verificada nos discursos e nas práticas pode ser explicada,
em certa medida, pela propagação do modelo escolar paulista para os demais estados
brasileiros. Esse modelo, como observa Marta Carvalho, instituiu–se sobre o primado
da visibilidade entendido em um duplo sentido: “na lógica que presidiu a sua
institucionalização e na força exemplar que passa a ter nas iniciativas de
remodelação escolar de outros estados” (Carvalho, 2003, p. 225). Com efeito, vários
estudos têm assinalado o modo pelo qual o sistema escolar paulista foi utilizado
como referência modelar em vários estados envolvendo atração e repúdio,
resistências, embates e diferenças em relação ao sistema de ensino e à atuação dos
reformadores paulistas: Moreno (2003), Souza (2004), Isobe (2004), Amâncio
(2000), Reis (2003), Lopes (2001), Novaes (2001), Ferreira (2001), Piacentini
(1984).
Em que pesem as vicissitudes do ensino primário em São Paulo nesse período
– a desarticulação e as disputas internas –, as representações em circulação na época
consagraram a imagem de um sistema orgânico, racional e moderno; imagem
legitimada pelo número significativo de instituições multiplicadas no estado e pelo
conjunto de dispositivos materiais e simbólicos postos em visibilidade: a construção
de prédios próprios para a escola compreendendo uma arquitetura imponente,
mobiliário escolar moderno e importado, materiais didáticos, sistema de inspeção

22
023

técnica, número de escolas e alunos matriculados, publicação de periódicos


educacionais – revistas e Anuários do ensino – realização de festas e comemorações
cívicas dando publicidade da ação escolar no meio social.
A produção sobre os grupos escolares põe na ordem do dia a necessidade de
uma discussão aprofundada sobre reformas educacionais e modernização da
instrução pública no final do século XIX e início do século XX no Brasil. No
horizonte dos reformadores de vários estados brasileiros estava a difusão da
educação popular e a constituição de um moderno sistema de ensino. Mas a
concretização desses ideais significava o enfrentamento de dificuldades insuperáveis.
Conseqüentemente, o ordenamento legal tornou–se o terreno privilegiado para as
disputas no campo político com vistas à instituição da modernidade educacional
almejada. Compreendem–se, dessa maneira, as sucessivas reformas educacionais
empreendidas a cada mudança de governo de estado e ou mesmo de autoridades da
administração do ensino público.
A criação, instalação e expansão dos grupos escolares nos estados atestam os
limites da ação reformadora nos seus aspectos centrais, isto é, na questão da
democratização da escola e da constituição de um moderno sistema de ensino. A
matéria exige cautela para não se confundir a alardeada repercussão dos grupos como
símbolo de modernização da escola primária e o necessário distanciamento crítico do
pesquisador em relação ao significado mesmo do que se considerava moderno, assim
como o papel dos grupos em relação a outros tipos de escola primária e a
contribuição efetiva deles para a ampliação das oportunidades educacionais. Em se
considerando a expansão permanente desse tipo de escola, os estudos deveriam
avançar em relação às décadas de 30 a 60 do século XX.
Efetivamente, apenas aqueles estados que possuíam significativa
prosperidade econômica puderam implantar um sistema moderno de ensino
ampliando vagas e multiplicando instituições modelares. Além de São Paulo e Minas
Gerais destaca–se o estado do Pará. Ribeiro (1996), examinando as reformas da
educação realizadas nesse estado durante o ciclo da borracha (1870–1913), constatou
significativas mudanças na instrução pública no início do período republicano. A
reforma realizada no governo de Paes de Carvalho (1897–1901) instituiu as escolas–
modelo anexas à Escola Normal do Pará e os grupos escolares. Em 1908, já haviam
sido criados 36 grupos no estado, sendo 7 na capital e 29 no interior, atendendo

23
024

8.714 alunos correspondendo a 62,59% das matrículas nas instituições de ensino


público estadual (Cf. Ribeiro, 1996, p. 154).
Em outros estados, no entanto, a difusão da instrução primária mesmo quando
não foi lenta no início do século XX, como é o caso do Rio Grande do Sul, ocorreu
não pelo concurso das modernas instituições escolares, mas mediante a expansão das
escolas isoladas7 e de outras instituições que não os grupos escolares. É preciso,
portanto, reconhecer o papel preponderante e central desempenhado por essas escolas
primárias na disseminação da instrução elementar na primeira metade do século XX.
Da mesma forma, atenção especial deve ser dada às escolas reunidas – modelo
transitório entre a escola isolada e o grupo escolar –, que concorreram para a
expansão do ensino público.
Essa centralidade das escolas isoladas e reunidas na organização e expansão
do ensino primário é atestada por Pinheiro (2002) em relação ao estado da Paraíba e
Lopes (2001) em relação ao estado do Piauí.
Entre 1916 e 1929 foram criados 14 grupos escolares na Paraíba – cinco na
capital e 9 no interior do estado. A expansão das escolas reunidas no período foi
significativa. Em 1926, o estado contava com 35 escolas desse tipo. O crescimento
significativo dos grupos escolares ocorreu apenas nas décadas de 1930 e 1940.
No Piauí, os grupos escolares, propostos inicialmente em 1905, foram criados
legalmente na reforma de 1910. Mas até a década de 20 foram instaladas apenas as
escolas reunidas pelo agrupamento de escolas isoladas em um mesmo espaço físico,
contando com um diretor e um porteiro–servente, além dos respectivos professores
de cada escola isolada agrupada. Somente em 1922 foi criado o primeiro grupo na
cidade de Parnaíba (Grupo Escolar Miranda Osório) por iniciativa da elite político
comercial do município que vinculava a instrução ao desenvolvimento econômico
regional. Dessa maneira, a instrução primária associada à urbanização e à construção
de estradas foi apontada como eixo de um projeto político que visava a fortalecer a
condição de Parnaíba como cidade comercial mais importante do Piauí. A atuação
reformista do poder municipal, antecipando a iniciativa do governo estadual, é
singular na história do ensino primário nesse estado.
Segundo Lopes (2001) o Grupo Escolar Miranda Osório teve prédio
construído em 1925 (planta projetada em São Paulo) e representou um marco na

7
Para uma análise minuciosa sobre as escolas isoladas no estado de São Paulo no período de 1933 a
1943 ver: Silva, 2004.
24
025

modernização educacional da cidade. Essa modernização contou ainda com a


presença de um reformador da instrução pública municipal contratado em São Paulo
– o professor Luiz Galhanone que atuava como diretor do Grupo Escolar João Kopke
na capital paulista. Em Teresina, capital do estado, o primeiro grupo começou a
funcionar em 1926, em prédio especialmente construído para isso. Entre 1922 e 1930
foram criados 17 grupos escolares no estado.
O mesmo se verifica em relação ao estado do Espírito Santo, onde o
crescimento do número de grupos escolares veio a acontecer a partir da década de 30.
De acordo com Ferreira (2001) e Novaes (2001), o primeiro grupo escolar foi criado
em 1908 em decorrência da reforma da instrução pública empreendida no governo de
Jeronimo Monteiro, visando à modernização do estado – projeto ancorado em
iniciativas de implementação do desenvolvimento econômico mediante a
diversificação da produção agrícola e da industrialização. Para a remodelação da
instrução pública o governo convidou o professor paulista Carlos Alberto Gomes
Cardim nomeado diretor da Escola Normal e da Escola Modelo. Não obstante, ainda
em 1926, o Espírito Santo contava com apenas quatro grupos escolares (dois na
capital, um em Cachoeiro de Itapemirim e outro em Muqui). Na década de 30
acelerou o crescimento dessa modalidade de escola primária. Em 1940 havia 69
grupos escolares e 829 escolas isoladas espalhadas por várias cidades capixabas
(Ferreira, 2001).
O descompasso entre práticas discursivas de modernização da instrução
primária e iniciativas de efetiva implantação da escola pública no meio popular
sobressai em vários estudos mencionados neste texto.
O caso do estado do Mato Grosso é ilustrativo. A propósito, Amâncio (2000)
e Reis (2003) retratam as disputas e críticas que envolveram a atuação dos
professores Gustavo Kuhlmann e Leowigildo Martins de Mello contratados em 1910
para reformar a educação no Mato Grosso. Recém formados pela Escola Normal de
São Paulo, Gustavo Kuhlmann assumiu a direção grupo escolar e Leowigildo M.
Mello a direção da Escola Normal e Escola Modelo anexa. Imbuídos dos princípios
da pedagogia moderna e dos idéias liberais republicanos que norteavam a educação
pública em São Paulo, os dois professores ao implementarem a organização da
instrução pública matogrossense buscaram divulgar na imprensa seus ideais
republicanos e pedagógicos e enfrentaram dificuldades, críticas e animosidade do
grupo católico.

25
026

Apesar dos conflitos e das disputas políticas em torno da educação pública, a


elite política matogrossense continuou apostando na contratação de professores
paulistas para modernizarem a instrução primária do estado. Em 1912 foram
contratados mais quatro normalistas em São Paulo para assumirem a direção dos
novos grupos escolares visando a estender a reforma para o interior do estado.
Novamente, em 1922, foi contratado um professor paulista para a direção da Escola
Normal de Cuiabá (Cf. Amâncio 2000).
Não obstante o ímpeto reformista do estado, a expansão do ensino primário
foi lenta durante as primeiras décadas do século XX. Os dois primeiros grupos
escolares foram criados em 1910, mas em 1927 havia apenas 11 grupos em
funcionamento no estado. Dados analisados por Reis (2003) demonstram a pequena
matrícula nos grupos, principalmente naqueles localizados fora da capital e a
existência de um grande número de escolas isoladas e de escolas particulares.
Em relação ao estado do Paraná, Souza (2004) oferece várias informações
sobre visitas de autoridades e professores paranaenses ao estado de São Paulo nas
primeiras décadas do século XX para observação e estudo do sistema escolar de
ensino público desse estado considerado modelar. Mediante relatórios
circunstanciados, essas missões de professores comissionados ofereciam às
autoridades políticas e aos reformadores da instrução pública dados sobre
organização e método das escolas públicas paulistas, além de impressões e sugestões
para a aplicação do modelo no estado do Paraná com vistas a dinamizar no estado a
modernização da instrução pública.
Nos anos 20, o governador do estado, Caetano Munhoz da Rocha, contratou
César Prieto Martinez, diretor da Escola Normal de Pirassununga – SP, para assumir
a diretoria geral da instrução pública parananense e empreender mais uma reforma
educacional. Esperava–se, dessa maneira, imprimir à educação pública paranaense
uma feição moderna e orgânica de forma que as escolas primárias e a escola normal
pudessem cumprir as nobres finalidades de regeneração social, contribuindo para a
construção do Estado e da nação brasileira. Para o empreendimento de moralização e
modernização da instrução pública, conforme explicita Moreno (2003), Prieto
Martinez adotou, como princípios norteadores de sua ação reformadora,
racionalidade, produtividade, controle e profissionalização. A atuação do diretor logo
provocou oposições e resistências. Em torno da “importação de um estrangeiro” para
dirigir a educação do Paraná se voltaram as críticas da imprensa.

26
027

A expansão dos grupos escolares nesse estado foi bastante peculiar como
atestam os estudos de Bencostta (2001), Moreno (2003) e Souza (2004).
Apesar do primeiro grupo ter sido construído e inaugurado em 1903, a
regulamentação e a normatização dessas unidades escolares oscilaram no início do
século XX. Uma multiplicidade de tipos de escolas primárias coexistiram nesse
período — escolas isoladas, ambulantes, promíscuas, escolas combinadas, semi–
grupos escolares e grupos escolares. O agrupamento de escolas isoladas, antes da
instalação do grupo escolar, foi um recurso comumente utilizado pelo poder público
para a expansão do ensino. Em 1924, havia, no estado do Paraná, 32 grupos escolares
e 605 escolas isoladas, totalizando 13.488 alunos matriculados (Moreno, 2003, p.
26).
O estado de Santa Catarina também contou com a participação de um
professor paulista, Orestes Guimarães, colocado à disposição desse estado pelo
governo de são Paulo para a reorganização da instrução pública em 1911. Embora
previstos no ordenamento legal desde 1907, os primeiros grupos foram instalados no
contexto da Reforma Vidal Ramos de 1911. Em 1928 havia, no estado, 23 grupos
responsáveis pela matrícula de 5.999 crianças, embora ainda prevalecesse a escola
isolada como modalidade de escola primária que, no mesmo ano, contava com 634
unidades e 33.551 alunos matriculados (Cf. Piacentini, 1984; Fiori, 1991).
No caso do Rio Grande do Sul, a pesquisa de Eliane Peres nos mostra que
entre as décadas de 1910 e 1940 a educação escolar gaúcha passou, em sua
totalidade, pelas tensões que marcam os processos de renovação. Desde as políticas,
passando pelas práticas cotidianas até os discursos pedagógicos, especializados ou
não, em todos eles fez–se sentir o peso e a urgência das mudanças que se queria
imprimir e legitimar no já complexo sistema escolar público no RS.
No primeiro momento (anos 1910–1930), a criação dos Colégios elementares
e a institucionalização da escola seriada, implicaram o esforço de criação e
legitimação de um novo modelo para o ensino primário gaúcho. Já num segundo
momento (anos 30–50), verificou–se foi a busca em institucionalizar a modernidade
pedagógica o que foi feito, sobretudo, pela criação de estruturas burocráticas no
próprio aparelho de Estado, dentre as quais se destaca o Centro de Pesquisas e
Orientação Educacionais/CPOE, em 1943. No interior deste processo, mas nem
sempre como carro chefe, esteve a criação e implantação dos grupos escolares.

27
028

Os estudos sobre grupos escolares permitem delinear um quadro emaranhado


de questões a serem investigadas. Entre fragmentos, ausência de fontes e dados, o
privilegiamento de determinados aspectos e o silenciamento de outros, essa produção
multifacetada tem retratado aspectos pertinentes à cultura escolar ampliando o
conhecimento disponível sobre o funcionamento interno das instituições de ensino
primário.
Entre as diversas chaves para decodificação da cultura escolar, a análise do
espaço tem sido salientada por vários estudos sobre grupos escolares constituindo–se
também em objeto de investigação específica (Cf. Oliveira, 1991, Bencostta, 2001;
Buffa e Pinto, 2002).
A constituição e diferenciação de um espaço específico para o funcionamento
da escola pública intensificado especialmente pela necessidade de instalação dos
grupos escolares constituiu–se numa transformação significativa na história do
ensino primário no país. No século XIX, era consensual a desincumbência dos
poderes públicos provinciais em relação ao dispêndio de recursos com aluguel ou
compra de casas escolares. Por essa razão, foi comum o funcionamento de escolas de
primeiras letras ou cadeiras isoladas públicas na residência dos próprios professores.
Na segunda metade desse século, passou–se a advogar a necessária autonomia dos
espaços físicos da escola em relação à residência dos professores e o funcionamento
de escolas primárias em casas alugadas tornou–se prática rotineira. O projeto dos
republicanos para a educação popular gestado nas décadas finais do século XIX
incluiu a responsabilidade do Estado pela construção de prédios projetados
especialmente para abrigar escolas como uma das exigências de reforma e melhoria
da instrução pública. À parte dos colégios e escolas normais, as edificações para
grupos escolares tornaram–se o maior e mais relevante conjunto arquitetônico de
escolas públicas existente no país.
No estado de São Paulo muitos edifícios foram construídos especialmente
para o funcionamento dessas escolas. A arquitetura monumental e suntuosa de
algumas dessas edificações escolares, além de expressar a importância social e
política da escola primária serviu para propagar a ação do governo em relação à
instrução pública (Cf. Souza, 1996).
Em relação a Belo Horizonte, Faria Filho (1996) identificou uma intrínseca
relação entre a arquitetura escolar, a importância da educação e o planejamento
urbano. Os primeiros grupos foram instalados em regiões centrais, em prédios

28
029

próprios construídos pelo estado, com boas condições de higiene e acesso. A


diferenciação interna dos espaços para atividades administrativas (diretoria,
secretaria, sala de professores) e pedagógicas (biblioteca, museu, pátio, quadra de
esportes, etc.) revela a relação entre ordenação do espaço e concepções pedagógicas.
A qualidade dos prédios escolares – beleza, imponência e exuberância –,
marco relevante do investimento público em educação, não predominou em todas as
regiões do país e nem mesmo nos estados de São Paulo e Minas Gerais. À exceção
de uns poucos edifícios considerados verdadeiros “palácios”, prevaleceram
edificações modestas com poucas diferenciações internas além das salas de aula.
Registra–se ainda, a precariedade e a insuficiência dos prédios, problema acentuado
no ensino primário em todo o país.
Por sua vez, investigações sobre o tempo escolar põem a descoberto outros
aspectos implicados na apreensão do tempo vivido na infância (Cf. Faria Filho e
Vago, 2001; Souza, 1999b). Os estudos têm revelado como o tempo constitui uma
ordem que se experimenta e aprende na escola e como ele se relaciona com os outros
tempos sociais. A incisiva regulamentação do tempo na escola (organização
pedagógica e disciplinar) mediante o estabelecimento de calendários e horários
constitui eficiente dispositivo de racionalização; além de ordenar as atividades
educativas — distribuição e seqüência do conhecimento, as lições, exercícios,
intervalos, pausas — a prescrição sobre o tempo cumpre uma finalidade moral e de
disciplinarização das condutas (apreensão de valores relacionados à pontualidade,
assiduidade, probidade, cumprimento do trabalho, o repúdio ao ócio, etc.)
Outro aspecto relevante explorado na análise da cultura escolar tem sido os
programas de ensino. Além da racionalidade na ordenação dos conteúdos, as
pesquisas têm assinalado a diversidade dos saberes introduzidos na escola primária
especialmente nos programas de ensino dos grupos escolares. Além do ensino de
leitura, escrita e cálculo, registra–se, nas diversas regiões do país, uma enorme
preocupação dos reformadores, políticos, intelectuais e educadores com a educação
moral e cívica, a difusão dos valores cívico–patrióticos, a construção da
nacionalidade e a preparação para o trabalho.
O reconhecimento do papel da escola primária na formação do caráter, no
desenvolvimento de virtudes morais e sentimentos patrióticos fomentou e justificou
as expectativas em relação à institucionalização da escola primária no período
republicano. Forjar a identidade regional e nacional era o horizonte propugnado pelas

29
030

elites políticas em todos os cantos do país. A propósito, Pinheiro (2002) mostra


como, na Paraíba, alguns manuais didáticos adotados na escola primária traziam
claramente a ideologia do nacionalismo patriótico e visavam à construção da
identidade do homem e da cultura paraibana (paraibanidade), mediante a valorização
dos heróis, das datas e fatos que marcaram a história do estado, as especificidades da
cultura regional. A introdução do ensino de agricultura no currículo do ensino
primário nesse estado na década de 10 atesta a tentativa de adequar a formação dos
futuros trabalhadores à principal atividade econômica do estado.
Essa mesma preocupação com o trabalho é assinalada por Faria Filho (1996)
em Minas Gerais referindo–se às tentativas de implantação do “ensino técnico
escolar”. No estado de São Paulo, os trabalhos manuais cumpriram essa mesma
finalidade (Souza, 1996). O ideal de civilização das massas, de disciplinarização da
classe trabalhadora, de difusão dos valores morais e cívicos atribuídos à escola
primária perpassava todos os conteúdos escolares, fosse na prática da educação
física, como retrata Vago (2002), nas lições de escrita e leitura (Faria Filho, 1996;
Souza, 1996, Vidal, 2001; Oliveira, 2004), na música e no canto orfeônico (Jardim,
2003; Morila, 2004), na história e geografia (Lopes, 2001, Bittencourt, 1989, 1993,
Moreno, 2003). Esse conteúdo civilizador de caráter moralizante e cívico foi
amplamente propagado na escola pública primária nas festas escolares de diversos
tipos: comemorações cívicas, solenidades de inauguração da escola, exposições
escolares, festas de encerramento do ano letivo enlaçando o tempo escolar ao
calendário social.
Mas, se os programas possibilitam entrever as finalidades da escola primária
e a natureza do projeto cultural por ela veiculado ao longo do século XX, o estudo
dos métodos de ensino coloca–se no centro da problemática que envolve a relação
entre idéias pedagógicas e práticas educativas.
Novamente, a compreensão do sentido do moderno em educação se impõe
para o estudo da cultura escolar. No final do século XIX e início do século XX, o
método intuitivo foi o símbolo da renovação pedagógica, por isso figurou na maior
parte das reformas educacionais realizadas na instrução pública no Brasil nesse
período, seguido posteriormente pelo método analítico e pela escola nova. O método
de ensino analisado seja nos seus fundamentos, seja na forma de sua circulação e
apropriação (por exemplo, nos estudos de Valdemarin, 2004 e Carvalho, 2001),
quando cotejado com a história das instituições educativas revela o complexo

30
031

processo de configuração de práticas particularmente a substituição de um modo de


fazer por outro considerado novo e moderno. Nesse diálogo, conquanto a
aproximação das práticas continue sendo um desafio, é atestada a fertilidade das
interpelações que provoca: em que medida os aspectos constituintes dessa forma
escolar se coadunam com tais proposições pedagógicas? A incongruência entre
transmissão de saberes e experiência do aluno (construção do conhecimento), entre
ensino e aprendizagem, entre ordenação serial do ensino e seletividade e outras
propostas de organização interna do ensino fundamental não estaria no modelo de
escola graduada?

Alguns desafios e uma agenda de pesquisa para a história do ensino primário no


Brasil

Um balanço preliminar da produção brasileira sobre os grupos escolares


mostra a potencialidade que os estudos têm trazido para a compreensão do ensino
primário no país e, por outro lado, indica a necessidade de enfrentar alguns desafios.
As investigações sobre o processo de organização dos grupos escolares no Brasil
fazem parte de uma nova configuração das pesquisas em história da educação no
Brasil. A partir do diálogo com diversos campos de investigação – notadamente a
sociologia, a antropologia, a política, a arquitetura e os estudos sobre urbanismo – e
matrizes teóricas, os/as historiadores/as da educação têm conseguido produzir os
grupos escolares como um rico e complexo objeto de estudo.
Uma das vertentes a partir da qual os estudos sobre os Grupos Escolares têm
contribuído para a renovação da História da Educação no Brasil é a das pesquisas
sobre a cultura escolar. Ao recortar o objeto de estudo grupos escolares, entendendo–
o como forma e mecanismo de realização das culturas escolares, os pesquisadores
têm permitido visualizar uma gama de fatores e interrelações antes não enfocadas
pelos estudos das políticas educacionais ou dos sistemas educativos no Brasil. No
entanto, em estudos recentes (Souza, 2000; Faria Filho et al, 2004) chamamos a
atenção não apenas para a grande diversidade de sentidos aparentemente unificados
sob o rótulo cultura escolar mas também para a necessidade de um maior
aprofundamento teórico desta noção. O que temos observado é que a noção de
cultura escolar tem sido empregada na maioria dos estudos muito mais como um
recurso descritivo do que analítico. Nossa apropriação da noção de cultura escolar

31
032

tem nos ajudado muito a perceber que elementos como conhecimentos, espaços,
tempos, metodologias, materiais pedagógicos... constituem a cultura escolar, mas
pouco temos avançado na resposta à pergunta de como os sujeitos escolares
produzem a cultura escolar e, no mesmo movimento, como as culturas escolares
produzem os sujeitos que dela fazem parte.
Do nosso ponto de vista, uma utilização mais analítica da noção de cultura
escolar pode ajudar–nos no desvendamento dos processos, conflituosos por certo,
que levam ao estabelecimento e transformação das culturas escolares. Por isso
mesmo a sua apropriação não pode se fazer sem se levar em conta o(os) conceito(s)
de cultura que lhe são subjacentes. Quase todos os trabalhos, enfocam os grupos
escolares como fazendo parte de um processo de mudanças no padrão de
escolarização e na cultura escolar. Como articular este processo de mudanças com
uma noção que supõe, além da transformação, a tradição, a seleção, a sedimentação,
a continuidade? Obviamente que é possível e necessário articular estas distintas
dimensões da noção de cultura escolar mas o que sabemos também é que ao se
articular os grupos escolares com a instituição de uma nova cultura escolar, não
podemos descuidar do fato de que a escola e as culturas escolares são os lugares
sociais e culturais por excelência daquilo que pouco e muito lentamente se
transforma.
Assim, um dos grandes desafios, postulado e ampliado pela historiografia dos
grupos escolares, é o desvendamento da cultura escolar, a compreensão dos
elementos que conformam a organização escolar. No jogo entre permanências e
mudanças, é importante atentar para a estabilidade das práticas.
Nesse sentido, muito têm contribuído a história das disciplinas escolares e a
história do currículo, problematizando os conteúdos e métodos de ensino. A
numerosa produção sobre aspectos específicos – método de ensino de leitura,
cartilhas e livros de leitura, disciplinas específicas, manuais didáticos etc., demanda
sínteses analíticas que possam servir de subsídio para avançar no conhecimento que
vem sendo produzido.
Um exame aprofundado da cultura material escolar constitui outra temática
relevante. Do surgimento da lousa no século XVIII ao uso do computador no final do
século XX, da instalação dos primeiros museus e laboratórios nas escolas primárias
no século XIX às salas ambiente na década de 1990, a produção e a circulação de
materiais escolares evidenciam o uso de tecnologias aplicadas à organização e

32
033

implementação didático–pedagógica da escola, ao mesmo tempo em que


consubstanciam a promessa de tornar o ensino mais produtivo e eficiente, as aulas
mais motivadas e atrativas, a educação mais moderna.
Atenção especial deve ser dada ao estudo das práticas simbólicas – exames,
festas escolares, comemorações cívicas, desfiles e paradas – elementos de
sociabilidade, de visibilidade e de construção da identidade da escola primária. Os
múltiplos sentidos que adquirem essas práticas para alunos, professores, famílias e
comunidade escolar; as representações sobre a escola que geram no meio social, e o
significado que têm como atividade curricular e educativa não podem ser
desconsiderados e estão no centro da compreensão dos valores em torno da escola
pública.
Nesse mesmo viés, falar de cultura escolar compreende, necessariamente,
pensar em outras culturas institucionais, mesmo que menos explicitamente
estruturadas como aquelas relacionadas às instituições religiosas e familiares ou ao
mundo fabril e ao ambiente urbano. Mas não apenas isso: seria interessante
buscarmos estabelecer os elementos e momentos que historicamente fazem com tais
instituições entrem em conflito e, dialeticamente, os nexos, na forma de códigos
compartilhados/apropriados, que fazem com que estas instituições/espaços
convivam, interpenetrem, dialoguem e se reforcem mutuamente.
O problema, ao nosso ver, é que pouco temos realizado estudos que possam
compreender empiricamente como se dão os processo de estabelecimento de padrões
culturais e de troca entre as diferentes instituições que atuam no socialização da
infância. Sabemos que a escola guarda fortes relações com a igreja. No entanto
pouco sabemos sobre a educação religiosa que ocorre no cotidiano das populações e
menos ainda sobre o como a escola reforça e/ou desloca o lugar ocupado pela igreja
na socialização das novas gerações. O mesmo parece ocorrer com o mundo do
trabalho. Sabemos, por um lado, que durante os últimos séculos o trabalho infantil é
um dos grandes limites para o pleno estabelecimento da escolarização e que, por
outro, há uma intensa apropriação, sobretudo a partir dos grupos escolares, de
representações do mundo fabril para se produzir as diversas modernidades escolares.
Em quase todo o mundo, a definitiva implantação da forma simultânea de
ensino e da seriação são vislumbradas como a realização, no mundo da escola, das
leis econômicas (leia–se, capitalistas) da divisão do trabalho. Também no Brasil foi
assim, conforme vários estudos o demonstram. Acontece, no entanto, que temos

33
034

aprofundado muito pouco esta dimensão dos grupos escolares. A cristalização da


série correspondendo ao ano letivo como um dos pilares da ordenação temporal do
ensino tem uma relação direta com outro elemento organizacional essencial da escola
moderna que é a classificação dos alunos mediante o sistema de avaliação. A
seletividade do ensino primário, assim como as representações dos profissionais da
educação e da sociedade em torno da excelência escolar, são questões essenciais para
a compreensão da forma e cultura escolares.
Problema semelhante ao apontado em relação à noção de cultura escolar
parece ocorrer com os estudos que lançam mão do conceito de forma escolar para o
estudo dos grupos escolares. Aqui também observamos poucos aprofundamentos
teóricos. Inicialmente, convém lembrar que quando os autores franceses,
inicialmente Guy Vincent (1980) e posteriormente Vincent, Lair e Thin (2001),
forjam este conceito, eles estão querendo justamente dar conta de uma certa
invariância, invariância esta que, segundo eles, não seria captada nem mesmo pela (e
na) instituição escola mas deveria ser buscada na forma escolar de socialização. Ou
seja, produziram um conceito que, segundo eles, se prestaria a analisar a
constituição, na longa duração, de uma forma de socialização que apropriando–se ou
afastando–se dos ritos, da materialidades, dos tempos e espaços das demais
instituições (família, igreja, trabalho..), lograria, no transcurso da modernidade, tal
êxito assumiria a centralidade da socialização das novas gerações. Ainda sendo eles,
a medida do êxito da forma escolar está justamente no fato de que ela não se realiza
mais apenas no âmbito da escolar mas se espraiou por todo o tecido social.
Ora, se como estávamos dizendo os trabalhos analisados enfocam os grupos
escolares como portadores do novo, da mudança, como analisá–los a partir de uma
noção que trabalha com a permanência e a invariância? Há aqui, no mínimo, uma
dificuldade que precisa ser reconhecida, explicitada e superada pelo esforço analítico
e investigativo daqueles que lidamos com os grupos escolares como objeto de
pesquisa e que queremos dialogar com os colegas franceses acima nomeados. Uma
das possibilidades de diálogo poderia ser forjada se, por um lado, relativizarmos o
potencial analítico da noção de forma escolar para o estudo de curtos períodos de
tempo (um ou duas décadas por exemplo) e, por outro, nos engajássemos no estudo
de períodos maiores. Não poderíamos, por exemplo, compreender melhor o lugar dos
grupos escolares no processo de escolarização no Brasil e suas relações com as

34
035

culturas escolares se estudássemos não apenas a implantação destes mas também a


lenta transformação destas instituições ao longo de todo o século XX?
O mapeamento da constituição do ensino primário em cada estado continua
sendo um investimento necessário. A direção contemplada nos estudos recentes
demarca férteis possibilidades de uma interpretação que articula as reformas – o
âmbito das prescrições normativas –, as práticas, as instituições e a cultura escolar.
Os trabalhos anteriormente analisados bem como os que constam desta coletânea nos
mostram que há uma grande diferença na forma e na temporalidade de implantação
dos grupos escolares entre os diversos estados brasileiros. Neste sentido, mais uma
vez, é preciso chamar a atenção para a impossibilidade de estabelecermos padrões ou
modelos únicos para a institucionalização da modernidade pedagógica em nosso
país. Por outro lado, são poucos os estudos que atentam para a também diferente
dinâmica de estabelecimento dos grupos escolares no meio urbano e no meio rural.
Mais do que isto, são poucos os estudos que enfocam os distintos significados
emprestados aos grupos escolares nestes espaços diferenciados. Poderíamos, por
exemplo, indagar: por que é mais comum encontrarmos mulheres dirigindo grupos
escolares nas capitais? O que este recorte de gênero na administração da unidade
escolar significa? Estaríamos, pura e simplesmente, diante da constatação de um
maior progressivismo das elites intelectuais e políticos das capitais e de uma maior
presença das mulheres na cena pública ou, ao invés disso, diante de um fenômeno
mais complexo relacionada às formas de estruturação dos espaços públicos e
privados nestes diferentes ambientes?
A história da escola primária guarda uma relação intrínseca com a história do
magistério primário. Formação, condições de ingresso na carreira e trabalho, as lutas
e a identidade profissional são fundamentais para o entendimento da escola primária
como instituição. Não se entende, portanto, uma história das instituições educativas
sem alunos e professores (Magalhães, 1998). No caso dos professores, pensamos que
um tema de pesquisa ainda pouco explorado diz respeito às resistências que os(as)
professores(as) das escolas isoladas, principalmente das cidades do interior dos
estados, apresentaram à implantação dos grupos escolares. Pouco sabemos ainda
sobre os projetos pessoais e culturais abraçados por estes sujeitos que, de alguma
forma, vislumbravam outros percursos para a história das instituições em que
trabalhavam. As pesquisas precisam avançar no conhecimento sobre a forma pela
qual os professores lidaram ao longo do tempo com as formulações teóricas

35
036

inovadoras no campo pedagógico e com as reformas educacionais incorporando


pressupostos e atividades ou ignorando–os sobejamente.
Por outro lado, o interesse pelas origens, isto é, pelo momento de implantação
das instituições modelares, deve extrapolar para outros períodos históricos. Tanto se
faz necessário o recuo ao século XIX como avançar no século XX. Questões como a
graduação escolar e as transformações internas das escolas de primeiras letras no
período imperial são fundamentais para ampliar a compreensão da suposta
modernidade que se pretendia instaurar na instrução pública no período republicano.
Da mesma forma, não se pode aceitar as representações erigidas em torno da escola
isolada vinculando–a ao atraso e ao passado que se desejava ultrapassar sem
considerar as inovações introduzidas nessas escolas primárias na transição do século
XIX para o século XX e a relevância que elas tiveram na escolarização da população
brasileira. Entender a escola isolada parece ser condição para o entendimento da
manutenção de práticas e dificuldades de instituição de uma nova cultura escolar.
A historiografia sobre os grupos escolares mostra que, embora implantados
durante a Primeira República, a difusão efetiva dessa modalidade escolar ocorreu a
partir dos anos de 1930. Essa expansão acarretou de muitas maneiras a deterioração
das condições de atendimento do ensino primário. Os grupos escolares deixaram de
representar o moderno em educação pública e se tornaram precárias escolas
primárias. Somente dessa maneira poder–se–á balizar melhor as representações
instituídas no início do século XX acerca dos grupos escolares como símbolo de
modernização educacional. O exame dessa transformação é relevante, assim como a
investigação sobre as transformações internas das escolas primárias, ocorridas entre
as décadas de 1930 e 1970, período de forte predomínio da escola nova, provocando
redimensionamento das finalidades do ensino primário e uma reordenação da escola.8
A extinção dos grupos escolares na década de 1970 é outra questão que
merece estudos aprofundados. Se durante boa parte do século XX, eles constituíram

8
No estado de São Paulo, as reformas empreendidas por Lourenço Filho e Fernando de Azevedo no
início dos anos 30 do século XX ressaltaram a finalidade social da escola pública enfatizando o caráter
nacional do ensino e o vínculo da escola com o projeto de reforma cultural da sociedade brasileira.
Foram instituídas nessa época várias obras sociais escolares, peri-escolares e post-escolares como:
associação de pais e mestres, associações de ex-alunos, amigos da escola, conselhos escolares e
caixas, cooperativas escolares de consumo e escotismo. Além disso, foram implementadas instituições
auxiliares da escola: biblioteca infantil, caixas escolares, cinema educativo, canto orfeônico,
assistência dentária, entre outros. Aspectos muito parecidos com esses já haviam aparecido, por
exemplo, na reforma organizada por Mário Casasanta e Francisco Campos em Minas Gerais alguns
anos antes (1927) o que nos leva a pensar que talvez eles estejam bastante disseminados nas políticas
do período.
36
037

a identidade da educação pública no país, qual o significado histórico e institucional


de sua eliminação e da implantação da escola de 1º grau? Em que medida essa
mudança influenciou na cultura escolar? A eliminação formal dos grupos não
implicou o desaparecimento do modelo ou forma escolar que eles instauraram. Como
compreender isso? E o que dizer da reestruturação da rede de ensino fundamental no
final da década de 1990 resultando na separação das séries iniciais das finais? Em
que medida a escola fundamental de 1ª a 4ª série se aproxima ou se distancia do
antigo grupo escolar?
Finalmente, é importante frisar que justamente uma das facetas mais
inovadoras dos grupos escolares tem sido sistematicamente negligenciada: aquela
que se refere à instituição do curso primário no Brasil. Como sabemos a noção de
curso já existia no Brasil para a escolarização posterior às primeiras letras/instrução
elementar/instrução primária desde pelo menos a implantação dos Colégios
religiosos na segunda metade do século XVI. No entanto, até o final do século XIX
havia um baixíssimo grau de institucionalização da escolarização anterior à
secundária. Uma das conseqüências disso era que a noção de curso primário (ou
elementar) não era utilizada para descrever ou organizar o período inicial de
aprendizagem escolar dos alunos.
Foi sobretudo com os grupos escolares que, ao organizar o ensino na forma
seriado, introduziu–se e rapidamente generalizou–se a organização dos cursos
primários, graduados em 3 ou 4 séries. No entanto, se temos chamado muito a
atenção para a seriação pouco temos falado do curso. Ao introduzir o curso, define–
se um per–curso a ser percorrido pelo aluno ao longo de sua escolarização inicial,
bem como criam–se as condições para a introdução de mecanismos internos e
externos de fortalecimento da cultura escolar e da própria escola no interior da
sociedade. À introdução de um curso, de um percurso legítimo, corresponde a
deslegitimação de outros percursos: não é por acaso que a partir desse momento vão
se criando mais e mais barreiras para a escolarização doméstica das crianças e estas
passam a não poder mais simplesmente fazer o exame de conclusão de curso e
devem se matricular na escola desde primeira série sob pena de não terem sua
aprendizagem reconhecida.
O olhar que se debruça sobre espaços e tempos escolares, disciplinas,
métodos de ensino, materiais e festas escolares e sobre outros aspectos

37
038

configuradores da cultura escolar não pode se desvencilhar da necessidade de


contrastar os aspectos internos da escola com outros dados que auxiliam a
dimensionar o significado institucional, material e simbólico dos grupos escolares no
ensino primário. Dessa maneira, é fundamental intensificar o diálogo dos grupos
escolares com outros tipos de escolas primárias — as escolas isoladas, escolas
reunidas, escolas de núcleos coloniais, escolas rurais e urbanas, municipais e
particulares, escolas estrangeiras e de alfabetização de adultos — com os jardins de
infância e escola maternal, assim como com o ensino secundário; enfim, com o
contexto institucional diverso do ensino elementar. Isso implica uma consideração
mais cuidadosa dos dados quantitativos de número de unidades escolares, matrícula
efetiva, freqüência e promoção submetendo–os a uma interpretação acurada.
Significa reconsiderar a importância dos dados quantitativos sobre a evolução
da rede escolar e a necessidade de articulação com as estatísticas educacionais. Da
mesma forma, a relação entre oferta e procura pela educação e a questão das
demandas populares e dos movimentos sociais pela escola muito podem contribuir
para o conhecimento sobre a escolarização do social e a produção social da escola,
nos termos como tem assinalado Faria Filho (2002).
É preciso avançar também no conhecimento sobre a escolarização das
crianças, a duração do tempo de escola e seu significado social, a oscilação da
freqüência escolar, a origem sócio–econômica dos alunos, a relação entre a escola
primária e a cultura infantil na zona urbana e rural. Particularmente na questão das
condições sócio–econômicas dos alunos, é preciso considerar dados de livros de
matrícula que possibilitem uma caracterização mais precisa e empírica do que a
pressuposição apressada segundo a qual os grupos teriam servido inicialmente às
camadas médias e às elites, uma vez que alguns estudos têm demonstrado a presença
de grupos sociais heterogêneos e uma grande presença de crianças de camadas
populares (Cf. Faria Filho, 1996; Souza 1996, 1999a). Além disso, é preciso levar em
conta outros dados de caracterização, por exemplo, gênero, raça, nacionalidade.
Por último, cabe frisar que os estudos analisados têm permitido, por um lado,
que os estudos dos grupos escolares passem ao largo de uma história por demais
institucionalista destas instituições e, por outro, ao chamar a atenção para o processo
de construção do lugar social/político/cultural dos grupos, que a própria instituição
escolar seja desnaturalizada. Ou seja, ao demonstrar a historicidade da escola na
forma dos grupos escolares e a construção de sentidos e significados sociais em torno

38
039

dos mesmos, tais estudos têm contribuído para tornar a escola relativa. No entanto,
não se pode deixar de mencionar a significativa contribuição que os estudos sobre
grupos escolares têm possibilitado para a escrita da história institucional da escola
pública. A atenção antes dada aos colégios de ensino secundário volta–se agora para
as escolas primárias. Esse deslocamento é significativo e relevante tanto pela
contribuição que possa trazer para o campo da história da educação quanto para as
investigações mais gerais sobre o ensino primário, sobretudo pelo seu significado
político e pedagógico para a escola pública.
Diferente dos colégios de ensino secundário historicamente especializados em
dispositivos de diferenciação social voltados para a formação das elites, a escola
primária registra a história da democratização da cultura. Ela, ainda que marcada
pela exclusão social, dá a conhecer o significado da educação escolar para mulheres
e homens comuns. Trata–se de uma história que se conecta com as experiências e
lutas das camadas populares, com as expectativas e anseios por elas depositadas na
escola como possibilidade de melhoria de vida, de ascensão social mediante
melhores empregos e salários, como oportunidade de participação política, social,
econômica e cultural.
Na tarefa incessante e absorvente de educar as novas gerações, as escolas
públicas de ensino fundamental cedem continuamente às pressões e atribulações do
presente. Em geral, o passado dessas instituições sobrevive em esparsos vestígios,
seja nos prédios escolares submetidos a pichações e depredações freqüentes, seja nos
poucos documentos remanescentes ou na memória de antigos alunos, professores,
diretores, funcionários e da comunidade onde se encontra localizada a escola.
Portanto, recuperar essa história significa valorizar a escola pública
reconhecendo o direito que a sociedade tem à memória e ao passado histórico de uma
instituição por ela estimada e que vem exercendo ao longo do tempo um papel
central na experiência infantil. Configura–se, pois, como contribuição valiosa para a
história social e a história da educação.
Ao perturbar o desassossego do presente, a história institucional reclama
políticas de preservação da escola pública como patrimônio histórico–cultural.9
Assim, adquire importância os programas de história oral e a constituição e

9
Esse movimento é claramente perceptível na constituição dos Centros de Memória da Educação
vinculados às Universidades, como o Centro de Memória da Educação da Universidade de São Paulo,
e às Secretarias de Educação, como o Centro de Referência da Educação Mário Covas em São Paulo e
o Museu da Escola de Minas Gerais.
39
040

conservação dos arquivos escolares envolvendo alunos, professores, pesquisadores e


a comunidade escolar.10 Como tão bem nos lembra Justino Magalhães, uma
instituição educativa compreende “uma complexidade espaço–temporal, pedagógica,
organizacional, onde se relacionam elementos materiais e humanos, mediante papéis
e representações diferenciados, entretecendo e projectando futuro(s) (pessoais)
através de expectativas institucionais. É um lugar de permanentes tensões. As
instituições educativas são projectos arquitectados e desenvolvidos a partir de
quadros sócio–culturais” (Magalhães, 1998, p. 61/62).
Na união entre história e memória reside mais uma possibilidade da história
da educação contribuir para a qualidade da escola pública.

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10
Pode-se apontar como exemplo de iniciativa bem sucedida dessa natureza os arquivos escolares
constituídos em oito Escolas Técnicas do estado de São Paulo participantes do Projeto “Pesquisa sobre
o Ensino Público Profissional no Estado de São Paulo: memória institucional e transformações
histórico-espaciais regionais” desenvolvido pelo Centro de Memória da Educação, da Faculdade de
Educação da Universidade de São Paulo em cooperação com o Centro Paula Souza. Ver Moraes e
Alves, 2002. Ver também experiência desenvolvida na Escola de Aplicação da Faculdade de
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46
047

A IMPLANTAÇÃO DAS ESCOLAS CENTRAIS EM PORTUGAL

Margarida Louro Felgueiras11


Elizabeth Poubel e Silva12

A escola básica, como hoje a concebemos, é uma construção histórica que


se constituiu na segunda metade do século XIX e que se organizou segundo dois
modelos básicos: o que privilegia a relação directa professor-aluno e a
contratualização pais-professor; outro, presente nas escolas centrais, que estrutura a
relação professor-grupo de alunos e a mediatização da relação com os pais através de
um aparato burocrático – director do estabelecimento de ensino. No primeiro caso há
uma continuidade com a tradição familiar, enquanto no segundo, estamos perante a
produção de uma nova relação entre o mestre e a família, mediatizada pelo aparato
burocrático da escola, enquanto instância do aparelho de estado. O Regulamento do
decreto de 1901, no art.º62, define como funções do director de uma escola central o
dever de “estender quanto possível a sua missão educadora às relações com as
famílias dos alumnos; pertence-lhes cumprir e fazer cumprir os regulamentos e
ordens emanadas da estação superior” (Collecção official da legislação portuguesa,
1903, p. 921).
A afirmação da obrigatoriedade escolar, que torna o envio das crianças à
escola um dever das famílias perante o Estado, coloca a educação como uma questão
do domínio público, ao qual o poder parental se submete. Ao deixar o foro privado,
de uma competência exclusiva da família, o estado assume também a
responsabilidade pela educação dos seus elementos mais novos. E ainda que a
“instrução primária e gratuita a todos os cidadãos” figure entre os direitos civis e
políticos dos cidadãos na Carta Constitucional (1826), a reforma de Rodrigo da
Fonseca Magalhães (Decreto de 7 de Setembro de 1835) fala da “obrigação dos pais
de família de enviar os seus filhos às escolas públicas” (Título VII, art.º 1.º).
Na passagem para o novo modelo o espaço da aula autonomiza-se como
escola – instituição pública, gerida pelos professores, onde as famílias não podem

11
Professora Auxiliar da Faculdade de Psicologia e Ciências da Educação da Universidade do Porto.
E-mail: margalf@hotmail.com
12
Doutoranda em História da Educação do Programa de Pós Graduação da FEUSP. E-mail:
bethpoubel@uol.com.br

47
048

interferir nem têm lugar. Neste processo, a escola que se confundia com a casa do
professor ou com o sítio onde se dava a aula, em edifício público, religioso ou
alugado, passa a ser um espaço arquitectonicamente definido, segundo regras de
higiene pública e de ordem pedagógica, que se vai distinguindo dos demais edifícios
circundantes. A concepção do espaço, da volumetria, da localização dos edifícios
manifestam as representações sociais sobre a importância atribuída à escola,
acompanham e provocam alterações orgânicas, de ambiente de trabalho e de práticas
escolares. A graduação no ensino primário, que aparece com a reforma de Costa
Cabral (Decreto de 20 de Setembro de 1844), com a definição de dois graus,
elementar e complementar, é disso exemplo. Estas alterações, que se traduzem na
documentação administrativa recebida e produzida nas escolas, nos materiais
didácticos e no próprio mobiliário escolar, conformam a escola às novas exigências
sociais, que lhe são imputadas, produzindo ela própria uma tecnologia educativa,
disciplinadora do corpo e das mentes das crianças, com reflexos na sociedade, pelos
elementos que fornece.
No contexto deste processo histórico, surgem, em Portugal, as “escolas
centrais”, acompanhando o movimento de modernização educacional dos demais
países europeus.
O objectivo deste texto é assinalar como ocorreu a implantação deste
modelo de escola primária em Portugal, registrando assim, os debates e interesses
que motivaram a adopção desta forma escolar no país. Compreende, pois, uma
revisão da literatura portuguesa sobre o tema, articulada com os resultados de uma
pesquisa nos arquivos da Biblioteca Pública Municipal do Porto e da documentação
existente nas escolas de Cedofeita, do Bonfim, de Paranhos, na cidade do Porto e que
foram antigas escolas centrais.

48
049

Escola Central nº 71 e 72 na Freguesia de Cedofeita.


Os municípios e a implantação das escolas centrais

Em Portugal, assim como na Alemanha ou na Bélgica, as escolas graduadas


receberam o nome de escolas centrais.
A primeira de que há notícia surgiu em Lisboa em 1869, através da portaria
de 31 de Dezembro de 1869 do Ministério Geral da Instrução Pública. A Escola
Central n.º1 funcionou em carácter experimental. A sua implantação atendeu a
proposta do comissário de estudos do distrito, Sr. Ghira, que defendeu este modelo
escolar à imitação do que se praticava nas cidades mais cultas da Europa, com
reconhecida vantagem para a difusão e aperfeiçoamento do ensino popular
(Costa,1870, p. 242).
O novo modelo escolar consistia na reunião de escolas isoladas. Segundo
Costa (1870, p. 242-243)

O pensamento das escolas centrais de instrução primária é este: Em lugar


de cada escola singular ter um só professor que reja todas as disciplinas de
educação e de instrução, reunirem-se três ou quatro escolas singulares
numa central, onde cada matéria de per si seja entregue à regência de
professor especial.

Além da reunião de escolas, a Escola Central nº 1 de Lisboa introduziu o


ensino simultâneo, propondo a organização de classes de acordo com a idade do
aluno, sob a batuta de um professor para cada classe (Collecção official da legislação
portuguesa, 1870, p. 876). Substitui as escolas de ensino mútuo, suprimidas através
do decreto de 14 de Novembro do mesmo ano. Era uma escola destinada ao sexo
masculino, contendo três classes, podendo ser subdivididas em duas secções, que
49
050

ficavam a cargo de quatro professores nomeados, sendo que um deles ocupava a


função de director. Eram eles: Sr. Júlio de Brito, o director, José Maria da Graça
Affreixo13, Henrique Freire14 e, para a classe infantil, D. Maria Augusta de Souza
Bentes (Costa, 1870, p. 242-243).

Escola Central nº 1 construída em 1872, na Rua da Inveja (Freguesia da Pena, Lisboa)


Fonte: Beja e tal, 1985:74.

Segundo Barroso (1995, p.104), no relato das Conferências Pedagógicas do


Porto de 1883, os professores consideram que só a partir de 1875 as escolas centrais
da capital terão sido criadas “em bases seguras”. Julgamos que tal opinião se deve ao
facto de ter sido instituída nesse ano, sob proposta de Elias Garcia, uma repartição
especial de instrução na Câmara, dirigida pelo vereador, com dotação orçamental,
secretaria e inspecção das escolas. É igualmente deste ano a construção do edifício
da Escola Central n.º1(Costa, 1884,p. 73). Na década de 80 existiriam pelo menos 19
escolas centrais na capital, a avaliar pela documentação compulsada por Maria de
Fátima Sá Machado (2004, p. 220), no Arquivo Histórico da Câmara Municipal de
Lisboa.
É interessante observar que, através da portaria de 1869, surge então a
figura do director do estabelecimento de ensino, responsável pela organização
pedagógica e administrativa da escola, estabelecendo, deste modo, diferentes

13
Professor primário, da escola central de Lisboa e em 1887 da Escola Normal de Évora. Foi
colaborador de várias revistas de educação e ensino e publicou diversos livros de pedagogia
direccionados para o ensino normal. Interveio nas comunidades locais onde viveu ao nível da
instrução popular, tendo sido amigo de Henrique Freire. Cf. Nóvoa, A. Dicionário de Pedagogos
Portugueses. Porto, Asa, 2003.
14
Henrique Freire foi igualmente professor primário , subinspector de ensino, professor da Casa Pia
de Lisboa, docente da Escola Normal de Lisboa. Colaborou em revistas de educação, nas conferências
pedagógicas e foi correspondente do Retiro Literário Português do Rio de Janeiro. Foi cavaleiro da
50
051

relações de poder dentro do universo escolar. O aparecimento deste cargo é um dos


traços que diferencia a organização destas escolas. Segundo Barroso (1995, p.117), a
escola central marca “a evolução terminal do modo de ensino simultâneo, por um
processo de complexificação organizativa e administrativa”, com a autonomização
destes processos, que passam a substituir-se ao processo pedagógico e que dá lugar,
“a uma pedagogia burocrática”, ao predomínio de uma “solidariedade mecânica” na
organização do ensino, e à representação da escola como um “sistema fortemente
acoplado”, conceitos que o autor, retira respectivamente de Lobrot (1973), Bernstein
(1967) e Ecker (1985).
Em 1870 a escola central deixa o seu carácter experimental e é oficializada
através da Reforma da instrução primária, onde reza que “nas cidades de Lisboa e
Porto, assim como nas outras capitais do distrito, duas ou mais escolas paroquiais
podem reunir-se, constituindo escolas centrais regidas pelos respectivos professores,
pelo modo que for mais estatuído nos regulamento” (Decreto 16 Ago. 1870, Art.12º
§2º).
A legislação espelhava a “vontade” dos governantes, que não tinham em
conta a realidade do país e os meios necessários para a tornarem exequível. O Dr.
Luiz Jardim, vereador de Instrução da Câmara da Lisboa, expôs, duramente, a
realidade escolar da capital, sete anos depois:

Em algumas freguesias faltam escolas para a educação do povo; noutras


foram criadas, mas não foram providas. Em todas falta mobília e os
objectos essenciais, para o bom ensinamento dos alunos; as casas destas
escolas são, na máxima parte, acanhadas e sem condições higiénicas e
pedagógicas. Não têm ar e luz suficiente, e, funcionando algumas em
segundos e terceiros andares, constituem um foco de infecção pelas
péssimas condições referidas, expondo, além disso, as crianças a
contingências muito sérias, pois são obrigadas a subir e a descer mais do
que uma vez diariamente algumas dúzias de degraus de escadas pouco
asseadas, falta de luz e mal construídas (Jardim, 1877, p.8).

Assim, Jardim justificou a ampliação do número de escolas centrais em


Lisboa, pois só havia uma única funcionando, a da rua da Inveja, embora a n.º 2
tivesse sido criada por Elias Garcia em 1875 e eliminada por “ poderes superiores” à
repartição da instrução (Costa, 1884, p.74). Argumentou que este modelo escolar era
usado na Bélgica, Suíça, Prússia e nos Estados Unidos e expôs a necessidade de

Ordem de Cristo. Tal como seu amigo Graça Affreixo são dos mais dignos representantes de uma
geração de educadores que formaram corrente de opinião em prol de uma rede pública de ensino.
51
052

criação de mais 18 escolas centrais, masculinas e femininas, funcionando em 9


edifícios, construídos especificamente para este fim, com espaço e condições para as
aulas.
Após apresentação de duas propostas para implantação destas escolas
centrais, Jardim sugeriu possibilidades do município angariar fundos para execução
das obras e provimento das escolas. A Câmara Municipal não chegou, nem ao
menos, a defender este projecto, que foi considerado por Costa (1884, p. 76-77)
como um projecto franco, sem artimanhas nem paliativos. Porém, segundo ele “uma
coisa chamada Política, e que tem por missão, diz ela, o desenvolvimento da
felicidade pública, dissolveu esta câmara municipal. O projecto sumiu-se nos
abismos”.
Em 1878, ao assumir de novo lugar na vereação na Câmara Municipal de
Lisboa, José Elias Garcia passou a ter o Pelouro da Instrução sob a sua
responsabilidade. A sua acção é marcada pelo restabelecimento de duas instituições:
a Repartição Especial de Instrução e a Escola Central n.º 2, que haviam sido
eliminadas pela vereação anteriormente. Sob a sua direcção foram criadas mais dez
escolas centrais, totalizando seis para cada sexo. Em todas se praticavam canto coral
e exercícios ginásticos e apresentam um currículo diferenciado por sexos: ensino
militar, desenho profissional e caligrafia para meninos; costura, lavores e talhe de
roupa para meninas (Costa, 1884, p. 79).
No Porto, a Câmara Municipal em reunião de 1882 fez alusão à necessidade
de criar uma escola central alegando que “grande serviço prestaria ao município se, a
exemplo do que tem feito a vereação em Lisboa, procurasse o mais breve possível
estabelecer pelo menos uma escola central onde se desse ao ensino maior largueza do
que é possível dar-se nas escolas primárias”.
Não estamos em condições de afirmar qual terá sido a primeira escola
central da cidade do Porto. Sabemos, contudo, que a 4 de Fevereiro de 1887 foi
autorizada a instalação de “uma escola central de ensino primário elementar e
complementar para o sexo feminino, aproveitando para tal fim o edifício construído a
expensas da Junta de Parochia de Cedofeita” (Governo Civil, Livro de Ofícios 172,
1877, fl. 28-29). O edifício seria composto por salas de aula, biblioteca e habitação
das professoras. Desse período resta-nos o estandarte da escola, bordado a seda. A

52
053

data exacta desconhece-se (ver foto)15. Contudo, segundo Luís Correia (1996)
durante o período de 1863 a 1880 foram criadas “2/3 das escolas oficiais” da cidade
registadas no final do século XIX. Em documentação existente nas escolas
encontramos referenciada a escola central n.º1 do Bonfim em 1902 e em 1906 a de
Santo Ildefonso. O Anuário da Câmara Municipal do Porto de 1923, que apresenta a
evolução do ensino no concelho desde 1913, refere, no cumprimento do decreto-lei
de 29 de Março de1911, a criação ou transformação das escolas existentes em
centrais. Na escola de Paranhos encontramos a cópia de um contrato de
arrendamento datado de 1916, em que na clausula 4 a Câmara afirma que o prédio se
destina a “uma Escola central masculina, de quatro lugares e habitação da
professora”.

Se os municípios de Lisboa e Porto se envolveram na criação de escolas


centrais, o mesmo não aconteceu em todas as capitais de distrito como a lei previa.
Ao Governador Civil, como interface entre o governo central e o local e às Câmaras
foram atribuídas competências administrativas sobre o ensino, mas não foram
dotados de meios financeiros para a sua efectivação. Pelo contrário, esperava-se que
o mecenato e a iniciativas colectivas providenciassem os meios para a construção e
equipamento das escolas e apoio sócio-educativo aos alunos mais carenciados.

No inventário a que procedemos nas escolas do Porto, que tinha como objectivo a criação de um
15

museu da escola primária, encontrámos estandartes de 2 escolas centrais : de Cedofeita e do Bonfim e


53
054

Está ainda por estudar a verdadeira extensão que estas escolas conheceram
ao nível do país, mas pensa-se que tenha sido muito limitada. Mediante a
documentação encontrada,16 percebemos que este modelo escolar funcionou no
Porto, sob o nome de escola central até à reforma educativa de 1919, passando então
a serem designadas por Escolas de Ensino Primário. E, curiosamente, são algumas
destas escolas que no princípio da década de 60 são demolidas e dão lugar a edifícios
com 20 ou mais salas de aula, mais modernos, designados por “Grupo escolar”.

O enquadramento legal das escolas centrais

Segundo a versão oficial, que a legislação traduz, a situação da educação no


país, no final do século XIX, encontrava-se em estado alarmante e os governos
procuravam acompanhar o movimento europeu, introduzindo em Portugal as mais
recentes inovações. A elite política e intelectual conhecia as decisões e os debates
que no campo educativo se travavam no estrangeiro e procuravam traduzi-las na
legislação, algumas vezes pequenos desfasamentos temporais. Essas medidas, porém,
muito dificilmente eram concretizadas, configurando o que se tem designado por
uma “construção retórica” da escola de massas (Soysal e Strang, 1989).
Assim, o articulado introdutório da lei de 1870 traça a seguinte imagem:

Contemplar os principais fatos relativos a esta questão desola o espírito.


Apesar de uma série de providências legisladas desde 1834, apesar das
obrigações impostas até aqui à localidades, apesar mesmo dos esforços
beneficentes e louváveis da iniciativa particular, a consociação d’estes
três elementos pôde melhorar a educação e instrucção do povo portuguez
em relação ao passado, mas não conseguiu realizar os grandes princípios,
não logrou equiparar a educação nacional, nem aproximá-la sequer, ao
que exigem as necessidades públicas (Decreto 16 Ago. 1870, I
[Preâmbulo da lei]).

O legislador compara ainda Portugal com outros países, considerados


avançados ao nível da relação entre o número de escolas e o número de habitantes e
clarifica o estado deficitário do investimento no sector educacional. Segundo os
dados explícitos no decreto citado: “Na Espanha há 1 escola para 600 habitantes; em
França, Baviera, Itália, Holanda e Inglaterra 1 para 500 e 400; na Suécia 1 para 300;

referências à existência de outras, que entretanto já desapareceram.


54
055

nos Estados Unidos 1 para 160; na Prússia 1 para 150. Portugal 1 escola para 1000
habitantes” (Decreto 16 Ago.1870, idem ). Como causas apontadas e que
determinariam o atraso em que se encontrava a instrução primária estão a
organização centralizadora, a carência de inspecção, péssima situação do
professorado, desamparo da instrução do sexo feminino, a falta de frequência escolar
e a desorganização interna da escola, não abrangendo a educação física, política e
civil nem a instrução profissional. Cientes de tais problemas, investiram na reforma
da instrução acreditando que “a escola do século XIX é uma revolução nas condições
sociais da humanidade” ( Idem, VI ).
Mesmo diante de tal argumentação, esta Reforma foi revogada no dia 27 de
Dezembro do mesmo ano (Collecção official da legislação portuguesa, 1871, p.558).
“Ao fim de sessenta e nove dias do Ministério da Instrução Pública, o governo do
Duque de Saldanha caiu sendo substituído pelo do Marquês de Sá da Bandeira, tudo
então desaparecendo: reforma, ministro e ministério” (Soares, 1985, p.71). E deste
modo, a implantação anunciada das escolas centrais não se pôde executar.
É neste contexto de frustração de reformas que se situa a Reforma da
Instrução Pública de 1878, sob a batuta de Rodrigues Sampaio, mas que só será
regulamentada em 1880, pelo Decreto de 28 de Julho do mesmo ano. Segundo
Araújo (2000, p. 86) só começa a ser implementada em 1881. Esta reforma procedeu
à descentralização do ensino primário, estabeleceu a obrigatoriedade de frequência
para rapazes e meninas, regulamentou assuntos tão diversos quanto matrículas,
organização curricular, exames, regulamentação sobre os professores estabelecendo a
igualdade de salário entre professores e professoras, etc. Foi precedida das propostas
de lei de 20 de Janeiro de 1872 e de 23 de Janeiro de 1875, de influência de
Rodrigues Sampaio e segundo os mesmos princípios da Reforma de 1870. Mas tanto
esta legislação como a que se lhe seguiu (Decreto de 22 de Dezembro de 1894) não
faz referência à organização das escolas centrais, indicando apenas que haverá um
director.
Será com o governo de João Franco (Decreto de 18 de Junho de 1896), que
se encontra de novo menção a este tipo de escola. Nele se assume claramente o
carácter graduado da instrução primária por classes e graus. Este Regulamento,

16
Nos livros de Correspondência expedida da Escola nº 2 e no livro Acta de reuniões do Conselho da
Escola Central nº 1,da Freguesia do Bomfim, podemos observar que tais escolas utilizaram o nome de
Escola Central até 1919.
55
056

considera Gomes (1986,p.125) como o “primeiro texto legal que estabelece, de uma
forma explícita, o número de classes de que deve constar o ensino elementar”.

Nas escolas centrais, há quatro classes ascendentes, que se denominarão


1ª,2ª,3ª e 4ª, compreendendo, em regra, as três primeiras o ensino
elementar do primeiro grau e a 4ª do segundo (art.39º). Nas escolas de um
só professor pode haver também quatro classes como nas escolas centrais
(art. 49º).

Na legislação subsequente, no decreto nº 8 de 24 de Dezembro de 1901 e a


sua regulamentação através do decreto nº 4 de 19 de Setembro de 1902, consta a
autorização da organização de escolas centrais em Lisboa, Porto e em outras
povoações com mais de 10.000 almas “sempre que as conveniências do ensino o
exijam e precedendo voto afirmativo do Conselho Superior de Instrução Pública”
(Collecção official da legislação portuguesa, 1901, art.º 26, p. 1237). Na
regulamentação aparece um conjunto de atribuições do director da escola central e
uma clara hierarquização de funções: os professores são responsáveis perante o
director (regente) (art. 64); ao regente compete entre outras atribuições “visitar as
classes regidas pelos outros professores”, fazer a distribuição do serviço docente no
início de cada ano (art.73) e fazer a passagem dos alunos, sob proposta escrita do
professor da classe (art. 87). O director aparece como o responsável pela escola no
seu todo perante o exterior e as autoridades escolares.
A existência de um grande número de alunos e de vários professores num
edifício comum mas com espaços divididos segundo uma lógica graduada deve ter
determinado desencontros e tensões e necessidades novas de organização. Esta vai-se
estruturando segundo modelos existentes noutros graus de ensino e pela própria
dinâmica interna (Viñao Frago, 1990., p. 22-23). Para além do director, que surgiu
como necessidade imediata vai aparecer o conselho escolar. Este só aparece
formulado no regulamento de 24 de Fevereiro de 1910. Aparece fundamentado na
experiência de instituições de outros níveis de ensino; na experiência francesa; nos
desígnios da própria escola central como meio de “colaboração de todos os mestres
para a educação intelectual e moral dos alunos”; como contraponto do poder do
director, ao impedir que se conserve isolado dos outros professores, impondo
métodos sem discussão, que lhes limitariam a iniciativa; para promover a
colaboração e aperfeiçoamento de todos, novos e mais velhos, evitando “o
isolamento pedagógico”. Com amplas atribuições, o conselho escolar desloca a
56
057

discussão em torno dos métodos de ensino para uma visão mais ampla da acção
educativa, que envolve a organização de diferentes serviços, como a biblioteca,
museu escolar, cantina, caixa económica. Assume um papel de aconselhamento do
director e uma forma de controlo da sua acção, funcionando de alguma forma como
um elemento moderador da gestão escolar. Barroso (1995, p. 111) salienta o papel
desempenhado pelo conselho escolar na recuperação da anterior autonomia
individual do professor para um poder colegial, que se lhe sobrepõe; na coordenação
do trabalho docente e a exigência de novas competências de gestão e planificação de
diferentes actividades; a delimitação dos campos pedagógico e administrativo da
escola, implicando a colaboração e partilha de poderes entre o conselho e o director.
Não parece abundar documentação que nos permita rastrear os debates que
a criação deste tipo de organização suscitou. É de supor que representou algum
benefício para o trabalho dos professores, como demonstra o artigo de Ulysses
Machado. Porém, podemos detectar críticas a alguns aspectos das escolas centrais já
em 1899, no relatório de Bernardino Machado. Critica este a aglomeração de alunos
num mesmo edifício, o que poderia tornar a escola menos acessível; professores a
mais, nomeadamente os de desenho, costura, ginástica e exercícios militares, a
existência de um corpo de pessoal auxiliar e a categoria de professor auxiliar. Este
acabaria por cumprir funções docentes, permanentemente. Se pensarmos nas
dificuldades de deslocação no século XIX podemos pensar que a concentração de
escolas num mesmo edifício dificultaria o acesso das crianças e seria mais um
motivo para o abandono escolar.
A mudança de regime político em 1910, da Monarquia para a República,
reflectiu-se, como era de esperar, na educação. Segundo Pintassilgo (1998)

O ensino primário e o combate ao analfabetismo concentraram boa parte


das atenções. Reafirmam-se os princípios (liberais) da gratuitidade e da
obrigatoriedade, inovam-se as disciplinas e os métodos de ensino,
aumenta-se o número de escolas e o número de professores, sobem-se os
vencimentos destes últimos, entre outras medidas. (…) A exiguidade das
verbas orçadas para a educação foi um obstáculo que o novo regime
nunca conseguiu (ou nunca quis?) superar, tornando difícil a realização de
qualquer projecto educativo.

De certo modo, “este conjunto de intenções vai encontrar uma primeira


estruturação legal, na Reforma do Ensino Primário e Normal de 1911.

57
058

No novo quadro político a escola é assumida como uma oficina onde se


fabrica cidadãos e os professores como os grandes mentores da nova geração”
(Nóvoa, 1989). Neste contexto, a designação “escola central” não aparece nos textos
legais; porém, as orientações quanto à organização do ensino continuam sendo as
mesmas, mantendo-se o número limitado de alunos por classe sob a regência de um
único professor, as figuras do director escolar ou professor regente e do conselho
escolar e a exigência da construção de prédios apropriados, sendo providos de
materiais didácticos e mobiliário adequados. A reforma de 1919 já não se refere às
escolas centrais, que desaparecem como designação.

Os professores e a organização das escolas centrais

Não abundam debates ou declarações de professores sobre esta questão.


Contudo, nas Conferências Pedagógicas, que se realizaram em 1883 na cidade do
Porto, discutiu-se a “administração, funcionamento e organização” destas escolas. O
debate parece ter-se centrado sobre a distribuição dos professores por classes ou por
disciplinas.
Segundo Barroso (1995, p.105), a polémica à volta desta questão não se
resume à procura de uma melhor divisão do trabalho dos professores. Reflecte uma
oposição entre perspectivas ligadas a uma concepção organizacional oriunda do
mundo fabril (a divisão por disciplinas) e uma concepção com origem na tradição
mais pedagógica de acompanhamento e formação do aluno (divisão por classes). Vai
ser esta a opção no sistema de ensino português, que as conclusões das Conferências
já anunciava:

[Nas escolas centrais] Em vez de um professor dividir a sua actividade


pelo ensino de todas as disciplinas professadas na escola, desde os
rudimentos até ao fim do respectivo programa, como sucede nas escolas
portuguesas em geral, divide-se pelo contrário o ensino das diversas
disciplinas em parte, ou grau, de disciplina. Isto é, em vez de se dividir o
professor por todo o ensino que a escola ministra, divide-se o trabalho
por diversos professores. Há a divisão do trabalho e não do trabalhador.
(...)
Mas também se tem ensaiado uma outra divisão de ensino, a saber: Em
lugar de cada professor tomar regência duma aula permanentemente e
nela ensinar as partes de todas as disciplinas que lhe correspondem, faz-se
a divisão do trabalho por disciplinas; isto é, distribuem-se as diversas
disciplinas professadas na escola pelos seus professores e cada um vai
ensinar as que lhe foram distribuídas desde a 1.ª até à última. Estes

58
059

ensaios, porém, não têm dado resultados satisfatórios, (in Barroso, 1995,
p. 105).

O Regulamento de 1902, no seu art. 73 § único, estipula que “os


professores devem acompanhar os seus alumnos até à última classe todas as vezes
que isso seja possível”. Para Barroso (1995, p. 108), esta “especialização” por níveis
de ensino estará na origem da tentativa de hierarquização sexista dos professores do
ensino primário em 1919. Saliente-se, porém, que já se encontra em legislação
precedente vários indícios de tentativas dessa hierarquização. E o Relatório da
comissão presidida por Bernardino Machado para inquérito às escolas da capital, e
apresentado ao Ministro do Reino em 30 de Março de 1892, critica a “promiscuidade
de sexos” entre o professorado primário como prejudicial ao bom nome das casas de
educação, e sugere que se “confie a senhoras o ensino elementar, principalmente a
regência das aulas menores” (Machado, 1899, p. 89).
O professor da Escola Central de Santos (Lisboa), Ulysses Machado, autor
de livros escolares alguns deles premiados em exposições no Rio de Janeiro e
articulista de jornais voltados para a educação, escreveu acerca da ampliação do
número de escolas centrais em Lisboa e das suas vantagens, num artigo intitulado
“Escolas Centrais”:

Segundo as informações dos jornais de grande circulação, o conselho


superior de instrução pública, numa de suas últimas sessões, aprovou
parte duma proposta da inspecção das escolas de Lisboa, escolhendo, para
conversão em centrais, três escolas do sexo feminino e uma para o sexo
masculino, de quatro para aquele sexo e de duas para este, que haviam
sido apontadas, pela sua muita frequência.
Vai-se, pois, reconhecendo a necessidade de transformar escolas de um só
professor, ou deste com os competentes ajudantes, em escolas centrais,
cujos resultados são, como já temos tido ocasião de demonstrar várias
vezes, incomparavelmente muito mais satisfatórios (Revista Pedagógica,
nº10, 1906).

É através deste professor que nos aparece o termo “escolas semi-centrais”.


Segundo Machado a escola semi-central seria a reunião das escolas de uma mesma
localidade (masculinas e femininas) numa só, do ponto de vista administrativo, com
professores e professoras que entre si distribuíam o serviço. “E é nestas escolas,
ainda melhor do que naquelas, a que se pretende dar o nome de semi-centrais, o
ensino poderá ser ministrado, como a prática o tem demonstrado nas demais já
criadas” (Revista Pedagógica, 1909, nº 87).

59
060

Pelo que podemos interpretar, o recurso deste professor ao termo “semi-


central” é elucidativo do processo de estabelecimento deste tipo de organização do
trabalho docente. Fruto do desejo de inovação de alguns e da necessidade de
rentabilizar esforços perante o grande número de alunos em algumas escolas urbanas,
que ultrapassavam a centena, como na de Cedofeita no Porto, os professores teriam
iniciariado um processo de divisão de trabalho. A diferença entre as escolas centrais
e as “semi-centrais” seria devido ao facto de as primeiras se encontrarem reunidas
num mesmo edifício, com os respectivos serviços e com alguma hierarquização de
funções, como a legislação determinava, enquanto as segundas eram frutos da
dinâmica de professores que, numa mesma localidade, iniciavam um processo de
organização e divisão de trabalho por níveis de ensino (classes e idades).

A conformação dos espaços escolares.

A partir da segunda metade do século XIX houve um grande consenso no


discurso político sobre a necessidade de criação de escolas para combater
eficazmente o analfabetismo. A maioria das escolas funcionavam em espaços
alugados, improvisados e inadequados para o ensino.
As escolas existentes, receberam dos intelectuais portugueses e da imprensa,
adjectivos assombrosos e foram definidas como “pardieiros em locais húmidos, de
paredes baixas, enegrecidas, recebendo luz escassamente o telhado em mau estado
deixando penetrar água da chuva (…)” (A Instrução, nº18, 1916, p.140). Eça de
Queirós definiu-a como “ variação torpe entre o celeiro e o curral”; Ramalho Ortigão
como “lúgubre, enxovalhada, sem luz e sem ar”; e D. António da Costa como
“imprópria” (Beja et. al, 1985, p.61). É um facto que o Estado no século XIX e XX
esperava que fossem os cidadãos a construir e financiar as escolas ou para isso
contribuíssem maioritariamente. Para tal prometia apoios e fazia exortações junto
dos poderes locais e através dos governadores civis17.
Perante a incapacidade do Estado, a sociedade civil pressionou, através de
doações de edifícios, à criação de lugares e colocação de professores, assim como à
definição de normativos legais e higiénicos sobre os espaços escolares. Esta acção,
hoje difícil de rastrear, pelo ocultamento a que o Estado Novo procedeu, perdura

60
061

contudo através da existência ainda de um número significativo de edifícios. É o caso


da doação de António Xavier Pinto de Campos em 1863, do legado de José António
de Souza Flores, do Conde Ferreira em 1866, entre muitos outros, iniciando, assim, a
“era das Construções Escolares”.
Ao Conde de Ferreira se deve o contributo mais significativo não só pela
importância do seu testamento (120 casas de escolas primárias de ambos os sexos)
mas também pela repercussão que isso teve a nível legislativo.
Filomena Beja afirma que em Lisboa e no Porto não foram construídas
escolas com o legado do Conde Ferreira, pois, nestas duas cidades, a Instrução
Pública competia a um pelouro das Câmaras Municipais, que criava e mantinha as
Escolas Centrais (Beja et al,1985, p.73). Esta afirmação é inexacta, pois
relativamente ao Porto foram construídas duas escolas Conde Ferreira: uma na
freguesia de Lordelo Ouro e outra na freguesia de Ramalde (Felgueiras, 2000; 2004).
O facto de as Câmaras e posteriormente o Estado terem a responsabilidade da sua
construção, não significava que não aceitassem ou promovessem as doações de
particulares. É o caso da Escola Central n.º 1 de Lisboa, para o sexo masculino,
construída com a doação feita por dois cidadãos, que contribuíram com a quantia de
2.500$00, com a condição de ser complementada pelo Estado com igual quantia
“obrigando-se a Câmara, caso aceitasse a dádiva, a construir um edifício escolar que
obedecesse às mais modernas regras de higiene e pedagogia” (Costa, 1884, Beja et
al,1985, p.74). É também dos poucos casos que se conhece em que foi construído um
edifício de raiz para uma escola central. Segundo Bernardino Machado (1899,p.92)
“os edifícios em que se acham estabelecidas as escolas primárias, não são, salvo o da
escola nº 1, de construção especial, nem são todos os mais apropriados (…) alguns
dos edifícios são condenáveis em absoluto ou demandam reparações para continuar a
servir; outros são mal avizinhados”.
As escolas centrais não deram lugar, de um modo geral à construção de
grandes edifícios, com uma individualidade própria, como aconteceu em outros
países europeus. A investigação sobre os edifícios escolares está ainda numa fase
muito embrionária pelo que no Porto, só nos é possível afirmar que a freguesia de
Cedofeita terá construído uma edifício de raiz para escola central, mais tarde
demolido, tendo dado lugar a um “grupo escolar”. Aí funcionaram as escolas nº 71 e

17
Cf. Circular do Governador Civil do Porto de 30 de Abril de 1874. Arquivo Municipal de Vila do
Conde, Pasta Ensino, doc. nº34 . Encontra-se publicada na rubrica “Documentos inéditos” do Caderno
61
062

72, do sexo masculino e feminino respectivamente. O edifício foi construído para


este fim, com uma traça rectilínea, com habitação para os respectivos professores e
biblioteca paroquial (Livro de Plantas nº 89, 1884, pp.30-36). O terreno pertencia ao
Priorado de Cedofeita e foi expropriado pela Câmara Municipal para utilidade
pública.
Nas freguesias do Bonfim e de Paranhos, ambas pertencentes ao município
do Porto, as escolas centrais funcionaram em edifícios alugados.
No freguesia Bonfim, a Escola Central nº 2, sob a direção da professora
Maria Isolina da Silva Cardoso, funcionou na rua Duque de Saldanha, 663, num
estado carecendo de atenções. A directora, na sua correspondência com a Câmara
Municipal, relata um fato acontecido:

Hoje, pelas 1½ horas, foi a vizinhança desta escola alarmada pelos gritos
ininterruptos das crianças que, saindo espavoridas das classes procuravam
fugir do edifício. À Escola ocorreu muita gente a indagar do que se
passava.
Foi o caso que parte do estuque da sala da 1ª classe desabou e o baque por
ele produzido, ao despedaçar-se sobre as carteiras, sobressaltou e
amedrontou de tal forma as crianças da respectiva classe, que estas,
abandonando precipitada e desordeiramente a sala, no meio de uma
gritaria, alvoroçaram não só o resto da população escolar, como também a
vizinhança e pessoas que passavam nas ruas próximas.
Felizmente nenhuma criança ficou ferida, mas é certo que o caso podia ter
ficado assinalado por consequências bem tristes. De há muito que eu
reclamo, baldadamente, a reparação dos tectos das salas. Mais uma vez o
faço pedindo à V. Excia. Se digne providenciar de modo que tal reparação
se faça sem perda de tempo, visto o risco que correm as pobres
criancinhas (Livro de Correspondência, 1914, p.66).

Este prédio escolar não demonstrava ter condições mínimas de


funcionamento, pois, noutros ofícios, é solicitado à Câmara outros tipos de reparos.
Em Paranhos funcionaram as Escolas Centrais nº 37 e 38, masculina e
feminina respectivamente. A Escola nº 37 funcionava na rua Costa Cabral nº 596,
tendo 4 salas de aula e uma habitação da professora. Era um espaço adaptado para o
funcionamento da escola, tendo em vista que o prédio era arrendado de um
particular, Sr. Joaquim José de Souza Ribeiro. A Escola Central nº 38, também
funcionava em prédio alugado na rua Costa Cabral nº 303, tendo as mesmas
características.

de Cultura , Suplemento do Jornal de Vila do Conde, nº262, 8 de Nov. 1984.


62
063

Segundo Escolano (2000, p.183) o “espaço-escola não é somente um


continente onde se situa a educação institucional, isto é, um cenário desenhado desde
propostas exclusivamente formais em que se situam os agentes que intervêm no
processo de ensino-aprendizagem para executar um determinado repertório de
acções”. A arquitectura escolar, afirma, é “também por si mesma, um programa, uma
espécie de discurso que institui em sua materialidade um sistema de valores, como os
de ordem, disciplina e racionalidade, uns marcos para a aprendizagem sensorial e
motora e toda uma semiologia que cobre diferentes símbolos estéticos, culturais e
inclusive ideológicos”. Ao mesmo tempo, o espaço educativo tem reflectido no seu
formato as inovações pedagógicas, tanto em suas concepções gerais como nos
aspectos mais técnicos. Os espaços escolares contribuíram para a consolidação de
uma nova cultura escolar, que, “em seu movimento de constituição, foi o palco e a
cena de apropriações diversas, produzindo e incorporando múltiplos significados
para um mesmo lugar projectado pela arquitectura escolar” (Faria Filho, 2000:69).
É interessante observar que, quando em Lisboa é criada a primeira escola
central, em 1869, ainda havia poucos prédios construídos para o funcionamento das
escolas. Com o surgimento das escolas Conde Ferreira estas eram constituídas
geralmente por um vestíbulo, uma sala para trabalhos de costura, salas de aula e
habitação para o professor. A Escola Central nº 1, de Lisboa, tinha local específico
para a Educação Física, implantado pelo Dr. Luis Jardim, realçando a necessidade de
se obedecer a determinadas normas higiénicas e pedagógicas.
A educação, que antes acontecia na casa do professor, deslocou-se para um
espaço próprio, porém, trouxe para o seu interior a habitação deste. Em Portugal,
apesar da pouca expansão que a escola graduada teve e do desconhecimento que
ainda temos sobre as escolas centrais, podemos dizer que do ponto de vista da
definição do espaço, diferenciaram-se somente das demais, pelo número de salas de
aula e pela complexidade de relações do “espaço vivido”.

Considerações finais

As escolas centrais em Portugal não tiveram a expressão e significado que


tiveram em outros países, talvez porque não houvessem sido criadas no âmbito de
um projecto político, onde a sua criação representasse uma oposição ao regime
político anterior. Contudo o conhecimento do seu funcionamento e sua implantação

63
064

surge, por exemplo, muito antes do que na vizinha Espanha, cujo decreto para a sua
criação é de 1898, regulamentado no ano seguinte (Viñao Frago, 1990, p. 13).
A sua implantação ficou circunscrita inicialmente a Lisboa e Porto, e
posteriormente a algumas outras capitais de distrito. Não parece ter despertado o
interesse da sociedade civil, que geralmente continuou a doar edifícios escolares de
um ou dois lugares, mais próximos das populações a que serviam, tendo-se
confinando à esfera político-educacional. Os poucos edifícios construídos, através de
doações ou pelo dinheiro público, para escolas centrais, não configuraram um tipo
arquitectónico específico, apresentando diferenças no que diz respeito ao número de
sala de aula que as constituíam, à organização do espaço e de traça. Eram adequadas
para atender as quatro classes, funcionando em prédios, como também em casas
alugadas e adaptadas para este fim.
Algumas, como no caso de Escola Central de Cedofeita e a Escola Central
de Paranhos, deram lugar na década de 60 do século XX a Grupos Escolares. Não
encontrámos, até ao momento da escrita desta pesquisa, algo que justificasse essa
mudança de nomenclatura.
Embora de implantação limitada no ensino público primário português, a
cultura escolar introduzida, deixou marcas na educação e na cultura profissional dos
professores, visíveis até aos nossos dias. Do ponto de vista pedagógico marca a
passagem do atendimento directo do aluno ao ensino simultâneo de um grupo
“homogéneo de alunos”, com o recurso ao método intuitivo e às lições de coisas. O
agrupamento de professores implicou a busca de formas de organização burocrática,
com alterações evidentes na actividade docente e no quotidiano escolar,
acompanhada de um distanciamento da escola face à família.

Referências bibliográficas

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67
068

DAS ESCOLAS REUNIDAS AO GRUPO ESCOLAR:


A ESCOLA COMO REPARTIÇÃO PÚBLICA DE VERDADE

Antônio de Pádua Carvalho Lopes18

Introdução

Criados legalmente, no Piauí, pela reforma da educação de 1910, os grupos


escolares foram inicialmente propostos em 190519. No discurso reformista que então
era gestado, apareceram como elemento modernizador do sistema escolar piauiense,
superando o modelo da casa–escola, considerado antiquado, buscando tornar a escola
“uma repartição pública de verdade ”.
Sua constituição não foi imediata e conviveu, mesmo no seu período áureo,
com as casas–escola e as escolas reunidas. Estas eram, inicialmente, a opção
considerada mais viável para o Piauí: eram, no seu começo, meras junções de
escolas, antes isoladas, em um mesmo espaço físico, implicando apenas no
aparecimento da figura do diretor e do porteiro. O grupo escolar, por sua necessidade
de instalações apropriadas, pelos recursos materiais que exigia e o tornavam mais
oneroso, foi concretizado somente em 1922.
Assim, a implantação dos grupos escolares, no Piauí, foi antecedida pela
implantação das escolas reunidas, no período de 1905 a 1922. Em 1922, temos, como
marco divisório, a criação do Grupo Escolar Miranda Osório, em Parnaíba, pelo que
representou de diferenciação em relação às escolas reunidas situadas na capital,
Teresina, fundadas em 1910.

Reformando a educação: que escola nos convém?

Todo o discurso oficial em torno da implantação de um novo modelo de


escola para o Piauí estava delimitado, por um lado, pela visão negativa das condições
vigentes da organização escolar e, por outro, pelo que o Governo poderia e se
dispunha a fazer para modernizar esta estrutura e torná–la eficiente.

18
Universidade Federal do Piauí. E-mail: apadualopes@ig.com.br
19
Sobre a implantação dos grupos escolares em outros estados, cf. Souza (1998a e 1998b); Faria
Filho (1996); Fiori (1975); Kuleska (1997); Moreira e Araújo (1997); Pinheiro (2002).
68
069

A idéia da criação dos grupos escolares surgiu, assim, em mais um momento


de avaliação negativa que o Governo Estadual fazia da instrução primária, taxada de
lastimável, e em mais um reformismo da legislação escolar estadual. Insatisfação e
reformismo que já estavam presentes nos discursos oficiais antes de 1905.
Em 1905, o Governador Álvaro de Assis Osório Mendes (1904 – 1907)
reclamava do descompasso existente entre os investimentos e os resultados na
educação pública primária. Elogiando o empenho do novo Diretor da Instrução
Pública, Miguel de Paiva Rosa, em mudar este quadro, anunciava que este havia,
dentre diversas medidas sugeridas para modificar a instrução pública, proposto a
“(...) transformação das quatorze escolas da capital em três grupos escolares (...)”
(Piauí,1905).
Destaca–se aí o aparecimento dos grupos escolares vinculados à criação de
uma nova realidade educacional, sendo esta, contudo, limitada à capital, seja pelo
número de escolas ali existentes, sendo possível agrupá–las; seja pela importância
que, como capital, possuía; ou ainda, porque o Governo considerava que uma ação
mais complexa e onerosa em matéria de educação primária deveria ficar restrita à
Teresina.
Contudo, nem a capital, nem outra cidade qualquer do Piauí viria a conhecer
nesse momento esta modalidade de escola. A reforma da instrução, concretizada em
1910, deveria criar mecanismos de controle das escolas, evitando o modelo
pulverizado e incontrolável, até então existente:

Uma idéia que o governo acaricia e a porá brevemente em prática é a fusão


das actuaes escolas públicas da capital em grupos escolares. Nestes o
governo poderá exercer mais fácil fiscalização e estabelecer medidas
hygienicas que não possue a maioria das nossas escolas. Para este fim já foi
adquerido pelo exm. Sr. Dr. Vice–governador, quando em exercicio, o
material necessario e conto em breve poder realizar o meu plano. (Piauí,
1908).

Os principais objetivos da reestruturação da rede escolar primária, iniciada


com as escolas da capital (e por muito tempo limitada a estas) era, ao tempo em que
modernizava a escola, fiscalizar de modo mais eficaz o trabalho pedagógico da
escola e transformá–la em “repartição pública de verdade”. A higienização do espaço
escolar também estaria mais facilitada no modelo agrupado de escolas. O grupo
escolar era, pois, a forma ideal para realizar tais objetivos, principalmente se
69
070

comparado com o modelo casa–escola e com as ambigüidades e dificuldades de


controle inerentes a este modelo.
O modelo dos grupos escolares, sofisticado do ponto de vista das instalações
e recursos didáticos, principalmente se comparado à casa–escola, implicava, todavia,
em maiores gastos. Este fato determinou a postergação de sua implantação.
A lei de 1909, que autorizou a reforma da instrução pública (Piauí, 1910c),
colocou os grupos escolares como componentes do aparato escolar piauiense, embora
restringindo–os à capital. Assim, na capital, a instrução primária deveria ser
ministrada nos grupos escolares e escolas isoladas; já no interior, apenas em escolas
isoladas que poderiam ser masculinas, femininas ou mistas. Nessa lei, o Governo
reforçava o papel da capital como centro de inovações educacionais.
Certamente os custos implicados na estruturação e manutenção dos grupos
escolares, o fato de que na Capital o aluguel do prédio das escolas já era pago pelo
Governo e o número reduzido de escolas estaduais existentes na maioria das
localidades do interior eram fatores que, também, faziam com que essa modalidade
moderna de escola fosse proposta como ação imediata do Governo de modo
restritivo à Teresina.
Mas, o grupo escolar poderia servir como atrativo para que os municípios,
esses parceiros sempre escorregadios, procurassem engajar–se na modernização do
aparato escolar de sua municipalidade, pois permitia, como atrativo, que o município
que mantivesse pelo menos quatro escolas primárias pudesse requisitar a criação de
um grupo escolar.
A reforma da instrução e a constituição dos grupos escolares faziam–se
gradativamente. Era necessário encontrar uma fórmula que unisse praticidade de
execução e poucos gastos (Piauí, 1910a). Em 1910 era realizada a reforma da
instrução pública, sendo observado o critério de economia de despesas, patente nos
discursos sobre a extinção da obrigatoriedade escolar, e da preferência dada às
mulheres para o exercício do cargo de professora primária20.
A reforma de 1910 colocou como central a criação de grupos escolares,
apresentando–os, pois, como o tipo de escola moderna que se adequava à superação
do que era definido como atraso da educação primária piauiense. Restringia,
contudo, estas escolas à capital e cidades mais populosas. Esta medida vinculava este

20
Sobre a feminização do magistério público primário piauiense, ver Lopes (1996).
70
071

tipo de escola ao espaço urbano, sendo um dos parâmetros, inclusive, para a


caracterização do grau de desenvolvimento de uma cidade.
Desse modo, tido como modelo urbano, oneroso e desenvolvido de escola, o
grupo escolar conviveu, sendo minoritário, com escolas isoladas, escolas reunidas e a
Escola Modelo. Esta última, por sua estreita vinculação com a Escola Normal,
objetivava servir de referência pedagógica para o conjunto das escolas, colocando–se
à parte, mesmo em relação aos grupos escolares.

Casa–escola e grupo escolar: o que se desejava mudar?

O grupo escolar foi constituído em oposição ao modelo da casa–escola. Ante


a modesta e arcaica casa–escola, o grupo escolar era apresentado como arrojado,
moderno e competente. Era uma verdadeira repartição pública, com horários de
funcionamento, postos, hierarquias funcionais, divisões dos alunos por classes,
concentração de crianças e docentes, aparelhamento, higiene, pedagogicamente bem
instalado e bem localizado.
Assim, o grupo escolar, pensado na reforma de 1910, desejava modificar,
entre outros aspectos, o caráter multisseriado21 das aulas das casas–escola, pela
implantação da escola graduada ou pelo que o Governador Antonino Freire da Silva
(1910 – 1912) denominava “divisão do trabalho” (Piauí, 1910b) docente22. Divisão
esta que não estava restrita à esfera da escola, mas que implicava no estabelecimento
de uma eficiente “inspeção técnica do ensino”.
Uma outra diferenciação entre a casa–escola e o grupo escolar dizia respeito
ao fato de este congregar todos os anos do ensino primário, separados por série. O
curso primário completo era de quatro anos, sendo três de ensino elementar e um de
ensino complementar (Piauí, 1913).
O ensino elementar era ministrado nas escolas isoladas e o complementar era
ministrado nos grupos escolares, na Escola Modelo e nas escolas complementares da
capital. Assim, o ensino complementar ficava restrito à capital, embora houvesse a
possibilidade de criação de grupos escolares nas cidades mais populosas do interior
(Piauí, 1913)23.

21
Havia na mesma sala de aula alunos com diferentes idades e níveis de escolarização.
22
Sobre graduação e escola graduada, ver Frago (1990).
23
A escola complementar era pensada originalmente como parte do grupo escolar e da Escola
Modelo. Contudo, nas disposições transitórias dessa lei, foram convertidas duas escolas primárias
71
072

As transformações na organização do trabalho docente eram outro ponto de


diferenciação entre a casa–escola e os grupos escolares. O grupo escolar, e mesmo as
escolas reunidas, implicava, por ser a junção de aulas antes autônomas, no
surgimento de duas novas funções na escola: a direção e a portaria.
A reunião das escolas em um único espaço já transformava o modelo de
organização das casas–escola, reduzindo–as, inicialmente, ao espaço de cada classe,
controladas, no conjunto, pela direção24. O porteiro também marcava uma ruptura
com o modelo casa–escola, na medida em que delimitava o espaço escolar como
separado da casa, ou melhor, como repartição pública, sendo que o acesso a ele
passava a ser regulado por normas padronizadas de funcionamento.
Além disso, a direção da escola era exercida por um dos professores, o que
tornava imprescindível a presença das professoras adjuntas, já existentes em
algumas casas–escola melhor situadas, para que o diretor pudesse realizar as
atribuições de fiscalização e controle, pertinentes ao cargo, sem que a disciplina da
escola como um todo pudesse ser transtornada por classes momentaneamente sem
docente. Essa necessidade era posta explicitamente, em 1918, por exemplo, no
requerimento do Diretor das Escolas Reunidas do Sexo Masculino da capital,
Francisco Marques, ao Diretor Geral da Instrução Pública, solicitando a criação de
um lugar de adjunta de professora nas escolas sob sua direção:

O regulamento da instrução (...) incumbe–me, como director destas escolas,


da fiscalização das diversas classes nellas ensinadas; advindo por isso
prejuizo para a classe que leciono, desde que não haja uma adjunta a quem eu
possa incumbir nesta occasião a direcção da classe. Se deixar de cumprir o
que me compete na qualidade de director, devido o interesse de minha classe,
talvez não venha ter o aproveitamento desejado; porque é necessaria a
fiscalização ás outras classes devido a ordem e mesmo para que as
professoras ponham em execução a melhor forma de ensino de conformidade
com as instrucções de V. Exa. Havendo uma adjunta competente que me
substitua em os momentos de eu fiscalizar as demais classes, normalizar–se–
á o serviço, e se obterá o exigido adiantamento (Piauí, 1877 – 1934).

Pensando desse modo o papel do diretor, esperava–se superar o que sempre


foi limitação para a execução de uma ação pedagógica uniformizadora por parte do
Governo: a falta de uma fiscalização regular do trabalho docente e a autonomia que

da capital, uma de cada sexo, em complementares, devendo funcionar como escola isolada até o
surgimento dos grupos escolares.
24
O surgimento e a exigência, nas escolas reunidas e nos grupos escolares, de que o professor
assinasse o livro de ponto, antes de assumir o exercício da sala de aula, já colocava um instrumento
de controle do trabalho docente inexistente no modelo casa-escola. Cf. Piauí (1913,art. 170).
72
073

os professores tinham na execução de sua tarefa. Fiscalização esta muito mais


presente e eficaz que as dos inspetores de ensino. Isso era importante para um
Governo que estava limitado na sua capacidade de controle das escolas, não sabendo
mesmo se o número de alunos apresentado pelos docentes conferia com a existência
real de crianças na casa–escola.
A proibição aos docentes de morar na escola estava presente no artigo 74 do
decreto estadual no 771, de 6 de setembro de 1921, que alterou o Regulamento Geral
da Instrução Pública: “é expressamente vedado que os professores públicos, em
geral, residam no mesmo prédio em que funccionarem as suas escolas”. Era a
tentativa de tornar a escola “uma repartição pública de verdade”, pela expansão do
modelo das escolas reunidas e dos grupos escolares.

Uma nova escola para o Piauí: grupos escolares ou escolas reunidas?

Pensar uma nova escola para o Piauí era reconhecer os limites políticos e
econômicos da ação do Governo estadual e, ao mesmo tempo, promover a
modernização do aparato escolar. Nessa perspectiva, surgiram as primeiras escolas
de novo tipo: elas eram grupos escolares ou apenas escolas reunidas? Os
documentos oficiais, às vezes, diferenciavam estes dois termos; na maioria das vezes
os utilizavam como sinônimos. Haveria diferenças entre essas nomenclaturas que
caracterizassem tipos diferentes de escolas?
O grupo escolar era criado, majoritariamente, pela junção das escolas isoladas
existentes no lugar, ou pela junção das escolas existentes e criação de mais algumas;
mais raramente, pela sua criação pura e simplesmente. Predominava, contudo, o
modelo de junção das escolas existentes. Assim, os grupos escolares eram criados,
primeiramente, como escolas reunidas, sendo estas, então, a etapa primeira, e muitas
vezes duradoura, da constituição de um grupo escolar, embora não fosse necessária.
O modelo escolas reunidas, de uma etapa da constituição dos grupos,
constituiu uma alternativa definitiva de escola, por ser menos onerosa e intermediária
entre a casa–escola e o grupo escolar. Daí a dominância desse modelo durante toda a
primeira fase de implantação dos grupos escolares.
As escolas reunidas eram a simples junção de três ou mais escolas em um
mesmo espaço sob uma mesma direção, mantendo, inicialmente, a mesma
organização pedagógica da casa–escola. O regulamento da instrução pública

73
074

expedido com o Decreto nº 434, de 1910, previa, em seu art. 87, a criação,
incondicional, de tais escolas na capital e, condicionalmente, nas localidades que
oferecessem ou que o Estado possuísse prédios apropriados para tal .
Embora os documentos oficiais utilizassem indistintamente os termos grupo
escolar e escolas reunidas para nomear a nova forma de organização escolar, havia
diferenças marcantes entre eles. Diferenças estas situadas seja no tipo de instalação
requerida, seja na organização do ensino ou na divisão do trabalho e do poder na
escola.
A predominância inicial do modelo escolas reunidas ocorreu, principalmente,
em decorrência de seu baixo custo em relação ao grupo escolar, e por apresentar a
vantagem de, ao agrupar as escolas isoladas, proporcionar maior controle do trabalho
docente e economia com aluguéis, para o Governo.
Em 1911, o Governo do Estado anunciava a instalação na capital, “em
prédios confortáveis e adaptados ao seu destino”, de três escolas reunidas (Piauí,
1911). O processo de junção de algumas das escolas isoladas urbanas da capital em
escolas reunidas teria, contudo, iniciado ainda em 1910 e estas permaneceriam
sendo, nessa primeira etapa de reorganização da escola primária, as únicas escolas de
novo tipo existentes no Estado25. Teresina havia sido eleita, por sua própria condição
de capital e espaço onde a escola era colocada como centro de inovações
educacionais, como lugar da realização dessa modernização da educação.
Foram criadas, em 1910, as seguintes escolas reunidas26, todas com três
cadeiras, possuindo, além dos professores das cadeiras, professoras adjuntas de
professores, diretores e porteiras–serventes:
a) 1º Grupo Escolar ou Escolas Reunidas do Sexo Masculino;
b) 2º Grupo Escolar ou Escolas Reunidas do Sexo Feminino;
c) 3º Grupo Escolar ou Escolas Reunidas Mistas27.

25
A mensagem governamental de 1912 fala na suspensão, por conveniências administrativas, da
construção do Grupo Escolar Artur Pedreira, da cidade de Amarante. Os indicíos são de que essa
escola não chegou a funcionar nesse período. Guimarães (1923), em 1921, afirmava possuir
Amarante duas escolas estaduais e uma municipal. O Grupo Escolar Eduardo Ferreira, de
Amarante, foi inaugurado somente em 9 de abril de 1935. Cf. Moura (1997).
26
Embora houvesse a divisão das escolas por sexo dos alunos, em 1914, ao expor o número de
matrículas dessas escolas, o secretário de governo Júlio Emílio de Paiva Rosa, apresentava em todas
as escolas matrículas tanto do sexo masculino, como feminino, o que as tornava mistas. Não foi
possível esta informação na documentação disponível e, infelizmente, a documentação interna das
escolas não foi preservada.
27
Posteriormente denominadas Escolas Reunidas 24 de Janeiro, Escolas Reunidas José Lopes e
Escolas Reunidas Theodoro Pacheco, respectivamente.
74
075

Nesse período funcionavam, na capital, além dessas escolas reunidas, as


escolas isoladas e duas escolas complementares. A Escola Modelo ainda não havia
sido implantada . No interior do Estado, continuavam funcionando apenas as escolas
isoladas.
Em 1914, o Secretário do Governo Luiz de Moraes Correia era taxativo ao
negar a existência de grupos escolares no Piauí. Distinguia grupo escolar de escolas
reunidas, afirmando só existirem estas últimas, e apenas na capital:

(...) nestas [escolas reunidas], não se observa, como naquelles [grupos


escolares], a graduação do ensino, no tocante á distribuição deste pelas
respectivas professoras, ou seja a separação de classes, segundo se trate do
1o, 2o, 3o e 4o annos do curso primário.
Cada professora lecciona, nas escolas reunidas, aos mesmos alumnos durante
os quatro annos do curso, ou, por outra, ensina simultaneamente as materias
dos diversos annos do curso. (Piauí, 1914).

Assim, estas escolas não teriam, ainda, transformado o modelo pedagógico


das casas–escolas. A incorporação, inclusive das escolas complementares, fazia–se
gradativamente. Segundo Luiz de Morais Correia, as escolas reunidas realizavam
apenas uma finalidade do projeto de modernização da organização escolar: “reunir,
sob um mesmo tecto, o maior numero possivel de alumnos” (Piauí, 1914). Esta era,
inclusive, ainda segundo ele, uma desvantagem com relação ao modelo casa–escola,
visto que os prédios escolares eram residências adaptadas, com divisões internas
inadequadas para a quantidade de alunos desse novo tipo de escola28.
Em que pese esta constatação e as afirmações sobre a importância de um bom
prédio escolar, bem como os elogios e a concordância com a proposta de construções
escolares apresentadas no Rio de Janeiro, pelo Prefeito General Bento Ribeiro
Carneiro Monteiro29, não havia ainda iniciativas desse tipo no Piauí. Permanecia a
prática da adaptação de prédios particulares para o funcionamento de escolas isoladas
e mesmo das novas escolas reunidas.

28
Para ele, este fato tornava preferível a expansão do número de escolas isoladas com menos alunos à
criação de escolas reunidas como mero agrupamento de escolas isoladas, embora citasse Paulo
Pestana, de São Paulo, para destacar a utilidade e a razão de ser dos grupos escolares: “não se
discute a superioridade das escolas graduadas – entre nós impropriamente denominadas – grupos
escolares –, sobre as escolas não graduadas, ou isoladas. Naquellas, estando cada classe ou anno a
cargo de um professor, a efficacia do ensino é maior pela divisão do trabalho e pela egualdade
estabelecida nas edades e no adeantamento dos alumnos”. (Piauí 1914).
29
Nasceu no Rio Grande do Sul, em 1856, e faleceu no Rio de Janeiro em 1921. Prefeito do Rio de
Janeiro de 1910 a 1914. Sobre o projeto de prédios escolares desse período, no Rio de Janeiro, ver
Nunes (2000).
75
076

Gradativamente, as escolas reunidas vão estabelecendo estratégias para tornar


mais visível sua ação pedagógica no novo quadro escolar, no qual eram uma das
inovações centrais. Duas dessas estratégias são relembradas por (Britto, 1977). A
primeira dizia respeito à participação de professoras que não pertencessem ao quadro
docente da escola nos exames de promoção dos alunos. A segunda era a participação
crescente em festividades públicas com alunos discursando em nome da escola,
como fez Bugyja Britto em 1917, no coreto da Praça Rio Branco, durante a
celebração da Festa da Bandeira. As festas de encerramento do período letivo, outro
modo de marcar a presença da escola na cidade, eram anunciadas nos jornais, sempre
se referindo à exposição dos trabalhos dos alunos, reveladora dos méritos
pedagógicos da escola.
Essas estratégias tornar–se–iam atividades rotineiras dos grupos escolares,
que viriam a se consolidar como instituições educativas exemplares no interior do
aparato escolar piauiense, dando maior visibilidade à escola e destacando a
importância da educação nela ministrada.

A consolidação do grupo escolar no Piauí: uma escola urbana e moderna (1922–


1930)

O processo de criação dos grupos escolares tem na fundação do Grupo


Escolar Miranda Osório, em 1922, na cidade de Parnaíba, o marco de uma nova fase.
Este foi, se excluirmos a Escola Modelo, o primeiro grupo escolar implantado no
estado. Assim, embora sendo em Parnaíba, cidade diferenciada das restantes do
estado por sua importância comercial e pela ação de sua elite político–econômica na
consolidação de serviços urbanos que promovessem o desenvolvimento da região, o
grupo escolar surgiu interiorizado como resultado da ação do poder municipal, uma
vez que o poder estadual limitava–se à manutenção das escolas reunidas da capital.
No período de implantação e consolidação do modelo grupo escolar, que
encerra em 1930, foram criados 17 grupos escolares.

76
NOME DO GRUPO ESCOLAR LOCALIZAÇÃO E STATUS DA DATA DE CRIAÇÃO MODO DE CONSTITUIÇÃO
LOCALIDADE
G. E. Miranda Osório Parnaíba – interior 17 de março de 1922 Junção de duas escolas isoladas estaduais e duas municipais.
G. E. Demóstenes Avelino Teresina – capital 23 de fevereiro de 1926 Junção das Escolas Isoladas Frei Serafim e Casusa Avelino.
G. E. José Lopes Teresina – capital 23 de janeiro de 1928 Junção das Escolas Reunidas José Lopes e Escola Complementar
Antonino Freire.
G. E. Antonino Freire Teresina – capital 23 de janeiro de 1928 Antiga Escolas Reunidas 24 de Janeiro.
G. E. Teodoro Pacheco Teresina – capital 23 de janeiro de 1928 Antiga Escolas Reunidas Teodoro Pacheco.
G. E. Fenelon Castelo União – interior 23 de janeiro de 1928 Antiga Escolas Reunidas Fenelon Castelo Branco, criada em 13 de
Branco julho de 1927, com a fusão das escolas isoladas estaduais e municipal
existentes na localidade.
G. E. Matias Olímpio Teresina – capital 13 de fevereiro de 1928 Criado como tal.
G. E. José Narciso Parnaíba – interior 19 de abril de 1928 Fusão das escolas isoladas do bairro Tucuns.
G. E. Pe. Sampaio Castelo Branco Livramento (atual José de Freitas) – 19 de abril de 1928 Antiga Escolas Reunidas Padre Sampaio Castelo Branco, criada em 15
interior de janeiro de 1925 pela fusão das escolas isoladas estadual e municipal
e criação de mais uma escola.
G. E. Matias Olímpio Barras – interior 19 de abril de 1928 Antiga Escolas Reunidas Matias Olímpio, criada em 20 de maio de
1926 pela fusão das escolas isoladas estaduais existentes na
localidade.
G. E. Valdivino Tito Campo Maior – interior 12 de setembro de 1928 Fusão de duas escolas isoladas estaduais existentes no município.
G. E. Coelho Rodrigues Picos – interior 3 de novembro de 1928 Criado como tal.
G. E. Agrônomo Parentes Floriano – interior 3 de novembro de 1928 Criado como tal.
G. E. Marechal Pires Ferreira Pedro II – interior 27 de janeiro de 1930 Fusão de duas escolas estaduais existentes no município.
G. E. José Basson Cocal - povoado do muni- 27 de janeiro de 1930 Criado como tal.
cípio de Parnaíba
G. E. Barão de Gurgueia Teresina – capital 27 de janeiro de 1930 Antiga Escolas Reunidas Barão de Gurguéia, criada em 21 de janeiro
de 1929 com a ampliação do número de cadeiras da escola isolada do
mesmo nome.
G. E. Padre Freitas Piripiri – interior 29 de janeiro de 1930 Antiga Escolas Reunidas Padre Freitas, criada em 1924 com a fusão
de duas escolas estaduais e uma municipal.
Quadro – Grupos escolares criados no Piauí: 1922–1930
FONTE: PIAUÍ. Leis e Decretos do Estado do Piauí - diversos anos.
Arquivo Público do Estado do Piauí - Casa Anísio Brito.
- 78 -

Embora muitas dessas escolas tenham sido criadas, inicialmente, como escolas
reunidas, forma mais econômica de agrupar as escolas, a maioria delas, por haver sido
fundada no período em que o modelo grupo escolar estava consolidado, já foi criada
segundo este modelo.
A interiorização do modelo grupo escolar, antecipada por Parnaíba, ocorreu
paralelamente à sua criação na capital, o que fez disso uma das peculiaridades dessa
inovação: não mais somente a capital, mas o interior ia tornando–se também espaço para a
implantação de inovações educacionais e modernização da rede escolar.
O Grupo Escolar Miranda Osório foi criado em 17 de março de 1922, pelo Decreto
Estadual no 784 (Piauí, 1923), que reuniu duas escolas isoladas estaduais30 e duas
municipais existentes em Parnaíba. Esse grupo, criado como tal, não passou pela condição
de escolas reunidas, em um contexto em que na capital somente funcionava como grupo
escolar a Escola Modelo.
Se 1922 foi o ano de criação dessa escola31, o processo que levou a sua constituição
é anterior e relaciona–se com a modernização que as elites político–comerciais procuravam
realizar para fortalecer a condição de Parnaíba como cidade comercial mais importante do
Piauí. Esta modernização da cidade teve como eixos principais a urbanização32, a
construção de estradas e o desenvolvimento da instrução.
Em 1916 , ano em que teve início a construção da primeira estrada de ferro do
Piauí, o Jornal parnaibano “A Semana” colocava como etapa mais importante, após a já
conquistada estrada de ferro, a reforma da instrução :

30
Formaram o Grupo Escolar Miranda Osório apenas as Escolas Estaduais Isoladas Mista e do Sexo
Masculino. A Escola do Sexo Feminino, da professora Senhorinha Teixeira Mendes Avelino, não foi
agrupada àquelas, permanecendo multisseriada. Isso pode ser indicativo de resistência a essa modalidade
de organização escolar. Esta escola funcionava, como escola isolada, no mesmo prédio do Grupo Miranda
Osório, tendo a professora sido aposentada em 1926. Cf. Piauí (1919-1921) e Piauí (1928b).
31
O professor primário parnaibano João Campos afirma ser 1922 o marco no processo de modificação do
setor escolar da cidade. Tendo iniciado suas atividades como docente primário em 1912, ele relembra:
“Naquele tempo, o Estado não dava prédio escolar, nem mesmo mobiliário. Que milagres tinha de fazer
então um professor estadoal, para arranjar casa e tudo o mais que exigia o exercício do magistério!
Lembro-me de ter recebido, certo dia, a visita de um inspector escolar a quem, depois de apresentar meus
80 alunos, de pé uns, outros sentados em toscos bancos de cedro sem encosto, pedi que intercedesse junto
ao governo para melhorar aquêle ambiente escolar. Respondeu-me que não era só minha escola que assim
estava, e acrescentou: ‘Vá fazendo o que puder e não se preocupe muito com isso’”. (Campos 1940, p. 47).

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Lamentavel, sobremodo, é a creança piauhyense viver, em pleno século XX, seculo


de luz, de progresso e de expansão intellectual, nas trevas do analphabetismo, da
ignorancia e da perdição, e alheia aos movimentos constantes da civilisação
mundial. Parnahyba, a primeira cidade do Piauhy, depois da capital, não tem uma
instrução regular. Os nossos petit garçons, só comprehendem o que os arrastem ao
mal. São uns perdidos (especialmente os da plebe) e em suas cabecinhas infantis não
passa, siquer, um vislumbre do que nobilita, do que é essa humanidade caprichosa,
do que é a vida d’um homem sem cultura e experiencia. (...)
Profliguemos, pois, para que seja dado, aos nossos conterraneos, o caminho do bem,
do Dever e do Trabalho, por meio da instrução, que, infelizmente, tem sido, até
hoje, aqui, um sonho para os pais que não podem mandar educar os seus queridos
filhos, no Maranhão ou Ceará. (Auxan, 1916, p. 169).

Instrução e transportes seriam a chave para o desenvolvimento do potencial


produtivo da região. Rebelo (apud Auxan, 1916, p. 169), em 1921, resumia as
reivindicações da elite político–econômica de Parnaíba: caminhos de ferro e de rodagem,
canais e portos, escolas e bibliotecas – “tudo o mais é absurdo, caro e contraproducente”.
Inaugurado em 1922, o Grupo Escolar Miranda Osório veria sua condição
modificada somente em 1925, quando iniciou–se a construção de um prédio para o seu
funcionamento, com planta33 projetada em São Paulo: “no gênero é o maior do Piauhy. O
mobiliario, o distincto administrador [coronel José Narciso da Rocha Filho] pretende
escolher, pessoalmente, no sul, dotando, assim Parnahyba, de um bello palacete para o
Grupo Escolar Miranda Osório, que já conta com matrícula superior a duzentos alumnos.”
(Os municípios, 1925).
A escola moderna estava, agora que possuía prédio próprio e equipamentos, com o
feitio a ela apropriado. Complementava esse quadro de efetivação da modernização a
presença, em 1927, do reformador da instrução pública municipal, contratado em São
Paulo: Luiz Galhanone34. O jornal O Piauhy vinculou, inclusive, a vinda do professor
paulista à Parnaíba com a construção do prédio para o Grupo Escolar Miranda Osório e
todo o imaginário de modernidade existente e mobilizado no momento da instalação dessa
escola:

32
Correia e Lima (1945, p. 62) indicam como marco do processo de organização do espaço urbano da cidade
de Parnaíba o ano de 1914 “(...) com o levantamento da Cidade Nova, formada em quarteirões, cada um
com 100 metros em quadro, e com ruas e avenidas, respectivamente, de 20 e 30 metros.”
33
A elaboração deste projeto foi, segundo Gonçalves (1980), do engenheiro Samuel dos Santos.

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projecto de um edificio escolar paulista; mobiliario e material escolar paulistas (pois


a Municipalidade de Parnahyba já os tinha adquirido também em São Paulo) era
mister mesmo que se esforçasse mais um pouco para obter um organisador e
orientador paulista para o seu ensino” (A instrucção, 1927).

A ação, contudo, do reformador contratado em São Paulo ficou restrita à


municipalidade de Parnaíba.
Na avaliação que Luiz Galhanone fez da instrução pública em Parnaíba, vemos a
importância do Grupo Escolar Miranda Osório na cidade, bem como a construção de uma
divisão na história dessa escola, considerando sua existência até então como antiga e
procurando demarcar o período que se iniciava como o da concretização do modelo grupo
escolar e da modernização da instrução no município. Ao “antigo” grupo escolar faltava,
segundo Galhanone, espírito de organização e orientação pedagógica, o que era revelador
do estado de “anarquia” e “desordem” do ensino na cidade:

Como pode, de facto, haver organisação em um estabelecimento de ensino, no qual


a começar pelo predio em que funcciona, tudo é falho? Predio anti–hygienico e
anti–pedagogico; sem mobiliário adequado e conveniente; sem material escolar
apropriado aos diversos serviços do grupo; sem regimento interno que estabeleça
medidas de ordem collectiva e especifique tambem as attribuições de cada um de
seos funccionarios; sem empregados necessarios á bôa marcha do serviço. Emfim,
tudo sem o menor espirito de ordem e disciplina – base fundamental para o sucesso
de qualquer empresa. (...).
Como pode haver orientação pedagogica aqui, quando encontrei classes no Grupo
Escolar, formadas com mais de cem alumnos até. E, note–se, classes de
analphabetos. Não se observa aqui uniformidade nos methodos de ensino, a começar
pela maneira, como se processam as aulas, em que se pratica ainda o methodo
individual – aberração completa do principio que rege hoje o ensino moderno, o
qual é a intuição – analytica. Vi classes inteiras em que varios são os livros de
leitura adoptados, o que confirma o que acabo de dizer. Agora é que eu trouxe,
autorisado pelos poderes publicos municipaes, todo o apparelhamento, não talvez
em quantidade sufficiente, para se imprimirem ao ensino no Grupo Escolar os
processos modernos de pedagogia e methodologia, observados no ensino das
diversas materias do programma do ensino primario. Posso, entretanto, declarar que
vi, dependurado de uma das paredes do velho Grupo Escolar, um mappa de
linguagem para o ensino de leitura analytica. Não sei, porem, se o mesmo era
utilisado no ensino desta disciplina (Instrucção, 1927).

Com essa modernização o Grupo Escolar Miranda Osório assumiria,


momentaneamente, o papel destinado à Escola Modelo e tornar–se–ia referência de escola

34
Era diretor do Grupo Escolar João Kopke, da capital paulista. Silva (1987) o qualifica de ditador
pelo papel que desempenhou implantando as reformas do ensino municipal.

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moderna no estado, embora sua influência sobre a educação escolar tenha sido restrita à
condição de exemplo a ser seguido. Os indícios de uma influência mais duradoura deste
Grupo Escolar na educação do estado como um todo restringiu–se ao estabelecimento de
um novo programa das matérias do ensino primário, feito segundo o programa então em
vigor nos grupos escolares de São Paulo, aprovado pelo Conselho Superior de Educação e
adotado para todas as escolas do Piauí (Instrucção, 1928).
A instalação do Grupo Escolar Miranda Osório no novo prédio deu–se a 15 de
junho de 1927 com uma matrícula de cerca de quinhentos alunos, com dez classes “(...)
todas regidas por professoras diplomadas pelas Escolas Normaes de Theresina e do
Maranhão” (Piauí, 1929)35.
Escola moderna, urbana e civilizadora: esse Grupo Escolar deu um novo impulso à
modernização da escola, no Piauí, e foi utilizado como um indicador da civilidade e do
desenvolvimento de Parnaíba. Tornou–a uma referência em matéria de educação,
recebendo comissões oficiais de professoras da capital e de outras cidades do interior do
estado, como as compostas pelas professoras Josefa Ferraz, então diretora do recém criado
Grupo Escolar Antonino Freire, e Maria Antonieta Burlamaqui, que fizeram nesta cidade,
em 1928, sob orientação de Galhanone, “(...) um curso de aperfeiçoamento, segundo os
methodos da pedagogia moderna”36; e a da professora da Cadeira do Sexo Masculino de
Pedro II, Alzira de Resende Costa, enviada à Parnaíba em setembro de 1929 para
“exercitar–se nos novos methodos de ensino, durante um mez, no Grupo Escolar Miranda
Osório” (Piauí 1863 – 1930)37.

A modernização da escola primária na capital: da opção pelas escolas reunidas ao grupo


escolar

35
O corpo docente ser totalmente composto por professoras normalistas era um indicador da qualida-
de que se desejava imprimir a esta escola modernizada.
36
Sobre a ida destas professoras a Parnaíba, cf. Instrucção (1927); A actuação (1928); Instrucção (1928).
37
Embora fosse possível que professoras do interior do Estado fossem à Parnaíba inteirar-se dos
“novos métodos de ensino”, a estratégia do governo era de privilegiar as professoras da capital para, a partir
delas, expandir as inovações às escolas do interior: “Com a vinda desse techinico [Luiz Galhanone], fôram,
em commissão de estudos, a Parnahyba, algumas professoras estaduaes, que, apprehendendo e assimilando
intelligentemente as modalidades novas dos methodos educatorios, vão applicando a generalidade dos seus
principios à nossa Capital, de onde o convivio com as collegas os diffundirá, com proveito, pelo Piauhy”.
(Piauí [1928]).

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Em 1926, era criado legalmente em Teresina seu primeiro grupo escolar: o Grupo
Escolar Demóstenes Avelino, com quatro anos de curso, sendo o último complementar.
Essa escola foi constituída pela junção das Escolas Isoladas Frei Serafim e Casusa Avelino.
Portanto, a capital teve seu primeiro grupo escolar quatro anos após ter sido criado o
de Parnaíba. Isso revela a opção do Governo Estadual pelo modelo escolas reunidas ao
invés do grupo escolar, uma vez que as escolas da capital eram as que mais se beneficiavam
com as modernizações propostas pelo poder estadual. Explicitou esse fato, em 1926, o
governador Matias Olímpio de Melo (1924 – 1928), para quem os grupos escolares eram
inadequados para o Piauí pelos custos que implicavam, sendo mais adequado o modelo das
escolas reunidas, que, respondendo a necessidade de modernização escolar,
proporcionavam economia aos cofres estaduais38.
Em 1924 já havia sido iniciada a construção do prédio para o Grupo Escolar
Demóstenes Avelino (Piauí, 1924), sendo este, na capital, o primeiro prédio construído
especificamente para ser escola primária. Desse modo, embora tenha sido criada somente
em 1926, essa escola teve seu início em 1924, com a construção do edifício para abrigá–la.
Em 1925, o Governador Matias Olímpio de Melo anunciava o retardamento da conclusão
do prédio da escola (Piauí, 1925), inaugurado em 12 de outubro do mesmo ano. Até 1930,
foram construídos os seguintes prédios escolares: o do Grupo Escolar Demóstenes Avelino;
o do Grupo Escolar Matias Olímpio e o do Grupo Escolar Gabriel Ferreira, em Teresina39;
além do prédio do Grupo Escolar Miranda Osório, em Parnaíba. (Gonçalves, 1980, p. 257).
A importância que o Grupo Escolar Miranda Osório passou a ter no panorama
educacional da época pode ser avaliada por sua escolha como ponto de partida da festa
comemorativa da “fundação dos cursos primários no Brasil”, no dia 15 outubro 1927, cujo
encerramento deu–se num outro estabelecimento importante do período a Escola Modelo.”
(Ensino, 1927). Essas comemorações serviram também para delimitar as instituições
melhor aquinhoadas com a modernização escolar na capital: as solenidades concentraram–
se no Grupo Escolar Demóstenes Avelino, na Escola Modelo e na Escola Normal como

38
Matias Olímpio explicita isso em mensagem de 1926, ao afirmar: “A meu ver, e a observação m’o tem
demonstrado, o typo de escolas que mais nos convém, são as Escolas Reunidas: menos despesas, maior
aproveitamento ás classes, mais facil installação” (Piauí 1926).
39
Sobre a arquitetura dos prédios destas escolas, cf. Silveira (1999).

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forma simbólica de demonstrar que havia sido modificado o lugar da educação na


sociedade piauiense e que esta era um sistema modernizado.
Em 1928, o modelo grupo escolar foi ampliado em Teresina, com a criação dos
Grupos Escolares José Lopes, Antonino Freire, Teodoro Pacheco e Matias Olímpio. Esse
modelo de instituição escolar passava a se consolidar como a representação máxima da
modernidade escolar seja pedagógica, seja de instalações materiais e recursos didáticos.
Nesse período, além da capital, alguns municípios do interior também implantavam seus
grupos escolares, apresentados nos discursos oficiais como o modelo ideal de escola
primária, porém pouco adequado ao Piauí.
Em 1930, era criado o Grupo Escolar Barão de Gurguéia, sendo instalado “em
próprio estadual recentemente reconstruído, à praça Saraiva, desta cidade”. Essa escola,
conhecida como a “escola dos filhos dos soldados”, realizou a trajetória comum à maioria
das escolas que terminaram por se tornar grupo escolar: escola isolada, escolas reunidas e,
por fim, grupo escolar.
Estradas e grupos escolares em prédios apropriados eram as soluções apontadas
para o advento do progresso no Estado; comunicação e instrução para vencer o desafio do
isolamento do sertanejo, presa do banditismo por falta desses elementos que o integrariam à
nacionalidade. Progresso marcado, acima de tudo, pela construção de novas referências
arquitetônicas para a cidade, dando visibilidade e tornando vistosos os novos prédios
escolares, agora, finalmente, tornados palácios e “repartições públicas de verdade” –
separados das casas dos docentes e das casas precariamente transformadas em escolas.

Expandindo a modernidade escolar: o grupo escolar nos outros municípios ou “princípio


querem as coisas”

Embora Parnaíba tenha sido o principal marco da interiorização do modelo grupo


escolar, esse movimento não ficou, como já vimos, restrito apenas a esta cidade. Diversos
outros municípios tiveram constituídos seus grupos escolares, que passavam a indicar a
importância da cidade e a marcar a sua paisagem urbana40.

40
Bandeira (1983, p. 32), considerando a participação do Piauí na divisão do trabalho no Brasil, destaca, para
o período que estamos tratando nesse estudo, duas fases: a da produção pecuária e a do extrativismo
vegetal. Esta segunda fase, que mais de perto diz respeito ao período aqui analisado, corresponderia à

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O novo governo precisava “irradiar esta ação [a que exercia no melhoramento da


instrução da capital] pelo interior”. Matias Olímpio de Melo (1924–1928), avaliando de
modo positivo o resultado alcançado, dizia ter podido

(...) instalar as Escolas Reunidas ‘Padre Sampaio’, em José de Freitas, antigo


Livramento, cujo Prefeito, Antônio de Almendra Freitas, adquiriu e destinou a seu
funcionamento um prédio regular de amplas acomodações, oferecendo à
Municipalidade todo o excelente mobiliário e várias coleções de quadros
indispensáveis ao ensino.
Os Municipios, estimulados pela ação do Estado, faziam sacríficios pela causa do
ensino: Miguel Alves adquiriu o material necessário para dar inicio à construção
das Escolas Reunidas ‘Alvaro Mendes’: Esperantina, Barras, Buriti dos Lopes,
Luzilândia, José de Freitas, Piracuruca, Alto Longá, Campo Maior, Piripiri e Pedro
II adquiriram em 1925 mobiliário completo para suas Escolas. Sobrepujando aos
demais municipios, destacou–se o de Parnaíba, cujo Prefeito de então, Coronel José
Narciso da Rocha Filho, valendo–se da minha ida ao Sul do país, em 1926, me
pediu que conseguisse a vinda de um técnico para remodelar a Instrucção naquele
municipio. (...).
Este movimento, iniciado pelos municipios do norte, ramifica–se para o centro e se
faz sentir em Castelo, onde a Escola entregue outrora a leigos, sem orientação
pedagógica, é apparelhada de moderno mobiliário e entregue a professora
normalista. (Piauí, 1925, p. 68).

As municipalidades adaptavam ou construíam prédios escolares e equipavam–nos,


além de procurar atrair normalistas para o exercício da docência nessas escolas
modernizadas.
O ano de 1928 é um marco no processo de interiorização do modelo grupo escolar,
com a criação desse tipo de escola nos municípios de União, Livramento (atual José de

inserção do Piauí no mercado internacional. Na fase de predomínio da produção pecuária, em termos de


urbanização, caracterizava-se o Piauí por ter “(...) um fraco desenvolvimento das cidades, pois as unidades
produtoras agrárias, além de utilizarem intensivamente o trabalho compulsório, se caracterizavam por um
alto grau de auto-suficiência, ou seja, produziam quase tudo que necessitavam. Conseqüentemente, as
relações com outras unidades e a circulação monetária eram quase nulas, o que praticamente não permitiu o
crescimento das cidades.” Já o período dominado pelo extrativismo vegetal caracterizava-se pelo “esboçar,
no Estado, um maior desenvolvimento urbano. Tal desenvolvimento foi possibilitado por importantes
modificações nas relações de trabalho nas unidades produtivas, as quais já não eram mais escravistas, e sim
semimonetarizadas, na medida em que uma parte da reprodução da força de trabalho utilizada era
remunerada em dinheiro, permitindo a formação de um incipiente mercado de bens. Além disso, ao longo
do Vale do Rio Parnaíba, desenvolveram-se cidades que recolhiam os produtos extrativos para serem
enviados às casas exportadoras em Parnaíba, para posterior envio, pelo ‘porto’ de Parnaíba-PI e Tutóia-
MA, ao exterior” (p. 33). Segundo Nunes e Abreu (1995), com a mudança da sede da Província de Oeiras
para Teresina, no século XIX, a região centro-norte do estado passou a ter um maior dinamismo no que diz
respeito à implantação de núcleos urbanos – vilas e cidades. Para essas autoras, o extrativismo seria o
responsável por uma significativa dinamização de vários municípios piauienses.

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Freitas), Barras, Campo Maior, Picos e Floriano (Piauí, 1928a). Interiorização esta
concentrada na região norte do Piauí, da qual excluem–se apenas Picos e Floriano.
No discurso que fez na inauguração do Grupo Escolar Valdivino Tito, em 3 de
fevereiro de 1929, Cristino Castelo Branco (1929, p. 58), então Diretor Geral da Instrução
Pública, apesar de ter afirmado serem preocupações diárias do governo piauiense “a
creação de escolas, a fundação de grupos escolares, a diffusão do ensino por todos os
recantos da terra amada (...)”, dizia que a verdadeira modernidade escolar dependia da
professora:

É uma verdade sediça em pedagogia, que o mestre faz a escola, o que quer dizer que
sem educadores habeis, treinados, competentes, e apaixonados pelo seu officio, não
haverá nunca, em parte alguma do mundo escolas dignas desse nome. Um pedagogo
insigne escreveu alhures que um professor consummado, sem outro tecto que a
ramaria de um carvalho, nem mais livros que as suas folhas, faz mais, ensina mais
que um mau professor na escola em que nada falte.
Assim, á luz dessa verdade evidente, declarando, como declaro, inaugurado este
Grupo, que se acha apparelhado de todo o material escolar necessario, e
magnificamente installado em um predio de amplas accomodações, espero e confio
que as educadoras de Campo–Maior saibam corresponder aos desejos e á confiança
do governo, e trabalhem e se esforcem, intelligentemente, para que o Grupo
Valdivino Tito venha a ser, de facto, e em breve, um ponto luminoso no mappa
intellectual do Piauhy.

Esse discurso procurou unir o que a reforma de 1910 visava marcar como
modernidade escolar: professora normalista e grupo escolar. Incorporava, contudo, os
desencantos que o Governo tinha com a professora normalista e que ficou patente na crise
de 1922, quando se declarou a insuficiência da feminização do magistério e cogitou–se a
necessidade do celibato. Por isso o prédio e os recursos didáticos aparecem como
dependentes da competência das professoras.
Como boas professoras independem de prédios e recursos didáticos, a existência
destes era um luxo que não podia ser extraviado. O discurso de Cristino Castelo Branco
procurava demonstrar que o Governo cumpria seu papel e que a responsabilidade sobre os
destinos da escola inaugurada era das professoras.
Assim, até 1930, dez municípios do interior do Piauí implantaram seus grupos
escolares, sendo que, destes, sete situavam–se na região Centro–Norte do Estado e três na

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região Sul41. Municípios estes mais dinâmicos economicamente, principalmente as


localidades beneficiadas com o surto de desenvolvimento proporcionado pelo extrativismo.
Cabe destacar, ainda, iniciativas como a do desembargador Joaquim Vaz da Costa42 (1924,
p. 19), ex–juiz da comarca de São João, que oferecia o valor de seu livro Arengas e
retalhos, de 1924, com uma edição de seis mil exemplares, “em benefficio da construcção
de um predio offerecido ao Estado do Piauhy, para a fundação de um grupo escolar na
cidade de S. João.”43 Iniciativas estas que, embora não tenham logrado seu intento, revelam
a existência do reconhecimento da importância do grupo escolar como ideal de escola
moderna.

Referências bibliográficas

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domingo, 20 janeiro, 1928.

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sexta–feira, 10 junho 1927.

AUXAN, René. “Fragmentos”, in: A Semana, Parnaíba, PI, anno 1, n. 3, domingo, 3


dezembro 1916.

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CEPRO, Teresina, n. 1, v. 9, julho/dezembro 1983, pp. 31–50.

BRITTO, Bugyja. (1977). Narrativas autobiográficas 1. Rio de Janeiro: Folha Carioca.

41
Em 1925, Matias Olímpio de Melo fazia um balanço da participação dos municípios no finaciamento da
expansão escolar: “Já no corrente anno, adquiriram mobiliario completo os municipios de Bôa Esperança,
Barras, Burity dos Lopes, Porto Alegre, Livramento, Piracuruca e Alto-Longá, e, em parte, os de Campo
Maior, Peripery e Pedro II. Espero com o concurso de muitos dos representantes do povo, dignos chefes
locaes, que o movimento pela educação em breve se annucie tambem na zona do sul do Estado, fechando-
se, assim, o cyclo de acção em prol da grande causa, por que me bato, e por que deverão pugnar todos os
piauhyenses. Quanto ao centro, é com satisfação que transmitto á Camara que o movimento pelo ensino
popular já se faz sentirem Castello, onde a escola, outrora entregue a leigos, sem orientação pedagogica,
hoje, bem apparelhada e á frente distincta normalista, é motivo de justo orgulho para a localidade.” (Piauí
1925).
42
Nasceu em São Raimundo Nonato (PI), em 1886, e morreu em Teresina, em 1972. Era Bacharel em
Direito, formado pela Faculdade de Recife, em 1909.
43
Nesse mesmo livro, afirma Vaz da Costa (1924, p. 19): “Convicto de que, só pela instrucção e pela
educação, pela cultura da intelligencia e pela elevação do caracter, seja possivel conseguir-se o
soerguimento de uma sociedade ao nivel em que, cada um, tendo a nitida comprehensão de seus deveres,
saiba reclamar e defender os seus direitos, tomei aos hombros o, para mim, pesado encargo de adquirir, por
meio de conferencia, o peculio necessario á construcção de um predio que será offerecido ao Estado do
PIAUHY, para a fundação de um grupo escolar em S. JOÃO.”

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CAMPOS, João. (1940). “Parnaíba e suas escolas”, in: Almanaque da Parnaíba, Parnaíba,
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___. “Doc. Man. de 27 de setembro de 1929”, in: DIRECTORIA GERAL DA


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___. Governador, 1904–1907 (Álvaro de Assis Osório Mendes). Mensagem apresentada à


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Assis Osorio Mendes, Governador do Estado. Therezina, Typ. do Piauhy, 1905.

___. Governador, 1904–1907 (José Lourenço de Moraes e Silva). Mensagem apresentada à


Camara Legislativa a 1o de junho de 1908, pelo Exm. Sr. Desembargador José Lourenço
de Moraes e Silva, Presidente do Tribunal de Justiça. Therezina, Typ. do Piauhy, 1908.

___. Governador, 1909–1910 (Manoel Raymundo da Paz). Mensagem apresentada à


Camara Legislativa no dia 10 de março de 1910 pelo Exm. Sr. Coronel Manoel Raymundo
da Paz, presidente da mesma Camara no exercício de Governador do Estado. Therezina,
Typ. do Piauhy, 1910a.

___. Governador, 1910–1912 (Antonino Freire da Silva). Mensagem apresentada à


Camara Legislativa a 1º de junho de 1910, pelo Governador do Piauhy Antonino Freire
da Silva. [S.l., s.n.], [1910?]b.

___. Governador, 1910–1912 (Antonino Freire da Silva). Mensagem apresentada à


Camara dos Deputados, pelo Exm. Sr. Dr. Antonino Freire da Silva, Governador do
Estado, no dia 1o de junho de 1911. Therezina, Imprensa official, 1911.

___. Governador, 1920–1924 (João Luiz Ferreira). Mensagem apresentada à Camara


Legislativa, pelo Exm. Sr. Dr. João Luiz Ferreira, Governador do Estado, no dia 1o de
junho de 1924. Therezina, Typ. do Piauhy, 1924.

___. Governador, 1924–1928 (Mathias Olympio de Mello). Mensagem lida, a 1o de junho


de 1925, perante a Camara Legislativa do Estado do Piauhy. Therezina, [s.n.], 1925.

___. Governador, 1924–1928 (Mathias Olympio de Mello). Mensagem lida, a 1º de junho


de 1926, perante a Camara Legislativa do Estado do Piauhy, pelo Governador Exm. Sr.
Dr. Mathias Olympio de Mello. Therezina, [s.n.], 1926.

___. Governador, 1924–1928 (Mathias Olympio de Mello). Mensagem lida, a 1º de junho


de 1928, perante a Camara Legislativa do Estado do Piauhy, pelo Governador Exm. Sr.
Dr. Mathias Olympio de Mello. [S.l., s.n.], [1928?].

___. “Lei no 527, publicada em 06 de julho de 1909”, in: PIAUÍ. Leis e Decretos do Estado
do Piauhy do Anno de 1909. Therezina, Typ. do Piauhy, 1910c.

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apresentado ao Exm. Snr. Dr. Miguel de Paiva Rosa. M. D. Governador do Piauhy pelo
Dr. Luiz de Moraes Correia, Secretário de Estado do Governo do Piauhy, em 30 de abril
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de Ciências e Letras.

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- 91 -

GRUPOS ESCOLARES NA PARAÍBA:


INICIATIVAS DE MODERNIZAÇÃO ESCOLAR (1916–1922)44

Antonio Carlos Ferreira Pinheiro.45

As primeiras incursões e debates políticos para a criação de grupos escolares na Paraíba.

Este artigo tem como objetivo analisar as primeiras tentativas de modernização da


organização escolar na Paraíba no período de 1916 a 1922. A criação de grupos escolares
insere-se no contexto de grandes transformações culturais e sociais, porque do ponto de vista
econômico e político o estado paraibano manteve, ainda por muitos anos, a sua base produtiva
assentada na atividade agro-pastoril. Na perspectiva política o coronelismo e o mandonismo
deram as marcas de como os negócios do Estado foram administrados.
O primeiro grupo escolar paraibano foi criado em 1916, entretanto a notícia mais
remota que temos acerca da idéia de criação de grupos escolares na Paraíba remonta ao ano de
1908, quando o presidente do Estado, em mensagem enviada à Assembléia Legislativa,
ressaltou a necessidade de realizar uma reforma na instrução pública, apontando a importância
da criação dos grupos escolares para a “moderna educação”:

Seria (...) de grande vantagem e faço votos para que o meu honrado successor
adopte o mais depressa possivel a recommendada e utilissima instituição dos
grupos escolares, reforma que tão largos e fundos beneficios tem produsido
nos Estados que a introdusiram, como o mais proveitoso dos systemas de
ensino até hoje conhecido. (Parahyba do Norte, Estado da, 1908, p.13)46

No ano seguinte, o mesmo presidente propunha uma contínua substituição das “escolas
comuns estaduaes pelos grupos escolares que são instituições mais perfeitas e efficazes para a

44
- Este texto é resultado de parte da pesquisa intitulada: Velhos Grupos Escolares na Paraíba (1916-1929):
subsídios históricos para uma proposta de tombamento, desenvolvido em conjunto com o projeto de monitoria
da disciplina História da Educação I e II – Curso de Pedagogia, intitulado: Aprendendo e ensinando a partir do
uso de documentos. Participaram da pesquisa as alunas bolsistas: Rosinete Veloso Camelo, Helen Haline
Rodrigues de Lucena e Maria das Graças Gomes Coelho.
45
- Professor do Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Federal da Paraíba. Coordenador do
Grupo de Trabalho História da Educação da Paraíba, vinculado ao HISTEDBR. Este grupo de pesquisadores
tem se dedicado, prioritariamente, à história das instituições educacionais paraibanas. E-mail:
acfp@terra.com.br
46
- Documento do Arquivo Nacional. Doravante utilizarei apenas A N.

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educação primária” (Parahyba do Norte, Estado da, 1909, p.22). Os estímulos para a criação de
grupos escolares também se estenderam às administrações municipais. João Lopes Machado,
demonstrou a intenção em estabelecer acordo com as municipalidades nos seguintes termos: “A
medida que um município tiver um prédio escolar, construído segundo o typo archthetonico
adoptado, o governo do Estado dar-lhe-á um grupo escolar em substituição às escolas isoladas,
incumbindo-se da manutenção do mesmo.” [idem, ibidem].47 Nesse mesmo ano foi publicada a
lei nº 313, de 18 de outubro, que autorizou o poder executivo a instituir grupos escolares nos
municípios.
O discurso da elite paraibana sobre a necessidade da criação de grupos escolares no
Estado reportava-se ao fato de outros Estados do Brasil já terem, há alguns anos, iniciado o
processo de implantação e expansão dessas unidades escolares, consideradas instituições de
ensino mais úteis, (Parahyba do Norte, Estado da, 1909, p.23), por ser “incontestavel a
superioridade que decorre desses institutos sobre as escolas isoladas, na diffusão do ensino
popular”(Parahyba do Norte, Estado da, 1910, pp.17-18).
No entanto, é interessante ressaltar que a Escola Prática ou Escola Modelo, anexo da
Escola Normal  assim denominada em 1896, passou a se chamar Grupo Escolar Modelo, a
partir de 1910. Esse grupo escolar tinha por objetivo servir de espaço para o exercício das
atividades pedagógicas dos alunos que estavam se preparando para o magistério, seguindo os
“moldes paulistas”.
Para o Presidente da Província da Parahyba do Norte em 1910, o Grupo Escolar
Modelo era uma instituição muito importante para o desenvolvimento da instrução pública
local, e era ali que “os alumnos mestres [deveriam] apparelhar a sua capacidade profissional,
formar a sua educação para o magisterio, disciplinar o seu espirito na arte e na sciencia do
ensino, fins incomparavelmente mais elevados do que o ensino elementar commum” (Parahyba
do Norte, Estado da, 1910, p. 20).
Associada a essa experiência, no âmbito do funcionamento da Escola Normal, quase
sempre os gestores da instrução pública salientavam o significado social e pedagógico dos
grupos escolares, e em setembro de 1911, a Diretoria Geral da Instrução Pública elaborou e
encaminhou ao presidente do Estado um projeto de reforma da instrução primária, que dava
nova estrutura organizacional escolar paraibana destacando dentre outros, os seguintes aspectos:

47
- Documento do Arquivo do Estado de São Paulo, doravante apenas AESP.

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“divisão do ensino em elementar e complementar; o ensino será ministrado em escolas isoladas


e grupos escolares; as disciplinas professadas nas escolas serão distribuídas por quatro annos,
sendo o curso complementar praticado no último anno e somente nos grupos escolares”
(Parahyba do Norte, Estado da, 1911, p. 20. Grifo meu). 48
No mês seguinte, em 14 de outubro, mediante a lei nº 360, ficou estabelecido que “o
ensino primario estadoal [seria] ministrado em escolas isoladas e grupos escolares, distribuidos
de accordo com a população escolar e conveniencia do bem publico” (Almanach do Estado da
Parahyba de 1912, p. 644).49 Mais adiante, determinava a referida lei que “cada grupo escolar
[teria], além de um professor para cada escola, um director, incumbido de sua superintendencia
administrativa e tecnica” (Idem, p. 645). Tais artigos evidenciam a mesma concepção que
inicialmente tiveram os gestores e intelectuais paulistas acerca dos grupos escolares, conforme
Reis Filho (1995) sintetizou, ou seja, parece-nos que a idéia que se tinha de grupo escolar era a
de apenas “reunir ou agrupar”, num mesmo prédio, várias cadeiras isoladas, sob uma
superintendência administrativa e técnica, mantendo-se, contudo, sua autonomia pedagógica.
Cabe chamar a atenção para a imprecisão quanto à utilização dos termos “escolas
reunidas”, “escolas agrupadas” ou “grupos escolares”, ainda mais evidente quando lemos o art.
12 da mesma lei, segundo o qual “as escolas primarias estadoaes, isoladas ou agrupadas, serão
divididas em trez entrâncias.”
Em meio a esse movimento de mudança, a idéia inicial de apenas situar fisicamente
várias cadeiras isoladas em um mesmo prédio escolar terminou por forjar dois outros tipos de
instituição escolar  as escolas reunidas ou agrupadas e os grupos escolares propriamente ditos
–, o que acabou por determinar a coexistência de dois modelos de organização escolar: o
modelo tradicional, materializado nas cadeiras isoladas e as escolas reunidas ou agrupadas e os
grupos escolares. Aqui nos deteremos em analisar os grupos escolares.50
Apesar de já existirem leis que autorizavam a criação de grupos escolares pelos
poderes estadual e municipal, o primeiro grupo escolar da Paraíba somente foi criado em 1916,
pelo decreto nº 778 de 19 de julho.

48
- Documento do AN.
49
- Documento do Setor de Obras Raras da Biblioteca Central da Universidade Federal da Paraíba – Campus I.
Doravante apenas BC–UFPB.
50
- Para maiores informações sobre escolas reunidas ou agrupadas ver trabalho de Pinheiro (2002).

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O Grupo Escolar Dr. Thomaz Mindello foi constituído, inicialmente, de três escolas,
sendo: a) uma escola mista do 1º grau para crianças de cinco a sete anos; b) uma escola do 2º e
3º graus para o sexo masculino, e c) uma escola do 2º e 3º graus para o sexo feminino.
Semelhante ao que se passou nos grupos escolares de outras unidades da federação, no da
Paraíba, também, no primeiro momento, aglutinou cadeiras isoladas que já funcionavam em
outros locais e foram transferidas para o prédio do grupo escolar.51 O período entre a criação
oficial do Grupo Escolar Dr. Thomaz Mindello e a sua inauguração, ocorreu em um espaço de
tempo relativamente pequeno, uma vez que naquele mesmo decreto foram abertos os créditos
necessários para sua consecução. Na verdade, guardou apenas o período necessário de entrega
de um edifício à diretoria geral da instrução pública. A inauguração ocorreu em setembro de
1916.

Festividades de inauguração do primeiro grupo escolar paraibano: Grupo Escolar Thomaz


Mindello.

A inauguração do primeiro grupo escolar paraibano, em 09 de setembro 1916, foi bem


noticiada na imprensa local, dando destaque elogiosos ao benemérito cidadão da instrução
paraibana- Dr. Thomaz de Aquino Mindello, intelectual e político, que ocupara cargos na
estrutura administrativa do Estado e teve assento no legislativo paraibano. Professor
conceituado do Lyceu Parahybano, da Escola Normal e advogado da Great Western. Era
considerado pelos seus ex-alunos professor respeitado pela “austeridade [que] proporcionou
sempre aos seus discípulos o modelo de educador enérgico e ciente, inflexível no exigir a
moralidade mais íntegra e o cumprimento mais restrito do dever.”52 O seu nome foi indicado
para figurar no frontespício do primeiro grupo escolar, por ser considerado pela elite paraibana
intelectual, professor e gestor público modelo que deveria ser copiado pela infância uma vez que
seu nome era “sinônimo da virtude, da ciência do patriotismo”(Diário do Estado, 14/09/1916)53

51
- No artigo 3º e no parágrafo único do Decreto nº 778 de 15 de fevereiro de 1916, encontra-se: “ficam
transferidos para o grupo a atual 2ª cadeira do sexo masculino da capital e a escola mista da povoação de
Bananeiras e criada a cadeira do sexo feminino. A atual 3ª cadeira do sexo masculino da capital passa a ser
denominada de 2ª cadeira.”
52
- Depoimento de Manuel Tavares Cavalcante publicado no Jornal Diário do Estado de 14 de setembro de 1916.
53
- Documento do Instituto Histórico e Geográfico Paraibano. Doravante apenas IHGP.

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A festividade de inauguração contou com o “regular comparecimento de famílias e


pessoas gradas”, além das presenças do presidente do Estado, do Arcebispo Metropolitano, que
fez a benção do edifício, do Diretor da Instrução Pública, do Diretor do Lyceu Parahybano, bem
como de muitos professores. Toda a solenidade foi acompanhada pela banda musical da força
pública. A organização da solenidade ficou a cargo das alunas e professoras da Escola
Normal.54 Eis a programação da festa:

Benção do edifício
Instalação do grupo – Alocução análoga ao ato pelo Diretor da Instrução
Hasteamento da bandeira nacional, sendo entoado o hino pelos alunos das
Escolas Normal, Modelo e Grupo.
Hino dos livros – pelos alunos do 3º grau da Escola Modelo
A cidade da luz – Luiz Delfino por Izaurina Mattos Dourado
A boneca – caçoneta- por Zilda Teixeira
Saudação ao grupo recentemente instalado – pela senhorita Noemia Ribeiro,
aluna da Escola Normal.
A Escola- recitativo – por Avany Fonseca
A professora – comédia – por Oliva Carneio, Maria Luiza Moraes, Maria da
Penha Vinagre e Maria de Lourdes Coelho
Os edifícios – de Valentim Magalhães, por Heloysa Almeida
A locução de agradecimento – pelo diretor do grupo.
As flores – Canto – pelos alunos do 1º grau da Escola Modelo
Um dia de anos – monólogo – por Maria de Lourdes Coelho
As duas lágrimas – recitativo – por Izaurina de Mattos Dourado
Saudação ao patrono do grupo – pelo aluno Augusto da Silveira Paulo
O gaturano – canto por Jenny Tavares Benevides
Hino Nacional – pelos alunos das escolas Normal, Modelo e Grupo. (Diário
do Estado, 23/07/1916)

Ao observamos o conteúdo da programação podemos inferir que a mesma foi marcada


por uma perspectiva a qual os historiadores passaram a denominar de nacionalismo-patriótico,
tão comum nos discursos dos anos 10 e 20 dó século XX. Não é à toa que a solenidade foi
iniciada com o hasteamento da bandeira nacional e concluída com o hino nacional.
Esse aspecto, também pode ser observado no discurso proferido pelo Diretor da
Instrução Pública, Manoel Tavares Cavalcanti, que ao analisar a problemática da educação
apontou o analfabetismo como um monstro que aniquilaria as esperanças patrióticas (Diário do
Estado,14/09/1916). O monstro, todavia, tenderia a ser derrotado na Paraíba do Norte já que a

54
- Ver notícias publicadas no jornal Diário do Estado.

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partir de 1915, propiciado por um surto de elevado patriotismo entrou na “rota da expansão
escolar”.

Ainda não é decorrido um ano, senhores, e o número de localidades servidas


de escolas está quase duplicado e esta capital conta entre os seus edifícios este
prédio em que ora celebramos esta modesta festa do espírito e entre as suas
oficinas do saber este grupo escolar ... (A Imprensa, 14/09/1916).

Alusões aos ideais revolucionários franceses foram feitos, lembrando que seria
“impossível fazer a felicidade pública sem a mais larga distribuição do ensino, pois, como dizia
Danton, (...) depois do pão a instrução é a primeira necessidade do homem.”(Idem, Ibidem). Ao
mesmo tempo delimitou que a escola tinha como finalidade e missão o dever para com a pátria
formar bons cidadãos brasileiros.

Portanto ela não deve ser exclusivamente um veículo de conhecimentos


teóricos e práticos, mas tem de fortalecer a alma, criar o caráter, gerar o
patriotismo.(...) ela deve ser intelectual, deve ser moral e deve ser nacional.
Sem este tríplice aspecto, será sempre falho o ensino e desvirtuada estará a
função pedagógica (...)
O conhecimento [da] pátria, de modo cabal e completo, deve o professor
induzir nos anos infantes o amor ao torrão natal, o desejo servil ou até o
sacrifício.
Amar a pátria e cultivar e solidificar as afinidades morais que ligam os
membros do território, é conhecer e venerar as suas tradições, e triunfar com
as vitórias passadas e sofrer com as suas dores extintas. É zelar suas
instituições e tanto mais preza-las quanto mais nossas elas forem (Idem,
ibidem. Grifo meu).

Assim o grupo escolar para além de ser um templo de civilização, conforme analisou
Souza (1998), deveria ser o local para “irradiar a luz, o saber, a bondade, a virtude para ventura
nossa e glória da pátria.”
Consideramos ainda que a festividade instaura, no momento do acontecimento, práticas
ritualísticas que visam guardar na memória coletiva e/ou individual aspectos da vida cultural e
social. Objetiva, quiçá tornar aquele acontecimento histórico. No sentido mais amplo, também,
contribui para o exercício da cidadania e participação política e social. A veneração dos
símbolos a partir do hasteamento de bandeiras seguidas da entoação de hinos e discursos
patrióticos proporcionam o sentido de identificação dos homens com sua cidade, sua nação. No

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caso específico dessa festividade a busca da identidade pela educação formal e escolar, tendo
como símbolo o grupo escolar. Para Lopes (2002, s/p.)

a compreensão e o exercício da cidadania se dão através da


complementariedade entre identidade e alteridade; se a identificação, através
dos símbolos, trata do “mesmo”, outras práticas – além das comentadas –
devem garantir o reconhecimento da dimensão do “outro”.

Outro aspecto que verificamos na documentação consultada relaciona-se à preocupação


em reconstruir e consolidar uma idéia de nacionalidade alicerçada a partir da perspectiva de
considerar positivo o contato com o “outro”, isto é, da importância de se visualizar as
semelhanças e diferenças, uma vez que “estar atento” pode ajudar na compreensão de si próprio
e de seu povo. Porém, essa aproximação, segundo Tavares Cavalcanti, deveria ser regulada e
mediada pelo Estado através da instrução escolar, uma vez que o “estrangeirismo é o corrosivo
mais violento que destrói as fibras da nacionalidade”(A Imprensa, 14/09/1916).
Em que pese toda a pomposidade dada à inauguração ao Grupo Escolar Thomaz
Mindello, verificamos, também, que a compra do prédio para o seu funcionamento sofreu uma
série de denúncias em torno de um possível superfaturamento no ato de sua compra, e de se
constituir um prédio pouco apropriado para o funcionamento de um grupo escolar.

O Grupo Escolar Thomaz Mindello: superfaturamento e inadaptabilidade para o seu


funcionamento

Como verificamos acima a inauguração do primeiro grupo escolar paraibano foi


marcada com grande festividade. Entretanto, em meio a tantos discursos entusiasmados,
encontramos também, uma série de críticas e denúncias em relação à compra do imóvel onde
passaria a funcionar a referida instituição educacional. Ironicamente, essas denúncias foram
publicadas pelos mesmos jornais que simultaneamente elogiavam o Dr. Thomaz de Aquino
Mindello e o Dr. Manuel Tavares Cavalcanti e criticavam o Presidente do Estado, Antonio da
Silva Pessoa, levantando suspeitas quanto à sua idoneidade administrativa. Uma das questões
assentava-se no suposto superfaturamento no ato da compra do prédio. Vejamos:

Foi muito caro o prédio para o Grupo Escolar Thomaz Mindello.

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É tamanha a miséria de prédios públicos para as escolas nesta capital e no


interior, que estávamos quase a elogiar a compra feita pelo governo do novo
edifício da praça Pedro Américo, para nele ser instalado o Grupo escolar
Thomaz Mindello. Mas o prédio não vale mais de 40 contos de réis, e foi
comprado por 52 contos. Foi caríssimo.
O Sr. Antonio Pessoa, encarregado de mil achaques moraes é aperriado com
as últimas vontades de seu honroso testamento, não pode arregalar os olhos,
como lhe cumpria, afim de evitar que os cofres públicos despendessem 12
contos a mais sobre a quantia pela qual o Estado deveria ter adquirido o novo
prédio.
Parabéns ao operoso arquiteto, Sr. Paschoal Fiorillo por ter encontrado quem
advogasse, maneirosamente, esse negócio da China, juntos aos próceres
situacionista (Diário do Estado, 23/07/1916).55

A outra crítica foi direcionada à inadaptabilidade do prédio adquirido pelo Estado para
o funcionamento do grupo escolar. Esse aspecto nos parece interessante uma vez que na
literatura que trata sobre o tema é muito comum encontrarmos a indicação que os primeiros
grupos escolares fundados em várias localidades do Brasil seguiram rigorosamente as
prerrogativas exigidas pela política higienista que foi implantada nos anos 10 de 20 do século
XX. Apesar desses estudos analisarem os maiores centros urbanos, tais como o Rio de Janeiro,
São Paulo e Recife, temos uma série de indicações documentais que na Paraíba do Norte essa
política pública foi implementada nas cidades da Parahyba (atual João Pessoa), Campina
Grande, Princesa Isabel e Cajazeiras. Assim parece-nos um pouco apressada a idéia de que o
Grupo Escolar Thjomaz Mindello não tenha seguido, pelo menos em alguns aspectos, os
critérios exigidos para o funcionamento de uma escola dentro das condições mínimas de higiene
e salubridade.
De qualquer forma não podemos desconsiderar que as críticas direcionadas ao Grupo
Escolar Thomaz Mindello foram contundentes, vejamos:

Não podemos deixar de aproveitar a oportunidade para fazer ver a má


impressão que nos causou o prédio do primeiro grupo escolar paraibano pela
sua inadaptabilidade ao fim a que se destina.
Sim as necessárias condições de capacidade para preencher as exigências da
higiene exalar, trata-se de uma construção que de nenhum modo se presta ao
funcionamento de uma escola e, muito , de um grupo que deve conter maior
número de alunos.
Assim não se justifica, de nenhuma forma, o sacrifício do Tesouro,
adquirindo, por tão alto preço uma casa imprópria para servir de modelo as

55
- Documento do IHGP.

- 98 -
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demais escolas primárias do Estado (Diário do Estado, 23/07/1916. Grifo


meu).

É possível, todavia, ainda hoje, observarmos que o Grupo Escolar Dr. Thomaz
Mindello possui janelas, portas e pé direito do prédio que atendem algumas prerrogativas
arquitetônicas que facilitam a circulação de ventos e a penetração de luminosidade natural, o
que é básico para a higiene exalar. Entretanto, é importante salientarmos que foi somente em
1921 que foram publicadas oficialmente as orientações técnicas e arquitetônicas para a
construção de prédios escolares na Parahyba do Norte:

Os predios, (...) deverão ser construidos: a) em terreno sêcco e permeavel; b)


numa area nunca inferior a 1.000 m2; c) fóra do alinhamento das ruas; d)
longe do ruído das officinas e dos centros muito movimentados; e)
inteiramente livres de quaisquer outros edificios e de modo que os raios
solares tangenciando a parte superior dos vãos das janellas e portas cheguem
ao extremo opposto do piso; f) com um apparelho sanitario e um lavatório
pelo menos, para cada grupo de 30 alunos; g) expostos ao nascente; h) com
elevação nunca inferior 0,60m e o piso perfeitamente impermeabilizado e
livre de restas que concorra para o accumulo de sugidades; i) com os cantos
das paredes e alizares tanto inferiores como superiores arredondados; j) com
distribuição de luz unilateral ou bilateral, neste caso a luz deve ser indirecta;
l) com tres salas para as escolas isoladas, seis para as escolas reunidas e nove
para os grupos, cada uma com capacidade para trinta alumnos; m) com
janellas a caixilhos dispostos de forma que abertas aquellas não determinem
perda de espaço interior; n) com material de lei; o) com um compartimento
para directoria e archivo; p) com area descoberta para recreio; q) pintados de
cores neutras, de preferencia azul ou verde claro; r) com fossa aseptica, nas
localidades onde não hover esgottos” (Parahyba do Norte, Estado da. 1921,
p.1-2).

Um dos grupos escolares que foi construído seguindo praticamente todas essas
normatizações e orientações arquitetônicas foi o Grupo Escolar Izabel Maria das Neves.

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Foto 1- Grupo Escolar Izabel Maria das Neves – João Pessoa. Arquivo do autor – setembro de
1999.
Esse grupo escolar tem história muito peculiar porque foi construído a partir de recurso que coronel
Alípio Dias Machado deixou para o Estado, a partir de disposição testamentária. Exigiu, todavia,
que a escola recebesse o nome de sua mãe. O terreno foi doado pelo Estado através do Decreto nº
928 de 23 de abril de 1918. Foi inaugurado em 16 de fevereiro de 1921.

Modernização da cidade e da escola: os grupos escolares como espaços privilegiados para a


difusão de novas idéias e combater o analfabetismo56

Estamos considerando que a partir da inauguração do primeiro grupo escolar iniciou-se


um novo momento da história educacional paraibana. Novo momento que virá constituído do
discurso da modernização da organização escolar na Paraíba. Entre a criação dessa nova
instituição e sua condição de organização escolar primária preponderante no Estado transcorreu,
entretanto, um espaço de tempo significativo. Apesar de as cadeiras isoladas passarem a ser
prioritariamente denominadas escolas rudimentares ou elementares, o número de instituições
cujo funcionamento se pautava pelo modelo tradicional era muito mais elevado do que o dos
grupos escolares.
O período que se estendeu de 1916 a 1922, foram criados sete grupos escolares no
Estado da Parahyba do Norte, quatro deles localizados na capital, e três nas cidades de
Umbuzeiro, Itabaiana e Cajazeiras.
Do ponto de vista legal a criação de grupos escolares nas maiores cidades do interior,
deveria seguir a norma inscrita na lei nº 360, de 14 de outubro de 1911, cujo art.º 9º estabelecia

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que os grupos escolares deveriam ser construídos, preferencialmente, nas sedes de Municípios,
especialmente aqueles em que as prefeituras se dispusessem a construir os prédios e fornecer
material escolar (Almanach do Estado da Paraíba de 1912, p. 645).
Os grupos escolares, de uma maneira geral, apresentavam um certo ordenamento e
racionalização do espaço interno, variando entre três a seis salas de aulas, sala da direção, sala
dos professores, secretaria, museu, biblioteca e arquivo, áreas de recreação de cuja configuração
constavam pátios internos, jardins, largos, refeitório ou cantina e espaço destinado para as aulas
de ginástica.
Nesse período que ora estamos analisando os grupos escolares foram alocados em
suntuosas edificações, adaptadas ou construídas em bairros de elite ou nos centros das cidades,
como no caso específico dos grupos escolares Dr. Thomaz Mindello e Antonio Pessoa,
localizados no antigo centro comercial e de serviços da cidade da Parahiba. Em ruas largas e
arborizadas  no passado e ainda hoje, importantes vias de acesso  dos tradicionais bairros de
Tambiá, Jaguaribe e Centro, estão os grupos escolares Epitácio Pessoa, Pedro II e Isabel Maria
das Neves, respectivamente.
Em suma, os grupos escolares não apenas atenderam as exigências estéticas da elite,
mas também se prestaram a modernizar e embelezar a capital paraibana.
O contexto cultural em que surgiram os grupos escolares na Parahyba do Norte, onde,
apesar de serem mantidas relações sociais, econômicas e políticas tradicionais, se vislumbravam
elementos de “vanguarda”, aqui traduzidos por modernização, em função do processo de
urbanização e do surgimento do setor industrial  incipiente, se relacionado ao movimento
nacional, mas significativo para a economia local.
As décadas de 10 e 20 do século XX foram um período de grande mobilização em
defesa da modernidade e da modernização das cidades brasileiras. Entretanto, a intensidade e os
ritmos conferidos a esse processo de modernização variaram de acordo com as especificidades
regionais e, até mesmo, as especificidades inerentes a cada uma das capitais brasileiras,
principalmente quanto aos aspectos culturais e às mudanças nos comportamentos sociais.

56
- Algumas das idéias aqui desenvolvidas constam também no livro de minha autoria, Da era das cadeiras
isoladas à era dos grupos escolares na Paraíba, publicado, em 2002, pela Editora Autores Associados e
Universidade São Francisco.

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O intervalo entre os primeiros anos que se seguiram à 1ª Grande Guerra Mundial e o


início dos anos 20 correspondem a um breve período de “prosperidade econômica” no Estado
da Parahyba do Norte, segundo Galliza (1993, p.35),

notadamente quando Epitácio Pessoa ascendeu à Presidência da República.


(...) Seu estado natal foi grandemente aquinhoado dentro [do] plano de
“crescimento equilibrado”. O programa de obras públicas executado
principalmente no Sertão, além de difundir o trabalho assalariado, criou
condições para a convergência da produção paraibana para a Capital.57

Embora não possamos considerar que a Paraíba tenha entrado na “era do usinismo”,
como havia ocorrido no Estado de Pernambuco, houve, ainda conforme Galliza (Idem, ibidem),
uma

modernização da indústria do açúcar com a implantação de usinas. Essas


modernas unidades açucareiras não somente produziram açúcar, mas tinham
suas próprias plantações de cana, que lhes asseguravam a matéria prima
necessária. A usina recriou, pois, em grande escala, a organização produtiva
do engenho tradicional.

Há também que se ressaltar o processo de modernização em relação ao beneficiamento e


enfardamento do algodão (o ouro branco), principal fonte de renda do Estado. Entretanto, o
avanço das forças produtivas capitalistas não teve influência tão significativa, ao ponto de
operar mudanças na estrutura política brasileira e, menos ainda, na paraibana.
A produção historiográfica sobre a relação entre sociedade civil e sociedade política,
no que diz respeito à configuração do Estado ampliado brasileiro, é bastante prolífica, não
cabendo aqui analisar pormenorizadamente a questão, mas apenas lembrar a experiência
político-econômica e administrativa conhecida como “política dos governadores” ou “política
café com leite e açúcar”. O poder central brasileiro foi controlado, durante muito tempo, pelas
oligarquias cafeeiras, principalmente paulistas, e pelos produtores mineiros de leite e seus
derivados, aliados aos produtores de açúcar nordestinos, cujo clientelismo se manifestava em
todos os níveis da administração pública, como já nos referimos anteriormente.

57
- Esse aspecto deve ser ressaltado, uma vez que grande parte da produção paraibana era escoada pelo interior,
com destino à cidade e ao porto de Recife.

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Na análise sobre os grupos escolares nos pareceu significativo que os grupos


conservadores se utilizaram desse novo tipo de escola – um dos “signos” da modernização e da
modernidade – para perpetuar as tradicionais oligarquias paraibanas e demonstrar seu prestígio
e poder.
Apenas para ilustrar, vale atentar para a utilização de nomes das lideranças (dos
coronéis) para denominar esse novo tipo de instituição escolar – os grupos escolares , sem
esquecer que, a partir de 1915, as cadeiras isoladas na capital, inicialmente identificadas pelo
nome da localidade onde estavam situadas, passaram a ser denominadas com nomes de políticos
e educadores. Assim, as aulas noturnas para adultos e menores, localizadas na sede do Partido
Operário, passaram a ser chamadas Escola Castro Pinto, “como merecido tributo ao egregio
administrador que tanto se esforçou pelo desenvolvimento da instrucção entre nós”(Parahyba
do Norte, Estado da, 1915, p.7).58
Entendemos, portanto, que as escolas públicas passaram a ser utilizadas como veículo de
propaganda política, também servindo para marcar o poder das oligarquias, cujos nomes seriam
sempre lembrados, uma vez que os suntuosos prédios escolares, principalmente os dos grupos
escolares, como vimos, marcaram a nova feição urbana em pleno processo de mudança e
serviram, por conseguinte, para embelezar a cidade e dar-lhe um ar de modernidade. Em
mensagem encaminhada à Assembléia Legislativa do Estado da Parahyba do Norte em 1916, o
vice-presidente em exercício, Coronel Antonio da Silva Pessoa, assim se expressava:

Esforcei-me quanto possível para que outro fosse o patrono da escola recem-
creada. Até cheguei a indicar o nome do venerando educador e virtuoso
sacerdote parahybano padre Rolim, para substituir o meu, alvitre que não foi
aceito.
Por decreto anterior havia eu dado, sob proposta da Directoria Geral de
Instrucção Publica, o nome do respeitavel e meritorio politico do antigo
regimen, Barão de Abiahy, á escola nocturna que tem a sua séde na Sociedade
de Artistas Mechanicos e Liberaes.

Em 1919, a construção de outros grupos escolares foi ultimada: um, na capital, e outro,
no Município de Umbuzeiro59. Ambos receberam o nome de Grupo Escolar Antonio Pessoa. No
ano anterior, também na capital, o Grupo Escolar Epitácio Pessoa fora inaugurado.60

58
- Documento arquivado na Biblioteca Central da Fundação Joaquim Nabuco. Doravante apenas BC-FJN.
59
- Documento do AN.

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O destaque dado a esses grupos escolares se deve ao fato de que, no período em que
foram construídos, a oligarquia liderada por Epitácio Pessoa  constituída, principalmente, pelas
famílias Neiva, Figueiredo, Silva Pessoa e Lucena  estava no auge do poder e se ramificou da
esfera federal para a esfera estadual, estendendo-se até às bases políticas municipais. Assim é
que, nessa época, tanto a alocação espacial de grupos escolares quanto sua denominação
estavam vinculadas aos membros dessa oligarquia, situação que perdurou até os anos 30
(Parahyba do Norte, Estado da, 1919, p.13).
O processo de modernização da sociedade brasileira, na década de 20 principalmente
nos espaços urbanos, possibilitou a elaboração de projetos que incorporaram a modernidade à
estrutura educacional. Nesse sentido,

coube aos educadores brasileiros, nesse momento, grande responsabilidade


pela discussão do tema da modernidade e dos projetos políticos que lhe
diziam respeito, a partir de certa visão de sociedade e de povo brasileiro. Ao
trabalhar nos maiores e mais importantes centros urbanos do país, liderando
as famosas reformas de instrução pública, eles criaram não só a possibilidade
de estruturar um campo de identificação dos educadores, mas sobretudo,
interferiram na ordenação simbólica das cidades, armando novas
representações do urbano e do seu papel profissional dentro dele (Nunes,
1994, p.180).

Foi precisamente nesse contexto que surgiu o grupo escolar, forma de organização
escolar mais complexa, que viria a atender as necessidades impostas pelas mudanças que
estavam se processando na sociedade brasileira e paraibana. Teve como objetivo último formar
novos homens e mulheres - os cidadãos. Cidadãos amantes da ordem, do progresso, da
República, uma vez que “a prática do regimen representativo exige cidadãos probos e
illustrados. Possuil-os é questão vital para as democracias (...). Republica sem escolas é uma
extravagancia sem nome”(Almanach do Estado da Parahyba, 1922, p.224).61 Entretanto, os
homens e mulheres (muito mais homens!) “modernos” deveriam estar preparados para
acompanhar o processo de modernização e atender as necessidades objetivas impostas por esse
novo momento histórico na capital e nas cidades do interior do Estado paraibano.

60
- A inauguração desse grupo escolar também foi marcada por grande festividade e seguiu a mesma concepção do
Grupo Escolar Dr. Thomaz Mindello. Para melhor detalhamento ver Jornal Correio da Manhã, nº 58, março de
1918.
61
- Documento da BC–UFPB.

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Entre a criação do primeiro grupo escolar do Brasil e o primeiro da Paraíba há uma


distância temporal de doze anos. Os grupos do Estado de São Paulo, segundo Souza (1998, p.
p.15,25-26), faziam parte do projeto republicano de educação popular, voltado para a formação
do cidadão, a consolidação do novo regime  em última análise, a “regeneração da Nação”:

A institucionalização dessa modalidade de escola primária representou uma


das faces do projeto republicano de modernização da sociedade e de
civilização das massas, portanto, uma expressão do processo de
desenvolvimento do capitalismo no Estado de São Paulo e dos processos de
urbanização e industrialização dele decorrentes (pp. 279-280).

Apesar de a Paraíba não ter tido o mesmo nível de desenvolvimento econômico dos
Estados de São Paulo, Rio de Janeiro, Minas Gerais e nem mesmo de Pernambuco e Bahia, a
criação de grupos escolares esteve no bojo do processo de modernização do Estado. É evidente
que as preocupações com a formação do cidadão e o fortalecimento da república estiveram
também presentes, embora de forma secundária, nos discursos da elite paraibana, que
enfatizavam a necessidade de modernização não só da capital, mas também das cidades do
interior do Estado.
Diversamente do que ocorreu em cidades como São Paulo e Rio de Janeiro, cuja
modernização era evidenciada pelo acelerado processo de urbanização, aliado a um florescente
industrialismo, a Paraíba não vivenciou, com a mesma intensidade, nem o processo de
urbanização nem o de industrialização.
Acreditamos que o descompasso do desenvolvimento econômico paraibano em relação
a outros Estados, inclusive os nordestinos, (especialmente em relação às capitais Recife e
Salvador) e em relação ao contexto brasileiro geral é uma das explicações possíveis para o lento
processo de organização do novo modelo de organização escolar.
Consideramos, no entanto, que as necessidades objetivas, tanto do Estado como da
sociedade como um todo, exigiram um certo aprimoramento dos serviços públicos  dentre eles
a instrução pública , que propiciaram particular visibilidade ao movimento de modernização de
algumas cidades paraibanas. Nesse sentido, a modernização do Estado da Paraíba foi se
efetivando muito mais pela via estatal do que pela acumulação de capital do setor privado,
conforme se processou, principalmente, no Estado de São Paulo.

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Segundo Costa (1983, pp.14 e 122)  que estudou o processo de expansão, durante a
República Velha, do ensino primário no Estado de São Paulo , o rápido crescimento e o
sucesso dos grupos escolares foram propiciados por condições favoráveis, do ponto de vista
demográfico, econômico, social e político. No entanto, ressalta a autora, a implantação de tais
instituições restringiu-se às zonas urbanas, então sujeitas a acelerado processo de crescimento
populacional e, conseqüentemente, de urbanização, fato que se repetiu no Estado da Paraíba.
Nesse primeiro momento, apesar de todo o discurso sobre a importância da criação de
grupos escolares para a modernização do Estado paraibano e a formação do cidadão, esses
estabelecimentos atenderam as necessidades dos filhos da elite e da classe média locais  esta
última constituída, principalmente, por profissionais liberais, funcionários públicos,
comerciantes , além dos filhos de proprietários de médias e grandes propriedades, oriundos da
zona rural.
Um dado crítico – signo do arcaico, do atraso social e revelador de um quadro
econômico beneficiário das relações de dominação e da exacerbada exploração das classes
subalternas  colocava permanentemente em xeque o discurso da modernização: o alto índice de
analfabetismo, evidência de um Brasil da modernização sem mudança, de uma Paraíba da
modernização sem desenvolvimento.
Em seus discursos, à época, alguns políticos insistiam, constantemente, no fato de que
o investimento na instrução pública, com vistas a combater o analfabetismo, (Parahyba do
Norte, Estado da. 1918, p.23)62 seria o único ponto de partida para a boa e definitiva
organização de uma sociedade. Para Reis Filho (1995), no entanto, o objetivo de combater o
analfabetismo implicou, na verdade, a perda da função política da educação, função esta
veementemente defendida pelo ideário republicano. Ao deteriorar-se, a educação deixou,
portanto, de habilitar o indivíduo para a cidadania.
No discurso de alguns intelectuais, porém, mantinha-se a esperança de que a educação
realmente pudesse contribuir para a construção da cidadania e a consolidação da nação
republicana, como podemos observar na obra de 1918 de Aarão Reis  Economia, finanças e
contabilidade , que incluía a educação dentre as inúmeras atribuições do Estado: “Promover
carinhosamente a educação popular no sentido de preparar os cidadãos para o exercício regular

62
- Documento do IHGP.

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de todas a suas múltiplas funções, desde as da procriação de gerações fortes, sadias e robustas
até a da defesa intemerata da pátria nos campos de luta armada” (Apud Paim, 1978, pp. 38-39).
Esse pensamento nos remete à afirmação de Hegel de que as idéias e gostos mais atuais
são os que melhor representam o espírito de uma época, conforme evidenciam as idéias de
Aarão Reis  que viveu e sofreu os reflexos da 1ª Guerra Mundial , em cujo texto, não por
acaso, utiliza expressões, tais como: gerações fortes, defesa da pátria nos campos de luta armada
etc.
A lembrança da 1ª Guerra Mundial ainda estava muito presente no espírito da
intelectualidade brasileira. Sabemos que esse conflito propiciou a consolidação da supremacia
econômica e política de algumas nações européias  principalmente França e Inglaterra  e dos
Estados Unidos, que passaram a reconfigurar a organização política e econômica do mundo
Ocidental. A reordenação do sistema capitalista mundial impunha mudanças em, praticamente,
todas as nações subordinadas aos interesses econômicos das referidas potências “imperialistas”.
No Brasil e, particularmente, na Paraíba, foram muitos os reflexos desse conflito,
porque uma parcela significativa da elite brasileira, apontava para a necessidade de a educação
se atualizar (se modernizar) e acompanhar o “progresso” da ciência e da técnica. Tais aspectos
podem ser evidenciados, por exemplo, no discurso proferido em 12 de outubro de 1921, por
ocasião da instauração da Conferência Interestadual do Ensino Primário, pelo deputado Tavares
Cavalcanti, que tinha exata visão de seu tempo ou do “novo tempo” delineado a partir do
primeiro grande conflito mundial:

A educação é o primeiro elemento da defesa nacional.


Mas, se isto era uma verdade hontem, hoje assumiu taes fóros de evidencia
que se impõe aos mais irreductiveis. Falliram as praças fortes deante dos
canhões monstros e falliram os grandes couraçados, deante dos pequenos
apparelhos de destruição. O que não falliu, nem fallirá jámais é a intelligencia
humana, ajudada dos ensinamentos da sciencia, a engenhar sempre novas
machinas e novos factores da victoria. Na guerra moderna povo sem saber e
sem industria está de antemão vencido. Gente forte e apta improvisa
exercitos, restaura com facilidade as suas perdas e ganha batalhas, porque
hoje para o soldado cada movimento dos musculos obedece por assim dizer á
solução de um problema technico.
(...) Cuidemos com carinho de nossa defesa militar, mas não esqueçamos que
el’a se apparelha mais nas escolas do que nos quarteis e nos arsenaes
(Almanch do Estado da Parahyba, 1922, pp.222-223).63

63
- Documento da BC–UFPB.

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O resultado da disputa entre aquelas nações pela hegemonia no mundo ocidental


dependia, substancialmente, da qualidade de sua produção e do controle econômico sobre as
nações “atrasadas”. Para não ter seus produtos recusados ou preteridos na concorrência mundial,
fazia-se necessário que os países produtores modernizassem tecnologicamante o setor industrial,
sob pena de ficarem para traz e serem inexoravelmente eliminados (idem, p.223). Como já dizia
Tavares Cavalcanti, no discurso citado anteriormente, “gente analphabeta não póde ser,
portanto, gente que vença. A riqueza em materia prima, para quem não sabe usar della e
aperfeiçoal-a é apenas um desafio á gula do estranho” (Idem, ibidem, grifo meu).
Na década de 20, os índices de alfabetização no Brasil (em torno de 25%) e, em
especial, na Paraíba (aproximadamente 13%), eram muito baixos, como, infelizmente, ainda o
são até hoje. Segundo informações oficiais, em 1921, “dos 180 mil meninos na edade de
frequentar escolas, sómente cerca de 20 mil [receberam] os rudimentos da instrucção
elementar” (Parahyba do Norte, Estado da. Mensagem,1921a, p.14).64 O diretor da Instrução
Pública, no mesmo ano, reiterou a necessidade de

difusão do ensino primario em todos os recantos do territorio parahybano.


Essa medida deve ser tomada, custe os sacrificios que custar. As despesas
feitas com a instrucção publica são altamente remuneradoras. Os povos que
têm a visão do progresso não as calculam com mesquinharias, porque a
estabilidade e o augmento da riqueza nacional repousam na instrucção
generalizada (Parahyba do Norte, Estado da, Relatório da Instrucção Publica,
1921b, p.2).65

A “instrução generalizada”, como fator de “progresso”, foi sistematicamente defendida


pela elite paraibana e esteve condicionada à difusão dos ideais positivistas, já acatados no Brasil
desde meados do século XIX. Por conseguinte, predominou a convicção de que a ampliação da
oferta de instrução pública propiciaria a ordem e o progresso  para muitos, questão de
sobrevivência nacional, como veementemente salientava Tavares Cavalcanti:

Para os outros povos, progredir é condição de crescer e subir. Para nós,


progredir é condição de subsistir e viver. Os outros poderão viver sem
progredir. Nós teremos de progredir, sob a pena de não viver ! (...) Para nós o
progresso é uma condição vital.

64
- Documento do AN.
65
- Documento do IHGP.

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(...) A ‘riqueza nacional’ era desperdiçada por conta da enorme porcentagem


de analfabetos que nos “exhibe essa massa innumeravel que seria
valiosissimo capital humano se o valorizasse o brilho da intrucção elementar
e techinica.
(...)Todo homem é um valor economico. A população é um capital tanto mais
solido e valioso, quanto é a sua preparação intellecutal e technica (Almanach
do Estado da Parahyba de 1922, pp. 215 e 220). 66

A alfabetização é o fiat lux, o germe da vida, a fórmula da redenção, uma obra


imprescindível, enfim, sentenciou o referido deputado em seu discurso. Na seqüência
acrescentou ainda acerca dos males causados à sociedade brasileira pelo analfabetismo:

(...) entorpecendo as energias da nossa gente, encadeando os surtos do nosso


desenvolvimento, annullando as aspirações do nosso escól intellectual e
moral, ei-lo o doloroso flagelo, o mais pungente estigma da nacionalidade.
A elle se ligam as nossas difficuldades financeiras, como os nossos fracassos
economicos. Delle decorrem os abortos, tantas vezes sentidos das mais nobres
e elevadas aspirações sociais. A elle se filliam as manifestações do fanatismo,
agitando hostes rebelladas em Canudos ou no Contestado, obrigando o
Govêrno a dispender com a mobilização de tropas e o trabalho horrendo da
destruição quantias avultadas que bem melhor se houveram applicado na
formação da mentalidade nacional, de accôrdo com as luzes do seculo.
(...) Redimir é educar! E educar é redimir, porque é transformar o ser,
convertel-o em valor. Depois de entrar na vida, todos passam por uma nova
gestação para a vida moral. O que não se instruiu ficará em embryão ou será
um monstro. Só o educado será uma entidade moral. (...) Portanto, qualquer
localidade sem escola e terra sem vida moral, e agrupamento sem alma
colletiva, é cháos, sem a luz da redempção 67 (Idem, p. 217).

O Congresso Nacional, pressionado pela sociedade civil, aqui representada por


intelectuais em geral e, principalmente, pelo professorado, durante a realização da Conferência
Interestadual de Ensino Primário, no Rio de Janeiro, em 1921, autorizou o Governo a acordar
com os Estados medidas que regulamentassem o assunto. Para tanto, foi criada uma

subvenção destinada a difundir o ensino primário com as seguintes bases:


a) os estados acordantes se comprometem a aplicar, pelo menos, 10% de sua
receita na instrução primária;
b) a subvenção da União variará de 10 a 60 % da importância despendida
pelo estado acordante;

66
- Documento da BC–UFPB.
67
- Documento BC–UFPB.

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c) a subvenção será relativa às escolas primárias e às normais julgadas em


condições de equiparação ao tipo que a União adotar (Instituto Nacional de
Estudos e Pesquisas Educacionais, 1987, p.83)..

No mesmo ano com o objetivo de minorar a precária situação da organização escolar e


o resultante baixo rendimento escolar, caracterizado pelos incipientes índices de alfabetização, o
diretor da Instrução Pública, em relatório encaminhado ao presidente do Estado da Parahyba,
recomendou adoção das seguintes medidas: “a) Imposto especial destinado exclusivamente á
instrucção; b) Solicitação de um auxilio ao governo federal; c) Animação á iniciativa particular
para a fundação de escolas; d) Premios aos professores pela alphabetização dos
alumnos”(Parahyba do Norte, Estado da, Relatorio da Instrucção Publica de 1921b, p. 2).
O estado brasileiro, até os dias atuais, sobrecarrega, ou mesmo pune, a população, com
crescente número de tributações. Entretanto, tais medidas sempre suscitaram e, ainda suscitam,
discussões e desconforto entre os próprios gestores do poder público federal, assim como
inconformismo, por parte dos partidos de oposição e, principalmente, dos contribuintes, como
ocorreu, então, em relação à proposta do diretor da Instrução Pública, que, significativamente,
se exime de argumentar quanto à necessidade de implantação da medida explicitada no item
“a”: “Não me alongarei em considerações sobre o novo imposto a ser creado para fazer face ao
augmento de despezas da instrucção primaria”(Idem, ibidem).
Em relação aos demais itens, no entanto, o referido diretor procedeu diferentemente:
enfatizou, sobremodo, a necessidade de maior participação do governo federal, no que tange à
expansão da “distribuição e aperfeiçoamento do ensino de primeiras letras”: “É justo e natural
que a Federação coparticipe das despezas da instrucção elementar, pois vai tanto quanto o
Estado colher os beneficios da difusão della”(Idem, Ibidem). Lembrou ele, ainda, que a lei
orçamentária federal nº 2.738, de 4 de janeiro de 1913, autorizava o governo a

promover e animar a difusão do ensino primario, podendo para esse fim


fundar escolas nos territorios federaes e entender-se com os Governos do
Estado, ajustando os meios de crear e manter escolas nos districtos e
povoações onde não existam, ou que sejam insufficientes; subvencionar as
escolas fundadas pelas municipalidades, associações e particulares expedindo
o necessário regulamento, fixando as bases e condições convenientes e
abrindo o necessário crédito (Idem, Ibidem).

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Cabe chamar a atenção, na documentação consultada, para a constatação de um


sentimento generalizado de que, tal qual conduzida pelo poder central, a idéia de regime
federativo enfatizava apenas uma das facetas da autonomia dos Estados federados, pelo menos
no que dizia respeito ao setor educacional. Afinal, “os negócios de interesse comum” eram,
também, de responsabilidade do governo federal  possivelmente, um dos aspectos que muito
estimulou a elite brasileira a permanentemente defender a criação do “sistema educacional
brasileiro”. Tendo em vista, portanto, que a instrução pública propiciava a formação de cidadãos
que eventualmente viriam a defender a nação, a pátria e o respeito pela República, maior
participação do governo central nas questões educacionais e, mais particularmente, no combate
ao analfabetismo era fundamental:

Se alguma razão houve para o legislador constituinte cercear as attribuições


do Govêrno Federal neste assumpto, foi apenas o respeito á autonomia dos
Estados, a quem se quis deixar também uma somma importante de
prerrogativas e direitos.
(...) Falo em nome dos representantes dos Estados e penso poder affirmar com
a sancção de todos elles, que se tanto fosse necessario para a solução do
maximo problema da nacionalidade, os departamentos da federação abririam
mão até dessas prerrogativas, sacrificando-as pelo bem do Brasil.
(...) Os estados salvaguardam o seu direito de interferir na questão do ensino e
influir decisivamente para que se dissipe a vergonha do analphabetismo. Mas,
querem a cooperação de todas as almas bem formadas, estimulam a iniciativa
particular e não podem repellir o bemfazejo influxo da União para ser um
factor decisivo um coordenador das vontades orientadas neste sentido
(Almanach do Estado da Parahyba de 1922, p. 225).68

A necessidade de se combater os altos índices de analfabetismo não era enfatizada


apenas na esfera estadual, mas também fazia parte dos discursos de gestores do governo central.
Em mensagem encaminhada pelo presidente da República ao Congresso Nacional, em 1922,
destacamos a seguinte observação:

O Governo da União não pode nem deve conservar-se impassível ante os


prejuízos decorrentes da falta desse preparo. Urge providenciar contra os
efeitos do analfabetismo dominante em muitos Estados da República, os
quais, por falta de recursos próprios, estão deixando sem remédio eficaz esse
grande mal e contribuindo, assim para agravar cada vez mais o nosso atraso
social e político (Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais,
1987, p.80).

68
- Documento da BC–UFPB.

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- 112 -

Os grupos escolares foram freqüentemente reconhecidos, principalmente pelos gestores


públicos, como um novo tipo de instituição escolar que propiciava ao Estado brasileiro e à
sociedade grandes benefícios, principalmente como espaço facilitador para o combate ao
analfabetismo.
No âmbito estritamente pedagógico nos grupos escolares se efetivou a graduação do
ensino primário em séries. Foram estabelecidas classificações, com o objetivo de tornar as
“classes” igualitárias e homogêneas, considerando-se a idade dos alunos e seu nível de domínio
dos conteúdos. Durante os primeiros anos de implantação dos grupos escolares, discutiu-se
como deveria ser graduado o ensino e o número “ideal” de classes por instituição, chegando-se
à conclusão consensual de que os grupos escolares não deveriam ser hipertrofiados, do contrário
passariam a produzir efeitos administrativos, higiênicos e pedagógicos contraproducentes
(Almanach do Estado da Parahyba de 1922, pp. 226-227).69

Será arbitraria a lotação de um grupo escolar ? Não. Ella se determina pelo


numero de classes, e este pelas divisões e subdivisões dos gráos de ensino.
Ordinariamente se consideram três gráos com três divisões para o primeiro e
o ultimo e duas para o segundo. Outros admitem três divisões para cada gráo.
(...) Em conclusão: um grupo regular deve conter oito classes de vinte e cinco
alumnos, cada uma, o que dá a lotação de duzentos alumnos. Como, porém,
estamos em um pais de pobreza pedagogica, admittamos para conceder, um
maximo de nove classes e de trinta alumnos para cada classe. Assim, a maior
lotação de um grupo será duzentos e setenta alumnos, mas isto deve ser
tolerado e não recomendado (Idem, ibidem).

Ainda refletindo sobre a questão da hipertrofia dos grupos escolares, Tavares


Cavalcanti, em discurso proferido nas sessões de 3 e 8 de novembro de 1921 da Câmara Federal
chamava a atenção que grupos escolares muito grandes levariam a um considerável aumento
dos custos para a construção, manutenção e aumento do número de pessoas envolvidas com a
administração. Do ponto de vista higiênico, faltaria “cubagem de ar suficiente” para alunos e
professores. Em se tratando de uma escola hipertrofiada, esta passaria a atender a demanda de
vários bairros, fato que obrigaria as crianças a fazerem “caminhadas longas ou exhustivas antes
e depois das aulas, sujeitando-as ao trabalho mental, em occasião de cansaço physico, o que é
contrarios aos princpios de hiygiene infantil” (Idem, ibidem).

69
- Documento da BC–UFPB.

- 112 -
- 113 -

Nos grupos escolares foram também aperfeiçoados os mecanismos disciplinadores e o


uso do tempo passou a ser mais efetivamente padronizado e racionalizado. Surgiram as equipes
pedagógicas, formadas a partir da convivência diária de vários professores, e foi criado um
corpo técnico-administrativo, de que faziam parte, diretor, secretário, bedéis, assistentes,
porteiros, inspetores internos e monitores da escola.
Outros aspectos devem ser salientados: aumento da concentração de alunos em cada
unidade escolar; elaboração de regimentos internos; espaço privilegiado para que inovações de
ensino pudessem ser testadas e/ou adotadas; e, finalmente, como ressalta Souza (1998b, p.16),
“fragmentação do trabalho pedagógico (a cada professor uma classe, a cada horário uma
matéria) e (...) redistribuição do poder no interior da escola.”
Ao mesmo tempo que os grupos escolares implicaram o aperfeiçoamento e a
sofisticação dos mecanismos de controle do Estado sobre uma significativa parcela da sociedade
(principalmente professores e alunos), esse novo modelo de organização escolar também
propiciou, segundo avaliações de gestores públicos da época, melhoria na qualidade do ensino
público no Brasil.
Aliado a esse aspecto, o Estado brasileiro, por meio da disseminação de grupos
escolares, esforçou-se em maximizar os investimentos destinados à educação. Se, num primeiro
momento, os custos para a construção de prédios escolares eram altos, num segundo, esses
investimentos foram logo compensados pela diminuição dos custos de cada aluno em relação ao
professor, uma vez que tanto os professores como cada unidade escolar passaram a atender
maior número de estudantes.
Tendo em vista o fato de que os números demonstravam maior racionalização das
despesas com a instrução pública e maior eficiência técnico-pedagógica, principalmente no que
se refere à tentativa de diminuição dos índices de analfabetismo, os grupos escolares foram
motivo de grande euforia entre os responsáveis pelo gerenciamento do Estado brasileiro, nos
anos que se seguiram.
Para concluir podemos dizer que o período correspondente às décadas de dez e vinte do
século XX, prepararam para as profundas mudanças políticas, econômicas, sociais e culturais
que iriam eclodir no início dos anos de 1930. O sudeste, então na iminência de se tornar uma
região, prioritariamente, urbana, deu passos decisivos para desenvolver uma indústria mais
competitiva, que viria a superar, em importância econômica, o setor primário agro-exportador.

- 113 -
- 114 -

Na Parahyba do Norte, pelo contrário, as inovações se deram mais no plano da própria


organização do Estado que buscou aperfeiçoar os mecanismos de controle social e, a escola,
evidentemente, teve papel fundamental. Se de fato encontramos diversos elementos que nos
sugerem um processo de modernização da escola e da cidade que terminaram por gerar práticas
sociais e culturais excludentes, uma vez que os altos índices de analfabetismo não foram
superados.

Referências bibliográficas

COSTA, Ana Maria Catelli Infantosi da. (1983). A escola na República Velha: expansão do
ensino primário em São Paulo. São Paulo, SP: EDEC.

GALLIZA, Diana Soares de. (1993). Modernização sem desenvolvimento na Paraíba: 1890-
1930. João Pessoa, PB: Idéia.

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educação nas mensagens presidenciais (1890-1986). V. I, Brasília, DF: Mec.

LOPES, Fátima Faleiros. (2002). Memória, história, educação: trilhas sugeridas por um
Almanaque. Dissertação em Educação, Unicamp.

NUNES, Clarice. (1994). “A escola reinventa a cidade”, in: HERSCHMANN, Micael M. e


PEREIRA, Carlos Alberto Messeder (orgs.). A invenção do Brasil moderno: medicina,
educação e engenharia nos anos 20-30. Rio de Janeiro, RJ: Rocco.

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(Biblioteca tempo universitário).

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Francisco. (Coleção educação contemporânea).

REIS FILHO, Casemiro dos. (1995). A educação e a ilusão liberal: origens da escola
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SOUZA, Rosa Fátima de. (1998a). “Espaço da educação e da civilização: origens dos Grupos
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___. (1998b). Templos de civilização: a implantação da escola primária graduada no Estado


de São Paulo (1890-1910). São Paulo: UNESP, 302 p.

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XAVIER, Maria Elizabete e RIBEIRO, Maria Luisa; NORONHA, Olinda Maria.(1994).


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304 p.

Fontes:

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ACTOS DOS PODERES LEGISLATIVO E EXECUTIVO. Coleção de leis e decretos de


1916. Estado da Parahyba. Imprensa Official. Parahyba, 1917.

ACTOS DOS PODERES LEGISLATIVO E EXECUTIVO. Coleção de Leis e Decretos de


1918. Estado da Parahyba. Imprensa Official – Parahyba, 1920.

PARAHYBA DO NORTE, Estado da. Mensagem apresentada á Assembléa Legislativa em 1º


de março de 1908 por occasião da instalação da 1ª sessão da 5ª legislatura pelo Presidente do
Estado Monsenhor Walfredo Leal. Parahyba do Norte: Impresnsa Official, 1908. s/p.

___. Mensagem apresentada á Assembléa Legislativa do Estado em 1º de setembro de 1909


por occasião da instalação da 2ª sessão da 5ª legislatura pelo presidente do Estado João Lopes
Machado. Parahyba do Norte: Imprensa Official, MCMIX,1909, 62 p.

___. Mensagem apresentada á Assembléa Legislativa do Estado em 1º de setembro de 1910


por occasião da instalação da 3ª sessão da 5ª legislatura pelo Presidente do Estado João Lopes
Machado. Parahyba do Norte: Imprensa Official, MCMX, 1910, s/p.

___. Mensagem apresentada á Assembléa Legislativa do Estado em 1º de setembro de 1911


por occasião da instalação da 4ª sessão da 5ª legislatura pelo Presidente do Estado João Lopes
Machado. Parahyba do Norte: Imprensa Official, MCMXI, 1911, s/p.

___. Mensagem apresentada á Assembléa Legislativa na abertura da 4ª sessão ordinaria da 7ª


legislatura, a 1º de setembro de 1915, pelo Coronel Antonio da Silva Pessoa, vice-presidente
do Estado em exercicio. Parahyba: Imprensa Official, 1915, 24 p.

___. Mensagem apresentada á Assembléa Legislativa na abertura da 3ª sessão ordinaria da 8ª


legislatura, a 1ª de setembro de 1918, pelo Dr. Francisco Camillo de Hollanda, presidente do
Estado. Parahyba: Imprensa Official, 1918, 72 p.

___. Mensagem apresentada á Assembléa Legislativa na abertura da 4ª sessão ordinaria da 9ª


legislatura, em 1º de setembro de 1919, pelo Dr. Francisco Camillo de Hollanda, presidente
do Estado. Parahyba: Imprensa Official, 1919, s/p.

___. Mensagem apresentada á Assembléa Legislativa na abertura da 2ª sessão ordinaria da 8ª


legislatura, 1º de setembro de 1921, pelo Dr. Solon Barbosa de Lucena, presidente do Estado.
Parahyba: Imprensa Official, 1921, s/p.

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- 116 -

___., Relatorio apresentado ao Exmo. Sr. Dr. Solon Bardosa de Lucena, M.D. Presidente do
Estado, pelo Director Geral da Instrucção Publica, João Alcides Bezerra Cavalcanti, em 1921
(primeira parte), in: Jornal O Educador, Anno I, número I. Parahyba: 1º de novembro de
1921.

___. Relatorio apresentado ao Exmo. Sr. Dr. Solon Bardosa de Lucena, M.D. Presidente do
Estado, pelo Director Geral da Instrucção Publica, João Alcides Bezerra Cavalcanti, em 1921
(segunda parte), in: Jornal O Educador, Anno I, número II. Parahyba: 7 de novembro de
1921.

___. Relatorio apresentado ao Exmo. Sr. Dr. Solon Bardosa de Lucena, M.D. Presidente do
Estado, pelo Director Geral da Instrucção Publica, João Alcides Bezerra Cavalcanti, em 1921
(terceira parte), in: Jornal O Educador, Anno I, número III. Parahyba: 14 de novembro de
1921.

___. Relatorio apresentado ao Exmo. Sr. Dr. Solon Bardosa de Lucena, M.D. Presidente do
Estado, pelo Director Geral da Instrucção Publica, João Alcides Bezerra Cavalcanti, em 1921
(quarta parte), in: Jornal O Educador, Anno I, número IV. Parahyba: 21 de novembro de
1921.

___. Relatorio apresentado ao Exmo. Sr. Dr. Solon Bardosa de Lucena, M.D. Presidente do
Estado, pelo Director Geral da Instrucção Publica, João Alcides Bezerra Cavalcanti, em 1921
(quinta parte), in: Jornal O Educador, Anno I, número V. Parahyba: 28 de novembro de
1921.

___. Relatorio apresentado ao Exmo. Sr. Dr. Solon Bardosa de Lucena, M.D. Presidente do
Estado, pelo Director Geral da Instrucção Publica, João Alcides Bezerra Cavalcanti, em 1921
(sexta parte), in: Jornal O Educador, Anno I, número VI. Parahyba: 5 de dezembro de 1921.

___. Relatorio apresentado ao Exmo. Sr. Dr. Solon Bardosa de Lucena, M.D. Presidente do
Estado, pelo Director Geral da Instrucção Publica, João Alcides Bezerra Cavalcanti, em 1921
(sétima parte), in: Jornal O Educador, Anno I, número VII. Parahyba: 12 de dezembro de
1921.

___. Relatorio apresentado ao Exmo. Sr. Dr. Solon Bardosa de Lucena, M.D. Presidente do
Estado, pelo Director Geral da Instrucção Publica, João Alcides Bezerra Cavalcanti, em 1921
(oitava parte), in: Jornal O Educador, Anno I, número VIII. Parahyba: 19 de dezembro de
1921.

___. Mensagem apresentada á Assembléa Legislativa na abertura da 3ª sessão ordinaria da 8ª


legislatura, a 1º de setembro de 1922, pelo Dr. Solon Barbosa de Lucena, presidente do Estado.
Parahyba: Imprensa Official, 1922.

b) Almanaques e Jornais:

ALMANACH DO ESTADO DA PARAHYBA: Terceira phase, Anno X. Parahyba: s/e, 1912.


(Director: João de Lira Tavares)

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- 117 -

ALMANACH DO ESTADO DA PARAHYBA: Administrativo, Historico, Mercantil, Industrial.


Parahyba: Imprensa Official, 1922. (Diretor: Bel. Nelson Lustosa Cabral).

DIÁRIO DO ESTADO, ano II, nº 433, Parahyba, 23/07/1916

DIÁRIO DO ESTADO, ano II, nº 471, Parahyba, 14/09/1916

A IMPRENSA, ano XII, nº 5, Parahyba, 14/09/1916

JORNAL DE NOTÍCIAS, ano II, nº 199, Parahyba, 10/09/1916

DIÁRIO DO ESTADO, ano IV, nº 1000, Parahyba, 14/07/1918

CORREIO DA MANHÃ, ano II, nº 58, Parahyba, - /03/1918

CORREIO DA MANHÃ, ano II, nº 60, Parahyba, 19/03/1918

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A EMERGÊNCIA DOS GRUPOS ESCOLARES NO MARANHÃO

Diomar das Graças Motta 70

A questão educacional no espaço maranhense foi marcada pela instabilidade política


local, principalmente, durante os quarenta e nove anos do Segundo Reinado, estendendo-se
até ao segundo quadriênio governamental na Primeira República. Esta situação
impossibilitou uma continuidade administrativa que assegurasse algo planejado no trato das
coisas políticas. Dentre elas, a educação que era praticamente privada e, expressamente, a
cargo das mulheres (Motta, 2003, p. 49).
O descaso do poder público com a educação, sua conseqüente, fragmentação e
inexistência de registros sobre as instituições escolares levou-nos a sustentar o presente
estudo em fontes disponíveis, no caso a legislação educacional produzida um pouco antes e
durante a emergência dos grupos escolares.
Neste ínterim, os homens maranhenses lutavam apenas pelas posições de mando e
não lhes importava, na ânsia da conquista que atropelavam, a Lei e o Direito. Ao que
presumimos a parcialidade da aplicação dessa legislação educacional, ao lado dos
desmandos e violências perpetradas; bem como o iletramento de alguns desses homens.
Fato que Francisco de Paula Belfort Duarte (advogado, parlamentar, jornalista e teatrólogo)
que integrou a Junta Governativa de 18 de novembro de 1889, para defender-se dos
absurdos da época, exclamou ironicamente: “entre a espada e a ignorância, limito-me a
salvar a gramática” (Lima, 2002, p. 165). Portanto são ocorrências que constituem um
desafio em nosso estudo, além do que nos possibilita, segundo Nóvoa (1992, p. 42), “olhar
a escola como um tempo e um espaço, onde podemos exprimir a nossa natureza pessoal e
social”. Para tanto iniciamos com o panorama político – educacional, a fim de melhor
centrarmos a emergência do grupo escolar em solo maranhense.

O panorama político – educacional

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Com o estabelecimento da República, a nova Constituição estadual só foi


promulgada a 28 de julho de 1892, entretanto o caos educacional estabelecido fez com que
bem antes fosse baixado o decreto nº 21, de 15 de abril de 1890, organizando o ensino
público, que ficou dividido em primário, secundário e técnico ou profissional. Por este
decreto o então governador do Estado o dr. José Thomaz da Porciúncula (22.1. a 4.5. 1890)
manteve o Liceu, criou a Escola Normal, um Conselho Superior de Instrução e um
Instituto Técnico, além de extinguir o castigo corporal, nas escolas (Fernandes, 1929, p.
246).
Entretanto, dos dois governadores seguintes, com mandatos de meses, um deles
extingue o Conselho Superior de Instrução, sem ao menos haver sido implantado. Como se
observa, a República se iniciava com a mesma instabilidade governamental com que
sempre lutara-se na Monarquia (Meireles, 2001, p. 272).
No ano seguinte, o outro governador – dr. Lourenço Augusto de Sá e Albuquerque
(14. 3 a 13. 6. 1891) reorganiza o ensino público que pelo decreto nº 94 de 1º de setembro
de 1891 e o artigo 2º determinava: “o ensino primário será leigo, gratuito e obrigatório”. O
artigo 40 preceituava:

Pertence aos municípios a instrução pública primária, podendo todavia o


Estado, quando julgar conveniente, criar e manter escolas primárias em cada
um deles.

Destas disposições, apenas os municípios assumiram a então instrução primária e a


gratuidade foi cumprida, mas as demais disposições foram platônicas. Isto ocasionado pela
instabilidade política em que o pouco tempo de mandato, só permitia a expedição e a
revogação de decretos e leis, inviabilizando a sua observância.
Todavia o inspetor da Instrução Pública dr. Correia Leal, em seu relatório de 30 de
janeiro de 1895, aponta os fatos que reclamavam a interferência do poder público, no
sentido de corrigir as distorções vigentes, especificamente no então ensino primário, como
expressa o texto a seguir:

Professora Adjunta de História da Educação Brasileira no Departamento de Educação II e do Programa de


70

Mestrado em Educação na Universidade Federal do Maranhão – UFMA. E-mail: diomar@elo.com.br

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- 120 -

A unidade de princípios, a coerência de meios, produzem necessariamente a


homogeneidade de fins.
Uma vez admitido este postulado, é evidente que torne necessária a unidade
na instrução primária, um tipo de escolas, que realize para o primeiro ramo da
instrução, o mesmo que o governo federal há feito com relação à instrução
secundária e superior. (Grifo nosso). (In: Fernandes, 1929, p. 248 e 249).

Aqui fica demonstrada como a necessidade de uma escola organizada e com um


mínimo de estrutura já se instigava, sem contudo haver uma atenção efetiva para o
problema por parte do poder público, além do que 80 % da população enfrentava o
analfabetismo. Era comum nessa época as aulas na casa dos professores ou escolas
unidocentes, em que num espaço comum se agrupavam as crianças de todas as séries com a
orientação de uma única pessoa. Estas escolas eram mistas ou do sexo masculino. A
clientela feminina era atendida em casa ou nas poucas instituições privadas, laicas e
religiosas existentes (Motta, 2003, p. 153).
Paradoxalmente, evidencia-se nesta ocasião a importância da instituição escolar nos
discursos políticos, mas o foco era somente para o Liceu, a Escola Normal e, mais tarde,
para Escola Modelo.
Esta última que fora criada em Lei Estadual n° 155 de 6 de maio de 1896 trouxe
inovações com a unificação do ensino primário destinado aos dois sexos, oferta de ensino
seriado, em sete anos, condenava o ensino baseado na memorização e só admitia professora
normalista. Seu primeiro diretor foi o dr. Antonio Batista Barbosa de Godois (1860-1923),
intelectual, entusiasta da educação e comprometido com os assuntos educacionais,
permitindo-lhe editar várias obras sobre a temática e haver participado das inúmeras
reformas do ensino, da sua época.
Mas a educação maranhense é elevada à centralidade política como conseqüência da
sua relação e a construção de uma nova ordem política, que segundo Arroyo (1991, p. 36),
“não é invenção de educadores ou políticos, mas tratava-se de uma relação que fazia parte
de um movimento maior de interpretação dos processos de constituição das sociedades”.
Perspectiva que levou o dr. Barbosa de Godois a visitar sistemas educacionais de países da
Europa e da América do Norte. Seu retorno contribuiu para ampliação de outras questões
educacionais, inclusive a da alfabetização na política educacional maranhense, fato que lhe
levou ao Estado de São Paulo a fim de constatar as suas inovações educacionais, sobre
aquela questão. Ao que registrou em seu Relatório da Instrução Pública: “Na Escola

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Modelo de São Paulo são aplicados, simultaneamente no 1° ano, para estudo da língua
materna os métodos de silabação e palavração (...). Sobre estas matérias nossa marcha é
outra, na primeira seguimos o método da sentenciação (...)” (Mensagem de 16. 2. 1905).

A emergência dos grupos escolares

Assim os grupos escolares foram instituídos inicialmente no município de São Luis


– capital do Estado pela Lei Estadual nº 323, de 26 de março de 1903 e nos demais
municípios do interior pela Lei Estadual n° 363 de 31 de março de 1905, portanto após dois
anos de criação dos primeiros grupos em terras maranhenses.

A lei n° 323 / 1903 abordou as questões:


a) Autorizou o governo do estado a converter em grupos escolares as escolas
estaduais existentes no perímetro da cidade de São Luis.
b) Estabeleceu que cada grupo ficaria com três escolas, correspondendo ao
ensino de cada uma delas a parte do programa da Escola Modelo, de modo
que compreendesse toda a sua matéria, assim como os métodos de ensino.
c) Juntamente com o curso elementar, médio e superior ( o que compreendia
a primeira, a segunda e a terceira classe do ensino primário) foi oferecido um
curso especial, destinado ao trabalho manual. Este era oferecido
indistintamente a ambos os sexos.

Subtende-se que essas determinações serviam para agregar as escolas estaduais que
se encontravam dispersas e impor-lhe um novo caráter organizacional, tendo a Escola
Modelo como fio condutor desse novo momento.
A aprovação do Regimento Interno para os grupos escolares existentes na Capital,
através do decreto n° 38 de 19 de julho de 1904, foi conferido ao diretor da Escola Normal
poderes para designar e remanejar os professores dos grupos escolares (Art.2°). Tanto que o
dr. Barbosa de Godois além de ser diretor da Escola Modelo acumulava a diretoria da
Escola Normal. Apesar da existência do Conselho Superior de Instrução, que teve sua
extinção revogada logo no governo seguinte, os grupos escolares eram administrados por
aquelas instituições de ensino, que gozavam de conhecimento pedagógico inovador ao lado
do prestígio político.
Convém registrar que a emergência dos grupos escolares ocorre num momento em
que a manutenção das instituições escolares existentes era precária. Assegurar o seu

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funcionamento contava com a interferência do dr. Benedito Pereira Leite (1857-1910) que à
testa do Partido Federalista, depois Republicano foi o responsável pela orientação política e
administrativa do Estado durante quinze anos – 1893 a 1908 (Viveiros, 1992).
Tanto que pelo decreto n °2 de 5 de julho de 1899, do então governador dr. João
Gualberto Torreão Costa (1898 – 1902) a Escola Modelo tomou o nome de “Benedito
Leite”. Os adversários deste tomavam seu esforço como oportunismo político e durante a
sua gestão como governador no Estado (1906 – 1908) ao demonstrar a escassez dos
recursos públicos eles sugeriam que fechasse as escolas, inclusive os grupos. Ao que
respondeu: “a mão prefiro cortar a ser forçado assinar a supressão de uma escola”. Fato que
nos leva a observar os limites e as possibilidades das instituições escolares no Maranhão,
sobretudo àquela época, cujo papel crucial não permitia se distinguir a fronteira entre
necessidade educacional e as nuances políticas.

A organização e o funcionamento dos grupos escolares

O então curso primário oferecido nos grupos escolares compreendia três classes,
que correspondiam às diferenças de conhecimento dos alunos e compreendiam toda a
matéria do programa da Escola Modelo “Benedito Leite (Art. 2° do Regimento). Entretanto
essas turmas não excederiam em duas na primeira e segunda classes, podendo se elevar a
três apenas na terceira. Contudo esta terceira, que correspondia ao 7° ano da Escola Modelo
desaparece com a redução do ensino primário de sete para seis anos.
Os quadros, a seguir ilustram essa organização e o conteúdo ensinado em cada
cadeira.

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PRIMEIRA CLASSE SEGUNDA CLASSE TERCEIRA CLASSE


Primeira Cadeira Segunda Cadeira Terceira Cadeira
1ª Turma 1ª Turma 1ª Turma
Primeiros
rudimentos do
ensino. Parte do Parte do programa Parte do programa
1° ano programa 3º ano correspondente ao 5º ano relativo ao 5º ano
correspondente ao 3º ano da Escola da Escola Modelo.
1º ano da Escola Modelo.
Modelo
2ª Turma 2ª Turma 2ª Turma
Parte do programa
6º ano relativo ao 6º ano
Parte do Parte do programa da Escola Modelo.
2º ano programa relativo 4º ano que abrangia o 4º 3ª Turma
ao 2º ano da Escola ano da Escola Parte do programa
Modelo. Modelo 7º ano relativo ao 7º ano
da Escola Modelo
Prendas Femininas
Fonte: Coleção de Leis e Decretos Estaduais de 1904

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Primeira Cadeira Segunda Cadeira Terceira Cadeira

Língua materna, exercícios Língua materna, exercícios Língua materna, exercícios


orais, exercícios gráficos orais, exercícios gráficos, orais, exercícios gráficos,
cálculo, forma, tamanho, cálculo , forma, ensino cálculo, lugar, ensino
lugar, ensino objetivo, objetivo, instrução cívica, objetivo, instrução cívica,
instrução cívica, música, música, desenho, educação desenho, canto, teoria
desenho, educação física. física, trabalhos manuais. musical, trabalhos manuais.
Fonte: Coleção de Leis e Decretos Estaduais de 1904

O funcionamento dos grupos escolares, conforme o Regimento, era de 1° de


fevereiro a 30 de novembro, em todos os dias úteis, das 9 horas da manhã à 1 da tarde.
A matrícula acontecia anualmente de 2 a 23 de janeiro, desde que fossem cumpridas
as seguintes exigências (Art 7°):

- Declaração de idade – mais de 6 anos e menos 12.


- Prova de ter sido a criança vacinada, através da cicatriz da vacina.
- Verificação do aspecto da criança de não sofrer moléstia contagiosa, caso
houvesse a menor suspeita era exigido o atestado médico.

Porém, se essas exigências não fossem cumpridas, o responsável (pai, mãe ou


protetor) podia interpor recurso para o Diretor da Escola Normal. Era também enviado a
este mapa final da matrícula, como toda e qualquer alteração que se fizesse nela no decorrer
do período letivo. Por exemplo, o aluno que completava 14 anos era transferido para a
escola, estadual que não compunha o grupo escolar.
Os exames, com início determinado pelo Diretor da Escola Normal, eram realizados
por uma mesa examinadora, composta pelo presidente (designado pelo Governador),
respectiva professora de cada turma e um outro (a) professor (a) normalista, designado (a)
pelo Diretor da Escola Normal (Art 38). Os exames constavam de provas gráficas, orais e
práticas, de acordo com o conteúdo do programa (Art. 41). As provas gráficas tinham
duração de 3 horas no máximo; as orais 15 minutos para cada aluno; as práticas 20 minutos

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no mínimo e 3 horas no máximo. As notas de julgamento dos exames e lições (Art 31)
eram:

10 equivalente a ótima
7 a 9 “ a boa
4 a 6 “ a sofrível
1 a 3 “ a má
0 “ a péssima ou nula.

Quando do resultado final das notas em cada matéria ou na classe, os alunos,


conforme o artigo 58, eram:

- Aprovado com distinção, correspondendo ao grau 10.


- Aprovado plenamente, correspondendo aos graus de 7 a 9.
- Aprovado, correspondendo aos graus de 4 a 6.
- Reprovado correspondendo aos graus de 1 a 3.

Ao invés do diploma ou certificado os alunos da 3ª classe recebiam cartas de


habilitação, que eram assinadas pela mesa (Art. 59).
Apesar do Capitulo IX do Regimento se intitular Das Professoras, encontramos no
Grupo Escolar “Henriques Leal” , um professor normalista: Sr. Francisco Ribeiro, que era
responsável pela turma do 1° ano. Como na Escola Modelo “Benedito Leite” todos que
lecionavam no grupo escolar eram egressos da Escola Normal. As sanções aplicadas aos
professores e professoras variavam de advertência escrita a penas de multa de 10$000 a
50$000. Esta última (Art.64) desde que:

- reincidisse em faltas pelas quais já tivesse sido advertida;


- deixasse de dar aula por mais de três dias, sem causa justificada ou
participação do motivo ao Diretor da Escola Normal;
- não observasse o roteiro do ensino, o horário, ou admitisse livros e
compêndios não autorizados competentemente;
- não cumprisse as ordens e determinações emanadas do Diretor da Escola
Normal;
- aplicasse aos alunos e alunas qualquer pena que não estivesse
expressamente permitida pelo Regimento.

- 125 -
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Os professores e professoras contavam com as vigilantes (Art. 67), que lhes


prestavam auxílio na manutenção da ordem e disciplina dos alunos e alunas. O asseio dos
prédios ficava na responsabilidade das serventes (Arts. 68 e 69).
A escrituração escolar era de competência das professoras, recaindo na professora
do 4º ano a responsabilidade das funções de secretaria (Art.76). Esta enviava toda a
competente documentação até o dia 5 de cada mês, para Escola Normal, que remetia em
seguida para o Tesouro do Estado para fins de pagamento dos respectivos funcionários do
grupo escolar de sua atuação. Mensalmente um comissário do Diretor da Escola Normal
visitava cada grupo escolar, ocasião em que a professora-secretária exibia a vida escolar do
alunado (freqüência, notas mensais) bem como a escrituração dos métodos de ensino e
conteúdos ensinados (Art.82). Importa acrescentar que o Regimento não faz menção a
função de diretora ou diretor. Vamos encontrar seu registro nos grupos escolares criados
em 1919, quando a função era competência da professora do 5° ano. Observa-se que o
Regimento feminiza a função docente, esquecendo os poucos homens existentes, como
registramos anteriormente.
Em 1905, seis decretos entre os meses de janeiro a abril procuraram adaptar o
Regimento, modificando a organização pedagógica do ensino primário, ampliando o estudo
de matérias, como a inclusão da língua francesa em todas as classes e prendas domésticas
apenas na segunda e terceira classes, o ensino da História do Maranhão na Escola Normal,
Escola Modelo “Benedito Leite”, Grupos escolares e nas demais escolas estaduais.
As inovações prosseguem e se tornam mais expressivas na década de 1920, com o
advento do escolanovismo no espaço maranhense, gerando os novos regulamentos. O
Regulamento para os estabelecimentos de instrução primária do Estado, aprovado pelo
decreto n° 616, de 15 de fevereiro de 1923, organizou o ensino primário, em curso
elementar (feito dos cinco aos sete anos de idade); curso médio (dos sete aos doze anos) e o
curso complementar (dos doze aos treze anos). O curso médio era ministrado, durante cinco
anos nos grupos escolares, mas o elementar e o complementar eram prerrogativas da Escola
Modelo “Benedito Leite” (Art. 2°). Nesta ocasião os grupos escolares e a Escola Modelo
se tornaram espaços de inovações e constituem referência para os demais estabelecimentos
de ensino. Tanto que o art°39 determina a convocação anual de professores do interior
para, examinarem as inovações e os exercícios pedagógicos em ambas as instituições. Esta

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convocação era da alçada do Secretário do Interior, a quem cabia coordenar a instrução


pública naquele momento. Paralelamente surgem as escolas urbanas (mistas de duas
classes, regidas por uma professora) e rurais (mistas de três classes, também, regidas por
uma professora). Nestas últimas era dado relevância ao ensino da leitura, linguagem, escrita
e cálculo (Art.3°).
Na década de 1930, o Regulamento do ensino primário aprovado pelo decreto n°
252, de 2 de março de 1932, em seu artigo 132, dispõe: “A atual escola Modelo “Benedito
Leite” terá os programas e finalidade dos grupos escolares”, continuando a paridade de
funções, iniciada na década anterior. De acordo com este regulamento (Art. 126), sempre
que houvesse, num raio de dois quilômetros, alunos cuja matrícula subisse a 300, poderia o
Governo criar um grupo escolar, com curso de cinco anos: e eram transformados em
escolas isoladas, os cuja freqüência média anual fosse inferior a 90 alunos. Pois nesta
legislação (Art. 122) o curso primário ou elementar era, também oferecido em escolas
mistas ou masculinas do tipo: isoladas, grupo escolar, curso de Aplicação e curso noturno.
Com este dispositivo a Escola Modelo, que também tinha finalidade de campo de estágio
para as normalistas é substituída pelo então Curso de Aplicação que funcionava na Escola
Normal. Mesmo com a redução de funções, tanto pedagógica como administrativa, à Escola
Modelo é dedicada onze dos seus artigos, enquanto aos grupos escolares apenas seis.
Entretanto, é na década de 1950 que se tem a criação de vinte e um grupos
escolares, período de sua maior explosão, mas altera muito pouco o panorama desolador da
escolarização no Maranhão. Pois em 1960, segundo Silva (1971) o atendimento da
população escolar de 7 a 14 anos era de 16,6 %, conseguindo-se atender 36,9 % até 1970,
período em que são convertidos, por força do art. 3° da Lei n° 5692 / 71, em unidades
escolares e centros interescolares.

Considerações finais

A legislação rastreada para sustentação deste estudo, ao nosso ver, não tem alcance
para uma análise aprofundada das organizações escolares na sua interioridade e pouco nos
aponta para as interrelações com a comunidade da sua inserção. Para tanto nos alerta
Enguita (1989. p.158): “A experiência da escolaridade é algo mais amplo, profundo e

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complexo do que o processo de instrução”. Isto nos leva a refletir que a emergência dos
grupos escolares no Maranhão traz em seu bojo a oferta de ensino excludente, haja vista a
clientela da Escola Modelo, que majoritariamente pertencia à elite local e servia de padrão
para estas novas instituições escolares. Essa reflexão é ilustrada pela crônica de autoria de
J. Francisco, intitulada: “Era uma vez....” publicada na Folha do Povo de 10.2.1931:

Foi certamente Benedito Leite quem reorganizou o ensino público nesta


cidade e no interior do Estado. Ou fosse que seu espírito se sentisse impelido
a esse trabalho, por haver reconhecimento que a base do desenvolvimento de
um povo é a sua instrução; ou fosse que sua habilidade política lhe houvesse
ditado que era preciso fazer algo para seu sossego.
Apareceram, então os grupos escolares com cinco professoras, reorganizou-se
a “Escola Modelo”, que se afirmou uma verdade pedagógica: aparelharam-se
as aulas e material necessário ao ensino objetivo, às lições de coisas;
adquiriram-se carteiras próprias, higienizaram-se os prédios, enfim tudo se
transmudou.
Deu-se, então, uma completa transformação no ensino, de que se derivou um
fato por demais interessante.
As escolas públicas que eram freqüentadas pelos filhos de operários, de
cozinheiras, de lavadeiras, de carregadores, de serventes, de pescadores, etc.
etc. passaram a ser freqüentadas pelos filhos de bacharéis, médicos,
engenheiros, comerciantes, altos funcionários do Estado, capitalistas, etc. etc..

Ele continua a crônica comentando que essas escolas municipais são posteriormente
transformadas em grupos escolares e expulsas as crianças das classes econômicas menos
favorecidas.
A importância política dada aos grupos escolares, durante quase meio século, no
Maranhão foi tamanha que sua localização no interior era na praça principal ao lado da
matriz, da prefeitura, do fórum e da câmara. Constituindo-se um elemento do poder,
juntamente com o religioso, judiciário, legislativo e executivo. Lamentavelmente
professores, pais e grande parte dos estudiosos da educação no espaço maranhense,
prestaram pouca atenção para esta representação, significação e implicações da instituição
grupo escolar. Tanto, que só nos últimos dois anos, conseguiu-se escolarizar,
aproximadamente, 90% da população de sete a quatorze anos maranhense.

Referências bibliográficas

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A ESCOLA NO ESPELHO:

SÃO PAULO E A IMPLANTAÇÃO DOS GRUPOS ESCOLARES NO ESTADO DE SERGIPE

Jorge Carvalho do Nascimentoi

As viagens de estudo e a “importação” de técnicos constituíram estratégias


importantes para a política de reforma do ensino e implantação dos grupos escolares em
Sergipe a partir da segunda década do século XX. Ainda em 1909, o presidente do Estado,
Rodrigues Dória, trouxe de São Paulo o professor Carlos da Silveira, diretor do Grupo
Escolar da Avenida Paulista, para reorganizar a instrução pública. Este propôs um plano
que previa a construção de grupos escolares, a organização do serviço de inspeção escolar,
a adoção dos novos métodos de ensino e a remodelação dos ensinos normal e secundário.
Pessoalmente visitou todas as escolas da cidade de Aracaju, em companhia do presidente
Rodrigues Dória, para selecionar as professoras que deveriam integrar o corpo docente dos
grupos escolaresii. Carlos da Silveira permaneceu cerca de um ano em Sergipe, retornando
em seguida a São Paulo, onde passou a atuar como professor da Escola Normal Secundária
da Capital. O seu projeto teve conseqüência e, cinco anos depois, no período em que
Helvécio de Andrade estava dirigindo a instrução pública, este relatou ao presidente do
Estado a necessidade de importar o material escolar necessário ao bom funcionamento dos
grupos escolares: “globos, mapas, sólidos geométricos, sistema de pesos e medidas, séries
de seres orgânicos e inorgânicos, material para as lições de coisas etc...”iii A política de
construção de grupos escolares intensificou–se mais na década de 1920, quando a
presidência do Estado foi exercida por Maurício Graccho Cardoso. Na década de 1930, o
interventor de Sergipe mandou buscar um outro técnico em São Paulo, com o objetivo de
dirigir o serviço de Estatística do Estado: João Carlos de Almeida. A sua mulher, Amália
Ricci de Almeida assumiu a responsabilidade pela execução dos serviços de estatística
educacionaliv.
Desde o início do século XX o modelo dos grupos escolares de São Paulo fora
assumido por políticos e educadores de outros Estados, a exemplo dos paranaenses que
criaram o seu primeiro grupo, em 1903, na Capital, em caráter experimental, com o nome
de Grupo Escolar Dr. Xavier da Silva, tendo por modelo a estrutura de grupo escolar do

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Estado de São Paulov. A instituição de ensino paranaense foi criada após a visita do então
diretor da Instrução Pública daquele Estado, Victor Ferreira do Amaral, a São Paulo,
quando teve a oportunidade de conhecer a reforma do ensino que ali se realizava e o
funcionamento dos grupos escolares paulistas. Durante o governo de Jerônimo Monteiro,
“o presidente do Estado do Espírito Santo levou para Vitória, como seu principal auxiliar, o
professor da Escola Modelo de São Paulo, Carlos Alberto Gomes Cardim”vi. Maria Lúcia
Hilsdorf esclarece que

A partir do final da década de 1890 a presença de lideranças de São Paulo no


governo federal colabora para a disseminação em outros estados do modelo
paulista de organização escolar e metodológica, representado como o mais
adequado para a modernidade republicana: Ceará, Espírito Santo, Mato
Grosso, Goiás, Piauí, Sergipe, Santa Catarina e Paranávii.

Estudos realizados por Luciano Mendes de Faria Filho esclarecem que no Estado de
Minas Gerais projetos como o da implantação dos grupos escolares e o da adoção das
propostas da Pedagogia Moderna seguiram um outro tipo de trajetória. Em Minas Gerais,
os Grupos Escolares foram introduzidos legalmente em 1906, com a Lei 439, que autorizou
reformar o Ensino Primário e Normalviii.
Em Sergipe, o projeto de implantação dos grupos escolares também estava
articulado ao discurso da modernização pedagógica e ganhou contornos mais nítidos na voz
do médico Helvécio de Andrade, duas vezes diretor da instrução pública: a primeira, no
período de 1913 a 1918 e, a segunda, de 1930 a 1935. Delegado fiscal do governo federal
junto ao Atheneu Sergipense, foi professor e diretor da Escola Normal, onde trabalhou
como lente das cadeiras de História Natural, Pedagogia, Pedologia, Higiene Escolar e
Ciências Físicas e Naturais. Foi militante ativo do Centro Socialista Sergipano, da Hora
Literária (que depois se transformaria na Academia Sergipana de Letras, da qual Helvécio
foi membro fundador e ocupante da cadeira de número 15), do Centro Literário Educativo,
da Sociedade Médica de Sergipe e do Instituto Histórico e Geográfico de Sergipe. Dirigiu,
em Sergipe, a Associação Brasileira de Educação. Entusiasta do projeto de reformas do
Estado de São Paulo, criou a biblioteca da Escola Normal e organizou as “conferências
cívicas e pedagógicas”. O seu entusiasmo com o modelo das reformas de São Paulo teve
início quando ele trabalhou em Santos, como Inspetor Geral da Educação, na última década

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do século XIX, antes de transferir–se para Sergipe, e pode ser medido por intervenções
como a que fez em 1927, durante a Conferência Nacional de Educação realizada em
Curitiba: “São Paulo [foi] o primeiro dessa santa cruzada, recebendo dos Estados Unidos as
primícias de um método capaz de desenvolver a inteligência e promover a sua divulgação
no Brasil”ix. As idéias que aprendera em São Paulo, Helvécio de Andrade buscou
implementar como diretor da instrução pública, em Sergipe: “adotamos métodos mais
suaves, humanos e naturais, de acordo com os preceitos da Pedagogia moderna”x.
Helvécio de Andrade representou em Sergipe o entusiasmo que contaminou os
governos dos demais Estados em face das reformas que se irradiaram a partir de São Paulo,
pela visibilidade que estas ganharam junto à opinião pública, em função do seu caráter
moderno, que se exprimia através de um discurso de racionalidade técnica dos profissionais
de educação, da legitimação que se poderia obter ao articular–se com a Associação
Brasileira de Educação e pelo caráter espetaculoso dos modelos arquitetônicos dos grupos
escolares que passaram a adotar, inspirando–se na arquitetura escolar adotada em São
Paulo. Um dos governantes estaduais a compreender essa repercussão foi o líder político
cearense Justiniano Serpa que conseguiu, em 1922, o apoio do governo de São Paulo,
levando para o Ceará, como diretor da instrução pública, o professor Lourenço Filho.
O êxito do modelo de São Paulo pode ser verificado pelo fato de terem se
multiplicado as viagens de estudos dos intelectuais de diferentes Estados que buscavam
apreender as reformas implementadas pelos paulistas. Outro indicador desse sucesso foi o
freqüente empréstimo de técnicos por parte do Governo de São Paulo aos vários Estados
brasileiros, como ocorreu em 1909, com a chegada do professor Carlos da Silveira a
Sergipe. Nem mesmo a crise vivida pelo modelo de São Paulo na década de 1920 pode ser
apontada como um declínio desse interesse dos intelectuais da educação brasileira pelas
decisões de política educacional tomadas no planalto paulista. A reforma Sampaio Dória,
na primeira metade da década de 1920 agitou as discussões sobre educação no seu Estado e
no Brasil, ao tempo em que o país inteiro estava sensibilizado pela ação civilizatória
representada pelo movimento das ligas nacionalistas.
O entusiasmo que o professor Helvécio de Andrade reiterava sempre em relação ao
projeto reformador de São Paulo fez com que este, ao dirigir a Instrução Pública em
Sergipe pela segunda vez, no período de 1930 a 1935, autorizasse a viagem àquele Estado

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do professor José Augusto da Rocha Lima, em 1931. Quando do seu regresso a Sergipe,
Rocha Lima publicou um Relatório revelando a importância de “estudar os novos métodos
e processos pedagógicos, ali em prática, a fim de serem adotados na Instrução Pública de
Sergipe”xi. A viagem foi motivada pela boa repercussão que teve em Sergipe a reforma do
ensino de São Paulo, implementada em dezembro de 1930 sob a inspiração de Lourenço
Filho. O trabalho do professor Rocha Lima em São Paulo incluiu visitas ao Jardim de
Infância anexo à Escola Normal, dirigido pela professora Hortência Pereira Barreto com o
auxílio da professora Heloisa Grassi Fagundes. No Jardim, entusiasmou–se com a adoção
das práticas dos métodos de Fröebel, Montessori e Decroly. Dos grupos escolares, ficou
impressionado com o Grupo Escolar do Arouche e o Grupo Escolar Pedro II. À época, a
Escola Normal já havia sido transformada em Instituto Pedagógico e era dirigida pelo
professor Firmino Proença. No Instituto, o professor Rocha Lima permaneceu a maior parte
do tempo durante o qual ficou em São Paulo. Outra instituição visitada por ele foi a Escola
Profissional e Industrial de São Paulo, antiga Escola Profissional Masculina. O estágio em
São Paulo, com Lourenço Filho, serviu à atualização bibliográfica do professor José
Augusto da Rocha Lima. Conheceu a obra de autores como Mallart, Ferrière, Decroly,
Dewey, Balesteros, Claparède, Piéron, Kerschensteiner, Corinto da Fonseca e José Ferraz
de Campos, além da obra do próprio Lourenço Filho.

A Implantação dos Grupos Escolares

O interesse que as reformas educacionais despertaram deixou muitos vestígios na


educação do Estado de Sergipe. A partir da década de 1910, inaugurou–se o novo edifício
da Escola Normal. “Amplo, bem localizado, obedecendo à planta do Major de Engenharia
José Calazans e executado pelo Engenheiro Tenente Firmo Freire do Nascimento”xii.
Instalado à praça Olímpio Campos, no centro da cidade, “era monumental, um dos mais
importantes da Capital sergipana , tendo sido os móveis e o material didático importado dos
Estados Unidos”xiii. Foram construídos vários grupos escolares em Sergipe, quase todos
em Aracaju: o Modelo, anexo à Escola Normal; o Central; o Barão de Maroim; o General
Valadão; o Coelho e Camposxiv. Até o final da década de 1920 estavam funcionando no
Estado quatorze grupos escolares: cinco na capital e nove nas principais cidades do interior.

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As carteiras dos grupos escolares foram importadas dos Estados Unidos. Além disso, no
Atheneu, foram instalados os gabinetes de Química, Física, História Natural e Geografia,
com equipamentos importados de países europeus. Em 1912, foi reorganizada a direção da
instrução pública estadual, com a divisão do Estado em cinco distritos, para fins de
inspeção do ensino primário.
O projeto de implantação dos grupos escolares entusiasmou lideranças políticas e
intelectuais sergipanas e, como em São Paulo e nos demais Estados a proposta era tida
como a solução para o problema das escolas isoladas:

São justamente os grupos escolares que podem fomentar com segurança os


progressos da instrucção popular. O ensino isolado é trabalhoso, requer
duplicado esforço do professor e não poucas vezes deixa as coisas em meio
caminho. Não quero dizer que se pense em acabar de vez com o ensino
isolado, pois este se impõe, por enquanto, na maioria das casas, mas que a
creação de grupos é uma necessidade, onde quer que se possam reunir pelo
menos seis escolasxv.

Esse relatório demonstra a preocupação com a criação de grupos, sem negar a


permanência das escolas isoladas. Isso pode ser compreendido, uma vez que a construção
de grupos exigia muitos gastos. O alto custo das obras dos grupos era devido a sua
monumentalidade. Os prédios eram grandiosos e ficavam nas proximidades do centro das
cidades.
Os custos financeiros foram, portanto, o principal elemento do discurso daqueles
que não viam com entusiasmo o modelo paulista que estava sendo trazido para Sergipe. A
alegação evidenciava as dificuldades financeiras do Estado. O alto custo dos prédios era
questionado e chegaram a pensar em outras alternativas para a formação de novas
instituições escolares.
Uma possível solução para esse impasse seria a participação das municipalidades,
que ficariam responsáveis pela aquisição dos prédios e criação de caixas escolares. “Ao
Estado caberia adaptar o prédio aos padrões pedagógicos e manter o ensino. Isso permitiria
continuar formando grupos monumentais”xvi. Outra proposta pensada seria a construção de
casas mais simples para reunir as escolas isoladas:

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O Estado terá que edificar casas de pouco custo nos locais que mais
convierem o ensino, levando muito em conta as distancias dos grupos já em
funcções. A experiência aconselha que ditas casas deveriam constar de dois
salões para as aulas, um pateo para exercicios physicos e duas sentinas
apparelhadas com o material hygienico. Quanto a estructura, esta seria em
moldes de possivel ampliação logo que o local requeresse um grupo
modesto, de accordo com o augmento da população”xvii.

Além da preocupação com o custo das obras, havia também discussões quanto a
distância entre os grupos. A maioria localizava–se na região central das cidades,
dificultando o acesso dos alunos da periferia.
As reformas implementadas no ensino em Sergipe por inspiração das idéias que se
irradiaram a partir de São Paulo entusiasmaram os principais intelectuais da educação e
muitas lideranças políticas. Contudo, não beneficiaram todo o Estado. Seus resultados
foram sentidos apenas em Aracaju e em outros centros urbanos importantes do Estado
como as cidades de Capela, Estância, Lagarto e São Cristóvão. Na zona rural e na maior
parte dos municípios a situação continuou muito difícil.
O Grupo Escolar Modelo, criado em 1910 e inaugurado em 1911 na cidade de
Aracaju, foi a primeira instituição dessa natureza a funcionar em Sergipe. Anexo à Escola
Normal, foi pensado como campo de aplicação para as normalistas e deveria regular o
funcionamento dos demais grupos escolares. O Grupo Escolar Central foi inaugurado no
mesmo ano e três anos depois ganharia nova denominação: Grupo Escolar “General
Siqueira”. Em 1925, o grupo mudou de endereço e o seu edifício passou a abrigar o Quartel
da Polícia Militar do Estado de Sergipe.
A política de implantação dos grupos escolares em Sergipe ganharia mais clareza a
partir do mês de setembro de 1911. Naquela data, uma Mensagem encaminhada à
Assembléia Legislativa pelo presidente do Estado, José Rodrigues da Costa Dória, fazia
uma análise do quadro educacional sergipano e apontava o modelo dos grupos escolares
como o ideal para a reforma da instrução pública que se propunha a empreenderxviii. Em
1917 foi a vez da inauguração do Grupo Escolar Barão de Maroim, edificado sobre os
alicerces do antigo “Asylo Nossa Senhora da Pureza”, localizado na Avenida Barão do Rio
Branco, no bairro Presidente Barbosa (atual São José). O asilo fora criado por um grupo de
homens, liderados por João Gomes de Mello, o Barão de Maroim. Este doou o terreno para
que fosse construído o edifício, em 1874. A extinção do Asilo foi decretada pela resolução

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1341 de 31 de agosto de 1888. Segundo essa resolução, o estabelecimento não poderia


receber novas internas e seria extinto quando as órfãs do estabelecimento completassem 13
anos de idade.
A fachada principal do Grupo Escolar Barão de Maroim era em estilo clássico, com
oito colunas jônicas e seis janelas. Na parte central superior da fachada havia a data da
construção (1917) e o nome do grupo. Nas laterais e na parte central havia escadas que
davam acesso ao edifício. O prédio também correspondia aos novos preceitos pedagógicos,
uma vez que as janelas eram altas para evitar a distração dos alunos. Outros sinais da
preocupação com a aprendizagem eram as salas amplas, confortáveis e arejadas, a
iluminação adequada e o pátio para o recreio.
O Grupo Escolar General Valadão foi inaugurado em 1918. O seu primeiro edifício
estava situado à praça Pinheiro Machadoxix, à época importante zona de expansão
residencial da cidade.

A sua construção deveu–se à iniciativa particular. Os sócios do extinto


Comício Agrícola, uma associação de proprietários de terra existente desde o
Império, destinaram à construção de uma escola os recursos da Associação.
O jornal Correio de Aracaju ampliou a idéia, numa campanha de donativos
para um Grupo que deveria denominar–se “Gal. Valladão” homenageando o
chefe político e presidente do Estado. Porém, quando já tinha sido iniciada a
construção do prédio, para que esta fosse terminada dentro de um menor
espaço de tempo e também pela grande exigência de recursos financeiros
para atender às proporções da obra, os promotores do projeto resolveram
doá–lo ao Governo, que se responsabilizou pela conclusão do
empreendimentoxx.

As inaugurações de grupos escolares seriam retomadas seis anos depois. Em


1924 foi a vez do Grupo Escolar Manoel Luiz; em 1925, o Grupo Escolar José Augusto
Ferraz. Todos estes funcionando na capital do Estado, posto que a primeira instituição deste
gênero inaugurada no interior de Sergipe foi o Grupo Escolar Coelho e Campos, em 1918,
na cidade de Capela. O Grupo Escolar Coelho e Campos foi criado oficialmente pelo
decreto n. 679 de 30 de setembro de 1918, começando a funcionar no dia 12 de outubro de
1918, com quatro salas de aula para atender as quatro séries do curso primário, por
iniciativa do ministro José Luiz Coelho e Camposxxi. Ele doou a sua residência, com o
objetivo de fazer funcionar a instituição de ensino. Era um sobrado de dois andares,
construído de taipa, com janelas, um banheiro e uma porta. O piso era em assoalho de

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madeira. O edifício mantinha características da arquitetura colonial, apesar de ter sofrido


adaptações internas para o funcionamento da instituição escolar. As adaptações internas
acompanhavam o padrão da modernidade pedagógica adotado naquele período. Com sua
imponente arquitetura e localização o Grupo atendia aos requisitos exigidos pelas novas
políticas educacionais.
O Grupo Escolar Dr. Manoel Luís estava situado na Avenida José Calazans, em
frente a atual Praça da Bandeira, em Aracaju.
Tal como ocorria nos demais Estados que buscaram em São Paulo o modelo dos
grupos escolares, em Sergipe, as caixas escolares foram um importante mecanismo de
financiamento dessa atividade escolar. Estas eram formalmente instituições civis destinadas
a amparar a infância pobre. No Grupo Escolar General Valadão, a sua Caixa Escolar
recebeu o nome de Elvira Valadão, tendo os seus recursos servido para a aquisição e
distribuição de livros e outros utensílios necessários ao ensino, ajudando a diminuir as
dificuldades responsáveis pelo distanciamento existente entre as crianças de famílias pobres
e a escola. Para arrecadar fundos as “Caixas” organizavam festas.

A Formação Cívica

Os grupos escolares deram à formação cívica importância fundamental. A partir da


implantação do Grupo Escolar Modelo e ao longo de toda a primeira metade do século XX
foram muitas as iniciativas dos governos que objetivaram criar condições para que os
grupos escolares priorizassem a formação cívica dos seus alunos. Livros de leituras morais,
sempre com a preocupação de fixar valores relativos ao cumprimento do dever, ao culto da
responsabilidade, do amor, do bem, da solidariedade, do respeito às leis, dos valores
morais. Uma outra prática era a de dar nomes de personalidades políticas e intelectuais às
salas de aula dessas instituições escolares.
Ao ser inaugurado, em 1917, o Grupo Escolar Barão de Maroim, destinado
exclusivamente à educação das meninas, homenageava em suas salas de aula a Felisbelo
Freire, Geminiano Paes, Oliveira Ribeiro, Monteiro de Almeida, Possidônia Bragança e
Gumersindo Bessa. No Grupo Coelho e Campos foi feito o mesmo, homenageando Maria
Eufrosina, Carvalho Mello, Pinheiro Machado e o Barão de Cotegipe. Em 1922,

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inaugurou–se no salão nobre do Grupo Escolar General Siqueira de Menezes o retrato de


Pereira Lobo, líder do Partido Republicano Conservadorxxii. Era uma oportunidade para que
os alunos fossem perfilados, entoassem hinos e ouvissem preleções cívicas feitas por
líderes políticos e professores. O general Firmo Freire, engenheiro responsável pela
construção do edifício do Grupo Escolar Barão de Maroim fazia a defesa explícita do culto
aos grandes homens da nação. “Para ele, o sentimento patriótico deveria ser construído com
a valorização dos heróis e da bandeira nacional”xxiii. Assim, para Firmo Freire, a escola
seria o lugar onde se ensinaria a ler e escrever e formaria soldados para o país:
“fundamentalmente soldado é todo indivíduo que está em condições de defender a sua
patria”.
As festas cívicas eram fundamentais nesse processo de formação. O calendário
festivo se estendia ao longo do ano, incluindo a recepção a personagens ilustres e
autoridades, além da celebração de datas como o dia da árvore. Dentre as práticas utilizadas
nessas celebrações estava o canto de hinos patrióticos. O governo do Estado de Sergipe
regulamentou, em 1913, o canto dos hinos, publicando o Hymnario dos Grupos Escolares e
Escolas Singulares do Estado de Sergipexxiv. Organizado pelo professor Balthazar Góes e
aprovado em agosto de 1913, o hinário era divido em duas partes: Hinos Patrióticos e
Hinos Escolares, contendo letras e partituras. Na primeira parte estão cinco hinos: de
Sergipe, da Independência, Nacional, da República e da Bandeira, com a indicação das
datas nas quais deveriam ser entoados. A segunda parte da publicação contém doze hinos
escolares, com a indicação das práticas escolares às quais deveriam corresponderxxv.
Todos os dias, antes de entrar na sala de aula, os alunos, em forma, cantavam o
Hino Nacional, repetindo o mesmo rito ao final da aula.
A participação dos grupos escolares em festas públicas destinadas à celebração de
eventos cívicos era importante e merecia o registro freqüente dos jornais. Nas
comemorações da independência do Brasil realizadas no dia sete de setembro de 1915, o
diretor da Instrução Pública organizou uma festa no edifício do Grupo Escolar Modelo que
teve como ponto alto os exercícios de marcha e os hinos que foram entoados pelos
alunosxxvi. O Grupo Escolar General Valadão, na ocasião da Semana da Pátria de 1939,
ofereceu à imprensa, autoridades e parentes dos seus alunos “demonstrações de canto
orfeônico, cultura física, de jogos esportivos, etc”xxvii.

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O elevado número de alunos nos desfiles cívicos era um meio de demonstrar os


progressos da educação no Estado. O desfile, além de ser um meio de criar o sentimento
patriótico, era também veículo de propaganda estatal. Existiam incentivos para aumentar o
número de participantes, alegando o fortalecimento do civismo nos alunos e na população:

É preciso que os professores tomem o mais vivo interesse por estas


manifestações públicas do crescente movimento escolar. Resulta delle um
grande estímulo para as creanças e para o povo, que tem occasião para
apreciar esse desenvolvimento e comprehender a necessidade de incrementa–
loxxviii.

As professoras eram vistas como as responsáveis por incentivarem a total


participação estudantil nos desfiles
O encerramento do ano letivo era também transformado em um evento que cumpria
um papel da maior importância na formação cívica e moral, no qual se demonstrava a todos
os estudantes e aos seus familiares a necessidade de aplicação nos estudos e de aprovação
nos exames. Nessas ocasiões, o diretor da Instrução Pública comparecia, algumas vezes
acompanhado pelo presidente do Estado, ao edifício do Grupo Escolar Modelo, para
prestigiar a exposição dos trabalhos realizados pelas alunas durante o ano. As atas nas quais
constavam os nomes das alunas aprovadas eram lidas em sessão pública, à qual se seguia o
canto do hino nacional brasileiroxxix. Esse mesmo rito era adotado nos demais grupos
escolares.
As solenidades de inauguração dos grupos escolares e as celebrações das datas de
fundação dessas instituições tinham idêntico significado. O Grupo Escolar Barão de
Maroim foi inaugurado no dia oito de julho, data na qual se comemora a emancipação
política de Sergipe. Essa vinculação era comum e ocorreu também na inauguração de
outras instituições como o Grupo Escolar Coelho e Campos, no município de Capela, que
se realizou no dia 12 de outubro de 1918, celebrando também o dia do descobrimento da
América. “Durante a semana da inauguração do Grupo Barão de Maroim os jornais
aracajuanos anunciavam o evento, criando a expectativa de que fosse uma solenidade
grandiosa”xxx. Foram convidadas para a inauguração as principais lideranças políticas e
religiosas de Aracaju. Todos ressaltavam a imponência do prédio, que obedecia aos novos
preceitos pedagógicos. Firmo Freire evidenciou o papel do professor primário. Para ele, a

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educação era fundamental na formação das nacionalidades e no fortalecimento das


democraciasxxxi. A relação entre educação e civismo é enfatizada no pronunciamento de
Firmo Freire:

A instrucção primaria é, por assim dizer, o primeiro passo para a organização


da nossa defesa, porque a instrucção primaria é o hymno sabido de cor, é o
dever aprendido. Precisamos auxiliar a nossa nacionalidade,
consequentemente precisamos ensinar a ler e a contar, precisamos implantar
no coração das moças o mappa do Brasil, se quizermos estimular o sacrificio
da vida em fronteiraxxxii.

A ênfase que o engenheiro do Grupo Barão de Maroim dava ao civismo também


fica evidente quando ele compara a escola a um quartel. A escola seria o espaço no qual
deveria ter início a formação do soldado.
Essa preocupação com a formação cívica era também tônica nas aulas de Geografia,
História e Música. Nos programas de ensino havia a ênfase na formação do sentimento
patriótico dos alunos através de hinos patrióticos, do estudo de mapas e das riquezas
naturais do país. O programa também ressaltava a união dos cidadãos na defesa da pátria e
as virtudes do brasileiro.

Idéa de Deus, como creador de tudo e da alma immortal. O trabalho, sua


necessidade e dignidade. A economia, sua influencia na vida e na felecidade.
A perseverança nos bons desígnios, a energia nos emprehendimentos. A
patria, o que lhe devemos, a familia, o que lhe devemos, as virtudes cívicas.
A Bandeira; culto que lhe devemos e porque”xxxiii.

A ênfase no civismo incluía ainda a continuidade da influência da religião e o culto


à família.
Outro aspecto de fundamental importância para os grupos escolares do período era
o uniforme usado pelos estudantes. Além de promover e distinguir os grupos, o uniforme
também promovia uma espécie de igualdade entre os alunos, camuflando as diferenças
sociais. A importância do fardamento dos alunos dos grupos escolares é salientada por
Rosa Fátima de Souza quando ela diz que “o uniforme tem a poderosa capacidade de
igualar todos os indivíduos num mesmo nível de posição”xxxiv. Durante o período de 1918 a
1929, o uniforme adotado no Grupo Escolar Coelho e Campos para as alunas, era saia

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plissada e blusa branca de gola quadrada. Para os meninos, era a mesma blusa e a calça da
mesma cor do tecido da saia das meninas.

A Crise dos Anos 20

Na metade da década de 1920 eram muitos os questionamentos existentes em


Sergipe a respeito da eficácia do modelo dos grupos escolares. Um relatório publicado pelo
professor Helvécio de Andrade em 1926 é revelador da situação:

Segundo estou bem informado acham–se matriculados no grupo “Vigário


Barroso”, em São Cristóvão, 57 crianças, distribuídas por cinco classes,
enquanto há duas escolas isoladas com 90 crianças uma, e com 70 outra,
matriculadas. Não se pode dar testemunho mais cabal de desprestígio em que
caíram esses estabelecimentos, em que foram gastas elevadas somas de
dinheiro. Talvez porque fosse tão pouco procurado o grupo acima referido, 3
das 5 professoras à ele pertencentes passaram quase todo o ano na capitalxxxv.

A crise se expressava através da redução do número de matrículas nos grupos


escolares. No Grupo Escolar Coelho e Campos, a partir de 1929, começou a haver uma
evasão de alunos antes desconhecida. O diretor do Grupo, Bruno Manoel de Carvalho,
informou por mais de duas vezes que alunos já matriculados na instituição continuavam
saindo para as escolas particulares existentes na cidade, inclusive para o colégio das freiras,
Imaculada Conceição, que acabara de entrar em funcionamento.
O grupo escolar anexo à Escola Normal havia sido extinto e tal situação era vista
como grave deficiência no processo de formação dos professores do Estado de Sergipe.
Outra vez Helvécio de Andrade enfatizava o absurdo da existência de uma Escola Normal
sem grupo escolar anexo: “não compreendo uma escola normal, como não compreendo
escola de medicina sem hospital em anexo”xxxvi.
De um modo geral, os intelectuais responsáveis pela administração do ensino
atribuíam a crise ao abandono do plano original proposto para o Estado de Sergipe pelo
professor paulista Carlos da Silveira, que viera reformar o ensino sergipano em 1911,
durante o governo do médico Rodrigues Dória. De fato, após o retorno de Carlos da
Silveira a São Paulo, foram muitas as emendas ao regulamento do ensino proposto por este.

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Uma outra crítica à crise dos grupos escolares apontava o fato de estas instituições
haverem abandonado o método intuitivo que caracterizou os seus primeiros anos de
funcionamento em Sergipe. “A prática do método intuitivo introduzida em Sergipe em
1911, iniciada com vigor, que conquistou a confiança geral pela disciplina imposta a
docentes e discentes, quase perdeu o caráter de método geral, mesclado que se acha de
práticas obsoletas”xxxvii. Contudo, este não era um ponto de vista unânime. O método
intuitivo foi responsabilizado, em 1929, pela acentuada evasão escolar existente no Grupo
Escolar Coelho e Campos, da cidade de Capela, que vinha perdendo muitos alunos para o
Colégio Imaculada Conceição. Apesar de o Colégio Imaculada Conceição ser uma escola
de elite, utilizava métodos de ensino considerados ultrapassados pelo sistema de instrução
utilizado no Grupo Escolar Coelho e Campos. Os pais alegavam que com o método
intuitivo, os seus filhos só aprendiam a brincar, passear e nada mais. Outros alegavam que
os alunos não queriam se sujeitar ao novo programa de ensinoxxxviii. Na opinião dos pais de
alunos do Grupo Escolar Coelho e Campos, o método decorativo e a palmatória eram a
forma mais correta de ensinar e aprender. A melhor metodologia que consideravam mais
adequada continuava em uso apenas nas escolas particulares, inclusive no Colégio
Imaculada Conceição, razão pela qual muitos pais, transferiram seus filhos para o colégio
católico. Esta prática provocou uma redução no número de alunos matriculados no Grupo
Escolar Coelho e Campos, preocupando seriamente o diretor do Grupo.
Um outro grave problema apontado era o fato de os inspetores do ensino
responsáveis pelo acompanhamento do trabalho nos grupos escolares não estarem
diretamente ligados ao gabinete do diretor da Instrução Pública, mas sim lotados em
inspetorias regionais instaladas em diferentes municípios.

A inspeção do ensino perdeu, em grande parte, a influencia na organização


técnica e administrativa da escola. Os inspetores são agentes que atuam na
escola como orientadores do método e como fiscais de conduta legal dos
professores. A sua eficiência na primeira fase da reforma foi notável. Depois,
a frouxidão, a exceção, o desvirtuamento, o quase abandono, por culpa dos
que desmandaram ou não sabem mandar. A distribuição de inspetores por
sedes fixas, colocando–os fora do contato direto da direção geral, pondo–os,
a vontade, livres de trabalhar como e quando quiserem, ou de nada fazerem,
inutilizou tudo o que se conseguiu no começo (1911–1913). Escolas não
visitadas e práticas não examinadas são coisas que não substituem a
tendência para o descanso, a indisciplina e o abandono. Os inspetores

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deverão residir na capital e daí partirem para a inspeção com roteiros de


terminados, em tempo prefixadoxxxix.

A nova orientação da Diretoria da Instrução Pública vai fazer com que, a partir da
segunda metade dos anos 1920 se intensifique a atuação de inspetores de ensino como
Antonio Xavier de Assis, José Augusto da Rocha Lima e José de Alencar Cardoso,
orientando os professores através de reuniões que buscavam difundir os princípios e
métodos do ensino ativo, as excursões pedagógicas, a Pedagogia de Decroly e os novos
procedimentos de aprendizagem da leitura e da escrita.

Considerações Finais

No caso do Estado de Sergipe, é evidente a força do modelo de São Paulo, visível


através da presença, a partir de 1909, de técnicos paulistas como Carlos da Silveira,
exercendo a função de diretor da Instrução Pública e da Escola Normal. Também as
viagens a São Paulo de intelectuais e políticos de Sergipe, como Helvécio de Andrade, José
Augusto da Rocha Lima, Franco Freire, Penélope Magalhães, Abdias Bezerra e outros
atestam essa apropriação.
A estratégia de adotar o modelo de São Paulo é explícita no discurso dos dirigentes
da política educacional sergipana. Em Sergipe, os grupos foram implantados inicialmente
na capital do Estado e depois em outros municípios, organizados sempre sob a forma de
“templos–espaços” do ensino elementar e atendendo a uma clientela reduzida. Muitos dos
edifícios suntuosos construídos para os grupos escolares foram depois destinados a abrigar
outras instituições, como o Quartel da Polícia Militar e a Faculdade de Direito. Outros
desses edifícios majestosos continuam até os dias atuais servindo ao funcionamento de
escolas públicas de ensino fundamental ou médio, em Aracaju e no interior do Estado.
Os procedimentos que os grupos escolares adotaram revelam, através dos desfiles
nas datas cívicas, do processo de seleção de livros didáticos, da utilização dos hinos pátrios
e escolares, das récitas, das disputas esportivas, da educação física, a incorporação de novos
padrões de educação moral paralelamente a adoção do método intuitivo. O projeto de São
Paulo contribuiu para que fossem realizadas alterações profundas na estrutura do ensino do
Estado de Sergipe, através da política de formação de professores, da reorganização

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administrativa, da organização de um Conselho Superior de Instrução Pública e da


implantação dos grupos escolares.

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Notas

i
Doutor em Educação pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. Professor Adjunto do
Departamento de História e do Mestrado em Educação da Universidade Federal de Sergipe. E-mail:
jocarna@uol.com.br
ii
Cf. BARRETO, Luiz Antônio. 2003. “O Quincas (Marido de Professora)”. in: Gazeta de Sergipe. Aracaju,
21 de junho. p. 3.
iii
Cf. ANDRADE, Helvécio de. 1914. Relatório apresentado ao presidente do Estado pelo Dr. Helvécio de
Andrade.P. 18.
iv
Cf. BARRETO, Luiz Antônio. 2003. “Uma ponte chamada Eugenia”. in: Gazeta de Sergipe. Aracaju, 24 de
junho. p. 3.
v
Cf. OLIVEIRA, Maria Cecília Marins de. 2001. “O Grupo Escolar Dezenove de Dezembro: história e
organização”. in: Anais do I Congresso Brasileiro de História da Educação. Niterói, SBHE. CD Room.
vi
Cf. BARRETO, Luiz Antônio. 2003. “Uma ponte chamada Eugenia (II)”. in: Gazeta de Sergipe. Aracaju,
25 de junho. p. 3.
vii
Cf. HILSDORF, Maria Lúcia Spedo. 2003. História da Educação Brasileira: leituras. São Paulo, Pioneira
Thomson Learning. p. 71.
viii
Cf. KLINKE, Karina. 2001. “A leitura nos grupos escolares de Minas Gerais (1906–1927)”. in: Anais do I
Congresso Brasileiro de História da Educação. Niterói, SBHE. CD Room.
ix
Cf. COSTA, Mª. José Franco Ferreira da; SHENA, Denílson Roberto e SCHMIDT, Mª. Auxiliadora. 1997.
I Conferência Nacional de Educação. p. 198.
x
ANDRADE, Helvécio de. Op. cit. P. 09.
xi
LIMA, José Augusto da Rocha. 1931. Relatório. Aracaju: Imprensa Oficial.
xii
Cf. NUNES, Maria Thétis. 1984. História da Educação em Sergipe. p. 214.
xiii
Idem.
xiv
Instalado no município de Capela, foi o primeiro grupo escolar que funcionou no interior do Estado de
Sergipe, em 1918.
xv
Cf. ASSIS, Antônio Xavier de. 1919. Relatório apresentado a Diretoria de Instrução Pública de Sergipe
pelo inspetor escolar Antônio Xavier de Assis. Estado de Sergipe, 18 de janeiro.
xvi
Cf. SANTOS, Magno Francisco de Jesus. 2004. O Grupo Escolar Barão de Maroim e as Festas Cívicas de
Aracaju (1917–1919). Relatório de Pesquisa. São Cristóvão, Universidade Federal de Sergipe. (Programa
Integrado de Bolsas de Iniciação Científica – PIBIC/CNPq/UFS).
xvii
Cf. ASSIS, Antônio Xavier de. Op. cit.
xviii
Cf. SERGIPE. Decreto 563, de 03 de agosto de 1911.
xix
Atualmente, praça Tobias Barreto.
xx
Cf. AZEVEDO, Crislane Barbosa de. 2003. “General Valladão” : 85 anos de história em Aracaju. in: Jornal
da Cidade. Aracaju, 11 de setembro. Caderno B – Cidades. B–6.
xxi
O Grupo Escolar Coelho e Campos surgiu por iniciativa do sergipano José Luiz Coelho e Campos, à época
Ministro do Supremo Tribunal Federal.Cf. CRUZ, Maria Madalena da Silva. 2002. A trajetória do Grupo
Escolar Coelho e Campos (1918–145). Própria. Monografia (Licenciatura em História). Departamento de
História do Centro de Educação e Ciências Humanas da Universidade Federal de Sergipe.
xxii
Cf. “A inauguração do retrato do Dr. Pereira Lobo, no Grupo Escolar General Siqueira”. In: Sergipe
Jornal. 1922. Aracaju, 24 de outubro. p. 1.

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xxiii
Cf. SANTOS, Magno Francisco de Jesus. 2004. O Grupo Escolar Barão de Maroim e as Festas Cívicas
de Aracaju (1917–1919). Relatório de Pesquisa. São Cristóvão, Universidade Federal de Sergipe. (Programa
Integrado de Bolsas de Iniciação Científica – PIBIC/CNPq/UFS).
xxiv
Cf. AZEVEDO, Crislane Barbosa de. 2003. Nos majestosos templos do saber: a implantação dos grupos
escolares em Aracaju. Monografia (Licenciatura em História). São Cristóvão, Universidade Federal de
Sergipe.
xxv
Os hinos eram entoados no início das aulas, na saída para o recreio, no retorno do recreio, no encerramento
do expediente letivo e na recepção a visitantes ilustres.
xxvi
Cf. “Grupo Escolar”. In: O Estado de Sergipe. 1915. Aracaju, 09 de setembro. p. 2.
xxvii
Cf. “As comemorações da Semana da Pátria no Grupo Escolar General Valadão”. in: O Nordeste. 1939.
Aracaju, 04 de setembro de 1939. p.04. Apud MAYNARD, Dilton Cândido Santos. 1998. Em tempo de
guerra: aspectos do cotidiano em Aracaju durante a Segunda Guerra Mundial (1939–1945). Relatório de
Pesquisa. São Cristóvão, Universidade Federal de Sergipe. P. 70.
xxviii
Cf. Diário da Manhã. 12 de setembro de 1917.
xxix
Cf. “Grupo Modelo”. In: Correio de Aracaju. 1914. Aracaju, 21 de novembro. P. 1.
xxx
Cf. SANTOS, Magno Francisco de Jesus. 2004. O Grupo Escolar Barão de Maroim e as Festas Cívicas de
Aracaju (1917–1919). Relatório de Pesquisa. São Cristóvão, Universidade Federal de Sergipe. (Programa
Integrado de Bolsas de Iniciação Científica – PIBIC/CNPq/UFS).
xxxi
Cf. “Pronunciamento de Firmo Freire na inauguração do Grupo Escolar Barão de Maroim no dia 8 de
julho de 1917”. in: Estado de Sergipe, 10 de julho de 1917.
xxxii
Idem.
xxxiii
Cf. “Programa para o curso primário nos Grupos Escolares e Escolas isoladas do Estado de Sergipe.
Programa de Educação”. in: Estado de Sergipe, 23 de fevereiro de 1917.
xxxiv
Cf. SOUZA, Rosa Fátima de. 1998. Templos de Civilização: a implantação da escola primária graduada
no Estado de São Paulo (1890–1910). São Paulo: Editora da UNESP. p. 270.
xxxv
Cf. ANDRADE, Helvécio de. 1926. Instrução Pública: necessidade de uma regulamentação definitiva
dos ensino primário e normal. Relatório apresentado ao exmo sr. dr. Cyro de Azevedo, D. Presidente do
Estado. Em novembro de 1926. Aracaju, Typ. do Sergipe Jornal. p. 7.
xxxvi
Idem. p. 8.
xxxvii
Ibidem. p. 3.
xxxviii
Cf. Livro para registro de correspondências do Grupo Escolar Coelho e Campos. 1930–1932. Capela,
correspondências nº 351, 352 e 359. pp. 14–15.
xxxix
Cf. ANDRADE, Helvécio de. 1926. Instrução Pública: necessidade de uma regulamentação definitiva
dos ensino primário e normal. Relatório apresentado ao exmo sr. dr. Cyro de Azevedo, D. Presidente do
Estado. Em novembro de 1926. Aracaju, Typ. do Sergipe Jornal. p. 4.

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