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AS PROVÁVEIS INFÂNCIAS NAS ESCOLAS ISOLADAS DA CIDADE DE

SÃO PAULO (1894-1919)

Adilson Ednei Felipe1


Claudia Panizzolo2

Grupo de Estudos e Pesquisas: Infância, Cultura e História – GEPICH. Universidade


Federal de São Paulo.

Palavras-chave: escolas isoladas; primeira república; infância.

1 Introdução

A cidade de São Paulo se situava, no período da Primeira República, em plena


expansão urbana e, em uma cidade em expansão, “a arquitetura transforma-se em geometria
[e] [...] Os estratos da sociedade convertem-se nas massas” (MORSE, 1970, p. 274). Na
Educação a cidade se projetava em segmentos diversificados – grupos escolares, escolas
isoladas, escolas reunidas – que representavam, via de regra, as escolas públicas dedicadas ao
ensino da primeira infância.
Dentre os segmentos citados, podemos destacar as escolas isoladas, pois estas
representavam ao mesmo tempo a dimensão do passado a ser superado já que eram as escolas
de primeiras letras do Período Imperial, a permanência no presente haja vista a sua ampliação
durante o Período Republicano e a projeção para o futuro, tendo em consideração as tentativas
de modernização destas escolas pelos republicanos paulistas. Estas escolas atenderam na
cidade de São Paulo, as crianças de variados bairros e no estado de São Paulo, tornou-se
referência do ensino nos espaços rurais.
O presente estudo representa parte da tese de doutorado intitulada Nem
Modernidade, Nem Uniformidade: as escolas isoladas da cidade de São Paulo (1894-1919)
1
Doutor em Educação pelo Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Federal de São Paulo.
Professor da Rede Municipal d São Caetano do Sul e Coordenador Pedagógico da Rede Municipal de São
Bernardo do Campo. Contato: adilsonedneifelipe@gmail.com
2
Doutorado em Educação: História, Política, Sociedade pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo.
Estágio Pós Doutoral na Universidade de Caxias do Sul (Brasil) e na Università degli Studi Del Molise (Itália).
Docente do Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Federal de São Paulo UNIFESP.
Docente do curso de Pedagogia. Contato: claudiapanizzolo@uol.com.br

2
(FELIPE, 2023). O objetivo desta pesquisa está concentrado em identificar quais infâncias
eram atendidas nas escolas isoladas da cidade de São Paulo nas décadas iniciais da República,
assim como situá-las nas diferentes realidades vividas a depender de seus posicionamentos
sociais, econômicos e geográficos.

2 Fundamentação teórica
Esta pesquisa está amparada conceitos da Nova História Cultural. As categorias de
análise são “representação” segundo a perspectiva proposta por Chartier (1990), para o qual as
representações “[…] têm tanta importância como as lutas econômicas para compreender os
mecanismos pelos quais um grupo impõe, ou tenta impor, a sua concepção do mundo social,
os valores que são seus, e o seu domínio” (p. 17), permitindo a apreensão de que há uma
relação de contínuo abastecimento do status quo por meio da interação entre materialidades e
representações social, econômica e política. A categoria “estado” está fundamentada nos
estudos desenvolvidos por Norbert Elias (1991) que em sua obra O Processo Civilizador 2:
formação do estado e civilização tece considerações do papel do estado na propagação da
modificação das condutas em sociedade.

3 Metodologia
Como procedimentos metodológicos foram analisadas produções literárias, imagens e
mapas de sala, registros sobre exames, documentos legislativos e cartas disponíveis em
suportes digitais e físicos disponíveis no site Hagop Garagem, no acervo digital e físico do
Arquivo Público do Estado de São Paulo, Arquivo Municipal de São Paulo, Domínio Público,
Alesp, acervo digital da Biblioteca Nacional e acervo digital do jornal O Estado de São Paulo.
Os procedimentos de análise tomaram por base entendimentos descritos por autores como
Kosoy (2021) no trato das relações entre a fotografia e a pesquisa histórica, Farge (2009) e
Bacellar (2005) no que se refere aos documentos dos arquivos, e Luca (2005) em relação às
pesquisas realizadas em periódicos.

4 Resultados e Discussão
Os resultados desta pesquisa indicaram a existência de um atendimento variado das
escolas isoladas às infâncias paulistas durante as primeiras décadas republicanas. Estas

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escolas atendiam crianças de diferentes grupos étnicos, sociais e econômicos da cidade,
distribuindo-se e disseminando o ensino das primeiras letras em diversas regiões. No entanto,
coube discutir a relação entre estas diferenças e as desigualdades nos atendimentos,
lembrando ainda que um número considerável das crianças da cidade de São Paulo não se
encontrava nas escolas (MOURA, 1999).

5 Considerações Finais
As possibilidades de entendimento propiciadas por esta pesquisa indicaram caminhos
para a identificação e apreensão de algumas dimensões das infâncias paulistas na Primeira
República. Neste sentido, ao identificar e apreender as proximidades e os distanciamentos
entre as infâncias da cidade de São Paulo no período inicial republicano, também ocorreu a
viabilização de uma percepção das desigualdades e do papel do estado na manutenção destas
disparidades, partindo do princípio da distribuição e fornecimento de condições para o devido
funcionamento e aprimoramento dos serviços públicos – seja a providência de serviços
sanitários, comunicação, água, luz, transporte ou educação.
A presença de crianças imigrantes ou filhas de imigrantes apresentam também nuanças
internas das desigualdades que já se apresentavam em suas formas de adentrar ao país, como
nos indica Panizzolo (2020) e prosseguem após o seu estabelecimento, como podemos
identificar na produção literária de Alcântara Machado. A distribuição geográfica também
estava relacionada à propagação das diferenças. As distinções étnicas, econômicas, sociais e
geográficas, embora se façam presentes de forma majoritária, o que pode ser observado tanto
no conto Negrinha de Monteiro Lobato, quanto em trechos de Éramos Seis de Maria José
Dupré, não são definidores absolutos.
A análise das fotografias viabilizou o traçar de imagens de infância em seus diversos
espaços e atuações, tanto quanto os documentos escritos, fossem estes jornais, registros
oficiais ou produções literárias. Neste sentido, as localizações das escolas isoladas e as
imagens e descrições dos bairros da cidade de São Paulo apresentaram crianças em uma
variedade de condições – pobres, privilegiadas, trabalhadoras do comércio e das indústrias, na
rua, nas escolas, brincando, não brincando. Assim sendo, as desiguais realidades que se
apresentavam entre os espaços citadinos, entre suas escolas, também se apresentavam entre as
infâncias paulistas.

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Referências

BACELLAR, C. Uso e Mau Uso dos Arquivos. In: PINSKY, C. B. (Org.). Fontes Históricas.
São Paulo: Contexto, 2005.

BARTHES, R. Câmara Clara. 9. ed. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1984.

CHARTIER, R. A História Cultural: entre práticas e representações. Tradução: Maria Manuela


Galhardo. 2ª ed. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 1990.

ELIAS, N. O Processo Civilizador, vol. 2: formação do estado e civilização. Rio de Janeiro:


Zahar, 2011.

FARGE, A. O Sabor do Arquivo. São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo. 2009.

FELIPE, A. F. Nem Modernidade, Nem Uniformidade: as escolas isoladas da cidade de São


Paulo (1894-1919). Orientadora: Claudia Panizzolo. 275f. (Doutorado em Educação).
Universidade Federal de São Paulo – UNIFESP, 2023.

LUCA, T. R. de. História dos, nos e por meio dos Periódicos. In: PINSKY, C. Fontes
Históricas. São Paulo: Contexto, 2005. p. 111-153.

MOURA, E. B. B. de. Meninos e Meninas de Rua: impasse e dissonância na construção da


identidade da criança e do adolescente na República Velha. Revista Brasileira de História,
1999, 19 (37), p. 85-102. Disponível em:
https://www.scielo.br/j/rbh/a/8VRmw4qKHcp4VxGHPBsLpPG/?lang=pt#ModalHowcite.
Acesso em: 1 maio 2023.

PANIZZOLO, C. O Cotidiano de Crianças Italianas de Lá e de Cá do Oceano Atlântico:


algumas considerações sobre a infância entre fins do século XIX e início do século XX.
Conjectura: Filos. Educ., Caxias do Sul, RS 135-155, v. 25, Dossiê, 2020.

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