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RAIVA 
 

Por que nos preocupamos com a raiva? No fim das contas, não é verdade que todos nós 
sentimos raiva? De fato, a raiva é um sentimento humano que todos experimentamos de vez 
em quando. O principal problema está nas consequências, o que acontece quando você fica com 
raiva? Se não acontece nada quando você fica com raiva, então a sua raiva não é razão para 
preocupação, porque as consequências são limitadas. No entanto, se tiver atitudes derrotistas 
em relação a si ou se fizer mal aos outros, e se a sua raiva tiver consequências dolorosas ou 
prejudiciais, então talvez tenha razão para se preocupar com ela. 
Por exemplo: você está guiando por uma autoestrada, atrás de uma pessoa que conduz 
a 50 km, quando a velocidade permitida é de 80 km, e se atrasa para um encontro. Começa a 
sentir‐se muito irritado por causa disso, ultrapassa impudentemente o outro carro. Põe a sua 
própria  vida  e  a  dos  outros  em  risco  por  causa  da  sua  condução  imprudente,  ou  seja, 
potencialmente uma consequência muito perigosa da sua raiva. 
Outro exemplo das consequências nocivas da sua raiva poderia ser o seguinte:     
‐ Já é tarde, você quer ir embora do trabalho mais cedo, para jogar futebol. Começa a trabalhar 
mais cedo e também trabalha na hora do almoço, para compensar o fato de sair mais cedo. No 
meio da tarde, aparece o seu patrão e lhe dá uma nova tarefa, e quer que seja feita antes de 
você ir embora. Você obedece, mas só acaba a tarefa muito tarde, quando já não dá mais para 
jogar  futebol.  Enquanto  o  tempo  vai  passando,  mais  você  se  sente  furioso.  Quando  sai  do 
trabalho, para num bar a caminho de casa, para aliviar um pouco da sua raiva. Acaba bebendo 
demais, chega a sua casa muito tarde e tem uma discussão com a sua mulher, a quem não se 
preocupou em telefonar para avisar que chegaria mais tarde. 
  Ou , em vez de parar num bar, pode ir diretamente para casa depois do trabalho, de 
muito mau humor.  Tropeça nos  brinquedos das  crianças, espalhados pela sala, onde os seus 
filhos estiveram brincando, esperando você chegar. Despeja a sua raiva contra as crianças, as 
mandando  arrumarem  a  sala;  ao  ver  que  elas  demoram  a  arrumar  os  brinquedos,  você 
finalmente, num ataque de fúria, ordena que elas vão para cama. Depois, senta‐se para jantar 
com a sua mulher e a acusa violentamente por ser uma péssima mãe. 
  Para alguns de nós, as consequências dolorosas ou prejudiciais da raiva, resultam em 
expressarmos abertamente contra as outras pessoas. Exemplos extremos dessas consequências 
são as formas de violência doméstica e de brutalidade contra as crianças. Por outro lado, alguns 
de  nós  podemos  negar  os  sentir  dificuldade  em  aceitar  e  falar  abertamente  sobre  os 
sentimentos de raiva, contra as outras pessoas. Podemos esconder a nossa raiva, guardando ela 
para nós mesmos, engolindo ela dentro de nós. Podemos ter medo de que os outros não gostem, 
se a manifestarmos francamente. 
  Nós reprimimos a nossa raiva, qualquer que seja a razão, fazíamos o uso de drogas para 
amenizar o sentimento de raiva, ou seja, reprimíamos nossos sentimentos. Enquanto usávamos, 
podemos ter nos tornado pessoas fisicamente hostis. 
  Outros  de  nós  podem  ter  escondido  os  seus  sentimentos  de  raiva,  mas  depois 
descontam essa raiva contra pessoas que o amam. 
 
 
 
 
 
 
 
 
   

APRENDER A COMPREENDER A RAIVA E AS SUAS CAUSAS 
 
  Aprender a lidar com a raiva de forma saudável, sem fazer mal a nós próprios ou aos 
outros, é uma parte importante de nossa vida. Embora seja importante para todos nós, sermos 
capazes de enfrentar de forma eficaz a nossa raiva, para alguns, isso se torna especialmente 
importante. 
  Se  estivermos  em  recuperação  das  drogas  e  do  álcool  ou  de  problemas  emocionais, 
podemos correr o risco de uma recorrência desses problemas se não aprendermos a controlar 
a nossa raiva. 
  “Irrita‐me tanto”. 
  A maior parte de nós pensa que são as outras pessoas ou situações que nos fazem ficar 
irritados. Achamos que o que as outras pessoas fazem ou o que nos acontece que isso é o que 
causa a nossa raiva. Atiramos para cima dos outros a responsabilidade da nossa raiva “eles me 
deixam loucos”. Ou achamos que temos um gênio ruim, como se fôssemos sempre desse jeito 
e não poderíamos mudar. Achamos que não podemos mudar esses sentimentos perturbados 
sem  que  as  “causas”  (pressões  exteriores  ou  outras  pessoas)  mudem.  Acusar  nos  permite 
racionalizar a nossa raiva. Arranjamos desculpas para os nossos sentimentos de raiva, colocamos 
a culpa nos outros e nos recusamos a mudar o nosso jeito. 
  Para alguns de nós, culpar outras pessoas ou situações pela nossa raiva nos fornece uma 
desculpa para usar álcool ou drogas. Para outros, essa acusação constitui uma justificação para 
a nossa raiva, e por isso não a largamos. 
  Contrariamente à crença comum sobre a raiva (de que os casos ou as situações é que 
nos fazem ficar irritados) o que realmente nos faz sentir e pensar com raiva sobre as coisas que 
nos acontecem. Aquilo que pensamos ou que contamos a nós mesmos sobre um acontecimento 
é que nos faz sentir raiva, e não o acontecimento em si mesmo. 
  Normalmente, quando julgamos ou avaliamos qualquer coisa de forma negativa ficamos 
perturbados.  Se  julgarmos  ou  avaliarmos  uma  coisa  de  forma  menos  negativa  ou  mais 
positivamente, nos sentimos de forma geral, melhor. 
  Basicamente, não são os acontecimentos que nos perturbam, mas sim a nossa forma de 
pensar sobre esses acontecimentos. Por outras palavras, sentimos como pensamos. 
 
UM EXEMPLO 
 
  Uma mãe leva o filho de 1 ano para visitar uma amiga. A criança engatinha pelo chão 
enquanto as duas mulheres conversam. Certa hora, a criança se estica até a mesinha onde estão 
algumas revistas e então começa a jogar as mesmas no chão. 
  A mãe afasta a criança da mesa, coloca as revistas na mesa e continua a conversar com 
a  amiga.  A  criança  volta  a  engatinhar  até  a  mesinha,  se  estica,  e  começa  de  novo  a  jogar  as 
revistas no chão. A mãe observa a situação e pensa consigo mesma: “‐Ele não devia fazer isto...” 
“Não  devia  ser  tão  irritante...”  “Não  devia  interromper  a  minha  conversa...”  “Não  devia  me 
aborrecer...” A mãe grita e bate na criança, e a criança a chorar. 
  A amiga também observou a criança jogando as revistas no chão e pensa com ela: “É 
próprio de uma criança de 1 ano mexer nas coisas” “Teria sido melhor se eu tivesse preparado 
a  sala  para  poder  receber  uma  criança  antes  de  chegarem”  “A  criança  precisa  se  distrair.”  A 
amiga diz então: “Vamos ver se encontramos outras atividades que interessam ao seu filho.” 
Este exemplo demonstra como sentimos da forma como pensamos. 
  Com base na forma como encararam a situação, uma das mulheres ficou irritada e a 
outra  não.  Aquilo  que  pensaram  ou  disseram  a  si  próprias,  a  forma  como  avaliaram  as 
circunstância determinou o que sentiram. 
  Então, o que estamos dizendo realmente é que o nosso pensamento a respeito de uma 
situação é que causa a nossa raiva, e não a situação em si. A maneira de pensar que provoca em 
nós sentimentos de raiva tem a ver com a nossa necessidade de controle e a nossa exigência de 
   

que  tudo  seja  feito  da  nossa  maneira.  A  sequência  começa  quando  queremos  que  as  coisas 
corram segundo a nossa vontade, o que é um exemplo normal do egocentrismo que todos nós 
temos. Quando esse desejo não se realiza e não conseguimos aquilo que queremos, podemos 
ficar com raiva. 
  No entanto, o que acontece com a nossa raiva, é que a nossa forma de pensar muda ou 
se desvia quando queremos que tudo seja exatamente do nosso jeito (tem que ser como eu 
quero!). Quanto mais sentimos raiva, mais exigimos que as coisas sejam do nosso jeito, mas não 
conseguimos. 
 
EGOCENTRISMO: A necessidade de controlar “Conseguir o que quero”. 
 
FLEXÍVEL  RÍGIDO 
Querer que as coisas corram como eu quero  Exigir que as coisas corram como eu quero e 
e não conseguir. Eu quero, desejo ou prefiro  não conseguir. Devia ter, tenho que ter uma 
uma  coisa  e  não  obtenho:  consequência  –  coisa e não consigo: consequência – ira, ódio, 
raiva (sentimento de perturbação normal).  rancor (sentimentos de perturbação intensa). 
CONSEQUÊNCIAS DA NOSSA RAIVA 
 
  As consequências da nossa raiva movida por ressentimentos ou crenças errôneas, serão 
sempre tentando conseguir o que queremos sendo agressivos, verbal ou fisicamente (gritando, 
berrando ou batendo). O que acontece com a nossa relação com os outros, se usarmos a raiva 
para conseguir o que queremos? Como é que os outros nos veem? Evitam‐nos? Ignoram‐nos? E 
como é que isto nos atinge sobre a aceitação que temos de nós próprios? 
 
UM EXEMPLO: 
 
  É sábado de manhã e você faz questão de arrumar uma cadeira de madeira do pátio, 
que se partiu. Desce até a sua oficina no porão, abre a porta e descobre que seu filho de dez 
anos deixou todas as suas ferramentas espalhadas pelo porão. Observa a cena e pensa “O que 
é que se passa com aquele rapaz?” “Ele deveria saber que não pode deixar as minhas jogadas 
no chão”. “Ele tem que se lembrar do que eu disse sobre arrumar as coisas”. “Não devia ter feito 
isso”.  “As  minhas  ferramentas  tem  de  ficar  arrumadas  como  deve  ser”.  “Vai  ver  o  que  vai 
acontecer quando chegar em casa”. Em consequência disto, você sente raiva. Procura então o 
martelo  e  não  consegue  encontrá‐lo  e  pensa:  ”Não  devia  perder  meu  tempo  procurando  o 
martelo” e cada vez se sente mais furioso. Finalmente encontra o martelo e os pregos, e começa 
a arrumar a cadeira. Com a irritação, acaba entortando um dos pregos e pensa novamente “Isto 
não deveria acontecer” e fica cada vez mais furioso. Ao tentar endireitar o prego, bate com o 
martelo em seu polegar e grita “Não posso aguentar isto!” Enche‐se então de raiva (fica irado e 
irritado)  e  joga  o  martelo  longe,  que  acaba  batendo  no  banco  que  estava  contra  a  janela, 
quebrando o banco e a janela. Arrasta‐se pesadamente pelas escadas. Tendo por costume usar 
álcool ou drogas para aliviar a sua raiva, pode ser que se dirija para uma destas saídas. Abre a 
geladeira, pega uma cerveja e vai para a sala beber enquanto assiste Palmeiras x Corinthians na 
TV, pelo resto da tarde. Depois se torna implicante e critica os outros membros da família até o 
fim do dia. Ou, se não for dependente químico, pode talvez subir as escadas, sentar‐se numa 
cadeira cozinhando a sua irritação até que seu filho de dez anos chegue em casa. Então grita 
com ele dizendo‐lhe que é “um irresponsável, que não presta para nada, e que não pode confiar 
nele para nada”. Depois, o manda para o quarto e o deixa de castigo por todo o fim de semana. 
Nesse  exemplo,  foram  as  exigências  do  pai  de  que  o  filho  não  devia  ter  deixado  as  suas 
ferramentas  jogadas  pelo  chão  e  que  deveria  fazer  as  coisas  do  seu  jeito  e  isso  acabou  o 
irritando. Se ele tivesse alterado as suas exigências para as preferências, não teria ficado como 
raiva. O diálogo interior poderia ter sido estruturado dessa forma: 
“Teria sido melhor se ele tivesse arrumado as ferramentas quando acabou.” 
   

“Era melhor se ele deixasse as coisas arrumadas como eu deixo.” 
Com estas preferências mais realistas, o pai poderia então ter conversado com o filho a respeito 
do assunto, e explicado sobre as vantagens da ordem e do respeito pelas coisas dos outros. Há 
outro aspecto a considerar no desenrolar dos sentimentos de raiva. Quando ficamos com raiva 
por  causa  daquilo  que  pensamos,  essa  raiva  pode  distorcer  os  nossos  pensamentos  ou 
percepções sobre a situação, tal como se víssemos as coisas através de “óculos da raiva”. É difícil 
observar uma situação positivamente ou com realismo quando estamos com raiva, é provável 
que agir segundo estas percepções distorcidas, torne a situação ainda pior ou agrave perante as 
suas consequências negativas. A maior parte de nós poderá recordar situações em que a raiva 
nos impediu de observarmos e compreendermos claramente o que se estava a passar.  
 
APRENDER A CONTROLAR NOSSA RAIVA 
Como poderemos então controlar os nossos sentimentos de raiva? Se for a nossa maneia irada 
de  pensar  que  causa  a  nossa  raiva,  terá  de  trabalhar  para  modificar  ou  substituir  os  nossos 
pensamentos irados de forma a reduzirmos ou controlarmos essa raiva. Podemos alternar as 
exigências que estão na base dos nossos pensamentos irados (não deveria discordar de mim, eu 
não devia cometer erros, tem de ser pontual) e nos esforçarmos para deixar de controlar tudo 
ao nosso redor. Isto poderá parecer simples e evidente, mas como é que se aprende a modificar 
a nossa forma irada de pensar? Para começar, podemos fazer um “inventário pessoal”. Fazer 
um inventário pessoal sobre a nossa raiva, nos ajuda a desenvolver uma maior consciência e 
compreensão  quanto  a  sua  origem,  quanto  às  suas  consequências  de  ficarmos  amarrados  a 
essas situações e quanto ao que nossos sentimentos e a tomar consciência da nossa necessidade 
de controle. Pode usar o esquema “ABC” para ajudar a compreender a “anatomia” da raiva. 
 
A = Situação 
O problema que nos desperta certos sentimentos que perturbam ou enraivecem.  
 
B = Convicções 
O que pensa ou o que diz a si mesmo (as suas exigências) a respeito da situação. 
 
C = Sentimentos e ações 
Como se sente (perturbado ou enraivecido) a propósito da situação por causa do que pensa, e 
como se comporta ou atua por causa do que sente: as consequências derrotistas ou dolorosas. 
 
UM EXEMPLO 
 
A = Situação 
Vou para a cozinha esperando que o meu almoço esteja pronto, antes de ir trabalhar. Encontro 
minha mulher ajudando nossa filha com os deveres da escola. Sendo assim, meu almoço ainda 
não está pronto. 
 
B = Convicções 
Acho que minha mulher poderia ter feito meu almoço e que minha filha deveria fazer os deveres 
da escola sozinha. 
 
C = Sentimentos e ações 
Sinto‐me cheio de raiva. Grito com ela. Digo que meu trabalho é mais importante do que os 
deveres  da  escola  de  uma  criança  e  saio  violentamente  de  casa.  Chego  ao  trabalho  muito 
irritado. 
 
Se eu tivesse analisado essa situação de forma objetiva ou realista, teria compreendido que a 
minha mulher já tinha feito uma opção ao ajudar a nossa filha nos deveres da escola. As coisas 
   

do meu jeito apenas refletiam as minhas exigências egocêntricas, e geraram a raiva que tive em 
casa e levei comigo ao trabalho. 
 
FAZER UM “DIÁRIO DE BORDO” 
Como parte do processo de aprendizagem para fazer um inventário pessoal sobre a sua raiva, é 
muito útil fazer um “diário de bordo”. Para começar, tome nota de acontecimentos ou situações 
passadas ou recentes em que sentiu raiva. Ao descrever essa experiência, use o esquema "ABC”. 
 
 A    B    C  
Situação  Convicções  Sentimentos e ações 
 
Depois de ter alguma prática na descrição de manifestações da sua raiva, passadas ou recentes, 
pode considerar útil trazer consigo um pequeno bloco para fazer um registro diário das suas 
manifestações  de  raiva.  Ao  longo  do  dia,  pode  usar  o  esquema  “ABC”  para  tomar  nota  de 
exemplos  dos  seus  sentimentos  de  raiva.  Fazer  um  diário,  o  ajuda  a  desenvolver  uma  maior 
consciência da sua raiva, das causas e consequências. Fazer um  diário o ajuda também a  ter 
contato com os seus sentimentos.  
 
USAR O PROCESSO “ABC” – ABRANDAR A “FERRADURA” 
 
  A primeira parte do processo ABC para o controle dos sentimentos de raiva pode ser 
comparado à analogia entre a chaleira e a raiva. Podemos imaginar a nossa raiva como sendo a 
água dentro de uma chaleira sobre o fogão. Se a água continuar a aquecer, sairá pela chaleira 
em forma de vapor. 
  Com a nossa raiva acontece o mesmo (quanto mais sentimos raiva, mais provável que 
ela se exteriorize abertamente). Algumas pessoas acreditam que a melhor forma de lidar com a 
raiva é ficarem aliviadas, será como a chaleira. 
  No entanto, se apagar o fogo debaixo da chaleira não terá o jato de vapor. Aquilo que o 
processo ABO nos mostra é que se “diminuirmos a chama” dos pensamentos irados que estão 
“fervendo” da nossa raiva, não haverá necessidade de expelir essa raiva. Mantendo‐nos alerta 
para detectar os primeiros sinais de raiva e nos dirigindo uma mensagem de auto ajuda, não 
ficaremos tão “enfurecidos” que tenhamos que “despejar o vapor”. 
 
USAR O D – PÔR EM QUESTÃO A NOSSA FORMA DE PENSAR 
 
  O passo seguinte na aprendizagem do controle da raiva consiste em acrescentar um D 
ao esquema ABC, a fim de provocar uma mudança. É aqui que começamos a modificar os nossos 
sentimentos de raiva ao questionarmos os nossos pensamentos irados (as nossas exigências). 
Praticando  o  inventário  pessoal  ABC  aprendemos  a  identificar  os  pensamentos  perturbados, 
exigentes e negativos que nos fazem sentir raiva. Em seguida, vamos por os seguintes tipos de 
questões: Quem disse isso? Por quê? Que provas eu tenho? Haverá outra forma  que me possa 
ser  mais  útil  na  análise  da  situação?  Por  fim,  respondemos  as  nossas  perguntas...  Voltemos 
agora ao exemplo da condução previamente citado, e o colocamos em formato ABC. 
 
UM EXEMPLO 
A = Situação 
  Estou seguindo em uma estrada atrás de um carro que vai a 50Km tendo a estrada o 
limite de 80Km e estou atrasado para um compromisso. 
 
B = Convicções 
  Esta pessoa devia dirigir de acordo com o limite de velocidade. Não devia me atrasar. 
Tenho que chegar a tempo para o meu compromisso. 
   

 
C = Sentimento 
  Raiva. 
 
D = Discussão 
  Quem é que disse que ele devia andar a 80Km? (fui eu). Porque ele não pode ir à minha 
frente? Não há razão para que eu tenha sempre de fazer a minha vontade. Porque eu deveria 
chegar  na  hora  certa?  Não  vai  ser  nenhuma  desgraça  se  eu  chegar  atrasado;  iriam  me 
compreender. Deixe de controlar tudo a sua maneira. Talvez a pessoa esteja dirigindo o mais 
rápido que é capaz. Era melhor eu esperar e ultrapassar quando seguro. 
 
  No passo D do esquema ABC, iniciamos o processo de enviar a nós mesmos algumas 
mensagens novas para afastarem ou tomarem o lugar dos nossos pensamentos egocêntricos e 
exigentes. Este “gênero” de mensagens novas que nos dirigimos e que nos prestam auxílio são 
mais  realistas  e  menos  perturbados,  e  podem  nos  ajudar  a  reduzir  a  nossa  necessidade  de 
controle. 
 
RESOLVER OS PROBLEMAS – ACRESCENTAR E, F e G 
 
  Usar o esquema ABC como inventário pessoal nos ajuda a ter uma visão mais clara dos 
fatores que contribuem para sentirmos raiva e saber como começar o processo de mudança. 
  Compreender isto nos leva a seguir os passos (E, F e G) do esquema ABC. Mantendo um 
simples diário sobre a nossa raiva, podemos desenvolver uma maior consciência a seu respeito 
e  a  respeito  das  suas  consequências.  Podemos  então  começar  a  modificar  a  nossa  forma  de 
pensar  irada  e  exigente,  nos  fazendo  perguntas  que  ajudem  a  reduzir  a  raiva  que  sentimos. 
Descobriremos  que  determinadas  situações  provavelmente  nos  perturbarão  ou  enraivecerão 
menos, se colocarmos em questão a nossa forma de pensar. 
  Quando estivermos menos perturbados, poderemos analisar o problema claramente e 
decidir  como  fazer  para  que  a  situação  se  desenrole,  criando  objetivos  realistas  para  nós 
mesmos (E). Podemos nos perguntar: “O que eu posso mudar nesta situação e o que eu tenho 
que  aceitar?”  Isto  se  aplica  na  Oração  da  Serenidade:  “Concedei‐me  Senhor  a  serenidade 
necessária, para aceitar as coisas que não posso modificar, coragem para modificar aquelas que 
eu posso e sabedoria para distinguir uma das outras.” 
  Tendo decidido aquilo que quer que aconteça, pode perguntar a si mesmo: O que eu 
posso fazer de útil para obter aquilo que quero? Como consequência começa a perceber quais 
são as opções construtivas (F) para alcançar os seus objetivos. Seleciona então uma opção e põe 
ela em prática (G). 
 
 
A = Situação 
  A  situação  problemática  que  está  causando  alguns  sentimentos  que  o  perturbam  ou 
enraivecem. 
 
B = Convicções 
  O que pensa a respeito da situação ou o que diz dela a si mesmo (as suas exigências). 
 
C = Sentimentos e Ações 
  O que sente (perturbação ou raiva) a respeito da situação por causa do que pensa, e 
como age por causa do que sente (as consequências derrotistas ou dolorosas). 
 
D = Discussão 
   

  Questionar  e  desafiar  os  pensamentos  que  o  perturbam  ou  enraivecem  as  suas 
exigências. Quem disse isso? Por quê? Haverá uma maneira mais eficaz de encarar a situação? 
 
E = Objetivos realistas 
  Novos objetivos realistas em relação a situação. O que gostaria de ver acontecer? O que 
quer? 
 
F = Opções construtivas 
  O que poderá fazer de útil para obter o que deseja? 
 
G = Coloque a sua opção em prática 
  Selecione uma opção e a coloque em prática. Ação construtiva! 
 
UM EXEMPLO: 
A = Situação 
  Fim  de  tarde.  Você  está  na  cozinha  seguindo  com  todo  o  cuidado  uma  complicada 
receita  de  bolo  e  pesando  os  ingredientes.  De  repente,  os  seus  filhos  entram  na  cozinha 
correndo, gritando e pedindo bolachas. Eles se esticam por cima da bancada para chegar à lata 
de bolachas; fazendo isso derrubam a tigela com os ingredientes que você estava pesando. 
 
B = Convicções 
  Pensa consigo mesmo: “O que essas crianças têm?” “Não são capazes de ver que estou 
ocupado e não posso ser interrompido?” “Não deviam entrar correndo desta maneira.” “Deviam 
ter mais consideração por mim.” “Não suporto que me interrompam assim.” 
 
C = Sentimentos e Ações 
  Se sente cheio de raiva. Grita com os seus filhos. Os chama de “egoístas e estourados”. 
Não os deixa comer. Manda‐os para o quarto e diz a eles que não poderiam sair de lá antes que 
os chame. 
 
D = Discussão 
  Começa  a  questionar  as  suas  exigências:  Quem  é  que  disse  que  eu  não  poderia  ser 
interrompido?  Fui  eu  quem  disse.  As  interrupções  acontecem.  Se  eu  tivesse  olhado  para  o 
relógio tinha visto que as crianças estavam chegando Por que é que não iriam correndo para 
cozinha comer? Eu sei que o dia de escola é muito comprido para elas e que esperam lanchar 
quando  chegam  a  casa.  Seria  melhor  se  mostrassem  mais  consideração  pelas  minhas 
necessidades,  mas  eu  também  tenho  de  mostrar  consideração  pelas  necessidades  delas.  Era 
melhor  se  não  me  interrompessem  quando  estou  na  cozinha,  mas  posso  aguentar  as 
interrupções! Se sente agora desapontado e frustrado, mas não com raiva. 
 
E = Objetivos realistas 
  No  futuro,  gostaria  de  poder  acabar  de  cozinhar  sem  ser  interrompido,  mas  gostaria 
também de evitar ter discussões com os meus filhos quando chegam da escola. 
 
F = Opções construtivas 
  Podia  preparar  a  comida  para  uma  ocasião  em  que  as  probabilidades  de  ser 
interrompido fossem menores. Quando for possível, planejarei o trabalho de forma que esteja 
pronto quando os meus filhos chegarem a casa. Terei alguma coisa preparada para comerem 
quando chegarem. 
 
G = Colocar as opções em prática 
   

  A próxima vez que fizer um bolo, o farei de manhã, depois do almoço talvez. Durante 
esta semana, pelo menos três tardes, deixarei em lanche para quando as crianças chegarem. 
Também deixarei em tempo livre para quando as crianças voltam da escola e mostrar interesse 
pelas atividades que tiveram durante o dia. 
Controlar a raiva que sente através do processo ABC, você terá que praticar muito até 
conseguir alguns resultados. É por isso que muitos de nós nos tornamos “especialistas” em ficar 
com raiva. A raiva se torna a forma habitual de lidar com situações problemáticas, quando as 
coisas não acontecem como gostaríamos. O que isto significa, é que iria precisar de muita prática 
para  aprender  a  controlar  a  raiva  através  do  processo  ABC,  e  “desaprender”  os  seus  velhos 
hábitos. 
 
MAIS SOBRE O PROCESSO ABC 
 
  Pode usar o processo ABC quando começar a sentir raiva. Começa treinando a perceber 
os sinais iniciais dos seus sentimentos de raiva, e os utiliza como sinais de “STOP”. Foca‐se ao 
entrar em contato com os seus sentimentos de raiva no momento exato em que começar a se 
sentir  perturbado.  É  mais  fácil  fazer  qualquer  coisa  para  controlar  e  transformar  esses 
sentimentos de frustração e desapontamento, quando está começando a se sentir perturbado, 
do que quando já está furioso ou com um acesso de fúria. 
  Controlar  os  nossos  sentimentos  é  como  controlar  um  carro.  É  mais  fácil  controlar  a 
velocidade de um carro que vai a 20Km por hora do que daquele que vai a 80Km. Da mesma 
forma,  é  mais  fácil  acalmar  os  nossos  sentimentos  antes  que  eles  comecem  realmente  a  se 
tornar incontroláveis. 
  O que isto significa é que cada um de nós tem de desenvolver uma maior consciência 
dos  sinais  ou  indicações  da  nossa  raiva,  igual  como  cerramos  os  dentes  e  passamos  mal  do 
estômago. As formas como cada um exterioriza a sua raiva são diferentes. Uma das primeiras 
tarefas para aprendermos a controlar a raiva é aprendermos a identificar as suas manifestações 
de  forma  que  podemos  usar  como  avisos  para  pararmos.  Então,  enviando  mensagens  mais 
realistas, podemos nos sentir frustrados e desapontados com o comportamento das pessoas, 
mas não teremos raiva nem jogaremos pragas nelas. 
 
USAR MENSAGENS ÚTEIS 
 
  O passo seguinte no processo ABC consiste em utilizar estas pistas como sinal inicial para 
sua raiva, para poder controlar este sentimento. Para fazer isto, poderá enviar uma mensagem 
eficaz,  que  se  oponham  as  habituais  mensagens,  exigentes  e  prejudiciais,  que  provocam  os 
sentimentos de raiva. 
  Uma mensagem que poderá achar particularmente eficaz é: “Devagar se vai ao longe, 
não se irrite”. 
  De início poderá achar necessário endereçar mensagens mais longas a fim de suspender 
as velhas mensagens, negativas e exigentes. Provavelmente praticou tanto a forma de pensar 
com raiva que poderá ser necessário, a princípio, conversar mais consigo mesmo para conseguir 
“largar” ou modificar essa forma de pensar. 
  Mensagens  suplementares  que  ajudarão  a  melhorar  a  situação  são  aquelas  que  o 
colocam  em  contato  com  o  seu  egocentrismo  e  necessidade  de  controle.  Pare  de  ser  tão 
exigente. Por que é que tem que ser sempre como eu quero? Por que é que os outros não fazem 
o que eu quero? Continuará a sentir alguma perturbação (querer usar a TRE não faz calar os seus 
sentimentos), mas vai se sentir frustrado ao invés de sentir raiva. 
  Inicialmente, aprender a controlar os seus sentimentos poderá ser difícil  em relação a 
certas situações que o perturbaram no passado igual aqueles que envolveram problemas com o 
seu parceiro (a), os seus filhos ou no seu trabalho. 
   

  Devido aos seus sentimentos de raiva, geralmente intensos no decorrer das situações, 
terá que recorrer a um pequeno intervalo. Afastar‐se da situação para que isso o ajude a alterar 
esse sentimento. Como parte desse intervalo, pode praticar exercícios de respiração profunda 
para ajudar a descontrair ou pode querer utilizar a técnica da imagem. Poderá por exemplo, 
imaginar  que  está  num  local  onde  se  sinta  em  paz  e  com  tranquilidade.  A  descontração  e  a 
técnica da imagem podem ajudar a aprender a reduzir a sua agitação em situações associadas à 
raiva intensa. 
 
RESUMINDO 
 
  Depois de termos reduzido ou modificado os nossos sentimentos de raiva aplicando a 
primeira parte do processo ABC, estamos agora em melhor posição para observar a situação de 
forma  mais  realista  do  que  através  dos  óculos  da  raiva.  Podemos  reavaliar  ou  redefinir  a 
situação. O que se passa realmente nessa situação? O passo seguinte dentro do processo ABC 
será  fazermos  a  nós  mesmos  a  grande  pergunta:  “O  que  posso  fazer  de  eficaz  nessas 
circunstâncias?” 
  É aqui que a Oração da Serenidade pode ser aplicada como um guia que nos auxilia: 
“Terei  eu  nessa  situação  que  me  esforçar  para  aceitar?”  “Será  o  comportamento  das  outras 
pessoas?”  “O  que  eu  poderei  fazer  para  modificar  esta  situação?”  “Geralmente  é  só  o  meu 
comportamento.” Decidi o que poderia fazer de útil, em seguida terei que analisar as opções 
construtivas que irei escolher para realizar os objetivos da Oração da Serenidade. Finalmente 
fazer uma opção e coloca‐la em prática. 
 
CONTROLAR A NOSSA RAIVA – SETE BREVES PASSOS 
 
  Exige  tempo  e  prática  para  aprender  esse  processo  ABC  de  controle  dos  seus 
sentimentos de raiva, ao mesmo tempo em que “desaprende” os seus velhos comportamentos 
irados. A princípio irá achar que é útil trazer junto com você uma breve descrição do processo, 
como aquela que se segue. Com o tempo, aprenderá por intuição a ir de um passo para outro. 
  Comece  pelos  sentimentos  que  o  perturbam.  Os  identifique.  Use‐os  como  sinais  de 
“STOP”.  Os  sentimentos  que  o  perturbam  são  sinais  de  que  está  dizendo  a  si  coisas 
perturbadoras.  Você  poderá  se  tornar  um  melhor  observador  dos  seus  sentimentos.  Isto 
equivale a entrar em contato com os seus sentimentos. 
  Neutralize  os  sentimentos  que  o  perturbam  endereçando  a  eles  uma  mensagem 
positiva. Coloque uma trava nos seus sentimentos. Diga para si mesmo: “Acalme‐se, simplifique. 
Não fique tão nervoso.” 
  Identifique os pensamentos irritantes dentro da situação que estão te provocando raiva. 
O que você está exigindo? O que é que está tentando controlar? Examine os pensamentos que 
o perturbam. Pergunte a si mesmo: “Por que é que tem que ser como eu quero?  Por que é que 
o outro tem que fazer o que eu quero?” E depois responda as perguntas. 
  Torne  a  situação  clara  para  si  próprio.  Pergunte‐se:  “O  que  realmente  me  deixa  com 
raiva? Em que consistem os fatos e quais são as minhas opiniões sobre eles? Haverá uma forma 
mais eficaz de encarar a situação? Pode então ficar desapontado com a situação, mas não com 
raiva contra as pessoas que a criaram. 
  Em seguida, estabeleça para si objetivos mais realistas em relação às circunstâncias que 
levantaram o problema. Pergunte a si próprio. O que posso fazer que seja eficaz a respeito desta 
situação? Seja específico e concreto.  Aplique a Oração da Serenidade. O que posso mudar (o 
meu comportamento) e o que terei de aceitar (o comportamento dos outros) nesta situação? 
  Faça  uma  lista  das  opções  construtivas  por  meio  das  quais  pode  alcançar  os  seus 
objetivos.  Pergunte‐se:  “Que  ações  construtivas  pode  empreender  para  atingir  os  meus 
objetivos?” Escolha uma opção construtiva para alcançar o seu objetivo e atue de acordo com 
ela. O resultado final do processo ABC é uma ação positiva da sua parte. 
   

 
UM EXEMPLO 
 
  A  situação  consiste  numa  conversa  com  a  minha  mulher  sobre  as  nossas  finanças. 
Começamos na discordar e, depois, começamos a discutir. 
Começo a detectar os primeiros sinais de raiva: estou a serrar os dentes. 
  Digo a mim mesmo,: “Acalme‐se, não complique. Não fique tão zangado.” 
  Depois  digo‐me:  “O  que  estou  pensando?  Ela  não  devia  perguntar  quanto  é  que  eu 
ganho. Ela não devia brigar por causa das contas. Trabalho muito – devia poder gastar o dinheiro 
como bem entendesse. Ela não devia estar sempre contestando a forma como eu gasto o meu 
dinheiro.  Tendo  identificado  alguns  dos  pensamentos  que  me  perturbam,  começo  então  a 
analisá‐los: Por que é que ela não se preocuparia com o dinheiro? É ela quem paga as contas. 
Ela também trabalha e traz dinheiro para casa. Por que é que eu teria que gastar dinheiro só 
comigo  mesmo?  O  restante  da  família  também  quer  coisas.  Pare  de  exigir  que  ela  faça  tudo 
como você quer. Pare de tentar controla‐la. 
  Não gosto de algumas idéias da minha mulher, nem do seu tom de voz, mas estando 
mais  calmo,  consigo  reexaminar  a  situação.  Parece‐me  que  temos  mesmo  alguns  problemas 
com as nossas finanças. As contas parecem realmente estar aumentando. A minha mulher tem, 
de  fato,  algumas  preocupações  legítimas  com  as  nossas  finanças.  Temos  ambos,  as 
responsabilidades neste ponto. 
  Pergunto então a mim mesmo: “Perante esta situação o que é que eu posso fazer que 
seja eficaz?  O  que posso  mudar para  que nos  tornemos mais capazes de  governar as nossas 
finanças de uma forma agradável para ambos?” 
  Faço uma lista de algumas opções que tenho: 
‐ Combinar uma ocasião habitual durante a semana para falar sobre as nossas finanças. 
‐ Estabelecer em conjunto algumas prioridades na forma de gastar o dinheiro. 
‐ Combinar um novo orçamento familiar com a minha mulher. 
‐ Rever regularmente esse orçamento e modificá‐lo quando necessário. 
  Para começar, a minha mulher e eu acordamos numa ocasião regular todas as semanas., 
quando  não  estivermos  cansados  e  não  for  provável  sermos  incomodados,  para  discutir  os 
problemas do nosso orçamento. 
 
USAR UM INVENTÁRIO PESSOAL PARA BATER OS RESULTADOS POSITIVOS 
 
  Controlar os sentimentos de raiva através do esquema ABC pode ser considerado como  
um inventário pessoal. No início, este inventário pessoal exigirá de si muito tempo e esforço. 
Começa com a utilização de um diário a fim de desenvolver uma maior conscientização das suas 
causas e consequências. 
  A partir deste diário, poderá aprender a identificar os sentimentos que o perturbam e 
estão na base da sua raiva. 
  Pode  então  prosseguir,  praticando  o  processo  ABC  como  meio  de  modificar  os  seus 
sentimentos de raiva ao modificar também a sua forma irada de pensar. 
  Segue‐se a resolução dos problemas que fazem parte daquelas situações difíceis que o 
perturbam. 
  Com a prática continuada deste processo, chegará muito provavelmente à conclusão de 
que os seus esforços estão gradualmente a ser recompensados. Será mais capaz de controlar ou 
de modificar a sua raiva do que a sua raiva de controlar a si. 
  Com a prática continuada do controle dos seus sentimentos de raiva pelo processo ABC, 
poderá eventualmente, reduzi‐lo a um esquema mais simples de quatro passos. 
 
  Use os primeiros sinais de raiva como sinais de STOP. 
  Diga a si mesmo, acalme‐se, simplifique. Não se zangue. 
   

  Pergunte‐se: O que poderei fazer nestas circunstâncias, que seja útil? 
  Depois atue de acordo com as suas opções construtivas. 
 
  O  processo  ABC  pode  ser  instrumento  muito  útil  no  processo  de  recuperação  de 
problemas emocionais  ou de problemas relacionados com o abuso do álcool ou outras drogas. 
O processo representa uma forma valiosa de enfrentar a perturbação emotiva que se encontra 
muitas  vezes  associada  aos  problemas  ligados  ao  abuso  do  álcool  e  outras  drogas  ou  com 
problemas  emocionais.  Se  não  aprender  a  lidar  construtivamente  com  as  perturbações 
emocionais, poderá estar em risco de uma recaída, já que as situações que envolvem problemas 
fazem parte inevitável da vida. 
O  processo  ABC  nos  proporciona,  pelo  fato  de  não  termos  as  nossas  percepções 
obscurecidas  pela  desordem  das  emoções,  uma  maneira  diferente  de  ver  as  coisas.  O  nosso 
sentimento a respeito das coisas modifica‐se à medida que a nossa maneira de pensar a respeito 
delas se modifica – Sentimos como pensamos! 
 
O QUE É ESPIRITUALIDADE? 
 
  Em relação aos Alcoólicos Anônimos ouvimos com frequência que “o nosso programa é 
um programa espiritual”. Mas o que significa “espiritual”? 
  Será uma palavra que se refere só a Deus, ou talvez a religião ou tenha um significado 
mais abrangente? 
  Muitas pessoas, ao se darem conta de que o Programa de Recuperação dos 12 Passos 
dos Alcoólicos Anônimos é um programa espiritual desanimam. Interrogam‐se: “Será que tenho 
que me tornar religioso para poder me recuperar?” Este capítulo destina‐se a ajudar as pessoas 
em  recuperação  a  compreenderem  o  que  significa  a  palavra  “espiritual”  e  “espiritualidade”. 
Também se destina a ajudar os leitores a verem que a “espiritualidade” já faz parte das nossas 
vidas sem nos darmos conta disso. 
  No  programa  dos  12  Passos  de  AA  a  palavra  “espiritual”  aparece  ligada  à  palavra 
“despertar”. Isto é o que acontece depois de termos feito o nosso caminho ao longo de todos 
os passos tivemos um despertar espiritual, o primeiro problema que aparece no Primeiro Passo: 
“Admitimos que somos impotentes perante nossa adicção e que tínhamos perdido o domínio 
sobre nossas vidas”. 
  Apesar de a primeira vista não parecer uma constatação de um problema espiritual, mas 
é na realidade! 
  Para podermos ver isso claramente, precisamos começar a desenvolver uma definição 
de espiritualidade com a qual trabalhar. Uma das maneiras de definí‐la é constatando todas as 
áreas de vida as quais a espiritualidade se liga, assim espiritualidade é: A qualidade do nosso 
relacionamento com quem quer que seja de mais importante na nossa vida. 
  Esta simples definição pode nos ajudar a perceber como a espiritualidade faz parte da 
vida  de  qualquer  pessoa.  Consideramos  o  seguinte  raciocínio.  Todos  nós  temos  pessoas  ou 
coisas  que  são  importantes  para  nós.  Uma  vez  que  temos  estas  relações  importantes  para 
nossas vidas alguma deve ser “a mais importante”. Que este “algo” seja maneira, ou pessoa ou 
grupo de pessoas, tem que existir alguma coisa que seja prioritária na nossa vida. O “quem” 
quer  que  seja  ou  o  que  quer  que  seja  “mais  importante”  define  o  principal  foco  da  nossa 
espiritualidade. 
  Podemos dizer que a espiritualidade faz parte da condição humana. Assim como todos 
nós  temos  um  lado  físico  e  um  lado  emocional  também  temos  um  lado  espiritual. 
Reconhecemos  que  somos  pessoas  com  um  lado  espiritual.  Abre‐nos  a  possibilidade  de 
descobrirmos o quanto este lado da nossa vida nos afeta. É um erro pensarmos que não temos 
um lado espiritual se não acreditarmos em Deus. Deus é apenas um dos muitos focos espirituais 
possíveis.  Podemos  vir  a  descobrir  na  nossa  vida  alguns  focos  e  efeitos  espirituais  muito 
surpreendentes, se tivermos a coragem de explorar essa parte do nosso ser.   
   

 
 
Uma  vez  que  está  relacionada  com  que  (ou  quem)  é  importante  para  nós;  a 
espiritualidade está intimamente ligada a valores, prioridades, objetivos e preocupações. Tem a 
ver com o que quer que seja que está no centro da nossa vida. Gastamos muito do nosso tempo, 
energia,  pensamentos  e  nos  entregamos  ao  nosso  foco  ou  centro  espiritual,  porque  a 
espiritualidade  tem  a  ver  com  relações  que  estão  intimamente  ligadas  a  coisas  como  amor, 
confiança e compromisso. Um resultado espiritual pode ser qualquer coisa que toque a nossa 
relação com os outros mais ou menos amorosos e desvelados. 
  Como  se  disse:  há  muitos  focos  espirituais  possíveis.  O  foco  da  nossa  espiritualidade 
podia ser o álcool ou outros químicos. Quando o álcool é o foco da nossa espiritualidade tem 
tendência  para  descrever  o  alcoolismo  como  uma  doença  espiritual.  O  alcoolismo  pode  ser 
descrito como uma expressão destrutiva da espiritualidade. Assim, uma maneira de descrever o 
problema  do  alcoólico,  será  dizer,  “o  álcool  tornou‐se  demasiado  importante”.  Demasiado 
tempo  e  energia  são  absorvidos  para  beber.  A  relação  tornou‐se  um  fardo  tremendamente 
destrutivo. Esta qualidade destrutiva cresce, e à medida que cresce, destrói o alcoólico. 
  O  alcoolismo  é  descrito  como  uma  doença  progressiva.  Nos  termos  da  definição  da 
espiritualidade  isto  implica  que  o  álcool  se  torna  mais  importante  à  medida  que  a  doença 
progride, e este crescimento tem muitas repercussões. Na nossa definição de espiritualidade, 
quando alguma coisa aumenta na sua importância, as outras coisas têm necessariamente que 
diminuir e ficar para trás. À medida que o álcool se torna mais importante, a nossa família, por 
exemplo, é necessariamente negligenciada por causa desta nova e poderosa relação. A família 
é apenas uma das muitas relações que é afetada pela importância crescente do álcool.  
O trabalho será afetado. Ao invés de se devotar com energia e tempo inteiro ao trabalho, 
o alcoolismo é capaz de viver ou utilizar outras drogas durante o trabalho. Talvez, o fato de beber 
na noite anterior comece por afetar a sua capacidade de ser pontual e estar desperto durante o 
trabalho. Se o alcoólico for estudante, as festas, beber ou usar outras drogas, ou até vendê‐las 
para ser financeiramente possível continuar a usá‐las. Estas são apenas algumas das áreas da 
vida  afetadas,  à  medida  que  o  álcool  se  torna  cada  vez  mais  importante.  À  medida  que  o 
alcoolismo se torna crônico, cada vez mais relações de toda a espécie serão alteradas na vida do 
alcoólico.  Sabemos  que  se  a  doença  progride  sem  ser  reconhecida,  causará  eventualmente 
enormes perdas em todas as áreas da vida e até a perda da própria vida. 
Os  membros  da  família  do  alcoólico  podem  facilmente  se  tornar  vítimas  de  uma 
mudança da sua própria espiritualidade. Os valores, os objetivos e as relações dos membros da 
família são fatalmente afetados à medida que a doença do alcoolismo progride. À medida que 
o  alcoólico  se  torna  menos  responsável,  os  membros  da  família  podem  focar  cada  vez  mais 
energia na tentativa de o “endireitar” e fazer funcionar melhor. A sua mulher pode despejar as 
garrafas na tentativa de parar o excesso de bebida; os pais podem de um momento para o outro 
começar a discutir com a filha adolescente numa tentativa para que pare de usar; um adicto 
numa família perturba o equilíbrio familiar. Encontrar uma solução para este problema pode 
levar a uma grande perda de tempo e energia. À medida que os membros da família começam 
a se preocupar com o adicto, há outros aspectos das suas vidas que começam a sofrer com isso. 
Tentar lidar com o comportamento do adicto pode desviar a família de uma vida normal. A coisa 
mais importante na vida da família de um adicto pode tornar‐se uma tentativa desesperada de 
controlar  seu  uso  e  comportamentos  decorrentes  disso.  Essa  preocupação  em  “endireitar”  e 
controlar o adicto pode transformar‐se num doloroso foco espiritual. Uma organização de apoio 
como  os  Programas  de  Familiares  (Al‐anon  e  Nar‐anon)  pode  ser  necessária  para  ajudar  os 
membros da família a recuperar o equilíbrio e a serenidade. 
A palavra espiritualidade tem na sua raiz a palavra “espírito”. Outra maneira de pensar 
em espiritualidade é nos perguntar onde se foca o espírito de cada um. “Espírito”, neste sentido, 
não fará nenhuma diferença, se o considerarmos como, por exemplo, o espírito de equipe num 
jogo de futebol. Um grupo de jogadores e expectadores poderá estar muito entusiasmado com 
   

a vitória de um jogo. Um craque pode incitar de modo a criar mais entusiasmo e espírito no 
grupo. O foco espiritual é energicamente dirigido para “ganhar o grande jogo”. Em outras áreas 
da  espiritualidade  encontramos  espírito  e  entusiasmo  como  sendo  o  reflexo  exato  onde  se 
centra a espiritualidade dessa pessoa. As coisas que na vida nos fazem brilhar os olhos e mexer 
por dentro estão intimamente ligadas à espiritualidade. Espiritualidade tem a ver com as coisas 
que  são  os  grandes  “amores”  da  nossa  vida.  Descobriremos  que  o  nosso  coração  está 
fortemente ligado às áreas espirituais da vida. 
  O  espírito  e  entusiasmo  pela  bebida  é,  as  vezes,  óbvio  na  vida  de  um  alcoólico.  O 
alcoolismo,  quando  começa,  pode  ser  como  um  namoro.  Para  um  alcoólico  talvez  nada  se 
compare ao ato de beber às escondidas ou do adicto a usar. Pode ter passado a última hora de 
aula desejando ansiosamente a oportunidade de beber. Para outros alcoólicos esta relação pode 
ir  crescendo  muito  lenta  e  gradualmente  até  que,  só  anos  depois  possa  dar  conta  desta 
necessidade  permanente  de  beber.  O  entusiasmo  e  espírito  persistem  muitas  vezes  mesmo 
quando,  o  relacionamento  com  o  álcool  se  tornou  destrutivo  e  a  energia  e  o  entusiasmo  da 
pessoa  em  outras  áreas  da  vida  foram  seriamente  afetadas.  No  meu  próprio  trabalho  com 
pessoas em recuperação lembro‐me de inúmeros indivíduos dizendo, “Beber tornou‐se a coisa 
mais importante da minha vida e isso aconteceu de tal maneira que nem me percebi. Chegou 
ao ponto de já não me dar nenhum prazer, apenas me ajudar a sentir bem neste momento, mas 
tinha que beber”. É este o ponto difícil em que uma pessoa está na verdade “agarrada” à bebida, 
mesmo, quando ele ou ela possam dar‐se conta que beber já não funciona da mesma maneira. 
Contudo, está agarrada pela impotência, dependente da própria causa da sua destruição. 
  Mas, como é que começam a se desenvolver essas relações espirituais destrutivas tão 
poderosas? Como é que alguém pode se envolver  numa relação  como a acima descrita, que 
pode levar à morte, suicídio ou à loucura se não tiver ajuda? 
   As relações espirituais evoluem da maneira como uma pessoa vive a vida e como ela 
consegue lidar com as situações da sua própria vida. A nossa espiritualidade pode ter um foco 
consideravelmente diferente se tivermos tido um conjunto variado de experiências de vida. Ter 
o  álcool  e  a  droga  como  foco  espiritual  destrutivo  na  nossa  vida,  é  o  resultado  da  nossa 
experiência com o álcool e da capacidade com que ele tem de ir ao encontro de algumas das 
necessidades básicas humanas. Nem todas as pessoas reagem ao álcool e à droga da mesma 
maneira, e por isso nem todos desenvolvem o mesmo tipo de relação com ele. Quando uma 
pessoa  começa  a  ligar‐se  ao  álcool  pode  ser  por  aquilo  que  ele  ou  ela  viram  ou  ouviram  da 
experiência dos outros. Os amigos podem nos ter encorajado a beber. Eventualmente existe o 
momento em que a pessoa bebe pela primeira vez e essa foi a sua primeira experiência com o 
álcool. Dependendo dessa primeira experiência uma pessoa pode desenvolver um padrão de 
abuso do álcool e drogas, ou beber moderadamente com pouco entusiasmo. Se a experiência 
for muito negativa a pessoa pode nunca mais tornar a beber; se o interesse da pessoa pelo álcool 
aumenta  é  porque  efetivamente,  ele  vai  ao  encontro  de  alguma  necessidade.  O  famoso 
psicólogo Carl Jung descreveu uma vez o alcoolismo do fundador dos AA, Bill W., como uma 
“doença espiritual que tem na sua base o impulso para plenitude...” Sentir‐se meio e completo 
é uma necessidade humana básica. 
  A  maneira  como  o  álcool  vai  ao  encontro  da  nossa  necessidade  de  nos  sentirmos 
satisfeitos não é difícil de compreender. Se uma pessoa é naturalmente acanhada o álcool pode 
ajuda‐la  a  tornar‐se  mais  ousada  e  desinibida.  Se  uma  pessoa  está  cheia  de  raiva  e 
ressentimentos, o álcool pode ajuda‐la a acalmar‐se e encontrar alguma paz. Se uma pessoa está 
sem alento, deprimida, pode ir a um bar e “esquecer de tudo”. Uma pessoa pode beber porque 
gosta da imagem de quem bebe ou usa. À medida que a doença da adicção progride beber ou 
usar  torna‐se  necessário  para  que  se  possa  viver  e  sentir  “normal”.  Todos  estes 
comportamentos são uma tentativa para encontrar ou manter a “plenitude”. 
  Outra  necessidade  básica  humana  é  o  relacionamento  com  os  outros.  Beber  é  uma 
atividade social. O álcool e outras drogas tendem a juntar pessoas. Olhando para trás podemos 
ver os amigos apenas como “amigos do uso” ou “amigo dos copos”, mas pelo menos havia uma 
   

espécie  de  “estarmos  juntos”,  de  camaradagem.  Beber  era  uma  maneira  de  ter  um  contato 
pessoal e “passar um bom bocado” ao fazê‐lo. 
O álcool e as drogas enganam as pessoas porque, até certo ponto, vão de encontro de 
necessidades humanas. Mas em longo prazo não o fazem da melhor maneira para o adicto. A 
busca espiritual que acaba na adicção pode ter começado por um simples desejo de ser feliz. 
Talvez ajude a entender a adicção como uma tentativa legítima de ser saudável e feliz. Ajuda‐
nos a evitar alguns julgamentos e críticas que possamos ter à tentação de usar contra nós ou 
outros adictos em recuperação. 
  Um olhar mais atento para algumas das palavras que são usadas para espiritualidade 
podem ajudar a aprofundar a compreensão desta palavra. Definir espiritualidade como qualquer 
coisa que tem a ver com o mais importante na nossa vida. Se alguma coisa é importante para 
nós isso significa que lhe damos valor e importância. O processo de dar valor a qualquer coisa 
chama‐se valorização ou veneração. Quando veneramos alguma coisa estamos a falar de uma 
relação com o objetivo da adoração, do tipo da que temos com Deus. Por vezes no programa 
podemos ouvir alguém dizer “o álcool e as drogas tinham‐se tornado meu deus”. Muitas vezes 
isto  é  uma  constatação  exata  mesmo  que  nunca  tenhamos  pensado  assim  nesta  relação.  À 
medida que a doença do alcoolismo progride, podemos dizer que a relação com um deus que 
esquece o indivíduo. Esta relação já não é a solução perfeita porque já não vai de encontro às 
necessidades da pessoa. 
  Mesmo que insistamos que não queremos uma relação com Deus (com um D grande), 
assim  como  é  impossível  evitar  a  espiritualidade  como  um  fato  na  nossa  vida,  também  é 
impossível evitar relacionamentos do tipo do que se tem com (um) deus. Quer os reconhecemos 
claramente ou não, eles fazem parte da nossa vida. Afetam‐nos. 
  Uma  relação  do  tipo  da  que  se  tem  com  deus,  tem  uma  relação  interessante  com  a 
palavra “entusiasmo”, palavra essa que está  ligada a espiritualidade. A palavra “entusiasmo” 
vem do grego “em‐theos” que significa “em deus”. Outra maneira de vermos as coisas pelas 
quais temos um grande entusiasmo é dizermos que elas refletem a nossa compreensão e relação 
com o nosso deus. 
  Para o alcoólico cuja vida está sendo destruída. O desafio da recuperação é encontrar 
uma nova relação da do tipo que se tem com deus, um novo foco para a sua espiritualidade, um 
novo  centro.  Alguma  coisa  tem  que  substituir  o  álcool  e  as  drogas  como  principal  centro  de 
interesse na vida de uma pessoa. Esta é a razão pela qual a recuperação não consiste apenas em 
não beber. Por a rolha na garrafa não quer dizer necessariamente que outra coisa qualquer se 
tornou nosso centro de interesse da vida de uma pessoa. Somente parar de beber sem outro 
crescimento e mudanças apenas frustrará uma pessoa que não aprendeu outro modo de ir ao 
encontro das necessidades humanas básicas. 
  A irmandade de AA encara o desafio de ajudar os alcoólicos a encontrarem um novo 
centro de interesse espiritual. A sua missão é muito parecida com a de ajudar alguém a saltar 
de um barco que se afunda para outro barco. Pode ser muito traiçoeiro. A missão envolve o 
conseguir  ganhar a confiança e  eventualmente o coração da pessoa. De algum modo, com a 
ajuda dos Doze Passos dos AA, com a irmandade das reuniões e, nas novas relações com gente 
sóbria, um alcoólico ou adicto em recuperação começará a entregar‐se a um novo centro de 
interesse  espiritual.  A  pessoa  em  recuperação  procura  ir  de  encontro  às  suas  necessidades 
humanas de uma maneira completamente nova à medida que descobre o modo de vida de AA. 
  O  foco  espiritual  dos  que  estão  em  Anônimos,  tem  muito  a  ver  com  um  “Poder 
Superior”; “Deus, como nós o compreendemos”, e as pessoas da irmandade. Os passos Dois e 
Três dos AA começam esta nova relação e iniciam o novo foco espiritual. Para o que quer que 
entreguemos  a  nossa  vontade  e  a  nossa  vida,  isso  tem  que  necessariamente  ser  muito 
importante para nós. O Passo Três foi sabiamente deixado tão aberto quanto possível para que 
ninguém seja excluído. Embora a palavra Deus esteja escrita com D maiúsculo, no Passo Três, 
temos que entender que há alternativas de como este Passo pode ser abordado. Para aqueles 
que  não  compreendem  a  idéia  de  Deus  no  sentido  tradicional,  o  Terceiro  Passo,  pode,  por 
   

exemplo, ligar‐se ao grupo básico de AA. Um grupo de pessoas é um poder maior do que nós 
mesmos, e podemos dar‐lhe o poder divino de nos mostrar o que precisamos fazer. Poderemos 
ver que aceitarmos ser guiados pelas pessoas do programa pode ser melhor do que continuar o 
caminho que sabemos, que acabará na destruição. Outros recém‐chegados ao programa podem 
falar de Deus atuando através do grupo. Podem dizer que Deus é um espírito de amor que se 
exprime pelo amparo, carinho e orientação que o grupo tem para oferecer. Haverá outros que 
acreditam nisso e também ligar‐se a Deus por outros caminhos, tais como a oração e a leitura 
devotada. O Passo Três permite variedade e flexibilidade na maioria como os relacionamentos 
com um Poder Superior. 
  Quando as pessoas olham pela primeira vez para os passos Dois e Três, muitas vezes 
tomam uma de duas posições extremas. A primeira é rebelarem‐se e dizerem que tal programa 
não é para elas. Os seus sentimentos podem ser traduzidos por este sentimento “não quero ser 
um  fanático  religioso!  Não  acredito  nesta  história  de  Deus”.  A  outra  reação  é  ultrapassar 
rapidamente estes passos e dizer para si próprio: “Sempre acreditaram em deus. E depois?” 
  Nenhum destes dois extremos ajudará muito. A espiritualidade é uma área da vida em 
que precisamos descobrir muito sobre nós próprios. Não se pede a ninguém que acredite em 
alguma coisa em que não pode acreditar. Acreditar não é algo que se possa forçar. Acreditamos 
naquilo  que  acreditamos.  Normalmente  aquilo  em  que  acreditamos  resulta  da  nossa 
experiência. Do que sabemos da experiência dos outros e do que nos ensinaram. O segredo da 
mudança do foco espiritual é ter um  espírito aberto, e nos permitir experimentar algo diferente 
– muito como fazer uma experiência com a nossa vida espiritual. 
  A maneira que temos de experimentar algo diferente na nossa vida espiritual provém 
da  ajuda  que  as  pessoas  em  recuperação  oferecem.  Não  estamos  sós,  estamos  com  outras 
pessoas  que  trabalham  na  sua  recuperação  e  que  podem  tornar‐se  amigos  de  verdade.  A 
experiência  de  recuperação  das  pessoas  na  irmandade  dá  uma  informação  prática,  preciosa 
sobre o que precisamos fazer de modo a vivermos uma vida sóbria e feliz. Dirão coisas como 
“vive um dia de cada vez”. Em outras palavras não queira ultrapassar e não se preocupe hoje 
com as coisas do amanhã. A força de hoje é a que precisa para os problemas de hoje, outra 
maneira que as pessoas na irmandade têm de se ajudar e confrontarem‐se mutuamente com a 
realidade. Muitas vezes não conseguimos ver claramente como nos magoamos a nós mesmos 
com as nossas atitudes emocionais e com a maneira como pensamos nas coisas. Outras pessoas 
podem nos ajudar a resolver problemas e a esclarecer a nossa situação. Outra maneira simples 
de encontrar plenitude está na capacidade de falar com outra pessoa sobre como nos sentimos. 
Partilhar  tem  o  efeito  de  “dividir  o  nosso  fardo”  e  “duplicar  as  nossas  alegrias”.  Na  partilha 
podemos encontrar alívio dos sentimentos negativos de desânimo, medo e raiva. 
  As pessoas no programa, quase sem exceção, farão igualmente parte da espiritualidade 
que descobrimos à medida que recuperamos. O que aprendemos com elas e o apoio emocional 
que nos podem dar são quase impossíveis de atingir numa experiência, qualquer, solitária. Um 
“slogan” popular no programa é “Eu preciso das pessoas como Eu”. 
  Vamos olhar agora para espiritualidade x religião.  
  Há  muita  confusão  no  que  diz  respeito  a  relação  da  espiritualidade  e  religião.  Para 
complicar as coisas, as pessoas usam indiferentemente as palavras e, às vezes, com o mesmo 
significado. 
  Melhor do que tentar definir o que é religião e o que é espiritual precisamos nos lembrar 
da  nossa  definição  de  espiritualidade.  Quando  dizemos  “espiritualidade  tem  a  ver  com  a 
qualidade da nossa relação com o que é mais importante na nossa vida”, não excluímos nada 
nem ninguém associado à religião como sendo um foco espiritual. Por exemplo, é muito possível 
ter como a coisa mais importante da nossa vida uma relação com Deus como numa tradição 
religiosa. A nossa definição de espiritualidade não inclui ou exclui necessariamente tudo aquilo 
que na nossa mente está associado à “religião”. 
  Um exemplo pode ajudar a clarificar a diferença entre ser aparentemente “religioso” e 
estar espiritualmente concentrado em outra coisa. 
   

  Imagine um jovem de 15 anos que se vê envolvido, sem o desejar e por insistência dos 
pais, na catequese da igreja local. 
Ele abusa quer do álcool, quer da maconha. Durante o intervalo das aulas, sai da igreja 
para “usar”. Neste caso, o que acha que será o foco espiritual deste jovem neste momento? 
Provavelmente são muito mais os químicos do que a sua instrução religiosa. 
  Como outro exemplo, imagine uma mulher jovem que trabalha e é muito devotada à 
sua  igreja.  Assiste  regularmente  aos  serviços  religiosos,  participa  de  um  grupo  de  senhoras 
ligado à igreja e reza todos os dias. Tem vários bons amigos na igreja com quem discute muitos 
aspectos da sua vida. Suponha que esta mulher está dando os primeiros passos no alcoolismo e 
é  uma  adicta  ao  álcool  na  sua  casa,  sem  ninguém  saber.  O  que  podemos  dizer  da  sua 
espiritualidade?  Este  exemplo  não  é  tão  direto  quanto  o  primeiro.  Pelo  menos  podemos 
suspeitar que esta mulher esteja com a espiritualidade dividida, mas também podemos prever 
que ela será arrastada cada vez mais para o foco espiritual que é o álcool, à medida que a doença 
progride. 
  A  conclusão  que  podemos  tirar  de  uma  pessoa  que  aparentemente  é  religiosa  e 
espiritualmente se concentra em outra coisa, pode muitas vezes ser descrita como hipocrisia. 
Aquilo em que a pessoa diz que acredita e aquilo que é revelado pelo seu comportamento não 
combina. Há falta de integridade. Muitas vezes aquilo que as pessoas detestam nas igrejas é 
exatamente a hipocrisia de alguns de seus membros. Aquilo que criticamos tão fortemente é a 
falta de espiritualidade autêntica. 
 
  Espiritualidade é uma palavra convidativa quando é bem compreendida. Convida‐nos a 
descobrir  nosso  mundo  de  valores  e  aquilo  em  que  acreditamos.  Ao  avaliar  os  nossos  focos 
espirituais e ao vermos como nos ajudou a ir ao encontro de nossas necessidades, isso pode nos 
ajudar a abandonar relações espirituais destrutivas e a procurar relações em que um honesto e 
saudável  ser,  pode  ser  encontrado.  À  medida  que  mudamos  o  nosso  foco  espiritual,  iremos 
necessariamente desenvolver um estilo de vida diferente porque o que é importante para nós 
mudou.  Talvez  pessoas  e  interesses  que  antes  eram  importantes  deixem  de  o  ser  porque  a 
relação  destrutiva  com  o  álcool  terminou.  Uma  espiritualidade  renovada  conduzirá  a  uma 
sanidade restaurada. Além disso, a espiritualidade renovada mudará os princípios das nossas 
vidas porque fornece uma nova base para todas as decisões e relações. A espiritualidade tendo 
a ver com a qualidade da nossa relação com quem ou o que é mais importante nas nossas vidas 
– toma o seu lugar nos aspectos físicos e emocionais de um programa de recuperação como 
sendo o alicerce necessário para a construção de um novo modo de vida. 
 
 
 

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