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Prefácio
CONTEXTO
METODOLOGIA
NORMAS INTERNACIONAIS
Faz uma década que a Human Rights Watch examinou pela primeira vez as condições
prisionais no Brasil. Desde então, a população carcerária tem crescido rapidamente. Além de exacerbar a
superlotação das prisões -- problema que a Human Rights Watch documentou durante sua pesquisa no
país em 1988 -- o rápido crescimento da população carcerária tem coincidido com vários anos de
flagrantes abusos nas prisões. Assim, nosso primeiro relatório sobre a condição carcerária foi seguido
pela publicação de 1989, que tinha como foco as condições em uma notória prisão de São Paulo, seguido
por um relatório de 1992 sobre a chacina na Casa de Detenção do Carandiru, em outubro daquele ano.
Nosso relatório anual sobre as condições globais dos direitos humanos, no entanto, tem condenado o
Brasil de forma regular pela grave superlotação das prisões, condições de detenção horríveis e execução
sumária de detentos.
Embora este relatório aborde algumas deficiências gerais do sistema de justiça criminal
quando diretamente relevante, não tem a pretensão de ser uma avaliação ampla da administração da
justiça no Brasil. A Human Rights Watch tem, em vários relatórios anteriores, documentado e analisado
as outras formas de abusos dos direitos humanos que permeiam a Justiça brasileira, focalizando
principalmente casos de violência policial.(1) A situação dos detentos descrita neste relatório, deve ser
enfatizado, é uma parte integrante desse sistema mais amplo. A vida dos presos no Brasil é diretamente
afetada pelas decisões da polícia, juizes, defensores públicos, e dos Ministérios Públicos, entre outros.
Dessa forma, embora uma reforma prisional seja claramente necessária, uma abordagem abrangente para
reforma --uma que integre preocupações com direitos humanos em todos os níveis do sistema jurídico--
deve ser mais eficiente do que uma resolução por partes.
Com as vantagens de tal abordagem, a Human Rights Watch foi incentivada pelo
lançamento do governo brasileiro, em 1996, do Programa Nacional de Direitos Humanos. Esperamos que
este relatório possa servir de apoio à implementação dos objetivos de direitos humanos incluídos nesse
programa.
Contexto
Os problemas nas prisões do Brasil representam uma conseqüência lógica de duas
décadas de elevadas taxas de criminalidade, aumento da pressão pública em favor do "endurecimento"
contra o crime e a contínua negligência dos políticos. A onda de rebeliões em 1997, embora provocada
por eventos recentes, tem suas raízes na confluência de uma série de fatos históricos.
O golpe de Estado de 1964, que terminou com o governo do presidente João Goulart, foi
o primeiro de uma série de golpes na América do Sul que levou a região a duas décadas de autoritarismo.
No Brasil, como em outras partes da região, o regime militar caracterizou-se pelas graves e sistemáticas
violações aos direitos humanos, incluindo desaparecimentos forçados, assassinatos políticos e a prática
rotineira de tortura contra presos políticos. No final dos anos 70, os militares iniciaram um processo de
abertura com a aprovação, em 1979, de uma lei que anistiava aqueles que haviam cometido abusos contra
os direitos humanos, libertava vários presos políticos e permitia que muitos dissidentes exilados
retornassem ao país. Nos anos seguintes, o governo militar recusou-se a atender às crescentes demandas
populares por um retorno imediato à democracia. Ao invés disso, programou uma transição gradual que
permitia aos brasileiros eleger o presidente através de eleições indiretas em 1985 e eleger os constituintes
que elaborariam uma nova constituição em 1988. Em 1989, na primeira eleição direta para presidente no
Brasil em quase trinta anos, os brasileiros elegeram Fernando Collor de Mello que superou, no segundo
turno, por uma pequena margem, o candidato de esquerda Luís Inácio "Lula" da Silva. Três anos depois, a
força das recém criadas instituições democráticas mostrou-se no processo de impeachement que afastou
Collor devido à corrupção excessiva de sua administração.
Os sérios problemas econômicos que afetaram a América Latina, primeiro com a crise
do petróleo nos anos 70, não foram menos graves no Brasil. Logo após o milagre econômico-- período de
contínuo crescimento econômico que marcou o final dos anos 60-- a economia brasileira começou a
diminuir seu ritmo de crescimento; já nos anos 70 e na década de 80 o crescimento foi quase nulo. De
fato, entre os anos de 1980 e 1993, segundo o Banco Mundial, o crescimento anual da economia
brasileira, em média, foi de 1,5%. Ao mesmo tempo, a distância entre os mais ricos e os mais pobres, que
já era significativa, aumentou continuamente. Um crescente número daqueles entregues à pobreza voltou-
se ao crime, freqüentemente crimes violentos. No estado do Rio de Janeiro, onde a onda de crimes no
Brasil é mais visível, o número de homicídios triplicou durante os anos de recessão e estagnação
econômica, subindo de 2.826 homicídios em 1980 para 8.408 homicídios em 1994.(2) De forma paralela,
o índice de homicídios no estado de São Paulo subiu de 14,62 por 100.000 habitantes em 1981 para 44,89
por 100.000 habitantes em 1995.(3)