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Sá de Miranda,

inovador literário (2)

Micaela Ramon
micaelar@elach.uminho.pt
ÍNDICE

Sá de Miranda, inovador literário (cont.).

 Os subgéneros italianizantes: os sonetos e as canções


- características formais e principais núcleos
temáticos.
 Os subgéneros clássicos: as cartas, as éclogas e as
elegias - características formais e principais núcleos
temáticos.
 A reação dos contemporâneos às inovações
mirandinas
Os subgéneros italianizantes

Sá de Miranda introduziu em Portugal:


- novos subgéneros líricos;
- novas estruturas métricas;
- novas temáticas poéticas.

A ele se deve a introdução do verso de dez sílabas a que


passou a chamar-se «medida nova», designando-se por
«medida velha» as estruturas tradicionais.
A ele se deve também a introdução de novos subgéneros
líricos, dentre os quais o soneto e a canção, de influência
italianizante, uma vez que foram assimilados pelas literaturas de
línguas modernas a partir dos modelos italianos.
Os subgéneros italianizantes

Foi Sá de Miranda quem introduziu e divulgou


o soneto em Portugal, após a sua viagem a
Itália.

Formalmente, o soneto é constituído por


catorze versos decassilábicos, duas quadras e
dois tercetos, com esquema rimático
ABBA/ABBA, nas quadras, e CDC/DCD ou
CDE/CDE, nos tercetos.
Os subgéneros italianizantes
Do ponto de vista temático, os sonetos mirandinos abordam os
seguintes temas:
 Teorização literária
 No tratamento desta temática sobressaem os princípios da
teorização literária horaciana:
 - o «labor et lima»: Miranda concebe a poesia como fruto de três
qualidades associadas – ingenium (engenho ou apetência
natural para a arte), ars (arte entendida no sentido de artifício,
i.é., de conhecimento técnico) e labor (estudo ou trabalho
constante de aperfeiçoamento da obra produzida).
 Sá de Miranda rejeita a inspiração repentista e defende o valor
do estudo e do trabalho na escrita de uma obra literária.
Paralelamente, advoga a necessidade de se proceder a uma
imitação dos autores gregos e romanos e afirma a importância
da poesia na imortalização dos acontecimentos histórico-
políticos.
 (Cf. sonetos: «Ao Príncipe D. João,/quando lhe mandou
pedir/obras suas»; «A segunda vez que lhe mandou mais papéis»;
«A terceira vez, mandando-lhe mais obras»; e «Resposta a um
soneto/de Pêro d’Andrade Caminha»).
Os subgéneros italianizantes

Do ponto de vista temático, os sonetos mirandinos abordam os


seguintes temas:
 Reflexão filosófico moral (estoicismo, ideário ético e
consciência da efemeridade e da vanidade da vida)
 Nestes sonetos, Sá de Miranda exprime:
 a sua atitude moral estóica, desprezando o valor do destino
(Cf. soneto: «Alma, que fica por fazer desd’hoje?»);
 a sua atitude ética fundamentada no valor da honestidade e
da inteireza de caráter, bem como na honra que se
sobrepõem a quaisquer riquezas mundanas (Cf. sonetos:
«Aquela fé tão clara e verdadeira» e «Tantas mercês tão
desacostumadas,»);
 a mudança que surge em contraste com a natureza que,
embora mudando, se renova, ao passo que o ser humano
apenas decai (Cf. soneto: «O sol é grande, caem co’a calma
as aves,»).
Os subgéneros italianizantes

Do ponto de vista temático, os sonetos mirandinos abordam os


seguintes temas:
 Amor (elaboração pessoal dos códigos petrarquista e
neoplatonista)
 Nos textos de temática amorosa, Sá de Miranda acusa a
influência do neoplatonismo e do petrarquismo, a que terá
tido acesso aquando da sua estadia em Itália.
O neoplatonismo caracterizou-se por difundir a ideia de que a
experiência amorosa poderia propiciar uma visão do divino. Os
neoplatónicos acreditavam que a beleza sensorial terrena era
uma pálida sombra da beleza celestial. Assim, através da
contemplação da beleza física de uma mulher, seria possível ao
homem elevar-se a regiões mais altas, iniciando um processo de
ascese que o conduziria ao divino.
Os subgéneros italianizantes

Do ponto de vista temático, os sonetos mirandinos abordam os


seguintes temas:
 Amor (elaboração pessoal dos códigos petrarquista e
neoplatonista)
 na poesia de Petrarca encontra-se a expressão do amor por
uma mulher ideal, de olhar sereno e luminoso, de gesto manso e
digno, de riso subtil e discreto, que não passa de uma pálida
imagem da Beleza-Ideal e o caminho do amor é o caminho
para atingir essa Beleza.
 Esta forma de encarar o sentimento amoroso e a mulher amada
assume em Petrarca várias facetas, expressas através de: um
elogio hiperbólico da amada no aspeto físico, psicológico, moral
e social; uma exploração das contradições íntimas do poeta
feliz-infeliz; um reconhecimento das contradições dos efeitos do
amor; um lamento e uma saudade na ausência da mulher
amada; a apresentação de uma natureza sombria ou amena
segundo o estado de espírito do amador; uma luta entre o amor
e a razão.
Os subgéneros italianizantes

Do ponto de vista temático, os sonetos mirandinos abordam os


seguintes temas:
 Amor (elaboração pessoal dos códigos petrarquista e
neoplatonista)

 (Cf. sonetos: «Este retrato vosso é o sinal», «Ah! que diré qu’es
esto? qu’ansí engaña», «Del Tibre embuelto al nuestro Tajo
ufano» e «Desarrezoado amor, dentro em meu peito»;
canção: «Canção a Nossa Senhora»; elegia: «A uma Senhora
muito linda, em nome de um seu servidor»).
Os subgéneros italianizantes

 A canção é um poema de caráter lírico que Sá de Miranda


também introduziu na nossa literatura, sob influência de
Petrarca.
 Este tipo de canção italianizante compõe-se de texto e finda
ou commiato. O texto é composto por estrofes longas, com
versos de 10 sílabas ou os seus quebrados de 6 sílabas. A finda
é uma estrofe final mais curta em que o poeta ou invoca o
texto ou o comenta. Trata-se de uma forma semifixa, visto
que o poeta tem liberdade para escolher o esquema da
primeira estrofe, mas deve depois reproduzi-lo em todas as
restantes, exceto a final.
 Sá de Miranda escreveu duas canções, ambas de temática
religiosa e dedicadas à figura da Virgem, o que documenta
as profundas convicções religiosas do autor.
Os subgéneros clássicos
 Acusando a influência da cultura e da literatura greco-latinas,
Sá de Miranda escreveu cartas, éclogas e elegias.
 As cartas ou epístolas são um subgénero literário
originariamente greco-latino e que consiste numa
composição poética destinada a um amigo ou um mecenas,
escrita numa linguagem quotidiana e que pode abordar
diversos assuntos.
 As cartas de Sá de Miranda, do ponto de vista formal, são
textos híbridos, uma vez que adotam um subgénero clássico,
combinado com o uso da medida velha. Na sua
generalidade, estes poemas desenvolvem temáticas de
natureza filosófico-moral, onde é possível detetar os traços do
pensamento ético de Sá de Miranda, muito influenciado
pelas máximas horacianas do «odi profanum vulgus», do
«otium vs. negotium» e da «aurea mediocritas».
Os subgéneros clássicos

 A écloga ou bucólica é um poema pastoril em que se louvam


os benefícios da vida campestre. Este subgénero lírico tem
origem na literatura greco-latina, sendo escritores modelares
neste género Teócrito, com os Idílios, e Virgílio, com as
Bucólicas.
 Sá de Miranda escreveu dois tipos de éclogas:
 as éclogas morais: desenvolve temáticas de natureza social
ou filosófica, exprimindo através delas os seus princípios éticos
e defendendo os preceitos horacianos como normas de
conduta;
 as éclogas artísticas: demonstra uma nítida intenção de
reformulação estética, experimentando novos metros, novas
combinações estróficas e novos temas.
Os subgéneros clássicos

 A elegia é um tipo de poema em que o poeta se lamenta ou


faz o elogio fúnebre sobre a morte de alguém ilustre ou
querido. Miranda escreveu três elegias, mas a mais famosa
de todas é a que dedicou a António Ferreira.
 - «Elegia a António Ferreira»: Trata-se de um poema escrito
em tercetos decassilábicos com versos em terza rima (a 2ª
rima de uma estrofe é sempre a 1ª e a 3ª da estrofe seguinte),
e que termina com uma quadra de rima cruzada.
 Este poema é composto por duas partes: na primeira parte, o
poeta aborda temáticas de natureza literária, queixando-se
da difícil aceitação das inovações por si introduzidas por
parte dos seus contemporâneos; na segunda parte,
encontramos referências à recordação fúnebre do filho
morto de Miranda, em que o autor perspetiva a vida e a
morte em função do pensamento estóico: «a vida é longa se
for plena» (Cf. estrofes 1-10).
Reações dos contemporâneos às inovações
mirandinas e contra-reação do poeta
A originalidade de Sá de Miranda esteve
na base da formação da sua plêiade,
da qual fez parte António Ferreira, que
lhe dedicou alguns poemas nos quais Sá
de Miranda surge como um mestre
literário e moral.
 No entanto, nem todos os seus
contemporâneos foram favoráveis às
inovações de Sá de Miranda ou
estiveram dispostos a acolhê-las.
Consciente disso, Miranda toma duas
atitudes:
Reações dos contemporâneos às inovações
mirandinas e contra-reação do poeta

 - pede a proteção dos mecenas, nomeadamente do


príncipe D. João Manuel que lhe lia a obra a conselho do seu
tio, o Cardeal D. Henrique;
(cf. os sonetos: «Ao Príncipe D. João, quando lhe mandou
pedir obras suas», «À segunda vez que lhe mandou mais papéis»
e «A terceira vez, mandando-lhe mais obras»);

 - queixa-se aos amigos e seguidores


(cf. a elegia «A António Ferreira»).

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