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Jornal de Estudos Espíritas 1, 010304 (2013) - (6 pgs.) Volume 1 – 2013

Reflexões Críticas sobre o Perispírito e sua Influência na Formação e


Manutenção do Corpo Físico
Alexandre Fontes da Fonseca1,a , Antonio Cunha Lacerda Leite2 e Christiano Torchi3
1
Campinas, SP
2
Editor do GEAE, New York, NY
3
Campo Grande, MS
e-mail: a a.f.fonseca@bol.com.br
(Republicado em 15 de Setembro de 2013)
Artigo reproduzido do Boletim do GEAE ns. 531, 532 e 533 (2007)

R ESUMO
Este artigo analisa a validade de uma função comumente atribuída ao perispírito que é a de servir como “molde”
na formação e manutenção do corpo físico de um encarnado. Com base nas obras básicas da codificação, na litera-
tura espírita e em conceitos da ciência, mostramos que o conceito de “molde” não é perfeitamente adequado para
descrever a ação do perispírito sobre o corpo. Propomos, então, que o perispírito seja um modelo influenciador
biológico, onde sua ação se dá em conjunto com os diversos fatores materiais que também determinam a forma e
manutenção do corpo físico.
Palavras-Chave: Períspírito; MOB; MIB.

I I NTRODUÇÃO partida aos fatores puramente materiais presentes nesses


processos. Basicamente, desejamos mostrar que o pe-
Uma das questões mais importantes para a Ciência rispírito não é um molde mecânico ou rígido do corpo
Espírita é o estudo das propriedades e funções do peris- físico, assim como se faz na fabricação de peças de me-
pírito. A Ciência, que ainda não reconhece sua existência, tal ou gesso, nem que sua influência ocorre da mesma
muito se beneficiaria do estudo do perispírito no desen- forma como no conhecido exemplo da limalha de ferro
volvimento de novos tratamentos para determinadas do- que se organiza de acordo com as linhas de campo de um
enças e na orientação para uma vida mais saudável. Não ímã. Analisaremos diversas explicações sobre o assunto
somente a área médica teria grande proveito no conhe- contidas nas Obras Básicas da Codificação e em outras
cimento do corpo espiritual da criatura, mas as ciências obras espíritas, para mostrar que os processos de forma-
exatas teriam nesse assunto uma área nova para pesqui- ção e manutenção do corpo físico ocorrem devido a uma
sar, sem embargo das profundas indagações filosóficas interação harmoniosa entre forças puramente materiais e
que o tema suscita, considerando que ele abre ao pesqui- forças espirituais ou psíquicas.
sador um novo paradigma para o estudo da origem e da Na seção 2, exporemos trechos de A Gênese [4] re-
evolução dos seres vivos. lacionados com a ação do perispírito sobre a matéria.
O estudo do perispírito não está circunscrito apenas Na seção 3, analisaremos a idéia de molde associada ao
às Obras Básicas da Codificação. Estudiosos como o Dr. perispírito e na seção 4, examinaremos o Modelo Orga-
Hernani G. Andrade e Dr. Zalmino Zimmermann bus- nizador Biológico. Na seção 5, confrontaremos algumas
caram aprofundar esses conhecimentos, chegando o pri- citações espíritas a respeito da importância dos fatores
meiro, por exemplo, a propor uma teoria ou modelo para puramente materiais nos processos de formação e manu-
o perispírito, denominado Modelo Organizador Biológico tenção do corpo físico. Na seção 6, apresentaremos uma
(MOB) [1, 2]. Além disso, o Movimento Espírita conta proposta qualitativa para a influência do perispírito so-
com o trabalho profícuo de Zalmino Zimmermann que bre o corpo físico. Na seção 7, resumiremos a discussão
apresenta tudo, ou quase tudo, o que já foi estudado e apresentada e tiraremos as conclusões.
pesquisado a respeito do perispírito [3], uma obra de ines-
timável valor cultural e científico, de leitura indispensável
para todo e qualquer estudioso e pesquisador espírita e II A ÇÃO DO PERISPÍRITO SOBRE A MATÉ -
mesmo não-espírita. RIA
Neste artigo, propomos um esclarecimento e uma No item 17 do cap. XI de A Gênese [4], Kardec diz:
abordagem adicional sobre a influência do perispírito
na formação e manutenção do corpo físico do ser hu- “Pela sua essência espiritual, o Espírito é um ser
mano. Procuraremos estabelecer mais acuradamente, e indefinido, abstrato, que não pode ter ação direta sobre
de acordo com os avanços científicos atuais relacionados a matéria, sendo-lhe indispensável um intermediário, que
é o envoltório fluídico, o qual, de certo modo, faz parte
com o tema, o valor justo dessa influência em contra- integrante dele.”

Seção 03: Artigos Reproduzidos 010304 – 1 Autor(es)


c
Reflexões Críticas sobre o Perispírito e sua . . .

Mais adiante, nesse mesmo item, o Codificador acres- proporcionada pelo molde. É importante destacar que o
centa: molde é completo no sentido de que nenhum outro fator
“Esse envoltório, denominado perispírito, faz de um ser
externo é necessário para a formação do objeto. Seria o
abstrato, do Espírito, um ser concreto, definido, apreen- perispírito um molde no mesmo sentido? Neste tópico,
sível pelo pensamento. Torna-o apto a atuar sobre a ma- vamos analisar essa questão.
téria tangível, conforme se dá com todos os fluidos im- Gabriel Delanne, contemporâneo de Kardec, na obra
ponderáveis, que são, como se sabe, os mais poderosos
motores.”
O Espiritismo Perante a Ciência [5] afirma, categorica-
mente, à p. 246, cap. 2, 4a parte, que o perispírito é o
É importante destacar a preocupação de Kardec em “esboço sobre o qual se modela o corpo humano”. O
mostrar o Espírito como um ser que pudesse atuar e in- mesmo autor, no livro A Evolução Anímica [6], obra de
teragir com o corpo físico, pois, se isso fosse impossível, leitura indispensável, no cap. 1, p. 39, assevera que o
não poderíamos associar a responsabilidade de um Es- perispírito
pírito aos seus atos como encarnado. Portanto, a pos- “contém o desenho prévio, a lei onipotente que servirá de
sibilidade de influência do Espírito sobre a matéria, por regra inflexível ao novo organismo, e que lhe assinalará o
meio do perispírito, é um ponto fundamental no Espiri- lugar na escala morfológica, segundo o grau de sua evo-
tismo. Resta-nos o trabalho de pesquisa sobre o como lução. É no embrião que se executa essa ação diretiva.
(...).” (Grifos em negritos, nossos).
essa influência ocorre, o que repercutirá tanto na Ciência
como um todo, quanto sobre nossa maneira individual E no capítulo 4, à página 125-126:
de encarar a vida. Esse trabalho de investigação sobre o “A indestrutibilidade e a estabilidade constitucional do pe-
corpo espiritual não pertence somente ao Espiritismo e rispírito fazem dele o conservador das formas orgâni-
vem sendo realizado por diversas doutrinas e religiões ao cas; graças a ele, compreendemos que os tecidos possam
longo dos tempos. Acreditamos que a Doutrina Espírita renovar-se, ocupando os novos o lugar exato dos antigos,
e daí a manutenção da forma física, tanto interna como
possui elementos para nos ajudar ainda mais no apro- externa.” (Grifos em negrito, nossos).
fundamento da questão, em ambos os aspectos, científico
e filosófico, o que já vem ocorrendo, conforme se pode Ainda Delanne, em O Fenômeno Espírita [7], p. 174-
notar na obra Perispírito [3]. 175, insiste:
Ainda em A Gênese [4], (item 11 do cap. XI), Kardec “Esse perispírito é o molde fluídico no qual se incorpora
frisa: a matéria durante a vida.” (Grifos em negrito, nossos).

“Para ser mais exato, é preciso dizer que é o próprio Léon Denis, fiel companheiro e continuador de Kar-
Espírito que modela o seu envoltório e o apropria às dec, reporta-se ao perispírito como “forma fluídica origi-
suas novas necessidades; aperfeiçoa-o e lhe desenvolve e
completa o organismo, à medida que experimenta a ne- nal”, “esboço fluídico”; “regulador”; “mediador plástico”;
cessidade de manifestar novas faculdades; numa palavra, “armadura invisível”, nos livros Cristianismo e Espiri-
talha-o de acordo com a sua inteligência. Deus lhe tismo [8] e O Grande Enigma [9]. A seu turno, Emmanuel
fornece os materiais; cabe-lhe a ele empregá-los. É assim
esclarece, na obra Roteiro [10], p. 31, cap. 6:
que as raças adiantadas têm um organismo ou, se qui-
serem, um aparelhamento cerebral mais aperfeiçoado “O perispírito é, ainda, corpo organizado que, represen-
do que as raças primitivas. Desse modo igualmente se ex- tando o molde fundamental da existência para o ho-
plica o cunho especial que o caráter do Espírito imprime mem, subsiste além do sepulcro, demorando-se na região
aos traços da fisionomia e às linhas do corpo.” (Grifos que lhe é própria...” (Grifos em negrito, nossos).
em negrito, nossos).
Essas colocações se baseiam em determinados fenô-
Inferimos do texto acima que o Espírito modela o menos fisiológicos como a diferenciação das células no
corpo por meio do perispírito. Mas como se processa- processo de crescimento do embrião, a regeneração de
ria esse modelamento? Essa é, talvez, uma das questões determinados tecidos e a manutenção da forma física.
científicas mais importantes de nosso século, pois a res- A idéia de molde é excelente para explicar esses fenô-
posta a ela pode significar uma demonstração, em termos menos fisiológicos, contudo, podemos identificar algumas
dos conceitos das diversas ciências, da sobrevivência da questões para as quais a idéia de molde não traz solução
alma. Sabemos, no entanto, o quão difícil ainda é achar- definitiva.
mos uma resposta precisa para essa pergunta. Nosso ob- Sabemos, pela Ciência, que os seres vivos seguiram
jetivo aqui é procurar algumas pistas que possam ajudar um processo evolutivo a partir de seres mais simples em
a guiar futuros pesquisadores na busca pela resposta da organização para seres mais complexos e ricos, culmi-
questão acima. nando com o surgimento do ser humano. Kardec tinha
conhecimento disso e no item 15 do cap. XI de A Gênese,
III A IDÉIA DE molde assim se expressa:
A idéia de molde foi proposta por diversos estudiosos “Da semelhança, que há, de formas exteriores entre
o corpo do homem e o do macaco, concluíram alguns
espíritas, desde a época de Kardec. Essa idéia consiste fisiologistas que o primeiro é apenas uma transformação
em propor que o perispírito é um molde para o corpo fí- do segundo. Nada aí há de impossível, nem o que, se
sico. O conceito de molde é o de algo que se utiliza para assim for, afete a dignidade do homem. Bem pode dar-
dar formas a um material inicialmente amorfo e maleável se que corpos de macaco tenham servido de vestidura aos
primeiros Espíritos humanos, forçosamente pouco adian-
que, após secar ou esfriar, se torna rígido porém na forma tados, que viessem a encarnar na Terra, (...).”

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da Fonseca, A. F.; Leite, A. C. L. e Torchi C.

Porém, sabemos que esse processo evolutivo não ocor- tico seria responsável por influenciar o corpo físico em
reu em dias ou meses, mas em milhares de anos. Qual- sua formação e manutenção e é sugerido que isso ocorra
quer melhoramento na raça humana se processou de de modo análogo à organização de punhado de limalha
modo muito mais lento do que a idéia de um molde rígido de ferro sob ação de um campo magnético comum.
poderia sugerir. De fato, os sistemas vivos são considerados sistemas
Uma outra questão que não pode se explicada pela auto-organizados. Porém, apesar da complexidade, ainda
idéia de molde advém da questão 356 de O Livro dos não existe uma demonstração absoluta de que a vida de-
Espíritos [11]: corre apenas das interações puramente materiais entre
as partículas que compõem o corpo físico. Entretanto, o
“356. Entre os natimortos alguns haverá que não tenham
sido destinados à encarnação de Espíritos ? Prof. Ilya Prigogine, prêmio Nobel de Química em 1977,
Alguns há, efetivamente, a cujos corpos nunca nenhum formulou a teoria da Termodinâmica de Processos Irre-
Espírito esteve destinado. Nada tinha que se efetuar para versíveis [13], em que ele mostra as condições para a exis-
eles. Tais crianças então só vêm por seus pais.” tência de sistemas auto-organizados. Essa teoria é um
Se é possível que um corpo de bebê se forme sem a forte argumento dos materialistas para a não existência
presença de um Espírito ligado àquele, então o que serviu do Espírito ou de um MOB, responsável pela formação e
de molde para ele? O perispírito da mãe não poderia ser manutenção do corpo físico.
um molde no sentido da palavra. Desse exemplo inferi- A primeira dificuldade desse modelo é que, se por
mos que talvez a idéia da influência do perispírito sobre hipótese o MOB possui um campo biomagnético capaz
o corpo físico não esteja bem representada pelo conceito de interagir com a matéria, teria que ser possível medi-
de molde. lo com instrumentos terrestres. A teoria do “Psi Quân-
Podemos citar, também, o caso Segismundo, presente tico” [14] é muito qualitativa e ainda precisa ser melhor
no livro Missionários da Luz [12]. No capítulo 14, por analisada em vista de algumas críticas [15]. Até o mo-
exemplo, André Luiz narra a atuação dos “Construtores” mento, o que se sabe, por exemplo, da bioeletrografia
(uma equipe de Espíritos responsável pela formação do (ou fotos Kirlian) é que ela expressa apenas o chamado
novo feto) nos primeiros 21 dias após a ligação do peris- efeito corona, que é a radiação emitida pelos elétrons do
pírito de Segismundo ao embrião. Sem deixar de haver a objeto perante os altos campos eletromagnéticos produ-
influência do perispírito de Segismundo na formação do zidos pelo aparelho Kirlian. Em outras palavras, ainda
feto, os “Construtores” agem sobre as células em forma- não se consegue detectar a existência de um campo cuja
ção “para que a reencarnação, por vezes tão dificilmente causa não possa ser explicada por nenhum fenômeno fí-
projetada e elaborada, não venha a falhar, de início, por sico normal.
falta de colaboração de nosso plano, onde são tomados os Uma outra dificuldade do MOB, porém não absoluta,
compromissos”, disse o chefe dos “Construtores”. decorre das heranças genéticas. Se o modelo é organiza-
Se existe o risco de prejuízo no processo inicial de dor num sentido absoluto, como os fatores hereditários
formação do feto a ponto de, em casos onde há mereci- surgem na formação do novo corpo? A própria seme-
mento, a Espiritualidade intervir para que nada dê er- lhança física entre pais, avós e filhos sugere que fato-
rado, então concluímos que o perispírito, sozinho, não res materiais preponderam em determinadas partes da
garante sucesso absoluto na formação do novo corpo. formação do corpo físico. Aliás, a idéia de molde dis-
Isso nos mostra, mais uma vez, que a idéia de molde cutida na seção anterior também não explica a origem
ainda é insuficiente para descrever, em caráter definitivo, dessa semelhança. O instrutor Alexandre, em Missio-
a influência do perispírito sobre o corpo físico. nários da Luz [12], no capítulo 13, diz que “Os contor-
nos e minúcias anatômicas vão desenvolver-se de acordo
com os princípios de equilíbrio e com a lei da here-
IV I DÉIA DO M ODELO O RGANIZADOR B I - ditariedade. A forma física futura de nosso amigo Se-
OLÓGICO (MOB) gismundo dependerá dos cromossomos paternos e
Hernani G. Andrade talvez tenha sido pioneiro na maternos; adicione porém, (...), a influência dos mol-
formulação de uma teoria para o perispírito, com base des mentais de Raquel, a atuação do próprio interessado,
em conceitos da Física. Ao que nos consta, foi ele o concurso dos Espíritos Construtores, que agirão como
quem cunhou a expressão “Modelo Organizador Bioló- funcionários da natureza divina (...). (Grifos em negrito,
gico” (MOB) [1, 2], que seria “uma unidade autônoma e nossos).
evolutiva, capaz de interagir com a matéria orgânica e, Percebemos, portanto, que a própria Espiritualidade
desse fato, resultar o ser biológico” [2]. nos informa que os fatores materiais não podem ser ne-
Entre suas características principais, o MOB seria gligenciados.
portador de um campo biomagnético capaz de interagir A situação apresentada na questão 356 de O Livro
com a matéria. O MOB teria uma função que se espera dos Espíritos também mostra que é possível formar um
de um molde, porém ele não seria algo rígido e estático corpo físico sem a presença do perispírito ou, no caso, do
e pode evoluir adquirindo novas propriedades de acordo MOB.
com a evolução moral do ser. É importante mencionar a seguinte afirmativa do re-
Uma característica importante do MOB é a capaci- ferido instrutor, ainda no capítulo 13 da obra referida:
dade de organizar a matéria viva. O campo biomagné- “O organismo maternal fornecerá todo o alimento para a

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Reflexões Críticas sobre o Perispírito e sua . . .

organização básica do aparelho físico, enquanto a forma Percebe-se, portanto, que André Luiz e Hernani não
reduzida de Segismundo, como vigoroso modelo, atuará desprezam os fatores materiais na formação e manuten-
como imã entre limalhas de ferro, dando forma consis- ção do corpo físico.
tente à sua futura manifestação no cenário da Crosta.”
(Grifos em negrito, nossos).
VI M ODELO I NFLUENCIADOR B IOLÓGICO
Destacamos a palavra “como” na citação acima, para
enfatizar que o processo de influência do perispírito so- (MIB)
bre a matéria é semelhante à atuação de um imã sobre Diante da análise realizada até o momento, gostaría-
limalha de ferro, porém não é exatamente o mesmo pro- mos de fazer uma proposta qualitativa para a ação do
cesso. Como elucidamos acima, para que esse processo de perispírito sobre a matéria.
influência seja do mesmo jeito que a influência de campos Notem que não estamos afirmando que somente os
magnéticos sobre objetos metálicos, seria preciso medir fatores materiais são importantes. Está claro, pelas ci-
tais campos magnéticos e mostrar que sua causa não es- tações acima, que fatores materiais e espirituais conjun-
teja na própria organização da matéria. tamente determinam a formação e manutenção do corpo
Por essas razões, nós ponderamos que a influência do físico. Enfatizamos que os fatores materiais não devem
perispírito sobre o corpo físico ainda não seja totalmente ser negligenciados numa proposta para os mecanismos de
bem representada pela idéia de um modelo organizador ação do perispírito sobre a matéria.
em fenômeno totalmente análogo ao de um campo mag- O MOB, proposto por Andrade, tenta fazer isso, ao
nético atuando sobre a limalha de ferro. Adiante, expore- desenvolver a idéia do campo biomagnético que intera-
mos uma proposta que pode conciliar a possibilidade de giria com o corpo físico. Porém, a forma pela qual essa
influência do perispírito com as características científicas interação ocorreria necessita da demonstração da existên-
dos sistemas vivos. cia de campos por ora ainda não medidos pela Ciência.
O MOB ainda não leva em conta o caráter complexo dos
sistemas vivos, de acordo com os conhecimentos da Ciên-
V A INFLUÊNCIA DOS FATORES PURA -
cia que prediz a possibilidade de existência de sistemas
MENTE MATERIAIS auto-organizados.
A semelhança entre avós, pais e filhos sugere que fato- Propomos, então, a idéia de um Modelo Influenciador
res puramente materiais dirijam o processo de formação Biológico (MIB) para o perispírito. O MIB seria aná-
do corpo físico. Certamente, que isso ocorre em muitos logo ao MOB, exceto no fato de que ele não dirigi-
outros aspectos além da semelhança física. ria a formação da matéria da mesma maneira que um
campo magnético organiza a limalha de ferro. A palavra
André Luiz, na obra Evolução em Dois Mundos [16],
“influenciador” deve ser entendida no sentido científico
explica que o automatismo presente em diversas funções
de ser um elemento que gera uma pequena influência (ou
fisiológicas como, por exemplo, as funções vegetativas do
uma pequena perturbação em termos científicos) no sis-
nosso corpo, é o resultado do acúmulo de experiências do
tema material. Segundo a teoria do Caos [17], pequenas
princípio inteligente no seu corpo espiritual, através dos
perturbações, ou influências, podem levar a grandes alte-
séculos. Entretanto, no cap. IV, ele ressalva que:
rações no sistema material como um todo. Através des-
sas pequenas influências, um sistema complexo como um
“(...), em qualquer estudo acerca do corpo espiritual,
não podemos esquecer a função preponderante do au- ser vivo pode ser formado e mantido sem que o controle
tomatismo e da herança na formação da individuali- dessa formação requeira o gasto de muita energia. Isso
dade responsável, para compreendermos a inexeqüibili- significa que tais pequenas influências não requerem que
dade de qualquer separação entre a Fisiologia e a Psico-
logia, (...).” (Grifos em negrito, nossos).
a intensidade do campo biomagnético, que vai interagir
com a matéria, seja grande.
Essa afirmativa de André Luiz é clara no sentido de Essa idéia resolve todos os problemas apresentados
que não se deve excluir os fatores materiais em todos os até aqui: i) nossa proposta não despreza a ação das leis
processos biológicos, assim como não se deve excluir os físico-químicas que regem o funcionamento do corpo fí-
fatores espirituais. A citação feita na seção 4, do livro sico; ii) permite que o Espírito atue sobre o corpo físico
Missionários da Luz, reforça isso. O próprio Hernani G. sem necessitar um campo biomagnético de grande inten-
Andrade reconhece (p. 51 de [2]) que: sidade (diferente da limalha de ferro que precisa de um
campo relativamente forte ou significativo para se orga-
“Se admitíssimos, (...), a existência de estruturas de
nizar sobre uma superfície); e iii) não diminui nenhuma
campo pré-existentes e ligadas aos processos biológicos, das propriedades e funções organizadoras do perispírito,
talvez pudéssemos, reforçando as teorias evolucionistas, pois é a característica complexa dos sistemas vivos que
dar-lhes melhor explicação, sem ferir os bem firmados os tornam até certo ponto maleáveis e dirigíveis, perante
princípios da genética. (...) O fenômeno ao qual de-
nominamos vida resultaria, segundo uns, exclusivamente influências de intensidade pequena ou sutil.
das propriedades físico-químicas da matéria. Mas, se- No modelo MIB, portanto, o campo biomagnético se-
gundo este outro ponto-de-vista, ele se originaria da ria de intensidade pequena e, por isso, demasiadamente
conjugação de duas categorias de fatores: as propri-
sutil para ser medido com os aparelhos usuais. Entre-
edades físico-químicas da matéria e um modelo orga-
nizador biológico (MOB).” (Grifos em negritos nossos). tanto, algumas pesquisas indicam a existência de campos

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da Fonseca, A. F.; Leite, A. C. L. e Torchi C.

elétricos de baixa intensidade ainda não explicados pela ria formar e manter o corpo físico sem a necessidade de
Ciência. Em nota de rodapé do capítulo I da obra Pe- exercer essa atuação por intermédio de campos físicos de
rispírito [3], o Dr. Zalmino Zimmermann traz a lume a intensidade elevada. Mostramos que essa idéia concilia o
seguinte notícia: fato de o perispírito poder atuar sobre o corpo físico com
“O cientista norte-americano, HAROLD SAXTON
a necessidade de essa atuação ser de natureza sutil, já
BURR, com sua equipe de colaboradores, investigando, que não se consegue medir, com os instrumentos atuais,
durante mais de 30 anos, os campos elétricos em estrutu- a presença do perispírito.
ras biológicas, verificou, através de minuciosas e delicadas Enfatizamos que o MIB é uma proposta ainda qua-
medições, a existência de campos elétricos que pareciam
presidir às diferentes funções biológicas de todos os seres litativa para o perispírito. Dentro desse modelo, falta
vivos, desde os seus componentes biomoleculares, celula- desenvolver as características do campo (magnético ou
res, citológicos e glandulares. Segundo a sua conclusão, elétrico) que atuaria sobre a matéria, bem como teremos
esses campos se estruturam no estilo de uma organização que desenvolver um modelo físico para essa atuação.
hierárquica, evidenciando que ’não são resultantes funci-
onais, mas sim, determinantes das funções peculiares aos Para encerrar, reportamo-nos à advertência do Espí-
organismos, isto é, formam uma estrutura que governa e rito LAMMENAIS, reproduzida à p. 72 de O Livro dos
mantém a organicidade do ser vivo!’ (conf. ANDREA, Médiuns [18], no cap. IV, item 51, “Dos Sistemas”:
Jorge. ’Psicologia Espírita’, 6a ed., Rio: LORENZ, 1994,
p. 31). “Agora o ponto de vista científico, ou seja: a
essência mesma do PERISPÍRITO. Isso é ou-
Tais campos eletrodinâmicos foram denominados ’campos tra questão. Compreendei primeiro moralmente.
de vida’ (fields of life) e, segundo BURR – professor emé- Resta apenas uma discussão sobre a natu-
rito de Anatomia, da Escola de Medicina da Universidade reza dos fluidos, coisa por ora inexplicável.
de Yale –, todos os seres, ’do homem ao rato, das árvo- A Ciência ainda não sabe bastante, porém lá chegará, se
res às sementes’, são por eles ’moldados e controlados’, quiser caminhar com o Espiritismo. O perispírito pode
podendo, inclusive, ’ser medidos e localizados por meio variar e mudar ao infinito. A alma é o pensamento:
de modernos voltímetros’. Como os campos da Física - não muda de natureza. Não vades mais longe, por
afiança o cientista - ’possuem qualidades organizadoras este lado; trata-se de um ponto que não pode ser
e diretoras que foram reveladas por muitos milhares de explicado. Supondes que, como vós, também eu não
experimentos’. (BURR, H. S. ’Blueprint of Immortality’. perquiro? Vós pesquisais o PERISPÍRITO; nós
Londres, NEVILLE SPEARMAN, 1971, pp. 11 e 12. Cf. outros, agora, pesquisamos a ALMA. Esperai, pois.”
ANDRADE, Hernani Guimarães. ’Espírito, Perispírito – Lamennais. (Grifos nossos).
e Alma – Ensaio sobre o Modelo Organizador Biológico’.
10a ed., S. Paulo: PENSAMENTO, 1984, p. 7).” (Grifos Lamennais deixa claro que cabe a nós, encarnados,
nossos).
o trabalho de pesquisa e que a busca pelo conhecimento
Certamente, esses campos são de intensidade pe- não pára nunca.
quena, o que reforçaria uma tese de influência do peris-
pírito sobre a matéria que se baseasse em campos sutis.
Isso não deve ser tomado como comprovação da proposta
de um MIB. Na verdade, estamos apenas propondo uma R EFERÊNCIAS
mudança qualitativa na idéia do Modelo Organizador Bi-
ológico de modo a conciliar as características científicas [1] H. G. Andrade, Espírito, Perispírito e Alma, Ed. Pensa-
mento, São Paulo (1984).
que se conhecem hoje sobre os sistemas vivos e a possi- [2] H. G. Andrade, A Matéria Psi, Casa Editora O Clarim, Ma-
bilidade de ação do perispírito sobre a matéria. tão (1971).
[3] Z. Zimmermann, Perispírito, Departamento Editorial do
Centro Espírita Allan Kardec (2000).
VII C ONCLUSÕES [4] A. Kardec, A Gênese, Ed. FEB, 36a edição, Rio de Janeiro
(1995).
Neste artigo, revisamos os modelos existentes para
[5] G. Delanne, O Espiritismo Perante a Ciência, Ed. FEB, 3a
o perispírito e seu possível mecanismo de ação sobre a edição, Rio de Janeiro (1995).
matéria. Analisamos as idéias de molde e o Modelo [6] G. Delanne, A Evolução Anímica, Ed. FEB, 3a edição, Rio
Organizador Biológico, mostrando que tais idéias, con- de Janeiro (1992).
quanto satisfatórias em determinados aspectos, ainda são [7] G. Delanne, O Fenômeno Espírita, Ed. FEB, 4a edição, Rio
de Janeiro (1988).
insuficientes para explicar todas as propriedades e ca-
[8] L. Denis, Cristianismo e Espiritismo, Ed. FEB, 10a edição,
racterísticas do fenômeno de formação e manutenção do Rio de Janeiro (1994).
corpo físico. [9] L. Denis, O Grande Enigma, Ed. FEB, 10a edição, Rio de
O fato de fazermos uma crítica construtiva dos mode- Janeiro (1992).
los anteriores não desmerece o trabalho de pesquisa reali- [10] Emmanuel, psicografia de F. C. Xavier, Roteiro, Ed. FEB, 9a
edição, Rio de Janeiro (1982).
zado por seus autores. Muito pelo contrário, tornam-nos
[11] A. Kardec, O Livro dos Espíritos, Ed. Feb, 76a edição, Rio
ainda mais valorosos no aspecto científico. A história da de Janeiro (1995).
Ciência mostra como os conceitos modernos foram cons- [12] A. Luiz, psicografia de F. C. Xavier, Missionários da Luz,
truídos com base nos conceitos anteriores, e a Ciência Ed. FEB, 26a edição, Rio de Janeiro (1995).
Espírita deve aproveitar isso no seu desenvolvimento. [13] I. Prigogine, Nonequilibrium Statistical Mechanics, Ed.
Wiley-Interscience, New York (1962).
Propomos que o perispírito seja um Modelo [14] H. G. Andrade, Psi Quântico, Uma Extensão dos Conceitos
Influenciador Biológico (MIB), em que, através de pe- Quânticos e Atômicos à Idéia do Espírito, Ed. Pensamento,
quenas influências sobre a matéria, o perispírito pode- 9a edição, São Paulo (1993).

JEE 010304 – 5 J. Est. Esp. 1, 010304 (2013).


Reflexões Críticas sobre o Perispírito e sua . . .

[15] C. A. Appoloni, A propósito da matéria psi, Núcleo [17] A. F. Da Fonseca, FidelidadEspírita 12, p. 20 (2003).
Espírita Universitário NEU – Londrina, http://www. [18] A. Kardec, O Livro dos Médiuns, Ed. FEB, 62a edição, Rio
neudelondrina.org.br/artcientificos_capa.htm de Janeiro (1996).
[16] A. Luiz, psicografia de F. C. Xavier, Evolução em Dois Mun-
dos, Ed. FEB, 11a edição, Rio de Janeiro (1989).

Title and Abstract in English

Perispirit and its Influence on the Formation and Maintenance of the Physical Body

Abstract This paper analyses the validity of the assumption commonly attributed to the perispirit of being a “mold” in the
formation of a person’s physical body. Based on the spiritist literature and on some scientific concepts, we show that the concept
of a “mold” is not perfectly appropriate to describe the action of the perispirit on the physical body. We, then, propose that the
perispirit is a influencer biological model, where its action occurs in conjunction with the material factors that also determine
the shape and maintenance of the physical body.
KeyWords: Perispirit; MOB; MIB.

J. Est. Esp. 1, 010304 (2013). 010304 – 6 JEE

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