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UFCG - UNIVERSIDADE FEDERAL DE CAMPINA GRANDE

CH / UACS / FILOSOFIA
Disciplina: Teoria do conhecimento
Docente: Dr. Antônio Gomes
Discente: Márcio Silva Fernandes

O conceito de Alma na filosofia Cartesiana

CAMPINA GRANDE
2023
RESUMO: O referido artigo tratará razoavelmente e superficialmente uma abordagem
conceitual para chegar-se ao conceito de Alma na filosofia cartesiana, aprofundando-se e
usando como base essencial a análise dos termos de Ser e Substância no próprio contexto de
pesquisa deste artigo, seguir-se-á também como orientação a quarta parte do livro Discurso
do método onde trata-se do conceito Alma e Deus, como também de apoio dicionários de
filosofia e livros metafísicos.
Palavras-Chave: Alma, Ser, Substância, Conceito.

INTRODUÇÃO:
Tratar do conceito de Alma requer uma atenção metafísica especial para tal abordagem,
pois no que se refere ao abstrato sempre se faz necessário aprofundar-se em outros conceitos
para se chegar a uma ideia do conceito desejado. Conceituar a alma sempre foi e será um
desafio na história da filosofia, vários pensadores desde os antigos, passando por Platão,
Aristóteles, Cícero, Santo Agostinho, Santo Tomás de Aquino, e vários outros do medievo,
onde o estudo pela alma e teológico foi de grande força, também segue-se na modernidade até
chegar no ponto de enfoque deste artigo, conceituar e refletir sobre o que seria a Alma que
René Descartes abordara, neste trabalho algumas citações será do livro Discurso do Método
de Descartes. Onde este elabora pela verdade seus métodos de buscar o conhecimento ideal.
Voltando-se para a abordagem de conceituar a alma, este artigo trilhará um caminho formado
por três conceitos importantes, são eles: Ser, Essência e finda-se na Alma. O caminho a ser
feito é baseado na metafísica clássica, nos conceitos que Aristóteles teria abordado em seus
livros da Metafísica. Portanto, tal artigo tratará de uma maneira simples e humilde todo um
trajeto conceitual para chegar na sustentação da conceitualização do que se denomina Alma.
1. ANÁLISE CONCEITUAL DO “COGITO ERGO SUM” (PENSO LOGO

SOU).

1.1 Ao iniciar seus estudos em elaboração do método, Descartes transita pela metafísica,
as coisas abstratas nas quais está além da percepção dos sentidos. Como também das matérias
espaçosas perceptíveis pelos sentidos, nas quais pertencem a física. Por fim, René utiliza-se
também da moral, tal qual fará necessário para analisar os comportamentos humanos
necessariamente em todo o seu processo de elaboração do método e também na pratica de tal.
Colocando tudo que se pode ser posto em dúvida, Descartes coloca até mesmo a
existência, num sentido analítico. O seu próprio ser é uma questão duvidosa, já que ainda não
se fora pensado sobre sua formação de essência que lhe intitule indiscutivelmente como ser. O
passo primário e essencial não só para toda a filosofia cartesiana mas também para a
sustentação do método é a famosa frase de Descartes “Penso, logo sou”.
Refletir seriamente a frase citada e analisar suas duas partes de uma forma minimalista,
“penso” referir-se-á primeiramente em sua única certeza que tem no momento ser a ação do
pensar, no qual é própria do ser humano como ser pensante e duvidoso o qual o fato de ele
estar duvidando naturalmente está pensando, logo que temos que o duvidar enquadra-se numa
faculdade do pensamento.
[...] compreendi, então, que eu era uma substância cuja essência ou natureza
consiste apenas no pensar, e que, para ser, não necessita de lugar algum, nem
depende de qualquer coisa material. De maneira que esse eu, ou seja, a alma,
por causa da qual sou o que sou, é completamente distinta do corpo e,
também, que é mais fácil de conhecer do que ele, e, mesmo que este nada
fosse, ela não deixaria de ser tudo o que é. (DESCARTES, 1999, p. 62)

Segundo, afirmar que o pensar garante sua existência como ser pensante, ele afirma o
seu Ser, sua essência pensadora. Pois como na citação acima, Descartes afirma que o ser não
necessita de lugar nem de matéria para ser, no qual o que ele denominará a alma, tal qual não
necessite do corpo para a existência de sua natureza. Onde finaliza a citação afirmando que a
alma se torna mais fácil de conhecer do que o corpo, mesmo que a alma nada fosse.
Sendo assim, é necessário antes de qualquer abordagem aprofundada do conceito de
alma, fazer-se uma elaboração do conceito de “Ser” na metafísica clássica aristotélica, para
nortear-se e fundamentar-se no conceito geral para a procedência até o conceito alma.

2. CONCEITO METAFÍSICO DE “ENS (SER)”.


2.1 O caminho percorrido por este artigo é basicamente com o intuito final de
conceituar algo metafísico1, independente da matéria (corpo), pois já fora citado neste
trabalho que René afirma a independência da matéria para a perfeita natureza da alma.

Portanto é imprescindível buscar o significado do termo Ser conceitualmente em


dicionários. Logo, segundo o Dicionário de Filosofia do filósofo italiano Nicola Abbagnano,
o significado de Ens2 enraíza-se em duas vias a do uso predicativo, e do uso existencial.
Na diferença entre S. predicativo e S. existencial baseia-se ainda a distinção
aristotélica entre tese e hipótese, como premissas do silogismo: a primeira não
assume a existência do objeto a que se refere; a segunda, sim. (ABBAGNANO,
2012, p. 1043).

Pois ao notar-se que existe duas vias a seguir para o conhecimento de tal termo, seguir-
se-á pela via do significado existencial, tal qual como foi analisado na citação acima, o uso
existencial assume a existência em si do objeto, caminho este que será aprofundado por mais
duas categorias; a existência em geral e a existência privilegiada3, ambas como em obviedade
da nomenclatura. A primeira, trata-se da abordagem em geral do ser, como por exemplo
quando Aristóteles confirma no livro VI da metafísica: “Mas, dado que o ente - aquilo que se
concebe como “ente” sem mais - se diz de vários modos[...]” (ARISTÓTELES, livro VI da
Metafísica, 1026a 33).
Na segunda qualificação de existência, (privilegiada) Aristóteles afirma sobre o ser
primário, que o Ser se diz de muitos modos, mas apenas um é seu significado primário e
fundamental (ARISTÓTELES, Livro VI da Metafísica, 1026a 33). Portanto, seguindo o
pensamento em busca de conceituar alma, e seguindo também o pensamento metafísico
aristotélico na conceitualização do ens tal artigo encaminha-se para outro ponto importante,
onde se é introduzido o termo substância, no qual tem grande importância para a
compreensão geral do ens.
Pois, se há de ser algo aquilo que precisamente ser para homem é, ele não poderá
ser o ser para não-homem, nem o não-ser para homem (são estas suas negações);
pois era uma só coisa aquilo que ser para homem significava, e isso era essência de
algo. E significar essência é significar que o ser da própria coisa não é nenhum
outro. (ARISTÓTELES, Livro IV da Metafísica, 1007a 20).

Em análise da citação acima determina-se resumidamente em um simples trecho de tal;


“[...] significar essência é significar que o ser da própria coisa não é nenhum outro.”

1
A alma no pensamento cartesiano.
2
Tradução de “Ser” do Latim.
3
Também conhecida por “primária”.
(ARISTÓTELES, Livro IV da Metafísica, 1007a 20). Logo, é afirmar que quando se indica a
substância4 de tal coisa, automaticamente levará ao seu Ser.

3. CONCEITO DE SUBSTÂNCIA E SUAS ESTRUTURAS.

3.1 Encaminhando-se para o ápice da proposta de tal artigo, chega-se na ocasião de


analisar detalhadamente o termo Substância, tal qual teve dois significados primordiais, o de
estrutura necessária e conexão constante, onde o que se refere ao primeiro indica a metafísica
e o segundo o empirismo. Obviamente este trabalho abordará especificamente a estrutura
necessária, tendo em vista o ponto máximo (alma) como metafísico.
Faz-se importante exteriorizar duas determinações para a estrutura necessária que
Abbagnano relata no significado de substância; A primeira Nicola denomina como o que é
necessariamente aquilo que é, e que Aristóteles em seu contexto denominará “quod quid erat
esse5” no qual será um significado para aquilo que o ser está em estabilidade ou em
continuidade, como afirma Nicola:
A primeira determinação é designada por Aristóteles com a expressão quod quid
erat esse que pode ser traduzido como essência necessária; com efeito ao pé da
letra, essa expressão significa aquilo que o ser era, onde o imperfeito “era” indica a
continuidade ou estabilidade do ser, seu ser desde sempre e para sempre.
(ABBAGNANO, 2012, p. 1092).

A segunda, o que existe necessariamente, Abbagnano relata a correlação desta com a


primeira, pois Aristóteles discorre sobre no livro VII da metafísica que o conhecimento das
coisas particulares é antecedido pelas essências necessárias, ou seja conhece o geral para
conhecer os particulares.
Temos ciência das coisas particulares só quando conhecemos a essência necessária
das mesmas, e com todas as coisas ocorre o mesmo que ocorre com o bem: se o que
é bem por essência não é bem, então nem o que existe por essência existe, e o que é
uno por essência não é uno; e assim com todas as outras coisas (ARISTÓTELES,
Livro VII da Metafísica, c.6, 1031 b6).

Pois, visto que o conhecimento nesta abordagem de substância parte do conhecimento


geral para sucessivamente o singular, mais específico, e assim associar que a substância em
sua essência necessária faz a coisa aquilo que é, consequentemente levando assim a essência
ser algo incriado e indestrutível.
Em percurso final para o núcleo deste labor pode-se ter uma noção ampla desde a
conceitualização do Ens, tal que se divide em partes e que necessariamente abrange o conceito

4
O termo substância e essência para Aristóteles terá o mesmo significado de identidade. Varia apenas entre
traduções.
5
Tradução: essência necessária.
de substância esta que é fundamental para a compreensão de todo restante do artigo, um
efeito “cola” que une todas as partes para formação do pensamento ideal do referido trabalho.

4. A CONCEITUALIZAÇÃO DO TERMO “ALMA” EM DESCARTES.

4.1 No pensamento Cartesiano ele elaborará um método para o conhecimento, métodos


escritos em sua obra Discurso do Método, onde o filósofo elaborará meios seguros para o
conhecimento verdadeiro. No decorrer de sua obra será abordado sobre a alma e sobre a
existência de Deus (quarta parte), baseando-se em uma metafísica tradicional para explicar o
seu próprio conceito de alma e Deus.
A princípio Descartes afirma sua compreensão que sua essência consiste apenas no ato
de pensar e que o ato de ser não se faz necessário a matéria, já que são coisas distintas, e que
sua alma6 é puramente abstrata independente do material, consequentemente seu ser torna-se
desnecessário da matéria (corpo).
É importante ressaltar as diferenças que Descartes tem de Aristóteles, quais são como
exemplo; o ser para Aristóteles é perfeito, essência em sua pureza máxima. Porém, em René
tem-se que esta, a alma, em seu ser é imperfeita, pois a substância maior de Ser encontra-se
apenas no Ser supremo, Deus. Levando em consideração sua religiosidade, Descartes
sobrepõe a alma humana a divindade do Ser divino, pois o criador é maior que o criado, e que
embora a alma humana seja a mais essencialmente maximizada, jamais será igual ou maior a
divindade Deus.
De maneira que restava somente que tivesse sido colocada em mim por uma
natureza que fosse de fato perfeita do que a minha, e que possuísse todas as
perfeições de que eu poderia ter alguma ideia, ou seja, dizê-lo numa única palavra,
que fosse Deus. (DESCARTES, 1999, p. 63-64)

Por fim, mesmo com as distinções entre a metafísica de Aristóteles e o pensamento que
Descartes atribui ao conceito de alma, liga-se todos os pontos desde a conceitualização do
cogito ergo sum, onde pensar é a garantia de ser. Posteriormente o conceito de ens metafísico
embasado no aristotelismo para comprovar a independência para com a matéria, ou seja, o
ente enquanto ente. Como também aprofundando na substância, característica principal e
fundamental do ser. Tudo isto na intenção de comprovar a sustentação feita por Descartes ao
afirmar que a alma humana independe do corpo. A distinção de Descartes nesse aspecto para
a metafísica Aristotélica é a imperfeição da essência da alma que René defende.

6
Aqui uma abordagem do conceito “alma” enquanto ser, existência. “Penso, logo sou”.
CONCLUSÃO:
Portanto, ao analisar detalhadamente o cogito ergo sum no qual pode-se ter uma noção
de Descartes afirmar que seu pensamento assegura a veracidade da sua existência, e que a
existência se baseia em seu ser. Ser este que dá sua essência de alma e essa alma totalmente
metafísica independe da matéria, e é justamente nessa linha de pensamento que fora feito a
correlação com a metafísica aristotélica sobre o termo Ser e substância / essência, pois a alma
que é caracterizada pelo ens necessita da abordagem detalhada de cada parte dessa metafísica.
Em busca de demonstrar que o pensamento cartesiano é sustentável, fora feito um
embasamento com a metafisica e também com o Dicionário de Filosofia do filósofo Nicola
Abbagnano, onde a maioria dos termos em itálico foram usados do dicionário. Tal trabalho
elaborado até aqui fora resultado de pesquisas e junções de ideias buscando ao máximo a
coesão e coerência para o entendimento do leitor. A intenção primordial é levar o leitor ao
conhecimento do conceito de alma de Descartes e sua sustentabilidade através da metafísica
clássica, mesmo com as divergências de Aristóteles e Descartes. Resta apenas concluir que
mesmo com a razoabilidade de informações, a intenção é passar por todos os pontos possíveis
para um conhecimento seguro deste modelo de “metafisica cartesiana7” e perceber o sentido
da abordagem, até mesmo René afirmando a imperfeição da alma, coisa que é vereda
diferente da Metafísica Clássica, porém faz-se necessário, pois aqui estamos falando do
pensamento cartesiano e sua marca neste artigo está justamente neste ponto, a independência
da matéria para que a substância do ser faça-se existente, e fora apenas feito uma relação com
Aristóteles.

7
Termo utilizado devido Descartes relatar metafisicamente seu conceito de alma.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:

DESCARTES, René. Discurso do Método (Pensadores). 7 ed. São Paulo – SP: Enrico
Corvisieri, 1999.
ABBAGNANO, Nicola. Dicionário de Filosofia. 6 ed. São Paulo – SP: Ivone Castilho, 2012.
ARISTÓTELES. Metafísica (Livro IV). 14 ed. Campinas – SP: Lucas Angioni, 2007.
ARISTÓTELES. Metafísica (Livro VI). 14 ed. Campinas – SP: Lucas Angioni, 2007.
ARISTÓTELES. Metafísica (Livro VII). 14 ed. Campinas – SP: Lucas Angioni, 2007.

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