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Margotte Channig

Margotte Channig

VINGANÇA

Margotte Channing

(Romances Vitorianos 02)


Margotte Channig

Sinopse

Londres, 1852

Alexandra vive por seu trabalho como pesquisadora, até


encontrar Gabriel, marquês e espião, e as faíscas voam entre os
dois.
Ela decide não vê-lo novamente, e ele, que tem de levá-la para
sua cama. E usará qualquer método, mesmo chantagem, se
necessário, para levá-la aos seus braços.
Imersos em um mistério cheio de mentiras e assassinatos,
eles terão que lutar, primeiro para sobreviver e depois para saber o
que é mais importante para ambos.
Margotte Channig

ADA

É uma linguagem de programação, desenhado por encargo do


Ministério de Defesa dos Estados Unidos no ano 1970. Foi
projetada com a segurança em mente e com uma filosofia
orientada à redução de enganos comuns e difíceis de descobrir.
O nome se escolheu em memória de Lady Ada Augusta Byron
(1815-1852), Condessa de Lovelace, filha do poeta Lorde George
Byron, a quem se considera a primeira programadora da história,
por sua colaboração com o Charles Babbage, criador da máquina
analítica.
Em 1953, cerca de cem anos após sua morte, as notas de Ada
na máquina analítica de Babbage foram publicadas sob seu nome
real, agora sendo reconhecido como um modelo de computador
inicial e as notas de Ada como uma descrição de seu software.
Esta novela é dedicada a todas as pessoas, homens ou
mulheres, que, com seu trabalho, conseguiram melhorar nossa
vida e quem, no entanto, morreu sem ser reconhecido por isso.
Muito obrigada.
Margotte Channig

Capítulo 1

Londres, 1852

O corpo jazia imóvel, deitado de lado, sob uma grossa capa de


mantas. Na semi escuridão do quarto, iluminada pela luz da lua
que entrava pela janela, vislumbrava-se com muita dificuldade
uma silhueta. Por acima do lençol, via-se a cabeça de um ancião,
coberta por um gorro de dormir. Sua face estava coberta por uma
máscara, e debaixo, por uma barba branca, que lhe cobria o resto
do rosto. Roncava ligeiramente, indiferente ao estranho, que havia
se introduzido em seu quarto uns momentos antes, e que estava
imóvel ao lado da cama. O assassino ergueu o braço direito para
esfaquear o corpo adomercido quando o quarto de repente se
transformou em um pandemônio de corridas e gritos. Dois homens
o derrubaram. Só então, várias lâmpadas a gás foram ligadas
simultaneamente.
Quando o delinquente foi mantido no chão, o velho pulou da
cama com agilidade imprópria para a idade. Caminhou até o
intruso, observando os dois policiais iluminarem seu rosto com

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uma das lâmpadas, depois virou-se para o inspetor ao lado dele,


segurando outra lâmpada.
— Eu lhe disse James! Sabia que era o sobrinho! Deve-me
um jantar no “Pomme de Terre”, eu sabia disso! — a mulher, pois
claramente o era por sua voz, tirou a barba com um puxão seco, e
logo o gorro de dormir. Ficaram alguns restos de cola no queixo,
mas, no todo, seu aspecto era normal, estava completamente
vestida. O inspetor de polícia, sorria ao vê-la mover-se de um lado
a outro com aquela energia, pouco lhe faltava para ficar dando
saltos de alegria.
— Está bem, Alexandra, convidarei-te. Embora fosse mais
justo que você me convidasse, já que você ganha mais que eu. —
queixou- se.
— Oh, não! uma aposta é uma aposta. — agarrou seu
revólver debaixo do travesseiro e o meteu na bolsa como se fosse
qualquer coisa. Dali tirou um lenço com o qual terminou de limpar
os restos de barbicha do queixo — Bom, vou para casa, com um
pouco de sorte, minha tia me terá guardado o jantar.
— Não conheci, em minha vida, ninguém, homem ou mulher,
que coma tanto como você. — ele a pegou pelo cotovelo — Vamos,
eu vou te levar, é tarde. — fez um gesto a um de seus homens,
para que se encarregassem do detido. — Vou levar a senhorita
Wallace a sua casa, em seguida vou a delegacia de polícia. —
Frank, seu segundo em comando, assentiu.
Alexandra seguiu tagarelando pelo caminho, até que subiram
no carro, e uma vez dentro, também.
— Este caso era muito importante — lhe olhava com os olhos
brilhantes — saiu nos jornais. Agora ninguém pode pôr em dúvida,

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que posso fazer o mesmo trabalho que um homem — ele assentiu,


estava totalmente de acordo com ela. O ancião, que tinha sofrido
duas tentativas de assassinato, a contratou, graças em grande
parte, a sua amizade com a tia da Alexandra. Ela tinha falado com
o James, quando lhe ocorreu a ideia de ficar como isca. Tomou a
sério porque já tinha trabalhado com ela um par de vezes antes, e
conhecia seu profissionalismo, e que suas ideias, geralmente, eram
muito acertadas.
Escutou-a cantarolar olhando pela janela. O fazia
ocasionalmente. Quando estava contente.
— E como está o seu irmão?
— Desgostoso! Continua a insistir para que eu pare com isso.
Mas eu adoro! — encolheu os ombros — Ele está em St. Ives, mas
vem de vez em quando para nos ver. Você me entende verdade
James?
— Claro, também gosto do trabalho. — algo no tom de sua
voz lhe fez o observar com atenção. Olhou-lhe pela primeira vez à
luz essa noite, havia algo diferente nele, era como se lhe ocultasse
algo.
— James, o que está errado?
— Eu não sei o que você quer dizer. — encolheu os ombros.
— James… acredito que já nos conhecemos, não me insulte
mentindo para mim. Prefiro que você me diga que não pode me
dizer. — ele olhou para ela atentamente.
— Se não te contar, acabará por descobrir. Outro dia, meu
chefe me chamou para o escritório dele. Recebi ordens para visitar
o Marquês de Bute. — Alexandra não conseguiu deixar de

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estremecer ao escutar o nome. James não era um tolo, ele


percebeu.
— Você o viu? — já não estava tão contente.
— Sim, esta manhã. — ele continuou, olhando para ela, como
se avaliasse a conveniência de lhe contar tudo.
— James por favor! Me conte o que te disse, já que começou a
contar a história. — o carro parou na frente da casa de sua tia,
mas nenhum dos dois se moveu.
— Bem, pois estive na mansão do Marquês, que imagino que
você já conhece. Recebeu-me o dono em pessoa, e bastante
zangado. Ele me culpa pela sua intervenção neste caso e nos
outros dois em que colaboramos.
— Não posso acreditar nisso! — ela tinha ficado com a boca
aberta, literalmente.
— Sim, acredite, além disso, tinha muito interesse em
conhecer nossa verdadeira relação, já que lhe parecia que não era
somente profissional. Tendo em conta que, como os dois sabemos,
este homem é conhecido em nosso ambiente, por ter sido um dos
melhores espiões do país, e posteriormente, diretor do Serviço
Secreto, chamou-me a atenção o grosseiramente que tratou todo o
tema. É quase como se quisesse que eu lhe contasse isso para que
você fizesse… o quê?
Ela olhou suas próprias mãos. Sabia que, ao final, Gabriel
não se conformaria com as negativas que lhe tinha dado durante
meses. Tinha chegado o momento. Tinha que ser muito mais
firme, e cortar aquilo pela raíz.
— Desculpe James, é minha culpa, ao menos em parte. Ele é
um homem a quem é difícil dizer não.

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— Imagino — James estendeu sua mão enluvada e deu um


apertão em uma das suas mãos — Alex, se necessitar ajuda, sabe
que pode contar comigo.
— Sei. — negou com a cabeça — Mas eu tenho que resolver
isso. Bem, eu vou estar na delegacia de polícia amanhã para a
declaração — James desceu primeiro para ajudá-la. Demorou uns
segundos em soltar sua mão.
— Recorda o que te falei, sabe onde me encontrar — a olhou,
era um pouco mais alto que ela, com o cabelo castanho, e uns
formosos olhos da mesma cor. Seria um homem muito bonito, se
não fora por uma cicatriz que lhe cobria toda a bochecha
esquerda, provocada por uma queimadura. Ele nunca tinha dito o
que tinha acontecido com ele. Mas ela sabia que essa não era a
única cicatriz que tinha. E eram piores as internas, ela também as
tinha. Apoiou sua mão na bochecha ferida e olhou nos olhos dele.
— Obrigada James. — beijando-o na bochecha, dirigiu-se a
sua casa. James não deixou de olhá-la em nenhum momento,
ninguém havia tornado a lhe beijar, depois do incêndio. Quando
ela entrou, subiu à carruagem e partiu. Ainda tinha muito que
fazer essa noite.
Anthony, o mordomo fechou a porta um tanto sério, a
senhorita tinha aspecto de cansada, mais que o habitual.
— Você quer jantar na sala de jantar?
— Não, por favor Anthony, sozinha não. Na salinha, na mesa
da janela, muito obrigada. Então vou ler algo enquanto isso.
Minha tia já foi para a cama?
— Sim, há algum tempo.
— Vá dormir Anthony, levarei as minhas coisas na cozinha.

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— Não me importo de esperar. — a olhou sério.


— Anthony por favor, é tarde, assim não jantarei tranquila.
Asseguro-lhe que não necessito nada.
Estava exausta, não era incomum, já que não fazia uma
pausa por meses. Sua tia começou a reclamar, vendo suas olheiras
e que havia perdido vários quilos. Ela contou a mesma história
para todos, que tinha que trabalhar mais do que um homem, para
ser considerada boa em seu trabalho. Que ela teria tempo para
descansar depois. Mas não era verdade. A verdade era que se ela
não deitasse à noite, totalmente exausta, não conseguia dormir.
Dois olhos negros apareciam em sua mente, e ela lembrava-se dos
tempos em que se conheciam, repassava as conversas. Mais que
conversas, as discussões que mantinham.
Sentou-se jantando diretamente na bandeja que haviam lhe
trazido. Enquanto o fazia, só na salinha, já que Anthony havia lhe
escutado e se recolheu, recordou a última discussão que manteve
com Gabriel.
Drogo e Amanda, os convidaram para jantar, ao voltarem da
lua de mel em sua propriedade na Toscana. O lugar escolhido foi o
restaurante mais elegante da cidade, The Clerk. Corria o rumor
que seu dono era um homem misterioso, conectado, de alguma
forma, ao submundo. Alexandra realmente queria ir lá,
especialmente para conhecê-lo e ver o que era verdade. Black,
assim se chamava, tinha sido encantador, recebeu-lhes como se
fossem da realeza, e os colocou em um dos salões privados, que
Alexandra sabia que se reservavam com meses de antecedência.
Os convidados eram os mesmos que foram às bodas de Drogo e
Amanda, no ano anterior. Sua tia Margaret com seu “amigo”, o

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doutor Sweets, ela mesma com seu irmão Jake, e, é óbvio, o jantar
foi bastante desagradável para ela. Desde o começo, era evidente
que os dois homens, Black e Gabriel, conheciam-se, e que não
eram, precisamente, bons amigos. Logo depois, Black deve ter
notado algo, entre Gabriel e ela, e desde então não parou de flertar
com Alexandra. Ela estava segura de que o fazia para incomodar
Gabriel. Como ela também queria lhe chatear, seguiu-lhe um
pouco a corrente. Gabriel estava fervendo lentamente, até que, à
saída, agarrou-a pelo braço para que esperasse. Ela aceitou
ficando a seu lado, deixando que saíssem os outros. Logo se voltou
para ele.
— O que quer? — levantou o queixo, altiva, sabendo que,
esse simples gesto, incomodaria-lhe.
— Temos que falar, mandei-te várias mensagens. — ela
tentou soltar o braço, mas ele não a soltou. Black estava ao lado
da porta, observando o intercâmbio, quando decidiu intervir.
— Alexandra, necessita ajuda? — a utilização de seu nome,
fez que ela se desse conta de que estava sendo usada para
provocar Gabriel. Nesse momento decidiu cortar a situação, antes
que piorasse.
— Não, obrigado senhor Black. — lhe jogou “o olhar
fulminante”, herdado de sua tia, mas não pareceu lhe fazer efeito.
Teria que praticá-lo mais, cada vez mais homens eram imunes.
— Havia dito que poderia me chamar Black, não é necessário
o senhor.
— Como lhe havia dito senhor Black — voltou a repetir o
tratamento — não precisamos de você. — por fim se deu por
vencido e partiu.

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Ao que parece, isso tranquilizou algo em Gabriel, que a


soltou. Ela seguiu andando.
— Por favor. — escutou. Nunca, mas nunca, tinha esperado
escutar essa palavra em sua boca, voltou-se assombrada e ficou
lhe olhando.
— Está bem, o que quer?
— Só quero conversar com você, meia hora no máximo, em
um lugar público se quiser. Vamos tomar um café.
— Está bem, estamos hospedadas no Savoy, em meia hora,
acompanharei primeiro a minha tia, de acordo? — ele assentiu
respirando fundo.
Despediram-se na saída, e no carro, sua tia lhe perguntou o
que tinha acontecido.
— Nada, um mal-entendido.
— Pois me parecia uma briga de gatos de ruas, e, neste caso,
quem ganhou foi você, querida — sua tia ria com vontade, seus
cachos brancos disparando para todos lados.
— Os homens são muito confusos tia. — soprou.
— Filha, estou preocupada com você. — a olhou
surpreendida, estava séria.
— Por que tia? Estou bem de saúde, você também, e tenho
muito trabalho.
— Por isso! Não digo que se case, não, se não é o que quer.
Mas filha não se diverte nada! Sempre está trabalhando. Eu
gostaria que, alguma vez, saísse com um homem. Para mim, o
Marquês não parece ruim, ele é um bom homem, e ele também é
visto com experiência.
— Tia, você não está me dizendo o que eu acho?

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— Sim, pelo menos, prova o sexo, antes de decidir se você


gosta ou não. Se o fizer, tem que ser com alguém que saiba o que
faz e que te tenha carinho — Alexandra moveu a cabeça para os
lados, negando o que ouvia.
— Eu não estou te ouvindo, a propósito. Onde o Dr. Sweets
foi tão rápido?
— Tinha uma visita, você sabe que está muito ocupado,
sempre está daqui para lá, nunca temos tempo de estar juntos.
Bem, quase melhor, porque sempre acabamos discutindo. —
lançou algumas risadinhas, acompanhadas por sua sobrinha.
Chegaram à casa.
— Tia, tenho que ir à delegacia de polícia, imagino que
voltarei em um par de horas, na melhor das hipóteses. — sua tia a
olhou por um longo momento antes de descer, e, sorrindo, disse-
lhe:
— Fique bem querida. — Logo, desceu do carro ajudada pelo
Anthony, o mordomo, que tinha saído à rua para fazê-lo.
Não havia maneira de lhe ocultar nada! Só esperava ser como
ela, quando tivesse sua idade — pensou sorridente, disse ao chofer
que fossem ao Savoy e voltou a acomodar-se no assento.
Toda Londres falava da inauguração desse hotel, ela ainda
não o conhecia, mas imaginava que seria como os outros. Ela
estava errada. Na sala de chá, havia mulheres por pares, pela
primeira vez, saindo para uma bebida em público, sem homens a
seu lado. Era precioso, luxuoso, muito acolhedor. Quando chegou,
disse ao maitre do restaurante que Gabriel a estava esperando. Ele
já estava lá, buscou pela sala, mas não o viu. Estava em um salão
dos chamados “duplo”. Era pequeno, com uma mesa para duas

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pessoas. Levantou-se com cortesia, quando ela entrou. Ele olhou


para ela, estava muito sério. Sentou-se frente a ele, ajudada pelo
garçom, que logo os deixou sozinhos. Ao lado da mesa, deixaram o
que era necessário para o café ou chá, leite, massas, sanduíches e
bolos.
— Olá Alexandra. — sua voz seguia criando desejos
impossíveis em seu interior. Era o único homem que o conseguia.
Até o momento.
— Acabamos de nos ver Gabriel, mas olá de novo. — ele
sorriu ironicamente.
— Não entendo como é possível que, a mulher a que mais
desejei em minha vida, resulte ser a menos romântica de todas as
que conheci. — parecia rir de si mesmo por isso.
— Não posso responder a isso, mas tenho que ir à delegacia
de polícia. Se não se importa me dizer o que quer. — ela olhou
para a cafeteira na mão, antes de servir um café com leite — Quer
café?
— Sim, um pouco, obrigado. De verdade quer me fazer
acreditar, que não sabe sobre o que quero falar?
— Não, — deu um sorvo, estava muito bom — faz tempo que
não nos vemos, e, que eu saiba, não ficou nada pendente da
última vez.
— Com nada pendente, você quer dizer aquela vez que você
estava prestes a morrer sangrando junto a mim, quando uma
bomba explodiu naquela casa? Ou quando te tive em meus braços
em meu escritório, e quase fizemos amor em cima da
escrivaninha?

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— Eu não o chamaria fazer amor, — resmungou metendo


uma massa na boca — de qualquer jeito, tudo isso faz já muito
tempo Gabriel. Sei que trocou de amiga, imaginava que, esta nova,
daria o que necessita.
— Isso não é seu assunto. — tinha conseguido deixá-lo
zangado. Com alguma sorte, ele a deixaria ir em cerca de dez
minutos.
— Eu diria que sim, se pretender que ocupe seu lugar.
— Nunca pretendi tal coisa. — já estava ficando avermelhado.
Ficava pouco para deixa-lo totalmente zangado. Com ele nunca
falhava essa tática.
— Ou seja, que seguiria tendo sua amante e, além disso,
quando te interessasse, você e eu transaríamos em algum lugar.
Foi o que pensou? Acredito que se enganou de religião, e de país —
depois de comer outra massa, voltou a olhar para ele.
— Sei o que pretende, quer que me zangue, de tal maneira,
que te deixe em paz. Isso não vai acontecer Alexandra. Nunca
pretendi que fosse minha amante, por alguma razão, esse papel
não cabe em você. Para começar, eu mantenho Beth, e dou
presentes frequentemente. Presentes caros, não acredito que você
gostaria dessa situação. — ela o olhou irada — Bom, se me desse
de presente de vez em quando uma caixa de massas, seria feliz —
agora tinha conseguido que ela ficasse zangada.
— Mas se engana, não queria que falássemos sobre isto,
queria comentar com você algo que chegou aos meus ouvidos —
ela franziu o cenho ao lhe olhar, não sabia a que podia referir-se.
— Me diga.

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— Contaram-me que está colaborando com um inspetor de


polícia, em um caso especialmente perigoso. De fato, advertiram-
me, que arrisca sua vida, desnecesariamente, muito
frequentemente.
— E? — levantou o queixo.
— Estou seguro de que sua tia, para começar, não sabe, nem
seu irmão tampouco.
— Quão baixo você caiu Marquês! Está me fazendo
chantagem? — sentia que estava a ponto de explodir. Se pudesse,
gritaria como uma lavadeira, mas se manteve aparentemente
calma.
— Se não deixar esse caso, verei-me obrigado a contar para
ele. — Ele estava olhando para ela com certeza, como se ela não
tivesse escolha senão fazer o que ele disse. Apesar do que
acreditava, ainda não a conhecia. No mínimo.
Ela terminou seu café, deixando a xícara sobre o pires com
um golpe seco. Logo se inclinou um pouco para ele para que a
escutasse, embora estivesse sussurrando.
— Me escute com atenção Gabriel — inspirou fundo e
continuou — e acredite no que digo. Se contar algo a minha
família, o que seja. Se me chantagear, pode ser que consiga que
deixe de trabalhar nesse caso. Mas jamais, nunca, irá me ter. Se é
difícil que me deite contigo, essa é a maneira mais segura de que
isso não ocorra jamais. Me entendeu? — ele assentiu sem falar.
Não recordava que outra pessoa o tivesse deixado mudo. Nunca.
— Agora vou, o café estava muito bom. Muito obrigada.
Adeus, Gabriel. — se foi do salão, deixando a porta entre aberta. O
Marquês de Bute seguia na cadeira, tal como o tinha deixado.

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Estava atônito, não pelo que ela havia dito, mas sim como se
sentiu quando o fez. Tinha muito em que pensar.

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Capítulo 2

Desde então, tinha recebido várias notas dele cada vez mais
insistentes, mas não tinha feito nenhum caso. Nem sequer as
tinha respondido, seguia zangada. Claro que nunca acreditou, que
se atreveria a falar diretamente com a polícia. Isso sim podia
prejudica-la. Começava a fazer um nome. Olhou o relógio que
havia sobre a chaminé, certamente, ainda estaria acordado. Levou
a bandeja para a cozinha e subiu para se trocar. Maquiou-se um
pouco, tinha umas olheiras terríveis. Certamente Gabriel, assim
que a visse, mandaria ela dormir, antes de falar com ela.
Ela vestiu um vestido confortável, bem mais bonito que o que
levava. Ao fim e ao cabo, era uma mulher, e ia ver um homem
muito atraente. Também se perfumou. Agarrou sua bolsa,
comprovou que levava dinheiro e saiu para rua, voltando e
fechando a porta com chave. Tinha deixado um travesseiro debaixo
dos lençóis de sua cama, embora não estava segura de que esse
velho truque funcionasse. No caso de alguém olhar, tinha fechado
as venezianas, para que não entrasse luz e só se visse um vulto.
Não encontrou um carro e pediu ajuda a um policial, que
patrulhava com uma lanterna pendurada no chapéu. O homem

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Margotte Channig

assentiu, e a acompanhou duas ruas mais à frente, onde havia um


carro parado.
— É muito tarde, para que as damas estejam sozinhas pela
rua. — a olhou fixamente, parecia ameaçador, mas falou
tranquilamente. Era mais velho, teria uns cinquenta anos.
— Sim, tem razão, mas não tenho mais remédio que sair,
muito obrigada agente. — ele assentiu ajudando-a a subir, depois
de que ela deu a direção ao condutor.
A casa do Gabriel estava em uma das zonas mais luxuosas da
cidade, na Cromwell Road, perto do Museu Nacional de História.
Era uma mansão preciosa, mas um pouco esmagadora. Disse ao
condutor que esperasse, se por acaso não a atendessem.
Surpreendeu-se quando o dono abriu a porta, quando ia voltar a
bater. Estava descalço e com a camisa desabotoada, quase por
completo.
— Sabia que viria, cedo ou tarde. Esperava você. — a olhou
com os olhos cuspindo fogo.
— Espera, tenho que pagar ao chofer. — se virou para descer
os degraus, mas ele a segurou.
— Entra, eu pago. — desceu os degraus descalço, embora
não parecesse notar. Pagou o condutor dando uma generosa
gorjeta e voltou ao seu lado, de novo, em um par de minutos.
Empurrou-a sem muita delicadeza e fechou a porta. Logo, agarrou-
a pelo braço e, durante uns segundos, olhou para o piso superior,
mas suspirando, dirigiu-se a uma sala abaixo.
Era uma espécie de sala pequena, quase abaixo das escadas,
mas, com muita diferença, era a habitação mais acolhedora de
todas as que tinha visto naquela casa. Havia uma mesinha baixa,

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Margotte Channig

um sofá, e uma mesa com duas cadeiras junto a uma grande


janela. Na chaminé ardia um fogo alegre. Era uma habitação de
mulher, mas estranhamente, Gabriel não destoava dali.
— Eu gosto desta habitação. É muito bonita.
— Era a preferida de minha mãe. — o olhar de Alexandra
passeou pela habitação. Ele foi para a mesa, onde havia uma
garrafa e dois copos, um com bebida.
— Estou seguro de que você gosta de uísque. — já estava
jogando a bebida no copo vazio.
— Sim. — quando o deu, não fez nenhum intento de tocá-la.
Dirigiu-se ao sofá e se sentou ali, descamisado, e descalço,
bebendo, enquanto a olhava fixamente. A postura de seu corpo,
enfraquecida, indicou-lhe, que tinha bebido muito.
Estava espetacularmente bonito. Isso era inegável. Depois de
tirar o chapéu e a capa, e de deixá-los sobre uma cadeira, ficou de
pé frente a ele, apesar de que morria de cansaço. Terminou o
uísque com um gole, que fez ele sorrir irônicamente.
— Bebe com frequência?
— Não muito, só quando quero, — era certo que não gostava
muito de uísque, mas sabia que o incomodaria, e não pode resistir
— está bem Gabriel, conseguiu que eu viesse aqui. Imagino que
isso é o que procurava com toda a confusão que montou, para que
James o visitasse.
— James? Refere-se a seu amiguinho? Se disser a verdade
não me pareceu grande coisa. É algo sombrio. Eu diria que
esconde algo. — se levantou, para pegar o uísque.
— Gabriel por favor, pode deixar de beber? — ele se voltou
com o copo na mão e o tragou de uma vez.

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Margotte Channig

— Qual é o problema com você? — deixou o copo de um golpe


na mesa, e ficou de pé, enfrentando-a. Ela pensava que estava
calmo, mas realmente o álcool não tinha conseguido lhe acalmar.
Não entendia o que se passava.
— Pode-me dizer o que se passa agora? Está zangado?
— E se estou zangado? — se deu conta de seu tom de voz,
baixo. Continuou se aproximando, até que ficou presa a seu corpo,
de pé junto à chaminé — Quando terminou sua façanha, esta
noite, veio alguém e me contou o que andou fazendo na casa desse
senhor. Se fazendo passar por ele, para que o seu sobrinho
pudesse te apunhalar — Começaria a soltar vapor de um momento
a outro.
— Gabriel, estava rodeada de policiais, era impossível que…
— Não! Isso o que vai dizer é mentira, não é impossível que te
matem, não é impossível que matem a ninguém! Maldita seja! —
agarrando um dos seus braços a sacudiu. Ela soltou
involuntariamente o copo, que saiu voando e caiu contra a
chaminé rompendo-se e lançando o uísque por todos os lados —
Não posso suportá-lo mais! — resmungou — estou seguro de que,
se dormir com você, poderei te tirar de minha cabeça e seguir com
minha vida! — Ele pegou sua mão e a afastou, arrastando-a para
fora da sala. Alexandra teve tempo para gritar enquanto a levava
pela escada, e também enquanto a levava até seu quarto. Mas ela
não fez, ela não era tão hipócrita. Era o que seu corpo pedia,
quando não dormia à noite. Aos vinte e oito anos, ela tinha certeza
de que queria que Gabriel não fosse só o primeiro, mas seu último
homem. Ele fechou a porta e olhou para ela.

~ 21 ~
Margotte Channig

— Não está lutando — ele sussurrou para ela — É o que


deseja? — ela olhou para ele corando.
— Sim. Mas, antes de mais nada, quero que saiba que eu não
fiz isso antes. Não foi por nada, estive muito ocupada com meu
trabalho e… — Ele a deteve com um beijo terno e ardente ao
mesmo tempo, suas línguas entrelaçadas em antecipação a dança
de seus corpos. Quando se separaram, os dois estavam respirando
pesadamente.
— Deus! Sinto ter bebido tanto — passou a mão pelo cabelo.
— Isso pode afetar você? — ele soltou umas risadinhas.
— Espero que não. Vem, vamos junto à lareira, quero te olhar
bem quando a despir, e que não sinta frio — ela assentiu
obediente, deixaria-o no comando da situação, já que tinha
experiência e ela não.
Os olhos dele estavam escurecidos por um intenso desejo. Se
sentia incômodo consigo mesmo, porque sabia que, se ela o
negasse, chegaria a suplicar. Não podia passar uma noite mais
sem ela. Logo eles se esqueceriam.
Começou a desabotoar os botões das costas do seu vestido,
notou o tremor que percorreu seu corpo.
— Tem medo? — Alexandra meneou a cabeça enquanto
baixava o vestido pelos quadris. Ele olhou para ela.
— Não, você não me assusta, Gabriel — ele deixou ver, em
seu olhar por uns instantes, a exasperação que sentia pela
mentira da mulher — mas isso pode ser um erro — sussurrou.
— É possível, mas mesmo que seja, vamos fazer —
murmurou ele e a beijou. Ela se apertou contra ele e afundou os
dedos entre seu cabelo. Estremeceu-se de novo, mas nesta ocasião

~ 22 ~
Margotte Channig

devido à paixão. As rápidas mãos dele já estavam tirando a roupa


interior, procurando sua pele.
Despiu-a em um tempo recorde. Quis contemplá-la à luz do
fogo, mas ela não o permitiu, lançando-se para o despir. Ela seguia
acariciando suas costas, ou seu peito, onde pudesse alcançar,
enquanto tirava, de maneira inexperiente a camisa, e logo as
calças e as meias. Totalmente ruborizada, tirou os seus calções,
deixando à vista seu pênis ereto. Ela sabia como eram, tinha visto
algum desenho, mas a impressionou de toda maneira. Aproximou
o dedo indicador para tocá-lo, e ele se sacudiu quando o fez.
— Te fiz mal? — perguntou. Ele sacudiu a cabeça com o
cenho franzido, parecia que custasse se concentrar.
— Não, ao contrário, eu gosto — ela se aproximou mais e o
acariciou com a palma, logo agarrou suas bolas na mão e as
apertou ligeiramente. Ele aguentou tudo com um pequeno gemido
de prazer, olhando com um anseio infinito. Por fim, ela ficou em
frente a ele e abriu os braços.
— Faça o que quiser. — Ele sorriu como se ela tivesse lhe
dado a lua, e a levou em seus braços para a cama. Ele imaginou
penetrá-la selvagemente, até que seus gritos retumbassem na casa
e ele se esvaziasse, mas respirou profundamente para se
tranquilizar. Ele a deitou na cama e depois se recostou.
Voltou a se aproximar uns instantes depois, algo mais
acalmado, embora terrivelmente excitado, até o ponto que lhe doía.
Sentou-se a seu lado. Ela olhava para ele com olhos de gata,
sonolentos. Tinha o aspecto de estar cansada. Acariciou seus
peitos pequenos e firmes. Os mamilos estavam inchados, pegou
eles com os dedos, ela gemeu, logo os meteu em sua boca e sugou.

~ 23 ~
Margotte Channig

— Alexandra, gosta disto? — ela assentiu, sem dar-se conta


de que ele não a via.
— Sim, por favor, continua. — ele beijou seu pescoço e
lambeu sua orelha, até chegar ao ombro, onde lhe deu uma
pequena mordida. Voltou a gemer.
Ela queria mais e o queria mais depressa. Sabia o que
Gabriel lhe faria, e que doeria, o tinha explicado sua tia fazia
tempo.
— Gabriel, prefiro que o faça rápido. Disse-me minha tia que
a primeira vez é impossível que tenha um orgasmo, mas eu
gostaria de ter algum antes de ir, se puder — ela disse muito séria.
Ele deixou seu pescoço e ficou olhando fixamente, com um sorriso.
— Assim, quer um orgasmo? Não se preocupe, o terá, antes
do que crê — separou suas pernas as levantando e as flexionando
deixando-a totalmente a seu alcance. Quando começou a lamber
sua vagina, ela levantou a cabeça bruscamente.
— O que faz? Estou segura de que essa não é a forma correta
de fazê-lo.
— Fique quieta Alexandra e desfruta — em parte para lhe dar
uma lição, dirigiu-se a seu clitóris, e o lambeu repetidamente
enquanto observava sua reação. Ela, a princípio olhava para ele
com os olhos como pratos, até que começou a sentir o prazer, e
logo, só gemia movendo a cabeça de um lado para o outro. Ele a
penetrou de uma vez com um dedo, imitando um pênis, para que
chegasse antes ao orgasmo, o que ocorreu quase em seguida.
Deixou-a uns segundos descansando, estava esparramada na
cama, com os olhos fechados, e respirando com agitação.
— Isso é um orgasmo, gostou querida?

~ 24 ~
Margotte Channig

— Deus! O que estava perdendo, é melhor que a comida!


Bom, que o chocolate, não — ele rio as gargalhadas, conhecendo
sua afeição por comida.
— Isso foi só o começo, agora vamos à segunda parte. Abre as
pernas — se colocou entre elas, e acariciou seu rosto, retirando o
formoso cabelo, negro e liso, que lhe tinha grudado pelo suor.
Beijou-a, percorrendo com a língua toda sua boca, lhe abraçou
acariciando a nuca.
Dedicou sua atenção aos peitos, e ela voltou a gemer uns
instantes depois. Colocou um dedo dentro dela para ver como
estava fechada, era bastante estreita. Mas estava muito úmida.
Dirigiu seu pênis com a mão e o situou na entrada, ela olhava
tudo com atenção.
— Iremos devagar, para que doa o mínimo possível Alexandra
— seguiram beijando-se enquanto seu membro pulsava,
desesperado, igual a ele, esperando seu turno. Empurrou uns
centímetros e entrelaçou suas mãos com as dela.
— Gabriel, necessito mais, por favor. — a beijou porque não
podia escutar isso de sua boca, e seguir tranquilo. Ao inclinar-se,
empurrou sua pélvis contra ela, o que provocou que entrasse um
pouco mais. Voltou a sair, e voltou a entrar, assim até que os dois
estavam tão excitados, que não poderiam aguentar muito mais. —
Gabriel já, por favor! Preciso de você. — gritou.
— Não quero te fazer dano. — quase não o entendia, porque
falava entre dentes, tentando controlar-se.
— Agora! — guiando-se de sua intuição, que não a estava
acostumada falhar, cruzou as pernas pela cintura dele
empurrando para ela. Ele não resistiu, e deu o último empurrão

~ 25 ~
Margotte Channig

que necessitava, para romper o obstáculo e assim ser um. Logo


ficou quieto observando-a, não a beijou, nem a acariciou. Manteve
suas mãos enlaçadas e esperou por ela, que tinha os olhos
fechados. Olhou para ele.
— Sinto muito, não queria te fazer dano, mas a primeira vez é
impossível que não doa, tentei que fosse o menos possível…
— Se cale, estou bem, foi como uma espécie de ardência, nem
sequer se pode chamar dor, asseguro isso. Não é comparável a
quando me cravou o vidro lembra? Isso sim que foi dor — brincou,
ele sorriu sem poder evitar voltar a beijá-la. Ela pigarreou, para
chamar sua atenção — Ehhh, poderíamos seguir? Tenho a
sensação de que ficou algo pendente — ele riu alto, isso a fez
estremecer, já que estava ainda dentro dela. Gabriel, feliz,
continuou movendo-se com investidas largas e profundas, ela
adiantou suas mãos para acariciar seus lados, e seus braços. Seu
corpo parecia maravilhoso. Começou a notar que algo ia ocorrer,
igual ao que tinha feito ele antes com sua língua, mas desta vez
era diferente, mais forte. Quando a alcançou o prazer, sentiu-se
como se flutuasse durante uns segundos. Gabriel, então, pareceu
enlouquecer. Tomou pelos ombros e a apertou contra seu corpo.
— Outra vez! — exigiu jogando a cabeça para trás, e
beijando-a vorazmente a boca — Outra vez, maldita seja! — seguiu
introduzindo-se nela e voltando a sair, ela não podia seguir.
— Não Gabriel, por favor — estava muito cansada.
— Sim, maldita seja! Não vai esquecer esta noite, nunca! —
olhou-o fixamente, ao escutar o desespero em sua voz. Nesse
momento, deu-se conta do dano que tinha feito, com suas
negativas.

~ 26 ~
Margotte Channig

Suas mãos, voltaram a percorrer o corpo dele, ao tempo que


arqueava o seu, oferecendo-se por inteiro. O seguinte clímax da
Alexandra fez que Gabriel se sentisse esmigalhado pelo prazer.
Resmungando algo inarticuladamente, explodiu dentro dela e
deixou cair sua cabeça no oco de seu ombro. Quando as esgotadas
mãos dela escorregaram pelos suados ombros de Gabriel, este
pronunciou seu nome.
Ela não falou durante um longo momento. Em realidade, não
havia nada a dizer. Tinha dado um passo equivocado, plenamente
consciente do que fazia. Se havia consequências, pagaria-as. Agora
tinha que reunir toda dignidade que possuía, e ir embora dali.
— Devo ir — Ele desviou o olhar e sentou-se. Estava
mortalmente cansada.
— Fica um momento Alexandra.
— Não posso dormir aqui, sabe. — aproximou-se da lareira,
recolhendo suas roupas, era muito esforço, que esteve
considerando pedir a ele que recolhesse. Gabriel pôs a mão em seu
ombro, meio erguido, para que ela se voltasse.
— Alexandra — olhou para ele, parecia triste — só um
momento. Descansa. Despertarei-te em um par de horas, não
parece que tenha dormido em muito tempo.
Pois sim que tinha tido êxito maquiando suas olheiras.
Assentiu em silêncio, deixando que a agasalhasse e a abraçasse
contra ele. Dormiu como uma menina.
Despertou quatro horas depois. Apesar de que sabia que
discutiria com ele por havê-la deixado dormir tanto, não foi capaz
de fazê-lo. Desfrutou vendo como dormia, e o bem que a sentia
entre seus braços. Movia-se muito dormindo, quando o fazia, ele

~ 27 ~
Margotte Channig

abria os braços e, quando ficava quieta, voltava-os a fechar sobre


ela.
Não lhe importou estar acordado velando seu sono, não lhe
importaria fazê-lo sempre.
Quando despertou, insistiu em que tomasse banho, e em
acompanhá-la ele mesmo, já que ela não saberia como era o
sistema da ducha. Olhou para ele com a sobrancelha arqueada,
sabendo perfeitamente que queria aproveitar-se, mas, com o gesto
de uma rainha, permitiu-o. Ele queria estender o tempo juntos
tudo o que pudesse.
Uma hora depois estavam na porta.
— Pode pôr todos os empecilhos que queira, que não vai
sozinha. E amanhã falaremos de tudo isso da polícia.
— Não há nada do que falar — apesar de que falavam em
sussurros para não despertar aos criados, as frases conduziam
todo o gênio que tinham os dois, que era muito — você faz sua
vida e eu a minha. Se quiser que tenhamos algum tipo de relação,
necessito liberdade, se não, esqueça de tudo.
— É uma chantagista! — estava indignado, mas ela também.
ficaram olhando-se como dois duelistas.
— Igual a você, não sei do que se queixa — recordou,
indignada.
— Está bem, mas te acompanho. E me reservo o direito de te
proteger, sempre que creia que esteja em perigo — abriu a porta da
rua e a deixou passar, ela o fez protestando.
— Nada disso! — calaram-se ao ver um policial, que lhes
olhava atento. Alexandra se agarrou ao braço de Gabriel, que
inclinou a cabeça para o guarda.

~ 28 ~
Margotte Channig

— Não saberá onde é mais fácil encontrar um carro?


— Sim senhor, um pouco mais acima sempre tem vários
esperando, pelo teatro.
— Está bem, obrigado.
— Não quero que fale mais com a polícia Gabriel, faz-me
parecer pouco profissional — disse enquanto caminhavam.
— Eu vou fazer o que eu acho conveniente — ele olhou para
ela, com raiva — Então isso significa que nós temos um
relacionamento exclusivo?
— Não — morreu de medo, ela não podia consentir o que
aconteceu com sua mãe — Gabriel, se quiser que sigamos adiante,
você segue com sua vida, eu seguirei com a minha, e nos
encontraremos de vez em quando — ele voltou a olhá-la com cara
de zangado — se não for isto o que quer, é melhor que o diga
agora, temos que estar de acordo os dois.
— Está bem, imagino que tenho que estar muito contente. É
o sonho de todo homem, que a mulher com quem se deita, diga-lhe
que o faça com todas as que queira. Isso quer dizer que você
também te deitará com outros?
— Não. Definitivamente não. Só contigo. Acredito que
poderíamos, enquanto dure nossa atração, nos tratar como amigos
— ele a olhou incrédulo, mas sabia que não podia discutir, pelo
menos nesse momento, por isso assentiu.
— Como nos comunicamos?
— Mandamo-nos notas a nossas casas, não tem por que
haver problema, não é como se houvesse um marido ou mulher
ciumento. Estamos solteiros, não te parece? — ele voltou a
assentir, estava extranhamente calado.

~ 29 ~
Margotte Channig

— Gabriel, está chateado com algo? — Eles entraram no


carro depois de dar o endereço.
— Não, tudo está perfeito — ela mordeu o lábio inferior,
insegura de repente.
— Olhe, sei que sou nova nestas coisas, se te incomodei em
algo, sinto-o. — ele deixou de olhar pela janela, seu olhar se
acalmou ao ver sua expressão. Acariciou seu rosto com o dorso da
mão e a beijou ligeiramente nos lábios suspirando.
— Não me incomodaste em nada, é minha culpa, quero
muitas coisas. Mas sou muito paciente, é uma de minhas virtudes
— sorriu.
— Gabriel, não te ocorra esperar mais de mim, se chegarmos
a um acordo… — ele a agarrou em seus braços beijando-a para
deixá-la sem respiração, e sem fala, segundo sua intenção.
Enquanto, o carro seguia seu caminho, transitando pelos
paralelepípedos da velha e desmantelada Londres.

~ 30 ~
Margotte Channig

Capítulo 3

Acompanhou-a até a porta, apesar de seus protestos, e a


beijou apaixonadamente, como despedida. Não voltou ao carro, até
que ela não entrou em casa e fechou a porta com chave.
Alexandra, uma vez dentro da casa, tirou os sapatos para que
não se escutassem seus saltos no piso de madeira e subiu as
escadas sigilosamente, amaldiçoando quando soava algum degrau.
Não respirou com tranquilidade, até chegar ao seu quarto. Despiu-
se e se meteu na cama, sem pensar em nada mais, estava muito
cansada. Sentiu-se como se adormecesse assim que caia na cama.
Uma das donzelas, não sabia qual tinha sido, porque não
estava acordada de tudo, tinha entrado em seu quarto, para lhe
dizer que a esperavam, embaixo, sua tia e o doutor Sweets.
Levantou a cabeça, a tempo para ver como se fechava de novo a
porta. Voltou a apoiá-la no travesseiro de novo, mas, de repente,
abriu os olhos como se lhe tivessem jogado um balde de água fria
em sua cabeça.
Lavou-se na bacia decidindo que se banharia de noite e,
desejando, que sua tia pusesse uma ducha das que estavam se
tornando tão famosas e que tinha utilizado na casa de Gabriel, e

~ 31 ~
Margotte Channig

por qual se apaixonou. Desceu os degraus para a sala de jantar


vinte minutos depois, com um vestido de cor bege, para estar em
casa, e o cabelo recolhido atrás com um broche.
Sua tia e Sweets a esperavam sentados juntos, tomando o
café da manhã. Serviu-se de um café com leite bastante carregado,
para confrontar o que acreditava que iriam dizer. Não se podia
acreditar que sua tia o fizesse por fim. Não era tola, tinha notado
que tinham uma relação, evidentemente. Mas sua tia não era dada
a dar explicações, igual a ela. Levantou o olhar de sua taça, estava
dizendo algo, e não tinha escutado nada. Ficava assim quando
estava cansada, custava muito concentrar-se, tendia a divagar.
— Alexandra! Levo uns minutos te falando e não te inteiraste!
Onde tem a cabeça agora mesmo minha filha?
— Sinto-o tia. — olhou aos dois, não pareciam especialmente
felizes, na verdade. Não acreditava que lhe fossem comunicar nada
bom.
— Estava dizendo que Sweets quer te pedir um favor. Trata-
se de uma paciente dele, precisa te encarregar uma investigação,
mas não pode pagá-la. — boa detetive estava sendo, hoje não era
seu dia. Tentou prestar atenção.
— Perdoem, estou cansada, e já sabe o que acontece quando
estou assim tia.
— Sim, sei, pois abre bem as orelhas filha, este assunto é
muito importante. — olhou significativamente ao Sweets, que
olhava a Margaret embevecido. Sua tia o repreendeu com um
sussurro.

~ 32 ~
Margotte Channig

— Robert! — logo olhou a Alexandra, para que recordasse


porquê estavam ali reunidos. O ancião pigarreou, um pouco
envergonhado.
— Sim, perdoe-me Alexandra. — voltou sua vista para ele
mais tranquila. De momento não teria que pensar no casamento
de sua tia. Embora se ocorresse se alegraria, é óbvio.
— Estou tratando, há uns dias, de uma mulher muito doente,
possivelmente tenha ouvido falar dela, Ada Byron King. Isto é
confidencial, é óbvio, mas está morrendo. Ficam dias, se muito,
alguma semana. Conhece-a?
— É óbvio, como todos, não? A filha do Byron, quero dizer, a
única que teve dentro do matrimônio. Mas além disso é uma
grande matemática. Escutei-a em uma conferência na
Universidade de Cambridge, faz uns anos, foi muito interessante
— sua tia a olhou estranhamente.
— Como é que não me levou contigo?
— Não quis vir, disse que seria um piada. — sua tia pôs
empecilhos porque quando queria, bem que a arrastava a rolos
como o daquele Chejov… Alexandra entendeu sem palavras. Sua
tia, ainda, jogava-lhe na cara aquela saída para o teatro.
— Bom, — o doutor Sweets decidiu cortar rápido, sabia que,
se não, ficariam falando do tema, e a discussão podia durar
bastante — me alegro de que a conheça. A senhora King, Ada, é a
que necessita alguém de confiança, que procure algo para ela.
— O quê?
— Se não se importar, ela prefere contar a você. Falei de você,
mas explicando que você ia perguntar isso, não sabia se se
interessaria pelo trabalho.

~ 33 ~
Margotte Channig

— Não sei, agora estou pela metade com um assunto da


polícia. Se surgirem casos interessantes, colaboro com o inspetor
Brown.
— Estou segura de que pode dedicar uns dias a este caso,
tendo em conta da urgência, pela saúde da senhora, não? — sua
tia sabia que não podia resistir a nada que pedisse, estava segura
de que havia dito a seu enamorado que o faria. Para que ia manter
uma fachada de que estava pensando, se todos sabiam que ia dizer
que sim?
— Claro que sim tia.
— Quanto a seus honorários, a senhora não está bem
economicamente, como verá quando a visitar. Pagarei-o eu. — sua
tia olhou surpreendida ao médico e este encolheu os ombros —
Essa mulher sofreu muito. — sussurrou.
— Não é necessário, não cobrarei. Não se preocupe doutor. Se
o caso o merece, em algumas ocasiões, eu tampouco cobro. — se
observaram mutuamente, valorando-se pela primeira vez, de
verdade, desde que se conheciam.
— Vou agora visitá-la. Pode me acompanhar, se te convier
falo com ela. Se se sentir com forças, pode entrevistar ela.
Poderíamos adiar, mas não acredito que fique muito tempo. Além
disso, pelas manhãs, está mais forte.
— De acordo, deixe que eu tome outro café para me acordar,
coloco o casaco e vamos.
— Robert, deixa que tome o café da manhã bem, caso
contrário, não será capaz de falar duas palavras seguidas.
— Tia! — recriminou-a indignada.

~ 34 ~
Margotte Channig

— Filha, é igual a eu, seria incapaz de se concentrar, e menos


ainda, cansada como está. Come algo sólido, demorarão cinco
minutos mais.
Sabendo que, no fundo ela tinha razão, fez-lhe caso e, uns
minutos depois saía, o estranho casal, para o domicílio da doente.
Já no carro, tentou solicitar algo mais de informação, pelo
menos dentro da especialidade do doutor.
— Que enfermidade tem? — olhou-a distraído — do que está
morrendo?
— Em minha opinião, o fim se acelerou porque um par de
açougueiros, não posso chamar médicos, decidiram praticar uma
sangria nela, que era o pior para sua enfermidade. Tem um tumor
já estendido por meio corpo. Deve ter começado no útero, já que
tinha, conforme me contou, há anos, umas hemorragias terríveis.
O mais contraproducente é, nestes casos, fazer que perca mais
sangue.
— E não tem solução? Lembro que é jovem.
— 37 anos. Muito jovem. Mas não se pode fazer nada. Quão
único posso fazer por ela é, que sofra o menos possível.
Alexandra assentiu emocionada. Não invejava a profissão do
doutor. O resto da viagem transcorreu em silêncio, os dois estavam
perdidos em seus pensamentos. Ao descer, jogou uma olhada ao
redor, o bairro não era pior dos quais tinha visto, mas de noite,
não seria conveniente aventurar-se por aqueles becos, certamente.
Um punhado de meninos observavam com curiosidade a
carruagem e aos dois adultos que desceram dela, pouco
acostumados a ver gente assim. Eles mesmos vestiam pouco mais
que farrapos. Alexandra se sentiu golpeada profundamente ao vê-

~ 35 ~
Margotte Channig

los, como sempre ocorria quando via meninos, assim tratados pela
vida. Teriam que fazer que isso mudasse. Se uma sociedade
necessitava, para seguir adiante, que os meninos trabalhassem,
em lugar de estudar e, que desfrutassem de sua infância, algo
estava errado e teria que mudar. Com uma última olhada à roda
de meninos que jogavam na rua, seguiu o médico, que esperava na
porta da moradia.
Entregaram os casacos a uma mulher, que mais tarde Sweets
comentou que era uma vizinha. E perguntou:
— Como vai?
— Muito nervosa doutor, dormiu mal. — ele assentiu e
assinalou uma cadeira que havia no mesmo corredor dirigindo-se
a Alexandra — Se importa de esperar aqui?
— É óbvio que não. — sentou com as mãos cruzadas sobre o
regaço e sorriu à vizinha que lhe oferecia um chá.
— Não, acabo de tomar café, muito obrigada senhora.
Sweets tinha desaparecido por uma porta que havia ao lado
da cozinha, onde estava a doente. A casa não parecia ter mais
habitações. Graças a seu trabalho se deu conta fazia tempo, da
sorte que tinha, e por ter uma família, não ter que viver na rua.
Uns minutos depois Sweets lhe fez um gesto para que entrasse.
O quarto cheirava a fechado, e a enfermidade. Só olhando à
mulher deitada na cama, notava-se que não ia durar muito. Era
pouco mais que um esqueleto. Seus olhos estavam frágeis,
imaginava que pela medicação que lhe dava Sweets. Este
aproximou uma cadeira à cama, para que se sentasse, e assim
poder falar com ela. Logo, pôs a mão no ombro de Alexandra e
disse em voz alta:

~ 36 ~
Margotte Channig

— Esperarei lá fora. — a doente a olhava intensamente. Não


parecia ser capaz de falar, ou não sabia por onde começar. Tentou
facilitar as coisas.
— Meu nome é Alexandra Wallace, vi-a faz uns anos na
Universidade de Cambridge. Dava uma conferência sobre uma
tradução que tinha feito, do artigo de um cientista italiano. Não me
lembro do nome.
— Luigi Federico Menabrea. — sussurrou a mulher.
Alexandra assentiu.
— Eu não sabia quem era esse senhor, você nos explicou que
era um reconhecido cientista italiano, e que o artigo tratava sobre
uma máquina analítica que o professor Babbage queria construir.
Eu tinha lido algo sobre a máquina nos periódicos. Acredito que
você dedicou muitos anos a esse projeto. — a mulher assentiu,
com os olhos um pouco mais vivos.
— Sim, isso… — respirou profundamente — é importante —
teve que inclinar-se para entender o que dizia. Fazendo um esforço
a doente continuou — As notas! Tenho que recuperá-las! São
muito importantes. Sem elas a máquina não funcionará. É a única
herança que deixarei a meus filhos — olhou a Alexandra
angustiada — Me ajudará?
— Sim, senhora King, é óbvio. Mas necessitarei alguns dados.
Tente não falar, de acordo? Só mova a cabeça quando eu pergunte,
para que você não fique pior. Só se não entender algo bem, o direi
para que me explique isso. Vejamos. — tirou seu livreto de notas e
a pluma estilográfica, presente de seu irmão Jake, e que sempre
levava em sua bolsa.

~ 37 ~
Margotte Channig

— Essas notas, são algum tipo de fórmulas ou explicações,


para que funcione a máquina do professor Babbage?
— Sim, mas ele não as tem, terá que encontrá-las, é muito
importante, entende-o? — incorporou-se algo na cama, o que fez
que respirasse mais superficialmente. Ela tocou gentilmente o
antebraço para acalmá-la.
— Sim, a entendo, tranquilize-se, por favor Ada. Ajudarei-a,
prometo. Me diga, sabe onde estão essas notas? — a mulher negou
com a cabeça.
— A última vez que as vi, estavam em minha casa, quando
vivia com meu marido. Pode ser que estejam ali, não sei. Tive que
sair depressa. Faz anos que não vejo meus filhos, cometi muitos
enganos. — sua voz tremia.
— Ada, escute — tentou que sua voz soasse algo mais firme
— se não se tranquilizar, não poderei ajudá-la, por favor, respire
devagar e acalme-se, de acordo? — a doente assentiu e voltou a
recostar-se.
— Bem, vejamos, o primeiro que farei, nesse caso, é ir ver seu
marido.
— Ele não quererá recebê-la…
— Não se preocupe por isso, me receberá. Alguém mais,
próximo a seu marido, e que possa saber algo?
— Sim, essa atriz tão bonita, a russa. — a olhou estupefata,
não podia ser que tivesse tão má sorte.
— María Feodorovna? — Ada assentiu. Com letra algo
tremente, apontou o nome debaixo do Conde de Lovelace — bem,
com isto tenho algo para começar. E o mais importante de tudo

~ 38 ~
Margotte Channig

Ada. O que fará, uma vez que tenha as notas de novo em seu
poder?
— As venderei — quase não podia seguir falando —
herança…para meus filhos.
— Está bem, entendi, não diga nada mais. Agora entrará o
doutor. Me escute Ada, farei tudo o que possa, para recuperar as
notas e trazer para você.
— Se eu estiver viva…
— Não diga isso, — agarrou sua mão, estava muito quente —
pense em seus filhos.
— Estou muito cansada. — a olhou fixamente nos olhos,
Alexandra se estremeceu, porque sentiu como se a olhasse da
tumba. Parecia um fantasma e não um ser vivo — Peço-lhe que
venda e faça pelos meus filhos. Não deixe que ninguém mais fique
com isso. O doutor diz que é boa pessoa, e que confia em você. É o
único que tenho, o resto o esbanjei. Irei mais tranquila, se souber
que eles não terão problemas econômicos.
— Dou-lhe minha palavra de que farei tudo o que possa.
Aguente Ada, logo que eu saiba de algo, eu lhe direi. — ela tinha
fechado os olhos e parecia que dormia, ou… algo pior, não estava
segura, se levantou depressa para avisar ao Sweets. Ele entrou em
seguida e ela saiu respirando fundo. Tinha os olhos úmidos, e
beliscou a ponta do nariz, um truque para não derramar lágrimas,
quando estava prestes a fazê-lo. Ela respirou profundamente um
par de vezes para se tranquilizar. Sweets saiu e ela o olhou com
curiosidade.
— Está bem, não se preocupe Alexandra.

~ 39 ~
Margotte Channig

— Doutor, eu acredito que já é hora de deixarmos de


cerimônia, e mais, tendo em conta sua relação com minha tia,
parece-me absurdo que não nos tratemos pelo primeiro nome. O
que acha?
— Sim, me chame Robert, por favor.
— Está bem. — se dirigiram à saída. A senhora que os tinha
recebido na chegada, estava na porta mantendo-a aberta.
De novo na carruagem, ele a perguntou.
— Vai trabalhar para ela?
— Sim, é óbvio, tenho que solicitar um pouco de informação
antes de começar, mas não acredito que haja nenhum problema.
Irei para casa, e dali, planejarei quais vão ser meus movimentos.
— Deixarei você ali então, eu tenho que seguir com meu
trabalho.
— Robert, acredito que o trabalho que faz é maravilhoso —
falou pensativamente — não tinha me dado conta, até agora, do
desagradável que é sua profissão nestas situações. Gente jovem
morrendo, e em circunstâncias terríveis, sem ninguém de sua
família. Menos mal que há gente como você, que ajuda os outros.
— Igual a você agora.
— Sim, bom, mas meu trabalho não é tão importante. — se
ruborizou e ficou olhando pela janela.
Sua tia estava fazendo crochê, essa atividade estava virando
moda entre todas as senhoras de certa idade. Sentou junto a ela e
a observou, ela tinha aprendido a fazê-lo, para os casos em que
tinha que se fazer passar por uma anciã, dava muita credibilidade
ao personagem. Além disso, resultava relaxante, fazia vários

~ 40 ~
Margotte Channig

cachecóis de lã. Ficou calada observando como ia formando o


trabalho com o fio. Era quase hipnótico.
— O que ocorre querida?
— Foi muito triste, já sabia — suspirou — mas nunca é como
se imagina. — sua tia agarrou seu queixo com sua mão e a olhou
nos olhos.
— É como sua mãe, o mesmo grande coração. — não soube
porque, mas, embora o havia dito em muitas ocasiões, nunca
tinha caido tão mal como nesse momento, levantou-se zangada.
— Não diga isso tia! Eu não sou como ela, nem vou cometer o
mesmo engano. Sabe o que significou para Jake e para mim, vê-la
consumir-se pela pena, porque meu pai não vinha alguma vez nos
ver? — aproximou-se da janela para olhar a rua e tentar
tranquilizar-se — Não se deve querer tanto a nenhum homem,
põe-lhe uma arma em suas mãos. E logo não tem uma maneira de
se defender.
— Sei querida, nunca falamos disso. Isso é suficiente para
que imagine o que sofreram, por culpa do desgraçado matrimônio
de minha irmã. Mas Alexandra, ela quando se casou, sabia que ele
não a queria… — se voltou para sua tia indignada.
— Não! Não quero saber nada tia. Prometeu-me que não
falaríamos sobre isso. — Margaret se levantou preocupada!
— Está bem filha, sinto muito. Tem razão, me deixe te dizer
algo, só uma coisa — se aproximou dela e pôs a mão em sua
bochecha — sua mãe se equivocou. Tinha que ter valorizado acima
de tudo, os dois filhos maravilhosos que tinha, e não o fez. —
Alexandra estava de novo a ponto de chorar, o que estava
ocorrendo com ela?

~ 41 ~
Margotte Channig

— Vem, ia tomar um chá, me acompanhe por favor. Quer me


contar algo do que ocorreu na casa dessa mulher?
— Sim — contou o ocorrido, um pouco mais tranquila.
— Imaginava um pouco parecido, tinha ouvido rumores. Essa
pobre mulher vacilou muito nos últimos anos, desde que se
separou do marido. Arruinou-se pelo jogo e os amantes. Já não a
recebiam em nenhuma casa, acredito que sua mãe cuidou de seus
filhos.
— Compreendo, e o que sabe do marido?
— Não muito, acredito que, e perdoa que o diga, ao lado da
senhora Lovelace, foi bastante discreto. Terá tido seus namoricos,
imagino, têm separados o bastante, mas não deu nenhum
escândalo.
— Compreendo, vou me trocar, e logo, irei visitar-lhe.
Tentarei que me receba.
— Por certo. Chegou uma nota para você, está na bandeja da
entrada.
Aproximou-se dos envelopes que havia ali em cima, como se
uma serpente escondida pudesse saltar e mordê-la, no momento
menos esperado. Agarrou o que tinha seu nome e o abriu. É óbvio.
A letra era tão autoritária como o homem que a tinha escrito.
Dentro só duas palavras:
— Esta noite? — subiu as escadas correndo, apertando a
nota contra seu peito, enquanto sorria, quase feliz.

~ 42 ~
Margotte Channig

Capítulo 4

O conde do Lovelace, recebeu-a na estufa de sua mansão,


onde estava cuidando de umas orquídeas. Não deixou o que estava
fazendo, até que terminou. Ela não poderia dizer o que era o que
tinha feito, mesmo que a matassem. Algo com pinças entre dois
andares. Quando terminou, tirou o avental e as luvas, e deu tudo
a um criado que esperava para isso.
— Percy, recolha tudo e desinfete-o, já sabe o que terá que
fazer — se dirigiu para ela e a observou fixamente, como se fosse
um inseto sob o microscópio. — Vem você da parte de Augusta?
— Sim senhor, — havia algo estranho nesse homem, não
parecia zangado nem preocupado — acredito que seria melhor se
pudéssemos falar em privado.
— Se o desejar, eles a levarão junto a meu secretário, que
marcará uma entrevista…
— Senhor, temo que não temos tempo, tenho más notícias.
— Meu tratamento é Sua Senhoria. — já sabia o que ocorria,
era um idiota perdido.
— Sim, perdão. Sua senhoria, é um assunto muito urgente e
grave. — pôs sua cara de boba, nunca falhava.

~ 43 ~
Margotte Channig

— De acordo, me acompanhe. — a olhou de cima abaixo —


senhorita.
Seguiu ele até uma habitação junto à entrada, imaginava que
para que saísse quanto antes da casa, assim que terminassem a
conversação. Ele se sentou ante uma escrivaninha, e lhe fez um
gesto para que ela fizesse o mesmo, em frente a ele. O mordomo,
sigilosamente, fechou a porta.
— Senhorita Wallace, meu tempo é muito valioso, mas
escutarei atentamente o que tenha que me dizer de minha esposa.
— É você consciente de que a condessa está morrendo? — em
benefício dele, teve que admitir que ficou pálido.
— Não. Sabia que estava doente, haviam-me dito isso, mas
não que era tão grave. Imagino que existem coisas que quer
arrumar.
— Precisamente, a condessa lhe pede, nestas circunstâncias
tão penosas, que lhe devolva umas notas nas que trabalhou muito
tempo.
— A verdade, não sei a que se refere. — parecia sinceramente
confundido.
— Os trabalhos que realizou, durante anos, para a
construção da máquina analítica do Professor Babbage.
— Ah!, isso! — de repente, recuperou toda a cor que tinha
perdido, de fato, sua cara se ruborizou totalmente, e começou a
balbuciar — já compreendo. Não entendo para que as quer, não
têm nenhum valor. — Alexandra lhe olhou com o cenho franzido,
estava excessivamente nervoso.

~ 44 ~
Margotte Channig

— Sua Senhoria, precisamente se não tem valor, espero que


não tenha nenhum problema que me deixe leva-las. — ele passou
a mão pelo escasso cabelo que tinha na cabeça, alvoroçando-lhe.
— Não posso.
— Escute! Estamos falando do desejo de uma moribunda. —
se esforçou para manter a pose — Não sei o que ela lhe fez, mas
posso assegurar que, se a visse, perdoaria-lhe o que ocorreu. Ou
pelo menos, não lhe guardaria rancor.
— Não é isso, senhorita, — se levantou da cadeira e andou
pela habitação, estava muito agitado. Alexandra decidiu deixar ele
falar. Efetivamente, a pressão do silêncio fez que, um par de
minutos depois, fizesse-o:
— Não as tenho em meu poder. — ela se levantou atônita.
— Vendeu-as? — ele negou com a cabeça — jogou fora? —
voltou a negar — se não as vendeu, nem as jogou fora — se
aproximou dele — deu a alguém? — por fim assentiu. Olhou para
ele com o cenho franzido, não mentia, tinha dado a alguém. Mas
quem podia querer essas notas?
— Por favor, pode me dizer a pessoa que as tem em seu
poder?
— Disse-me que colecionava fórmulas matemática, porque
seu pai tinha sido professor na Universidade de Moscou. E que
adoraria ter as de minha mulher, porque não tinha nenhuma de
uma mulher cientista. Ela a admirava muito.
— Por favor, sua senhoria, pode me dizer o nome dessa
mulher? — Havia muitos russos em Londres.
— María Feodorovna — como não! Aproximou-se da cadeira e
voltou a sentar-se. Tinha dado sua palavra a uma mulher

~ 45 ~
Margotte Channig

moribunda, tinha que fazer o possível para encontrar as notas,


embora tivesse que falar com o próprio demônio. Ergueu-se na
cadeira, seguiria adiante, custasse o que custasse.
— Posso lhe perguntar, a natureza de sua relação com ela? —
ele ficou vermelho como um tomate.
— Não, não pode! Mas direi algo, embora não seja de sua
incumbência, eu não faltei a meus votos com minha mulher,
nunca! Desgraçadamente, não se pode dizer o mesmo dela. —
parecia sinceramente indignado. Para si mesma, teve que
reconhecer, que não era o aristocrata afetado que tinha acreditado
em princípio. A não ser um homem apaixonado, ao que a vida
tinha tratado mal, e que não sabia como fazer frente a isso.
— Sinto ter feito essa pergunta, sua senhoria. Preciso ter a
maior informação possível, para expor a situação à senhorita
Feodorovna.
— Não se preocupe, escreverei para ela uma nota, para que o
devolva. Como o queria como lembrança, não terá nenhum
problema. — esse homem era um inocente, sinceramente tinha
acreditado em uma mulher, quando havia dito que lhe desse uma
série de fórmulas matemáticas que as ia guardar como lembrança?
Com a justificativa de que seu pai era professor de matemática?
era como um menino.
— Muito obrigada. — disse, enquanto ele escrevia a nota e a
colocava em um envelope fechado, no qual ele colocou o nome da
atriz e seu endereço. Antes de lhe entregar, pareceu em dúvida,
queria lhe perguntar algo. Olhou-o fixamente esperando.
— Poderia… Poderia visitá-la? — sussurrou.
— À condessa? — ele assentiu— o perguntarei sua senhoria.

~ 46 ~
Margotte Channig

— Me chame William, por favor, ninguém utiliza meu título,


eu não gosto, mas estava tão zangado, bom, ainda estou. Em
qualquer caso, preciso vê-la antes de que…
— Sim, não se preocupe, entendo. Arrumarei-o. Esta tarde
mandarei uma nota com a resposta. O que acha? — Não se atrevia
a leva-lo sem avisar, se por acaso Ada ficava muito nervosa e era
contrária. Preferia falar antes com o Sweets. Estaria bem se ele
estivesse lá também.
Saiu da visita nervosa e preocupada. Não imaginava, ao
entrar na casa, o giro que daria a história. Quase se chocou com
um policial, que ia fazendo a ronda.
— Ui! Desculpe. — Ela disse, antes de entrar em sua
carruagem, olhou para ele por um momento, mas decidiu seguir
na marcha e deu o endereço da atriz ao motorista.
Gostou tanto da casinha de María Feodorovna, que podia
imaginar-se vivendo, ela mesma, em uma parecida. Era um prédio
de baixa elevação na área de Chelsea, com um jardim privado e
árvores em toda a rua. Era encantadora. Sim, ela não se
importaria de viver em um lugar semelhante.
Bateu à porta e esperou, abriu uma jovem, que a olhou
interrogativamente.
— Bom dia, preciso ver a senhorita Feodorovna.
— A senhora não recebe a estas horas, mas se quiser deixar
uma nota. — esse truque o conhecia, a donzela de sua casa
também o utilizava, quando não queriam receber.
— Por favor, entregue esta nota. Esperarei. — a mulher a
agarrou e fechou a porta. Virou-se para observar, enquanto
esperava, a rua. Havia uma carruagem esperando ao final da

~ 47 ~
Margotte Channig

mesma, e a intrigou, não sabia por quê. Observou atentamente,


entrecerrou os olhos, estava muito longe — sim, parecia ter visto a
carruagem saindo da residência do conde. Poderia ser uma
casualidade, mas não acreditava nelas. Possivelmente estava
muito nervosa. Escutou a porta abrir de novo, a donzela fez um
gesto para que entrasse. Jogou uma última olhada a carruagem,
antes de entrar.
A atriz a recebeu em uma habitação muito alegre. A luz
entrava pelos janelas que davam ao jardim, inundando a estadia
de luminosidade. O papel pintado das paredes era de cor verde
muito suave, com minúsculas margaridas. Ao entrar observou,
sobre a mesa, um trabalho em um bastidor, não imaginava que
gostasse de costurar, assim como papel de carta e pluma. Nesse
momento, também escutou a porta. Assim que a senhorita
Feodorovna tinha avisado a alguém, e podia imaginar a quem, é
óbvio. Gabriel tinha mentido para ela. Embora não tivesse dito
diretamente, que já não estava com ela, tinha dado a entender que
tinha trocado de amante. Mas, com isso parecia, que seguiam
juntos. Veria em seguida, somente terei que esperar e ver se ele
deixava tudo para vir. Ignorou o sentimento de tristeza que a
invadiu, havia se equivocado tanto com ele. Não permitiria que
isso, fizesse ela desistir de seu propósito. Ao fim e ao cabo, a única
coisa segura era aferrar-se ao seu trabalho.
— Bom dia senhorita Feodorovna! — saudou-a com sua
habitual energia, que não dissessem que estava abaixo de um
homem!
— Senhorita Wallace — a atriz a saudou inclinando a cabeça.
De perto era, ainda, mais impressionante que no cenário. Embaixo

~ 48 ~
Margotte Channig

de toda maquiagem e pó, desperdiçava uma espetacular beleza.


Alexandra sabia que não podia competir. Nem pensava fazê-lo.
— Por favor, nos sentemos — assentiu, a mesma donzela
havia trazido chá — ia tomar um chá, gosta?
— É óbvio. — Sentaram, e, durante uns minutos,
conversaram sobre temas que não interessavam a nenhuma das
duas.
— Senhorita Feodorovna, perdoe-me, mas vou direto ao
assunto. É muito importante, e urgente, que consiga os
documentos que citou o Conde de Lovelace, na nota que eu trouxe.
— a mulher jogou uma olhada à nota que tinha deixado sobre a
mesa, junto à bandeja.
— Sim, imagino.
— Bem, e pode me entregar isso?
— Não quer umas massas?
— Não posso perder tempo. A Condessa está morrendo. — A
atriz se entristeceu, não era tão fria como queria aparentar. Em
seguida, seus olhos se velaram, para não deixar ver nenhum
sentimento.
— Sinto muito, não conheci essa senhora, mas acredito que
não teve sorte na vida. E não deram valor a tudo o que fez, só por
ser mulher. — Parecia que o dizia sinceramente. Era boa atriz.
— Está bem, me diga, vai dar as notas da Condessa, sim ou
não?
— Não. — Alexandra levantou as sobrancelhas indignada —
Senhorita, não posso dizer mais, mas acredite que não é por
capricho.

~ 49 ~
Margotte Channig

— Não, não acredito! — teve que respirar fundo para


tranquilizar-se e não agarra-la pelos cachos negros,
estrategicamente colocados por toda sua cabeça. Levantou
indignada. — Só me esclareça uma coisa, ainda as tem em seu
poder?
— Sinto, de verdade lamento esta situação. — Nesse
momento escutou a porta. Gabriel entrou, com sua própria chave,
da rua e ficou na soleira da salinha. María Feodorovna fez o
melhor de sua carreira deixando-os sozinhos e fechando a porta.
— Alexandra, escuta, não dê rédea solta a sua imaginação,
não é o que você acredita. — Não havia nada pior para uma
mulher furiosa, que tentassem aplacá-la com besteiras. Naquele
momento, ela teria sido capaz de matá-los. Ela sentou, sabendo
que esse era o fim de tudo. O que eles tinham e o que poderiam
ter. Não lhe perdoaria, nunca, semelhante mentira.
— Gabriel, por favor, sente-se. Tenho que te fazer umas
perguntas, estou aqui a pedido de uma mulher muito doente. —
Sentou ante ela. Embora seu coração sangrasse, cumpriria com
seu trabalho.
— Sim, isso ouvi, não sabia que a conhecia.
— Não a conhecia, não até esta manhã. — ele observava seu
rosto tentando vislumbrar seus sentimentos, mas ela estava
decidida a esclarecer tudo aquilo antes de ir. — Preciso recuperar
as notas que escreveu Ada Byron King, Condessa de Lovelace, para
que morra tranquila. Você as têm, ou pode me dizer como as
conseguir?
— Alexandra, quero explicar, primeiro, porquê estou aqui, e
porquê tenho a chave desta casa. — tentou parecer razoável.

~ 50 ~
Margotte Channig

— Não! Responde ao que perguntei, por favor. — ele a olhou,


rígido e levantou da cadeira.
— Então, não me deixa mais opção que dizer que não sei do
que me fala, e que não tenho nem ideia de onde encontrar esses
documentos. — Lá estava novamente, aquela pose de arrogante e
bastardo. Foi assim que ela o conheceu e isso a fez odiá-lo, não
mais do que conhecê-lo. Ela sabia que ele estava mentindo e sabia
que ela sabia. Ela se levantou, mais furiosa e ferida do que nunca
em sua vida.
— Está bem, muito obrigada por ser tão sincero comigo
Gabriel. — Respondeu ironicamente, levantou-se para partir — Ah!
E não me espere esta noite. Nem nunca, se vem ao caso, claro.
Amaldiçôo. — sussurrou em seu rosto — e amaldiçôo a noite
passada, farei todo o possível para apagar da minha mente. Isto é
uma despedida. — Gabriel empalideceu, toda a cor que ele tinha
no rosto, tinha passado para o dela, que estava vermelha pelo
aborrecimento — desta vez, definitiva. — Respirou fundo tentando
segurar o choro. — Dá igual o que diga a minha família.
Confessarei a eles, se for necessário, que me deitei contigo em um
ataque de loucura, para que não tenha nada com o que me
chantagear. — Cada uma de suas palavras pareciam golpear ao
Marquês, que seguiu sentado, pálido e com os punhos apertados,
enquanto ela terminava — Nunca perdoarei você por isso, Gabriel.
— sussurrou.
Saiu dali quase correndo e batendo a porta da rua. María veio
em seguida e se aproximou dele, sem saber muito bem o que dizer.
— Sinto Gabriel, não sabia o que fazer, tinha que te chamar.

~ 51 ~
Margotte Channig

— É óbvio. — Sentia-se como se tivessem esvaziado-o por


dentro, rasgando as suas vísceras ao fazê-lo. Sentiu uma dor tão
forte no peito, que recordou que seu pai tinha morrido de um
ataque ao coração, e se perguntou se tinha chegado sua hora.
— Não se preocupe, passará e ela entenderá suas razões.
Não respondeu. Pela primeira vez em sua vida adulta,
acudiram lágrimas a seus olhos, e não tentou esconder. María ao
vê-lo chorar, saiu da habitação deixando-o só com sua dor.
Com os olhos avermelhados pelo choro, voltou para casa de
sua tia. Dali enviou uma nota ao Sweets, pedindo opinião, sobre a
visita do Conde à Condessa. Depois, subiu ao seu quarto e aplicou
compressas frias nos olhos, para tentar acalmar a irritação. Logo
foi em busca de Margaret. Estava a ponto de entrar na sala de
jantar.
— Ah! Querida está aqui? Como foi tudo? — observou a sua
sobrinha e apertou os lábios ao ver seus olhos, fazia anos que não
via tanta dor neles. Desde que morreu sua mãe. Jurou a si
mesma, que o responsável o pagaria.
— Regular, apenas tia. Necessito um pouco de informação, se
você não souber, com certeza pode me dizer a quem posso
perguntar.
— Me diga filha. Anthony, por favor, outro prato para minha
sobrinha.
— Claro, já peguei os talheres. — Anthony, também sério,
inclinou-se e saiu deixando-as sozinhas.
— Querida o que ocorre?
— Nada tia, eu sou estúpida. Eu me acho inteligente, e sou a
mais estúpida das mulheres.

~ 52 ~
Margotte Channig

— Já não gostaria de me dar mais informações, para que


tenha uma ideia melhor, do que a deixou tão chateada? — Não
podia falar disso, de momento não.
— Tia por favor, depois te conto isso. Necessito que me diga,
se conhecer alguém que possa me dar informação sobre a María
Feodorovna.
— A atriz? — assentiu — filha, se for pelo Marquês…
— Não, tia. — bom, para falar a verdade, não só por ele — O
Conde de Lovelace deu para ela, os documentos de sua mulher.
— À russa? Por quê? Para se vingar de sua mulher?
— Pode ser, — suspirou cansada, doia as têmporas. Estava
muito cansada e zangada, para poder fazer bem seu trabalho —
não sei, o caso é que ela não quer ou não me pode dar isso. Preciso
saber mais a respeito dela.
— É óbvio, lembra do dono do restaurante ao que fomos?
— Qual? — não sabia a quem se referia.
— The Clerk se chama, parece-me, não?
— E por que ia pensar no Black?
— Filha, não se inteira nunca das intrigas, não sei em que
mundo vive. Pelo visto, quando a senhorita Feodorovna chegou a
Londres faz anos, esteve bastante tempo atada com ele. O Marquês
a arrebatou debaixo de seu nariz, como se diz vulgarmente. Por
isso, no outro dia estavam como dois cães, brigando pelo mesmo
osso.
E ela que pensava que Gabriel havia ficado ciumento pelos
cuidados de Black com ela. Era muito mais idiota do que
acreditava. Isso era o que ocorria, quando deixava que os
sentimentos, nublassem o cérebro.

~ 53 ~
Margotte Channig

— Não sabia, está bem tia, muito obrigada. Tem um desses


envelopes, que Sweets te dá para a dor de cabeça? — levou a mão
à têmpora direita.
— Sim filha. Agora mesmo te dou um, estão na cozinha.
— Eu mesma vou. — Se levantou com um batimento do
coração contínuo nas têmporas. A cozinheira deu um desses
envelopes, e logo um copo de água para misturar o pó. Fez uma
careta por quão amargo era e voltou para a sala de jantar.
Quase não comeu, movendo as verduras de um lado a outro
do prato. Quando pôde escapar dali, escreveu uma nota no
despacho, que deu ao Anthony. Era urgente, e tinham que esperar
a resposta. Logo foi se deitar um momento, para esperar passar a
dor de cabeça.
Um par de horas depois, estava bastante recuperada, pelo
menos não tinha essas espetadas na cabeça. Quando desceu,
havia duas cartas para ela.
A do Sweets dizia que lhe parecia boa ideia que o marido a
visitasse, inclusive podia animá-la um pouco. Respondeu ao
Conde para lhe dizer que podia ir visitar sua mulher sem
problemas, dando a direção.
A outra nota era mais intrigante.
“Às sete no The Clerk. Venha sem jantar”.
O famoso Black convidou-a para jantar, ela imaginava que
seria um prazer perigoso, mas essa era a vida dela. Cheia de
prazeres perigosos. O Sr. Black lembraria aquela noite. Toda sua
vida.
Essa noite decidiu, em grande parte por despeito, colocar o
vestido mais escandaloso que tinha. Levava os ombros descobertos

~ 54 ~
Margotte Channig

e era completamente negro. O decote dianteiro era, em si mesmo


uma obra de arte, já que não entendia como se segurava no lugar,
sem mostrar nada. Sua tia, felizmente, não o tinha visto. Colocou
um xale em cima e a capa depois, e saiu para seu carro. Levava o
cabelo recolhido em um coque frouxo, e os brincos de pérolas,
dados por sua tia quando ela tinha idade. Maquiou-se
ligeiramente, sobre tudo para que não notassem os efeitos do
choro da manhã e de sua enxaqueca. Sabia que, poucas vezes,
tinha estado tão atrativa. O vestido se ajustava, a suas curvas,
perfeitamente. The Clerk estava cheio, como sempre. Era um
ambiente perfeito para os casais de apaixonados, já que se
respirava uma espécie de romantismo, em grande parte motivado
pela decoração e a luz suave do local.
Black estava de pé, junto ao bar que havia ao fundo, de onde
dominava seu universo. Olhou-a. Seus olhos eram verdes, mas de
um tom muito diferente aos seus, muito mais escuros. Poderia ser
um homem muito bonito, se não fosse pelo nariz torto, embora
desse a ele um aspecto muito masculino. Chegou junto a ele e pela
primeira vez o observou como homem, tinha o cabelo loiro roçando
os ombros e não o levava como outros, embora o corte favorecia
que não tampasse o seu rosto.
— Boa noite senhorita Wallace, me acompanhe, por favor. —
inclinou a cabeça saudando e o seguiu, segurando a sua capa,
pensando se aquilo teria sido uma boa ideia.
— Acredito que conhece o Marquês de Bute. — a mesa de
Gabriel estava no caminho. Black era um descarado, aproveitava
qualquer oportunidade para chatear a um inimigo. Gabriel, junto
com o homem que o acompanhava, levantaram-se inclinando-se

~ 55 ~
Margotte Channig

para Alexandra, que fez o mesmo. Com um sorriso fingido, dirigiu-


se a seu anfitrião.
— Poderiam, por favor, guardar isto? — tirou-se a capa com
elegância, Black a segurou com grande cortesia, e ela ficou com o
vestido ressaltando seu corpo. Se o tivesse planejado não teria
saído melhor. Sorriu a todos como se fosse a mulher mais feliz do
mundo — Onde é a salinha privada, Black? — olhou, coquete.
Pareceu surpreso, mas reagiu com rapidez. Esse homem não
a conhecia, nenhum deles, muito menos Gabriel. Black, sorrindo
maliciosamente, fez um gesto com a mão para que andasse a sua
frente, para uma salinha, cuja porta estava entre aberta. Para
arrematar, olhou fixamente para Gabriel. Parecia que ia ter um
ataque, inclinou a cabeça com fingida educação.
— Cavalheiros. — seguiu andando até entrar no salão, onde
tudo estava preparado para um jantar íntimo. Virou-se para o
único homem, que poderia dar algum tipo de explicação e que a
olhava como se fosse um enigma que teria que decifrar.

~ 56 ~
Margotte Channig

Capítulo 5

— Senhorita Wallace, por favor, sente-se, acredito que temos


muito o que falar. — ela sentou em frente à porta.
— Me chame Alexandra, por favor. — apertou sua mão, para
deixar claro que, essa visita, era meramente profissional.
— Está bem, — Serviu duas taças de uma garrafa que havia
em um balde, junto a ele — pedi um rosado suave, às mulheres
geralmente gostam…
— Prefiro uísque, se não se importar. — o interrompeu, ele
voltou seus olhos entrecerrados para ela, como se não tivesse dado
o devido valor ao competidor que tinha diante dele.
— É óbvio, algum em especial?
— Se posso escolher, prefiro que seja bom. — ela sorriu.
— É óbvio, como todos. — se levantou e se dirigiu ao móvel
que havia junto à porta. Havia muitas garrafas, escolheu a que
estava atrás de todas as demais — Este me mandaram da Escócia,
o ofereço a pouca gente. Parece-me que você saberá apreciá-lo.
— Sou uma privilegiada então. Obrigada. — serviu dois copos
generosos e o saborearam tranquilos. Ele se encostou na cadeira e,

~ 57 ~
Margotte Channig

como um tributo a sua inteligência, não baixou os olhos para o


decote de seu vestido, escandalosamente baixo.
— Alexandra, estou encantado de jantar contigo. É uma
mulher muito bela, como estou seguro que sabe, mas estou
curioso. O que quer de mim, além de fazer ciúmes ao Marquês? —
disse ironicamente.
— Necessito informação, estou disposta a pagar por ela, e
sinceramente, não sei a quem mais acudir. — encolheu os ombros
e ficou olhando o copo.
— Tem algum problema pessoal? — Black, pela primeira vez,
pareceu humano. Não esperava que pudesse o preocupar, o que
acontecesse com outra pessoa. Sorriu, negando com a cabeça.
— Não, é só que prometi ajudar a uma mulher que está
morrendo. Falando que sou sua última esperança. Imagine meu
nível de desespero.
— Pois não sei se eu gosto de estar nessa posição. Está bem,
me conte o que necessita, e eu direi se posso ajudar. — ela mordeu
os lábios duvidando. Pela primeira vez, pareceu muito atrevido o
que ia dizer.
— Está bem, procuro uns documentos. Contratou-me sua
legítima proprietária, a mulher que os escreveu. Umas fórmulas
matemáticas. — observou, mas ele não parecia saber nada do que
estava contando. Começou a se desesperar, existia a possibilidade
de que não encontrasse as notas. E não sabia por onde continuar
a busca.
— Quem é a proprietária? — perguntou.
— A Condessa de Lovelace.

~ 58 ~
Margotte Channig

— A filha do Byron? — ela assentiu — O certo é que, já tinha


ouvido que é uma espécie de perita em matemática, e acredito que
também escreve poesia, se mal recordo, — esfregou o lóbulo da
orelha direita, enquanto olhava para um ponto indeterminável da
parede — e as fórmulas têm valor?
— A verdade é que não sei, mas ela acredita que sim. Seu
estado de saúde é muito grave, é questão de dias. Os documentos
os tinha seu marido, mas me confessou esta manhã que não os
tem mais em seu poder, os deu a — duvidou uns instantes, mas
finalmente o soltou — María Feodorovna.
Black deu um pequeno golpe, não muito grande, ela o notou
porque o observava atentamente.
— Entendo. Imagino que saberá que faz tempo que não tenho
nenhuma relação com essa… dama. — fez uma careta, ao utilizar
o adjetivo.
— Isso tenho entendido, mas não sei a quem mais recorrer.
Estive em sua casa depois de ver o Conde, e não quis me dizer
nada. Pouco depois, apareceu o Marquês. — assinalou com a
cabeça para fora, para que soubesse a quem se referia.
— Imaginava que seguiam vendo-se, apesar de que querem
dar a entender que tudo acabou entre eles. — franziu o cenho
antes de seguir — Por isso, veio me ver. Efetivamente, María e eu
estivemos nos vendo por três anos, mas tudo acabou quando
descobri sobre seu Marquês.
— Não é meu Marquês.
— Vá, embora não me caia bem, asseguro que o homem que
está aí fora, se interessa por você mais que qualquer outra. Vi-o

~ 59 ~
Margotte Channig

com outras mulheres, e, asseguro que, com nenhuma, comportou-


se como com você.
— Não me interessa um homem que minta.
— Nem a mim uma mulher que o faça.
— Poderíamos ser o casal perfeito. — brincou.
— Sim. — Black soltou uma gargalhada inesperada que soou,
como se a risada saísse do fundo do peito.
— E bem? Pode me dizer algo?
— Tenho que fazer alguma averiguação, há pessoas à quem
posso perguntar. Antes de nada, quero expor duas coisas: Uma
suspeita, e uma hipótese. — olhou-o com os olhos brilhando pela
primeira vez desde que chegou. Que homem mais interessante!
— Não falei nunca disto com ninguém, e tampouco me decidi
nunca a investigá-lo a fundo. Por meu ego — sorriu — queria
aparentar, inclusive ante mim mesmo, que não me importava que
María tivesse mentido.
— Mas sim importa verdade? — observaram-se,
pormenorizados. Ele assentiu lentamente como com inapetência.
Ela suspirou.
— Há pouco tempo, umas semanas, tenho uma suspeita
sobre essa relação. É uma sensação, nem sequer isso, não sei
como explicá-lo, chama-o intuição, se quiser, de que tudo é uma
farsa. E refletindo sobre uma série de feitos ocorridos durante o
tempo que nos vimos, cheguei a pensar… — a olhou fixamente, ela
não se moveu. Quase não se atrevia a falar.
— Black, fala já, vou ter um enfarte.
— Cheguei a pensar que não são amantes, mas sim María
trabalha para o Gabriel.

~ 60 ~
Margotte Channig

— O quê? Mas se ela é atriz. — estava assombrada, não


entendia nada.
— É uma ingênua. — sorriu ao voltar a beber um sorvo de
uísque.
— O que quer dizer?
— Não recorda a antiga profissão do Marquês? — olhou-o
com os olhos como pratos e se apoiou totalmente no respaldo da
cadeira.
— Quer dizer que ele segue…? — não a deixou terminar a
frase.
— Sim.
— E que ela também é…? — agora tampouco.
— Sim. Escuta, as paredes têm ouvidos, e mais esta noite.
Proponho que saiamos daqui e conto o resto de meu plano.
— Mas necessito que me diga algo sobre as notas da
Condessa.
— Investigarei, prometo isso, mas em troca de algo. Vamos,
acredito que a função está a ponto de começar.
— Que função?
— Vamos ao teatro. — Levantaram, ela permitiu que lhe
pusesse a capa, depois, a fez sair antes que ele. Olhou para a
mesa. Gabriel seguia nela, embora sozinho. Levantou ao vê-la
partir, ela passou ante ele sem dedicar nenhum olhar, Black sorriu
desdenhoso ao passar e piscou um olho. O outro homem espremia
um guardanapo com a mão direita, como se fosse o pescoço do
dono do estabelecimento.
Saíram fora, estava frio.
— Trouxeste carro?

~ 61 ~
Margotte Channig

— Sim, olhe, está em frente. — seu chofer estava esperando-a


— Vamos. — Black pegou com segurança seu cotovelo para
cruzar a rua, quando foram subir, olhou para sua direita.
— Sobe Alexandra, agora mesmo estou contigo. — se dirigiu
rápido para um beco próximo, mas ao olhar, não havia ninguém,
voltou pensativo.
— Viu algo?
— Acreditei ver alguém nos vigiando, mas acho que me
equivoquei.
— Bom e onde vamos?
— Quero que veja onde trabalha a “Grande Feodorovna”. —
assim era como era conhecida entre o grande público.
O Teatro do Drury Lane estava localizado no edifício Covent
Garden. Era o maior teatro da Europa. Tinha capacidade para
3.600 espectadores. Black era conhecido na entrada, e o deixaram
entrar diretamente, sem ter que esperar a fila da bilheteria. Uma
vez dentro, houve um intercâmbio de bilhetes, e seguiram um
menino que os levou, através de uma galeria onde em cada lado
havia várias portas, até a entrada dos camarotes. Black lhe deu
uma gorjeta e virou para sua acompanhante, assinalando a
entrada.
— Mademoiselle1, depois de você. — ela fez uma pequena
reverência, com a mesma irônia e respondeu:
— Merci beaucoup2. — entrou no camarote e ficou,
literalmente, com a boca aberta. Nunca tinha estado nesse teatro,
já que as entradas costumavam ser caras, imagine os camarotes.
Aproximou-se da borda para olhar o pátio de poltronas, era

1 Madame em Francês.
2 Muito obrigado em Francês

~ 62 ~
Margotte Channig

gigantesco. Havia cinco níveis de galerias sustentadas por enormes


colunas de ferro.
Apesar de sua tremenda capacidade, estava quase cheio,
excetuando os camarotes. Tirou sua capa, que deixou nas mãos de
Black, e se sentou no assento que estava mais ao canto, para
poder falar com tranquilidade. Esperou que seu acompanhante se
sentasse.
— Black, por favor, enquanto começa a obra, pode me
explicar o que ocorreu? — ele assentiu olhando-a fixamente. A
Alexandra parecia que não tinha deixado de analisá-la, desde que
tinham se visto essa tarde.
— Olhe quem está sentado no camarote frente ao nosso. —
devido à distância não via bem a quem se referia, só um contorno
impreciso. Ante ela apareceram uns binóculos, preparados para
ser usados. Seu acompanhante pensava em tudo. Olhou através
deles, era o homem que estava jantando com Gabriel no
restaurante de Black, ainda a pouco. Baixou os binóculos com o
cenho franzido e a cabeça funcionando a todo vapor. Olhou Black.
— Também é…?
— Sim, um dos pontos de encontro é meu restaurante, já faz
tempo que sei. Por isso preciso me inteirar do que ocorre.
Damsworth, não está acostumado a vir por aqui, imagino que,
porque é muito conhecido, mas envia a este… mensageiro? — ela
assentiu unindo todos os conhecimentos que havia em sua cabeça,
que eram claramente insuficientes.
— Bem, quer dizer — Alexandra sussurrou o resto no ouvido
do Black, que se inclinou como se fossem um par de amantes —

~ 63 ~
Margotte Channig

que Gabriel é o chefe, ela é espiã e a este outro homem utilizam


para trocar informação. Mas com que fim?
— Acredito que ele nunca deixou sua profissão. Quando se
fez muito conhecido, pelo assunto do Primeiro-ministro, fizeram
ver que era assim, mas acredito que, agora pelo menos, está no
Serviço Secreto — olhou para o cenário — começo a pensar que
nunca esteve com a María, não como eu acreditava.
— E por que não me contou isso? Prefere que o odeie
pensando que me enganou com outra?
— Não. É uma questão de lealdade, juraram não dizer nada a
ninguém. Investiguei, é um requisito que têm que cumprir ao
entrar, — ela assentiu — a questão está em, se aceita ficar atrás
de seu trabalho em importância para ele. Eu não o admito. Quero
ser o primeiro. Em tudo. Sou um egoísta e o reconheço. — parecia
triste.
— Entendo, bem, a meu parecer, isto muda as coisas. Mas o
que têm a ver as notas da Condessa?
— Verificaremos, mas, preciso te fazer uma proposta.
— Nunca acreditei que diria isto a um homem, mas me dá
medo. — soltou uma gargalhada.
— Não diga isso, é uma mulher valente, não muitas fariam o
que você está fazendo esta noite. Escuta, porei todos os meios que
tenho, e são muitos, para saber onde estão as notas, mas em
troca, tenho um preço. Ou melhor, como o chamei antes, uma
proposta.
— Está bem, diga estou tremendo, mas me diga isso.
— Imagine que nós consigamos que ambos acreditassem que
estamos apaixonados, você não acha que eles se quebrariam o

~ 64 ~
Margotte Channig

suficiente para cometer um erro e tornar mais fácil para que nós
possamos descobrir algo? Eu acredito que, sobre tudo seu
Marquês, seria muito difícil que atuasse logicamente. Dessa
maneira, podemos pilhar-los e nos inteirar de tudo. O que acha?
— Olhou-a com emoção nos olhos. Ela baixou o olhar a suas
próprias mãos e as observou cruzadas no colo. Suspirou, tinha
razão desde o começo, era um homem muito perigoso. Olhou nos
olhos dele antes de falar.
— Parece que é a desculpa mais parva que me deram alguma
vez para conseguir vingança. Você não quer que falem, você quer
que María sofra te vendo comigo.
— Sabia que era muito inteligente. — fez uma careta.
— Nunca se é o suficiente. — sorriu malvada, o sorriso de
sua tia.
— Então não o faremos?
— Ao contrário, sou o suficientemente má, para fazê-lo.
— Você não pode dizer a ninguém que tudo é uma mentira.
Pelo menos publicamente, temos que manter a aparência de
amantes. Independentemente do que você pensa, tenho certeza de
que terá efeitos imediatos sobre isso.
— De acordo. Não se preocupe, sou perita em... — deixou de
falar quando uns lábios ardentes a beijaram de improviso, Ficou
quieta, à espera, sem saber o que fazer. Finalmente, sabendo que
os viam desde outros camarotes, inclusive do pátio, levantou suas
mãos para os ombros de Black, e logo até sua nuca. Felizmente, foi
um beijo cumprido, mas casto. Ele se separou, devagar, um pouco
depois.

~ 65 ~
Margotte Channig

— Temos que nos acostumar. — disse. Olhou-a para ver se


estava zangada, mas Alexandra se sentia, mais que nada, um
pouco confundida.
— Está bem, mas agradeceria que este tipo de amostras de
carinho fossem as menores possíveis, e que me avisasse antes. —
lhe olhou carrancuda. Ele assentiu.
— Nosso amigo da frente está olhando para cá com os
binóculos. Não! Não olhe, — agarrou sua mão e a beijou — quero
que conte tudo ao Damsworth quando o ver, olhe, começa a
função.
Apagaram as luzes e saiu o primeiro ator de Romeo e Julieta.
É óbvio María Feodorovna era Julieta, e estava incomparável, além
de muito bela. Alexandra pareceu notar uma pequeno hesitação
em um momento da representação, quando os viu, mas era muito
boa atriz para que se notasse. Assim ainda a afetava Black, este
contemplava à atriz ao seu lado, rígido.
— Por que escolheriam seu restaurante e o teatro para
comunicar-se? Há muita gente, não seria melhor a sós, na casa de
algum dos dois? — ele encolheu de ombros.
— Imagino que são vigiados, aqui é muito difícil que os
peguem, não pode imaginar a quantidade de galerias que há, atrás
do cenário.
— Entendo, bom, terá um plano.
— Não. Acredito que será melhor que vamos improvisando no
caminho. Posso passar por certa taberna para falar com o dono, —
olhou seu relógio — temos que ir se quiser que dê tempo. Se não o
encontro ali, perderei um dia.
— Em meio da representação?

~ 66 ~
Margotte Channig

— Assim acreditarão que temos pressa para estarmos


sozinhos. Convém-nos. — se levantou e estendeu a mão, para
ajudá-la a levantar. Saíram do camarote em silêncio, e assim
percorreram os corredores. Até chegar à rua. Uma vez ali,
dirigiram-se ao carro da Alexandra e entraram.
— Acompanharei você a sua casa, se concordar, e ali pegarei
um carro de aluguel. À zona de Londres que vou visitar esta noite,
é melhor que não vá com meu carro.
— Bem, me escreverá amanhã, com o que descobrir?
— Recorda que estamos apaixonados. Irei a sua casa com um
buquê de flores, e daremos um passeio, ali te contarei tudo.
— Doces de chocolate. Flores não. Se me conhecesse de
verdade, nunca me traria flores, poderiam ser bombons.
— Meu cozinheiro faz as melhores massas de Londres.
Levarei um monte que ficará como uma bola.
— Que bom! Afinal, não me levou para jantar. Espero que
minha tia tenha deixado um prato, tenho fome. Bom, quem guarda
é Anthony, adoro esse homem. — murmurou.
— Quem é Anthony? — perguntou curioso.
— O mordomo. — respondeu séria.
— Ah! — Nesse momento compreendeu quais eram suas
prioridades, com um sorriso. — Se quiser, passamos pelo
restaurante para que o chef te prepare algo.
— Não! Tem muito que fazer. Necessito que consiga essa
informação Black, por favor. — o olhou angustiada
— Está bem, está bem, entendo-o, não se preocupe. Amanhã
às 10 passarei para vê-la.

~ 67 ~
Margotte Channig

— De acordo. E traga as massas! Caso contrário não


passearemos. — Riu as gargalhadas.

~ 68 ~
Margotte Channig

Capítulo 6

Ela estava sozinha na sala de jantar esperando que Black


chegasse a qualquer momento. Ela adormeceu, o que era estranho
nela. Ela tinha dormido mal, tinha círculos profundos sob os
olhos. Estava tomando café da manhã e, ao mesmo tempo, fazendo
uma de suas listas, detalhando o que tinha que fazer durante o
dia. Isso a ajudou a se concentrar e não pensar no que ela não
deveria.
Sua tia descia as escadas, seguiu escrevendo algumas coisas
e tachando outras, em seu inseparável caderninho.
— Bom dia querida. — se aproximou para lhe um beijo.
— Olá tia como dormiu? — deu a bochecha, concentrada em
sua tarefa.
— Bem, muito bem na verdade e você?
— Bem também. — mentiu. Sua tia a olhou com olhos de
águia, mas não disse nada. Não tinha chegado a sua idade sem
aprender quando tinha que se calar.
— Está fazendo uma de suas listas?
— Sim, tenho muito que fazer hoje, se não me organizo não
dará tempo de fazer tudo. Contei que o Conde irá ver sua mulher?

~ 69 ~
Margotte Channig

— Não, mas me alegro, pobre mulher! — sussurrou — Não


posso imaginar nada pior que morrer sozinha, abandonada pelos
seus, e que ninguém vá te ver. Não acredito que ninguém seja tão
mau para merecer isso.
— É muito boa tia, e muito inocente, não sabe quanta
maldade há no mundo — comeu outra massa — e me alegro de
que não saiba. Hoje irei vê-la, depois de…— teria que lhe dizer
sobre Black, estava a ponto de vir.
— Depois do quê?
— Nada, é possível que venha um cavalheiro para me levar
para dar um passeio.
— O Marquês? — sua tia tinha uma expressão entre
emocionada e surpreendida.
— Não exatamente, é Black, falamos ontem à noite dele o
recorda?
— Não me diga que ontem à noite foste vê-lo.
— Pois não digo isso.
— Alexandra! Faz tempo que decidi não me meter em sua
vida, como eu não gostaria que se metessem na minha, mas não
acredito que esse homem, sinceramente…
— Tia, tenho 28 anos, não sou nenhuma menina recém
desmamada. — assim que saiu por sua boca, soube que tinha
errado. Havia certas palavras que sua tia não admitia.
— Que expressão mais desafortunada! — comeu uma parte
da torrada com cara de aborrecimento.
— Sinto tia, mas estou um tanto nervosa, desculpa minhas
palavras — suspirou — sabe o que quero dizer. Sou adulta e, faz

~ 70 ~
Margotte Channig

muito que tomo minhas decisões, inspirada por você, se me


permitir que recorde isso. O que tem contra Black, se posso saber?
— Rumores que é da máfia. — sussurrou.
— Sim, não creio nisso. Mas estamos apenas indo dar um
passeio, não se preocupe. Por sinal, não acho que possa comer.
Quando eu voltar do passeio, irei ver minha cliente, e depois irei
para a delegacia, acho que talvez James possa me ajudar com esse
enredo.
— Quando você vai trazê-lo? Você disse que iria trazê-lo para
um almoço. Você falou muito sobre ele disse que eu gostaria de
conhecê-lo.
— Sim, eu digo a ele, tia. Obrigada, — se levantou — vou me
trocar, porque se não, quando o Black vier, não estarei pronta
para sair.
Black foi pontual, ela tinha colocado um vestido rosa claro.
Por cima levava uma capa de lã combinando que sua tia havia
comprado para seu aniversário, com um capuz precioso com a
borda coberta de pele de raposa branca. Sabia que ficava muito
bem nela.
O homem a observou enquanto colocava as luvas, admirando
sua beleza.
— Está muito bonita Alexandra. — o olhou com as
sobrancelhas arqueadas, segura de que o dizia se por acaso
alguém escutava.
— Muito obrigada, você também. — sua tia pigarreou da sala
de jantar. Alexandra revirou os olhos e sussurrou — o sinto, tem
que cumprimentá-la, do contrário não me deixará em paz.
Entregue as massas para ela.

~ 71 ~
Margotte Channig

— Claro. — seguiu-a até a sala de jantar onde se virou


estupendamente, era um patife encantador. Saíram deixando à
anciã um pouco ruborizada e sorridente, pelas adulações
recebidas de Black. E pelas massas, claro. Alexandra esperava
que, quando voltasse para casa, sobrasse alguma.
Deixou que a ajudasse a subir ao landau3, antes de falar.
— Você se dá bem com as damas. — ele só sorriu, uns dentes
perfeitos e brancos, contrastando com a pele morena, e agitou
brandamente as rédeas dos cavalos. Esperou até estar no parque
antes de falar, parados em frente ao lago Serpentine. Alexandra
prestava toda sua atenção nele.
— Escuto-o. — ele também voltou sua cabeça para observá-
la.
— Em primeiro lugar, quero assegurar-me que esta
associação está em pé de igualdade, contaremos tudo,
concordamos? E por enquanto, somos parceiros e não
permitiremos que ninguém se meta no meio.
— De acordo. — estendeu sua mão para fechar o trato, ele a
apertou sério. Assentiu e logo continuou.
— Ontem eu estava visitando um par de pessoas que conheço
e podem nos ajudar. Anos atrás, algo foi ouvido sobre alguns
documentos, algo impreciso, mas eles foram considerados muito
valiosos.
— Por quê?
— Não tenho nem ideia, de momento. Mas tenho um nome.
Amanhã de noite poderíamos visitá-lo.
— De acordo.

3 O landau ou landó(ô) era um antigo tipo de carruagem de dois bancos situados frente a
frente.

~ 72 ~
Margotte Channig

— Teremos que ir a uma luta de boxe. — Parecia divertir-se


provocando-a.
— Muito bem.
— Ilegal. — definitivamente o estava se divertindo.
— Estupendo. Não ocorre algum outro impedimento para que
não vá? — ele seguiu sorrindo.
— Não. Cai-me bem Alexandra Wallace. E você? Há algo que
queira me contar?
— Não, se refere-se a uma informação, não tenho nenhuma,
mas logo vou ver a Condessa. E a James Brown, um amigo policial
que pedirei informação.
— Sim, esse é aquele com quem faz as investigações. Leio o
jornal. — esclareceu quando o olhou, surpresa por ele saber seu
nome.
— Sim, tive muita sorte. É o único que encontrei, que não
tem nenhum problema em trabalhar comigo. Não posso acreditar
que, no século XIX, nós mulheres ainda tenhamos que lutar tanto
para que nos considerem iguais. Mas James é de mente aberta,
felizmente.
— Mas será que ele não gostaria de ter algo mais contigo?
— Claro que não! — desprezou a ideia em seguida, embora
sua tia o tinha comentado, espantada das facilidades que ele tinha
dado desde que a tinha conhecido.
— Está bem, está bem, damos um passeio pelo parque para
que nos vejam? Terá que pôr cara de apaixonada, agora parece que
quer analisar minha contabilidade. — ela riu com vontade, sempre
agradecia o senso de humor.

~ 73 ~
Margotte Channig

Ao voltar para sua casa, sem perder tempo, colocou um


casaco mais discreto. Ao fim e ao cabo, não ia a nenhuma festa, e
pegou um carro de aluguel.
Ada estava sozinha, à exceção da vizinha, que voltava a estar
com ela. Entrou no quarto devagar, já que disse que possivelmente
estivesse adormecida.
— Olá — estava acordada e olhava um livro, embora quase
não podia segurá-lo com as mãos. Sorriu com cansaço.
Aproximou-se dela e se sentou na cadeira que havia junto a sua
cama.
— Como se encontra hoje?
— Um pouco melhor, o doutor Sweets encontrou algo para a
dor, que faz que me sinta melhor. Hoje é um bom dia.
— Bem, me alegro. De momento não trago boas notícias, mas
estou trabalhando nisso. Seu marido veio?
— Sim, ontem, estou muito contente de que tenha vindo.
Pude pedir perdão por todo o ocorrido. Foi muito generoso comigo
depois do que fiz para ele. Sabendo que me perdoa, morrerei mais
tranquila. Agradeço Alexandra.
— Não me agradeça. Queria fazer uma pergunta, é algo que
me dá voltas na cabeça, se acreditar que está o suficientemente
forte.
— Sim, me diga, não se preocupe. — olhou-a, seus olhos
estavam mais claros.
— Ocorre a você que outras aplicações poderiam ter as notas,
além da máquina do professor Babbage? — ficou pensativa uns
instantes, logo encolheu os ombros.

~ 74 ~
Margotte Channig

— Não, a não ser que… É uma tolice, mas uma vez, o


professor me disse, que minhas notas eram perfeitas como base
para encriptar mensagens, — observou sorridente a expressão de
ignorância da Alexandra — sabe como funcionam os algoritmos?
— Não tenho ideia.
— Bom, digamos que duas pessoas têm a mesma folha de
minhas notas, que seria uma espécie de chave, poderiam ter uma
mensagem, sem nenhum sentido, e com essa folha, em poucos
minutos, traduzi-lo. Embora não era o propósito quando foram
criados. Isto é pura teoria. A verdade, não sei para que alguém
quereria mandar mensagens cifradas hoje em dia.
— As mensagens poderiam ser vistas por qualquer um e se
não tivessem suas notas não os poderiam traduzir? E podemos
acreditar que essa mensagem é diferente?
— É óbvio que não, meus logaritmos são complexos, se não
tivessem as minhas notas seria impossível que os decodificassem.
Descobriu algo Alexandra? Recorda que não tenho muito tempo. —
tentou fazer uma brincadeira.
— Ainda não. Mas tenho uma ideia, já sabe que seu marido
não tem as notas.
— Sim, me confessou isso tudo, então essa atriz não as tinha
em seu poder?
— Ao que parece não, mas não se preocupe. Encontrarei-as,
sou tremendamente teimosa.
— Confio em você.
— Uma última pergunta e a deixarei descansar. Qualquer um
pode utilizar suas notas e codificar as mensagens, ou tem que ser
algum especialista?

~ 75 ~
Margotte Channig

— Não, qualquer um não, primeiro, imagino, teria que criar


uma rotina de decodificação. Quer dizer, outro matemático, teria
que criar uma espécie de roteiro, de modo que, ao codificar e
decodificar, as duas partes o seguem e, o resultado é o mesmo,
não sei se me explico bem.
— Sim, perfeitamente, e isso o poderia fazer qualquer
matemático?
— Não, — sorriu — possivelmente três ou quatro que eu
conheça, me incluindo, me perdoe a falta de humildade.
— Prefiro a sinceridade à humildade. Desses matemáticos,
algum é britânico?
— É óbvio, o professor Charles Babbage, meu mentor. —
Alexandra se recostou na cadeira como um cão que tivesse
farejado um rastro. Assentiu com cara de pôquer4, mas seu
instinto despertou.
— Já vou indo Ada, descanse, assim que saiba algo novo,
voltarei a vê-la.
— Obrigado por tudo Alexandra.
— De nada, até outro dia.
Saiu da casa para a rua despedindo-se da outra mulher com
a mão. Deu a direção ao condutor e subiu no carro tentando se
recuperar do espanto.
A seguinte parada foi na delegacia de polícia, ao descer, ainda
duvidava o que ia dizer a James, mas falar com ele a ajudava a
pensar. Era um bom amigo, e sabia que podia contar com ele.

4Um jogador de pôquer precisa manter o rosto sempre sem expressão, para não demonstrar
qualquer ideia das cartas que tem, e essa cara é chamada de poker face. A pokerface faz
parte do jogo de poquer, uma vez que o jogador tem que tentar sempre enganar seus
adversários.

~ 76 ~
Margotte Channig

A delegacia de polícia estava estranhamente tranquila, o


sargento de guarda a saudou com uma inclinação de cabeça, já a
conheciam. Dirigiu-se diretamente ao escritório de James. Estava
sentado entre um montão de papéis, e levantou o olhar,
carrancudo, ao escutar a porta abrir. Quando a viu sorriu, ao
levantar-se para saudá-la.
— Mas bem, parece que o dia melhora um pouco! Bem na
hora de comer. — estreitou sua mão, mas lhe deu um beijo na
bochecha.
— Sim, decidi ser magnânima e convidar você para comer.
Não no botequim do lado, creia. — fez um gesto de
condescendência que teria causado inveja a qualquer rainha.
James riu a gosto, pela primeira vez na manhã.
— E como você decidiu se encontrar com os pobres mortais?
— Ele abotoou, enquanto falava, o botão superior de sua camisa,
alisando a gravata e colocando o casaco e o chapéu de feltro.
— Leva dez segundos em estar preparado? — ele encolheu os
ombros.
— Já é costume.
— Precisava falar contigo, e assim não comerá sozinho, certo?
— Vamos, antes de que saiam os meus companheiros e não
tenhamos lugar para nos sentar. Estou farto de comer de pé no
balcão.
Fez um gesto com a mão e viraram à esquerda na mesma
rua, voltaram a virar na seguinte travessa. Ali estava o único
botequim onde tinha entrado Alexandra, o “Botão de âncora”. Não
sabia o porquê desse nome, já que o dono, James havia

~ 77 ~
Margotte Channig

comentado, era um antigo policial, e eles não estavam perto das


docas.
O temor de James era infundado, já que havia várias mesas
livres. Escolheram uma, a mais afastada das demais, para ter um
pouco de tranquilidade. Já começava a gritaria das comidas. Uma
vez instalados e pedidas as bebidas, James esperou que ela
falasse. Decidiu ser prudente.
— Preciso fazer umas perguntas — observou sua cara
tranquila, transmitia-lhe confiança e respeito, nunca tinha
trabalhado com outro policial, além dele. Sempre o estaria
agradecida por isso.
— Certo. — ele disparou e deu um gole em sua cerveja
enquanto a escutava.
— Preciso saber se lembra algo associado ao nome de Ada
Lovelace.
— Claro, a filha de Byron, não? — parecia surpreso pela
pergunta.
— Sim, mas sabia que é matemática, e que escreveu uma
série de fórmulas para fazer funcionar uma máquina?
— Que máquina?
— Uma que inventou o professor Charles Babbage.
— Ah essa! Acredito que li algo nos jornais, faz anos. É uma
espécie de máquina para o futuro, que pode seguir ordens. Mas
havia problemas para construí-la.
— Escuta, estive investigando. — tirou seu livrinho de notas
para ler, literalmente, algumas partes — Mas, eu não poderia te
dizer bem, vou lê: Charles Babbage idealizou uma máquina de
propósito geral, à qual qualquer usuário, pode ordenar executar

~ 78 ~
Margotte Channig

um repertório de instruções na ordem desejada. A máquina é


capaz de armazenar 1000 números de 50 dígitos cada, mas não foi
capaz de ser construída até agora, já que ainda não existe
tecnologia suficiente. Ela poderia fazer qualquer tipo de cálculo,
não apenas aqueles referentes a tabelas logarítmicas ou funções
polinomiais — James a olhava como se lhe falasse em outro
idioma. — Já sei, não se entende a metade. Imagina que é capaz
de resolver, sozinha, centenas de enunciados de todo tipo de
fórmulas matemática. O operador da máquina não tem porquê
saber resolver as fórmulas, só deveria colocar os dados. Não sei,
me parece incrível.
— Vale, o entendo, mas se não se pode construir… — voltou
a encolher os ombros.
— Sim, é certo, bom isto não é o que queria dizer. Verá, para
que essa máquina funcione, necessita uns algoritmos, uns
parâmetros, — pensou — como se fossem regras, eu imagino que
sejam, — explicou ao ver a cara de assombro do policial — eu
tampouco entendo tudo. Isso, precisamente, é o que inventou Ada
Byron King. — ficou calada esperando.
— Mas eu pensava que, o invento, só era do professor
Babbage.
— A máquina sim, mas essas instruções ou regras que
necessita, ela inventou. De fato, assinou as notas só com suas
iniciais sabendo que, ao ser mulher, não levariam a sério.
— Compreendo.
— E agora vem o mais incrível, resulta que ela se separou do
marido, e deixou as notas em sua casa. Agora, que está muito
doente, quer recuperá-las. O marido deu a outra mulher, com

~ 79 ~
Margotte Channig

quem mantinha uma relação, e ela não quer devolver isso. Não sei
porquê. Pode investigar ou, perguntar por aí, se aparecer uma
ocasião, se por acaso se inteira de algo?
— Claro. Por certo, quem é a mulher, a que não quer entregar
isso? — perguntou enquanto atacava sua sopa de cebola.
— María Feodorovna. — Ele deixou cair a colher no prato
deliberadamente e olhou-a atentamente. Ficou vermelha sem
poder evitar. — Não me olhe assim James.
— E agora vai me dizer, que o Marquês não tem nada a ver
com isso.
— Não que eu saiba. — mentiu, seguiu tomando sua sopa —
já sei que estão juntos.
— Estão? Eu acreditava que estavam separados faz tempo.
— Acredito que seguem juntos. — pelo menos
profissionalmente, não sabia se Black tinha razão.
— Bom, não custa nada ter os ouvidos abertos, por uma
amiga.
— Obrigada James.
Depois da comida, dirigiu-se à Universidade de Cambridge.
Uma vez ali perguntou onde poderia localizar o professor, era fácil
de encontrar. E a porta de seu escritório estava aberta. Ficou
surpresa que uma pessoa tão conhecida, não tivesse, nem sequer,
uma secretária. Entrou e viu um homem maior com uma testa
ampla, comendo uma maçã enquanto lia o jornal.
— Professor Babbage? — ele levantou a vista do jornal e
soltou a maçã.
— Sim, sou eu, e você é?

~ 80 ~
Margotte Channig

—Alexandra Wallace. — se aproximou para apertar sua mão,


indicou a única cadeira que havia na habitação. Estavam
totalmente rodeados de cacarecos mecânicos meio montados, e de
livros. Ela se sentou na beira da cadeira já que tinha bastante pó,
e inspirou para começar a falar.
— Venho vê-lo por parte da Condessa Lovelace. — o professor
mudou a expressão. Até então, tinha mostrado uma afável
indiferença, e agora, pareceu vislumbrar, um olhar de angústia.
— E como está a querida Ada? Comentaram que estava
doente.
— Está morrendo. — isso o deixou paralisado, certamente
não haviam dito o alcance da enfermidade.
— Não sabia, — ficou olhando o escritório, com a vista
perdida. Logo elevou a vista para ela — e seus filhos?
— Sua mãe esta cuidando deles. Ela vive sozinha, não sei se
esta informado de que se separou de seu marido.
— Sim, sim, isso sabia. Uma garota com muito má sorte.
Sabia que a conheci quando tinha 17 anos? Já então tinha uma
mente privilegiada para a matemática. Extraordinária.
— Professor, tenho que fazer uma pergunta. — se o deixava
divagar, intuía que não sairia dali.
— Sim, claro, me diga.
— Você não sabe nada sobre as notas que a Condessa
desenvolveu, para utilizar junto com a máquina analítica que você
ia construir?
Então ocorreu o que menos esperava. Aquele homem de 62
anos, de aspecto erudito e bonachão, ficou olhando como se

~ 81 ~
Margotte Channig

estivesse perdido e não soubesse responder, e começou a soluçar


como um menino.

~ 82 ~
Margotte Channig

Capítulo 7

Alexandra sabia que não era boa ideia. Era melhor ir para
casa e planejar o seguinte passo, mas não podia evitá-lo, fervia-lhe
o sangue. Tinha que saber se o que pensava, era certo. Quando
chegou em frente a casa de Gabriel, ficou olhando a fachada uns
minutos. Depois, com um suspiro e endireitando as costas, que
doía terrivelmente, certamente pela tensão desses dois dias, bateu
na porta. Deu seu nome ao mordomo, quem a fez passar, sem
perguntar, até a sala de jantar, onde estava jantando o dono da
casa. Ele se levantou ao vê-la. Entrou, para que o mordomo
pudesse fechar a porta.
— Se quer posso esperar, em outro lugar, que termine de
jantar.
— Não quer me acompanhar? Sente-se, por seu aspecto não
acredito que tenha passado por sua casa antes de vir.
— Não, levo todo o dia fora de casa. Mas não é necessário que
me ofereça o jantar, não temos porquê ser tão educados. Termina
de jantar, por favor, eu esperarei. Só quero que tenhamos uma
conversa tranquila. Não é pessoal, não se preocupe.

~ 83 ~
Margotte Channig

— Preferiria que o fosse. — encaixou a mandíbula furioso, ao


ver seu aspecto de cansada — Sente-se, não há necessidade que
vá a nenhum outro lugar, podemos falar aqui. Em realidade, não
tenho fome. Ultimamente não como bem. Estou seguro de que isso
não acontece com você. — Disse ironicamente.
— Não, mas durmo mal, o que nunca me ocorreu. — Se
sentou frente a ele na larga mesa. Via-se refletida em sua cara o
cansaço e o olhar de tristeza. Decidiu atacar, não ia adoecer
pensando no que podia ter sido, não era seu estilo.
— Gabriel, estive falando com o professor Babbage — ele se
surpreendeu ao escutá-la — não o culpe de nada, veio abaixo
quando contei a situação da Ada. Está muito arrependido por
haver dado os papéis para você. Sobre tudo, agora, que sabe que
está morrendo.
— Sim, já me havia dito que está muito doente — sua boca
tinha um sorriso amargo — assim que te contratou.
— Por que vou dar informação, se você não teve essa
consideração comigo?
Ele apertou a mandíbula ao escutá-la.
— Não posso falar desses temas com ninguém. Sabe.
— Sim, já me disseram isso ontem. — ele franziu o cenho —
Escuta Gabriel, não é minha intenção pôr em perigo sua rede de
espiões, colocando os holofotes nas notas de minha cliente. —
suspirou — Essa pobre mulher só quer poder deixar algo a seus
filhos. Estou disposta a levar uma proposta econômica, sempre e
quando for generosa. Quero uma renda vitalícia para cada um dos
filhos. — se levantou — Mas se for necessário, falarei com outra
pessoa.

~ 84 ~
Margotte Channig

— Não há outra pessoa, tem má sorte. Terá que negociar


comigo.
— Não há nada que negociar. Ela cede, por escrito, a
propriedade dos documentos e em troca, seus filhos recebem essa
renda vitalícia.
— Não. — ela, seguia sentada aparentando tranquilidade,
levantou-se de repente.
— Como não? Sabe o que diz? Irei a um jornal e contarei
tudo. Imagino que isso porá em risco, o trabalho tão importante
que fazem você e sua amante. — seu olhar fulminante não a
abandonou, em nenhum momento.
— Não sabe o que faz comigo quando me olha assim, você
acredita que me assusta, e o que faz, é me excitar. Fico com
vontade de levar você a cama mais próxima. — se levantou e se
aproximou dela, o suficiente para ver que tinha as pupilas
dilatadas pela excitação — De acordo, darei a cifra que queira para
seus filhos, parece justo. Estou autorizado a fazê-lo. Em troca
quero duas coisas. — ela entrecerrou os olhos.
— O quê?
— Fica esta noite, sem perguntas. Não falemos de nada disto,
será um parêntese, que se repetirá ou não, mas desfrutemos desta
noite. E a segunda, quero saber qual é sua relação com Black.
— A relação que eu mantenho com Black não é seu assunto,
igual às suas com outras mulheres. Mostre-me que não é meu
assunto. Quanto a essa noite, não posso, mas dou minha palavra
que de manhã virei.

~ 85 ~
Margotte Channig

— Não, esta noite ou nada. E sobre Black já falaremos,


possivelmente esta noite não seja a mais adequada para isso. —
enfrentou-o, com as mãos nos quadris.
— Seria capaz de não fazer o trato, só porque não nos
deitamos esta noite? — sua voz soou indignada.
— Sim, o faria. — ele também estava indignado,
possivelmente com ele mesmo. Mas não tinha lhe deixado outra
saída, era uma medida desesperada em vista dos acontecimentos.
— Está bem, ficarei, deixe que mande uma nota para minha
tia. — ele assentiu assombrado, nunca acreditou que aceitaria.
Tinha muito má opinião dele se pensava que deixaria a esses
meninos, agora que conhecia a situação real da mãe,
desamparados. Mas se aproveitaria do fato, para que não
escapasse das suas mãos de novo. Já não deixaria que se
separasse dele, embora ela não sabia ainda.
Depois de mandar seu carro de volta para casa com uma nota
para sua tia, contando uma história sobre a investigação que,
duvidava que acreditasse, voltou-se para Gabriel e exigiu.
— Bom, vai me servir o jantar ou não? — ele fez um gesto ao
mordomo, e colocaram os talheres na mesa. Como sempre que
doía algo, quase não comeu. Gabriel estava sentindo saudades.
— O que passa?
— Não sei, tenho o estômago estranho, mas, sobre tudo, me
dói as costas muito. — Se reclinou na cadeira um momento,
fechando os olhos. Escutou ele se aproximar, mas pensou que iria
à porta para pedir algo ao mordomo. Notou suas mãos primeiro no
pescoço, medindo, acariciando.

~ 86 ~
Margotte Channig

— Me deixe Gabriel, dói-me um montão. — endureceu seus


músculos preocupada de que fizesse mal.
— Fique quieta um momento, quero ver se posso fazer que
relaxe um pouco os músculos, tem rígida toda as costas. Incline-
se ligeiramente para frente. — ela o fez e se deixou massagear.
Embora era doloroso, notou certo relaxamento, por onde foram
passando os fortes dedos do homem.
— Onde aprendeu a fazer isto?
— Realmente fazendo isso eu mesmo, quando ficava travado
algum músculo. Faz anos jogava futebol e muitas vezes acabava
destroçado. Esta era a única maneira de poder andar, mais ou
menos normalmente, no dia seguinte. Acredito que começa a
aparecer profissionais, que dão massagens deste tipo.
— Sério?
— Sim, embora para fazê-lo bem, deveria estar deitada. —
com risco de fazer dano, girou totalmente o pescoço para o olhar.
— Não estou segura, mas é uma das desculpas mais
inacreditáveis que me deram, para que me deite com algum
homem.
— E, é óbvio, se despir — continuou ele como se ela não
tivesse falado — tenho um óleo que poderia passar pelo corpo.
— Gabriel não sou idiota! — ficou ruborizada só de pensar no
prazer de estar nua, e que ele acariciasse seu corpo, melando-o
com óleo.
— Faremos um trato. Se não estiver melhor quando terminar
contigo, prometo que cada um dormirá em um quarto. Façamos
uma trégua esta noite. — se olharam, com um pouco de medo.

~ 87 ~
Margotte Channig

— De acordo. — a sensação de suas mãos na pele era


maravilhosa. Além disso se tirasse suas dores, seria perfeito. É
óbvio, seguia zangada com ele. Isso não admitia dúvidas.
— Bem, subamos ao quarto, acredito que o fogo de meu
quarto já estará aceso.
Gabriel, além disso, acendeu um abajur de gás, mas lhe deu
um pouco de vergonha.
— Por favor, não acenda mais luz Gabriel. — ele pareceu que
objetaria algo, mas sua expressão fez que aceitasse.
— Está bem. — apagou o abajur e se aproximou dela. Puxou
sua mão e a colocou em frente ao fogo. Ela recordou outro
momento, tão diferente… Por um momento hesitou sobre o que
estava fazendo lá. Ela não era uma mulher que se deixava
assustar por qualquer um. Mas quem queria enganar? Ela
precisava estar com ele, pelo menos uma vez, antes de dizer adeus.
Tudo tinha sido muito rápido. Ela sabia perfeitamente que nunca
poderia apaga-lo do coração. Depois daquela noite, ela estava
disposta a começar de novo e dar a si mesma a chance de ser feliz
sem ele. Ela tentaria ser mais generosa consigo mesma. Começaria
uma vida sem ele, mesmo que Gabriel não estivesse ciente disso.
Ele a despiu, como se estivesse desembrulhando o melhor
dos presentes. Com delicadeza, de vez em quando, em algum
lugar, deixava cair um beijo. Alexandra não era capaz de protestar.
Já nua, levou-a a cama, ali fez que se deitasse o mais perto da
borda possível, de barriga para baixo. Ele, por sua parte, tirou a
jaqueta e a gravata e arregaçou a manga da camisa. Desapareceu
por uma porta, trazia uma toalha e um frasco com uma
substância oleosa. Tampou seu corpo da cintura para baixo com a

~ 88 ~
Margotte Channig

toalha, e desenhou sobre suas costas umas linhas com o óleo, que
logo deixou na mesinha. Então começou a massagear seu corpo.
Sentiu um aroma, lavanda, não podia ser.
— Gabriel, não posso acreditar que tenha óleo de lavanda.
— Tinha a esperança de que me deixasse te dar uma
massagem algum dia.
Não tinha nada de parecido com o que tinha feito na sala de
jantar. Agora Gabriel utilizava toda sua força quando era
necessária, em ocasiões, tinha que fazer algum dano para
conseguir relaxar os músculos. Meia hora depois, pensava que
aquilo era mais prazeiroso que o sexo. Agora já não lhe doía, tinha
esfregado suas costas, os braços, o pescoço, baixando a
intensidade cada vez mais, até que já não era uma massagem, a
não ser carícias. Estava a ponto de dormir.
— Vire-se Alexandra.
Ela estava sonolenta, a ponto de lhe dizer que estava
dormindo, quando com as mesmas mãos, oleosas e quentes pela
fricção contínua, envolveu seus peitos massageando-os com
doçura, e puxando seus mamilos. Gemeu enquanto despertava de
novo. Ele se afastou para despir-se, Alexandra o observou fazê-lo,
curiosa. Nu, voltou junto a ela. Os lábios do Gabriel se fecharam
sobre os dela, famintos, devoradores, ardentes. Sua língua entrou
com urgência na boca e se encontrou com a sua. Jogou os braços
ao redor de seu pescoço e perdeu qualquer pensamento racional,
sentindo uma explosão de alegria e prazer nas veias. Em seguida,
Gabriel se colocou em cima e introduziu as pernas entre as dela.
Foi uma penetração brusca e violenta. Ela gritou, arqueou as
costas cravando as unhas em seus ombros. Seu pênis estava tão

~ 89 ~
Margotte Channig

quente e duro, que quase fazia dano ao entrar em seu corpo. Ele
ardia pela necessidade, seus músculos se estremeciam ao penetrar
cada vez mais profundo, em toda sua longitude. Sua boca se
apoderou da dela, sossegando seus gemidos à medida que ia
alagando-a a excitação. Aquilo nunca tinha ocorrido com ela.
Desejava-o como jamais desejou outra pessoa, nunca. Ela não
podia pensar em nada mais do que o que sentia nesse momento,
tinha-o dentro tão profundo, como uma presença opressiva,
transbordante. Terminou tão rápido como tinha começado,
gemeram pelo prazer, como se tivessem descarregado a frustração
que levavam em seu interior.
Gabriel enterrou a cabeça em seu ombro e se estremeceu de
alívio, como se não tivesse podido suportar um instante mais,
separado dela. Aquele não era o Marquês de Bute que todos
conheciam, régio e disciplinado. Era somente um homem com um
apetite incontrolável, por ela. Era sua debilidade. Considerava-se
um homem controlado, mas naquele momento, não mostrava
nenhum controle. Alexandra acariciou suas costas com as mãos,
notando os fortes músculos sob a pele.
— Não teria sido melhor, possivelmente não soltar sua besta?
— murmurou com um sorriso. Ele levantou o rosto e esboçou um
sorriso de tristeza. Apoiou-se sobre os cotovelos, adotou uma
postura mais cômoda sobre ela e a beijou nos lábios.
— Sou um homem desesperado. Assim que posso tocar você,
preciso estar dentro de você o mais rapidamente possível, antes de
que mude de opinião. — Aquelas palavras a surpreenderam, pois
apontavam uma vulnerabilidade, uma necessidade, que jamais
tinha suspeitado que Gabriel pudesse sentir. Sabia que a desejava,

~ 90 ~
Margotte Channig

mas ali parecia haver algo mais. Ele não a deixou seguir o
pensamento. Moveu-se de novo, lentamente, o que desencadeou
um pequeno motim em suas terminações nervosas. Lançou uma
leve exclamação, e elevou as pernas para lhe abraçar os quadris.
— Por que ia mudar de opinião? Tomei uma decisão. —
conseguiu dizer.
— As coisas não são fáceis entre nós. — Tampouco eram
fáceis naquele momento. Havia tensão, dor e incerteza, uma
explosiva atração sexual, até bastante hostilidade, em ocasiões,
provocada pelo choque entre duas personalidades fortes. Não
havia nada sereno naquela relação, não o tinha havido nunca. Ela
deslizou os dedos entre as mechas do cabelo dele, sujeitando, ao
mesmo tempo em que levantava os quadris e começava a mover-se
por sua conta. O corpo inteiro de Gabriel ficou tenso, e seus olhos
arderam, embora fossem, virtualmente, negros. Pareceu perder a
capacidade de respirar. Ela, atenta, repetiu o movimento, levantar-
se para o absorver dentro de si e contrair todos seus músculos
internos para o reter, o sugar com seu corpo. Um áspero grunhido
saiu da garganta dele.
— Onde aprendeu a fazer isso?
— Sou uma leitora incansável de todo tipo de livros. Tinha
curiosidade de saber se por acaso haveria algum, que descrevesse
técnicas para fazer amor. E existem, aos montes, minha tia tem
alguns.
— Adoro a sua tia. — Em agradecimento, repetiu o
movimento, até que nenhum dos dois pôde resistir mais à nova
avalanche de prazer.

~ 91 ~
Margotte Channig

Despertou em seus braços, na manhã seguinte. Permaneceu


deitada e em silêncio, ainda sonolenta, entre a vigília e o sonho.
Estava virada para o lado esquerdo. Gabriel era um sólido muro
nas suas costas, com as pernas entrelaçadas com as suas e um
braço descansando sobre seu quadril. Sentia o calor de sua
respiração no ombro. Possivelmente nunca mais voltaria a estar
assim com ele. Aquela revelação causou uma forte impressão. Não
via o relógio, mas quase tinha amanhecido, o céu começava a
clarear. Sentia-se estranhamente contente de estar justamente
onde estava. Todo seu corpo estava torpe, satisfeito, bem usado.
Os lábios de Gabriel roçaram ligeiramente a sua nuca. Se
empurrou um pouco mais contra ele e suspirou de prazer.
A ereção matinal de seu amante a empurrou por trás,
insistindo contra suas nádegas. Tentou dar a volta, mas ele a
manteve em seu lugar com um murmúrio, e ajustou sua postura
para guiar-se entre suas pernas. Arqueou as costas para lhe
oferecer um melhor ângulo. Gabriel pôs uma mão no seu estômago
para sujeitá-la e empurrou. Foi penetrando lentamente, Alexandra
estava suave, úmida, mas as posições de ambos, faziam com que
seu corpo cedesse a contra gosto àquela intrusão. Respirou pela
boca, tratando de manter-se relaxada. Tendo as pernas juntas,
não havia muito espaço em seu interior. Sentia-o enorme,
dilatando sua carne até o limite. Era uma sensação que chegava
quase a doer, mas precisamente, por isso resultava excitante.
Jogou a cabeça para trás, contra seu ombro, lutando por suportá-
lo. Um centímetro mais, e deixou escapar um gemido. Ele ficou
quieto.

~ 92 ~
Margotte Channig

— Dói? — Sua voz era grave, turva pelo sono e o desejo.


Talvez. Não sabia.
— Sim, mas não pare. — sussurrou. Ele subiu a mão direita
até seus seios e começou a apertar ligeiramente seus mamilos, tal
como tinha descoberto que ela gostava. Isso acendeu uma chama,
que aumentou quando rodeou um deles com sua mão. Assustava
ver o quão rapidamente tinha aprendido, como gostava que a
acariciasse. Tinha centrado sua atenção nela de tal forma, que não
tinha escapado nem a menor falha de sua respiração. Depois de
duas noites, conhecia seu corpo tão bem. Deslizou o braço
esquerdo debaixo dela, para rodear a cintura e descansar uma
mão sobre seu púbis. Continuando, introduziu o dedo médio e
pressionou ligeiramente o clitóris. Não o esfregou, só o pressionou,
deixando o dedo ali. Então, começou a empurrar com movimentos
lentos e largos, que faziam que o corpo dela avançasse e
retrocedesse contra seu dedo. Ela gritou e se agitou, sob a
vibração de prazer. Gabriel sussurrou algo tranquilizador, para
acalmá-la, e reatou os movimentos.
— Desejei você a primeira vez que te vi. — murmurou —
Deus, como a desejei! — Sua mão direita subia e descia pelo
tronco de Alexandra. — Fiquei afastado de você durante meses.
Quando estivemos juntos na outra noite, foi como entrar no
paraíso, para que logo me enviasse ao inferno. Mas não admitirei
que volte a se afastar. Resolveremos tudo Alexandra, só necessito
uma oportunidade. — o escutava pela metade, imersa em um
prazer crescente — Agora é minha, Alexandra. Minha. — Ela
estava aturdida.

~ 93 ~
Margotte Channig

Gabriel, então, retirou os quadris e voltou a penetrá-la em


um movimento firme, sem pressa, que se contradizia com a forma
em que retumbava o seu coração.
— Gabriel, por favor, necessito que… — gemeu voltando a
cabeça tentando olhá-lo, mas não chegava a ver seu rosto.
Ele deslizou a boca até seu pescoço, em busca do ponto exato
situado entre o pescoço e o ombro em que o mais leve contato a
fazia estremecer de prazer e uma mordida a voltava louca. Então,
mordeu-a, sujeitando seu tremente corpo, tenso contra o seu. Ela
gritou e tentou separar as pernas, mas ele não deixou. Alexandra
estava enlouquecendo. Por muito bom que fora aquele dedo entre
suas pernas, ao fechá-las, o contato não era suficiente. Suas
carícias não chegavam o bastante dentro, nem o bastante rápido.
Tinha-a levado até o ponto de ebulição com palavras e carícias,
mas não permitia transbordar.
— Se mova mais depressa, por favor.
— Ainda não, — voltou a beijá-la no pescoço. Acariciou sua
orelha — antes tenho que dizer algo. Sei que pensa que isto é o fim
do nosso relacionamento. Nada disso, meu amor. É minha, e
seguirá sendo minha.
— Gabriel. — suspirou Alexandra — Te quero. Apesar de
tudo, inclusive de mim mesma. Sei que dentro de um momento me
arrependerei de haver dito isso, mas se não começar a se mover
neste exato momento...! — ele riu, feliz, e obedeceu. Elevou sua
coxa sujeitando-a com a mão e começou a mover-se mais
depressa, aprofundando mais. Ela se esticou, com as pernas
tremendo, e explodiu em um violento clímax. Gabriel se uniu a ela
antes de que tivessem cessado os espasmos. Manteve-a abraçada

~ 94 ~
Margotte Channig

contra ele enquanto isso ocorria, como se temesse que pudesse


partir nesse momento.
Alexandra não podia deixar de tremer. O prazer tinha sido
muito intenso, muito prolongado, e ainda não acreditava em todas
as coisas que Gabriel havia dito. E o que era pior, o que tinha
respondido para ele. Voltou-se para ver seu rosto, e imediatamente
a expressão dele se voltou cautelosa. Ela conseguiu esboçar um
sorriso, embora o coração retumbava de tal maneira que mal podia
falar.
— Não acredite que vai poder dizer coisas assim, só quando
me tiver de costas. — O tocou no rosto, tomando sua bochecha na
palma da mão — Falou sério? — Gabriel estremeceu.
— Sim. Tudo.
— Eu também, embora vá contra todos meus princípios e das
decisões que tomei para poder fazer bem meu trabalho. —
comentou triste. Gabriel agarrou seus dedos e os levou aos lábios.
Por um instante pareceram lhe faltar as palavras.
— Iremos devagar, não espero de você mais do que possa me
dar. Sei quem é, não se lembra? Tem um trabalho que fazer, e eu
não vou pedir que renuncie a ele, pelo menos, não de tudo.
Chegaremos a um acordo.
Alexandra o olhou ironicamente, embora não podia deixar de
tocá-lo. Todas aquelas largas horas passadas na cama com ele,
não tinham feito outra coisa se não aumentar seu desejo, em lugar
de aplacá-lo. Acariciou seu peito duro como uma rocha, depositou
um beijo em sua garganta.
— De acordo, já o pensaremos. Mas acredito que fui muito
branda contigo. Parece-me que não posso resistir a você, deve ter

~ 95 ~
Margotte Channig

um aroma especial ou algo assim, que faz com que não possa. —
soltou várias risadinhas que fez seu peito vibrar. Adorava vê-la, tão
séria, procurando uma justificativa lógica para sua mútua atração.
— Carinho, se serve de algo, não foste nada branda. Nunca o
é. Tem-me feito suar mais que qualquer mulher.
— Mas serei muito dura na negociação para a compensação
aos filhos da Condessa, quero conseguir justiça para ela. O que te
parece se a fazemos agora?
— A negociação?
— Sim. — Se sentou na cama cobrindo-se com os lençóis,
olhou o relógio que havia sobre o suporte da lareira. Ainda ficava
algum tempo durante o qual poderia entrar em sua casa
discretamente — Está bem, temos uns minutos, vamos solucionar
o problema. Eu gostaria de poder ir hoje a sua casa, para dar a
boa notícia.
Gabriel se sentou apoiando-se na cabeceira da cama,
gloriosamente nu, e a olhou fixamente enquanto sorria.
— Está bem, me diga suas condições querida. — Ela não
sorria, pôs sua cara mais séria, apesar de que estava nua com a
pessoa que tinha que negociar. Tinha que dar-se pressa em
pensar, assim estabeleceu uma quantidade de dinheiro que lhe
parecia justa e, logo, multiplicou-a por dez, então a transladou ao
Gabriel. Ele aceitou sem regatear, o que fez com que ela franzisse o
cenho, pensando que a tinha enganado.
— Parece que estás me provocando. — Ele levantou as
sobrancelhas assombrado.

~ 96 ~
Margotte Channig

— Está de brincadeira? Sabe que, qualquer outra pessoa não


teria conseguido nenhuma décima parte disso. Agora vem e
fechemos o trato. — Estendeu a mão para ela.
— Só um beijo Gabriel, tenho que chegar logo em casa.
Minha tia faz vista grossa até certo ponto. — Se aproximou dele,
que a sentou sobre suas coxas, para fazer que se calasse, e fizesse
melhor uso de sua boca.
Não muito longe dali, María Feodorovna despertava
sobressaltada. Tinha dormido muito mal essa noite, não conseguia
tirar da cabeça a imagem de Black com aquela mulher. Sabia que
não era uma coincidência, e que ele tentaria fazer todo dano que
pudesse. Sentou-se na cama nervosa. Entrecerrou os olhos ao
observar a cadeira sob a janela, onde normalmente deixava a
roupa. Se não fosse porque sabia que era impossível, pensaria que
havia um homem sentado ali. Inclinou a cabeça para ver melhor,
quando escutou o estalo típico de alguém que acendia um abajur.
Seu coração começou a pulsar descontroladamente, estava muito
assustada. Quando o viu, quase morreu de susto. Levantou-se da
cama, sem se dar conta que levava uma fina camisola, para
enfrentá-lo.
Black, tinha usado suas antigas habilidades, para entrar em
seu quarto e vê-la dormir. Tinha-o feito outras vezes, mas nunca a
despertou. Esta vez, tinha tido um pesadelo, e o tinha visto contra
a luz. Se não, teria ido sem que se inteirasse. Observou-a
aproximar-se com seus olhos de bruxa, aqueles cachos negros
movendo-se como se tivessem vida própria, e suas longas pernas.
Sonhava com elas, enroscando-se ao redor de seus quadris,
enquanto faziam amor. Ninguém o tinha feito sentir como aquela

~ 97 ~
Margotte Channig

bruxa mentirosa. Imaginava que o tinha merecido. Ele tinha ido de


cama em cama, até que a conheceu. Tinha encontrado a forma de
seu sapato.
— Como se atreve a entrar em meu quarto? — Quando se
zangava ou estava assustada, era o único momento no qual se
notava o sotaque russo.
— Tenho que fazer umas perguntas e pensei que seria
melhor, para você, que não nos vissem juntos. — sorriu com
maldade — Ou quer chamar o Marquês para que esteja aqui? —
ela empalideceu ao escutá-lo, mas não mudou a expressão.
— O que quer?
— Que me diga quem tem os papéis pelos quais perguntou
Alexandra Wallace, os que escreveu a filha do Byron.
— Black, por favor, não posso dizer nada. Se tiver vindo por
isso, está perdendo o seu tempo. — Se voltou e tirou sua bata de
um cabide, logo, a pôs tranquilamente, mas ele tinha visto sua
expressão, estava assustada. Levantou-se para aproximar-se dela.
Tirou o casaco, e a jaqueta.
— O que faz? — a voz dela saiu afogada.
— Me pondo em igualdade de condições para o interrogatório.
— Ela voltou para trás assustada, mas ele a reteve pelo braço,
aproximando-a a seu corpo. Beijou-a como tinha feito sempre,
tomando tudo o que encontrava como se fosse dele, porque o era,
os dois sabiam. Não importava se tinha deitado com outros
homens ou não. Ela, depois de uns instantes, não pôde seguir
negando-se e jogou as mãos à nuca para o atrair para ela. Então
ele se separou.

~ 98 ~
Margotte Channig

— María quem tem os documentos? — o olhou aturdida


tentando aproximá-lo mais a ela. Ele resistiu, até que viu que ela
começava a se zangar e se retiraria, então perderia tudo. Ia ser
uma noite longa, pode ser que infrutífera, mas muito prazeirosa.

~ 99 ~
Margotte Channig

Capítulo 8

O “Sombra”, como era conhecido nos baixos recursos


londrinos, viu sair Alexandra Wallace do domicílio do Marquês de
Bute, acompanhada por ele, e montar em uma de suas
carruagens. Suas suspeitas eram acertadas. Esse romance, em
que pese a tudo, convinha a seus propósitos, por fim tinha
encontrado o calcanhar de Aquiles do Marquês. Agora todos
pagariam.

*****

Apesar de não ter dormido e estar terrivelmente cansada,


encontrava-se de excelente humor. Por pouco teve tempo de
arrumar-se para acompanhar a sua tia no café da manhã. E isso
porque tomou banho na casa de Gabriel. Sua tia sorriu, contente
ao vê-la.
— Bom dia querida! — Levantou-se para dar um beijo e
voltou a sentar-se junto a ela na mesa. Precisavam falar. Começou
assim que ficaram sozinhas.
— Tia, queria falar contigo, antes de que me pergunte.
Mandei uma nota dizendo que não viria pela investigação, mas era

~ 100 ~
Margotte Channig

mentira, passei a noite com o Gabriel. — sussurrou. Sua tia a


olhou atônita, mas não pela mentira, como disse em seguida.
— De verdade pensava que tinha me enganado? Me acha
muito inocente Alexandra. Sei perfeitamente que ontem à noite
esteve com ele, e a outra noite que faltou, também. — Agora a
surpreendida era ela.
— Acreditava que se surpreenderia.
— O que me surpreende é que me considere tão tola. Recorda
que tive sua idade, e não fui de tudo feia. — a última frase a disse
com intenção. Assim que sua tia idosa, apesar de não haver se
casado nunca, tinha tido seus namoricos, é óbvio. Olhou-a
atentamente, com toda a confusão que tinha ocorrido nas últimas
semanas, não tinha se fixado muito em sua tia, mas estava muito
feliz. Possivelmente muito.
— Tia posso fazer uma pergunta?
— Não, prefiro que mantenhamos a privacidade nesse tipo de
assuntos, se não se importa. — Levantou as mãos em sinal de paz.
— Ok, ok, só tinha curiosidade.
— Pois, vai ficar curiosa. Isso só é meu assunto. Me passe os
ovos, por favor. Como vai sua investigação?
— Bem, muito bem, na verdade, hoje tenho muito o que fazer.
Primeiro ir a casa da Condessa, para dizer que consegui uma
renda vitalícia para seus filhos. Eu acredito que é bastante justo.
— Seguiu tomando o café da manhã, estava muito faminta.
— Que rápido Alexandra! E terão para viver, com segurança
econômica, toda sua vida?
— Oxalá eu tivesse o que consegui para eles tia, terão até
para seus netos. Não posso te dar cifras, mas está muito bem. Vou

~ 101 ~
Margotte Channig

já, não quero fazê-la esperar mais. — Se levantou. Sentia um


pouco de remorso por estar tranquilamente tomando o café da
manhã, e essa mulher esperando, enquanto sofria.
— Está bem filha, vai. Espero-te para comer?
— Sim, tenho que visitar o Black, irei ao restaurante, mas
acredito que me dará tempo de voltar para comer. Se não,
mandarei uma nota. — Beijou a bochecha de sua querida tia e
aspirou com carinho seu aroma.
Esta vez coincidiu com o Sweets na casa, virtualmente
chegaram ao mesmo tempo. Deixou que ele entrasse primeiro para
examiná-la, e, quando saiu, entrou ela.
Estava visivelmente pior que o primeiro dia que a tinha visto,
impressionou a deterioração de seu corpo desde o dia anterior.
Não sabia que isso fosse possível em um só dia. Sweets já lhe
havia dito que não acreditava que aguentasse mais que um par de
dias, e que falasse o menos possível. Sentou-se junto a ela, tinha
os olhos fechados. Pelo menos parecia tranquila e sem dores.
— Ada, está dormindo? — negou com a cabeça como se
custasse falar, mas abriu os olhos e girou um pouco a cabeça. O
suficiente para poder olhá-la. — Tenho que falar com você, não
precisa dizer nada, de acordo? — ela assentiu. — O governo está
de acordo em conceder uma renda vitalícia, para cada um de seus
filhos, de 20.000 libras anuais. Estiveram utilizando seus
documentos, com a finalidade que você me comentou. — decidiu
não indicar a intervenção que tinha tido o professor em tudo, para
não lhe fazer mais dano — Seus filhos não terão nunca nenhum
problema econômico. Devido a sua situação com o Conde, e que
eles estão vivendo com sua avó, pensei que, possivelmente, queria

~ 102 ~
Margotte Channig

que se fizesse cargo, uma pessoa independente, do legado até que


sejam maiores de idade. A quem quer você nomear para que cuide
de tudo enquanto sejam menores? — a mulher parecia um pouco
angustiada pela pergunta — possivelmente a sua mãe?
—Não, ela…não, ela não é de confiança com o dinheiro, igual
ao que eu... — falava com muita dificuldade — tampouco o fui.
Agora mesmo não sei quem pode ser a pessoa mais adequada. Não
conheço ninguém.
— Quer que volte um pouco mais tarde para que me diga
isso? Além disso estão preparando um documento, que tem que
assinar, para ceder suas notas, em troca do dinheiro para seus
filhos. — Ada assentiu de novo, mais tranquila ao saber, que não
tinha que se decidir nesse momento. Não obstante, disse algo,
quando Alexandra estava a ponto de abrir a porta.
— Alexandra, muito obrigada, e, não venha muito tarde. Não
acredito que seja capaz de aguentar muito tempo — confessou com
um sorriso tremente. Alexandra assentiu, e, uma vez fechada a
porta, desafogou-se chorando. Era uma situação extremamente
triste. Uns braços desconhecidos a acolheram com carinho, a
princípio se assustou, até que reconheceu ao doutor. Deixou-se
levar uns segundos e logo se ergueu devagar para que a soltasse.
— Obrigada doutor.
— Acreditava que havíamos acertado de que me chamaria
Robert.
— Robert, sim, tem razão, perdoa, não pude evitá-lo.
— Não há nada que perdoar, não seria humana se não se
afetasse. É muito triste essa situação. — Se encaminharam para a
porta, uma vez fora, deu-lhe um beijo na bochecha, igual tinha

~ 103 ~
Margotte Channig

feito com sua tia, e subiu na carruagem. Tinha muitas coisas que
fazer, e muito pouco tempo.
Felizmente tinha marcado com Gabriel à uma, tinha tempo
de passar pelo The Clerk antes. Tinha que voar, não podia falhar
com Ada.
Como imaginava, Black ainda não tinha chegado, então
deixou uma nota em um envelope fechado:

Black:
Não siga investigando, não é necessário, vinha para contar as
novidades, mas não posso esperar. Tenho que declinar o convite
desta noite, mas está tudo solucionado. Quando quiser que falemos,
me mande uma nota, e estarei encantada de esclarecer tudo.
Obrigada por tudo, foi um prazer conhecê-lo.
Alexandra

Sabia que soava como despedida, mas era como se sentia,


depois da noite que tinha passado com Gabriel. Havia coisas que
teriam que esclarecer, e assuntos nos quais teriam que encontrar
um meio termo, mas o certo, era que estava totalmente
apaixonada por ele. Essa noite tinha feito uma mudança nela.
Tinha sido capaz de dizer que o queria. Uma vez que o teve feito, o
resto foi mais singelo.
A delegacia de polícia de James ficava perto, assim decidiu
aproximar-se, já que não podia consentir que dedicasse nem um
minuto a uma investigação desnecessária. Encontrou-o, como
sempre, entre papéis, em seu escritório. Sorriu ao vê-la, e se
levantou para saudá-la.

~ 104 ~
Margotte Channig

— Alexandra! Como vai tudo? — Pôs cara de pena — sinto ter


que dizer que, ainda, não tenho notícias para você.
— Não se preocupe, era sobre isso que queria falar, posso me
sentar um momento?
— É óbvio, senta. — Guiou-a até a cadeira frente à sua, e a
olhou atentamente, como sempre.
— Veja, não posso explicar tudo, mas, ao final, consegui
chegar a um acordo com os que estão utilizando os documentos. É
o que queria minha cliente, e todos estão contentes.
— Mas não o entendo, se os tinham roubado… — parecia
desconcertado
— James, digamos que, se puséssemos uma denúncia, nunca
prosperaria. Entende? — Era o máximo que podia dizer. Tinha
chegado a um acordo com Gabriel que a proibia de dizer, para que
serviam os documentos. Tinha assegurado que, qualquer
comentário sobre isso, poria em perigo a vida dos agentes que
operavam por toda a Europa.
— Entendo, quer dizer, que detrás está o Ministério do
Interior, e o Marquês. — o olhou franzindo o cenho, mas sem dizer
nada — Está bem, entendo-o Alexandra. Se tiver conseguido o que
necessitava sua cliente, é o mais importante.
— Sim, tenho que ir, tenho que fazer muitas coisas. Só vim
para que não dedique tempo a este tema, já solucionado.
— De acordo. Muito obrigado por vir tão rápido me dizer isso.
Espero voltar a verte logo. — Observou fixamente como se
levantava e colocava as luvas.
— Claro que sim. — Ele levantou-se e se despediram, logo
saiu do escritório.

~ 105 ~
Margotte Channig

Dirigiu-se de novo a casa de Gabriel. A princípio disse que era


mais profissional se tratavam esse assunto no Ministério do
Interior, mas ele tinha sorrido sarcásticamente e tinha respondido
que não a queria ver por ali. Estava convencido de que sairia com
um trabalho. E não estava disposto a isso.
Tinha tudo preparado, só surgiu um problema com o tema do
tutor para os menores, não queria deixar o espaço em branco.
Além disso, negou-se a assinar o documento e que Alexandra o
levasse, para que o assinasse Ada.
— Não, acompanharei a sua casa e o arrumaremos ali. Além
disso, prefiro que não passe por tudo sozinha. — guardou os
documentos em uma carteira, fora de seu alcance e indicou a
porta. Ela fez beicinho, mas fez conta.
— Tinha acertado com ela ir esta tarde, mas imagino que será
melhor ir quanto antes. Está realmente mal. — suspirou olhando
pela janela do carro. Gabriel agarrou sua mão e a manteve entre
as suas, sem dizer nada.
— Como vai? — perguntou com medo à vizinha que cuidava
dela, depois de apresentar ao Gabriel. Se chegava tarde, não o
perdoaria.
— Igual. — Alexandra assentiu e dirigiu um olhar a ele para
que a seguisse. Respirou fundo antes de abrir a porta, e entraram.
Pareceu que tinha pior cor. Não parecia ficar muito tempo,
respirava mais superficialmente. Gabriel apertou a mandíbula ao
vê-la. Alexandra se sentou junto à cama e agarrou sua mão.
— Ada, escute, estamos aqui com os documentos, — abriu os
olhos com aspecto de cansada. Apesar de tudo, sorriu — poderá
assinar?

~ 106 ~
Margotte Channig

— Acredito que sim. — sussurrou.


— Está tudo preparado, só falta que nos diga a pessoa que
quer que administre o legado de seus filhos.
— Pensei-o muito. Você Alexandra. Acredito que é uma
mulher muito inteligente, e, o que é mais importante, boa pessoa.
— Eu? Não acredito. — olhou para Gabriel que devolveu o
olhar sério — Escute, tem que haver alguém entre sua família ou
amigos. O que ocorre que, agora mesmo, não se lembra. Está
segura de que quer que seja eu?
— Não quer você me fazer esse favor? Sei que possivelmente
seja pedir muito, mas tenho que estar segura de que estarão bem
cuidados, que estudarão. É muito importante que estudem, o que
eles queiram, a mim não queriam me deixar estudar matemática.
— de repente pareceu que lhe faltava o ar.
— Tranquila Ada. Farei-o, não se preocupe, ocuparei-me
deles o melhor possível, juro. Falarei com o Conde para explicar...
— Não se preocupe, já disse. Os meninos seguirão com minha
mãe, nos falamos. Está de acordo em que seja você quem
administre o dinheiro.
— Está bem, — Gabriel, apoiado em uma mesinha que havia
junto à cama, tinha aproveitado para pôr o nome da Alexandra no
espaço em branco — têm que assinar as duas então. Alexandra
você, já que está aqui, que aceita o posto. Primeiro você, Condessa.
— Colocaram o papel sobre a carteira do Gabriel, em cima de uma
almofada para que ela não tivesse que mover-se e assinou.
— Está bem a assinatura? — apressaram-se a dizer que
estava perfeita. Ela fechou os olhos, tranquila por fim. Alexandra
assinou aceitando o cargo, e Gabriel como testemunha. Assim não

~ 107 ~
Margotte Channig

haveria nenhum problema. Quando teve os documentos metidos


em sua carteira, Alexandra se aproximou dele.
— Importaria de me deixar uns minutos a sós com ela? — ele
assentiu com a cabeça, antes de sair sussurrou em seu ouvido:
— Se já não estivesse, teria me apaixonado por você nesse
instante. — Depois, saiu do quarto. Ela voltou a sentar-se junto à
cama e a agarrar sua mão.
— Ada, me escute, já vou, necessita algo mais?
— Não, — negou com a cabeça — muito obrigado por tudo,
você foi muito boa comigo. Eu gostaria de ter te conhecido antes,
acredito que tivéssemos podido ser amigas.
— É óbvio que sim. Seguro que não há nada mais do que
queira de que me encarregue?
— Não, já falei com meu marido do enterro. O doutor virá
esta tarde ficar comigo, é muito bom também. Tive muita sorte no
final. Adeus, querida, acredito que vou dormir um pouco. —
Alexandra se inclinou e a beijou na testa com lágrimas nos olhos,
entristecia-a profundamente a situação dessa mulher.
— Vou então, adeus. — Gabriel a esperava fora, agarrou-a
pelo cotovelo guiando-a até o carro, uma vez dentro, acolheu-a em
seus braços.
— Vou dizer ao chofer que vamos para minha casa, não quero
me separar de você estando tão triste.
— Não, Gabriel, preciso dormir, e contigo é impossível, —
sorriu entre lágrimas — além disso quero contar tudo a minha tia.
— Está bem, mas esta noite…

~ 108 ~
Margotte Channig

— Não! Nos veremos amanhã. Vem me buscar para dar um


passeio, nunca o fizemos. E isso me animaria. — ele respirou
fundo e assentiu.
— Está bem, não posso negar nada se estiver assim. — Ela
limpou as lágrimas e deu um beijo rápido nos lábios, logo se
sentou bem no assento.
— Terá que me ajudar, para administrar o melhor possível o
dinheiro desses meninos.
— Estou seguro de que você se basta para fazê-lo sozinha,
mas sabe que te ajudarei no que necessite.

*****

Sua tia a recebeu em seus braços quando contou todo o


ocorrido, e também chorou, emocionada, com ela. Sweets tinha
confirmado que passaria a noite na casa da doente, esperando o
desenlace.
Quando se levantou da cama, tinha tido que deitar um par de
horas devido ao cansaço que sentia, Anthony entregou para ela
uma mensagem. Era de Black.

Alexandra:
Apesar do que pensa, é imperativo que nos vejamos esta noite,
às sete estaria bem. The Clerk está fechado, mas bate na porta e te
abrirei. Tenho algo no restaurante, que fará que troque de opinião
sobre o que acredita ter descoberto.
P.S.: María e Gabriel poderiam estar em perigo, acredito que
tudo é uma armadilha.
B.

~ 109 ~
Margotte Channig

Olhou o relógio mais próximo que tinha. Eram seis e quinze,


subiu correndo as escadas para vestir-se, e agarrar sua pistola.
Essa nota não lhe dava bom presságio. Possivelmente tivessem que
ir a algum bairro perigoso. Trocou-se em dez minutos e voltou a
descer pelas escadas correndo. Deixou uma nota rápida para sua
tia, que tinha saído enquanto dormia, junto à nota de Black, para
que a visse.
A essa hora da noite, não se via absolutamente nada na
cidade, a menos que estivesse iluminada. Algumas zonas, as mais
ricas de Londres, começavam a se iluminar com luzes de gás à
noite, há alguns anos. The Clerk estava em uma zona de
comércios, que, a essa hora estava fechada, encontrava-se
totalmente escura. Somente passavam carruagens pela rua, mas
não havia ninguém nas calçadas. Disse ao condutor do carro de
sua tia que a esperasse. O homem assentiu, ficando a vontade no
assento.
Bateu na porta principal, que se abriu devagar com seu
golpe. Esteve a ponto de não passar, mas viu uma luz no fundo,
onde estava situada ao bar. Ali estava acostumado a estar Black,
de pé, vigiando aos clientes como um falcão. Virou-se porque
escutou algo estranho atrás dela, mas já era tarde, alguém, a
agarrou pela cintura e lhe pôs um trapo molhado na boca.
Esperneou e gritou, mas ninguém escutou seus gritos. Foi ficando
sem forças, até que, caiu em um sono involuntário. O homem que
a tinha drogado, agarrou-a em seus braços para tirá-la pela porta
traseira. Aí esperava um carro que os levaria onde ninguém a
encontraria.

******

~ 110 ~
Margotte Channig

O Marquês de Bute bateu na porta, mas não abriram.


Curiosamente, voltou a chamar. O mordomo abriu a porta e o
olhou o reconhecendo, parecia afetado por algo.
— Bom dia, vim buscar à senhorita Wallace. — Escutou um
gemido na sala de jantar. Gabriel não esperou mais, apesar do
mordomo, que tentou reter sua entrada, dirigiu-se para lá.
A tia da Alexandra chorava nos braços do doutor Sweets.
Aproximou-se deles realmente assustado, pela primeira vez em sua
vida.
— O que ocorre?
— Gabriel! — a anciã se levantou andando para ele — por
favor, nos ajude, aconteceu algo, sei! Minha menina não passaria a
noite fora, sem me mandar uma nota. — ele empalideceu ao
escutá-la, sabia que tinha razão. Tinha visto, de primeira mão, sua
preocupação por manter informada, sempre, a sua tia de seus
passos, para que não se preocupasse.
— O que aconteceu? — Sweets aproveitou para fazer duas
coisas, tirar a Margaret de cima e dar duas notas para ele. A que
tinha mandado Black a ela, e a que tinha deixado a sua tia,
dizendo que voltaria em um momento e jantariam juntas.
— Fizeram algo? — Sweets negou com a cabeça.
— Acabamos de nos dar conta de que não está em seu
quarto, faz uma meia hora. Só agora me avisaram. Íamos à polícia.
— Eu me encarrego. Necessito as notas.
— É óbvio. — Assentiu o homem, Margaret se separou dele e
se aproximou de Gabriel.

~ 111 ~
Margotte Channig

— Por favor, traga ela de volta para casa, não deixe que lhe
aconteça nada. Sei que aconteceu algo, sei. — Voltou a chorar, e
Sweets a abraçá-la.
Gabriel lhe pôs uma mão no ombro. — Trarei-a de volta
Margaret.
Sua cara quando saiu da casa, era uma promessa de
vingança e de horror para quem quer que tivesse feito algo a
Alexandra.
Não descansaria até tê-la a salvo, e, depois, não permitiria
que desaparecesse de sua vista.

~ 112 ~
Margotte Channig

Capítulo 9

A luz e o frio que entravam pela minúscula janela, a


despertaram. Tentou sentar-se, mas não pôde fazê-lo, já que tinha
as mãos e os pés atados. Arrastando-se, conseguiu apoiar-se na
parede para sentar-se devagar, a cabeça parecia que ia explodir.
Era como se tivesse um sino dentro, dando as horas
continuamente. Inspirou profundamente o que ocasionou ânsias,
então, como pôde, inclinou-se para o lugar a sua direita, e
vomitou. Era um efeito da droga que a tinham feito respirar,
clorofórmio certamente. Observou a seu redor, tentando não
deixar-se levar pelo pânico, apesar de que, o que mais gostaria de
fazer, seria gritar e dar chutes na porta, que estava fechada com
chave. A habitação parecia um calabouço, embora imaginou que
era um porão em alguma casa isolada, já que não se ouvia ruído
de carros passando, nem de pessoas. Era possível que estivesse no
campo. Devia ter amanhecido fazia muito, sua tia estaria histérica,
e Gabriel iria procurá-la para seu primeiro passeio… Se negou a
seguir pensando em tudo isso. Olhou de novo a habitação, havia
uma mesa que parecia a ponto de partir-se em duas, sem nada em
cima, uma cadeira, e que ela visse, nada mais. A janela era

~ 113 ~
Margotte Channig

pequena, e com grades, sua única esperança era a porta.


Desgraçadamente tinham tirado sua bolsa, onde levava a pistola.
Olhou seus pés, não tinham tirado as botas de cano longo,
felizmente. Dentro levava uma navalha, sempre levava uma em um
de seus sapatos, embora quase ninguém sabia. Deixou-a aí de
momento. Escutou um ruído na porta. Um homem com um lenço
tampando a maior parte do rosto menos os olhos, abriu e ficou na
soleira. Levava uma bandeja.
— Eu vou me aproximar agora, se você fizer algo tolo, meu
parceiro vai atirar em você com sua própria arma. Não seria
engraçado? Não nos interessa matá-la, mas sempre a podemos
disparar em uma perna. — ela empalideceu.
— Está bem, não me moverei. — permaneceu sentada
observando. O homem depositou a bandeja na mesa. Havia uma
jarra de água com um copo, e o necessário para escrever.
— Nos disseram que poderia ter mau gosto na boca pelo
clorofórmio, note nossa consideração. — o homem que a apontava,
situado depois do que falava, riu a gargalhadas. — Bem, agora,
vamos soltar você um momento para que possa escrever, — ela o
deixou fazer sem opor resistência, de momento não podia fazer
nada mais — nos tinham avisado que, possivelmente, daria-nos
muita trabalho, mas você é uma cordeirinha.
Ela não respondeu, só se fixava em todos os detalhes físicos
dos dois delinquentes, os que podia ver. Uma vez que a soltaram,
quase caiu ao levantar, já que tinha os músculos duros. Mordeu
os lábios e andou para a cadeira, logo se deixou cair nela. Deram
uma pluma na mão e uma folha de papel diante.
— Escreva:

~ 114 ~
Margotte Channig

“Querido Gabriel:
Se não entregar os documentos aos homens que me
sequestraram, eles vão me matar esta noite. Espera outra nota como
esta, eles vão dizer onde entregá-los...”

O sequestrador lia uma nota que levava na mão, mas deixou


de fazê-lo, quando viu que ela não escrevia. Bateu forte nas costas
dela, que fez com que ela se inclinasse para frente e, seu queixo se
chocasse contra a mesa, mordendo os lábios por dentro.
— Escreva!
— Não o farei. — sussurrou com o sangue enchendo a boca.
Não seria a responsável pela morte de ninguém. Não acreditava
que Gabriel trocasse os documentos por ela, mas preferia não o
pôr nessa situação. Sentiu-se levantada da cadeira, e logo, levou
um murro no queixo. Enjoou-se pela dor, o impacto a lançou a
certa distância, e a deixou aturdida. Mas pôde escutar a
conversação entre eles, enquanto aparentava estar desmaiada.
— Está louco? O chefe disse que não a tocasse! E sabe como
é quando se zanga, eu não gostaria de estar em suas calças! Se dê
por morto. — foram se indo para a saída.
— O que acreditou o Sombra? Queremos destruir o sistema,
não podemos andar com delicadezas. Talvez teremos que matá-la e
mandá-la em partes a seu amiguinho. — depois, fecharam a porta
e escutou as pisadas afastando-se. Escutou com atenção, não
pareceu que subissem escadas, simplesmente tinham passado a
uma habitação ao lado. Seu olhar foi para o copo que havia na
mesa, esvaziou-o de água e se dirigiu à porta onde o colocou para
ouvir o que diziam. A princípio não escutava nada, mas trocando
de lugar, conseguiu entender parte da conversa.

~ 115 ~
Margotte Channig

— É melhor que eu vá e o conte. Já sabe que disse que, se


passava algo, não tentássemos solucioná-lo nós e que o
disséssemos, ele tinha que ficar vigiando. Você fica aqui e não
volte a entrar lá. Entendeu?
— Sim, claro, não voltarei a tocar a dona melindrosa, não se
preocupe.
— E não beba, só faltava que ele venha e esteja bêbado.
— Certo, não seja difícil.
— Recorda o que nos disse. Se algo acontece com ela, ele
cobrará em nossas peles.
— Que difícil, vá agora!
Alexandra olhava tudo a seu redor, desesperada, para ver se
não havia nada que pudesse utilizar para escapar. Não podia sair
sem que a vissem. Pela janela era impossível. Mesmo sem barras,
não passaria pelo vão. Só ocorria a ela, fazê-lo entrar de novo com
alguma desculpa, e o surpreender. Teria uma oportunidade, além
disso não sabia se demoraria o outro em voltar, tinha que
apressar-se. Tirou a navalha e a olhou duvidando. Não sabia se
teria coragem para fazê-lo. Antes de pensar se deu um bom corte
no lóbulo da orelha, cortou-se uma vez quando era pequena, e
aquilo era um fornecedor de sangue. Esperou uns momentos, e
pôs sua mão debaixo para, logo, esfregar pela cara. Realizou a
operação um par de vezes mais, logo se aproximou da porta
pedindo socorro. Deu vários golpes nela com todas suas forças
como se estivesse aterrada, enquanto, mantinha a navalha em sua
mão, tentando que não escorregasse. Tinha tanto medo que o
coração parecia querer sair pela boca.

~ 116 ~
Margotte Channig

— O que acoteceu agora? — quando abriu deixou que visse o


seu rosto com sangue, logo se inclinou como se lhe doesse o
ventre.
— Dói-me muito, estou morrendo. — o homem se aproximou
preocupado, certamente pensando na ameaça que o tinha
recordado seu companheiro.
— Mas por que sangra tanto? Eu não bati tão forte assim… —
se aproximou instintivamente e pôs sua mão na cabeça para
levantá-la. Alexandra se deixou elevar, mas, ao mesmo tempo,
cravou a navalha como pôde, no ventre. O homem colocou as mãos
sobre a ferida olhando-a com ódio, mas ela já saía pela porta como
podia, e a fechava com a chave que ele tinha deixado na
fechadura. Saiu do edifício andando com dificuldade. Não estavam
no campo, como tinha pensado, só em um beco em um favela de
Londres, onde ninguém se metia na vida dos outros. Olhou para
todos os lados para ver se via um policial, mas não encontrou
nenhum. Passaram dois carros de aluguel e os chamou, mas não
pararam ao ver seu aspecto. Devia dar medo. Rasgou uma parte
da anágua, e com sua própria saliva, sem parar de andar, limpou
como pôde o sangue de seu rosto. Voltou a tentá-lo com o seguinte
carro, quase soluçou de alívio ao ver que o condutor freava e a
deixava subir. Deu a direção de sua tia, assustada de que
voltassem a agarrá-la, mas não havia ninguém perseguindo-a.
Quando chegou, pediu que esperasse, e, ao abrir a porta, disse ao
Anthony que o pagasse. A cara deste era um poema. Seguiu até o
salão onde imaginou que estava sua tia. Efetivamente, ali estava
junto com Sweets, também Gabriel e Black, com os dois olhos
roxos. Gabriel empalideceu ao vê-la, ela, ao os ver todos, de

~ 117 ~
Margotte Channig

repente, sentiu-se incapaz de seguir sem chorar. Explodiu


chorando na frente de todos, tampando o rosto com as mãos.
Gabriel a abraçou contra ele, enquanto sua tia se aproximava o
mais depressa que podia.
— Filha, Por Deus! O que aconteceu no seu rosto? Sweets,
por favor! — não podia falar e tranquilizá-los, só podia chorar
como uma menina pequena. Gabriel a separou um pouco, a contra
gosto, para que o doutor visse a ferida.
— É um corte no lóbulo, o desinfetaremos e já ficara boa,
mas acredito que é melhor que tome um bom banho primeiro. Se
tranquilizará, — farejou o cabelo de Alexandra — clorofórmio,
drogaram ela.
Gabriel não pôde resistir por mais e voltou a abraçá-la. Black
se aproximou, Gabriel o olhou, com aspecto de que iria o
assassinar se dizia algo indevido.
— Alexandra, vou, virei mais tarde para vê-la, ou
possivelmente amanhã. Me alegro de que esteja bem. — ela
assentiu, sem deixar de chorar abraçada ao Gabriel.
— Gabriel, por favor, leve-a a seu quarto, darei um bom
banho nela. — sua tia revoava a seu redor muito nervosa. Isso
fazia que Alexandra chorasse com mais força.
— Margaret, possivelmente seja melhor que você não suba. —
olhou para Sweets quem se fez cargo da situação.
— Querida deixa que suba com Gabriel e a deixe nas mãos da
criada, você está muito nervosa. Quero que termine a infusão que
estava tomando. — agarrou pela cintura para levá-la de novo ao
sofá, ela assentiu com um murmúrio limpando os olhos com um
lenço.

~ 118 ~
Margotte Channig

Alexandra tinha tremores, como se estivesse gelada. Gabriel


olhou significativamente ao médico, Sweets assentiu para que a
levasse tranquila. Agarrou-a em seus braços, e a subiu ao piso de
cima seguida pelo mordomo, quem indicou seu quarto.
— Senhor, enviarei à donzela agora mesmo.
— Não! Anthony, por favor, deixe que o Gabriel fique comigo.
Não diga nada a minha tia. — o mordomo franziu o cenho,
claramente contra a pedido, até que ela se separou o suficiente
para que pudesse ver seu rosto.
Assentiu consternado pelo que tinham feito com ela.
— Não se preocupe senhorita Alexandra, não os incomodarão.
Agora subirão água para o banho.
Entrou no quarto com sua mulher em seus braços. Deixou-a
sentada na cama e acendeu o fogo. Estava realmente assustada. E
tinha um golpe tremendo no queixo. Quando pegasse quem o tinha
feito, não voltaria a pegar outra mulher em sua vida. O olho
palpitava, tinha dado um bom murro no Black pensando que tinha
algo a ver no desaparecimento da Alexandra, e como resposta o
outro homem o havia devolvido. Depois disso, quando disse porque
o batia e viu sua cara de surpresa, soube que ele não tinha
mandado a nota. Era muito áspero, e Black era inteligente. O que
fez que, ainda, ficasse mais nervoso ao não saber como
recuperaria Alexandra.
Se agachou na frente dela.
— Onde guarda sua bata? — assinalou seu armário, tirou-a
dali, e a deixou sobre a cama.
— Vamos ao banheiro e a ajudo a se despir? — ela negou com
a cabeça.

~ 119 ~
Margotte Channig

— Irei sozinha, não se preocupe, estou bem. — sussurrou.


Enquanto ela esteve se trocando, dois criados trouxeram a
banheira, e as donzelas entraram e saíram várias vezes, com os
baldes, até enchê-la. Deixaram fora uma de água quente e outro
fria. Assim como o sabão e a esponja. Era estranho que ainda não
tivesse saído. Bateu na porta e a escutou soluçar baixinho. Entrou
sem avisar, estava, já com a bata colocada, sentada no chão,
apoiada contra a parede.
— Carinho! Levanta — a ajudou, e a acompanhou à banheira
— vem, tire a bata, será bom para você se banhar, você verá.
Deu-lhe banho como faria com uma criança. Ao final do
banho, tinha deixado de soluçar, embora estava muito calada. Não
parecia ela. Secou, com cuidado, a orelha. Ao se molhar havia
tornado a sangrar, pôs a camisola e a bata. Ela não quis deitar na
cama até que não deixasse de sangrar o lóbulo, tinha pego uma
toalha que apertava contra sua orelha. Não quis discutir com ela,
assim pediu que avisassem ao Sweets e a sua tia.
Margaret se aproximou sorrindo, fazendo das tripas coração.
Via-se de onde vinha a ascendência de Alexandra. Sentou-se com
ela na cama. Enquanto, o doutor passava uma pomada no lóbulo,
que por fim, cortou a hemorragia.
— Filha, como se encontra? — Alexandra respirou fundo
como vinha fazendo desde alguns minutos, para deixar de chorar.
O banho, e estar uns minutos a sós com o Gabriel, a tinham
tranquilizado um pouco. Tinha contado o ocorrido entre beijos e
carícias por parte dele. Mas não sabia se, alguma vez, tiraria o
medo do seu corpo.

~ 120 ~
Margotte Channig

— Estou melhor, tia, de verdade. — sua tia a abraçou dando


um beijo na bochecha. Devolveu o abraço. Tinha acreditado que
não voltaria a vê-los novamente. Por cima da cabeça de sua tia,
Gabriel a olhava fixamente, um pouco afastado da cama.
— Acredita que poderá dormir sozinha? Se não, posso dar um
remédio para que fique calma.
— Não precisa Robert, muito obrigada.
— Eu ficarei aqui contigo. — sua tia parecia decidida, mas
Alexandra observou a cara de cansaço que tinha.
— Tia, quero que se deite, além disso, terei que fazer uma
declaração. Possivelmente poderia chamar o James. Estou segura
que viria.
— Não é necessário. Tenho autoridade para recolher eu a
declaração, em ausência de um policial, se fosse necessário. Mas
prefiro que seja amanhã, se tiver com forças, vamos ao Ministério.
Avisei ao George Grey, nos espera a primeira hora, se você estiver
bem. Assim, com todos os detalhes que dê, darão instruções às
delegacias de polícia.
— Já ouvi esse nome. — Margaret olhou para Sweets sem
ideia, este olhava para Gabriel assombrado, mas respondeu à
mulher.
— É o Ministro do Interior. — Alexandra assentiu olhando
Gabriel.
— Sim, não se preocupe, iremos. — Sweets e Margaret
observaram como se olhavam, sua tia, embora desejava ficar, foi
consciente de que tinham que falar. Aproximou-se de Alexandra
para lhe dar um beijo.

~ 121 ~
Margotte Channig

— Querida se quiser, logo direi que subam uma bandeja com


o jantar.
— Já veremos tia. Agora mesmo não tenho fome.
Saíram os dois anciões, fechando a porta com cuidado atrás
deles.
Gabriel ficou um longo momento em silêncio olhando-a
fixamente. Alexandra estava sentindo esse olhar desde que se
sentou na cama, depois de dar banho nela. Sentia-se inquieta. De
repente, moveu-se para ela. Olhou-o, não sabia o que ocorria.
— Gabriel o que foi? — ficou ao pé da cama, e sorriu
ironicamente ao escutá-la.
— Não imagina o que me passa? — aproximou-se sentando-
se na cama a seu lado. Não a tocou, ela se sentia tão vulnerável,
que teve vontades de ir-se dali e não estar a sós com ele.
— Não, por favor, não posso discutir hoje. — a abraçou,
trazendo-a para seu corpo devagar. Beijou sua têmpora com
doçura. Estava tremendo, ela franziu o cenho ao notá-lo.
— Ainda não posso acreditar no que aconteceu. Quando sua
tia me mostrou a nota de Black, fui até ele, quase o matei. Mas ele
não enviou o bilhete.
— Sei, descobri em seguida. — não se importaria em ficar
entre seus braços, para sempre.
— Não imagina as horas que passei sem saber o que havia
ocorrido, nem onde estava.
— Sinto muito.
— Não vou passar por isso nunca mais, me entende? —
separou-se como pôde, para o olhar assustada. Certamente, por

~ 122 ~
Margotte Channig

fim, tinha conseguido afastá-lo, embora nesta ocasião tinha sido


de maneira involuntária.
— Casaremo-nos assim que esteja recuperada. Dá-me igual o
que diga, ou que queira ser independente. — Se manteve
convenientemente calada. Mas isso não era suficiente para ele.
Não depois do ocorrido. — Não vai me responder? Talvez não seja
uma proposta matrimonial habitual, mas eu gostaria que me desse
uma resposta.
— Sim, sim a tudo. Quando pensava que não voltaria a ver
você, dei-me conta do que realmente era importante. — Se separou
um pouco para que visse seu rosto — Quero você Gabriel, já lhe
havia dito isso, mas quero que o recorde sempre. — engoliu um
soluço que subia, raivoso, para sua boca — O mais duro ao saber
que morreria, foi pensar que não soubesse.
— Não diga isso. — a beijou com cuidado pelo arroxeado de
seu queixo, e permaneceram abraçados um longo momento.

*****

O "Sombra" estremeceu quando viu o homem esfaqueado no


chão. Ele ainda estava respirando, se virou e encarou aquele que
veio buscá-lo. Felizmente, nenhum desses dois gastadores sabia
quem ele era. Antes de entrar na sala ele sabia que ela não estava,
é claro. Ele a conhecia bem. Ela era destemida e muito inteligente.
Que mulher, ele franziu a testa ao ver o sangue.
— E este sangue? — começou a ver tudo vermelho.
— Não sei, ele a pegou, mas não acreditava que tivesse
sangrado tanto… — Sombra se voltou empunhando o revólver que

~ 123 ~
Margotte Channig

levava sempre — Sombra! Não faça isso, disse que não o fizesse,
mas não me fez conta!
— Eu disse que não podiam tocar nem um fio de cabelo dela,
não é certo? Acreditei que minhas instruções tinham ficado claras.
— não deixou que desse nenhuma explicação, descarregou dois
tiros no corpo de seu ajudante, com uma careta de desgosto. Fazia
muito tempo que tinha decidido, que ninguém o pararia, para
conseguir seus objetivos. Disparou também no que seguia,
desacordado no chão, com a navalha no ventre, e logo, pegou a
navalha como lembrança. Saiu à rua andando normalmente.

*****

Esperavam à porta do Ministério. Gabriel era saudado por


todos os homens que encontravam no caminho. O próprio Sir
George Grey, um homem de 1,60 aproximadamente, muito magro
e extremamente elegante, saiu para os receber. Alexandra, ao ver
sua relação se deu conta de que eram amigos, não chefe e
empregado como tinha pensado. O fez entrar e se sentaram
tranquilamente. Ela não entendia o que fazia ali, em lugar de estar
na delegacia de polícia com James.
— É um grande prazer conhecê-la finalmente senhorita
Wallace, Gabriel me contou o que tem feito pela Condessa de
Lovelace. Um caso muito desafortunado, no que estávamos
cometendo uma grande injustiça. Acredito que tudo se resolveu
favoravelmente. Não é assim? — ela assentiu. — E como está ela?
— Morreu ontem à noite. — Tinha chegado uma nota de
Sweets essa manhã. Era triste, mas esperado. Agora teria que
cuidar do patrimônio desses meninos.

~ 124 ~
Margotte Channig

— Sinto-o muitíssimo, uma pessoa tão jovem, — balançou a


cabeça com tristeza — eram vocês muito amigas?
— Não, — olhou para Gabriel porque não sabia o que ele teria
contado — acabei de conhecê-la, apresentaram-me isso para que
me ocupasse de seu… “problema”.
— Sim, ouvi que você é muito boa em seu trabalho,
possivelmente gostaria de trabalhar para mim? Necessito mulheres
com sua inteligência e arrojo.
— Não pode trabalhar para você, já aceitou um trabalho em
tempo integral comigo. Vamos nos casar. — ela virou a cabeça
para Gabriel surpreendida. Não tinham comentado com ninguém,
ainda. Mas como fazia desde que voltou de seu muito curto
sequestro, manteve a boca fechada. Tinha descoberto que estava
acostumado a sair beneficiada.
— Parabéns então! Gabriel, me alegro muito por você! — de
novo apertaram as mãos — Imagino que estará cansada
Alexandra. Se me permitir que a chame assim. E dolorida. —
observou o golpe no rosto.
— Sim, um pouco.
— Bem, pois me conte o ocorrido ontem, com todo detalhe. —
ela o fez, incluindo uma descrição dos dois sequestradores.
Quando terminou, os dois homens se olharam durante uns
segundos, por fim, Sir George olhou para Gabriel e lhe perguntou:
— O que parece para você? — Gabriel franziu o cenho e
pensou durante uns instantes.
— Poderia ser, me chama muito a atenção que tivessem
instruções de não fazê-la dano. A falsificação da letra de Black era

~ 125 ~
Margotte Channig

boa. — encolheu de ombros — Sim, poderia ser. E logo, querer


obrigá-la a escrever aquela carta, sim, acredito que é ele.
— Tenho uma curiosidade. — o Ministro a olhou fixamente —
Por que se negou a escrever a carta?
— Estava segura de que me matariam de toda maneiras.
Tinha que tentar, pelo menos, que não fizessem mal ao Gabriel. —
Grey sorriu ao olhar para Gabriel, que permanecia calado com a
mandíbula encaixada como um bulldog.
— Está bem. Se quiser, organizarei que logo passem por sua
casa para redigir a denúncia e que a firme.
— De quem estão falando? — de novo, aquelas olhadas entre
eles — Estou sentindo, que não querem falar na minha frente.
Entendo, que tem algum suspeito em mente. — Olhou para
Gabriel significativamente. Mas foi o Ministro quem falou.
— Sim, temos alguém. Acreditamos que é um homem que
estamos atrás há anos. Gabriel, especialmente. É por isso, que ele
não se retirou. Ele é o maior criminoso da Inglaterra, mas não é
um criminoso comum. O que ele quer é o caos no país. Ele nos
odeia ou odeia nosso modo de vida, eu não sei. Não sabemos quase
nada sobre ele. Apenas um nome. E vários assassinatos
cometidos, além de todos os tipos de crimes. É responsável por
vários ataques. Em suma, sabemos apenas um nome, uma lenda,
um sussurro do submundo, é o mais temido criminoso de nosso
tempo.
— Como se chama?
— “Sombra”.
— Nunca ouvi falar dele. — estava intrigada.

~ 126 ~
Margotte Channig

— É óbvio querida, nem o escutará. Graças ao Gabriel,


conseguimos parar a maior parte dos golpes deste sujeito, mas é
muito escorregadio. E inteligente. Não podemos contar muito mais,
e o que hei dito, peço que você não comente fora daqui.
— É óbvio, nunca o faria. E por isso, queria as notas da Ada?
— Sim, se descobrisse as chaves que usa nossa rede de
espiões, não é exagerado dizer que desestabilizaria o país. É muito
importante que o detenhamos, — suspirou — mas esse é outro
tema. Deixo-a, para que possa ir a sua casa descansar.
Gabriel agarrou seu cotovelo e franziu o cenho ao observar as
olheiras que tinha. Ele por deferência a sua tia, ficou em uma
cadeira, até o amanhecer. Então, rogou que a abraçasse, porque
tinha muitos pesadelos. Assim dormiram um par de horas. Mas
não tinha descansado suficiente, não depois de todo o ocorrido no
dia anterior.
Saíram dali e subiram a sua carruagem. A seguinte parada: a
joalheria para escolher o anel de compromisso, logo Alexandra
podia dormir o quanto quisesse.

~ 127 ~
Margotte Channig

Capítulo 10

— Black — levantou o olhar do livro de contabilidade do


restaurante, e olhou para o seu estranho porteiro. Sabiam que, a
essas horas, não o deviam incomodar. Estavam fechados ainda,
assim não podia ser um problema com algum cliente. Seu
empregado ficou de lado, para que pudesse ver quem estava atrás
dele. Gabriel Damsworth. Levantou-se como uma mola. Assentiu
para que os deixassem sozinhos, o fez entrar e fechou a porta.
— Sente-se, se quiser Damsworth, gostaria de tomar algo? —
os prós e contras do The Clerk eram como os de outro negócio
qualquer, do mais normal. Todo o luxo estava reservado à parte
que viam os clientes. Voltou para seu assento, frente a sua visita,
impressionado de o ver por ali.
— Não, muito obrigado. — Se sentou, observando o espartano
escritório.
— Nunca esperei que viesse para me ver em minha casa. —
observou o hematoma do olho do Marquês com satisfação. Estava
se curando, mas devia doer, como o seu.
— Por favor, já que tivemos uma pequena briga, penso que
seria ridículo se continuássemos falando sobre você. Além disso,

~ 128 ~
Margotte Channig

você sabe que nunca tive nada a ver com María. Alexandra insiste
em que, pelo menos nos conheçamos melhor, diz que nos
entenderíamos bem. — torceu o gesto em uma careta.
— Que sorte teve com essa mulher! Como está?
— Melhor, tem duas costelas quebradas, disse o médico
ontem, e não deve fazer esforços. Queria vir, mas tem que se
mover o mínimo possível.
— Me alegro. Estive perguntando por aí, tenho boas fontes de
informação.
— Sim, sei. Se se inteirar de algo…
— É óbvio, não tem nem que dizê-lo. Não quero que aconteça
nada a Alexandra.
— Em realidade vim por outra razão. — Black o olhou
arqueando as sobrancelhas.
— Tenho uma carta para você, de María. Está fora do país,
em uma missão. — Ele estendeu um envelope selado com o nome
de Black. O pegou, mas não fez nenhum movimento para abri-lo.
Gabriel suspirou ao vê-lo. Faria um esforço por se dar bem com
ele, tal e como o tinha prometido a Alexandra. — O que sabe da
vida da María na Rússia? — Black franziu o cenho, não esperava
essa pergunta.
— Não muito, que seu pai era professor na Universidade. Sua
mãe morreu faz muitos anos, e não tinha mais família, exceto
alguma prima. Acredito recordar.
— Sim, basicamente, tudo é verdade. Quando veio aqui, foi
convidada por uma antiga companheira de colégio, que tinha
casado com um britânico. Esteve de visita uns meses. Ia voltar
para São Petersburgo, quando chegou uma carta de sua prima,

~ 129 ~
Margotte Channig

dizendo que tinham detido o seu pai. E que não voltasse, porque
estavam procurando ela, apesar de que não tinha nada a ver com
o assunto. — Black ficou pálido ao escutá-lo, inclinou-se para
frente no assento, como se com isso pudesse inteirar-se melhor, ou
mais rápido da informação. Gabriel o olhou e seguiu falando.
— O pai era um idealista. Pelo visto, em suas classes da
universidade, começou a falar contra o regime czarista5. Não sei o
que passava pela cabeça dele, mas acabou encarcerado. Uns
meses depois se suicidou no cárcere. Pelo menos, essa é a versão
oficial. É possível que houvesse jogo sujo. María não acredita que
seu pai se suicidaria. Contou algo de tudo isto em algum
momento?
— Não — respondeu com secura — nem sequer sabia que
havia morrido seu pai.
— Sim, o encarceramento foi o principal motivo para que
começasse a trabalhar para o ministério. Ofereceram para ela um
acordo mediante o qual, em troca de conseguir os papéis da
Senhora King, a Inglaterra negociaria com o governo russo para
que soltassem seu pai. É óbvio, não devia dizer nada a ninguém.
Por isso, quando o conheceu, já trabalhava para a Inglaterra, mas
não pôde contar nada para você. Desgraçadamente não chegamos
a tempo. Quando conseguiu as notas, por meios diplomáticos se
chegou a um acordo com a Rússia, para um intercâmbio de
prisioneiros. Mas já era tarde para seu pai. Tudo isto ocorreu
quando eu estava fora, na guerra. Quando o professor morreu,
pensou deixá-lo, mas finalmente, decidiu continuar. Acredito que
considera que é uma maneira de lutar, na medida de suas

5Czarismo foi um sistema político que imperou na Rússia desde 1547 até a revolução de
1917. Czar era o título que se dava ao Imperador Russo.

~ 130 ~
Margotte Channig

possibilidades, contra o regime que encarcerou o seu pai. De fato,


sua única petição, é que, dentro do possível, enviem-na sempre a
missões contra a Rússia. Estou contando muitas coisas Black,
mas aprecio María e estou preocupado por ela.
— Por quê? Eu diria que é bastante autossuficiente. —
respondeu com secura.
— Não é assim. Ontem a vi quando me trouxe a carta, estava
muito pálida, e mais magra, como se não comesse nem
descansasse o suficiente. E não tem ninguém que cuide dela. — o
olhou com simpatia, sabia o que era não poder acreditar que a
mulher a que se quer, não deixasse tudo para estar contigo.
— Onde está agora?
— Fora do país. Ajudando a uma compatriota a vir a
Inglaterra, outra mulher muito valente que está em perigo.
— Sim. — respondeu secamente. Quer dizer que
indiretamente também María estava em um grande perigo.
— Só queria dizer a verdade, porque ela não o fará, para não
o pôr em perigo. Acredito que o quer muito, — se levantou para
partir, olhou um momento antes de sair — por experiência própria,
asseguro que não vale a pena ter orgulho, se em troca deixa
escapar à mulher de sua vida. Adeus Black. — saiu sem dizer
nada mais.
Black esperou uns instantes e logo abriu o envelope.

Querido Black:
Sei que está muito zangado comigo, e que, pelas circunstâncias
de sua vida, que o têm feito ser como é, não me perdoará. Não posso
me desculpar de maneira nenhuma, para diminuir minha culpa em
tudo. Tem razão. Faz tempo tomei uma decisão. Não contei a

~ 131 ~
Margotte Channig

verdade das coisas que me estavam ocorrendo. Decidi viver duas


vidas, uma, a de meu trabalho oculto, desagradável, duro e, muitas
vezes, sim, não nego, perigoso, e minha vida contigo, onde somente
era uma mulher tremendamente apaixonada. Porque só há uma
coisa que não consinto que duvide, que estive e estou apaixonada
por você. Se esse amor é o bastante para que o nosso
relacionamento durasse? Não sei, sinceramente. É possível que
simplesmente, haver ocultado coisas de ti, já seja suficiente
resposta para você.
Meu pai morreu alguns meses depois que começamos a ser
amantes, você estava viajando quando descobri. Você não vai se
lembrar. Ao voltar, disse-me que tinha má cara, e te disse que
estava constipada. Estava tão triste, eu gostaria tanto que se
tivessem conhecido…mas a vida é assim. Apressei meus momentos
contigo pensando, sempre, que poderia ser o último. Assim o senti
no outro dia, quando descobri que estava em meu quarto.
Me perdoe, por não o ter estimado como você necessitava.
Quero-o e peço que seja feliz. Sei que há algo dentro de você que não
o deixa sê-lo, mas com a mulher adequada, conseguirá.
Desgraçadamente, eu não sou essa mulher.
Só tenho um pedido para Deus. Todas as noites rezo para que
seja feliz.
Adeus, meu amor.
María

Black baixou a carta e a deixou na escrivaninha com a mão


tremente, logo, fechou os olhos e se reclinou na cadeira, com uma
expressão de dor no rosto.

~ 132 ~
Margotte Channig

******

O casal estava coberto, incluindo suas cabeças, pelos lençóis.


Havia apenas o som ocasional de um riso do homem que parecia
gostar de agradar a mulher. Eles fizeram amor por um longo
tempo, e por causa de sua idade, a recuperação não era fácil,
então eles se divertiram na cama como duas crianças pequenas.
Por fim, ele bateu as roupas de cama várias vezes, afastando-as da
cabeça.
— Por Deus Margaret! Vamos sufocar! — ela ria a
gargalhadas, parecia uma menina, sobre tudo quando ria como
agora. Quando tinha proposto hoje ir a um hotel, surpreendeu-o
ao aceitar. Tinha perguntado centenas de vezes, ao longo dos anos,
desde que haviam se reencontrado. Mas hoje havia dito que sim.
Deitou de lado para seguir olhando-a. Não queria deixar de fazê-lo.
Nunca. Mas era difícil descansar.
— O que olha Robert? — olhou-a com seu cabelo quase todo
branco, ondulado, solto e seu rosto com suas amadas rugas.
— E o que vou olhar? Você, olho você, à mulher mais formosa
que vi em minha vida.
— Que exagerado é! Nunca fui especialmente bonita, e você
sabe, mas agradeço o elogio, — olhou ele. Ainda mantinha esse
mistério no olhar, que o tinha apaixonado quando era uma
jovenzinha — é encantador Robert. E temo que não o tratei
especialmente bem. Mas sim que o quis. Sabe — ele assentiu sem
dizer nada — quando voltou minha menina ontem, recordei o
rápido que pode desaparecer uma pessoa de sua vida. E não quero
que você vá da minha — a abraçou contra seu corpo ao ver seus
cílios úmidos. Decidiu fazer a pergunta. De novo.

~ 133 ~
Margotte Channig

— Está bem, voltarei a perguntar isso. Quer se casar comigo?


— ela franziu o cenho como se não esperasse a dita pergunta, e o
olhou nos olhos durante uns segundos, logo sorriu. O coração do
Robert saltou um par de batimentos.
— Sim, o farei, maldito seja. — respondeu com uma
gargalhada, logo a apertou contra ele quase sem deixá-la respirar,
e a beijou na boca, até que ela se separou meio asfixiada. — Sabe
cavalheiro! Que já não temos 15 anos. — riu encantada.
— Por isso, temos muitos anos para recuperar. — Voltou a
beijá-la, esta vez ela não se separou. Acariciou seu cabelo grisalho,
com a mesma paixão que o fazia quando eram adolescentes.
Durante um longo momento, não voltaram a pronunciar nenhuma
palavra.

******

Anthony entrou no salão para anunciar a visita.


— O inspetor James Brown. — James em sua casa!
Emocionou-se ao vê-lo. Fez um gesto para que se aproximasse e se
levantou, para dar um beijo.
— Não se levante, por favor Alexandra. — a abraçou com
cuidado contra ele. Tinha cara de preocupação. Logo a separou —
Sente-se por favor.
— Só se você o fizer também. Por cinco minutos não cruzou
com Gabriel — disse maliciosa.
— Que lástima! — Sorriu seguindo a brincadeira. — Como
está de verdade Alexandra?
— Bem, o hematoma do queixo é escandaloso, mas já quase
não me dói. Só tenho uma ferida pequena no lóbulo, — mostrou a

~ 134 ~
Margotte Channig

orelha — e me doem um pouco as costelas, bom, e os restos do


susto, claro.
— Não sabe quanto o sinto.
— Sei. Não se preocupe. Tenho que repensar a minha vida.
Tudo isto tem feito com que pense, sobre o que de verdade é
importante.
— Entendo-o.
— Imagino que se inteirou pelo comunicado.
— Sim, me chamou a atenção que diretamente tenha ido ao
Ministro do Interior, sendo você e eu amigos. Mas imagino quem a
fez ir ali. Eu teria feito o mesmo.
— Obrigada por ser tão pormenorizado. Queria falar contigo
primeiro, mas Gabriel insistiu. — encolheu os ombros — Como vai
tudo?
— Como sempre, agora com um trabalho acrescentado. O
primeiro trabalho de todos os policiais de Londres é localizar e
deter esse malfeitor, “Sombra”, seguindo instruções do Ministro.
Deteremo-o Alexandra, asseguro isso. — apertou uma das mãos
para transmitir seu carinho.
— Não tenho nenhuma dúvida. — sorriu olhando a seu
amigo.
— Bom, vou, tenho muito que fazer, como deve imaginar.
— Sim, imagino. Não quer tomar algo?
— Não, muito obrigado, não se levante. Sei onde está a porta.
— se aproximou dela e a olhou com tristeza. Os dois sabiam que
sua conexão especial, agora seria impossível, as circunstâncias
tinham mudado. Inclinou-se e a beijou na bochecha.

~ 135 ~
Margotte Channig

— Adeus James, espero que consiga ser feliz. — ele sorriu


com tristeza e se foi.
Alexandra se sentiu triste, teve a certeza de que tinha perdido
um amigo. Não acreditava que essa amizade sobrevivesse agora.
Um momento depois voltou sua tia, sozinha. Embora ela
esperava que entrasse Sweets, mas não o fez. Margaret
resplandecia. Por fim. Ao parecer, sua desagradável aventura tinha
servido para que ela se desse conta do que estava perdendo.
— Olá querida como se encontra? — se não pensasse que era
impossível, diria que sua tia ruborizou.
— Tudo bem, tia, como você está? — definitivamente, o rubor
tomou conta de suas orelhas. Sorriu feliz.
— Muito bem. — pareceu a ponto de dizer algo, mas o deve
ter pensado melhor, porque fechou a boca.
— Tia, vem, sente-se a meu lado. — deu batidinhas no
assento a seu lado na poltrona. Parecia um pouco angustiada —
Me diga, o que acontece? — Margaret olhava para frente. Agarrou
sua mão e a pôs na bochecha — tia, me conte.
— Não sei como lhe dizer isso, talvez deveria esperar a que
chegasse Jake. — tinham avisado ao irmão da Alexandra do
ocorrido, mas não sabiam quanto demoraria para vir, porque
estava na casa familiar em Gales.
— Conte-me, por favor. — a observou, parecia curvada.
— É que eu não sei, em algum momento, há algum tempo,
aceitei... — começou a imaginar o que ia dizer, mas não podia
acreditar — me casar com o Robert. — Olhou a sua sobrinha, que
tinha a boca aberta, incrédula, por essa frase ter saído de sua
boca.

~ 136 ~
Margotte Channig

— Tia! — Ela sorriu feliz, conhecia há muito tempo Sweets —


Parabéns! — Abraçou-a muito excitada — Por que não queria me
contar?
— Não sei, toda a vida dizendo para você que uma mulher
tem que ser independente, que não me aconteceria o mesmo que
sua mãe. Quase parece uma hipocrisia me casar, mas não me
importa. Quero aproveitar o que fica de vida, junto ao Robert.
— Acho que já era hora. Você pode ter certeza que ele a ama,
esperou por você a vida toda.
— Sim, e eu a ele.
Jake entrou agitado, e observou a imagem das mulheres mais
queridas para ele abraçadas, sorrindo e chorando ao mesmo
tempo. Aproximou-se delas devagar sem entender o que ocorria.
Segundos depois não sabia se sorria pelas próximas bodas, ou
zangar-se com sua irmã por ficar em perigo continuamente.
Decidiu as abraçar, e decidiria depois o que fazer.

~ 137 ~
Margotte Channig

Capítulo 11

A noiva estava muito nervosa, Sweets tinha insistido em que,


se fosse necessário, sedaria-a para que se casassem. Todos tinham
rido divertidos, mas ele os olhou sério, porque não o havia dito de
brincadeira. Baixinho resmungava dizendo que não ia esperar nem
um dia mais. A noite anterior, seria a última que passaria solteira,
esteve com sua sobrinha em seu quarto. Falando e comendo,
chorando e rindo como adolescentes. Alexandra nunca a tinha
querido mais.
Margaret, agora, estava de pé junto à janela, depois de que a
maquiou, já mais tranquila, porque via que, por fim, ia acontecer.
Bateram na porta do quarto, era Amanda. Estava muito formosa
grávida, embora ainda estava de quatro meses e quase não se
notava. Mas seu rosto nunca tinha irradiado tanta felicidade.
Abraçaram-se e logo foi ver a noiva.
— Querida menina! Como agradeço que tenha vindo! — As
lágrimas acudiram, de novo, a seus olhos. Alexandra já tinha
retocado, duas vezes, a maquiagem.
— Tia, nem ocorra chorar! — Nunca a tinha visto tão
emocionada.

~ 138 ~
Margotte Channig

— Tínhamos que vir, são nossa família. Além disso, Drogo o


estará dizendo ao doutor, da mesma forma que digo isso a vocês.
Disse-me, quando se inteirou de suas bodas, que gostaria que
fossem de lua de mel, ao imóvel da Toscana. — observou a reação
de Margaret que aumentou muito os olhos, como uma menina
pequena. Sempre tinha querido viajar e não tinha tido
oportunidade de fazê-lo.
— Que sorte tia! Acredito que é maravilhosa, estavam ali até
agora? — Amanda assentiu.
— Sim, quase um mês, quando confirmamos a gravidez.
Drogo ficou nervoso e não queria estar tão longe, por causa do
parto, — sorriu — está histérico e perdido.
— Margaret, deixa que olhe você, está muito bela, o vestido
mais bonito, e original!
Levava um vestido de seda cinza pérola sem cauda, com um
véu um pouco mais claro, e um ramo de margaridas e lavanda. O
quarto inteiro cheirava a lavanda. Como as mulheres da família.
Sorriu ao vê-las.
— Fizemos o que pudemos, com minha idade…
— Não diga tolices tia, — a abraçou carinhosamente
Alexandra — está muito bonita, se olhe no espelho.
Ela o fez, a sobrinha a retirou quando viu que iria voltar a
chorar. A esse passo, não sairiam dali.
— Como vai vestido o noivo? De negro?
— Não, de cinza, mas mais escuro que o dela. — Respondeu
Alexandra, que estava colocando o véu sobre o rosto de sua tia
com cuidado. Quando estava pronta sorriu.

~ 139 ~
Margotte Channig

— Acredito que está pronta. — Ela assentiu, e sussurrou um


obrigada tremente.
— Bom, vamos casar você, garotinha. Espera, que busco o
Jake.
Seu irmão estava ao pé da escada, junto a Drogo que o
observava zombador. Jake olhava o relógio continuamente, como
se fosse o pai, em vez do sobrinho.
As bodas se celebraram em uma capela com a assistência de
poucos convidados. Se tivesse sido pelo noivo, teriam fugido. Mas
Margaret, apesar do que havia dito sempre, quis um vestido de
noiva. Alexandra estava na primeira fila acompanhada de Gabriel,
que esperava que, ao ver a felicidade de sua tia, aceitasse casar-se
o quanto antes possível. Ao outro lado de Alexandra estava Jake, e
junto a ele, Drogo e Amanda.
— Sim, aceito. — Não tremeu a voz de nenhum dos dois,
apesar de que colocavam um toque final de ouro, a um amor de
mais de 50 anos. Quando desfilaram pelo corredor, Alexandra
correu para a saída, junto com o Jake, para poder jogar o
tradicional arroz, uma vez convertidos em marido e mulher.
Aproximaram para beijar a sua tia, que estava muito
emocionada. O noivo esperava, paciente, ante a carruagem. Foram
ao The Clerk para celebrar. Black ofereceu o banquete nupcial. Em
alguns dias, saíriam para a Toscana, para passar um mês na vila
de Drogo. Estava encantado de que alguém de sua família a
utilizasse, já que eles, durante um tempo, não poderiam viajar.
Alexandra chorava de felicidade vendo o cuidado com que Sweets
ajudava a sua tia a subir à carruagem, e logo beijava o dorso da
sua mão.

~ 140 ~
Margotte Channig

— Não chore, sempre chora nas bodas. — Reprovou com


ternura Gabriel.
— Não posso evitar, é tão incrível que se quiseram todos estes
anos. Imagine o que sofreram, — o olhou — eu não teria resistido,
teria partido.
— E eu teria seguido você.
— Sei.
— Quando vamos marcar a data das nossas bodas, meu
amor?
— Logo, o prometo, é só que tenho que me acostumar com a
ideia, mas sabe que nos vamos casar, possivelmente o ano que
vem… — ele arqueou as sobrancelhas zangado, meio sério, meio
em brincadeira e a encarou.
— Isso é muito, não penso esperar tanto! — Agarrou-a pela
cintura, e ali, em plena rua, diante de todos, lhe deu um beijo
arrebatador, deixando-a sem fôlego.
— Gabriel!
— Penso fazer este tipo de coisas em qualquer lugar,
continuamente, até que decida. — Ela sorriu porque ele não sabia,
mas ia desfrutar de seu método de persuasão. Ele tentou parecer
assustado, mas não podia enganá-la.
— É malvada.
— Sim.
— Mas a quero. — Jake, que estava cansado se dirigiu aos
outros.
— Eu não sei vocês, mas sinto uma necessidade extrema de
beber algo. Tantos beijos, estão me dando vontade de vomitar.

~ 141 ~
Margotte Channig

— Sim, vamos ao restaurante. — Se encaminharam para os


carros de cada um deles.
Outro carro permanecia estacionado em uma travessa lateral,
de onde tinha uma visão perfeita da porta da capela. O “Sombra”
não esperava que esse fosse o desenlace de todos seus planos. Pela
primeira vez desde fazia muito tempo, alguém destroçava tudo o
que o tinha levado meses preparando. Fixou sua vista no Marquês,
a quem odiava com tal intensidade, que sua vingança contra ele,
dava sentido a sua vida. Na escuridão da carruagem, não podia ver
seu rosto. Mas quando Alexandra se aproximou dele rindo pela
calçada, agarrada em seu braço, para dirigir-se a sua carruagem,
inclinou-se para diante para vê-la melhor. Desfrutou de sua figura,
seus cabelos negros e seus olhos verdes, era a mulher mais
formosa do mundo para ele, e esse homem não a merecia. Jurou
que faria o que fosse para separá-los.

*****

The Clerk tinha sido decorado para a ocasião. Embora eram


poucos convidados, Black tinha tido a deferência de fechar o local,
para que estivessem sozinhos. Em troca o tinham convidado à
mesa com eles. Estava organizando tudo em seu local habitual no
bar, antes de sentar-se, quando Alexandra se dirigiu a ele. Tinha
deixado Gabriel sentado, bastante tranquilo, tendo em conta que
ia falar a sós com Black. Possivelmente já tinha chegado o
momento de que se fizessem amigos.
— Black, muito obrigada por tudo. — O beijou na bochecha.
Ele ficou surpreso, e pareceu, um pouco envergonhado, embora, é
óbvio, não o reconheceria nunca.

~ 142 ~
Margotte Channig

— Não me agradeça, é o mínimo que posso fazer, — a olhou


fixamente — não se nota já o arroxeado.
— É a maquiagem, nota-se um pouco ainda, mas faço magia
com ela. — o homem sorriu, mas em seguida ficou sério.
— Me alegro que tenha vindo um momento, tenho informação
sobre “Sombra”. — sussurrou em seu ouvido, arrepiou o pelo da
nuca de Alexandra ao escutar esse nome.
Assentiu ao Black, mas um garçom os interrompeu para
perguntar algo para ele.
— Nos falamos logo?
— Sim, melhor, se quer fica um pouco depois. Com o
Damsworth, é óbvio. — Ela assentiu e se dirigiu à mesa, antes
disse para ele:
— Vem se sentar Black, é parte dos convidados.
— Vou agora mesmo. — Assinou algo em um papel que
apresentavam e agarrou um par de garrafas para as levar a mesa.
Seguiu-a pouco depois.
Alexandra, que se encarregara de organizar as bodas, tinha
preferido uma mesa redonda, que pareceu mais íntima, para o
banquete da família. Sua tia daria, mais adiante, uma festa para
seus amigos. Seria muito maior quanto a número de convidados,
mas esta era a celebração com os mais próximos. Os que tinham
ido à cerimônia, os que a conheciam e queriam bem, de verdade,
aos dois, e se alegravam com sua união.
Em meio dos brinde e a gritaria da sobremesa, conseguiu
poder dizer ao Gabriel no ouvido o que tinha comentado Black,
este assentiu sem perder o sorriso, como se falassem sobre o
tempo. Sua tia, estava de um lado, do outro lado estava seu

~ 143 ~
Margotte Channig

marido, é óbvio, totalmente ruborizada depois de beijar duas vezes


a seu marido, aceitando às petições dos convidados. Apesar da
preocupação que sentia pelo “Sombra”, não podia evitar sentir-se
muito feliz ao vê-la, tão alegre como uma menina. Cruzou um
olhar com seu irmão, que também mostrava um olhar tenro que
não era habitual nele, ao ver sua tia. Estava sozinho, como
sempre, causava-lhe tristeza que não tivesse ido com ninguém.
Mas Jake, como todos, tinha que trilhar seu próprio caminho.
Ao lado de Jake, estavam Amanda e Drogo. Depois do
ocorrido no ano anterior em Gales, ninguém teria dito que, todos,
converteriam-se em grandes amigos. Amanda, por outro lado,
tinha confessado que seguia sem recuperar a memória, perdida
quase como uma bênção, quando tentaram assassiná-la.
Como era costume, quase ao final, serviram o bolo nupcial, e
os noivos foram cortando partes do mesmo, repartindo para todos,
dava boa sorte que todos comessem desse bolo juntos. O
cozinheiro do The Clerk o tinha feito, e estava delicioso. Depois de
beber uma última taça de champagne, e rechaçar uma segunda,
decidiram partir. Jake já sabia que ela voltaria com o Gabriel, e
sua tia partiria, lógicamente, com seu marido. Despediram-se de
todos na porta, e se dirigiram, seguindo Black, a outro salão
privado. Ali, serviu um copo de uísque para cada um deles, e fez
um gesto para que se sentassem. Era distinta às outras habitações
que Alexandra tinha visto do restaurante, havia várias poltronas
repartidas por ela. Parecia perfeita para ler um bom livro bebendo
uma taça, ou falando com alguns amigos. Poderia formar parte de
qualquer clube, Black não deixava, nunca, de surpreender. Gabriel

~ 144 ~
Margotte Channig

e ela se sentaram juntos, frente a ele, que olhava sua bebida,


ordenando suas ideias.
— Bem, o primeiro, tenho que dizer, que não estou seguro,
cem por cem, da confiabilidade da fonte que me deu a informação.
Como sabem, quando voltou Alexandra, conversei com algumas
pessoas que conheço, no submundo… — Gabriel lhe interrompeu.
— Delinquentes? — Black encolheu elegantemente os
ombros.
— Digamos que cada um ganha a vida como pode, eu
também o fiz em algum momento, por isso conheço esse mundo.
— Alexandra estava atônita, mas Gabriel não. Sempre tinha
suspeitado, embora não tinha antecedentes. Tinha investigado ele.
— Como ia dizendo, eu disse que pagaria muito bem,
qualquer tipo de informação sobre “Sombra”. Esta manhã, por fim,
recebi uma nota para me reunir com uma dessas pessoas. Estive
com um homem, que não conhecia previamente, que me disse que
ele conheceu um alguém chamado assim faz uns anos. Este
homem dizia de si mesmo que não tinha nome, nem passado,
essas eram suas palavras exatas, que só era uma sombra. Quando
o conheceu, estava doente, e levava ataduras em parte de seu
corpo.
— Sabe que enfermidade era?
— Não — negou com a cabeça — mas sim que tinha fortes
dores. Viveu umas semanas em uma habitação em seu mesmo
edifício. Um par de vezes bebeu com ele, e bêbado, contou de umas
cartas que procurava, sobre uma mulher que tinha estado na
Corte com a Rainha, e que as desacreditavam às duas. Dizia que
afundariam a Monarquia. Pelo visto, estava obcecado com isso.

~ 145 ~
Margotte Channig

Umas semanas depois se foi e não soube nada mais dele. —


Alexandra se voltou para o Gabriel, ao notar que continha a
respiração.
— Disse de que mulher se tratava? — Alexandra franziu o
cenho ao ver a preocupação na cara de seu prometido.
— Não sabia, falou de um escândalo, algo que podia
prejudicar à Rainha, mas que não se encontraram as provas, não
sei mais, tudo é muito vago, mas… — Encolheu ombros — De
qualquer forma, eles sabem que, se descobrissem algo, é para me
contar, suas informações valem dinheiro. Então vou descobrir se
alguém sabe alguma coisa.
— De acordo. Muito obrigada por tudo Black. — Se
despediram e saíram do restaurante. Uma vez no carro olhou para
Gabriel. Estava muito calado. Muito.
— Gabriel, o que ocorre? — agarrou sua mão para pô-la em
sua bochecha, ele sorriu com tristeza. Moveu a cabeça. — Diga-
me, sabe que não pararei até que me inteire.
— Assim que cheguemos ao parque, o que acha de darmos
um passeio.
— Ah! Acreditava que íamos a casa de minha tia.
— Não, sabia que não me deixaria em paz até que falássemos,
assim que disse ao chofer que nos leve aos Jardins de Kensington,
a esta hora não haverá ninguém. E não nos podem escutar.
— Está bem. — Se assustou ligeiramente. Sobre tudo, por o
ver tão preocupado. Gabriel sempre fazia ornamento de uma
grande presença de espírito. Desceram pouco depois,
acompanhou-o agarrada de seu braço sem falar. Deixaria que se
explicasse, antes de mais nada. Sentaram-se em um banco, havia

~ 146 ~
Margotte Channig

outro casal um pouco mais afastado, dando de comer aos patos do


lago que havia em frente a eles.
Voltou seu corpo para ele para emprestar toda sua atenção.
— Me conte Gabriel, o que ocorre?
— Faz 3 anos, havia na corte uma dama de companhia da
mãe da Rainha, chamava-se Lady Florence Hastings. Correu o
rumor de que estava grávida, a opinião na Corte era que, dito
rumor, tinha-o iniciado a própria Rainha junto com sua secretária
particular, a Baronesa do Lehzen. Ao que parecia, odiavam Lady
Florence. Esta, fazia umas semanas, aparentava estar grávida, seu
ventre inchou, provocando-a fortes dores, o que deu pé aos
rumores. Ela não fez caso deles, e não quis, por vergonha, que a
examinasse o médico real. Uns dias depois, toda a história saiu
nos periódicos. Arrastaram seu nome pela lama todos os dias.
Então foi ao exame médico. A consulta foi realizada por três
doutores reais, que opinaram que tinha um grande tumor no
fígado. Ela morreu, como resultado dois meses depois.
— Lembro da história, mas a Rainha pediu desculpas, e a
Baronesa eu acredito, foi acusada de certa forma e enviada para
casa.
— Sim, mas nunca se conseguiu nenhuma prova da
culpabilidade da Rainha, todos pensavam que a principal culpada
foi a Baronesa. Entende a importância dessas cartas, se é que
existem?
— Sim, é óbvio. — Agora sim que estava preocupada,
imaginava que o pior estava por vir.
— Eu, naquela época, não estava no Ministério, mas sei a
história de primeira mão, como logo explicarei. Recordará que, algo

~ 147 ~
Margotte Channig

depois, demitiu-se fulminantemente o Ministro do Interior, e se


nomeou Sir George em seu lugar.
— Sim, mas o que tem isso a ver?
— O Ministro, eu acredito que, seguindo ordens, encarregou
a um empregado do Serviço Secreto, que fosse a um edifício no que
vivia uma irmã da Baronesa do Lehzen. Sua missão era tentar
recuperar, de qualquer jeito, um par de cartas que, acreditavam,
que tinha em seu poder. Sua irmã as tinha dado para proteger-se
em caso de que o governo, ou a Rainha tentasse algo contra ela. As
cartas demonstravam claramente a culpabilidade da Rainha neste
assunto.
— Meu deus, que confusão!
— Sim, — sorriu ironicamente — o caso é, que não se sabe
se, por ordem do Ministro ou por decisão própria, matou à irmã da
Baronesa, mas não encontrou as cartas. E, a falta de algo melhor,
não ocorreu outra coisa que incendiar a moradia. O fogo se
estendeu por todo o edifício, salvaram-se poucas pessoas,
Morreram quarenta e nove. Foi espantoso, li os informe.
— Como sabe tanto de tudo isto se você não foi com o
Ministro?
— Lady Florence era minha tia, por parte de minha mãe.
Minha mãe de solteira se chamava Sofía Hastings.
— Gabriel! — Sua boca estava aberta por algum tempo e ela
não conseguia fechá-la.
— Eu tinha trabalhado para o Ministério em algumas
ocasiões, mas, quando voltei para o país, deixei claro que não
voltaria. Fiz-o quando substituíram ao Ministro do Interior por Sir
George. Depois, estive dando uma mão, mas quando nos

~ 148 ~
Margotte Channig

casarmos, deixarei-o. Minha família, é óbvio, não entende que siga


os ajudando, mas o faço por meu país. Não fui capaz de não
ajudar, de ficar de braços cruzados, enquanto esse delinquente
siga solto.
— Acredita que “Sombra” é da família da Baronesa?
— Não sei, mas me parece que não, pode ser qualquer dos
pobres desgraçados que viviam ali, e que morreram de uma morte
terrível, e, sem necessidade. — encolheu os ombros — O pior de
tudo é que o entendo. Não o que faz, é óbvio, mas sim que queira
justiça. O problema é que é muito inteligente, e estudou o
suficiente à polícia para conhecer seu funcionamento, antecipa-se
sempre a seus movimentos.
— Justiça ou vingança. — assentiu e agarrou sua mão.
Os dois olharam fixamente o lago. Pensou durante uns
momentos, e logo, pôs em palavras seus pensamentos.
— Gabriel, necessitamos ajuda, imagino que para isto está
descartado pedir ajuda ao Ministério do Interior diretamente, dada
sua possível implicação no passado.
— Totalmente descartado, excetuando Sir George, que então
não estava no posto, não sei quem, de outros, conhecia o ocorrido.
— Está bem, temos Jake, que pode nos ajudar. Tem amigos
na polícia e pode indagar discretamente, de maneira extra oficial.
Black, que tem conexões que nos podem vir muito bem no
submundo, e, é óbvio, James. Sei que você não gosta, mas é um
homem muito inteligente, e conhece seu ofício.
— Eu não gosto porque está apaixonado por você, eu não
gostaria de nenhum homem que o estivesse e que a rondasse tão
perto.

~ 149 ~
Margotte Channig

— Já disse que não acredito que isso seja assim, mas caso
esteja certo, não ficam muitas opções. — o olhou decidida a
discutir. Tinham que solucionar aquilo.
— É certo, está bem. O faremos, — Se ergueu e sua
mandíbula se esticou — teremos uma reunião com todos, em
minha casa, se for do seu agrado.
— É óbvio, é melhor. — assentiu — Daria tempo para que nos
reunamos esta tarde a última hora? Quero começar o quanto
antes seja possível. Estive quieto muito tempo. Enquanto esse
homem siga livre, significa um perigo para você.
— Acredito que sim, assim que volte para casa escreverei as
notas e as mandarei pelo chofer, urgentes. Deveríamos voltar,
minha tia vai pensar que nós fugimos, já sabe como se preocupa.
— Quanto tempo Jake tem pensado em ficar? — agora foi ela
quem encolheu os ombros.
— Não sei muito bem, mas acredito que até que volte minha
tia. Eu acho que eles concordaram em não me deixar sozinha, —
olhou para Gabriel desconfiada — não terá você algo que ver
nisso?
— A outra opção é que nos casemos e vá viver comigo. Não
pode viver sozinha, pelo menos, até que solucionemos isto.
— De acordo. — Gabriel assentiu com um calafrio.
Uma semana antes, jamais teria admitido esse amparo sem
brigar, isso indicou o quão assustada estava.
Levantaram-se e saíram dali. Tinham muito que fazer se
queriam reunir-se essa tarde com os outros. Além disso, tinha
prometido ajudar a sua tia com a bagagem. Subiu a seu quarto
assim que chegou em casa, e o primeiro que fez foi escrever as

~ 150 ~
Margotte Channig

mensagens para seus amigos, e desceu novamente para entregá-


las para Anthony, com instruções que fossem entregues
urgentemente. Logo, perguntou por sua tia, e ele confirmou que,
seu flamejante marido, não estava em casa. Ainda tinha muitos
assuntos de seu trabalho que deixar em mãos de alguns
companheiros, conforme o tinha comentado fazia um par de dias,
por isso não podiam ir-se em seguida.
O quarto de sua tia era uma loucura, mas a bagagem
avançava a bom passo. Estava fazendo uma lista no dia anterior
da roupa e complementos que levariam, e Alexandra a entregou à
donzela, para que hoje ficasse com ela. Embora não sairiam até
três dias depois.
— Tia, acaba de se casar, não deveria estar relaxando
sentada no salão com seu marido?
— Robert foi para continuar com a transferência de
pacientes, e eu decidi ajudar Mary. — a donzela a olhou pedindo
socorro, assentiu sem dizer nada.
— Vou tomar um chá, por que não me acompanha e toma
uma taça? Mary é perfeitamente capaz de arrumar tudo sozinha.
— Não acredito… — mas Alexandra já tinha pego sua mão e
tirava ela pela porta, logo a agarrou o braço e desceram juntas as
escadas.
— Vou sentir sua falta tia. — murmurou carinhosa.
— E eu a sua, carinho. — Aceitou a amostra de carinho
encantada, já que Alexandra, e ela mesma, não eram muito dadas
a elas.
Anthony já tinha dado instruções para servir o chá, e as
estava esperando. Sentaram-se, sua tia, que tinha trocado de

~ 151 ~
Margotte Channig

roupa, luzia um vestido de lã, em cor malva, que a favorecia muito.


Alexandra estava segura de que a felicidade que transmitia seu
olhar, era o que fazia estar mais bela.
— Quanto me alegro que seja tão feliz. — sorriu meigamente.
— Sim, não acreditei que se pudesse sê-lo tanto, e menos a
minha idade.
— Tem que me escrever frequentemente e me contar tudo. Eu
adoraria conhecer esse lugar, falam no mundo todo muito bem
dela.
— Se você casar logo, poderiam vir conosco.
— O quê? Um casal tem que estar sozinho, pelo menos umas
semanas. Você não quer que ninguém a incomode, eu não
pensaria em ir lá para lhe incomodar. — sua tia a olhou com uma
careta, mas não protestou, porque tinha razão, meteu outra massa
na boca.
Depois sua tia se vestiu para visitar sua melhor amiga, a
quem ia comentar das bodas. Até esse momento não havia dito a
ninguém.
Duas horas depois estava sentada na salinha, e sentia um nó
no estômago, sua intuição dizia que havia algo que tinha
escapado. Estava diante de seus narizes, mas quando tentava vê-
lo, escapava. Algo dava voltas por sua mente, uma ideia, mas não
era capaz de apanhá-la. Suspirou, quando acontecia isso era
melhor não pensar no que a atormentava, de qualquer jeito, viria a
sua cabeça o que queria recordar. Agarrou um livro do salão que
tinha pela metade e começou a ler, mas o deixou em cinco minutos
ao dar-se conta que tinha que reler continuamente as linhas,
porque não era capaz de concentrar-se. Bateram na porta,

~ 152 ~
Margotte Channig

Anthony abriu, e ela aguçou o ouvido, levantou-se reconhecendo a


voz de Jake. Por fim podia contar tudo para ele.

~ 153 ~
Margotte Channig

Capítulo 12

Chegou com meia hora de antecipação para falar com o


Gabriel a sós, inclusive disse a Jake que fosse depois, para que os
deixasse um pouco de tempo. Jake sorriu assentindo e
perguntando quando seriam as bodas, mostrou a língua para ele e
saiu de casa.
Gabriel estava muito sério. Sabia que estava muito
preocupado por ela, e que levava muito mal não poder protegê-la,
ele diretamente. Solucionariam logo, mas antes queria deter este
delinquente que era um perigo, não só para ela, também para
qualquer um que se interpusesse em seu caminho. E pelo que
intuía, não se deteria ante nada. Não falaram até chegar à
biblioteca, havia uma mesa redonda em que se podiam sentar
todos, e estariam mais cômodos. E era impossível que os criados
da casa ouvissem algo.
Apoiando as costas contra a porta, Gabriel a atraiu para seu
corpo, e a beijou profundamente, logo, antes de que aquilo se
descontrolasse, apoiou a bochecha na cabeça da Alexandra
respirando fundo. Necessitava mais, mas de momento, tinha que
se conformar.

~ 154 ~
Margotte Channig

— Sinto sua falta. — sussurrou rouco.


— E eu a sua, estive a ponto de vir esta noite, sem que
soubessem nada em casa.
— Se você vier sozinha à noite eu vou matar você, você não
precisa de mais ninguém para fazê-lo! — havia-se posto vermelho
em poucos segundos, seu noivo não aguentava as brincadeiras.
— Era brincadeira.
— Pois não tem graça. — Deu um beijo nos lábios dele como
uma bitoca. Como não mudava a cara de aborrecimento, deu outro
no nariz. Abaixando a cabeça para ter seu rosto na sua altura, o
deu nos olhos, até que notou que ele relaxou. Ele voltou a beijar,
mas ela se separou sorrindo.
— Nos sentemos, senão, quando chegarem, estaremos na
cama, ou me terá em cima da escrivaninha, fazendo comigo o que
queira.
— Oxalá estivéssemos sozinhos, quando solucionarmos isso,
vamos fugir, dá-me igual o que digam os outros. Iremos para
Escócia e nos casamos. Ao fim e ao cabo, minha família é dali,
assim é mais do que conveniente. — esperou a reação dela, mas
não houve. — Não diz nada?
— Não, — encolheu os ombros — me daria pena que não
estivesse a família, mas entendo que seria o mais rápido. — Ele
assentiu e a beijou na mão.
— Explicou para o que vinham?
— Não tinha muito tempo, assim simplesmente, pedi que
viessem, dizendo que era algo muito importante, mas nada mais.
Agora, quando vierem, contamos tudo.

~ 155 ~
Margotte Channig

— Sim, acredito que funcionará. — bateram na porta, Jake


tinha chegado, acompanhado por Black, encontraram-se na porta.
Já era a hora. James chegou atrasado. Cinco minutos depois,
estavam todos. Alexandra apresentou a todos, a maioria se
conheciam, exceto James, que não conhecia Jake e Black. Quando
apresentou este último, Black ficou olhando fixamente, e disse que
pareceia que já tinham se encontrado antes, mas James com um
sorriso disse que não lembrava. Black encolheu os ombros e se
sentaram, todos, ao redor da mesa.
Alexandra começou a falar, como tinha combinado com
Gabriel.
— Primeiro, gostaria de agradecer por virem, ontem Black nos
deu uma informação, graças a qual, temos uma pista, acreditamos
que seja sobre “O Sombra”. Agora, continuará Gabriel, mas repito,
muito obrigada por atenderem meu convite. — Sorriu para todos.
— Antes de mais nada, quero saber se querem formar parte
desse grupo. Vamos tentar detê-lo. Quem não quiser, que vá, por
favor. Isto é totalmente voluntário, é óbvio. — observou todos, mas
nenhum fez intenção de levantar do assento.
— Bem, acreditamos que “Sombra” surgiu faz uns anos
devido a um ocorrido em Londres. Faz três anos exatamente,
queimou-se um edifício em Whitechapel, Alexandra e eu
acreditamos que, esse incêndio, está diretamente relacionado com
as atuações dele — tinham decidido não falar do tema das cartas
ainda. Gabriel não queria, se podia evitá-lo, voltar a relembrar
tudo e que sua família voltasse a sofrer — pelo que aconteceu,
como resultado desse acontecimento, nasceu esse delinquente e,

~ 156 ~
Margotte Channig

poucas semanas depois, “Sombra” fez sua aparição pela primeira


vez.
Estavam todos silenciosos, e incrédulos, só se atreveu a falar
James.
— Na polícia até o comunicado do Ministério, não tínhamos
informação deste sujeito, assim que eu, de momento, não posso
dizer nada novo, mas estarei atento, é óbvio.
— Sim, o Ministério do Interior, decidiu que se encarregasse
dele o Serviço Secreto, mas até agora não teve êxito.
— Acreditava que você foi membro do Serviço Secreto —
recriminou-lhe James, todos o olharam incrédulos e olharam para
Gabriel, para ver o que respondia.
— Era-o, faz anos, agora já não. Mas tenho um interesse
particular na resolução deste caso. — todos olharam a Alexandra
que baixou a vista.
— Isto não se resolverá com o Serviço Secreto, terá que
mover-se pelo submundo, a polícia tampouco pode fazer nada. —
Black falou olhando ao James, com o cenho franzido. Não entendia
o que fazia ali. Compreendia sobre Jake, porque era irmão da
Alexandra, mas esse policial! Não gostava, nada.
— Todos podemos contribuir. Jake tem amigos em outras
delegacias de polícia que, possivelmente possam dar uma mão,
Black contatos muito interessantes, que outros não temos e James
é um inspetor muito reconhecido, que pode investigar
internamente sem levantar suspeitas. — Gabriel não disse nada
mais, seguro de que não faria falta, tinha conseguido calar a todos.
— Já que temos uma pista. Black poderia falar com seu
informante para que você e eu possamos vê-lo?

~ 157 ~
Margotte Channig

— Sim, mas, devido ao sistema que temos acordado, não


poderá ser antes de amanhã pela manhã. Assim que chegue em
casa enviarei aviso com a hora, o local sempre é o mesmo.
— Bem, amanhã, sem problemas. Avisa-me para o
acompanhar?
— Melhor, passo para buscar você diretamente, às sete
horas? Encontrarei ele às oito horas. O bairro fica um pouco longe.
E leve uma arma.
— Querem que os acompanhemos? — Jake parecia
preocupado por ficar fora da ação.
— Não. — Black sorriu — não quero que se assuste, já é
complicado que venha alguém comigo. São gente muito
desconfiada, como devem imaginar.
— Está bem, mas se trocar de opinião… — agora sorria
Alexandra, vendo seu irmão aborrecido por não poder estar em
primeira linha.
— É óbvio. — assentiu Black. Alexandra estava surpreendida
pela cooperação do Black, não a entendia. Com seus antecedentes,
imaginava que não o fazia por justiça.
— Bem, temos um objetivo: conseguir qualquer informação
do “Sombra”, se todos concordarem, vemo-nos aqui em dois dias.
Não obstante, se amanhã conseguirmos alguma informação
relevante, avisaremo-os. Vamos ver se for possível que, entre
todos, consigamos deter este delinquente. Só pelo que fez a
Alexandra, deveria apodrecer no cárcere. — todos assentiram, e
terminaram suas bebidas — Qualquer um que consiga um pouco
de informação, por favor, que me comunique isso, e convocaremos

~ 158 ~
Margotte Channig

aos outros, têm alguma pergunta? — todos responderam que não,


e se foram levantando para partir.
Jake lançou um olhar interrogantivo a sua irmã, quem a sua
vez olhou para Gabriel. Era tarde, às nove da noite. Se não tivesse
sido pela expressão de Gabriel, não teria duvidado em ir com ele,
mas algo dentro dela, dizia que ele a necessitava.
— Jake, você se importa se eu levar sua irmã, dentro de um
pouco? — seu irmão pareceu duvidar. Alexandra temia uma
discussão, por isso pôs uma mão no braço de Gabriel pedindo um
momento a sós com seu irmão. Este assentiu e saiu deixando-os
sozinhos.
— Alex, se deixo você aqui, a tia, quando voltar, corta-me em
rodelas. — tinha o cenho franzido, isso sempre era mau.
— Não use a tia de desculpa, ela é mais liberal que você.
Jake, Gabriel está mal, passando por algo que não posso contar
agora para você, e que afeta à investigação, — respirou fundo
tentando ter as palavras adequadas — preciso estar a sós com ele
um momento. Vamos nos casar assim que isto passe. Desde o
sequestro, dei-me conta que é uma tolice perder tempo, se pode
estar com a pessoa que amas.
— De verdade que vai casar? — parecia realmente
assombrado.
— Sim, o quanto antes.
— De acordo, contarei alguma história para tia. Que tinham
um jantar com alguns amigos? — perguntou sorridente.
— Parece-me uma boa desculpa. Se chegar tarde, que não se
preocupem, tenho chave.

~ 159 ~
Margotte Channig

— Bem, até amanhã então irmãzinha. Já sei que sabe o que


faz. — deu um beijo na sua bochecha e saiu. No corredor se
despediu do Marquês.
— Que não volte sozinha, por favor.
— Não se preocupe, e obrigado por deixar que fique Jake. —
este assentiu, não muito contente com a situação, mas conhecia
sua irmã, e como era quando metia algo na cabeça.
Gabriel o acompanhou à porta e, ao voltar, encontrou a
Alexandra bebendo, sentada de novo. Sentou-se frente a ela, esta
vez, com o olhar fixo em seu rosto, deleitando-se em sua beleza,
parecia impossível que, por fim seria sua esposa.
— Vamos subir?
— Não jantei, nem sequer lanchei como é devido, tenho fome.
— ele a olhou divertido, levantou-se e agarrando sua mão, levou-a
para cozinha. Como tinha feito muito tempo atrás, para tentar
aplacá-la, alimento-a. Sabia que se não, estaria intratável.
A cozinheira os recebeu, com mais naturalidade que a vez
anterior. Jantaram na cozinha, comendo as sobras. Alexandra
costumava fazê-lo na casa de sua tia, com ela. Gabriel, até que a
conheceu, não o tinha feito nunca.
Quando ele terminou com a sobremesa, sua expressão
relaxou, ela reconheceu que se sentia melhor também. Subiram as
escadas saciados, pelo menos no aspecto alimentar. Ele fechou a
porta do quarto atrás deles e puxou-a para perto, colocou o rosto
em seu ombro e a cheirou.
— Eu precisava mantê-la próxima.
Ele olhou para ela e esmagou seus lábios com um beijo
dominante, então, levando-a nos braços, ele foi até a cama e jogou-

~ 160 ~
Margotte Channig

a sobre ela. Rindo, ela lutou com as saias, que se enroscavam nas
pernas, mas não tinha forças, por causa do riso. De repente, o
corpo de Gabriel estava em cima dela, e ela estava grudada no
colchão.
— Pegou-me despreparada. — o olhou sorridente, fazia muito
que não estavam tão juntos.
— Sim, vejo que o terei que fazer frequentemente se quero ter
você nesta posição. — passeou o olhar acariciando seu rosto sem
as mãos — Já te falei alguma vez que é a mulher mais formosa que
vi na vida?
— Sim, mas não é certo, — ela baixou o olhar, esse tipo de
comentários de Gabriel, conseguiam envergonhá-la sempre — é só,
que como me quer, o pareço. — sussurrou isso — Você também é
o mais bonito do mundo para mim.
Ele baixou a cabeça e deu uma leve dentada em uma parte de
seu peito, que ameaçava transbordar do decote — uma risada
afogada e nervosa escapou da garganta de Alexandra. Em seguida
ficou séria, assim que notou a mão dele que subia por sua perna
com um objetivo muito definido.
— Não vamos nos despir?
— Não posso esperar, se você não se importar, primeiro
vamos tentar vestidos, quero que você possa avaliar as... diferentes
técnicas, que podem ser usadas no decorrer desta atividade. —
sorriu malicioso, e ela riu a gargalhadas.
Voltou a aproximar o nariz ao pescoço e inspirou
profundamente.
— Meu Deus! Quanto senti falta de você, sonho todas as
noites contigo. Todas as mulheres deveriam cheirar como você. —

~ 161 ~
Margotte Channig

antes de que ela pudesse responder adequadamente, beijou-a de


maneira tão persuasiva, que todo pensamento racional
desapareceu de sua cabeça. Colocou a língua em sua boca, para
dar um lânguido festim até que ela sentiu que a cabeça dava
voltas. Tentava sujeitar-se a algo, mas só podia fazê-lo à colcha da
cama, que mantinha enrugada entre seus punhos. Ele apartou os
lábios e a mordeu delicadamente na garganta. Logo, murmurou
sua necessidade por ela com crueldade no ouvido.
— Não posso estar separado de você, não suporto. Me acordo
várias vezes de noite, depois de sonhar contigo, olhe como estou
sempre! — tomou uma mão dela para apoiá-la com força entre as
suas pernas para que ela soubesse como se sentia habitualmente.
Logo, voltou a colocar a mão sob seu vestido, até que
alcançou seus calções. Baixou-os com rapidez, fazendo que ela se
levantasse para poder fazê-lo, e os deslizou por suas pernas,
jogando-os longe. Sua mão de novo, avançou sob seu vestido, esta
vez sem barreiras. Tocou seus cachos com delicadeza, separando
seus lábios, observando-a em todo momento. Não deixavam de
olhar-se aos olhos. Primeiro roçou o clitóris, isto fez que ela
mordesse os lábios, logo deslizou os dedos descendo por sua
fenda, e a penetrou com dois deles, devagar.
— Está molhada. — sussurrou com agrado. Realizou umas
quantas penetrações mais, e se separou dela uns momentos para
poder desabotoar as calças, agarrou sua ereção, Alexandra aspirou
com força quando viu sua expressão e o tamanho de sua
virilidade. Voltou a deitar-se sobre ela.
— Quero que grite quando a penetro, que perca a cabeça, que
desmaie em meus braços. — sussurrou e a penetrou com força, ela

~ 162 ~
Margotte Channig

se queixou pela dureza da investida. Ele parou ao escutá-la e a


observou. Sorriu e acariciou o seu rosto para que continuasse.
Fez-o, e seguiu fazendo-o com movimentos bruscos, rápidos,
profundos. Ela lutava por receber ele em seu interior sem
desconforto, era a ocasião das que tinham estado na cama, em que
ele estava sendo mais selvagem. Gabriel tinha a cara obscurecida
por um rubor estranho. Ela sentia que o coração o martelava
contra as costelas. Chegou um ponto, que seus olhos encheram de
lágrimas, sentiu-se afligida. Gabriel a tranquilizou com suaves
murmúrios, sem deixar de investir com os quadris, embora com
movimentos mais lentos e suaves.
Voltou a beijá-la, parecia querer absorver todos seus
gemidos, ela precisava chegar ao clímax. Ocorreu pouco depois, foi
tão intenso, que acreditava, como tinha pedido pouco antes, que
desmaiava em seus braços. Nem foi consciente de que ele teve o
seu, momentos depois.
Recuperou a consciência abrindo caminho em uma névoa de
prazer, saciedade e amor pleno para seu companheiro. Não sabia
como tinha ocorrido, mas tinha a bochecha apoiada em seu peito,
escutando os batimentos de seu coração, ele, enquanto isso,
entreteve-se em desfazer seu penteado e acariciava seu cabelo.
Em outro momento teria o repreendido, mas não se sentia
com forças para nada mais que para permanecer ali, escutando o
som desse coração, que tinha chegado a ser o centro de sua
existência. Dormiram um momento, e voltaram a fazer amor, esta
vez, devagar e com ternura. Ela notou que iria adormecer e sentou
na cama, ele a olhou surpreso.

~ 163 ~
Margotte Channig

— Quero contar algo para você — Ele olhou para ela, deitado
de lado.
— De acordo, mas deite-se melhor.
— Não, isto é importante, tenho que explicar isso bem.
— Está bem. — se sentou na cama, tal e como tinha feito ela
— Estou escutando.
— De acordo. Meus pais se separaram quando eu era
pequena, bom não era exatamente uma separação. Meu pai vinha
de vez em quando para nos ver, mas minha mãe não aceitou essa
situação nunca. Ele não a queria, ela, entretanto, só queria a ele.
Gabriel, queria-o de tal maneira, que não havia lugar em seu
coração, para o Jake nem para mim. — estendeu os braços para
ela enternecido, mas ela fez um gesto para que a deixasse
terminar. — Quando fui o suficientemente maior para
compreender a situação, e ver o sofrimento de minha mãe, e o
nosso, já que necessitávamos muito mais dela, prometi a mim
mesma, que não permitiria que um homem fizesse comigo o
mesmo. Por isso, quando o conheci e vi o que sentia por você,
tentei te afastar. Mas não o fez.
— Nem o farei meu amor. Nunca. — agora permitiu que a
abraçasse, arrastando-a para seu corpo. Manteve-a contra si, para
que sentisse como a rodeava com seus braços e sua ternura.

*****

Deixaram o cabriolé a uma distância prudencial do lugar da


reunião, e seguiram andando, tinham tido a precaução de não ir
bem vestidos, para não destoar com o lugar. Entraram no

~ 164 ~
Margotte Channig

botequim e, seguindo uma indicação de Black, Gabriel o seguiu,


para pedir um par de cervejas no bar.
— Duas canecas. — o homem que os servia, ao ver Black,
ficou nervoso olhando ao redor. Esperou que outro, que acabava
de entregar uma jarra se fosse, para falar com ele.
— Ele veio ontem, eu dei o bilhete, mas receio que ele não
venha hoje.
— Por quê? — sussurrou, tal como fazia o outro homem.
— Assassinaram-o no beco do lado. Quando saía daqui com a
nota. Veio a polícia um par de horas depois e levaram o corpo, mas
o vi bem morto. Além disso, escutei os disparos.
— Como chegou rápido a polícia? — Gabriel não acreditava.
— Casualidade que vieram tão rápido, as vezes que o morto
fica dias na rua. Depende se estorvar muito ou não.
— Sabe se foi a delegacia de polícia do centro ou qual?
— Não, os Runners, do Bow Street6 — Gabriel assentiu,
conhecia alguém ali.
— Muito obrigado, até mais tarde. — Black deixou uma
moeda de prata sobre o bar que o dono tampou com a mão, e que
embolsou em seguida.
Vinte minutos depois estavam em Bow Street, na guarida dos
Runners. Gabriel perguntou pelo Henry Goodard. Quando se
asseguraram que eram bem vindos, um policial os acompanhou ao
porão, que era onde, aparentemente, fazia seus experimentos.
Abaixo também estavam as celas dos detidos. Depois de que

6 Os Bow Street Runners são conhecidos como a primeira força policial profissional de
Londres. A força foi fundada em 1749 pelo escritor Henry Fielding com somente seis homens,
de início. Bow Street runners era o apelido dado pela população a esses oficiais, "apesar de os
oficiais nunca se referirem como escoteiros (runners), considerando o termo depreciativo". O
grupo acabou somente em 1839.

~ 165 ~
Margotte Channig

passassem junto a elas, ao fundo, a última porta era a do


“laboratório” de Henry.
Não era um Runner como os outros, o resto de seus
companheiros estavam acostumados a serem homens altos e
musculosos, que sabiam fazer seu trabalho, mas,
intelectualmente, um pouco mais escassos. Nesse contexto, era
chamativa a presença do Henry Goodard, que estava se
especializando na identificação das armas que tinham cometido
um crime, estudando as balas disparadas, e as estrias e
protuberâncias nas mesmas. Tinha descoberto o assunto por
acaso, e tinha chegado à conclusão de que, embora fossem o
mesmo tipo de arma com o mesmo calibre, cada arma disparava
de uma maneira, quer dizer, cada bala que saía de uma arma
tinha um selo que deixava essa arma, inconfundível. O magistrado
de Bow Street, vendo a importância do descobrimento, tinha
deixado um espaço para que seguisse com suas investigações, e o
tinha retirado das ruas.
Encontraram ele olhando por um microscópio, mas, embora
escutou a porta, não levantou a cabeça do mesmo.
— Henry, bom dia, preciso falar contigo, tem um momento?
— agora sim os olhou. Sorriu ao ver Gabriel. Adiantou-se com a
mão estendida para saudar.
— Quanto tempo Gabriel! Me alegro de ver você. — Gabriel
apresentou Black, e comentou que tinha que o consultar sobre
algo, nesse momento entrou um companheiro para trazer uma
arma com balas. Falou com ele uns momentos, e depois de anotar
uma série de coisas em uma folha que deixou sob a arma, voltou-

~ 166 ~
Margotte Channig

se para eles. Quando seu companheiro partiu, voltou-se para


Gabriel.
— Vamos sair, tomemos uma cerveja, aqui não vão nos deixar
falar. — Saiu antes deles para os guiar à saída, e, depois, a um
lugar bastante afastado da delegacia de polícia, onde se sentaram
na zona mais escura para falar.
— Como é que vem tão longe para tomar uma cerveja? —
sorriu com irônia, depois que Henry pedisse cerveja para todos.
— Não sou parvo de todo Gabriel, se veio me buscar, é por
algo extra oficial, se não fosse, teria mandado uma nota do
Ministério, como outras vezes. Imagino que seja algo pessoal. E se
quiser que não se inteire ninguém, melhor que não saibam alguns
de meus companheiros, asseguro isso.
— Está bem, necessito um pouco de informação. Acredito que
recolheram ontem à noite um cadáver de um homem em um beco
de Whitechapel.
— Sim, tinham-lhe disparado acredito, não conheço todos os
detalhes, mas sim me deixaram um par de balas que havia por ali.
Para que as olhe quando puder. Tenho um par de encargos antes,
mas se tiver muito interesse, posso dedicar um pouco de atenção.
— Agradeceria isso.
— Agora mesmo só posso dizer que procedem de um Colt, o
que é algo estranho, porque, embora o Sr. Colt começou a fabricá-
los em Londres, na parte norte do Tamisa este ano, ainda não
começaram a vender em terras inglesas. Os primeiros modelos não
foram aprovados. Deve ser algum modelo americano.
— Eu pude ver algum no mercado negro, trazem-nos dali e
vendem aqui, têm muita aceitação. — os dois olharam Black, que

~ 167 ~
Margotte Channig

decidiu fechar a boca. — Alguma coisa mais? — o homem negou


com a cabeça, pensativo.
— Uma coisa, disseram meus companheiros, que parecia um
ajuste de contas, porque levava dinheiro com ele e não o tinham
roubado. Este homem esteve em um botequim próximo, e, ao sair,
aproveitando que passava junto a um beco, assassinaram-o. Deve
ter visto seu assassino, porque corria em direção contrária quando
dispararam nele.
— Quer dizer que ele conhecia o assassino? — encolheu os
ombros.
— Poderia ser, ou que simplesmente o viu com a arma,
assustou-se, e fugiu.
— Está bem, muito obrigado Henry. — fez um gesto à
garçonete.
— De nada, analisarei a fundo as balas para ver se posso
dizer algo mais e perguntarei os detalhes do caso. Avisarei você
assim que saiba algo. — apertaram as mãos do policial e saíram
dali.
Black não pôde resistir mais, enquanto caminhavam em
busca do carro, que tinham deixado em uma quadra, espetou:
— Que filho da puta! Mas, como sabia que ia ao botequim
recolher a nota? — voltou-se para o Gabriel que o olhou com o
cenho franzido.
— Há várias possibilidades, entre elas, que tenhamos alguém,
em minha casa ou na sua, que esteja levando informação.
— Ponho a mão no fogo por minha gente. — Ele adiantou-se
indignado.

~ 168 ~
Margotte Channig

— Black, depois disto, há alguém próximo a nós que não é o


que parece, eu diria que temos que investigar as pessoas que nos
rodeiam, — o outro homem assentiu depois de duvidar — Vou
fazê-lo em minha casa, ao fim e ao cabo, é onde tivemos a reunião.
— Está bem, isto cada vez se complica mais, mas tem razão.
Quando chegar em casa começarei a fazer perguntas. — Gabriel
assentiu, muito sério, já que se tinha calado seu principal
suspeito, embora a expressão de Black disse que não fazia falta
que o dissesse. Ele sozinho se deu conta de outra possibilidade,
que um dos participantes na reunião era o “Sombra”.

*****

Apresentou-se na casa de Alexandra, tal como tinha


combinado com ela, para informar do ocorrido. Estavam na
salinha que havia junto à entrada, para ter algo mais de
privacidade. Esperou que ela se explodisse, mas não o fez, olhou-o
com tristeza.
— O que acontece?
— Acredito que sei quem é. — olhou para a janela,
repassando os mesmos detalhes como tinha feito em sua mente
durante toda a manhã. Ela se atirou nos braços de Gabriel,
agradecendo por ter ele ao seu lado. Então, ela disse o nome à sua
orelha, ele virou o rosto surpreso.
— Está segura? — ela assentiu sem dar mais explicações, em
uns minutos voltaria para a realidade. Antes tinha que assumir
que essa pessoa levasse enganando-a a tanto tempo.

*****

~ 169 ~
Margotte Channig

O plano era fazer que se revelasse sozinho, e estavam todos,


no dia seguinte, em torno da mesa, igual na primeira reunião.
Black começou a dizer que tinham matado à pessoa que tinha
passado a informação para ele. Gabriel o observava como um
falcão, esperando que fizesse algum movimento estranho. Tinha
sua pistola no bolso direito, esperando ser usada. Mas tinha um
sangue frio tremendo, não disse nada, falou como os outros, e não
conseguiram que se revelasse. Finalmente, Alexandra não pôde
aguentar mais, Jake e Gabriel se haviam posto muito impacientes
para que não fizesse, mas tinha que fazê-lo, queria ver sua cara
quando soubesse, que ela sabia.
— James, me diga porquê. — Gabriel se esticou a seu lado, e
pôs a mão no seu antebraço, temendo que ela cometesse algum
engano perigoso.
— Não sei a que se refere. — James sorria tranquilo,
aparentemente.
— Sabemos que é você, as mãos e a cara enfaixadas,
pensávamos que era algum tipo de enfermidade, mas logo me dava
conta de que tem o rosto e as mãos queimadas. De fato, quase
sempre, leva luvas. Investigaram e sabem que não existia até faz 3
anos. E tem um colt. Sei porque me deixou dispará-lo. Por que
James? — ela tinha lágrimas nos olhos, ele um sorriso triste.
Sabia que tudo ia acabar assim quando foi à entrevista. Era um
homem inteligente, tinha notado os movimentos durante todo o
dia, cercando-o na delegacia de polícia. Companheiros que não se
separavam dele, quando estava acostumado a estar sozinho.
Outros que insistiam em comer com ele, quando nunca o faziam. E
um par de homens que o seguiram todo o dia até chegar a casa do

~ 170 ~
Margotte Channig

Marquês. Estava muito cansado. Não queria seguir assim, tinha


pensado que seria uma boa morte levar-se por diante a seu odiado
inimigo, mas vendo Alexandra, deu-se conta de que não poderia
fazê-lo.
— Faz três anos, eu estudava para médico, e minha irmã
Daisy para professora, era uma garota muito doce. Nossos pais
nos tinham deixado um pouco de dinheiro, com isso, e alguns
trabalhos esporádicos, teríamos para estudar e ir adiante até que
trabalhássemos. Mas nos destroçaram a vida. Por ordem de uma
mulher malcriada, sua rainha, que era tão maliciosa que arrastou
o nome de uma inocente, pelo barro, morreu minha irmã em um
incêndio atroz. Ela e quarenta e oito pessoas mais. Daisy nunca
tinha feito dano a ninguém Alexandra. Eu também morri esse dia.
E nasceu “O Sombra”. Minha única finalidade era derrocar ao
demônio que reina neste país, mas não contei contigo Alexandra.
— tirou o colt que tinha metido no bolso — Tire-a. — disse ao
Gabriel, apontando a Alexandra. Gabriel, embora não o acreditava
capaz de disparar a Alexandra, jogou a pistola na mesa. Não podia
correr nenhum risco, com ela não — Ordenei que a sequestrassem
para chantagear a ele, mas eu lhes disse para cuidar de você como
se você fosse sua família. Quando descobri o que eles fizeram com
você, eu os matei como cães. — a olhava fixamente, Alexandra não
podia afastar a vista de seus olhos.
— Ontem acreditei que Black tinha me descoberto, viu-me de
soslaio no beco, quando os vigiava, o dia do teatro — Alexandra
sentiu um calafrio — eu, ou algum de meus homens, sempre os
vigiamos. E quando conheci a importância dos documentos da
filha de Byron, entendi que tinha que consegui-los, para poder

~ 171 ~
Margotte Channig

derrubar a Monarquia. Mas hoje na delegacia de polícia soube que


tinham dado instruções, para que não me deixassem sozinho.
Sabiam que era eu. Seguro que você adivinhou Alex. — a olhava
com carinho — É a mulher mais inteligente, que já conheci. Oxalá
tivesse conhecido você antes de tudo isto. Damsworth, leve-a
daqui. — Gabriel, ao ver sua expressão, agarrou-a pela cintura e
saiu da habitação correndo. Acabavam de chegar ao corredor,
quando escutaram o disparo.
James tinha girado o revolvér para sua têmpora, enquanto
sussurrava:
— Ao fim e ao cabo, já estou morto — e tinha disparado sem
duvidá-lo.
Jake e Black saltaram de seus lugares, quando o corpo caía
derrubado sobre a mesa. Gabriel a levou, enquanto Alexandra
explodia em soluços. Levou-a ao salão, e se sentou em uma
poltrona, com ela no colo, chorando abraçada a ele, a face
escondida em seu pescoço.

~ 172 ~
Margotte Channig

Epílogo

A última reunião do grupo se celebrou uma semana depois.


Black, Jake, Gabriel e Alexandra, estavam sentados na casa de
Margaret. Todos queriam entender o ocorrido. Gabriel tinha
necessitado poucos dias para descobrir aos outros três seguidores
de James, e juntar todo o quebra cabeça. Depois de informar a Sir
George, decidiu fazê-lo com o resto dos participantes naquela
investigação.
— Faz uns dias, antes de saber quem era James, Alexandra
me disse que, no transcurso da investigação, havia sentido como
se a vigiassem em várias ocasiões. Mas somente viu, em três
ocasiões, policiais patrulhando. Imaginou que era por isso que
sentia que a vigiavam. E estava certa, mas não como ela
acreditava. Eram ajudantes de James que foram disfarçados de
policiais e que seguiam Alexandra, a mim mesmo, e inclusive ao
Black. É óbvio ninguém desconfia de um policial. Quando Black
mandou a nota ao Whitechapel para encontrar-se com o
informante, só tiveram que seguir ao criado que levou a nota e
vigiar o botequim onde a entregou. Ao ver quem a recolhia, o
seguiram, e no beco mais próximo, o assassinaram. Preocupava-

~ 173 ~
Margotte Channig

me especialmente, quando terminou tudo, como se inteiraram da


utilidade dos documentos da Condessa, mas foi mais simples do
que pode parecer. Alexandra já havia dito a James que estava
procurando informação sobre esses documentos, só tiveram que
segui-la para ver onde vivia a senhora King. E, subornar à vizinha
que, desde esse momento, estava sempre em sua casa cuidando-a,
e escutando, é óbvio, todas as conversações. James era um
homem muito inteligente, e com o pouco que disse essa senhora,
deu-se conta da importância que tinham esses documentos, para o
Governo da Inglaterra. Isso provocou o sequestro da Alexandra, —
inspirou e olhou a sua futura mulher sério, ainda não podia falar
disso sem tremer por dentro — embora acredite que ele não
pensava em fazer mal a você. Acredito que o princípio de seu fim
foi, quando viu o que tinham feito à mulher que queria, pelo
menos como amiga, por sua culpa. Quando ocorreu o incêndio no
qual morreu sua irmã, ele se queimou ao entrar para tentar salvá-
la, já que não estava no edifício. Ver como morria tanta gente ante
ele, deve ter sido terrível. Acredito que sua mente não pôde
suportar o ocorrido. Era um homem atormentado por uma
brutalidade cometida contra sua irmã e outras quarenta e oito
pessoas.
Equivocou-se ao procurar vingança a qualquer preço. O resto
podem imaginar, procurou iguais entre o submundo, homens que
queriam derrubar o sistema, pelas razões que fossem. Criou para
si uma identidade nova, James Brown, e ingressou na polícia, para
poder ter acesso as melhores informações, e assim cometer os
delitos mais rentáveis para seus fins.
Todos guardaram silêncio, impressionados.

~ 174 ~
Margotte Channig

*****

Antes de sair de viagem à Escócia, Alexandra convenceu


Gabriel para ir visitar os filhos da Condessa, viram-os na casa de
seu pai, onde estavam de visita. Embora a avó comentou, que
certamente acabariam vivendo com ele. O Conde estava realmente
de causar pena pela morte de Ada, e tinha convidado sua sogra a
vir, junto com seus filhos, para viverem todos juntos.
Depois de estar ali por mais de uma hora, Gabriel ficou
impaciente para que saíssem, e estavam a caminho. Entretanto, o
chofer parou dez minutos depois, e ela o olhou assombrada.
— Tanta pressa e agora paramos? Tem algo para fazer?
— Sim, vamos, desça. — ela o fez, estavam em uma das
esquinas da praça do Parlamento, se plantou na rua agarrando o
seu braço, tentando o frear.
— Gabriel o que passa?
— Vamos, é um momento. — atravessaram a grade da Igreja
de St. Margaret, na porta estava Jake sorridente. Recebeu-a com
um beijo na bochecha. Olhou aos dois sem acreditar no que
acontecia.
— Não faz sentido que fugíssemos, não somos menores de
idade, que nossas famílias não nos permitam nos casar. Somos
dois adultos apaixonados. Levamos organizando as bodas, desde
que me disse que nos casaríamos. Ao sair daqui iremos a Escócia,
mas de lua de mel, para nossa casa. — ela sentiu como se
enchiam os olhos de lágrimas.
— Eu sabia que você lamentava muito se casar sem alguém
da sua família, então, exceto pela sua tia e Sweets, seus amigos e o
resto de sua família e os meus estão aqui. Eu tive dificuldade em

~ 175 ~
Margotte Channig

localizar sua amiga Mary, mas chegou ontem à noite, — tirou seu
lenço e secou suas lágrimas — o quanto você gosta de chorar em
casamento! — abraçou-se a ele perguntando-se, como era possível
querer tanto a alguém. Limpou seus olhos e assoprou, como uma
menina pequena, fazendo que sorrissem os dois homens.
— Quero você Gabriel.
— Sei querida, e eu a você. — Gabriel fez uma careta.
— Por favor, vamos os casar já, não sou capaz de suportar
isto muito mais. — disse Jake.
Gabriel assentiu e deu um beijo nela antes de entrar na igreja
e andar pela nave lateral até colocar-se em seu local, ao pé do
altar. Dali, virou-se para observar como se aproximava dele. Todos
os convidados se levantaram e fizeram o mesmo, sorrindo.
Jake ofereceu, orgulhoso, seu braço à noiva, que o aceitou
encantada e manteve a vista no rosto de seu futuro marido,
enquanto percorria os metros que a separavam de sua nova vida.

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