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Sebenta Fiscal – 2018/2019 DNB

Caracterização do Direito Fiscal .................................................................................................................. 3


TRIBUTOS ..................................................................................................................................................... 7
Impostos................................................................................................................................................... 9
Elementos dos Impostos no EDD ...................................................................................................... 10
Classificações dos Impostos no Sistema Fiscal Português ............................................................... 13
Taxas ...................................................................................................................................................... 20
Contribuições Financeiras ...................................................................................................................... 24
Benefícios Fiscais .................................................................................................................................... 26
RELAÇÃO JURÍDICA TRIBUTÁRIA ............................................................................................................... 29
SUJEITOS da Relação Jurídica Tributária ............................................................................................... 29
1. Contribuinte .................................................................................................................................. 30
2. Substituto Tributário ..................................................................................................................... 30
3. Responsável (em Responsabilidade Tributária) ........................................................................... 32
PRESTAÇÃO TRIBUTÁRIA na Relação Jurídica Tributária ..................................................................... 41
Relação Jurídica Tributária DINÂMICA ................................................................................................. 42
Constituição da Relação Jurídica ...................................................................................................... 43
Alteração dos Elementos Essenciais da Relação Jurídica ................................................................. 43
Extinção da Relação Jurídica ............................................................................................................. 47
PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS FISCAIS .................................................................................................... 49
Princípio da Legalidade Fiscal .................................................................................................................... 51
Reserva de Lei (na Vertente) Competencial ......................................................................................... 52
Reserva de Lei Material – Princípio da Tipicidade Fiscal ...................................................................... 57
Criminalização, Agravação, Descriminalização ou Atenuação ........................................................ 61
Determinação e Indeterminação ...................................................................................................... 61
Art. 103º/3 CRP ..................................................................................................................................... 64
Princípio da Proibição da Retroatividade ................................................................................................. 65
Leis Procedimentais e Processuais ........................................................................................................ 65
Leis Substantivas ................................................................................................................................... 66
Impostos de Obrigação Única e Impostos Periódicos ........................................................................ 67
Alcance da Proibição da Retroatividade ............................................................................................ 71
Conceito de Retroatividade para Efeitos de IVA ................................................................................ 72
Proibição da Retroatividade como Manifestação do Princípio da Segurança Jurídica ....................... 72
Retrospetividade e Princípio da Proteção da Confiança ...................................................................... 74
Princípio da Proteção da Confiança e da Auto-Reversibilidade das Leis ........................................... 75
Normas Oneradoras e Desoneradoras do Sujeito Passivo ................................................................... 75
Art. 12º LGT ........................................................................................................................................... 76
Cláusulas Antiabuso .............................................................................................................................. 77
Princípio da Igualdade Fiscal ........................................................................................................................ 78

Regência: ANA PAULA DOURADO


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Princípio da Capacidade Contributiva ................................................................................................... 78


Proibição dos Impostos Confiscatórios ................................................................................................. 78
Imposto Rendimento Pessoas Singulares (IRS) ............................................................................................. 79
Princípios da Tributação em IRS .............................................................................................................. 80
Características do IRS .............................................................................................................................. 83
Estrutura e Processo de Liquidação Do IRS .............................................................................................. 87
Incidência Pessoal ................................................................................................................................... 90
Normas Específicas para as Categorias IRS .............................................................................................. 92
CATEGORIA A – RENDIMENTOS DE TRABALHO DEPENDENTE ............................................................ 92
CATEGORIA B – RENDIMENTOS EMPRESARIAIS E PROFISSIONAIS ...................................................... 95
CATEGORIA E – RENDIMENTOS DE CAPITAIS ...................................................................................... 98
CATEGORIA F – RENDIMENTOS PREDIAIS ........................................................................................ 100
CATEGORIA G – INCREMENTOS PATRIMONIAIS ............................................................................... 104
CATEGORIA H – PENSÕES ................................................................................................................. 110
Problemas com a Categoria E e G (APD) .......................................................................................... 112
Normas Comuns para todas as categorias IRS ....................................................................................... 116
Englobamento .................................................................................................................................. 116
Taxas de IRS...................................................................................................................................... 116
Quociente Conjugal .......................................................................................................................... 117
Deduções à Coleta ........................................................................................................................... 119
Crédito de Imposto por Dupla Tributação Jurídica Internacional ..................................................... 119
Retenções na Fonte ......................................................................................................................... 119
Pagamentos por Conta ..................................................................................................................... 120
Declaração de Rendimentos ............................................................................................................ 120
Liquidação do IRS ............................................................................................................................. 120
Princípio da Tributação do Rendimento Real ............................................................................................. 121
Tributação do Rendimento Real das Empresas e Dedutibilidade dos Gastos ......................................... 122
Métodos Indiretos ................................................................................................................................ 127
Tributação do Rendimento Real e as Tributações Autónomas ............................................................... 128
Imposto Rendimento Pessoas Coletivas (IRC) ............................................................................................ 132
Imposto sobre Valor Acrescentado (IVA) ................................................................................................ 135
Tributação sobre o Património .................................................................................................................. 141
IMI ........................................................................................................................................................ 141
PRINCÍPIOS INTERPRETATIVOS E PROIBIÇÃO DO ABUSO............................................................................ 143
Princípio da Praticabilidade ................................................................................................................... 143
Interpretação das Leis Fiscais ................................................................................................................ 143
ELISÃO/ABUSO FISCAL, EVASÃO E FRAUDE FISCAIS, PLANEAMENTO FISCAL AGRESSIVO ....................... 145

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Caracterização do Direito Fiscal


Direito Fiscal é chamado a regular a relação jurídica pública que se estabelece entre o sujeito
que tem as obrigações materiais e/ou formais relacionadas com os impostos (sujeito passivo)
e a entidade de Direito Público titular do direito de exigir o cumprimento das obrigações
tributárias (sujeito ativo = administrações fiscais (regionais ou estaduais), i.e., o fisco).
➢ Direito Fiscal disciplina a relação jurídica estabelecida entre o sujeito passivo e o fisco.
➢ Direito Fiscal disciplina a relação jurídica que tem por objeto outras receitas públicas,
para além dos impostos.
o Ana Paula Dourado: Os impostos são avançados em primeira linha pois ainda
são a principal fonte de receita dos Estados da OCDE e da UE, apresentando
também a maior complexidade do ponto de vista da política fiscal e da
dogmática jurídica.

Submissão dos impostos ao Direito é a uma medida de justiça, controlável pelos tribunais
desde o início do séc. XX – substitui a relação autoritária e ajurídica entre o Estado e o sujeito
submetido a obrigações fiscais.
➢ Direito Fiscal surge com a Lei Geral Tributária alemã, de 1919, Enno Becker – pela
primeira vez uma lei atribui direitos ao sujeito passivo na relação com o sujeito ativo,
tornando a obrigação tributária (que era entendida como uma relação de poder) numa
relação jurídica de Direito Público.

Albert Hansel sistematiza os elementos da relação jurídica do imposto tal como os encontramos
hoje, tendo um caráter universal – Tatbestand Sistemático de Imposto
• Sujeito Passivo: quem tem obrigação de pagar o imposto
• Sujeito Ativo: ente público que entra na relação e tem direito de exigir o cumprimento
das obrigações tributária
• Objeto/Incidência Objetiva: sobre o que é que se paga imposto
• Elementos que contribuem para a quantificação do imposto
• Taxa/Alíquota: percentagem do valor do objeto que será deduzida como imposto

Direito Fiscal é Direito de sobreposições


➢ Incide sobre instituições e depende de outros ramos de Direito – recorre a tipos
estruturais (estruturas especiais de quadros jurídicos) do Direito Privado.
o O imposto incide sobre relações jurídicas privadas ou resultado económico
destas.
➢ A discussão sobre a interpretação autónoma ou não dos conceitos jurídicos importados
de ramos de Direito Privado atravessou todo o séc. XX e ainda hoje as respostas não são
consensuais.

Complexidade do Direito Fiscal resulta da conjugação de diversos fatores:


• Construção dogmática depende de múltiplos ramos do Direito, que dialogam com o
Direito Fiscal através de princípios, institutos e conceitos dogmáticos para atender às
finalidades deste;
• Tensão entre princípios de Segurança Jurídica e Justiça Fiscal (e entre a situação típica
da lei e a situação individual que exige ponderação casuística);

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• Ser um Direito de atos-massa – tenta-se tributar todas as manifestações de riqueza num


universo ilimitado de contribuintes, pelo que o princípio da praticabilidade1 tem de estar
sempre presente;
• Existência de vários níveis de decisão legislativa ou de recomendações de legislação.

A reação ao abuso e ao planeamento fiscal agressivo têm conduzido a alterações constantes na


legislação fiscal, com o objetivo de suprir incertezas na interpretação e lacunas.
Além disso, as necessidades orçamentais e as mudanças na política fiscal contribuem, também
elas, para uma crescente complexidade das leis fiscais.

COERÊNCIA DO ORDENAMENTO JURÍDICO FISCAL


Ana Paula Dourado: essa coerência é um objetivo a atingir, através da interpretação da ordem
jurídica tributária à luz da CRP e do DUE.
→ Implica a interpretação da legislação fiscal tendo em conta os princípios desenvolvidos
nesse conjunto legislativo, nunca contrariando a CRP e o DUE.

DIREITO FISCAL GERAL


Direito das receitas pública tributárias e estuda principalmente os impostos porque estes
constituem as principais receitas dos Estados – os Estados com autonomia orçamental (sem
ajuda externa) são Estados Fiscais.
• Estuda-se a relação jurídica entre fisco e administrado (e o papel dos tribunais), tendo
como objeto principal o imposto.
• É o facto de se estudar a relação jurídica tributária que caracteriza o estudo do jurista-
fiscalista.

DIREITO FISCAL ESPECIAL


Direito Fiscal é constituído por diversos domínios, alguns dos quais têm já uma dogmática muito
desenvolvida.

1
Princípio interpretativo, dirigido também ao legislador, do princípio da legalidade (para assegurar a
Segurança Jurídica) e o princípio da igualdade (para assegurar a justiça na tributação).

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1. Direito Fiscal Internacional


Aumento da circulação de pessoas, serviços e capitais levou à multiplicação de Factos
Tributários Plurilocalizados: factos localizados simultaneamente em vários ordenamentos
jurídicos que são objeto de tributação em cada um deles.

2. Direito Fiscal Europeu


Não existe no TFUE um preceito específico quanto à harmonização fiscal de forma a evitar a
dupla tributação, i.e., não existe previsão quanto à harmonização de impostos sobre o
rendimento.
➢ Tem-se encontrado fundamento no art. 114º/1 TFUE para se proceder a esta
harmonização.

A harmonização do IVA está prevista no art. 113º TFUE pois este imposto é um recurso da UE,
uma vez que uma percentagem deste imposto vai para o Orçamento da União, cabendo a sua
gestão e cobrança aos Estados-membros.
➢ Só formalmente é um imposto nacional, pois os seus elementos essenciais estão
harmonizados, existindo uma pequena margem de discricionariedade legislativa
deixada aos Estados-membros.

DIREITO FISCAL E GLOBALIZAÇÃO


Este ramo do Direito é muito aberto às influências dogmáticas e avanços de política fiscal
externas ao território português.
• Encontramos princípios e conceitos transplantados de diferentes ordenamentos
jurídicos e de diferentes instâncias internacionais.
• Hoje em dia, os desafios que o Direito Fiscal Português enfrenta são os mesmos que os
restantes membros da UE e da OCDE.

O Direito Fiscal contemporâneo enfrenta a questão da subsistência do Estado Fiscal (Estado


sustentando fundamentalmente por impostos), dado que a livre circulação e a crescente
especialização de funções multinacionais, tornam muito difícil aos Estados manterem objetivos
nacionais de arrecadação de receitas.
• As liberdades fundamentais de circulação podem ser usadas para comportamentos de
Exílio Fiscal – não é possível os Estados tributarem muito (numa ótica de Patriotismo
Fiscal2), pois as pessoas evadem e mudam de Estado para não pagarem tanto de tributos
fiscais.

Há dificuldade dos Estados tributarem os cidadãos mais capacitados/qualificados.


• APD: já não se pode sustentar a doutrina clássica de que o Imposto é coercivo por
derivar da lei (manifestação de autoridade soberana do Estado)
o Devido às livres circulações é possível escolher o Estado onde se pagam os
impostos.
▪ Por isso, pode dizer-se que os Estados atuam como agentes privados
no mercado e escolhem os seus cidadãos. Ex: governo oferece
benefícios fiscais a cidadãos emigrados que decidam voltar – forma de
os captar e de eles pagarem impostos em Portugal.

2
Conceito que nos EUA tem significado oposto ao que tem na UE: Tea Party Americano invoca esta noção
quando advoga impostos muito baixos e pouca intromissão do Estado.

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▪ Estados têm dificuldade para atrair investimento e cidadãos


qualificados – daí que ajam com políticas fiscais específicas,
comportando-se como agentes privados.
➢ APD: Impostos já não se podem qualificar como coercivos e os
Estados têm de encetar esforços para que os cidadãos os
paguem.

Os Estados enfrentam um grande conflito entre o objetivo de manterem a sua soberania, a qual
depende dos impostos, e ao mesmo tempo atraírem investimento através de políticas fiscais
competitivas (reduzindo ou eliminando impostos, de forma genérica ou seletiva).

Ex: Imposto Robles


• É um Imposto e não uma Taxa – tem um unilateral.
• Imposto sobre mais-valias (diferença entre o custo de aquisição de um ativo e o preço
da sua alienação).
APD: a racionalidade deste Imposto relaciona-se com os desafios que o Direito Fiscal enfrenta
no séc. XXI
• Tributa-se o que não se mexe – imóveis – pois não há possibilidade de os deslocar para
não se pagar os impostos.
• Lado negativo é a possibilidade de acabar com o investimento imobiliário.
o A maior parte dos imóveis detidos em Portugal são propriedade de fundos de
investimento, tratam-nos quase como ativos móveis.
• Medidas de tributação de imóveis são medidas que estão a ser estimuladas/propostas
pela Comissão Europeia, já desde 2012. Isto acontece devido à perceção de que é difícil
tributar os cidadãos mais capacitados, que se deslocam para os Estados que lhes
oferecem mais condições (pagando menos impostos).
o Não são os partidos de Esquerda portugueses que trouxeram estas medidas.

À partida, uma medida orçamental que vá aumentar a tributação sobre um imóvel é uma
medida que vai produzir receita, pois o imóvel não se deslocaliza. Todavia, quando estamos
numa situação de investimento forte no imobiliário (através de sociedades anónimas), o
imposto pode vir a não produzir receita porque uma tão forte tributação pode parar a
atividade de investimento.

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TRIBUTOS
Conceito de Tributos
→ Receitas criadas e cobradas pelo Estado ou outras entidades públicas para a satisfação
de necessidades públicas e sem função sancionatória.

Conceito APD é mais amplo que a maioria da doutrina: fala em finalidades públicas e não
meramente financeiras, porque pode ter objetivos extra-fiscais.
➢ Ex: 10 cêntimos sacos de plástico – objetivo principal não é financeiro, mas sim
necessidade pública de reduzir impacte ambiental.
➢ Se objetivo financeiro foi cumprido então a política falhou – não se alcançou a finalidade
desse tributo.

Nem a CRP nem a Lei Geral Tributária (LGT) dão uma definição de tributo, mas, através dos
preceitos constitucionais e legais relacionados com os tributos podemos averiguar se a definição
referida é válida no nosso ordenamento jurídico-constitucional.

Art. 103º/1 CRP: Sistema fiscal = conjunto de impostos disciplinados pelo ordenamento jurídico
português.
Art. 165º/1/i CRP: Sistema fiscal = Sistema dos impostos (conjunto dos impostos e princípios e
regras aplicáveis a todos os impostos), por contraposição à segunda parte da alínea que se refere
a outros tributos.
➢ Portanto, a CRP não tem conceito de tributos, mas o art. 165º/1/i faz referência aos
tipos ou categorias de tributos.

Art. 3º/1/a LGT3:


• Tributos fiscais = criados com finalidades públicas não sancionatórias (em regra de
arrecadação de receitas, sendo tais, finalidades financeiras).
o Os Tributos Fiscais incluem os Parafiscais, pois também estes prosseguem
finalidades públicas não sancionatórias
o Tributos parafiscais = criados por entidades públicas de base não territorial e
cujas receitas escapam ao princípio da unidade orçamental (Ex: tributos de
associações públicas, fundações, institutos públicos e etc.), provocando o
fenómeno da desorçamentação de receitas publicas.

Art. 3º/2 LGT: classificação dos tributos

O art. 165º/1/i CRP e o art. 3º/2 LGT contêm as 3 categorias de tributos reconhecidos no
ordenamento jurídico-constitucional português.
➢ Tripartição dos tributos que consta também do art. 4º LGT.
o Impostos; Taxas, Contribuições Especiais.
▪ Qualquer um destes tributos visa assegurar a satisfação das
necessidades financeiras do Estado e de outras entidades públicas,
correspondendo à função/definição clássica.

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Conceitos para melhor controlar a constitucionalidade dos tributos – temos de estar atentos aos
elementos e características que podem ter os tributos Fiscais, Parafiscais e Extrafiscais

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Alguma vaguidade de alguns termos não pode significar que se deixe de retirar da CRP categoria
e os princípios constitucionais que regem os tributos.
➢ Categorias híbridas ou novas têm de ser bem enquadradas para não trazer consigo a
desproteção do contribuinte, o que não é compatível com o Estado de Direito.

Desde meados do séc. XX que se juntaram outras finalidades aos tributos, ligadas à orientação
de comportamentos, como a prossecução de fins ambientais e a alteração de comportamentos
individuais com ou sem externalidades negativas ou para si e terceiros, ou para si e o ambiente.

Sistema Fiscal e Tipos de Normas


Fim patente no art. 103º/1 CRP: repartição justa dos rendimentos e da riqueza
= art. 5º/2 LGT

Deve ser interpretado como o critério de distribuição do montante total do imposto por cada
sujeito, i.e, como um critério de igualdade ou de capacidade contributiva de cada sujeito, que
deve ditar a quantificação de cada imposto.
➢ Isto significa que o sistema português deve assentar nos impostos, mas, também que os
impostos sobre o rendimento e o património devem ter um lugar de relevo, porque são
eles que melhor permitem assegurar a tributação segundo o princípio da igualdade ou
da capacidade contributiva.
= art. 5º/1, 2ª parte LGT

Estas disposições indicam como deve ser aplicada a receita dos impostos: correção de
desigualdades.
➢ Aqui já estamos a considerar o lado orçamental das despesas e a abandonar o campo
restrito do Direito Fiscal como o Direito das receitas.

Não é necessário que cada imposto prossiga uma finalidade financeira, essa finalidade
predomina no sistema fiscal no seu conjunto.
➢ Este sistema fiscal é um pressuposto do Estado de Direito.

Sistema Fiscal prossegue múltiplas funções e concretiza-se por 3 grupos de normas:


1º. Normas com Finalidades Fiscais – visam a arrecadação de receitas, constituem o maior
e mais relevante grupo de normas de Direito Fiscal e inserem-se no Tatbestand (tipo
sistemático).
• Fazem repartir a carga fiscal entre o universo de contribuintes, com base no
princípio da igualdade.
2º. Normas com Finalidades Sociais – não visam predominantemente a fiscalidade, mas
têm outras finalidades públicas (quer políticas, económicas, culturais, ambientais e etc).
• Normas extrafiscais.
• Podem constituir Benefícios fiscais (Normas de Orientação da Economia. Ex:
isenções ao investimento de natureza contratual. Normas de Redistribuição. Ex:
deduções à coleta de juros com a aquisição de habitação própria) ou
Agravamentos fiscais (se o comportamento adotado pelo contribuinte não for
o pretendido).
3º. Normas Procedimentais e Processuais + Normas com Finalidades de aplicação da lei –
normas que disciplinam a relação jurídico tributária e o contencioso tributário +

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regulamentos ou orientações genéricas (art. 68º-A LGT) que concretizam conceitos


legais vagos e indeterminados, clarificando a aplicação da lei fiscal.

Impostos
• Tributos unilaterais, materializados por prestações pecuniárias cuja finalidade
seja a arrecadação de receitas a título principal ou secundário por parte de
entidades públicas (fim fiscal), ou até a prossecução de quaisquer outras
finalidades públicas (fins extrafiscais) que não tenham por base uma infração e
correspondente sanção.
o Legitimidade dos impostos com exclusivas finalidades extrafiscais deve ficar
dependente de uma justificação material bastante, sob pena de se subverter a
função dos impostos do EDD (que é o Estado Fiscal).
▪ Para continuar a ser imposto não se pode consignar a receita que se
possa vir a obter (se o tributo falhar nos objetivos extrafiscais).

1. Caráter Unilateral: tributo sem contraprestação pública direta e imediata, servindo as


necessidades financeiras gerais (princípio da não consignação orçamental)
• Não se sabe quais os bens/necessidades públicos que vão ser satisfeitos com esse
imposto;
o Sempre que estejamos perante bens/serviços públicos que causem
externalidades – o benefício é para todos e não se sabe quem vai beneficiar
concretamente. Ex: defesa nacional, polícia
o Não dá para se aferir um benefício individualizado, só se sabe que vai ser afeto
a serviços públicos: causadores de externalidades positivas (potencialmente
beneficiam todos).
• Não há relação jurídica comutativa/sinalagmática;
• Está previsto orçamentalmente mas não consignado.

2. Prosseguição de Finalidades Públicas Não Sancionatórias: finalidade principal é a


arrecadação de receitas, que é o principal objetivo do sistema fiscal.
• Mas, os impostos extrafiscais, orientadores de comportamentos, são ainda impostos,
desde que se verifiquem as restantes características do imposto.
o Impostos extrafiscais ficam sujeitos às exigências jurídico-constitucionais dos
impostos.

3. Sujeitos ao Princípio Orçamental da Universalidade: servem para financiar todas as despesas.


• São receitas unilaterais para cobrir despesas orçamentais gerais.
• Não é imposto se os montantes cobrados forem afetos à compensação dos prejuízos
causados pela rigidez dos comportamentos que se pretendiam orientar (consignação
orçamental) – ex: imposto sobre o consumo de sacos de plástico for especialmente afeto
a atividades públicas de reciclagem e etc.

4. Exigidos por Entidades Públicas: os sujeitos ativos são entidades públicas (art. 18º LGT).
• Em regra, são o Estado, Regiões Autónomas e Municípios, pois as restantes entidades
públicas são normalmente financiadas através de taxas ou contribuições especiais.

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5. Prestações Pecuniárias: prestação em dinheiro


• Essa prestação é calculada e quantificada Ad Valorem, através de uma percentagem
(taxa de imposto)

6. Sem Caráter Sancionatório: deixa-se de fora do conceito de imposto as coimas e multas.

Ex: Financiamento dos Transportes Públicos


Se preço nas áreas metropolitanas de Lisboa baixar, para que as pessoas os usem mais e não
tanto o carro, como vai ser financiado?
➢ Taxa: quem paga é o utilizador do transporte. Mas se ficar abaixo do preço de utilização
do transporte então tem de haver fatia do OE para cobrir o resto (e isso vem de Impostos
– que são pagos por todos e em todo o país).

APD: deve ver-se todos os bens públicos a serem financiados e escolher os mais importantes.
➢ Tem de se ter em conta a política fiscal e se o bem é divisível (só beneficia quem o
utiliza).
➢ Sempre que os bens públicos são divisíveis, devem ser financiados por taxas (quem os
utiliza) e não por impostos (todos os outros contribuintes).

Elementos dos Impostos no EDD


Elementos essenciais: Objeto e Sujeito + Quantificação
→ Tatbestand Sistemático dos Impostos: an + quantum

An: Incidência (objetiva + subjetiva) do Imposto


→ Incidência Objetiva = Objeto = Facto Tributário
o Sobre o que é que se paga imposto.
o Art. 1º de cada código tributário
→ Incidência Subjetiva = Sujeito Passivo4
o Pessoa que, segundo a lei, tem obrigações formais ou materiais perante o fisco
– obrigações jurídicas cujo incumprimento origina uma sanção.
▪ OBRIGAÇÕES MATERIAIS: pagar o imposto
▪ OBRIGAÇÕES FORMAIS: alarga o conceito de sujeito passivo,
abrangendo aqui outras obrigações
• Obrigações Declarativas5 - sujeitos têm de preencher
declarações, designadas na lei – cada Código de Imposto tem as
suas obrigações declarativas. Ex: empresa tem de declarar
atividade; contrato de arrendamento tem de ser transmito ao
fisco – se não for transmitido haverá contraordenação.
• Obrigações de Contabilidade – relacionadas com os impostos
sobre o rendimento que assentam na tributação do rendimento
líquido – para tributar a diferença entre o rendimento e os
gastos tem de haver cooperação do sujeito passivo, tendo a sua
contabilidade organizada (de forma a que o fisco consiga

4
Por oposição ao Sujeito Ativo -> ente público que entra na relação e tem direito de exigir o cumprimento
das obrigações tributária.
5
Apesar de não se relacionar com o rendimento do sujeito, ele já é um sujeito passivo.

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averiguar se os gastos invocados estão documentados e são


dedutíveis à luz da lei fiscal).

→ Incidência em Sentido Amplo: QUANTIFICAÇÃO DA MATÉRIA TRIBUTÁVEL


o Quantificação = interpretação das regras legais sobre qual a matéria a ser
tributada e como tal deve ser feito
o Matéria Tributável = Matéria Coletável = Base do Imposto
▪ Elementos que vão formar a base para tributar – desenvolvimento do
objeto com a definição/interpretação de conceitos.

Quantum: Taxa do Imposto = Alíquota


➢ Quando se aplica esta Taxa do Imposto à matéria tributável obtemos a COLETA DO
IMPOSTO = resultado da aplicação da taxa à matéria tributável.

Montante de imposto a pagar


➢ APD: nem sempre é isto, porque há códigos que preveem Deduções à Coleta =
Abatimentos6
o No IRS as despesas de educação são deduzidas à coleta – só são deduzidas
depois de termos aplicado a taxa do imposto.
▪ Esta solução existe porque no IRS a taxa é progressiva – se a lei
permitisse a dedução de despesas de educação, saúde e etc. antes de
aplicar a taxa isso faria com que o escalão pudesse ser reduzido e a taxa
a aplicar era menor.
▪ Entende-se que isso não é o mais justo pois a dedução de despesas de
educação e saúde (e eventualmente a habitação) são despesas que têm
a ver com o conceito de Estado Social e não com o apuramento do
rendimento.
▪ O apuramento do rendimento líquido só deve aceitar a dedução de
despesas relacionadas com a atividade (se forem despesas relacionadas
com a atividade então é justo que sejam deduzidas antes de se aplicar
a taxa).
▪ Os Abatimentos já não têm que ver com a capacidade contributiva em
sentido puro, têm que ver com uma participação do Estado nestas
despesas – que têm caráter social.
o Outras deduções à coleta têm a ver com duplas tributações.
▪ Ex: A reside em Portugal e tem rendimentos cá, mas também na
Holanda. Vai ser tributado pelos rendimentos obtidos na Holanda nesse
Estado e vai ser tributado em Portugal também por esses rendimentos
– pois no conceito de capacidade contributiva tem de se comparar o
rendimento global.
▪ Nesses casos há deduções à coleta do montante que já foi tributado na
Holanda.

6
Elementos que contribuem para a quantificação do imposto

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PORTANTO,
Nos EDD, devido ao seu caráter unilateral, a definição dos (elementos essenciais dos)
impostos estão sujeitos a Reserva de Lei e devem tributar a capacidade económica,
por isso assentam em critérios ad valorem.

1. Reserva de Lei: única forma de controlo, por parte dos sujeitos passivos7 – origem no “No
taxation without representation” da revolução americana.
• Não é inerente ao conceito de imposto, pois o seu significado e alcance varia consoante
as exigências e práticas constitucionais.
• Em Portugal, só é imposto se tiver sido criado pela AR ou pelo Governo com autorização
legislativa – art. 165º/1/i CRP

Posição Tribunal Constitucional quanto ao Conceito de Imposto e Reserva de Lei


Em Portugal há frequentes litígios sobre a questão de saber se, sob a denominação formal de
taxas ou de outras contribuições financeiras, não foram criados impostos ocultos.

O TC tem conceito mais restritivo de imposto, do qual não faz parte a extrafiscalidade.
➢ O TC não opera somente com o critério estrutural de imposto e delimita esse conceito
através de um critério finalístico, centrado sobre a razão de ser ou o objetivo das
receitas em causa.
o APD: nos casos analisados pelo TC o que parece mesmo que é exigido é que a
finalidade fiscal seja a principal (Acórdão nº 70/92).
▪ O TC também admite que algumas receitas extrafiscais, como os
diferenciais de preços, podem ser financeiramente impostos quando
constituam receita da entidade que prossegue finalidades públicas, pois
há prestação pecuniária a favor de entidade pública sem se receber
nada em troca.

Conceito de Imposto e Reserva de Lei na Doutrina


Fernando Pessoa Jorge, Paulo Pitta e Cunha, Sousa Franco: prestação pecuniária com vista a
realização de fins públicos não sancionatórios, com a finalidade de contribuírem com bens
económicos para a cobertura dos encargos públicos.

Alberto Xavier, Diogo Leite Campos: função imediata do tributo, incluindo o extrafiscal, deve ser
financeira
António Braz Teixeira, Casalta Nabais, Saldanha Sanches, Soares Martinez: defende os fins
públicos dos impostos, aludindo ao critério teleológico de “realização de fins públicos” com a
principal utilização de receitas para a cobertura de despesas públicas.

→ Todos defendem um conceito amplo de imposto.

Ana Paula Dourado: um imposto, para efeitos de reserva de lei, tanto é o “imposto fiscal” (cuja
finalidade principal é a obtenção de receitas) como os “impostos extrafiscais” (cuja finalidade

7
Se não concordar com a afetação dos impostos às despesas públicas só pode haver uma reação política
(nas eleições), através dos programas eleitorais.

12
Sebenta Fiscal – 2018/2019 DNB

principal é a prossecução de finalidades sociais/orientação de comportamentos), devendo


exigir-se, em regra, que a obtenção de receitas não seja estranha ao tributo.

2. Capacidade Contributiva: a unilateralidade dos impostos, ligada ao facto de estes servirem


para financiar as despesas gerais de uma comunidade, exige a sua repartição pelo universo dos
contribuintes segundo um critério de capacidade contributiva.
• É para justificar a repartição de encargos segundo a capacidade contributiva, aos quais
não correspondem benefícios equivalentes, e para não serem cometidos abusos por
quaisquer entidades públicas não eleitas, que existe a reserva de lei parlamentar fiscal.

3. Critérios ad valorem

Classificações dos Impostos no Sistema Fiscal Português


Têm relevância pelas virtudes de organização concetual mas, especialmente, por algumas delas
corresponderem a exigências constitucionais na configuração de um sistema judicial justo, e
todas terem implicações na configuração e na interpretação do seu regime jurídico.
➢ APD: as classificações só interessam se tiverem diferentes consequências jurídicas, pelo
que estas classificações são com base nos seus Regimes Jurídicos.

1. Impostos sobre o Rendimento, Consumo e Património


Categoria que classifica consoante o objeto sobre o qual recai o imposto – presente no art.
104º CRP (de forma explícita)
➢ Grandes categorias de impostos, de exigência constitucional, correspondendo aos tipos
de impostos que vigoram em todo o mundo, tal como teorizados pelos economistas do
séc. XX.
➢ São manifestações da riqueza (sobre onde incide a tributação) dos sujeitos passivos de
certo território.

RENDIMENTO (art. 104º/1 e 2): organiza-se em IRS (sobre o rendimento das pessoas singulares)
e em IRC (sobre o rendimento das pessoas coletivas).
• No caso das pessoas singulares assenta no rendimento universal dos residentes.
• No caso das pessoas coletivas assenta em rendimentos obtidos no território nacional.

Dada a mobilidade atual dos fatores de produção (em especial o capital), tem havido estudos
propondo a substituição do IRC baseado na tributação do lucro, por um imposto no destino dos
bens ou serviços (baseado na locação dos consumidores).
➢ Proposta para ultrapassar as perdas de receita neste imposto, resultado da livre
circulação de capitais trazida pela globalização.
➢ Também afetou as pessoas singulares pois, nas últimas décadas, avultados montantes
de rendimentos de capitais têm sido colocados em territórios de baixa ou nula
tributação (os “paraísos fiscais”8 = não cooperantes, pois não fornecem informações aos
Estados de residência dos sujeitos que aí colocam as suas poupanças).

8
Desde 2009 que tem havido pressões globais para que se tornem territórios cooperantes e troquem
informações.

13
Sebenta Fiscal – 2018/2019 DNB

São considerados os impostos mais justos pois têm em conta os proveitos, mas, também as
despesas associadas à sua obtenção – Rendimento Líquido9.
➢ Inclui-se também alguns elementos redistributivos associados ao Estado Social
➢ Quanto às empresas deve tributar-se o seu rendimento real.

No nosso sistema fiscal o IRS e o IRC introduzem o conceito de tributação do rendimento-


acréscimo (ou rendimento líquido), considerado desde o início do séc. XX como o critério mais
rigoroso e justo de tributação do rendimento – é o critério que corresponde ao rendimento real
(tal como definido na lei fiscal).
➢ Rendimento-líquido opõe-se ao conceito de rendimento-fonte, que é aplicado sobe uma
atividade, independentemente de esta gerar lucro ou prejuízo, podendo assentar em
presunções de lucro (rendimento presumido).

CONSUMO (art. 104º/4): incidem sobre o consumo geral de bens e serviços (IVA) e sobre o
consumo específico de certos bens (imposto sobre o consumo de álcool, tabaco, produtos
petrolíferos e etc.).
➢ Impostos gerais sobre o consumo são considerados menos justos do que os impostos
sobre o rendimento – incidem sobre todos os sujeitos na mesma medida,
independentemente da capacidade económica de cada um.
o Mas são considerados mais neutros para o funcionamento da economia, porque
implicam menos distorções, nas opções acessíveis aos contribuintes.

PATRIMÓNIO (art. 104º/3): impostos sobre a riqueza


• Estáticos – incidem sobre a detenção de riqueza; manifestação de riqueza no valor da
propriedade.
o Os impostos gerais sobre o património são estáticos e têm como função
principal controlar a capacidade contributiva do sujeito passivo, através do
cruzamento de dados com as declarações de IRS.
o Os impostos que incidem sobre uma parte do património podem ser estáticos
(caso do IMI) ou dinâmicos (IMT)
• Dinâmicos – manifestação de riqueza na transação; podem recair sobre transmissões
onerosas (Imposto sobre a Transmissão de Imóveis, IMT10) ou sobre transmissões
gratuitas (sobre doações e sucessões – sujeitam-se ao imposto as pessoas singulares
para quem se transmitem os bens)

Não existem Impostos Gerais Sobre o Património em Portugal pois entende-se ser impossível
encontrar um momento ou conjunto de momentos durante o ano fiscal que possa traduzir com
rigor o valor dos ativos mobiliários (dada a flutuação do valor destes11) e imobiliário.

9
E não bruto, porque não dá uma imagem real da capacidade contributiva
10
Incide sobre as transmissões onerosas do direito de propriedade ou de figuras parcelares desse direito,
sobre bens imóveis situados no território nacional de imóveis, qualquer que seja o título por que se
operem.
Este imposto é devido pelas pessoas para quem se transmitam os bens imóveis, pois como adquirentes
manifestam riqueza.
11
TC Alemão considerou arbitrária a avaliação destes ativos e declarou inconstitucional o imposto geral
sobre o património.

14
Sebenta Fiscal – 2018/2019 DNB

2. Impostos Reais e Pessoais


Categoria que classifica consoante a função que o imposto desempenha no ordenamento
jurídico-constitucional – presente no art. 104º CRP (de forma explícita ou implícita)

REAIS: impostos que se centram na manifestação da riqueza, sem considerar outros elementos
diferenciadores ligados à capacidade económica do sujeito.
• Foco é o objeto de tributação – o que releva é o valor do objeto e não a capacidade
contributiva do sujeito – tributa-se o valor do bem
• Não interessa a capacidade contributiva – ela tem de existir, senão não se compra o
bem nem se paga imposto, mas, não interessa fazer diferenciações quanto à capacidade
contributiva.

IVA é imposto real – o que interessa é o valor do bem e é sobre isso que incide o imposto (sobre
o consumo); é uma percentagem do valor desse bem e difere consoante os bens.

Mas, hoje em dia, os Impostos Reais têm elementos de pessoalidade e o legislador faz
valorações atinentes à capacidade contributiva

O IVA português resulta de uma Diretiva da UE que permite 3 taxas de imposto/alíquotas


diferentes – 6%, 13%, 23%
• Essas 3 taxas são elementos pessoalizantes e que distorcem o imposto real
• Interferem com Princípio da Neutralidade – característico dos Impostos Reais
em que, à partida, a taxa de imposto deve ser a mesma para todos os bens para
que o consumidor possa escolher de entre aqueles bens apenas pela qualidade
dos bens, sem a distorção do fator fiscal.
• Neutralidade deve ser assegurada por uma única taxa para não se verificar essas
distorções.

Estas diferentes alíquotas fazem distorção pois dão incentivos a consumir certo
produto em vez de outro.
➢ Provou-se que taxas mais baixas não fazem diminuir o preço – o consumidor não
é afetado e são os profissionais que beneficiam.
➢ Legislador orienta as opções dos contribuintes, mas, muitas vezes, os seus
objetivos não são cumpridos.

3 taxas do IVA são fatores distorcivos da neutralidade do imposto real, mas, são opção
da UE.
➢ Há países (Nova Zelândia, Canadá, Taiwan e etc.) que conseguem garantir a
neutralidade e os princípios fundamentais do IVA enquanto imposto sobre o
consumo.

Na UE, já não se pode dizer que o IVA é um mero Imposto Real: à partida é um Imposto
Real mas, a nível europeu, existem elementos pessoalizantes que já têm em conta a
capacidade contributiva das pessoas e, por vezes, objetivos extrafiscais.

15
Sebenta Fiscal – 2018/2019 DNB

PESSOAIS: impostos que se centram na riqueza do sujeito, mas em que o foco de atenção é a
capacidade contributiva do mesmo12.
• Têm em conta alguns elementos diferenciadores relacionados com a capacidade
contributiva do sujeito, estando ligados a um conceito mais fino de justiça mas podendo
revelar-se menos eficientes, por provocarem mais distorções.

Para apurar a capacidade contributiva:


I. Atende-se ao rendimento global – permite averiguar diferenças entre os vários sujeitos
passivos = Capacidade Contributiva Global
• Todo o rendimento é tratado de forma idêntica – daí ser global.
o Se houver aumento (acréscimo, na diferença calculada entre o fim e o
início do ano fiscal) tributa-se, seja rendimento de trabalho, capital,
mais-valias e etc. – tudo está englobado.
➢ APD: rendimento em sentido amplo, em que se conta também
acréscimos patrimoniais. Tudo está englobado.
• Deve ser global para não se introduzir distinções entre as várias categorias de
rendimento – unicidade postula o englobamento de todos os rendimentos, de
modo a não haver rendimentos submetidos a tratamento mais favorável do que
outros.
o No entanto, o IRS português (introduzido em 1988) não respeita a
unicidade por força da integração no mercado único da UE (livre
circulação de capitais).13
o A regra é o Sistema Dual (por inspiração dos países nórdicos) em que os
rendimentos de capitais são sujeitos a uma taxa única e afastados da
progressividade.
➢ Mas têm de ser tributados, tem de haver uma tributação
universal, para melhor se prosseguir objetivos de justiça fiscal.
II. Lógica de Justiça Fiscal – faz-se uma comparação entre as várias capacidades
contributivas.
• Estes impostos excluem da tributação o “mínimo de existência”, dado um juízo
da capacidade económica tendo atenção a dignidade da pessoa humana.
• Também deve haver consideração aos encargos familiares, pois eles diminuem
a capacidade económica do sujeito e devem contribuir para a redução do
imposto a pagar.
• O caráter pessoal do IRS também é aferido pelas deduções à coleta de despesas
de caráter social.

Com as liberdades de circulação e a abertura da economia é difícil apurar o rendimento global –


coloca-se este conceito em causa, pois é difícil apurar.
➢ Existência de “paraísos fiscais” aumenta esta dificuldade, pois são sistemas fiscais
opacos.

12
Todos os impostos são pagos por pessoas, a diferença é o foco sobre o qual incide esse pagamento.
13
Estados, para serem competitivos, abdicaram da tributação idêntica de todas as categorias de
rendimentos e, na prática, tributam de forma mais favorável (mais baixa) os rendimentos com maior
mobilidade – capitais, juros, dividendos, mais valias, rendimentos trabalhadores mais qualificados

16
Sebenta Fiscal – 2018/2019 DNB

APD: conceito em crise – ex: Imposto Robles é um imposto ad hoc sobre o rendimento que
manifesta o desespero dos Estados em tributar os que têm maior capacidade contributiva.

Impostos sobre o Património são reais ou pessoais?


• Se for um Imposto Geral sobre o Património é um Imposto Pessoal – não existe em
Portugal, mas existe na Bélgica e em Espanha.
o Imposto serviria fundamentalmente para controlar a declaração de
Rendimentos do sujeito passivo – para fiscalizar o imposto sobre o Rendimento.
▪ Este incidiria sobre riqueza estática (património mobiliário e
imobiliário) e não poderia ser muito elevado senão desgastava o valor
do património e retirava competitividade.
▪ Não se está a tributar o fruto do património, mas o próprio património
– a alíquota deve ser baixa, pois a sua função é a de que o sujeito passivo
declare todo o património que tem, sendo possível confrontar com a
declaração de IRS.
▪ É relevante devido ao exemplo dos anos 90: vida luxuosa a ser mostrada
nas revistas e no IRS declarava o mínimo. Se existisse este imposto, eles
teriam de declarar ao fisco e havia instrumento para controlar, ao fazer
a declaração.
• Se for um Imposto Parcial/Sobre parte do Património não pode ser um Imposto
Pessoal – para ser pessoal implicaria o englobamento do seu objeto.

Sujeitos passivos com maior riqueza patrimonial é devido a património imobiliário e mobiliário,
portanto, agravar os impostos sobre o património imobiliário é tentar atingir uma parte da
riqueza, mas, não existe função de imposto pessoal porque toda a riqueza mobiliária fica de fora.
➢ Quando se fala em tributação ao património, essa noção é truncada e discriminatória
– há parte elevada de riqueza (mobiliária), que fica de fora.
o APD: O que justifica este aumento de tributação ao património é o facto de se
tributar imóveis – consegue-se efetivamente tributar em Portugal, pois ela não
se movimenta para territórios de tributação mais baixo.
➢ Não há verdadeiros argumentos de justiça, mas apenas o de se conseguir tributar aquela
riqueza, enquanto, em contrapartida, não se consegue tributar a riqueza móvel que
pode ser deslocalizada.

3. Impostos Proporcionais, Progressivos e Regressivo


Categoria que classifica consoante a função que o imposto desempenha no ordenamento
jurídico-constitucional – presente no art. 104º CRP (de forma explícita ou implícita)

Quantificação Ad Valorem do imposto pode manifestar-se através de uma destas formas.

PROPORCIONAIS: impostos cuja taxa/alíquota é fixa, sob a forma de uma percentagem.


• Proporcionalidade é suficiente para assegurar o princípio da igualdade.
• Sendo ad valorem, a proporcionalidade também é adequada aos impostos pois estes
incidem sobre a capacidade contributiva.
o Estão de acordo com este princípio pois o imposto final será mais elevado
quanto maior for o valor do objeto a tributar.

17
Sebenta Fiscal – 2018/2019 DNB

o Num Estado Social tal pode não ser suficiente para assegurar a justiça fiscal, que
é Redistributiva.
• Impostos reais são normalmente associados a taxas proporcionais

PROGRESSIVIDADE: implica existência de alíquotas variáveis – aumento da taxa tendo em conta


o aumento do rendimento (mais rigorosamente, da matéria tributável), e concretiza-se pela
existência de escalões.
• A progressividade é característica dos impostos pessoais.
• Contém um elemento redistributivo mas não é exigida pelo princípio da igualdade, que
se satisfaz com uma taxa proporcional.
• Quanto mais escalões, maior a progressividade.
o APD: no caso dos impostos pessoais, a progressividade não é assegurada com 2
taxas pois há inclusão de realidades económicas muito diversas em somente 2
escalões, não traduzindo um imposto progressivo.
• A progressividade nos impostos pessoais, aliada à liberdade de movimentos, pode gerar
fenómenos de Exílio Fiscal (quando as taxas dos últimos escalões são muito elevadas e
ultrapassam os 50%14) – que se manifestam em mudança de residência ou até de
nacionalidade.
• A progressividade nos impostos reais estimula fenómenos de planeamento, abuso e
fraude fiscal.

REGRESSIVIDADE: tributação mais elevada de uma menor capacidade contributiva ou


tributações iguais de diferentes capacidades contributivas15.
➢ É inconstitucional – contraria princípio da igualdade.

4. Impostos Diretos e Indiretos


Categoria que classifica consoante o modo como o imposto atinge/incide sobre o objeto e o
sujeito.

Classificação no art. 6º LGT e art. 112º e 113º TFUE – adoção de critério financeiro, atendendo
ao objeto do imposto
➢ Classificação Económica

DIRETOS: aqueles que atingem as manifestações diretas ou imediatas de riqueza e da


capacidade contributiva (impostos sobre o rendimento e o património).
• Autoridade tributária tem informação sobre situação do rendimento e património do
sujeito, podendo controlar as declarações.

14
Já põem em causa a Autonomia Privada e a Autonomia Empresarial – torna-se imposto confiscatório
15
Como os Impostos de Capitação/Per Capita/Lump-sum Taxes – avançados por Margaret Tatcher nos
anos 80 mas que não entraram em efetividade.
➢ Vantagem de ser uma forma de imposto menos distorciva, havendo uma eficiência parateana
o Cada um e todos pagam a mesma coisa – em termos absolutos pagam o mesmo, mas
ao comparar com o rendimento do indivíduo, o mais pobre paga maior percentagem (à
medida que o rendimento aumenta, o peso do imposto diminui).
➢ Problema é que não seria possível existirem bens públicos nem alcançar uma justiça
redistributiva num Estado Social.

18
Sebenta Fiscal – 2018/2019 DNB

INDIRETOS: aqueles que incidem sobre manifestações indiretas de riqueza e da capacidade


contributiva (impostos sobre o consumo e despesa).
• Mostra que há capacidade contributiva mas não mostra toda a riqueza.

APD: classificação falha, no caso do IVA, uma vez que a autoridade tributária tem informações
sobre os sujeitos que têm as obrigações perante o fisco.16

5. Impostos de Obrigação Única e Impostos Periódicos


Categoria que classifica consoante o período temporal de nascimento e extinção do imposto.

OBRIGAÇÃO ÚNICA: aqueles cujo facto tributário nasce e se extingue com um ato ou negócio
jurídico – consumo, importação, aquisição onerosa ou gratuita.

PERIÓDICOS: aqueles cujo facto tributário se renova por diferentes períodos fiscais, dando
origem a obrigações declarativas, enquanto não se informa a administração tributária da
extinção desse facto ou da atividade económica.
➢ O facto tributário nasce e extingue-se ao fim de um determinado período fiscal (ano
fiscal ou período mais curto definido pela lei), mas a continuidade da relação jurídica
tributária faz nascer relações jurídicas que adquirem um caráter de permanência até
que se verifique a alteração ou cessação da situação.17
o Permitem o controlo da situação fiscal do sujeito passivo por parte da
administração tributária, facilitando a arrecadação de receitas.
o Criam deveres declarativos ao sujeito passivo mas também evitam o
cumprimento renovado dos mesmos, pois presume-se que a relação jurídica
tributária continua inalterada, cabendo apenas apurar o valor do rendimento
ou património em cada período fiscal.
➢ Retenções definitivas não configuram imposto periódico mas estão inseridas num
periódico.

Impostos de Formação Sucessiva


Dada a dificuldade de aplicar ao IVA a distinção tradicional entre impostos periódicos e de
obrigação única (pois o IVA incide sobre cada transmissão mas os deveres declarativos são
periódicos), considerou-se relevante para efeitos da contagem o sujeito passivo de IVA e não o
consumidor final – ou seja, para contagem de prazos de caducidade, o que releva são as
liquidações e dívidas dos sujeitos passivos do IVA e não dos consumidores finais, tal como nos
impostos periódicos.

Imposto sobre as mais-valias imobiliárias pode ser configurado de várias maneiras:


• Obrigação Única – o facto constituiu-se e extinguiu-se no momento em que obtivemos
a mais valia;

16
Isto devido à forma como o Imposto está configurado – em que são os sujeitos passivos, que
desenvolvem uma atividade de prestação de serviços, que se relacionam com o fisco (abrindo atividade e
prestando informação sobre ela) e entregam o IVA do consumidor ao Estado.
17
Enquanto existir a situação subjacente que faz surgir a obrigação, ela repete-se anualmente.

19
Sebenta Fiscal – 2018/2019 DNB

• Formação Sucessiva – situação atual no Código IRS e Código IRC – mais valia de uma
transação é um dos elementos do facto tributário, mas, se tiver havido várias transações
ao longo do ano fiscal, o que se tem de apurar é o resultado dessas transações.
o Pode haver mais valias ou menos valias, nesse resultado.
o É imposto de formação sucessiva porque não se tem em conta o resultado
individual de cada uma das transações.
▪ Os impostos periódicos podem assumir esta faceta – vão sendo
formados ao longo do ano.

Taxas
Sendo verdadeiras Taxas, não há sujeição ao princípio da Reserva de Lei e podem ser criadas
pelos Municípios.
➢ Não precisam de ser criadas pela AR. Art. 165º/1/i CRP apenas exige uma lei com o
Regime Geral das Taxas – existe o das autarquias (Lei 53-E/2006).

1. Caracterizam-se por serem tributos sinalagmáticos ou bilaterais compreendendo 3 tipos de


situações, conforme o disposto no art. 4º/2 LGT:
1º. CONTRAPARTIDA pela utilização de Serviços Públicos
2º. CONTRAPARTIDA pela utilização de um Bem Público, Semipúblico ou Bem do Domínio
Público
3º. CONTRAPARTIDA pela Remoção de um Obstáculo Jurídico ao exercício de uma atividade
por parte dos particulares
• Até Acórdão 117/2010, o TC entendia que o conceito de taxa pressupunha
sempre a utilização de um bem ou serviço público ou semipúblico, o que
inutilizava o conceito de taxa. Nesse Acórdão, o TC mudou a sua posição pois
entendeu que as taxas sobre a remoção de obstáculos não são
inconstitucionais se os referidos obstáculos tutelarem reais interesses
públicos. Ex: anúncios que estejam na via pública, uma vez que as licenças para
autorizar a publicitação tutelam reais interesses públicos como a “configuração
do ambiente de vivência urbana das coletividades locais”.18

18
Nos vários acórdãos que proferiu (nomeadamente no Acórdão nº 313/92, nº 63/99, nº 166/09) o TC
sempre foi considerando como organicamente inconstitucional a criação de tributos que não incidissem
sobre bens públicos, semipúblicos ou do domínio público, como é o caso dos reclamos publicitários. Esta
remoção de obstáculos jurídicos sobre bens privados foi apelidada de “licença fiscal” por TEIXEIRA
RIBEIRO, uma vez que era artificial a existência de uma taxa e o que estava em causa, tal como o TC
concluiu, era um imposto oculto, cuja competência seria da Assembleia da República, nos termos do art.
165º/1/i.
No entanto, o Acórdão nº 117/2010 traz uma nova abordagem ao assunto pelo TC. Desde esse
acórdão, o Tribunal já não considera inconstitucional a taxa sobre remoção de obstáculos jurídicos se tais
obstáculos tutelarem reais interesses públicos. Neste caso, os anúncios estão na via pública, portanto, o
tributo pela remoção de um obstáculo jurídico ao exercício de uma atividade por parte dos particulares
(art.4º/2, parte final), está a tutelar um real interesse público que se prende na “configuração do ambiente
de vivência urbana das coletividades locais”.
ANA PAULA DOURADO alerta para a insegurança jurídica criada por esta solução, uma vez que
“nem a reserva de lei nem o princípio da cobertura de custos está a ser aplicado ao controlo da
constitucionalidade das taxas” e SALDANHA SANCHES afirma que na “cobrança de taxas pela mera
utilização do domínio público, sem qualquer atividade por parte do detentor desse mesmo domínio
público, não há um custo a cobrir e as receitas serão afetas às necessidades gerais do sujeito ativo”,
configurando, então, um imposto.

20
Sebenta Fiscal – 2018/2019 DNB

Lógica do sinalagma jurídico – tem de haver uma contrapartida, pela qual se paga por se
beneficiar do bem ou serviço.
• Não pode ser ad valorem (não pode estar relacionado com o valor do bem, rendimento,
etc.) e tem de estar relacionado com o custo e o benefício (Princípio da Cobertura dos
Custos).

2. As taxas também se caracterizam por serem bens ou serviços individualizáveis, que tenham
uma existência presente, não podendo ser futuro
• Os bens/serviços são Divisíveis e cada um paga a sua utilização
• Tributa-se pela utilização individual do bem – se o pagamento do tributo trouxer
externalidades então perde o cariz individual e não pode ser considerado uma taxa.

Saldanha Sanches: liga a necessidade de ser uma prestação individualizável à noção de


sinalagma, pois a “sinalgmaticidade só poderá ter lugar quando se trate de um qualquer bem
que seja divisível, ou seja, que possa ser prestado em unidades individualizadas”, reclamadas
pelo indivíduo que paga a contrapartida.
➢ Postula-se a “estreita correlação entre o destinatário do encargo financeiro e o
beneficiário da despesa pública”.

Ex: Propinas
• As que pagamos têm de ser para nós, na licenciatura, não podem financiar os mestrados.
• Não podem ser cobradas propinas para financiar alargamento da biblioteca porque o
bem é futuro e podemos vir a não beneficiar dele.
• Mas, pagar logo as propinas do ano todo não é pagar por um bem futuro, porque tudo
indica que esse ano vai funcionar e que o estudante está inscrito e vai beneficiar desse
ano todo.

3. As taxas têm de ser quantificadas de acordo com o Princípio da Cobertura de Custos.


• O custo do tributo não pode ultrapassar o benefício do mesmo – se o montante for em
excesso pode ser um imposto oculto.

Não havendo reserva de lei, o controlo constitucional destes tributos tem de assentar na
sinalgmaticidade, ou no princípio da cobertura de custos.
➢ As taxas têm um sinalagma jurídico e económico.

A bilateralidade da taxa também tem de ser aferida pelo montante cobrado e não se pode
separar o sinalagma jurídico da quantificação da taxa.
• Só há bilateralidade se os custos pelo bem utilizado, serviço prestado ou remoção do
obstáculo não excederem o benefício recebido por parte do particular – Princípio do custo-
benefício.
o A taxa pode ser inferior ao custo, caso em que o referido custo tem de ser
também financiado por transferências de impostos. Ex: proposta de
financiamento dos transportes públicos
o Mas o valor a cobrar pela taxa nunca pode ser superior ao da utilidade prestada,
sob pena de se estar a sair da bilateralidade e estarem a ser cobrados impostos
cuja competência está sujeita a reserva de lei.

21
Sebenta Fiscal – 2018/2019 DNB

Lógica do custo-benefício tem subjacente dois princípios: Princípio do Custo + Princípio da


Utilidade.
➢ Mas o Princípio do Benefício é mais complexo de se apurar
o Utilidade pode ser difícil de apurar, pois há casos em que não há base
económica objetiva.
o Paula Rosado Pereira: tendencialmente a utilidade é um critério que distingue
este tributo dos outros. Mas é um falso critério pois não acontece sempre. Ex:
carta de condução – podíamos ficar sempre com a mesma; utilidade é duvidosa;
parece que isso só traz benefício ao Estado (particular tem custos mas nenhuma
utilidade aparente).

Na jurisprudência, esta matéria é tratada timidamente através do Princípio da


Proporcionalidade, que não é aplicado cabalmente pois o TC introduziu como limite a proibição
da “manifesta desproporcionalidade”.
➢ APD: significa que os contribuintes em Portugal ainda não estão cabalmente protegidos
contra abusos de entidades públicas na cobrança de taxas.

TC (Acórdão 68/200719 e Acórdão 215/2005): utilizar o valor patrimonial de imóveis para cobrar
taxas tem subjacente que, apesar desse valor patrimonial também ser uma manifestação da
capacidade contributiva, isso reflete o custo e a utilidade necessária para a quantificação das
taxas.
➢ Mas tal não pode ser alheio ao custo-benefício20, e o resultado não pode ser
manifestamente desproporcional.
➢ APD: Controlo pela negativa e tutela frágil dos contribuintes

Ex: pagamento dos emolumentos com os aumentos de capital social


Porque é que um aumento de uma sociedade com milhões de euros era mais caro que um
aumento de uma sociedade com umas centenas de euros?
➢ A prestação de serviços era a mesma.
o Lógica é de que a empresa maior tinha mais custos porque ia ter mais benefício
(ganhar mais) – mas isto é uma tributação da capacidade contributiva, só que
se dizia atender à utilidade propiciada.

Legislação evoluiu para definir um teto máximo para o emolumento, que é bilateral

Em Itália e na Alemanha há o entendimento que as Taxas devem ser sujeitas a Reserva de Lei,
de forma a que haja um controlo jurisdicional da aplicação do princípio Custo-Benefíco.
➢ APD: entre nós, a desproteção do contribuinte em matéria de taxas é clara – o princípio
do custo-benefício não é aplicado pelos tribunais; a ausência de leis deixa uma margem
ampla de discricionariedade às entidades públicas.

Ex21: Taxa de Proteção Civil de Lisboa (e Vila Nova de Gaia)

19
Onde afirma expressamente que apenas se exige um Sinalagma Jurídico.
20
Não se pode ter em conta elementos completamente alheios ao custo-benefício – como o atender aos
rendimentos, pois isso é pura capacidade contributiva
21
Outro Exemplo: Ponte 25 de Abril e aumento das portagens nos anos 90
➢ Problema principal era estar a aumentar-se a portagem para financiar a outra ponte.

22
Sebenta Fiscal – 2018/2019 DNB

1. Há regulamento geral de taxas municipais e previa-se que os municípios podiam criar taxas
relacionadas com os serviços de proteção civil.
➢ As competências da proteção civil são muito amplas e ocorrem em todo o território,
mas estão delimitadas em cada município.

Portanto, à partida seria possível criar num município esta taxa, pois elas são delimitadas
espacialmente – quem beneficia são os residentes em Lisboa.
➢ Mas não são somente os residentes Lisboa que beneficiam da taxa -> há turistas,
pessoas que vêm trabalhar e etc.
o Há externalidades, o que caracteriza os impostos e não as taxas.
Em Lisboa seriam só os proprietários de imóveis a pagar.
➢ Ainda mais limitado o tributo é e ainda mais gente beneficia enquanto externalidade
(arrendatários e etc.)

Tribunal Constitucional concordou que objeto de incidência era demasiado limitado para ser
uma taxa.

3. Também havia um problema no cálculo do valor a pagar – era relacionado com o valor
patrimonial dos prédios que constava do IMI.
➢ Portanto, tinha uma lógica ad valorem típica dos impostos.
o Taxas têm lógica diferente: montante a pagar por uma taxa não pode ser ad
valorem e tem que ver com o custo-benefício.

Na taxa de proteção civil o montante teria de estar relacionado com o valor dos serviços
prestados.
➢ APD: para ser uma taxa, valor a pagar teria de ser distribuído sobre todos ou alguns
residentes e esse montante teria de estar relacionado com o custo dos serviços
prestados pela proteção civil e não poderia ser superior a esses serviços prestados.

2. No entanto, há outro problema:


O conceito de taxa exige que o bem/serviço seja presente, tem de existir e não pode ser futuro
ou baseado em riscos ou probabilidades – pagar à proteção civil é pagar por risco.

Esta Taxa, em Lisboa e Gaia, foi declarada inconstitucional.


➢ APD: boa decisão do TC, pois incide sobre um risco e não sobre um bem presente – este
tributo não pode ser configurado como taxa.

Portanto, as 3 Características das Taxas são:


• Sinalagma Jurídico – contrapartida por utilização de bem/serviço público
o Relação jurídica comutativa, ou seja, relação bilateral em que o pagamento do tributo
é a contrapartida pelo benefício de uma qualquer prestação concreta da Administração
Pública (através de um bem ou serviço).
• Bem ou serviço tem de ser presente e individualizável
• Lógica de custo-benefício (princípio da cobertura de custos < princípio da
proporcionalidade) – sinalagma económico

o Não era relacionado com o benefício de passar aquela ponte – era um custo para
pessoas que não iam ter o benefício futuro.

23
Sebenta Fiscal – 2018/2019 DNB

Contribuições Financeiras
Após a revisão CRP 1997 terminou a dicotomia entre impostos e taxa e introduziu-se uma
terceira categoria de tributos.
• Casalta Nabais: esta não é uma 3ª categoria de impostos e reconduz-se às outras duas.
• Ana Paula Dourado: é uma 3ª categoria e tem características próprias.

As Contribuições Especiais é uma categoria residual que enquadra:


• Tributos que não apresentem as características dos impostos, em especial a
unilateralidade e a cobertura da generalidade das despesas;
o Não podem apresentar uma quantificação ad valorem
• Tributos que não apresentem as características das taxas, em especial a bilateralidade
em sentido estrido;
• Tributos a favor de entidades públicas de base não territorial com características de
sinalagma difuso.

As Contribuições que têm sido criadas podem ser agrupadas em algumas categorias, tal como a
doutrina as tem sistematizado:
1. Serviços de Interesses Difusos – beneficiam concretamente alguns grupos de destinatários,
mas com externalidades positivas. Ex: prevenção de riscos naturais
➢ Sinalagma Difuso: não é bilateral nem unilateral e provoca externalidades positivas

2. Contribuições Especiais Parafiscais – financiam entidades públicas de base não territorial22


cuja atividade beneficia um grupo homogéneo de destinatários. Ex: taxas de financiamento das
entidades reguladoras23
➢ Pretende-se uma diminuição de custos associados à eficiência dos mercados, à
informação transparente e à livre concorrência.
➢ São parafiscais porque escapam ao orçamento do Estado ou de outras entidades
públicas.
➢ Dizem respeito aos “organismos de coordenação económica”

As taxas de regulação económica24 têm vindo a proliferar e são essenciais para financiar as
despesas e garantir a independência das entidades reguladoras – serviços prestados por
privados que ainda têm algum interesse público e/ou pretendem evitar a concorrência desleal.

Enquadram-se neste âmbito mas não têm efetivamente um enquadramento legislativo


orientador que guie a sua criação.25
• Os tributos (parafiscais) criados pelas entidades reguladoras estão relacionados com
a prestação de serviços às entidades reguladas26 – ao grupo das entidades reguladas -
> Sinalagma de Grupo

22
Elemento importante da parafiscalidade.
23
A parafiscalidade está relacionada com a regulação económica
24
Que o TC evitou qualificar tributariamente no Acórdão 613/08, embora reconhecendo que se
aproximavam de taxas.
Ana Paula Dourado enquadra nas contribuições especiais.
25
Paula Rosado Pereira: também as quotas para as ordens profissionais são contribuições financeiras, tal
como as “taxas” de audiovisual.
26
A parafiscalidade está relacionada com o sinalagma difuso e de grupo

24
Sebenta Fiscal – 2018/2019 DNB

o A utilidade não é individualizada – a reguladora vai ter atividade que beneficia


o conjunto das reguladas.
o Sinalagma difuso que provoca externalidades, que se limitam ao grupo.

Para não violarem os princípios constitucionais têm de respeitar os seguintes critérios materiais:
A. Contribuintes devem constituir grupo homogéneo
B. Contraprestação deve ser suportada pelo grupo de destinatários/beneficiários dos
serviços – pode ser o “conjunto dos regulados”
C. Deve existir uma utilidade do grupo
D. Montante deve suportar o teste de proporcionalidade/equivalência – por se
caracterizarem através de um sinalagma difuso, tem de se atender ao Princípio da
Equivalência que se traduz em:
• Benefício do grupo tem de ser repartido igualmente por todos os beneficiários,
presumindo-se uma utilidade ou benefício potencialmente idênticos, mesmo
que em cada ano fiscal esse benefício possa variar em concreto.
o O grupo de beneficiários deve pagar uma contraprestação igual – tem
de se presumir/assumir a igualdade, pois o sinalagma é difuso. Ex:
Gastos totais da Reguladora a dividir IGUALMENTE pelas Reguladas.
• Quantificação do montante do tributo é através da utilidade do grupo.
Correspondência entre o montante a cobrar e os custos da entidade reguladora,
observando-se os princípios da objetividade, transparência e não discriminação.
• Deve fixar-se o montante máximo do tributo a cobrar a cada operador, sob pena
de não existirem limites para os custos das entidades reguladoras e/ou de se
criarem tributos confiscatórios.

Se a quantificação deste sinalagma difuso se basear em critérios ad valorem, como tem


acontecido, então estamos perante um imposto pelo que se aplica a reserva de lei a cada
imposto.
➢ Lei portuguesa tem problema e quantifica este tributo por uma percentagem
o Portanto, está a fazer-se um juízo sobre a capacidade contributiva dos
contribuintes em causa e as Reguladas com mais lucro pagam mais.
▪ APD: é inconstitucional, mas TC nunca declarou.
▪ Quantificação do tributo pela capacidade contributiva está reservada à
AR (art. 165º/1/i CRP) e é apenas para os Impostos – estando a ser feita
para as Contribuições Especiais, estão a ser criados Impostos Ocultos,
contrários à CRP.
o Critérios ad valorem permitem que as reguladoras tenham as despesas que
quiserem, sem tal ser controlado pelas reguladas. Ao não relacionar com a
utilidade propiciada à entidade regulada, a reguladora cobra segundo os lucros
desta, tendo um orçamento maior ou menor consoante os lucros das reguladas,
apesar da utilidade para essas reguladas ser a mesma.

▪ TC até hoje só recorreu ao Princípio da Proporcionalidade para saber se


o montante cobrado não é manifestamente desproporcional.
❖ APD: TC não foi mais além e não evocou o Princípio da
Cobertura de custos.

25
Sebenta Fiscal – 2018/2019 DNB

❖ Único teste de constitucionalidade feito é a avaliação se o


montante cobrado não é manifesta desproporcional

Ex: Fundo de Resolução da UE


Instituições financeiras dos Estados-membros têm de depositar parte dos seus ativos nesse
fundo comum – montante que é para salvaguardar depósitos se uma instituição for à falência
➢ Objetivo é extrafiscal: de salvaguardar a estabilidade financeira da economia
o Mas vai para um fundo autónomo – quem cria estes tributos são entidades
reguladoras, que são entidades públicas de base não territorial.

3. Tributos Extrafiscais – contribuições com finalidades extrafiscais puras, destinadas a modelar


ou orientar comportamentos, mas, ao contrário dos impostos, os montantes cobrados são
afetos à compensação dos prejuízos causados pela rigidez dos comportamentos que se pretendia
orientar (consignação orçamental).
➢ Tudo o que for cobrado vai ser canalizado para o objetivo extrafiscal27.
➢ Não se pode confundir com sanções – os tributos não são consequência de proibições
baseadas em desvalores da ação que se pretendia alterar.
o Solução do TC no Acórdão 80/2014 não é correta.
➢ APD: na ausência da aprovação de um regime geral, não é admissível, num EDD, que as
contribuições financeiras e a extrafiscalidade fiquem libertas da reserva de lei que se
aplica aos impostos, dada a similitude com estes

Ex: tributo com tabaco, bebidas alcoólicas e bebidas açucaradas


• Objetivo do tributo é fiscal -> é um imposto com finalidade fiscal
o É um imposto, não um tributo fiscal porque não há consignação de receitas
relacionadas com os objetivos da extrafiscalidade.

Benefícios Fiscais
Desagravamentos fiscais que introduzem exceções à incidência tributária, prosseguindo
finalidades extrafiscais.
➢ A situação da vida recairia nas normas de incidência, mas estas são afastadas devido a
uma lei que introduz um regime mais benéfico.
o Por serem excecionais violam o princípio da igualdade – têm de ser justificados
por princípios que se sobreponham à igualdade e, em regra, ter duração
limitada.

Existem diversos tipos de benefícios fiscais e diversas técnicas de atribuição de benefícios


fiscais. Ex: isenções totais ou parciais, deduções à coleta, créditos fiscais presumidos e etc.

Art. 2º/1 Estatuto Benefícios Fiscais define este conceito: “Consideram-se benefícios fiscais as
medidas de carácter excecional instituídas para tutela de interesses públicos extrafiscais
relevantes que sejam superiores aos da própria tributação que impedem.”
• “Interesses públicos extrafiscais relevantes” é concretizado através dos princípios
materiais legitimadores dos benefícios fiscais:

27
Se não o for, estamos perante um Imposto, que pode ter finalidades extrafiscais cuja consequência da
sua falha é a arrecadação de receitas.

26
Sebenta Fiscal – 2018/2019 DNB

o princípio do bem-estar social (controla o arbítrio);


o princípio da proporcionalidade (atendendo à necessidade económica dos
contribuintes com repercussões positivas em toda a comunidade);
o princípio do ganho ou do mérito (recompensa fiscal de um comportamento que
serve o interesse geral).
• Deve haver relação entre princípios materiais legitimadores dos benefícios fiscais e os
princípios fiscais materiais.28

Há benefícios fiscais com certas finalidades – têm objetivos extrafiscais:


• Finalidades Económicas – como violam o princípio da igualdade, tem de verificar-se se
essas finalidades são superiores à violação desse princípio; verificar se as finalidades
prosseguidas são suficientes para justificar o benefício. Ex: benefícios fiscais à
Autoeuropa ou Google – têm de servir para se criar emprego, contribuir para aumentar
o PIB, revitalizar uma região e etc.
o Tem de estar claramente explicitado na lei, para melhor poder ser controlado,
quais os fundamentos do Benefício Fiscal.
▪ O controlo tem de ser feito pela AR e pelos Tribunais.29

• Finalidades Políticas – atendendo aos fins, tem de haver uma ideia de reciprocidade.
o Ex: isenções do pessoal diplomático e das embaixadas, com base na convenção
de Viena sobre Direito Diplomático – só há essa isenção quando a embaixada
exerce a sua atividade no sítio da isenção.

• Finalidades Culturais – de forma a apoiar realidades consideradas essenciais na


sociedade.
o Ex: mecenato

Ex: LEI DA LIBERDADE RELIGIOSA (LEI 16/2001)


➢ Deixa de fora a Igreja Católica – submetida a Concordata

Finalidades Religiosas: art. 21º -> exercício do culto e dos ritos, de assistência religiosa, de
formação dos ministros do culto, de missionação e difusão da confissão professada e de ensino
da religião.
➢ Quem prossegue estas finalidades são igrejas ou comunidades religiosas, sendo, à
partida pessoas coletivas que pagam IRC

28
Quando o escopo e a incidência desses Benefícios Fiscais são muito limitados tem de se ponderar se se
justifica a violação da igualdade.
29
Muitas vezes os Benefícios Fiscais com finalidades económicas são atribuídos com base em Contratos
Fiscais.
➢ São contratos entre o Ministro das Finanças e o contribuinte que beneficia dos Benefícios Fiscais.
o Como são celebrados com cada uma das entidades, eles devem ser públicos para
escrutinar a sua constitucionalidade – não podem ser contratos secretos. Ex: como
aconteceu com os acordos secretos entre a Google/Apple/Amazon e a Irlanda
o De um ponto de vista constitucional, o secretismo coloca sempre problemas de
igualdade

27
Sebenta Fiscal – 2018/2019 DNB

No entanto, há certas prestações que estão livres de impostos (art. 31º) e estas igrejas
beneficiam de certos benefícios fiscais (art. 32º).

Art. 31º - Prestações Livres de Imposto


1 - As igrejas e demais comunidades religiosas podem livremente, sem estarem sujeitas a
qualquer imposto:
a) Receber prestações dos crentes para o exercício do culto e ritos, bem como donativos
para a realização dos seus fins religiosos, com carácter regular ou eventual;
b) Fazer colectas públicas, designadamente dentro ou à porta dos lugares de culto, assim
como dos edifícios ou lugares que lhes pertençam;

Montantes cobrados pelas igrejas podem ir para 2 fins, estando livres de impostos: art. 31º/1/a
ou art. 31º/1/b

E se as coletas públicas (art. 31º/1/b) forem afetas à criação de uma SGPS para prosseguir
atividades lucrativas, também se pode isentar de imposto? A coleta inicial, ao ser passada para
uma SGPS, perde os benefícios fiscais?
• Essa SGPS pode estar mediatamente relacionada com os fins religiosos -> criação de um
canal TV para difundir a mensagem
• Essas SGPS podem ter outra atividade lucrativa qualquer

APD: pode ser criada a SGPS, pode ter muito lucro, mas, depois, tem de se fazer um controlo
dos lucros e para onde é que eles são canalizados.

E se esses montantes forem afetos à compra de apartamentos de luxo para certos membros da
igreja?
➢ APD: atendendo ao art. 103º RGIT, a obtenção indevida de benefícios fiscais pode
constituir uma fraude fiscal.
o Não deve ser atribuído o benefício se houver essa afetação à compra de
apartamentos de luxo sem a comunicação ao fisco.
➢ É uma situação de abuso de confiança – há apropriação indevida dos montantes pois
eles eram destinados à Igreja/Comunidade Religiosa e foram canalizados para certas
pessoas específicas para as quais não se dirigiam.

Sem o art. 31º haveria muitas situações que cairiam na capacidade contributiva e seriam
tributadas em sede IRC.
➢ Esta norma vem excecionar o âmbito da incidência, tendo de ser justificada por
princípios superiores à violação da igualdade e trazer um contributo de bem-estar
geral na sociedade.

28
Sebenta Fiscal – 2018/2019 DNB

RELAÇÃO JURÍDICA TRIBUTÁRIA


Conceito em torno do qual se desenvolve o Direito Fiscal

Relação Jurídica Tributária – relação de Direito Público entre sujeito ativo e sujeito passivo e,
como tal, confere a estes últimos direitos e deveres.
• Lei Geral Tributária: tem por objeto a disciplina dos direitos e deveres dos sujeitos
passivos, na sua relação jurídica tributária, contendo também o procedimento
tributário.

Título II LGT: Relação Jurídica Tributária


I. Capítulo I – SUJEITOS da Relação Jurídica Tributária
II. Capítulo II – OBJETO da Relação Jurídica Tributária
➢ Relação jurídico-tributária Estática
III. Capítulo III – CONSTITUIÇÃO e ALTERAÇÃO da Relação Jurídica Tributária
IV. Capítulo IV – EXTINÇÃO da Relação Jurídica Tributária
➢ Relação jurídico-tributária Dinâmica

A definição e caracterização dos Sujeitos e Objeto da relação jurídico-tributária é um


pressuposto do procedimento tributário (art. 54º LGT30) – são elementos essenciais dessa
relação (são elementos essenciais do Tatbestand sistemático de imposto).

O procedimento dirige-se não só à declaração de direitos mas também de deveres tributários,


consoante o caso, e há uma pluralidade de procedimentos – significa também a pluralidade de
relações jurídicas tributárias.

SUJEITOS da Relação Jurídica Tributária


SUJEITO ATIVO: art. 18º/1 e 2 LGT
• Entidade de Direito Público titular do direito de exigir o cumprimento das obrigações
tributárias, quer diretamente, quer através de representante.
o É titular do crédito tributário e de outras pretensões tributárias.
• Sujeito ativo pode coincidir ou ser distinto do sujeito que é titular da receita tributária31.
o Referência à representação abre a possibilidade de a exigência do tributo ser
efetivada por uma entidade pública diferente do sujeito ativo ou até mesmo por
uma entidade privada

SUJEITO PASSIVO: art. 18º/3 e 4 LGT


• O art. 18º/3 contem conceito-quadro de sujeito passivo, o qual tem de ser definido, em
cada caso, pela lei respetiva.
o O conceito de sujeito passivo é mais amplo do que o adotado neste artigo.
o APD: sujeito passivo é aquele que, nos termos da legislação tributária, está
obrigado ao cumprimento de uma prestação tributária de natureza material
ou formal.

30
Sucessão de atos dirigidos à declaração de direitos tributários
31
Pode ser o Estado, as Regiões Autónomas, as Autarquias Locais, ou qualquer entidade pública de base
não territorial.

29
Sebenta Fiscal – 2018/2019 DNB

▪ Pode tratar-se de uma pessoa singular ou coletiva, de uma entidade


constituída segundo os requisitos legais ou em desrespeito destes, de
um património, de uma organização de facto ou de direito ou de
qualquer outro agrupamento de pessoas, consoante a previsão legal.
• A densificação deste conceito, em cada código de imposto ou lei procedimental, deve
ser o mais ampla possível para atingir os sujeitos que se encontrem na mesma situação
material, de modo a evitar comportamentos elisivos ou abusivos.
• Não adquire a qualidade de sujeito passivo quem: suporta o encargo do tributo por
repercussão e não tenha direitos nem deveres perante o sujeito ativo; quem deva
prestar informações sobre assuntos tributários de terceiros, exibir documentos, emitir
laudo em processo administrativo ou judicial ou permitir o acesso a imóveis ou locais de
trabalho (art. 18º/4 LGT).

Categorias de Sujeitos Passivos


Categorias que se enquadram na relação jurídica tributária.

1. Contribuinte
= contribuinte direto = contribuinte originário = substituído = devedor do imposto

Sujeito relativamente ao qual se verificam os pressupostos do pagamento de impostos.


➢ Contribuinte é o sujeito passivo obrigado por lei a pagar tributos ou outros encargos
legais a estes associados.

Contribuinte de facto é um conceito não jurídico, originado pelo fenómeno da repercussão


tributária – extrapola a relação jurídica tributária e não atribui direitos nem deveres.
➢ A lei afirma no art. 18º/4/a LGT que não é sujeito passivo quem suporta o encargo do
imposto por repercussão legal, mas, atribui-lhe alguns direitos nos termos das leis
tributárias (Lei nº 55-A/2010).
o Ou seja, a lei reconhece legitimidade processual ativa ao consumidor final ou
adquirente de serviços para reclamar administrativamente ou impugnar
judicialmente o ato tributário.
o Isto significa que o consumidor final ou adquirente de serviços de IVA é um mero
sujeito passivo no nosso ordenamento jurídico. Não é tratado como mero
contribuinte de facto, mas como contribuinte.
▪ Ao contrário do que se afirma no art. 18º/4/a LGT, no nosso
ordenamento, a repercussão legal implica que quem a suporta é sujeito
passivo (repercussão legal é a que existe no IVA), e só a repercussão
fáctica, não prevista na lei, é que não atribui legitimidade
procedimental e processual a quem suporte o encargo do imposto.

2. Substituto Tributário
Sujeito que tem obrigações conferidas por lei, relacionadas com a retenção do imposto do
contribuinte e que tem de ser entregue ao fisco.
➢ Sujeito passivo que, por imposição da lei, está obrigado a cumprir prestações
materiais e formais da obrigação tributária em lugar do contribuinte – art. 20º/1 LGT

30
Sebenta Fiscal – 2018/2019 DNB

o É sujeito passivo, mas não é contribuinte – quem está a ser tributado não é o
substituto, ele apenas auxilia a tributação do substituído.

Substituição efetivada através do mecanismo da RETENÇÃO NA FONTE – art. 20º/2 LGT

Figura que surgiu no Reino Unido, no final do séc. XIX, como um meio de prevenir a evasão fiscal
– sucesso mundial e adotada em muitos Estados.
• O fisco recorre a uma entidade privada – A)devedora de rendimentos e B)com
contabilidade organizada (de modo a permitir o controlo das retenções e entrega do
imposto retido) – para o auxiliar a liquidar e cobrar receitas fiscais32.
o 1º Dever: retenção
o 2º Dever: entrega ao fisco
• Recaem normalmente deveres de retenção na fonte sobre as entidades empregadoras,
as entidades que prestam serviços, as entidades financeiras que pagam rendimentos de

Relacionado com impostos periódicos de formação sucessiva. Ex: rendimento do trabalho


dependente – para o trabalhador, obrigação tributária só surge a 31 de dezembro e declaração
e pagamento são feitos no ano seguinte.
➢ Para auxiliar o contribuinte, que fica desobrigado de um pagamento avultado – não tem
de estar preocupado a poupar para depois pagar.

Os deveres de retenção e entrega do tributo significam a delegação do exercício de uma


atividade que, em princípio, deveria caber ao fisco, mas entende-se que o exercício desta
funções no interesse público33, não restringe desproporcionalmente o direito ao exercício de
atividades privadas e por isso não é inconstitucional.
➢ O tributo retido e pago pelo substituto, ainda que indevidamente, é considerado como
tendo sido pago em nome e por conta do substituído.

A entrega de tributo por parte do substituto ao fisco, sem ter existido retenção do mesmo,
confere direito de regresso por parte do substituto em relação ao substituído, a exercer nos
termos da lei civil.

Outras manifestações de substituição tributária – liquidação e cobrança por entidades


prestadoras de serviços a clientes
➢ Ex: contribuição para o audiovisual, taxa de exploração para a Direção Geral de Geologia
e Energia, taxa municipal de direitos de passagem e etc.
Esta figura abrange outras situações além do trabalho dependente.
➢ Ex2: instituição financeira paga juros e retém na fonte – contribuinte recebe juros
líquidos.
➢ Ex3: Imposto de Selo – particular pede dinheiro emprestado ao banco e depois paga-lhe
com juros. Sobre esses juros recai imposto de selo, que vai ser o Banco a pagar ao Fisco
(apesar de ter de ser o particular a fazê-lo), portanto, cobra ao particular os juros + esse
imposto. Não é um caso de retenção na Fonte, pois é o oposto

32
Mecanismo da Substituição é útil para garantir a capacidade financeira do Estado – retenção na fonte
diminui o risco e aproxima o facto pelo qual se cobra o imposto e a sua entrada nos cofres do Estado
33
Prevenir a evasão fiscal aliado ao princípio da praticabilidade (dado o Direito Fiscal ser um direito de
atos-massa).

31
Sebenta Fiscal – 2018/2019 DNB

Pode ser:
A. A título definitivo
• Imposto de Obrigação Única – no ato do pagamento do imposto extingue-se a
obrigação. Ex: juros34

Substituição Total
• Não-Residentes: há logo obrigação do substituto de reter definitivamente na fonte, com
taxa liberatória
o Retenção a Título Definitivo, devido a ser difícil tributar o não-residente, pelo
facto de que quem tem informação para tributar o imposto pessoal é o Estado
da residência.
• Residentes (Categora E, IRS): há taxa liberatória que libera o contribuinte de qualquer
outra obrigação de contribuição – caso dos juros que recebe do banco
o Retenção a Título Definitivo, devido a tal não ser englobável.

B. Por conta do imposto devido no final


= retenção provisória = retenção por conta
• Impostos de Formação Sucessiva – o acerto é feito no final do ano. Ex. IRS
o Pois no final do ano é que se vê qual a taxa que se vai aplicar ao indivíduo.
o Estas retenções não são definitivas porque pode haver acertos
o Paula Rosado Pereira: as Retenções são apenas aproximações do que é devido
como imposto – essa aproximação deve ser o mais aproximado possível da
obrigação fiscal de imposto.
▪ Não gosta da expressão “pagamento por conta” – isso é da Categoria B
do IRS e é o contribuinte que paga.
▪ Prefere “retenção por conta” ou “adiamento por conta”.

Quanto ao trabalho dependente, só é uma Retenção por Conta se o Sujeito Passivo for
RESIDENTE em Portugal.

Substituição Parcial
• Há uma aproximação ao imposto final – Contribuinte ainda depois vai ter
responsabilidade de verificar o acerto (pagar ou receber), não está liberado

Se não houve retenção, substituído recebeu montante bruto do salário (livre de imposto) – é
sobre ele que o Fisco vai agir, pois é sobre ele que recai obrigação de imposto.
➢ Se ele não tiver património suficiente vai haver lugar a Responsabilidade Tributária –
entidade empregadora violou o seu dever, sendo a consequência que ela se torna
responsável tributária.

3. Responsável (em Responsabilidade Tributária)


Art. 18º/3 – Responsável é aquele que está sujeito a Responsabilidade Tributária

34
Diferença entre os jutos e o rendimento do trabalho dependente é que o rendimento do trabalho
(categoria A, IRS) é englobado e sujeito a progressividade e o rendimento de capitais (categoria E, IRS) é
tributado a uma taxa fixa e não são englobados.

32
Sebenta Fiscal – 2018/2019 DNB

Responsável tributário é o sujeito passivo que violou deveres legais e a quem é exigido, na
sequência dessa violação, o pagamento de uma dívida tributária de outrem (sujeito passivo
originário = contribuinte = substituído), não atempadamente paga – art. 22º/4 LGT
➢ Pelo facto de a responsabilidade tributária ser uma responsabilidade pela dívida de
outrem35, ela não deve ser reconduzida à responsabilidade civil. Também não é
responsabilidade criminal.

A exigência do pagamento da dívida ao sujeito passivo originária não corresponde à figura da


responsabilidade tributária, mas ao cumprimento da obrigação de imposto – art. 22º/2 LGT está
errado.
➢ APD: Art. 22º/2 trata, sob a figura da responsabilidade tributária, duas realidades: a da
obrigação tributária (art. 22º/2/1ª parte) e também a da responsabilidade tributária.

Essa responsabilidade é sempre subsidiária, se a lei não estabelecer uma responsabilidade


solidária – art. 22º/4 LGT.
➢ Isto significa que autoridade tributária tem de executar primeiro o património do
responsável primário (substituto – art. 28º/3) ou do obrigado tributário (substituído –
art. 28º/2) e, na ausência ou insuficiência, pode executar o património do sujeito referido
na lei (que pode ser outro substituto. Ex: responsabilidade de órgãos sociais).

Entidade empregadora reteve e não entregou – Fisco vai à entidade empregadora pedir.
➢ Presunção da lei que trabalhador não consegue saber se o retido foi entregue – ele não
tem domínio da situação e a sua responsabilidade extinguiu-se quando recebeu
rendimento líquido.

Responsabilidade tributária efetiva-se por reversão do processo de execução fiscal (art. 23º/1
LGT).
➢ A reversão contra o responsável subsidiário depende da fundada insuficiência dos bens
penhoráveis do devedor principal e dos responsáveis solidários, sem prejuízo do
benefício da execução (art. 23º/2 LGT).

Quando os pressupostos da responsabilidade se verifiquem em relação a mais de uma pessoa,


todas são solidariamente responsáveis pelo cumprimento da dívida tributária – abrange toda a
dívida, juros, multas e demais encargos legais.

TIPOS DE RESPONSABILIDADE TRIBUTÁRIA


i. Responsabilidade do Titular de Estabelecimento Individual de Responsabilidade Limitada –
art. 25º LGT
➢ É uma avaliação de culpa funcional: se o titular do EIRL dissipou património do mesmo,
sem cuidar das dívidas tributárias.
ii. Responsabilidade Tributária dos Liquidatários das Sociedades – art. 26º LGT
iii. Responsabilidade de Gestores de Bens ou Direitos de Não Residentes – art. 27º LGT
iv. Responsabilidade em Caso de SUBSTITUIÇÃO TRIBUTÁRIA – art. 28º LGT

35
Especificidade da responsabilidade tributária: obrigação por dívida de outrem.

33
Sebenta Fiscal – 2018/2019 DNB

➢ Responsabilidade que ocorre se forem violados os deveres do substituto tributário:


deveres de retenção + deveres de entrega.
o Violação pode ocorrer em relação a um ou a ambos destes deveres
complementares.
o Esta responsabilidade tributária aplica-se em relação a quaisquer impostos
devidos pela pessoa coletiva (ou ente fiscalmente equiparado).

Art. 28º/1 – Retenção na fonte, mas Não entrega do imposto


→ Responsabilidade: Substituto

Substituto tributário é o único responsável pelo imposto retido e não entregue.


➢ Substituído fica liberto de quaisquer obrigações relacionadas com a retenção.
o Existe a presunção que o substituído não sabe nem tem possibilidade de saber
se o montante retido foi entregue ao fisco – apenas sabe que o montante foi
retido, ficando liberto de quaisquer obrigações.
➢ Substituto reteve montantes que não são propriedade sua, portanto, não há
justificação para os aplicar a outras finalidades – montante nunca é da empresa, mesmo
estando entregue à sua confiança, é sempre do Estado.

Art. 105º RGIT – pode gerar abuso de confiança, quando se desviam os montantes das suas
finalidades.

Art. 28º/2 – Não retenção na fonte do imposto por conta (e consequente não entrega)
→ Responsabilidade: Substituído e, subsidiariamente, Substituto

Cabe ao substituído a obrigação de pagar o tributo não retido e ao substituto a responsabilidade


subsidiária.
➢ O contribuinte recebeu o seu rendimento bruto, uma vez que não foi objeto de
retenção na fonte, cabendo-lhe, portanto, satisfazer a obrigação do imposto36.
o Caso haja fundada insuficiência para pagar a dívida tributária (art. 23º/2 LGT), o
substituto será responsável subsidiário, pois violou o seu dever de retenção.
o Nessa situação, o substituto também é responsável por juros compensatórios,
desde o termo do prazo de entrega dos montantes que deveriam ter sido
retidos, até à data em que se efetivar o pagamento ou até ao termo do prazo
para o pagamento do tributo pelo substituído (art. 35º LGT).

Art. 28º/3 – Não retenção na fonte a título definitivo (e consequente não entrega)
→ Responsabilidade: Substituto

Substituto tem responsabilidade originária pelo pagamento do tributo não retido e respetivos
juros compensatórios.
➢ Ao substituído cabe apenas responsabilidade, pelo cumprimento da sua própria
obrigação tributária, a título subsidiário.
o Em casos de retenção definitiva é mais difícil a Autoridade Tributária recuperar
o montante devido junto do substituído37:

36
APD: não é “responsabilidade tributária” mas sim a obrigação de pagar imposto que sobre ele recai.
37
APD: Lógica da praticabilidade e de quem é mais fácil alcançar

34
Sebenta Fiscal – 2018/2019 DNB

▪ se for residente, não os tem de englobar nem incluir na declaração anual


de imposto;
▪ se não for residente é muito difícil recuperar o montante pois há poucos
mecanismos de auxílio a cobrança entre Estados (existe uma diretiva
europeia a prever isso no seio da UE mas é um processo muito
burocrático e oneroso).
o Apesar de tudo, o substituto pode exercer o seu direito de regresso ao abrigo do
CC junto do substituído – o Direito Fiscal desvincula-se desta questão.

v. Responsabilidade dos MEMBROS DOS CORPOS SOCIAIS E RESPONSÁVEIS TÉCNICOS – art.


24º LGT
APD: este regime é singular e não há semelhante na UE nem fora.
➢ É regime gravoso (devido ao art. 24º/2) pois os gestores respondem com o património
pessoal por dívidas de outrem – há reversão para o seu património pessoal.

Parte-se do art. 28º e só se a pessoa coletiva não tiver património é que se vai para o art. 24º
• Caso de Sociedade em que há decisão tomada por um dos gestores de não entrega dos
montantes ao fisco no prazo exigido por lei.
o Contribuinte ficou liberto da sua obrigação porque houve retenção.
o Há responsabilidade tributária da entidade empregadora, cujo património vai
ser executado.
▪ Mas Sociedade não tem património suficiente.
➢ Pode haver uma responsabilização do gestor – art. 24º LGT.
➢ Responsabilidade é do gestor que tomou a decisão ou do que
no momento do pagamento não o efetuou?

Gestores de direito ou de facto38 de pessoas coletivas (e entes fiscalmente equiparados) são


subsidiariamente responsáveis em relação a estas e solidariamente entre si pelas dívidas
tributárias cujo facto constitutivo se tenha verificado no período em que exerceram o cargo,
ou pelas dívidas cujo prazo legal de pagamento/entrega tenham terminado no período de
exercício do cargo, consoante o caso, se tomaram a decisão de não pagamento da mesma ao
fisco, ou participaram em tal decisão.

Tem de se provar que o património da pessoa coletiva não se tornou insuficiente para a
satisfação das dívidas por culpa do gestor.

38
Gestor de Facto vs. Gestor de Direito
➢ De facto – pode ser responsabilizado
➢ De direito – discussão na jurisprudência
o E se na prática esteve ausente e não teve contacto com a Sociedade?
▪ Negligência não liberta de culpa quanto à responsabilidade tributária.
o E se tinha o pelouro mas não sabia de nada?
o Tem de se avaliar caso a caso e ver se pode ser liberto de responsabilidade.
▪ APD: só fica liberto de responsabilidade se houver gestor que de facto assumiu
essas funções. Não pode é haver presunção de gestão de facto – a gestão tem
de ser aferida no caso e a jurisprudência que advoga essa presunção merece
crítica.

35
Sebenta Fiscal – 2018/2019 DNB

A) Caso em que o facto constitutivo das dívidas tributárias verificou-se no período em que
gestor exerceu o cargo e o prazo legal de pagamento/entrega terminou depois deste cessar
funções
• Não existe presunção de culpa se o prazo legal de pagamento/entrega terminou depois
do exercício do cargo.
• Na dúvida, o ónus da prova funciona a favor do gestor.

B) Caso em que no prazo legal de pagamento/entrega há gestor em funções não responsável


pelo facto constitutivo das dívidas tributárias
• Existe presunção de culpa dos gestores pelas dívidas tributárias cujo prazo legal de
pagamento/entrega tenha terminado no período de exercício do seu cargo39, quando
não provem que não lhes é imputável a falta de pagamento.
• Na dúvida, o ónus da prova funciona contra o gestor.
o Lei presume que o gestor no momento do pagamento é o gestor que tomou a decisão.
o Esse gestor é que tem de demonstrar que não foi culpa sua.

Não há responsabilidade objetiva.


➢ Pode é existir presunção legal de culpa – art. 23º/4 LGT

O ónus da prova pode correr contra o substituto-responsável tributário (art. 24º/1/b LGT).
➢ Mas essa culpa do substituto tem de ser apurada, apesar do disposto no art. 28º LGT

Como se averigua a Culpa?


Existe culpa se for cometido crime ou contraordenação de abuso de confiança fiscal, de falta na
entrega da prestação tributária ou crimes de fraude fiscal.
➢ A condenação em sede do RGIT significa a culpa também para efeitos de
responsabilidade tributária.

Noção funcional de culpa: não é juízo de mérito do gestor, mas sim aferição se o gestor cumpriu
ou não os deveres tributários e tinha ou não competência legal ou factual para tal.40

Averiguação de culpa:
1º. Identificação do responsável pela decisão de não cumprir o dever tributário de retenção
e/OU entrega do tributo41;
2º. Ter em conta os deveres de diligência e a relação existente entre o presumível
responsável e o sujeito passivo originário.
a. No caso de Sociedades, deve indagar-se acerca da boa organização da sociedade
e se havia um departamento responsável pelas obrigações tributárias – permite
saber se essa boa organização lhe permite cumprir devidamente as suas
obrigações ou se é defeituosa42.

39
Presunção da alínea b), que só depois de ilidida é que se pode indagar da presunção da alínea a)
40
Deve ter-se em conta o estado de necessidade, a situação de impossibilidade absoluta, consentimento
da instituição credora, erro desculpável e etc.
41
Temos de ver quem tomou a decisão e o porquê de ela ter sido tomada – pode haver uma explicação,
nos termos da lei, que evita que o gestor se torne responsável tributário.
42
APD: Devido à crise de 2008, há uma necessidade de os departamentos de compliance da Sociedade
estarem bem delimitados e perceber-se bem quem pode ser responsabilizado.
➢ Apura-se melhor se a responsabilidade do gestor.

36
Sebenta Fiscal – 2018/2019 DNB

b. Se existir uma organização empresarial defeituosa estamos perante caso de


culpa da sociedade, para efeitos de responsabilidade tributária.
c. Se não existir uma organização empresarial defeituosa, cabe averiguar por que
razão não foram pagos os tributos devidos43.

Na apreciação dos deveres de diligência há que ter em conta que decorre um período entre a
retenção e a entrega, durante o qual o particular substituto não deve ser visto como um fiel
depositário
➢ APD: apesar de implicitamente ser isso que a jurisprudência entende.
➢ Os montantes são fungíveis, podendo ser movimentados durante esse período – gestor
tem de os gerir de forma razoável.
o Pois a pessoa coletiva não é proprietária do património, que é do Fisco, pelo que
o gestor deve tratá-lo como montante alheio.

Se a organização empresarial for adequada, implica avaliar o risco envolvido nas


movimentações dos montantes devidos ao fisco, que não são propriedade do substituto.
➢ O risco, no caso concreto, pode significar uma maior ou menor diligência.
o Nestas ponderações, deve prevalecer o máximo dever de diligência para com os
montantes cobrados ou retidos e a entregar ao Estado, dado que tais montantes
não foram gerados no quadro da atividade empresarial da entidade que os
cobra ou retém, mas derivam das suas obrigações tributárias.

3º passo: para averiguar a culpa é necessário indagar por que razão o património da sociedade
se tornou inexistente para pagar a dívida do imposto.
➢ Ou seja, saber se o gestor contribuiu para essa insuficiência ou inexistência.
o Não é um julgamento de mérito e é saber se o comportamento do gestor foi
diligente, ou não, tendo sempre em vista assegurar o cumprimento de todos
os deveres fiscais da sociedade.

Se não houve crime fiscal (fraude; abuso de confiança e etc.) e não havia intenção de ocultar e
desviar, tem de se perguntar qual o risco assumido por parte do gestor.
Ex: gestor deposita montante numa instituição financeira, que depois fica insolvente – não podia
prever isto, portanto, o risco corrido ao se depositar lá os montantes é baixo.

➢ É mais fácil para ir logo para a responsabilização do gestor do art. 24º.


43
Se há boa organização da sociedade, à partida, a sociedade em si, não incorre numa situação de culpa,
para efeitos de responsabilidade tributária.

37
Sebenta Fiscal – 2018/2019 DNB

Se for afeto a pagar outras obrigações fiscais também pode não ter risco elevado.
➢ Ex: pagou IRC da empresa, pois à partida os reembolsos do IVA iam fazer retornar o
montante.
o Lógica de compensação em sentido amplo.
➢ Não havia muito risco porque o gestor contou que o Estado fosse um devedor fiável –
mas para isso tem de se ter em conta as condições económicas atuais do Estado.

APD: ponderação tem de ser feita caso a caso, tendo em conta o risco concreto do gestor
➢ Análise de substância da culpa vale para o que tomou a decisão e para o que estava no
cargo no momento do pagamento.

Resumo:
• À partida, quando à situação de crime automaticamente há responsabilidade tributária
– os pressupostos do crime são mais exigentes.
• Não existindo situação de crime fiscal (como a fraude fiscal), tem de se averiguar a
culpa, que implica saber se a sociedade estava bem organizada, com departamento
responsável pelo cumprimento das obrigações tributárias, quem eram os gestores desse
departamento e aqueles que, em concreto, foram responsáveis pela decisão.
• A partir desses gestores, temos de aferir como se tomou a decisão e se eles assumiram
um risco elevado ou se a decisão de não pagar imediatamente não corria risco.

Responsabilidade do gestor pode ocorrer em 3 situações:


1. Património da sociedade não é suficiente para pagar dívida de IVA não cobrado e entregue
– é um risco mais severo e só excecionalmente se pode afastar a culpa dos gestores, quando o
risco corrido era quase nulo.
➢ Não é idêntica às retenções na fonte do IRS.

É cobrado IVA e tem de ser entregue ao Fisco.


➢ IVA cobrado é montante do Estado (o prestador de serviços é mero depositário).
➢ Sendo montante que não lhe pertencia, se no momento do vencimento do prazo este
não tiver sido entregue, então vai ser difícil tentar libertar-se de culpa.
o Tem de se aferir se há justificação para uma afetação a outras finalidades.
▪ APD: é mais difícil haver justificação para não ter culpa do que no caso
do IRS – no caso do IRS essas justificações podem ter a ver com o
pagamento de salários44.

2. Património da sociedade não é suficiente para pagar dívida de IRS ou montantes para a
segurança social retidos.

3. Património da sociedade não é suficiente para pagar dívida de IRC da sociedade – este caso
não é de Responsabilidade, a dívida é da Sociedade.

44
Não foi entregue o montante ao fisco porque, numa situação de crise, o gestor teve de pagar salários
evitando despedir trabalhadores – argumento que normalmente não é aceite, todavia é muito invocado.
➢ art. 103º/1, 2 e 104º vs. art. 59º/1/a CRP.
➢ Esta justificação não faz sentido no IVA, imposto externo em que sujeito passivo é mero
depositário.

38
Sebenta Fiscal – 2018/2019 DNB

Se não for acompanhada de crime, os deveres de diligência do gestor em relação ao


cumprimento dos deveres tributários da sociedade têm de ser tidos em conta.
➢ Cabe perceber se a insuficiência patrimonial se deveu a aplicações arriscadas desses
montantes ou se o risco era pequeno ou quase inexistente.
o APD: culpa individual funcional e não societária, pelo que o pagamento dos
salários dos trabalhadores pode justificar a não reversão da execução fiscal,
relativamente a cobrança de IRC.

Findo o prazo de constituição da dívida e no momento do pagamento a Sociedade não tem


património – temos de ver se a culpa de não haver património é dos gestores.
• Não se pode equiparar a Responsabilidade Tributária e não tem associado um juízo de
boa ou má gestão.
• Nestes casos não há reversão para o gestor

Diferença entre o IRC e o IVA + IRS é que nestes últimos temos impostos de outrem, que tinham
de ser geridos com diligência por parte da Sociedade, cujo gestor tinha a responsabilidade por
esse tratamento.
➢ No caso do IRC, é um imposto que é devido pela própria sociedade – portanto, se o
património falhou, desde que não tenha havido crime (delapidação danosa do
património) não há reversão da execução do património.

Aos Responsáveis Técnicos cabe assegurar o respeito pela lei civil ou fiscal.
• Se tiver havido violação dos deveres de entrega e de cooperação por parte dos gestores
da sociedade, cabe aos responsáveis técnicos revelar tais factos, desde que devam
tomar conhecimento deles na tarefa de certificação de contas das sociedades ou
pessoas coletivas que auditarem.
• Os responsáveis técnicos também podem ser responsabilizados por falsas declarações
fiscais.

v. Outras Situações que Poderiam Conduzir a Responsabilidade Tributária


Responsabilidade do substituto por registo incorreto na contabilidade – a lei não prevê uma
solução de responsabilidade tributária (do substituto) quanto à diferença resultante entre o
montante de tributo que o substituído deveria ter pago sobre estes montantes e o montante do
tributo efetivamente pago.

39
Sebenta Fiscal – 2018/2019 DNB

Não estão previstas expressamente outras responsabilidades

4. Promotores e Utilizadores de Esquemas de Planeamento Fiscal Agressivo


DL 29/2008, DE 25 DE FEVEREIRO
→ criou uma nova categoria de sujeitos passivos, sobre os quais cabe o dever de
comunicação ao diretor-geral dos impostos de esquemas ou atuações de planeamento
fiscal.45
o É nova categoria de sujeito passivo pois há deveres legais de prestação formal:
obrigação de comunicação
▪ Surgiu devido à globalização e liberdades europeias tornarem difícil às
autoridades tributárias conhecerem os vários esquemas que existem e
aferir da sua legalidade.

É promotor qualquer entidade com ou sem personalidade jurídica, residente ou estabelecida


em qualquer circunscrição do território nacional, que, no exercício da sua atividade económica,
preste, a qualquer título, com ou sem remuneração, serviços de apoio, acessória,
aconselhamento, consultoria ou análogos no domínio tributário, relativo á determinação da
situação tributária ou ao cumprimento de obrigações tributárias de clientes ou de terceiros.
➢ Ao traçarem-se esquemas para a poupança fiscal, aproveitando lacunas da lei.
➢ Sempre que há indivíduos ou sociedades a promover planos de poupança, aproveitando
as lacunas da lei, estamos nesta categoria.

45
Conceito que surge relacionado com o Direito Fiscal Internacional

40
Sebenta Fiscal – 2018/2019 DNB

o Podem ser ROC e Sociedades ROC + Advogados e Sociedades de Advogados46 +


Solicitadores e Sociedades Solicitadores + TOC e Sociedades TOC + Instituições
Financeiras

Deve comunicar os esquemas ou atuações de planeamento fiscal quando tenha participado ou


colaborado na respetiva conceção ou proposta ou quando tiver acompanhado a sua elaboração,
adoção ou implementação.
➢ Estes intermediários podem existir, mas têm este dever.
➢ É um dever abstrato em que não é preciso identificar os clientes em concreto – basta
comunicar quais os esquemas que os clientes têm
o Utilidade é Fisco ter noção do que acontece (conhecer esquemas que estão a
ser levados a cabo) para depois investigar se há ilegalidades ou ilicitude.
▪ Forma de Fisco se antecipar a comportamentos de ilegalidade ou
ilicitude.
o Pode também servir para colaborar com outras autoridades tributárias.

Se promotor não for residente ou não tiver havido promotor, cabe ao utilizador proceder à
sua comunicação ao diretor-geral de impostos.

Diretiva DAC 6 822/2018, de 25 de maio


➢ UE vem exigir a comunicação desses planeamentos e a identificação dos clientes.
o Se Promotor invocar SIGILO então são os próprios clientes a ter o dever de
comunicar – haver sigilo da parte do promotor não desobriga o cliente do dever
de comunicar o esquema ao Fisco.
▪ Advogados: só há sigilo se houver litígio em concreto; não se pode
invocar sigilo quando ainda não há representação em litígio concreto –
aí tem o dever de comunicar.

5. Sucessão Tributária
Art. 29º/2 LGT – pode haver transmissão das obrigações tributárias em caso de sucessão
universal por morte.
➢ Esta transmissão pode corresponder a obrigações tributárias originárias ou subsidiárias,
o que significa que cobre a responsabilidade tributária.

PRESTAÇÃO TRIBUTÁRIA na Relação Jurídica Tributária


Prestação tributária não é apenas a prestação de pagamento do tributo.
➢ Abrange prestações materiais e formais.

O seu incumprimento, consoante a sua gravidade, dá origem a sanções nos termos do RGIT.

Os deveres de cooperação e de colaboração dos sujeitos passivos estão no centro das


prestações tributárias.
➢ Sem o seu correto cumprimento não é possível tributar o rendimento real, não é
possível aplicar os métodos diretos, não é possível arrecadar a receita do IVA.

46
O escândalo dos Panama Papers revelou que havia escritórios de advogados que faziam esquemas de
planeamento fiscal agressivo

41
Sebenta Fiscal – 2018/2019 DNB

O cumprimento dos referidos deveres é também atualmente exigido pelos padrões


internacionais de troca de informações entre autoridades tributárias, com o auxílio a cobrança
entre essas autoridades.

Relação Jurídica Tributária DINÂMICA


Relação Jurídica é uma relação de Direito Público, complexa, composta por diversos
procedimentos tributários e exemplificados pelo art. 54º/1 LGT.

De entre os diversos procedimentos tributários.


• a liquidação dos tributos (efetuada pela Administração Pública)
• ou autoliquidação (efetuada pelos sujeitos passivos), seguida de pagamento ou
cobrança da prestação do tributo
Procedimentos principais da relação jurídica tributária.

Os restantes procedimentos podem ser acessórios ou complementares ao objetivo de cobrança


do tributo.
• Eles incluem um conjunto de deveres de cooperação ou colaboração, que são
essenciais à determinação do rendimento real do contribuinte ou a uma cobrança
efetiva do IVA.

Também há procedimentos que disciplinam os litígios entre o sujeito passivo e o Fisco e o


reconhecimento de ilegalidades pela própria administração tributária.

Tatbestand Sistemático de Imposto47


Conjunto de pressupostos que a lei deve descrever para que ocorra a obrigação tributária
principal
➢ Conjunto de elementos essenciais da relação jurídica tributária e que podem resultar na
pretensão tributária.

Abrange elementos indiciadores de capacidade contributiva, cuja verificação é necessária para


o apuramento do montante de imposto a pagar.

O tatbestand está relacionado com a arrumação e juridificação da relação do imposto,


permitindo uma linguagem comum do Direito Fiscal nos vários ordenamentos jurídicos
➢ A identificação dos elementos essenciais do Tatbestand tem como funções principais
sistematizar a obrigação jurídica de imposto, orientar o procedimento tributário e
também densificar a reserva de lei.
➢ A configuração destes elementos foi contemporânea da introdução de impostos sobre
o rendimento real e de caráter pessoal.

O tatbestand orienta o procedimento de liquidação dos tributos efetuado pela administração


– art. 44º/1/b CPPT

47
Remonta a Hensel e tem funções de organização do Direito Fiscal.

42
Sebenta Fiscal – 2018/2019 DNB

➢ Orienta também a autoavaliação do sujeito passivo, bem como a administração e os


tribunais na sua função de controlo da aplicação da lei – é o ponto de partida para a
aplicação da lei.

Os elementos essenciais constitutivos de cada Tatbestand de imposto devem constar de lei


formal – aí, o tatbestand desempenha a função de garantia e não coincide totalmente com o
tatbestand sistemático.

Também pode desempenhar uma função heurística – enunciação de um conceito geral de


tatbestand de imposto, com caráter normativo-material, que abstrai dos impostos em concreto.

Constituição da Relação Jurídica


Art. 36º/1 LGT
Relação jurídica tributária constitui-se pelo preenchimento fáctico dos pressupostos legais,
i.e., com a subsunção do facto (rendimento, prestação de serviços venda de bens, aquisição ou
detenção de património) à lei.
➢ Sabemos que existe uma relação jurídica tributária se existir facto jurídico tributário.
o A ocorrência do facto tributário e restante preenchimento do tatbestand
sistemático estão associados.
➢ Verifica-se se os pressupostos da lei estão preenchidos, não implica a atuação do fisco.
o Verificando-se os pressupostos a relação está constituída – estão a decorrer
prazos e etc.

Doutrina de Alberto Xavier, que discuti se a obrigação tributária nasce com o ato administrativo
de determinação da matéria tributável está ultrapassada.
APD: o que é relevante é assegurar a possibilidade de defesa do sujeito passivo contra
ilegalidades cometidas pelo Fisco, através de reclamação, recurso ou impugnação judicial (art.
268º/4 CRP + art 9º/2 LGT)

Alteração dos Elementos Essenciais da Relação Jurídica


Princípio da Indisponibilidade do Imposto
Pelo facto de a relação tributária nascer do preenchimento sucessivo do tatbestand sistemático,
decorre do art. 36º/2 que os elementos essenciais da relação jurídica não podem ser alterados
por vontade das partes.
➢ Decorrência do princípio da legalidade fiscal na vertente da reserva de lei.
1. Obrigação nasceu da lei e não pode ser negociada pelo Fisco.
2. Não é só apuramento do montante final a pagar; os elementos essenciais (o
tabestand sistemático de imposto) são todos indisponíveis e não podem ser
negociados pelo fisco.

No entanto, há casos em que a determinação da matéria tributável dos grandes contribuintes


(o apuramento do rendimento real) implica um diálogo, e por vezes até acordo, entre o Fisco
e esses contribuintes, dentro da margem de livre apreciação conferida pela lei.
➢ Casos de Complexidade de Tributação – grupos em que economicamente só há um
sujeito passivo:

43
Sebenta Fiscal – 2018/2019 DNB

1. Tributação de Multinacionais
▪ Não se pode ter em conta o grupo e cada Estado apura quanto à
entidade que opera no seu território.
▪ O regime específico quando há transferência de um ordenamento
jurídico para outro é específico e complexo (STA: não são correções
quantitativas pois a correção da matéria tributável “para mais” num
Estado implica a correção simétrica “para menos” noutro Estado).
2. Grupo Empresarial que opere somente em Portugal
▪ Tributação devia ser do resultado do conjunto – o lucro devia ser
apurado em relação a todo o grupo, sem o dividir entre as partes do
grupo económico, cujo interesse, em termos de tributação, seria o
apuramento global/consolidado do grupo48.
▪ Direito Fiscal resolve esta situação vendo cada uma das pessoas
coletivas como um sujeito passivo.

Transações entre as empresas do mesmo grupo têm de ser tratadas como se de empresas
independentes se tratasse (está previsto no art. 63º CIRC) – princípio das entidades
independentes/princípio da plena concorrência.
• Art. 63º CIRC e regime da Portaria 1446-C/2001 contêm regras específicas na
determinação da matéria tributável de entidades que realizam operações comerciais
com outras entidades com as quais mantêm relações especiais.

Quer o REGIME DOS PREÇOS DE TRANSFERÊNCIA (remuneração cobrada por transações de


grupo). quer o significado de relações especiais estão definidos de forma vaga e indeterminada
– opinião TJUE (C-282/12, Itelcar)
• A determinação da matéria tributável, através dos preços de transferência praticados
entre entidades com relações especiais entre si é concretizada por ficções legais,
impondo a lei que as operações entre empresas associadas sejam tratadas como se
dissessem respeito a “entidades independentes”.
o Os métodos que concretizam o princípio das entidades independentes nem
sempre são os mais adequados a uma determinada entidade ou operação por
ela conduzida.
o E se há empréstimos entre grupo? Quem fixa a taxa de juro é a entidade que
empresta, mas, substancialmente quem decide é a sede.
o Dada a elevada indeterminação legal das regras sobre preços de transferência,
há riscos de correções da matéria tributável, conduzidas pela administração
tributária.
▪ À partida, Fisco vai poder corrigir este valor, atendendo à taxa de juro
do mercado.
▪ Estas correções têm base legal quer no nosso regime interno, quer nas
convenções bilaterais celebradas por Portugal.
▪ Não são permitidas correções caso as operações tenham ocorrido
segundo as condições normais de um mercado concorrencial (se ele
existir).

48
APD: é o que faz mais sentido, pois se se tributar autonomamente cada uma das partes do grupo pode
haver lucro num lado e não noutro.

44
Sebenta Fiscal – 2018/2019 DNB

• Há uma promoção de métodos de negociação com o contribuinte – através da


exigência legal do dossier de preços de transferência (art. 63º/6,7 e 130º CIRC) e sua
interpretação; através dos acordos prévios sobre preços de transferência que
pretendem evitar discussões sobre o método de preços de transferência a utilizar no
caso concreto (art. 138º CIRC).
o Põe em causa o entendimento restrito do princípio da indisponibilidade do
crédito: Fisco vai estar a negociar porque é difícil a autoridade conhecer
exatamente qual o preço de transferência.
• Correções dos preços de transferência podem ocorrer em caso de utilização indevida
dos mesmos, resultante do facto de empresas associadas transacionarem entre si, e
desse modo transferirem lucros, gastos ou perdas, de uma empresa para a outra.
• Soluções são encontradas dentro da margem de livre apreciação, pelo que não se pode
dizer que haja uma alteração dos elementos essenciais da relação jurídica pelas partes.
o Outra dificuldade surge quanto ao royalties dos bens intangíveis – marcas,
patentes, etc.
▪ É difícil saber quanto valem os royalties e quanto vale a marca.
▪ Desmaterialização da economia implica este negoceio do Fisco.

Proibição de Moratórias e Indisponibilidade do Crédito


Art. 36º/3 + 30º/2 LGT
Não se pode conceder adiamentos e o crédito tributário só pode fixar-se em condições para a
sua redução ou extinção com respeito pelo princípio da igualdade e da legalidade.
➢ Ambos os preceitos são manifestações do princípio da indisponibilidade do crédito
tributário, que, por sua vez, decorre dos princípios da legalidade e da igualdade.

Em Portugal houve subsequentemente vários Regimes Excecionais de Regularização de Dívidas


Tributárias
➢ RERT foram sucessivamente introduzidos pelas leis retificativas do Orçamento de
Estado (para 2005, 2010) e pelo OE (2012).

Os 3 RERT aprovaram regimes de perdão fiscal (parcial) e o regime de regularização de dívidas


consistiu num perdão de juros e sanções (a cobrança coerciva transformou-se em pagamento
voluntário). Estes RERT aprovaram regimes excecionais de regularização tributária de
elementos patrimoniais colocados no exterior.
➢ Foram perdões fiscais acompanhados de obrigação de repatriamento de capitais
o Pode violar o princípio da igualdade – TC devia indagar se há princípio superior
que o justifique
o Pode ser contrário à livre circulação de capitais da UE

Nos primeiros foram excluídos da aplicação do regime excecional os elementos patrimoniais


situados em países ou territórios não cooperantes, mas, no RERT III não.

45
Sebenta Fiscal – 2018/2019 DNB

Em princípio os RERT são inconstitucionais por violarem o princípio da igualdade,

Perdões fiscais têm de ser justificados por finalidades extrafiscais que, no caso concreto, se
sobreponham à igualdade.
➢ Têm de ter uma aplicação excecional.
➢ Devem ser acompanhados de reformas fiscais para evitar a repetição do
comportamento de fuga de capitais, no futuro.
o Pode aprovar-se regime com a justificação de falta de investimento e poupança
em Portugal, tentando que os capitais retornem ao país para contrariar essa
situação.
o Para respeitar o princípio da igualdade dever-se-ia indagar se existem outras
medidas fiscais que acompanham este regime excecional. Ex: redução para
futuro da tributação de capitais – estímulo legislativo ao repatriamento dos
capitais e medida geral que envia sinal de que o que se pretende é que a

46
Sebenta Fiscal – 2018/2019 DNB

poupança permaneça em Portugal. Se for mera aprovação sem medida que


torne o repatriamento eficaz é inconstitucional.

APD: é duvidoso que os RERT tenham tido um objetivo de repatriamento de capitais, dada a
sua sequência temporal e dado o facto de o último não ter excluído os paraísos fiscais. Além
disso, não foi introduzida uma tributação menos gravosa do investimento e poupança.
➢ A comparabilidade entre contribuintes faltosos e cumpridores exige que a separação
temporal entre os regimes que estabelecem perdões fiscais vá muito além de cada
ano/exercício fiscal.
➢ APD: a partir da aprovação de um regime excecional de perdão fiscal tem de se ter em
conta o período de prescrição das dívidas fiscais até eventual aprovação de novo
perdão fiscal, para evitar uma nova violação do princípio da igualdade.
o Senão, isto é sinal a todos os contribuintes de que vale a pena não pagar as suas
obrigações fiscais – espera-se 1 ou 2 anos e vem aí outro perdão fiscal.
o Responsabilidade é do TC verificar se existem princípios superiores que
justifiquem e se passou um período mínimo para que não haja aproveitamento.

Extinção da Relação Jurídica


A Relação Jurídica extingue-se pelo Pagamento.
➢ Cobrança e pagamento são termos idênticos mas de pontos de vista diferentes
(primeiro do sujeito ativo e segundo do sujeito passivo).

Relação Jurídica Tributária extingue-se através da cobrança que assume 2 modalidades:


1. PAGAMENTO VOLUNTÁRIO OU COERCIVO (ART. 163º E SS. CPPT) – art. 40º LGT, art. 78º CPPT
Forma comum é o pagamento voluntário (art. 84º CPPT) – efetuado dentro do prazo
estabelecido nas leis tributárias e nos termos do art. 40º LGT

Não existindo esse pagamento voluntário, passa-se à fase do pagamento Coercivo – art. 40º
LGT, art. 78º CPPT
• Cobrança coerciva é desencadeada com a emissão de um Título Executivo: certidão de
dívida ou outro título enunciado no art. 162º CPPT.
o Certidão de dívida é extraída findo o prazo legal de pagamento voluntário e
contém todos os elementos identificadores necessários à cobrança da dívida
(art. 88º CPPT).
• Órgão da execução fiscal é a Administração Tributária (art. 149º CPPT), competindo-
lhe instaurar o processo (art. 178º e ss.) e aos tribunais decidir os incidentes (art.
151º).

Cobrança coerciva está associada à execução do património do sujeito passivo – processo de


execução fiscal – penhora e alienação dos bens apreendidos.
• Citação (art. 188º CPPT) + penhora (art. 215º CPPT) + venda do património do sujeito
passivo
• Quando um sistema fiscal justo é eficiente, assenta no bom funcionamento dos deveres
declarativos e de cooperação do sujeito passivo, levando ao pagamento voluntário.
• A cobrança coerciva deve ser excecional e, se não o for, revela um sistema injusto
(inadequado à realidade económica do ordenamento jurídico) e ineficiente.

47
Sebenta Fiscal – 2018/2019 DNB

o Estado pode penhorar os bens mas nada garante que eles são vendidos e que o
produto da venda cobra todo o montante da dívida fiscal.

Art. 264º e 265º permitem o pagamento voluntário durante o processo de execução – tutela
interesse do sujeito ativo em conseguir pagamento voluntário.

2. CADUCIDADE DA LIQUIDAÇÃO (ART, 45º LGT) OU PRESCRIÇÃO DA DÍVIDA TRIBUTÁRIA (ART.


49º LGT)
A notificação da liquidação é necessária para tornar a dívida de imposto certa e exigível.
• Esse poder de liquidação caduca, se a notificação da mesma não ocorrer ou não for
válida, dentro do prazo da lei – 4 anos (art. 45º LGT).
• Há vários prazos especiais no art. 45º LGT e outros códigos de imposto preveem-nos
• A forma de contagem dos prazos varia consoante o tipo de imposto.

A caducidade do poder de liquidação por decurso do prazo decorre dos princípios gerais de
Direito, destinados a assegurar que as situações de incumprimento de obrigações não fiquem
eternamente pendentes.
• A segurança e a paz jurídicas recomendam harmonização de prazos de caducidade, que
não podem ser demasiado longos.

A formação da dívida tributária após a liquidação validamente notificada faz correr o prazo de
pagamento voluntário e o prazo de prescrição – começa a contar a partir do momento em que
ocorre o facto tributário, e quando atingido o limite do prazo, a prescrição abrange a dívida,
juros compensatórios (art. 35º/1 LGT) e juros de mora (art. 44º LGT).
➢ Também podem ser devidos juros indemnizatórios – obrigação quase simétrica dos
juros compensatórios (Saldanha Sanches) – nos termos do art. 35º

48
Sebenta Fiscal – 2018/2019 DNB

PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS FISCAIS


CRP 1976 estabelece um catálogo de princípios formais e materiais de Direito Fiscal,
desenhando, no seu conjunto, uma Constituição Fiscal.

Princípios Constitucionais de Direito Fiscal já vêm desde o séc. XIX e das Monarquias
Constitucionais – garantia dos cidadãos contribuintes relacionado com o princípio da segurança
jurídica.

PRINCÍPIO FORMAIS: 1. Legalidade e 2. Proibição da Retroatividade


➢ Estes princípios constitucionais fiscais remontam às monarquias constitucionais e estão
relacionados com o princípio da segurança jurídica e proteção da propriedade privada.
➢ Materializam-se nos princípios da: Segurança Jurídica; Legalidade; Não Retroatividade

PRINCÍPIOS MATERIAIS: 3. Igualdade (i.e, Capacidade Contributiva)


➢ Associados ao Estado Social de Direito e ao Estado Fiscal – surgem nas Constituições do
pós-2ª Guerra Mundial, relacionando-se com a conceção de Estado Social
➢ Materializam-se nos princípios da: Capacidade Contributiva; Tributação Pessoal;
Tributação Real
o O princípio da igualdade é concretizado através de outros princípios
constitucionais consoante o tipo de imposto: Princípio da tributação pessoal,
global, universal e progressiva no IRS; Princípio da tributação do rendimento
acréscimo e do rendimento líquido; Princípio da neutralidade fiscal no IVA

A estes princípios juntam-se OUTROS DOIS PRINCÍPIOS INTERPRETATIVOS:


• Princípio da proibição de abuso fiscal – princípio estadual e supraestadual
• Princípio da praticabilidade – relacionado com a administração de atos-massa

A justiça fiscal implica a escolha dos impostos segundo um princípio do benefício, determinando
a matéria tributável e os limites da carga fiscal.
• No Estado Fiscal, os limites da carga fiscal estão relacionados com as tarefas estaduais.
• No quadro da UEM, os Estados que não conseguem ter competitividade, veem os seus
limites da carga fiscal sem estar politicamente relacionado com a lógica do Estado Fiscal.

TC não tem sido muito ativo quanto à emissão de juízos de compatibilidade das leis fiscais com
os princípios fiscais materiais.
• No entanto, no período do Memorando de Entendimento com a Troika houve alguma
proatividade.
o A ausência de representatividade democrática supranacional, quer do FMI, quer
das entidades que representaram a UE, fez com que os princípios
constitucionais fiscais materiais prevalecessem quando o TC avaliou a
compatibilidade das medidas adotadas ao abrigo do Memorando de
Entendimento com a CRP.
o Muitas das medidas foram declaradas inconstitucionais – apesar dos
compromissos perante os credores terem de ser respeitados, por serem
compromissos internacionais, os Memorandos de Entendimento têm de ser
concretizados respeitando as Constituições nacionais.

49
Sebenta Fiscal – 2018/2019 DNB

• A legitimação dos impostos tem de respeitar o quadro constitucional, o que significa


que os contribuintes-eleitores estão sempre (e devem estar sempre)
constitucionalmente protegidos.

Todos estes princípios têm de ser interpretados à luz das liberdades fundamentais do TFUE

Vamos estudar os Princípios Constitucionais Materiais (Igualdade Fiscal e Tributação do


Rendimento Real) em conjugação com a caracterização do Sistema Fiscal Português.

Portanto:
1. Princípio da Legalidade
2. Princípio da Proibição da Retroatividade
3. Princípio da Igualdade Fiscal
➢ IRS
4. Princípio da Tributação do Rendimento Real
➢ IRC
5. Caracterização do Sistema Fiscal Português – outros impostos
➢ IVA
➢ Impostos sobre o Património
6. Princípios Interpretativos do Sistema Fiscal Português
➢ Praticabilidade
➢ Proibição do Abuso

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Sebenta Fiscal – 2018/2019 DNB

Princípio da Legalidade Fiscal


Casalta Nabais: Este princípio é uma expressão/explicitação do princípio do Estado de Direito
Democrático (art. 2º e 3º/2 CRP)

Princípio fiscal formal com origem nas monarquias constitucionais, assegurando que a
interferência na propriedade privada resulta de discussão e aprovação parlamentar.
• No taxation without representation – princípio democrático
o Os impostos são pressupostos do Estado e fundamentam-se na representação
popular.
• A lei é o ponto de partida para garantir a segurança jurídica, por ser aprovada pelos
representantes parlamentares, servindo a igualdade por ser geral e abstrata.

Reserva de Lei – Justificação


Preocupações garantísticas, da função parlamentar de orientação política e do princípio
democrático.
➢ Impostos são ingerências sérias do Estado no património dos cidadãos, portanto,
entendeu-se que devem ser os próprios cidadãos a decidir estas situações, regulando
a definição de impostos através dos seus representantes eleitos na Assembleia da
República.
o Lógica de autotributação e de no taxation without representation.

Função garantista da reserva de lei parlamentar está em crise desde a segunda metade do séc.
XX, porque o aumento de intervenção do Estado na sociedade tem sido acompanhado pelo
aumento das competências técnicas governamentais e por uma menor capacidade de discussão
parlamentar das matérias a aprovar.
➢ A crise da função garantista da reserva de lei parlamentar significa a crise (relativa) do
princípio da legalidade fiscal.

Está associada à previsibilidade e calculabilidade da obrigação de imposto e dos seus


elementos essenciais – segurança jurídica.
➢ Não é um cálculo antecipado do imposto (TC rejeita isto)

Exige discussão e consentimento parlamentar em plenário, mesmo que o trabalho técnico


tenha sido preparado fora do Parlamento (ou em comissões parlamentares especializadas)49.

Apesar do Acórdão TC 48/8450, para a função de garantia ligada à previsibilidade é irrelevante o


sentido em que são alterados os elementos essenciais do imposto.
➢ Qualquer alteração aos elementos essenciais do imposto é entendida como uma
interferência ou ablação na propriedade e liberdade privadas.

49
Na prática os tributos já não são criados no Parlamento, tout cour, mas a sua aprovação e discussão
tem de ser em Plenário da AR.
➢ Só assim se garante a função de indirizzo (orientação) da AR.
50
APD critica argumentação do Governo: mesmo que as alterações aprovadas por DL sejam mais
benéficas para o cidadão, se tal não constava da autorização legislativa então não podia ser feito.

51
Sebenta Fiscal – 2018/2019 DNB

É o Princípio Democrático que fundamenta e postula a reserva de lei parlamentar, não sendo
suficiente a reserva de lei formal (no sentido de ato legislativo51).
➢ Manifesta-se no procedimento legislativo parlamentar, que permite a discussão pública
da lei e o contributo da oposição (desacordo ou consentimento).

CRP portuguesa contém:


• Vertente Competencial – art. 165º/1/i; 165º/2; 227º/1/i; 232º/1; 238º/4
• Objeto da reserva de lei – art. 165º/1/i; 103º/2
• Vertente Material – art. 103º/2 (exigências de densificação da lei fiscal quanto aos
elementos essenciais dos impostos). Garante um princípio da legalidade substancial ou
princípio da tipicidade fiscal.
• Preferência ou precedência de lei – art. 103º/3 (resistência à tributação que viole a CRP
ou a lei, havendo uma conceção garantística da legalidade fiscal)

Reserva de Lei (na Vertente) Competencial


i. Reserva Relativa de Competência da AR – art. 165º/1/i
Competência legislativa em matéria de criação de impostos e sistema fiscal está reservada ao
Parlamento, mas este pode delegá-la ao Governo.
➢ Casalta Nabais: partilha diacrónica do poder
➢ Sérvulo Correia: policentrismo institucional

Ser Reserva Relativa está associado à afirmação corrente de que os governos dispõem de
legitimação democrática por emanarem dos Parlamentos
➢ Reis Novais: homogeneização política da AR e do Governo

FUNÇÃO DE ORIENTAÇÃO POLÍTICA – o Parlamento, unilateralmente ou com a colaboração do


Governo, através de lei ou de autorização legislativa, deve definir sempre as linhas de orientação
política em matéria de impostos.
➢ Se o Parlamento delegar ao Governo, a orientação política deve ser partilhada – tem
sempre de haver um assentimento parlamentar dessa orientação, mesmo que ela seja
proposta pelo Governo.

Os Governos podem legislar através de Autorizações Legislativas.


ii. Autorizações Legislativas – art. 165º/2
Têm por objetivo contrabalançar o poder legislativo parlamentar com um poder legislativo
governamental mais especializado e ciente das imperfeições da lei na sua aplicação efetiva, pela
sua proximidade da administração fiscal e de organizações internacionais (OCDE, UE).
➢ Casalta Nabais: contrabalançar do poder legislativo pelo poder fáctico e técnico da
administração. Há uma governamentalização fiscal material52.

51
Sérvulo Correia: este princípio impede que a reserva de lei se reconduza a uma simples reserva de
norma jurídica, uma vez que nem a Constituição concebe um poder que se não funde no povo, nem o
seccionamento da ligação entre a vontade popular e a emissão de normas deixaria de por em causa a
bondade do conteúdo destas.
52
APD: que também acontece entre Portugal e a UE – há transferência dos Governos para o Conselho da
União Europeia (art. 113º e 114º TFUE), no quadro de uma harmonização fiscal europeia.

52
Sebenta Fiscal – 2018/2019 DNB

➢ APD: Hoje em dia, no princípio da legalidade há uma inversão – é governo que tem
iniciativa legislativa53 e pede a AR autorização legislativa.
o Esta inversão tem a ver com a tecnicidade das matérias. A nível parlamentar há
somente uma discussão política dos assuntos. Desde que haja debate
parlamentar não está em risco o princípio da legalidade.54
o Há vários Estados em que Governo não tem poderes legislativos – há um maior
cumprimento da Reserva de Lei (ex: Holanda, EUA) com uma maior discussão
parlamentar.

O Governo tem sido o órgão legislativo por excelência, dominando a atividade legislativa em
relação ao Parlamento.
➢ Mas, em matéria de impostos e sistema fiscal, a competência legislativa ordinária do
Governo depende de autorização legislativa parlamentar.
o Tem sempre de haver discussão na AR para garantir os direitos dos
contribuintes.

O Decreto-Lei autorizado contém uma normação primária e não secundária, advindo de


autorizações legislativas que são linhas de conduta que não criam uma fonte de direito aplicável
às relações que pretende reger.
➢ Estão sujeitas ao art. 169º CRP

Autorização legislativa deve definir:


• Objeto – o quê?
• Extensão – como?
• Duração (podendo ser prorrogada) – prazo específico para uso da autorização legislativa
ou prazo caduca no fim daquele orçamento (art. 165º/5 CRP)
• Sentido – densificando por uma tripla função/vertente (António Vitorino e TC 358/92)

Leis de autorização legislativa não poder ser cheques em branco – têm de ter uma determinação
mínima do sentido
• Acórdão TC 358/92: os elementos constantes dos preceitos da autorização legislativa
têm de encerrar, em si mesmos, um critério orientador do uso dos poderes delegados.
o Tem de haver rigor na determinação do sentido da autorização em causa, por
forma que o preceito autorizador cumpra uma tripla função: conteúdo material
bastante da lei de autorização; linha de orientação do legislador delegado; elemento de
informação genérica das inovações a introduzir no ordenamento para os particulares.
o Sem isto, estamos perante uma autorização em branco, esvaziando a função
habilitante que ao Parlamento cabe assumir num processo legislativo especial
como é o das autorizações legislativas.

SENTIDO DAS AUTORIZAÇÕES LEGISLATIVAS E OS ELEMENTOS DO IMPOSTO – “impostos e


sistema fiscal” tem o sentido do art. 103º/2 CRP.

53
Após proposta dos Serviços, que apresentam proposta já com trabalho preparado.
54
Em Portugal, muitas leis fiscais não são discutidas a fundo porque são aprovadas no Orçamento de
Estado.

53
Sebenta Fiscal – 2018/2019 DNB

O sentido dado pela lei de autorização legislativa deve ter uma Tripla Vertente/Função (António
Vitorino + TC 358/92), por referência ao art. 103º/2:
a) Conteúdo material bastante: para quê?
• Finalidade da concessão dos poderes delegados, numa ótica do delegante. Ex:
para tornar IRS mais justo
b) Linha de orientação genérica do legislador: de que modo?
• Indicação genérica dos fins que o delegado deve prosseguir, numa ótica do
delegado. Ex: o que pode ser alterado no IRS
c) Informação genérica das novidades
• Sujeitos passivos devem poder fazer juízo de prognose de qual a alteração no
Ordenamento Jurídico – ele não tem de saber logo à partida qual o tributo que
vai ser pago, mas tem de haver amplitude restrita acerca desse montante a ser
pago. Ex: alteração dos escalões do IRS têm de ser num ou outro escalão e entre
certo valor.

Lei de Autorização Legislativa é diferente quando se está a falar de impostos ou outro tributo
A Tripla Vertente é diferente quando se trata de impostos.
➢ Lei de autorização legislativa deve versar sobre o An e o Quantum

An – incidência
• Em sentido amplo (não só objetivo e subjetivo): todos os elementos que servem para a
quantificação do imposto.
• Todos os elementos que podem interferir com os DLG dos contribuintes deve constar da
lei de autorização.
Quantum – taxa

Conteúdo material bastante: art. 103º/2


Linha de orientação genérica: tem de se dizer o para quê
Juízo de prognose: art. 103º/2

Sousa Franco e Jorge Miranda: art. 165º/2 e art. 103º/2 devem ser conjugados
➢ O Parlamento tem de dar o seu acordo político sobre todos os elementos essenciais
dos impostos, dos benefícios fiscais e das garantias dos contribuintes, tal como
enumerados no art. 103º/2.

54
Sebenta Fiscal – 2018/2019 DNB

iii. Poder Tributário das Regiões Autónomas


Distribuição vertical do poder tributário é novidade da CRP 1976.
➢ O princípio democrático, que constitui um dos fundamentos da reserva de lei, já não é
cabalmente assegurado pelo Parlamento nacional e atribui aos parlamentos regionais e
às autarquias locais poder tributário (legislativo ou regulamentar), nos termos previstos
na CRP e na lei55.

Com a revisão da CRP de 1982 introduziu-se o poder tributário próprio das regiões autónomas,
tendo sido desdobrado, em 1989, em Poder Tributário Próprio e Poder de Adaptação.

Art. 227º/1/i CRP – as Regiões Autónomas dispõem, então, de poder tributário próprio, nos
termos da lei, e podem também adaptar o sistema fiscal nacional às especificidades regionais,
nos termos da lei-quadro da AR.
➢ Trata-se de um poder ou soberania tributária originária, pois é atribuída pela
Constituição.
o Casalta Nabais: quer o poder tributário do Estado quer o poder tributário das
regiões autónomas têm origem na Constituição, e nesse sentido são originários
e não derivados, pois o seu reconhecimento não depende de lei estadual. No
entanto, o poder tributário regional tem os seus limites fixados em maior ou
menor medida na lei (é apenas Poder Originário e não Originário Primário).
o Maria Luísa Duarte<3: poder tributário estadual é Originário (é inerente à
soberania do Estado); poder tributário regional é Derivado (pois é limitado e é
concessão do Estado)

PODER TRIBUTÁRIO PRÓPRIO


A. Tese dos Regionalistas – admitem um verdadeiro poder de criação de impostos regionais,
sempre que houvesse interesse específico e a Constituição o admitisse.
➢ Eduardo Paz-Ferreira, Teixeira Ribeiro, Maria Luísa Duarte

MLD: há um “poder de autolimitação” da AR, através da aprovação da lei da qual depende o


exercício do poder tributário pelas regiões autónomas, pois com a aprovação dessa lei, verifica-
se uma deslocação de uma matéria originariamente da competência reservada para uma
competência partilhada com as Regiões Autónomas, embora sujeita a limites fundamentais
(interesse específico, limite territorial, inderrogabilidade das leis gerais da República56,
enquadramento legal e princípios constitucionais).

B. Tese dos Centralistas – admitem somente um poder de adaptação dos impostos nacionais
➢ Sousa Franco, Saldanha Sanches

55
Tendência que surgiu nas Constituições dos meados do séc. XX em que se atribui soberania
(competência originária) fiscal às Regiões Autónomas ou Estados Federados – há legitimidade
democrática que justifica a soberania tributária.
56
Resulta do espírito da CRP que as Assembleias Legislativas Regionais não podem legislar/tributar em
sentido contrário ao da CRP
➢ Tem de ser dado grau de discricionariedade, mas dentro de ser amplitude, sob pena de
descaracterizar o sistema fiscal.

55
Sebenta Fiscal – 2018/2019 DNB

C. Ana Paula Dourado


➢ Na perspetiva da legalidade fiscal e do âmbito das competências legislativas das Regiões
Autónomas em matéria fiscal, a discussão sobre se o poder tributário próprio era um
poder de criação de impostos regionais ou um poder de adaptação dos impostos
nacionais é errónea.
o Ambos os poderes têm idêntico significado em termos de reserva de lei fiscal,
sendo certo que o seu enquadramento jurídico e o alcance têm de ser definidos
por lei da AR.
o Teixeira Ribeiro: criação de impostos e adaptação de elementos essenciais não
se distinguem substancialmente, pois permite-se que vigore um sistema que seja
diferente do que o que vigora no resto do país.

Art. 57º/3 Lei das Finanças Regionais faz enumeração exemplificativa dos impostos que podem
ser criados pelas Assembleias Legislativas Regionais e limita-se a contribuições de melhoria e a
tributos extrafiscais de caráter ambiental.
➢ Em teoria, as Regiões Autónomas podem criar quaisquer tipos de impostos, desde que
não incidam sobre matéria objeto de incidência por impostos nacionais.
➢ Art. 112º/4 CRP faz menção à reserva de competência de certas matérias aos órgãos de
soberania, clarificando as proibições de as Regiões Autónomas extinguirem impostos
nacionais e de criarem impostos regionais com o mesmo objeto de impostos nacionais
em vigor.
➢ Art. 57º/1 e 2 LFR confirma isto.

As Regiões Autónomas podem dispor das receitas provenientes dos impostos nacionais e que
tenham conexão com o território daquelas, e uma vez que o espetro dos impostos nacionais
cobre todas as manifestações de riqueza, não é de estranhar que o poder de criação de
impostos pelas regiões, previsto na lei, seja quase insignificante.
➢ A disciplina do PODER DE ADAPTAÇÃO confirmam as teorias do Federalismo Financeiro
sobre a distribuição vertical de competências, pois é fundamentalmente dirigida à
concorrência fiscal, à concessão de benefícios fiscais sobre os impostos nacionais.
o MLD: pode levar à criação de paraísos fiscais
o APD: poder de adaptação pode revelar-se mais prejudicial para o Estado Fiscal
e princípios materiais fiscais do que a criação de impostos novos e adicionais
aos existentes.

iv. Poder Tributário das Autarquias Locais


Podem criar taxas, mas não podem criar nem adaptar impostos.

Municípios não têm competência legislativa e somente regulamentar.


➢ As competências não são soberanas e originárias da CRP – são competências que
advêm da lei.
o Lei da AR pode dar competência a municípios que aprovam tributação por
regulamentos.

Tem alguns poderes em matéria tributária quando a impostos próprios


➢ Podem conceder benefícios fiscais relativamente aos impostos e outros tributos
próprios.

56
Sebenta Fiscal – 2018/2019 DNB

ART. 238º/4 CRP, introduzido pela revisão de 1997, consagrou expressamente um poder
tributário dos municípios a exercer nos termos da lei, cujo alcance ainda não está delimitado.
➢ Não se trata de criar e adaptar impostos nacionais.
➢ Apenas legitima a atribuição legal de discricionariedade aos municípios, quanto a
elementos essenciais dos impostos.
o Casalta Nabais: art. 238º/4 não acrescenta nada de novo à adequada
compatibilização ou concordância prática do princípio da legalidade fiscal com
o princípio da autonomia local, pois o princípio da autonomia local sempre
permitiu que o legislador concedesse tais poderes tributários.

Reserva de Lei Material – Princípio da Tipicidade Fiscal


A determinação da lei está associada ao Estado de Direito.
O Princípio da Tipicidade Fiscal não é violado com a vaguidade da lei57, desde que a orientação
política quanto aos elementos essenciais do imposto seja dada pelo Parlamento, e o Governo-
legislador concretize as autorizações parlamentares quanto a esses elementos essenciais, de
forma que, a partir daí a carga fiscal seja previsível e (quase) calculável.
➢ Os aspetos mais técnicos podem ser concretizados por regulamento – progressiva
concretização pode ser aferida na denominada margem de livre tipificação.
o Os conceitos técnicos podem estar em Regulamento ou Portaria
o Se elementos essenciais forem remetidos para outro normativo que não uma
lei em sentido amplo há uma inconstitucionalidade orgânica.

Art. 103º/2 e Elementos Essenciais dos Impostos


Art. 103º/2 enumera os elementos dos impostos e as matérias que devem ser definidos por lei
da AR, Decreto-Lei autorizado e Decreto-Legislativo regional.
➢ Disposição consagra uma regra de legalidade material, densificando a legalidade
formal, definindo o conteúdo do Princípio da Tipicidade dos impostos.
➢ Art. 103º/2 é o que dá substância à competência – aplica-se em conjugação com a
Vertente Competencial, densificando as competências do que pode ser aprovado por
essas entidades.
o PRP: exigência de uma suficiente definição/detalhe do tipo fiscal

Alarga o objeto do art. 165º/1/i – além das taxas e de outras contribuições financeiras a favor
de entidades públicas, os impostos e o sistema fiscal, inclui na reserva de lei os benefícios fiscais
e as garantias dos contribuintes.
• O princípio da tipicidade dos impostos diz respeito ao An e ao Quantum dos mesmos –
exige-se que o objeto do imposto, o sujeito passivo, a base tributável (elementos que
concorrem para a determinação da medida do imposto) e a taxa do imposto sejam
definidos por lei formal.
• Benefícios Fiscais não fazem parte da incidência, porque prosseguem outras finalidades
– são normas extrafiscais. São normas de despesa fiscal.

57
No Direito Fiscal, quando os conceito jurídicos são vagos e indeterminados começa uma margem de
livre apreciação do Governo-legislador.
➢ Jurisprudência consolidada diz que a vaguidade dos conceitos não implica a indeterminação da
lei.

57
Sebenta Fiscal – 2018/2019 DNB

• As garantias dos contribuintes, na parte não coberta pelo art. 165º/1/i, é o corolário da
tipicidade do imposto e encontra a sua justificação no EDD (art. 268º/4 e 5 CRP).

i. TABESTAND DE GARANTIA
Incidência
An e Quantum da Obrigação Tributária – incidência em sentido amplo
• A incidência não se pode limitar ao facto tributário em sentido estrito e ao sujeito
passivo58 – risco de a reserva de lei fiscal não cumprir a sua função.
o Tem de abranger também todos os aspetos da quantificação – legalidade fiscal
tem funções garantistas e os impostos, mesmo que entendidos que entendidos
como deveres fundamentais, são limites imanentes ao direito de propriedade
individual.
o Também fazem parte as Normas de Conexão Unilaterais – definem os
rendimentos tributáveis de sujeitos passivos residentes e de não residentes.
o Também fazem parte as Normas Unilaterais de Atenuação de Dupla Tributação
– pois afetam o quantum do imposto a pagar.

Base tributável59 e qualquer elemento de quantificação do imposto


➢ Sentido amplo de incidência devido à razão de ser da Reserva de Lei é a previsibilidade
do imposto para qualquer contribuinte.
o A representação popular tem como justificação o facto de cada cidadão ter o
direito e a garantia de saber antecipadamente quanto é que vai pagar de
imposto.
o O “quanto” tem de ser interpretado juridicamente e tem de abranger os
elementos de quantificação do imposto – tem de haver uma identificação clara
na lei de qual o valor objetivo e o peso relativo de cada elemento no cálculo
desse valor.

Conceitos de Lançamento e Liquidação60 estão obsoletos e estiveram ligados a funções


administrativas ou procedimentais de fixação e apuramento da matéria tributável pelo Fisco.
• Tais funções procedimentais deixaram de existir quando foram introduzidos os deveres
de cooperação do sujeito passivo, ligados ao apuramento do rendimento real.
• Apesar de obsoletos, estes conceitos estão ligados à determinação da matéria
coletável e respetiva quantificação – incidência em sentido amplo.
o As disposições de determinação de matéria tributável interferem com o
montante de imposto a pagar e, por isso, estão sujeitas à reserva de lei fiscal.
o Todas as disposições que imponham deveres aos sujeitos passivos que
interfiram com a avaliação ou quantificação do imposto estão sujeitas a
reserva de lei.
▪ PRP: administração não pode alterar o procedimento de modo
arbitrário, frustrando garantias dos contribuintes.

58
Senão estaria em causa a definição do tipo fiscal – não se percebe até onde vai aquilo que está sujeito
a tributação.
59
Desenvolvimento do objeto – regras previstas para apurar objeto
60
Paula Rosado Pereira: variam de imposto para imposto.
• IRS: heteroliquidação
• IRC: autoliquidação

58
Sebenta Fiscal – 2018/2019 DNB

Um exemplo de equívocos dos termos Lançamento e Liquidação tem surgido pelo caso da “taxa”
de comercialização de produtos de saúde.
Tribunal Tributário de 1ª Instância de Lisboa recusou aplicar uma disposição legal, por
inconstitucionalidade, na parte em que ela determinava que a taxa sobre a comercialização de
produtos de saúde incidia sobre o volume de vendas de cada produto, tendo por referência o
respetivo preço de venda ao público.
Referência valorativa só faria sentido num sistema de preços fixos e que o introdutor no
mercado (responsável pelo pagamento do tributo) sabe de antemão qual irá ser o valor do preço
de venda ao consumidor final.
• APD: concorda com este entendimento que a autoliquidação estava relacionada com os
elementos da quantificação do tributo, estando sujeitos a reserva de lei fiscal, sendo
que a base de quantificação ou de incidência era insuficientemente determinada.

Tribunal Constitucional pronunciou-se (Acórdão 127/04): incorreu no mesmo erro que o


Ministério Público (aquando do recurso da decisão do Tribunal Tributário) e fez uma distinção
entre regras inseridas no procedimento de determinação do imposto: as materiais estariam
sujeitas a reserva de lei fiscal (conteúdo está relacionado com a modelação normativa dos
elementos constitutivos do tipo tributário de cuja concretização factual deriva a obrigação de
imposto e o seu montante); as procedimentais estão fora das exigências de lei fiscal.
• No caso estaríamos perante norma substantiva, em que a dimensão quantitativa do
facto tributário em que se expressa a matéria coletável ainda está na dimensão da
incidência objetiva, mas, a técnica remissiva permitiria conhecer com previsibilidade e
segurança jurídica os termos quantitativos do facto tributário, portanto, não era
inconstitucional.
• Até aqui está correto, mas depois o TC faz cisão indevida entre critérios abstratos de
determinação quantitativa de imposto (sujeitos a reserva de lei) e lançamento ou
liquidação (não sujeitos a tal reserva).
• A consequência desta cisão é a indeterminação ou desconhecimento de um elemento
essencial do imposto – a base de incidência – no momento de aplicação da lei, o que
não é admissível na reserva de lei fiscal.
o APD: esta remissão não permite previsibilidade pois a remissão para um
determinado preço que se venha a estabelecer no mercado não era conhecido
no momento em que tinha de ser feita a liquidação.

Taxa/Alíquota
Art. 103º/2 – faz parte dos elementos essenciais do imposto
• Não apenas os limites mas a definição precisa da taxa de imposto tem de estar na lei.
• Outros princípios ou disposições constitucionais podem legitimar uma margem (estreita
ou não muito alargada) de discricionariedade quanto ao montante exato da mesma –
princípio da autonomia local; art. 238º/4 e etc.)

ii. BENEFÍCIOS FISCAIS


Não fazem parte do Tatbestand de Garantia
➢ São normas extrafiscais – confluência CRP económica e CRP fiscal, pelo que existe
alguma flexibilidade quanto à reserva de lei.

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Sebenta Fiscal – 2018/2019 DNB

Casalta Nabais: a consagração expressa da reserva de lei para os benefícios fiscais justifica-se
para evitar equívocos ou dificuldades de interpretação, sobretudo se se tiver em conta que os
benefícios fiscais são, por via de regra, medidas extrafiscais.
➢ Sendo extrafiscais estão sujeitas às regras do Direito Económico Fiscal, entre as quais
a reserva de lei parlamentar e, em parte, a regras flexíveis de adaptação à economia do
Direito Económico.
o Não são um elemento do tipo de imposto, relativos à determinação do an e
do quantum.

Diferente das normas fiscais stricto sensu (destinadas à obtenção de receitas fiscais), cuja
reserva de lei parlamentar está relacionada com preocupações garantistas e com o princípio do
Estado de Direito democrático, a reserva de lei parlamentar para os benefícios fiscais encontra
a sua justificação capital no facto de eles restringirem o princípio do Estado fiscal (justamente
porque este se caracteriza como o Estado cujas necessidades financeiras são essencialmente
cobertas por impostos) e de se desviarem do princípio da igualdade, na vertente da capacidade
contributiva, sendo esta um limite material constitucional ao legislador ordinário.

São o reverso da medalha das normas de incidência e da taxa de imposto – legislador


constituinte entendeu que o afastamento dessas normas e com ele a restrição dos limites ou
princípios materiais constitucionais fiscais deve estar também submetido à reserva de lei
parlamentar, sob pena de defraudar a reserva de lei fiscal.

Além da sujeição à reserva de lei, o afastamento ou restrição dos limites materiais


constitucionais fiscais carece de justificação com base em princípios orientadores, os quais
devem ser sempre ponderados conjuntamente com os princípios materiais fiscais a restringir.
• Ex: é compatível com a CRP os contratos fiscais que são negociados pelo Governo, e
assinados pelo Ministro das Finanças, com um empresa privada.
o Por haver essa flexibilidade, exige-se fiscalização material porque violam
princípio da igualdade, tendo de ser justificada (daí não poderem ser secretos).
o Só pode ser aprovado pelo Ministro das Finanças se a lei lhe der essa
competência, que é dada com parâmetros amplos.

Inclusão dos benefícios fiscais no art. 103º/2 traduz a convicção de que a reserva de lei é um
dos instrumentos para garantir, simultaneamente, o legítimo afastamento dos princípios
constitucionais materiais do Estado fiscal e a observância dos princípios a que os benefícios
fiscais estão submetidos.
➢ Os benefícios fiscais podem esvaziar o tatbestand de garantia, portanto tem de haver
um controlo apertado para a exceção não ser a regra.

iii. GARANTIAS DOS CONTRIBUINTES


Não fazem parte do Tatbestand de Garantia
Art. 103º/2 – tem ínsito as garantias procedimentais e as garantias contenciosas

Conteúdo das garantias dos contribuintes é expressamente determinado pela CRP.


➢ O art. 103º/2 estabelece que essas garantias são determinadas por lei, mas, não exclui
dessa mesma reserva de lei as normas que ampliem essas garantias ou as que se limitem
a declarar limites imanentes às mesmas.
o Garantias procedimentais e processuais – asseguradas pelo art. 165º

60
Sebenta Fiscal – 2018/2019 DNB

A função garantista da reserva de lei nunca foi entendida como dizendo respeito apenas às
normas desfavoráveis, mas sim a quaisquer alterações de regime, por estar em causa a
previsibilidade do montante do imposto (e da situação fiscal) e a tutela de confiança do
contribuinte.
➢ Mesmo as normas procedimentais e processuais têm de estar sujeitas a reserva de lei,
pois esse sistema de garantias, instituído por lei parlamentar ou DL autorizado, poderia
ser neutralizado (defraudado) pelo executivo por DL não autorizado.
o Se a alteração for substancial, tem de constar de lei – prazos têm de constar de
lei, pois eles contendem com direitos fundamentais, são questões substantivas.
o Se alterar questão meramente procedimental, não tem de constar de lei –
tecnicidades sobre o tamanho das folhas, declaração em papel, declaração
eletrónica e etc.

Criminalização, Agravação, Descriminalização ou Atenuação


Acórdão TC 56/84: a reserva de lei abrange a atividade de criminalização ou agravação e a de
descriminalização ou de atenuação
➢ Os crimes fiscais e as contraordenações fiscais são da exclusiva competência da AR, salvo
autorização ao Governo.

Determinação e Indeterminação
O princípio da legalidade fiscal exige que todas as leis em sentido formal (lei da AR; DL
autorizado; DLegislativo Regional) sejam suficientemente determinadas, de modo que os
particulares possam entender e prever as atuações da administração tributária (TC 233/94).
➢ Legalidade Fiscal Material exige que a lei seja suficientemente determinada, senão
teríamos uma legalidade vazia.
➢ O art. 103º/2 é uma concretização que vai além do art. 165º/2 – é uma aplicação deste
último artigo à matéria tributária.
o Todos os elementos do Tatbestand de Garantia têm de estar suficientemente
determinados na lei – senão havia uma espécie de fraude à CRP, pois acabar-se-
ia por não se cumprir as exigências da reserva de lei.

Exigências de densificação não implicam necessariamente a calculabilidade do imposto pelo


sujeito passivo (ou o cálculo exato)

61
Sebenta Fiscal – 2018/2019 DNB

Uma lei é indeterminada quando o conjunto de argumentos legais disponíveis é insuficiente


para justificar os resultados a que se chega.
• Uma lei determinada não é necessariamente uma lei muito pormenorizada.
• As normas muito detalhadas não evitam as lacunas, pelo contrário.
• Havendo enumeração exaustiva pode facilitar a existência de lacunas e, por
conseguinte, permitir o planeamento fiscal agressivo.
• Uma lei feita através de princípios padrão, sem enumeração tipificada e exaustiva, pode
ser mais determinada/densificada, cobrindo as várias hipóteses.61
o Doutrina Moderna: seria impossível o princípio da tipicidade ser taxativo, pois
não seria possível descrever com tal detalhe62.
• A diferença entre determinação e indeterminação é quantitativa e não qualitativa.

Um caso típico de indeterminação fiscal é o dos preços de transferência aplicável às empresas


multinacionais.

Indeterminação da lei fiscal, devido às exigências da reserva de lei fiscal, postula uma
concretização progressiva da lei formal, através de DL, regulamentos, orientações genéricas e
etc.
➢ Na verdade, a indeterminação da lei fiscal raramente aconselha o juízo discricionário,
segundo as circunstâncias do caso.
o A indeterminação legal resolvida através de soluções individuais coloca em
causa o princípio da igualdade.
o Cabe sempre aos tribunais exercerem o controlo dos limites internos e externos
à margem de livre apreciação e à discricionariedade e por isso os acordos
secretos são proibidos.

Não é inconstitucional a utilização de conceitos vagos e indeterminados e uma consequente


margem de livre apreciação atribuída à administração, nem o desenvolvimento desses
conceitos por DL não autorizados e regulamentos, quanto aos aspetos técnicos da disciplina
legal (Acórdãos TC 233/94, 756/95, 263/01, 127/04)

Grau de Determinação Legislativa exigido pelo art. 103º/2


Normas de Determinação do An e do Quantum do imposto – cabe à lei formal estabelecer
diretamente o regime para os casos típicos (padrão/paradigma) a que se dirige (o núcleo –
determinados/cobrindo de caos típicos – do conceito deve ser maior que a auréola –
indeterminados/cobrindo casos atípicos)

Incidência Objetiva stricto sensu (Objeto do Imposto) – além da definição e enumeração das
manifestações típica de riqueza que cada imposto pretende atingir (pela técnica da tipicidade
tendencialmente fechada e através de tipos jurídicos estruturais ou reais), podem ser
consagradas cláusulas residuais que abram a tipicidade e atinjam manifestações de riqueza
semelhantes

61
PRP: Caso do art. 2º CIRC – tem 15 números e diversas alíneas. Se fosse exaustivo seria muito maior e
provavelmente cresceria de mês a mês.
62
PRP: podiam surgir outros problemas – como o facto de deixar de ser lei, por deixar de ser geral e
abstrata.

62
Sebenta Fiscal – 2018/2019 DNB

Incidência Subjetiva (Sujeitos Passivos) – enumeração dos sujeitos não tem de ser taxativa, mas
exemplificativa, de modo a evitar que determinadas entidades, pela forma jurídica que
assumam, escapem do âmbito de incidência.

Regras de Determinação e Quantificação da Matéria Tributável – cabe à lei definir o regime a


aplicar, de tal modo que o intérprete perceba quais as opções tomadas e consiga prever (no
sentido amplo do termo) o imposto a pagar (princípio da previsibilidade e calculabilidade).
• Mas, para que a lei não fique sobrecarregada de pormenores, deve caber a um DL não
autorizado ou a um regulamento o desenvolvimento desses critérios.
• É recomendável que as orientações genéricas vão concretizando os conceitos legais (e
regulamentares) indeterminados, de modo que diminua o grau de incerteza na
aplicação da lei, e permita ao contribuinte ver gradualmente assegurados os referidos
princípios da previsibilidade e calculabilidade do imposto.
• A concretização progressiva dos conceitos jurídico indeterminados permite aos
tribunais um controlo mais eficaz da aplicação da lei pela administração.

Benefícios Fiscais – a lei parlamentar ou DL autorizado podem conceder ao Ministro das


Finanças discricionariedade para ponderar a atribuição dos mesmos a casos concretos, mas os
tribunais deveriam fazer um controlo da observância de princípios materiais.
• Só são legítimos os que prosseguem o bem-estar geral, respeitem o princípio da
proporcionalidade e haja um ganho para a comunidade.
• Devem também ser confrontados com os princípios materiais de Direito Fiscal.

Em todos estes pontos, os Tribunais devem controlar a legalidade da atuação administrativa.


• A consagração de conceitos jurídicos indeterminados implica a sua interpretação
segundo os critérios gerais de interpretação das leis fiscais.
• STA tem defendido a existência de uma margem de livre apreciação administrativa, na
ausência de erro manifesto.
• Na ausência de densificação de leis indeterminadas pela Administração, deve o tribunal
fazê-lo através de uma jurisprudência constante.

Jurisprudência TC sobre a não inconstitucionalidade dos conceitos indeterminados tem sido


secundada por uma jurisprudência constante do STA.
• Quando a lei usa conceitos jurídicos indeterminados, embora daí resulte que a
Administração vem a beneficiar de uma certa margem de livre apreciação, não haverá
ofensa à CRP desde que os dados legais possam ser tidos pelos destinatários da norma
como elementos suficientes para determinar os pressupostos de atuação da
Administração e que simultaneamente habilitem os tribunais a proceder ao controlo da
adequação e proporcionalidade da atividade administrativa assim desenvolvida.

TJUE (C-282/12, Itelcar) já decidiu que havia normas portuguesas (do CIRC) que não eram
suficientemente determinadas para efeitos do Direito Europeu

63
Sebenta Fiscal – 2018/2019 DNB

Remissões da Lei Formal para DL Simples ou Regulamentos


O princípio da legalidade fiscal não impede as remissões expressas da lei formal para
regulamento ou DL simples que desenvolvam aspetos estritamente técnicos do regime.
➢ Remissões são aconselháveis para que a lei fiscal possa exercer eficazmente a sua
função de garantia.

Não são inconstitucionais os DL Simples ou Regulamentos que não criem uma nova categoria de
incidência – isso acontece quando a norma não trata do critério definidor do tipo de deduções
à matéria coletável.

É também compatível com o princípio da legalidade, a atribuição por lei de uma margem de
apreciação à administração, na aplicação de critérios técnicos ao caso individual.

A densificação das leis fiscais tem de ser conjugada com o princípio da igualdade, o que significa
que as exigências de densificação não são absolutas, justificando-se que o legislador possa
recorrer a conceitos jurídicos indeterminados, com o objetivo de facilitar a aplicação da lei a
casos idênticos

Art. 103º/3 CRP


Consagra Princípio da Preferência/Precedência de Lei e uma espécie de direito de resistência
ao pagamento de impostos inconstitucionais ou ilegais, quando estes violam a CRP.
➢ Reafirma que a Administração e os Tribunais estão submetidos à CRP e à Lei.
➢ APD: este artigo não faz qualquer opção quanto à não sujeição das regras de liquidação
e cobrança à reserva de lei, mas refere-se apenas à atividade administrativa de aplicação
da lei de imposto

Consagra um direito de resistência face a todos os tributos que não tenham sido criados de
acordo com a CRP e a lei.
➢ Também já resultava do art. 2º e art. 3º/2 CRP.

64
Sebenta Fiscal – 2018/2019 DNB

Princípio da Proibição da Retroatividade


Regra no Direito Fiscal é a de que a lei nova só se aplica para futuro.
➢ A aplicação a factos passados é proibida – art. 103º/3
o Art. 103º/3 CRP63 foi introduzido na revisão de 1997: antes de 1997 o TC
aplicava esta proibição ao abrigo do princípio da proteção da confiança e
segurança jurídica.
o Este princípio da proibição da retroatividade decorre do princípio da segurança
jurídica, ínsito no art. 2º CRP

RETROATIVIDADE AUTÊNTICA (sentido próprio/forte) – quando a lei nova é aplicada a um


facto com início no passado, inteiramente decorrido ao abrigo de uma lei antiga.
➢ Quando lei nova se aplica a factos que se passaram no passado e estes já produziram
todos os seus efeitos – na data de entrada em vigor da lei mais desfavorável o facto e
seus efeitos já estão consolidados na Ordem Jurídica.
➢ É proibida pelo art. 103º/3 CRP.

RETROSPETIVIDADE – quando a lei nova é aplicada a um facto com início no passado, mas que
ainda está a decorrer.
➢ Nos casos em que o facto tributário ainda está a decorrer estamos perante
Retroatividade Inautêntica
➢ É proibida se violar a proteção da confiança.
o Ainda valem os critérios do Tribunal Constitucional, pois não há proibição
objetiva da CRP, mas sim subjetiva, atendendo aos princípios da confiança.

O que significa factos futuros e factos passados varia consoante se trate de leis procedimentais
ou leis substantivas e de fatos tributários de obrigação única ou de factos tributários de
formação sucessiva.

A proibição da retroatividade visa proteger a segurança jurídica e a confiança do sujeito


passivo, pelo que só as normas fiscais oneradoras do sujeito passivo é que não podem ser
retroativas.
➢ As normas desoneradoreas favorecem os sujeitos passivos e a segurança jurídica não é
afetada, pelo que se admite a sua retroatividade.

Leis Procedimentais e Processuais


Estas leis (garantias dos contribuintes) têm aplicação imediata a procedimentos e processos
em curso respeitantes a factos tributários já ocorridos, mas que ainda são objeto de
investigação e que não foram atingidos pela caducidade da liquidação, nem pela prescrição da
dívida fiscal.

63
Sónia Reis: Parece que a proibição da retroatividade se restringe à categoria do tributo Imposto – CRP
não dá resposta e também não define o que significa “imposto retroativo”.
• Generalidade das Constituições dos outros Estados não têm positivada a proibição da
retroatividade – exceto a da Suécia
• Ideia de introduzir o princípio da retroatividade estava no Parecer 25/81, pois antes era sempre
admitida se não ferisse as legítimas expetativas dos contribuintes.
• Esta norma não traz muito e permite ao TC uma margem de interpretação discricionária muito
grande.

65
Sebenta Fiscal – 2018/2019 DNB

Art. 12º/3 LGT – normas de procedimento e de processo são de aplicação imediata, sem prejuízo
das garantias, direitos e interesses legítimos anteriormente constituídos dos contribuintes.
• As garantias e os direitos e interesses legítimos constituídos são aqueles em relação aos
quais já decorreu o prazo de caducidade e de prescrição, ou tenha havido caso julgado.
o Contribuintes = sujeitos passivos em sentido amplo, pois mesmo que não sejam
contribuintes são protegidos pela proibição da retroatividade.

TC também aplica a distinção entre retroatividade autêntica e retrospetividade às normas


procedimentais e processuais ou relacionadas com as garantias dos contribuintes.
• É o caso das REGRAS DE PRESCRIÇÃO DE DÍVIDA TRIBUTÁRIA.

A prescrição das obrigações tributárias e respetivas causas de interrupção e suspensão são


verdadeiras garantias dos contribuintes, pelo que a aplicação de causas de interrupção ou
suspensão introduzidas pela lei nova a prazos de prescrição que já haviam começado a correr
ao abrigo da lei antiga é assimilável a uma situação de aplicação retrospetiva de norma fiscal
desfavorável.
• Acórdão TC 6/2014 – aplicação da norma do art. 49º/4 LGT a um processo em curso –
TC considerou que não havia violação do princípio da proibição da retroatividade (art.
103º/3 CRP) pois a lei nova não foi aplicada a um facto passado, inteiramente decorrido
ao abrigo da lei antiga (retroatividade autêntica).
• Considerou também que não havia violação do princípio da proteção da confiança, na
vertente da segurança jurídica.
• O legislador não está impedido de alterar o sistema legal afetando relações jurídicas já
constituídas e que ainda subsistam no momento em que é emitida nova
regulamentação, por ser essa uma necessária decorrência da autorreversibilidade das
leis.
o Concluiu que o novo regime não é essencialmente mais gravoso que o que
resultava da norma primitiva e que o regime legal se mostrava justificado por
razões de interesse público relacionadas com a necessidade de obtenção de
receitas fiscais que resultem de impostos que tenham sido já objeto de
liquidação.

Acórdão TC 592/2012
➢ As expetativas dos contribuintes na manutenção em bloco das causas de interrupção
e suspensão dos prazos de prescrição vigentes não assumem a magnitude necessária
para que se verifique uma violação do princípio constitucional da proteção da
confiança.

Leis Substantivas
Devem distinguir-se normas fiscais consoante elas contenham factos tributários de formação
sucessiva ou de obrigação única.
➢ Distinção quanto ao objeto da lei fiscal.
o Consenso na doutrina tributária segundo o qual, no quadro da lei tributária,
tem de se distinguir se já existe facto consumado que requeira a proteção da
confiança do contribuinte ou se esse facto ainda não está consumado.
o Se não estiver consumado temos de nos perguntar se há razões para proteger
a confiança dos destinatários, caso ela exista.

66
Sebenta Fiscal – 2018/2019 DNB

Quando fazemos esta distinção introduzem-se valorações sobre o que deve ou não ser protegido
ao abrigo da lei antiga.

Impostos de Obrigação Única e Impostos Periódicos


IMPOSTOS DE OBRIGAÇÃO ÚNICA – facto tributário constitui-se e conclui-se com um único ato
ou contrato jurídico.
• Proibição da retroatividade implica o respeito pelos factos tributários passados – não
aplicação da lei nova a esses factos, em que a obrigação tributária nasceu e está
concluída.

IMPOSTOS PERIÓDICOS – facto tributário tem início no primeiro dia do ano (ou período fiscal) e
só está concluído/consolidado no último dia desse ano (ou período).
• São factos tributários de formação sucessiva, que só estão concluídos quando termina
o ano/período fiscal, fazendo esse período o parâmetro para aferirmos o próprio
conceito de retroatividade.
• Proibição da retroatividade assume contornos próprios, relacionados com a formação
sucessiva do facto tributário e com a existência de anos/períodos fiscais que separam
as obrigações tributárias por períodos64.

Mas no quadro do IRS e do IRC há factos tributários de formação sucessiva e outros de


obrigação única.
➢ Aquilo que está sujeito a englobamento só está concluído no final do período fiscal.

Mais-Valias
Factos tributários de formação sucessiva ou factos tributários de obrigação única?
➢ Consoante esta caracterização vamos ter respostas diferentes quanto à proibição da
retroatividade.

APD: As mais-valias tributárias em IRS também só podem ser apuradas no final do ano
• Código do IRS diz que a tributação incide sobre o saldo entre mais valias e menos valias.
o Há englobamento do saldo, portanto tem de ser um imposto de formação
sucessiva.

Regime das mais valias confere-lhe a natureza de periocidade típica do IRS.


➢ Se fosse tributada autonomamente, não se tributaria o rendimento acréscimo num
determinado ano fiscal, mas sim o rendimento acréscimo respeitante a cada realização
(passava a ser tratada como obrigação única).
o STA 5/2017: não entende assim e decide que as alterações introduzidas ao
regime tributário das mais-valias apenas se podem aplicar aos factos
tributários ocorridos em data posterior à da sua entrada em vigor – segundo
o STA, o facto tributário da mais valia nasce no momento da alienação, sendo
esse o momento relevante para a aplicação da lei nova.
▪ Releva a norma de incidência e não a norma que prevê a tributação
entre as mais-valias e as menos-valias (aplica-se art. 10º/3 em vez do

64
Parâmetro é o ano fiscal – havendo lei fiscal nova a meio do ano não causa problemas de Retroatividade
Autêntica, só de Retrospetividade. Só seria problema de Retroatividade Autêntica se se estabelecesse que
entrava em vigo no ano seguinte mas com efeitos para o ano atual (ex: através do OE)

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Sebenta Fiscal – 2018/2019 DNB

art. 43º/1 CIRS) em face de todos os atos de alienação ocorridos num


ano, pois essa é uma norma de determinação da matéria tributável, não
sendo essa que localiza o facto tributário no tempo.
▪ Considerou que as mais-valias eram caso de retroatividade autêntica,
pois o que é importante para apurar a sujeição à retroatividade é o
momento da alienação, logo, no caso das mais valias não era imposto
de obrigação sucessiva mas assumia a característica de obrigação
única.65

o APD: critica esta posição


▪ Levaria a concluir que IRS é constituído por um conjunto de obrigações
únicas, pelo que qualquer agravamento das taxas do IRS não poderia
abranger esses ganhos realizados anteriormente.
▪ A determinação da matéria tributável é um elemento relevante para
de determinar se o imposto é periódico ou de obrigação única – só a

65
Discussão na jurisprudência foi suscitada devido à Lei 15/2010 – que não estabelecia regime transitório
e entrava logo em vigor no dia seguinte.
• Até julho 2010 estabelecia-se quando se detivesse ações por período superior a 12 meses, ao
alienar essas ações, a mais valia estava excluída da tributação (delimitação negativa de incidência
– não é benefício fiscal);
• Após julho 2010 determinou-se que essa mais valia estava sujeita a tributação.

Quanto ao momento da venda das ações – sujeita-se a tributação todas as mais valias ao longo daquele
ano, mesmo as antes da entrada em vigor da Lei?
• AUTORIDADE TRIBUTÁRIA: Sim – tem de se ter em contra o cômputo das mais valias no ano
inteiro, nos termos do art. 1º/1 e 43º/1 CIRS
o Apuramento das mais valias é no final do ano (diferença entre as mais-valias e as menos-
valias), portanto, neste cenário havia casos de retroatividade inautêntica.
o Questão nesse caso é a tutela da confiança.
• STA: Não – as mais valias são de obrigação única, nos termos do art. 10º/3 (norma de incidência
quanto a mais valias), logo, Autoridade Tributária estava a violar a proibição de retroatividade
autêntica.
o Foi logo discutido no STA pois estava em causa puras matérias de direito – houve
recurso per saltum
o Invocava o art. 10º/3 (norma de incidência) pois art. 43º é norma de determinação do
rendimento coletável.
▪ Art. 10º/3 define quando há incidência – quando há facto tributário – e só se
pode calcular pelo art. 43º se se considerar que há facto tributário (apurado
pela norma de incidência do art. 10º/3).
▪ PRP concorda
o Menção no acórdão ao art. 12º LGT é possível pois a Lei 15/2010 não o derrogava e
havia somente uma única liquidação que se aplicava tanto às que surgiram havendo já
norma de incidência como as que surgiram quando não havia.

Quanto ao momento da aquisição e período de detenção – está em causa uma situação de violação das
expetativas dos contribuintes
• Houve situações que, em termos históricos do IRS, em que as expetativas foram tuteladas tendo
em conta o momento de aquisição.
o Art. 5º DL 442-A/88 – se vender imóvel adquirido antes de 1989 (quando entrou em
vigor o CIRS) não se é tributado.
o Se se adquire algo não estando sujeito a tributação (não havendo norma de incidência)
então não pode ser tributado na venda – Lei 15/2010 não tinha regime transitório a
tutelar isso como havia no DL que aprovou o CIRS

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Sebenta Fiscal – 2018/2019 DNB

determinação da matéria tributável pode esclarecer se o imposto incide


sobre o acréscimo patrimonial anual ou não. Isto significa que as
normas de determinação da matéria coletável têm consequências
para a aplicação da lei no tempo.
▪ Critica o facto de STA trata as mais valias como impostos de obrigação
única e não como impostos de formação sucessiva.
▪ Este caso das mais valias não deve ser resolvido ao abrigo da
retroatividade autêntica mas devia ter sido resolvido ao abrigo da
proteção da confiança.

Taxas Liberatórias e Tributações Autónomas


No caso das Retenções na Fonte sujeitas a:
TAXA LIBERATÓRIA – retenções na fonte definitivas e sem submissão dos rendimentos a
englobamento;
➢ Facto tributário de obrigação única, pelo que não é relevante o ano/período fiscal,
mas o dia em que ocorreu a obrigação de imposto.
➢ O facto tributário está concluído no momento da obtenção do rendimento ou da
colocação do mesmo à disposição do sujeito passivo.

TRIBUTAÇÕES AUTÓNOMAS
➢ Os factos tributários objeto de tributação autónoma constituem factos tributários de
obrigação única
o Tributação Autónoma incide sobre despesas avulsas e não sobre o rendimento
acréscimo.
o Despesas que não são úteis à atividade da empresa. Ex: pagar viagem a pessoas
da empresa; pagar espetáculos e etc.
o Quando essa despesa é incorrida o facto tributário nasce e morre naquele
momento – portanto, apesar de IRC ser imposto periódico, vai assumir uma
feição única.
▪ Portanto, há problema de Retroatividade Autêntica quando há
mudança a meio do ano fiscal e quer abranger o ano todo (mesmo as
tributações autónomas passadas).

Lei nova só deve ser aplicada a factos tributários que ocorram após a sua entrada em vigor, sob
pena de ser retroativa e, por conseguinte, inconstitucional.
• STA (830/11) reconhece que estas tributações autónomas, embora formalmente
inseridas no Código IRC66, sempre tiveram um tratamento próprio, uma vez que não
incidem sobre rendimento, cuja formação se vai dando ao longo do ano, mas antes
sobre certas despesas avulsas que representam factos tributários autónomos sujeitos
a taxas diferentes da de IRC.

• TC (617/2012): facto gerador do imposto é a própria realização de despesa, não se


tratando de um facto complexo, de formação sucessiva ao longo de um ano, mas de
um facto tributário instantâneo típico dos impostos de obrigação única, pois esgota-
se no ato da realização de determinada despesa que está sujeita a tributação.

66
PRP: inserção no CIRC ou no CIRS é por mera comodidade administrativa e facilidade da gestão do
imposto

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Sebenta Fiscal – 2018/2019 DNB

o A operação de liquidação é no final de um determinado período, não


transformando o imposto num de formação sucessiva, somente agregando,
para efeitos de cobrança, do conjunto de operações sujeitas a essa tributação
autónoma, cuja taxa é aplicada a cada despesa.

o Este acórdão corrige a orientação anterior do TC (18/1167), que considerou a


tributação autónoma como uma tributação do rendimento.
▪ APD: tratamento das despesas documentadas como dedutíveis significa
que enquanto despesas elas contribuem para o apuramento da matéria
tributável e, portanto, para o apuramento do IRC como imposto sobre
o rendimento acréscimo.
▪ Mas, enquanto facto tributário, as despesas não constituem por
definição rendimento acréscimo.
▪ Mesmo que os custos submetidos a tributação autónoma sejam
dedutíveis como custos para efeitos de IRC, isso não prova que eles
sejam tributados como rendimento acréscimo.
▪ Em voto de vencido, Conselheiro Vítor Gomes defendeu que a aplicação
retroativa da tributação autónoma mais gravosa configurava um caso

67
Jurisprudência entendeu que se devia fazer raciocínio de retroatividade inautêntica, pois as regras de
tributação autónoma estão num código que diz respeito a um imposto periódico – tributação autónoma,
como se incluía num imposto de formação sucessiva, aplicava-se entendimento de retrospetividade, pois
era o entendimento para esses impostos.

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Sebenta Fiscal – 2018/2019 DNB

de retroatividade proibida pelo art. 103º/3 CRP, posição correta que


antecipava o posterior acórdão do TC.

APD: a nossa legislação fiscal consagra as tributações autónomas como factos tributários de
obrigação única, uma vez que a tributação incide sobre cada ato de despesa, e o facto de a
tributação autónoma estar sistematicamente incluída nos códigos do IRS e do IRC não a torna
uma tributação de factos de formação sucessiva.
➢ Assim sendo, as leis novas mais onerosas devem aplicar-se a factos tributários futuros.
o Pois há retroatividade autêntica.
o Se fossem enquadradas como retroatividade inautêntica, como é considerado o
aumento das taxas durante o período de tributação, como nos impostos de formação
sucessiva, então não era proibido pelo art. 103º/3 CRP.

Alcance da Proibição da Retroatividade


As normas tributárias, oneradoras do sujeito passivo, aplicam-se somente aos factos
posteriores à sua entrada em vigor; sem prejuízo da eliminação, com efeitos retroativos, de
normas ilegais ou inconstitucionais.
➢ APD: parte final é controversa e não está totalmente esclarecida pelo TC

Acórdão TC 395/2017 – volta-se a questionar se as leis fiscais interpretativas podem ter


aplicação retroativa.
➢ TC tem oscilado.
➢ Neste acórdão considera-se que em regra a lei interpretativa não pode ser retroativa,
pois vai colocar em causa a segurança jurídica.
o Mas admite uma exceção, devido à discordância jurisprudencial sobre a
interpretação de uma norma fiscal:
a) havendo muitos Acórdãos quanto à interpretação de uma certa lei fiscal
com conclusões muito díspares, admite-se lei nova interpretativa com
efeitos retroativos;
b) se a disparidade/discordância for ao nível da Autoridade Tributária a lei
nova interpretativa só se aplica para futuro.

APD: tem de se distinguir com muito cuidado se a lei nova é verdadeiramente interpretativa ou
não.
➢ Lei verdadeiramente interpretativa não pode trazer elementos inovadores e somente
esclarecer as situações passadas.
o Controlo feito pelos tribunais tem de ser o de saber se a lei nova está
verdadeiramente a interpretar ou se está a alterar a lei antiga.
o Se for mesmo interpretativa não está abrangida pela proibição da
retroatividade.

Quando existem muitas dúvidas e litígios quanto à interpretação de uma lei, não existe
segurança jurídica nenhuma.
• Não se deve dizer que a lei interpretativa, então, só deve vigorar para o futuro devido ao
princípio da segurança jurídica – não é assim, porque na verdade não havia segurança
jurídica.

71
Sebenta Fiscal – 2018/2019 DNB

o Não há expetativa dos contribuintes quanto a resposta certa – Tribunais não


conseguem clarificar porque se a lei é ambígua não vai haver resposta certa.
o Tem de ser o legislador a clarificar.
• Do ponto de vista do contribuinte é sempre uma situação de insegurança.

Conceito de Retroatividade para Efeitos de IVA


Sujeito passivo não coincide com o consumidor final.

Enquanto para o consumidor final o IVA é um imposto de obrigação única, para o sujeito
passivo ele é um facto tributário de formação sucessiva68.
➢ Como o IVA é suportado pelo consumidor final, a aplicação da lei nova no tempo, em
matérias de IVA, não pode colocar em causa o imposto já pago pelo consumidor final.
o Assim, o aumento do IVA a meio do ano fiscal só se pode aplicar aos factos
tributários (consumo, prestação de serviços ou importação) futuros (que
ocorram após a entrada em vigor da lei nova), sob pena de se colocar em causa
o montante de IVA cobrado anteriormente em cada elo da cadeia.

Proibição da Retroatividade como Manifestação do Princípio da Segurança Jurídica


A segurança jurídica é princípio decorrente do Estado de Direito (art. 2º CRP), pelo que deve
ser garantida pelo Ordenamento Jurídico a todos os destinatários de normas jurídicas e, no
Direito Fiscal tem como vertente positiva o princípio da proteção da confiança e como
vertente negativa o princípio da proibição da retroatividade fiscal.
➢ Ambas as vertentes permitem tutelar a previsibilidade das consequências jurídicas das
ações dos destinatários das normas.
➢ É também essencial para a economia de mercado, porque a previsibilidade dos efeitos
das normas jurídicas é condição do planeamento empresarial e da iniciativa privada.

A proibição da retroatividade não se confunde com o princípio da legalidade, pois uma lei
parlamentar ou DL autorizado retroativos passam o teste de legalidade.

APD: Art. 103º/3, introduzido na revisão CRP 1997, não trouxe nada de fundamentalmente
novo quanto ao significado e alcance da proibição da retroatividade fiscal.
• Por um lado, porque não se explica o que são impostos retroativos, cabendo ainda ao
intérprete (nomeadamente o TC), delimitar esse conceito.
• Por outro lado, porque quer o conceito de impostos retroativos quer a proibição destes
devem ser ainda e sempre fundamentados no princípio da tutela da confiança como
manifestação da segurança jurídica.

Não explica tudo e a proteção da confiança surge como princípio interpretativo da


retroatividade e da retrospetividade

68
Art. 7º CIVA dá o momento relevante para se apurar o montante e é por esta referência que se faz juízo
de retroatividade.

72
Sebenta Fiscal – 2018/2019 DNB

POSIÇÃO DO TC: Art. 103º/3 introduziu novidades


• Acórdão 129/09 – qualquer norma fiscal desfavorável será constitucionalmente
censurada, quando assuma natureza retroativa em sentido próprio/autêntico, i.e.,
proíbe-se a aplicação de uma lei fiscal nova, desvantajosa, a um facto tributário ocorrido
no âmbito da vigência da lei fiscal revogada (a lei antiga) e mais favorável.
• Por estar expresso na CRP, deve ser entendido numa dimensão objetiva e
autovinculação do Estado de Direito.
• Devido a este princípio geral de irretroatividade da lei fiscal, a mera natureza retroativa
de uma lei fiscal desvantajosa para os particulares é sancionada de forma automática
pela CRP – juízo de inconstitucionalidade decorre da mera análise de dados
normativos, não dependendo, em nenhum momento, da averiguação de quaisquer
elementos circunstanciais que resultem da condição, em concreto, de uma certa
relação jurídico-tributária.

APD: Mas TC faz valoração da norma do art. 103º/3 CRP


➢ Está a distinguir quais as situações de retroatividade que devem ser proibidas
quando estamos perante uma lei fiscal.
• APD: é que se se fizesse uma interpretação literal deste preceito não havia
distinção e proibia-se toda a retroatividade.
o Se está a ser feita esta distinção, isto é fazer valorações.
o Não existe interpretação declarativa.
o Portanto, art. 103º/3 CRP consagra um PRINCÍPIO de proibição da
retroatividade em matéria fiscal.
▪ Tem de ser ponderado com outros princípios, como o da
proteção da confiança.
▪ Tem de ser confrontado com o princípio da igualdade,
também (como no das regras antiabuso).

TC estabeleceu uma dicotomia entre a Retroatividade Autêntica e a Retrospetividade.


• TC 399/201069: Só é proibida a retroatividade autêntica e do art. 103º/3 CRP está
excluída a retrospetividade.
o Nos casos da retroatividade autêntica, ao ser proibida pela CRP, não tem de se
avaliar se a proteção da confiança foi violada ou não, havendo somente essa
análise para as situações de retrospetividade.
▪ Mas TC nem sempre é coerente com esta posição (Acórdão 135/2012
sobre comercialização de produtos farmacêuticos – considera que é
situação de retroatividade autêntica, mas, não considera suficiente e
analisa se há violação da proteção da confiança).

APD: quando concluímos que uma lei fiscal é retroativa ou retrospetiva, já fizemos um juízo sobre
a violação da proteção da confiança e considerámos que a retroatividade autêntica implica uma
violação mais forte da proteção da confiança do que a retrospetividade.
• A proteção da confiança está sempre ínsita na análise a retroatividade de uma lei fiscal
– é o seu princípio interpretativo.

69
É um acórdão de plenário = consenso TC

73
Sebenta Fiscal – 2018/2019 DNB

o TC assume, na sua jurisprudência constante, que nos casos de retroatividade


autêntica a proteção da confiança é sempre violada devido à letra do art. 103º/3
CRP.

Retrospetividade e Princípio da Proteção da Confiança


A proibição da retroatividade do art. 103º/3 CRP não abrange aquelas situações em que a lei é
aplicada a factos passados mas cujos efeitos ainda perduram no presente. Ex: quando a lei é
aprovada até ao final do ano a que corresponde o imposto e mesmo que se aplique a todo o ano
ou período fiscal em curso (TC 399/2010).

Dado que os factos tributários de formação sucessiva só estão concluídos no final de um ano
ou período tributário, cabe saber se as expetativas que as leis novas mais gravosas só entrem
em vigor depois de o período fiscal estar em curso estar concluído são protegidas
constitucionalmente pelo Princípio da Proteção da Confiança.

Para que o princípio da proteção da confiança seja tutelado, na ponderação de eventual


inconstitucionalidade de normas dotadas de Retroatividade Inautêntica, é necessário que se
reúnam dois pressupostos essenciais e cumulativos:
A. Afetação de Expetativas em sentido desfavorável – mutação da ordem jurídica que os
destinatários das normas não podiam contar;
B. Necessidade de Salvaguardar direitos e interesses constitucionalmente protegidos
que devam considerar-se prevalecentes – atendendo ao princípio da proporcionalidade
o art. 18º/2 CRP.
Estes dois critérios são densificados através de 4 requisitos/testes:
1. Estado encetou comportamentos capazes de gerar nos privados expetativas de
continuidade;
2. Expetativas de continuidade são legítimas, justificadas e fundadas em boas razões;
3. Privados fizeram planos de vida tendo em conta a perspetiva de continuidade do
“comportamento” estadual;
4. Não podem ocorrer razões de interesse público que justifiquem, em ponderação, a
não continuidade do comportamento que gerou a situação de expetativas
• TC 128/2009 – interesse público relevante pode operar uma mutação na ordem
jurídica, que, de outra forma, seria imprevisível e injustificada e com a qual os
cidadãos não contavam.
• Ideia que interesse público tem de prevalecer sobre os interesses dos
particulares (TC 399/2010): há motivos de interesse público que justificam essa
retroatividade.
• Proteção da confiança é sempre violada, mas, se houver razões de interesse
público que justifiquem, então isso prevalece.

APD: o 1º e o 4º requisito conjugados têm tornado rara a probabilidade de aplicação da


proteção da confiança e a proibição da retrospetividade.
➢ E basta que um dos testes não esteja cumprido para que não seja possível, com
fundamento na violação da proteção da confiança, julgar inconstitucional as normas sub
judicio (TC 401/2013).

74
Sebenta Fiscal – 2018/2019 DNB

o Portanto, na prática, o TC não tem aceitado como relevante o princípio da


proteção da confiança para julgar inconstitucional a retrospetividade.

Princípio da Proteção da Confiança e da Auto-Reversibilidade das Leis


TC 18/2011: este princípio postula uma ideia de estabilidade da ordem jurídica e constância da
atuação do Estado.
• Não existe um direito à não frustração de expetativas jurídicas ou à manutenção do
regime legal e relações jurídicas duradouras ou relativamente a factos complexos já
parcialmente realizados.
• Ou seja, o legislador não está impedido de alterar o sistema legal afetando relações
jurídicas já constituídas e que ainda subsistam no momento em que é emitida a nova
regulamentação, sendo essa uma necessária decorrência da autorreversibilidade das
leis.
• O que se impõe determinar é se poderá haver por parte dos sujeitos de direito um
investimento de confiança na manutenção do regime legal.

Ponto de partida do TC é que o contribuinte não pode contar com a estabilidade e constância
da lei de imposto no decurso do ano fiscal, a não ser que tal estabilidade fosse anunciado.
➢ Princípio da autoreversibilidade das leis sobrepõe-se às expetativas de estabilidade, e o
contribuinte deve sempre contar com a alteração dos impostos ao longo do ano.

TC acaba por admitir que o princípio da tutela da confiança não tem, em regra, autonomia do
princípio da proibição da retroatividade.
➢ A tutela da confiança só proíbe a retroatividade em sentido próprio.
➢ Só excecionalmente tem autonomia, fora da Retroatividade Autêntica
o Quando há erro político grosseiro quanto à criação pública de expetativas e
quando não exista interesse público na alteração da lei.
➢ Isto significa que só excecionalmente a retrospetividade poderá ser considerada
contrária à tutela da confiança.

APD: esta jurisprudência pode ser perigosa e contribuir para orçamentos negligentes, pois os
governos e as maiorias parlamentares sabem que em qualquer altura do ano fiscal o interesse
público pode justificar um agravamento de impostos de formação sucessiva com efeitos a partir
de 1 de janeiro desse mesmo ano.

Normas Oneradoras e Desoneradoras do Sujeito Passivo


NORMAS ONERADORAS – afetam negativamente a posição do sujeito passivo, aplicando-se a
proibição da retroatividade e tutelando a confiança.

NORMAS DESONERADORAS – são nomas mais favoráveis, pelo que não colocam questões de
proteção de confiança.
➢ Ou seja, se a lei nova desoneradora não era esperada, a confiança existente não precisa
de ser protegida e o sujeito passivo agradece ser surpreendido pela lei nova.

75
Sebenta Fiscal – 2018/2019 DNB

Art. 12º LGT


Tem solução diferente da que resulta do art. 103º/3 CRP

Art. 12º/1: princípio da proibição da retroatividade

Art. 12º/2: factos tributários de formação sucessiva, perante lei nova, vão ser submetidos a lei
nova apenas quanto ao período decorrido a partir da entrada em vigor.
➢ Está a dividir-se o tempo de aplicação das leis.
o Se TC tivesse seguido este raciocínio, até certo momento tributava-se de acordo
com lei antiga e a partir do momento em que entra em vigor a lei nova, tributa-
se à luz da lei

Para o TC, o que tem valido é o art. 103º/3 CRP e ignorado o art. 12º/2 LGT
• Grande objeção ao art. 12º/2 é que este é mais complexo de aplicar – princípio da
praticabilidade no Direito Fiscal recomenda que não haja distinção entre dois períodos;
o É incorreto tributar o mesmo facto tributário de forma diferente entre dois
períodos do ano porque isto pode falsear o tributo (ex: metade do ano com
lucro e a outra metade com prejuízos).

Art. 12º/3: aplicação imediata para as normas de procedimento e processo.

Art. 12º/4: não são normas de procedimento e processo.


➢ Normas de quantificação da matéria tributável são analisadas tendo em conta a
aplicação da lei no tempo das leis substantivas.
o APD: Interpretação da incidência em sentido amplo, sem confundir liquidação e
lançamento com aspetos procedimentais.

Clarifica que, para efeitos de retroatividade, normas de lançamento e liquidação (normas de


cálculo da matéria tributável) são normas de incidência em sentido amplo.
➢ Antes da reforma de 1988/1989 os códigos falavam em “lançamento e liquidação”, apelando ao
art. 103º/3 CRP – Fisco pegava nas declarações dos contribuintes e fazia as contas (apurava a
coleta = montante de imposto a pagar).
➢ A partir de 1989 passou a existir autoliquidação e Fisco somente fiscaliza e corrija se tudo foi
normalmente apurado.

O que significa lei no art. 103º/3? É o mesmo sentido que o do art. 103º/2? ´
Parece que operação de liquidação e cobrança não está sujeita a reserva de lei, pois se estivesse,
estaria no art. 103º/2.
➢ APD: o art. 103º/3 é preferência/precedência de lei (uma outra vertente do princípio
da legalidade) e não está relacionado com reserva de lei – autoridade tributária está
sujeita à lei em sentido formal.
o TC veio dizer que atividades de liquidação (= quantificação) não estavam
submetidas a Reserva de Lei – APD discorda pois quantificação tem de estar
submetida à Reserva de Lei, senão esta Reserva não está preenchida (não dá
segurança jurídica).
o Contribuinte consegue prever quanto vai pagar no final do ano devido à
reserva de lei e à proibição da retroatividade, i.e., proteção da confiança.
▪ No entanto, no IRS, a proteção da confiança não está garantida até ao
final do ano porque o facto tributário ainda não está concluído.

76
Sebenta Fiscal – 2018/2019 DNB

Legislador da LGT quis clarificar que as normas de quantificação são normas de incidência, em
sentido amplo.
➢ Para não haver dúvidas quanto ao sentido e conteúdo de certas normas
(nomeadamente o art. 103º/2 e 103º/4).
➢ Ou seja, liquidação dos impostos tem a ver com quantificação e para efeitos de
retroatividade não são normas de procedimento.
o Não se aplica imediatamente a lei nova e tem de ser feita as valorações que são
feitas às normas substantivas (da Retroatividade Autêntica e Inautêntica).

Como a LGT não tem valor reforçado, as suas normas são meramente indicativas e só são
aplicáveis se forem conformes aos princípios constitucionais de proibição da retroatividade
fiscal e de tutela da confiança.
➢ PRP: quando há lei nova que pretende que o regime se aplique ao ano todo, elas têm o
mesmo valor que a LGT, prevalecendo a lei que dispõem quanto ao caso concreto (desde
que respeite a CRP)

Cláusulas Antiabuso
Tribunal Central Administrativo Sul, 31/1/2012: o abuso de formas jurídicas, com vista à
obtenção de vantagem fiscal indevida, nem sempre consubstancia um único ato e pode ser uma
cadeia de atos.
➢ TC 77/2013: não se pode concluir que o TCA Sul tenha aceitado a aplicação retroativa
dos preceitos em causa, sempre que os factos se integrem numa cadeia de atos em que
nem todos ocorreram já no seu domínio de vigência.

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Sebenta Fiscal – 2018/2019 DNB

Princípio da Igualdade Fiscal


Vertente Negativa: proíbe as discriminações e os privilégios fiscais (art. 13º/2 CRP)
➢ Esta discriminação fiscal tem de ser determinado à luz da CRP e do DUE
Vertente Positiva: é preciso tratar igual o que é igual e diferente o que é diferente.
➢ Tem uma componente ativa/material que visa corrigir as desigualdades – decorrendo
do princípio da justiça.

Art. 104º/1 CRP


Exigência de um único imposto progressivo
APD: só uma interpretação atualista é que permite entender a exigência de unicidade e
progressividade de um imposto único.
➢ Era preferível este artigo ser reformulado ou eliminado.

Princípio da Capacidade Contributiva


Concretiza o princípio da igualdade – sendo o princípio estruturante e medida de igualdade
económica aplicada aos impostos, concretizando um princípio de justiça fiscal.
• Contém a medida de comparabilidade entre os objetos de tributação e entre os sujeitos
passivos.
• Este princípio deve estar sempre presente na elaboração das leis fiscais e deve fazer
parte do Tatbestand sistemático de imposto.

Este princípio é a medida de igualdade económica que rege a tributação dos impostos.
➢ Aplica-se ao universo de sujeitos que mostram essa capacidade e não apenas a alguns.
o A tributação de alguns sujeitos, deixando outros de fora, tem de ser justificada
por um princípio constitucional que, no caso concreto, legitime a violação do
princípio da igualdade.
o A regra é a tributação de todos os sujeitos passivos segundo o princípio da
igualdade e a exceção são as isenções ou tributação diferente.

A Comparabilidade está relacionada com a ligação da pessoa (impostos pessoais) ou do bem


(impostos reais) ao território de tributação.
➢ Comparabilidade é determinada pelo princípio do benefício – daí justificarem-se
impostos diferentes sobre os residentes e os não residentes.
o A residência implica um maior benefício dos bens e serviços públicos estaduais,
devendo os residentes ser tributados segundo o princípio da tributação
universal.

Proibição dos Impostos Confiscatórios


Os impostos confiscatórios são aqueles que limitam de forma desproporcionada a
propriedade privada e a iniciativa económica.
• TEDH (Gáll v. Hungary, 2013) – imposto anual sobre as pessoas singulares que atinge os
60% é confiscatório.
• TC podia ter-se pronunciado, na jurisprudência da Crise, mas não o fez e refugiou-se no
estado de emergência e medidas temporárias.

- princípio a partir do qual falaremos do IRS -

78
Sebenta Fiscal – 2018/2019 DNB

Imposto Rendimento Pessoas Singulares (IRS)


O Imposto sobre o Rendimento das pessoas Singulares (IRS) foi criado no contexto da reforma
fiscal de 1988/89, com o propósito de modernizar e simplificar a tributação do rendimento das
pessoas singulares, mediante a introdução de um imposto único ou sintético70.
➢ Surgiu para ficar em conformidade com o disposto no art. 104º CRP.
➢ APD: Por exigência da CRP 1976, o imposto sobre o rendimento das pessoas singulares
deveria ser um imposto pessoal – único, progressivo e com objetivos redistributivos
(os quais seriam satisfeitos não só com a unicidade e a progressividade, mas também
com deduções à coleta de despesas sociais).
o Corresponde à visão do início do séc. XX (à luz de uma soberania estadual
fechada) que entende que o imposto deveria recair sobre o rendimento líquido
global, porque é isto que reflete de forma mais rigorosa a capacidade
contributiva do sujeito.
o Tributando o rendimento global não há discriminação de categorias de
rendimento – é mais justa e neutra.

Rendimento tem duas aceções para efeitos fiscais:


• Rendimento-produto (rendimento em sentido estrito) – rendimento relevante
corresponde apenas aos fluxos de receitas que sejam imputáveis a uma fonte produtora
de que o sujeito passivo seja titular
o Ex: capacidade de trabalho, capital, imóveis e etc. – reconduz-se à remuneração
do trabalho, juros, rendas e etc.
o Tem uma certa regularidade/repetição na obtenção do rendimento (relevando
o fluxo de receitas tendencialmente periódicas).
o O rendimento é gerado por um bem ou direito sem que a sua obtenção faça
cessar ou prejudique a continuação da titularidade do bem ou do direito gerado
do rendimento71 – obtenção do rendimento não prejudica a manutenção da
fonte produtora.
• Rendimento-acréscimo (rendimento em sentido lato) – a par dos fluxos de rendimento
gerados pelos fatores de produção da titularidade do sujeito passivo, são também
relevantes as valorizações sofridas ao longo do ano por qualquer elemento do
património global do sujeito passivo (diferença entre o valor dos seus bens no início e no
fim do período anual).
o Centra-se mais na capacidade contributiva do sujeito passivo pois não releva
apenas os rendimentos gerados elos fatores de produção de que o sujeito
passivo é titular e sim em qualquer acréscimo patrimonial obtido pelo sujeito
passivo no decurso do ano fiscal.

Conceito jurídico-tributário de rendimento foi-se afastando da conceção estrita e evoluiu para


uma conceção lata, já concebida com o propósito de medir a capacidade contributiva do sujeito
passivo.
➢ Cabem mais conceitos: as mais-valias somente cabem na conceção de rendimento-
acréscimo, bem como as aquisições a título gratuito (que são tributadas em sede de
Imposto de Selo e não IRS).

70
Antes havia uma estrutura dualista composto por impostos cedulares/parcelares e um complementar
de sobreposição.
71
Conceção próxima do conceito de fruto no Direito Civil (art. 212º CC)

79
Sebenta Fiscal – 2018/2019 DNB

O sistema jurídico português tem uma conceção de rendimento-acréscimo mitigada pois só


relevam as mais-valias REALIZADAS, excluindo a tributação das mais-valias potenciais ou
latentes.
➢ O IRS, através de uma ampla base de incidência, espelha uma conceção de rendimento-
acréscimo atenuada pelo princípio da realização, tributando apenas os acréscimos
patrimoniais realizados que se concretizaram num aumento líquido da disponibilidade
monetária do respetivo titular72.
o Excluindo a valorização de ativos que não tenham sido objeto de alienação
onerosa pelo seu titular.

Princípios da Tributação em IRS


Permitem uma sistematização e uma ponderação dos aspetos valorativos subjacentes aos
regimes jurídicos consagrados, fornecendo uma justificação para as normas concretas, estando
na sua base e explicando a sua razão de existência.

1. Princípio da Igualdade
O critério de repartição do encargo tributário entre os contribuintes tem de ser norteado por
considerações de justiça material.

SEMI-DUALIZAÇÃO DO IRS
Pelo facto de alguns tipos de rendimentos estarem sujeitos a tributação por taxas especiais de
tributação autónoma (art. 72º CIRS) ou liberatórias (art. 71º CIRS), ao passo que outros,
quando obtidos por sujeitos passivos residentes são de englobamento obrigatório, sendo-lhes
aplicáveis taxas gerais progressivas de IRS (art. 68º CIRS).
➢ Esta situação não assegura uma igualdade horizontal na tributação, uma vez que
contribuintes com o mesmo rendimento líquido podem ser tributados de forma bastante
distinta e sujeitos a níveis de tributação díspares, se a capacidade contributiva for
revelada mediante a obtenção de diferentes tipos de rendimento.

É a conjugação com o princípio da praticabilidade que justifica esta situação pois há necessidade
de assegurar competitividade no sistema fiscal.

2. Princípio da Capacidade Contributiva


Concretização ao nível dos impostos da igualdade.
➢ Critério de repartição dos encargos tributários que melhor concretiza a ideia de justiça
material ao nível dos impostos e melhor obedece ao princípio da igualdade – É O
PRESSUPOSTO E CRITÉRIO DA TRIBUTAÇÃO.
➢ Tem um papel estruturante ao nível da tributação do rendimento.

Ao nível do IRS concretiza-se:


• Na incidência do imposto sobre as manifestações de força económica do contribuinte

72
O art. 1º/1 CIRS admite a tributação de rendimentos que provenham de atos ilícitos (sendo considerado
incremento patrimonial pelo art. 10º) – lógica pragmática em que legislador entendeu que se há
capacidade contributiva, não há por que não ser tributado.
➢ Se não tributasse seria quase como conferir uma vantagem a quem obtenha rendimentos de
forma ilícita.

80
Sebenta Fiscal – 2018/2019 DNB

• Na consagração de uma base de incidência tão ampla quanto possível – visando abarcar
a generalidade dos rendimentos auferidos pelas pessoas singulares, culminando na
tributação do rendimento global do contribuinte.
• Na adoção do rendimento-acréscimo – inclui as mais-valias , mas o legislador foi
seletivo e não inclui no campo de incidência os ganhos com bens móveis, deixando de
fora ganhos que poderiam representar manifestações de capacidade contributiva
devido à dificuldade de controlo deste tipos de ganhos.
• Na repartição do encargo tributário segundo o critério da força económica efetiva do
contribuinte
• Na personalização do imposto
• Na consagração de um mínimo de existência – art. 70º CIRS determina a não tributação
de valores que se revelem essências para a subsistência básica do indivíduo e do
agregado familiar73.
o Paula Rosado Pereira: Tem um caráter demasiado restrito e não protege todos
os contribuintes que dele necessitariam (apesar de estar menos restritivo
devido à inclusão das atividades no âmbito do art. 151º CIRS ex vi Portaria
1011/2001).
o APD: Mínimo de existência é conceito de Direito Fiscal que implica a não
tributação de certos sujeitos quando a lei entende que eles não atingem um
mínimo de capacidade contributiva.
▪ Da aplicação das taxas não pode resultar um valor inferior ao valor
anual da retribuição mínima mensal mais 20%
▪ Determina-se a matéria tributável, vê-se qual é o escalão. Quando se
determina a coleta (aplicando as taxas à matéria tributável), se o rendimento
líquido for inferior ao valor mínimo anual de retribuição mais 20%, então o
sujeito não é tributado.
▪ Não tem capacidade contributiva

▪ Isto é benefício fiscal ou outra situação?


➢ Tem a ver com a DPH concretizada no princípio da capacidade
contributiva.
➢ Quando se interpreta este princípio também tem de se ter em
conta a DPH – é isto que justifica a não tributação.
➢ Não é benefício fiscal – só há beneficio fiscal quando há
capacidade contributiva.
❖ Sujeito não tem regra que exceciona as normas de
incidência.
❖ Sujeito fica de fora das normas de incidência pois a lei
considera que não atinge o mínimo de existência.

• Na assunção de limites máximos de tributação e proibição do confisco

O rendimento bruto não representa a efetiva capacidade contributiva, pois a determinação


desta pressupõe a dedução das despesas inerentes à obtenção do rendimento sujeito a imposto

73
Rendimento líquido inferior ao valor anual de retribuição mínima mensal não é tributado – mínimo de
existência.
➢ Isto não constitui uma exceção à capacidade contributiva, pois fica abaixo desta – o critério de
comparabilidade de capacidades contributivas não lhe é aplicável.

81
Sebenta Fiscal – 2018/2019 DNB

(para se chegar ao rendimento líquido objetivo) e, ainda, a dedução de despesas


pessoais/familiares essenciais (para se apurar o rendimento líquido subjetivo).
• O apuramento líquido do rendimento difere consoante as categorias, pois os gastos
dedutíveis não são comunicáveis.
• A determinação do rendimento líquido de cada categoria é dada pelas deduções
específica nessa mesma categoria.

3. Princípio da Tributação do Rendimento Líquido Objetivo


A tributação tem de ser efetuada pelo valor líquido do rendimento – admite-se a dedução das
despesas conexas com a obtenção do rendimento sujeito a imposto, atendendo ao facto de
que a verdadeira capacidade contributiva reside nesse rendimento líquido.

Art. 25º e ss. CIRS – deduções ocorrem na fase determinação do rendimento coletável e
constituem deduções específicas ao rendimento bruto de cada categoria, estando na fase
analítica do imposto.
➢ Nem todas as categorias admitem deduções específicas – não se admite no rendimento
de capitais nem nos incrementos patrimoniais (excetuando as mais valias).

4. Princípio da Tributação do Rendimento Líquido Subjetivo


Impõe-se que se deduzam as despesas mais elementares necessárias à vida do sujeito passivo
– dedutibilidade de despesas de cariz pessoal ou familiar necessárias à existência humana,
assentando no pressuposto de que a parte do rendimento auferido pelo sujeito passivo que seja
necessária para tais despesas essenciais não representa capacidade contributiva e não deve,
portanto, ser tributada.
➢ São DEDUÇÕES À COLETA, não sendo deduções ao rendimento líquido total – art. 78º e
ss. CIRS

5. Princípio da Tributação do Rendimento Real


Corolário do princípio da capacidade contributiva, tributando a matéria coletável realmente
auferida pelo sujeito passivo.
≠ APD

Implica a existência de uma correção monetária (art. 50º/1 CIRS) que permite a tributação de
mais-valias apenas sobre a valorização real do bem e não sobre o aumento nominal do seu valor,
em resultado da desvalorização monetária.

6. Princípio da Solidariedade entre Períodos de Tributação


Anualidade do período de tributação não pode ser estanque pois o facto de cada ano fiscal ser
objeto de liquidação e pagamento de imposto de modo independente relativamente aos outros
constitui um arranjo artificial, uma vez que a obtenção de rendimentos é, em geral, pautada por
um caráter de continuidade e não por uma separação estanque de períodos anuais.

Art. 55º CIRS


➢ As perdas de um sujeito passivo podem ser reportadas para os anos seguintes mas
apenas para serem deduzidos aos rendimentos líquidos positivos da mesma categoria.
➢ As perdas são incomunicáveis entre sujeitos passivos.
7. Princípio da Realização

82
Sebenta Fiscal – 2018/2019 DNB

Consagração da conceção do rendimento-acréscimo mas atenuada por este princípio – apenas


são tributáveis os ganhos decorrentes de transações já consumada

8. Princípio da Conformidade com as Liberdades de Circulação do DUE


O tratamento fiscal em Portugal não pode ser discriminatório face a outros cidadãos da UE e
não pode desincentivar o exercício das liberdades fundamentais.

Características do IRS
1. Imposto sobre o Rendimento
Incide sobre a capacidade contributiva das pessoas singulares revelada através do rendimento
– art. 4º/1 LGT
➢ Os rendimentos tributáveis estão tipificados – art. 1º/1 CIRS

APD: Imposto Único e Progressivo que tenha em conta os Rendimentos do Agregado Familiar
Único é noção que remonta ao final do séc. XIX e XX
➢ Numa lógica de justiça o que faz sentido é tributar o rendimento global – quando
falamos do princípio da igualdade no geral temos de encontrar um elemento de
comparação entre os vários contribuintes.
o Critério mais rigoroso é ter em conta todo o seu rendimento – rendimento
global é o mais justo para comparar.

2. Imposto Pessoal
Tem em conta as características específicas do sujeito passivo que são determinantes na
configuração do regime, atendendo ao elemento subjetivo da incidência.
➢ Formação do imposto é fortemente marcada pelas características específicas dos
sujeitos passivos, ao nível pessoal, económico e social.

Coerente com o art. 104º/1 CRP e 6º/1 LGT – deve ter-se em conta as necessidades e os
rendimentos do agregado familiar.

Há casos em que o IRS se assemelha a um imposto real (art 71º e 72º CIRS), onde os elementos
personalizantes do imposto não têm aplicação.

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Sebenta Fiscal – 2018/2019 DNB

3. Imposto de Base Cedular


Reminiscências da tributação antes de 1988/89.

Tipificação dos rendimentos tributáveis com recurso a seis categorias de rendimento, baseadas
na respetiva fonte geradora.
➢ Manifesta-se ao nível da incidência real, com a tipificação das categorias de
rendimento, mas também se manifesta quanto à determinação do rendimento líquido
dessas categorias de rendimento, prevendo deduções específicas para cada uma delas

PRP: O que compromete o caráter unitário do IRS não é a sua conceção de base cedular, mas sim
a contraposição entre rendimentos sujeitos a englobamento obrigatório e outros excluídos.

4. Imposto Periódico
É um imposto periódico de base temporal, caracterizado pela formação sucessiva do facto
tributário objeto da previsão legal.
➢ Art. 1º/1 CIRS

5. Imposto Único
Mas não Unitário74

Incide sobre o rendimento global da pessoa singular.


➢ Opção fundamental para uma tributação de acordo com a capacidade contributiva do
sujeito passivo.

Apesar disto, o IRS não prescinde de definir a sua incidência real com recurso a diversas
categorias de rendimento, organizadas em função da providência ou da natureza dos
rendimentos – há regras distintas para cada categoria de rendimentos.
➢ PRP: Isto não prejudica a característica de ser um imposto único/sintético pois após
uma Fase Analítica em que são aplicáveis regras específicas para cada categoria de
imposto, segue-se uma Fase Sintética caracterizada pela aplicação de um único
conjunto de regras fiscais.

Portanto, não há aqui uma tributação unitária pois não há a tributação da generalidade dos
rendimentos líquidos do sujeito passivo de acordo com um mesmo figurino similar.
➢ Apesar de ser imposto único – incidente sobre todos os rendimentos do sujeito passivo,
com um único Código, regras de tributação e estrutura normativa – não é unitário.

Rendimento global é assumido na CRP como imposto único.


Significa que não deve haver discriminação entre as várias categorias de rendimento.
• Um sujeito passivo deve ser tributado sobre os rendimentos de trabalho dependente,
independente, capitais, mais valias e etc.
• Todos eles sujeitos às mesmas regras de determinação da matéria tributável (taxas e
outros elementos de quantificação).
o Tudo isto pressupõe um englobamento – uma vez englobadas submetemo-lo às
taxas de imposto

74
PRP: é único porque tributa todo o rendimento de uma só vez mas não é unitário porque o regime de
cada categoria é diferente

84
Sebenta Fiscal – 2018/2019 DNB

Conceito teórico puro de uma tributação justa sobre os residentes


➢ APD: problema quanto a este conceito – elaborado num contexto de Estados
factualmente soberanos, i.e., cada Estado aprovava as suas normas de tributação sem
interferência de outros Estados ou entidades supraestaduais.
o Com as livres circulações a tributação de imposto global único deixou de ser
possível.
o Ex: se juntarmos juros e capitais no englobamento e os submetermos a
progressividade, o efeito que teremos é uma fuga de capitais. Fuga de poupança
para outros territórios que tributem a taxa mais baixa ou não tributem.
▪ Política fiscal atual tem de ser elaborada tendo em conta o
constrangimento factual das livres circulações – daí que tributação de
rendimentos mais móveis não sejam englobados (mais valias, capitais e
etc.) e saem do imposto único que a CRP queria criar.

No CIRS há 2 figurinos de tributação:


1. Tributação por via do ENGLOBAMENTO – rendimentos líquidos de diversas categorias
são adicionados e assim convertidos num rendimento global.
• Art. 68º CIRS75
2. Tributação pelas TAXAS LIBERATÓRIAS76 e/ou TAXAS ESPECIAIS77 – Aplicação exclui os
rendimentos do regime de englobamento, exceto por opção diferente do contribuinte
residente. Têm uma tributação proporcional e frequentemente mais moderada que
aquela que resultaria da aplicação das taxas gerais progressivas do IRS.
• Art. 71º e 72º CIRS.
• Em ambos os casos, a lei permite ao sujeito passivo a possibilidade de englobar.
o Se o contribuinte preferir pode englobar – ponderação face à taxa de
imposto que resulta dos escalões.
➢ Se taxa for mais baixa deve optar pelo englobamento.
➢ Se não for mais baixa deve optar por uma taxa proporcional e
final.
o Esta opção de englobamento não garante a progressividade e redu-la,
pois só optarão pelo englobamento os sujeitos passivos cujo escalão
ficar abaixo das taxas proporcionais estabelecidas nos artigos.
o APD: opção criticável – ao dar esta opção, o legislador tenta remediar a
descriminação que ele provocou ao retirar estes rendimentos do
englobamento.
➢ Pois houve retirar de categorias do imposto único, justificando-
se com a ponderação de princípios (da necessidade e etc.) para
evitar fuga de capitais.
➢ Mas isso é introduzir discriminação quanto aos rendimentos de
trabalho, que estão sujeitos a taxas progressivas.
➢ Então legislador dá uma volta e diz que se sujeito passivo quiser
pode englobar.

75
Art. 22º contém englobamento, que é necessário para aplicação das taxas progressivas.
76
Não está sujeito a englobamento; há retenção na fonte a título definitivo e sujeito passivo fica libertado
do englobamento
➢ Aplicam-se aos residentes com certo tipo de rendimentos, não-residentes com rendimentos de
trabalho dependente e pensões e etc.
77
Foram sendo acrescentadas pelo legislador com base em razões diferentes de política fiscal.

85
Sebenta Fiscal – 2018/2019 DNB

➢ Na prática isto não é utilizado pelos contribuintes.

TC 17/95 não declarou inconstitucional a dualidade de tributação.


➢ APD: esta dualidade é uma sábia decisão legislativa – não englobamento dos
rendimentos de capitais e de mais-valias permite evitar a fuga de poupança e
investimento para o exterior e justifica-se para atrair a poupança e o investimento.

Devido ao art. 71º/1/e, os Rendimentos Prediais estão sujeitos a uma taxa proporcional –
passagem desses rendimentos do regime de englobamento obrigatório e de taxas progressivas
para a tributação proporcional com taxas especiais.
Isto aprofunda a semi-dualização do IRS, não sendo aplicadas às diversas categorias de
rendimentos as mesmas taxas de tributação.

Também os rendimentos de capitais e mais-valias mobiliárias são sujeitos a um tratamento


fiscal preferencial, caracterizado por uma tributação a taxas proporcionais, em geral mais
baixas do que as taxas de imposto progressivas aplicáveis aos rendimentos de outra natureza.

Isto leva a que não seja assegurada uma igualdade horizontal – contribuintes com idêntica
capacidade contributiva podem ser tributados de forma distinta.
➢ Esta situação é agravada dados os rendimentos sujeitos a essas taxas proporcionais,
dado serem aqueles são mais frequentes e de valor mais significativos nos contribuintes
com capacidade contributiva superior.
➢ PRP: o atual IRS, com o seu sistema semi-dual apresenta até características de
regressividade

o TC 57/95 foi chamado a pronunciar-se acerca do nosso sistema de tributação


mas não analisou a questão de fundo suscitada, invocando argumentos de
natureza formal.

Casalta Nabais: Esta característica semi-dual justifica-se pelo princípio da praticabilidade pois
se assim não fosse havia soluções impossíveis de levar à prática e economicamente
insustentáveis.

APD: Art. 104º/1 CRP não está a ser observado pelo legislador, mas há boas razões para isso –
observar o disposto na CRP teríamos efeito perverso de na prática não se conseguir tributar
certos rendimentos
➢ Unicidade não está a ser aplicada em substância pelo IRS – formalmente há um único
código, mas com diversas categorias (não há englobamento para todas as categorias)

Se tivéssemos imposto único haveria fuga de capitais e fraude fiscal.


Imposto único contribui para a fraude fiscal – há deslocalização de rendimentos para territórios
que não contribuem;
➢ Esta fraude fiscal existiria mais porque se o legislador disser que os residentes estão
sujeitos à tributação universal de todos os rendimentos, o efeito seria a deslocalização
de rendimentos para territórios que não trocam informações e não declaram os
rendimentos obtidos no exterior

APD: Na prática, no CIRS há imposto dual pois há uns rendimentos que são englobados e outros
que não.

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Sebenta Fiscal – 2018/2019 DNB

• Hoje em dia, IRS é disciplinado por um único código mas não é um imposto único e
progressivo, no sentido do art. 104º/1 CRP.
o APD: é um imposto dual
o Combina tributação sobre rendimentos obrigatoriamente englobados (art.
22º e 68º CIRS) e sujeitos a progressividade com uma tributação não sujeita a
englobamento obrigatório de outros rendimentos (art. 71º e 72º CIRS).

6. Imposto Progressivo
Aumenta o nível de tributação do contribuinte à medida que aumenta o próprio rendimento
coletável.
➢ As taxas são progressivas por escalões e o imposto funciona com limites nas deduções
à coleta.

À medida que aumenta o rendimento é crescente a respetiva parcela que é afeta ao


pagamento do imposto – surge de um raciocínio marginalista e é justificada como uma
decorrência do Estado social de Direito.

Mas além destas taxas progressivas, o CIRS consagra algumas taxas proporcionais (art. 71º, 72º,
73º CIRS).
➢ O regime da opção pelo englobamento traz algum equilíbrio e coesão ao imposto mas
é insuficiente para a resolução de todos os problemas de que o IRS padece em termos
de falta de respeito pelo princípio da igualdade horizontal entre contribuintes.

O princípio da praticabilidade vem justificar isto pois a necessidade de assegurar ao sistema


fiscal alguma competitividade em termos internacionais tem de permitir esta situação diferente
para os rendimentos de capitais e mais-valias mobiliárias, mais facilmente deslocalizáveis para
outros Estados.
➢ As razões de concorrência fiscal são aquelas que impõem um tratamento fiscal mais
favorável aos rendimentos de capitais e mais-valias mobiliárias.

7. Imposto Direto
Coincidência entre o sujeito passivo contribuinte e a pessoa que deve suportar o encargo
económico do imposto.

Estrutura e Processo de Liquidação Do IRS

FASE ANALÍTICA – aplicam-se regras específicas para cada categoria de rendimento


1º. Enquadram-se os rendimentos apurados pelo sujeito passivo nas categorias de
rendimentos previstas no CIRS, aferindo a sua sujeição a tributação ou não – art 2º e ss.
2º. Apurando o rendimento bruto subtrai-se-lhe o valor correspondente às deduções
específicas desse rendimento bruto e que sejam aplicáveis ao caso concreto – art. 25º
e ss.
3º. Nas categorias B, F e G há lugar à dedução de perdas dos anos anteriores – art. 55º

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4º. Rendimentos líquidos auferidos por sujeitos passivos residentes são objeto de
englobamento, havendo alguns excluídos – art. 22º
5º. Após o englobamento apura-se o rendimento líquido/coletável do sujeito passivo.

FASE SINTÉTICA – aplicação de um único conjunto de regras fiscais


1º. Aplicam-se as taxas progressivas de IRS – art. 68º
2º. No caso de casos há que ter em conta o quociente conjugal, antes e após a aplicação
das taxas gerais – art. 69º
3º. Ao valor da coleta têm de ser efetuadas deduções à coleta – art. 78º e ss.
4º. Apura-se o valor de imposto final.

Considera-se valores de imposto aquilo que o sujeito passivo pagou ao longo do ano a título de
retenções na fonte.

Isto leva a que ainda se possa ter imposto a pagar ou reembolso de imposto a receber
(retenções na fonte como os pagamentos por conta são deduzidos à coleta do IRS e, quando
superiores ao devido, conferem direito ao reembolso da diferença – art. 78º/2 e 3 CIRS).

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Sebenta Fiscal – 2018/2019 DNB

Incidência Pessoal
São sujeitos passivos de IRS as pessoas singulares que residam em território português e as que,
embora aí não residindo, obtenham rendimentos considerados como obtidos em território
português – art. 13º/1 CIRS (+ art. 6º/1 LGT)

Distinção essencial é entre Sujeitos Passivos Residentes e Sujeitos Passivos Não-Residentes


• Uns são tributados refletindo o Elemento de Conexão Residência.
• Outros são tributados refletindo o Elemento de Fonte do Rendimento.
o APD: são os 2 princípios que estruturam os códigos de imposto em todo o
mundo – só com mínimo de conexão ao território é que Estado pode invocar o
direito de tributar.
▪ Residência (como critério de comparação rendimento global, obtido no
território nacional ou fora dele)
➢ Rendimento Global obtido dentro e fora do território nacional
– tributação do rendimento universal dos residentes.
▪ Fonte (como critério de comparação dos não residentes mas que
tiveram rendimento em território português).
➢ Critério de comparação é obter rendimentos em território
nacional – não é rendimento global e somente os obtidos em
território nacional.
o São estes porque tendo em conta o tipo de economia desde a II Revolução
Industrial são os que demonstram uma maior conexão ao território nacional78 –
que melhor permitem afetar a ligação entre território nacional e a
possibilidade/legitimidade de melhor tributar esses rendimentos.

Rendimento global é conceito de justiça que está ligada aos residentes79.


➢ Rendimento global justifica tributação progressiva.

Quanto aos não-residentes, como o vínculo ao território é mais fraco, a comparação não está
relacionada com o rendimento global mas apenas com o rendimento obtido dentro do território.

78
APD: Nacionalidade não é relevante – só nos EUA é que releva a nacionalidade
79
Art. 104º/1 CRP só se aplica aos residentes.
➢ Parâmetro de comparabilidade para efeitos de apurar a capacidade contributiva é apenas dos
residentes, porque só em relação aos residentes é que existe vínculo suficientemente forte por
parte do Estado na lógica da troca de utilidades.
o Impostos justificam-se com base na troca de utilidades entre o que o Estado fornece a
um sujeito passivo e o que recebe dele através dos impostos.
o São bens e serviços públicos – é mais forte/intenso/permanente quando o sujeito é
residente, por isso é que é legítimo o Estado tributar o rendimento universal desse
residente (obtidos dentro e fora do território) e submeter esses rendimentos à
progressividade, que tem finalidades distributivas.

Não residentes têm vínculo fraco com esse Estado.


➢ Devem contribuir para o orçamento mas a lógica de troca de utilidades não implica imposto único
nem progressivo.

Ao nível da UE há 3ª categoria de sujeitos passivos: trabalhadores fronteiriços – art. 17º-A


➢ Quando não residente obtém pelo menos 90% dos seus rendimentos em território português
➢ Surge devido às liberdades fundamentais da UE.

90
Sebenta Fiscal – 2018/2019 DNB

➢ Tributação dos não residentes, na fonte, é uma tributação proporcional.

Residência
A par da fonte do rendimento é um dos elementos de conexão que definem os termos de
aplicação da lei fiscal no espaço, quando nos encontramos perante situações com um elemento
internacional relevante.

Art. 16º, 16º-A, 17º, 17º-A CIRS


Rui Duarte Morais: condição de residente supõe, por regra, a presença física, real ou presumida,
no território de um determinado Estado, implicando uma ligação económica e um certo grau de
integração social.

APD: Critério mais importante é o critério objetivo – número de dias em território português80
(de seguida ou interpolados).
➢ Também pode haver indício de critérios objetivos – ver se há casa de morada de família
e intenção de estar naquela casa de forma permanente.
o Mas isto não significa dar relevância a elementos subjetivos.
o Temos de procurar indícios objetivos que concretizem esse conceito vago (ex:
há ligação de internet, água, jardineiro, correspondência periódica, família
habita na casa).
o Mesmo que esteja só em Portugal no Natal e na Páscoa pode ser tributado pelo
rendimento universal, se a casa de morada de família for mantida.

Sujeição ao IRS vai abranger todos os rendimentos, mesmo aqueles obtidos fora do território
português – art. 15º/1 CIRS
➢ PRINCÍPIO DA TRIBUTAÇÃO UNIVERSAL: podem ser tributados em Portugal todos os
rendimentos obtidos por um residente, independentemente do local onde tais
rendimentos sejam obtidos.
o Excetuam-se os casos em que se aplicam Convenções de Dupla Tributação

APD: Residência virtual é conceito novo


• Acórdão TJUE Schumacker – ele residia na Bélgica mas ia todos os dias trabalhar à Alemanha.
o Como obtinha rendimentos apenas na Alemanha não conseguia deduzir as suas
despesas na Bélgica porque não tinha lá rendimentos.
o Não conseguia deduzir na Alemanha porque não tinha residência na Alemanha.
o Exerceu liberdade fundamental do TFUE e estava a ser discriminado por isso. TJUE
concorda e diz que Alemanha deveria equipará-lo a um residente, pois era onde obtinha
a maior parte dos seus residentes.
o Tribunal não estabeleceu critério percentual e referiu-se apenas à maioria dos
rendimentos (maioria dos Estados interpretou como sendo 90% dos seus rendimentos
– interpretação também em Portugal)

80
Residência em região autónoma também permite o planeamento fiscal.
➢ Não é muito recomendável termos vários conceitos de residência para o território nacional, o
que permite abusos.
o Podem declarar residência numa região autónoma por ser carga fiscal mais baixa,
quando na realidade a residência cairia no continente.
➢ É difícil averiguar e provar que a residência não é na região autónoma.
o Concretização dos 183 dias é através de 2 elementos que podem ser facilmente
manipulados: permanência habitual e registo para números fiscais (obtenção de NIF
numa região autónoma)

91
Sebenta Fiscal – 2018/2019 DNB

Fonte de Rendimento
Um não residente é sujeito passivo de IRS quanto aos rendimentos que obteve somente em
território português – art. 15º/2 CIRS

APD: Os não residentes têm sempre taxa de imposto mais baixa


➢ Isto não é concorrência fiscal agressiva – os não residentes são sempre tributados com
taxa mais baixa porque o vínculo com o país é mais leve.
➢ E eles serão tributados no Estado de residência sujeitos a taxas progressivas/escalões.

Art. 18º elenca os rendimentos que se consideram obtidos em território português, podendo
ser tributados em sede de IRS, mesmo quando auferidos por um não residente.

Tem de se ter em atenção se há Convenção de Dupla Tributação que impede o Estado Português
de tributar.

Outros estatutos de residência no CIRS


• Residentes noutro Estado-Membro da UE ou do EEE – art. 17º-A, 71º/8, 72º/9 e 10
• Residentes não habituais – beneficiam de um regime especial específico do art. 16º/8

Normas Específicas para as Categorias IRS


→ Normas de Incidência Objetiva

CATEGORIA A – RENDIMENTOS DE TRABALHO DEPENDENTE


Incidência Real
Art. 2º/1 esclarece o que se considera rendimentos do trabalho dependente – todas as
remunerações pagas ou postas à disposição do seu titular.

Remunerações Tributáveis
Art. 2º/2 não define remuneração mas efetua uma enumeração exemplificativa bastante ampla
dos principais tipos de pagamento e prestações que constituem rendimentos do trabalho
dependente.
➢ Procura-se integrar todos os rendimentos que, de alguma forma, sejam recebidos em
contrapartida do trabalho dependente.

Art. 2º/3 contribui para a certeza e segurança jurídica dos contribuintes, através de uma maior
previsibilidade relativamente aos abonos e benefícios sujeitos a tributação.
➢ Reduz significativamente o campo de potenciais dúvidas acerca da incidência de IRS
sobre os diversos abonos e benefícios previstos nesta disposição legal, fomentando a
sua tributação efetiva pelas entidades pagadoras, levando a uma aplicação mais
homogénea das regras de incidência – fundamental para assegurar a igualdade
horizontal e vertical entre os contribuintes que auferem rendimentos deste tipo.

Momento Relevante para a sujeição a tributação


Rendimentos da categoria A ficam sujeitos a tributação desde o momento em que sejam pagos
ou postos à disposição do titular, não obstando à tributação o facto de este não os ter
efetivamente recebido por motivo de mora sua no recebimento do pagamento devido.
Remunerações Acessórias e Em Espécie

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Sebenta Fiscal – 2018/2019 DNB

Muitas das remunerações acessórias do art. 2º/3/b são remunerações em espécie, não
correspondendo a um pagamento mas sim à oferta de um bem, atribuição do direito à utilização
pessoal e etc.
➢ Tem de se recorrer ao art. 24º CIRS para efeitos da determinação da respetiva
equivalência pecuniária.

Dificuldade surge com a distinção, no caso concreto, entre remunerações em espécie (efetivas
vantagens económicas para o trabalhador, tributados na categoria A) e outro tipo de situações
que não devem ser tributadas em IRS.
A. Instrumentos de Trabalho proporcionados ao Trabalhador
Resulta da possibilidade destes bens proporcionados ao trabalhador serem passíveis de dupla
utilização – fins profissionais e pessoais.
Ex: computador, carro

Exclui-se o caráter de vantagem económica para o trabalhador quando:


• Os bens em causa sejam utilizados exclusiva ou principalmente para o exercício das
funções profissionais;
• A utilização redunda numa maior vantagem para a entidade patronal que para o
trabalhador;
• A utilização para fins pessoais, se existir, tem caráter claramente secundário.

Se não preencherem os requisitos, então há vantagem para o trabalhador, tributável em IRS


como remuneração acessória.

B. Ofertas conformes aos Usos Sociais e Comerciais


Ex: presentes de natal, aniversário, merchandising da empresa e etc.

C. Realizações de Utilidade Social


Possibilidade de utilização e fruição pelos trabalhadores e/ou seus familiares de estruturas de
utilidade social ou de lazer mantidas pela entidade patronal.
Ex: creches, lares, jardins de infância, cantinas, bibliotecas, ginásio e etc.

Tem de se verificar os critérios do art. 43º CIRC.

Alargamentos Subjetivos
Art. 2º/10 e 11 efetua um alargamento subjetivo da figura da entidade patronal e do sujeito
passivo dos benefícios de forma a que se evite a subtração abusiva de remunerações
relacionadas com o campo do trabalho de incidência tributária.
Ex: pagar viagem ao empregado e à sua família

Rendimentos Excluídos de Tributação


Art. 2º-A complementa a delimitação negativa também presente no art. 2.
Art. 2º-A/1 prevê um conjunto de situações que, apesar de corresponderem a montantes ou
benefícios recebidos pelo trabalhador em virtude do seu trabalho, não são objeto de tributação
como rendimentos do trabalho dependente, devido à natureza específica da prestação e
finalidades sociais prosseguidas através da atribuição desses montantes.

Deduções Específicas

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Sebenta Fiscal – 2018/2019 DNB

Ao rendimento bruto do trabalho dependente é subtraído o valor correspondente às deduções


específicas da categoria A, previstas no art. 25º CIRS, de modo a apurar o rendimento líquido
tributável.
➢ APD: São poucas as deduções autorizadas pelo CIRS – deduções de contribuições
obrigatórias para a Segurança Social e Indemnizações ao trabalhador por rescisão
unilateral.
o Justificação para isto é que há pressuposto da entidade empregadora conceder
ao trabalhador os instrumentos necessários para o exercício da sua atividade

Art. 25º/1/a – valor standard que não pressupõe qualquer encargo incorrido pelo trabalhador
e existe de forma a que esta categoria não seja assim tão desfavorável.
➢ Dedução fixa
➢ Mas se as contribuições obrigatórias excederem esse limite, a dedução é realizada pelo
montante total dessas contribuições (art. 25º/2).

Regime de Tributação
Rendimento líquido do trabalho dependente apurado por sujeitos passivos residentes é sujeito
a englobamento obrigatório – art. 22º/1 e 22º/3/b a contrario CIRS

Há casos que não estão sujeitos a englobamento obrigatório: gratificações auferidas pela
prestação ou em razão da prestação de trabalho, quando não atribuídas pela entidade patronal
(ex: gorjetas dos profissionais de banca nos casinos) – art. 72º/3 CIRS

Ao rendimento global líquido aplicam-se as taxas gerais de IRS do art. 68º CIRS – taxas de
imposto progressivas, por escalões.

Ao valor da coleta calculada mediante a aplicação das taxas gerais de IRS são efetuadas
deduções à coleta – art. 78º e ss. CIRS.

Apura-se, assim, o valor do imposto final devido.

Os residentes não habituais são sujeitos a taxa especial de tributação autónoma de 20% - art.
72º/6 CIRS
➢ Podem ser englobados por opção do sujeito passivo não residente – art. 72º/8 CIRS
➢ Mas eles estão excluídos do regime de englobamento – art. 22º/3/a CIRS

Os não residentes têm tributação por retenção na fonte a título definitivo – art. 71º/4/a CIRS

Há regimes especiais para os cidadãos UE – art. 17º-A, 71º/8 a 11 CIRS

Retenções na Fonte
O valor destas retenções, que têm natureza de adiantamento por conta do imposto devido em
termos finais, é dedutível à coleta – art. 78º/2 e 3 CIRS

As entidades devedoras de rendimentos do trabalho dependente são obrigadas a reter o imposto


no momento do seu pagamento ou colocação à disposição dos respetivos titulares, mediante a

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Sebenta Fiscal – 2018/2019 DNB

dedução das importâncias correspondentes à aplicação das taxas de retenção legalmente


previstas – art. 99º/1/a CIRS

Residentes: natureza de adiantamento por conta do IRS devido em termos finais


• Exclui-se a remuneração em espécie – a não ser por pedido (art. 99º-C/3)
• Exclui-se os rendimentos auferidos por pessoas singulares relativos a atividades no
estrangeiro, desde que sujeitos a tributação efetiva no país da fonte – art. 99º/5

Não residentes: natureza de retenção na fonte a título definitivo – tributados a taxa liberatória
de 25% (art. 71º/4/a)

Pagamentos por conta opcionais – art. 102º/8 CIRS


Situação residual quando as entidades devedoras de rendimentos de trabalho dependente são,
elas próprias, não residentes e sem estabelecimento estável em Portugal.

CATEGORIA B – RENDIMENTOS EMPRESARIAIS E PROFISSIONAIS


Aglutina as antigas categoria B (rendimento de trabalho independente), C (rendimentos
comerciais e industriais) e D (rendimentos agrícolas) devido às similitudes relevantes, ao nível
dos aspetos essenciais, entre elas.

Incidência Real
→ Art. 3º/1 e 2 CIRS

Poder de Atração da Categoria B


Art. 3º/2/a – se o imóvel arrendado integrar os ativos afetos a uma atividade empresarial ou
profissional, as rendas constituem rendimento da categoria B e não da F
Art. 3º/2/b – se os juros de contas bancárias ou de aplicações de tesouraria são referentes a
uma atividade empresarial/profissional, então é rendimento da categoria B e não da E
Art. 3º/2/c – mais-valias podem ser consideradas rendimento da categoria B e não da G
➢ Na integração dos ganhos da venda de imóveis ativos afetos a uma atividade geradora
de rendimentos empresariais e profissionais não segue o regime da Categoria G,
portanto não se aplica o art. 43º/2 CIRS e as mais valias imóveis são tributadas e
consideradas em 100% do seu valor.

Isto significa que, não obstante preencherem as condições de incidência das respetivas
categorias, as rendas, juros ou mais-valias que sejam imputáveis a atividades empresariais e
profissionais são “atraídos” para a categoria B ou por esta absorvidos.
➢ Tributa-se pela categoria B e não pela categoria que a priori integrariam, em virtude das
suas características e natureza.
➢ Categoria B prevalece imperativamente sobre as outras

Opção pela Tributação de Rendas na Categoria B


Sujeito passivo pode optar pela tributação de rendimentos prediais na categoria B – art. 4º/1/n
e art. 8º/1, in fine CIRS
• Opção livremente realizada pelo sujeito passivo sem dependência do preenchimento de
qualquer tipo de métrica ou teste de substância que vise aferir a natureza
verdadeiramente empresarial do rendimento em causa.

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Sebenta Fiscal – 2018/2019 DNB

• Essa opção é feita na declaração de início de atividade – art. 4º/5 CIRS

Vai levar a que se pressuponha que o imóvel gerador das rendas é objeto de afetação aos ativos
de uma atividade empresarial ou profissional, tributada no âmbito desta categoria – art. 29º/1
CIRS
• Caso o imóvel provenha do património particular do sujeito passivo, a respetiva
afetação aos ativos empresariais/profissionais gera uma mais valia suspensa (art.
10º/1/a e 10º/3/b)
• A transferência do imóvel do património empresarial para o particular constitui uma
mais valia, tributável na categoria B (art. 3º/2/c)

Momento Relevante para sujeição a tributação


→ Art. 3º/6 CIRS

Determinação do rendimento tributável da Categoria B


Pode ser determinada de acordo com vários regimes, dependendo da situação concreta e das
opções do sujeito passivo:
A. CONTABILIDADE ORGANIZADA – art. 32º e 33º
B. REGIME SIMPLIFICADO DE TRIBUTAÇÃO – art. 31º
C. Atos isolados – art. 30º
D. Opção de tributação segundo as regras da categoria A – art. 28º/8
E. Imputação especial – art. 20º

Regimes principais da Contabilidade Organizada e Regime Simplificado são enquadrados pelo


art. 28º CIRS
• Apura-se rendimento líquido mas parte-se de outro ponto de partida: a regra é que os
gastos relacionados com a atividade podem ser deduzidos com algumas exceções.
o Diferença para a Categoria A é que nessa se presume que o empregador fornece
os instrumentos de trabalho – aqui como são profissionais independentes ou
empresariais, os gastos relacionados com a atividade têm de ser realizados pelo
próprio, daí a regra da dedutibilidade
o A justificação é o Princípio da Praticabilidade

Contabilidade Organizada: pode ser opção ou resultar do art. 28º/3


• Sujeitos passivos que não ultrapassaram 200 000€ líquidos por ano.
• Matéria tributável (rendimento líquido presumido) é apurada através de coeficientes
previstos para diferentes tipos de atividades desta categoria.

Regime Simplificado: pode ser opção ou resultar do art. 28º/2


• Aplicam-se as regras do IRC para determinar o lucro tributável, mas com adaptações.
• Surgem alguns limites, decorrentes da dificuldade de se diferenciar a esfera empresarial
e a esfera privada em relação a alguns gastos

(In)comunicabilidade com a esfera privada


Quando se fala de deduções da categoria B no IRS há diversos gastos que dizem respeito a bens
mistos – utilizáveis na esfera profissional e na esfera privada

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Sebenta Fiscal – 2018/2019 DNB

• Não é possível ao fisco, devido ao Princípio da Praticabilidade, quanto a cada


contribuinte, qual é a proporção de utilidade que atribui à esfera privada e à esfera
profissional de certos bens.
o Ou estabelece limite para todos ou impede a dedutibilidade desses bens mistos.
o Normalmente há limite – técnica jurídica da tipificação

Deduções diferentes entre as categorias: Incomunicabilidade


Categoria A tem certas deduções a B outras – elas não são comunicáveis
➢ APD: Se houvesse comunicabilidade das despesas poder-se-ia chegar a resultado
negativo na categoria A.
o Para evitar essa situação os gastos relativos à categoria B só são dedutíveis
nessa categoria e não são comunicáveis às outras categorias.
o A incomunicabilidade de gastos dedutíveis pretende evitar a erosão da
matéria tributável.

APD: Apesar dos objetivos prosseguidos pela incomunicabilidade, a diferenciação de regimes,


consoante as categorias, incentiva o planeamento fiscal e o abuso.

Dedução de Perdas
Quando for apurado um resultado líquido negativo na Categoria B81, com contabilidade
organizada, a perda é reportável nos anos seguintes – art. 55º CIRS

Regime de Tributação
O rendimento tributável da categoria B obtido por sujeitos passivos residentes, quer seja
apurado através da Contabilidade Organizada ou Regime Simplificado, é objeto de
englobamento obrigatório – art. 22º/1 e 22º/3/b a contrario CIRS

Ao rendimento global líquido aplicam-se as taxas gerais de IRS do art. 68º CIRS – taxas de
imposto progressivas, por escalões.

Ao valor da coleta calculada mediante a aplicação das taxas gerais de IRS são efetuadas
deduções à coleta – art. 78º e ss. CIRS.

Apura-se, assim, o valor do imposto final devido.

Os residentes não habituais são sujeitos a taxa especial de tributação autónoma de 20% - art.
72º/6 CIRS
• Podem ser englobados por opção do sujeito passivo não residente – art. 72º/8 CIRS
• Mas eles estão excluídos do regime de englobamento – art. 22º/3/a CIRS

Os não residentes têm tributação por retenção na fonte a título definitivo – art. 71º/4/a CIRS
Há regimes especiais para os cidadãos UE – art. 17º-A, 71º/8 a 11 CIRS

Retenções na Fonte

81
Existe comunicabilidade das perdas entre algumas categorias: nas categorias A, G e H, é dedutível ao conjunto dos
rendimentos líquidos sujeitos a tributação o resultado líquido negativo apurado em qualquer categoria de
rendimentos.
➢ Na categoria F só pode ser deduzido dos resultados positivos dessa mesma categoria.

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O valor destas retenções, que têm natureza de adiantamento por conta do imposto devido em
termos finais, é dedutível à coleta – art. 78º/2 e 3 CIRS

Residentes: art. 101º/1/a, b, c


Devido ao poder de atração temos de considerar o art. 101º/9 e 10

Residentes Não Habituais: art. 101º/d

Não Residentes: natureza de retenção na fonte a título definitivo – tributados a taxa liberatória
de 25% (art. 71º/4/a)

Há um conjunto de situações nas quais o titular de rendimentos da categoria B não é sujeito a


retenção na fonte (ou a lei não prevê, dadas as características; ou só porque as entidades com
contabilidade organizada é que se encontram obrigadas a reter na fonte) – esta insuficiência é
suprida mediante a realização dos pagamentos por conta.

Pagamentos por conta


Sujeitos passivos podem ficar obrigados à realização de pagamentos por conta – art. 102º CIRS
➢ É uma forma de aproximação temporal entre o momento dos factos tributários e a
entrada do imposto nos cofres do Estado, visto os pagamentos por conta serem
efetuados no próprio ano a que o imposto se refere, constituindo um adiantamento por
conta do imposto devido em termos finais.

CATEGORIA E – RENDIMENTOS DE CAPITAIS


Rendimentos que correspondem a frutos e demais vantagens económicas procedentes, direta
ou indiretamente, de elementos patrimoniais, bens, direitos, ou situações jurídicas, de natureza
mobiliária – art. 5º/1 CIRS

Saldanha Sanches: o rendimento prototípico desta categoria é o Juro – tem por base o
rendimento periódico que deriva de um outro direito ou de um certo ativo financeiro, podendo
ser recebido sem que isso afete a substância do bem que o produz.
➢ Rui Duarte Morais: havendo alienação da fonte que produz o rendimento de capital, o
rendimento que produz é uma mais-valia.
o Estes são rendimento-produto (ao passo que as mais-valias são rendimento-
acréscimo) pois surgem em períodos sucessivos com uma certa regularidade.

Sofreu alterações com a reforma de 2014

O rendimento bruto é logo tomado como rendimento coletável e não é admissível,


para efeitos fiscais, a dedução de quaisquer gastos inerentes à obtenção dos
rendimentos.

Incidência Real
→ Art. 5º/1 e 2 CIRS
Procura-se fazer face a uma realidade complexa em que os contratos subjacentes à obtenção
dos rendimentos em causa são múltiplos, variados e atípicos – tipificação é tão ampla quanto
possível.

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Sebenta Fiscal – 2018/2019 DNB

• São rendimentos passivos, que o titular aufere sem recorrer a uma atividade destinada
à sua obtenção
o Este é um critério que os distingue das outras categorias (pois se estes
rendimentos fossem obtidos no âmbito de uma atividade empresarial e
profissional seriam considerados rendimentos da Categoria B e não da E).

Presunções relativas a Rendimentos de Capitais


Apesar de se nortear pelo princípio da tributação do rendimento real, o legislador não abdicou
da adoção de algumas presunções relativamente aos rendimentos de capitais, devido à
dificuldade sentida pela AT, face à natureza específica dos rendimentos desta categoria, em
assegurar a eficiência da tributação.
➢ Presunções facilitam a prova da AT.
➢ Art. 6º CIRS

Momento Relevante para a sujeição a tributação


Os factos geradores de rendimentos de capitais são, em regra, factos continuados, verificando-
se a necessidade de os periodizar para efeitos de tributação.
➢ Art. 7º CIRS

Vencimento: momento no qual, em virtude do decurso do praxo, o credor adquire o direito de


exigir do devedor o cumprimento da obrigação.
Colocação à disposição: devedor procede ao cumprimento da sua obrigação sem necessitar da
colaboração do credor.
Apuramento do quantitativo: conjunto de operações algébricas destinadas ao apuramento de
um montante de rendimento, ou a liquidação do rendimento, que assim se torna certo e exigível.
Liquidação da Operação

Inexistência de deduções específicas e Deduções de Perdas


Não se admitem deduções específicas para efeitos da determinação do rendimento coletável.
• Rendimento bruto corresponde ao rendimento tributável, visto não ser admissível
para efeitos fiscais a dedução de quaisquer gastos inerentes à obtenção dos
rendimentos.
o Baseia-se no facto de ser rendimento passivo e o titular não ter de incorrer em
despesas para o efeito.

Está ausente do art. 55º CIRS

Regime de Tributação
Aplicação de retenção na fonte a título liberatório – o regime do englobamento obrigatório
deixou de se aplicar no âmbito da Categoria E.

Retenção na Fonte Liberatória


Os rendimentos de capitais obtidos em território português, tanto por residentes como por
não residentes, estão sujeitos a retenção na fonte a título definitivo e a taxas liberatórias.

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Sebenta Fiscal – 2018/2019 DNB

• Taxa de 28% - art. 71º/1 CIRS


• Taxa de 35% - art. 71º/12 CIRS

Se não estão sujeitos a retenção na fonte (ex: por não haver em Portugal uma entidade que
possa cumprir a função de substituto tributário), a taxa também é de 28% - art. 72º/1/d

Opção pelo Englobamento


Ao estarem sujeitos a taxas liberatórias do art. 71º estes rendimentos não são englobados –
art. 22º/3 CIRS

Se forem residentes em Portugal podem optar pelo englobamento, para efeitos de tributação
– art. 71º/6 CIRS
➢ Também aqueles rendimentos sujeitos a tributação autónoma a taxa especial podem
ser englobados – art. 72º/8 CIRS

A opção é do sujeito passivo (art. 22º/5), sendo que a retenção na fonte assume a natureza de
pagamento/adiantamento por conta do imposto devido a final (art. 71º/7).

Eliminação da Dupla Tributação Económica


Quando o mesmo rendimento é tributado, em impostos com idêntica natureza, na esfera de
sujeitos passivos distintos.
Ex: distribuição de lucros por uma sociedade aos seus sócios tem dupla tributação porque o
mesmo rendimento em termos económicos (lucro da sociedade) é primeiro tributado na esfera
desta e depois novamente na dos sócios (na medida do lucro distribuído).

Art. 40º-A CIRS atenua esta dupla tributação económica, permitindo um englobamento parcial
do rendimento e causa
• Lucros recebidos são apenas considerados em 50% do seu valor, no caso de opção pelo
englobamento.
• Se não optar pelo englobamento eles são tributados pela taxa liberatória de 28% que
incide sobre os 100% do valor dos lucros.

Benefícios Fiscais
No contexto da tributação dos rendimentos de capitais há que aferir da existência de benefícios
fiscais que sejam aplicáveis ao rendimento em apreço.
➢ Há vários benefícios fiscais relativos aos rendimentos de capitais: art. 20º, 20º-A, 21º,
22º-A, 23º

Obrigações Acessórias
Quando sujeitos passivos não optem pelo englobamento ficam dispensados de apresentar a
declaração anual destes rendimentos – art. 58º/1/a CIRS
➢ Isto não abrande os que optam pela tributação conjunta – art. 58º/3/a CIRS

CATEGORIA F – RENDIMENTOS PREDIAIS


Estes rendimentos partilham com a Categoria E a característica de serem rendimentos
essencialmente derivados de uma aplicação de capital.

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Sebenta Fiscal – 2018/2019 DNB

Saldanha Sanches: eles têm a natureza substancial de rendimentos de capital, decorrendo de


uma aplicação de capital imobiliário, mas contando com uma previsão normativa autónoma.
➢ PRP discorda e acha excessivo

Fonte produtora de rendimento são os imóveis – o que justifica a plena autonomização da


categoria dos Rendimentos Prediais, no âmbito da estrutura cedular adotada pelo CIRS

Incidência Real
→ Art. 8º CIRS

PRÉDIO: delimitação com base no art. 2º do Código do IMI


➢ Recorre a 3 elementos – físico, jurídico, económico

Art. 8º/3 apenas tem as definições dos vários tipos de prédios


Art. 8º/4 exige uma característica de permanência para a noção de prédio
• Rui Duarte Morais discorda que tal seja relevante para o IRS
• PRP: é adequado a característica de permanência pois não há motivo para que a
distinção de prédio para efeitos do IRS seja diferente da do IMI, criando assim uma
complexidade ainda maior do que a que já existe

RENDA: prestação pecuniária, periódica, através da qual o arrendatário cumpre a obrigação de


pagar ao senhorio um preço pelo direito temporário de uso e fruição do imóvel arrendado.
➢ Art. 8º/2 CIRS tem noção mais ampla

Exclui-se a tributação das “rendas imputadas”, somente tributando as rendas pagas ou


colocadas à disposição.
➢ Estas rendas imputadas correspondiam ao valor da utilização dos prédios pelos
respetivos proprietários e eram tributáveis em sede de Contribuição Predial, antes da
reforma de 1988/89.

Hoje em dia a dedutibilidade, em sede de IRS, do IMI pago, contribui para atenuar a alegada
“sobretributação”, mitigando o efeito da sobreposição entre a tributação dos rendimentos
prediais e a tributação patrimonial estática dos prédios arrendados.
➢ Art. 41º/5 CIRS prevê que o IMI e Imposto de Selo pagos em determinado ano apenas
são dedutíveis aos rendimentos prediais brutos quando respeitem a prédio ou parte
de prédio cujo rendimento seja objeto de tributação nesse ano fiscal.

Deduções Específicas aos Rendimentos Prediais


Por homenagem ao princípio da tributação do rendimento líquido, admite-se a dedução dos
encargos inerentes à obtenção do rendimento – art. 41º CIRS
• CIRS não exige o englobamento dos rendimentos prediais como condição para a dedução
dos gastos – o direito à dedução dos gastos relacionados com o imóvel objeto de
arrendamento não depende do exercício pelo sujeito passivo da opção pelo
englobamento (sujeitando às taxas gerais progressivas do art. 68º CIRS).

Sublocação
Art. 8º/2/c não admite qualquer dedução (art. 41º/6).

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Sebenta Fiscal – 2018/2019 DNB

Há quem teça diversas críticas a este regime.


➢ PRP: é um regime prático, simples e fácil de aplicar

Dedução de Perdas
O resultado líquido negativo da categoria F, apurado em determinado ano, só pode ser deduzido
aos rendimentos líquidos positivos desta mesma categoria, apurados nos 6 anos seguintes
àquele a que respeita a perda – art. 55º/1/b CIRS.

Impossibilidade de compensação entre ganhos e perdas apurados pelo sujeito passivo num
mesmo ano, mas em diferentes categorias de rendimento.
→ Não existe comunicabilidade horizontal de perdas entre as categorias de rendimento
do IRS

Art. 55º/8 introduz limitações ao reporte das perdas da Categoria F.

Tributação Autónoma e Taxa Especial


→ Art. 72º/1/e

Rendimentos prediais não são somados aos rendimentos de outras categorias – daí ser uma
tributação autónoma e não um regime de englobamento.
➢ Ao valor dos rendimentos prediais, já líquidos das deduções de gastos do art. 41º é
aplicada a taxa especial do art. 72º/1/e (28%).
➢ Seguindo este regime de tributação autónoma não há deduções à coleta dos art. 78º e
ss. CIRS

Pode haver opção pelo englobamento – art. 72º/8 CIRS


➢ Fica obrigado a englobar a totalidade dos rendimentos dessa categoria – art. 22º/5 CIRS
➢ Nesse caso fica sujeito às taxas progressivas (art. 68º) e todas as características do
imposto que se aplicam no contexto do regime de englobamento.

Incentivos Fiscais à Reabilitação Urbana


Previsão de taxa de tributação autónoma mais reduzida para casos de reabilitação urbana – art.
71º/7 EBF.

Retenção na Fonte
Rendimentos prediais encontram-se sujeitos a retenção na fonte apenas quando as rendas
forem pagas por pessoa singular ou coletiva que disponha ou deva dispor de contabilidade
organizada – art. 101º/1 CIRS
➢ Esta retenção é a 25% (art. 101º/1/e) e tem natureza de adiantamento por conta do
imposto devido em termos finais.

Rendimento para habitação não é em regra sujeito a retenção na fonte.

Obrigações Acessórias

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Sebenta Fiscal – 2018/2019 DNB

Art. 115º/5 CIRS – titulares de rendimentos da Categoria F são obrigados a passar recibo de
quitação, em modelo oficial, de todas as importâncias recebidas dos seus inquilinos, pelo
pagamento de rendas nos termos do art. 8º/2/a-e CIRS

Rendimentos Prediais enquadrados na Categoria B


Estes rendimentos prediais podem ser tributados na Categoria B se forem imputáveis a
atividades geradores de rendimentos empresariais e profissionais (art. 3º/2/a CIRS) ou se o
sujeito passivo optar (art. 4º/1/n, + art. 8º/1, in fine CIRS).

Afetação do imóvel ao património empresarial


Configura um facto tributário (art. 10º/1/a) mas o ganho só se considera obtido no momento
da posterior alienação onerosa dos bens em causa ou da ocorrência de outro facto que
determine o apuramento de resultados em condições análogas – art. 10º/3/b CIRS
➢ PRP: mais-valia fica suspensa e a correspondente tributação é diferida até à ocorrência
de um desses factos
➢ Há exceção na parte final do art. 10º/3/b

Em suma: aquando da afetação do imóvel gerador de rendas aos ativos de uma atividade
empresarial por si exercida em nome individual (tributando-se na Categoria B), o sujeito
passivo é suscetível de apurar uma mais-valia. Contudo, esta fica suspensa até que o imóvel
em causa seja alienado a terceiro ou reafectado ao património particular do seu titular (sem
ser para arrendamento de bem imóvel habitacional, onde nesse caso a suspensão se
manteria).

Desafetação do imóvel ao património empresarial


Transferência do património empresarial para o património particular do empresário constitui
uma mais-valia, tributável pela Categoria B – art. 3º/2/c CIRS
➢ Não é mais-valia suspensa.
➢ Se for um imóvel habitacional, não se considera que haja uma transferência para o
património particular do empresário e não se preenche a norma de incidência do art.
3º/2/c – art. 3º/9 CIRS

PRP: há incongruência entre o art. 3º/9 e 10º/3/b, in fine

Regime Fiscal dos Rendimentos Prediais integrados na Categoria B


Os rendimentos prediais passam, para múltiplos efeitos fiscais, a ser tratados como rendimentos
desta categoria.
➢ Enquadra-se o sujeito passivo pelo art. 28º CIRS

Há dedução de perdas nos termos do art. 55º CIRS

Integrado na Categoria B, a venda do imóvel vai gerar uma mais-valia profissional que se apura
pelo art. 46º CIRS.
➢ Não se aplica o art. 43º/2 (que é só para a Categoria G) e são tributados em 100% do
seu valor.

Retenção na fonte: art. 101º/9 CIRS

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Sebenta Fiscal – 2018/2019 DNB

➢ Remissão para o art. 101º/1 CIRS também é para os rendimentos da Categoria F.

Alojamento Local: enquadra-se no art. 4º/1/h, pois inclui serviços complementares como
limpeza e receção.
➢ Mas o alojamento local é uma figura que pode ter diferentes enquadramentos fiscais.

CATEGORIA G – INCREMENTOS PATRIMONIAIS


Paulo Pitta e Cunha: designação escolhida pelo legislador é inapropriada pois todos os
rendimentos constituem incrementos patrimoniais na medida em que aumentam o valor do
património do sujeito passivo, em resultado da entrada de novos ativos ou em consequência da
valorização dos ativos já detidos.

Art. 9º CIRS
→ Caráter taxativo

Art. 9º/1/a -> Art. 10º: Mais-Valias


Conceito que corresponde a uma valorização ocorrida em bens ou direitos – ganho de caráter
ocasional ou fortuito que se gera na esfera do proprietário alienante, sem que tal se verifique no
contexto do desenvolvimento de uma atividade empresarial.
➢ Este ganho revela uma capacidade contributiva, o que justifica a respetiva sujeição a
imposto.

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Sebenta Fiscal – 2018/2019 DNB

São “windfall gains”82 – valorização fortuita de bens não dependente de uma atividade do
sujeito passivo orientada para a obtenção do ganho.

Corresponde a um ganho – diferença positiva entre o valor de realização e o valor de aquisição


do mesmo bem ou direito.
≠ Menos-Valia: situações em que o valor de realização do bem ou direito é inferior ao valor de
aquisição.

Art. 10º não define Mais-Valia e procede a uma enumeração casuística dos ganhos sujeitos a
tributação como Mais-Valias.
➢ Este artigo assume o caráter residual83 da qualificação de um ganho como mais-valia e
constrói uma incidência seletiva bastante restrita.
o Seleção dos tipos de bens e direitos tem critérios subjacentes como a frequência
da situação, expressão económica, facilidade de controlo do facto gerador e
determinabilidade dos valores em causa.

Factos Geradores de Mais-Valias


Podem corresponder a ganhos obtidos que, não sendo considerados rendimentos empresariais
e profissionais, capitais ou prediais, resultem dos seguintes factos geradores:
i. Mais-Valias Imobiliárias – art. 10º/1/a; art. 10º/1/d
ii. Mais-Valias Mobiliárias – art. 10º/1/b; art. 10º/1/e; art. 10º/1/f; art. 10º/1/g; art.
10º/1/h
iii. Mais-Valias referentes a Propriedade Intelectual/Industrial – art. 10º/1/c

Dado o caráter residual, o art. 10º/1 tem uma delimitação negativa expressa, que afasta da
Categoria G os rendimentos que, embora resultantes de factos ou situações especificamente
previstas nas alíneas do art. 10º/1, sejam de considerar, por natureza, rendimentos empresariais
e profissionais, de capitais ou prediais.
➢ Isto denota uma prevalência das Categorias B, E e F relativamente à Categoria G, em
termos de atração de rendimentos à categoria

Momento da Obtenção do Ganho


Art. 10º/3 CIRS – as mais-valias consideram-se obtidas no momento da prática dos atos que dão
origens aos ganhos.
➢ Há regras específicas para certas situações (alíneas a, b, c).

Não-Tributação das Mais-Valias Potenciais/Latentes


CIRS prevê a tributação das mais-valias somente após a sua realização, não sendo tributáveis
as mais-valias meramente potenciais ou latentes – apenas se sujeita a tributação as mais-valias
realizadas que originaram para o sujeito passivo um acréscimo do respetivo rendimento.
➢ Sistema Português adota uma conceção de Rendimento-Acréscimo mitigada.

82
Ganhos trazidos pelo vento
83
Quando o ganho resultar de alienação onerosa de bens ou direitos pertencentes ao ativo afeto a
atividade empresarial ou, mesmo não estando afeto, ocorre no âmbito dessa atividade a tributação é na
Categoria B (art. 3º/2/c, 3º/1/a CIRS)

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Sebenta Fiscal – 2018/2019 DNB

Mais-Valias Imobiliárias
Art. 5º DL 442-A/88 tem regime transitório na Categoria G – os ganhos derivados da alienação
a título oneroso de prédios, mesmo que constituam mais-valias tributáveis pelo art. 10º CIRS,
só ficam sujeitos a IRS se a aquisição dos bens ou direitos a que dizem respeito tiver ocorrido
já depois da entrada em vigor do CIRS (1/1/1989)
• Isto constitui uma exclusão de incidência (não uma isenção).
• Não se aplica à alienação onerosa de lotes de terreno para construção

Regime do Reinvestimento do Valor de Realização


Art. 10º/5, 6, 7 CIRS – prevê-se a possibilidade de excluir de tributação as Mais-Valias
decorrentes da transmissão onerosa de um bem imóvel afeto a habitação própria e permanente,
mediante o reinvestimento do valor de realização do imóvel transmitido, efetuado dentro de
certos prazos e condições.
➢ Implica o cumprimento de obrigações declarativas.
➢ Regime consiste em eliminar os obstáculos, relacionados com a tributação de
rendimentos, à mudança de habitação por parte dos indivíduos e famílias que
disponham de casa própria.

Art. 10º/5 é norma de exclusão de incidência tributária


➢ PRP: em rigor, está-se perante uma suspensão de tributação aplicável mediante a
simples manifestação, na declaração de rendimentos referente ao ano de realização,
da intenção de proceder ao reinvestimento (art. 57º/4/a).
o Se sujeito passivo não efetuou o reinvestimento ou fez parcialmente, será
sujeito a uma liquidação adicional de IRS, pelo imposto correspondente à
totalidade ou a parte do valor da mais-valia (se não fez reinvestimento ou fez a
título parcial).
o Só há efetiva exclusão tributária se ocorrer o reinvestimento nos termos e
dentro dos prazos estabelecidos legalmente.

Determinação do Valor da Mais-Valia Tributável: art. 43º CIRS


O ganho sujeito a IRS a título de mais-valias corresponde ao saldo apurado entre as mais-valias
e as menos-valias realizadas no mesmo ano.

Mais-valia imobiliária resulta da diferença positiva entre o valor obtido com a transmissão do
imóvel (valor de realização) e o valor pago aquando da aquisição do mesmo (valor de
aquisição).
➢ Se a diferença entre o valor de realização e o valor de aquisição for negativa, temos
menos-valia.
➢ Se for positiva, temos mais-valia.

O saldo entre mais-valias e menos-valias realizadas no mesmo ano, por residentes, quer seja
positivo ou negativo, é apenas considerado em 50% do seu valor – art. 43º/2 CIRS
➢ Somente se aplica a residentes e apesar do Caso Hollman (TJUE, C-443/06, 2017),
Portugal não alterou o artigo no sentido de alargar esse regime de tributação apenas de
50% do valor aos residentes de outro Estado-Membro da UE.

Valor de REALIZAÇÃO: apurado pelo art. 44º/1 CIRS

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Sebenta Fiscal – 2018/2019 DNB

Valor de AQUISIÇÃO: apurado pelo art. 45º e 46º CIRS

Ex:

Particularidades da Transferência de Bens do Património Particular para o Empresarial


Aquando da afetação do imóvel gerador de rendas aos ativos de uma atividade empresarial por
si exercida em nome individual (tributando-se na Categoria B), o sujeito passivo é suscetível de
apurar uma mais-valia.
➢ Contudo, esta fica suspensa até que o imóvel em causa seja alienado a terceiro ou
reafectado ao património particular do seu titular (sem ser para arrendamento de bem
imóvel habitacional, onde nesse caso a suspensão se manteria).

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Sebenta Fiscal – 2018/2019 DNB

Em virtude deste regime de suspensão da mais-valia inicial, o sujeito passivo é tributado


relativamente às mais-valias obtidas em ambos os momentos.
Há que apurar 2 mais-valias tributáveis:

Correção Monetária e Despesas e Encargos na Mais-Valia Imobiliária


A tributação deve incidir sobre a efetiva valorização do bem.

Não visa tributar os ganhos meramente nominais que não correspondam a uma valorização real
do bem, mas apenas um aumento nominal do valor do bem em resultado da desvalorização
monetária.
→ Art. 50º CIRS

Na Categoria G não são feitas quaisquer deduções aos rendimentos qualificados como
incrementos patrimoniais excetuando-se as mais-valias – art. 42º CIRS
➢ Elas beneficiam da dedução de despesas e encargos (art. 51º)

Dedução de Perdas na Mais-Valia Imobiliária


CIRS não admite a comunicabilidade horizontal entre perdas e rendimentos de categorias
distintas nem de diferentes sujeitos passivos pelo que as perdas apuradas numa categoria
devem ser reportadas para o futuro, pelo sujeito passivo que as obteve – art. 55º CIRS

Na categoria G há outra limitação: incomunicabilidade entre perdas e rendimentos de


natureza imobiliária e mobiliária.
• IMOBILIÁRIA – art. 55º/1/c
• MOBILIÁRIA – art. 55º/1/d

Regime de Tributação da Mais-Valia Imobiliária


Residentes: Rendimento é de englobamento obrigatório e fica sujeito às taxas progressivas do
art. 68º, sendo esse montante a englobar apenas 50% do valor do saldo positivo (art. 43º/2).
Não Residentes: art. 18º para apurar os rendimentos em Portugal sendo tributados pelo valor
total da mais valia pelo art. 72º/1/a

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Sebenta Fiscal – 2018/2019 DNB

Não Residentes com Estabelecimento Estável: tributa-se o valor total da mais-valia pelo art.
72º/2/a

Obrigações Acessórias
Sujeitos passivos residentes encontram-se obrigados à apresentação da declaração anual de
rendimentos Modelo 3 de IRS – art. 57º CIRS
➢ Mesmo que só tenha rendimentos da Categoria G tem esta obrigação pois não cabe nas
situações de dispensa de apresentação de declaração (art. 58º).

Mais-Valias Mobiliárias
Com a entrada em vigor do CIRS passou a prever-se a tributação das mais-valias mobiliárias.

Exclusão de Tributação
Art. 5º DL 442-A/88 exclui de tributação, em sede de IRS, as mais-valias mobiliárias resultantes
da alienação de partes sociais adquiridas antes de 1/1/1989.
➢ Aplicação pouco frequente.

Determinação do Valor da Mais-Valia Tributável: art. 43º CIRS


Mais-valia mobiliária resulta da diferença positiva entre o valor obtido com a transmissão (valor
de realização) e o valor pago aquando da aquisição do mesmo (valor de aquisição).
➢ Se a diferença entre o valor de realização e o valor de aquisição for negativa, temos
menos-valia.
➢ Se for positiva, temos mais-valia.

Valor de REALIZAÇÃO: apurado pelo art. 44º/1 CIRS

Quando a AT considerar que existe uma divergência entre o valor de alienação declarado e o
valor de transmissão, aplicam-se as presunções legais do art. 52º CIRS.

Valor de AQUISIÇÃO: apurado pelo art. 45º e 48º CIRS


➢ Art. 43º/6 tem um conjunto de regras destinadas à determinação da data de aquisição
de partes sociais ou outros valores mobiliários, aplicáveis a situações em que tal não
seja linear.

Também há correção nos termos do art. 50º CIRS


Dedução de despesas é feita pelo art. 51º/b CIRS

Regime de Tributação da Mais-Valia Mobiliária


Tributação a uma taxa especial de tributação autónoma, tanto para residentes como para não
residentes – art. 72º/1/c CIRS
➢ É pelo valor total pois o art. 43º/2 não se aplica a estas mais-valias.

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Sebenta Fiscal – 2018/2019 DNB

o Só não é se forem micro e pequenas empresas – art. 43º/3 CIRS

Residentes podem optar pelo englobamento (art. 72º/8), ficando obrigado a englobar a
totalidade dos rendimentos da mesma categoria (art. 22º/5).

Mais-Valias referentes a Propriedade Intelectual/Industrial


Aplica-se o art. 10º/4/a e 51º/b, sendo sujeita a uma taxa de tributação autónoma especial (art.
72º/1/c), sendo possível que os Residentes englobem (art. 72º/8).
➢ Apenas se considera 50% do valor – art. 43º/2 CIRS

Outros Incrementos Patrimoniais


Além das mais-valias, o art. 9º prevê outros incrementos patrimoniais – art. 9º/1/b, c, d, e

Regime de Tributação quanto às Indemnizações

Aplicável também à Obrigação de Não Concorrência.

Os Acréscimos Patrimoniais Injustificados não têm deduções (art. 42º) mas se o valor não
exceder os 100 000€ é sujeito a englobamento obrigatório e tributado às taxas gerais deste
imposto.
➢ Se o valor for superior a 100 000€ então a tributação é autónoma e à taxa especial de
60% (art. 72º/11).

CATEGORIA H – PENSÕES
Conceito amplo de Pensões – art. 11º/1 CIRS
APD: Há partida não há nenhuma diferença entre as pensões e os rendimentos de trabalho
dependente (Categoria A).
➢ Já foi discutido se não se devia eliminar a categoria H.

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Sebenta Fiscal – 2018/2019 DNB

o Manteve-se as duas por causa das deduções relativas a cada uma

Determinação do Rendimento Coletável


Aos rendimentos brutos é subtraído, por cada titular que os tenha auferido, o montante de
4 104€ e no caso dos rendimentos brutos desta categoria serem de valor anual igual ou inferior
a esse valor é deduzida a totalidade do valor do rendimento auferido até à sua concorrência –
art. 53º/1
➢ Esta dedução específica permite apurar o rendimento liquido tributável
➢ Também há despesas que podem ser deduzidas (art. 53º/4).

Tem de se distinguir entre Capital e Renda – art. 54º

Regime de Tributação
Rendimento de englobamento obrigatório – art. 22º/1 e 22º/3/b, a contrario
➢ Há uma situação de rendimentos da Categoria H, recebido por residentes, que não
segue o regime do englobamento obrigatório – art. 83º-A CIRS (tributados
autonomamente pelo art. 72º/5).

Ao englobamento aplicam-se as taxas gerais progressivas do IRS – art. 68º CIRS

Há deduções à coleta – art. 78º e ss. CIRS

Residentes não habituais: podem estar isentos de tributação em Portugal, nos casos do art.
81º/6.

Não-Residentes: excluídos do englobamento (art. 22º/3/a) sendo tributados pelo art. 71º/4/c.

Retenção na Fonte
Incide sobre o valor das pensões líquidas da dedução prevista no art. 53º CIRS.
➢ Funciona nos termos do art. 99º/1/b CIRS.

Pagamentos por Conta Opcionais


Art. 102º/8 CIRS prevê um regime opcional de pagamentos por conta na Categoria H, a efetuar
pelos titulares de pensões, no caso das entidades devedoras não se encontrarem abrangidas
pela obrigação de efetuar as retenções previstas no art. 99º.

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Sebenta Fiscal – 2018/2019 DNB

Problemas com a Categoria E e G (APD)


Rendimentos de Capitais v. Incrementos Patrimoniais
• Nos EUA esta diferença foi eliminada durante a Administração Reagan
• São difíceis de distinguir
• Para efeitos de definição geral e legal surgem problemas nos casos intermédios

Rendimentos de capitais – frutos ou vantagens que resultem da detenção de ativos


patrimoniais. Acabam por ser rendimentos periódicos que resultam dessa detenção.
Incrementos patrimoniais – categoria residual (G) que vai tributar todos os
incrementos/aumentos de património que não sejam subsumíveis às outras categorias.
Ex: descobre-se na conta de A 5 milhões que não foram declarados à Autoridade Tributária. Qual
a proveniência deste montante? Não havendo resposta/justificação por parte do contribuinte,
vai ser considerado incremento patrimonial não justificado tributado no âmbito da categoria G

Ou seja, para distinguir dos rendimentos de capitais que é detenção de ativos, os incrementos
patrimoniais têm a ver com a alienação de ativos.

EXEMPLO:
Rendimento que só é auferido no final de certo período de detenção – OBRIGAÇÕES DE CUPÃO
ZERO.
➢ Quando vence, recebe rendimento e capital acrescido.
➢ Fundação está isenta de tributação de rendimento (havendo juros, tal não é tributado).
Portanto sujeito passivo aliena a essa fundação as suas obrigações, antes de elas
vencerem.
➢ Após isso vencer, a fundação revende os ativos ao sujeito passivo.

No dia da alienação temos mais valia ou juros?

Sujeito passivo tem obrigações de cupão zero (ativos cujo rendimento vence no momento em
que é resgatado o próprio ativo – não são rendimentos periódicos, mas sendo as obrigações
compradas por um período de 3 anos a remuneração será atribuída no momento do reembolso
da própria obrigação).

E se aliena essa obrigações de cupão zero for alienada a uma Fundação B que está isenta de
tributação no momento do vencimento dos juros.
➢ Depois ela revende ao sujeito passivo A.

E se legislação não for clara quanto à tributação do rendimento descrito?


Quanto a esse rendimento cumulado ao longo do ano e que é pago no momento em que é
reembolsado o capital investido?

Está em causa eventualmente Rendimento de Capitais


→ Art. 5º e 40º e ss. CIRS

Frutos e vantagens económicas procedentes de elementos patrimoniais de natureza mobiliária,


com exceção dos ganhos e outros rendimentos tributados noutras categorias.
APD: se porventura houver dúvidas vão prevalecer outras categoriais
Pode estar em causa uma situação do art. 10º (Mais-Valias)

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Sebenta Fiscal – 2018/2019 DNB

São rendimentos de capitais ou de mais valias?


➢ Se entendermos que rendimentos resultantes das obrigações de cupão zero são mais
valias, porque resultam da alienação, então a operação do sujeito A foi com o objetivo
de ele próprio não ser tributado porque a fundação B está isenta.
➢ Se entender que são rendimentos de capitais o rendimento acumulado resultaria da
detenção das obrigações (frutos da detenção).

Situação está clarificada no CIRS:


• Foi aos tribunais (STA e TC) pois era uma questão controvertida.
• Também houve responsabilidade tributária.
• O que aconteceu foi que as instituições financeiras não retiveram na fonte porque não
eram juros (não eram rendimentos de capitais), não entregando o imposto.
• Fisco entendeu que eram rendimentos de capitais e foram exigir responsabilidade
financeira das entidades responsáveis. Se fossem mais valias estavam isentas, daí não
terem feito retenção na fonte.

Temos de saber como se calculou, para aquele produto financeiro, o rendimento – temos de
ver como se calculou e se tal era fruto da detenção de um ativo patrimonial ou se aquele
rendimento derivava da alienação.
• Esta situação é aferida perante o método do cálculo.
o Tem de se ver a natureza dos juros – ver como é que aquele montante é
calculado.
▪ Se variasse consoante o valor de mercado, então no momento de
alienação o rendimento que era auferido dependia dessa avaliação no
dia em que foram alienados – nesse caso seria mais valias (dadas pela
diferença entre o valor da aquisição e o valor da alienação).
▪ Tribunal concluiu que a remuneração era contabilizada dia a dia, o que
significa que sujeito A recebe a remuneração menos 1 dia. Recebe o
montante que estava acordado com as instituições financeiras menos o
dia que estava acordado para o vencimento. Tratava-se de juros
(rendimentos de capitais).
➢ APD concorda

Temos de interpretar, segundo caso concreto, fazendo prevalecer a substância sobre a forma –
não interesse de onde derivou o rendimento, o que interessa é olhar para a substância do negócio
e se o rendimento derivou de uma forma de apuramento que é típica dos juros então estamos
na categoria E.

Art. 5º CIRS aponta para os rendimentos capitais como categoria residual. Mas no art. 10º há
a mesma situação.
➢ Redação não permite resolver a situação – qual é a residual?
o Única maneira é perceber qual a função das categoriais.

APD: os incrementos patrimoniais é que constituem a categoria residual – se não se conseguir


tributar por nenhuma das outras categorias, o IRS não deixa nenhum acréscimo patrimonial de
fora pelo que se enquadra na categoria G

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Sebenta Fiscal – 2018/2019 DNB

Sujeito passivo A entendeu que eram mais valias, daí estar isento, portanto alienou antes do
prazo.
• Como ainda não estava vencido o rendimento (era só a 31 de dezembro), para não ser
tributado o sujeito passivo alienou (a 25 dezembro) a uma fundação para estar isento
de tributação da mais valia – esquema de planeamento fiscal.
• Quando o rendimento foi vencido estava na detenção da fundação B, que é sujeito
passivo isento, portanto não seria tributado.
• Vencido o rendimento os rendimentos foram novamente alienados aos detentores
iniciais.

• Tribunal veio averiguar como é que os sujeitos A calcularam o montante que tinham a
receber da venda do ativo – se esse montante correspondesse ao valor de mercado no
dia da alienação eram mais valias, e estavam isentas; se esse montante era a soma dos
dias de detenção então eram juros, pelo que devia ter havido retenção na fonte pois os
juros não estavam isentos.

Isto mostra a dificuldade de distinguir rendimentos de capitais e incrementos patrimoniais.


➢ Se houver tributação numa categoria e isenção noutra isto vai fomentar o esquema de
planeamento fiscal – lavagem de cupão / lavagem de dividendos e etc.

Ligando à existência de imposto único é que a vantagem deste imposto é tratar de forma
neutra os vários rendimentos – evita distorções e planeamento fiscal.
➢ Se todas as categorias fossem tratadas da mesma forma havia neutralidade e era mais
fácil tributar.

Rendimentos de Capitais
Definição do conceito no corpo do art. 5º CIRS, tendo depois uma enumeração exemplificativa.
Temos de ter em atenção que a enumeração é meramente exemplificativa – interpretação
correta implica voltarmos sempre ao corpo do artigo.

Caso de lavagem de cupões também está relacionado com esta técnica legislativa – pois não
estava previsto expressamente as obrigações de cupão zero.
➢ APD: não é preciso estar previsto. Não podem estar todos os exemplos enumerados84,
tem de se interpretar a partir do artigo. Estes são exemplos padrões que permitem, em
conjunto com o corpo do artigo, dizer as características.

Reserva de lei e princípio da determinação e tipicidade não obriga nem recomenda


enumerações exaustivas – quanto maior o pormenor e o número de exemplos mais complexa
e menos clara fica a lei. Exige-se simplicidade.

Fronteira entre rendimentos de capitais (categoria E) e incrementos de capitais (categoria G) não


é clara e existem dúvidas.

84
Instrumentos financeiros estão constantemente a ser criados e não é possível a lei prevê-los a todos.
Nem é desejável pois causa maior dificuldade à interpretação.

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Sebenta Fiscal – 2018/2019 DNB

➢ As vantagens resultantes da alienação onerosa de partes sociais e de outros valores


mobiliários podem constituir mais-valias ou rendimentos de capitais.
o O que distingue uma e outra categoria é a forma de obtenção do
rendimento: se se tratar de um montante periódico (ou soma de
montantes periódicos) é rendimento de capital; se se tratar de um
montante apurado consoante o valor de mercado é uma mais-valia.
▪ APD: devido à dificuldade de distinção alguns sistemas aboliram esta
diferença

Incrementos Patrimoniais
No art. 42º e 43º prevê-se o apuramento do saldo entre mais valias e menos valias
➢ Por esta razão, APD defende que não se pode falar em retroatividade em sentido
próprio relativamente às mais valias apuradas de forma individual, elas seguem o
regime do CIRS e é uma situação diferente que a tributação autónoma.

Há outras situações como indemnizações (b), importâncias auferidas (c) e acréscimos


patrimoniais não justificados (d).
• Se aparecer montante não declarado e não justificado vai haver tributação ao abrigo da
categoria G.
o Tributação dos acréscimos não justificados foi introduzido muito depois do CIRS,
já no ano 2000, e permite enquadrar situações que escapavam à aplicação do
CIRS.

Residentes são tributados pelo rendimento universal, o que significa que mesmo o rendimento
obtido no exterior tem de ser declarado em território português. Se não foi declarado, em
termos puramente fiscais, montantes colocados em contas no exterior e que não tenham sido
declarados o sujeito passivo tem direito a audição para explicar a sua proveniência e se não
explicar é tributado ao abrigo desta categoria.
• APD: princípio de justiça muito importante para não premiar rendimentos obtidos
ilicitamente.

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Sebenta Fiscal – 2018/2019 DNB

Normas Comuns para todas as categorias IRS


Após a Fase Analítica em que se aplicam as regras específicas de cada categoria segue-se uma
Fase Sintética em que se aplica um único conjunto de regras fiscais.

Englobamento
Representa a passagem da Fase Analítica para a Fase Sintética do imposto.
Através do Englobamento apura-se o rendimento global líquido ou rendimento coletável do
sujeito passivo residente, mediante a adição dos rendimentos líquidos das várias categorias –
art. 22º/1 CIRS

Não é aplicável a todos tipos de sujeito passivo de IRS nem a todos os tipos de rendimentos
auferidos.
➢ IRS tem sistema de tributação semi-dual

Há rendimentos isentos que não são englobados para efeitos da tributação – mas quando a lei
imponha têm de ser obrigatoriamente englobados para se determinar a taxa a aplicar aos
restantes rendimentos, havendo aí uma isenção com progressividade (art. 22º/4)
➢ Ex: art. 81º/7 CIRS, 37/3, 38º/2, 39º/4, 39º-A/6 EBF

Taxas de IRS
Taxas gerais constam do art. 68º/1 CIRS
➢ Aplicam-se ao rendimento coletável constituído pelo conjunto de rendimentos
auferidos num determinado ano, sujeitos a englobamento obrigatório ou opcional.
➢ São taxas progressivas por escalões

Art. 68º/2
➢ À parte do rendimento coletável igual ao limite do maior dos escalões que nele
couber, aplica-se a taxa da coluna B correspondente a esse escalão;
➢ Ao excedente, aplica-se a taxa da coluna A respeitante ao escalão imediatamente
superior.

Ex: rendimento coletável de 30 000€ - os primeiros 25 000€ integram-se no 4º escalão e é lhes


aplicável a taxa da coluna B (24,967%); os 5 000€ excedentes integram-se no 5º escalão e aplica-
se-lhes a taxa da coluna A (37%).

Taxa Adicional de Solidariedade


Aos rendimentos particularmente elevados aplica-se a taxa adicional de solidariedade – art. 68º-
A CIRS

Taxas Liberatórias – art. 71º CIRS

Taxas Especiais – art. 72º CIRS

Taxas de Tributação Autónoma – art. 73º CIRS


O denominador da tributação deste tipo de despesas e encargos é a de evitar um certo tipo de
práticas abusivas.

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Sebenta Fiscal – 2018/2019 DNB

➢ Procura desencorajar procedimentos evasivos, mediante a imposição de um encargo


fiscal adicional a quem procede aos pagamentos em apreço.

PRP: Este não é um imposto sobre o rendimento.


➢ Apesar de estar no CIRS é uma imposição fiscal materialmente distinta da tributação em
IRS.
➢ É uma tributação autónoma de encargos (e não de rendimento), que apenas por razões
de comodidade na administração e liquidação do imposto se encontra integrada no IRS.

TC 18/2011 primeiro classificou como imposto periódico.


STA 0281/11 classificou como tributação sobre a despesa, sendo uma obrigação única
TC 310/2012 alterou a posição e veio adotar a posição do STA

Quociente Conjugal
A regra é a da tributação separada, sendo a tributação conjunta aplicável apenas quando haja
opção de ambos os cônjuges ou unidos de facto nesse sentido – art. 13º/2 CIRS

Optando pela tributação conjunta dos seus rendimentos, antes da aplicação das taxas gerais
progressivas IRS, há operações inerentes ao mecanismo do quociente conjugal – art. 69º CIRS
➢ Determina-se assim os ajustamentos necessários à aplicação da tabela de taxas gerais
do art. 68º

Justificação deste regime é que, no caso de existir um agregado familiar há uma poupança
relacionada com as economias de escala – portanto faz sentido juntar os rendimentos.

Ana Paula Dourado: Todavia as exigências de um imposto pessoal sobre o rendimento não
recomendam a tributação conjunta – pois a capacidade contributiva é individual.
• Maioria da legislação OCDE já não tributam os cônjuges mas cada um separadamente e
só as dos filhos é que são repartidas pelos dois.

É compatível com a CRP que a regra deve ser a tributação individual e a referência ao agregado
familiar é apenas uma referência quanto aos filhos ou ascendentes.

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Sebenta Fiscal – 2018/2019 DNB

• CRP faz referência, no quaro do imposto pessoal, ao agregado familiar – rendimentos


devem ser tidos em conta para efeitos do imposto pessoal mas isso não implica uma
tributação conjunta85.

Com a reforma de 2014 mudou-se este sistema para uma tributação individualizada, o que é
mais coerente com a existência de um imposto pessoal.
• O que se tem em conta é a capacidade contributiva de cada um.
• Este entendimento tem levado a que Estados da OCDE tenham vindo a tributar
separadamente os casais – para não haver distorções.

Tributação conjunta provoca distorções pois se um dos cônjuges tiver elevada capacidade
contributiva e outro não trabalhar isto vai levar à descida do escalão do primeiro cônjuge.
➢ Isto pode levar a planeamento fiscal e levar a que se opte que um deles não trabalhe.

Questão muito discutida nos países nórdicos e ficou resolvida nos anos de 1970 – este tipo de
opção de tributação conjunta dos casais levava a que as mulheres não trabalhassem.
➢ Sensibilidade à igualdade de género levou a que se terminasse com isto, pois a
tributação estava a fomentar a desigualdade.

Opção em Portugal foi uma solução ambígua: em cada caso as pessoas optam por tributação
singular ou conjunta.
➢ Hoje em dia há possibilidade de optar – situação única; não há nenhum regime em que
se permite esta opção.
o APD: opção muito questionável porque coloca em causa o princípio da
igualdade – se cada casal opta pela solução mais favorável (prevendo o
montante de imposto) há uma situação de planeamento o que vai implicar uma
alteração no critério único que altera a igualdade que tinha de haver entre todos
os sujeitos submetidos ao IRS.
➢ O imposto é apurado individualmente, mesmo quando exista agregado familiar –
imposto é apurado em relação a cada cônjuge ou unido de facto e aos seus dependentes
que não administrem os seus bens.
o Este é um imposto pessoal com finalidades redistributivas, pelo que o
parâmetro de comparação deve ser a capacidade contributiva individual e não
a tributação conjunta.

Isto é diferente das despesas em relação a dependentes a cargo do sujeito passivo


➢ Na lógica do imposto pessoal e da justiça e capacidade contributiva, as despesas com os
descendentes devem ser tidas em conta – isto é o que a CRP exige, não a tributação
conjunta e método inerente de splitting.

85
Englobam-se os rendimentos dos cônjuges e equiparáveis e faz-se o coeficiente conjugal – apura-se a
matéria coletável globalmente de ambos, divide-se por dois e depois é que se aplica o escalão (a taxa
progressiva).

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Sebenta Fiscal – 2018/2019 DNB

Deduções à Coleta
Art. 78º/1 e 2 CIRS

São feitas depois de se aplicar os escalões da progressividade, pelo que já não interferem com a
capacidade contributiva86.
➢ São deduções diferentes e aparecem num momento diferente daquele do apuramento
da matéria tributável – estão relacionadas com o conceito de Estado social (saúde,
educação, encargos com lares e etc.)
o Também podem ser deduções de caráter técnico que estejam relacionadas com
o funcionamento do imposto (ex: art. 81º CIRS)

Elenco heterogéneo que tem vindo a sofrer alterações ao longo dos anos.
➢ Sistematizam-se em deduções que constituem elementos de personalização do IRS;
deduções de caráter mais técnico e com finalidades específicas; benefícios fiscais que
operam por dedução à coleta.

Art. 78º/7 tem limites máximos para a soma de um conjunto de deduções à coleta.
➢ Os contribuintes que tenham um rendimento coletável igual ou inferior ao valor do
primeiro escalão são os únicos que não se encontram sujeitos a limite máximo para o
referido conjunto de deduções à coleta.
➢ Por outro lado, os contribuintes quem têm rendimento coletável superior ao valor do
último escalão têm como limite máximo de deduções 1 000€

Este mecanismo ajuda à progressividade do imposto.

A Lei do Orçamento de Estado para 2009 veio converter os abatimentos ao rendimento líquido
total em deduções à coleta, sendo tal mais adequado para evitar tendenciais efeitos regressivos
da consideração fiscal de despesas pessoais realizadas pelos sujeitos passivos.
➢ Tem mais vantagens, de uma forma geral.

Crédito de Imposto por Dupla Tributação Jurídica Internacional


Art. 81º elimina a dupla tributação jurídica internacional, assentando num princípio de
neutralidade na exportação de capitais.
➢ Usa um método de imputação/de crédito de imposto.

Retenções na Fonte
Tributação do rendimento no IRS pauta-se por um princípio de aproximação entre o momento
do facto tributário e o da entrada do imposto nos cofres do Estado.
➢ Concretiza-se neste mecanismo conforme o disposto nos art. 98º a 101º-D CIRS

Há retenções na fonte efetuadas às taxas liberatórias do art. 71º - mecanismo de substituição


tributária total, exonerando o contribuinte de qualquer subsequente obrigação de pagamento
de imposto.

86
Se fizéssemos estas deduções antes de apurarmos o escalão estávamos a baixar indevidamente a
capacidade contributiva.
➢ A capacidade contributiva para efeitos de apuramento do escalão está apenas relacionada com
o conceito de rendimento líquido.

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Sebenta Fiscal – 2018/2019 DNB

Há retenções na fonte por conta do imposto devido em termos finais – têm a natureza de
adiantamento por conta do imposto devido em termos finais, constituindo um mecanismo e
substituição tributária parcial.
➢ Art. 101º CIRS – se a entidade obrigada a reter o imposto disponha ou deva dispor de
contabilidade organizada.

Pagamentos por Conta


Tributação do rendimento no IRS pauta-se por um princípio de aproximação entre o momento
do facto tributário e o da entrada do imposto nos cofres do Estado.
➢ Concretiza-se neste mecanismo conforme o disposto no art. 102º CIRS

Declaração de Rendimentos
Os sujeitos passivos devem apresentar anualmente uma declaração de rendimentos – art. 57º
a 61º CIRS

Liquidação do IRS
Corresponde à aplicação da taxa ou taxas de imposto à matéria coletável, assim tornada certa
e líquida a obrigação de imposto.
➢ É realizado pela Autoridade Tributária, sendo um Imposto Heteroliquidável.
o Art. 75º a 77º CIRS

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Sebenta Fiscal – 2018/2019 DNB

Princípio da Tributação do Rendimento Real


Conceito de Rendimento Real surgiu no final do séc. XIX, estabelecendo que a tributação deve
coincidir com a diferença entre despesas e gastos.
➢ É este conceito que faz sentido porque sujeito passivo pode receber 100 mil de receitas
e ter 500 mil de despesas – não faz sentido tributar as receitas sem saber quais as
despesas relacionadas com a obtenção daquele rendimento.

Quando se fala da diferença entre proveitos e gastos estamos a falar de gastos que foram
incorridos para se obter aquelas receitas.
➢ Rendimento real significa rendimento-acréscimo – rendimento líquido entre as
diferenças e os gastos legalmente dedutíveis, o que significa que os gastos relacionados
com a atividade da empresa devem ser dedutíveis.
o Tem de sempre haver relação com a atividade empresarial.

Rendimento real baseia-se na contabilidade dos sujeitos passivos – pressupõe que sujeitos
passivos cumpram deveres acessórios (de cooperação com o Fisco).
➢ Contabilidade organizada para AT conseguir apurar.
o Conceito atual de rendimento líquido/acréscimo/real depende do cumprimento
dos deveres por parte dos sujeitos passivos.
o Sem o cumprimento desses deveres a AT não consegue tributar segundo o
rendimento real.

Não é um rendimento fáctico – o que eu determino/decido que deve ser dedutível.


➢ Rendimento tal como a lei fiscal o determina: há gastos que são contabilizados e estão
de acordo com as regras da contabilidade mas não são aceites para efeitos fiscais.

RENDIMENTO REAL – rendimento tributável que resulta da diferença entre proveitos e


gastos e é apurado segundo métodos diretos, i.e., com base na contabilidade e outros
deveres de declaração do sujeito passivo, tal como exigido pelas leis fiscais.

Rendimento Real pode ser equiparado a Tributação Direta87


➢ APD: tributar o rendimento real significa atingir a matéria coletável realmente
auferida pelo sujeito passivo, mas, mesmo nos métodos indiretos, estamos dentro
deste princípio e o que varia é o grau de confiança que merecem os elementos
fornecidos pelo sujeito passivo

Tributação do rendimento real e os deveres de declaração e cooperação são duas faces da


mesma medalha.
➢ Para se assegurar uma fiscalização adequada do rendimento real os meios da
administração têm de ser suficientes para realizar cabalmente esta fiscalização.

Métodos indiretos são aplicáveis quando sujeito passivo não cumpre as suas obrigações legais
declarativas, nomeadamente as de contabilizada organizada.
➢ Nesses casos, o Fisco não consegue aferir corretamente qual o rendimento real.

87
APD: discorda de Teixeira Ribeiro, que admite que a tributação indireta possa estar inserida no
rendimento real

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Sebenta Fiscal – 2018/2019 DNB

o Solução é tributar segundo métodos presuntivos, tentando chegar o mais


próximo possível ao rendimento real.
o Tem de se procurar indícios e pode haver comparação com outras atividades
similares – solução de segundo ótimo pois tentamos aproximar-nos de uma
situação e não estamos a tributar efetivamente aquele contribuinte que falhou.

Tributação do Rendimento Real das Empresas e Dedutibilidade dos Gastos


Art. 17º/1 CIRC concretiza art. 104º/2 CRP88 – conceito de rendimento real (lucro tributável)
que parte do resultado apurado pela contabilidade, mas que não depende totalmente desse
resultado; é noção jurídica e não corresponde a uma noção de rendimento fáctico nem
contabilístico (não há coincidência entre normas de contabilidade e rendimento real).
➢ Lucro tributável = lucro contabilístico adaptado aos princípios e finalidades jurídico-
fiscais.
o As correções são com base nos princípios constitucionais de igualdade,
capacidade contributiva, prevenção de abuso fiscal e etc.

Lei fiscal restringe a dedutibilidade dos gastos contabilisticamente comprovados àqueles que,
além de estarem comprovados pela contabilidade, sejam “indispensáveis” para a realização
dos rendimentos tributáveis ou para a manutenção da fonte produtora – isto antes da reforma
de 2014

Indispensável:
• Relação necessária entre gastos suportados e rendimentos obtidos
o APD: interpretação inaceitável por implicar juízo de mérito sobre as decisões
empresariais e desconsiderar o risco empresaria
• Juízo de conveniência
• Relação entre gastos e o interesse da empresa – business purpose
o Seguido pela jurisprudência do STA (15/6/11, 049/11; 24/9/14, 779/12) –
perceção da relação de causalidade económica entre a assunção de um custo e
a sua realização no interesse da empresa, atento o objeto societário do ente
comercial em causa89.

88
Art. 104º/2 – Empresas são tributadas fundamentalmente pelo Rendimento Real
➢ Fundamentalmente não significa exclusivamente – podemos ter tributação de rendimentos
empresariais com base em métodos indiretos (presuntivos) que se contrapõe à tributação do
rendimento real.
89
Ex: existe protocolo cultural entre Portugal e outro Estado segundo o qual as atividades culturais de
difusão da língua por parte desse outro Estado em território português estão isentas. País tem embaixada
cultural (pessoa coletiva) onde há várias atividades culturais pagas de difusão (cinema, apresentação de
livros, música e etc.) e ensino da língua. Como é que os rendimentos são tributados ao abrigo do IRC? São
tributados como lucro ou como rendimento global ou temos de distinguir entre as várias situações?
➢ Para saber se é atividade empresarial temos de perceber se há concorrência com outras – todas
essas atividades têm fim lucrativo. Instituições de ensino estão em concorrência com outras, portanto
é uma atividade que visa o lucro.
➢ As outras não são atividade empresarial portanto haverá remissão para o CIRS.

APD: as atividades empresariais devem pagar imposto, se não ficava tudo isento e não é essa a
finalidade da lei.
➢ Normalmente a atividade das fundações são tributadas segundo o rendimento global e não como
atividade empresarial.

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Sebenta Fiscal – 2018/2019 DNB

Dedutibilidade de Juros
Juros suportados pelos sujeitos passivos de IRC como remuneração de empréstimos e demais
encargos financeiros associados são dedutíveis como gastos no apuramento do lucro tributável
– art. 23º/1/c CIRC
➢ A dedutibilidade de juros devidos pela obtenção de fundos por uma sociedade, para
financiar a aquisição de ativos próprios, não suscita dúvidas – desses mesmos ativos se
esperam benefícios económicos futuros para a sociedade.

À partida são dedutíveis os gastos que estão relacionados com a atividade da empresa – temos
de atender à finalidade empresarial e assim, pelo Método Direto, determinamos o rendimento
coletável.

Gastos podem ser relativos a atividades não produtivas – encargos de natureza financeira. Ex:
se sociedade precisa de financiamento, esses encargos são à partida dedutíveis, mesmo não
sendo afetos à atividade produtiva – se sociedade pedir financiamento para si própria.

A dedutibilidade de juros devidos pela obtenção de fundos por uma sociedade para financiar
uma entidade com ela relacionada, através de suprimentos gratuitos é questionável.

É discutível se a obtenção onerosa de fundos para financiamento gratuito de uma afiliada deve
ser interpretada como uma atuação da empresa da qual se esperam benefícios futuros, de uma
atuação com finalidade lucrativa (no interesse da empresa) e no exercício da atividade.
• Interpretação STA (10/7/02, 0246/02) – não admite;
o Os custos previstos no art. 23º CIRC têm de dizer respeito à própria sociedade
contribuinte, pelo que para determinada verba ser considerada custo daquela
sociedade, é necessário que a atividade respetiva seja por ela desenvolvida, e
não por outra sociedade, ainda que em relação de domínio.
o Jurisprudência tem vindo a ser confirmada
o APD: não são subsumíveis pois não se trata de juros de capitais alheios aplicados
na própria exploração90

Quanto às SGPS – jurisprudência portuguesa permite a dedução de encargos, em casos


semelhantes ao anterior, se a sociedade for uma SGPS. Lucro delas vem dessa gestão de

Tributam-se os não residentes se eles tiverem Estabelecimento Estável em Portugal


➢ Quando há uma instalação fixa (sucursal) em Portugal, através da qual a empresa não residente
desenvolve a sua atividade em território português, ela é equiparada a residente e é tributada
pelo lucro como uma sociedade portuguesa.

Se não existir grau de permanência suficiente em território português que permita ter um
Estabelecimento Estável, o rendimento obtido em território português não é tributado como EE, é
tributado através dos rendimentos das diversas categorias tal como elas são no IRS.

90
Se sociedade-mãe pedir financiamento para uma das sociedades do grupo (sendo ela a pedir por razões
não fiscais ou outras) tal não é dedutível pela sociedade-mãe porque os sujeitos passivos são distintos.
Sociedade-mãe é tributada pelo seu próprio rendimento e as filiais também.
➢ Em termos jurídicos, para efeitos de IRC, não há tributação de grupo e cada uma é tributada por
si, pelo que não pode haver uma transferência de rendimentos de um lado para outro.
➢ Isto está relacionado com a prevenção de comportamentos abusivos – para evitar estes
comportamentos, não se permite estas transferências.

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Sebenta Fiscal – 2018/2019 DNB

sociedades. Nestes casos, como a sua atividade está relacionada com este objeto daí poder ser
deduzido.
➢ APD discorda – deve analisar-se caso a caso.
o Se participada não conseguir financiamento, pode ir a SGPS.
o Se razões para SGPS se endividar for puramente fiscais então não devia ser
possível deduzir.

Mesmo com a reforma de 2014, a jurisprudência constante é apoiada pela doutrina ao


interpretar indispensabilidade como sendo aferida através da relação desses gastos com a
atividade da empresa, excluindo outras sociedades do grupo.
➢ Gastos e perdas dedutíveis são aqueles incorridos na prossecução dos interesses da
sociedade e no desenvolvimento da sua atividade, entendida esta no sentido amplo e
não apenas no sentido de atividade produtiva.

Tributação segundo método Direto: IRC permite dedução de gastos que estejam relacionados
com a atividade da empresa.
➢ Esses gastos não têm de coincidir com os admitidos para efeitos fiscais e aqueles
admitidos segundo as regras gerais de contabilidade.

Além disso, os códigos de imposto sobre os rendimentos estabelecem limites à dedução dos
gastos – para prevenir comportamentos abusivos e/ou evitar que haja indiferenciação entre
a esfera empresarial e pessoal.
➢ Não deve haver valoração quanto ao significado de gasto no interesse da empresa – AT
não deve substituir-se ao juízo do empresário.
o Não pode haver um limite relacionado com o juízo de mérito.

➢ Referência a gastos relacionados com a atividade da empresa implica ter-se em conta


gastos relacionados com atividades produtivas e não produtivas: encargos de
natureza financeira também estão implicados.
o Jurisprudência constante do STA (0246/02) não enquadra aqui os suprimentos
gratuitos a uma afiliada.
▪ Os gastos de uma empresa-mãe afetos à sua própria atividade são
dedutíveis.
▪ Os gastos para fazer suprimentos a afiliada não são dedutíveis. Elas são
autónomas e têm capacidades contributivas autónomas. São 2 sujeitos
passivos autónomos. Evita planeamento fiscal.
• Exceção é quanto à SGPS – critica de APD pois a jurisprudência
é acrítica e olha para SGPS e permite dedução de encargos de
natureza financeira afetos a suprimentos gratuitos (pois é o
objeto e natureza destas sociedades).
• Mas, com base nessa natureza jurídica não fazem análise de
substância e extrapolam para o domínio fiscal sem verificar se
há atividade económica exercida pelas afiliadas que justifique
os suprimentos gratuitos91.

91
O que está em causa é: quando os tribunais questionam se podem ser deduzidos os suprimentos na
esfera da sociedade mãe, o que estão a fazer é um juízo formal (não atende à necessidade de
financiamento das afiliadas).
➢ Isto é questionável porque apesar da natureza ser a gestão de prestações sociais pois nas SGPS
é difícil ter a certeza se as afiliadas têm atividade efetiva ou são meras caixas postais.

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Sebenta Fiscal – 2018/2019 DNB

Tem de se fazer uma interpretação caso a caso para ver se está relacionada com a atividade.
➢ Isto significa que a tributação do rendimento real é um conceito normativo e que implica
limites à dedução de gastos por parte do legislador, nos termos da CRP.
➢ Ex: dedutibilidade de juros por parte de um sujeito passivo de IRC – caso ainda por
decidir92

Alcance da Tributação do Rendimento Real


Capacidade contributiva é a medida da igualdade nos impostos.
Tributação do rendimento real é uma concretização desse princípio e também exprime os
direitos de propriedade e iniciativa privada

➢ Tribunais não fazem teste de saber se o financiamento era necessário para uma atividade
relevante por parte da afiliada.
o APD: não bastaria uma dedução automática e teria de se fazer teste ulterior e verificar
para que fins foram afetos os montantes financeiros transferidos para as participadas.
STA é muito rígido quanto às Sociedades que não são SGPS e demasiado brando quanto
às SGPS.
92
Os códigos de imposto têm normalmente limites à dedução de juros – estes limites foram introduzidos
para reduzir um enviesamento na forma de financiamento das sociedades.
• Em termos fiscais tem havido um entendimento que é mais favorável ao endividamento.
• Quando há lucro há tributação e quando há distribuição de dividendos aos acionistas há nova
tributação – dupla tributação económica (tributação do mesmo rendimento).
o Existe nova tributação porque há 2 passivos com 2 capacidades contributivas
autónomas.
o Do ponto de vista económica isto é desvantajoso porque é o mesmo rendimento que
está em causa.
o Se sociedade optar por recorrer ao crédito o tratamento fiscal é mais vantajoso, pois
esses juros são dedutíveis e vão reduzir o lucro.

Tratamento fiscal esteve na origem da crise financeira de 2008, porque juros eram pagos a entidades
situadas em paraísos fiscais.
➢ Financiamento ocorre dentro dos grupos societários mas quem o faz está situado em Estados
não cooperantes.
➢ Isto significava que a sociedade que se endividava estava num território de tributação normal e
que emprestava estava num território de tributação baixa ou nula (esse rendimento, portanto,
não era tributado).

➢ Reação a esta situação foi introdução de normas nos códigos de imposto que limitem esta
situação. Regras no código até 1 milhão de € ou 30% - regras EBTIDA que orientam o
comportamento das empresas.

Este limite é compatível com o art. 104º/2 CRP?


Ponderação do princípio da capacidade contributiva (tributação rendimento real até às últimas
consequências) e princípio de segundo ótimo para evitar o abuso fiscal.
➢ Tem de se evitar sobreendividamento para transmitir lucros para paraísos fiscais onde não
seriam tributados.
➢ Os grupos, desde os anos 90, organizam-se de forma a que se for preciso lucro há transferência
dentro dos grupos que acabam por ir para territórios de baixa tributação.

Isto está ser analisado no Tribunal Constitucional Alemão – se se decidir pela sua inconstitucionalidade,
as normas em Portugal do EBTIDA também vão sofrer porque são inspiradas.

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Sebenta Fiscal – 2018/2019 DNB

➢ Tributação do rendimento real encontra a medida certa que resulta da ponderação do


dever de contribuir para as despesas gerais da comunidade e o respeito pelo princípio
da propriedade privada.
o A tributação do rendimento bruto e/ou do rendimento presumido pode levar a
tributos confiscatórios da propriedade privada.

É um critério de justiça que pondera o dever de contribuir para as despesas gerais da


comunidade o respeito pelos direitos de propriedade e iniciativa privada.

Tem-se também em conta o Princípio do Abuso Fiscal


• Sempre que os gastos possam ser utilizados abusivamente pelo sujeito passivo,
provocando a erosão das bases tributárias, é legítimo ao legislador impedir ou limitar a
dedução desses gastos.
o Isso acontece na dedutibilidade de juros entre empresas associadas, despesas
de representação e etc. – casos em que a fronteira entre a esfera empresarial
e a esfera privada são difíceis de determinar.

Não são dedutíveis as despesas não documentadas


➢ Despesas não documentadas = despesas relativamente às quais não existe prova
documental (STA, 7/7/10, 204/10)

Importância da Tributação do Rendimento Real


Art. 104º/2 CRP é reação ao ordenamento jurídico-tributário que vigorou durante a CRP 1933.
➢ Mas, este princípio da Tributação do Rendimento Real apenas foi introduzida em
1988/89 – até lá vigorava uma tributação de lucros presumidos.
o Reforma de 1988/89 consagrou esta exigência constitucional – houve mais de
uma década em que códigos não concretizavam a exigência constitucional.
o Foi uma consagração radical e só havia método direto
▪ Gerava inequidades pois os contribuintes incumpridores eram
beneficiados – não cumpriam deveres de contabilidade organizada e
não tinham consequências.
▪ Não havia forma de tributar esses sujeitos. Contribuintes cumpridores
estavam numa situação desvantajosa.
▪ Tanto quanto ao IRC como à Categoria B do IRS

Mito da Tributação do Rendimento Real


Rendimento Real não é o rendimento fáctico mas sim aquele que a lei entende ser rendimento
real – os gastos dedutíveis são aqueles que a lei entende que devem contribuir para o
apuramento do rendimento real.
➢ Margem de conformação legislativa que tem de ser exercida segundo os princípios
constitucionais.

A Tributação do Rendimento Real opõe-se à Tributação segundo Métodos Indiretos.

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Sebenta Fiscal – 2018/2019 DNB

Métodos Indiretos
Esses métodos vulgarizaram-se a partir dos anos 70 mas em Portugal eles só foram incluídos no
final da década de 90 – devido às circunstâncias históricas.

São métodos subsidiários (art. 81º, 83º, 85º LGT) de determinação da matéria tributável, a
aplicar quando não é possível determinar com fiabilidade o rendimento real, ou quando o
sujeito escolhe ser tributado com base no regime simplificado.
➢ Administração só pode recorrer a estes métodos se não puder ser aplicado o método
direto, i.e., a tributação do rendimento real com base nos deveres de contabilidade e
declarativos do sujeito passivo
o Quando o contribuinte não cumpre os seus deveres legais (acessórios) de
cooperação com o Fisco, o Fisco pode tributar através de outros métodos que
se podem reconduzir à figura dos métodos tipificantes (tributação segundo tipo
médio/frequente).
o São métodos presuntivos – designação doutrinal que a legislação não acolhe
pois eles existiam antes da reforma fiscal e estavam associados a uma situação
de injustiça.
▪ Métodos presuntivos/tipificantes = métodos indiretos
➢ TC 84/2013, 43/2014: não é inconstitucional (não são contrários ao art. 104º/2 CRP93)

Para não serem inconstitucionais devem aproximar-se o quanto possível do que seria a situação
real.

Utilização subsidiária deve ser interpretada em sentido estrito e só pode ser utilizada se
estiverem verificados os pressupostos dos art. 87º e ss. LGT.
1. Violação de deveres formais ou de cooperação por parte do Sujeito Passivo (art.
87º/1/b, e)
2. Discrepância não justificada entre o valor declarado e os valores de referência (art.
87º/1/d, f)
➢ As manifestações de fortuna também podem dar lugar à tributação segundo
métodos indiretos.
➢ As manifestações de fortuna e desvios do rendimento padrão são indícios legais
de que há uma ocultação material de informações – contêm uma presunção de
que a informação sobre os rendimentos efetivamente obtidos pelo sujeito
passivo é deficiente ou insuficiente
i. PRP: essas manifestações de fortuna têm de ser adequadas – têm de ser
adequadas a uma revelação estrutural da capacidade contributiva (da
força económica do contribuinte)

Há estas 2 situações previstas na lei que se aplicam quer a sujeitos passivos de IRS quer a sujeitos
passivos de IRC.
➢ Casos de uma situação de non-liquet em que a tributação conforme à declaração
apresentada pelo sujeito passivo fracassa
o Fisco não consegue apurar o rendimento real pois a declaração do contribuinte
ou não foi apresentada, ou foi apresentada com insuficiências, ou não foi
acompanhada pelos instrumentos exigidos por lei, ou há manifestações de

93
Temos de ter sempre presente que dada a exigência do art. 104º/2 estes métodos são de aplicação
excecional.

127
Sebenta Fiscal – 2018/2019 DNB

fortuna que não se consegue comprovar como foi obtido o rendimento para a
sua aquisição.

A aplicação destes métodos implica uma diminuição da medida da prova por parte da AT (art.
74º/3 LGT) e a limitação do princípio do inquisitório e da verdade material (art 58º, 99º/1 LGT).
➢ Aplicação de métodos indiretos só se justifica quando existe impossibilidade por parte
da AT segundo os métodos diretos e não deve existir nenhum juízo de mérito por parte
da autoridade tributária – são factos objetivos.

Tributação é feita nos termos do art. 90º LGT


• Art. 90º tem que quando AT aplica métodos indiretos deve usar o maior número de
alíneas para se aproximar da tributação do rendimento real94.
o Deve procurar aplicar-se o maior número de alíneas ao caso concreto – não é
opção do Fisco, há margem de livre apreciação mas pode questionar-se a
legalidade da aplicação do artigo se somente aplicar uma alínea (nos termos do
art. 104º/2 CRP).

Pode haver também uma tributação pelo rendimento padrão – rendimento de referência que
orienta a Administração tributária para o desvio no caso concreto.
➢ Sujeito passivo pode sempre explicar e justificar.

Os métodos indiretos são uma solução de segundo ótimo, justificando-se apenas quando
violados os deveres de contabilidade, pois estes são o pressuposto e condição da tributação do
rendimento real

Tributação do Rendimento Real e as Tributações Autónomas


As tributações autónomas incidem sobre a despesa, mas são uma exceção à tributação do
rendimento real e a sua consagração tem de ser justificada.

As despesas não documentadas são a figura que ocupa a lógica da tributação do rendimento
real (tendo absorvido a antiga categoria de despesas confidenciais).
➢ A autonomização das despesas não documentadas tem razões históricas.

Hoje em dia, a ausência de prova documental exigida para efeitos fiscais, implica não apenas
a sua indedutibilidade mas também a sua tributação autónoma.
➢ Esta é uma figura jurídica criada pelo legislador português que não tem muita
semelhança com outros regimes de Direito Comparado, sendo utilizada para tributar
rendimentos que não conseguem ser tributados na esfera do contribuinte, dados os
seus contornos variáveis, difíceis de caracterizar e voláteis.

94
Primeiro temos de ver se há fundamento para a AT utilizar os métodos indiretos;
Depois vemos como a AT aplicou esses métodos indiretos
➢ Dos elementos do art. 90º LGT ainda temos uma indicação que a AT vai tentar perceber qual a
situação exata a ser tributada, dentro dos seus limites e recursos
o AT não pode impor uma percentagem, tem que tentar chegar o mais perto possível da
tributação real.

128
Sebenta Fiscal – 2018/2019 DNB

➢ Esta tributação, afasta-se da tributação do rendimento real e é um regime específico


português que não tem paralelo noutros ordenamentos – na Bélgica há regime residual
que se assemelha a este.
o Legislador fiscal foi introduzido várias situações neste quadro por lhe ser mais
fácil tributá-las.
o APD: grande parte delas são inconstitucionais

Imposto cedular, de taxas proporcionais ou progressivas que incide sobre despesas do sujeito
passivo.
➢ Formalmente incluída nos códigos de impostos sobre o rendimento mas formalmente
não corresponde a rendimento. Incide sobre despesas do sujeito passivo.

Este é um imposto inserido no CIRS (art. 73º) e no CIRC (art. 88º) mas que é diferente do IRS e
IRC
➢ É um imposto cedular, de taxa proporcionais ou progressivas, incidindo sobre despesas
do sujeito passivo.
o Estas despesas constituem rendimentos que presumivelmente não
conseguiram ser tributados na esfera do contribuinte (ou porque não se sabe
quem é, dada a não documentação; ou porque existe dificuldade em separar a
esfera privada da profissional).
o Existe, então, uma responsabilização tributária do sujeito passivo que paga os
rendimentos.

Qual a razão de ser deste instituto?


Difícil justifica-lo perante a CRP – a existência desta categoria não é fácil de justificar perante os
princípios do Direito Fiscal da tributação do rendimento real e do rendimento líquido, bem como
da capacidade contributiva – mas cujas motivações subjacentes à sua introdução são:
1. Despesas correspondem a rendimentos que não conseguem ser tributados na esfera
do contribuinte – despesas confidenciais, que não se sabe a quem foram pagas (sendo
então tributadas na esfera de quem as pagou).
• Se estas obrigações contabilísticas não forem cumpridas, identificando quem
recebeu, devia somente prever a indedutibilidade.
• Lei vai mais longe pois além de eles não serem deduzidos, a lei tributa quem
pagou.
2. Despesas difíceis de distinguir entre a esfera empresarial ou profissional (fronteira é
difícil de traçar) – despesas de representação, encargos com viaturas ligeiras de
passageiros.
• Lei tributa autonomamente.
• Responsabilização tributária do sujeito passivo que paga os rendimentos95.

A evolução deste regime tem demonstrado uma finalidade penalizadora, a par de uma razão
estritamente fiscal, relacionada com a não dedutibilidade
➢ Subjacente a este regime está uma finalidade sancionatória – devia ser alheia à
tributação, pois não faz parte do conceito de tributo/imposto, mas é expressamente
referida pelo TC 18/2011

95
APD: paralelo a este instituto porque a responsabilidade tributária é quanto a dívidas de outrem. Aqui
é mais ou menos o mesmo.

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Sebenta Fiscal – 2018/2019 DNB

o APD: infelizmente a jurisprudência deturpa o conceito de imposto e as suas


finalidades. Ao ter finalidades sancionatórias afasta-se das características do
imposto.

STA e TC reconhecem que esta é uma forma de tributação, formalmente inserida no CIRS e CIRC,
mas que não têm a ver com a tributação do rendimento e sim com a tributação de certas
despesas.
➢ Mas, o TC (18/11) aponta uma finalidade “penalizadora” e de “desmotivar práticas”
que podem envolver situações de ilicitude penal ou de menor transparência fiscal.
o Associa a uma finalidade antiabuso.
▪ APD: argumento interpretativo ilegítimo no Direito Fiscal.

Finalidade antiabuso – como se não consegue tributar o beneficiário dos rendimentos vai-se
tributar quem efetua a despesa, desincentivando essa despesa.
➢ Quem fica submetido à tributação autónoma é quem efetua a despesa – se despesa não
foi efetuada não se transmitiu rendimento para um sujeito em que não se consegue
apurar e tributar.
o No contexto de violação de dever parece que tem finalidade de repreensão –
sanção pode ser avançada com maior aquidade do que nos outros casos (ex:
não faz sentido a lei repreender a aquisição de uma viatura ligeira ou despesas
de representação – o máximo que se pode fazer é limitar a dedutibilidade)

A tributação autónoma é a consequência de uma violação de um dever, tendo aí uma


finalidade de repreensão.

Mas a tributação autónoma de despesas não documentadas pode resultar numa violação do
princípio do ne bis in idem, pois art. 117º RGIT já contém uma contraordenação que versa
sobre o incumprimento do dever de entrega, exibição ou apresentação de despesas
documentadas.

Esta tributação autónoma das despesas não documentadas pretende compensar o pagamento
oculto de rendimentos a outro sujeito passivo não identificável pela AT.
• É uma forma de recuperar a receita que não consegue ser tributada na esfera do
beneficiário.
• Esta tributação assenta numa presunção inilidível de abuso.

Tributação autónoma dos art. 88º CIRC e art. 73º CIRS cria uma responsabilidade tributária e
por isso não assenta nos métodos diretos de tributação (não assenta na tributação do
rendimento acréscimo ou rendimento real líquido).

130
Sebenta Fiscal – 2018/2019 DNB

➢ Não se trata apenas da tributação da despesa na esfera do devedor do rendimento,


tributando-se também o rendimento, mas na esfera do substituto responsável
tributário.
➢ Mas isto também não constitui um método indireto de tributação, pois não se está a
tributar o rendimento do sujeito passivo que incorre naquelas despesas não
documentadas.

Há esta tributação porque é difícil traçar a fronteira entre o business purpose e outros, pelo que
assim se garante alguma tributação apesar de tudo.

APD: regime da tributação autónoma devia ser eliminado – surgiu por facilidade de
arrecadação de receita, mas essa não pode ser o fundamento dos impostos.
➢ Num EDD nunca podemos dizer que um imposto se justifica porque o Estado precisa de
arrecadar receitas, tem de o fazer dentro dos limites constitucionais e seus princípios.

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Sebenta Fiscal – 2018/2019 DNB

Imposto Rendimento Pessoas Coletivas (IRC)


Art. 104º CRP exige que a tributação das empresas incida fundamentalmente sobre o seu
rendimento real.
→ Código do IRC de 1988 veio satisfazer esta exigência constitucional e colocar o sistema
fiscal português a par dos impostos societários dos Estados da OCDE e da CEE.

Objeto e Sujeitos Passivos


Art. 2º CIRC – sujeitos passivos são as pessoas coletivas, de direito público ou privado, com sede
ou direção efetiva em território português96.
• Também se inclui as entidades sem personalidade jurídica não tributáveis em IRS e sem
transparência fiscal (heranças jacentes e etc.).
o São situações irregulares.
o Tributa-se para que estas não sejam beneficiadas face aos contribuintes que
constituíram as sociedades de acordo com todas as regras.

RESIDENTES:
• para aqueles que desenvolvem atividades empresariais o objeto do IRC é o lucro
tributável;
• para aqueles que desenvolvem atividades não empresariais são tributados pelo
rendimento global (que corresponde à soma algébrica das categorias do IRS).

NÃO RESIDENTES: temos de distinguir dos que têm Estabelecimentos Estáveis em Portugal e os
que não têm
• Estabelecimentos Estáveis – tributação incide sobre o lucro (equiparado aos residentes
dado a ser atividade com caráter de permanência).
o Tributam-se os rendimentos que não sejam tributáveis em IRS
o Se houver instalação fixa através da qual é exercida a atividade de uma
sociedade não residente (ex: sucursal), ou se houver uma sociedade que envia
um dos seus trabalhadores por um período limitado no tempo, então também
esse não-residente é tributado em IRC se não for uma situação que caia no
âmbito do IRS. Sabemos isso se se tratar de uma sociedade noutro Estado, que
vai ser tributada como não-residente em território português. Temos de
atender ao estatuto jurídico do não residente à luz do nosso código.
• Estabelecimentos Não Estáveis – tributação é sobre rendimentos das diferentes
categorias por remissão para o CIRS

96
O que interessa é a sede estatutária – sendo constituída com a sede principal em Portugal ela é
residente.
➢ Mesmo não tendo a sede, se desenvolver a sua atividade principal em Portugal ela é considerada
como residente.

Ex: pode acontecer que haja processo de investigação que ocorre em Portugal e que gera uma patente
(ou algo equiparado). Sociedade vai procurar regime fiscal mais favorável e regista a patente no Panamá
ou Irlanda. Com esse registo, a invenção resultante da investigação vai ser considerada residente no
Panamá/Irlanda, tendo lá a sua sede. Mas como a investigação que originou a patente foi em Portugal,
Portugal é que terá direito a tributar os rendimentos dessa patente pois a atividade efetiva foi em
Portugal.

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Sebenta Fiscal – 2018/2019 DNB

Determinação da Matéria Tributável


Base de imposto: art. 3º CIRC
➢ Lucro é apurado nos termos do art. 3º/2 e 17º
o Atende-se ao balanço final
o Há, portanto, uma dependência parcial do IRC da contabilidade da empresa97
▪ Dependência é parcial pois a parte final do art. 17º/1 esclarece que a
contabilidade da empresa é o ponto de partida mas o CIRC pode adaptar
e modificar.
▪ Lucro tributável pode ser diferente do lucro contabilístico.
• Contabilidade é para espelhar com rigor a situação patrimonial
da empresa;
• Correção do CIRC é para melhorar a igualdade entre
contribuintes.

Tributa-se o Rendimento Real – conceito normativo que traduz métodos diretos na tributação
do rendimento líquido – art. 17º CIRC98
➢ Ocorre quando há contabilidade organizada e cabe ao sujeito passivo fazer a liquidação
na declaração periódica de rendimentos (autoliquidação), com base na matéria
coletável aí apresentada.

Art. 23º CIRC prevê a dedutibilidade de gastos e perdas incorridos ou suportados pelo sujeito
passivo para obter ou garantir os rendimentos sujeitos a IRC – têm de ser documentados e
incluem várias situações.
Art. 23º-A CIRC consagra os encargos não dedutíveis

Pode haver uma limitação à dedutibilidade de gastos de financiamento – limites podem ser
justificados de forma orientar o comportamento das empresas no sentido de recorrerem ao
mercado de capitais (evitando o sobre-endividamento – para evitar um tratamento mais
vantajoso dos juros em relação aos dividendos); combater o abuso fiscal; garantir uma simetria
na dedução de gastos e correspondente tributação (pois esta regra é especialmente dirigida ao
endividamento externo das empresas).
→ Art. 67º

Reporte de prejuízos é permitido com base na mesma lógica de simetria entre dedução de
prejuízos e tributação do lucro.
Estabelecendo limites ao reporte de perdas os Estados aceitam participar das perdas das
empresas (não as tributando), por um número determinado de anos.
→ Art. 52º

Na falta de apresentação da declaração, a liquidação é feita com base no valor anuaL da


retribuição mínima mensal ou, quando superior, a totalidade da matéria coletável do exercício
mais próximo que se encontre determinada, ou na falta destes elementos, com base nos
elementos de que a administração fiscal disponha.

97
Se esta base não for idónea para calcular utilizam-se os métodos indiretos
98
Para APD: só é tributação do rendimento real quando tal ocorre com base na declaração de
contabilidade das empresas e não quando se recorre a métodos indiretos.
Para PRP: mesmo com métodos indiretos ainda é tributação do rendimento real – atende-se à
substância e não à forma.

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Sebenta Fiscal – 2018/2019 DNB

➢ Alguns sujeitos passivos de IRC podem optar pelo regime simplificado de determinação
da matéria coletável
o Residentes não isentos nem sujeitos a um regime especial de tributação, que
exerçam a título principal uma atividade de natureza comercial, industrial ou
agrícola e que não ultrapassem um certo montante líquido de rendimentos –
art. 86º-A

O IRC tem uma incidência ampla e não cedularizada, pelo que uma menos-valia pode engolir o
lucro – entende-se que esta menos-valia pode ser em fraude para não se ter matéria coletável
que faça funcionar a norma de incidência.
➢ Admite-se reporte para o mesmo ano

IRC não funciona em ótica de caixa – há ligação entre os exercícios.


Ex: proveito das máquinas compradas vão entrar ao longo de 10 anos (período de vida útil), pelo
que ao longo de 10 anos vai haver amortização – art. 29º
• O que se pagou vai ser levado a custo ao longo de 10 anos
• O custo de depreciação (art. 31º) está regulado em decreto regulamentar – que divide
o custo do bem pelo período de vida útil.
A aquisição de um computador que tem um período de vida útil de 4 anos faz com que em cada
ano só se leve a custo 25% da aquisição desse computador.

Art. 87º e ss. LGT


Sujeitos passivos de IRC podem ser ainda tributados por métodos indiretos tendo em conta os
elementos constantes do art. 90º

Para não ser inconstitucional só pode ocorrer em casos e condições expressamente previstos
na lei, designadamente na impossibilidade de apuramento do rendimento real, o que significa
que ela só pode ocorrer quando o contribuinte violou os seus deveres formais de modo a
impossibilitar a tributação segundo a contabilidade organizada, ou quando apresentou um
acréscimo patrimonial não justificado.

Taxa
2017: 21%
➢ Deveria ser única, mas introduziram-se taxas diferentes nos últimos anos

134
Sebenta Fiscal – 2018/2019 DNB

- Caracterização do Sistema Fiscal Português99: Outros Impostos -


Outras referências do art. 104º CRP – impostos sobre o consumo e sobre o património

Imposto sobre Valor Acrescentado (IVA)


Imposto geral sobre o consumo100

No final do séc. XIX já havia uma espécie de IVA num Estado federado dos EUA.
IVA foi criado em França e adotada pelo Tratado de Roma como imposto a ser aplicado por todos
os Estados-Membros da UE.
É imposto de sucesso e tem vindo a ser implementado em cada vez mais países do mundo.
➢ Imposto de grande sucesso e é aquele que gera mais receita em Portugal (38,2% em
2015).
o IVA gera mais receita que o IRC (em vários Estados da UE, como Portugal).
o Na Europa tem aumentado o IVA pois os impostos diretos têm vindo a diminuir
– devido a dificuldade em cobrar IRC e concorrência fiscal entre Estados.
o Compensa a diminuição de receitas nos outros impostos diretos.

o Consumo é imóvel, ao passo que a tributação direta sobre as empresas é


quanto a fatores móveis, que se deslocam para outros Estados.

o À partida IRS e IRC seriam mais justos – impostos diretos incidem sobre
situações em que é mais fácil verificar a capacidade contributiva.
▪ IVA não consegue prosseguir objetivos de justiça.

Imposto de base alargada, sobre a venda de bens e incluindo pelo menos o estádio de
manufatura, com sistemática creditação do imposto cobrado sobre bens comprados como
inputs – excetuando os bens de capital – e contra os devidos outputs
➢ Definição FMI

Imposto plurifásico – incide sobre as diferentes fases de produção


Imposto indireto – incide sobre o consumo (manifestação indireta de riqueza)
Imposto de obrigação única – incide sobre factos tributários instantâneos

99
Sistema Fiscal Português começou a ser estruturado em 1985 como exigência constitucional e da
Comunidade Económica Europeia.
• No final dos anos 80 surgiu a primeira reforma fiscal – iniciada em 1985 com a introdução do IVA,
continuada em 1988/89 com a aprovação do IRS e IRC.
• No final dos anos 90 surge a LGT e o Código de Procedimento e Processo Tributário.
• No início dos anos 2000 surge o RJIT.
• Mais recentemente, em 2011, surgiu o RJAT (Regime Jurídico da Arbitragem Tributária).

A tributação do rendimento, do património e do consumo permite atingir todas as


manifestações de riqueza.

100
Os Impostos sobre o Consumo são divididos num imposto geral sobre o consumo (IVA) e impostos
especiais sobre o consumo.

135
Sebenta Fiscal – 2018/2019 DNB

Incide sobre todas as fases do processo produtivo (todas as transações económicas a título
oneroso), e atinge os atos de consumo através do método subtrativo indireto (liquidação e
dedução do imposto em cada fase do circuito económico), das faturas e do crédito de imposto.
• Isto significa que sobre cada fase do processo de produção vai se deduzir IVA e deduzir
os gastos que se teve para se acrescentar valor.
o Receita que entra menos os gastos necessários para adicionar o valor.
• É o consumidor que paga o preço total.

Sujeito passivo não é o consumidor, pois ele não entra na relação jurídica com a autoridade
tributária – o consumidor é o contribuinte de facto.
➢ Sujeito passivo não é contribuinte, pois quem suporta o imposto é o consumidor final.

Técnica que só existe no IVA – técnica muito sofisticada que permitiria controlar a evasão fiscal
pois evita que um setor de atividade fuja aos impostos.
• Problema é que na prática só funciona com muita fiscalização da AT
o Quando não se consegue permanentemente estar a fiscalizar, o IVA vai implicar
uma grande perda de receita fiscal (há proteção interna dos setores e se
nenhum passar fatura então não há pagamento do IVA).
o Emissão de fatura é um pressuposto para o bom funcionamento do IVA.
• Depende da boa organização da AT e dos ministros responsáveis pela pasta da
fiscalidade.

Objeto do Imposto
Definido no art. 1º CIVA e a nível interno dependem da qualidade do sujeito:
→ estão sujeitas a imposto as transmissões de bens e as prestações de serviços efetuadas
em território português e a título oneroso, desde que tais transações sejam efetuadas
por um sujeito passivo.

Sujeitos Passivos do Imposto


• Pessoas singulares ou coletivas que exerçam uma atividade empresarial;
• Pratiquem ato empresarial isolado, em território nacional ou não;
• Pratiquem uma operação sujeita a IRS ou IRC e etc.

Não são sujeitos passivos de IVA o Estado e outras pessoas coletivas de direito público que
realizem operações tributáveis em IVA.

Neutralidade do Imposto
Pressupõe que não haja isenções e quanto menos taxas houver, menor o impacto nas decisões
empresariais e consequente neutralidade do imposto.

IVA deve ser imposto Neutro – é assim que nasce, definido e configurado.
➢ Ou seja, por ser imposto indireto não devia estabelecer a diferença entre setores, pois
tal introduz distorções no mercado
o Estado não devia privilegiar certas atividades em função de outras.

Neutralidade devia ser assegurada por uma taxa única (Nova Zelândia, Austrália e Taiwan)

136
Sebenta Fiscal – 2018/2019 DNB

Imposto é neutro se não tiver impacte nas decisões comerciais (em sentido amplo) – decisões
sobre o tipo de atividade a ser exercida.
➢ Na UE essa eficiência e neutralidade estão abaixo da média
o Mas seria possível desde que o imposto seja configurado dessa forma.

Depende da base tributária


• Temos base hipotética que nos diz que o IVA deve abranger todo o consumo de bens
e serviços
• Temos também uma base real que nos diz que o IVA abrange todo o consumo, exceto
o consumo que está isento e aquele que está sujeito a taxas reduzidas
o Sempre que temos taxas reduzidas ou isenções acabamos por ter uma base real
que é muito mais baixa do que a base hipotética.

APD: A diferença entre a base real e a base potencial é justificada, em alguns casos, por
objetivos sociais ou redistributivos, conduzindo à diferenciação de taxas do imposto e à
isenção de entidades do setor público ou de entidades de caridade (isenção de mérito).

Portanto base potencial é alargada e neutra.


➢ A base real é retirar dessa base hipotética certas situações e corresponde àquilo que os
Estados efetivamente conseguem cobrar

Legislação introduz esta diferença devido a:


A. Desafios internos – distorções à concorrência (em Portugal ou na UE); falta de
neutralidade que resulta da fraude fiscal (há perda de receita que reduz a base real face
à base potencial)
B. Desafios externos – custos de cumprimento na própria UE (quanto a importações)

No IVA há várias áreas problemáticas:


• Exclusões da base fiscal – à luz do principio da neutralidade não deveria haver
exclusões, mas, excluem-se certos produtos:
o para prosseguir objetivos sociais (lei tem em vista objetivos sociais quando os
exclui da tributação, tirando-os da base hipotética) – isenções de mérito
o porque há certos serviços que são muito difíceis de tributar (há casos em que é
difícil desagregar as operações financeiras101)
Ex1: imposto sobre as transações financeiras – imposto não produz resultado e
vai ter repercussões nas pessoa que fazem transações. No final, em termos
económicos, não incidiria sobre as instituições financeiras (que se visa tributar
em IVA), mas sim sobre o consumidor. Não alcança os resultados.
Ex2: Serviços Financeiros e de Seguros; Propriedade Imobiliária; Jogo

O mesmo vale para a diferenciação das taxas


➢ Sempre que lei introduz uma diferenciação, introduzi uma distorção.

Mas sem isto há uma a regressividade do IVA

101
APD: argumento falacioso porque há países que tributam as operações financeiras em IVA, UE também
o poderia fazer

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Sebenta Fiscal – 2018/2019 DNB

➢ Se tivéssemos uma taxa única no IVA, havia neutralidade, mas, como todos os
consumidores pagariam o mesmo imposto independentemente da capacidade
contributiva significava que os contribuintes com maior capacidade contributiva
estariam a pagar um menor imposto do que aqueles com menor capacidade
contributiva.
o IVA totalmente neutro seria regressivo porque não tinha em conta capacidade
contributiva.

APD: argumento falacioso porque não compete ao IVA prosseguir objetivos de redistribuição
• Argumentos estão a ser introduzidos no imposto errado – não há esta lógica de justiça
redistributiva no IVA.
o Basta este aspeto para se assegurar que não há uma inconstitucionalidade.
• Questões perdem racionalidade porque são discutidas a nível político

Único argumento que pode ter acolhimento é o facto de ser muito difícil atualmente arrecadar
receitas em matéria de imposto societário dada a livre circulação de capitais
➢ Pelo que se vai buscar receita fiscal a outros impostos (ao IVA e impostos estáticos do
património) – há uma compensação.
o E já que há essa compensação então tem de se lhe dar uma feição mais
redistributiva.
▪ APD: pode fazer sentido quanto a bens essenciais mas é discutível
noutros

Taxas do IVA
Este imposto é harmonizado ao nível da UE, que mantém um sistema de taxas múltipla –
permite uma taxa normal (não inferior a 15%) e outras mais reduzidas.
➢ Regras deixam muita margem de liberdade aos Estados-Membros.

IVA europeu tem 3 taxas, consagrado na Diretiva da UE


• Consagra mínimo de 15% para a taxa normal
• Consagra mínimo de 5% para a taxa reduzida – há 22 itens que podem estar sujeitos a
esta taxa (Estados optam)
• Ainda há possibilidade de taxa zero

IVA europeu é um IVA que não é recomendável como modelo para fora da UE – as 3 taxas
destroem a neutralidade do IVA
➢ Introduz fator de progressividade em imposto que não deve ter essas preocupações
(que está ligada à prosseguição de justiça fiscal).
➢ Introduzem juízos valorativos que não devem estar associados ao IVA – todas as
distinções jurídicas vão gerar distorções. Ex: touradas

Em Portugal há 3 taxas do IVA:


• Taxa Reduzida – para bens, serviços e importações consideradas essenciais (6%)
• Taxa Média – para bens alimentares, combustíveis, energia renovável e outros afins
(13%)
• Taxa Normal – para todos os restantes bens, serviços e importações (23%)

138
Sebenta Fiscal – 2018/2019 DNB

Nas regiões autónomas são mais baixas.


➢ Reserva de lei competencial dá poder de adaptação às Regiões Autónomas. Esse poder
de adaptação pode ser enquadrado no fenómeno de concorrência fiscal.

Há problemas da introdução de regimes diferenciados


• Introduz dificuldades interpretativas, aumentando a complexidade e a incerteza.
o TJUE já teve vários casos sobre isto
▪ Mais famoso foi sobre a definição de “Batata”. Batatas fritas estão
sujeitas à taxa reduzida. As Pringles estarão? É que eles não são batata,
mas sim derivado de batata. Pode ser sujeito à taxa mínima?
▪ Marks & Spencer – discutia-se se era bolo ou biscoito
• Estimulam o planeamento, abuso e fraude fiscal (TJUE, C-419/02, BUPA)
o Sempre que temos atividades isentas vamos estar a fomentar um planeamento
para que certos contribuintes e certas atividades caibam nessa isenção.
o Este planeamento fiscal tem acontecido especialmente quanto às atividades de
mérito (saúde e educação), introduzindo distorções económicas e eventual
perda de receitas.
o Ex: devido a estas distinções do IVA, na saúde há parte de atividade isenta e
parte não isenta – num hospital privado o que diz respeito à atividade de saúde
está isenta, o que diz respeito a alojamento e refeições não está isento. Em
termos de organização para pagamento do imposto tem de ser feita essa
distinção, que é difícil quanto aos bens mistos. Eletricidade do hospital não dá
para perceber a qual deles se aloca.
• Originam distorções económicas
• Aumentam custos de cumprimento e administrativos
• Problema com as isenções incompletas do art. 9º CIVA – justificados no sentido de que
os fornecimentos isentos são menos onerosos para o consumidor final.
o Consequências variam consoante as atividades sejam ou não intensivas em
trabalho.

Taxas Reduzidas aplicadas a Serviços Intensivos em Trabalho


Mais um aspeto que introduz distorções e afeta a neutralidade do IVA
Ex: cabeleireiros, limpezas

Objetivo é diminuir o mercado informal e trazê-lo para a legalidade e o mercado formal,


havendo tributação.
• Também se fomenta o emprego.
• Não basta uma taxa reduzida de IVA, tem de haver um controlo da autoridade tributária.

Em 2003 a Comissão Europeia veio dizer que a redução do IVA não tem efeitos no preço ao
consumidor, não aumenta o emprego nem reduz o mercado informal.
➢ Discussão da redução para as atividades culturais e outras não devia existir –
consumidor não vai beneficiar em nada quanto a essa redução; ele suporta o mesmo
custo e há é mais margem de lucro para o produtor.

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Sebenta Fiscal – 2018/2019 DNB

Conclusão
É muito difícil simplificar o IVA europeu e seria mais simples criar de novo todo o imposto, desde
o início, com uma taxa única.
➢ APD: isto não vai acontecer na UE

Taxa do IVA vai aumentando, devido a não se conseguir cobrar IRC, mas também por se irem
introduzindo várias taxas de isenções.

Mas o que são prestações isentas?


Aquelas que não suportam o imposto no output
➢ Pode haver isenções sem crédito do imposto
o Ex: hospital compra equipamento e paga imposto; mas depois não o pode
cobrar ao consumidor porque ele está isento do IVA
o Nas atividades de mérito, quem desenvolve a atividade vai funcionar como
consumidor final, suportando os custos do IVA e não o podendo repercutir no
verdadeiro consumidor final.

140
Sebenta Fiscal – 2018/2019 DNB

Tributação sobre o Património

Os impostos gerais sobre o património têm a função principal de controlo102 dos impostos sobre
o rendimento das pessoas singulares e, por essa razão, por serem estáticos e periódicos, a sua
taxa é baixa a alíquota tem de ser muito baixa para não atingir a fonte da riqueza.
➢ Em Portugal não existe nenhum imposto geral sobre o património e somente existem
impostos parcelares.
o Sousa Franco tentou introduzir para contribuir para a igualdade entre os
cidadãos, dando abrigo à exigência constitucional.
o Teria funções redistributivas.
➢ Não foi criado devido à livre circulação – imposto geral implicava tributar bens
mobiliários e imobiliários o que levava a fuga de capitais para o exterior.
➢ Havia também sigilo bancário em muitos dos Estados da OCDE – não era possível obter
informação sobre riqueza situada no exterior.
➢ Imposto destinado ao fracasso e que não atingia a sua função.

Têm vindo a ser abandonados:


• Dificuldade de tributar património mobiliário
• Determinação do valor dos bens é arbitrário
o Valores mobiliários não têm um critério satisfatório para avaliar a sua riqueza
o Ex: ações – o valor é o médio? No início do ano fiscal? No final? É sempre um
critério arbitrário pois pode haver uma alteração drástica nesse valor.
• Provoca distorções quanto à avaliação da capacidade contributiva.
o TC Alemão, 1995, declarou inconstitucional o imposto geral sobre o património
que existia na Alemanha – nessa sequência vários outros Estados aboliram.

Se estamos sujeitos à tributação do património imobiliário, qual a função que este imposto
serve?
APD: imposto parcial sobre o património não deve prosseguir objetivos redistributivos porque
se o fizer está a fazê-lo de forma arbitrária.
➢ Não se pode aplicar critério de igualdade se o critério é numa base truncada – ser só
imobiliário e não mobiliário afeta a igualdade.

IMI
Imposto Municipal sobre Imóveis incide sobre o valor patrimonial tributário dos prédios
rústicos e urbanos situados no território português, constituindo receita dos municípios onde os
mesmos se localizam.

102
Permite controlar a declaração de rendimentos se aquilo que é declarado corresponde ao património
que é detido pelo sujeito.
➢ Se houve discrepância é possível ouvir o sujeito passivo e questionar qual a fonte dessa riqueza
e etc.

Função é de controlo, que contribui para uma função redistributiva – não é exercida diretamente pelo
imposto geral mas complementa os impostos pessoais.

141
Sebenta Fiscal – 2018/2019 DNB

Taxas do IMI são utilizadas para prosseguir múltiplas finalidades fiscais e extrafiscais mas não
prosseguem objetivos redistributivos pois tal só poderia ser prosseguido por um imposto geral
sobre o património e não por impostos parcelares.

Durante a crise financeira alterou-se o Imposto de Selo que agravou o IMI


➢ Este imposto não foi declarado inconstitucional
o APD: discorda – legislador está a tributar a propriedade de prédios urbanos
(deixando de fora prédios rústicos) e na tributação da matéria tributável fazia
uma avaliação segundo/aceitando o regime de propriedade horizontal. Ex: tinha
várias frações e cada uma inferior a 1 milhão, mesmo se a soma fosse maior de
1 milhão não se tributava
o A lei estava estatuída como avaliando cada um dos prédios autonomamente
o Esta forma de cálculo é uma forma arbitrária – se queremos tributar o valor
patrimonial segundo um critério de capacidade contributiva não se pode
discriminar.
▪ E há várias discriminações (mobiliário vs. imobiliário; escolha de objeto
de tributação são os prédios pelo que o critério de comparabilidade não
pode ser um prédio autonomamente considerado).

Situação foi corrigida com o adicional ao IMI


Já não é verba do imposto de selo e sendo agregada ao IMI já se avalia o valor total dos prédios
– reduziu-se/minimizou-se o problema discriminatório que tinha sido criado pela verba 28 do
Imposto de Selo.
• Adicional do IMI foi introduzido em 2017 e incide sobre a soma do valor patrimonial dos
prédios habitacionais ou terrenos para construção em território português de que o
sujeito passivo seja titular em 1 de janeiro de cada ano, e superior a 600 000€.
o STA, 29/3/17, 0593/16: é aplicado sobre a totalidade de imóveis detidos por
um contribuinte
o Pretende conferir a este imposto finalidades redistributivas, mas não o converte
num imposto pessoal.

Chegados ao fim do art. 104º CRP podemos verificar que atualmente há uma destruturação
dos sistemas fiscais.
➢ Devido à globalização o que existe é uma tributação crescente do imobiliário e a nível
do IVA.
➢ Solução deste problema é a coordenação internacional.

142
Sebenta Fiscal – 2018/2019 DNB

PRINCÍPIOS INTERPRETATIVOS E PROIBIÇÃO DO ABUSO

Princípio da Praticabilidade
O Direito Fiscal é um ramo de Direito de atos massa, pelo que se caracteriza pela tipificação
legal, por contraposição à individualização.

A capacidade contributiva individual só pode ser apreendida de forma tipificada – a igualdade


a garantir no resultado da carga fiscal só é possível porque o legislador se orienta pelo caso
regra.
➢ Tipificação significa que o legislador abrange num Tatbestand o caso médio e trata os
casos diferentes de forma igual, segundo este caso médio.

Tipificação é utilizada no método direito de determinação da matéria tributável.

Há situações que podem ser fixadas por Portaria (ex: art. 33º/2 CIRS)
• Casalta Nabais: dada a reserva de lei fiscal e as exigências de determinação, defende
expressamente a tipificação legal, como uma forma recomendável de simplificação da
lei fiscal, considerando-a preferível à tipificação administrativa.

O princípio da igualdade é satisfeito com a utilização da tipificação nas diversas categorias de


normas do Tatbestand sistemático de imposto e serve os interesses de uma aplicação igual da
lei.
➢ As técnicas tipificantes têm de se basear em tipos médios ou frequentes, de modo a que
haja uma correspondência tão grande quanto possível com a capacidade contributiva
real.

As tipificações legais devem sempre evitar as presunções inilidíveis, de forma a que a


tributação incida sobre a capacidade contributiva e, fundamentalmente, sobre o rendimento
real.
• Art. 73º LGT deve ser interpretado em conformidade com o art. 104º/1 e 2 CRP –
resulta uma proibição de recurso às presunções inilidíveis quanto à obtenção do
rendimento, i.e., não se pode presumir a existência em si de rendimentos, porque dessa
forma prescinde-se do pressuposto básico da capacidade contributiva
o = TC 348/98

Mas o legislador pode recorrer legitimamente às técnicas presuntivas, se forem violados os


deveres de cooperação dos sujeitos passivos, desde que não se ponha em causa a
predominância da tributação do rendimento real.

Interpretação das Leis Fiscais


A interpretação da Lei Fiscal segue as regras gerais de interpretação – art. 9º CC é aplicável à
interpretação das leis fiscais internas, ex vi art. 11º/1 LGT
• Interpretação das normas tributárias faz-se nos mesmos termos que as restantes
normas jurídicas.

Mas há limites/especificidades à interpretação geral da lei:

143
Sebenta Fiscal – 2018/2019 DNB

• Princípio da legalidade fiscal na reserva de lei competencial + princípio da tipicidade =


proibição tendencial da analogia.
o Interpretação em Direito Fiscal tem como limite o sentido possível das palavras
no contexto em que são utilizadas.
o À partida, a reserva de lei proíbe a integração analógica no Direito Fiscal,
permitindo-se apenas uma interpretação extensiva, mas, se não for possível
integrar nas palavras não se vai à analogia.
o Casalta Nabais: aceita interpretação/aplicação analógica de Direito Fiscal

o É difícil perceber qual o limite da interpretação extensiva e se a interpretação


segundo a substância económica já não foge do elemento literal.
▪ APD: mesmo sendo difícil, é possível encontrar essa fronteira –
aplicação analógica é proibida

Toda a interpretação deve ser conforme à Constituição e ao Direito da União Europeia

Art. 11º/2 LGT – Interpretação Autónoma


Os conceitos importados de outros ramos do Direito têm de manter o sentido originário ou ser
interpretados autonomamente segundo os princípios e fins da norma fiscal em causa – parte-se
do sentido originário e verifica-se se coincide com os fins da norma fiscal e se a interpretação
teleológica se afastar do sentido originário, então a lei fiscal deve ser interpretada
autonomamente.
➢ Parte-se do conceito originário mas o resultado interpretativo pode ser diferente, se o
espírito da lei fiscal ou pensamento legislativo objetivo ditar um resultado diferente.

Art. 11º/3 LGT – Interpretação segundo a Substância Económica dos Factos


Interpretado em conjunto com o art. 11º/2 LGT

Critério de interpretação que é uma concretização da interpretação teleológica aplicada ao


Direito Fiscal – autonomiza-se a interpretação das leis fiscais e resolve-se as dificuldades que os
conceitos jurídicos importados colocam à interpretação da lei fiscal.
➢ Doutrina com origem na Alemanha e que já assumiu diferentes configurações –
pretende ter em conta a capacidade contributiva e não se deve fazer uma interpretação
meramente formal e deve atender-se à substância da situação.

Ex: residência das pessoas coletivas


• CIRC diz que pessoa é residente se a sede estatutária está em território português a sua
direção efetiva – prevalece este último conceito.
• Prevalece o conceito de substância económica – deixa para trás a consideração do
Direito Societário da sede estatutária e utiliza-se o critério da sede real e efetiva.
o Isto concretiza o princípio da prevalência da substância económica.
• Hoje em dia isto é muito difícil de ser verificado.
o Empresa mais produtivas têm intangíveis de elevado valor – muito difícil saber
onde está a ser desenvolvida a atividade relativa a bens intangíveis.

144
Sebenta Fiscal – 2018/2019 DNB

ELISÃO/ABUSO FISCAL, EVASÃO E FRAUDE FISCAIS, PLANEAMENTO FISCAL


AGRESSIVO
Há casos que não estão sujeitos a imposto (ou são reduzidos) devido a diversos fatores

Planeamento Fiscal e Moralidade Fiscal


Se se optasse por impostos paretianos (de soma fixa = lump-sum taxes) ou de capitação, seria
possível evitar o Planeamento Fiscal mas a ausência de considerações de justiça tornaria os
sistemas fiscais dos Estados de Direito inconstitucionais.
➢ Todavia, sempre que os sistemas introduzem considerações de justiça fiscal ou
extrafiscais criam-se distorções à neutralidade e incentiva-se o planeamento fiscal.

Planeamento fiscal enquadra-se nas liberdades de iniciativa económica e da empresa (art. 61º,
80º/c e 86º CRP).
➢ É lícito – a compatibilização entre os princípios constitucionais da liberdade de iniciativa
e económica da empresa e os princípios constitucionais materiais dos art. 103º/1 e 104º
CRP não põe em causa o planeamento fiscal em sentido próprio.

Moralidade fiscal não é um princípio jurídico, pelo que não pode ser utilizada como princípio
interpretativo da lei fiscal.

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Sebenta Fiscal – 2018/2019 DNB

Lacunas Legais Intencionais e Não Intencionais


A ausência de neutralidade fiscal devido à prossecução de finalidades extrafiscais é
concretizada através de lacunas intencionais. Ex: tributam-se mais-valias decorrentes da
alienação de quotas e isentam-se as mais-valias decorrentes da alienação de ações.
• Estas lacunas intencionais implicam um tratamento diferenciado de rendimentos.
• São uma opção de política legislativa e o parlamento através de lei formal goza de ampla
margem discricionária quanto a essas opções legislativas dentro dos limites do sistema.

As lacunas não intencionais estão relacionadas com a imperfeição da linguagem jurídica,


implicando uma tributação desigual de iguais manifestações de riqueza – não resultaram de
uma deliberação parlamentar mas também gozam da proteção da reserva de lei.
➢ A analogia está proibida, portanto as lacunas não intencionais só podem ser supridas
através de lei formal que as elimine e não por integração analógica.
o São a base para o fenómeno de Elisão Fiscal
o Mas, os conceitos indeterminados não são proibidos nem podem ser – toda a
linguagem jurídica implica, nos casos difíceis, indeterminação

Estas lacunas não intencionais devem distinguir-se das lacunas não intencionais resultantes
da conjugação de dois ou mais ordenamentos jurídicos (disparidades).
• As lacunas não intencionais proporcionam elisão fiscal.
• As disparidades proporcionam dupla não tributação e consequente planeamento fiscal
conducente a esse resultado.

Como se reduzem as lacunas não intencionais103?


• Interpretação segundo a substância económica dos factos
• Utilização de cláusulas específicas antiabuso que reduz âmbito de aplicação de certos
regime regra
• Utilização de cláusula geral antiabuso que averigua a existência de um propósito
negocial subjacente (ou existência de atividade económica subjacente aos atos e
negócios)

Elisão Fiscal = Abuso de Normas Fiscais


Atos ou negócios jurídicos que assumem formas jurídicas que não são abrangidas pelas
normas de incidência ou que evitam certas normas de determinação da matéria tributável.
• Elisão ocorre pois a substância desses atos ou negócios não é conforme ao espírito nem
ao fim da lei.
o Elisão é discrepância entre a letra e o espírito da lei
• Não conformidade pode ser uma não conformidade às normas de incidência ou às
normas de determinação da matéria tributável.
o Esta matéria da elisão fiscal está relacionada com o facto de termos na aplicação
da lei fiscal uma escala em que há comportamentos do contribuinte 100%
conforme à lei (cabe na letra e no espírito da norma) e 0% conforme à lei.
o É que há toda uma zona intermédia em que o contribuinte faz algum
planeamento fiscal para reduzir o montante a pagar.
▪ Esse planeamento pode ser legítimo ou cair na zona do abuso.
▪ Se houver abuso/elisão, a AT vai corrigir.

103
Estas soluções não eliminam as lacunas intencionais nem o devem fazer, dado serem intencionais

146
Sebenta Fiscal – 2018/2019 DNB

As situações de elisão fiscal podem ser resolvidas por interpretação da lei fiscal ou, quando esta
não é suficiente, por cláusulas antiabuso.

Como a lei fiscal deve ser interpretada segundo os critérios de interpretação da lei, nestas
situações o elemento teleológico da norma desempenha uma função valiosa para reconstruir
o significado da lei na sua materialidade e razão de ser.
➢ Mas a lei fiscal não pode ser interpretada com base no princípio da capacidade
contributiva – esse é um princípio constitucional de repartição da carga tributária e a
sua concretização cabe ao legislador, o qual tem discricionariedade legislativa.
o Ou seja, a lei fiscal escolhe os factos a tributar e por isso a finalidade de
arrecadação nunca pode orientar a interpretação da lei fiscal.

STA, 3/5/2000, processo 024585


Alienação de obrigações de cupão zero antes do vencimento ou reembolso, pagos pelo
adquirente ao alienante aquando da transação efetuada, dava origem a juros ou mais-valias?
• Juros estavam sujeitos a tributação.
• Mais-valias estavam isentas de tributação.

Neste caso a requalificação foi feita através da interpretação: eram juros para efeitos fiscais
(apesar de não o serem para o Direito Civil pois ainda não tinham vencido).

Mas havia 2 maneiras de ver a questão:


1) Lei fiscal quando utiliza termo juros está a atribuir-lhe um significado autónomo do
Direito Civil – não são só os vencidos mas também os corridos; está dentro dos limites
de interpretação.
2) Raciocínio anti-abuso – pergunta-se qual a finalidade da lei e qual a finalidade/objetivos
do contribuinte.
• Elemento subjetivo – não nos interessa a intenção do contribuinte no sentido
de dolo e culpa
• Elemento objetivo – temos de atender ao comportamento do contribuinte e ver
se o objetivo dele é meramente fiscal ou não

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Sebenta Fiscal – 2018/2019 DNB

Reação à Elisão Fiscal no ordenamento jurídico português

A elisão fiscal em sentido amplo pode ser colmatada pelas regras de interpretação.
A elisão fiscal em sentido restrito é corrigida pela aplicação de cláusulas antiabuso.
➢ Abuso Fiscal é sinónimo de Elisão Fiscal: significa um comportamento que é conforme à
letra da lei mas desconforme ao espírito e muitas vezes o contribuinte utiliza um
esquema artificial para conseguir os seus objetivos.

CLÁUSULAS GERAIS ANTIABUSO: exigem a verificação da finalidade da lei fiscal onerosa


(elemento normativo), dos meios utilizados para eliminar ou reduzir a onerosidade (elemento
meio) e da intencionalidade do abuso (elemento da finalidade/intenção objetiva).

CLÁUSULAS ESPECÍFICAS ANTIABUSO: prescindem da análise desses elementos e pretendem


controlar comportamentos elisivos cujo resultado é a diminuição das receitas fiscais.

Art. 38º/2 LGT – Cláusula Geral Antiabuso


Tem os elementos típicos das cláusulas antiabuso:
1. Existência de uma vantagem fiscal: elemento resultado;
2. Obtenção dessa vantagem fiscal é contrária à finalidade da lei fiscal: elemento
normativo (interpretação da norma de incidência em causa ou da norma relativa à
matéria coletável);
3. Obtenção da vantagem fiscal é uma das finalidades essenciais das transações:
elemento de finalidade;

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4. Utilização de meios ou esquemas artificiosos/fraudulentos104 cuja verificação


concretiza objetivamente a intenção: elemento meio.

Reação do ordenamento ocorre através da ineficácia dos atos adotados e da requalificação


segundo as normas aplicáveis ao comportamento “típico”.105
➢ Esta noção e requisitos correspondem aos que foram desenvolvidos pela OCDE e pela
jurisprudência do TJUE.

Caso das fusões – pode incorporar se houver “razões económicas válidas”


➢ O controlo que se faz é um controlo anti-abuso – para verificar que o contribuinte não
está a usar as normas fiscais que lhe permite reduzir o imposto somente por razões
fiscais.

Caso da transformação de sociedades por quotas em sociedades anónima devido à isenção de


tributação de mais-valias das ações, que tem de estar associado à forma societária e também a
requisitos de substância económica quanto à detenção de ações.
• A transformação deve trazer vantagens económicas ou financeiras à própria sociedade
além das vantagens fiscais – tem de haver razões economicamente válidas e tem de ser
interpretado como um critério aferidor da finalidade da lei.
• A conversão de quotas em ações podia ter uma finalidade exclusivamente fiscal e não
pode ser vista como abuso, desde que o período mínimo de detenção dos títulos se
tenha verificado106.

Ex: operações de fusão entre empresas.


• Sociedade Foggia fundiu-se com outras 3, e uma das incorporadas tinha prejuízos
avultados.
o Porque é que uma sociedade incorpora uma sociedade com prejuízos?
▪ Para reduzir o valor da matéria tributável.

Só podem fundir-se por razões económicas válidas – conceito indeterminado – se houver estas
razões económicas válidas pode haver uma dedução dos prejuízos.
• Que razões se enquadram aqui? De forma a que autoridade tributária permita deduzir
esses prejuízos?

104
Fradulento = esquemas artificiosos que revelam a ausência de finalidade económica ou comercial
(business purpose test).
105
Escândalos com multinacionais (movimento BEPS – base erosion profit shift) levaram alguns Estados a
aplicar sanções. Ex: Espanha, EUA
106
Lei isentava as mais-valias de ações, como aconteceu durante um tempo no CIRS, para aquelas detidas
superiores a um período de 12 meses – mas não se falava das sociedades por quotas, por isso havia uma
transformação da sociedade.
➢ A pergunta é qual a finalidade da transformação daquela sociedade numa sociedade por quotas
– se for um objetivo só de não pagar o imposto, temos de perguntar se há conformidade entre o
espírito e a letra da lei.
➢ Porque é que o legislador isenta mais valias decorrentes das ações e não das quotas? Há
elemento normativo que temos de apurar para este tipo de atuação do contribuinte.
o Se se tentar atingir só as sociedades anónimas estamos perante lacuna intencional –
planeamento do contribuinte é legítimo.
o Se for não intencional – a letra da lei é cumprida mas o espírito não (pode não ter como
objetivo somente isentar as sociedades anónimas).

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o Sociedade incorporada tem valor intrínseco dado aos seus ativos intrínsecos em
si que são valiosos. Sociedade que faz fusão entende que são recuperáveis e
podem beneficiar a sociedade fundida.
o Se razões forem fundamentalmente fiscais não pode haver dedução de
prejuízos, se forem razões económicas válidas pode.
o Este conceito indeterminado funciona como regra anti-abuso107: permite-se a
dedução dos prejuízos se houver uma substância económica para a operação,
se essa operação não for meramente artificial.

A aplicação do art. 38º/2 não contém uma presunção de abuso, mas cabe ao fisco demonstrar
que a vantagem fiscal foi uma das finalidades essenciais ou principais do negócio ou ato
jurídico (nos termos do art. 63º CPPT).
• Se houver situação de artificialidade o fisco pode requalificar
o Há uma desqualificação e depois uma requalificação

Princípio de Abuso no DUE e Impostos Diretos Não-Harmonizados


O conceito de abuso na UE tem de ser caracterizado pelos seguintes testes cumulativos:
1. Finalidade principal das operações transfronteiriças é a de contornar a aplicação da
legislação de um Estado-Membro para a obtenção de um regime mais favorável noutro
Estado-Membro;
2. Exercício artificial das liberdades fundamentais;
3. Tem de se atender à artificialidade do caso concreto à luz do princípio da
proporcionalidade.

Princípio de Abuso no DUE e Impostos Diretos Parcialmente Harmonizados


É concretizado na Diretiva das fusões, cisões, troca de ativos e permuta de ações.
• Transposto no art. 73º/10 CIRC – norma concretiza a cláusula geral antiabuso do art.
38º/2, havendo como consequência a mera requalificação do negócio sem a aplicação
de qualquer sanção.
• Interpretação é à luz do DUE e se se tratar de um caso em que as operações não tenham
sido realizadas por razões economicamente válidas, tais como a reestruturação ou a
racionalização das atividades das sociedades que nelas participam, compete ao TJUE
interpretar “razões económicas válidas” e já existe jurisprudência sobre o assunto (C-
126,10, Foggia).

É concretizado na Diretiva das sociedades-mães/afiliadas108.

107
APD: São regras complementares às regras de interpretação das leis fiscais.
• Há autores que dizem que não eram necessárias e bastava-se uma interpretação teleológica.
• Elas existem fundamentalmente devido à reserva de lei – contribuinte fica com maior ideia de
como a AT vai aplicar a lei fiscal e quais os limites ao planeamento.
108
Quanto às sociedades-mãe, houve regras que surgiram nos EUA no final dos anos 60, pois percebeu
que havia muitas filiadas a serem constituídas em paraísos fiscais que não distribuíam dividendos e
portanto EUA nunca tributavam.
➢ Regras CFC – sociedades estrangeiras controladas
o Desconsidera-se a personalidade jurídica e tributa-se diretamente.
o Funcionava como uma presunção inilidível.
o Na Europa não podem haver estas regras – não podem haver presunções inilidíveis.

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Princípio de Abuso no DUE e Impostos Indiretos Harmonizados

Recomendação de Cláusulas Gerais Antiabuso


A Comissão Europeia tem vindo a recomendar, desde 2012, a adoção de uma cláusula geral
antiabuso na legislação interna dos Estados-Membros, promovendo um conceito único de
abuso em toda a UE.
➢ Esta Recomendação segue os testes já elaborados pelo TJUE

Planeamento Fiscal Agressivo


Associado à globalização e à livre circulação de capitais bem como aos riscos de evasão ou
elisão fiscal: aparece relacionado com a existência de factos tributários interestaduais que
envolvem ordenamentos jurídicos de baixa tributação ou regiões do território (delimitadas
territorialmente) com regimes de tributação mais baixos.

No quadro da OCDE e da UE o Planeamento Fiscal Agressivo é descrito, em geral, como o


comportamento adotado pelas multinacionais para explorar as oportunidades
existentes para reduzir a carga fiscal como resultado da globalização e interação das
regras fiscais dos diferentes ordenamentos jurídicos.
➢ É um conceito-chapéu que pode referir-se a situações de elisão fiscal ou a um mero
planeamento fiscal, consoante o contexto.

DL 29/2008
Ordem Jurídica portuguesa foi das primeiras a introduzir o conceito de Planeamento Fiscal
Agressivo, ao exigir a comunicação às autoridades fiscais de esquemas que consistam em tais
planeamentos por parte das entidades que os recomendam ou por parte dos beneficiários desses
esquemas.
➢ O regime é justificado com o objetivo de trazer de volta a integridade e a justiça ao
sistema fiscal, reduzir o efeito perverso de desencorajar o contribuinte cumpridor a
observar as suas obrigações ficais e a reduzir os enormes custos administrativos com a
fiscalização.

▪ TJUE não permite que estas presunções sejam inilidíveis e tem de haver uma
possibilidade para o particular contrariar a presunção.
▪ É muito difícil aplicar cláusulas anti-abuso na lógica internacional.

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