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10.37885/200800802
RESUMO
MÉTODO
Foi realizada uma revisão bibliográfica de caráter descritivo (MANCINI & SAMPAIO,
Ano de publi-
Título da publicação Autores Revista/Editora Base/Periódico
cação
A transformação do sofrimento em
BRANT L.C., MINAYO- Ciência e Saúde Co-
adoecimento: do nascimento da clinica Scielo 2004
-GOMES C. letiva
a psicodinâmica do trabalho.
Ministério da Saúde. Ministério da Saúde. Ministério da Saúde.
Saúde Mental. Secretaria de Atenção à Secretaria de Atenção à Secretaria de Aten- 2013
Saúde Saúde ção à Saúde
Ressignificando a Prática Psicológica:
CANTELE, Juliana; AR- Psicologia, Ciência e
o Olhar da Equipe Multiprofissional dos Scielo 2017
PINI, Dorian Monica. profissão
Centros de Atenção Psicossocial.
Psicologia e saúde pública: interlocu-
ções acerca das práticas nos centros CAVALCANTE, K.B. Ciência e saúde coletiva Scielo 2011
de atenção psicossocial – CAPS.
A Escuta da Diferença na Emergência
CORBISIER, C. Ciência e saúde coletiva Scielo 2010
Psiquiátrica.
FERNANDES, Amanda
Dourado Souza Akahosi;
Práticas de cuidado em saúde mental
MATSUKURA, Thelma Cadernos Brasileiros de
na Atenção Básica: identificando pes- Scielo 2018
Simões; LOURENCO, Terapia Ocupacional
quisas no contexto brasileiro.
Mariana Santos De
Giorgio.
Rev. de Terapia Ges-
A clínica da aflição e os ajustamentos GRANZOTTO, M. J. M.; talt de la Asociación
Scielo 2012
ético-políticos. GRANZOTTO, R. L. Española de Terapia
Gestalt
Ser e Tempo HEIDEGGER, M. Ed. Vozes Ed. Vozes 1927/2012
RESULTADOS E DISCUSSÕES
Através dos avanços das Reformas Sanitária e Psiquiátrica no Brasil, muitas mudanças
vêm ocorrendo no setor público de saúde. Certamente a maior conquista ocorre no campo da
saúde mental, onde o processo de desinstitucionalização do portador de sofrimento psíquico
está ocorrendo através da gradual implementação de serviços de saúde em meio aberto e
numa perspectiva comunitária, com isso alguns dispositivos estão sendo implantados que
visem esse objetivo, tais como: os CAPS, os Hospitais-dia e os Residenciais Terapêuticas.
A partir dessa reformulação gradual, os sujeitos que antes viviam enclausurados e isolados
nos hospitais psiquiátricos, agora podem contar com um tratamento mais próximo de seus
familiares e da comunidade onde vivem.
Mas, antes de darmos prosseguimento sobre a discussão que se propõe esse traba-
lho, é importante refletir os caminhos da história da Saúde Mental até a Política Nacional
de Saúde Mental no Brasil.
Nesse sentido, o modelo manicomial configurava-se em uma base hospitalocêntrica que
olhava os sujeitos institucionalizados através da ideia dos "doentes mentais". Esse modelo
foi construído por discursos médicos que adotavam como prática de tratamento dos pacien-
tes o eletrochoque, a convulsoterapia e etc. Segundo Foucault (1978), o discurso médico
denominava a loucura como anormalidade e desrazão. Com isso, foram criados hospitais
psiquiátricos para oferecer tratamento aos sujeitos acometidos pela doença mental. Essa
perspectiva de trabalho visava uma forma de proteção à sociedade, uma vez que a ideia do
"louco" era percebida como ameaça a normalidade social. O discurso da loucura enquanto
anormalidade e o sistema manicomial como local de tratamento permaneceram por quase
dois séculos.
O sofrimento é uma experiência do gênero humano, faz parte da vida de todos nós e
nesse sentido é uma experiência que pode ser atravessada pela alteridade, para um outro
que é endereçada a uma demanda que solicita algum sentido (BIRMAN, 2003).
O sofrimento cria laços discursivos entre os sujeitos, o que solicita a demanda e aquele
que pode ajudar, e possibilita que estes partilhem as compreensões que são atravessadas
por essas experiências (BRANT; MINAYO-GOMEZ, 2004).
Por ser uma experiência relacional, o sofrimento também carrega o caráter dialógico,
sempre sendo atravessado por uma experiência a dois e por isso o sofrimento possui um
potencial ético-político que revela a tonalidade ética da vivência cotidiana da desigualdade
social. Nesse sentido, ao conhecermos o sofrimento ético-político, poderemos analisar as
formas sutis de espoliação humana por trás da aparência da integração social, e, portanto,
compreender a exclusão e a inclusão como as duas faces modernas de velhos e dramáticos
problemas, tais como, a desigualdade social, a injustiça e a exploração (SAWAIA, 2009).
Esse componente ético-político presente na vivência do sofrimento é uma habilidade
e sensibilidade de estar voltado à dor do outro, principalmente quando esse outro sofre as
consequências do modo de produção da lógica da vida capitalista. O sofrimento ético-po-
lítico nos parece a lente necessária para a busca da melhoria das condições de vida e de
saúde da maioria da população, pois, gera a discussão necessária que encaminha de forma
positiva o entendimento crítico das situações que geram sofrimento, produz uma relação
empática entre os que sofrem, possibilitando relações de que produzam dispositivos para a
superação dos sofrimentos (SAWAIA, 2009).
Nesse sentido, percebe-se a necessidade de questionamentos político-sociais que
apontam para a necessidade de construção de práticas que atendam a demanda da Saúde
Pública, onde a mesma precise ser contextualizada nas problemáticas emergentes das clas-
ses menos favorecidas, ou seja, uma atenção a dimensão coletiva do sofrimento aliada a
uma preocupação ou cuidado na dimensão ética-política da ação do psicólogo, um redimen-
sionamento da postura professional. O cuidado ético-político presente na atenção básica a
saúde por parte do psicólogo deve estar pautada em uma escuta singular no espaço clínico,
evitando-se de todas as formas um enquadramento dentro dos parâmetros médicos curati-
vos, mas considerando todo o campo social onde o paciente esteja participando e tornando
possível ajustamentos criativos. Apenas nesse sentido que é possível construir uma clínica
compreendida enquanto cuidado (CIMINO; BARRETO, 2013).
A obra de Martin Heidegger surge como uma dessas importantes contribuições para o
pensamento humano. O filósofo nos apresenta a proposta radical de reconstruir as noções
tradicionais do ser humano. Na obra Em Ser e Tempo Heidegger desconstrói o conheci-
mento metafísico e a ontologia tradicionais em que nossos modos de ver o mundo estão
fundamentados e com isso propondo pensar as questões a partir da questão do ser. Com
isso, Heidegger objetiva superar a nossa tradição. Nesse sentido, vemos no trabalho hei-
deggeriano um espaço de reconstrução das concepções tradicionais que nos orientam em
saúde para assim contribuir na organização de uma nova lógica propondo uma discussão
que olhe para o cuidado em saúde considerando os aspectos ontológicos-existenciais.
Nos trabalhos de Heidegger é importante apontar que pensar o cuidado em saúde
deve ser visto pela ótica ontológica do cuidado. Nesse sentido, para reconstruir as práticas
em saúde é importante considerar o caráter ontológico do cuidado. O cuidado em sentido
ontológico aponta para o próprio caráter existencial do homem: ele sempre cuida. Mesmo
em situações adversas somos um ser do cuidado. Esse cuidado que estamos falando en-
quanto estrutura existencial articula a totalidade da existência e a sustenta (HEIDEGGER,
1927/2012).
Olhar para o trabalho do profissional de psicologia é entender os caminhos que ele toma
como trajetória para compreender o seu fazer. Nesse sentido, é se aproximar das lógicas
presentes nas práticas de cuidado à saúde.
O cuidado nas práticas de saúde tem sido um tema tratado recorrentemente por auto-
res da Saúde Coletiva. Essas discussões refletem dois modos contrários de se considerar o
cuidado à saúde, ora baseado com ênfase nos procedimentos e nas intervenções técnicas,
pautada numa lógica tradicional, e em outros momentos com foco na relação de encontro
entre profissionais e usuários dos serviços de saúde, com a influência da Reforma Psiqui-
átrica, a clínica ampliada.
Para pensar essas questões presente trabalho permitiu destacar a necessária e im-
portante atuação do psicólogo na Saúde Pública, com base na Reforma Psiquiátrica, onde
a mesma não se limite a uma prática médica curativa e individualizante, mas que abranja
ações que promovam autonomia, conscientização e empoderamento, visando a transfor-
mação social do usuário do serviço de saúde.
A busca por uma ação que vise a horizontalidade das relações, permitindo um olhar
entre “iguais” para uma atuação contextualizada. Nesse sentido, existe um posicionamento
ético-político de profissionais da psicologia, onde psicólogos possam sair de lugares pré-
-estabelecidos rumo a uma prática comprometida socialmente. Bem como, considerar o
espaço de reconfiguração das práticas de saúde com base nas noções de humanização,
acolhimento, responsabilidade, vínculo e autonomia.
Junto a isso uma importante reflexão sobre a filosofia heideggeriana como sendo um
espaço epistemológico para se rever a antiga lógica de saúde e que contribua a construção
da nova concepção dessas práticas, não pensando o cuidado apenas como algo presente
nas estratégias e dispositivos de saúde, mas como nossa condição ontológica como ser-com,
tornando possível estar com o outro de modo mais livre e criativo.
REFERÊNCIAS
ANDRADE, A. N., MORATO, H. T. P. Para uma dimensão ética da prática psicológica em institui-
ções. Estudos de Psicologia, 9(2), 345-353, 2004.
BIRMAN J. Dor e sofrimento num mundo sem mediação. In: Resumos do congresso Estados Gerais
da Psicanálise: II Encontro Mundial, realizado entre 30/10 e 02/11 de 2003, Rio De Janeiro, 2003.
BOFF, L. Saber Cuidar: ética do humano – compaixão pela terra. 8 ed. Petrópolis: Vozes, 2002.
BRASIL. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Saúde mental. Brasília, DF: Minis-
tério da Saúde, 2013.
CAVALCANTE, K.B. Psicologia e saúde pública: interlocuções acerca das práticas nos centros
de atenção psicossocial – CAPS. Ciênc. saúde coletiva , Rio de Janeiro, v. 14, n. 1, p. 297-305,
fev. 2011.
HEIDEGGER, Martin. Ser e Tempo. Trad. Fausto Castilho. Campinas: Ed. Unicamp; Petrópoles,
RJ: Vozes, 1927/2012.
MANCINI, Marisa Cotta; SAMPAIO, Rosana Ferreira. Quando o objeto de estudo é a literatura:
estudos de revisão. Rev. bras. fisioter., São Carlos , v. 10, n. 4, Dez. 2006.
SANTIN, G.; KLAFKE, T. E. A família e o cuidado em saúde mental. Barbaroi [online]. n.34, p.
146-160, 2011.
VASCONCELOS, E.M. Desafios políticos da reforma psiquiátrica brasileira. Ciênc. saúde coletiva
, Rio de Janeiro, v. 14, n. 1, p. 297-305, fev. 2010.