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SELEÇÕES DA HUSIA:

Sabedoria Sagrada do Antigo Egito

Selected and Retranslated by


MAULANA KARENGA
1

À Cheikh Anta Diop, que propôs o projeto de resgatar e reconstruir o legado do


antigo Egito e usá-lo para reviver a cultura Africana e produzir um paradigma
verdadeiramente africano do que os humanos deveriam ser e se tornar.
E aos africanos aqui nos EUA e em todos os lugares cuja rica e antiga herança
moral e espiritual representa um legado fundamental, não apenas para si, mas para toda
humanidade.
2

Imagem do Início do Papiro de Ani: Cena da qual se inicia um "Hino de Louvor a Rá,
quando este se Ergue na parte Leste do Firmamento".

Imagem do Papiro de Ani: Câmara (Sala) de MAat - Cena da Pesagem do


Coração de Ani.
3

SUMÁRIO

Prefácio
Introdução
O LIVRO DO CONHECIMENTO DAS CRIAÇÕES
Descrição da criação de Rá
A Criação de Rá como Ptah
As Quatro boas Ações do Criador
Auto-definição de Rá
O LIVRO DE ORAÇÕES E LOUVORES SAGRADOS
O LIVRO DA NARRATIVA MORAL
O Livro de Khun-Anup
OS LIVROS DA SÁBIA INSTRUÇÃO
O Livro de Ptah-Hotep
O Livro de Kagemni
O Livro de Kheti
O Livro de Ani
O Livro de Amenemope
O Livro de Ankhsheshonqi
O Livro de Phebhor
OS LIVROS DE CONTEMPLAÇÃO
Livro de Khakheper-Rá-Seneb
O Livro de Ipuwer
O Livro do Diálogo com a Alma
O Livro das Canções
O Livro de Neferti
O LIVRO DAS DECLARAÇÕES DAS VIRUDES
OS LIVROS: RESSURGINDO COMO RÁ
Livro do Vir à Luz do Dia
O Livro da Vindicação
4

O Livro da Ascensão e Transformação


BIBLIOGRAFIA
5

PREFÁCIO

Por pelo menos dois séculos, Pretos pensadores e comprometidos ensinaram as


pessoas Pretas sobre nossa antiga herança Etíope e Egípcia. Curiosamente, a consciência
sobre essa herança cultural durante esse período parecia ter se originado entre os Pretos na
Diáspora e retornando do hemisfério Ocidental ao continente Africano. Certamente, essa
consciência tem sido uma força integral nos movimentos Nacionalistas Pretos no hemisfério
Ocidental, bem como na África, há mais de cem anos. Durante todo esse período houve uma
forte apreciação pela espiritualidade altamente desenvolvida do povo Preto do Vale do Nilo, a
quem chamamos de antigos Egípcios. Tão dominante era esse aspecto do sistema
governamental do antigo Egito, que era como uma “política religiosa”.
Dr. Maulana Karenga, seguindo os ensinamentos do Dr. Carter G. Woodson,
George G.M. James e o Dr. Cheikh Anta Diop, deu uma contribuição distinta a uma
tradição honrosa. O Husia é uma excelente compilação e reedição de seleções da
literatura sagrada mais importante de todos os tempos. A necessidade de tais obras está
atrasada e o Dr. Karenga deve ser elogiado por esse esforço pioneiro desta direção.
A busca por enriquecimento espiritual entre as pessoas Pretas, na diáspora física e
cultural, as levaram à adoção dos Livros Sagrados de outros povos; a Torá, a Bíblia e o
Alcorão. Ironicamente, a literatura sagrada do antigo Egito que antecede esses textos há
milhares de anos é a fonte de grande parte da sabedoria desses Livros Sagrados, como o Dr.
Karenga aponta. O fato de as pessoas Pretas poderem encontrar conforto espiritual nessas
escrituras estrangeiras fala tanto das contribuições africanas para essas religiões, quanto da
intensidade da busca espiritual africana. Com todo o devido respeito à tradição Preta nas
chamadas grandes religiões, mas agora é hora de "retornar à fonte".
A Husia é, portanto, um passo vital em direção à re-criação e restauração de nosso
fundamento espiritual. Os textos selecionados pelo Dr. Karenga são dos grandes livros do
antigo Egito. Essas seleções, bem como o arranjo criativo em sete seções, fornecem uma
estrutura sugerida para o desenvolvimento de um Livro Sagrado maior e mais definitivo para
o povo africano.
As retranslações feitas pelo Dr. Karenga são bastante aprimoradas por sua ampla
familiaridade com muitas línguas, especialmente as Africanas, bem como seu talento como
6

poeta. Ele não apenas resgatou os textos das traduções "literais" e pontuais dos egiptólogos,
mas, na minha opinião, ele também os tornou em espírito muito mais parecido com o
verdadeiro significado dos antigos escribas. Num sentido tipicamente egípcio, ele deu vida a
eles. O resultado é um volume de literatura espiritual completamente legível, agradável e
inspirador.
Os comentários no início de cada uma das sete seções são muito esclarecedores para
ajudar o leitor a colocar o texto no contexto apropriado. O Dr. Karenga demonstra uma
compreensão profunda do significado interno dos vários conceitos, bem como da ontologia
geral. Sua crítica modesta e sutil à arrogância dos egiptólogos nesses comentários e nesta
introdução é um bom argumento para a tarefa que ele empreendeu.
A obra de arte feita por Kweli é excelente. As ilustrações são claras, autênticas e muito
apropriadamente selecionadas de acordo com o tema do trabalho.1
Assim, todos esses elementos: as seleções apropriadas; o arranjo criativo; as
retranslações poéticas e contextuais; os comentários perspicazes; e a excelente obra de arte
resultam em um livro que será imensamente útil para milhões de pessoas pretas que buscam
enriquecimento espiritual e renovação cultural. Isso é especialmente verdadeiro para aquelas
que fundaram recentemente templos baseados na antiga espiritualidade egípcia. O trabalho
também será útil para pessoas Pretas Estudiosas em seus esforços para traçar novas direções
em nosso desenvolvimento intelectual.
Para as antigas pessoas Pretas do Vale do Nilo, Maat era o compromisso ético mais
alto. A fórmula social para Maat é a reciprocidade: o criador "Di.fAnkh" (Ele dá vida). Os
seres humanos, por sua vez, devem dar aquilo que sustenta a vida - tanto mental quanto física.
A esse respeito, a Husia é um excelente modelo de Maat.

Jacob H. Carruthers
The Kemetic Institute, Chicago

1
Devido a questões técnicas desta tradução, ocultamos os desenhos da obra original [não digital].
7

INTRODUÇÃO

Durante anos, Estudiosos Africanos no Continente e na Diáspora ensinaram sobre o


rico legado moral e espiritual da África antiga, especialmente o do Egito. Mas ninguém
escreveu mais ou deu provas mais substanciais - textual, lógica e historicamente - da
conquista do Egito e da dívida que a África devia ao mundo do que o Dr. Cheikh Anta Diop.
Ele nos instou constantemente a estudar os textos antigos e extrair deles seu rico e variado
legado cultural e usá-lo como base para uma cultura africana renovada e revigorada. Além
disso, o Dr. Jacob Carruthers, diretor do Instituto Kemetic em Chicago e seus colegas estão
fazendo um trabalho importante focado na necessidade de resgatar e retraduzir a literatura
sagrada e secular do antigo Egito como um meio de compreender de maneira mais eficaz a
nossa história. Este volume é uma contribuição consciente para este projeto histórico e atual.
Uma primeira intenção deste volume é fornecer uma breve seleção representativa da
antiga literatura sagrada egípcia, que pode servir como uma referência legível e agradável
para aqueles interessados especificamente na literatura sagrada egípcia e africana antiga e
aqueles que estão interessados na literatura egípcia e africana antiga em geral, seja sagrada ou
secular. Além disso, como parte de um trabalho maior, representa uma contribuição para o
desenvolvimento de um texto sagrado africano definitivo que servirá como guia e reforço
moral e espiritual, da mesma maneira que outros textos sagrados fazem para seus adeptos e
crentes. O volume maior, quando concluído, será publicado pela Third World Press.
Organizei A Husia em sete seções que representam os vários tipos de textos que
encontrei em minha pesquisa, ou seja, livros de criação, orações e louvores sagrados, narrativa
moral, instrução sábia, contemplação, declarações de virtudes e "ressurgindo como Rá"[rising
like Ra]. Como não existe um único texto sagrado do egípcio antigo, foi necessário não
apenas coletar escritos de várias fontes e tentar impor alguma ordem a eles, mas também dar
um nome aos escritos.
O título deste texto, A Husia, é retirado de duas antigas palavras egípcias que
significam os dois poderes divinos pelos quais Rá (Ptah) criou o mundo, isto é, Hu, expressão
autorizativa [authoritative utterance] e Sia, compreensão [insight] excepcional. Assim, reuni
os dois para expressar o conceito "expressão autorizativa de compreensão excepcional". Dada
a importância de uma declaração autorizativa e uma compreensão excepcional do reino
moral e espiritual e seu caráter divino na antiga teologia egípcia, Husia parece tão atraente
quanto apropriada como um título para um texto dos escritos sagrados do antigo Egito.
8

Ao preparar este volume, fiz uso necessário das traduções e estudos existentes em
inglês e francês e, portanto, sou grato a eles. No entanto, muitas vezes discordei de suas
conclusões conceituais sobre muitas passagens e das palavras que elas usavam para
expressá-las. Foi e é minha conclusão que eles forneceram traduções essencialmente
monótonas e redutoras de uma literatura muito bonita e comovente. Em seu fascínio
epigráfico por traduções literais, os epigráficos e os egiptólogos tradicionais nos deram
traduções de literatura não apenas desprovidas de grande parte de sua beleza original, mas
também de seu significado. Pode-se apreciar a necessidade de traduções exatas, mas as
traduções literais nem sempre são exatas ou corretas. Por exemplo, pode-se traduzir a frase
em suaíli “Wanasema Kizulu kama maji” literalmente e obter “Eles falam zulu como água”.
Mas, figurativamente e corretamente, significa "Eles falam zulu fluentemente". Assim, tomei a
liberdade de ser figurativo, onde uma tradução literal privaria a passagem da beleza, do
significado ou de ambos. E onde há questões de correção na tradução ou onde adicionei uma
palavra ou frase para maior clareza, usei itálico. Além disso, na maioria das vezes, usei o
inglês moderno, e não o elisabetano, a linguagem bíblica tão frequentemente usada pelos
tradutores. No entanto, quando palavras arcaicas como “eis” pareciam mais poéticas e
apropriadas, tomei licença poética e as usei. E com a mesma licença, tento reduzir e remover
o viés masculino e de classe dos escritos.
Além disso, usei um nome para Deus, Rá, exceto na descrição da criação Men-neferita
(Memphita). Mesmo assim, usei Rá com o nome Ptah. Em outros casos, simplesmente traduzi
a palavra como um atributo ou nome de louvor de Rá, ou seja, Atum, o Completo ou o
Perfeito; Kheper, o portador do ser, etc. Também traduzi os nomes de "deuses" e "deusas" por
seus atributos e traduzi as palavras "deus" e "deusa" como poderes do céu, poderes divinos ou
exaltados. Isso foi feito para simplificação, bem como para o fato de que há suporte para o
argumento de que todos esses são simplesmente atributos e manifestações de Rá. Além disso,
“netcher” ou “neter” não é apenas a palavra para deus ou deusa como no inglês2, mas talvez
seja melhor traduzido como poder [power]ou princípio.
Finalmente, é importante afirmar aqui que essa re-transliteração, como eu a
denominei, não é cimentada nem resistente a revisões. É, na verdade, apenas uma versão de
trabalho, uma apresentação provisória, convidando resposta, correção e assistência. É por esse
motivo que preparei este volume para ser lançado durante a Primeira Conferência Anual de
Estudos Egípcios Antigos [First Annual Ancient Egyptian Studies Conference], que será

2
A mesma crítica cabe às traduções hegemônicas para a língua portuguesa no Brasil. (N. do T.)
9

realizada de 24 a 26 de fevereiro de 1984 em Los Angeles e patrocinada pelo Institute of


Pan-African Studies e presidido pelo Dr. Jacob Carruthers e eu.
É neste momento que reconheço com gratidão a colaboração e a ajuda fraterna e
importante que tive do Dr. Carruthers na preparação deste volume. Suas traduções, conselhos
e encorajamento são materiais importantes dos quais este volume é feito. Agradeço também a
minha amiga e esposa, Tiamoyo, que preparou o manuscrito para a editora, e ao Instituto de
Estudos Pan-Africanos [Institute of Pan-African Studies] e aos advogados de US3 por
sugestões de apoio e inspiração. Como sempre, sou grato ao meu povo cuja luta e aspiração
por libertação e um nível mais alto da vida humana me incentivam constantemente a buscar
modelos e meios eficazes para ambos.

Maulana Karenga
Institute of Pan-African Studies
Los Angeles, California
January, 1984

3
Organização Política que Maulana Karenga fazia [ou ainda faz] parte.
10

O LIVRO DO CONHECIMENTO DAS CRIAÇÕES

O LIVRO DO CONHECIMENTO DAS CRIAÇÕES. Este livro recebeu o título de “O


Livro de Conhecer as Criações de Rá e de Derrubar Apófis” (a serpente do mal e do caos),
mas contém escritos de outras fontes também. Como não há um único texto que apresente
uma composição do antigo conceito Egípcio de criação, uma compreensão efetiva disso só é
possível através da coleta e síntese de passagens de várias fontes.
Como o título sugere, os antigos Egípcios viam a criação como um processo contínuo.
Assim, temos “As Criações” ao invés de “A Criação”. A primeira criação foi o primeiro
evento no primeiro tempo. Porém, a criação é repetida todos os dias na natureza e na história
humana. Na natureza, o nascer do sol e o novo começo que surge a cada dia é um reflexo
disso. Na história humana, isso se reflete no constante estabelecimento e restabelecimento da
ordem e retidão da humanidade em meio ao caos e ao mal, num papel semelhante ao de Rá.
Nestas poucas passagens, lemos o mais antigo registro, escritos do surgimento da
consciência estruturada da humanidade em relação à ontologia e à ética. Esses textos
sagrados, antecedem a ontologia e a ética Hebraica, Cristã e Mulçumana por milhares de anos
e aparentemente contribuiu para elas. Assim, encontramos pela primeira vez na história da
humanidade o conceito de Logos, isto é, criação através do pensamento conceitual e
enunciação autorizada; o conceito de livre arbítrio e igualdade humana na declaração de Rá
sobre Suas Quatro Boas Ações; e uma moralidade reflexiva que indica julgamentos sociais
definidos sobre o que é amado e o que é odiado, e a crença de que Deus daria vida aos justos e
punição e morte aos maus.
É interessante e importante notar que Rá cria o universo através de Maat, um termo
com múltiplos significados, isto é, justiça, ordem, harmonia, retidão, igualdade, nivelamento,
etc. Sua importância reside no fato de ser um conceito divino, poder e prática que não apenas
informaram e ajudaram a ação de Rá, mas foi estabelecido como conceito fundamental, bem
como poder e desenvolvimento da sociedade humana. Assim, em cada livro, Maat é uma
preocupação e foco central, seja como verdade, justiça, retidão, ordem ou harmonia.
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DESCRIÇÃO DA CRIAÇÃO DE RÁ

Assim disse Rá, o Senhor de Tudo, o Senhor dos Limites Máximos, depois que Ele
nasceu: Eu sou o único que surgiu como Kheper, Aquele que vem a existir e traz à existência.
Quando eu nasci, o próprio ser surgiu. Todos os seres surgiram depois que eu nasci. Muitos
foram os seres que saíram dos comandos da minha boca. O céu ainda não havia surgido. A
terra também não havia surgido. Nem o solo havia sido criado ou as coisas que rastejam e se
arrastam sobre ele. Eu levantei seres nas águas primordiais4 enquanto coisas inertes. Não
encontrei lugar para ficar. Eu as formei do desejo em meu coração; Eu estabeleci a fundação
através de Maat. Eu criei formas de todo tipo. Muitas foram as formas que emitiram os
comandos da minha boca. Ainda não havia estabelecido Shu, o poder e o princípio da luz e do
ar. Nem enviado Tefnut, o poder e o princípio da umidade. Não existia ninguém que agisse
junto comigo. Eu concebi isso no meu próprio coração. E surgiu um vasto número de formas
de seres divinos como formas de descendência e formas de suas descendências...
Saí dentre as plantas que Eu criei e Eu criei todas as coisas que rastejam e se arrastam
e tudo o que existe entre elas. Então, pelo poder e princípios da luz e do ar e pelo poder e
princípio da umidade, o céu e a terra foram trazidos à existência, e pela terra e céu Osíris,
Hórus, Seth, Ísis e Néftis foram criados do útero, um após o outro, e deram à luz às multidões
nesta terra.

4
Nun é a entidade kemética simbolizada como as águas primordiais.[N.do T.]
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A CRIAÇÃO DE RÁ COMO PTAH

Eis Ptah (uma forma de Rá), o Altíssimo, que deu existência a todo poder divino e às
suas essências através de seu coração, mente e língua. Assim, aconteceu que o coração, a
mente e a língua passou a governar todos os outros membros ensinando que Ptah (Rá) é boca,
bem como língua, de todos os poderes divinos, de toda a humanidade, de gado, de toda coisa
rastejante e de todos os seres vivos. E Ele pensa assim como o coração e a mente e comanda
assim como a língua o que Ele deseja.
À companhia de Ptah (Rá) de poderes divinos estão diante dele como dentes e
lábios...e ... são os dentes e lábios que estabeleceram os nomes de todas as coisas e de onde
saíram Shu, os poderes da luz e do ar e Tefnut, o poder da umidade e trazido à existência a
companhia dos próprios poderes divinos.
A visão dos olhos, a audição dos ouvidos e a respiração do nariz são comunicadas ao
coração e à mente, e o coração e a mente causam todas as percepções. E o que o coração e a
mente pensa e deseja é declarado pela língua. Todos os poderes divinos foram criados e a
companhia dos poderes divinos, concluída.
De fato, toda palavra de Deus surgiu através daquilo que o coração e a mente pensava
e a língua ordenava.
Assim, por meio da Palavra, foram criadas e formadas todas as faculdades e
qualidades que fornecem todo alimento e produzem toda nutrição.
E assim, a Justiça é dada a quem faz o que é amado e a punição é dada a quem faz o
que é odiado.
Assim, também, vida é dada a quem é pacífico e morte é dada a quem viola a Lei.
E assim foram feitos todos os trabalhos e todos os ofícios, a ação dos braços e mãos, o
movimento das pernas, o movimento de todos os membros do corpo, de acordo com o
comando que é concebido pelo coração e pela mente e produzido pela língua, e que cria a
utilidade e a ação de tudo.
Diz-se de Ptah (Rá), então, Ele é quem fez tudo e criou os poderes divinos. Ele é
Ta-tenen (a Terra Ressuscitada) que produziu os poderes divinos e de quem tudo saiu –
comida e provisões, ofertas divinas e tudo de bom.
Assim, foi reconhecido e entendido que Ele é o mais poderoso de todos os poderes
divinos. E depois que Ele criou todas as coisas e as declarações divinas, Ptah (Rá) ficou
satisfeito e descansou.
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AS QUATRO BOAS AÇÕES DO CRIADOR

Estas são as palavras ditas por Ele-Cujos-Nomes-Estão-Escondidos, o Senhor de Tudo,


enquanto Ele fala àqueles que silenciam a tempestade durante a navegação das Quatro Boas
Ações, que meu próprio coração e mente fizeram por mim no meio da serpente do mal, a fim
de silenciar a perturbação. Eu fiz Quatro Boas Ações no limiar do horizonte.
Eu criei os quatro ventos a fim de que cada pessoa possa respirar em seu tempo e
lugar. Esta é uma das ações.
Eu criei o grande dilúvio para irrigação, a fim de que os humildes pudessem se
beneficiar como os grandes. Esta também é uma das ações.
Eu fiz todas as pessoas como seu e sua companheira; e não lhes ordenei que fizessem
o mal. Foi em seus próprios corações e mentes que os levaram a desobedecer ao que Eu
ordenei. Esta também é uma das ações.
Eu fiz o coração de homens e mulheres para que não esquecessem o dia da morte, a
fim de que as oferendas sagradas fossem feitas aos poderes divinos dos distritos. E esta
também é uma das ações.
Assim, Eu criei os poderes divinos do meu suor e a humanidade das lágrimas dos
meus olhos.
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AUTO-DEFINIÇÃO de RÁ

E Sua Majestade Rá, Senhor de Tudo, falou com Ísis, a Grandiosa, dizendo:
Eu sou Aquele que fez o céu e a terra, uniu as montanhas e criou tudo o que existe
sobre elas.
Eu sou Aquele que fez a água primordial e causou o céu para vir-a-ser.
Eu sou Aquele que criou o macho e a fêmea a fim de que as alegrias do amor possam
vir ao mundo.
Eu sou Aquele que fez os céus e os lugares ocultos dos dois horizontes, a fim de que as
almas habitem neles.
Eu sou Aquele que, quando Abre os olhos, torna-se claro, e, quando Fecha-os, torna-se
escuro; Aquele cujo comando as águas do Nilo se erguem e cujo nome os Orgulhosos não
sabem.
Eu sou Aquele que cria as horas para que os dias possam vir-a-ser.
Eu sou Aquele que inicia os festivais de ano novo e cria as águas da enchente.
Eu sou Aquele que fez o fogo vivente, a fim de que o trabalho das casas possa ser
realizado.
Eu sou Kheper, o Portador da Existência; na manhã, Rá, o Altíssimo e Glorioso ao
meio-dia e Atum, o Completo à noite.
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O Livro de Orações e Louvores Sagrados

O Livro de Orações e Louvores Sagrados. A poesia de louvor é um modo de


celebração verbal do secular e do sagrado, que é uma instituição e conquista africana distinta
e inegável. Embora outros povos em outros tempos se dedicassem a louvores poéticos, isso
era e não é tão difundido ou vital para o secular e sagrado quanto na África. E o fato de
elogiar a poesia de ambos os tipos - ou "canções de louvar e glorificar", como são chamadas
no Livro de Vir à Luz do Dia - era muito difundido e vital para o Egito antigo, reforçando a
verdade de seu enraizamento africano. O poema de louvor é estético e espiritual. De fato, sua
beleza é parte de sua espiritualidade, pois aumenta o senso de admiração, grandeza e unidade
com Deus ou à pessoa louvada.
A palavra eficaz na África é divina e criativa. Isso faz lembrar Rá, no primeiro evento,
que concebeu e comandou, e o universo e tudo nele surgiu. Não apenas anuncia, evoca atitude
e comportamento e reforça ambos. Além disso, o poema de louvor é um ato de participação e
compartilhamento das qualidades e ações dos louvados. Assim, os poemas de louvor à Rá não
são apenas atos de adoração e oferenda, mas um compartilhamento de Sua força e glória,
benevolência e beleza, criação e cuidado ativo.
Eu pretendia originalmente chamar esse livro de Livro dos Salmos, pois os salmos são
canções ou hinos sagrados. No entanto, mudei por dois motivos básicos. Primeiro, eu não
queria dar a impressão de que eu ou o antigo Egito estava emprestando da Bíblia. Pois, na
verdade, era o contrário, como provam as evidências cronológicas e textuais. E segundo, o
termo salmo não é tão estético ou definitivo do conteúdo do livro quanto o título escolhido,
"Orações e louvores sagrados".
Neste livro, encontramos descrições e louvores a Deus que apareceriam mais tarde nos
textos sagrados hebraicos, cristãos e muçulmanos. Rá é o Bom Pastor, apaixonado por Seu
rebanho, que é a Sua própria imagem. Ele resgata o prisioneiro e o oprimido. Ele é "o
timoneiro que conhece bem a água", e o salvador e "primeiro ministro dos pobres". Ele é o
médico que cura sem remédio e o juiz que não aceita suborno. São essas imagens do
relacionamento de Deus e da humanidade e o uso da sociedade e natureza humanas como
reinos da revelação da benevolência do Criador que serviram como fonte não apenas dos
Salmos Hebraicos, mas, como veremos, em sua teologia em geral também.
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O Livro de Orações e Louvores Sagrados

I. E Amenemope e sua esposa Hathor disseram:


Bem-aventurado quem está sentado nas mãos de Amon-Rá, pois é Ele quem dirige os
tímidos, que resgata os humildes e os necessitados, que dá o sopro da vida àquele ou àquela a
quem ama e aumenta sua vida no Oeste de Tebas.
Oh meu Deus, Senhor dos senhores, Amen-Rá, Senhor de Karnak. Me dê tua mão e me
salve! Brilha sobre mim e me sustenta! Tu és o único Deus e não há ninguém como a Ti. Tu
és Rá que se eleva nos céus, o Deus que criou homens e mulheres.
És Tu quem ouve as orações de quem O invoca, que salva um homem e uma mulher
das mãos dos violentos e que faz o Nilo subir e fluir para aqueles que Nele estão. Rá é o guia
perfeito para todos.
Quando Ele ressuscita, homens e mulheres vivem e seus corações se elevam quando
veem Aquele que dá o sopro da vida àqueles que estão no ovo. Quem faz as pessoas e os
pássaros viverem, que fornece até comida para ratos nos buracos, além de vermes e pulgas.
Que Ele nos conceda um enterro honroso após a velhice, para que possamos estar seguros em
Suas mãos.

II. Neb-Rá louva Amen-Rá, dizendo:


Amen, Rá, Senhor de Karnak, o grande Deus, que preside Tebas, o Deus Santo que
ouve orações, que vem ao chamado dos humildes e necessitados e daqueles em perigo, que
fortalece quem é fraco.
Louvo a Amen-Rá, Senhor dos Tronos do Egito, que preside Tebas. Beijo o chão
diante de Amen-Rá de Tebas, o grande Deus, o Senhor do santuário, grande e bonito, para que
Ele deixe meus olhos verem Sua beleza.
Louvado seja Amen-Rá. Faço hinos em Seu nome, louvo-Lhe às alturas do céu e até os
confins da terra. Falo de Sua majestade e poder para aqueles que navegam rio abaixo e
aqueles que navegam rio acima.
17

Fique admirado com ele. Declare-o a seu filho e filha, aos grandes e aos pequenos.
Declare-O geração após geração que ainda não nasceram. Declare-O aos peixes no fundo e
aos pássaros no céu. Declare-O aos ignorantes e aos sábios. Fique admirado com Ele.
Tu, ó Amon-Rá, és o Senhor daqueles que não têm voz. Tu vens ao chamado dos
humildes e necessitados. Quando clamo por Ti, angustiado, Tu vens rapidamente em meu
auxílio, Tu vens para dar força a quem é fraco e para salvar-me da minha escravidão.
Tu, Amen-Rá, Senhor de Tebas, és Aquele que resgata aqueles que estão trancados e
isolados. Pois Tu que és misericordioso. E quando as pessoas clamam por ti, Tu vens de
longe.
O pintor de Amen-Rá no Lugar da Verdade, Neb-Rá, que é vindicado, filho de outro
pintor no Lugar da Verdade, Pai, que também é vindicado, fez essa estela em nome de Seu
Senhor Amen-Rá, senhor de Tebas, que vem ao chamado dos humildes e necessitados.
Eu fiz para Ele louvores ao Seu nome. Pois o Seu poder e majestade são grandes. E
orei a Ele diante Dele e na presença de toda a terra, em nome de meu filho, o pintor
Nakht-Amen, quando ele estava doente e quase morrendo, estando no poder de Amen por
causa de suas obras.
Eu encontrei o Senhor dos Senhores vindo como um vento do norte e aquela brisa
doce passou diante Dele. E Ele resgatou meu filho, Nakht-Amen, o vindicado, o filho do
pintor de Deus no Palácio-da-Verdade, Neb-Rá, e da senhorita Peshed, ambos vindicados.
Neb-Rá diz:
Embora o servo esteja inclinado a cometer erros, o Senhor está inclinado a ser
misericordioso. O Senhor de Tebas não passa o dia inteiro com raiva. Ele fica com raiva por
um momento e nada disso fica para trás. O vento gira para nós em Sua misericórdia e
Amen-Rá volta à brisa. Que teu espírito seja sempre gentil, que tu sempre perdoes. E que o
que já foi rejeitado não volte para nós.
Esta estela, então, farei em teu nome e registrarei este hino de louvor por escrito. Pois
tu me salvaste, meu filho, Nakht-Amen. Eu falei contigo e tu me amas. Agora, eis que faço o
que prometi. Pois tu és o Senhor para quem clama por ti e para quem está satisfeito com a
justiça.

III. Amen-Rá é o timoneiro que conhece bem a água. Ele é o leme para os fracos.
Ele dá pão aos que não têm, e sustenta os que O servem no Seu templo.
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Não tomo os poderosos como protetor. Eu não dependo daqueles com riqueza. E não
coloco minha vida sob o braço forte de outro. Porque a minha riqueza e força estão na casa do
meu Senhor. Meu Senhor é meu protetor; Conheço o poder Dele. De fato, Ele é um ajudante
forte de braço e ninguém é verdadeiramente forte, exceto Ele.
Amen-Rá é Aquele que conhece a compaixão que ouve aqueles que O chamam.
Amen-Rá, Senhor dos Senhores. O touro de grande força que se deleita com poder.

IV. Meu coração deseja vê-lo, ó Senhor das acácias. Meu coração deseja vê-lo, ó
Amen-Rá. Tu és o protetor dos humildes e necessitados, pai e mãe dos órfãos, marido da
viúva.
Doce é dizer o seu nome, é como o gosto da vida, sim, como o gosto do pão para uma
criança, como o sopro da liberdade para o cativo.
Volte-se para nós, Ó Eterno, que esteve aqui antes que qualquer outro existisse.
Embora tu faças para mim trevas, faça com que a luz brilhe em mim para que eu possa vê-lo.
Enquanto tua alma perdura pela eternidade e teu rosto lindo e amado dura para sempre, tu
podes vir de longe e deixar-me vê-lo. Adorar tu, ó Rá, é bom. Tu és, ó Senhor, muito bom de
procurar, pois descobri que tu desvias todo o medo. Coloque alegria, ó Rá, no coração das
pessoas. Pois felizes são aqueles que te veem, Ó Rá, e eles se alegram a cada dia.

V. Ó Amen-Rá, pastor que cria o rebanho pela manhã, levando os famintos a


pastos verdes. Assim como o pastor conduz seu rebanho a prados verdes, tu também, ó Rá,
leve os necessitados à comida. Pois Rá é realmente um bom pastor, nunca ocioso, atendendo
àqueles que se apoiam Nele.
Ó Rá, eu te amo e de Ti tenho preenchido meu coração. Tu me resgatarás da boca da
multidão no dia em que eles falarem mentiras contra mim. Pois o Senhor da Justiça vive em
retidão. Assim, não vou me debruçar sobre a ansiedade em meu coração, pois certamente o
que Rá disse acontecerá.

VI. E o Faraó Ramsés II cercado no campo de batalha por inimigos e muitos


problemas orou dizendo:
Agora eu te invoco desde os confins da terra, ó Amen-Rá, tudo o que eu fiz foi por
amor à Ti. Ó Pai, Amen-Rá, eu clamo-te, pois estou no meio de muitos inimigos e toda esta
terra está contra mim. Estou sozinho e és minha única defesa, pois meus muitos soldados me
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abandonaram; meus carros se recusaram a ficar comigo. Embora eu os chamasse, ninguém


respondeu ao meu chamado.
Agora, clamo a ti, ó Rá, e acho que tu, Rá, és mais útil para mim do que milhões de
soldados, mais de centenas de milhares de carros, mais de milhares de irmãos e filhos, todos
juntos. Pois o esforço de muitos não é nada comparado à majestade e poder de Amen-Rá.
Então disse o Faraó Ramsés II: Agora, embora eu tenha rezado em uma terra distante,
minha voz ressoou no sul de On. Eu descobri que Amen-Rá veio quando eu o chamei. Ele me
deu a mão e ... encontrei meu coração forte e cheio de alegria. E tudo o que fiz foi
bem-sucedido.

VII. Louvado seja tu, Amen-Rá, que falou com Tua boca e surgiram homens,
poderes e princípios do universo, gado grande e pequeno, e tudo o que voa e pousa, todos
eles.
Tu criaste até as margens do povo Hanebu que se estabelecem em suas cidades e
também os prados frutíferos fertilizados pelas águas originais e, depois disso, deram à luz
coisas boas sem número para sustentar tudo o que vive.
Tu és poderoso como pastor, cuidando de todas as pessoas por toda a eternidade. Os
corpos estão cheios de tua beleza e os olhos veem por tua causa. Tu inspiras admiração em
todos e seus corações se voltam a ti. Pois tu és bom em todos os momentos. E todo o mundo
vive por tua presença.
Todo mundo diz: "Nós somos teus", os fortes e os fracos juntos, os ricos e os pobres
com uma boca, e todas as outras da mesma forma. Tu és adorado em seus corações. E nenhum
corpo carece de tua beleza.
Não dizem as viúvas: Tu és nosso marido, e os filhos pequenos dizem que tu és nosso
pai e mãe? Os ricos se gabam de tua beleza e os pobres reverenciam tua presença. O
prisioneiro se vira a ti e os doentes o chamam.
Teu nome será uma proteção para o corpo de quem estiver sozinho. É salvação e saúde
para aqueles que estão na água e libertação do crocodilo. É bom lembrar de Rá em tempos de
alvoroço, pois Ele é uma libertação da boca do agressivo.
Ó Rá, todos podem se voltar à Ti e colocar suas petições diante de ti. Teus ouvidos
estão abertos para ouvi-los e tu concede o que eles desejam. Tu és o Criador que ama aqueles
à Tua imagem, o pastor que gosta do Seu rebanho.
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VIII. Louvado sejas, ó Rá, Senhor da Verdade, cujo santuário está oculto, Senhor
dos Senhores. O Portador do Ser em Seu barco sagrado, que determinou, e os poderes e
princípios do universo surgiram. O Criador que criou a humanidade e distinguiu seus
caráteres, quem fez sua vida, que fez suas cores diferentes umas das outras.
Louvado seja Rá, Aquele que ouve a oração do prisioneiro, beneficia de coração
quando alguém o chama. Aquele que resgata o oprimido do opressor, que julga entre o fraco e
o forte, Senhor da Percepção, em cuja boca está a autoridade.
Por Seu amor, o Nilo chega. O Único Benevolente, o muito amado, quando Ele vem as
pessoas vivem...
Ó Todo-Poderoso, Senhor dos Senhores, nós reverenciamos sua força porque tu nos
criastes; nós gritamos de alegria por ti porque tu nos moldastes; nós te louvamos porque tu se
cansastes conosco.
Louvado sejas, que fez tudo isso, único e somente com muitas mãos, que passa a noite
acordado enquanto homens e mulheres dormem, buscando o melhor para Suas criaturas.

IX. O Faraó Akhenaton cantou louvores dizendo:


Tu se eleva em beleza no horizonte do céu, Ó vivente Aton, criador da vida. Quando tu
se eleva no horizonte oriental, enche toda terra com tua beleza. Tu és Rá e alcança os limites
das terras e as restringe para seu amado filho (Akhenaton). Tu fazes a semente crescer nas
mulheres e cria pessoas a partir do esperma. Tu alimentas o embrião no ventre da mãe,
acalmando-o apesar de suas lágrimas.
Quão múltiplas são tuas obras, embora ocultas da vista, ó Deus único, além de ti não
há nenhum. Tu criastes a terra de acordo com teu desejo, tu sozinho. Todas as pessoas, gado e
todos os tipos de animais, todos na terra que andam sobre as pernas e todos no alto que voam
com asas. Tu colocas cada pessoa em seu lugar e satisfaz suas necessidades. Todos têm
comida e seu tempo de vida é determinado. Suas línguas diferem na fala e seus caráteres
também. As cores de suas peles também são diferentes. Pois distinguiste as pessoas. Quão
excelentes são os seus caminhos, ó Senhor da eternidade.

X. Toda cidade está sob a sombra de Amen-Rá, para que Seu coração possa se
mover naquilo que Ele amou. As pessoas cantam para Rá sob todo o teto, e todo fundamento
permanece firme sob o Seu amor. Eles celebram por Ele nos dias de festa e passam a noite
ainda acordados à meia-noite ...
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Rá é Aquele que liberta a pessoa do mal e afasta o sofrimento. Ele é um médico que
cura o olho sem remédio, que abre o olho e cura os olhos. Ele salva quem quiser, mesmo que
eles já estejam na sepultura.
Ele ouve as orações daqueles que O invocam e chega em um momento de longe para
aqueles que clamam por Ele.
Ele prolonga o tempo de vida, encurta-o e dá além do que é atribuído pelo destino
àqueles a quem Ele aprecia.
Amen-Rá é magia, palavras de poder, sobre a água, quando Seu nome é dito acima das
profundezas. E o crocodilo não tem poder quando uma pessoa chama Seu nome.
Os ventos mudam e o vento se move. Fica calmo quando se lembra de Rá. Seu nome é
uma palavra útil em tempos de angústia, uma brisa suave para quem o invoca.
É Rá que salva aqueles que sofreram, um Deus gentil com conselhos eficazes. Ele
pertence àqueles que repousam as costas Nele quando estão na hora de dificuldade.
Ele é mais poderoso que milhões para aqueles que O colocam em seus corações e um é
mais poderoso que muitos através do poder de Seu nome. Ele é o protetor compassivo, o
Benevolente, aquele que não comete erros, e alguém que os humanos não podem apagar.

XI. Amen-Rá, que foi o primeiro Rei, o Deus da antiguidade e Aquele que
continua sendo o Primeiro-Ministro dos pobres. Rá não aceita suborno dos culpados; Ele não
presta testemunho da testemunha e não presta atenção a quem promete. Amen-Rá julga a terra
com um aceno de dedo. Ele fala ao coração e julga o culpado. E Ele atribui os culpados ao
fogo do Leste e os justos à paz do Oeste.
Amen, apareça como primeiro ministro e liberte os pobres. Que os pobres sejam
justificados e sua necessidade apenas supere a riqueza.

XII. Faraó Piankhi instruiu seus homens antes da batalha, elogiando o poder de
Amen-Rá e dizendo:
Quando vocês chegarem a Tebas, antes de Karnak, entrarão na água e se banharão.
Vestirão roupas finas, amarrando os arcos e deixando de lado as flechas. Que nenhum
supervisor ou governante se vanglorie de ser poderoso. Pois não há força para os poderosos
sem Amen-Rá. Ele transforma os fracos em armados, de modo que as multidões fogem dos
fracos e só um leva mil cativos. Unjam-se, então, com as águas de seus altares e curvem-se
diante da terra Dele e digam antes: “Faça para nós uma maneira de lutarmos na sombra da tua
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espada. Pois quando os rapazes que tu enviares lançar seus ataques, as multidões fugirão
deles”.

XIII. Montemhet, o Profeta de Amen-Rá, orou dizendo:


Homenageio-te, ó Amen-Rá, criador da humanidade, Deus que criou todos os seres.
Rei Benevolente, Primeiro e Único do Egito, As Duas Terras, que concebeu em Seu coração e
em Sua mente a eternidade que Ele criou. Um, grande em poder, impressionante em Seu
poder, cujas formas são exaltadas acima de todos os outros poderes divinos. O mais forte que
derruba os violadores da Lei, cujo chifre ataca os que praticam o mal. Eu confio no teu nome.
Que seja meu médico. Que elimine a doença do meu corpo e afaste toda a dor de mim.
Que Rá ponha amor por mim no coração das pessoas, para que todos gostem de mim.
Que Ele me conceda um bom enterro no cemitério da minha cidade. Pois a terra sagrada está
ao Seu alcance. Que Ele faça meu nome durar como as estrelas do céu e meu monumento
durar como os de Seus seguidores. Que minha essência divina seja lembrada em Seu templo
dia e noite. Que eu renove minha juventude como a lua e que meu nome não seja esquecido
nos anos que virão, para sempre.
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O LIVRO DA NARRATIVA MORAL

O LIVRO DA NARRATIVA MORAL. Embora exista outra narrativa moral na antiga


sabedoria sagrada egípcia, nenhuma é tão clara, bonita e definitiva quanto o Livro de
Khun-Anup. Este livro é chamado de "O Camponês Eloquente" pelos egiptólogos
tradicionais. No entanto, escolhi chamá-lo pelo nome do homem que é seu personagem
central e porta-voz, um camponês ou agricultor que é injustamente tratado e apela por alívio,
justiça e retidão do Alto Administrador, Rensi, que lidou com esses assuntos. Rensi ficou
impressionado com a eloquência de Khun-Anup e transmite isso ao faraó. O faraó
impressionado com o relatório pede a Rensi que adie a decisão sobre o caso no antigo Egito,
já que em outras partes da África isso era/é muito apreciado. Rensi também recebeu ordens de
cuidar da família de Khun-Anup pelos dias em que manteve Khun-Anup esperando por uma
decisão e copiar meticulosamente tudo o que disse.
O que se segue é uma série de nove petições feitas por Khun-Anup por justiça e
retidão ou como os egípcios chamavam ambos, Maat. Conforme declarado na introdução ao
Livro do Conhecimento das Criações, Maat era o fundamento da ordem natural e social. Seu
conceito central é a retidão na natureza e a retidão (que torna uma ordem ou sistema correto)
na sociedade humana. Embora os egiptólogos tradicionais traduzem Maat principalmente
como justiça nesta narrativa, eu traduzo principalmente como retidão. Pois entre os três
significados mais usados ​- verdade, justiça e retidão - a retidão parece-me o termo mais
abrangente e inclusivo e sugere e exige tanto a verdade quanto a justiça.
Khun-Anup apela ao senso de retidão, verdade e justiça de Rensi, pois Maat era vista
na antiga sociedade egípcia como as relações da sociedade humana. O faraó e sua sociedade
eram o símbolo e a personificação de Maat e os juízes, como representantes do faraó, usavam
no peito uma imagem do poder divino, Maat, apontando-a para os justificados em um caso.
Khun-Anup começa elogiando Rensi, o representante do faraó, como alguém que destrói a
falsidade e traz justiça, e o desafia a ganhar a vida eterna por sua justiça. Posteriormente, ele o
critica por não agir de acordo com Maat. Mas, no final, um julgamento é proferido a favor de
Khun-Anup.
A linguagem da narrativa é cheia de terminologia náutica e de medição. Isso ocorre
porque a religião reflete a vida social de um povo. A antiga vida egípcia era grandemente
moldada por atividades no Nilo e arredores e por atividades agrícolas, como arar, colher e
medir grãos. Assim, o faraó e seu representante são vistos como o timoneiro do navio do
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Estado e desejam boa navegação. Da mesma forma, eles são vistos como o equilíbrio ou
escalas que não devem inclinar, o prumo ou a língua que não deve se desviar - para que o
sistema em si não fique desequilibrado e a ordem social seja interrompida e perturbada. A
apreciação pela balança ou pesagem vem também da referência à Balança Sagrada, na qual o
coração dos que partem e ressuscitam será pesado no Dia do Julgamento. (veja abaixo Os
Livros: Ressurgindo como Rá).
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O Livro de Khun-Anup

Então Khun-Anup disse ao Alto Administrador, Rensi:


I. Quando tu embarcas no Lago de Maat (verdade, justiça e retidão), que possas
navegar com um bom vento. Que nenhuma tempestade rasgue tua vela, nem seu barco fique
para trás. Pode não haver infortúnio em seu mastro e seus pilares não se romperem. Que tu
não encalhes, nem a corrente o leve embora. Que tu não proves os males do rio nem veja uma
face de medo. E que os peixes venham rapidamente até a ti e pássaros gordos se juntem ao seu
redor. Pois tu és o pai do órfão, o marido da viúva, o irmão da mulher divorciada e uma roupa
protetora para os sem mãe.
Deixe-me levantar seu nome nesta terra como a personificação de toda boa lei. Pois tu
és um líder sem cobiça, um grande homem livre de baixeza, alguém que destrói a falsidade e
cria a justiça, alguém que vem à voz do interlocutor. Quando eu falo, tu podes me ouvir.
Conceda-me justiça, ó Louvável, a quem aqueles que são louvados louvam. Ponha um fim à
minha opressão, pois estou muito sobrecarregado. Conte-me e tu me encontrarás ausente.

II. Um homem mortal morre junto com seus dependentes, mas serás tu um
homem da eternidade por tua retidão? Não é errado quando uma balança se inclina, um prumo
se desvia e a sequência fica torta? Eis que a justiça fugiu de ti, foi embora desse lugar. Os
juízes agem errado e a fala correta se torna unilateral. Os juízes pegam o que foi roubado.
Quem deve acertar as coisas faz as coisas darem errado. Quem deve respirar sufoca quem está
no chão e quem deve facilitar a respiração, faz falta de ar. O mediador é um ladrão e quem
deve destruir a necessidade comanda sua criação. A cidade é essa água de enchente
conquistada e quem deve combater o mal, comete crimes.
A reparação é curta, mas o infortúnio é longo e uma boa ação retorna àqueles que a
praticam. Este é o preceito: faças a[o] executor[a] o que ele ou ela também faz. É agradecer a
alguém pelo que se pode fazer, bloquear um golpe antes que ele aconteça e atribuir uma tarefa
a quem é hábil. Seja um abrigo e faça segura tua margem. Veja como o seu cais está coberto
de crocodilos. Deixe sua língua falar direito e não se desvie para um mau caminho.

III. Puna o ladrão e salve aqueles que sofrem. Não seja um dilúvio contra o
requerente. Esteja ciente da aproximação da eternidade. Desejo viver por muito tempo, pois
como se diz: Fazer o certo é respiração para o nariz. Castigue aqueles que merecem castigo e
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ninguém será igual à sua justiça. Não responda o bem com o mal e não coloque uma coisa no
lugar de outra.
O equilíbrio da terra está em Maat - verdade, justiça e retidão. Não fale falsamente,
porque tu és grande; não aja de ânimo leve, pois tu tens peso; não seja falso, pois tu és o
equilíbrio e não desvie, pois és o padrão. Tu estás no nível da balança. Se inclinar, tu também
te inclinarás. Não derivas, e sim conduza. Não roubes, ao invés disso, aja contra o ladrão. Pois
alguém não é realmente excelente, se ele o é com ganância. Se tu desvias o rosto da violência,
quem punirá as transgressões?

IV. Não há quem fala rápido, livre de palavras precipitadas e nenhuma luz do
coração e da mente, cujos pensamentos tenham peso. Seja paciente para aprender a justiça e
reprimir sua raiva pelo bem de quem entra humildemente. Ninguém apressado alcança a
excelência e aquele que é impaciente não se apoia. Deixe seus olhos verem e seu coração
perceber. Não aja severamente com seu poder, para que não caia sobre ti.
Timoneiro, não deixes teu navio se perder. Doador de vida, não deixes as pessoas
morrerem. Provedor, não deixes as pessoas perecerem por necessidade. Sombra, não deixes as
pessoas secarem ao sol. Protetor, não deixes que os crocodilos agarrem as pessoas e as
arrastem para longe.

V. Não roubes os pobres de seus bens, os humildes que tu conheces. Pois os


pertences dos pobres lhes dão fôlego e tirá-los é como tirar-lhes o nariz.

VI. Quem diminui a falsidade encoraja a verdade. Quem apoia o bem diminui o
mal - assim como a satisfação chega e acaba com a fome e a roupa remove a nudez; assim
como o céu se acalma após uma tempestade e aquece todos os que estão com frio; assim como
o fogo cozinha o que é cru e a água sacia a sede. Quem trapaceia diminui a justiça. Mas a
justiça dada com razão não fica aquém nem transborda. Não atrase; lide com o assunto em
questão. Se tu separar, quem juntará? O instrumento está na tua mão, faças as medições.
Certamente a água é rasa. E se o barco encalhar, sua carga apodrecerá em terra.

VII. Seja paciente, para que alguém possa lhe falar sobre sua justa causa. Não fique
com raiva, não torne-se assim. O rosto pensativo torna-se facilmente chateado. Não pense no
que ainda não aconteceu, nem se alegre com o que ainda não veio. A paciência prolonga a
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amizade e dispõe de uma preocupação passada, pois não se sabe o que há no coração. Se a lei
é negligente e a ordem destruída, os pobres não podem sobreviver. Pois quando eles são
roubados, a justiça não se aplica a eles.

VIII. As pessoas caem na ganância. Aqueles que atacam os outros não alcançam
sucesso real. O sucesso deles é, na verdade, uma perda. Embora sejam gananciosos, isso não
lhes rendem nada; embora roubem, não se beneficiam com isso. Aja de modo reto pelo
Senhor da Justiça, cuja retidão é de fato justa. Quando o bem é bom, é realmente bom.
Certamente, a justiça é para a eternidade. Vai para o túmulo com quem a faz. Quando são
enterrados e a terra os envolve, seu nome não é apagado da face de sua bondade. Pois este é
um princípio estabelecido pela palavra de Deus. Fale certo e faça certo. Pois a justiça é
poderosa. É ótima; dura; seu valor é real e leva à bem-aventurança. A transgressão não atinge
seu objetivo, mas aquele que é justo chega a terra seca.

IX. A língua é a balança de uma pessoa e é a balança que descobre defeitos.


Castigue os que devem ser castigados e ninguém será igual à sua justiça. Quando a falsidade
anda, ela se perde. Ela não atravessa a balsa, nem avança. Quem se torna rico por ela não tem
filhos ou herdeiros na terra. Aqueles que navegam com ela não alcançam terra firme, seu
barco não ancora na cidade pretendida.
Não seja muito pesado, nem leve demais. Não seja lento ou muito apressado. Não seja
parcial nem ouça pura emoção. Não desvie o rosto de quem tu conheces. Não seja cego para
quem vistes e não rejeite a quem lhe pede. Abandone essa lerdeza e deixe teu discurso ser
ouvido. Aja por quem age por ti. Não dê ouvidos a todos, mas atente-se àqueles que têm uma
causa justa. Os vagarosos e preguiçosos não têm herança; quem é surdo à verdade não tem
amigos e quem é ganancioso não tem descanso.
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OS LIVROS DA SÁBIA INSTRUÇÃO

OS LIVROS DA SÁBIA INSTRUÇÃO. Certamente, um dos livros mais importantes


e bem escritos de literatura sagrada do antigo Egito são Os Livros da Sábia Instrução. Embora
alguns egiptólogos tradicionais argumentem que as instruções sejam mais seculares do que
sagradas, a evidência não suporta tal afirmação. Supõe-se que eles tenham chegado a essa
conclusão porque as Instruções oferecem lições de vida explícitas sobre como se conduzir,
sozinho e com os outros. No entanto, se esse é o principal argumento – e parece ser o de todas
as leituras – então, eles teriam que pautar o Livro de Provérbios como secular. Pois, não
apenas contém instruções semelhantes, mas também foi baseado no modelo do antigo Egito e
empregou passagens inteiras do Livro de Amenemope (veja abaixo).
Os Livros de Sábia Instrução são tão sagrados quanto qualquer outro livro da Husia,
pois o foco principal está em Maat e na obrigação moral e espiritual que cada pessoa tem de
preservá-la e praticá-la na e para a comunidade. Assim, cada pessoa, e não apenas o faraó, foi
instada a preservar e praticar Maat. Pois ele ou ela era julgado por isso e concedido vida longa
na terra, bem como a vida eterna em Amenta (paraíso) ou morte e inexistência com base nisso.
Portanto, Ptah-hotep diz: “Maat é grande, seu valor é duradouro e permanece
inalterado e inigualável desde o tempo de seu Criador”. Ela é, ele continua, “um caminho
claro, mesmo para os ignorantes, e aqueles que violam suas leis são punidos”. Assim, ele
recomenda a excelência moral em tudo o que se faz "para que nenhuma falha seja encontrada
em seu caráter". Da mesma forma, Kheti, diz a seu filho Merikare que ele deve "fazer o que é
certo para que viva muito tempo na terra". Pois "mais aceitável é o pão dos justos que o boi
dos que praticam o mal".
Claramente, então, Maat, conceito moral e espiritual por excelência da antiga e
sagrada literatura Egípcia, constitui o foco principal das Instruções, mesmo que algumas
situações e soluções bastante seculares sejam apresentadas. Além disso, dado o vínculo
inseparável no antigo Egito e em outras partes da África entre o sagrado e o secular, a
tentativa de separá-los faz pouco sentido e tem ainda menos sucesso. Assim, os sábios
ensinam suas crianças e o povo a pensar Maat, falar Maat e exercer Maat em situações
seculares e sagradas. Pois isso garantirá não apenas uma comunidade mutuamente benéfica,
baseada em Maat, mas também a vida eterna.
Nos termos dos nomes dos Livros, fiz duas mudanças que devem ser observadas.
Primeiro, o livro chamado “Instruções para Merikará” pelos egiptólogos tradicionais é
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re-intitulado “O Livro de Kheti”. Isto foi feito porque é relativamente certo que o faraó que
escreveu era chamado Kheti e o “Livro para Merikará” seria inconsistente com o outro
“Livro de...”. Segundo, o livro chamado “Papiro Insinger” pelos egiptólogos tradicionais
recebe o título de Livro de Phebhor, em homenagem a seu autor. Os egiptólogos e
colecionadores tradicionais tinham o hábito bastante perturbador e até mesmo arrogante de
nomear antigos papiros Egípcios com o nome de alguém que os comprou “ou que os possuía”
por vários meios. Assim, Insinger, Harris, Beatty, etc., são afixados aos papiros, que
geralmente têm seus próprios nomes. Naturalmente, não vi necessidade ou razão para seguir
essa prática.
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O LIVRO DE PTAH-HOTEP

I. Não seja arrogante por causa do seu conhecimento. Tome conselhos tanto com os
ignorantes quanto com os sábios. Pois, os limites do conhecimento, em qualquer campo,
nunca foram estabelecidos, e ninguém jamais os alcançou. A sabedoria é mais rara que as
esmeraldas e, no entanto, é encontrada entre as mulheres que se reúnem nas pedras de amolar.
II. Se tu és um líder e comanda a muitos, lute pela excelência em tudo o que faz, para
que nenhuma falha seja encontrada em seu caráter. Por Maat – caminho da Verdade, Justiça e
Retidão – a grandiosa! Seu valor é duradouro e permaneceu inigualável e inalterável desde o
tempo de seu Criador. Encontra-se como um caminho claro, antes mesmo que os ignorantes e
aqueles que violam suas leis sejam punidos. Embora a maldade possa ganhar riqueza, as ações
erradas nunca levaram seus produtos a um porto seguro. No final, é Maat, caminho da
Verdade, Justiça e Retidão – que persiste e permite que os retos digam “Esse é o legado de
meu pai e de minha mãe”.
III. Não aterrorize as pessoas porque, se o fizer, Deus o castigará de acordo. Se
alguém viver de tal maneira, Deus tirará o pão da boca. Se alguém disser ‘Eu serei rico por
esses meios’, acabará por dizer ‘meus meios me prenderam’. Se alguém disser ‘Eu roubarei
outro’, acabará sendo roubado. Os planos dos homens e das mulheres nem sempre acontecem,
pois no final é a vontade de Deus que prevalece. Portanto, deve-se viver em paz com os
outros, e eles virão e voluntariamente darão presentes, que outro os tomariam através do
medo.
IV. Seja diligente enquanto viver, sempre fazendo mais do que lhe é ordenado. Não
abuse do seu tempo enquanto segue seu coração, pois é ofensivo à alma desperdiçar tempo.
Não perca a oportunidade diária de aumentar o que tu tens. A diligência produz ganhos e os
ganhos não perduram quando a diligência é abandonada.
V. Se és parente da dignidade e da sabedoria, treine tuas crianças para que sejam
agradáveis a Deus. E se elas fazem o que é certo, seguindo o teu exemplo, e lidam com os
seus assuntos como deveriam, faça-as tudo o que é bom. Pois elas são geradas de seu próprio
coração. Porém, se elas não seguirem o teu caminho, se opuserem à tua vontade, rejeitando
todos os conselhos, e colocarem a boca em movimento com palavras vis, então afaste-se
delas. Pois elas não são suas crianças e nem nasceram para ti. Aquelas que são guiadas não
erram, mas as que perdem o caminho intencionalmente não encontrarão um caminho reto.
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VI. Se moves entre as pessoas, ganhe respeito e confiança falando abertamente e com
sinceridade. Aqueles que são confiáveis e falam com sinceridade se tornarão líderes e mestres
de si mesmos. Aqueles que dominam a si mesmos desfrutam de um bom nome e não são
criticados. Eles estão em boa saúde e sua face está voltada para seu povo. E eles são louvados
sem que saibam disso. Porém, aqueles cujo coração obedece a desejos vis causam mais
desprezo do que amor. Os de grande coração são os escolhidos de Deus, porém, aqueles que
obedecem aos desejos vis tornam-se posse do inimigo.
VII. Se és um líder, verifique se os planos que fazes são realizados. Faça grandes
coisas que serão lembradas muito depois de ti. Onde há elogios, a depreciação não pode
sobreviver. Porém, onde entram os de má vontade, como crocodilos, brigas também vem.
VIII. Se és um líder, seja cortês e ouça atentamente as apresentações dos peticionários.
Não os interrompa até que tenham derramado seu coração e falado o que vieram dizer.
Aqueles com queixas gostam de falar e expor as petições de seu coração. Porém, quem quer
que interrompa uma apresentação levanta a questão do porquê alguém que tem esse poder age
desta maneira. Nem tudo o que é pedido pode ser concedido, mas uma audiência justa satisfaz
o coração.
IX. Se desejas que a amizade dure na casa que entras como mestre, amigo ou irmão,
ou em qualquer outro lugar em que entre, evite abordar as mulheres de maneira imprópria.
Nenhum lugar é pacífico onde isso é feito e quem os invade não é bem-vindo. Milhares de
homens foram arruinados por um prazer momentâneo, que passa como um sonho e depois
leva a morte àqueles que se entregaram a isso. Homens e mulheres saem de casa por causa
disso e o coração deve abster-se disso. Quanto aos que erram por causa da lascívia, nenhum
de seus planos prosperará.
X. Se desejas que sua conduta seja perfeita, livre-se de tudo o que é mau, proteja-se
contra o vício da ganância pelas coisas materiais. É uma doença grave e não há cura para isso.
Não pode haver confiança entre seus infectados. Transforma um amigo gentil em um inimigo
amargo. Causa conflito com pais, mães e irmãos das mães, e separa a esposa do marido. É um
pacote de todos os tipos de males e uma bolsa contendo vícios de todo tipo. Estabilizados
estão aqueles cujo padrão é a retidão, que andam de acordo com seus caminhos. Eles
certamente prosperarão desse modo, os gananciosos, porém, não terão sequer uma sepultura.
XI. Se és sábio e procura tornar sua casa estável, ame sua esposa completa e
retamente. Dê-lha comida, roupas e óleo para seu corpo e faça-a feliz enquanto vives. Pois ela
é de grande valor para ti, marido dela. Não sejas brutal com ela. Bondade e consideração a
influenciarão melhor que sua força. Preste atenção ao que ela deseja, visa e considera
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altamente. Assim, ela permanecerá contigo. Abra teus braços à ela; chame-a e mostre-a seu
amor.
XII. Compartilhe com seus amigos o que tens, pois o que é seu é um presente de Deus.
Aqueles que falham em compartilhar com seus amigos são rejeitados por terem uma alma
egoísta. Embora as pessoas possam planejar para o amanhã, não sabem o que acontecerá. Mas
é pela justiça que as pessoas são sustentadas. Portanto, se o infortúnio vier e tiveres sido justo
com seus amigos, eles o receberão. A paz não será encontrada em uma cidade onde os amigos
são esquecidos e suas necessidades não atendidas.
XIII. Se és alguém de dignidade e sabedoria que faz parte de um conselho de
governança, aplique seu coração e mente naquilo que é sábio. Fale apenas quando souber que
poderá ajudar na solução de uma dificuldade. Pois o silêncio é melhor do que conversas
inúteis. Existe uma arte em dar bons avisos no conselho. Certamente isso é mais difícil do que
todos os outros deveres. Quem entende isto, pode o fazer e servi-los bem.
XIV. Se és uma pessoa poderosa, conquiste respeito através do conhecimento e da
gentileza da fala e conduta. Dê comandos apenas quando necessário e adequado. Aqueles que
abusam de sua autoridade provocam resistência. E aqueles que se colocam acima dos outros
são humilhados. Não silencie quando é seu dever falar, mas seja cauteloso em seu discurso
para não ofender. Quando responderes aos zangados, mostre autocontrole. Pois o coração
irado fala palavras impetuosas, mas aqueles que andam gentilmente, seu caminho já está
pavimentado. Além disso, aqueles que se preocupam o dia todo não terão nenhum momento
feliz. E aqueles que buscam o prazer o dia todo não serão capazes de se sustentar.
XV. Se és um juiz escolhido para manter a ordem entre as pessoas, lide com as
questões com um senso estrito de justiça. Não se incline de um lado para o outro. Tome
cuidado para que ninguém reclame que és injusto e que suas ações resultem em julgamento
contra ti.
XVI. Se estás irritado com um erro que foi cometido por outro, incline-se, não para se
lembrar, mas para a justiça. Passe-o depressa e não o segure no seu coração após o primeiro
dia em que isso aconteceu.
XVII. Se crescestes muito após ter vivido numa condição humilde, e tiver ganhado
riqueza após ter sido pobre em sua cidade no passado, não esqueças como tu eras
antigamente. Não confie na sua riqueza, que veio a ti como um presente de Deus. E não
deixes para trás outro que é teu igual e a quem o mesmo aconteceu.
XVIII. Seja generoso enquanto viver. O que entra no armazém deve sair. Pois o pão é
feito para ser compartilhado. Aqueles cujas barrigas estejam vazias se transformam em réus e
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aqueles que estão privados tornam-se oponentes. Veja que nenhum desses são seus vizinhos.
A generosidade é um memorial para aqueles que demonstram isso muito depois de partirem.
XIX. Conheça aqueles que são fiéis a ti e não maltrate aqueles que são seus amigos.
Eles são um campo bem regado a ti e mais valiosos do que grandes riquezas. Pois o que
pertence a um amigo pertence a outro. O caráter de uma pessoa justa é uma honra para ele ou
ela, e algo de valor que há muito é lembrado.
XX. Se o respeito existir no coração daqueles que foram postos em autoridade, eles
serão sempre beneficiados e sua sabedoria durará para sempre. O coração dos sábios
regozija-se quando a sabedoria está estabelecida e é feliz quando ela prospera na terra. Os
sábios são conhecidos por sua sabedoria e os grandes por suas boas ações. O coração deles
está em harmonia, com seus olhos veem corretamente e seus ouvidos ouvem o que é
proveitoso para seus filhos, para que possam fazer o que é certo e se livrarem da injustiça.
XXI. Se um filho e uma filha aceitarem os ensinamentos justos de seus pais, nenhum
de seus planos darão errado. Ensine suas crianças, então, a serem aquelas que ouvem bem;
elas serão valorizadas por aqueles de peso e substância e sua fala informará aquilo que
ouviram. Respeitadas são aquelas que ouvem bem, elas serão excelentes e seus atos as
distinguirão. Mas o fracasso seguirá aquelas que não ouvem. Os sábios acordam cedo para se
estabelecerem, mas os tolos sempre deixam de levantar no tempo oportuno.
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O Livro de Kagemni
I. A pessoa modesta é forte e alguém que é verdadeiro em palavras e ações é
elogiado. As casas são abertas aos humildes e um assento amplo é concedido a quem é gentil
em fala e conduta. Mas facas afiadas estão prontas para o intruso injusto. Pois não há entrada,
exceto para os justos.
II. Aqueles que são irrepreensíveis em questões de conduta, nenhuma palavra
pode prevalecer contra eles. E aqueles que têm autodomínio, os rudes são mais gentis com
eles do que suas próprias mães, e todas as pessoas se tornam suas servas. Deixe seu nome sair,
então, enquanto tu mesmo estiveres em silêncio e serás reconhecido e respeitado.
III. Não seja arrogante entre seus pares por causa de sua força. E tome cuidado ao
agir de maneira a incentivar a oposição. Pois não se sabe o que acontecerá ou as coisas que
Deus fará para punir o mal.
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O Livro de Kheti

I. Seja hábil em falar para ter sucesso. A língua de um homem é sua espada e a
fala eficaz é mais forte do que toda luta. Ninguém pode superar os hábeis. Uma pessoa sábia é
uma escola para os nobres e aqueles que têm consciência de seu conhecimento não o atacam.
Nenhum mal acontece quando ele está perto. A verdade chega a ele em sua forma essencial,
moldada nos ditos dos ancestrais.
II. Siga os passos de seus antepassados, pois a mente é treinada através do
conhecimento. Eis que essas palavras perduram nos livros. Abra e leia-os e siga seus sábios
conselhos. A quem é ensinado, torna-se hábil. Não seja mau, pois a bondade é boa. Faça a tua
memória durar através de teu amor. Multiplique as pessoas que a cidade abriga, para que Deus
seja louvado por suas doações. E o povo... agradecerá por sua bondade e orará por sua saúde.
III. Adiante teus funcionários para que eles ajam de acordo com tuas leis. Quem
tem abundância em casa não será tendencioso. Um tem riqueza quando ele ou ela não tem
desejos. Uma pessoa pobre pode não falar verdadeiramente e alguém que diz “eu gostaria de
ter”, não é sincero. Ela se inclina em direção a quem o pagará. Verdadeiramente grande é uma
pessoa importante quando seus homens e mulheres de estatura são excelentes. Forte é o rei
que tem conselheiros e rico é aquele que é rico em estatura.
IV. Fale a verdade em sua casa para que os príncipes da terra possam respeitá-lo. A
justiça é adequada para um governante. Pois é a frente da casa que inspira respeito nas costas.
Faça o que é certo para que possas viver muito tempo na terra. Conforta o choro e não oprime
a viúva. Não afaste ninguém da propriedade de seu pai. Não defraude os nobres de sua
propriedade. Cuidado com a punição injusta. Não mate, pois não terá lucro.
V. Não faça distinção em seu comportamento entre os de nível hierárquico e as
pessoas comuns. Em vez disso, escolha uma pessoa por causa de suas habilidades, para que
todas as embarcações possam continuar.
VI. Uma geração sucede a outra e Deus que conhece a natureza humana está
oculto. Não se pode evitar ou opor-se à mão de Deus. Ele alcança tudo o que os olhos veem.
Assim, deve-se reverenciar a Deus em seu caminho ... Como um curso de água seca é
substituído por um riacho, também nenhum rio se deixa esconder. Quebra a barreira atrás da
qual estava oculto. Assim também a alma chega ao lugar que conhece e não se desvia do
caminho anterior.
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VII. Torne digna a sua casa no Oeste e torne firme o seu lugar na cidade dos que
partiram sendo retos e justos. É sobre isso que os corações de homens e mulheres confiam.
Pois mais aceitável é a virtude dos justos do que o boi daqueles que praticam o mal. Sirva a
Deus para que ele também possa trabalhar por ti.
VIII. Bem cuidada é a humanidade que são os rebanhos de Deus. Ele fez o céu e a
terra por causa deles. Ele destruiu os perigos da água. Ele deu o sopro da vida para seus
narizes. Eles são à Sua imagem e vieram do Seu corpo. Ele brilha no céu por causa deles. Ele
fez plantas para eles e gado, peixe e aves para nutri-los. Ele matou Seus inimigos e reduziu
Seus filhos quando eles conspiraram para se rebelar contra Ele. Ele faz a luz do dia por causa
deles e navega em Seu barco sagrado para poder vê-los. Ele construiu Seu santuário ao redor
deles e quando eles choram, Ele ouve. Ele fez para eles governantes, até mesmo do ovo,
líderes para levantar a carga das costas dos fracos. Ele fez para eles palavras de poder como
armas para afastar o golpe dos eventos do mal, guardando-os de dia e de noite. Ele matou os
traidores entre eles quando um homem golpeou seu filho por causa de seu irmão. Pois Deus
conhece todo nome.
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O Livro de Ani

I. Não entre e saia do tribunal de justiça para que seu nome não seja manchado.
Não brigue em uma discussão. Fique em silêncio e isso irá servi-lo bem. Não vá na presença
de um bêbado, mesmo que prometa lhe trazer honra.
II. Derrama libação para seu pai e sua mãe que descansam no vale dos mortos.
Deus testemunhará sua ação e a aceitará. Não se esqueça de fazer isso mesmo quando estiver
longe de casa. Pois, como faz com seus pais, seus filhos também farão por ti.
III. Não frequente tabernas, para que palavras más não caiam da sua boca e não
saibas o que estás dizendo. Se tu cair, seus membros poderão se quebrar e não haverá
ninguém para ajudá-lo. Até seus companheiros de bebida podem se levantar e dizer "Ponha o
bêbado para fora". Se alguém procurar e conversar contigo, o encontrará deitado no chão,
como se fosses uma criança pequena.
IV. Quando o mensageiro da morte vier para levá-lo, deixe-o encontrá-lo pronto
para ir ao seu local de descanso, dizendo: "Aí vem alguém preparado diante de ti". Não diga
então "eu sou jovem demais para ser levado". Pois a morte chega e agarra o bebê no seio de
sua mãe, bem como o homem e a mulher que atingiram a velhice.
V. Proteja-se contra palavras e atos de engano e contra palavras que não são
verdadeiras. Destrua o desejo de fazer e falar mal dentro de ti, pois o homem mau não tem
descanso.
VI. Afaste-se do homem agressivo e não o leve como companheiro. Tome então
para um amigo aquele que é verdadeiro e justo, cujas ações observaste. E se sua justiça é igual
à dele, sua amizade será equilibrada.
VII. Pequenos presentes retornam mais e o que é substituído traz abundância. Os
sábios vivem da casa dos tolos. Proteja o que é seu e tu sempre o encontrarás. Estejas atento
ao que possuis, para não acabar como um mendigo. Quem está sempre ocioso não vale de
nada, mas quem é diligente é honrado.
VIII. Se Deus lhe concede filhos, que o coração de seu pai e sua mãe os conheça.
Quem tem fome, fique satisfeito na casa de sua mãe e seu pai. Deixe-os encontrar ali um muro
que os proteja. Não fique sem coração generoso, pois é Deus quem lhe dá riqueza.
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IX. Não se sente quando alguém mais velho do que tu está de pé, mesmo que tenha
alcançado um status mais alto em sua profissão. Nenhuma falha é encontrada com um bom
caráter, mas um caráter maligno é sempre culpado.
X. Ande todos os dias no caminho da retidão e chegará ao lugar para onde está
indo. Nunca fale palavrões a nenhum visitante; uma palavra dita descuidadamente, algum dia,
quando estiveres fofocando, poderás derrubar sua casa. Se fores generoso em tempos de
prosperidade, quando a adversidade vier, serás capaz de suportá-la. Se és justo, serás
reconhecido e respeitado. E, se estiveres entre muitos ou poucos, encontrarás tua família e
amigos, e tudo o que desejar será concedido.
XI. Não deixe seu coração se revelar para estranhos, para que não usem suas
palavras contra ti. Palavras ofensivas que saem da sua boca, se repetidas, podem fazer
inimigos amargos. Uma pessoa pode ser arruinada por sua língua. Tome cuidado e se sairá
bem. O coração dos humanos é amplo como um armazém e cheio de respostas de todos os
tipos. Escolha então os que são bons, fale-os e mantenha aqueles que são ruins fechados em
sua barriga. Uma resposta dura provoca conflitos, mas quem fala com gentileza é amado.
XII. Dobre os presentes que sua mãe lhe deu e cuide dela enquanto se importava
contigo. Ela carregava um fardo pesado por ti e não o abandonou. Quando ela te trouxe depois
de seus meses, ela ainda estava ligada a ti. Pois os seios dela ainda estavam na sua boca por
três anos. Enquanto tu crescia, ela limpou sua sujeira sem nojo no coração e sem dizer "ó, o
que posso fazer?" Ela te colocou na escola para ser educado e veio lá diariamente em teu
nome com pão e cerveja para seu professor. Assim, quando se tornar jovem e se casar com
uma esposa e estabelecer sua casa, não perca de vista sua própria infância. Crie seus filhos
como sua mãe fez. Não deixe que ela encontre falhas em ti, para que ela não levante as mãos
de Deus contra ti e Deus ouça suas queixas e o castigue.
XIII. Não coma pão enquanto outro estiver parado, sem estender a mão para ele.
Quanto à comida, está sempre aqui, são homens e mulheres que não ficam. Uma pessoa pode
ser rica ou pobre, mas o pão permanece com quem a compartilha. Quem era rico no ano
passado pode ser um vagabundo este ano. Portanto, não fique ansioso para encher a barriga
sem considerar os outros. Pois não sabes aonde seu curso levará. Se te tornares carente, outro
poderá fazer o bem por ti. O curso de água do ano passado desapareceu e este ano outro
riacho apareceu em seu lugar. Grandes águas desapareceram nas profundezas do oceano.
Nenhum homem ou mulher caminha por um único caminho. Esta é uma lição do Senhor da
Vida.
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XIV. Não dê ordens à sua esposa em sua casa quando souber que ela a mantém em
excelente ordem. Não pergunte a ela “onde está” ou diga a ela “traga para nós” quando ela
tiver colocado no lugar apropriado. Observe-a com cuidado e fique em silêncio e verás como
ela maneja. Quão feliz é sua casa quando tu a apoias. Existem muitos homens que não sabem
disso. Mas se um homem se abstém de provocar conflitos em casa, não verá o seu início.
Assim, todo homem que deseja dominar sua casa deve primeiro dominar suas emoções.
XV. Não responda aos anciãos que estão com raiva. Deixe-os seguir o seu caminho.
Fale docemente quando falarem amargamente. Pois é um remédio que acalma o coração.
Respostas controversas provocam conflitos e, eventualmente, sua vontade será quebrada. Não
fique perturbado o seu coração, pois em breve eles voltarão para louvá-lo quando a hora da
raiva passar. Quando suas palavras agradam o coração, o coração está inclinado a aceitá-las.
Procure o autodomínio e seu domínio vos subjugará.
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O Livro de Amenemope

I. Cuidado com o roubo dos pobres e a opressão dos fracos e desamparados. Não
levante a mão contra os idosos nem fale com um ancião com discurso impróprio. Não se
deixe levar em uma missão maligna, nem fique na companhia daqueles que o realizaram. Não
se enfureça contra aqueles que o feriram, nem por sua conta, responda-os. O cais cai debaixo
dos ímpios e uma inundação de água os lavam. O vento norte desce para terminar sua hora na
terra e se transforma em uma tempestade; o trovão ruge e os crocodilos vêm sem piedade.
II. Vamos seguir um rumo justo para que possamos carregar os ímpios através do
caminho, sem nos tornarmos como eles. Levante-os, dê-lhes a mão e, em seguida, deixe-os
nas mãos de Deus. Encha-os com a comida de sua bondade para que fiquem satisfeitos e se
arrependam. Outra coisa boa no coração de Deus é que você pare e pense antes de falar.
III. Não discuta com os contenciosos, nem os provoque com palavras. Faça uma
pausa diante daqueles que o interrompe e dê lugar aos que o ataca verbalmente. Durma uma
noite antes de falar. Pois a pessoa irrestrita é como uma tempestade que explode como uma
chama em uma pilha de palha.
IV. Agora, o homem ou a mulher irrestrita no templo é como uma árvore cultivada
em terreno não fértil. Suas folhas murcham rapidamente e seus frutos verdes caem na terra.
Atinge seu fim no pátio de madeira ou flutua longe de seu lugar. E seu tecido mortuário se
torna uma chama de fogo. Mas o homem ou a mulher com autodomínio se diferencia. Ele ou
ela é como uma árvore cultivada em solo fértil. Cresce em solo verde e dobra sua produção de
frutas. Ele tem seu lugar aos olhos de seu dono. Sua fruta é doce, sua sombra é agradável e
seu fim é alcançado no jardim.
V. Melhor é um alqueire que Deus lhe dá do que cinco mil obtidos
indevidamente. Tais ganhos não ficam um dia no armazém ou no celeiro e são inúteis na
fabricação de cerveja. A estadia deles no depósito não passa de um momento. Quando a
manhã chega, eles afundam de vista. Melhor ser pobre nas mãos de Deus do que riquezas no
armazém. Melhor é o pão com um coração feliz do que as riquezas com muita preocupação.
VI. Não se regozijem com as riquezas obtidas pelo roubo nem se lamentam por
causa da pobreza. Se os arcos da frente avançam muito longe, a empresa os abandona. O
barco do avarento é abandonado na lama, mas o navio do homem e da mulher autônomos
navega com o vento. Reza a Deus todos os dias quando o sol nasce, dizendo: "Conceda-me
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prosperidade e saúde". E Deus lhe dará tudo o que você precisa na vida e estará seguro do
medo.
VII. Mantenha sua língua longe das palavras de depreciação, e você será amado
pelo povo. Você encontrará seu lugar no templo de Deus e seus dons estarão entre as ofertas
aos seus senhores. Você será grandemente honrado na velhice, devidamente escondido em seu
caixão e a salvo da ira de Deus.
VIII. Pois a mulher e o homem irrestritos são como um filhote de lobo no quintal da
fazenda. Eles olham um contra o outro. Eles fazem com que irmãos e irmãs discutam. Eles
vão diante de todo vento como nuvens. Eles obscurecem o brilho do sol. Eles dobram a cauda
como um crocodilo bebê, enrolando-se para infligir danos. Seus lábios são doces, mas sua
língua é amarga e um fogo consumidor queima em sua barriga. Não pule para se juntar a
alguém, para que não traga infortúnio a si mesmo.
IX. Não fale falsamente com ninguém, pois é uma abominação para Deus. Não
separe o coração da língua e todos os seus planos serão bem-sucedidos. Terás peso na
presença de outras pessoas e estará seguro nas mãos de Deus. Deus odeia quem falsifica as
palavras. E a grande abominação de Deus é o engano e a dupla negociação.
X. Não engane um homem ou mulher com caneta e papiro. É uma abominação
para Deus. Não dê testemunho com palavras falsas, nem fira outra pessoa com a língua. Não
taxe quem não tem nada, nem faça sua caneta escrever falsamente. Se encontrar uma dívida
grande contra uma pessoa pobre, divida-a em três partes, perdoe duas e deixe uma ficar de pé.
Descobrirá que este é um caminho de vida. Passará a noite em um sono profundo e pela
manhã, encontrarás novamente como uma boa notícia. Melhor é o elogio com o amor dos
outros do que a riqueza no armazém. Melhor é o pão quando a mente está em paz do que
riquezas com o coração atribulado.
XI. Não confunda uma pessoa no tribunal nem maltrate os justos. Não leve em
consideração aqueles que estão com roupas limpas e não rejeite aqueles que aparecem em
trapos. Não aceite o presente do homem forte nem oprima o fraco por ele. A justiça é um
grande presente de Deus e Deus a dá a quem Deus deseja. Certamente, a força de quem é
como Deus salva os miseráveis de seu opressor.
XII. Não diga: “Encontre um protetor forte para mim, pois alguém na minha cidade
me machucou”. E não diga: "Encontre-me um redentor, pois quem me odeia me fez mal".
Certamente não conheces os planos de Deus e não podes ver o amanhã. Sustente-se, então,
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nas mãos de Deus. E seu autodomínio em silêncio os derrubará. Pois antigo e profundo é o
medo do crocodilo que não faz barulho.
XIII. Não revele a sua alma a todos, nem prejudique o respeito por ti. Não espalhe
suas palavras entre os outros, nem se associe com aqueles que desnudam seus corações.
Melhores são aqueles cujo conhecimento permanece dentro deles, do que aqueles que falam
em desvantagem. Não se corre para alcançar a perfeição. E não se cria para se destruir.
XIV. Não ria dos cegos, nem zombe de um anão, nem interfira nos planos dos coxos.
Não assedie os que estão nas mãos de Deus, nem seja feroz diante deles, se eles errarem.
Certamente, os humanos são argila e palha, e Deus é o construtor. Deus derruba e edifica
diariamente. Deus faz mil humildes como quer. É Deus quem transforma milhares em
superintendentes quando estão na hora de suas vidas. Bem-aventurados os que alcançam o
Oeste enquanto estão seguros nas mãos de Deus.
XV. Se tu vires uma pessoa mais velha do lado de fora, ande atrás dela
respeitosamente. Dê também uma mão aos idosos cheios de cerveja. E respeite-os como seus
filhos fariam. O braço forte não é enfraquecido por ser descoberto. E as costas não são
quebradas dobrando-as em respeito. Melhor é uma pessoa pobre que fala palavras agradáveis
​do que uma pessoa rica cujas palavras são tão duras e secas como palha. Um piloto que vê à
frente não afundará o navio nas rochas.
XVI. Não exponha uma viúva se você pegá-la no campo. Nem deixe de entender sua
resposta. Não recuse seu jarro de óleo a um estranho para dobrá-lo para seus amigos e
familiares. Deus ama mais aqueles que respeitam os pobres do que aqueles que reverenciam
os ricos.
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O livro de Ankhsheshonqi

I. Sirva a Deus para que Ele possa protegê-lo. Sirva seus irmãos e irmãs para que
possas ter uma boa reputação. Sirva uma pessoa sábia, para que ela possa lhe servir. Sirva
quem o servir. Sirva qualquer pessoa, para que possas se beneficiar. E sirva a sua mãe e seu
pai, para que possas seguir em frente e prosperar.
Examine todos os assuntos que entender. Não diga “sou instruído”, mas prepare-se
para se tornar sábio. Seja gentil e paciente, então seu caráter será lindo. É no desenvolvimento
do caráter que a instrução é bem-sucedida. Aprenda a estrutura e o funcionamento do céu.
Aprenda a estrutura e o funcionamento da terra.
A boa sorte de uma cidade é um líder que age com retidão. A boa sorte de um templo é
seu sacerdote. A boa sorte de um campo é o tempo em que é trabalhado. A boa sorte de um
armazém é a sua armazenagem. E a boa sorte dos sábios é seu excelente conselho.
II. Que o “irmão mais velho” da cidade seja aquele a quem é confiado. Que o
irmão mais gentil da família seja aquele que age como "irmão mais velho" por isso. Que eu
tenha alguma coisa e que meus parentes tenham alguma coisa para que eu possa comer sem
me conter. Que a água da enchente nunca deixe de chegar. Que o campo nunca deixe de
florescer. Que os filhos honrem o pai e a mãe. Que a lua siga o sol e não deixe de nascer. Que
eu possa reconhecer meus amigos para poder compartilhar meus bens com eles. Que eu possa
reconhecer meu irmão e irmã, afim de que possa abrir meu coração para eles. E que a vida
sempre siga a morte.
Não envie um homem sábio em um assunto pequeno quando um assunto importante
estiver esperando. Feliz é o coração daquele que fez um julgamento perante um homem sábio.
Um mestre sábio que pede conselhos, sua casa permanece para sempre. Um homem sábio
procura um amigo, um tolo procura um inimigo. Os filhos do tolo andam pelas ruas, mas os
sábios estão sempre com eles. Um homem sábio é aquele que sabe o que se passa à sua volta.
III. Que o coração de uma esposa seja o coração de seu marido, para que eles
fiquem livres de contendas. Se uma mulher está em paz com seu homem, ela nunca se sairá
mal. Se uma mulher sussurra sobre seu homem, ela nunca se sairá bem. Uma boa mulher de
caráter nobre é comida que vem em tempos de caçador. Uma mulher que permanece uma
mulher à noite é elogiada durante o dia. Quem violar uma mulher casada na cama terá sua
esposa violada no chão. Uma mulher se deixa amar de acordo com o caráter de seu homem.
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Não envie um tolo em um assunto importante quando puder enviar alguém que seja
sábio. Não instrua o tolo para que ele não te odeie por isso. Quando alguém instrui um tolo,
ele ou ela diz: "O que eles estão fazendo me insulta". O amigo de um tolo é um tolo. O amigo
de uma pessoa sábia é outra pessoa sábia. Se receber pão por ser estúpido, pode aprender a
desprezar as instruções. Embora o caminho de Deus esteja diante de todas as pessoas, o tolo
não pode encontrá-lo.
IV. Não menospreze os idosos em seu coração. Honre os idosos em seu coração, e
será honrado no coração de todos. Não ria do seu filho na frente da mãe, para não aprender a
medida do pai. Não prefira um de seus filhos ao outro, pois não sabe qual deles será gentil
contigo.
Não há dente com cárie que permaneça em seu lugar. Não há amigo que anda sozinho.
Não existe um sábio que sofra. Não há tolo que encontre lucro. Não há ninguém que deserte
seu companheiro de viagem, a quem Deus não responsabiliza por isso. Não há quem engane
quem não é enganado, nem quem pratica o mal que realmente prospera.
V. Não atire uma lança se não conseguir apontar corretamente. Não faça mal a
uma pessoa e, portanto, faça com que outra pessoa faça isso com você. Deixe a sua
generosidade alcançar quem precisa. Não seja mesquinho, pois a riqueza não é uma segurança
real. Fale a verdade para todos; deixe que se apegue ao seu discurso. Não faça a uma pessoa o
que não gosta e, assim, faça com que outra pessoa faça isso contigo também. Não há boa
ação, exceto a boa ação que é feita para quem precisa dela. Aqueles que lutam junto com o
povo de sua cidade se regozijarão na vitória com eles.
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O Livro de Phebhor

I. Se uma viga for maior que a medida correta, o excesso será cortado. Se o vento
sopra além da medida certa, destrói os navios. Aqueles que aplicam a medida certa em todas
as coisas boas não são culpados. O Deus da justa medida criou um equilíbrio para estabelecer
a medida correta na terra. Ele colocou o coração no fundo do corpo para a medida certa de seu
dono. Assim, se aqueles que aprendem não são equilibrados, seu aprendizado é de pouca
utilidade, e um tolo que não sabe equilibrar, não escapa à desgraça. Orgulho e arrogância são
a destruição de seu dono. Mas aqueles de caráter gentil criam seu próprio destino.
II. A criança tola que um pai ou mãe não instruiu é como uma estátua de pedra. É
uma vantagem e boa sorte de um filho e uma filha pedir e receber instrução. Mas nenhuma
instrução pode ter sucesso, se houver ressentimento por ela. Os jovens que não são
corrompidos por desejos básicos não são culpados, e aqueles que controlam seu apetite
sexual, seu nome não emitem um odor desagradável. Aqueles que são firmes e atenciosos são
escolhidos entre as pessoas e aqueles que ouvem uma correção se protegem de receber outra.
Certamente, a falha em todo tipo de personagem está em não ouvir. O Deus da sabedoria
colocou os enfermos na terra para ensinar os tolos por meio deles. Mas Ele deu aos sábios um
sentimento de vergonha para evitar toda punição. Assim, um jovem que tem respeito por
vergonha não é rejeitado com punição.
III. É melhor uma serpente estar em casa do que um tolo que vem com frequência.
Aqueles que se associam a um tolo são atraídos para o mal. Quem vive com um tolo morre
em cativeiro. Os amigos dos tolos dormem amarrados a eles. E a má conduta dos tolos
prejudica até seus próprios parentes. Quando um tolo acende um fogo, ele se aproxima demais
e se queima. E quando um tolo começa uma briga, ela se aproxima demais e lhe derruba.
Aqueles que andam com os sábios compartilham seus elogios, mas aqueles que passam na
companhia de um tolo criam um mau cheiro na rua.
IV. Não seja ganancioso, para que seu nome não cheire um odor ofensivo. A
ganância traz conflitos e brigas em uma casa, leva todo o sentimento de vergonha,
misericórdia e confiança do coração de alguém e causa tumulto na família. Aqueles que são
gananciosos não gostam de dar para quem os deu. Eles não consideram o amanhã, pois estão
preocupados apenas com o momento e a ganância está junto. O dinheiro é a armadilha que
Deus colocou na terra para os ímpios, para que eles se preocupassem todos os dias. Mas Ele
dá àqueles a quem favorece, a fim de tirar a preocupação do coração deles.
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V. Aqueles que dão comida generosamente quando têm dinheiro são aqueles a
quem o destino dá fortuna. Pois a riqueza vai para aqueles que dão comida a outros por meio
dela. O coração de Deus é satisfatório quando os pobres estão previstos diante Dele. Assim, se
você adquirir propriedade, dê uma parte a Deus dando uma parte aos pobres. Se você adquirir
um imóvel, gaste-o na sua cidade para que não haja turbulência. Se estiver ao seu alcance,
convide os que estão longe e os que estão perto de você. Para aqueles que convidam de longe,
o nome deles será ótimo quando forem longe. Aqueles que amam seus vizinhos encontrarão
uma família ao seu redor. Deus permite que se adquira riqueza em troca de fazer o bem. E
aqueles que dão comida aos pobres, Deus os leva para Si em misericórdia, sem medida.
VI. Gentileza na conduta de todo tipo faz com que o sábio seja louvado. Não faça
sua boca rouca ou fale alto com a língua. Pois uma voz alta causa danos aos membros do
corpo como uma doença. Não fique tão impaciente quando pedir, que guardes a raiva
enquanto estiver ouvindo. O louvor dos sábios é grande diante das pessoas porque elas
ouvem. Não ceda frequentemente à sua língua para aconselhar quando não foi solicitado.
Aqueles que se apressam com a boca, dão uma resposta incorreta quando falam. Não se leva a
sério as palavras do falador ao considerar uma acusação. E não se julga a queixa de um tolo
com base no quão alto é apresentado.
VII. Se os sábios não são calmos, seus modos não são perfeitos. Se não houver
calma na batalha, o exército não descansa. Se não houver calma entre as festas, o dono e a
amante da casa não poderão se divertir. E se não há calma em um templo, Deus a abandona.
Assim, louvor é dado aos sábios por causa de sua calma e a velhice é um bom momento na
vida por causa da calma que vem com ele.
VIII. Não tome uma coisa pequena para não sofrer com isso. O dano mortal chega ao
tolo por levar a grandeza de ânimo leve em seu coração. Da mesma forma, o mal chega a uma
grande pessoa por levar a pequenez de ânimo leve. É Deus quem dá aos sábios discernimento
no coração, a fim de que eles tenham o devido respeito. Quem teme todo dano evita todo
dano. Não tome de ânimo leve uma pequena doença para a qual existe um remédio, tome o
remédio.
Uma pequena cobra tem veneno. Um pequeno rio tem seus perigos. Um pequeno
incêndio deve ser temido. Um pequeno documento tem grandes benefícios. Um pequeno
cordão se liga. Uma pequena verdade defende seu dono. Uma pequena mentira causa
problemas para quem conta. Um pouco de comida dá saúde a quem a possui. Poupar um
pouco leva à riqueza. O pequeno coração sustenta seu dono. Algumas boas notícias fazem o
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coração feliz. Um pouco de orvalho dá vida aos campos. Um pouco de vento leva o barco.
Uma abelhinha traz mel. Um pequeno gafanhoto deposita a videira no lixo. Um pequeno erro
leva à morte. E pequenas ações boas não estão escondidas de Deus. Assim, muitas são as
pequenas coisas que merecem respeito, mas poucas são as grandes que merecem admiração.
IX. O coração e a língua dos sábios e a grandeza do lugar em que descansam, todos
vêm de Deus. Quando o povo levanta a mão, Deus sabe disso. Ele conhece o ímpio que
imagina o mal. Ele conhece os piedosos e que eles têm a grandeza de Deus em seus corações.
Antes da pergunta da língua, Deus sabe sua resposta. Ele dirige o coração e a língua por Seu
comando. É Ele quem dá uma decisão justa, sem ter audiência. Ele permite que uma pessoa
seja ótima em sua vida por causa de Sua misericórdia. E Ele faz do pobre mendigo um mestre
porque conhece seu coração.
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Os Livros de Contemplação

OS LIVROS DE CONTEMPLAÇÃO. Esses livros contêm três formas de


contemplação: lamentações, afirmações proféticas e meditações sobre a morte e a vida eterna.
Esses livros refletem um ceticismo, tristeza e postura contemplativa nascidos do colapso e
transformação da ordem social e o consequente caos e perda do centro cultural que isso
trouxe. Os Livros de Khakheper-Rá-Seneb e Ipuwer representam lamentações sobre o baixo
estado em que a sociedade havia caído. Como Khakheper-Rá-Seneb diz, “Maat, retidão e
ordem, foram expulsos e Isfet, mal e caos, está no Salão do Conselho. O caminho de Deus é
violado e Seus Comandantes são afastados. A terra está turbulenta e há luto por toda parte”.
Ipuwer lamenta a reversão da ordem social quando pessoas de fora destruíram a
harmonia interna e a estabilidade da antiga sociedade Egípcia. “Eis agora”, diz ele, “quão
grandemente as pessoas tem mudado”. “O ladrão ficou rico e a pessoa honrada, ladrona”.
Os estrangeiros impuseram novos caminhos e criaram novas relações e os justos "egípcios de
ontem não podem ser encontrados em lugar algum".
No Livro do Diálogo com a Alma, um homem expressa desespero pelas mudanças nas
circunstâncias sociais e contempla a morte. Este é o exemplo literário mais antigo conhecido
de uma alma em alvoroço, confrontando sofrimentos injustos e levantando a questão do
porquê e do que deve ser feito. Ele antecede o Livro Hebraico de Jó aproximadamente mil e
quinhentos anos, que representa uma preocupação e questão semelhante e com o qual foi
comparado. O Livro das Canções concentra a meditação na inevitabilidade da morte e na
necessidade de aproveitar a vida agora, na maior parte do tempo, e sugere uma postura que é
expressa mais tarde no Livro Hebraico de Eclesiastes. A última canção, no entanto,
concentra-se nos elogios ao aprendizado e aos aprendizes e argumenta que é o aprendizado
conquistado que faz com que o nome de alguém dure para sempre.
Finalmente, o Livro de Neferti oferece profecia da vinda de um justo rei salvador, um
messias para restabelecer Maat e expulsar Isfet. Esta é a projeção messiânica mais antiga e
mais clara e antecede o modelo hebraico de Davi por mais de mil anos. Pelo menos um
egiptólogo tradicional argumentou que esse messianismo era evidente em Ipuwer; o que é
pelo menos quinhentos anos antes. Mas a passagem que ele cita para apoiar parece mais um
apelo a Deus do que a um faraó. No entanto, existem outras passagens em Ipuwer que
sugerem uma esperança e projeção messiânica. Além disso, uma nota de interesse nessa
50

profecia é a previsão de um rei messias nascido de uma mãe da Núbia, que foi a fonte de
repetidos renascimentos egípcios após períodos de degeneração e desespero.
51

Livro de Khakheper-Rá-Seneb

I. Que eu saiba do que os outros ignoram, algo que já não havia sido dito, para
que eu possa falar e meu coração me responder. Que eu possa explicar minha aflição e mudar
esse fardo nas minhas costas e dizer daquilo que me aflige. Que eu possa contar o que sofro e
dar um suspiro de alívio posteriormente.
Eu medito no que tem acontecido, nas coisas que aconteceram por toda a terra.
Mudanças estão ocorrendo e não é como no ano passado. Um ano é mais problemático do que
o outro. A terra está em alvoroço e sendo destruída. Maat, retidão e ordem, tem sido expulsa e
Isfet, mal e caos, está no Salão do Conselho. O caminho de Deus é violado e Seus
mandamentos ignorados. A terra está em alvoroço e há luto por toda parte.
II. Toda vez que o dia amanhece traz eventos dos quais o rosto é forçado a
virar-se. Eu falo fortemente contra isso. Meus membros estão muito pesados e meu coração
está carregado de tristeza. É doloroso não falar sobre isso. Outro coração pode dobrar ou
quebrar, mas um coração forte em meio a dificuldades é um aliado para seu dono.
Então Khakheper-Rá-Seneb disse ao seu coração: Vem, meu coração! Para que eu
possa falar contigo e que possas me responder ao que tenho dito. Interprete para mim o que
está acontecendo na terra. Por que aqueles que antes eram tão brilhantes agora estão abatidos?
Eu medito sobre o que aconteceu. A miséria chegou hoje e o alvoroço não terminará amanhã.
III. Todo mundo está calado sobre isso. A terra toda está com grandes problemas.
E ninguém é suficientemente sábio para conhecê-los; ninguém fica encolerizado o suficiente
para falar, e todos os dias amanhece o sofrimento. Portanto, meu sofrimento é longo e pesado.
Os fracos e miseráveis não têm forças para salvar-se daquilo que os esmagam. É doloroso
ficar calado sobre o que se ouve e, no entanto, é inútil responder aos ignorantes.
As pessoas amam apenas suas próprias palavras. Todo mundo baseia-se na
desonestidade e a fala correta é abandonada. Falei contigo, meu coração; agora me responda.
Um coração que se aproxima não deve ficar calado, pois certamente o servo e o mestre
compartilham o mesmo destino. E assim, muitas são as coisas que também devem pesar sobre
ti.
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O Livro de Ipuwer

I. Eis o que os ancestrais predisseram! A terra está cheia de bandos de


malfeitores e o lavrador vai lavrar com seu escudo. Rostos estão pálidos; arqueiros estão
prontos; as transgressões estão por toda parte e não há homem ou mulher de ontem. Eis que as
mulheres estão estéreis e nenhuma concebe, pois Deus não cria mais criança alguma por causa
do estado da terra! Há sangue por toda parte e não faltam mortos. De fato, o tecido mortuário
clama antes que alguém se aproxime.
Eis que a terra gira como uma roda de oleiro! O ladrão ficou rico e a pessoa honrada,
um ladrão. Os estrangeiros de fora vieram ao Egito e a pessoa egípcia de ontem não pode ser
encontrada em lugar algum. Eis que os grandes e os pequenos dizem: “eu gostaria de estar
morto”, e as crianças pequenas dizem: “ele não deveria ter-me feito viver”. Eis que o
desenfreado diz: “Se eu soubesse que Deus existe, o serviria”.
II. Veja agora, quão grandemente as pessoas mudaram! Quem nunca dormiu numa
caixa, agora possui uma cama. Aqueles que antes não se teciam, agora possuem linho fino.
Veja! Aqueles que antes não construíram barcos, agora possuem navios, e os antigos donos
apenas olham, pois não são mais deles. Aqueles que antes não tinham abrigo, agora têm casas,
e aqueles que tinham enxadas, estão na explosão da tempestade. E aqueles que nada sabiam
sobre Deus, agora fazem oferendas a Ele com o incenso de outros.
Ora, por que Deus procura criar homens e mulheres, quando os gentís não se
distinguem dos violentos? Porém, Ele traz frescor no meio do calor. E todos dizem: “Ele é o
pastor de toda a humanidade e não há mal em Seu coração”. Embora Seus rebanhos sejam
poucos, Ele passa o dia inteiro cuidando deles. Mas não há fogo em seus corações. Oh, que
Ele tivesse percebido a natureza deles na primeira geração! Então Ele teria destruído os
ímpios, estendido Seus braços contra eles! Certamente, Ele teria destruído sua semente e seu
legado.
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O Livro do Diálogo com a Alma

I. Eu falei com minha alma para que pudesse responder o que dizia: Com quem
devo falar hoje? Irmãos e Irmãs estão maus e hoje os amigos não valem a pena amar. Os
corações estão muito gananciosos e todo mundo apreende os bens do próximo. A bondade
passou longe e a violência é imposta a todos.
Com quem devo falar hoje? As pessoas aceitam voluntariamente o mal e a bondade é
lançada ao chão em toda parte. Aqueles que deveriam enfurecer as pessoas por suas más
ações, as fazem rir de seus maus atos. As pessoas saqueiam, e todos apreendem os bens de
seus vizinhos.
II. Com quem devo falar hoje? Quem está fazendo algo errado é um amigo
íntimo, e o irmão com quem costumava lidar é um inimigo. Ninguém se lembra do passado e
ninguém devolve a boa ação que é feita. Irmãos e irmãs são maus e as pessoas recorrem a
estranhos por justiça ou afeto.
Com quem devo falar hoje? Os rostos estão vazios e todos desviam a face de seus
irmãos e irmãs. Os corações estão gananciosos e não há coração de homem ou mulher sobre o
qual alguém possa se apoiar. Ninguém é justo ou reto e a terra é deixada aos que praticam o
mal.
Com quem devo falar hoje? Não há amigos íntimos e as pessoas recorrem aos
estranhos para contar seus problemas. Nenhum deles estão contentes e aqueles com quem
costumava andar não existem mais. Estou sobrecarregado de tristeza e não tenho ninguém
para me confortar. Não há fim para o mal que percorre a terra.
III. Portanto,
Morte, para mim, atualmente é como saúde para os doentes, como ir ao ar livre após o
confinamento. Morte, para mim, atualmente é como o cheiro da mirra, como sob a vela sobre
um dia ventoso. Morte, para mim, hoje, é como a fragrância da flor-de-lótus, como estar
sentado na margem do banquete.
Morte, para mim, atualmente é como um caminho bem trilhado, como retornar para
casa após a guerra. Morte, para mim, hoje, é como a clareira das nuvens do céu, como uma
pessoa descobrindo o que era desconhecido. Morte, para mim, hoje, é como a saudade de casa
após passar muitos anos em cativeiro.
54

IV. Certamente, quem alcança o além será um deus vivo, punindo as ofensas do
transgressor. Certamente, quem alcança o além será aquele que fica na Casca do Sol de Rá,
causando presentes abundantes aos templos. Certamente, quem alcançar o além será
considerado sábio e não será impedido de apelar para Rá quando ele ou ela falar.
E minha alma disse-me: Deixe de lado tuas queixas, meu camarada e irmão. Faças
oferendas sobre o sacrificial e apegue-se à vida como Eu disse. Me ames, sua alma, aqui!
Separe os pensamentos da morte e deseje-a somente quando teu corpo se unir à terra. Então,
Eu vou pousar em ti após tornar-se verdadeiramente cansado e juntos nos habitaremos para
sempre.
55

O Livro das Canções

I. Canção do Faraó Antef, o vindicado:


Próspero é esse bom príncipe! Pois seu tipo de destino aconteceu. Uma geração passa
e outra permanece desde o tempo dos ancestrais. Os exaltados que viveram nos tempos
antigos agora descansam em suas pirâmides. E os nobres abençoados também estão
enterrados em suas pirâmides. Porém, aqueles que construíram essas pirâmides, seus lugares
não existem mais. Veja o que aconteceu com eles!
Tenho o coração das palavras de Imhotep e Hardedef, dois sábios da antiguidade,
cujos ensinamentos são repetidos com frequência. Porém, onde estão seus lugares agora?
Todas as suas paredes foram destruídas, seus lugares desapareceram como se nunca tivessem
existido. Não há ninguém que retorne de lá para que possa nos dizer como se sai, ou o que
eles precisaram para que nossos corações fiquem em paz até que também cheguemos ao local
para onde foram.
Deixes teu coração feliz então e esqueças teu dia de partida. Siga o desejo de teu
coração enquanto viver. Coloque mirra na sua cabeça e vista-se com roupas finas. Aprecie as
coisas maravilhosas adequadas para um deus. Aumente o número de coisas que tu gostas e
não deixes teu coração relaxado ou perder seu vigor. Siga os desejos de teu coração e faça o
que é bom a ti. Satisfaças tuas necessidades na terra de acordo com os comandos de teu
coração até que o dia de teu luto chegue a ti. Pois o Deus dos que partiram não ouve luto, e o
lamento não salva ninguém da sepultura. Celebres, então, os dias de regozijo e não se canses
deles. Pois eis que ninguém pode levar consigo seus bens e ninguém que parte volta
novamente.

II. Canção para o Sacerdote de Rá, Neferhotep (I):


Gerações passam desde o primeiro dia da criação e outras gerações entram em seus
lugares. O esplendor de Rá aumenta de manhã e vai descansar no Oeste. Homens geram e
mulheres concebem e toda narina respira ar. O dia amanhece e os recém-nascidos vão para
seus lugares designados. Celebre os dias de regozijo, ó sacerdote! Coloque os melhores
aromas no nariz e guirlandas de flores de lótus no pescoço, nos ombros e no corpo de sua
amada irmã que está sentada ao teu lado. Separe a canção e a música antes de ti e toda a coisa
má atrás. Lembre-se apenas da alegria, até que chegue o dia em que tu alcances o porto na
56

terra que ama o silêncio. E dê pão aos que não têm campo, pois assim obterás um bom nome
eternamente.

III. Também, para o Sacerdote Neferhotep (II):


Eu ouvi aquelas canções que estão nos túmulos dos tempos antigos. E do que dizem
quando louvam a vida na terra e menosprezam a cidade dos que partiram. Por que isso é feito
na terra da eternidade, a justa e reta, onde nenhum medo é encontrado? A briga é uma
abominação e ninguém se coloca contra um companheiro. Pois esta é uma terra que não tem
oponentes. Não há nenhum que alcançará este lugar. A duração do que é feito sobre a terra
passa como um sonho. Mas para aqueles que alcançam o paraíso no Oeste, é dito:
“Bem-vindo, são e salvo!”.
IV. Canção em Louvor aos Instruídos:
Quanto aos escribas do tempo que vieram após os poderes do céu e que predisseram o futuro,
seus nomes se tornaram eternos, mesmo que partissem tendo completado os dias de suas
vidas. E todos os seus parentes estão esquecidos. Eles não fizeram para si pirâmides de metal,
com estelas de metal do céu. Eles não sabiam deixar crianças herdeiras que poderiam repetir
seus nomes. Em vez disso, eles fizeram herdeiros dos livros de instrução que eles
compuseram.
Eles tomaram para si o pergaminho como professor-sacerdote e o quadro de anotações
como um filho amoroso. Os livros de instruções são suas pirâmides, a caneta de cana seu filho
e, a superfície de pedra em que escreveram, sua esposa. Os grandes e os pequenos se tornaram
seus filhos. Pois o escriba se tornou seu líder. O homem decai; seu corpo se torna pó e todos
os seus parentes falecem. Mas um livro faz com que ele seja lembrado pela boca daqueles que
o citam. Melhor é um livro do que uma casa bem construída, do que um túmulo no Oeste. De
fato, um livro é melhor do que uma grande casa com uma sólida fundação ou uma estela no
templo.
Existe alguém como o sábio Hardedef ou outro como Imhotep? Nenhum dos nossos
parentes é como Neferti ou Kheti, o principal deles. Submeto a ti o nome de Ptah-em-Tehuti e
de Khakheper-Rá-Seneb. Existe alguém como Ptah-hotep ou alguém que seja igual a Ka-iris?
O que veio da boca desses homens instruídos que predisseram o futuro aconteceu. E é
encontrado como uma declaração clara escrita em seus livros. Embora possam ter ocultado
suas palavras de poder de todos os outros, elas podem ser encontradas em seus livros de
57

instrução. A morte pode ter feito esquecer seus nomes, mas são seus escritos que os fazem ser
lembrados.
58

O Livro de Neferti

I. E Sua Majestade Faraó Snefru disse: “Venha Neferti, meu amigo, e fale
comigo belas palavras e frases bem escolhidas que possam agradar-me ao ouvi-las. E o
professor-sacerdote, Neferti, deplorou o que havia acontecido no Egito, falando sobre a
condição do Leste, onde os povos Asiáticos vagueiam com força, assustando aqueles que
estão prestes a colher suas colheitas e apreendendo gado mesmo no arado. Ele disse:
Mova-se meu coração e lamente por esta terra em que tu nasceste. Pois há silêncio
diante do mal; o que deve ser condenado é temido e os grandes são roubados na terra do seu
nascimento. Não canse enquanto este mal existir. Levante-se contra o que está diante de ti!
Pois eis que os grandes não governam mais a terra e o que foi estabelecido foi desfeito. Que
Rá venha restabelecer esta terra, pois está arruinada e nada de valor permanece. Nem mesmo
o “preto de uma unha” escapou deste destino. Eis que a terra está destruída e não há quem
cuide dela. Não há quem fale, nem quem chore. Como passa, então, esta terra?
II. Falarei do que está diante de mim. Jamais irei predizer o que não virá. Um
pássaro estranho se reproduz no pântano do Delta e faz seu ninho ao lado do povo do Egito.
Pois o povo deixará isso se aproximar por falta de ação. E depois, todas as coisas boas
passarão.
Bestas do deserto beberão no rio do Egito e se aliviarão sobre as margens, pois não
temerão a ninguém. A terra está em alvoroço e ninguém sabe o que acontecerá, pois o que o
futuro trará está oculto. E como é dito: quando a visão e a audição falharem muito, aqueles
que não podem falar liderarão.
III. Mostro-vos uma terra destruída pelo alvoroço. O que não deveria ser, terá de
acontecer. Pessoas erguerão armas de guerra e a terra viverá em confusão. Pessoas derramarão
sangue por pão e rirão alto da dor e da miséria. E ninguém chorará sobre a morte. O coração
de todos deve cuidar apenas de si mesmo. Uma pessoa sentará virada de costas enquanto uma
mata outra. Mostro-te o filho e a filha como inimigos, o irmão e a irmã como adversários e o
mais baixo contra o mais alto.
IV. Mas um rei virá do sul, chamado Ameni, o reivindicado, filho de uma mulher
da Núbia. Ele unirá a Coroa Dupla e a terra será anexada em suas garras. O povo de seu
reinado regozijará, pois Ameni, o filho do homem, fará seu nome por toda eternidade. Os
maliciosos conspiradores reterão seus discursos traiçoeiros por medo dele. Os invasores
Asiáticos cairão diante de sua fúria e os invasores Líbios serão consumidos por sua chama.
59

Rebeldes cederão antes de sua ira e traidores serão abatidos por sua força. Então, Maat,
justiça e ordem, retornará ao seu lugar e Isfet, mal e caos, será expulso.
60

O Livro das Declarações das Virtudes

O Livro das Declarações das Virtudes. Como afirmado anteriormente, o coração da


ética egípcia antiga e seu esforço espiritual é Maat. A ética e a espiritualidade egípcia antiga,
como toda a ética e espiritualidade Africana, têm e enfatizam uma dimensão prática. A justiça
é real apenas na prática pessoal e social. Maat, portanto, é como uma tarefa e bem social e
espiritual pela qual a recompensa é uma vida agradável e bela na comunidade da terra e uma
vida espiritual nos céus como um deus vivo5. Numa palavra, Maat é uma tarefa pessoal e
social e a promessa e recompensa por concluí-la.
Os antigos egípcios, portanto, desenvolveram um tipo de caráter ideal enraizado e
refletido em Maat, que as Instruções recomendam e as Declarações das Virtudes afirmam
como fato realizado e modelo a imitar. Esse tipo ideal era o geru, o autodomínio, isto é,
calma, silêncio, controle, modéstia, sabedoria, gentileza e sociabilidade ativa; e o geru Maat,
aquele que verdadeiramente era mestre de si mesmo. O primeiro era o domínio de si, o
segundo era um tipo de mestre do domínio de si. O oposto do autodomínio é o desenfreado –
boca hostil, temperamento hostil, agressividade e geralmente unida com Isfet, oposto de Maat.
O que se vê, então, nas Declarações das Virtudes é a prática de valores básicos, no
nível pessoal e social, que representam um tipo ideal e servem como modelo de Maat para
outros imitarem. É importante notar que o pessoal é inseparável do social, que a retidão e a
restrição são sempre, como em outras éticas e espiritualidades africanas, alcançadas, testadas
e temperadas nas relações com os outros. Maat surge com as relações familiares que fazem
com que uma pessoa seja elogiada por seu pai, amada por sua mãe e apreciada por seus
irmãos e irmãs. Maat se expressa numa declaração clássica da moralidade egípcia que aparece
milhares de anos depois no texto sagrado hebraico-cristão: “Dei comida aos famintos, roupas
aos despidos, águas aos sedentos e um barco aos que não tinham nada”. A última parte desta
declaração de virtude, evidentemente, reflete novamente o antigo ambiente marítimo egípcio e
revela a essencialidade de ter um meio de transporte na água.
Essas Declarações, geralmente encontradas nas estelas, uma espécie de placa
memorial, formam um paralelo e complementam as Declarações de Inocência que aparecem
no Livro de Vir-à-Luz do Dia6 e, portanto, expressam uma ética consistente da prática e
pensamento correto, cuja recompensa é encontrada nesta vida e na próxima.

5
veja abaixo no Livro: Ressurgindo como Rá.
6
Veja abaixo.
61

O Livro das Declarações das Virtudes

I. Harwa, chefe oficial da Alta Sacerdotisa de Amen-Rá diz:


Eu sou um nobre por quem se deve agir, um de coração firme até o fim da vida. Sou
um ente querido de sua cidade, elogiado por seu distrito, de bom coração com suas cidades.
Fiz o que as pessoas amam e Deus elogia. Era verdadeiramente venerado e não tinha falha,
que dava pão aos famintos e roupas aos despidos. Pus fim à dor e apaguei as transgressões.
Enterrei os abençoados, apoiei os idosos e satisfiz as necessidades dos que não tinham. Eu era
um abrigo para as crianças e ajudava a viúva; alguém que classificava até mesmo uma
criança. Fiz essas coisas sabendo seu valor e conhecendo sua recompensa pelo Senhor de
Maat, numa palavra, para preservar na boca do povo sem fim, para ser bem lembrado por
anos e anos.
II. Djedkhonsefankh, profeta de Amen-Rá, diz:
Salve a ti que virá após mim, que viverá nos tempos vindouros. Farei-te chamar-me de
abençoado, pois meu destino foi ótimo. Rá, como Khnum, o Grande Oleiro, me transformou
em um dos mais capazes, um assessor de excelentes conselhos. Ele tornou meu caráter
superior aos outros e guiou minha língua àquilo que era excelente. Mantive minha boca livre
de ataque àqueles que me atacaram. Minha paciência transformou meus adversários em
amigos e meus inimigos em aliados. Eu controlava minha boca e era hábil em responder, mas
não me submetia ao mal.
As pessoas me julgaram generoso, porque eu odiava acumulação de riquezas. Fiz com
que todos me cumprimentassem por minha excelência, prestando homenagem à minha
essência interior e dizendo de mim: “ele é um descendente justo de seu pai e um descendente
divino de sua mãe”. Ninguém falou mal dos meus pais por minha causa. Meus pais foram
muito honrados por causa da minha dignidade. De fato, eles me acharam útil enquanto viviam
na terra. Eu providencio ofertas para eles, agora que partiram. Além disso, não permiti que
meus servos me tratassem como “nosso mestre”, mas, em vez disso, me fiz à imagem do Pai
deles.
III. Paheri, escriba do tesouro real e prefeito das duas cidades, diz:
Eu sou um nobre que serviu ao seu Senhor, um hábil e livre de negligências. Eu andei
pela estrada que havia explorado. Fui guiado pelo meu próprio coração na estrada daqueles
louvados pelo faraó. Meu bom caráter elevou-me às alturas. Fui convocado como alguém em
quem nenhuma falha foi encontrada. Se eu fosse colocado na balança, sairia íntegro, sem
62

culpa e sem defeito. Fui e venho com o coração firme, sem mentir para ninguém. Conheço o
Deus que habita no homem e na mulher. Conhecendo-O, a partir disso eu sabia e executava as
tarefas como eram ordenadas. Eu nunca confundi a mensagem com o mensageiro. Não falei
palavras vulgares nem conversei com pessoas sem valor. Na verdade, eu era o modelo da
bondade.
IV. Harkuf, governador do Alto Egito e professor-sacerdote, diz:
O faraó me elogiou e meu pai fez um testamento para mim, pois eu era um digno. Um
amigo de seu pai, elogiado por sua mãe e alguém que todas as irmãs e irmãos amavam. Dei
pão aos famintos, roupas aos despidos e levei o barco para a terra seca. Fui quem falou com
justiça, que repetiu o que era agradável de ouvir. Eu nunca falei maldosamente contra alguém
ao seu superior, pois eu queria estar bem com o Deus Altíssimo. Nunca julguei entre dois
contendedores de tal maneira que tenha privado uma criança do legado de seus pais.
V. Nefer-Seshem-Rá, diz:
Eu falei verdadeiramente e fiz bem. Falei com justiça e repeti o que era justo. Eu
aproveitei o momento certo para ficar bem com as pessoas. Julguei entre dois de maneira a
satisfazer os dois. Salvei os fracos daqueles que eram mais fortes, tanto quanto estava em meu
poder. Dei pão aos famintos, roupas aos despidos e levei o barco à terra seca. Enterrei aqueles
que não tinham filhos e construí um barco àqueles que estavam sem. Respeitei meu pai,
agradei minha mãe e ajudei minhas irmãs e irmãos.
VI. Wennefer, profeta de Osíris, diz:
Que Deus me dê incenso pela cidade da eternidade e água pelo cemitério do Oeste.
Pois eu sou um homem por quem se deve agir. Eu era sincero, justo e fidedigno. Alguém que
andou na água de Deus. Fui elogiado em sua cidade, generoso em seu distrito e gentil e
compassivo com todos. Eu era amigável e acolhido por todos, amplamente amado e alegre. Eu
tinha autodomínio em tempo de estresse e infortúnio, de discurso belo e polido. Eu era um
forte abrigo para os necessitados, em quem todos os pobres podiam se apoiar. Acolhia os
estrangeiros e fui um conselheiro prestativo, um guia eficaz. Protegi os fracos dos fortes e fui
um barco para atravessar a água a todos.
Eu fui um nobre digno que fazia o desejo de Deus e era gentil e compassivo com meus
amigos. Fui generoso com os que não tinham nada. Meu coração não disse “me dê!” a
ninguém. Eu era alguém que amava a justiça e odiava transgressões. E eu sempre fiz o que era
bom.
VII. Nebneferu, profeta de Amen-Rá, diz:
63

Vivo na terra como... alguém que guiou os ignorantes ao trabalho, que instruiu o
artesão pela regra. Que sabia o que dizer quando falava no palácio, que apagava erros em
todas as situações, que agradava a Deus com graça. Conversava com as pessoas da maneira
que elas gostavam e dava atenção ao que desejavam.
VIII. Ankhetifi, grande governante dos distritos de Edfu e Hieracrópolis, diz:
Eu sou a vanguarda e a retaguarda do povo. Alguém que encontra a solução onde está
faltando. Um líder da terra através de firme afirmações. Eu escolho e uso bem as palavras e
coleto-as em meus pensamentos no dia da reunião dos três distritos mais ao sul. Pois sou um
campeão sem igual, que falou quando o povo estava em silêncio, no dia em que o Alto Egito
estava em silêncio. Aqueles em quem eu coloquei minha mão nunca encontraram a desgraça,
pois meu coração era comprometido e meu conselho, excelente.
IX. Beka, administrador do celeiro público, diz:
Eu fui justo e verdadeiro e alguém sem malícia. Pois coloquei Deus em meu coração e
fui rápido em discernir Sua vontade. Cheguei à cidade dos que habitam na eternidade. Fiz o
bem na terra. Não tenho machucado os outros. Não tenho feito mal e nem aprovado nada de
mal ou ofensivo. Tenho prazer em falar a verdade. Pois eu conhecia bem a recompensa que
advém de fazer isso na terra, desde a primeira lei até os juízes divinos, os intérpretes
habilidosos, os descobridores de todas as leis e os castigadores de todos os crimes.
Tive prazer na retidão, mantendo-me em harmonia com as Leis de Maat. Eu não
oprimi os humildes, nem fiz mal àqueles que honram a Deus. Passei minha vida no caminho
da justiça. A sinceridade e a bondade que estavam no coração de meu pai e de minha mãe
retornei através de meu amor por eles. E jamais agi de maneira alguma para desonrá-los,
mesmo desde os primeiros dias da minha juventude. Embora de grande status, agi como
alguém cuja posição era baixa. E não enfraqueci ninguém mais digno do que eu.
X. Antef, alto administrador do escritório do Governo, diz:
Sou silencioso diante do zangado, paciente com o ignorante, a fim de acabar com o
conflito. Sou calmo, livre de atos precipitados, antecipando o resultado, esperando o que
ocorre. Sou alguém que aconselha em situações de conflito, uma pessoa que sabe quais
palavras incitam raiva. Sou amigável, quando chamado, com aquele que me diz sua
preocupação. Sou controlado, amável, amigável, alguém que conforta quem chora, com boas
palavras. Sou generoso com aqueles que contam comigo e alguém que faz bem aos seus pares.
Sou alguém que está na casa de seu Senhor, que reconhece a lisonja quando é falada. Sou
agradável, generoso, possuidor de comida que não esconde o rosto dos necessitados. Sou
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amigo dos pobres e favorável aos que não têm. Sou aquele que alimenta os famintos que são
necessitados e alguém que é generoso com os destituídos.
Sou alguém que é informado àqueles que não têm conhecimento e ensina uma pessoa
o que é útil para ela. Estou de pé na casa de faraó, alguém que sabe o que deve ser dito em
todos os ofícios. Sou um ouvinte, alguém que ouve Maat e que pondera no coração. Sou um
pacificador na casa de seu Senhor, alguém que é lembrado por suas excelentes qualidades.
Sou gentil nos tribunais, alguém que é calmo e não é ofensivo.
Sou um bom homem, não agindo apressadamente, alguém que não ataca uma pessoa
por uma única observação. Sou preciso como a balança, imparcial e verdadeiro como o
Senhor da Justa Medida. Sou um homem firme de pé, cujos planos são bem pensados; que é
leal àqueles que o fizerem prosperar. Sou um conhecedor que aprendeu de si mesmo, um
assessor cujo conselho é procurado. Sou alguém que fala no salão da justiça, alguém que é
hábil em falar em situações difíceis.
Além disso, ele diz:
Ponho bondade em minha casa e o amor por mim percorre toda a terra. Dei pão aos
famintos, água aos sedentos e ajudei os náufragos em seus caminhos. Enterrei os idosos, vesti
os despidos. Não cometi nenhum erro contra homem ou mulher, nenhum que Deus odeia.
Apliquei a Lei que o faraó amava. Eu vim para minha cidade e entrei em minha casa. Eu fiz o
que tanto o homem como a mulher amam e as coisas que são aprovadas por Deus.
65

Os Livros:
Ressurgindo como Rá

OS LIVROS: RESSURGINDO COMO RÁ. Esses livros são singularmente, e juntos,


o registro escrito mais antigo da aurora da consciência moral estruturada. Eles representam os
africanos liderando a ruptura humana com o mundo animal e estabelecendo não apenas um
padrão ético de comportamento social, mas apresentando a possibilidade de ressurreição,
ascensão e transformação em um deus vivo. Nesta seção, tenho títulos de livros diferentes dos
que os egiptólogos mais tradicionais lhes atribuíram. Os textos mais antigos que são do Reino
Antigo e são chamados por eles de Textos da Pirâmide, intitulei O Livro da Ascensão e
Transformação. A justificativa para isso é o foco e a atividade expressa no texto em que o
real vindicado, ou seja, o faraó, neste caso, ressuscita dos mortos, ascende nos céus e se
transforma em um deus vivo. Erguer-se aqui refere-se tanto à ressurreição quanto à ascensão
aos céus. E a transformação é alcançada por ter vivido em retidão, tornando-se Um com Deus
e depois se tornando um deus vivo, isto é, um poder nos céus.
Os textos do Reino do Meio são chamados de textos de caixão pelos egiptólogos
tradicionais. A estes, intitulei “O ​Livro da Vindicação” que, como mostra a primeira linha do
livro, é o que pelo menos uma parte dele, se não o texto total, foi chamado. Finalmente, eu
rejeitei o título, Livro dos Mortos, e usei também o título que os antigos egípcios atribuíram
ao livro, ou seja, O Livro de Vir à Luz do Dia.
Embora o Livro da Ascensão e Transformação aparentemente tenha sido usado pela
primeira vez principalmente para os faraós, era, na minha opinião, um modelo de
possibilidade humana representado pela pessoa que, mais do que qualquer outra pessoa,
simbolizava a possibilidade da divindade. Além disso, este livro e os outros desta seção foram
eventualmente apropriados pelas massas e se tornaram os textos básicos para "ressuscitar
como RÁ". Assim, usei “um vindicado real” ou “um vindicado” em vez do “N” ou nome de
um faraó específico, como é a prática dos egiptólogos tradicionais. Pois não são apenas os
faraós que se levantaram e se transformaram, mas todos os que foram vindicados.
Coloquei os livros em uma ordem que é reservada cronologicamente, mas que se
encaixa logicamente de acordo com a atividade que cada um contém. Primeiro, uma pessoa
surge (ressuscita), declara sua inocência no Salão do Julgamento, é justificada e depois se
levanta e se transforma em um deus vivo. Embora exista um pouco de cada um, cada livro
tende a ter mais da atividade pela qual é nomeado.
66

No Livro de Vir à Luz do Dia, usei o título Declarações de Inocência, para as 36 e 42


declarações feitas por uma pessoa no Salão da Justiça para estabelecer sua irrepreensibilidade.
Embora alguns egiptólogos tradicionais chamem essa declaração de "Confissão Negativa",
outros usaram "As Declarações de Inocência" também. A Declaração obviamente não é uma
confissão, seja no conteúdo ou no contexto. Não é uma admissão de faculdades, mas uma
negação delas. E o Salão da Justiça não é um lugar em que alguém confessa falhas, mas antes,
em que se declara inocente, para que possa ser vindicado e se levantar como Rá.
Um dos principais significados desses "Livros de Ressurgindo como Rá" é a ênfase na
antiga crença egípcia no conceito da possibilidade de imortalidade e divindade para os seres
humanos. Em uma palavra, eles afirmam que através do pensamento e da prática corretos,
alguém pode se tornar um deus e viver para sempre à direita de Rá. Isso pode ser alcançado
conforme esses livros e outros da Husia que expõem e sugerem, de três maneiras básicas que:
1) alcançou desenvolvimento interno; 2) excelência nas relações sociais; e 3) serviços e
realizações sócio-históricas significativas.
Por fim, é importante observar que nas Declarações de Inocência, como tem sido
apontado com frequência, encontramos uma fonte dos Dez Mandamentos e nos Livros:
Ressurgindo como Rá encontramos novamente a fonte histórica de tantos outros conceitos
centrais para Teologia hebraica e cristã, isto é, ressurreição, Salvador ressuscitado, Filho
Amado, Dia e Salão do Julgamento, imortalidade da alma, etc. É a esta e às outras
contribuições citadas acima, bem como àquelas não mencionadas neste volume, que formam
o rico e antigo legado moral e espiritual da África que, através de sua filha, o antigo Egito,
deu ao mundo.
67

Livro de Vir à Luz do Dia

Aqui começa o Livro de Vir à Luz do Dia, de canções de louvor e glorificação, de


surgir e entrar no Domínio Abençoado de Deus no belo Oeste. Estes devem ser recitados no
dia do enterro, [no momento] de vir [à luz] após [ter] saído [dela].
I. Ó tu, que traz almas inocentes na Casa de Osíris, o Ressuscitado Salvador,
traga esta excelente alma contigo. Deixe que ela ouça como tu ouves e veja como tu vês.
Deixe que ela se levante enquanto tu levantas e se sente enquanto tu sentas. Ó tu que dá pão e
cerveja a almas inocentes na Casa de Osíris, dê pão e cerveja dia e noite à essa alma cuja
palavra é verdadeira diante de Deus, Senhor da cidade sagrada de Abydos, e diante de ti.
Ó vós, que abrem o caminho e limpam os caminhos para almas inocentes na Casa de
Osíris, abri-vos e limpais os caminhos para a alma daquele cuja voz é vindicada por ti. Que
ela entre na Casa de Osíris com ousadia e saia amada e triunfante. Que suas palavras possam
viajar contigo. E que ela não seja encontrada deficiente na Balança e seja livre de todas as
falhas.
II. Não seja eu julgado segundo a boca da multidão. Que a alma se levante diante
do meu coração e seja considerada justa na terra. Posso entrar em tua presença, ó Senhor dos
Senhores, que eu chegue ao Salão da Justiça. Que eu me levante como um deus vivo e dê luz
como os poderes divinos que estão no céu.
Deixe-me prosseguir em paz para o Oeste. Que os senhores da Terra Sagrada me
recebam e me louvem três vezes em paz. Que eles façam-me sentar além dos Anciãos do
Conselho. Possa eu ascender na presença do Benevolente. E possa eu assumir qualquer forma
que eu queira, em qualquer lugar que meu espírito deseje estar.
III. Ó Meu coração, minha mãe, meu coração, minha mãe, meu coração, pelo qual
eu venho a existir! Não se levante contra mim como testemunha nem se oponha a mim no
Conselho de Julgamento. Não pese demasiadamente contra mim antes do Kheper da Balança.
Tu és minha essência divina que habita em meu corpo, o poder divino que fortalece meus
membros. Quando tu apareces no lugar da felicidade para onde vamos, não deixe meu nome
emitir um odor ofensivo diante daqueles que designam pessoas para o seu devido lugar.
Que seja favorável para nós, e o Ouvinte seja favorável a nós, e que haja alegria na
pesagem das palavras. Que a falsidade não seja proferida contra mim diante do Grande Deus.
Pois certamente a sua justiça fará com que tu te levantes em triunfo.
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IV. Eis que estou em tua presença, ó Senhor do Céu. Não há mal em meu corpo,
não falei conscientemente aquilo que não é verdade, nem fiz nada com um coração falso.
Conceda que eu possa ser como aqueles favorecidos que estão no teu caminho e que eu possa
ser um Osíris - um escolhido e ressuscitado - e muito favorecido pelo Deus Benevolente ...
V. Eu saio triunfante contra meus inimigos. Eu divido os céus e abro o horizonte.
Viajo pela terra nos calcanhares dos meus inimigos. Faço com que os Gloriosos e os Grandes
venham até mim, pois estou equipado com palavras de poder. Eu como com minha própria
boca e mastigo com minha própria mandíbula. Pois eu adoro a Deus no céu e recebo o que
perdura no meio das coisas que são derrubadas.
Afaste-se do meu caminho, pois Eu sou Um com Rá, saindo pelo horizonte contra Seu
inimigo, que não será resgatado de mim. Estendi a mão como Senhor da Coroa do Alto Egito.
Levantei minhas pernas como quem apressa o amanhecer. Meu inimigo não deve escapar-me.
De fato, ele deve cair diante de mim. Ele me foi dado e não será resgatado.
VI. Levanto-me como Hórus, filho amado e escolhido deste pai. Sento-me como
Ptah, Deus que lançou os fundamentos do universo, cresci forte como Thoth, exaltada
sabedoria. Eu me tornei tão poderoso quanto Atom-Rá, como o Perfeito. Ando com meus
próprios pés, falo com minha própria boca. Eu persigo meu inimigo. Ele é dado a mim e não o
será resgatado. Entrei como um falcão e saí como uma fênix. A estrela da manhã abre
caminho para mim, para que eu possa adorar Rá no belo paraíso do Oeste.
VII. Meu nome não ficará ausente. Eu sou a alma que criou o abismo, que assenta
no domínio de Deus. Meu ninho, meu local de nascimento, está escondido e meu ovo não foi
quebrado. Eu sou o Senhor das alturas e fiz meu ninho no céu. Mas eu desço à terra para
acabar com a minha impureza.
Ó Senhor Osíris, venha então e me estabilize e me faça forte. Conceda que eu possa
entrar na terra da eternidade, como tu fez com seu pai Rá, cujo corpo nunca faleceu e quem é
aquele que realmente não morre. Eu não fiz o que tu odeias, mas louvei o teu nome entre
aqueles que amam tua Essência Divina. Que teu espírito me ame e não me rejeite. E que tu
não deixes meu corpo se deteriorar, mas me liberte como tu te libertou. Deixe a vida sair da
morte. Não se apodreça, para que eu acabe ou meus inimigos venham contra mim em suas
muitas formas.
VIII. Eu sou o Grande, filho de um Grande. Eu sou o Incendiário, filho do Ardente,
cuja cabeça foi restaurada depois de ter sido cortada. A cabeça de Osíris, o Salvador
ressuscitado, não foi tirada dele e minha cabeça não será tirada de mim. Eu me levantei e me
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tricotei. Eu me fiz inteiro. Eu me renovo e cresço jovem novamente. Eu sou Um com Osíris,
Senhor da Eternidade.
Aquele que me acompanha, quando estiver-me prestes a cair, me levantará quando eu
descer no vale de Abydos e descansar. Pois certamente sou alguém que O adora. Eu assumi
autoridade divina na cidade onde o encontrei. Conquistei e levei a escuridão pela minha força.
Eu tomei posse da coroa do Alto Egito. A verdade é o meu corpo. Eu vim para iluminar as
trevas e derrotar os maus espíritos nelas. Aqueles que habitavam na escuridão me adoram. Eu
fiz com que os que choravam se levantassem mesmo que estivessem cansados. Eis-me, eu sou
realmente o Profundo que subjugou as trevas. Afastei as trevas para que a luz pudesse ser
levantada.
IX. Estas são palavras que serão ditas ao chegar ao Grande Salão de Maat, para
que alguém possa ser separado de todas as ofensas que ele ou ela tenha cometido e possa
contemplar os rostos dos divinos. (A Declaração de Inocência)
Alguém diz: Homenageio-te, Grande Deus, Senhor de Maat. Vim a ti, ó Senhor, para
que eu enxergue tua beleza. Conheço-te; Sei o teu nome; Conheço os nomes dos quarenta e
dois seres divinos que vivem contigo neste Salão de Maat, que vivem dos que praticam o mal
e se alimentam de sangue no dia em que falam sobre o caráter na presença de Osíris, O Bom.
Certamente, as Duas Filhas, os Dois Olhos, Senhor da Justiça é o teu nome: Eis que eu vim a
ti. Eu te trouxe justiça e acabei com a injustiça.
PARTE I. Eu não fiz o mal contra as pessoas. Eu não maltratei minha família e
associados. Eu não contei mentiras no tribunal, a sede da Verdade. Eu não me associei a
pessoas más ou sem valor. Eu não fiz coisas más. Nem comecei um dia exigindo mais do que
era devido. Eu não trouxe meu nome para louvor. Eu não amaldiçoei a Deus. Eu não defraudei
os pobres de suas propriedades. Eu não fiz o que é odioso a Deus. Eu não caluniei um servo
ao seu superior. Eu não infligi dor. Eu não fiz ninguém ficar com fome. Eu não fiz ninguém
chorar.
Eu não cometi assassinato. Eu não ordenei um assassinato ou entreguei alguém a um
assassino. Eu não fiz ninguém sofrer. Eu não roubei as ofertas do templo. Eu não defraudei os
seres divinos de suas ofertas de pão. Eu não roubei as ofertas dos que se foram. Eu não cometi
adultério. Eu não fui indiferente no santuário. Eu não aumentei ou diminuí a medida dos
grãos. Eu não reduzi o comprimento da palma da mão. Eu não invadi os campos de outro. Eu
não adicionei ao peso da balança. Eu não adulterei a língua da balança. Eu não tirei leite da
boca das crianças. Eu não tirei o gado do pasto.
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Eu não peguei pássaros sagrados. Eu não peguei peixe com a isca de seus próprios
corpos. Eu não parei o fluxo de água em seu devir. Eu não apaguei o fogo quando deveria
queimar. Eu não violei os períodos de oferendas de carne. Eu não afastei o gado da
propriedade de Deus. E eu não desprezei a Deus diante de Suas aparições. Eu sou [uma alma]
pura.
PARTE II. Eu não pratiquei o erro. Eu não furtei. Eu não fui ganancioso. Eu não
roubei. Eu não matei pessoas. Eu não traí as medidas. Eu não cometi fraude. Eu não roubei a
propriedade de Deus. Eu não contei mentiras. Eu não roubei comida. Eu não falei maldições.
Eu não violei a lei. Eu não matei animais sagrados. Eu não negociei enganosamente.
Eu não roubei terra. Eu não escutei e nem falei demais. Eu não fiquei zangado sem
justa causa. Eu não cometi adultério. Eu não fui descortês. Eu não aterrorizei ninguém. Eu não
violei a lei. Eu não fui temperamental. Eu não fui surdo às palavras da verdade. Eu não
provoquei conflitos. Eu não fui cego à injustiça. Eu não me envolvi em sexo não natural. Eu
não fui enganador.
Eu não me entreguei a discussões. Eu não me envolvi em violência. Eu não fui
irritante. Eu não deturpei minha natureza. Eu não fofoquei. Eu não caluniei o faraó. Eu não
entrei na água potável. Eu não tenho falado alto. Eu não blasfemei contra Deus. Eu não fui
arrogante. Eu não discriminei os outros. Eu não cobicei outras propriedades. Eu não ofendi o
Deus da minha cidade.
X. Eis que cheguei a ti, vazio do mal e desprovido de engano, inocente, sem
testemunha contra. Portanto, que nenhum caso seja apresentado contra mim.
Eu vivo em Maat, eu me satisfaço com a justiça do meu coração. Pois eu fiz o que
homens e mulheres pedem e o que agrada a Deus. Encontrei favor dando pão aos famintos,
água aos sedentos, roupas aos nus e um barco aos que não os tinham. Fiz as devidas ofertas a
Deus e funerárias aos que partiram. Livra-me então e protege-me. Não faça denúncia contra
mim na presença do Grande Deus. Pois eu sou aquele cuja boca é pura e cujas mãos estão
limpas. Portanto, diga-me: "Bem-vindo, venha em paz!", aqueles que me verão.
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O Livro da Vindicação

Aqui começa o Livro de Vindicar uma Pessoa no Reino do Belo Oeste.


I. Buscador de vindicação, tu és o Leão, na verdade o Leão Duplo. Tu és Hórus,
protetor de seu pai. Tu és o quarto desses quatro poderes do céu que são fortes e poderosos,
que trazem água e fazem o Nilo fluir através do poder de sua divindade. Ó buscador de
vindicação, levante-se do seu lado esquerdo e coloque-se do seu lado direito.
O Deus da terra ordenou e o Leão Duplo repetiu, que tu recebas tua alma que está na
terra e tua sombra que está em lugares secretos. Buscador de vindicação, levante-se para ser
justificado contra seus inimigos. Pegue sua equipe, seu lombo e suas sandálias e vá ao
Conselho de Julgamento. Que tu sejas justificado contra aqueles que o prejudicariam e
aqueles que intentariam uma causa contra ti no Conselho de Julgamento neste dia de regozijo.
II. Ó buscador de vindicação, a terra abre sua boca para ti; abre suas mandíbulas
em teu nome. Que tu comas teu pão e recebas tua abundância. Que alcances a Grande
Escadaria e chegue à Cidade Sagrada. Que recuperes seu calor sobre a terra e se torne Um
com Osíris, o Salvador Ressuscitado. Ó buscador de vindicação, os grandes defendem a ti e
os escribas que se sentam em seus tapetes estão admirados contigo em tua presença. Tu
assumiste por si mesmo os atributos das serpentes sábias na Cidade Sagrada de On. Salve,
buscador da vindicação! Tome posse do céu e herda a terra. Quem te tirará o céu, seu lindo
deus jovem? Pois tu és vindicado contra seus inimigos, homens e mulheres.
III. O buscador da vindicação diz: Salve a ti, Conselho de Julgamento de Deus que
me julgará neste dia a respeito se o que eu disse e fiz foi ignorância, negligência e indiferença.
Ó vós que me cercais e estejais de pé atrás de mim, que eu seja justificado na presença do
Senhor da Terra. Ele deve me julgar de acordo com o que eu fiz conscientemente.
Levantei-me com a pena da verdade na cabeça e a justiça na testa. Meus inimigos estão muito
tristes e, em minha defesa, ganhei posse de tudo o que possuo.
IV. Ó vindicado, saia grande e poderoso, assim como Rá saiu grande e poderoso no
lado oriental do céu. Os poderes do céu que falaram em nome de Hórus, o protetor de seu pai,
e que subjugaram seus inimigos que o odiavam, devem falar em nome deste justificado e
subjugar aqueles que o machucariam, que o odeiam e quem intentaria uma ação contra ele
neste dia.
V. Salve! vindicou um. Atravessarás o céu e atravessarás a extensão dos céus; os
que estão na hidrovia sinuosa devem venerá-lo e vê-lo quando tu subires no horizonte
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oriental. Tu sairás da Pele-da-Noite de Rá e embarcará na Pele-do-dia, como Hórus, senhor


dos nobres, ele mesmo, lhe ordena. Salve, vindicou um. Tu subirás no grande lado oriental do
céu e descerás no grande lado ocidental da terra, entre os poderes dos céus que estão na
companhia de Osíris, o Salvador Ressuscitado. E tu irás em paz, em paz com Rá, que está nos
céus.
VI. Salve! vindicou um. Tu és um deus e tu deves ser um deus. Tu não terás
inimigos ou oponentes diante de Rá, que está nos céus, ou diante de Osíris, o grande e divino
poder que está na cidade sagrada de Abydos. O Senhor da terra abrirá teus olhos cegos e
endireitará teus joelhos dobrados para ti. E tu receberás teu coração que veio de sua mãe, teu
coração que pertence ao teu corpo, tua alma que estava na terra e teu cadáver que estava no
chão. Haverá pão para o corpo, água para a garganta e ar doce para as narinas.
VII. Salve! vindicou um. Venha para que tu possas levantar-se nos céus. A escada
ao lado de Rá foi montada para ti entre os poderes do céu que purgam as correntes de tua
pestilência, para que tu possas beber água deles. Tu deves andar sobre teus próprios pés e não
deves andar com a cabeça para baixo. Tu és limpo e puro. Como Rá vive, tu és irrepreensível
e sem defeito.
VIII. As portas dos céus estão abertas para ti por causa da tua justiça. Que subas e
vejas Hathor, Amor e Elevadíssima Beleza. Que qualquer caso contra ti seja cancelado. Que
qualquer ofensa tua seja apagada por aqueles que pesam corações na balança no dia em que
consideram o caráter. Que possa ser concedido que junte-se àqueles que estão na Pele-Solar
por aqueles que estão na companhia de Rá.
IX. Vá e abra a mansão da alma adiante... Se encontrares os poderes do céu
sentados, deverá sentar-se com eles. Receba este seu cetro, que está aos pés de Rá e sua vara,
que está nos céus, entre as estrelas que não morrem, e atacarás com teu cetro e governarás
com tua vara.
X. Tu podes atravessar o deserto com Rá. Que Ele faça com que tu vejas os
lugares daqueles que seguem seus corações. Que tu encontres nos vales cheios de água para
suas lavagens. Tu podes escolher plantas de papiro, juncos e flores e brotos de lótus. Aves
aquáticas chegarão a ti em milhares, deitadas no teu caminho. Tu jogarás teu taco de atirar
neles e mil cairão ao som do seu vento. À ti, uma escada para os céus será montada e o céu
estenderá sua mão à ti.
XI. Tu tens tuas pernas. Levante teu corpo; reúna teus membros para que tu possas
dar os passos no Conselho de Julgamento, no local onde estão os poderes do céu, para que
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eles possam dar a ti a vida fluida que sai de ti. Que nunca fiques imóvel quando recuperá-lo.
Que viajes e nunca te canses. Que viajes pelo céu e pela terra e nunca te canses, um virtuoso e
justificado.
XII. Um grito saiu para mim da boca de Rá, o Perfeito, e o ar se abriu sobre meus
caminhos. Fui eu quem iluminou o céu após a escuridão. Minha cor agradável vem do ar que
sai depois de mim da boca de Rá, o Perfeito. As nuvens do céu são as que fluem de mim; e
tempestades de granizo e meia-escuridão são o meu suor. O comprimento do céu pertence aos
meus avanços e a largura da terra pertence ao meu domínio. Eu sou aquele a quem Rá, o
Perfeitíssimo, criou e estou destinado ao meu lugar na eternidade.
XIII. Eu nasci da carne do Deus auto-criado. Eu sou a alma de Shu, o Senhor da Luz,
o Deus de forma invisível. Eu sou quem é Um com Deus. Eu me tornei Ele. Eu sou quem
acalmou o céu e estabeleceu a ordem nas Duas Terras do Egito. Eu sou mais forte e mais feroz
do que os Nove Exaltados.
XIV. Jamais obedecerei a más palavras de poder e nada de prejudicial acontecerá
comigo. Eu ascendi e coloquei meus inimigos debaixo dos meus pés, para que eu exercesse
poder sobre eles de acordo com o que Rá ordenou de mim. Eu sou a serpente sábia. Touro dos
Nove Exaltados, que não obedece a magia, que não é queimado pelo fogo e que não é
molhado pela água. De fato, nunca serei queimado pelo fogo ou molhado por causa da água.
Serei como Rá todos os dias, alguém que será moldado e produzido todos os dias pelas
pessoas do sol que viram ontem.
XV. Eu brilho como Rá diariamente. Eu estabeleço a verdade e expulso a falsidade.
Abro as portas que estão no abismo abaixo. Eu sou esse amigo de Rá, cansado de feridas. E
recebo força através da sabedoria. Encontrei a balsa perdida nas águas da enchente e a trouxe
para terra. Eu direcionei meus pés para o lugar certo. Eu estendi meus braços. Eu estabeleci
um domínio nos céus e tomei posse da terra. E os Exaltados do céu estão satisfeitos com isso.
XVI. Eu sou, portanto, o Leão, o Leão Duplo e o maior de seu sacerdócio. Eu Sou
Hórus, o Unificador. Eu sou quem traz a quietude após a tempestade. Eu Sou Ísis em
Chemmis, refugiando-me de Seth, o maligno, e ouvirei como alguém surdo e esforçado para
ver. Eu sou o Senhor da terra, que entrou na terra. Eu Sou quem avalia quem o serve. Eu Sou
transformado em alguém cujos espíritos são poderosos. Eu Sou Um com Rá, senhor de suas
duas terras, e Eu Sou quem é colocado atrás dele. Eu Sou as águas e a terra. Lago Amargo e
Grande Touro são meus nomes. Eu vou viajar e entrar no lugar que Eu Conheço.
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O Livro da Ascensão e Transformação

I. Levante-se, ó vindicado! Corra, pois tu és extremamente forte. Tu deves se


sentar na cabeça dos poderes do céu. Tu deves fazer o que Osíris, o Salvador Ressuscitado,
fez na Mansão do Príncipe, que fica na cidade sagrada de On. Recebas tua devida honra; o teu
pé não será obstruído no céu, nem serás contra a terra. Pois tu és o espírito que Nut, a mãe do
céu, deu à luz e Néftis, sua irmã, amamentou, e elas o uniram. Levante-se em sua força e faça
o que tu fez antes. Pois tu és um espírito. Levante-se o espírito, extremamente forte, adornado
como um grande touro selvagem. Tu não encontrarás oposição em qualquer lugar que ande e
seu pé não será obstruído em qualquer lugar que tu queiras estar.
II. Levante-se, ó vindicado! Segure tua cabeça. Reúna teus ossos, pinça teus
membros e sacuda o pó da tua carne. Pegue o teu pão que não conhece moldura e a tua
cerveja que nunca fica azeda. Fique nos portões que impedem aqueles sem nome. Eis, o
porteiro sai a ti. Ele segura tua mão e o leva para o céu, para teu pai. Ele se alegra com a tua
vinda, dá-lhe as mãos, beija-o, conforta-o e coloca-o diante dos espíritos, das estrelas
imperecíveis.
III. Os Céus declaram: Este escolhido real é meu filho amado, em quem me
agrado... meu primeiro nascido no trono da terra, e Rá lhe deu sua herança na presença dos
Grandes Poderes do céu. Todos os poderes do céu se alegram em dizer quão abençoado é esse
que é justificado, pois Seu Pai está muito satisfeito com ele.
IV. Ó escolhido real, a morte não te fragmentou. Tu saíste vivo. Sente-se então no
trono de Osíris, o Salvador Ressuscitado, com o cetro na mão, para que tu possas comandar os
vivos, com o cetro com botão de lótus na mão, para dar ordens àqueles cujos assentos estão
ocultos. Teus braços e ombros são os de Rá, tuas costas e barriga são os de Rá, teu lombo e
pernas são os de Rá. Teu rosto é o do Deus dos mortos. E as duas colinas de Hórus e Seth te
servem.
V. Ó, Rá! Este vindicado real chega até ti, um espírito imortal e indestrutível, que
reivindica os quatro pilares, os quatro pontos cardeais do universo. Teu filho (filha) vem a ti,
este vindicado real vem a ti. Que juntos cruzem o céu, unidos no lugar que lhe agrada.
Levante-o/a, ó Rá, e coloque-o/a em teu abraço, pois eis que é o/a filho/filha do teu próprio
corpo para todo o sempre.
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VI. O sacerdote da realeza escolhida diz: Levante-se nesta terra que se originou de
Rá, como aquele que completa essa saliva que saiu de Rá, como o Portador. Venha a existir
nesta terra, ó escolhido real. Sê exaltado por ela, para que teu Pai, Rá, te contemple. Diz o real
vindicado: Eu vim até ti, ó Ra. Conceda que eu possa aproveitar o céu e tomar posse do céu e
provê-los. Coloque a curva da liderança na minha mão para que a cabeça do Baixo e Alto
Egito seja humilhada.
VII. O escolhido real diz: Eu sou esta flor sagrada que brotou da terra. Minha mão
é purificada por Aquele que preparou meu trono e estou no nariz de Rá, o Grande em Poder.
Eu vim à Ilha de Fine para provar. Eu estabeleci o Certo no lugar do errado, e estou a caminho
de me vestir e me equipar. Eu apareço como a flor de lótus que está no nariz de Rá. Ele virá
no horizonte a cada dia no esplendor do sol e os poderes do céu serão purificados à Sua vista.
VIII. O escolhido real diz: Eu vim ao meu trono que está sobre os espíritos. Eu uno
corações, ó vós grandes e responsáveis ​pela sabedoria! Eu me torno a personificação de Sia, a
Exaltada Sabedoria, que carrega o livro de Deus e que repousa à direita de Rá. Ó tu que está
protegido pela minha mão, sou eu quem fala qual é o coração de Rá, o Grande. Eu, mesmo,
sou a Exaltada Sabedoria, que repousa à direita de Rá; o orgulhoso que preside a caverna das
profundezas.
IX. O escolhido da realeza diz: ó vós que estejais com o passar das horas, que estão
diante de Rá, preparais um caminho para mim, para que eu possa passar entre a patrulha
daqueles com rostos de guerreiros, pois estou no meu caminho para este meu trono. Eu sou
aquele que está por trás do Grande Deus, aquele cuja cabeça está colocada no lugar, que
adquiriu um chifre forte e agudo... Aquilo que remove problemas antes de Rá, o Grande
Touro, aquilo que faz tremer os que estão nas trevas é o chifre forte, que está por trás do
grande Deus. Eu subjugo aqueles que devem ser punidos. Eu os golpeio com força na testa e
permaneço sem oposição no horizonte.
X. Os redutos flutuantes do céu estão estabelecidos por Rá, que Rá possa cruzar
neles até o horizonte. E a cana flutua no céu e se estabelece para mim, para que eu possa
atravessá-las até o horizonte em direção a Rá. O canal é aberto, o campo de juncos é
preenchido e a via navegável é inundada, para que eu possa ser transportado até Ra. Traga
para mim os quatro irmãos que passam, portadores da trava lateral que estão ao lado de seus
cajados no lado leste do céu. Que eles possam dizer meu bom nome para Rá. Alegra-te por
mim, alegra-te pela minha essência divina. Pois sou justificado e minha essência divina é
justificada diante de Deus.
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Rá me recebeu para si mesmo, para o céu, para o lado oriental do céu, como Hórus, o
vingador de seu pai, como Osíris, o Ressuscitado, como esta estrela que ilumina o céu. Minha
irmã é Sothis e minha filha é a estrela da manhã. Nunca mais o céu estará vazio de mim ou a
terra estará vazia da minha presença.
XI. O céu está limpo e Sothis vive. Porque eu sou vivo, o/a filho/filha de Sothis e
os Grandes Poderes do céu se purificaram para mim entre as estrelas da Ursa Maior, a eterna.
Minha casa no céu não passará, e meu trono na terra não será destruído. O Abridor dos
Caminhos me fez voar para o céu na companhia de meus irmãos e irmãs, os poderes do céu. E
o céu estendeu seus braços em boas-vindas para mim.
XII. Meu lugar é contigo, ó Rá, e eu não irei ceder a ninguém! Eu subirei ao céu
para ti, ó Rá. Meu rosto é o rosto de falcões; minhas asas são aquelas do pato e minhas garras
são aquelas que habitam na Montanha Cerastes. Não há evidência contra mim na terra entre
homens e mulheres e nenhuma acusação contra mim no céu entre os poderes do céu. Pois eu
provei falsas todas as evidências contra mim; de fato, dispus para que eu pudesse voar para o
céu entre meus irmãos e irmãs, os poderes do céu. Usei meus braços como um ganso e bati
minhas asas como um falcão. Eis, o aviador voa! Ó homens e mulheres da terra! Eu me
levanto e vôo para longe de vós.
XIII. “Quão bonito de se ver, e quão maravilhoso de se testemunhar”, diga os
poderes do céu quando este escolhido real se elevar no céu, quando tu, o vindicado, ascender
no céu com seu poder sobre ti, sua admiração ao redor de si, e suas palavras se dirigem a seus
pés. Os poderes do céu e da terra chegam até ti. Eles fazem suportes para ti em seus braços.
Que tu subas ao céu e subas nele na Escada Divina. Pois Rá diz: "Os céus e a terra são dados
a ti". Eis que tu te tornaste o touro ameaçador entre os touros selvagens contra o maligno.
Persevera e finalmente, ó touro duradouro, para que prevaleça à frente deles e à cabeça dos
espíritos para todo o sempre.
XIV. Eu sou um santo que está na vanguarda, que levanta à testa, uma estrela diante
da qual os poderes do céu são humildes, e os Exaltados ficam admirados. E é a minha própria
mão que me levantará. Eu sou quem escapou da serpente enrolada do mal. Eu me levantei em
uma explosão de fogo, tendo me virado. Eu viajei pelas estradas do céu. Eu me limpei na
colina onde Rá se levantou. Eu coloco a escada. Montei a escada e os que estão no paraíso
agarram minha mão e me levantam para o céu.
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XV. Homenageio-te, ó Rá, tu que viajas pelo céu, e pelos céus atravessa a hidrovia
sinuosa. Eu te agarrei, porque sou um deus e filho de um deus. De fato, sou uma flor que
surgiu do Nilo, uma flor dourada que se origina de Iseion.
XVI. O Céu recomendou este vindicado a Rá, o Perfeitíssimo, e o de braços abertos
recomendou este escolhido ao Senhor da Luz, para que Ele possa fazer com que suas portas
do céu sejam abertas para os justificados e barrar outros que não têm nome. Segure a mão
deste vindicado e leve-o ao céu para que ele não morra na terra entre homens e mulheres.
XVII. “Quão bonito de se ver e maravilhoso de testemunhar”, diz Ísis, mãe sagrada,
quando tu ascendes aos céus, com seu poder sobre ti, sua admiração ao seu redor e suas
palavras de poder aos teus pés. Tu és socorrido por Rá, o Perfeitíssimo, como Ele sempre faz.
Os Exaltados do céu são trazidos a ti e os exaltados da terra são reunidos para ti. Eles colocam
as mãos debaixo de ti e fazem uma escada para ti, para que possas subir até o céu. As portas
dos céus e as entradas da extensão estrelada estão abertas por ti. Rá, o Perfeitíssimo, reuniu os
distritos por ti e deu as cidades da terra. Tu és quem preside o Alto Egito e Núbia. Eles te
mataram ou disseram que deverias morrer? Tu nunca morrerás, mas certamente viverás para
sempre. Tu serás eficaz contra eles (e) superior a eles, vivendo e perseverando para todo o
sempre.
XVIII. Eu vim a ti, ó Mãe do Céu, enterrei meu pai devidamente e deixei
Hórus, o novo faraó, atrás de mim. Minhas asas se tornaram as de um falcão, cheio de penas
do falcão sagrado. Minha alma me trouxe e minhas palavras de poder me tornaram eficazes.
Veja-me, ó Rá, e me reconheça! Pertenço a quem te conhece; portanto, me conhece
também. Se este justificado for levantado, não esquecerei a boa ação feita por mim.
Recomenda-me aos quatro ventos ferozes e furiosos que estão ao seu redor e que veem com
duas faces, os ventos que confrontam com rugidos furiosos aqueles que estão destinados à
angústia, aqueles a quem eles destruiriam. Que eles não ofereçam oposição quando eu me
virar para ti, quando eu for a ti e lhe contar esse nome. "Grande Dilúvio que saiu para Quem é
Grande". Não serei cego, mesmo que me coloque na escuridão e não serei surdo, mesmo que
não ouça sua voz. Leve-me contigo, ó Rá. Pois expulsarei tempestades por ti, afastarei as
nuvens por ti e quebrarei e espalharei granizo por ti. Certamente, produzirei louvores e
elogios por ti e adorações sem fim.
78

Imagem que encerra o Papiro de Ani, contendo um "Hino de Louvor a Osíris [Wsir] que
habita Amentet".
79

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