Você está na página 1de 198

Universidade do Estado do Pará

Centro de Ciências Sociais e Educação – CCSE


Programa de Pós-Graduação em Educação
Linha de Pesquisa: Saberes Culturais e Educação na Amazônia

ADRIELE DE FÁTIMA DE LIMA BARBOSA

A Educação Ambiental na Amazônia: um estudo da


experiência do Grupo Ambiental de Fortalezinha (GAF)

Belém – PA
2020
ADRIELE DE FÁTIMA DE LIMA BARBOSA

A Educação Ambiental na Amazônia: um estudo da


experiência do Grupo Ambiental de Fortalezinha (GAF)

Dissertação apresentada como requisito final


para obtenção do título de Mestre em
Educação no Programa de Pós-Graduação em
Educação da Universidade do Estado do Pará
– UEPA.
Linha de Pesquisa: Saberes Culturais e
Educação na Amazônia
Orientador: Prof. Dr. Sérgio Roberto Moraes
Corrêa.

Belém – PA
2020
Dados Internacionais de Catalogação-na-publicação (CIP)
Biblioteca do CCSE/UEPA, Belém – PA

Barbosa, Adriele de Fátima de Lima


A educação ambiental na Amazônia: um estudo da experiência
do Grupo Ambiental de Fortalezinha (GAF). / Adriele de Fátima de
Lima Barbosa; Orientador Sérgio Roberto Moraes Corrêa , Belém –
2021. MARINA CORREA GONÇALVES

Dissertação (Mestrado em Educação) Universidade do Estado do


Pará, Belém, 2020.

Educação ambiental – Maiandeua, Ilha de (PA). 2. Conhecimento


tradicional – Maiandeua, Ilha de (PA). 3.Grupo Ambiental de
Fortalezinha (GAF) I. orient..Corrêa, Sérgio Roberto Moraes. II.
Título.

CDD. 23 ed.
Elaboração da Ficha Catalográfica: Regina Ribeiro CRB-2/739
e
ADRIELE DE FÁTIMA DE LIMA BARBOSA

A Educação Ambiental na Amazônia: um estudo da


experiência do Grupo Ambiental de Fortalezinha (GAF)

Dissertação apresentada como requisito final


para obtenção do título de Mestre em
Educação no Programa de Pós-Graduação em
Educação da Universidade do Estado do Pará
– UEPA.
Linha de Pesquisa: Saberes Culturais e
Educação na Amazônia
Orientador: Prof. Dr. Sérgio Roberto Moraes
Corrêa.

Data da Defesa: 30/09/2020

Banca Examinadora

_______________________________________ - Orientador
Prof. Dr. Sérgio Roberto Moraes Corrêa
Dr. em Ciências Sociais
Universidade do Estado do Pará

_______________________________________- Examinador Externo


José Bittencourt da Silva
Dr. em Ciências Ambientais
Universidade Federal do Pará- PPEB/NEB

_______________________________________- Examinador Interno


Maria das Graças da Silva
Dr. em Planejamento Urbano e Regional
Universidade do Estado do Pará

Belém – PA
2020
À minha amada mãe Maria de Fátima e
minha família.

Aos integrantes do Grupo Ambiental de


Fortalezinha, mulheres e homens da
comunidade tradicional pesqueira de
Maiandeua, que construíram a história de
uma ação coletiva a partir da experiência
singular de uma Educação Ambiental na
Amazônia.
AGRADECIMENTOS

Agradeço com o coração tomado pelos sentimentos de alegria e gratidão,


faço este registro em um tempo histórico adverso, em uma pandemia e seu contexto
do isolamento social. Tempo em que as lembranças de todos aqueles que ajudaram
e iluminaram meu caminhar durante a construção deste trabalho, trouxeram afago
em minha memória e alento para percorrer os dias de incertezas.
A Deus, aos meus mentores espirituais, ao universo, aos sinais e intuições, à
natureza em harmonia com todos os seus seres e a potência renovadora de sua
energia, foram meu alicerce e proteção durante a caminhada deste trabalho, em
cada processo de escrita, em cada etapa, em cada viagem a campo, em cada
vivência física e espiritual singular, todo meu respeito e gratidão.
À minha amada mãe Maria de Fátima, por todo apoio e amor, por ser minha
amiga e parceira em todos os momentos, por ter segurado minha mão em cada
dificuldade e ter compartilhado tantas conquistas. Mãe, você é meu maior exemplo
de força e luta, minha inspiração. Obrigada por ser luz em minha vida, minha mãe!
Ao meu pai Paulo e meu irmão Acácio, pela disponibilidade em ajudar sempre
e pela torcida em cada etapa.
Ao meu orientador Prof. Dr. Sérgio Roberto Moraes Corrêa, por ter acreditado
na proposta de pesquisa e conduzido o processo de construção deste trabalho em
uma relação pautada no diálogo, respeito e afeto, por ter compreendido meus
momentos de dificuldade e limitações. Professor Sérgio, sua dedicação e
compromisso em todas as etapas da orientação foram fundamentais para o
esclarecimentos diante das dúvidas e incertezas na trajetória deste trabalho.
Professor, ao senhor toda minha admiração e gratidão!
Ao grupo GEPPSEMA, por cada reunião e trocas significativas para minha
formação como pesquisadora.
Ao GRUPEMA, por tudo que representa em vida profissional e pessoal.
Aos professores examinadores Prof. Dr. José Bittencourt da Silva e Prof.ª Drª.
Maria das Graças da Silva, por todas as importantes contribuições na tessitura desta
pesquisa.
Aos Docentes do Mestrado em Educação da Universidade do Estado do Pará,
por cada aula, cada seminário, rodas de conversas, por proporcionarem novas
reflexões e questionamentos acerca da educação brasileira.
Ao Programa de Pós-graduação da Universidade do Estado do Pará,
especialmente à secretaria do PPGED, representado por seu Jorginho, que sempre
teve disponibilidade em ajudar em todos os momentos e pelos conselhos durante os
desafios do Mestrado. Seu Jorginho, obrigada por tudo!
À Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES)
pela concessão da bolsa durante o período do Mestrado em Educação, que
possibilitou minha dedicação integral ao curso.
À Prof.ª Drª Maria Betânia Albuquerque, todo meu carinho e gratidão por tudo
que vivi, pelo convite, pelo acolhimento, pela paciência e disponibilidade em ajudar
sempre, serei eternamente grata por tudo que aprendi com você e com a irmandade.
Aos meus colegas da 14ª turma do Mestrado, turma pela qual carrego um
carinho e admiração por todos os discentes que fizeram o Mestrado ser leve e
divertido, em especial ao meus amigos e parceiros de seminário, Shirley Amador,
Mailson Soares, Paulo de Paula, ainda lembro-me do nosso primeiro seminário e do
quanto aprendi em cada etapa com vocês.
Às minhas amigas Angélica, Paulinha e Iviny, a amizade de vocês foi um
presente no caminhar do Mestrado, que sorte a minha ter conhecido mulheres tão
fortes e incríveis como vocês. Minha gratidão por tudo que vivemos juntas nesses 2
anos na Universidade, vocês são especiais!
À minha parceira de orientação, Victória, com quem compartilhei tantas
vivências entre alegrias e desafios no caminho do Mestrado, lembro-me das nossas
apresentações de seminários, das viagens aos eventos acadêmicos e dos infinitos
áudios no whatsapp e das conversas no laboratório. Vi, são muitas memórias que
construí na relação contigo ao longo desses dois anos e meio, mas aqui quero
destacar minha admiração e gratidão por ter conhecido você.
À Dona Graça Santana, por todas as conversas, pelos momentos de
aprendizado em campo, pela disponibilidade em ajudar sempre, pela receptividade
em sua casa e na sua pousada em Fortalezinha na fase inicial da pesquisa. Dona
Graça, com a senhora aprendi a interpretar os sinais da poesia, da arte, da alegria
na simplicidade do cotidiano da vida, tocando o barco sempre na direção dos meus
sonhos. Todo meu afeto e gratidão!
À Prof.ª e amiga Lúcia Santana, por cada palavra afetuosa e amiga, pelos
conselhos, por ser calmaria e afeto em momentos de ansiedade. Professora Lúcia,
obrigada por tudo!
A todos os moradores da comunidade de Fortalezinha, que foram
acolhedores e solícitos durante o período que estive em campo, especialmente aos
participantes do Grupo Ambiental de Fortalezinha, Ivan, Jacinto, Said, Manuel,
Cleide e Edina, sem dúvida não seria possível construir este trabalho sem vocês.
À querida Rosa, moradora de Fortalezinha, que foi essencial na etapa final da
pesquisa, disponibilizando sua casa para os dias de trabalho de campo. Rosa,
obrigada por nossas conversas, por cada almoço, cada café da tarde, por cada troca
durante minha ida à comunidade, minha eterna gratidão!
À minha amiga Alzira Araújo, pelo apoio e amizade, por sempre ter uma
palavra amiga e verdadeira, pela paciência em ouvir e por sua disposição em ajudar.
Zira, minha gratidão a você e tudo que sua amizade representa em minha vida.
À minha amiga Ana Daniele, por ter compartilhado tantas experiências no
decorrer da vida, por ser presente em todos os momentos de alegrias e dificuldades,
por acolher minhas limitações. Dani, obrigada por sua ajuda nessa caminhada do
Mestrado, em cada áudio no whatsapp de dúvidas e incertezas você trouxe paz e
luz. Obrigada por tudo, minha amiga!
Às minhas amigas e irmãs do coração Sarah, Ingrid e Barbara três mulheres
incríveis que sempre estão presente em minha vida, mesmo quando estou ausente e
distante. Sou imensamente grata em ter a oportunidade de viver o lado leve da vida
com vocês, amo vocês e todas as memórias que construímos juntas no decorrer da
história da nossa amizade. Todo meu carinho e gratidão!
“Fortalezinha é princesinha
Prima de Algodoal
Filha de Maracanã
Beleza não tem igual
Eu vou no mar
Terra tão linda
Terra de muito amor
Agora é Fortalezinha
Para quem nunca se encantou.”

(Dona Onete)
RESUMO

BARBOSA, Adriele de Fátima de Lima. A Educação Ambiental na Amazônia: um


Estudo sobre o Grupo Ambiental de Fortalezinha (GAF). Dissertação (Mestrado
em Educação) – Universidade do Estado do Pará, Belém, 2020.

Esta dissertação teve como objeto de investigação a experiência de educação


ambiental nas ações coletivas do Grupo Ambiental de Fortalezinha (GAF),
objetivando identificar e analisar o que a ação coletiva do GAF, na comunidade
tradicional (pesqueira) de Fortalezinha, revelou sobre a sua experiência de
“educação ambiental” a partir das narrativas da comunidade e de outros agentes
institucionais que compunham o GAF. A problemática fomentada orientou-se pela
seguinte pergunta: O que a ação coletiva do GAF, na comunidade tradicional
(pesqueira) de Fortalezinha tem a revelar sobre a sua experiência de “educação
ambiental” a partir das narrativas da comunidade e de outros agentes institucionais
que compunham o GAF? Tencionando obter resposta para esse questionamento,
algumas questões “Sul” ajudaram a interrogar e a responder à questão central: Qual
a origem do GAF e o que levou a sua constituição? Que papel a Comunidade
Tradicional Pesqueira de Fortalezinha teve em sua constituição? O que é possível
aprender com essa experiência de ação coletiva de educação ambiental oriunda de
comunidades tradicionais pesqueiras da Amazônia sob o enfoque das
epistemologias do Sul? Quais os avanços e limites dessa ação coletiva do GAF no
tocante à sua proposta de “educação ambiental” na comunidade pesqueira de
Fortalezinha na perspectiva das epistemologias do Sul? Que desafios é possível
identificar para o debate da educação ambiental a partir dessa experiência com
essas populações tradicionais da Amazônia? Para responder a estas questões
buscou-se: apresentar elementos que caracterizam a origem do GAF e o que levou
a sua constituição, bem como o papel que a Comunidade Tradicional Pesqueira de
Fortalezinha teve em sua constituição; analisar a concepção de educação ambiental
presente nessa experiência do GAF; investigar em que essa experiência de ação
coletiva de educação ambiental do GAF contribuiu para essa comunidade; identificar
os avanços e limites dessa ação coletiva do GAF no tocante à sua proposta de
“educação ambiental” sob a perspectiva das epistemologias do Sul. O percurso
metodológico foi caracterizado pela abordagem qualitativa, sob a perspectiva das
Epistemologias do Sul. Com a pesquisa de campo, as técnicas utilizadas foram:
estudo de caso, observação participante, diários de campo, registros fotográficos e
de áudio, coleta de dados por meio de entrevista narrativa. Este estudo teve a
participação de oito sujeitos que participaram do GAF, sendo seis pessoas da
comunidade, onde três pessoas se identificaram como pescadores e atuantes em
outras atividades econômicas, um agente de saúde, um comerciante e um
coordenador de um espaço educativo e duas pessoas que atuaram como agentes
externos, que não são moradoras da vila, mas possuem casa e empreendimento
particular. Para a interpretação dos dados dessa pesquisa, utilizaram-se as
categorias de análise em triangulação de dados. Deste modo, identificou-se que o
GAF surge, de início, a partir das problemáticas encontradas com a questão do lixo
na comunidade, mas a pesquisa revelou outros fatores estruturais e contraditórios
que contribuíram na fomentação de múltiplas discussões dentro do grupo e
consequentemente em ações que objetivassem no atendimento dessas respectivas
necessidades básicas de Fortalezinha. De acordo com as narrativas dos sujeitos
externos e moradores que participaram da ação do GAF, a experiência de educação
ambiental assentava-se em torno do aspecto econômico, social, político, cultural e
ambiental, demarcado em sua temporalidade histórica em avanços, apresentado
como um espaço formativo e de circulação de conhecimentos para os integrantes na
construção de um olhar mais crítico e sensível para o meio ambiente e também na
autonomia, participação social e reivindicação de seus direitos. Os limites da
atuação do grupo e consequentemente das ações realizadas, foram pontuadas
devido a fatores de ordem estrutural que envolvia, desde o apoio financeiro de
outras instituições para a manutenção do grupo e fatores que envolviam relações
interpessoais. Em consequência dos dados encontrados com a pesquisa e suas
respectivas análises, alguns desafios aparecem para pleitear no debate da
educação ambiental na Amazônia, os quais destaco: como as comunidades locais
estão se organizando frente às problemáticas ambientais atuais, como as áreas de
proteção ambiental vem trabalhando a educação ambiental em seus territórios e por
fim reconhecer a cultura local da realidade amazônica como elemento fundamental
na discussão da educação ambiental da Amazônia.

Palavras Chave: Educação Ambiental, Grupo Ambiental de Fortalezinha, Ação


Coletiva, Epistemologias do Sul
ABSTRACT

BARBOSA, Adriele de Fátima de Lima. Environmental Education in the Amazon:


a Study on the Grupo Ambiental de Fortalezinha (GAF). Dissertation (Master's
degree in Education) - Pará State University, Belém, 2020.

This essay had as object of investigation the experience of environmental education


in the collective actions of the Grupo Ambiental de Fortalezinha (GAF), aiming to
identify and analyze what the collective action of GAF, in the traditional fishing
community of Fortalezinha, presented about its experience of "environmental
education" from the narratives of the community and other institutional agents that
consists the GAF. The issue raised in this research was guided by the following
question: What does the collective action of the GAF, in the traditional fishing
community of Fortalezinha have to reveal about its experience of "environmental
education" from the narratives of the community and other institutional agents that
consists the GAF? Seeking to get an answer to this question, some questions were
used to guide and help to ask and answer the main question: What is the origin of the
GAF and what led to its constitution? What role did the Traditional Fishing
Community of Fortalezinha have in its constitution? What is possible to learn from
this experience of collective action of environmental education from traditional fishing
communities of the Amazon under the focus of southern epistemologies? What are
the advances and limits of this collective action of the GAF regarding its proposal of
"environmental education" in the fishing community of Fortalezinha from the
perspective of epistemologies of the South? What challenges can be identified for the
environmental education debate from this experience with these traditional
communities of the Amazon? To answer these questions, the aim was to present
elements that characterize the origin of the GAF and what led to its constitution, as
well as the role that the Traditional Fishing Community of Fortalezinha had in its
constitution; to analyze the conception of environmental education present in this
GAF experience; to investigate in which this experience of collective action of
environmental education of The GAF contributed to this community; to identify the
advances and limits of this collective action of the GAF regarding its proposal of
"environmental education" from the perspective of epistemologies of the South. The
methodological path was characterized by the qualitative approach, from the
perspective of epistemologies of the South. With the field research, the techniques
used were: case study, participant observation, field diaries, photographic and audio
records, data collection through narrative interviews. This study had the participation
of eight individuals who participated of the GAF: six people from the community,
three of them identified themselves as fishermen and active in other economic
activities, one of them as a health agent, another one as a trader and a also
coordinator of an educational space. The two external individuals were not residents
of the village, but they have houses and private enterprise. For the data interpretation
of this research, the categories of analysis in data triangulation were used. Thus, it
was identified that the GAF arises, at first, from the problems encountered with the
issue of garbage in the community, but the research revealed other structural and
contradictory factors that contributed to promote discussions within the group and
consequently in actions that aimed at the resolution of these basic needs of
Fortalezinha. According to the narratives of external subjects and residents who
participated in the action of the GAF, the experience of environmental education was
based around the economic, social, political, cultural and environmental aspect,
demarcated in its historical temporality in advances, presented as a formative space
and movement of knowledge for the members in the construction of a more critical
and sensitive look at the environment and also in autonomy, social participation and
claiming their rights. The limits of the group's performance, and consequently of the
actions taken, were punctuated due to structural factors that involved, from the
financial support of other institutions for the maintenance of the group and factors
that involved interpersonal relationships. As a result of the data found with the
research and its respective analyzes, some challenges appear to be added in the
debate on environmental education in the Amazon, which I highlight: how local
communities are organizing themselves in the face of current environmental issues,
how environmental protection areas have been working on environmental education
in their territories and, finally, recognizing the local culture of the Amazonian reality
as a fundamental element in the discussion of environmental education in the
Amazon.

Keywords: Environmental Education, Grupo Ambiental de Fortalezinha, Collective


Action, Epistemologies of the South
LISTA DE SIGLAS

APA: Área de Proteção Ambiental


ACEDESPIM: Associação Comunitária de Desenvolvimento da ilha de Maiandeua
ANPED: Associação Nacional de Pesquisa e Pós-Graduação em Educação
CAPES: Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal do Nível Superior
CF: Constituição da República Federativa do Brasil de 1988
CONAMA: Conselho Nacional de Meio Ambiente
COEA: Coordenação-Geral de Educação Ambiental
CNUC: Cadastro Nacional de Unidade de Conservação
DIAP: Diretoria de Áreas Protegidas
FUNATURA: Fundação Pró-Natureza
GAF: Grupo Ambiental de Fortalezinha
IBAMA: Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e Recursos Naturais
IBGE: Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
ICMBIO: Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade
IDEFLOR: Instituto de Desenvolvimento Florestal da Biodiversidade do Estado do
Pará
ISA: Instituto Socioambiental
JUACRI: Movimento de Jovens Amigos de Cristo
MMA: Ministério do Meio Ambiente
MEC: Ministério da Educação
PARNA: Parque Nacional
PCN: Parâmetros Curriculares Nacionais
PIEA: Programa Internacional de Educação Ambiental
PLACEA: Programa Latino-americano e Caribenho de Educação Ambiental
PRONEA: Programa Nacional de Educação Ambiental
OSCIP: Organização Civil de Interesse Público
ONU: Organização das Nações Unidas
RESEX: Reserva Extrativista
RENAS: Recursos Naturais e Antropologia de Sociedade Pesqueira da Amazônia
SECTAM: Secretaria de Estado de Ciência e Tecnologia e Meio Ambiente
SETUR: Secretaria de Turismo do Estado do Pará
SEMA: Secretaria de Meio Ambiente
SEMA: Secretaria de Especial do Meio Ambiente
SEMAS: Secretaria de Meio Ambiente e Sustentabilidade
SEUC: Sistema Estadual de Unidade de Conservação
SISNAMA; Sistema Nacional de Meio Ambiente
SNUC: Sistema Nacional de Unidades de Conservação
SNIF: Sistema Nacional de Informações Florestais
UCs: Unidades de Conservação
UICN: União Internacional para a Conservação da Natureza
UNESCO: Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura
LISTA DE QUADROS

Quadro 01 – Levantamento das Produções Acadêmicas.................................... 27


Quadro 02 – Levantamento das Produções Acadêmicas.................................... 34
Quadro 03 – Perfil dos sujeitos da pesquisa ...................................................... 53
Quadro 04 – Principais ações do GAF............................................................... 113
LISTA DE GRÁFICOS

Gráfico 01 – Número de moradores da vila de Fortalezinha........................... 89


Gráfico 02 –Órgão deliberativos do GAF........................................................ 106
Gráfico 03 – Principais Eixos Temáticas do GAF............................................ 107
LISTA DE FIGURAS

Figura 01 - Localização de Maracanã na microrregião do Salgado Paraense. 58


Figura 02 - Representação por satélite do município de Maracanã................. 61
Figura 03 - Representação por satélite da distância entre Belém e Maracanã 62
Figura 04 - Antigo Trapiche Municipal da Vila do Quarenta do Mocooca........ 62
Figura 05 - Orla de Maracanã........................................................................... 66
Figura 06 - Unidades de Conservação do Brasil (2018)................................... 74
Figura 07 - Localização da APA de Algodoal/ Maiandeua................................ 76
Figura 08- Ponta da Mamede Algodoal........................................................... 79
Figura 09 - Vista área da Vila de Algodoal....................................................... 79
Figura 10 - Ruas da Vila e Charretes usadas pela população......................... 80
Figura 11 - Croqui do registro do percurso realizado de Belém à
Fortalezinha...................................................................................................... 82
Figura 12 - Chegada no 40 do Mocooca.......................................................... 82
Figura 13 - Porto do 40 do Mocooca................................................................ 83
Figura 14 - Atravessia de rabeta no Furo do 40 do Mocooca........................... 84
Figura 15 - Furo do 40 do Mocooca.................................................................. 84
Figura 16 - Caminho até à Vila de Fortalezinha............................................... 85
Figura 17 - Coqueiro Arrancado pela força da maré alta.................................. 86
Figura 18 - Placa de sinalização da APA de Maiandeua em Mocooca............ 87
Figura 19 - Escola de Fortalezinha ponto que demarca à Vila de Mocooca e
Vila de Fortalezinha.......................................................................................... 87

Figura 20 - Construção de Pedra em Formato Circular.................................... 88


Figura 21 - Praia de Fortalezinha..................................................................... 90
Figura 22 - Praia de Fortalezinha e Local de Trabalho dos Pescadores.......... 91
Figura 23 - Pedras retirada da beira da praia em barragem no bar comercial. 92
Figura 24 - Praia de Fortalezinha no período de chuva................................... 93
Figura 25 - Documento de Certificação do Estatuto Social do GAF................ 105
Figura 26 - Atividade do GAF de Confecção de Artesanatos........................... 121
Figura 27 - Integrante do GAF em Processo de Construção de Lixeira de
Bambu................................................................................................................ 121
SUMÁRIO
1. INTRODUÇÃO....................................................................................................... 19
1.1 Origem da pesquisa............................................................................................. 19
1.2 Problemática e objetivos da pesquisa.................................................................. 23
1.3 Referencial teórico-metodológico da análise....................................................... 26
1.4 Caminhos metodológicos da pesquisa................................................................ 47
1.4.1 Tipo de pesquisa .............................................................................................. 50

1.4.2 Os sujeitos da pesquisa ................................................................................... 52

1.4.3 Técnicas utilizadas em campo ......................................................................... 54

1.4.4 Sistematização e análise de dados .................................................................. 55

2. A VILA DE FORTALEZINHA: AS CONTRADIÇÕES DE UMA


TERRITORIALIDADE SINGULAR DA AMAZÔNIA..................................................59
2.1 O Município de Maracanã.................................................................................... 59
2.2.1 Unidade de Conservação: princípios e diretrizes de sua organização ............. 68

2.2.2 Unidade de Conservação de Uso Sustentável: APA de Algodoal: a Caminho de


Fortalezinha............................................................................................................... 77

3.O GRUPO AMBIENTAL DE FORTALEZINHA...................................................... 95


4. EDUCAÇÃO AMBIENTAL: UM CAMPO DE ESTUDO EM MOVIMENTO.........124
4.2 As principais correntes ecologistas.................................................................... 136
4.3 As principais correntes teóricas em educação ambiental.................................. 142
4.4 Macro-tendência das correntes da educação ambiental: nas principais
perspectivas político-pedagógica............................................................................. 146
5. OUTRAS PEDAGOGIAS: UM OLHAR PARA EDUCAÇÃO NA AÇÃO
COLETIVA DO GAF................................................................................................ 153
5.1 As epistemologias do sul e pedagogias pós-abissais – uma contribuição
interpretativa acerca da experiência de educação ambiental do GAF..................... 160
5.2 A Proposta da experiência de educação ambiental do GAF..............................163
5.3 A educação ambiental do GAF: avanços e limites de sua experiência..............168
6. CONSIDERAÇÕES FINAIS – OS DESAFIOS DA EDUCAÇÃO AMBIENTAL A
PARTIR DO SUL......................................................................................................183
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS........................................................................188
APÊNDICE............................................................................................................... 192
APÊNDICE A........................................................................................................... 193
TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO....................................193
APÊNDICE B........................................................................................................... 195
ROTEIRO DE ENTREVISTA SEMI-ESTRUTURADA............................................. 195
19

1. INTRODUÇÃO
1.1 Origem da pesquisa

Esta pesquisa adentra o campo de estudo da ação coletiva de uma


comunidade tradicional pesqueira da microrregião do Salgado paraense, tendo como
eixo temático a educação ambiental inscrita a partir da experiência da atuação do
Grupo Ambiental da comunidade de Fortalezinha, localizada no município de
Maracanã, nordeste do Estado do Pará.
O interesse pelo tema está alicerçado em minha história de vida e trajetória
acadêmica e profissional. Começo referenciando as memórias de minha infância,
mais especificamente sobre uma experiência com um lugar, em um marco temporal
no ano de 2000, verão amazônico e a primeira viagem com minha família para ilha
de Algodoal, inserida em uma das vilas que formam a Área de Proteção Ambiental
(APA de Algodoal/ Maiandeua).
Ao passar dos anos, continuei frequentando a ilha, já no ano de 2009, conheci
outros lugares como a vila do 40 do Mocooca e Camboinha. A curiosidade em
conhecer mais sobre as vilas da APA de Algodoal/Maiandeua se intensificava em
cada retorno que fazia à localidade, principalmente, em conhecer mais sobre o povo,
a cultura e a dinâmica da realidade da APA.
As recordações tangentes à APA de Algodoal/Maiandeua aguçavam em mim
inquietações a respeito das múltiplas realidades ambientais, sociais e culturais da
Amazônia e também como um ser pertencente a um contexto regional muito mais
complexo e plural, que de acordo com Gonçalves (2015), a Amazônia é complexa e
diversificada, há diferentes tipos de Amazônia:

Há Amazônia de várzea e há Amazônia de terra firme. Há Amazônia dos


rios e de água branca e a dos rios de água preta. Há a Amazônia dos
cerrados, a Amazônia dos manguezais e a Amazônia das Florestas
(GONÇALVES, 2015, p. 9).

Essas lembranças me acompanhavam durante meu percurso acadêmico. No


início do curso de Pedagogia na Universidade do Estado do Pará, o contato com
alguns autores como: Brandão (2007), Freire (1996), Gohn (2010), Santos (2010),
Leff (2012) dentre outros e a disciplina de “Educação em Instituições Não Escolares
e Ambientes Populares” contribuíram para um entendimento amplo do que seja
20

educação, seu papel na sociedade, os processos educativos que envolvem a vida


humana e não humana e a variedade de práticas educacionais.
Destaco, ainda, minha experiência como Bolsista do Programa Institucional
de Bolsa de Iniciação à Docência (PIBID) – UEPA/CAPES, o qual continha em seu
projeto a temática: “Práticas Socioeducativas no Campo Ambiental: Formação de
Docentes e Discentes da Educação Básica como Agentes de Mediação entre a
Escola e Universidade”. As vivências como bolsista contribuíram de forma
significativa para a formação inicial como discente e assistente de pesquisa,
principalmente, no campo das ações educativas da realidade ambiental com a
escola.
A minha participação no Grupo de Estudo e Pesquisa em Educação e Meio
Ambiente (GRUPEMA) foi significativa para a escolha da temática desta pesquisa,
uma vez que, a atuação no Grupo possibilitou a construção de um embasamento
teórico e prático, para analisar as potencialidades das diversas realidades
socioambientais e educacionais que existem na região amazônica, bem como,
entender suas respectivas, heterogeneidades no contexto da educação e, também a
conexão entre o conceito de cultura relacionado à questão do ser humano-natureza.
Outro ponto a salientar na trajetória acadêmica e profissional, que motivou na
escolha do tema deste estudo, guarda relação com o estágio realizado no Serviço
de Educação do Museu Paraense Emílio Goeldi (SEEDU-MPEG), sendo a
instituição científica mais antiga da Amazônia. Mediante o estágio no Museu, tive a
oportunidade de conhecer os trabalhos realizados em torno das comunidades
pesqueiras, em particular as pesquisas desenvolvidas na região do Salgado
paraense.
Foi nesse momento que comecei a buscar mais informações sobre a
localidade da APA de Maiandeua, embora de forma bem sucinta, pois não se tratou
de uma pesquisa completa, tendo em vista que na época estava dedicada ao
Trabalho de Conclusão de Curso da Graduação, concentrado no campo da
educação e o acervo didático no Museu Goeldi.
O interesse em dar prosseguimento em minha formação como pesquisadora
continuou no ano de 2017 como aluna especial do Programa de Pós-Graduação em
Educação- Mestrado da Universidade do Estado do Pará, nas disciplinas cursadas:
“Cultura, Saberes e Imaginário na Educação Amazônica” e “Teoria Social”, que
21

conduziram-me a reflexões acerca de uma proposta de pesquisa na área da


educação.
A partir dos estudos de Le Goff (2013) sobre memória, que convergem em
alguns pontos para o campo da educação e para construção da identidade das
sociedades, pude, nos termos de Freire, reler criticamente minhas memórias e daí
imaginar e criar uma possibilidade de pesquisa e, sobretudo, chamar atenção para
importância da memória coletiva como importante dimensão cognitiva e política
contra a dominação e em busca da emancipação.
A partir das disciplinas mencionadas acima, comecei a comecei a delinear
uma futura proposta de estudo, na intenção de pesquisar a história da APA de
Algodoal/Maiandeua.
Ainda que de forma prematura, iniciei um levantamento bibliográfico acerca
da APA de Algodoal, visando apreender mais sobre o lugar que evocava tantos
afetos e lembranças em minha vida. Nessa circunstância, tive contato com o livro
“Desencanto da Princesa” de Helena Quaresma, dissertação premiada pelo Núcleo
de Altos Estudos Amazônicos, publicada no ano de 2002.
A obra trata de um estudo sobre como o Estado se apropria de espaços já
tradicionalmente ocupados por populações pesqueiras e se incorporava ou não
essas populações ao processo de elaboração e implementação de suas políticas de
meio ambiente, questionando as transformações que vinham ocorrendo tanto nas
esferas social, econômica e cultural dessa APA no final da década de 90.
No decorrer de seu texto, a autora citava a vila de Fortalezinha, sobre a qual
descrevia algumas informações e características sociais, culturais e ambientais,
fazendo menção sobre o Grupo Ambiental da comunidade (GAF), aspecto que
chamou minha atenção, pela correlação com a minha vivência em grupo de
pesquisa na área da educação e meio ambiente, principalmente, quando a autora
mencionou sobre a atuação do Grupo no desenvolvimento da educação ambiental
com a comunidade.
O livro foi um estímulo para conhecer a vila de Fortalezinha, aqui revelo que
durante a imersão na leitura tive uma feliz surpresa, quando a autora se reportou à
coordenação do GAF no período em que a pesquisa foi realizada, citando o nome de
Graça Santana, pesquisadora do Museu Goeldi, a qual tive a oportunidade de
conhecer durante meu estágio na Instituição, por quem tenho uma profunda
admiração e amizade.
22

À vista disso, entrei em contato com Graça Santana para saber mais a
respeito do Grupo Ambiental de Fortalezinha e da comunidade da APA. Foi
agendada uma visita em sua residência, onde Graça Santana contou um pouco da
sua história, de como chegou à comunidade, das pesquisas realizadas com os
pescadores da ilha, do cotidiano em Fortalezinha e sua atuação no Grupo
Ambiental. A cada relato e apresentação de algumas de suas produções científicas,
identifiquei a riqueza de elementos sociais, culturais, turísticos e ambientais,
diferente das demais vilas da APA que já havia conhecido.
A partir desse encontro, percebi algumas confluências entre a realidade da
vila de Fortalezinha e a educação compreendida também, como fenômeno que se
realiza na produção de conhecimentos que emergem de experiências cotidianas;
questão esta que Brandão (2007) enfatiza, ao situar a educação em todos os
espaços, em redes e estruturas de relações sociais, existentes em distintas formas e
praticadas em inúmeras sociedades e culturas.
Assim, atentei para a importância de um estudo voltado para as comunidades
tradicionais que residiam na Área de Proteção Ambiental, ponderando, sobre o fato
de que, o espaço amazônico demanda de pesquisas educacionais que cheguem a
espaços singulares, que em sua maioria são geradores de conhecimentos
específicos, invisibilizados pela concepção da ciência hegemônica eurocentrada e
por instituições religiosas coloniais.
Tendo como referência o posicionamento do Santos (2010), a ciência
moderna não considera o conhecimento que parte do senso comum, ou seja, o
conhecimento que parte das experiências, que não podem ser universalizados em
leis, considerando que a dinâmica e interação do senso comum, não podem ser
analisados pelo pressuposto de ordem e estabilidade da lógica da ciência
dominante.
Partindo desse encaminhamento epistemológico, averiguar a realidade
amazônica apresenta-se como um caminho contra hegemônico, possibilitando o
reconhecimento de uma dada experiência, de uma ação coletiva de uma
determinada área, classificada como periférica ou subalternizada pela concepção da
ciência moderna.
Dessa forma, para o desenvolvimento de uma proposta que encaminha-se no
interior da linha de pesquisa “Saberes Culturais e Educação na Amazônia”, é
necessário definir como área de interesse estudar: a experiência de educação
23

ambiental em uma ação coletiva de comunidade tradicional pesqueira, tomando


como objeto de estudo o Grupo Ambiental de Fortalezinha, vila localizada em uma
Área de Proteção Ambiental.
1.2 Problemática e objetivos da pesquisa

O interesse em conhecer Fortalezinha não se limitava apenas ao lugar, mas


observar um pouco da realidade da comunidade pesqueira, o cotidiano das pessoas
que participaram do Grupo Ambiental descrito em documentos que eu já tivera a
oportunidade, em outro momento, de analisar; assim, conhecer a comunidade
pesqueira significava compreender alguns aspectos da APA de Maianadeua.
A vila de Fortalezinha, onde foi realizada a pesquisa, está inserida em um
contexto de uma Área de Proteção Ambiental (APA) de Algodoal/ Maiandeua que é
uma das categorias de uso sustentável da Unidade de Conservação (UC),
estabelecida na Lei de Nº 9.985, de 18 de julho de 2000, a qual define em seu artigo
15 do Capítulo III a Área de Proteção Ambiental como:

Áreas em geral extensas com um certo grau de ocupação humana, dotado


de atributos abióticos, bióticos, estéticos ou culturais especialmente
importantes para a qualidade de vida e o bem-estar da população humana e
tem como objetivos básicos proteger a diversidade biológica, disciplinar o
processo de ocupação e assegurar a sustentabilidade do uso dos recursos
naturais (Brasil, 2000, p.8).

Quaresma (2003, p. 26) destaca que APA de Algodoal/ Maiandeua, foi a


primeira Unidade de Conservação litorânea do estado do Pará, um aspecto
importante na compreensão do processo histórico das unidades de conservação no
âmbito estadual e também nacional. APA de Algodoal/ Maiandeua situa-se no
município de Maracanã, microrregião do salgado, no litoral nordeste do Estado do
Pará; a mesma limita-se: ao norte com o oceano atlântico ao norte; ao sul com o furo
do Mocooca; a leste com o rio de Maracanã e a reserva extrativista marinha de
Maracanã, e a oeste com o rio de Marapanim.
A presente pesquisa foi de extrema relevância epistemológica, por conduzir a
possibilidade de construir uma compreensão da experiência da proposta educação
ambiental da ação coletiva do Grupo Ambiental de Fortalezinha, uma vez que com
avanços e limites dessa experiência, datam a sua correspondência de uma dada
territorialidade, temporalidade e saberes da comunidade tradicional pesqueira
24

tangenciada por diversos sentidos e significados em torno das questões


socioambientais.
Nesta tessitura, apresenta-se o Grupo Ambiental de Fortalezinha,
considerando alguns dados que colaboraram na compreensão de sua história e
atuação na Área de Proteção Ambiental (APA) Algodoal/Maiandeua, sob o enfoque
das narrativas de seus ex-integrantes no que tange à experiência de ações em torno
da educação ambiental, assim como dos princípios normativos do seu Estatuto
Oficial.
O GAF, atualmente desativado, foi o Grupo Ambiental de Fortalezinha, criado
por moradores da comunidade no ano de 1997, com auxílio de outros agentes
institucionais como o Museu Paraense Emílio Goeldi, que segundo os relatos de
seus participantes identificaram algumas questões de procedência ambiental e
social na vila, referentes à preocupação do crescimento do fluxo de visitantes em
outras localidades, o aumento do turismo nas demais vilas da APA e,
consequentemente, a produção dos resíduos nas praias – até o final da década de
noventa não havia nenhuma política pública para a questão do lixo da localidade.
Partindo desse contexto, alguns moradores de Fortalezinha e agentes
externos de outras instituições, elaboraram estratégias de intervenção no campo da
educação ambiental, incialmente em ações voltadas para tratamento do lixo,
preservação dos ecossistemas, os igapós, o mangue, a praia e a retirada das pedras
da praia e na extração de mariscos, como sarnambi e siri, que implicam diretamente
na sobrevivência e na economia da ilha, demarcando a importância econômica e
cultural, ao mesmo tempo social, política e ambiental.
Durante a pesquisa de campo, alguns moradores relataram o aspecto social
da vila durante o contexto de criação e atuação do GAF na década de noventa e sua
comparação com a realidade atual. Aspectos estes, que resultaram em algumas
inquietações em relação ao grupo e, consequentemente, a problemáticas locais,
como: a ausência de coleta regular de lixo, que ainda hoje não é realizada na
comunidade; a situação precária da Estrada do 40 do Mocooca, a qual, no período
do inverno amazônico, torna-se, praticamente, intrafegável; e a ausência de uma
estrutura segura e confortável no porto do 40 do Mocooca.
Considerando os aspectos revelados pelos participantes do GAF
entrevistados na pesquisa, acerca do que foi o grupo, quais eram suas normativas,
sua relação com a comunidade, suas ações coletivas, quais foram os avanços e
25

limitações da perspectiva de uma proposta de educação ambiental e as informações


dos moradores; a pesquisa buscou investigar a trajetória do grupo a partir das
narrativas da comunidade, procurando compreender a experiência de educação
ambiental decorrente de uma ação coletiva proposta pela/ e ou vivenciada pela
população da vila, tendo em vista seu caráter como comunidade de povos
tradicinais.
Desse modo a pesquisa orientou-se pela seguinte pergunta: O que a ação
coletiva do GAF, na comunidade tradicional (pesqueira) de Fortalezinha tem a
revelar sobre a sua experiência de “educação ambiental” a partir das narrativas da
comunidade e de outros agentes institucionais que compunham o GAF?
Algumas questões “Sul” ajudaram a interrogar e a responder à questão
central: Qual a origem do GAF e o que levou a sua constituição? Que papel a
Comunidade Tradicional Pesqueira de Fortalezinha teve em sua constituição? O que
é possível aprender com essa experiência de ação coletiva de educação ambiental
oriunda de comunidades tradicionais pesqueiras da Amazônia sob o enfoque das
epistemologias do Sul? Quais os avanços e limites dessa ação coletiva do GAF no
tocante à sua proposta de “educação ambiental” na comunidade pesqueira de
Fortalezinha na perspectiva das epistemologias do Sul? Que desafios é possível
identificar para o debate da educação ambiental a partir dessa experiência com
essas populações tradicionais da Amazônia?
A partir das questões acima foi possível desvelar algumas práticas educativas
do Grupo Ambiental de Fortalezinha. Para tanto, como princípio metodológico, foi
preciso traçar o seguinte objetivo geral:
Analisar o que a ação coletiva do GAF, na comunidade tradicional (pesqueira)
de Fortalezinha, revelou sobre a sua experiência de “educação ambiental” a partir
das narrativas da comunidade e de outros agentes institucionais que compunham o
GAF.
Em decorrência do objetivo geral, definiram-se os seguintes objetivos
específicos:
• Apresentar elementos que caracterizam a origem do GAF e o que
levou a sua constituição, bem como o papel que a Comunidade
Tradicional Pesqueira de Fortalezinha teve em sua constituição.
• Analisar a concepção de educação ambiental presente nessa
experiência do GAF.
26

• Investigar em que essa experiência de ação coletiva de educação


ambiental do GAF contribuiu para essa comunidade
• Identificar os avanços e limites da ação coletiva do GAF no tocante à
sua proposta de “educação ambiental” sob a perspectiva das
epistemologias do Sul.
• Identificar os desafios do debate da educação ambiental a partir dessa
experiência com populações tradicionais da Amazônia.

1.3 Referencial teórico-metodológico da análise

O planejamento acerca da revisão da literatura acerca do assunto aqui


estudado, ajudou a demarcar o objeto de pesquisa, além da subjetividade e
experiência de vida acima alinhavadas, que, juntamente, com as reflexões teóricas e
epistemológicas fundamentam este estudado. Para isso, foram consultadas
produções acadêmicas, com a finalidade de verificar como está posto o debate do
campo de estudo da educação ambiental, por quais caminhos teóricos e temáticos
vêm sendo traçado esta temática no contexto nacional e internacional e quais os
avanços e limites desse campo de estudo.
Para tanto, realizou-se um levantamento no Catálogo de Teses e
Dissertações da CAPES (Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível
Superior). Foi escolhido esse banco de dados pela confiabilidade e legitimidade de
suas respectivas referências acadêmicas no âmbito do reconhecimento científico
nacional e internacional.
Os descritores que alicerçaram a pesquisa inicial foram: educação ambiental,
ação coletiva e comunidade tradicional pesqueira, delimitado no período de cinco
anos no recorte temporal de 2014 – 2018 para as dissertações e teses, entretanto,
alguns trabalhos completos não foram encontrados.
A pesquisa com as dissertações e teses seguiu os critérios de busca na área
das ciências humanas; a área do conhecimento e avaliação foi delimitada a:
educação. Como área de concentração especificou-se a educação ambiental nos
programas educacionais em todas as regiões do Brasil.
Ressalta-se que durante o levantamento no Catálogo de Teses e
Dissertações foram analisados trabalhos e suas respectivas palavras-chave, que
correspondessem aos descritores citados acima. No levantamento sobre o descritor
de educação ambiental, foram encontrados 28 trabalhos, sendo 24 dissertações e
27

quatro teses. Os trabalhos estão organizados de acordo com os descritores das


pesquisas realizadas nas regiões do Brasil, para que haja uma compreensão em
relação às pesquisas nos últimos cinco anos, vinculadas aos programas de
mestrado e doutorado em Educação e Educação Ambiental, como mostra o quadro
abaixo:
Quadro 01 – Levantamento das Produções Acadêmicas
Descritor – Educação Ambiental
Período de 2014 – 2018

DESCRITOR 1- EDUCAÇÃO AMBIENTAL


Nº de Dissertações Nº de Teses
Pesquisas relacionadas ao descritor 24 4
Pesquisas relacionadas ao descritor na Região Norte 6 1

Pesquisas relacionadas ao descritor no Estado do Pará 5 0

Pesquisas relacionadas ao descritor na Região 1 1


Nordeste
Pesquisas relacionadas ao descritor na Região 4 2
Centro-Oeste
Pesquisas relacionadas ao descritor na Região Sudeste 4 Foi zero

Pesquisas relacionadas ao descritor na Região Sul 4 0

REGIÃO NORTE

Título Autor Titulação Instituição Ano Programa


Educação ambiental no Kelly Dissertação UFPA 2014 Educação
licenciamento: um estudo do Soares
programa de educação Mafra
ambiental na transamazônica -
município de Brasil Novo/Pará
Práticas pedagógicas de Ana Dissertação UFA 2015 Educação
educação ambiental em escolas Rafaela
municipais de Manaus Goncalves
Ferreira
Educação ambiental e áreas de Aloncio de Dissertação UFA 2014 Educação
risco: o trabalho de uma escola Oliveira
pública em Manaus
Os dilemas e as proposições da Edisa Dissertação UFPA 2014 Educação
educação ambiental na Assuncão
transamazônica (br-230): do Correa
atendimento as normas para o
licenciamento ao encontro das
expectativas das comunidades
da rodovia
Educação ambiental: saberes e Raimunda Tese UFPA 2017 Educação
percepções socioambientais Kelly silva
dos docentes de uma escola Gomes
28

ribeirinha do assentamento
agroextrativista do
Anauerapucu, Santana-AP
Pensando com a educação Eliel do Dissertação UFPA 2017 Educação
crítica para crítica da educação Carmo
ambiental na reserva extrativista Pompeu
Ipaú-Anilzinho
As possibilidades da inserção Roble Dissertação UFPA 2016 Educação
da educação ambiental em Carlos
unidades de conservação: o Tenorio
caso da reserva extrativista Moraes
“Ipaú-Anilzinho” na Amazônia
Tocantina
REGIÃO NORDESTE
A política de educação Magnus Tese UFRN 2014 Educação
ambiental da Universidade José
Federal do Rio Grande do Barros
Norte: limites e desafios para Gonzaga
sua efetivação
Avaliação de um programa de Potyra Dissertação UFRN 2014 Educação
educação ambiental não formal: Borges
a caravana ecológica na visão Pinheiro
dos participantes
REGIÃO CENTRO-OESTE

Desafios da educação Luiz Alves Dissertação UnB 2015 Educação


ambiental na recuperação da da Silva
nascente do Ribeirão Santa
Maria: o sentido da ação
humana na preservação do
meio ambiente
Arte-educação ambiental, um Rita Patta Tese UnB 2016 Educação
constructo transdisciplinar Rache

Currículos festeiros de águas e Lucia Tese UFMT 2015 Educação


outonos: fenomenologia da Shiguemi
educação ambiental pós-crítica Izawa
Kawahara
Educação ambiental campesina: Edilaine Dissertação UFMT 2016 Educação
do diálogo de saberes à Maria
semeadura de projetos Mendes
ambientais escolares Ferreira
comunitários
Educação ambiental na Cristiane Dissertação UFMT 2018 Educação
comunidade quilombola de mata Carolina de
cavalo: diálogos da arte, cultura Almeida
e natureza Soares
Entre linhas e nós: um olhar da Amanda Dissertação UFMT 2018 Educação
educação ambiental sobre o Martins de
currículo na comunidade Espindula
quilombola de Mata Cavalo Areval
REGIÃO SUDESTE

Educação ambiental na Daniela Dissertação UFMG 2014 Educação


estruturação de mundos Campolina
possíveis: o caso do núcleo Vieira
Manuelzão córrego João
Gomes Cardoso
29

A perspectiva crítica nas Maria Dissertação USP 2015 Educação


pesquisas em Educação Cristina
Ambiental Bolela e
Silva
Mapeamento ambiental da Aurea Dissertação UNIMEP 2016 Educação
região do São Domingos no Cristina
município de Sumaré/SP: Bastos da
possíveis desdobramentos para Costa
uma educação ambiental crítica Pereira
em espaço não formal
Pesquisa em educação Larissa Dissertação UNESP 2017 Educação
ambiental e movimentos sociais: Nobre
um estudo sobre teses e Magacho
dissertações brasileiras
REGIÃO SUL
O transitar de saberes Samira Dissertação UNISUL 2014 Educação
populares de pescadores Martins
artesanais na escola Pereira
Área de proteção ambiental do Aurici Dissertação PUCRS 2015 Educação
banhado grande: APABG: Azevedo da
escolas, educação e Rosa
preservação ambiental
Ecopedagogia enquanto Ivan Luis Dissertação UNOCHAP 2018 Educação
educação ambiental como Schwengbe ECÓ
prática da liberdade r
Fonte: Banco de Dados de Teses e Dissertações (CAPES), 2020.

Da região norte, foram analisados sete trabalhos realizados nos últimos cinco
anos com a temática sobre educação ambiental, que possuem aproximações com o
objeto desta pesquisa. O estudo de Mafra (2014) intitulado “Educação ambiental no
licenciamento: um estudo do programa de educação ambiental na transamazônica -
município de Brasil Novo/Pará”, fez uma análise dos resultados das ações
promovidas pelo Programa de Educação Ambiental da BR-230 no município de
Brasil Novo, nos anos de 2009 a 2011. Com esta pesquisa foi possível identificar a
relevância da reflexão acerca dos processos pedagógicos sobre a educação
ambiental realizada pelo Programa na Transamazônica e sua influência nas ações,
conhecimentos e vivência dos sujeitos daquela localidade.
Ferreira (2015) em sua dissertação intitulada “Práticas pedagógicas de
educação ambiental em escolas municipais de Manaus”, estudou práticas
pedagógicas de Educação Ambiental na execução da agenda ambiental escolar em
duas escolas municipais de Manaus; a qual foi avaliada como “insuficiente” em
relação à complexidade ambiental e suas inferências na sociedade, assim como no
cotidiano escolar na reprodução de uma prática conservadora da educação
ambiental. No entanto, a pesquisa possibilitou identificar que a cultura e a
30

sustentabilidade oportunizam uma educação ambiental mais crítica, reflexiva e


analítica.
Oliveira (2014) em “Educação ambiental e áreas de risco: o trabalho de uma
escola pública em Manaus”, objetivou conhecer e analisar a educação ambiental em
áreas de risco no trabalho de uma escola pública de Manaus e a práxis docente em
relação ao tema; identificando que a escola conseguiu desenvolver a educação
ambiental com vários temas, principalmente, com áreas de risco. Entretanto, há uma
insuficiente consonância entre a direção e docentes no desenvolvimento dos temas
e suas metodologias, frequência e a forma de trabalho, sendo observada apenas
ações realizadas em datas de referência comemorativa.
Na dissertação intitulada “Os dilemas e as proposições da educação
ambiental na transamazônica (BR – 230): do atendimento as normas para o
licenciamento ao encontro das expectativas das comunidades da rodovia”, Correa
(2014) analisou se os resultados das ações de educação ambiental que foram
implementadas pelo programa da BR – 20 por meio do PEA no município de
Altamira – PA no ano de 2010 a 2011 favoreceram a promoção da prática da
educação ambiental nas comunidades, bem como na construção de uma
consciência ambiental.
Gomes (2017) em sua tese sobre “Educação ambiental: saberes e
percepções socioambientais dos docentes de uma escola ribeirinha do
assentamento agroextrativista do Anauerapucu, Santana – AP”, buscou refletir sobre
os saberes e as percepções socioambientais, em um prisma teórico holístico e
socioambiental na prática educativa docente.
Pompeu (2017) na dissertação intitulada “Pensando com a educação crítica
para crítica da educação ambiental na reserva extrativista Ipaú – Anilzinho”, analisou
a educação ambiental presente na percepção dos educadores e no contexto da
escola EMEIF de Anilzinho e na EMEF de Joana Peres, como instrumento
pedagógico de mediação e sociabilidade ambiental.
Moraes (2016) no estudo “As possibilidades da inserção da educação
ambiental em unidades de conservação: o caso da reserva extrativista “Ipaú –
Anilzinho” na Amazônia Tocantina”, investigou como as ações de educação
ambiental como política pública inserida no contexto de unidades de conservação
estava relacionada com a gestão da RESEX e se favoreceram o desenvolvimento da
comunidade local.
31

Na região nordeste foram encontrados dois trabalhos, o primeiro trata-se de


uma tese intitulada “A política de educação ambiental da Universidade Federal do
Rio Grande do Norte: limites e desafios para sua efetivação”, em que Gonzaga
(2014) faz uma análise – a partir do referencial teórico-metodológico do materialismo
histórico e dialético – sobre as ações realizadas pela Universidade Federal do Rio
Grande do Norte, considerando a dimensão da política de Educação Ambiental e as
exigências socioambientais da sociedade contemporânea.
Já o segundo trabalho é a dissertação sobre “Avaliação de um programa de
educação ambiental não formal: a caravana ecológica na visão dos participantes”,
em que Pinheiro (2014) fez uma avaliação com base na percepção dos participantes
sobre a experiência de um programa de educação ambiental na modalidade não
formal itinerante.
Já na região centro-oeste foram encontrados seis trabalhos, sendo duas teses
e quatro dissertações. O primeiro trabalho intitulado “Desafios da educação
ambiental na recuperação da nascente do ribeirão Santa Maria o sentido da ação
humana na preservação do meio ambiente”, Silva (2015) realiza uma pesquisa-ação,
que investigou a contribuição das comunidades locais para a revitalização e
preservação das nascentes do ribeirão Santa Maria.
Rache (2016) em sua tese “Arte-educação ambiental, um constructo
transdisciplinar”, verificou a emergência da expressão arte-educação ambiental na
ONG Núcleo de Educação e Monitoramento Ambiental (NEMA), do Rio Grande/RS e
da Escola da Natureza, de Brasília/DF, se caracteriza ou não como uma subárea ou
especialidade que surge do conhecimento, tendo em vista que a expressão não está
limitada ao espaço e à produção do NEMA e da Escola da Natureza, tem sido
referendada em outras ONGs, coletivos e instituições de educação básica e
superior.
Kawahara (2015) ao realizar o estudo “Currículos festeiros de águas e
outonos: fenomenologia da educação ambiental pós-crítica”, analisou os contextos
das festas tradicionais das comunidades banhadas pelas águas do Pantanal mato-
grossense do Brasil e das festas da colheita de arroz celebradas no outono na Ilha
de Noto no Japão. Procurou conhecer as relações e os saberes construídos nos
festejos tradicionais como forma de pensar, realizar e viver a educação ambiental
fora do espaço escolar.
32

Ferreira (2016) na dissertação “Educação ambiental campesina: do diálogo de


saberes à semeadura de projetos ambientais escolares comunitários”, procurou
compreender como foi estabelecido o processo de aprendizagem coletiva e
colaborativa, alicerçado num diálogo freireano com a comunidade acadêmica,
escolar e comunidade do campo; com propósito de dialogar e refletir acerca das
sociedades sustentáveis em diversos espaços e a criação de táticas de
enfrentamento às mudanças do clima.
Soares (2018) no estudo “Educação ambiental na comunidade quilombola de
Mata Cavalo: diálogos da arte, cultura e natureza”, teve como objetivo a realização
de um mapeamento social, destacando a cultura da comunidade quilombola, os
diálogos da arte-educação-ambiental, em uma cartografia das dimensões dialógicas
do entrelaçamento da arte, cultura e a natureza.
Areval (2018) buscando compreender qual a relevância do currículo no âmbito
de uma escola quilombola, formulou a dissertação “Entre linhas e nós: um olhar da
educação ambiental sobre o currículo na comunidade quilombola de Mata Cavalo”,
em que situa a importância da educação e do currículo no quilombo, para a
construção coletiva de saberes da comunidade aprendente fundamentada na
educação ambiental.
Na região sudeste foram encontradas quatro dissertações, trabalhos estes,
vale ressaltar, mais dialogam com a temática da educação ambiental desenvolvida
nesta pesquisa.
O estudo intitulado “Educação ambiental na estruturação de mundos
possíveis: o caso do núcleo Manuelzão córrego João Gomes Cardoso”, analisou as
ações decorrentes do processo de educação ambiental do grupo inserido ao Núcleo
Manuelzão João Gomes Cardoso, com objetivo de compreender a conexão entre a
melhoria da qualidade de vida com a qualidade ambiental, tendo como referencial a
educação ambiental performática.
A pesquisa “A perspectiva crítica nas pesquisas em Educação Ambiental”, faz
uma análise sobre a concepção crítica das pesquisas em educação ambiental, a
partir de dissertações e teses em educação ambiental, apresentando como o
resultado o percentual de: 35% do total das pesquisas assentadas na perspectiva
crítica.
O estudo “Mapeamento ambiental da região do São Domingos no município
de Sumaré/SP: possíveis desdobramentos para uma educação ambiental crítica em
33

espaço não formal”, buscou debater coletivamente questões socioambientais com


jovens moradores dessa localidade atendidos pela ONG Instituto Bem Querer, que
viviam em um contexto de exclusão social no município de Sumaré.
Encerrando a região sudeste, o último trabalho aborda a “Pesquisa em
Educação Ambiental e Movimentos Sociais: um estudo sobre teses e dissertações
brasileiras”, que realizou uma investigação acerca da relação entre movimentos
sociais e educação ambiental, definida nas pesquisas de teses e dissertações
brasileiras em educação ambiental; em que foram identificadas com objetos de
estudo centralizados em movimentos ambientalista, os movimentos sociais e
campesinos e movimentos feministas, com referência no MST e MAB e a proposta
da educação ambiental crítica ou transformadora.
Na região sul foram encontrados três trabalhos do ano de 2014 a 2018, que
versam sobre educação ambiental e Áreas de Proteção Ambiental, saberes locais e
o debate sobre a ecopedagogia. Aqui faço uma observação sobre as pesquisas
analisadas, pois algumas abordam o papel da escola, embora não seja a referência
central do levantamento, foram consideradas, pois nota-se a relação com saber local
e APAS, termos estes que estão inscritos no decorrer desta pesquisa.
Pereira (2014) em seu texto “O transitar de saberes populares de pescadores
artesanais na escola”, buscou elucidar a percepção dos sujeitos/atores sobre a
inclusão dos saberes populares da pesca ao processo educativo formal. O resultado
da pesquisa identificou que são poucos os alunos que consideram o saber dos
pescadores, embora a pesca seja a principal atividade econômica das famílias ali
envolvidas; seria necessário a valorização dos saberes dos pecadores, por meio da
contextualização com os conteúdos da escola.
Rosa (2015) realizou um estudo sobre Área de Proteção Ambiental do
Banhado Grande (APABG) – situada no Rio Grande do Sul, intitulado “Área de
proteção ambiental do banhado grande: APABG: escolas, educação e preservação
ambiental”, em que analisou como a educação ambiental e a escola fizeram parte da
história de criação da APA. Identificou os modos de relação do humano com a
natureza, analisou os reflexos e a emergência de políticas e legislações ambientais;
identificando os atores sociais e políticos e suas contribuições na atual legislação
brasileira de unidades de conservação e examinou como a educação ambiental se
conectou com essa história.
34

E finalizando a região sul, Schwengber (2018) em seu trabalho


“Ecopedagogia enquanto educação ambiental como prática da liberdade”, realizou
uma abordagem crítica da Educação Ambiental, sob a perspectiva da ecopedagogia,
enquanto uma prática educacional emancipadora, alicerçado em um referencial
teórico que possibilitou a compreensão da integração das pessoas com seu mundo,
evidenciando o papel do ser humano na construção de seu espaço, em uma práxis
transformadora do sujeito e do ambiente em que vive.
Aqui faço uma observação sobre o levantamento dos trabalhos encontrados
com o descritor educação ambiental: tratam-se de estudos no campo da educação
ambiental ainda em uma relação direta com espaços formais de educação, trabalhos
estes que não tem ponto de convergência com a temática proposta nesta pesquisa.
Nesse sentido, destaco também que os descritores ação coletiva e comunidade
tradicional pesqueira foram inseridos juntos no campo de busca do banco de dados
da CAPES, buscando encontrar trabalhos mais próximos deste estudo, como mostra
o quadro a seguir:

Quadro 02 – Levantamento das Produções Acadêmicas


Descritores – Ação Coletiva e Comunidade Tradicional Pesqueira
Período de 2014 – 2018
DESCRITORES 2 – AÇÃO COLETIVA E COMUNIDADE TRADICIONAL PESQUEIRA
Nº de Dissertações Nº de Teses
Pesquisas relacionadas aos descritores 2 0
Pesquisas relacionadas aos descritores na 0 0
Região Norte
Pesquisas relacionadas aos descritores no 0 0
Estado do Pará
Pesquisas relacionadas aos descritores na 0 0
Região Nordeste
Pesquisas relacionadas aos descritores na 0 0
Região Centro-Oeste
Pesquisas relacionadas aos descritores na 1 0
Região Sudeste
Pesquisas relacionadas aos descritores na 1 0
Região Sul
REGIÃO NORTE
Título Autor Titulação Instituição Ano Programa
Não foi encontrado nenhum trabalho
35

REGIÃO NORDESTE
Não foi encontrado nenhum trabalho
REGIÃO CENTRO-OESTE
Não foi encontrado nenhum trabalho
REGIÃO SUDESTE
Apanhando desperdícios ou Caio Dissertação UFSCar 2016 Educação
contra o desperdício da
Renno
experiência: cartografia de
coletivos em busca de uma Jose
educação emancipatória no
município de Sorocaba
REGIÃO SUL
Diálogo entre a escola e o saber- Jaquelin Dissertação UNIVALI 2015 Educação
fazer de uma comunidade e Maria
tradicional: possibilidade de Alexand
transição para um espaço re
educador sustentável Weiler
Fonte: Banco de Dados de Teses e Dissertações (CAPES), 2020.

Nas regiões norte, nordeste e centro-oeste não foram encontrados trabalhos


com os descritores ação coletiva e comunidade tradicional pesqueira, apenas nas
regiões sudeste e sul, porém, em quantidade ínfima.
Na região sudeste, o estudo “Apanhando desperdícios ou contra o
desperdício da experiência: cartografia de coletivos em busca de uma educação
emancipatória no município de Sorocaba”, realizado por Renno (2016), constrói uma
cartografia de coletivos que buscam a educação emancipatória na cidade de
Sorocaba – SP, por meio da percepção de suas respectivas dinâmicas,
organizações e do seu caráter, gerador de subjetividades rebeldes, inerentes à
experiência de participação na ação coletiva.
Já na região sul foi encontrado apenas um trabalho intitulado “Diálogo entre a
escola e o saber fazer de uma comunidade tradicional: possibilidade de transição
para um espaço educador sustentável”, o estudo teve como objetivo a inclusão e as
contribuições dos saberes e fazeres da comunidade tradicional de Taquaras em
Balneário do Camboriú, Santa Cantarina, durante a transição de uma escola para
um espaço educador sustentável.
Com o levantamento no banco de dados da CAPES, foi possível fazer uma
avaliação acerca do número de produções acadêmicas com a temática ambiental, a
partir da perspectiva “não formal”, que considere outras experiências e realidades.
Pesquisas que tenham relação com ações coletivas em contextos de comunidades
36

tradicionais pesqueiros, apresentam um percentual mínimo dentre os trabalhos


encontrados.
Além de poucos trabalhos versarem sobre educação ambiental e populações
rurais tradicionais, em particular comunidades pesqueiras em APA na Amazônia,
tendo um recorte em ação coletiva advinda desses grupos sociais, é importante
destacar que, nesse levantamento, é mínimo também o número de pesquisas que
apontem ou assentem-se num debate pós-colonial e, principalmente, decolonial no
campo da educação ambiental. É urgente questionar as bases teóricas e
epistemológicas eurocentradas da educação ambiental, para assinalar rupturas
epistemológicas, compreender melhor essa temática a partir do Sul Global, em
particular dos povos e grupos sociais subalternos e lugares periféricos da sociedade
brasileira.
A partir do exposto acima, destaca-se que esta pesquisa pretende suscitar um
debate decolonial que possa pluralizar e alargar o horizonte teórico, epistemológico
e metodológico do campo de estudo da educação ambiental, fazendo emergir outros
saberes, outras interpretações e experiências críticas. Assim, este estudo elaborado
a partir da experiência de educação ambiental do Grupo Ambiental de Fortalezinha
visa contribuir com a discussão científica da educação ambiental na região
amazônica.
Primeiramente, por apresentar uma abordagem diferenciada a respeito da
educação ambiental – as Epistemologias do Sul –, esta pesquisa demarca um outro
olhar para a construção do referencial teórico ambiental, elencando particularidades
que abarcam uma pesquisa em uma Área de Proteção Ambiental e o contexto local
de uma comunidade tradicional pesqueira, realidade esta, que em sua demanda
carrega uma dinâmica específica Amazônica. Isto é, uma análise a partir de grupos
sociais subalternos e da periferia.
Outro fator que anuncia um outro horizonte para o campo de estudo em
educação ambiental, manifesta-se por meio da experiência de ações educativas e
seus desafios, desenvolvidas diretamente com a população local e sua atuação
direta no cotidiano da vila, uma vez que as ações estavam pautadas em atividades
de intervenção nas problemáticas enfrentadas em Fortalezinha.
O que revela a educação ambiental em uma outra proposta de contexto não
formal, onde se considera outros pilares conceituais, como exemplo: a cultura local,
o protagonismo juvenil, a questão econômica e social. Por fim, vale também
37

destacar que ao trabalhar com as narrativas dos sujeitos, o papel da memória


coletiva torna-se importante marco referencial na tessitura e contextualização da
história do grupo ambiental.
A construção da síntese destas produções que discorreram em aproximações
como o objeto proposto nesta pesquisa, foi uma etapa essencial no discernimento
das referências teóricas, que viabilizaram as demarcações epistemológicas que
situam o objeto apresentado. Desse modo, revelou concepções fundamentais na
estruturação de um aporte teórico, facilitando assim, ponderações das categorias
elementares deste estudo como: cultura, educação, educação não formal, educação
ambiental, ação coletiva, memória, comunidade tradicional pesqueira e
epistemologias do Sul.
Não obstante, essa pesquisa tome como referência central as epistemologias
do Sul, com ênfase em Boaventura Santos, ela dialoga com um quadro referencial
mais amplo e plural no campo crítico, dando destaque para o pensamento social e
educacional critico latino americano. Assim, apresento os autores que alicerçaram
teoricamente esta pesquisa como: Brandão (2002, 2007, 2015), Thompson (1995),
Loureiro (1995), Nora (1993), Bosi (1994), Diegues (1999), Gohn (2011), Arroyo
(2009, 2012), Furtado (1987), Reigota (2012), Leff (2012), Santos (2010)
considerando também as contribuições de outros autores para este estudo.
O delineamento teórico do estudo parte das contribuição de Santos (2010),
uma vez que, para o autor o mundo é epistemologicamente diverso e tangenciado
por nuances presentes nas experiências sociais, demarcando a necessidade de uma
pluralidade epistemológica, que reconheça a complexidade dos conhecimentos para
que sejam atribuídos parâmetros diferentes de validade, possibilitando assim uma
interpretação, visibilidade e credibilidade aos conhecimentos desperdiçados pela
racionalidade hegemônica.
Fazendo uma leitura acerca dessas novas formas de conhecimento, os
conhecimentos de matrizes populares, leigos, plebeus, camponeses, indígenas,
originários no outro lado da “linha epistemológica” não são considerados como
conhecimentos relevantes ou comensuráveis, por se encontrarem para além do
universo verdadeiro e do falso dentro dimensão moderna.
O pensamento moderno orienta-se pela sua capacidade de produzir e
radicalizar distinções, a realidade especifica de determinada localidade não se
conjuga com a universalidade da metrópole, as grandes cidades e capitais. Criando
38

assim, uma divisão epistemológica dos conhecimentos produzidos pela lógica


abissal, que tem sua característica principal a negação de outras experiências que
estão fora da linha eurocêntrica dos países que historicamente demarcaram
posições privilegiadas de produção de conhecimentos, em detrimento de outros
países que estão situados fora do eixo ocidental.

A característica fundamental do pensamento abissal é a impossibilidade da


co-presença dos dois lados da linha. Este lado da linha só prevalece na
medida em que esgota o campo da realidade relevante. Para além dela há
apenas inexistência, invisibilidade e ausência não-dialéctica (SANTOS,
2010, p.24).

Buscando superar uma cartografia epistemológica abissal, fundamentada na


negação radical, na ausência radical, na ausência da humanidade, na
subumanidade moderna, na humanidade moderna que não se concebe sem uma
subumanidade moderna, optou-se por um caminho epistemológico que reconheça,
traduza e dialogue com os diferentes tipos de conhecimentos, originários de
experiências e realidades plurais.
Assim, de um debate voltado para educação no âmbito não-escolar, este
estudo orienta-se por meio da perspectiva das epistemologias do sul, buscando
reconhecer a partir do contexto da realidade brasileira, em especial, a região
amazônica e sua dinâmica plural, a realidade dos grupos sociais subalternos e suas
características singulares pouco reconhecidas, a saber a comunidade tradicional
pesqueira de Fortalezinha.
Considerando o campo de estudo, pontua-se inicialmente a compreensão
sobre cultura, como o encadeamento da criação do ser humano incorporado em
múltiplas estruturas significativas ao mundo, que de acordo com Brandão (2015,
p.134) são manifestadas por meio do trabalho motivado, reflexivo e atribuído por
distintas interpretações.
Assim, podemos conjecturar que a cultura envolve, articula e faz interagir as
múltiplas unidades e os diferentes sistemas de coisas, de objetos, de técnicas de
relacionamentos com a natureza (pesca, caça, agricultura), de processos sociais de
saberes (da culinária à filosofia), de complexos valores e as suas gramáticas e
regras de posições e de relações sociais e conflitos: quem é quem? Quem pode ou
deve fazer o que com quem? Enfim, nós nos tornamos humanos criando um mundo
de cultura no qual passamos, sem nunca deixarmos de viver, ao mesmo tempo, no
mundo de natureza que nos é dado (BRANDÃO, 2015, p. 134).
39

A consequência entre o processo de transformação e significados referidos ao


mundo, na realização da coletividade da ação social gerada pela própria sociedade,
traduzindo assim a identidade do homem. Para Brandão (2002) a cultura é
designada a partir da elaboração social que encaminha historicamente a ação
humana, sobre ela mesma e com o mundo.
A consciência humana é a cultura, resultante do trabalho e da criação
histórica. O ser humano é o protagonista de criação e recriação da cultura, não
limita-se apenas na sua interação com o mundo, mas corresponde às instigações da
realidade. Apreender sobre o conceito de cultura é substancial no referencial teórico
deste estudo, considerando a realidade específica da vila de Fortalezinha, bem
como do Grupo Ambiental, que não podem ser desassociados do cotidiano
pesqueiro da região do Salgado paraense.
Desse modo, Thompson (1995) ao repensar a cultura em uma concepção
estrutural, dá-nos subsídios para o esclarecimento do conceito de cultura,
considerando o caráter simbólico dos fenômenos culturais incluídos em conjunturas
sociais estruturadas e marcadas por processos conflituais de classes sociais e do
valor de suas experiências.
Ao descrever esta concepção de cultura como uma concepção “estrutural”,
desejo destacar a preocupação com os contextos e processos socialmente
estruturados nos quais as formas simbólicas estão inseridas. Mas não quero sugerir
que esta preocupação esgota a tarefa da análise cultural; ao contrário, o que é
crucial é a maneira pela qual esta preocupação se liga à atividade de interpretação.
A concepção estrutural da cultura é tanto uma alternativa à concepção simbólica,
como uma modificação dela, isto é, uma maneira de modificar a concepção
simbólica levando em conta os contextos e processos socialmente estruturados
(THOMPSON, 1995, p.182).
É reconhecendo o caráter estrutural da cultura e também a particularidade
das formas simbólicas da região amazônica, demarcada por pluralidades, que utilizo
Loureiro (1995) e sua contribuição na edificação da categoria cultura e imaginário
amazônico. Considerando, assim, a riqueza das narrativas dos moradores de
Fortalezinha, sua pluralidade, enredo, e mitopoéticas que explica a origem de
diversos acontecimentos da zona do salgado, protagonizados por elementos como
sereias, princesas e o mundo encantado, que compõem o imaginário daquela
40

região, em especial a ilha de Maiandeua, um imaginário que envolve além do


humano o não-humano.

A cultura amazônica onde predomina a motivação de origem rural-ribeirinha


é aquela na qual melhor se expressam, mais vivas se mantêm as
manifestações decorrentes de um imaginário unificador refletido nos mitos,
na expressão artística propriamente dita na visualidade que caracteriza
suas produções de caráter utilitário – casas, barcos etc. O interior –
expressão que designa o mundo rural, embora inclua vila e povoados – é o
lugar das tensões próprias dessa sociedade onde os grupos humanos estão
dispersos ao longo de extensos espaços e onde se acham mergulhados
numa ideia vaga de infinitude, propiciadora da livre expansão do imaginário
(LOUREIRO, 1995, p. 56).

Em consonância com o campo do imaginário, a memória neste estudo é


tomada como campo conceitual importante para o entendimento do que foi o Grupo
Ambiental de Fortalezinha, tendo em seu princípio as narrativas de cada integrante
que expressam suas vivências no grupo. Identificando assim, a relação da memória
com a história, em consequência oportunizando uma reflexão mais específica no
enfoque das memórias individuais, que resultam em memórias coletivas e suas
funções sociais nos grupos sociais excluídos pela lógica da memória nacional.
Por conseguinte, é preciso adentrar nos estudos relacionados a memória e
história; isto nos encaminha ao pensamento de Nora (1992), que identifica a
diferença entre as memórias, como exemplo a memória arquivística apoiada na
concretude dos registros e a memória da vivência. Esclarecendo que a memória
verdadeira contempla gestos e hábitos, que circulam saberes em silêncio,
transformados no decorrer da história.

É antes de tudo, uma memória, diferentemente da outra, arquivística. Ela se


apoia inteiramente sobre o que há de mais preciso no traço mais material no
vestígio, mais concreto no registro, mais visível na imagem. O movimento
que começou com a escrita termina na alta fidelidade e na fita magnética.
Menos a memória vivida do interior, mais ela tem a necessidade de
suportes exteriores e de referências tangíveis de uma existência que só vive
através delas (NORA, 1993, p.14).

Bosi (1994) no tocante à memória, destaca sua função social, reconhecendo


a memória como o fenômeno a desempenhar a alta função da lembrança. Embora a
autora dedique-se, enfaticamente, a importância da memória das pessoas idosas e a
riqueza de suas experiências para o mundo social, o conceito utilizado para o
diálogo teórico nesta pesquisa, está validado nos aspectos da memória voltada para
ação (hábitos), que revivem o passado. Nesse caso, as análises das narrativas dos
41

sujeitos entrevistados nascem das memórias do que fora vivenciado em


determinada época, das práticas coletivas de um grupo ambiental.

É o momento de desempenhar a alta função da lembrança. Não porque as


sensações se enfraquecem, mas porque o interesse se desloca, as
reflexões seguem outra linha e se dobram sobre a quintessência do vivido.
Cresce a nitidez e o número das imagens de outrora, e esta faculdade de
relembrar exige um espírito desperto, a capacidade de não confundir a vida
atual com o que passou, de reconhecer as lembranças e opô-las às
imagens de agora (BOSI, 1994, p.81).

Na trajetória conceitual, a próxima categoria a elencar-se é a educação. A


qual Brandão (2007) analisa como o processo inerente à vida do ser humano,
presente em todos os lugares, na família, na comunidade, nas instituições
dogmáticas, na escola, nos movimentos sociais. É importante destacar que a
educação transforma realidades, porém, também é utilizada para conservar e
reproduzir estruturas de dominação e opressão, assim, formar subjetividades que
mantenham a ordem hegemônica vigente.
Para Brandão (2007) a educação antecede as ações, pois sua existência já
se localiza no imaginário das pessoas e nas ideologias de seus respectivos grupos
sociais, seu processo se edifica de dentro para fora e sua incumbência se faz na
mudança do sujeito em seu mundo. Para o autor a existência da educação pode ser
livre, onde os sujeitos expressam seus saberes, ideias, crenças, aquilo que é
comum, tornando-a uma vivência comunitário. Também pode ser imposta por um
poder centralizado, como uma ferramenta de controle social, que legitima as
desigualdades estruturais entre os homens.

A educação existe onde não há a escola e por toda parte, podem haver
redes e estruturas sociais de transferência de saber de uma geração a
outra, onde ainda não foi sequer criada a sombra de algum modelo de
ensino formal e centralizado. Porque a educação aprende com o homem a
continuar o trabalho da vida (BRANDÃO, 2007, p. 13).

Não há somente uma maneira de se compreender e vivenciar a educação, a


mesma é caracterizada em decorrência da reciprocidade, das múltiplas relações
existentes entre os sujeitos sociais. À vista disso, é que se entende, nesta pesquisa,
as ações exercidas pelo Grupo Ambiental de Fortalezinha como formas de
educação, coexistente entre pessoas e realidades distintas.
No intuito de apresentar um direcionamento epistêmico através dos preceitos
de uma educação decolonial, destaca-se a contribuição de Palermo (2014), a autora
42

ressalta, o modo de fazer educação encontra-se na experiência produtora de


saberes, onde estão envolvidos distintos sujeitos portadores de memórias diversas,
com suas respectivas experiências de vida, inseridos em sistemas de produção
heterogêneos.
Entende-se, dessa maneira, que estão sendo produzidas outras epistemes,
situadas em movimentos sociais e também em muitos coletivos, aqui pode-se
exemplificar que ação coletiva do GAF, considerando suas particularidades, como os
saberes de uma comunidade tradicional pesqueira.

(...) Lo que nos interesa es complejizar la comprensoón del “lugar de


enunciación”, no solo como “construcción de subjetividade ligada a la
memoria sócio-cultural, es decir a la historia local, sin dejar de tener em
cuenta la incidencia de la historia personal y las experiencias vitales de
cada enunciador individual”, cuya inflexión se encuentra em la herancia
histórico-colonial desde la que nos construímos como sujetos del conocer,
decir y hacer; sino también em la interacción com el presente que nos
habita, y las particularidades desde las cuales nos encontramos
condicionados (pero no sujetos) em escenarios actuales de
(pos)colonialidad (PALERMO, 2014, p. 69).

Esses lugares de enunciação são espaços dinâmicos, que também implicam


em fronteiras, territórios, conexões seletivas, interações e posicionamentos.
Constituem uma rede de relacionamento entre as pessoas, lugar de construção de
subjetividade vinculada à memória sociocultural. Esses espaços de história e
memória têm em seu princípio norteador a pluriversalidade, sendo oposto da
universalidade, tendo a heterogeneidade como marca da comunidade ali presente.
De tal modo, o conceito de comunidade tradicional é essencial para esta
pesquisa, considerando a contexto da vila de Fortalezinha, que ao ser analisada a
partir da perspectiva conceitual de Diegues (1999), pode ser compreendida como
comunidade tradicional. Pois, segundo o mesmo autor: “sociedades tradicionais” é o
termo que diz respeito a grupos de pessoas com culturas especificas, diferenciadas
entre si com modos de vidas reproduzidos historicamente de forma ou não isolada,
que tem em suas bases sociais práticas cooperativas e técnicas singulares na
relação com a natureza e no manejo do meio ambiente. Essa concepção faz
referência aos povos indígenas e a segmentos da população nacional que possuem
modos próprios de existência.
43

Exemplos empíricos de populações tradicionais são as comunidades


caiçaras, os sitiantes e roceiros tradicionais, comunidades quilombolas,
comunidades ribeirinhas, os pescadores artesanais, os grupos extrativistas
e indígenas. Exemplos empíricos de populações não-tradicionais são os
fazendeiros, veranistas, comerciantes, servidores públicos, empresários,
empregados, donos de empresas de beneficiamento de palmito ou outros
recursos, madeireiros, etc (DIEGUES, 1999, p. 22).

No entanto, vale ressaltar que no conceito de “populações tradicionais”


apresentado por Diegues (1999) há limitações no que tange sua definição, partindo
do princípio que todas as culturas e sociedades tem uma “tradição”. Em outro
sentido, essa conceituação fundamentada em um conjunto de “traços culturais”
empíricos, não viabiliza analisar sociedades e culturas ativas em constante estado
de transformação (DIEGUES, 1999, p. 23).
Já a questão territorial para a concepção das populações tradicionais, ainda
perpassa como o lócus das representações e do imaginário dessas sociedades. A
íntima relação do ser humano com seu meio, sua dependência maior em relação ao
mundo natural. Nesse direcionamento, é válido analisar o sistema de
representações, símbolos e mitos que essas populações constroem, pois estas
representações implicam diretamente na relação dos povos tradicionais com a
natureza.
Por tratar-se de uma comunidade pesqueira, consideram-se também os
estudos de Furtado (1987) sobre a pesca artesanal, abordando os aspectos
ambientais da pesca, sua configuração espacial, o saber dos pescadores tendo
como base a organização social da produção pesqueira, as relações do ser humano
com o seu meio ambiente, revelando o modo de ser do ribeirinho, de quem faz a
pesca na Amazônia.
A respeito de educação não formal, tenho como fundamento teórico Gohn
(2011), ao conceber que a existência de tais práticas educativas se dá por meio da
cultura, a forma de representação do ser humano na história, qualificando tais
modos educativos no encadeamento de quatro esferas: o que tangencia os
conhecimentos políticos; dos direitos e do papel de cidadãos; o treinamento dos
sujeitos para o trabalho; o aprendizado voltado para o exercício da autonomia,
direcionados para a solucionar problemáticas coletivas. Educação esta, que
segundo o mesmo autor serve para a construção de civilidade e disposta em
diferentes espaços, onde o ensinar ocorre de forma mais autêntica.
44

Gohn (2011) enfatiza que a educação não formal se dá em “ações e práticas


coletivas organizadas em movimentos, organizações e associações sociais” (GOHN,
2011, p. 108). Para autora os espaços onde ocorrem a educação não formal são:

Os espaços onde se desenvolvem ou se exercitam as atividades de


educação não formal são múltiplos, a saber: no bairro-associação, nas
organizações que estruturam e coordenam os movimentos sociais, nas
igrejas, nos sindicatos e nos partidos políticos, nas Organizações Não
Governamentais, nos espaços culturais, e nas próprias escolas, nos
espaços interativos dessas comunidades educativa etc (GOHN, 2011, p.
108).

É com base no exposto acima que se atribui a característica de espaço


educativo não formal à experiência do Grupo Ambiental de Fortalezinha.
Enfatizando, a profunda relação dos membros do Grupo com meio ambiente em que
vivem, o os processos de aprendizado que dali emergem. Lembrando que a
educação não formal para Gohn (2011) tem sempre uma característica coletiva.
Observando as informações estabelecidas no Estatuto Social do GAF,
também há concordância para com os tipos de aprendizagem procedentes de
espaços não formais segundo o quadro comparativo de Gohn (2011): na associação
democrática para o desenvolvimento, ter caráter voluntário, promover a socialização
e ter uma natureza descentralizada.
No que se refere ao conceito de ação coletiva, ao qual também podemos
incluir ações do GAF, conduzimo-nos por meio da análise de Arroyo (2012), ao
destacar a ação de agentes sociais em movimentos organizados coletivamente.

Seus movimentos e ações coletivas podem ser vistos como uma reação na
medida em que em suas ações se mostram presentes, existentes,
incômodos. Mostram-se presentes na arena política, econômica, cultural,
pedagógica, nas marchas, ocupações, nas cidades e nos campos. Uma
presença coletiva afirmativa em que não se reconhecem, mas contestam as
formas negativas, inferiorizantes em que foram pensados. Nessa afirmação
como sujeitos existentes, contestam de maneira radical, na raiz, o
pensamento que os pensou e classificou como inexistentes, como meros
objetos e produzem outras formas de pensá-los (ARROYO, 2009, p. 4).

Arroyo (2009) destaca que nas ações coletivas há outros conhecimentos,


outras pedagogias, que resultam na formação de outros sujeitos, com uma nova
consciência, comprometida com a sociedade, ativa politicamente e mais
humanizada. Quando Arroyo (2012) cita como exemplo de outros sujeitos em ações
coletivas de grupos invisibilizados: o povo do campo, quilombolas, povos da floresta,
45

movimento feminista, de orientação sexual, pró-teto, pró-escola/universidade e


moradia. Poderíamos inserir neste grupo a experiência vivenciada pelos membros
do GAF.
Dentre os conceitos de ação coletiva, também sirvo-me dos estudos de Gohn
(1997), o mesmo segue o percurso histórico das teorias de ação social e suas
distintas correntes teórico-metodológicas, e analisa a ação coletiva para localizar o
conceito de movimento social. Nesse sentido, em sua síntese a respeito de ação
coletiva Gohn (1997) designou cinco grandes grupos de correntes, das quais três
correntes constituem a teoria dos movimentos sociais e as outras duas formam as
correntes sobre ação coletiva, descritas abaixo:

1- A Escola de Chicago e alguns interacionistas simbólicos do início deste


século. Como um dos produtos desta corrente temos a primeira teoria sobre
os movimentos sociais, no trabalho de Herbert Blumer (1949). 2- A
segunda corrente desenvolveu-se ao longo dos anos 40 e 50, com as
teorias sobre a sociedade de massas de Eric Fromm (1941), Hoffer (1951) -
também militante de movimento social - e K. Kornhauser (1959). Este último
exerceu forte influência sobre algumas produções posteriores; ele
caracterizava os movimentos como formas irracionais de comportamento e
os considerava ante-modernos. 3- A terceira corrente predominou nos anos
50 com um forte acento em variáveis políticas e está presente nos trabalhos
de S. Lipset (1950) e Heberle (1951). Ela articulava as classes e relações
sociais de produção na busca do entendimento tanto dos movimentos
revolucionários como da mobilização partidária, do comportamento diante
do voto e do poder político dos diferentes grupos e classes sociais. Ela
gerou a segunda grande teoria específica sobre os movimentos sociais,
expressa nos trabalhos de Heberle (GOHN, 1997, p. 26).
4-A quarta corrente foi uma combinação das teorias da Escola de Chicago
com a teoria da ação social de Parsons e se fez presente nos trabalhos de
Goffman (1959), Turner e Killian (1957), N. Smelser (1962) e David Aberle
(1966). Eles analisaram desde formas elementares de comportamento
coletivo até a construção das ações coletivas em grande escala, retomando
o approach psicossocial e deixando de lado os vínculos entre as estruturas
e a política, tão caros à corrente anterior. 5- A quinta e última corrente da
abordagem clássica, denominada organizacional-institucional, está
representada pelos trabalhos de Gusfield (1955) e Selzinick (1952) (GOHN,
1997, p. 26).

Gohn (1997) tem como premissa a origem dos movimentos socais como o
aspecto de sociedades em processo de mudança, subsidiando assim, em pré-
condições de estrutura para o aparecimento de uma ação coletiva que fundamenta
um movimento social, são elas:
46

a) bloqueio estrutural (barreiras na estrutura social que impedem as


pessoas de eliminar suas fontes de descontentamento); contato (interação
com os descontentes); eficácia (expectativa de que a ação proposta aliviará
o descontentamento); e ideologia (massa de crenças que justificam e
apoiam a ação proposta) (GOHN, 1997, p. 47).

Gohn (1997) cita os fatores característicos de uma ação coletiva: percepção


de injustiça, mudança de status social, falta de laços primários, destaca ainda que
não há distinção entre ação coletiva institucionalizada e não institucional, conforme
descreve a seguir:

As ações coletivas envolvem a busca racional de interesses pelos grupos;


demandas e reivindicações são produtos permanentes de relações de poder
e não podem explicar a formação dos movimentos; movimentos formam-se
devido a mudanças nos recursos, na organização e nas oportunidades para
a ação coletiva; o sucesso de um movimento envolve o reconhecimento do
grupo como ator político ou o aumento de benefícios materiais; e,
finalmente, a mobilização envolve organizações formais em ampla escala,
burocráticas e com propósitos especiais (GOHN, 1997, p. 57).

Dessa forma, o exposto acima tem como referência duas temporalidades em


que o Grupo Ambiental de Fortalezinha passou, a primeira na década de noventa
enquanto o grupo sem o Estatuto Social e a segunda no ano de 2000, quando é
criado em 2006 o Estatuto Oficial do GAF.
Reigota (2012) em seus estudos sobre educação ambiental, elabora um
conceito a partir da ligação entre as lutas dos movimentos sociais com a proposta de
educação ambiental, que tem seu marco inicial nas décadas de 1960, 1970 e 1980
(REIGOTA, 2012, p. 505). Para o autor a educação ambiental é heterogênea, trata-
se de um tema, prática discursiva e uma atividade científica que suscita uma
transgressão em relação a ciência hegemônica (neoliberal), na perspectiva que a
educação ambiental pertence ao campo emergente da ciência que deve viabilizar a
estruturação social democrática, livre e justa.
Nesse direcionamento, aborda-se a concepção do saber ambiental de
Enrique Leff (2012) para o reconhecimento das identidades dos povos, sua origem e
seus saberes tradicionais pertencente às formas culturais de apropriação do seu
patrimônio, de recursos, configurando assim um novo sentido ao saber ambiental,
que emerge da união da revalorização e reinvenção das identidades culturais e
práticas tradicionais.
47

1.4 Caminhos metodológicos da pesquisa

A pesquisa orientou-se na perspectiva do método dialético com enfoque


decolonial, partindo do princípio que a investigação levou em consideração o
processo de constituição do grupo e suas distintas ações realizadas no decorrer do
período de dez anos, sendo um movimento coletivo que desenvolveu ações
educativas no campo ambiental. Uma vez que, a organização do grupo originou-se a
partir de problemáticas ambientais enfrentadas na comunidade de Fortalezinha.
Motivo este que alicerçado aos preceitos do método dialético, compreende a
concepção do mundo como um encadeamento de processos, partindo da
complexidade do mundo a partir de um movimento constante, onde as coisas não
são analisadas em atribuições de objetos fixos. Para a dialética as coisas não estão
em posições rígidas e estáticas, mas encontram-se sempre na possibilidade de
transformação e desenvolvimento, o fim de um processo é sempre o começo de
outro (MARCONI; LAKATOS, 2010).
Oportunizado por meio do caminho metodológico nos preceitos do enfoque da
decolonialidade, em particular das epistemologias do Sul de Boaventura Santos, o
direcionamento epistêmico desta pesquisa dialoga com a ruptura do pensamento
abissal, estabelecido pela ciência moderna e sua concepção eurocêntrica de
interpretação do mundo (SANTOS, 2010; 2019).
O pensamento decolonial foi relevante no campo de inserção da pesquisa,
pois o conceito transcende à concepção de descolonização e pós-colonial,
evidenciando um outro lado que considera a nova organização da divisão
internacional do trabalho-e-natureza entre centros e periferias e também as
hierarquias étnicos-raciais e de gênero. Buscando ir além da denúncia de
descolonização e do ceticismo da pós-modernidade celebratória, constituída em
uma falsa percepção de que o mundo moderno está dissociado da colonialidade,
como pode ser observado abaixo na interpretação de Castro-Gomez e Grosfoguel
(2007) sobre a perspectiva decolonial:

Desde el enfoque que aquí llamamos ‘decolonial’, el capitalismo global


contemporáneo resignifica, en un formato posmoderno, las exclusiones
provocadas por las jerarquías epistémicas, espirituales, raciales/étnicas y de
género/sexualidad desplegadas por la modernidad. De este modo, las
estructuras de larga duración formadas durante los siglos XVI y XVII
continúan jugando un rol importante en el presente (CASTRO- GÓMEZ E
GROSFOGUEL, 2007, p. 14).
48

A perspectiva decolonial para o estudo das ações coletivas de educação


ambiental do GAF foi válida, uma vez que expressou as exclusões suscitadas pela
hierarquia epistêmica, possibilitando assim uma visibilidade da produção de
conhecimentos locais historicamente subalternizados pelas estruturas coloniais. É
importante destacar que esse enfoque decolonial, em particular o de Boaventura
(2010, 2019), não reduz sua crítica à estrutura colonial, mas, dialeticamente, ao
capitalismo e patriarcado, também, como sistemas de dominação e opressão.
Tendo como exemplo a Europa e seu modelo de Ser universal projetado com
o objetivo de expansão de uma suposta e muito particular ideia de modernidade,
civilização e desenvolvimento, resultando em uma dicotomização estratificante e
inferiorizante do Outro (Ocidente x Oriente; Civilização x Barbárie; Desenvolvimento
x Subdesenvolvimento, assumindo as ciências humanas e sociais papel fundamental
na legitimação dessa narrativa eurocêntrica hegemônica (DUSSEL, 1993; LANDER,
2005; SANTOS; 2010).
Os estudos decoloniais objetivam interpelar e contestar tanto as formas
hegemônicas de conhecimento, quanto as estruturas socais que elas procuram
legitimar tendo em vista o avanço do capitalismo global. O sistema-mundo moderno
colonial não contempla e nem considera a diversidade epistêmica global e
sociocultural. Ele se origina de uma suposta universidade e neutralidade, sendo
inviável para o conhecimento prático de trabalhadores (as), de mulheres, de povos
originários e comunidades tradicionais, de homossexuais e movimentos anti-
sistêmicos, que são produzidos como não-existentes por essa racionalidade
dominante eurocentrada, que forja o desperdício de experiências e saberes e produz
epistemecídio (SANTOS, 2001; 2005), reproduzindo e reforçando as linhas abissais
(SANTOS, 2010).
O conhecimento de outro modo como uma opção decolonial, surge através de
uma pergunta das possíveis realidades que podem instaurar outras vozes, diferentes
das concedidas pelo poder colonial. Entende-se que estão sendo produzidas outras
epistemes, situadas em movimentos sociais e também em muitos coletivos.
A opção decolonial estabelecida nesse estudo converge para uma reflexão
que ultrapassa os limites disciplinares da lógica colonial, objetivando liberar as
sociedades e grupos colonizados do pensamento universal do sistema mundo
capitalista, que se estrutura na sociedade pela relação social de dominação,
exploração e conflito pelo controle no âmbito das experiências social e humana.
49

É nesse panorama que Santos (2010) crítica a ciência moderna em sua


universalidade e perspectiva colonial, posto que desconsidera os outros saberes e
seus contextos locais e a diversidade epistemológica existente na cultura mundial, a
qual desperdiçou as experiências sociais que não estivessem de acordo com os
interesses e objetivos da racionalidade dominante ocidental, que sustenta e é
sustentada pelo capitalismo global e ao seu regime cultural e civilizacional.
É a partir das epistemologias do sul que são alternativas ao paradigma
epistemológico estabelecido pela ciência moderna, instalada pelo colonialismo
ocasionou em uma relação desigual entre o saber-poder. Para as epistemologias do
sul há uma busca na valorização das experiências desconsideradas da lógica
dominante, buscando dialogar com a múltiplas formas de matrizes de
conhecimentos e suas distintas localidades que estão para além das realidades
ocidentais.
Trata-se do conjunto de intervenções epistemológicas que denunciam a
supressão dos saberes levada a cabo, ao longo dos últimos séculos, pela
norma epistemológica dominante, valorizam os saberes que resistiram com
êxito e as reflexões que estes têm produzido e investigam as condições de
um diálogo horizontal entre conhecimentos. A esse diálogo entre saberes
chamamos ecologias de saberes (SANTOS; MENESES, 2010, p. 7).

Partindo desse entendimento, as epistemologias do sul aparecem como um


outro caminho epistêmico para adentrar em outras margens que estão fora das
linhas abissais do conhecimento, é considerando a reprodução do pensamento
abissal, Santos (2010) propõe um pensamento pós-abissal como um pensamento
ecológico, buscando reconhecer e ampliar outras possibilidades de produção de
conhecimento. Ao analisar a experiência do Grupo Ambiental de Fortalezinha, em
uma perspectiva do Sul, abre-se a possibilidade de caminhar pela “ecologia de
saberes”, que se constrói no reconhecimento de uma pluralidade de conhecimentos
e experiências de uma realidade específica amazônica e de sua comunidade
tradicional pesqueira, invisibilizada historicamente pela monocultura da ciência
moderna e pelo sistema capitalista e colonial.
Dessa forma, as contribuições do pensamento decolonial, em particular das
epistemologias do Sul, a pesquisa configura-se como um procedimento reflexivo
sistemático de caráter crítico, onde é possível reinventar a teoria crítica e inferir
novos fatos e dados, solicitando um tratamento de ordem científica em diálogo com
os sujeitos da pesquisa e dando visibilidade para seu protagonismo, compondo um
50

caminho para aprender a realidade ou encontrar verdades parciais e, ao mesmo


tempo, apontar para possibilidades de mudanças subjetivas e objetivas em suas
realidades.
A finalidade teve origem a partir uma problemática alicerçada em hipóteses no
campo de pesquisa na vila de Fortalezinha, que, respectivamente por meio do
trabalho de campo, subsidiaram no alcance de informações e dados, oportunizando
no esclarecimento dos questionamentos e percepções encontradas na fase do
levantamento da pesquisa de campo.

1.4.1 Tipo de pesquisa

Inserindo-se nesse aspecto de descrição das dinâmicas sociais, em que os


seres humanos estão envolvidos, a presente pesquisa fez um estudo de caso sobre
o Grupo Ambiental de Fortalezinha e sua experiência de educação ambiental em
uma comunidade tradicional pesqueira. Para Yin (2001) o estudo de caso é um
esforço de pesquisa, que auxilia no esclarecimento dos fenômenos de ordem
organizacionais, individuais, sociais e políticos, onde complementa a seguir:

Em resumo, o estudo de caso permite uma investigação para se preservar


as características holísticas e significativas dos eventos da vida real - tais
como ciclos de vida individuais, processos organizacionais e
administrativos, mudanças ocorridas em regiões urbanas, relações
internacionais e a maturação de alguns setores (YIN, 2001, p. 21)

O estudo de caso sobre o Grupo Ambiental de Fortalezinha, foi realizado a


partir de narrativas dos sujeitos que construíram a história do GAF, que
possibilitaram averiguar como se formou o processo de organização do grupo e as
consequentes mudanças na vila de Fortalezinha. Atribuindo também o significado da
ação coletiva às vivências dos moradores que estavam engajados em ações
educativas ambientais e sociais elencadas pelo grupo na comunidade.
A partir das informações levantadas com as pessoas envolvidas na ação
coletiva do GAF, obtivemos informações essenciais para a construção deste
trabalho.
Assim, foi realizada a pesquisa de campo na vila de Fortalezinha, a
proximidade inicial com o campo ocorreu em março de 2018, em contatos prévios
com a comunidade e com os entrevistados. No entanto, para a entrada em campo e
51

início do levantamento dos dados na comunidade, foi necessário uma solicitação de


pesquisa ao Instituto de Desenvolvimento Florestal da Biodiversidade do Estado do
Pará (IDEFLOR-BIO), órgão responsável pela fiscalização nas Áreas de Proteção
Ambiental (APA) de Maiandeua/ Algodoal em que a vila de Fortalezinha está
localizada, autorização concedida em maio de 2019.
Etapa que compreende o encaminhamentos de alguns documentos, como
exemplo: o preenchimento do formulário de solicitação para autorização de
pesquisa, termo de compromisso para o desenvolvimento do projeto de pesquisa,
oficio de solicitação de autorização, cópia do projeto de pesquisa, cópia dos
documentos de identificação e declaração de anuência da instituição de ensino,
considerando assim, os princípios éticos que regem esta pesquisa.
A pesquisa de campo tornou possível conhecer os aspetos geográficos,
culturais, sociais da comunidade de Fortalezinha, tendo em vista a aproximação com
os moradores e com os ex-integrantes do Grupo Ambiental, e compreender
cientificamente a problemática encontrada sobre o que ação coletiva do GAF
consistiu como uma experiência de “educação ambiental”.

A pesquisa de campo é aquela utilizada com o objetivo de conseguir


informações e/ou conhecimentos acerca de um problema, para qual se
procura uma resposta, ou de uma hipótese, que se queira comprovar, ou,
ainda de descobrir novos fenômenos ou as relações entre eles (MARCONI
E LAKATOS, 2010, p. 169).

A pesquisa de campo desse modo, serviu como observação e vivência fatos e


fenômenos ocorridos na vila de Fortalezinha. E possibilitou a seleção de dados
referentes aos acontecimentos durante a pesquisa. Tendo sempre em vista que esta
é uma etapa essencial da pesquisa:

Essa etapa combina entrevistas, observações, levantamentos de material


documental, bibliográfico, instrucional etc. Ela realiza um momento
relacional e prático de fundamental importância exploratória, de confirmação
ou refutação de hipóteses e construção de teorias (MINAYO, 1994, p. 26).

Todas as etapas que antecederam a pesquisa de campo foram


contempladas, como exemplo: a pesquisa bibliográfica, por meio do acervo referente
à temática ambiental e educação, o preenchimento dos documentos oficiais a
respeito da APA de Maiandeua e a leitura do Estatuto Oficial do Grupo.
52

No referente a pesquisa documental, Marconi e Lakatos (2010) afirmam ser


esta a fonte inicial no levantamento de dados circunscritos em documentos que
podem ser de natureza escrita ou não. Sendo assim, foram consultados documentos
oficiais, ofícios, relatórios, documentos jurídicos, situados no campo da educação
ambiental, das Unidades de Conservação, do Estatuto Social do Grupo Ambiental de
Fortalezinha e também documentos de procedência estatística, como os registros
dos moradores da vila de Fortalezinha, realizado pelos agentes de saúde e a mim
disponibilizados.
Foi primordial a realização de uma abordagem qualitativa nesta pesquisa,
por buscar compreender e explorar subjetivamente os significados das ações
decorrentes da experiência do Grupo Ambiental de Fortalezinha, interpretando e
contextualizando a realidade analisada. Segundo Minayo (2003, p. 21-22) a
pesquisa qualitativa está relacionada à questões particulares, trabalhando com o
mundo de significados, motivos, aspirações, crenças, valores e atitudes,
correspondendo assim a um espaço mais profundo das relações, dos processos e
fenômenos que não podem ser limitados à operacionalização das variáveis. O
estudo qualitativo tem como relevância o processo social, suas determinações e
transformações realizadas pelo sujeito pesquisado, considerando a complexidade
das relações entre o geral e a parte, entre o problema e a sua correlação com o
contexto que o envolve e o condiciona historicamente.
Assim, esta pesquisa em sua abordagem qualitativa, fez a descrição do que
foi o GAF, apresentada na seção 3 sobre a caracterização do grupo e a relação com
os sujeitos envolvidos na ação coletiva.

1.4.2 Os sujeitos da pesquisa

Os sujeitos, considerados aqui como “interlocutores” da pesquisa (SANTOS,


2019), foram os moradores de Fortalezinha que participaram do GAF, assim como
alguns agentes externos que atuaram de forma voluntária na ação coletiva da
comunidade. O contato prévio (“Rapport”) com os entrevistados se deu por meio de
uma breve conversa, em que foram repassadas algumas informações a respeito da
proposta da pesquisa, de seus respectivos objetivos e da importância da mesma
como do registro singular sobre a comunidade de Fortalezinha.
53

Os entrevistados foram selecionados a partir do seu envolvimento no Grupo


Ambiental de Fortalezinha. Foi solicitado aos que se dispuseram participar da
pesquisa, que fizessem a leitura e assinatura do Termo de Consentimento Livre
Esclarecido (TCLE) em conformidade ao protocolo ético da pesquisa. Os
agendamentos das entrevistas foram realizados de acordo com a disponibilidade
dos moradores e dos agentes externos; e sua realização ocorreu entre os meses de
setembro de 2019 a janeiro de 2020.
Sobre a autorização da publicação da identificação dos participantes, por
unanimidade, todos os entrevistados autorizaram a divulgação de seus nomes
completos nesta pesquisa, não ocorrendo a utilização de pseudônimos.
Os interlocutores da pesquisa totalizam o número de 8 pessoas, sendo 6
pessoas da comunidade, onde 3 pessoas se identificaram como pescadores e
atuantes em outras atividades econômicas, 1 agente de saúde, 1 comerciante e 1
coordenador de um espaço educativo e duas pessoas que atuaram como agentes
externos, vinculados ao Museu Paraense Emílio Goeldi, que não são moradoras da
vila, mas possuem casa e empreendimento particular.
Abaixo, seguindo os dados obtidos no primeiro tópico 1 do roteiro 1 da
entrevista sobre a trajetória de vida dos sujeitos do GAF, organizados em quadro
apresenta-se os perfis dos narradores desta pesquisa.

Quadro 03 – Perfil dos sujeitos da pesquisa


Nome Completo Idade Onde Mora Há quanto tempo Trabalha em que
reside na ilha
Cleide Martins dos 48 Mocooca 48 anos Agente de saúde
Santos
Ivan Sousa Teixeira 48 Fortalezinha 48 anos Pescador
Said de Nazaré Senado 36 Fortalezinha 36 anos Pescador
Jacinto Teixeira 55 Fortalezinha 55anos Pescador
Maria Edina Teixeira Não Fortalezinha Nasceu em Comerciante
Informou Fortalezinha e saiu
com 12 anos e
passou 30 anos na
cidade de Belém e
retornou há 5 anos
novamente para
Fortalezinha
Maria das Graças Alves 73 Belém Não reside na ilha Atualmente é
Santana Voluntária do
EcoMuseu da

1
Instrumento da pesquisa de campo, roteiro da entrevista (Apêndice B) Tópico sobre os aspectos da
trajetória de vida dos sujeitos do GAF.
54

Amazônia, Foi
Museóloga e
Pesquisadora do
Museu Emílio Goeldi.
Manuel de Oliveira 47 Fortalezinha 47 anos Coordenador de um
Teixeira espaço educativo
“Tio Milico”.
Lúcia das Graças 49 Belém Não reside na ilha Pesquisadora do
Santana da Silva Museu Paraense
Emílio Goeldi e
Membro do Fórum
de Museus
Amazônicos.
Fonte: Elaboração própria da pesquisadora/pesquisa de campo – 2020.

Os perfis dos entrevistados de acordo com os dados acima apresentados são


constituídos por quatro mulheres com faixa etária de 48 a 73 anos, sendo que duas
mulheres residem em Belém, uma em Mocooca e uma em Fortalezinha. Já o perfil
masculino é composto por quatro homens com faixa etária de 36 a 55 anos, todos
residem em Fortalezinha.
Durante o processo de entrevista com os sujeitos, o convívio na comunidade
foi uma etapa muito significativa, a qual tive a oportunidade de vivenciar o cotidiano
e acompanhar algumas atividades dos participantes, que relataram um pouco das
suas histórias de vidas.
Outro ponto a destacar foi a memória afetiva que muitos integrantes
demonstraram em suas falas, algumas narrativas marcadas pela lembrança saudosa
de um tempo que marcou a vida na comunidade, no entanto algumas contradições
apareceram nas narrativas do entrevistados que estão referidas nas seções 3 e 5,
no que tange as concepções do grupo e os motivos que levaram ao encerramento
das atividades na comunidades.

1.4.3 Técnicas utilizadas em campo

Por meio da técnica da observação participante na comunidade, estabelecida


em uma relação próxima com a comunidade e os moradores durante os meses de
pesquisa de campo, sendo a forma de observação participante artificial (MARCONI
E LAKATOS, 2010), em decorrência de não fazer parte da comunidade, a entrada
em campo foi para coletar informações para a pesquisa.
Foi utilizado o diário de campo, instrumento essencial durante a pesquisa e
todo levantamento de dados em campo, foi registrado nas anotações do diário,
55

assim como também os materiais de registro audiovisual, como aparelho celular,


usado na gravação das entrevistas, vídeos e imagens realizadas na comunidade.
Levando em consideração os objetivos da pesquisa e sua delimitação na
temática ambiental e a história do GAF, optou-se pela entrevista narrativa, que
designa o ato de rememorar, a narração da experiência vivenciada permitindo o
acesso de questões particulares do sujeito de uma forma natural (WELLER E
ZARDO, 2013, p. 133). A finalidade do trabalho foi compreender a relação de cada
participante no processo de construção do grupo e as experiências educativas sob o
prisma ambiental.
As entrevistas foram gravadas em vídeo e áudios encaminhadas no aplicativo
transcriber no aparelho celular. Sendo a organização das entrevistas divididas em
dois momentos: a primeira efetuou-se com as perguntas a respeito do perfil dos
entrevistados e o segundo momento foram realizadas perguntas diretamente
relacionadas à temática do GAF que versavam a respeito dos aspectos sobre
origem e desenvolvimento do GAF, a proposta de educação ambiental do GAF e o
término do GAF e suas implicações.

1.4.4 Sistematização e análise de dados

Tendo em vista a relevância das etapas acima, que fundamentaram os


encaminhamentos para a sistematização e análises dos dados, optei pela análise
das entrevistas narrativas com técnica de triangulação, que consiste como uma
estratégia de pesquisa alicerçada às condições científicas testadas e conceituadas,
atendendo e ajustando-se a distintas realidades e noções interdisciplinares
(MINAYO, 2010).
Partindo para o processo interpretativo, seguindo as contribuições de Gomes
(2010), no primeiro momento ocorreu aplicação com a técnica para os dados
primários e o segundo momento analítico, as narrativas orais foram
contextualizadas, comparadas e trianguladas. A estruturação do primeiro processo
interpretativo, ocorreu por intermédio de três etapas: a primeira foi a elaboração e
agrupamento dos dados; segunda, o parecer da qualidade e a terceira foi
elaboração das categorias de análise.
Na primeira etapa ocorreu a sistematização dos dados viabilizado pela análise
documental, interligando as informações de diretrizes oficiais nas esferas de ordem
56

Municipal, Estadual e Federal, subsidiando para o entendimento da educação


ambiental, assim como de referenciais das Unidades de Conservação (UC) e as
Área de Proteção Ambiental (APA).
Após o fechamento das entrevistas, foi realizada a transcrição das
entrevistas, uma etapa que teve duração aproximadamente 02 meses, novembro e
dezembro de 2019 a janeiro de 2020, onde se verificou a necessidade de voltar à
vila de Fortalezinha para fazer o levantamento de dados que não foram
contemplados em visitas anteriores.
A transcrição foi uma etapa que demandou um tempo extensivo, pois a
tradução do código oral para o escrito levou em consideração aspectos relacionados
a entonação da voz, o silêncio, a repetição e destaque de palavras, a emoção e
euforia, dentre outras observações relevantes que apontaram para um determinado
aspectos relacionado ao grupo, sendo todas as palavras foram transcritas na
íntegra.
Após a transcrição dos áudios das entrevistas, realizou-se a segunda etapa
em que ocorreu a pré-análise dos dados para que ocorresse o debate em torno das
categorias estabelecidas na fase inicial do projeto da pesquisa. A utilização de
categorias neste trabalho buscou contextualizar, refletir e elucidar com base nas
narrativas dos interlocutores (as) os elementos conceituais que tem características
comuns e estão relacionados entre si. Nesse sentido, destacam-se as contribuições
de Gomes (2001) no que tange ao trabalho com categorias:

As categorias são empregadas para se estabelecer classificações. Nesse


sentido, trabalhar com elas significa agrupar elementos, ideias ou
expressões em torno de um conceito capaz de abranger tudo isso. Esse tipo
de procedimento, de um modo geral, pode ser utilizado em qualquer tipo de
análise em pesquisa qualitativa (GOMES, 2001, p. 70).

Concomitante ao exposto anterior, na terceira etapa da análise de dados foi


realizada as construções das seguintes categorias: Grupo Ambiental de
Fortalezinha, ação coletiva e educação ambiental, respectivamente analisadas nas
seções 3 e 5 desta pesquisa, questões centrais deste estudo e que tiveram como
foco principal as informações obtidas nas narrativas dos entrevistados em uma
aproximação com o aporte teórico.
Cabe ressaltar, que esta terceira etapa de análise não se constituiu como
etapa final. Assim, foi realizada a etapa da análise contextualizada e triangulada dos
57

dados, na qual o encadeamento de informações procedeu com a reconstrução dos


dados da realidade da trajetória do Grupo Ambiental de Fortalezinha, segundo as
narrativas de seus participantes.
Investigando a diversidade interpretativa sobre a história do grupo, partindo
não apenas das narrativas orais, mas incluindo ações, conexões e características
singulares aos aspectos conjunturais importantes para compreensão do que foi o
GAF. Foi a partir das análises das falas apresentadas nas entrevistas narrativas,
buscando compreender a partir dos contextos específicos de cada entrevistado,
quais foram os motivos que levaram os integrantes que participaram do grupo,
levando em consideração os sentimentos, reações, expectativas e silêncios
expressados durante o processe da entrevista.
Após leitura do material transcrito, realizou-se um estudo do conteúdo,
tencionando interpretar todo enredo em que as informações foram geradas no
grupo, situando ao mesmo tempo as especificidades existentes nessa parcela
analítica.
Configurando como a etapa da construção de inferências, na qual perguntas
foram elaboradas para o aprofundamento de tais representações implícitas.
Identificou-se nas falas dos sujeitos que participaram do GAF, alguns elementos
comuns em suas respectivas falas, como exemplo: educação ambiental, história do
grupo, memória, cultura, natureza e atividades educativas.
Questionamentos estes que contribuíram no aprofundamento dos dados
coletados e que possibilitaram na construção de eixos temáticos já mencionados
anteriormente. Dessa forma, ocorreu a articulação das informações prestadas pelos
entrevistados com as questões mais amplas, as quais foram elucidadas e
complementadas nas falas apresentadas, interpretando a partir das falas dos
sujeitos, construindo uma síntese por meio do diálogo dos referenciais teóricos às
narrativas orais dos participantes do grupo.
Nas análises por triangulação ocorreu uma reflexão conceitual e das
narrativas dos entrevistados que foram os sujeitos históricos construtores desta
pesquisa, com base no entendimento dos participantes, foi possível interpelar o a
experiência de educação ambiental do GAF, considerando os diferentes
posicionamentos durante a pesquisa de campo, apresentadas nas seções 3 e 5
desta pesquisa.
58

Este estudo está estruturado em seis seções incluindo as considerações


finais, sendo:
1. A introdução, na qual apresento a origem e motivações da pesquisa, bem
como a problemática, os objetivos e o percurso do referencial teórico
conceitual de análise, os caminhos metodológicos da pesquisa.
2. A segunda seção apresenta a vila de Fortalezinha: as contradições de uma
territorialidade singular da Amazônia, informações a respeito do município de
Maracanã, Unidade de Conservação: princípios e diretrizes de sua
organização e Unidade de Conservação de Uso Sustentável: APA de
Algodoal: a caminho de Fortalezinha.
3. A terceira seção apresenta a caracterização do GAF entre memórias e
histórias do grupo ambiental de Fortalezinha.
4. A quarta seção apresenta a educação ambiental: um campo de estudo em
movimento com os principais marcos teóricos do campo da educação
ambiental no contexto internacional, na américa latina e no Brasil, assim
como as principais correntes ecologistas as principais correntes teóricas em
educação ambiental, macrotendência das correntes da educação ambiental:
nas principais perspectivas político-pedagógica
5. A quinta seção apresenta outras pedagogias: um olhar para educação nas
ações coletivas do GAF, organizada em 4 momentos com ponderações
acerca da experiência de educação ambiental do GAF no percurso do registro
dos dados, apresenta-se com base nos resultados encontrados.
6. Por fim, apresenta-se com base nos resultados encontrados, as
considerações finais acerca do estudo e alguns desafios que envolvem esse
tema sob a enfoque das epistemologias do Sul.
59

2. A VILA DE FORTALEZINHA: AS CONTRADIÇÕES DE UMA


TERRITORIALIDADE SINGULAR DA AMAZÔNIA
2.1 O Município de Maracanã

A Vila de Fortalezinha está localizada no Município de Maracanã, o qual se


situa na microrregião do nordeste paraense, também conhecida como o Salgado, ou
Zona do Salgado do Estado do Pará (FURTADO, 1987). Sendo o Pará um dos 26
estados da República Federativa do Brasil, o segundo maior estado do Brasil, com
um território de aproximadamente 1.248.042,515 Km², com 144 municípios, divididos
em 6 mesorregiões e 22 microrregiões. Com base na última atualização dos dados
no portal digital do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), no ano de
2018, a estimativa da população foi de aproximadamente 8.513.497 habitantes no
estado.
A figura a seguir mostra a localização da microrregião do Salgado e o
município de Maracanã.

Figura 01 – Localização de Maracanã na microrregião do Salgado Paraense

Fonte: Google Maps, 2019.

A mesorregião do nordeste paraense compreende 5 microrregiões que são:


Bragantina, Cametá, Guamá, Salgado e Tomé-Açu. De acordo com Silva (2011), a
microrregião do Salgado é formada por onze municípios: Colares, Curuçá,
Magalhães Barata, Maracanã, Marapanim, Salinópolis, São Caetano de Odivelas,
60

São João da Ponta, São João de Pirabas, Terra Alta e Vigia. Já para a Coordenação
Estadual do Programa de Gerenciamento Costeiro (GERCO/PA) há a inserção de
mais sete municípios que são: Santarém Novo, Bragança, Viseu, Tracuateua,
Primavera, Quatipuru e Augusto Corrêa, totalizando em 18 municípios.
O nordeste paraense encontra-se entre norte e nordeste do oceano Atlântico,
a leste e sul da região Bragantina, a baía de Marajó e a oeste na região Guajarina
(FURTADO, 1987). A região do Salgado tem essa denominação por receber as
águas do oceano atlântico, a qual sofre influência diretamente da salinidade dos rios
e igarapés, essa salinidade é dividida em três áreas: Baixo Salgado, a parte que
água doce é predominante; Médio Salgado, onde há ocorrência de misturas entre
águas dos rios com água do oceano e o Alto Salgado, é a parte em que há maior
concentração de água oceânica, maior salinidade (QUARESMA, 2003).
Em decorrência desse processo, a atividade pesqueira tem características
particulares, quando relacionadas com outras atividades em sistemas aquáticos das
demais microrregiões do Estado. Quaresma (2003, p.119) cita que os pescadores
fazem referência às áreas próximas ao continente, Baixo Salgado, como área de
beira, pesca denominada de pesca de dentro ou da beira. Na área do Médio
Salgado, é usada a expressão lá fora e quando estão na área do Alto Salgado da
parte oceânica, estão na pesca do mar.
O Clima quente e úmido é predominante nessa região, tendo uma
temperatura média em torno de 25ºC e máxima de 34ºC. O período de chuvas
ocorre com mais frequência nos meses de janeiro a março, já o verão há a estiagem
que vai de setembro a dezembro (QUARESMA, 2003). A faixa litorânea é
contornada pela vegetação de mangal, a mata geral recobre toda a parte Salgada.
Furtado (1987) acrescenta que a vegetação tropical é, também, formada por
capoeiras.2
Para Silva (2011), a particularidade da microrregião do Salgado está na parte
costeira, pelos elementos naturais descritos abaixo:

2
Após a derrubada e queimada contínua da cobertura da vegetação primária, surge a vegetação
denominada capoeira (FURTADO, 1987).
61

O Salgado Paraense caracteriza-se em sua parte estritamente costeira, por


uma microrregião composta de área de extensos manguezais, berçário de
inúmeras espécies costeiras e marinhas e de recursos vivos que
possibilitam as atividades de coleta e pesqueiras, o que lhe empresta, de
fato, a caracterização de uma microrregião de costa (SILVA, 2011, p. 63).

Furtado (1987) comenta que devido ao desgaste do “baixo platô”, termo


designado para terra-firme, dos sedimentos da série Barreiras, ocorreu a formação
de falésias com altura de 10 a 20 metros. Os sedimentos que ficaram no litoral
dificultaram o deslocamento de embarcações, acarretando na construção de
grandes portos. Sob o prisma geológico, há uma diversidade de terrenos na região
do Salgado, formado por terrenos classificados em terciários e quaternários.
As contribuições do campo da arqueologia, no processo da concepção acerca
das primeiras ocupações humanas na microrregião do nordeste paraense, se
evidenciam com os estudo dos primeiros indícios encontrados na região, como
exemplo: as cerâmicas simples, feitas de superposição de argila em uma base no
formato de anéis ou espiral, cobertas por conchas moídas, denominadas de (Minas
Simples) e areia (Tijuco simples) (QUARESMA, 2003).
Sambaquis encontrados na Zona do Salgado eram formados por conchas de
moluscos. Quaresma (2003) comenta a respeito dos objetos presentes nos sítios
arqueológicos:
Neles foram encontrados artefatos líticos, como lâminas de machado
polidas, moedores de seixos, raspadores de lascas e quebra-cocos
lascados, artefatos de osso, conchas e dentes, além de fragmentos de
cerâmica. Associados a camadas de conchas, esses artefatos foram
encontrados em meio a sepultamentos primários, vértebras de peixe, dentes
de felinos e conchas, utilizadas na produção de colares ou transformados
em possíveis adornos auriculares, pingente, bem como furadores de ossos
e carimbos (QUARESMA, 2003, p. 121).

O fragmento acima descreve alguns objetos do cotidiano dos habitantes


originários dos sítios arqueológicos na faixa litorânea da Zona do Salgado, revelando
a existência de populações humanas entre a baía de Quatipuru e a baía de
Maracanã. A sobrevivência desses povos e seu processo de produção estavam
assentados nos recursos do mar, frutos, sementes e raízes coletados para o
abastecimento da alimentação.
De acordo com os estudos de Furtado (1987), o povoamento dessa região
aconteceu no sentido norte-sul, buscando rotas alternativas aos manguezais,
organizando em áreas mais afastadas, sítios adequados para agricultura.
62

Considerando que o solo predominante é o latossolo amarelo e pequena faixa


litorânea de solos hidromórficos simplificavam a penetração em direção à região
Bragantina.
Vários municípios dessa região têm sua origem em aldeamentos indígenas.
Documentos históricos mostram que muitos desses lugares estavam sob o comando
da Companhia de Jesus referente à ocupação de Maracanã, Curuçá, Vigia, Colares
e Marapanim. “A presença dessa ordem religiosa entre os grupos Tupinambás que
viviam espalhados pelo território do Salgado” (FURTADO, 1987, p.37).
A microrregião do Salgado é uma das áreas mais populosas do Estado do
Pará, o município de Maracanã apareceu nos índices do IBGE (2018) com a
estimativa de 29.429 pessoas. O resultado do último censo de 2010 foi de 28.376
pessoas, com densidade demográfica 33,16 hab/km², com área da unidade territorial
de 855,664 km² (IBGE, 2017). Nas figuras abaixo, estão as ilustrações do município
de Maracanã e a distância em referência à capital paraense.

Figura 02 – Representação por satélite do município de Maracanã

Fonte: Google Maps, 2019.


63

Figura 03 – Representação por satélite da distância entre Belém e Maracanã

Fonte: Google Maps, 2019.

O município de Maracanã fica 169 km distante de Belém. O acesso ocorre


pela BR-316 e PA-127, pelo terminal rodoviário, trapiche municipal (sede),
ancoradouro da Ponta do Mamede-vila de Algodoal, trapiche municipal da vila do
Quarenta do Mocooca, local de onde sai embarcações para a vila de Fortalezinha,
como mostra a figura abaixo:

Figura 04– Antigo Trapiche Municipal da Vila do Quarenta do Mocooca

Fonte: Arquivo fotográfico da autora/2020.


64

A imagem acima é o trapiche municipal que fica localizado na vila do


Quarenta do Mocooca, a travessia é feita pelas pequenas embarcações (rabetas ou
pô-pô-pô)3 com passagem no valor de R$ 2,00 (dois reais). Ressalta-se que essa
paisagem sofreu alterações, a ponte foi destruída pela maré alta do mês de janeiro
de 2019, o que vem também contribuindo no avanço da erosão da Orla do 40 do
Mocooca, relacionando ao processo do fenômeno do aquecimento global.
Fazendo limites com os municípios ao Norte Oceano Atlântico; à Leste -
Salinópolis, São João de Pirabas e Santarém Novo e; ao Sul - Igarapé-Açu; a Oeste
- Marapanim e Magalhães Barata (SETUR, 2017). Possui três distritos: Maracanã,
São Roberto e Boa Esperança (IBGE, 2019).
Apresenta uma rede hidrográfica intensa com o rio Maracanã, que nasce no
município de Santa Maria do Pará, passando pelo município Nova Timboteua, tendo
limite a Leste com Santarém Novo e Salinópolis (SETUR, 2017). Sobre seus
principais igarapés, profundidade e características, algumas informações constam
do Inventário Turístico de Maracanã, organizado pela Secretária de Turismo do
Estado do Pará (SETUR, 2017), descritos abaixo:

Os mais importantes os igarapés Mato Grosso, Inuçu e PeriAçu. A


profundidade do rio Maracanã varia de 15 a 20 metros, sendo principal
afluente esquerdo, o rio Caripi, o qual tem seus formadores no município de
Igarapé-Açu, percorre o município de Maracanã até sua foz, na baía de
Maracanã. Seus afluentes, em ambas as margens, se encontram todos
dentro do município, como os igarapés do Campo, Cupiuba, Curupipino e
Açu. Outros rios menos importantes, são o Cuinarana, de pequena
extensão, que separa, a oeste, Maracanã do município de Magalhães
Barata e o rio São Paulo, a leste, que serve de limite entre Maracanã e
Salinópolis. Na baía de Maracanã, no Oceano Atlântico, encontram-se
várias ilhas importantes, como: Maiandeua, do Marco do Curuaru e de
Algodoal (SETUR, 2017, p.16).

Durante o levantamento sobre as primeiras ocupações no município de


Maracanã encontraram-se algumas informações de uma limitante perspectiva

3
De acordo com o significado no dicionário Online de Português rabeta é um pequeno motor de
propulsão que, colocado na traseira de pequenas embarcações (canoas) ou barcos, sua condução é
realizada manualmente, com o auxílio de um bastão que determina as direções, sendo utilizado como
transporte de pessoas e materiais, o tamanho da embarcação influencia na capacidade de lotação,
assim como a influência do fluxo das marés.
Já pô-pô-pô é um barco maior que a rabeta, geralmente com motor situado no meio da embarcação e
protegido por uma caixa, alguns apresentam cabine, mastro, com o tamanho maior da proa, popa e
roda de leme, seu nome faz uma analogia ao barulho característico do motor da embarcação.
65

epistêmica, fixada em uma concepção eurocêntrica do processo de formação da


localidade, o que pode ocasionar na exclusão de outras narrativas dos povos
originários da região Amazônica.
As informações sobre o processo histórico de Maracanã apenas expressarão
informações no que tange ao percurso de datas sinalizadas que demarcam o
caminho da progressão da categoria de vila até o status de município que Maracanã
recebe.
A localidade até então era aldeia dos índios Maracanã, com o início do
comando da ordem dos jesuítas e a apropriação dos primeiros missionários da
companhia de Jesus, tomando como objetivos estratégicos tanto “catequizar e
converter” aqueles que habitavam a região, bem como “ocupar e expandir” sob o
comando do Império Português. Sobre a chegada de Padre Antônio Viera, o
Inventário Turístico de Maracanã, organizado pela Secretaria de Turismo do Estado
do Pará (SETUR, 2017), informa:

Apresentou ao Governo Provincial a carta Régia que lhe dava a faculdade


de evangelizar, educar, fundar igrejas, missões pelo sertão, levar índios
consigo, etc. Em Maracanã, Padre Antônio Vieira Fundou a primeira igreja
de taipa e pilão e batizou o primeiro índio-chefe Copaúba, o qual recebeu o
nome de Lopo de Souza. E organizou a aldeia (SETUR, 2017, p.14).

A presença dos Lusitanos foi o eixo principal para ação política de controle
europeu no Brasil e consequentemente da invasão e a dominação do território,
sendo o cenário para a constituição dos diversos povoados no litoral do norte e
nordeste brasileiro. Quaresma (2003) comenta como se deu esse processo inicial
de ocupação do Império Português em Maracanã4:

Maracanã, o município em que está situada a APA de Algodoal/Maiandeua,


recebeu missionários da Companhia de Jesus. Eles ingressaram na região
por volta de 1653, inicialmente em Belém, e posteriormente expandiram-se
por diversas áreas do estado. Fundaram aldeamentos e missões que
dariam origem a vilas e cidades, além de desenvolverem atividades

4
“Os espanhóis chegaram ao município em 1622, estiveram na Ilha do Marco, deixaram um
monumento demarcatório, sinalizando 50 léguas da Costa Ocidental do rio Turiaçu em Maranhão,
limite de uma pretensa capitania Hereditária. Daí surgiu o nome da ilha em decorrência do "marco" ou
monumento de pedra” (SETUR,2017, p. 11).
“Em outra versão relata que o topônimo indígena, Maracanã é uma ave, espécie de arara comum na
Amazônia e em todo o Brasil, também conhecida por Araguaiaí, Araguari e Aruaí. A ave ganhou esse
nome devido fazer o ruído de chocalho, daí o nome maracá (chocalho) e nã (falso)” (SETUR, 2017,
p.11).
66

relacionadas ao extrativismo, ao comércio das drogas do sertão e à


exploração de engenhos e pesca (QUARESMA, 2003, p.121).

Na descrição acima, a autora salienta acerca da organização espacial e


atividade produtiva nas primeiras ocupações em Maracanã, uma característica ainda
marcante no município, no que se refere a distribuição de residências em vilas e a
atividade pesqueira.Com a primeira missão jesuítica e o controle dos missionários
da companhia de Jesus, no ano de 1700, Maracanã adquiriu foros de Freguesia, e
como a expulsão a missão religiosa Companhia de Jesus pela política pombalina,
alterando seu nome para Cintra (QUARESMA, 2003, p.122).
Maracanã tem uma trajetória nasce como aldeia a partir da missão jesuítica,
torna-se vila e logo após freguesia, o reconhecimento do território como município foi
estabelecido no Governo de Paes de Carvalho em 1897 e da iniciativa do cônego
Ulisses de Pennafort, o município recebeu a atual denominação (QUARESMA, 2003,
p.123).
Em seu aspecto cultural, a região é atravessada por manifestações populares.
Em torno de festividades religiosas, destacam-se a festa do Padroeiro São Miguel
Arcanjo, e de folclore que ocorre no período de 19 a 27 de setembro; o Círio de
Nossa Senhora de Nazaré, no segundo domingo de novembro e a festa de São
Benedito, do dia 26 a 28 de dezembro. As manifestações folclóricas também estão
presentes, ressaltam-se as três principais que são: o Carimbó, os Pássaros e o Boi
Bumbá.
De acordo com os dados do portal Cidade-Brasil (2019) e Loureiro (1987), a
base do setor econômico são as atividades de: agricultura (arroz e milho), pesca
(mexilhão e caranguejo) agropecuária, silvicultura, exploração florestal, turismo,
indústria e serviços. A seguir a imagem da Orla do Maracanã:
67

Figura 05 – Orla de Maracanã

Fonte: http://maltez-vidaecultura.blogspot.com, 2012.

As informações acima elencadas a respeito do município de Maracanã,


subsidiam um entendimento contextual amplo do município, onde se localiza a vila
de Fortalezinha. O município também integra uma Unidade de Conservação (UC),
que tem em sua estrutura duas categorias: a primeira trata-se da Reserva
Extrativista de Maracanã (RESEX), criada pelo Decreto federal s/nº de 13 de
dezembro de 2002, onde é utilizada por populações extrativistas tradicionais,
comunidade que tem em sua subsistência atividade do extrativismo, agricultura e
criação de animais de pequeno porte.
O objetivo principal da RESEX é a proteção dos meios de vida e da cultura
dos povos tradicionais, assegurando o uso sustentável dos recursos naturais dessas
comunidades. Com base nos dados da Secretaria de Turismo do Estado do Pará
(SETUR – PA) a RESEX apresenta:

Vegetação de ecossistema manguezal, pelos gêneros Rhizophora, Avicenia


e Laguncularia. A Fauna é composta por garças brancas; maçaricos;
gaviões, caranguejos, ostras, mexilhões, botos, macacos; tamanduás-
bandeira, tartarugas e cobras. Descritivo de Acesso Descritivo do acesso ao
atrativo: Pode ser acessada via fluvial, partindo do trapiche localizado na
sede municipal, com percurso de cerca de 3h em embarcações ou pode ser
acessada saindo da sede municipal via terrestre, percorrendo-se 36 km pela
PA 127 e 24 km pela PA-395, entrando a direita, próximo a vila de Nazaré
do Fugido no município de Magalhães Barata, percorrendo cerca de 31km
em estrada de piçarra (em mau estado) até a vila do 40 do Mocooca.
Estado geral de conservação: Excelente (SETUR, 2017, p. 105).
68

E a segunda trata-se da Área de Proteção Ambiental de Algodual/Maindeua


(APA) formada por quatro vilas: Algodoal, Camboinha, Mocooca e Fortalezinha.
Nessa sequência, o segundo tópico desta seção versará sobre o conceito da
Unidade de Conservação, suas atribuições e categorias, na qual a APA de Algodoal
aparece. Delineando assim, uma explanação geral sobre a UC e por conseguinte
apresentação acerca da APA de Algoadoal e de suas respectivas vilas.

2.2.1 Unidade de Conservação: princípios e diretrizes de sua organização

Esta subseção discorre sobre as Unidades de Conservação a partir de um


campo conceitual de Quaresma (2003), pelos princípios normativos do documento
oficial do Sistema Nacional de Unidades de Conservação (SNUC) e pelo banco de
dados do Cadastro Nacional de Unidade de Conservação (CNUC) sancionado pela
Lei Nº 9.985/2000.
O Brasil em sua extensão territorial abriga uma mega diversidade cultural,
populacional, biomas e ecossistemas. Entretanto, o território brasileiro vem
passando por acentuadas mudanças, tanto na esfera social como ambiental.
Incessantes episódios de degradação, alteração e transformação do ambiente
ecológico estão diretamente relacionados às atividades produtivas e instalação de
infraestrutura.
A política de criação das Unidades de Conservação (UCs) manifesta-se como
um artifício disponibilizado pelo Estado para ponderar os impactos ambientais.
Quaresma (2003) comenta sobre a estratégia de criação de UC se propõe a atingir
três objetivos: a preservação de habitats naturais ou sítios culturais significativos, a
proteção do abastecimento de recursos de valor alto e manter as particularidades e
da diversidade da paisagem, considerando as futuras gerações. A autora traz outros
esclarecimentos a respeito das (UCs):

Essas áreas podem ter como objetivos manter a diversidade natural,


favorecer a pesquisa científica, manejar recursos florestais, bem como
assegurar o crescimento econômico regional de modo organizado,
garantindo assim a proteção de seus recursos. Nesse caso são
denominadas Unidades de Uso Indireto. Podem também objetivar a
qualidade de vida das economias locais, por meio do uso dos recursos.
Nesse caso são denominadas Unidade de Uso direto (QUARESMA, 2003,
p. 30).
69

Anteriormente a criação da Unidade de Conservação, na Constituição Federal


de 1988 a questão ambiental já estava presente nas diretrizes do capítulo VI,
especificamente no Art. 225 que consta:

Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de


uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao
poder público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as
presentes e futuras gerações (BRASIL, 1988).
§ 1º - Para assegurar a efetividade desse direito, incumbe ao poder público:
I - preservar e restaurar os processos ecológicos essenciais e prover o
manejo ecológico das espécies e ecossistemas;
5
II - preservar a diversidade e a integridade do patrimônio genético do País
e fiscalizar as entidades dedicadas à pesquisa e manipulação de material
genético;
III - definir, em todas as unidades da Federação, espaços territoriais e seus
componentes a serem especialmente protegidos, sendo a alteração e a
supressão permitidas somente através de lei, vedada qualquer utilização
que comprometa a integridade dos atributos que justifiquem sua proteção;
6
IV - exigir, na forma da lei, para instalação de obra ou atividade
potencialmente causadora de significativa degradação do meio ambiente,
estudo prévio de impacto ambiental, a que se dará publicidade;
V - controlar a produção, a comercialização e o emprego de técnicas,
métodos e substâncias que comportem risco para a vida, a qualidade de
vida e o meio ambiente;
VI - promover a educação ambiental em todos os níveis de ensino e a
conscientização pública para a preservação do meio ambiente;
7
VII - proteger a fauna e a flora, vedadas, na forma da lei, as práticas que
coloquem em risco sua função ecológica, provoquem a extinção de
espécies ou submetam os animais a crueldade (BRASIL, 1988).

Contudo, salienta-se que a trajetória histórica da proposta de criação da UC


se inicia no século XIX, denominada anteriormente de Área Protegida, o PARNA
(Parque Nacional) de Yellowstone (Quaresma, 2003) com advento do primeiro
modelo de Área Protegida no ano de 1872, nos Estados Unidos, mas em uma
perspectiva de áreas extensas desabitadas com o objetivo de as áreas naturais e as

5
Lei nº 8974, de 5.1995, que regulamenta os incisos II e V do § 1º do art. 225 da Constituição
Federal, estabelece normas para o uso das técnicas de engenharia genética e liberação no meio
ambiente de organismos geneticamente modificados, autoriza o Poder Executivo a criar, no âmbito da
Presidência da República, a Comissão Técnica Nacional de Biossegurança, e dá outras providências
(BRASIL, 1995).
6
Lei nº 8974, de 5.1995, que regulamenta os incisos II e V do § 1º do art. 225 da Constituição
Federal, estabelece normas para o uso das técnicas de engenharia genética e liberação no meio
ambiente de organismos geneticamente modificados, autoriza o Poder Executivo a criar, no âmbito da
Presidência da República, a Comissão Técnica Nacional de Biossegurança, e dá outras providências
(BRASIL, 1995).
7
Lei nº 4771, de 15.9.965, que institui Código Florestal. Lei nº 5197, de 3.1.1967, que dispõe sobre a
proteção a fauna (Código de Caça). Decreto-Lei nº 221, de 28.2.1967, que dispõe sobre a proteção e
estímulos a pesca (BRASIL, 1988).
70

vidas selvagens. O modelo desse tipo de parque passou a ser estabelecido também
em outros países, como um sistema de fronteira definida.
Todavia, não foi apropriado para países com especificidades diferentes dos
países centrais de economia industrial. No Brasil esse modelo também foi
reproduzido, a proposta de criação de UCs seguindo os padrões americanos foram
inviáveis para os territórios habitados por comunidades locais. Quaresma (2003)
referência a primeira proposta de criação de UC no Brasil ocorreu no ano de 1876,
por André Rebouças, com o Parque Nacional (PARNA) na ilha do Bananal e de Sete
Quedas. Mas, foi apenas no ano 1937, tendo respaldo do artigo 9 do Código
Florestal de 1934, que houve a criação do PARNA de Itatiaia, no Rio de Janeiro.
O Parque Nacional tinha a função de realizar pesquisas científicas e
proporcionar lazer às populações da cidade, no mesmo padrão dos Estados Unidos.
As informações expostas acima, compõem uma síntese breve sobre as UCs e suas
perspectivas históricas, o tópico não se aprofundará para tal análise, pois busca-se
situar a partir do século XXI com a criação da lei.
O Sistema Nacional de Unidade de Conservação (SNUC) surgiu a partir do
pedido do Instituto Brasileiro de Desenvolvimento Florestal à Fundação Pró-
Natureza (Funatura), uma organização não governamental, no ano de 1988, para a
construção de um anteprojeto de lei, que viabilizasse um sistema de unidade de
conservação. Uma problemática encontrada na época, foi a definição das categorias
de manejo, elaborando novas tipologias de unidade que tinham lacunas em sua
estruturação. Esse projeto foi aprovado pelo Conselho Nacional de Meio Ambiente
(CONAMA) em 1992, já no formato de Projeto de Lei enviado ao Congresso
Nacional, após um longo processo de espera, o projeto foi aprovado no ano de
2000.
Regulamentado pelo Art. 225 da Constituição Federal de 1988, instaura por
via da LEI Nº 9.985, DE 18 de julho de 2000, o Sistema Nacional de Unidades de
Conservação da Natureza (SNUC) organizado em três esferas de governo
(municipal, estadual e federal) com princípios e diretrizes normativas de
planejamento e gestão.
SNUC é constituído por unidades selecionadas que contemplem os
parâmetros nacionais de conservação da natureza. De acordo com o Capítulo I da
Lei Nº 9.985 no Art. 2º do SNUC (2000) entende-se por Unidade de Conservação
como um espaço territorial e de seus recursos naturais que estão inclusas: as águas
71

jurisdicionais protegidas pelo poder público, tendo como princípios fundamentais a


conservação da natureza pelo manejo do da utilização do ser humano da natureza,
tendo como base a preservação, manutenção, o uso sustentável, o restauro e
recuperação de áreas naturais, que em sua base seja a produção do favorecimento
das bases sustentáveis para a geração do presente e do futuro, garantindo a
sobrevivência dos seres vivos de forma geral (BRASIL, 2000).
Como espaços que consideram a diversidade biológica, variedade de
organismos existentes, ecossistemas aquáticos, terrestres, compreende as distintas
espécies e ecossistemas, o recurso ambiental. A preservação por meio de métodos,
procedimentos e políticas direcionada para proteção de espécies, habitats naturais.
No manejo de conservação biológica e de ecossistemas, utilização indireta que não
seja para o consumo, coleta ou prejudique os recursos naturais.
Uso direto apenas ao destinado a coleta e uso comercial ou não dos recursos
naturais, uso sustentável do ambiente, garantindo a perenidade dos recursos
ambientais renováveis e de seus processos ecológicos, extrativismo sustentável,
recuperação, restauração e restituição de ecossistemas ou de uma população
silvestre (BRASIL, 2000).
Os objetivos principais de acordo com Art. 4º das Unidades de Conservação
(UCs) são: contribuir da manutenção da diversidade biológica e dos recursos
genéticos em todo território nacional e águas jurisdicionais; proteger as espécies
ameaçadas de extinção em esfera regional e nacional, as paisagens naturais, as
características da natureza geológica, geomorfológica, espeleológica, arqueológica,
paleontológico, cultural e os recursos hídricos e edáficos e sua recuperação.
Preservar e restaurar os ecossistemas naturais; promover o desenvolvimento
sustentável a partir dos recursos naturais e a utilização dos princípios e práticas de
conservação da natureza e seu desenvolvimento; incentivar pesquisas científicas e
estudos de monitoramento ambiental; valorizar a diversidade biológica em sua
dimensão econômica e social; oportunizar condições e promoção da educação e
interpretação ambiental, a relação recreativa com a natureza e o turismo ecológico;
proteger os recursos naturais de subsistência utilizados pelas populações
tradicionais, respeitando e reconhecendo seus saberes e sua cultura, propiciando
um crescimento social e econômico (BRASIL, 2000).
O Sistema Nacional de Unidade de Conservação tem sua gestão centrada
nos órgãos municipais, estaduais e federativos, responsáveis por atribuições
72

especificas como: I- Órgão consultivo e deliberativo: o Conselho Nacional do Meio


Ambiente – CONAMA, tendo como função acompanhar e implementar o Sistema; II-
Órgão Central, sendo o Ministério do Meio Ambiente coordenar o SNUC e III-
Órgãos executores: o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade
(ICMBIo) e o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e Recursos Naturais (Ibama), em
atributo supletivo, os órgãos ligados ao estado e município, tem a função de
implementar o SNUC, subsidiando propostas de criação e administrar as Unidades
de Conservação federais, estaduais e municipais em suas respectivas esferas de
atuação .
No tópico sobre as Categorias de Unidade de Conservação do Capítulo III, o
Art. 7º destaca a divisão de dois grupos: o primeiro é sobre a Unidade de Proteção
Integral, a qual tem o objetivo central a preservação da natureza, permitindo apenas
o uso indireto dos seus recursos naturais, exceto os casos previsto nessa lei.
Os grupos que estão nas Unidades de Conservação de Proteção Integral são:
Estação Ecológica8; Reserva Biológica; Parque Nacional; Monumento Natural e
Refúgio de Vida Silvestre. Na Estação Ecológica seu objetivo é a preservação da
natureza e a realização e pesquisas científicas. A Reserva biológica tem a função da
preservação integral do ecossistema e de todos os recursos naturais existentes
dentro de seu território e demais características naturais em seus limites sem
interferência humana ou modificações ambientais.
Já a finalidade do Parque Nacional é a preservação de ecossistemas naturais
que tem uma importância ecológica e beleza cênica e concede a realização para
pesquisas científicas e a expansão de atividades no plano da educação ambiental e
recreações com a natureza e turismo ecológico (BRASIL, 2000).
O Monumento Natural tem como objetivo preservar os sítios naturais de
belezas paradisíacas. O Refúgio de Vida Silvestre é designada para proteção de
ambientes naturais, que podem ser asseguradas condições para a existência ou

8
§ 4º Na criação de Estação Ecológica ou Reserva Biológica não é obrigatória a consulta de que
trata o § 2º deste artigo. § 5º As unidades de conservação do grupo de Uso Sustentável podem ser
transformadas total ou parcialmente em unidades do grupo de Proteção Integral, por instrumento
normativo do mesmo nível hierárquico do que criou a unidade, desde que obedecidos os
procedimentos de consulta estabelecidos no § 2º deste artigo. § 6º A ampliação dos limites de uma
unidade de conservação, sem modificação dos seus limites originais, exceto pelo acréscimo proposto,
pode ser feita por instrumento normativo do mesmo nível hierárquico do que criou a unidade, desde
que obedecidos os procedimentos de consulta estabelecidos no § 2º deste artigo. § 7º A desafetação
ou redução dos limites de uma unidade de conservação só pode ser feita mediante lei específica
(BRASIL, 2000).
73

reprodução espécies ou comunidades da flora local e fauna migratória ou residente


(BRASIL, 2000).
O segundo é sobre a Unidade de Uso Sustentável tem como objetivo
compatibilizar a conservação da natureza com a utilização sustentável de parcela
dos seus recursos naturais. Os grupos formadores da Unidade de Uso Sustentável
são: Área de Proteção Ambiental; Área de Relevante Interesse Ecológico; Floresta
Nacional; Reserva Extrativista; Reserva de Fauna; Reserva de Desenvolvimento
Sustentável e Reserva Particular do Patrimônio Natural.
Sobre a Área de Proteção Ambiental é designado as seguintes atribuições:

Art. 15. A Área de Proteção Ambiental é uma área em geral extensa, com
um certo grau de ocupação humana, dotada de atributos abióticos, bióticos,
estéticos ou culturais especialmente importantes para a qualidade de vida e
o bem-estar das populações humanas, e tem como objetivos básicos
proteger a diversidade biológica, disciplinar o processo de ocupação e
assegurar a sustentabilidade do uso dos recursos naturais (BRASIL, 2000).

O lócus de estudo desta pesquisa insere-se em uma Área de Proteção


Ambiental, denominada como APA de Maiandeua/Algodoal, a qual analisaremos de
mais adiante no tópico especifico sobre a UC do Pará e sua categoria APA de
Maiandeua. Na Área de Proteção Ambiental é formada por terras públicas ou
privadas, podendo apresentar normas e restrições na utilização de uma propriedade
privada. A Área de Relevante interesse Ecológico é uma área de extensão pequena,
onde pode ou não haver ocupação humana, tendo como objetivo a manutenção dos
ecossistemas naturais de relevância regional ou local e regular a utilização dessas
áreas.
A respeito da Floresta Nacional trata-se de uma área com cobertura floresta
de espécies de predominância nativas, objetivando a utilização sustentável dos
recursos florestais e pesquisas científicas (BRASIL, 2000).
A Reserva Extrativista é uma área de utilização de populações extrativistas
tradicionais com atividade de subsistência no extrativismo, sendo complementada
com a agricultura e a criação de animais de pequeno porte, como objetivo de
proteger o meio de vida e cultura dessas populações, respaldadas no uso
sustentável dos recursos naturais da unidade. A Reserva de Fauna é uma área
natural com animais de espécies nativas, terrestres ou aquáticas, indicadas
conjuntamente para pesquisas técnicas-científicas (BRASIL, 2000).
74

A categoria de Reserva de Desenvolvimento Sustentável pertence a uma área


natural com populações tradicionais, em que sua existência é baseada no sistema
sustentável de exploração dos recursos naturais, tem a função de proteger a
natureza e a manutenção da diversidade biológica, atuando na preservação e
garantia das condições e meios imprescindíveis na reprodução e melhoria da
qualidade de vida utilização dos recursos naturais das populações tradicionais.
E a Reserva Particular do Patrimônio Natura refere-se a uma área privada,
destinada a conservação da diversidade biológica. As Unidades de Uso Sustentável
descritas acima são categorias importantes para compreensão do papel do SNUC e
suas atribuições para áreas de conservação. As informações apresentadas nesta
seção estão fundamentadas no documento oficial de Nº 9.985, seu detalhamento
dos respectivos Capítulos, Artigos e Incisos são relevantes na tessitura da
caracterização do lócus dessa pesquisa sobre a vila de Fortalezinha, principalmente
no âmbito da Área de Proteção Ambiental.
As UCs foram criadas pelo Poder Público suas normativas partem dos
estudos técnicos e de consultas públicas, possibilitando uma identificação da
localização e a noção dos limites mais apropriados para a unidade. Se considera no
processo de consulta, a disponibilização de informações para a comunidade local e
a outras partes interessas na criação de uma UC.
Consta no Art. 22 que o Poder Público poderá, a partir da retificação das
atividades agropecuárias e outras atividades econômicas que estão em andamento
e obras públicas licenciadas, na forma da lei, deliberar limites administrativos
temporários para o exercício de atividades e empreendimentos efetivados ou
responsáveis por impactos ambientais, para efetuação de estudos, tencionando para
criação de Unidade de Conservação, quando estabelecidos pelo a critério do órgão
ambiental responsável, houver o risco de prejuízo aos recursos naturais existentes.
Importante observar o Art. 23, pois revela um aspecto sobre as comunidades
tradicionais, quando as Reservas Extrativistas e Reservas de Desenvolvimento
Sustentável são áreas habitadas pelas populações locais, a posse e o uso serão
regulados por contratos, de acordo com o regulamento da Lei Nº. 9,985, para as
populações inseridas nesse contexto, aponta-se:
75

§ 1º As populações de que trata este artigo obrigam-se a participar da


preservação, recuperação, defesa e manutenção da unidade de
conservação. § 2º O uso dos recursos naturais pelas populações de que
trata este artigo obedecerá às seguintes normas: I - proibição do uso de
espécies localmente ameaçadas de extinção ou de práticas que danifiquem
os seus habitats; II - proibição de práticas ou atividades que impeçam a
regeneração natural dos ecossistemas; III - demais normas estabelecidas
na legislação, no Plano de Manejo da unidade de conservação e no contrato
de concessão de direito real de uso (BRASIL, 2000).

Outro fator sobre as UCs é a respeito da utilização de um Plano de Manejo,


sendo proibida qualquer intervenção, atividades, ou modalidade que não estejam em
acordo com os objetivos estabelecido no Plano de Manejo nas unidades de
conservação. Até a elaboração do Plano de Manejo, todas as atividades e obras
realizadas nas UCs de proteção integral, estão limitadas àquelas destinadas que
garantem a integridade dos recursos naturais a qual a unidade de conservação
protege. Garantindo as futuras populações tradicionais que eventualmente possam
ocupam essas áreas, condições de acesso e permanência, buscando suprir suas
respectivas necessidades matérias, sociais e culturais.
Outra informação acerca das Unidades de Conservação no Brasil, é o
Cadastro Nacional de Unidades de Conservação (CNUC), sistema integrado de
banco de dados atualizados pelo Ministério do Meio Ambiente (MMA) com a
colaboração do Ibama, do ICMBIo e pelos órgãos municipais, estaduais e
particulares, conforme descrito no Art. 50º do SNUC:

Art. 50. O Ministério do Meio Ambiente organizará e manterá um Cadastro


Nacional de Unidades de Conservação, com a colaboração do Ibama e dos
órgãos estaduais e municipais competentes. § 1o O Cadastro a que se
refere este artigo conterá os dados principais de cada unidade de
conservação, incluindo, dentre outras características relevantes,
informações sobre espécies ameaçadas de extinção, situação fundiária,
recursos hídricos, clima, solos e aspectos socioculturais e antropológicos. §
2o O Ministério do Meio Ambiente divulgará e colocará à disposição do
público interessado os dados constantes do Cadastro (BRASIL, 2000).

A imagem abaixo encontra-se as Unidades de Conservação do Brasil e os


respectivos estados.
76

Figura 06 – Unidades de Conservação do Brasil (2018)

Fonte: Brasil, 2018

No mapa, os estados identificados nas paletas de cores: azul escuro, verde


amarelado, azul gelo, púrpura azulado, marrom, são as UCs de Proteção Integral.
As cores: verde, verde primavera, magenta, amarelo, roxo, amarelo escuro e cinza,
estão as UCs de Uso Sustentável.
Conforme os dados encontrados no monitoramento do portal eletrônico do
Instituto Socioambiental (ISA) Organização Civil de Interesse Público (OSCIP),
associação sem fins lucrativos, atuando na proposição de ações sociais e
ambientais, defendendo bens e direitos coletivos em relação ao ambiente, o
patrimônio cultural e as comunidades indígenas e tradicionais (ISA, 2019) o Brasil
apresenta 338 Unidades de Conservação a nível Federal, sendo 152 de Proteção
Integral e 186 de Uso Sustentável, totalizando 338 UCs. Já na parte da Amazônia
legal há 193 Estaduais, 146 Federais totalizando 339 UCs.
No estado do Pará o território ocupado pelas UC equivale a 21.141.798
(SEMA, 2012) com administração da Secretaria do Estado de Meio Ambiente
(SEMA-PA), com intermédio da Diretoria de Áreas Protegidas (DIAP/SEMA). O
Sistema Estadual de Unidades de Conservação, foi criado pela Lei n. 5.887/1995,
com 20 Unidades de Conservação, na quais estão divididas em Área de Proteção
Integral que são: 3 são Parques Estaduais, 1 Estação Ecológica, 1 Reserva
Biológica e 1 Refúgio de Vida Silvestre e de Uso Sustentável que corresponde a: 8
77

Áreas de Proteção Ambiental, 2 Reservas de Desenvolvimento Sustentável e 4


Florestas Estaduais.
A gestão dessas áreas é por meio da formação e implantação do instrumento
de Planejamento (Plano de Manejo e Planos Operacionais Anuais) e com
participação da Sociedade Civil em conselhos Consultivos e deliberativos e
parcerias institucionais governamentais e não governamentais (SEMA, 2012).
Compreendendo a dimensão do debate em torno das UCs e suas diretrizes,
destaca-se que nesta seção não se aprofundou no campo: dos incentivos, isenções
e penalidades; das reservas da biosfera e das disposições gerais e transitórias, de
seus respetivos capítulos. A proposta da inserção da UC neste capítulo foi
apresentar o conceito, normativas e as categorias das Unidades de Conservação,
para que se tenha um entendimento contextual amplo do lugar em que a pesquisa
está situada.

2.2.2 Unidade de Conservação de Uso Sustentável: APA de Algodoal: a Caminho de


Fortalezinha

Após o enunciado conceitual sobre Unidades de Conservação, este último


tópico apresentará a categoria de Uso Sustentável da Unidade de Conservação de
Maracanã, APA de Algodoal/Maiandeua e suas referentes vilas de Algodoal,
Mocooca, Camboinha e Fortalezinha.
A Área de Proteção Ambiental de Algodoal/Maiandeua é a primeira Unidade
de Conservação Estadual do Sistema Estadual de Unidade de Conservação (SEUC)
do Pará, criada pela Lei nº 5.621, de novembro de 1990, também é a primeira
Unidade criada pelo Estado na Zona do Salgado Paraense. Seu processo de criação
começou no ano de 1989, iniciando a partir de uma observação feita pela população
local, em buscar preservar as belezas e os recursos naturais, diante do crescimento
do turismo local, que teve início na década de 50, na figura abaixo encontra-se a
localização da APA de Algodoal, segundo os dados do portal do Instituto
Socioambiental (ISA, 2019) Unidades de Conservação no Brasil:
78

Figura 07– Localização da APA de Algodoal/ Maiandeua

Fonte: https://uc.socioambiental.org.2019.

A APA é formada por duas Ilhas separadas por um furo, chamado de Furo
Velho/Igarapé das Lanchas, com uma extensão de aproximadamente 2.378ha. A
Ilha de Algodoal tem uma área de 358ha e Maiandeua mede 1.993ha, constituídas
por quatro Vilas (Algodoal, Camboinha, Mocooca e Fortalezinha).
O acesso pode ser realizado através do Município de Marapanim ou
Maracanã. O Trajeto por Marapanim é feito pela rodovia Br-316, PA- 136, até o porto
de Marudá e atravessar pelo rio Marapanim. Já o acesso feito por Maracanã se dá
pela rodovia BR-316, PA-395 e a Estrada do Quarenta até o Porto do Quarenta,
atravessar o Furo do Mocooca, acessa a APA da Vila de Mocooca, ao sudoeste da
APA.
A Gestão da APA é realizada pela Gerência da APA de Algodoal/Maiandeua
da SEMA-PA, criando em 2007 e pelo Conselho Gestor, criado no ano de 2006. É
proibido a circulação de veículos na Área, apenas o uso de carroças.
O nome Algodoal está relacionado a existência de uma planta denominada de
algodão-de-seda e o nome Maiandeua, tem origem tupi, que significa Mãe da Terra.
A APA de Algodoal/Maiandeua agrega uma diversidade de ecossistemas, como
igarapés, praias, dunas, restingas litorâneas, campos naturais salinos (Apicuns),
manguezais, bosque de mata primitiva, lagos e furos. Com vegetação do bioma
costeiro, segundo os dados da Secretaria de Meio Ambiente (SEMA) (2007) a APA
apresenta 54 espécies, que são utilizadas com fins alimentícios, terapêuticos, na
79

construção civil e para geração de energia. Na área de manguezais são encontrados


os tipos: Mangue-Vermelho, Mangue-Preto ou Siriúba e Mangue-branco.
A fauna que correspondente na APA, de acordo com SEMA (2007) é de 25
espécies de animais terrestres, exemplos: macacos de cheiro, capivaras, gato do
mato, paca, cutias e camaleões. As espécies aquáticas encontradas correspondem
a uma variedade de “peixes (raias, tubarão e cação), cetáceos (golfinhos), sirênios
(peixe-boi), quelônios (tartarugas), crustáceos (caranguejos, siris e camarões) e
bivalves (turus)” (SEMA, 2007, p. 17). Foram identificadas 117 espécies de aves,
destacam-se: os papagaios, tucanos, pica-paus, garças e gaviões.
O clima divide-se em dois períodos, com chuvas mais intensas que ocorrem
entre fevereiro e abril e período menos chuvoso entre os meses de setembro a
novembro. A rede hidrográfica é formada pelos furos, lagos e igarapés, influenciados
pelas marés da zona do salgado. A parte geológica compreende a da plataforma
Bragantina, com formações decorrentes da fase Pirabas e Barreira e sedimentos do
período Pós-Barreiras. Formada pelo Planalto Costeiro e Planície Costeira, em
falésias ativas e inativas, praias, dunas vegetadas e planaltos salinos.
Após essa breve identificação da APA de Algodoal/Maiandeua, começamos
nosso percurso pelas Vilas que integram essa Área, até chegarmos à Vila de
Fortalezinha. Iniciamos pela Vila de Algodoal, a maior ilha da APA, situada na parte
noroeste da Área de Proteção, é a única vila da Ilha de Algodoal, cercada pelo rio
Marapanim e por seus furos, que liga Furo Velho até o Oceano Atlântico (SEMA,
2007).
O acesso se dá pela travessia do rio Marapanim, entre a vila (Ponta do
Mamede) e o Porto de Marudá, que dura aproximadamente 30 minutos a 01 hora,
dependendo do fluxo das marés. As ruas que formam a vila não são pavimentadas,
o transporte é realizado com charretes puxadas a cavalos, as casas em sua grande
maioria são de alvenaria, mas ainda há moradias de madeira na parte mais afastada
do Ponta do Mamede.
As manifestações culturais na ilha são marcadas pelos festejos religiosos,
rodas de carimbó9, chamado pelo Mestre Chico Braga de carimbó de pau e corda,

9
Nome em tupi, refere-se ao tambor com o qual se marca o ritmo, chamado CURIMBÓ (tambor
grande feito de tronco de árvores). O Carimbó surgiu na zona do salgado paraense, onde tem sua
expressão mais forte nos Municípios de Marapanim, Curuçá e Maracanã, onde está a APA de
Algodoal-Maiandeua. Dois mestres carimbozeiros de Algodoal tornaram-se bastante conhecidos:
80

ritmo predominante na Vila, organizado pelos nativos da ilha, com Mestres Praianos,
tendo sua origem no carimbó do festejo de São Benedito no barracão de Dona
Margarida Menezes (Magá) de acordo com o Documentário Mestres Praianos do
Carimbó de Maiandeua (2015).
A maior parte da população da APA encontra-se na Vila de Algodoal, a
principal atividade econômica na vila é a pesca artesanal, realizada por pescadores
com dedicação totalmente exclusiva à atividade, que em suas canoas saem até os
locais de pesca, onde há uma embarcação mãe, regionalmente conhecida como
“geleira”, com gelos mantidos em caixa para conservar o peixe e assim é levado
para comercialização.
Além da pesca, o turismo local também é uma atividade econômica,
intensificado em alta temporada que ocorre no período de feriado da semana santa,
férias escolares e festas de final de ano. A seguir, algumas imagens da Vila de
Algodoal:
Figura 08 – Ponta da Mamede Algodoal

Fonte: http://www.guiaviajarmelhor.com.br. Gustavo Albano

Francisco Paulo Monteiro Braga (Chico Braga) e José Miguel Costa Teixeira (Zé Mingau), com
diversas poesias e músicas que relatam o cotidiano da população local (SEMA, 2012, p. 33).
81

Figura 09 – Vista área da Vila de Algodoal

Fonte:http://www.guiaviajarmelhor.com.br. Gustavo Albano

Figura 10 – Ruas da Vila e Charretes usadas pela população

Fonte: Fonte: http://www.guiaviajarmelhor.com.br. Gustavo Albano.

Na figura 08 apresenta-se o pequeno porto do Mamede, local onde são


realizadas travessias para o porto de Marudá e outras localidades, já na figura 09 é
uma vista panorâmica da vila de Algodoal e na figura 10 trata-se de uma das ruas da
vila, como pode ser observado não há asfalto e a locomoção é feito por charretes e
carroças.
82

A segunda Vila da APA de Algodoal é a Vila de Camboinha, localizada às


margens do rio Marapanim, parte sudoeste da APA. Seu acesso é feito através do
transporte fluvial, com frete de embarcações, que saem do Ponta do Mamede na
Vila de Algodoal até o porto da Vila de Camboinha, com duração de
aproximadamente 20 minutos. O acesso também pode ser feito por via terrestre, por
trilhas entre as vilas de Algodoal e Fortalezinha.
A Vila de Camboinha é a menor das quatro vilas da APA, sua principal
atividade econômica também é a pesca artesanal, com predominância da pesca do
camarão, conhecido como piticaia (Xiphopenaeus kroyeri), a qual é comercializado
na localidade e em outros municípios, como Belém, Maracanã, Castanhal, Igarapé
Açu, Santa Maria e São Miguel (SEMA, 2007), o peixe e camarão são a base
alimentar da população local que reside na Vila.
As manifestações culturais envolvem as festas religiosas, festas escolares e
eventos organizados pela Associação dos Morados da Vila de Camboinha (AMC).
Com base nos dados da (SEMA, 2007) a cultura é marcada pela produção do
artesanato usados no cotidiano feito pelos moradores, como construção do pulsar, a
rede de pesca, tarrafa, cestas de miriti, crochê, reciclagem de materiais usados na
decoração.
A terceira Vila da APA de Algodoal/Maiandeu é a Vila de Mocooca, situada na
parte sudeste da APA, rodeada pelo rio Maracanã e pelo Furo de Mocooca, sendo a
segunda entrada da APA. O acesso à localidade se faz pelas embarcações (canoas
e rabeta) no Furo de Mocooca, entre o Porto da Vila e o Porto da Vila do Quarenta,
também pode ser realizado por trilhas na Vila de Fortalezinha.
Atividade econômica está centrada na pesca artesanal por meio da pesca de
currais e da coleta de caranguejos, em atividades comerciais como: pequenos
estabelecimentos comercias, bares, mercearias e botecos, extrativismo animal,
agricultura e atividades turísticas em meses de alta temporada.
As manifestações culturais também envolvem os festejos religiosos como o
dia de São Pedro, no mês de junho, danças típicas como quadrilhas e rodas de
carimbó. O artesanato também está presente da comunidade de Mocooca, a
produção de artigos em crochês, colares, pulseiras, bordado, sandálias e artigos da
pesca.
Depois de percorrer as três Vilas da APA, Algodoal, Camboinha e Mocooca,
chega-se a Vila de Fortalezinha, localizada entre a Vila de Mocooca e o Igarapé do
83

Mupéua, na ilha de Algodoal/ Maiandeua, segundo Santana (2006) a vila é


conhecida entre os pescadores e seus familiares como Fortaleza de Mocooca ou
Fortalezinha, uma Vila Pesqueira às margens do rio Maracanã, região costeira da
Zona do Salgado.
O acesso à Vila pode ser realizado pela travessia no Porto da Vila, que fica
em frente à praia de Fortalezinha e também pode ser feito pela BR – 316 passando
por diversas localidades, Castanhal, Igarapé-açu, Magalhães Barata, até a PA – 430
que liga a Vila da Concinha em Magalhães Barata à Vila do 40 do Mocooca, no
município de Maracanã, estrada de terra de difícil acesso, com muitas crateras, que
fazem com que os automóveis trafegam de forma cautelosa durante o caminho.
Após este caminho chega-se à comunidade do 40 do Mocooca, no Porto do
Quarenta, onde ficam as embarcações que fazem a travessia no furo do 40 que
também se liga ao rio Maracanã. Chega-se ao outro lado do furo onde está situada a
vila de Mocooca, realizando uma trilha a pé de aproximadamente 60 minutos até
chegar na Vila de Fortalezinha. A seguir algumas imagens da pesquisa de campo
inicial até a chegada em Fortalezinha:

Figura 11 – Croqui do registro do percurso realizado de Belém à Fortalezinha

Fonte: Arquivo fotográfico da autora/2018.

Apresentação do croqui acima, tem como objetivo exemplificar o trajeto


realizado na visita de campo, situando as localidades percorridas durante a viagem.
O registro foi elaborado no diário de campo no mês de Setembro de 2018.
84

Figura 12 – Chegada no 40 do Mocooca

Fonte: Arquivo fotográfico da autora/2018.

A figura acima retrata a chegada no 40 do Mocooca, nessa região o acesso é


difícil, apenas carros e micro-ônibus conseguem chegar até o ponto evidenciado na
imagem, uma observação importante sobre as ruas de terra, não há asfalto que
torna muitas vezes inviável chegar até a comunidade, principalmente no período de
inverno, que resultam na formação de depressões nas ruas do 40 do Mocooca.
Muitos moradores relatam que a Prefeitura de Maracanã tem conhecimento
da situação atual da vila, entretanto a gestão do município é ausente e não
encaminha as devidas diligências.

Figura 13 – Porto do 40 do Mocooca

Fonte: Arquivo fotográfico da autora/2018.


85

Na figura 13 apresenta-se o local de onde as embarcações fazem as


travessias do 40 do Mocooca, para as vilas de Mocooca, Camboinha e Fortalezinha.

Figura 14– Travessia de rabeta no Furo do 40 do Mocooca

Fonte: Arquivo fotográfico da autora/2018.

A figura 14 representa o momento de travessia na rabeta “baluarte” pelo Furo


do 40 do Mocooca, uma travessia que dura aproximadamente 5 minutos,
dependendo do fluxo das marés, já na figura 15 apresenta-se o Furo do 40
Mocooca, banhado pelo rio Maracanã.

Figura 15 – Furo do 40 do Mocooca

Fonte: Arquivo fotográfico da autora/2018.


86

Após a travessia de rabeta chega-se à vila de Mocooca, pelo caminho


encontra-se muitas pedras e uma paisagem moldada pelas interferências naturais e
as marcas da ação da maré alta no inverno.
Logo na descida da embarcação percebem-se alterações na praia,
decorrentes do processo de erosão, uma parte da praia foi coberta por pedras, a
vegetação de coqueiros e outras plantas foram arrancadas pela força marinha, que
avançou em direção às moradias, diminuindo o espaço de habitação, o que levou a
migração das famílias de pescadores para parte alta do relevo.
Além deste processo, o avanço do mar e do manguezal contribuiu para a
saída de moradores que abandonaram suas residências no local. Foram registradas
algumas imagens de casas abandonadas no início de Mocooca, como podem ser
observadas a seguir:

Figura 16 – Caminho até à Vila de Fortalezinha

Fonte: Arquivo fotográfico da autora/2018.


87

Figura 17– Coqueiro Arrancado pela força da maré alta

Fonte: Arquivo fotográfico da autora/2018.

Na imagem acima visualize-se um coqueiro derrubado com suas raízes


expostas, o registro foi feito durante o caminho em Mocooca, segundo as
informações de alguns moradores o fenômeno sempre ocorre no período da maré
alta, onde a força da água acaba derrubando as árvores em torno da beira da praia.
No caminho para vila de Fortalezinha foram observadas moradias de alvenaria,
igrejas católica e protestante e a escola que é o ponto de referência que demarca a
Vila de Mocooca da Vila de Fortalezinha.
Nota-se a diferença da organização espacial entre as duas comunidades, na
Vila de Mocooca as residências são organizadas em estilo "arruado", enquanto a
Vila de Fortalezinha é separada em ruas, recebem denominação e a divisão espacial
do lugar é de forma horizontal e vertical, em sua margem há estabelecimentos
comerciais pequenos, com exemplo: padarias, tabernas, restaurantes, alguns bares,
pousadas, serviços de saúde, posto médico, ressalta-se que não há posto policial na
comunidade.
Durante a última visita de campo em janeiro de 2020, verificou-se que
ocorreram algumas mudanças no trajeto de Mocooca para Fortalezinha, uma delas
foi a inserção de placas de sinalização da APA de Maiandeua pelo Instituto de
Desenvolvimento Florestal e da Biodiversidade do Estado do Pará (Ideflor-bio), a
implementação dessas placas ocorreram no ano de 2019.
88

Figura 18 – Placa de sinalização da APA de Maiandeua em Mocooca

Fonte: Arquivo fotográfico da autora/2020.

Figura 19 – Escola de Fortalezinha ponto que demarca à Vila de Mocooca e Vila de


Fortalezinha

Fonte: Arquivo fotográfico da autora/2018.

A imagem da escola acima é “marcador” entre o limite entre Mocooca e


Fortalezinha, sendo que Mocooca fica antes da escola e Fortalezinha fica depois da
escola, no ano de 2019 a escola passou uma reforma, a imagem acima foi
registrada antes desse processo. As fotografias acima fazem referência às
impressões sobre o acesso, localização, aos aspectos sociais, características da
89

paisagem natural e espacial e algumas problemáticas encontradas e relatadas pela


comunidade de Fortalezinha.
As imagens apresentadas, evidenciam o trajeto realizado até chegar a Vila de
Fortalezinha, que de acordo com Santana (2006) e seus estudos sobre a área
comenta que alguns antigos moradores relacionam a origem do nome de
Fortalezinha, com uma edificação de pedras, em formato circular construída na
comunidade por padres missionários no século XIX. Para o imaginário popular a
construção é mal-assombrada e que haveria um pote de ouro enterrado neste lugar.
Segundo informações concedidas na entrevista com a Moradora Maria do
Rosário, a vila de Fortalezinha era chamada de Maiandeua, mas com a edificação
em pedras a população começou associar como uma possibilidade de referência
para a comunidade. Nesse sentido, como é um elemento marcante na história da
localidade, destaca-se também esse símbolo na tessitura para caracterização da
vila, como mostra a imagem a seguir:

Figura 20 – Construção de Pedra em Formato Circular

Fonte: Arquivo fotográfico da autora/2020.

A comunidade pesqueira tem sua formação a partir dos laços de parentescos


entre os moradores, as tarefas do cotidiano são feitas coletivamente, como exemplo
atividade da pesca, limpeza dos roçados, dos poços, das ruas e do preparo da
farinha (SANTANA, 2006, p.398).
90

Os dados em relação ao número de habitantes da vila de Fortalezinha foram


verificados com base nas informações da pesquisa de campo, obtidas com as
famílias cadastradas no posto de saúde, verificadas com os agentes comunitários da
localidade, que repassaram o levantamento de acordo com suas áreas de atuação,
na qual estão organizados por micro áreas, que também inclui a Vila de Mocooca.
De acordo com Luiz Carlos Teixeira agente comunitário da microárea 1 que
compreende área de Mocooca e uma parte da Vila de Fortalezinha e outros dois
agentes, repassaram o número geral de famílias e moradores, não apresentando o
número de habitantes por faixa etária e gênero. À vista disso, seguem os dados de
2018:

Gráfico 01 – Número de moradores da vila de Fortalezinha

Fonte: Pesquisa de campo/2020.

Apresentação dos dados, segue a ordem decrescente de organização em


microáreas. A microárea 3 Mocooca e uma parte de Fortalezinha, o agente
comunitário de saúde responsável foi Luiz Carlos de Lima Teixeira informou que há
58 famílias em Mocooca, 5 famílias em uma parte de Fortalezinha, totalizando 187
pessoas.
Na microárea 2 Fortalezinha o agente comunitário de saúde responsável foi
Moacir Modesto Teixeira informou que há 44 famílias em Fortalezinha, totalizando
173 pessoas. Já a microárea 1 agente comunitário de saúde responsável foi Aldo
Rodrigues Carrera informou que há 56 famílias cadastradas, totalizando 216
91

pessoas. Sendo assim, Fortalezinha tem em média 576 habitantes, considerando os


dados do último cadastro realizado pela prefeitura de Maracanã em 2018.
As atividades econômicas da comunidade estão pautadas na pesca artesanal,
na agricultura, os pequenos comércios como, bares, mercearias, panificadoras e
pequenos restaurantes, a Vila é a segundo lugar mais procurado na APA de
Algodoal/Mainadeua, assim o turismo também se configura como uma atividade
econômica da localidade em períodos de alta temporada, feriado, julho e final de
ano.
A infraestrutura da comunidade ainda é precária, na Vila só há 1 posto
médico, uma escola, não há policiamento, as ruas não são pavimentadas, assim
como em Algodoal não é permitido a entrada de veículos, entretanto, há circulação
de motos sem placas circulando por Fortalezinha. O contexto cultura é marcado por
manifestações religiosas, escolares e pelas rodas de carimbó, com o grupo cultural
Filhos de Maiandeua.
As belezas naturais são os atrativos principais da vila de Fortalezinha, seu
aspecto ambiental é marcado pela presença de praias, áreas de terra firme com
vegetação, como os coqueiro na imagem abaixo e manguezais e uma grande
diversidade de ecossistemas marinhos e terrestres. Uma curiosidade a respeito de
Fortalezinha, por sua localização geográfica, é que na vila somente pode ser visto o
nascer do sol.

Figura 21 – Praia de Fortalezinha

Fonte: Arquivo fotográfico da autora/2018.


92

Durante a visita de campo foi observado na parte baixa da Vila de


Fortalezinha a praia como mostra a figura acima, também trata-se de uma área de
trabalho dos pescadores, onde os mesmos se organizam para a pesca de curral e
de rede, para o conserto de barcos e rabetas, manutenção do curral, bem como
atuam também nos restaurantes e bares, recepcionando os turistas, amigos,
familiares que frequentam a comunidade.

Figura 22 – Praia de Fortalezinha e Local de Trabalho dos Pescadores

Fonte: Arquivo fotográfico da autora/2018.

Na praia também foi observado que o processo de erosão está ocorrendo de


forma intensa e rápida, se aproximando das áreas onde estão construídos os bares
e restaurantes, alguns bares e também uma parte da vegetação de coqueiros não
existem mais, devido a este processo, para amenizar os impactos das águas, os
proprietários dos estabelecimentos estão construindo barreiras feitas de pedras
retiradas da praia. Uma prática que vem sendo criticada pelos próprios moradores
que ressaltam a ausência de fiscalização do Instituto de Desenvolvimento Florestal e
da Biodiversidade do Estado do Pará – Ideflor-bio, órgão responsável pela
manutenção da Política Ambiental na APA de Maiandeua.
93

Figura 23 – Pedras retirada da beira da praia em barragem no bar comercial

Fonte: Arquivo fotográfico da autora/2018.

Ressalta-se que durante a visita de campo alguns morados relataram sobre o


avanço da maré, devido a retirada das pedras feita por outros moradores, como
mostra a figura anterior, o que acaba influenciando no processo de erosão
avançando em direção as falésias (SANTANA, 2006, p. 399) alterando diretamente
na força do fluxo das águas.
As chuvas fortes que ocorrem entre os meses de janeiro até abril, como
pontua Santana (2006), acabam deixando o solo com deformações, a qual dificultam
o trajeto de quem caminha pela área. Os manguezais estão avançando para área da
praia, o que acaba resultando o impedimento da passagem dos pescadores.

Figura 24 – Praia de Fortalezinha no período de chuva

Arquivo fotográfico da autora/2018.


Fonte: Arquivo fotográfico da autora/2018.
94

Em terra firme, outra problemática se apresenta animais que vivem soltos


como cavalos e bois, sujam as ruas de fezes e urina, pisoteiam o solo e invadem os
roçados dos comunitários. No centro da ilha está ocorrendo o desmatamento de
muitas árvores centenárias e típicas da região, com motosserras sem a devida
fiscalização, tendo em vista que esta área foi escolhida pela comunidade para ser
preservada e garantida no Plano de Manejo da APA (segundo relatos dos antigos
Coordenadores do Grupo Ambiental que existia em Fortalezinha - GAF).
Os registros acima citados fazem referência às impressões sobre o acesso,
localização, aos aspectos da paisagem natural e espacial, algumas problemáticas
encontradas e relatadas pela comunidade de Fortalezinha, que demarcam a
caracterização do lócus da pesquisa.
95

3. O GRUPO AMBIENTAL DE FORTALEZINHA

Nesta seção apresento o sujeito-objeto da pesquisa, elencando as principais


referências que demarcam a trajetória do GAF, assentada nas narrativas dos
participantes que concederam entrevistas durante a pesquisa de campo,
reconhecendo a importância da memória individual e coletiva dos integrantes e suas
vivências durante atuação no grupo.
Além dessas narrativas, destacam-se, também, os registros de observação de
campo e de observação participante. Relacionando também com algumas
informações obtidas em documentos oficiais, como exemplo o Estatuto Social do
Grupo, bem como compreender quais foram os fatores constituintes de sua criação
e qual foi o papel da comunidade de Fortalezinha durante esse processo.

3.1 Entre memórias e histórias do Grupo Ambiental de Fortalezinha

Alicerçado no instrumental da pesquisa (APÊNDICE B) com os moradores e


agentes externos que atuaram no grupo, foram formuladas 10 perguntas pontuadas
no tópico 2 do roteiro da entrevista, sobre a origem e desenvolvimento do GAF, que
possibilitaram apreender um pouco da história do grupo na vila de Fortalezinha.
Considerando o papel da memória social ou coletiva como fonte de
informações de acontecimentos do passado, possibilitando reconstituir o que foi o
GAF e suas respectivas ações, revelando uma nova possibilidade de compreender o
percurso do grupo na comunidade, por meio de um panorama plural e singular,
específico da realidade pesqueira, substanciado a partir dos dados das entrevistas
da pesquisa de campo, destaco a seguinte citação.

A memória é um elemento essencial do que se costuma chamar identidade,


individual ou coletiva, cuja busca é uma das atividades fundamentais dos
indivíduos e das sociedades hoje, na febre e na angústia. Mas a memória
coletiva é não somente uma conquista, é também um instrumento e um
objeto de poder. São as sociedades cuja memória social é, sobretudo, oral,
ou que em vias de constituir uma memória coletiva escrita, aquelas que
melhor permitem compreender esta luta pela dominação da recordação e da
tradição, esta manifestação da memória (LE GOFF, 2013, p. 435).

Le Goff (2013) ao abordar duas concepções de memória, onde a primeira


designa a memória como um elemento principal da identidade, podendo ser
individual ou coletiva. A segunda sendo a memória social como um processo que
96

emerge a partir da oralidade e subsidia conceitualmente a construção do debate em


torno da memória do Grupo Ambiental de Fortalezinha. Nesse direcionamento, o
estudo das narrativas dos moradores envolvidos, a experiência da ação coletiva,
revela suas respectivas memórias individuais e seus saberes, uma possibilidade de
interpelar a memória coletiva do grupo.
Ao analisar as narrativas desses sujeitos, a história do GAF vai sendo
anunciada em sua incompletude, ao falar sobre memória, sua ocorrência é sempre
atual. Memória e história ocupam lugares antônimos, mas estão entrelaçadas, uma
vez que, “tudo o que é chamado hoje de memória não é, portanto, memória, mas já
história. (...) a necessidade de memória é uma necessidade da história” (NORA,
1993, p. 14).
Ponderar a memória é também ponderar a história, história de vidas, história
de uma comunidade, história de uma cultura, de saberes, de conhecimentos e de
experiências.
Memória, história: longe de serem sinônimos, tomamos consciência que
tudo opõe uma à outra. A memória é a vida, sempre carregada por grupos
vivos e, nesse sentido, ela está em permanente evolução, aberta à dialética
da lembrança e do esquecimento, inconsciente de suas deformações
sucessivas, vulnerável a todos os usos e manipulações, suceptível de
longas latências e de repentinas revitalizações. A história é a reconstrução
sempre problemática e incompleta do que não existe mais. A memória é um
fenômeno sempre atual, um elo vivido no eterno presente; a história uma
representação do passado. Porque é afetiva e mágica, a memória não se
acomoda a detalhes que a confortam; ela se alimenta de lembranças vagas,
telescópicas, globais ou fluentes, particulares ou simbólicas, sensível a
todas as transferências, cenas, censuras ou projeções (NORA, 1993, p.9).

O Grupo Ambiental de Fortalezinha tem sua história assentada tanto na


oralidade de seus respectivos atores, que participaram da ação na comunidade,
quanto na escrita, que foi usada pelo grupo para racionalizar e sistematizar sua
experiência e dá um estatuto de formalidade jurídica e político-pedagógico. Diante
disso, as informações da entrevista com Manoel Teixeira, conhecido na comunidade
como “Preto”, um dos fundadores do grupo, sinaliza o marco inicial do GAF
relacionando com sua vivência em um outro movimento de cunho religioso, e não
ambiental ligado à igreja católica, denominado de JUACRI (Jovens Amigos de
Cristo) tendo como local de atuação a Vila de Algodoal.
Manoel Teixeira relata que durante essa experiência no JUACRI em Algodoal,
percebeu que alguns moradores não atentavam para questão do reconhecimento de
seus direitos, enquanto moradores da localidade.
97

Enquanto morador eu nasci, me criei aqui e aí a gente tinha um trabalho


dentro da igreja, voltada não pra essa da questão [ambiental], mas a
questão religiosa, né, que o grupo de jovens e tudo. E aí eu entreguei aqui,
acho que eu assumi uns dois anos da igreja. Depois eu fui pra Algodoal, aí
organizei esse movimento da igreja né, que era o juacri (Jovens Amigos de
Cristo) e aí, então nessa minha vivência eu percebi que a própria juventude
ali de alguns moradores, eles assim, não tinha muita perspectiva pra essa,
pra essa questão de questionar os direitos deles, né (MANOEL TEIXEIRA).

Manoel Teixeira sublinha que em Algodoal tinha uma Associação Comunitária


de Desenvolvimento da ilha de Maiandeua (ACEDESPIM) que em sua área de
abrangência estava a Ilha de Maiandeua, voltada para as questões do meio
ambiente, organizada por pessoas de fora que estavam morando em Algodoal e
acabaram convidando alguns nativos para participar desse movimento.
Entretanto, segundo Manoel, quem tinha o posicionamento de questionar
sobre a questão ambiental eram os moradores de fora e não os nativos da ilha.
Havia, segundo o mesmo, tanto uma imposição e silenciamento sobre os de “dentro”
pelos “de fora” da comunidade, demarcando uma evidente forma de dominação e
cerceamento de direitos e de participação da população da comunidade, quanto um
certo conformismo por parte da população local, fatores que lhe geraram um grande
incomodo, descontentamento.

Um grupo de pessoas que estavam morando em Algodoal que vieram de


fora e pegaram alguns nativos, né? Pra fazer parte. Só que é assim, quem
questionava não era os nativos, né, era o pessoal de fora pela questão do
entendimento, né? E aí nessa minha vivência dentro da igreja e eles
repassaram assim alguns lances, né, que eles não tinham direito de
questionar, sabe? Então aquilo me incomodou, né? Me incomodou muito e
eu percebia também que eles deixaram muito que o pessoal de fora
tomasse atitudes por eles, entendeu? Com relação a essa questão da
natureza do lixo, né, da preservação da ilha e aquilo me questionava
(MANOEL TEIXEIRA).

Para o entrevistado, a indagação acerca dos problemas ambientais que


interferiam no cotidiano da Vila de Algodoal, decorrentes do crescimento do turismo
local, surgiu com a experiência do grupo de jovens que durou o período de seis
meses. Após esse momento, Manoel Teixeira retorna à Vila de Fortalezinha com a
preocupação em relação ao aumento do lixo que poderia atingir futuramente
Fortalezinha, mas também outros problemas, como turismo e a venda de imóveis
por um preço abaixo da média local.
98

Aí, quando eu entreguei na igreja, fez seis meses a direção lá do grupo do


movimento. Aí, eu percebi que essa problemática da questão do lixo ela
vinha atingir Fortalezinha, então logicamente com os anos, né, o turista ia
descobrir Fortalezinha e consequentemente, os problemas iriam, né,
aumentar aqui, a questão da especulação, a questão do lixo sobretudo, né.
Aí, foi quando eu voltei de lá e fui. Eu reuni os grupos. Os jovens que
estavam comigo na igreja eram mais ou menos uns doze. Então eram todos
os adolescentes com doze anos treze anos. Aí eu tive que ir na Casa dos
Pais, né, pedir pra eles pra gente criar um movimento (MANOEL
TEIXEIRA).

No trecho acima, o entrevistado já sinaliza a primeira movimentação com


alguns jovens da vila para a mobilização do Grupo Ambiental de Fortalezinha, nesse
momento, nota-se que no início, antes da formação do GAF, o grupo que ainda não
era denominado com a temática ambiental, estava vinculado a igreja católica, que na
época concentrava jovens em movimentos sociais internos:

Os movimentos sempre foram vinculado com a igreja, porque a Igreja


Católica, Evangélica sempre criaram os movimentos aqui, né, mas muito
voltado para as questões religiosas, mesmo né. Agora, o GAF esse
movimento, ele surge em parceria com a Igreja com a Igreja Católica,
porque os jovens eram tudo da igreja, na Igreja Católica, né (MANOEL
TEIXEIRA).

Todavia, o GAF surge como o primeiro movimento que se atenta para as


questões ambientais e outras problemáticas sociais da Vila de Fortalezinha, Manoel
Teixeira tem a iniciativa de criar o grupo em conjunto com alguns jovens da
comunidade na época, abaixo descreve o momento dessa organização:

Foi quando a gente nos reunimos, né. Já preocupado nisso, a gente reuniu
numa tarde, ali, na casa da Tia Hilda, reunião mais ou menos, eram doze a
treze jovens, né, todos aqui, mas eles eram adolescentes. Não tinham ainda
assim muita responsabilidade, mas nós nesse dia a gente, nós discutimos e
eu toquei no assunto com relação a questão de Algodoal. A questão do lixo,
né, e foi aí que o pessoal aceitaram, né (MANOEL TEIXEIRA).

Ivan Teixeira morador de Fortalezinha e ex-integrante do grupo em sua


definição sobre o que foi o GAF, reforça a narrativa anterior, frisando sobre a
situação do lixo na comunidade tendo como exemplo o crescimento do turismo
encontrado em Algodoal, mas aponta, também, para o problema da falta de
participação e de responsabilidade do poder público estadual e municipal, bem como
da própria comunidade.
99

A gente via que o fluxo de pessoas tavam aumentando e não se


preocupava com essa questão ambiental, né? Ai então, a gente dizia assim:
“com a demanda do turismo aumentando, logicamente que a questão do
lixo, ela vinha se lastrar cada vez mais, né”. Aí, então surgiu essa
preocupação da gente “poxa, nós tivemos como exemplo Algodoal,
Algodoal na época de férias assim, depois de férias, a gente via que a, a
quantidade de lixo que as pessoas deixavam era muito grande”, aí não tinha
certo tratamento, né? Nem a prefeitura, nem o governo, então deixava muito
à deriva da própria comunidade, mas a própria comunidade em si, não tava
muito preocupada com a questão do lixo (IVAN SOUSA TEIXEIRA).

Ivan ao lembrar do marco inicial do grupo e os anseios dos demais


participantes, demonstra que a memória do GAF estava diretamente ligada à função
de uma sensibilização socioambiental e à participação da comunidade,
fundamentada em saberes, vivências e conhecimentos específicos de uma
comunidade tradicional pesqueira, organizada e operacionalizada de forma coletiva.
Denunciando tanto a ausência da gestão municipal e estadual na
implementação de uma política direcionada para o tratamento do lixo, como chama
atenção para o protagonismo da comunidade e de seus saberes mesmo diante da
falta de condições estruturais para tal, fatores estes que impulsionaram para o
envolvimento com grupo:

Se a gente não tem um, não tem um apoio do município, da prefeitura, não
tem gari, não tem nada, aí, nós mesmo vamo fazer, nós fomo, coletava
todos finais de semana, a gente saia coletando, coletava, colocava num,
num ponto estratégico. Aí e agora como é que a gente vai fazer pra
transportar? vamo transportar? vamo queimar? o que que é pra fazer? Aí,
surgiu essa preocupação, né! Porque lixo a gente não pode tá jogando
também em qualquer canto, nem queimando também, de qualquer forma
vai poluir, né? Aí, então surgiu essa preocupação (IVAN SOUSA
TEIXEIRA).

Pode-se inferir que é nesse momento que os jovens, tendo Manoel Teixeira à
frente do movimento, começam o processo de envolvimento e articulação do grupo
em relação a princípios relacionados a temática ambiental e possíveis implicações
na Vila de Fortalezinha, assim como a inserção de agentes externos que
auxiliassem, também, no processo de criação do GAF.

A gente cria um movimento pra discutir essas questões ambientais, né?


Porque brevemente iria nos atingir e assim e o pessoal daqui, a Ilha de
Fortalezinha, mesmo eles sempre foram muito mais apegados essas
questões, né? De lutar pelos valores da terra, daqui do nosso lugar e foi daí
que a gente pô, mas a gente quer discutir essa questão do lixo. A questão
ambiental, mas a gente precisa, né? Que alguém nos auxilia, nos oriente,
né? Nos dê um norte disso? Foi quando a professora Graça Santana. Ela já
estava aqui pela Vila, né? Como pesquisadora também trazendo outras
100

pessoas. Aí, foi quando surgiu de nós chamarmos a Graça. Ela, né? E ela
fazia parte de toda essa discussão, desse todo esse processo, né? O GAF
surge basicamente nosso daqui (MANOEL TEIXEIRA).

O processo de criação do grupo teve a iniciativa da comunidade de


Fortalezinha com Manoel Teixeira e os moradores que eram jovens na época no
início do grupo, com a faixa etária entre 16 e 18 anos e filhos de pescadores,
motivados para discutir inicialmente as questões em torno das problemáticas
ambientais, mas que não estava limitado apenas ao campo ambiental.
Aqui destaco um elemento que chamou atenção na entrevista, a autoanálise
que Manoel faz sobre si e sobre os outros moradores, em sua fala: “mas a gente
precisa, né? Que alguém nos auxilia, nos oriente, né? Nos dê um norte disso?
(MANOEL TEIXEIRA). A fala de Manoel problematiza um lógica assentada na
racionalidade hegemônica, o interlocutor ao afirmar que precisa do outro para
“auxiliar” o processo de criação de um grupo local provoca uma reflexão acerca de
como estes participantes se reconheciam como moradores e sua autonomia em um
processo de organização de um grupo em uma comunidade pesqueira.
Manoel Teixeira cita também que durante os encaminhamentos para a
formação do grupo fizeram o convite à Graça Santana, que é proprietária de uma
pousada em Fortalezinha, e pesquisadora na época era vinculada ao Museu
Paraense Emílio Goeldi (MPEG)10, por meio do qual já tinha uma aproximação
grande com a temática ambiental e com localidade, pois já havia realizado algumas
visitas à Fortalezinha. Manoel Teixeira convida Graça Santana para auxiliar e
orientar nas decisões e ações que deveriam ser tomadas pela comunidade para
consolidação e estruturação do Grupo.
Graça Santana aparece no contexto de origem do GAF, visto que Manoel
Teixeira e assim como os demais moradores já conheciam o trabalho dela e sua
experiência no campo da pesquisa, em particular com os pescadores na zona do

10
Instituição de pesquisa fundada em 1866 na cidade de Belém (PA), local onde foi o primeiro parque
zoobotânico do país, o Museu Goeldi que é responsável pela estação científica localizada na Floresta
Nacional de Caxiuanã, no Marajó (PA), onde funciona um laboratório avançado sobre as florestas
tropicais. Suas pesquisas estão situadas no campo dos sistemas naturais e socioculturais da
Amazônia, atuando na divulgação de conhecimento, organização e manutenção de acervos de
referência mundial relacionados à região. Investiga a Floresta Amazônica agrupando dados das
Ciências Humanas, Biológicas, Sociais e da Terra. É umas das instituições de pesquisa mais antiga
do Brasil, sendo um dos maiores e populares museus brasileiros, stimulando a apreciação,
apropriação e uso do conhecimento científico.
101

salgado, por meio do projeto RENAS11 (Recursos Naturais e Antropologia de


Sociedades Pesqueiras da Amazônia) do Museu Goeldi.
Graça Santana, que na época estava vinculado ao Museu Paraense Emílio
Goledi, seu entrosamento com a comunidade e com os jovens pescadores foi sendo
estabelecido paulatinamente no decorrer de suas idas à vila, como ressalta no
trecho a seguir:
Eu comecei a falar da ECO 92, eu comecei a falar da finitude do recurso
dos discursos, que havia no mundo inteiro sobre a questão dos recursos
humanos e naturais e eles foram se interessando, eu fui falando da pesca.
Foi o momento que eu entrei no projeto RENAS. Eu falei da pesca, né? o
desaparecimento de vários peixes, né? A pesca predatória a predação do
meio ambiente. (GRAÇA SANTANA).

O contato de Graça Santana foi inicialmente por intervenções artísticas, após


esse momento, Graça Santana se reuniu com o grupo de jovens compartilhando a
experiência do Museu Goeldi em torno do campo ambiental e da pesca. Manoel
Teixeira detalha um pouco desse momento da criação do grupo:

Começou todo um processo, né? Quando a Graça, ela, a gente trouxe a


Graça pra dentro do grupo e ela não vivia aqui, né? Ela vinha muito pouco
assim, final de semana, férias, feriados. Ela era Coordenadora, mas que
ficava lá em Belém repassando essas informações pra gente, né? E eu
ficava aqui tanto que eu viajava, por exemplo, às vezes a gente discutia as
coisas aqui, né? Organizava o nosso organograma, né? De atividades. Mas
eu ia pra lá com ela. Todas as informações, né? Lá no museu e essas
informações eu trazia pra dentro da comunidade. Eu reunia toda a
juventude e a gente começava a trabalhar, né? Então a gente tinha todo um
planejamento baseado nas orientações dela (MANOEL TEIXEIRA).

Graça relata que a aproximação com a comunidade se deu com sua chegada
à localidade no ano de 1996, em uma viagem a passeio, por intermédio da
Secretária da Coordenação de Ciências Humanas do Museu Paraense Emílio
Goeldi, etapa inicial em que a pesquisadora relembra o momento em que se
aproxima da Vila e os enredos de suas conversas com os moradores, citando alguns
elementos temporais das discussões em torno da área ambiental, das matérias
11
Os primeiros estudos sobre populações pesqueiras amazônica realizados pela equipe de
antropólogos do Museu Paraense Emilio Goeldi datam dos anos 1967, através dos projetos
Marapanim, Quatipuru, Marajo e Antropologia da Pesca, com Lourdes Gonçalves Furtado, Isolda
Maciel da Silveira, Maria José Carvalho Brabo, Ruth Cortez, Ivete Nascimento e Arian Nery (in
memória). Os três primeiros financiados pela Fonte do Tesouro e pelo CNPq, e o último pela
Superintendência do Desenvolvimento da Amazônia (SUDAM) através do PoloAmazônia. Os três
projetos inicias deram origem ao Projeto Recursos Naturais e Antropologia das Sociedades
Marítimas, Ribeirinhas e Estuarinas da Amazônia: Relações do Homem com o seu Meio Ambiente
(RENAS), concebido no início de 1990, pela antropóloga Lourdes Gonçalves Furtado, e nesse
mesmo ano foi iniciada a captação externa de recurso financeiros.
102

primas encontradas na comunidade, da interferências do ser humano na natureza e


as decorrentes situações da pesca na Amazônia, expressando que os jovens
começaram a manifestar interesse pelos assuntos abordados durante suas idas à
Fortalezinha.
Eu fui ficando. Fui indo mais para Fortalezinha e comecei a me entrosar
com a comunidade, com a comunidade de jovens, né? Pescadores que
vieram até a mim e começaram a conversar e certo dia, eu estava fazendo
máscaras e eles pediram que eu fizesse uma máscara de carnaval de palha
de coco e foi assim que eu comecei a ter esse entrosamento e depois nós
reunimos (GRAÇA SANTANA).

Ocasionando assim, o delineamento do momento de sua participação e da


comunidade na formação do Grupo, em fevereiro de 1997:

Eu fui colocando isso e a gente reunia na casa uma casa vizinha da dona, a
mãe da dona Ezidia. Eu reuni esses jovens e começava a falar sobre isso e
depois eu comecei a levar a pequenos textos que mostrava essa relação
homem - meio ambiente desde a pré-história e tudo comecei, a ler uma
série de coisas com eles, ouvir música e tal. Aí, um belo dia fui convidada
para criar o grupo. Aí eu disse: “olha o grupo ele tem que ter um nome”, aí
todo mundo, disse: “ah, tudo bem, a gente escolhe o nome”. Aí eu coloquei
uma panela no meio da casa e eles fizeram assim, num papel vários nomes
e colocaram dentro da panela e depois nós sacudimos e o nome que saiu
foi o nome Grupo Ambiental de Fortalezinha e todo mundo acatou (GRAÇA
SANTANA).

O grupo surge da comunidade. A comunidade, não é eu que chego lá. Eles


vêm se aproximam de mim, eu fazendo aqueles trabalhos. Eles perguntam
como é? Não havia assim uma pergunta direta, porque não era, eles não
tinham essa intenção. Foi a gente trabalhando e assim fazendo oficinas
mesmo de artesanato. Eu dizia pra eles, muita matéria prima que eles
poderiam fazer várias coisas com aquele material. Eu dando incentivo disso
(GRAÇA SANTANA).

O envolvimento de Graça Santana na constituição do Grupo era de auxiliar os


jovens moradores e a comunidade na organização das ideias, expectativas e
demandas colocadas em pautas durantes as primeiras reuniões, para que fossem
realizadas propostas de intervenção e ações que pudessem amparar na solução de
problemas enfrentados no dia a dia dessas pessoas.
Como destaca a pesquisadora do Museu, o desejo da comunidade passou a
manifestar múltiplos temas, haja vista o conjunto de problemas estruturais a que ela
estava condicionada, demarcando processos de falta de oportunidade para enfrentar
essa estrutura social desigual e excludente da sociedade brasileira, em particular
dessas comunidades rurais-ribeirinhas tradicionais da Amazônia.
103

A gente começou a organizar a programação a partir dessas pequenas


reuniões, das demandas que eles tinham naquele momento. Aí, eles
falaram que gostariam de ter um grupo ambiental que trabalhasse a relação
homem e meio ambiente, mas eles não queriam só a parte do
comportamento de juntar lixo e tal, eles queriam também outras coisas. Aí,
eles falaram: "olha aqui, nós não temos uma escola pro segundo grau, só
temos pro primeiro grau, se a gente quiser estudar tem que atravessar
aquele rio que fica um pouco distante do continente. A questão da saúde, a
questão da cultura, falaram da cultura do artesanato que eles gostariam
muito que isso fizesse parte da nossa programação. Aí, a gente começou a
fazer várias programações baseada nas conversas que nós tínhamos,
incentivar o artesanato, levar pessoas que dessem um melhor orientação
melhor sobre os instrumentos musicais, principalmente os tambores, né?
(GRAÇA SANTANA).

No primeiro trecho revelado, identifica-se que as discussões no grupo


estavam direcionadas para além do campo ambiental e a temática do lixo, eram
abordados temas sociais diversos, como exemplo: a precariedade da educação e
saúde, a ausência de políticas públicas, restrita oportunidade de trabalho e geração
de renda para os moradores, ratificado da mesma forma na fala de Ivan Teixeira:

Aí, fomos trabalhando dessa forma, fomos trabalhando, trabalhando, aí,


outras coisas que a gente via também que havia necessidade de trabalhar
dentro dessa parte do meio ambiente era artesanato também, né? Aí, como
eu trabalhava, agora não que eu não trabalho mais, mas eu trabalhei muito
com artesanato (IVAN SOUSA TEIXEIRA).

Os aspectos acima, podem ser considerados também como complementos na


memória e história do GAF, conduzindo-se pela memória da vivência, que para Nora
(1993) é a memória verdadeira, onde circulam saberes em silêncio:

Sem dúvida é impossível não se precisar dessa palavra. Aceitemos isso,


mas com consciência clara da diferença entre memória verdadeira, hoje
abrigada no gesto e no hábito, nos ofícios onde transitem os saberes do
silêncio, nos saberes do corpo, as memórias de impregnação e os saberes
reflexos e a memória transformada por sua passagem em história, que é
quase o contrário: voluntária e deliberada, vivida como um dever e não mais
espontânea; psicológica, individual e subjetiva e não mais social, coletiva,
globalizante (NORA,1993, p.14).

Para o autor há uma diferença entre memória verdadeira e memória


transformada, a primeira é a memória preliminar da experiência, assentada aos
saberes decorrentes do hábito e gesto, na qual se observa uma equivalência como o
comentário anterior de Bosi (1993) quando se observa o trabalho da pesca, do
artesanato e outras práticas reveladas nas narrativas dos sujeitos sobre a origem do
GAF, identificam-se outros saberes decorrentes dessas ações, como: saberes da
104

pesca, saberes do artesanato, saberes medicinais entre outros, saberes em silêncio


na lembrança do grupo.
Um silêncio e esquecimento que é ocasionado, nos termos de Boaventura
Santos (2001, 2006, 2010), pelo paradigma hegemônico da ciência moderna
ocidental, em particular pela sua “razão indolente”, que produz a não-existência de
outros saberes e desperdiça experiências plurais, provocando o “epistemecídio”
(SANTOS, 2005).
Já a memória transformada tem uma rigidez em sua base, não condiz com a
espontaneidade dos atos, assim não há um saber resultante dessa memória.
Embora, a pesquisa não objetive compreender tais saberes destacados, tornam-se
pertinente as contribuições de Bosi (1993) nesses elementos da memória, sobretudo
na percepção da função social que essas práticas exerciam no grupo.
Em prosseguimento ao processo de criação do GAF e as conexões externas,
Manoel Teixeira comenta tais contribuições que o grupo recebia com a interação de
outros profissionais, com interlocuções externas com Graça Santana:

Com isso, a gente foi evidenciando todo o nosso potencial que a gente
tinha, por exemplo, pra discutir essas questões ambientais, discutir política,
né? E discutir outras coisas que isso nos questionava, por exemplo, a
questão dos talentos mesmo, né? Porque a gente tem um celeiro de
pessoas que, que trabalham com uma infinidade de coisas, né? Como
artesanato, a cultura mesmo e aí, a gente foi descobrindo isso, foi emergido
essas coisas a partir do GAF, né? Porque reunia, discutia coisas. E essa
interação com o pessoal, né? Que a Graça trazia, fez a gente despertar
muitas coisas, né? Essas coisas, a gente discutia essas questões, né? E a
gente também discutia esses nossos valores, né, esses nossos valores,
mas o GAF, a ideia do movimento, era a gente potencializar novas
lideranças pra que quando a gente Nós morremos mais fortificando, né?
Repassando de geração pra geração, né? Como os nossos antepassados,
né? que não tem diploma de academia, né? De universidade, Mas dentro do
saber deles, eles foram repassando (MANOEL TEIXEIRA).

Considerando os aspectos apontados tanto na fala de Manoel Teixeira como


de Graça Santana, interpreta-se que havia uma correlação entre os motivos para a
criação do GAF, oportunizando compreender o envolvimento de ambos, porém com
delimitações em suas funções.
Procedendo das narrativas desses sujeitos, observa-se que Manoel Teixeira
enquanto morador e sua vivência em movimentos com grupos anteriores,
organizava os jovens que tinham a pretensão de envolver-se em um grupo na vila,
intencionando construir uma autonomia coletiva com os outros integrantes. Já Graça
105

Santana atuava coletivamente na orientação e sistematização mais técnica dos


procedimentos, adequando às necessidades anunciadas no grupo.
Importante mencionar que as informações, repassadas pelos dois
entrevistados, foram selecionadas para compor a apresentação inicial da trajetória
temporal do GAF, aceitando as manifestações dos demais sujeitos da pesquisa, que
quando eram interpelados sobre a origem do grupo, faziam uma observação para
atuação de Manoel Teixeira e Graça Santana, como verifica-se nas falas de Cleide
Martins e Ivan Teixeira, integrantes entrevistados:

Como te falei, quando eu participei já era fundado, não sei quando ele
surgiu, só quem pode te responder é o Preto que já participava. Eu acredito
que foi deles, da Dona Graça, do Preto. Eu não sei te responder assim qual
o motivo que eles criaram, mas eu acho que foi assim sobre o
desenvolvimento na comunidade, né? Porque na época que tinha o GAF,
não tinha outra atividade, só era o GAF mesmo, não tinha outro grupo, né?
Ambiental, só era ele mesmo. (CLEIDE MARTINS).

Aí, eu foi convidado na época pra trabalhar com, pra participar do grupo,
que era o Grupo Ambiental de Fortalezinha, o GAF. Aí, eu fui convidado, eu
não sou um dos fundadores, mas eu fui convidado assim, tava recente,
acho que tinha, tinha uns seis meses que tinha sido fundado. Aí, os
meninos tavam procurando membros, fazendo a inscrição, preencher ficha
pra participar, mas eu já conhecia um pouco do trabalho, porque eu convivia
aqui, via eles trabalhando tudo. Aí, que geralmente chamava atenção, né?
Ai foi, me lançaram o convite e eu aceitei e fui participar, já como, como
convidado, não foi como fundador, né? (IVAN SOUSA TEIXEIRA).

O enunciado de Ivan Teixeira mostra como era feito o processo de


participação dos integrantes, por meio de registros formais com fichas de inscrição,
para que fosse caracterizado o vínculo entre o participante com o grupo. Sendo os
primeiros encaminhamentos para a instalação de diretrizes legais do GAF.
A data de fundação do grupo foi em 18 de fevereiro de 1997, no entanto
apenas em 30 de dezembro de 2003 foi aprovada a proposta do Estatuto Social no
barracão Comunitário da vila de Fortalezinha. Em março de 2006 o Estatuto Social
do grupo foi aprovado e com base no Art. 2º do Estatuto Social desse documento, o
GAF tinha como objetivo incentivar ações educativas voltadas para a melhoria da
qualidade de vida da vila de Fortalezinha e das outras comunidades de Maiandeua,
sendo uma entidade civil, de direito privado, de caráter socioambiental, abaixo
encontra-se o documento de certificação do Grupo Ambiental de Fortalezinha:
106

Figura 25 – Documento de Certificação do Estatuto Social do GAF

Fonte: Arquivo fotográfico da autora/2018.

Nos princípios normativos que regem a certidão estavam pautados os


seguintes objetivos: a promoção, incentivo e apoio a educação ambiental nas
comunidades da ilha de Maiandeua; alcance de recursos nas esferas do Governo
Federal, Estadual e Municipal e financiadores nacionais e internacionais; realizações
de pesquisas para o desenvolvimento da educação ambiental; incentivo a eventos e
formações que viabilizem soluções para os problemas encontrados no contexto da
ilha de Maiandeua.
Fomento, sustento e fortalecimento das organizações sociais de agentes
multiplicadores, intencionando contribuir na qualidade de vida da população local;
mover atenção da comunidade para ações de educação ambiental e atividades de
lazer e esporte, como parte integrante da educação das pessoas da comunidade;
defesa e luta pelos interesses da comunidade; auxílio técnico às comunidades
pesqueira na elaboração e implantação de projetos de pesquisa e educação
ambiental, programas sociais, cultural, turismo, transporte, trabalho, comunicação,
infraestrutura, energia e segurança.
Viabilização de eventos com lideranças locais e poder público, a fim colocar
em debate problemas sociais e ambientais do município; realização de intercâmbio
de vivências e informações do município com instituições especializadas Estaduais,
Nacionais e Internacionais; luta pela defesa dos interesses da comunidades e seu
107

patrimônio social, cultural e ambiental; promoção do cumprimento da legislação que


ampara os objetivos elencados; valorizar a tradição cultural da localidade.
Segundo o capítulo II do Estatuto Social do GAF, apresenta quatro tipos de
sócios: sócio fundadores, aqueles que participaram da Assembleia Geral de
Fundação do GAF e tinham direito ao voto e ser votado em todos os níveis e
instâncias; sócios efetivos, aqueles que colaboravam com a melhoria da qualidade
de vida da população; sócio beneméritos, pessoas físicas ou jurídicas que
elaboravam ou prestavam serviços à causa ambientais e sócio colaboradores,
pessoas que solicitavam por escrito para ingressar no grupo, tendo sua solicitação
deferida pela Coordenação Geral.

Gráfico 02 - ÓRGÃO DELIBERATIVOS DO GAF

Fonte: Estatuto Social do GAF, 2006.


108

Gráfico 03 – Principais Eixos Temáticas do GAF

Fonte: Estatuto Social do GAF, 2006.

Nessa organização também estava o Conselho Fiscal que atuava no


direcionamento da contabilidade do grupo, recurso financeiro que era a contribuição
de R$ 1,00 (UM REAL) para os membros moradores da comunidade e R$ 2,00
(DOIS REAIS) para os membros que moravam em Belém; os Patrimônios que eram
os bens adquiridos, doados ou transferidos ao grupo; das deliberações, as diretrizes
e recomendações ao GAF tomadas em consenso.
E por fim as disposições finais, que tratam da definição e dos objetivos do
GAF, como instância de mobilização social na relação entre as pessoas da
comunidade com o meio ambiente. No que tange à proposta do GAF, os
entrevistados especificaram algumas informações com dimensões distintas, alguns
comentaram a respeito da proposição do grupo com direcionamento apenas para a
questão ambiental, já em outro momento relataram sobre o reconhecimento da
cultura local, sobre a relação de pertencimento com o lugar, a construção da
autonomia e da percepção do mundo, exemplificados nas narrativas de Ivan
Teixeira, Said de Nazaré Senado, Jacinto Teixeira, Manoel Teixeira e Graça
Santana:
A nossa proposta era trabalhar com a questão ambiental mesmo, fortalecer
essa questão ambiental, pra tipo assim, pra preparar as pessoas também os
jovem né? Não só os jovens como os adultos também né, trabalhar essa
questão ambiental que era a preocupação nossa era essa questão
ambiental (IVAN DE SOUSA TEIXEIRA).
109

A proposta inicial do grupo era preservar as culturas e fazer com que o


nativo, o pescador, tivesse uma outra percepção do mundo, tá entendendo?
E com que ele também passassem pra que as pessoas tivessem uma outra
percepção dele. Então, foi basicamente isso né? Homem e meio ambiente,
esse era o slogan do grupo, assim, sempre foi ligado a isso (SAID DE
NAZARÉ SENADO).

Na verdade a proposta do grupo era educação. Educar principalmente os


jovens, né, da importância da importância do meio ambiente, no qual a
gente vive, né? Essa era uma das grandes, grande meta da gente
(JACINTO TEIXEIRA).

Na verdade era a gente se preocupar com aprender, essas questões


ambientais, né? E repassar não só pros moradores, mas também pros
turistas, né, sobre essas questões do lixo, né? Aproveitar o que a gente
pudesse reaproveitar, né, e reciclar, o que pudesse reciclar, porque nós
fizemos várias atividades de reciclagem, mas na época e também a
proposta era de valorizar. A potência local, né, os nossos artesãos, né, da
evidência pra essas pessoas, né? E digamos também potencializar esse
sentimento de pertencer a esse lugar tão bonito, né. Onde nós nascemos,
estávamos criando, então era mais ou menos, mas a espinha mesmo
dorsal. A preocupação é dele mesmo total era a questão ambiental, mesmo
né (MANUEL TEIXEIRA).

Para os posicionamentos acima, ocorrem pontos de convergências de uma


proposta educativa com o meio ambiente, no entanto, há uma observação para fala
de Said Senado, em que aborda a denominação do “homem e ambiente”, partindo
de uma leitura crítica para determinado termo, que pode expressar uma visão
machista para slogan do grupo. Interpreta-se que o entrevistado analisa o aspecto
cultural e sua concepção para as características do homem da localidade, que é o
nativo da vila, o pescador, o morador e sua interação com a questão ambiental.
As informações dos entrevistados direcionam que o grupo caminhava no
sentido de um fortalecimento na formação de uma nova geração sensível à temática
ambiental. Assim, em uma interface com o campo do conhecimento do enfoque do
saber ambiental de Leff (2012) associando ao entendimento das falas acima,
interpreta-se que a locução “questão ambiental e ambiente” tem conexão com os
preceitos da epistemologia ambiental, como mostra a seguir:

O saber ambiental transcende o conhecimento disciplinar; não é um


discurso da verdade, mas um saber estratégico que vincula diferentes
matrizes de racionalidade, aberto ao diálogo de saberes. O saber ambiental
constitui novas identidades onde se inscrevem os atores sociais que
mobilizam a construção de uma racionalidade ambiental e a transição para
um futuro sustentável. (...) O saber ambiental constrói sua utopia a partir do
potencial do real e da realização do desejo que ativa e da realização do
desejo que ativa princípios materiais e significações sociais para a
construção de uma nova realidade – de uma racionalidade social alternativa
–, na qual se verificará sua verdade como potência, mobilizando processos
110

para a realização de certos objetivos, ativando a potência do real e do


simbólico, da natureza e da cultura (LEFF, 2012, p.47).

Ao optar-se em relacionar o saber ambiental com a proposta do grupo,


partindo do pressuposto que há uma pluralidade e complexidade ambiental e
cultural, verificada nas falas dos entrevistados, como é citado abaixo na fala de
Graça Santana:
A proposta do grupo era homem e meio ambientem, eles diziam: “queremos
um trabalho que envolva o homem e o meio ambiente”. Aí, foi quando eles
falaram sobre a educação, primeiro foi a questão da educação, né? Que é
eles estudavam longe. A escola só tinha o primeiro a primeira série de
primeiro grau, né. Aí, eles me falando: “antigamente aqui a gente tinha um
boi, antigamente a cultura”, eles falavam “quero que bote isso mais”
(GRAÇA SANTANA).

Sobre a função que integrantes exerciam no GAF, os entrevistados elencaram


suas atribuições desenvolvidas durante o período que o grupo estava em
funcionamento. Ivan Teixeira comenta como se deu a sua trajetória no grupo, que
começou como convidado e depois passou a ser o coordenador, embora não lembre
o período certo que exerceu a função:

Cara, eu antes eu era como convidado depois, depois os meus colega viram
o meu desenvolvimento né, que eu desenvolvi, tipo assim dentro da
instituição, aí, no final eu já fui, me lancei a candidato a pré-coordenador,
né? Aí, acabou que ia ficando na minha mão a coordenação, nem lembro
mais o ano, mas acho que foi dois mil, dois mil e dois por ai assim (IVAN
SOUSA TEIXEIRA).

Ivan também ressalta que o grupo apresentava um cronograma de atividades,


voltado para coleta seletiva, confecção de lixeiras, coleta de materiais para oficinas e
era a partir desse cronograma que todas atividades eram realizadas de forma
voluntária pelos integrantes.

Coordenava as atividades, também é, coordenava as atividades, porque a


gente tinha dentro da coordenação. Cronograma né? Tal dia fazia uma,
passava o cronograma tudinho, aí como a gente trabalhava voluntário a
gente não podia tá trabalhando também todos os dias, né? A gente tinha
nossos afazeres também, a gente marcava tal dia tem campanha seletiva,
tal dia nós vamos confeccionar mais lixeira, tal dia nós vamos coletar esse
material, porque não era uma oficina só um dia pra coletar o material pra
fazer vinte lixeiras, trinta lixeiras. Então, tudo tinha uma demanda entendeu,
aí a gente marcava três, quatro, cinco dias assim, porque nem todo mundo
vinha também né? Mas a gente trabalhava dentro do cronograma de
atividades (IVAN SOUSA TEIXEIRA).
111

Said Senado ao falar sobre sua atuação na coordenação de esporte e lazer,


salienta, além da vivência com os turistas visitantes no período das férias nos meses
de julho, as atividades com proposta de mobilização sobre a cultura, frisando a
prática do avoado, que, de acordo com Said, é o prato principal do moradores tendo
como base os ingredientes: peixe assado com farinha, geralmente realizado em
coletivo na beira da praia ou em quintais.

A minha função no GAF, eu sempre fui coordenador de esporte, de algumas


atividades, como o rally ecológico, a coleta seletiva do lixo. Então, eu, o
Ivan, o Pelado, o Reginaldo, Wanilson, outros nativos, a gente colocavam o
grupo em funcionamento quando essas pessoas, Preto, e os outros, Graça,
que moravam em Belém, moravam na cidade e não estavam aqui na
comunidade. Então, os nativos juntos faziam as atividades e nas férias a
gente fazia um movimento de propaganda e de conscientização do turista
na comunidade né. Conscientizando sobre as suas atividades, sobre as
culturas, ela tá ligada com o esporte. Eu entrei no GAF como um
comentador do esporte e da qualidade de vida gerada através disso, né, do
surf, de ciclismo. Era o surf, a bike, a caminhada. A gente fazia muita trilha,
muita natação. E essa vivência também de ensinar as pessoas de fora a
conhecer, a fazer um avoado, a fazer que é o nosso prato principal aqui,
que é o peixe assado com farinha fazemos bastante, mas nessa época o
avoado era pauta de férias, então, a gente ensinava os turistas a fazer o
avoado, ensinava as pessoas a fazer fogo (SAID SENADO).

Jacinto Teixeira ao comentar sobre sua função no grupo destacou que foi vice
coordenador, mas não mencionou o ano. Já Graça Santana foi coordenadora do
grupo por quatro anos, relata também uma das etapas desse período:

Eu fui coordenadora geral do GAF, né. Eu passei quatro anos como


coordenadora. O resto foi a parte que nós trabalhamos as reuniões.
Entrosamento e sensibilização até chegar a parte da criação do grupo e a
formação do estatuto (GRAÇA SANTANA).

Lúcia Santana, agente externo, também pesquisadora do Museu Goeldi,


destacou que antes do processo de institucionalização do grupo, sua função foi
sendo estabelecida de forma processual, com trabalhos no campo da arte e
ludicidade, desenvolvida com as crianças da comunidade.

Logo no início era uma participação não institucionalizada, né? Não havia
aquela coisa formal. A gente foi fazendo as coisas devagarzinho e eu além
de ser filha da Graça, né, eu gostava muito de tá trabalhando com ações
primeiro voltada para as crianças, né? Então fiz muitas brincadeiras com as
crianças, as atividades de teatro com as crianças eu me identificava muito
com essa parte de trabalho com as crianças. O grupo trabalhou
informalmente com pessoas da comunidade e com muita gente que também
gostou, né (LÚCIA SANTANA).
112

Ainda sobre a coordenação do grupo, ela acontecia em dois endereços:


Fortalezinha e Belém, respectivamente a sede e subsede na residência de Graça
Santana. Manoel Teixeira relata como se dava a logística do grupo entre as duas
localidades e como era sua função antes do Estatuto ser registrado.

Olha, eu sempre fui coordenador do GAF, né. Aqui na época que ele não
tinha registro, né, como uma empresa, de fato de direito, né, eu sempre fui o
coordenador porque nós trabalhamos assim, a Graça ficava em Belém, era
coordenadora e eu ficava aqui como coordenador também. Então, a gente
fazia essa ponte, às vezes eu ia pra lá. A gente discutia com os nativos que
moravam lá. A gente reuniu na casa Graça. A base era aqui, mas a gente
tinha um núcleo lá na casa dela, né. Depois que a gente formou a diretoria,
eu fui vice coordenador, já com a diretoria formada mesmo porque eu não
quis assumir porque não tinha muita capacidade de gerenciar uma
empresa, né. Eu precisava aprender aí, nós colocamos a Graça como um
Presidente do GAF e eu era o vice (MANOEL TEIXEIRA).

Partindo da fala de Manoel Teixeira registrada acima, observa-se que o


entrevistado atribui o sentido de empresa ao grupo, o que pode estar relacionado ao
processo de construção do registro do estatuto e das diretrizes de organização do
GAF, que ao ser analisado por Manoel Teixeira faz uma comparação com sentido de
empresa. Manoel Teixeira fez parte da coordenação do GAF, após a estruturação
do grupo passou para Graça Santana.
Sobre a experiência no GAF, Ivan Teixeira e Lúcia Santana demarcam sobre
a importância do grupo em suas respectivas formações e também das ações
promovidas pelo GAF:
Cara, a experiência foi muito boa, só cresci, fortaleci o meu conhecimento,
né? E com essa questão ambiental também, que eu também não tinha tanto
conhecimento, mas aí eu adquiri, fui adquirindo conhecimento através das
palestras, de pessoas que já tinham uma certa influência voltada pra essa
questão aí. Então, cara, eu não tenho nada o que dizer assim do meu
tempo que eu participei do grupo, porque eu adquiri muito conhecimento,
experiência também, né? Foi legal mesmo, não me arrependo não e
também não tenho nada de dizer de mal não (IVAN SOUSA TEIXEIRA).

Ele me formou. Sabe aquele período que você tá entre dezessete e dezoito
anos e que esse é o seu grande ensaio de cidadania. Eu acho que o GAF
foi meu ensaio de cidadania. Uma menina que vinha da cidade de Belém, já
acompanhava a mamãe em alguns processos de pesquisa, mas quando eu
comecei a perceber que o mundo da pesca era o mundo aonde tinha muitas
vulnerabilidades, né? No sentido assim da desvalorização do pescador, da
desvalorização das mulheres, do trabalho das mulheres, né? Do
desperdício também porque as vezes eles tinham muita fartura de peixe,
mas não tinham como escoar, da dificuldade do acesso, de uma passagem
cara, né, distante mesmo de acesso, vinculado à questão da informação
sobre direitos humanos, sobre cidadania, então fui começando a perceber
todas essas vulnerabilidades e a partir disso eu quis me engajar (LÚCIA
SANTANA).
113

Nessa continuação, Said Senado e Jacinto Teixeira situam suas experiências


como um processo de aprendizado significativo, relacionado como uma filosofia de
vida que mudou o entendimento da interação entre o turista e a comunidade, assim
como na troca de conhecimento com outros profissionais que ministravam palestras.

Pra mim foi incrível, eu absorvi tudo assim. Eu me tornei tudo, tudo o que o
grupo tinha. Aquilo me identificou de uma maneira, que eu absorvi aquilo
pra mim. Tipo, eu vivo a ideia desse grupo até hoje, assim, tipo, hoje eu sou
o GAF, tipo, não é que eu queira não, é que a minha vida se tornou isso né?
Até de cuidar dos turistas, de cuidar das pessoas, eu tenho ainda isso,
sabe. Então isso é o GAF, menos capital, mais nativismo mesmo, né?
Valorizar mesmo o ser nativo. Ao ser nativo, a estar ali, nativar e ser
daquela região e sobreviver daquela região, né? Então é um estilo de vida.
Você vive um nativismo, né? (SAID SENADO).

Olha, foi uma experiência ótima, né. Foi uma experiência assim, que a
gente teve grandes conhecimentos, chegava as pessoa também de grandes
conhecimentos, né? Pra discutir com a gente, conversar, e mostrar a
realidade da importância do meio ambiente (JACINTO TEIXEIRA).

Manuel Teixeira destaca que a sua experiência no grupo, possibilitou um


aprendizado, amadurecimento e crescimento no campo profissional:

Pra mim foi uma experiência assim muito, muito marcante, muito boa, né,
que me proporcionaram conhecer, pessoas de vários nível, né? E
profissional. Também me levaram pra conhecer outros mundos, não só a
cidade de vocês, mas também outros estados, né, e também pessoal. Só foi
um impulso pra mim sair um pouco mais daqui, entendeu? E descobrir
outros horizonte, né? descobrir outras ilhas de conhecimento (MANOEL
TEIXEIRA).

As ações realizadas pelo grupo durante seus dez anos de atuação na


comunidade, informadas pelos interlocutores foram: campanha seletiva, confecção
de lixeiras, de placas de advertência, palestras nas escolas da comunidade, limpeza
de áreas públicas, poços e praia, rodas de conversas e atividade de esporte e lazer
e a realização de alguns cursos.

A gente fazia a campanha seletiva, né? Confeccionava lixeiras, trabalhava


com palestras nas escola com crianças e adolescentes, a gente trabalhava
na limpeza também de áreas públicas que tinha, que nem aquela praça lá
hoje, se tu ver aquela praça ali, foi graças a gente aqui que limpamos
aquela área e mapeamo tudinho, conservava aquela área limpa sabe, pra
que ninguém fosse construir nada lá, aí com uma época surgiu um trabalho,
um projeto do governo, aí foi que foi cedido pra fazer aquela praça lá, se
não hoje num tinha nada. Aí, a gente trabalhava na época como não tinha
energia, não tinha água encanada, trabalhava com os poços né? A gente
fazia trabalho de mutirão na limpeza dos poços (IVAN SOUSA TEIXEIRA).
114

Olha, o GAF tinha uma das ações, além da coleta seletiva do lixo, ele tinha
toda a dinâmica de criação artística, interação com a escola, com a escola
municipal, com as atividades ligado a educação, todas elas, fazer a ponte
da interação entre pesquisadores e pescadores e nativos, pescadores e
pescadoras, mas, a atividade principal dele era: criar um diálogo, um
comando, então o GAF ele criava um momento de conversação. Então, a
partir do GAF as pessoas se expressavam, colocavam suas vontades de
falar e juntos se criavam uma maneira de falar (SAID SENADO).

Consideração duas falas, tanto de Ivan Teixeira e quanto de Said Senado,


sinalizam-se as ações do grupo como momentos de interação entre o GAF e a
comunidade, ações que estavam direcionadas para atuar na melhoria de algumas
problemáticas da realidade da vila, o que indica que na época de atuação do grupo
não havia uma gestão estadual nem municipal efetiva de intervenções básicas,
como a limpeza da vila. Dessa forma, com base nas narrativas apresentam-se as
principais ações desenvolvidas pelo GAF em Fortalezinha.

QUADRO 04 - Principais ações do GAF


 CAMPANHA SELETIVA
 CONFECÇÃO DE LIXEIRAS
 PALESTRAS NA ESCOLA DA COMUNIDADE
 LIMPEZA DE ÁREAS PÚBLICAS DA VILA
 CONSERVAÇÃO DE ÁREAS LIMPAS
 LIMPEZA DE POÇO
 MULTIRÃO DE LIMPEZA
 ATIVIDADE DE ARTESANATO
 EXPOSIÇÕES ARTISTICAS
 ATIVIDADES RECREATIVAS NA PRAIA
Fonte: pesquisa de campo/2019.

Comparando com a realidade encontrada no período em que estive durante a


pesquisa de campo entre os meses de abril de 2018, setembro de 2018, setembro
de 2019 e janeiro de 2020, infelizmente, ainda não há uma política pública de
limpeza do lixo no cotidiano da vila, dado este que foi verificado em algumas
conversas com moradores, por meio das quais fui informada que não acontece
coleta regular do lixo em Fortalezinha.
Uma moradora repassou a seguinte informação, de que atualmente, quem faz
o recolhimento do lixo de forma voluntária são jovens de um grupo denominado
Grupo Amigos de Maiandeua (GAMA) em período de férias e festas de final de ano,
a prefeitura de Maracanã, apenas faz o transporte através da vila de Algodoal do lixo
de Fortalezinha uma ou duas vezes ao mês.
115

Acerca do posicionamento de Said Senado, quando cita a interação com a


escola, menciona que a escola apenas era usada como espaço para a realização
das palestras sobre as questões ambientais com outros profissionais, realizadas
para os moradores da comunidade.
As ações tinham também o aspecto cultural no carimbó e artesanato em seu
princípio organizacional, como é citado pelos entrevistados Jacinto Teixeira e Lúcia
Santana:
As ações de limpeza, as ações de fazer a jornais, né? De informações e
lixeiras, a gente fazia lixeiras, fazias limpeza nas praia, né? E programavas
algumas cultura como carimbó, as vezes quadrilhas, né? E assim
sucessivamente (JACINTO TEIXEIRA).

Nós fizemos muitas ações, o grupo ele tinha toda uma estruturação, tinha a
coordenação geral a vice coordenação, né, a parte de turismo, tinha a parte
de educação ambiental, tinha a parte de cultura. Então, as segmentações,
mas, por exemplo, as atividades que mais se saiam, né, era a atividade de
artesanato. Os meninos tinham uma grande capacidade de fazer cordões,
pássaros, utilizando fibras, coco folhagem, muito voltado pra questão da
natureza, também a valorização do que a água deixava a floresta deixava e
como que você poderia transformar aquele objeto que estava ali, o aliás
daquela matéria-prima num objeto estético, então havia uma filosofia de se
valorizar essa natureza, então a questão foi muito forte. A principalmente a
questão do carimbo também, que quando nós chegamos lá os mestres de
carimbó, eles estavam muito embaixo. Não havia essa visibilidade hoje que
a gente tem patrimônio cultural brasileiro, que é o carimbó, né? (LÚCIA
SANTANA).

Nesse aspecto, a cultura local foi um dos pilares para as ações desenvolvidas
pelo grupo, evidenciando a temática ambiental e sua relação com a questão cultural
e também para o trabalho, envolvendo também elementos do cotidiano e da
natureza, como base de matéria prima, a habilidade do artesanato de alguns
moradores exerciam além da pesca.
Assim como também o carimbó, que na década de noventa ainda não tinha
visibilidade, nem reconhecimento dos mestres que viviam na comunidade. Ações
envolvendo a confecção de instrumentos musicais, também havia ações de esporte
e lazer como o rally ecológico, a trilha que acontecia na vila, ações voltadas para
capacitação de turismo de base comunitária e ações voltadas para área da saúde.
Ao situar a localização de Fortalezinha como uma das Vilas mais visitadas de
Maiandeua e seu contexto inserido em uma Área de Proteção Ambiental, foi
verificado se o grupo tinha alguma relação com a APA/ Resex e com os Turistas.
Segundo os entrevistados, a criação do GAF foi anterior à formação da Área de
Proteção Ambiental.
116

A relação do grupo com a APA foi estabelecida através da participação do


Conselho Gestor, órgão criado por meio da portaria nº 291 de 06 de junho de 2006,
pautado no disposto no § 5º do artigo 15 da Lei nº 9.985, de 18 de julho de 2000, lei
que institui o Sistema Nacional de Unidades de Conservação da Natureza – SNUC.
A respeito da função do Conselho Gestor inserido no capítulo III das categorias de
unidades de conservação, destaca-se abaixo:

§ 5o A Área de Proteção Ambiental disporá de um Conselho presidido pelo


órgão responsável por sua administração e constituído por representantes
dos órgãos públicos, de organizações da sociedade civil e da população
residente, conforme se dispuser no regulamento desta Lei (BRASIL.2000).

As informações acima, são relevantes, pois ajudam a compreender qual a


finalidade do Conselho Gestor em uma APA, portanto, com base no portal eletrônico
da Secretaria de Meio Ambiente e Sustentabilidade (SEMAS) do governo do estado
do Pará, o Conselho Gestor da APA de Maiandeua tem a seguinte atribuição:

Art. 2° – Compete ao Conselho da APA Algodoal-Maiandeua: I –


acompanhar a elaboração, implementação e revisão do Plano de Manejo da
unidade de conservação, garantindo o seu caráter participativo; II – buscar a
integração da unidade de conservação com as demais unidades e espaços
territoriais especialmente protegidos e com o seu entorno; III – envidar
esforços para compatibilizar os interesses dos diversos segmentos sociais
relacionados com a unidade; IV – avaliar o orçamento da unidade e o
relatório financeiro anual elaborado pelo órgão executor em relação aos
objetivos da unidade de conservação; do termo de parceria com
Organização da Sociedade Civil de Interesse Público – OSCIP, no caso de
gestão compartilhada da unidade por determinação do órgão executor; VI –
acompanhar a gestão por OSCIP e recomendar a rescisão do termo de
parceria, quando constatada irregularidade, no caso do inciso anterior;VII –
manifestar-se, sempre que solicitado pela SECTAM, sobre obra ou atividade
potencialmente causadora de impacto na unidade de conservação; VIII –
propor diretrizes e ações para compatibilizar, integrar e otimizar a relação
com a população do entorno ou do interior da unidade; e IX – elaborar o seu
regimento interno (SECTAM, 2006).

Uma observação para o fragmento anterior acerca do órgão da Secretaria de


Estado de Ciência e Tecnologia e Meio Ambiente (SECTAM), foi reorganizado pela
lei nº 7026 em 30 de julho de 2007, houve deslocação da ciência e tecnologia,
ficando apenas com o meio ambiente, reorganizada pela Secretaria de Estado de
Meio Ambiente e Sustentabilidade (SEMAS).
Durante atuação da SECTAM na criação da APA, alguns profissionais da
secretaria realizaram visitas à vila de Fortalezinha, Ivan Teixeira situa que nesse
processo inicial, alguns moradores que participavam do grupo, auxiliaram com
117

informações sobre a localidade para pesquisadores que estavam estudando a área


na época da proposta de criação, na década de noventa. “Nós contribuímos muito
também com as nossas ideias nessa discussão, né ? E alguns participantes do
movimento do GAF ajudaram, né. Pesquisadores da APA no momento da criação,
né?” (IVAN SOUSA TEIXEIRA – Entrevista concedida em setembro/2019).

A gente foi muito convidado participativo mesmo né, sempre convidava a


gente pra participar na parte da orientação do conhecimento, a gente
conhecia a ilha, toda aí, né? A parte de trilha, a parte dos ecossistema de
mangue, igapó, essas coisa tudo. Então, eles procuravam muita a gente,
pra gente identificar essas coisas pra eles, entendeu? Pra gente levar eles,
aí dizer onde é que ela tava localizado tem através do mapa né? E a gente
era muito procurado (IVAN SOUSA TEIXEIRA).

Quando ocorreu a criação do Conselho Gestor, Ivan Teixeira também explica


como se dava a atuação do GAF a da relevância da participação no órgão:

Também fazia parte do conselho, né? Nós tínhamos, nós tínhamos cadeira
dentro do conselho e mas também, ele assim fora dessa dessas reuniões
do Conselho, mas eles conversavam com algumas outras pessoas, né? E
acho que foi importante a gente contribuir muito também pra esse momento
da APA, da criação, né (IVAN TEIXEIRA).

As informações encontradas no portal eletrônico da SEMAS datam do ano de


2006 sobre o conselho Gestor da APA de Maiandeua, ainda são dados com
titulações que não são mais usados atualmente, como exemplo SECTAM.
Assim, o Conselho Gestor tem em sua estrutura vinte e dois membros
organizados em representantes do Poder Público que são: Secretaria de Ciência,
Tecnologia e Meio Ambiente do Estado do Pará – SECTAM; Secretaria de Saúde do
Estado do Pará – SESPA; Companhia Paraense de Turismo – PARATUR; Prefeitura
de Maracanã; Prefeitura de Marapanim; Batalhão de Polícia Ambiental – BPA;
Delegacia do Meio Ambiente – DEMA; Universidade Federal do Pará – UFPA;
Gerencia Regional de Patrimônio da União – GRPU; Museu Paraense Emílio Goeldi
– MPEG; Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis
– IBAMA.
E representantes da sociedade civil, sendo um de cada entidade abaixo
relacionado: ACEDESPIM – Associação Comunitária de Desenvolvimento da ilha de
Maiandeua; Associação dos Empresários de Turismo de Algodoal – AETA;
Associação Comunitária dos Moradores de Maiandeua – ACMM; Grupo Ambiental
de Fortalezinha – GAF; Associação Comunitária dos Pescadores Artesanais da Vila
118

de Algodoal; Associação dos Lancheiros Marudá/Algodoal – ALMA; Associação Pró-


Ilha de Algodoal/Maiaundeua – SUATÁ; Associação dos Carroceiros da Vila de
Algodoal; Associação dos Moradores de Camboinha; Associação dos Canoeiros;
Grupo Ecológico Maiandeua-Algodoal – GEMA.
Said Senado assinala como ocorria a participação do GAF nas reuniões do
Conselho Gestor na APA, salientando o papel do órgão na comunidade:

O grupo além da APA, o grupo teve uma importância de tipo, obrigar o


governo a dar importância pra APA, a criar o plano de manejo, porque o
GAF batia nessa tecla da necessidade de preservar, da necessidade de
organizar e também tinha cadeira no conselho gestor quando montou o
plano de manejo, sempre teve voto, então, como ONG tinha, e com certeza
era o grupo mais influente dentro do plano de manejo. Tudo se era baseado
pelo GAF (SAID SENADO).

Entretanto, Lúcia Santana ao falar das discussões que transcorriam nos


encontros do Conselho Gestor, as demandas levantadas não eram solucionadas
pelos órgãos administrativos.

E nesse sentido, quando a secretaria chegou, ela instaurou o Conselho


Gestor Conselho. Ele é decretado por lei todas as unidades de conservação
e nós entramos com um representante do grupo ambiental. Depois nós
tivemos umas três representações, mas a gente sentia que fazer as
reuniões, mas não conseguia resolver as demandas, Entendeu as
demandas (LÚCIA SANTANA).

Durante a pesquisa de campo alguns moradores informaram que ainda


ocorrem reuniões do Conselho Gestor, mas ainda há uma insuficiência na
deliberação em medida de intervenção para os problemas encontrados na
comunidade. Quando foi perguntado aos entrevistados se havia alguma relação do
grupo com a RESEX, foi relatado que não ocorreu nenhuma relação entre os dois.
No que corresponde à relação entre o grupo e os turistas visitantes, as
respostas dos entrevistados ressaltava dois momentos: o primeiro é grifado por
Manoel Teixeira como uma relação atravessada por conflitos e resistências, onde o
visitante desconsiderava a realidade da comunidade e resultava em
comportamentos inapropriados para uma Área de Proteção Ambiental:

Teve uma relação de briga, né, porque logo quando nós criamos e a gente
começou realmente a incomodar o turista, com relação as lixeiras de
bambu, as nossas placas, né, por exemplo, eu presenciei ainda muita
discussão com relação a essa questão da moto. Eu mesmo parei umas
cinco a dez motos pessoal de Igarapé- Açu na época das férias, né, e a
119

gente impediu que eles circulassem outras coisas também, a gente brigou
com eles, porque eles pegavam as nossas lixeiras de bambu e queriam
fazer fogueira, teve essas briga. Eu digo que é turista, né, porque eles não
moram aqui, o pessoal de Igarapé-Açu. Aquilo nos incomodaram muito, foi
uma briga muito intensa, assim com eles, já ao ponto da gente querer brigar
com eles na casa deles, aonde eles ficavam, assim, sabe (MANOEL
TEIXEIRA).

Manoel acentua que a principal problemática com a relação a entrada de


visitantes foi a circulação de motos pela comunidade, que na maioria das vezes
eram pessoas de municípios próximos. Infelizmente, a circulação de motos na vila
ainda ocorre, aqui faço uma ressalva sobre período que estive na localidade e
presenciei a circulação de um número considerável de motos sem placas e
motoristas sem uso de capacete.
Embora, tal dificuldade tenha sido encontrada com a presença de visitantes,
há um segundo momento em que a relação do grupo com os turistas foi indicada de
forma positiva, em decorrência do envolvimento de ambos em atividades de lazer,
esporte e oficinas de vivências com a natureza e cultural local, dado que está
circunscrito nas falas de Lúcia Santana e Graça Santana:

Na verdade, a gente fazia todo um trabalho de trilha que também atraía


gente de Curuçá, Maracanã, que era o Rally Ecológico, também
trabalhando esse Rally ecológico, valorizando a cultura local e aonde o
vencedor não era aquele que chegava na frente, mas o vencedor. Era
aquele que conseguia descobrir as pistas que nós deixávamos, né? Nesse,
nesse percurso e envolvia toda comunidade, todo mundo saia pra torcer.
Então era muito bacana essa parte do entretenimento mesmo e do
envolvimento dos jovens, né (LÚCIA SANTANA).

Os pescadores davam a primeira oficina que era sobre peixe, porque eles
tratavam, o que eles traziam do curral, botava na parte daqueles gradeado e
eles tratavam e mostravam para o turista, o que que era peixe de água
salgada, de água doce, o que era peixe para pra fritar, pra cozinhar, como
abrir, como tratava. Depois, pedia pros turistas, cavarem no chão, formaram
em fogareiro e assaram, porque essa era a tradição deles. Depois botava
em cima duma mesa e todo mundo ia comer junto (GRAÇA SANTANA).

Em sequência, conforme o tópico que disserta sobre as lideranças que


atuaram no grupo durante os dez anos de atividade, foram apresentados alguns
nomes, como exemplo: “Primeira liderança foi o Preto, é o Manuel, é que a gente
chama ele assim. Segunda, Graça Santana, como coordenador, eu tô falando como
coordenador. O Ivan como coordenador, foram essas três até o dia de hoje”
(JACINTO TEIXEIRA, Entrevista concedida em setembro de 2019).
120

Graça Santana também fala sobre umas das lideranças do GAF e destaca
também outros moradores e agentes externos que foram de extrema relevância no
grupo:
Assim, eu considero, né? O Preto, foi a pessoa que mais se capacitou
dentro do GAF, né. A outra liderança que eu posso considerar muito
também foi o Ivan, Ivan é uma grande liderança, contribuiu principalmente
no campo da artesanato. Era aquele o conselheiro, né, aquela pessoa que
pega na tua mão e diz: “olhe para aí! Vamos conversar sobre isso”, aquela
pessoa que segura, né? Ele também foi uma liderança muito forte. Eu achei
isso bastante interessante, a Dona Luzia na parte que trabalhava bem na
cozinha, mesmo com dez filhos dela, uma situação difícil, mas ela deixava
tudo pra ir lá pro grupo ambiental. A Edina também, né? Que também foi
uma liderança a Samaria, a diretora da escola que frequentava e também o
considerar porque ela vinha todas as vezes que a gente chamava e ela
organizava junto com a gente. Posso dizer a Lúcia Santana, a Élida também
grande liderança, o Pina na Educação na parte da educação (GRAÇA
SANTANA).

As falas de Jacinto Teixeira e Graça Santana, evidenciam como liderança


Manuel Teixeira, conhecido na comunidade como “Preto”, Ivan Teixeira e outros
moradores da comunidade e profissionais de Belém. Apesar da repetição dos nomes
nas narrativas, verifica-se que há o reconhecimento por parte dos entrevistados do
trabalho individual das pessoas citadas em suas respectivas atribuições dentro da
estrutura do coletivo.
A fala de Said Senado serve como complemento dos posicionamentos
anteriores:
Olha, o GAF era constituído das coordenações eram assim: tinha o
coordenador né? Que pra gente foi sempre a Graça Santana, pela uma
questão natural de convívio, é o Preto era o vice e tinha as coordenações:
Ivan tesoureiro, Edna, que é a dona da padaria, é conselho fiscal, o Nil,
conselho fiscal, eu, coordenador de esporte e lazer, e a gente só ia
mudando e mudando algumas coordenações, né? Mas todo mundo era
coordenador de alguma coisa e tinha o coordenador geral (SAID SENADO).

Constata-se que as lideranças durante o período que o grupo esteve ativo,


desenvolveram funções representativas, eleitos por meio de votação do grupo, com
cargos específicos, todavia o GAF tinha autonomia e todos os membros
colaboravam de alguma forma.
Em relação a participação de outras pessoas e instituições, as respostas dos
entrevistados foi sim, os membros participantes atuavam de forma direta e indireta
na organização e ações do grupo. Ivan Teixeira e Graça Santana, relatam como se
dava essa participação:
121

O grupo ele tinha membros efetivos, tinha membros colaboradores e outras


pessoas que colaboravam com algumas coisas, entendeu? Então, eles se
dividiam, porque as pessoas quando vinham gostavam do trabalho passava
conhecer o trabalho e se interessava, entendeu? Só que eles não podiam tá
aqui, “então é o seguinte, olha eu vou ajudar vocês, então coisa vou dar um
objeto pra vocês botarem no bingo, pra fazer um bingo pra agariar dinheiro,
pra comprar alguma coisa aí pra vocês” tá entendendo? Porque a gente
trabalhava com a confecção das lixeira, mas às lixeira é o seguinte, a gente
precisava de prego, precisava de serrote, precisava de martelo, precisava
de algumas coisas, então a gente não tinha, então o que que acontecia,
essas pessoas que gostavam do nosso trabalho, “então é o seguinte, olha
vou fornecer um objeto pra vocês fazerem um bingo, pra vocês comprarem
essas coisas”, então era aquele membro colaborador, que colaborava com
algumas coisas. A única instituição que ajudava depois de formada foi a
SEMMA né, ela colaborava com a gente em algumas coisas (IVAN SOUSA
TEIXEIRA).

Sim várias, o Luiz Pina, que era professor da parte de arte, Ivete que é
daqui do Museu Goeldi. Nós tivemos vários parceiros, muita gente
trabalhou, né, e que ajudava o grupo às vezes com as doações,
principalmente quando era época do aniversário do grupo. Lançava
campanha de doação e essas pessoas se prontificaram ajudar, por
exemplo, a própria Helena Doris, então o povo vinculado a pesquisa
educação, principalmente aqui do museu, também participava das ações do
Renas, mas a gente tinha vários parceiros (LÚCIA SANTANA).

Nota-se que os parceiros externos eram em sua maioria pesquisadores de


várias áreas que contribuíram com doações para financiar as ações do grupo, no
entanto essas pessoas não atuavam diretamente nas atividades. E a respeito das
instituições que participavam do GAF, a única mencionada foi o Museu Paraense
Emílio Goeldi, representado por Graça Santana e Lúcia Santana.
Além das narrativas, alguns registros fotográficos ajudam a contar um pouco
da experiência e trajetória histórica do grupo na vila de Fortalezinha, acervo
disponibilizado por um morador que atuou no GAF, no entanto, não recordava sobre
todas as informações a respeito de cada momento em que o registro fotográfico foi
realizado na época. Nesse sentido, as descrições de cada imagem estão de acordo
com o que foi exposto pelo morador.
A imagem abaixo mostra um outro momento a respeito de uma ação
educativa do GAF, que abordava uma atividade de confecção de artesanato com
materiais alternativos.
122

Figura 26 – Atividade do GAF de Confecção de Artesanatos

Fonte: Acervo pessoal do ex-integrante do GAF, Pesquisa de Campo, 2018.

Através da imagem percebe-se que ação educativa era desenvolvida em um


espaço aberto, o que tornava possível a visualização e interação das pessoas que
possivelmente transitavam pelos arredores do barracão do grupo, um elemento
interessante para destacar nesse percurso histórico do GAF.
Na imagem abaixo trata-se do espaço onde o GAF realizava seus encontros e
atividades durante sua atuação, nesse registro aparece um integrante em um
processo de construção de lixeira alternativa utilizando bambu.

Figura 27 – Integrante do GAF em Processo de Construção de Lixeira de Bambu

Fonte: Acervo pessoal do ex-integrante do GAF, Pesquisa de Campo, 2018.


123

As imagens acima apresentadas associadas com as informações obtidas nas


entrevistas de campo com as pessoas que participavam do grupo, assim como
agentes externos e dados do Estatuto Social, denotam um pouco das ações e
atividades do grupo Ambiental de Fortalezinha, que durante sua atuação e
envolvimento com a comunidade, evidenciaram o desenvolvimento de múltiplos
saberes e processos educativos no campo da educação ambiental.
124

4. EDUCAÇÃO AMBIENTAL: UM CAMPO DE ESTUDO EM MOVIMENTO

Nessa seção, como princípio condutor para compreensão do conceito de


educação ambiental e sua estruturação, como área de estudo, adentra-se no
percurso histórico do movimento ecologista ou ambientalista, situando os
marcadores dos debates e conferências da proposta de educação ambiental no final
do século XX e início do século XXI.

4.1 Principais marcos teóricos do campo da educação ambiental no contexto


internacional, na américa latina e no Brasil

Buscando analisar a partir dos referenciais elementos que demarcam a


trajetória teórica e conceitual da educação ambiental, procura-se demarcar, de forma
resumida, esse campo de estudo em debate e em movimento, informando seus
avanços, limites e desafios para outros enfoques na atualidade, em particular da
sociedade brasileira. Ademais, busca-se, também, assentar os instrumentos de
análise para dialogar com as narrativas que denotam a experiência do Grupo
Ambiental de Fortalezinha. Para tanto, procuro dar ênfase nos respectivos autores:
Tristão; Jacobi (2010), Reigota (2012), Martínez Alier (2018), Loureiro (2006), Sauvé
(2005) e Layrargues; Lima (2011).

A educação ambiental passa, então, a ser compreendida não só como um


modismo passageiro, mas como um caminho que, grupos de profissionais
militantes do movimento ambientalista e de outras áreas de atuação e de
conhecimento se veem motivados a seguir. Esse processo se desenvolve
de forma gradual e abrange um contingente de jovens profissionais e
estudantes motivados pelo alcance e pelo projeto de transformação de
sociedade, de pensamentos e de valores explícitos nos repertórios dos
discursos ambientalistas, agrega outros campos teóricos e metodológicos
para sua tessitura e de compreensão da sua abrangência e complexidade
(TRISTÃO; JACOBI, 2010, p. 14).

A educação ambiental surge em um contexto histórico-cultural com estruturas


de base do ecologismo, movimento global que surge na década de 60, que
guardava uma relação com pautas sociais, de resistência às imposições sociais e
políticas hegemônicas, mas, com maior visibilidade a partir dos anos 70.
Foi a partir da Conferência de Estocolmo que houve a recomendação de uma
educação para o meio ambiente (TRISTÃO; JACOBI, 2010), que tratou sobre a
relação do ser humano e natureza, da proteção e melhoramento do meio ambiente
125

como questão fundamental da qualidade de vida dos povos no mundo; da constante


avaliação do ser humano acerca de sua experiência e continuar descobrindo,
inventando, criando e progredindo com o meio ambiente.
Adoção de normas e medidas apropriadas para enfrentar problemas
decorrente do crescimento natural da população, na defesa e o melhoramento do
meio ambiente humano para as gerações do presente e do futuro, com esforços na
preservação e melhorarias do meio ambiente em benefício do ser humano e de sua
posteridade.
Os princípios norteadores do documento sobre educação ambiental
destacam, a necessidade de um esforço no campo da educação em considerar os
questionamentos ambientais, possibilitando uma formação mais crítica tanto para os
jovens como os adultos, refletindo assim em uma conduta social do sujeito com mais
responsabilidade em sua interação com o meio ambiente (DECLARAÇÃO DE
ESTOCOLMO, 1972, p. 6).
A relação da educação com o meio ambiente, a partir do documento de
Estocolmo, foi o início de um trabalho específico mundial, sendo tratado como pauta
oficial para ONU. Após o evento de Estocolmo, foi fixada uma parceria entre a
Organização para a Educação, Ciência e Cultura (Unesco) e o Programa
Internacional de Educação Ambiental (Piea), de domínio internacional, encarregada
em promover encontros regionais e nacionais, para a produção do boletim Connect,
distribuído para doze mil pessoas e instituições, em prol da educação ambiental.
A partir da união entre a Unesco e o Projeto Internacional de Educação
Ambiental (PIEA), a educação ambiental tornou-se uma área específica,
reconhecida internacionalmente no ano de 1975, consolidada por meio do I
Seminário Internacional de Educação Ambiental, em Belgrado. A carta de Belgrado
fundamenta suas diretrizes no campo da educação ambiental, considerando o
ambiente em sua totalidade natural sob a criação do ser humano em suas
dimensões: ecológica, econômica, tecnológica, social, legislativa, cultural e estética.
A carta de Belgrado pontua a educação ambiental como um processo
contínuo, tanto no contexto da escolar ou não, alicerçado em um modelo
interdisciplinar, na luta contra os problemas ambientais, examinando as principais
perspectivas em nível mundial, sobre as demandas ambientais, levando em
consideração as especificidades de cada região. Subsidiando em condições
ambientais no âmbito do presente e do futuro, averiguando todo o desenvolvimento
126

e crescimento sob a ótica ambiental, promovendo a importância da cooperação em


escala local, nacional e internacional na busca de solucionar os problemas
ambientais (CARTA DE BELGRADO, 1975, p. 3).
Na américa latina, também houve um evento marcante na trajetória da
educação ambiental, intitulado Taller Subregional de Educación Ambiental para
Educación Secundaria, em Chosica, Peru, no ano de 1976. O evento regional
apresentou uma abordagem em educação ambiental, a qual destacou a
transformação social em suas estruturas e abordagem da educação ambiental.
Sobre o evento ação educativa voltada para a educação ambiental é
permanente, pois a comunidade educativa integra uma consciência de sua inserção
na realidade global (MINISTÉRIO DO MEIO AMBIENTE, 2018).
No ano de 1977, ocorreu a Conferência Intergovernamental em Tbilisi, na
Georgia, (ex-União Soviética), foi um encontro importante na trajetória dos debates
da educação ambiental. Nesse evento, a educação ambiental foi apresentada,
segundo Loureiro (2006), como um meio educativo de interlocução da dimensão
social e ambiental, problematizando a realidade para compreender de onde emerge
a crise civilizatória. A educação ambiental, de acordo com a Conferência de Tbilisi
(1977):
Deve atingir pessoas de todas as idades, todos os níveis e âmbitos, tanto
da educação formal quanto da não-formal. Os meios de comunicação social
têm a grande responsabilidade de colocar seus imensos recursos a serviço
dessa missão educativa. Os especialistas em questões ambientais, assim
como aqueles cujas ações e decisões podem repercutir de maneira
perceptível no ambiente, devem adquirir, no decorrer de sua formação, os
conhecimentos e as atitudes necessários e perceber plenamente o sentido
de suas responsabilidades a esse respeito (CONFERÊNCIA
INTERGOVERNAMENTAL SOBRE EDUCAÇÃO AMBIENTAL, 1977, p. 1).

Em decorrência da Conferência em Tbilisi, foi encaminhado um apelo aos


Estados Membros da inclusão em políticas de educação, dos conteúdos, diretrizes e
atividades ambientais em seus respectivos sistemas, estabelecidos nos objetivos
elencados acima. Autoridades em educação são convidadas a intensificarem os
trabalhos de observação, de pesquisa e inovação pertinente à educação ambiental.
Convoca os Estados membros na colaboração do intercâmbio de experiências, de
pesquisas, de documentação e de materiais e também promove a formação
profissional.
E, por fim, convoca a comunidade internacional para o fortalecimento da
solidariedade e promover a compreensão internacional e a paz. Todas as pessoas
127

deverão ter o direito à educação ambiental. Partindo desse princípio, as


recomendações do documento da conferência de Tbilisi têm em suas finalidades
norteadoras da proposta:

a) contribuir para a compreensão clara da existência e importância da


interdependência econômica, social, política e ecológica, nas zonas urbanas
e rurais; b) proporcionar a todas as pessoas a possibilidade de adquirir os
conhecimentos, a noção de valores, as atitudes, o interesse prático e as
aptidões necessárias para proteger e melhorar o meio ambiente; c) propor
novos padrões de conduta aos indivíduos, aos grupos sociais e à sociedade
como um todo em relação ao meio ambiente (CONFERÊNCIA
INTERGOVERNAMENTAL SOBRE EDUCAÇÃO AMBIENTAL, 1977, p. 4-
5).

Sobre os objetivos da educação ambiental tratados nessa conferência,


destacam-se: a contribuição na construção de uma consciência social individual e
coletiva mediante da sensibilização, na transmissão de valores, autonomia,
participação no ambiente global e promover vivências em contextos diversos a fim
de possibilitar uma percepção do ambiente e dos seus respectivos problemas.
No que se refere aos princípios, considera-se a totalidade do ambiente em
todos os seus aspectos, forma-se no encadeamento educativo contínuo e
permanente em todos os níveis de ensino formal e não formal, também
considerando outros contextos em escala mundial, em uma investigação das
indispensáveis questões ambientais, em que o educando possa ter acesso às
informações das circunstâncias ambientais de outras realidades em equivalência
local, regional, nacional e internacional (CONFERÊNCIA INTERGOVERNAMENTAL
SOBRE EDUCAÇÃO AMBIENTAL, 1977, p. 5-6).
No entanto, o contexto nos anos 70 no Brasil em consequência da ausência
de um espaço democrático para debates, no período de ditadura civil-militar e pela
influência desenvolvimentista conservadora, as questões ambientais ficavam à
margem do Estado brasileiro e eram pouco debatidas na sociedade. As ações em
torno das problemáticas ambientais eram realizadas sob uma orientação mais
política, por intermédio de protestos e passeatas organizadas por movimentos
sociais, intelectuais, membros da comunidade acadêmica docentes e ativistas
(TRISTÃO; JACOBI, 2010).
Nesse período, o ambientalismo centrava seu papel na denúncia contra a
crescente poluição e degradação ao meio ambiente, ocasionado pelos centros
industriais.
128

Essas iniciativas ambientais ocupam durante a década de 70 e a primeira


metade dos anos 80, uma posição secundária nas práticas discursivas dos
movimentos reivindicatórios pela constituição da cidadania. Os movimentos
sociais estavam muito mais preocupados com a pobreza e com as
necessidades básicas das populações, o que se reflete numa lógica binária
de compreensão das interações entre sociedade/ meio ambiente, natureza/
cultura. Essa concepção típica do pensamento racionalista da ciência
moderna, ao dicotomizar degradação social e degradação ambiental, limitou
as disciplinas das ciências sociais ao estudo da sociedade e as das ciências
naturais e da terra à ecologia e ao meio ambiente (TRISTÃO; JACOBI,
2010, p. 17).

A limitação de argumentos para o ambientalismo não estava apenas


direcionada para o combate à poluição e apoio à preservação dos ecossistemas,
manifestava, também, um distanciamento com inúmeras entidades com a temática
da justiça social e da justiça ambiental. A maioria dos constituintes das associações
ambientalistas não dialogava com a população mais excluída da sociedade, não
consideravam aspectos socioeconômicos da crise ambiental.
Em consequência, a educação ambiental, segundo Tristão e Jacobi (2010), foi
interpretada de forma equivocada subsidiada em uma prática simplória, romantizada
e fora do contexto da realidade social. Tendo a natureza e o meio ambiente
separados do campo da educação de forma geral.
O movimento ambientalista não interpretava a natureza como cultura, havia
uma impossibilidade de conexão entre natureza e cultura, pobreza e destruição
ambiental.
Dentro dessa perspectiva, na conjuntura social, política e econômica da
década de 70, a educação ambiental fica reduzida a uma conscientização
ecológica, categoria que privilegia sobretudo o conteúdo e a crença em uma
única racionalidade, funcionalista e instrumental em detrimento de
racionalidades abertas, expressivas com uma razão sensível (TRISTÃO;
JACOBI, 2010, p. 19).

Na década de 1970, com a imposição de um regime autoritário, isso acarretou


em uma vigilância e controle repressivo sobre os movimentos sociais e estudantis.
Gonçalves (2008) destaca que a esquerda acreditava que o subdesenvolvimento do
Brasil estava alicerçado no imperialismo, ligado ao monopólio latifundiário, fator
determinante do quadro de miséria e atraso em que o povo brasileiro vivia.
No entanto, a união do ambientalismo com a luta de outros movimentos
sociais e com outros atores (professores, estudantes e escolas etc.) durante o
processo de redemocratização do país, impulsionou, mediante de organizações de
órgãos municipais e estaduais, atividades no campo da educação, direcionadas para
129

recuperação, conservação, preservação e melhorias no meio ambiente. Nesse


contexto, são criados os primeiros cursos de especialização em educação
ambiental.
Para Reigota (2012), foi na democracia que houve a ampliação do movimento
ecologista nos espaços públicos e consequentemente na vida cotidiana. Durante a
ditadura, era impossível ter um discurso ecologista, tendo em vista que o prisma
político não considerava a ecologia como prioridade na agenda pública. O autor
ainda descreve que a educação ambiental no Brasil é um campo emergente e não
pode ser limitada e nem universalizado por documentos institucionais (REIGOTA,
2012, p. 503-504).
Reigota (2012), ressalta que os movimentos sociais exerceram um papel de
extrema importância para educação ambiental, tendo relação da educação
ambiental como um campo da ciência e da academia, influenciado pela frequente
atividade dos movimentos sociais, grupos e pessoas.
Outra possibilidade é a relação do movimento social de engajamento político
alicerçado em princípios políticos e pedagógicos presentes em distintos espaços
educativos. A educação ambiental também pode ser ponderada por via da prática
discursiva em contextos públicos variados, resultando em impactos na sociedade, no
campo ou movimento nas décadas de 1960,1970 e 1980 (REIGOTA, 2012, p.505).
O processo de institucionalização da educação ambiental no Brasil foi
construído no início de 1973, por meio da criação da Secretaria Especial do Meio
Ambiente (SEMA), ligada ao Governo Federal. No ano de 1981, foi criada a Política
Nacional de Meio Ambiente (PNMA), lei de Nº 6.938, em suas diretrizes legislativas,
a Política Nacional de Meio Ambiente instituiu a Educação Ambiental em todos os
níveis de ensino, envolvendo a educação nas comunidades, objetivando contribuir
na formação e participação na proteção do meio ambiente.
Assim, finalizando a trajetória da década de 70, em 1979 na Costa Rica,
ocorreu o Seminário Educação Ambiental para América Latina e 1988 o Seminário
Latino-Americano de Educação Ambiental, na Argentina. Os dois seminários
demarcaram a indispensabilidade da preservação do patrimônio histórico-cultural e o
papel da mulher em promover o desenvolvimento da localidade e das culturas
ecológicas Loureiro (2006).
Já nos anos 80, o ambientalismo no Brasil começou analisar as questões
ambientais que estavam na interface com a “conscientização das pessoas”, mas não
130

atingia a maioria da população. Para Tristão e Jacobi (2010), o início dos anos 80 é
sinalizado pelo crescimento de iniciativas que buscavam aperfeiçoar os mecanismos
de gestão ambiental, na criação de Organizações Não Governamentais (ONGs) na
esfera ambientalista, que na maioria das vezes algumas dessas organizações não
deram continuidade em seus respectivos trabalhos.
Contudo, ressalta-se também que na década de 80 ocorreu um importante
momento para a política ambientalista com a criação da Constituição de 1988,
oportunizando que uma parte considerável da sociedade conhecesse a concepção
em uma diretriz legal ambientalista no país. Para Tristão e Jacobi (2010), ocorreu um
avanço no campo da educação ambiental, ainda que o foco estivesse direcionado
em um aspecto conservacionista e de preservação dos ecossistemas.
O enfoque cultural ambientalista no Brasil, em seu processo de
amadurecimento, vai mudando de forma gradativa, manifestando outras possíveis
formas para conservação, restauração e recuperação dos ambientes impactados
(TRISTÃO; JACOBI, 2010).

E assim emergem na educação ambiental os ideais de uma educação


crítica engendrada nos ideais democráticos e emancipatórios do
pensamento crítico aplicado à educação. No Brasil esses ideais foram
constitutivos da educação popular que rompe com uma concepção
tecnicista, difusora e repassadora de informações e de conhecimentos,
convocando a educação a assumir a mediação na construção social de
saberes implicados na vida dos sujeitos (TRISTÃO; JACOBI, 2010, p. 21).

Tendo como referência Paulo Freire no pensamento crítico da educação no


Brasil, sendo oposição à corrente tradicional na educação e no currículo:

Em contraste com a vertente tradicional da educação e do currículo, nessa


tendência crítica, o argumento é de que nenhuma teoria é neutra, científica
ou desinteressada, pois está inevitavelmente implicada em relações de
poder. A educação ambiental começa a ser fortemente influenciada por
essa tendência no final desta década, trazendo a sua especificidade, a de
compreender as relações sociedade-natureza e de intervir nos problemas e
conflitos socioambientais. A conscientização é compreendida como uma
reflexão-ação, e passa por uma profunda mudança de valores e de atitudes
na formação dos sujeitos (TRISTÃO; JACOBI, 2010, p. 21).

Desse modo, a educação ambiental começa a ser delineada em um formato


mais crítico e complexo no começo dos anos 90, mesmo que ainda ocorressem
diferenças no âmbito das práticas e metodologias, a movimentação dos encontros e
dos debates estavam em torno da participação, da sustentabilidade, ação política, a
131

ideologia, interdisciplinaridade, tangenciando também para o campo da democracia,


emancipação, ação-reflexão, política e ideologia, relação de poder e conflito.
Aqui é importante destacar a relação entre a década de noventa com o início
de um movimento tangente às questões ambientais na comunidade de Fortalezinha,
onde ocorreu uma movimentação entre pesquisadores que frequentavam a
localidade e moradores para a formação do Grupo Ambiental de Fortalezinha no ano
de 1997. Demarcando que o debate mundial e nacional em torno do meio ambiente
exercia um papel relevante para o contexto da região Amazônica.
Em 1991, a Comissão Interministerial durante a preparação do evento do Rio
de janeiro em 1992, deliberou a educação ambiental como um dispositivo de política
ambiental, criando assim duas esferas no Poder Executivo, para atuar
especificamente como o Grupo de Trabalho de Educação Ambiental do MEC, que
no ano de 1993 foi transformado em Coordenação-Geral de Educação Ambiental
(Coea/MEC) e ocorreu a divisão de Educação Ambiental do Instituto Brasileiro de
Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama).
Suas atribuições institucionais foram organizadas para a representação na
institucionalização da política de educação ambiental, no plano do Sistema Nacional
de Meio Ambiente (Sisnama). Ainda em 1992, em decorrência da Conferência da
Rio-92 em parceria com o Ministério da Educação, foi elaborada a Carta Brasileira
para Educação Ambiental, na qual houve o reconhecimento da educação ambiental
como um instrumento essencial na viabilização da sustentabilidade como uma
estratégia de sobrevivência do planeta, encaminhando-se para a melhoria na
qualidade de vida humana.
Os objetivos definidos na carta, evidenciavam que o atraso da produção de
conhecimentos e ausência de comprometimento real do Poder Público no
cumprimento e complementação da legislação, no que tange às políticas exclusivas
à Educação Ambiental, no nível completo de ensino, assentavam um modelo
educacional que não atendia as reais necessidades do país.
Com o objetivo da criação de órgãos de referência para a elaboração de
programas estaduais de Educação Ambiental, a extinta Sema, em seguida o Ibama
e o Ministério do Meio Ambiente impulsionaram a construção de Comissões
Interinstitucionais Estaduais de Educação Ambiental, onde a assessoria aos
programas dos estados ficou sob responsabilidade do Ministério do Meio Ambiente.
132

No ano de 1992, ocorreu a Conferência das Nações Unidas sobre o Meio


Ambiente e Desenvolvimento, no estado do Rio de Janeiro, também conhecida
como a ECO/92. No evento, foi produzido o documento de Tratado da Educação
Ambiental para Sociedades Sustentáveis e Responsabilidade Global, um registro
que demonstra o pensamento sobre a educação ambiental, na perspectiva dos
educadores do mundo todo e marca os compromissos da coletividade para a
sociedade civil planetária.
O ambientalismo entra em uma nova dinâmica e momento histórico. Para
Tristão e Jacobi (2010), ocorreu uma institucionalização das ONGs e o voluntariado
começa ter o aspecto profissional. Contudo, uma observação acerca da Declaração
do Rio é feita, que não ocorreu de fato um reconhecimento do papel da educação
em sua constituição, a educação abordada no documento tem em sua base uma
apenas a transmissão e uma concepção ainda hegemônica herdada da trajetória da
educação ambiental, que no ano de 1992 já completava 20 anos.
A educação proposta no capítulo 36 da Agenda 21 era tratada de forma
instrumental e não como um processo permanente de construção, importante
questionar os momentos históricos datados como marcadores oficiais do debate em
torno da educação ambiental, ainda estavam sob diretrizes que silenciavam e
limitavam o campo da educação.
Porém, destaca-se que coexistente ao que estava sendo discutido na Rio/92,
movimentos sociais organizaram documentos alternativos como exemplo “Tratado
de Educação Ambiental para Sociedades Sustentáveis e Responsabilidade Global”
em seu preceito a educação ambiental era concebida como ato político e ideológico,
longe de uma neutralidade, que buscava a transformação social baseada em
valores. Para Tristão (2005), é nesse momento que ocorre o encadeamento de uma
interpretação da educação ambiental em um entendimento como ato político,
ampliando outras áreas de intervenção nas práticas socioambientais.
Considerando a Constituição de 1988 e dos compromissos firmados na Rio-
92, em dezembro de 1994, a Presidência da República criou o Programa Nacional
de Educação Ambiental (PRONEA), compartilhado com o Ministério do Meio
Ambiente, dos Recursos Hídricos e da Amazônia legal e também pelo Ministério da
Educação e do Desporto, em conjunto com o Ministério da Cultura e o Ministério da
Ciência e Tecnologia.
133

Loureiro (2006) sinaliza que o Programa Nacional de Educação Ambiental foi


definido por meio de sete linhas de ação: (1) Educação Ambiental no ensino formal;
(2) Educação no processo de gestão ambiental; (3) A promoção de campanhas
específicas de Educação Ambiental para usuários de recursos naturais; (4)
Cooperação com os que atuam nos meios de comunicação e com os comunicadores
sociais; (5) Articulação e integração das comunidades em favor da Educação
Ambiental; (6) Articulação intra e interinstitucional; (7) Criação de uma rede de
centros especializados em Educação Ambiental.
Prosseguindo o caminho da Educação Ambiental no Brasil, no ano de 1995, a
Câmara Técnica Temporária de Educação Ambiental no Conselho Nacional de Meio
Ambiente (CONAMA), tendo como princípios norteadores a participação, a
descentralização, o reconhecimento da pluralidade e diversidade cultural e
interdisciplinaridade. Em 1996, o Ministério do Meio Ambiente organizou um Grupo
de Trabalho Ambiental, direcionado pelo regulamento do Ministério da Educação,
buscando à assistência técnica e institucional em Educação Ambiental, se
caracterizando como um canal formal de ações em conjunto.
Em nível da educação básica, em 1997 foi aprovado pelo Conselho Nacional
de Educação os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN), material de apoio ao
ensino, que trata dos eixos principais de conteúdo das disciplinas de português,
matemática, ciências, histórias e geografia, abordando também os temas
transversais como exemplo: saúde, ética, pluralidade cultural, orientação sexual e
meio ambiente. Sobre o eixo transversal do meio ambiente, destaca-se a relação ser
humano e natureza sob a seguinte perspectiva:

Identificar-se como parte integrante da natureza e sentir-se afetivamente


ligados a ela, percebendo os processos pessoais como elementos
fundamentais para uma atuação criativa, responsável e respeitosa em
relação ao meio ambiente; • perceber, apreciar e valorizar a diversidade
natural e sociocultural, adotando posturas de respeito aos diferentes
aspectos e formas do patrimônio natural, étnico e cultural; • observar e
analisar fatos e situações do ponto de vista ambiental, de modo crítico,
reconhecendo a necessidade e as oportunidades de atuar de modo
propositivo, para garantir um meio ambiente saudável e a boa qualidade de
vida; • adotar posturas na escola, em casa e em sua comunidade que os
levem a interações construtivas, justas e ambientalmente sustentáveis; •
compreender que os problemas ambientais interferem na qualidade de vida
das pessoas, tanto local quanto globalmente; • conhecer e compreender, de
modo integrado, as noções básicas relacionadas ao meio ambiente; •
perceber, em diversos fenômenos naturais, encadeamentos e relações de
causa/efeito que condicionam a vida no espaço (geográfico) e no tempo
(histórico), utilizando essa percepção para posicionar-se criticamente diante
134

das condições ambientais de seu meio; • compreender a necessidade e


dominar alguns procedimentos de conservação e manejo dos recursos
naturais com os quais interagem, aplicando-os no dia-a-dia (PARÂMETROS
CURRICULARES NACIONAIS, 1997, p. 197-198).

No ano de 1997 também ocorre um movimento importante para o campo da


pesquisa em educação ambiental, pela inserção em Programas de Pós-Graduação
em Educação da universidade e da socialização de trabalhos da Associação
Nacional de Pesquisa e Pós-Graduação em Educação (ANPED) e uma
movimentação para a criação do grupo de trabalho em educação ambiental
(TRISTÃO; JACOBI, 2010).
Outro momento importante na trajetória da educação ambiental foi a
Conferência Meio Ambiente e Sociedade e Educação e Consciência Pública para a
Sustentabilidade, sediada em Thessaloniki, em 1997. Alguns pontos abordados
nesse evento foram em torno da formação dos professores, a construção de
materiais didáticos e um encontro em uma dimensão menor para a troca de
experiências entre os profissionais.
Em 1999 a Coordenação de Educação Ambiental no Ministério do Meio
Ambiente criou a Política Nacional de Educação Ambiental (PNEA), a qual determina
em sua normativa principal do capítulo I da educação ambiental: a educação
ambiental é entendida como o transcurso que o indivíduo e a coletividade constroem
valores sociais, conhecimentos, habilidades, atitudes e competências convergente
para a proteção do meio ambiente.
É o elemento fundamental e permanente para educação nacional, em todos
os níveis e modalidades da formação educativa, que pode ter caráter formal ou não
formal um, sendo um direito de todos. Em seus princípios básicos estão: o enfoque
humanista, democrático e participativo, a concepção do meio ambiente em sua
totalidade e sua interdependência entre o meio natural, o socioeconômico e o
cultural na conexão com a sustentabilidade.
Tem como relevância também a pluralidade das ideias e conceitos
pedagógicos em caráter interdisciplinar, multidisciplinar e transdisciplinar. Alicerçado
na ética, educação, trabalho e práticas sociais, na garantia do processo educativo
ser contínuo e permanente, em uma frequente avaliação crítica desse processo, na
interlocução com as questões ambientais e no reconhecimento e respeito à
pluralidade e diversidade individual e cultural (PNEA, 1999).
135

Em 2002, segundo os dados obtidos no Portal do Ministério do Meio


Ambiente, houve Assembleia Geral das Nações Unidas, durante sua 57ª sessão, foi
estabelecida a resolução nº 254, declarando 2005 como o início da Década da
Educação para o Desenvolvimento Sustentável, na qual a Unesco ficou responsável
pela implementação da iniciativa.
Já em 2003, na XIV Reunião do Foro de Ministros de Meio Ambiente da
América Latina e Caribe, em novembro no Panamá, foi oficializado o Programa
Latino-americano e Caribenho de Educação Ambiental (PLACEA), onde sucederam
as discussões dos congressos ibero-americano de educação ambiental.
Após o processo das inúmeras conferências de debates da educação
ambiental, as Nações Unidas implementaram a Década da Educação para o
Desenvolvimento Sustentável (2005-2014), representando uma conquista para a
educação ambiental, sendo reconhecido o papel da na luta da problemática
socioambiental, reforçando a sustentabilidade a partir da educação.
Passando para o século XXI, no ano de 2000, a educação passa a integrar
pela segunda vez o Plano Plurianual (2000-2003) identificando o Programa de
Educação Ambiental, vinculado ao Ministério do Meio Ambiente. No ano de 2002, o
Decreto Nº 4.281 regulamenta a lei de Nº 9.795/99, sob a gestão do Órgão do
PNEA, um passo importante para a realização das ações em Educação Ambiental
no Governo Federal.
É possível observar que, por um lado os documentos produzidos e o próprio
ambientalismo resistiram em incorporar a educação ambiental como
educação e os encontros e eventos de educação e de pesquisa em geral,
bem como sua própria legislação e documentos, também resistiram. Apesar
desses desencontros e das tendências pragmáticas, podemos afirmar a
existência de um movimento de inserção da educação ambiental na
academia. Uma das características visíveis de articulações que fizemos
entre os campos que constituem as intolerâncias da Educação Ambiental, é
sua confluência num movimento recursivo, entre o acadêmico e o
socioambiental, a produção do conhecimento e a militância (TRISTÃO;
JACOBI, 2010, p.26).

Partindo dessas múltiplas discussões em torno do conceito de Educação


Ambiental, compreende-se que a educação ambiental é resultado de um processo
dos movimentos ecologista e ambientalista, em uma relação dialógica com frentes
de movimentos sociais e grupos invisibilizados na sociedade. Ao analisar em
conjunto com os documentos oficiais de cada período histórico, é possível perceber
os avanços e limites do campo de estudo da educação ambiental, principalmente, na
transição para o século XXI.
136

Vive-se, no início deste século XXI, uma emergência, que, mais que
ecológica, é uma crise do estilo de pensamento, dos imaginários sociais,
dos pressupostos epistemológicos e dos valores hegemônicos que
sustentaram a modernidade. O caminho para sociedades sustentáveis se
fortalece na medida em que se desenvolvam práticas sócio-educativas
inclusivas que considerem a unidade na sociobiodiversidade, pautadas pelo
paradigma da complexidade, aportem para a escola viva, dinâmica e aberta
para a criação de ambiente pedagógicos vivenciais numa atitude reflexiva-
ativa em torno da problemática ambiental (TRISTÃO; JACOBI, 2010, p.27).

Nesse direcionamento, com base na tessitura sobre o conceito de educação


ambiental que surge do movimento ecologista ou ambientalista, são apresentadas
as principais correntes que marcaram o movimento do ambientalismo.

4.2 As principais correntes ecologistas

Em prosseguimento aos marcadores teórico-conceituais do movimento


ecologista, este tópico concentra-se em uma breve observação em relação às
correntes ambientalistas em nível global, fundamentado nos estudos de Martínez
Alier (2018), pois apresentam alguns aspectos gerais das correntes do
ambientalismo, buscando, com isso, articular e mobilizar mais elementos teóricos e
epistemológicos para interpretar e compreender a experiência de educação
ambiental do GAF.
O autor reconhece a existência de três correntes ambientalistas, sinalizando
seus respectivos pontos de convergência e objeções. Assim, as correntes são
intituladas de: “culto ao silvestre”, “evangelho da ecoeficiência” e o “ecologismo dos
pobres”. Para Martínez Alier (2018) há uma característica essencial em cada
corrente com as ciências ambientais, como exemplo: a biologia da conservação e a
ecologia industrial. Cita-se ainda, a relação com o feminismo, o poder exercido pelo
Estado, a religião, interesses de empresas e movimentos sociais. Inicia-se pela
apresentação da corrente o culto à vida silvestre, que “não ataca o crescimento
econômico enquanto tal. Até mesmo admite sua derrota na maior parte do mundo
industrializado. Porém, coloca em discussão uma ação de retaguarda” (MARTINEZ
ALIER, 2018, p. 22).
Seu interesse estava voltado para a preservação e manutenção dos espaços
que não foram impactados pelo avanço da lógica mercadológica. Com subsídios
teóricos na biologia da conservação, desenvolvido no ano de 1960, com a prioridade
da preservação da natureza sobre o uso comercial, com uma proposta política
137

voltada para manutenção das áreas de recursos naturais, chamadas de parques


nacionais ou naturais.
Entretanto, durante o processo de criação e construção desses espaços,
populações locais que viviam nessas áreas foram expulsas, sem nenhuma proposta
voltada para os interesses e demandas dessas comunidades. Outro ponto a
destacar, é o fator apelativo de caráter religioso:

Eventualmente, essa corrente ambientalista apela para a religião, como


parece ilustrar a vida política nos Estados Unidos. Pode apelar para o
panteísmo ou para as religiões orientais, menos antropocêntricas do que o
cristianismo ou judaísmo. Pode ainda, escolher eventos bíblicos
apropriados, como a Arca de Noé, um caso notável de conservação ex situ
(MARTÍNEZ ALIER, 2018, p. 23).

A natureza assumia em dois momentos o aspecto da sacralidade, o primeiro


se dava na funcionalidade da esfera do sagrado em culturas específicas, em
segundo lugar na contribuição do esclarecimento da centralidade do tema da
economia ecológica. Há um valor imensurável do sagrado que antecede o
econômico. Mas, a partir do momento que ocorre intervenção do sagrado sobre a
sociedade de mercado, o conflito torna-se consequência (MARTÍNEZ ALIER, 2018).
A presente corrente emerge dos países centrais com capitais do Norte, como
Washington e Genebra, passando pela África, Ásia e América Latina, com
profissionais da biologia e filosofia ambiental, com o apoio de organizações que
exerciam uma forte influência no mercado, como exemplo a “International Union for
the Conservation of Nature (IUCN), Worldwide Fund of Nature (WWF) e Nature
Conservancy” (MARÍNEZ ALIER, 2018, p. 24).

Hoje em dia, nos Estado Unidos não só se preserva a vida silvestre, como
também ela é restaurada através da desativação de algumas represas, da
recuperação dos Everglades da Flórida ou pela reintrodução dos lobos no
Parque de Yellowntone. O silvestre restaurado realmente equivale a uma
natureza domesticada, talvez terminando por se converter em parques
temáticos silvestres virtuais (MARTÍNEZ ALIER, 2018, p. 24).

Não obstante, corre uma mudança cultural ao final da década de 70, a


natureza passa ter um novo significado, o conceito de “pós-materialismo” resultado
da criação de um grupo de estudo de um segmento da população dos Estado
Unidos, a qual interpretava o meio ambiente como um luxo e não mais como uma
necessidade básica do cotidiano. Todavia, países como Estado Unidos, União
Europeia e o Japão em que a economia dependia diretamente da energia, dos
138

matérias e áreas de descartes e depósitos, encontravam-se em oposição a esse


conceito.
Para Martínez Alier (2018), o ambientalismo no ocidente não cresceu na
década de 70 devido a etapa de uma economia “pós-materialista”, mas sim, pela
preocupação com a contaminação química e as dúvidas na utilização da energia
nuclear. Nesse sentido, a resistência à energia nuclear estava centrada no risco da
radiação e na poluição nuclear, à vista disso foi organizado o grupo Amigos da Terra
no ano de 1969.
Uma associação constituída por diferentes grupos de diversos países,
guiados por causas distintas, alguns estão em defesa da vida silvestre, outros estão
voltados para ecologia industrial, em conflitos ambientais e direitos humanos. Na
década de 90, o grupo obteve um reconhecimento pelo trabalho dos cálculos a
respeito do espaço ambiental, mas, ainda assim o conceito do “pós-materialismo”,
estava longe das práticas do movimento ambientalista ocidental.
Já a segunda corrente, denominada de “evangelho da ecoeficiência”, está
voltada para as consequências do crescimento econômico, tanto para o âmbito da
natureza como também na economia industrial, agrícola e urbana (MARTÍNEZ
ALIER, 2018).
Sua atenção está direcionada para os impactos ambientais ou riscos à
saúde decorrentes das atividades industriais da urbanização e também da
agricultura moderna. Essa segunda corrente do movimento ecologista se
preocupa com a economia na sua totalidade. Muitas vezes defende o
crescimento econômico, ainda que não a qualquer custo. (MARTÍNEZ
ALIER, 2018, p. 26).

Admissão central do “evangelho da ecoeficiência” encontra-se justificada na


perspectiva do “desenvolvimento sustentável”, na “modernização ecológica” e na
“boa utilização” dos recursos naturais, no qual domina os debates ambientais. Onde
o conceito de natureza é incorporado como “recurso natural” ao valor do capital.
A contradição dessa corrente perpassa em uma pseudo defesa da natureza,
com argumentação da defesa dos “recursos naturais” e “capital natural” e “serviços
ambientais”. Envolvendo profissionais do ramo da engenharia e economia. Localiza-
se nos Estado Unidos a circulação de debates ambientais, sociais e políticos em
torno da “ecoeficiência”, em bases conceituais como: “curvas Ambientais de
Kuznets”, onde se tem:
139

(...) O incremento de investimentos conduz, em primeiro lugar, a um


aumento da contaminação, mas no final conduz a sua redução; o
“desenvolvimento sustentável”, interpretado como crescimento econômico
sustentável; a busca de soluções de “ganhos econômicos e ganhos
ecológicos” – win-win –, e a “modernização ecológica” (MARTÍNEZ ALIER,
2018, p. 28).

Com o alicerce na modernização ecológica em duas bases, uma econômica,


com eco impostos e licenças para emissões e a outra tecnológica, favorecendo
medidas direcionadas para economia de matéria-prima e energia. Os critérios
científicos dessa corrente voltam-se para economia ambiental e o preceito da
Ecologia Industrial, ligados na Europa e Estado Unidos. Dessa maneira, a ecologia
conduz uma ciência que objetiva apenas limpar ou amenizar os impactos causados
pela industrialização.
A “ecoeficiência” é representada como uma “condição empresarial para o
desenvolvimento sustentável”. No campo do ambientalismo dos Estados Unidos e
no contexto mundial as duas correntes dominantes são: o “culto ao silvestre”
proposto por Jonh Muir e o “credo da ecoeficiência” proposto por Gifford Pinchot, as
duas correntes, segundo Martínez Alier (2018), estão correlacionadas e atuam
paralelamente.
Nesse caminho, o movimento ambiental passou por uma transformação, onde
a compreensão do desenvolvimento sustentável deve estar desvinculada da ideia da
“modernização ecológica”, considerando que:

Essa cronologia de ideias é plausível se considerarmos o “desenvolvimento


sustentável” uma autêntica novidade. Porém, torna-se duvidosa no caso de
observamos o desenvolvimento sustentável como de fato ele é, ou seja, um
irmão gêmeo da “modernização ecológica”, ou mesmo uma reencarnação
da ecoeficiência proposta por Pinchot (MARTÍNEZ ALIER, 2018, p. 32).

Em uma alternativa, tanto para primeira corrente quanto a segunda,


apresenta-se a terceira corrente com a proposição de um movimento que faça uma
justiça ambiental, identificada no ano de 1985, formada por aqueles que foram
silenciados por correntes do ambientalismo dos países eurocêntricos. A corrente do
ecologismo dos pobres, problematiza e questiona o crescimento do capital como o
fator determinante na progressão dos impactos ambientais.

Nesse sentido, observamos que os países industrializados dependem de


importações provenientes do Sul para atender parcela crescente e cada vez
maior que das suas demandas por matérias-primas e bens de consumo. Os
Estados Unidos importam metade do petróleo que consomem. A União
Europeia importa uma quantidade de materiais (inclusive energéticos)
140

quase quatro vezes maior que a que exporta. Ao mesmo tempo, a América
Latina exporta uma quantidade seis vezes maior de materiais (inclusive
energéticos) do que aquela que é importada. O continente que constitui o
principal sócio comercial da Espanha, não em dinheiro, mas em quantidade
importada, é a África (MARTÍNEZ ALIER, 2018, p. 34).

Sobre o fragmento acima, podemos inferir que a demanda de matérias-primas


tem um aumento significativo em proporções diferenciadas em países do Norte e
Sul, acarretando na abertura de novos espaços para construção de fronteiras de
importação e exportação, em consequência dessa dinâmica, múltiplos territórios são
impactados, tanto em políticas econômicas ou por tecnologias, que não consideram
as especificidades dos grupos sociais pertencentes a esses contextos.

Apesar disso, o eixo principal desta terceira corrente não é uma reverência
sagrada à natureza, mas antes, um interesse material pelo ambiente como
fonte de condição para a subsistência; não em razão de uma preocupação
relacionada com os direitos das demais espécies e das futuras gerações de
humanos, mas sim, pelos humanos pobres de hoje (MARTÍNEZ ALIER,
2018, p. 34).

O objetivo dessa corrente tem em sua diretriz ética a busca pela justiça social
atual entre os seres humanos, indicando a relação dos povos originários e
organizações situados em territórios ameaçados, sustentam uma relação com
natureza e possibilitam a conservação da biodiversidade. Com designações voltadas
para os movimentos do terceiro mundo, que reivindicam contra a degradação
ambiental e os riscos em que a maioria da população excluída socialmente enfrenta
diariamente em seu cotidiano.
Movimentos de camponeses, onde suas terras são destruídas pelas
organizações do agronegócio, de mineradora ou por pedreiras, os pescadores
artesanais no desafio contra as embarcações tecnológicas e pescas industriais,
movimentos de oposição às minas e fábricas, oriundos das comunidades
prejudicadas pela poluição do ar e do rio (MARTÍNEZ ALIER, 2018).
A corrente da justiça ambiental tem o apoio da agroecologia, da etnoecologia,
da ecologia política, sociólogos do campo ambiental, ecologia urbana, assim como
da economia ecológica. Devido ao crescimento dos conflitos ecológicos, a corrente
sobre o ecologismo dos pobres vem tomando uma proporção maior em uma escala
global, pois se ocorre o aumento da economia, há o crescimento da produção de
resíduos e cada vez mais sistemas naturais são prejudicados.
141

Martínez Alier (2018) chama atenção para a noção entre ecologismo dos
pobres e sua luta contra o racismo ambiental e justiça ambiental utilizada nos Estado
Unidos, voltada apenas para minorias, na qual a primeira identifica a noção de rural
terceiro-mundo e a segunda em uma concepção urbana, para o autor as duas
noções estão inscritas na mesma corrente e direcionadas para a maioria da
população mundial que se encontram em situações de vulnerabilidade ambiental e
social.
O movimento pela justiça ambiental é potencialmente importante, sempre e
quando se dispões a falar em nome não só das minorias localizadas nos
Estados Unidos, como também das maiorias de fora desse país (que nem
sempre estão definidas em termos raciais), envolvendo-se em assuntos
como biopirataria e biossegurança e as mudanças climáticas, para além dos
problemas locais de contaminação. O que o movimento pela justiça
ambiental herda do movimento pelos direitos civis dos Estados Unidos
também vale em escala mundial devido à sua contribuição para formas
gandhianas de luta não violenta (MARTÍNEZ ALIER, 2018, p. 38).

O movimento da justiça ambiental tem em seu campo de conhecimento uma


ciência participativa, que surge da associação da ciência formal com a ciência
informal, em um entendimento, que tem a “ciência com pessoas” a luta em defesa
da agroecologia tradicional de grupos originários como indígenas e camponeses,
grupos que carregam uma riqueza cultural e tem muito a ensinar sobre seu modo de
viver com a natureza, conduzindo-se em um diálogo de saberes.
O diálogo de saberes é fundamental no caminho do movimento da justiça
ambiental, por considerar que as lutas aparecem decorrentes da presença de uma
pluralidade entre os povos e seus territórios, imersos em conflitos ambientais locais,
regionais e nacionais, ocasionadas por uma lógica econômica excludente e pela
desigualdade social (MARTÍNEZ ALIER, 2018), onde cada um tem uma
especificidade a ser compreendida de forma singular, não podem ser padronizadas
em medidas eurocêntricas capitalistas.
Após apresentação das correntes mais relevantes para a concepção da
educação ambiental, concentra-se a seguir na análise das principais denominações
das práticas educativas, com objetivo de qualificar as propostas de educação
ambiental em correntes teóricas.
142

4.3 As principais correntes teóricas em educação ambiental

O termo corrente é empregado a uma maneira geral de compreender e de


praticar a educação ambiental. Sauvé (2005) ao realizar a cartografia das correntes
em educação ambiental, a autora aponta que uma determinada corrente pode
elencar indicativos próximos a outras correntes, dependendo do prisma que é
analisado.
Embora cada uma das correntes apresente um conjunto de características
específicas que a distingue das outras, as correntes não são, no entanto,
mutuamente excludentes em todos os planos: certas correntes
compartilham características comuns. Esta sistematização das correntes
torna-se uma ferramenta de análise a serviço da exploração da diversidade
de proposições pedagógicas e não um grilhão que obriga a classificar tudo
em categorias rígidas, com o risco de deformar a realidade (SAUVÉ, 2005,
p.17-18).

Nesse tópico, serão abordadas, de forma breve, 15 correntes da educação


ambiental, incluindo as correntes de tradição mais “antiga”, que datam da década de
1970 a 1980, e outras que foram surgindo recentemente, sendo organizado em dois
momentos: o primeiro trata das correntes mais tradicionais que são: naturalista,
conservacionista/ recursista, resolutiva, sistêmica, científica, humanista, moral e
ética.
O segundo momento contempla as correntes em educação ambiental mais
recentes que são: holística, biorregionalista, práxica, crítica, feminista. ecoeducação
e da sustentabilidade, centrando em analisar os parâmetros propostos por Sauvé
(2005) sobre a concepção dominante do meio ambiente, a intenção central da
educação ambiental, enfoques e exemplos de modelos de cada corrente.
A primeira corrente, naturalista, trata-se de uma corrente em que seu centro é
emerge da relação com a natureza, tendo como enfoque educativo, segundo Sauvé
(2005), pode ser atribuído ao cognitivo (o aprendizado se constrói com as coisas
sobre a natureza), experiencial (viver e aprender com a natureza), afetivo, espiritual
e artístico (onde se associa a criatividade humana à da natureza).
Com a tradição mais antiga, a corrente naturalista traz o aprendizado a partir
da imersão ou imitação nos grupos sociais cuja cultura está construída na relação
com o meio natural. Também pode ser compreendida como a educação para o meio
natural.
143

Na corrente naturalista, há o reconhecimento do valor da natureza, seu


modelo de intervenção pontua-se como “A educação para a terra”, proposta por
Steve Van Matre (1990), a qual possibilita as experiências cognitivas e afetivas no
meio natural. A natureza é considerada como meio de aprendizagem.
A reconstrução da natureza é objetivo da corrente naturalista, com enfoque
sensorial, experiencial, afetivo, cognitivo, estético, com a estratégia de atuação por
via da imersão, interpretação, jogos sensoriais e atividades de descoberta.
A segunda corrente é conservacionista/recursista que agrupa concepções de
conservação dos recursos naturais no que tange à quantidade e qualidade, a
conservação da natureza tem uma preocupação com a gestão ambiental. Essa
perspectiva de educação sempre fez parte do cotidiano familiar ou comunitário os
recursos são escassos.
Os programas de educação ambiental agrupados nos três “R”, Redução,
Reutilização e da Reciclagem, a preocupação ambiental estava apenas na gestão
da água, na gestão do lixo e gestão da energia.
Concebe o ambiente como recurso, tendo o enfoque cognitivo pragmático,
como estratégia de intervenção utiliza o código de comportamentos, “auditoria”
ambiental.
A terceira corrente é a resolutiva, que tem seu início na década de 1970,
momento específico em que a sociedade encontrava problemas ambientais
acentuados. Nessa corrente a visão de educação ambiental é a proposta adotada
pela UNESCO estabelecida em seu Programa Internacional de Educação Ambiental,
objetivando mudar o comportamento para solucionar problemas decorrentes da
relação entre o ser humano e a natureza.
O modelo pedagógico desenvolvido pelos principais autores como Harold R.
Hungerford e seus colaboradores (1992) estava baseado no desenvolvimento de
habilidades em sequências de resolução de problemas, segundo esses autores a
educação ambiental volta-se para a investigação dos problemas ambientais, levando
em consideração fatores sociais, biofísicos e suas contestações.
A perspectiva de ambiente é o problema, tendo como objetivos a resolução de
problemas do diagnóstico à ação, com enfoque cognitivo e pragmático, em
estratégias de intervenção com estudos de caso, análise de situações problema,
experiência em resolução de problemas associadas a um projeto.
144

A quarta corrente é a sistêmica, seu enfoque busca em conhecer e entender


corretamente a realidade e as problemáticas ambientais, possibilitando identificar os
diversos componentes que tangenciam um sistema ambiental e a importância das
relações entre seus componentes, por meio encadeamento entre os elementos
biofísicos e os sociais em uma determinada situação ambiental.

O enfoque das realidades ambientais é de natureza cognitiva e a


perspectiva é da tomada de decisões ótimas. As habilidades ligadas à
análise e à síntese são particularmente necessárias. A corrente sistêmica
em educação ambiental apoia-se, entre outras, nas contribuições da
ecologia, ciência biológica transdisciplinar, que conheceu seu auge nos
anos de 1970 e cujos conceitos e princípios inspiraram o campo da ecologia
humana (SAUVÉ, 2005, p. 22).

A compreensão sistêmica da situação averiguada averigua soluções que


possam ser menos prejudiciais ou mais adequadas ao meio ambiente. O meio
ambiente visualizado como um sistema, nas quais os objetivos da educação
ambiental estão alicerçados em desenvolver o pensamento sistêmico: análise e
síntese para uma visão global, compreendendo a realidade ambiental, com decisões
apropriadas, cognitivo é o enfoque predominante nesta corrente é o cognitivo,
analisando os sistemas ambientais.
A quinta corrente é a científica tem como objeto de estudo apropria-se de
conhecimentos fundamentados nas ciências ambientais, buscando desenvolver
habilidades relativas à experiência científica, com enfoque dominante no campo
cognitivo experimental, estuda os fenômenos por meio da observação,
demonstração, experimentação, atividade de pesquisa hipotético-dedutiva.
A Sexta corrente trata-se da corrente humanista, compreende o meio
ambiente na perspectiva do meio de vida, como objetivos demarcados para o sujeito
que conhece o seu meio de vida, conhece a si mesmo, que nesse movimento resulta
no desenvolvimento de pertencimento ao meio ambiente. Com enfoques definidos
em campos da sensação, da reflexão, afetividade, experiência, criatividade e
estética. Tendo como estratégia de intervenção o estudo do meio, itinerário
ambiental e leitura de paisagem.
Já a sétima corrente é denominada de moral e ética, interpreta o meio
ambiente como objeto de valor, objetivando dar a prova de ecocivismo na
construção de um sistema de ética, de forma cognitiva, afetiva e moral seus
145

enfoques são delineados, a intervenção de estratégias está respaldada na análise


de valores, definição de valores e crítica de valores sociais.
A oitava corrente é holística, concebe o meio ambiente o total todo o ser,
tendo como propósito desenvolver as múltiplas dimensões de seu ser em interação
com o conjunto de dimensões do meio ambiente, estimulando uma visão “orgânica”
do mundo e uma atuação participativa em e com o meio ambiente. Com enfoque
holístico, orgânico, intuitivo, criativo, em suas respectivas estratégias está a
exploração livre, visualização, oficina de criação, integração de estratégias
complementares.
A corrente biorregionalista compreende o meio ambiente como lugar de
pertença e projeto comunitário, desenvolvendo competências em
ecodesenvolvimento comunitário, local e regional, na perspectiva cognitiva, afetiva,
experiencial, pragmática, criativo, explorando o meio para projetos comunitários e
criação de ecoempresas. A décima corrente é a práxica, conduz o meio ambiente
em uma ação e reflexão, aprendendo para e pela ação, no exercício da reflexão, de
forma práxica em uma pesquisa-ação.
Na corrente crítica o meio ambiente é configurado como objeto de
transformação, como lugar de emancipação, desconstruindo as realidades
socioambientais, com uma visão transformar a causa dos problemas ambientais,
práxica reflexiva e dialogístico são os enfoques dominantes nesta corrente,
analisando o discurso, estudo de casos, debates e pesquisa-ação.
Já corrente feminista, interpreta o meio ambiente como objeto de solicitude,
integrando os valores feministas à relação com o meio ambiente, abordando o
campo ambiental pela intuição, afetividade, pelo valor simbólico, espiritual,
criativo/estético, com estudos de casos imersão, oficinas de criação, atividade de
intercâmbio e de comunicação.
O meio ambiente para a corrente etnográfica é um território, lugar de
identidade, natureza e cultura, reconhecendo a estreita ligação entre natureza e
cultura, aclarando sua própria origem, valorizando a dimensão cultural de sua
relação com o meio ambiente, a experiência, a intuição, assim como também
afetividade, simbólico, espiritual e criativo/estético. Contos, narrações e lendas,
estudo de caso, imersão e modelização com estratégia de intervenção.
A corrente da ecoeducação evidencia o meio ambiente como um polo de
interação para a formação pessoal e de identidade, experenciando o meio ambiente
146

para a formação do sujeito consciente, buscando uma melhor relação com o mundo.
O enfoque experiencial, sensorial intuitivo, afetivo e simbólico criativo. Com a
intervenção pelo relato de vida, imersão, exploração, introspecção, escuta sensível,
alternância subjetiva e objetiva e também de forma lúdica.
A última corrente aborda a temática da sustentabilidade, onde o meio
ambiente é o recurso para o desenvolvimento econômico de recursos
compartilhados, promovendo um desenvolvimento na economia, respeitando os
aspectos sociais e do meio ambiente. Com enfoque pragmático e cognitivo, e assim
tendo a intervenção estratégica pautada no estudo de caso, experiência de
resolução de problemas e projetos de desenvolvimento de sustentação e
sustentável.
Em prosseguimento, após apresentação da variação das correntes de
projeção e práticas pedagógicas em educação ambiental, onde foi verificado que
uma mesma proposição pode ocorrer simultaneamente com duas ou três correntes
distintas, que podem ou não reproduzir ações viabilizando apenas a conscientização
hegemônica ou uma transformação crítica da relação entre ser humano e meio
ambiente. Assim sendo, aborda-se no tópico a seguir, as macro-tendências que
apontam a classificação do campo da Educação Ambiental no Brasil.

4.4 Macro-tendência das correntes da educação ambiental: nas principais


perspectivas político-pedagógica

Procedendo do entendimento, já exposto anteriormente, a educação


ambiental tem em sua formação uma variedade de atores, instituições e grupos
sociais, associados à normativas e valores iguais. Todavia, há uma diferenciação
entre esses atores sociais e seus pareceres a respeito do meio ambiente e dilemas
ambientais, no que contempla as proposições políticas pedagógicas e
epistemológicas.
Ocorrendo assim, uma competição entre esses grupos sociais na
concentração de poder do campo de estudo ambiental, que tem em suas variantes
interpretativas a realidade e interesse específicos com panoramas
conservacionistas, pragmáticos e transformadores para o vínculo da realidade social
com o meio ambiente.
147

Agrega também a percepção do movimento e da coexistência entre


tendências que disputam a dinâmica da hegemonia deste campo. Por esta
perspectiva podemos explorar a posição dos grupos que dividem o campo,
as relações que mantêm entre si, assim como as tendências à reprodução e
à transformação da ordem constituída. A análise dessa dinâmica dialética,
portanto, representa o substrato do qual emergem as macro-tendências
político-pedagógicas ora analisadas (LAYRARGUES; LIMA, 2011, p. 3-4).

Não há como prescrever o momento certo que ocorre a criação de diferentes


correntes político-pedagógicas na educação ambiental, mas demarcar-se
possivelmente na década de 90 o início da manifestação a partir da crise ambiental.
Embora o surgimento da educação ambiental tenha ocorrido em um contexto
marcado pela então crise ambiental, ao final dos anos noventa, onde a preocupação
estava centrada na prática social de medidas que viabilizassem a redução dos
impactos ambientais, o que prevaleceu foi a ratificação que o campo da educação
ambiental contemplava um domínio multifacetado alicerçado em uma conexão entre
sujeitos, educação, sociedade e a natureza.
No qual demandaram de estudos mais complexos e acentuado, em análises
respaldadas por estudiosos, que se dedicavam em novas formulações conceituais
no atendimento da área e das práticas educativas ambientais. Na construção do
trajeto histórico da educação ambiental que foi apresentado nesta seção, verificou-
se que no início buscava-se a universalidade de um conceito para todos que
estavam incluídos nessa área educativa.
Porém, no decorrer da estruturação de uma nova definição, ocorre o
entendimento acerca da diversidade de concepções e múltiplos protagonistas, nas
quais compartilhavam o universo de ações e saberes. Ao compreender a pluralidade
desse campo, foram encaminhadas novas pesquisas, formulações teóricas e
também políticas.
Como já mencionado anteriormente, é atravessado por uma interpretação de
uma posição pedagógica, disciplinas e práticas epistêmicas e políticas, que
elucidavam os enfoques da educação, sociedade, ambiente natural e construído
(LAYRARGUES; LIMA, 2011). Após a exposição da variação do contexto histórico
do movimento ambientalista e suas respectivas correntes e quais eram seus
objetivos demarcados, é notório a impossibilidade de elaborar um conceito para a
educação ambiental mais democrático e integral.
Ainda que a fase inicial do processo conceitual intencionava uma hegemonia
epistêmica e política. O surgimento de novas propostas teóricas evidenciava a
148

multiplicidade interna que o campo da educação ambiental já estava consolidado.


Atenta-se então, para as mudanças do prisma analítico em relação ao objeto de
referência sobre a educação ambiental.
Dessa forma, na fase inicial da educação ambiental estava pautada em uma
nova prática conservacionista na concepção do ambiente como natureza, em um
enfoque romantizado para um despertar sensível do ser humano com a natureza,
LAYRARGUES; LIMA (2011) destacam a seguir:

A vertente conservadora, que se expressa por meio das correntes


conservacionista, comportamentalista, da Alfabetização Ecológica e do
autoconhecimento, com limitado potencial de se somar às forças que lutam
pela transformação social, por estarem distanciadas das dinâmicas sociais e
políticas e seus respectivos conflitos de interesses e de poder
(LAYRARGUES; LIMA, 2011, p.8).

A base da ciência ecológica orientava para uma “conscientização” limitada ao


aspecto ecológico, incorporando a fauna, flora e o ambiente físico, no entanto, não
há alusão para uma dimensão humana, principalmente no que tangencia ao campo
do trabalho, o que pode-se inferir é a ligação com o momento da crise ambiental, na
defesa da “pauta verde”.

Isso provavelmente porque a face mais visível da crise ambiental em seu


princípio foi a destruição da natureza e porque as ciências ambientais ainda
não estavam maduras o suficiente para compreender a complexidade das
relações entre sociedade e natureza. Os problemas ambientais eram, em
grande medida, percebidos como efeitos colaterais de um projeto inevitável
de modernização, passíveis de serem corrigidos, ora pela difusão de
informação e de educação sobre o meio ambiente, ora pela utilização dos
produtos do desenvolvimento científico e tecnológico (LAYRARGUES;
LIMA, 2011, p.5).

A identidade da educação ambiental é formada a partir do campo ambiental e


sua herança institucional do ponto de vista simbólico e político. A relação entre teoria
e prática com o campo educativo favoreceu uma leitura ecológica das problemáticas
ambientais. Pois, não acontecia participação de outros cientistas das áreas humanas
e sociais.
Com o tempo, os educadores ambientais foram se dando conta que, da
mesma maneira que existem diferentes concepções de natureza, meio
ambiente, sociedade e educação, também existem diferentes concepções
de Educação Ambiental (LAYRARGUES; LIMA, 2011, p.6).

Assim, outras possibilidades de atuação foram sendo criadas a partir da


divisão das áreas de conhecimento e suas práticas educativas. Considerando que
149

no campo da educação há várias correntes, o movimento ambientalista desenvolveu


múltiplas correntes reflexivas e a concepção de sociedade também. Diferencia-se
em outras possibilidades de abordagem, é perceptível que os pontos de
convergência entre elementos que subsidiaram a educação ambiental.
Estruturando a amplitude de um prisma e possibilidade entre a educação e
meio ambiente (LAYRARGUES; LIMA, 2011). À medida que essa diversidade
interna se tornou visível, as análises buscaram problematizar esse fenômeno,
fazendo da educação ambiental um objeto de estudo auto-reflexivo, que pensa sua
prática e desenvolvimento a necessidade de compreender suas singularidades.
A auto-reflexividade educação ambiental para Layrargues; Lima (2011)
somada à uma consciência e respeito da crise ambiental ocasionou no
enfraquecimento da vertente conservacionista, por parte dos educadores que
estavam em um outro direcionamento epistêmico.

Assim, no início dos anos 90, educadores ambientais que partilhavam de


um olhar socioambiental, insatisfeitos com os rumos que a Educação
Ambiental vinha assumindo, começaram a diferenciar duas opções: uma
conservadora e uma alternativa. Julgavam que a opção conservadora,
materializada pelas vertentes conservacionista e pragmática, era limitada,
por entender que o predomínio de práticas educativas que investiam em
crianças nas escolas, em ações individuais e comportamentais no âmbito
doméstico e privado, de forma a - histórica, apolítica, conteudística,
instrumental e normativa não superariam o paradigma hegemônico que
tende a tratar o ser humano como um ente genérico e abstrato, reduzindo
os humanos à condição de causadores e vítimas da crise ambiental,
desconsiderando qualquer recorte social (LAYRARGUES; LIMA, 2011, p.7).

Para o conservacionismo e o conservadorismo, não há uma dimensão social,


política e cultural à crise ambiental, apenas o aspecto ecológico é abordado,
desconsidera-se a complexidade dos fenômenos ambientais, reduzindo em aspectos
da intervenção da inovação tecnológico.
A outra vertente da macro-tendência trata-se da vertente pragmática tem a
concepção de ambiente como recurso, sendo a educação ambiental voltado apenas
para o desenvolvimento e consumo sustentável.

Dessa forma, essa vertente que responde à “pauta marrom” por ser
essencialmente urbano-industrial, acaba convergindo com a noção do
Consumo Sustentável, que também se relaciona com a economia de
energia ou de água, o mercado de carbono, as eco-tecnologias legitimadas
por algum rótulo verde, a diminuição da “pegada ecológica” e todas as
expressões do conservadorismo dinâmico que operam mudanças
superficiais, tecnológicas, demográficas, comportamentais (LAYRARGUES;
LIMA, 2011, p.9).
150

O meio ambiente em uma visão pragmática não tem relação com os aspectos
humanos apenas limita-se ao agrupamento dos recursos naturais, tendo uma
preocupação apenas com o desperdício e o lixo considerando como resíduo.
Situado em um contexto neoliberal, não pondera as desigualdades da distribuição
custos e benefícios da apropriação dos bens ambientais incorporadas na lógica
desenvolvimentista, ocasionando em ofertas de reformas setoriais na sociedade,
não questionando os subsídios de base, incluindo os órgãos responsáveis pela crise
ambiental.
Assim, no contexto neoliberal em que a economia de mercado impõe seus
valores e sua lógica, em que o padrão de consumo de bens eletrônicos
desponta como um símbolo de bem-estar e modernidade, em que a crise
ambiental parece mostrar seu desafio decisivo por meio da ameaça
planetária das mudanças climáticas; o cruzamento desses vetores parece
moldar uma conjuntura específica para a ascensão da vertente pragmática,
produzindo novos e polêmicos sentidos identitários para a Educação
Ambiental e despontando como a tendência hegemônica na atualidade
(LAYRARGUES; LIMA, 2011, p.10).

Na concepção pragmática o estado reduz sua atuação em uma proporção


prejudicial à políticas públicas e sociais, principalmente as políticas ambientais, a
educação ambiental pragmática tem uma configuração apelativa aos sujeitos em
renunciar alguns padrões de bem-estar e confere a obrigação às empresas em
abdicar parte dos suas vantagens lucrativas mercadológicas, afim do favorecimento
do governamental.
Afinal, nessa lógica neoliberal, o mercado tem a liberdade de explorar a
natureza, seus recursos e seres humanos, não objetiva a transformação social,
apenas adota medidas paliativas em minimizar os problemas decorrentes dessa
exploração exacerbada, alguns exemplos representativos são a adoção de medidas
de reciclagem, reutilização, reduzir, repensar e recusar 3R e 5R, para dar conta dos
resíduos que foram gerados.
A incoerência desse modelo, é que o mesmo não tem a pretensão de diminuir
o consumo, apenas da conta dos resíduos. Dando ênfase para a questão da
preservação na manutenção da biodiversidade. Com isso, a vertente pragmática
não faz uma reflexão sobre as circunstâncias dos problemas ambientais,
desconsiderando suas consequências e especificidades, respaldada em uma ciência
neutra e tecnológica com um olhar superficial e desconectado do caráter político das
151

relações na sociedade e sua dinâmica com o meio ambiente, em que é inexistente a


possibilidade de confrontar a política da crise.
Em uma interlocução com a pesquisa realizada em uma Área de Proteção
Ambiental, que é uma medida criada pelo estado na ponderação dos impactos
ambientais, pode-se fazer uma leitura, que a realidade ambiental encontrada na
comunidade em um panorama da gestão administrativa da localidade, manifesta
elementos característicos de uma vertente pragmática.
No entanto, quando trata-se da experiência de educação ambiental do grupo
de Fortalezinha, observando as informações da seção anterior, são expostos os
aspectos que podem levar à duas prospectivas interpretativas, a primeira é a
pragmática, se for analisada e limitada apenas nas ações voltadas para questão
comportamentalistas dos participantes do grupo nas atividades de coleta e
reciclagem do lixo da comunidade.
A segunda é a vertente crítica em um horizonte socioambiental, conduzido a
partir da mobilização e motivação dos sujeitos envolvidos preocupados não somente
com a questão ambiental, mas em uma visão social, no auto-reconhecimento como
sujeito pertencente à uma comunidade tradicional pesqueira, questionando seus
direitos diante das desigualdades sociais frente a atuação do estado, a construção
de uma autonomia participativa e a relação com o trabalho.
Uma vez que, a vertente crítica tem uma perspectiva socioambiental na
vinculação entre a sociedade e natureza em uma interação de reciprocidade,
trazendo o enfrentamento com as políticas de desigualdade e injustiça
socioambiental (LAYRARGUES; LIMA, 2011), também por meio do campo do
ambientalismo, que segundo LAYRARGUES; LIMA (2011) é incorporado ao debate
por apresentar alguns conceitos-chave que são:

Em grande medida, assim como o ambientalismo, há um forte viés


sociológico e político na vertente crítica da Educação Ambiental, e em
decorrência dessa perspectiva são introduzidos no debate desses campos
alguns conceitos-chave como os de Cidadania, Democracia, Participação,
Emancipação, Conflito, Justiça Ambiental e Transformação Social. Não por
acaso o surgimento e a consolidação dessa vertente coincidem com o
movimento ocorrido na Ecologia Política como possibilidade de
interpretação do ambientalismo (LAYRARGUES; LIMA, 2011, p.11).

Além de uma atenção política, a educação ambiental crítica desenvolve-se


em uma complexidade, no que concerne aos perigos e problemáticas da sociedade
contemporânea, reprovando qualquer tipo de reducionismo, seja na área biológica,
152

econômica, política e sociológico. Procurando legitimar as demandas no âmbito da


cultura, particularidade tanto dos sujeitos como da realidade social e ambiental,
identidade e subjetiva, que são consequências das frequentes transformações
sociais.
(...)A ressignificação da noção de política, a politização da vida cotidiana e
da esfera privada, expressas nos novos movimentos sociais e na gênese do
próprio ambientalismo. Ou seja, as dimensões política e social da educação
e da vida humana são fundamentais para sua compreensão e
desenvolvimento, mas elas não existem separadas da existência dos
indivíduos, de seus valores, crenças e subjetividades (LAYRARGUES;
LIMA, 2011, p.11).

A exemplo da citação de Layrargues; Lima (2011), também faz uma


associação para vertente crítica com as diretrizes da Lei Nº 9.795 da Política
Nacional de Educação Ambiental, que fundamenta uma compreensão de
transformação social, contextualizando historicamente o ser humano com a
natureza.
É plausível apreender pela vertente crítica como foi a construção da interação
entre o ser humano e natureza, a ressalva de atentar-se para mudanças dentro da
estrutura de exploração do ser humano com a natureza e do ser humano em relação
ao trabalho de outros sujeitos, tencionando combater as políticas das desproporções
e das injustiças socioambientais. Em uma reflexão e transformação social, além da
superação de dicotomias como a dissociação sujeito e objeto, natureza e sociedade.
A importância de compreender como o campo da educação ambiental vem
sendo construído desde do início do movimento ambientalista na década de 60 até
os dias atuais. Como os movimentos sociais e suas consequentes correntes, foram
um passo significativo para as macrotendências político-pedagógicas da educação
ambiental no Brasil abordadas de forma breve no tópico desta seção.
153

5. OUTRAS PEDAGOGIAS: UM OLHAR PARA EDUCAÇÃO NA AÇÃO


COLETIVA DO GAF

Após a exposição conceitual acerca da educação ambiental, das diretrizes e


documentos oficiais, da relação com o movimento ambientalista e suas referentes
correntes, assim como as macrotendências e vertentes que encaminharam
historicamente a educação ambiental em escala global e nacional, dar-se
prosseguimento a esta seção, a qual versa sobre as questões dos pontos 3 e 4 do
instrumento da pesquisa12, a respeito da proposta de educação ambiental do GAF.
Aqui apresento inicialmente um diálogo com alguns preceitos fundamentais
para a compreensão do campo de uma educação construída fora dos modelos
hegemônicos, referências de teorias pedagógicas que em suas concepções
epistemológicas não estão baseadas em um movimento educativo trazido de fora
para dentro (ARROYO, 2012). Para uma interpretação e reconhecimento das formas
de criação e recriação de uma educação proposta para um tempo e temporalidade
específicas da região do Nordeste Paraense e a possibilidade de legitimidade
recíproca entre as experiências que não são limitadas às totalidades ou partes, e
sim na sua relação dialética, dinâmica e dialógica.
Dessa forma, a seção está organizada em 4 momentos: o primeiro tem como
objetivo a discussão inicial para acepção da proposta de educação em uma ação
coletiva; o segundo traz uma análise interpretativa a partir das epistemologias do sul
para o debate sobre a experiência de educação ambiental do GAF; o terceiro
apresenta a proposta de educação ambiental a as ações procedentes dessa
experiência, assentada nas narrativas dos participantes; e o quarto tópico revela
quais foram os avanços, limites e desafios que resultaram da ação coletiva e de sua
proposta de educação ambiental.
Dialogando assim, com alguns preceitos fundamentais para o campo de uma
outra educação, fora dos padrões eurocêntricos formativos, em espaços outros em
processos de ação coletiva. Desse modo, trago marcadores interpretativos que
contribuem para a compreensão de outras formas de educação que emergem de
uma atuação contra hegemônica não institucionalizada.

12
Instrumento da pesquisa de campo, roteiro da entrevista narrativa. O tópico 3 refere-se a proposta de
educação ambiental do GAF e o tópico 4 ao término do GAF e suas implicações.
154

Ao pesquisar o GAF parto da perspectiva de uma educação não formal


“aquela que se aprende “no mundo da vida”, via os processos de compartilhamento
de experiências, principalmente em espaços e ações coletivos cotidianos” (GOHN,
2010, p.16). Segundo Gohn (2010), há um campo próprio da educação não formal
com objetivos e propostas demarcadas para formação da cidadania e emancipação
dos sujeitos, embora o senso comum e parte dos meios midiáticos informacionais
não considerem outros espaços como potenciais educativos:

A educação não formal é um campo que vem se consolidando desde as


últimas décadas do século XX e a explicação para este fato advém das
mudanças e transformações ocorridas na sociedade neste período,
especialmente com a globalização (GOHN, 2010, p. 34).

O que tem gerado novas demandas e necessidades no âmbito educacional


com uma diversidade de movimentos sociais: associações, fenômenos culturais,
práticas de lazer, dentre outras, que não estão vinculadas diretamente com o espaço
escolar (GOHN, 2010).

A aprendizagem e o exercício de práticas que capacitam os indivíduos a se


organizarem com objetivos comunitários, voltados para a solução de
problemas coletivos cotidianos, geradas pela participação em associações,
movimentos, fóruns, conselhos e câmaras de gestão, de forma que estes
cidadãos possam entender e fazer uma leitura do que está ao seu redor,
quem é quem, que projetos e quais interesses cada um defende, quais são
os interesses da maioria que deveriam ser defendidos, quais são as práticas
cidadãs e emancipatórias (GOHN, 2010, p. 35).

Sendo “em seu processo de experiência e socialização, pertencimentos


adquiridos pelo ato da escolha em dados processos ou ações coletivas” (GOHN,
2005, p. 18). Havendo uma intencionalidade em sua ação, na participação, no
aprendizado e na transmissão ou trocas de saberes, com a finalidade formar
cidadãos propostos a uma abertura de conhecimento no mundo.

Seus objetivos não são dados a priori, eles se constroem no processo


interativo, gerando um processo educativo. Um modo de educar é
construído como resultado do processo voltado para os interesses e as
necessidades dos que participam. A construção de relações sociais
baseada em princípios de igualdade e justiça social, quando presentes num
dado grupo social, fortalece o exercício da cidadania. A transmissão de
informação e formação política e sociocultural é uma meta na educação não
formal (GOHN, 2005, p.19).
155

No que tange às características da educação não formal, podemos sintetizá-la


na atuação subjetiva de grupos, com trabalhos orientados para uma formação
cultural e política. Estimulando os vínculos de pertencimento dos sujeitos e a
valorização da identidade coletiva, gerando consequentemente o desenvolvimento e
fortalecimento de sujeitos com interesses comuns. Com o esforço de alcançar
resultados, que segundo Gohn (2005) se dão pela sequência processual que são:

– Consciência e organização de como agir em grupo coletivos. – A


construção e reconstrução de concepção(ões) de mundo e sobre o mundo.
– Contribuição para um sentimento de identidade com uma dada
comunidade. – Forma o indivíduo para a vida e suas adversidades (e não
apenas o capacita para entrar no mercado de trabalho) (GOHN, 2005, p.21).

A autora distingue a educação não formal por uma lógica estruturada, que
acontece por meio da subjetividade, tomada de consciência, discernimento e leitura
de mundo, em diálogo com a educação popular, e no entendimento da educação
como manifestação essencial da prática social, em consonância com Freire (2015).

Me parece que o primeiro aspecto a sublinhar é que a prática educativa é


uma dimensão necessária da prática social, como a prática produtiva, a
cultural, a religiosa etc. Enquanto prática social a prática educativa, em sua
riqueza, em sua complexidade, é fenômeno típico da existência, por isso
mesmo fenômeno exclusivamente humano (FREIRE, 2015, p.78).

De tal maneira, a educação como ato político deve ser pensada em favor das
classes e grupos sociais excluídos, tendo em vista que a sociedade capitalista é
marcada por contradições e conflitos, processos de dominação e opressão,
desigualdades e exclusão, mas, também, um caminho de lutas e resistências.
Os estudos de Paulo Freire (2015) são fundamentais para o entendimento de
uma educação popular em contextos de lutas sociais, que alicerçam em avanços de
marcadores sociais. Um desses avanços é a legitimação da educação como um
direito de todos, referendado na Constituição Federal de 1988, sobre o Art. 205 da
seção que descreve:
Art. 205. A educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será
promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno
desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e
sua qualificação para o trabalho (Art. 205, Constituição Federal, 1988).

O Art. 205 configura a promoção e incentivo da educação em parceria com a


sociedade e como a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDBEN) Lei
de nº 9.394/96 é outro documento que define e legitima a educação em múltiplos
156

espaços, incluindo como “os processos formativos que se desenvolvem na vida


familiar, na convivência humana, no trabalho, nas instituições de ensino e pesquisa,
nos movimentos sociais e organizações da sociedade civil e nas manifestações
culturais (art. 1º, LDBEN, 1996).
Carneiro (2015) ao comentar sobre a LDBEN traz algumas informações para
uma compreensão mais abrangente da educação, produzindo uma ruptura com a
legislação anterior que apenas limitava à educação ao sinônimo de ensino:

O artigo em apreço representa uma ruptura de dimensão axiológica na


medida em que elastece a carga semântica de educação, imputando-lhe um
atributo de ação coletiva para construir identidades nas mais diferentes
ambiências humanas: na família, no trabalho, na escola, nas organizações
sociais, nas associações, nos sindicatos etc. Em qualquer destes espaços,
há um processo formativo, ou seja um chão de aprendizagem sobre o qual
se forma a cidadania. Trata-se, por conseguinte, de uma prática humana
eivada de equipamentos de subjetividade e de ações intencionalizadas que
focam a construção histórica e coletiva da humanidade (CARNEIRO, 2015,
p. 48).

A fala do autor remete à LDBEN a formação de quatro alicerces estruturais,


localizando outras possibilidades de meios pedagógicos, que são: a prática social,
atividade produzida em sociedade pela ação do ser humano (CARNEIRO, 2015);
mundo do trabalho, espaço com a finalidade de sobrevivência e transformação na
sociedade; movimentos sociais, lugares alternativos organizados por coletivos em
busca de uma autonomia da coletividade e manifestações culturais, criação humana
em sua intervenção pelo trabalho e sobre a natureza.
Faço uma conexão com o comentário de Carneiro (2015) quando esclarece o
movimento social como um meio educativo ao pensamento de Gohn (2005) da
dimensão educativa dos movimentos sociais pela diferenciação entre educação
formal e educação não formal. Dessa forma, reporta-se também ao estudo de Arroyo
(2012) em que considera para educação e seu fazer pedagógico a presença e
consciência de outros sujeitos e outros contextos educativos.

Esses coletivos com suas presenças, seja nos movimentos sociais, seja nas
escolas, trazem histórias nos processos formadores em contextos
concretos, sociais, econômicos, políticos, culturais. Trazem uma lição a não
deixar no esquecimento: todo pensamento social, pedagógico traz esse
enraizamento nas relações políticas, nas experiências sociais em que é
produzido. As pedagogias ou processos em que formaram e formam como
sujeitos sociais, éticos, culturais, de pensamento e aprendizagem são
inseparáveis desses contextos e das relações sociais, relações de poder
dominação/subordinação em que foram segregados (ARROYO, 2012, p. 11)
157

Para Arroyo (2012), o pensamento educacional volta-se a todos os processos


em que ocorre uma formação com os sujeitos sociais, sendo um processo inerente
às relações sociais, estabelecendo processos de dominação ou emancipação social.

As teorias pedagógicas não põem em prática concepções, epistemológicas


de educação trazida de fora, do centro civilizado e civilizador, mas foram
gestadas na concretude do padrão de poder/saber colonizador, aqui, nos
processos concretos de dominar, submeter os povos originários, indígenas,
negros, mestiços, trabalhadores livres na ordem colonial escravocrata
(ARROYO, 2012, p. 11).

O olhar de Arroyo (2012) para a educação como fenômeno social educação


historicamente nutrido por uma ordem excludente e colonizadora, no entanto,
considera a chegada de novos atores e outras experiências sociais, culturais, com
múltiplos valores, demonstrando que outras pedagogias estão sendo configuradas.
Assim, a ação coletiva do Grupo Ambiental de Fortalezinha insere-se nesse outro
trilhar pedagógico, constituindo um coletivo que reivindica seu lugar de ação no
mundo.
Na medida em que nossa história política, cultural, esses coletivos foram
decretados à margem da história intelectual e cultural sua condição de
sujeitos de formação intelectual, cultural, política foi ocultada, ignorada,
consequentemente suas pedagogias de formação como sujeitos sociais,
culturais não foram reconhecidas na história oficial das ideias, concepções e
práticas pedagógicas. Ao se afirmar presentes como sujeitos políticos,
sociais exigem o recontar dessa história pedagógica que os segregou como
sujeitos e os relegou a meros objetos, destinatários das pedagogias
hegemônicas. Exigem que sua história seja reconhecida, ou melhor, que as
narrativas da história oficial das pedagogias seja outra (ARROYO, 2012.
p.12).

Partindo do entendimento acima, há um delineamento de uma outra


pedagogia, onde sujeitos sociais estão voltados para ações coletivas, ações estas
que caracterizam como contextos educativos, que se transcorrem em tempos e
espaços distintos. Ao considerar toda caracterização do GAF, já apresentada na
seção 3, verificou-se as motivações que tangenciaram a mobilização para criação do
grupo como uma ação coletiva, com outros sujeitos e uma especificidade do
contexto de uma comunidade tradicional pesqueira na Amazônia. Caminhando
nessa mesmo direcionamento Arroyo (2012) destaca:

Presença de Outros Sujeitos em ações coletivas que se tornaram


afirmativas no campo, quilombolas, indígenas, povos da floresta, movimento
feminista, negro, de orientação sexual, pró-teto, moradia, pré-
escola/universidade...Sujeitos sociais, invisibilizados, apenas destinatários
de programas sociais compensatórios e de políticas educativas se
mostrando presentes, visíveis, resistentes (ARROYO, 2012, p. 25-26).
158

Tendo como base o fragmento acima descrito, quando menciona “povos da


floresta”, das águas e do campo etc., pode-se aproximar para o contexto da
realidade da Amazônia e fazer a inclusão do povo de uma comunidade tradicional
pesqueira, sendo mais um exemplo da sociodiversidade amazônica. Desse modo,
oportuniza-se um diálogo, no que tange à concepção de ações coletivas, concepção
esta que deve ser interpretada com certa cautela, principalmente por sua
diferenciação em relação ao conceito de movimento social.
Ressalta-se que todo movimento social inclui uma ação coletiva, mas nem
toda ação coletiva é um movimento social. Ação coletiva conjectura para o
desenvolvimento da autonomia do social e de seus respectivos espaços de
mobilização política na sociedade civil e política, lugares que são garantidos e
tangenciados por uma cultura política democrática e por instituições de diretrizes
políticas formais representativas (GOHN, 1997, p. 67).
Não há uma ação coletiva sem o reconhecimento da identidade políticas de
seus sujeitos organizados coletivamente, sem a criação de novos sentidos,
organizações, novas identidades e espaços sociais. Essas ponderações viabilizam
estruturar o GAF em uma premissa de ação coletiva, em um nível organizacional na
vida cotidiana da localidade de Fortalezinha, inserida em um contexto maior e plural,
que trata da realidade do nordeste paraense, região amazônica. Dessa maneira,
para amparar esse entendimento reporta-se para seguinte esclarecimento:

Em resumo, ação coletiva envolve forma de associação específica para o


contexto de uma sociedade civil moderna e pluralista. Além disso, as duas
abordagens distinguem dois níveis de ação coletiva: a dimensão manifesta
em uma mobilização em larga escala (greves, competições, demonstrações)
e o nível menos visível, latente, de forma de organização e de comunicação
entre grupos relevantes para a vida cotidiana e para a continuidade da
participação do ator (GOHN, 1997, p. 80).

É de extrema importância referendar estes aspectos no diálogo de outras


pedagogia, em sua abrangência para diversidade de espaços e novos atores sociais
no tocante a ações coletivas e suas pautas sociais mobilizadoras para uma reflexão
educativa especifica de cada coletivo. Abordar o pensamento pedagógico em uma
amplitude que considere outros processos educativos mais complexos, de
realidades específicas históricas, sociais, política, cultural e pedagógica (ARROYO,
2012, p. 29).
159

Todas as pedagogias fazem parte dessas relações políticas conflitivas de


dominação/reação/libertação. Os movimentos sociais se afirmam atores
nessa tensa história pedagógica. Em sua diversidade de ações, lutas por
humanização/emancipação se afirmam sujeitos centrais na
afirmação/fortalecimento das pedagogias de libertação, logo sujeitos de
contestação/desestabilização das pedagogias hegemônicas de
desumanização/subordinação (ARROYO, 2012, p. 29).

Pontuando a compreensão de que há outras pedagogias em outros espaços e


relações sociais, quando Arroyo (2012) cita os movimentos sociais como atores
nessa tessitura pedagógica, elencando as ações que constituem os objetivos de
organização e suas lutas. Embora, o prisma dos movimentos sociais não seja a
temática central deste estudo, avalia-se que há pontos de convergência com o
sentido das ações coletivas, como designa Gohn (1997).

As ações coletivas envolvem a busca racional de interesses pelos grupos;


demandas e reivindicações são produtos permanentes de relações de
poder e não podem explicar a formação dos movimentos; movimentos
formam-se devido a mudanças nos recursos, na organização e nas
oportunidades para a ação coletiva; o sucesso de um movimento envolve o
reconhecimento do grupo como ator político ou o aumento de benefícios
materiais; e, finalmente, a mobilização envolve organizações formais em
ampla escala, burocráticas e com propósitos especiais (GOHN, 1997, p.
56).

Assim, as ações coletivas são definidas no decorrer de seu processo de


formação, sendo ações que atribuem crenças e símbolos antecedentes, não
caminham em uma inovação ideológica, mas a forma de articulação entre seus
respectivos ativistas entre suas matrizes e eixos de ação, ação coletiva encontra-se
em um plano mais micro em relação aos movimentos sociais. As ações coletivas são
resultados de processos múltiplos e com orientações distintas, em um transcurso
relacional que cria identidade coletiva do grupo, processo este que centraliza para
uma reflexão da ação social.
É a partir dessa reflexão e seu movimento entre os atores sociais, que a
outras formas de pedagogias tornam-se possíveis, em que sujeitos pedagógicos
estão inserido historicamente no silenciamento, de seus saberes, culturas e
identidades, marcadas pela trajetória das pedagogias colonizadoras (ARROYO,
2012, p. 30).
As pedagogias escolares são mais cercadas e fechadas a definir critérios
rígidos de validade e até de não reconhecimento de validade dos saberes,
modos de pensar e de pensar-se, de aprender e de educar-se que os
educandos levam às escolas e às universidades (ARROYO, 2012, p. 33).
160

Levar em consideração outros espaços pedagógicos além dos campos


institucionalizados, é viabilizar no reconhecimento de importantes contribuições de
outros sujeitos, sabres e processos de construção de conhecimentos, ao
exemplificar a experiência do GAF de uma outra educação voltada para o campo
ambiental, é compreender que há outras formas de educação ambiental não
consideradas pela pedagogia eurocêntrica do Norte global excludente.

Essa afirmação de que há conhecimentos e pedagogias fora, nas lutas


sociais, no trabalho, nos movimentos e ações coletivas daqueles pensados
como inferiores é o embate mais radical trazido para o embate pedagógico
e epistemológico. Essas presenças afirmativas dos inferiorizados e esses
reconhecimentos de que há conhecimentos lá fora tornam difícil a função de
ocultamento desses espaços, de outras experiências sociais e de Outros
Sujeitos como produtores de conhecimentos e de pedagogias. Entretanto,
os critérios legítimos, hegemônicos de validade resistem em reconhecer
outros espaços e outros sujeitos pedagógicos. As salas de aulas nas
escolas e nas universidades são espaços dessas tensões (ARROYO, 2012,
p. 34).

Ao olhar ação coletiva do Grupo Ambiental de Fortalezinha pela perspectiva


de uma outra, é compreender uma outra forma de aprender para além de uma
educação rígida e definida, que não considera outras experiências e realidades
como formas de novos conhecimentos, é entender sobre temporalidades e seus
protagonistas sociais e suas formas distintas de construir uma alternativa ao campo
da educação moderna.

5.1 As epistemologias do sul e pedagogias pós-abissais – uma contribuição


interpretativa acerca da experiência de educação ambiental do GAF

Este tópico aporta-se nas contribuições de Santos (2010), demarcando a


necessidade de uma pluralidade epistemológica, que reconheça a complexidade dos
conhecimentos para que sejam atribuídos parâmetros diferentes de legitimidade,
possibilitando assim uma interpretação, visibilidade e credibilidade aos
conhecimentos desperdiçados pela racionalidade hegemônica.
Há uma heterogeneidade epistemológica do mundo, como anuncia Santos
(2010, p.12 – 13), denominada de epistemologias do Sul, partindo do entendimento
do Sul de forma metafórica como um campo de instigações epistêmicas, buscando
reparar os prejuízos e consequências históricas ocasionadas pela correlação
colonial com o capitalismo no mundo.
161

As epistemologias do Sul são intervenções epistemológicas que denunciam a


relação desigual do saber e poder, que anulou os saberes dos povos e nações
colonizadas, elas proporcionam a valorização dos múltiplos saberes e um diálogo
horizontal entre os conhecimentos, denominado por Santos (2010) de ecologia de
saberes.
Expressando assim, a construção de uma análise crítica ao modelo de
racionalidade e desenvolvimento ocidental hegemônico, que historicamente
colonizou e excluiu os saberes e as experiências sociais de povos tradicionais latino-
americanos, em particular amazônicos, tomo as proposições de Boaventura de
Souza Santos, para que me auxilie na leitura da experiência singular de educação
ambiental resultante da ação coletiva do GAF, que historicamente ocupou uma
posição subalternizada pelo campo epistemológico assentado em um pensamento
abissal que desconsidera e anula os conhecimentos descendentes de territórios
coloniais.
A linha visível que separa a ciência dos seus ‘outros’ modernos está
assente na linha abissal invisível que separa de um lado, ciência, filosofia e
teologia e, do outro conhecimentos tornados incomensuráveis e
incompreensíveis por não obedecerem, nem aos critérios científicos de
verdade, nem aos dos conhecimentos, reconhecidos como alternativos, da
filosofia e da teologia (SANTOS, 2010, p.25-26).

Santos (2010) destaca que no outro lado da linha há uma vasta gama de
experiências desperdiçadas, tornadas invisíveis, assim como seus respectivos
autores, os quais não são localizados territorialmente. Foi por intermédio de uma
análise das narrativas dos entrevistados a partir das epistemologias do Sul, que se
pode comprovar um vasto repertório de vivências dos participantes do GAF,
destacando-se as práticas educativas.
Esses conhecimentos que emergem da experiência de educação ambiental
do GAF, nos ajudam a compreender contextos de educação não escolar na
Amazônia. Neste caso, enfatizando duas especificidades: o mesmo se dá em uma
comunidade tradicional pesqueira e pertencer à uma Área de Proteção Ambiental.
Nesta pesquisa foi essencial uma coerência epistemológica que promovesse
o diálogo e o reconhecimento com os diferentes tipos de experiências. Para a
tessitura da categoria analítica sobre educação ambiental, o pensamento pós-
abissal fundamentou o estudo, com objetivo de encontrar alternativa à lógica
162

predominante da ciência moderna, onde ocorre a invisibilidades para realidades que


estão fora do sentido capitalista.

O pensamento pós-abissal parte do reconhecimento de que a exclusão


social no seu sentido mais amplo toma diferentes formas conforme é
determinada por uma linha abissal ou não-abissal, e que enquanto a
exclusão abissalmente definida persistir, não será possível qualquer
alternativa pós-capitalista, progressista (SANTOS, 2010, p.43).

O pensamento moderno ocidental conduz as linhas abissais, uma vez que a


dicotomia entre o mundo humano e subumano é assegurada em uma concepção e
prática hegemônica, que segregam e negam o outro lado da linha. O lado da linha
onde predomina o conhecimento real, visível e universal, se constrói a regulação e
emancipação, já tangenciando ao lado da linha invisível, inexistente e subalterna, se
estabelece a apropriação e violência de conhecimento e de direito.
Pela lógica abissal, a experiência do Grupo Ambiental de Fortalezinha é
observada no campo dos conhecimentos invisíveis, considerando que o Grupo está
localizado em uma realidade subalternizada da região Amazônica, que sempre
ocupou o lugar de colônia, pois sua especificidade não se adequa a lógica da
universalidade das grandes metrópoles, detentoras da ciência, filosofia e teologia.
Ao analisar as narrativas dos interlocutores desta pesquisa, a ecologia de
saberes proposta por Santos (2010) possibilita compreender e reconhecer um modo
de se fazer educação ambiental em território amazônico. Destacando os avanços
desta experiência em dada comunidade, assim como o anúncio de uma
problemática atual.
De tal feita, inscrevem-se nas ações do GAF uma rede de significados e
sentidos inerentes a realidade local. Questões estas, que perpassam desde o
problema do lixo, assuntos econômicos, políticos, culturais, relacionados a dinâmica
do movimento turístico naquele lugar. Assim como, a inter-relação entre o saber e o
fazer, e suas implicações com: o planejar, escutar, pensar e atuar de modo
individual e coletivo, dos sujeitos envolvidos.
A vivência decorrente dessa iniciativa em educação ambiental abre reflexões
que estão para além da cientificidade moderna, de uma racionalidade ambiental
eurocêntrica prevista apenas em parâmetros curriculares dos contextos escolares.
Pois, há nas ações desenvolvidas pelo grupo, assim como de seus integrantes e
163

agentes externos uma tessitura direta de conhecimentos interligados que foram


sendo criados e ressignificados durante atuação do GAF na comunidade.
As problemáticas socioambientais, assim, demandam princípios analíticos
próprios que venham a atender sua singularidade. E, desse modo, apontem um
caminho epistemológico coerente para a realidade de uma comunidade tradicional
pesqueira e sua inserção no espaço da científico e pedagógico.

5.2 A Proposta da experiência de educação ambiental do GAF

Dando sequência, esta seção de análise enfatizará as práticas que levaram a


organização de pessoas com interesses comuns, como exemplo a criação de um
grupo, que se deu a partir de buscar alternativas para os problemas socioambientais
da comunidade, mas, também, envolveu elementos de contradições e conflitos
internos, narrados durante as pesquisas.
Elementos estes, que foram apresentados anteriormente pelo entrevistado
Manoel Teixeira, no tópico 3.1 sobre a história do GAF, como exemplo: as
contradições que perpassaram a fase inicial do grupo, marcada pelos
questionamentos sobre a problemática ambiental, a qual era colocado em debate por
pessoas de fora da comunidade e não pelos nativos da ilha. O que de certa maneira,
ocasionou imposições e silenciamentos, demarcando algumas posições iniciais no
interlocutor Manoel.
E também outras situações, como as tensões que envolviam o processo de
coleta, transporte e tratamento de resíduos, fato evidenciado na fala de Ivan Teixeira
no tópico 3.1. Conflitos ocasionados pelo crescimento da entrada de turistas, o
aumento da produção de lixo. Outro fator contraditório que o grupo discutia era a
formação de novas lideranças para construção de um fortalecimento no campo
ambiental da localidade, como Manoel Teixeira também descreve na seção 3.1. No
entanto, o que aconteceu na prática no decorrer dos anos, foi o enfraquecimento das
ações educativas do grupo e ausência de uma liderança para dar prosseguimento a
proposta do grupo.
A partir de agora, adentra-se nas narrativas dos entrevistados na pesquisa de
campo, buscando apresentar elementos que expressem a experiência de educação
ambiental na ação coletiva do GAF. De tal modo, que já na narrativa abaixo
podemos averiguar a questão mencionada:
164

A nossa concepção era que as pessoas passassem a conhecer o que era a


educação ambiental, do seu convívio dentro da ilha, né? A escola é uma
fonte de educação, então nossa concepção era que os professores
tentando repassar pros seus alunos essa questão do nosso trabalho e a
questão do meio ambiente pra que as crianças passassem a conhecer
também essa relação, né, conviver sobre meio ambiente saber tratar
também o seu próprio seu próprio lixo, né? (IVAN SOUSA TEIXEIRA).

De acordo com Ivan Teixeira, a ideia era uma proposta de trabalhar em


parceria com a escola e os alunos da comunidade, mas as ações de que a escola
participava junto com o grupo se dava apenas no momento em que se
disponibilizava uma sala de aula para a realização de alguma palestra ou curso que
o grupo recebia, não havia de fato, uma de parceria entre as escola da vila e o GAF,
de modo que a comunidade escolar participasse de forma mais intensa nos
processos de educação ambiental ali realizados.
Uma observação importante aparece nas falas de Said Senado e Jacinto
Teixeira, que identificaram a proposta educativa para o cenário ambiental, em uma
ótica de valorização da cultura da localidade, em especial do pescador.
No entanto, as falas sinalizam uma certa tensão com o crescimento dos
visitantes na vila, que ao mesmo tempo em que os elementos da cultura local são
aspectos relevantes para chegada de outras pessoas, há uma preocupação da
forma como esse crescimento do turismo poderia implicar no cotidiano dos
moradores de Fortalezinha.
Olha, a proposta do GAF era preservar a cultura nativa, dando importância
pro pescador. Então, principalmente isso, preservar e valorizar a cultura que
com a chegada do turismo, automaticamente ia excluindo aquilo, então a
maioria dos nativos iam morar em Belém, especificamente, então se havia
uma necessidade de manter essa cultura aqui. Então, também quando eles
vinham de lá, eles queriam encontrar o peixe assado, eles queriam
encontrar a praia limpa, eles queriam encontrar, havia uma necessidade dos
que moravam fora também de se sentir nativo (SAID DE NAZARÉ
SENADO).

Preservar o que era da gente, né? E assim sucessivamente a gente sabe


que quando entra muita gente vem muita sujeira, vem tudo, vem o que é
bom e também vem o que não é bom, né? Essa era uma das propostas da
gente manter a nossa cultura o mais longo possível, né (JACINTO
TEIXEIRA).

Para Said, a cultura nativa está diretamente relacionada com a pesca, como
aponta para o papel do pescador, demonstrando também uma preocupação em
relação à chegada do turismo e a saída do morador da comunidade, como fatores
que ocasionavam o enfraquecimento da cultura local.
165

As narrativas apontam que a concepção de educação ambiental naquela


comunidade pesqueira atentou-se a condições que dizem respeito a identidade
local, preocupada com fatores que não legitimam ou descaracterizam aquela cultura.
Para Manuel Oliveira Teixeira, a proposta educação ambiental do GAF foi
sendo realizada de forma processual; pautava-se, inicialmente, sobre questão do
lixo, no entanto, cada vez que se observava a realidade, outros problemas eram
identificados, como: a especulação imobiliária, na venda de baixo custo de casas e
terrenos dos moradores para turistas e visitantes, a derrubada de árvores para a
retirada de madeira para construção de residências, queimadas de árvores e de
resíduos sólidos.
Na verdade, foi todo um processo, né? A gente começou com a questão
praticamente do lixo e depois, na medida que a gente observava, outros e
outros problemas, aí, vieram a preocupação com a com a especulação
imobiliária. E depois, consequentemente, com a derrubada das árvores,
com as queimadas, então esse era nosso foco das coisas. Questões eram
realizadas para promover educação ambiental no grupo e na comunidade
(MANUEL OLIVEIRA TEIXEIRA).

A temática socioambiental esteve presente na concepção e proposta do


grupo, compreendendo que os desafios ambientais e sociais da vila se
caracterizavam como pautas das ações educativas, o que dialoga com as diretrizes
do Estatuto Oficial do Grupo.
No entanto, aqui faço uma observação, não há como demarcar se a
concepção e a proposta caminhavam efetivamente em uma vertente crítica da
educação ambiental; ao analisar a fala da Graça Santana que circunscreve a
proposta ambiental “Homem e meio ambiente”, podemos observar como esta pauta
suscitava diversas questões. Bem como, denotavam a insatisfação dos moradores
com realidade de Fortalezinha, tendo em vista a ausência de políticas públicas, de
uma gestão eficiente na área educação e saúde.

A proposta do grupo era ambiental. Era homem e meio ambiente que eles
entendem. “Queremos um trabalho que envolva o homem e o meio
ambiente”. Aí, foi quando eles falaram sobre a educação, primeiro foi a
questão da educação, né? Que eles estudavam longe, a escola só tinha a
primeira série do primeiro grau, né. Aí, eles iam me falando... Isso tudo aí
eles falaram, né, falaram da saúde das pessoas, que a malária nessa época
teve muito o índice muito grande de malária e morreu muita gente lá
naquela região. Aí, eles falaram da área que eles precisavam da parte de
dentista, então tudo isso eu fui decodificando essas mensagens. Então, a
proposta do grupo em si, né? Era trabalhar as questões do meio ambiente
com relação ao homem (GRAÇA SANTANA).
166

Podemos compreender a educação ambiental empreendida pelo GAF, como


um ato político, uma tomada de consciência sobre espaço o educativo, a luta por
direitos historicamente negados. Com relação a essas questões, a posição de Lúcia
Santana expressa a prática educativa do grupo como um exercício de cidadania:

A proposta do GAF como um processo educativo, né? Então havia


primeiramente esse conflito em relação ao entendimento de educação
dentro de um contexto mais ampliado. E quando eu falo dentro de um
contexto mais ampliado, eu acho que algumas palavras são, né? A
educação como um ato político. Eu acho que é importante a gente sinalizar
a educação como ato político e aí é bem Freireana, é você ter consciência
de onde que você está falando, né? (LÚCIA SANTANA).

A narrativa acima, aponta que Lúcia Santana em seu lugar de fala, expressa
sua experiência no campo da educação, o que não pode ser desconsiderado, ao
mencionar a educação como ato político, sustenta a proposta da educação
ambiental como um processo em movimento e amplitude para além da educação
presente nas instituições formais.
Partindo desse esclarecimento, as ações realizadas pelo GAF na
comunidade, iam desde a campanha de limpeza seletiva da vila, até a ações de
prevenção de doenças:

Nossas ações era mais voltada na questão da campanha, campanha


seletiva, né? Que saía coletando o lixo, orientava as famílias também, né, a
não, toda essa a essa questão também, veio depois a questão da malária,
teve uma época que nós tivemos um surto de malária muito grande aqui,
então a preocupação era que os quintais também tivesse limpo, né? Evitar
negócio de vasilhame que ficasse depositado água, essas coisas, então a
gente saía trabalhando essa questão aí, do grupo orientar as famílias pra
trabalhar seus quintais, zelar pelos seus quintais, então isso foi uma
preocupação também (IVAN SOUSA TEIXEIRA).

Na fala de Ivan, faço uma ressalva ao identificar o anúncio de uma concepção


de educação ambiental assentada em uma vertente pragmática, onde a educação
ambiental limita-se para as questões relacionadas ao “desenvolvimento e consumo
sustentável” conceitos neoliberais aplicados à educação ambiental, justificando a
ecoeficiência em uma concepção da natureza apenas como recurso natural.
Todavia, para além das ações de campanha seletiva Said Senado comenta
sobre ações educativas do GAF em uma proposta diferenciada que incluíam
oficinas, rodas de conversa, luaus na beira da praia e momentos de lazer com a
comunidade. Proposições essas, que, segundo Said, oportunizavam uma maior
interação com a vila de Fortalezinha.
167

Oficinas, conversas, rodas de conversas, festas. Até as festas do GAF eram


educativas, entendeu? A gente fazia luais sem bebida, onde a comunidade
ia, tá entendendo? Então, era zero droga, zero bebida, a galera ia
conversar, ia desenhar, ia se expressar. Então, a melhor forma de curtir um
ambiente é quando você consegue tirar de você coisas simples e fazer o
outro enxergar aquilo como (SAID DE NAZARÉ TEIXEIRA).

Na fala de Said é possível identificar os espaços educativos múltiplos dessa


experiência do GAF em procedimentos bem distintos, partindo da realidade desses
grupos sociais. Elemento este que aponta para uma interpretação de um possível
movimento de justiça ambiental, por considerar que a fala de Said anuncia um
diálogo de saberes, expressada pela presença de um aspecto plural entre os
moradores e seu território.
Já na fala de Manuel Teixeira, relembra que as palestras eram ações
predominantes durante atuação do GAF, palestras que abordavam diferentes
assuntos.
A gente fazia, fazia muito palestra. Trazia muitos educadores aqui pra dar
palestra, né? sobre a importância da água. Era essas ações que a gente
fazia a questão das oficinas, né? Das oficinas do reaproveitamento do lixo e
da questão das palestras. As palestras era uma das coisas que a gente
trabalhava muito, bastante mesmo (MANUEL OLIVEIRA TEIXEIRA).

Nota-se a partir das falas, que as características das ações promovidas no


campo da educação ambiental pelo grupo, apresentam dualidades em suas
concepções teóricas, dado este que é importante para identificar quais foram os
pontos de convergências e os pontos de contradições que permeavam a ação
coletiva do GAF.
Destacam-se também as ações direcionadas, que se pode considerar uma
possibilidade de uma pedagogia outra, como por exemplo, a aula do avoado,
atividade que era realizada a partir do saber local e também da cultura da pesca,
que acontecia junto com alguns pescadores e turistas visitantes. Descrito na fala de
Lúcia Santana, a seguir:

Tinha uma que era muito legal, que era o avuado. Eles traziam os peixes,
né, os pescadores e aí, a gente chamava vários pescadores e eles davam
aula para os turistas, né, e depois eles davam aula no sentido assim, não
era aquela aula formal. Eles vem dizendo “ó por que que a gente tem que
abrir o peixe assim, a barriga do peixe, né?”. O tipo de peixe se era Gó, se
era Dourada, se era Pratiqueira. Então havia muitos turistas na hora. Ele
não sabiam do peixe, então, a questão de determinado peixe que vive em
determinado período, né? O caranguejo, né? Por que que o caranguejo tá
desse tamanho? Qual é a diferença do caranguejo que tá aqui e no
quarenta? Qual a diferença do caranguejo de Fortalezinha a diferença?
Tudo isso a gente levava, a gente preparava a chamada aula do avoado.
168

Então eu acho que essa atividade de educação ambiental era uma atividade
de vivência de coletividade e também de aspecto conceitual, porque o
avuado ele é um termo de companheirismo. (LÚCIA SANTANA).

Nessa ação percebe-se detalhes do cotidiano e referências a saberes


inscritos na prática da pesca, como exemplo: o saber que identificava o tipo de
peixe, o modo de preparo, qual o período predominante para cada tipo de peixe, o
que diferencia de uma localidade à outra e os tipos de Caranguejos.
Processos estes que não são reconhecidos pela lógica da ciência moderna,
mas apresentam uma relevância na formulação de um debate acerca do prisma das
epistemologias do Sul, para construção de conhecimentos que foram
subalternizados na perspectiva colonial, capitalista e eurocêntrica, evidenciando o
quão a América Latina, em especial a Amazônia carrega em sua pluralidade de
saberes uma valiosa contribuição para o diálogo de distintos conhecimentos, os
quais são específicos de cada realidade local, como exemplo a cultura do avoado.
Os conhecimentos singulares originários da experiência da ação coletiva do
GAF, são fundamentais para compreensão das riquezas culturais promovidas pelos
povos subalternizados. A intervenção por meio das epistemologias do Sul, não trata,
exclusivamente, de uma luta no campo intelectual, mas também de uma luta política,
respaldada no reconhecimento das diversas realidades, saberes e culturas,
amparados no processo de uma justiça cognitiva e consequentemente de uma
justiça social.
Estes saberes não estão inseridos em conteúdos programáticos e não são
ensinados na escola, são conhecimentos que nascem a partir da tessitura da
experiência com o meio ambiente, do trabalho, no sentido da vida de uma
comunidade tradicional.

5.3 A educação ambiental do GAF: avanços e limites de sua experiência

Ao analisar experiência de educação ambiental do GAF, depara-se com um


campo de saberes circunscritos à região nordeste do estado do Pará, próprios de
uma comunidade tradicional pesqueira, como já foi mencionado anteriormente,
grupo que em sua organização e ação coletiva de resistência, buscou alternativas
para enfrentar condicionantes socioeconômicos e político-culturais adversos.
169

Ainda que a ação coletiva do GAF esteja posicionada em um nível menos


visível de uma organização em grupos do cotidiano, com a contínua participação dos
atores envolvidos com as causas defendidas, há a ocorrência de avanços e limites
apontados nesta experiência acerca da temática de educação ambiental, como é
descrito por Ivan Teixeira em relação ao alargamento de conhecimentos e de
consciência socioambiental:

Foi um avanço grande assim, nós avançamos muito nessa questão aí,
porque nosso conhecimento se expandiu, não só dentro da comunidade,
como nas comunidades vizinhas também, né. Aquilo que eu tô te falando, a
gente tivemos a oportunidade de dá palestra sobre meio ambiente, não só
aqui na escola, Maracanã, no Colégio Kennedy, tivemos a oportunidade de
dar palestra na colônia de pesca, tivemos a oportunidade de dá palestras
em Belém nas escolas, Algodoal na escola também (IVAN SOUSA
TEIXEIRA).

A narrativa de Ivan é marcada por lembranças sobre a formação decorrente


das palestras com a temática meio ambiente e a troca recíproca com outras
localidades, destacando também a contribuição para o conhecimento especifico na
área ambiental.
Então, isso foi o nosso avanço do nosso conhecimento que nós tínha em
relação à educação ambiental, só pra te ver, que nós mesmo, nós
absorvemos o conhecimento sobre o meio ambiente, que nós não tinha
experiência de nada, eu que nem eu, né? Eu não tinha conhecimento quase
de nada, mas aí eu passei a ter a partir do GAF e eu saía como dando
palestra como monitor, também sabe. Aí, do nosso convívio no dia a dia a
gente foi através das palestras que vinha pessoas de fora, dando palestra
sobre o meio ambiente, a gente foi como foi a gente foi se especializando
nessa área (IVAN SOUSA TEIXEIRA).

Apesar de Ivan não relatar os conhecimentos e saberes que atravessam seu


trabalho como pescador e artesão, pondero sobre as influências das suas
experiências na pesca e no artesanato durante sua formação como monitor.
Para Graça Santana, um dos marcadores dos avanços promovidos pelo GAF
foi a mudança da percepção dos moradores que participaram do grupo, em relação
à realidade ambiental da comunidade, em uma denominada “consciência do
território”, pontuada por Graça Santana.

Eu achei assim que houve um avanço das pessoas, né? Que começaram a
se perceber que aquele ambiente como um território, uma consciência como
território deles, que eles tinham que cuidar, que eles tinham que zelar.
Algumas pessoas começaram a mudar seu pensamento, a mudar a sua
postura a chamar atenção do outro quando estava fazendo algo, é respeitar
170

os materiais dos pescadores, então eu acho que esse foi assim um dos
avanços principais, nesse sentido de educação, né? (GRAÇA SANTANA).

Manoel Teixeira descreve que os avanços daquela ação coletiva são


perceptíveis até hoje, e podem ser percebidos no envolvimento que os moradores
tem com relação a problemática do lixo na comunidade:

Olha é a questão dos próprios moradores. Hoje, por exemplo, hoje os


moradores, alguns eles despertaram pra reaproveitar aquilo que eles
jogavam fora. Em termo do lixo orgânico, outros quando criaram seus
próprios ambientes, como lá no Catitu, né, ele já procuraram a introduzir,
né, essas questões da educação ambiental do Reaproveitamento, né?
desses materiais dentro desses espaços que hoje se se tornam atrativos, né
dentro da vila, né? (MANOEL OLIVEIRA TEIXEIRA).

Para Manoel Teixeira, a ação coletiva contribui para que comunidade pudesse
construir o sentido de pertencimento, o que implica reconhecer-se enquanto
comunidade tradicional pesqueira, relembrando a importância da memória e herança
das gerações antecessoras.

Então essas nossas ações coletivamente, acho que despertou muito esses
interesses assim, tanto pelo mais jovens também de lutar pelo espaço dele,
pelo lugar dele, né? E agregar também por exemplo, hoje as pessoas
fazem, que é levar pro quintal dele, de apanhar um coco, né? Eu acho que
fez com que também a gente aumentasse mais né? Aquilo que a gente tem
dentro da gente, que é essa questão do humanismo, né? Da parceria, do
dividir entendeu? Que é isso que a gente traz muito dos nossos
antepassados, dos nossos avós, né? Eles gostam de tomar um café numa
roda, dialogando conversando, então essa ação do GAF fez com
potencializar isso, né? E hoje a gente tá batalhando pra não perder
(MANOEL TEIXEIRA).

Um ponto importante sobre a fala de Manoel, é que, ao final demonstra uma


preocupação com os aspectos herdados de outras gerações para que não seja
perdido, esquecido, caminha no mesmo sentido para uma ciência que não facilite
esse processo. Demarca aqui um encontro significativo com a ecologia dos saberes,
uma vez que busca encontrar outros conhecimentos decorrentes de outras relações
de saberes. Manoel cita que a ação do GAF despertou o olhar para a herança
cultural deixada pelos antepassados, manifestações da cultura que se fazem
presentes no dia a dia, em ocorrências com distintos significados.
Lúcia Santana traz um dado importante nas ações de educação ambiental
implementadas pelo GAF: a proposta de inclusão, voltadas para pessoas com
171

deficiência auditiva, uma observação relevante, tendo em vista que há um número


considerável de pessoas surdas naquela localidade.

Primeiro pela própria inserção do GAF, que trabalhou dez anos. A gente
tinha nossas lixeiras, tinha a própria coleta seletiva do lixo, havia muita
programação educativa de cinema, teatro. A gente trabalhava com surdos, a
gente também procurava fazer essa inclusão, né? E isso de uma certa
forma mudou essa consciência de cuidar do ambiente, né. Então, por
exemplo, em muitos momentos, eles faziam mutirão, “Ah, vamos limpar a
frente de Fortalezinha”, todo mundo ia limpar a frente de Fortalezinha. “Ah,
vamos limpar a praça”, todo mundo ia limpar a praça. Então havia já da
própria natureza deles essa emancipação ligada a esse cuidar (LÚCIA
SANTANA).

Lúcia Santana recorda outras circunstâncias daquele período na vila, o


momento de sua chegada em Fortalezinha e sua percepção a respeito da
organização espacial da comunidade em comparação com a vila de Algodoal;
descrevendo abaixo as relações de poder estruturais desiguais nessa região e a
produção da desigualdade e exclusão abissal:

Quando nós chegamos em Fortalezinha, nós fizemos um trabalho intenso já


havia um processo turístico, por exemplo, a parte da praia que antes era as
casas dos pescadores, foram todas trocadas pelo pessoal que tinha muita
grana, muito dinheiro, né? Construíram seus resorts, os hotéis, e a
comunidade ficou mais restrita pra área dos mangues, isso lá em Algodoal,
de uma certa forma já via o pessoal de Algodoal muito arredio, achando
somente o que dava mais dinheiro era ligação com o turismo, enquanto que
Fortalezinha não sofreu esse impacto de imediato, por ela não ter sofrido
desse impacto de imediato, ela conseguiu perceber isso em Algodoal. Então
a consciência ilha de Fortalezinha, ela é diferente da consciência dos filhos
de Algodoal (LÚCIA SANTANA).

Ao mencionar que o fluxo do turismo não impactou tanto em Fortalezinha


como em Algodoal, a interlocutora destaca a realização do trabalho intenso com os
turistas e com a comunidade. Concomitante com esta situação apontada por Lúcia,
Said Senado apresenta o avanço da experiência do GAF, como um momento de
“percepção ambiental”, e faz uma comparação daquela época com a realidade atual
de Fortalezinha:
O GAF foi o único momento de lucidez ambiental. Então, tipo, se você
perguntar pra mim: “mas existe hoje?” É, não, não tem. Nossa parcela de
observadores e cuidadores do meio ambiente é menor do que dos
investidores donos de pousadas e destruidores, né (SAID SENADO).

Said enfatiza que atualmente o número de pessoas de fora é maior


equiparado ao número de moradores que estão envolvidos com as demandas
socioambientais da vila, expondo o que vem ocorrendo com a chegada dos turistas:
172

Então, o turista vem, ver aquela área. O nativo quer um celular, quer um
motor, quer um barco, e acaba que trocando. Aí troca seu próprio espaço,
seu vento, sua vista, sua vivência. Então, pro que vem de fora sempre vai
expulsar o nativo pro uma nova área e ele vai ser um outro nativo. Então,
aqui tá se criando os outros/novos nativos ou outros nativos também (SAID
SENADO).

O posicionamento de Said expressa uma chamada de atenção para o novo


cenário do turismo em Fortalezinha e como isso pode contribuir para alterações
estruturais, culturais, sociais daquela comunidade.
Assim como ocorreram avanços na experiência de educação ambiental na
ação coletiva elencada acima, a experiência do grupo também apresentou limitações
para o prosseguimento de suas atividades na comunidade, como são anunciadas
nas narrativas de Ivan Teixeira e Jacinto Teixeira:

Problema maior, porque o seguinte voltando a questão do meio ambiente,


porque a gente esperava muito do poder público também, né, pra que ele
apoiasse a gente, né, porque a gente deu um passo inicial tá entendendo,
então como o município se ele pretendia trabalhar essa questão do turismo
dentro da comunidade, então tipo assim “que, que vamos fazer? Nós vamos
pegar esse grupo que já tem lá, só pegasse esse grupo lá, pra gente
trabalhar nessa parte aí”, só que a gente, nós não tivemos esse apoio,
então isso foi um problema só desestimulou, porque se nós tivesse apoio
até hoje, tivesse tido esse apoio, acho que até hoje existia ainda, entendeu?
(IVAN SOUSA TEIXEIRA).

O maior problema enfrentado, era que a gente não tinha muito apoio, né?
Não tinha apoio municipal, não tinha apoio estadual, não tinha apoio, a
gente fazia só a gente mesmo, sem recursos, né? Isso era um dos grandes
problemas. Pra você avançar hoje em dia em determinadas trabalhos você
tem que ter recurso, tem que ter apoio, né? Então isso a gente não tinha,
isso foi um dos grandes problemas que a gente enfrentou (JACINTO
TEIXEIRA).

Para Ivan e Jacinto a falta de apoio dos órgãos públicos e seus gestores tanto
a nível municipal, como estadual durante o período de dez anos de atuação do
Grupo, foi um dos fatores que inviabilizaram a continuação do trabalho. Porque de
acordo com Ivan, a ausência de incentivo resultou na desistência por parte dos
integrantes, que embora realizassem um trabalho voluntário, buscavam também a
oportunidade de trabalho de forma remunerada, como revela abaixo:

Cara, se ele estivesse dado esse apoio pra gente, eu acho que hoje tava
muito melhor, muito bem melhor, muito melhor mesmo do que, né, a gente
não tinha sido desestimulado, né, porque poxa, tu não vai ficar trabalhando
de graça o tempo todo, se tu tem uma família. Então, nós se disponibilizava
nas férias pra fazer a coleta seletiva na praia, aqui na vila, tá entendendo?
Sem troco de nada pô, não ganhava nada, quer dizer nas férias é um mês
que tu pode tá fazendo alguma coisa pra ganhar um troquinho, né (IVAN
SOUSA TEIXEIRA).
173

Já para Said Senado a problemática enfrentada na experiência de educação


ambiental do GAF estava essencialmente ligada às condições de vida e trabalho
precárias e aos impactos do turismo, sobretudo na questão da construção de
empreendimentos e casas de pessoas de fora da comunidade:

O cara queria montar uma pousada numa área de preservação protegida


pelo GAF e aquilo gerava uma disputa. O GAF não queria que tirasse
pedras da frente da comunidade, mas as pousadas precisavam ser
construídas, as casas dos nativos, dos turistas, porque o nativo fazia de
bioconstrução, entendeu? Então, mas só que, alguns outros nativos pra
bancar celular, droga, manteiga, essas parada toda, café, açúcar, quando
não tava pescando era mais fácil tirar pedra, tirar areia, tirar mangue, tá
entendendo? E isso sempre dava de frente com os investidores (SAID DE
NAZARÉ SENADO).

Graça Santana destaca a falta de informações e capacitação de algumas


pessoas do grupo e também a ausência de comprometimento com as causas
defendidas pelo GAF, por parte de moradores da comunidade:

Os problemas enfrentados pra trabalhar a questão da educação ambiental,


a falta de informação pra alguns e a capacitação, né. Pra algumas pessoas
da comunidade, fazia um pouco caso do Grupo Ambiental, né? Então essa
falta de capacitação de participação nas reuniões do GAF, dessas pessoas,
né (GRAÇA SANTANA).

Lucia Santana sublinha que os problemas enfrentados eram provenientes de


segmentos variados, que incluíam desde a resistência por parte de alguns
moradores, a desistência de alguns educadores durante o processo educativo, como
embates político-partidários que demarcavam atores e grupos de interesse
conflitantes.

Os problemas são diversos, primeiras suas resistências, né? Todo processo


de educação que você vai trabalhar ele é um processo desafiador pra quem
vai fazer, ocorre a desistência, porque não é todo educador que vai
fazendo, né? Vai continuando. O processo vai acreditando no processo, tem
gente que desiste logo no início, né. Então teve pessoas que entraram no
grupo, mas rapidamente saíram também. Por quê? porque perceberam que
eram um trabalho desafiador, né? E lógico mudar a cabeça de pessoas não
é um processo simples, né? Então a gente teve vários embates com a parte
partidária, né, político partidária e principalmente com os comerciantes,
embates principalmente com alguns idosos que assumiram, digamos assim
um determinado poder na ilha, né? (LÚCIA SANTANA).

Os problemas encontrados durante atividade do GAF, resultaram em


limitações do grupo em relação à educação ambiental, que de acordo com as
informações dos entrevistados, tinham relações também com outros fatores, como
174

questões pessoais dos participantes. Ivan cita que as limitações se davam ainda
com questões referentes a disponibilidade dos participantes, pois além do GAF os
integrantes tinham outros afazeres:

As limitações, nós tinha um certo limite da seguinte forma, porque a gente


não poderia trabalhar assim, vamos supor o tempo todo, vamos supor
dentro da semana nós tirava dois dia pra trabalhar, o resto geralmente era
final de semana sábado e domingo, dia de semana a gente deixava pra
gente fazer os nossos afazeres. Então a gente tinha um certo limite, pra
gente não ficar totalmente só pra aquele serviço (IVAN SOUSA TEIXEIRA).

Para Said Senado as limitações também atingiam o campo financeiro. O


entrevistado utiliza o termo “privatizar” fazendo referência a perda de território,
exemplificando empreendimentos que foram realizados em torno na vila. Isso implica
um processo de subjetivação da racionalidade de mercado, que vai se expandido
nessas comunidades tradicionais, desarticulando-as, por meio do que Santos (2007)
denomina de “monocultura produtivista”.

Olha, as limitações todas foram investimento, que pra você fazer qualquer
tipo de trabalho você precisa de investimento e a outra é a perda de
território. Perdeu o território, perdeu voz, perdeu ação. Então, quando
começou a se privatizar a Ilha, o GAF começou a perder e a criar problemas
muito grande como: alguém queria construir na praia e o GAF ia lá
embargar (SAID NAZARÉ SENADO).

Na visão de Jacinto Teixeira, as limitações estavam concernentes às


problemáticas internas e externas. Situações que o Grupo não tinha como controlar,
como a falta de apoio de parte da população de Fortalezinha.

O limite? O único limite que a gente tinha era tentar limitar aquilo que não
tava dentro do contexto, né? Que vinha trazer problemas pra comunidade
em relação à educação ambiental, as vezes quando se fala em proteção, aí
tem outras pessoas que acha que é besteira, que é isso e aquilo, que isso
não funciona e a gente se limitava da maneira possível, assim pra não ter
grandes atritos, essas coisas (JACINTO TEIXEIRA).

Graça Santana ao falar das limitações vivenciadas pelo GAF em suas ações
de educação ambiental, situa desde questões territoriais, a entraves de ordem
financeira.

O GAF ele começou pequeno, né? Primeiro grupo de estudo, né? Aí depois
ele começou, o próprio nome do GAF já limitou a sua área de base, né, que
era Fortalezinha, então toda Fortalezinha e ali a gente trabalhava todo
aquele território. Depois houve pessoal de Mocooca, né que começaram a
questionar por que que o GAF não ia até Mocooca, né? Aí pessoas de
175

Mococa também se inscreveram no GAF passaram a ser membro do GAF.


Então nossas ações passaram atingir Mocooca. Aí, a questão de limites de
estruturas, limites, limites financeiras o limite pra sessões dele foi a questão
financeira. (GRAÇA SANTANA).

A mesma interlocutora enfatizará as questões de ordem financeira como fator


determinante para a conjuntura de trabalho do Grupo e a organização da sociedade
civil em torno de um coletivo.

Os limites é o seguinte, porque a gente sabia que nós éramos um grupo,


nós não tínhamos dinheiro às vezes, em alguns momentos a gente tinha
problemas com essa questão do que é ser voluntariado, né. Aí, não
remunerar as pessoas, né, e as pessoas precisavam de remuneração
porque você ser voluntário durante um ano, dois anos, três anos tudo bem,
mas você ser quase dez anos, era uma questão que isso passava por crises
conosco. Em relação a isso, por isso que nós decidimos no momento
oficializar o grupo, né? Porque precisava sair da pessoa física e ser uma
pessoa jurídica pra gente concorrer aos editais, né? (LÚCIA SANTANA).

Lúcia Santana ao comentar sobre o processo de oficialização, ressalta que foi


uma das últimas ações realizada pelo grupo:

E foi uma das últimas ações do grupo, porque só a discussão do formato


organizacional dele, né? Do estatuto, demorou muito, até porque a gente
não entendia o que era estatuto e tudo, então a gente teve que organizar,
né? Ver todas essas questões, né? Pra poder enquanto grupo ter uma
instituição jurídica que pudesse pleitear dinheiro (LÚCIA SANTANA).

O entrevistado Manoel Teixeira assinala que as limitações vividas pelo GAF


ocorreram em decorrência das relações intrapessoais e interpessoais, pois para ele,
o grupo atingiu um ponto em que os aspectos particulares e pessoais, ocuparam
posições inquietantes nas discussões, o que colaborou para o encerramento das
atividades do GAF no ano de 2007.

Olha, eu acho que a limitação foi quando a gente não teve assim, digamos,
aquele senso de compreender o nosso ego, né? Porque se a gente tivesse
deixasse o nosso ego de lado um pouco e realmente fosse mais humilde,
naquele ponto de discutir a valorização de um coletivo, né? De uma
problemática voltada pro próprio lugar, né? Acho que fez essa falta de
sensibilidade, aí da gente não compreender essas coisas dele. Porque
chegou no momento que cada um já tava querendo muito colocar o seu
ponto de vista, sabe? Aí chegou naquele momento que a gente não teve
mais como. Vamos separar essas coisas, desgastando, já tava no limite.
Acho que foi isso, né? (MANOEL OLIVEIRA TEIXEIRA).
176

Manoel não relatou de forma detalhada os motivos que geraram as limitações


e a paralização das ações do GAF, hoje sendo uma lembrança naquela
comunidade, mas também um marco educativo.
De acordo com Ivan Teixeira, o grupo acabou devido a saída dos jovens que
participavam na época, muitos foram para outras localidades em busca de
oportunidades de estudo e trabalho. Significa dizer que, os condicionantes
estruturantes influenciaram bastante para enfraquecer o GAF e favorecer a
dissolução do grupo.

O grupo faleceu nesse sentido aí, porque os jovens, os componentes do


grupo foram saindo, foram em busca de oportunidade, né? Uns saíram pra
estudar, outros saíram pra trabalhar mesmo, né? E outros foram
desestimulando também com relação a isso, porque eles pensaram o
seguinte: “vou ficar trabalhando o tempo todo de graça? Sem ganhar nada?”
Então, isso foi desestimulou também, né? Porque lógico o jovem quer
trabalhar, mas quer ganhar, né, ter um serviço próprio dele pra ganhar nem
que seja um trocado (IVAN SOUSA TEIXEIRA).

Ivan Teixeira menciona novamente a ausência de um apoio de órgãos


municipais e estaduais, no financiamento de ações que viabilizassem um trabalho
remunerado para os moradores que atuavam no grupo. Convergente também com a
resposta de Jacinto Teixeira que elenca os mesmos fatores que contribuíram para o
término do grupo: falta de logística estrutural e condicionantes de perspectivas
particulares de cada participante.

Então, aquilo que eu te falei, se tivesse tido uma assistência do poder


público, né? Pra a alimentar o trabalho, “não é o seguinte eu vou querer
vocês pra trabalhar, mas vocês vão ganhar um salário ou meio salário, sei
lá uma coisa assim, pra vocês manter o serviço lá, né?”. Então, acho que o
grupo veio a falecer muito voltado mais essa questão aí (IVAN SOUSA
TEIXEIRA).

Olha, o grupo ele acabou porque, primeiro, não tinha recursos; segundo, as
pessoas começaram a se dispersar pra outros lugares, né? Pessoa que
estudava, que trabalhavam, então precisavam sair, tinha uns que
precisavam estudar, tinha outros que tinha que trabalhar. Então, eles foram
se dispersando, né? Foram se dispersando aí, como a comunidade a
deixava só em prol do GAF a limpeza, essas coisas, e a gente não tinha
recurso pra comprar material, aí a gente foi também se debandando, né? E
hoje a gente não conseguiu mais reunir as pessoas. Então é por isso, uns
casaram, foram embora, outros foram estudar, outros cada um procurou a
sua direção (JACINTO TEIXEIRA).

Lúcia Santana avalia que o término do GAF se deu a partir do encerramento


de um ciclo de dez anos, e que algo determinante para isto foram desentendimentos
internos e demandas pessoais dos integrantes.
177

Eu acho assim que tudo na vida é um ciclo, né? Adriele, tudo tem o início
meio e fim. Eu penso que nós ficamos durante dez anos, já era uma época
também como eu disse, até porque a gente também queria seguir outras
coisas e eu fui percebendo também que eu cresci, fui tendo filho e
casamento coisas. Eu Já não conseguia mais acompanhar o grupo como
deveria acompanhar. Então a gente acabou. Já deixando mais pra
amadurecer mais essa proposta do grupo e os próprios conflitos internos,
que também teve, né? Ponto de vista partidário de grupos políticos (LÚCIA
SANTANA).

Embora, Lúcia Santana situe o grupo em um momento de término, no


decorrer da entrevista, anuncia um dado relevante a respeito do GAF, que diz
respeito a possível retomada das atividades do grupo. E revela que apesar do GAF
não está ativo, as pessoas não deixam de estar inseridas nos debates das causas
socioambientais em torno daquela região.

Mas eu percebo que há uns três anos pra cá as pessoas estão pensando e
ativar o GAF, né. As pessoas falam demais, eu acho que a ideia é tá ai, né?
O grupo tá instituído, a gente não deixou de participar das causas. A gente
sempre tá envolvido nas causas do nordeste paraense (LÚCIA SANTANA).

Lúcia Santana manifesta um contentamento acerca de um possível retorno


das ações do GAF, expressando também um parecer em relação à pesquisa,
destacando o protagonismo do pescador na discussão de sua própria realidade:

Eu acredito que são ciclos. Naquele momento, houve o limite. Hoje a gente
tá avançando em outras frentes, né? Eu acho legal se reativarem, né? É tu
que vem estudar um grupo, que tá interessada nessa história do nordeste
paraense, que é uma história invisibilizada, inclusive é uma história
invisibilizada que precisa dessa voz que pode falar pelo nordeste paraense
senão os próprios pescadores, senão o próprio movimento, entendeu?
(LÚCIA SANTANA).

Lúcia considera que o grupo não parou, para ela o GAF está ativado em
outras distintas formas de movimento, de envolvimento às causas da realidade
ambiental e social da região do salgado, em que se encontra representado por
aqueles que participaram do GAF e desenvolveram uma relação de pertencimento,
em que o grupo foi a base para uma formação cidadã e profissional.

Então, eu acredito que ele não parou. Ele tá sendo ativado de diferentes
maneiras, né? Agora a relação de pertencimento eu acho que isso que
precisa ser referenciado, né? Se hoje eu sou uma Lúcia que trabalha com
comunidades pesqueiras, Por quê? Porque eu tive uma formação lá atrás
voltada para um grupo que era de uma comunidade pesqueira litorânea que
era o GAF (LÚCIA SANTANA).
178

Interessante apontar, que Said Senado em sua declaração no tocante ao


término do GAF, expõe uma situação contraditória, que o grupo ainda está ativo.
Para o morador, o grupo é uma “filosofia de vida”, que conduz sua forma de viver e
trabalhar na comunidade e de perceber à intrínseca relação entre a localidade e a
natureza.

Então, o GAF nunca deixou de existir, o GAF é uma filosofia de vida, eu vivo
ela, identifico outras pessoas que vivem ela e isso, eu acho, que isso é o
mais importante. Assim, acho que é todo o trabalho, é sem investimento, só
na ideia, o GAF foi um dos que mais teve êxito, assim, porque ele continua
vivo e muito vivo (SAID DE NAZARÉ SENADO).

Said Senado justifica que o grupo está ativo no campo das ideias,
esclarecendo que a institucionalização do grupo impossibilita a utilização do nome.
No entanto, para Said o GAF está diretamente ligado à sua história como sujeito de
uma comunidade local pesqueira e a seu modo de viver, intitulado como “nativismo”,
descrito da seguinte forma:

Porque como virou uma ONG, não pode ser usada sem que tenha o
consenso do coletivo, né? Mas ele tá dentro de cada um, é isso. O GAF é
essa ideia da manutenção do nativismo. Eu sinto que é uma resistência. O
GAF é a resistência atual do ser nativo e morar na vida off, quando se fala
na vida off na Amazônia atlântica se tá falando da ideia que o GAF trouxe.
O GAF trouxe a vida off, a gente só não sabia materializar, então agora a
gente consegue. Então, todo mundo que prática esporte, leu o seu
ambiente, que vive ele, as suas tradições, as culturas de seus pais, de seus
avós, e que vive, essa pessoa, o que ela é, ela é o GAF dentro dele, assim
(SAID DE NAZARÉ SENADO).

Dessa forma, Said acredita em uma exequível probabilidade de retomada das


atividades do grupo, mas em uma nova abordagem, diferente da que ocorreu no
período de 1997 a 2007.

Então, eu acredito que quando essa ideia, quando o GAF voltar, ele vai
voltar com mais força ainda, sabe, ele parou como instituição, ele não parou
como filosofia. Ele parou como instituição, porque é preciso de eleição,
precisa de uma burocracia que não é fácil de coordenar e talvez ninguém
esteja disponível de largar a sua vivência pra instituição GAF, sabe, acho
que tá mais fácil hoje colocar em prática é, tipo aleatoriamente, do que
voltar de novo com aquela instituição (SAID DE NAZARÉ SENADO).

Já para Manoel Teixeira, expõe que o grupo não terminou, mas ocorreu uma
“desarticulação”, motivada por questões particulares em detrimento às ações
coletivas.
179

Então na verdade, o grupo eu acho que ele ainda não acabou, né? Mas, eu
te falo assim o que levou pra gente se desarticular foi a questão de algumas
pessoas deixaram que o ego e sobressaísse mais do que a própria vontade
de lutar de forma coletiva e de pensar na própria comunidade pensar como
um grupo, né? São coisas que acontecem infelizmente, tem muito essa
questão pessoal, né, e foi isso que aconteceu muito a questão pessoal”
(MANOEL TEIXEIRA).

Para Manoel, o enfraquecimento do grupo foi decorrente ao processo de uma


interferência externa nas questões demandadas pela comunidade local. Na visão do
entrevistado, a proposta era buscar uma formação e um campo de diálogo para o
fortalecimento de uma sensibilização às problemáticas encontradas na vila e uma
autonomia dos participantes na tomada de decisões e participação na realidade
socioambiental de Fortalezinha.

Pensar como um grupo tá entendendo porque eu via muito as


interferências, né? Das pessoas de fora, tá entendendo? E aquilo me
incomodou. Porque não foi aquilo que a gente tinha proposto. A gente
queria nos capacitar, né? A gente queria se formar, a gente queria adquirir a
aprender, a gente queria, a gente tinha sede pra aprender coisas novas,
mas a gente queria liderar um movimento nosso, né? (MANOEL TEIXEIRA).

Para os entrevistados acima, o grupo ainda se encontra ativo no campo das


ideias, mas é importante elencar que as últimas atividades do grupo foram
registradas no ano de 2007. Nesse sentido, Jacinto Teixeira conta um pouco da sua
percepção após a finalização do trabalho do GAF em Fortalezinha.

Olha, eu percebi o que a gente plantou ainda existe, né? Tem muitas
pessoas que tem esse conhecimento, que lutam pra manter isso vivo e eu
acho que foi uma das sementes que a gente plantou que funcionou. Só que
ultimamente, como ela é uma área de preservação já, a gente deixa a
desejar, né? Tem muitas coisas que não tão sendo realizada como devia
ser. Como eu lhe falei agora, o desmatamento, a entrada das moto, as
destruições dos manguezais, mudou muitas coisa (JACINTO TEIXEIRA).

O pescador Ivan Teixeira, relaciona o fim das ações do grupo diretamente


com o acúmulo de lixo nas ruas e nas praias:

Depois que o grupo terminou muitas coisas voltou a acontecer, porque tipo
assim, com relação ao lixo nas ruas e nas praia, veio sendo acumulado,
porque não tinha mais aquele grupo que fazia aquela limpeza, né? Então
agora que tá voltando novamente, né? Mas depois que o grupo
enfraqueceu, ele o lixo veio, aí as pessoas também lamentavam, né? “Égua,
não existe mais o grupo GAF pra fazer esse serviço tudo, porque é o GAF
que fazia”, a gente todo tempo confeccionava as lixeiras colocava nos
pontos estratégicos pra que as pessoas chegassem colocassem seu lixo
(IVAN SOUSA TEIXEIRA).
180

Ivan faz uma análise crítica da conjuntura atual da comunidade e da ausência


do poder público, e uma série de problemas ambientais e sociais que ali estão
ocorrendo.
Tipo assim, que aumentou a degradação das retirada de pedra, da retirada
de areia, porque aumentou muito, tem pra mais de dez pousadas. Então
tudo isso aí, as pessoas tiram esses recursos naturais só daqui da ilha, a
pedra, a madeira também da própria ilha, desmatamento às árvore, a área
de que nós tinha de ecossistema maior, aí os cara desmataram, cortando
motosserra, foi uma onda e até hoje existe ainda. Por isso, que eu tô te
falando a displicência do poder público, né? E da APA, a gerência da APA é
muito fraca, ela não tem poder de mobilizar essas pessoas, tentar impedir
que eles façam. Então, tá acontecendo isso e a gente não pode fazer nada,
porque a gente não tem autonomia de nada, né, a gente não vai ficar
brigando com as pessoas, a gente não tem um certo apoio, né? Do poder
público (IVAN SOUSA TEIXEIRA).

São informações importantes, porque ajudam a compreender a de


Fortalezinha na atualidade, tendo em vista sua localização numa Área de Proteção
Ambiental. O entrevistado não deixa de demonstrar sua insatisfação com o poder
público e seus gestores no que diz respeito aos cuidados que deviam dispensar
àquela área.
Manoel Teixeira verificou que após à suspensão das atividades do GAF, as
questões sobre a educação ambiental, ficaram estagnadas e as mudanças
consequentes desse processo, geraram um impacto negativo na comunidade:

Eu percebi que Fortalezinha se estagnou um pouco nas questões das


discussões. Nós não avançamos na questão da dessa política, né? Da
discussão ambiental, da política social, né? E também na formação de
novos agentes, né? Novas lideranças. Porque o GAF é uma direção de
formação, a gente discutia várias coisas. Mas assim, quando o GAF parou
de fazer as suas ações, houve esse impacto, né? Impacto pra comunidade,
mesmo porque as pessoas perguntaram pra gente “aí o que aconteceu”,
não só o local, mas de fora que vinham. Isso então foi um choque assim, foi
um impacto pra todo mundo (MANOEL TEIXEIRA).

Assim, em decorrência dessa experiência de ação coletiva e considerando


algumas lições que ficaram do tempo de vigência do grupo, Manoel Teixeira cita as
principais como: o significado do trabalho coletivo e a importância de uma
autorreflexão dos seus respectivos integrantes, no processo de incluir todos os
sujeitos:
Eu acho que ficaram várias lições, sabe. Acho que ficaram várias lições de
um trabalho coletivo, né? Ficaram também da gente saber controlar o nosso
ego com relação a essas ações coletivas, esse trabalho coletivo, porque às
vezes quando você pensa só no eu, ele tem um resultado pra você, mas
quando você pensa no eu, incluindo o outro, você tem um resultado pra
todo mundo. Eu acho que o amadurecimento pra mim, um amadurecimento
181

profissional, né? E intelectual também. Ele mexeu muito com a minha


inteligência, da minha capacidade de pensar, de escrever, de questionar,
né? De liderar também (MANOEL TEIXEIRA).

Nas falas dos interlocutores há algo comum decorrente das ações de


educação ambiental realizadas pelo GAF: o esclarecimento sobre o conceito de
preservação ambiental, mas também outros conhecimentos adquiridos:

Olha, ficaram umas boas lições, né? Lição de conhecimento, lição de


preservação da vida, lições de como você deve viver no meio ambiente, né?
Não só aqui mas em todo setores, em todo canto. Eu acho que foi isso que
ficou na cabeça de qualquer um da gente do GAF e até hoje ainda se
lembra do GAF, tem algumas pessoas que conversam sobre isso, mas a
gente também já tá deixando pro um outro grupo que tá chegando aí, né?
(JACINTO TEIXEIRA).

Igualmente, Graça Santana acredita que a principal lição deixada pela ação
do grupo foi a constituição de um espaço formativo nas questões ambientais,
territoriais e no campo do trabalho, para os moradores participantes do Grupo
Ambiental de Fortalezinha. Para Graça, as discussões do grupo fomentavam uma
reflexão para a realidade da pesca, bem como a influência direta que o morador
exercia sobre a floresta que circunda a comunidade.

Ah, o aprendizado, né? Com trocas de conhecimentos, o avanço de alguns


pescadores assim, em termos de a respeito do seu território, do seu
trabalho, né, da questão mesmo da pesca, da finitude do recursos do
desaparecimento de alguns de alguns peixes, como eles colocavam, né? E
também assim, a lição é que eles começaram também a parar de fazer
queimadas para construir casas e barracos deles mesmo, entende?
(GRAÇA SANTANA).

Graça Santana destaca a presença de alguns integrantes GAF no Conselho


Gestor na APA de Maiandeua e no Plano de Manejo do Município de Maracanã.
Outro elemento mencionado é a mudança comportamento dessas pessoas em
relação com suas famílias e, possivelmente, como as vivências no GAF serviram
para estimular outras perspectivas de vida.

E também o que eu achei interessante é que eles também tiveram assento


em conselhos, né? Participaram do plano de Manejo do Plano Diretor do
município e assumiram responsabilidade com as suas famílias,
principalmente as dos jovens que tinham filhos e que não viviam com a sua
mulher nem com seus filhos e passaram assumir isso. Eu acho que foi uma
lição aprendida que eu que eu presenciei e também a vinda deles para aqui
em Belém, né? Para frequentarem as universidades e também serviu ao
182

quartel, essa coisa toda e eles já levaram toda essa bagagem pra fora,
saíram de lá com toda essa bagagem. Então, essa sim foi a lições
aprendidas pra mim, né, ter contribuído com esse trabalho lá na
comunidade (GRAÇA SANTANA).

Por fim, Lúcia Santana em sua fala, informa que o GAF oportunizou uma
experiência pessoal e profissional, na qual percebeu a importância de uma ação
coletiva, como um trabalho intenso com suas demandas, atravessado por afetos e
emoções, que imprime um valor simbólico na vida do sujeito.

A intensidade dessa experiência, né? Que a gente viveu é que dá valor a


essa que a gente sustenta, então pra mim, eu vivi uma intensidade,
entendeu? por isso que é tão rico, por isso que há emoções afetos, porque
foi muito bom, muita brincadeira, muita coisa boa criativa, né? E hoje essa
memória e também procuro reativar em vários processos meus de atividade.
Esses momentos que eu vivi e eu digo ainda são eficazes (LÚCIA
SANTANA).

As lições que ficaram com a experiência do GAF, a partir das informações


apresentadas nesta seção, denotam que o grupo teve um papel significativo na
tessitura histórica da vila de Fortalezinha. Por meio das entrevistas foi possível
verificar que o Grupo Ambiental de Fortalezinha fez parte da formação individual e
coletiva de muitas pessoas que moravam na comunidade e em outras localidades,
como exemplo, a cidade de Belém.
Pode-se compreender também que embora o grupo não se encontre em
exercício, a ideia e a concepção de uma educação ambiental voltada para uma
comunidade tradicional pesqueira da Amazônia, ainda reverbera no modo de viver,
nas falas e nas memórias daqueles que fizeram parte dessa ação na vila.
Com as observações feitas em campo, considero que a experiência de
educação ambiental implementada pelo GAF revelou outras possibilidades
educativas para o campo ambiental, em que limites e avanços anunciam que a
prática da educação ambiental na Amazônia precisa conectar-se às suas
particularidades, e jamais deixar-se reduzir a uma forma unilateral de pensamento e
ação educativa
183

6. CONSIDERAÇÕES FINAIS – OS DESAFIOS DA EDUCAÇÃO AMBIENTAL A


PARTIR DO SUL

O caminho desta pesquisa é de estradas de terra, areia, encontrando-se com


o rio, onde a temporalidade da maré é quem comanda o momento da travessia,
onde se espera do apaziguar das ondas, para então enxergar a outra margem, em
que um horizonte de pedras e uma paisagem conduziram a caminhada até
Fortalezinha.
Assim, entre idas e vindas no decorrer de dois anos, tive a oportunidade de
conviver e aprender um pouco sobre a realidade ambiental, social e cultural de uma
área tão rica e singular da região Amazônica, que ainda encontra-se em situação de
invisibilidade, encoberta pela racionalidade eurocentrada hegemônica e seu modelo
dominante de sociedade.
Desse modo, a busca em compreender a perspectiva de educação ambiental
do GAF, se deu em um encontro com um campo tomado por relações de afeto,
tensões, memórias, experiências e histórias de vidas que foram influenciadas de
forma direta e indireta pela atuação do Grupo. Atuação que ainda hoje faz parte do
enredo narrativo de atores que estiveram envolvidos naquela prática coletiva.
Assim, esta pesquisa se definiu em seções, que buscaram elucidar desde as
motivações de ordem pessoal e acadêmica que compreendem a parte introdutória
do trabalho apresentando a temática central a ser abordada, assim como
problemáticas já relacionadas a pesquisa, porém, encontradas durante as etapas
que antecederam a construção do projeto deste estudo; na parte inicial da
dissertação também trago os objetivos gerais e específicos, o aporte teórico utilizado
nesta investigação e o procedimentos metodológico da pesquisa.
Em seguida apresento a vila de Fortalezinha, sua história, localização,
características de comunidade tradicional pesqueira da Amazônia, especificando as
principais informações sobre o contexto de Área de Proteção Ambiental (APA) e
suas diretrizes formais da APA de Maiandeua.
Já num terceiro momento do texto, apresento o Grupo Ambiental de
Fortalezinha, sua história e processo de construção do grupo, os motivos para sua
respectiva criação e suas principais ações. O quarto momento construo um
panorama do campo da educação ambiental e seus marcos teóricos no contexto
internacional, da América Latina e do Brasil, as principais correntes ecologistas, as
184

principais correntes teóricas dentro do campo da educação ambiental, e as


macrotendências das correntes da educação ambiental: nas principais perspectivas
político-pedagógicas.
O quinto momento faço uma análise da experiência de educação ambiental a
partir da ação coletiva do GAF, na interface de uma leitura de outras pedagogias,
abordando também um prisma teórico das epistemologias do sul e a possibilidade
interpretativa para essa experiência de educação, verificando avanços e limites
dessa ação. E finalizo com estas considerações, que tecem alguns entendimentos
sobre a pesquisa e desafios que foram identificados a partir dessa experiência para
o debate do campo da educação ambiental com as populações tradicionais da
Amazônia.
As considerações aqui apresentadas são “abertas”, sem a pretensão de
encerrar o debate e reflexões suscitados ao longo do estudo. A partir das
entrevistas, o Grupo Ambiental de Fortalezinha é anunciado como uma experiência
que ainda se encontra ativa para a maioria daqueles e daquelas que estiveram
engajados e engajadas com as demandas do grupo. Apesar de ainda se encontrar
desativado em sua uma concretude coletiva, o grupo respalda-se em uma diretriz
legal por meio de seu respectivo Estatuto Oficial.
A experiência de pesquisa com o GAF revelou a potencialidade de uma
“outra” educação ambiental que emerge da realidade pesqueira da região do
salgado paraense, a qual perpassava não apenas uma sensibilização em relação ao
tratamento dado ao lixo pela comunidade, mas, também, apresenta sinais de uma
problematização de questões socioambientais encontradas durante a atuação do
grupo na vila, considerando os impactos do crescimento do turismo e problemas
estruturais e a relação das questões ambientais em atividades interligadas com os
aspectos da cultura local.
Para compreender essa experiência educativa ambiental, recorri aos
instrumentos teóricos e epistemológicos e recursos metodológicos contra
hegemônicos, voltados para um direcionamento pós-abissal do conhecimento, que
considera outras formas de fazer ciência, legitima outras experiências e saberes,
situados em lugares distintos e que estão para além de uma linha abissal
reducionista e eurocêntrica.
Ação coletiva do Grupo Ambiental de Fortalezinha e sua experiência em torno
da educação ambiental na comunidade e os seus agentes formativos, tem uma
185

importância significativa no debate da educação ambiental na Amazônia, pois


anuncia a singularidade de um grupo, que tem referências a partir da memória
individual de cada participante, a constituição histórica coletiva do GAF, suscitada
por demandas encontradas na realidade de Fortalezinha, na transição do final de
década de noventa para o início do XXI.
O GAF surge imerso à problemáticas encontradas com a questão do lixo na
comunidade, mas a pesquisa revelou outros fatores que contribuíram na fomentação
de múltiplas discussões dentro do grupo e consequentemente em ações que
objetivassem o atendimento dessas respectivas necessidades básicas de
Fortalezinha, que infelizmente, possui uma gestão que não atende as diligências da
vila e dos moradores.
De acordo com as falas de agentes externos e de moradores que
participaram da ação do GAF, as pautas trabalhadas na perspectiva da educação
ambiental abordavam também aspectos sociais e culturais da comunidade.
Apresentado avanços significativos para vila de Fortalezinha, como um movimento
educativo que promoveu a circulação de conhecimentos, provocando a construção
de um olhar mais sensível para o meio ambiente e, também chamando atenção para
a participação social dos moradores nas reivindicação de seus direitos.
Contudo, a falta de recurso e limitações de ordem logística e de relações
interpessoais constam como dificuldades enfrentadas pelo Grupo. E ainda, vale
ressaltar que a experiência de educação ambiental realizada pelo GAF, apesar de
sua importância e marco para aquela comunidade, estava voltada para mobilização
coletiva em viabilizar ações para problemática dos impactos ambientais gerados
pelo avanço do turismo, aumento da produção de resíduos, queimadas, retirada de
pedras da praia e outras implicações que afetavam diretamente a realidade
socioambiental da vila.
Outra experiência de educação ambiental desenvolvida pelo GAF que merece
destaque, é a que estava direcionada ao aspecto cultural: atividades que
possibilitavam a circulação de saberes em torno da pesca e do cotidiano dos
moradores, como exemplo ação do “avuado”; embora seu exemplo tenha sido dado
como uma atividade voltada para os turistas, não se pode desconsiderar a
potencialidade de seus símbolos e significados culturais em interface com a
educação ambiental.
186

A pesquisa registra um dado muito importante, destacada pelos


interlocutores. Os entrevistados consideram que o grupo ainda se encontre ativo na
concepção de uma perspectiva de compreensão da realidade por aqueles que
vivenciaram o GAF durante seus dez anos de atuação, encontrando-se legalizado
perante ao seu Estatuto Social. Verificando nas informações obtidas com as
entrevistas, que ainda há um interesse por parte dos participantes do grupo em
retomar as atividades, debates e ações educativas ambientais na comunidade de
Fortalezinha.
A partir das análises aqui empreendidas pode-se inferir alguns desafios para
a educação ambiental na Amazônia. O primeiro desafio para educação ambiental na
Amazônia seria averiguar como as populações locais tradicionais estão se
organizando frente às problemáticas ambientais atuais e que conhecimentos
tangenciam esses processos.
É fundamental atentar para comunidades tradicionais e observar como vem
sendo estruturadas alternativas de resistência contra o avanço de ataques ao meio
ambiente e qual seria o papel da educação ambiental diante de um contexto com
tantos retrocessos e perdas de direitos, instaurados por uma política que ainda tem
em sua base o colonialismo.
Outro desafio é verificar como as áreas ambientais que são protegidas vem
trabalhando a educação ambiental em seus territórios, diante dos impactos que
perpassam áreas que requerem uma constante fiscalização local e as gerências do
Estado, frente ao enfraquecimento atual de políticas públicas em torno das questões
ambientais.
Por fim, um terceiro e último desafio que identifico a partir da minha pesquisa,
encontra-se no debate da educação ambiental no campo do reconhecimento e
valorização da cultura local da realidade amazônica, elemento este que foi
anunciado em muitos pontos durante as falas dos interlocutores. Buscar uma diálogo
com os sujeitos que fazem parte e são protagonistas na construção de uma cultura
local específica, como exemplo os pescadores, é de extrema importância para o
debate da educação ambiental, uma vez que esses atores sociais carregam
saberes, modos de viver, conhecimentos que muito tem a revelar e contribuir para o
campo da educação.
Portanto, encontrar um caminho para educação ambiental por meio da
compreensão da cultura de povos tradicionais, exige um exercício constante, em um
187

olhar que reconheça a particularidade de cada lugar, em especial nesta pesquisa, a


região Amazônica, historicamente constituída como espaço de conflitos e
contradições, inflamados pelo contexto político nacional que vivemos hoje. Mas,
ainda assim, por meio dos povos tradicionais que ali vivem, geradora de
possiblidades outras de se pensar o mundo.
188

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

ALBERTI, V. Manual da História Oral. São Paulo: Editora FGV, 2004.


ARROYO, Miguel G. Outros Sujeitos, Outras Pedagogias. Petrópolis: Vozes,
2012, p. 23-70

ARROYO, Miguel G. Ações Coletivas e Conhecimento: Outras Pedagogias?.


Porto Alegre. Universidade Popular de Movimentos Sociais. p. 1-28, novembro.
2009. Disponível em:
http://www.universidadepopular.org/site/media/leituras_upms/Acoes_Coletivas_e_Co
nhecimento__30-11-09.PDF. Acesso em 05/03/2019.

BOSI, Ecléa. Memória e Sociedade: lembrança de velhos. 3ª ed. São Paulo:


Companhia das Letras. 1994. (Cap.1,2,4).

BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil: texto constitucional


promulgado em 5 de outubro de 1988, com as alterações determinadas pelas
Emendas Constitucionais de Revisão nos 1 a 6/94, pelas Emendas Constitucionais
nos 1/92 a 91/2016 e pelo Decreto Legislativo no 186/2008. – Brasília : Senado
Federal, Coordenação de Edições Técnicas,2016. 496 p.

BRASIL. SNUC – Sistema Nacional de Unidades de Conservação da Natureza:


Lei nº 9.985, de 18 de julho de 2000; Decreto nº 4.340, de 22 de agosto de 2002;
Decreto nº 5.746, de 5 de abril de 2006. Plano Estratégico Nacional de Áreas
Protegidas: Decreto nº 5.758, de 13 de abril de 2006 / Ministério do Meio Ambiente.
– Brasília: MMA/SBF, 2011.76 p.

BRASIL. Cidade Brasil. Município de Maracanã. Brasília: Cidade Brasil.com. 2018.


Disponível em: https://www.cidade-brasil.com.br/municipio-maracana.htmL. Acesso
em: 20 jan. 2019.

BRASIL. SNUC – Sistema Nacional de Unidades de Conservação. Brasília:


Ministério do Meio Ambiente. 2018. Disponível em: http://www.mma.gov.br/areas-
protegidas/unidades-de-conservacao/sistema-nacional-de-ucs-snuc.html. Acesso
em: 22 mar. 2019.

BRASIL. SNIF – Sistema Nacional de Informações Florestais: Brasília: Ministério


do Meio Ambiente. 2018. Disponível em: http://snif.florestal.gov.br/pt-br/dados-
complementares/212-sistema-nacional-de-unidades-de-conservacao-mapas. Acesso
em: 22 mar. 2019.

BRASIL. IBGE – Panorama da Cidade de Maracanã: Brasília: Instituto Brasileiro de


Geografia e Estatística. 2019. Disponível em:
https://cidades.ibge.gov.br/brasil/pa/maracana/panorama. Acesso em: 20 mar.2019.

BRASIL. Maracanã. Prefeitura de Maracanã. Pará. 2019. Disponível em:


http://www.maracana.pa.gov.br/site/. Acesso em 20 mar. 2019.
189

BRASIL.Política Nacional de Meio Ambiente. LEI Nº 6.938, DE 31 DE AGOSTO


DE 1981. Brasília: Casa Civil da PR/Subchefia para Assuntos Jurídicos, 1981.

BRASIL. Constituição Federal da República Federativa do Brasil. Título VIII


Da Ordem Social Capítulo VI Do Meio Ambiente. Brasília: Casa Civil da
PR/Subchefia para Assuntos Jurídicos, 1988.

BRASIL. MINISTÉRIO DO MEIO AMBIENTE – MMA. Histórico Brasileiro de


Educação Ambiental. Disponível em: http://www.mma.gov.br/. Acesso em: 02
outubro 2018.

BRANDÃO. Carlos Rodrigues. A educação como cultura. Campinas. Mercado de


Letras, 2002.

BRANDÃO, Carlos Rodrigues. O que é Educação. São Paulo: Editora Brasiliense,


2007.

BRANDÃO, Carlos Rodrigues. Nós, os humanos do mundo à vida, da vida à


cultura. São Paulo: Cortez, 2015.

CASTRO- GÓMEZ; Santiago; GROSFOGUEL, Ramon. Prólogo. Giro decolonial,


teoria crítica y pensamento heterárquico.In: CASTRO-GOMES, Santiago;
GROSFOGUEL, Rámon (Orgs.). El Giro Decolonial: Reflexiones para una
diversidade epistémica más allá del capitalismo global. Bogotá: Siglo del Hombre
Editores; Universidad Central, Instituto Pensar, 2007.

CALDART, Roseli Salete. Dicionário da Educação do Campo. 2ª. ed. Rio de


Janeiro, São Paulo: Escola Politécnica Joaquim Venâncio, Expressão Popular, 2012.

CASCINO, Fabio. Educação ambiental: princípios, história e formação de


professores. 4.ed. São Paulo: Editora Senac São Paulo, 1999.

FURTADO, Lourdes Gonçalves. Curralista e Redeiros de Marudá Pescadores do


Litoral do Pará. Museu paraense Emilio Goeld, Belém 1987.

FREIRE, Paulo. Política e educação. 2.ed. São Paulo: Paz e Terra, 2015.

GONÇALVES, Carlos Walter Porto. Amazônia, Amazônias. 3. ed. São Paulo:


Contexto, 2015.

GONÇALVES, Carlos Walter Porto. OS (DES)CAMINHOS DO MEIO AMBIENTE.


14.ed. São Paulo: Contexto, 2008.

GOHN, Maria da Glória. Educação não formal e cultura política: impactos sobre o
associativismo do terceiro setor. 5. ed. São Paulo: Cortez, 2011.

GOHN, Maria da Glória. Teoria dos movimentos sociais paradigmas clássicos e


contemporâneos. São Paulo: Loyola, 1997.
190

GOHN, Maria da Glória. Educação não formal e o educador social: atuação no


desenvolvimento de projetos sociais. São Paulo: Cortez, 2010.

ISA. Instituto Socioambiental. Unidades de Conservação do Brasil. Brasil. 2019.


Disponível em: https://widgets.socioambiental.org/content/ucs-federais-no-brasil.
Acesso em: 20 mar.2019.

ISA. Instituto Socioambiental. Unidades de Conservação do Brasil. Brasil. 2019.


Disponível em: https://uc.socioambiental.org/quem-somos. Acesso em: 20 mar.2019.

ISA. Instituto Socioambiental. Unidades de Conservação do Brasil. Brasil. 2019.


Disponível em: https://uc.socioambiental.org/. Acesso em: 20 mar.2019.

ISA. Instituto Socioambiental. Unidades de Conservação do Brasil. Brasil. 2019.


Disponível em: https://uc.socioambiental.org/pt-br/uc/91. Acesso em: 20 mar.2019.

LAKATOS, Eva Maria. MARCONI, Marina A. Fundamentos de metodologia


científica. 7. ed. São Paulo: Atlas, 2010.

LEFF, Enrique. Aventuras da epistemologia ambiental: da articulação das


ciências ao diálogo de saberes. Tradução de Silvana Cobucci Leite. São Paulo:
Cortez, 2012.

LE GOFF, Jacques. História e memória. 7ª ed. Campinas, SP. Unicamp, 2013.

LEFEBVRE, Henri. Marxismo. Porto Alegre, RS. L&PM, 2009.

LOUREIRO, Carlos Frederico B. Trajetória e fundamentos da educação


ambiental. 2.ed. São Paulo: Cortez, 2006.

MARTÍNEZ ALIER, Joan. O Ecologismo dos pobres. [tradutor Maurício Waldman].


2.ed. São Paulo: Contexto,2018.

MINAYO, M. C. S. (ORG.); DESLANDES, S. F.; NETO, O. C.; GOMES, R. Pesquisa


Social: Teoria, Método, e Criatividade. Petrópolis: Editora Vozes, 1994.

MINAYO, M. C. S.; SOUZA, E. R.; CONSTANTINO, P.; SANTOS, N.C. Métodos,


técnicas e relações em triangulação, In: MINAYO, M. C. S.; ASSIS, S. G.; SOUZA,
E.R. (orgs). Avaliação por triangulação de métodos: Abordagem de Programas
Sociais. Rio de Janeiro: Editora Fiocruz, 2010, p. 71-103.

NORA, Pierre. Entre memória e história: a problemática dos lugares. São Paulo.

PALERMO, Zulma. Para una pedagogía decolonial. 1ª ed. Ciudade Autónoma de


Buenos Aires: Del Signo, 2014.

QUARESMA, Helena Doris de Almeida Barbosa. O desencanto da Princesa:


pescadores tradicionais e turismo na área de proteção ambiental de
Algodoal/Maiandeua. Belém: NAEA, 2003.
191

REIGOTA, Marcos. Educação Ambiental: a emergência de um campo científico.


Revista Perspectiva, Florianópolis, v. 30, n. 2, p. 499-520, maio/agosto. 2012.
Disponível em: https://periodicos.ufsc.br/index.php/perspectiva/article/view/23702.
Acesso em: 05/03/2019.

SANTANA, Graça. Zoneamento, usos sociais e representações dos espaços


aquáticos de Fortalezinha, Maracanã-PA. In: CASTRO, Edna (Org). Belém das
águas e ilhas. Belém: CEJUP, 2006. p. 375- 400.

SANTOS, Boaventura de Sousa. Um discurso sobre as ciências. 5.ed. São Paulo:


Cortez. 2008.

SANTOS, B. S.; MENESES, M. P. (Org.). Epistemologias do Sul. São Paulo:


Cortez, 2010. 637 p.

SANTOS, B. S. Para Além do Pensamento Abissal: das linhas globais a uma


ecologia dos saberes. In SANTOS, B. S.; MENESES, M. P. Epistemologias do Sul.
São Paulo: Cortez, 2010, p. 31-83.

SANTOS, Boaventura de Sousa. A gramática do tempo: para uma nova cultura


política. 3. Ed. São Paulo: Cortez, 2010.

SAUVÉ, Lucie. Uma cartografia das correntes em educação ambiental. In:


SATO, Michele; CARVALHO, Isabel. EDUCAÇÃO AMBIENTAL PESQUISA E
DESAFIO. Porto Alegre: Artmed,2005. (p.18-42).
SEMAS. Secretaria de Meio Ambiente e Sustentabilidade. Portaria nº 291. Pará.
2006. Disponível em: https://www.semas.pa.gov.br/2006/06/06/9850/. Acesso em:
16 jan.2020.

SILVA, Raimundo Reinaldo Carvalho da Silva. Gerenciamento Costeiro Integrado:


Proposta de Inserção de Concepções Subsidiárias Ao Plano Diretor Municipal de
Curuçá. Dissertação de Mestrado Em Recursos naturais e Desenvolvimento Local.
NUMA, 2011.

THOMPSON, Jonh B. Ideologia e Cultura Moderna. Teoria social crítica na era dos
meios de comunicação de massa. Petrópolis/ Rj: Vozes, 1995. Cap. III. O conceito
de cultura. (p.165-215).

TRISTÃO, Martha; JACOBI, Pedro Roberto. A educação ambiental e os


movimentos de um campo de pesquisa: entre, através e além do
ambientalismo e da educação. In: TRISTÃO, Martha; JACOBI, Pedro Roberto.
Educação ambiental e os movimentos de um campo de pesquisa. São Paulo:
Annablume, 2010. (p.13-28).

YIN, Robert K. Estudo de caso: planejamento e métodos / Robert K. Yin; trad.


Daniel Grassi - 2.ed. -Porto Alegre: Bookman, 2001.
192

APÊNDICE
193

APÊNDICE A
TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO

“EDUCAÇÃO AMBIENTAL” EM COMUNIDADES TRADICIONAIS


PESQUEIRAS DA AMAZÔNIA: UM ESTUDO SOBRE A EXPERIÊNCIA DO GRUPO
AMBIENTAL DE FORTALEZINHA (GAF)

Estamos comunicando, por meio deste Termo, a convidá-lo (a) a participar da


pesquisa de Dissertação de Mestrado, intitulada ““Educação Ambiental” em
Comunidades Tradicionais Pesqueiras da Amazônia: um Estudo sobre a Experiência
do Grupo Ambiental de Fortalezinha (GAF)”, vinculada ao Programa de Pós-
Graduação em Educação na Universidade do Estado do Pará (UEPA), tendo como
orientador Prof. Dr. Sérgio Roberto Moraes Corrêa. Esta pesquisa tem como objetivo
geral é identificar e analisar o que a ação coletiva do GAF, na comunidade
tradicional (pesqueira) de Fortalezinha, tem a revelar sobre a sua experiência de
“educação ambiental” a partir das narrativas da comunidade e de outros agentes
institucionais que compunham o GAF.
Esclarecemos que sua participação será por meio de entrevista, cujo
instrumento foi elaborado por nós a respeito do tema em estudo. Para o registro das
respostas, utilizaremos anotação direta ou, se você concordar, o gravador do celular
ou câmera de vídeo. Poderemos utilizar, também, imagens fotográficas suas tiradas
durante a entrevista ou em alguma atividade do seu cotidiano.
Fica claro para todos, quais são as propostas do estudo, os procedimentos a
serem realizados, as garantias de confiabilidade e de esclarecimento pertinente.
Fica claro também que a participação é isenta de despesas, de compensação
financeira e que não oferecem riscos morais, psicológicos, de vida e de saúde.

________________________
Aluna/ Pesquisadora
Adriele de Fátima de Lima Barbosa
(91) 982966781
194

CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO

Eu,...........................................................................................................,
declaro que li as informações sobre a pesquisa e que me sinto perfeitamente
esclarecido (a) sobre o conteúdo da mesma. Declaro, ainda, por minha livre vontade,
que aceito participar, cooperando com a coleta de informações para a pesquisa.

Belém,_____/_____/_____ ____________________________
ASSINATURA DO SUJEITO DA PESQUISA
195

APÊNDICE B
ROTEIRO DE ENTREVISTA SEMI-ESTRUTURADA

1. ASPECTOS DA TRAJETÓRIA DE VIDA DOS SUJEITOS DO GAF


a) Nome completo
b) Quando e onde nasceu?
c) Há quanto tempo reside na ilha?
d) Trabalha em que?

2. ASPECTOS SOBRE ORIGEM E DESENVOLVIMENTO DO GAF


a) O que foi o GAF e quando surgiu?
b) De onde e de quem surgiu a iniciativa de criar o GAF?
c) Quais os motivos para sua criação?
d) Qual era a proposta do grupo?
e) Qual a sua função no GAF?
f) Como você descreve a experiência no Grupo?
g) Quais ações eram realizadas pelo grupo na comunidade?
h) O Grupo tinha alguma relação com a APA/ Resex e com os turistas visitantes?
i) Quais foram as lideranças que fizeram parte do GAF?
j) Havia participação de outras pessoas e instituições fora da comunidade? Se
sim, quais?

3. A proposta de educação ambiental do GAF.


a) Qual a concepção e proposta de educação ambiental do GAF?
b) Que ações eram realizadas para promover a educação ambiental no grupo e na
comunidade?
c) Quais avanços da experiência do GAF em relação ao tema da educação
ambiental na vila?
d) O que ação coletiva contribui para comunidade?
e) Quais os problemas enfrentados pela experiência do GAF em relação ao tema
da educação ambiental?
f) Havia alguma relação entre o GAF e a Escola da comunidade?
g) Quais as limitações da experiência do GAF em relação a educação ambiental?
196

4. O termino do GAF e suas implicações.


a) Por que o Grupo acabou?
b) O que você percebeu depois que o grupo terminou?
c) Ocorreu alguma mudança na Vila? Se sim, quais?
d) Que lições ficaram?
197

Universidade do Estado do Pará


Centro de Ciências Sociais e Educação – CCSE
Programa de Pós-Graduação em Educação
Linha de Pesquisa: Saberes Culturais e Educação na Amazônia
Tv. Djalma Dutra S/N – Telégrafo
www.uepa.com.br

Você também pode gostar