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Uma entrevista psiquiátrica bem conduzida resulta em uma compreensão multidimensional dos
elementos biopsicossociais do transtorno e fornece as informações necessárias para que o
psiquiatra, com o paciente, desenvolva um plano de tratamento centrado na pessoa.
PRINCÍPIOS GERAIS
PRIVACIDADE E CONFIDENCIALIDADE
ATENÇÃO! A confidencialidade pode ser quebrada quando há risco de o paciente causar dano a
outra pessoa ou a si mesmo (obrigatoriedade de alertar a vítima – nesses casos, também é possível
aumentar dose de medicamentos ou internar o paciente).
Exceto em uma emergência, o consentimento do paciente deve ser obtido antes de o psiquiatra
falar com o parente.
RESPEITO E CONSIDERAÇÃO
• O paciente deve ser tratado com respeito, e o entrevistador deve considerar as circunstâncias
da condição do paciente (dor, sofrimento, vulnerabilidade e incerteza).
RAPPORT/ EMPATIA
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RELACIONAMENTO PACIENTE -MÉDICO
CONSCIENTE / INCONSCIENTE
Uma entrevista psiquiátrica deve ser centrada na pessoa (paciente), ou seja, deve focar em
compreender o paciente e permitir que ele conte sua história.
• É necessária uma apreciação das experiências e de seu impacto sobre a pessoa para formar
um entendimento do paciente.
• Perguntas abertas são úteis para a obtenção da história do paciente; perguntas fechadas são
utilizadas para compreensão da situação e extração de informações.
TIPOS DE ENTREVISTA
ENTREVISTA ABERTA
2 Luísa Soares
ENTREVISTA ESTRUTURADA
• Nas entrevistas estruturadas, a forma pela qual se obtém as informações, a sequência das
perguntas e os registros dos resultados são pré-determinados.
• Geralmente, os formulários dessas entrevistas contém glossários, que procuram descrever,
acuradamente, os termos empregados.
• A principal vantagem desse tipo de entrevista é aumentar a confiabilidade do diagnóstico
psiquiátrico, facilitando a concordância entre diferentes profissionais.
• Em razão disso, as entrevistas estruturadas tem se constituído em importante instrumento
para as atividades de pesquisa clínica e estudos epidemiológicos.
• Pode-se questionar a pequena flexibilidade desse tipo de entrevista, o que, em determinadas
circunstâncias, poderia prejudicar a colaboração do paciente.
ENTREVISTA SEMI-ESTRUTURADA
ANAMNESE PSIQUIÁTRICA
IDENTIFICAÇÃO
• Nome, idade, sexo, estado civil (ou outro relacionamento significativo), raça ou etnia e
ocupação do paciente. Muitas vezes, a fonte de encaminhamento também é inclusa.
QUEIXA PRINCIPAL
• Esta deve ser a queixa apresentada pelo paciente, idealmente em suas próprias palavras.
o Exemplos incluem: “Estou deprimido” ou “Sinto muita ansiedade”.
• A doença atual é uma descrição cronológica da evolução dos sintomas do episódio atual. O
relato também deve incluir qualquer mudança que ocorreu durante esse mesmo período de
tempo nos interesses, nas relações interpessoais, nos comportamentos, nos hábitos pessoais
e na saúde física do paciente.
3 Luísa Soares
Perguntas abertas podem fornecer
grande parte das informações essenciais
para a seção.
• O médico deve obter informações sobre todas as doenças psiquiátricas e seu curso ao longo
da vida do paciente, incluindo sintomas e tratamento.
o A descrição dos sintomas passados deve incluir quando eles ocorreram, quanto
tempo duraram e sua frequência e gravidade.
• Os tratamentos dos episódios anteriores devem ser revistos em detalhes.
o Ambulatorial (psicoterapia), hospitalização parcial, internação hospitalar (definir se
voluntária ou não; justificativa da internação).
• Medicamentos e outras modalidades de tratamento também devem ser revistas.
o Deve-se explorar o que foi tentado (pode ter de listar de nomes para os pacientes),
por quanto tempo e em que doses eles foram usados (para estabelecer a adequação
das tentativas) e por que foram interrompidos.
• O psiquiatra também deve indagar se um diagnóstico foi feito, qual foi e quem o fez.
• Consideração especial ao estabelecimento de uma história de letalidade, importante na
avaliação do risco atual.
O Ideação, intenção, plano e tentativas de suicídio passados devem ser revistos,
incluindo a natureza das tentativas, a letalidade percebida das tentativas, a
possibilidade de ser salvo, bilhetes de suicídio, doação de coisas ou outras
preparações para a morte. História de violência e potencial homicida incluirá
quaisquer atos ou intenções violentos.
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USO, ABUSO E ADIÇÃO DE SUBSTÂNCIAS
Uma revisão cuidadosa de uso, abuso e adições de substâncias é essencial para a entrevista.
• A história de uso deve reunir quais substâncias foram usadas, incluindo álcool, drogas,
medicamentos (prescritos ou não prescritos para o paciente), e vias de uso (oral, nasal ou
intravenosa).
• A frequência e a quantidade do uso devem ser determinadas.
• A tolerância, a necessidade de quantidades crescentes de bebida e outros sintomas de
abstinência devem ser estabelecidos para ajudar a determinar abuso versus dependência.
• O impacto do uso sobre interações sociais, trabalho, escola, consequências legais e dirigir
intoxicado deve ser abordado.
o Alguns psiquiatras usam um questionário padronizado breve, o CAGE ou o RAPS4,
para identificar abuso ou dependência de álcool.
FASES DA MUDANÇA
• Em 1977 James Proschaska e colaboradores começaram a desenvolver o modelo transteórico
de mudança de comportamentos. Atualmente o modelo define cinco fases de mudança:
o Pré-contemplação: A pessoa não têm a intenção de mudar e pode nem ter
consciência do problema associado ao comportamento;
o Contemplação: A pessoas reconhece o problema e pensa nos prós e contras;
o Preparação: A pessoa quer mudar no futuro próximo, e começa a dar pequenos
passos em direção a uma mudança de comportamento;
o Ação: A pessoa está a fazer mudanças evidentes e concretas no seu comportamento
ou a iniciar novos comportamentos saudáveis;
o Manutenção: A pessoa mantém os novos comportamentos de forma sustentada e
está a trabalhar para prevenir a recaída.
HISTÓRIA FAMILIAR
• Muitas doenças psiquiátricas são familiares e um número significativo delas tem uma
predisposição genética, senão uma causa;
• Auxilia não apenas a definir os possíveis fatores de risco para doenças específicas como
também a formação psicossocial do paciente.
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HISTÓRIA EVOLUTIVA E SOCIAL
REVISÃO DE SISTEMAS
• A revisão de sistemas tenta captar quaisquer sinais e sintomas físicos ou psicológicos atuais
ainda não identificados na doença atual.
O exame do estado mental (EEM) é o equivalente psiquiátrico do exame físico no resto da medicina.
• Até aqui, tivemos um relato feito pelo paciente e, em alguns casos, outros dados colhidos por
familiares ou pessoa que o acompanha à entrevista. Nosso trabalho foi o de registrar e
organizar tais informações.
• Neste ponto da anamnese, cessa esse relato do paciente e passa-se a ter o registro da
observação do entrevistador ou terapeuta, no momento da(s) entrevista(s).
APARÊNCIA E COMPORTAMENTO
ATIVIDADE MOTORA
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FALA
HUMOR
AFETO
Afeto difere de humor, visto que é a expressão do humor ou o que o humor do paciente parece ser
para o médico.
CONTEÚDO DO PENSAMENTO
• É essencialmente os pensamentos que estão ocorrendo ao paciente, deduzidos pelo que ele
expressa de maneira espontânea, bem como pelas respostas a perguntas específicas visando
evocar determinada patologia.
o Pensamentos obsessivos são aqueles indesejados e repetitivos que invadem a
consciência. São, em geral, alheios ao ego, e o paciente resiste a eles.
o As compulsões são comportamentos repetitivos e ritualizados que os pacientes se
sentem compelidos a realizar para evitar um aumento na ansiedade ou algum
desfecho temido.
o Delírios são ideias fixas, falsas, que não são compartilhadas por outras pessoas e
podem ser divididos em bizarros e não bizarros.
PROCESSO DO PENSAMENTO
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o Pensamentos ou associações frouxos diferem dos pensamentos circunstanciais e
tangenciais, uma vez que, com os pensamentos frouxos, é difícil ou impossível ver
conexões entre o conteúdo sequencial.
o Perseveração é a tendência a focar-se em uma ideia ou conteúdo específicos sem a
capacidade de mudar para outros tópicos.
o Bloqueio do pensamento refere-se a um processo de pensamento perturbado no
qual o paciente parece ser incapaz de completar um pensamento.
o Neologismos. Invenção de novas palavras ou expressões ou uso de palavras
convencionais de maneiras idiossincráticas.
PRODUÇÃO/FORMA:
• Como o paciente conecta ideias, em que sequência, se segue ou não sintaxe e lógica.
• Pode ser lógica, ilógica ou mágica (não obedece às leis da realidade, tempo e espaço,
envolvendo sorte/misticismo).
CURSO:
• Quantidade de ideias – pode ser abundante a escassa, – e velocidade das ideias – rápida,
lentificada ou bloqueada.
• Problemas: fuga de ideias, perda de associações, tangencialidade, circunstancialidade,
bloqueio do pensamento, perseveração, pobreza do pensamento, associação por rimas.
CONTEÚDO:
• Ideias e sua conexão ou não com a realidade – cuidar especialmente ideias que possam
representar um perigo para si ou para outros.
• Problemas: delírio ou ideia delirante (ideia falsa/crença irreal com impossibilidade de
conteúdo, não compartilhado com outros de mesma cultura, não muda o pensamento por
argumentação lógica), ideias supervalorizadas, ideias de referência (outras pessoas ou meios
de comunicação referem-se a si), pobreza (vago), obsessões.
CONSCIÊNCIA
Capacidade do indivíduo de dar conta do que está ocorrendo dentro e fora de si mesmo.
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SENSOPERCEPÇÃO
• Capacidade de perceber e interpretar estímulos aos órgãos dos sentidos (auditivos, visuais,
olfativos, táteis e gustativos).
o Ilusões: ocorre quando os estímulos sensoriais reais são confundidos ou interpretador
erroneamente.
o Alucinações: ocorre percepção sensorial na ausência de estímulo externo (não tem
insight – crítica). A verdadeira é mais nítida, tem corporeidade, enquanto a pseudo é
frustra/vulto/embaçado – mas é percebida, sabe que não é real.
ATENÇÃO! Despersonalização é uma sensação de ser estranho a si mesmo ou de que alguma coisa
mudou. Desrealização é uma sensação de que o ambiente mudou de alguma forma estranha que é
difícil de descrever.
COGNIÇÃO
• Os elementos do funcionamento cognitivo que devem ser avaliados são o estado de alerta,
orientação, concentração, memória (tanto de curto como de longo prazos), cálculo, cabedal
de conhecimento, raciocínio abstrato, insight e julgamento.
ESTADO DE ALERTA
• Observação pura do nível de alerta do paciente.
ORIENTAÇÃO
• Situar-se no tempo, espaço ou situação e a reconhecer a si mesmo e familiares.
o Qual o seu nome? Quem sou eu? Que lugar é este? Onde se localiza?
CONCENTRAÇÃO
• Verificar a concentração do paciente por meio de testes como:
o Começando em 100, conte de trás para a frente de 7 em 7 (ou de 3 em 3).
o Diga as letras do alfabeto de trás para a frente, começando com o Z.
o Diga os meses do ano de trás para a frente, começando com dezembro.
MEMÓRIA
• Capacidade de registrar, fixar ou reter, evocar e reconhecer objetos, pessoas e experiências
passadas ou estímulos sensoriais. Existe a memória declarativa/verbal e a procedural.
• É avaliada em imediata (repetir sequência de números), recente (repetir palavras e depois de
5 min), remota (falar de eventos importantes).
o Imediata:
▪ Repita os números comigo: 1, 4, 9, 2, 5.
o Recente:
▪ O que você comeu no café da manhã?
▪ O que você estava fazendo antes de começarmos a conversar?
▪ Quero que você se lembre destas três coisas: pente, rua, azul. Após alguns
minutos, vou pedir para você repeti-las.
o De longo prazo:
▪ Qual era seu endereço quando você estava na 3a série?
▪ Quem era o seu professor?
▪ O que você fez no verão entre o ensino médio e a faculdade?
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RACIOCÍNIO ABSTRATO
• É a capacidade de compreender e abstrair a partir de conceitos gerais e exemplos específicos.
• Pedir ao paciente para identificar semelhanças entre objetos ou conceitos semelhantes
(maçã e pera, ônibus e avião ou um poema e uma pintura), bem como interpretar provérbios,
pode ser útil para avaliar a capacidade da pessoa de abstrair.
CÁLCULO
• Pedir ao paciente para:
o Se você comprar algo que custa R$ 3,75 e pagar com uma nota de R$ 5,00, qual será
o troco?
o Quanto custam três laranjas, se uma dúzia custa R$ 4,00?
CABEDAL DE CONHECIMENTO
• Questionar temas de conhecimento geral, como:
o Qual é a distância entre Nova York e Los Angeles? Qual é o oceano que fica entre a
América do Sul e a África?
INSIGHT
JULGAMENTO
• Refere-se à capacidade da pessoa de tomar boas decisões e agir de acordo com elas.
• O nível de julgamento pode ou não estar correlacionado com o nível de entendimento: um
paciente pode não ter consciência de sua doença, mas ter bom julgamento.
INTELIGÊNCIA
LINGUAGEM
SONO
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EXAME FÍSICO
• Com pacientes ambulatoriais, pouco ou nenhum exame físico pode ser realizado
rotineiramente, enquanto no pronto-socorro ou em pacientes hospitalizados, um exame
físico mais completo é justificado.
o Sinais vitais, peso, circunferência da cintura, índice de massa corporal e altura podem
ser medidas importantes a acompanhar, em particular devido aos efeitos potenciais
dos medicamentos psiquiátricos ou de doenças sobre esses parâmetros.
FORMULAÇÃO
• Deve incluir, ainda, uma discussão de fatores biológicos (história médica, familiar e de
medicação) e também de fatores psicológicos, como circunstâncias da infância, criação e
fatores sociais anteriores, incluindo estressores, e outras questões atuais, como finanças,
escola, trabalho, casa e relacionamentos interpessoais.
PLANEJAMENTO DO TRATAMENTO
TÉCNICAS
INTERVENÇÕES FACILITADORAS
Estas são algumas das intervenções eficazes que permitem ao paciente continuar compartilhando
sua história e que também são úteis para promover um relacionamento paciente-médico positivo.
• Reforço: frases breves como “Entendo”, “Continue”, “Sim”, “Conte-me mais”, “Hmm” ou
“Uh-huh” transmitem o interesse do entrevistador em que o paciente continue.
• Reflexão: usando as palavras do paciente, o psiquiatra indica que ouviu o que ele está
dizendo e transmite um interesse em ouvir mais.
• Resumo: periodicamente, durante a entrevista, é proveitoso resumir o que foi identificado.
• Educação: educar sobre o processo da entrevista.
• Reafirmação: muitas vezes, é adequado e proveitoso transmitir segurança para o paciente.
• Encorajamento: para muitos pacientes, é difícil comparecer a uma avaliação psiquiátrica.
Com frequência, não têm certeza do que irá acontecer, e receber encorajamento pode
facilitar seu envolvimento.
• Reconhecimento das emoções: é importante que o entrevistador reconheça a expressão de
emoções pelo paciente. Isso frequentemente leva o paciente a compartilhar mais
sentimentos e a se sentir aliviado por poder fazê-lo.
• Humor: a partilha de humor pode diminuir a tensão e a ansiedade e reforçar a autenticidade
do entrevistador.
• Silêncio: o uso cuidadoso do silêncio pode facilitar a progressão da entrevista. O paciente
pode necessitar de tempo para pensar sobre o que foi dito ou para vivenciar um sentimento
que surgiu na entrevista.
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COMUNICAÇÃO NÃO-VERBAL
INTERVENÇÕES EXPANSIVAS
• Clarificação: esclarecer cuidadosamente o que o paciente disse pode elucidar problemas não
reconhecidos ou psicopatologia.
• Associações: à medida que o paciente descreve seus sintomas, outras áreas relacionadas a
um sintoma devem ser exploradas.
• Direção: a continuidade da história pode ser facilitada perguntando “o que”, “quando” ou
“quem”.
• Sondagem: encorajar o paciente a falar mais sobre determinado assunto.
• Transições: a transição significa passar para uma área diferente da entrevista, e uma
declaração-ponte é útil.
• Redirecionamento: pode ser usado quando o paciente muda o tema ou quando ele se
mantém em uma área não produtiva ou já bem abordada.
INTERVENÇÕES OBSTRUTIVAS
• Perguntas fechadas;
• Perguntas compostas;
• Perguntas/afirmações parciais (certo x errado);
• Minimizar preocupações ao tentar tranquilizar;
• Conselho/interpretação prematuro (ao não conhecer todas variáveis);
• Transições (se repentinas demais);
• Comunicação não verbal inadequada: olhar relógio, se afastar, bocejar, tédio;
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