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ESCOLA DE MÚSICA
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO PROFISSIONAL EM MÚSICA
Salvador
2021
RAFAEL DA SILVA FONTE
Salvador
2021
Ficha catalográfica elaborada pela
Biblioteca da Escola de Música - UFBA
CDD: 785.14
Ao meu pai, Silas Fonte, pelo incentivo ao estudo. Obrigado por vender um terreno para
Às minhas irmãs, Leilane e Dayane, por estarem sempre presentes, mesmo distantes.
À minha avó Zelair, tios e tias. Obrigado por sempre torcerem por mim.
Ao Tiago, Handenberg e Alancaster (Palheta Sonora). Este projeto começou com vocês.
Ao grupo de câmara da Banda Sinfônica do Exército (Renata Garcia, Francisco Júnior e Filipe
Sales). Obrigado pelo excelente trabalho que fizeram na gravação das adaptações dos
dobrados.
todo estímulo.
RESUMO
ABSTRACT
The present work seeks to reflect on the formation of a chamber music repertoire of Dobrados
(brazilian marchs), among the traditional works of the Brazilian Army, adapted for clarinet
quartet. The following works by composer Antônio Manoel do Espírito Santo were adapted:
Dobrado 220, Dobrado Cisne Branco, Dobrado 182, Dobrado Quatro Dias de Viagem,
Dobrado Bombardeio da Bahia. Therefore, this research is configured as a case study of
qualitative character and as a data collection instrument, we used a semi-structured interview,
which included the participation of clarinetists from a military band of the Army, in São
Paulo. Thus, this study is justified because it encourages the practice of chamber music in
civil or military music bands, using the main repertoire of this music groups, Dobrados,
adapted for clarinet quartet. In addition, this work is composed of a descriptive Memorial, a
scientific article, a professional report on the oriented practices, adapted Dobrados scores for
clarinet quartet and an album with the studio recording of the adapted Dobrados.
INTRODUÇÃO ...................................................................................................................... 14
ANEXO 1:................................................................................................................................ 60
ANEXO 2:................................................................................................................................ 72
PARTITURA DA ADAPTAÇÃO DO DOBRADO CISNE BRANCO .............................. 72
ANEXO 3: ............................................................................................................................... 81
ANEXO 4: ............................................................................................................................... 92
INTRODUÇÃO
Escolhi para iniciar este Memorial, a epígrafe citada anteriormente a fim de sintetizar
todo o sentimento e apreço que possuo por estes grupos musicais, as bandas de música. Da
mesma maneira, detenho uma profunda afeição pelo principal repertório das bandas, o
dobrado. Sendo assim, mesmo tendo consciência de que o Memorial, geralmente, se constitui
de um relato de experiência traçado a partir do início do mestrado profissional, se fez
necessário, tendo em vista o tema desta pesquisa, constituir uma narrativa que descrevesse um
pouco da minha vivência musical em bandas de música e consequentemente, minha prática
com o repertório de dobrados.
Posto isto, iniciei meus estudos musicais aos dez anos de idade em uma escola de
música de uma instituição religiosa em Santa Cruz, Rio de janeiro, minha cidade natal. A
escola funcionava de forma bastante informal e tinha o objetivo primo de formar músicos para
suprirem as necessidades da banda da igreja. Dois importantes nomes para a música naquele
contexto eram Lucrécio Torquato e Altamiro Quaresma, conhecido como “Miro”. Lucrécio
era saxofonista, clarinetista e maestro do coral da igreja. Além disso, era o responsável por
realizar a iniciação musical de jovens e adultos e isto se dava por meio da apresentação, de
forma individual, de lições de solfejo. Quando o aluno alcançava a lição 100 (cem), era
considerado apto a fazer parte da banda.
A banda de música da igreja tinha o “Miro” como regente e possuía em sua formação
instrumentos de madeiras, instrumentos de metais e instrumentos de percussão, bem como
instrumentistas de toda faixa etária. Era muito interessante observar o cuidado dos músicos
mais experientes com os mais novos como também o respeito que os jovens tinham com os
mais velhos da banda. O grupo musical era composto por quase cinquenta músicos e seu
repertório era formado por hinos sacros, marchas e dobrados, porém, este último era
executado com mais frequência pela banda de música durante as reuniões da igreja e eventos
externos de caráter religioso. Havia dobrado em homenagem ao pastor da igreja, em
homenagem ao maestro, em homenagem a algum componente da banda, todos estes de
autoria de Altamiro Quaresma. É importante destacar que neste período, o gênero dobrado,
em minha experiência, não tinha um caráter marcial, mas sim, religioso, tendo em vista este
estilo composicional ser executado durante as atividades religiosas da igreja.
A banda dispunha de poucos recursos, de modo que, os instrumentos não possuíam
sequer uma manutenção especializada. Não tínhamos métodos para estudos específicos e não
possuíamos professores capacitados para cada instrumento. Tudo ficava a cargo do regente da
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banda que era trombonista de formação, porém tinha a incumbência de ensinar todos os
naipes que compunham o grupo musical. Fato muito comum no cotidiano das bandas. No
entanto, assim como diz a canção “A banda” de Chico Buarque de Holanda, “ a marcha
alegre se espalhou na avenida e insistiu, a lua cheia que vivia escondida surgiu, minha
cidade toda se enfeitou, pra ver a banda passar [...]”, era com esta euforia que éramos
recebidos pelos moradores das localidades onde a banda de música da igreja passava em
passeata, para convocar todos para uma espécie de reunião ao ar livre. Isso era fator
motivador para todos os participantes da banda que, apesar das dificuldades, encontravam
forças para seguir com o trabalho musical. Foi neste contexto bandístico que fui inserido
ainda criança.
Como citado anteriormente, não tínhamos métodos de estudos de clarinete, sendo assim,
para aprimorarmos a nossa técnica, utilizávamos os dobrados que faziam parte do repertório
da banda. Logo, posso afirmar que fui musicalizado no clarinete por meio dos dobrados que
faziam parte do cotidiano da banda de música da igreja.
Fonte: Acervo pessoal. Catedral das Assembleias de Deus em Santa Cruz. 1996
Com o passar dos anos, busquei especialização musical em outras escolas da região
como a escola de música da Assembleia de Deus em Marechal Hermes/RJ e a escola de
música da Assembleia de Deus em Campo Grande/RJ. Nesta última, tive a chance de obter
um aperfeiçoamento mais completo e assim estudar teoria musical, harmonia, solfejo e ter
aulas com professores de clarinete. Menciono aqui o professor Moisés Santos, clarinetista do
Teatro Municipal do Rio de Janeiro, que teve uma influência significativa neste momento da
minha experiência como estudante de clarinete.
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Fundada em 1921, a banda Portugal é a mais antiga das bandas portuguesas no Brasil
ainda em atividade no país e foi criada inicialmente com a função prima de apoiar os eventos
da comunidade luso brasileira no Rio de Janeiro. Segundo o trabalho de Oliveira (2017) a
respeito das bandas portuguesas no Brasil, a banda Portugal foi a que mais conseguiu projeção
artística dentre as bandas da comunidade lusitana, principalmente nas décadas de 80 e 90 na
qual ganhou por diversas vezes o Concurso Estadual de Bandas sendo considerada “Hors
Concours” em 1992.
Em 2006, ingressei no curso de formação de Sargento Músico do Exército Brasileiro.
Foi um momento totalmente novo em minha experiência musical, pois, além do contato com
o repertório básico das bandas militares, ou seja, dobrados, hinos e canções; durante o período
de formação, recebia instruções concernentes a fardamento, legislação militar, ordem unida,
prática de acampamento, prática de tiro entre outros temas com relação à caserna.
Ao final do período de formação na escola de sargentos, de acordo com a nota obtida
nas avaliações durante o curso, tive a oportunidade de escolher, mediante a classificação, a
região do Brasil na qual pretendia trabalhar. Neste caso, escolhi a banda do 2° Batalhão de
Polícia do Exército em Osasco/SP.
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O projeto teve duração de dois anos e obteve, apesar da inovação, um retorno positivo
do público e dos músicos. O grupo encerrou suas atividades em 2017, todavia deixou neste
pesquisador, o desejo de seguir com este projeto, a fim de formar um repertório camerístico
de dobrados adaptados para quarteto de clarinetes, com a finalidade de atender os clarinetistas
de banda de música militar ou civil.
1
Disponível no repositório da UFBA: http://repositorio.ufba.br/ri/handle/ri/31403
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para ingresso no curso tinha como produto final, apresentar adaptações de dobrados para
quarteto de clarinetes de todos os dobrados tradicionais do Exército, que constam no total de
17 obras. No entanto, a partir da orientação do professor Robatto, percebemos que seria um
trabalho inviável tendo em vista a duração do curso. Por isso, como critério de escolha, dentre
os dobrados tradicionais do Exército, decidimos adaptar para quarteto de clarinetes, os
dobrados do compositor Antônio Manoel do Espírito Santo. Foram adaptados para esta
formação os seguintes dobrados, cujas partituras se encontram em anexo neste trabalho:
Dobrado 220 (Avante Camaradas)
Dobrado 182
Dobrado Cisne Branco
Dobrado Bombardeio da Bahia
Dobrado Quatro Dias de Viagem
As adaptações para quarteto de clarinetes foram realizadas por este autor com o objetivo
de incentivar a prática da música de câmara em bandas de música por meio do principal
repertório destes grupos musicais, o dobrado. Para maiores informações a respeito desta
pesquisa, vide o artigo “Adaptações de dobrados para quarteto de clarinetes: uma alternativa
para a prática da música de câmara em bandas de música” que se encontra como Apêndice
neste trabalho.
É importante citar a contribuição da classe de bacharelado em clarinete da UFBA nos
laboratórios de música de câmara ministradas pelo professor Pedro Robatto. Nelas, tive a
chance de verificar se as adaptações soavam bem para a formação de quarteto de clarinetes e a
partir de então, realizar as alterações necessárias. Igualmente significativa foi a contribuição
dos clarinetistas da banda do 2° Batalhão de Polícia do Exército com o qual realizei
entrevistas como coleta de dados para o artigo acadêmico, bem como do quarteto de clarinetes
da Banda Sinfônica do Exército com o qual tive a oportunidade de ensaiar e gravar as
adaptações em estúdio.
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2
Francisco Paulo Mignone (1897-1986), nascido em São Paulo, foi compositor, pianista e regente. Em suas
obras identificamos em sua grande maioria influências rítmicas brasileiras, além das influências afro brasileiras,
ao introduzir a percussão e outras especificidades desta cultura. Mignone defendia o nacionalismo, pois
reconhecia que havia nas suas composições uma variedade, diversidade, que denotava ambiente e cor às suas
obras. (Silveira, 2006).
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3
Link da apresentação no Encontro 30+30: https://youtu.be/96yRPxiyV9A
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4
Ernst Mahle nasceu no ano de 1929, em Stuttgart, Alemanha e mudou-se para o Brasil em 1951. “Estudou
composição com Hans Joachim Koellreuter e complementou sua formação musical em cursos no exterior com
Messiaen e Fortner, além de estudar regência com Rafael Kubelik e Mueller-Kray. É co-fundador da Escola de
Música de Piracicaba "Maestro Ernst Mahle" e membro da Academia Brasileira de Música” (cadeira n.6)
(Mahle, 2019).
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8 ATIVIDADES EXTRACURRICULARES
Ao longo do curso, além dos eventos relativos ao mestrado, tive a oportunidade de
participar de alguns eventos artísticos e acadêmicos descritos a seguir:
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Professor e pesquisador de Teoria e Composição Musical na Universidade Federal da Bahia, Doutor em
Composição Musical (UFBA). Como pesquisador, tem atuado na área de Teoria Musical, especialmente
Musicologia Digital e contornos melódicos. Atualmente é o coordenador do curso de Composição e Regência da
UFBA, já foi vice-coordenador do mesmo curso e vice-chefe do Departamento de Música.
6
Link da gravação da Sonata de Poulenc: https://youtu.be/gvH1K-LSueM
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Disponível no endereço eletrônico: https://youtu.be/P6mIB0ZObAU
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Disponível no endereço eletrônico: https://youtu.be/zImGbPQuse8
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Disponível no endereço eletrônico: https://youtu.be/xMhH8py3Jls
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Como forma de produção de conteúdo e interação com outros clarinetistas, o grupo realiza
encontros remotos com personalidades musicais ligadas à vida militar, bem como gravações
do repertório de dobrados adaptados, por este proponente, para quarteto de clarinetes. Sendo
assim, foram gravadas, até o presente momento, as adaptações para quarteto do Dobrado
18210 e Dobrado Quatro dias de viagem11.
9 PRODUTO FINAL
Como já exposto anteriormente neste trabalho, o produto final do mestrado profissional,
tende a ser um trabalho com relevância social, ou seja, de modo geral, deve trazer alguma
contribuição para um grupo de pessoas. Nas bandas militares, nas quais os dobrados
adaptados foram interpretados, o retorno dos músicos foi bastante positivo, tanto na
interpretação da obra quanto aos benefícios adquiridos pela prática da música de câmara com
este repertório. Além disso, as adaptações de dobrados para quarteto de clarinetes, isto é,
música de câmara, atraíram um público diferente daquele estritamente militar.
Quanto a adaptar um repertório de banda, o dobrado, para quarteto de clarinetes, decidi
não realizar modificações a ponto de retirar as características principais deste estilo
composicional. Contudo, algumas inovações são claramente reconhecidas, tal como a
cadência na adaptação do Dobrado 220 e um pequeno trecho do Lago do Cisne de
Tchaikovsky na adaptação do Dobrado Cisne Branco.
Concernente ao percurso trilhado para a produção do produto final, iniciamos os ensaios
do quarteto de clarinetes a partir do segundo semestre de 2020, com encontros semanais. À
medida que as adaptações dos dobrados eram finalizadas, realizávamos laboratórios para
conhecer a opinião dos outros participantes do grupo. No entanto, percebemos que para
realizarmos um trabalho com maior refinamento, deveríamos ter a supervisão de um
profissional com maior experiência artística com música de câmara e assim, decidimos
convidar o clarinetista e produtor musical Luca Raele que, além de participar desde 1991 do
célebre conjunto de clarinetes Sujeito a Guincho, possui vasta experiência na produção
musical no eixo popular e erudito.
Após diversos ensaios, a fim de realizar o registro fonográfico do trabalho, decidimos
realizar dois dias de gravação no estúdio da FATEC em Tatuí, São Paulo. O estúdio possui
instalações distribuídas em uma área com mais de 500 metros quadrados e abriga diversas
salas, como a sala que realizamos a gravação, que possui capacidade para atender 70 músicos.
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Endereço da gravação do Dobrado 182: https://youtu.be/Ji8iUjluwIs
11
Endereço da gravação do Dobrado Quatro dias de viagem: https://youtu.be/jDVr1YqnCjI
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Além disso, fomos assistidos pelos alunos do curso de Produção Musical da instituição e pelo
coordenador do curso Zé Pires que nos auxiliou, juntamente com Raele, em todo o processo
de gravação em estúdio. Vale ressaltar que, além de todo o desafio existente quanto à
produção de um registro em estúdio, havia os obstáculos devido à pandemia de Covid 19.
Tudo devia ser realizado seguindo os protocolos de distanciamento social e utilização de
máscara.
Após o período de gravação, iniciamos, sob a supervisão de Zé Pires, o processo de
mixagem e masterização do material gravado. Todo o procedimento foi realizado de forma
remota, tendo em vista a crise sanitária que enfrentávamos no momento. Assim, a partir da
gravação que realizamos em estúdio, escolhíamos um áudio base e apoiado nisso, fazíamos as
modificações necessárias.
Assim sendo, a partir do exposto, este trabalho possui como produto final, um álbum12
gravado em estúdio com todas as adaptações de dobrados para quarteto de clarinetes –
Dobrado 220, Dobrado 182, Dobrado Cisne branco, Dobrado Quatro dias de viagem, Dobrado
Bombardeio da Bahia e contou, além da minha participação, com a presença dos seguintes
clarinetistas: Filipe Sales, Francisco Júnior e Renata Garcia, todos pertencentes à Banda
Sinfônica do Exército. Posteriormente, o objetivo será disponibilizar este material em todas as
plataformas de streaming.
10 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Ao encerrar o Mestrado, consigo perceber quanto aprendizado obtive ao longo do
curso. Seria impossível enumerar todo conhecimento adquirido por meio do contato com
outros profissionais que faziam parte do corpo discente da pós–graduação bem como durante
os encontros das disciplinas do mestrado.
Concernente às aulas de Clarinete com o Professor Dr Pedro Robatto, considero que
foram de extrema importância para o meu amadurecimento como músico prático. Não possuía
experiência com o repertório brasileiro tampouco com o repertório de música contemporânea
e era considerado um “Romântico”, devido a minha vivência com obras deste período da
música. No entanto, apesar dos avanços, acredito que o período de pandemia trouxe certo
retardo aos meus estudos, tendo em vista a falta de encontros presenciais com o professor.
Ademais, tive que me adaptar a enviar gravações, a encontrar um ambiente propício para
12
https://drive.google.com/drive/folders/1-JsYSDmW0gPkExgIay6v-POSZZq0PBjD
Link da gravação em estúdio das obras apresentadas como produto final: Dobrado 182, Dobrado 220, Dobrado
Bombardeio da Bahia, Dobrado Cisne Branco, Dobrado Quatro Dias de Viagem.
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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
MAHLE, E. Biografia e obra de Ernst Mahle. In:Portal Música Brasilis, 2009. Disponível
em: <http://musicabrasilis.org.br/compositores/ernst-mahle>. Acesso em: 27 de setembro de
2021.
APÊNDICE A – ARTIGO
RESUMO
O presente artigo tem como objetivo tecer reflexões a respeito da prática da música de câmara
em bandas de música por meio de adaptações do gênero musical brasileiro de dobrados para
quarteto de clarinetes. Para isso, utilizamos nesta pesquisa a adaptação para quarteto de
clarinetes do dobrado 220 (Avante Camaradas) do compositor Antônio Manoel do Espírito
Santo. Assim, este estudo de caso de caráter qualitativo foi realizado na banda de música do
2° Batalhão de Polícia do Exército em Osasco/São Paulo e se serviu de entrevista semi-
estruturada como técnica de coleta de dados, contando com a participação voluntária de
quatro clarinetistas da banda de música. Logo, este trabalho se justifica por utilizar o principal
repertório das bandas de música brasileiras, o dobrado, adaptado para a formação camerística,
como um caminho para a prática da música de câmara em bandas de música e outros grupos
musicais.
ABSTRACT
This article aims to reflect on the practice of chamber music in music bands through
adaptations of the Brazilian musical genre called “Dobrado” to clarinet quartets. For this, we
used in this research the adaptation for clarinet quartet of the “Dobrado 220” (Avante
Camaradas) by the composer Antônio Manoel do Espírito Santo. Thus, this qualitative case
study was carried out in a military music band in Osasco / São Paulo and used a semi-
structured interview as a data collection technique, with the voluntary participation of four
clarinetists from the music band. Therefore, this work is justified by using the main repertoire
of Brazilian music bands, the “Dobrado”, adapted for chamber music formation, as a way to
practice chamber music in music bands and other musical groups.
Keywords: Music Band, Clarinet Quartet, Chamber Music, “Dobrado”, Clarinet Section
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INTRODUÇÃO
O presente artigo tem como objetivo tecer reflexões a respeito da prática da música de
câmara em bandas de música por meio de adaptações do gênero musical brasileiro de
dobrados para quarteto de clarinetes. Essa abordagem se deve à atuação deste pesquisador
como clarinetista de banda militar do Exército, bem como concludente do curso de Mestrado
Profissional da Universidade Federal da Bahia (UFBA). Além disso, foi determinante para
este trabalho, a experiência musical como integrante em um quarteto/trio de clarinetes
chamado “Palheta Sonora”. Esse grupo atuou durante três anos em cidades da região
metropolitana de São Paulo e executava, inicialmente, um repertório tradicional para esta
formação. Na busca por constituir uma identidade musical do grupo, nasceu, em 2016, o
projeto “Dobrado Desdobrado” que visava adaptar, para quarteto/trio de clarinetes, dobrados
tradicionais do Exército Brasileiro, em virtude dos integrantes serem oriundos de Banda de
Música Militar. O grupo encerrou suas atividades no ano seguinte, no entanto, deixou no
autor deste trabalho, o desejo de contribuir para a formação de um repertório de dobrados
adaptados para música de câmara a fim de atender à demanda de clarinetistas de banda de
música.
Tomando como ponto de partida a experiência citada anteriormente, tendo em vista
fomentar a prática da música de câmara nas bandas, escolhemos para ser adaptado para
quarteto de clarinetes o gênero musical “dobrado” que, como obra musical brasileira,
executada para elevar o moral da tropa nas solenidades da caserna13, é o repertório principal
das bandas de música militares. Além disso, este estilo composicional não é exclusividade das
bandas de instituições beligerantes.
Diversas bandas civis que representam cidades, igrejas ou associações utilizam o
dobrado como repertório básico em suas apresentações. Dantas (2017, p.29), corrobora tal
constatação ao afirmar que as bandas de música mantêm “vínculo com os movimentos
militares e com as ocasiões religiosas”.
É importante ressaltar que o fato do dobrado ser o principal repertório das bandas de
música, tornou esse gênero parte da cultura de muitos músicos brasileiros, bem como de
diversos clarinetistas do país, sendo utilizado como método de iniciação musical em várias
bandas. Temos como exemplo, a experiência do autor deste artigo que aprendeu a tocar
clarinete em uma banda de música de uma igreja com a utilização de diversos dobrados.
13
Termo sinônimo a quartel ou aquartelamento.
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Porém, este não é um caso isolado, por meio do contato com outros clarinetistas que atuam
em diversas bandas e orquestras brasileiras, constatamos que muitos possuem a formação
musical iniciada em bandas de música com a utilização desse gênero musical.
Concernente ao tema da pesquisa, a abordagem se deve a observação deste autor,
como clarinetista de banda de música militar, nas dificuldades encontradas na prática musical
do naipe de clarinetes tais como: afinação, timbre, articulação, dinâmica, sonoridade entre
outros. Tais dificuldades ocorrem em decorrência do fato dessas bandas terem a função prima
de executarem o repertório de dobrados ao ar livre e com intensidade forte para
musicalizarem eventos civis ou militares. Isso faz com que o naipe muitas vezes, perca a
referência de uma sonoridade mais refinada. Por isso, tendo em vista encontrar meios para
solucionar as dificuldades supracitadas, escolhemos a prática da música de câmara com
adaptações de dobrados para quarteto de clarinetes, a fim de contribuir para o
aperfeiçoamento musical desse naipe como um todo.
Assim, concernente aos benefícios da prática camerística, vejamos o que SACKS
(2016, p.11, tradução nossa) nos afirma:
Os benefícios da prática da música de câmara na busca por explorar novas
sonoridades são incontáveis, pois com um número reduzido de
instrumentistas, o risco de desequilíbrio sonoro é menor, sendo, portanto,
mais fácil o ajuste musical de um pequeno grupo do que de um grande
coletivo [...] grupos menores de instrumentistas permitem a realização
focalizada de idéias musicais.14
Desse modo, considerando tais benefícios e tendo em vista o fato de o dobrado fazer
parte do repertório cotidiano dos profissionais de banda, juntamente com este artigo,
iniciamos um trabalho de escolha e adaptação para quarteto de clarinetes de alguns dobrados
dentre o repertório básico de obras musicais do Exército Brasileiro. A respeito desse
repertório básico, constam o Boletim do Exército Nº 25 do ano de 2000, que “estas
composições devem estar presentes em todas as bandas e fanfarras do território nacional, bem
como possuir as partituras do regente e as partes individuais dos instrumentos”. Dentre essas
composições, constam os seguintes dobrados:
1. Dobrado ao Exército Brasileiro
2. Dobrado Barão do Rio Branco
3. Dobrado Batista de Melo
4. Dobrado Comandante Narciso
14
Texto original: “The benefits of the chamber setting in the search for new and interesting sound are numerous.
Primarily, with a single player on an instrument, the risk of unbalanced sound is significantly smaller, as it is
obviously easier for one musician to adjust than a large group to do so collectively […] Smaller ensembles allow
for the focused realization of ideas with less prospect of poor reception due to means outside of the composition
and music themselves”.
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5. Dobrado Guararapes
6. Dobrado Mato Grosso
7. Dobrado O Guarani
8. Dobrado Os Flagelados
9. Dobrado os Quatro Tenentes
10. Dobrado Quatro Dias de Viagem
11. Dobrado Saudades de Minha Terra
12. Dobrado Sargento Calhau (Cisne Branco)
13. Dobrado Primeiro grupo de Aviação Embarcada
14. Dobrado Bombardeio da Bahia
15. Dobrado n° 182
16. Dobrado n° 220 (Avante Camaradas)
17. Dobrado Marcha de Guerra Brasil
(BOLETIM DO EXÉRCITO BRASILEIRO, Nº 25, 23 de junho de 2000, p.27, portaria 008).
1 - O DOBRADO – contextualizando
O gênero musical dobrado é uma marcha, ou seja, é resultado das atividades de
musicalização das manobras militares. Concernente a isso, Sousa (2017, p. 107) nos expõe:
A marcha é o gênero musical que resultou diretamente da dimensão
funcional da música militar, pela sua utilização operacional nas manobras
táticas [...] em linha de combate. O termo marcha originalmente significa um
tipo de manobra [...].
No que tange à forma do dobrado, sua estrutura mais básica é dividida em três partes –
parte A, parte B e TRIO- acrescidas de introdução, ponte e coda. Apesar disso, encontramos
no repertório brasileiro, dobrados que possuem inúmeras variações quanto a forma, no
entanto, apesar da riqueza de detalhes quanto à estrutura do dobrado, não caberia neste artigo
as inúmeras informações a respeito dos aspectos formais deste gênero e suas diversas
características.
Assim, podemos inferir que o dobrado é uma marcha com características brasileiras,
executada em ritmo binário, andamento metronômico entre 112 e 116 passos por minuto e
com harmonia definida de acordo com as regras clássicas.
Vale ressaltar que, o dobrado possui uma linguagem instrumental própria. Dantas
(2015) aborda essa linguagem como “função instrumental”, ou seja, o que cada grupo de
instrumentos da banda de música executa para dar identidade ao gênero. Assim, de acordo
com o autor mencionado, identificamos, basicamente, as seguintes funções:
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1) Canto: linha melódica principal. É geralmente apresentado pelas flautas, clarinetes, trompetes,
saxofones alto e trombones.
2) Contracanto: é a linha melódica que realiza o diálogo com a linha principal. É executado pelo
euphonium ou sax tenor. Contracanto também é a linha melódica com figuração rítmica
ligeira apresentada pelos clarinetes no canto realizado pelos metais.
3) Centro: é geralmente apresentada pelas trompas e determina a identidade tonal e rítmica do
dobrado. É por meio desta divisão rítmica que podemos diferenciar o dobrado de outros
gêneros musicais marciais. Nesta linha também, podemos identificar, por meio de três ou
quatro notas distintas, se estamos na tônica, dominante ou já estamos em algum tom diferente.
4) Marcação: assim como o “centro”, define a tonalidade e o estilo rítmico característico do
dobrado sendo confiada aos instrumentos graves. Além disso, as notas desta linha auxiliam no
preenchimento do campo harmônico.
A partir do exposto, identificara “função instrumental” do dobrado foi determinante
para adaptá-lo para quarteto de clarinetes, tendo em vista, não perder as características
principais do gênero – canto, contracanto, centro, marcação. No entanto, como adaptar as
“funções instrumentais” do dobrado para quarteto de clarinetes a fim de não perderem as
características do gênero como marcha brasileira?
1° Cl. Bb
2° Cl. Bb
3° Cl. Bb
4° Cl. Bb
1° Cl. Bb
2° Cl. Bb
3° Cl. Bb
4° Cl. Bb
2- A 2ª Clarineta está responsável por fazer a 2ª voz, bem como dialogar com a linha melódica
principal, ou seja, executa o contracanto.
15
https://youtu.be/tVJhMh9fU-o
Link da gravação em áudio e vídeo da adaptação para quarteto de clarinetes do dobrado 220. A gravação foi
realizada no segundo semestre de 2020 e contou com a participação do quarteto de clarinetes da banda sinfônica
do Exército.
41
No que tange à forma de registro das entrevistas, utilizamos a gravação em áudio, que
foi devidamente autorizada pelos participantes. Quanto a essa forma de registro, Zago (2003,
p. 299) discorre:
Este registro tem uma função também importante na organização e análise
dos resultados pelo acesso a um material mais completo do que as anotações
podem oferecer e ainda por permitir novamente escutar as entrevistas,
reexaminando seu conteúdo.
vezes, a execução ocorre ao ar livre, em movimento e com intensidade forte para musicalizar
os eventos militares e civis.
No entanto, percebemos que a adaptação de dobrados para grupos de câmara, assim
como qualquer outro repertório camerístico, pode trabalhar de forma mais eficiente, atributos
musicais por vezes esquecidos no dia a dia da banda tal como afinação, dinâmica, articulação,
timbre, percepção entre outros. Esses atributos, se trabalhados de forma cotidiana, podem
contribuir para o aperfeiçoamento do músico e do grupo ao qual o mesmo se insere.
4 – CONSIDERAÇÕES FINAIS
A partir do levantamento bibliográfico, após a aplicação da oficina e análise das
entrevistas, é possível tecer algumas reflexões a respeito da prática da música de câmara por
meio de adaptações do repertório cotidiano das bandas, o dobrado.
Percebemos, por meio dos relatos dos entrevistados, que os músicos de banda,
geralmente,possuem um arcabouço musical para realizarem um trabalho mais refinado,
porém, por conta do cotidiano das bandas e a falta de tempo hábil para de fato ensaiarem o
repertório de dobrados, fazem com que este refinamento muitas vezes seja esquecido.
Apesar de realizarmos a pesquisa de campo com um pequeno grupo – quatro
clarinetistas de uma banda – sabemos, por meio do contato com outros músicos de outras
bandas militares e civis, que a realidade exposta no atual trabalho é a mesma em diversos
grupos musicais.
No que tange à prática da música de câmara com adaptações de dobrados para quarteto
de clarinetes, podemos perceber, por meio do estudo de caso realizado com a adaptação do
dobrado 220, adaptação utilizada neste estudo, que a mesma foi bem recebida pelos
Clarinetistas participantes da pesquisa e que foi possível trabalhar atributos musicais com
maior refinamento, assim como em qualquer obra camerística. Com isso, pretendemos
com este trabalho, ser incentivo para a criação de novos grupos de música de câmara que
utilizam o repertório de dobrados, por vezes esquecido, a fim de serem utilizados, não
somente nas bandas de música militares ou civis, mas também nas escolas de música, a fim de
servir para o enriquecimento cultural dos músicos em formação.
Ainda há diversos dobrados nos arquivos de bandas de igrejas, bandas militares e civis,
se perdendo com a ação do tempo, que podem ser resgatados pelas bandas que estão em
atividade e que por vezes preferem recorrer, unicamente, a um repertório de caráter
estrangeiro ou de cultura de massa em seu cotidiano.
Assim, sugerimos aos Regentes de Banda, que fomentem atividades musicais como a
prática da música de câmara abordada neste trabalho e utilize nestas atividades, o repertório
de dobrados como forma de melhoramento musical do grupo como um todo, tendo em vista o
aperfeiçoamento continuado dos músicos de banda.
45
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
Repertório:
Módulo I (20/08 a 24/08)
Lúdica de RONALDO MIRANDA – Decidimos interpretar durante o curso obras de autores
brasileiros. Quanto à peça em questão, foram abordadas questões técnicas, estéticas, formais e
interpretativas.
Total de horas em aula presencial: 2 horas
- Laboratório com alunos da turma de bacharelado em clarinete. Oficina realizada com a
participação ativa dos alunos da graduação que compartilhavam suas experiências e
propunham melhorias quanto à interpretação das obras apresentadas em aula.
Total de horas em aula presencial: 2 horas
8) Orientação:
A orientação se deu de forma híbrida, por meio de aulas presenciais e envio de áudios das
obras escolhidas para estudo.
22 e 23 de Agosto de 2019
26 e 27 de Setembro de 2019
25 e 26 de Novembro de 2019
Total: 95 horas
8) Orientação:
1 encontro presencial preparatório sobre o levantamento de informações auxiliares (1
hora);
Encontros para preparação do repertório ( 50 horas);
Total: 51 hs
Total: 51 horas
Repertório:
Concertino para clarinete e orquestra de FRANCISCO MIGNONE.
Concerto 1988 para clarinete e Orquestra de ERNST MAHLE.
Estudo Técnico:
Paul JEANJEAN – “ Vade-Mecum” do clarinetista.
Reginald KELL – 17 estudos de staccato.
8) Orientação:
A orientação se deu por meio de aulas no formato remoto, bem como pelo envio de áudios
com o repertório indicado pelo professor.
Total: 20hs
8.3) Cronograma das Orientações - Encontros no formato remoto:
De 3 de Agosto à 28 de Novembro de 2020.
Total: 82 horas
8) Orientação:
1 encontro presencial preparatório sobre o levantamento de informações auxiliares (1
hora);
Encontros semanais para preparação do repertório (40 horas);
Gravação do repertório em estúdio (16 horas)
Total: 57 hs
8.1) Cronograma das Orientações - Encontros no formato remoto:
De 3 de Agosto à 28 de Novembro de 2020.
Total: 45 horas
Repertório:
Concerto 1988 para clarinete e Orquestra de ERNST MAHLE.
Concerto n°1 para clarinete e orquestra de LOUIS SPOHR.
8) Orientação:
Deu-se por meio de duas formas:
Aulas individuais no formato remoto, com o envio de áudios das obras estudadas como
suporte de ensino. (1 hora)
Laboratório quinzenal com alunos da turma de Mestrado em clarinete. Oficina realizada
no formato remoto, com a participação ativa dos alunos da pós-graduação que
propunham melhorias quanto à interpretação da obra. Além disso, eram abordados
temas técnicos com relação ao estudo do clarinete. (3 horas)
Total: 47 hs
8.3) Cronograma das Orientações - Encontros no formato remoto:
De 1 de Março à 30 de Junho de 2021.
Total: 55 horas
Repertório:
Concerto 1988 para clarinete e Orquestra de ERNST MAHLE.
Clarinete Solo de MARCOS DI SILVA
Total de horas em aulas remotas: 19 horas
8) Orientação:
Deu-se por meio de duas formas:
Aulas individuais no formato remoto, com o envio de áudios das obras estudadas como
suporte de ensino. (1 hora)
Laboratório semanal com alunos da turma de Mestrado em clarinete. Oficina realizada
no formato remoto, com a participação ativa dos alunos da pós-graduação que
propunham melhorias quanto à interpretação da obra. Além disso, eram abordados
temas técnicos com relação ao estudo do clarinete. (2 horas)
Total: 64 hs
8.3) Cronograma das Orientações - Encontros no formato remoto:
De 5 de Julho à 25 de Novembro de 2021.
Total: 38 horas
ANEXO 1:
PARTITURA DA ADAPTAÇÃO DO DOBRADO 220/SHEET MUSIC FOR DOBRADO
220’S ADAPTACION
61
62
63
64
65
66
67
68
69
70
71
72
ANEXO 2:
PARTITURA DA ADAPTAÇÃO DO DOBRADO CISNE BRANCO/SHEET MUSIC FOR
DOBRADO CISNE BRANCO’S ADAPTATION
73
74
75
76
77
78
79
80
81
ANEXO 3:
PARTITURA DA ADAPTAÇÃO DO DOBRADO 4 DIAS DE VIAGEM/ SHEET MUSIC
FOR DOBRADO 4 DIAS DE VIAGEM’S ADAPTATION
82
83
84
85
86
87
88
89
90
91
92
ANEXO 4:
PARTITURA DA ADAPTAÇÃO DO DOBRADO 182/SHEET MUSIC FOR DOBRADO
182’S ADAPTATION
93
94
95
96
97
98
99
100
101
102
103
104
105
ANEXO 5:
PARTITURA DA ADAPTAÇÃO DO DOBRADO BOMBARDEIO DA BAHIA/ SHEET
MUSIC FOR DOBRADO BOMBARDEIO DA BAHIA’S ADAPTATION
106
107
108
109
110
111
112
113
114