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O MUNDO SEGUNDO ADAM CURTIS

em ‘The Century of the Self’ e ‘Hypernormalisation’

Freud afirmou repetidamente que quando a psicanálise chegasse à América e a França seria
profundamente deformada pelo pragmatismo americano e pelo racionalismo francês. A série “The
Century of the Self”, de 2002, realizada por Adam Curis, um britânico que trabalha para a BBC, expõe os
equívocos dos usos americanos da clínica da psicanálise para aumentar o poder das Corporações e
manipular as populações. O primeiro equívoco passa pela repetida hibridação das descobertas de Freud
com os binarismos filosóficos referentes a uma dogmática ‘natureza humana’, suposta dividir o mundo
entre ‘racional’ e ‘irracional’, um velho paradigma elitista, racista e sexista que, a coberto da filosofia
grega, organizou o suprematismo protestante dos povos do Norte.

Freud não descobriu nas populações quaisquer ‘instintos animais’, porque nunca usou o conceito de
instinto, nem descobriu ‘perigosas forças ocultas eróticas e agressivas, que ameaçavam a civilização’ e
que os Políticos e Magnatas teriam que controlar. Bem pelo contrário, o que descobriu cientificamente
foi as pulsões recalcadas na infância de todos, explorados e exploradores, em idades em que a função
reflexiva ainda terá que esperar muitos anos, se por acaso se vier a desenvolver. Em vez de uniformizar
e de binarizar, Freud detetou a existência de 3 tipos de humanos, avisando desde o seu Mal-estar na
Civilização que as pulsões mais perigosas se desenvolviam nos ‘homens de acção’ (1930) ou ‘homens
narcísicos’ (1931), serventuários do Poder, que tanto podiam contribuir para o desenvolvimento da
Civilização como dar cabo dela. ‘Instintos’, não encontrou nenhuns, uma vez que as necessidades
humanas se articulam com o espaço cultural e são culturalmente satisfeitas ou culturalmente frustradas
e inibidas.

As pulsões ‘histéricas’, ‘obsessivas’ e ‘narcísicas’, até aí conhecidas pela psicologia filosófica como
‘emoções’ orientadas para diferentes tipos de acção, distribuem-se assimetricamente na ‘guerra dos
sexos’ e na ‘luta de classes’, mas as pulsões narcísicas, que existem em toda a gente, são mais inibidas
nos explorados e mais cultivadas nos criminosos e nos exploradores que, em busca do poder, da glória e
da magnificência, estão organizados para as aproveitar a seu favor.

Como a série The Century of the self evidencia, o que o judeu americano Edward Bernays, partindo de
um fraquíssimo conhecimento da obra do tio e apoiando-se em psiquiatras americanos soube promover
em seu favor, foi que desejos reprimidos de prazer, liberdade e reconhecimento narcísico das pessoas
das classes ascendentes, travados por uma educação ascética e autoritária, numa luta gerontocrática de
gerações e de géneros, podiam ser aproveitados por Corporações e Ideologias para pôr as mulheres a
fumar e a guiar ou para vender mais automóveis, criando um novo tipo de Marketing.

Abandonar o velho Materialismo Ascético Protestante, supostamente ‘racional’, em que os cidadãos


viviam lutando para “satisfazer as suas necessidades” básicas e tirar partido da satisfação dos desejos
exibicionistas, diminuiu o Autoritarismo ascético machista e criou uma onda libertária de “consumismo”
e de “busca da felicidade”, aproveitada pela Indústria, pelo cinema e pelos Media narcísicos, para se
expandir. Mas, embora conviesse ao discurso ideológico de Bernays e ao de Adam Curtis, que se lhe
opõe, isso não tornou os americanos em “máquinas da felicidade”, na medida em que não existem nos

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humanos temíveis ‘instintos animais’, como afirmavam filósofos Racionalistas do século XIX - os
humanos não são comparáveis a “máquinas” domináveis por Empresários e por Políticos, e a
“felicidade” que vem da liberdade não é maquínica.

Como Freud detetou a nível científico, e pode ser demonstrado experimentalmente, através da hipnose,
o inconsciente existe e corresponde à mente infantil, que desconhece a genitalidade e a morte,
inicialmente alimentada com doses de contos populares, histórias religiosas e filmes de Walt Disney e
depois reprimida primeiro a partir de dentro, para agradar aos pais e ‘outros legítimos superiores’ e
mais tarde reprimida a partir de fora, para manter, a bem ou a mal, a intimidação e a dominação fálica e
gerontocrática, conservadora e servidora das Elites milionárias.

Acontece que os Exploradores, que actuam organizados em rede, foram, como sempre, muito mais
rápidos e oportunistas a aproveitar avanços científicos do que os Explorados que confiam nas pesadas
máquinas sindicais e partidárias rigidamente organizadas ritualmente pelos Obsessivos, para não
passarem além do Marxismo vulgar, por eles popularizado de forma acéfala.

A aposta comercial de Bernays foi bem sucedida porque visou constantemente a conciliação de
interesses, através do reconhecimento da legitimidade da realização dos desejos, a qual nada tem de
‘irracional’, tal como a dominação fálica, militar e empresarial, manipulada pelas Elites capitalistas, nada
tem de ‘racional’. A sua ‘engenharia do consentimento’ funcionou porque realizava sonhos de acesso
aos ‘brinquedos’ dos ricos e à libertação das mulheres, à época domesticadas, sonhos até aí bloqueados
pela ditadura do Autoritarismo ascético, de tipo protestante.

Acontece que roubou espaço para a promessa de Marx de que o mundo se viraria de pernas para o ar se
os comunistas, com a sua teoria do iceberg, conseguissem binarizar a tensão social entre ‘exploradores’
e ‘explorados’ e conseguissem fazer coincidir todo o bem com o Proletariado e todo o mal com os
Empresários, algo de absurdo e inviável, que jamais foi praticado. As revoluções comunistas não foram
populares, foram político-militares, na Rússia como na China ou em Cuba. A corrupção dos líderes dos
maiores Sindicatos americanos também ajudou muito ao desmantelamento programado das lutas
sociais. Por sua vez, o ‘consumismo’ tirou multidões da miséria de viver para satisfazer a custo as
‘necessidades’ básicas, tirando o tapete aos economicismos do século XIX que só previam ‘liberdades’ e
‘felicidades’ para depois do agigantamento do Capital ou para depois da Revolução popular, o que saiu
frustrado por erro dessas conceções teóricas binarizantes, também elas fundadas na oposição
divergente entre a realização de desejos narcísicos das Elites ou das massas exploradas.

No nível clínico, a psicanálise tratava da saúde mental das pessoas e, no nível científico teorizava a falta
dela, nos indivíduos como nos Aparelhos de Estado e na agitação das massas, que psiquiatras
aproveitavam a favor do Poder estabelecido. Não consta que o sucesso do século Americano tenha
coincidido com o sucesso clínico da psicanálise americana, conservadora mas inadequada a manipular
populações.

A grande alteração histórica não começou com a chegada da clínica psicanalítica a Nova YorK. Deu-se
com a entrada do Império Austro-Húngaro na guerra e evidenciou um novo erro de cálculo, agora das
políticas Imperiais. O efeito de iceberg entrou em cena, afundando os Impérios do Leste da Europa e do
Médio Oriente, dando uma oportunidade aos discípulos de Marx para exercitarem o seu projeto

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salvífico na Rússia, o que levou à criação do ‘Ocidente’ liderado pelos Vencedores, o qual desde logo
prometeu publicamente implantar Israel na Palestina colonizada pelos Britânicos, criando a Tríade
Anglo-Americana-Sionista que domina, manipula e explora o Mundo até hoje, encontrando no entanto
forte resistência em diferentes Orientes.

Nenhuma psicologia, ou psicanálise, comanda o Capitalismo ou as Guerras Narcísicas dos Impérios,


embora os Aparelhos Tecno-militares e policiais se possam servir das psicologias, como realmente
aconteceu, tanto para o marketing, com a psicanálise vulgarizada, como para a tortura política,
legalizada na América a partir do Behaviourismo, a escola de psicologia dominante, uma psicologia
neodarwiniana que coloca os humanos ao nível dos animais de laboratório, como ratos e pombos e
manipula condicionamentos para restringir as liberdades.

Mas nada deste enquadramento geopolítico e tecnocientífico é abordado por Adam Curtis, o que obriga
a situar esta série a partir do seu episódio final, enquadrado nos interesses da BBC e da esquerda
britânica da viragem do século (2002). Existe uma velha crença que a História é escrita pelos
Vencedores. Neste caso, esta história filmada, tal como é contada, é escrita pelos Perdedores da
Esquerda britânica, levada ao seu ocaso tanto por sucessivas derrotas como pela ‘vitória’ de Blair,
obediente aos seus conselheiros analistas do marketing eleitoral e pelo abandono da ‘luta de classes’,
anteriormente devotadas acriticamente como dever ‘racional’ e ‘moral da Esquerda e como Motor da
História.

Entretanto, contando uma história enviesada pela obsessão de atacar Freud e a sua família, em busca de
acusar um bode expiatório pela sucessivas perdas do Labour, Curtis vai alinhando culpados. Afinal não
foi apenas Bernays, sobrinho americano de Freud, que foi solicitado para solucionar a crise do excesso
de produção causada pelo final da Guerra, os sociólogos, nesses anos do pós-guerra, também estavam
ao ataque e continuavam a promover a linguagem filosófica da Grécia Antiga, que inventara o conceito
de ‘sociedade’ para falar da organização elitista dos Patrícios em Democracias gregas que só às Elites
deles pertenciam. A reação política de Walter Lippman, afirmando que, dada a perigosa
‘irracionalidade’ popular, as pessoas tinham que ser ‘guiadas a partir de cima’, apenas repunha no
discurso o Elitismo Olímpico de sempre. Mais tarde, a sociologia gestionária de George Gallup deu a
Roosevelt a oportunidade de ouvir os desejos dos Americanos, provando que se fossem ouvidos e
tomados em consideração como cidadãos, os seus desejos narcísicos de participação e de aumento da
auto-estima eram ainda mais importantes que os seus desejos ‘consumistas’. A política tinha aprendido
com Freud a importância de ouvir e corresponder ao sentir das populações em vez de lhes imprimir
diktats ideológicos de Superegos Partidários.

Tendo perdido os clientes políticos, e aproveitando os novos ventos ideológicos, Bernays passou a
reforçar os laços das populações com as grandes Corporações, como a General Motors, instalando em
1939 a sua “Democracity” em plena Feira Internacional de Nova Iorque, vendendo a ideia liberal que
não a psicanálise mas o Capitalismo ‘libertaria a América’. Propaganda dos Poderes e das Corporações,
Relações Públicas, Publicidade estratégica, manipulação da Opinião Pública, escondiam então o que ia
sendo desenvolvido nas Relações Internacionais, o Projeto Anglo-Americano de arrefecimento do
conflito social e de construção de uma Nova Ordem Mundial, Branca e Protestante (WASP), isto é, de
um Novo Império Anglo-Americano, combinado entre Thomas Woodrow Wilson e Churchill, os
vencedores da Primeira Grande Guerra, projeto esse que exigia uma nova Guerra Mundial para

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conseguir a derrota do Império Alemão e a sua desmilitarização.

A eliminação dos Impérios Europeus e Asiáticos e a criação da Frente Anglo-americana-sionista visava a


promoção de um Projeto de uma Nova Ordem Mundial e a de imediato publicamente prometida
reimplantação de Israel nas terras da Palestina islamizada, agora nas mãos coloniais dos Ingleses, tal
como o Afeganistão e o Iraque.

Mas os factos da geopolítica não convêm ao cineasta com vocação de historiador diletante, obcecado
pelo maniqueísmo de opôr o suposto ‘irracional’ entrevisto no Inconsciente por Freud ao ‘racional’ que,
enquanto Ideal Hegeliano, os líderes da esquerda britânico, segundo ele, deviam propor, deixando de
trair os velhos ideais de criar um mundo novo e melhor a partir da luta e do voto democrático dos
trabalhadores sindicalizados.

Enquanto pseudo-derivações da obra científica de Freud, a Psicologia do ‘consuming self’ insaciável e a


sua oponente Sociologia da escuta gestionária da ‘opinião pública’ constituíam as fachadas populares e
mediatizadas de Políticas Imperiais que escapam à focalização psicossociológica de Adam Curtis. Como
escapa a ideologia educacional de Margaret Mead que procurava então noutras culturas tribais boas
soluções a importar, que ela pudesse implantar na América, adentro do otimismo manipulativo
subjacente as idealizações da sua engenharia antropológica que veio alimentar o mundo tribal dos
hippies da Califórnia, consumidores de alucinogénios.

Não escapa a Curtis que à época, movido por ideais e pela manipulação dos desejos das massas a
nazificar, para lhes devolver a Megalomania Germânica, alimentada por Nietzsche e por Wagner,
também Hitler não acreditava numa democracia espontânea, temia a fúria das populações perante a
miséria cíclica causada pelas guerras e crises bancárias que viabilizavam a concentração do capital e o
desenvolvimento de tecnologias de guerra, a favor dos Impérios. E que também Hitler pretendia seduzir
narcísicamente as massas com um novo dualismo, ‘racional’ do ponto de vista nazi, clivando-as entre as
que ‘amavam o Líder’ e as que o traíam e deviam morrer, o que descartava qualquer funcionamento
Parlamentar. Os judeus representaram para Hitler o que Freud e restante família, também judeus,
representam para Adam Curis, nesta série, isto é o Mau Objecto a binarizar para o acusar ou extinguir,
um mecanismo arcaico que Freud registou cientificamente, ainda em 1895, no seu Projecto de uma
Psicologia Científica, inserido na Correspondência para Fliess, que associava a neurologia às relações
primárias com a figura Cuidadora, transpondo o Vazio académico, suposto epistemologicamente
intransponível, entre a biologia e a psicologia como mais tarde veio a articular esta com as ciências
sociais e políticas.

O segundo episódio, sobre a ‘engenharia do consentimento’, introduz a psicanálise familialista da


adaptação social, com aparente reforço do Ego adaptativo, promovida em Inglaterra por Anna Freud, a
qual, sem o dizer, exigia o reforço de um superego social, numa época vitoriana oscilando entre a
megalomania burguesa e o colapso individual de soldados, estrelas de cinema e outras figuras da ‘high
society’, já que a psicanálise americana, com a chegada de analistas europeus fugidos de Hitler,
reforçara o apoio à conceção Elitista que exigia o reforço do controlo social manipulativo e não olhava a
meios para o conseguir.

Dado que toda esta série visa a condenação marxista da psicanálise e seus malefícios, repetida à

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exaustão, para justificar o colapso dos Trabalhistas Britânicos, Curtis não distingue entre a obra científica
do Freud e a apropriação psiquiátrica americana de uma nova indústria clínica ao serviço da Economia
capitalista, das Corporações e dos Aparelhos de Estado, que o sobrinho servia mas em que Freud, que
bem antes, em 1909, obtivera o reconhecimento científico de uma Universidade Americana onde
lançara as suas ‘Cinco lições de psicanálise’, sempre condenou, indo bem além da clínica, que usava
como laboratório de investigação e previa substituível, dado que incompatível com a aceleração da vida
burguesa.

Curtis ignora ou escotomiza demagogicamente que para Freud, a clínica era secundária e poderia vir a
ser substituída por psicoterapias curtas, mas que a análise do ‘mal-estar na civilização’, publicada em
1930, era fundamental. Depois de analisar, em 1923 e em 1929, os perigos da transferência dos desejos
narcísicos de massas infantilizadas para Líderes Autoritários e Megalómanos, prontos a passar à acção
sociopática os seus desejos de omnipotência, bem como o papel desempenhado na criação de ilusões
históricas por Aparelhos de Estado, com as suas estruturas organizativas familialistas, manipulativas e
repressivas, nomeadamente o Exército e a Religião (1921, 1929), Freud alertava para o papel central
desempenhado no drama humano pelas pulsões políticas agressivas, disruptivas e destrutivas,
exclusivamente humanas, que só as pulsões amorosas, criadoras de laços familiares, sociais e políticos,
poderiam conter. Um papel central que, focando a luta entre pulsões de morte e pulsões de vida, torna
a história da espécie dramática e problemática.

Na sua luta tendenciosa contra a psicanálise, Curtis escamoteia que a psicologia americana era
Behaviourista, nascera com Watson em 1914, evoluindo na mesma direção dos trabalhos de Pavlov, na
Rússia, promovia experiências de condicionamento com ratos de laboratório, e incorporara como novo
instrumento os choques elétricos de Cerletti (1937) e outros meios de condicionamento negativo, e
desembocara nas experiências secretas da CIA, lado a lado com o uso de alucinogénios, como o LSD,
para produzir o apagamento da memória, a qual constitui o centro da biografia, destruindo pessoas e
causando um enorme fiasco, uma vez que era possível destruir mentes, tornadas vegetativas, mas não
era possível controlá-las politicamente ou retirar-lhes a identidade e o desejo, como um outro cineasta
anglo-americano, muito mais reflexivo, Kubrick, veio a evidenciar na sua ‘Laranja Mecânica’.

O que Curtis critica de forma enviesada, porque desconhece, deriva da apropriação psiquiátrica da
psicanálise na América, alimentando uma visão megalómana e perversa da clínica, o que nada tem a ver
com Freud, que desenvolveu a única teoria integrativa nas ciências do Homem, indo da neurologia à
análise das tensões familiares (com as suas sexualidades e com as suas lutas inter-geracionais e de
género) e progredindo da análise dos Aparelhos do Estado Fálico (Exército, Igreja, manipulação política
das massas) para a análise científica do Mal-estar na Civilização, num percurso teórico solitário,
soberbamente ignorado pelos psiquiatras americanos que se tornaram Empresários da Clínica das
Neuroses.

Só na década de 90 a psiquiatria americana, posta em tribunal, desistiu de monopolizar a clínica


psicanalítica, quando Freud, desde o início afirmou que, mesmo do ponto de vista clínico, os médicos
eram as pessoas menos indicadas para a exercer e, coerentemente abriu as portas a especialistas das
artes, da literatura e das ciências sociais, bem como a mulheres, que a medicina afastava, sempre
lutando contra a visão psiquiátrica de Breuer, de Adler, de Jung, de Bleuler e de tantos outros.

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Foi essa abordagem híbrida, situada entre a psiquiatria e a filosofia, dada a vulnerabilidade narcísica dos
psiquiatras, inferiorizados face à restante Medicina, que criou ilusões eufóricas às elites burguesas,
sobretudo americanas, influenciou a propaganda comercial, os estudos de mercado, (introduzindo os
‘focus groups’, que registavam os desejos, angústias, medos e recusas dos consumidores), promovendo
o sucesso dos media apropriados pelos grandes magnatas dos Jornais de referência política e pelos
maiores produtores do cinema judaico de Los Angeles, uma deriva política que mais tarde Marcuse e
Luther King recusariam frontalmente. Marcuse, um filósofo marxista, denunciava a criação manipulativa
do ‘Homem Unidimensional’ como um perigo Civilizacional e Luther King recusava-se publicamente a
adaptar-se ao racismo branco e à intolerância do protestantismo, pelo que foi de imediato liquidado,
como Kennedy, pela Ditadura soft alimentada pela Sociedade das classes médias brancas, judaicas e
protestantes, a que os Americanos chamam ‘Democracia’.

O 3º episódio acompanha a subversão da clínica freudiana pela emergência do projeto de libertação


promovido por Reich. Obcecado pelos perigos da política de massas do nazismo, ignorava o inconsciente
associado à sexualidade infantil e promovia a passagem ao acto a fim de libertar a genitalidade e o
orgasmo da repressão obsessiva familialista que criava uma ‘armadura caracterial’ (1927), a qual,
segundo ele, tornava intratáveis os obsessivos, então predominantes. Fugindo para a América, uma vez
expulso por comunistas e por psicanalistas, Reich relançou uma nova geração histérica, individualista e
exibicionista, que queria ‘exprimir’ as suas emoções reprimidas, em busca de catarses, a que outros
acrescentaram a busca de um ‘inner self’, de um ‘Eu essencial’ e profundo, o qual desembocava na
busca budista do vazio, da libertação do passado e na fixação no presente enunciado como carregado de
potenciais de criatividade individual e até de mudança do mundo, embora não soubessem como.

Incorporando este novo dualismo supostamente ‘racional’ Reich. que no início promovia o Freudo-
marxismo, abandonou a análise geopolítica e cultural, reforçava o individualismo ao confundir o inimigo
com a repressão biográfica de que os seus discípulos se queriam libertar. Tal como o obcecara o
behaviourismo, com a sua promoção violenta da obediência, também Reich, opondo-se a Freud,
afirmava que havia que deixar o passado, permanecer no presente e satisfazer clinicamente desejos
erótico-narcísicos, que incluíam a catarse da agressividade reprimida, a libertação da genitalidade
insatisfeita e o grito primal, em grupo restrito ou muito alargado, já com dimensão espetacular.

Depois da Guerra de 45, face à chegada de multidões de soldados traumatizados, passara-se, em


Inglaterra, com Bion, da análise individual para a grupanálise e daí, na América, para a dinâmica de
grupos orientada para objetivos de pesquisa comercial, de análise do ‘potencial humano’, de deteção de
valores e estilos de vida diferenciados, de confrontação racial ou de libertação das freiras californianas
da sua repressão genital, o que levou à extinção do convento, apenas sobrevivendo com vida em
comum uma pequena Irmandade lésbica, mas Reich já transitara do corpo genital para recomendar o
uso terapêutico de uma energia cósmica que só ele conhecia, o orgone, o que o levou à prisão.

Aproveitado pelos Poderes Organizados do Estado Americano, a Revolução Genital de Reich, que nada
tinha a ver com Freud, desembocou no beco sem saída da expressividade grupal, fomentando primeiro
a agressão racial e, depois, com mais proveito, a nudez, a genitalidade, as drogas e o sexo circunstancial
que, na nova cultura juvenil, cantada por Joan Baez e John Denver, deixaram de ser problema e
tornaram-se vulgares, como resultado da viragem para a amorosidade, para o budismo e para o

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pensamento positivo, em paralelo com organização da violência radical, na guerra racial, sem que a
Felicidade descesse à terra. Impensado pelos filósofos e pelos gestores da histeria colectiva, o ‘mal-
estar na civilização’ continuava actual.

Marcuse, um teórico marxista, criticou a despolitização das psicoterapias e obteve, durante um tempo,
que os jovens ativistas acreditaram que ‘havia um polícia dentro das suas cabeças, que tinham que
destruir.’ Os movimentos de protesto dos anos 60 contra a guerra do Vietname e o movimento hyppie
afundaram-se em experiências de criação de um ‘novo self’ pessoal que acreditavam que se viria a
generalizar ‘espontaneamente’, transformando a quantidade em qualidade, mas nem uma nem a outra
cumpriram estes delírios ideológicos em voga.

A Califórnia e o Instituto Esalen eram o novo Laboratório de uma miríade de psicoterapias de grupo e
de milhares que se queriam libertar dos seus ‘demónios interiores’, e o ‘Movimento do Potencial
Humano’ promovia ‘grupos de encontro’ que desembocavam na busca da fusionalidade que
ressuscitasse um comunismo primitivo livre de inibições, sem luta de classes nem necessidade de
qualquer Revolução Marxista, uma vez que a luta de classes, o capitalismo, o Estado e a história não
existiam, apenas self individuais em busca de si próprios, numa peregrinação platónica para fora da
repressão Capitalista. Libertados da Caverna, viam finalmente ao espelho a Luz e filosofavam,
acreditando que o mundo esperava que eles, uma vez purificados pelo amor, o viessem a liderar.

A viragem seguinte veio uma vez mais da psicologia social e não da psicanálise, com o trabalho de
Abraham Maslow, nos anos 80, com grande sucesso na utilização de questionários para isolar
motivações e fomentar uma Nova Sociedade que expressasse a variedade de padrões de Valores e
Estilos de Vida, os quais uma vez mais as Corporações estudaram com ‘focus groups’, à procura de se
‘conformarem com a nova inconformidade’, o que não lhes foi difícil porque esta diversificava a
produção e criava novas modas e novos mercados.

Contra todos os vaticínios, o republicano Ronald Reagan fez-se eleger em 80, seduzindo a nova geração
individualista com o slogan que poderia ser de Esquerda, proclamando que ‘o governo não é a solução,
o governo é o problema’, um simplismo que atraindo a juventude esquerdista da busca do ‘novo self’,
cumpria o velho sonho liberal de emagrecer o Estado até ao osso das ‘funções de Segurança’ e dar rédea
livre à ‘iniciativa privada’ das grandes Corporações, dando nova vida ao Capitalismo. Os eleitores nada
sabiam da Escola de Chicago, nem do neoliberalismo que aí vinha empobrecer as classes médias e
precarizar as futuras gerações, e eram facilmente manipuláveis por investigadores sociológicos, que as
auscultavam de forma manipulativa, em grupos de pesquisa, ou sondavam com questionários as
aspirações pessoais à diversidade de Estilos de vida.

No episódio final, a passagem do ‘Século do self’ Americano para a Inglaterra dos anos 80, que estava
longe da Nova Histeria Exibicionista Americana, permite clarificar a lógica deste trabalho de Adam Curtis
para a BBC, que então se propunha viver da Monarquia aristocrática e promover programas sérios, com
públicos sociologicamente hierarquizados de A até E, à boa maneira do ‘Admirável mundo novo’ (1932),
de Aldous Huxley, públicos esses interessados em diversas informações, inteligências e coisas materiais,
de uma forma elitista vista como ‘racional’, isto é, no caso deles, superior à dos Americanos.

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Acontece que a eleição de Margareth Tatcher pela direita conservadora, com um discurso psicológico
informado pelos técnicos de sondagens de Ronald Reagan, trouxe para a ribalta um discurso que, de
forma delirante mas eleitoralmente eficaz, em função de objetivos manipulativos, prometia colocar o
indivíduo como centro da sociedade, garantindo que as pessoas teriam o ‘direito à desigualdade, desde
que iguais em importância’. Tirava desse modo o tapete à Esquerda Socialista, baralhada nas
contradições internas a cavalo entre o Estado Social e o marxismo, a qual aparecia contaminada pelas
aventuras comunistas, acusadas das suas persistentes ditaduras sobre os cidadãos.

Não eram os eleitores que tinham sido arrastados ao longo do século XX para uma aventura psicológica
‘irracional’ pela maligna ‘família’ Freud (uma acusação desprovida de sentido), eram os eleitores que
tinham deixado de ver como ‘racionais’ os ideais dos Trabalhistas, de promover a Luta de Classes
aumentando os impostos aos Milionários mas também às classes médias, a favor dos pobres e dos
trabalhadores os quais, pagando impostos, não se queriam confundidos com os não-trabalhadores num
Estado Social que agora queriam descartar, e por isso votavam nos Conservadores, que lhes prometiam
‘terem o Estado como seu Servidor e não como seu Senhor.’

A manipulação sociológica derivada da Guerra dos Assessores invisíveis era, de ambos os lados, radical,
mas é disso que vivem os Assessores Partidários, como Robert Reich, que escassamente visível, nesta
série gere a lógica do cinema documental de Curtis.

Na Inglaterra de 79, a luta situava-se na Guerra das audiências dos Grandes Jornais e Media, entre os
‘racionais’, vistos como imparciais e sérios, e os ‘irracionais’, como os Tablóides, que promoviam,
segundo os técnicos da Esquerda, os ‘aspetos mais egoístas da natureza humana’. Recorrendo a um
discurso da ética filosofante, os ‘racionais’ não perceberam a tempo que esse discurso perdera adeptos
nos eleitores mais jovens, que não mais queriam ouvir Ideais Racionalistas continuadamente
fracassados mas ver realizações sociais vantajosas a que de facto aspiravam.

Um outro investigador, Philip Gould, avisou a Elite Trabalhista que aqueles eleitores que sondara em
grupos focados na questão eleitoral não mais queriam ouvir a arrogância moralista dos seus Líderes,
mas ele próprio não foi ouvido e Smith perdeu para John Major. Os eleitores tinham deixado de se ver
como parte de grupos eleitorais em confronto sociológico e queriam retorno para os impostos que lhes
saíam do bolso. Das Classes binarizadas por Marx, tinha-se passado à diversidade de Classes agregadas
pelas suas aspirações, pouco ou nada interessadas no ataque às Grandes Corporações e em potenciais
Nacionalizações.

A partir daqui, a série é governada pelo pensamento binário desse investigador ao serviço dos
Trabalhistas, Robert Reich, em luta quixotesca com ‘os desejos egoístas da classe média’, traída, na
América, pelos Governos de Clinton, o qual, segundo ele, se vira por sua vez obrigado a trair os Ideais
dos Democratas Rooseveltianos, procurando a conformidade com a mente dos eleitores que fora
forçado a ouvir para poder ser reeleito em 96. A manipulação e o cinismo das Corporações, dos grandes
Media como o Sun e dos Líderes políticos de Direita ganhavam aos líderes de Esquerda, surdos para a
mudança cultural e repetidamente derrotados.

Os novos Líderes Trabalhistas acreditavam agora que era preciso o ‘sacrifício simbólico’ das antigas
políticas de Estado Social bem como a mimetização com os que anteriormente acusavam de serem os
‘traidores’ que ameaçavam devolver o Poder aos Conservadores, uma vez que apresentam um discurso

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mais apelativo, numa Democracia tornada um Mercado de Discursos pesquisados por Assessores
sociológicos.

A vitória de Blair, com a sua Terceira Via, era feita à custa do sacrifício dos Ideais Trabalhistas, de raiz
marxista, visando um Socialismo Sindicalista. Segundo os Assessores sociológicos, desta vez ouvidos e
obedecidos pelos Líderes, a nova política de Esquerda, baseadas em sondagens e em Grupos de opinião
focados nas eleições, teria que impor a Lei e a Ordem, levar os eleitores a ganhar mais para poderem
gozar as coisas boas da vida, como aspiravam, uma vez que achavam ser justo que fossem ambiciosos a
favor das suas famílias, desinteressando-se do combate ao Capitalismo e às grandes Corporações.
O iceberg eleitoral dava uma vez mais a volta, mas apenas no Discurso. Blair prometia que, se fosse
eleito, os Governantes seriam ‘os servidores dos eleitores que agora passariam a ser os seus Senhores’.
O Novo Individualismo apolítico britânico era alimentado discursivamente com doses de narcisismo.

Nesta série documental, passada na BBC em 2002, Adam Curtis alinha uma enorme quantidade de
informação, se bem que guiado por um argumento falso. Assim descrita muito enviesadamente a
História do século XX, o binarismo maniqueísta permite a Curtis, através da voz de Dick Morris, a
satisfação ideológica de acusar ‘a família’ de Freud, confundindo o cientista com os sucessos malignos
do sobrinho e com os falhanços teóricos da filha Anna, uma família com grande diversidade interna,
como Curtis demonstra à saciedade, mas que diaboliza, acusando ‘a família’ de todos os
experimentalismos psicossociológicos e de todas as correntes psicológicas anglo-americanas, do
Behaviourismo às Terapias de Grupo dominantes a partir da segunda Guerra, e não apenas da escuta
atenta dos humanos, libertando aspirações reprimidas pelo Autoritarismo patriarcal e pelo Materialismo
Protestante e reforçando o Ego.

A escuta analítica das pessoas, neuroticamente ambivalentes e em busca da sua verdade profunda, veio
destruir, acusa Curtis, o suposto dever dos Políticos de Esquerda de guiar os Eleitores para propostas
‘racionais’ que deveriam equacionar, transmitir e levar a que fossem aceites disciplinadamente, o que
jamais aconteceu como planeado, até porque o tempo dos Mestres filosóficos e partidários da antiga
Esquerda chegara ao fim e começara já o tempo dos Assessores.

As derrotas de Democratas americanos e de Trabalhistas britânicos não derivam de descobertas


científicas feitas por Freud. A libertação das Mulheres, dos Jovens, do erotismo, das lutas raciais e das
Políticas da Identidade, tinham trazido para a ribalta novos atores sociais, obtendo a melhoria
‘consumista’ da vida quotidiana, certamente mais livre, mas seguiram caminhos de que Freud
discordaria de forma veemente, como se percebe da sua obra maior sobre ‘O mal-estar na Civilização’.

Tal como a luta de classes marxista, nem a clínica nem o Consumismo promovido pelas Corporações
tinham mudado a história do sofrimento humano que em Freud têm outros enquadramentos teóricos
que Curtis desconhece. A pobreza, a marginalização, a violência fálica e o racismo locais não foram
eliminados nem por uns nem pelos outros, mas algo de novo brilhava para a generalidades das classes
trabalhadoras, géneros e etnias, o direito a existirem como pessoas e a lutar Quinze anoscomo
Identidades, com vidas, aspirações e voz próprias, quer as Elites políticas Racionalistas gostassem, quer
não.

A POLÍTICA DA AMBIGUIDADE DECEPTIVA E DE HIPERNORMALIZAÇÃO


Quinze anos mais tarde, em 2017, Adam Curtis fez passar na BBC o seu longo filme,
‘Hypernormalization’, um conceito que foi buscar a um antropólogo russo, a ensinar nos Estados Unidos.

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Alexei Yurchak, no seu livro de 2006 sobre os tempos da agonia soviética, afirmara que ‘todos
sabiam que o Sistema estava a falhar mas ninguém conseguia imaginar uma alternativa para o
status quo e que tanto políticos como cidadãos tinham-se resignado a manter a imagem de uma
sociedade funcional. Com o tempo, a desilusão tornou-se uma profecia performativa e a falsidade
foi confundida com a realidade’, criando o efeito de hipernormalização. A associação da falsidade
da sociedade soviética à falsidade da sociedade capitalista que denunciara no seu ‘Século do self’
permanece implícita.

Estrategicamente, neste filme, Davis toma como linha de base o ano de 1974, associando mundos
distantes, Nova York a Damasco. Na América, o Sistema capitalista tornou-se disfuncional (ou
Hiperfuncional) na medida em que o Presidente não apoiou o Governo de Nova York, então falido e
a gestão financeira foi entregue a uma equipa de 9 membros, 8 dos quais banqueiros, uma vez que
os banqueiros, que tinham fruído da Dívida que alimentavam e da qual viviam, se recusavam agora
a continuar o financiamento e mostravam a sua face insaciável: na verdade, queriam sair dos
bastidores e devorar os políticos, democráticos mas incompetentes, evidenciando que a
Democracia era uma fachada conveniente mas descartável por uma Sociedade Gestionária.

A tomada de poder pelos Banqueiros não era nova, nos Estados Unidos. No inverno de 1912, com
o Parlamento em semi-hibernação, os Rockfeller, Rostchild e associados, reunidos em Jekyll Island,
conseguiram do Presidente Thomas Woodrow Wilson que assinasse a transferência da emissão da
moeda para um grupo de bancos de investimento privados, que passaria a cobrar juros da Dívida
nacional. Amschel, o patriarca dos Rostchild bem tinha afirmado, no final do século XVIII, a
sentença que ditava a morte da Democracia: ‘entreguem-me a emissão da moeda e eu não quero
saber que políticos governam.’ O Presidente Americano mostrou mais tarde como se arrependera,
mas a transferência do poder democrático para o poder bancário tornou-se irreversível até hoje,
com uma Banca grande demais para poder falir, como acontecia, nas crises, a outros megapólios
privados, vivendo acima da Lei. O Governo de Nova York podia falir, a Banca nunca.

Mas Davis salta continuamente factos necessários à compreensão da história e segue a sua linha
psicologista. Ninguém se opôs, radicais e extremistas viviam desencantados e drogados nas ruínas
das fábricas, numa onda de desilusão, a Revolução fora adiada indefinidamente. Um jovem
empresário, Donald Trump, avançou, propôs-se investir nos grandes edifícios abandonados que
tornaria em hotéis de luxo, desde que obtivesse um desconto fiscal de 600 milhões.

Do outro lado do mundo, em Damasco, no mesmo ano de 74, Henry Kissinger enganava Bassar Al-
Assad, que queria resolver a questão palestiniana, permitindo o regresso de centenas de milhar às
terras de onde tinham sido expulsos por massacres liderados por civis e por tropas de Israel.
Kissinger, profundamente ambicioso e promotor do projeto americano de Globalização, usou do que
chamava “ambiguidade construtiva” e, criando decetivamente a ilusão de que os Palestinos
poderiam regressar, levantou até hoje os demónios escondidos no mundo árabe, onde a Honra
conta e exige, face à deslealdade, vingança. A criação de dois Estados na antiga Palestina
Otomana, reconhecidos internacionalmente pelo ONU em 47, era uma ficção Americana, Israel
continua até hoje a sua expansão militar e o Estado islâmico da Palestina, muitos milhares de
mortos mais tarde, nunca existiu senão no papel. Não era só a Banca privada que soterrava a
Democracia, era também a Geopolítica militar, dois Aparelhos insaciáveis no expansionismo
devorador e destrutivo de que se alimentam sem escrúpulos.

Entretanto, também na União Soviética nascia uma sociedade sem futuro, gerida pela falsidade, em
que se manipulavam corpos e mentes, o real se tornara instável e em que ninguém acreditava em
nada, uma Sociedade Hipernormalisada.

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Na América, com Reagan, nascia uma cruzada moral que, distante do realismo cínico de Kissinger,
afirmava agora, como um pastor evangélico, que Deus tinha posto o destino do mundo nas mãos da
América, ressuscitando a crença oitocentista no excecionalismo americano que afirmava
religiosamente esse ‘Destino Manifesto’, que, sem perder de vista a Britânia, se queria WASP
(branco, anglo-saxão e protestante),

Tanto quanto consta, Deus não interveio e, em 1982, milhares de palestinianos que viviam em
campos de refugiados no Líbano forram assassinados por milícias cristãs libanesas, protegidas por
Israel. O mundo ficou chocado, Reagan enviou tropas neutrais mas Assad, que não dispunha de
tropas que pudessem enfrentar a América, já acordara, com Kissinger, para o cinismo americano, e
aliou-se a Khomeini, que promovia no Irão uma ética xiita do sacrifício, criando os homens-bomba
que, em nome da honra divina, se deveriam fazer explodir matando quantos inimigos pudessem.

A América acicatou o Iraque sunita contra o Irão xiita, mas a Guerra dos Islamismos não deu o
resultado esperado, o Irão era invencível. E em 1983, mais de 200 marines americanos foram
atingidos no Líbano por homens-bomba a quem eram prometidos a glória de Allah e as huris do
Paraíso. Quatro meses depois, Reagan mandou retirar todas as tropas do Líbano. Assad, apoiado
pelo Hezbollah iraniano tinha, por uma vez sem exemplo, derrotado a América com os seus
homens-bomba suicidas. Entretanto, o Estado da Palestina permanecia nas gavetas da ONU.

Por essa época, a meio dos anos 80, a Mega Banca de Investimento apostava na criação do
Ciberespaço, um Sistema de informações interligadas quase invisível para as populações e para os
políticos, um espaço sem leis, apenas brutal, governado pelo Poder das grandes Corporações que
geriam os créditos com base nessas informações secretas.

No ping-pong desta história americana, um novo grupo de visionários californianos, vindos da


cultura hyppie dos anos 60, alimentada pelo LSD, criaram, contra o Ciberespaço capitalista, um
Ciberespaço Independente, um novo mundo que diziam incontrolável, que declararam ‘mágico e
livre’, fora da dura geopolítica de Reagan. Um mundo em que qualquer pessoa pudesse manifestar
as suas crenças, independentemente do Poder, criando uma nova Ordem de Liberdade.

Entretanto, humilhado no Líbano, Reagan inventava um inimigo imaginário, um falso terrorista


fascinado com o seu sucesso, o Coronel Khadafi que, com um golpe militar, chegara ao poder
na Líbia e se exibia como mais um Revolucionário Internacional, promotor, com o seu Livro
Verde, de uma Terceira Via em que só ele acreditava. Aproveitando atentados por homens-
bomba em Roma e Beirute, Reagan atacou Khadafi, quando os seus serviço secretos
apontavam a Síria de Assad. O falso inimigo era histérico e punha-se a jeito. Tomado por
louco, Khadafi apoiava a Revolução Mundial, na Irlanda e prometia delirantemente armar um
exército de 400 mil afro-americanos para lutarem contra o racismo.
Em 86, tomando como pretexto um ataque a uma discoteca em Berlim Ocidental, os
Americanos promoveram, num mundo fictício mediatizado, um caso que não existia,
bombardeando a casa de família de Khadafi, e matando muitas crianças. A América
transformava a política em Religião e projetava a perceção do Mal sobre os inimigos. E em 98,
aproveitando o abate de um avião em Lockerbie, a America promoveu o abate de Khadafi,
mesmo sabendo que, mais uma vez, eram os sírios que estavam por detrás do atentado.
Ao lado da Guerra das Religiões, entre Evangélicos e Islâmicos, a promoção da religiosidade
era estrategicamente implementada, com a difusão de documentos secretos falsos que

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pretendiam criar ameaças alienígenas que assustassem populações. Misturando facto e ficção,
promovia-se a ‘gestão das perceções’ referentes à América, ao mundo árabe ou à Rússia,
projetadas sobre poderosos inimigos inexistentes para criar alhures a perceção do Mal, no
novo discurso binário em que a América, alimentada pelos super-heróis das bandas
desenhadas e por filmes da Disney, representava Jeová, o planeta Terra e o Bem. Hollywood,
como sempre, antecipando a venda de boas histórias, acelerou. A Política, vendida à Banca,
gostava da Luta entre o Mal e o Bem e promovia novos delírios e terrores.
Tinha-se chegado ao momento da implosão da URSS, que ninguém no Ocidente antecipara. A
política caía em descrédito e Jane Fonda lançava a Revolução do Corpo, com a sua elegante
ginástica anaeróbica. Analistas falaram de ‘um mundo em descontrolo em que era impossível
prever fosse o que fosse.’ Os políticos deviam desistir de mudar o mundo, apenas deviam
administrar o mundo antecipando os riscos e mantendo a Sociedade estável.
Longe, numa vila americana, um investidor do Mundo Cibernético criara um computador quase
infalível, Alladin, que estabelecia milhões de correlações entre dados do passado e do
presente, atraindo uma carteira de investidores que acumularam, como ganhos especulativos,
7% da riqueza mundial. O capitalismo digital ganhava onde a geopolítica perdia. Chegavam
novos tempos e novas drogas, os analistas do Alladin, que consumiam Prozac muito acima da
média americana, pretendiam com as drogas mudar a perceção e criar ‘pensamento positivo’.

E um outro analista descobria a Inteligência Artificial por acaso, ao programar um computador,


Eliza, para reagir interactivamente como se fosse um psiquiatra recetivo que seguisse as
orientações ‘positivas’ de Carl Rogers, o psicoterapeuta em voga. Perdidos na História, numa
Idade do Individualismo, os indivíduos viciavam-se no desejo de verem o seu self íntimo ser
espelhado para eles por uma máquina, evitando a compreensão das complexidades do mundo
e a luta política por uma Sociedade Melhor. A corrosão do velho projeto democrático que daria
a voz aos mais fracos contra os poderosos que deles abusavam criou um ressentimento que
começou a crescer nas margens da sociedade, enquanto Trump fazia fortuna nos seus casinos
de Atlantic City.

A violência fronteiriça entre os guerrilheiros do Hamas e as tropas de Israel subia de tom e,


aprendendo com as milícias do Hezbollah iraniano como a utilização de homens bomba era
eficaz, o Hamas lançou uma onda de ataques suicidas contra Israel, o que um teólogo egípcio
validou como martírio em nome de Allah. Sucessivas vagas de homens bomba invadiram Israel
e destruíram a possibilidade de resolver diplomaticamente a questão palestina por que Assad
lutara. Nas eleições de 86, Nethaniou voltou-se contra o processo de paz, criando ciclos de
violência, e ainda hoje se faz reeleger e expandir Israel, com a ajuda Americana. O mundo
Judaico não vivia apenas da emissão da moeda e da aliança entre a City e Wall Street, ou do
cinema de Hollywood; armado até aos dentes e de Bíblia na mão esquerda, esmagava o sonho
Palestino dos islâmicos, expulsos pelas armas da Terra Prometida.
No final do século XX estava instaurado um clima de pessimismo na América, preocupado com
os riscos do futuro, e sucessivos filmes de terror anteciparam a destruição dos arranha-céus de
Nova York no 9 de Novembro de 2001. Na versão oficial, para muitos pouco credível, dezenas
de homens-bomba sauditas, estudando pilotagem em diversas escolas americanas, passaram
meses despercebidos, ultrapassaram todas as defesas e mataram milhares de americanos no
seu próprio território.

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Continuando o discurso evangélico de Reagan, Bush anunciou que se não era possível extirpar
o Mal do Médio Oriente, islâmico, havia que torná-lo democrático pela força de invasões
militares e de Primaveras Árabes programadas. Embora começassem pelo Afeganistão, o alvo
era o Iraque, de Sadam Hussein, um antigo aliado sunita que, Curtis não conta, ameaçara a
América com a pior bomba expectável, a criação de uma moeda internacional que substituísse
o dólar. Bush e Blair anunciaram mediaticamente e com evidência falsa a existências de armas
químicas e a preparação de armamento atómico, e invadiram o Iraque.

Dando asas à fantasia cognitiva, Curtis afirma que ambos acreditavam em qualquer história
que confirmasse as más intenções de Hussein e conclui, na tua tese fílmica, que ‘a linha entre
a realidade e a ficção diluiu-se ainda mais.’ É uma versão ingénua: um general americano
atestou que, muito antes, assistira a uma reunião cimeira em que tinha sido programada a
invasão militar de sete Estados islâmicos, visando no final a invasão do Irão. E, como mostra
Davis, a ‘fonte que confirmava tudo’ passara ao M16 uma versão tecnicamente absurda,
inspirada num filme de terror de 96, com Sean Connery e Nicholas Cage.
A morte de Assad em 2000 e a chegada ao poder do filho não melhorou a situação, apesar dos
Americanos, agora promotores de democracias à distância, numa ação de engenharia tribal
para a qual não tinham qualquer preparação, terem entregado o poder do Iraque aos xiitas e
aos curdos, tirando de lá a liderança sunita, que era minoritária mas militarmente poderosa. A
desestabilização intencional do mundo islâmico continuava, agora desestabilizando a Síria,
invadida por milícias sunitas vindas do Iraque e apoiadas pelos Americanos.

No mundo cibernético, um novo dispositivo, o Optic Nerve tirava os dados de milhões de


americanos e descobria o secreto culto da pornografia e da pedofilia até aí invisíveis. Miúdas
liceais despiam-se para os namorados exigentes e estes masturbavam-se mesmo que apenas
tivessem à sua frente uma boneca virtual.
A democracia era ciberneticamente estrangulada. De forma ocultada, algoritmos cibernéticos
de Mega Corporações privadas, sem Lei que as impedisse, garantiam que as pessoas só viam
e ouviam o que gostavam e os portais de notícias cada vez mais excluíam algo que desafiasse
as pessoas e as suas crenças. Por detrás das liberdades superficiais, redes de corporações
gigantescas com sistemas opacos controlavam o que as pessoas viam e moldavam o que
pensavam. Indo além do que o jornalismo e a televisão tinham conseguido, no Mundo do
Segredo, tomavam decisões sobre as pessoas bem como sobre o que queriam esconder delas.
No ziguezague da história contada por Curtis, saído da Internet e tornando-se real, apareceu o
Movimento Occupy Wall Street, invadindo as ruas e depois o Senado, ‘ocupando tudo’ na luta
contra a corrupção bancária que criara o crash financeiro de 2008. Os políticos tinham salvo os
bancos (que não os tinham salvo em 74, é altura de relembrar) e praticamente nada tinha sido
feito quanto à corrupção maciça então revelada. Obcecados pela crença de que era possível
que cada pessoa fosse um indivíduo autónomo expressando aquilo em que acreditava, e que
era possível organizar as pessoas sem exercer o poder, ficaram exaustos com tantos e tão
prolongados debates e o Movimento apagou-se.
Mas a Política Cibernética, apagada em Nova York, reapareceu nas ‘Primaveras Árabes’,
primeiro na Tunísia, depois no Egipto, enchendo a Praça Tahrir, em Janeiro de 2011,
promovendo aparentes ‘revoltas espontâneas’ convocadas por jovens analistas de sistemas

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que trabalhavam para a Google, criando uma revolução que, proclamavam, pertencia à internet
americana e à juventude egípcia. Mais uma vez tentavam lançar uma Revolução sem líderes,
sem organização e sem objetivos definidos. Simetrizando o discurso dos líderes Americanos,
também eles queriam livrar o mundo dos “Tiranos do Mal”, acreditando que depois a
Democracia popular floresceria.
No seguimento, quando uma ‘Primavera Árabe’ começou na Líbia, o Coronel Khadafi deixou de
ser um Herói do Ocidente, e a Grã-Bretanha e a França apoiaram a Revolução sem líderes,
promovendo com um míssil disparado de uma base militar do deserto do Nevada americano a
liquidação militar do ‘Ditador Malvado’ que tantos Académicos e políticos do Ocidente tinham
incensado como um pensador islâmico.
Entretanto, as Revoluções populares, sem líderes e sem objetivos, apenas geriam os discursos
das multidões e iam falhando, de Wall Street ao Egipto. No Cairo, os revolucionários tinham
chamado os militares para destronarem o novo poder religioso dos bem organizados ‘Irmãos
Muçulmanos’, promotores da Sharia, e a aventura Líbia desembocou numa guerra civil da qual
saíram as ruínas de um Estado-pária, que hoje alimenta, com a Síria, a emigração
mediterrânica para a Europa, reforçando o autoritarismo dos Estados que a contestam e
alimentando o Brexit.
No Ocidente nem sequer os radicais tinham qualquer ideia de como mudar o mundo. Os
políticos cediam o poder às Finanças e tinham-se tornado Gestores de equilíbrios e da
burocracia que eles mesmos promoviam. As suas Aventuras Internacionais tinham falhado. E a
sua visão simplista do mundo geopolítico tinha sido denunciada como perigosa e destrutiva.
Entretanto, na Rússia, a manipulação política parecia bem-sucedida. Num mundo de
Assessores e ‘Técnicos’ políticos, como Surkov, vindo do mundo do teatro de vanguarda, o
controlo dos Media permitiu manipular o eleitorado, e a política ia sendo transformada num
teatro estranho em que mais ninguém sabia o que era verdade e o que era falso, mantendo
Putin no poder até hoje. Com Surkov, tratava-se, segundo Curtis, de debilitar a perceção do
mundo, de modo que nunca se sabia o que estava realmente acontecendo. Apoiando todos, da
oposição antifascista aos neofascistas, ninguém estava certo do que era real ou do que era
falso na Rússia moderna.

O mesmo começava a passar-se no Ocidente. O sistema tinha falhas profundas, a corrupção


bancária, a evasão fiscal das Grandes Corporações, a vigilância secreta dos e-mails pessoais
pela Agência Nacional de Segurança, a NSA, eram constantemente noticiadas, mas ninguém
era processado e a desigualdade gritante continuava a crescer. Nada mudou, a estrutura do
poder permanecia a mesma, não era permitido desestabilizar o sistema.
A campanha eleitoral de Trump foi diferente, nada era fixo nem previsível, atacava os seus
pares Republicanos com uma linguagem de esquerda, dizendo que faziam parte de um sistema
falido e corrupto e afirmando que com as suas doações ele próprio tinha corrompido até
mesmo líderes democratas, o que mostrava como a América estava doente. Ao mesmo tempo
utilizava a linguagem da extrema-direita racista, associando-a aos piores medos das pessoas,
nomeadamente face à emigração latina, que considerava o pior ‘Cavalo de Tróia’ de sempre,
pondo a América em perigo. Muito do que dizia era completamente falso mas não se importava
porque ele e os seus apoiantes sabiam que o discurso não tinha qualquer relação com a
realidade. O que significa que Trump derrotou o jornalismo, que devia controlar a verdade e

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expor a mentira, o que lhe parecia irrelevante. Putin achou-o admirável, os liberais ficaram
revoltados mas exprimiam a raiva no Ciberespaço, controlado por algoritmos, o que apenas
beneficiou os ganhos das redes sociais.
Entretanto, relançando a confrontação entre sunitas e xiitas, o ISIS, um outro nome do Daesh,
promovera ataques suicidas em Damasco, que se desintegrava sob uma guerra civil apoiada
pelo Ocidente, e decapitou face às câmaras da televisão prisioneiros ocidentais, executados
por ocidentais islamizados. No Ocidente, descobriram que os aliados do ISIS eram ainda pior
que as tropas de Assad. E entretanto, em 2015, os russos intervieram mas em Março de 2016,
anunciaram com grande festa, que estavam abandonando a Síria, o que nunca fizeram. O
objetivo, neste novo tipo de guerra, não era, segundo Surkov, vencer mas usar o conflito para
criar um estado constante de incerteza, de modo a gerir e controlar a perceção do que se
passava.
E entretanto surgiu um novo ideólogo xiita, Abu-Mussad Al-Suri, ‘o Sírio’, proclamando que a
política de Ossama Bin Laden, visando atacar o Ocidente de frente, estava errada porque tinha
criado uma resposta militar poderosa que quase destruiu o Islamismo, e promoveu que o que
era preciso era criar um estado de incerteza e dúvida, fazendo com que grupos e indivíduos
independentes atacassem civis na Europa e na América, o que logo passou a acontecer. O
horror chegou ás capitais europeias e, na Grã-Bretanha, Nick Farage aproveitou para lançar a
“questão islâmica” no interior do seu país, e para promover um Brexit que permitisse controlar
as fronteiras.

Curtis termina o seu ziguezague informativo recuperando, entre as revoluções de rua falhadas,
o falhanço dos Partidos que, sem alternativas, alternaram no Poder e o permanente cinismo
geopolítico, indo da ‘ambiguidade construtiva’ de Kissinger, que agravou a questão palestina
em vez de dar passos para a resolver, às políticas da Incerteza política, cientificamente
instruídas pelos psicólogos behaviouristas americanos, criadores da tortura baseada na
incerteza cognitiva, mais tarde generalizadas. E fecha com um final histérico e catastrofista, em
que invoca o terror de um filme de 1976, ‘Carrie’, de Brian de Palma e com uma entrevista de
rua, a uma inglesa muito ‘dececionada’, como o próprio cineasta agora libertário, afirmando
que pensava que ‘os Americanos é que eram o povo tão cheio de ódio’, não os Britânicos,
clivados pela proposta do Brexit, que reintroduziriam o fascismo na Europa.
A saudade dos tempos binários em que se sabia quem era quem e queria o quê, nas
democracias anglo-saxónicas, em que a Esquerda Socialista Britânica tinha vitórias em vez de
acumular derrotas, enquanto o neoliberalismo financeiro e fiscal corria descontrolado, marcam
o discurso de Adam Curtis. Sem formação como historiador, promotor de um cinema
documental de tipo jornalístico que acumula informação em ziguezague sem qualquer análise
consistente, atacando antes a psicanálise e agora sem saber quem culpar, Curtis apresenta
desta vez a Nova Desordem Mundial, a desorientação ‘libertária’ e o pessimismo que diz que é
dos outros, em toda a parte, das mulheres aos jovens, da sexualidade e das drogas às
invasões militares, e ás manipulações dos Governantes, dos ativistas do Ciberespaço
acumulando iniciativas a que só a Banca e a Política da Vigilância Cibernética com contornos
fascistas dão consistência, das Primaveras Árabes e dos terrorismos xiitas e sunitas à
desestabilização permanente do mundo promovida, mas isso não diz, pelo projecto de uma
Nova Ordem Mundial Suprematista, Autoritária e antidemocrática, anunciado por Bertrand
Russel no início dos anos 50 e promovido pelos Assessores Políticos como Kissinger e Dick

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Cheeney, o ex-vice presidente que nem sequer é mencionado, a quem foi entregue a
reconstrução privada, pela sua Halliburton, do Iraque destruído pelos Americanos.

O que Adam Curis não diz, por falta de elaboração da informação que despeja, é que na falta
de Políticos com envergadura Mundial, capazes de travar a insaciável expansão imperialista
americana, de promoverem projetos de resolução de problemas internacionais, visando a
pacificação e a cooperação, e de limitarem a ganância sociopática da MegaBanca, o Mundo,
humanamente descontrolado, está entregue às grandes Corporações Tecnomilitares, que
precisam de Guerras como de pão para a boca, e as sabem provocar, encenando Crises e
Traumas espetaculares, e entregue num nível menos visível, à manipulação promovida, cada
um por sua conta, por Assessores políticos megalómanos, como Kissinger ou Zurkov,
multiplicados por actores, psicólogos comportamentalistas e por técnicos do Ciberespaço.

Quando se afirma ‘libertário’, Curtis descarta a análise do Olimpo Imperialista, tecnomilitar e


financeiro, um Aparelho decorrente da dupla vitória da primeira metade do século XX, escapa
até mesmo, uma vez derrotada a sua dama, da análise da sociologia partidária a que chamam
democracia e desce para o nível individualista que foi condenando, o que não valida o seu
projeto de dirigir em ziguezague filmes de jornalismo histórico para a BBC.

Britânico em tempos de Brexit, neste filme recente, a história contada por Curtis tem interesse
meramente jornalístico. Como habitualmente no jornalismo, omite muito, confunde outro tanto e
nada esclarece por falta de instrumentos de análise histórica, a qual é tridimensional e
orientada por objectivos Imperiais. O que tem, a nosso ver, de melhor é o modo como deixa à
vista que algum cinema americano é sintomático e antecipa a descida à terra não do Cristo
mas de terrores e catástrofes politicamente programadas pelo Olimpo Imperial.

JGPB – 25 de Outubro de 2020

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