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BACHARELADO EM ARQUITETURA E URBANISMO

MARIANE TELLES SÁ FREIRE

INTERVENÇÃO URBANA NAS ORLAS DO RIO PARAÍBA DO SUL


EM CAMPOS DOS GOYTACAZES, RJ.

Campos dos Goytacazes/RJ


2015
MARIANE TELLES SÁ FREIRE

INTERVENÇÃO URBANA NAS ORLAS DO RIO PARAÍBA DO SUL EM


CAMPOS DOS GOYTACAZES, RJ.

Monografia apresentada ao Instituto Federal de


Educação, Ciência e Tecnologia Fluminense
Campus Campos – Centro como requisito parcial
para a conclusão do Curso de Bacharelado em
Arquitetura e Urbanismo.

. Orientadora: Silvana Monteiro de Castro Carneiro

Campos dos Goytacazes/RJ


2015
Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)
Biblioteca. Setor de Processos Técnicos (IFF)

F862i Freire, Mariane Telles Sá.


Intervenção urbana nas orlas do rio Paraíba do Sul em Campos
dos Goytacazes, RJ / Mariane Telles Sá Freire - 2015.
119 f. : Il.

Orientadora: Silvana Monteiro de Castro Carneiro.


Monografia (Arquitetura e Urbanismo). Instituto Federal de
Educação, Ciência e Tecnologia Fluminense. Campus Campos
Centro, 2015.
Referências bibliográficas: p. 100-103.

1. 1. Planejamento urbano – Campos dos Goytacazes (RJ) ---


2. Projetos e plantas. 2. Paraíba do Sul, Rio, Vale – Campos dos
3. Goytacazes (RJ) - Projetos e plantas. I. Carneiro, Silvana Monteiro
4. de Castro, orient. II. Título.

CDD – 711.4098153
AGRADECIMENTOS

Agradeço primeiramente a Deus, por ter guiado minhas escolhas e permitido que eu
chegasse até aqui com a interseção de Nossa Senhora Aparecida, a quem também agradeço.
Aos meus pais, Mário e Janei, minha irmã, Juliana, e meu noivo, Bruno, pelo amor,
incentivo e apoio incondicional.
A esta instituição, bem como o corpo docente do curso de Arquitetura, pelo suporte e
conhecimento passado.
A minha orientadora Silvana, pela orientação, apoio e confiança.
As minhas colegas de turma Aliny, Maiany, Mayara, Thatiana, Pollyanna e Raíssa,
que foram sempre companheiras durante esse tempo, tornando os dias difíceis mais alegres e
sendo apoio diário.
E a todos os amigos mais que direta ou indiretamente fizeram parte da minha
formação, muito obrigada!
[...] o rio simboliza sempre a existência humana e o curso da
vida, com a sucessão de desejos, sentimentos e intenções, e a
variedade de seus desvios.
Jean Chevalier e Alain Gheerbrant
RESUMO

O presente trabalho apresenta um projeto de intervenção no trecho urbano das margens do rio
Paraíba do Sul que corta a cidade de Campos dos Goytacazes, especificamente entre as pontes
Alair Ferreira e Saturnino de Brito, buscando um tratamento das áreas lindeiras do rio através
da conformação de orlas, estruturação de equipamentos urbanos e inserção de espaços
públicos que contribuam para renovação da relação rio-cidade, intencionando estreitar os
laços com a população e a reintegração ao tecido urbano existente. Apesar dos rios possuírem
papel fundamental na formação das cidades, os processos de urbanização chegam acrescidos
ao descaso e esquecimento por parte da gestão pública e também da população. O rio Paraíba
do Sul, no contexto urbano da cidade de estudo, não é exceção e encontra-se desvalorizado,
sendo alvo de poluição e de desqualificação urbana em suas orlas. Por essa razão, busca-se
apresentar soluções capazes de reestabelecer o rio como símbolo da identidade local. Como
metodologia, foi utilizada primeiramente uma abordagem teórica, através de pesquisas
bibliográficas. Depois, um embasamento projetual, por meio de referências de projetos, e
também documental, com a análise de legislações relacionadas. Além disso, inclui-se
instrumentos como entrevistas e questionários, aplicados a grupos diversos de pessoas que
convivem nos bairros às margens do rio, para levantamento de questões acerca da atual
relação rio-cidade. Anseia-se que o trabalho estimule a conscientização do uso das águas e das
margens do rio, e ainda, contribua para que o Paraíba do Sul possa voltar a se tornar um
marco da paisagem urbana e cultural da cidade.

Palavras-chave: Intervenção urbana. Rios urbanos. Rio Paraíba do Sul. Relação rio-cidade.
ABSTRACT

The present work introduce an intervention project in the urban stretch of the Paraíba do Sul
river which runs through the city of Campos dos Goytacazes, specifically between the bridges
Alair Ferreira and Saturnino de Brito, seeking a treatment of areas bordering the river,
forming edges, structuring of urban equipments and inserting public spaces that contribute to
the renewal of river-city relationship, intending to strengthen ties with the population and the
reintegration into the existing urban tissue. Despite the rivers have fundamental paper in the
formation of cities, the urbanization processes arrive plus the neglect and oblivion by the
public administration and also to the population. The Paraíba do Sul River, in the context
urban of the city studied, is not exception and is devalued, target of pollution and urban
disqualification on their edges. For this reason, we seek to provide solutions able to restore
the river as a symbol of local identity. The methodology was first used a theoretical approach
through bibliographic researches. Then a projetual basement, through projects references, and
also documentary, with the analysis of related laws. Also, include instruments as interviews,
applied to diverse groups of people living in the neighborhoods along the river, to questions
about the current relationship river-city. It longs that work going to stimulate an awareness of
the use of water and the river borders, and contribute to the Paraíba do Sul can become again
a symbol of urban and cultural landscape of the city.

Keywords: Urban Intervention. Urban Rivers. Paraíba do Sul River. Relationship river-city.
LISTA DE FIGURAS

FIGURA 01. Localização da bacia hidrográfica do rio Paraíba do Sul .............................. 25

FIGURA 02. Localização geral .......................................................................................... 27

FIGURA 03. O rio Paraíba do Sul em Campos dos Goytacazes ........................................ 28

FIGURA 04. Pranchas no rio Paraíba do Sul ...................................................................... 29

FIGURA 05. Construção da ponte ferroviária em 1906 ..................................................... 30

FIGURA 06. Enchente de 1966 .......................................................................................... 30

FIGURA 07. Demolição do pavilhão de regatas ................................................................ 31

FIGURA 08. Evolução urbana da cidade de Campos dos Goytacazes ............................... 32

FIGURA 09. Flagrante de esgoto sendo despejado no rio Paraíba do Sul ......................... 33

FIGURA 10. Resíduos na vegetação ciliar ......................................................................... 33

FIGURA 11. Resíduos na margem ..................................................................................... 34

FIGURA 12. Vista aérea do trecho urbano do rio Paraíba do Sul em Campos dos
Goytacazes em março de 2012 ............................................................................................ 34

FIGURA 13. Vista aérea do trecho urbano do rio Paraíba do Sul em Campos dos
Goytacazes em março de 2015 ............................................................................................ 35

FIGURA 14. Vista aérea do High Line Park ...................................................................... 37

FIGURA 15. Espaço flexível para convivência, contemplação e estar .............................. 37

FIGURA 16. Espaço que não restringe usos ....................................................................... 38

FIGURA 17. Street art integrada à paisagem ..................................................................... 38

FIGURA 18. Preservação de trilhos e vegetação típica da época das ferrovias ................. 39

FIGURA 19. Vista aérea do rio Rhône ............................................................................... 40

FIGURA 20. Cotas distintas de circulação nas margens .................................................... 41


FIGURA 21. Trecho de intervenção que considera áreas para fauna e flora ribeirinhas ... 41

FIGURA 22. Trecho de intervenção que considera barcos atracados para diversificação
de usos ................................................................................................................................. 42

FIGURA 23. Arquibancada que em área antes inacessível a população ............................ 42


FIGURA 24. Vista da arquibancada à noite ....................................................................... 42

FIGURA 25. Vista geral do projeto .................................................................................... 43

FIGURA 26. Perspectiva da orla do rio Guaíba ................................................................. 43

FIGURA 27. Perspectiva do projeto para orla do rio Guaíba ............................................. 44

FIGURA 28. Vista geral do trecho ..................................................................................... 45

FIGURA 29. Vista noturna ................................................................................................. 45

FIGURA 30. Mini-ETE ...................................................................................................... 46

FIGURA 31. Instalação Mini-ETE ..................................................................................... 46

FIGURA 32. Mini-ETE instalada em um jardim ................................................................ 47

FIGURA 33. Exemplo componentes do telhado verde ....................................................... 48

FIGURA 34. Telhado verde ................................................................................................ 48

FIGURA 35. Localização do trecho de estudo na cidade ................................................... 50

FIGURA 36. Delimitação do trecho de estudo ................................................................... 50

FIGURA 37. Bairros inseridos no trecho ............................................................................ 51

FIGURA 38. Resultado do questionário sobre satisfação ................................................... 53

FIGURA 39. Resultado do questionário sobre oferta de usos variados .............................. 53

FIGURA 40. Despejo de lixo nas margens ......................................................................... 54

FIGURA 41. Pessoas de costas no Terminal ...................................................................... 54

FIGURA 42. Falta de manutenção e de bicicletário ........................................................... 55

FIGURA 43. Falta de manutenção das calçadas ................................................................. 55

FIGURA 44. Estacionamento no Cais ............................................................................... 55

FIGURA 45. Lixo e ermo em Guarus ................................................................................ 55

FIGURA 46. Pôr-do-sol visto do Cais ................................................................................ 55

FIGURA 47. Prática de pesca no Cais ............................................................................... 55

FIGURA 48. Prática de esportes urbanos ........................................................................... 56

FIGURA 49. Vista do Centro Histórico .............................................................................. 56

FIGURA 50. Grafite ........................................................................................................... 56


FIGURA 51. Pontos de interesse da margem direita .......................................................... 57

FIGURA 52. Pontos de interesse da margem esquerda ...................................................... 58

FIGURA 53. Mapa de análise morfológica do espaço ....................................................... 59

FIGURA 54. Mapa de análise com base em Lynch para bairros e marcos ........................ 60

FIGURA 55. Mapa de análise com base em Lynch para circulações, limites e pontos
nodais .................................................................................................................................. 61

FIGURA 56. Mapa de vazios urbanos ................................................................................ 62

FIGURA 57. Mapa de insolação e ventilação ..................................................................... 62

FIGURA 58. Mapa de áreas de especial interesse do Plano Diretor .................................. 64

FIGURA 59. Mapa de uso e ocupação da Lei de Uso e Ocupação do Solo ....................... 65

FIGURA 60. Delimitação das áreas de intervenção pontual .............................................. 71

FIGURA 61. Plano geral de intervenções ........................................................................... 72

FIGURA 62. Piso drenante ................................................................................................. 73

FIGURA 63. Superfície do piso drenante instalado ........................................................... 73

FIGURA 64. Deck de madeira ipê ...................................................................................... 74

FIGURA 65. Banco Leman Benido Urban ......................................................................... 74

FIGURA 66. Lixeira circular .............................................................................................. 74

FIGURA 67. Poste de 1 pétala ............................................................................................ 75

FIGURA 68. Poste de 2 pétalas .......................................................................................... 75

FIGURA 69. Abrigo de ônibus ........................................................................................... 75

FIGURA 70. Bicicletário Mude .......................................................................................... 75

FIGURA 71. Ipê-amarelo ................................................................................................... 76

FIGURA 72. Palmeira Jerivá .............................................................................................. 76

FIGURA 73. Sanitário público ........................................................................................... 76

FIGURA 74. Posto policial ................................................................................................. 77

FIGURA 75. Quiosque ....................................................................................................... 77

FIGURA 76. Delimitação da intervenção pontual 1 ........................................................... 78


FIGURA 77. Estudo de manchas da área de intervenção pontual 1 ................................... 79

FIGURA 78. Croqui da área de intervenção pontual 1 ....................................................... 81

FIGURA 79. Banco linear iluminado ................................................................................. 87

FIGURA 80. Banco poltrona .............................................................................................. 87

FIGURA 81. Banco escultura ............................................................................................. 87

FIGURA 82. Perspectiva geral da área de intervenção pontual 1 ...................................... 88

FIGURA 83. Antes e depois 1 ............................................................................................ 88

FIGURA 84. Antes e depois 2 ............................................................................................ 89

FIGURA 85. Antes e depois 3............................................................................................. 89

FIGURA 86. Delimitação da intervenção pontual 2 ........................................................... 90

FIGURA 87. Estudo de manchas da área de intervenção pontual 2 ................................... 91

FIGURA 88. Croqui da área de intervenção pontual 2 ....................................................... 93

FIGURA 89. Peixaria municipal ......................................................................................... 95

FIGURA 90. Associação de moradores .............................................................................. 95

FIGURA 91. Mobiliários do Kic Park ................................................................................ 96

FIGURA 92. Perspectiva geral da área de intervenção pontual 2 ...................................... 96

FIGURA 93. Antes e depois 4 ............................................................................................ 97

FIGURA 94. Antes e depois 5 ............................................................................................ 97


SUMÁRIO

LISTA DE FIGURAS ........................................................................................................ 07

INTRODUÇÃO .................................................................................................................. 13

1 OS RIOS E O MEIO URBANO .................................................................................... 17


1.1 A relação dos rios com o desenvolvimento das cidades ............................................ 17
1.2 A influência dos rios na paisagem urbana ................................................................. 20
1.3.Os espaços públicos e os rios urbanos ........................................................................ 22

2 O RIO PARAÍBA DO SUL E A CIDADE DE CAMPOS DOS GOYTACAZES .... 25


2.1 Caracterização da bacia do rio Paraíba do Sul ......................................................... 25
2.2. O rio Paraíba do Sul no contexto histórico e urbano da cidade ............................. 27
2.2. A orla e a cidade no contexto atual ........................................................................... 31

3 REFERENCIAIS PROJETUAIS .................................................................................. 36


3.1 Funcional ...................................................................................................................... 36
3.2 Tipológico ..................................................................................................................... 39
3.3 Plástico-formal ............................................................................................................. 43
3.4 Tecnológico ................................................................................................................... 44

4 CARACTERIZAÇÃO E DIAGNÓSTICO DA ÁREA ............................................... 49


4.1 Definição do trecho de intervenção ............................................................................ 49
4.2. Resultados e discussões da pesquisa de campo ........................................................ 52
4.3 Aspectos urbanísticos e socioeconômicos.................................................................... 54
4.4 Aspectos legais .............................................................................................................. 63

5 PROPOSTA PROJETUAL ........................................................................................... 67


5.1 Conceito e partido ........................................................................................................ 67
5.2 Programa de necessidades ........................................................................................... 68
5.3 Descrição da proposta ................................................................................................. 70
5.3.1 Plano geral de intervenções ........................................................................................ 71
5.3.2 Intervenção pontual 1 .................................................................................................. 78
5.3.3 Intervenção pontual 2 .................................................................................................. 90

CONSIDERAÇÕES FINAIS ............................................................................................ 98

REFERÊNCIAS ................................................................................................................. 100

ANEXOS
ANEXO I: Mapa detalhado da bacia hidrográfica do rio Paraíba do Sul .............. 105

APÊNDICES
APÊNDICE A: Roteiro de observação ....................................................................... 108
APÊNDICE B: Modelo de entrevista ......................................................................... 110
APÊNDICE C: Modelo de questionário ..................................................................... 112
APÊNDICE D: Imagens do projeto ............................................................................ 116
13

INTRODUÇÃO

Os rios urbanos desempenham um papel significante na configuração histórica e


geográfica das cidades que cortam, isso porque desde os primórdios das civilizações eram
estratégicos para aquisição de recursos e meios de circulação. Além disso, funcionam muitas
vezes como eixos determinando o traçado urbano (GORSKI, 2010).
No entanto, com a crescente e desordenada urbanização pela qual várias cidades vêm
passando, esses rios se tornam cada vez mais desvalorizados, sendo alvo de descaso e
poluição. Nesta situação se apresenta o rio Paraíba do Sul, no que se refere ao trecho que corta
a cidade de Campos dos Goytacazes, no estado do Rio de Janeiro, onde é possível observar
focos de poluição das águas e desmatamento das matas ciliares. Diante dessas circunstâncias,
é fundamental que se pense em intervenções urbanísticas ao longo das margens dos rios,
visando contribuir não apenas com a recuperação de suas águas, mas também com o processo
de reincorporação deles ao tecido urbano já consolidado e à vida urbana da população.
Uma intervenção urbana consiste em atuar em áreas já consolidadas da cidade de
maneira a reestruturar e requalificar esses espaços que muitas vezes se encontram
desvalorizados, degradados e desintegrados do restante. Esse processo é possível através de
projetos e planos urbanísticos que objetivam o desenvolvimento local considerando diversos
aspectos condicionantes, sejam culturais, ambientais, históricos ou sociais; afinal, antes de se
intervir é preciso compreender a dinâmica do urbano e suas interrelações que pedem uma
nova abordagem e um novo pensamento sobre seus processos (VARGAS, 2006).
Sendo assim, o objetivo principal deste trabalho é elaborar um plano de intervenção
urbana nas margens do rio Paraíba do Sul, em Campos dos Goytacazes, do trecho que se
estende da ponte Alair Ferreira à ponte Saturnino de Brito, nas duas margens, com a intenção
de reestabelecer a relação do contexto urbano existente com a orla do rio. Além disso, como
objetivos específicos, visa contribuir para revalorização da história do rio Paraíba do Sul,
reafirmando-o como um símbolo de identidade cultural da cidade; propiciar maior
conscientização e preservação ambiental; identificar práticas sociais consolidadas e
demandadas pela população para oferecer novos espaços públicos urbanos que diversifiquem
e promovam o uso das orlas; reestruturar equipamentos e vazios urbanos existentes no entorno
imediato; propor qualificação da infraestrutura urbana no trecho que se refere, bem como
14

alternativas aos problemas de mobilidade urbana que ocorrem nas vias que margeiam o rio, de
forma a articular os dois lados da cidade e promover fácil acesso e circulação na orla.
Essas propostas se justificam no fato de que, apesar do rio Paraíba do Sul ter tido
grande representação no desenvolvimento socioeconômico da cidade de Campos dos
Goytacazes, devido ao seu uso como eixo navegável, abastecimento de água e geração de
energia, atualmente parece estar esquecido pela população e gestores públicos, se restringido
a, segundo Maia (2003, p.10): "um mero divisor de águas entre grupos sociais: os que habitam
a parte central da cidade e os periféricos, que passam a povoar a parte menos nobre da
cidade." Ou ainda, a uma ameaça devido às inundações que sujeita o local em períodos de
cheia (CARNEIRO, 2015).
No Brasil, desde o século XX, a relação harmoniosa de encontro da população com o
rio deixou de existir em meio aos conflitos entre desenvolvimento, sociedade e meio físico
(GORSKI, 2010). Com o Paraíba do Sul em Campos não foi diferente, passando despercebido
e deixando de ser uma paisagem atraente ao olhar das novas gerações:

[...] o conhecimento do objeto é elaborado a partir das sensações que dele o


sujeito experimenta [...] por isso que o rio Paraíba do Sul, tão expressivo
para minha geração e da dos que me antecederam, deixou de ser signo,
perdeu o significado para as novas gerações porque não foi mais 'sentido'
por elas (MAIA, 2013, p.10).

Além disso, cabe ressaltar que o descaso vindo por parte da gestão pública também
tem grande influência na fraqueza da relação rio-cidade. A falta de políticas que trabalhem a
consciência sobre sua preservação e incentivem a visão do rio como símbolo da cidade,
prejudicam o sentimento de identidade da população com esse elemento tão marcante da
paisagem urbana.
Carneiro (2015) demonstra ao longo de sua pesquisa que as orlas do rio Paraíba do
Sul, hoje desvalorizadas, possuem grande potencial paisagístico, cultural e econômico,
podendo favorecer o lazer e o turismo. Porém, para reverter a atual situação, é preciso que se
questione as maneiras pelas quais o rio pode ser revalorizado no desenho urbano, tomando
como referência casos bem-sucedidos de projetos de recuperação de orlas fluviais que
15

promoveram a reintegração do rio ao tecido e à vida urbana. Considerando que, não basta
despoluir o rio e embelezar sua orla, ele precisa também voltar a se incorporar na vida da
população (GORSKI, 2010).
Mann (1991) já discute o crescente interesse das cidades contemporâneas pelos
projetos de revalorização dos rios urbanos:

Muitas cidades foram construídas junto às águas, nas margens de rios, em


seus deltas, no encontro de dois ou mais rios, ou nas margens de lagos e
mares. Atualmente várias cidades, em diferentes países, apresentam um
renovado interesse pelos seus rios urbanos. Este interesse pode ser observado
em pesquisas acadêmicas e na confecção de novos projetos paisagísticos e na
criação de programas para a valorização e revitalização de rios urbanos
(MANN, 1991 apud ESCARLATE, 2006, p. 22).

Dessa forma, considerando que o Paraíba do Sul não tem mesmo sido identificado
como um elemento de valor simbólico, visto a falta de interação com a população e a situação
de descaso em que se encontra, há uma urgente necessidade de um novo olhar sobre ele,
percebendo a relevância da sua presença na malha da cidade e o pondo como uma paisagem
cultural a ser preservada, como nos lembra Constantino (2014, p.3): “Reconhecer o rio como
paisagem, portanto, é habitar o rio".
Acerca dos métodos e meios para o desenvolvimento do trabalho, primeiramente
caracteriza-se o estudo como de natureza aplicada e exploratória, pois irá reunir
conhecimentos para aplicação prática de soluções aos problemas encontrados na orla do rio
Paraíba do Sul em Campos dos Goytacazes, investigando e buscando compreender as razões
locais pelas quais a relação rio-cidade se modificou ao longo dos anos para propor alternativas
na intervenção. Para tanto, se levará em conta métodos qualitativos que possibilitem uma
análise profunda do contexto.
Inicialmente, foi necessário realizar uma abordagem teórica, onde se elaborou uma
pesquisa bibliográfica por meio de consulta a sites, jornais, revistas e livros, assim como a
trabalhos acadêmicos, visando colher dados e informações sobre rios urbanos, o rio Paraíba
do Sul e sua importância dentro do contexto histórico e urbano da cidade. Depois, a pesquisa
de referências projetuais veio reunir em quatro categorias referenciais: funcional, tipológico,
16

plástico-formal e tecnológico. O funcional, está ligado a projetos que desenvolvem a mesma


função do projeto em questão; o tipológico está relacionado a mesma tipologia de implantação
da proposta, enquanto o plástico-formal consegue reunir aspectos estéticos e formais de
inspiração. Já o tecnológico, buscou referência em soluções técnicas a serem inseridas no
projeto. Esses projetos contribuíram para criação de repertório urbanístico e arquitetônico, e
para o conhecimento de diferentes formas de se relacionar com os rios, respaldando o
processo de elaboração do trabalho. Considera-se importante, também, a abordagem
documental feita na pesquisa, através da consulta à legislação vigente, visando auxiliar no
embasamento das propostas de uso do solo urbano diante da incorporação de novas atividades
que estabeleçam uma relação entre o rio e o entorno.
Além disso, foram abordados também, nos procedimentos metodológicos, as pesquisas
de campo e de levantamento. A primeira foi feita a partir de um roteiro de observação para
diagnóstico da área e registro fotográfico; associada a etapa de levantamento, com a aplicação
de instrumentos de coleta de dados como entrevista e questionários. Esse processo foi
importante para que fossem identificadas as diferentes apropriações vivenciadas pela parcela
da população que de alguma maneira já se relaciona com o rio. As entrevistas foram aplicadas
a comerciantes, moradores, usuários do terminal rodoviário e pessoas que conformam o
intercâmbio social dos bairros que margeiam o Paraíba do Sul, com objetivo de identificar o
tipo de relação de grupos diversos de pessoas com ele e investigar os aspectos responsáveis
pelo afastamento entre o rio e a vida urbana. Questionários on-line, mais simplificados,
vieram à complementar as entrevistas feitas in loco, abrangendo a visão de uma amostra da
população da cidade como um todo, considerando não só a parcela que se encontra
frequentemente próxima ao rio.
Quanto à estrutura do trabalho, é composto por cinco capítulos: o primeiro, faz uma
abordagem teórica sobre os rios urbanos, destacando a figura desses rios na formação das
cidades, a importância da sua paisagem e o aproveitamento de suas orlas para inserção de
espaços públicos como solução que o reintegre a vida urbana. O segundo capítulo traz dados
acerca do rio Paraíba do Sul e sua relação com a cidade de Campos dos Goytacazes. O
terceiro, enumera as categorias de referenciais projetuais que serviram de base para a
proposta. O quarto, traz o diagnóstico do trecho de implantação do projeto através de análises
de aspectos condicionantes dessa área. E por fim, o quinto capítulo reúne as informações
relativas a proposta projetual, desde o conceito e partido adotados, passando pela elaboração
do programa de necessidades e demonstrando, através de desenhos técnicos e imagens
ilustrativas, as soluções de projeto.
17

1 OS RIOS E O MEIO URBANO

Os rios que um dia foram fator de favorecimento para que surgissem as primeiras
civilizações, às suas margens, hoje são rios urbanos que cortam importantes cidades e
metrópoles do mundo. Apesar de terem tido amplo destaque e importância na formação
dessas morfologias urbanas, contribuindo com funções ligadas ao consumo de água e o
desenvolvimento de culturas agrícolas, são comumente alvo de esquecimento, descaso e
poluição desde que iniciados os processos de urbanização.

Os rios urbanos são aqueles que, dialeticamente, modificam e são


modificados na sua inter-relação com as cidades. E a partir dessa interação,
surge algo que é, ao mesmo tempo, natural e cultural, orgânico e artificial,
sujeito e objeto, algo híbrido por que não é mais natural, mas também não se
transformou ao ponto de deixar de carregar em si a Natureza (ALMEIDA,
2010, p.33).

Este capítulo vem embasado nos estudos e reflexões de diversos autores especialistas
do tema, tratar da evolução desse contexto entre os rios urbanos e as cidades que cresceram ao
longo de suas margens, apresentando, de modo geral, a relação histórica que determinou esse
papel de agente formador e a problemática atual envolvida nessa questão.

1.1 A relação dos rios com o desenvolvimento das cidades

Os cursos d'água possuem evidências históricas como elementos formadores e


conectores das cidades. "Na história das civilizações, de modo geral, [...] rios, córregos,
riachos integravam sítios atraentes para assentamentos de curta ou longa permanência,
18

indistintamente, e eram tidos como marcos ou referenciais territoriais" (GORSKI, 2010, p.31).
Ainda segundo essa autora, a lógica norteadora de inúmeras civilizações antigas na seleção de
sítio para estabelecer suas aldeias, foi a proximidade da água, quer seja por razões funcionais,
estratégicas, culturais ou patrimoniais. Entre os rios Tigre e Eufrates, por exemplo,
construíram-se as cidades da Mesopotâmia; na extensão do rio Nilo, as cidades egípcias; as
cidades da civilização grego-romana desenvolveram-se junto à bacia do Mediterrâneo e ao rio
Tibre; as civilizações orientais nos arredores dos rios do Himalaia e as cidades medievais
européias como Londres, Paris, Viena e Praga, ao longo do Tâmisa, do Sena, do Danúbio e o
Vlatva, respectivamente. Até mesmo nos Estados Unidos, desde o período de colonização,
aglomerações urbanas se formavam próximo à costa marítima ou aos rios, tidos como eixos
de deslocamento rumo a outras regiões ribeirinhas a serem conquistadas.

O Brasil apresenta uma situação similar, pois, é detentor de uma das mais
extensas e ricas redes de rios perenes no mundo, por suas condições
geológicas e climáticas dominantes, com grande extensão territorial,
localizada geograficamente na faixa mais úmida da Terra, entre o Trópico de
Capricórnio e o Equador (REBOUÇAS, 2006 apud GORSKI, 2010, p. 33).

Os rios urbanos, que se inserem no contexto histórico de desenvolvimento das cidades,


podem se apresentar como demarcadores de território, produtores de alimentos, corredores de
circulação de pessoas e de produtos comerciais e industriais, assim como, de corredores de
fauna e flora, geradores de energia, espaços livres públicos de convívio e lazer, marcos
referenciais de caráter turístico e elementos determinantes de feições geomorfológicas
(GORSKI, 2010).
No entanto, o crescimento urbano, por muitas vezes desordenado, acabou por afastar
essas cidades fluviais de seu elemento central de desenvolvimento: a água, desconsiderando
ainda todo ecossistema de seu entorno. As modificações ocorridas no contexto mundial no
final do século XIX ocasionaram a descaracterização das áreas naturais a partir do intenso
processo de urbanização que acontecia nos aglomerados urbanos.
19

Nesta época, o planejamento urbano realizou-se considerando,


principalmente, os aspectos sociais, culturais e econômicos, admitindo que o
meio físico deveria adequar-se às atividades do homem. Considerava-se que
os recursos naturais podiam ser utilizados e alterados de forma ilimitada,
desde que fossem atendidas as necessidades básicas: habitar, trabalhar,
circular e recrear (PORATH, 2004, p. 35).

Diante desses acontecimentos, Porath (2004, p.10) revela ainda "[...] preocupação em
relação à urbanização junto às margens dos rios, a impermeabilização do solo, a canalização
de rios, interferência no leito do rio e degradação da mata ciliar", fatores que acabam por
prejudicar a dinâmica natural do rio e fazer com que cidade o perceba cada vez mais como um
problema. Essa visão, por sua vez, resulta em "[...] paisagens de rios esquecidos, que se
tornam cada vez mais sujos, poluídos e desvalorizados onde quanto menos ele é visto, melhor
é para a imagem da cidade" (PORATH, 2004, p. 2). O trecho a seguir reforça a interferência
dos processos de urbanização nos rios urbanos:

A evolução da urbanização foi conseguindo eclipsá-los e anular sua


importância, restringindo sua presença quase apenas aos sintomas
perturbadores, ou seja: mau cheiro, obstáculo à circulação e ameaça de
inundações. Chega a parecer que a situação 'cidades invadindo águas, e
águas invadindo cidades' se generalizou como irreversível, inerente ao
desenvolvimento (GORSKI, 2010, p. 31).

Dessa maneira "[...] as paisagens fluviais foram paulatinamente se transformando


também em paisagens urbanas" (COSTA, 2006 apud MANHÃES, 2013, p. 14). Entretanto, se
por um lado os cursos d'água que se localizam no meio urbano sofreram um processo de
degradação contínua, transformando-se em alvo de esquecimento e rejeição. Por outro, o meio
urbano vem sendo constantemente exposto a inundações, à carência de mananciais adequados
para abastecimento público e tem sofrido com desqualificação da paisagem fluvial (GORSKI,
2010).
20

1.2 A influência dos rios na paisagem urbana

Como já mencionado anteriormente, os rios desempenharam um papel fundamental no


desenvolvimento urbano, e com isso, acabam por também estruturar as paisagens urbanas e
consolidarem uma conexão entre forma e uso característicos de cada cidade (PORATH,
2004). No entanto, a urbanização desenfreada interferiu notoriamente também nesse aspecto
de paisagem. O programa de canalização de rios e córregos e a implantação de avenidas de
fundo de vales nos anos 1930 tinham, segundo Delijaicov (1998, p. 14), "[...] o objetivo de
eliminar os problemas de drenagem de água pluviais que causam inundações, reduzindo os
riscos para a população situada nos fundos de vales e melhorando as condições do tráfego
local”. O autor ainda esclarece que essa situação de inserção de marginais aos cursos d'água,
elimina as oportunidades de integração urbanística entre o ambiente fluvial e o desenho da
cidade, o pedestre não consegue mais se aproximar da beira do rio, ficando a orla fluvial
como cenário para o motorista apressado que muitas vezes nem a percebe.

Os córregos urbanos foram perdendo em presença e visibilidade ao longo do


processo de urbanização e esta ausência na paisagem deve-se principalmente
a uma inserção paisagística equivocada, aonde os valores atribuídos aos
cursos d’água não incluíam sua relevância ambiental (COSTA, 2005 apud
ESCARLATE, 2006, p. 30).

Segundo Penning-Rowsell & Burgess (1997 apud ESCARLARTE, 2006), hoje se


percebe não apenas a importância das águas dos rios, fundamental para a sustentabilidade das
cidades, mas também o surgimento de uma nova abordagem, onde as paisagens desses rios
não são mais percebidas apenas pelo ponto de vista da engenharia, em que a técnica deve
suplantar a natureza, incluindo-se novos valores onde elas assumem novos significados,
principalmente em termos ambientais e culturais. Ainda segundo esses autores:
21

[...] embora pareça ser uma questão contemporânea, os primeiros estudos


sobre as paisagens dos rios iniciaram-se durante as décadas de 60 e 70,
quando se percebeu que muitos dos rios urbanos transformaram-se em áreas
degradadas como consequência da negligência ou de uma abordagem
tecnicista da engenharia e do saneamento [...] que fizeram com que assim as
grandes concentrações urbanas jogassem esgotos nos cursos de água
agravando a poluição de forma rápida e preocupante (PENNING-
ROWSELL & BURGESS, 1997 apud ESCARLARTE, 2006, p. 22).

Dessa forma, é preciso que sejam exploradas maneiras de replanejar a paisagem


considerando seu processo dinâmico e repensando a natureza dentro do meio urbano
consolidado. A ação de reintegração de rios urbanos deve envolver não só a melhoria do atual
estado do curso d'água e seu entorno, mas englobar também uma valorização geral de
propriedades ecológicas, sociais, econômicas e estéticas (GORSKI, 2010).
Cabe ressaltar que se avalia a paisagem urbana como processo dinâmico, visto que
está em constante construção cultural. Não é um cenário estático e autônomo em relação à
presença humana, afinal, como afirma Escarlate (2006, p. 36): "[...] a paisagem é um espaço
de convívio. É o lugar de possibilidades e impossibilidades, encontros e desencontros. É neste
espaço que nossa vida flui, do nascer ao morrer e na memória ficam as imagens". Os rios são
elementos que estruturam as paisagens urbanas e consolidam a forma, o uso e a cultura de
cada cidade, gerando paisagens particulares. Assim,

[...] os lugares e elementos que compõe uma paisagem possuem valores


específicos que mudam constantemente, acompanhando a evolução dos
padrões culturais. Esses padrões são enraizados nos processos naturais de
cada lugar ou região, isto é, a natureza e a cultura juntas, como processos
interagentes, conferem forma e individualidade a cada lugar (LEITE, 1994
apud PORATH, 2004, p. 24).

Sendo assim, é possível destacar que o rio, como parte integrante e fundamental da
paisagem urbana, é também uma referência de lugar e de espaço que integra a identidade de
um povo (GORSKI, 2010), e compreendê-lo como paisagem, significa também dar a ele um
22

valor ambiental e cultural, não só uma peça de saneamento e drenagem. É preciso, como
destaca Costa (2006, apud GORSKI, 2010, p.41): “[...] reconhecer que o rio urbano e cidade
são paisagens mutantes com destinos entrelaçados”.

1.3 Os espaços públicos e os rios urbanos

A proposta de espaços livres públicos é uma das principais alternativas à recuperação


das margens de rios urbanos no que se refere ao estreitamento da relação rio-cidade. Segundo
Mota (1999 apud PORATH, 2004), compete ao homem, tanto gestores quanto população,
procurar adequar o processo de urbanização às características do ambiente existentes
considerando os rios urbanos como áreas especiais que devem ser incorporados ao tecido
urbano consolidado, com a intenção de que os efeitos negativos vividos no decorrer da
história, sejam amenizados através da reestruturação desses trechos levando-se em conta os
ambientes físico e biótico.

Os rios das regiões urbanas são os recursos naturais mais intensivamente


consumidos. Eles se destacam pelas diversas utilizações através das quais
somos favorecidos: o abastecimento de água, o transporte fluvial, a geração
de energia elétrica, a irrigação, a pesca e o lazer. Porém, devido à ampla
diversidade de usos que os rios proporcionam à humanidade, há a
necessidade de uma gestão que venha conciliar a preservação dos rios com a
questão sociocultural, principalmente no que diz respeito a seus usos
(MANN, 1973 apud ESCARLATE, 2006, p. 23).

No Brasil, o principal problema é o mesmo de praticamente todos os países não


desenvolvidos, "a falta de planejamento e de investimentos sérios em saneamento básico e em
planos urbanísticos [...] com isso, muitas prefeituras dão verdadeiros tiros nos pés, pois
prejudicam o turismo e o bem-estar dos habitantes." (RIOS, 2013 apud RODRIGUES, 2013).
23

É possível mencionar, ainda, o potencial econômico que os planos de urbanização das orlas
dos rios trazem quando acabam envolvendo novos critérios de uso de solo, desenvolvimento
turístico e criação de empregos.
Para Costa et. al. (2002 apud PORATH, 2004, p. 22), “[...] para serem apropriados de
outras formas, não simplesmente como depositários de lixo e esgoto, os rios urbanos e todas
as suas possibilidades de fruição devem estar visíveis para a população". Sendo assim, afirma
o autor, novos valores podem ser atribuídos, antigas atitudes podem ser mudadas e a situação
em que hoje eles se encontram talvez possa ser revertida. É um processo longo,

[...] na medida em que a população precisa ser ainda informada da existência


de rios na cidade e perceber que o rio é mais um espaço livre público que
pode oferecer possibilidades de convergência social, locais de lazer, de
fruição da paisagem, de memória urbana, além de funcionar como
importante corredor biológico na cidade, dentre muitas outras funções
(COSTA et al, 2002 apud PORATH, 2004, p. 22).

Tudo isso está relacionado ao sentimento de identidade que, em meio às constantes


alterações urbanas, fez com que a história ligada à importância da existência do rio fosse se
perdendo. No entanto, ao reconhecer a cidade como organismo vivo e dinâmico, é possível
prever a existência de relações entre ela e o homem que nela vive a partir da vivência e das
práticas sociais. As relações entre as formas urbanas e os processos sociais que as produzem e
delas se apropriam são, realmente, indicativos das características de uma sociedade
(PORATH, 2004, p.13).

No século XX, surgiu e consolidou-se o modelo fordista de produção e taylorista de


administração do mundo do trabalho, o que significou mais consumo e mais tempo livre, e
introduziu o lazer e a recreação como novos assuntos na gestão urbana (MENEZES, 2007).
Na década de 1990, diversas cidades, principalmente as de países desenvolvidos,
implementaram projetos considerados modelos sob o ponto de vista da integração com o meio
urbano e com a bacia hidrográfica em que se inserem. Um exemplo foi o Plano de
Recuperação do Rio Don, em Toronto, no Canadá, "[...] que teve início com a pressão da
sociedade civil e de organizações não governamentais para que se recuperasse a qualidade
24

ambiental e estética do rio e das áreas adjacentes, tendo como meta futura a recuperação da
totalidade da bacia hidrográfica" (GORSKI, 2010, p. 127).
No Brasil, a cidade de Piracicaba, em São Paulo, foi pioneira nos projetos de
recuperação de rio urbano com o projeto Beira-rio, que foi iniciado no ano de 2001 tendo
como foco a orla urbana do rio Piracicaba e sua articulação com o tecido urbano. O projeto foi
voltado para a recuperação da qualidade da água, preservação do cinturão meândrico,
reestruturação do tecido urbano, incentivo do rio como caminho, conservação da paisagem e
conexão entre o cidadão e o rio.
A legitimação dos rios urbanos como protagonistas do espaço público, através do
aproveitamento de suas orlas como paisagens e percursos, pode contribuir para a mudança da
atual condição de abandono e depreciação, considerando o cuidado em articular essas novas
áreas com a composição daquelas já existentes ou mesmo previstas no Plano Diretor local. Os
espaços públicos propiciam a participação das pessoas na criação de uma sociedade mais
coesa e consciente, estreitando a relação da população com o rio e incentivando a
preservação, o coletivo.
O elemento capaz de exercer a conexão entre os espaços públicos e a contemplação da
paisagem é a orla. É, portanto, fundamental pensar nesse espaço através da implantação de
atividades que confiram urbanidade e diversificação de usos, com vistas a potencializar as
características do lugar e gerar novas oportunidades, fortalecendo naturalmente a identidade
local. Dessa maneira, segundo o Estúdio Leonardo Noguez Arquitectos (2014, on line),
aumentam-se as possibilidades de que os espaços se convertam em patrimônio de memória
coletiva do lugar e criem uma conexão emocional com o usuário que sente o espaço como
seu, vivendo, desfrutando e respeitando.
25

2 O RIO PARAÍBA DO SUL E A CIDADE DE CAMPOS DOS GOYTACAZES

O capítulo anterior tratou dos rios urbanos de maneira geral, através de uma revisão
teórica, mas também provocou a reflexão sobre o caso do rio Paraíba do Sul em Campos dos
Goytacazes, fazendo-se agora necessário um aprofundamento da sua relação particular com a
história do desenvolvimento da cidade.
Sendo assim, o presente capítulo vem estreitar o tema identificando aspectos
importantes envolvidos nesse contexto, buscando compreender a figura simbólica do rio
naquela época, os elementos marcantes da sua paisagem, a sua relação com a população e a
vida urbana, os usos que existiam nas suas águas e margens, e as mudanças sofridas nessa
área ao longo do tempo e do processo de urbanização.

2.1 Caracterização da bacia do rio Paraíba do Sul

Segundo a Agência Nacional de Águas (2014, on line), o rio Paraíba do Sul pertence a
uma das três maiores bacias hidrográficas do país, com uma área aproximada de 62.074km² e
de mesmo nome. É possível observá-la de modo geral na Figura 01 a seguir e também mais
detalhadamente no Anexo I deste trabalho.

Figura 01 - Localização da bacia hidrográfica do rio Paraíba do Sul

Fonte: Racismo Ambiental, 2014.


26

O Paraíba do Sul nasce na Serra da Bocaina, resultando da confluência dos rios


Paraibuna e Paraitingano, no estado de São Paulo, e percorre um trajeto de cerca de 1.150km
até desaguar no oceano Atlântico, em Atafona, São João da Barra, no Norte Fluminense. Seus
principais afluentes são o Jaguari, o Buquira, o Paraibuna, o Piabanha, o Pomba e o Muriaé,
sendo esses dois últimos os maiores. Ao longo de seu trecho, passa por 184 munícipios
dentre os estados de São Paulo, Minas Gerais e Rio de Janeiro, sendo, portanto, considerado
um rio federal, de domínio da União (CAMPOS TURISMO, [200-], on line).
Os principais usos da água na bacia são: abastecimento, diluição de esgotos, irrigação
e geração de energia hidrelétrica. Vale ressaltar que essa bacia possui destacada importância
no cenário nacional, por estar localizada entre os maiores polos industriais e populacionais do
país, e pelo processo que envolve o gerenciamento de seus recursos hídricos, como a
transposição já existente com o rio Guandu para abastecer a região metropolitana do Rio de
Janeiro, e outra em discussão recente para o sistema Cantareira que abastece municípios de
São Paulo.
No Rio de Janeiro é o rio mais importante do estado, atravessa a conhecida região
socioeconômica do Vale do Paraíba e percorre ao todo 37 municípios. Através da
transposição para o rio Guandu garante o abastecimento de água para mais de 12 milhões de
habitantes da Região Metropolitana (REZENDE, 2011, on line).
Em relação a qualidade das águas, de acordo com o Comitê de Integração da Bacia
Hidrográfica do Rio Paraíba do Sul (2011, on line), há diversos fatores que contribuem para
a degradação da bacia, tais como: a disposição inadequada do lixo; desmatamento
indiscriminado com a consequente erosão, que acarreta o assoreamento dos rios, agravando as
consequências das enchentes; retirada de recursos minerais para a construção civil sem a
devida recuperação ambiental; uso indevido e não controlado de agrotóxicos; extração
abusiva de areia; ocupação desordenada do solo; pesca predatória; entre outros.
Quanto ao saneamento básico, a situação é crítica, pois ainda com base nos dados do
comitê, 1 bilhão de litros de esgotos domésticos, praticamente sem tratamento, são despejados
diariamente nos rios da bacia do Paraíba, e aos efluentes domésticos somam-se 150 toneladas
de DBO (Demanda Bio-Química de Oxigênio) por dia, correspondente à carga poluidora
derivada dos efluentes industriais orgânicos (sem contar os agentes tóxicos, principalmente
metais pesados).
Acerca dos períodos de cheias e estiagem do rio, para Costa (1994, p. 45), o regime de
chuvas é bem caracterizado. No período de novembro a janeiro tem-se o trimestre mais
27

chuvoso, provocando grandes cheias no rio Paraíba do Sul, já o período de junho a agosto é o
mais seco. Ou seja, chuvas no verão e seca no inverno.

2.2 O rio Paraíba do Sul no contexto histórico e urbano da cidade

O município de Campos dos Goytacazes (Figura 02) é o maior em área territorial do


Estado do Rio de Janeiro, fica situado no norte do estado e se localiza à cerca de 300
quilômetros da capital.

Figura 02 - Localização geral

Fonte: PMCG, 2010.

De acordo com o Censo do IBGE de 2010, a cidade possui uma população de 463.545
habitantes. Se consolidou em uma planície fluvial, junto à margem direita do rio Paraíba do
Sul (Figura 03), e se caracterizou inicialmente pela economia canavieira, no entanto hoje, é
grande produtora de petróleo na região.
28

Figura 03 - O rio Paraíba do Sul em Campos dos Goytacazes

Fonte: PMCG, 2010.

O rio teve grande influência na constituição de seu tecido urbano. Na margem direita
se formou o núcleo central da cidade, consolidando freguesias, se construindo as casas dos
barões, igrejas, e também a praça central (Praça São Salvador), onde ocorriam as relações
sociais que movimentavam a cidade. A aristocracia, muito influente na política e no poder
local, construiu sobrados e solares às margens do rio Paraíba, que passou a ser “[...] o centro
da cidade, da juventude e mocidade, além de palco para as competições de natação e remo”
(RODRIGUES, 1988, p. 271).
A população costumava frequentemente se reunir às margens do rio. Quando
aconteciam as disputas de regatas, a Beira-Rio se enchia de gente, por todos os lados,
destacando-se as belas jovens campistas. Bandas de música faziam o fundo musical, colorindo
de alegria a paisagem urbana (RODRIGUES, 1988, p. 273). A prática da pesca também era
constante nas orlas, sendo o robalo o maior interesse dos pescadores.
Enquanto isso, Faria (2004 apud SOUZA, 2008) relata que, na margem esquerda, a
área hoje conhecida como Guarus, sempre foi uma parte da cidade mais segregada, com
maiores problemas, sendo considerada como perímetro urbano da cidade de Campos dos
Goytacazes somente após o Plano Urbanístico de 1902, do engenheiro Saturnino de Brito, e
sofrendo uma ocupação mais intensa a partir de 1920.
Além disso, o Paraíba do Sul sempre foi também um importante meio de
abastecimento e transporte de pessoas e mercadorias que chegavam até ela. Pinto reafirma:
29

Era através dos rios e lagos que se realizava um percurso de navegação


permanente de mercadorias e pessoas. Na Campos colonial, mercadorias e
passageiros eram transportados pelo sistema rio Paraíba, canal da Valeta,
Lagoa do Taí Pequeno-Lagoa do Taí e Rio Açu, alcançando o Atlântico [...]
O sistema de navegação chegou e aprofundou-se pelo século XX e só perdeu
sua força com o predomínio das estradas de ferro e, e depois, das rodovias
(PINTO, 2006, p.60).

Segundo Rodrigues (1988, p.96) o rio constantemente movimentava “pranchas”, um


tipo de embarcação comum da época que em conjunto de três ou quatro, criavam um belo
espetáculo, ao que denominava de “velas abertas como grandes aves”, chamando a atenção
das pessoas, que o apreciavam com alegria (Figura 04). No século XIX, até D. Pedro II
chegou à Campos dos Goytacazes em embarcação com grande comitiva, para inaugurar a luz
elétrica na cidade, afinal, esse era caminho natural, via oceano, adentrando o interior pelo rio
Paraíba do Sul. Até que com o advento da ferrovia, o rio foi perdendo a sua função de meio de
transporte, o que gerou mudanças na sua relação com a população campista. (PINTO, 2006,
p.65).
Figura 04 - Pranchas no rio Paraíba do Sul

Fonte: Rodrigues, 1988.

Em 1906 se deu a construção da ponte ferroviária sobre o rio (Figura 05), que
possibilitou a extensão da linha que já conectava Campos a Macaé e a Niterói, até Vitória,
capital do estado do Espírito Santo. A facilidade de circulação alcançada com esse processo
30

ajudou a alavancar a economia do município, e junto à riqueza gerada pela cana-de-açúcar,


trouxeram crescimento e desenvolvimento à cidade.

Figura 05 - Construção da ponte ferroviária em 1906

Fonte: Arquivo Público Municipal de Campos, [200-].

Entretanto, com o passar do tempo, muitos moradores do núcleo se deslocaram para


outras regiões, permanecendo essa área com grande predominância comercial e sem atrativos
à população, fazendo com que o movimento se restringisse apenas aos dias da semana,
comerciais. Isso sem se falar no certo receio causado pelos transbordamentos que essa área
sofre nos períodos de cheia, que também acabou por afastar a população. Dentre as enchentes
que assolaram a cidade, é possível dar destaque às de 1906, 1943, 1966 e 2007 (Figura 06).

Figura 06 - Enchente de 1966

Fonte: Arquivo Público Municipal de Campos, [200-].


31

Problemas ambientais devido despejo de dejetos e poluentes químicos, desmatamento,


extração de areia, dentre outros impactos, também têm não só alterado a paisagem do rio
como afetado a sua relação com população.
O Pavilhão de Regatas que aparece na Figura 06, por exemplo, já não existe mais pois
foi demolido (Figura 07). Relevante na paisagem em que se inseria e para história do remo na
cidade, por muitos anos foi palanque nas competições concentrando ali grande número de
pessoas. No entanto, seu valor histórico foi desconsiderado desde que passou a ser apenas
uma marquise erguida aleatoriamente na orla, abandonado, e depois, com sua total demolição
em junho de 2012.

Figura 07 - Demolição do pavilhão de regatas

Fonte: Nogueira, 2012.

2.3 A orla e a cidade no contexto atual

O desenvolvimento urbano desencadeado na cidade (Figura 08) gerou ao longo do


tempo diferentes usos do rio Paraíba do Sul e de suas orlas, alterando significativamente a
paisagem central da cidade. As frequentes enchentes demandaram a construção de diques em
trechos de sua margem, ao todo seis pontes foram erguidas para atravessá-lo e novos prédios
32

foram sendo adicionados ao contexto arquitetônico existente e responsável pela identidade da


cidade.

Figura 08 - Evolução urbana da cidade de Campos dos Goytacazes

Fonte: Almeida et al, 2014.

Diante processo de urbanização e de todo contexto histórico mencionado, juntamente


com o aumento do número de habitantes na cidade, tornou-se notório determinado descaso em
relação rio, que passou a ser visto comumente como um obstáculo para se atravessar os dois
lados da cidade. Ele já não é mais utilizado para navegação, e raramente se vê a prática de
esportes e de pesca. Em suas margens, surgiram novas e altas construções devido a lógica do
mercado imobiliário, e nesse meio prédios históricos estão se perdendo sem que sejam
consideradas a preservação da paisagem e a visibilidade do rio.
O Paraíba, em Campos, encontra-se desconectado do tecido urbano. A falta de
atrativos, de infraestrutura e de segurança, bem como a poluição por efluentes e o
desmatamento da mata ciliar, só restringem a relação da população com esse elemento tão
marcante na história e no desenvolvimento socioeconômico da cidade. Esse fato se comprova
ao longo deste trabalho, com as análises de caracterização da área e a pesquisa de campo.
Em pleno século XXI, e em uma cidade economicamente favorecida como Campos
dos Goytacazes, ainda é possível observar focos de poluição das águas por lançamento de
efluentes, por descarte de lixo e desmatamento das matas ciliares. A imagem a seguir (Figura
09), é um flagrante pelo jornal Terceira Via, em matéria do site, de esgoto sendo despejado a
33

céu aberto no rio Paraíba do Sul. A água poluída caia próximo a Ponte João Barcelos Martins
e vinha de residências da margem esquerda do rio (Guarus).

Figura 09 - Flagrante de esgoto sendo despejado no rio Paraíba do Sul

Fonte: Terceira Via, 2014.

Nessas próximas imagens (Figuras 10 e 11), pode-se notar a presença de resíduos


variados que são descartados nas margens do rio em seu trecho urbano, dentre sacos plásticos
e garrafas pets. De acordo com o Código Florestal, a mata ciliar deveria ter pelo menos 30
metros de mata preservada, mas é afetada pelo crescimento urbano desenfreado, a falta de
chuva e também pela falta de conscientização da população.

Figura 10 - Resíduos na vegetação ciliar

Fonte: Acervo pessoal, 2015.


34

Figura 11 - Resíduos na margem

Fonte: Acervo pessoal, 2015.

Na ausência da mata ciliar, as margens são assoreadas mais rapidamente, ou seja, a


terra desce para o rio e o deixa cada vez mais raso. Além disso, rio enfrentou recentemente a
pior seca dos últimos 80 anos, diante da escassez de chuva, o que é possível notar ao se
comparar nas imagens aéreas a seguir (Figuras 12 e 13):

Figura 12 - Vista aérea do trecho urbano do rio Paraíba do Sul em Campos dos Goytacazes
em março de 2012

Fonte: Google Earth, 2015.


35

Figura 13 - Vista aérea do trecho urbano do rio Paraíba do Sul em Campos dos Goytacazes
em março de 2015

Fonte: Google Earth, 2015.

Apesar do Plano Diretor Municipal de 2008 contemplar as margens do rio Paraíba do


Sul como Áreas de Especial Interesse de Recuperação e Valorização Paisagística, fica claro a
desatenção dada atualmente a essa área. Muito antes, desde os anos 1930 e 1940, segundo
Faria (2000, p. 8), quando se começou a discutir na cidade ideias de urbanização e de reforma
urbana, o prefeito da época, Mário Motta, publicou na Folha do Comércio de 23/11/40 seu
projeto de reforma urbana e outros trabalhos, como a construção de dique e o embelezamento
da avenida Beira Rio, demolindo os últimos armazéns, planejando novas ruas, de praças, e a
melhoria da rede de transporte. Mas ainda nos anos de 1940, a cidade apresentou sinais de
declínio da indústria açucareira, o que denunciou que a estruturação e a manutenção do
espaço urbano, por falta de recursos financeiros necessários, não seriam mais garantidos
(FARIA, 2000, p. 9).
Até então, portanto, um novo olhar sobre as margens do rio Paraíba do Sul no que se
refere ao trecho urbano da cidade de Campos dos Goytacazes, não saiu ainda das recordações
históricas, dos planos urbanísticos existentes e das leis vigentes hoje, estando o rio ainda à par
de mais alterações na sua paisagem e visibilidade, logo cada dia mais distante em relação a
vida urbana.
36

3 REFERENCIAIS PROJETUAIS

Além da abordagem teórica através das pesquisas bibliográficas, fez-se necessário


uma fundamentação projetual através da pesquisa de projetos que possam colaborar como
referências para a proposta urbanística final, visto que este trabalho é de natureza aplicada.
Dessa forma, como já mencionado, os referenciais se dividem em quatro categorias de
maneira que assim sejam esclarecidas as contribuições de cada um para a proposta. O
funcional, embasa soluções relativas ao funcionamento do programa do projeto; o tipológico
traz um exemplo de mesma tipologia de implantação da proposta; já o plástico-formal engloba
as referências estéticas e formais, enquanto o tecnológico reúne técnicas e soluções que
podem aprimorar o projeto.

3.1 Funcional

O primeiro referencial funcional escolhido para este trabalho, foi o High Line Park
(Figura 14) que fica localizado em Nova Iorque, nos Estados Unidos. O projeto trata de um
parque urbano linear que foi implantado sobre uma linha férrea elevada. Ele se tornou "[...]
referência mundial pela qualidade do desenho urbano e pelo sucesso como estratégia de
renovação de áreas centrais degradadas" (EDITORIA CONCURSOS DE PROJETO, 2012, on
line).
37

Figura 14 - Vista aérea do High Line Park

Fonte: Editoria Concursos de Projeto, 2012.

Como contribuição para a proposta projetual a ser apresentada, destaca-se neste parque
a funcionalidade dos variados espaços públicos de convivência, lazer e contemplação
associados a jardins, galerias de arte, cafés e lojas comerciais. Os espaços não costumam ditar
ou limitar as atividades possíveis de serem realizadas neles, sendo repletos de passeios e
mobiliários de design inovador que convidam as pessoas a vivenciarem o local de maneiras
diferenciadas (Figuras 15 e 16).

Figura 15 - Espaço flexível para convivência, contemplação e estar

Fonte: Joaquina, 2013.


38

Figura 16 - Espaço que não restringe usos

Fonte: Joaquina, 2013.

Além disso, em vários trechos, o parque incorpora elementos de street art aos espaços
(Figura 17), aspecto que se verá mais adiante, presente também no contexto da área da
proposta. Nesse sentido, a organização estadunidense Project for Public Spaces (PPS),
destaca que “mais do que nunca, as obras de arte pública são estimulantes e convidam a um
diálogo ativo ao invés da observação passiva, fomentando, assim, a interação social que pode
inclusive conduzir a um sentido de coesão social entre os próprios espectadores”. Ações desse
tipo permitem que os cidadãos mudem sua percepção de um lugar, podendo identificar-se
com este, considerando-o divertido e dinâmico.

Figura 17 - Street art integrada à paisagem

Fonte: Joaquina, 2013.


39

Vale ressaltar que o projeto também possui acessibilidade para cadeirantes, e todo
paisagismo é inspirado na natureza que se desenvolveu nos trilhos dos trens (Figura 18),
englobando aspectos relativos a história do local.

Figura 18 - Preservação de trilhos e vegetação típica da época das ferrovias

Fonte: Joaquina, 2013.

3.2 Tipológico

Como referencial tipológico, está o projeto de recuperação das margens do rio Rhône
que fica em Lyon, na França (Figura 19). No trecho de 5km (cinco quilômetros) ao longo da
margem esquerda do rio foram implantadas novas áreas de estar, circulação e lazer "[...]
conforme demandas e qualidades inerentes aos diversos intervalos de atuação." (SIQUEIRA,
2013, p. 51). O primeiro trecho foi inaugurado em 2007, e já se encontra enraizado na vida da
população da região metropolitana de Lyon. Serviu inclusive, segundo Siqueira (2013, p.52)
"[...] de inspiração para que outras cidades francesas encarassem o desafio de transformar
estacionamentos, antigas áreas industriais e vias expressas ao longo de cursos d'água em
parques e áreas verdes."
40

Figura 19 - Vista aérea do rio Rhône

Fonte: Siqueira, 2013.

Além de se tratar de um projeto de mesma tipologia da proposta deste trabalho,


trazendo uma intervenção urbana nas margens de um rio através da reestruturação do trecho e
inserção de novos usos, é relevante o fato de "[...] além de proporcionar um maior contato
entre cidadãos e rio, essas áreas devem incentivar o uso de meios de locomoção mais
sustentáveis, como o transporte público, a bicicleta e o caminhar." (SIQUEIRA, 2013, p. 51).
As novas áreas propostas tomaram o lugar de um estacionamento com capacidade para 1600
carros que dominavam a paisagem e que com o projeto foram transferidos para novos
edifícios construídos com essa finalidade. Além disso, durante um período, a população foi
consultada, "[...] o que possibilitou um maior conhecimento das demandas e expectativas dos
futuros usuários e moradores da região." (SIQUEIRA, 2013, p. 51).
Agora no que se refere a implantação dessas áreas, é interessante a ideia dos espaços
ao longo das margens do rio terem sido organizados em duas cotas distintas (Figura 20),
conformadas por um talude antigo de pedras aparentes. A cota inferior, junto à água do rio,
passou a ser de acesso exclusivo a pedestres e veículos não motorizados, com exceção de
veículos de manutenção e emergência. Enquanto na cota superior a circulação de pedestres foi
locada na faixa mais próxima ao Rhône e o tráfego de veículos ficou naquela mais perto dos
edifícios existentes. A conexão entre esses dois níveis foi possível com a presença de rampas
integradas ao talude que, por vezes, são complementadas com a inserção de núcleos dispostos
ao longo do projeto, onde existem escadas e elevadores, além de serviços como postos de
saúde, pontos de informação, aluguel de bicicleta, etc. Ao restituir a circulação de pedestres e
ciclistas em escala territorial, o projeto possibilitou novas articulações espaciais nos sentidos
longitudinal e transversal ao rio.
41

Figura 20 - Cotas distintas de circulação nas margens

Fonte: Siqueira, 2013.

Um fator comparável ao trecho onde pretende-se trabalhar a proposta de intervenção


no Paraíba do Sul, é que longitudinalmente o projeto do rio Rhône "[...] apresenta uma
configuração simétrica: enquanto a área central é mais urbana, as duas extremidades tem
caráter mais natural." (SIQUEIRA, 2013, p. 52). Dessa maneira, ao norte fica a parte menos
urbanizada do parque, com áreas que preservam a fauna e a flora ribeirinhas (Figura 21); na
parte central, barcos atracados abrigam cafés, restaurantes e casas noturnas (Figura 22); mas o
ponto focal do projeto é a intervenção junto a Pont de la Guilliotière, onde foram instaladas
mais de 300m de arquibancadas em substituição a uma área antes inacessível a população
(Figuras 23 e 24).

Figura 21 - Trecho de intervenção que considera áreas para fauna e flora ribeirinhas

Fonte: Siqueira, 2013.


42

Figura 22 - Trecho de intervenção que considera barcos atracados para diversificação de usos

Fonte: Siqueira, 2013.

Figura 23 - Arquibancada que em área antes inacessível a população

Fonte: Siqueira, 2013.

Figura 24 - Vista da arquibancada à noite

Fonte: Siqueira, 2013.

Mais uma vez se equiparando ao caso de Campos, a paisagem oferecida a população é


o centro histórico da cidade de Lyon, com alguns de seus edifícios mais notáveis e o próprio
43

rio Rhône, que em conjunto configuram um cenário especial para eventos, como concertos,
projeções e comemorações. Por fim, destaca-se a construção de decks de madeira, que
permitem atividades relacionadas a água, como a pesca, nos dois extremos do rio.

3.3 Plástico-formal

O referencial plástico-formal utilizado é o plano urbano Beira-Rio para um trecho da


orla do rio Guaíba (Figura 25), localizado em Porto Alegre, no Brasil, e de autoria do
escritório Hype Studio Arquitetura. A escolha desse projeto se deu diante da busca de
desenhos e formas que se adaptem e integrem com a estética de uma cidade fluvial.

Figura 25 - Vista geral do projeto

Fonte: Vaz, 2009.

Nesse caso os espaços se definem através de traçados variados, hora mais geométricos,
hora sinuosos, com texturas diferentes, jardins gramados ou decks em madeira, que apesar
dessas alternâncias conseguem conversar entre si e quebrar a monotonia que a linearidade dos
cursos d’água podem acabar causando, como é possível notar na Figura 26.
44

Figura 26 - Perspectiva da orla do rio Guaíba

Fonte: Vaz, 2009.

Frequentemente, esses espaços ainda incorporam elementos vazados e esculturas que


se destacam na paisagem (Figura 27). Além disso, são trabalhados diferentes níveis, que em
algumas situações proporcionam marquises para restaurantes e áreas de permanência.

Figura 27 - Perspectiva do projeto para orla do rio Guaíba

Fonte: Vaz, 2009.

3.4 Tecnológico

A Orla Taumanan (Figuras 28), em Boa Vista, capital do estado de Roraima, é o


primeiro referencial tecnológico escolhido.
45

Figura 28 - Vista geral do trecho

Fonte: APRF Turismo, 2015.

É um espaço elevado sobre o rio Branco que oferece quadras esportivas, lanchonetes,
restaurantes, áreas para descanso, trechos de passeio e contemplação. O local é muito
frequentado e bem aceito pela população da cidade, inclusive à noite, sendo, portanto, bem
iluminado (Figura 29). Mas sua relevância está no fato do projeto ter sido executado em uma
grande plataforma sobre estacas, considerando o período de cheia do rio e favorecendo a
visibilidade da paisagem. Pretende-se adaptar essa técnica construtiva em trechos do Paraíba
em que a paisagem possa ser valorizada e os usos variados.

Figura 29 - Vista noturna

Fonte: APRF Turismo, 2015.


46

Para complementar as referências tecnológicas no âmbito da sustentabilidade, destaca-


se a mini-estação de tratamento de esgoto, Mini-ETE (Figuras 30 e 31). Segundo Organum
([200-], on line), esse é um sistema modular para tratamento de água e esgoto, fabricado em
plástico atóxico, leve e reciclável. O sistema é indicado para locais distantes ou não atendidos
pela rede pública, como casas de campo, casas de praia e indústrias, sujeitos a contaminação
do solo, corpos d’água e lençol freático pela falta de tratamento adequado do esgoto. Mas
também para parques e projetos ecológicos e sustentáveis, visando o reuso da água tratada.

Figura 30 – Mini-ETE

Fonte: Organum, [200-].

Figura 31 - Instalação Mini-ETE

Fonte: Organum, [200-].

“É capaz de atender qualquer porte e número de usuários para tratar efluentes de


origem orgânica, isto é, aqueles provenientes de banheiros, cozinhas, lavanderias
convencionais, torneiras e outros pontos de uso” (ORGANUM, [200-0], on line). Ainda
segundo o site do fabricante, depois de tratada e descontaminada, a água poderá ser usada
para lavagem de pisos e automóveis, regas de horta e jardins e descarga de bacias sanitárias.
Dessa forma, além de se evitar poluição e riscos de doenças, gera-se economia no tratamento
de água e esgoto tanto para o cliente quanto para o poder público.
47

Por ser modular e ajustável ao número de usuários, a Mini-ETE pode variar seu porte
em função do dimensionamento, podendo ser ampliada desde que haja área disponível, que
em geral não necessitam ser muito grandes (Figura 32).

Figura 32 – Mini-ETE instalada em um jardim

Fonte: Organum, [200-].

O sistema atende às normas da ABNT NBR 7229/93 e NBR 13969/97, assim


como à legislação ambiental dos Estados e municípios brasileiros. Permite o
lançamento da água em rios, lagos etc., ou ser infiltrada direto no solo, pois
seu uso permite manter a água livre de patógenos, sem risco de transmissão
de doenças pela falta de saneamento (ORGANUM, [200-], on line).

De acordo com o fabricante Organum ([200-], on line), o sistema também não utiliza
eletricidade para o funcionamento. Ela tem ação de caráter biológico: as águas servidas são
tratadas por meio de microrganismos eficientes e benéficos, que se multiplicam em função de
encontrarem ambiente adequado e removem a carga orgânica do efluente, eliminando
bactérias, coliformes totais e fecais.
Em resumo, a ideia é que com a inserção de novos espaços e equipamentos ao longo
das orlas, não haja extrema necessidade de grandes modificações ou sobrecargas na rede de
esgoto existente, muito menos que se cogite um despejo inadequado. Com a instalação de
mini-ETEs onde houver proposta de novos equipamentos urbanos em trechos das margens, é
possível que o esgoto gerado seja tratado de forma facilitada e ambientalmente correta para
que a água possa ser reutilizada na manutenção dos espaços da própria orla.
48

Seguindo esta mesma linha, o telhado verde se enquadra também como referencial
tecnológico. De acordo com a Ecocasa Tecnologias Ambientais (2011, on line), se trata de
uma solução construtiva que consiste na aplicação e uso de um tipo de solo especial –
substrato – e vegetação sobre uma superfície impermeável, sobre edificações em geral (Figura
33). É uma alternativa sustentável frente aos telhados e lajes convencionais pois atua como
gerenciador de volumes de chuvas, retardando sua drenagem para as galerias pluviais,
contribuindo de forma importante para a mitigação de inundações e enchentes.

Figura 33 - Exemplo de componentes do telhado verde

Fonte: Senac Londrina, 2014.

Dessa forma, busca-se garantir que os equipamentos a serem inseridos nas orlas, como
sanitários e quiosques, contarão com soluções técnicas sustentáveis que justifiquem sua
presença e garantam seu funcionamento sem que se afete o meio ambiente.
Vale ainda destacar, que esses telhados acabam também exercendo certa função
estética, a partir do momento que minimiza os efeitos visuais dessas construções amenizando
as superfícies sólidas de concreto com mais verde (Figura 34). Esse efeito, quando se intervê
em um local repleto de elementos naturais como a orla de um rio, é ponto positivo.

Figura 34 - Telhado verde

Fonte: Senac Londrina, 2014.


49

4 CARACTERIZAÇÃO E DIAGNÓSTICO DA ÁREA

O presente capítulo trará uma extensa análise dos aspectos e condicionantes relativos
às margens do rio Paraíba do Sul e seu entorno imediato, dentro da delimitação definida. Essa
etapa vem associada à pesquisa de campo e levantamento, incluindo a elaboração e a
aplicação do roteiro de observação, das entrevistas e dos questionários, mencionados nos
apêndices.
Além disso, são apresentados registros fotográficos, feitos durante as visitas técnicas
ao local, e mapas de caracterização dos aspectos julgados relevantes, como morfologia
urbana, legislação vigente e vazios urbanos.
O objetivo é que essas análises contribuam para um melhor domínio e compreensão da
área de estudo, de forma que possam ser considerados no projeto os diversos elementos
existentes que conformam o trecho de intervenção e se relacionam nesse contexto.

4.1 Definição do trecho de intervenção

O trecho de estudo do rio Paraíba do Sul em que se pretende intervir, está inserido na
área urbana da cidade de Campos dos Goytacazes, mencionada no capítulo anterior. Essa área
se encontra demarcada na Figura 35 a seguir:
50

Figura 35 - Localização do trecho de estudo na cidade

Fonte: Google Earth (grifo nosso s/ escala), 2015.

Na próxima imagem (Figura 36), é feita uma localização mais exata do trecho, que se
estende da ponte Alair Ferreira à ponte Saturnino de Brito, abrangendo ambas as margens do
rio que possuem uma extensão de cerca de 3km (três quilômetros) cada e são delimitadas
pelas Avenida 15 de Novembro (na margem do Centro) e pela Avenida Francisco Lamego (na
margem de Guarus).

Figura 36 - Delimitação do trecho de estudo

Fonte: Google Earth (grifo nosso s/ escala), 2015.

Vale ressaltar que esse trecho corta diversos bairros da cidade (Figura 37). São eles, na
margem esquerda: Parque Vera Cruz, Parque Santo Antônio, Parque Jardim Carioca e Parque
51

Vicente Gonçalves Dias/Parque Bartolomeu Lisandro. Na margem direita: Parque Sumaré,


Parque Caju, Parque Conselheiro Tomaz Coelho, Centro e Lapa.

Figura 37 - Bairros inseridos no trecho

Fonte: Geocities, [200-].

Tal delimitação foi feita com objetivo de se elaborar um Plano geral de intervenções,
que a contemple por inteiro e demonstre uma ideia integrada de projeto mesmo depois que
definidas as áreas de interesse para intervenções pontuais. Essa metodologia de concepção
projetual, partindo da escala macro para a micro, faz considerar parcelas variadas da
população que habitam os diferentes bairros cortados pelo trecho, o que torna possível um
projeto mais acessível e próximo da realidade da população como um todo.
Além disso, o fato de se estender da ponte Alair Ferreira à ponte Saturnino de Brito
não se fez em vão. Busca-se inserir no projeto todas as pontes que de alguma forma, e em
tempos variados, acabaram por interferir na paisagem do rio e no traçado da cidade, se
tornando pontos importantes na conformação do trecho urbano cortado pelas orlas.
Observando-se a Figura 35, existem ao todo seis pontes: a ponte Alair Ferreira e a ponte
General Dutra, que são marcos da entrada e saída da cidade, cortada por uma rodovia federal,
a BR-101; a ponte Ferroviária Senador Viana e a ponte João Barcelos Martins, que fizeram
parte de momentos importantes da história de Campos; bem como a ponte Leonel de Souza
Brizola e a ponte Saturnino de Brito, que são parte do cotidiano da cidade, sendo os principais
eixos de deslocamento entre uma margem e outra.
52

4.2 Resultados e discussões da pesquisa de campo

Como já mencionado na metodologia, a pesquisa de campo contemplou um roteiro de


observações, levantamento fotográfico e aplicação de entrevistas in loco e questionários on
line. Os resultados das visitas técnicas, onde foram observados os aspectos citados no roteiro
e se fez registros fotográficos da situação atual do trecho em questão, serão apresentados na
próxima etapa, de caracterização e diagnóstico da área.
Já em relação às entrevistas, aplicadas a 18 indivíduos, constatou-se que os mais
idosos possuem vastas lembranças que envolvem o rio Paraíba do Sul, principalmente dos
campeonatos de remo, que como um grande evento, atraiam toda cidade há décadas atrás.
Além de recordações de banhos de rio, pesca e das cheias vivenciaram. Entretanto, entre os
mais jovens fica claro o afastamento e a indiferença à presença do rio. Muitos relataram nem
mesmo repará-lo ao passar por alguma das orlas e não souberam opinar sobre o que seria
atrativo para que houvesse a possibilidade de se reestabelecer alguma relação.
Essa constatação foi o que motivou a aplicação do questionário on line, com intuito de
alcançar a percepção de uma parcela maior da população e identificar as possíveis maneiras
de reverter esse quadro dentro da proposta de intervenção urbana nas orlas, obtendo opiniões
da população como um todo acerca das carências e demandas do local.
Após 63 questionários respondidos, vale destacar algumas frases de impacto que
resumem os aspectos, reflexões e sugestões mais mencionados pelas pessoas:
“Tenho a impressão de que o rio é apenas uma parte isolada da natureza o qual separa
a cidade em duas”.
“Criaram barreiras de forma que a orla não tenha identidade de orla, seja pela
existência de muros opacos ou pela retirada da imagem do pescador, a economia pesqueira e o
clima de orla. Ela foi descaracterizada”.
“Não há grande visibilidade para o rio nem alguma estrutura que motive esse olhar.
Ele apenas está ali e algumas pessoas não notam ou simplesmente não dão importância”.
“A orla merece um ritmo de atividade constante, com bares e vida noturna, tornando-
se uma parte atraente da cidade e proporcionando um contato da população com o recurso
hídrico, com a paisagem urbana característica da cidade. Uma orla com uma espécie de
Parque linear seria também muito interessante, onde as pessoas pudessem caminhar, relaxar,
viver a cidade”.
53

Como resultados mais precisos, constatou-se que uma grande maioria não está
satisfeito com o existente hoje (Figura 38), aceitando a proposta de que sejam oferecidos usos
mais variados nesse espaço (Figura 39).

Figura 38 - Resultado do questionário sobre satisfação

Fonte: Acervo pessoal, 2015.

Figura 39 - Resultado do questionário sobre oferta de usos variados

Fonte: Acervo pessoal, 2015.


54

Além disso, diversas pessoas relataram gostar do contato com a natureza e se


incomodarem com a poluição, os muros impossibilitam observar o rio enquanto passam de
bicicleta, carro ou a pé, e até mesmo da iluminação de destaque das pontes que desviam a
atenção do rio durante a noite. Costumam sentir falta atrativos que levem as pessoas ao lazer,
mais arborização, mais transparência visual em relação aos limites entre a cidade e o rio e
principalmente mais segurança pública e manutenção do espaço.
Foram sugeridos diversos usos e atividades, sendo os mais citados: espaço de lazer e
cultura que ofereçam exposições, eventos musicais e apresentações artísticas, ciclovia e área
de caminhada, áreas para piqueniques e prática de slackline, mirante,
bares/quiosques/restaurantes, espaço para atividade física e esportiva, bem como parque para
crianças e praças. Também foi sugerido aluguel de canoas para passeios no rio.

4.3 Aspectos urbanísticos e socioeconômicos

Durante a visita técnica e registro fotográfico, foram identificados alguns pontos


negativos como focos de despejo de lixo (Figura 40), pessoas sentadas de costas para o rio no
Terminal Rodoviário (Figura 41), falta de manutenção das calçadas e mobiliários das áreas
livres (Figuras 42 e 43), extenso estacionamento a céu aberto no Cais da Lapa (Figura 44)
além de lixo e ermo na orla de Guarus (Figura 45).

Figura 40 - Despejo de lixo nas margens Figura 41 - Pessoas de costas no Terminal

Fonte: Acervo pessoal, 2015. Fonte: Acervo pessoal, 2015.


55

Figura 42 - Falta de manutenção e de bicicletário Figura 43 - Falta de manutenção das calçadas

Fonte: Acervo pessoal, 2015. Fonte: Acervo pessoal, 2015.

Figura 44 - Estacionamento no Cais Figura 45 - Lixo e ermo em Guarus

Fonte: Acervo pessoal, 2015. Fonte: Acervo pessoal, 2015.

No entanto também foi possível identificar pontos positivos ao longo do trecho. Como
por exemplo o pôr-do-sol visto da curva do Cais da Lapa (Figura 46), prática da pesca em um
domingo, também no Cais da Lapa, quando livre do estacionamento (Figura 47), prática de
esportes urbanos na Praça São Salvador (Figura 48), vista do Centro Histórico na orla de
Guarus (Figura 49) e grafites urbanos sob a ponte Leonel Brizola (Figura 50).

Figura 46 - Pôr-do-sol visto do Cais Figura 47 - Prática de pesca no Cais

Fonte: Acervo pessoal, 2015. Fonte: Acervo pessoal, 2015.


56

Figura 48 - Prática de esportes urbanos Figura 49 - Vista do Centro Histórico

Fonte: Acervo pessoal, 2015. Fonte: Acervo pessoal, 2015.

Figura 50 - Grafites urbanos

Fonte: Acervo pessoal, 2015.

Feita a visita e o levantamento, foram elaborados dois mapas (Figuras 51 e 52) para
sintetizar os principais pontos de interesse do trecho de intervenção. Destacando-se por
exemplo, os prédios e elementos históricos, de valor patrimonial, como a Igreja N. S. da Lapa
e o prédio do Corpo de Bombeiros, bem como as pontes Ferroviária Senador Viana e João
Barcelos Martins. Além de áreas de apropriação irregular do espaço, equipamentos como
escolas, hospitais e demais instituições. Seguem apresentados nas duas páginas seguintes:
57

Figura 51 - Pontos de interesse da margem direita

Fonte: Autoria própria, 2015.


58

Figura 52 - Pontos de interesse da margem esquerda

Fonte: Autoria própria, 2015.


59

Agora, a fim de analisar e identificar o tipo interação entre ecossistemas existentes, a


malha urbana consolidada e os espaços de convívio ou práticas sociais distribuídos ao longo
do trecho, foi elaborado este mapa de Análise morfológica do espaço (Figura 53). Através
dele é fácil notar a grande densidade do tecido urbano em ambas as margens do rio e a
pequena proporção de mata ciliar, em azul mais escuro. Vê-se que seis pontes cortam esse
trecho, interligando toda malha em diversos pontos. E por último, os principais espaços livres
públicos ao longo das margens, dentre praças, áreas com quiosques e quadras esportivas,
incluindo o Cais da Lapa que segundo a legislação, como se observará em uma próxima
análise, consta no Setor Especial Recreativo no zoneamento, mas como a maioria de todos
espaços demarcados, encontra-se subutilizado, no momento destinado à um grande
estacionamento.

Figura 53 - Mapa de análise morfológica do espaço

Fonte: Autoria própria, 2015.

Os próximos dois mapas, refletem análises baseadas nas teorias de percepção do


espaço de Kevin Lynch, importante urbanista que discute e analisa a imagem da cidade,
destacando as maneiras como ela e suas partes constituintes são percebidas por seus
moradores e como essas percepções podem ser impregnadas de valores, lembranças e
significados (LYNCH, 1982).
60

Através da Figura 54, é possível constatar que as margens do rio assumem distintas
características perceptivas ao longo de seu percurso. Por essas diferenças se limitam os
chamados “bairros”. Os bairros marcados com a letra A são regiões mais depreciadas do
trecho, ermas e sem muita manutenção. Nas que marcadas com a letra B percebe-se que ainda
que mais desertas, possuem alguns estabelecimentos comerciais e mais manutenção das
calçadas, até mesmo uma maior fiscalização das diretrizes de construção de edificações. Com
a letra C a área mais movimentada e ativa da margem de Guarus, na letra D se identifica a
ambiência única do Centro Histórico da cidade e na letra E foi percebido um ambiente com
potencial visual, por se localizar em uma curva e ter uma paisagem privilegiada de
praticamente todo trecho.
O mapa também destaca os “marcos” do trecho, que são elementos de relevância na
paisagem, como as pontes, o próprio rio, prédios de importância histórica como a Igreja N. S.
da Lapa e de São Salvador, bem como a torre da antiga Fábrica de Tecidos.

Figura 54 - Mapa de análise com base em Lynch para bairros e marcos

Fonte: Autoria própria, 2015.

Na Figura 55, o segundo mapa baseado em Lynch, onde são demarcadas as


circulações predominantes, os “limites”, nesse caso entendido como o rio, e os “pontos
nodais” conformados pela concentração ou conflito de todos os agentes envolvidos na
dinâmica do espaço. Dentre os pontos nodais identificados, estão algumas das subidas e
61

descidas de pontes, a praça São Salvador, na área central da cidade, e o terminal rodoviário
Luís Carlos Prestes.

Figura 55 - Mapa de análise com base em Lynch para circulações, limites e pontos nodais

Fonte: Autoria própria, 2015.

O mapa a seguir, apresentado na Figura 56, mostra os vazios urbanos mais relevantes
do trecho. Esse levantamento possibilitou a análise de áreas que possam receber novos usos
integrados e complementares às atividades propostas nas orlas, e remanejamentos dos
moradores ou comerciantes que foram localizados em áreas de apropriação irregular do solo,
ou na necessidade de desapropriação em benefício do coletivo.
62

Figura 56 - Mapa de vazios urbanos

Fonte: Autoria própria, 2015.

Por fim, a Figura 57 traz o mapa de estudos de insolação e ventilação da área. Essa
análise, mesmo que breve, é de extrema importância para implantação da proposta. Baseado
nela é possível, dentre outros aspectos, identificar as áreas privilegiadas pelo nascer ou pôr-
do-sol, definir o posicionamento de espaços como quadras esportivas, e ter noção sobre o
conforto térmico das edificações inseridas no trecho.

Figura 57 - Mapa de insolação e ventilação

Fonte: Autoria própria, 2015.


63

4.4. Aspectos legais

É importante também, nessa etapa de diagnóstico, conhecer o que determinam as


legislações vigentes para a área de estudo, buscando se embasar para que as propostas feitas
estejam de acordo com todos os âmbitos legais. Sendo assim, começando pela atual
Constituição Federal, sabe-se que estão incluídos dispositivos sobre recursos hídricos que
dispõem sobre o domínio das águas, seu aproveitamento e as competências legislativa e
administrativa das três esferas do Poder Público. Ela considera de domínio público todas as
águas visto que:

São bens da União os lagos, rios e quaisquer correntes de água em terrenos


de seu domínio, ou que banhem mais de um Estado, sirvam de limites com
outros países, ou se estendam a território estrangeiro ou dele provenham,
bem como os terrenos marginais e as praias fluviais (JÚNIOR, 2004, p. 13).

Observando ainda que “[...] no Brasil não existem águas particulares ou privadas, com
domínio ligado à propriedade da terra. Não existem, também, recursos hídricos de domínio
dos Municípios” (JÚNIOR, 2004, p. 13).
Segundo Gorski (2010, p. 178), o Código Florestal, instituído pela Lei nº 4.771 de 15
de setembro de 1965, denomina como Áreas de Preservação Permanente (APPs) as nascentes,
corpos d’águas e sistemas frágeis, tais como manguezais e reestingas, determinando a faixa de
preservação da cobertura vegetal ao longo das faixas marginais aos corpos d’águas.
No entanto, a resolução n° 369 do Conama, de 2006, permite a implantação de área
verde de domínio público em Áreas de Preservação Permanente urbanas, desde que se cumpra
requisitos como a proteção das margens dos corpos d’água e a manutenção de altas taxas de
permeabilidade, definindo essas áreas como: “[..] espaço de domínio público que desempenhe
função ecológica, paisagística e recreativa, propiciando a melhoria da qualidade estética,
funcional e ambiental da cidade, sendo dotado de vegetação e espaços livres de
impermeabilização” (Art. 8°, §2°, Resolução Conama n° 369).
64

Dessa forma, fica resguardada em âmbito nacional, a proposta de espaços públicos ao


longo das orlas do rio Paraíba do Sul em Campos dos Goytacazes, visando a qualificação
paisagística, a preservação ambiental e a função recreativa. Ainda assim, faz-se necessário se
respaldar nas leis vigentes no município, até porque, o próprio Código Florestal aconselha a
observação dos Planos Diretores Municipais e leis de Uso e Ocupação do Solo Urbano, que
devem respeitar as diretrizes da legislação federal.
O Plano Diretor vigente, instituído pela Lei nº 7.972/08, contempla diversos aspectos
relacionados ao rio Paraíba e o uso de suas margens em seu trecho urbano. No Art. 138, inciso
V, define-se o trecho municipal do rio Paraíba do Sul e suas ilhas como áreas de Valorização
Turística e de Lazer, por apresentarem condições para consolidação e/ou exploração de
atividades turísticas, culturais e de lazer. Além disso, como é possível notar na Figura 58, as
margens do rio se apresentam como Áreas de Especial Interesse de Recuperação e
Valorização Paisagística, sendo entendidas como espaços que possam contribuir para a
formação de ambiências urbanas que, requalificados paisagística e ambientalmente, sirvam à
fruição e ao lazer da população, tendo como finalidade a recuperação dos recursos naturais
adjacentes às unidades de conservação e a recuperação e valorização de áreas com
reconhecida qualidade ambiental e paisagística para utilização como espaços de lazer.

Figura 58 - Mapa de áreas de especial interesse do Plano Diretor

Fonte: Campos dos Goytacazes, 2008.

Já em relação aos parâmetros da Lei de Uso e Ocupação do Solo, Lei nº 7.974/08, o


Art. 7º declara como “Non Aedificandi” toda a faixa de terra na zona urbana da cidade de
Campos dos Goytacazes, compreendida entre a faixa de rolamento e o dique às margens do
65

rio Paraíba do Sul, assim como uma faixa de 30,00m (trinta metros) na orla de todas as lagoas
existentes no município, sendo apenas permitida a execução, pelo poder público, de obras
consideradas de utilidade pública ou de interesse social, excluídas quaisquer obras de
edificação.
De acordo com os usos permitidos nas áreas destinadas a edificações, expostos na
Figura 59, são abrangidas nessa área a Zona Centro Histórico, Zonas de Comércio Principal e
Zonas Residenciais em ambos os lados do rio, e áreas destinadas ao Setor Especial
Recreativo, às margens do rio, principal foco de intervenção deste trabalho para projetos de
utilidade pública.

Figura 59 - Mapa de uso e ocupação da Lei de Uso e Ocupação do Solo

Fonte: Campos dos Goytacazes, 2008.

Vale ainda ressaltar, como informações complementares relativas às atividades


incentivadas pelo poder municipal, que no Art. 40, inciso IV, descreve-se o incentivo à prática
do remo e da vela na lagoa de Cima, na lagoa Feia, na lagoa do Vigário e no rio Paraíba do
Sul, sendo essa considerada uma das medidas prioritárias de gerenciamento para o esporte e
lazer no município. Além disso, como medidas de gerenciamento para valorizar o patrimônio
natural e cultural, o Art. 89 aponta o aproveitamento dos principais corpos d’água do
município, como o rio Paraíba do Sul, a Lagoa de Cima, a Lagoa Feia, entre outros, como
eixos cultural, ambiental e econômico, com o incentivo à implantação de atividades turísticas
e de lazer, tais como restaurantes flutuantes, passeios de barco, prática de remo e canoagem.
66

Diante desses aspectos, fica claro que a ausência de equipamentos de lazer e de


atrativos nas orlas do rio contrariam potencialidades já previstas em leis. A utilização das
orlas do rio Paraíba do Sul como espaços de lazer e convivência, dotados de infraestrutura
convidativa ao uso, atentaria a população para a importância do curso d’água, estreitaria essa
relação e, consequentemente, contribuiria para sua preservação.
67

5 PROPOSTA PROJETUAL

A partir desse momento, feitas as análises relativas ao trecho de intervenção para


conhecimento de suas características, são apresentados todos os aspectos que estiveram
envolvidos na elaboração do projeto, objeto principal deste trabalho.
Estão descritos e demonstrados desde os primeiros estudos projetuais, passando pelo
processo de tomada de decisões e, por fim, o resultado final. Tudo isso através de croquis,
mapas esquemáticos, plantas e imagens ilustrativas.

5.1 Conceito e partido

A definição de um conceito e um partido é um fator determinante no processo de


projeto, pois irá conduzir as decisões, baseado em uma ideia norteadora, que deverá de
alguma forma ser identificada ao longo de toda intervenção, sendo esta responsável pela
identidade do projeto.
Sendo assim, no conceito está a retomada do rio Paraíba como símbolo da paisagem
urbana e cultural da cidade de Campos dos Goytacazes, buscando reafirmar sua visibilidade e
renovar a sua relação com a vida urbana.
Isso partindo do princípio de criar, e até mesmo recriar, espaços públicos e
equipamentos urbanos que proporcionem essas ações de atender a novas demandas, recuperar
atividades que se perderam ao longo do tempo, e reorganizar as situações hoje desfavoráveis
para que exista de fato uma valorização da paisagem e um incentivo ao sentimento de
identidade por parte da população em relação ao rio, por meio do estreitamento do contato
com suas margens e águas.
68

5.2 Programa de necessidades

Com intuito de que a elaboração e a tomada de decisões sobre o projeto não ficassem
restritas apenas às percepções da autora, visto que a intenção é proporcionar um espaço que
atenda democraticamente a todos que demandam de área livre pública de qualidade,
satisfazendo suas reais necessidades e incentivando as sensações de pertencimento e de
identidade local, o programa de necessidades foi elaborado a partir dos resultados obtidos nas
entrevistas e questionários aplicados e já mencionados neste trabalho.
Essa foi a forma encontrada de incluir a população no processo de desenvolvimento
do projeto, garantindo que sejam propostos usos e equipamentos coerentes com a demanda da
cidade. Sendo assim, no período de aplicação dos instrumentos de pesquisa, desde moradores,
comerciantes, trabalhadores, idosos, e até mesmo jovens e crianças, puderam opinar sobre as
condições atuais das orlas e do rio Paraíba do Sul, bem como refletir sobre sua relação com
esse espaço e possíveis mudanças que contribuíram para melhorias.
As visitas técnicas feitas às orlas e as análises elaboradas na etapa de diagnóstico da
área também colaboraram para construção deste programa a partir do momento que
demonstraram apropriações irregulares, usos inadequados, vazios urbanos, marcos e pontos
nodais.
Dessa maneira, o programa de necessidades, irá reunir os seguintes usos e atividades
apresentados no quadro a seguir:
69
70

5.3 Descrição da proposta

Primeiramente, é importante destacar que o projeto se apresentará em duas partes. A


primeira, consiste em um Plano geral de intervenções, que em escala macro busca contemplar
toda a extensão do trecho, e no padrão de um estudo preliminar, demonstrar a integração de
ideias e demandas de todo projeto.
Depois, em uma segunda etapa, foram escolhidas e justificadas duas áreas de interesse
para que fossem elaboradas intervenções pontuais a serem detalhadas a nível de anteprojeto.
A fim de esclarecer os padrões de projetos que serão apresentados nos tópicos a
seguir, torna-se importante frisar as definições dessas etapas de um projeto de arquitetura. O
CAU/BR (2011, p. 18), entende como estudo preliminar a “etapa destinada à concepção e à
representação do conjunto de informações técnicas iniciais e aproximadas, necessários à
compreensão da configuração do projeto, podendo incluir soluções alternativas”. Já como
anteprojeto:

Etapa destinada à concepção e à representação das informações técnicas


provisórias de detalhamento da edificação e de seus elementos, instalações e
componentes, necessárias ao inter-relacionamento das atividades técnicas de
projeto e suficientes à elaboração de estimativas aproximadas de custos e de
prazos dos serviços de obra implicados. Esta etapa inclui a elaboração dos
Documentos Para Aprovação (ou “Projeto Legal”), destinada à representação
das informações técnicas necessárias à análise e aprovação, pelas
autoridades competentes, da concepção da edificação e de seus elementos e
instalações, com base nas exigências legais (municipal, estadual, federal), e à
obtenção do alvará ou das licenças e demais documentos indispensáveis para
as atividades de construção (CAU/BR, 2011, p. 18).

Com base no diagnóstico e caracterização da área, etapa exposta no Capítulo 4, foram


definidas que as áreas do Cais da Lapa (englobando a Fábrica de Tecidos, a Praça Duque de
Caxias, o CIEP Nilo Peçanha e a Igreja N. S. da Lapa) e área da descida da ponte João
Barcelos Martins (abrangendo a Peixaria Municipal, a Praça São Cristóvão, a comunidade
Madureira e a Vila Olímpica) situada na margem de Guarus, serão as contempladas com a
71

elaboração do anteprojeto, pois foram julgadas como de maior relevância no trecho e


abrangem juntas as duas margens do rio.
A área do Cais da Lapa consistirá na “Intervenção pontual 1”. Além de possuir grande
importância histórica, quando engloba a área da Fábrica de Tecidos, a Praça Duque de Caxias
e a Igreja N. S. da Lapa, tem sua potencialidade elevada visto que incluem marcos do trecho,
como a torre da fábrica e o próprio Cais, que atualmente não se encontra destinado a um uso
em acordo com o determinado pela legislação municipal.
A área escolhida na margem oposta, será por sua vez será chamada de “Intervenção
pontual 2”. Ela foi definida identificada como um ponto de grande potencial de paisagem,
vista privilegiada do Centro Histórico, e um ponto nodal pela descida da ponte de pedestres
João Barcelos Martins.
Ambas se encontram demarcadas na Figura 60 abaixo:

Figura 60 - Delimitação das áreas de intervenção pontual

Fonte: Autoria própria, 2015.

5.3.1 Plano geral de intervenções

O Plano geral de intervenções, consiste em um mapa síntese indicativo do


replanejamento urbano da área como um todo, apontando possíveis estratégias e soluções para
as demandas e encontradas ao longo de todo trecho (Figura 61).
72

Figura 61 - Plano geral de intervenções

Fonte: Autoria própria, 2015.


73

Esse plano busca também a padronização de pavimentações, equipamentos,


mobiliários e arborização de toda a orla, em ambas as margens, o que proporcionará a ideia de
identidade ao trecho. Portanto, a seguir serão demonstradas as tipologias padrões para
pavimentações (decks e pisos permeáveis), mobiliários (bancos em geral, lixeiras, postes de
iluminação, ponto de ônibus e bicicletário) e arborização.
Para a pavimentação dos passeios e ciclofaixa, propõe-se a utilização de placas
drenantes de concreto Rhino Pisos (Figura 62), utilizando-se as cores natural – cinza claro,
grafite – cinza escuro e vermelho – terracota, respectivamente. Os pisos drenantes são feitos
de concreto poroso, permitindo o escoamento das águas da chuva e ajudando o combate às
enchentes e inundações. Além disso, de acordo com o fabricante, tem superfície atérmica,
antiderrapante, acessível e resistente a tráfego leve de veículos (Figura 63).

Figura 62 - Piso drenante

Fonte: Rhino Pisos, [200-].

Figura 63 - Superfície do piso drenante instalado

Fonte: Rhino Pisos, [200-].


74

Para os decks, é indicado o uso de réguas maciças de madeira ipê (Figura 64), secas
em estufa, para melhor resistir às variações climáticas, tratadas e estruturadas com vigamento
de mesmo padrão.
Figura 64 - Deck de madeira ipê

Fonte: Pau-pau Pisos de Madeira, [200-].

Em relação aos mobiliários necessários ao longo de todo trecho de estudo, foram


escolhidos os seguintes como padrão: banco Leman Benido Urban (Figura 65) com pés de
fundição dúctil e resistência à corrosão, fixados ao piso e tábuas de madeira tropical tratadas
com protetor fungicida e inseticida; lixeira circular em aço inoxidável (Figura 66) podendo ser
fixada ao cimento ou solo; postes Slot Vela Simes (Figuras 67 e 68) com iluminação
em iodetos metálicos, 1 ou 2 pétalas e 5 ou 10 metros de altura; abrigo de ônibus curvo
(Figura 69) estruturado em réguas de madeira ipê tratadas e vidro temperado 8 milímetros e,
por fim; bicicletário Mude (Figura 70) em aço inox e vidro temperado 8 milímetros, com
capacidade para até nove bicicletas, fixado ao piso.

Figura 65 - Banco Leman Benido Urban Figura 66 – Lixeira circular

Fonte: Benito Urban, 2012. Fonte: Benito Urban, 2012.


75

Figura 67 - Poste de 1 pétala

Fonte: Archiproducts, [200-].

Figura 68 – Poste de 2 pétalas

Fonte: Archiproducts, [200-].

Figura 69 - Abrigo de ônibus

Fonte: Estúdio Leonardo Noguez Arquitectos, 2014.

Figura 70 - Bicicletário Mude

Fonte: Mude, 2012.


76

Visando propor uma unidade também no que diz respeito à arborização do trecho,
propõe-se ao longo dele o Ipê-amarelo (Tabebuia chrysotricha) já característico da cidade de
Campos, com média de 6 à 8 metros de altura; e a palmeira Jerivá (Syagrus romanzoffiana)
que atinge de 6 à 9 metros de altura (Figuras 71 e 72).

Figura 71 - Ipê-amarelo Figura 72 - Palmeira Jerivá

Fonte: Jardineiro, [200-]. Fonte: Jardineiro, [200-].

Há ainda edificações padrões projetadas para os equipamentos urbanos que serão


introduzidos ao longo trecho: sanitário público (Figura 73), posto policial (Figura 74) e
quiosque (Figura 75).

Figura 73 - Sanitário público

Fonte: Autoria própria, 2015.


77

Figura 74 - Posto policial

Fonte: Autoria própria, 2015.

Figura 75 - Quiosque

Fonte: Autoria própria, 2015

Mesmo exercendo funções distintas, esses prédios possuem elementos estéticos em


comum que os relacionam entre si e com o trecho, como a utilização de linhas limpas,
superfícies com textura de madeira e platibanda com telhado verde. A intenção é transmitir a
ideia de identidade e integração à área.
Os sanitários públicos dividem-se em feminino e masculino, contando com quatro
lavatórios e quatro cabines sanitárias cada, sendo uma delas em tamanho adequado para
atender pessoas em cadeira de rodas. O posto policial conta com uma área de atendimento e
vigia para dois policiais, acrescida de um lavabo. Já o quiosque conta com uma cozinha e área
de atendimento, além área coberta para os clientes. Sempre que não estiver em
funcionamento, será possível guardar os mobiliários (mesas e cadeiras) na área fechada. Vale
destacar que esses equipamentos contarão com as mini-ETEs, citadas nos referenciais deste
78

trabalho, como solução de tratamento de esgoto, e ainda que, tanto o posto policial quanto o
quiosque terão fornecimento de água através bombeamento de água de cisternas, já os
sanitários, por meio de reservatório superior ao prédio.

5.3.2 Intervenção pontual 1

Como já mencionado neste capítulo, a área de intervenção pontual 1 (Figura 76) se


trata principalmente da proposta de um Novo Cais e seu entorno imediato.

Figura 76 - Delimitação da intervenção pontual 1

Fonte: Autoria própria, 2015.

O principal referencial projetual utilizado para esta área foi o projeto de recuperação
das margens do rio Rhône, na França, apresentado no capítulo 3 deste trabalho. Baseou-se na
proposta de cotas distintas, considerando trechos alagáveis em determinados períodos do ano
e trechos secos, nos espaços de contemplação com grandes arquibancadas e na recuperação de
trechos de mata ciliar, mesmo que não obrigatórias pela lei nesse trecho urbano, mas ciente de
sua importância para o meio ambiente e para a paisagem.
79

No quadro abaixo, estão listados os usos e atividades do programa de necessidades


desse espaço:

Já no mapa a seguir (Figura 77), essas atividades encontram-se distribuídas na área em


questão:

Figura 77 - Estudo de manchas da área de intervenção pontual 1

Fonte: Autoria própria, 2015.


80

A área de apoio ao Corpo de Bombeiros e às regatas estão estrategicamente


posicionadas em frente ao prédio onde funciona o grupamento e um dos clubes de regatas. As
arquibancadas contemplativas se posicionam no ponto onde é possível se tirar maior proveito
da vista, para contemplação ou mesmo assistir campeonatos de remo, natação, etc. As áreas
de gramado, servirão para descanso, contemplação e piqueniques. O espaço multiuso poderá
receber eventos culturais, feiras, atividades físicas ao ar livre e diversas outras, funcionando
como uma grande praça. Há também áreas para prática da pesca, uma praça na frente do CIEP
Nilo Peçanha como uma extensão da escola, visto que os alunos têm o costume de utilizarem
a orla, e uma praça em referência ao Ururau da Lapa¹ no local onde teria surgido a lenda.
Ocupou-se alguns vazios urbanos existentes na área com novos equipamentos como o
Novo Terminal Rodoviário, o Centro Cultural e de Apoio Turístico, o Edifício Garagem e o
Centro de Educação Ambiental. Ao longo do trecho serão posicionados alguns pontos de
ônibus, atendidos pelos ônibus terminal que possui em localização estratégica, com acesso à
duas ruas, o que facilita a lógica de movimentação dos veículos. O Centro Cultural e de Apoio
Turístico oferecerá atividades culturais e administrará os passeios de barco que ficarão
atracados na orla logo à frente. O Edifício Garagem vem em função do remanejamento do
estacionamento que existe hoje no Cais, além disso, se encontra em uma distância estratégica
do edifício garagem existente na Praça São Salvador. O Centro de Educação Ambiental se
localiza próximo à Igreja da Lapa, onde hoje funciona um Instituto Profissional, podendo
haver interação de atividades, bem como também com os estudantes do CIEP Nilo Peçanha.
Além disso, vale lembrar que nas áreas onde estão sendo inseridos bares e sanitários,
se considera a instalação das mini-ETEs. E por fim, destaca-se que há duas cotas distintas na
área, representadas pelos círculos brancos e azuis. Nos brancos estão os espaços localizados
em um trecho elevado em relação ao rio, nível da via existente. Já nos azuis, as áreas com
maior risco de alagamento em épocas de cheia. Elas estão em um nível inferior em relação ao
restante, 50 centímetros acima do atual nível do cais da Lapa, como é o caso do anfiteatro, da
arquibancada, das áreas de gramado e abrigo dos barcos (área sob o piso do nível elevado).
Definido o programa demandado e o distribuído na área escolhida, inicia-se o desenho
do projeto determinando seu traçado. Mas antes de uma planta técnica, ainda foram
necessários mais estudos que guiassem as decisões projetuais, como mostra o croqui a seguir
(Figura 78):

¹ Circula na cidade a lenda de que um Ururau, jacaré de papo amarelo, vivia em frente à Igreja da Lapa espantando
canoeiros e pescadores. Conta-se que o animal ainda habita o local, escondido em um sino naufragado que seria levado para a
igreja vindo de Portugal. Ainda segundo a lenda, o jacaré seria um jovem travestido no bicho, jogado no rio a mando do pai
descontente com o romance entre sua filha e o jovem.
81

Figura 78 - Croqui da área de intervenção pontual 1

Fonte: Autoria própria, 2015.


82

As plantas-baixas seguintes demonstrarão o resultado final desses estudos de


intervenções propostos no trecho. Para melhor compreensão e visualização, ele foi dividido
em três partes. O traçado proposto reúne formas mais geométricas deixando a sinuosidade a
cargo das margens do próprio rio e tirando proveito delas pelos diferentes ângulos de
paisagens que proporcionam. Dessa forma, linhas retas e curvas existem harmonicamente no
trecho, deixando de lado a monotonia e o tornando sempre dinâmico.
O telhado verde nos equipamentos permite uma unidade estética mais harmônica com
os elementos naturais existentes quando vistos no trecho como um todo. Além disso, é uma
superfície permeável, auxiliando na drenagem da área e compensando o espaço
impermeabilizaria caso tivesse uma cobertura tradicional.
As dimensões das vias, calçadas e ciclofaixas variam ao longo de todo trecho. Apesar
de buscar sempre seguir as referências para via arterial da lei municipal 7.975/2008, que trata
do Parcelamento do Solo, em algumas partes o trecho se limita por um dique de importância
histórica. Ainda assim, foi possível manter mínimos previstos nessa mesma lei sem que se
prejudique a circulação. Dessa forma, as vias de trânsito variam de 9,00 metros (com 3 faixas
de circulação) à 3,50 metros com uma única faixa; as calçadas de 6,00 à 1,20 metros e as
ciclofaixas de 2,70 à 2,40 metros.
87

Alguns mobiliários são referenciados em especial para os espaços desse trecho, além
dos padrões já anteriormente apresentados. São eles: o banco linear de madeira com
iluminação (Figura 79) nas áreas livres em geral como na Praça Duque de Caxias; bancos com
formatos mais lúdicos, como se fossem poltronas de descanso para as áreas de gramado livre
(Figura 80) e bancos integrados à esculturas, também em formas lúdicas, para a praça Nilo
Peçanha, onde predominarão jovens estudantes (Figura 81). Eles também buscam quebrar a
monotonia e contribuir para a identidade dos espaços.

Figura 79 - Banco linear iluminado Figura 80 - Banco poltrona

Fonte: Fazmetr, 2015. Fonte: Architonic, 2014.

Figura 81 - Banco escultura

Fonte: Turenscape, 2013.

Para ideia total do trecho como um todo, é apresentada a seguir uma perspectiva geral
(Figura 82). Mas, para complementar, imagens ilustrativas da proposta final para o trecho
junto a imagens do mesmo atualmente, esclarecem melhor o projeto a nível de comparação
com a realidade, sendo demonstrado nas Figuras 83, 84 e 85 abaixo, na ordem: antes versus
depois.
88

Figura 82 - Perspectiva geral da área de intervenção pontual 1

Fonte: Autoria própria, 2015.

Figura 83 - Antes e depois 1

Fonte: Autoria própria, 2015.


89

Figura 84 - Antes e depois 2

Fonte: Autoria própria, 2015.

Figura 85 - Antes e depois 3

Fonte: Autoria própria, 2015.


90

5.3.3. Intervenção pontual 2

A área de intervenção pontual 2 (Figura 86) trata da oferta de um espaço livre público
aproveitando-se da proposta de remanejamento da população removida das áreas de
apropriação irregular para conformação do Loteamento Madureira, onde já existe uma
comunidade também irregular. Vale destacar, que o Plano Diretor vigente já define está área
como Área de Especial Interesse Social 1, destinada a loteamentos de interesse social.

Figura 86 - Delimitação da intervenção pontual 2

Fonte: Autoria própria, 2015.

O principal referencial projetual utilizado para esta área foi o projeto da orla
Taumanan em Boa Vista, apresentado no capítulo 3 deste trabalho. Tira-se proveito da ideia
de plataforma elevada em prol de espaços de variados, que atendam a demanda do bairro, e
valorização da paisagem.
No quadro a seguir, estão listados os usos e atividades do programa de necessidades
desse espaço:
91

Já no mapa a seguir (Figura 87), essas atividades encontram-se distribuídas na área em


questão:

Figura 87 - Estudo de manchas da área de intervenção pontual 2

Fonte: Autoria própria, 2015.

A praça São Cristóvão e a Vila Olímpica, serão mantidas, visto que estão em bom
estado. A Peixaria Municipal ganhará nova estrutura e tanto os clientes quanto os
trabalhadores poderão praticar a pesca no Deck do Pescador. Na área do loteamento
92

Madureira, foram desapropriadas construções irregulares assentadas de maneira inadequada e


sem afastamento devido a existência de uma comunidade carente na área. No entanto, está
prevista a realocação desses moradores nesse mesmo quarteirão, propondo que área receba
uma nova configuração e inclua também as desapropriações feitas ao longo do trecho devido
a construção do Novo Terminal e a recuperação da mata ciliar.
A fim de oferecer uma estrutura às pessoas inseridas no novo loteamento, propõe-se
um espaço público nesse trecho da orla, adequado aos usos do bairro com atividades como
parque infantil, associação de moradores, quiosques, píer contemplativo, aproveitando a vista
privilegiada da margem direita, e equipamentos de apoio (sanitários e posto policial). Por fim,
mais uma vez vale destacar que onde forem inseridos quiosques e sanitários, também serão
inseridas mini-ETEs.
Como feito para a Intervenção Pontual 1, segue abaixo um croqui referente aos
estudos elaborados para esse trecho (Figura 88). Dessa vez é possível perceber que não há
distinção de cotas, pois a proposta é diferenciada, se tratando de uma grande plataforma
elevada sobre a margem do rio, onde se concentram as atividades demandadas. O traçado, no
entanto, segue a mesma linha de raciocínio do primeiro trecho, com fortes referências
geométricas.
93

Figura 88 - Croqui da área de intervenção pontual 2

Fonte: Autoria própria, 2015

A planta-baixa apresentada na página a seguir demonstra o resultado final dos estudos


de intervenções propostos no trecho:
95

Com a sugestão de revitalização da peixaria municipal, que se trata basicamente de


uma área coberta para abrigar feira de peixes em determinados dias da semana, propõe-se
então uma nova cobertura, mais integrada esteticamente aos demais equipamentos das orlas,
seguindo o padrão de linhas limpas e utilização de superfícies com textura de madeira (Figura
89).

Figura 89 – Peixaria municipal

Fonte: Autoria própria, 2015.

Na parte 2, há um espaço destinado à uma associação de moradores para o novo


Loteamento Madureira (Figura 90). O projeto do espaço contará com uma recepção/lobby,
banheiro, sala de guardados e duas salas multiuso para atividades cotidianas da associação.

Figura 90 - Associação de moradores

Fonte: Autoria própria, 2015.

Em relação aos mobiliários que contribuem com a dinâmica e identidade dessa área,
são referenciados os mobiliários que se sobressaem dos decks de madeira, como o exemplo do
Kic Park, na China (Figura 91).
96

Figura 91 - Mobiliários do Kic Park

Fonte: Architizer, 2009.

Para ideia total do trecho como um todo, é apresentada a seguir uma perspectiva geral
(Figura 92). Mas por fim, imagens ilustrativas da proposta final para o trecho junto a imagens
do mesmo atualmente, esclarecem melhor o projeto a nível de comparação com a realidade,
sendo demonstrado nas Figuras 93 e 94 abaixo, na ordem: antes versus depois.

Figura 92 – Perspectiva geral da área de Intervenção Pontual 2

Fonte: Autoria própria, 2015.


97

Figura 93 - Antes e depois 4

Fonte: Autoria própria, 2015.

Figura 94 - Antes e depois 5

Fonte: Autoria própria, 2015.


98

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Esse trabalho evidenciou a importância dos rios urbanos para as cidades que se
desenvolveram ao longo deles, e inclusive o modo como costumam ser afetados em relação ao
crescimento urbano. Seja com poluição, degradação e esquecimento, como também com
exemplos de preservação, valorização e espaço de uso coletivo quando há reconhecimento da
sua relevância no ambiente em que se insere.
A utilização das margens do rio Paraíba do Sul, em Campos, como espaços de lazer e
convivência, consolidando orlas dotadas de infraestrutura convidativa ao uso, seria não só
uma forma de estreitar sua relação com a população como também de promover sua
preservação. No entanto, embora projetos que visem esse resultado sejam indicados pelas leis
municipais já citadas e analisadas nesse estudo, as orlas se encontram monótonas, degradadas
e ocupadas irregularmente.
Por essa razão, o projeto apresentado demonstra a possibilidade de reverter a situação
atual. Além de estimular a conscientização do uso das águas e das margens do rio Paraíba do
Sul na cidade, ainda contribui para que ele retorne a ser um marco da paisagem urbana e
cultural, como um espaço que convida a população a vivenciá-lo oferecendo diferentes
atividades e paisagens. Os usuários passam a ser motivados a sentirem o espaço como seu
para que o desfrutem e o respeitem.
Acredita-se que os objetivos propostos foram alcançados com esse projeto,
principalmente no que diz respeito de estreitar o relacionamento com a população, visto que
os espaços foram pensados de acordo com a demanda de cada trecho; e de mobilidade, através
da melhoria de acesso às orlas, não só possível por carros, mas que inclui também o pedestre e
o ciclista, da promoção da bicicleta com o circuito de interligação das orlas, e por fim, da
reestruturação do terminal de ônibus existente.
A metodologia, cuidadosamente pensada, também se fez importante, pois possibilitou
uma grande revisão teórica do tema, já que existem muitos autores relevantes, estudos e
projetos relacionados. Além da aplicação das entrevistas e questionários, que puderam incluir
a população nas decisões acerca do projeto.
As entrevistas, no entanto, se mostraram como uma primeira barreira a ser superada. A
suposta indiferença da população em relação ao rio foi comprovada, quando questionadas
nem mesmo conseguiam imaginar melhorias para as orlas. Além disso, o tamanho do trecho
99

urbano que margeia o rio, também foi um desafio, pois compreende um conjunto de áreas
distintas mesmo em uma única cidade. Cada bairro, ou trecho, possui suas demandas e
particularidades, que deviam, e foram consideradas na proposta.
Mesmo assim, o tamanho real deste projeto, não coube no tempo e no nível de um
trabalho final de graduação, ainda que caiba na motivação e vontade da autora. Embora confie
na força da proposta aqui apresentada, é preciso ter consciência que ela é parte de um todo
maior que deve continuar sendo acatado. Faz-se necessário se atentar ainda, por exemplo, a
recuperação e manutenção das águas, bem como da mata ciliar nas áreas rurais, onde também
existem ocupações irregulares, despejo de resíduos e esgoto.
Vale destacar também, que na cidade de Campos dos Goytacazes existem outros
cursos d’água relevantes, como o Canal Campos-Macaé, que merecem não só ter suas águas
devidamente recuperadas, como também ter sua história preservada e valorizada.
100

REFERÊNCIAS

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104

ANEXOS
105

ANEXO I: Mapa detalhado da bacia hidrográfica do rio Paraíba do Sul


106
107

APÊNDICES
108

APÊNDICE A: Roteiro de observação


109
110

APÊNDICE B: Modelo de entrevista


111
112

APÊNDICE C: Modelo de questionário


113
114
115
116

APÊNDICE D: Imagens do projeto


117

Intervenção Pontual 1

Anfiteatro

Espaço Multiuso e Deck do Pescador

Cais das Pranchas, Área de quiosques e Arquibancada


118

Cais das pranchas, Área de Quiosques e Praça Nilo Peçanha

Intervenção Pontual 2

Perspectiva Geral

Ponte Barcelos Martins, Peixaria Municipal e Deck do Pescador


119

Avenida Francisco Lamego

Praça Madureira e Píer Contemplativo

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