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Comunicação e

LINGUAGEM
Ângela Kroetz dos Santos
Gilberto Fonseca
COMUNICAÇÃO E
LINGUAGEM
 ngel a K roet z dos S antos
G ilberto F onseca

1ª E dição
J a neiro | 2020
Gestão Universidade
Reitor Prof. Dr. Paulo Fossatti - Fsc
Vice-Reitor, Pró-Reitor de Pós-grad., Prof. Dr. Cledes Casagrande - Fsc
Pesq. e Extensão e Pró-Reitor de Graduação
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Diretora de Pesquisa e Pós-Graduação Stricto Sensu Profª. Dr.ª Patricia Kayser Vargas Mangan
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Diretor de Marketing e Relacionamento Cleiton Bierhals Decker
Procuradora Jurídica Michele Wesp Cardoso
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Gestão EaD
Coordenadora Pedagógica Profa. Me. Michele de Matos Kreme
Coordenador de Produção Prof. Dr. Jonas Rodrigues Saraiva

Equipe de Produção EaD


Anderson Cordova Nunes Érika Konrath Toldo Ingrid Rais da Silva Patrícia Menna Barreto
Arthur Menezes de Jesus Fabio Adriano Teixeira dos Santos João Henrique Mattos dos Santos Sidnei Menezes Martins
Bruno Giordani Faccio Gabriel Esteves de Castro Jorge Fabiano Mendez Tiago Konrath Araujo
Daniele Balbinot Guilherme P. Rovadoschi Nathália N. dos Santos

S237c Santos, Ângela Kroetz dos.


Comunicação e linguagem / Ângela Kroetz dos Santos, Gilberto Fonseca. –
Canoas, RS : Universidade La Salle EAD, 2019.
126 p. : il. ; 30 cm. – (Educação e cultura)

ISBN 978857257014-5

1. Linguística. 2. Linguagem. 3. Comunicação. I. Título. II. Série.

CDU: 81’42

Bibliotecário responsável: Michele Padilha Dall Agnol de Oliveira - CRB 10/22350

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CEP: 92010-000 | 0800 541 8500 | eadproducao@unilasalle.edu.br
APRESENTAÇÃO
Prezado estudante,

A equipe de gestão da EaD LaSalle sente-se honrada em entregar a


você este material didático. Ele foi produzido com muito cuidado para
que cada Unidade de estudos possa contribuir com seu aprendizado da
maneira mais adequada possível à modalidade que você escolheu para
estudar: a modalidade a distância. Temos certeza de que o conteúdo
apresentado será uma excelente base para o seu conhecimento e para
sua formação. Por isso, indicamos que, conforme as orientações de seus
professores e tutores, você reserve tempo semanalmente para realizar
a leitura detalhada dos textos deste livro, buscando sempre realizar as
atividades com esmero a fim de alcançar o melhor resultado possível
em seus estudos. Destacamos também a importância de questionar,
de participar de todas as atividades propostas no ambiente virtual
e de buscar, para além de todo o conteúdo aqui disponibilizado, o
conhecimento relacionado a esta disciplina que está disponível por
meio de outras bibliografias e por meio da navegação online.

Desejamos a você um excelente módulo e um produtivo ano letivo.


Bons estudos!

Gestão de EaD LaSalle


Comunicação
e Linguagem
APRESENTANDO OS AUTORES

Ângela Kroetz dos Santos

É licenciada em Letras pela UNISINOS (2003), especialista em Assessoria


Linguística e Comunicação - Ênfase em Produção e Revisão Textual pela
Uniritter (2013) e mestre em Letras pela Uniritter (2016). Atualmente
trabalha como tutora da área de Letras na Unilasalle, em Canoas, e como
revisora de textos técnicos e acadêmicos

Gilberto Fonseca

É licenciado em Letras pela UFPel (2003) e possui mestrado em Artes


Cênicas pela UFRGS (2010) e em Letras pela Uniritter (2016). É diretor de
teatro, com mais de 20 espetáculos profissionais em seu currículo, e escritor
(Contos de amor & morte, 2017, e A casa no fim da rua, 2018). Atualmente
trabalha como professor de Língua Portuguesa no Instituto Rio Branco,
em São Leopoldo, como tutor de Letras na Unilasalle, em Canoas, e como
professor de escrita criativa na Editora Metamorfose, em Porto Alegre.
APRESENTANDO A DISCIPLINA

Prezado aluno,

Nesta disciplina vamos trabalhar noções de comunicação e elementos que


constituem esse processo, para que você possa compreender a estrutura
da comunicação e seus componentes essenciais. Vamos refletir sobre a
leitura e a compreensão textual, elementos fundamentais para a formação
de pessoas críticas e engajadas com a realidade do mundo acadêmico
e profissional. Para que isso seja possível, é necessário construirmos
estratégias de interação que possibilitem a adequada articulação entre
autor-leitor-texto. Abordamos, ainda, tópicos sobre a escrita, com o objetivo
de elaborar frases, parágrafos e textos coesos e coerentes, que possibilitem
uma comunicação efetiva e crítica a partir do uso lógico e dinâmico da
língua. Por fim, contextualizamos alguns gêneros textuais acadêmicos,
orais e escritos, a fim de instrumentalizá-lo para organizar, articular,
redigir e apresentar ideias. A dinâmica de trabalho que propomos em todos
os capítulos deste livro é menos teórica e mais prática, a fim de que você
perceba como acontece, de fato, a interpretação e a elaboração de textos.

Bons estudos!
Sumário
UNIDADE 1
O Processo da Comunicação................................................................................................................. 9
Objetivo Geral ....................................................................................................................................... 9
Objetivos Específicos ........................................................................................................................... 9
Questões Contextuais............................................................................................................................ 9
1.1 Introdução........................................................................................................................................10
1.2 Origem do Processo Comunicativo..................................................................................................12
1.3 Os Elementos da Comunicação.......................................................................................................16
1.4 Ruído na Comunicação....................................................................................................................18
1.5 As Funções da Linguagem...............................................................................................................20
1.6 A Noção de Interlocutor...................................................................................................................22
1.7 Adequação da Linguagem à Situação Comunicativa.....................................................................24
1.8 Comunicação e Gêneros Textuais....................................................................................................26
1.8.1 Gênero, Tipo e Domínio Textuais....................................................................................................... 26
Síntese da Unidade.............................................................................................................................. 32
Referências.......................................................................................................................................... 33

UNIDADE 2
Da Leitura à Compreensão Textual..................................................................................................... 35
Objetivo Geral ..................................................................................................................................... 35
Objetivos Específicos ......................................................................................................................... 35
Questões Contextuais.......................................................................................................................... 35
2.1 Introdução........................................................................................................................................36
2.2 Leitura e suas Interfaces.................................................................................................................38
2.3 Leitura e Compreensão: o Papel do Leitor......................................................................................40
2.3.1 Estratégias de Leitura: Existe umaFórmula Eficaz?........................................................................... 41
2.3.2 Estratégias de Leitura: Aplicação...................................................................................................... 44
2.4 Esquemas de Leitura........................................................................................................................51
2.5 Interpretação e Intertextualidades..................................................................................................53
2.6 Interpretação de Textos Não Verbais...............................................................................................58
2.7 Interpretação de Questões Modelo ENADE......................................................................................61
2.7.1 Questão Modelo ENADE 1................................................................................................................. 61
2.7.2 Questão Modelo ENADE 2:................................................................................................................ 63
Síntese da Unidade.............................................................................................................................. 65
Referências.......................................................................................................................................... 66
UNIDADE 3
A Articulação da Escrita...................................................................................................................... 69
Objetivo Geral ..................................................................................................................................... 69
Objetivos Específicos ......................................................................................................................... 69
Questões Contextuais.......................................................................................................................... 69
3.1 Introdução........................................................................................................................................70
3.2 A Escrita na Contemporaneidade....................................................................................................72
3.3 Estruturas Básicas da Escrita: Frase e Parágrafo...........................................................................73
3.4 Texto e Fatores de Textualidade......................................................................................................78
3.4.1 A Coesão.......................................................................................................................................... 80
3.4.2 A Coerência...................................................................................................................................... 85
3.5 Estrutura do Texto Argumentativo...................................................................................................87
3.6 A Construção do Texto Argumentativo: Passo a Passo..................................................................89
Síntese da Unidade.............................................................................................................................. 93
Referências.......................................................................................................................................... 94

UNIDADE 4
O Texto em Ação.................................................................................................................................. 97
Objetivo Geral ..................................................................................................................................... 97
Objetivos Específicos ......................................................................................................................... 97
Questões Contextuais.......................................................................................................................... 97
4.1 Introdução........................................................................................................................................98
4.2 Gêneros Acadêmicos........................................................................................................................99
4.2.1 Resenha........................................................................................................................................... 99
4.2.2 Resumo.......................................................................................................................................... 101
4.2.3 Ensaio............................................................................................................................................ 103
4.2.4 Mapa Mental.................................................................................................................................. 105
4.2.5 Seminário e Apresentação de Trabalho........................................................................................... 108
4.3 Dúvidas Gramaticais Recorrentes.................................................................................................117
Síntese da Unidade............................................................................................................................ 120
Referências........................................................................................................................................ 121
unidade

1
O Processo da Comunicação
Prezado estudante,

Estamos começando uma unidade desta disciplina. Os textos que a compõem


foram organizados com cuidado e atenção, para que você tenha contato com
um conteúdo completo e atualizado tanto quanto possível. Leia com dedicação,
realize as atividades e tire suas dúvidas com os tutores. Dessa forma, você, com
certeza, alcançará os objetivos propostos para essa disciplina.

OBJETIVO GERAL
Estudar noções do processo comunicativo e seus elementos, as funções
da linguagem e os gêneros textuais, com o objetivo de compreender a
estrutura da comunicação e seus componentes essenciais.

OBJETIVOS ESPECÍFICOS
• Refletir sobre a origem da comunicação e sua importância;

• Compreender os elementos da comunicação e suas funções;

• Refletir sobre o papel do interlocutor e a adequação da linguagem à


situação comunicativa;

• Estudar os gêneros textuais e suas características.

QUESTÕES CONTEXTUAIS
1. Você já refletiu sobre o papel da comunicação na sua vida?

2. Como você supõe estar estruturado o processo comunicacional? Você


sabia que a linguagem desempenha funções de acordo com a situação em
que é empregada?

3. Você conhece os gêneros textuais?


10 COMUNICAÇÃO E LINGUAGEM | Ângela Kroetz dos Santos e Gilberto Fonseca

1.1 Introdução
Você já parou para pensar sobre a maneira como se comunica com as outras
pessoas? Esse processo, que parece intuitivo, não tem nada de aleatório e se
organiza por meio de elementos essenciais. Entender esses elementos e suas
funções contribuirá para que você se aproxime do universo da linguagem e se
expresse de forma mais efetiva.

Você se comunica desde sempre. Quando bebê, ao chorar, manifestava aos outros
as suas necessidades básicas. Suas primeiras palavras faladas e, posteriormente,
escritas fizeram parte de um processo evolutivo que o conduziu até aqui,
permitindo que, neste momento, você curse o ensino superior. A comunicação
está intimamente ligada ao seu processo de socialização e de crescimento
pessoal e profissional. Nesse sentido, é importante que você reflita de forma
crítica sobre como interage com a linguagem e sobre o papel dela na sua vida.

Este ebook, além de contribuir para o seu processo de formação, objetiva


problematizar aspectos da linguagem que extrapolam o ambiente acadêmico,
permitindo que você tenha uma relação mais ativa e efetiva com a língua.
Dessa forma, conhecer o que contribui e o que impede o sucesso do processo
comunicativo, bem como entender as múltiplas possibilidades da linguagem e
como esta se organiza por meio de gêneros textuais, fará com que você, enquanto
sujeito que tem sua identidade construída pela linguagem, seja protagonista do
seu aprendizado.

Pretende-se, muito mais do que ensinar uma disciplina, mostrar que a


comunicação, a leitura e a escrita, objetos que serão aqui abordados, extrapolam
os limites da educação formal (como encontros em universidades), uma vez que
servirão como base para a realização de qualquer uma das atividades que fazem
parte da sua formação. Esperamos conseguir! Boa leitura! Bons estudos!
O Processo da Comunicação | UNIDADE 1 11

Na Figura 1.1, está contemplada a sequência didática da Unidade 1.

Figura 1.1 – Sequência Didática.

Origem do
processo
comunicativo

Comunicação e Os Elementos
Gêneros Textuais da Comunicação

Adequação da Ruído na
Linguagem Comunicação

A Noção As Funções
de Interlocutor da Linguagem

Fonte: Elaborado pelos autores.


12 COMUNICAÇÃO E LINGUAGEM | Ângela Kroetz dos Santos e Gilberto Fonseca

1.2 Origem do Processo Comunicativo


Sem a comunicação não haveria a cultura humana. Todo o processo histórico
da comunicação confunde-se com o processo de evolução do ser humano.
Hoje, nos comunicarmos com outro semelhante por meio da fala ou da escrita
não passa de uma atividade cotidiana e quase automática. Mas é necessário
recuperarmos que, antes de juntarmos letras ou fonemas em algo que fizesse
algum sentido para nosso interlocutor, o gesto era o recurso mais utilizado.

O filósofo Rousseau supôs que a linguagem humana evoluiu gradualmente a


partir da necessidade do homem primitivo de expressar sentimentos. Para ele,
a primeira linguagem do homem foi o “grito da natureza”, usado pelos primeiros
seres humanos para implorar socorro em situações de perigo ou como alívio de
dores violentas.

É importante entender que a comunicação é uma necessidade inerente a


qualquer ser humano. No momento em que duas ou mais pessoas se encontram,
necessariamente a comunicação passa a ser vital para a convivência e manutenção
desse grupo social. Agora, quanto mais organizada for uma sociedade humana
mais complexos serão os seus sistemas de comunicação e sua compreensão.

Essa complexidade, muito provavelmente, teve origem há cerca de oito mil


anos, na pré-história, quando surgiram os primeiros indícios de escrita com
os desenhos das cavernas. O progresso da escrita está ligado à transformação
das sociedades, porque possibilitou o desenvolvimento das civilizações e
permitiu transmitir o conhecimento no espaço e no tempo. Quando o homem
passa de nômade e caçador a sedentário e agricultor, sente a necessidade
de medir a colheita e os animais e, para isso, usa representações gráficas.
Os sinais pictóricos (símbolos/desenhos) foram substituídos por conjuntos de
letras entre 1700 e 1500 a.C., com o alfabeto hebraico. Por volta de 400 a.C.
surgiu o alfabeto grego, do qual provém o alfabeto latino, que usamos hoje nas
línguas ocidentais.
O Processo da Comunicação | UNIDADE 1 13

Figura 1.2 – Pintura rupestre.

Fonte: Pixabay (2019).

Figura 1.3 – Alfabeto Fenício.

Z W E G L K A N M L K
zayin waw he gimel lamedh kaph aleph nun mem lamedh kaph

Y T H T SH R Q S P O/Pausa S
yodh teth heth taw shin resh qoph sadeh peh ayin samekh

Fonte: Adaptado por Universidade La Salle EaD.


14 COMUNICAÇÃO E LINGUAGEM | Ângela Kroetz dos Santos e Gilberto Fonseca

Figura 1.4 – Hieróglifos.

Fonte: Pixabay (2019).

O processo rudimentar de escrita transformou-se, ao longo do tempo, em


modernas formas que possibilitam a disseminação em massa do conhecimento
obtido pelo homem. Assim, pode-se dizer que a tecnologia trouxe novas percepções
sobre a comunicação, sendo que a sociedade passou de uma perspectiva oral
para uma dimensão de escrita. Basta verificar os hábitos sociais: antigamente,
predominavam as narrativas orais, e hoje prevalece o romance, que é escrito;
se antes as pessoas usavam telefone para se comunicar, hoje utilizam as redes
sociais/whatsapp; se antes o ensino era totalmente presencial, hoje uma parte
significativa ocorre em EaD, que depende, em grande parte, da comunicação
escrita; por fim, se antes as interações pessoais eram mais próximas, face a face,
hoje predominam as interações virtuais, possibilitadas pelos meios eletrônicos
de comunicação.
O Processo da Comunicação | UNIDADE 1 15

Figura 1.5 – A evolução da comunicação.

Fonte: http://gg.gg/cvlca.

VÍDEO

Ficou interessado em saber um pouco mais sobre


esse assunto? O vídeo no link mostra, de modo bem
objetivo, o desenvolvimento da escrita, partindo dos
desenhos rupestres até chegar à escrita de hoje. Acesse:
http://gg.gg/cvlcf.

As muitas interações possibilitadas pelas formas modernas de comunicação,


claro, passaram a ser objeto de pesquisa das mais diversas áreas. A seguir,
apresentamos os tópicos mais significativos que embasam esse estudo.
16 COMUNICAÇÃO E LINGUAGEM | Ângela Kroetz dos Santos e Gilberto Fonseca

1.3 Os Elementos da Comunicação


Uma das maneiras mais fáceis de entender o processo comunicativo é utilizando
“o modelo comunicativo de Jakobson”, proposto pelo linguista de origem russa
Roman Jakobson. Ele organizou, baseado no artigo “Uma teoria matemática da
comunicação”, de Claude Shannon, a comunicação humana em seis elementos:

• O emissor (ou remetente) é o ser responsável por dar início ao processo


comunicativo, direcionando uma mensagem a um interlocutor.

• O receptor (ou destinatário) é para quem a mensagem é enviada. Falaremos


mais tarde sobre a relevância desse personagem dentro do processo.

• A mensagem é o conjunto de informações que o emissor deseja enviar ao


receptor.

• O canal é o meio pelo qual o emissor e o receptor se comunicam e por onde


circula a mensagem.

• O código é um sistema de signos comuns partilhados (total ou parcialmente)


entre emissor e receptor que permite a compreensão da mensagem.

• O contexto (ou referente) é o assunto da mensagem, aquilo que permeia a


situação comunicativa.

Para que a comunicação efetivamente ocorra, é fundamental que os seis


elementos componham de fato uma interlocução, ou seja, que emissor e receptor
se entendam.

Um elemento não previsto por Jakobson, mas que merece a nossa atenção é o
feedback. Sendo o processo comunicativo um processo interacional, ele não se
sustentaria sem a resposta do interlocutor ao emissor.
O Processo da Comunicação | UNIDADE 1 17

Figura 1.6 – Os elementos da comunicação.

Contexto

Mensagem

Canal Código
Emissor Receptor

Feedback

Fonte: Elaborado pelos autores.

Uma maneira de você compreender o processo comunicativo dentro de uma


situação cotidiana é imaginando o seguinte cenário:

Você recebe um e-mail com orientações de acesso ao LEX de seu tutor. O tutor,
neste caso, é o emissor da mensagem e você, logicamente, o receptor. O canal
comunicativo escolhido foi o e-mail, e o conteúdo da mensagem, as instruções
necessárias para o acesso ao ambiente virtual de aprendizagem. O código,
comum entre emissor e receptor, é a língua portuguesa. O contexto, aquilo que
circunda a mensagem, o assunto, é o início das aulas e a necessidade de acesso
ao LEX.

Quando você responde ao e-mail está dando o feedback, fechando, dessa forma,
o processo comunicativo, que poderá ser reaberto com alguma dúvida que você
possa ter, invertendo, assim, os papéis de emissor e receptor entre você e seu
tutor.
18 COMUNICAÇÃO E LINGUAGEM | Ângela Kroetz dos Santos e Gilberto Fonseca

1.4 Ruído na Comunicação


Se por algum motivo o processo comunicativo é prejudicado por uma falha em
qualquer um dos seus elementos, acontece o ruído. Ele pode se manifestar das
mais diversas formas: um emissor com problemas de dicção ou que fale muito
baixo, um receptor desatento, um código não comum entre ambos, um canal de
comunicação falho, entre outras possibilidades.

Figura 1.7 – Tirinha a evolução da comunicação.

Fonte: http://gg.gg/cvlf6.

Na tirinha anterior, você pode perceber que a comunicação não se efetiva.


Embora todos os elementos necessários estejam presentes, há um ruído, e a
mensagem não é compreendida conforme a intenção do emissor. Vamos analisar
mais detalhadamente esses elementos?

Quem é o emissor? Hagar

Quem é o receptor? O homem com o cachimbo

O que Hagar pretende comunicar? Qual é a mensagem? A compra de um barco novo


e a possibilidade de troca para efetivar o negócio.

Qual o canal de comunicação escolhido? Uma conversa presencial.

Qual o código utilizado? A Língua Portuguesa.

Qual é o contexto? Uma negociação.

Assim, você poderia perguntar: se todos os elementos estão presentes, o que deu
errado? Por que há ruído nessa comunicação?

Com a presença da Helga, mulher de Hagar, no ambiente comunicativo,


e a ausência do objeto de troca, o barco, o vendedor interpreta equivocadamente
O Processo da Comunicação | UNIDADE 1 19

a mensagem, pensando que o objeto de troca fosse a mulher. Nesse contexto,


o ruído causa o humor na tira.

No entanto, nem sempre o ruído resulta em uma situação divertida. É muito


comum, principalmente no ambiente empresarial, que a dificuldade de
comunicação cause prejuízos e descontentamentos. Conforme o mestre e
especialista em Gestão de Comunicação Marcos Scharf,

[...] ruído de comunicação é toda a forma de interferência na


transmissão de uma mensagem. Algo que prejudica a compreensão
de uma ideia compartilhada. As fotografias fora de foco, o celular
inaudível, os dados imprecisos de um relatório e os erros de
português de um e-mail podem atrapalhar a comunicação entre
as pessoas. Outro dia um gerente de vendas confirmou com a
diretoria da empresa X que a reunião nacional com os vendedores
aconteceria no dia 16. Distraído, digitou na intranet e repassou para
os vendedores a seguinte mensagem: “confirmada a reunião para
o dia 26”. A troca do “1” pelo “2” fez toda a diferença; a empresa
teve que arcar com o prejuízo de passagens aéreas, diárias de hotéis,
coffee break [...] (SCHARF, 2018)

Como você pode perceber, uma simples falha em qualquer um dos elementos da
comunicação pode colocar em risco todo o processo.

VÍDEO

Quer conhecer mais exemplos de Ruído na Comunicação?


Veja no link: http://gg.gg/cvlfl.
20 COMUNICAÇÃO E LINGUAGEM | Ângela Kroetz dos Santos e Gilberto Fonseca

1.5 As Funções da Linguagem


O modelo comunicativo de Jakobson também procurou trazer luz a uma questão:
por que as pessoas se comunicam? Se voltarmos ao início desta unidade,
no texto que trata sobre a origem do processo comunicativo, podemos entender
que a comunicação possuía um caráter predominantemente informativo,
sendo que a sociedade evoluiu a partir das informações que nossos antepassados
nos deixaram. Mas, então, o objetivo da comunicação é informar? Também.
Porém, como se enquadram situações como um pedido de socorro ou um grito de
dor? E como explicar a música, a poesia, ou mesmo uma conversa descontraída
com um amigo?

Jakobson criou o conceito de seis funções da linguagem, cada uma ligada a um


elemento da comunicação, ou seja, em cada situação comunicativa, a ênfase
recai sobre um dos elementos, e, consequentemente, a função relacionada
predomina sobre as demais. Sim, é bem possível que uma situação comunicativa
apresente mais de uma função da linguagem (quem sabe as seis?), mas sempre
haverá o predomínio de uma. Procuraremos explicar a seguir.

A função da linguagem que prevalece na maioria das situações comunicativas


é a função referencial (ou denotativa); ela está relacionada ao contexto
justamente pela sua característica informativa e sua linguagem objetiva.
Essa função é encontrada, principalmente, nos textos informativos, como as
matérias de jornais e sites de notícias, e na maioria dos textos acadêmicos que
você irá ler durante sua formação.

Já a função emotiva (ou expressiva) apresenta uma característica totalmente


contrária, pois está centrada no emissor e relacionada aos sentimentos
particulares deste, por isso nela predomina o emprego da primeira pessoa
do discurso e a linguagem subjetiva. Como exemplo, podemos citar toda a
manifestação de um ponto de vista do emissor sobre um assunto, como um
comentário feito pelo leitor sobre uma notícia, no qual ele critica ou apoia o
conteúdo. Também podemos citar os comentários cotidianos: “O dia está lindo!”,
“Que blusa feia!” etc.

A função apelativa (ou conativa) está diretamente relacionada ao receptor,


e sua principal característica é a persuasão do interlocutor, a fim de que ele tome
determinada atitude. Um exemplo claro do uso da linguagem apelativa são as
propagandas.
O Processo da Comunicação | UNIDADE 1 21

A função poética, ligada à mensagem, destaca que a maneira de comunicar


é tão importante quanto a comunicação em si. Ou seja, com a função poética,
a linguagem é mais elaborada do que no seu uso cotidiano. São exemplos:
a poesia, a letra de uma música, a linguagem literária, entre outros.

A função fática diz respeito ao início, à manutenção e ao fechamento de uma


situação comunicativa. Está relacionada ao canal e é sempre breve, como um
“Alô?” ao atender uma ligação, um “Está entendendo?” ou um “Até breve”.
No primeiro exemplo, o “alô” abre uma comunicação, enquanto a expressão
seguinte, “está entendendo”, testa a sua eficiência e, obviamente, o “até breve”
dá um fim à comunicação.

Por fim, quando a linguagem comunicativa é utilizada para falar sobre ela
mesma, a predominância é da função metalinguística, focada no código.
Imagine a seguinte situação: você precisa gravar um vídeo para uma atividade
e procura dicas de como gravar e editar esse vídeo no YouTube. Percebeu?
Para gravar um vídeo, você assiste a um vídeo. Da mesma forma, se você
precisa do significado de determinada palavra e consulta um dicionário,
você está procurando uma palavra para explicar outra palavra.

Figura 1.8 – Os elementos da comunicação e as funções da linguagem.

função referencial

Contexto

função emotiva função apelativa

Emissor Mensagem Receptor

função poética

Canal Código
função fática função
metalinguística

Fonte: Elaborado pelos autores.


22 COMUNICAÇÃO E LINGUAGEM | Ângela Kroetz dos Santos e Gilberto Fonseca

1.6 A Noção de Interlocutor


Dentro do processo comunicativo, é bastante comum delegar toda
responsabilidade ao emissor, uma vez que é dele que parte a comunicação.
Essa é uma premissa que coloca o receptor num papel de inteira passividade.
Só que a comunicação é um processo interacional, você se recorda? Emissor e
receptor devem assumir as suas responsabilidades para que a comunicação seja
efetivada, uma vez que eles mudam de papel constantemente.

A compreensão de uma mensagem está ligada diretamente ao repertório


comunicativo que os interlocutores carregam como bagagem. Se, por um lado,
o emissor parte do seu conhecimento de mundo para contextualizar uma
situação, por outro, o receptor age da mesma forma, apoiando-se no seu
repertório particular para compreender a mensagem e respondê-la.

Observe as situações:

Figura 1.9 – Tirinhas.

Fonte: http://gg.gg/cvlh6.

Nos dois exemplos, é evidente a presença de ruído na comunicação, causado pela


condição passiva ou descuidada do interlocutor, que coloca a responsabilidade
do sucesso da comunicação no emissor. Veja:
O Processo da Comunicação | UNIDADE 1 23

Na primeira tira, Hagar, enquanto receptor, seleciona o que lhe interessa dentre
todos os eventos informados pelo outro personagem, focando somente naquilo
que lhe é conveniente, deixando clara a sua falta de atenção.

Já na segunda, a mensagem é direcionada a Hagar, mas o outro interlocutor,


Eddie Sortudo, é quem responde ao questionamento de Helga, mesmo não sendo
ele o destinatário.

A partir dos exemplos, você pode verificar que a compreensão da mensagem e,


consequentemente, o sucesso do processo comunicativo requer a participação
ativa e colaborativa entre emissor e receptor.

Escutatória - Rubem Alves

Sempre vejo anunciados cursos de oratória. Nunca vi anunciado curso de escutatória.


Todo mundo quer aprender a falar. Ninguém quer aprender a ouvir. Pensei em
oferecer um curso de escutatória. Mas acho que ninguém vai se matricular. Escutar
é complicado e sutil. Faz muito tempo, nunca me esqueci. Eu ia de ônibus. Atrás duas
mulheres conversavam. Uma dela contava do marido hospitalizado, dos médicos,
dos exames complicados, das injeções na veia – a enfermeira nunca acertava – dos
vômitos e das urinas. Era um relato comovente de dor. Até que o relato chegou ao
fim esperando, evidentemente, o aplauso, admiração, uma palavra de acolhimento na
alma da outra que, supostamente, ouvia. Mas o que a sofredora ouviu foi o seguinte:
“Mas isso não é nada…” A segunda iniciou, então, uma história de sofrimentos
incomparavelmente mais terríveis e dignos de uma ópera que os sofrimentos da
primeira. Daí a dificuldade: a gente não aguenta ouvir o que o outro diz sem logo dar
um palpite melhor, sem misturar o que ele diz com aquilo que a gente tem a dizer.
Como se aquilo que ele diz não fosse digno de descansada consideração e precisasse
ser complementado por aquilo que a gente tem a dizer, que é muito melhor. No fundo
somos todos iguais às duas mulheres do ônibus.

Fonte: http://gg.gg/cvlhb. (adaptado)


24 COMUNICAÇÃO E LINGUAGEM | Ângela Kroetz dos Santos e Gilberto Fonseca

1.7 Adequação da Linguagem à


Situação Comunicativa
Cada situação comunicativa, oral ou escrita, apresenta uma intenção.
Não há comunicação sem objetivo: até mesmo por trás das famosas conversas
de elevador há um propósito, ainda que este seja espantar o tédio ou evitar
um silêncio constrangedor. Essa intenção, esse propósito, é mais facilmente
atendido quando o emissor se vale da linguagem adequada ao interlocutor com
quem está em contato. O emissor deve sempre acolher o receptor, jamais afastá-
lo, por isso conhecer o seu público e prever a qual tipo de linguagem ele é mais
suscetível é o recomendado.

A língua é como a roupa, cada situação requer uma escolha. Imagine que você
está em um ambiente que exige um traje específico, como uma solenidade
de formatura, em que se espera que os formandos e os professores estejam
usando togas. A linguagem, nesse ambiente, também tenderá a ser mais formal.
Da mesma forma, em um ambiente informal, como um churrasco entre amigos,
imagina-se que as vestimentas sejam confortáveis e descontraídas e que a
linguagem também o seja.

Você consegue compreender essa relação proposta entre linguagem e roupa?

Procure responder à questão abaixo:

Vamos supor que você recebeu de um amigo de infância e seu colega de escola um
pedido, por escrito, nos seguintes termos:

“Venho mui respeitosamente solicitar-lhe o empréstimo de seu livro de


Redação para Concurso, para fins de consulta escolar.”

Essa solicitação em tudo se assemelha à atitude de uma pessoa que:

a) comparece a um evento solene vestindo smoking completo e cartola.

b) vai a um piquenique engravatado, vestindo terno completo, calçando sapatos de


verniz.

c) vai a uma cerimônia de posse usando um terno completo e calçando botas.

d) frequenta um estádio de futebol usando sandálias de couro e bermudas de


algodão.

e) veste terno completo e usa gravata para proferir uma conferência internacional.
O Processo da Comunicação | UNIDADE 1 25

Antes de revelarmos a resposta correta, vamos compreender o contexto: você


recebeu um bilhete (meio de comunicação escrito, mas de caráter informal) de
um colega de escola, de quem espera-se informalidade, mas escrito em uma
linguagem extremamente erudita, formal. Percebe que há um equívoco nessa
escolha?

Então, se você respondeu a letra B, acertou! Um piquenique é uma situação


informal, que requer, portanto, uma roupa informal. Ninguém pensaria em
vestir um terno completo e calçar sapatos de verniz, um traje, convenhamos,
bastante formal, em uma situação de lazer. No caso exposto, o piquenique é a
situação, o meio de comunicação; já a roupa é a linguagem.

A adequação da linguagem à situação comunicativa requer investimento em


repertório (vale a insistência nisso por ser de extrema relevância). Quanto mais
possibilidades comunicativas você tiver, maiores serão as chances de que você
consiga sucesso em sua comunicação. Um bom comunicador não é somente
aquele que se vale do uso formal da língua, mas aquele que conhece as suas
variações e é capaz de conversar com os mais diferentes públicos.
26 COMUNICAÇÃO E LINGUAGEM | Ângela Kroetz dos Santos e Gilberto Fonseca

1.8 Comunicação e Gêneros Textuais


Até agora falamos sobre a comunicação em situações genéricas para explicar
os vários elementos que fazem parte do processo comunicativo. Mas como é
que, de fato, nos comunicamos? Conforme Marcuschi (2008), a comunicação
humana acontece sempre por meio de textos, dos mais variados gêneros, que
vamos utilizando a cada situação, formal ou informal, com que nos deparamos.

Assim, de maneira bem simples, texto é toda e qualquer expressão comunicativa


resultante de uma interação entre emissor e receptor. Um texto pode ser verbal
(um romance, uma crônica etc.), visual (um quadro, uma escultura etc.) ou verbo-
visual (um filme, uma propaganda etc.). Nesse sentido, ao visitar um museu,
por exemplo, você é levado a fazer uma “leitura” das obras (textos visuais ou
verbo-visuais), deslocando-se para diferentes épocas e espaços, compreendendo
criações humanas que expressam ideologias de hoje ou de outros tempos.
O mesmo acontece quando você lê um romance ou vê um filme, que podem ser
atuais ou se reportarem a épocas com costumes e concepções diferentes das
suas. A relação com essas realidades distintas é muito importante, pois permite
que você busque elementos para compreender a evolução e a realidade humana.

Os textos se organizam em gêneros, tipos e domínios textuais. O objetivo do


estudo dos gêneros é que você compreenda que a comunicação se efetiva por
meio de diferentes textos, cada qual com um objetivo comunicacional específico.

1.8.1 Gênero, Tipo e Domínio Textuais


Ao longo da sua vida, você já leu uma série de textos, certo? Mesmo aqueles
que assumem não gostar de ler têm alguma experiência leitora. Alguns textos
são mais corriqueiros, como o romance, a música, o e-mail. Considerando esses
exemplos que citamos, você percebe que há diferença de formato entre eles?
E quanto ao objetivo comunicacional, é possível dizer que cada um deles tem
uma finalidade própria?

De acordo com Marcuschi (2008, p. 154), os gêneros textuais explicam o


funcionamento da sociedade, uma vez que “toda a manifestação verbal se dá
sempre por meio de textos realizados em algum gênero”. Nessa perspectiva,
é possível dizer que a linguagem organiza nossas práticas sociais cotidianas,
nossas formas de vida e nossas relações.

No contexto dos gêneros, é importante que você entenda a diferença entre


gênero textual, tipo textual e domínio textual. O conceito de gênero textual
O Processo da Comunicação | UNIDADE 1 27

contempla os diversos textos, escritos ou orais, que você encontra no dia


a dia, como por exemplo o e-mail, o artigo, o resumo, o cartaz publicitário,
o romance, a palestra etc. Cada um desses textos apresenta uma estrutura
própria, relativamente estável, o que permite visualizar mais facilmente as suas
características. Os gêneros são tão numerosos quanto os eventos comunicativos
em que o ser humano se envolve. De acordo com Guimarães (2011), os gêneros
são relativamente estáveis porque os textos que correspondem a cada gênero
possuem algumas características comuns, conforme apresenta a Figura 1.10:

Figura 1.10 – Características dos Gêneros Textuais.

Intenção do gênero: carta comercial → negócio I


Objetivo propaganda → vender

Assunto do gênero: propaganda→ mostrar vantagens


Tema de um item I carta → falar de assuntos pessoais

Estrutura característica do gênero: texto argumentativo


Estrutura → introdução, desenvolvimento e conclusão I propaganda
→associação de texto verbal e não verbal

Linguagem adequada ao gênero: conversa →


Linguagem informal I palestra acadêmica → formal

Área típica de circulação do gênero: oração/canção →


Esfera de típicos da esfera religiosa I editorial/artigo de opinião
Circulação → típicos da esfera jornalística

Fonte: Adaptado de Guimarães (2011).

Quanto aos tipos textuais, você não pode confundi-los com os gêneros,
já que são categorias ligadas à natureza linguística da composição (aspectos
lexicais, sintáticos, tempos verbais, relações lógicas, estilo), ou seja, à maneira
de construir o texto. Marcuschi (2008) os define como modos textuais e os
classifica em narração, argumentação, exposição, descrição, injunção.
Um gênero pode ser formado por mais de um tipo textual. De acordo com Koch
e Elias (2008, p. 120), “a presença de vários tipos textuais em um gênero é
denominada de heterogeneidade tipológica”. Mais adiante você verá um exemplo
dessa ocorrência.

Por fim, o domínio textual diz respeito a uma “esfera da atividade humana”,
evidenciando as instâncias discursivas em que determinado gênero circula.
28 COMUNICAÇÃO E LINGUAGEM | Ângela Kroetz dos Santos e Gilberto Fonseca

Nesse sentido, existem gêneros próprios do discurso jurídico, como por exemplo
leis, contratos e editais, ou do discurso jornalístico, como editoriais, notícias e
artigos de opinião. Alguns gêneros podem circular em mais de um domínio ou
esfera, como, por exemplo, as leis, que são textos corriqueiros nos domínios
jurídico e político.

O Infográfico da Figura 1.11 mostra os principais gêneros textuais, classificados


nos respectivos domínios discursivos. A listagem não é definitiva, visto que outros
gêneros e domínios podem ser acrescentados, tendo em vista a dinamicidade das
atividades que envolvem a vida humana. Perceba que no Infográfico os gêneros
estão segmentados em escritos e orais.
O Processo da Comunicação | UNIDADE 1 29

Figura 1.11 – Gêneros Textuais e Domínios Discursivos.

GÊNEROS TEXTUAIS

Artigos Científicos, verbetes de


Instrucional enciclopédia, relatórios, diários Conferências, debates,
de campo, resumos, resenhas, teses/ exposições, aulas,
dissertações, manuais de ensino, entrevistas, arguição,
curriculum vitae, atas de reunião, seminário/colóquio
provas, biografias, memoriais

Jornalístico Editoriais, notícias, reportagens, artigos


de opinião, histórias em quadrinhos, Entrevistas (TV e rádio),
cartas do leitor, classificados, crônicas, notícias (TV e rádio), programa
boletim do tempo, resumo de filme, de rádio, boletim do tempo,
programação semanal, capa de revista, reportagens ao vivo
agenda de viagem

Religioso

Orações, catecismo, canções Sermões, confissões,


religiosas, bulas papais, encíclicas cantorias, orações, homilias

Saúde
Receita médica, Consulta,
bula de remédio, parecer entrevista médica,
médico, receitas culinárias conselho médico

Comercial Rótulos, nota de compra/venda,


publicidade, carta comercial,
memorando, carta de representação, Publicidade de feira,
certificado de garantia, atestado de rádio e TV
qualidade, balanço comercial

Industrial
Instruções de montagem, descrição
de obras, código de obras, avisos,
controle de estoque, atestado de Ordens
validade, manuais de instrução

Jurídico
Contratos, leis, regimentos e
Depoimentos, declarações,
estatutos, certidões, atestados,
inquérito judicial/policial,
certificados, diplomas, boletim de
ordem de prisão
ocorrência, editais, alvarás

Publicitário Propagandas, publicidades,


anúncios, cartazes, folhetos, Publicidade de rádio e TV
outdoors, placas, inscrições em
muros

Lazer
Piadas, jogos, adivinhas,
história em quadrinhos, Fofocas, piadas, adivinhas,
palavras cruzadas, horóscopo teatro

Interpessoal Cartas pessoais, cartão de visita,


e-mail, bilhetes, telegramas, convites, Recados, conversações
diário pessoal, lista de compras, auto- espontâneas, telefonemas,
biografias, diários, relatos de viagem, bate-papo virtual, avisos,
blogs ameaças

Militar
Ordem do dia, roteiro de
cerimônia oficial, roteiro de Ordem do dia
formatura, lista de tarefas

Ficcional
Épico/lírico/dramático, poemas, Fábulas, contos,
contos, fábulas, histórias em lendas, teatros
quadrinhos, romances

Político
Panfleto, santinho, plano Discurso, debate
de governo, leis

Artístico/Cultural
Letra de música, painel de museu,
roteiro de teatro, roteiro de viagem, Palestras, eventos culturais
romance, quadro, obra de arte,
roteiro de evento

Esportivo
Narração de jogos,
Roteiro de eventos esportivos programas esportivos de
TV e rádio, entrevistas

LEGENDA: Escritos Orais

Fonte: Adaptado de Marcuschi (2008).


30 COMUNICAÇÃO E LINGUAGEM | Ângela Kroetz dos Santos e Gilberto Fonseca

Como você pode perceber, os gêneros permeiam todas as atividades humanas, e


isso significa que a comunicação, tanto escrita quanto oral, sempre se efetiva por
meio de um gênero. Para que você compreenda bem a diferença entre gênero,
tipo e domínio, apresentamos um exemplo de gênero com suas respectivas
classificações.

Figura 1.12 – Gênero reportagem | Domínio discursivo jornalístico | Os emojis são a linguagem
universal?.

GÊNERO REPORTAGEM I DOMÍNIO DISCURSIVO JORNALÍSTICO I


OS EMOJIS SÃO A LINGUAGEM UNIVERSAL?
Giovanna Rossin I Revista Galileu I Abr 2015
Sete anos depois de darem as caras (literalmente) no teclado dos
smartphones ocidentais, eles são considerados uma espécie de
idioma universal pela Geração Z. Seria o emoji um esperanto que
deu certo?

Em janeiro, o julgamento de Ross Ulbrich mal tinha começado na LEGENDA TEXTO


corte de Nova York quando foi interrompido pela defesa. Uma
informação tinha sido omitida e precisava ser levada em conta pelo júri: um emoji. sequência
narrativa
“É parte da prova do documento”, concordou a juíza responsável. Ulbricht, acusado de
comandar o mercado negro online Silk Road, tinha postado em um chat uma mensagem sequência
seguida de um emoji sorridente, que foi ignorado na transcrição oficial do texto. Pouco argumentativa
tempo depois, o jovem Osiris Aristy foi preso por ser uma “ameaça terrorista”. Seu crime?
Escrever mensagens de repúdio a policiais acompanhadas de emojis. Os dois casos sequência
provocam reflexão sobre até que ponto os emojis são uma ferramenta legítima de expositiva
comunicação no mundo real. Mesmo a tradicional Biblioteca do Congresso
(Washington) incluiu em seu acervo em 2013 o primeiro livro escrito em emoji – Emoji
Dick, uma tradução do clássico Moby Dick, de 1851. “Achei que seria um ótimo
desafio”, diz o autor, Fred Benenson, sobre o curioso projeto coletivo realizado
online. Benenson, que se autointitula um aficionado do emoji, reuniu 800 pessoas para
traduzir as cerca de 10 mil frases de Moby Dick. O processo levou um ano e meio.

A PALAVRA ESCRITA MAIS POPULAR DE


2014 NÃO FOI UMA PALAVRA, MAS SIM
O EMOJI DE CORAÇÃO VERMELHO

MEIO UNIVERSAL
Criado no Japão no final dos anos 1990, o emoji – palavra japonesa formada por e
(“figura”, picture), mo (“escrita”, writing) e ji (“sinal”, character) – começou a se
popularizar na cultura ocidental por volta de 2009 [...]. Tanto a linguagem já foi
incorporada por usuários do mundo todo que a palavra escrita mais popular de 2014
não foi uma palavra, mas sim o emoji de coração vermelho. Para elaborar a lista, a
Global Language Monitor analisou blogs, redes sociais e 275 mil mídias de notícias no
mundo todo, e pela primeira vez ela foi liderada por um símbolo. “Os emoji produzem
sentido nas práticas discursivas no meio digital e são capazes de tornar a
interação virtual mais afetiva e dinâmica, propiciando rapidez nas trocas de
informações”, dizem as especialistas em ciências da linguagem Renata Fonte e
Roberta Caiado.
Como pictogramas, os emojis são usados para transmitir emoções, substituir um objeto
ou sugerir ideias abstratas construídas de acordo com o contexto social e cultural. Mas,
apesar do sucesso entre os usuários de smartphones, especialmente os da geração
Z (nascidos a partir de 1990), Renata e Roberta não acreditam nos emojis como
uma linguagem: “Eles podem substituir, complementar ou enfatizar o texto
escrito, e ainda representar a gestualidade corporal e facial presente nas
interações face a face, mas não vemos nenhum potencial no emoji para tornar-se
um idioma, muito menos universal”. [...]. “Mas a linguagem está em constante
evolução, [...] e não é difícil imaginar uma gramática emoji em desenvolvimento”.

Fonte: Adaptado de Revista Galileu, abr 2015.


O Processo da Comunicação | UNIDADE 1 31

O texto que você acabou de ler pertence ao gênero reportagem e se refere ao


domínio discursivo jornalístico. O gênero em questão é constituído por vários
tipos textuais, a saber, narrativo, expositivo e argumentativo, dispostos de forma
intercalada. Também é interessante que você observe as características formais
do gênero reportagem evidenciadas no exemplo:

a. interação entre linguagem verbal e não verbal (entre imagens e texto);

b. manchete, em destaque, que apresenta uma espécie de resumo da


reportagem; no caso do exemplo, a manchete apresenta uma pergunta,
que deverá ser respondida ao longo do texto (Seria o emoji um esperanto
que deu certo?);

c. segmentação do texto em etapas, com presença de subtítulo;

d. repetição de parte importante do texto, destacada em fonte maior para


chamar atenção do leitor;

e. entrevistas com especialistas da área noticiada;

f. abordagem de temática atual e relevante, de interesse público, com o


objetivo de informar o leitor;

g. uso de pergunta norteadora e argumentos com o objetivo de munir o leitor


para que este possa se posicionar frente à temática discutida.

GLOSSÁRIO

Você sabe o que é Esperanto, termo que está na manchete da reportagem?


Esperanto é uma língua artificial, criada em 1887 pelo polonês Ludovico
Zamenhof, com o objetivo de ser uma língua universal. Ludovico morava
em uma cidade em que viviam muitas comunidades linguísticas distintas
e quis criar uma língua que pertencesse igualmente a todos os homens.
O Esperanto possui gramática simples e regular, e utiliza raízes de línguas
europeias, latinas e gregas. (HOUAISS, 2009). Para saber mais, acesse o
site: http://gg.gg/cvljp.

Ao longo das próximas Unidades, você visualizará muitos exemplos de gêneros


e poderá conhecer a estrutura característica de diferentes textos.
32 COMUNICAÇÃO E LINGUAGEM | Ângela Kroetz dos Santos e Gilberto Fonseca

SÍNTESE DA UNIDADE
Nesta unidade, você foi convidado a refletir sobre a origem da comunicação e
sobre os elementos que constituem o processo comunicativo (emissor, receptor,
mensagem, canal, código e contexto, além do feedback, responsável por tornar
esse processo interacional). Você ainda foi apresentado ao conceito de ruído e
pôde, a partir dos exemplos apresentados, problematizar as dificuldades que
atrapalham a comunicação. Além disso, aprendeu as funções da linguagem
(emotiva, apelativa, poética, fática, metalinguística e referencial) e compreendeu
o papel do interlocutor e sua importância para que a comunicação, de fato,
aconteça. Por meio dos exemplos propostos, refletiu sobre a relevância da
adequação da situação comunicativa ao leitor e foi apresentado aos gêneros
textuais, entendendo como funciona a articulação textual para a construção de
sentidos.
O Processo da Comunicação | UNIDADE 1 33

REFERÊNCIAS
FIORIN, J. L.; SAVIOLI, F. P. Lições de Texto: leitura e redação. 5. ed. São Paulo:
Ática, 2009.

GOULART, C. R.; BOTH, J. T. Interpretação e compreensão de textos. In: AIUB, T


NIA. (Org). Português: práticas de leitura e escrita. Porto Alegre: Penso, 2015.

GOULART, C. R.; AIUB, T. O Texto e os fatores de textualidade.


In: AIUB, T N. (Org). Português: práticas de leitura e escrita. Porto Alegre:
Penso, 2015.

GUIMARÃES, T. C. Comunicação e Linguagem. São Paulo: Pearson, 2011.

HOUAISS, A. Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa. Rio de Janeiro: Objetiva,


2009.

KOCH, I. V.; ELIAS, Vanda Maria. Ler e compreender: os sentidos do texto. 2. ed.
São Paulo: Contexto, 2008.

MARCUSCHI, L. A. Produção Textual, análise de gêneros e compreensão. São


Paulo: Parábola, 2008.

SCHARF, M. G. O ruído na comunicação afeta as relações humanas. Disponível


em: http://gg.gg/cvlka. Acesso em: 18 de nov. 2018.
34 COMUNICAÇÃO E LINGUAGEM | Ângela Kroetz dos Santos e Gilberto Fonseca

ANOTAÇÕES
unidade

2
Da Leitura à Compreensão Textual
Prezado estudante,
Estamos começando uma unidade desta disciplina. Os textos que a compõem
foram organizados com cuidado e atenção, para que você tenha contato com
um conteúdo completo e atualizado tanto quanto possível. Leia com dedicação,
realize as atividades e tire suas dúvidas com os tutores. Dessa forma, você, com
certeza, alcançará os objetivos propostos para essa disciplina.

OBJETIVO GERAL
Refletir sobre a leitura e a compreensão textual, reconhecendo-as como
elementos fundamentais para a autonomia do sujeito e como processos
que requerem a construção de estratégias de interação que possibilitem a
adequada articulação entre autor-leitor-texto.

OBJETIVOS ESPECÍFICOS
• Refletir sobre a leitura e sobre como ela amplia a visão de mundo do
sujeito leitor;
• Buscar estratégias claras de leitura e compreensão de um texto;
• Compreender o processo de interpretação a partir da ativação de
conhecimentos prévios e do levantamento de inferências;
• Estudar a interpretação textual em contextos de intertextualidade;
• Estudar a interpretação em textos não verbais e mistos;
• Mapear o que é central e secundário em um texto, organizando esquemas
de leitura que facilitem a compreensão;
• Interpretar diferentes gêneros textuais, colocando em prática os estudos
da Unidade.

QUESTÕES CONTEXTUAIS
1. Você já pensou sobre como acontecem os processos de decodificação e
de compreensão daquilo que lê?
2. Qual é a importância da leitura para você?
3. Por que ler é tão desafiador?
36 COMUNICAÇÃO E LINGUAGEM | Ângela Kroetz dos Santos e Gilberto Fonseca

2.1 Introdução
Você já pensou sobre como acontecem, em seu cérebro, os processos de
decodificação e de compreensão daquilo que lê? Embora não saibamos como,
complexas conexões neurais se estabelecem durante a leitura. Nosso desafio é,
pois, tornar esse evento o mais eficiente possível, obtendo o máximo de
aproveitamento do tempo que dedicamos à leitura.

GLOSSÁRIO

Decodificar: traduzir claramente uma informação, entender, compreender.

Um requisito esperado de qualquer profissional é que ele seja um leitor


proficiente. No entanto, estatísticas mostram que muitas pessoas, no Brasil,
embora sejam alfabetizadas, não são capazes de interpretar adequadamente até
mesmo textos simples. Um dos fatores que contribui para esse cenário é a falta
de leitura. Quanto menos uma pessoa ler, provavelmente menor será o seu
conhecimento de mundo, o que reduzirá a capacidade de reconhecer as estruturas
textuais e de sintetizar, abstrair e interpretar o que um texto traz.

GLOSSÁRIO

Proficiente: competente, eficaz, conhecedor.

Nesse sentido, é importante que você saiba que o processo de leitura vai muito
além da simples decodificação dos sinais gráficos que compõem as palavras.
Isso significa que ler não é o mesmo que compreender e interpretar um texto.
Compreender requer um esforço muito maior, ou seja, a reunião de vários
requisitos que, em conjunto, operam a construção de sentidos.

A partir dessa realidade, propomos a você uma reflexão sobre os diversos


elementos que interagem e que se inter-relacionam no processo de leitura e
interpretação. É muito importante que você, estudante universitário, domine a
arte de dialogar com os mais diversos gêneros e tipos de texto com os quais terá
contato ao longo do seu curso e ao longo da vida. Na Figura 2.1, está contemplada
a sequência didática da Unidade 2.
Da Leitura à Compreensão Textual | UNIDADE 2 37

Figura 2.1 – Sequência Didática.

Leitura e suas
Interfaces

Leitura e
Interpretação de
Compreensão:
Questões ENADE
o Papel do Leitor

Interpretação de Esquemas
Texto Não Verbal de Leitura

Interpretação e
Intertextualidades

Fonte: Elaborado pelos autores.


38 COMUNICAÇÃO E LINGUAGEM | Ângela Kroetz dos Santos e Gilberto Fonseca

2.2 Leitura e suas Interfaces


Que tipo de texto você gosta de ler? Romance? Reportagem? Crônica de
jornal? Coluna esportiva? Música? Sempre há aquele texto com o qual você
mais se identifica, bem como aquele que você não aprecia tanto, não é mesmo?
Suas preferências leitoras têm relação direta com as experiências que você teve,
desde a infância, com a leitura. A habilidade de interagir com diferentes textos
faz de você uma pessoa que se comunica de forma eficaz.

Mas como adquirir a proficiência leitora? Lendo!

Não há outra forma de desenvolver as habilidades de leitura e interpretação a


não ser exercitando tais ações. Quando você lê, amplia a sua visão de mundo e
a capacidade de “enxergar” além do que está escrito. No Brasil, as pessoas leem
muito pouco. Por isso, muitos apenas decodificam textos, mas não compreendem
realmente os seus sentidos. Veja a charge a seguir:

Figura 2.2 – Charge – Hagar, O Horrível.

Fonte: http://gg.gg/cw9rc.

O texto acima evidencia o desprestígio da leitura e do pensamento nos dias


atuais. Essa realidade certamente traz consequências, e seria possível dizer que
o baixo índice de leitura prejudica o desenvolvimento da sociedade. Mas por
que será que ler é tão desafiador?

SAIBA MAIS

No Brasil, há cerca de 38 milhões de analfabetos funcionais. Para saber


mais, acesse no link: http://gg.gg/cvmag.
Da Leitura à Compreensão Textual | UNIDADE 2 39

Para ler um texto, é preciso ter conhecimentos. E um dos pontos vulneráveis dos
estudantes brasileiros é, justamente, a bagagem de conhecimentos que trazem.
A falta de leitura é um entrave na construção dos conhecimentos prévios que,
por sua vez, são fundamentais para o bom entendimento de um texto. Você já
deve ter percebido que, nesse aspecto, existe uma relação de interdependência:
ler requer ter conhecimentos prévios e, para ter conhecimentos prévios, é
preciso ler.

Os conhecimentos prévios são a articulação de vários tipos de conhecimento,


conforme mostra a Figura 2.3:

Figura 2.3 – Tipos de Conhecimento.

Conhecimentos
Prévios

Conhecimento Conhecimento Conhecimento


Linguístico Interacional de Mundo

Fonte: Elaborado pelos autores com base em Guimarães (2011).

O conhecimento linguístico diz respeito à língua e suas estruturas,


contemplando, também, os gêneros textuais e seus modos de funcionamento.
O conhecimento de mundo configura-se por todas as informações que temos
armazenadas na memória, com base no que lemos, ouvimos e vivemos. Por fim,
o conhecimento interacional se refere aos conhecimentos partilhados entre o
autor e os possíveis leitores de um texto.

Outro desafio da leitura se apresenta quando o leitor mistura o que está


explícito no texto com as suas próprias percepções acerca do assunto.
Assim, um dos pré-requisitos para que a interpretação seja eficiente é saber
distinguir os limites entre os pontos de vista do autor e os seus próprios
pontos de vista enquanto leitor.

Vamos entender um pouco mais sobre isso analisando o papel do leitor no


processo de interpretação.
40 COMUNICAÇÃO E LINGUAGEM | Ângela Kroetz dos Santos e Gilberto Fonseca

2.3 Leitura e Compreensão: o Papel do Leitor


Você tem o hábito de ler? Muitas vezes não avaliamos a importância que a
leitura tem na nossa vida. Ler muda qualquer pessoa, porque conduz o sujeito
a distintas realidades, épocas e experiências. Parece clichê, mas a leitura
permite a você um universo de possibilidades sem que você saia de casa. Todo o
conhecimento que o homem adquiriu ao longo de séculos de história advém da
transmissão oral de experiências e/ou da leitura.

Faz parte da ação de ler interpretar aquilo que é lido. Não há uma forma única
de compreensão, porque os sentidos não são estabelecidos unicamente por quem
escreve. Um texto sempre é escrito por alguém para alguém, e este interlocutor
(o leitor) completa o sentido do texto, preenchendo suas lacunas ao contribuir
com o seu próprio repertório comunicativo. Esse aspecto é importante, porque
muda o foco de uma antiga concepção: a que trazia o autor como detentor
absoluto de sentidos.

Hoje, sabe-se que o leitor é peça fundamental desse jogo de “completar” um


texto, de produzir sentidos sempre novos conforme o conhecimento de mundo e
as vivências de cada um. Isso significa que cada leitor tem uma maneira original
de compreender um texto.

Se é assim, cada leitor pode interpretar uma obra como quiser? Qual é o limite
que existe nessa relação?

A resposta é simples: a compreensão de um texto depende das relações que você


já teve com o assunto, das leituras que você já fez e do domínio que você tem do
código e dos conceitos que estão no texto. Esses conhecimentos são variáveis, e
não é preciso ter um saber nivelado ao de outros leitores para compreender.
Apesar disso, você não pode “fantasiar”, inventar sentidos: no momento da
interpretação, precisa ser fiel aos elementos que estão no texto.

DESTAQUE

Interpretar “é o processo de localizar as pistas e sinalizações deixadas no


texto pelo autor e atribuir-lhes significado”. (GUIMARÃES, 2011, p.107).

Tendo em vista essa relação colaborativa entre autor, texto e leitor, a leitura
é, segundo Koch e Elias (2008, p. 11), “uma atividade interativa altamente
complexa de produção de sentidos”, que “requer a mobilização de um vasto
conjunto de saberes”. A interação pressupõe uma participação ativa do leitor
Da Leitura à Compreensão Textual | UNIDADE 2 41

no processo de compreensão, já que a leitura é “uma atividade que implica


estratégias de seleção, antecipação, inferência e verificação” (PCN, 1998, p. 70)
por parte do leitor.

Agora que você já conhece o importante papel do leitor, vamos explorar algumas
estratégias de leitura que podem ajudá-lo nesse percurso de desvendar um texto.

2.3.1 Estratégias de Leitura: Existe uma


Fórmula Eficaz?
Quando você lê apressadamente, não consegue fazer uma leitura eficaz, capaz
de captar as sutilezas do texto. É por isso que é tão importante estabelecer
estratégias de leitura, que nada mais são do que passos que ajudam o leitor a
olhar mais criticamente para o texto.

Conforme Goulart e Both (2015, p. 48), “o uso de estratégias de leitura nos


permite controlar o que vai ser lido, tomar decisões diante das dificuldades de
compreensão, avançar na busca de soluções de dúvidas e avaliar as suposições
feitas”. As autoras ainda acrescentam que, após a leitura, devemos ser capazes
de “processar, criticar, contradizer e avaliar” o texto lido, atribuindo sentidos à
nossa experiência leitora.

Para tanto, utilizar estratégias de leitura, ou tomar consciência das estratégias


que você já usa sem se dar conta, pode ajudá-lo muito no processo de interpretar.
Nesse sentido, o esquema didático da Figura 2.4 mostra estratégias de leitura
amparadas nos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs):

Figura 2.4 – Estratégias de Leitura.

Seleção

Antecipação
Estratégias de Leitura Ativação de
Conhecimentos
Inferência Prévios

Verificação

Fonte: Adaptado de Guimarães (2011).


42 COMUNICAÇÃO E LINGUAGEM | Ângela Kroetz dos Santos e Gilberto Fonseca

Na Figura 2.4, você pode observar estratégias que conduzem à ativação de


conhecimentos prévios. Isso significa que todas as estratégias só são eficazes se
o leitor tiver conhecimentos preexistentes. Obviamente você nunca saberá tudo
e, portanto, saber onde buscar as informações de que necessita para completar
as lacunas que surgem durante a leitura também é uma tarefa importante.

DICA

A internet é um universo de possibilidades, facilitando muito a busca de


conhecimento. No entanto, você precisa estar atento às fontes de pesquisa,
já que muitos sites ou posts não são confiáveis! Procure verificar se os posts
possuem autoria e, se possível, consulte a fonte original para confirmar a
informação. Para buscar artigos acadêmicos, consulte sites especializados,
como o Google Acadêmico (http://gg.gg/cvmbb). Sempre que possível,
recorra a livros (físicos ou virtuais).

Antes de aplicar as estratégias, é importante ter claro o objetivo de leitura.


Isso determina o foco que você coloca na ação de ler. Se você lê um artigo
científico com o objetivo de resumi-lo para uma aula, deve ficar atento aos
pontos principais que o artigo traz. Nesse caso, montar um esquema com os
elementos relevantes do texto é uma ótima estratégia (mostramos como fazer
isso mais adiante). Agora, se você lê uma reportagem apenas por curiosidade, o
seu objetivo pode ser simplesmente informativo. Ter um objetivo é importante
para que você faça uma leitura com o olhar atento ao que realmente busca.

Com o objetivo traçado, você pode focar as estratégias apresentadas na Figura


2.4. Quanto à seleção, esta consiste em uma leitura rápida, que você realiza
quando passa os olhos no texto. Seria um primeiro reconhecimento, a partir
do qual você seleciona o assunto e filtra o texto para coletar informações
superficiais.

A antecipação é uma etapa importante, que se refere à formulação de hipóteses


primárias a partir de elementos gerais do texto. Essa etapa requer que você
analise uma série de itens. A Figura 2.5 os apresenta e descreve:
Da Leitura à Compreensão Textual | UNIDADE 2 43

Figura 2.5 – Estratégias de Leitura: a Antecipação.

Qual é o veículo em que está o texto? Revista, jornal,


outdoor, embalagem, etc.
Veículo

Há imagens e outros elementos gráficos? Estes completam


o sentido do texto ou são os únicos elementos (caso de
Elementos textos não verbais).
não verbais

Quem é o autor do texto? Saber quem fala e as ideologias


que defende pode agregar valor à interpretação.
Autoria

Qual é o contexto histórico em que esse texto foi realizado?


A época a que o texto se refere e o lugar de onde procede
Contexto podem dizer muito sobre o conteúdo.
de Produção

Qual é o gênero do texto? Reconhecer os aspectos formais


do gênero e saber quais são os seus objetivos facilita a
leitura.
Gênero

Fonte: Elaborado pelos autores.

A etapa seguinte, a inferência, pressupõe que você construa previsões.


À medida que o texto se revela, as expectativas podem mudar, sendo atendidas
ou não. Espera-se que você, leitor, consiga fazer inferências, já que nem tudo é
explícito em um texto oral ou escrito. A capacidade de fazer inferências está
diretamente relacionada aos conhecimentos prévios que você possui.

GLOSSÁRIO

Inferir é deduzir, concluir pelo raciocínio a partir de fatos, de indícios.


(HOUAISS, 2009).
44 COMUNICAÇÃO E LINGUAGEM | Ângela Kroetz dos Santos e Gilberto Fonseca

A verificação é uma etapa na qual você confirma se a seleção realizada,


as hipóteses formuladas e as inferências feitas são adequadas. (GUIMARÃES,
2011). Pode ser que o texto tome um rumo completamente diferente daquele que
você imaginou que ele fosse seguir e, nesse caso, é preciso que você corrija as
suas hipóteses iniciais.

Por fim, a ativação de conhecimentos prévios diz respeito aos conhecimentos


que você adquiriu ao longo da vida. Tais conhecimentos são ativados no momento
da leitura e muitas vezes vão determinar a sua capacidade de interpretar
corretamente ou não os sentidos de um texto. Por isso, como já mencionamos,
é muito importante que você invista em sua cultura geral e que amplie o seu
repertório comunicativo e de leitura, a fim de mobilizar os diferentes tipos de
conhecimento.

A partir do exposto, a seguir, propomos a você um exercício prático de leitura e


interpretação, utilizando os pontos (etapas) que acabamos de estudar.

2.3.2 Estratégias de Leitura: Aplicação


Vamos, então, praticar?

O texto que vamos analisar, da Revista Superinteressante, foi editado a fim


de tornar a análise mais sintética. Em decorrência disso, a estrutura original
também foi readaptada.
Da Leitura à Compreensão Textual | UNIDADE 2 45

| GÊNERO REPORTAGEM |
| DOMÍNIO DISCURSIVO JORNALÍSTICO |
| Eduardo Szklarz e Bruno Garattoni |
| Adaptado de Revista Superinteressante |
| Out 2018 |

A ERA DA BURRICE
◄▬
Você já teve a impressão de que as pessoas estão ficando mais T Í T U L O
burras? Estudos apontam que, pela primeira vez na história,
a inteligência humana começou a cair. Entenda os possíveis◄▬
MANCHETE
motivos – e as consequências – disso.

Discussões inúteis, agressivas. Gente defendendo asneiras. Pessoas


perseguindo e ameaçando outras. Líderes políticos imbecis. De uns
tempos para cá, parece que o mundo está mergulhando na burrice.◄▬
Você já teve essa sensação? Talvez não seja só uma sensação. 1 º P A R Á G R A F O
Estudos em vários países revelam algo inédito e assustador: a
inteligência humana começou a cair.

Os primeiros sinais vieram da Dinamarca. Lá, os homens que se


alistam no serviço militar são submetidos a um teste de inteligência:
o teste de QI (quociente de inteligência). Depois de crescer em todo
século 20, em 1998 o QI dos dinamarqueses começou a cair 2,7
◄▬
pontos a cada década. O mesmo acontece na Holanda (-1,35), 2 º P A R Á G R A F O
Inglaterra (-2,5) e França (-3,8). “Há um declínio contínuo no QI ao
longo do tempo”, diz o antropólogo inglês Dutton. No atual ritmo,
alguns países podem regredir para QI médio de 80, definido como
‘baixa inteligência’, já na próxima geração de adultos. Mas como
explicar a proliferação de burrice mesmo entre quem foi à escola? E
a queda do QI nos países desenvolvidos?

De 0 a 160

O teste de QI (quociente de inteligência) consiste em uma bateria


de testes (compreensão verbal, raciocínio, memória e velocidade
de processamento). De 90 a 110 pontos, tem-se um nível de
inteligência normal. Quem faz mais de 130 pontos enquadra-se na
◄▬
categoria mais alta (o máximo é 160). No século 20, o QI aumentou 3 º P A R Á G R A F O
no mundo todo. Não é difícil entender essa evolução. Melhore a
saúde, a nutrição e a educação e as pessoas se sairão melhor em
qualquer teste de inteligência. Então, como explicar o efeito atual,
de queda na inteligência?
46 COMUNICAÇÃO E LINGUAGEM | Ângela Kroetz dos Santos e Gilberto Fonseca

Involução Natural

A primeira hipótese é polêmica. “A capacidade cognitiva é


influenciada pela genética. E pessoas com altos níveis dela vêm
tendo menos filhos”, afirma o psicólogo Woodley, da Universidade
de Umeå, Suécia. Há décadas a ciência sabe que parte da
inteligência (estudos falam em 50%) é hereditária. Trata-se de uma
teoria controversa. No passado, ela levou à eugenia, que buscava
o aprimoramento humano pela reprodução seletiva. Hoje ninguém
proporia “melhorar” a sociedade obrigando os inteligentes a ter mais
filhos – ou impedindo os demais de ter. Mas isso não significa que
a matemática das gerações não possa estar levando a um declínio
na inteligência, inclusive pela evolução da sociedade, que tornou a
vida mais fácil. Há quem diga que o salto tecnológico dos últimos
20 anos esteja afetando a inteligência. “Hoje, crianças de 7 ou 8
anos crescem com o celular”, diz Bauerlein, da Universidade Emory,◄▬
EUA. “É nessa idade que elas deveriam consolidar o hábito da leitura 4 º P A R Á G R A F O
para adquirir vocabulário”. Há indícios de que o uso de smartphones
na infância já esteja causando efeitos negativos. Na Inglaterra 28%
das crianças de 4 e 5 anos não sabem se comunicar com frases
completas no nível normal para a idade. Segundo educadores,
isso se deve ao tempo que elas ficam na frente de TVs, tablets e
smartphones. As pessoas nunca leram e escreveram tanto; mas
estão lendo e escrevendo coisas curtíssimas em smartphones. Há a
hipótese de que as redes sociais, que são projetadas para consumo
rápido e tomam muito tempo (3h39 por dia do brasileiro), estejam
corroendo nossa capacidade de prestar atenção às coisas. Levar
no bolso a internet baniu o tédio da vida, mas nos tornou mais
impacientes, menos capazes de manter o foco.

Os limites da razão

Você certamente já discutiu com uma pessoa irracional, que manteve


a própria opinião mesmo diante de argumentos irrefutáveis. É o que
os psicólogos chamam de “viés de confirmação”: a tendência que
a mente tem de abraçar informações que apoiam suas crenças, e◄▬
5 º PA R ÁG R A F O
rejeitar dados que as contradizem. Quanto mais comprometido você
está com uma teoria, mais tende a ignorar evidências contrárias.
Para piorar, a evolução nos pregou outra peça: quase toda pessoa
se acha mais inteligente que as outras. Aplicando essa lógica ao
mundo de hoje, o resultado é o mar de conflitos que tomou conta do
dia a dia. A era da cizânia – e da burrice.
Da Leitura à Compreensão Textual | UNIDADE 2 47

Vamos analisar o texto “A Era da Burrice” a partir das estratégias que estudamos.
Para dar conta da etapa de seleção, você deve fazer uma leitura rápida do texto.
Em um olhar superficial, chama atenção o título. Na manchete, evidencia-se o
fato de que as pessoas estão ficando mais burras e de que a inteligência humana
está caindo. O texto promete desvendar as causas e consequências desse fato.
Vemos também que ele é subdividido em etapas, introduzidas por subtítulos.
Esses elementos podem ou não chamar a sua atenção. Se você pudesse escolher,
teria interesse de ler essa matéria?

A etapa de antecipação permite analisar o contexto geral de produção do texto.


Seguindo nosso roteiro, você pode perceber os seguintes elementos:

a. VEÍCULO: Revista Superinteressante;

b. ELEMENTOS NÃO VERBAIS: a imagem de capa mostra um terno e um


chapéu vestidos em um balão. Inevitavelmente vem à mente a expressão
“cabeça de vento”, utilizada para designar alguém desatento. A imagem
faz referência, pois, ao tema da burrice;

c. AUTORIA: os autores não são pessoas publicamente conhecidas,


provavelmente são repórteres. Vale mencionar o estilo das matérias dessa
revista, a saber, reportagens fortemente embasadas em estudos científicos
realizados, em sua maioria, nos Estados Unidos e na Europa;

d. CONTEXTO DE PRODUÇÃO: a publicação é recente (2018).


Há elementos que evidenciam tratar-se de um texto atual, como a citação
de uma pesquisa que revela que a inteligência humana passou a regredir a
partir de 1998. As primeiras frases contextualizam problemas da atualidade
(discussões inúteis, gente defendendo asneiras, pessoas perseguindo e
ameaçando outras, líderes políticos imbecis) e os últimos parágrafos
ressaltam a tecnologia (smartphones, etc.);

e. GÊNERO: trata-se de uma reportagem. Formalmente, há imagem


condizente com o texto, manchete e subtítulos. Em termos de conteúdo,
há entrevistas com especialistas e abordagem de tema atual com objetivo
informativo. Também há várias perguntas que direcionam o leitor.

Partimos, então, para a etapa de inferência. Para realizá-la, você deve ler todo
o texto e fazer deduções com base nos caminhos oferecidos, pouco a pouco,
pela matéria. A seguir, destacamos algumas dessas INFERÊNCIAS (vide
trechos em destaque). Lembramos que estas são algumas possibilidades, mas
não as únicas. Cada leitor poderia sugerir outras inferências.
48 COMUNICAÇÃO E LINGUAGEM | Ângela Kroetz dos Santos e Gilberto Fonseca

O título da matéria é determinante para começarmos nosso trabalho. A burrice,


termo central do título, de modo bem simples, pode ser entendida como falta
de inteligência. Assim, a tese do texto poderia ser (perceba as inferências
sublinhadas):

As pessoas de hoje não são inteligentes.

Ou, ainda,

As condições de vida atuais não estimulam a inteligência.

Em princípio, essas inferências feitas a partir do título poderiam ser negadas por
questões lógicas: o homem cria tecnologias cada vez mais modernas, então deve
ser inteligente; e hoje, muito mais do que no passado, o homem tem à disposição
muitas possibilidades de desenvolvimento pessoal, social e cognitivo, então
deve ser inteligente. Ora, se há indícios favoráveis à inteligência, como podemos
estar na era da burrice, como dizem o título e a manchete?

Quando iniciamos a leitura, o texto logo nos dá pistas. Ao citar que o tempo atual
é marcado por discussões inúteis, defesa de bobagens, perseguições e ameaças
(1º parágrafo), parece plausível dizer que o autor se refere à baixa inteligência
emocional das pessoas, já que elas estão mais intolerantes e têm dificuldade de
respeitar opiniões alheias. Então, será que o texto vai falar sobre inteligência
emocional, mostrando que é ela que está caindo?

A ideia acima não é sustentada na sequência. O segundo parágrafo traz o dado


de que o QI de vários povos europeus está caindo. O QI é um teste que mede a
capacidade cognitiva, como mostra o parágrafo 3. Assim, podemos fazer mais
uma inferência: o que está caindo é a inteligência global do homem (emocional
+ cognitiva)? O segundo parágrafo termina com o dado de que a próxima
geração de adultos pode ter uma média de QI considerada baixa e propõe 2
perguntas que novamente podem conduzir nossas inferências: como explicar
a proliferação de burrice mesmo entre quem foi à escola? E a queda do QI nos
países desenvolvidos?

O próprio texto sinaliza, nesse ponto, uma situação inusitada. Não se esperaria
que quem vai à escola tivesse resultados baixos de inteligência, nem que os
resultados de países desenvolvidos fossem ruins nesse quesito. O parágrafo 3
reforça que no século XX o QI aumentou no mundo todo em função da melhora
da saúde, nutrição e educação. Então, como explicar que no século 21, quando a
população tem mais acesso ainda a esses benefícios, a inteligência esteja caindo?
Da Leitura à Compreensão Textual | UNIDADE 2 49

A partir do quarto parágrafo, surgem as possíveis causas. A primeira explicação


para o fenômeno seria genética, e, como pessoas com alta capacidade intelectual
estão tendo menos filhos, a média de QI estaria caindo. Para entender por que o
texto diz que essa teoria é controversa, é preciso saber o que foi a eugenia no
século XX (conhecimento prévio).

GLOSSÁRIO

EUGENIA, palavra grega cujo significado é “boa origem”, foi uma teoria
seguida por Hitler, que visava a eliminar pessoas que apresentassem alguma
deficiência, visando a aperfeiçoar geneticamente a raça ariana.

Um segundo argumento cita a “evolução da sociedade, que tornou a vida mais


fácil”. Mas por que uma vida mais fácil limitaria a inteligência? O texto responde:
“Há quem diga que o salto tecnológico dos últimos 20 anos esteja afetando a
inteligência”. Ainda assim poderíamos pensar que o salto tecnológico explicaria
um aumento e não uma queda de inteligência, como inferimos no início.

O quarto parágrafo segue explicando a tese de interferência da tecnologia na


queda de inteligência em função do mau uso tecnológico. A superexposição
de crianças a eletrônicos estaria causando efeitos nocivos no desenvolvimento
da linguagem. Essa ideia está vinculada ao apego moderno à leitura e à escrita
instantâneas. O uso das redes sociais estaria “corroendo a capacidade de
prestar atenção às coisas”. Percebe-se que é o mau uso da tecnologia que traz
malefícios. Assim, seria possível inferir, aqui, que o uso excessivo de aparelhos
causa efeitos negativos, especialmente sobre as crianças, que desviam a atenção
da leitura e acabam tendo problemas no desenvolvimento cognitivo. Além disso,
seria possível inferir que “a vida mais fácil” também repercute negativamente
sobre a inteligência em função de um menor grau de exigência, já que tudo está
na mão das pessoas o tempo todo e elas não precisam se esforçar tanto.

Por fim, no quinto parágrafo, o autor menciona a tendência do homem de


abraçar as suas opiniões mesmo que haja argumentos irrefutáveis contra elas.
Isso seria o motivo das discussões irracionais que muitas vezes acompanhamos.
Com esse argumento, o autor retoma o início do texto, em que cita justamente
atitudes irracionais: discussões agressivas, defesa de asneiras, perseguições e
ameaças. Assim, parece fechar-se o ciclo do texto, que começou falando da falta
de inteligência emocional, passou a evidenciar a falta de capacidade cognitiva e
terminou explicando a tese da falta de inteligência emocional.
50 COMUNICAÇÃO E LINGUAGEM | Ângela Kroetz dos Santos e Gilberto Fonseca

Quanto à etapa de verificação, você já deve ter percebido que ela ocorreu quase
simultaneamente à etapa de inferência. Isso se deve ao fato de que, a cada
nova informação que líamos, comprovávamos ou rejeitávamos hipóteses que
havíamos levantado. O que ainda podemos fazer é voltar às nossas inferências
iniciais e verificar se agora temos respostas a elas. Assim:

As pessoas de hoje não são inteligentes? Não há como generalizar essa tese,
dizendo que todas as pessoas não são inteligentes. O texto evidencia que o QI
dos países desenvolvidos está caindo, e que muitas pessoas mostram atitudes
irracionais, o que faz crer que a inteligência, tanto cognitiva quanto emocional,
esteja caindo.

As condições de vida atuais não estimulam a inteligência? Quanto a esse


aspecto, o texto mostra que as condições atuais estimulariam a inteligência,
já que vivemos em uma era em que as pessoas têm acesso a muitos recursos
(saúde, nutrição e educação). No entanto, fica evidente que, apesar de tudo isso,
os índices de inteligência vêm caindo, em função de a) hereditariedade, b) efeitos
nocivos da tecnologia e/ou do mau uso da tecnologia e; c) biologia.

Na ativação de conhecimentos prévios, alguns elementos necessários ao


entendimento, além do linguístico, de gênero e de mundo, podem ser destacados:
conceito de eugenia, de QI, de cizânia. Dependendo do leitor, outros pontos
ainda precisariam ser esclarecidos, o que pode ser feito por meio de dicionários
e internet.

GLOSSÁRIO

CIZÂNIA: [Botânica] tipo de gramínea que causa danos ao trigo; joio.

[Figurado] falta de entendimento entre pessoas; em que há discórdia;


desavença

Você percebeu como, ao longo da leitura, vamos imaginando o rumo que o


texto pode tomar? Quanto menos elementos do texto conhecemos, menor é a
chance de acertarmos nossas inferências. No entanto, na medida em que vamos
avançando nos argumentos, percebemos os caminhos pelos quais o autor quer
nos conduzir e vamos, pouco a pouco, desvendando sentidos.

A seguir, vamos verificar outra estratégia que pode facilitar o processo de


interpretação. Trata-se da elaboração de esquemas.
Da Leitura à Compreensão Textual | UNIDADE 2 51

2.4 Esquemas de Leitura


Você sabe fazer um esquema?

Em um esquema, você pode mapear as principais informações de um texto,


organizando-as de maneira lógica, a fim de ter em mãos um resumo. Essa é uma
ótima alternativa para sintetizar um texto e retomá-lo em outro momento.

Fazer um esquema também possibilita que você organize o pensamento e


compreenda as relações lógicas que se estabelecem no texto. Enquanto o constrói,
você automaticamente estuda o assunto abordado, o que facilita o estudo para
uma prova, por exemplo.

Para que você entenda o que é um esquema, vamos construir um modelo a partir
do texto “A Era da Burrice”? Mãos à obra!

Figura 2.6 – Esquema de Leitura: A Era da Burrice.

A inteligência
humana está
caindo
1º Parágrafo:
descrição do
problema Há sinais de queda
de inteligência
emocional

2º Parágrafo: Pesquisas
comprovação indicam a
do problema queda de QI

Conceito de QI;
3º Parágrafo: critérios de
descrição de QI pontuação do QI

A Era Genética
da Burrice

4º Parágrafo: Exposição
causas da queda excessiva à
de inteligência tecnologia

Prática de leitura e
escrita restritas
(smartphones)

Tendência do
homem de não
mudar de opinião
5º Parágrafo:
causas da queda
de inteligência Tendência do
homem de se achar
mais inteligente do
que os outros

Fonte: Elaborado pelos autores.


52 COMUNICAÇÃO E LINGUAGEM | Ângela Kroetz dos Santos e Gilberto Fonseca

Verifique que o nosso esquema foi construído com base nos parágrafos do
texto. A lógica partiu da captura da ideia central de cada parágrafo. Essa é uma
forma de construção, mas não a única. Você poderia dividir o texto em causas e
consequências da queda de inteligência, por exemplo. Os caminhos são muitos.
O importante é que você perceba o quanto esse exercício pode facilitar a sua
leitura.

Preparado para construir os seus próprios esquemas? Procure experimentar


esse recurso nos textos que você lê para as aulas.

DESTAQUE

Figura 2.7 – Como ler mais e melhor?

COMO LER MAIS E MELHOR?


Você sabe explorar bem o tempo que dedica à leitura e
ao estudo? Algumas dicas simples podem facilitar a sua
experiência leitora e motivá-lo a ler mais.

1 CRIE O HÁBITO DE LER


Leia um pouco todos os dias. Se você não é um expert
em leitura, comece aos poucos. Inicie pelos gêneros
mais simples e curtos e amplie o repertório até chegar a
textos mais complexos.

2 GERENCIE O TEMPO
Organize-se de modo a incluir a leitura e os estudos
na sua vida. Acha que não é possível? Com esforço e
organização você encontra tempo para ampliar o
conhecimento.

3 ESTABELEÇA UM LOCAL
Hoje temos baixa capacidade de concentração devido
aos estímulos a que somos submetidos. Procure ler em
um local silencioso e propício à concentração.

4 DESLIGUE-SE DAS REDES SOCIAIS


Enquanto lê e estuda, desligue-se dos aparelhos
eletrônicos e das redes sociais para que a sua leitura
seja mais produtiva.

5 CONCENTRE-SE
Concentrar-se é um exercício. Respire profundamente
(inspire e expire algumas vezes) para diminuir o ritmo e
focar a atenção na atividade que você vai executar.

6 RABISQUE O TEXTO
Faça anotações, resumos e esquemas. Isso facilita a
retomada do que é mais importante, favorecendo que
você retenha o que é essencial.

Fonte: Elaborado pelos autores.


Da Leitura à Compreensão Textual | UNIDADE 2 53

2.5 Interpretação e Intertextualidades


Você certamente já observou que muitas vezes um texto cita outro texto, ou que
um texto faz você se lembrar de outro, como se houvesse um diálogo entre eles.
Se você já reconheceu esse fenômeno, já teve contato com a intertextualidade.

O filósofo russo Mikhail Bakhtin (1895-1975) afirmava que nada do que falamos
é novo, pois tudo o que dizemos vem de discursos anteriores, proferidos pelos que
nos antecederam. De acordo com essa ideia, tudo o que você diz traz resquícios
de outras vozes, já que você se respalda nas experiências e conhecimentos
obtidos ao longo da vida para sustentar posicionamentos.

Essa maneira de pensar justifica a ideia de intertextualidade. De acordo com


Koch e Elias (2008), a intertextualidade se refere à construção de textos que
fazem referência a outros textos. Nem sempre a intertextualidade é explícita,
e, dependendo do conhecimento prévio que você tem ou não tem, pode percebê-
la ou não.

As Figuras a seguir são exemplo de intertextualidade. Quando você vê a primeira,


o que lhe vem à mente? É difícil não se lembrar da icônica foto dos Beatles
atravessando a Abbey Road em Londres. Veja que a releitura da foto contempla
detalhes do retrato original (de 1969), como os carros estacionados, a roupa
vestida pelos personagens e os pés descalços do Cebolinha (Paul McCartney na
foto original). Apesar disso, há particularidades que identificam as personagens
de Maurício de Souza, como o Sansão, a melancia e o guarda-chuva do Cascão.
Note que, no exemplo, a intertextualidade é o que provoca o humor na charge
de Maurício de Souza.

Figura 2.8 – Gênero charge | Domínio discursivo jornalístico.

Fonte: Banco de imagens Google (2018).


54 COMUNICAÇÃO E LINGUAGEM | Ângela Kroetz dos Santos e Gilberto Fonseca

GLOSSÁRIO

A charge da Turma da Mônica trata-se de uma Paródia.

A paródia é uma nova interpretação, uma recriação de uma obra já existente


e, em geral, consagrada. A paródia é, pois, a criação de um novo texto
com base em um texto já existente, com uma finalidade satírica, irônica ou
humorística.

A partir desse exemplo, você pode perceber a importância do conhecimento de


mundo para compreender as diversas produções humanas. Vamos agora analisar
um exemplo de intertextualidade no gênero conto.

| GÊNERO CONTO | DOMÍNIO DISCURSIVO FICCIONAL |

A Princesa e a Rã

Era uma vez... numa terra muito distante... uma princesa linda,
independente e cheia de autoestima.

Ela se deparou com uma rã enquanto contemplava a natureza e


pensava em como o maravilhoso lago do seu castelo era relaxante
e ecológico...

Então, a rã pulou para o seu colo e disse: linda princesa, eu já fui um


príncipe muito bonito.

Uma bruxa má lançou-me um encanto e transformei-me nesta rã


asquerosa.

Um beijo teu, no entanto, há de me transformar de novo num belo


príncipe e poderemos casar e constituir lar feliz no teu lindo castelo.

A tua mãe poderia vir morar conosco e tu poderias preparar o meu


jantar, lavar as minhas roupas, criar os nossos filhos e seríamos
felizes para sempre...

Naquela noite, enquanto saboreava pernas de rã sautée,


acompanhadas de um cremoso molho acebolado e de um finíssimo
vinho branco, a princesa sorria, pensando consigo mesma:

– Eu, hein? Nem morta!

Luís Fernando Veríssimo

Fonte: http://gg.gg/cvmia.
Da Leitura à Compreensão Textual | UNIDADE 2 55

O conto é um gênero caracterizado por uma narrativa de curta a média extensão.


O tipo textual predominante é a narrativa, com presença de personagens e ações
que determinam o curso de uma história. O texto acima classifica-se como conto
e apresenta intertextualidade com a história “A princesa e o sapo”. Trata-se,
novamente, de uma paródia, uma vez que é reescrito em uma nova perspectiva,
originando um final imprevisto e humorístico.

O final do conto de fadas é desconstruído quando a princesa escolhe um novo


destino, diferente do predestinado no original. Dessa forma, a releitura de Luís
Fernando Veríssimo faz uma crítica ao papel que a sociedade impõe às mulheres,
ao mesmo tempo em que concede a elas o poder de mudar o seu destino.
Com isso, o texto busca fomentar no leitor um olhar crítico para a realidade.

Na sequência, vamos analisar um exemplo de intertextualidade no gênero tira.

Figura 2.9 – Gênero tira | Domínio discursivo jornalístico/lazer.

Fonte: Quino (2010).

No texto acima, no segundo quadrinho, o autor dá pistas da intertextualidade


ao citar a “formiga da fábula”. É muito difícil alguém não conhecer a fábula em
questão, já que ela faz parte do repertório de quase todos nós desde a infância.
Ainda assim, o leitor precisa ter um conhecimento um pouco mais aprofundado
para compreender o último quadrinho, que faz menção a Esopo. Esopo foi um
escritor da Grécia antiga a quem é atribuída a autoria de diversas fábulas, dentre
elas “A Cigarra e a Formiga”. O humor da tira se estabelece quando Manuelito
amaldiçoa o autor da fábula por ter criado uma história que exalta quem trabalha
e critica quem só descansa. No entendimento da personagem, a moral da
fábula não é tão boa, já que os que descansam estão felizes e ele, que trabalha,
está infeliz. Há, com isso, uma subversão da moral da fábula.
56 COMUNICAÇÃO E LINGUAGEM | Ângela Kroetz dos Santos e Gilberto Fonseca

A propaganda a seguir traz outro exemplo de intertextualidade que podemos


explorar.
Figura 2.10 – Gênero propaganda | Domínio discursivo publicitário.

Fonte: Campanha de Doação de Órgãos Santa Casa de Porto Alegre (2017).

A campanha publicitária veiculada pela Santa Casa de Porto Alegre em prol


da conscientização para a doação de órgãos no ano de 2017 teve como tema
“Vida. O Show tem que continuar”. Há, na cultura da música popular brasileira,
uma canção com o mesmo título, “O Show tem que continuar”. A canção,
composta por Arlindo Cruz e Luiz Carlos da Vila, foi regravada por uma série
de artistas brasileiros.

| GÊNERO MÚSICA | DOMÍNIO DISCURSIVO CULTURAL |

O teu choro já não toca, meu bandolim


Diz que minha voz sufoca, teu violão
Afrouxaram-se as cordas e assim desafina
E pobre das rimas da nossa canção
Se hoje somos folha morta, metais em surdina
Fechada a cortina, vazio o salão
Se os duetos não se encontram mais
E os solos perderam emoção
Se acabou o gás pra cantar o mais simples refrão
Se a gente nota em uma só nota já nos esgota
O show perde a razão
Mas iremos achar o tom, um acorde com um lindo som
E fazer com que fique bom outra vez, o nosso cantar
E a gente vai ser feliz, olha nós outra vez no ar
O Show tem que continuar
Da Leitura à Compreensão Textual | UNIDADE 2 57

O gênero música apresenta como característica principal o formato em versos.


A canção em questão também evidencia rimas no final de vários versos (violão/
canção/ salão/ emoção/ refrão/ razão – cantar/ continuar, etc.).

A letra abre algumas perspectivas de interpretação. Inicialmente, parece se


referir a carreiras em crise (os duetos não se encontram mais/ os solos perderam
a emoção). Entretanto, parece possível estender a compreensão a qualquer
crise que aconteça na vida do ser humano, ou seja, situações de desencontros
(teu choro já não toca meu bandolim, minha voz sufoca teu violão) que fazem
com que as emoções se esvaziem (somos folha morta, metais em surdina) e que
os relacionamentos/situações sejam finitos (fechada a cortina, vazio o salão,
os solos perderam emoção). Nessas circunstâncias de crise, o show perderia a
razão, e seria preciso achar uma forma para que “fique bom outra vez o nosso
cantar”, para voltar ao ar, para, enfim, o show continuar.

Quando a propaganda da doação de órgãos se apropria do slogan da música,


interpreta-se que a morte também é uma dessas situações que evocam fim de
show, perda da emoção, cortina fechada, salão vazio. Nessa perspectiva, a
doação de órgãos seria a forma de prosseguir com a vida, de fazer o show da
vida continuar, não mais naquele que partiu, mas em uma outra pessoa que pode
seguir vivendo a partir do gesto de quem doa.

Você conseguiu perceber como a intertextualidade modifica a forma como


interagimos com os diversos textos? É exatamente por causa desse diálogo
permanente que há entre as produções humanas que precisamos aprimorar
constantemente o nosso repertório cultural e o nosso conhecimento de mundo
para sermos leitores proficientes.

A seguir, vamos ampliar um pouco mais o nosso repertório, voltando o olhar,


desta vez, à interpretação de textos não verbais.
58 COMUNICAÇÃO E LINGUAGEM | Ângela Kroetz dos Santos e Gilberto Fonseca

2.6 Interpretação de Textos Não Verbais


Na comunicação cotidiana, você não utiliza apenas palavras, mas múltiplas
linguagens. Talvez você nem se dê conta disso, porque relaciona automaticamente
à linguagem falada gestos, expressões e sinais. Da mesma forma, à linguagem
escrita podem estar associados elementos visuais e expressivos que
complementam o sentido das palavras, ou que por si sós trazem significados
completos. A linguagem não verbal, em suas múltiplas manifestações, é tão
importante quanto à verbal para a compreensão textual.

Um exemplo bastante interessante é uma obra de arte. Quando você vai a um


museu e observa um quadro, muitas vezes não encontra nada escrito. Mesmo
assim, aquele objeto comunica, expressa algo. Veja o exemplo abaixo, uma obra
de Tarsila do Amaral:

Figura 2.11 – Gênero obra de arte | Domínio discursivo cultural.

Fonte: http://gg.gg/cw9tj.

A obra “Operários” (1933) pertence à fase social da pintora brasileira. Na década


de 1930, o Brasil vivia um forte período de industrialização e de migração em
massa do interior às grandes cidades. São Paulo protagonizava esse processo,
recebendo muitos imigrantes. Se você observar o quadro, algumas características
são bem evidentes: a) há muitos rostos, todos sem expressão, e não há nenhum
Da Leitura à Compreensão Textual | UNIDADE 2 59

corpo; b) as pessoas estão empilhadas uma sobre a outra; c) há mistura de raças


e gêneros; d) há presença do elemento industrial, as chaminés ao fundo.
Todas essas características levam a perceber a massificação, ou seja, o processo
de “coisificação” das pessoas, que, ao trabalharem nas grandes fábricas, passam
a alimentar o estilo capitalista, alicerçado no ganho de capital acima dos valores
humanos. A obra é, pois, uma denúncia dessa realidade que aprisiona o homem
e lhe tira a individualidade. Essa reflexão, contudo, não pode ser feita se você
não souber o mínimo sobre o contexto histórico que envolvia a Era Vargas
(1930-1945), governo vigente no ano em que a obra foi produzida.

SAIBA MAIS

Tarsila do Amaral (1886-1973) foi uma pintora brasileira. Filha de um


abastado fazendeiro de São Paulo, viveu na Europa e, interessada em artes,
estudou escultura, desenho e pintura em Paris. Em 1922, voltou ao Brasil
e se inseriu no grupo que promoveu a Semana de Arte Moderna, evento
que buscou revolucionar o pensamento da época, voltado à valorização da
cultura externa, europeia, em detrimento da interna. O movimento buscava a
legitimação da cultura brasileira, ou seja, a valorização da língua e da cultura
do Brasil.

Saiba mais no site oficial da artista: http://gg.gg/cvmjv.

Um gênero textual que utiliza muito a combinação de texto verbal e não verbal
é o anúncio publicitário. Nesses textos, geralmente os elementos não verbais são
fundamentais para que se alcance o objetivo, que é promover um produto, uma
empresa, uma causa, etc. Muitas vezes o entendimento de uma mensagem só é
possível quando se alia o texto verbal e o não verbal, como no exemplo abaixo:
60 COMUNICAÇÃO E LINGUAGEM | Ângela Kroetz dos Santos e Gilberto Fonseca

Figura 2.12 – Gênero anúncio | Domínio discursivo publicitário.

Fonte: Banco de imagens Google (2018).

Se você analisar a figura sem ler o texto, vê “pás de cimento” utilizadas em


canteiros de obras. Isso é mais evidente ainda quando você observa que a peça
publicitária se refere a uma indústria de cimento. No entanto, ao aliar a imagem
à chamada publicitária (“Uma história de amor à natureza”), você provavelmente
vai identificar uma segunda imagem oculta por trás da primeira, já que as pás
fazem alusão a árvores. Perceba que a imagem admite uma nova interpretação
quando avaliada sob a perspectiva do texto verbal.

Os exemplos de textos não verbais que estudamos são apenas alguns dentre
muitas possibilidades. Outros exemplos de linguagem não verbal são: fotos,
mapas, gráficos, quadros, diagramas, charges, infográficos e demais gêneros
que utilizam a linguagem mista (verbal e não verbal).

A seguir, você poderá explorar questões interpretativas. Exercícios desse tipo


podem ser contemplados em concursos ou nas avaliações das disciplinas de seu
curso de graduação.
Da Leitura à Compreensão Textual | UNIDADE 2 61

2.7 Interpretação de Questões Modelo ENADE


Ao longo do curso, você vai ouvir falar muito do ENADE (Exame Nacional de
Desempenho de Estudantes). Esse exame avalia o rendimento dos concluintes
dos cursos de graduação em relação aos conteúdos programáticos, às habilidades
e às competências adquiridas durante a formação. O ENADE é composto por
questões relacionais, que procuram estimular nos estudantes a reflexão crítica,
a capacidade de analisar, de comparar, de deduzir e de sintetizar, além de aplicar
e articular conceitos estudados. (INEP, 2018).

Como você pode perceber, perguntas no modelo ENADE serão amplamente


utilizadas, de modo que você precisa entender como elas funcionam e como
interpretá-las. Assim, vamos analisar algumas questões nesse modelo, para que
você comece a treinar o seu olhar para esse tipo de atividade.

DICA

Tente primeiro resolver cada exercício e depois verifique a análise de cada


alternativa para checar se você interpretou corretamente as respostas.

2.7.1 Questão Modelo ENADE 1


Leia a seguinte tirinha da Turma da Mônica:

Figura 2.13 – Tirinha.

Fonte: Banco de imagens Google (2018).


62 COMUNICAÇÃO E LINGUAGEM | Ângela Kroetz dos Santos e Gilberto Fonseca

Analise as seguintes afirmativas sobre a tirinha:

I. há intertextualidade com a história bíblica de Adão e Eva, e o humor se


estabelece justamente quando o texto original é desconstruído pela tira;

II. apenas pela intertextualidade é possível saber quem são Adão e Eva, uma vez
que eles não aparecem como personagens explícitos da tira;

III. não é necessário ter nenhum conhecimento prévio para fazer a correta
interpretação da tira. Como a personagem Magali é conhecida como comilona,
não é difícil interpretar o final da tira.

São corretas as seguintes afirmativas:

a. apenas a I.

b. apenas a I e a II.

c. apenas a II e a III.

d. apenas a II.

e. apenas a III.

Você já respondeu à questão? Vamos, então, analisar atentamente cada afirmativa.

A afirmativa I está correta. De fato, existe intertextualidade da tira com um texto


bíblico. Quem não conhece a história do pecado de Adão e Eva que comeram
a maçã e foram expulsos do paraíso? Entretanto, o texto bíblico não é seguido
à risca, e Magali, a personagem, come a maçã em vez de oferecê-la a Adão.
Com a desconstrução do texto original, o humor se estabelece na tira.

A afirmativa II também está correta. Adão e Eva não são personagens explícitos
da tira. As personagens que de fato aparecem são Magali e a serpente. Tanto
é assim que a cobra diz que “quem nasceu pra Magali nunca chegará a Eva”.
Entretanto, como temos um conhecimento prévio acerca da história bíblica de
Adão e Eva, percebemos a intertextualidade.

A afirmativa III está incorreta. É preciso, sim, ter conhecimento prévio para
interpretar a tira. Quem não conhece a história bíblica que embasa o texto não
conseguirá interpretá-lo.

Assim, a resposta correta é a letra “B”.

Como você se saiu? Achou a questão difícil? Perceba que todos os elementos
necessários para a compreensão estão no texto. Vamos analisar mais uma
questão?
Da Leitura à Compreensão Textual | UNIDADE 2 63

2.7.2 Questão Modelo ENADE 2:


Analise o seguinte cartaz publicitário:

Figura 2.14 – Cartaz.

É DESSA FLORESTA QUE SAI O CHAPEUZINHO VERMELHO,


JOÃO E MARIA, OS IRMÃOS KARAMAZOV, A DAMA DAS
CAMÉLIAS E OS TRÊS MOSQUETEIROS.

Fonte: Revista Bolsa, 1986. In: CARRASCOZA, J. A. A evolução do texto publicitário: a associação
de palavras como elemento de sedução na publicidade. São Paulo: Futura, 1999 (adaptado).

Nesse cartaz publicitário de uma empresa de papel e celulose, a combinação dos


elementos verbais e não verbais visa a:

a. justificar os prejuízos ao meio ambiente, ao vincular a empresa à difusão


da cultura.

b. incentivar a leitura de obras literárias, ao referir-se a títulos consagrados


do acervo mundial.

c. seduzir o consumidor, ao relacionar o anunciante às histórias clássicas da


literatura universal.

d. promover uma reflexão sobre a preservação ambiental ao aliar o


desmatamento aos clássicos da literatura.

e. construir uma imagem positiva do anunciante, ao associar a exploração


alegadamente sustentável à produção de livros.
64 COMUNICAÇÃO E LINGUAGEM | Ângela Kroetz dos Santos e Gilberto Fonseca

Para resolver esta questão, primeiramente você precisa ativar os seus


conhecimentos prévios para entender quem são os personagens a que o anúncio
se refere: Chapeuzinho Vermelho e João e Maria (clássicos da literatura infantil);
os irmãos Karamazov (literatura russa, de Fiódor Dostoyewski); a Dama das
Camélias (literatura francesa, de Alexandre Dumas Filho); os 3 Mosqueteiros
(literatura francesa, de Alexandre Dumas Pai). Aqui descrevemos os autores,
mas você não precisa saber isso. O que importa saber é que todos eles são
personagens de obras literárias.

Qual a ligação desses personagens com uma floresta? Sabe-se que o papel é
feito da celulose, que advém das árvores. A partir desses conhecimentos
prévios, pode-se inferir que o cartaz publicitário faz um jogo de linguagem
ao dizer que os personagens saem da floresta. Na verdade, a floresta origina a
celulose, a celulose origina o papel, o papel origina os livros e nos livros estão
os personagens citados. Assim, indiretamente, os personagens saem da floresta.

Em um segundo momento, a imagem mostra uma área reflorestada, o que


pressupõe a sustentabilidade ambiental, ou seja, a preocupação da empresa que
produz o papel em restaurar a floresta.

Por fim, deve-se analisar o objetivo de um anúncio publicitário. Este serve para
vender ou para exaltar uma qualidade positiva de um produto ou anunciante.

A partir desses elementos, conclui-se que a alternativa correta é a “E”.

Essa questão exige alguns conhecimentos prévios do leitor e a articulação desses


conhecimentos a fim de chegar à resposta correta.
Da Leitura à Compreensão Textual | UNIDADE 2 65

SÍNTESE DA UNIDADE
Ao longo desta unidade, você estudou a leitura e suas diversas interfaces,
refletindo sobre a importância do leitor e sobre a participação ativa dele no
processo de construção de sentidos de um texto. Além disso, você identificou
estratégias de leitura e de interpretação textuais que buscam facilitar a interação
com os diversos gêneros textuais com os quais você lida no seu dia a dia.
Essas estratégias, que visam a tornar mais dinâmica e precisa a sua relação
com os textos, são: seleção, antecipação, inferência, verificação e ativação
de conhecimentos prévios. Essas etapas pressupõem um estudo minucioso do
texto com o objetivo de analisar os sentidos que ele estabelece.

Os sentidos de um texto não são fechados e, por isso, o processo de interpretação


requer um leitor atento, que reconheça as sutilezas do texto e contribua para
preencher suas lacunas. A partir dessas estratégias, você vai desvendando o
texto, imaginando os rumos que ele pode tomar, mudando rotas, fazendo novas
inferências. Em relação aos conhecimentos prévios, estes dizem respeito à
articulação de todos os conhecimentos que você acumula ao longo da vida.
No decorrer da leitura, eles vão sendo ativados e contribuem para a compreensão.

Você também estudou a interpretação textual em contextos de intertextualidade,


verificando como diferentes textos mantêm diálogo entre si e se complementam
mutuamente, em um constante movimento de integração das produções
humanas. Outro aspecto estudado foi a interação entre linguagem verbal e não
verbal, mais uma vez sob o foco da interpretação textual.

A partir de agora, em suas leituras, você pode fazer os exercícios que propomos
neste capítulo, aprimorando seu olhar, a fim de enxergar além do que está escrito
em um texto. E lembre-se: a habilidade de interpretar você adquire com treino!
66 COMUNICAÇÃO E LINGUAGEM | Ângela Kroetz dos Santos e Gilberto Fonseca

REFERÊNCIAS
GOULART, C. R.; BOTH, J. T. Interpretação e compreensão de textos. In: AIUB, T
N. (Org). Português: práticas de leitura e escrita. Porto Alegre: Penso, 2015.

GUIMARÃES, T. C. Comunicação e Linguagem. São Paulo: Pearson, 2011.

HOUAISS, A. Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa. Rio de Janeiro: Objetiva,


2009.

INEP. Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira.


2018. Disponível em: http://gg.gg/cvmll. Acesso em: 06 de nov. 2018.

KOCH, I. V.; ELIAS, V. M. Ler e compreender: os sentidos do texto. 2. ed. São


Paulo: Contexto, 2008.

MARCUSCHI, L. A. Produção Textual, análise de gêneros e compreensão. São


Paulo: Parábola, 2008.

PARÂMETROS CURRICULARES NACIONAIS – Língua Portuguesa (PCN).


Brasília, 1998. Disponível em: http://gg.gg/cvmlk. Acesso em 19 out. 2018.

SZKLARZ, E.; GARATTONI, B. A Era da Burrice. Revista Superinteressante.


Edição 394, out. 2008.
Da Leitura à Compreensão Textual | UNIDADE 2 67

ANOTAÇÕES
68 COMUNICAÇÃO E LINGUAGEM | Ângela Kroetz dos Santos e Gilberto Fonseca
unidade

3
A Articulação da Escrita
Prezado estudante,

Estamos começando uma unidade desta disciplina. Os textos que a compõem


foram organizados com cuidado e atenção, para que você tenha contato com
um conteúdo completo e atualizado tanto quanto possível. Leia com dedicação,
realize as atividades e tire suas dúvidas com os tutores. Dessa forma, você, com
certeza, alcançará os objetivos propostos para essa disciplina.

OBJETIVO GERAL
Estudar os principais elementos necessários à adequada articulação da
escrita, com o objetivo de elaborar frases, parágrafos e textos coesos e
coerentes, que garantam uma comunicação efetiva e crítica a partir do uso
lógico e dinâmico da língua.

OBJETIVOS ESPECÍFICOS
• Refletir sobre a escrita como processo emancipatório dos sujeitos;

• Refletir sobre a escrita na contemporaneidade;

• Compreender os conceitos de coesão e coerência;

• Estudar os articuladores textuais;

• Estudar a estrutura da frase, do parágrafo e do texto;

• Buscar estratégias dinâmicas de escrita textual, com foco no texto


argumentativo;

• Organizar esquemas de texto que facilitem a escrita textual.

QUESTÕES CONTEXTUAIS
1. Você tem dificuldade de escrever?

2. Acredita que, por vezes, lhe falte “inspiração” para redigir um texto?

3. O que você pode fazer para melhorar a sua escrita?


70 COMUNICAÇÃO E LINGUAGEM | Ângela Kroetz dos Santos e Gilberto Fonseca

3.1 Introdução
Você já se percebeu em uma situação em que precisava escrever e, mesmo cheio
de ideias e argumentos sobre um assunto, teve dificuldades de colocá-los no
papel? Ou, ainda, as ideias lhe faltaram e você acreditou não estar “inspirado”
para escrever? Você não é o único que passou (ou passa) por isso! No entanto,
ao contrário do que muitos pensam, a escrita não depende de uma “inspiração”
que surge como um passe de mágica. Escrever é mais uma das muitas atividades
humanas que requerem treino para serem bem executadas.

Uma escrita coesa, precisa, coerente e sem erros graves é uma habilidade que
se espera de qualquer profissional. Isso reforça, mais uma vez, a ideia de que
o domínio da língua é determinante para o bom desempenho dos sujeitos em
qualquer profissão. No capítulo anterior, você pôde perceber que para interpretar
é necessário ampliar o repertório cultural e comunicativo, o que acontece por
meio da leitura e das experiências culturais a que você tem acesso. Você também
foi estimulado a notar que a leitura estende a capacidade de compreender as
estruturas linguísticas que constituem os diversos gêneros.

A boa notícia é que, para escrever bem, os pré-requisitos são os mesmos!


Ao desenvolver a habilidade de interpretar, você aprimora a capacidade de
escrever, visto que os elementos necessários para essas duas atividades são
similares: reconhecer estruturas linguísticas e textuais, aprimorar práticas
culturais e desenvolver a fluência. Assim, novamente, quanto mais você lê,
maior é o seu repertório para escrever, visto que a escrita demanda, igualmente,
conhecimento de mundo. Com isso, entende-se que escrever não é algo que se
realiza do nada. É preciso ter o que dizer, e só tem o que dizer quem sabe o que
acontece, quem lê, quem se relaciona, quem interage.

Nesta unidade, você é convidado a refletir sobre a escrita e sobre a sistematização


de textos argumentativos. Expressar-se adequadamente pela escrita é
fundamental para a sua carreira, como também é imprescindível que você saiba
defender logicamente um pensamento, utilizando argumentos plausíveis para
defender suas posições. Independente da dificuldade que você sinta ao escrever,
seja em termos de criação ou de organização, algumas práticas simples podem
qualificar muito o seu texto. Vamos conhecê-las?
A Articulação da Escrita | UNIDADE 3 71

Na Figura 3.1, está contemplada a sequência didática da Unidade 3.

Figura 3.1 – Sequência Didática.

A escrita na
contemporaneidade

A Construção Estruturas
do Texto Básicas da
Argumentativo Escrita

Estrutura do Texto e
Texto Fatores de
Argumentativo Textualidade

Elementos
de Coesão
e Coerência

Fonte: Elaborado pelos autores.


72 COMUNICAÇÃO E LINGUAGEM | Ângela Kroetz dos Santos e Gilberto Fonseca

3.2 A Escrita na Contemporaneidade


Para que você entenda o valor da escrita na contemporaneidade, é interessante
retomar a origem da escrita, já contemplada na Unidade 1, verificando o quanto
ela contribuiu para que chegássemos à era tecnológica. Você se lembra de que
a escrita fomentou o desenvolvimento das civilizações por meio da transmissão
do conhecimento pelos séculos afora? Recorda-se de que falamos sobre o fato de
a sociedade ter passado de uma dimensão oral para uma perspectiva de escrita,
transformando hábitos sociais antes voltados à oralidade?

Por meio desse histórico, entendemos a significativa importância que o texto


adquire na vida contemporânea. É possível dizer, como explora a reportagem
que analisamos na Unidade 2, que nunca se escreveu tanto quanto hoje, muito
embora a escrita moderna seja fragmentada e reduzida a frases curtíssimas
redigidas em smartphones. É inegável que a tecnologia impôs novas formas
de nos relacionarmos com a escrita, mas, apesar disso, é essencial que você
tenha o domínio da língua escrita padrão (assim como de suas variações),
visto que ela empodera o sujeito e pode permitir ou negar o seu acesso a
determinados círculos.

Nas próximas seções, você aprofundará o seu conhecimento acerca da escrita e


de suas propriedades, iniciando pelas formas mais elementares: a frase e o
parágrafo. Adicionalmente, verificará breves tópicos de sintaxe. Contudo, esse
aspecto não será aprofundado, uma vez que o objetivo desta unidade é,
primordialmente, que você exercite a escrita.

GLOSSÁRIO

SINTAXE é a “parte da gramática que estuda as palavras enquanto elementos


de uma frase, as suas relações de concordância, de subordinação e de
ordem”. (HOUAISS, 2009, p. 1751).
A Articulação da Escrita | UNIDADE 3 73

3.3 Estruturas Básicas da Escrita:


Frase e Parágrafo
Você sabe que a frase é a estrutura básica da comunicação humana? Sempre
que você fala ou escreve, junta as palavras em frases, para que formem sentido
e comuniquem o que você quer expressar. A palavra possui significado por si
só, mas é apenas na sua interação com outros termos, em uma frase, e na sua
inserção em um contexto comunicativo, que ela adquire valor.

Como exemplo, podemos citar a palavra trabalho. Se consideramos o termo


isoladamente, talvez você imagine que estejamos falando do substantivo
trabalho (O trabalho estava bastante difícil.), mas é possível que nossa
intenção tenha sido utilizar o verbo (Eu trabalho todos os dias da semana.).
Perceba que é o contexto que determina o sentido por meio da interação
que existe entre os termos. Observe que tomando a palavra isoladamente,
ela admite mais de um significado, já dentro da frase, na maioria da vezes,
apenas um sentido é possível.

Uma frase é um enunciado que possui sentido completo. Existem diferentes


tipos de frases: as frases nominais (formadas apenas por substantivos, adjetivos
etc), as orações (apresentam um verbo) e os períodos (apresentam mais de um
verbo). No exemplo a seguir, você pode visualizar a estrutura básica de uma
oração, a saber, a divisão entre sujeito e predicado (formado por verbo e/ou
complementos):

A empresa em que João trabalha concedeu férias coletivas


SUJEITO (quem pratica a ação) A empresa em que João trabalha
VERBO (a ação) concedeu
COMPLEMENTO (complementa o
férias coletivas
verbo: concedeu o que?)

DESTAQUE

Quando temos um conjunto de frases que “conversam entre si”, reconhecemos


um parágrafo. Um parágrafo, por sua vez, pode ter sentido completo ou
também depender da relação com outros parágrafos para expressar uma
ideia global. A reunião de vários parágrafos encadeados é um texto. Com
isso, você pode perceber que o mecanismo de articulação da língua funciona
com o agrupamento de palavras em frases, de frases em parágrafos, e de
parágrafos em textos.
74 COMUNICAÇÃO E LINGUAGEM | Ângela Kroetz dos Santos e Gilberto Fonseca

Parece simples, mas nem sempre é. Muitas pessoas têm dificuldade de escrever
e de articular logicamente as ideias por desconhecerem os mecanismos de
encadeamento da língua. Se esse é o seu caso, para facilitar a sua prática, você
precisa começar pelo princípio: aprender a construir boas frases, seguir para
bons parágrafos para, por fim, construir bons textos.

Então, vamos seguir esse caminho e falar sobre a construção de frases.


Um erro comum é a elaboração de frases muito extensas. Frases longas podem
comprometer a argumentação, enquanto frases curtas demais podem fragmentar
o texto. Veja exemplos dessas ocorrências:

FRASE LONGA FRASES FRAGMENTADAS CONSTRUÇÃO IDEAL


A indústria de alimentação A indústria de alimentação A indústria de alimentação,
abrange as empresas de abrange as empresas de que abrange tanto empresas
alimentos e bebidas e verifica-se alimentos e bebidas. Verifica- de alimentos quanto de
que o setor apresentou aumento se que o setor apresentou bebidas, apresentou aumento
do faturamento tanto para o aumento do faturamento. Isso no do faturamento nos mercados
mercado interno, quanto para mercado interno e no mercado interno e externo entre 2012 e
o mercado externo, entre 2012 externo, entre 2012 e 2014. 2014. Contudo, o desempenho
e 2014, mas o desempenho Mas o desempenho positivo da positivo do setor foi afetado pelo
positivo da indústria brasileira e indústria brasileira e do setor de cenário econômico brasileiro,
do setor de alimentos foi afetado alimentos foi afetado pelo cenário considerando que o PIB sofreu
pelo cenário da economia do da economia do Brasil. Em 2015 retração de 3,8% em 2015 e
Brasil, em 2015 o PIB apresentou o PIB apresentou uma retração de 3,6% em 2016. Em função
uma retração de 3,8%, enquanto de 3,8%. Enquanto que em da recessão da economia, a
que em 2016 essa retração foi de 2016 essa retração foi de 3,6%, indústria de transformação
3,6%, em função do encolhimento em função do encolhimento apresentou queda de 5,2%
da economia a indústria de da economia. A indústria de em 2016, e a produção física
transformação apresentou queda transformação apresentou queda da indústria de alimentação
de 5,2% em 2016 e a produção de 5,2% em 2016. A produção caiu 1% no mesmo ano. Nesse
física da indústria de alimentação física da indústria de alimentação contexto, as empresas, em
teve resultado de queda de 1% teve resultado de queda de 1% geral, e o setor de alimentos, em
no mesmo ano, as empresas em no mesmo ano. As empresas em particular, precisaram se tornar
geral e o setor de alimentos, em geral e o setor de alimentos, em mais competitivos.
particular, precisaram se tornar particular, precisaram se tornar
mais competitivos. mais competitivos.

Veja que, na frase longa, há apenas um ponto final. As muitas informações estão
sobrepostas, distanciando-se do objetivo da argumentação. O leitor perde o “fio
da meada”, e não consegue prestar atenção à condução das ideias. Já a segunda
sequência é uma sucessão de frases entrecortadas, sendo que algumas relações
entre elas se perdem. O texto ideal é o que apresenta frases não tão extensas,
e igualmente não tão cortadas. Nesse formato, cada frase trabalha uma ideia,
ou seja, tem-se o cuidado de manter os elementos da frase padrão (sujeito –
verbo – complemento). Na proposta, você facilmente identifica quem é o sujeito
(quem pratica a ação), diferentemente da frase longa, em que tal definição não
é precisa. Assim, lembre-se de jamais construir frases tão longas quanto a do
exemplo, porque elas dificultam, e muito, o entendimento do leitor.
A Articulação da Escrita | UNIDADE 3 75

Começamos falando em frase, mas logo avançamos ao parágrafo, uma vez que
transformamos a frase única do exemplo em um parágrafo. O que podemos
perceber ao analisar mais precisamente o parágrafo que construímos? Vejamos:

Figura 3.2 – A composição do parágrafo.

A indústria de alimentação, que abrange tanto


empresas de alimentos quanto de bebidas, Apresenta um fato O setor de alimentos
Fase 1 apresentou aumento do faturamento nos cresceu entre 2012 e 2014.
mercados interno e externo entre 2012 e 2014.

Contudo, o desempenho positivo do setor foi Apresenta um


O desempenho do setor de
afetado pelo cenário econômico brasileiro, contraponto ao fato
Fase 2 considerando que o PIB sofreu retração de
alimentos foi afetado com
a queda do PIB.
3,8% em 2015 e de 3,6% em 2016.

Em função da recessão da economia, a indústria Explica


de transformação apresentou queda de 5,2% Os números confirmam
contraponto
Fase 3 em 2016, e a produção física da indústria de o desempenho negativo
alimentação caiu 1% no mesmo ano. do setor de alimentos.

Nesse contexto, as empresas, em geral, e o Conclui o


As empresas do setor setor
Fase 4 setor de alimentos, em particular, precisaram pensamento
precisam ser competitivas
se tornar mais competitivos. para contornar a crise.

Fonte: Elaborado pelos autores.

Quando analisamos frase a frase, parece que tudo se torna mais claro,
e compreendemos melhor o processo de construção. Existe uma lógica que
permeia a ligação dos elementos que compõem o parágrafo. A estrutura da
Figura 3.2 permite compreender que o parágrafo é uma unidade constituída
por uma oração que desenvolve uma ideia central, a qual se agregam outras
orações que apresentam ideias secundárias, decorrentes da ideia central e a ela
relacionadas pelo sentido.

Guimarães (2011) apresenta a noção de que o parágrafo é construído a partir de


um Tópico Frasal, ou seja, de uma ideia núcleo, que seria a principal informação
do parágrafo, sendo que as demais ideias são apenas um desdobramento do que
foi expresso no tópico. De acordo com a autora, a estrutura do parágrafo-padrão
seria a seguinte:

Parágrafo padrão = Tópico Frasal + desenvolvimento + conclusão

DESTAQUE

“Enunciando logo de saída a ideia-núcleo, o tópico frasal garante de antemão


a objetividade, a coerência e a unidade do parágrafo, definindo-lhe o propósito
e evitando digressões”. (GARCIA, 1983).
76 COMUNICAÇÃO E LINGUAGEM | Ângela Kroetz dos Santos e Gilberto Fonseca

Conforme Garcia (2003), há diferentes tipos de tópico frasal, adequados a


diferentes estilos de escrita. O autor destaca três tipos, conforme disposto na
Figura 3.3:

Figura 3.3 – Tipos de tópico frasal.

DECLARAÇÃO INICIAL DEFINIÇÃO DIVISÃO

Faz uma declaração Apresenta um Divide o tópico


genérica (ampla) conceito em conceitos
que será explicada que será que serão
desenvolvido nas explicados nas
frases seguintes frases seguintes

Fonte: Elaborado pelos autores.

Veja, no Quadro 3.1, um exemplo de cada tipo. O tópico frasal de cada parágrafo
está destacado em negrito:

Quadro 3.1 – Tipos de tópico frasal.

Declaração inicial Definição Divisão


A escrita é uma atividade Originalmente, liderar significa Nos EUA existem dois segmentos
desafiadora para muitos. De fato, conduzir. Assim, o líder é aquele políticos, a saber, o democrata
parece haver resistência à escrita que conduz um determinado e o republicano. A maior
em várias áreas do conhecimento, grupo, como fizeram Júlio diferença entre eles diz respeito
mesmo nas humanas. Um ponto César, Martin Luther King e às ideologias, que são a base
que determina essa realidade é Gandhi ao longo da história. de construção de um governo.
a ineficiência da leitura, muitas Nessa perspectiva, conforme Enquanto os democratas são de
vezes realizada sem atenção ou a Maximiano, a liderança sempre centro-esquerda, os republicanos
partir de fontes duvidosas. está relacionada a pessoas, e têm ideias de direita. Assim, a
diz respeito a tarefas que elas forma de atuação desses grupos
realizam quando são responsáveis políticos é totalmente contrária.
por um grupo.

Fonte: Elaborado pelos autores.

Até aqui, você refletiu sobre a escrita de frases e parágrafos, conhecendo


algumas particularidades de estrutura. Vamos, agora, avançar nossa reflexão
em direção ao texto e aos fatores de textualidade, que são as características que
fazem com que um texto seja, de fato, um texto.
A Articulação da Escrita | UNIDADE 3 77

NOÇÕES DE USO DA VÍRGULA

Para escrever melhor, é importante que você tenha noção de como empregar
a vírgula. A vírgula é um elemento de pontuação que contribui muito para a
coesão textual.

Tanto o sujeito quanto o predicado (verbo + complemento) são chamados termos


essenciais porque formam a estrutura básica da oração. Por isso, a ligação entre
esses termos não pode ser interrompida por uma vírgula.

No entanto, em algumas ocasiões, o uso da vírgula (ou de vírgulas) é permitido.


Veja as possibilidades:

a) Quando se intercalam termos entre o sujeito e o predicado:

A intercalação de termos entre o sujeito e o predicado deve ser marcada por


vírgulas. É indispensável que, nesses casos, haja uma vírgula antes e outra depois
do termo intercalado.

Exemplo: Os alunos, ontem à noite, apresentaram o seminário.

Sujeito Os alunos
Predicado apresentaram o seminário
Termo Intercalado ontem à noite

b) Quando vários termos formam um sujeito composto:

Exemplo: Ana, Carlos, Joana e Sandra fazem parte da comissão de formatura.

c) Quando há adjunto adverbial deslocado:

O adjunto adverbial é um termo acessório da oração. Trata-se da função sintática


exercida por um advérbio, denotando alguma circunstância sobre o fato expresso
pelo verbo ou intensificando o sentido de um verbo, advérbio ou adjetivo.

Exemplo 1: Naquela tarde, professores, tutores e alunos celebraram o sucesso da


disciplina.

Sujeito professores, tutores e alunos


Predicado celebraram o sucesso da disciplina
Termo Intercalado naquela tarde

Exemplo 2: De repente, todos foram surpreendidos com uma festa.

Sujeito todos
Predicado foram surpreendidos com uma festa
Termo Intercalado de repente
78 COMUNICAÇÃO E LINGUAGEM | Ângela Kroetz dos Santos e Gilberto Fonseca

3.4 Texto e Fatores de Textualidade


Quando você domina a redação de um parágrafo, boa parte da dificuldade de
escrever já foi vencida. A Figura 3.4 evidencia o desafio do texto:

Figura 3.4 – Os desafios do texto.

Escrever parágrafos
que se conectam
internamente

Desafio
do texto

Integrá-los em
um todo, de modo
que façam
sentido entre si

Fonte: Elaborado pelos autores.

Você já refletiu sobre quais são as características de um bom texto? E quais


são os elementos que fazem um texto ser um texto? Como já observamos, um
texto não é um amontoado aleatório de frases, mas um conjunto preciso e bem
articulado de orações que interagem entre si para produzir sentidos. Os elementos
que permitem essa boa articulação são chamados de fatores de textualidade.
São eles: coesão, coerência, informatividade, intencionalidade, aceitabilidade,
situacionalidade e intertextualidade.

A coesão se refere ao uso que você faz da língua para construir um texto. Trata-
se do emprego dos mecanismos gramaticais e lexicais, da concordância,
dos tempos e modos verbais, das conjunções, das substituições e reiterações etc.

GLOSSÁRIO

LÉXICO: é o conjunto de palavras que as pessoas de uma determinada língua


têm à sua disposição para expressar-se, oralmente ou por escrito. Pode ser
definido como o acervo de palavras de um determinado idioma.
A Articulação da Escrita | UNIDADE 3 79

A coerência corresponde ao “como” você diz. Relaciona-se ao domínio dos


mecanismos necessários para alcançar os objetivos do texto. Nesse sentido,
refere-se aos conceitos dispostos no texto (aspectos semânticos, lógicos e
cognitivos). (ANTUNES, 2005). O texto faz sentido? É lógico? Essa dimensão
diz respeito não só ao autor, mas também ao leitor, que deve ter subsídios para
compreender o texto.

A informatividade relaciona-se ao fato de você “ter o que dizer”. Ao escrever,


você deve fazer o texto progredir, trazendo informações novas na medida em
que avança. Estas devem sustentar a tese, comprovando os raciocínios que você
procura expor. Esse critério revela o grau de conhecimento do autor, e determina
o interesse que o leitor terá no texto. Se um texto não acrescenta nada, se só traz
o óbvio, o leitor pode não se interessar por ele.

A intencionalidade pode ser entendida como o que você quer transmitir com
o texto. Diz respeito às intenções de quem escreve, e está ligada à aceitação do
texto pelo leitor.

A aceitabilidade tem foco voltado ao leitor, que aceita o texto quando o


compreende e consegue interagir com ele.

A situacionalidade determina que você, enquanto autor, deve considerar o


interlocutor, o ambiente em que este se encontra e o assunto abordado, adequando
a linguagem à situação comunicativa. Se a situação é formal, você deve ter mais
cuidado com a escolha das palavras e com a organização textual como um todo.

Por fim, a intertextualidade, já estudada na Unidade 2, pressupõe que todo


texto remete a outro ou a vários textos, já que todo o conhecimento humano
sempre advém de um saber anterior, configurando uma cadeia dinâmica de
relações.

A Figura 3.5 sintetiza os fatores de textualidade:

Figura 3.5 – Fatores de textualidade.

Coesão Coerência Informatividade Intencionalidade

Aceitabilidade Situacionalidade Intertextualidade

Fonte: Elaborado pelos autores.


80 COMUNICAÇÃO E LINGUAGEM | Ângela Kroetz dos Santos e Gilberto Fonseca

Os fatores de textualidade contemplam todas as dimensões de um texto, sejam


linguísticas ou interacionais, tornando-se elementos indispensáveis a um
bom texto. De todos esses aspectos, vamos enfatizar a coesão e a coerência,
estudando-os mais detalhadamente.

3.4.1 A Coesão
Você sabe a diferença entre coesão e coerência? Embora os dois conceitos
contribuam para uma boa organização textual, a coesão é focada nos elementos
linguísticos e a coerência no sentido. A coesão atua, pois, na materialidade do
texto, e a coerência em um nível mais ideológico (de ideias). Por fim, enquanto
a coesão depende do autor, a coerência depende dos dois interlocutores (autor e
leitor).

Vamos explicar. Um texto é formado por várias frases e alguns parágrafos, e


todos precisam estar articulados entre si. A adequada articulação dos termos
indica coesão, e a adequada articulação das ideias caracteriza a coerência. É
claro que esses dois fenômenos são interdependentes.

Na língua, os elementos que possibilitam interligar palavras, frases e parágrafos


são chamamos de “articuladores textuais”. Esses articuladores são as preposições,
os advérbios e as conjunções. A Figura 3.6 apresenta tais conceitos.

Figura 3.6 – Articuladores textuais.

Preposição Advérbio Conjunção

Estabelece relações Modifica um verbo, Liga duas ou mais


entre dois ou mais um adjetivo ou uma ideias, garantindo a
termos de uma frase. oração inteira, indicando continuidade do
Só tem sentido uma circunstância sentido do texto
no contexto. (tempo, lugar, modo,
intensidade) Exemplos:
Exemplos: mas, porque, pois, logo,
de, do (de+o), da (de+a) Exemplos: embora, conforme, etc.
por, pelo (por+o) aqui, certamente,
em, no (em+o), etc bastante, apenas,
bem, etc.

Fonte: Elaborado pelos autores.


A Articulação da Escrita | UNIDADE 3 81

Vamos verificar, no Quadro 3.2, um exemplo (PLATÃO; FIORIN, 2006) de como


a coesão se efetiva em um texto argumentativo a partir do uso de preposições,
advérbios e conjunções:

Quadro 3.2 – Análise das relações de coesão de um texto.

COESÃO COESÃO COESÃO


TEXTO
Preposições Advérbios Conjunções
No início do século, a Paulista era a São os elementos São os elementos São os elementos
avenida mais espaçosa DA cidade, destacados em caixa sublinhados: hachurados:
com pistas separadas para bondes, alta:
carruagens e cavaleiros. Também DA, DE, COM, NO, Por exemplo: Por exemplo:
era a mais bela, COM quatro fileiras PELOS. [...] No início do e: especifica ideia de
DE magnólias e plátanos. Era um fim século: especifica adição;
DE mundo, NO final DA ladeira DA Por exemplo: circunstância de também: especifica
Consolação. Lá residiam imigrantes [...] fileiras DE tempo; ideia de adição;
recém-enriquecidos: Martinelli, magnólias: especifica No seu lugar, depois: especifica
Crespi, Matarazzo, Von Bullow. o tipo de fileiras; [...]: especifica ideia de tempo;
Depois disso, lá PELOS anos 50 e 60, [...] NO final DA circunstância de apesar: especifica
o acelerado processo DE urbanização ladeira: ‘no’ indica lugar; ideia de concessão
DA cidade varreu dali os 24 casarões local e ‘da’ especifica Já completamente
DA avenida. No seu lugar, surgiram de que tipo de final ladeada [...]:
prédios, alguns enquadrados entre se trata. especifica
os mais modernos do mundo, como circunstância de
o Citibank e o Sudameris. modo
Já completamente ladeada DE prédios [...] avenida
DE porte, a recente inauguração do mais moderna:
metrô lhe conferiu novo charme. COM especifica
todos esses antecedentes, ela é hoje, circunstância de
apesar DAS contradições, a avenida intensidade.
mais moderna, dinâmica e nervosa
DA cidade, eleita PELOS moradores o
mais fiel retrato DE São Paulo.

Fonte: Elaborado pelos autores.

No texto acima, você pode perceber que há uma série de elementos que
proporcionam a interação entre substantivos e verbos. Eles orientam a
argumentação, indicando o tempo, o espaço e as circunstâncias do texto.

Em relação às conjunções, terceiro elemento de coesão mencionado na Figura


3.6, são classificadas de acordo com a ideia/relação que estabelecem no texto.
Conforme Goulart e Both (2015), para saber a ideia que um conector articula, é
preciso sempre voltar ao texto e não simplesmente decorar seu sentido. A seguir,
na Figura 3.7, veja a relação das principais conjunções e suas respectivas relações:
82 COMUNICAÇÃO E LINGUAGEM | Ângela Kroetz dos Santos e Gilberto Fonseca

Figura 3.7 – Conjunções.

CONJUNÇÕES
Veja as principais conjunções da língua e os
sentidos que elas estabelecem
E, nem, ainda, também, além disso, não só... mas também,
Adição tanto... quanto
Exemplo: NÃO SÓ era bonita, COMO TAMBÉM culta.

Ou, ou... ou, ora... ora, ora, seja... seja, quer... quer
Alternância
Exemplo: A festa seria OU no natal OU no ano novo.

Mas, porém, contudo, todavia, no entanto, entretanto


Oposição
Exemplo: Estou com dor, MAS não vou tomar remédios.

Logo, portanto, com isso, assim, dessa forma, então, pois, por
Conclusão conseguinte
Exemplo: Vou à festa. LOGO, sairei mais cedo do trabalho

Ainda que, embora, mesmo que, conquanto, a despeito de


Concessão
Exemplo: EMBORA esteja atrasado, vou tomar um café.

Como, conforme, consoante, de acordo com, segundo, para


Conformidade Exemplo: COMO disse o presidente, não haverá aumento de
salário.

Consequência Tanto que, a ponto de, tal que, tão que


Exemplo: Chorou TANTO QUE borrou a maquiagem.

Porque, pois
Explicação Exemplo: Vou à festa PORQUE fui convidado pelo meu
melhor amigo.
Já que, como, uma vez que, porque, porquanto, como,
Causa visto que, por isso, como
Exemplo: COMO cheguei cedo, trabalhei mais.

Se, caso, desde que, a não ser que


Condição
Exemplo: SE eu chegar cedo, conseguirei um bom lugar.

Como, assim como, tal qual, do que, tão que, mais... do que,
Comparação menos... do que, tanto... quanto
Exemplo: Ela era bonita COMO a mãe.

Para, para que, a fim de que, com o intuito de


Finalidade
Exemplo: Ele bebia PARA esquecer a dívida.

À medida que, à proporção que, ao passo que


Proporção
Exemplo: À MEDIDA QUE crescia, tornava-se menos tímido

Quando, enquanto, depois que, desde que, logo que, assim


Tempo que, sempre que
Exemplo: No trem, ENQUANTO dormia, ele foi assaltado.

Fonte: Elaborado pelos autores.


A Articulação da Escrita | UNIDADE 3 83

Até aqui, falamos da coesão que se estabelece por meio de preposições, advérbios
e conjunções. Há, ainda, outras formas de coesão, como as pronominalizações,
as substituições vocabulares e as elipses, que tornam o texto mais enxuto e
não repetitivo. Tais recursos acontecem sempre que algum elemento do texto
é retomado com uso de outra palavra, ou quando algum termo é suprimido.
Leia a resenha abaixo e após, no Quadro 3.3, observe a definição e exemplos de
pronominalização, substituição vocabular e elipse.

Em Amor Líquido, Zygmunt Bauman aborda a fragilidade das


relações, utilizando um texto sério, sem ser sisudo e também sem
levá-lo a um cientificismo desnecessário, deixando claro que seu
livro não tem por objetivo compreender o amor em seu âmago,
mas considerar seus efeitos e as mutações na forma de vê-lo nesses
tempos. O olhar do autor perturba o leitor, pois o coloca diante de um
espelho e o faz enxergar cicatrizes que se procura esconder ou, ao
menos, disfarçar. Bauman não tem receio de apontar a ambiguidade
do “líquido cenário da vida amorosa”, que oscila entre o céu e o
inferno. Mostra que, ao mesmo tempo em que tudo fazemos para
fugir da solidão, não queremos vínculos permanentes, porque não
há certeza de que faremos a escolha certa, de que a pessoa que
partilhará do nosso dia a dia não nos fará sofrer, ou ainda, de que
nos comprometendo com ela, não estamos abrindo mão de outra,
ainda melhor, com mais qualidades, que nos tornaria ainda mais
felizes ou satisfeitos. Não queremos desperdiçar tempo nem energia
em uma relação que possa não trazer resultado algum. O que se
quer é, com o mínimo de esforço, obter o máximo de satisfação.
A fórmula testada e aprovada é bem-vinda, mas mesmo esta, não é
garantida. [...] (FONSECA, 2010).
84 COMUNICAÇÃO E LINGUAGEM | Ângela Kroetz dos Santos e Gilberto Fonseca

Quadro 3.3 – Análise das relações de coesão de um texto.

RECURSO O QUE É? EXEMPLO OBSERVAÇÃO


Pronominalização Quando se usa O olhar do autor
um pronome perturba o leitor, pois O pronome oblíquo O
para retomar um O coloca diante de retoma O LEITOR nas
referente. Esse um espelho e O faz duas ocorrências.
pronome pode ser enxergar cicatrizes
de qualquer tipo que se procura
(reto, oblíquo, esconder ou, ao
demonstrativo, menos, disfarçar.
possessivo, relativo,
indefinido, de Em Amor Líquido,
tratamento) Zygmunt Bauman
aborda a fragilidade
das relações, O pronome oblíquo
utilizando um texto LO retoma TEXTO;
sério, sem ser O pronome
sisudo e também possessivo SEU
sem levá-LO a retoma Zygmunt
um cientificismo Bauman
desnecessário,
deixando claro que
SEU livro [...]
Substituição Quando se usa uma Em Amor Líquido, A palavra “livro”
Vocabular palavra ou expressão Zygmunt Bauman retoma o nome
com o mesmo aborda a fragilidade da obra, “Amor
sentido para retomar das relações, Líquido”.
um elemento. utilizando um texto O recurso permite
sério, sem ser sisudo não repetir os
e também sem levá- mesmos termos.
lo a um cientificismo
desnecessário,
deixando claro que
seu LIVRO [...]
Elipse Quando se suprime Bauman não tem Na segunda frase,
a referência direta, receio de apontar o nome “Bauman”
porque pelo contexto a ambiguidade do não é repetido. Ao
é possível inferir o “líquido cenário da utilizar só o verbo
referente vida amorosa”, que (MOSTRA), recorre-
oscila entre o céu e se ao recurso da
o inferno. MOSTRA elipse.
que, ao mesmo
tempo em que tudo
fazemos para fugir
da solidão [...]

Fonte: Elaborado pelos autores.


A Articulação da Escrita | UNIDADE 3 85

SAIBA MAIS

Zygmund Bauman (1925-2017) foi um grande pensador da modernidade,


analisando temas fundamentais para a compreensão das relações afetivas da
atualidade. O filósofo aborda a sociedade por meio do conceito de liquidez.
Sua obra Amor Líquido é um best-seller. Leia a entrevista do autor à Revista
Cult (Ago, 2009) em: http://gg.gg/cw8vv.

Nesta seção, você estudou os elementos de coesão que contribuem para uma boa
articulação textual. Na sequência, verificará aspectos de coerência, fechando o
ciclo de estudos acerca dos fatores de textualidade.

3.4.2 A Coerência
De acordo com Garcia (2003, p. 287), a coerência, “do latim cohaerens, entis:
o que está junto ou ligado, consiste em ordenar e interligar as ideias de maneira
clara e lógica e de acordo com um plano definido”. O autor ainda ressalta que

sem coerência é praticamente impossível obter-se [...] unidade


e clareza. Ela é, por assim dizer, a “alma” da composição.
Os organismos vivos, os próprios mecanismos, só funcionam
quando suas partes componentes se ajustam, se integram numa
unidade. Podem-se reunir as mil e uma peças de um aparelho de
televisão, mas o conjunto só funcionará quando todas estiverem
adequadamente ajustadas e conectadas segundo o esquema de
montagem. (GARCIA, 2003, p. 287).

Com isso, evidencia-se a relevância de as ideias estarem adequadamente


dispostas a fim de não comprometer o todo de um texto. As frases do Quadro
3.4 evidenciam exemplos de coerência e incoerência:

Quadro 3.4 – Coerência x Incoerência.

FRASES COERENTES FRASES INCOERENTES


A festa estava ótima e, dessa forma, voltei A festa estava ótima, porém voltei muito
muito tarde tarde.
Gosto de café, por isso comprei vários tipos, Gosto de café, por isso comprei biscoitos.
produzidos em vários estados brasileiros.
Gosto de café, embora prefira chá. Prefiro café, embora prefira chá.

Fonte: Elaborado pelos autores.


86 COMUNICAÇÃO E LINGUAGEM | Ângela Kroetz dos Santos e Gilberto Fonseca

Você percebe a diferença que há entre cada par de frases acima? É possível
entender que há coisas que não podem ser ditas porque não fazem sentido,
não é mesmo? A incoerência pode existir tanto no nível frasal (como nos
exemplos acima) quanto no textual. Um exemplo de incoerência textual é quando
o autor defende um ponto de vista e, mais adiante, no mesmo texto, muda de
perspectiva, passando a sustentar uma ideia contrária.

Assim, em termos de coerência textual, qual você acha que é o maior erro que
se pode cometer?

Quando se escreve sem planejamento, lançando as ideias no papel na medida em


que elas vêm à mente, sem um raciocínio lógico e uma organização precisa,
permite-se a ocorrência de lapsos e deslocamentos de sentidos prejudiciais à
coerência e clareza do texto. Para evitar esses problemas, é necessário que você
execute um plano para colocar os pensamentos em uma ordem adequada ao
propósito da comunicação. “Ordem e transição constituem os principais fatores
da coerência”. (GARCIA, 2003, p. 287). Na seção 3.6 abordamos o planejamento
do texto para que você entenda melhor como projetar um texto coerente.

Leia o poema a seguir:

Subi a porta e fechei a escada.


Tirei minhas orações e recitei meus sapatos.
Desliguei a cama e deitei-me na luz.

Tudo porque
Ele me deu um beijo de boa noite...
(Autor anônimo)

O que podemos dizer sobre esse texto? Ele é incoerente?

Percebe-se que vários elementos estão trocados no texto. No entanto, o poema não
é incoerente. A aparente incoerência, que se desfaz com os dois últimos versos,
é um recurso estilístico que dá ao texto um sentido próprio. Assim, a leitura do poema
reforça o que você já estudou: a importância de olhar além do texto, entendendo os
sentidos, por vezes, escondidos nas entrelinhas.
A Articulação da Escrita | UNIDADE 3 87

3.5 Estrutura do Texto Argumentativo


Como já sinalizamos, o foco de estudo desta unidade é o texto argumentativo.
O tipo textual dissertativo-argumentativo é caracterizado, entre outros elementos,
pela existência de argumentos que defendem determinado posicionamento.
A estrutura clássica consiste em introdução, desenvolvimento e conclusão.

A introdução é a parte do texto que apresenta a tese, a ideia central, o ponto de


vista principal a ser desenvolvido. O desenvolvimento consiste na argumentação,
no desenrolar da ideia central apresentada. Para que o desenvolvimento seja
coerente, é preciso selecionar, dentre muitas possibilidades, argumentos que
permitam defender a tese escolhida. Por fim, a conclusão é a parte final da
produção escrita, na qual o ponto de vista é reafirmado e/ou é oferecida uma
possível solução para a problemática apresentada.

A Figura 3.8 apresenta um esquema de estrutura do texto argumentativo.

Figura 3.8 – Estrutura do Texto Argumentativo.

Macroestrutura do Texto Dissertativo

Divisão básica Estabelecer uma cadeia


das três partes lógica entre as três
comunicantes Título partes comunicantes

Introdução 1 2 Introdução
3

2
Desenvolvimento
argumentos Desenvolvimento
1,2 e 3

Conclusão 1 2 3 Conclusão

Fonte: Elaborado pelos autores.


88 COMUNICAÇÃO E LINGUAGEM | Ângela Kroetz dos Santos e Gilberto Fonseca

Em termos formais, é fundamental a presença de título. Este deve ser significativo,


sinalizando a essência do texto. Espera-se que o texto argumentativo seja
composto por pelo menos 3 parágrafos (1 de introdução, 1 de desenvolvimento
e 1 de conclusão), mas o ideal é que, no desenvolvimento, seja estruturado um
parágrafo para cada um dos argumentos escolhidos.

Nesta seção abordamos breves pontos sobre a estrutura do texto argumentativo.


A seguir, para finalizar esta unidade, mostramos a você uma forma prática de
construir um texto. Trata-se de um passo a passo, que pode facilitar, e muito,
a sua escrita.

DICA

Evite escrever parágrafos com uma frase única em textos argumentativos.


Essa prática é recorrente entre os estudantes e, algumas vezes, até entre
escritores. Mas qual é o problema?

Um parágrafo é uma reunião de frases que articulam sentido entre si. Um


parágrafo não é uma frase, mas um conjunto de frases. Em uma única frase,
não se conclui toda a argumentação que um parágrafo requer, até porque, de
acordo com a estrutura que estudamos, um parágrafo deve ter tópico frasal,
desenvolvimento e conclusão internos.

É claro que em textos mais livres, como crônicas e narrativas, essa prática
pode ser utilizada como recurso estilístico.
A Articulação da Escrita | UNIDADE 3 89

3.6 A Construção do Texto Argumentativo:


Passo a Passo
Você se recorda do esquema de leitura que construímos na Unidade 2? Naquela
ocasião, partimos de um texto já escrito, e selecionamos as partes mais relevantes
para construir um esquema que funcionasse como resumo da reportagem
“A Era da Burrice”.

Para elaborar um texto argumentativo, você pode fazer um exercício


muito semelhante, usando a mesma metodologia, mas de modo inverso.
Nessa perspectiva, você vai partir de um esquema, construído sob orientação
de algumas perguntas norteadoras, para chegar a uma espécie de “esqueleto do
texto”. Vamos ver como isso funciona? Na Figura 3.9, estão algumas perguntas
que podem nortear a construção do texto que vamos compor.

Figura 3.9 – Questões norteadoras da escrita.

Tema Sobre o que vou falar?

Problema Qual é o problema que existe em relação


ao tema?

Argumento 1 Qual é o primeiro argumento que sustenta


o que quero dizer?

Argumento 2 Quais são os demais argumentos que


justificam o que quero dizer?

Contraponto Quais são os contrapontos daquilo que


defendo?

Conclusão Considerando o tema e os argumentos


expostos, o que é possível concluir?

Fonte: Elaborado pelos autores.


90 COMUNICAÇÃO E LINGUAGEM | Ângela Kroetz dos Santos e Gilberto Fonseca

Para executar o nosso “esqueleto de texto”, vamos, inicialmente, responder às


perguntas acima. Para tanto, vamos utilizar a proposta do Enem 2017, cujo tema
foi “Desafios para a formação educacional de surdos no Brasil”. Na Figura
3.10 vamos elaborar um esquema que dê conta do assunto proposto:

Figura 3.10 – O esqueleto do texto.

Tema Desafios para a formação educacional de surdos


no Brasil

Dificuldades da formação educacional de surdos


Problema no Brasil, com queda de matrículas desses alunos
na educação básica

O estado é omisso para com a formação de


Argumento 1 surdos
Poucas escolas são adeptas ao uso de libras

Existe preconceito da sociedade para com os


Argumento 2 surdos
Os deficientes são vistos como pouco capazes

Contraponto Iniciativas de apoio à cultura surda que existem

Conclusão Atuação maior do Estado


Atuação maior da iniciativa privada

Fonte: Elaborado pelos autores.

A partir do esquema acima, é possível desenvolver muito mais facilmente um


texto. Claro que cada um dos tópicos apresentados precisa ser desmembrado
e detalhado, mas a sequência textual já está elaborada. Vamos ver o texto que
poderia resultar desse esquema?
A Articulação da Escrita | UNIDADE 3 91

A formação educacional de surdos encontra, no


Brasil, uma série de empecilhos. Essa tese pode ser
comprovada por meio de dados divulgados pelo Inep, os
quais apontam que o número de surdos matriculados em Introdução
instituições de educação básica tem diminuído ao longo O tópico frasal apresenta o tema
dos últimos anos. Nesse sentido, algo deve ser feito para e o problema. A 2º frase explica o
alterar essa situação, uma vez que milhares de surdos tópico. A 3º frase fecha a ideia.
de todo o país têm o seu direito à educação vilipendiado,
confrontando, portanto, a Constituição Cidadã de 1988,
que assegura a educação como um direito social de todo
o cidadão brasileiro
Em primeira análise, o descaso estatal com a formação
educacional de deficientes auditivos mostra-se como
um dos desafios à consolidação dessa formação. Isso Desenvolvimento
porque poucos recursos são destinados pelo Estado O tópico frasal apresenta o
à construção de escolas especializadas na educação argumento 1 (descaso estatal com
de pessoas surdas, bem como à capacitação de a formação de surdos).
profissionais para atenderem às necessidades especiais A 2º frase explica o tópico, o porquê
desses alunos. Ademais, poucas escolas são adeptas do descaso. A 3º frase apresenta
do uso de libras, segunda língua oficial do Brasil, a um desdobramento do argumento 1
qual é primordial para a inclusão de alunos surdos (pouca adesão escolar a libras).
em instituições de ensino. Dessa forma, a negligência A 4º frase conclui a ideia.
do Estado, ao investir minimamente na educação de
pessoas especiais, dificulta a universalização desse
direito social tão importante.
Em segunda análise, o preconceito da sociedade com os
deficientes apresenta-se como outro fator preponderante
para a dificuldade na efetivação da educação de pessoas
surdas. Essa forma de preconceito não é algo recente
na história da humanidade: ainda no Império Romano, Desenvolvimento
crianças deficientes eram sentenciadas à morte, sendo O tópico frasal apresenta o
jogadas de penhascos. O preconceito ao deficiente argumento 2 (preconceito da
auditivo, no entanto, reverbera na sociedade atual, sociedade). As frases 2 e 3
calcada na ética que considera inúteis pessoas que, explicam o porquê do preconceito e
aparentemente menos capacitadas, têm pouca serventia a origem dele. A 4º frase conclui a
à comunidade, como é caso de surdos. Os deficientes ideia, trazendo as consequências
auditivos, desse modo, são muitas vezes vistos como do preconceito contra os surdos.
pessoas de menor capacidade intelectual, sendo
excluídos pelos demais, o que dificulta aos surdos não
somente o acesso à educação, mas também à posterior
entrada no mercado de trabalho.
Nesse sentido, urge que o Estado, por meio de envio
de recursos ao Ministério da Educação, promova a
construção de escolas especializadas em deficientes
auditivos e a capacitação de profissionais para atuarem
não apenas nessas escolas, mas em instituições de ensino
comuns também, objetivando a ampliação do acesso Conclusão
à educação aos surdos e assegurando a eles, por fim, O tópico frasal amarra as ideias
um direito garantido constitucionalmente. Outrossim, apresentadas nos parágrafos
ONGs devem promover, através da mídia, campanhas anteriores propondo uma solução
que conscientizem a população acerca da importância ao problema. A frase 2 apresenta
do deficiente auditivo para a sociedade, enfatizando uma segunda possibilidade de
em mostrar a capacidade cognitiva e intelectual do solução. A última frase retoma e
surdo, o qual seria capaz de participar da população conclui as ideias anteriores
economicamente ativa (PEA), como fosse concedido a
este o direito à educação e à equidade de tratamento, por
meio da difusão do uso de libras. Dessa forma, o Brasil
poderia superar os desafios à consolidação da formação
educacional de surdos.
92 COMUNICAÇÃO E LINGUAGEM | Ângela Kroetz dos Santos e Gilberto Fonseca

O texto acima foi redigido por uma estudante do Piauí para o Enem 2017.
A redação em questão foi avaliada com a nota máxima. Procuramos explicar o
desenvolvimento de cada parágrafo a fim de que você perceba como a trama do
texto constitui sentidos, progredindo a cada nova frase composta.

É importante destacar que nem sempre o texto que você vai escrever admitirá
todas as questões trazidas na Figura 3.9. No texto que você acabou de analisar,
o item “Contraponto” não foi desenvolvido. Isso significa que o texto poderia
ter mais um parágrafo trazendo boas práticas que são realizadas no Brasil em
relação às pessoas surdas. Um outro exemplo nesse sentido poderia ser um texto
sobre a maioridade penal, que permite tanto uma posição contrária quanto uma
opinião favorável ao tema. Esse tipo de texto requer o contraponto, ou seja,
que você relate fatores favoráveis e contrários a uma posição.

Para finalizar esta unidade, desafiamos você a criar novos esquemas e


a desenvolver textos a partir de temas de seu interesse ou então a partir de
temáticas trazidas pelas disciplinas que você está cursando. Lembre-se de que a
escrita também requer exercício para ser aprimorada.
A Articulação da Escrita | UNIDADE 3 93

SÍNTESE DA UNIDADE
Neste capítulo, você refletiu sobre a escrita e sobre a importância de redigir
textos coesos e coerentes a fim de que o processo de comunicação seja eficaz.
Nesse contexto, foram estudadas as estruturas básicas da escrita, a saber,
a frase e o parágrafo. Para facilitar o seu aprendizado, comparamos frases ideais
com estruturas deficitárias. No que diz respeito à construção de parágrafos,
estudamos o tópico frasal, para que você pudesse compreender melhor o ponto
de partida para redigir um parágrafo.

A seguir, você foi conduzido a refletir sobre as características de um bom texto,


estudando os elementos que permitem a articulação textual: coesão, coerência,
informatividade, intencionalidade, aceitabilidade, situacionalidade e
intertextualidade. Dentre esses aspectos, nosso foco de análise recaiu sobre
a coesão e a coerência. Você pôde compreender que a coesão é constituída
na materialidade do texto, ou seja, a partir do uso de articuladores textuais,
e que a coerência se projeta em um nível ideológico, ou seja, a partir das ideias
desenvolvidas no texto.

Você ainda observou, brevemente, a estrutura do texto argumentativo,


e acompanhou o desenvolvimento de um passo a passo que problematiza a
construção desse tipo de texto. A partir desse “esqueleto textual”, objetivamos
facilitar o seu processo de redação daqui em diante. Esperamos que você utilize
esses recursos sempre que produzir trabalhos acadêmicos ou redigir e-mails,
relatórios e demais textos em seu ambiente profissional.
94 COMUNICAÇÃO E LINGUAGEM | Ângela Kroetz dos Santos e Gilberto Fonseca

REFERÊNCIAS
ANTUNES, I.: Lutar com palavras: Coesão e Coerência. São Paulo: Parábola
Editorial, 2005.

FONSECA, G. Resenha: Amor Líquido. Porto Alegre, 2010. Não publicado.

GARCIA, O. M. Comunicação em prosa moderna: aprender a escrever, aprendendo


a pensar. 23.ed. Rio de Janeiro –RJ Ed. FGV, 2003.

GOULART, C. R.; BOTH, Joseline Tatiana. Interpretação e compreensão de textos. In:


AIUB, T N. (Org). Português: práticas de leitura e escrita. Porto Alegre: Penso, 2015.

GUIMARÃES, T. C. Comunicação e Linguagem. São Paulo: Pearson, 2011.

HOUAISS, A. Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa. Rio de Janeiro: Objetiva,


2009.

PLATÃO, F.; FIORIN, J. L. Lições de Texto: Leitura e Redação. 5. ed. São Paulo:
Ática, 2006.
A Articulação da Escrita | UNIDADE 3 95

ANOTAÇÕES
96 COMUNICAÇÃO E LINGUAGEM | Ângela Kroetz dos Santos e Gilberto Fonseca
unidade

4
O Texto em Ação
Prezado estudante,

Estamos começando uma unidade desta disciplina. Os textos que a compõem


foram organizados com cuidado e atenção, para que você tenha contato com
um conteúdo completo e atualizado tanto quanto possível. Leia com dedicação,
realize as atividades e tire suas dúvidas com os tutores. Dessa forma, você, com
certeza, alcançará os objetivos propostos para essa disciplina.

OBJETIVO GERAL
Estudar alguns gêneros textuais acadêmicos, orais e escritos, a fim de
instrumentalizar os estudantes para que possam organizar, articular,
redigir e apresentar ideias.

OBJETIVOS ESPECÍFICOS
• Estudar gêneros textuais acadêmicos escritos, como a resenha, o
resumo, o ensaio, o mapa mental e a apresentação, e orais, como o
seminário;

• Reconhecer características dos textos supracitados e entender os seus


processos de construção;

• Elencar e problematizar alguns erros comumente encontrados em textos


escritos.

QUESTÕES CONTEXTUAIS
1. Você conhece os principais gêneros do contexto acadêmico?

2. Você já escreveu um ensaio, uma resenha?

3. Ou já organizou um roteiro para apresentar oralmente?


98 COMUNICAÇÃO E LINGUAGEM | Ângela Kroetz dos Santos e Gilberto Fonseca

4.1 Introdução
Nas unidades que você estudou até aqui, seguimos um percurso que se iniciou
com as noções do processo comunicativo e seus elementos, passando pelas
funções da linguagem e pelos gêneros textuais. Depois, seguimos nossa reflexão
com foco na leitura e na compreensão textual, entendendo que esse processo é
inerente a todas as atividades em que o homem se envolve. A seguir, passamos
pelos elementos necessários à articulação da escrita, com vistas a uma construção
textual coesa e coerente.

A proposta, agora, é discutir alguns gêneros textuais muito usuais na academia.


Ao longo de sua graduação, você terá contato com textos orais, como seminário
e palestra, e escritos, como texto argumentativo, resenha, resumo, apresentação
de trabalho e outros dessa natureza, por meio dos quais você poderá articular
e sistematizar o conhecimento teórico adquirido nas disciplinas. Nesse sentido,
vamos problematizar, nesta unidade, caraterísticas dos gêneros supracitados,
mostrando, inclusive, o processo de construção de alguns deles. Além disso,
também apresentamos uma relação de problemas usualmente encontrados em
redações e trabalhos de estudantes universitários. O objetivo é que você possa
usar esse material como um manual de consulta, recorrendo a ele em caso de
dúvidas sobre algumas formas gramaticais da língua.

Na Figura 4.1, está contemplada a sequência didática da Unidade 4.

Figura 4.1 – Sequência Didática.

Resenha

Problemas
Gramaticais Resumo
Recorrentes

Seminário
Apresentação Ensaio

Mapa Mental

Fonte: Elaborado pelos autores.


O Texto em Ação | UNIDADE 4 99

4.2 Gêneros Acadêmicos


Você conhece os gêneros textuais que fazem parte do mundo universitário?
Há uma série de textos, de caráter mais formal, que são empregados para
organizar e divulgar o pensamento. Conforme apresentado na Unidade 1,
pertencem ao domínio textual “acadêmico” ou “instrucional” os gêneros artigo
científico, relatório, resumo, resenha, tese/dissertação, mapa mental, manual de
ensino, ata de reunião, prova, seminário, palestra, aula dialogada, entre outros.
Dentre estes, selecionamos e apresentamos aqueles que julgamos ser mais
relevantes na sua trajetória no ensino superior. Vamos aprender a elaborá-los?

4.2.1 Resenha
Mesmo que você imagine não saber o que é uma resenha, provavelmente já
teve contato com um texto desse gênero. A resenha é um texto objetivo,
que tem como característica principal apresentar, de maneira breve, uma
apreciação crítica sobre determinado assunto, na maioria das vezes ligado ao
meio cultural (livros, peças de teatro, filmes).

Uma resenha é composta por uma parte descritiva (apresentação da obra em si)
e por uma parte crítica (juízo de valor sobre a obra). O texto deve se valer de
um vocabulário simples e objetivo, mas não superficial. É preciso que a crítica
seja amparada por argumentos convincentes que justifiquem o ponto de vista do
autor, seja ele positivo ou negativo, sobre a obra resenhada.

A seguir, você pode observar um exemplo de resenha, postada em um site


direcionado a esse tipo de publicação. A resenha é sobre o seriado americano
Friends (1994-2004).
100 COMUNICAÇÃO E LINGUAGEM | Ângela Kroetz dos Santos e Gilberto Fonseca

Resenha | Friends

Friends, seriado criado por David Crane e Marta Kauffman, é estrelado por Jennifer
Aniston, Courteney Cox, Lisa Kudrow, Matt LeBlanc, Matthew Perry e David
Schwimmer. Essa série, de grande sucesso no mundo todo, conta a história dos
amigos Rachel, Monica, Phoebe, Joey, Chandler e Ross, e foi pensada para atingir
um público que não necessariamente queria decifrar citações. A proposta é fazer
uma crônica mais ou menos desajeitada e sem muitas pretensões sobre o cotidiano
de seis amigos que viviam em Nova York. A pauta é a mais popular possível: sexo,
amor, relacionamentos, carreira, amizade.

O ingrediente elementar da série é a aproximação com o público, que começa já na


abertura, embalada pela canção I’ll Be There For You, dos The Rembrandts, com
os seis protagonistas dançando e se divertindo em torno de uma fonte. Não só a
música, mas também o formato de clipe musical, levam o espectador para perto
dos personagens, fazendo valer a temática da amizade e a emoção necessária para
fidelizar o público.

Os roteiros das 3 primeiras temporadas são mais estruturados na psicologia dos


protagonistas, marcando o território de cada um e plantando os futuros “pequenos
arcos” da 4ª temporada e os “grandes eventos” das 6 temporadas finais, como os
casamentos de Ross; as conquistas na vida de cada um dos friends; os desenlaces
do romance Ross-Rachel; o romance Monica-Chandler; a gravidez de Phoebe, os
preparativos para o final do show. É impressionante que esses blocos são colocados
de forma mais ou menos espalhada ao longo de uma década e, quando as coisas
começam a se organizar para a despedida, já em meados da 9ª Temporada, essas
mesmas pontas são amarradas com inteligência e precisão.

A despeito de todo crescimento dos personagens, os textos da temporada final não


negam as origens humildes, a ingenuidade dos “vinte e tantos anos” e os sonhos
do passado de cada um. Com o maior respeito ao público e cientes do legado que
deixariam, Crane e Kauffman prepararam um término emotivo, fechando a contento
o ciclo aberto em 1994 e terminando o programa com um novo começo, um capítulo
diferente na vida dos personagens.

Mas não só de boa estrutura nos roteiros que sobrevive Friends. Mesmo em se
tratando de uma série menos exigente em termos de conhecimentos culturais,
isso não significa que ela é um clímax eterno de “piadas sobre qualquer coisa”.
O show tem o mérito de trabalhar temas transversais de enorme importância, como
a igualdade de gêneros, a sexualidade, a ciência, a arte e questões familiares que,
ganharam versões simpáticas, criativas, engraçadas e bem representadas pela
excelente química do grupo em cena.

As indicações culturais e a exposição de itens da cultura pop por meio de pôsteres,


nomes de personalidades ou artistas, citações de grandes obras da literatura, teatro,
cinema ou eventos históricos são os “pontos nerd” que os mais atentos podem
perceber e admirar na série. Já nos primeiros episódios há citações, homenagens
O Texto em Ação | UNIDADE 4 101

ou representações simbólicas de Pinóquio (1940), Psicose (1960), A Noviça Rebelde


(1965), Banzé no Oeste (1974), O Poderoso Chefão (1990), Sociedade dos Poetas
Mortos (1990) e O Silêncio dos Inocentes (1991), de modo que se constata que a
ideia dos produtores é citar sucessos cinematográficos e a cultura pop para prender
o público com algo familiar.

Friends é uma daquelas produções artísticas que nunca enjoam e sempre farão parte
dos preferidos do público. A série não apenas marcou uma mudança na estrutura de
produção televisiva, mas conseguiu conquistar públicos distintos e estabelecer um
novo padrão para as séries de comédia que a sucederam. Na maioria das vezes, os
enredos de Friends riam do material que traziam à tona, mas, em outros momentos,
expunham questões de uma forma mais filosófica, humana, analítica, o que não era
a base da série, mas esteve presente em alguns icônicos episódios ao longo dos 10
anos em que o programa se manteve no ar, especialmente no capítulo de despedida,
que fez muita gente chorar, falar sobre o que acontecia com os personagens e imitá-
los.

Fonte: Adaptado de http://gg.gg/cw93o.

SAIBA MAIS

Friends é uma premiada sitcom americana. Sitcom, a abreviação de situation


comedy, trata-se de uma “comédia de situação”, encenada por personagens
comuns que retratam ambientes do cotidiano como família, grupo de amigos,
local de trabalho. Emissora: NBC • Episódios: 236 • Duração média de cada
episódio: 22 min.

4.2.2 Resumo
O resumo é um gênero textual muito comum, que requer duas habilidades básicas:
síntese e objetividade. O produto final é um texto em que são apresentados os
pontos essenciais, as ideias ou os fatos principais que foram desenvolvidos no
decorrer de um outro texto. Tudo isso é exposto de forma abreviada, sempre
respeitando uma ordem cronológica do que aparece no original a ser resumido.

A capacidade de resumir informações está relacionada à habilidade de


compreensão. Assim, para resumir, é preciso separar o que é ideia primária
do que é informação secundária, selecionando o que é mais importante e
descartando o que é acessório. Vamos fazer um exercício, resumindo a resenha
apresentada no tópico anterior? Nosso objetivo será reduzir o texto a um único
parágrafo.
102 COMUNICAÇÃO E LINGUAGEM | Ângela Kroetz dos Santos e Gilberto Fonseca

Resumo | Friends

Friends, criado por David Crane e Marta Kauffman, aborda o cotidiano dos amigos
Rachel, Monica, Phoebe, Joey, Chandler e Ross em Nova York. A pauta é a mais
popular possível: sexo, amor, relacionamentos, carreira, amizade. As 3 primeiras
temporadas estruturam a psicologia dos protagonistas, preparando o cenário para
os “grandes eventos” da trama, como os casamentos de Ross; as conquistas na
vida de cada um; os desenlaces do romance Ross-Rachel; o romance Monica-
Chandler, a gravidez de Phoebe. Na 9ª temporada, essas pontas são amarradas
com inteligência e precisão. Os textos da temporada final não negam as origens
humildes, a ingenuidade dos vinte anos e os sonhos de cada um, fechando o ciclo
da série com um novo começo, um capítulo diferente na vida dos personagens.
Mas não só de boa estrutura nos roteiros sobrevive Friends. Mesmo sendo menos
exigente em termos de conhecimentos culturais, a série não se restringe a “piadas
sobre qualquer coisa”, mas trabalha temas importantes como igualdade de gêneros,
sexualidade, ciência, arte e questões familiares, em versões simpáticas, criativas
e engraçadas. Friends marcou uma mudança na estrutura de produção televisiva,
estabelecendo um novo padrão para as séries de comédia que a sucederam. Na
maioria das vezes, os enredos riam do material que traziam à tona, e em outros,
expunham questões de uma forma filosófica, humana e analítica, especialmente no
capítulo de despedida, que fez muita gente chorar, falar sobre os personagens e
imitá-los.

Fonte: Elaborado pelos autores

Para escrever, também é importante saber parafrasear.

Parafrasear é reescrever um texto com outras palavras. Paráfrase deriva do latim


(paraphrasis), cujo significado é "maneira adicional de expressar-se".

Vamos ver um exemplo de paráfrase originado do texto anterior?

TEXTO ORIGINAL TEXTO RESUMIDO E PARAFRASEADO


Mesmo em se tratando de uma Em relação a conhecimentos culturais,
série menos exigente em termos de a série é menos exigente, embora não
conhecimentos culturais, isso não se restrinja a “piadas sobre qualquer
significa que ela é um clímax eterno coisa”. Ao contrário, trabalha temas
de “piadas sobre qualquer coisa”. importantes como igualdade de
O show tem o mérito de trabalhar temas gêneros, sexualidade, ciência, arte
transversais de enorme importância, e questões familiares, em versões
como a igualdade de gêneros, a simpáticas, criativas e engraçadas.
sexualidade, a ciência, a arte e questões
familiares que, ganharam versões
simpáticas, criativas, engraçadas e bem
representadas pela excelente química
do grupo em cena.
O Texto em Ação | UNIDADE 4 103

DICA

Ao utilizar a ideia de um autor a par tir de um livro ou site, o ideal é


sempre parafrasear o autor. Isso significa que, em vez de copiar na
íntegra o que o autor diz, deve-se interpretar o tex to e reescrevê-lo
com as próprias palavras. Mas cuidado! Mesmo parafraseando, é
necessário mencionar a autoria.

4.2.3 Ensaio
O ensaio é um tipo de texto discursivo argumentativo expositivo livre de
convenções. Nele, o autor pode se manifestar sobre qualquer assunto, sendo
mais comum a abordagem de temas ligados à política, economia, cultura e ética.

Por não ter fronteiras bem demarcadas com os outros gêneros, o ensaio é
assim rotulado pelos próprios escritores. Seu principal objetivo é refletir sobre
algo de forma crítica e apresentar, na maioria das vezes, conclusões originais,
fundamentadas essencialmente em um raciocínio lógico e na defesa de um ponto
de vista, apoiando-se na retórica e na persuasão para fins didáticos. Abaixo,
você pode visualizar um exemplo de ensaio.
104 COMUNICAÇÃO E LINGUAGEM | Ângela Kroetz dos Santos e Gilberto Fonseca

ESCRITA: O MAIS FINO INVÓLUCRO DO PENSAMENTO

A escrita é uma atividade desafiadora para os mais diversos públicos. Um dos pontos
que determina essa realidade é a ineficiência da leitura, muitas vezes realizada de
forma fragmentada ou a partir de fontes duvidosas. Não menos importante é a falta
de exercício da escrita, o que equivale a dizer que só escreve bem quem pratica essa
atividade e quem atribui importância a ela. Mas afinal, para que escrever?

Vários são os motivos que colocam a escrita como uma atividade fundamental ao
homem. Dela depende o registro da história e o desenvolvimento da ciência, que
só progride pelo compartilhamento do que já foi descoberto. Igualmente, a escrita
é essencial à comunicação de um povo e à inter-relação entre as diversas culturas.
Em um nível mais intimista, entretanto, as razões da escrita são a expressão do
sentimento e a organização do pensamento.

Clarice Lispector, ao dizer que “devemos modelar nossas palavras até se tornarem
o mais fino invólucro dos nossos pensamentos”, atribui importância subliminar
às palavras, considerando que elas são constituidoras da subjetividade humana.
Assim, cada homem expressa, na escrita, experiências de vida e percepções únicas,
constituindo uma riqueza que ninguém pode repetir. Nesse contexto, a escrita é
sentimento, é um revelar-se a si mesmo do escritor, é a expressão daquilo que cada
ser humano tem de mais “seu”.

Se a expressão do sentimento não depende exclusivamente da escrita, visto que


também pode ser feita oralmente, a organização do pensamento é mais efetiva
quando realizada pela escrita. Nesse aspecto, nada substitui o registro gráfico, que
pode ser refeito, reorganizado e postergado. Quando se escreve, reflete-se sobre o
pensamento e visualizam-se possibilidades que a fluidez da oralidade não permite
alcançar. Além disso, depois de repousar por um tempo, o texto mostra novas
perspectivas, que proporcionam aprimorar ainda mais as intenções originais.

Dessa forma, pode-se comparar a escrita a uma obra de arte, que deve ser executada
manualmente, com primor e sem pressa, com base em reflexões mais apuradas
do mundo e da cultura. Por esse motivo, escrever não é algo que se realiza do
nada. É preciso saber o que dizer, sobretudo ter o que dizer. E só tem o que dizer
quem sabe o que acontece, quem lê, quem escuta os outros, quem vive. Assim,
pode-se refletir que a escrita é uma ação essencialmente humana, como também
são fundamentalmente humanas atitudes como pensar, intercambiar experiências,
expor sentimentos, escutar e se relacionar.

Fonte: SANTOS (2014).

GLOSSÁRIO

SUBLIMINAR: o que os sentidos humanos não conseguem perceber de


forma consciente, atingindo o subconsciente.
O Texto em Ação | UNIDADE 4 105

SAIBA MAIS

O termo ensaio, foi utilizado pela primeira vez no século XVI pelo filósofo e
humanista francês Michel de Montaigne (1533-1592) com a publicação de
sua obra “Les Essais” (Os Ensaios), em 1580.

4.2.4 Mapa Mental


Um mapa mental é um tipo de resumo do resumo, em forma de esquema,
construído com palavras ou expressões que se interligam de acordo com o
sentido que apresentam em um texto ou em um tópico de conteúdo. Pode ser
construído a partir de um texto ou de relações que se estabelecem livremente a
partir de um dado tema.

O mapa mental auxilia a imaginar uma sequência lógica da escrita e pode ser
utilizado para fins de estudo, já que ativa vários pontos importantes do raciocínio
para a aprendizagem de conteúdos e retenção de informações.

Para que você entenda o que é um mapa mental, vamos construir um a partir do
ensaio discutido no tópico anterior. Veja na Figura 4.2:

Figura 4.2 – Exemplo de Mapa Mental.

Escrita

Por que escrever?


Desafios
Pressupõe leitura,
escuta e vivências

Ineficiência da Leitura
Organizar o pensamento

Falta do exercício da escrita

Refletir sobre as ideias

Registrar a história Expressar o sentimento


Reorganizar as ideias

Comunicar-se Vizualizar novas possibilidades Constituir a subjetividade

Fonte: Elaborado pelos autores.


106 COMUNICAÇÃO E LINGUAGEM | Ângela Kroetz dos Santos e Gilberto Fonseca

No mapa mental acima, você pode observar que as ideias principais referentes à
escrita, apresentadas no texto, foram ligadas ao tema principal, e as ideias
decorrentes foram ligadas cada qual à sua origem, em um esquema hierárquico.
Isso significa que, para produzir um mapa mental a partir de um texto,
as relações estabelecidas nele devem ser respeitadas. No entanto, um mapa
mental não precisa ter origem em um texto, podendo caracterizar-se como um
brainstorm de ideias acerca de um assunto.

GLOSSÁRIO

Brainstorming significa tempestade de ideias. Trata-se de uma dinâmica que


pressupõe colocar no papel todas as ideias que vem à mente sobre o assunto
em pauta.

Vamos mostrar um exercício de Mapa Mental que foi aplicado aos alunos da
disciplina de Leitura, Produção e Revisão de Textos, em 2018. A instrução era
a seguinte:
O Texto em Ação | UNIDADE 4 107

“Estude, meu filho!”

Esse conselho, dado pela sua mãe ainda enquanto você era criança, talvez seja a melhor
lição que você possa ter recebido em sua vida. Dados apresentados pela Fundação
Getúlio Vargas mostram a diferença que os anos de estudo podem representar no seu
crescimento profissional: para cada ano estudado, o salário do trabalhador aumenta, em
média, 15%. Observe que o tempo médio de permanência de um brasileiro no ambiente
escolar não ultrapassa os 8 anos (isso quer dizer que a formação média é inferior ao
ensino fundamental, que é de 9 anos). É claro que hoje o acesso ao ensino superior/
profissionalizante está mais facilitado. Milhões de brasileiros estão matriculados em
faculdades ou em universidades, mas boa parte deles não conclui a formação, o que
faz com que, em algumas áreas, haja uma escassez de mão de obra. Ou ainda, que a
mão de obra disponível não seja tão qualificada quanto necessário. “Estude, meu filho!”.
Forme-se e estude mais ainda. Boa parte dos que investem seu tempo e/ou dinheiro
em cursos de pós-graduação têm um aumento de mais de 66% em seus salários.
Isso sem falar no ganho pessoal que o estudo promove. Quem estuda aprende mais.
Parece uma obviedade, mas muita gente esquece disso. O estudo amplia as fronteiras
do conhecimento, desenvolve e aprimora o senso crítico. E liberta. Ninguém continua
sendo o mesmo depois de conhecer. Que tal pensar nisso?

A partir da leitura do texto acima, com o objetivo de aprimorar o seu conhecimento


pessoal, elabore um MAPA MENTAL apresentando estratégias de estudo que envolvam:

a) EDUCAÇÃO FORMAL (ensino superior e leituras técnicas que envolvam a sua área
profissional);

b) EDUCAÇÃO INFORMAL (aprendizados práticos, culturais e do dia a dia)

Veja um Mapa elaborado a partir da motivação acima:


Figura 4.3 – Mapa Mental elaborado.

Formal Educação Informal

Família
Escola/Faculdade Respeito

Amor
Professores
Sociedade
Livros Didáticos
Orientação Educação

Exercícios
Sabedoria Exposições Culturais
Formação

Palestras
Cinema
Seminários

Peças Teatrais

Fonte: Elaborado por estudantes da disciplina de Leitura, Produção e Revisão de Textos.


108 COMUNICAÇÃO E LINGUAGEM | Ângela Kroetz dos Santos e Gilberto Fonseca

Observe que o texto base apenas motivou a elaboração do segundo mapa,


mas não foi o tema central, como no primeiro exemplo. Assim, o mapa foi
construído a partir de ideias sobre o assunto que vieram à mente do aluno que o
construiu.

SAIBA MAIS

O Mapa Mental é um diagrama simplificado que conecta informações em


torno de um tema central.

Você pode imaginá-lo como uma árvore cujos galhos consistem em


informações concisas que saem de um eixo principal. Esse recurso é uma
ferramenta poderosa para a memorização e o aprendizado. Recomenda-se a
construção de Mapas Mentais utilizando o Go Conqr.

Acesse em: http://gg.gg/cw97q.

4.2.5 Seminário e Apresentação de Trabalho


Figura 4.4 – Tirinha Calvin.

Fonte: http://gg.gg/cwqo0.

A tirinha da Figura 4.4 mostra o personagem Calvin tentando fugir de uma


apresentação oral. É muito comum o fato de falar em público causar um
desconforto e até mesmo um sentimento de desespero em quem precisa fazer
um exposição oral ou apresentar um trabalho. Se isso acontece com você, saiba
que é possível minimizar esses sentimentos apenas com uma boa preparação.
Quem lê sobre o assunto que vai abordar e se prepara adequadamente para falar,
pode até ficar inseguro, mas terá grande chance de se sair bem. Dessa forma,
é evidente que você precisa montar um roteiro e ensaiar aquilo que vai apresentar.
Mesmo em uma situação simples e talvez não tão formal, saber o que dizer faz
toda a diferença.
O Texto em Ação | UNIDADE 4 109

O seminário é um gênero oral expositivo cujo objetivo é apresentar um estudo/


pesquisa/dados a um determinado público a fim de compartilhar um saber.
No contexto de sala de aula, muitas vezes você fará uso dessa prática, expondo
um conhecimento adquirido em uma pesquisa aos colegas e ao tutor/professor.

Para conduzir um seminário, o orador precisa conhecer o assunto, organizar um


esquema de apresentação, ter postura, cuidar de gestos, tom de voz e fluência da
fala, além de usar formalmente a língua.

Veja, a seguir, alguns pontos que norteiam o planejamento de um roteiro de


exposição oral. A Figura 4.5 dispõe os passos quanto à elaboração de conteúdo:

Figura 4.5 – Planejamento de um roteiro de exposição oral.

Definir o tema e os
objetivos do trabalho

Pesquisar o assunto em referências


diversas (jornais,livros,internet,
revistas e especializadas, vídeos,etc.)

Produzir um esquema com


informações sucintas que
norteiam o discurso

Enriquecer o conteúdo com


recursos audiovisuais e
imagens condizentes ao tema

Fonte: Elaborado pelos autores.

Com base nos passos apresentados anteriormente, vamos elaborar uma


apresentação de trabalho a partir do tema “O fracasso como professor”.

Certamente você já assistiu uma palestra de alguém bem sucedido que


apresentou fórmulas de como obter sucesso e tornar-se uma pessoa de destaque
em determinada área. Aproveitamos a matéria publicada na revista Galileu,
sessão Novas Ideias, para propor uma visão diferente sobre o fracasso. Leia a
matéria para compreender a sequência da nossa apresentação.
110 COMUNICAÇÃO E LINGUAGEM | Ângela Kroetz dos Santos e Gilberto Fonseca

Os fracassados são os melhores professores


Ouvir palestras de pessoas bem-sucedidas não vai trazer nada de útil para o seu
dia a dia
Cass Phillips
O fracasso é inevitável, enquanto o sucesso só acontece de vez em quando.
Então, por que continuamos tentando aprender apenas a partir de experiências
bem-sucedidas? Em todas as conferências para empreendedores, você escuta
palestrantes se vangloriando dos passos certeiros que deram. Mas será que isso
é realmente útil? As palestras podem ser inspiradoras mas, na maioria das vezes,
você não consegue replicar aquela experiência, já que há diversos fatores diferentes
do que você tem na vida real. Se quisermos aprender algo útil, precisamos — em
vez de escutar as histórias onde tudo deu certo — ouvir os fracassos retumbantes
e dar voz às pessoas que fizeram tudo errado.
Primeiro, porque dentro do sucesso há uma boa parcela de sorte. Já o fracasso
está mais relacionado com as escolhas que você realmente tem de fazer a cada dia.
Uma boa parte do sucesso se deve a pessoas que você conheceu, um determinado
momento propício do mercado ou a uma série de fatores que não se repete. Já
as falhas sempre estarão presentes em algum ponto do seu caminho, mesmo em
empreendimentos bem-sucedidos. Quando você se depara com elas, é importante
saber como outras pessoas se recuperaram rapidamente depois de errar feio.
Minha experiência de fracasso numa start-up me ensinou que, para corrigir erros,
precisamos fazer pequenas modificações rápidas em vez de mudar todo o projeto.
Se mudarmos tudo, é impossível saber exatamente o que foi feito corretamente.
Um exemplo de como lidar com as falhas vem da empreendedora Janice Fraser.
Depois de fundar uma start-up bem-sucedida, ela começou uma segunda companhia,
a Emmet Labs. Mesmo com muito investimento e atraindo alguns clientes, a ideia
deu errado. Na época, ela escreveu um e-mail para os investidores reconhecendo os
erros (inclusive os que foram de seus funcionários, pois foi ela quem os contratou)
e citando as lições que aprendeu. Cada um dos investidores respondeu que voltaria
a financiar uma nova start-up de Janice. A partir daí ela abriu uma nova empresa —
que deu certo —, a LUXr. Essa atitude pode inspirar muitos a sair do limbo, e cada
empreendedor que falhou tem uma lição para ensinar.
Além das lições de como se virar frente ao fracasso, ouvir como tudo deu errado
para alguém pode ser encorajador. Veja o exemplo de Mark Levchin, que teve 4 start-
ups falidas e ficou com o nome sujo antes de se tornar um dos fundadores do Pay-
Pal. Quando você se depara com histórias como a dele e vê que dá para se recuperar
(o Pay-Pal foi vendido por US$ 1,5 bilhão ao Ebay), há sempre mais esperança de
que as coisas melhorem.
Por mais paradoxal que pareça, a ideia de aprender com o fracasso tem sido
bem-sucedida. A conferência dos fracassados está no nosso terceiro ano em San
Francisco, temos uma edição programada para Paris e contatos para trazer a ideia
ao Chile, Brasil e Cingapura.
Cass Phillips é produtora-executiva da failcon, conferência em san francisco em que
empreendedores falidos dividem suas experiências.
Texto disponível em: http://gg.gg/cw98l.
O Texto em Ação | UNIDADE 4 111

O objetivo da apresentação é entender que aprender com os nossos erros


(e os dos outros, claro) pode ser muito mais interessante do que seguir fórmulas
prontas, que muitas vezes são impossíveis de replicar. Veja alguns exemplos a
seguir:

Os fracassados são os
melhores professores
Por (nome do apresentador)

1. Prefira fundo branco nos seus slides (a menos que exista um excelente
motivo para usar alguma cor), pois o branco vai iluminar melhor a sala e
ajudar na leitura dos textos. Apresente seu trabalho, dê um título a ele e
assuma a autoria.

O sucesso é ir de
fracasso em fracasso
sem perder entusiasmo.
Winston Churchill
112 COMUNICAÇÃO E LINGUAGEM | Ângela Kroetz dos Santos e Gilberto Fonseca

2. Uma boa maneira de começar é partir de uma vivência particular, de uma


história sobre uma personalidade ou a partir de uma contextualização.
Prefira textos curtos e priorize as imagens.

Segundo o dicionário, fracasso,


refere-se ao estado ou condição de
não atingir um objetivo desejado
ou pretendido. Pode ser visto como
o oposto de sucesso.

3. Defina seu tema e a forma como você irá abordar o assunto, permita a seu
público entender o caminho que você irá percorrer.

- Huston, nós temos um


problema.

4. Todo mundo gosta de ouvir histórias, capriche na narrativa e utilize os


recursos visuais em momentos estratégicos. Nessa parte da apresentação o
objetivo foi apresentar a história da terceira vez que o homem pisaria a Lua.
A missão Apollo 13 partiu rumo ao espaço em 11 de abril de 1970 e, depois
O Texto em Ação | UNIDADE 4 113

de 47 horas de uma viagem tranquila, uma pane comprometeu a missão.


Felizmente, o fracasso em chegar até o satélite espacial foi transformado
em sucesso, ao trazer os astronautas vivos à Terra.

Ayrton Senna
GP Brasil 1991

5. Os exemplos de sucesso podem ser inspiradores mas, na maioria das vezes,


replicar aquela experiência é impossível, já que há diversos fatores
diferentes do que você tem na vida real. Para aprender algo útil, precisamos
ter contato com fracassos retumbantes e escutar as pessoas que fizeram
tudo errado.

Cair para levantar!


114 COMUNICAÇÃO E LINGUAGEM | Ângela Kroetz dos Santos e Gilberto Fonseca

6. Aqui usamos exemplos particulares de quem aprendeu com os erros, Cass


Phillips, a autora do artigo, cita Mark Levchin, que teve 4 start-ups falidas
e ficou com o nome sujo antes de se tornar um dos fundadores do Pay-Pal.
Quando você se depara com histórias como a dele e vê que dá para se
recuperar (o Pay-Pal foi vendido por US$ 1,5 bilhão ao Ebay), há sempre
mais esperança de que as coisas melhorem.

Conferência dos Fracassados

7. Traga uma novidade para o seu público. Guarde uma carta na manga para
quando estiver perto da conclusão. Aqui apresentamos a FailCon, uma
conferência de fracassados que já teve edições em vários países e que, em
breve, terá sua versão brasileira.

Eleito o melhor vídeo


motivacional de 2015.
O Texto em Ação | UNIDADE 4 115

8. Conclua em grande estilo! Guarde seu melhor para o final. Aqui, terminamos
com um vídeo que entendemos que dialoga muito com o assunto abordado.

VÍDEO

Visualize o vídeo em http://gg.gg/cw9ab.

Seu nome aqui


Email ou telefone

9. Deixe espaço para perguntas e apresente uma maneira de seu público


entrar em contato.

10. Dica final: fuja das canetas laser, das animações (a menos que as considere
importante para apresentar as suas ideias). Lembre-se: menos é mais! Os
slides são um recurso e não devem carregar toda a responsabilidade da
apresentação.
116 COMUNICAÇÃO E LINGUAGEM | Ângela Kroetz dos Santos e Gilberto Fonseca

Agora que você sabe elaborar uma apresentação, na Figura 4.6 mostramos
pontos que você deve observar durante a apresentação oral:

Figura 4.6 – Pontos a observar na comunicação oral.

Ensaiar previamente
a apresentação

Considerar as características do público-alvo,


como faixa etária, tipos de interesse,
expectativas e conhecimentos prévios

Usar linguagem formal, evitando hábitos


da oralidade como: Né? Tipo assim, Ahnn...

Atentar para a postura: evitar gestos


excessivos, manter o tom de voz em ritmo
bem articulado e não monótono,
permanecer de frente para a plateia

Fonte: Elaborado pelos autores.

VÍDEO

Para verificar um exemplo de apresentação de conferência,


assista ao vídeo da romancista Chimamanda Adichie,
no qual ela pontua os perigos de ouvirmos apenas uma
história sobre outra pessoa ou país, não observando a
sua diversidade. A apresentação foi realizada no TED
conference, evento sem fins lucrativos destinado à
disseminação "ideias que merecem ser disseminadas".
Acesse no link: http://gg.gg/cw9b5.
O Texto em Ação | UNIDADE 4 117

4.3 Dúvidas Gramaticais Recorrentes


Nos textos do cotidiano encontramos alguns erros de linguagem bastante
básicos, que acontecem porque quem escreve não domina certas regras da
língua formal. Por isso, elaboramos um quadro contendo algumas expressões
ou termos que acabam sendo empregados, muitas vezes, de forma incorreta.
Cada item é exemplificado para que você entenda qual é a forma correta.

Expressão inadequada Correção e Explicação


“Mau entendido”, “mal humor” MAL é contrário de BEM e MAU é contrário de
BOM.
Logo: mal entendido (bem entendido), mal-
humorado (bem humorado).
Da mesma forma: mau humor (bom humor),
mal-intencionado, mau jeito, mal-estar.
“Fazem” cinco anos. Fazer, no sentido de tempo, é impessoal, não
varia.
Faz dez anos. / Fazia dois meses que ele não
aparecia.
Houveram muitos incidentes. Haver, assim como existir, também é invariável:
Houve muitos incidentes. / Havia muitos
participantes no evento.
“Existe” muitas esperanças. Verbos como existir, bastar, faltar, restar e
sobrar admitem o plural: Existem muitas
esperanças. / Bastariam duas colheres de
açúcar. / Faltavam poucos metros para a
chegada.
Para “mim” fazer. Mim não faz, porque mim não pode ser sujeito.
Assim, o correto é Para eu fazer, para eu dizer,
para eu trazer.
Entre “eu” e você. Depois de preposição, usa-se sempre pronome
oblíquo (mim ou ti): Entre mim e você. / Entre
eles e ti.
“Há” cinco anos “atrás”. Há e atrás indicam passado na frase, portanto
não devem ser usados juntos. Use apenas há
cinco anos ou cinco anos atrás.
“Entrar para dentro”. O certo é entrar em. Fique atento a outras
redundâncias: Sair fora ou para fora, elo de
ligação, monopólio exclusivo, já não há mais,
ganhar grátis, viúva do falecido.
“Porque” você fez isso? Sempre que estiverem claras ou implícitas
as palavras razão ou motivo, use por que
separado: Por que (razão) você fez isso? / Não
sei por que (motivo) ele desapareceu. / Explique
por que razão você se atrasou. Porque é usado
nas respostas e pode ser substituído por pois:
Ele se atrasou porque (pois) o trânsito estava
parado.
118 COMUNICAÇÃO E LINGUAGEM | Ângela Kroetz dos Santos e Gilberto Fonseca

Nunca “lhe” vi. Lhe substitui a ele, a eles, a você e a vocês


e por isso não pode ser usado como objeto
direto. Assim, o correto é: Nunca o vi. / Não o
convidei. / A mulher o deixou. / Ela o ama.
Chegou “em” Porto Alegre. Verbos de movimento exigem a, e não em:
Chegou a Porto Alegre. / Vai amanhã ao
shopping. / Levou os filhos ao teatro.
A última "seção" de cinema. Seção significa divisão, repartição, e sessão
equivale a tempo de uma reunião/evento.
Assim, deve-se usar: seção eleitoral, seção
de esportes, seção de brinquedos; sessão de
cinema, sessão do Congresso.
Não sabiam "aonde" ele estava. O correto é: Não sabiam onde ele estava. Aonde
se usa apenas com verbos de movimento: Não
sei aonde ele quer ir. / Aonde vamos?
Ela era "meia" transtornada. Meio, advérbio, não varia: meio transtornada,
meio lúcida, meio atenta.
A questão não tem nada "haver" com você. A questão, na verdade, não tem nada a ver ou
nada que ver. Da mesma forma: Tem tudo a ver
com você.
Ele foi um dos que "chegou" antes. Um dos que faz a concordância no plural: Ele
foi um dos que chegaram antes (dentre os que
chegaram antes, ele foi um). / Era um dos que
sempre vibravam com a vitória.
Tinha "chego" atrasado. "Chego" não deve ser usado, o correto é: Tinha
chegado atrasado.
Chegou "a" duas horas e partirá daqui "há" Há indica passado e equivale a faz, enquanto a
cinco minutos. exprime distância ou tempo futuro (não pode
ser substituído por faz). Assim, o correto é:
Chegou há (faz) duas horas e partirá daqui a
(tempo futuro) cinco minutos. / O atirador
estava a (distância) pouco menos de 12 metros.
/ Ele partiu há (faz) pouco menos de dez dias.
Eles "tem" razão. Com sujeito no plural, têm é assim, com
acento. Tem é a forma do singular. O mesmo
ocorre com vem e vêm: Ele tem, eles têm; ele
vem, eles vêm.
Vou sair "essa" noite. É este que designa o tempo no qual se está
ou objeto próximo: Esta noite, esta semana (a
semana em que se está), este dia, este jornal (o
jornal que estou lendo), este século (o século
21).
A promoção veio "de encontro aos" seus A expressão correta que indica uma situação
desejos. favorável é ao encontro de: A promoção veio
ao encontro dos seus desejos. De encontro
a significa condição contrária: A queda no
nível dos salários foi de encontro (contra) às
expectativas da categoria
O Texto em Ação | UNIDADE 4 119

Já "é" 8 horas. Horas e demais palavras que definem tempo


variam: Já são 8h. / Já é (e não "são") 1h, já é
meio-dia, já é meia-noite.
Ficou "sobre" a mira do assaltante. Sob significa debaixo de: Ficou sob a
mira do assaltante. / Escondeu-se sob a
cama. Sobre equivale a em cima de ou
a respeito de: Estava sobre o telhado.
/ Falou sobre a inflação. Lembre-se:
O animal ou o piano têm cauda e o doce, calda.
Da mesma forma, alguém traz alguma coisa e
alguém vai para trás.
Estudou muito, “mais” não conseguiu passar Mais e mas são termos completamente
na prova. diferentes. Mais indica quantidade. Passou
mais uma noite no trabalho. Mas indica
adversidade. Estudou muito, mas não
conseguiu passar na prova.
Tranqüilo O "trema" foi abolido. É usado apenas em
estrangeirismos e derivados de nomes
estrangeiros. Ex: Müller, mülleriano.
No caso do exemplo, o correto é tranquilo.
120 COMUNICAÇÃO E LINGUAGEM | Ângela Kroetz dos Santos e Gilberto Fonseca

SÍNTESE DA UNIDADE
Durante toda a abordagem deste livro você estudou diversos gêneros textuais
que usamos no dia a dia, refletindo sobre como o conhecimento humano é
difundido pela linguagem. Obviamente, no ambiente acadêmico, não poderia
ser diferente, de modo que resguardamos um capítulo específico para abordar
textos da academia. Dentre os numerosos textos acadêmicos que conhecemos,
optamos por estudar mais detalhadamente o seminário (oral) e a resenha, o
resumo, o ensaio, o mapa mental e a apresentação de trabalho (escritos). Claro
que existem muito mais gêneros acadêmicos do que os aqui abordados, e você
certamente desenvolverá outros durante a sua graduação, mas entendemos que
o recorte aqui apresentado pode instrumentalizá-lo a fim de que possa obter
um melhor aproveitamento de suas leituras e um melhor desempenho na tarefa
de sistematização do conhecimento. Para que esse processo seja simplificado,
procuramos mostrar como alguns desses textos são construídos.

Em um segundo momento, elaboramos uma relação de dúvidas gramaticais


recorrentes, contendo situações de equívocos gramaticais cometidos por
estudantes em seus trabalhos. A ideia é que esse material também ajude a suprir
dúvidas que eventualmente você possa ter ao construir os seus próprios textos.
O Texto em Ação | UNIDADE 4 121

REFERÊNCIAS
DREY, R. F. O texto na prática: o resumo e a resenha. In: AIUB, T. (Org). Português:
práticas de leitura e escrita. Porto Alegre: Penso, 2015.

GUIMARÃES, T. C. Comunicação e Linguagem. São Paulo: Pearson, 2011.

MOTTA-ROTH, D.; HENDGES, G. R. Produção Textual na Universidade.


São Paulo: Parábola Editorial, 2010.

NOGUEIRA, S. O Português do dia a dia. Como Falar e Escrever Melhor.


Rio de Janeiro: Rocco, 2004.

PHILLIPS, C. Os fracassados são os melhores professores. Revista Galileu.


Disponível em: http://gg.gg/cw9k7.

PEDROZA, D. Vídeo Motivacional Eleito o Melhor 2015/2016. Disponível em:


http://gg.gg/cw9kc - video motivacional

SANTOS, Â. K. Escrita: O mais fino invólucro do pensamento (Ensaio). Porto Alegre,


2014. Não publicado.
122 COMUNICAÇÃO E LINGUAGEM | Ângela Kroetz dos Santos e Gilberto Fonseca

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