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SENHORES
meus pequenos serviços , nao era possivel agora , quando se vao reunir
muito a podem interessar, pois de mais a mais espero que a sua publicaçao
e com mais luzes , poderaõ melhor illustrar a materia , que tanta relaçaõ
que formou parte de hum vasto continente , e ainda mesmo aos ante
riores áquelle , em que a Praia foi villa (nos quaes o seu nome he muito
palmas , para no mesmo dia dellas sessenta e hum annos depois se cobrir
( 4 )
tugueza , he indubitavel que por certo o foi , por ser o primeiro dominio
caminho , que devia tomar; e Portugal ( ainda que tarde ) seguio valerosa
Francezes, invadiraõ Portugal , por que sem duvida foi mais huma vez
entre tantas , que Angra aproveitou (durante todo o tempo dessa invasaō)
para mostrar á face da Europa o seu brioso desinteresse , pois antes quiz
ser levada por o principio de fidelidade aos seus legitimos Reis, obedecer ao
Senhor Rei Dom Joao VIº entao no Brasil , donde tao tardiamente lhe vi
nhao os recursos , e para onde nao podia mandar os seus generos , sem que
fazer prevalecer sob o privilegio dessa installaçao ; por que sem duvida
nao lhes lembrou , que foi sempre marcha segura de todos os tempos captar
partido . Com tudo logo que em 13 de Maio de 1821 , lhe chega o Decreto
do Senhor Rei D. Joao VI° para alli se jurar a Constituiçao , ella se apressa
firmemente ; marcha esta que tambem seguio quando em 1826 lhe foi
E que vemos nos agora ? Angra sempre fiel , sempre pacifica , porem
desgraçada pelo estado a que desde tempos immemoriaes tem sido levada ,
assaz concorreo para o mal estar dos povos, deixando-os caminhar para
que menos , pelo estado da sua agricultura , a qual sim se tem augmen
tado em alguns ramos , mas ainda se acha na sua totalidade muito longe
Naçao Portugueza.
parte desta materia em alguns dos meus escriptos , que fiz exarar nos
decurso desta pequena obra , a qual deve servir de thema para pennas
mais bem aparadas .
memorias ; pois por este modo he que a patria se pode enriquecer e eno
brecer . A este respeito nao peço desculpas , se por mim for o negocio
mal tratado ; porque se pago o que devo , quanto , e como posso , a que
centar por este meio o numero dos meus adversarios , que nem levemente
desejo desafiar ; e possa nao ter vigor para commigo , aquelle Veritas
( 6 )
odium parit. Asseguro com a ingenuidade que me he propria , que fiz
negocios.
derá duvidar ; e eis por certo o que com assaz especialidade me animou a
esta empresa , tao pouco facil , quanto superior ás minhas forças ; o que
marca de Angra.
E PRINCIPALMENTE
SOBRE A TERCEIRA.
§ 3º. Sendo seguidos estes estudos pouco mais d'hum seculo depois
da descoberta das Ilhas dos Açores , ao mesmo tempo que a mocidade se
instruia na melhor moral , vigorosamente se formava nos exercicios da
caça , das armas ( 2) , e da equitaçao , fazendo todos os annos as suas cavalha
das , aonde sempre entrava a flor da nobreza , empregando estes fes
tejos , ou ja por motivos religiosos , ou mesmo por motivos faustos ( 3) .
S 4°. Educados com estes mesmos principios nao he de admirar que
nossos maiores fizessem relevantes serviços na Africa , e na Asia ; é taes
houve , que tiveraõ depois a honra de governar as Indias , e muito
a contento dos nossos Soberanos , sendo em todos tal o desinteresse com
que servirao , que nenhum accrescentamento tiverao correspondente ;
porque ainda mal , foi quasi sempre de todos os tempos guardar os titu
los , e as commendas para outros fidalgos na corte , que menos os mere
ciao : nao cabendo a Angra menos nome em quanto por outro lado dava
grandes pilotos a Portugal, Lentes a Lisboa , e á universidade de Coimbra,
e ás Indias directores espirituaes , sendo algum delles ja de illustre nas
cimento (4).
§ 5º. A morte daquelle soberano cortado na flor da idade , e a intru
sao dos Philippes nos nossos reinos , foi sem duvida huma das pri
meiras causas da decadencia da Naçaõ Portugueza, e com particularidade
a da Ilha Terceira , aonde singularmente contra essa intrusao se procu
rou sustentar a acclamaçao que havia feito pelo Senhor D. Antonio.
aquella mesma regalia tao distincta , tao singular, e tao digna d'inveja,
quanto na verdade saõ honrosissimos os termos do Alvará de 15 de Junho
seus distinctos serviços nao tivessem sido avaliados conforme o seu mere
cimento , ou porque com effeito a introducçaõ de costumes estranhos
naquelles fataes sessenta annos tivesse podido diminuir lhes aquelle antigo
brio portuguez , que tanto ciume fez sempre á Naçao Hespanhola .
§ 8°. Como quer que seja , he muito certo que o Senhor Rei D. Jozé I °
achando decahida a nobreza em todo o Portugal , e naquellas Ilhas
procurou elevalla abrindo caminho ás letras , e ás armas , a que deo hum
grande impulso , promettendo adiantar a mesma nobreza logo que por
qualquer destes caminhos ella o merecesse . Foi quando criou o Governo
das Ilhas dos Açores , e he precizo confessallo , que essa reforma nao sortio
tao bom effeito , como na Universidade de Coimbra ; antes foi em muito
maior decadencia a instrucçao publica nas mesmas Ilhas , ja por que
que muitos houve entre os nove Generaes que desde aquelle tempo go
vernarao as Ilhas a quem os nossos Reis nao podéraõ deixar d'enviar Cartas
Regias concebidas em termos bem amargos , quanto era o conhecimento
que tinhaõ dos seus deserviços ; mas quao pouco isso lhes importava , se
assim mesmo lhes eraõ depois dados titulos de grandeza ?
S 10. Com o andar dos tempos cada vez mais se foi conhecendo o atra
2
( 10 )
d'hum plano d'estudos , que podesse servir para todas as Ilhas , e sempre 0
e
seu respeito disserao os Padres no sagrado concilio de Trento .
midavel o seu pezo até para hombros d'Anjos . - Angelicis etiam hume ar
2
d'hum collegio que elle mesmo edificou , e sustentou até morrer, aonde
tanta mocidade se aproveitou debaixo das vistas daquelle virtuoso pre se
lado . E tudo isto ah ! porque na sua sobria mesa nao tinha porcelana do a
lientes , quanto mais facil he o sen remedio ; porque hum tal bispado cert
tendo oito para dez contos de reis de renda , tendo tambem vinte veit
losophia ( ainda sem fazer mudança d'algum estabelecimento que podesse mesr
( 11 )
manejados .
S 15°. O Senhor Rei D. Joao VI° conheceo perfeitamente a importancia
destas verdades , quando poz a sede da Monarchia no Rio de Janeiro, pois
The havia mostrado a experiencia , que as Camaras a quem a Orde
naçaõ do Reino incumbe o melhoramento dos baldios , e o poderem fazer
certos aforamentos , designando-lhes ao mesmo tempo o modo de apro
veitar as colinas , etc.; naõ podião efficasmente cooperar levando ao
ultimo estado de perfeição , e conveniencia o que a ellas de mui perto
dava vantagens , por que a multiplicidade dos negocios ( entao desco
nhecidos , ou em ponto muito pequeno) e dos trabalhos que sobreveio ás
mesmas Camaras , nao era possivel vencer-se em duas sessões , que a lei
( 12 )
lugares , como escala para a sua maior elevaçao . E mesmo pelo que res sin
peita aos seus principios em relaçao com semelhante objecto , quaes qu
se poderá esperar que sejao , e que poderá por exemplo saber hum Gene qu
ral em agricultura pratica? de
S 17° . Todavia supponhamos de graça que este General tem a possibi a
lidade de saber alguma cousa na sua terra , porque talvez nella possua
pe
huma horta ajardinada , em que tenha visto vegetar alguma planta per er
tencente a horticulturas (visto que os seus grandes predios , ou Condados th
se os tem , andao sempre por mãos de administradores) ou mesmo por
que em algum quintalaõ visse vegetar huma laranjeira, ou hum loureiro,
qi
etc. etc. Por ventura será sufficiente esse conhecimento para o dirigir com de
( 13 )
Tei aonde a este respeito tudo lhe he desconhecido ? Isso varia muito .
Outro solo , outra atmosphera , outra economia agricola , e em
ias,
consequencia outra rapidez , ou demora na vegetaçao das plantas ;
belas
nal, e o que tambem nao he indifferente , outros preços aos generos , e huma
mais ou menos facilidade de sua exportaçao , o que tudo he preciso
por
comparar com a maior seriedade no acto em que se trata de qualquer inno
tade
vaçaõ desta natureza , a fim de que a Naçao possa tirar vantagens que
Ti
sobrepujem aquellas , que os povos em commum estao tirando todos os
m
dias , quando se devem deixar as novas especulações ás pessoas intelli
le
gentes , e ainda aos viveireiros , que a salvo se podem sair dellas, sem que
estes jamais possao perder muito , porque pouco arriscao (9) .
§ 18°. Quanto menos poderei dizer de todos os Corregedores , e Juizes
de Fora , que alli tenho conhecido desde o estabelecimento daquella
Junta , que possa abonar-lhes algum conhecimento em agricultura ?
E que progresso poderia fazer a mesma Junta , ainda que todos os seus
registro , e ordenei hum indice (unico que lá existia até aquelle tempo) ao
rico e importantissimo 3º livro ; e pensando eu que estes meus trabalhos
(ainda que eraõ hum pequeno exordio de quanto alli se havia mister) de
veriaõ nobremente excitar o derramamento de luzes dos meus collegas ,
foi quando passei pelo desgosto de ver como tudo era olhado com tena
cissima indifferença , de maneira que por nao ser imitado , deixei de ser
muito excedido em contraposicao á minha esperança , e aos meus deesjos ,
tal he o amor que tenho á minha Patria , ficando estas cousas , e todas as
mais que lá se achavao , no mesmo estado de confusao , em que as tinha
muitos officios , por que eraõ Deputados das Reaes Juntas da Fazenda ,
do Melhoramento d'Agricultura , do Crime , e do Paço , Superintenden
tes das Alfandegas e do Real Contrato do tabaco e saboarias, fazendo tam
bem as mais das vezes de Provedores dos Residuos , quando em seculos
de oiro só conhecião d'aggravos , de correiçaõ e de policia , e naquelle
S 23°. He manifesto por tanto que sendo estes trabalhos muito exce
dentes á sua possibilidade , ainda mesmo quando elles tivessem tantos
conhecimentos agronomos quantos conviessem para dirigir com acerto
hum tal ramo d'administraçao publica (em que tanto se ha escripto nas
Nações mais cultas , nas quaes se tem feito criar sociedades agronomicas
para o seu aperfeiçoamento) jamais elles poderiaõ desempenhar os seus
deveres por
falta de tempo , donde taò perniciosas consequencias se
seguiao , e o peor he que sem se poderem evitar ( 10).
S 24°. Desde então muito mais se exaltárao os nossos males , tivémos
de ver o Presidente da Junta feito proprietario , e lavrador , atropellando
entrando muitas gentes das mais Ilhas , que vaõ servir quasi todas as
casas da cidade , e algumas tambem dos lavradores ; os claustros nao
tem mais d'ametade da gente , que nossos paes lhes conhecêrao , e al
guns tem menos ; o estado do matrimonio muitas vezes alli se vê em
mento que deveria esperar- se; e isto sem ser por que as Ordens Regias
permittaō a emigraçaõ para o Brasil ( ainda quando esse estado nos per
tencia ) ou para qualquer outro paiz estrangeiro , mas antes mui positi
vamente se lhe oppoem , de modo , que até ha muitos annos temos
sido poupados de levas de soldados , sendo ás vezes precisos na Mãi
Patria , mas nem por isso deixao d'emigrar muitas gentes por desleixo do
Governo ; com tudo eu estou persuadido de que ainda os Generaes mais
3
( 18 )
acautelados tem sido algumas vezes illudidos por quem os cerca ou
pode concorrer para a sua illusao ; e que terá entao acontecido aos me
nos espertos ? Sem duvida terem deixado sair muita gente , como attesta
tos , e ás vezes mais , de que nao escapa a terça parte , por que alem do
tènue e quasi sempre mal pago ordenado de mil reis mensaes , que taõ
pouco se dá ás amas que os criaò , tem tambem contra si o pouco zelo ,
se algum ha , da parte dos Medicos , e Cirurgiao do Senado em acudir
lhes, quando he necessario ; e o que ainda he mais revoltante , em re
ceitar-lhes quando para isso sao procurados , por cujo desleixo se perde
desde o berço immensidade de braços com hum grande máologro das
despezas do Concelho , e em grandissimo deserviço da Naçao.
Ihes aproveitavao pelo errado andamento das cousas; tendo o roteiro dos
muitos que tinhao morrido em todos os annos antecedentes , d'alguns que
caçao physica inteiramente novo ( para aquella Ilha ) e algum tanto mais
despendioso ; e porque ha muito sentia gritar , que nao tinhamos em
alguns ramos leis que nos regulassem, julguei conveniente principiar
a apontar quanto me pareceo , e pude alcançar , em abono do projecto
desde 1654 em que os Nossos Augustos Soberanos olhando este ramo
d'administraçao publica , como hum dos mais carecidos da Benefi
cencia Real , e vendo que as providencias anteriores nao correspondiaō
ao desejado fim, houverao por bem , por Alvará de 29 d'Agosto de 1654 ,
isentar da milicia os maridos das amas dos engeitados em quanto os
criassem ; depois , por Alvará de 26 de Outubro de 1701 , forao confir
vendo-se d'antes para esse effeito entendido com os Facultativos ; mas por
( 20 )
que ainda assim mesmo eu julguei tudo insufficiente remedio na presença
d'huma tao grande soma de males , accrescentei na mesma Memoria ,
que se todas aquellas providentes Ordens Regias se tinhaõ julgado neces
sarias em Portugal , particularmente em Lisboa , aonde sem comparaçao
ha melhor acolhimento para taes desgraçados , muito mais a sua
didos nella , que attendido o mao estado dos expostos , e nao menos
a grande distancia em que alguns se achavao , até n'outro Concelho a
4 e a 5 legoas da Cidade , aonde lhes naõ era facil ir remedio prompta
( 21 )
Nacional , que estava quasi inutil , como ainda hoje (que foi do Mar
quez de Castello Rodrigo detraz do Collegio , que foi dos Jezuitas) para
que se pedisse a S. Magestade , e que sendo concedida , como era bem
d'esperar-se da Beneficencia Real , se ajuntassem nella humas poucas
d'amas escrupulosamente escolhidas , cujo numero só com o tempo se
poderia aproximadamente designar, e addicionei o uso lacteo caprino ,
devendo ter á sua disposiçao algumas cabras para com esse auxilio
naò soffrerem os meninos falta de leite .
S 37°. E tanto ambicionava eu ver progredir este proposto novo
systema , que me responsabilizei a dar dous moios de trigo todos os
annos em quanto vivesse , se com effeito se posesse em pratica , como
eu o havia indicado : e até me prestei a pedir esmolas para esse fim ,
leinbrando ao mesmo tempo , que os grandes estabelecimentos de pie
dade conhecidos em toda a Europa , e mesmo entre nós, haviaõ tido
principios muitas vezes pequenos ; mas que a boa direcçao , a boa fé ,
e zelo com que se haviao criado, tinhao attrahido a benevolencia publi
ca , e com ella o seu engrandecimento .
$ 44° . Com effeito dos nossos Governantes nos tem vindo os mais funestos
resultados , e estes se centuplicaraõ em quanto o sabio Governo de Sua
Magesdade nao tiver a fortuna de ser mais bom succedido na escolha das
authoridades que para alli nos forem mandadas ; e isto porque ainda
hum nao sei que desvia os homens dos sentimentos da sua especie ,
que he justamente como se pode explicar o motivo por que até aquelle
tempo se nao tinha adoptado , nem melhorado o projecto de vac
cinaçao por mim apresentado em Camara no dia 15 de Dezembro de
1821 ( contido em 10 artigos ) em cuja execuçao nenhuma despesa
era preciso empregar, senao em hum livro , aonde deviao ser lançados
os nomes dos vaccinados . Só assim se nao perderia tao saudavel bene
ficio , e estaria o Senado sempre em dia para poder satisfazer ao Go
verno de S. Magesdade quando a esse respeito fosse perguntado ; ou
tambem quando em acto de Correiçaò tivessemos Corregedores ido
neos , e mais aliviados de suas tarefas , para se poderem interessar
ARTIGO I°.
II.
As amas que morarem no contorno da Cidade na distancia d'huma
legoa voltarao com os expostos vaccinados para suas casas , sendo com
tudo obrigadas a apresentar-se com elles outra vez na sala da vaccinaçao
no dia e hora indicada pelo Medico , ou Cirurgiaõ Vaccinador.
III.
VIII .
DESPACHO .
de celleiro ; e posto ser o andar mais baixo do edificio , o que nao conviria
a todas as molestias , com tudo elle ainda he superior ao plano da rua ;
( 29 )
e que nao servisse para mais , era por certo bom para alguns convalescen
tes ; e de inverno seria até mui proveitoso , por ser o mais agasalhado ,
ou o que seria melhor, podia accrescentar-se mais hum andar sobre o
mesmo edificio ; por este modo era facil dar entrada a hum mayor
numero de doentes , e seriao mais bem guardadas as mandas de nossos
maiores, que taõ piedosamente concorrêrao para aquelle estabelecimento .
Na verdade, bastava que se fizesse o mesmo que ja a Misericordia da Villa
da Praia havia reconhecido necessario , e que tanta honra merece por
esse augmento , com tao manifesto proveito publico ; porem naquella
villa proporcionao mais os trabalhos aos Provedores , nao os fatigao
tanto ; elegem-nos amiudadas vezes , mas nao acontece assim na Cidade
de maneira que em toda a minha vida , nao conheci senaò tres Prove
dores que com a vida acabarao as funções do seu cargo , estando o ul
timo talvez servindo havia mais de 20 annos , o que se nao era culpa ,
era descuido da Meza , tornando-se surda aos clamores dos pobres en
fermos , que poucos se curavao bem , e peor ainda parecendo indiffe
rente aos muitos que se nao tinhao podido receber ; nao podendo pôr de
parte as difficuldades que se encontravaõ na admissaõ d'alguns irmaos ,
que queriaõ ser da Misericordia , quando por falta de gente he que se ha
viao tornado quasi perpetuos aquelles Provedores , e quando os seus es
tatutos os mandaõ eleger todos os annos ; e mesmo por decencia parece
que deviao ter suffocado o grito geral , pois administrações que dao tanto
trabalho e responsabilidade , jamais se conservao, que nao seja por gran
dissimos interesses particulares com prejuizo publico ; tanto mais que de
40 annos , o que deve fazer suppôr hum grande deposito com que entaò
de futuro possa fazer o que ha muito tempo tem esquecido com prejuizo
da Naçao .
( 30 )
sem , por qué saõ "muitas , sendo somadas com as do augmento das
suas rendas , deviao pelo menos dar- nos resultados equivalentes áquelles
de melhores dias , cuja falta amargamente lamentamos hoje ; muito mais
ainda por que da inadmissaõ de sujeitos para aquella Santa Irmandade
tem nascido a permanencia quasi eterna daquelle Provedor; por este modo
se vai apagando a memoria daquelles varões illustres e desinteressados , que
jamais tem servido tal cargo , senao por hum anno, e assim ficao muitas
vezes escondidas as virtudes de muitos outros, que por nao terem lugar,
deixaõ de prestar, como devem serviços uteis á Patria .
.
§ 50 ". Quem naõ verá que tudo isto sao causas destruidoras da socie
dade, as quaes infinitamente tem concorrido para deixar de crescer aquella
povoaçao , e tolher-se em consequencia o progresso da nossa agricul
tura? Quem nao verá ?... Remediados estes inconvenientes , entao des
( 31 )
conhecidos aos Nossos Soberanos , deve augmentar-se immenso a popu
事
laçao , e ainda que nao houvesse alteraçao no systema agricola , só por
este grande auxilio nao deixariaõ d'apparecer resultados agradaveis ; e
estes poderiao chegar ao ultimo estado d'aperfeiçoamento , se em cont
formidade das Reaes Ordens , e Paternaes desvelos do Senhor Rei D.
Joao VI se houvesse por bem pela liçao da experiencia de fazer emendar
o que servio d'embaraço e estorvo ao desejado melhoramento . He na
verdade o caminho mais proprio para se fazer conhecer ao Governo ( de
S. Magestade quanto convem praticar em beneficio d'aquelles povos;
entaò elles seriaõ levados mais docemente ao augmento de culturas ja
experimentadas , e que ainda hoje se achao em ponto muito pequeno ;
elles conheceriao melhor suas vantagens , e elles se dariao pressa a en÷
trar em certas culturas novas , a que por costumes velhos saõ sempre
oppostos ; erros estes que continuarao por muito tempo em quanto por
meio da persuasao , e da propria experiencia se lhes nao fizer sentir
quanto elles tem perdido na sustentaçao desses costumes ; por que por
ainda que de nossos
via de regra elles sempre se oppoem ás innovações ,
dias tiveraõ huma , que assaz os devia animar para muitas outras , posto
que tanto a praguejarao no principio , quando o General Diniz Gregorio
de Mello e Castro a isso os obrigou , quanto hoje a bem dizem , com mil
expressões d'agradecimento ; vindo este General a merecer em Angra
vantagem....
$ 510. Foi a cultura da batata Ingleza , que he ja considerada entre
elles , como huma taboa de salvaçao em caso d'esterelidade de ceriaes ,
por que na verdade está hoje taõ generalizada , e produz em tanta copia,
que muitas vezes se vende a 50 e 60 reis o alqueire, e fora sem compa
raçao mais abundante e mais pingue a sua colheita , se politicamente
naõ estivesse vedada a sua exportaçao para os nossos Reinos , pelos gran
des direitos que dellas se pagaõ ; o que só redunda em proveito d'alguns
estrangeiros ; encarecendo
em consequencia o mercado publico ( por
que nao concorrem outras que # lhes façao face ) quando alias se 7 po
deria tornar baratissimo com vantagem nossa.
( 32 )
os baldios com ellas , que até de mais a mais saõ hum excellente preparo
para as terras cereaes , e tao pouco precaria a sua producçao , que a
mesma intemperie da athmosfera , que ás vezes pela sua muita humi
dade véda a alegria aos lavradores murchando suas bem fundadas espe
ranças na formosura de suas espigas , sem duvida lhes he assim mesmo
a mais benéfica, e a mais conducente a produzir com abundancia.
§ 53°. Ella vegeta entre o mesmo milho , e produz excellentemente ,
sem que muito o affronte ; todavia muitos mais podiaõ ser os interesses
pendentes d'auxilio estrangeiro , sem com toda essa barateza poder preju
dicar a lavoura de Portugal ; nem só por que o nosso trigo he d'outra qua
lidade , e de menos merecimento que o d'aquelles Reinos, mas quasi indis
pensavel para se misturar com elle, como por que a batata em grandè quan
tidade nao faria conta cultivar-se em Portugal, assim pela carestia dos ter
renos , e dos trabalhos que com elles se empregao , como por que o solo e
athmosphera , lhe nao he tao proprio ( 16) , quanto o nosso ; e alem disto
consideravelmente cresciao os bens Nacionaes pelo augmento dos dizimos
e dos direitos das alfandegas ; porem até aquelle tempo nao sendo olhadas
estas vantagens nem a bem das nossas Ilhas , nem a favor de Portugal ,
continuárao por isso a ser consideradas as nossas batatas , como hum ge
nero estrangeiro , por cujo motivo se nao exportao , donde nasce que ha
vendo pela sua abundante producçao barateado tanto , acontece algumas
vezes nao se poderem reputar todas , fazendo-se em consequencia uso for
çado para animaes de maneira que ja nao faz conta ao Colono estender
se a maior cultivo , nem ainda mesmo em terras magras de que se paga
pouca renda; por que quanto ás gordas e as mais productivas , se o Agri
cultor com ellas occupa algum terreno, elle tem sempre pelo menos a con
tar com huma colheita de 120 alqueires por alqueire de terra (ou 200 bra
ças quadradas ) e muitas vezes tem colhido acima de 240 , sendo hum ter
( 33 )
mo medio de 200 alqueires ; porem nem ainda assim mesmo lhe faz conta ;
por que se muitos o fizessem viriaõ as batatas a preço de 20 , e 30 reis o al
queire no que perderia muito o Cultivador; pelo que dispoem da terra pa
ra outras sementes com que mais se interessa , a pezar de serem algumas
vezes repetidas ( 17 ) , o que deve evitar-se quanto for possivel pelos in
convenientes que dahi resultaõ ( 18 ).
§ 54° . Entretanto esta cultura e todas as mais seriaõ susceptiveis
d'hum engrandecimento extraordinario , ainda que o Governo de
S. Magesdade por hum lado nao annuisse ao que huma Junta Agrono
mica em coincidencia com estes principios , e muitos outros, lhe houvesse
ra, sem duvida será o seu Orago que mais contente o de Santa Maria pela
grande devoçao que ha com a Mai de Deos ; quando alias, entre muitos
outros inconvenientes , se vê o pobre colono obrigado a passar no dia
Europa ( pela sua reproducçaò e extensa vida , pois que dura trinta para
quarenta annos a qual por muito que a exaltao nao lhe contao mais de
a qual em nada he excedente ao que a esse respeito tenho lido , sendo certo
que no meu paiz tenho visto relvar 5 e 6 vezes principiando a cortar-se em
Abril , nunca sendo preciso mais d'hum mez para cada corte , e ás vezes
" sendo o seu tamanho ordinario de 3 a 4 palmos , e entre elles
alguns de 5, e no seu perfeito estado de florescencia ; e alem desses ,
mais 3 ou 4 vezes se sega conforme he o inverno. Estes ultimos cortes
posto nao chegarem d'inverno a florescer , com tudo elles sempre chegao
a dous palmos , e ás vezes mais ; e se por exemplo estes comparados com
os outros nao valem tanto para animaes de grande trabalho , para esses
mesmos sempre aproveita nas palhadas , ainda que nao poupe o grao ,
que se economisa durante os 5 ou 6 cortes abundantes , interessa con
tudo muito mais para as vaccas de leite ; sendo tambem secca huma das
melhores forragens conhecidas .
S 56°. Quem dirá que ainda assim mesmo os povos se naõ resolvèrao a
cultivalla ? Contudo ella ja estaria em todas as Freguezias da Ilha , se
nao fossem os acontecimentos politicos de 1828 , por que tinha a contar
que todos os morgados, e amigos a quem em 1821 e 1822 eu havia dado
sementes della (que tinha mandado ir d'Inglaterra), houvessem de obri
gar os seus rendeiros a que a cultivassem , instruindo-os ao mesmo
tempo sobre as vantagens da sua cultura , e se fosse necessario, eu faria
huma memoria que deveria ser espalhada por aquelles povos . Pude
observar se d'antes era bem preparada a terra , aonde devia ser feita a
sementeira .
§ 57°. Muitos annos se perdêrao em que foraõ alli desconhecidas as
vantagens de tao rico prado , o que tambem tem acontecido em Por
inconveniente , sem duvida por que lhes naõ saõ presentes os meios de
os soltar com a mistura de terras mais fracas , areas , vegetaes , e estru
mes ; pois mal sabem o que perdem em nao aproveitar esta rica planta ,
que nao menos deve ser olhada economicamente quanto ao sustento dos
animaes, como por que os livra de molestias, e os cura ; sendo cousa rara
ver-se na Terceira hum cavallo com mormo , ou polmoeira , molestias
que em Portugal se encontrao a cada passo , talvez, segundo me parece ,
seja huma das principaes causas , pelo pouco cuidado que se emprega
em guardar as palhas , que lhes servem todo o anno , e nao menos ,
pela muita humidade , que de ordinario apanhao na sua conducçao ,
como tive d'observar em 5 invernos que estive em Portugal .
§ 58°. Se estas vantagens só por si sao muito excedentes a todas es
sas decantadas pelos Estrangeiros , e por alguns dos nossos Portuguezes ,
eu vou apresentar outras filhas da minha experiencia em relaçaõ com
à minha Patria, que nao menos me parecem dignas d'attençao, para que
resses agricolas tao de pressa correm por outros principios, que nao sejaõ
os da propria experiencia ) nao ha duvida que muito mais adiantados
poderiaõ estar , se elles tivessem prados artificiaes , visto haverem
aquellas duas epocas do anno nas quaes o cultivador necessariamente gasta
huma grande parte do dia em conduzir o seu gado para o trabalho , na
distancia d'huma a duas legoas da sua habitaçao , e ás vezes mais ; con
sumindo-se nestas jornadas a carne dos seus animaes , e fatigando- se
estes a ponto d'entrarem de má volta no mesmo trabalho ; alem de que
gastao-se-lhes as unhas , o que muitas vezes os despéa , obrigando-os a
manquejar, e muitas outras os inhabilita para traballhar, sendo ainda
peor a perda do tempo , pois que o atrazamento dos trabalhos d'hum
dia , nem só tem dado lugar á multiplicidade delles, como tambem a im
de trigo , quantas vezes temos nós visto , que vindo a chuva logo de
pois , se multiplicaõ as fadigas por mais dias , e com que perda de
trigo ? E que incalculaveis consequencias naõ pode ter esta perda olhada
debaixo de vistas agricolas e commerciaes , em que hum momento
abandonado tem tantas vezes decidido de grandes fortunas ?
§ 61°. Só por estes principios julgo que o agricultor facilmente se
convencerá de quao proveitoso lhe seria estabelecer hum luzernal
perto da sua casa . Elle mungiria tambem de suas vaccas muito mais.
leite , pelo poder tirar duas vezes no dia , e de muito melhor qualidade
para delle poder extrahir a melhor manteiga, e em maior copia ; e restando
lhe em consequencia mais tempo para as suas culturas , elle se despreocupa
ria, vindo a conhecer que nem só de trigo , e milho se tira proveito corres
pondente ao que pela terra paga , ás suas despesas , e ao premio das suas
fadigas ; naõ devendo tambem pôr de parte o interesse que d'ahi lhe
proviria pelo augmento das suas estrumeiras , e muito mais ainda , pelo
quanto nellas influe a mistura d'estrume animal , em cujo manejo agri
cola naò deixao alguns dos nossos lavradores d'estar hum pouco atraza
lizar seus desejos , ainda que pouco repetidos sejaõ seus effeitos .
§ 62°. Para maior elucidaçao da materia julgo conveniente fazer publico
o proveito que tenho tirado da luzerna. Com verdade posso dizer ser até
áquelle tempo (e creio que ainda hoje) o maior cultivador desta planta na
quella Ilha, e nao he por que com ella occupe grande extensaõ de terreno ,
porem sim em comparaçao da acanhada cultura dos outros . Tao somente
constao os meus prados de 13 alqueires de terreno ( ou 2600 braças qua
dradas ) plantados em differentes pontos conforme he a minha residencia
na Cidade , ou no campo , e com elles sustentei sempre à farta 8 bestas ,
2 bois, e 2 vaccas, dando-lhes apenas alguma raçaõ de cevada , e assim
mesmo em algum anno tive sobras , de que dispuz para forragem d'inver
no. Durante seis mezes sempre poupava 6 a 7 moios de fava e cevada, con
servando os animaes sadios , gordos , e fortes ; quando sendo postos a
resses , pois que nao ficaria hum palmo de terreno por cultivar, sem
que essa cultura fizesse o mais pequeno estorvo aos ricos fructos de
Ceres , e Pomona.
"
§ 65°. Outros muitos generos do Brazil se poderiaõ tambem cultivar
nas nossas Ilhas , bastante nos tem ensinado a abundancia das bananas ,
tiváraõ alli aonde apenas escapou o gengibre , por estar debaixo da terra ;
e entao se cerráraõ as portas á nossa fortuna , até que no tempo do
Snr. D. Affonso VIº ( sendo-lhe repetidos os conselhos dados a seu
Augusto Pae pelo nosso respeitavel P. Antonio Vieira ) , se princi
como n'outra nao podemos ja tirar vantagem , como nos havia sido muito
mais facil no 1º seculo da descoberta das Ilhas , ou por que os seus Po
voadores fossem mais diligentes , e o Governo os auxiliasse , ou por que
com effeito naquelle tempo era mais frequente o nosso commercio com
o Brazil.
as suas Reaes Ordens , nem só pelo que diz respeito aos engenhos ( por
incuria dos Ministros encarregados disso ) como pela falta de segu
rança da costa , o que deve recahir sobre " o Ministerio de S. Ma
gestade ; entao se foi diminuindo aquella grande cultura , que tanto
commercio attrahio da Inglaterra , Hollanda , e Sevilha , d'onde muitos
navios iao alli carregar della , de que muito precizavao para as
tintas , até que inteiramente se extinguio com immensa perda da Real
Fazenda , e prejuizo daquelles povos , nao só pelo que diz respeito á sua
producçao , como pelo muito que a sua cultura influia na dos trigos ,
d'onde vem que naquelle tempo havia muito mais trigo , do que ha hoje,
e nao só por isso , como por se haver adoptado o milho em lugar do
pastel ; nem era d'esperar- se menos , por que huma maçaroca deste milho
grosso sustentada em huma cana alta e maciça , preciza muito mais ali
mento , que huma tal planta , que corresponde a huma alface .
das nossas fabricas publicado pelo mesmo distinto auctor nas suas Varie
dades . Tomo 1º , pag. 181 e seg. ) Porem eu nao sei que chegassem ao nosso
conhecimento tao providentes , e animantes determinações sobre tal ma
teria; talvez, ou porque o Governo de Portugal nao as remettesse aos Aço
( 43 )
der dizer a este respeito , ao menos com o Epico Latino : Hos ego
versiculos feci , tulit alter honores. - E tudo isto acontece , desde que
deixámos de ter Juizes Ordinarios , que se interessavao sempre na con
servaçaõ das casas ; e por isso quando viao que eraõ mal administradas ,
davao-lhes tutores ; porem a maior parte dos Ministros que alli tenho
conhecido até aquelle tempo , em vez de cumprirem as mais saudaveis leis ,
que ha a esse respeito , procuravao antes tirar partido desse mesmo des
leixo , e das tristissimas consequencias delle , tao perniciosas , como ine
vitaveis .
forte construcçao , mas ainda para os mais excellentes trastes , com que
adereçassem as suas casas. Por este modo elles augmentariao muito os
seus rendimentos , elles se fariao independentes de seda estrangeira , e
por isso cada vez mais aptos a servir bem a Naçao.
S 77°. He tambem muito certo que podiamos ter fabricas de lani
ficios assim como ja temos huma fabrica de chapéos , que nesse genero
nos torna independentes de soccorro estrangeiro , sendo de mais duraçao
que os de fora, e talvez hoje mesmo os rivalize no azevichado, o que de
verá attrahir boa reputaçao ao seu fabricante . A nossa lãa , posto que
geralmente naỡ he da melhor qualidade , com tudo alguma temos que he
magnifica, e corresponde á melhor d'Hespanha ; mas em pequena quan
tidade , naõ faltando industria para esse fabrico. Ha muitos annos que a
Ilha das Flores faz baetas , baetões , e cachemiras ; de linho tambem
alguns festões , a cuja imitaçaõ ja deo algum principio a Ilha de S. Jorge,
cuja industria nao tem chegado a hum estado de aperfeiçoamento , como
tanto conviria, por naõ ter sido animada nenhuma dellas; e eu me lembro
daquellas Ilhas com preferencia a qualquer outra , por ser aonde ja pri
meiramente apparecêrao os primeiros ensaios de taes manufacturas ; e
por que jamais serei d'opiniao , que aonde se quer animar em grande a
agricultura , se procurem ahi fazer fabricas , que quasi sempre nos seus
principios sao repugnantes a ella , pelos muitos braços que lhe roubao ,
1
bem que por fim sempre ambas se dêm as maos , e reciprocamente se
interessem .
S 78°. Por este pequeno esboço se deve colher quanto falta por fazer
a bem daquelles povos , e da Fazenda Nacional , o que tudo em vez de
ter progresso , soffreo diminuiçao , resultante do estorvo proveniente da
criaçao d'huma Junta d'Agricultura formada dos Ministros territoriaes ;
contribuindo nao menos para nao virem a effeito os paternaes dézejos
e Real solicitude de Sua Magestade , que se criasse hum inspector
tambem forasteiro (filho da Ilha da Madeira) cuja educação podendo bem
habilitallo para algum outro officio , que aproveitasse á sociedade , he
muito certo que nunca podia dar conta de tao difficil commissao , pois
The faltava quanto havia mister para o seu perfeito desempenho , como
desgraçadamente por experiencia nossa tivémos d'observar .
( 46 )
nao pode deixar de ter nas extremidades dous planos inclinados, que.
d'inverno se tornaõ ás .1 vezes perigosos , por serem d'hum barro vis
guento ; e entaõ dao mais que sentir ao gado , que d'inverno por alli se
serve , fazendo-se-lhe tanto mais penoso o serviço por esta estrada , por
que ainda se nao acostumárao a ferrar o gado vaccum, pondo de parte, o
detrimento que d'ahi resultou ao mesmo Bettencourt , nao só pelo valor
outro pedaço mais pequeno entre seis e sete braças fronteiro, ao mesmo
predio do mesmo Teixeira, alem d'outros bocados na mesma Freguezia ;
sendo a obra da Silveira ( Freguezia de S. Pedro ) , de todas a mais des
pendiosa , nao tanto pela sua extensao , que andará talvez entre doze e
quatorze braças , como pela sua grande altura , que nao será menos de
sinco ou seis , sendo forçoso fazer huma mui grossa sapata , para sus
( 49 )
mesmo de proposito lancei maõ destas que estao mais junto de nós , e
que tanto se achaõ ha quarenta e tantos annos figurando na scena poli
tica , sendo bem sabido que cada huma dellas deve muito mais que
nós ; e por ventura o seu debito serve-lhes , ou jamais lhes tem servido
d'estorvo , ou tolhimento ás mais altas empresas ? E por que será isto ,
se nao por que qualquer das duas Nações se acha muito rica , e em es
tado de prosperidade a sua agricultura , commercio e artes ? E quando
nós ( com principal referencia a Portugal ) nessa remota antiguidade ,
em tempos mais felizes , nos achavamos nas mesmissimas circunstan
cias , nao foi que descobrimos e conquistámos novos Mundos no
Oriente , e no Occidente do Mundo conhecido , entretanto que os Fran
cezes , como diz Voltaire , se achavao fazendo os seus torneios ? E apoz
esses tempos de valor, e de heroismo nao se abrilhantárao mais os nossos
conhecimentos ? Nao tivémos o Camões , o Barros , e Fr. Luiz de Sousa , e
outros que tanta honra fazem á Naçao Portugueza ? Nao agriculta
vamos tao bem , e nao colhiamos em tanta abundancia que nos sobrava
o trigo que exportavamos , quando hoje nos falta para o nosso pro
prio pao ? E nao estavamos tao adiantados na pesca , que nem hum ti
sico bacalhau importavamos, quando hoje segundo leio n'huma memoria
da Academia Real das Sciencias de Lisboa anda por tres milhões de
crusados , a importancia do bacalhau que entra em Portugal , alem do
muito que se importa em seus Dominios (25) ?
§ 87°. Esses tempos nos devem servir de guia ; naõ he preciso mendigar
exemplos alheios nas Nacões Estranhas ; tanto mais achando-nos hoje
muito mais adiantados em Finanças , Agricultura , e Commercio , em
cujos ramos tao sabia e zelozamente se haò empregado os illustres Accur
cio das Neves , Franco , e Mousinho d'Albuquerque , e outros em mui
differentes ramos , que nao deixaõ de convergir essencialmente ao mesmo
centro . Extenda-se essa melhoria a todos os Dominios ultramarinos ,
e aos nossos Reinos , he direito de petiçaõ que tem todo o cidadaõ Portu
guez , que quanto mais bem fundado , mais bem deve esperar da sabe
doria do Governo tudo que he conducente á felicidade dos povos ; e
entao nao será infundado o dever contar- se com hum engrandecimento
extraordinario em todas essas fontes da publica opulencia , logo que se
7
( 50 )
sentar-vos algum artigo novo , que hum dia possa servir á historia das
plantas desde que nascem até que se formao perfeitamente : e como nós
nos entretivemos mais tempo sobre laranjeiras , e prados artificiaes , seraõ
Digo que me vejo embaraçado para bem vos responder , por que mui
tas cousas me faltao , e naõ só a mim , pela preguiça de as haverem es
cripto os meus compatriotas , nao se tendo occupado na historia daquelles
importantes Dominios Portuguezes ( Açores ) se nao no seculo 17 0 Dou
tor Fructuoso em seus manuscriptos, que se achao na Real Bibliotheca de
Lisboa , e o P. Cordeiro na sua Historia Insulana , que imprimio en 1717
n'hum volume em folio.
Os graves inconvenientes desta omissao ninguem os conhece melhor do
que vós , e por certo nao he a unica entre os Portuguezes, mais dispostos
a levantar do que concluir grandes edificios , nascido talvez tudo isto
( 52 )
de que o nosso Governo tem perdido em muitas épocas efficazes elemen
tos , com que muitas cousas , nem só podiao estar acabadas , como muito
bem aperfeiçoadas .
Quando solto este pensamento a semelhante respeito , he quando me
recordo de que ha muitos seculos as nossas antigas Ordenações ( ainda
muito tempo antes d'outras instituições agronomicas de muitas Nações )
incumbirao ás Camaras o aproveitamento e economia publica na parte
agraria ; e porque os Corregedores eo Governo a respeito destes, se foraõ
descuidando d'observar , e fiscalizar as obrigações das mesmas Camaras ,
estas de dia em dia augmentáraõ os seus descuidos , deixando até de es
crever os seus poucos trabalhos, de maneira que muitas cousas nem sabe
mos como principiárao , nem quando.
Todavia em reconhecimento tambem a huma planta que tantas vanta
gens tem levado áquellas Ilhas ( Sao Miguel e Terceira ) eu sinto bem
naõ vos poder dizer quando ella começou a ser conhecida alli ; podendo
apenas informar-vos , mas inexactamente , de quando foi o seu começo ,
que me parece andar a par daquelle tempo , em que principiou tambem
a vegetar em Portugal ; e muitas expressões de reconhecimento sejaõ en
viadas aos cuidados de D. Francisco Mascarenhas , que primeiro em 1635
mandou ir huma laranjeira da China a Goa , e de lá a Portugal , que entao
plantou no seu jardim de Xabregas , conforme nos conta o Doutor
Macedo .
faziao uso da sua madeira para muitos trastes com que mobilhavao prin
cipalmente as suas quintas, havendo tambem a tradiçaõ que lhe dà huma
idade muito mais remota que á laranjeira doce .
A duraçao destas plantas , a sua formosura , e desmarcada grandeza nos
inculcao serem de pevide , e tanto nos confirmamos nesta hypothese ,
quanto he mais moderna a variada invençao da mergulhia. Com effeito os
nossos maiores , ou por que menos ambiciosos , ou talvez porque se nao
e proprio para as cereaes , cuja exportaçaõ annual anda por 6 mil moios)
o discreto cultor planta os seus pomares em terras de lava , as quaes ao
cultivar -se no principio parecem tao magras, e tao fêas , quanto de
( 56 )
d'ouro , que as Nações do Norte tanto invejaõ, e a par destes outros tantos
verdes como as esmeraldas , e ainda muitos mais em alabastrinas flores "
e todos (conforme a sua idade) tao perfeitos, e em tanta copia , que huma
só parte seria sufficiente recompensa a grandes por maiores que fossem
chegar ao pé desta planta a mais copada, conseguida huma tal vista , era
sobeja paga , era hum encanto ; por que nao menos o embelezára o matiz
com que a natureza havia enfeixado tao grande immensidade de fructos
todos irmaos , e todos differentes , do que lhe seria delicioso o aroma que
elles exhalavao , sobresahindo tanto mais esta formosura , e estes mimos
na grandeza da arvore.
Entre 40 a 50 palmos d'altura , de pouco mais de 100 annos de idade
( ao que parece ) ella se conserva bem guardada do furor dos ventos
na canada da Cruz Dourada (nome que lá se dá aos caminhos estreitos )
Freguezia de S. Bartholomeu , a qual se acha aformoseando aquelle
famoso laranjal , para que ella naõ concorreo pouco pela sua lindeza e
( 57 )
fazer mençaõ das das nossas terras que na verdade muito as excedem.
Creio bem que o commercio com aquellas terras , e nao com as nossas
e o descuido dos meus Compatriotas , deixando d'escrever cousas uteis ,
tem dado causa a este , e a outros muitos inconvenientes , nem só em
nosso desabono , como tambem das outras Nações , que por menos preço
poderiao ter muito melhores fructos da mesma especie , do que por
exemplo aqui se encontrao; mas que muito se o nosso mesmo Governo
em Lisboa ignora estas e outras muitas cousas daquellas terras ? E que
jamais deixo d'olhar com a mais seria attençao qualquer artigo, ainda
que pequeno pareça , por que me lembra que tambem delle poderá
a minha Patria tirar algum partido ; mas este quanto a mim naõ he
pequeno, e sem duvida se vos tivesseis informado da antecipada preferen
cia dos nossos fructos naquelle tempo , isto he, que as nossas laranjas desde
o fim de Novembro correspondem em doçura ás daquelle Reino no
mez Março , e d'ahi por diante correspondentemente ; por certo que teriaŎ
fará ver ; por isso , que se naõ faça menção das nossas Ilhas d'onde todos
os annos saem acima de 300 vasos carregados de laranjas para Ingla
terra , podendo haver anno em que saiaõ mais de 400, se nao he cousa
pasmosa , e que ainda até hoje isto seja desconhecido em França , por
certo que he bem digno de se commemorar .
Entre tanto vos bem sabeis que os Ingleses, como todas as mais Nacões
deveriaõ fazer, costumao sempre comprar gallinha gorda por pouco
dinheiro : á vista disto nao vos será difficil acreditar que nao sou exagerado
no que vos affirmo , tanto mais que vos he facillimo saber as laranjas
insulanas que todos os annos entrao em Inglaterra ; e se eu me de
morar, como espero , em Paris , a todo o custo heide mandar vir por
Londres huma caixa de laranjas que possa aqui chegar pelo meado de
Dezembro , e entao eu espero convencer-vos com huma prova dellas, que
muito estudadamente agora fui escasso com a narração que vos fiz das
suas qualidades ( 28) .
as azedas ; porem este ataque nunca apparece , senaõ dos fins de Maio por
diante , donde vem nao serem estes fructos , depois daquelle tempo ,
tao duradouros como acontece em Portugal ; com tudo annos ha em
rando ainda o que lhe deo o ser ; mas entao apparece a novidade de que
os fructos precoces que naquelle tempo começao a gerar- se naõ sejaõ
muito nesta parte a Ilha de S. Miguel , qne de mais a mais tem o araçà ,
e poderiamos ter a cana d'assucar em grande quantidade , pois que ja
foi assaz conhecida nas nossas Ilhas , cuja cultura se perdeo , como se
perdem muitas cousas proveitosas. Podiamos ter o carrapato , e à nico
ciana que alli vegetao entre pedras , e só estas plantas podiaõ fazer a
felicidade daquellas Terras ; ja se principiou a conhecer alli o algodão ;
( 61 )
que mais por ostentaçao se nutrem e conservaõ plantas , sem que dellas
tirem o necessario proveito ; com tudo em abono da verdade sempre estes
proprietarios no meu Paiz fizerao mais algum uso desta mesma planta, e
hum delles ja depois de a cultivar em pontomaior, forneceo sementes della
para Portugal a hum dos maiores lavradores daquelles Reinos , que
a breve, e apressada resposta que vos dou ; todavia eu nao me quiz demo
rar em responder quanto era mister , ou por que desconfiasse que pouco
avançaria nessa delonga , ou por vos querer dar por este modo huma
prova nada equivoca dos desejos que tenho de obsequiar-vos, e do grande
respeito que vos consagra, quem he com o maior apreço , e estima
Monsieur HUZARD ,
I
( 63 )
NOTAS .
NOTA I.
Eu dezejára que os paes de familias fossem obrigados a educar os seus filhos , mas
que podessem ser attrahidos ao cumprimento deste dever sagrado , nao como por huma
cega obediencia, mas sim por huma especie de instincto natural e espontaneo resultante
da boa escolha que o Governo tivesse feito de mestres sabios , e dotados de boa moral ,
havendo-lhes dado huma norma geral , para que impreterivelmente por meio della
fosse educada amocidade . Naō ha duvida que segundo os conhecimentos do dia seria
entao mui proveitoso por meio de compendios , ou ainda mais por meio de traslados
formar-se a mocidade , em primeiro lugar nos principios da nossa santa Religiaò Ca
tholica ; depois nos da historia do nosso paiz , e nos da agricultura , apprendendo em
tempo conveniente aquellas mesmas artes , que nos sao tanto indispensaveis , quanto
só par meio dellas , poderemos ter a facilidade d'entrar no templo das sciencias :
julgando nao menos necessarios os exercicios gymnasticos , d'equitaçao, e nadadura , sem
pôr de parte os das bellas artes , em que se podem aproveitar muitos talentos , só para
ellas dispostos , podendo-se tornar os homens nao menos uteis à si mesmos , que á so
ciedade, quando pelo contrario se tornao membros inuteis que lhe servem de peso. En
caminhada a mocidade desta maneira , como que se me antolha hum permanente, e
prospero futuro ; como que vejo cada hum atar-se e ligar-se aos seus deveres , e sa
bendo cumprillos conservar por este modo a sua liberdade; parece-me ver a Naçao Por
tugueza estreitamente apertada por vinculos sociaes ; parece-me ver por huma vez afas
tada d'entre nós a mais vergonhosa dissidencia d'opiniões politicas , parecendo assim
impossivel desmembrar-se a Naçao , antes convergindo ao seu proprio interesse , he bem
d'esperar- se de a ver ligada suavemente , como huma familia instruida, e rica , que a
mais nada aspira do que á conservaçaõ da sua existencia, empregando para esse fim tantos
meios , e taò efficazes , quanto isso lhe houver sido subministrado na acertada instruçcao,
que lhe tiver sido dada ; e o que nao sei se vale mais, firmada por este modo , ou por
qualquer outro em relação com estes principios , ao mesmo tempo que com elles tiver
mos fundado com a maior permanencia o edificio social , poderemos por certo chamar
nos huma Naçao independente , sendo poupados tambem de nos abismar nos grandes
perigos, em que nos tem feito cahir tantas vezes a seductora ingerencia dos nossos adver
sarios . Quando estava para imprimir estes meus trabalhos , chegou-me ás maōs a riquis
sima memoria para a historia do Grande Marquez de Pombal, escripta pelo nosso dis
tincto e infatigavel Chefe de Esquadra Jozé Maria Dantas Pereira , da qual extrahi a
seguinte nota , que coincidindo na maior parte com a minha doutrina , mais me ani
( 65 )
mei a fazella publica , sendo como se segue, diz o Author. « Quadra pois , convem , e he
indispensavel á nobreza , até pára se manter sem violencia , e portanto para durar com
segurança , e firmeza , que sobresaia sensivelmente na virtude e na sciencia : alias , ainda
quando na virtude se distinga , ver-se-ha no caso do Evangelho . Si cæcus cœcum ducit,
ambo infoveam cadunt. Ora o caso de intentar hum cego dirigir quem vê , requinta
sobre o dos dous segos ; e o verdadeiro contraveneno , ou especifico , está longe de con
sistir na empreza da universal cegueira , pois alem de outras consequencias taò pre
cizas como terrívies , o que se pode conseguir, quando muito , he ficar reduzido ao ca
cus cæcum, e entao a cova se transformará em abysmo cada vez mais profundo , no meio
da recrescente elevaçao do progresso das outras nações ; de sorte que por fim a quéda
tornar-se-ha mortal , sem que o bom senso deva estranhallo. Por isso o grande Mar
quez recorreo ao remedio genuino , e unico , procurando derramar a instrucçaò , e que
nella sobresaissem os nobres : objecto este essencialissimo , que nao somente o deter
minou por hum lado a generalizar gradualmente a instrucçao primeira , mas tambem
a instituir , por outro lado o collegio de nobres , a establecer de novo na Universidade
a faculdade da Mathematica , e a fazer inserir nos Estatutos da Universidade regenerada
em 1772 , com a maior solemnidade e pompa. « Haverei (he sua Magestade quem falla)
a todos os Fidalgos da Minha Casa por serviço vivo na campanha , todo o tempo, que
cursarem a Mathematica na Universidade. » Todavia parece que os outros negocios
nao lhe deixáraō livre a reflexao para avaliar adequadamente a importancia de huma
instrucção primeira uniforme , em quanto ás ideas mais geraes ; importancia espe
cialmente sensivel a quem pondera a influencia de tantas causas tendentes a desi
gualar e desunir os homens , em despeito das vantagens , e da precisao da convergencia
ou concorrencia de todos para a prosperidade universal, maximo fim do Estado social .
A mesma cartilha religiosa ; a mesma cartilha civil , ou social , incluindo resumidas
e bom coordenadas as mais sans e geraes ideas respectivas ; amesma cartilha por assim
dizer , economica domestica rural , semelhantemente escrita : é a mesma cartilha his
torica nacional ; conviria que seguidamente fossem lidas em todas as nossas aulas de
primeiras letras, a bem naō só da geral ventura , mas tambem do vigor da uniaō nacio
nal , cada vez mais enfraquecido pelo egoismo , que sob tantas e tao especiosas for
moa faz marchar para a dissoluçaō ; a qual deve ser seguida... Para mais illustrar a mate
riajulgo a proposito transcrever o que do nosso Bentan Portuguez , o illustre Silvestre
Pinheiro Feirrera , no seu Projecto Geral das leis fundamentaes , e constituintes de
hum monarchia representativa , se encontra sabiamente detalhado sobre instrucçao pu
blica nos seguintes artigos .
Art. 115. Durante a sua minoridade , e nas épocas marcadas por lei , os cidadãos
seraō successivamente matriculados por seus paes , où tutores nos collegios de instrucçao
publica designados na mesma lei , ou para ahi seguirem o curso de estudos determina
dos nos regulamentos respectivos , ou para concorrerem aos exames , em que devein
tomar parte todos os moços matriculados em uma mesma classe.
9
( 66 )
126. Do mesmo modo se procederá a respeito dos alumnos matriculados nas escolas
geraes , quanto á sua promoçao ás escolas normaes.
127. Os alumnos , que durante os tres annos de seos exames nas escolas normaes
tiverem obtido a qualificação de distinctos , serão candidatos a professores nas escolas
geraes , assim como aos lugares de academicos de primeiro grao inferior. Os que nas
escolas normaes nao tiverem obtido senaò a qualificaçao de mediocres , seraô candi
datos a professores nas escolas primarias de municipalidade .
128. Nas capitaes de provincias haverá academias dos diversos ramos dos conheci
mentos humanos compostas de tres ordens de membros , que corresponderao a sexta ,
quinta , e quarta ordem de jerarchia civil. Alem disso os academicos da primeira or
dem inferior corresponderao aos professores das escolas geraes ; e os da segunda ordem
corresponderao aos professores das escolas normaes .
129. Os academicos terao, a titulo de pensao, e afim de se poderem entregar á cul
tura de suas profissões a dotaçao legal de graduaçao , que lhes competir na forma do
artigo antecedente , em quanto continuarem a obter nas eleições annuaes , ao menos ,
um terço dos votos .
130. Seraò candidatos aos logares de professores nas escolas primarias das munici
palidades todos os cidadaòs , que tiverem obtido , ao menos , a qualificacao de medio
cres nos exames dos tres annos ultimos nas escolas normaes.
131. Seraō candidatos aos logares de professores nas escolas primarias de districto
os professores das escolas de municipalidade .
132. Os professores das escolas primarias de districto poderao ser successivamente
promovidos ás escolas primarias de cantaò , commarca , e provincia.
133. Aos logares 1 de professores nas escolas geraes serao candidatos os cidadãos
que tiverem obtido a qualificação de distinctos nos exames dos tres ultimos annos nas
escolas normaes , e bem assim os academicos da primeira ordem inferior.
134. Aos logares de professores nas escolas normaes seraò candidatos os professores
das escolas geraes , e os academicos de segunda ordem.
135. As pessoas que , nao tendo seguido os cursos nos collegios nacionaes , quizerem
concorrer com os alumnos daquelles collegios aos exames determinados nos artigos
precedentes para serem admittidos ou como alumnos ou como professores em uma das
( 68 )
NOTA 2 .
He tanto certo o uso que se fazia na quella Ilha do jogo da espada, que ja mais hum
cavalheiro sahia ánoite , ainda mesmo encaminhado pelas intenções mais innocentes ,
que nao levasse consigo a sua espada , e em muitos encontros que tinhaō huns com
os outros se desafiavao, como huma especie de jogo em que departe a parte se disputava a
pericia da mesma arma ; porem hoje outros saõ os jogos , d'onde nos tem vindo tantos
males , e aquelle que entao era proveitoso está inteiramente abandonado .
NOTA 5.
Ainda em meus dias por alguns annos se continuárao as nossas justas , ordinaria
mente votadas a S. Joao Baptista , e algumas vezes tambem para festejar acções glo
riosas , como por exemplo , as motivadas pela expulsao dos Francezes , que tinhaō
invadido Portugal ; o que as mais das vezes nem ao menos os Generaes faziaō chegar ao
conhecimento de S. Magesdade exceptuando apenas o General Stochler , que teve por
isso de nos attrahir muitos agradecimentos de S. Magesdade. Mas nao foi só essa falta do
Governo o que mais concorreo para se hir perdendo o gosto á quella nobre arte , foi
sim por que só tivemos dous Generaes muito cavalleiros , е que até lá mesmo ensináraō
aquella arte, e os outros quasi todos de pois a tinhaō em pouco preço, e tal houve , que
até em jornadas se animou a sair montado n'hum burro acompanhado de muitos ca
valleiros , que mal acreditavao vendo o que mal podiaò imaginar ; e o peor he , que
o abandono desta taō util arte tem-se feito extensivo a todo o nosso Portugal, e eu
cada vez o sinto mais , quando aqui mesmo até vejo exercitar-se nella o bello sexo , e
com tanto proveito , que muitas vezes as tenho visto correr, etao galhardas , que qual
quer dissera, que se tornavao bellas aquellas mesmas que naò o saô.
NOTA 4.
NOTA 5.
Para que não pareça fantasia o que ja tenho escripto , e continuarei a escrever a
este respeito , transcrevo aqui o mesmo Alvará citado , que fiz extrahir da Torre do
Tombo de Lisboa , e nelle se encontrará muito mais do que quanto expendo.
«Eu El Rei Faço saber aos que este Alvará virem , que havendo respeito ao que me
foi proposto pelos Procuradores das Cortes da Cidade de Angra , Ilha Terceira nas que
celebrei nesta Cidade de Lisboa em 22 de Octubro de seis centos sincoenta e tres , pe
dindo no Capitulo primeiro , que fosse servido , que naquellas Ilhas nao houvesse
Vice-Rei, nem Governador General pelos inconvenientes que se me tinhão represen
tado em todas as Cortes passadas , e que Eu havia de achar que o governo que de
presente havia nas Ilhas era o que mais convinha, por ser o mesmo com que as cria
rão os Senhores meus progenitores ; e pelas razões que me representáraō , e as mais
que sobre esta materia em Cortes passadas me foraò apontadas. Hei por bem de con
ceder o que no dito Capitulo se pede , tendo juntamente consideração ao merecimento
da fidelidade , e satisfaçaò que tenho de como sempre se houverao os moradores da
dita Ilha ; e quando se offereça occasiaò em que convenha alterar-se esta Rezoluçao , se
nao tomará della assento, sem ser ouvida a Camara da dita Cidade de Angra , tendo-se
sempre respeito ao favor que folgarei de lhe fazer . E este Alvará se cumprirá como nelle
se contem, e valerá posto que seu effeito haja de durar mais de hum anno , sem em
bargo da Ordenaçao do Livro segundo , Titulo 40 em contrario. Manoel do Canto o
fez em Lisboa a quinze de Junho de mil seis centos sincoenta e quatro. E este vai por
duas vias. Jacinto Fagundes Bezerra o fez escrever. - Rei. Esta copia foi extrahida
em execuçao do Decreto de 13 de Julho de 1824 ; está conforme o Livro vinte e seis
da Chancellaria do Senhor Rei D. Joaó IV , Folhas cento quarenta e quatro . Real Ar
chivo, tres de Setembro de 1832. -0 Official Maior , Francisco Nunes Franklin . »
O Senhor Rei D. Joaó IV° por quaò Paternaes fossem suas intenções nesta Real
Rezolução que tomou a pedido das Cortes , foi mais abalado por hum principio de
justiça prorogando áquelles habitantes a mesma Graça que outr'hora lhes havia sido
outorgada ; sendo deliberaçao propria do sen Animo Real a com que politicamente
por meio d'huma amnistia chamou a Portogal a nobreza que se tinha retirado á Hes
panha ; e na Ilha Terceira nao sei se ainda fez mais , por que sendo D. Pedro Ortiz
(entre poucos) hum dos Fidalgos daquella Ilha , que no Castello de S. Joao Baptista
junto ao Governador da mesma fortaleza , se conservou firmemente por quasi hum
( 70 )
anno contra toda a nobreza da mesma ' Ilha , que entao sustentou fielmente os Inau
ferivies Direitos do nosso Legitimo Monarcha , foi todavia perdoado , e em pouco
tempo depois teve a honra de merecer a confiança dos povos , fazendo -lhes serviços ,
que merecêrao o Real agrado de S. Mag . e de que teria sido privados , se se não ti
vesse aquelle respeito empregado a mais sabia politica , e isto ainda em tempos , ' em
que ella não era olhada , como huma das armas mais poderosas , com que hoje se sus
tentao os imperios ; e a cujo exemplo tambem sabiamente caminha o Senhor D. Pedro
em Nome da Senhora D. Maria II Rainha de Portugal segundo temos a esperar do
Tratado que ha poucos dias li das quatro Nações , Franceza , Ingleza , Hespanhola , e
Portugueza no f qual o mesmo Augusto Senhor, promette dar huma amnistia geral
e completa à todos os Portuguezes.
NOTA 6. ·
Nao posso deixar de mencionar que no tempo d'hum dos Governos que alli tivemos ,
quando Stockler foi o nosso General , e sem duvida aquelle , de quem mais tinhamos
a esperar pela vastidao dos seus conhecimentos ; tive de ouvir ao nosso Bispo D. Frei
Manoel Nicolau , que se nao podia combinar com o General sobre melhoramento d'es
tudos , por que huma das cousas que o General queria , era o estabelecimento de al
gumas cadeiras de sciencias naturaes , e o Bispo queria com preferencia a tudo fatigar
os estudantes com huns poucos d'annos que tantos julgava precizos para se ensinar
Theologia . A vista desta heterogeneidade de modos de pensar, sendo
f ambos homens
instruidos ; como entao se poderiao combinar outras e as mais das vezes , o saber dos
Bispos com a ignorancia dos Generaes ?
of1 NOTA 7 .
viço, ou bastava que mostrasse patente que a isso o habilitasse, lhe奥康 fazia valer os por
que entao se havia feito benemerito; mas que muito , (tao pouco era o zelo com que erao
olhados os negocios daquellas Ilhas) se havendo sido o Senhor Rei D. Joao VIº por seu
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Real Decreto de 25 de Novembro de 1825 abalado emvirtude de requerimentos meus
e d'outros dignos compatriotas a tomar consideraçao sobre a tropa que mais poderia
convir ao serviço dos Açores, e o mais quea esse respeito Determinou, e se subentendia ;
e se bem fazendo recahir a escolha dos Membros eleitos para aquella commissao nas
Pessoas Ide 3 Generaes que tinhaō sido das mesmas Ilhas , e em outros dous que forao
Commandantes do Batalhaō em Angra, nem assim mesmo no decurso de mais de 3 an
nos, podéraò cumprir as Reaes Ordens , quando para concluir esses trabalhos seis dias
seriaò sufficientes , como tantas vezes me disse hum dos mesmos Generaes , e sem duvida
o mais sabio de todos elles ?
NOTA 8.
Na verdade D. Agostinho primeiro Bispo d'Angra que para alli foi em 1537 encheo
quanto pode desejar-se as difficeis funções de tao alta Dignidade, por qué tal era seu
merecimento e suas letras , que voltando a Lisboa foi empregado em reformador da
Universidade de Coimbra ; e tal era sua virtude , que tendo sempre huma conducta
NOTA 9 .
NOTA 10 .
Quem melhor quizer instruir-se , e quizer achar a base de todas essas sociedades
agronomicas , leia na nossa antiga Constituiçao , o Tit . 66, Liv. 1 ° . e ainda mais a
Tit. 60 , page 15 , aonde encontrará quanto anticipadamente ás Nacões mais cultas
do dia legislámos sobre meios de melhoramento de agricultura . Entretanto se tivémos a
honra de nos havermos anticipado muito tempo em nossa legislaçao agricola a todas as
( 72 )
outras nações , de que na verdade soubémos tirar vantagens nesse tempo , he muito
que hoje nos devemos cobrir de vergonha , por que em vez de augmentar, perdêmos
apraticadesses conhecimentos , contentando-nos tao somente com as descobertas, e com
os dominios sem tratar de os aproveitar. He precizo com effeito viajar pelas nações mais
cultas para ver o adiantamento em que se achao todos os ramos que podem fazer o es
plendor , e a publica prosperidade , ou quando menos vir a França e examinar de bem
perto as suas producções d'industria , e d'agricultura , e o augmento de suas artes ,
maquinas , e fabricas , e tudo isto, por que hum espirito patriotico ( algumas vezes
favorecido pelo Governo) se tem introduzido na Naçao Françeza , tomando cada hum,
como por huma obrigação , que o seu brio lhe excita , de melhorar , e inventar cousas
que possaō aproveitar a todos. Para dar huma pequenissima idea do interesse e zelo
que todos tomao em proveito publico , bastará dizer-se que os mesmos octogenarios
se esforçao tanto no serviço da Patria , como se estivessem na flor da idade. He facto ,
porque eu mesmo o tive de observar em Junho na primeira occasiaò em que assisti a
huma sessaō da Sociedade Real e Central de Agricultura de Paris , na qual M. Husard ,
que he dos deste numero ( aonde se encontrao outros da mesma idade) ahi teve de
fallar dando conta de seus trabalhos em revisao de alguns folhetos , porem isto naò he
tanto, porque todo o homem estando no uso perfeito de suas faculdades intellectuaes ,
póde até morrer dar sempre fructos , e fructos maduros , que muito aproveitem a socie
dade ; porem na verdade o que mais me admirou , foi dizer-me elle mesmo , que no dia
seguinte partia a viajar a mais de cem legoas longe de Paris , tendo de fazer certas obser
vações sobre agricultura , que lhe haviaò absorver tres a quatro mezes , até que emn
Outubro se retirasse para dar conta da sua commissaò. Que louvavel esforço taō digno
de imitaçao, que triumpho sobre tantos invernos , e de tantos serviços carregados ! Quanto
na verdade póde o brio e o pundonor nacional ! Entretanto eu nao sei se ainda he mais
que isto , como depois tive de observar na Sociedade de Horticultura de Paris , que
de annos taò verdes alli se encontrem trabalhos taò maduros , que nessa mesma occa
siaō me foraō apresentados , e que na verdade muito interessavao a Naçao ; e eu tive
de ouvir tambem dous bem concertados discursos a dous mancebos , que (ao que pa
recia) poderiaō ter 20 a 22 annos d'idade. Que taò precoces sao os fructos nesta idade,
mas tao proveitosos os desta natureza , porque saò filhos das sciencias e das artes !
NOTA 11 .
Não se entenda, que por quao verdadeiros sejao os exemplos referidos , com os quaes
a todas as luzes se prova, que a desmoraliraçao e infelicidade das Ilhas datao desde que
deixáraó de ser governadas pelos seus Capitães Donatarios , pelas suas Camaras , e
seus Capitães Mores , jamais me possaò persuadir , e menos que esse seja o fim para
quem ler este escripto , que nós seriamos hoje mais felizes, se fossemos governados "
como entao o foraò aquellas Ilhas por nossos maiores pelo espaço de mais de dous se
culos ; ao contrario, nem esse bem se pode ainda esperar pela difficuldade de reverter,
( 73 )
mos a esses melhores tempos , em que a Naçaò estava toda unida com o vinculo fortis
simo da nossa Santa Religiao, e em que quanto a nós o espirito da ambição dormia :
assim mesmo por que do berço levantou a cabeça , principiáriaô logo a apparecer alguns
excessos , e entao foi que o Senhor Rei D. Jozé 1º querendo occorrer a esses males ,
houve por bem criar o Governo daquellas Ilhas ; mas como por desgraça nossa co
meçárao desde logo a ser infringidas quasi todas as Ordens Regias, isso foi o que deo
lugar a que a cubiça ousando mais e mais causasse os estragos que experimentamos , e
que não tem pouca relação com os nossos Reinos sendo D. Antao d'Almada
o 1º Governador e Capitaō General , 2º Diniz Gregorio de Mello e Castro ,
3º Conde d'Almada , 4º Conde de S. Lourenço, 5º D. Miguel Antonio de Mello , que
depois foi Conde de Murça , 6° Aires Pinto de Souza Continho , 7° Francisco Antonio
d'Araujo, 8º O Tenente General Francisco de Borja Garçao Stockler , que depois foi
Barao da Villa da Praia , e 9º Manoel Vieira d'Albuquerque e Tovar.
NOTA 12 .
NOTA 13.
Para se provar quanto aquelles Generaes eraò mais que Reys , e as mais das vezes
se faziaō superiores á Lei , eu passo em breve a contar mais hum facto acontecido
comigo mesmo , é tao publico, que foi no meio da praça d'Angra. Na mesma praça
entre a Ermida de Nossa Senhora da Saude, e o Corpo da Guarda, voltado para a sul
estava hum recanto , que seraò dez braças de distancia pouco mais ou menos , faciado
por hum muro , que tapa hum quintal pertencente a huma casa nobre que tenho ao
lado do mesmo Corpo da Guarda voltado para o ponente ; e porque o General ém
todo o tempo do seu governo nao tinha podido reprehender-me (e se o fez, ficou repre
hendido) e muito menos castigar-me , como tanto desejava , entendeo que visto
tambem nao ser eu daquelles que houvesse de soffrer-lhe animosidades , com outros
praticadas , poderia elle impunemente com o escudo do interesse publico , combinar
se com a Camara, e de concerto tratou com ella em 1824 de fazer humas barracas en
cravadas no mesmo meu muro, para ahi se poderem vender frutas . Nao puderao fazer
isto tanto ás escondidas , que eú muito em tempo , sem que a obra tivesse começado,
nao acudisse pela sustentação dos meus direitos ; e pelo muito que o publico perdia
no estabelecimento daquella obra , em quanto olhada pela sua deformidade , pois
que sendo a principal praça que nós tinhamos , hia à ficar huma parte della feita
alpendre no meio de dous edificios altos , quando havia tantas leis que favoreciao o
aformoseamento das praças ; mostrei-o prospecto d'hum edificio que eu intentava no
mesmo lugar , e accrescentei , que daquella praça ninguem podia dispôr , nem de
huma polegada , por que para ella se achar como estava , tinha sido preciso que
nossos maiores comprassem algumas casas para a fazer mais regular, e alli poderem
correr as suas cavalhadas . Ora he de notar que a Real Junta nao estava autorisada
a fazer emprestimos, por que mesmo para obras de reedeficações publicas , sao-lhe
limitados seus poderes , o que nessa occasiaò se naō observou ; mas se o despreso de
tantos direitos he sobre maneira admiravel , e irregular, quanto mais se naò torna es
candaloso que se procurasse conseguir huma Carta Regia, que parecia abonar o plano
( 75 )
M
da obra, e o emprestimo que para ella se devia fazer pela mesma Junta, occultando
se ao Ministerio de S. Magestade o prejuizo de 3º que nunca morre, aonde ha leis que
o sustentem ? Ainda ha mais que isto ; por que se consultou a vontade de S. Ma
gestade , foi tao somente por mera ceremonia, e tanto assim, que quando chegou a
Carta Regia, ja a obra estava concluida. Entao extrahi duas certidões : huma , de
quando se tinha acabado a obra, e outra da mencionoda Carta Regia ; e sendo compara
das as datas, e tomando-se em consideraçao o ataque da minha propriedade, naò obs
tante o ter pela proa o General , que tantas protecções tinha em Lisboa , a Camara , e
Corregedor, eu pude com tudo em Maio de 1826 conseguir huma Regia Provisaò, que
invalida a mesma Carta Regia, e me habilita a poder demandar a Camara para que seja
demolido aquelle edificio informe, o qual deve hum dia ser substituido com hum
outro que abrilhante a mesma praça. Em proporçao destes factos , eu pudera contar
mais outros, se intentasse fazer a historia dos Generaes Açorianos ; porem os que tenho
expendido sao sobejos para se conjecturar, que nao menos que nossos maiores , temos
razao, nem só para publicar os nossos soffrimentos , mas antes tambem os evitar, se
podermos . Nao podendo deixar de lembrar a necessidade que há d'hum mercado pu
blico em lugar mais proprio do que a praça , havendo para isso muitos lugares de que
se pode dispôr, sem atacar ò sagrado direito da propriedade.
NOTA 14 .
Eu seria incoherente , e mesmo pareceria acanhado nos desejos que tenho de ver
melhorada a minha Patria , se quando trato de querer poupar a humanidade com o
saudavel preservativo da vaccina ( que tanta honra faz ao seu descubridor o immortal
Genner , o qual tem por isso tantos direitos ao reconhecimento dos homens ) eu pro
curasse por algum meio moroso retardar-lhe esse beneficio, que he o que parece depre
hender-se na indicaçao que faço designando hum certo numero de expostos , que
de cada vez devia ser vaccinado ; e entao antes que seja perguntado por que assim o
indiquei , desde ja me anticipo a trazer á memoria a distancia em que muitos
se achavao, e a que por causas mui desconhecidas se poderia mallograr essa operaçao ;
sendo de todas a principal razao em que me fundei a incapacidade que o Hospital da
Misericordia tém para receber hum grande numero delles ; e a que nao deixará de
ter algum lugar , por que assim se facilitava o possivel prolongamento do pus vac
cinico , que em quanto aproveitava a huns nasciaō outros , que tambem delle
depois se aproveitavao ; pois que nao he indifferente a distancia em que nos acha
mos de Lisboa , por nos nao poder ser repetido , como dezejamos , especialmente de
inverno ; alem de que muitas vezes, nos chega sem a necessaria energia, e por isso
inefficaz :: e por este modo julgo que poderia satisfazer ao zelo de quem a semelhante
aquellas rendas que seus maiores deixáraô . Tendo ja na imprensa este meu escripto
tive de saber que muitas destas cousas respeitantes á Misericordia , e Hospital esta
vaò remediadas por este Governo , o que muito estimei pelo grande beneficio geral
que d'ahi resulta .
NOTA 16 .
Nao he em todos os pontos de Portugal que se deve entender esta doutrina , por
que eu sei que nos contornos da Villa de Cea na Beira Baixa , e em outros lugares
do Minho e no Algarve produz bem a batata, vulgarmente chamada Ingleza , mas he
notavel , que ainda assim naō possaō fazer face ás Estrangeiras , ou sejà por sua quali
dade , ou por que com effeito tal cultura nao corresponde ao desejo, e entao por isso
terá de continuar sempre em ponto muito pequeño , principalmente se por desgraça
nossa deixarem conservar as estradas no máo estado em que se achao.
NOTA 17.
Quem encarar o diminuto preço das batatas na Ilha Terceira , e o comparar com o
de Portugal, julgará achar-se fundado a observar-me se o excedente preço em Portu
gal de 160 a 240 por alqueire muitas vezes nao será sufficiente a convidar a expor
taçao de tal genero , pois que muito dá para os direitos, e favorecer o commercio; po
rem a isso anticipadamente se responde ; que sendo a batata hum genero de facil cor
rupção , especialmente sendo ferida , ou molhada , e sendo as viagens daquellas
Ilhas humas vezes muito mais longas que outras , se corre o grande risco de se
perder huma carregaçao , principalmente pelo tempo em que se deve principiar a
exportar, especulação esta que só se poderá repetir huma e muitas vezes , quando seja
aliviada de direitos ; nao podendo esquecer-me , que quando este genero fosse favore
cido pelo Governo , convinha ser inspeccionado por huma Junta de Agricultura , que
jamais deveria deixar sahir batatas , se naò de Setembro por diante , que he quando
ellas tem chegado ao seu perfeito estado de madureza , que dellas se extrahe excel
lente goma para preparar a roupa de linho , e de que se faz alguma mistura com outras
farinhas para pao. Seria mui proveitoso que estes mesmos cuidados se empregassem
a respeito do trigo , que perde alguma cousa no mercado em Portugal por chegar alli
as mais das vezes alterado com avea , e outras sementes , o que obrigaria os proprie
tarios no acto de o encelleirarem a serem mais escrupulosos , e entao fariaō cumprir á
risca as condições , que sempre pôem aos seus Rendeiros ; porem sempre mal obser
vadas pela relaxaçaò de alguns senhorios , os quaes para que nisso fossem mais
exactos nenhuma vantagem tinhaō quanto á venda na terra para o exportar ,
porque , quer fosse limpo, quer sujo , lhe era pago pelo mesmo preço ; donde nas
cia , que quando chegava a Portugal era muitas vezes mal reputado , perdendo-se
muito por bem pouco em algumas centenas de milhares de alqueires , pelo ridiculo
e tenuissimo aproveitamento de algumas pequenas porções , que o manchao , e isto
alem das sensiveis differenças dos Mestres de navios , que sempre dao quebras humas
( 78 )
muito maiores que outras , como que o alqueire de Portugal seja maior que o nosso "
e que o mesmo trigo se conduzisse sobre volcoens , que seccassem , e nao sobre hum
humido elemento , que mais propriedade tem para o fazer engordar , que entisi
car; a cujo respeito seria de grande importancia que a mesma Junta agronomica
inspeccionasse , e na sua falta os encarregados da administraçao das Alfandegas , por
que só assim melhor se aproveitaria o genero mais importante , e o menos precario
de todas aquellas Ilhas .
NOTA 18 .
NOTA 19 .
Posto que a nova ordem de cousas tenha diminuido segundo me consta , alguns
destes inconvenientes , facilitando commodidades a estes povos e dentre elles
escolhendo juizes , que decidao de seus negocios , nem por isso julgo inuteis estas no
ticias porque , quando menos , algumas dellas podem servir para a historia daquelle
Paiz , entre tanto que vao apparecendo outras cousas carecidas de remedio .
NOTA 20.
Em huma nota pouco he o que se pode dizer desta planta , com tudo eu direi duas
palavras, por onde mostre a veneraçao que os antigos lhe tributárao . Columella dá-lhe
huma preferencia distincta entre todos os alimentos que mais agradao aos animaes :
sed ex iis quæ placent , eximia est herba medica , lib. II , cap . XI ., Ed. cit . Plinio que
nos dá a historia desta planta fixa a epoca da sua introducção em a Grecia , época que
elle olha como muito interessante ; elle parece incansavel em celebrar suas vantagens,
como melhor se pode ver no, lib. XVIII , cap . VI , pag. 398. Ed . cit. Na verdade elle
assegura que huma vez semeada , ella se sustenta mais de trinta annos . Tanta dos ejus
est cum ex uno satis amplius quam tricenis annis duret , liv. XVIII , cap . XVI . Ed. et
pag. cit. E muitos outros como Varrao , Paladio , Hales, e o que coroa a obra , Olivier de
Serres , que em seu estillo energico appellidou a luzerna - La merveille du ménage . --
Com tudo mais adiante se verá a descripção do Onobrychis , que em alguns lugares
nao será de menos importancia comparadas suas vantagens com as da luzerna
( 79 )
NOTA 21 .
Entre as arvores de construçção naò nos consta que se estabelecesse nenhuma mata
importante antes de Fructuoso Jozé Ribeiro , grande negociante natural de Braga que
para alli foi no meado do seculo 18 , e haverá cousa de 50 e tantos annos que elle plan
tou o grande pinhal da Pateira , o qual prosperou tanto , que em nossos dias temos
visto cortar alguns pinheiros , que podiaō servir para mastros de navios , o que talvez
com 100 annos de idade se nao poderia conseguir em Portugal, e assim abrio caminho a
aplantarem-se outros pinhaes , porem ainda em ponto muito pequeno . Quanto atraza
( 80 )
dos nos achavamos , e quanto tarde principiámos nesta cultura em relaçao com Por
tugal , aonde já a respeito dos pinhaes existentes junto de Leiria se havia dado Regi
mento datado de Fevreiro de 1524 a que depois se seguio a Constituiçao do Reino ;
que tanto incumbe ás Camaras esses cuidados ! Duvido ( e com pezar ) se foi o mesmo
Ribeiro quem plantou a Matella de cedros , mas se nao foi elle que a plantou , teve
pelo menos o merecimento , que nao pode pertencer a alguns vizinhos , por que nao
souberaō guardar as suas pequenas matas , sendo elle só o que levou a effeito o seu
projecto. Com tudo ainda se naò principiáraò alli a tirar dos pinheiros as vantagens
das suas resinas , por que ainda alli * se naò sabe fabricar o alcatraò , nem tao pouco
se conhecem as utilidades da casca da madeira do carvalho , e das suas folhas que
muito proprias sao para o curtume de couros , e de que tanto se a proveitao em
França para os seus atanados .
NOTA 25 .
A este respeito nao posso deixar de fazer huma pequena observaçao , e ainda que
por desgraça a poderia tornar mais sensivel com muitos exemplos , eu aproveitarei al
guns bem proximos a nos , e aos quaes só quem não tiver senso commum deixará de dar
consideraçao , devendo conhecer por meio delles os motivos por que ha muito tempo
se tem hido por agoa abaixo as nossas finanças , e isto por que os pilotos da naô do Es
tado nada sabiao daquelles mares em que nao podiao tomar pé, e por isso se procuravao
salvar sempre com a taboa de salvaçao dos emprestimos , sempre ruinosos ao mesmo
Estado , por que sensivelmente se augmenta o debito , em quanto huma desleixada ar
recadaçao de Fazenda diminue o credito publico . E na verdade , quem se nao lembrarà
de que quando no Erario se clamava por retardados pagamentos , e a que se dava sem
pre a resposta, que aonde naò ha o mesmo Rei perde, fôra nesse mesmo tempo que fu
gio algum ministro levando consigo avultadissimas sommas da chorada decima? Quem
naosaberâ que houve quem offereceo muito mais pelo papel sellado do que elle rendia? E
quem nao terá presente que nesse tempo , e ja de ha muito , se fizeraò por tantas vezes os
ouvidos surdos a alguns depositarios , que de muitos tempos tinhaō em seu poder gran
des sommas , de cuja responsabilidade se queriaò aliviar empregando a esse respeito em
penhos , muitas vezes mallogrados ? E quantos Ministros nao tem morrido sem terem
dado contas de muitos annos da decima? E o que nao sei se he peor , quantos foraò des
pachados para por esse meio se dezempenharem desses alcances da Fasenda Publica ,
authorisando esses defeitos , que muitas vezes degenerárao em vicios ? 'E daqui nas
çeo , poderem-me assegurar dous Ministros de probidade , e intelligencia ( haverá
pouco mais de hum anno ) que desde 1826 ate 1833 excedia muito 600,000,000 reis
o que se devia de decimas somente em Lisboa, e seus contornos. E assim tambem he
do meu tempo, e nao ha muitos annos , hum grande negociante, feito em pouco tempo ,
que tinha arrematado os dizimos de algumas Ilhas , fugir com hum alcance de huns
poucos de annos excedente a mais de 100,000,000 reis . Oh escandalosa arrecadaçao
( 81 )
da Real Fasenda , oh tempo daquelle immortal Ministro ( Marquez de Pombal ) , oh
NOTA 24. 7
Esta rica e musgosa planta nasce na superficie das pedras , em cujos effei
tos vulcanicos abunda infinitamente o meu paiz , aonde aos olhos mais prespi
cazes poder-se-hao descobrir perfeitamente identificadas com elles muitas particulas
ferreas , e bem assim outras materias , todas filhas da explosao que as formára , mas
jamais poderá , nem presumir-se , que em seu seio se possa conter humo sufficiente
a nutrir algum ente com taò duradoura vida , inculcando-se á primeira vista taò de
pendente até do mais pequeno sopro do ar que facilmente lhe pode arrebatar os seus
delicados estames , e com elles o terreo e musgoso leito em que se criára ; mas naò
acontece assim ; ella intimamente se abraça com a mãi de que nascêra, e he tal a força
da natureza que a sustenta , que parece por fim hum quasi petrificado ; mas taò flexivel ,
e taò agradavel se torna assim que chega ás maòs de quem sabe aproveitalla , que pou
cos trabalhos com ella se hao mister para produzir a côr tyria , a mais brilhante das
cores .
Talvez esta planta especifica pela sua independencia , e ainda mais pela riqueza
resultante da sua decomposicao , tivesse podido ser levada a hum estado de cultura ,
que muito mais interessasse a sociedade pela sua grandeza , e propagaçaò , se o Natu
ralista tivesse de bem perto espreitado os passos da sua vegetaçao ; mas ja que se nao
tem dado a estes trabalhos , era mister pelo menos , que se tivesse seguido a marcha
economica dos nossos antepassados , ja marcando os lugares em que ella nasce , e ze
lando esses mesmos lugares ; ja fiscalisando ao mesmo tempo , se era colhida na sua
propria sasaò (porque a naõ o ser , naõ só deixa de ficar substituida por sementes deposi
tadas na mesma cama , aonde nascera , mas até lhe faz diminuir muito a sua quali
dade em razao da sua verdura) e já sobre a mistura de algum musgo , que ao mesmo
tempo que lhe arrebata as sementes em si depositadas , lhe diminue tambem o preço no
mercado , para cujo desmerecimento nao he tambem indifferente a alteraçao que lhe
fazem muitas particulas terreas , que consigo leva muitas vezes , ou por ignorancia
ou má fé de quem colhe para a tornar mais pesada , mas de qualquer dos modos
sempre lhe attrahe grande descredito .
Eisaqui os desvelos agronomos de que eu desejava ver occupada huma Junta de
Melhoramento d'Agricultura . Deste modo era olhado com a maior seriedade e interesse
este importante negocio de administraçao publica no tempo das nossas antigas Ca
maras , que até em certas paragens , aonde ella mais produzia , se naò dava lugar a
outras culturas, nem se dava licença para a edificação de casas. Porem ha muito tempo
para cá tudo saò casas, sem se reparar no lugar em que se fazem , nem se tem alicerces
que as sustentem ; tudo saò luzes , sem nem ao menos se dispôr de huma candeinha
II
( 82 )
NOTA 25 .
Na mesma memoria do General Dantas Pereira encontro a seguinte nota , que muito
deve illustrar a materia sobre pescarias : « Quando hum Portuguez amante da sua
patria , falla em pescarias , nao pode deixar de sentir que na do bacalháo nem ao
menos aquinhoemos , tendo sido nossos maiores os descobridodes da Terra-Nova ,
como se colhe até da muito bem conservada colleçao de mappas hydrograficos ,
feitos em pergaminho pelo nosso piloto Lazaro Luiz , e datados de 1563 ; onde os prin
cipaes pontos das costas daquella Terra tem nomes portuguezes . Accresce que entre os
estrangeiros , actuaes usofructuarios daquella grande pescaria , preponderaó os que
se appellidao nossos protectores com a razaò que tem tornado cada vez mais notavel ;
e sobre tudo isto , nao comendo aquelle peixe , vendem-nos conforme Walton na
pag. 155 da edição portugueza da primeira carta à Grey 300,000 quintaes delle , andando
a sua importancia por 3,000,000 de crusados em cada hum anno ; pois este he o me
dio dos onze decorridos desde 1818 até 129 , constantes do primeiro documento im
presso nas Considerações politicas , e commerciaes do nosso distincto Portuguez Jozé
Accurcio das Neves. Devemos crer que o primeiro Ministro Pombal nao pôde aliviar
nos , ao menos de huma attendivel parte deste enormissimo gravame , a respeito do
qual conviria talvez imitarmos os Hespanhoes ; porem mostrou que reputava muito
attendivel a pescaria nacional , pois assim o provaò a Portaria de 15 de Maio de 1773
a favor dos pescadores da Ericeira que fossem ao Algarve ; os Decretos de 15 de Junho
de 1773 , 17 de Março de 1774 , e 13 de Julho de 1776 , concernentes aos pescadores
algarvios , e o de 7 de Agosto de 1775 relativo aos de Setuval.
Se a mencionada nota he sufficiente em relação com Portugal , todavia me parece
a proposito amplialla mais relativamente ao meu paiz , a respeito do qual infelizmente
ninguem tem fallado em nossos dias , porque o mesmo illustre auctor , que ha poucos
( 83 )
annos escreveo dos Dominios Ultramarinos occupou-se muito pouco dos Aço
res , donde com muita mais facilidade podia receber illustrações em razaò de suas
amizades , e nao só por isso , como pela propria experiencia de quando em meus dias
alli foi Juiz de Fora , Corregedor, e por algum tempo, Membro do Governo Interino :
e em quanto pennas mais aparadas dormem sobre estes negocios taō interessantes , eu
as vou despertando com estes assumptos , lembrando naõ somente o que se depre
hende da sobredita nota , pois que temos a excellente abrotega (congénere da pescada ,
e bacalháo) a cavalla , dourada, bicuda , cherne, a fina garoupa , o delicioso inchareo ,
e o precioso escolar, alem de outras muitas qualidades de peixes que quasi todos os
annos se pescao , em quanto o tempo , e a capacidade dos barcos o permittem ; mas
tambem o atrazamento em que se acha a nossa pesca, é geralmente a navegação en
tre todas as Ilhas.
Esta falta na verdade he muito sensivel em quanto olhada commercialmente, por
que de inverno se tolhem por muitas vezes as correspondencias , nao sendo com tudo
tao grande esse inconveniente , comparado com a sempre chorada perda de muitas
gentes, que quasi todos os annos saò victimas da cubiça dos especuladores , e da neces
sidade que conduz huns e outros a lutar com os mares arriscando vidas , e fazenda , e
tudo isto , pela temeridade de se fazerem aquellas navegações em barcos de boca aberta,
quando na proximidade em que se achao as Ilhas humas das outras , era bem facil a
communicação, e muito menos perigosa, sendo feita em barcos cobertos .
Sao bem conhecidas as vantagens que resultariao desta indicaçao ; primo , por que
deste modo , nem se roubariao tantos braços á agricultura , como acontece para sup
prir os que naufragaò ; secundo, por que seria mais facil dispôr a marinhagem para
o commercio, podendo vir a ser grandes pilotos , como ja n'outro tempo tivemos (entre
os quaes tem hum distincto lugar Manoel Fernandes por que foi o primeiro que
descobrio a derrota de Portugal a Malaca, sem antes desta tocar na India ; o qual teve
depois a honra de conduzir o Real Galeaô S. Martinho em que o Senhor Rei D. Se
bastiao passou á Africa) de que infelizmente hoje apresentamos poucos exemplos , ou
seja pela continuada navegação feita pelo dito modo, em que se tem amiudado os
perigos , e em consequencia afrouxado a inclinaçaò que os Açorianos sempre tiveraō
para navegar ; ou seja tambem pelo pouco vigor , e consideraçao que presentemente se
dá á Carta Regia de 29 de Janeiro de 1515 com a qual o Senhor Rei D. Manoel tanto
animou , e honrou a classe dos Mestres Pilotos ; e tertio finalmente , porque sendo as
sim habilitados na marinha mercante, facilmente se estabelecia nesta hum deposito
para a marinha Real , aonde bem podiaò aproveitar, e assim ficavaò tambem as ou
tras classes poupadas de perder muitos braços, o que muito atraza a industria , e a
agricultura ; eo peor he, que as mais das vezes he pouco o que aproveitao sendo arras
tados para huma vida para que nenhuma inclinaçao tem . E se estas reflexões em ponto
pequeno interessao mais as nossas Ilhas , que a Portugal , quanto mais se interessarao
os nossos Reinos , se em ponto maior se favorecer a pesca , e a navegacao em geral ?
( 84 )
A este respeito deve ver-se a sabia observaçaò na mesma memoria do General Dantas.
a f. 79.
Qualquer ordem do Governo de Sua Magestade prohibindo a sahida de inverno dos
barcos sem coberta , pouparia o sacrificio de tanta gente , que nem sempre prompta
mente se póde supprir, e essa prohibiçaò seria sufficiente para augmentar o numero
dos cahiques em que menos arriscadamente se poderia navegar.
Nao acontece porem que se experimente grande falta de peixe no inverno , por que
ainda que os barcos sejao muito pequenos, se ex . gr. o mar está bravo pelo norte, se
pesca no sul , e reciprocamente ; porem nós naō só podiamos evitar esta pequena
falta, mas antes tornar-nos abundantes, fazendo grandes salgas dos referidos preciosos
peixes, evitando por este modo nao somente a importaçao do bacalhão , que nos ar
rasta muitos contos de reis todos os annos " mas tambem com esses mesmos peixes
podiamos fazer hum pequeno ramo de commercio com Portugal , aonde alguns del
les , apenas sao conhecidos no Museo de Historia Natural , como a garoupa , o in
chareo, e nao sei se entra neste numero , o escolar, que se pode dizer dos peixes o rei ;
e para isto bastava tao somente que seguissemos o exemplo do que por tantas vezes
nos tem ensinado as outras Ilhas , d'onde todos os annos vem fazer pescas no inar da
Terceira, e com maior proveito que nós , por que sendo maiores os seus aparelhos , e
incomparavelmente maiores as suas embarcações , sao precisamente maiores as suas
vantagens , e menos perigosas as suas pescas entao emprehendidas em mares mais altos,
a que nao podem chegar os nossos saveirinhos , nem lanchinhas , se nao em tempos
os mais serenos.
Se a navegação entre aquellas Ilhas estivesse mais facilitada , era impossivel , que
nao tivesse lembrado a pesca das baleias , ficando reservado por incuria nossa esse
aproveitamento aos Americanos Inglezes, que de lá taò longe as vem pescar todos os
annos nos nossos mares , vendendo-nos logo depois o azeite que dellas extrahem , á
troco de refrescos , que nessa occasiao nos compraō.
Se debaixo de qualquer destes pontos de vista póde a navegação dos Açores fazer-se
por hum modo mais proveitoso , nao menos ás mesmas Ilhas, que aos nossos Reinos,
quanto , e quanto mais naò será augmentada entre nós , e quanto facilmente naò at
trahirá o commercio das outras Nações , sendo concluida a grande empresa, apenas
começada, de hum Dique ao pé do Castello de S. Sebastiao na Cidade d'Angra? E quaò
facil seria acabar-se a obra, se o Governo de Sua Magesdade garantisse hum empres
timo correspondente a ella , sendo todos os seus rendimentos obrigados , com princi
pal hypotheca , até que se amortisasse a divida , ainda que a esse respeito á mesmas
Ilhas se imposesse temporariamente algum tributo ?
A obra por quao grande pareça , e mesmo por quaò grande seja , vê-se bem quanto
he possivel , e sendo concluida , ella deve attrahir a maior gloria ao Governo de Sua
Magesdade , e aos nossos Deputados em promover este negocio o maior penhor de re
conhecimento de todas aquellas Ilhas, e de todos os que se poderem poupar ao seu
( 85 )
abrigo de serem abismados , como tantas vezes quasi todos os annos temos presen
ciado.
NOTA 26 .
NOTA 27 .
drino ) as carnes salgadas dos Estrangeiros tambem se vendem carissimas , como por
exemplo huma lingoa de vacca por 600 rs. , que muitas vezes nem tres arrateis tem de
peso , em lugar de as poder ter a cruzado , e a carne em proporção ; e quanto a nós he
evidente quanto essa falta de commercio nos terá sido sensivel , porque nem ao menos
aproveitamos os nossos prados naturaes , aonde podiamos criar muito mais gado do
que temos ; donde resulta que apenas conservamos os generos sem os ter augmentado
consideravelmente , podendo ser extraordinario o seu engrandecimento ja pelo nu
mero , e ja pela sua qualidade ; e taes devem ser suas vantagens , quantas podem de
prehender-se de tornar a Naçao independente destes generos de fora : e ainda que por
este modo algum tanto se diminuissem os direitos nas Alfandegas , tudo isso seria so
bejamente compensado , assim pela facilidade do commercio , como pela barateza do
mercado , e muito mais ainda pela conservação do numerario , que por este modo
nunca sahe senaò apparentemente.
Eu transcrevo o Alvará concedido pelo Senhor Rei D. Joao IVº . a requerimento dos
nossos Deputados em 1653 para que se conheçaò pelo seu conthendo as vistas ulte
riores daquelle sabio Governo. Diz o Alvará....
EU EL REY Faço saber aos que este Alvará virem , que havendo respeito ao que
me foi proposto pelos procuradores de Cortes da Cidade de Angra , Ilha Terceira , nas
que celebrei nesta Cidade de Lisboa em vinte e dous de Octubro de seis centos e cin
coenta e tres , pedindo-me no Capitulo nono , que fosse servido ordenar que se nao
prohiba aos moradores daquellas Ilhas mandarem o seu trigo , e vinho a esta dita Ci
dade de Lisboa, porque quem o quizesse navegar para alguma conquista deste Reino ,
o podia comprar nella , e que para o trazerem a esta Corte se lhes nao impedissem
fretarem as embarcaçoens que necessarias forem. E porque sobre a faculdade de se
navegarem'os vinhos , e trigo de que trata o dito Capitulo nao ha prohibição particu
lar com que se impida . Hey por bem que assim se possa fazer , guardando-se o que pelas
Leis , e Regimentos estiver provido . E este Alvará se cumprirá como se nelle con
têm , e valerá posto que seu effeito haja de durar mais de hum anno , sem embargo
da Ordenação do Livro segundo titulo quarenta em contrario . Manoel do Canto o fez
em Lisboa a quinze de Junho de mil e seis centos cincoenta e quatro , e este vai por
duas vias . Jacinto Fagundes Bezevra o fez escrever . - REY.
Esta copia foi extrahida em execuçao do Decreto de treze de Julho de mil oito centos
vinte e quatro , e està conforme o livro vinte e seis da Chancellaria do Senhor Dom
Joao IV0 folhas cento quarenta e quatro . Real Archivo , tres de Setembro de mil oito
centos trinta e dous. O Official Maior Francisco Nunes Franklin .
Eu nao faço applicaçaò d'aquelle tempo quanto aos direitos que pagamos hoje dos
trigos , assim porque os naò julgo excessivos , como por que d'ahi nos nao tem vindo
máos resultados , naò se tendo diminuido a sua cultura , que mesmo somos obrigados
a conservar por ser esta a mais certa , a mais rendosa , è a menos precaria em razao da
sua exportação ; com tudo nao posso deixar de fazer alguma observação a respeito dos
( 87 )
vinhos das Ilhas. Primeiramente deve saber-se que se subentendem por vinhos das
Ilhas , os da Madeira , Pico , e S , Jorge, em cujo numero nao entraō as mais Ilhas , por
que os seus terrenos bem que vulcanicos , lhes nao saò tao proprios quanto ás outras ,
como he bem facil conhecer pela sua posiçao topografica , e mais ainda em razaò da
cultura empregada nelles. Hora o vinho daquellas Ilhas he conhecidamente mais forte
que o de Portugal, exceptuando o do Alto Douro , com o qual elle rivaliza em alcohol ; e
por que será que naquelle Reino nem na mesa dos poderosos se faz ordinariamente uso
do vinho do Porto ? Naò se dirá o que poderia ser attribuido á mesa dos que tem huma
pequena fortuna ; entaò se nao he por falta de meios que deixa de ser usado por aquel
les que o reconhecem como o melhor, e o mais especial entre todos os da mesma côr
conhecidos na Europa inteira , parece dever ser pela qualidade do vinho, isto he , pela sua
grande força alcoholica ; logo dada a mesma razaò a respeito dos das Ilhas , he tam
bem manifesto que elles seriaò em Portugal quasi desusados , nunca entrando nas
mezas senao nos dessires , tempo em que o paladar embotado pelos outros vinhos ape
nas pode fazer destes hum tenuissimo uso . Se isto he certo , como na verdade nin
guem pode duvidar , entao muito he o que tem perdido aquellas Ilhas em naò expor
tarem os seus vinhos pelos muitos direitos que delles se pagaò ; e muito mais he o que
tem perdido a Nacao nos rendimentos das alfandegas , principalmente a de Lisboa ,
nem só dos proprios vinhos , como das mercadorias que as outras nacões levassem a
troco dos mesmos vinhos , o que nao acontecia n'outro tempo em quanto sabiamente
se fazia cumprir o mencionado Alvará , que sem dúvida tendia a facilitar por meio
daquelle genero o commercio em geral com as mais nações , e particularmente com
a nossa , e com as nossas conquistas ; mas por que essa medida economica por
quaò sabia fosse durou pouco tempo , nao he de admirar que d'hahi resultasse o
que hoje experimentamos , vendo-nos precisados pela nossa falta d'industria de dar
consumo ás mercadorias estrangeiras sendo com o oiro , e nao com os nossos generos,
que fazemos face a essas permutações , d'onde provêm o nosso estado de decadencia com
mercial , e exhaurimento de numerario . Em consequencia he evidente que huma tal
importação em Portugal taò longe està de poder prejudicar os seus vinhos, que antes
pela facilidade do commercio, que os nossos deveriao promover , seria hum resultado
necessario tambem importarmos nas nossas Ilhas muito mais vinho tinto de Por
tugal do que com effeito importamos , sendo certo que ordinariamente gostamos
mais daquelle , que do nosso . O mesmo se deve entender com as agoas ardentes , que
em todos os tempos foraō sempre hum ramo especifico de commercio para as nossas
conquistas.
NOTA 28 .
Diz o mesmo Author das Georgicas : « O onobrychis ( sainfoin dos Francezes ; hedy
sarum onobrychis dos botanicos ) he entre as plantas da familia leguminosa adop
tadas para prados artificiaes , a que parece mais util, e de mais extensa applicação para
este fim nas differentes provincias de Portugal .
I". Por que sendo indigena na Europa meridional , e nella originaria das mon
tanhas calcarias, facilmente pode prosperar com a cultura no clima deste Reino .
2º. Porque exigindo as plantas de prado artificial, taes como a luzerna , o trevo , ete. ,
terreno plano , profundo , pouco compacto , e fresco , o onobrychis prospera nas
terras mais seccas , elevadas , pedregosas , e até nas areentas , principalmente se na
composição dellas entra substancia calcaria , a qual se encontra quasi geralmente nos :
terrenos de Portugal.
3º. Por que , o onobrychis , tanto na sementeira como nos amanhos para as suas
colheitas annuaes , exige menos trabalho , e menos adubo do que as ditas plantas ;
he com tudo mui util semeallo em terra profundamente lavrada , e ainda melhor se
nella tem precedido culturas taes como a do milho , batata , etc., cujos amanhos de
videm a terra , e extinguem nella as hervas nocivas ; huma e outra cousa he conve
niente para que no primeiro e segundo anno ganhem vigor as raizes desta planta , as
quaes , em tal caso , profundaò perpendiculamente até dez palmos e mais , de que
provém o vingar a onobrychis nos terrenos ingratos , e aridos , pois que pode pelas
suas raizes procurar em grande profundidade os succos necessarios á vegetaçao.
4°. Porque ainda que a luzerna ou o trevo produzem maior quantidade d'herva ,
a do onobrychis que fornece nos paizes meridionaes tres ou quatro cortes abundan
( 89 )
tes em cada anno ou seja dada em verde , ou em feno, he mais substancial , e conserva
os gados mais vigorosos , e menos expostos ás molestias.
5º. Por que, o onobrychis , que dura em prado de 10 até 15 annos , pela decomposição
das suas abundantes raizes melhora consideravelmente o terreno , para nelle se pra
ticar a cultura das cereaes .
Tanto os Inglezes , como os Francezes tem conhecido as vantagens da cultura desta
planta , e por isso huns e outros , ha annos a esta parte , tem multiplicado os prados
della . He digno de se notar , e de servir d'exemplo o que tém acontecido na parte da
Champagne denominada , pela esterilidade do seu terreno , Champagne pouilleuse ;
esta porção daquella provincia era , ha menos de quarenta annos , o districto mais
miseravel de França ; os seus gados poucos e enfezados , as suas arvores raras e mes
quinhas , e as colheitas das cereaes nunca suppriaò ao sustento annual dos seus entao
infelizes habitantes , os quaes com a introducção dos prados do onobrychis , tem feito
desapparecer o aspecto indigente daquelle paiz , aonde com este meio nelle actual
mente mui generalizado , as terras produzem abundantes colheitas de cereaes , criao
arvores perfeitas , e sustentao gados vigorosos . }}
A consideraçao que os antigos tem dado à luzerna , o sainfoin a tem merecido dos
modernos . Os nossos terrenos os menos succozos pela seccura das suas areas ver
melhas , amarelhas , e esbranquiçadas, e mais alguns outros formados de materias cal
calcarias devem ser ainda mais proprios que os de Portugal para produzir a desejo o
sainfoin , o qual ( se medimos a producçao de todas as mais plantas ) sendo aclimati
sado como a luzerna deve esperar-se haja de produzir os mesmos cortes , que esta , e
mesmo que os nao produzisse em tanta abundancia , elle pode assim mesmo fazer es
timar em muito alguns terrenos , que pouco ou nada valessem antes . Este trevo pode
semear-se em Setembro com o centeio , ou em Março com o trigo , ou avea. Sendo
notavel que elle morre nos terrenos os mais productivos , quando nestes a luzerna se
nutre e vivifica.
M. Tull. fallando com o maior respeito do sainfoin , sustenta que elle fornece tanto
sobre hum arpent de terra mediocre ( geira Franceza ) quando elle he bem cultivado,
como quarenta geiras de prados naturaes. Elle diz , e muitos outros o tem repetido ,
que a sua semente he excellente para os cavallos , e até a mais propria a promover a
geraçao ; mas como tal alimento he muito escandecente , naò se deve dar senaò com
a maior prudencia e moderaçao ; quando o seu feno he o mais salutar de todos os
conhecidos , e sem duvida nesta parte mui superior á luzerna.
Antes de acabar de tratar desta planta julgo do meu dever dizer duas palavras
d'huma especie de sainfoin conhecido debaixo da denominaçao de sulla , ou silla (he
dysarum coronarium) com que os Calabrezes nutrem e engordao os seus cavallos . Em
huma memoria de M. Grimaldi inserida nas da Sociedade Economiea de Berne en
contraō-se detalhes singularissimos sobre esta planta . Ella produz em todos os solos
elevando-se algumas vezes á altura d'hum homem ; semeia-se depois da colheita do
12
7
( 90 )
trigo sobre o restolho , que se queima sem que lhe seja precisa outra preparaçaò ; al
guns mezes se demora na terra sem germinar ; cresce depois lentamente até á prima
vera ; que he quando de todo se eleva sobre os campos , sendo de tudo o mais ad
miravel, que feita a colheita da sulla , trabalha-se a terra semeando-se de trigo , e este
vem mais bello que n'outros campos, que nao tem sido cultivados com esta planta ;
a sulla nao parece existir entre o trigo , mas quando elle tem crescido , e se queima
o restolho , ve-se apparecer, e cobrir o campo, como a primeira vez , e assim depois todos
os dous annos , sem que haja necessidade de a ressemear durante mais de 40 annos.
Todos os animaes gostao , segundo dizem , desta planta que prodigiosamente os
engorda, a qual ha muitos annos he conhecida na Italia ; porem em França tendo-se
experimentado a sua cultura nos arredores de Paris , diz-nos M. Gilbert que ella tem sido
destruida pelo gelo ; quanto bem se teria naturalizado sendo cultivada nos departa
mentos os mais meridionaes , e sem duvida por isso nos nossos deve produzir quanto
pode desejar se.
NOTA 30 .
Cahe-me a proposito tocar de passagem sobre a minha conducta politica , para que
se vejaò os fundamentos que tive em fazer nesta memoria huma pequena observaçao
sobre o andamento do Governo na minha Patria a meu respeito. Todos sabem 1º que
por ordem daquello Governo me foi intimado em 30 de de Dezembro de 1828 que eu
devia sahir deportado para Inglaterra , por espaço de 6 mezes , em virtude dos acon
tecimentos politicos , que tiveraò lugar na Ilha Terceira em 18 de Maio de mesmo
anno, sendo obrigado na mesma occasiaò a assignar um termo de nao hir para Portu
gal durante aquelle tempo , ou para qualquer das Ilhas pertencentes áquella Provin
cia , sob pena de perder todos os meus bens , salvo no caso de antes me achar perdoado
pela Mesma Augusta Senhora ; 2º que antes de assignar esse termo fora sequestrada a
minha casa em 24 do mesmo Dezembro , ainda antes de me ser intimada essa depor
taçao , ou mesmo qualquer outra declaração judicial , e por consequencia muito anti
cipadamente ao merecimiento da pena que se me tinha comminado ; 3° que em 9 de
Janeiro seguinte se verificou a deportação ; 4º que em Março de 1832 pela chegada do
Senhor D. Pedro ás Ilhas he que S. Magestade houve por bem por S. R. Mercè am
nistiar, em nome da Rainha a Senhora D. Maria IIª todos aquelles que em virtude de
taes occorrencias se achavao pronunciados por huma devassa ; 5° que desde logo todo
aquelle a quem fosse facil ter esse conhecimento poderia hir tomar posse dos seus
bens , e se o nao fizesse por algum motivo legitimo , tendo lá seu Procurador , seria
quanto bastasse para a sustentaçao do seu direito , huma vez que a amnistia lho
nao impedisse ; e 6º finalmente que em Agosto de 1833 chegando o Senhor D. Pedro
a Portugal em continente amnistiou todos os que depossessem as armas em que tives
sem pegado contra o Governo da Mesma Augusta Senhora. E por que eu nunca
tinha pegado em armas contra este Governo , nem ainda pelos acontecimentos de
( 91 )
18 de Maio de 1828 , nem pelos de 22 de Junho do mesmo anno , nem até ao presente,
havendo taobem escapado de depôr , ou julgar da vida e fazenda dos Constitucionaes,
em consequencia naò duvidei assim que me achei melhor ( havendo estado em Cintra
por espaço de seis mezes a restabelecer-me de sezões que por duas vezes fortemente
me haviao atacado no intervallo de 7 para 8 mezes ) recolher-me a Lisboa em 18 de
Outubro , apresentando-me logo á Authoridade civil ( Corregedor Aguilar ) que vendo
o meu Passaporte de Cintra , e a facilidade com que eu me apresentava , naò duvidou
tambem abonar-me para com a Policia para alli poder tirar meu Passaporte para In
glaterra , ou França , e com elle chegando a este Reino logo me apresentei ao Consul
Geral Daupias , que entaò estava encarregado dos negocios de Portugal ; e depois
disso escrevi para a minha casa , recommendando que promovessem a restituiçaò dos
meus bens , do mesmo modo que o fizessem os outros que se achavao nas mesmas circuns
tancias . Para o conseguir mais promptamente, remetti hum certificado da minha apre
sentaçao, passado pelo Consul , e esse certificado chegou em Fevreiro seguinte , e sendo
apresentado he para admirar ( segundo noticias tenho até 19 de Agosto ) que me fosse
negada folha corrida , justamente facilitada a outros que se achavao nas mesmissimas
circunstancias , e que por isso adiantarao os seus negocios achando-se ja ha tempos na
posse dos seus bens , e eu espoliado dos meus desde 24 de Dezembro de 1828. E final
mente tendo lido o Tratado da quadrupla alliança , e sabendo que esse Tratado foi
ratificado pelo S. D. Pedro em nome da Rainha a S. D. Maria IIª e tendo em
consequencia a esperar huma amnistia completa e geral ( de que eu nao precisava ,
nem da antecedente ) , se com tudo ainda prevalecer o arbitrio , eu hirei respeito
samente dirigir minhas supplicas ás Cortes , eu hirei aos pés do Throno , e eu cla
marei justiça , menos pelos meus interesses , que pelos funestos resultados d'huma taō
escandalosa postergaçao de Lei ; com tudo tenho ainda bem presente , sem me poder
esquecer, o ataque que em dia claro nas antevesporas da minha sahida me fizeraō dous
assassinos na calçada nova do Carmo procurando votar-me á execraçao publiea, de que
me salvei com maó logro de suas pessimas intenções , e receando que destes terriveis
ensaios se seguissem muitos assassinatos sobresaindo ás ordens do Governo , como teve
depois de acontecer por muitas vezes , e me consta ainda haver repetiçaõ desses horrores
em Lisboa , e que naò seria sufficiente escudo para meu socego e conservaçaò a regu
laridade que sempre tenho tido em minha conducta ; conhecendo ao mesmo tempo
que o homem nasce con direitos inalianaveis e emprescriptiveis como saò a conser
vaçao da sua honra , da sua vida , e da sua propriedade , assim como tambem o liber
dade de suas opiniões , quando estas naò affectaō a ordem publica , vendo todos estes
preciosos bens arriscados a ponto de se perderem totalmente , mais precipitada fiz a
minha sahida para França . Eisaqui os motivos que deraò lugar a eu dizer , que vol
tarei á minha Patria quando huma Lei der garantias , e marcar deveres , e quando a
propriedade e a liberdade individual forem respeitadas , e eu queria dizer nisto , que
esperava, e espero ainda que todos, e particularmente os executores das Leis , sejao
( 92 )
responsaveis pelos seus excessos , ou omissões , e em quanto o nao forem , naò se guar
dara a ordem publica , nem se poderá dizer que está extincto o arbitrario , maximo
fim a que se deve encaminhar hum Governo Constitucional .
NOTA 31.
NOTA 32.
NOTA 35 .
Quando escrevi esta pequena memoria ( que he tal e qual só com a differença das
notas e de ser entao na lingoa Franceza ) eu nao podia prever o recente Decreto ,
que tanto facilita a importaçaò das mercadorias estrangeiras pela igualdade dos direi
tos impostos nellas ; e em consequencia muito mais facil se torna a permutaçao dos seus
mesmos effeitos com os nossos , e particulamente com esta Naçaò , que tanto adiantada
se acha em todos os ramos d'industria.
CORREÇÕES .
5 24 enobrecer ennobrecer.
7 19 Jezu Jezus.
15 7 deesjos desejos .
བབ་
24 5 en em .
27 26 esreverá escreverá .
37 34 sus seus.
44 I soboreáraō saboreáraō.
57 13 antecipada anticipida .
59 6 Ingleses Inglezes.
8238
66 I duodicima duodecima.
1 -
73 principiariao principiáraō.
76 30 eus seus.
4843
77 14 dessires desséres.
Idem 18 Nacao Naçao.
Idem 19 Nacoes Nações .
88 13 cairegados carregados .
1
1
24
C
Österreichische Nationalbibliothek
+Z155381305
W
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