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14393/OUV-v18n2a2022-66162
Luís Carlos Ribeiro dos Santos, dito Luiz Carlos Laranjeiras, é ator, dramaturgo, doutor em
Artes Cênicas (ECA-USP), mestre em Filosofia, diretor teatral e musical de peças com os
grupos paulistas Andaime, Coletivo dos Anjos, Cia. Burucutu, Alumiah, Pés no Chão, Caixa
de Histórias, Farândola Trupe, Teatro do Imprevisto, Arte das Águas, Labirinto/Tropa da Vale,
Cênica e Teatro da Cadela Manca/PR. Publicou os livros A música e a dança popular na
aprendizagem das Artes Cênicas; jogos rapsódicos (2021), Teatro de Luiz Carlos Laranjeiras
(2015) e Folia da terra (2009). Ator, cenógrafo, bonecos, objetos do Teatro Ventoforte (RJ-
SP), nos espetáculos com direção de Ilo Krugli: As quatro chaves, Brinquedo da noite,
Labirinto de Januário, A tempestade, História do barquinho, Choro Lorca, História de lenços
e ventos, Sete corações, Caminhadas e o disco O gigante azul. Integrante do Grupo
Multidisciplinar de Estudo e Pesquisa em Arte e Educação (ECA-USP).
Afiliação: Universidade de Brasília - UnB (2017-2019)
Lattes: http://lattes.cnpq.br/1058267540188986
Orcid: https://orcid.org/0000-0003-1719-2291
•RESUMO:
O artigo é parte da pesquisa atoral acerca da música, da dança e das artes visuais como linguagens
essenciais para o jogo dos atuantes com o público no teatro de rua. A tese originária do artigo é
constituída de estudos e experimentações corpóreo-musicais na sala de ensaio, apresentações de
peças, de rua e palco, investigações e recolhas permanentes de materiais estéticos pelo país, para
construir as bases práticas e conceituais de uma metodologia de ensino do teatro fundamentada nas
variantes antropológicas brasileiras, que traz a música e a dança popular para os processos criativos
e as relações de ensino-aprendizagem. Nesse contexto investigativo atoral, o artigo destaca os modos
de preparação-criação e apresentação de “As quatro chaves”, espetáculo de rua e espaços abertos,
em que as artes são integradas num jogo de aprendizagem dos desejos com o público, ressaltando a
relevância artística e pedagógica de Ilo Krugli e do Ventoforte na historiografia da arte-educação e do
teatro infanto-juvenil no Brasil. A peça traduz o ideário, a criativa e libertária visão de mundo de Ilo
Krugli, que faz da brincadeira de rua dos desejos o espaço de troca de saberes e experiências, campo
de conhecimento e liberdade de expressão, de autonomia do ser, de tempos e espaços coletivos de
comunhão e celebração.
•PALAVRAS-CHAVE:
Ilo Krugli, Teatro Ventoforte, Teatro de rua, Pedagogia do teatro, Arte-educação
•ABSTRACT:
The article is part of the actoral research on music, dance and visual arts as essential languages for the
play of the performer with the public in street theater. The original thesis of the article consists of
corporeal-musical studies and experimentation in the rehearsal room, presentations of plays, street and
stage, investigations and permanent collections of aesthetic materials across the country, to build the
practical and conceptual bases of a methodology for teaching theater, based on Brazilian
anthropological variants, which brings music and popular dance to creative processes and teaching- • 230
learning relationships. In this actorial investigative context, the article highlights the modes of
preparation-creation and presentation of “As quatro chaves” (The four keys), a street show and open
spaces, in which the arts are integrated in a game of learning desires with the public, highlighting the
artistic and pedagogical relevance by Ilo Krugli and Teatro Ventoforte in the historiography of art
education and the children’s theater in Brazil. The play translates Ilo Krugli's thought, creative and
libertarian worldview, which makes the street play of desires a space for exchanging knowledge and
experiences, a field of knowledge and freedom of expression, of autonomy of being, of times and
collective spaces of communion and celebration.
•KEYWORDS:
Ilo Krugli, Teatro Ventoforte, Street theater, Theater pedagogy, Art education
Para que o público seja criador uma atitude é proposta pela obra, atitude que
envolve interpretar e estar ativo nas mesmas condições de jogo do atuante. O
Narrador ao perguntar propõe a tomada de atitude: você tem desejo de quê? O
espectador se abre publicamente na rua, fala dos seus desejos particulares a todos,
realiza os desejos dos outros, os personagens, constrói sua participação com
atitude interpretativa, como autor, ocorrendo assim, “um primeiro aspecto
pedagógico” na experiência estética com o teatro, sem cair na armadilha da
verborragia “pedagogizante”.
Mesmo não falando diretamente do teatro infantil feito por adultos, mas por
crianças, Walter Benjamin vê a educação da primeira infância calcada no “contexto,
no sistema” e não pela palavra dita, a verborragia. As frases retóricas são alheias ao
imaginário, ao mundo inventivo da criança, não propõem a tomada de atitude
interpretativa citada por Desgranges, ocorrida em “As quatro chaves”. No programa
de teatro infantil proletário pensado por Benjamin, nas oficinas e apresentações as
crianças tomam conhecimento de si e do mundo. Deste modo, “apenas o verdadeiro
pode atuar de maneira produtiva” (BENJAMIN, 2002, p. 112), as frases complexas
distanciam a criança do que é verdadeiro e necessário para a tomada de atitude.
Benjamin refuta o interesse pelo método porque é “a ideologia do continuar
a enrolar e da preguiça” (BENJAMIN, 2002, p. 113). Mais importante que a ideia para
a qual se educa é o contexto, “o terreno objetivo no qual se educa” (BENJAMIN,
2002, p. 102). A educação ocorre durante a vida, mas a proposta de educação
infantil proletária considera os limites, o contexto em que ocorre a educação. O
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teatro da educação burguesa não se preocupa com o contexto e os conteúdos para
o aprendizado, pois é orientado pelo lucro, como meros “instrumentos de sensação”
(BENJAMIN, 2002, p. 113), que podem ser relacionados aos efeitos ilusórios, aos
aspectos “pedagogizantes” vistos por Koudela e à atitude interpretativa proposta
pela obra ao contemplador pensada por Desgranges, de modo que as crianças ou
se distanciam ou participam da verdadeira experiência como autores.
O teatro é proscrito na educação burguesa pelo seu poder de despertar
aptidões, ampliar visões, abrir consciências. O teatro infantil proletário é “o fogo no
qual realidade e jogo se fundem para as crianças”, sua finalidade não são as
encenações, que “acontecem de passagem, por descuido, se poderia dizer, quase
como uma travessura das crianças” (BENJAMIN, 2002, p. 114), como um jogo no
tempo e no espaço do improviso. O diretor não é uma “personalidade moral” a qual
Referências
GARCIA, Clóvis. Uma brincadeira para as crianças. E os adultos não resistem. Crítica, São
Paulo: Caderno Divirta-se, Jornal da Tarde, março de 1984.
HUIZINGA, Johan. Homo ludens: o jogo como elemento da cultura. Tradução João Paulo
Monteiro. São Paulo: Perspectiva, 2012.
KRUGLI, Ilo, e LARANJEIRAS, Luiz Carlos. 10 anos do Teatro Ventoforte. Rio de Janeiro:
Catálogo comemorativo. FUNARTE, 1984.
PUPO, Maria Lúcia. Teatro infantil. In: KOUDELA. Ingrid Dormien, JÚNIOR, José Simões de
Almeida. Organização. Léxico de Pedagogia do Teatro. São Paulo: Perspectiva. SP
Escola de Teatro, 2015.
SILVA, Igor de Almeida. Brincadeira. In: KOUDELA. Ingrid Dormien, JÚNIOR, José Simões
de Almeida. Organização. Léxico de Pedagogia do Teatro. São Paulo: Perspectiva. SP
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SPOLIN, Viola. Improvisação para o teatro. Tradução e revisão Ingrid Dormien Koudela e
Eduardo José de Almeida Amos. São Paulo: Perspectiva, 2010.
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Como Citar
SANTOS, L. C. R. dos (dito Luiz Carlos Laranjeiras). Nas ruas do sem fim do mundaréu com
"As quatro chaves" e o Ventoforte. ouvirOUver, [S. l.], v. 18, n. 2, [s.d.]. DOI: 10.14393/OUV-
v18n2a2022-66162. Disponível em:
https://seer.ufu.br/index.php/ouvirouver/article/view/66162.