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Walter D.

Mignolo

NOVAS REFLEXÕES SOBRE A “IDÉIA DA AMÉRICA LATINA”: a

DOSSIÊ
direita, a esquerda e a opção descolonial

Walter D. Mignolo*

Este texto tem um caráter específico de debate, retomado pelo autor em função de resenhas e
entrevistas realizadas sobre o seu livro The Idea of Latin America, publicado em 2005. Inicia
demonstrando como as narrativas diversificadas da história da colonização são plurais, mas, ao
serem difundidas, unificam-se em narrativas globais de caráter universal, como efeito de
processos de totalidade. Para o autor, essa diversidade de forças históricas caladas, mas vivas,
hoje se expõem sem perspectiva de retorno ao passado. Nesse sentido, ele fala do projeto
modernidade e colonialismo, de descolonizar o conhecimento, respondendo e aprofundando
diversos aspectos paradoxais postos pelo debate de seu livro, como o diálogo entre movimentos
e pensamentos de emancipação que surgem no centro do sistema-mundo. Com isso, não pre-
tende fechar-se ao debate, mas, ao contário, busca atualizar e avançar nessas questões da
diferença e das populações não homogêneas de uma perspectiva de futuro e de uma perspecti-
va de um conhecimento e práticas pluri-versalistas.
PALAVRAS-CHAVE: modernidade, emancipação, diferença, descolonização do pensamento, Améri-
ca Latina.

INTRODUÇÃO inclusive, de caráter universal). Esse processso é


um tanto similar à narrativa do baseball dos Esta-
O Novo Mundo e a América são invenções dos Unidos, cujos campeonatos anuais se anunci-
européia-cristãs, cujos agentes foram as monarquias am como se fossem a copa do mundo, em torneios
e, em seguida, os estados-nacionais do Atlântico. que, no melhor dos casos, além dos Estados Uni-
A formação histórica do mundo moderno-colonial dos, só há, no máximo, uma equipe canadense.
resultou das ações e das narrativas produzidas Ao lado de Smith, estava – em Londres – o
basicamente em quatro das seis línguas modernas africano liberto Ottobah Cugoano. Em seu relato,

CADERNO CRH, Salvador, v. 21, n. 53, p. 239-252, Maio/Ago. 2008


imperiais: português, castelhano, francês e inglês. Thoughts and Sentiments on the Evil of Slavery
Ao relermos, hoje, a seção sobre o colonialismo, (1786), não fazia qualquer diferença entre as cinco
no clássico livro de Adam Smith The Wealth of monarquias que disputavam as possessões e as
Nations (1776), aprendemos – a partir do ponto riquezas da América e convertiam os africanos
de vista dos interesses britânicos, que Smith nos numa mercadoria a mais. Para Adam Smith, o li-
concede de forma afetiva e intelectual – como, ao vre comércio era, sem dúvida, o motor da prospe-
longo dos séculos XVI e XVII, vão se configuran- ridade; assim, por exemplo, ele nos conta, entre
do certas “brigas de família” entre Castela, Portu- as muitas histórias e exemplos que apóiam seu
gal, Holanda e França, que, ao serem narradas, argumento, que:
impressas e difundidas como nenhuma outra nar-
rativa tinha podido fazê-lo naquele momento, con- Rum is a very important article in the trade which
the Americans carry on the coast of Africa, from
vertem-se numa narrativa global (alguns diriam, which they bring back negroes slaves in return
(1976 [1776], v. 2, p.91).

Cugoano tinha outra imagem, porque não


* Professor de Literatura na Duke University - Estados
Unidos. wmignolo@duke.edu vivenciava – como Smith – os interesses e a histó-

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ria da Grã Bretanha, mas sentia na pele e a história tradição e o subdesenvolvimento. A América do
de africanos capturados, transportados ao Novo Norte, em contrapartida, encarnará o espírito do
Mundo e escravizados: capitalismo, tanto na versão de Weber como na
anterior de Smith. Sem dúvida que, nesse proces-
Nothing else can be conceived, but that the power so, haverá também focos do espírito capitalista na
of infernal wickedness has so reigned and
pervaded over the enlightened nations as to América do Sul e outros focos de indiferença.
infatuate and lead on the great men, and the Contudo, a difusão do mercado do livro e
kings of Europe, to promote and establish such a
horrible traffic of wiknedness as the African slave das idéias, que fez de Smith um clássico e de
trade and the West-India slavery, and thereby to
bring themselves under the guilty responsibility Cugoano uma curiosidade para espíritos bem
of such awful inequity (Cugoano, 1999 [1786], pensantes, pode encobrir, porém não enterrar e
p.81).
desterrar, essas particularidades. Enquanto os eu-
ropeus letrados, pessoas de governos, viajantes,
O “espírito do capitalismo” (cuja fundação
etc., nadavam, direta ou indiretamente, nas fontes
histórica se localiza nas mudanças radicais
gregas e romanas, no latim e no grego, o mesmo
introduzidas pela abertura da economia do Atlân-
não acontecia com a diversidade e variedade indí-
tico, no século XVI), não parece estar ligado à
gena e africana. Para os europeus, o wolof e o
ascética protestante e à secularização da chamada,
bambara, o aymara, o quechua ou o tojolabal eram
como foi proposto por Max Weber, mas a uma éti-
idiomas tão estranhos como o latim e o grego o
ca da rapinagem que prevalece, de forma ainda mais
eram também para africanos e indígenas. No en-
ampla, hoje em dia. Por essa razão, a obra de Smith
tanto, conhecemos a história: a elite crioula de
continua sendo um livro de cabeceira para os pen-
descendência européia, a elite mestiça de espírito
sadores liberais, enquanto que a ética do direito à
europeizado e a população migrante européia dos
vida, que Cugoano defende, passou a ser curiosi-
fins do século XIX em diante mantiveram viva a
dade étnica do multiculturalismo.
chama moderno-colonial.
Tudo isso é parte do processo de invenção
Hoje, essas forças históricas, caladas durante
da América (O’Gorman). Nesse processo, ademais
séculos, porém nunca apagadas, chegaram a um
da escravidão, fortes organizações sociais, como o
ponto que não tem retorno. Não sei qual será o
Tawantinsuyu e Anahuac, e territorialidades, como
destino do governo de Evo Morales. No entanto,
a de Abya-Yala, foram sendo relegadas ao passado.
já não é possível voltar atrás no passo que foi dado.
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Sem dúvida, a população indígena que vai de


Não sei qual será o destino do socialismo do sécu-
Tawatinsuyu a Anahuac, suas zonas intermediári-
lo XXI, mas tenho a impressão de que tampouco
as, mais “seus nortes e seus suis”, ou as popula-
haverá retorno nem ao socialismo castrista nem ao
ções indígenas do Caribe, tal como os arahuacos e
franco neoliberalismo que golpeou América Lati-
os taínos, não eram homogêneas. Tampouco eram
na desde Augusto Pinochet e Carlos Sául Menem
homogêneas as multidões de africanos roubados e
a Gonzálo Sánchez de Losada. A elite petroleira da
arrancados de seus reinos e principados. Foram
Venezuela já perdeu definitivamente o que pos-
arrebatados de distintos reinados, falavam línguas
suía antes da chegada de Hugo Chávez. Por tudo
diferentes e tinham vários tipos de crenças.
isso, é necessário atender ao nível ontológico da
Tampouco aqueles que chegaram da Europa for-
idéia da América Latina, e prestar atenção além do
mavam uma massa homogênea. Eram cristãos, sim,
mais ao nível ôntico. Isto é, não aceitar a América
mas de ordens monásticas de diferentes tipos. Com
Latina como uma coisa natural e contar histórias
o decorrer do tempo, não somente provinham da
do que lá acontece, esquecendo que tudo que lá
Península Ibérica, mas também da França, Holanda
ocorre tem sua razão de ser na história imperial-
e Inglaterra. A América do Sul, nesse processo,
colonial de como a América Latina foi constituída.
ilustra cada vez mais o que seria entendido como a
Os 40 milhões de latinos presentes hoje,

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nos Estados Unidos, mostram outra cara da sua riador e um semiólogo, meio filósofo e meio histo-
latinidade: não mais a européia, branca, mas a riador. A resenha de Salvatore é coerente com o
latinidade de cor. Não sei se Barack Obama será argumento do livro, e o leitor de sua resenha não
eleito presidente. O que não se pode evitar é que será guiado por falsos caminhos. Ele é também
também nos Estados Unidos – com as devidas di- generoso, ao mesmo tempo em que sublinha as-
ferenças, entre a América anglo-saxã e a América pectos do argumento que são relevantes para mim.
considerada como latina – chegou-se a um ponto Salvatore sublinha que La idea de América Latina
sem retorno. Não menos importante é o fato, nas é um verdadeiro manifesto para a descolonização
Américas, de duas mulheres brancas, e uma mu- do conhecimento nas e sobre as Américas
lher branca, nos Estados Unidos, já serem (Salvatore, 2006, p.130). Ele o considera também
presidentas e (ou) pleitearem a carreira presiden- como um manifesto pós-ocidental, na medida em
cial. É também certo que nem toda pessoa de cor é que aponta para uma mudança radical na política
dissidente, e muitas têm o direito de optar pela do conhecimento – uma mudança que coloca o
assimilação e votar pelo partido republicano. No trabalho intelectual de indígenas e afro-latinos no
entanto, é difícil imaginar que 100% das pessoas foco de mira (2006, p.130).
de cor se assimilarão às formas de vida dos “anglos São três suas observações críticas. Minhas
brancos”; assim como é também difícil imaginar respostas a cada uma delas não tentam fechar o
que todos os “anglos brancos” aceitarão e repro- debate, mas continuá-lo num diálogo rumo ao fu-
duzirão formas de vida que herdaram, mas que já turo. Salvatore assinala aspectos essenciais que
não são suas. contribuem para tornar visível a fronteira que se-
Vou ilustrar essas questões a partir de rese- para os princípios dos paradigmas disciplinares
nhas, críticas, entrevistas e comentários que sur- (neste caso a história) e os princípios do pensa-
gem de novas reflexões sobre meu livro La Idea de mento descolonial. É precisamente por essa razão
América Latina. que insisto no argumento sustentado ao longo de
La idea de América Latina, de que o pensamento
*** descolonial é uma opção (descolonial) de coexis-
tência (ética, política, epistêmica). Não de coexis-
Pelo que conheço, a versão original de The tência pacífica, mas de conflito que reclama o di-
Idea of Latin America (2005a) e sua tradução para reito de re-existência em todas as ordens do pen-

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o castelhano La idea de América Latina (2007) re- sar e do viver, como magnificamente o mostrou e
ceberam duas resenhas e duas entrevistas de con- argumentou Adolfo Achinte Albán (2007).
siderável extensão. Tanto as resenhas como as en- 1) Para Salvatore um dos maiores méritos
trevistas provocam e convidam a um debate que do livro é abrir o caminho e estabelecer os funda-
busco dar continuidade com estas reflexões. mentos para a exploração da “colonialidade” no
Cronologicamente, a primeira resenha1 foi a terreno do conhecimento e da subjetividade, isto
do historiador argentino Ricardo Salvatore (2006), é, “da geo-política do conhecimento” (2006, p. 132).
intitulada A Post-Occidentalist Manifesto, publicada Não obstante, para Salvatore, esse argumento apre-
em A Contracorriente, revista de História Social e senta uma visão limitada da “colonialidade” posto
Literatura na América Latina. Com Salvatore te- que privilegia categorias, conceitos e visões de
mos uma relação amistosa e intelectual de longa mundo sobre outras “formas mais comuns de do-
data, ainda que com as diferenças entre um histo- minação colonial” (p. 132), das quais entendo que
Salvatore se refere ao controle colonial econômico
1
Resenhas breves foram publicadas por Robert B. Kent e político. De modo que, se a “colonialidade” –
(2007), que colocou o livro em circulação entre geógrafos
e na área da geografia humana. E, no âmbito da língua e sustenta Salvatore – é “a estrutura lógica da domi-
literatura, a resenha de Susan Castillo (2007) é única e
informativa. nação colonial”, não fica claro quais são as rela-

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ções entre essas e as formas de dominação, explo- de controle do conhecimento e da subjetividade.


ração e exclusão na esfera da produção e reprodu- Isto é, colonialidade do saber e do ser. Caracteri-
ção, e no espaço público. Depois de explicar com zou o pensamento descolonial como o desprendi-
mais detalhe sua primeira objeção, Salvatore con- mento do eurocentrismo como esfera do conheci-
clui essa seção sustentando que, de certo modo, mento, a partir do qual é possível controlar a eco-
minha posição acaba sendo dual: de um lado, esta- nomia, a autoridade, o gênero e a sexualidade, em
ria somente a epistemologia moderna ocidental e, suma, a subjetividade.
de outro, a pluriversalidade, somente as vozes e as Santiago Castro-Gómez (filósofo), em um
posições dos damnés (Alban Achinte,2007, p. 133). segundo momento, se ocupou em esclarecer as
Sobre o primeiro ponto, devemos conside- relações, na matriz colonial de poder, entre a do-
rar dois níveis de argumentos: um primeiro que já minação material (economia, autoridade, institui-
foi explorado no projeto modernidade- ções) e a dominação epistêmica. Castro-Gómez
colonialidade-descolonialidade, e um segundo re- (2005), dialogando com as teses principais de
lativo à parte que destaco no argumento de La idea Edward Said, presentes em Orientalismo (1978),
de América Latina. Posto que o objetivo de meu destaca a importância fundamental do conhecimen-
argumento era compreender como a idéia da Amé- to no controle da subjetividade e, por conseqüên-
rica Latina chegou a se constituir, e não explicar a cia, no controle da economia e a autoridade. Con-
lógica da colonialidade em relação a outras opções tudo, essas premissas já estavam em andamento
(disciplinares, ideológicas, políticas, éticas, antes de 1978, no diálogo complexo travado, entre
epistêmicas), parece óbvio que a explicação do finais dos anos 60 e dos anos 70, entre a teoria da
surgimento e consolidação de uma idéia acentue dependência, a filosofia da liberação e a teologia
as categorias, os conceitos, as visões de mundo e a da liberação. Em suma, a matriz colonial deixa para
filosofia do conhecimento. trás o legado da distinção entre estrutura e supe-
Além das publicações e intervenções públi- restrutura e destaca as complexas inter-relações nas
cas recentes de vários membros do projeto, na esferas da matriz colonial de poder: a idéia da
América Latina e na Europa,2 é importante notar, América Latina que tem como horizonte imperial
nas explorações descoloniais do duo modernidade- o controle da economia e a autoridade (aqui en-
colonialidade, dois momentos. O primeiro momen- tram os conflitos e interesses imperiais da França
to, iniciado por Aníbal Quijano, e já referido em frente aos Estados Unidos), o controle do conhe-
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La idea de América Latina, introduziu a noção de cimento, o controle da subjetividade dos sujeitos
padrão colonial de poder (em meu vocabulário coloniais, o controle do gênero e da sexualidade
“matriz” em vez de “padrão”). Quijano (como so- mediante o modelo de família cristã-colonial, lati-
ciólogo ligado à economia, a partir da teoria da fundiária e burguesa, e da normatividade sexual.
dependência) enfatizou as seguintes esferas: o con- 2) A segunda observação de Salvatore se
trole da economia (apropriação de terras e recur- refere à História (escrita com maiúscula) e a
sos naturais; exploração do trabalho) e o controle colonialidade (escrita em itálico). Para Salvatore,
da autoridade (formas de governo, controle mili- meu argumento segue o de Frank e Wallerstein, na
tar). Definiu o eurocentrismo não em termos geo- medida em que situo o começo do sistema-mundo
gráficos, mas em termos epistêmicos e históricos: capitalista no século XVI, ao mesmo tempo em que
2
localizo, no século XVI, o surgimento de uma cons-
Ver, por exemplo, a obra recente de Heriberto Cairo e
Walter Mignolo (2008). Ver também a primeira parte de telação de poder (por exemplo, a matriz colonial),
uma longa entrevista realizada por Marina Grzinic (2008),
onde explico as relações entre as quatro esferas da ma- estruturada com duas faces de peso desigual: a
triz colonial do poder. Nessa entrevista, o objetivo era
explicar a matriz colonial de poder e não apresentar como modernidade e a colonialidade. Em realidade, eu
nasceu a idéia da América Latina, ela mesma (a idéia) não sigo nem um nem outro ponto, o que já está
sendo parte da formação e transformação da matriz co-
lonial do poder. claro em meu livro Historia Locales/Diseños Globales

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(2003).3 A objeção de Salvatore provém, aqui, de e depois disso, se possível, algo é feito para que as
um mal entendido, provavelmente devido aos li- pesssoas não morram; também é necessário elimi-
mites postos pelos editores da coleção Manifestos. nar, de diferentes maneiras e através de várias vias,
A dupla face da mesma moeda, modernidade- aqueles que atentam contra a ordem econômica e
colonialidade, está explicada principalmente num de autoridade). Por outro lado, também se man-
artigo monográfico publicado em inglês (Mignolo, têm as quatro esferas inter-relacionadas da matriz
2007a) e que também será publicado em castelhano colonial de poder (economia, autoridade, gênero e
em 2008. Salvatore se pergunta e questiona as re- sexualidade, conhecimento e subjetividade), me-
lações que estabeleço entre a invasão castelhana diante o controle do conhecimento, que é, ao mes-
em Tawantinsuyu e Anahuac e a invasão dos Es- mo tempo, racista e patriarcal. Esses são elemen-
tados Unidos no Iraque. Como pode sustentar-se tos que não mudaram, desde o discurso cristão do
que a lógica da colonialidade se mantém através século XVI ao discurso secular e economicista do
de tantas mudanças na História? século XXI: no caso do Iraque, o objetivo final era
A resposta é a seguinte: em primeiro lugar, o controle da economia (já conseguido através da
muda a retórica da modernidade. No século XVI, presença das oito companhias petroleiras ociden-
a retórica salvacionista da modernidade enfatizava tais que assinaram contratos de longo prazo no
a conversão ao cristianismo. Mais adiante, a partir país) e do conhecimento (o qual foi e será difícil;
do século XVIII, a salvação é pensada em termos melhor dito, impossível). Desse modo, meu obje-
de conversão à civilização (secular). Após a Se- tivo não é comparar a conquista da América com a
gunda Guerra Mundial, a retórica salvacionista da invasão do Iraque, mas conectar dois momentos
modernidade celebra o desenvolvimento como históricos na trajetória e na transformação da ma-
condição da modernização. Isso permanece até hoje, triz colonial do poder: estamos ainda no mesmo
na quarta etapa, depois da queda da União Sovié- horizonte, embora a economia deslocasse a
tica, agora com ênfase na tríade desenvolvimento, hegemonia da teologia e a teoria secular do estado
democracia e mercado. Mudaram também as rela- dos séculos precedentes.
ções de produção e o controle da economia: do 3) Na terceira observação, Salvatore começa
monopólio mercantil ao livre comércio; da revolu- a dialogar com seus fantasmas mais do que com os
ção industrial à revolução tecnológica, etc. Muda- argumentos de La idea de América Latina. Esse é
ram também as relações de autoridade (controle um tema sobre o qual Salvatore também gerou só-

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político): os espanhóis saíram da América do Sul; lidos e importantes trabalhos.4 E é um tema tam-
os ingleses da América do Norte e em seguida da bém sobre o qual colaboramos na organização de
Índia; os franceses da África do Norte, etc. Enfim, dois seminários, um em Duke e o outro na
mudaram “os conteúdos”, mas não os “termos da Universidad Torcuato Di Tella, em Buenos Aires.
conversa” (a lógica da colonialidade). Mudaram as É um tema delicado, no qual é comum que o fan-
ênfases nos domínios da matriz colonial de poder tasma se levante cada vez que alguém que não é
(da ênfase no controle das almas passa-se ao con- negro nem índio, ou que é homem e heterossexu-
trole dos corpos – a eugênica – e ao controle das al, invoca o menosprezo epistemológico a que es-
carteiras – a sociedade de consumidores). Porém o tão submetidos e submetidas pessoas identificadas
que não mudou foram dois dos elementos funda- com tais configurações sociais. O fantasma comum
mentais da matriz colonial de poder. Por um lado, 4
Ver o artigo de Salvatore (1998) sobre a representação do
mantém-se a dispensabilidade da vida humana (a império informal dos Estados Unidos na América Lati-
na, que foi em seguida desenvolvido num magnífico
acumulação e a autoridade vêm em primeiro lugar, livro (2006). Ver, também, vários dos trabalhos de um
dos seminários que co-organizamos, publicado em
3
No mesmo ano de 2003, este livro foi traduzido para o Nepantla. Views from South. Local versus Imperial
português, no Brasil, pela Editora da Universidade Fede- Knowledge: reflections on Hiram Bingham and the Yale
ral de Minais Gerais (UFMG), com o título Histórias Peruvian Expedition, v.4, n.1, 2003. Disponivel em: http:/
locais/Projetros globais. /muse.jhu.edu/journals/nepantla/toc/nep4.1.html.

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(até Zizek conseguiu vê-lo) é o do “privilégio creva em castelhano (e não do direito que tem, por
epistêmico” e o da “política de identidade”. As- exemplo, Pierre Bourdieu de escrever em francês,
sim, Salvatore, depois de levantar objeções que, e não em bretão ou em árabe, posto que os france-
como digo, são brigas com moinhos de vento mais ses colonizaram o Magreb). Assim, Nina Pacari,
que com meu argumento, sentencia: advogada quechua, ativista e ex-ministra de rela-
ções exteriores do Equador; e Féliz Patzi Paco, so-
Não considero a idéia de privilégio epistêmico ciólogo aymara, e ex-ministro de Educação e Cul-
totalmente convincente. Tampouco acho que uma
comunidade de determinada localidade seja ca- tura nos primeiros anos do governo de Evo Morales,
paz de controlar e de manter para si mesma sua não têm privilégio epistêmico, mas, simplesmente
própria perspectiva, conhecimento ou categori-
as. O conhecimento local, assim como qualquer o direito epistêmico de argumentar por seus inte-
outro tipo de bens, está sujeito à apropriação por
estranhos (Salvatore, 2006, p.136). resses, da mesma maneira que mestiços e crioulos
o fazem e o fizeram pelos seus.7 Isso não quer di-
Antes de entrar nesse parágrafo, é necessá- zer que Pacari ou Patzi Paco “representem” todos
rio dissipar outros mal-entendidos. Salvatore acha os indígenas. Essa é a premissa cega do pensa-
que, em meu argumento, privilegio certos autores mento imperial, tanto na metrópole como nas co-
“que são representantes de raças ou povos opri- lônias. Realmente, não representam ninguém, mas
midos por séculos de colonialismo […] é muito apenas colocam sobre o tapete uma opção: a opção
difícil de engolir” (p. 136).5 Por quê? pergunta-se descolonial, a opção de pensar e intervir, tanto em
Salvatore: “Estariam os textos de um sociólogo termos políticos como epistêmicios, que lhes foi
boliviano escrito em quechua mais em sintonia com negada (racismo epistêmico), e continua ainda sen-
as necessidades dos oprimidos do que os textos do negada pelo privilégio epistêmico da
de outro sociólogo boliviano escrito em castelhano, modernidade. Como Pacari e Patzi Paco não repre-
ou inclusive que de um sociólogo europeu escrito sentam aos indígenas, não esperam tampouco que
em inglês ou francês?”(p. 137). todos os indígenas se unam a suas propostas, ain-
Sem dúvida, Salvatore tem razão. E não são da que elas sejam propostas avançadas, pensadas
essas as coisas e posições as que eu defendo ou e sentidas a partir da ferida colonial indígena, da
destaco em meus argumentos. Em primeiro lugar, mesma maneira como as de Bourdieu são propos-
já tornei explícito que o único privilégio epistêmico tas que surgem de um intelectual branco e francês,
é o da modernidade, o mesmo privilégio que “comprometido” com a causa dos indigentes. Isso
CADERNO CRH, Salvador, v. 21, n. 53, p. 239-252, Maio/Ago. 2008

Salvatore defende nesses argumentos.6 O privilé- também pode ser aplicado a Bartolomé das Casas.
gio epistêmico da modernidade é o que gera e man- Há pouco conversávamos em Amsterdã com
tém a colonialidade do saber e do ser. Salvatore Kwame Nimako, a propósito da presença e das
tem razão, mas não acerta o alvo. Esse não é o meu intervenções feitas por Robert Blackburn numa
ponto central. conferência sobre questões de escravidão e eman-
Primeiramente, Salvatore está reagindo frente cipação que teve lugar esses dias e a uma de suas
à possibilidade de que um sociólogo indígena es- seções a que assistimos juntos. Como todos e to-
5
das participantes eram brancos e brancas, pergun-
Entre os autores que Salvatore diz que privilegio, estão
Arturo Ardao e Bolívar Echevarría. Na verdade, não pri- tei a Kwame (originário de Ghana) – já terminada a
vilegio nem um nem outro, mas, ao contrário. Ardao é
uma referência importante, posto que tem importantes
trabalhos sobre a idéia da América Latina. É simples- 7
Ver os textos de Nina Pacari, La incidencia de la
mente uma referência acadêmica. Com Bolívar participación política de los pueblos indígenas: un
Echevarría, pelo contrário, me situo na calçada frontal. camino irreversible, e de Felix Patzi, Sistema comunal:
Parece-me que Salvatore considera que privilegio todo una propuesta alternativa al sistema liberal, presentes
autor que menciono ou cito. em: Cairo e Mignolo (2008). Patzi, por exemplo, pensan-
6
Atendendo a objeções semelhantes, já faz alguns anos, do tanto política como economicamente a partir da me-
escrevi um artigo no qual levanto tais argumentos mória e da experiência colonial do ayllu, retoma e põe
(Mignolo, 2002). E, mais recentemente, estendi e con- em questão as teses de Nikolas Luhman, que pensa a
centro o argumento, distinguindo entre política de iden- sociedade a partir da memória e a experiência da
tidades e identidade na política (2007b). modernidade ocidental.

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seção e gozando do bom clima de Amsterdã nes- ciências sociais, é, em verdade, uma monotopia
ses dias – qual era a diferença entre as teses de que se estendeu em volta do globo, seguindo a
Robert Blackburn e sua crítica à escravidão e as do expansão econômica e política do Ocidente.
cientista político e o Primeiro Ministro de Trinda- Esses pontos se relacionam com as obser-
de e Tobago, Eric Williams, que publicou em 1944 vações e objeções levantadas por Marcel Velázquez
seu livro clássico Capitalismo e Escravidão. Como Castro (2008) em sua resenha, publicada em Críti-
o título o indica, Williams, ademais de ser negro, ca y Emancipación. Essa resenha, como a de
era marxista. E essa era, em realidade, a questão Salvatore, é cuidadosa e rigorosa. Apresenta com
chave da minha pergunta. A resposta dada por clareza e honestidade os argumentos. Como
Kwame foi curta, porém contundente: “Blackburn, Salvatore, Velázquez Castro levanta também suas
como é branco, necessita do marxismo para criti- dúvidas sobre alguns de meus argumentos ou pre-
car a escravidão; Williams, em troca, não necessi- sunções. A principal, que merece atenção e clarifi-
ta”. Igualmente como Fanon, Williams “sabia” que cação, é a seguinte:
os legados da experiência escravista e o racismo
anti-negro, no mundo de hoje, vão muito além do Apesar dos evidentes sinais da vitalidade do pen-
samento descolonial na conjuntura atual, é difí-
marxismo. Não se trata, pois de um “privilégio cil aceitar a ruptura epistemológica celebrada
epistêmico”, mas do direito que têm os intelectu- por Mignolo. Essas novas formas de pensar estão
realmente fora do capitalismo global? Não
ais e ativistas negros de não continuar sendo tra- estamos convertendo determinados subalternos
duzidos e representados por honestos intelectu- e a sua perspectiva nos novos agentes privilegia-
dos do futuro e na única maneira de ler a realida-
ais brancos. de? Para se enfrentar com êxito as formas de do-
Assim, como dizia anteriormente, Pacari e minação do capitalismo global, é necessário
desvincular o marxismo do projeto descolonial?
Patzi Paco não representam os indígenas, mas fa- Qual seria o diálogo possível entre os movimen-
tos de emancipação que surgem no centro do
zem propostas baseadas na experiência de nações sistema-mundo e o projeto descolonial? Como em
sem estado, da mesma maneira que os crioulos e todos os livros de Mignolo, as perguntas se multi-
plicam porque sua aventura radical de pensar
mestiços fizeram suas propostas e construíram o sempre confunde e perturba seus leitores
estado moldado a seus interesses, e que eu tam- (Velásquez Castro, 2008, p. 163).
bém (filho de imigrantes italianos) tenho o direito
de me alinhar com as propostas de Pacari, Patzi Não se pode responder a esse pacote de
Paco ou Williams, e não com as de Blackburn ou perguntas, todas elas cruciais para o projeto

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Bourdieu. Essa é, simplesmente, uma das teses descolonial, em umas poucas páginas nem em uns
fundamentais presentes em La idea de América poucos dias. As perguntas são marcas de um pro-
Latina, no que concerne às relações entre identi- cesso e um debate em andamento, que nos levarão
dade e epistemologia e identidade e política. a transitar por várias décadas. O que segue nada
mais é que um passo a mais nesse processo, no
*** qual tento contribuir a elucidar o que está em jogo
nas perguntas e nos meus argumentos que as sus-
Os três pontos e observações levantados por citam. Vamos, pois, por partes.
Salvatore são bastante relevantes para continuar Reconhecida a vitalidade do pensamento
esclarecendo que o pensamento descolonial e o descolonial em geral – e não em minha versão par-
pensamento epistêmico e político crítico, no ticular –, esse reconhecimento acompanha as dú-
paradigma da modernidade, coexistem, mas cada vidas expressas nas perguntas. Primeira dúvida:
um tem seu norte, sua orientação, seus objetivos. essas novas formas de pensar estão realmente fora
Em vista disso, a geopolítica e a corpo-política do do capitalismo global? O pensamento descolonial,
conhecimento são fundamentais, e, por isso, a em sua fundação histórico-filosófica, não surge
monotopia da aparente diversidade epistêmica, nas fora, mas sim na exterioridade: ou seja, o pensa-

245
NOVAS REFLEXÕES SOBRE A “IDÉIA DA AMÉRICA LATINA”...

mento de alguém que foi classificado (a) fora estamos convertendo determinados subalternos e
(anthropos, bárbaros, primitivos, inferiores, homos- a sua perspectiva nos novos agentes privilegiados
sexuais, lésbicas), no processo epistêmico político do futuro e na única maneira de ler a realidade? A
de definir o que está dentro (humanidade, civili- pergunta é similar a quando se pergunta se o copo,
zação, desenvolvimento, heterossexual, branco ou com a metade de líquido, está meio cheio ou meio
branca, cristão ou cristã, europeu ou européia, ou vazio. Em primeiro lugar, hoje estamos vivendo
crioulo [a], mestiço[a] de descendência européia na perspectiva de agentes privilegiados do passa-
na América do Sul, Austrália, Nova Zelândia, Es- do e do presente. Em segundo lugar, a opção
tados Unidos, Canadá). Esse argumento já foi de- descolonial, e por isso é uma opção e paradigma
senvolvido extensamente em outros lugares e de- de co-existência, rejeita sempre uma única manei-
bates (2008a, 2008b). Por exemplo, nos casos de ra de ler a realidade, seja esta cristã, liberal ou
Guamán Poma de Ayala e Ottobah Cugoano, es- marxista.9 Esses pensamentos totalizantes, criado-
cravo liberto, ambos se declaram cristãos, e é a res de totalidade, estão em conflito com o pensa-
partir de sua assunção do cristianismo, articulado mento fronteiriço e a opção descolonial. Como
na experiência e na memória indígena e africana, expliquei no debate citado (Mignolo, 2008b),
respectivamente, que fazem críticas devastadoras Vélazquez Castro pensa, assumindo a objetivida-
à cristandade européia. Ao fazê-lo, ambos produ- de sem parênteses e a partir da perspectiva que
zem tratados políticos descoloniais que, por certo, coloca, e eu também penso com a mesma lógica
não foram reconhecidos como tal pelos especialis- que ele. Porém a opção descolonial, a opção de
tas em Maquiavel, Hobbes, Locke, etc. No pensa- coexistência, é um pensamento que assume a ob-
mento fronteiriço, como método, e na opção jetividade entre parênteses: creio no que creio e
descolonial, como horizonte, é assumido que não defendo o que creio, e entendo que frente à minha
há o “fora”, mas que o pensamento surge da postura há outra posição equivalente de alguém
exterioridade (a criação do fora pelo dentro), isto que defende suas crenças, mas sabe que a sua não
é, na fronteira. Mas uma fronteira na qual os dois é a “única maneira de ler a realidade”. Esse é o
lados não estão em igualdade de condições. Daí a espaço do diálogo pluri-versal. Frente a ele se en-
diferença epistêmica e ontológica colonial a partir contram os espaços uni-versais, os pensamentos
da qual reclamam seus direitos epistêmicos (e não que assumem a objetividade sem parênteses – que
seu privilégio) aqueles que foram deixados de fora há uma única maneira de ler a realidade e que te-
CADERNO CRH, Salvador, v. 21, n. 53, p. 239-252, Maio/Ago. 2008

do jogo e das decisões. Hoje, Evo Morales tornou mem quando alguém não a aceita, não está de acordo
visível uma continuidade histórica em que as na- ou a desafia. Aqui está a fratura epistemológica
ções indígenas mantiveram não sua “pureza e es- onde se gestarão os projetos epistêmicos, políticos
sência índia”, já que nunca houve índios até que o e éticos do século XXI. A pergunta parecia apontar
discurso dominante Europeu impusesse essa de- para o temor do pensamento hegemônico, moder-
nominação a aymaras, quechuas, chiquitanos, no e pós-moderno, que poderia perder seu privi-
tojolabales, zapotecos, iroquíes, etc... Mas sim o légio a partir do momento em que os subalternos
que foi mantido pelos povos indígenas é a diferen- começam a pensar por si mesmos, sem esperar a
ça, sua rejeição à assimilação e seu direito à dife- orientação do maestro.
rença. Justamente porque não está fora do capita- A terceira pergunta é a seguinte: Para en-
lismo global é que Evo Morales tem os problemas
que tem com os latifundiários de Santa Cruz.8 9
Aqui há outro nó por desamarrar. No Islã, certos atores
sociais assumem a objetividade sem parênteses, repro-
A sua segunda pergunta é a seguinte: não duzindo, em outras palavras, a lógica imperial do oci-
dente que enfrentam. Mas, por outro lado, há tendênci-
8
Para mais detalhes, ver Racism and Human Rights, 6 de as e atores sociais que traçam já um tipo de pensamento
junho de 2008, no blog: Disponível em: http:// fronteiriço e uma opção descolonial, ainda que não usem
waltermignolo.com/2008/06/06/racism-and-human- essas expressões. O lema é Olha o que fazem e não como
rights. o chamam. Não olhe o que dizem, mas o que fazem.

246
Walter D. Mignolo

frentar-se com êxito às formas de dominação do pela França, Inglaterra e Moscou (onde o Marxis-
capitalismo global é necessário desvincular o mar- mo chegou ao estado), pode sem dúvida apelar a
xismo do projeto descolonial? Remeto-me nova- Marx e a pensadores marxistas subseqüentes, para
mente à anedota e conversa com Kwame Nimako a “analisar” a formação do “capital” a partir da revo-
propósito de Eric William e Robert Blackburn. lução industrial, mas eles seriam de pouca utilida-
Minha resposta à pergunta é um contundente sim. de para analisar a formação da “matriz colonial do
Isso não nega o marxismo, mas o vê provinciano. poder”. Seria de menos utilidade ainda para anali-
“Enfrentar com êxito o capitalismo global” requer sar e entender outras formas de controle, como a
mais que outro projeto também global e universal, colonialidade do saber e do ser, o controle do co-
como o capitalismo, que já mostrou, em variadas nhecimento e a subjetividade, esfera na qual está
ocasiões, que o marxismo pode ser um espaço de incluído o domínio das “religiões”. Ou seja, na
dissidência, mas não pode competir dentro da medida em que o marxismo mantém, da mesma
mesma lógica apenas invertendo os conteúdos. forma que o “capitalismo global”, o horizonte uni-
Na medida em que a opção descolonial não pro- versal, e muda o conteúdo da opressão à emanci-
põe uma ideologia universal (como o liberalismo, pação, a opção descolonial se desprende de todo
o cristianismo ou o marxismo, todas elas forman- projeto totalitário, ainda que esse seja um projeto
do parte do globo do Show de Truman), enfrentá- totalitário de liberação (seja o marxismo, a filosofia
la com êxito significa e implica multiplicar e da liberação, ou o islamismo fundamentalista).
conectar projetos descoloniais globais. Simplifican- Em síntese, os argumentos sobre os limites
do: se distinguimos entre o Ocidente e o resto (“the do marxismo para enfrentar o “capitalismo global”
West and the rest”), deixando de lado todas as são conhecidos, ainda que freqüentemente esque-
zonas intermediárias, aquilo que o “resto” – o Ori- cidos. O líder ideológico da revolução iraniana,
ente Médio, a América do Sul e o Caribe, a Ásia Ali Shariati, publicou em 1974, em seu regresso
Central e o Cáucaso, a África do Norte e sub- da França ao Irã, sua célebre obra Del Marxismo y
Saariana, e mesmo a China e Japão, que não foram otras falacias occidentales. Os intelectuais indíge-
colonizadas como Índia, mas não escaparam das nas disseram também: é possível trabalhar juntos,
intervenções do Ocidente na primeira na Guerra como na presidência (Evo Morales) e na vice-pre-
do Ópio (1848) e na segunda a partir da restaura- sidência da Bolívia (Álvaro García Linera), mesmo
ção Meiji (1865) – tem em comum é ter sido toca- que a cosmologia indígena e a cosmologia marxis-

CADERNO CRH, Salvador, v. 21, n. 53, p. 239-252, Maio/Ago. 2008


do e supervisado, ferido ou empurrado pelo Oci- ta sustentada pelos blancoides, no dizer de Félix
dente. Cada um dos projetos de enfrentamento à Patzi Paco, compartilhem um horizonte de
matriz colonial de poder (uma de cujas esferas, a enfrentamento ao capitalismo global que, no en-
econômica, leva, no vocabulário marxista, o mote tanto, marcha por caminhos paralelos. Robert
de capitalismo) se desenvolveu em distintas lín- Blackburn necessita do marxismo para criticar o
guas, histórias, subjetividades, formas de organi- capitalismo, porém Eric Williams e, antes dele,
zação política e econômica prévias à infiltração da Fanon, não o necessita.
matriz colonial de poder (produção de mercadori- Já me estendi em demasia, de modo que
as e promoção do livre comércio, transmissão de atendo brevemente à quarta e última pergunta de
imagens televisivas, imposição de políticas esta- Velázquez Castro: Qual seria o diálogo possível
tais nas relações internacionais, controle de rela- entre os movimentos de emancipação que surgem
ções de gênero e sexualidade, imposição e contro- no centro do sistema-mundo e o projeto
le do conhecimento a partir das ciências sociais e descolonial? As diferenças que existem entre mo-
as humanidades à ciência e a tecnologia, etc.). O vimentos e pensamentos de emancipação que sur-
“resto”, que não compartilha com o Ocidente as gem do centro do sistema-mundo e o projeto
histórias derivadas da Grécia e Roma, passando descolonial se dariam na medida em que os pri-

247
NOVAS REFLEXÕES SOBRE A “IDÉIA DA AMÉRICA LATINA”...

meiros abandonem sua pretensão de se apresenta- ***


rem como movimentos emancipatórios para todo
o mundo (se ocupam de suas próprias coisas, por Dois longos diálogos – mais que meras en-
assim dizer), e na medida em que a periferia conti- trevistas – foram conduzidos por Mónica González
nue dependendo dos movimentos sociais e pen- García e por Antonio Lastra. González García é
sadores (de esquerda) para resolver os problemas chilena de origem e estudante na Universidad da
locais. De fato, devemos ter em conta que, na atu- California en Berkeley, diretora da revista Lucero,
alidade (sobretudo com as migrações massivas do muito conhecida entre estudantes e professores da
ex-Terceiro Mundo ao ex-Primeiro Mundo, ao co- área luso-hispânica nos Estados Unidos. Antonio
ração da União Européia e aos Estados Unidos), Lastra é filósofo espanhol, radicado em Valencia,
surgem as periferias, políticas e epistêmicas, ao que co-dirige (com Javier Alcoriza) uma magnífica
mesmo tempo em que se continuam mantendo os revista (em desenho e conteúdo): La Torre del
centros da periferia. Virrey: revista de Estudios Culturales.
Não seria tão difícil, depois de tudo que o Posto que aqui entramos no terreno do diá-
“resto” foi forçado a aprender do centro por 500 logo-entrevista, me referirei a meus interlocutores
anos de formação e transformação das formas de pelos seus nomes de batismo, Mónica e Antonio.
produção e exploração do trabalho, nas minas, nas Mónica editou um número especial da revista
plantações nas fábricas, nos colégios, nos Lucero (2007), magnífico tanto em desenho como
monastérios, nas universidades e em outros cen- em composição, intitulado Remapeando la idea de
tros de investigação. Fanon fez a sugestão: a opção América. A conversação durou umas seis sema-
descolonial toca tanto o colonizado como o colo- nas. Ela propôs fazer uma pergunta por vez, de
nizador, ou seja, a opção descolonial propõe o modo que a seguinte pergunta tomava em consi-
desprendimento da lógica da colonialidade, de um deração a resposta anterior. Às vezes se passavam
horizonte de vida onde se vive para trabalhar, em três ou quatro dias antes de chegar a nova pergun-
lugar de trabalhar para viver. ta ou que fosse feita a nova resposta. Por isso, as
Em última instância, o diálogo seria possível perguntas são mais que perguntas, são parte do
na medida em que os movimentos sociais, intelec- diálogo, e díficeis de resumir. Ademais, foi tam-
tuais e ativistas do centro estejam dispostos a dialo- bém um diálogo tenso em certos temas. Seleciono
gar com quem avança nos projetos descoloniais, os uma intervenção de Mónica na qual se destacam
CADERNO CRH, Salvador, v. 21, n. 53, p. 239-252, Maio/Ago. 2008

quais, em geral, surgiram da periferia global e na dois tópicos onde a tensão se revela. Ao reler a
periferia interior dos centros econômicos e industri- entrevista, encontro certas semelhanças com as
ais (os seis países centrais da União Européia e Es- tensões surgidas nas duas resenhas que comentei
tados Unidos). É interessante notar, por exemplo, anteriormente.
que, em minha experiência particular, o diálogo O momento do diálogo a que me refiro gira
começou com ativistas, artistas, filósofos e filósofas em torno da ferida colonial e ao fato de que ela
na Eslovênia e na Espanha.10 tem diferentes escalas: as conseqüências da
colonialidade, do ser e do saber, foram diferentes
10
Ver, por exemplo, a entrevista Marina Grzinic (2008), e
para as populações provenientes da África, em
também Sobre pensamiento fronterizo y representación: relação às populações provenientes da Europa e
diálogo con Walter Mignolo, Bilboquet, n.8, 2007. Dispo-
nível em: http://bilboquet.es/B8/PAG/waltermignolo.html. para as populações já existentes em Abya Yala, no
Também os encontros e publicações sobre pensamiento
descolonial organizado por Heriberto Cairo (cientista po- momento que chegaram europeus voluntários e
lítico), na Universidad Complutense de Madrid, e o africanos forçados. Eu ressaltava, no diálogo, que
primeiro volume, já mencionado que co-editamos. Isso
no que me corresponde pessoalmente. Outras várias ati- a ferida colonial afeta não somente a africanos e
vidades estão em andamento através de outros membros
do projeto modernidade-colonialidade, assim como ou- indígenas, mas também a população “branca”, em
tros projetos concorrentes, tais como o da Caribbean
Philosophical Association. critérios locais do sul. Em La idea de América La-

248
Walter D. Mignolo

tina, menciono o célebre ensaio de H. A. Murena, No segundo tema dessa mesma interven-
O pecado original da América (1954), para ilustrar ção, Mónica insiste na importância da guerra EUA-
as respostas brancas à ferida colonial. Em outras México e o tratado Guadalupe Hidalgo (1848) em
ocasiões, ocupei-me de Rodolfo Kusch, cujas sóli- relação à configuração histórica da latinidade. Sem
das reflexões mostram, a cada passo, a diferença dúvida, a própria idéia de latinidade, surgida na
colonial do saber e do ser. Mónica reagiu ante es- França, projetada e adaptada pelos “brancos” lo-
sas reflexões dizendo: cais, surgiu em grande parte por essa guerra e pela
expansão dos Estados Unidos em direção ao Sul.
I do not share that “white” Latin American pain Bilbao também reage ante a esse fato. A outra parte
that you describe because I am part of the huge
number of people in this continent that have not da idéia de latinidade responde aos conflitos im-
benefited from hegemonic discourses that periais no interior da Europa e no projeto francês
operate locally in every “Latin”American nation.
First during the dictatorship and then, during de liderar os países latinos, fato que permanece
the neo-liberal/democratic governments, in the
nineties, I struggled against being completely até hoje e de cuja história e legados Nicholás
oppressed and silenced by these hegemonic Sarkozy está se aproveitando: já não liderar o sul
discourses (González García, 2007, p.43).
da Europa, mas sim o Mediterrâneo.
Em primeiro lugar, quando o editor de
Como ocorre com freqüência, o efeito “totali-
Blackwell me propôs escrever esse manifesto, a
dade” se impõe. Mónica confirma o que eu estava
primeira coisa que me ocorreu foi ampliar o argu-
dizendo: ela se des-identifica das elites brancas do
mento, antecipado em dois trabalhos prévios so-
poder (durante a ditadura e o neoliberalismo dos
bre a definição da América Latina (Mignolo, 2000,
noventa). No entanto, não reconhece pertencer a
2004). Em segundo lugar, o pensamento
uma história, memória e sensibilidade de uma grande
descolonial pensa a história não cronologicamen-
parte do subcontinente de descendência européia
te, mas sim em nós de heterogeneidade histórico-
(nesse caso hispânica, González García). H. A.
estrutural, que Aníbal Quijano descreveu em vári-
Murena, Rodolfo Kusch, Enrique Dussel falam da
os de seus escritos. Nesse caso, 1848 é a âncora de
experiência da fratura da “consciência imigrante”,
uma triangulação que envolve a França (o famoso
com a qual me identifico como descendente de imi-
18 Brumário) e a liderança que assume no sul da
grantes italianos que chegaram à Argentina nos fi-
Europa, a partir da América Latina e Estados Uni-
nais do século XIX. Coma ferida colonial (white
dos (o tratado Guadalupe Hidalgo). Há uma sucesão

CADERNO CRH, Salvador, v. 21, n. 53, p. 239-252, Maio/Ago. 2008


Latin American pain), não estou falando de outra
de conflitos imperiais internos (França frente à In-
coisas que de Augusto Pinochet, Carlos Saúl Menem
glaterra e Alemanha), conflitos imperiais globais
o a Goñi Sánchez de Losada. Nem todos os indíge-
(França frente à expansão de Estados Unidos), e o
nas são revolucionários, nem todos os afro-
avanço na deformação do continente Sul-Ameri-
caribenhos são seguidores de Frantz Fanon, nem
cano que, junto à África e Ásia Central, vai fican-
todos os brancos sul-americanos são férreos defen-
do fora da história (apud Hegel); também o
sores dos regimes opressivos ligados ao “capital glo-
surgimento de uma configuração social não exis-
bal”. Enfim, haveria muito mais o que dizer sobre
tente até esse momento: a latinidade nos Estados
questões de racismo e gênero. Mas fica para outra
Unidos. O pensamento descolonial pensa a partir
ocasião. Os projetos políticos se situam em relação
das margens, e pensa as margens em relações im-
a como nos situamos na ordem de classificação so-
periais-coloniais de poder. A descolonização da
cial e como respondemos a eles (Quijano, 2000). O
história narrada e do pensamento historiográfico é
que é importante dizer é que, no século XXI, pensar
parte da tarefa do pensamento descolonial para
em termos universais abstratos não tem sentido. Por
avançar na opção descolonial.
isso, a opção descolonial se orienta em direção à
pluri-versalidade como projeto universal.
***

249
NOVAS REFLEXÕES SOBRE A “IDÉIA DA AMÉRICA LATINA”...

O diálogo com Antonio Lastra (2007-2008) to eurocentrado de acolher pessoas de cor que re-
é uma conversa em dois sentidos: entrecruzam-se produzem o pensamento eurocentrado, como Sen
pensamentos que partem de premissas, experiên- e Appiah. Em política, temos o exemplo equiva-
cias, subjetividades, histórias, linguagens (não lín- lente de Condoleezza Rice. Isso é tranquilizador,
guas, posto que nós dois falamos castelhano) dife- não se pretende puxar-lhes das orelhas nem tirar
rentes. A diferença é que, no pensamento o tapete do chão. Sen e Appiah adotaram e se iden-
descolonial, ativa-se a lógica que une o senhor ao tificaram com a identidade disciplinar (economia,
escravo: o escravo conhece a razão do senhor e a filosofia) e com o controle disciplinar do conheci-
razão do escravo, enquanto o senhor conhece so- mento, que – a partir desse poder identitário
mente a razão do senhor, posto que o escravo, se- epistêmico – marginalizou e continua marginali-
gundo ele, não tem “razão”. Nesse caso, e voltan- zando todos e todas que não se submetem às re-
do a uma das perguntas de Mónica, é possível gras do jogo.11 Em suma, eu sugeriria, em vez de
estabelecer um diálogo com ativistas de Bilboquet, Amartya Sen, Vandana Shiva e Ashis Nandy. E
mas é quase um “diálogo de surdos” entre quem em vez de Anthony Appiah, sugiro a Sylvia
pensa em (não sobre, mas “em” no sentido de estar Wynter e Lewis Gordon. Mas aposto que Antonio
envolvido) e aqueles que pensamos na opção desconhece, conhece pouco ou não levou a sério
descolonial. No entanto, o diálogo com Antonio foi todos aqueles que estão na genealogia de meu pen-
útil para que eu pudesse entender os temores, os samento. Por isso, o diálogo é quase de surdos,
preconceitos, as mágoas de um pensamento euro- como o diálogo entre o senhor e o escravo liberto.
peu que se fecha sobre si mesmo, como pensamen- Não comento a referência aos estudos su-
to, mas tenta abranger o mundo, como conteúdo. balternos porque isso não tem muito sentido neste
Vejamos um caso patente desse diálogo de surdos, diálogo, já que pensamento descolonial e estudos
e do amparar-se sob a capa salvacionista de “pensa- subalternos são laranjas de diferentes sítios. Po-
dores liberais de cor”, como Amartya Sen e Anthony rém, é importante sublinhar o seguinte: quando
Appiah. Ofereço somente uma amostra que se rela- falamos no projeto modernidade-colonialidade, de
ciona com temas debatidos. Diz Antonio: descolonizar o conhecimento, partimos do fato de
que a filosofia (ou qualquer outra disciplina tanto
Você nega que sua postura possa ser acusada de na instituição como nos princípios dos saberes
“essencialismo”. No entanto, não crê que em todo
ocidentais) pressupõe identidades fortes que não
CADERNO CRH, Salvador, v. 21, n. 53, p. 239-252, Maio/Ago. 2008

argumentação dos estudos subalternos há sempre


o risco de uma imitação fatal, neste caso, da se reconhecem como tal, mas sim que se apresen-
homogeneidade? Índios, afros, mulheres de cor,
gays e lésbicas, em quem você deposita a esperan- tam como universalidades abertas. Mas quem as
ça de uma iniciativa, são exemplos de identida- controla? Não são por acaso homens brancos, cris-
des fortes. Penso, pelo contrário, nas reflexões de
outros pensadores sobre regiões descolonizadas, tãos e europeus quem formaram o cânon filosófi-
como é o caso de Amartya Sen a propósito da co, “roubando-o” dos filósofos gregos aos pensa-
Ásia ou de Anthony Appiah, a propósito da Áfri-
ca, opostos à tentação de identidades e priorida- dores árabes que os exploraram antes que os euro-
des únicas. “O próprio” como você mesmo afirma
em La Idea de América Latina (Mignolo, 2007, peus? Não são os partidos políticos identidades
p.112-113, 134-135), pode ser entendido no sen- fortes, controlados por elites identitárias, e que se
tido dessa tentação (Lastra, 2007-2008, p. 77).
pretendem democráticos e abertos? Entramos aqui,
novamente, no terreno da identidade na política e
Se a conversa tivesse tido lugar em um bar, na epistemologia, um âmbito de debate e trabalho
cara a cara, lhe responderia: “¡Vamos hombre, haz para as próximas décadas.
tus deberes!” Mas, no âmbito acadêmico, há que
tratar as insolências (talvez inclusive inconscien- ***
tes) com respeito. A pergunta volta-se contra si 11
Ocupei-me detalhadamente desse problema, sobretudo
no que se refere a Amartya Sen, faz pouco tempo, em
mesma em seu ponto cego: a alegria do pensamen- Mignolo (2005b).

250
Walter D. Mignolo

Termino estas reflexões com uma anedota REFERÊNCIAS


que atravessa todas as minhas observações anteri-
ores. O livro The idea of Latin America (2005a) ALBÁN ACHINTE, A. Tiempos de zango y de guampín:
transformaciones gastronómicas, territorialidad y re-
recebeu, em 2006, o prêmio Frantz Fanon outorga- existencia socio-cultural en comunidades Afro-
descendientes de los valles interandinos del Patía (Sur de
do pela Associação Caribenha de Filosofia. A as- Colombia) y Chota (Norte del Ecuador), siglo XX. Tese
(Doctorado en Estudios Culturales) - Universidad Andina
sociação foi uma iniciativa do filósofo jamaicano Simón Bolívar, Quito-Ecuador, 2007.
Lewis Gordon, com a colaboração de Padget Henry, CAIRO, H.; MIGNOLO, W. (Ed). Las vertientes america-
Anthony Bogues, Cleavis Headley e Nelson nas del pensamiento y el proyecto des-colonial. Madrid:
Trama Editorial / Gecal, 2008.
Maldonado-Torres, os primeiro originários do CASTILLO, S. Review of the idea of Latin America. The
Caribe britânico e o último de Porto Rico. Mónica Modern Language Review, [S.l.],v.102, n.4, oct., p.1125-
1127, 2007.
o mencionou no começo de sua entrevista. Na edi-
CASTRO-GÓMEZ, S. La postcolonialidad explicada a los
ção castelhana, publicada por Gedisa em 2007, e niños. Bogotá: Ed. Universidad del Cauca; Universidad
Javeriana, 2005.
utilizada por Salvatore, Velázquez Castro e Lastra,
CUGOANO, O. Thoughts and sentiments on the Evil of
não se faz menção alguma ao fato. A Editorial Slavery. Londres: Penguin, 1999 [1786].
Gedisa omitiu a informação na capa do livro, ape- GRZINIC, M. Delinking epistemology from Capital and
Pluri-versality. A conversation between Marina Grzinic
sar de várias insistências de minha parte. and Walter Mignolo. Reartikulacija. Lubjama, Eslovenia,
Minha insistência não se deveu a propósi- n.4, 2008. Disponible en: www.reartikulacija.org/
dekolonizacija/dekolonialnost4_ENG.html. Acesado en:
tos de promoção pessoal, mas sim pela implicação 13 jun., 2008.
política do prêmio. Será que Gedisa omitiu a men- GONZÁLEZ GARCÍA, M. Review of the idea of Latin
America. LUCERO. A Journal of Iberian and Latin
ção de um prêmio Frantz Fanon num livro sobre a American Studies, Berkely-USA, v.17, 2007.
idéia de América Latina por esquecimento? Se, por KENT, R. B. Review of the idea of Latin America, by
Walter D. Mignolo. Geographical Review, New Hampshire,
outro lado, estivéssemos falando de um Prêmio v.97, n.1, enero p136-137, 2007.
José Martí (que não conheço a existência e que LASTRA, A. Walter Mignolo y la idea de América Latina.
presumo não houvesse ganho), a editorial Gedisa Un intercambio de opiniones. La Torre del Virrey: revista
de Estudios Culturales, Cordoba-Argentina, n.4, p.68-78,
haveria feito alguma menção? 2007-2008.

Em suma, talvez o resumo mais suscinto de MIGNOLO, W. La opción des-colonial: desprendimiento


y apertura. Un manifiesto y un caso. En: CAIRO, H.;
La idea de América Latina. La herida colonial y la MIGNOLO, W. (Ed.) Las vertientes americanas del
pensamiento y el proyecto des-colonial. Madrid: Trama
opción descolonial seja tanto o significado do prê- Editorial;Gecal, 2008a. p.175-209.
mio Frantz Fanon como seu silêncio por parte da _______. Revisando las reglas del juego: conversación con

CADERNO CRH, Salvador, v. 21, n. 53, p. 239-252, Maio/Ago. 2008


Pablo Iglesias Turrion, Jesús Espasandín López e Íñigo
editorial Gedisa. Antonio Lastra menciona, em sua Errejón Galván. En: CAIRO, H; MIGNOLO,W. (Ed.) Las
introdução ao diálogo, que o livro foi publicado vertientes americanas del pensamiento y el proyecto des-
colonial. Madrid: Trama Editorial; Gecal, 2008b, p.209-256.
pela Gedisa justamente na coleção “Biblioteca _______. Delinking: the rhetoric of modernity, the logic of
Iberoamericana”, que inclui livros que Lastra men- coloniality and the grammar of decoloniality. Cultural
Studies, Berkely, Universituy of California, v.21, n.2/3,
ciona, como Racismo y discurso en América Lati- p.449-514, 2007a. Disponíble en: www.informaworld.com/
smpp/content~content=a776418353~db=ai~order
na, editado por Teun A. van Dijk, e Repensar =page. [trad. al castellano por José Romero, Caracas, 2008.
América Latina, de Francisco Delich. En prensa.
______. The decolonial option and the meaning of identity
in politics. ANALES. Nueva Época, Gotemburgo, Institu-
to Iberoamericano, Universidad de Goteborg, n.9-10
(Tradução de Breno Marqués Bringel) (n.especial sobre Etnicidad en América Latina: Relatos de
Colonialismo, Resistencia y Agencia), 2007b, p.43-72.
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NOVAS REFLEXÕES SOBRE A “IDÉIA DA AMÉRICA LATINA”...

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NEW REFLECTIONS ON THE “IDEA OF LATIN NOUVELLES REFLEXIONS SUR “LA CONCEPTION DE
AMERICA”: the right, the left and the discolonizing L’AMERIQUE LATINE”: la droite, la gauche et l’option
option décoloniale

Walter D. Mignolo Walter D. Mignolo

This text has the specific character of debate Ce texte revêt un caractère spécifique de débat
retaken by the author caused by reviews and interviews repris par l’auteur en fonction de rapports et
about his book The Idea of Latin America, published in d’interviews réalisés à propos de son livre The Idea of
2005. It begins demonstrating how the various Latin America publié en 2005. Il commence en
CADERNO CRH, Salvador, v. 21, n. 53, p. 239-252, Maio/Ago. 2008

narratives of the history of colonization are plural, but démontrant comment les narratives diversifiées de
as they spread they become unified in global narratives l’histoire de la colonisation sont plurielles mais,
of an universal character, as an effect of totality proces- lorsqu’elles sont diffusées, elles finissent par s’unifier
ses. For the author that diversity of silent but alive en narratives globales à caractère universel, comme
historical forces, are today exposed, without a conséquence d’un processus de totalité. Pour l’auteur,
perspective of return to the past. In this sense he speaks cette diversité de forces historiques silencieuses mais
about the modernity/coloniality project of decolonizing vivantes, apparaissent aujourd’hui sans perspective de
knowledge, answering and deepening several retour en arrière. Dans ce sens-là, il parle du projet
paradoxical aspects forwarded by the debate of his modernité/colonialité pour décoloniser la
book, as the dialogue among thoughts of emancipation connaissance. Ceci permet de répondre et
and movements that appear in the center of the world d’approfondir divers aspects paradoxaux soulevés par
system. With this he doesn’t intend to close the debate, le débat de son livre comme le dialogue entre les
but, on the contrary, strives to update it and to move mouvements et les pensées d’émancipation qui
forward in those issues of non-homogeneous surgissent au cœur du système-monde. Il n’est pas
populations and difference from a perspective of future question de conclure le débat, bien au contraire, on
and from a perspective of a pluri-versalist knowledge cherche à actualiser et à avancer dans ces questions de
and practices. la différence et des populations qui ne sont pas
homogènes dans une perspective d’avenir et d’une
connaissance et des pratiques pluri-versalistes.
KEYWORDS: modernity, emancipation, difference, MOTS -CLÉS: modernité, émancipation, différence,
decolonization of thought, Latin America. décolonisation de la pensée, Amérique Latine.

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