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Processo nº

Data: 26/04/2022 Pelas: 10:33

TRANSCRIÇÃO DAS DECLARAÇÕES PRESTADAS PELA TESTEMUNHA


ANTÓNIO JOAQUIM PESSANHA DE FIGUEIREDO CARVALHO E MELO
GRAVADAS EM SUPORTE DIGITAL

Juiz – Qual é o seu estado civil?

António Carvalho e Melo – Casado.

Juiz – Profissão?

António Carvalho e Melo – Sou empresário agrícola e médico.

Juiz – Onde reside?

António Carvalho e Melo – Resido habitualmente na freguesia de Vilarinho de São


Romão, Sabrosa.

Juiz – O senhor vai prestar declarações de parte. Sendo o autor aqui nesta ação, jura por
sua honra que vai dizer a verdade e só a verdade.

António Carvalho e Melo – Sim.

Juiz – Faz favor de se sentar, e vai responder ao senhor doutor.

Mandatário – Portanto, salvo erro, a 4, 5,6, 7... 4... então... está ligado? Está.

Juiz – Sim, sim, Senhor Doutor.

Mandatário – Portanto, estamos aqui... senhor doutor, estamos aqui a tratar de uns
prédios denominados Mouras, não é?

António Carvalho e Melo – Sim, Mouras.

Mandatário – Mouras. Portanto, daqui para a frente, quando falar em Mouras, é os dois
prédios. É os dois prédios. Pronto, primeiro: esses prédios, sabe quais são?

António Carvalho e Melo – Sim, perfeitamente.

Mandatário – Perfeitamente. Pronto. Esses prédios eram propriedade de quem?

António Carvalho e Melo – Esses prédios, na altura em que eu fiz o contrato com o tio
António Manuel, eram propriedade deles, e foi resultante de uma doação da avó.

Mandatário – Perdão. Vamos identificar. Propriedade dele, quem era? Quem é o “ele”?
Como é que se chamava?

António Carvalho e Melo – António Manuel Martins Moreira, era o meu tio.
Mandatário – Que era seu tio, portanto. Tio por parte de quem?

António Carvalho e Melo – É o irmão a seguir à minha mãe.

Mandatário – A seguir à sua mãe, pronto.

António Carvalho e Melo – Irmão da minha mãe.

Mandatário – Estas Mouras, que eram do tio António, estes dois terrenos Moura, que
eram do tio António, vinham da avó? Como é? Foi uma doação?

António Carvalho e Melo – Foi resultado de duas doações da minha avó - mãe da
minha mãe - Maria Leonor, do António Manuel, tio António Manuel, e do tio João. Foi
dividido em partes iguais, vários números que correspondiam a uma coisa que nós
designávamos Quinta da Moura ou Amieiro.

Mandatário – Pronto. Ou seja, a Quinta da Moura era da avó, distribuiu pelos três
filhos, entre eles, sua mãe, Maria Leonor...

António Carvalho e Melo – E o António Manuel e o tio João Henriques.

Mandatário – E o tio João. Sim, senhor. Estas que estamos aqui a falar eram, então, as
Mouras que calharam ao tio António, não é?

António Carvalho e Melo – Exatamente.

Mandatário – Nessa divisão. Ora bem, recuando a 1991, que é quando começa o que
aqui se está a relatar, essas propriedades que calharam ao tio António, portanto, as duas
Mouras que calharam ao tio António, como é que se encontravam?

António Carvalho e Melo – Aquilo era monte, um olival abandonado, que estava
transformado num terreno improdutivo, com os restos do olival muito velho e antigo.

Mandatário – Não tinha vinha.

António Carvalho e Melo – Não tinha vinha nenhuma.

Mandatário – Não tinha vinha nenhuma. Pronto. Estavam montes, disse aqui: oliveiras
dispersas, improdutivas e matas.

António Carvalho e Melo – Sim. Aquilo tinha sido, enfim, talvez há 150 anos tinha
sido eventualmente vinha, em algumas partes, que foi (?03:37) e, quando o meu bisavô
herdou a casa em 1892, começou a recuperar algumas coisas. E lembro-me da minha
avó e madrinha dizer que se lembra do pai dela estar a plantar, a mandar plantar com
oliveiras. Isto seria no princípio do século XX. 1900... a minha avó nasceu em 1894,
seria provavelmente em 1905 ou 10.

Mandatário – Pronto.

António Carvalho e Melo – Não posso precisar.


Mandatário – Portanto, mas recuando, para nos centrarmos aqui, recuando a 1991,
tinha... estava de mato.

António Carvalho e Melo – Estava de mato.

Mandatário – Sim, senhor. As Mouras, quer dizer, as duas Mouras, não é?

António Carvalho e Melo – Todo aquele... as duas Mouras e outros terrenos que
ficaram para a minha mãe, aliás, e para o tio João.

Mandatário – Também estavam?

António Carvalho e Melo – Todo aquele conjunto resultante das duas doações estava
mais ou menos nas mesmas condições. Umas tinham um bocadinho mais de oliveiras
velhas, outras menos.

Mandatário – Sim, senhor.

António Carvalho e Melo – E conheço isso profundamente desde criança. Por lá ir


desde tenra idade.

Mandatário – Sim. Tinham casa ali.

António Carvalho e Melo – Casa em Donelo. Aliás, nessa altura, eu vivia na casa da
minha avó, em Donelo, de 1990 em diante. Muito antes disso, em pequenos, quando
estávamos em férias, nós, os primos, todos eles, conhecíamos aquilo profundamente.

Mandatário – Sim, senhor. Portanto, estamos a recuar a 1991. Olhe, e então, pergunta-
se aqui se, em 1991, o senhor doutor quis comprar estes terrenos, as Mouras, ao tio
António, e então diga-nos porque é que quis, em que condições, e o que é que fez.

António Carvalho e Melo – Portanto, a explicação é clara. Tinha havido uma tentativa
em nome da minha avó, antes da doação, de se fazer uma candidatura ao PDRI, para se
conseguir licenças novas de plantio de vinha que, naquela altura...

Mandatário – Tem que falar só um pouco mais devagar.

António Carvalho e Melo – Portanto, a doação da minha avó aos três filhos deveu-se
ao insucesso de uma candidatura conjunta da avó ao PDRI. O PDRI foi um programa de
desenvolvimento rural integrado, que permitia o apoio do Banco Mundial com
financiamento bastante favorável. O insucesso deveu-se à impossibilidade de apresentar
os documentos legais, e então, a avó, conjuntamente com a minha mãe, o tio António
Manuel e o Tio João, resolveram pedir que lhes passasse e se subdividisse aquilo em
três parcelas. Nessa altura, foi feito um levantamento topográfico que revelou cerca de
15 hectares de área livre, porque foi feito o levantamento conjunto por simplificado, que
incluiu a estrada, incluiu um terreno que mais tarde até vim a comprar, incluiu o laranjal
e, portanto, depois, grosso modo, havia cerca de 150 000 metros quadrados que foram
divididos pelos três filhos. Ao tio António Manuel coube a subunidade acima da
estrada, que tem cerca de 20 000 metros, tem talvez um pouco mais, estava até, antes,
no momento das doações estava com cerca de 16500 metros, depois foi corrigida a área,
e tem cerca de 21900 metros, 22 000, no máximo. Para o tio António Manuel perfazer a
área dos 5 hectares ficou com 28 000 metros quadrados, como se vê, aliás, na certidão
da conservatória no momento da compra por mim ao tio António Manuel. Por mim e
pelo meu irmão Alberto. Para a minha mãe, ficou uma área imediatamente...

Mandatário – Mas ó... ó senhor doutor, tudo bem. Ficou, portanto, foi também uma
área igual para a mãe...

António Carvalho e Melo – Uma para a minha mãe...

Mandatário – E outra para o tio João.

António Carvalho e Melo – Para o tio João.

Mandatário – Pronto. Mas, concentrando-nos agora na parte do tio António. Pronto, o


tio António ficou, então, com este terreno.

António Carvalho e Melo – Ficou com este terreno.

Mandatário – Pois. E porquê, estava o senhor doutor a explicar, porquê então em 1991,
diz-se aqui em dezembro de 1991, o senhor doutor e o seu irmão Alberto – é o que está
aqui dito, mas o senhor confirmará e explicará – quiseram comprar este terreno ao tio
António porquê?

António Carvalho e Melo – Eu estava a fazer o enquadramento histórico. Eu estava


profundamente empenhado, fui a pessoa da família que sempre mais conheci esta
problemática agrícola, e ajudei o próprio tio António Manuel nesta fase, digamos, em
que ficámos todos tristes por não se terem conseguido as licenças novas. E vi uma
oportunidade de propor ao tio António Manuel anexar o terreno dele ao da minha mãe.
Era um investimento...

Mandatário – São pegados.

António Carvalho e Melo – São pegados. É um investimento que eu fiz, digamos, de


olhos fechados. E, quando o propus ao tio António Manuel, aquilo teve um processo em
que ele demorou algum tempo, não posso precisar exatamente quanto, mas foram umas
semanas largas, talvez até alguns meses, até me dizer que me vendia, quando me
telefonou para casa a dizer: “António, afinal vendo-te o terreno. Vem cá tratar disso.”.
Entretanto percebi, um pouco mais tarde, que o tio António Manuel, naturalmente, falou
com o irmão, o tio João, para saber se ele estava interessado no terreno. Porque, entre
um sobrinho, entre sobrinhos, e o irmão, eu achei natural. Mas a verdade é que o tio
João nada fez, e eu, no dia seguinte a ter este telefonema do tio António Manuel, onde ia
com muita frequência, não é? Aliás, como médico, também ele me ajudou em algumas
coisas da parte da oftalmologia.

Mandatário – Ele era médico.

António Carvalho e Melo – Era médico, era médico. E com quem eu me dava com
muita frequência, não é? E, sobretudo, nesta altura em que insisti, porque vi uma
oportunidade importante e relativamente acessível. A certa altura até achei que o tio
António Manuel demorava a responder, enfim, e pareceu-me que o negócio não se
concretizaria. Fiquei muito contente quando ele me disse isso, fui com o meu irmão, no
dia seguinte, já com um contrato feito...

Mandatário – Ó senhor doutor, só fazer aqui um parêntesis. Mas, nessa altura, em que
estava em negociações com o tio António Manuel, o senhor doutor granjeava o terreno
anexo da senhora sua mãe, da Maria Leonor?

António Carvalho e Melo – Sim. Sim, já tinha projetos para fazer um investimento e
mais ainda, e tenho um contrato com conhecimento dos meus irmãos, um contrato de
comodato desde essa data.

Mandatário – Pronto. Era só um parêntesis. Portanto, também estava a granjear o


vizinho.

António Carvalho e Melo – Pois. Eu vivia em casa da minha avó em Donelo, nessa
altura ela ainda era viva e estava em casa dos meus pais, muito doente e, portanto, eu fui
contactado por muitas pessoas, nomeadamente pela tia Maria Eduarda, quando a tia
Maria Emília - a mãe - morreu de uma maneira abrupta e inesperada à porta de casa.

Mandatário – Pronto. E então, voltando aos seus contactos com o tio António. Então,
como é? O tio António decidiu vender-lhe? Como é que foi?

António Carvalho e Melo – O tio António Manuel, como eu digo, depois de uma fase
que eu diria negocial, telefonou-me para casa dos meus pais e disse: “António, afinal
resolvi: vou-te vender o terreno”. E como eu disse, fiquei muito contente, preparei um
contrato redigido por mim com apoio daqueles livrinhos que se compram para pessoas
que não são da área jurídica, e combinei com o meu irmão Alberto - para dividir o risco
- sermos nós os dois a comprar o terreno.

Mandatário – Sim, senhor.

António Carvalho e Melo – Fui lá a casa, assinei o contrato, o tio António Manuel
assinou o contrato, o meu irmão Alberto assinou o contrato, entreguei o cheque... e
pronto, e vim contente para casa.

Mandatário – E de quanto é que era o cheque?

António Carvalho e Melo – O cheque foi de 1250 contos.

Mandatário – 1250 contos. Pelas duas Mouras, não é?

António Carvalho e Melo – As duas Mouras. O terreno acima da estrada e o terreno


abaixo da estrada, que é uma parcela, que perfazia o tal terço da área doada pela avó
Leonor aos seus três filhos.

Mandatário – Pronto. Olhe, portanto, inicialmente, esse contrato era também com o
seu irmão Alberto, não é?

António Carvalho e Melo – Sim.


Mandatário – O seu irmão Alberto... pagaram 1250 como? Por...

António Carvalho e Melo – Por cheque.

Mandatário – Por cheque.

António Carvalho e Melo – Um cheque entregue ao tio António Manuel no dia em que
assinámos o contrato.

Mandatário – Senhora Doutora Juiz, só para confirmar, para podermos exibir o


contrato de promessa de compra e venda que está junto à petição inicial, só exibir, só
para ver se o contrato é esse que está aí.

António Carvalho e Melo – Exatamente, é este contrato mesmo.

Mandatário – Pronto. E esse contrato...

António Carvalho e Melo – Esta é uma cópia do contrato.

Mandatário – Sim. Depois foi junto ao original. Foi junto ao original depois. Mas este
contrato, com esta redação, o senhor doutor disse aí que foi o senhor que fez a partir de
uma minuta que encontrou, portanto, já o levou assim ao tio António Manuel?

António Carvalho e Melo – Sim, sim. Já foi levado feito, porque eu queria que ficasse
esclarecido perante os meus primos, até, e mais ainda, perante os meus irmãos, que
tinham o terreno da mãe, não é? A nossa mãe tinha total confiança em nós e, portanto,
para ficar claro que tinha feito o negócio e que estava bem esclarecido e, portanto,
fiquei com consciência plenamente tranquila de que tinha concluído com sucesso um
negócio que já vinha de há algum tempo atrás.

Mandatário – Sim, senhor. Pronto. Olhe, portanto, isso foi assinado aonde?

António Carvalho e Melo – Em casa do tio António Manuel.

Mandatário – Foi em casa do tio António Manuel. Sim, senhor. Portanto, quem é que
foram as pessoas que estiveram presentes?

António Carvalho e Melo – Estava presente o tio António Manuel, o meu irmão
Alberto, eu, e a tia Marília andava pela casa, não deu grande importância a isso. A tia
Marília era...

Mandatário – Mulher...

António Carvalho e Melo – A mulher. A minha tia, casada com o tio António Manuel.

Mandatário – Com o tio António Manuel. Sim, senhor. Portanto, fizeram o contrato de
promessa número 7... pronto, já vimos o contrato de promessa. Olhe, portanto, foram
logo pagos 1250 contos, também já disse... agora...

António Carvalho e Melo – Senhor Doutor, não sei se posso acrescentar...


Mandatário – Sim.

António Carvalho e Melo – Eu sei - e toda a família sabe - que os meus primos
ficaram um bocadinho chateados com o pai porque: “Então foi vender ao António
isto?”, pronto, achavam que, provavelmente, podia ter vendido melhor, ou que não
precisava de vender. E até houve depois umas certas animosidades, de todos eles, dos
três filhos - da Inês, do Fernando e da Clara - e que foram transmitidas à família, isso foi
claro durante algum tempo, não sei quanto tempo, “pois, o António tem jeito para os
negócios”, não sei quê... a verdade é que eu agi sempre com uma lisura total e até, em
certo momento, admiti que o tio António Manuel não quisesse vender. Não me parecia
que houvesse outra solução. Pronto, fiquei muito contente, apesar de, um bocado como
sou eu, um pouco, digamos, com o espírito investidor, enfim, saber que posso criar
algumas inimizades, ou até algumas invejas.

Mandatário – Olhe, mas depois, vamos lá ver... pronto, temos aqui o contrato de
promessa, já vimos, a promessa é de venda ao senhor doutor e ao seu irmão Alberto,
mas, depois, o Alberto desistiu da compra? Como é que foi?

António Carvalho e Melo – O Alberto desistiu da compra...

Mandatário – Primeiro, deixe-me perguntar aqui: nos 1250 contos, 1.250.000 escudos,
que o senhor diz que pagou na altura, o Alberto também entrou?

António Carvalho e Melo – O Alberto interveio com exatamente metade. Eu vi, até
tenho aqui, vi e confirmei nos meus canhotos, que ele, no dia 20 - portanto, no dia
seguinte a assinarmos o contrato, e a ter entregue o valor ao tio António Manuel -, ele
depositou-me, confirmei isso, 625 contos em dinheiro na minha conta.

Mandatário – Na sua conta.

António Carvalho e Melo – Por acaso, essa conta estava em nome da minha mãe e no
meu. Mas eu e o meu irmão Alberto tínhamos alguns negócios e emprestávamos
dinheiro um ao outro de vez em quando. Não era com muita frequência, mas aconteceu.

Mandatário – Pronto.

António Carvalho e Melo – Portanto, para nós, foi claro: não podíamos perder aquele
terreno, porque passávamos a ter 10 hectares de terreno para mais tarde se aproveitar da
maneira melhor.

Mandatário – Sim.

António Carvalho e Melo – Como veio a acontecer, aliás.

Juiz – O senhor tem que esperar que o Senhor Doutor faça as perguntas.

António Carvalho e Melo – Peço desculpa.

Juiz – Se não, não avançamos mais. Senhor Doutor, faz favor.


Mandatário – Olhe, António, entretanto, na verdade, depois, embora o Alberto tivesse
entrado inicialmente, depois, digamos, ele desistiu? Saiu? Como é que foi?

António Carvalho e Melo – Desistiu. O Alberto pediu-me para sair, devolveu-me o


dinheiro... A justificação foi que, pronto, fez-lhe jeito ter o dinheiro de volta. Entretanto,
depois disso, as coisas foram muito sequenciais. Depois disso há, digamos, a parte, que
é aquilo que nos traz aqui, de certa maneira...

Mandatário – Certo. Já lá vamos. Já lá vamos.

António Carvalho e Melo – Mas o Alberto pediu-me para sair. Há razões que eu
percebi, outras posso deduzir, mas não...

Mandatário – Pronto. Interessou-lhe sair.

António Carvalho e Melo – Interessou-lhe sair, e eu devolvi-lhe o dinheiro. Ele não


pode deixar de confirmar isso.

Mandatário – Sim, senhor.

António Carvalho e Melo – Porque é verdade.

Mandatário – Portanto, olhe: a sua intenção quanto às áreas, já disse aqui, mas disse
que um tinha cerca de 22 000 metros, não foi?

António Carvalho e Melo – Um tinha 21 000 metros e tal, e o outro tinha 28 000,
como se pode ver na certidão da conservatória...

Mandatário – 28 ou 58?

António Carvalho e Melo – 28. Isso depois tem uma explicação própria.

Mandatário – Pronto, então... sim senhor. As áreas são as que estão na matriz e na
conservatória, não é?

António Carvalho e Melo – O terreno que eu comprei ao tio António Manuel é o


terreno que ele podia vender.

Mandatário – Sim, sim. Claro.

António Carvalho e Melo – Portanto, que se limita a cerca de 50 000 metros.

Mandatário – 50 000 metros. Olhe, e isto, depois, a sua intenção era lá - já nos disse
aqui - plantar vinha, não é? Vinha nova. Agora, o problema é: estes terrenos tinham
licença de plantio de vinha? Ou não tinham?

António Carvalho e Melo – Não, estes terrenos não tinham qualquer licença de plantio
de vinha.
Mandatário – Não tinham. Não tinham porquê?
António Carvalho e Melo – Não tinham porque, para plantar vinha, era preciso, na
altura, ter uma vinha existente, seja na própria propriedade, ou fosse nas propriedades
em seu nome noutro lado.

Mandatário – Mas, ó senhor doutor, nós, que não somos entendidos, ou que não somos
muito entendidos em vinhas, pelo menos, o que eu sei – e já é alguma coisa -, da minha
atividade profissional, o problema que se pode pôr, e o senhor doutor vai explicar, é:
pronto, não tinham, mas iam aí ao organismo competente, e pediam uma licença.

António Carvalho e Melo – Isso não era possível. A atribuição de novas licenças de
vinhas está condicionada na Europa há talvez 60 anos. Com a exceção do tal PDRI, que
permitiu plantar no Douro 3000 hectares de vinhas novas.

Mandatário – Pois, que foi o tal projeto em que não conseguiram entrar.

António Carvalho e Melo – Que se perdeu, exatamente.

Mandatário – Pronto. Portanto, ou seja: não tinha licença de plantio, então, se queria lá
plantar vinhas e não tinha licenças de plantio para plantar vinhas, então, como é que a
conseguiu lá plantar? Porque, de facto, plantou lá uma vinha.

António Carvalho e Melo – Ora bem, eu, como digo - e julgo que é importante - nessa
altura, estava profundamente envolvido em investimentos e em estudos sobre a
agricultura. Tinha acabado o meu curso de medicina há relativamente pouco tempo,
tinha tirado um curso de jovem agricultor, e tinha, sempre tive, uma particular apetência
para estar na economia agrária. Desde miúdo que estudava coisas de contabilidade
agrícola. Ora bem, e eu já tinha, a pedido da tia Maria Eduarda, por um lado, e outras
pessoas de família...recomecei 10h39

Mandatário – Ó senhor doutor, vamos fazer aqui um ponto de situação. Tia Maria
Eduarda é a Senhora Dona Maria Eduarda Martim Marinho Moreira Pereira da Silva
Pessanha Canto Moniz.

António Carvalho e Melo – É, quando me refiro à minha tia Maria Eduarda, é prima
direita da minha mãe - ou era, porque a minha mãe já não é viva desde dia 6 de
dezembro -, era prima direita e eu, toda a vida...

Mandatário – Pronto. Ou seja...

António Carvalho e Melo – Portanto, é por tia Maria Eduarda.

Mandatário – Familiarmente conhecida como tia Eduarda. Pronto. Quando o senhor


disser “tia Eduarda”, significa a Senhora Dona Maria Eduarda Canto Moniz, não é?

António Carvalho e Melo – Exatamente.

Mandatário – Pronto. Então, diga-nos lá.


António Carvalho e Melo – Portanto, a tia Maria Eduarda tinha-me pedido, algum
tempo antes, enfim, talvez um ano e meio, ou dois anos, até, na sequência da morte da
tia Maria Emília, a mãe dela, que vivia no Porto e que durante toda a vida administrou o
que havia para administrar em Paradela, concretamente os terrenos de Paradela, a casa e
uma quinta anexa, Quinta de São Cosme. Morreu à porta de casa num acidente trágico
e...

Mandatário – A mãe...

António Carvalho e Melo – A mãe da tia Maria Eduarda. E a tia Maria Eduarda viveu
toda a vida em Lisboa. Toda a vida, desde que se casou, pelo menos. E, portanto, veio
ter comigo, sabia que eu estava no Douro, com interesse... tivemos várias reuniões, até
na altura em que eu estava a dirigir o programa LÍDER. Em Paradela, houve uma vez
que veio o Ministro da Agricultura, e a tia Maria Eduarda quis estar comigo, e fomos a
Casal de Loivos com o Arlindo Cunha, estivemos com o Valente de Oliveira numa
reunião aqui em Vila Real... portanto, havia um grande entrosamento. E, portanto, um
pouco antes, a tia Maria Eduarda pediu-me apoio, porque não sentia vocação para tratar
das vinhas. E assim foi. Portanto, eu julgo que em 1990, ou fins de 1989, por aí, que se
faz uma parceria com umas vinhas velhas que havia em Paradela, vinhas velhas essas
para as quais eu até apresentei contas ao tio Luís, e era uma parceria que tinha, posso
explicar exatamente como foram as contas e qual o valor, e tenho até aqui a
documentação. Mas, para haver interesse, nomeadamente fiscal, foi passado um
contrato dito de arrendamento para as vinhas de Paradela de Guiães. Portanto, foi isso
que me deu acesso a ter exploração das vinhas de Paradela durante um período
relativamente curto, até se arrancarem. Ora bem, mas isto, para explicar o seguinte:
portanto, eu tinha conhecimento de que havia uma cultura que era muito pouco rentável,
eu não sei se sabem, se o Tribunal sabe como é que era distribuído o benefício nas zonas
de letra F, portanto, as vinhas tinham benefício, mas eram de letra F, portanto, é uma
classificação com um quantitativo muito baixo e, em certos anos, nem tinha direito a
benefício, como, por exemplo, agora, também não tem. E, portanto, eu propus à tia
Maria Eduarda, logo a seguir vi a possibilidade de apresentar um projeto para
aproveitamento das licenças. E tudo se resume a isso. Tudo se resume a isso. Eu já tinha
comprado o terreno ao tio António Manuel, portanto, tinha a terra, tinha capacidade de
fazer um projeto, fosse ele qual fosse, tinha até o estatuto de jovem agricultor, mas não
tinha licenças de plantio. E estas licenças que estavam aplicadas, da tia Maria Eduarda,
nos terrenos de Paradela, que eram dela, eu propus que pudéssemos fazer um acordo
para que essas licenças viessem a ser aproveitadas com muito maior mais valia.

Mandatário – Mas a serem aproveitadas por si.

António Carvalho e Melo – Por mim. Exatamente. Percebi perfeitamente que a tia
Maria Eduarda não ia nem viver para Paradela, nem ter muita preocupação com algo
que era francamente pouco rentável.

Mandatário – Pronto. E então, e depois, como é que...

António Carvalho e Melo – Não, eu depois...

Mandatário – Como é que concretizaram isso?


António Carvalho e Melo – Ora bem, isto foi logo a seguir, porque eu procuro ser
rápido naquilo que é preciso e, na altura, havia uma grande febre de apresentar os
projetos. Tive que falar com a tia Maria Eduarda e propus-lhe exatamente isso, com que
ela concordou de imediato. Entretanto, havia o problema que era de ter de explicar ao
tio António Manuel - que foi o que aconteceu -: “Tio António Manuel, olhe, eu tenho
um acordo com a tia Maria Eduarda, importa-se que ela vá à escritura em vez de mim?”,
pronto, e sei o que é que ele me disse, concordando.

Mandatário – O que é que ele disse?

António Carvalho e Melo – O tio disse: “Eu já recebi o dinheiro, não tenho problema
nenhum com quem vá ou quem não vá. Aliás, ele dava-se muito bem com ela, não é?
Eram primos íntimos e bem conhecidos.

Mandatário – Primos direitos.

António Carvalho e Melo – Primos direitos, exatamente.

Mandatário – Mas vamos lá ver, então, isto é, para concretizar melhor: a tia Eduarda é
que vai comprar... isto é uma pergunta, embora dedutível do que o senhor está a dizer,
mas é melhor esclarecer bem. Portanto, a tia Eduarda é que foi comprar os terrenos que
estão naquele contrato de promessa de compra e venda.

António Carvalho e Melo – A tia Maria Eduarda não comprou os terrenos.

Mandatário – Não. Sim, vá, diga lá.

António Carvalho e Melo – Não, o que eu queria dizer é o seguinte: o acordo que foi
feito com a tia Maria Eduarda era, aliás, a única forma possível de ter posto este projeto
em pé. Portanto, permitam-me que eu torne a responder: eu tinha terra, mas não tinha
licenças, e tinha capacidade de apresentar um projeto futuro mais próximo, fosse de
vinha ou fosse do que fosse. Mas não tinha licenças. Aqui o que interessa no Douro, o
que valoriza, são as vinhas. E, portanto, eu sabia, e isso foi percetível pela tia Maria
Eduarda, que tinha até um grande amigo comum, o Engenheiro Celso Madeira, por
exemplo. Eu sabia que as vinhas na Moura, no terreno que eu tinha comprado ao tio
António Manuel, que passariam para letra A. Portanto, digamos, era um investimento
muito importante de se fazer. E a tia Maria Eduarda, por outro lado, queria, e foi o que
ela me disse, lembro-me perfeitamente, é aliás um dos acordos, não sei se ela foi
ouvida, se pode ser ouvida, mas um dos acordos era: “Ó António, o que eu quero é ficar
lá com um bocadinho de vinha de vinho do Porto”. E porquê? Porque não tinha ficado
com a Quinta de São Cosme, que é uma propriedade muito valorizada, e que era da
família, e que não era dela...

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