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Martim Ghira Campos

HC II

IGM - Sarajevo 1914

Havia um grande otimismo tecnológico nas classes medias altas das cidades europeias,
mas o lado solar não consegue apagar problemas, tensões, ansiedades e crises que
marcam o século XX desde o seu início.

Não existe nenhum consenso sobre a causa do início da guerra

A IGM não é um caso onde se consiga repartir culpas e encontrar culpados, é mais
complexa, mais trincada. É mais Seculo XIX do que século XX

Três palavras decisivas para explicar o início da IGM:

• Alianças → designa o sistema de alianças de natureza defensiva entre as várias


potências europeias que firmavam pactos de paz e de proteção mútua.
Significa Medo

• Marrocos → Sublinha o imperialismo. A palavra imperialismo está marcada por


submissão e domínio. Marrocos é um paradigma das forças imperialistas,
funcionando como palco de lutas, principalmente entre Alemanha e França.
Significa vontade de colonização

• Balcãs → local perpetuamente dilacerado. Significa Nacionalismo, vontade de


afirmação etnonacionalista

As potências vivem um clima de medo, de tensão, de receio. Por baixo do lençol de


estabilidade, existiam medos e tensões

O século XX começa com medo, com um sistema de alianças defensivas que não eram
do conhecimento de terceiros

1871 → ano traumático para a França, perdendo a guerra Franco-Prussiana e


consequentemente os territórios da Alsácia-Lorena, ficando como uma espinha
entalada na garganta dos nacionalistas franceses. A grande ambição da França vai ser
sempre recuperar estes territórios. A direita francesa repudiava o inimigo histórico, a
Alemanha

Tríplice Aliança (1882) → dois parceiros clássicos e um relutante que acaba por sair.
Alemanha, Império Austro-húngaro e Itália. Bismarck percebeu que 1871 era o fim de
um capítulo e não o fim da historia, porque sabia que a frança NÃO iria aceitar a
derrota de 1871, portanto esta aliança é defensiva face à França.

A tríplice aliança expressava as ansiedades de paz de 1871, mas surge outra aliança, a
Aliança Franco-Russa (1892), sendo também ela de natureza defensiva e secreta, com
termos secretos, onde se promete ajuda mútua face à Alemanha e à Austro-Hungria.
Martim Ghira Campos

Do ponto de vista geográfico, a principal ansiedade da França era a possibilidade de


uma invasão alemã.

A aliança Franco-Russa procura conter o expansionismo alemão quer para o lado da


frança, quer para o lado da Rússia

A Inglaterra sai vitoriosa das invasões napoleónicas, com 40mil efetivos conseguiu
governar um império de 2 milhões de súbditos, e viveu anos de prosperidade. Para a
Inglaterra, estes anos foram de isolamento glorioso, devido à sua ilha, ao seu poder
naval (mantinha aberta as linhas de comércio), marcando um séc. XIX glorioso para
Inglaterra

Two Power Standard → a Inglaterra sabia que tinha de ter uma frota naval mais forte
do que as outras duas (França e Rússia)

Mas o sono isolacionista inglês é despertado → em 1898 a Alemanha começa a


construir uma força naval poderosa, porque iam fazer frente à força naval francesa e
consequentemente à força naval inglesa.
A Inglaterra responde com o Three Power Standard, aumentando a construção naval e
a sua força naval, para fazer frente não só à França e Rússia (seus aliados), mas
também à Alemanha em ascensão

Surge um conflito com a Inglaterra e os Boers Sul Africanos porque a Alemanha


entendia que a sua posição no xadrez continental???

As relações entre Londres e Berlim ficam mais tensas. A Inglaterra sabia que não podia
continuar no isolamento e em 1909 faz uma aliança com o Japão.

O que vai definir o definitivo fim do isolamento inglês, acontece com a criação da
Entente Cordiale assinada em 1904, assinada entre a França e a Inglaterra. Uma
aliança defensiva e secreta, entendida pela Alemanha como o início de uma posição
agressiva da França com apoio inglês, com o objetivo de recuperar o perdido com a
guerra Franco-Prussiana

Se a Inglaterra estava claramente ao lado da França, aos olhos do kaiser, não havia
motivo para a Alemanha ficar quieta no plano intrnacional, principalmente em
Marrocos. Porque é que a França tinha livre arbítrio no domínio de Marrocos e a
Alemanha não? Vai então disputar esse domínio sob a capa da independência de
Marrocos

Com uma visita a Marrocos, o kaiser mostra-se solidário com um reino de Marrocos
independente, que levou a uma Conferência em Espanha para discutir a
independência de Marrocos com um recuo da França. No entanto, a Inglaterra e a
França defendem a posição francesa em Marrocos
Martim Ghira Campos

Em 1907 a Grã-Bretanha, depois de firmar um tratado com a França, faz o mesmo com
a Rússia, havendo um alargamento da Entente Cordiale, tornando-se na Tríplice
Aliança

Os blocos que se vão enfrentar em 1914 estão compostos → Tríplice Aliança


→ Tríplice Entente

Nos Balcãs encontramos vários povos, vários países em vias de se tornarem


independentes e um grande império, o império Otomano. O sinal de fraqueza do
império otomano estava na preponderância da servia no Leste da europa, que tinha a
“missão” de congregar todos os povos eslavos sobre a sua bandeira, todos eles deviam
ser unidos num único estado nação, sendo proclamados pela Sérvia.

O Império Austro-húngaro preocupava se com a possível congregação dos povos


eslavos por parte da Sérvia.

Em 1908 acontece uma revolução na Turquia que vai enfraquecer o Império otomano,
sendo uma revolução que teve sucesso imediato e que procurava um modo de
governamento ocidental para a Turquia

A Austro-Hungria, de forma preventiva, vai anexar a Bósnia, um pequeno povo eslavo


que estava sob o domínio do Império Otomano, gerando uma resposta imediata da
Sérvia.

A Sérvia sabia que não podia enfrentar diretamente a Austro-Hungria, e pede ajuda ao
seu aliado na região, a Rússia.

O kaiser alemão entende as ameaças da Rússia e da Servia seca

A crise Bósnia, como efeito imediato, a Austro-Hungria sentia-se com o apoio da


Alemanha. Teve como imediata consequência a humilhação da Rússia nas mãos da
Alemanha e do Império Austro-Húngaro. Esta crise balcânica sinaliza o papel da Itália,
que não concordava com a anexação da Bósnia, levando ao seu afastamento da
Tríplice Aliança. A crise bósnia aproxima as relações entre a Tríplice Entente

Segunda Crise Marroquina → 1911 estala uma revolta contra o sultão Abdal(?), sendo
que a França envia tropas para defesa do sultão, que gera uma resposta Alemã que
envia tropas para o porto de Agadir. Este confronto foi temperado e evitado
temporariamente com cedências parte a parte. A França concede territórios do Congo
francês à Alemanha, e a Alemanha reconhece o domínio francês em Marrocos e
promete não se intrometer em assuntos franceses futuros em Africa.

A Rússia sente-se humilhada na crise dos Balcãs, desta vez foi a Alemanha que se
sentiu humilhada, pois o kaiser foi acusado de não ter entrado em confronto direto
com a França, como uma posição de medo
Martim Ghira Campos

É a partir de 1911 que o investimento na indústria de guerra faz parte dos principais
objetivos da Inglaterra

A última crise anterior a 1914 dá-se nos Balcãs. Em 1913 a Sérvia saiu vitoriosa das
guerras Balcânicas, guerras independentistas contra o Imperio Otomano, destacando-
se como principal potência dos Balcãs.
A Sérvia exige então ao Imperio Austro-húngaro a devolução da Bósnia. Perante esta
situação, dá-se um atentado que na altura foi visto apenas como mais um atentado,
que em nada ia interferir com a política internacional

A 28 de Julho de 1914, o herdeiro do trono Austro-húngaro faz uma visita a Sarajevo,


onde a casa real mostrava que a bósnia era território austro-húngaro e tenta aumentar
a sua influência no local

1º atentado não tem consequências, Francisco Fernando consegue escapar


2º atentado, Francisco Fernando depara-se com Gavrilo Princip, pertencente a um
grupo anarquista pan-eslavista (Mão Negra) e é assassinado pelo mesmo

Os acordos defensivos e secretos, como não são conhecidos, a natureza dos tratados
não é conhecida, logo não se sabe que o ataque a uma parte suscita a defesa por parte
dos aliados. O ataque a um, desconhece a defesa dos aliados

O império Austro-húngaro não pensou que ao declarar guerra à Servia, existiriam


aliados prontos a atuar, pois os tratados eram desconhecidos

28 Julho 1914 → o Império Austro-húngaro declara guerra à Sérvia

Muitos intelectuais achavam que a Guerra era a única maneira de dissipar as tensões
entre as várias potências. Era impossível prever o grau de intensidade e de perdas da
guerra

O que leva uma civilização que conhecia a paz há anos a caminhar para o caos e para o
clima bélico intenso → Uma mistura de otimismo de que a guerra podia ser
purificadora e um fatalismo que achava que era necessária uma guerra

Livros → Á beira do Abismo


→ International History of 20th century
→ A Guerra que acabou com a paz
→ Texto Moodle

Queda da Monarquia e a implementação da República

O século XIX foi particularmente traumático para Portugal, devido à invasão francesa e
a todas as ideias a ela associadas que entraram em Portugal. Estas invasões tiveram
como principais consequências, a destruição e ocupação do país.
Martim Ghira Campos

Com as invasões francesas, a corte exila-se no Brasil e com a ausência do Rei, dominam
as ideias liberais e promulga-se uma Constituição, forçando o Rei a voltar. A
independência do Brasil é também um caso peculiar, pois é a primeira vez que um
príncipe declara um Estado independente da metrópole, sendo que Portugal se viu
mais uma vez reduzido à margem oriental.

Com a independência do Brasil, Portugal perde uma receita enorme. Em 1826 Portugal
passa a ter uma Carta Constitucional dada por D. Pedro, que reforça o poder da Coroa

O período após a guerra civil continua a ter momentos de confronto entre diversas
fações

Até meados do seculo XIX Portugal vive em instabilidade e quebras na economia e na


população. Esta metade é problemática e instável. Depois disto há um período de
redefinição ideológica interna revelando-se uma tensão entre o bloco legitimista e o
bloco liberalista. O liberalismo acaba por vencer e D. Maria II inicia o seu reinado,
recebendo o reino completamente em baixo e vivendo inúmeras revoluções devido à
criação da Constituição por parte dos liberais

Momento definidor – Regeneração

Em 1851/52, inicia-se o período da Regeneração através do golpe de Estado dado pelo


Marechal Duque do Saldanha, sendo uma tentativa de levantar Portugal. Quando se
inicia a Regeneração, inicia-se um período liberal, no entanto, o liberalismo precisa de
eleitores e estes necessitam de liberdade de voto: existiam governos e eleições, mas o
governo ganhava sempre as mesmas, porque o rei, que tinha o poder moderador, fazia
de árbitro, sendo ele que convocava novas eleições quando queria.

Havia dois blocos que iam alternando no poder (rotativismo da Monarquia


Constitucional):

• Partido progressista → visão mais democrática com menos instituições ligadas


à coroa
• Partido Regenerador → assenta numa ideia de progresso e desenvolvimento,
tendo como fundador o Fontes Pereira de Melo.

O objetivo era que Portugal atingisse níveis competitivos a nível europeu face a outros
Estados. Este período reconhece alguma estabilidade

Nesta altura 75% da população é analfabeta, o PIB per capita é muito baixo e a
esperança media de vida são 40 anos, logo o que faz as eleições rodar é o Rei.
Os reis do final da dinastia de Bragança, são reis por temperamento liberais. Nesta
família de Bragança não existia uma vontade totalitária.

Há uma estagnação na Regeneração, havia alternância, mas sem alternativa, tornando-


se redundante.
Martim Ghira Campos

Há um sobressalto cívico em Portugal em 1889 que abala a estabilidade social e


política que se vivia. O projeto horizontal Português vai coincidir com o projeto vertical
inglês, levando ao Ultimato de 1890. Portugal só tinha a hipótese de ceder, causando
um abalo no modo como os portugueses se vêm a si próprios, vindo abalar o avanço e
a estabilidade alcançados.

O rei D.Carlos é visto como um traidor, um fraco. Passou a imagem de um rei que não
defende os interesses nacionais, pouco patriota e que defende os ideais ingleses.

Portugal procurava a virtude colonial e é abalado com este entrave inglês

Aliada à crise política que deriva da desagregação dos partidos, surge uma crise
económica e financeira e mais tarde uma crise agrícola e moral.

D.Carlos nomeia em 1906 João Franco. Um ano depois desiste de governar de uma
maneira mais calma e moderada, e governa em ditadura sem Parlamento

João Franco resolve denunciar a situação dos financiamentos adiantados do Estado, e


atar o Rei à sua denuncia. Isto teve um custo reputacional muito grande

Chega 1908 com a ideia de que era a última hipótese de salvar o regime. No entanto a
família real chega de Vila Viçosa e o rei é assassinado no Terreiro do Paço. É um
elemento definidor do que acontecerá a seguir, pois mataram o Rei e o príncipe
herdeiro

Este é um período belicoso no que toca a líderes políticos, pois era comum serem
assassinados

A posição do rei deixa de estar ligada à política

D.Manuel apanha este fim trágico. Há uma tentativa de reestruturação dos partidos,
mas não é feita grande coisa porque só durou 2 anos

A 5 de Outubro de 1910 a revolução é bem-sucedida

O republicanismo não é uma ideia do século XX. O republicanismo português traz uma
série de promessas e uma convicção de que essas promessas são alcançáveis,
principalmente com o auxílio da ciência. O nosso republicanismo tem, do ponto de
vista teórico, uma ideia de refundador da “alma” nacional

O homem republicano aparece como o homem virtuoso. Havia a ideia de que a ciência
está do lado deste novo regime.

A esquerda monárquica queria uma república com rei


Martim Ghira Campos

O republicanismo português tem uma ideia de os homens todos como um só, e tem
uma matriz do federalismo. Os republicanos viam com bons olhos uma federação
ibérica, querendo que o Estado fosse uma federação interna

Quais são os apoios, a base popular deste partido? O partido nasce na década de 70 e
é um partido que consegue afirmar-se numa franja social em que os partidos
tradicionais tinham dificuldade em fazê-lo.
O crescimento de notoriedade do partido não representa um aumento de
representação política, mantendo-se um partido com poucos deputados. Era difícil um
partido que contrariava o regime afirmar-se dentro do mesmo.

Melhoria da condição feminina, do proletariado, uma menor dependência do reino


unido, sufrágio universal, maior afirmação da nacionalidade... → elementos que dão
esperança ás pessoas, ganhando força na fase final da monarquia, dada a instabilidade
vivida na época

O regime é imposto um pouco contra a lógica militar, não havendo uma destruição do
outro lado, há sim um encolhimento, um deixar passar.

Os Problemas do republicanismo surgem porque no seu seio há duas visões daquilo


que deve ser o republicanismo, uma mais aberta e outra mais rígida/jacobina

A fratura originaria acerca do que o regime devia ser, faz com que dentro do partido
republicano comecem a existir tensões.
O partido em 1911 tinha 229 dos 234 deputados do Parlamento

O republicanismo nasce cercado socialmente porque a sua base de apoio é reduzida

Primeira República e a participação portuguesa na IGM

Havia uma indecisão acerca da participação de Portugal na IGM

Os portugueses foram “carne para canhão”, o contingente estava mal preparado e,


portanto, a participação portuguesa sagrou-se por um massacre honroso, que não
deixa de ser um massacre

O apoio popular de que o governo gozava e aquela motivação nacionalista, com o


massacre divulgado da IGM, vai se dissipando

Há governos sucessivos do governo democrático (Republicano) que não mudam muito


entre si.

Tudo vai desembocar num golpe de estado liderado por Sidónio Pais. Sidónio Pais
(republicano) centra o poder em si, há um regresso da ordem e da disciplina. Há uma
liderança carismática, mudando a situação interna e a nível europeu
Martim Ghira Campos

Com o fim do Sidonismo os monárquicos percebem que voltaram ao ponto zero. Paiva
Couceiro tenta uma restauração de novo, mas não consegue romper os limites estritos
do Norte de Portugal, não havendo nenhum movimento que queira verdadeiramente
a restauração da monarquia. Paiva Couceiro volta a sair do país, volta mais tarde e vai
ser um critico de Salazar

Há um terceiro período da república, a Nova República

Revolução Russa

Vamos tentar compreender como é possível que aquilo que Marx defendia e aplicava
em países industriais, aconteceu num país que estava longe de ser industrialmente
desenvolvido. Na sua teoria da historia que definia como cientifica, ele procurava
mostrar um socialismo científico em comparação com o socialismo meramente
utópico – Marx afirmava que a história da humanidade se baseava numa luta de
classes e que o século XIX representava a última etapa entre o proletariado e a
burguesia, sendo que uma luta iria precipitar uma crise e levaria à falência, sendo
perante esta destruição do capitalismo que se iria construir uma sociedade socialista.

De certa forma, o marxismo é uma espécie de historicismo no sentido em que, tal


como podemos estabelecer certas leis físicas para explicar o mundo físico, também é
possível estabelecer leis rigorosas que explicam o caminho e o sentido da história, que
leva necessariamente para uma sociedade comunista.

Marx pensava que o triunfo do comunismo dar-se-ia em países desenvolvidos, porque


era a única forma de o capitalismo se autodestruir. Nesse sentido, a teoria marxista
olhava para países como a Bélgica, Alemanha, Grã-Bretanha como o habitat natural da
teoria, ou seja, países que tinham vivido pelo menos uma Revolução Industrial

Quando olhamos para a Rússia no início do século XX, temos muita dificuldade em
encontrar um país que se assemelhasse a algo do género:

• Tinha um sistema czarista e com domínio da família de Nicolau II há 300 anos

• A revolução industrial não se fizera sentir da mesma forma como, por exemplo,
em Inglaterra, França ou Holanda

• Era um país sobretudo rural, atrasado e com a maior parte da população


analfabeta

Apesar de tudo, o czar Nicolau II, contra a sua vontade, tentou diminuir algumas
desigualdades e deu algumas aparências de democratização. Em 1905 foi forçado a
aceitar a existência de um Parlamento, a Duma, embora com um papel bastante
limitado, sendo que a representatividade que lá se apresentava era totalmente selete,
sendo permitido a Nicolau II dissolve-la
Martim Ghira Campos

Apesar dos vários períodos de fome que o país enfrentava, o czar ainda recebia algum
apoio do campesinato e as Forças Armadas eram leais ao czar, portanto, apesar da
falta de industrialização, o czar acreditou que era possível continuar a governar sem
mudanças significativas (uma espécie de ilusão em regimes que são incapazes de se
reformular)

Neste caso, evitar reformas é o caminho mais imediato para se ter uma revolução,
sendo exatamente isso que aconteceu. Existiam 3 grupos de oposição:

• Os estrangeirados, os ocidentalizados e os democratas

Desejavam uma democracia ocidental e liberal. Eram compostos pelas classes


mais educadas da Rússia, que se tinham tentado envolver nos movimentos
humanistas europeus, influenciados por França e Itália, querendo levar a Rússia
para a modernidade

• Revolucionários socialistas

Talvez a Rússia não fosse o melhor palco para uma revolução socialista de larga
escala, porém os revolucionários socialistas tinham uma visão ligeiramente
distinta, porque admitiam que a força poderia não estar no proletariado, mas
que devido ao tecido económico da Rússia, o campesinato seria o proletariado
em países como a Rússia

• Social-democratas

É uma cisão do marxismo-leninismo que se vai dividir em duas famílias em


1903:
o Os Mencheviques → a maioria
o Os Bolcheviques → a minoria

A principal diferença é que para os Bolcheviques não bastava apenas conhecer as


teorias científicas de Marx segundo as quais a revolução iria inevitavelmente
acontecer. Para Lenine era necessária uma vanguarda de revolucionários profissionais
que conseguissem educar o proletariado e tomar a revolução. Ou seja, a ideia de Marx
de que o capitalismo iria cumprir todas as etapas acabando por se destruir, para
Lenine não existia, porque era preciso apressar as coisas, terminar com a dinastia de
Romanov e fazer a revolução

Por muito bom que fosse o comprometimento revolucionário, a revolução não


aconteceu de imediato por causa da IGM. A Rússia foi severamente punida pela
participação, mas a sua participação significou um impacto grande no país:

• Sofreu perdas desastrosas que abalaram uma nação inteira, uma vez que era
um exército quantitativamente preparado (6 milhões de soldados), mas
Martim Ghira Campos

qualitativamente mal preparado, pelo que o declarar de guerra à Alemanha


levou a resultados desastrosos

• Devido aos desastres consecutivos nas batalhas, em 1915 o czar toma a decisão
arrojada e desastrosa de se nomear a si mesmo Comando Efetivo das Forças
Armadas. No século XVIII este ato não seria excecional, mas no século XX o
nível de especialização militar já era muito diferente, sendo que o czar não era
a melhor opção para as Forças Armadas, para não falar no facto de que todas
as consequências seriam diretamente associadas a ele

• Simultaneamente, a Rússia vive um período de fome, racionamento e as


principais cidades russas estavam entregues ao banditismo, sem segurança
pública, vivendo uma situação de caos revolucionário. Perante isto, existiam
dois caminhos:

o O czar capitular, dadas as vastas vidas humanas perdidas e a


incapacidade do exército de combater

o O czar lutar, mas tentar reprimir as forças de descontentamento e


rebelião

O czar vai ser obrigado a abdicar, colchoando o ponto final na dinastia que
durava há três séculos.

Era um fim há muito desejado, e é nesse sentido que um Governo Provisório,


essencialmente composto por sociais-democratas e mencheviques, fica com a tarefa
de governar a Rússia.

A tarefa não era fácil, porque a Rússia era um país destroçado, em que as ordens
centrais do poder politico eram questionadas diretamente pelos sovietes, sendo neste
contexto que em Abril de 1917 Lenine regressa do exílio para uma primeira tentativa
de conquistar o poder, mas o governo provisório resiste às investidas bolcheviques e
Kerensky consegue evitar a queda do governo provisório, ordenando a prisão dos
principais líderes bolcheviques. Lenine volta para o exílio na Finlândia, mas já com a
ideia de que a oportunidade bolchevique estava perto.

É então que se dá um dos episódios mais marcantes e irónicos da Revolução → o


governo provisório não estava a ter sucesso a lidar com as várias crises e não
terminava com a participação da Rússia na IGM, sendo precisamente no seio do
governo provisório que Kornilov (comando em chefe do exército), procura levar a cabo
um golpe de estado contra Kerensky.

O objetivo do Golpe era submeter os sovietes à autoridade do governo provisório


(instaurar uma ditadura militar) e continuar a guerra para que a Rússia não perdesse
uma parte substancial do seu território. Perante isto, Kerensky vai apelar à ajuda da
fação Bolchevique, sendo que para vencer a rebelião do general Kornilov a família
socialista tinha de se unir.
Martim Ghira Campos

Kerensky arma os Bolcheviques, que vão derrubar e depor o governo provisório,


tomando rapidamente o controlo de Moscovo e Petrogrado, das principais vias e
fontes de comunicação e em 1917 do Palácio de Inverno, pelo comando de Lenine e
Trotsky

Lenine conseguiu o apoio da sociedade do seu tempo com o cumprimento de três


promessas:

1) Terminar com a participação da Rússia na IGM, que já via infiltrações alemãs no


seu território e cujo esforço de guerra contribuía para a cadência económica do
país. Resumidamente, queria a PAZ

2) Expropriação da propriedade à nobreza e à igreja ortodoxa

3) Controlo das fábricas e controlo dos principais centros de industrialização que


seria exercida pelos sovietes (conselhos de cada cidade)

Para além destas promessas, Lenine tem duas tarefas gigantescas:

• Consolidar o programa dos bolcheviques, manter o seu controlo sobretudo da


administração e do exército

• Preparar-se para os anos de Guerra Civil em que os bolcheviques vão combater


contra mencheviques, aristocratas e liberais

Com Lenine vamos ter um regime ditatorial com o objetivo de proteger a rua
revolução, tendo técnicas próprias:

• Prisão de inimigos políticos


• Constituição e uma polícia política – Tcheka
• Gulags
• Dissolução da assembleia constituinte, o último vestígio minimamente liberal.
Em Janeiro de 1918 houve eleições para a mesma, como os bolcheviques só
obtiveram 20% dos votos, Lenine acaba com a assembleia

A Rússia vai ser um país de regime com partido único, partido esse que estava
preparado para a longa Guerra Civil que se iria revelar tão traumática como a IGM,
com a agravante de que desta vez era dentro de portas.

Em 1922 Lenine sai vitorioso dessa guerra civil e em 1924 nasce formalmente a URSS

Com a morte de Lenine em 1924, tratou-se de saber quem seria o seu sucessor e ao
que tudo indica o seu desejo era Trotsky, devido à sua estratégia, inteligência e
coragem, enquanto que Estaline queria gerir o status quo sem a preocupação com o
internacionalismo.
Martim Ghira Campos

Estaline tinha vantagens competitivas em relação a Trotsky → convenceu os seus


camaradas que a solução para o país era o engrandecimento da URSS pela
transformação do país numa potência industrial, pois sem passar por uma revolução
industrial, estaria sempre dependente de terceiros e vulnerável

Ao longo da década de XX, Estaline vai começar com as purgas e com o afastamento
dos bolcheviques. A partir de 1934 começa um período de purgas que obedeciam ao
mesmo padrão → denuncia de alguém que se preparava para um golpe de estado e o
fim era a sua execução. Essas purgas eram maioritariamente acompanhadas por
julgamentos públicos e quase todos os bolcheviques acabavam por ser presos ou
executados

A perseguição de Estaline abrangia milhões de pessoas, das mais diversas classes e


grupos. Em 1937, depois de dizimar politicamente os bolcheviques e a sociedade civil,
Estaline ocupou-se das Forças Armadas. Ele sabia que não conseguia controlar
totalmente o exército e é nesse seguimento que 35mil oficiais seriam presos ou
executados, ou seja, a URSS via destruídos os seus militares mais profissionais

Ao mesmo tempo, em 1939, quando a Alemanha dava todos os sinais de que se


preparava para uma nova ameaça, a URSS e a Alemanha fazem o pacto Molotov-
Ribbentrop. Neste momento a URSS já tinha elevadas taxas de industrialização, um
exército preparado, alfabetização e uma economia robusta, o que a colocava como
uma das potências mundiais, realidade muito diferente de 1914

28 de Maio de 1926

A ideia de que o anticlericalismo e o laicismo militante estavam a criar uma rotura no


país, teve avanços na 1ª República, mas essa tónica manteve-se e há um grosso
conservador, tradicionalista, monárquico, republicano, de direita e até mesmo
sindicalista (que eram perseguidos na 1ª Republica), que começam a perceber que era
preciso mudar essas coisas, levando a um clima de pré-guerra civil eminente

O 28 de maio é mais um desses levantamentos (houve vários que fracassaram). No 28


de Maio, o PM da altura (António Maria da Silva) disse que a situação se resolveria
rápido e que o exército se iria manter leal á Republica e que tudo iria correr bem,
sendo que a população podia ficar descansada

Não foi bem isso que aconteceu, muito pelo contrário, assim como a monarquia não
teve muitos apoiantes, também a 1ª República termina sem grande apoio

Há uma hegemonia de um único partido, acompanhada de instabilidade

Dá-se um levantamento militar em Braga, liderado pelo general Gomes da Costa e


outro em Lisboa liderado por Mendes Cabeçadas, a que se junta uma divisão vinda de
Évora liderada pelo general Carmona. Estas três figuras são essenciais neste período,
constituindo o primeiro triunvirato que vai tentar ordenar a República
Martim Ghira Campos

Apesar de existirem monárquicos no movimento, o movimento não tem um cunho de


restauração, mas sim de defender a república, frisando a ideia de que querem tornar a
república mais adequada ao sentido nacional

Por um lado, temos o almirante Cabeçadas que era republicano maçom e tinha
participado no 5 de outubro. Numa primeira fase é ele que aparece como o chefe
deste movimento, talvez por estar em lisboa facilitava ser um interlocutor mais
imediato com o poder

Mendes Cabeçadas era quem estava na frente e diz a Bernardino Machado para
demitir o governo, de maneira a nomear pessoas certas para a defesa da pátria e para
as funções

O Parlamento é encerrado e Bernardino Machado demite-se

O poder residia no exército que estava em Sacavém. Ao início aceitam a solução de


Mendes Cabeçadas, mas rapidamente (de Maio a Junho) se percebe que o homem
forte do movimento é Gomes da Costa

Gomes da Costa é um militar que viu a ação, combateu, é um oficial tipicamente


colonial (índia, angola, moçambique). Mais tarde, o que lhe trouxe notoriedade foi o
facto de ter sido comandante do primeiro corpo expedicionário português na IGM,
sendo condecorado por feitos próprios com torre e espada. É de uma ala direita
conservadora, ao contrário de Mendes Cabeçadas que é de uma ala conservadora
dentro do republicanismo

Devido à participação em diversas conspirações e sabendo o prestígio que gomes da


costa tinha, o governo republicano envia-o para a India em 1922, inspecionar as coisas
por lá

Quando volta em 1924, continua envolvido na critica ao regime e aceita liderar um


movimento que parte de Braga que vem lentamente até Lisboa, recolhendo apoios,
não sendo uma coisa precipitada

Na primeira fase há uma tensão entre Mendes Cabeçadas e Gomes da Costa. Ambos
integraram o primeiro governo liderado por Mendes Cabeçadas, mas em Julho a tropa
em Sacavém diz que Mendes Cabeçadas era demasiado conotado com o Antigo
Regime e que não é suficientemente envolvido nesta revolução nacional para assumir
o controlo do movimento, deixando o lugar para Gomes da Costa

O general Carmona era o menos bélico dos três, de estado maior, secretaria, mas teve
um fator da carreira que o permitiu ter grandes apoios → passou por quase todos os
serviços do exército, portanto conhecia grande parte das lideranças militares

Também Carmona apoiou Sidónio Pais e no julgamento à noite sangrenta, ele foi o
promotor de justiça, alguém que procurou castigar os excessos da República
Martim Ghira Campos

Foi fugazmente Ministro dos Negócios Estrangeiros e nesse período consegue ver a
ditadura reconhecida internacionalmente e acaba por ascender à liderança do governo
e durante um tempo acumular essa liderança com a chefia do Estado

É o único caso no Século XX português de um Presidente da república que morre em


funções (foi nomeado a 25 de Março de 1927 e morre em 1951)

Temos três homens e três tendências cujo principal objetivo era negativo, derrubar o
Estado

Mendes Cabeçadas é da ala mais conotada com o regime anterior, um republicano à


moda antiga
Gomes da Costa é da ala mais direita e radical
Carmona é conservador republicano (centro)

Estabelece-se uma ditadura. Os parlamentos e o liberalismo não tinham boa fama


nesta altura, pois culpavam-nos da precipitação do mundo que levou á IGM, surgindo
um movimento europeu autoritário, antiparlamentar e antidemocrático, que reage ao
liberalismo e à ameaça vermelha que tinha ganho força em 1917
Surge uma nova corrente que é vista como a que se deve instaurar em Portugal →
ditadura

A ditadura não solucionou tudo de um momento para outro e podia ter acabado como
todos os outros governos. Houve inúmeras tentativas de golpes de estado à esquerda
e à direita, houve instabilidade, houve confrontos. Há um regime que continua a
deteriorar-se

A rotura financeira e económica portuguesa era grave. O General Sinel de Cordes


advogava a necessidade de um apoio económico externo, um bocadinho como o que
aconteceu com a Troika

Nesta altura surge uma outra visão defendida por um professor universitário de Viseu,
sendo que escreveu críticas ás políticas que iam ser seguidas. Foi convidado para
ministro das Finanças em 1926, mas como não lhe deram total poder para fazer o que
queria, ficou apenas duas semanas → Salazar

Começamos a assistir a algo que facilitou a ascensão máxima ao poder executivo, a


partir do quinquagésimo ministério, Salazar foi sempre Ministro das Finanças. Por esta
altura, Salazar já tinha explicado quem era e ao que vinha

Salazar na tomada de posse em 1927 → “(...) que o país estude, represente, reclame,
discuta, mas que obedeça quando se chegar à altura de mandar”
Tinha uma visão clara do que queria fazer com as finanças e com a economia
portuguesa

Salazar quer direito de veto relativamente as riquezas dos ministérios, quer controlo
das finanças e das despesas, quer mais impostos. No fundo quer impor a austeridade
Martim Ghira Campos

ao pais e que o pais com a sua própria força (dobrado sobre si próprio), encontre as
soluções económicas e financeiras para sair do problema, sem contrair empréstimos
externos

Salazar tinha uma aversão ao parlamentarismo (apesar de ter sido deputado), sendo
que o regime que ele queria para Portugal não seria um regime herdeiro da 1ª
República

Este primeiro período é um período em que o papel de Carmona como árbitro é muito
importante, sendo ele quem muitas vezes segura Salazar.
Há uma diarquia entre Salazar e Carmona. Carmona é quem faz com que o exército se
mantenha leal e do lado do regime, impedindo revoltas. Salazar respeitava muito
Carmona, pois era quem dependia menos dele

Este regime que se vai institucionalizando não rompe com os símbolos anteriores
(bandeira, hino). Há um republicanismo conservador que vai fazendo o seu caminho

O novo regime começa a assentar no exército, na igreja e na opinião publica que


estava cansada da 1ª República. Do ponto de vista formal não tinha grandes diferenças
do regime anterior (aparentemente)

A constituição de 1933, projeto de Salazar, garante liberdade de associação, de


expressão, só que essas liberdades eram quartadas por legislação não constitucional.
Há uma influência formal do liberalismo, no modo como a constituição é estruturada

O Estado Novo (como se passa a chamar o regime a partir de 1933) que tem Salazar
como presidente do conselho de ministros e carmona na presidência da República,
assenta numa constituição que tem influências lusitanas, da doutrina social da igreja,
do corporativismo italiano, da constituição de Weimar (influencia importante porque
era considerada o presidencialismo do chanceler, acontecendo que o regime assentou
no presidencialismo do presidente do conselho de ministros)

Há um repudio do parlamentarismo de 1911, uma relativa marginalização da função


parlamentar, um pendor do executivo forte e estável, e há uma defesa da autoridade
do estado como fonte de autoridade política que é diferente da anterior, sendo um
regime anti atividade parlamentar e nacionalista

Criam-se duas camaras políticas (Assembleia nacional e camara corporativa) que


deviam assegurar a representação dos principais setores económicos.

É criado um movimento que na prática seria um partido único, mas que tem nos seus
estatutos de que expressamente não é um partido, havendo uma rejeição do
partidarismo e, portanto, a ação política tinha que se subordinar à ação governativa e
ao bem comum (esta ideia de bem comum é tirada da doutrina social da igreja)

O catolicismo, no caso português, resultou num regime diferente antiparlamentar,


dotando-se de mecanismos para se defender → Apostou fortemente na propaganda
Martim Ghira Campos

(criou o secretariado da propaganda nacional) e criou-se a PVDE que mais tarde se


chamou PIDE, que tinha como função combater qualquer oposição e era
principalmente dura com o Partido Comunista Português

Os quadros do regime saem união nacional, do exercito e da universidade, havendo


três fontes de recrutamento, mas é um recrutamento relativamente estanque, por
exemplo a monarquia liberal teve o dobro dos deputados que teve o Estado Novo

Era um regime que procurava a vida habitual. A perseguição política não era
direcionada ao povo (a toda a gente) com o objetivo de instaurar um clima de terror
ao estilo bolchevique ou nazi, mas aqueles que estavam prontos a derrubar o regime e
que tinham essa ambição

A diarquia inicial entre Salazar e Carmona acaba por redundar num presidencialismo
de chanceler, á medida que Salazar vai concentrando mais poder, sendo a fonte e a
chave do ponto de equilíbrio do regime

O Estado novo tinha elementos fascizantes (mocidade portuguesa, legião portuguesa,


estética e orientação fascista), mas simultaneamente Salazar proíbe e combate o
principal movimento fascista, o Nacional sindicalismo de Rolão Preto, que apoiava um
candidato oposicionista anos mais tarde. Salazar considerava este movimento como
uma doutrina estrangeira, pagã e que não estava de acordo com a tradição portuguesa

O Estado Novo assenta em equilíbrios dentro da direita conservadora, havendo


períodos em que o pendor fascizante é mais notório, mas que acaba por ser limitado
devido às origens católicas e cristãs da maior parte da elite dirigente

Parte dos conservadores republicanos transitam para este regime, sendo que os
conselheiros de Salazar tinham sido políticos na 1ª República. Não há um corte como
se deu entre a Monarquia Constitucional e a 1ª República, por exemplo, os oficiais que
fazem o 28 de Maio eram na sua maioria republicanos

Uma das grandes vantagens do subdesenvolvimento é o facto de as crises não se


sentirem da mesma maneira. A crise de 1929 (crash da bolsa) não foi sentida da
mesma maneira em Portugal e permitiu a Salazar ter um superavit à custa do sacrifício
da população e da austeridade governativa, e ainda estruturar alguma linhas do que
viria a ser a forma de proceder o plano económico deste regime (exemplo: há uma
continuidade em relação às colonias e a necessidade de tirar um maior partido das
mesmas)

O facto da Europa se ter envolvido em guerras neste primeiro período do salazarismo


(1933-45)(ascensão da republica em Espanha, guerra civil espanhola e a IIGM) faz com
que Portugal passe ao lado dos conflitos, proclamando neutralidade na maior parte
dos mesmos (vendendo a todos os beligerantes na IIGM e apoiando os nacionalistas
em Espanha). Temos um regime que aposta na ideia de tranquilidade e refúgio, que
atraiu um investimento estrangeiro para Portugal (exemplo da capacidade de atração
de investimento exterior: fundação Gulbenkian)
Martim Ghira Campos

O regime promoveu o turismo, defendeu a agricultura (Salazar tinha uma visão rural
do país, colocando-a em primeiro lugar, sem nunca abandonar a industria), a paz social
que lhe permitiu a expansão económica, sempre tendo como prioridade o equilíbrio
orçamental (primeiro o equilíbrio de orçamento e depois o fomento económico)

Apesar de ser um jurista ligado à economia, Salazar é um pragmático que tem por base
o equilíbrio financeiro e o fomento económico (ambos os conceitos têm por base
privilegiar as capacidades internas do país – ideia de nacionalismo económico, de
salvaguardar a independência e identidade do país)

Salazar desconfiava das pessoas em geral e o progresso e desenvolvimento tinham de


ser lentos para ser sólidos

Este regime não era um regime liberal nem apostado em abrir as portas a todos os
investimentos, pelo contrário, havia um condicionamento industrial.

Para quem viveu os anos da 1ª República, havia uma diferença abissal no modo de
vida, ao perceber que há uma outra estabilidade e ordem.

A ordem e a estabilidade tinham consequências. Neste período deu-se uma descida da


taxa de analfabetismo, aumento das estradas, das escolas, das infraestruturas, uma
melhoria das condições do exército, criação de uma força aérea, ações de florestação,
apoio à natalidade com o abono de família.
Tudo isto aconteceu neste período, no entanto, tinha um custo passivo → Compressão
das liberdades, compressão da liberdade de participação, de agir e criar associações e
organizações que contestem o regime

As pessoas, saídas da 1ª República, veem que existe uma nova estabilidade, mas com
um novo custo

O Salazarismo é entendido como um tipo peculiar de autoritarismo, mais próximo do


regime austríaco (antes da tomada nazi) de orientação cristã, corporativa e do regime
de Vichy, do que propriamente de um regime fascista assente no carisma do líder,
centrado na força e no exército. Não tem uma ideia de expansionismo, tem sim uma
ideia de conservação dos limites territoriais (nacionais), com a ambição de construção
por dentro e por cima.

Salazar nega o totalitarismo como via, defende que o estado não deve ser totalitário,
no entanto, a repressão existe, existe tortura, prisões, violência, mas com uma
diferença de grau (não a torna melhor por causa desta diferença de grau, mas o
impacto na população é diferente)

Na fase inicial este regime goza de um amplo apoio, um sinal desse apoio é por
exemplo o Cristo Rei, assinalando a gratidão de Portugal não ter entrado na IIGM,
mantendo-se fora do conflito enquanto a Europa estava toda em guerra.
Martim Ghira Campos

O Estado Novo é um período de consolidação e afinação do poder, que lentamente e


gradualmente vai sendo mais eficaz

O regime vai-se tornando cada vez menos um Estado Novo e cada vez mais um
salazarismo, precisamente pelo seu tipo peculiar de autoritarismo, pelas suas
diferenças do autoritarismo puro, não deixando, no entanto, de o ser

É um regime que se afirma internacionalmente, que não interveio nas guerras e que
consegue uma estabilidade relativa. Esta estabilidade também é feita à custa de um
desnível da qualidade de vida entre as zonas rurais e as zonas urbanas.

A censura prévia das liberdades cívicas fazia parte do dia-a-dia, havendo uma ideia de
sobrepor interesses de fações ao interesse nacional - “Saúde e fraternidade” da 1ª
República, foi substituído para “a bem da nação”, mostrando o foco no nacionalismo e
na especificidade portuguesa

Havia a ideia de que Portugal deverá encontrar em si, dentro de si e dobrado sobre si,
a solução para os seus problemas, havendo uma prioridade nacional. Esta visão choca
com realidades como o investimento estrangeiro.

É um regime nacionalista, corporativo, antiparlamentar, antidemocrático, anti


partidário, tão assente numa pessoa que o seu destino se confunde com o dessa
mesma pessoa.

Salazar foi indispensável e fez o seu trabalho de uma maneira diferente das que eram
normais na época. Salazar tem influências de fascismo italiano, e apesar das
parecenças formais do regime com outros autoritarismos, havia grandes distinções,
sendo que o regime de Salazar se estruturava de maneira diferente

É espantoso como é que o regime parlamentar mais instável da Europa Ocidental dá


origem ao regime autoritário mais estável da Europa Ocidental.

De volta a seculo XX mundial – Tratado de Versalhes

Salto de 1914 para 1918

A IGM representou a maior carnificina militar que a humanidade tinha conhecido até
então. Ainda não presenciamos a catástrofe da IIGM, onde vai haver um número
enorme de mortes de civis. Na IGM os civis foram razoavelmente poupados, o
contingente militar na frente de guerra é que não foram poupados.

Mais de 1M de mortes em países como França, Rússia, Alemanha, Austro-Hungria,


etc…

A IGM destruiu toda uma geração, dizimou jovens, consumiu uma geração
Martim Ghira Campos

Na IGM, a Alemanha perdeu a guerra de uma forma clara, mas a população alemã não
sentiu isso, porque entre 14-18, não houve nenhum soldado inimigo que tenha
entrado no território alemão

O território alemão ficou intacto, por isso os soldados alemães, ao regressar da frente
de batalha depois de assinar o armistício, foram recebidos como heróis.

A Alemanha foi atraiçoada pelas suas elites políticas, elites estas da altura da república
de Weimar que eram de esquerda alemã

A Alemanha começou a perder a guerra no verão e 1918 depois da Segunda Batalha do


Marne. O exército alemão saiu em debandada e os aliados conseguiram segurar as
posições junto às fronteiras alemãs levando à rendição, que era apenas uma questão
de tempo.

A Alemanha estava perdida, devido ao colapso dos seus principais aliados (Império
Austro-húngaro e Império Otomano), ia, portanto, render-se numa questão de poucos
dias. Faltava saber se ia capitular-se dentro ou fora das suas fronteiras

À medida que a derrota se torna clara, surgem os motins de soldados alemães que se
recusam a combater pelo kaiser, as perdas humanas sobem a pique nos últimos meses
de guerra, o governo de Weimar chega a conclusão que não é possível continuar a
combater, pois isso significaria:

1- Invasão terrestre da Alemanha


2- Revolução interna na Alemanha, imitação do que se passou na Rússia, podendo
cair num golpe bolchevique ou comunista, de maneira a tirar o país da guerra

Do lado aliado surgem duas opções:

• Os americanos achavam que era preciso derrotar os alemães no seu próprio


território, pois sem essa derrota não era possível obrigar os alemães a assinar
um acordo de paz, que fosse punitivo e que não permitisse uma interpretação
revisionista por parte da Alemanha

• Quer a Grã-Bretanha quer a frança achavam que havia riscos numa invasão
terrestre da Alemanha. Havia dois problemas → os aliados lutavam desde
1914, ao contrário dos americanos que entraram apenas em 1917, por isso
para as opiniões públicas da França e da Grã-Bretanha, continuar na guerra
significava um preço material e humano muito alto. Em segundo lugar, quando
se assinasse um armistício mais tarde, as clausulas do acordo seriam mais
vantajosas aos EUA e não aos aliados

A 8 de Outubro de 1918, General Ferdinand Foch, comandante-em-chefe das tropas


aliadas, vai se submeter ao governo Francês honorando, no qual se afirma que as
tropas francesas e aliadas estavam prontas para um armistício, desde que os alemães
concordassem com os termos do armistício:
Martim Ghira Campos

1- Evacuar todos os territórios que tinham ocupado desde 1870 (incluindo alsácia-
lorena)
2- Era necessário instalar bases militares do lado alemão do rio reno. O raciocínio
de Foch era: se a Alemanha não cumprisse com o que estava dito no armistício,
estaria facilitada a invasão terrestre do território alemão.
3- Deixar o terreno e entregar os equipamentos de guerra com os quais estava a
combater

A 7 de novembro, depois do abdicar do kaiser, o governo alemão vai requerer um


armistício, partindo do pressuposto que o armistício e o tratado de paz que poderia vir
a ser assinado, iriam respeitar o que o presidente W.Wilson tinha definido como os 14
pontos para a paz

Wilson era um presidente ligado à tradição idealista, ou seja, considerava que as


causas profundas do conflito 14-18 estava no facto de não existirem estruturas supra
nacionais que pudessem impedir os conflitos de chegar a um estado de guerra
(ausência da liga das nações) – para ele era fundamental deixar de olhar para as
nações como uma soma zero, era necessário um organismo neutral e a negociação
entre todos

14 pontos fundamentais para a paz (explicados):

1- É uma espécie de lição básica do que se passou em 1914. As alianças secretas


impediram que as potências percebessem a natureza defensiva de algumas
alianças, levando a uma resolução ofensiva. Defende a diplomacia aberta e
clara, que fosse entendida pelos vários Estados soberanos e pela opinião
pública. Era fundamental informar a opinião pública, que apoiaria ou
condenava as decisões dos seus governos

2- Retoma uma ideia fundamental → Livre comércio. Não agradava especialmente


à Grã-Bretanha, que olhou para este ponto como uma ameaça direta.

3- A ideia de que todos têm a ganhar se participarem no comércio mundial

4- Relacionado com a corrida ao armamento pré 1914 que despertou nas outras
nações o desejo de participar também na corrida ao armamento (Dilema de
Segurança). As armas devem servir para garantir a segurança interna e não
para guerrear em conflitos como a guerra de 1914

5- Ideia de que a autodeterminação dos povos era a pedra de toque das novas
relações internacionais, significando o estabelecimento do novo sistema de
mandatos (ideia de que as potências (principalmente França e Grã-Bretanha)
devem ajudar os vários territórios que se emanciparam dos grandes impérios
que desapareceram com a IGM, para conseguirem desenvolver os seus
governos e caminhar por si só). Wilson defende o fim do sistema colonialista
Martim Ghira Campos

que tinha vigorado, sendo que a França e Grã-Bretanha viram aqui uma ameaça
à estabilidade dos seus impérios

6- Era preciso que a Rússia fosse tratada como uma aberração no concerto das
nações, uma nação fora do processo, devido ao seu passado. Cordão sanitário
para a Rússia, mas os territórios não podem ser devolvidos a Rússia, seriam
entregues a uma futura liga das nações para novos povos

7- Devolver os territórios que a Rússia abdicou com o tratado de Brest-Litovsk

8- Aquando da conferencia de paz de Versalhes as tropas alemãs são obrigadas a


evacuar da Bélgica e do Luxemburgo. Era uma inevitabilidade, mesmo que
Wilson não fosse a favor de anexações, o mesmo reconhecia → devolução da
Alsácia-Lorena à França, era necessária para a paz

9- Era importante acautelar o nascimento de novas civilizações que iriam surgir


nas vizinhanças e já não faziam parte do Império Austro-Húngaro
10- O que era válido para as colonias extraeuropeias, era valido sem sistema de
mandatos para as nações europeias.

11- Fala da autodeterminação dos estados balcânicos, mas é suficientemente vago


para não convencer e incomodar ninguém

12- O desaparecimento do Império Otomano, levou a saber o que fazer a esses


territórios seculares administrados pelo mesmo (Síria, Líbano, Palestina,
Jordânia), cumprindo o princípio de autodeterminação

13- A Polónia devia ter acesso ao mar, mas isso era um corredor que rasgava o
território alemão. Hitler vai ver aqui um apoio teórico. A Polónia vai ter muito
mais do que aquilo que os peace makers desejavam, anexando território que
não lhe foi atribuído pelo Tratado de Versalhes e vai criar muitas inimizades

14- Conclusão lógica de toda a arquitetura dos 14 pontos. São as sementes da


futura liga das nações, liga essa onde as diferentes nações pudessem negociar,
discutir, encontrar mútuas garantias de independência política e integridade
territorial

O Primeiro Ministro Clémenceau desprezou os 14 pontos de Wilson, pelo motivo de


não haver grandes referências ao facto de a Alemanha ter sido a agressora, ter perdido
a guerra e acima de tudo ter de pagar (a falta destes três elementos é o grande
problema dos 14 pontos de Wilson)

O tratado é assinado em Versalhes na sala dos espelhos porque tinha sido lá que os
franceses tinham assinado a rendição depois da guerra de 1871. A delegação alemã
ficou no hotel onde a delegação francesa ficou quando foi assinar a rendição. Isto
prova que os povos não esquecem o passado, o ódio.
Martim Ghira Campos

Paris 1919 → O armistício é assinado na 11ªhora do 11º mês e no 11º dia


(11/11/1919). Achavam que a culpa era do kaiser, o kaiser lançou a Alemanha e
invadiu a Bélgica, mas agora era altura de um recomeçar. Os termos do armistício
eram um aperitivo da conferencia de paz

1) Retirada da Alsácia-Lorena, Bélgica, Luxemburgo (todos os territórios retirados


pela Alemanha às potências aliadas)

2) Rendição da quase totalidade da frota alemã, da sua força aérea e da sua


artilharia pesada

3) A Alemanha tinha de renunciar aos tratados com a Rússia e a Roménia

4) Construção de bases militares depois do rio reno (a Alemanha tinha de assinar


tudo, senão não estava salva de uma invasão terrestre)

A 18 Janeiro de 1919 começa a conferencia de paz de Paris – é o aniversario da


coroação de Guilherme I em 1771, que tinha sido também em Versalhes

O que se tornou o objeto de discussão, polémica, e que vai ter uma importância
decisiva na história da europa e da Alemanha → Tratado de Versalhes

Tratado de Versalhes → Procurou redefinir a geopolítica da europa.

O que sai deste tratado em termos territoriais?

1) Perda dos territórios coloniais fora do continente europeu. Uma das causas da
guerra está nas corridas coloniais (disputas de Marrocos, etc). A Alemanha
perde os territórios coloniais fora da europa (Africa), ficando sob domínio dos
aliados ate que conseguissem suportar-se sozinhos.

2) Devolução da Alsácia-Lorena

3) Perda do cantão de Eupen-Malmedy para a Bélgica

4) A região do Sarre seria administrada pela Liga das Nações

5) A província da Posnânia e da Prússia Ocidental para a Polónia; Silésia Ocidental


para a Polónia

6) Perda da “cidade-livre” de Danzig

7) Território de Memel sob administração da Liga das Nações

Isto tudo significa que 13% do território alemão deixa de pertencer à Alemanha
Grande parte vai ser recuperado por Hitler assim que chegar ao poder, quebrando as
imposições de Versalhes
Martim Ghira Campos

Em termos militares?

1) Exército com um máximo de 100 mil efetivos

2) Proibição de tanques, carros blindados ou artilharia pesada

3) Proibição de aeronaves militares

4) Proibição de embarcações navais com mais de 10 mil toneladas

5) Proibição de submarinos

6) Renânia desmilitarizada

Em termos Financeiros?

1) Exploração mineira da região do Sarre pela França

2) Valor das reparações de guerra fixado em 7,6mil milhões de euros

3) Estaleiros navais alemãs reconstruiriam navios aliados destruídos durante a


guerra. A Alemanha deixava de ser proprietária da sua indústria naval

Aspetos que não estão no tratado:

• A Alemanha manteve soberania sobre Renânia contra os desejos da França,


porém os artigos 42 e 43 do Tratado impediam que a Alemanha tivesse lá
tropas, realizasse exercícios militares, etc, ou seja, para todos os efeitos
deixava de ser território alemão, era apenas formalmente, porque Wilson não
queria que a Renânia se tornasse na Alsácia-Lorena, não queria que
envenenasse o pós-guerra (o processo de paz)

• O Sarre ficou sob soberania alemã, mas a França tinha o direito da exploração
do carvão, mesmo que esta região fosse administrada pela Liga das Nações.

• Na Alemanha acabou a recruta militar, impedindo a construção de um corpo


militar de salvaguarda. O Exército alemão não seria obrigatório nem a base de
recrutas, era um exército de voluntários, sempre sem ultrapassar os 100K

Os alemães achavam que Versalhes não era um tratado de paz, eram imposições dos
aliados à Alemanha. A Alemanha e os aliados tinham de reconhecer a culpa da
Alemanha pelo começo da guerra, algo intolerável para a Alemanha do ponto de vista
da honra da nação. Para os alemães, 1914 não era pintado como pintavam os aliados,
para eles a Rússia é que apoiou a Sérvia ao que levou a uma resposta alemã para
apoiar o Império Austro-Húngaro. Existe uma parte de verdade nesta afirmação da
Alemanha → a guerra começou com um assassinato em território Austro-Húngaro e a
Martim Ghira Campos

declaração de guerra partiu de um aliado alemão, e os termos que são impostos aos
territórios que da desintegração do império Austro-Húngaro também são muito
danosos

O tratado de Versalhes não sinaliza apenas a Alemanha, mas também os seus aliados,
sendo que com os mesmos, os tratados assinados, também vão ser punitivos

A Alemanha esquecia-se de um ponto, por muito violentos que os termos sejam, são
menos punitivos que os tratados que a Alemanha impôs à França em 1871 e à União
Soviética (tirou à Rússia, a Polonia, Ucrânia, Bielorrússia. A Rússia perdeu 1/3 da sua
terra fértil, metade da sua capacidade industrial e 90% da sua capacidade de produção
de carvão com o tratado de Brest-Litovsk) → Ponto de defesa dos aliados

Perante estes termos, o chanceler Scheidemann recusou a assinatura do Tratado de


Versalhes afirmando que jamais iria associar o seu nome à rendição. A não assinatura
implicava duas coisas:

1) Invasão terrestre por parte das potências aliadas


2) Invasão terrestre pela Polonia, adquirindo mais território pela recusa alemã de
assinar o tratado

A Alemanha não consegue alterar as clausulas e é assinado a 28 de Junho de 1919.

Esta assinatura vai valer muito pouco e iremos ver como o Tratado de Versalhes se
começa a desfazer logo a partir de 1919

Fim de Pós-Versalhes e início da Weimar

Quais as disfuncionalidades que conduziram a república de Weimar para a tragédia?

Como é que a Alemanha foi conduzida a uma ditadura que acabou por arrasar com a
Europa?

Impactos de Versalhes na Europa:

Grã-Bretanha → a população achava que o tratado de Versalhes tinha sido justo, mas
não suficientemente punitivo/duro. Se o grande problema era continuar a ser a
potência naval dominante na europa, agora estava ainda mais direcionada para isso,
ainda por cima a indústria alemã estava a produzir para a Grã-Bretanha.

• Havia 2 problemas:
o O caderno de encargos que a Alemanha tinha de pagar significava que a
Grã-Bretanha perdia um dos seus principais parceiros comerciais

o O facto de a França ser a potência dominante na europa.


Martim Ghira Campos

Caminho preferencial dado por Keynes → cancelamento das dividas entre os diversos
participantes (Aliados, Alemanha), de modo a que as engrenagens económicas
mundiais voltassem ao normal. Com a reconstrução económica da Europa, todos
saíam a ganhar, não só a nível económico, mas também a nível político e social, a
Alemanha por exemplo deixava de alimentar os extremismos de esquerda e direita
que eram o dia-a-dia da república de Weimar

Isto não aconteceu e leva à demissão de Keynes ainda durante a conferência de Paz,
porque acha que o seu papel é meramente decorativo.

Os britânicos foram os que mais longe viram as consequências da paz de Versalhes:

• A França ficou contente com os termos do tratado, pensando sempre que


podiam ser mais severos, por exemplo, preferiam que a Renânia fosse um
estado independente, exploração total do Sarre, um exército de 100K de
militares era demasiado. No entanto, achavam o tratado justo e que eliminava
a ameaça alemã por muito tempo

O general Ferdinand Foch entendia que a Alemanha tinha sido humilhada para
lá do limite e que o Tratado de Versalhes seria humanamente impossível de
monitorizar (saber se os termos eram respeitados). Na opinião dele, mesmo
que os Aliados percebessem que os termos não estavam a ser respeitados pela
Alemanha, o que iriam fazer? Uma nova guerra?

• Nos EUA a perceção do tratado foi diferente. A população achava o tratado


severo, mas aconteceu uma não retificação do senado, que levou a uma não
entrada dos EUA na Liga das Nações. A retificação não foi feita porque não
havia uma maioria de 2/3 do senado, logo a constituição não permite que o
tratado entre em vigor.

Havia um bloco a favor do tratado, mas havia dois blocos do senado contra a
participação dos EUA na liga das nações:

• Bloco reservacionista → bloco que tinha reservas que lidavam com


dois pontos:
o a doutrina de Monroe (os EUA têm legitimidade para intervir
na parte sul do hemisfério americano quando estiverem em
causa interesses de segurança ou estratégia). Não fazia
sentido a participação numa liga das nações pois a PE
americana ia estar a ser decidida em Genebra e não em
Washington, pondo em causa a ascensão americana no
hemisfério sul;

o Emenda Platt que era a aplicação da doutrina de Monroe em


Cuba, isto é, os americanos não iam abrir mão da sua
influência em Cuba
Martim Ghira Campos

• Bloco irreconciliáveis → opunham-se à participação na liga das


nações apenas pela sua existência, era uma oposição filosófica e
ideológica.

A Alemanha foi apunhalada nas costas pelos Criminosos de Novembro (aqueles que
assinaram o armistício em novembro de 1918 e que abriram caminho à assinatura do
tratado de Versalhes)

O ressentimento alemão assentava na divida que tinham de pagar e na ideia de que


apenas a Alemanha pagava pelo que tinha acontecido na IIGM. Isto não é verdade,
pois acontecem tratados igualmente humilhantes, não tanto como a Alemanha, mas
igualmente severos:

• Áustria → Com o Tratado de St.Gérmain (1919) perde território para a Itália,


Roménia, para a criação dos novos Estados da Checoslováquia, da Jugoslávia,
da Polónia, o exército foi reduzido a 30mil homens e foram proibidos de
qualquer futura união com a Alemanha

• Hungria → Com o Tratado de Tríanon (1920), perdeu território, o exército foi


reduzido a 30mil efetivos, tornando-a um país inviável

• Turquia → Este caso mostra as limitações do tratado de Versalhes e a


inutilidade da liga das nações desde o seu nascimento.

A Turquia fez parte do esforço de guerra das potências centrais, e através do


Tratado de Sèvres (1920) perde grande parte do território a Ocidente para a
Grécia, o exército era de 50mil homens, deixou de ter o controlo de dois
estreitos muito importantes a nível comercial (Bósforo e Dos Dardanelos). Para
além disso, tropas aliadas ficam estacionadas no seu território.

Face a isto surge uma ameaça direta de guerra contra os Aliados, não se
verificando a capacidade da Liga das Nações para diminuir o conflito, nem uma
resposta por parte dos Aliados

Para piorar a situação, os aliados decidem reescrever este tratado, assinando o


Tratado de Lausanne em 1923, tratado esse que diz exatamente o contrário do
tratado de Sévres

Lausanne → A Turquia pode recrutar os efetivos que entender para garantir a sua
segurança, volta a ter a total autoridade dos dois estreitos, o território da Grécia volta
todo para a Turquia embora a Grécia possa manter algumas partes pouco
significativas, os aliados têm de sair do território turco não podendo haver nenhuma
base aliada.

Em 1923 vê-se a incapacidade da liga das nações e dos aliados de cumprir o que fica
estipulado. O mundo percebeu que era possível alterar tratados sem nenhuma
consequência. O Tratado de Sèvres, ao ser rasgado pelas próprias potências que o
Martim Ghira Campos

escreveram, faz com que se perca a legitimidade e a autoridade de todos os tratados


até aí assinados. Ao não se respeitar o que ficou assinado em 1920, fica possível
reassinar tudo o que foi imposto até à data. O que leva a Alemanha a cumprir o que foi
assinado pelos Criminosos de Novembro?

A Alemanha sentia-se vulnerável do ponto de vista da sua segurança. Temia a Rússia, a


França e a Polónia.

Temia a França porque era um inimigo fundamental no continente e com as limitações


de exército, o exército francês era muito superior, representando uma possibilidade de
invasão terrestre. Em 1923, a Alemanha não pagou a cota de carvão prometida à
França, sendo grave porque era a 34ª falha em 3 anos, sendo que os Franceses
invadem militarmente o Sarre e o Reno, obrigando os mineiros alemães a pagar a cota,
levando a uma resposta alemã de greve geral. Os mineiros franceses são enviados para
a região e vai levar a inúmeras mortes. Este episódio é importante porque a França
atua à margem da Liga das Nações, voltando esta a ser posta em causa, porque a
França atuava à bruta, levando a uma possível resolução semelhante no futuro por
parte de outras nações.

Para além disso, a Polónia é um caso importante, porque no tratado de Versalhes, para
compensar a Polónia, desenha-se um corredor polaco que divide a Alemanha em duas
partes (para esta ter acesso ao mar), significando que uma parte da Alemanha era
governada por polacos e que a Alemanha não estava unida (a Alemanha via-se
obrigada a lutar em duas frentes porque este corredor polaco dividia o país em duas
partes)
A partir de 1919 a Polónia leva a cabo ações de captura de território que pertencia à
Rússia bolchevique, até que em 1920, a Rússia e a Polonia estão em guerra.

Mais uma vez a liga das nações não estava presente, sendo que se fez um envio de
tropas aliadas para a Polónia sob o mando francês com a ideia de repelir as forças
russas, conquistar território e só depois assinar um tratado.

Acaba por ser o Tratado de Riga (1921) → significa que mais uma vez ninguém ligava a
liga das nações, violava a ideia de Wilson contra a anexação de territórios, significa que
a Polónia se tornou um território maior mas a partir de 1920/21 a Polónia sabe que
tem dois inimigos brutais: Alemanha de Hitler que nunca vai perdoar o corredor polaco
e a URSS assim que terminassem a sua guerra civil. Quando Hitler e Estaline assinam o
Pacto Molotov-Ribbentrop em 1939, significava a divisão da Polónia entre a URSS e a
Alemanha, que não esqueciam de 1919/1920/1921

Em 1918 a Alemanha resolve refundar-se, no entanto era impossível que a república


nascesse em Berlim que era um campo de batalha entre a extrema-direita e a
extrema-esquerda, ou seja, a total instabilidade politica e social de Berlim implicou que
depois das eleições para uma nova Assembleia Constituinte, a elite alemã se tenha
deslocado para a cidade de Weimar, dando nome a toda a república.
Martim Ghira Campos

Ebert torna-se líder da Alemanha e as prioridades do novo chanceler passam por


confrontar as ameaças à instabilidade política da esquerda e da direita.

Um importante da esquerda foi a rebelião Espartaquista, liderada por Rosa


Luxemburgo que acaba por ser assassinada pelos Freikorps (grupos de veteranos de
guerra que defendiam a república de Weimar contra a ameaça Bolchevique). Não
significava que se identificassem com a república de Weimar, mas consideravam que
enquanto não fosse possível restaurar a monarquia, pelo menos era necessário evitar
que a Alemanha caísse nas mãos dos Bolcheviques

A nova Constituição da república de Weimar instituía uma república, um sistema


multipartidário, era avançada para o seu tempo, tinha alguns direitos fundamentais
ainda que nem sempre fossem respeitados, permite sufrágio universal.

Com o receio de existirem concentrações de poder na Alemanha, a constituição e o


seu sistema eleitoral, tornavam mais difícil a formação de partidos, de modo a evitar
um que se tornasse maioritário. Esta dificuldade de entendimento ente partidos leva à
criação da maioria de Hitler (frase contraditória e possivelmente errada ☺)

Desafios da república de Weimar → a nação alemã era uma nação de fome, que não
possuía os cuidados básicos de saúde proporcionado pela IIGM. As autoridades não
tinham muita autoridade em algumas cidades alemãs, que se denominavam sovietes.
É por isto que Ebert toma a iniciativa de combater rebeliões de direita e esquerda.

À direita → o Golpe de Estado de Kapp, situação de 1920 que consistia em duas fases:
1- Kapp, com o apoio do Freikorps, tenta controlar a cidade de (?)
2- Controlar todo o território alemão para repudiar a república de Weimar e a
constituição
A ideia de Kapp era, assim que possível, restituir a monarquia, representando a parte
fiel ao kaiser.
Este golpe falha, mas é um aviso da extrema direita

• Golpe de Munique levado a cabo pelo partido nacional socialista, dando a


prisão de Adolf Hitler

Num espaço de três anos, havia imensa instabilidade política e social, com inúmeros
assassinatos políticos. Para juntar a este quadro, desde 1919 a Alemanha nunca mais
viveu em paz.

Em 1923 dá-se a salvação da Alemanha, que até então era nada, com um dos nomes
mais importantes da república de Weimar → Gustav Stresemann

Guerra-Civil Espanhola (1936-1939)

Reinava Afonso XIII que resolve abandonar o país a 12 de Abril 1931 de modo a evitar
uma guerra sangrenta, sem ter abdicado formalmente.
Martim Ghira Campos

Dois dias depois é proclamada a 2ª república espanhola, mudando o regime

É criado um governo provisório que tem na frente Niceto Alcalá-Zamora, que tinha
uma visão conservadora da república, burguesa, assente nas classes médias e nos
intelectuais. Tentou que o conteúdo da nova república fosse moderado

No entanto, ao mesmo tempo, os setores que tinham ganho as autárquicas, queriam o


contrário, destruir as influências da igreja e do exército, à semelhança da revolução de
1910 Portuguesa (anticlerical e jacobinizante)

Esta Espanha é uma Espanha atingida pela recessão mundial de 1929, com aumento
do desemprego, com episódios de fome, 45% da população vive da agricultura, os
preços agrícolas estão em queda e há constante violência nas zonas rurais
Em Mais há episódios de queima de conventos e igrejas. Apesar da tentativa do
presidente do governo provisório de o tornar um governo moderado, havia uma fação
jacobinizante, levando a uma reação de medo

Há uma luta entre moderados e radicais quanto ao modo como esta república vai ser
formatada

No tempo do governo provisório há medidas que vão influenciar o modo como os


militares vão apoiar ou não este regime:

• Tentativa de reforma e de redução de efetivos no exército feita por Manuel


Azaña (Ministro da Guerra) e uma alteração no sistema de promoções
• Fechou-se a academia militar de Saragoça chefiada pelo General Franco

Apesar de todo o temor da direita face a este novo regime, há uma divisão inicial entre
dois campos:

• Os acidentalistas → achavam que a questão do regime não era a mais


importante. O movimento mais importante é a Confederação Espanhola das
Direitas, liderada por José Maria Gil Robles

• Os catastrofistas → achavam que o que era importante era acabar com este
novo regime e restaurar a antiga ordem. O movimento dos Carlistas,
equivalente espanhol ao Miguelismo, que defendiam outro ramo da dinastia de
Bourbon; a Renovação Espanhola que são os que defendem Afonso XIII; e
grupos fascizantes que olham para Itália e Alemanha e tiram inspiração (Junta
de ofensiva Nacional Sindicalista). Estes três movimentos fundem-se no
movimento Falange Espanhola, liderada por José António Primo de Rivera

Os catastrofistas querem derrubar o regime, porque achavam que nada do que viesse
era bom
Martim Ghira Campos

Os acidentalistas, sem prestar vassalagem à república, poderiam por dentro participar


no regime

Há eleições constituintes em Julho de 1931 e o resultado é uma vitória da esquerda


(Manuel Azaña centro-esquerda).

Da constituição resulta um sistema eleitoral que tinha tudo para dar asneira, porque
era natural baseado na república de Weimar, beneficiando brutalmente os partidos
mais votados. Acontecia que bastava uma maioria pequena de votos para que no
Parlamento a diferença de mandatos fosse enorme

Quer de um lado que do outro, a violência nas ruas, contra as igrejas e conventos,
contra partidos de esquerda, operários, nunca parou. Nunca houve uma completa
estabilidade deste regime.
A constituição é adotada a 9 de Novembro, era laica, democrática, liberal, mas com um
anticlericalismo muito acentuado

Alcalá-Zamora demite-se porque era católico e não se identificava com a nova


Constituição, e a presidência é assumida por Manuel Azaña, tendo então o primeiro
biénio (1931-33) → Biénio reformista/progressista

Há uma questão regional → A Catalunha quer uma república e independência

Há uma questão religiosa que a nova república quer diminuir drasticamente. Quer
diminuir o poder da Igreja Católica, nacionalizando os bens da mesma, dissolvendo
ordens como os Jesuítas, secularizando os cemitérios, implementando a lei do divórcio
Está criado um clima de hostilidade em relação á igreja católica e em relação aos
grandes proprietários

Há ainda a questão agrária do desemprego rural, uma questão sindical (os sindicatos
tinham pouco poder). Promulga-se uma lei de reforma agrária e persiste a reforma
militar de Manuel Azaña

Este primeiro biénio é um biénio de cumprimento do programa progressista do novo


governo. Em 1932 há uma tentativa de golpe por parte do General Sanjurjo que
fracassa, e acaba por ser preso e condenado à morte, mas acaba por se exilar em
Portugal

Há uma insurreição anarquista

Face ao caráter anticlerical do novo regime, o Papa faz uma condenação explicita do
espírito anticristão do regime espanhol → Não é que se deva defender a monarquia, o
que estava em causa era o ataque permanente que a Igreja sofria.

A Europa ainda estava a sofrer o impacto da revolução Bolchevique, o fascismo em


Itália estava a afirmar-se e o partido nazi também. O mundo corria para os extremos →
O medo do fascismo e o medo da ameaça vermelha
Martim Ghira Campos

Há dois blocos sociais antagónicos acerca da Espanha

Em Novembro de 1933 a direita ganha as novas eleições (primeiras eleições em que as


mulheres votaram, estando isto relacionado com o facto de serem mais conservadores
e aproximadas da Igreja, pelo que ficaram afastadas das primeiras eleições)

Primeiro Biénio 1931-1933


Segundo Biénio 1933-1935

Este segundo biénio é considerado pela esquerda o biénio negro, porque tenta
retificar o biénio anterior. O partido mais votado não era quem constituía governo,
sendo convidado para liderar o governo o partido republicano radical, que apesar do
nome acabou por ser centrista e moderado.
Houve uma tentativa de parar algumas propostas progressistas do antigo biénio. A
ideia não é fazer tudo ao contrário, é sim dar margem à república para acolher a
direita acidentalista.

Partidos:

• Esquerda → Socialistas, comunistas, PSOE


• Direita → CEDA que concorre aliada aos partidos catastrofistas
• Centro → Republicano radical que se alia ao movimento de direita

Há mais tensões e violência, e há da parte da direita, o medo que se instala


proveniente do Golpe de 1934 (Outubro Vermelho)

Dentro do PSOE há uma fação mais moderada e uma fação mais radical (fala muitas
vezes da ditadura do proletariado, fala muito de Lenine, aproxima-se de um
esquerdismo mais radical)
O PSOE vive numa tensão dentro de si, devido a estas duas fações

Este período mais tenso leva a eleições gerais em 1936, a esquerda concorre unida e
volta a ganhar. São eleições contestadas pela direita, pode ter havido fraude, mas não
havia mecanismos para verificar a veracidade das eleições

Manuel Azaña volta a ser PM. Assim que toma posse põe os generais mais
conservadores nas periferias, amnistia os revoltosos do Outubro Vermelho soltando
muitos presos, tendo como consequência um aumento do clima de preocupação.

A violência não para e aumenta a uma velocidade incrível, traduzindo-se nos debates
parlamentares. Havia “mortes, saque, destruição”

A conspiração estava em marcha há algum tempo e a morte de Calve Sotelo foi um


fator de ignição do golpe que estava previsto.
Martim Ghira Campos

Já desde Março de 1936 que havia um conjunto de generais que conspiravam para
restaurar a ordem na república.

Temos um Movimento com Sanjurjo como líder, mas como se faz a guerra contra um
regime que tem as Forças Armadas (monopólio da violência)? Implica organização e
capacidade de insurreição de unidades militares

Participantes: Mola (cérebro da operação), Franco, Fanjul, Goded, José António Primo
da Rivera (preso e fuzilado)

Franco viaja para Marrocos, põe-se à frente do exército marroquino espanhol, mas
havia o problema de passar o exército para o sul de Espanha. A Marinha estava
maioritariamente do lado da república, por isso era preciso uma ajuda. A ajuda chegou
dos Alemães e dos Italianos

Fanjul e Goded estavam em Madrid e Barcelona, são presos e fuzilados

Sanjurjo apanha um avião de um amigo para chegar mais rápido e o avião cai

Há um período com uma liderança bicéfala, a Norte Mola e a Sul Franco

O general Mola morre, sobrando apenas Franco

Em 1937, o governo republicano está cada vez mais defensivo


Em 1938 mantém-se igual
Em 39 está relativamente estável, mas não há maneira de os republicanos ganharem a
guerra. Uma das razões foi a passagem dos generais mais experientes para o lado
revolucionário (é paradoxal o exército revolucionário ser o mais experiente)

Durante a Guerra, Franco tem decisões estranhas, por exemplo, em 1936 Madrid
estava à mão de semear, mas Franco decide ir a Toledo porque havia um contingente
nacionalista cercado. Este atraso fez com que Franco tivesse mais tempo para
consolidar o seu poder pessoal

Do lado nacionalista → temos um exército estruturado, hierarquizado e com aptidão


combatente, apoiado pela Alemanha, Itália e Portugal (Viriatos).

Do lado republicano → temos uma maior dificuldade de organização, alguns generais,


mas com dificuldade em ter um comando único, com apoio Soviético (por um lado
trouxe mais eficácia militar, mas por outro aumentou o controlo comunistas sobre as
Forças Armadas Espanholas da República)

A república, face ao ataque a Madrid, muda a capital para Valência e depois para
Barcelona. Mais tarde acaba por reconhecer a derrota
Martim Ghira Campos

A fase final de Madrid implicou um Golpe de Estado republicano contra o Governo em


funções, achando que haveria margem para negociações. Assim que Madrid se rende
não há qualquer tipo de negociação

Franco assume o papel de Comandante máximo das Forças (?)istas e o lugar de


Generalíssimo. Franco assume o título de líder de Espanha

O exército vermelho perdeu a força, a guerra acaba e o novo regime tem o nome de El
Nuevo Estado

Tudo isto originou uma fratura na sociedade espanhola. Os massacres sucederam-se, a


arbitrariedade sucedeu-se, a violência sucedeu-se, houve mortes, perseguição etc

Na altura, o regime procurou dignificar o seu lado (ficar como o bom da fita), mas com
o tempo a historiografia é equilibrada

A Espanha democrática que há hoje em dia foi uma transição, uma vez que o regime
Franquista votou a sua dissolução, não sendo preciso uma revolução

Inicio república de Weimar

O que se verificou em Weimar foi um confronto de extremos em que a extrema direita


e a extrema esquerda colocaram em causa a legitimidade da república de Weimar, isto
é, procuraram pela força das armas tomar o poder, quer a nível federal, quer a nível
estadual. Um dos exemplos deste clima insurrecional acontece em Munique em 1923
com Adolf Hitler.

Os primeiros anos da república de Weimar foram anos de grande conflitualidade


política, de grande violência onde o assassinato de políticos era recorrente. Foi um
período de grandes dificuldades económicas, onde um país derrotado foi sujeito a
termos muito duros do Tratado de Versalhes e tinha a obrigação de pagar dividas de
guerra pesadas. Não tinha o apoio do seu tecido industrial e económico robusto, isto
porque a Alemanha tinha perdido território industrial importante e população.

Apesar de toda a situação, havia um nome importante, Gustav Stresseman, chanceler


da Alemanha em 1923. Mas foi como Ministro dos Negócios Estrangeiros que teve
um papel muito importante:

• Quer do ponto de vista diplomático → A Alemanha voltou ao concerto das


nações e a ser um país respeitado

• Quer do ponto de vista económico e financeiro → tentativa de solucionar a


crise económica alemã, o problema da inflação e posteriormente da
hiperinflação

Iniciativas diplomáticas de Stresseman que tiveram impacto na Alemanha e na Europa:


Martim Ghira Campos

1) Tratados de Locarno (1925) → Stresseman convida Aristide Briand (MNE


Francês) para assinar um tratado de maneira a melhorar as relações
diplomáticas entre os dois inimigos tradicionais europeus desde a guerra
Franco-prussiana (1870), procurando uma normalização diplomática entre
França e Alemanha.

O que é que é colocado em cima da mesa de negociações por parte de


Stresseman?

a. Aceita oficialmente as fronteiras redefinidas pelo Tratado de Versalhes

b. Fez uma afirmação de que a Alemanha não seria mais um problema das
negociações no centro da Europa, ou seja, não perturbaria as relações
no seio da Europa

c. O Tratado foi também assinado pela Grã-Bretanha, Itália, Bélgica e pela


Checoslováquia → Comprometiam-se a não iniciar hostilidades entre si
e a apoiar um país que fosse invadido. Isto era importante para a
Alemanha porque desde a derrota na IGM, a Alemanha temia a França,
sendo que isto dava à Alemanha conforto e segurança, porque caso
fosse invadida, teria ajuda de todas as outras potências.

2) Como corolário dos Tratados de Locarno, em 1926 a Alemanha entra na Liga


das Nações, deixando de ser uma espécie de pária internacional, regressando
ao palco internacional.

Se Stresseman permitiu o renascer internacional da Alemanha, também foi muito


importante do ponto de vista económico, como por exemplo o cumprimento sério do
pagamento de guerra → Para que isto acontecesse, era preciso estabilizar
financeiramente a Alemanha, levando à implementação de uma nova moeda:

• Em Novembro de 1923 introduz-se uma moeda temporária – Rentenmark


(baseado no valor patrimonial e não nas reservas de ouro, para controlar a
inflação. Gradualmente é restaurada a confiança do povo alemão)

• Mais tarde é convertido em Reichsmark, que já era suportado pelas reservas


de ouro e que passou a circular na Alemanha controlando a hiperinflação

A juntar a isto, outro plano económico de Stresseman é o Plano de Dawes (1924) –


Stresseman conseguiu para a Alemanha um novo esquema de reparações, ou seja,
havia a intenção de pagar aquilo que era devido, mas era necessário que a Alemanha
tivesse capacidade de honrar os seus compromissos, caso contrário cairia muito
rapidamente na situação de incumprimento.

Plano Dawes:
Martim Ghira Campos

1) Este plano previa empréstimos americanos à Alemanha de cerca de 800milhões


de marcos de ouro para revitalizar a economia e pagar o que devia às potências
aliadas.

2) Este novo esquema de reparações acautela a capacidade da economia alemã


para fazer estes pagamentos, ou seja, as reparações seriam sempre pagas de
acordo com o crescimento da economia alemã (algo que não foi bem
acautelado no Tratado de Versalhes).

3) Além disso, o período de pagamento do empréstimo foi significativamente


aumentado.

4) Por fim, o montante a pagar foi reduzido a 1/3 relativamente ao que tinha sido
determinado pelo Tratado de Versalhes.

Os EUA emprestam dinheiro à Alemanha, com este empréstimo a Alemanha é capaz


de pagar as reparações de guerra à Grã-Bretanha e à França, que por sua vez são
capazes de pagar os empréstimos aos EUA.

Ciclo vicioso de pagamentos → este modelo funciona muito bem enquanto tudo
funciona muito bem. Basta um dos membros não ter capacidade de empréstimo para
que o ciclo colapse completamente, sendo que estão todos dependentes de todos.
Se uma economia entra em colapso, as outras consequentemente também vão
caminhar no mesmo caminho.

O ciclo de pagamentos assenta num pensamento otimista de que tudo vai correr bem.
No entanto, os dois Crashs da Bolsa de Nova Iorque vão colocar em causa este ciclo
perfeito, em que o dinheiro circula para contentamento de todos os participantes. O
que acontece a partir de 1929 é que os EUA desaparecem do ciclo, ou seja, com o sair
do grande financiador mundial, é evidente que as economias europeias (a começar
pela Alemã, Francesa e Britânica) vão também entrar em colapso.

Grande depressão (O crash de 1929, o que se passou nos EUA)

Não há uma explicação uniforme para o que se passou, não se sabe quem é o
verdadeiro responsável, há várias opiniões acerca de Roosevelt, sendo que há quem
defenda que a IIGM é que salvou verdadeiramente a economia americana.
Martim Ghira Campos

É importante perceber o que era a estrutura da economia americana em finais do


século XIX e inícios do século XX. O crash e a Grande depressão apenas suscitaram
problemas/fragilidades que eram estruturais da economia americana e que nunca
tinham sido verdadeiramente enfrentados.

Entre 1890 até à IGM, os EUA emergiram como a mais importante economia mundial,
devido ao papel que os EUA tiveram na 2ª Revolução Industrial, igual ao papel que a
Grã-Bretanha teve na 1ª.

Nesta 2ª Revolução não falamos de carvão, ferro, etc., falamos sim de grandes
desenvolvimentos na engenharia, no petróleo, nos químicos, na eletricidade, nos
produtos farmacêuticos, nas novas formas de comunicação (telégrafo, telefone, rádio).

É um período em que os EUA começam a ter uma liderança económica mundial,


deixando de ser um país tradicionalmente importador em 1913, e passam a ser
essencialmente exportadores (cobre, aço, ferro, petróleo). Quando se dá a IGM os EUA
estão numa situação invejável, não apenas porque já eram os exportadores para o
velho mundo, mas também porque passaram a ser os principais exportadores de bens
de primeira necessidade e de armamento durante a IGM.

A indústria americana era pojante, sendo que em 1890 a agricultura americana não
acompanhava os progressos da indústria. Verifica-se uma queda acentuada dos preços
agrícolas, uma limitação do crédito, uma grande dependência do caminho de ferro e
dos bancos, uma grande preocupação com a mão de obra barata causada pelas
grandes vagas de emigração que chegavam aos EUA.

A agricultura não acompanhou o processo de modernização da nova indústria


americana. É nesta altura (finais do século XIX) que o partido populista americano
surge nas zonas rurais e opunham-se ao capitalismo, exigindo várias coisas: subsídios
ao Estado, controlo dos preços praticados pelos caminhos de ferro para o transporte
dos bens agrícolas, controlo da emigração que provocava mão de obra barata. O
partido populista teve muito sucesso na altura, mas desaparece quando o partido
republicano e o democrata integram as preocupações do partido populista nos seus
programas eleitorais.

Com a IGM, que foi uma espécie de tónico que acabou por levar à prosperidade da
economia americana, os EUA tornam-se a economia dominante no mundo. Nesta
altura (início da década de 20) os americanos passam a ter um padrão de vida
elevadíssimo. Havia um desejo de consumir, de conforto material e de acesso aos
novos produtos e novidades tecnológicas.

Antes de 1914 o padrão da economia americana passava por empréstimos e


investimentos em países que eram capazes de desenvolver as suas estruturas
produtivas e através disso eram capazes de pagar esses empréstimos, sendo uma
situação em que ambas as partes ficavam a ganhar.
Martim Ghira Campos

A partir de 1918 e sobretudo durante o período da guerra onde havia empréstimos


para setores não produtivos da economia europeia, os empréstimos feitos pelos EUA
não tinham retorno e não contribuíam para o desenvolvimento das economias
europeias

Nas vésperas de 1929, temos excesso de crédito, de dividas e uma incapacidade de


pagar o crédito e as dividias que tinham sido contraídas. É neste contexto, com todas
estas fragilidades, que se dá o Crash de 1929.

O que se passou? No final da década de 20, a compra de ações estava fora de controlo,
os preços tinham duplicado entre 1926 e 1929, sendo que o valor das ações cresceu
muito mais em relação ao que a economia valia efetivamente. Além disso, muitas
ações eram compradas com empréstimos que cobriam até 75% do seu valor. Comprar
e vender ações era um passatempo para todos, era uma prática corrente.

Em setembro dá-se uma queda abrupta do valor das ações, sendo um primeiro sinal,
mas não gerou grande pânico. No dia 24 de Outubro (Black Thursday) e a 29 de
Outubro (Black Tuesday), o valor das ações caiu em 26 mil milhões de dólares. Esta
derrocada financeira não tem uma explicação certa.

Possibilidades dadas por historiadores:

• Ausência de regulação adequada pois havia a ideia de que o Estado devia


intervir o menos possível. É verdade em 1929 porque estamos numa fase
incipiente do capitalismo;

• Razões psicológicas relacionadas com a prosperidade e as taxas de juro baixas


que levaram à especulação;

• Importância da influência do padrão ouro com o regresso da Grã-Bretanha ao


mesmo;

• Causas estruturais americanas que agravaram a depressão de 1929,


convertendo-a numa Grande Depressão, de tal forma que muitos historiadores
afirmam que mais importante do que olhar para as medidas tomadas por
Hoover ou por Roosevelt, a economia americana só seria verdadeiramente
salva com um novo conflito mundial;

Em 1929 → 3% de desemprego, que representa uma situação quase perfeita


Em 1933 → 25%, 30 milhões de americanos não têm meios adequados para a própria
subsistência, dado que as mulheres e crianças não trabalham.

Do ponto de vista bancário, a grande depressão liquidou mais de 5500 bancos. Isto
explica-se pela incapacidade dos clientes de fazerem os seus pagamentos e da Europa
de honrar os seus compromissos bancários. As fontes tradicionais de rendimento dos
bancos (depósitos e concessão de empréstimos) também entram em colapso.
Martim Ghira Campos

Herbert Hoover foi muito importante na IGM e na forma comos os EUA acorreram às
situações de fome e miséria da população russa em 1917. Esteve à frente dos esforços
de recuperação económica e de salvamento nas grandes cheias do Mississípi. Se havia
alguém preparado para enfrentar as consequências de uma depressão, esse alguém
era Hoover. Atualmente, foi considerado incapaz de lidar com a depressão e deixou
termos de críticas como os Hoover Blankets ou a Hooverville.

Quais foram os problemas de Hoover? A lentidão da resposta através da sua


passividade inicial. Isto explica-se do ponto de vista ideológico, pois era uma
situação que tinha sido causada pelo próprio sistema capitalista e o presidente
Hoover, como conservador que era, acreditou que os problemas se iriam
resolver sozinhos, ou seja, sem ser necessária a intervenção do Estado.
A contribuir para esta passividade, está o facto dos reais efeitos da depressão
não se fazerem sentir em 1929, mas sim a partir de 1931 com as falências, o
desemprego, o colapso do sistema bancário, é que Hoover vai ser obrigado,
contra os seus ideais, a tentar interferir na economia americana.

Perante isto, quais foram as respostas a nível federal que foram encontradas para
estancar os efeitos da Grande Depressão:

1) Primeiro percebe que é necessário intervir no sistema bancário, sendo


necessário fazer referência ao Reconstruction Finance Corporation 1932 –
instrumento sancionado pelo governo federal, para financiamento direto
aos bancos, ou seja, o Estado assumia-se como emprestador de último
recurso de forma a garantir a liquidez à banca em dificuldades. Foi uma
medida importante, mas que não foi extensível a outras áreas da economia
americana.

2) Outro projeto foi o Grain Stabilisation Corporation 1930, que procurou


tabelar os preços do trigo de forma a evitar (?)

3) (?)

Subida de Hitler ao Poder

Como é que se explica o colapso da república de Weimar e a subida ao poder de um


líder de uma fação extremista pequeníssima?

Hitler é um caso clássico de alguém que utiliza a democracia para liquidar a


democracia, ou seja, não se fala em golpe de Estado, mas sim numa apresentação
democrática ao eleitorado alemão e através de eleições chegar ao poder. É a prova de
que, mesmo seguindo todas as regras constitucionais, a emergência de um Estado
Ditatorial não está completamente excluída.

Putsch de Munique → Em 1923, época de grande instabilidade, onde a política era


dominada pelos extremos, dá-se uma tentativa frustrada de Golpe de Estado na
Martim Ghira Campos

Baviera. Foi a primeira aparição de Hitler, onde o mesmo foi preso e acusado de
traição, sendo assim que o golpe uma conotação importante na história da Europa e
da Alemanha.

A passagem pela prisão é importante no estudo do nacional-socialismo porque nos 9


meses em que esteve preso, Hitler condensou toda a sua visão política no chamado
Mein Kampf.

O Mein Kampf funciona como uma espécie de blueprint onde as ideias centrais de
Hitler são expostas e estão já contidas.

Concessão rácica da humanidade → Afirma claramente que os Arianos são uma raça
superior e nesse sentido, qualquer política de Estado deve passar pela preservação da
pureza da raça. Na cabeça de Hitler, a diferença entre a colonização da América do
Norte e da América do Sul, está no facto de a América do Norte ter preservado os
emigrantes originários e a sua raça, evitando a mistura com a população nativa, não
corrompendo a sua raça. Isto é um aviso feito no Mein Kampf, acerca do que o partido
nazi iria fazer assim que chegasse ao poder, por exemplo através de um conjunto de
leis de Estado, onde se proíbe o casamento entre Arianos e não Arianos (sobretudo
Judeus).

O Mein Kampf tem outro elemento da mundividência nazi → antissemitismo

Tem a ideia de que as raças impuras (principalmente Judeus) fazem de tudo para
minar os fundamentos raciais puros. Corrompe mulheres, meninas e até o sangue
através do casamento com arianos. Para ele a corrupção da raça ariana por parte das
raças impuras, não é meramente pessoal, é sim uma procura de obedecer a um plano
desenhado para conquistar e manipular a sociedade. Este património antissemita é
recuperado de documentos e ideologias já existentes, como por exemplo:

• Protocolos dos Sábios do Sião → documento que em finais do século XIX, a


polícia czarista forjou, para tentar comprovar um alegado plano judaico de
dominação do mundo. É usado para justificar as perseguições que a Rússia
czarista fazia aos judeus. Aquilo que Hitler escreve no seu Mein Kampf é uma
espécie de paráfrase daquilo que se pode encontrar nos Protocolos dos Sábios
do Sião

(à parte) Depois de um período de abertura no Leste da Europa para os Judeus


que aí viviam (czar Alexandre II), o czar é assassinado. Não foi assassinado por
judeus, mas foi-lhes atribuída a responsabilidade do ato, pelo que o czar
Alexandre III leva a cabo uma vaga de ataques antissemitas, sendo nesse
contexto que surgem os Protocolos dos Sábios do Sião. Este documento
procura demonstrar que existe um plano universal segundo o qual os Judeus,
através de intervenção nos governos, na finança, nos media, na literatura,
procuram dominar o Ocidente e subjugar os povos não arianos aos seus
desígnios, ambição de riqueza, manipulação e domínio. Este documento,
Martim Ghira Campos

apesar de comprovadamente forjado, ainda hoje tem um papel muito nocivo


quando se fala do antissemitismo contemporâneo:

Exemplo: a carta fundamental do Hamas (grupo islamita radical), cita


como argumento os Protocolos dos Sábios do Sião

Existe o antissemitismo religioso (séculos XIII, XIV, XV na europa), o nacionalista


(século XIX) e rácico (século XX, ligado ao Holocausto)

Até aqui há dois elementos presentes no Mein Kampf → afirmação da raça ariana
como superior e a demonização dos judeus

Para além desses, existe a definição do Estado racista → uma defesa da ditadura, como
forma de fortalecer a Alemanha depois das injustiças de 1919. Nesta defesa do Estado
Ditatorial, um dos elementos a destruir é, sem grande surpresa, o próprio Parlamento.
O Estado racista/ditatorial, não tem um corpo de representantes que possam resolver
através da maioria de votos. O que está aqui em causa é a destruição da democracia
representativa pelo estabelecimento de uma estrutura de poder vertical, na qual no
topo está o Führer e a quem todos devem a sua obediência.

Os inimigos da Alemanha não são apenas a França, os Judeus como corpo interior, são
também os Comunistas (para Hitler, judeus e comunistas é como se fossem entidades
indistinguíveis, quase a mesma coisa). Para ele, a Rússia Comunista é dominada por
Judeus, e os judeus com a sua mensagem internacionalista, mais cedo ou mais tarde
vão tentar fazer o mesmo com a Alemanha.

Portanto, quando no Mein Kampf se lê que a destruição do Comunismo é também um


objetivo do partido nacional socialista, aquilo que se vai passar sobretudo depois de
1941, não deixa ninguém espantado.

Por outro lado, afirma que a exiguidade do território alemão não pode continuar (é
provado que a fação nazi, uma vez no poder, não ia respeitar os pontos do Tratado de
Versalhes, pois defendem que a Alemanha não pode viver confinada a um espaço tão
exíguo).

Encontramos também a semente do conceito de espaço vital, ou seja, a ideia de que a


Alemanha deve integrar territórios que já foram parte do seu grande Império e onde
existe população germânica, expandindo-se essencialmente para Leste.

Aquilo que é realmente importante depois do golpe falhado de 1923, não é apenas a
oportunidade que Hitler teve de por em “ordem” as suas ideias, mas é essencialmente
o facto de Hitler ter percebido que a chegada ao poder dar-se-á por via democrática.
Não valia a pena subverter o Estado e o caminho passava pela realização de eleições.

Até 1929 o partido nazi vai participar nas várias eleições, sendo que os resultados
obtidos são irrelevantes. Se o partido nazi se tivesse dissolvido em 1929, dificilmente a
Martim Ghira Campos

História tinha sido a que foi e as ideias de Hitler eram só um pequeno retrato de ideias,
lidas por curiosos.

O problema é que 1929 é o ano do grande Crash, sendo que a Grande Depressão tem
um efeito devastador na Alemanha. O Crash de Wallstreet rapidamente se alastra na
Europa, levando à queda do comércio mundial e aumento do desemprego, pelo que a
Alemanha é atingida duramente pela Grande Depressão. Em parte, pela fragilidade
económica que já era parte da República de Weimar, mas também porque começou a
ser exigido o pagamento dos empréstimos dos EUA desde 1924. Isto leva a que a
República de Weimar deixe de poder honrar os seus compromissos, levando a um
crescimento assustador do desemprego dentro da Alemanha e sobretudo ao
crescimento espetacular dos partidos extremistas do sistema (comunista e nacional-
socialista).

A diferença estava na composição dos eleitorados dos dois partidos → quem vota do
partido comunista é o proletariado, os nazis eram apoiados pelos pequenos
comerciantes, para os trabalhadores desempregados e pela elite intelectual alemã,
universidades, classe letrada. Hitler antes de conquistar o Estado, começa por
conquistar os estudantes.

O clima é então aproveitado pelo partido nazi e sobretudo aproveitado para iniciar um
conjunto de ações de terrorismo contra os potenciais adversários do partido nazi.
Surgem então as SA (camisas castanhas), uma milícia privada do partido nacional-
socialista, para ameaçar opositores políticos, cultivar uma atmosfera de caos.

A partir de 1929, a República de Weimar, que tinha conhecido um período de relativa


estabilidade a partir de Stresseman (1924), regressa até aos inícios da sua existência.

Perante este clima de caos, encontramos a ascensão do partido nazi, entre 1928 e
1933. Um pequeno partido torna-se o partido mais votado da Alemanha

Como é que se explica a subida de Hitler ao poder? Como é que se vai estender a
passadeira para que Hitler possa chegar a líder do governo?

Isto é visível com as eleições de Novembro de 1932 → Tendo em conta a incapacidade


dos sucessivos governos de encontrar uma maioria estável que lhes permitisse
governar, dão-se novas eleições em 1932. O que acontece é que não se consegue
encontrar uma maioria estável (o partido nacional-socialista tem a maioria dos votos,
mas não consegue governar por si só).

Em Janeiro de 1933 dá-se um dos episódios mais importantes da história da Alemanha


e da Europa → o Presidente Hindenburg vai acabar por nomear Hitler para chanceler,
mas de forma a poder limitar esse poder, o Presidente vai impor Von Papen como
Vice-Chanceler. Além disso, por indicação do presidente, o governo nazi não poderia
ter mais do que 2 Ministros do partido nacional-socialista.
Martim Ghira Campos

Perante a incapacidade de se gerar maiorias a partir de finais da década de 30, o


presidente será forçado a convidar Hitler para chanceler, acreditando que tendo Von
Papen como vice-chanceler e limitando a presença de membros do partido nacional-
socialista no governo, era possível controlar Hitler e impedir que a Alemanha inicia-se
uma deriva rumo à ditadura.

A verdade é que de facto Hitler parecia limitado → os nazis não tinham maioria
parlamentar, só havia 3 membros do partido nazi no governo, o partido comunista era
uma força importante e expressiva.

Então como é que a partir de Janeiro de 1933, com todas estas condicionantes,
Hitler, num espaço de 18 meses, destrói a República de Weimar e se torna ditador da
Alemanha?

• Um dos acontecimentos que vai explicar essa espécie de fatalidade, dá-se logo
em Fevereiro de 1933, com o famoso incêndio do Reichstag. O Reichstag é o
edifício que alberga o Parlamento Alemão. Hitler responsabiliza o partido
comunista pelo incêndio e de terrorismo, convocando eleições para Março de
1933, porque entendia que num contexto de medo e de ameaça comunista,
era possível haver uma espécie de consagração democrática oficial do partido
nacional-socialista. Pretendia, com novas eleições, ter o partido nazi não
apenas como mais votado (pois já era), mas capaz de congregar a maioria do
parlamento. Para além disso, visava formar um Governo sem limitações
impostas pelo Presidente.
Há eleições, mas, mais uma vez, não é concedida uma maioria absoluta ao
partido nazi.

• Apesar de desapontado com o resultado eleitoral, Hitler impede que o partido


comunista tome lugar no parlamento e vai conseguir o apoio do partido do
centro (partido católico) e do partido nacionalista para formar governo.
O que acontece é que Hitler consegue congregar dois partidos importantes da
democracia alemã, conseguindo formar um governo de maioria, governo esse
que começa por lançar mão de uma manobra típica de um Estado Ditatorial, ao
excluir o partido comunista e a sua representação no Parlamento alemão.

• Mas Hitler não fica por aqui. Vai imediatamente neutralizar os opositores
políticos, acabando por banir todos os partidos políticos, incluindo os partidos
que lhe possibilitaram a formação de uma maioria.

• Além disso, e socorrendo-se da lei de emergência que Hitler tinha obrigado o


Presidente a passar aquando do incendio do Reichstag, Hitler vai também
proibir a formação de novos partidos políticos, significando que a Alemanha se
transformara numa ditadura de partido único, ao mesmo tempo que prendia
socialistas, comunistas e membros da direita nacionalista ou popular.

• A seguir a tudo isto, o que se passa é o endurecimento de um regime ditatorial:


Martim Ghira Campos

o Proíbe os sindicatos

o Elimina os próprios SA que serviram como milícia do próprio partido


nazi nas campanhas de terror e violência. Os camisas castanhas estavam
ao comando de Ernst Röhm, e Hitler, para além de eliminar opositores,
eliminou membros que não lhe eram inteiramente fiéis, sendo que
neste caso, Röhm queria tomar o seu lugar, sendo uma ameaça direta à
liderança de Hitler.

Noite das Facas Longas → Neste sentido, a 30 de Junho de 1934 as SS prendem e


executam vários membros das SA. Röhm foi abatido na prisão, outros elementos das
SA são também eliminados.

Uma vez eliminada a oposição externa e interna, Hitler assume-se como senhor
absoluto da Alemanha e a Alemanha passa a ser um Estado Ditatorial, significando que
é um Estado submetido ao líder, em que existem campos de concentração para
opositores políticos sem julgamento prévio.
A partir de 1935 surgem as primeiras leis antissemitas na Alemanha, juntando-se ás
campanhas sistemáticas de identificação e de exclusão civil dos Judeus.

A partir de 1933 começa o Holocausto, por apesar de datar 1941, é em 1933 que
começa a definição de Holocausto. Não é apenas o que se fez nos campos de
extermínio, não é apenas o que se fez no contexto da IIGM, é aquilo que se começa
logo a fazer em 1933 e mais tarde em 1935 com Leis que excluem os judeus da vida
civil alemã.

Conclusão → O processo de ascensão ao poder de Hitler acelerou-se de forma


dramática a partir de 1928, mas sobretudo com o crash de 1929. A partir deste
momento, um partido que até então era um partido marginal, sem grande expressão
eleitoral, transforma-se no partido mais votado da Alemanha. Apesar de não conseguir
maioria Parlamentar para governar, conseguiu cooptar partidos tradicionais alemães
para chegar ao poder. Utilizando esses partidos, acaba por se tornar ditador da
Alemanha e em 1934, quando se dá a morte do Presidente ele consegue congregar
nele próprio as figuras de chanceler e Presidente (Führer)

Desde o início que o partido nazi tem uma atenção especial e letal para com os judeus,
algo que não era uma novidade para a extrema direita alemã nem para Hitler. O
problema é que quando atinge o poder, Hitler lança várias medidas, que começam por
ser de natureza legal, de modo a excluir a população judaica da Alemanha.

Leis de Nuremberga (Setembro de 1935) → têm uma importância decisiva na escalada


antissemita do regime nazi, em primeiro lugar, colocando restrições legais aos judeus,
restrições essas que procuram cumprir a visão da raça pura que Hitler já tinha
elaborado no Mein Kampf.
São constituídas por duas Leis/Decretos, que procuram essa mesma exclusão dos
judeus da vida alemã:
Martim Ghira Campos

1) Leis para a proteção do sangue e da honra alemãs → proibição de casamento


entre arianos e judeus

2) Lei da cidadania do Reich → vai retirar aos judeus a condição de cidadãos


plenos, definindo-os como súbditos do Reich em vez de cidadãos. Isto significa
que perdem direitos de participação política, sendo uma degradação cívica que
vai acarretar um conjunto de novas restrições que se espalham para as esferas
de natureza comercial, económica, cultural. Há, por via legal, um estreitamento
do espaço de ação dos judeus na Alemanha

Para piorar esta situação, é preciso referenciar a Kristallnacht, conhecida como a Noite
dos Cristais, que foi essencialmente uma campanha de violência levada a cabo contra
os judeus, tomando como rastilho o facto de um jovem judeu ter assassinado um
oficial alemão na embaixada de Paris. Foi um assassinato motivado por razões de
natureza privada/familiar, porque este jovem tinha a família deportada para a
Alemanha. Como resposta, aproveitando o acontecimento, os nazis levam a cabo a
campanha de violência em toda a Alemanha, sendo a primeira campanha sistemática
de perseguição aos judeus, começando a encher os campos de concentração com
judeus. Os vidros partidos das lojas dos judeus faziam lembrar cristais, dando origem
ao nome da noite.

Começa a surgir em 1935, um conjunto de organizações judaicas no interior e fora da


Alemanha, que têm como principal objetivo ajudar à emigração de judeus para fora da
Alemanha.

Para além disto, e do ponto de vista da construção da ditadura alemã, é evidente que a
ditadura se fazia com censura prévia, com controlo da educação com o papel
fundamental do Ministro Goebbles, uniformização cultural e perseguição de artistas.

A Alemanha começa a desenvolver, do ponto de vista científico, a esterilização


compulsória para quem tivesse deficiências físicas ou doenças mentais, tendo como
objetivo a criação de uma raça pura, que pudesse deixar uma espécie de património
genético à descendência sem qualquer imperfeição.

Quando Hitler chega ao poder em 1933, a economia estava em ruínas. O impacto da


Grande Depressão teve um peso brutal na Alemanha, porque a economia alemã era
muito endividada e ligada à máquina da banca americana, significando que perante
uma situação de Grande Depressão, fica privada dessa fonte de rendimento.

Uma vez no poder, o partido nazi começa a desenvolver grandes obras de


modernização e industrialização do país, que começam por ter efeitos económicos a
muito curto prazo, como por exemplo a queda brutal da taxa de desemprego.

Hitler vai, numa primeira exibição de força face à comunidade internacional, e


sobretudo numa exibição de força que procura desautorizar a autoridade do Tratado
de Versalhes, rasgar os limites à capacidade alemã que tinham sido estabelecidos pelo
Martim Ghira Campos

Tratado. Em 1935, anuncia o rearmamento e recruta militar alemães, passando de 100


mil efetivos a 1milhão e meio de homens.

Este rearmamento da Alemanha acabou por ter um impacto imediato em outros


setores da economia e da indústria alemã. Teve uma importância decisiva na indústria
do carvão, dos químicos, do ferro, de tal forma, que em 1939, a economia alemã já era
uma das mais poderosas da Europa.

Dito isto, como é que podemos explicar que Hitler, no espaço de 6 anos, se
transforma de líder da Alemanha em responsável pelo início da IIGM? Hoje, em 2020,
é fácil olhar para a forma gradual como Hitler foi rasgando os vários tratados
internacionais e desrespeitando fronteiras soberanas, como uma prova claríssima de
que Hitler pretendia expandir o seu Reich, podendo apenas conduzir a uma situação
militar. Na verdade, vivendo na década de 30 e tendo a sombra da IGM, havia uma
mistura de incredulidade de que as coisas podiam realmente desembocar num novo
conflito, mas ao mesmo tempo havia também uma resistência a que uma vez mais a
Europa pudesse lançar um novo conflito militar. Na década de 30 era mais difícil
perceber que o conflito estava mesmo para vir.
Este processo gradual, para quem tivesse tido o esforço de ler o Mein Kampf na
altura em que foi escrito (e poucos o fizeram), era claro o que Hitler desejava:

• Grandeza da Alemanha,
• Grandeza do povo ariano como poder político, cultural, rácico e militar
• Unir o povo germânico sob o seu comando
• Aumentar o território exíguo para Leste (aumentar o espaço vital, que
claramente ia gerar confronto com a comunidade internacional e com os
países a Leste da Alemanha)

Para que Hitler conseguisse realizar estas pretensões e levantar a Alemanha, era
preciso fazer algumas coisas:

• Lidar com o Tratado de Versalhes e com a comunidade internacional → não


respeitar os termos do tratado, que visava várias coisas:

a. Recuperar o território perdido na IGM

b. Trazer os 7milhões de Alemães que tinham sido alienados à Alemanha


pelo Tratado de Versalhes, como consequência da IGM

c. Reconstruir as forças armadas alemãs

d. Destruir o comunismo soviético

É através disto que a Alemanha dá indícios de que não estava interessada em seguir
um caminho estabelecido pelo Tratado de Versalhes.
Martim Ghira Campos

Um dos feitos de Stresseman foi a entrada da Alemanha na Liga das Nações, no


entanto, logo em 1933, Hitler retira a Alemanha da Liga e da Conferência de
desarmamento da Liga das Nações.

Em 1935, Hitler rasga outra exigência de Versalhes ao reinstituir o serviço militar


obrigatório, justificando isso afirmando que os efetivos militares que tinham sido
previstos por Versalhes eram insuficientes para que a Alemanha se protegesse e que,
uma vez que a França tinha aumentado o serviço militar obrigatório de 12 para 18
meses, a Alemanha não poderia ficar de braços cruzados à medida que o inimigo
histórico constituía um corpo de efetivos e de reservas mais poderoso e crescente.

Perante esta situação, em que a Alemanha se afasta da Liga das Nações e não aceita
os limites ao seu armamento e ao número de efetivos militares que podia ter,
porque motivo é que a Liga das Nações não fez nada? Porque havia uma série de
condicionalismos por parte dos países que pertenciam à Liga, que impediu uma
espécie de resposta comum e mais vigorosa:

1) A Alemanha era vista pela Grã-Bretanha como um país que tinha sido
fortemente punido no Tratado de Versalhes. A Grã-Bretanha era a favor do
aumento de efetivos para segurança da Alemanha, desde que a Alemanha se
permanecesse pacifica.

2) Assim que Hitler começa a rearmar a Alemanha e a aumentar o número de


efetivos militares, a França não estava interessada num novo conflito militar só
porque a Alemanha se afastava da Liga, pelo que não deu importância a esse
desrespeito alemão.

A partir de 1936 as coisas tomam outro contorno → Se até então havia dúvidas das
intenções de Hitler ao voltar a constituir um corpo militar poderoso, isso termina em
1936 quando as tropas germânicas vão marchar sob o território da Renânia, algo
evidentemente contra o Tratado de Versalhes, bem como a remilitarização dessa
região. Perante esta situação, a Liga das Nações devia ter atuado, pois já não
estávamos perante uma simples reorganização das forças armadas internas,
estávamos perante uma agressão claríssima a um território que não era alemão e que
não competia à Alemanha invadir e remilitarizar. A Liga não atuou e foi o primeiro
grande fracasso da mesma (só a URSS é que pediu na Liga uma resposta para impedir
Hitler)

Esta ocupação da Renânia fez Hitler entender que era possível rasgar o Tratado de
Versalhes, e se era possível faze-lo em matérias de natureza militar e ao ponto de não
respeitar a integridade territorial de territórios fora da alçada alemã, isso significava
que muito provavelmente era possível ir mais além. A ocupação da Renânia deu carta
branca para que Hitler pudesse pensar em ir mais além.

Hitler também se apercebeu da fraqueza militar das potências ocidentais, isto é, que a
Grã-Bretanha ou a França já não eram as potências que tinham saído da IGM, não só
pelas razões económicas, mas também pelo motivo de que tinha existido uma geração
Martim Ghira Campos

dizimada pela IGM e a memoria dos que ficaram, estando interessados em não repetir
a experiência.

De um lado, a Europa tinha alguém que não temia a guerra e até a cobiçava, do outro
tinha democracias liberais e pluralistas que não estavam dispostas a levar os seus
cidadãos para um novo conflito.

Se tinha resultado com a Renânia, porque não tentar anexar a Áustria, que era
também uma linha vermelha do Tratado de Versalhes. Qualquer violação desta linha
vermelha (proibição) deveria ter levado a comunidade internacional a ter uma atuação
de força imediata. A verdade é que não aconteceu e em 1938, Hitler vai anexar o
território Austríaco. O modo de atuação do partido nazi era o mesmo em vários
territórios europeus:

1) as estruturas nazis criavam uma situação de caos no interior do país

2) depois as autoridades oficiais apelavam a Hitler para que repusesse a ordem,


significando tomar conta desse mesmo país, estabelecendo o mando direto.

É um processo habitual, onde um poder exterior causa o caos interno para depois
poder vir restabelecer a ordem. Foi exatamente o que aconteceu na Áustria, onde as
tropas nazis vão restabelecer a ordem que elas próprias causaram, e para mostrar uma
capa de legalidade, realizam um plebiscito, para que os austríacos pudessem “decidir”
se pretendiam a anexação com a Alemanha. Como resultado, 99,75% concordaram
com a anexação, permitindo a Hitler mostrar à comunidade internacional que os seus
desígnios para a Áustria não eram mais do que fazer cumprir o desejo da população do
país.

O resultado da anexação austríaca foi mais uma vez a incompetência da Liga das
Nações e das grandes potências europeias, passando sem nenhuma censura.

Mais uma vez, com esta inoperância da comunidade internacional, Hitler teve um
triunfo brutal:

• Consolidou o seu poder interno

• Tinha agora ao seu dispor os recursos naturais e militares do novo país


anexado, ou seja, do ponto de vista económico, a anexação revelou-se um
belíssimo negócio para o III Reich.

• Para além disso, mostrou aos seus generais que era perfeitamente possível
rasgar todos os artigos do Tratado de Versalhes sem nenhuma consequência
nociva para a Alemanha.

Porque é que havia uma resistência tão grande por parte das potências europeias em
confrontar a Alemanha?
Martim Ghira Campos

Este período que começa com a anexação da Áustria, é conhecido como o período do
Appeasement, ou seja, é o período do apaziguamento. Isto significa que as potências
ocidentais procuraram uma política de apaziguamento com Hitler.

Hoje, quando se discute a década de 30 e as vésperas da IIGM, os Appeasers (surgindo


o nome de Chamberlain como o rosto da fraqueza de se confrontar com Hitler, sendo
o oposto de Churchill que tinha uma posição de firmeza contra a Alemanha nazi) são
vistos com um comportamento condenável.

Há um lado genuíno na política de apaziguamento → Chamberlain entendia que o


Tratado de Versalhes tinha sido realmente punitivo para a Alemanha em várias
frentes, nas reparações de guerra e na questão económica. Uma parte deste
apaziguamento nasce da consciência das injustiças que foram cometidas contra a
Alemanha.
Em segundo lugar, é preciso não descartar completamente que para Chamberlain, a
negociação poderia trazer melhores resultados do que o simples confronto direto.
Chamberlain acreditou até à invasão da Polónia, que pela negociação e persuasão era
possível controlar os instintos expansionistas do III Reich.

Mas havia outras razões que explicavam o apaziguamento e relutância da comunidade


internacional em atuar face a Hitler:

• O medo da guerra, que era compreensível dada a memoria da IGM e a Guerra


Civil Espanhola.

• Do ponto de vista económico e militar, a Grã-Bretanha não estava preparada,


pois estava a sofrer as consequências da Grande Depressão. Para além disso há
quem defenda que Chamberlain tinha a consciência de que não tinha
condições para confrontar o poder alemão.

• O medo da União Soviética de Estaline, que era vista como um perigo maior do
que Hitler.

A seguir à anexação da Áustria, vem a Checoslováquia, cujo interesse de Hitler começa


por ser por uma região em particular, a região dos Sudetas.

Sudetas → situavam-se na parte Ocidental da Checoslováquia e la existiam 3 milhões


de alemães, ou seja, se Hitler precisava de um pretexto para marchar sobre a
Checoslováquia, a região dos Sudetas dava-lhe esse mesmo pretexto. A estratégia
usada é exatamente a mesma utilizada na Áustria → começa a surgir caos social e
instabilidade promovidos pelo partido nazi local, sendo que Hitler, alegando os
supostos interesses dos alemães que viviam na região dos Sudetas, vai então entrar na
região de modo a proteger os interesses desses mesmos alemães.

Isto desperta um alarme em Chamberlain de que Hitler não ia parar, e em 1938,


Chamberlain voa para a Alemanha para uma primeira conversação com Hitler. Hitler
vai dizer que não queria apenas uma invasão da região dos Sudetas, tal como tinha
Martim Ghira Campos

acontecido na Áustria, queria um plebiscito para que fosse a própria população da


região a decidir se queria ou não pertencer à Alemanha.

Chamberlain e a França, vão convencer o Presidente da Checoslováquia a aceitar este


plebiscito. Era uma maneira de os Aliados evitarem uma expressão de força por parte
de Hitler, que iria avançar nos Sudetas de qualquer maneira.

O presidente da Checoslováquia, convencido pela Grã-Bretanha e pela França de que


essa era a única saída, vai concordar com a realização do plebiscito, mas Hitler não
contava com essa colaboração e boa vontade. Hitler vai então rasgar a sua pretensão
plebiscitária na região dos Sudetas e vai por e simplesmente decidir-se pela invasão
do território.

Esta decisão de Hitler mostra à comunidade internacional, mais uma vez, as suas
pretensões, com ou sem legalidade.

Neste contexto, com a crise da Checoslováquia, em 1938 realiza-se uma Conferência


em Munique que procurava essencialmente estabelecer os termos de uma nova
convivência com a Alemanha Nazi. O que ficou concordado foi a passagem da região
dos Sudetas para território alemão, cumprindo a pretensão de Hitler, desde que a
integridade da Checoslováquia fosse respeitada. Os checos foram obrigados a aceitar
esta cedência para salvar a Checoslováquia.

Numa última ilusão e esperança, sai desta conferência com um “pedaço de papel”,
onde Hitler se compromete a optar pela negociação ao invés da força militar.

Com isto, Hitler ganha os Sudetas sem disparar uma bala e tem acesso aos recursos da
região, sendo que a Checoslováquia perde grande parte da sua indústria.

Tal como não se contentou com a Renânia e teve de partir para a Áustria, e
posteriormente para os Sudetas, Hitler vai também avançar sobre a Checoslováquia.
Apesar de isto não ser uma novidade, marca algo de novo na trajetória de Hitler, isto
porque, ao invadir a Checoslováquia, Hitler já não podia justificar a sua ação com o
interesse de proteção dos alemães, mostrando que a sua vontade era apenas poder.
Por outro lado, mostrou que não era de confiança de maneira alguma, ou seja, a
Alemanha era novamente um pária internacional.
Por fim, mostrou que se Hitler tinha avançado para a Áustria, Renânia, Sudetas e
Checoslováquia, a Polonia era uma questão de tempo.

Neste contexto de falta de palavra de Hitler em relação a Munique, a Grã-Bretanha e a


França fazem um acordo de garantia de defesa da Polónia, significando que ambas
tinham a esperança de que com um tratado com a Polónia, Hitler hesitaria em
continuar a ir para Leste.

A resposta de Hitler a este acordo, começa com um acordo com a União Soviética em
1939 → Pacto Molotov-Ribbentrop (Pacto de não agressão). Este tratado procurava
cumprir algo importante para as duas partes:
Martim Ghira Campos

1) Para a Alemanha, este tratado procurava essencialmente garantir que em caso


de conflito militar, a Alemanha não teria de se preocupar com o flanco a Leste,
podendo ocupar-se da frente Ocidental

2) Para a URSS, isto garantia o acesso à parte Leste da Polonia, ou seja, quer a
Alemanha quer a URSS podiam repartir o território polaco

Perante esta situação, o último passo acontece com a invasão da Polónia, algo que
sempre foi ambicionado por Hitler. Hitler queria começar por Danzigue que tinha 90%
da população alemã, entrando na visão unificadora de Hitler, sendo que o calculo dele
era precisamente esse: se a Grã-Bretanha e a França não tinham feito nada em relação
à Checoslováquia, mesmo tendo assinado um pacto de defesa da Polonia, de forma é
que poderiam justificar que os alemães que se situavam em território polaco, não
teriam direito a unificar-se com a Alemanha

A 1 de setembro de 1939, as tropas germânicas invadem a Polónia e a 3 de Setembro


a Grã-Bretanha declara guerra à Alemanha. A Grã-Bretanha sabia que não podia
defender a Polónia e que o pacto era apenas um comprometimento de que a
Alemanha iria ter oposição, mas a verdade é que com a declaração de Guerra da Grã-
Bretanha e da França, a Alemanha declara-lhes guerra, dando início à IIGM.

Salto de 1939 para 1945 – Pós IIGM

Holocausto e Fundação do estado de Israel

Nada melhor do que olhar para uma vida que tenha sido destruída pelo Holocausto,
para perceber o impacto que teve nas vítimas, pois quando se olha para o geral, acaba
por se perder a verdadeira perceção.

Petr Ginz, um jovem checoslovaco, foi o autor do último grande diário sobre o
Holocausto.

Quando se fala do Holocausto, referimo-nos a um período que vai de 30 de Janeiro de


1933 (quando Hitler se tornou senhor absoluto da Alemanha), até à data da derrota
completa do III Reich em 1945. Durante este período os judeus foram perseguidos e
exterminados na Europa, onde cerca de 6 milhões acabaram por morrer.

“A solução final para a questão judaica” → processo de matança em larga escala de


judeus na Europa (o processo final)

No entanto, antes deste processo final, a perseguição foi gradual:

• Em 1935 com as Leis de Nuremberga (excluíram os judeus da vida civil


germânica).
• Em 1938 a situação torna-se dramática, com a Noite de Cristal, onde morrem
muitos judeus e tantos outros são enviados para campos de concentração.
Martim Ghira Campos

• Em 1939 a Alemanha invade a Polónia e inicia-se a IIGM.


• Em 19340 os nazis começam a estabelecer os primeiros guetos na Polónia
conquistada, tendo um grande significado porque a Polónia tinha a maior
percentagem de população judaica da Europa.

Mas é sobretudo a partir de 1941, com o ataque à URSS, que é posta em marcha a
solução final, ou seja, a destruição dos judeus da Europa. Os judeus começaram por
ser executados quando as localizações eram invadidas, sendo que um dos massacres
mais conhecidos é o de Babi Yar em Kiev (30 a 35 mil judeus foram fuzilados em 2 dias)

Em Janeiro de 1942 tenta-se encontrar um mecanismo de eliminação, que fosse um


mecanismo sistemático, de larga escala. Esta decisão foi tomada na chamada
Conferência de Wannsee na Alemanha, em que o objetivo era o de conseguir uma
forma mais industrial e eficaz de levar a cabo o Holocausto.

Um dos motivos para encontrar outra forma de eliminação, devia-se não só pelo
desejo de apressar o genocídio contra o povo judaico, mas também porque a matança
à queima roupa de judeus estava a provocar problemas psicológicos nos militares
nazis.
Em 1942 quando é decidida a solução final, os nazis já tinham estabelecido na Polónia
6 centros de extermínio, sendo o mais conhecido Auschwitz-Bikernau.

O Holocausto está ligado à fundação do estado de Israel, sendo que dizer isto, não é
dizer que o Holocausto levou à criação do Estado de Israel, porque quando se fala do
Estado de Israel, falamos de uma ambição/projeto que não só é anterior à IIGM, como
inclusive é anterior à IGM. A ideia de um Estado para os Judeus, previsivelmente na
Palestina, mas não necessariamente, era um sonho antigo que foi tomando corpo em
finais do século XIX. O holocausto acaba por acelerar esse processo.

O que permitiu a manutenção da identidade judaica, foi a ideia de que um dia os


judeus dispersos pela Europa, poderiam regressar a Israel, dando unidade à
comunidade.

A Revolução Francesa também foi um acontecimento importante na história dos


judeus na Europa, porque com a Revolução Francesa os judeus foram integrados como
cidadãos de pleno direito. Muitos escolheram integrar-se na sociedade francesa,
outros resistiram a essa assimilação. Mas se este acontecimento melhorou a situação
dos judeus na Europa, a verdade é que no Leste da Europa, precisamente onde a
população judaica era ainda mais precária, os judeus eram ainda vistos como os
assassinos de cristo, os especuladores traiçoeiros.

Os judeus da zona polaca (polónia russa), vão apesar de tudo, conhecer também uma
fase de relaxamento das políticas governamentais, algumas reformas importantes: os
judeus começam a poder frequentar a universidade (Moscovo), nasceram movimentos
intelectuais judaicos que começaram a ter temas importantes acerca do papel da
religião na sociedade. O lema sob o reinado do czar Alexandre II, passou a ser para os
judeus “sê um judeu em casa e um homem na rua”, isto é, era possível continuar com
Martim Ghira Campos

os rituais e as festividades judaicas, mas isso não interferia com a possibilidade de


integração e participação na vida publica do país de acolhimento.

Esta abertura do czar Alexandre II vai chegar ao fim em 1881, quando um grupo de
revolucionários assassina o czar. Isto faz com que o reinado seguinte, de Alexandre III,
traga uma vaga de antissemitismo, onde os judeus são responsabilizados pelo crime,
sendo expulsos de Moscovo e transferidos para as periferias da cidade. São
estabelecidas quotas rigorosas no sistema de ensino e começa o Pogrom antijudaico,
que eram ataques à população judaica, levados a cabo por cidadãos normais, ainda
que com o encobrimento das autoridades czaristas.

Perante esta vaga de violência antissemítica, a partir de 1882, começa uma grande
vaga de emigração judaica para fora do império russo (principalmente para fora da
Polónia russa), sendo que essa vaga migratória abrange para todos os lugares possíveis
onde fosse possível tentar viver uma vida normal.

É com estes movimentos de procura de fuga, que começam a emergir as primeiras


ideias de natureza Sionista. Sionismo → velha ambição de regressar a Sião
Sião → Palestina, Israel, Monte Sião que fica em Jerusalém. É o símbolo do retorno
Com esta vaga, surgem textos de origem Sionista, que procuram defender a
necessidade de os judeus regressarem para a Palestina. Em 1882, a Palestina era parte
do Império Otomano que só desaparece no decorrer da IGM, e havia a ideia de que era
possível voltar, cultivar a terra e montar a vida lá.

• Um exemplo é o texto “Autoemancipação” de Léon Pinsker, em que essa


autoemancipação significa que a única maneira de derrotar o antissemitismo
incurável, era um lar nacional. Léon não mencionava a Palestina em concreto,
dando algumas outras opções como a América do Norte.

A partir de 1882 começam então a haver vagas de emigração para a Palestina, sendo
que as razões eram vastas: fugir às perseguições, motivação ideológica (sionistas), etc.
No entanto, quer por parte dos Sionistas, quer por parte dos trabalhadores, a ideia de
poder existir um estado soberano de Israel era mais fantasia do que realidade. Em
finais do século XIX, as condições demográficas eram esmagadoras para os Judeus,
pois na Palestina, pertencente ao Império Otomano, a maioria da população era
esmagadoramente muçulmana.

Esta situação transforma-se profundamente com Theodor Herzl, sendo a ele que se
devem os primeiros esforços verdadeiramente articulados para o estabelecimento de
um lar nacional judaico. Nasceu numa família judaica muito influente, afluente e muito
bem assimilada. Era correspondente em Paris de um jornal Austríaco, e nessa função
vai confrontar-se com um episodio que abalou a sociedade francesa em finais do
século XIX → Caso Dreyfus.

Caso Dreyfus → faz referência a um oficial judeu do exército francês, Dreyfus, que foi
preso em 1894 e foi acusado de vender informações secretas aos alemães. Como
falamos de 1894, falamos de um período particularmente sensível para a França que
Martim Ghira Campos

tinha saído derrotada da Guerra Franco-Prussiana, portanto, o capitão não estava


apenas acusado de cometer um crime de traição, mas também de cometer um crime
de traição em benefício do maior inimigo histórico da França. Este caso vai acabar por
dividir a sociedade francesa entre aqueles que defendiam Dreyfus e aqueles que eram
contrários a Dreyfus.

O que viria a impressionar Herzl, não foi o caso em si, mas sim o sentimento
antissemita que ele começou a ver na sociedade francesa. O que Herzl via nas ruas de
Paris era “morte aos judeus”, sendo perfeitamente comparável com o que acontecia
no Leste da Europa.

Dreyfus é condenado à prisão perpétua na Ilha do Diabo, apenas com perdão


presidencial em 1899 e com regresso ao seu posto em 1906.

O efeito do caso Dreyfus abalou a França e foi profundíssimo não só em França, mas
no Mundo, fazendo com que Theodor Herzl chegue a uma conclusão → os judeus da
Europa só estariam em segurança quando tivessem um lar seu. É neste sentido que
Herzl vai escrever “Der Judenstaat”, onde propõe uma identidade nacional e um lar
nacional para os judeus.
Herzl confrontava-se com um problema quase inultrapassável, que era mais uma vez o
facto de a Palestina ser uma parte do Império Otomano, não sendo possível reclamar
esse território.

Mesmo assim, para criar um movimento Sionista com respeitabilidade diplomática,


Herzl publica o seu livro e vai iniciar uma campanha diplomática intensiva para
defender a causa Sionista, para juntar as boas vontades dos Judeus espalhados pela
Europa.

A ideia de Herzl era essencialmente começar negociações com as autoridades


Otomanas e com autoridades como a Grã-Bretanha e Constantinopla.

Em 1902 dá-se também um caso importante deste movimento Sionista, que foi a
oferta feita a Herzl por parte do governo britânico de que os Judeus podiam instalar o
seu Estado, se assim quisessem, no Uganda. Herzl leva esta proposta para o congresso
Sionista e no sexto congresso havia uma divisão entre dois campos: os pragmáticos,
que era uma minoria inclinada para aceitar a proposta, e os idealistas, que eram
essencialmente os Sionistas do Sião, aqueles para quem só a Palestina podia cumprir o
desejo. No congresso seguinte, em 1905, a opção do Uganda deixa de estar em cima
da mesa (Herzl já não esteve presente porque faleceu em 1904).

Tendo em conta estas movimentações diplomáticas, estes desejos, a verdade é que a


Palestina era parte do Império Otomano, e por mais ambiciosas que fossem os desejos
judaicos, a verdade é que ninguém podia antecipar que o problema Otomano teria a
mais trágica das resoluções, isto é, ninguém conseguia prever que esse Império secular
iria desaparecer no fim da IGM.
Martim Ghira Campos

Em 1918 encontramos impérios destroçados, e na Palestina encontramos uma


presença judaica um pouco mais significativa. Mas a verdade é que, com a derrota dos
otomanos na IGM, surge a questão de saber o que fazer a um território que era
maioritariamente habitado por árabes, mas que também continha uma expressão
demográfica judaica significativa e também cristã. Essa questão torna-se
particularmente relevante para as potências que saíram vencedoras da IGM, existindo
4 alternativas possíveis:

1) Conceder todo o território, inclusive onde os judeus eram uma maioria, para
um novo Estado Árabe

2) Conceder todo o território, inclusive onde os árabes eram uma maioria, para
um novo Estado Judaico

3) Conceder todo o território à Síria porque era uma potência administrante da


Palestina durante o Imperio Otomano. Foi rapidamente descartada.

4) Dividir aquela terra entre Árabes e Judeus, de forma a que cada povo pudesse
criar um Estado. Era a mais viável em 1919, tendo em conta as realidades
populacionais daquele território.
Declaração Balfour → é uma carta de Balfour (MNE Britânico) a um dos nomes mais
importantes da comunidade judaica britânica, Lord Rothschild, onde afirma que via
com bons olhos a criação de um Estado nacional para os judeus, mas, acrescentava
que, embora concordasse, esse Estado não podia pôr em causa os direitos dos povos
Árabes. Isto era compreensível dado que a população árabe era 5x maior do que a
judaica, logo também tinha direito à sua autodeterminação.

A declaração foi aprovada pelo presidente Wilson, pelo governo Francês, Italiano,
Churchill reconheceu a criação do Estado Judaico, e a conferencia de Paz de Paris em
1919 colocou um ponto final na Guerra e, ao permitir o nascimento da Liga das
Nações, determinou a criação de um sistema de mandatos em que uma grande
potência politica ficaria responsável por determinados territórios e nacionalidades, até
ao momento em que estes se mostrassem capazes de garantir a sua própria soberania.

Durante o mandato britânico para a Palestina, verificamos que se havia qualquer


ilusão de que os povos muçulmanos, árabes e judeus pudessem chegar a uma
coexistência pacifica, essas ilusões terminam. Em 1919/20, verificamos que a violência
esporádica que emergia entre judeus e árabes, se transforma numa violência
sistémica, de tal forma, que o Governo britânico vai enviar uma comissão para a
Palestina (1936), para tentar entender o que se passava e para oferecer uma espécie
de resolução para o que se estava a passar.

Em 1937, a Comissão Peel vai publicar as conclusões, que se resumem a duas coisas:

1) Árabes e Judeus não podem viver juntos


2) É preciso a existência de dois Estados para dois povos
Martim Ghira Campos

Em 1937 faz-se a primeira proposta concreta para a existência de dois estados lado a
lado, com fronteiras reconhecidas, soberanos → Norte e costa pertencia aos judeus,
sul e leste aos árabes, zona central ao mandato britânico, incluindo Jerusalém que
estaria sob a supervisão britânica e da Liga das Nações.
A ideia da comissão Peel era um plano de partição, de forma a resolver toda a
conflitualidade entre as duas comunidades, com um estado judaico onde havia maior
população judaica, e um árabe onde havia maior população árabe.

Ainda hoje, a cidade de Jerusalém é foco de disputa entre árabes e israelitas.

Os judeus aceitaram o plano da comissão Peel, mas os árabes rejeitaram, exigindo que
toda a Palestina estivesse sob o controlo árabe e que toda a população não árabe
fosse transferida para fora da Palestina. Esta situação cria um impasse para as
autoridades britânicas, os confrontos entre os três aumentam e se o objetivo da
Comissão Peel era gerar maior concórdia, acabou por aumentar a violência.

Em 1939 o governo britânico vai publicar o chamado British White Paper, que hoje em
dia é visto como uma traição das aspirações judaicas à Palestina. Este documento
afirma que a emigração judaica para a Palestina tem de ser limitada, não podendo
exceder os 75mil judeus, e para além disso não advogava a divisão do território,
defendendo a existência de um governo provisório conjunto (árabe e judeu), sendo
que a constituição desse governo tinha de respeitar a composição demográfica
existente no território (uma maioria árabe e uma minoria judaica)

Este British White Paper é objeto de grande discussão por causa do que aconteceu a
partir de 1939 → a limitação da emigração judaica, surgiu na altura em que os judeus
mais precisavam de um porto de refúgio. Este documento foi uma machadada nas
aspirações judaicas em 1939, ainda que ninguém conseguia prever a catástrofe do
Holocausto.

Se a proposta de 1937 da criação de dois Estado tivesse acontecido, provavelmente o


século XX teria sido menos trágico para os judeus.

Como é que se explica este British White Paper? Porque é que a ideia inicial acabou
por recuar? Em primeiro lugar a violência no território era real, mas além disso, o
império britânico pretendia a manutenção de boas relações diplomáticas com vários
Estados Árabes (Iraque, Egito), por isso, quando em 1939 a guerra era uma
possibilidade, não era do interesse da diplomacia britânica andar com isso para a
frente.

O sionismo e as aspirações judaicas são sacrificados em 1939 porque o pano de fundo


era muito mais vasto do que a mera preocupação judaica.

Em 1945 o mundo conheceu a tragédia do Holocausto, e se é verdade que o Estado de


Israel não nasceu por causa do Holocausto, a verdade é que em 1947 as Nações Unidas
vão apresentar um plano de partição para partilha da Palestina. O Holocausto não
Martim Ghira Campos

causou a criação do Estado de Israel, pois o processo é anterior a 1939, mas incentivou
a pegar de novo na ideia após a IIGM, pela catástrofe que foi.

O plano da ONU teve como princípio orientador a ideia de que, os desejos de árabes e
judeus apesar de válidos, eram irreconciliáveis, logo a partição era o arranjo mais
realista

A partição procura dar resposta a realidades demográficas que em 1947 já eram


diferentes, com um aumento significativo quer de judeus, quer de árabes.

Na partição da ONU os judeus eram a maioria na área para o Estado de Israel


(incluindo as cidades judaicas de Jafa e Telavive). Os árabes ficavam com a fronteira
com o Egito e a parte ocidental (laranja na imagem)

Jerusalém, que ambos os povos reivindicam como capital dos respetivos Estados,
permanecia como uma zona internacional sob supervisão da ONU.

A parte judaica vai aceitar o plano de partição, mas a parte árabe vai recusá-la,
iniciando-se um período de guerra civil entre judeus e árabes.

Posteriormente, em 1948, com a proclamação do Estado de Israel, esse conflito vai se


internacionalizar iniciando-se uma guerra com os Estados árabes vizinhos – Guerra da
Independência que Israel acaba por vencer

Quando se fala, atualmente, de conflito israelo-palestiniano, ainda se está a falar da


rivalidade criada pelo plano de partição da ONU, de tal forma que, em 1967 quando se
da a Guerra dos Seis Dias, é possível encontrar a realidade com o qual o conflito tem
de lidar. No seguimento da Guerra dos Seis Dias, Israel vai triplicar o seu território,
saindo do plano de partição da ONU e ocupando a faixa de Gaza (que hoje já não é
Martim Ghira Campos

ocupada por Israel), a margem ocidental e a cidade de Jerusalém, os montes Golã na


Síria.

No conflito Israelo-palestiniano existem 3 problemas que surgem da proclamação do


Estado de Israel:

• As fronteiras de um futuro Estado de Israel e um Estado Palestiniano

• A cidade de Jerusalém

• A existência de refugiados palestinianos → No decorrer das guerras de 1948 e


1967, cerca de 1 milhão de Palestinianos fugiu ou foi expulso dos seus
territórios, que hoje em dia já são cerca de 6 milhões.

O nascimento do Estado de Israel criou um problema que ainda hoje é um problema


enorme

Conflito Israelo-Palestiniano detalhado

Cinco palavras fundamentais para entender o conflito:

1) Fronteiras → onde colocar as fronteiras de um futuro Estado Palestiniano e de


que forma é que as fronteiras se vão articular com o Estado de Israel

2) Jerusalém

3) Terrorismo → deve-se ao facto de ter havido uma mutação do conflito em


inícios do século XXI. O principal problema de Israel já nem é tanto com a
autoridade Palestiniana, mas sim com grupos de natureza islamita (Hezbollah e
Hamas)

4) Refugiados → o que fazer aos refugiados Palestinianos provocados pelas


guerras de 1948 e 1967

5) Colonatos → construção de colonatos por parte do Governo de Israel

Fronteiras

Isto é um problema porque ao longo do conflito foram avançadas as mais variadas


propostas, propostas essas que tendem a privilegiar o paradigma dos dois Estados. A
comunidade internacional defende o paradigma dos dois Estados como solução para o
conflito (EUA, Rússia, Liga Árabe, ONU, UE).
Martim Ghira Campos

A famosa Comissão Peel de 1937 chegou à conclusão de que dois povos distintos, sem
qualquer possibilidade de coexistência pacifica, só podem viver cada um no seu
próprio Estado. Ou seja, a ideia dos dois Estados é muito anterior à proposta das
Nações Unidas e está presente desde a Declaração Balfour (que abre a possibilidade
para um Estado Judaico, mas sem ignorar os interesses da comunidade muçulmana)

Sempre que Israelitas e Palestinianos se sentam, começam sempre pelo paradigma dos
dois Estados

Quais são os problemas relativamente a este paradigma?

Em primeiro lugar, a realidade do lado Palestiniano, é uma realidade substancialmente


distinta daquela que existia em 1947. Não existe uma Palestina, mas sim duas
Palestinas, de naturezas distintas e com objetivos distintos:

• Palestina concentrada na Faixa de Gaza → Palestina liderada por uma fação


islamita sunita palestiniana, o Hamas. O Hamas venceu as eleições
parlamentares na Faixa de Gaza há 15 anos, não voltando a haver eleições. Na
sua Carta Fundamental, o Hamas recusa-se a reconhecer a existência do Estado
de Israel, ou seja, para o Hamas a totalidade da Palestina deve pertencer ao
futuro Estado Palestiniano (e não apenas os territórios tradicionalmente
alocados e preferenciais ao futuro Estado Palestiniano)

• Palestina na margem Oriental → reconhece o Estado de Israel. Interpreta o


conflito de um ponto de vista territorial e não de um ponto de vista
necessariamente religioso

• Conclusão → Não é possível falar do paradigma dos dois Estados porque no


terreno existem três Estados (Estado de Israel, Estado da Autoridade
Palestiniana, Estado do Hamas. Muitos especialistas dizem que se é para
caminhar para um acordo, é mais rigoroso afirmar que existem três Estados.

Para piorar as coisas, existe hostilidade entre o Hamas e a Autoridade Palestiniana,


sendo que o conflito já não é apenas entre Israel e Palestina, é sim entre Israel e as
Palestinas, ao mesmo tempo que duas fações Palestinianas também estão em conflito
aberto.

Será que o paradigma dos dois (três) Estados é o único que é avançado? Não, na
realidade existe uma outra ideia que é o Paradigma de um Único Estado Binacional, ou
seja, existem autores que confrontados com a realidade afirmam que não é mais
possível falar em dois ou três Estados (falar do território da Palestina como se
estivéssemos em 1947). Tendo em conta a realidade que se vive no terreno e o facto
de a construção de colonatos por parte de Israel ter levado cerca de 700mil colonos
para a margem Ocidental e para a parte Leste, é absurdo acreditar que é possível ter
de um lado o Estado de Israel e do outro o Estado Palestiniano.
A ideia de um Estado Binacional significa que existiria um Estado para dois povos
(israelita e palestiniano).
Martim Ghira Campos

Principal problema desta proposta → Israel não aceita a proposta. O Hamas também
não, pelo motivo que não admitem que possa existir um Estado onde os judeus
também tenham a palavra.

O único lado que parece olhar com relativa tranquilidade para esta solução de um
único Estado Binacional é a Autoridade Palestiniana.

Seja como for, esta proposta é vista como impraticável, desde logo pelas experiências
históricas que temos de Estados binacionais ou multinacionais, sendo exemplos que
terminam em guerras civis declaradas (Líbano, antiga Jugoslávia). A coexistência
forçada entre diferentes nações tende a acabar em conflito.

Existe ainda outro paradigma, o Paradigma Jordano → é a ideia de que a Palestina e a


Jordânia poderiam ser um único país, ou pelo menos poderiam ser uma Confederação
ou uma Federação de Estados. A ideia era a de que a margem ocidental e a Jordânia se
unissem num único Estado. Esta proposta não foi bem aceita pela população jordana.

Jerusalém

É um problema porque as duas partes reivindicam esta cidade como capital dos
respetivos Estados.

Porquê Jerusalém? Porque tem uma enorme importância cultural, histórica e religiosa
fundamental para ambos os povos:

• É a cidade mais sagrada do Judaísmo, sendo la que se encontram as ruínas do


segundo Templo, no muro das lamentações. Este local é o mais sagrado para o
Judaísmo e tem uma importância fundamental para a identidade judaica.

• É também uma cidade de grande relevância para os muçulmanos, sendo a


terceira cidade sagrada para os mesmo, depois de Meca e Medina, porque se
acredita que o profeta Maomé ascendeu aos céus a partir de Jerusalém (por
cima do muro das lamentações existe a mesquita de Al-Aqsa, onde essa
ascensão aconteceu)

• Curiosamente também o cristianismo olha para Jerusalém como uma cidade


importante. Muito perto do Muro das Lamentações e da Mesquita de Al-Aqsa,
existe a Igreja do Santo Sepulcro onde se acredita que Jesus Cristo teria sido
sepultado

É exatamente pelo significado que Jerusalém tem para os dois povos, que as propostas
de paz têm sido muito cautelosas quando propõem um destino para Jerusalém
Martim Ghira Campos

Dada a importância simbólica para ambos, e como ficou no Plano de Partição das
Nações Unidas, percebeu-se que Jerusalém não pode pertencer a nenhum dos povos,
tendo de ser administrado por alguma entidade exterior, de maneira a que nenhum
possa gritar vitória.

Em 1948, com a guerra e no seguimento desta guerra, a parte oriental de Jerusalém


(onde se encontra o Muro das Lamentações) é capturada pela Jordânia, ao mesmo
tempo que a Faixa de Gaza é capturada pelo Egipto. Esta situação, Faixa de Gaza nas
mãos no Egipto e Cisjordânia + parte de Jerusalém nas mãos da Jordânia, é uma
situação que se vai prolongar até à guerra de 1967.

Guerra dos Seis Dias vencida por Israel contra o Egipto, a Jordânia e a Síria → Em 1967,
Israel vai capturar a Faixa de Gaza ao Egipto e a totalidade da margem Ocidental
incluindo a cidade de Jerusalém. Para além disso captura os Montes Golan à Síria,
situação essa que ainda se mantém. É a partir de 1967, e só a partir de 1967, que
temos esta situação dos territórios ocupados.

Hoje em dia Israel já não está na Faixa de Gaza, sendo precisamente na retirada
Israelita que se realizam as eleições vencidas pelo Hamas. Perante o que se passou em
Gaza, Israel continua a ocupar a margem Ocidental e a cidade de Jerusalém, afirmando
Jerusalém como a capital do seu Estado.
Terrorismo

É uma das principais preocupações por parte do Estado de Israel.

Quando se fala em terrorismo, fala-se essencialmente do terrorismo do Hamas,


embora o terrorismo do norte de Israel/sul do Líbano seja também uma preocupação.

Há duas organizações terroristas principais → Hamas e Hezbollah

Hamas → é um grupo islamita, sendo o descendente palestiniano da Irmandade


Muçulmana, seguindo o princípio de transformar o Médio Oriente e em particular a
Palestina num Estado Teocrático (egípcio sunita fundamentalista). Desde o momento
em que controlou a Faixa de Gaza, encarou a retirada de Israel como uma capitulação
e um convite à continuação de hostilidade. Utilizam a Faixa de Gaza como uma rampa
de lançamento de rockets para o interior de Israel, sendo exatamente por isso que
Israel diz que a retirada da Cisjordânia não tem data para acontecer, porque se a
retirada de Gaza não trouxe paz, então não se vão retirar da Cisjordânia.
Israel acredita que uma retirada da margem ocidental poderia significar a ascendência
do Hamas nesse território, não aceitando nada que não passe por uma renúncia à
violência do Hamas.

Hezbollah → desde a segunda guerra do Líbano que tem atacado a região norte de
Israel. O governo de Israel afirma que a presença na zona norte também é importante
para confrontar esta ameaça.
Há um Hezbollah institucional, que é o partido político, mas existe o seu braço armado,
uma fação terrorista.
Martim Ghira Campos

Refugiados

É uma das principais e intratáveis questões porque o lado Palestiniano tem sido muito
intransigente com esta questão.

Nas guerras de 1948 e 1967, criou-se um problema de refugiados Palestinianos, sendo


que no decorrer destas guerras há uma vasta massa populacional que foi obrigada a
abandonar as suas casas e terras, embora uma parte tenha fugido voluntariamente.

Numa fase inicial, quem podia fugir, fugiu, e quem não conseguiu fugir, foi expulso.

De acordo com os historiadores, em 1948 falamos de 700mil refugiados e em 1967


juntam-se 200 a 250 mil refugiados, sendo que por isso se fala em cerca de 1 milhão
de refugiados palestinianos.

Estes refugiados estão por todo o lado, principalmente na Jordânia, Egipto, Líbano.
Hoje em dia, quando se fala de refugiados palestinianos, já não se fala de 1 milhão de
refugiados, falamos sim de mais ou menos de 6milhões (ainda que muitos nunca
tenham habitado a Palestina).

O problema é que nas negociações de paz, a autoridade palestiniana exige o retorno


destes refugiados aos seus territórios originais, sendo que estes territórios originais
eram em grande parte territórios que se situam onde hoje está o Estado de Israel. Isto
significa que Israel ao aceitar milhões de refugiados, levaria ao desequilíbrio
demográfico do Estado de Israel, ou seja, Israel teria um Estado Judaico onde a parte
judaica poderia ser a minoria. Israel entende que esta exigência de regresso dos
refugiados palestinianos significaria o suicídio demográfico de Israel, significando que
para todos os efeitos existiriam dois Estados Palestinianos (Autoridade Palestiniana e
Israel com maioria árabe)

Israel afirma que se vai existir um futuro Estado Palestiniano, os refugiados


palestinianos devem ir para o Estado Palestiniano. No entanto, admite receber uma
parte pequena desses refugiados, ao abrigo de programas de reunificação familiar a
árabes que vivem em Israel. Admite ainda uma espécie de fundo internacional para
compensar economicamente uma parte desses milhões de refugiados. Recusa o
regresso da totalidade dos refugiados a Israel.

Nas várias negociações de paz, a situação dos refugiados faz descarrilar qualquer
possibilidade de se chegar à paz.

Vivem quase 2milhões de árabes em Israel. Existem cidadãos árabes que são cidadãos
de Israel, que votam e têm direitos políticos, e existem cidadãos árabes que vivem sob
ocupação, não sendo cidadãos de Israel, mas também não sendo cidadãos
palestinianos porque ainda não existe um Estado soberano Palestiniano.
Martim Ghira Campos

Nota à parte → Negociações de Camp David em 1978 onde o Egito reconhece Israel
como Estado soberano e Israel se retira dos territórios ocupados no Egito,
nomeadamente a Península do Sinai.
Summit de 2000 onde se reúnem à mesa Bill Clinton, Arafat e Ehud Barak

Colonatos

A construção de colonatos nos territórios ocupados tem sido prática dos governos
Israelitas desde 1967.

Colonatos na Faixa de Gaza que deixaram de existir com o Desengagement Plan de


Ariel Sharon. Foram destruídos pelo próprio exército israelita que depois se retirou da
faixa de Gaza.

Há ainda os Colonatos que Israel tem construído na margem ocidental. O principal


problema é que a construção de colonatos, ainda que se dê perto da fronteira que
determina o que seria um futuro Estado palestiniano, a verdade é que a construção de
colonatos está a alterar a configuração do futuro Estado palestiniano. A construção de
colonatos está a comer terra aos palestinianos

Isto é um problema porque enquanto a construção de colonatos avançar, a Autoridade


Palestiniana afirma com razão, que não tem condições para negociar um acordo de
Paz. Se não há um respeito pela Green Line de 1967, se não há respeito pela
integridade de território que desde 1967 é entendido como território que deve ser
alocado aos palestinianos, então não há possibilidade de chegar a nenhum
entendimento.

Como é que isto tem sido respondido pelas autoridades Israelitas? Tem sido
respondido de duas formas:

1) Israel afirma que a resolução das Nações Unidas de 1967, que surge depois da
Guerra dos Seis Dias, afirmava que Israel teria que respeitar territórios
Palestinianos e não OS territórios palestinianos. Ou seja, Israel interpreta a
resolução como dando margem de manobra para que Israel possa construir
alguns dos seus colonatos até por questões de segurança. Respeitar OS
territórios seria respeitar integralmente a fronteira que existia antes de 1967 e
Israel afirma que o que está na resolução da ONU não é “OS territórios”, mas
sim “territórios”, sendo vago e dando margem de manobra a Israel.

2) Por outro lado, Israel afirma que em todas as tentativas de acordos de paz,
existiu sempre uma tentativa de compensar as perdas territoriais da margem
ocidental, com o sacrifício de território Israelita.
Martim Ghira Campos

Há colonatos israelitas que inclusive cortam território palestiniano, impedindo a


contiguidade e continuidade do mesmo.

Desde 1967, quer as fronteiras quer a configuração da própria margem ocidental


foram alterados.

Já ninguém pensa no paradigma dos dois Estados e a realidade deste conflito está
congelada. A natureza do conflito mudou, sendo que neste momento o conflito já não
é tanto territorial entre Israel e Palestina, mas sim Israelo-Iraninano. A principal
preocupação de Israel é a ameaça do Irão e a sua capacidade nuclear (projeto nuclear
iraniano)

Estado Novo e o Ultramar

A mentalidade da classe dirigente no tempo do Estado novo era a de que Portugal não
é um país pequeno, com alguma dimensão devido às colónias.

No fim da monarquia sentiu-se uma fraqueza, que se acentuou com a 1ª República,


que foi entendida como necessária de combater, levando a essa nova afirmação de
Portugal pluricontinental e racial do Estado Novo.
Martim Ghira Campos

30 de Junho de 1961 → Salazar discursa à Assembleia Nacional e diz que somos uma
velha nação que vive agarrada às tradições

O ano de 1961 é muito importante para toda a dinâmica do Estado Novo.

O Estado Novo foi uma resposta ao liberalismo na sua versão republicana e jacobina
que tinha lançado o país para o caos. As promessas de melhoria e de progresso foram
infundadas ao fim de 16 anos e de 45 Governos.

O Estado Novo é antiparlamentar e nacionalista por natureza, vê o liberalismo como


uma característica imprópria para um Estado com as condições de Portugal, julga que
mais do que ter um parlamento muito ativo é preciso ter um governo que funcione.

Por isso, a Constituição de 1933 reúne aspetos com muitas origens → integralismo
lusitano tradicionalista, doutrina social da Igreja, doutrinas corporativas italianas
contra o papel e o peso das organizações laborais, constituição de Weimar quanto aos
amplos poderes do chefe de governo.

O Estado Novo assume uma espécie de Presidencialismo de chanceler, isto é,


enquanto o chefe de Estado não tem muitos poderes, o chefe de Governo (Presidente
do Conselho de Ministros da altura) é o detentor da maior parte do poder. No caso
português o regime identifica-se com a pessoa, sendo falar de Estado Novo é
praticamente falar de Salazar e Salazarismo. Esta identificação resulta do poder que
Salazar acumulou e do modo como soube construir alianças no seio do bloco que
apoiava o regime e dividir esse bloco para reinar sobre ele.

Há uma continuidade e estabilidade durante o Estado Novo, que permitiu um


progresso económico assinalável.

A historiografia, distante do fim do regime, tem tendido a considerar que apesar de


autoritário, o regime Salazarista não era fascista no sentido próprio, isto porque não
era vanguardista, não tinha tendências expansionistas, os seus elementos militares
estavam subordinados ao regime civil, não havendo propriamente um culto de um
chefe militar (apesar de haver um chefe evidente). A natureza do regime não é
exatamente de acordo aquilo que se convencionou como regime fascista, apesar de
ter elementos fascizantes como a mocidade portuguesa e a legião.

O regime salazarista é uma tentativa de fazer quase o oposto da 1ª República, isto


porque parte do pessoal político da 1ª República transita para o Estado Novo, não
havendo substituição total das elites.

A estabilidade política e financeira permitiu um programa muito amplo de obras


publicas e investimento publico, que ainda hoje são visíveis (escolas, tribunais,
estradas, etc.). Isto marca uma dupla dimensão, de um Estado que mostra que cuida
dos seus cidadãos, que os protege e vigia, mas que assegura a tranquilidade e o viver
tranquilamente que faltava à 1ªRepública.
Martim Ghira Campos

A preocupação com a ordem e a estabilidade do Estado novo, foi um dos motivos pelo
qual o Golpe de 28 de Maio de 1926 não teve oposição praticamente nenhuma. As
pessoas estavam cansadas da violência, da brutalidade, do caos político e da
incapacidade de resolução dos problemas, encontrando neste novo regime um
equilíbrio que foi julgado bom pela maioria da população. As pessoas apoiaram a
Constituição de 1933 e não questionaram a política ultramarina até muito tarde.

Este regime não é um regime que tenha uma visão benévola sobre a abertura dos
mercados, sendo que foi oscilando entre maior protecionismo e maior abertura.
Apesar de haver um nacionalismo económico de base, houve também alterações ao
longo dos anos.

É um regime que viveu com um desnível da qualidade de vida entre as zonas rurais e
as zonas urbanas, para além das desigualdades sociais importantes. Ao mesmo tempo,
não sendo uma democracia e não tendo preocupações de dar a entender que o era,
restringiu as liberdades cívicas:

• A constituição garantia um amplo leque de liberdades cívicas, mas na prática


não eram respeitadas.

• Existia uma polícia política (PVDE – Polícia de Vigilância e Defesa do Estado, que
passou a ser a PIDE – Polícia Internacional de Defesa do Estado. Na fase
Marcelista passou a ser a Direção Geral de Segurança (PIDE-DGS))

• Censura prévia na imprensa

Este Estado Novo não teve sempre em “Estado Novo”, porque há uma divisão clara
entre três períodos → 1933-1945, 1945-1961, 1961-1974

• 33-45 → Período de consolidação do poder por parte de Salazar, marcado por


questões externas como a Guerra Civil Espanhola e a IIGM. Havia o medo de
arrasto e contágio do regime socialista espanhol, proveniente da Guerra Civil
Espanhola, porque acontece apenas 3 anos depois de Portugal se ter
reestruturado, havendo o medo de cair de novo no regime da 1ª República.
Neutralidade na IIGM que permitiu a venda de matéria prima aos dois blocos
beligerantes, fazendo com que Portugal ganhasse verbas importantes e se
refugiassem em Portugal pessoas fugidas da guerra, acabando por ficar. É um
período de grande conflitualidade internacional, de luta ideológica acentuada,
de clara marcação de dois campos que deixavam pouca margem aos
moderados, sendo como uma espécie de corrida para o abismo à qual o Estado
Novo não aderiu, procurando assegurar a sua integridade territorial.
Houve ainda o impacto da ocupação de Timor por parte de Japão, que deu a
entender que as coisas podiam não ficar exatamente como estavam

• 45-61 → A nova ordem internacional estabiliza, Portugal adere à NATO como


membro fundador em 1949 e em 1955 é aceite na ONU. É um período de
crescimento económico, de alívio face ao que se tinha vivido anteriormente.
Martim Ghira Campos

Estamos no período de Guerra Fria, tendo como vantagem o facto de as


potências liderantes (EUA e URSS) quererem seduzir, manter e assegurar os
Estados que estavam do seu lado. Nesta altura Salazar goza de uma boa
reputação junto dos principais líderes ocidentais, sendo que Portugal, apesar
de não ser visto como uma democracia, também não era visto como um foco
de problemas (apesar de lentamente se começar a mudar a visão sobre o papel
do domínio europeu nos territórios africanos).
É o ponto mais alto do Estado Novo, em que a GF permite a estabilidade, há um
impulso enorme de industrialização e é claro o alinhamento atlântico do
regime. Para além disso, Portugal procura reforçar os laços com o Brasil.
Toda esta estabilidade faz com que o regime goze de um apoio social
significativo, que vai ter o primeiro abalo sério em 1958 com a candidatura
presidencial de Humberto Delgado. O resultado das eleições não foi livre nem
justo, ganhando o candidato apoiado pelo Estado Novo. O susto destas eleições
levou a uma alteração constitucional, sendo que a partir daí o Presidente da
República deixa de ser eleito por sufrágio direto, passando a ser eleito na
Assembleia Nacional (uma emanação do poder legislativo e não uma emanação
direta do voto dos portugueses).
Apesar de tudo, ate 1961 o regime gozou de relativa tranquilidade e
estabilidade, com um crescimento económico notável.

O ano de 1961 é um ano de viragem por muitas razões:

• Começa em Janeiro com o assalto a um paquete de Santa Maria, liderado por


Henrique Galvão (tal como Humberto Delgado já tinha estado alinhado com o
Estado Novo mas mudara a sua posição, tornando-se opositor do regime),
batizando o navio de Santa Liberdade e o regime acaba por ceder a que Galvão
conduza o navio até ao Brasil e lhe seja concedido exilio politico. É a primeira
vez que o regime salazarista aparece de forma tão fragilizada e exposta.

• Em fevereiro começa o conflito militar em Angola (Luanda) que submete os


colonos brancos a situações bárbaras e agressivas, levando o regime a reagir e
a deslocar um contingente grande para Angola para conter o acontecimento.

• Começa a mudar a visão da dominação europeia sobre os territórios do antigo


“terceiro mundo”, não só na sociedade, mas também na ONU, surgindo a
necessidade de descolonização.
• Em dezembro os territórios de Goa, Damão e Dio foram ocupados e ficaram
parte da União Indiana até hoje. O regime da União Indiana procurou apagar o
registo português

• Há uma consciencialização de alguma solidão internacional, com o inverter da


tendência de boas relações com os EUA de Kennedy. Tanto os EUA como a
URSS, por razões diferentes, opunham-se ao colonialismo europeu e
consequentemente ao português. Deixa de haver grande parte do apoio
americano por essas razões.
Martim Ghira Campos

• Em 1963 começa a guerra na Guiné

• Em 1964 a Frente de Libertação de Moçambique começa a guerra em


Moçambique, liderado por Eduardo Mondlane

A maneira como o Estado Novo se empenha na condução desta guerra, é bastante


vigorosa, isto é, o entendimento prevalecente é que isto era um ataque ao território
português conduzido por bandos de criminosos a soldo das potências internacionais.

Estamos num período em que o regime se sente atacado e que a sua visão é
minoritária em termos internacionais.

O MPLA, a FNLA e a UNITA tinham ódios entre si (de origem tribal), dando origem a
uma guerra civil sangrenta depois da Independência. Não correspondendo à verdade
quando o Estado português era visto como o único inimigo destes territórios, uma vez
que existiam confusões entre eles mesmos, tornando o conflito muito mais complexo.

A visão e a ideia do regime, de que Portugal era uno e indivisível, não facilitou o modo
como se pôde conceber qualquer negociação para arranjar uma saída do conflito.

A Guerra dura 13 anos, sendo o episódio bélico mais longo de Portugal.

Paralelamente a isto, temos uma sociedade em crescimento, Portugal adere à EFTA e


tem acesso direto a mais mercados europeus, o rendimento português sobe para 67%
acima da média europeia, o turismo aumenta, a agricultura reduz-se. Há uma transição
de sociedade rural para pós-industrial durante o Salazarismo.

O país rural, mais enraizado nas suas tradições, começa a ser um novo país, mais
virado para novos hábitos de consumo, valores e cultura europeus.

Por um lado, temos uma nova classe média com alguma capacidade económica, com
referências culturais diferentes daquelas que a elite dirigente do Estado Novo tem (já
não vê a proximidade de Africa), resultando em crises universitárias em 62 e 69. O
catolicismo, que era uma base de apoio do regime, em 58 dá nota da sua
incomodidade com a miséria e repressão, começando a moderar a adesão ao regime.
Há o efeito normal do desgaste de uma guerra.

Durante muito tempo, a defesa do ultramar correspondia à posição da maioria da


população e da elite portuguesa, aliás seria impossível conduzir uma guerra durante
tanto tempo caso não existisse consenso. A sociedade iria colapsar em pouco tempo.

Esta posição tem uma continuidade desde a monarquia constitucional, no controlo e


dominação de territórios. Esta tradição passa da Monarquia Constitucional para a
República, pelo que a tradição republicana é colonialista.

Na primeira fase só o PCP é que defendia as independências.


Martim Ghira Campos

O porquê desta afirmação de manter os territórios? Desde 1415 que Portugal não era
só insular e europeu, era sempre mais qualquer coisa, e essa ideia de limites maiores
justificava a grandeza do país e o orgulho de ser português. O entendimento português
passava pela colonização, ser português significava ter um império e territórios
ultramarinos, portanto inicialmente a designação era mesmo Império colonial
português. Portanto, dada essa herança colonial, durante o Estado Novo temos um
país que se empenha na guerra colonial.

Do ponto de vista militar, Portugal foi bastante eficaz, mas não se vencem guerras de
guerrilha, é muito raro, portanto o sucesso militar português foi bastante assinalável,
mas era na verdade uma tentativa de ganhar tempo, para permitir aos políticos
desbloquear a situação de alguma forma.

Do ponto de vista económico, houve uma regressão, isto porque um país em guerra
investe mais nas despesas militares, deixando de lado o investimento público

Há uma clara africanização do conflito, tendo uma consequência devastadora depois


das independências, porque as pessoas que combateram ao lado do exército
português, foram massacradas pelos novos regimes (nomeadamente Guiné e Angola)

Este conflito, apesar de baixa intensidade, sem grande número de mortos etc., teve
consequências. Mas ao mesmo tempo, a população portuguesa em África não parou
de crescer, o que prova que do ponto de vista militar as guerrilhas tiveram impacto
muito reduzido.

Uma maneira de perceber a baixa intensidade do nosso conflito, tem a ver com o
número de mortos por 1000 soldados → a média foi 2,33 por 1000

Se inicialmente o recrutamento não foi problemático porque existia o apoio social à


posição do Estado face às potências ultramarinas, a verdade é que com o passar dos
anos, esse apoio foi se degradando, pois, 13 anos é muito tempo e muita coisa muda.
Para além do impacto internacional, há sempre um impacto social, uma vez que há
uma geração inteira que se vê metida no conflito.

O impacto na saúde, na vida, na vertente psicológica das pessoas que estavam prestes
a ir para a guerra, faz com que se dê uma cisão da sociedade e seja reduzida a base de
apoio ao conflito e à ideia do regime de um império colonial.
Os setores católicos mantêm-se críticos, as Forças Armadas dão sinais de cansaço, as
empresas começavam a dar prioridade à Europa, há um desvio permanente de mão de
obra e de recursos.

Sendo assim, um elemento essencial da autodefinição portuguesa durante quase 500


anos é posto em causa desta maneira. Assistimos a um questionar de perceção por
parte da população de “será que isto ainda faz sentido?”.

Guerra Fria
Martim Ghira Campos

Divide-se essencialmente em duas dimensões:

• Ideológica e intelectual, que opõe os defensores da democracia liberal e o


sistema capitalista dos defensores da ditadura e da economia planificada

• Materialização em conflitos diretos. Embora EUA e URSS não se tenham


confrontado diretamente de forma militar, fizeram-no por meio de outros
atores. A Guerra Fria metastizou-se em vários territórios internacionais

A IIGM terminou em Maio de 1945 com a rendição alemã e com o lançamento das
bombas de Hiroxima e Nagasaki que levou à rendição japonesa. A primeira
consequência do fim da IIGM, é que em 1945, embora as potências aliadas fossem as
vencedoras, a verdade é que com o pós 1945 os EUA e a URSS saíram do conflito como
os verdadeiros superpoderes.

Se os EUA e a URSS eram os superpoderes em 1945, surgiu imediatamente a


preocupação do lado ocidental de que a ambição soviética passava por ocupar
território que anteriormente tinha sido tomado por Hitler, principalmente na parte
Leste. Moscovo respondia que apenas queria garantir a sua própria segurança,
mostrando o pacto Germano-Soviético como um pacto que não garantiu essa
segurança, sendo que a ideia era a de que a URSS não podia simplesmente retirar-se
para o seu território, tendo de garantir um período de transição para não temer
qualquer tipo de invasão ou hostilidade para o seu território.

O desenho da Guerra Fria começa a ser feito antes do fim da IIGM. Nesse sentido, tem
importância a Conferência de Ialta de 1945, em que o objetivo era saber o que fazer
com a Alemanha depois da guerra, ainda antes da sua rendição que já era esperada.

Participantes importantes → Estaline, Roosevelt, Churchill

Começaram por ser decididas algumas questões fundamentais que iram moldar e
determinar o que vai ser a Guerra Fria. Uma dessas questões era então o que fazer
com a Alemanha, e neste sentido, a Alemanha foi dividida em 4 zonas: francesa,
britânica, americana e soviética. A cidade de Berlim, que ficava no território soviético,
vai ser também dividida em 4 zonas.

Quando se dá a divisão, surge um problema obvio, que era o facto de, embora Berlim
ficasse dividido em 4 zonas, a verdade é que se situava em território soviético, algo
Martim Ghira Campos

que vai ter consequências gravosas quando se dá, por exemplo, o Bloqueio de Berlim
(que de certa forma deu inicio à Guerra Fria)

Na Conferência, decidiu-se também que:

• Os criminosos de guerra seriam julgados e punidos por crimes de guerra

• Os países de Leste vão ter eleições livres

• A Liga das Nações teria de ser substituída por uma nova organização (ONU)

• A Alemanha teria de pagar reparações de guerra, com um montante decidido à


posteriori e o pagamento dessas reparações teria de ser feito no quadro da
recuperação económica da Alemanha e da Europa (por detrás desta cautela
está a experiencia que a Europa tinha tido depois da IGM, ou seja, a ideia de
dar à Alemanha um pesado caderno de encargos sem ao mesmo tempo
garantir a recuperação económica alemã, tinha sido um desastre, desastre esse
que também contribuiu para a IIGM)

Poucos meses depois e já depois do fim da guerra em solo europeu, vai se realizar uma
nova conferência → Conferencia de Potsdam

Vão haver algumas alterações significativas relativamente à Conferência de Ialta. Em


primeiro lugar, os atores que participaram na Conferência de Potsdam vão alterar:
Estaline, Roosevelt morre e é substituído por Truman, Churchill é substituído por
Attlee.

Estaline afirma que enquanto a URSS não tivesse garantias de segurança (leia-se
enquanto não controlasse a totalidade do Leste da Europa) não poderia retirar as
tropas de território polaco. Fundamenta isto dizendo que foi precisamente devido à
saída soviética da Polónia e a essa falta de capacidade de proteção no flanco polaco,
que Hitler tinha decidido invadir a Polónia no decorrer da IIGM. Esta é a primeira
dissonância entre os participantes da Conferência, bem como o facto de a URSS não
permitir as eleições livres como tinha prometido meses antes.

Nesta conferência, a sensação com que se ficou foi a de que “uma cortina de ferro
descia sobre a Europa”, sendo que esta sensação se foi intensificando e tornando cada
vez mais presente à medida que a União Soviética se foi expandindo para vários países
do Leste.

Perante esta sensação, o presidente Truman vai entender que é necessário confrontar
a nova ameaça comunista, com uma nova doutrina geoestratégica, que passa a marcar
as Relações Internacionais dos EUA com o mundo a partir de 1945.

Depois de 1919 e sobretudo depois da não participação dos EUA na recém-criada Liga
das Nações, a década de 1920 e 1930 ficou marcada por um fortíssimo isolacionismo
americano. A conclusão a que Truman vai chegar é que não era possível, depois do que
Martim Ghira Campos

se tinha passado de 1939 a 1945, que os EUA regressassem a uma posição


isolacionista, afastando-se dos problemas globais, sobretudo quando do outro lado
havia uma ameaça crescente às democracias e ao mundo livre.

É nesse sentido que vai ser elaborada a Doutrina Truman, procurando contrabalançar
o poder soviético. Truman defendia que era obrigação dos EUA apoiar todos aqueles
que querem viver em liberdade e que eram pressionados pela União Soviética, sendo
que se os EUA não tivessem estado à altura do desafio, a paz mundial estaria
novamente posta em causa.

Truman começa por aplicar a doutrina na Grécia. Em 1944, as tropas britânicas


libertaram a Grécia dos exércitos nazis, restaurando a monarquia, mas a verdade é que
desde então os britânicos ajudavam Atenas a combater os comunistas que
procuravam controlar o país. É neste contexto que é pedida ajuda americana e Truman
entende que a única forma de conter o comportamento comunista agressivo na
Grécia, passava pelo uso da força americana. Esta situação na Grécia é a primeira
prova de que os EUA não se podiam afastar daquilo que se estava a passar em solo
europeu. O pensamento de Truman era precisamente esse → de que valia estar a
combater a ameaça nazi, quando a libertação de certos países iria implicar entregar
esses territórios a outro totalitarismo.

O conselho aprova a iniciativa de Truman e disponibiliza 400milhões de dólares para


ajudar a Grécia contra as investidas comunistas. Em 1949 a ameaça comunista na
Grécia é derrotada e a doutrina Truman vai inaugurar uma nova fase na Politica
Externa Norte Americana, ou seja, os EUA não voltam a uma posição isolacionista e
vão travar o avanço comunista no mundo, passando a estar em cima da mesa, a partir
de 1949, a Politica de Contenção dos EUA → procurava garantir a derrota do
comunismo em todo o mundo (ver resumos TRI)

Moscovo entende isto como uma declaração de guerra e é precisamente aqui que
começa a Guerra Fria.

Se é importante conter e limitar a agressão comunista, a verdade é que não era apenas
suficiente evitar essa espécie de ameaça militar, era fundamental garantir que os
países do Ocidente pudessem novamente começar a trilhar um caminho de
recuperação económica. É neste sentido que se vai aplicar o Plano de Marshall.

Plano de Marshall → as economias da europa tinham sido arruinadas na IIGM e com


esse cenário de devastação económica, partidos comunistas poderosos começaram a
avançar em países ocidentais como a França e a Itália, levando Truman a enviar George
Marshall para a Europa, de forma a fazer um levantamento das necessidades
económicas de que o continente precisava. O Plano Marshall começa então com a
reconstrução económica da Europa, estimada entre 12 a 17 mil milhões de dólares,
privilegiando as maiores economias (e mais afetadas), sendo elas a França e a Grã-
Bretanha, mas ajudando um total de 16 países.
Martim Ghira Campos

Estaline encarregou-se de garantir que os países de Leste não iriam receber ajuda
económica do Plano de Marshall, ou seja, olhou para o plano não só como uma
tentativa de reanimar as economias europeias, mas também como um objetivo de
travar a influência comunista e sobretudo travar essa influência através da melhoria
das condições de vida.

Estaline vai responder à Doutrina Truman e ao Plano de Marshall com o chamado


COMECON, que procurava responder ao desafio económico que o Plano de Marshall
trazia para a Europa. Basicamente a URSS chamou a si a responsabilidade de
estabelecer trocas comerciais com os países do Leste da Europa, significando a criação
de uma espécie de “mercado do comunista” em todo o território do Leste, de forma a
que os países sob domínio soviético pudessem realizar trocas entre si, mas não com o
Ocidente. É reagir ao bloco ocidental com um bloco próprio.

Se o palco da GF já estava montado com a situação da Grécia, a criação do Plano de


Marshall e a criação do COMECON, a verdade é que a primeira situação de verdadeira
tensão e enfrentamento entre a URSS e as potências ocidentais, vai se dar com o
Bloqueio de Berlim.

Bloqueio de Berlim → O Plano de Marshall ajudou a Alemanha e melhorou bastante a


situação económica do país. Em 1948, a parte francesa, britânica e americana da
Alemanha, vão se unificar, alarmando os soviéticos que consideraram isto como o
primeiro passo para reivindicar a total reunificação da Alemanha. Moscovo vai
aproveitar-se do facto de Berlim se situar em território soviético, para impedir o
tradicional acesso dos aliados à capital. O objetivo de Estaline era duplo:
• Em primeiro lugar era impedir uma reunificação total da Alemanha
• Mas sobretudo Estaline entendeu que o facto de as três zonas serem agora
uma só, permitiria aos soviéticos o controlo da totalidade de Berlim. A União
Soviética entendeu que isto era o pretexto para que pudesse fazer na cidade de
Berlim, o mesmo que as potências aliadas fizeram na parte ocidental da
Alemanha.

O que vai acontecer é que em 1948, as rotas para Berlim Ocidental foram fechadas por
Estaline. Este é o primeiro momento de verdadeira confrontação entre a URSS e as
potências aliadas.

A seguir, de forma a responderem ao bloqueio de Berlim, os Aliados vão responder,


não de forma militar, mas com ajuda alimentar enviada pelo ar, de forma a romper
com o bloqueio terrestre imposto por Estaline. Em maio de 1949, Estaline vai levantar
o bloqueio à cidade de Berlim.

Este gesto é visto como o primeiro grande momento da Guerra Fria porque os EUA e o
Ocidente mostraram unidade no confronto, mostrando que a doutrina Truman era
para levar a sério e que aquelas situações depois da criação da Liga Nações em que era
possível desencadear ações de natureza ofensiva sem que houvesse qualquer
retaliação da comunidade internacional, não voltariam a passar incólumes.
Martim Ghira Campos

O Bloqueio de Berlim serviu como um teste para verificar qual era o grau de
compromisso das potências ocidentais.

Por outro lado, o bloqueio de Berlim acabou por adiar a unificação alemã, que só se vai
verificar depois da Queda do muro de Berlim. A partir de 1949 começaram a existir
duas Alemanhas (Democrática e Comunista).

A cidade escolhida para capital da Alemanha Ocidental, foi a cidade de Bona, porque
não era uma das principais cidades da Alemanha Ocidental, ou seja, os Aliados
procuravam sinalizar que a capital da Alemanha Ocidental era apenas uma capital
puramente transitória, sendo que a situação da Alemanha só estaria regularizada com
a unificação do país e com Berlim como capital.

Em terceiro lugar, o Bloqueio de Berlim está diretamente ligado à formação da NATO


em 1949, em que os países se comprometem a entreajudar-se em caso de agressão.
Em 1955 dá-se a adesão da Alemanha Ocidental, algo que teve uma importância
decisiva.

A tentativa de Estaline de bloquear Berlim Ocidental em 1948/9, tinha sido derrotada,


e, portanto, Khrushchev (sucessor e herdeiro da política de Estaline) também tinha a
pretensão de que o ocidente acabaria por abrir mão de Berlim Ocidental.

Os EUA, que inicialmente olhavam para Khrushchev como um possível parceiro de


coexistência pacifica, vão se opor á sua política quando percebem que tinha apenas
havido uma mudança de rosto e que as pretensões soviéticas continuavam as mesmas.

A partir da década de 50, o Plano de Marshall teve um impacto decisivo no nível de


vida da população que se situava na parte Ocidental da Alemanha e sobretudo na
população que se situava na parte Ocidental de Berlim.

Mas o que se começa a verificar a partir de 1950, é que devido à diferença do nível de
vida, o Ocidente começou a ser um chamariz para a população do Leste da Alemanha e
de Berlim. Muitos cruzavam a fronteira para o Ocidente (entre 1945 e 1961, cerca de
2milhões de alemães do Leste cruzaram a fronteira), sendo que a maior parte eram as
pessoas mais qualificadas.

Khrushchev vai procurar terminar com este êxodo em 1961, fechando a fronteira,
sendo que não era suficiente apenas fechar a fronteira. Era preciso conseguir um
sistema que fosse muito mais eficaz e impedisse a fuga da população de Berlim e da
Alemanha de Leste (muitas vezes de forma letal), sendo sobretudo um sistema que
permitisse guardar a fronteira.

Em Agosto de 1961 a cidade de Berlim foi cortada ao meio por arame farpado e
tanques soviéticos no lado Oriental. Rapidamente substituiu-se o arame farpado por
um Muro com 45km e 3metros e meio de altura, torres de vigia e guardas com ordens
para abater quem cruzasse a fronteira.
Martim Ghira Campos

Primeiros resultados práticos da construção do Muro de Berlim → em primeiro lugar,


de um dia para o outro, 60 mil trabalhadores deixaram de poder passar para a parte
ocidental. Por outro lado, mais de 40 alemães foram abatidos só no primeiro ano ao
tentar passar pelo Muro de Berlim.

Consequências da construção:

• A realidade do muro de Berlim reduziu o número de deserções da cidade Leste


(desce de 2milhões para 5mil casos de sucesso de fuga).

• O muro constituiu-se como uma espécie de símbolo do que era a realidade do


Comunismo, ou seja, sinalizava que o comunismo precisava de usar muros e
fortificações para impedir que os seus cidadãos escapassem da alegada
perfeição e utopia comunista. Para o Ocidente, o muro era o símbolo do
comunismo

Aula 2 Guerra Fria

Recap → A GF significa um enfrentamento de natureza ideológica entre dois blocos


que do ponto de vista de organização política e económica são antagónicos. A GF foi
jogada em vários tabuleiros, sendo que mesmo sem confronto direto entre EUA e
URSS, foi desenvolvida em várias áreas do globo.

GF contribuiu para uma reorganização económica da Europa, feita por parte da URSS
(COMECON) e por parte dos EUA (Plano Marshall)

Consolidação do poder Soviético na sua esfera de influência

Com a subida ao poder de Khrushchev, começamos a encontrar uma situação de


aparente desanuviamento entre as relações URSS-Ocidente, levando mesmo à ideia de
entendimento entre ambos e abertura do Leste.

No entanto, há dois acontecimentos que consolidaram o poder soviético na sua esfera


de influência, destroçando as ilusões e possibilidade de abrir um novo capítulo da
guerra, ou seja, a tal ideia de apaziguamento que estava a ser transmitida

O primeiro dá-se com a Revolta Húngara (Budapeste) em 1956. O que aconteceu foi o
sinalizar por parte da URSS de que a coexistência pacifica não passava de um mito. A
Hungria foi um dos estados derrotados na IGM, quando fazia parte do Império Austro-
húngaro, sendo que toda a sua história é feita mediante o estatuto de perdedora da
guerra. Nunca foi possível instaurar uma democracia liberal na Hungria, a situação
económica também era complicada, tendo um forte impacto na sociedade civil
húngara.

Posto isto, no final da IIGM, com o patrocínio de Moscovo, foi instaurado um governo
comunista na Hungria sob o comando de Mátyás Rákosi. Por ser um Estalinista,
eliminou a oposição interna e procedeu à detenção de opositores políticos. Quando
Martim Ghira Campos

Estaline morreu, foi substituído por Imre Nagy, sendo que este mudar da guarda
aumentou a esperança de que a Hungria podia aliviar algumas das imposições
comunistas impostas pelo antigo governo.

Nagy teve alguma abertura na imprensa, para presos políticos, ensaiaram-se algumas
medidas de cariz democrático, mas em 1955, Rákosi voltou a tomar o poder, levando
inclusive a um endurecimento da URSS sobre a Hungria.

A partir de 1955 começam a acontecer motins contra o governo de Rákosi, onde houve
cerca de 20mil mortes e 200 mil presos políticos. Este endurecimento da revolta
resulta não só da opção de Rákosi, mas também das esperanças que foram criadas na
sociedade nos tempos em que Nagy estava no poder.

Durante estes motins, o que se reclamava era precisamente uma maior aproximação
ao Ocidente e o continuar das reformas democráticas iniciadas com Nagy. Os conflitos
vão se alastrar a várias áreas do país, sendo que a URSS, ao ser confrontada com esta
situação de rebelião geral, vai entrar na Hungria.

Nesta primeira invasão soviética da Hungria, o que vai acontecer para acalmar os
ânimos, é que o Ex-Primeiro Ministro Nagy, vai voltar ao poder. Isto acalma um pouco
a situação e leva as tropas soviéticas a sair da Hungria.

O problema é que depois da abertura reformista de Nagy, o PM vai continuar a essa


mesma agência reformista, apontando para dois princípios que a URSS não poderia
tolerar:

1) Nagy vai se comprometer com a realização de eleições livres e tudo o que elas
significam (fim da polícia política, retirada de tropas soviéticas do território
húngaro…). Khrushchev parecia aceitar, enquanto as pretensões de Nagy eram
só estas.

2) O grande problema foi que Nagy também exigiu o direito da Hungria de deixar
o pacto de Varsóvia e escolher uma espécie de papel neutral no contexto da
Guerra Fria. É precisamente esta pretensão de neutralidade que vai fazer com
que a URSS acabe por intervir na Hungria de forma brutal.

As tropas soviéticas voltam a entrar no país (mais de 1000 tanques) e Nagy tenta
apelar à ajuda do Ocidente e principalmente aos EUA, com o objetivo de proteger a
democracia na Hungria, mas a verdade é que rapidamente é derrubado, capturado e
executado, começando outro governo soviético liderado por János Kádár. A Hungria
ficou sob o total controlo soviético.

Principais consequências da invasão soviética da Hungria:

1) Preço humano impressionante


Martim Ghira Campos

2) Enorme fluxo de refugiados húngaros que acabaram por se instalar no


Ocidente. Principalmente pessoas mais especializadas e com maior capacidade
económica para fugir. Isto levou a um empobrecimento da sociedade húngara
presente em território húngaro

3) Do ponto de vista geoestratégico, e num contexto de Guerra Fria, isto significou


que o Ocidente não iria interferir com as atividades soviéticas no Leste da
Europa.

4) Dada a situação, outros estados satélites da URSS perceberam a mensagem e


não se atreveram a desafiar a autoridade de Moscovo.

Depois da revolta húngara, em 1968, há outro país do pacto de Varsóvia que vai
também entrar em ebulição antissoviética → Checoslováquia

A Checoslováquia foi um dos últimos países de Leste a tornar-se comunista e entre


1948 e 1968 foi governada por Antonín Novótny. Ele era leal à União Soviética, mas ao
contrário da maior parte dos países do Leste que tinham pouca ou nenhuma tradição
democrática e levava a que a oposição à União Soviética fosse frágil, a verdade é que
os checos tinham sido uma democracia consolidada entre 1919 e 1938. Tendo a
memória deste período democrático, a Checoslováquia sempre protestou contra o
governo soviético, de tal forma que, em 1968, Novótny foi forçado a demitir-se e foi
substituído no governo por Alexander Dubcek.

Nota → quando falamos de situações mais democráticas no Leste, estamos sempre a


falar de comunismo na mesma. A oposição à URSS não significava um não comunismo.

Como líder do partido comunista, Dubcek acreditava que tendo em conta as


especificidades sociais e políticas da Checoslováquia, era possível trilhar um caminho
que fosse um comunismo mais mitigado (comunismo como rosto humano – expressão
de Dubcek)

Isto significava medidas que Dubcek foi promovendo, como o levantamento da


censura, o controlo da economia/industria/agricultura foi reduzido para possibilitar a
constituição das primeiras empresas privadas, polícia política foi reduzida e o novo
governo vai abrir as fronteiras com o Ocidente, possibilitando os Checos de viajar e
trabalhar no Ocidente.

Perante esta situação de abertura checa, Leonid Brejnev (sucessor de Khrushchev) vai
começar a mostrar preocupação, principalmente com dois aspetos que eram já um
facto no interior da Checoslováquia:

1) A maior liberdade de expressão


2) A possibilidade de livre circulação de pessoas, isto porque a parte mais
qualificada da população checa vai poder viajar para o Ocidente e não
regressar.
Martim Ghira Campos

Brejnev entendia que aquilo que se estava a passar na Checoslováquia podia constituir
um preceito para os outros países do pacto de Varsóvia. Este caminho mais
liberalizante da Checoslováquia representava uma ameaça ao império soviético.

Em 1968, numa espécie de repetição do acontecimento da Hungria, tanques soviéticos


e também soldados de outros países do pacto de Varsóvia, invadiram a
Checoslováquia. O governo não resistiu e Dubcek caiu do poder, sendo substituído por
um líder do Partido comunista da “linha dura”, chamado Gustáv Husák.

Com esta substituição da liderança, o processo reformista na Checoslováquia vai ser


parado e todos os ganhos da Primavera de Praga vão ser revertidos, isto é, todas as
reformas do governo de Dubcek vão ser eliminadas.

Primavera de Praga → período reformista de Dubcek, pela possibilidade de haver vida


e abertura

É no contexto da revolta checoslovaca que vai ser definida a chamada Doutrina


Brejnev → foi uma espécie de ameaça direta feita por moscovo a todos os países do
pacto de Varsóvia que tivessem a tentação de sair da órbita soviética, isto é, se algum
desses países se aproximasse do modelo capitalista demoliberal, as autoridades desse
mesmo país são obrigadas a atuar, bem como todos os outros países socialistas do
pacto de Varsóvia.

Comparando a situação da Hungria em 1956 e a situação da Checoslováquia em 1968,


a principal diferença é que em 1968 não foram apenas tanques soviéticos a intervir,
foram sim vários países do pacto de Varsóvia.

A Doutrina Brejnev vai vigorar durante todo o contexto de GF até à altura em que
Gorbachov a abandona em 1989, levando à desagregação de todo o império soviético
e queda do muro de Berlim.

Principais consequências do que se passou na Checoslováquia:

1) Fim da Primavera de Praga, isto é, a fim da última hipótese de um país do pacto


de Varsóvia traçar um caminho diferente daquele que era imposto pela URSS

2) Endurecimento do governo de Moscovo quanto aos países da sua esfera de


influência

3) O ocidente entendeu quais eram as áreas de influência soviética e quais eram


as suas, um pouco à semelhança do que tinha acontecido na Hungria.

A guerra só foi verdadeiramente fria no interior da Europa, isto é, o congelamento do


conflito aconteceu apenas na Europa, uma vez que ao redor da Europa (Africa,
Vietname, ásia, América Latina) a GF deu-se de uma forma mais intensa e letal.
Martim Ghira Campos

4) Êxodo elevado de checos para o ocidente, significando, tal como na Hungria,


um empobrecimento da sociedade civil

Se a revolta na Checoslováquia marcou um fim na possibilidade de abertura do


comunismo soviético na Europa, a verdade é que na década de 1970, começamos a
observar alterações do ponto de vista geopolítico que vão ter um impacto direto no
contexto da GF.

A década de 1970 ficou marcada como a Época da Détente → foi uma época de
apaziguamento das tensões da GF. Não só o confronto direto entre as duas potências
iria trazer consequências muito maiores, mas também a corrida armamentista com o
objetivo de persuasão estava a demonstrar-se muito dispendiosa para ambas as
partes.

Nesta época de 1970, começam a haver sinais de uma relativa abertura de outros
países comunistas, como por exemplo a China, que se torna membro da ONU, e o
Presidente dos EUA (Richard Nixon) realiza visitas à URSS e à China (momento histórico
da GF)

Richard Nixon foi um grande presidente para os EUA, com boas medidas de política
externa, como por exemplo, essas relações mais abertas com a URSS e o fim da guerra
do Vietname.

A década de 1970 provoca alterações no roteiro da GF

A Época da Détente vai conhecer um fim com o que se vai passar no Afeganistão em
1979, que mais tarde deu origem ao 11/9.

O Afeganistão pertencia à esfera de influência soviética desde a década de 1950,


significando que a URSS era um importante parceiro do ponto de vista económico e da
construção de infraestruturas petrolíferas no Afeganistão.

Em 1973, a monarquia Afegã é derrubada, implicando um período de grande conflito e


perturbação interna no Afeganistão, terminando em 1978 quando o poder é tomado
por um grupo comunista com o apoio dos militares do país.

Em 1978, a União Soviética pretende para o Afeganistão as mesmas coisas que


pretendia para todos os outros países sob a sua influência, ou seja, uma sovietização
do país, passando por uma extensíssima reforma agrária, pela nacionalização de todos
os setores produtivos e pelo desmantelamento das instituições religiosas do
Afeganistão. Num país esmagadoramente muçulmano, a URSS pretendia uma
secularização forçada.

Isto desencadeia uma guerra civil no Afeganistão, sendo sobretudo a partir de 1978/79
que começamos a ver que a oposição ao governo afegão era efetuada por um grupo
muçulmano de inspiração religiosa, que levava o conflito como uma guerra contra os
Martim Ghira Campos

infiéis e não contra o comunismo. Este grupo (Mujahidin) vai contar com o apoio
direto dos EUA, em apoio financeiro, tecnológico e militar.

É neste contexto que se destaca Osama Bin Laden, na luta contra a presença soviética.

Quando o governo afegão se encontra sob ataque dos grupos Mujahidin, sobretudo
sabendo que estes grupos contam com o apoio dos EUA, pede ajuda à URSS.

É neste contexto que no natal de 1979, tanques e tropas soviéticas entram no


Afeganistão. Moscovo tinha o objetivo de preservar o governo comunista afegão e
tinha a preocupação de não permitir que o Afeganistão pudesse trilhar o caminho que
seguiu o Irão (revolução teocrática). Para além disso, a URSS também estava
preocupada com o que poderia acontecer interiormente, porque havia muitos
muçulmanos no interior da própria União Soviética. Por fim, a participação soviética
também se justifica pelo contexto de GF, porque não poderia perder a sua influencia
no Medio Oriente, porque significava perder uma influência fundamental numa altura
em que a China se afirmava como a principal potência comunista regional e contava
com o apoio indireto dos EUA.

Perante a guerra no Afeganistão entre o governo afegão e União Soviética contra os


EUA e os grupos rebeldes islamitas, a década de 1980 inaugurou-se com uma enorme
tensão entre os dois blocos, colocando um ponto final na Détente.

A partir de 1980 os soviéticos começam a perder a guerra no Afeganistão. O percurso


do conflito foi parecido com o do Vietname, isto é, há ganhos iniciais soviéticos rápidos
mas começa a perder força do ponto de vista económico e de baixar humanas, sendo
que o peso económico deste conflito vai determinar a decadência da união soviética
ao longo da década de 80.

A juntar a esta situação má para Moscovo, a chegada ao poder de Ronald Reagan foi
crucial para a GF, porque uma das estratégias era desgastar a União Soviética do ponto
de vista económico, retomando a corrida armamentista que Moscovo não ia conseguir
acompanhar. Isto significa que houve um aumento brutal da despesa militar nos EUA.

A partir de 1980 há então uma degradação económica da União Soviética, a


incapacidade de acompanhar a corrida armamentista e a incapacidade de vencer a
guerra do Afeganistão.

Em 1988 Gorbatchov anuncia a retirada do Afeganistão, operação essa concluída em


1989.

Com este desgaste militar, com o desgaste económico, está tudo traçado para levar à
gradual desagregação do império soviético. O principal momento desta desagregação
é marcado pela queda do Muro de Berlim.

Muro de Berlim
Martim Ghira Campos

O muro enquanto divisão de dois mundos e metáfora do comunismo e da Europa de


Leste

As potências que saíram vitoriosas da IIGM (EUA, URSS, Grã-Bretanha, França),


decidiram dividir a Alemanha em quatro zonas de ocupação, sendo que Berlim, ficaria
também dividida em 4 setores e a totalidade da cidade situar-se-ia em território
controlado pela URSS. Isto deu azo ao bloqueio de Berlim (tentativa de cortar ligações
entre Berlim e a parte Ocidental da Alemanha).

Berlim, mesmo com as divisões em setores, era uma cidade que funcionava como um
todo. Havia restrições, sinaléticas e controlo, mas na esmagadora maioria, os cidadãos
de Berlim não se dividiam em partes, podendo deslocar-se livremente pela cidade.
Inclusive, muitos optavam por viver na parte Oriental, porque o custo de vida era mais
baixo, trabalhando na parte Ocidental, onde os salários eram superiores.

Tendo em conta que Berlim se situava na parte soviética da Alemanha, havia um


calcanhar de Aquiles → a facilidade com que muitos cidadãos da República
Democrática Alemã (Leste da Alemanha) utilizavam a cidade de Berlim para fugir do
regime comunista da Alemanha. Isto era um problema para as autoridades da parte
oriental da Alemanha, porque aqueles que escolhiam fugir, eram a parte mais jovem e
mais qualificada da população.

A Alemanha Oriental estava a perder população, os cidadãos mais instruídos, os


trabalhadores mais qualificados, tudo isto a um ritmo que ameaçava tornar o estado
comunista inviável do ponto de vista económico e social.

Confrontados com este problema de fuga através da cidade de Berlim, começa a ser
equacionada a construção do Muro de Berlim.

As autoridades começam a tentar justificar a construção do muro, fazendo com que os


jornais e as televisões parassem de se referir a essas movimentações como “deserções
da republica”, passando a falar de “tráfico de pessoas”. A Alemanha de Leste dizia que
este tráfico acontecia, ou por suborno da Alemanha Oriental, para que as pessoas
mudassem para o lado capitalista, ou por sequestro nas ruas de Berlim, para que
mudassem para o lado Oriental. Em suma, o Leste negava que as pessoas não queriam
viver no lado Oriental, afirmando que eram atraídos ou sequestrados, para que
pudessem servir o lado Ocidental e o regime capitalista.

A construção do muro tinha de ser feita de forma imediata, para evitar deserções, e
tinha de se efetuar no espaço de uma única noite. É mesmo isto que acontece, sendo
que começa a ser construído dia 12, e dia 13 de Agosto de 1961 o muro estava
concluído. No espaço de uma noite, famílias ficam separadas até 1989, amigos ficam
separados, trabalhadores ficam sem acesso aos trabalhos, ou seja, de um dia para o
outro tudo tinha mudado.

O muro, na Alemanha de Leste, era apresentado como uma proteção antifascista. Já as


potências Ocidentais, designavam o muro como Muro da Vergonha.
Martim Ghira Campos

Importante → O muro era um controlo das fronteiras da Alemanha Oriental, que em


nada interferiu com os direitos dos cidadãos da Alemanha Ocidental. Se um Ocidental
pretendesse viajar para Leste, tinha de pedir visto, mas podia entrar e sair do Leste
sem problema. Já os cidadãos do Leste, estavam impedidos de sair da parte Oriental.

Qual foi a reação das três grandes potências que estavam na Alemanha, perante a
construção do muro?

A grande questão que as potências tinham, era se valia a pena um enfrentamento


militar, que certamente seria nuclear, por causa da cidade de Berlim. Todas as
potências acharam o muro uma agressão, intolerável, pondo em causa o que tinha
sido decidido no pós-guerra (manter Berlim uma cidade única, ainda que dividida em
setores). Mas na verdade, perante a impossibilidade de trazerem a totalidade de
Berlim para a parte ocidental e de reunificar a Alemanha, as potências pouco fizeram
perante a construção do muro.

EUA → Kennedy queria a unificação alemã, mas não estava disposto a marchar sobre
Berlim e a desencadear um enfrentamento nuclear com a URSS

Grã-Bretanha → O PM Harold Macmillan já tinha problemas económicos graves para


tratar, não querendo arriscar um novo enfrentamento militar por causa da cidade de
Berlim.

França → A elite francesa achava que o que se verificava era um abuso das
autoridades da Alemanha de Leste e da URSS, mas, recordando o passado entre França
e Alemanha, talvez a divisão não fosse de todo má aos olhos da França, isto porque a
Alemanha perdia capacidade de fazer frente à França.

Em 1961, as potências “aceitaram” o que se passou em Berlim, por falta de opção.


Quando o muro cai em 1989, não houve os festejos que se esperavam, pois havia o
medo de que pudesse haver uma reação da URSS, ainda que pouco esperada. A Grã-
Bretanha e a França temiam uma Alemanha reunificada.

Quem tinha tido contacto com o mundo Ocidental, era visto como perigoso, pois podia
trazer ideias ocidentais para as mentes das pessoas do Leste. Todos os professores
qualificados que tinham ensinado no Ocidente, mas que residiam no Oriente, foram
barrados do sistema educacional para a vida toda, pois entendia-se que traziam
concessões e vida e políticas que eram um perigo para o Estado. Muitos dos
estudantes de humanidades e ciência política, que eram cidadãos da República
democrática alemã (leste), tinham iniciado os estudos em universidades ocidentais,
sendo que por isso foram imediatamente colocados em unidades industriais, sendo-
lhes impossibilitada a continuação dos estudos.

Quando é que se começam a ver as primeiras brechas do Muro de Berlim?


Martim Ghira Campos

O início da década de 1980, vai trazer alterações profundas no xadrez da Guerra Fria. A
URSS tinha-se envolvido numa guerra destrutiva no Afeganistão e isso era um sorvedor
na economia, economia essa que já era debilitada.

Mas a verdade é que na União Soviética vai acontecer uma mudança de liderança, que
vai ser fundamental para aquilo que se vai passar ao longo da década de 80.

Na União Soviética, havia vários líderes que davam sinal de envelhecimento e doença
(Brejnev → Andropov → Chernenko). Em 1985, é eleito Secretário Geral do Partido
Comunista e novo líder da União Soviética, aquele que era o mais jovem membro do
Politburo → Mikhail Gorbatchov.

Gorbatchov era o primeiro líder da URSS, que tinha nascido depois da Revolução de
1917, ou seja, todos os outros líderes eram nomes que tinham vivido a revolução e
privado com aqueles que tinham sido os principais nomes da revolução (Lenine,
Trotsky, Estaline…). Gorbatchov era uma exceção, não só do ponto de vista
cronológico e etário, mas também do ponto de vista conceptual e intelectual.

Gorbatchov não pretendia abolir a União Soviética, nem desmantelar o comunismo,


apenas pretendia enfrentar a realidade, reformar o comunismo, de forma a preservar
o essencial da mensagem socialista. Pretende por isso, adaptar a União Soviética a um
novo contexto, sobretudo procurando lidar com as principais fragilidades do país, do
seu setor comercial, indústria e economia.

O primeiro problema com que Gorbatchov se defronta, é com a Guerra do


Afeganistão. A guerra era sorvedora de recursos, não estava a ser ganha e, portanto,
Gorbatchov começa a desenhar uma estratégia de forma a poder retirar as tropas
soviéticas do Afeganistão, acontecendo a partir de 1988.

Para além disso, Gorbatchov entendia que o comércio e indústria soviéticos, que ainda
estavam organizados segundo preceitos Estalinistas, não podiam competir com o
Ocidente nas novas áreas industriais e tecnológicas.

Um dos exemplos mais claros e catastróficos da situação em que se encontrava a


indústria soviética, deu-se em 1986 com a explosão do reator de Chernobyl. Chernobyl
não foi apenas um desastre ambiental e ecológico, foi também um desastre no
orgulho e sentido de superioridade da indústria soviética.

Perante esta situação, ou seja, a gradual ruína da economia soviética, Gorbatchov vai
procurar enfrentar estes problemas, sobretudo combinando dois programas
reformistas:

1) Perestroika (Reconstrução) → Era preciso reconstruir a economia soviética,


sendo apenas possível abrindo a atividade económica à iniciativa privada. A
única forma de a União Soviética regressar, passava pela competição industrial,
pela abertura das indústrias à iniciativa privada, ou seja, passava por imitar
aquilo que sempre se tinha feito a Ocidente.
Martim Ghira Campos

Não bastava apenas reconstruir a economia da União Soviética, era também preciso
implementar uma política de Glasnost.

2) Glasnost (transparência) → transparência para eliminar a corrupção existente


no governo e para começar a abrir a possibilidade de liberdade de expressão.
Era preciso reduzir a censura, aceitar que muitos dos opositores do regime
pudessem regressar a casa, ou seja, era preciso realizar uma abertura, não
apenas da economia, mas também artística, intelectual.

Mas o grande feito de Gorbatchov do ponto de vista de PE, que vai ter consequências
absolutamente devastadoras no leste da Europa, foi o abandono da Doutrina Brejnev,
ou seja, o abandono desta doutrina sinalizava aos outros países do pacto de Varsóvia,
que Moscovo, à imagem do que tinha feito na Hungria ou na Checoslováquia, não iria
interferir na vida interna desses países.

Com o abandono da Doutrina de Brejnev, os outros países da cortina de ferro vão agir
em conformidade. Exemplo → no ano de 1989, realizam-se as primeiras eleições
parcialmente livres na Polónia, ou seja, permite-se que a oposição dispute alguns dos
lugares da Camara dos Deputados, sendo que o que acontece é que vence todos os
lugares que lhes foi possível disputar. O que se verifica na Polonia é uma transição
praticamente irreversível para a democracia e para a democracia liberal.

Mas o acontecimento que vai sinalizar a primeira grande brecha no Muro de Berlim e
que vai ter um impacto direto, é aquilo que se vai passar na Hungria no dia 2 de Maio
de 1989. O governo Húngaro, que estava nas mãos de comunistas reformistas, com
uma mentalidade mais pluralista, surpreende o mundo ao começar a desmantelar a
sua fronteira fortemente fortificada com a Áustria. Basicamente, o que a Hungria
estava a fazer, era possibilitar os alemães a viajar para a Hungria, para facilmente
chegarem à Áustria. Em 1989 estávamos confrontados com uma situação igual à que
antecedeu a construção do Muro de Berlim, ou seja, uma vez mais, a República
democrática Alemã voltava a confrontar-se com milhares de cidadãos que diariamente
estavam a desertar.

Como reagir a um novo êxodo demográfico, a esta ameaça existencial para a própria
República Democrática Alemã → em 1953 ou 1961, as coisas resolviam-se com
brutalidade. Mas em 1989, as coisas eram diferentes. Em primeiro lugar porque
Gorbatchov estava no poder, em segundo lugar porque a própria situação económica
da República Democrática Alemã era trágica. Em 1989 o país estava em ruínas,
próximo da falência e com mais de metade das suas instalações industriais num estado
irrecuperável.

Perante este cenário, de Gorbatchov no poder, dos outros países do Pacto de Varsóvia
estarem a caminhar decididamente para a democracia, com a economia destroçada e
o êxodo populacional, já não era possível construir um muro sobre o muro, não era
possível fortificar o país inteiro, não era possível matar todos os manifestantes, ou
seja, não era possível voltar às técnicas do passado.
Martim Ghira Campos

Mas era possível tentar salvar a situação com uma nova Lei, ou um Decreto provisório
até haver uma Lei, relativa à forma como os alemães de Leste poderiam viajar. É
exatamente isto que vai acontecer no dia 9 de Novembro de 1989, quando o Politburo
entrega ao seu porta-voz para a imprensa (Günter Schabowski), o decreto com as
novas regras para que os alemães pudessem viajar para fora da Alemanha.

Anteriormente a este decreto, quem quisesse viajar para fora da Alemanha Oriental,
teria obviamente que pedir autorização ao Estado Alemão, e era muito rara a
autorização. Nestas novas regras, a República democrática Alemã comprometia-se a
não fazer perguntas acerca da razão para viajar, prometiam ser celebres na
autorização das viagens, mas mantinham a ideia de que as pessoas teriam de pedir
para viajar mesmo que esse pedido tivesse uma resposta positiva. O pedido
continuava a ser importante.
Por outro lado, o decreto afirmava que as novas regras para viajar para a parte
ocidental, eram regras que se aplicariam a partir do dia seguinte, ou seja, dia 10 de
Novembro de 1989.

O que se passa a seguir é um dos episódios mais inacreditáveis da história da Guerra


Fria → o Muro de Berlim caiu devido a um engano. Na noite de 9 de Novembro de
1989, Günter Schabowski aparece perante os jornalistas para responder a perguntas e
dar informações do dia. Cansado e sem ter lido o decreto que lhe tinha sido passado
para as mãos, na parte final da conferencia, afirma que a nova política de emigração
iria permitir a livre circulação de cidadãos do Leste para o Ocidente e que estas
medidas também se iriam aplicar à própria cidade de Berlim. Ou seja, Schabowski
informava, sem perceber o que estava a informar, que era possível viajar para países
estrangeiros sem nenhuma justificação especial, ou seja, que a República Democrática
Alemã tinha decidido abrir as portas, com entrada em vigor a partir daquele momento.

A partir desse momento, milhares de pessoas saem às ruas e os guardas confrontados


com uma situação que ninguém tinha comunicado (pois era só para entrar em vigor no
dia a seguir), não impediram a passagem dos cidadãos de leste para o Ocidente.

Um erro e imprudência de um funcionário da República Democrática Alemã, precipitou


as pessoas para o fim do Muro. Se o Muro tinha sido construído no espaço de uma
única noite, também caiu no espaço de uma única noite.

Começa a contestação a Gorbatchov pela ala dura do partido comunista e pela própria
população da União Soviética. A economia estava fraca, havia fome e a política de
Glasnost começou a possibilitar críticas ao regime. As repúblicas começam a exigir
independência e esta abertura de Gorbatchov vai ter consequências fora das fronteiras
da URSS, mas também na própria União Soviética.

Origens da UE até 1973 (primeiro alargamento)

O Churchill foi um pai ambíguo da União Europeia, porque se dizia que ele era
bastante comprometido e queria que o Reino Unido entrasse, mas também havia
Martim Ghira Campos

quem visse como alguém que entendendo que a união deveria existir, o Reino unido
era um bloco autónomo

A História da UE, não enquanto união entidade política, mas enquanto espaço
europeu, vai ser tratado muito tempo antes (por exemplo colonização grega, seculo
VIII a.c)

Há pontos em comum desde o Médio Oriente até à Península Ibérica, sendo que isto é
importante para mais tarde construir uma comunidade comum com as quais temos
parecenças e afinidades.

Mais tarde, temos o Império Romano como uma primeira tentativa de unificação, não
da Europa, mas de um território em torno do mediterrâneo, bem como o primeiro
caso de “cidadania europeia” (212 a.c).

Depois há ainda um elemento essencial na construção da identidade e contexto em


que ainda hoje nos movemos, que é o de expansão e afirmação do cristianismo. A
Europa, partindo do cristianismo de Israel e do Médio Oriente, é o espaço onde ele se
afirma e essa identidade cristã fica mais enraizada. Há um momento histórico de fluxo
cristão face à expansão do islão, que para na Península Ibérica.

Outro momento importante é a coroação de Carlos Magno como rei dos francos e
como imperador do Ocidente. É uma tentativa de reedição do império romano, que
tem nos Francos e em Carlos Magno o seu ponto fulcral. Este império acaba por dar
origem ao sacre-império romano-germânico (936 d.C). Dura até 1806 quando é
abolido por Napoleão, sendo um império que tem a sua frente príncipe eleitores, mas
que acabam por confluir na eleição de imperadores da dinastia de Habsburgo.

Toda esta influência grega, cristã, latina e de reedição do império romano, contribui
para a consciencialização de que de facto este espaço é um espaço com uma
identidade e autoridade próprias. A autoridade de Roma (papal), até aos cismas
(Oriente e reforma) era tida como a máxima autoridade na Respublica cristiana (ideia
de espaço político e espiritual do cristianismo que até hoje temos como Europa)

Todas estas realidades acabam por contribuir para formatar aquilo que hoje em dia
conhecemos como espaço europeu.

A partir de 1415 temos a expansão, que começa com a conquista de Ceuta por
Portugal, sendo que atrás vão outros povos europeus, havendo uma difusão do
cristianismo e do modo de viver europeu.

Isto contribui também para mostrar, mais uma vez, a atratividade desta civilização e ao
mesmo tempo o poder e capacidade de projeção de força que estes povos tinham
nesta altura.
Martim Ghira Campos

Simultaneamente, neste período, há também um fim simbólico do império romano do


Oriente. Constantinopla cai em 1453 e o império otomano delimita aí as fronteiras da
Europa.

Depois, mais a frente, surge um novo império continental de Carlos V, que é


simultaneamente imperador do sacre império e rei de Espanha, tendo um império
europeu e americano transcontinental tão grande que acaba por dividi-lo em duas
partes (parte espanhola para o filho e austríaca para o irmão).

Nesta altura é evidente que existe uma identidade, afinidade e cultura que é
transmitida nas universidades e que é vivida no dia a dia, distinguindo este espaço,
ainda que com fronteiras muito fluidas, uma vez que a separação era convencionada.
Este espaço conhecia uma vida própria e cada vez mais concentra o poder a nível
europeu.

Há mais uma tentativa de união da europa por força das conquistas napoleónicas.
Houve mais uma coroação imperial e esforço para unificar pelas leis e ideais este
espaço europeu, mas na verdade não vingou porque os povos assim não quiseram.

Chegamos ao fim do século XIX com grandes zonas controladas por impérios que
acabam por se esboroar e por se dividir após a IGM.

Depois, nesta altura, temos os primeiros esforços e impulsos para uma primeira união
mais parecida com a que temos hoje em dia. Depois da IGM, sendo este o antecedente
mais direto daquilo que hoje temos, temos o movimento pan-europeu de
Coudenhove-Kalergi, que defendia uma unidade política continental assente na
integração franco-alemã. Ao fim de todo este tempo, ficou obvio que o grande motor
de conflitos e as grandes questões bélicas e políticas passavam claramente por um
antagonismo franco-alemão, portanto qualquer projeto de construção de alguma
forma de unidade, tinha de assentar nessa integração franco-alemã. O que Kalergi
queria não é muito diferente daquilo que temos hoje em dia, pois ele queria uma
união, que tivesse um parlamento bicamaral (baixa que representava os povos e um
senado que reunisse os representantes dos Estados). O nosso Conselho e Parlamento
Europeu, se os virmos de uma forma integrada, enquanto colegisladores, podem ser
interpretados como uma camara alta e uma camara baixa.

Kalergi teve um grande apoio do herdeiro do trono austríaco, sendo que a bandeira
pan-europeia tem grandes semelhanças com a bandeira da UE.

A ideia de Kalergi era que este processo fosse feito através de uma conferência
intergovernamental, sendo que o primeiro objetivo seria uma união aduaneira e um
espaço económico único (tudo coisas que viemos a ter mais tarde).

Este projeto caiu bem em algumas elites europeias, nomeadamente o MNE Aristide
Briand, que discursou à Sociedade das Nações precisamente propondo a construção
de uma espécie de laço federal entre os Estados Europeus.
Martim Ghira Campos

Este anúncio e propostas de uma proximidade e associação de Estados, chocam com a


realidade do tempo em que são apresentadas → A crise de 1929, o recrudescimento
dos nacionalismos, a ascensão do III Reich e do fascismo, o alastramento dos regimes
totalitários como a URSS. Tudo isto faz parte de uma caminhada rápida para uma
situação que gera o clima político que irá levar à IIGM. Portanto este processo de
integração europeia que dava primeiros passos e que caminhava lentamente,
captando a atenção das elites europeias que ainda tinham o impacto da IGM bem
marcado, chocou com a afirmação do III Reich e os milhões de mortos resultantes da
IIGM.

Temos uma Europa absolutamente devastada, que se confronta com o problema de


ter que se reerguer de alguma forma e de procurar um caminho que impedisse e
diminuísse os riscos de uma volta às soluções armadas

Churchill em 1946 no Congresso de Haia, quando ainda tudo estava muito no princípio,
faz um discurso que acaba com o apelo à Europa para se reerguer e procurar o
caminho da integração, sendo que mais uma vez a tónica é colocada na necessidade
do entendimento franco-germânico.

Este apelo de Churchill é seguido por várias iniciativas e Churchill mantém um poder
central neste esforço. Em 1948 há um congresso que estabeleceu um comité político
de ligação que depois vai dar origem a um movimento europeu. Este movimento
europeu propunha a formação de um Parlamento Europeu, sendo mais uma vez um
protótipo de ideias que hoje em dia vemos aplicadas. Todas estas propostas e
tentativas de um reerguer europeu com base num sistema de cooperação de Estados,
tinha o objetivo de nunca mais se escalar para um conflito armado de escala mundial
como tinham sido as GM.

Em 1948, o MNE Francês propõe aos parceiros que assinaram um tratado de aliança
entre a França o Reino Unido e o Benelux, a criação de uma união económica e
monetária, e mais uma vez, de um Parlamento Europeu. Isto vem na linha do
Congresso de Haia e o que acontece é que, juntamente com o Congresso de Haia, esta
proposta leva à criação do Conselho da Europa. O Conselho da Europa podia ter sido a
instituição que dava origem ao que temos hoje.

No entanto, acabou por não ser, isto porque, apesar de haver um objetivo de
realização de uma união mais estreita entre os países europeus, o Reino Unido fez
força para que, para além de um órgão parlamentar, houvesse também um comité de
ministros em representação dos governos nacionais, para diluir a dinâmica mais
federalizante e equilibra-la com uma tónica mais federalista. Esta conversação
permanente entre a visão francesa mais federalizante e a visão britânica mais
soberanista, vai premiar todo o debate sobre os caminhos europeus.

Neste caso, o que acontece é que o comité de ministros acabou por ter uma
preponderância grande na dinâmica deste novo Conselho da Europa e, portanto, o
propósito de supranacionalidade que podia ter incorporado, acabou por não
Martim Ghira Campos

acontecer. Dado isto, o Conselho da Europa acabou por não ser o motor da construção
europeia que poderia ter sido.

Nesta altura, numa Europa em plena reconstrução, há outro mecanismo de


coordenação que acaba por ser criado no mesmo ano. Temos, em 1949:

• Conselho da Europa
• NATO – aliança defensiva de dimensão militar e de segurança
• OECE (Organização Europeia de Coordenação Económica) - onde se procurava
coordenar o auxílio americano dado à Europa através do Plano de Marshall

Havia aqui sementes de integração económica → regularização dos pagamentos,


liberalização do comércio e a tentativa da realização de uma união aduaneira (mais
uma vez duas perspetivas confrontam-se, pois o Reino Unido quer manter uma
posição privilegiada em relação aos EUA e conservar as relações com a sua Common
Wealth, mas a França, pelo contrário, advoga um avanço maior, sendo que a união
aduaneira acaba por não acontecer por via desta OECE)

Estas iniciativas, de uma forma ou de outra, acabam por ter o mesmo propósito de
assegurar a paz e de procurar um caminho de integração que dificulte a guerra e a
opção bélica entre os Estados que compõe a Europa.

Um homem que teve um papel muito importante e esteve na base daquilo que
realmente veio a acontecer e daquilo que verdadeiramente despoletou a construção
institucional que temos hoje, foi Jean Monnet. Ele criticava o funcionamento do
Conselho da Europa, porque entendia que mais do que grandes construções e grandes
anúncios, era necessário seguir uma estratégia de pequenas realizações comuns
(Estratégia dos Pequenos Passos). Esta estratégia devia motivar a criação de uma
solidariedade de facto entre estes países que tradicionalmente eram rivais. Era preciso
impedir que os focos de discórdia continuassem repetidamente a ser usados entre as
duas principais potencias tradicionalmente beligerantes na Europa (Alemanha e
França).

Estrasburgo, zona da França que faz fronteira com a Alemanha, é uma zona altamente
rica em minério (Carvão e Aço), que juntamente com a região do Sarre e da Alsácia-
Lorena, era motor de conflito entre a França e a Alemanha e impediam a sua
reconciliação. Portanto Jean Monnet pensa que o melhor seria criar uma autoridade
supranacional que regesse a gestão desses recursos essenciais para as indústrias e
para a condução da guerra.

Quem acaba por dar voz a estas propostas de Jean Monnet é o MNE Francês Robert
Schuman, que a 9 de Maio de 1950 propõe diretamente à Republica Federal da
Alemanha (que estava dividida em Federal controlada pelos Aliados e Democrática
dominada pela URSS) que o conjunto da produção e comercialização do carvão e do
aço fosse colocado sob a direção de uma alta autoridade, sendo ela que geriria a
produção e que faria de árbitro em caso de algum problema entre os dois Estados.
Martim Ghira Campos

O convite não visava apenas aliviar tensões políticas entre a Alemanha e a França,
porque é um convite aberto a todos os Estados que queiram aderir.

O que estava em causa era uma proposta absolutamente revolucionária e concreta de


gestão em conjunto de matérias primas essenciais para a realização da guerra e para
qualquer economia emergente. Este projeto afasta-se da abordagem que tinha
inspirado a criação do Conselho da Europa, que era uma abordagem federalista
porque propunha desde logo um Parlamento Europeu. Esta abordagem de Jean
Monnet é mais funcionalista, porque no fundo não se passa logo para um modo
abertamente político, passando-se primeiro pela vertente económica, sendo os tais
pequenos passos. Sem a criação das solidariedades de facto que faz com que haja,
entre os Estados, uma maior confiança, isto é, sem a proximidade diária e conjugação
de esforços, seria muito difícil que um projeto pudesse avançar. A ideia era identificar
e criar interesses comuns, não esquecendo que depois era necessário dar uma
orientação política.

É uma visão com uma dupla dimensão → tem o propósito último de unificação dos
Estados, mas usam o método funcional (de usar como mecanismo um método
funcional e gradual que começa por questões concretas que gerem a tal solidariedade
de facto)

Para além da Alemanha, associam-se imediatamente a Itália, a Bélgica, a Holanda e o


Luxemburgo → países fundadores da Comunidade Europeia do Carvão e do Aço (CECA)
O Tratado é assinado em Paris em 1951 e ela começa a laborar efetivamente em 1952,
sendo o primeiro passo no caminho europeu.

Nesta fase de reconstrução onde há necessidade de promoção e desenvolvimento das


indústrias, foi desde logo evidente o sucesso e os resultados da CECA, dando origem a
novas ideias associadas a esta, que procuram, noutras áreas, fazer o mesmo caminho.

Houve logo a perceção de que, em relação a questões de segurança e defesa, era


necessário fazer alguma coisa. Só que havia o problema do rearmamento → o medo
que a França e os outros Estados tinham relativamente à Alemanha. Houve vários
pensamentos em relação a isto e mais uma vez, um Ministro Francês inspirado em
Jean Monnet, René Pleven, apresenta um plano para uma comunidade europeia no
domínio da defesa. A ideia era que não houvesse propriamente um exército alemão,
mas que esse exército fosse integrado numas Forças Armadas europeias.

Estes propósitos são aceites pelos Estados e há um tratado de 1952 que cria uma
comunidade europeia de defesa. No entanto, este propósito choca com a oposição de
dentro da França, nomeadamente o General de Gaulle que teme o tal rearmamento
alemão, bem como parte da esquerda francesa também se opõe à entrada em vigor
desta comunidade de defesa e este tratado acaba por não vigorar porque a
Assembleia Nacional Francesa recusa a retificação do tratado. Em 1954 a França
decide que não viabilizará esta comunidade europeia de defesa, ficando desde logo
entendido que este caminho da segurança e defesa é mais sensível e não será dos
primeiros a vingar uma maior e mais rápida integração europeia.
Martim Ghira Campos

Havendo esta Comunidade Europeia do Carvão e do Aço em funcionamento bastante


eficaz, o foco passou dos aspetos mais políticos e de segurança e defesa, para o foco
económico. Este relançamento da construção europeia faz-se pela via já não só de
pequenos passos, mas pela via da criação de uma Comunidade mais abrangente.

Em 1955, os Ministros do Benelux propõem a criação de uma comunidade que integre


as atividades económicas através de um mercado único. Já não estamos a falar de
apenas duas matérias primas, mas da construção de algo mais ambicioso e que
contrastava com aquilo que Jean Monnet pretendia (pequenas integrações
económicas setoriais).

A verdade é que estas duas visões, a de Jean Monnet e a dos Ministros do Benelux,
acabam por confluir na proposta de criação de duas comunidades. A visão de Monnet
origina a proposta da Comunidade Europeia de Energia Atómica, que é setorial e é a
europeização da utilização da energia atómica não militar. A proposta dos Ministros do
Benelux redunda na proposta de criação da Comunidade Económica Europeia que tem
um âmbito maior de integração das atividades económicas e na criação de um grande
mercado único com liberdades de circulação, estabelecimento, etc., contrastando com
a especificidade da Comunidade Europeia de Energia Atómica (Euratom)

Porquê a criação de três comunidades (CECA, CEE, Euratom) e não integrar logo tudo
numa só? Esta questão tem a ver com a prudência dos negociadores, que
consideravam que o risco de a negociação descambar em casos em que os objetos
eram demasiado amplos, podendo pôr em causa a globalidade de tudo aquilo que era
proposto, que face à importância e ao carater absolutamente determinante que a
energia atómica assumia naquele período pós IIGM, havia que garantir que pelo
menos essa vingaria. Portanto optou-se pela proposta de duas novas comunidades em
vez de uma, de maneira a garantir que a Euratom vingaria.

Em 1957, os mesmos Estados assinam o Tratado de Roma e são constituídas a CEE e a


Euratom.

Esta tria de comunidades, sendo objeto de gestão autónoma, acabam por evidenciar a
necessidade de terem instituições comuns e há desde logo uma Assembleia
parlamentar e um Tribunal de Justiça que rege as três comunidades.

Em 1965 dá-se o tratado de fusão que estabelece um Conselho único e uma Comissão
Única em vez da alta autoridade, para as três comunidades europeias. A alta
autoridade é um antepassado da atual Comissão Europeia.

As três comunidades acabam por se fundir numa Comunidade Europeia e essa fusão
entrou em vigor em 1967.

Fora deste processo de integração, ficou, por via do entendimento britânico inicial
relativamente às comunidades europeias, o Reino Unido. O Reino Unido recusou-se a
aderir como membro fundador e depois, quando as coisas correram mal com a crise
Martim Ghira Campos

do Suez e perceberam que tinham perdido alguma capacidade militar e de liderança a


nível global e económico, candidata-se a ser membro. No entanto Charles de Gaulle
considera que o Reino Unido, pela ambiguidade do seu relacionamento com as
comunidades europeias e pelo entendimento que tem do mundo, não se enquadrava
bem nesta construção europeia e, portanto, veta a adesão britânica em 1963 e 1967.

O Reino Unido podia ter sido fundador e não quis. Criou o seu próprio espaço
concorrente, a EFTA, mas depois percebe a utilidade de aderir, propõe a adesão, mas
de Gaulle veta a adesão em 63 e 67. Só quando Charles de Gaulle sai do poder em
1969 é que a candidatura britânica tem margem para progredir.

Nesta altura o Reino Unido é visto como um elemento que pode revitalizar e dar mais
força a esta nova Comunidade e, portanto, com ele, iniciaram negociações a
Dinamarca, a Irlanda e a Noruega (acabou por ficar de fora).

O próprio nome União Europeia não é novo. Ele entra em vigor com o Tratado de
Maastricht, mas, já na Cimeira de Paris se advogava a transformação das comunidades
numa União Europeia. Há uma série de propostas que vão sendo agregadas e fundidas,
acabando por influir decisivamente no modo como a comunidade e depois a união
evoluíam.

Há uma fase de crescimento económico que vai até aos anos 70, fase essa onde as
comunidades eram uma fonte de paz, estabilidade e produtividade, surgindo a ideia de
que era necessário dar-lhes uma tessitura política maior, e, portanto, pensou-se que a
realização de eleições por sufrágio direto para o Parlamento Europeu, fariam confluir
em seu redor um maior consenso popular. Até esta altura (anos 70), a questão da
aceitação pública ou não do projeto, não era propriamente uma questão muito
importante.

Como as comunidades eram vistas como um modo de assegurar o bem-estar e a


prosperidade económica, presumia-se que havia tacitamente um apoio dos cidadãos.
Só lentamente é que as comunidades e futuramente a união se vão dotar de
ferramentas políticas para aferir dessa adesão, nomeadamente em 1979 já depois do
primeiro alargamento.

Este processo de integração que teve vários caminhos apontados e vários interpretes,
foi evoluindo entre grandes, pequenos e médios avanços, bem como entre propostas
mais ou menos ambiciosas, mas sempre num determinado sentido.

Para além da construção de um mercado único e depois de uma moeda única,


promove e tem promovido uma aproximação social, cultural e política entre os Estados
membros.

• Período de 1945 – 1959 → Europa que começa a cooperar, primeiro com a


CECA e depois com a CEE e a Euratom. Período marcado por uma
consciencialização crescente do perigo soviético. É uma Europa que tem
Martim Ghira Campos

consciência das suas debilidades e tem uma noção clara de que para sobreviver
precisa de agir em conjunto.

• Período 1960 – 1969 → período de crescimento económico brutal que teve


uma interrupção simbólica com o Maio de 1968. Muitas das mudanças que
este crescimento económico potenciou, depois tiveram como contraponto a
insatisfação de uma nova geração universitária que veio a criar a chamada
geração de 68

• Período de 1970 – 1979 → Período de expansão em termos territoriais, com o


alargamento à Dinamarca, à Irlanda e ao Reino Unido, mas que tem como pano
de fundo uma altura conflitual de queda de preços do petróleo, queda do
Estado Novo em Portugal, queda do regime franquista em Espanha. Temos
uma expansão das comunidades, um primeiro alargamento, uma circunstância
internacional mais adversa e ao mesmo tempo uma busca de maior politização
e proximidade com os cidadãos, que tem como consequência a eleição para o
Parlamento Europeu no ano de 1979. É nesta altura uma comunidade já com
anos de prática de vida comum, sendo um projeto com muita atratividade e
que tem um caminho conhecido e que acaba por motivar, depois de 1973,
novas adesões (Grécia em 1981 e Portugal e Espanha em 1986).

• Em 1995 há um novo alargamento, da Áustria, da Finlândia e da Suécia.

• Temos uma atratividade crescente do projeto que em 2004 conhece um Boom,


com 10 novos Estados membros: Chipre, República Checa, Estónia, Hungria,
Letónia, Lituânia, Malta, Polónia, Eslovénia, Eslováquia.

• 2007 → Bulgária e Roménia

• 2013 → Croácia
Só com o Brexit é que este movimento de integração conhece o seu primeiro refluxo.

Tudo isto faz com que este período de criação das primeiras comunidades até ao
primeiro alargamento, seja essencial para perceber muito do que acontece depois. A
fase preliminar em que há vários projetos, várias propostas, vários discursos e vários
caminhos, todos eles, em conjunto, acabaram por motivar aquilo que temos hoje de
diversas maneiras.

11 de Setembro de 2001

Acontecimento que fecha a história contemporânea do século XX. É um acontecimento


que, apesar de ter acontecido no primeiro ano do novo século, pertence firmemente
ao século XX porque as raízes daquilo que se passou no 11/9 estão no século anterior.

Para retratar o que aconteceu na manhã de 11/9 em Nova Iorque e não só, é
necessário não só recuar ao século XX, mas também ao século XIX, sendo necessário
falar das raízes do islamismo radical.
Martim Ghira Campos

O 11/9 não é o princípio de nada, é sim o culminar de um processo que é muito


anterior a 2001.

Recordando um pouco, aquilo que define o conflito israelo-palestiniano é a sua


natureza profundamente moderna, ou seja, estamos a falar de um conflito que
embora possa ter as suas raízes em finais do século XIX, vai-se intensificar
principalmente com a desagregação do Império Otomano. Relativamente ao Islamismo
Radical podemos dizer exatamente a mesma coisa e até mais, podemos até usar o
mesmo calendário e etapas cronológicas.

Em finais do século XIX, a civilização islâmica começa a pressentir uma sensação de


declínio com variadíssimas razões, mas que se explica em grande parte pela
comparação que essas sociedades estabeleciam entre o seu próprio nível de
desenvolvimento tecnológico e material e o nível de desenvolvimento tecnológico e
industrial que era possível observar no Ocidente. Ou seja, surge a questão de como
explicar o nível de desenvolvimento material conseguido pelas sociedades
industrializadas, quando comparamos isso com a relativa estagnação das sociedades
muçulmanas.

Esta sensação de declínio e de que a glória do passado não volta mais, sendo preciso
procurar outros caminhos ou retomar caminhos que se perderam, torna-se
particularmente premente com a desagregação do Império Otomano (consequência
da IGM)

O Império Otomano era fundamental desde o século XIV, mas sobretudo a partir do
século XVI, porque mantinha a unidade do califado. O Império Otomano era a
realidade política que mantinha a unidade do mundo muçulmano. Perdida esta
unidade, o que acontece é que, com a desagregação do Império Otomano, com o
domínio de potências estrangeiras em território muçulmano (França e Grã-Bretanha),
isto vai ter um impacto traumático na mentalidade islamita radical. Ou seja, o
problema depois de 1918, já não estava apenas em comparar o relativo atraso do islão
em comparação com o Ocidente, pois o problema agora estava em ser governado pelo
Ocidente, quer de forma direta pelo sistema de mandatos da Liga das Nações, quer de
forma indireta pela constituição de autoridades politicas ocidentalizadas que aos olhos
do islamismo radical não eram mais do que simples marionetas nas mãos de interesses
ocidentais.

Perante isto e perante este impacto de ocidentalização, vamos começar a ver autores
muçulmanos que vão começar a refletir sobre qual deve ser a forma de organização
política e social aconselhável, o que é que deve ser um Estado Islâmico, qual é o papel
da Lei nesse Estado, qual é o papel dos homens nesse Estado. Nesse sentido, o
primeiro grande pensador do islamismo radical moderno é Abul Maududi. É ele que
começa a teorizar pontos importantes do Estado Islâmico e de como o mesmo deve
ser.
Martim Ghira Campos

Maududi começa por afirmar que existem três características fundamentais de


qualquer Estado Islâmico:

1) Só Deus é soberano e todos os restantes são seus subditos, ao contrário do que


acontece nas democracias do Ocidente onde a soberania reside nas mãos do
povo. A esfera do poder político está sob a alçada da religião

2) É Deus que oferece a legislação aos homens, não podendo ser modificada por
mãos humanas

3) O Estado Islâmico baseia-se na Lei Divina

O objetivo central de Maududi é mostrar que os arranjos políticos e económicos que


se verificavam no Médio Oriente, sobretudo depois da desagregação do Império
Otomano, eram uma corrupção da mensagem fundamental do Profeta.
Maududi pretendia defender o Estado Islâmico e apresentá-lo como a antítese do
Estado secular Ocidental. O Estado Islâmico é uma Teocracia em que todos os
muçulmanos podem governar o Estado, mas apenas de acordo com o Corão e os
ensinamentos do Profeta.

Se Maududi teve este papel fundamental, um facto que vai acontecer na década de
1920 vai ser também fundamental neste adensar de narrativa sobre o islamismo
radical, sendo isso a formação da Irmandade Muçulmana no Egito.

A Irmandade Muçulmana deveu-se, em grande medida, aos esforços de Hassan al


Banna, outro importante teórico islamita radical, que vai ter uma grande influência no
Médio Oriente e na formação do pensamento Islamita. Hassan al Banna vai prolongar
muitas das preocupações que já tinham sido avançadas por Maududi.

O nascimento da Irmandade Muçulmana no Cairo marca o momento em que se


pretende responder à ameaça de Ocidentalização do país, ou seja, era preciso limpar o
islão de qualquer sombra de contaminação Ocidental e nos textos de Hassan al Banna
vemos a mesma mensagem que víamos em Maududi, isto é, a missão de transplantar
os princípios corânicos para todas as áreas da sociedade, mas vemos também um
esforço impressionante de construir um Estado que seja quase paralelo ao próprio
Estado Egípcio, ou seja, que também tenha rede de escolas, hospitais, instituições
sociais, etc.

Quando se dá a Primavera árabe e a Irmandade Muçulmana vence as eleições no


Egito, a Irmandade estava como um Estado dentro de um Estado, ou seja, foi
estabelecendo apoios sociais, formação de escolas, etc., que obviamente ajudaram
bastante nas eleições.

Além disso, a Irmandade Muçulmana não só se assume como um Estado dentro de


Estado, como vai começar a defender a Jihad como método, ou seja, é necessário
contra os infiéis (ocidentais ou quem se deixa influenciar pelos ocidentais) usar a
Martim Ghira Campos

guerra santa, o martírio → surge quase como uma espécie de rotina quotidiana,
representada por bombistas suicidas

Muitas das características que, associamos a um Estado Teocrático (Irão), estão


também nos princípios deste fundador da Irmandade Muçulmana.

Hassan al Banna afirma que o Ocidente é forte em questões materiais, mas que o
Médio Oriente se deve concentrar no facto de o Islão ser forte em questões
espirituais, ou seja, de que vale ao Ocidente ter um nível de prosperidade elevado,
quando na verdade produziu duas guerras catastróficas por ser pobre espiritualmente
e do ponto de vista moral.

Se Hassan al Banna foi um teórico fundamental da Irmandade Muçulmana, a verdade é


que também da Irmandade Muçulmana irá sair um pensador, que é provavelmente o
mais importante teórico sunita do islamismo radical → Sayyid Qutb

Qutb é o herdeiro intelectual de Hassan al Banna, mas a radicalização deste autor não
se processará apenas em confronto com a alegada corrupção da monarquia Egípcia, ou
seja, aquilo que interessa a Qutb não é apenas a crescente ocidentalização do seu
próprio país e a forma como isso estava a pôr em causa a mensagem tradicional do
Profeta. Qutb viajou para o Ocidente e contactou com a cultura Ocidental, deixando
uma descrição daquilo que para ele foi um choque profundo espiritual e de valores,
numa obra importante para compreender o islamismo radical e o que se passou em
Nova Iorque em 2001 → Milestones

Qutb deixa a descrição do Ocidente como um Inferno, ou seja, o que viu foi uma
sociedade essencialmente materialista, hedonista, onde existia liberdade para as
mulheres. Qutb deixou feições ao perigo do Ocidente e da forma como a
Ocidentalização punha em risco a pureza da mensagem corânica. Este escrito vai ter
uma influência decisiva no que se vai passar no Médio Oriente, sobretudo a partir da
segunda metade do século XX.

A Irmandade Muçulmana e sobretudo os escritos de Qutb, vão ter muita influência na


formação do Hamas e também num personagem que vai passar a marcar a história do
Islamismo Radical, sobretudo a partir de finais da década de 70 → Osama bin Laden

Isto foi uma base intelectual acerca do islamismo radical, no entanto são os
acontecimentos que fazem catapultar aquilo que está apenas no domínio intelectual.

O ano de 1979 é um ano fundamental na história do século XX e essencial para


perceber a emergência do islamismo radical e do terrorismo islamita.

Em 1979 passaram-se coisas relativamente pacificas, como a abertura da China ao


mundo, a chegada ao poder de Margaret Thatcher na Grã-Bretanha.

No entanto, 1979 é sobretudo importante devido a três acontecimentos essenciais


para perceber Setembro de 2001:
Martim Ghira Campos

1) Revolução Iraniana → o Xá (rei) do Irão, Mohammad Reza Pahlavi, incapaz de


suprimir a contestação popular feita por motivos de repressão política, pobreza
etc., vai partir para o exilio. Por sua vez, do exilio regressa o líder espiritual do
Irão (Aiatolá), Ruhollah Khomeini, que depois de violentos confrontos,
estabelece a República Islâmica (ainda hoje no Irão). Este acontecimento é
fundamental porque a revolução islâmica, pela primeira vez desde a
desagregação do Império Otomano, mostra que é possível estabelecer uma
República Islâmica contra a influência Ocidental. Um ato simbólico disto foi a
ocupação da Embaixada Americana. A revolução iraniana inaugurou e permitiu
uma espécie de horizontes de possibilidades, ou seja, um horizonte de que era
possível derrubar regimes ditatoriais através da ação das massas, da
constituição de regimes teocráticos, do afastamento de patronos ocidentais, de
forma a retornar às práticas sociais islâmicas mais puras, ou seja, de forma a
regressar à mensagem purificada do Islão, que obviamente se pautava pela
rejeição de serviço às potências coloniais.
Se o sistema de mandatos pós IGM vai determinar a Ocidentalização do Médio
Oriente, a Revolução Iraniana de 1979 vai marcar o ponto final nesta
subserviência e vai servir como um exemplo a seguir por parte de outros
grupos islamitas de natureza radical.

2) Invasão do Afeganistão pela URSS → A União Soviética invade o país para evitar
a decomposição do poder comunista Afegão, mas o que se vai passar é que a
ação militar vai acabar por unificar várias tribos afegãs e vai fazer com que os
Mujahidin combatam o inimigo infiel. De certa forma os Mujahidin entenderam
que a guerra santa (que resultou no caso do Irão), era para ser replicada no
Afeganistão.
O Afeganistão, nesta altura, converteu-se no principal palco militar de todos
aqueles que pela força das armas procuravam vencer os inimigos infiéis (URSS,
no sentido de que era uma ideologia materialista, ateia). Esta invasão vai levar
também ao apoio dos EUA aos Mujahidin.

3) Ocupação da Grande Mesquita de Meca, o lugar mais sagrado do Islão → num


ato de revolta contra as autoridades sauditas, fundamentalistas islâmicos vão
invadir a mesquita, sequestrando centenas de muçulmanos no seu interior,
sendo que as autoridades sauditas se mostram incapazes de pôr fim a esta
ocupação. O que vai acontecer é que passadas duas semanas desta ação, o rei
da Arábia Saudita vai autorizar a intervenção de comandos franceses e
paquistaneses, de forma a libertar a Grande Mesquita de Meca.
Surge a discussão de que tropas infiéis pisaram em solo sagrado, profanando a
mesquita, constituindo um crime da maior gravidade e fazendo com que a casa
saudita estivesse alinhada com os interesses ocidentais contra o próprio povo
muçulmano. De seguida, a Arábia Saudita, de forma a responder ao
descontentamento da população, sobretudo de forma a desculpar-se do seu
próprio papel durante a ocupação da Grande Mesquita de Meca, vai garantir
várias concessões, sobretudo uma seita puritana no interior da fé islâmica,
concedendo-lhes uma série de concessões que passam por costumes, etc.
Martim Ghira Campos

Para além disso, de forma a que a casa Saudita possa mostrar o seu
compromisso na luta contra os infiéis, vai apoiar os rebeldes afegãos na Guerra
do Afeganistão, sendo neste contexto que Osama bin Laden vai decidir juntar-
se à Jihad no Afeganistão.

É nesta altura, década de 1980, que se verifica o papel determinante de Osama bin
Laden. Bin Laden tinha sido profundamente influenciado por todos os teóricos do
islamismo de que foram falados. Vai ser um dos principais operacionais no
Afeganistão, desenvolvendo a sua luta com sucesso e a derrota soviética vai galvanizar
Osama bin Laden, que em 1988 vai fundar a Al-Qaeda.

O objetivo inicial da Al-Qaeda era a derrota completa dos soviéticos e espalhar a Jihad
e a Guerra Santa pelo Médio Oriente em primeiro lugar e depois poder levar a Guerra
Santa ao coração dos infiéis.

Como é que alguém que foi financiado e patrocinado pelos EUA enveredou pelo
caminho da Jihad? É necessário avançar até à primeira Guerra do Golfo. O que vai
catapultar este conflito vai ser a invasão do Kuwait (produtor de petróleo) pelo Iraque
de Saddam Hussein. Este acontecimento vai marcar o afastamento de Osama bin
Laden relativamente à Arábia Sudita e aos EUA, transformando-o num dos principais
inimigos da República Americana.

Porquê? Quando se dá a invasão do Kuwait por parte de Saddam Hussein, bin Laden,
que tinha conseguido uma vitória importante contra a URSS no Afeganistão, vai
colocar à disposição da casa real saudita os seus guerreiros. O que vai acontecer é que
a Arábia Saudita vai optar por uma coligação internacional liderada pelos EUA, ou seja,
a Arábia Saudita vai permitir uma espécie do mesmo erro que tinha cometido em 1979
com a ocupação da Mesquita por parte das tropas francesas e paquistanesas. Neste
sentido, a Arábia Saudita não só vai optar pela coligação internacional, como vai
permitir a construção, em território saudita (coração do islão), e bases militares norte-
americanas. No entendimento da Al-Qaeda e de Osama bin Laden, o que se estava a
passar era uma espécie de repetição do Afeganistão com a entrada de tropas
Ocidentais no país e uma repetição daquilo que se tinha passado na Mesquita em
1979, ou seja, um sacrilégio.

Perante esta situação, os esforços da Al-Qaeda vão passar a ser duplos:

1) Contra a Arábia Saudita e os seus aliados na região


2) Contra os EUA e os seus aliados na região (Israel)

Isto vai se ver com um conjunto de ações de Osama bin Laden, ações essas que se vão
prolongar ao longo de toda a década de 1990 e que passaram ao lado dos EUA e da
comunidade internacional, sendo encaradas como atividades terroristas despegadas e
sem nenhuma espécie de fio coerente, sendo que na realidade ganharam outro
sentido com o 11/9/2001.
Martim Ghira Campos

Exemplos disso são alguns atentados reivindicados pela Al-Qaeda ao longo da década
de 90, começando-se a constituir como uma espécie de inimigo invisível dos EUA,
semeando o terror sempre que há presenças de tropas americanas. Um dos casos mais
badalados foi aquilo que se passou na Somália em 1992 → Tropas americanas vão
entrar na Somália para restaurar as condições de segurança, mas na verdade, para o
líder da Al-Qaeda, a presença americana na Somália vai se afigurar como mais uma
investida dos cruzados contra o islão. Aqui com uma diferença, pois os americanos
montam uma operação para capturar o comandante da milícia muçulmana que
dominava a capital e, portanto, a luta contra os americanos é perspetivada como uma
luta santa/sagrada e que vai terminar com a morte dos soldados americanos. Isto que
se passou na Somália foi uma espécie de evidência de que é possível derrotar os
soldados americanos e de que os soldados americanos, confrontados com uma
agressão desta natureza, não estão dispostos a retaliar ou a reagir.
Na Somália, os EUA, tal como em todas as outras situações em que não conseguiram
lidar com o ataque, retiraram as suas tropas, sendo isto interpretado como uma vitória
dos islamitas que convida a novas ações de terror.

Sendo isso que vamos ter ao longo da década de 90, por exemplo, em 1996, depois do
triunfo na Somália, Osama bin Laden vai fazer uma declaração de guerra contra o
Ocidente e especialmente contra os EUA. Nesta declaração de guerra, Osama bin
Laden vai descrever quais vão ser os seus planos para os anos seguintes. Fala
explicitamente da batalha da Somália que levou aos EUA a retirarem-se depois da
humilhação, fala sobre a necessidade de punir o infiel onde quer que ele se encontre
(a luta não se ficava pelas fronteiras tradicionais do Médio Oriente) e fazia também a
afirmação de que não havia mais distinção entre alvos militares e alvos civis.

Se bin Laden afirma isto em 1996, é precisamente isso que vai fazer em 1998, quando
as embaixadas americanas no Quénia e na Tanzânia são atacadas por bombistas
suicidas. Mais uma vez, como bin Laden já tinha dito, a reação dos EUA é tímida e
praticamente nula

Perante isto, ataques que não são retaliados nem controlados, a Al-Qaeda vai
avançando. No ano de 2000, a Al-Qaeda vai atacar o navio USS Cole, acontecimento
com reação fraca dos EUA.

É perante esta escalada de atividade terrorista imparável que vamos ver, no decorrer
da década de 1990, o 11 de Setembro de 2001. Ao contrário do que muitas vezes se
diz relativamente ao 11/9, o 11/9 não marcou o início de nada, quanto muito deve ser
percecionado como o culminar de uma ação terrorista que é muito anterior do ponto
de vista teórico e prático.

O 11/9 é um culminar porque acontece em solo americano e pelo seu número de


mortos, mas que abre uma nova era do Jihadismo suicida. O 11/9 marca o
engrandecimento da Al-Qaeda e inaugura uma outra fase, em que a distinção entre
alvos civis e militares deixou de existir, sendo que o número de ataques terroristas no
Ocidente aumentou consideravelmente.
Martim Ghira Campos

25 de Abril e a consolidação da democracia

Período que contrasta com a relativa tranquilidade que afetou em grande medida o
Estado Novo. O Estado Novo foi um período de estabilidade política, mas a
aproximação do seu fim vai ter uma aceleração histórica que precipitará o país em
mudanças muito relevantes, sendo que mesmo do ponto de vista político e geográfico,
o Estado português que sai do Estado Novo é completamente diferente.

24 de Abril de 1974 (Salgueiro Maia) → “Meus senhores, como sabem há diversas


modalidades de Estado: o Estado socialista, o Estado capitalista e o Estado a que
chegámos. Nesta noite solene, vamos acabar com o Estado a que chegámos, de
maneira que quem quiser vir comigo, vem para lisboa e acabamos com isto. Quem for
voluntário, sai e forma, quem não quiser fique aqui” – isto retrata a situação do país.

Portugal tinha passado por um crescimento económico acelerado e acentuado,


também favorecido pela EFTA. Quer o rendimento per capita, quer a convergência
com o PIB europeu tinham subido, portanto tinha havido uma transição de uma
sociedade rural para uma sociedade industrial, sendo que em 1973 havia mais serviços
e industria do que agricultura → sociedade completamente diferente daquela que
existiu no inicio do Estado Novo, há uma nova classe média urbana, o turismo
aumentou e também aumentou a emigração, quer por motivos económicos, quer por
motivos de fuga à guerra. Há também um aumento da literacia, um fluxo de novas
ideias e uma atratividade maior da Europa face à ideia imperial do Estado. Há um
desgastar permanente relacionado com a guerra e há um desvio de mão de obra e de
recursos financeiros para alimentar esta guerra.

A manutenção do Portugal Ultramarino não era um capricho de umas elites, isto é,


durante muito tempo a visão de que Portugal era pluricontinental, era perfilhada pela
maioria da população. Era uma ideia que vinha já da Monarquia Constitucional,
reforçada na Primeira República e continuada pelo Estado Novo, sendo que só forças
muito minoritárias é que defendiam as independências.
Portanto o Portugal de 1974 é um Portugal que tem atrás de si uma guerra de 13 anos,
sendo esta o feito bélico que mais perdurou na história do país e aquele que mais
exigiu dele. A Guerra do Ultramar foi um episódio marcante na história do país.

Mantém-se a Guerra do Ultramar, mantém-se a repressão policial, há uma redução


permanente da base social de apoio do Estado (oposição de vários setores da Igreja),
as Forças Armadas demonstram algum cansaço na manutenção da guerra, as empresas
viam na Europa o seu futuro e não em África. Este Estado Novo foi criado à imagem de
António de Oliveira Salazar e ele era o fecho do regime, a peça que fazia com que
todas as outras se equilibrassem, sendo o criador, desenhador e em grande medida o
principal jogador político deste regime. Era alguém que tinha conseguido estabelecer
equilíbrios e pontes entre as diversas forças que apoiavam o regime.

Mas nada é eterno e Salazar de uma forma não prevista, tem um acidente, sofrendo
um AVC na celebre queda da cadeira em 1968 e em 26 de Setembro, o Almirante
Martim Ghira Campos

Américo Tomás (Presidente da República da altura) vê-se na contingência de nomear


um sucessor para substituir Salazar → Marcelo Caetano

Marcelo Caetano, não só era um produto do regime, como também era autor do
regime, pois contribuiu para que o regime fosse o que ele era.

O Marcelismo aparece como uma lufada de ar fresco num regime que estava
demasiado fechado sobre si próprio e aparece como algo que tenta assegurar alguma
transição de uma forma calma e moderada (evolução na continuidade, algo que não
foi possível, mas a ideia era essa, de modernizar o regime económica e politicamente,
suavizar a ação do regime).

O Marcelismo, assim como o Salazarismo, tem um problema, O problema → A Guerra


do Ultramar.

Os cenários não são todos iguais, há três teatros de operações → Angola, Moçambique
e Guiné. Em Angola a guerra era praticamente nenhuma, em Moçambique igualmente.
Já na Guiné o cenário era pior e mais intenso.

Existe esta primeira lufada de ar fresco (Primavera Marcelista), há uma série de


politicas liberalizadoras, propaga-se a rede de ensino, o ensino superior passa a ter
muito mais alunos, Mário Soares e o Bispo do Porto são autorizados a voltar, o
condicionamento industrial que entregava setores económicos a grupos empresariais
foi sendo gradualmente eliminado, Portugal começa a ter acordos com as
comunidades europeias para além de pertencer à EFTA, há alguma liberdade sindical,
há os primeiros passos de um Estado de providência. Do ponto de vista político em
1969 há eleições legislativas e são integrados na lista da união nacional jovens
reformistas daquilo que ficou conhecido como a Ala Liberal (Sá Carneiro, Pinto Leite,
Pinto Balsemão).

Este período também conhece obras grandes como Sines, havendo uma tentativa de
mostrar um novo ímpeto, uma nova dinâmica e de promover algum tipo de mudanças
no sentido de uma abertura gradual do regime.

Mas o problema era a Guerra e o que isso representava. A Guerra chegou a importar
em 50% da despesa pública e consumia mais ou menos 6% do PIB. Mais do que a
questão económica, que estava mais ou menos controlada, a questão social e o
impacto social eram muito significativos. Esta mudança foi sendo operada lentamente
do ponto de vista social, este advento de uma nova classe média, esta absorção de
ideias que faziam caminho para a Europa (nomeadamente de esquerda e extrema-
esquerda que tinham sido em grande parte promovidas pelo Maio de 1968) fizeram
com que o aliviar inicial da repressão e da censura tenha vida muito curta, tendo isto
como consequência um fechamento do regime, de modo que a Ala Liberal acaba por
romper com Marcelo Caetano, desiludida do modo como o regime não evoluía.

Esta desilusão interna e este fechamento do regime, têm também uma componente
externa. Há uma crise petrolífera em 1973 que faz com que a inflação e o custo de vida
Martim Ghira Campos

aumentem muitíssimo. Apesar do desemprego ser relativamente baixo, aumenta o


custo de vida e o descontentamento, mantendo-se uma pressão internacional sobre
Portugal acerca da descolonização (Portugal foi objeto de condenações sucessivas por
parte das Nações Unidas, sendo que o argumento português foi sempre o mesmo, de
que os territórios eram parte integrante do país e não colónias).

Esta pressão mantém-se e em 1970, há um momento que do ponto de vista simbólico


tem um efeito devastador para um regime que tinha uma relação muito proxima com
o catolicismo → encontro de três dirigentes de movimentos independentistas com o
Papa Paulo VI, sendo eles, Amílcar Cabral do PAIGC (Guiné), Agostinho Neto primeiro
presidente de Angola e Marcelino dos Santos que na altura era o Secretário Geral da
Frelimo (Movimento de Libertação de Moçambique). Este facto, só por si demonstra
ate que ponto o regime estava isolado e até que ponto uma instituição prudente como
a Igreja Católica, não abdicou de abrir a porta ao diálogo.

Há uma missão da ONU às zonas controladas pelo PAIGC na Guiné, em 1972 vários
dirigentes são autorizados a dirigir-se ao Conselho de Segurança das Nações Unidas e
em 1973 a Assembleia Geral da ONU reconhece mesmo a independência da Guiné.
Tudo isto mostra até que ponto era exercida pressão sobre um Estado que era, para os
padrões europeus, pouco desenvolvido e que mantinha, de uma forma estoica, esta
luta contra a pressão do tempo, isto porque todos os Estados europeus já tinham
descolonizado nesta altura.

Este cansaço e esta sensação de bloqueio, acaba por afetar os mais diretamente
envolvidos na guerra, ou seja, os militares. Em Dezembro de 1973 é criado um
Movimento das Forças Armadas que, numa primeira fase, tinha sobretudo uma origem
de debate corporativo, isto é, foi criado por causa de um célebre decreto do Ministro
Sá Viana Rebelo, que fazia uma tentativa de engrossar as fileiras do oficialato
português, por via da incorporação nos quadros de oficiais milicianos e não de carreira.
Isto gerou um descontentamento tremendo, gerou uma ideia de que não estavam a
ser cumpridas as hierarquias habituais num setor que dá muito valor a essa hierarquia
e, portanto, há um descontentamento que tem uma raiz corporativa, mas que
rapidamente ganha outras cores e outros aspetos.

Isto é acelerado com a publicação, em Fevereiro de 1974, do livro Portugal e o futuro


do General António Spínola.

Spínola é um general de cavalaria, gozava de boa fama e relativo respeito, tinha um


conjunto de oficiais que colaboravam com ele muito proximamente e que
comungavam das suas ideias. Tinha sido governador da Guiné e em Fevereiro de 1974
era Vice-Chefe de Estado Maior General das Forças Armadas (apenas com Francisco da
Costa Gomes à sua frente)

Portugal e o futuro dizia aquilo que já se sabia, que uma Guerra como aquela não
podia ser vencida militarmente e defendia negociações com os movimentos
independentistas e advogava para o território português uma solução de tipo federal.
Martim Ghira Campos

Spínola, enquanto governador da Guiné e por sua iniciativa, encetou algumas


negociações com o PAIGC e fez vários esforços para cativar as populações.
Este livro veio abanar as coisas de modo que, aqueles oficiais que estavam
descontentes com a política pelo que se passava num plano mais corporativo,
passaram também a perceber que os seus problemas eram também de outra
natureza.

O descontentamento era generalizado e teve, num plano hierárquico, um momento


simbólico muito importante → Célebre reunião da Brigada do Reumático em São
Bento (Nome dado por causa do conjunto de generais que se deslocaram à residência
do PM para lhe declarar fidelidade e ao regime, declarando que subscreviam a política
que estava a ser seguida no plano ultramarino). Era uma reação ao livro e à posição de
Spínola.

Generais que não vão a este beija-mão → Francisco da Costa Gomes e António de
Spínola, que são demitidos.

Imediatamente a seguir, 2 dias depois, dá-se uma primeira tentativa de golpe, o Golpe
das Caldas. Esse golpe fracassa, há alguma precipitação e aceleração desnecessárias,
que têm como consequência a existência de tropas fiéis ao governo que acabam por se
interpor no progresso, acabando por ser detidos vários oficiais.

Temos um regime que sente duvidas crescentes por parte da população e que está de
alguma forma imobilizado. Há um contraste do imobilismo do regime e uma aposta em
África da sua Ala mais direita, e uma sociedade em mudança que é premiada por
valores socioculturais e morais mais à esquerda, apostada numa convergência com a
Europa.

Esta dinâmica e separação, acaba por redundar no Golpe de Estado de 25 de Abril de


1974.

É um golpe que militarmente não sofre grande contestação. O regime e os principais


dirigentes do regime escolhem o quartel do Carmo para se refugiarem, sendo
sobretudo defensivo, não querendo ganhar o que quer que seja.

Há várias colunas militares, os primeiros a chegar são os da escola prática de cavalaria,


o Capitão Salgueiro Maia aborda o Presidente do Conselho que diz que não lhe entrega
o poder e Spínola aparece como a figura por trás deste movimento.

Há várias interpretações e face ao que aconteceu depois, há uma tentativa de


desassociar Spínola do movimento dos capitães, mas, até do ponto de vista
operacional, o facto de ele estar envolvido foi muito importante em momentos
cruciais. De tal forma que Otelo Saraiva de Carvalho, que era quem estava a comandar
militarmente a ação do Golpe no Posto de Comando da Pontinha, quando perguntado
por Salgueiro Maia se “o nosso general Spínola está no posto de comando”, Otelo
Saraiva de Carvalho, conhecendo a responsabilidade e feitio de oficial de cavalaria de
Martim Ghira Campos

Salgueiro Maia, mente e diz “sim, está, podes avançar”. Era importante para os oficiais
a validação de um oficial general com a reputação de Spínola.

Há um primeiro programa do MFA, que não fala em descolonização, fala em procurar-


se uma solução política para a questão do Ultramar e, portanto, há um primeiro
período em que é preciso arrumar esta nova circunstância. Os líderes do antigo regime
são exilados e há uma nova página que se inicia.

É logo formada no dia 26 de Abril, uma junta de salvação nacional que é presidida por
Spínola e que tem dois oficiais de cada ramo.

A 15 de Maio, Spínola é nomeado Presidente da República.

Há um súbito interesse por Portugal nesta altura, isto é, Portugal é visto com muita
curiosidade: depois de tantos anos como baluarte de um colonialismo que era cada
vez mais visto como algo datado e desatualizado, há um interesse dos jornais e das
televisões, de pessoas que querem perceber o que se passa e perceber o que tinha
sido este golpe e esta revolução.

No entanto, 25 de Abril de 1974 não é sinónimo de democracia. A democracia


demorou a institucionalizar-se em Portugal, até porque havia visões muito divergentes
sobre o futuro que o país devia tomar. No entanto, houve logo alterações muito
profundas:

• A elite política que tinha sido relativamente coesa e fechada, foi saneada.

• A elite militar tambem foi saneada, nomeadamente todos aqueles que


participavam na brigada do reumático.

• Há uma multiplicação de partidos, em contraste com a União Nacional e a Ação


Nacional Popular

• O próprio discurso político, a forma como a sociedade era percecionada,


também mudou radicalmente. A televisão e os jornais, em Março de 1974,
comparando com Maio, parece que estamos em países diferentes

• Há uma oposição desde logo entre dois modelos para o país:

o Há uma visão de uma democracia pluralista, de um mercado livre, da


liberdade de expressão. Uma visão ancorada nos valores e nas práticas
da Europa Ocidental

o Há outra visão que procura instituir um regime socialista ou marxizante,


uma economia controlada pelo Estado e uma censura face a tudo o que
não seja socialista ou marxista, ou seja, uma censura antifascista
destinada a reduzir o pluralismo. Estes movimentos estão mais
alinhados com a União Soviética, não se querendo integrar na
Martim Ghira Campos

comunidade política da Europa Ocidental, com uma visão do Estado


mais próxima de modelos socialistas ou marxizantes

Esta divisão, também tem um aspeto partidário:

o Do lado do modelo Ocidentalizante temos o PS, o PPD (futuro PSD) e o


CDS

o Do outro lado temos o PCP (o partido mais forte neste período), o


NDPCDE, o MRPP, a UDP

o Também há elementos que não são partidários, mas que têm influência
política, como o COPCON (Comando Operacional do Continente) que é
controlado por Otelo Saraiva de Carvalho. Temos também Vasco
Gonçalves que também é um dos principais elementos ligados à direção
do Movimento das Forças Armadas, que tem posições mais
esquerdizantes e que terá um papel relevante.

Aquele Portugal irredutível face ao destino do seu Ultramar, é o mesmo Portugal que
promove negociações rápidas com os movimentos independentistas e que, devido à
pressão sentida e exercida pela ala mais esquerda deste novo sistema político, se vê
incapaz de resistir à pressão de descolonizar.

Spínola tenta obstar a isso, pois o seu projeto e visão para Portugal não era essa e
tenta por tudo que isso não aconteça. No entanto, a Guiné pressiona para que a
dominação portuguesa acabe e ainda durante a presidência de Spínola, a Guiné torna-
se o primeiro Estado Africano Lusófono independente.

Estas independências vão acelerar num período seguinte, de modo que, em Novembro
de 1975, já todos os novos Estados africanos de língua portuguesa são independentes
→ Guiné-Bissau, Moçambique, Angola e São Tomé e Príncipe.
Foi uma mudança muito radical e muito rápida, tendo como passivo um retorno de
meio milhão de portugueses de origem europeia, que regressaram e tiveram de se
integrar na sociedade portuguesa (grande parte voltou sem nada).

Este Portugal vê-se reduzido à sua expressão europeia pela primeira vez desde 1415
(tomada de Ceuta). Isto é muito novo e é um choque de grandes proporções face
aquilo a que era o entendimento dos portugueses sobre si próprios e o entendimento
dos políticos portugueses sobre qual era o espaço natural em que Portugal se movia.
Deixou de ser um país pluricontinental, para ser um país meramente europeu.

A posição de Spínola vai se enfraquecendo e a preponderância dos elementos mais


radicais e mais à esquerda vão sendo cada vez mais evidentes. Spínola tenta contrariar
isso e convoca uma manifestação de apoio, que falha por ser perseguida e proibida,
redundando na demissão de Spínola.
Martim Ghira Campos

Francisco da Costa Gomes assume a Presidência da República, o regime vai resvalando


para uma visão mais esquerdizante de si próprio e os militares mais politizados vão
assumindo funções e poder cada vez mais evidente.

Há um momento em que os Spínolistas tentam recuperar o poder com um Golpe a 11


de Março de 1975, iniciando-se o Processo Revolucionário Em Curso (PREC).

A partir daí há uma aceleração muito mais rápida na esquerdização do regime, a Junta
de Salvação Nacional é substituída pelo Conselho da Revolução, a banca é
nacionalizada, as seguradoras são nacionalizadas, as empresas de transportes são
nacionalizadas, a energia, os cimentos, o tabaco….
Há uma ocupação de grandes territórios rurais no Sul (reforma agrária) e estamos cada
vez mais perante um conflito entre dois tipos de legitimidade: uma legitimidade
eleitoral e uma pertença legitimidade revolucionária daqueles que controlam as ruas e
que têm grande parte das armas.

Este conflito é também um conflito marcadamente geográfico, isto é, a Norte


preponderam forças mais conservadoras em grande medida apoiadas pela Igreja
Católica, enquanto que no Sul há uma série de forças radicais de esquerda, que atacam
e ocupam propriedades contra os “fascistas”. Portugal é um país que está todo ele
numa dinâmica de possível Guerra Civil, estando tenso e a precisar de clarificação.

O primeiro momento de clarificação eleitoral acontece a 25 de Abril de 1975, com as


eleições para a Assembleia Constituinte. Havia uma vontade de participar e de
contribuir para decidir o futuro, sendo que 94% das pessoas votou.

Ao contrário do que supunham aqueles que controlavam as ruas, o PCP tem menos de
13% e elege 30 deputados. As forças mais votadas são o PS e o PPD.

A pressão do operariado e dos movimentos controlados pelas forças mais


revolucionárias faz-se sentir e a 12 de Novembro de 1975 há um cerco à Assembleia
Constituinte durante 36h por parte de 100 mil manifestantes. Isto levou a que os
deputados do PS, do PPD e do CDS fossem para o Norte, havendo a possibilidade de a
Assembleia Constituinte reunir a Norte devido à falta de condições.

O clima entre estes radicais e os mais moderados adensa-se e a 25 de Novembro há


uma última tentativa de golpe, havendo um contragolpe da ala moderada liderado em
grande medida pelo regimento de comandos, comandada por Jaime Neves e por
Ramalho Eanes. O lado mais radical foi desmantelado, lado esse que impedia que
Portugal fosse uma democracia de modelo Ocidental, sendo uma democracia mais
soviética e que procurava cativar o povo para uma ideia de gestão e de poder popular.

A 25 de Novembro de 1975 ficou militarmente decidido qual seria o caminho a seguir e


garantiu-se que a Assembleia Constituinte podia concluir o seu trabalho, elaborando e
aprovando a Constituição (aprovada a 2 de Abril de 1976 e entrou em vigor a 25 de
Abril de 1976).
Martim Ghira Campos

Foi extinto o COPCON que era uma espécie de guarda pretoriana e que influía de
forma menos agradável na vida política e que tinha uma ação radicalizador muito
significativa.

A Rádio Renascença foi devolvida à Igreja.

Há eleições legislativas em 1976 e o PS vence essas primeiras eleições.

Este ano de 1976 tem muitas eleições → Abril as legislativas, em Junho Ramalho Eanes
é eleito Presidente da República e são eleitos os primeiros governos e assembleias
regionais, sendo que nesse ano ainda há eleições autárquicas.

Há um fim abrupto do crescimento económico que acontecia desde 1950 e uma


inflação que passa de 7,8 em 1973 para 27,9 em 1974. Um regime que assentava em
alguns pressupostos económicos acaba por ver amputada boa parte do seu território,
está em plena crise petrolífera, tem uma quebra de produção em virtude das
ocupações e nacionalizações, todo o sistema económico está débil, não há confiança
de investidores, há desemprego, há aumento do custo de vida…

Isto teve como consequência um período de grande instabilidade e nessa altura há


governos minoritários do PS que procuram relançar a economia.

Há um acordo com o FMI para que Portugal seja ajudado externamente, deixou de
haver obstáculos ao rumo europeu e Portugal reforça o seu propósito de adesão às
Comunidades Europeias, adere ao Conselho da Europa em 1976, apresenta uma
candidatura formal à CEE em 1977 e assinou o tratado de adesão em Junho de 1985
para vigorar em 1986.

A vida de Portugal pós 1974 é muito instável e com muitos governos diferentes.

Lentamente o sistema vai estabilizando e em 1982 há uma revisão constitucional que


extingue o Conselho da Revolução (bom para a candidatura às Comunidades
Europeias)

O FMI volta a intervir em 1983-85, que dificultava a entrada nas Comunidades


Europeias devido à incapacidade económica, ao desemprego, à inflação…

Esta integração europeia era vista como essencial para consolidar a democracia.

Portugal adere em 1986 e conhece um crescimento até 1990. Há estabilização, sem


golpes e ações militares. Há um momento em que a estabilização é simbolicamente
assinalada com a vitória de Mário Soares nas Presidenciais em 1986, sendo ele o
primeiro Presidente Civil da Terceira República (momento em que a cúpula do poder já
não está nas mãos de um militar e sim de um civil)

Em 1986 o PSD vence as legislativas sem maioria absoluta, maioria essa que viria a ter
depois.
Martim Ghira Campos

Temos uma Terceira República que pode ser dividida em vários períodos:

1) Biénio revolucionário → 1974-1976


2) Consolidação Democrática → 1976 – 1986
Democracia Consolidada → 1986 - atualidade

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