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Martim Ghira Campos

Regimes e Sistemas Políticos

I. O Estado

1. Elementos constitutivos do Estado

Definição de Estado – O Estado é uma comunidade política de pessoas, unidas por


uma vontade ou por uma consciência coletiva, ou por um interesse coletivo na
prossecução do bem comum, vivendo num determinado território geográfico,
politicamente organizada, dotada de uma autoridade soberana, detentora do
monopólio da coação legitima, em que uns governam e outros são governados

Jellinek – O Estado “é uma comunidade com território próprio, com súbditos próprios
e com um poder supremo de governo próprio”
“A totalidade destes três elementos é necessária para a existência do estado. Quando
falta algum deles, não há Estado, mas apenas formas subordinadas de um Estado”

Bluntschli – O Estado é “a organização da nação num dado país”. Para ele os


elementos do Estado são apenas dois: a Nação e o país. Sem nação não há Estado e a
Nação exige o país

 Conclui então que: “O Estado é um conjunto de homens, uma pessoa orgânica


e moral sobre um dado território sob a forma de governantes e governados, ou
mais brevemente: o Estado é a pessoa politicamente organizada de uma
nação”

Samuel Finer, sintetiza as duas posições anteriores, dando cinco características do


Estado:

 Pré-Modernos e Modernos:
o São populações territorialmente definidas, reconhecendo um supremo
órgão de governo

o Este órgão de Governo é servido por uma função pública (concretiza


decisões) e por um serviço militar (assegura as decisões pela força, se
necessário, e protege a associação de outras)

o Têm soberania: poder autónomo e independente na sua ação sobre a


população, reconhecido por outros Estados

 Modernos:
o Nacionalidade – a população do Estado forma uma comunidade de
sentimento, baseada na autoconsciência de uma nacionalidade comum

o Forma uma comunidade no sentido que os seus membros participam na


distribuição de taxas e benefícios
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Em suma: O Estado é então uma comunidade política de pessoas, que está ao serviço
das mesmas. Não é um fim em si mesmo, mas uma criação da sociedade, sendo que
não deve substituir-se à mesma, mas colocar-se ao seu dispor para permitir o seu
desenvolvimento e fortalecimento, orientando-se pelo princípio da subsidiariedade (as
instâncias superiores não devem assumir o que as inferiores são capazes de
desempenhar).
A função do Estado em relação à sociedade civil é supletiva, ou seja, o Estado só deve
intervir quando ela não estiver em condições de resolver os seus problemas por si só

O Estado é um país soberano, com estrutura própria e politicamente organizado,


formado por povo, território e poder político, que administra uma nação através de
um conjunto de instituições.

a) Território e as fronteiras

O território é o primeiro elemento do Estado, sendo indispensável á existência do


mesmo, pois é onde se exerce a jurisdição (não há Estado sem território)

O território não é apenas um espaço físico, delimitado por fronteiras (terra, solo e
subsolo), mas também um espaço aéreo e uma ZEE marítima, com os seus recursos
naturais

O território é a dimensão geográfica do Estado, podendo ser:

 Contínua ou Descontínua (assume formas dispersas, com enclaves rodeados


por território alheio, ou com espaços extraterritoriais noutros territórios)

 Exígua (Vaticano, Andorra...) ou extensa

O que dá unidade ao território do Estado, não é a sua contiguidade física, mas sim a
ordem jurídica. Contudo, a validade da autoridade do Estado está limitada ou
condicionada pelas fronteiras territoriais, ou seja, por outras ordens jurídicas
nacionais. (há exceções, casos de condomínio onde se exerce dupla soberania)

Evolução histórica do território:

 A territorialidade nasce com a sedentariedade, no entanto não havia


capacidade de constituir um Estado pela incapacidade de dotar o território de
jurisdição própria

 O Estado-território (uma organização política baseada num território) nasceu


com as cidades-Estado gregas

 O feudalismo estava divorciado da territorialidade, sendo que não se pertencia


a um país, mas a um Senhor
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 Só com o Estado moderno se levantam as fronteiras, entendidas como


separações territoriais.

O Estado-nação é habitado por uma Nação, em oposição ao Estado-Genérico que é


composto por uma variedade de nações.

O Estado-Nação assume o nome do país local, sendo um Estado Topónimo (Finer)

Finer tipifica os Estados combinando duas variáveis: a centralização administrativa e a


homogeneização cultural, linguística e jurídica

Para além de estados de jurisdição estatal nacional, existem territórios extra-estaduais,


sem tutela nacional, mas sim internacional (são de pertença internacional)

Os impérios são Estados vastos, onde prevalece a dominação de um povo e de um


território sobre outros povos e outros territórios (o centro prevalece sob a periferia)
Muitos dos estados europeus atuais resultam da dissolução de Impérios, sobretudo na
IGM

O território pode ser obtido pelo Estado de vários modos, desde a ocupação à cessão,
passando pela troca e pela anexação

b) O Povo

O povo é o segundo elemento do Estado, entendido como comunidade de pessoas que


habitam o território, como população do espaço geográfico, unido politicamente.

No sentido sociológico - O povo é entendido como realidade étnica com continuidade


histórica, como comunidade dos súbditos ou cidadãos de um Estado, como Nação
(uma cultura, uma história). Pode ser composto de várias nacionalidades

Nação – História comum, cultura comum, destino político comum, sentimento de


afinidade

Origens do Estado-Nação:

 O conceito moderno de povo, que se identifica como Nação, desponta


remotamente da ruína da respublica christiana medieval, resultando da
desagregação dos impérios

 Os Estados começaram a demarcar fronteiras, a afirmar-se com línguas


vernáculas próprias (abandonando o latim) e a dotar-se de religião própria
nacional, que serviu de emancipação face ao poder universal da Igreja

 A ideia se Povo-nação só se consolida e expande com a revolução Francesa e a


ideia de soberania nacional, com a substituição do princípio da legitimidade
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pelo princípio das nacionalidades, princípio este que identificou a Nação como
Estado, dotando-o de soberania, entendendo-a como corpo de cidadãos, com
poder constituinte e como continuidade histórica do povo

 Os Estados modernos passaram de Reinos a Nações: da unidade vertical e


hierárquica de súbditos de um reino, a cidadãos de uma mesma Nação

Nacionalização dos Estados

A soberania é atribuída á Nação, como um corpo de cidadãos, como poder constituído,


como comunidade histórica de um povo, graças a vários processos:

 Alfabetização da sociedade e escolarização de massas levam á homogeneização


e integração cultural das massas, à uniformização linguística como exigência do
mercado nacional, mercantilização do consumo

 Revalorização das tradições patrimoniais (linguísticas, etnológicas, históricas)

 Alargamento da legitimidade política, com a universalização do sufrágio

c) Evolução da cidadania

Conceção grega: a cidadania repousava na antítese entre o cidadão e o súbdito,


pressupondo a desigualdade entre homens (e as mulheres) e a primazia clara do
cidadão perante o estrangeiro. A cidadania traduzia-se na participação na vida pública
e na elegibilidade para cargos públicos, recusada ás mulheres, aos escravos e aos
estrangeiros

Conceção Romana: cidadania significa inclusividade no império, pertença ao Estado.


Era um estatuto legal mais do que uma pertença comunitária. O cidadão romano era
sujeito de direitos, gozando de prerrogativas especiais de privilégio

Conceção moderna: cidadania era o reverso da soberania; cidadão como sujeito da


soberania; cidadania traduzia não só a abrangência, mas também a subordinação e a
proteção do Príncipe; era um estatuto meramente passivo, mas geral, pressupondo
como princípio unificador a subordinação à soberania do Príncipe; cidadania traduzia
sujeição

Conceção Liberal: a cidadania assenta na igualdade de todos perante a lei. Cidadania


significa liberdade; o cidadão sujeito de direitos e deveres, direitos do individuo em
face do Estado, defendendo o individuo da prepotência do Estado. Ao início dizia
respeito sobretudo à privacidade cívica, era sobretudo cívica e ainda não política e
confinava-se socialmente aos proprietários e à sociedade burguesa
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Conceção democrática: a cidadania de cívica torna-se política, com a crescente


afirmação dos direitos políticos democráticos. Estes direitos vão se alargando e
universalizando, como por exemplo o sufrágio. Esse alargamento é feito com a
contrapartida de prestações do cidadão ao Estado (impostos, serviço militar
obrigatório, escolaridade obrigatória)

Conceção social: com a crise do capitalismo liberal, e com a formulação de novos


direitos sociais, a cidadania passa a significar também solidariedade social. De cívica
(liberdade) e política (participação), a cidadania torna-se social. O individuo, de sujeito
ativo de direitos, passa a sujeito passivo a quem se devem direitos.

Evolução da cidadania (Teoria de T.H.Marshall)

 Direitos Civis (liberdade individual, liberdade de expressão, propriedade


privada, direito á justiça)

 Direitos Políticos (direito a votar e a ser eleito)

 Direitos Sociais (direito mínimo de bem-estar económico e partilhar património


social)

d) O poder soberano do Estado

O terceiro elemento do estado é o poder. O que caracteriza o poder do Estado é a


soberania – autonomia interna (traduz-se na capacidade de dar ordens a um povo e de
as fazer cumprir através de um aparelho administrativo) e independência externa do
Estado

Origem do conceito de soberania:

 A ideia vem cunhada por Jean Bodin, que surgiu com o Estado absolutista para
traduzir um atributo da autoridade política, o poder do seu detentor no plano
interno e externo.

 A soberania absoluta do Rei contribuiu para a emancipação do Estado da Igreja:


primeira secularização do estado

 Francisco Suarez teorizou a soberania parcial ou limitada, com o intuito de


preservar a superioridade da Igreja sobre o Estado (no total o Estado está
secularizado, na parcial não)

 Mais tarde surge a soberania mista ou partilhada com a atribuição do poder


legislativo ao Rei e ao Parlamento.

 A ideia de Estado soberano, sem nenhuma ordem jurídica superior, implica a


primazia do direito nacional sobre o direito internacional
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Dizer que um Estado é soberano significa afirmar a superioridade da ordem jurídica


nacional sobre a internacional. São particularidades da soberania o ius tractuum, ius
legationis e o ius belli

Evolução da titularidade da soberania:

 A titularidade evolui do Príncipe para o povo, de soberania absoluta passa a


soberania popular

 A soberania passa a significar “vontade geral coletiva”, inalienável e indivisível

o De soberania real passa a soberania do povo-nação


o De soberania absoluta passa a soberania popular
o O poder passa de soberano a comissário e a soberania de constituinte a
constituída
o Soberano é o povo, não de súbditos, mas de cidadãos

A soberania evoluiu para limitada e partilhada, devendo respeitar:

 Os Direitos do individuo (limita a soberania)


 O Estado de Direito (deve estar a par da democracia)
 Separação de poderes (limita a soberania separando o poder em diferentes
mãos)

O poder da soberania:

 Legislativo -> Parlamento


 Executivo -> Governo
 Judicial -> Tribunais

A característica fundamental do Estado é o “monopólio da coação física legitima”


dentro de um determinado território. A população aceita o Estado e a sua coação

Um Estado deve ter órgãos de legislação, governo, jurisdição e exercer funções


legislativas, administrativas e judiciais. Deve-se basear em leis próprias e não alheias.
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2. Formas de Estado

As várias formas da Estado distribuem-se de acordo com o grau de centralização ou


descentralização. O centralismo traduz-se na existência de um único centro político
investido de poder soberano

A concentração (construção de um centro político) é um processo de federalização (de


baixo para cima na hierarquia)

A desconcentração é um processo de regionalização (de cima para baixo na hierarquia)

Estado unitário

Estado de soberania única, com um único governo, que tem na sua base uma
constituição, que assume uma forma de representação única.
Os órgãos locais são meras autarquias administrativas e não políticas nem autónomas.
Admite descentralização administrativa, em regiões, províncias, ou distritos, para
conseguir melhoria de prestação de serviços e políticas públicas

O Estado Unitário, como Estado-Nação surge com a diferenciação e construção das


fronteiras, com limites e formas de controlo territoriais, bem como com a consolidação
das hierarquias internas.

Os Estados Unitários criaram-se para formar mercados unitários e fechados com


fronteiras alfandegárias, dotando-se de exércitos profissionais e reunir espaços
geográficos mais ou menos homogéneos ou delimitados politicamente.

Para reforçar a sua identidade e unidade, os Estados Unitários revestiram-se de


religião, língua e cultura nacional própria.

Estado Regional (Espanha, França, Itália)

É uma forma intermédia entre o Estado Unitário e o Estado federal

É um Estado com regiões, dotadas de autonomia política, mas onde existe uma
fiscalização pelo poder central dos órgãos locais.

As regiões políticas têm governos e parlamentos próprios subordinados aos centrais e


compatíveis com eles, ou seja, com competências delegadas e subalternas.

São Estados sem partilha de soberania, onde as competências atribuídas às regiões


têm consagração constitucional

Enquanto o Estado Unitário tem autarquias, o Estado Regional tem autonomias.


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A autonomia tem poderes legislativos próprios, que decorrem de eleição, que a


autarquia não tem, estando diretamente subordinados pela Constituição (de tipo
rígido)

O poder das autarquias é delegado, o das autonomias é originário. As competências


dadas às autarquias são revogáveis, as dadas às autonomias não, porque são
constitucionalizadas.

Estado Federal (EUA)

É uma “união durável”, assente numa convicção livre, visando a conservação política
dos seus membros. O pacto federativo é livre na sua constituição, mas não é revogável
livremente

Forma-se através de um pacto constitucional. Protege os seus membros de agressões


externas, mas internamente resolve os seus conflitos por via jurídica.

Os Estados federais renunciam aos ius belli, ius legationes e ius tractuum

Para manter a sua independência, o Estado federado renuncia à sua impenetrabilidade


e aceita o direito de ingerência da Federação

O federalismo é uma forma política de conciliação da unidade com a diversidade

Processos de construção

1) De baixo para cima: processo de agregação (Estados Unidos, Suíça e Alemanha)

 Nascem da união de vários Estados membros, anteriores, que se juntam


para se tornarem unidos
 Soberania dupla: a do estado federal, dominante externa e a dos
estados federados, interna
 Os poderes repartem-se pelo governo federal e pelos governos
estaduais

2) De cima para baixo: por desagregação de Estados Unitários (Bélgica, Brasil,


Índia, Federação Russa)

 Resulta da desadequação da forma unitária


 Desarticulação da unidade precedente
 Para se manterem unidos, o centro “devolve” soberania à periferia

Em ambos os casos assistimos a uma transferência de soberania, de poder e de


competências (executiva ou legislativas), do centro para a periferia ou da periferia para
o centro
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A federação sela-se por uma constituição, de carater fechado, que exige maioria
qualificada para ser alterada

É bicameralista: Camara Alta (estados federados em igualdade) / Camara Baixa


(proporcional)

Confederação de Estados (Alemanha)

A confederação é uma união de Estados que mantêm a soberania. Mais do que um


Estado, a Confederação é uma organização internacional, sem ordenamento
constitucional

Na confederação as decisões tomam-se por unanimidade, enquanto que na Federação


basta maioria qualificada

Há quem distinga confederação antiga de moderna:

 Antiga – É uma transição para o Estado Federal e as relações entre os Estados


membros são reguladas pelo Direito Internacional. A soberania não está
dividida nem partilhada, residindo nos Estados membros. O Governo só tem
domínio indireto sobre os cidadãos e competências delegadas. Assenta
normalmente num Pacto ou Tratado aberto, de onde se pode sair sem lesar o
Estado.

 Moderna – tem a função de operar também na esfera do individuo e dos seus


direitos individuais. Estão envolvidos tanto os Estados membros como os
indivíduos que lhes estão sujeitos. É uma comunidade autónoma e não
necessariamente soberana, com uma organização democrática que garante a
distinção e equilíbrio de poderes.

União Política (União política Sérvia e Montenegro)

Não se devem confundir nomes com realidades. A União Indiana ou o reino Unido não
são propriamente uniões políticas

A própria União Europeia tem traços mistos, não sendo também uma União Política
A União Política de Estados, que preservam a sua soberania e identidade, pode ser
meramente pessoal ou real

A união pessoal é quando a mesma pessoa é investida na soberania de dois estados,


que se mantêm independentes, quer interna, quer externamente. A união diz-se real
quando se dá união de dois Estados, sem autonomia do ponto de vista internacional
3. A crise do Estado
Martim Ghira Campos

O Estado está atravessado por uma crise interna e por uma crise externa. A nível
interno, o Estado está em expansão. A nível externo está em regressão ou contração

Nos últimos tempos, verifica-se também uma regressão a nível interno devido à
proliferação do sub-grupismo (que enfraquece o Estado e o torna refém de interesses)
e ao aumento de competências dos cidadãos, resultantes da revolução telemática.

A vulnerabilização do Estado ocorre também perante a globalização e o fluxo


transnacional de povos, conhecimentos e tecnologias.

Há Estados falhados ou fracos, que têm dificuldade em impor a sua autoridade politica,
com governos incompetentes ou até inexistentes, que precisam de construir ou
reconstruir o Estado.

Limitar o Estado tornou-se um objetivo para o tornar mais capaz de implementar


políticas e de legislar

Fukuyama distingue duas dimensões da estadualidade:

 A força (poder do Estado) e a sua capacidade institucional para planear e


executar políticas

 Alcance ou campo de intervenção para medir o grau de estadualidade dos


vários países do mundo

Para ele, a capacidade institucional do Estado mede-se através de: organização e


gestão da administração, sistema político, base da legitimação, fatores culturais e
estrutura

a) A crise do Estado-Nação

O Estado Nação tem vindo a sofrer uma erosão por cima e por baixo da sua soberania,
pela globalização e pelo desenvolvimento do localismo político

O Estado Nação é “demasiado pequeno para enfrentar os grandes desafios e


demasiado grande para intervir na resolução dos pequenos problemas” – Daniel Bell

Dá-se uma desidentificação do Estado com a Nação, não sendo conseguido coincidir
um Estado com uma Nação, nascendo os Estado plurinacionais

Verifica-se uma separação dos conceitos de Soberania e de Estado, ou seja, a perda de


soberania do Estado-Nação por via da crescente internacionalização da vida
económica, político-militar e sociocultural.

Globalização:
Martim Ghira Campos

A globalização é um fenómeno económico e financeiro, traduzido na mundialização


dos mercados, na internacionalização da divisão do trabalho, na multinacionalização
das empresas, acompanhados pela circulação de pessoas, bens e capitais.

A intensificação das trocas comerciais, a mundialização dos investimentos, a


destruição das barreiras alfandegárias, têm provocado uma substituição da dimensão
estadual-nacional dos mercados, por uma mais vasta dimensão transnacional e
transcontinental

A concentração económica gerou o aparecimento de grandes empresas


multinacionais, que se tornaram relevantes atores da vida económica internacional,
muitas delas com mais orçamento que muitos Estados, condicionando a ação dos
mesmos

Do ponto de vista político-militar, a formação de blocos e o aparecimento da “teoria


das esferas de influência”, legitimando intervenções militares em países estrangeiros,
ao abrigo da noção de “soberania limitada”. O direito de declarar guerra deixou de
pertencer exclusivamente aos Estados, pertencendo também a grandes centros de
decisão de organizações militares transnacionais

O aparecimento e a proliferação de armamento e da produção nuclear


internacionalizaram o problema da segurança, tanto militar como ambiental

Do ponto de vista sociocultural, assistimos à crescente mundialização da opinião


pública, à afirmação e reconhecimento progressivo da necessidade de autoridades
internacionais para regular o acréscimo das comunicações mundiais, tanto com
transportes como com telecomunicações

O progressivo reconhecimento do direito internacional vai a par com a mundialização


do domínio cultural e ideológico. A cultura expande-se e atravessa nações e
continentes, sendo que alimentação, vestuário, etc., passam a ser os mesmos em
diversos países

Em suma, o Estado-nação e a sua soberania estão a ser postos em causa por todos
estes processos, que provoca uma erosão “a partir de cima”

No entanto a globalização é potenciada por outras dimensões

O que a torna possível é um processo de desenvolvimento tecnológico, principalmente


das tecnologias de informação e comunicação. Este processo cria novas relações
sociais e provoca mudanças nas sociedades. Possibilita ainda o trabalho a partir de
casa, algo impossibilitado pela revolução industrial

A globalização veio introduzir maior competitividade a nível mundial, com


consequências a nível local e ao mesmo tempo uma maior interdependência com o
aparecimento da sociedade de redes
Martim Ghira Campos

Culturalmente, a globalização implica uma profunda mudança cultural, com a


emergência de um novo paradigma de cultura, cuja nova linguagem exige uma nova
alfabetização cultural e tecnológica. Traduz também uma universalização da
consciência dos direitos humanos universais

Com a globalização, o mundo torna-se simultaneamente maior e mais pequeno, ou


seja, expande-se, mas torna-se mais próximo e interativo – aldeia global

A globalização tem ainda uma relevante dimensão ecológica, uma vez que os novos
problemas ambientais têm dimensão mundial e só são resolúveis em termos
transnacionais.

A relação entre o Estado e a sociedade é significativamente alterada. Na primeira


modernidade, a da industrialização, os contornos da sociedade deviam sobrepor-se
gradualmente aos contornos do Estado. A segunda modernidade, a da globalização,
desarticulou a unidade do Estado com a sociedade, substituindo a estrutura
monocêntrica do poder dos Estados nacionais por uma distribuição policêntrica do
poder, com grande diversidade de atores que concorrem e cooperam entre si.

Com a globalização, as pessoas parraram a ter uma plurilocalização, passando a ser de


vários locais simultaneamente

O Estado perde a sua soberania tradicional, deixando de conformar o poder político e


económico, a política cultural e de informação, a identidade comum dos cidadãos. A
soberania do Estado passa a ser um “poder cindido”, limitado e acorrentado pela nova
pluralidade de atores

A segurança ambiental, problemas de saúde e de qualidade de vida, mundializam-se e


exigem resoluções transnacionais.

Com a globalização, a estadualidade (centralização institucional do Estado) parece


eclipsar-se

A globalização derruba fronteiras, destrói distâncias, reforça a interdependência,


enfraquece a territorialidade do Estado, decresce a soberania e aumenta a
transterritorialidade.

A nova sociedade mundial é uma sociedade sem estado mundial, uma sociedade não
organizada politicamente, é por isso, uma sociedade mundial de riscos globais.

A globalização está a por em causa o modelo de Estados nacionais assentes no


equilíbrio entre economia de mercado, democracia política e welfare state.

A globalização, enquanto processo pelo qual o Estado nacional vê diminuir a sua


soberania e identidade, e serem transferidas para atores transnacionais, não deve ser
confundida com globalismo, enquanto ideologia de mercado mundial.
Martim Ghira Campos

Localismo político:

O desenvolvimento do localismo político faz uma erosão da soberania no Estado de “a


partir de baixo”

A globalização fez desenvolver a pequena dimensão. A necessidade de proximidade


dos cidadãos e dos seus problemas, desenvolveu os níveis elementares de poder e de
organização política – localismo político

O localismo é o reverso da globalização – “glocalização”. São duas dinâmicas


inseparáveis: o local é um aspeto do global e a globalização é uma “localização global”

Um é consequência do outro e um pede o outro

O Estado-nação, apesar de ver a sua soberania corroída, não desaparece, pelo


contrário, continua a ser um ator decisivo na cena internacional, sendo um fator
imprescindível da globalização e da localização

Segundo Saskia Sassen, há uma hierarquia de escalas: o global está parcialmente


inserido no nacional e este no local. Há uma interação de forças globais e nacionais.

II. Regimes Politicos

4. Totalitarismo e autoritarismo

Os regimes não democráticos surgem contra a democracia parlamentar e com o


propósito de a superar

Um regime não democrático é um Governo de uma ou várias pessoas que se


apoderam do poder e o monopolizam, exercendo-o sem restrições

Regimes antidemocráticos:

 Progressistas – entendem que o desenvolvimento da história levará a uma


ditadura do proletário e a uma sociedade sem classes

 Reacionários – não visam qualquer tipo de progresso e são contra o


parlamentarismo e a democracia multipartidária

Maneiras de olhar para os regimes antidemocráticos:

Teorias Nacionalistas
Martim Ghira Campos

Nesta categoria estão todas as teorias que interpretam os regimes não democráticos
como resposta à necessidade de construção ou consolidação das nações

Estes regimes surgiriam solicitados pelos processos de moderna construção de


Estados-Nação

Estaline definiu o nacional-socialismo como “um movimento nacional de libertação”

Teorias da Modernização

Inicialmente formulada por Organski, esta interpretação coloca os regimes não


democráticos numa perspetiva histórica mundial.

Para ele, as ditaduras entre guerras seriam uma etapa do desenvolvimento político
para a democracia parlamentar

Organski analisa o desenvolvimento político a partir do processo de “nation-building”.


O desenvolvimento político – constante aumento da capacidade do Estado de utilizar
recursos humanos e materiais do país, ao serviço dos objetos nacionais – está ligado
ao desenvolvimento económico e social

Organski considera que o desenvolvimento político tem quatro fases fundamentais:

 Unificação primitiva
 Industrialização (fascismo italiano e estalinismo)
 Estado assistencial (nazismo e Rússia de Kruschov)
 Estado de abundância (democracia parlamentar)

Teoria Marxista de classes sociais

Considera o fascismo (fascismo e nazismo) como ditadura do grande capital,


instrumentalizando a pequena burguesia

A generalização da caracterização de todas as ditaduras não comunistas como


fascismo, foi funcional à estratégia antifascista das Frentes populares. Dimitrov define
o fascismo como “a aberta ditadura dos elementos mais reacionários, mais chovinistas
e mais imperialistas do capital financeiro”

Os sociais democratas deixam de ser vistos como social fascistas e passam a ser vistos
como aliados para a realização de frentes únicas ou comuns (frentes populares
antifascistas)

 A frente única que os comunistas propõem aos sociais democratas deve ser
dirigida contra o fascismo
Martim Ghira Campos

Aa frente única antifascista tem hegemonia de comunistas, cujos partidos assumem


função e autonomia nacional
Esta unidade de ação antifascista exige o abandono do sectarismo

O comunismo e o fascismo, apesar de opostos, ambos combatiam a democracia


burguesa

Ernst Nolte e a guerra civil

O fascismo (nazismo e fascismo italiano) é uma resposta à ameaça da revolução russa


e do bolchevismo. O bolchevismo é condição fundamental para o surgimento do
fascismo, sendo que o que mais caracteriza o fascismo é o anticomunismo

Nolte diz que o medo do bolchevismo alcançar o poder alimenta o fascismo e o


nazismo, apesar de ser comum o ódio ao mundo burguês

A culpa da guerra civil europeia não foi do nazismo, mas sim do bolchevismo que o
provocou. A guerra entre ambos explica-se pelo contraste de ideologia do bolchevismo
e a contraideologia do nazismo.

Para o nacional-socialismo (nazismo), o bolchevismo foi motivo de temor e ao mesmo


tempo um modelo a seguir

Teoria do Totalitarismo e do Autoritarismo (teoria a estudar)

a) A relação partido-Estado

o As ditaduras totalitárias são ditaduras de movimento, que visam


destruir o Estado e subordina-lo ao partido (subordinam o Estado ao
partido)

O partido, entendido como o “movimento”, é a fonte originária do


poder e assume a função de direção

O totalitarismo é contrário à divinização do Estado e à absolutização do


seu poder

o As ditaduras autoritárias são ditaduras de partido, que visam assumir o


poder de Estado e ocupar as suas estruturas (o partido subordina-se ao
Estado, que se absolutiza)

O partido tem apenas um poder derivado e desempenha uma função de


suport

b) Formas de dominação e repressão


Martim Ghira Campos

Totalitarismo:
 A dominação totalitária é mais vasta, mais intensa e é maior a repressão
 O totalitarismo é um regime de terror indistinto, que visa cidadãos
indefesos e inofensivos e não apenas opositores
 Visa suprimir a liberdade. É uma repressão de massas. O monopólio do
poder não é apenas político, mas também social

Autoritarismo:
 A dominação autoritária é mais reduzida e menos intensa
 A repressão é menos forte e mais seletiva, atingindo apenas os que se
manifestam contra a oposição organizada
 Visa reprimir e controlar a liberdade, mas não eliminá-la
 O monopólio do poder pretende-se político

c) Concentração de poder e competitividade

 Nos regimes totalitários, a concentração de poder é maior. Existe um


único centro de poder e total ausência de competitividade. A situação é
de monismo político social

 Nos regimes autoritários, conhece-se algum pluralismo, vários centros


de poder, alguma competição simulada ou controlada

d) Ideologia e mobilização política

 Os regimes totalitários são fortemente ideologizados, de grande e


intensa mobilização política (tudo se politiza)
 O totalitarismo significa a invasão da sociedade civil pela sociedade
política, a destruição da fronteira ente a Sociedade e a Política
 O totalitarismo militariza a política e subordina as Forças Armadas à
política

 Os regimes autoritários têm uma ideologia conservadora de contenção


de massas, visam o seu enquadramento mais do que a sua mobilização
 Querem a sociedade organizada e despolitizada. Separam político do
social
 São regimes pragmáticos e pouco ideológicos
 O autoritarismo politiza as Forças Armadas, confere-lhes poder político

e) Condições de possibilidade do Totalitarismo


Martim Ghira Campos

 O totalitarismo só é possível em sociedade de massas. Só a massificação


das sociedades as atomiza e desintegra ao ponto de tornar possível a
sua mobilização intensa.

 Por outro lado, o totalitarismo exige massas dispensáveis, que tornem


possível a estratégia de terror em que se baseia.

 Por fim, o totalitarismo exige novas técnicas de destruição

Modelos de autoritarismo: autoritarismo conservador e autoritarismo de


modernização

Há distinção entre o autoritarismo conservador (tradicional) e o autoritarismo de


modernização (mobilização/participação)

O processo de modernização traduz-se numa crescente secularização, numa


mobilização social traduzida no processo de participação, com o objetivo de uma
mudança económica no sentido da industrialização.

1) Fascismo (autoritarismo moderno)

O fascismo italiano tinha a modernização como propósito e a mobilização como


estratégia. Visava o expansionismo das “nações proletárias” em termos internacionais

O que motiva a emergência de formas autoritárias modernas é a tensão estrutural


entre o processo de secularização e a necessidade de núcleos mínimos de natureza
prescritiva para manter a integração nacional

2) Autoritarismo conservador

O autoritarismo conservador é anti moderno e repudia a mobilização política intensa


visando o integracionismo defensivo do seu património histórico

O conservadorismo é relacionado com políticas de direita e procura preservar as


instituições, incluindo a religião, os direitos de propriedade e a hierarquia social,
enfatizando a estabilidade e a continuidade.

Opõe-se a políticas progressistas ou revolucionárias, sendo que, no entanto, não


procuram impedir qualquer mudança social (apenas as revolucionárias)

5. Teorias da Democracia
Martim Ghira Campos

a) A democracia segundo Tocqueville: regime de liberdade e igualdade de


condições

Define a democracia como um regime de liberdade política e igualdade de condições


ou oportunidades, oposto à aristocracia

A democracia pressupõe uma sociedade mais igualitária, com maior igualdade de


oportunidades e um governo fundado na soberania popular e na liberdade política

A democracia é favorecida por relações sociais menos hierarquizadas e por costumes


brandos porque os cidadãos se assemelham na maneira de viver.

O Governo democrático é aquele em que o povo toma maior parte nele, mas também
é um sistema de maior autorregulação

A procura da igualdade sem liberdade conduz ao despotismo do Estado – a


democracia tem de ser necessariamente liberal

O que levou á Revolução francesa e destruição do Antigo Regime foi a separação das
classes e a destruição da liberdade política

Papel importante na separação e no controlo do poder, joga a liberdade de imprensa,


tal como a religião contribui para o autocontrole da sociedade.

É a autorregulação democrática que impede a Revolução

b) A teoria do mandato concorrencial de J. Schumpeter

No seu livro, contesta a definição clássica de democracia como sendo um governo do


povo pelo povo, como sendo insuficiente

Para ele democracia é: o sistema institucional que conduz à tomada de decisões


políticas, em que os indivíduos adquirem poder de decisão na sequência de uma luta
concorrencial por votos do povo

Esta definição tem várias implicações:

 A democracia implica a possibilidade de respeitar a escolha de governantes


feita pelo povo, em eleições. A monarquia parlamentar é democrática. Não o é
a monarquia constitucional

 A democracia consagra, e não ignora, o papel da liderança e a possibilidade de


a substituir

 A democracia não despreza as vontades coletivas autenticamente expressas


Martim Ghira Campos

 A democracia envolve competição pela direção política: livres candidaturas


em competição por votos livres

 A democracia é um regime de liberdade individual: cada um se pode


candidatar contra o poder, com liberdade de discussão e de imprensa

 O que caracteriza a democracia é o poder do eleitorado de gerar um governo e


de o derrubar, de o nomear e revogar

 A democracia consagra a vontade da maioria e não a vontade do povo

Algumas observações à adoção desta definição:

1) A democracia não significa que o povo governe efetivamente, mas sim que o
povo aceita ou afasta os governantes, através da concorrência livre dos
candidatos pelos votos dos eleitores

2) O rendimento do governo democrático está comprometido pelo desgaste de


energias imposto aos dirigentes por causa da batalha no interior e exterior do
parlamento, já que a democracia quer dizer subordinação do governo aos votos
do parlamento e do corpo eleitoral

3) A democracia cria profissionais de política que converte em “homens de


Estado”

Condições de sucesso da democracia:

1) A democracia pressupõe material humano de qualidade – uma classe política


selecionada, experiente e treinada

2) A democracia exige que o domínio efetivo das decisões políticas não deve ser
vasto, mas limitado às questões que o grande público pode compreender e ter
uma opinião refletida

3) Um governo democrático deve dispor dos serviços de uma boa burocracia bem
treinada, gozando de boa reputação, apoiada em sólidas tradições. Uma
burocracia forte para guiar e instituir os políticos ministros

4) Autocontrole democrático:

 Os partidários do governo devem aceitar a sua direção e os opositores


devem observar as regras do jogo, no respeito das legislaturas

 Os eleitores não devem retirar facilmente a sua confiança no intervalo


das eleições
Martim Ghira Campos

 Evitar a ingerência política de irresponsáveis, com largo grau de


tolerância

 Unanimidade respeitante aos princípios estruturantes da sociedade

c) Os pressupostos económico-sociais da ordem democrática de Seymour Lipset

Para Lipset, a democracia é o sistema político que oferece oportunidades


constitucionais regulares para a mudança dos funcionários governantes, e o
mecanismo social que permita a uma parte da população (maioria) influir nas
principais decisões, mediante a escolha para cargos políticos

Para uma democracia se estabelecer, é preciso estarem reunidas determinadas


condições. Uma democracia exige:

1) Uma fórmula política


2) Um conjunto de líderes políticos
3) Uma oposição

Mas existem também pré-requisitos económico-sociais da democracia:

1) Uma sociedade mais igualitária – grandes desigualdades sociais geram


facilmente oligarquias e ditaduras

2) Níveis mínimos de modernização – o extremismo político é filho da falta de


riqueza, de desenvolvimento e de educação

A estabilidade das democracias depende da legitimidade (capacidade de gerar e


manter a crença nos valores e instituições) e da eficácia (desempenho real, capacidade
de satisfazer as funções de governo)

d) Teoria Poliárquica da democracia de Robert Dahl

Segundo Dahl, a principal característica da democracia é a continua responsabilidade


do governo perante as preferências dos seus cidadãos, considerados politicamente
iguais

Para haver responsabilidade, os cidadãos devem ter oportunidade de:

 Formular as suas preferências


 Manifestá-las ao governo por ações individuais e coletivas
 Ver as suas preferências igualmente consideradas no comportamento do
governo, sem descriminação
Martim Ghira Campos

Dahl estabelece cinco requisitos para a democracia:

1) Igualdade de voto
2) Participação efetiva
3) Compreensão iluminada
4) Controlo final da agenda
5) Inclusão

Esses requisitos, implicam condições:

 Liberdade para formar e entrar em organizações


 Liberdade de expressão
 Direito de voto
 Elegibilidade para cargos políticos
 Direito para os líderes políticos competirem em votações
 Fontes de informação alternativas
 Eleições livres e isentas
 Instituições governamentais dependentes do voto e de outras expressões de
preferência

Os regimes políticos dependeriam assim da inclusividade e da contestação pública, ou


seja, da participação e da liberalização

Teoria da poliarquia

As poliarquias são as democracias em que o poder está disseminado. O poder não é


soma zero.

O “Estrato politico” não é homogéneo, mas pluralista e diversificado nas sociedades


industriais.

O poder, as possibilidades de controlo dos governantes e os recursos políticos dos


governantes estão disseminados.

As poliarquias são de elevada participação e oposição, inclusão e competição

As modernas democracias representativas são uma poliarquia porque são:

 Governos de representação
 com limites à participação democrática
 diversidade política dos seus habitantes
 multiplicam-se as clivagens de os conflitos políticos
 pluralismos de grupos sociais e organizações
 expansão dos direitos individuais
A poliarquia distingue-se por duas características:

1) a cidadania estende-se a uma alta proporção de adultos (inclusividade)


Martim Ghira Campos

2) os direitos de cidadania incluem o de se opor e votar os mais altos cargos do


governo

Instituições próprias da poliarquia:

1) cargos eleitos – controlo sobre o governo e as suas decisões através de eleições


2) eleições livres e justas, sem coerção
3) sufrágio inclusivo, alargado a todos os adultos
4) direito de candidatura aos lugares
5) liberdade de expressão sem repressão
6) informação alternativa
7) autonomia de criar associações

Na poliarquia existem as seguintes condições:

 Durante o período eleitoral:


o Todos os membros da organização realizam os atos que consideram
serem uma expressão de preferência entre as alternativas, por exemplo
votando

o Ao ordenar as preferências, o valor atribuído à escolha de cada


individuo é idêntico

o A alternativa com maior número de votos é vencedora

 No período pré-eleitoral:
o Qualquer membro que apreende um conjunto de alternativas, pode
inserir a sua preferência entre as alternativas postas à votação

o Todos os indivíduos possuem idêntica informação acerca das


alternativas

 No período pós-eleitoral:
o As alternativas com maior número de voto destituem as alternativas
com menos votos
o As ordens dos eleitos são executadas

 Durante o período entre eleições:


o Todas as decisões, entre eleições, estão subordinadas às chegadas
durante o período eleitoral, isto é, as eleições controlam

o Ou novas decisões durante este período são governadas pelas


precedentes sete condições, operando, contudo, sob circunstâncias
institucionais bem diferentes
e) Teoria económica da democracia de Anthony Downs
Martim Ghira Campos

Vai buscar a ideia de que a função social não corresponde aos motivos privados dos
diretores de grandes empresas, bem como dos políticos.

Os diretores de grandes empresas querem produzir bens, mas pessoalmente querem


obter lucro

Os políticos, da mesma maneira, têm como motivo social promover políticas


governamentais, mas privadamente querem é manter-se no poder

A vida possui, portanto, uma racionalidade idêntica á vida económica, entendida como
eficiência – maximiza os resultados produzidos minimizando os meios investidos

O objetivo na democracia é ganhar eleições, daí que todos os seus esforços se dirijam
ao objetivo de maximizar o número de votos.

O comportamento dos cidadãos também é racional – votam no partido que


proporciona benefícios maiores

A incerteza afeta as decisões do governo e o voto dos cidadãos, pelo que gera a
persuasão dos indecisos, no sentido de ganhar confiança

É a incerteza que transforma a democracia num governo representativo

Em suma, os partidos comportam-se como os empresários das economias lucrativas:


racionalmente para obter maior número de votos

f) A teoria decisional da democracia de Giovanni Sartori

A política consiste em decisões coletivizadas, isto é, decisões que dizem respeito a uma
coletividade. Mas nem todas as decisões coletivizadas são políticas. São políticas
quando são: soberanas, sem escapatória, sancionáveis

Todas as decisões coletivizadas pressupõem custos internos e riscos externos. Os


custos variam com o número de pessoas que participam nas decisões. A ampliação de
um órgão decisório realiza-se para minorar os riscos externos

Para além do número de pessoas, há que introduzir outras variáveis:

1) O método de formação do órgão decisório: como se nomeia ou recruta, qual a


sua composição ou natureza

2) A norma que rege a tomada de decisões: os princípios e procedimentos da


adoção de decisões

2ª Frequência
Martim Ghira Campos

Sistemas Eleitorais

Um sistema eleitoral é o mecanismo de transformação de votos em mandatos, ou seja,


consiste em converter votos atribuídos nas eleições em lugares parlamentares.

Os sistemas eleitorais têm dois objetivos:

1. Visam a eleição de representantes


2. Indiretamente a escolha de governantes

Os sistemas eleitorais têm uma função legislativa e outra política. Estas duas funções
dos sistemas eleitorais – assegurar a governabilidade e a eficácia, por um lado, e a
representatividade ou legitimidade por outro – são difíceis de compatibilizar:

 sistemas que servem bem para escolher governantes, não servem tão bem para
escolher representantes, e vice-versa.

Sartori  “não existe nenhum sistema eleitoral ótimo ou de tal forma funcional de
que se possa dizer que possui, por certo aspeto, vantagens superiores aos próprios
defeitos. A adoção de um sistema eleitoral para um determinado contexto não impõe
de modo algum a adoção do mesmo sistema eleitoral noutros contextos”

Conclui que uma vez que não existe um sistema eleitoral superior aos outros, os
sistemas eleitorais são apenas instrumentos a utilizar em função dos fins a prosseguir e
dos problemas a que devem fazer face

A adoção de um sistema proporcional, que se justificava antigamente, pode não se


justificar da mesma maneira anos mais tarde, quando o que se pretende do sistema foi
alterado.

Os sistemas maioritários são melhores para garantir a governabilidade e a estabilidade,


e os sistemas proporcionais são melhores para obter representatividade. O sistema
maioritário é mais eficaz e o sistema proporcional é mais justo

Há quem veja a opção de um sistema proporcional  ideológica


Há quem veja a opção de um sistema maioritário  funcional

Um sistema democrático não é apenas o que representa bem, é também o que


proporciona um bom sistema de tomada de decisões

a) Origem dos sistemas eleitorais

O primeiro sistema eleitoral a surgir foi o maioritário, correspondendo a ideia simples


de que ganhava a eleição o que tinha mais votos  por isso se deu o nome de “first
past the post system” (sistema em que o primeiro passa o seguinte)
Martim Ghira Campos

Foi um sistema introduzido por via evolutiva e criou as democracias maioritárias.


Inicialmente adotado sob a forma de maioritário simples, mais tarde vem a exigir a
obtenção de maiorias absolutas, começando a multiplicar os turnos, criando ainda a
chamada segunda volta.

Era um sistema de “soma zero”, onde quem ganhava tinha tudo e quem perdia, perdia
tudo. Com a massificação da democracia, resultante do alargamento e universalização
do sufrágio, iniciou-se uma luta pela representação proporcional, cuja ideia era de que
as eleições, mais do que dizerem quem governaria, deveriam configurar
proporcionalmente a representação dos vários setores da opinião pública de um país,
que Lijphart designou como democracias consociativas.

Os ganhos eleitorais passavam a distribuir-se por todos, numa lógica de “soma


positiva”. A representação proporcional passou a ser o sistema adotado por via
revolucionária.

A adoção da representação proporcional ocorreu principalmente em pequenos países,


uma vez que os grandes países, que enfrentavam cargas de decisão mais pesadas,
resistiram mais à sua introdução, e quando a aceitaram, deram-se mal com ela.

Rokkan concluiu que a dimensão dos países é decisiva para a adoção dos sistemas
eleitorais: os sistemas proporcionais são aceitáveis em unidades mais pequenas,
porque estas têm uma menor carga em termos de processo de decisão. Para os
maiores países é desastrosa devido ao peso maior das suas responsabilidades.
Para além disso, também reconhece, em termos gerais, que:

1. As pressões no sentido da representação proporcional aumentam com a


heterogeneidade étnica e/ou religiosa do conjunto dos cidadãos e, mesmo em
eleitorados homogéneos em termos de etnia/religião, com a diferenciação
económica crescente decorrente da urbanização e da monetarização das
transações

2. A representação proporcional tem mais probabilidade de se revelar a linha de


menor resistência nas democracias diferenciadas com menos recursos
governamentais, enquanto os sistemas de maioria relativa têm mais
probabilidade de ser eficazmente defendidos nos regimes maiores com
instituições governamentais mais fortes.

Chega à primeira constatação a partir do argumento de que quanto menor for a


densidade, quanto mais pequenas foram as comunidades, quanto menos desenvolvida
e diferenciada estiver a economia, mais pessoal e territorial será o estilo de
representação, e menos desenvolvidas serão as organizações criadas com vista à
concorrência eleitoral a nível local. Procurando uma explicação histórica, assinala que
os primeiros países a abandonar o sistema de maioria simples e a adotar a
representação proporcional, foram os “regimes mais divididos em termos étnicos e
religiosos”.
Martim Ghira Campos

Chega à segunda, constatando que as democracias mais pequenas cedem mais


facilmente às exigências da proporcionalidade, porque as condições de articulação e
de agregação de interesses são diferentes

A representação proporcional ajuda a fixar as estruturas iniciais de articulação e


agregação, permitindo identificar mais facilmente as variações ao nível de base
sociocultural de apoio às diferentes alternativas políticas

A adoção do sistema proporcional é uma “estratégia de fracos”, que preferem a


segurança de posições de controlo já adquiridas em partidos minoritários em vez da
incerteza das fusões requeridas pelo sistema maioritário

a) Sistemas de representação proporcional

A classificação dos sistemas depende do tipo de escolha e do instrumento da sua


expressão, do tipo de colégio eleitoral e da sua dimensão, do tipo da fórmula

Neste sistema não ganha apenas o que fica à frente, todos ganham, na proporção de
votos obtidos, havendo uma maior e mais equitativa distribuição dos lugares

Este sistema é necessariamente plurinominal, ou seja, vota-se numa lista partidária.

Sistema de Andrae  o eleitor em vez de votar num só candidato, vota numa lista de
candidatos que estão dispostos pela ordem de preferência. Um candidato é eleito
quando atinge o número correspondente ao quociente eleitoral de Andrae. Os votos
sobrantes passam para o candidato seguinte na lista.

Quociente eleitoral de Andrae  nº de votantes / número de deputados

Thomas Hare  Apresenta uma das mais acolhidas alternativas ao sistema maioritário,
onde existe uma lista de deputados a eleger numa única circunstância nacional e o
eleitor em apenas um voto, ordena a lista como preferir (voto ordinal). O apuramento
era feito através de “Todos os sufrágios válidos / nº de lugares a concurso” (quociente
de Hare). De seguida “resultados da lista / quociente de Hare = nº de deputados a
eleger”. Caso o candidato obtivesse mais votos do que os necessários, o restante era
distribuído na proporção pelas segundas preferências

Vantagem da representação proporcional  aproveita os restos dos votos para


distribuir pelos restantes candidatos, dando a opção de lhes dar voz

Segundo Stuart Mill, o sistema de Thomas Hare assegura a representação em


proporção de qualquer divisão do corpo eleitoral, incluindo minorias, e não permite
que um eleitor seja representado nominalmente por alguém que não tivesse
escolhido, reforçando o vínculo entre eleitor e representante
Martim Ghira Campos

O sistema proporcional é uma parte essencial da democracia, que passa pela


representação apropriada das minorias, algo que o sistema maioritário não permite ao
dar voz a uma maioria numérica, privando o direito das minorias.

Por outro lado, Bagehot vem contestar o sistema de Hare, acusando-o de, ao eleger
principalmente aqueles que são membros de partidos, fomentar mais a sobrevivência
do que a independência dos candidatos. Na sua visão, o parlamento deixaria de ser
constituído por homens de sentimentos moderados, correndo o risco de promulgar
leis violentas, causando instabilidade na duração das legislaturas

Friedrich conclui que a incompatibilidade entre Mill e Bagehot provém de:

 Mill tem a teoria do “voto como direito”, preocupando-se com a representação


 Bagehot tem a teoria do “voto como função”, preocupando-se com as funções
do parlamento

Os métodos mais frequentes de representação proporcional utilizados, são os “das


médias mais altas” e os “dos restos mais altos”, sendo que este último é mais
proporcionalizante

Métodos das médias mais altas, a ordem de menor proporcionalização (segundo


Lijphart):

 Método de Hondt  nº de votos obtidos por cada partido / nº deputados a


eleger em cada circunscrição

 Método de Saint-Lague  nº de votos obtidos por cada lista / nº ímpares.


Difere do método de Hondt porque toma em conta uma parte dos restos,
sendo mais proporcional

Método dos restos mais altos do Quociente de Hare:

1- Determina-se o Quociente de Hare = nº sufrágios validamente expressos / nº


de lugares em cada circunscrição.

2- De seguida dividem-se os votos obtidos por cada partido pelo Q e apuram-se os


restos

3- Os lugares que sobram distribuem-se pelos restos mais altos

Este método é mais proporcional porque a % de lugares corresponde mais à dos


votos, e pequenos e grandes partidos são tratados mais igualmente
Vantagens do Sistema de representação Proporcional:

1) Distribuem melhor a representação parlamentar pelas várias forças políticas.


Os parlamentos espelham mais fielmente a diversidade de opiniões num país,
sendo um sistema mais justo e equitativo
Martim Ghira Campos

2) A proporcionalidade aumenta a representatividade e consequentemente a


legitimidade. Por esta razão se diz que este tipo de sistema é melhor para
escolher representantes, embora á custa da obtenção de maiorias, o que
dificulta a governabilidade

3) Leva mais forças políticas ao parlamento, fracionando mais a representação,


permitindo que um maior número de partidos tenha assento parlamentar,
permitindo mais facilmente a representação de minorias

4) É um sistema que ideologiza o sistema partidário, favorece a extremação de


posição do espetro partidário e reduz a maleabilidade negocial dos partidos,
tornando o sistema de partidos mais rijo e enfraquecendo o pragmatismo

5) Sendo necessariamente um sistema de listas, aumenta a partidocracia, os


eleitores votam em partidos, em listas, e não em pessoas. Esta prevalência dos
partidos faz com que os deputados gozem de uma menor autonomia, sendo
mais controlados pelos partidos.

6) A proporcionalidade afasta os cidadãos dos deputados, uma vez que os círculos


tendem a ser maiores, sendo difícil saber quem elegeu quem, evitando o
controlo sobre a atividade parlamentar

7) Reforçando os partidos e a partidocracia, promove a oligarquização interna dos


partidos e a sua rigidez organizativa, deteriorando a sua democracia interna

Evolução dos partidos políticos

a) Partidos de representação e partidos de integração

Partidos de representação  preocupados em garantir a representatividade dos


parlamentos e a estabilidade dos governos representativos, ainda não democráticos.

Eram grupos pouco homogéneos de deputados e de comités locais de notáveis, por


isso foram também chamados de partidos de notáveis. Os notáveis pertenciam à elite
aristocrática, tinham património próprio que lhes permitia administrar sem ganhar,
tinham cultura e direito de voto. Esta independência financeira garantia-lhes a
liberdade de decisão política

Eram uniões de burgueses unidos por convicções políticas comuns.


Estas uniões eleitorais só se transformam em partidos de massas com o alargamento
do sufrágio

Max Weber  são partidos de patrocínio (como chamou aos de cima), quando
procuram alcançar o poder para o chefe e benefícios para os quadros, resultantes da
ocupação de lugares na administração. São partidos de status quando dirigidos por
Martim Ghira Campos

interesses de um status ou classe. São partidos ideológicos quando dirigidos por fins
objetivos concretos ou princípios abstratos

Fim  São partidos eleitoralistas e parlamentaristas, querendo exclusivamente ganhar


eleições, conquistar o Parlamento e o governo do Estado, não olhando para a
sociedade

Composição  Não têm bases organizadas, apenas quadros, preparados para atuar no
parlamento e no Estado. São partidos de quadros e não de militantes

São partidos de caciques, com forte influência local. O caciquismo traduzia-se na


compra de voto apenas possível devido ao voto não ser secreto.

O parlamento é o lugar central da formação da vontade política, apoiado no princípio


da livre concorrência

Surge então um novo tipo de partidos que destrói o sistema parlamentar, os partidos
de integração, que aspiram a uma união dos cidadãos, não só política, mas que vai
para além do Parlamento

Intervêm em todos os domínios da vida ao alcance da política, autonomizam-se cada


vez mais do parlamento e atuam cada vez mais no terreno extraparlamentar

Com a democracia de massas surge o partido de integração, que exige aos seus
aderentes não só uma adesão permanente e um pagamento de quotas, mas também
uma influência crescente em todas as esferas da vida quotidiana do individuo

Foram estes partidos que promoveram a integração das massas na política moderna

b) Catch-all-party de Kirchheimer

Caracteristicas:

1- É um partido interclassista e aglutinador de origens sociais e matrizes culturais

O que o caracteriza é a sua homogeneidade social. O partido político deixa de


corresponder a uma clivagem social especifica e passa a ter membros de várias
origens sociais no seu interior. Este partido recruta todos os estratos sociais

2- Drástica redução da ideologia

Os partidos pragmatizaram-se e tornaram-se heterogéneos do ponto de vista


ideológico. Prevalecem as táticas a breve prazo, em detrimento das grandes
visões estratégicas a longo prazo. O imediatismo pré-eleitoral substitui a visão
última, os fins da história.
Martim Ghira Campos

Os partidos de integração eram partidos de programa, os catch-all-parties são


partidos de compromissos

3- Reforço dos grupos dirigentes do vértice

O que unifica o partido deixa de ser uma coesão social ou uma visão ideológica
e passa a ser um grupo dirigente. O partido personaliza-se, passando a
depender da figura dos seus líderes.
O financiamento dos partidos passa a depender muito mais do Estado e menos
da sociedade, tornando os dirigentes mais livres dos aparelhos partidários.
Com as novas tecnologias de marketing passaram a poder dirigir-se mais
facilmente aos eleitores de forma direta

4- Diminuição do papel do individuo, membro do partido

Os partidos deixam de ser instituições de pertença e passam a ser instituições


de referência

5- Menor acentuação da “classe gardé”, de uma classe ou clientela eleitoral

Classe e religião influenciam menos no voto e na configuração dos partidos


Os partidos deixam de ter base confessional ou social
Desaparecem os eleitorados fixos, as bases sociais, as fidelidades eleitorais,
passando a haver uma variedade de clientelas

6- Mercantilização do partido e da política. O partido oferece produtos aos


consumidores políticos, como “marca” comercial

7- Diminuição das fidelidades e aumento da volatilidade eleitoral

8- Influência crescente de fatores circunstanciais

9- Maior independência dos partidos em relação aos grupos de interesses. Maior


abertura ás exigências de vários grupos sociais

10- Alargamento dos objetivos dos partidos aos nacionais: educação, bem-estar,
saúde...

11- Diminuição das necessidades de segurança

c) Partido Cartel de Richard Katz e Peter Mair

Este é um novo modelo de interpretação da mudança nos partidos nas democracias


mais desenvolvidas
Martim Ghira Campos

Vai incidir sobre as mudanças ao nível das relações entre os partidos e o Estado, e as
mudanças ao nível da organização dos partidos

A noção de partido cartel vem substituir a noção de partido de governo, pois são os
partidos do arco da governação que se parecem mais com o modelo de partido cartel,
contrariamente aos partidos marginais ao governo ou antissistema, que não se
organizam do mesmo modo

A possibilidade de existir um partido cartel varia com os sistemas políticos e os tipos de


democracia, sendo mais comum em democracias consociativas do que em
democracias maioritárias

O que caracteriza o partido cartel é a mais estreita ligação dos partidos ao Estado, uma
“compenetração do partido e do Estado”, criando uma nova conceção de democracia
caracterizada por um “modelo de conluio interpartidário”

O partido fica cada vez mais ancorado ao Estado e cada vez menos à sociedade, sendo
cada vez mais dependente de financiamento do Estado.

O modelo normativo de democracia muda com os partidos cartel, pois deixa de ser um
processo de estabelecimento de limites ao Estado pela sociedade, passando a ser um
serviço do Estado à sociedade.

Os partidos carteis deixam de transmitir demandas ao Estado dos grupos sociais. Os


grupos sociais formulam eles próprios essas demandas aos partidos e ao Estado

Os partidos carteis criam mecanismos auto-protetivos, minimizam a competição


interior e protegem-se das insatisfações eleitorais

Segundo Katz, a democracia transforma-se com o advento dos partidos carteis: o


processo através do qual a sociedade civil controla o Estado, passa a ser um processo
de fornecimento de serviços pelo Estado, que fornece também as eleições e os
partidos típicos da democracia

O cartel de partidos manifesta-se de duas maneiras:

1- Conspirando para obter subsídios do tesouro público, já que as fontes


tradicionais de financiamento não satisfazem a crescente procura. Se a
vitalidade dos partidos é essencial à democracia, então o Estado tem de
assegurar essa vitalidade (os partidos)

2- Limitando a concorrência entre políticas  os partidos cartelizam o mercado


dos votos, tornando-o num oligopólio, apenas acessível a alguns.

Os partidos cartel sobrevivem de duas maneiras  reduzindo as expectativas do


público e passando a responsabilidade da política monetária a bancos centrais
Martim Ghira Campos

independentes; fazendo pactos de estabilidade em matéria de politica fiscal, reduzindo


o espetro politico das questões em que podem competir, alienando responsabilidades

A cartelização aumenta os incentivos a permanecer fiel ao cartel

Os riscos que correm os partidos cartel são a defeção interna de um dos seus membros
e o ataque do exterior

Características:

1- Objetivos políticos  deixam de ser a distribuição de privilégios (partidos de


notáveis), as reformas sociais (partidos de massas), melhorias sociais (catch-all-
parties), passando a ser reivindicações correntes sobre a eficiência e eficácia
das respetivas gestões

2- Competição entre partidos  é controlada e gerida pelo recíproco interesse da


sobrevivência organizadora coletiva. Deixa a segmentação do eleitorado em
círculos exclusivo (partidos de massas) e a extrema competitividade por
questões de eficácia política (catch-all-parties)

3- Recursos  as campanhas são profissionais e centralizadas, quase


exclusivamente com uso intensivo de capital e recursos vindos de subvenções
estatais

4- Inscritos e liderança  a diferença entre inscritos e não inscritos não é tão


clara, pois a mobilização é dos apoiantes: prevalece uma visão otimista da base
do partido, com filiações não tanto locais, mas diretamente centrais,
minimizando as organizações locais

Sistemas Parlamentares

a) Origens dos Parlamentos

Os parlamentos surgem com a divisão do poder, com a separação do poder executivo,


legislativo e judicial, e com o controlo do poder executivo pelo legislativo. Os
parlamentos nascem com o intuito não só de temperar o poder executivo, mas
também com a intenção de assumir o encargo de fazer leis, no quadro do “governo da
lei”

O primeiro parlamento surge em Inglaterra com o intuito de contrabalançar e limitar o


poder do rei.

Os primeiros parlamentos, como anota Giovanni Sartori, estavam situados no exterior


do Estado, com a função de pressionar a partir de fora. Com o tempo, passam de
órgãos externos a órgãos internos  O parlamento não governa, mas aprova leis
Martim Ghira Campos

O parlamento torna-se corpo legislativo não tanto para fazer leis, mas para impedir
que estas sejam feitas pelo Rei de maneira discriminatória

A função legislativa do parlamento é entendida como uma função de controlo da


legislação, que o parlamento tem vindo a perder.

Com o tempo, passou-se da limitação do executivo, à subordinação do próprio


executivo ao legislativo, havendo partilha do poder entre ambos

Os parlamentos têm hoje funções de representação, de controlo legislativo e de


controlo político

b) Parlamentos e democracia

O parlamento é uma exigência da democracia, sendo uma condição necessária – já que


não há democracia sem parlamento – mas não suficiente, pois existem parlamentos
não democráticos.

O parlamentarismo constitucional, por exemplo, não era democrático, uma vez que
não existia responsabilidade do governo perante o legislativo ou o eleitorado.

Max Webber  a parlamentarização e a democratização não são necessariamente


recíprocos entre si, estão até muitas vezes em contraste

Uma democracia sem parlamentarismo, meramente passiva, seria uma burocracia, e a


economia estacionaria com a abolição dos interesses racionalizados. Por isso, o
parlamento é indispensável mesmo nas democracias eletivas, e além disso nas
monarquias hereditárias

A crise do parlamentarismo liberal, que motivou o seu colapso perante surtos


autoritários em muitos países, foi motivada pelo enfraquecimento dos parlamentos
perante a ascensão dos partidos de massas, atuando fortemente no exterior dos
parlamentos, com a consequente transferência do poder para as direções dos partidos,
e com a debilitação dos executivos perante a ascensão do partidarismo parlamentar
excessivamente fracionado.

c) Funções e tipos de parlamentos

O parlamento é o órgão do poder legislativo, onde se reúnem os representantes


eleitos do povo. A primeira função do parlamento é a função legislativa, que consiste
na transformação das propostas de lei do governo e dos projetos de lei dos vários
partidos parlamentares em leis
Martim Ghira Campos

A feitura de leis não é a principal, nem exclusiva, função  Os parlamentos existem


para estabelecer a mediação e a comunicação entre o Rei e os súbditos, entre o
governo e os cidadãos (função de legitimação da autoridade governativa, através da
garantia da representação)

Os parlamentos têm ainda a função de representação política do povo. A


representação parlamentar é especificamente política

Quem está representado no parlamento são os partidos que enquadram e


representam as várias correntes políticas

Para além da função legislativa e representativa, o parlamento tem a função de


controlo político do governo e da administração pública

Em suma, os parlamentos medeiam, recrutam líderes e gerem conflitos

Max Webber distingue os parlamentos em:

1. Parlamento ativo  o único que pode constituir um terreno adequado para


que cresçam e ascendam nele, por via da eleição, qualidades não só de
comando, mas também políticas de chefe. Colaborando, controla
interruptamente a administração

2. Parlamento Perorante

Polsby distingue os Parlamentos Arenas dos Parlamentos Transformadores, consoante


o seu grau de independência de influências exteriores.

Parlamentos transformadores  são aqueles que possuem uma capacidade


independente para transformar propostas em leis (Ex: Camara dos representantes dos
EUA) (ativo)

Parlamentos Arenas  são mais abertos à interferência de forças políticas


significativas na vida do sistema político (Ex: parlamento britânico) (perorante)

Esta diferenciação dos parlamentos aponta menos para uma dicotomia e mais para um
contínuo

Os parlamentos são arenas ou transformadores consoante desempenham mais


acentuadamente a função política ou a função legislativa

As arenas adotam como método principal a dissuasão, os transformadores a


negociação

Os parlamentos arenas pressupõem partidos fortes, que fazem do plenário o seu


centro, porque são parlamentos de discussão política
Martim Ghira Campos

Os parlamentos transformadores, de partidos fracos, valorizam sobretudo o espaço


das comissões onde se desenrola o principal trabalho da produção legislativa, através
da negociação. Como sublinha Polsby, a existência de comissões pode ser uma
condição necessária de independência legislativa.

 Segundo Polsby, as arenas caracterizam-se por “comissões parlamentares


truncadas” e pela importância da “composição social dos parlamentos”. O impacto das
forças externas é decisivo para o resultado legislativo. Para compreender este tipo de
Parlamento, é fundamental a base social dos legisladores, o recrutamento
parlamentar, os grupos de pressão, os partidos extraparlamentares, a organização dos
partidos e o debate

 Nos transformadores, as formas de deliberação são mais baseadas na consulta na


negociação, que têm lugar nas comissões. A estrutura interna e as normas de
funcionamento são mais relevantes para o resultado legislativo. A análise deste tipo de
Parlamento, pede o estudo das estruturas das comissões e os processos de nomeação,
os processos de socialização institucional e a perceção e regulação dos interesses pelas
legislaturas.

Três variáveis que influenciam a independência e a capacidade transformativa dos


parlamentos:

1) Quanto mais ampla a coligação abraçada pelos grupos parlamentares


dominantes, mais transformativos são os parlamentos

2) Quanto menos centralizada e hierárquica for a gestão dos partidos


parlamentares, mais transformativos são os parlamentos

3) Quanto menos fixa e assegurada for a composição das maiorias parlamentares


em sucessivas questões especificas, mais transformativos são os parlamentos.

Sistemas Parlamentares: monocameralismo e bicameralismo

A maioria dos Parlamentos do mundo são monocamaralistas, no entanto,


historicamente falando, os primeiros parlamentos começam todos por ser
bicameralistas, sendo a Câmara Alta por nomeação régia e a Câmara Baixa por eleição
popular.
Martim Ghira Campos

O bicameralismo é mais frequente em países de grande extensão ou dimensão,


normalmente justifica-se por uma maior qualidade da legislação e pela maior
quantidade da representação – leis feitas por duas Câmaras, de forma mais cuidada e
demorada, tendem a ser melhores leis. Duas Câmaras representam mais e melhor os
interesses de uma sociedade do que uma só. É mais adotado pelos Estados Federais

O monocameralismo é particularmente usado em países de pequena extensão


territorial e de reduzida dimensão demográfica, de acentuada homogeneidade étnica e
cultural, funcionando como substituto da segunda Câmara o Conselho de Estado, ou as
direções partidárias, ou o Tribunal Constitucional. É mais adotado pelos Estados
Unitários.

Enquanto que as estruturas de parlamento monocamerais são muito idênticas, os


parlamentos bicamerais diferem. Segundo Lijphart, as várias modalidades de
bicameralismos dependem dos poderes que dispõem e da composição e modo de
eleição.

 Segundo os poderes que possui a segunda Câmara, os bicameralismos


podem ser simétricos (quando as duas câmaras dispõem de idênticos poderes
formais) ou assimétricos (quando uma das Câmaras tem maior poder que a
outra)

 Segundo a composição, temos bicameralismos congruentes (quando ambas


as câmaras têm sensivelmente a mesma composição, sem sobre
representações de minorias) e bicameralismos incongruentes (quando difere a
composição das duas Câmaras)

Bicameralismo Sólido  Câmaras incongruentes e simétricas


Bicameralismo atenuado  Câmaras congruentes e simétricas
Bicameralismo Débil  Câmaras incongruentes e assimétricas
Bicameralismo Insignificante  Câmaras incongruentes e assimétricas

Sartori simplifica os bicameralismos numa nova tipologia:

 Forte (assimétrico) e débil (simétrico), consoante têm força igual ou desigual


 Perfeito (paridade de poderes) ou imperfeito (poderes distintos)
 Semelhante (quando têm a mesma natureza eleitoral e ambas representam a
população e não territórios) ou diferenciado (quando não são eleitas as duas,
são eleitas por sistemas diferentes, ou representam coisas distintas)

Geralmente a Câmara Alta tem menor dimensão do que a Câmara Baixa, mas a
duração dos mandatos é maior. Normalmente as Câmaras Altas têm renovação
escalonada (mudam todas de uma vez), ao contrário da renovação integras das
Câmaras Baixas.
Martim Ghira Campos

A importância da Câmara Alta varia com a forma de constituição, com as competências


ou poderes, e com a natureza de representação. Em geral, as Altas são mais fracas do
que as Baixas, sendo que essa força depende do ativismo, da existência ou não de
poder de veto e ainda do que representam (regiões, cidadãos)

As Câmaras Altas destinam-se a controlar as Baixas, através de um sistema de filtros,


no entanto, a Câmara baixa prevalece e é mais forte

Segundo Sartori, as Câmaras são iguais se têm apenas um poder retardante, ou


desiguais se têm um poder de veto que não seja anulável por uma maioria simples. O
bicameralismo é forte quando a Câmara Alta tem poder de veto absoluto e é débil
quando tem apenas poder retardante.

O bicameralismo perfeito funciona quando as duas Câmaras têm a mesma maioria.


Duas maiorias hostis, exigem um governo de coligação

O bicameralismo é defendido por corrigir excessos e abusos da primeira câmara, por


emprestar maior competência e experiência ao processo legislativo, e por evitar a
precipitação na tomada de decisões em matéria legislativa.

O monocameralismo é defendido como sendo mais democrático (a Segunda Câmara


foi vista como um instrumento nas mãos da Coroa, sendo um elemento do “poder
moderador”). A divisão do legislativo e os conflitos entre câmaras enfraquecem os
Parlamentos. Como contrapartida, o monocameralismo é atacado por ser mais típico
das situações revolucionárias, por permitir decisões mal ponderadas e por facilitar o
despotismo e a tirania.

Sistemas de Governo

Sistema de Governo é a estrutura institucional de relacionamento do governo com o


Parlamento e com a chefia do Estado. Os sistemas de governo dependem dos sistemas
parlamentares e das formas de chefia do Estado.
Martim Ghira Campos

A divisão que se estabelece é:

 Sistemas de governo Parlamentaristas, onde o parlamento assume maior


relevância institucional

 Sistemas de governo Presidencialistas, onde a chefia de Estado presidencial


prevalece sobre os demais órgãos institucionais

O parlamentarista, caracteriza-se pela mútua dependência de poderes, em que o


governo tem o poder de dissolver o parlamento, e o parlamento tem o poder de
demissão do governo. É um sistema de controlo mútuo entre o governo e o
parlamento, em que ambos podem fazer cessar o funcionamento do outro.
O governo é um governo de leis e há uma interdependência por integração, ao
contrário da separação total do sistema presidencial  o sistema de governo
parlamentar é um modelo de governo em que o executivo deriva do legislativo, é
nomeado por ele e é responsável perante ele

O sistema de governo presidencialista, pelo contrário, caracteriza-se pela separação


de poderes, em que nem o executivo presidencial pode dissolver o parlamento, nem o
parlamento pode interromper as ações do executivo presidencial.
Neste sistema, o presidente deriva de eleição geral e o seu governo não depende do
parlamento

No parlamentarismo existe uma “interdependência de fusão” entre os órgãos de


Estado. No presidencialismo existe uma “interdependência por coordenação”.

Os grandes países, mais extensos e populosos, tendem a ter sistemas presidencialistas,


enquanto que os menores adotam mais facilmente sistemas parlamentaristas

Debate sobre qual o melhor sistema de governo:

 Linz  defende o sistema parlamentarista argumentando que confere maior


flexibilidade ao sistema político, provada pela moção de censura, que resolve
conflitos entre o governo e o parlamento, uma vez que o governo é mantido
pelo parlamento

 Lijphart  demonstra que o presidencialismo tende para “democracias


maioritárias” e o parlamentarismo para “democracias consociativas”. Os riscos
de conflito são maiores no presidencialismo, e as hipóteses de negociação são
maiores no parlamentarismo

O presidencialismo conduz muitas vezes a ditaduras, existindo quase uma relação


entre a rigidez do presidencialismo e o colapso das democracias.

O presidencialismo goza de menos apoio de maiorias e tem pouco incentivo à


formação de coligações maioritárias, sendo uma democracia mais frágil.
Martim Ghira Campos

Em suma, o parlamentarismo apoia melhor a consolidação das democracias. O


presidencialismo foi adotado em países recém-chegados à independência, com o
intuito de garantir a estabilidade governativa, no entanto, contribuiu para a formação
de regimes ditatoriais e autoritários

Os sistemas presidenciais incentivam mais acordos eleitorais e não acordos de


governo, sendo contrários aos sistemas parlamentares. Nos sistemas parlamentares os
partidos são mais disciplinados, no entanto, as decisões são mais transparentes nos
sistemas presidenciais

Governos Parlamentaristas

O que o caracteriza é o facto de retirar a sua autoridade da confiança que lhe confere o
parlamento, ou por maiorias parlamentares ou pela tolerância parlamentar para com
governos minoritários

Existem várias formas de governo parlamentar, que dependem do poder da


assembleia sobre o governo e da posição do chefe do governo em relação aos demais
membros

Sartori distingue o governo de gabinete (em que o governo prevalece sobre o


parlamento), do governo de assembleia ou de parlamentarismo puro (a atuação do
governo é praticamente impossível, porque está subordinado e limitado pelo
parlamento), do parlamentarismo controlado pelos partidos

Posição do Primeiro Ministro:

 Governo de Gabinete  é um “primus acima de desiguais” porque além de


líder de Governo é também líder de partido

 Governo de Assembleia  é um “primus entre iguais” que cai com o seu


governo, ou seja, na realidade não e um primus

 Parlamentarismo controlado pelos partidos  é um “primus entre desiguais”


que pode permanecer na chefia do governo mesmo quando caem alguns dos
seus ministros

a) Governo de Assembleia ou Governo de Convenção

Usado pela primeira vez na Revolução Francesa, e usado posteriormente na Revolução


Soviética.
Martim Ghira Campos

É uma forma de governo autocrático, sob pretexto democrático. Houve vários


exemplos históricos em Inglaterra, França, Confederação Suíça, governo dos Landers
alemães no começo da República de Weimar, Turquia, URSS e aos países do bloco leste
sob domínio soviético

O Governo de Assembleia é a plataforma plenamente arquidemocrática através da


qual se pode instalar um governo autocrático, ou de uma pessoa (ditador) ou de um
Comité, ou de uma Junta, ou de um partido. É talvez esta a razão da preferência
comunista por este tipo de governo

Características:

 A Assembleia tem o poder absoluto sobre os demais órgãos, incluindo o poder


executivo, que não tem autonomia perante a Assembleia

 Não há duas câmaras, nem separação de poderes. O governo da Assembleia, só


é responsável perante o eleitorado, não existindo qualquer poder de dissolução

 Os ministros são comissários, têm apenas funções técnicas de execução, e só


recebem instruções da Assembleia

b) Governo Parlamentar

Assenta na separação de poderes e há um dualismo de poder na determinação das


decisões políticas. O Governo é um governo de leis e equilibra-se com o Parlamento
(imbricam-se)

Ao contrário do sistema presidencial, há uma interdependência entre o Governo e a


Assembleia.

Há vários tipos de governo parlamentar:

 Governo de gabinete inglês

Traduz uma clara preponderância do Governo sobre o Parlamento

O Gabinete, pequeno comité dos líderes do partido maioritário, é nomeado pelo Rei,
com aceitação das Câmaras. O Gabinete é o mediador entre o Rei e o Parlamento e
tem funções governativas e políticas

O Governo é de maioria parlamentar, os Ministros são parlamentares e estão


presentes nas reuniões das Câmaras

Regra geral, o Governo é monopartidário, baseado num sistema eleitoral maioritário


uninominal, que produz um sistema bipartidário
Martim Ghira Campos

O Governo controla o Parlamento e o Parlamento controla o Governo. A


responsabilidade política traduz-se não por demissão do Governo, mas por dissolução
do Parlamento

Características:

 Os membros do Governo são simultaneamente membros do Parlamento. O


Governo é um comité da Assembleia, pela simples razão de que a Assembleia
pode controlar melhor os ministros que sejam membros dela

 O Gabinete é constituído pelos chefes do partido maioritário ou dos partidos


que, coligados, tenham maioria

 Estrutura piramidal do governo: o Primeiro Ministro tem supremacia sobre os


demais ministros, mas o governo é um “órgão coletivo” com solidariedade
governamental e responsabilidade comum. Os ministros não são meros
colaboradores do Presidente (executores das suas decisões), mas formam um
gabinete

 O Governo permanece no poder apenas enquanto dispuser do apoio da


maioria

 A decisão política está distribuída pelo governo e pelo parlamento

 O Parlamento e o Governo controlam-se reciprocamente: o Governo é


responsável perante o Parlamento, que o pode demitir através de moções de
censura ou de confiança. O Parlamento depende do Governo que o pode
dissolver

Governos Presidenciais

O Presidencialismo é um sistema de governo forte, concebido nos EUA, com


determinadas características que fazem o seu tipo ideal

O presidencialismo é um sistema de separação de poderes:

 O Governo e o Parlamento estão separados


 O executivo é unipessoal (Presidente)
 O Presidente tem uma legitimidade eleitoral diferente da do Parlamento
 O Presidente tem um mandato fixo, mas pode ser reeleito
 O Presidente tem os seus poderes garantidos pela Constituição
Existe uma incompatibilidade pessoal de desempenhar uma função executiva e
legislativa, pois era necessário ser simultaneamente membro do executivo e do
Congresso

Características:
Martim Ghira Campos

1) O Presidente é eleito diretamente pelos cidadãos e não pelo Parlamento, por


períodos fixos constitucionalmente pré-definidos. Não pode ser reeleito mais
do que uma vez

2) O parlamento também é eleito pelos cidadãos, logo o presidencialismo é um


sistema de dupla responsabilidade democrática, não permitindo a coincidência
da maioria parlamentar com a presidencial

3) A duração dos cargos do Parlamento e do Presidente são independentes,


determinando a rigidez do sistema presidencial

4) Uma vez que o Presidente é eleito por um sistema maioritário (sistema de


“soma zero”, o presidencialismo tende a gerar uma democracia maioritária,
sendo esta uma fraqueza do sistema

5) É um sistema mais agressivo e favorece a concentração maioritária do poder,


desfavorecendo o consenso

6) O presidencialismo desencoraja o multipartidarismo e a disciplina e coesão


partidária. Opondo-se à política proporcional, reduz o número de partidos e a
sua disciplina interna

7) Paradoxo  por um lado pretende favorecer um executivo forte e estável, por


outro teme a pessoalização do poder que provocam, limitando-o por vários
mecanismos

8) Proporciona governos mais estáveis e duradouros, delimitados no tempo e com


restrições à reeleição

9) Favorece a identificação da pessoa do presidente como chefe supremo das


Forças Armadas

10) Sistema de separação de poderes e não de concentração de poder:

a. O presidente, chefe do executivo, não é responsável perante o


Congresso (legislativo), que não o pode destituir. O Congresso não pode
ser dissolvido pelo Presidente
b. O Parlamento e o Governo são incompatíveis (não se pode ser membro
de ambos)
c. O Presidente não pode ser membro do Parlamento (o PM pode)
d. O Parlamento não pode demitir o Governo
e. O Presidente nomeia e demite os membros do executivo
f. Não existem moções de confiança nem de censura
g. O Chefe de Governo é eleito pelo povo e não designado pelo
Parlamento
h. O Chefe do Governo é um primus solus
Martim Ghira Campos

i. É um sistema equilibrado entre o governo e o parlamento, de checks


and balances

11) O Presidente é Chefe do Estado e do Governo, não existindo uma autoridade


dual entre o presidente e o governo. O Presidente dirige o Executivo, sendo
que o Executivo é de uma pessoa e não de um coletivo colegial

12) Os membros do Governo são conselheiros do Presidente e executam as suas


decisões. São nomeados pelo mesmo sem intervenção do legislador

13) O Presidente tem poderes de iniciativa e o Congresso poderes de controlo e


fiscalização

14) O Presidente não é líder de partido e recebe um mandato nacional

15) O Presidente tem direito de veto e o Senado ratifica tratados e confirma a


nomeação de funcionários

Segundo Sartori, há 3 características que definem o presidencialismo:

1. Eleição popular do Chefe de Estado


2. Que não pode ser objeto de voto de desconfiança por um voto parlamentar
3. Que preside ou dirige o governo por si nomeado

Segundo Lijphart, enuncia seis:

1. O Presidente não pode dissolver o Parlamento

2. O Presidente tem o direito de veto sobre as leis, que só pode ser superado por
maiorias qualificadas extraordinárias

3. O Presidente pode nomear membros do governo sem intervenção do


Parlamento

4. O Presidente é chefe de governo e chefe de Estado

5. O Presidente não pode exercer mais de dois mandatos

6. O Presidente não pode ser simultaneamente membro do Parlamento

O Presidencialismo está mais associado ao sistema maioritário e ao bipartidarismo,


sendo tipicamente americano
Presidencialismo norte-americano

O modelo de Washington é um sistema de checks and balances, que se caracteriza por


um executivo que subsiste separadamente do parlamento. É um governo dividido
Martim Ghira Campos

O Presidente concentra a dignidade de um rei e o poder de um Primeiro Ministro

Os membros do gabinete não podem ser membro do Congresso e são essencialmente


conselheiros do Presidente, e não um conselho de colegas com quem o Presidente tem
que trabalhar. Podem influenciar decisões, mas não controlar

Só o Presidente é responsável pelos seus atos, não havendo responsabilidade coletiva.


Os atos não têm impacto sobre o Congresso ou a Nação.

O Presidente não é senhor do Congresso, tem direito de veto e sendo líder do partido,
não lidera no Congresso, podendo, no entanto, influenciar o Congresso

O Senado americano confirma as nomeações de embaixadores e outros


representantes diplomáticos, confirma ou rejeita e emenda tratados, apenas por
maioria simples

A separação de poderes e a distribuição de funções entre os Estados e a Federação,


confere um governo forte

O Presidente é o chefe de Estado e de Governo, reina e governa, nomeia e destitui,


apresenta e executa o orçamento federal, é o Comandante Supremo das Forças
Armadas, Chefe da Diplomacia e do processo legislativo

Para alem destas funções, ele é  chefe do seu partido, porta-voz do povo, protetor
da paz, gestor da prosperidade e líder mundial

Todo este poder é limitado pelos poderes legislativos do Congresso e pelos poderes
negativos do Senado, pelo poder de investigação e de “impeachment” judicial, e pela
administração federal e opinião pública

Sistemas de Governo mistos: Semipresidencialistas ou de Parlamentarismo


racionalizado

a) Elementos de caracterização
Martim Ghira Campos

Combinam elementos de presidencialismo e de parlamentarismo, ou seja,


caracterizam-se pela coexistência de um Governo de tipo parlamentar e de um Chefe
de Estado do tipo presidencial

São sistemas não de separação de poderes, mas sim de repartição de poder  o


Presidente partilha o poder com o Chefe de Governo, governo esse que goza de apoio
parlamentar

Os sistemas mistos de executivo bipolar, caracterizam-se por ter um Presidente eleito


pelo povo, por sufrágio universal, direta ou indiretamente. Um PM e um Governo que
necessitam da confiança do Parlamento, e são responsáveis perante o mesmo. Isto faz
com que o Presidente não tenha apenas uma figura simbólica e tenha poder no
processo de governação

Segundo Sartori, as características definidoras de um sistema semipresidencial são:

1) O Chefe de Estado (presidente) é eleito com o voto popular, direta ou


indiretamente

2) O Chefe de Estado partilha o poder executivo com um PM, partilhando uma


autoridade dual, assim caracterizada:

a. O Presidente é independente do Parlamento, mas não lhe é permitido


governar sozinho ou diretamente, tendo de ser mediado pelo seu
Governo

b. O PM e o Governo são independentes do Presidente, na medida em que


são dependentes do Parlamento, sujeitos à sua confiança ou censura,
precisando de maioria Parlamentar

3) A autoridade dual consente diversos equilíbrios e situações mutáveis de poder


no executivo

Os sistemas mistos possuem características do parlamentarismo:

1. O Governo depende dos resultados das eleições legislativas

2. O Governo é responsável perante o Parlamento, que apoia o seu programa,


confirmando-o através de moções de confiança, ou demitindo-o através de
moções de censura**

3. O Parlamento é dissolúvel
**O Governo pode ser derrubado pelo Parlamento:

Iniciativa do Parlamento  Moção de censura  tem o objetivo de derrubar o


governo por discordância da forma como governa
Martim Ghira Campos

Iniciativa do próprio Governo  Moção de Confiança  O Governo “questiona” o


Parlamento se o mesmo lhe dá confiança para governar

Os sistemas mistos também possuem características presidenciais, tais como:

1. Eleição direta ou indireta do Presidente pelo povo, por sufrágio universal

2. O Governo é responsável perante o Presidente, que o pode demitir

3. Amplos poderes do Presidente, tais como veto suspensivo, poder de demissão


do governo e de dissolução do Parlamento

O que caracteriza o sistema misto é também a coexistência de duas legitimidades


eleitorais gerais (o Presidente e o Parlamento) e a dupla responsabilidade política do
governo perante o Parlamento (aprova o plano) e o Presidente (nomeia)

O equilíbrio deste sistema requer que o Presidente disponha de poderes arbitrais de


conflitos, de moderação e de intermediação, de compensação da fragilidade de
minorias políticas, de resolução de crises.

b) Tendências evolutivas dos sistemas mistos

Sartori  diz que o semipresidencialismo é um sistema de dois motores, um


parlamentar e outro presidencial, em que o último funciona quando o primeiro
deixasse de funcionar. É um sistema bimotor em que os motores não funcionariam ao
mesmo tempo, sendo por isso um presidencialismo alternante, com mandato do
Presidente coincidente ao do Parlamento

Lijphart  diz que mais do que uma síntese dos sistemas presidencialista e
parlamentarista, são uma alternância entre fases presidenciais e fases
parlamentaristas

Se num sistema misto prevalecem as características presidencialistas, temos um


Semipresidencialismo. Se prevalecem as parlamentaristas, temos um
Parlamentarismo Racionalizado ou Misto

O sistema tem fases oscilantes, sendo presidencial perante maiorias coincidentes


(quando as maiorias presidencial e parlamentar são da mesma orientação partidária) e
parlamentar perante maiorias dissonantes na presidência e no Parlamento (situação
de coabitação)

c) Presidentes e Governos

Nos sistemas mistos existem Presidentes executivos que partilham o poder executivo e
Presidentes orientadores que têm um mero poder de influência ou de orientação, sem
partilhar o poder executivo.
Martim Ghira Campos

Nas situações em que o poder executivo é partilhado e as maiorias coincidem, a


primazia é do Presidente.
Nas situações em que o poder executivo é partilhado e as situações são de coabitação,
a vantagem tende a ser do PM

Os sistemas mistos de governo podem ser  sistema presidencial-parlamentar ou


sistema premier-presidencial

Os Presidentes podem ser:

 Minoritários  em situações de governos minoritários, parlamentarmente


mais frágeis. A capacidade de intervenção do Presidente tende a aumentar

 Maioritário  em situações de governos maioritários, acentuando a vertente


presidencialista. O Presidente tem uma capacidade de intervenção diminuída
devido ao facto de o governo gozar de maioria confortável no Parlamento

Características do sistema de governo português:

O Sistema de governo acordado entre os militares do MFA e os partidos em 1976, tem


características típicas de presidencialismo e de parlamentarismo, sendo, portanto,
misto.

Parlamentarista:

1. O Governo é formado, atendendo aos resultados das eleições legislativas, e não


de eleições presidenciais

2. O Governo, por este facto, é responsável politicamente perante o Parlamento,


que aprova o programa e lhe dá confiança ou censura, podendo fazer cair o
Governo

Presidencialista:

1. Eleição por sufrágio direto e universal do Presidente da República, cuja


candidatura é apresentada não pelos partidos, mas sim pelos cidadãos, numa
tentativa de despartidarizar a eleição e a função

2. O Governo é também responsável perante o Presidente, que o pode demitir

3. O Presidente possui amplos poderes, quer extraordinários (demissão do


Governo e dissolução do Parlamento), quer ordinários
Martim Ghira Campos

O que diferencia o sistema português de um presidencialismo puro, é o facto de o


Presidente não deter o poder executivo, que pertence exclusivamente ao Governo. O
Presidente não governa, preside

No entanto, também não é meramente representativo como nos sistemas


parlamentaristas, pois possui poderes de demissão do Governo e dissolução do
Parlamento

O que distingue de um parlamentarismo puro, é o facto de o Presidente não ser eleito


pelo Parlamento, mas sim pelo povo, conferindo poderes especiais de dissolução do
Parlamento e de não ser responsável perante o mesmo

Além disso, o Presidente possui um poder próprio de orientação superior do Estado,


que advém da autoridade e legitimidade que possui

O Presidente, não exercendo funções executivas, não é responsável pela governação.

Não existe um consenso acerca da interpretação do sistema de governo português. A


escola constitucionalista de Lisboa considera-o semipresidencialista devido aos traços
presidencialistas prevalecerem aos parlamentaristas. A escola constitucionalista de
Coimbra inclina-se para o considerar parlamentar racionalizado pelas razões opostas.

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