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Breve biografia de nosso patrono Dom Barreto

Aula 1: Infância, vocação, seminário e primeiras freguesias

I – Introdução
“Homem forte”, de temperamento enérgico e polêmico.
A expressão foi tema de uma conferência sobre d. Francisco de Campos Barreto
pronunciada por mons. Luiz Fernandes de Abreu em 11 de setembro de 1961 na casa
generalícia das missionárias: «Não haveis de estranhar que eu tenha tomado por tema:
“O homem forte”. (...) A minha palestra é expressão de uma alma reconhecida e que
pôde apreciar durante muitos anos, a personalidade ímpar do Sr. Dom Barreto e,
podendo, portanto, afirmar: ele teve as características todas de um santo. (…) Eu não
verei, (estou com 64 anos), não verei a canonização de Dom Barreto, mas eu tenho
certeza, certeza segura de que mais hoje mais amanhã será instaurado o processo de
canonização de Dom Barreto, porque ele foi o homem de Deus, ele teve todos os sinais
do homem escolhido por Deus para as grandes realizações, ele teve o espírito e teve as
marcas de quem se entregando a Cristo realizava o que Cristo quis que fosse
realizado». ACG-MJC. armário 6. pasta «Fundador» 22. 1-15.

Apesar de poder ser considerado nosso contemporâneo, temos pouquíssimo material


disponível a respeito da vida de nosso patrono, assim sendo, foi usado como fonte
bibliográfica para esta aula, e para as próximas, quase que exclusivamente a tese de
licença do Padre Rafael Capelato na Pontificia Universitá Gregoriana no ano de 2011.
Padre Rafael usou como fontes documentos pontifícios e episcopais, arquivos da Cúria
Diocesana de Campinas e Pelotas, arquivos da Casa Generalícia das Missionárias de
Jesus Crucificado e algumas publicações escritas pelo próprio Dom Barreto.
Em um brevíssimo resumo, podemos dizer que Dom Barreto foi o Primeiro Bispo de
Pelotas/RS, o Segundo Bispo de Campinas/SP e o Fundador da Congregação das
Missionárias de Jesus Crucificado (congregação esta que recebeu a Irmã Amália, a
mística vidente estigmatizada das aparições de Nossa Senhora das Lágrimas, que se
Deus nos conceder a graça, também abordaremos em futuras aulas), e desde nossa
fundação, em 07/03/2023, Patrono do Centro Dom Barreto.
II – Nascimento, despertar vocacional e seminário
Nosso pai, Dom Barreto, nasceu em Arraial dos Sousas, hoje Distrito dos Sousas em
Campinas/SP, em uma quarta-feira Santa, aos 28 de março de 1877. Filho de Joaquim
de Campos Barreto e Gertrudes Leopoldina de Moraes, sendo descendente por via
paterna do fundador de Campinas, Francisco Barreto Leme, de quem herdou o nome.
Foi batizado um mês após seu nascimento na Paróquia da Santa Cruz, em Campinas
(Matriz Velha de Campinas), e recebeu o nome de Francisco de Campos Barreto.
Oriundo de uma família de forte raiz católica, teve contato desde a infância com o
Apostolado da Oração, pois sua mãe era presidente do apostolado, o que o fez
despertar, desde cedo também, a devoção ao Sagrado Coração de Jesus (devoção esta
que marcou sua vida pessoal e sacerdotal, como veremos), seu pai foi um dos
primeiros membros da Conferencia Vicentina da Paróquia Santa Cruz, em Campinas.
Seu pai tinha por hábito reunir a família todas as noites para ler trechos dos livros: “O
Relógio da Paixão” e “Horas Marianas”, entre outras obras espirituais.
Sua família mudou-se do Arraial dos Sousas para Campinas, onde começou a se
dedicar ao comércio. Esta mudança foi providencial para a vocação de Francisco, aos 9
anos recebeu sua Primeira Eucaristia, pouco tempo depois ingressou na escola
paroquial de formação de acólitos e coroinhas, mantida por Padre Nery, futuro
primeiro bispo de Campinas, na Matriz Velha (Paróquia da Santa Cruz). Foi nesta escola
que Francisco recebeu sua formação religiosa e viveu o despertar de sua vocação.
“Se bem me lembro foi com 10 ou 11 anos que senti desejos de ser coroinha, por achar
bonito, tendo sido coroinha por 1 ou 2 anos, aos 13 fui ao Seminário, onde fiquei por
quase 11 anos”. (Dom Barreto)
Em 1890, aos 13 anos, Francisco ingressou no Seminário Episcopal de São Paulo, de
onde saiu ordenado sacerdote em 1900, aos 24 anos.
Não se destacou por suas notas, mas sim pelo zelo e piedade, principais qualidades
desejadas em um sacerdote. Amava a Liturgia, e esmero pelo Cerimonial, o que lhe
granjeou a estima de Dom Joaquim Arcoverde, futuro 1º Cardeal da América Latina e
do Brasil, Cardeal Arcoverde (Natural de Cimbres, onde em 1936 houveram as
aparições de Nossa Senhora das Graças). Foi no seminário que nosso pai Dom Barreto
recebeu inúmeros elogios de Dom Sebastião Leme, futuro Cardeal Leme, 2º Cardeal da
América Latina e do Brasil.
Foi ainda como seminarista, antes de sua ordenação diaconal que serviu como Mestre de
Cerimônia de Dom Joaquim Arcoverde, na antiga Sé de São Paulo, seus dias como
cerimoniário aumentaram ainda mais o seu amor, zelo e piedade pela Sagrada Liturgia.
O amor pela Sagrada Liturgia que despertou sua vocação sacerdotal nos bancos do
acolitato do Padre Nery, na Matriz Velha de Campinas, o acompanhou durante todos os
anos do seminário e mais tarde em suas paróquias e dioceses, onde no exercício de seu
episcopado era considerado intransigente nas observâncias das rubricas do Missale
Romanum.
Recebeu a unção sacerdotal na antiga Sé de São Paulo pelas mãos de Dom Antônio
Candido de alvarenga, em 22/12/1900.
Duas frases chamam a atenção no Santinho de recordação da ordenação presbiteral do
Padre Francisco de Campos Barreto:
- A.M.D.G.V.M – À Maior Glória de Deus e da Virgem Maria
- O feliz exercício é a Santa Missa, na qual Aquele que me criou deu-me o poder de
também o criá-lo.
III – Primeiras Freguesias
Após sua ordenação sacerdotal foi nomeado Vigário para a recém criada Freguesia de
Santo Antônio de Vila Americana, atual cidade de Americana/SP, em 1901, uma
localidade com forte presença de protestantes oriundos da América do Norte. O Recém
ordenado Padre Francisco de Campos Barreto teve muito trabalho para despertar a fé e a
piedade de seu povo.
Sua primeira iniciativa foi a fundação do Apostolado da Oração, com 235 associados,
edificou um altar e o consagrou ao Sagrado Coração de Jesus (o incentivo as
associações religiosas foi um traço marcante em sua vida religiosa), e ao final deste
mesmo ano solicitou a seu bispo a autorização para erigir perpetuamente as Estações da
Via-Sacra em sua recém criada paróquia.
Suas primeiras ações como sacerdote nos revelam a marca de sua vida religiosa, a
centralidade da Devoção ao Sagrado Coração de Jesus, fortemente experimentada na
Santa Eucaristia que renova o sacrifício redentor do Crucificado.
Devido à escassez de recursos da recém criada paróquia, o jovem padre continuava
residindo com sua mãe em Campinas, ia de 2 a 3 vezes na semana para Vila Americana
de ônibus, com os custos das passagens e até mesmo dos cigarros que ele fumava, único
vício do padre Francisco, sendo pagos por sua mãe.
Essas não foram as únicas dificuldades encontradas pelo Padre Francisco de Campos
Barreto ao assumir a recém criada paróquia, como por exemplo, a conclusão da
construção da Igreja Matriz paroquial, bem como provê-la de alfaias necessárias para a
Liturgia.
Nosso patrono encontrou no Apostolado da Oração o fio condutor de seu paroquiato.
Após 10 meses à frente da Paroquia de Santo Antônio de Vila Americana foi transferido
para a Paroquia de Nossa Senhora do Bom Conselho, em Arraial dos Sousas, o berço de
seu nascimento, durante este processo de transferência de paróquias seguiu morando
com sua mãe e aproveitou para terminar seu primeiro livro: “A Igreja Católica e o
protestantismo”.
Assumiu a Paroquia Nossa Senhora do Bom Conselho em 01/04/1903, substituindo o
vigário anterior, um italiano que não deixou saudade aos seus paroquianos, pois era
descrito comum viver não edificante de atuação quase nula como Vigário, pois gostava
de gastar seu tempo em caçadas. Mas o novo pároco caiu nas graças dos fiéis quando
atendendo os desejos dos fundadores do lugarejo, inclusive o dos doadores do terreno da
Igreja, restituiu como padroeira Sant´Ana, voltando a se chamar Paróquia de Sant´Ana.
Em apenas 2 meses à frente da nova paróquia, em 31/05/1903, Padre Francisco institui o
Apostolado da Oração, tendo sido realizada a instalação definitiva em 05/06/1903, na
primeira sexta-feira do mês de junho, quando a paróquia foi consagrada ao Sagrado
Coração de Jesus e um altar à Ele dedicado foi inaugurado. Em apenas 90 dias o
Apostolado da Oração já contava com 12 zeladores e 400 associados.
Em Arraial dos Sousas, nosso pai Dom Barreto também encontrou uma paroquia
desprovida das alfaias necessárias para a liturgia e, mais uma vez, teve que recorrer aos
fiéis para providenciar os paramentos e um cálice para a Liturgia.
Foi ainda em sua terra natal que Padre Francisco viu a morte do Papa Leão XIII e a
eleição do Papa Pio e a posse de José de Camargo Barros (parente da família de minha
esposa) como Bispo de São Paulo.
Tais mudanças eclesiais foram importantes para a criação da Diocese de Campinas,
sendo a diplomacia de nosso patrono muito importante nesse processo.
Em um curto período de 4 anos, Padre Francisco de Campos Barreto deu provas de
grande empenho e zelo apostólico, além de grande capacidade administrativa.
Após 19 meses à frente da Paróquia de Sant´Ana foi transferido para a Paróquia da
Santa Cruz em Campinas, a Matriz Velha. Foi em 19/12/1904 que Pe. Francisco de
Campos Barreto assumiu como pároco a paróquia onde foi batizado e, como acólito do
Pe. Nery, viveu os primeiros sinais de sua vocação sacerdotal.
Em dezembro de 1904, assumiu o paroquiato da mais antiga, tradicional e
aristocrática freguesia de Campinas. Grandes sacerdotes o antecederam.
Os paroquianos de Santa Cruz, mantinham, com excessivo zelo, o renome
e fama da Matriz Velha, relicário e símbolo de um passado enaltecido e
sempre evocado42
Por ser uma paróquia mais antiga que já tinha sido a Matriz da cidade de Campinas não
houve necessidade de adquirir as alfaias litúrgicas e nem de instalar o apostolado da
Oração, pois já existia. Assim sendo, sua primeira iniciativa foi a criação do
“Mensageiro Paroquial” um órgão de imprensa católico nascido da Associação da Boa
Imprensa, iniciativa incentivada pelos bispos do Brasil na tentativa de fazer frente à
imprensa tradicional, de perfil iluminista, liberal, em sua maioria ligada a lojas
maçônicas espalhadas por todo o país. O episcopado brasileiro incentivava os párocos a
criarem órgãos de publicação semanal em suas paróquias, enquanto se angariava fundos
para o lançamento de um jornal católico do bispado.
O primeiro exemplar do jornal «Mensageiro Paroquial» data de 2 de
fevereiro de 1905 e na palavra de apresentação vem esclarecido o
programa almejado com a publicação: defender a religião, fortalecer entre
os fiéis das duas paróquias (Nossa Senhora da Conceição e Santa Cruz)
ainda mais o sentimento cristão, dar informações minuciosas de todo o
movimento paroquial e das associações religiosas e de caridade existentes
na cidade.
Dentre todos os objetivos traçados, folheando os exemplares do jornal,
desde o seu primeiro número, aquele que, entretanto, mais desponta, em
tons acentuadamente apologéticos, é o combate ao protestantismo, ao
espiritismo, às seitas, «heresias» em geral e às ideias de matriz iluminista
que, colocando a razão humana e o avanço das ciências acima da religião,
vinham acusadas como responsáveis pelo indiferentismo religioso que
assolava particularmente a Igreja Católica naqueles «tempos modernos».
É evidente a impostação do pensamento do pe. Barreto na organização
do jornal e no conteúdo das matérias veiculadas. Basta lembrar que foi no
ambiente da matriz de Santa Cruz que ele se sentiu especialmente
impelido a confrontar o protestantismo, presente na sociedade brasileira
desde meados do século XIX, escrevendo inclusive um opúsculo45 sobre o
assunto bem como outros artigos e discursos, declarando verdadeira
guerra contra os protestantes na pessoa do professor e pastor Ernesto de
Oliveira, e em defesa apologética da religião católica. Não contrastando
com o que se vivia na Igreja no Brasil daqueles tempos, procurava agir em
fiel obediência às diretrizes do episcopado.
Como já sabemos de seu empenho com as Associações Religiosas, em sua nova
paróquia não foi diferente, como já existia o Apostolado da Oração, Pe. Francisco
empenhou-se com esmero nas confissões e Santas Missas das Primeiras Sextas-feiras de
cada mês, dedicadas a Devoção ao Sagrado Coração de Jesus, destacando-se como
dedicado e muito exigente confessor e diretor espiritual, a ponto de alguns fiéis temerem
“a braveza do padre moço”, tinha como modelo e inspiração São João Maria Vianey, o
Cura D´Ars.
No começo do meu paroquiato na Matriz de Santa Cruz, veio morar na Rua
do Sacramento uma senhora francesa, viúva, mãe de um dos lentes do
Ginásio do Estado. Essa senhora, possuidora de bastante cultura, tornou-se
penitente do Vigário e ofereceu-lhe, de presente, a Vida do Cura d’Ars, pelo
Pe. Monnin, em 2 volumes. O Pe. Barreto já era devoto do Pe. Vianney e
imitador das suas penitências, mas não conhecia por miúdo a sua atuação
como diretor de consciência. Ele leu a obra de Monnin, com grande
edificação, com verdadeiro enlevo e proveito para a sua alma46

Todo esse tempo empregado ouvindo confissões e em aconselhamentos espirituais foi


benéfico na relação entre o pároco e seus paroquianos. Toda esta clara preocupação com
a reta formação católica de seu rebanho não podia deixar as crianças de fora, remodelou
o catecismo paroquial, com a colaboração de catequistas e das associações paroquiais,
criou a Congregação da Doutrina Cristã que tinha como missão realizar o ensino da
catecismo segundo os princípios da “Encíclica Acerbo Nimis” do Papa Pio X,
resumindo muito essa encíclica, podemos dizer que São Pio X constatou que a maior
causa dos problemas relativos à Fé, e consequentemente da perda das almas é a
ignorância das coisas divinas.
“se a fé enfraquece em nossos dias, até parecer morta em uma grande maioria, é
porque não se cumpriu adequadamente a obrigação de ensinar as verdades contidas no
Catecismo” (São Pio X)

Nosso incansável patrono, fundou ao mesmo tempo a Liga das Mães Cristãs, nascida
em Paris, cujo objetivo era desenvolver nas mães de família os valores da religião cristã
para contribuir diretamente na formação dos filhos. (tinha como padroeira Santa
Monica, notadamente reconhecida pelo seu incansável empenho na conversão de seu
marido, um homem violento e mulherengo e de seu ilustre filho, o Santo Agostinho, por
estes feitos é considerada a padroeira das mães católicas).
São frutos comuns da Congregação da Doutrina Cristã e da Liga das Mães Cristãs:

No mês de dezembro de 1905, os frutos do trabalho da Congregação da


Doutrina Cristã se fez ver com a primeira comunhão de 80 crianças e,
na mesma ocasião, o padre conseguiu que as senhoras da Liga das Mães
Cristãs fizessem sua comunhão coletiva, sinalizando de modo claro a sua
intenção de que a liga fosse uma associação destinada a auxiliar o trabalho
da Doutrina Cristã. As notícias se encontram no «Mensageiro Paroquial»
de 01 de dezembro de 1905. Segue a íntegra de uma delas, que permite
recompor um pouco do ambiente religioso que se buscava construir na
vida paroquial:
Tocante foi a solenidade da primeira comunhão realizada na matriz de Santa
Cruz no dia 8. As 7h da manhã estava repleta de nossas católicas famílias a
matriz velha, começando o ofício divino nessa hora com acompanhamento de
vozes e harmônium, executado pela exma. sra. d. Perpétua Duarte Leoni.
Antes que aquelas almas finas e inocentes se aproximassem para a
participação do Corpo do Senhor, como diz S. Paulo, o rvdmo. vigário dirigiu
a palavra aos meninos, mostrando a felicidade deles porque muitos meninos
por esse mundo vivem e morrem sem fazer a sua primeira comunhão, onde as
boas almas encontram a força para resistir às tentações do demônio, aos ardis
do mundo. Deu parabéns às mães cristãs que sabem, para a felicidade da
juventude, mostrar a seus filhos o caminho da igreja, onde se ministra a
doutrina de Cristo. Fez o orador votos para que o ensino religioso se grave e
se desenvolva, principalmente nos corações dos homens porque eles formam
a parte principal da humanidade. Em seguida aquelas oitenta crianças sobem
em perfeita ordem para receber nos corações o Pão dos Anjos, havendo nessa
ocasião a comunhão geral que elevou o número de comungantes a 230.
Terminada a missa foi oferecida aos meninos uma mesa de doces e vinho. A
tarde realizou-se a tocante cerimônia da renovação das promessas do batismo,
pregando por essa ocasião o padre dr. Mello e Souza, discorrendo sobre
aquela cerimônia, mostrando a alta dignificação da renúncia que o bom
católico deve fazer de Satanás – suas pompas e obras. Terminada a prática os
meninos em coro responderam afirmativamente cumprir todos os preceitos da
nossa religião. Depois desse espetáculo solene e encantador os meninos se
aproximaram do vigário recebendo uma preciosa lembrança daquele dia.
Terminou-se a festa com a benção do SS. Sacramento. Reunidos depois os
meninos no consistório de S. Vicente, foram oferecidas algumas lembranças
ao pregador do retiro padre Giovannini e aos bondosos catequistas que
durante o ano auxiliaram o vigário na aula de doutrina cristã que era dada aos
domingos a 500 e tantas crianças48.

Os homens não ficaram de fora de sua preocupação com a formação de uma sociedade
católica, e no ano de 1906 fundou na Paroquia de Santa Cruza “União de Santo
Agostinho”, uma espécie de clube, com atividades sociais, serões, jogos lícitos, sem se
esquecer de proporcionar a formação católica. Em 1907 criou também a Liga do
Menino Jesus, donde surgiram de suas fileiras diversas ordenações sacerdotais.
Finalmente em 07/06/1908 foi criado o Bispado de Campinas, sendo seu primeiro bispo
um velho conhecido do padre Francisco, Dom Nery, o pároco que ele acolitava quando
criança, um dos responsáveis pelo despertar de sua vocação sacerdotal, dessa maneira, a
Matriz de Campinas foi elevada a Catedral. Na mesma Bula Papal em que foi criado o
Bispado de Campinas, São Paulo foi elevado a Arquidiocese.
No Livro do Tombo n. 1 da Arquidiocese de Campinas, não se acham registros
manuscritos do primeiro bispo diocesano. Assim, o segundo bispo, após transcrever
ao menos a ata da posse de d. Nery, passa aos seus assentamentos. «Este livro é
destinado a receber o histórico da Diocese de Campinas. É o Livro do Tombo número
um porque até hoje não encontrei nenhum livro com a história deste Bispado, o que é
de se lamentar pela falta que há de fazer a ausência de tantos fatos interessantes e
sucedidos nos primeiros doze anos da vida desta Diocese. Remediando essa lacuna
começo a notar os acontecimentos de maior vulto e que vêm se dando desde a posse
que tomei deste Bispado de Campinas e ocorrida aos quatorze de novembro de mil
novecentos e vinte». ACMC. Livro do Tombo n. 1 da Diocese de Campinas. fl. 1.
Como resultado de seu empenho pessoal, e claro, pelo histórico de seu sacerdócio, o
padre Francisco recebeu da Santa Sé o honroso título de Monsenhor Camareiro Secreto
extranumerário de Sua Santidade o Papa Pio X.
O título de Monsenhor Camareiro remonta ao período medieval, ao grupo de
clérigos denominados camerarii que eram ligados ao cubiculum (quarto de dormir) do
papa, no Palácio Lateranense. Chamados de «domésticos» do Santo Padre, às vezes
podiam exercer missões de extrema confiança em nome do mesmo. Competia-lhes
transmitir aos prelados as convocações aos consistórios e às cerimonias, além de zelar
pelo bom andamento da vida cotidiana do Soberano Pontífice. Desde Gregório XI já se
verificava o hábito de conceder tal título em caráter simplesmente honorífico. Os
camareiros que possuíam somente prerrogativa de honra, ficaram posteriormente
conhecidos como extra-numerários. Foi Pio VI quem distinguiu os camareiros de
honra oficiantes em Roma dos camareiros extra urbem que não tinham direito de
entrar
em nenhuma antecâmera papal, mas exerciam a função de camareiros nos
deslocamentos do papa aos seus países de origem. O. GUYOTJEANNIN –
F. JANKOWIAK. «Cameriere». Philippe Levilain. (diretto da). Dizionario storico del
papato. Milano. Bompiani 1996. 222.

Durante os primeiros anos da nova diocese, Monsenhor Barreto foi nomeado para as
seguintes funções:
- Procurador da Mitra Diocesana
- Conselheiro Diocesano
- Cônego Catedrático do Cabido Diocesano
- Cônego Arcipreste do Cabido Diocesano
Em maio de 1909 o jornal “Mensageiro Paroquial” parou de ser publicado para dar
lugar ao jornal oficial do Bispado de Campinas, chamado, à propósito, “O Mensageiro”.
O segundo semestre de 1909 e o primeiro de 1910 foram difíceis para Mons. Barreto,
que até então, só havia experimentado êxitos em sua vida sacerdotal.
Em julho de 1909 foi extinta a Irmandade do Santíssimo Sacramento, irmandade esta
que já tinha sua importância ressaltada pelo próprio Mons. Barreto, logo quando
assumiu a paróquia de Santa Cruz, apontando como a primeira a cooperar com o vigário
para o bem material e espiritual da paróquia, sendo substituída pela Venerável Ordem
Terceira de Nossa Senhora do Carmo. Os reais motivos dessa substituição, como era de
se esperar, não constavam explicitamente nas atas da Irmandade. Passados os anos, em
1966 em uma revista da Congregação das Missionárias de Jesus Crucificado,
congregação esta fundada por Dom Barreto, como veremos em uma aula futura, lê-se o
seguinte:
- “Havia abusos a combater. A Irmandade do Santíssimo Sacramento recebera
elementos notadamente maçons, não casados pelo sacramento do matrimônio, e outros
de fama duvidosa. Extinguiu-a e valendo-se de bons homens e piedosas senhoras, criou
a Ordem Terceira do Carmo. Suportou críticas ferinas por isso, mas não recuou.
Este fato nos faz recordar tantos outros ocorridos no Brasil durante a “Questão
Religiosa” (conflito travado entre a Santa Igreja Católica e a Maçonaria, no tempo do
Brasil Império) desencadeada pelos Ultramontanos bispos do Pará e recife-Olinda,
respectivamente Dom Antônio de Macedo Costa e Dom Vital.
Ainda o ano de 1909 guardava mais uma triste perda para Mons. Barreto, a enfermidade
e falecimento de sua mãe “Dona Tudinha”, em 24/12/1909.
A criação de um cinema católico nas dependências da União de santo Agostinho
fracassou e gerou prejuízos significativos.
Em 1911, após conseguir eleger 3 vereadores nas eleições municipais de Campinas,
com apoio do assistente espiritual (Mons. Barreto), os membros da União de Santo
Agostinho decidiram montar um partido católico e organizaram um evento para lançar a
ideia da fundação do partido, no qual, também tomou parte o Bispo Diocesano, D. Nery,
porém do lado oposto, isso desmotivou o grupo, inclusive o Mons. Barreto que havia
acompanhado todo o processo e apoiado a iniciativa, também se viu constrangido com a
atitude do Bispo, há quem diga que este episódio teria, inclusive, feito o Mons. Tomar a
decisão de procurar outra diocese, D. Nery sabendo de suas intenções o repreendeu
severamente. Esse fato ocorreu às vésperas de sua nomeação episcopal.
Todas essas experiencias, boas e más vivenciadas na Matriz velha de Campinas foram
importantes no amadurecimento de seu temperamento, desenvolvendo também seu
caminho espiritual. Foi nesse período que ele intensificou a oração pessoal e diária do
Santo Rosário, que nunca mais abandonou. O uso de cilício e outros sacrifícios o
ajudaram a abraçar a austeridade de vida, pois, segundo consta, Mons. Era dado a certas
vaidades, gostava muito de cigarros importados, lenços perfumados e bengalas, certos
costumes aristocráticos da sociedade campinense da época.
Assim procurava amansar seu forte temperamento como se percebe nos testemunhos de
seus amigos:
João Lourenço, antes de se tornar amigo próximo do mons. Barreto, era seu
dirigido espiritual e, freqüentemente alude à dificuldade de argumentar com o padre
quando este estava categoricamente convencido de suas decisões: «(...) tal era ele
como diretor espiritual. Sabia querer e por isso sabia exigir de seus penitentes a
galvanizar-lhes a vontade, quando vinham a flutuar em momentos de perplexidade.
Sua ascendência seria incontrastável se não tivesse o contrapeso da sua prudência, da
sua discrição. Mesmo assim ele punha, não raro, em cheque certas autoridades que se
tinham por mais legítimas; e eis o que explica a atitude desconcertante de certos
católicos: levados pelo despeito eles liam com agrado, num matutino da época, os
ataques de certos anti-clericalistas contra o padre fanático.» ACG-MJC. armário 6.
pasta «Fundador» 22. João Lourenço Rodrigues. Subsídios para uma vida de d.
Barreto. 1° Caderno. 48.
Seu diretor espiritual o padre redentorista Valentim von Riedl, mostra-se feliz por sabê-
lo” mais calmo de espírito” ou “sossegado e animado”. As palavras de encorajamento e
confiança em Deus, ao padre amigo que se encontrava em um mar revolto, saem
naturais e constantes da pena desse diretor espiritual. Não é mero acaso
que o futuro bispo colocará ao centro do escudo de seu brasão episcopal
uma barca em alto mar e a divisa Dominus regit me que já lhe soara
confortadora para a personalidade e o espírito envolto em contínuos
desafios:
Com muita satisfação recebi sua prezada carta vendo que com a graça de
Deus meu bom amigo acha-se agora mais sossegado e animado. Que
Monsenhor reconheça neste fato a vontade consoladora: «vir obediens
victoriam loquestur». Se deixamo-nos guiar pelo Senhor do modo como Ele
quer, desconfiando das nossas idéias pessoais, de certo sempre realizar-se-á
também: Dominus regit me, et nihil mihi deerit (O Senhor me governa, e nada me falta)
Durante seu paroquiato frente à Paróquia Santa Cruz do Carmo, a Matriz Velha de
Campinas, de 1904 a 1911, não faltou ao Padre Campos Barreto esforços em trabalhar e
ousar podendo ser contado entre os mais significativos e frutíferos paroquiatos desta
paróquia. São frutos de seu trabalho:
- Inserção de Católicos na imprensa
- Organização das Associações Religiosas
- Assíduo atendimento aos fiéis, confissões, direção espiritual,
- Reformas e adequações prediais na Matriz Velha
- Escritos no “Mensageiro Paroquial”
- Opúsculos sobre a Igreja Católica contra o protestantismo,
- Protagonismo pela criação do Bispado de Campinas.

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