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No Brasil, a expansão das cidades é marcada pelos grandes loteamentos oficiais, destinados ás
camadas da população de maiores rendimentos, pelos denominados loteamentos irregulares ou
clandestinos e ainda pelo surgimento de áreas precárias de habitação de forma irregular
denominadas de favelas. Tal processo foi denominado por Milton Santos de urbanização espraiada.
Esse espraiamento por sua vez configurou um tipo de cidade que se caracteriza pela periferização,
fragmentação e dispersão. Na cidade de Campina Grande – PB, no Nordeste Brasileiro, verificou-se
na atualidade a permanência do seu espraiamento, da sua dispersão, da sua fragmentação e ainda da
formação de uma periferia não homogênea, mas sim, com grandes contrastes socioespaciais.
Revela-se a produção de uma cidade periférica, fragmentada em áreas onde se dão os loteamentos
irregulares com autoconstruções ou com construções tecnicamente assistidas; conjuntos
habitacionais para a população de baixa renda, e ainda, uma outra área periférica com os
loteamentos e condomínios fechados.
Palavras-chave: periferização; habitação popular; loteamentos irregulares, favelas, condomínios
fechados.
Resumen
Introdução
A expansão das cidades brasileiras deu-se de forma espraiada como bem ressaltou Milton Santos já
nos anos 80 do século XX. Esse espraiamento por sua vez configurou um tipo de cidade que se
caracteriza pela periferização, fragmentação e dispersão. São constantes os grandes vazios urbanos
encontrados entre a malha urbana e as novas ocupações. Se isto já era uma realidade desde os anos
1960 quando se iniciam as construções dos grandes conjuntos habitacionais nas cidades brasileiras
em diferentes escalas, permanece como realidade atual. Muito embora os processos de urbanização
apresentem particularidades, essa é uma tendência geral que se constata seja nas metrópoles, seja
nas denominadas cidades médias. O período de rápido crescimento das cidades médias gerou sérias
conseqüências, entre estas se destacam a precariedade da habitação e uma forte tendência à
periferização. A partir de década de 1970 essas cidades recebem um forte contingente migratório
principalmente em função da concentração fundiária no campo. Estes migrantes ao chegarem nas
cidades e não encontrarem habitação acessível passam a ocupar as áreas de domínio público,
particularmente aquelas que não estavam sob o comando do mercado imobiliário, produzindo as
denominadas favelas. Por conseguinte, dá-se início a uma urbanização cada vez mais periférica, ou
como já mencionado anteriormente, as cidades espraiadas. Na história da urbanização brasileira, a
expansão das cidades é marcada pelos grandes loteamentos oficiais, destinados às camadas da
população de maiores rendimentos e também pelos denominados loteamentos irregulares ou
clandestinos. Estes caracterizam-se por não obedecer à legislação que dispõe sobre o parcelamento
do solo ( Lei Federal 6.766/79). Além disso, tem-se a periferização da cidade produzida pelo Estado
com a construção dos conjuntos habitacionais e ainda a produção da cidade a partir da ação dos
incorporadores imobiliários que constroem os loteamentos fechados alimentada pela concentração
de renda e a constituição de uma camada da população de maiores rendimentos que optam por viver
em áreas afastadas e separadas do restante da cidade aguçando a fragmentação da cidade. Esta
forma de habitar caracteriza-se por apresentar exclusividade social, sistemas de segurança,
qualidade ambiental, funcionalidade e autonomia administrativa. Muito embora muitas dessas
características pudessem já ser encontradas nos loteamentos abertos, há nestes um elemento
fundamental que o demarca, separando-o do restante da cidade: o muro.
A cidade de Campina Grande nasce a partir de um entroncamento dos caminhos que conduziam o
gado e os tropeiros, no século XVII, portanto está associada à atividade pecuária que adentrava o
interior do território brasileiro e, por conseguinte, ao comércio de gado e de gêneros alimentícios,
que por sua vez, motivaram o aparecimento da feira de gado e também de uma grande feira livre. É
fato que as mudanças engendradas no sistema mundial alteraram o papel que até então Campina
Grande cumpria na ordenação territorial do espaço nordestino e principalmente paraibano: de
entreposto comercial subordinado à dinâmica gerada pelas atividades litorâneas. Constituía,
portanto, o que alguns autores denominaram de “Boca de Sertão” (AZEVEDO, 1957). A então vila
torna-se um importante centro de escoamento da produção primário-algodoeira realizada no semi-
árido nordestino. No ano de 1864 eleva-se à categoria de cidade.
No final do século XIX, a dinâmica da cidade dava-se principalmente em função da sua localização,
pois era por onde passava “a principal estrada que liga os sertões da Parahyba e Rio Grande do
Norte às cidades da Parahyba e Recife”, por conseguinte, o seu “commercio de transito,
principalmente em certos dias da semana, de quinta-feira até sábado, quando são feitas as suas
grandes feiras de gado, e de gêneros alimentícios” é bastante animado (JOFFILY, 1977, p. 268).
O início do período técnico tal qual define Santos (1993) dissemina aparatos tecnológicos que
promovem alterações na morfologia urbana e também na dinâmica econômica e social das cidades
de um modo geral. Apesar da distância temporal, fato é que a chegada da ferrovia no interior do
Nordeste introduz uma nova dinâmica econômica e também urbana. A cidade então movida pela
economia algodoeira passa a ter um outro elemento que redefinirá a sua estrutura, a sua morfologia,
a sua economia e ainda as relações sociais. Data de 1907 a instalação da ferrovia Great Western of
Brasil Railway. Tal incremento configura à cidade até então “Boca de Sertão”, uma outra
característica que também é destacada pelos que estudam a urbanização brasileira: a Ponta de
Trilho.
A economia algodoeira somada aos incrementos técnicos possibilitam a primeira grande expansão
da cidade que se dá para além do seu centro primaz. É ainda na primeira metade do século XX que
a aspiração pelo moderno, alimentada pelo capital algodoeiro, possibilita a realização de uma
grande reforma urbanística que destrói a cidade histórica e ergue uma que se assemelhasse aos
ideais da Modernidade. Neste período o seu centro primaz é completamente alterado: as ruas são
alargadas, as casas são substituídas por sobrados todos em estilo art decó, a feira livre é transferida
de lugar, praças são construídas, etc. Além disso, a produção do algodão favorece a instalação de
empresas, de bancos e, por conseguinte, de hospitais e colégios. Tais implementações têm como
principal propósito atribuir à cidade o status de cidade moderna.
A partir da década de 1960, com a política brasileira de industrialização do Nordeste através da
SUDENE (Superintendencia do Desenvolvimento do Nordeste), Campina Grande recebe novos
impulsos econômicos conduzindo à criação de distritos industriais em áreas periféricas da cidade.
Esta é a primeira expansão periférica da cidade, conduzida de fato pelo Estado. Entretanto, mesmo
com a criação desses distritos industriais, tal política não conseguiu imprimir grandes modificações
na estrutura e nem mesmo na dinâmica econômica da cidade. Como ocorrido em todo Nordeste, as
indústrias que aí se instalaram pouco permaneceram, constituindo o que Maria do Rosário Ferreira
denominou de um verdadeiro cemitério de indústrias (FERREIRA, 1984).
Já no final dos anos novecentos, a expansão da cidade foi impulsionada por outros elementos, tais
como a transferência do terminal rodoviário interestadual (nos anos 1980) e a construção do
Shopping Center Iguatemi, atual Boulevard Shopping (nos anos 1990) na porção Leste da cidade,
nas proximidades da ligação com a BR 230. Mais recentemente, a criação do parque tecnológico,
cujo edifício sede ainda está por ser construído na outra extremidade da cidade – zona oeste – nas
proximidades da Universidade Federal de Campina Grande e do Campus Bodocongó da
Universidade Estadual da Paraíba vem atraindo capitais externos e algumas empresas do setor
secundário e terciário da economia. Tais incrementos urbanos fomentam a transferência ou o
deslocamento de algumas atividades econômicas para essas áreas representando o que podemos
entender como processo de descentralização e, por conseguinte, a formação de subcentros.
Ao analisarmos o processo de urbanização de Campina Grande, percebemos os períodos de maior
expansão urbana, destacando-se os anos 1960 quando o Estado brasileiro (governo militar) passou a
atuar na produção de habitações com a construção massiva de conjuntos habitacionais. Tais
conjuntos habitacionais foram construídos nas metrópoles, mas também nas cidades médias. A
edificação dessas novas áreas residenciais não se deu de forma contínua à malha urbana, mas sim a
partir de grandes vazios urbanos, produzindo as cidades espraiadas traduzidas por Milton Santos
(1993). Segundo o autor, as cidades brasileiras,
[...] e sobretudo as grandes, ocupam, de modo geral, vastas superfícies,
entremeadas de vazios. Nessas cidades espraiadas, características de uma
urbanização corporativa, há interdependência do que podemos chamar de
categorias espaciais relevantes desta época: tamanho urbano, modelo
rodoviário, carência de infra-estruturas, especulação fundiária e imobiliária,
problemas de transporte, extroversão e periferização da população, gerando,
graças às dimensões da pobreza e seu componente geográfico, um modelo
específico de centro-periferia. (SANTOS, 1993, p. 95).
É com essas características que se dá a expansão da cidade de Campina Grande a partir dos anos
1960, intensificando-se a nas décadas de 1970 e 1980. Data também deste período a criação do
Campus II da Universidade Federal da Paraíba (UFPB) com sede na referida cidade. Tal
implementação executada pelo governo federal tem grandes repercussões na cidade, uma vez que
para esta se dirigem pessoas qualificadas e com rendimentos que impulsionam o comércio, a
demanda por serviços e ainda o setor imobiliário.
O processo de urbanização de Campina Grande arrolado revela-se parcialmente no quadro
demográfico referente ao período de 1970 a 2000. (Quadro 1). Analisando-se os dados dos Censos
Demográficos do período de 1970 a 2000 a partir do quadro 1, verifica-se um crescimento de
54,96%. Tal crescimento deu-se em ritmos diferentes. Na primeira década, 1970 a 1980 o aumento
populacional foi de 52.524 habitantes. Este acréscimo é entendido por alguns autores como sendo
decorrente das intervenções feitas a partir dos Programas Comunidade Urbana para Recuperação
Acelerada (CURA) e o Programa Nacional para Cidades de Porte Médio (PNCPM). Apesar da
ineficácia em dirimir a especulação imobiliária, os mesmos favoreceram modificações na infra-
estrutura e principalmente na economia urbana (particularmente o PNCPM), permitindo a fixação
da população local (LIMA, 2004).
O segundo período, entre as décadas 1980 – 1991, apresenta um acréscimo de 78.480 habitantes e
no último período analisado, entre 1991 e 2000, há um decréscimo no ritmo do aumento
populacional, perfazendo um total de 29.024 habitantes. Ou seja, entre as décadas de 1991 e 2000 o
crescimento populacional foi de 8,16%. Tal decréscimo no ritmo deve-se a uma maior centralidade
exercida pela cidade de João Pessoa, capital do estado, fruto das políticas nacionais que priorizaram
as capitais do estado desde os anos 1970, da centralidade da economia nacional no centro-sul
brasileiro e da quase ausência de novos incrementos na economia local.
A redução da população rural municipal no período analisado também denota o processo de
urbanização. Muito embora desde a década de 1970 Campina Grande se apresente como um
município com população predominantemente urbana (86%), esta característica intensifica-se em
2000, quando a população rural representa apenas 5% do total dos seus habitantes e a urbana passa
a somar 95% deste contingente. O comportamento do incremento populacional de Campina Grande
é condizente com o quadro brasileiro, pois, segundo Milton Santos (1993), no período de 1970 a
1980, “incorpora-se ao contingente demográfico urbano uma massa de gente comparável ao que era
a população total urbana de 1960” (p. 30). Tal crescimento do contingente populacional urbano
consolida-se na década seguinte.
Quadro 1
População do Município de Campina Grande 1970, 1980, 1991, 2000 e 2007.
1970 1980 1991 2000 2007
Campina Total 195.303 247.827 326.307 355.331 371.060
Grande
- PB Urbana 167.335 228.182 307.468 337.484 354.048
Rural 27.968 19.645 18.839 17.847 17.012
Fonte: Censos IBGE 1970, 1980, 1991, 2000 e Contagem da População 2007.
Figura 3 – Rua com habitações tipo duplex. Conjunto Glória – Campina Grande-PB.
Fonte: trabalho de campo, 2009. Foto: Mateus Augusto Araújo
Figura 4 - Interior de uma habitação tipo dúplex. O espaço reservado à sala e os acessos ao
banheiro, cozinha e escada. Conjunto Glória – Campina Grande-PB
Fonte: trabalho de campo, 2009. Foto: Mateus Augusto Araújo
Atualmente alguns projetos destinados à construção de casas populares para a população de baixa
renda estão em execução. Tais projetos vêm sendo geridos pela CEHAP (Companhia Estadual da
Habitação Popular), em parceria com o Governo Federal. Essas iniciativas têm como objetivo
dirimir o déficit habitacional da cidade que chega ao total de 14.000 habitações (SEPLAN, 2009).
Tais projetos preveem tanto a “urbanização” das favelas e a regularização fundiária, como a
construção de casas populares para realocação da população que mora em áreas de habitação
subnormais (favelas). Os dados atuais revelam a produção de três novos conjuntos habitacionais,
vinculados ao programa Pró-Moradia. Esses conjuntos no total somam 1.378 unidades
habitacionais, distribuídas conforme mostra o Quadro 4. Além destes soma-se a construção de
habitações pelo Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) no bairro do Araxá na área oeste da
cidade.
Quadro 4. Conjuntos Habitacionais produzidos pelo programa Pró-Moradia em Campina
Grande-Pb.
Nome dos Conjuntos Unidades Habitacionais
Colinas do Sol 386 Unidades
Novo Cruzeiro 333 Unidades
Três Irmãs 659 Unidades
Total 1.378 Unidades
Fonte: CEHAP, Fevereiro 2010.
Esses conjuntos habitacionais são destinados à população de baixa renda (de 1 a 3 salários
mínimos). As distribuições das casas são realizadas pela Caixa Econômica Federal (CEF), e após a
seleção, os beneficiários são acompanhados pelo setor social da CEHAP. Com relação ao tipo de
habitação, existem dois tipos: casa ou habitação térrea unifamiliar e o duplex, multifamiliar (duas
famílias) com um piso térreo e outro superior. O tipo duplex já encontrado nos Conjuntos Glória I e
II constitui um tipo de habitação dos novos conjuntos Novo cruzeiro e Colinas do Sol.
Além dos dados coletados e expostos acima, o levantamento de campo possibilitou constatar a
existência de comunidades com habitações precárias, não caracterizadas pelo IBGE, como
aglomerados subnormais, por não contabilizarem o total de 50 domicílios. Nas proximidades do
ginásio de esportes o “Meninão”, constata-se outra faceta da habitação subnormal do município.
Essa área apresenta um pequeno conjunto de habitações (entre 20 a 30) em estado bastante precário
e que vem crescendo diariamente9. As habitações foram construídas com papelão, zinco e outros
tipos de materiais de restos de construção ou do que se costuma descartar.
Além das favelas e das ocupações irregulares, uma outra forma de habitar é produzida a partir do
parcelamento do solo de forma arbitrária sem o controle dos órgãos gestores municipais,
comumente denominado de loteamentos clandestinos e/ou irregulares. A identificação destes é
bastante difícil, uma vez que por se tratar de uma irregularidade não se tem registro nas instituições
oficiais, particularmente na Prefeitura Municipal. Tais loteamentos são decorrentes da má
distribuição de renda e da falta de um controle maior sobre a ocupação e expansão da cidade,
especialmente no que diz respeito ao parcelamento do solo e à transformação de solos rurais em
urbanos.
A pesquisa constatou a implantação de dois loteamentos irregulares na cidade: o Loteamento Jardim
Europa, localizado na Zona Leste da cidade e Loteamento Campo 10 de Maio, no Bairro das
Malvinas (Grande Conjunto Habitacional). Sabe-se que esse tipo de ocupação traz tanto problemas
de ordem urbanística, como sociais. Os mais prejudicados são sem dúvida os compradores dos
lotes, pessoas de baixa renda que não sabem quais as exigências mínimas e necessárias para um
parcelamento de terras na forma legal. Porém, é possível encontrarmos casos em que os adquirentes
têm consciência da ilegalidade, fato que é aceito em razão dos preços mais baixos que os cobrados
nas áreas de terrenos regulares, melhor localizados, assistidos de serviços e equipamentos urbanos.
O Loteamento Jardim Europa é um empreendimento antigo da cidade, com mais de 20 anos.
Localizado no Bairro Nova Brasília, atualmente abriga 200 habitações. Estas têm em média 5
pessoas por habitação. O Loteamento Campo 10 de Maio, a primeira vista parece ter sido
legitimamente estabelecido, porém fere as regras de parcelamento do solo, regida pela LPSU (Lei
de Parcelamento do Solo Urbano), já que não obedece às normas mínimas para que pudesse ser
empreendido, como a reserva de área própria para a implantação de equipamentos urbanos, a
aprovação do projeto junto à Prefeitura entre outros. Durante as observações realizadas em campo
(agosto de 2009), foi possível averiguarmos uma das características mais expressivas da produção
das habitações para os moradores de baixa renda, ainda mais em um loteamento irregular: a
autoconstrução.
Analisando os dois loteamentos irregulares, podemos fazer algumas comparações. A primeira é com
relação a sua localização; os dois se encontram em áreas de expansão urbana, contudo o existente
no bairro das Malvinas, que vem atualmente exercendo certa subcentralidade, apresenta melhores
condições em termos de acessibilidade aos serviços, portanto, uma condição de vida menos
precária. Já o Loteamento Jardim Europa, que se encontra bem distante do centro e que não tem em
sua proximidade uma área ou bairro com infraestrutura e serviços, apresenta-se de forma mais
precária, muito embora já exista há bastante tempo, ou seja, se configure em uma ocupação
consolidada, porém bastante problemática. A segunda é em relação às condições de infraestrutura e
do tipo de edificação das casas. Verificamos que o Loteamento do Campo 10 de Maio, nas
proximidades das Malvinas, apresenta-se com um certo ordenamento e um padrão de construção um
pouco melhor. No Jardim Europa há uma maior precariedade do ordenamento urbano, como
também do padrão construtivo das habitações. Embora em locais bem distintos, em pontos extremos
da cidade, esse dois empreendimentos têm em comum algumas características, uma delas é a
própria edificação das casas, todas, foram os próprios moradores que as construíram, ou seja, são
produzidas pela autoconstrução, outra é a ilegalidade da implantação desse empreendimento e uma
terceira são as péssimas condições de infraestrutura das áreas ocupadas.
Assim, favelas, as ocupações e os loteamentos irregulares constituem formas de habitar em
Campina Grande que revelam as contradições sociais, a precariedade da habitação que impulsionam
a periferização e a fragmentação da cidade.
Uma outra periferia é produzida, muito embora não seja conhecida como tal, já que não
corresponde à área de pobreza, mas sim onde se encontram os loteamentos e os condomínios
fechados. Tal processo conduz à produção de uma cidade fragmentada e muitas vezes segregada,
especialmente quando se depara em algumas áreas da cidade com as construções de condomínios
horizontais fechados e em outras, ocupações com habitações improvisadas, bairros desprovidos de
infra-estrutura e mais recentemente conjuntos habitacionais localizados em áreas periféricas.
Constata-se em Campina Grande um eixo de expansão em direção à área Noroeste, que começa a
receber uma atenção cada vez maior do setor imobiliário, principalmente com relação aos bairros
do Alto Branco, bairro também considerado de alta renda, o Nações e o Jardim Tavares, que já
começam a receber grandes investimentos, a exemplo da construção de condomínios fechados
horizontais, por possuírem em seus limites grandes vazios urbanos e também pela fácil
acessibilidade ao centro através da via (BR 104), que constitui a saída para as cidades do Brejo10
paraibano. Soma-se a isso os serviços que esse eixo vem recebendo como a recente instalação do
Atacadão, da rede de supermercados Carrefour.
Visualiza-se, assim, uma espacialização muito nítida das camadas sociais na malha urbana
campinense, caracterizando um processo de segregação espacial, onde há visivelmente eixos de
forte especulação imobiliária e que se constituem bairros residenciais das camadas média e alta da
população. Há, por conseguinte, a formação de uma área com certa homogeneidade concebida pelo
mercado imobiliário, entendido como “o instrumento através do qual as espacialidades são
distribuídas se conformado certa acessibilidade” (VILLAÇA, 1998, p. 342). Dessa maneira,
identifica-se as duas formas de segregação, que apesar da simplificação do termo, é bastante
elucidativa: Tem-se a auto segregação realizada por aqueles que optam por viver separados dos
outros e que dizem buscar melhor qualidade de vida e infraestrutura, e também as amenidades,
como viver junto à natureza, com vistas agradáveis. E há também conforme exposto anteriormente,
a segregação imposta traduzida pela constituição de áreas precárias, com problemas de
infraestrutura, condições de habitabilidade e ainda renda familiar baixa. Esse tipo de segregação é
induzida principalmente pela impossibilidade do acesso ao solo urbano. A respeito do conceito de
segregação, Souza (2003, p. 84) afirma que a “segregação está entrelaçada com disparidades
estruturais na distribuição da riqueza socialmente gerada e do poder. A segregação deriva de
desigualdades e, ao mesmo tempo, retroalimenta desigualdades (retroalimentação positiva), ao
condicionar a perpetuação de preconceitos e a existência de intolerância e conflitos”.
Villaça também entende a segregação de forma semelhante, afirmando se trata de “ um processo
dialético, em que a segregação de uns provoca, ao mesmo tempo e pelo mesmo processo, a
segregação de outros” (VILLAÇA, 1998, p.148). Portanto, o distanciamento cada vez maior e mais
exposto ao invés de diminuir o conflito entre as classes, os intensifica, gerando mais violência e
mais insegurança. Tal sentimento generalizado principalmente nas metrópoles, mas que já se faz
presente nas cidades médias, é utilizado pelas campanhas publicitárias que vendem novas formas de
moradia, que se dizem cada vez mais seguras e isoladas e, que, por sua vez, geram mais segregação.
Como já dito anteriormente, a cidade se reproduz de forma desigual, revelando as grandes
contradições socioespaciais. Se por um lado existem as favelas, os loteamentos irregulares e os
conjuntos populares, por outro, se encontram os condomínios fechados, além dos denominados
bairros nobres de residências de alto padrão de construção.
Foram identificados alguns condomínios residenciais e loteamentos horizontais fechados que
configuram uma nova forma de morar nas metrópoles e também nas cidades médias. Estas
construções, em sua maioria se localizam em áreas afastadas das áreas centrais, a exemplo dos
condomínios fechados analisados por Teresa Pires Caldeira (2003) na cidade de São Paulo e por
Oscar Sobarzo (2006) na cidade de Presidente Prudente - SP. As pesquisas e as análises dos
referidos autores servem para se pensar e analisar as formas que os condomínios assumem nessas
cidades e aqui, particularmente em Campina Grande.
Os condomínios fechados correspondem á versão ideal desse “novo conceito de moradia”. Supõe-se
que condomínios fechados sejam mundos separados. Seus anúncios propõem um “estilo de vida
total”, superior ao da cidade, mesmo quando são construídos dentro dela (CALDEIRA, 2003,
p.265). Em Campina Grande foram identificados cinco condomínios horizontais fechados: o
„Monteville Residence‟, o „Santa Maria‟ Residencial, o „Residencial Kadoshi‟, o „Nações Residence
Prive‟ e o Sierra Resort. Com exceção do „Nações Residence Prive‟ e o Sierra Resort que são
loteamentos, os outros três são vendidos com as casas já construídas, o que se diferencia da maioria
dos outros condomínios fechados que negociam apenas o terreno. Outra diferença é que esses três
possuem poucos lotes quando se compara com a maioria dos condomínios fechados. No entanto,
apresentam todo um aparato de segurança e possuem áreas livres, além das próprias habitações
isoladas por muros que separam a rua ou mesmo a cidade desses locais privados, portanto,
configuram-se como condomínios horizontais fechados. Obedecem, portanto, aos requisitos que a
maioria dos autores utiliza para caracterizá-los:
São fisicamente demarcados e isolados por muros, grandes, espaços vazios e
detalhes arquitetônicos. São voltados para o interior e não em direção á rua,
cuja vida pública rejeitam explicitamente. São controlados por guardas
armados e sistemas de segurança, que impõem as regras de inclusão e
exclusão. São flexíveis: devido ao seu tamanho, às novas tecnologias de
comunicação, organização do trabalho e aos sistemas de seguranças, eles
são espaços autônomos, independentes do seu entorno, que podem ser
situados praticamente em qualquer lugar (CALDEIRA, 2003, p. 258-259).
O Santa Maria Residencial é o menor de todos os condomínios horizontais encontrados em
Campina Grande. Com apenas 10 unidades, sendo cada uma de 105 m² de área; o „Residencial
Kadoshi‟ possui 11 unidades de casas já prontas com 110 m² cada e o maior é o „Monteville
Residence‟ com casas que variam de 176 a 221 m² e possui 25 unidades. Esses imóveis são
destinados a uma camada de média renda e não de alta renda que ainda se concentra nos bairros
como Alto Branco e Mirante. No „Nações Residence Prive‟ os terrenos apresentam em média 450
m², com 230 lotes a venda. Contudo, no final do ano de 2008 surgiu um novo empreendimento, o
Sierra Resort com 197 lotes, cuja área individual de cada lote corresponde a 535 m² e oferece um
grande número de equipamentos para laser como quadra poliesportiva, quadra de tênis, quadras de
squash, quadra de vôlei, campo de futebol, arquibancadas com 450 lugares, praças temáticas,
saunas, piscina térmica com 3 sendo semi-olímpicas (25m) e piscina externa adulto e infantil.
Devido ao tamanho da área do lote ser superior aos demais e à grande área destinada aos
equipamentos de laser, o valor por unidade do lote também é bastante superior aos anteriormente
apresentados.
Quanto à localização, a maioria devido ao tamanho dos lotes, encontra-se nos bairros próximos ao
centro, sendo o mais distante, o „Nações Residence Prive‟ que está na Rodovia BR 104. Os mais
próximos são o „Residencial Santa Maria‟ no Bairro Quarenta e o „Monteville‟ no Bairro Alto
Branco. A localização é um tema explorado pelas propagandas divulgadas pelos corretores
imobiliários desses condomínios. Os anúncios fazem questão de anunciar a facilidade e a rapidez
para se chegar à área central da cidade, mesmo considerando que os possíveis compradores desses
novos modelos de habitação possuam transporte individual.
Quadro 8 – Campina Grande-PB. Condomínios fechados segundo número de lotes, preço das
unidades e área e localização, 2008?
Nome do Número de lotes ou Preço das unidades Área(s) dos Bairro
condômino casas ofertadas ofertadas em R$ Lotes e casas
(reais)
Nações 230 lotes 70 mil* 450 m² Nações
Residence Prive
Monteville 25 casas 309.000* 176, 210, 221 Alto Branco
Residence m²
Residencial 11 casas 100.000 103 m² Liberdade
Kadoshi
Santa Maria 10 casas 110.000 105 m² Quarenta
Residencial
Sierra Home 197 lotes 160.000 535m² Jardim Tavares
Resort
Fonte: Informações obtidas através de consultas aos corretores responsáveis pela comercialização dos
condomínios em novembro e dezembro de 2008.
* O preço varia conforme a localização no terreno.
Como já expresso anteriormente, a busca pela acessibilidade, pela melhor localização, considerando
os serviços e o tempo gasto nos deslocamentos são fatores, pelos quais as incorporações
imobiliárias lutam e, portanto sempre vão ser elementos valorizados pelos construtores imobiliários.
Isso ficou demonstrado no caso do Condomínio Fechado Sierra Home Resort, que teve sua
construção vinculada à confirmação da instalação do supermercado Grupo Carrefour ao lado desse
condomínio, além da boa acessibilidade pela Av. Manoel Tavares que leva em direção ao centro.
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VILLAÇA, Flávio. Espaço Intra-urbano no Brasil. São Paulo: Studio Nobel/ FAPESP/ Licoln
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1
Esse texto foi produzido a partir da pesquisa Cidades Médias Brasileiras: agentes econômicos e reestruturação urbana
e regional, financiada pelo CNPq através do Edital Casadinho (Processo 620008/2008-3). Parte do seu conteúdo integra
relatórios, bem como textos (artigos, trabalhos em eventos, monografias de conclusão de curso, dissertações de
mestrado e relatórios de iniciação à pesquisa) produzidos pela equipe que realiza a pesquisa na cidade de Campina
Grande: Carlos Augusto de Amorim Cardoso, Sergio Fernandes Alonso, Rogério Bezerra, Ernani Martins Filho, Andrea
Leandra Porto Sales, Yure Silva Lima, Rafaela Fernandes, Péricles Batista, Leonardo Barboza Costa, Sonale
Vasconcelos Costa, Mateus Augusto Araújo e Karlla Raquel da Silva.
2
Lei de 21 de agosto de 1964, publicado no Diário Oficial da União – DOU de 11/09/64. Disponível em http://
www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L4380.htm. Acesso em 10 de março de 2010.
3
Os INOCOOPs, entidades com caráter de Sociedade Civil sem fins lucrativos e regulamentados pelas Resoluções
68/66 e 95/66, ambas do BHN, foram instalados nos estados e tinham como atribuições prestarem assessoria técnica e
política com a finalidade de orientar as Cooperativas Habitacionais, em todas as operações necessárias para a produção
e aquisição da moradia.
4
Lei Federal Nº 11.124 de 16 de Julho de 2005.
5
O Pró-Moradia financia o acesso à moradia adequada à população em situação de vulnerabilidade social e com
rendimento familiar mensal preponderantemente de até 3SM.
6
Programa cujo objetivo é oferecer acesso à moradia adequada a cidadãos com rendimento familiar mensal bruto não
superior a R$ 1.050,00 por intermédio da concessão de subsídio.
7
http://server.ew3servers.com/~cehap/regioes.php?regiao=2 em agosto de 2008.
8
O termo aglomerado subnormal é o utilizado pelo IBGE e corresponde a “um conjunto constituído por um mínimo de
51 domicílios, ocupando ou tendo ocupado até período recente, terreno de propriedade alheia – pública ou particular –
dispostos, em geral, de forma desordenada e densa, e carentes, em sua maioria, de serviços públicos essenciais. Podem
se enquadrar, observados os critérios de padrões de urbanização e/ou de precariedade de serviços públicos essenciais,
nas seguintes categorias: invasão; loteamento irregular ou clandestino; e áreas invadidas e loteamentos irregulares ou
clandestinos regularizados em período recente (IBGE. Série Relatórios metodológicos, volume 25, Metodologia do
Censo Demográfico 2000. Rio de Janeiro, 2003).
9
Em uma primeira visita, no ano de 2007 foram identificados 10 barracos, mais recentemente em julho de 2009
contabilizamos 25 barracos.
10
Brejo é uma denominação dada a uma região do estado da Paraíba, caracterizada pelo clima úmido e relevo
acidentado – Planalto da Borborema.