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Fernando Paixão, poeta e professor, nasceu em Portugal, em 1955, vindo a transferir-se 6

anos depois para o Brasil. Aqui, formou-se em Filosofia na Universidade de São Paulo
(USP) e deu início a sua produção literária a partir livro Rosa dos Tempos – de 1980,
seguido de O Que é Poesia? dentro da coleção Primeiros Passos, dois anos após.

Nesta referida obra – “O que é poesia?” – Paixão debate a importância da poesia enquanto
entidade ativa no tecido social e como se dá, de fato, essa relação entre linguagem e
sociedade, bem como a função do tempo e o ritmo da poesia.

Em primeira análise, o poeta parte do pressuposto emocional que vem, em seguida, guiar
a discussão, ao afirmar que a poesia age como um fogo rápido que esquenta a frieza do
dia-a-dia e desvenda fatos reais através de uma lente especial: a sensibilidade. Ou seja, a
partir da marca pessoal e intrasferível do autor é tecida a poesia como um todo e, diante
da realidade vivida pelo leitor a essência do poema é captada.

Para embasar seu argumento, Paixão discute a famigerada frase “Eu te amo”, tão
desgastada, mas que ao ser reelaborada e reinventada por cada pessoa, traz consigo um
significado único e particular. Logo, para o ensaísta, a poesia é aquilo que vem do
sentimento, que acontece devido a alguma experiência captada e sintetizada pelo poeta.

As palavras são a união de letras sensíveis, assim começa o capítulo denominado


“Linguagem tem preço”; nele, Fernando faz uma análise efetiva acerca das palavras que
compõem um poema, afirmando assim, que mesmo sendo carregadas por letras visíveis
não possui conteúdo concreto, embora abram espaço para a imaginação. Palavras são
usadas nas mais diversas ocasiões assumindo diferentes significações como forma de
conhecer e intervir sobre a realidade.

Apesar de conhecer as palavras com maestria, o poeta – segundo Paixão – é imprevisível


para com elas, pois pode escrever laudas lamentando um acontecido ou declarar seus
pêsames em apenas duas linhas. O que é relevante para o poeta são seus sentimentos que
demonstram a sua visão de mundo, e ele fará isso refazendo o significado das palavras,
retirando-as do seu cotidiano e colocando-as em um contexto diferente e, portanto, não
usual.

Diante disso, pode-se perceber que a poesia se qualifica principalmente pelo uso criativo
e inovador que se faz das palavras, expressando a subjetividade.
Antigamente, a linguagem possuía um caráter poético, desfrutado pelo coletivo por meio
dos rituais e cerimônias, mas com a divisão dos homens em classes sociais coagiu a poesia
a limitar-se ao domínio dos poetas. A linguagem deixou de ser expressão coletiva de
autenticidade para tornar-se instrumento de dominação do homem sobre o homem. Em
virtude dessa problemática, passou a sobressair na sociedade a linguagem prática usada
na política em função de resultados econômicos e sociais, enquanto o valor da linguagem
poética foi esvaindo-se e tomando um lugar de privilégio onde poucos têm acesso.

Diante disso, Paixão apresenta a seguir o que ele entende como sendo um grande impasse
da sociedade atual, que é entender a poesia contemporânea. Tal problemática dá-se pelo
fato das pessoas lerem poemas como se lê um jornal ou como se estuda um livro didático.
Esses materiais impressos lidos por uma grande parcela da sociedade são como maneiras
de dominação, onde comumente é ditado o que deve ou não deve ser feito. Com o seu
desânimo mental, adaptadas às normas recebidas pelos ditadores acerca das trilhas do
caminhar, os indivíduos assustam-se ao notar que a poesia fala sobre o incerto e usa
expressões de subjetividade. Aterrorizam-se de verem que a poesia não conduz a um
aprendizado direto e imediato, mas estimula o uso das faculdades do pensar, além de
estimular o senso crítico do ser que, em tese, deveria ser pensante e fazer da subjetividade
a sua alavanca em busca de benefícios.

Como já mencionado, o grande motivador de tal problemática é o inacesso as poesias,


estando disponível a uma pequena parcela dominante, tendendo à formação do quadro
social poético que Fernando Paixão nos apresenta.

O autor expõe, de forma prática, quatro tempos que se encontram no momento do poema,
apresentando a sua concepção no tempo. Paixão nos fala sobre o tempo histórico-social
vigente na situação ideológica do poema; o tempo pessoal do indivíduo do poeta, com
suas próprias experiências, existências e a sua vivência na linguagem durante anos; o
tempo das imagens que aparecem intrínsecas no poema, onde aos poucos são revelados
que o poeta tem um universo simbólico e, por fim o tempo rítmico da frase, em que o
leitor é incentivado a um movimento imaginário no pensamento.

Fazendo aplicação da subjetividade, o poeta determina uma ponte entre ele, com seu
universo simbólico e o real. Percebe-se então que todos os tempos, através do uso das
tendências emocionais, passam a se relacionar simultaneamente dentro da realidade,
viabilizando assim que o poeta faça a associação dos quatro tempos, sintetizados por meio
do tempo poético, apresentando no tema central do poema a ligação desses tempos
determinantes.

No último capítulo, o papel do devaneio também é levantado pelo autor permitindo ao


poeta o livre passeio entre as ideias e as coisas da realidade, sem uma pré-organização e
sem uma ordem temporal fixa.

Paixão finaliza o livro afirmando que o ser poético – bem como o fazer – não equivale
somente a ter sabedoria para procurar palavras e organizar estruturalmente os versos, mas
principalmente saber britar e jardinar fatos no mundo da vida: solidariedade, diferenças,
amor, ou seja, uma capacidade que esteja ao alcance de todos.

Dessa forma, é compreensível a visão de Fernando Paixão a respeito da definição de


poesia: verso que desfruta da criatividade e inovação no jogo das palavras, resultando no
processo de subjetividade que provoca comoção no leitor conforme suas vivências.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

PAIXÃO, Fernando. O que é poesia. São Paulo: Brasiliense, 1982.

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