Você está na página 1de 84

DIREITO PENAL-RESUMO Aiken Renkel Afonso – UMN - Faculdade de Direito - 2020

1
DIREITO PENAL-RESUMO Aiken Renkel Afonso – UMN - Faculdade de Direito - 2020

Aiken Renkel Afonso

Resumo:
Direito penal
Questões fundamentais
Doutrina geral do crime

2ª Edição
2020

Estuda por prazer, não para honra nem glória, apenas faça por prazer. Inédito.

Lubango, 23 de Fevereiro de 2020

2
DIREITO PENAL-RESUMO Aiken Renkel Afonso – UMN - Faculdade de Direito - 2020

AIKEN RENKEL AFONSO, estudante de direito pela


Universidade Mandume Ya Ndemufayo, Huíla (Lubango)
desde 2016, conforme o nº de estudante: 2016138828.

Estudante do 5º ano, regime pós-laboral.


Especialidade: jurídicos Civis.
Jurisconsulto e pesquisador de direito penal.

A todos aqueles, principalmente aos meus queridos professores, com


quem aprendemos e o que para sempre continuaremos aprender. Sempre
transmitiram um certo rigor, passando a ideia que o jurista é um camaleão
científico, portanto urge a necessidade de nós auto superarmos, porque
fora é mais difícil do que dentro.

Como não poderia deixar de ser agradecer também a todos meus colegas,
desta forte lucánia. Tanto do regime pós-laboral assim, como os do regime
regular.

Não poderia parar de escrever sem deixar esse pequeno conselho, mas
vale, tirar 9 valores e reprovar do que, forçar uma a provação oculta em
sede de um exame especial e a posterior meter preso um inocente com
famílias para sustentar.

Portanto façamos o curso exclusivamente com dedicada vocação, com


amor, honestidade, competência, destemor e credibilidade, acima de tudo
com bastante respeito as autoridades.

3
DIREITO PENAL-RESUMO Aiken Renkel Afonso – UMN - Faculdade de Direito - 2020

Aiken Renkel Afonso

O presente resumo não está isento de erros.

APRESENTAÇÃO DO MANUAL
O Direito penal é o direito do povo, constitui uma parte da vida humana, aqui esta, a vida, a honra, a
liberdade. Portanto cuidado ao aplicar.

O presente resumo, em sua 2ª edição, vem adequado ao código de 1886, bem como ao Anteprojecto
do CP versão 2018 e buscando enriquecer a cultura do operador do Direito, tornando-se ferramenta
imprescindível àqueles que desejam aprimorar o domínio em direito penal e convertê-lo em
instrumento de trabalho com o esclarecimento da terminologia legal e doutrinária.

Trata-se de contribuição valiosa para todos aqueles que buscam a compreensão das questões básicas
em direito penal.

Entretanto o resumo em causa, divide-se em duais partes, tal como o Código Penal e o Anteprojecto,
temos um por lado a Parte Geral, este que por sua vez, faz um estudo sobre os elementos
constitutivos do conceito de crime e as consequências gerais que da realização, total ou parcial,
derivam penas, e as medidas de segurança.
Por outro lado a Parte Especial, procura estudar os crimes singulares, como sejam: homicídio, furto,
roubo.

Porem, não trazemos nenhuma teoria, tão pouco princípios ou regras, apenas nos limitados aos
escritos de F. Dias e outros penalistas da actualidade, tudo porque ainda nada sabemos sobre Direito
Penal.

4
DIREITO PENAL-RESUMO Aiken Renkel Afonso – UMN - Faculdade de Direito - 2020

Abreviaturas

Art……………………………………………………………………..……………….…………Artigo
Arts………………………………………………………………..……………………………..Artigos
CRA…………………………………………………………...... Constituição da República de Angola
Ant……………………………………………………………………………...……..…………….ante
Proj…………………………………………………………………………...…..…...………...projecto
Vig………………………………………………………………………...……………………..vigente
CP……………………………………………………………………...………………….Código Penal
Prof………………………………………….............................................................................professor
p. ex…………………………………………………………...……………………………por exemplo
pag…………………………………………..................................................................................página

5
DIREITO PENAL-RESUMO Aiken Renkel Afonso – UMN - Faculdade de Direito - 2020
Índice geral
PARTE I
TÍTULO I
NOÇÕES FUNDAMENTAIS
1. Noções fundamentais……………….………………………………..……………...…………7
2. A localização do direito penal no sistema jurídico (Direito penal intra-estadual e direito
internacional penal)…………………………………...…………...………………………….…...11
3. A ciência conjunta do direito penal…………………………………...……...…………….…12
3.1. Enciclopédia do direito penal ……………………………..……………...…………..…...….12
4. Normas jurídicas (regras, princípios fundamentais do direito penal)...................................…13
4.1. Classificação das normas penais…………………………………………...………….......….13
4.2. Princípios fundamentais do direito penal …………………………....………………..….......15
5. Fontes do direito penal………………………………………………………………..…..…..18
6. Função do direito penal (fins das penas art. 40º ant.2017)…………….……………………..19
6.1. O problema do fim das penas criminal (teorias)……………………………...……......…......20
7. Medidas de segurança e penas………………...…………………………...………..………..21
8. Comportamento criminal e sua definição…………………………………………….....……25
8.1. Crime e contravenção………………………………………………………………..………..28
9. Responsabilidade penal da pessoa jurídica…………………………………..………...……..28
10. A lei penal e sua aplicação……………………………………………...……………..….…..29
10.1. Aplicação do direito penal no tempo ………………………………..………..………31
10.2 Aplicação da lei penal no espaço…………………………………………..……….…...…...36
10.2.1. O chamado critério do pavilhão……………………………………….…….............…….38
10.2.2.Questão da extradição…………………………….…………...….…………..……......…..39
11. Da extinção da punibilidade………………………………………………..………….…....…41

Parte II
Doutrina geral do crime (teoria da infracção)
Construção da doutrina do crime (do facto punível)
1. Generalidade……………………………………………………………...………….……….43
1.1. Elementos da teoria da infracção (acção, tipicidade, ilicitude, culpa, e punibilidade)……….44
1.1.1.O dolo……………………………………………...…………………………………….…..46
1.1.2. Negligencia………………………………………………………………....…..……....…..49
2. Tipo de culpa…………………………………………………………………….…..………….51
2.1. A actio libera in causa …………………………………………………………………......…53
2.2. Imputabilidade em razão da idade…………………………………….…………......………..54
3. Os factos puníveis dolosos da acção, Os tipos incriminadores, O tipo objectivo de
ilícito…….…………………………………………………………………………………...……55
3.1. Questões gerais da tipicidade…………………..…………………………..…..........…….…55
3.2. Construção dos tipos incriminadores (tipos de crime)………...………………….…....….....56
4. Imputação objectiva do resultado à acção……………..…………………..….…...…..……...63
5. Tipo subjectivo de ilícito……………………………………….………..……...……..…...…66
6. Os tipos justificativos (causas da exclusão da ilicitude)………………..……..…….….…….69
6.1. Da inimputabilidade por embriaguez……………………………….…………………….…..73
6.2. Da inimputabilidade por doença mental ou desenvolvimento mental incompleto ou
retardado………………………………….……………………...……………………..……....….73
7. Causas de exclusão da culpa (a inexigibilidade)…………………….....………...……….…..74
8. Formas do crime, A preparação e a tentativa, Iter crimes…………..……..………...….….…75
8.1. A comparticipação nos crimes dolosos de acção……………………….…………...….….…78
9. O concurso de crimes……………………………………………...…………….……...…….83
10. Bibliografia ……………………………………………………………………………..……84

6
DIREITO PENAL-RESUMO Aiken Renkel Afonso – UMN - Faculdade de Direito - 2020

PARTE I
TÍTULO I
NOÇÕES FUNDAMENTAIS

INTRODUÇÃO
Onde existe sociedade, há crime (ubi societas, ibi crimen) e, bem por isso, deve haver o Direito
Penal. Este, ainda que de modo primitivo, sempre se fez presente em todos os agrupamentos sociais.

O Direito Penal é o rosto do Direito, no qual se manifesta toda a individualidade de um povo, seu
pensar e seu sentir, seu coração e suas paixões, sua cultura e sua aspereza. Nele se espelha a sua
alma1.

1. CONCEITO DE DIREITO PENAL


Inúmeras são as definições aduzidas pelos diversos autores

O direito penal ou direito criminal é um ramo do direito público, composto por normas
imperativas, criadas pelo Estado (art. 164 al. e) CRA), punem com penas de prisão ou medidas de
segurança, certas condutas socialmente reprováveis, cujo seu cumprimento é de carácter obrigatório,
normas essas que visam limitar o exercício do poder do estado e, salvaguardar os bens jurídicos
(vida, património, honra2).

Para Von Liszt, Direito Penal é o conjunto das prescrições emanadas do Estado que ligam ao crime,
como facto, a pena como consequência3. (Conceito insuficiente para definir o direito penal)

Numa formulação simples e despretensiosa, poder-se-ia conceituar o Direito Penal como o ramo do
Direito encarregado de definir as infracções penais e cominar-lhes a respectivas sanções4.

O Direito penal é um conjunto de normas jurídicas que ligam a certos comportamentos (crimes e
estado de perigosidade social) a certas consequências (penas e medidas de segurança).5

2 QUESTÕES EM REFLEXÃO
2.1. Direito penal é um direito público ou privado?
Santos Justos trata-se de um ramo do direito público, que protege a ordem jurídica de ataques cuja
particular gravidade ofende as condições essencial da vida em sociedade6.

1
Tobias Barreto
2
Nosso
3
Cit. Jesus, de Damásio – Direito penal-vol. 1-ed. 32- parte geral-Tratado de direito penal, trad. J. Higino, v. 1, p. 1.
4
Estefam, André-parte geral do direito penal-vol 7-2018
5
Dias, Jorge de Figueiredo- direito penal-parte geral-questões gerais e doutrina do crime-ed.2 tomo 1-ano 2007

7
DIREITO PENAL-RESUMO Aiken Renkel Afonso – UMN - Faculdade de Direito - 2020

Oliveira Ascensão, não se justifica o entendimento do direito penal como ramo do direito público, os
deveres penais são deveres dos indivíduos e, o facto de as penas serem aplicadas judicialmente não
implica que o direito penal regule actividade do estado7.

A generalidade de autores sustentam que é um ramo do direito Publico, bem como: Eduardo Correia,
Figueiredo Dias, Miguel REALE, Baptista Machado, Galvão Telles e etc.

Para termos uma posição quanto a essa questão, o fundamental é recorrer os ensinamentos do
primeiro ano na cadeira de Introdução ao Estudo de Direito, sob tema Ramos do Direito, onde na
pag. 234, A. Santos Justo propõe alguns critérios diferenciadores.8

2.2. As normas punitivas sancionatórias são propriedade exclusiva do direito penal?


Apesar do código penal de 1886 vig., no seu artigo (1º) primeiro sustentar categoricamente, que
crime ou delito é o facto voluntário declarado punível pela lei penal.

Nós entendemos que não, porque existem normas sancionatórias que não são propriedade exclusiva
do direito penal, é o caso por exemplo das relações provenientes de um contrato em que as partes
podem estabelecem uma cláusula penal ou convencional. Dá-se também à normas que desembocam
em crimes falimentares.

3.DIFERENÇA ENTRE ILÍCITO PENAL, CIVIL, ADMINISTRATIVO E DISCIPLINAR9


a) Ilícito penal - corresponde a violações que a ordem jurídica considera criminosas, a única
sanção adequada é a pena.

b) Ilícito civil - são estabelecidas pelo direito civil em relação a condutas indignas. Cuja
repressão assenta nas sanções de indemnização, da execução forçada do património, da
restituição in natura ou in specie, da anulação do acto etc.

c) Ilícito administrativo ou contra-ordenacionais - são geralmente dimanadas da


administração pública e punem com coimas, certas condutas susceptíveis de lesarem
interesses fundamentais.

d) Ilícito disciplinar - aplicam-se à infracções de deveres de determinadas categorias


profissionais no exercício da perspectiva actividade laboral. Sucede com repreensão,
suspensão e despedimento.

6
Justos, A. Santos-INESD-Ed-6-2012-pag.249
7
ibidem
8
Qual é a tua posição?
9
Justos A. Santos-INESD- Ed-6.2012

8
DIREITO PENAL-RESUMO Aiken Renkel Afonso – UMN - Faculdade de Direito - 2020

4. LEI PENAL E NORMA PENAL


Lei e norma são conceitos distintos. A lei corresponde ao enunciado legislativo e a norma refere-se
ao comando normativo implícito na lei. Assim, por exemplo, no art. 349º do CP, a lei penal é “Matar
alguém. Pena reclusão, de dezasseis a vinte anos”. A norma penal, por outro lado, é “não matarais”.

Lei - compreende todos os Diplomas emanados pela Assembleia da República.


Norma – é considerada como um modelo que orienta a conduta humana (A. Santos Justos).

5. A LEI PENAL REVESTE-SE DAS SEGUINTES CARACTERÍSTICAS


a) Imperatividade - impõe-se a todos independentemente de sua vontade ou concordância;
b) Exclusividade - somente a ela cabe a tarefa de definir infracções penais;
c) Generalidade - incide sobre todos, generalizadamente;
d) Impessoalidade - projecta-se a factos futuros, sem indicar a punição a pessoas determinadas.

6. ESPÉCIES DE NORMA PENAL


As normas penais têm algumas espécies dentre as quais temos: a norma penal incriminadora e a não
incriminadora. Mas adiante desenvolveremos, esta temática.

7. CONTEÚDO DO DIREITO PENAL (OBJECTO DO DIREITO PENAL)


Segundo figueiredo Dias, o conteúdo do Direito Penal abarca o estudo do crime, da pena, as
medidas de segurança, e o estado de perigosidade social, que são os seus elementos fundamentais.

8. DIREITO PENAL SUBSTANTIVO E ADJECTIVO


a) Direito penal substantivo ou material, é sinónimo de direito penal objectivo - ou seja, é um
conjunto de normas (princípios e regras) que se ocupam da definição das infracções penais e da
imposição de suas consequências (penas ou medidas de segurança).

b) Direito penal adjectivo ou formal - corresponde ao direito processual penal.

9. DIREITO PENAL OBJECTIVO E SUBJECTIVO


Como dissemos no tópico anterior, entende-se por direito penal objectivo – como um conjunto de
normas (princípios e regras) que se ocupam da definição das infracções penais e da imposição de
suas Consequências (penas ou medidas de segurança).

Cuida o direito penal subjectivo – o direito de punir do Estado ou ius puniendi estatal; isto é, o
direito que o Estado possui de exigir que as pessoas se abstenham de praticar uma conduta definida

9
DIREITO PENAL-RESUMO Aiken Renkel Afonso – UMN - Faculdade de Direito - 2020

como infracção penal (direito de punir em abstracto) e de exigir do infractor que se submeta às
consequências da infracção praticada (direito de punir concreto).

Só o Estado tem o direito de aplicar sanções. Só o Estado é o titular do jus puniendi, que é o Direito
Penal subjectivo. Mesmo nos casos de legítima defesa e de acção penal privada, o exercício desses
direitos não é transferido ao particular, pois o Estado conserva o monopólio do direito de punir (174º
CRA).

10. CARACTERES DO DIREITO PENAL


O Direito Penal regula as relações do indivíduo com a sociedade. Por isso, não pertence ao Direito
Privado, mas sim ao Público.

Quando o sujeito pratica um delito, estabelece-se uma relação jurídica entre ele e o Estado. Surge o
jus puniendi, que é o direito que tem o Estado de actuar sobre os delinquentes na defesa da sociedade
contra o crime.

11. DIREITO PENAL COMUM (primário ou ainda direito penal nuclear) E DIREITO PENAL
ESPECIAL (secundário ou ainda direito penal complementar)

a) O direito penal comum - cuja aplicação compete à justiça comum, ou seja é um conjunto de
incriminações que figuram no Código Penal. Tido de outro modo o Direito Penal comum é aquele
que aplica-se a todos os cidadãos.

b) Direito Penal especial - é um conjunto de incriminações tipificadas em legislação penal avulsa ou


extravagante. Tido de outro modo o Direito Penal especial tem o seu campo de incidência adstrito
a uma classe de cidadãos, conforme sua qualidade particular.

Ex.: em Angola, o Direito Penal militar pode ser indicado como Direito Penal especial, pois a sua
aplicação se realiza por meio da justiça penal militar, ao lado desse temos ainda a lei sobre os crimes
de branqueamento de capitais.

10
DIREITO PENAL-RESUMO Aiken Renkel Afonso – UMN - Faculdade de Direito - 2020

12. ÂMBITO DO DIREITO PENAL:


 Direito penal substantivo, Direito penal executivo e Direito processual penal.

a) Direito penal substantivo ou objectivo - é um conjunto de normas (princípios e regras) que se


ocupam da definição das infracções penais e da imposição de suas consequências (penas ou
medidas de segurança), este encontra-se no código penal. Ou seja esse é o direito penal
propriamente dito.

b) Cuida o direito processual penal ou adjectivo - a aplicação, a realização e concretização do


direito penal ou do direito substantivo, este encontra-se no código processo penal.

c) Ao passo que o direito penal executivo - são regras que determinam a execução das penas.

13. PARTE GERAL DO DIREITO PENAL E AS SUAS COMPONENTES


Socorrendo-se aos dizeres de Figueiredo Dias10, o direito penal em sentido restrito e assim, também
o próprio código penal, compõe-se em parte Geral e parte Especial.

Parte geral (do art.1º ao art.129º cód. Penal de 1886, vig. e do art.1º ao art.146º anteprojecto cód.
Penal versão 2018), definem os pressupostos de aplicação da lei penal, os elementos constitutivos
do conceito de crime e as consequências gerais que da realização de crime, total ou parcial, derivam
penas, e as medidas de segurança.

Parte especial (do art. 130º ao art. 486º cód. Penal de 1886, vig. e do art. 147º ao art. 475º
anteprojecto versão 2018), estabelece os crimes singulares (homicídio, violação sexual, furto, roubo
etc.
TÍTULO II
A LOCALIZAÇÃO DO DIREITO PENAL NO SISTEMA JURÍDICO

1- DIREITO PENAL INTRA-ESTADUAL E DIREITO INTERNACIONAL PENAL


Há diversas normas penais que promanam do direito interno e se projectam para além de nossas
fronteiras, bem como normas há que, oriundas de fontes externas, irradiam sobre factos ocorridos nos
lindes de nosso território11.

O direito penal internacional corresponde justamente ao direito produzido internamente, cuja


aplicação se dá sobre factos ocorridos fora de Angola. O Código Penal de 1886, vig., no art. 53º, ao

10
Dias, Jorge de Figueiredo - direito penal-parte geral-questões gerais e doutrina do crime-tomo 1-ed.2-2007
11
Jesus, de Damásio – Direito penal-vol. 1-ed. 32

11
DIREITO PENAL-RESUMO Aiken Renkel Afonso – UMN - Faculdade de Direito - 2020

tratar da extraterritorialidade, contém uma série de regras que disciplinam a aplicação da lei penal
angolana a factos ocorridos no exterior, trata-se do direito penal internacional, ou seja, aquele direito
interno com incidência externa.

O direito penal internacional o seu instrumento jurídico mais importante é o Tratado de Roma, que
fundou a Corte ou Tribunal Penal Internacional (TPI). Referida Corte foi criada em Julho de 1998,
pela Conferência de Roma; encontra-se sediada em Haia, nos Países Baixos. E tem como
responsabilidade o julgamento de crimes contra a humanidade, crimes de guerra, de genocídio e etc.
TÍTULO II
A CIÊNCIA CONJUNTA DO DIREITO PENAL

1- ENCICLOPÉDIA DO DIREITO PENAL


Quando se fala em Ciência Penal deve-se ter presente que nela há que se distinguir a dogmática, a
política criminal e a criminologia12.
a) A dogmática
Dogmática significa o estudo dos dogmas. Dogma deriva do grego doxa, isto é, qualquer opinião ou
crença.
Por dogmática penal entende-se “disciplina que se ocupa da interpretação, sistematização e
desenvolvimento, dos dispositivos legais e das opiniões científicas no âmbito do direito penal.

Outrossim, a dogmática jurídica consiste no estudo das normas de um ordenamento em determinado


período. Trata-se da Ciência do Direito em sentido estrito13.
Desse modo, a dogmática jurídica de Angola desde o período colonial ou imperial até ao momento
possui princípios totalmente diversos da nossa realidade, combatendo a ideia clássica que segundo o
qual, direito é a manifestação de culturas.

A dogmática tem como objecto estudo do ordenamento jurídico. Sob esse prisma, o jurista procura
compreender a legislação e tomá-la aplicável dentro da ordem vigente. Afrontando esse raciocínio
denota-se uma certa dificuldade em compreender e aplicar normas vigentes em Angola porque as
mesmas encontram-se equidistantes do nosso contexto social.

Se não vejamos, não se compreende, o facto de Luanda não houver crimes de furto ou roubo de
gados, usar isto como fundamento bastante para que não haja uma lei que regula tais questões.

12
Estefam, André-parte geral do direito penal-vol 7-2018
13
Venosa Silvio-Indrodução ao estudo do Direito-Vol.

12
DIREITO PENAL-RESUMO Aiken Renkel Afonso – UMN - Faculdade de Direito - 2020

O facto de os crimes económicos lesarem bens patrimoniais, isto não é razão para que essas normas
tenham molduras penais brandas, quando na verdade é por causa do cometimento desses crimes, que
muitos chegam cometem crimes contra a vida. Ou seja os crimes contra a vida na maior parte das
vezes ou se não mesmo em via de regra têm como pano de fundo os crimes patrimoniais. Dai que,
olhando para o crescimento desses crimes urge a necessidade de ajustar à norma à realidade,
diferente do que se lê tanto no CP vigente, tal como no ANTEPROJECTO.

b) A política criminal
A política criminal, por sua vez, corresponde à que deve ser implementada no combate à
criminalidade. “É aquele aspecto do controle penal que diz relação com o poder que tem o Estado de
definir um conflito social como criminal ( art. 164º al. e) CRA).

c) A Criminologia
A Criminologia constitui ciência empírica, que, com base em dados e demonstrações fáticas, busca
uma explicação causal do delito como obra de uma pessoa determinada. Dito por outro modo é a
ciência que estuda o aparecimento do crime.
TÍTULO III
NORMAS JURÍDICAS (REGRAS E PRINCÍPIOS FUNDAMENTAIS DO DIREITO PENAL)

1- NORMAS JURÍDICAS
Já foi discutido mais acima sobre o assunto, nunca é de mais dar novamente um relance.
Comummente usa-se o termo norma para exprimir toda categoria de princípios legais.

O legislador não diz expressamente que matar é crime, que é proibido matar, e sim que a occisão da
vida de uma pessoa por outra enseja a aplicação de determinada pena.

Daí ter afirmado Binding que o criminoso não transgride a lei, mas sim o preceito proibitivo (norma).
A norma cria o ilícito, a lei cria o delito. A conduta criminosa viola a norma, mas não a lei, pois o
agente realiza exactamente a acção que esta descreve.

2- CLASSIFICAÇÃO DAS NORMAS PENAIS


As normas penais classificam-se da seguinte maneira:
2.1. Normas penais incriminadoras;
2.2. Normas penais não incriminadoras (permissivas);
2.3. Normas penais complementares ou explicativas
2.4. Norma penal em branco.

13
DIREITO PENAL-RESUMO Aiken Renkel Afonso – UMN - Faculdade de Direito - 2020

2.1.Normas penais incriminadoras


Normas penais incriminadoras são as que descrevem condutas puníveis e impõem as respectivas
sanções14.

No dizer de Figueiredo Dias, normas incriminadoras, são aquelas que criam ou agravam a
responsabilidade jurídico-penal do agente. São aquelas normas que de alguma forma contêm a
criação de crimes, ou que contêm agravamentos dos pressupostos de punibilidade ou de punição.
Ex.: 349º conjugando com o art. 34⁰ cód. Penal de 1886, vig. e o art. 147⁰ anteprojecto do cód. Penal
versão 2018.

2.2.Normas penais não incriminadoras (permissivas)


Normas penais não incriminadoras ou permissivas são as que determinam a licitude ou a
impunidade de certas condutas, embora estas sejam típicas em face das normas incriminadoras (A.
Estefam).

Nos dizer de Figueiredo Dias, Normas não incriminadoras ou favoráveis, são aquelas que visam
aplicação das penas, dito de outro modo são aquelas normas que visam diminuir a responsabilidade
jurídico-penal do agente, ou atenuá-la, tornando mais suaves os pressupostos da punibilidade ou da
punição. Ex.: 349⁰ CP articulando com 39⁰ CP de 1886, vig.

2.3. Normas penais complementares ou explicativas


Normas penais complementares ou explicativas são as que esclarecem o conteúdo das outras, ou
delimitam o âmbito de sua aplicação.

2. 4. Norma penal em branco


Foi Binding quem pela primeira usou a expressão “lei em branco” para baptizar aquelas leis penais
que contêm a sanctio juris determinada, porém o preceito a que se liga essa consequência jurídica do
crime não é formulado senão como proibição genérica, devendo ser completado por outra lei (em
sentido amplo)15.
Trata-se da lei cujo preceito primário é incompleto, embora o preceito secundário seja determinado.
Tal lei tem de ser completada por outra, já existente ou futura, da mesma hierarquia ou de hierarquia
inferior16.

14
Idem
15
Jesus, de Damásio – Direito penal-vol. 1-ed. 32
16
Estefam, André-parte geral do direito penal-vol 7-2018

14
DIREITO PENAL-RESUMO Aiken Renkel Afonso – UMN - Faculdade de Direito - 2020

Ex.: são leis penais em branco, uma vez que punem condutas relacionadas com drogas ilícitas sem
descrever quais seriam essas substâncias.
Pune a conduta daquele que contrai casamento tendo ciência da existência de impedimento que lhe
cause nulidade absoluta, sendo que tais nulidades não são definidas pelo Código Penal, mas constam
do Código Civil.
TÍTULO IV
1- PRINCÍPIOS FUNDAMENTAIS DO DIREITO PENAL
a) Princípio da legalidade ou da reserva legal
O principio da legalidade é visto como garantia do cidadão, face ao poder punitivo do estado.

Entre nós, esse princípio pode ser extraído do art. 64º, nº 1 e 2, da CRA, bem como nos art. 5º do CP
de 1886, vig. e o art. 1º do anteprojecto versão 2018. Cujo o seu conteudo traduz: Nullum crimen,
nulla poena,sine lege ( Não há crime, nem pena, sem lei).

b) Princípio da proibição da analogia “in malam partem”


Corolário da legalidade proíbe a adequação típica “por semelhança” entre factos. A luz do art. 18º CP
de 1886, vig. e o art. 1º nº 3 do anteprojecto versão 2018.

e) Princípio da fragmentariedade
É consequência dos princípios da reserva legal e da intervenção necessária (mínima). O Direito Penal
não protege todos os bens jurídicos de violações: só os mais importantes. E, dentre estes, não os
tutela de todas as lesões: intervém somente nos casos de maior gravidade, protegendo um fragmento
dos interesses jurídicos, por isso é fragmentário.

f) Princípio da intervenção mínima


Segundo o qual conforme o art. 57º da CRA, só devendo intervir o Estado, por intermédio do Direito
Penal, quando os outros ramos do Direito não conseguirem prevenir a conduta ilícita.
g) Princípio da ofensividade
O Direito Penal só deve ser aplicado quando a conduta ofende um bem jurídico, não sendo suficiente
que seja imoral ou pecaminosa.

h) Princípio da insignificância
Ligado aos chamados “crimes de bagatela” (ou “delitos de lesão mínima”), recomenda que o Direito
Penal, pela adequação típica, somente intervenha nos casos de lesão jurídica de certa gravidade,
reconhecendo a atipicidade do facto nas hipóteses de perturbações jurídicas mais leves (pequeníssima
relevância material).

15
DIREITO PENAL-RESUMO Aiken Renkel Afonso – UMN - Faculdade de Direito - 2020

Princípio da insignificância e bem de pequeno valor


Para efeitos de reconhecimento ou não do princípio da insignificância, não se pode confundir os
conceitos de bem de pequeno valor com bem de valor insignificante. Apenas o segundo,
necessariamente, propicia a atipicidade material da conduta. A acção de subtrair bem avaliado em
aproximadamente 5% do salário-mínimo vigente à época do facto não pode ser considerada
insignificante, no país como o nosso (Angola), onde existe famílias que sobrevivem diariamente por
apenas 500kz.

Esse princípio tem sido adoptado pela nossa jurisprudência nos casos de furto de objecto material
insignificante, lesão insignificante ao Fisco, maus tratos de importância mínima, descaminho e dano
de pequena monta, lesão corporal de extrema singeleza, roubo de uma galinha, furto de um pente ou
agulha e etc.

Segundo a jurisprudência nos exemplos expostos, para se caracterizar hipótese de aplicação do


denominado ‘princípio da insignificância’ e, assim, afastar a recriminação penal, é indispensável que
a conduta do agente seja marcada por ofensividade mínima ao bem jurídico tutelado, reduzido grau
de reprovabilidade, inexpressividade da lesão e nenhuma periculosidade social.
É importante que se compreenda tal como afirma Zaffaroni ‘princípio da insignificância’ não pode
excluir a tipicidade, mas deve mitigar a pena ou a persecução penal. Num juízo de tipicidade
conglobante, que envolve não apenas o resultado material da conduta, mas o seu significado social.

i) Princípio da culpabilidade
Nullum crimen sine culpa. A pena só pode ser imposta a quem, agindo com dolo ou culpa, e
merecendo juízo de reprovação, cometeu um facto típico e antijurídico.

Entre nós o mesmo vem previsto no art. 65º da CRA, conforme disposto o nº 1 a responsabilidade
penal é pessoal e intransmissível: o juízo de reprovabilidade (culpabilidade), elaborado pelo juiz recai
sobre o sujeito imputável que, podendo agir de maneira diversa, tinha condições de alcançar o
conhecimento da ilicitude do facto (potencial consciência da antijurisdicidade). O juízo de
culpabilidade, que serve de fundamento à medida da pena.

j) Princípio da humanidade
O réu deve ser tratado como pessoa humana. A CRA, reconhece esse princípio em vários
preceituadores como sejam: (arts. 1º, 2º, 30º, 59º, 60º, 63º ).

16
DIREITO PENAL-RESUMO Aiken Renkel Afonso – UMN - Faculdade de Direito - 2020

Dito por outro modo, é uma garantia material e restritiva da lei penal, verdadeira salvaguarda da
dignidade pessoal. Portanto, um estado de direito democrático visa a proteger e reprimir os actos que
tentam contra a dignidade da pessoa humana.

l) Princípio da proporcionalidade da pena


Chamado também “princípio da proibição de excesso”, determina que a pena não pode ser superior
ao grau de responsabilidade pela prática do facto.

Significa que a pena deve ser medida pela culpabilidade do autor. Daí dizer-se que a culpabilidade é
a medida da pena. A luz do art. 66º nº 1 da CRA.

m) Princípio do estado de inocência


Geralmente denominado “princípio da presunção de inocência”, está previsto 67º nº 2 da CRA,
segundo o qual “ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal
condenatória”.

Dele decorre a exigência de que a pena não seja executada enquanto não transitar em julgado a
sentença condenatória. Somente depois de a condenação tornar-se irrecorrível é que podem ser
impostas medidas próprias da fase da execução.

n) Princípio da igualdade
Todos são iguais perante a lei penal (art. 23º da CRA), não podendo o delinquente ser discriminado
em razão de cor, sexo, religião, raça, procedência, etnia etc.

o) Princípio do “ne bis in idem”


Art. 65º nº 5 da CRA, ninguém pode ser punido duas vezes pelo mesmo facto. Possui duplo
significado:
1.º) Penal (também chamado caso julgado material): ninguém pode sofrer duas penas em face do
mesmo crime;
2.º) Processual (também chamado caso julgado formal): ninguém pode ser processado e julgado duas
vezes pelo mesmo facto.

p) Princípio da representação ou da bandeira


Trata-se de um princípio subsidiário, e, quando houver deficiência legislativa ou desinteresse de
quem deveria reprimir, aplica-se a lei do Estado em que está registada a embarcação ou a aeronave
ou cuja bandeira ostenta aos delitos praticados em seu interior.

17
DIREITO PENAL-RESUMO Aiken Renkel Afonso – UMN - Faculdade de Direito - 2020

TÍTULO V
FONTES DO DIREITO PENAL
CONCEITO
Fontes de Direito - são os modos de formação e revelação das normas jurídicas. Juridicamente, fonte
é o lugar donde provém a norma de direito. Fonte do Direito Penal é, pois, aquilo de que ele se
origina, no dizer de Magalhães Noronha.

1- AS FONTES DO DIREITO PODEM SER FORMAIS E MATÉRIAS.


As fontes formais dividem-se em:
a) Fontes formais imediatas e
b) Fontes formais mediatas.

Fontes Imediatas de Direito - são aquelas que têm força vinculativa própria, sendo portanto os
verdadeiros modos de produção de Direito. Ex.: lei.

Fontes mediatas de Direito - são aquelas que, embora não tenham força vinculativa própria, são
importantes pelo modo como influenciam o processo de formação e revelação da norma jurídica. Ex.:
costume, jurisprudência, doutrina e princípios gerais do Direito.

COSTUME
Como foi dito no primeiro ano, que o costume consiste no conjunto de normas de comportamento a
que pessoas obedecem de maneira uniforme e constante pela convicção de sua obrigatoriedade.

Por obediência uniforme entende-se a prática de actos da mesma espécie. Por constante, entende-se a
sua reiteração de forma continuada, por período mais ou menos longo.
Distingue-se o costume do hábito ou uso pela convicção de sua obrigatoriedade jurídica.

O costume não é fonte do direito penal, queremos com isso dizer que o costume não pode criar
delitos nem determinar penas muito menos medidas de segurança.

Entretanto, impede o princípio de reserva legal: não há crime sem lei anterior que o defina; não há
pena sem prévia cominação legal. A conduta punível, positiva ou negativa, só pode resultar de um
modelo legal, nunca de normas consuetudinárias. O costume não é fonte formal imediata e criadora
de Direito Penal. Por mais nocivo que seja um facto ao senso moral da colectividade, será atípico se
não estiver definido em lei como crime.

18
DIREITO PENAL-RESUMO Aiken Renkel Afonso – UMN - Faculdade de Direito - 2020

TÍTULO VI
FUNÇÃO DO DIREITO PENAL (FINS DAS PENAS ART. 40º ANT. PROJ. CP DE 2018)
1- GENERALIDADES
Já dizia Carrara que a função específica do Direito Penal é a tutela jurídica. Visa o Direito Penal a
proteger os bens jurídicos17.

Bem jurídico - o termo bem indica, sempre, algo positivo, como um favor, uma benesse, um proveito
ou uma ventura. Sob o prisma material, aponta para algo apto a satisfazer as necessidades humanas,
integrando seu património.

Em suma, o bem se apresenta vinculado aos mais preciosos interesses humanos, seja do ponto de
vista material, seja do prisma incorpóreo (moral ou ético). Há bens tutelados pelo Direito,
considerados indispensáveis à vida em sociedade, merecendo protecção e cuidado. A partir disso, o
bem se transforma em bem jurídico.

Bem Jurídico - é tudo aquilo que pode satisfazer as necessidades humanas. Todo valor reconhecido
pelo Direito torna-se um bem jurídico. Os bens jurídicos são ordenados em hierarquia. O Direito
Penal visa a proteger os bens jurídicos mais importantes, intervindo somente nos casos de lesão de
bens jurídicos fundamentais para a vida em sociedade18.

A Constituição da República (CRA) indica vários bens jurídicos, muitos dos quais ingressaram no
universo do Direito Penal. Ilustrando, vêem-se os seguintes bens jurídicos fundamentais: vida,
liberdade, igualdade, segurança, propriedade, intimidade, vida privada, honra, trabalho, dentre outros.
A eleição do bem jurídico vida dá ensejo a outros.

Nos dizer do prof. Figueiredo Dias o mestre do Direito penal Português, defende que a função do
Direito Penal apreende-se através da natureza do seu objecto, o facto ou comportamento criminoso, e
da especificidade das consequências jurídicas que àquele se ligam, as penas e as medidas de
segurança e os crimes.

Desta forma, demonstrar-se-á a que execução da pena de prisão deve orientar-se no sentido da
reintegração do recluso na sociedade, preparando-o para conduzir a sua vida de modo socialmente
responsável, sem cometer crimes19.

17
Cit. Por Jesus, de Damásio – Direito penal-vol. 1-ed. 32
18
BEM JURÍDICO também entendido como Valor ideal da ordem social que está juridicamente protegido. (A vida, por
exemplo, a propriedade, a vida intra-uterina).
19
Artigo 40 nº 2 do anteprojecto do Código penal.

19
DIREITO PENAL-RESUMO Aiken Renkel Afonso – UMN - Faculdade de Direito - 2020

2- O PROBLEMA DO FIM DAS PENAS CRIMINAL


Conceito de pena - é a sanção imposta pelo Estado, por meio de acção penal, ao criminoso como
retribuição ao delito perpetrado.

O fim das penas debate-se a luz de algumas teorias como sejam:


a) Teorias absolutas - pena como um instrumento de retribuição
Para esta teoria o fim da pena reside na retribuição, expiação, reparação ou compensação do mal
do crime.
Pune-se porque se pecou; “punitur quia peccatum est ” (já lá dizia o velho Platão). A pena era vista
como um castigo do mal do crime.

Para Kant, adepto dessa teoria, mesmo se uma sociedade voluntariamente se dissolvesse, ainda assim
o último assassino deveria ser punido, a fim de que cada um recebesse a retribuição que exige sua
conduta20. Nota-se, então, que a base das teorias absolutas encontra-se no passado, que demanda
reparação.

b) Teorias relativas - pena como um instrumento de prevenção


A frase de Kant certamente seria criticada pelos adeptos das teorias relativas. Romangnosi, ponderou
que se depois do primeiro crime existisse a certeza moral de que outro não seria praticado, a
sociedade não teria o direito de punir o agente.
Assim, esta teoria pune-se para não delinquir, isto consistiria justamente em evitar a ocorrência de
novos crimes.
 As teorias da prevenção subdividem-se em de prevenção geral21 e Prevenção especial

A prevenção geral – (intimidação dirigida a todo o corpo social por meio da ameaça da pena),
significa que a ameaça psicológica da pena servirá como elemento inibidor de comportamentos
criminosos. Trata-se da construção artificial (por meio da lei) de um freio interno, necessário quando
os freios religiosos, morais, éticos ou sociais falharem22, (intimidar a sociedade).

Prevenção especial – intimidação para evitar que o delinquente, após ter cumprido a pena e sofrer
suas consequências, volte a praticar novos crimes, (intimidar o delinquente).

20
Estefam, André-parte geral do direito penal-vol 7-2018
21
Prevenção geral, tem duas componentes: prevenção geral positiva – visa a integração - e a prevenção geral negativa –
visa a intimidação, a inibição do delinquente.
22
Dias, Jorge de Figueiredo - direito penal-parte geral-questões gerais e doutrina do crime-ed.2tomo 1-ano 2007.

20
DIREITO PENAL-RESUMO Aiken Renkel Afonso – UMN - Faculdade de Direito - 2020

c) Teorias mistas ou unificadas


As teorias mistas partem do pressuposto de que as funções retributivas e preventivas não são
inconciliáveis. Por esse motivo, pode-se identificar na pena um duplo papel: retribuir e prevenir
(punitur quia peccatum est et ne peccetur).

3- TEORIA DA PREVENÇÃO GERAL POSITIVA


As tradicionais teorias que acima foram analisadas baseiam-se, sem excepção, numa racionalidade
instrumental, isto é, enxergam a pena como um instrumento destinado à consecução de um
determinado objectivo (justa retribuição ou prevenção contra novos crimes).
Contudo, a pena deve ser encarada como mecanismo de comunicação de transmissão de mensagens.

Para entender melhor esta ideia, a pena (aplicada) é um mecanismo necessário para transmitir a todos
uma mensagem, sem a qual a sociedade não funcionará correctamente. A mensagem de que, apesar
do crime cometido, a norma segue vigente essa informação somente será transmitida, insista-se, se a
pena for efectivamente aplicada.

4- PREVENÇÃO ESPECIAL POSITIVA


Trata-se do objectivo de, uma vez imposta a pena, reeducar o condenado e promover sua reinserção
social. Art. 40º Anteprojecto. CP versão 2018.

5- CULPA COMO PRESSUPOSTO E LIMITE DA PENA (ARTS 41º E 42º ANT.PROJ.


CP 2018)
A culpa é o pressuposto irrenunciável de aplicação de qualquer pena.23, Esses limites devem ser
deduzidos, em primeiro lugar, do princípio da dignidade da pessoa humana e, além disso, das
inúmeras garantias constitucionais, como sejam arts. 59º, 60º, 63º até ao 69º, todos da CRA.

TÍTULO VII
MEDIDAS DE SEGURANÇA

1- FINALIDADE E LEGITIMAÇÃO DAS MEDIDAS DE SEGURANÇA


As medidas de segurança constituem espécies do género da sanção penal. Nosso Código, reserva aos
agentes inimputáveis ou semi-imputáveis em razão de doença mental ou desenvolvimento mental
incompleto ou retardado (CP vigente, art. 47º e 48º), que, comprovadamente, praticaram o facto
definido como crime ou contravenção penal.

23
Art. 42º no 1 do anteprojecto do CP.

21
DIREITO PENAL-RESUMO Aiken Renkel Afonso – UMN - Faculdade de Direito - 2020

MEDIDA DE SEGURANÇA E PENA


Partindo sobretudo do estudo sistemático levado a cabo pelo Prof. F. Dias, procurar-se-á caracterizar
um sistema de reacções criminais que, na perspectiva da protecção e defesa dos direitos humanos,
possa considerar-se integrado no chamado movimento internacional de reforma penal, penetrado por
um património de ideias que radicam num fundo político-criminal comum, de que podem apontar- se
como matrizes.

Num direito penal moderno, resultante da sucessiva evolução que tem sofrido, no sentido de melhor
satisfazer as exigências do Estado de Direito, as consequências jurídicas do crime correspondem,
essencialmente, às reacções ou sanções criminais, ou seja, às penas e medidas de segurança de cuja
articulação, na resposta ou reacção ao mesmo facto, depende a caracterização do sistema como
monista, dualista ou híbrido24.

O sistema do C. Penal de 1886, na sua versão vigente, tal como o anteprojecto do C. Penal
Angolano na versão 2018 permitem caracterizar o sistema de reacções criminais por eles abrangidos
como tendencialmente monista, na medida em que não são cumulativamente aplicáveis ao mesmo
agente, pelo mesmo facto, penas e medidas de segurança privativas da liberdade25.

A aplicação de penas e de medidas de segurança visa a protecção de bens jurídicos essenciais à


subsistência da comunidade social e a reintegração do agente na sociedade26.

A pena e a medida de segurança só podem ser aplicadas se forem proporcionadas à gravidade do


facto e à perigosidade do agente27 (66º nº1 CRA).

I. ESPÉCIES DE PENAS
De acordo com a classificação adoptada pelo Prof. Cavaleiro de Ferreira, as penas podem ser de
diversas espécies28.
a) Quanto ao seu objecto
b) Quanto à sua gravidade
c) Quanto à sua duração
d) Quanto à sua graduabilidade

24
Direito Penal e Processual Penal
25
ibedem
26
Art. 40 nº 1 do anteprojecto do Código penal.
27
Art. 42º nº anteprojecto CP
28
Não entraremos em descussão sobre o assunto, ver em: Latas, António J.-Duarte, Jorge D. e Patto, P. Vaz - direito
penal e processual penal-ano ed.2007.pag. 94 e 95

22
DIREITO PENAL-RESUMO Aiken Renkel Afonso – UMN - Faculdade de Direito - 2020

Entretanto interessa-nos é olhar para a classificação contida no C. penal de 1886, tal como a
classificação usada no Anteprojecto na versão 2018.

Desta feita consagra o C. Penal de 1886 as seguintes espécie de penas:


a) Penas maiores (enumeradas art. 55º), as penas maiores são todas de prisão;
b) Penas correccionais (enumeradas art. 56º);
c) Penas especiais para empregados públicos (enumeradas art. 57º).

Ora seguindo a classificação doutrinária adoptada, designadamente, pelo Prof. F. Dias e pela Prof.
Anabela Rodrigues, as penas podem distinguir-se entre penas principais, penas acessórias e penas
de substituição, que por sinal é a classificação adoptada pelo anteprojecto na versão de 2018 no
artigo 39º.

1- Penas principais
a) Prisão;
b) Multa.

2- Penas de substituição
a) Multa;
b) Prisão em fins-de-semana;
c) Prestação de trabalho a favor da comunidade;
d) Suspensão da execução da pena de prisão;
e) Admoestação.

3- Penas acessórias
a) Proibição de exercício de função;
b) Suspensão de exercício de função;
c) Proibição de conduzir veículos motorizados;
d) Expulsão do território nacional.

Penas principais - são as penas cominadas nos diversos tipos legais de crime previstos na parte
especial do código penal ou em legislação penal secundária e que podem ser concretamente aplicadas
na sentença condenatória, independentemente de quaisquer outras; são penas principais aplicáveis a
pessoas singulares a pena de prisão (pena privativa da liberdade) e a pena de multa (pena pecuniária).

Penas de substituição - são as penas de carácter não institucional ou detentivo aplicadas no lugar de
uma pena principal, após prévia determinação desta.

23
DIREITO PENAL-RESUMO Aiken Renkel Afonso – UMN - Faculdade de Direito - 2020

São penas de substituição em sentido próprio, as penas de suspensão da execução da prisão, multa de
substituição, prestação de trabalho a favor da comunidade, prisão em fim-de semana e de
admoestação.

Destas penas o C. Penal de 1886 prevê a multa de substituição (art. 86º) e a suspensão da execução
da prisão (art. 88º e ss).

Penas acessórias - são as que, previstas na parte geral ou especial do C. Penal ou, ainda, em
legislação avulsa, apenas são aplicáveis juntamente com uma pena principal ou pena de substituição
aplicada em seu lugar. São penas acessórias, entre outras, Proibição de exercício de função;
Suspensão de exercício de função; Proibição de conduzir veículos motorizados; Expulsão do
território nacional.

O chamado direito penal secundário é fértil em penas acessórias, nomeadamente as que se encontram
previstas para as pessoas colectivas, cuja punição é aí regime regra.

II. ESPÉCIES DE MEDIDAS DE SEGURANÇA:

São medidas de segurança (enumeradas no art. 70), do C. penal de 1886.

São medidas de segurança (enumeradas no art. 39 nº 4 ), do Anteprojecto entre as quais temos:


a) Internamento;
b) Suspensão da execução do internamento;
c) Interdição de actividades;
d) Cassação da licença de condução de veículos motorizados;
e) Interdição da concessão de licença de condução de veículos motorizados;
f) Cassação de licença de porte de arma;
g) Interdição de concessão de licença de porte de arma.

II.I. CLASSIFICAÇÃO DAS MEDIDAS DE SEGURANÇA:


a) Medidas de segurança pré-delituais e pós-delituais;
b) Medidas de segurança aplicáveis apenas a inimputáveis e imputáveis, Art. 101.º
ant.proj. e ss;
c) Medidas de segurança privativas da liberdade e não privativas da liberdade, Art. 109º
anteprojecto e ss;
d) Medida de segurança Detentiva e Restritiva.
A primeira distinção a fazer é entre medidas de segurança pré-delituais e pós-delituais, a que já se
aludiu, de acordo com a qual as primeiras têm a pretensão de evitar a futura prática de crimes,
mediante a sua aplicação a situações de perigosidade social, ligada a determinadas actividades ou
estilos de vida, de origem essencialmente exógena, como são os casos de chamada perigosidade dos

24
DIREITO PENAL-RESUMO Aiken Renkel Afonso – UMN - Faculdade de Direito - 2020

associais previstas no art. 71º do C. Penal de 1886, as medidas de internamento em casa de trabalho
ou colónia agrícola, ou a caução de boa conduta, aplicáveis a vadios, mendigos e equiparados
previsto nos artigos 256º até ao 260º todos do CP de 1886..

As medidas de segurança pós-delituais são – como o indica a sua designação, aplicáveis na


sequência da prática pelo agente de um facto qualificado como crime pela lei penal, de acordo, aliás,
com o princípio da Dignidade Humana inerente a um Estado de Direito e, portanto, a um direito
penal da culpa e não do agente, isto é, em que se reprimem factos ilícitos e não personalidades ou
meras opções de vida, sem efectiva violação da lei penal29.

As medidas de segurança podem ser ainda privativas da liberdade e não privativas da liberdade.

Medida de segurança Detentiva, consistente na internação em hospital de custódia e tratamento, e


medida de segurança Restritiva, consubstanciada em tratamento ambulatorial.

As medidas de segurança podem distinguir-se ainda entre as que são aplicáveis apenas a
inimputáveis, atendendo à necessária relação de causalidade entre a anomalia psíquica de que são
portadores e a perigosidade – criminal – manifestada no facto, e as que, prescindindo da culpa mas
podendo coexistir com ela, podem ser aplicáveis a imputáveis e inimputáveis.

TÍTULO VIII
COMPORTAMENTO CRIMINAL E SUA DEFINIÇÃO

1-CONCEITO DE CRIME
Em Angola, não existe um conceito legal de crime, ficando esse conceito a cargo da doutrina.
Embora o Código Penal de 1886 nos forneça um critério de distinção entre o crime e a contravenção
penal. Pela leitura do seu art. 1º (onde se lê: crime ou delito é o facto voluntário declarado punível
pela lei penal) como vêem não conseguimos destacar os elementos ou características indispensáveis
ao conceito de infracção penal.

1.1. Conceito formal e material de crime


a) Formal;
b) Material.
Conforme os ensinamentos de Bettiol, “duas concepções opostas se embatem entre si com a
finalidade de conceituar o crime: uma, de carácter Formal, outra, de carácter Material. A primeira
atém-se ao crime sub especie iuris, no sentido de considerar o crime ‘todo o facto humano, proibido

29
Latas, António J.-Duarte, Jorge D. e Patto, P. Vaz - direito penal e processual penal-ano ed.2007

25
DIREITO PENAL-RESUMO Aiken Renkel Afonso – UMN - Faculdade de Direito - 2020

pela lei penal’. A segunda, por sua vez, supera este formalismo considerando o crime ‘todo o facto
humano lesivo de um interesse capaz de comprometer as condições de existência, de conservação e
de desenvolvimento da sociedade’30.

Na verdade, os conceitos: formal e material não traduzem com precisão o que seja crime. Dai que
perfilhamos o conceito analítico.

1.2. Conceito analítico de crime


O conceito analítico do crime procura, como sua própria denominação sugere, analisar os elementos
ou características que integram a infracção penal, permitindo ao intérprete, após sua averiguação,
concluir ou não pela sua prática.

A função do conceito analítico é a de analisar todos os elementos ou características que integram o


conceito de infracção penal sem que com isso se queira fragmentá-lo. O crime é, certamente, um
todo unitário e indivisível.
O crime de forma analítica é entendido como uma acção típica, ilícita culposa e punível 31. A acção,
tipicidade, ilícita culposa e punível estão relacionadas logicamente de tal modo que cada elemento
posterior do delito pressupõe o anterior.

2-PRESSUPOSTOS DO CRIME: OBJECTO E SUJEITO


a) OBJECTO:
O objecto do crime pode ser material e jurídico
Objecto material - é a pessoa ou a coisa sobre a qual recai a conduta. Assim, o objecto material do
homicídio é a vítima; do furto, a coisa subtraída; do tráfico ilícito de entorpecentes, a substância
entorpecente.

Objecto jurídico - por outro lado, é o bem jurídico tutelado pela norma penal incriminadora. Assim,
nos exemplos acima, os objectos jurídicos seriam, respectivamente: a vida humana, o património e a
incolumidade pública.

b) SUJEITO:
O sujeito do crime: activo e passivo
O sujeito activo: é todo àquele que tem capacidade para delinquir, este pode ser singular ou
colectiva. Mencionado por outra forma é a pessoa que pratica o crime.

30
Cit. Por Rogerio greco, in código penal anotado – Brasileiro.Ed-6
31
Dias, Jorge de Figueiredo - direito penal-parte geral-questões gerais e doutrina do crime-ed.2-tomo 1-ano 2007

26
DIREITO PENAL-RESUMO Aiken Renkel Afonso – UMN - Faculdade de Direito - 2020

O sujeito passivo: é aquele que sofre acção levada a cabo pelo delinquente, este pode ser qualquer
pessoa colectiva ou singular, (criança ou adulto, nascido ou em face de formação ´´embrião´´).
Posição oposta ao preceito descritivo no artigo 66º do Código Civil. Dito por outra forma é a pessoa
que sobre o crime.

2- ELEMENTOS E CIRCUNSTÂNCIAS DO CRIME


I. Elementos: são os dados essenciais da figura típica, sem os quais não há crime. Ex.: são
elementos do crime de homicídio “matar” “alguém”.

II. Circunstâncias: por outro lado, são dados acessórios da figura típica que, agregados ao tipo
fundamental, influem na quantidade da pena, aumentando-a (art. 40º CP de 1886, vig.) ou
atenuando-a (39º CP de 1886, vig.). Exemplos: o facto de a vítima ser menor de 14 anos ou
maior de 60 constitui circunstância do homicídio.

I.I. Tais elementos, sejam essenciais e acessórios, podem ter natureza objectiva, subjectiva ou
normativa:
a) Elementos objectivos: são dados de natureza concreta, perceptíveis sensorialmente (isto é,
por intermédio de nossos sentidos). Exemplos: verbos núcleo do tipo (“matar” – no art. 349º do CP e
o art. 147º anteprojecto. CP versão 2018).
b) Elementos subjectivos: são dados de natureza anímica ou psíquica.
c) Elementos normativos: esses dados da figura típica não são aferíveis nem no mundo
concreto nem na psique do agente. Abrangem todas as expressões contidas no tipo penal que
requerem um juízo de valor (que será feito pelo juiz).

II. As circunstâncias, classificam-se em judiciais ou legais:


a) Judiciais: assentam: (na culpabilidade, antecedentes, conduta social e personalidade do agente,
circunstâncias, consequências e motivos do crime e comportamento da vítima);

c) Legais: podem ser genéricas, quando previstas na Parte Geral do Código Penal (agravantes,
atenuantes, causas de aumento e diminuição de pena), ou específicas, se estiverem na Parte
Especial do Código (qualificadoras e causas especiais de aumento e diminuição).

27
DIREITO PENAL-RESUMO Aiken Renkel Afonso – UMN - Faculdade de Direito - 2020

III. CRIME E CONTRAVENÇÃO


Contravenção nos termos do art. 3º do CP de 1886 vigente, diz que se considera contravenção o facto
voluntário punível que unicamente consiste na violação ou na falta de observância das disposições
preventivas das leis e regulamentos, independentemente de toda a intenção maléfica.

Aclara igualmente o anteprojecto do CP versão de 2018 no artigo 142º conforme se lê, constitui
contravenção o facto ilícito assim denominado pela lei e punível somente com pena de multa. Lê-se
ainda no nº 2 do mesmo artigo que; o facto ilícito denominado contravenção é considerado crime se a
lei lhe fizer corresponder uma pena privativa da liberdade.

Exe.: dirigir na via pública, veículos a motores sem estar habilitado por uma carta de condução;

Dirigir na via pública veículos a motores com uma taxa de álcool no organismo não superior a 1,2
gr./l.

 Os traços distintivos residem em suas consequências e em seu regime jurídico:


a) Os crimes podem ser de acção penal pública, ou de acção penal semi-pública e privada; já as
contravenções penais são sempre de acção penal pública incondicionada.
b) É punível a tentativa de crimes, o que não se dá nas contravenções;
c) Os crimes podem ser dolosos ou culposos, nas contravenções, basta seja a conduta voluntária.
d) As disposições relativas aos crimes são aplicáveis às contravenções, salvo quando a lei dispuser
diferentemente.

SECÇÃO I

RESPONSABILIDADE PENAL DA PESSOA JURÍDICA

Tradicionalmente, afirma-se que societas delinquere non potest (a pessoa jurídica não pode
delinquir).
Na actualidade, contudo, tem prevalecido o entendimento contrário, a despeito da resistência de parte
da doutrina. Diante do ordenamento jurídico pátrio, não há como negar a possibilidade da
responsabilidade penal da pessoa jurídica, conforme o art Artigo 9.º do Anteprojecto, versão 201832.

32
Os detractores da responsabilidade penal da pessoa jurídica lançam mão de diversos argumentos, os quais foram
sintetizados com maestria por Marcos Desteffeni: “a falta de capacidade natural de acção, a carência de culpabilidade e a
falta de indicação clara dos tipos penais em que poderia a pessoa jurídica incorrer”.

Marcos Desteffeni, “a responsabilidade da pessoa jurídica é sempre indirecta, decorrente da conduta da pessoa física que
actuar em seu nome e benefício. Esta ideia vai de acordo com o art. 10º do nosso ant. proj.

28
DIREITO PENAL-RESUMO Aiken Renkel Afonso – UMN - Faculdade de Direito - 2020

TÍTULO IX
A LEI PENAL E SUA APLICAÇÃO

1- O PRINCÍPIO DA LEGALIDADE DA INTERVENÇÃO PENAL


Quanto falamos sobre as fontes, chegamos a conclusão que só a lei é fonte imediata de conhecimento
do Direito Penal. A lei penal é o pressuposto das infracções e das sanções. Mas não é só a garantia
dos que não realizam condutas sancionadas; pois dela advêm pretensões para o Estado e para os
próprios criminosos.

Como observava Grandão Ramos, da lei nasce a pretensão punitiva do Estado a reprimir os actos
catalogados em seu texto como delitos, com a pena cominada, e por isso a lei é fonte e medida do
direito de punir.

Em consequência, o Estado não pode castigar um comportamento que não esteja descrito em suas
leis, nem punir o cidadão quando inexistente a sanctio juris cominada ao delito. Ao mesmo tempo, da
lei surge uma pretensão subjectiva em favor do delinquente. Portanto, “a lei penal é garantia da
liberdade para todos.

2- PRINCIPIO NULLUM CRIME, NULLA POENA SINE LEGE


Nullum crimen, nulla poena, sine lege33 - Não há crime, nem pena, sem lei.
Todo o sentido fundamental do princípio da legalidade é garantistico, tem por objectivo a defesa do
arguido contra eventuais abusos.

A lei só pode intervir para restringir ou limitar direitos, liberdades e garantias fundamentais quando
isso se revela imprescindível para acautelar outros direitos tão fundamentais, nos termos do art. 57º
da CRA.

O princípio da legalidade divide-se em 4 sob princípios:


Lei Prévia (antecipada, antecedente)
Lei Stricta (estrita, exacta)
Lei Certa (determinada)
Lei Scripta (escrita)

33
Foi dito pela primeira vez no inicio do sec. XIX, Anselm Feuerbach.

29
DIREITO PENAL-RESUMO Aiken Renkel Afonso – UMN - Faculdade de Direito - 2020

3- INTERPRETAÇÃO E ANALOGIA EM DIREITO PENAL


A analogia consiste em aplicar a uma hipótese não prevista em lei a disposição relativa a um caso
semelhante.
O legislador, através da lei A. regulou o facto B. o julgador precisa decidir o facto C. procura e não
encontra no direito positivo uma lei adequada a esse facto. Percebe, porém, que há pontos de
semelhança entre o facto B (regulado) e o facto C (não regulado). Então, através da analogia, aplica
ao facto C a lei A.

A aplicação do procedimento analógico no Direito Penal é objecto de tratamento particular (art. 18º
CP de 1886). Encontra-se proibida em relação às normas penais em sentido estrito, quais sejam, as
que definem infracções e cominam penas (as denominadas normas penais incriminadoras). Não pode
a analogia criar figura depletiva não prevista expressamente, ou pena que o legislador não haja
determinado. Contra ela vige a regra de reserva legal em relação aos preceitos primário e secundário
das normas definidoras de condutas puníveis.

Tal como, o CP de 1886, proíbe também aplicação da analogia o anteproj. do CP penal versão 2018,
dispões o artigo 1º nº 3, não é permitido o recurso à analogia para qualificar um facto como crime,
para definir um estado de perigosidade ou para determinar a pena ou a medida de segurança que lhes
correspondem.

4- HERMENÊUTICA E INTERPRETAÇÃO
Interpretar é inter pretare, que deriva de inter press, corretor, intermediário, mediador. Intérprete é o
mediador entre o texto da lei e a realidade o Direito Penal, ao contrário do Direito Civil, não nos
apresenta a numerus apertus, mas sim a numerus clausus.

Não há infracções senão as descritas pela lei penal e, em consequência, não há comportamento
humano que não seja ou conduta lícita, ou ilícito penal ( art. 5º CP de 1886)34.

Assim, como analogia encontra-se também proibida a interpretação extensiva é em direito penal, nos
termos do artigo 18º CP de 1886 e artigo 1º nº 3 do anteprojecto de 2018. Subscreve este último, não
é permitido o recurso à interpretação extensiva para qualificar um facto como crime, para definir um
estado de perigosidade ou para determinar a pena ou a medida de segurança que lhes correspondem.

34
Estefam, André-parte geral do direito penal-vol 7-2018

30
DIREITO PENAL-RESUMO Aiken Renkel Afonso – UMN - Faculdade de Direito - 2020

SECÇÃO II
1- APLICAÇÃO DO DIREITO PENAL NO TEMPO
Segundo o art. 2º do Anteprojecto versão 2018, sustenta que: as penas e as medidas de segurança são
determinadas pela lei vigente ao tempo da prática do facto ou da verificação dos pressupostos de que
dependem.

A lei penal como lei em geral (art. 6º de 1886, CP vig.) destina-se em regra a vigorar para o futuro.
Como decorrência do princípio nullum crimen, nulla poena sine lege praevia. Há uma regra que
domina o conflito de leis penais no tempo, é a regra da irretroactividade da lei penal (isto quer
dizer que a lei só aplica-se a casos futuros, salvo excepções contidas na respectiva lei), sem a qual
não haveria nem segurança, nem liberdade na sociedade.

2- DETERMINAÇÃO DO TEMPUS DELICTI


A determinação do tempo em que se reputa praticado o delito tem relevância jurídica não somente
para fixar a lei que o vai reger, mas também para fixar a imputabilidade do sujeito.

A questão apresenta interesse no caso em que, após realizada a actividade executiva do delito e antes
de produzido o resultado, surge nova lei alterando a legislação sobre a conduta punível: qual a lei a
ser aplicada, a do tempo da actividade ou a em vigor por ocasião da produção do resultado?

3- HÁ ESTÁ QUESTÃO EXISTEM TRÊS TEORIAS QUE VÃO NOS AJUDAR A


RESPONDER, COMO SEJAM:
1.ª) Teoria da actividade;
2.ª) Teoria do resultado;
3.ª) Teoria mista ou da ubiquidade.

Segundo a TEORIA DA ACTIVIDADE, o delito considera-se realizado ao momento da prática da


acção ou omissão.
Ex.: No crime de estelionato, crime de envenenamento.

Em face da TEORIA DO RESULTADO (do evento, ou do efeito), considera-se tempus delicti o


momento da produção do resultado. No homicídio, tempo do crime é o de seu resultado (morte), e
não o da prática dos actos executórios (acção).

31
DIREITO PENAL-RESUMO Aiken Renkel Afonso – UMN - Faculdade de Direito - 2020

De acordo com a TEORIA MISTA (OU DA UBIQUIDADE), tempus delicti é, indiferentemente, o


momento da acção ou do resultado. No homicídio, por exemplo é tanto o tempo da prática da acção
quanto o da produção do evento morte.

O anteprojecto do CP versão 2018, adoptou a teoria da actividade no seu art.3º conforme se lê: o
facto considera-se praticado no momento em que o agente actuou ou, no caso de omissão, no
momento em que devia ter actuado, independentemente do momento em que o resultado típico se
tenha verificado.
QUESTÕES:
Um rapaz, dias antes de completar 14 anos, desfere golpes na vítima, que vem a falecer dias depois
de ele completar a maioridade penal. O rapaz não responde por homicídio, por força do princípio da
presunção absoluta de inimputabilidade por desenvolvimento mental incompleto, o homicídio foi
cometido antes de ele alcançar a maioridade penal (tempo da acção — teoria da actividade).

Um sujeito, sendo imputável, envia uma máquina infernal cujo resultado se produz depois de tornar-
se inimputável por doença mental. A questão é diferente da anterior, pois ele responde pelo crime.
Este foi cometido quando era imputável. A respeito, determina o CPP: “Se se verificar que a doença
mental sobreveio à infracção o processo continuará suspenso até que o acusado se restabeleça. O juiz
poderá, nesse caso, ordenar a internação do acusado em manicómio judiciário35 ou em outro
estabelecimento adequado.

4-RINCÍPIO DA APLICAÇÃO DA LEI PENAL MAIS FAVORÁVEL (64º Nº CRA)


Conforme dito ao começo dessa temática, aplicação da lei no tempo, tem como princípio basilar a
irretroactividade da lei, entretanto, o mesmo não é absoluto, situações há em que será mitigado pelo
princípio da Lei mais favorável.

Admite-se, no direito transitório, a aplicação retroactiva da lei mais favorável (lex mitior). “a lei
penal não retroagirá, salvo para beneficiar o réu”.

Exemplos dos princípios expostos:


Cordeiro do Rosário, pratica um crime sob a vigência da lei X, que comina pena de reclusão de 1 a 4
anos. Por ocasião do julgamento, passa a viger a lei Y, regulando o mesmo facto e impondo a pena de
reclusão de 2 a 8 anos.
Qual a lei a ser aplicada, a anterior, mais favorável, ou a posterior, mais severa?

35
Manicómio judiciário, quanto nós não vamos entrar em discussão sobre isso, um Manicómio em Lubango, estaríamos a
falar de que lugar na Arimba, também não sei.

32
DIREITO PENAL-RESUMO Aiken Renkel Afonso – UMN - Faculdade de Direito - 2020

A lei posterior não pode ser aplicada, em face do princípio da irretroactividade da lei mais severa,
deve ser aplicada a anterior, que passa a reger um facto praticado durante a sua vigência, mas após a
sua derrogação.

É possível, então, a aplicação de uma lei não obstante cessada a sua vigência?
Sim, quando mais benéfica em face de outra, posterior. Essa qualidade da lei, pela qual tem eficácia
mesmo depois de cessada a sua vigência, recebe o nome de ultra-actividade.

Bernardo realiza uma conduta punível sob a vigência da lei X, que comina pena de 2 a 4 anos de
reclusão. Na ocasião de ser proferida a sentença, passa a vigorar a lei Y, determinando, para o mesmo
comportamento, a pena de reclusão de 1 a 4 anos. Qual a lei a ser observada, a anterior, mais severa,
ou a posterior, mais favorável?
Aplica-se a lei posterior, em face do princípio da retroactividade da lei mais favorável.

5- HIPÓTESES DE DISCRIMINAÇÃO
A lei penal que entra em conflito com a anterior pode apresentar as seguintes situações:
a) A lei nova suprime normas incriminadoras anteriormente existentes (abolitio criminis);
b) A lei nova incrimina factos antes considerados lícitos (novatio legis incriminadora);
c) A lei nova modifica o regime anterior, agravando a situação do sujeito (novatio legis in pejus);
d) A lei nova modifica o regime anterior, beneficiando o sujeito (novatio legis in melius).

a) A lei nova suprime normas incriminadoras anteriormente existentes (abolitio criminis)


Pode ocorrer que uma lei posterior deixe de considerar como infracção um facto que era
anteriormente punido.
Entretanto abolitio criminis, também chamada novatio legis, constitui facto jurídico extintivo da
punibilidade.
Extingue-se a punibilidade: pela retroactividade de lei que não mais considera o facto como
criminoso”.

Suponha-se que Hué tivesse praticado adultério. No transcorrer da acção penal entrou em vigor a Lei
nº 2018, que revogou o art. 404º do CP 1886, deixando de considerar criminosa aquela conduta. Hué
não poderia ser condenado por força da abolitio criminis ou lei supressiva da incriminação.

António pratica o crime previsto no art. 444º do Código actual. Advém novo Código, não prevendo o
facto como crime.

33
DIREITO PENAL-RESUMO Aiken Renkel Afonso – UMN - Faculdade de Direito - 2020

b) A lei nova incrimina factos antes considerados lícitos (novatio legis incriminadora)
Ocorre a novactio legis incriminadora quando um indiferente penal em face de lei antiga é
considerado crime pela posterior.
A lei que incrimina novos factos é irretroactiva, uma vez que prejudica o sujeito. O fundamento deste
princípio se encontra no aforismo nullum crimen sine lege praevia.
Ex.: Oldair, em Dezembro de 2019, constrange funcionária Verance, à ela subordinada, a manter
relação sexual, ameaçando-a de demissão caso não ceda ao seu pedido. A conduta do Oldair,
configura assédio sexual. Tal conduta passou a ser definida como crime somente em 16 de Maio de
2021, data de início de vigência da Lei nº 2018, que tipificou o acto de: “Constranger alguém com o
intuito de obter vantagem ou favorecimento sexual, prevalecendo-se o agente da sua condição de
superior hierárquico ou ascendência inerentes ao exercício de emprego, cargo ou função”, apenado
com detenção, de 1 (um) a 2 (dois) anos. A nova lei aplica-se ao Oldair?
Não, pois a nova lei, sendo gravosa, tem carácter irretroactivo. Cuida-se de novatio legis
incriminadora.
c) A LEI NOVA MODIFICA O REGIME ANTERIOR, AGRAVANDO A SITUAÇÃO
DO SUJEITO
Se a lei posterior, sem criar novas incriminações ou abolir outras precedentes, agrava a situação do
sujeito, não retroage. Há duas leis em conflito: a anterior, mais favorável, e a posterior, mais severa.

Em relação a esta, aplica-se o princípio da irretroactividade da lei mais severa; quanto aquela, o da
ultra-actividade da lei mais favorável. Dessa forma, se o sujeito pratica um facto criminoso na
vigência da lei X, mais benigna, e, no transcorrer da acção penal, surge a Y, mais severa, o caso deve
ser apreciado sob a eficácia da antiga, em face da exigência de não fazer recair sobre ele uma
valoração mais grave que a existente no momento da conduta delituosa.

Ex.: Helena Sacato comete um crime na vigência da lei X, que impõe, in abstracto, a pena de
reclusão de 1 a 5 anos. Surge a lei Y, cominando, para o mesmo comportamento, a pena de reclusão,
de 2 a 8 anos. A lei nova é mais severa. Não pode retroagir. Se Helena Sacato, for condenada a pena
deverá variar entre os limites da lei antiga: de 1 a 5 anos de reclusão.

Ex.: Helena Halaiwa prática um crime sob a vigência da lei X, que comina pena de multa. Entra em
vigor a lei Y, cominando, para o mesmo facto, pena privativa de liberdade (reclusão ou detenção).
A lei posterior é mais severa e não pode retroagir.

34
DIREITO PENAL-RESUMO Aiken Renkel Afonso – UMN - Faculdade de Direito - 2020

d) A lei nova modifica o regime anterior, beneficiando o sujeito (novatio legis in melius)
Se a lei nova, sem excluir a incriminação, é mais favorável ao sujeito, retroage. Aplica-se o princípio
da retroactividade da lei mais favorável.

A lei posterior, que de qualquer modo favorecer o agente, aplica-se aos factos anteriores, ainda que
decididos por sentença condenatória transitada em julgado.

Ex.: Américo Eridjoy confessa, espontaneamente, perante a autoridade, a autoria de um crime


imputada a Nelson Fina. Suponhamos que não existisse a atenuante. Durante o processo surge a lei
X, incluindo a referida circunstância. O sujeito, se condenado, deve ser favorecido pela atenuante,
embora não vigorasse, ao tempo da prática do crime, a disposição que a determinou. A lei nova, mais
favorável, deve retroagir.

6- LEIS INTERMÉDIAS
Pode acontecer que o sujeito pratique o facto sob o império de uma lei, surgindo, depois,
sucessivamente, duas outras, regulando o mesmo comportamento, sendo a intermediária a mais
favorável.

Portanto esta só poderá ser aplicada se o facto favorece o agente, em caso algum se poderá cogitar da
aplicação de qualquer lei sucessiva mais rigorosa, porque esta encontrará o agente já favorecido por
lei intermediária mais favorável.

7- AS CHAMADAS LEIS TEMPORAIS


Bem explica, o mestre do Direito Penal Português, Figueiredo Dias36, leis temporais são aquelas
publicadas pelo legislador para um tempo determinado, este período é desde logo apontado pelo
legislador em termos de calendário ou em função da cessão de um certo evento.

Ex: a duração de um estado de sítio ou um estado de guerra e A lei dos antigos combatentes e
veteranos de guerra.

36
Dias, Jorge de Figueiredo - direito penal-parte geral-questões gerais e doutrina do crime-ed.2tomo 1-ano 2007

35
DIREITO PENAL-RESUMO Aiken Renkel Afonso – UMN - Faculdade de Direito - 2020

SECÇÃO III
APLICAÇÃO DA LEI PENAL NO ESPAÇO

1- GENERALIDADES
A lei penal é elaborada para viger dentro dos limites em que o Estado exerce a sua soberania. Ou seja
a lei penal aplica-se a todas as infracções cometidas dentro de um determinado território.

Como cada Estado possui sua própria soberania, surge o problema da delimitação espacial do âmbito
de eficácia da legislação penal.

Estamos em face do denominado Direito Penal Internacional, que se refere ao estudo do modo pelo
qual um determinado ordenamento jurídico interno provê, com referência à matéria penal, a
resolução dos problemas impostos ao Estado, do qual emana este ordenamento, em virtude de sua
coexistência com outros Estados da comunidade internacional.

2- Sistema da aplicação da lei penal no espaço: princípios constituintes


A questão do âmbito de eficácia espacial da lei penal constitui matéria do Direito Penal Internacional,
existem alguns princípios a respeito dessa matéria dentre os quais temos:

2.1. Princípio da territorialidade (este é o princípio basilar);


2.2. Princípio da nacionalidade;
2.3. Princípio da defesa dos interesses nacionais;
2.4.Princípio da Justiça penal universal ou da universalidade;

2.1. Princípio da territorialidade


Faz-se necessário verificar os (arts. 4⁰, 5⁰ e 6⁰ do anteprojecto do CP, versão 2018 e o art. 53⁰ CP
vig.), que tem como Regra a lei penal no espaço: O PRINCÍPIO DA TERRITORIALIDADE. A
lei penal angolana é aplicável a factos total ou parcialmente praticados em território angolano ou a
bordo de navios ou aeronaves de matrícula ou sob pavilhão angolanos, independentemente da
nacionalidade do agente, salvo convenção ou tratado internacional em contrário.

O Princípio territorialidade por sua vez não é absoluto o mesmo é mitigado pelos seguintes
princípios:
2.2. Princípio da nacionalidade
Está previsto no art. 5º nº3 anteproj. versão 2018 e no artigo 53º nº 5 CP de 1886, também
denominado de princípio da personalidade, de acordo com o mesmo, a lei penal do Estado é aplicável

36
DIREITO PENAL-RESUMO Aiken Renkel Afonso – UMN - Faculdade de Direito - 2020

a seus cidadãos onde quer que se encontrem. Assim, se um angolano praticar um crime em Portugal,
cairá o facto sob o império da lei penal de nosso país. Este divide-se em:
a) Princípio da nacionalidade activa;
b) Princípio da nacionalidade passiva.
Para o primeiro, aplica-se a lei nacional ao cidadão que comete crime no estrangeiro,
independentemente da nacionalidade do sujeito passivo. Ou seja que se refere aos delitos praticados
por angolano no exterior.

O princípio da nacionalidade passiva exige que o facto praticado pelo nacional no estrangeiro atinja
um bem jurídico de seu próprio Estado ou de um co-cidadão. Ou seja também pode ser entendido
naqueles factos praticados por estrangeiro contra angolanos, fora do nosso país.

2.3. Princípio da defesa do interesse nacional


A luz do art. 5º nº1 al. a e b) anteproj. versão 2018 no artigo 53º nº 3 CP de 1886, tal como dispõe os
referidos artigos este princípio leva em conta a nacionalidade do bem jurídico lesado pelo crime,
independentemente do local de sua prática ou da nacionalidade do sujeito activo.

2.4. Princípio da Justiça penal universal


É também denominado princípio universal, preconiza o poder de cada Estado de punir qualquer
crime, seja qual for a nacionalidade do delinquente e da vítima, ou o local de sua prática37.

3- O PROBLEMA DA SEDE DO DELITO


A determinação do lugar em que o crime se considera praticado (locus commissi delicti) é decisiva no
tocante à competência penal internacional.

Para a solução do problema têm sido preconizadas três teorias principais:


3.1.ª) Teoria da actividade;
3.2.ª) Teoria do resultado;
3.3.ª) Teoria da ubiquidade.

3.1 De acordo com a teoria da actividade ou da acção, é considerado lugar do crime a aquele em
que o agente desenvolveu a actividade criminosa, onde praticou os actos executórios.

37
Também chamado de Princípio da Justiça Universal – O agente é sujeito à lei do país onde foi encontrado.

37
DIREITO PENAL-RESUMO Aiken Renkel Afonso – UMN - Faculdade de Direito - 2020

Ex.: Na fronteira Angola-Namíbia, um cidadão angolano (Manuel Chiloia), que se encontra em


território nacional, atira em outro, em solo Namibiano, vindo este a falecer.

Assim, se a vítima é ferida num determinado (país), e vem a morrer em outro, aquele é o competente
para conhecer o facto (lei angolana).

3.2 Segundo a teoria do resultado, também conhecida por teoria do efeito ou do evento, locus
delicti é o lugar da produção do resultado.

Ex.: Na fronteira Angola-Namíbia, um cidadão angolano (Adolfo Castilho), que se encontra em


território nacional, atira em outro, em solo Namibiano, vindo este a falecer ( lei namibiana).

Um Congolês, na África do Sul, envia uma “máquina infernal” a um angolano, que se encontra em
Lubango, vindo o engenho a explodir e matar a vítima.
Segundo esta teoria, o país competente para conhecer o homicídio seria aquele em que se produziu o
resultado morte, qual seja, Angola.

3.3 Nos termos da teoria da ubiquidade, mista ou da unidade, o lugar do crime é aquele em que
se realizou qualquer dos momentos do iter, seja da prática dos actos executórios, seja da
consumação. No exemplo acima, competentes seriam os dois países.

O Anteprojecto do CP versão 2018, adoptou a teoria da ubiquidade, como se nota no art. 6º o facto
considera-se praticado tanto no lugar em que, total ou parcialmente e sob qualquer forma de
comparticipação, o agente actuou, ou, no caso de omissão, deveria ter actuado, como naquele em que
o resultado típico se tiver verificado.

Assim, quando o crime tem início em território estrangeiro e se consuma em Angola, é considerado
praticado em Angola. Nestes termos, aplica-se a lei penal angolana ao facto de alguém, em território
namibiano, atirar na vítima que se encontra em nosso território, vindo esta a falecer; como também
ao caso de um estrangeiro expedir a pessoa que viva em Angola um pacote de doces envenenados, ou
uma carta injuriosa.

4- O CHAMADO CRITÉRIO DO PAVILHÃO


É o alargamento do princípio da territorialidade que se contem no art. 53º nº 2, parifica com factos
cometidos em território angolano os que tenham lugar a bordo de navios ou aeronaves, consulados e
embaixadas angolanas.

38
DIREITO PENAL-RESUMO Aiken Renkel Afonso – UMN - Faculdade de Direito - 2020

O critério do pavilhão deriva da tendência moderna de expansão das jurisdições penais para a
prevenção e uma repressão eficazes dos crimes internacionais. Trata-se, de toda maneira, de uma
conexão de competência que se revela subsidiária relativamente a conexão territorial38.

5- QUESTÃO DA EXTRADIÇÃO
Extradição é uma cooperação judiciária feita entre os Estados em matéria penal. Dito de outro modo
a extradição é o processo através do qual um estado entrega um condenado ou um arguido que se
encontra no seu território para outro estado, para que este cumpra a pena em que foi condenado ou
para ser julgado pelo respectivo tribunal, (art. 5º nº 1 al. d, e, nº 2 e 4 e o 53º nº 5 CP de 1886).

5.1. ESPÉCIES DA EXTRADIÇÃO


Segundo Cezar Roberto Bintecort39 a extradição pode ser:
a) Activa: em relação ao Estado que a reclama. (quando a Angola faz um requerimento a outro país,
visando à entrega de um nacional);
b) Passiva: em relação ao Estado que a concede. (quando alguma nação requer, a Angola, que
entregue o infractor);
c) Voluntária: quando há anuência do extraditando;
d) Imposta: quando há oposição do extraditando;
e) Reextradição: ocorre quando o Estado que obteve a extradição (requerente) torna-se requerido por
um terceiro Estado, que solicita a entrega da pessoa extraditada.

5.2. CONDIÇÕES E PRINCÍPIOS DA EXTRADIÇÃO


I — QUANTO AO DELITO:
a) Princípio da legalidade: por este princípio não haverá extradição se o crime imputado ao
extraditando não estiver especificado pela lei do lugar em que foram cometidos (art. 5º al. d-
i);

b) Princípio da especialidade: significa que o extraditado não poderá ser julgado por facto
diverso daquele que motivou a extradição;

c) Princípio da identidade da norma: o facto que origina o pedido de extradição deve consistir
em crime também no país ao qual a extradição foi solicitada, (art. 5º nº 1 al. e anteproj. 2018 e
art. 53º nº 5 al. b).

38
Dias, Jorge de Figueiredo - direito penal-parte geral-questões gerais e doutrina do crime-Ed.2tomo 1-2007
39
Código penal comentado. Ed.

39
DIREITO PENAL-RESUMO Aiken Renkel Afonso – UMN - Faculdade de Direito - 2020

II — QUANTO À PENA E À ACÇÃO PENAL


a) Princípio da comutação: como corolário do princípio de humanidade, a extradição concedida
por Angola é condicionada à não aplicação de pena de morte ou pena corporal. Se o país que a
requerer tiver a cominação de tais penas, para o delito imputado, terá de comutá-las em pena
privativa de liberdade (59º, 60º e 70º da CRA);
b) Princípio “non bis in idem” : há dois aspectos a considerar: em primeiro lugar, um conflito
positivo de competência, que impede a concessão da extradição quando Angola for igualmente
competente para julgar o caso; em segundo lugar, a necessidade de assumir a obrigação de
comutar o tempo de prisão que foi imposta em Angola, em decorrência do pedido de extradição
(art. 53º nº 5 al. a CP de 1886 e art. 5º al. d-iii);

d) Princípio da reciprocidade: a extradição institui-se basicamente sobre o princípio da


reciprocidade, que convém a dois Estados soberanos, especialmente por dois aspectos: de um
lado, porque o delito deve ser punido na comunidade onde foi praticado, e, de outro lado, porque
expulsa do território nacional um delinquente, naturalmente indesejável, que um Estado
estrangeiro deseja julgar e punir.

5.3 REQUISITOS E LIMITES DA EXTRADIÇÃO


É importante dizer que a extradição tem que ser conforme os direitos, liberdades e garantias
fundamentais como sejam: 30º, 59, 60º e 70º todos da CRA.

5.3. EFICÁCIA DA SENTENÇA ESTRANGEIRA


A sentença penal estrangeira, precisa ser homologada para que produza efeitos em Angola.
Entretanto observa-se os seguintes requisitos:

a) Para obrigar o condenado à reparação do dano, a restituições e outros efeitos civis, desde que
haja requerimento do interessado e que nossa lei preveja os mesmos efeitos na situação abordada
pela sentença estrangeira;
b) Para sujeitá-lo a uma medida de segurança, desde que, nesse caso, a lei angolana preveja os
mesmos efeitos para a hipótese tratada.

6. EXPULSÃO
Não se deve confundir extradição com expulsão.
Expulsão consiste em medida administrativa de retirada compulsória de migrante ou visitante do
território nacional, conjugada com o impedimento de reingresso por prazo determinado (70º CRA).

40
DIREITO PENAL-RESUMO Aiken Renkel Afonso – UMN - Faculdade de Direito - 2020

TÍTULO X
DA EXTINÇÃO DA PUNIBILIDADE

1- CAUSAS EXTINTIVAS DA PUNIBILIDADE (art. 125º e ss CP de 1886 vig. e 129º e até ao


139º do Anteprojecto do CP versão 2018)
Quando o sujeito pratica um crime surge a relação jurídico-punitiva: de um lado, aparece o Estado
com o jus puniendi; de outro, o réu, com a obrigação de não obstaculizar o direito de o Estado impor
a sanção penal.
Portanto, a punibilidade, é a possibilidade jurídica de o Estado impor a sanção.

1.2. EXTINGUE-SE A PUNIBILIDADE PELA:


a. Morte do criminoso, art. 125º nº 1 CP de 1886 vig.;
b. Graça e indulto, art. 126º nº 2 CP de 1886 vig.;
c. Amnistia, arts. 244º da CRA e 125º nº 3 CP vig.;
d. Renúncia e perdão, art. 125º nº 4 CP de 1886 vig.;
e. Oblação voluntária art. 125º nº 5 CP de 1886 vig.;
f. Realibitação art. 126º nº 4 CP de 1886 vig.;
g. Prescrição art. 125º nº 2 CP de 1886 vig.;
h. Pelo seu comprimento art. 126º nº 1 CP de 1886 vig.;
i. Retractação do agente.

a) Da morte do criminoso
Sendo personalíssima a responsabilidade penal, a morte do agente faz com que o Estado perca o jus
puniendi, não se transmitindo a seus herdeiros qualquer obrigação de natureza penal: mors omnia
solvit.
Ocorrendo a morte após o trânsito em julgado da sentença condenatória, o interessado pode ingressar
no juízo cível com a execução para efeito de reparação do dano contra os herdeiros ou sucessores
universais do condenado falecido (art. 140º e ss Anteproj., art. 129º CP de 1886).
A morte do agente deve ser provada por meio de certidão de óbito.

b) Graça e indulto
A graça se distingue do indulto nos seguintes pontos:
a) A graça é individual; o indulto é colectivo.
b) A graça (em regra) deve ser solicitada; o indulto é espontâneo.

41
DIREITO PENAL-RESUMO Aiken Renkel Afonso – UMN - Faculdade de Direito - 2020

Enquanto a amnistia e o indulto têm o carácter de generalidade, incidindo sobre factos e abrangendo
uma generalidade de pessoas, a graça é individual, pois só atinge determinado criminoso.
Enquanto a amnistia e o indulto podem ser concedidos espontaneamente pelo Poder Público, a graça
é concedida pela lei de execução penal.

Quem concede a graça e o indulto?


A competência é do Presidente da República, nos termos do art. 119º al.) n da CRA

c) Renúncia e perdão
A renúncia só é possível antes do início da acção só é, aplicada nos crimes particulares e semi-
públicos. (ex. 359º 407º, 401º e 360º todos do CP de 1886 Vig., art. 184º e ss e 215º e ss Anteproj.)

Perdão é o acto pelo qual, iniciada a acção penal privada ou seja nos crimes particulares e semi-
publicos, o ofendido ou seu representante legal desiste de seu prosseguimento. (ex. 359º 407º, 401º e
360º todos do CP. Vig).

d) Retractação do agente
Retratar-se significa desdizer-se, retirar o que foi dito, confessar que errou. Em regra, a retractação do
agente não tem relevância jurídica, funcionando somente como circunstância judicial na aplicação da
pena. Excepcionalmente, o estatuto penal lhe empresta força extintiva da punibilidade.

e) Da prescrição
O verbo “prescrever”, no sentido comum, significa preceituar, fixar, limitar e determinar; no sentido
jurídico, quer dizer ficar sem efeito um direito por ter decorrido certo prazo legal.

A palavra “prescrição”, no sentido comum, significa preceito, ordem expressa; no sentido jurídico,
significa perda de um direito em face de seu não exercício dentro de certo prazo. Prescrição penal,
num conceito preliminar, é a extinção do direito de punir do Estado pelo decurso do tempo.
Preferimos dizer que a prescrição penal é a perda da pretensão punitiva ou executória do Estado pelo
decurso do tempo sem o seu exercício.

O procedimento criminal extingue-se, decorrido os seguintes prazos:


a) 15 Anos, quando se tratar de crimes puníveis com pena de prisão cujo limite máximo for superior a
10 anos;
b) 10 Anos, quando se tratar de crimes puníveis com pena de prisão cujo limite máximo for igual ou
superior a 5 anos, mas que não exceda 10 anos;

42
DIREITO PENAL-RESUMO Aiken Renkel Afonso – UMN - Faculdade de Direito - 2020

c) 5 Anos, quando se tratar de crimes puníveis com pena de prisão cujo limite máximo for igual ou
superior a 1 ano, mas inferior a 5 anos;
d) 2 Anos, nos casos restantes.

É fundamental que se compreenda, são imprescritíveis os crimes de genocídio, os crimes contra a


humanidade e os crimes de terrorismo e terrorismo internacional40.

f) Oblação voluntária
Oblação voluntária é acção de extinção do procedimento criminal nas contraversões quando a lei
admite. Ou seja consiste no acto pelo qual o agente de uma forma voluntária realiza uma conduta e,
concomitantemente cessa o procedimento criminal41.

PARTE II
DOUTRINA GERAL DO CRIME (TEORIA DA INFRACÇÃO)

TÍTULO I
CONSTRUÇÃO DA DOUTRINA DO CRIME (DO FACTO PUNÍVEL)

1- GENERALIDADE
Na primeira metade do século passado, o Direito Penal voltou seus olhos para o autor do crime (para
o “delinquente”) e, com isso, iniciou-se uma fase designada como direito penal do autor. Nesse
contexto, uma pessoa deveria ser punida mais pelo que é e menos pelo que fez.

Justificavam-se, neste contexto, penas de longa duração para factos de pouca gravidade, caso ficasse
demonstrado que o agente fosse um indivíduo perigoso. Essa fase teve seu apogeu durante a Segunda
Grande Guerra e influenciou grandemente a legislação criminal da Alemanha nesse período.
Com o final da Segunda Guerra Mundial, o modelo filosófico representado por essa concepção caiu
em derrocada, retornando a lume uma diferente visão do direito penal, conhecida como direito penal
do facto.

Trata-se, sinteticamente, de punir alguém pelo que fez, e não pelo que é. A gravidade do facto é que
deve mensurar o rigor da pena.
Nos dias atuais, essa é a concepção vigorante em matéria penal e, segundo a quase unanimidade dos
autores, a única compatível com um Estado Democrático de Direito, fundado na dignidade da pessoa
humana42.

40
Anteprojecto do Cpversão 2018
41
Correcção modelo - Cristóvão Chivela

43
DIREITO PENAL-RESUMO Aiken Renkel Afonso – UMN - Faculdade de Direito - 2020

Como explica o prof. Cristóvão Chivela43, da faculdade de direito da UMN, A teoria da infracção ou
também denominada teoria do crime se concebe como sendo aquela que faz um estudo dogmático e
analítico sobre o crime e estudando os seus elementos de forma separada, nomeadamente: ACÇÃO
(FACTO PUNÍVEL), TIPICIDADE, ILICITUDE, CULPABILIDADE E PUNIBILIDADE.

Daqui resulta que as sucessivas especificações jurídico-penais da conduta humana, ao mesmo tempo
que aumentam a sua complexidade conceptual ou compreensiva, levam à redução do número de
condutas por elas abrangidas. Deste modo, se uma determinada conduta é típica mas não é ilícita é
porque o agente actuou em legítima defesa, ou ao abrigo de outra causa de exclusão da ilicitude,
excluída fica a indagação sobre o carácter eventualmente culposo da conduta, por não ter sentido, do
ponto de vista lógico e metodológico, falar-se da culpa do agente relativamente a um facto lícito
(Taipa de Carvalho44).

2- ELEMENTOS DA TEORIA DO CRIME (TEORIA DA INFRACÇÃO)


=Acção, tipicidade, ilicitude, culpa, e punibilidade=
2.1.A ACÇÃO
Não indo tão longe, nomeadamente porque sempre há-de falar-se numa acção típica ou numa conduta
típica, entendem autores como Roxin e Conceição Valdágua que a acção há-de conceber-se como
exteriorização da personalidade, devendo entender-se como acção relevante para o direito penal, o
comportamento humano, dominado ou dominável pela vontade, com reflexos no mundo exterior45.

Daqui resulta que do ponto de vista jurídico-penal não constituem acções e, portanto, não podem
consubstanciar a prática de um facto típico, os factos resultantes de forças da natureza, os simples
pensamentos, os movimentos reflexos (por exemplo convulsões) e os actos realizados em estado de
hipnose ou sonambulismo, sobre os quais não há qualquer domínio da vontade.

Em todos estes casos não existe uma conduta dominada ou dominável pela vontade, pelo que não se
lhe aplicam as proibições e comandos jurídico-penais, porquanto estes não podem ir além da
capacidade de intervenção do Homem com a sua acção, no decurso dos acontecimentos.
Não obstante o conjunto das considerações anteriores a doutrina faz uma reflexão a diversos
conceitos de acção, dentre os quais temos: conceito de acção: causal, final, social, negativo, pessoal
e a concepção teologicamente positiva e funcionalmente adequada esta última ensaiada pelo Prof. F.
Dias.

42
Estefam, André-parte geral do direito penal-vol 7-2018
43
Prof. De Direito penal da UMN.
44
Paita de Carvalho
45
Latas, António J.-Duarte, Jorge D. e Patto, P. Vaz - direito penal e processual penal-ano ed.2007

44
DIREITO PENAL-RESUMO Aiken Renkel Afonso – UMN - Faculdade de Direito - 2020

O prof. F. Dias, recusa e critica, manifestamente o conceito de acção a luz das seguintes concepções:
causal, final, social, negativo e pessoal.

Quando ao conceito causal, esta o autor o afasta com um nocaute, dizendo que o conceito causal da
acção está fora de questão, a mesma hoje já não é defendida por ninguém. Embora conseguisse
explicar a acção em sentido estrito, não conseguia solucionar o problema da omissão46.

Quanto ao conceito final e social, tanto um como outro, embora conseguisse explicar a acção,
deixam de fora da acção negligência um dos mais relevantes elementos das posteriores determinações
da tipicidade e da ilicitude47.

Quanto ao concito negativo de acção, tal como sustentam alguns conoplastas do saber direito,
acção do direito penal é o não evitar evitável um resultado (tal como escreve F. Dias). Quanto a este
conceito podemos encontrar elementos tais como: activo, omisso, doloso e negligente, mais
infelizmente este conceito não consegue separar crimes de resultados aos crimes de mera actividade.

Quanto ao conceito pessoal, ensaio feito por Roxin, segundo o autor acção residiria na expressão da
personalidade, em abarcar nela tudo aquilo que pode ser imputado a um homem como centro de
acção animo-espiritual. (F. Dias, não parece correcta este conceito segundo o autor, existem
acontecimentos naturais, meras cogitações actos compulsivos que possam não ser considerados
expressões da personalidade).

Quanto a concepção teologicamente positiva e funcionalmente adequada, na perspectiva de F.


Dias, o conceito de acção não pode, nem deve ser algo de previamente dada ao tipo mais apenas um
elemento, a par de outros, integrantes do cerne dos tipos de ilícito.

2.2.TIPICIDADE
A tipicidade constitui elemento essencial do crime, pois qualquer conduta só poderá ter relevância
penal, do ponto de vista da sua incriminação, se for típica, ou seja, quando preencha os elementos
constitutivos de um dado tipo penal48.
Uma das funções desempenhadas pelo tipo é precisamente a função jurídico- política de garantia,
enquanto decorrência do princípio da legalidade, como vimos – nullum crimen nulla poena sine lege.
Com a expressão, função jurídico- política, queremos dizer que é o processo de criação do tipo, a luz

46
F. Dias. Pag. 252
47
Ibedem. Pag. 255

45
DIREITO PENAL-RESUMO Aiken Renkel Afonso – UMN - Faculdade de Direito - 2020

do artigo 164⁰ al. e) da CRA. Outrossim A Tipicidade: é a demonstração de que aquele


comportamento cabe na previsão da norma.

A tipicidade esta intimamente ligada ao tipo, segundo o qual o tipo compreende o conjunto de
elementos que permitem saber de que crime se trata.

Na mesma linha de raciocínio, o Tipo é o modelo geral e abstracto, que da finalidade e atribuição da
norma penal, ( É a descrição do facto criminoso feita pela lei), ou seja determina uma conduta
protege um valor ou um bem jurídico. O tipo existe para ser violado, caso contrário é irrelevante.

Conforme ensina o prof. F. Dias49, do ponto de vista da natureza dos seus elementos ou conteúdo, o
tipo penal é composto por elementos objectivos e elementos subjectivos.

a) Elementos objectivos: Normativos e Descritivos


b) Elementos subjectivos: Dolo e Negligencia

a) Elementos objectivos:
1-Normativos: são expressões utilizadas pela lei, com significado jurídico ou social (ex.: os
conceitos de documento, cheque, justa causa, autorização, etc.)

2-Descritivos: são os elementos que se referem à materialidade do facto, descrevem a norma penal.
(ex.: matar, subtrair, violar).

b) Elementos subjectivos: Dolo e Negligencia


1- Dolo
O dolo-é o elemento subjectivo comum a todos os tipos (dolosos) e consiste na representação e
vontade psicológica de realização do facto50.

Cá entre nós, o dolo não é a intenção, dolo é conhecimento, representação e a vontade de querer,
realizar o crime. O artigo 12º do Anteproj. versão 2018, contradiz a essa posição nos seguintes
termos: age com dolo, sob a forma de intenção, quem, representando um facto que preenche um tipo
de crime, actuar com intenção de o praticar.

Do ponto de vista da sua estrutura, na visão dos profs. António João Latas, Jorge Dias Duarte e Pedro
Vaz Patto51 o dolo compõe-se de dois elementos: volitivo ou emocional e intelectual ou cognitivo.

49
Dias, Jorge de Figueiredo - direito penal-parte geral-questões gerais e doutrina do crime- ed.2-tomo 1-ano 2007
50
Latas, António J.-Duarte, Jorge D. e Patto, P. Vaz - direito penal e processual penal-ano ed.2007
51
idem

46
DIREITO PENAL-RESUMO Aiken Renkel Afonso – UMN - Faculdade de Direito - 2020

a) O elemento intelectual ou cognitivo: traduz-se no conhecimento de todos os elementos


objectivos do tipo.
b) Elemento volitivo do dolo: o elemento volitivo do dolo traduz-se na vontade de realização dos
elementos objectivos do tipo, como supra aludido.

Segundo o prof. T. Carvalho, em função da diversidade de atitudes psicológico-volitivas do agente e,


portanto, com referência ao seu elemento volitivo ou emocional, o dolo pode revestir três espécies,
formas ou modalidades: dolo directo, dolo necessário e dolo eventual.

I. ESPÉCIES DE DOLO:
I.I - Dolo directo do 1º grau, verifica-se quando a vontade do agente se dirige directamente, como
objectivo imediato da acção, à realização do facto típico que representou ( art. 12º nº1 Anteproj.
do CP 2018).

Dolo directo, o facto representado é o facto querido e o agente actua com vontade de realizar esse
mesmo facto, (prof. Figueiredo dias). Ex.: o arguido A, quer matar B, porque quer vingar-se dele.

I.II - Dolo necessário ou dolo indirecto do 2º grau. (art. 12º nº2 Anteproj. do CP 2018) - age com
dolo, sob a forma de dolo necessário, quem representar a realização de um facto que preenche
um tipo de crime como consequência necessária da sua conduta.

Nestes casos, a realização do facto típico não é o objectivo imediato da sua conduta, mas o agente
representa-a como consequência certa ou necessária da sua conduta e, portanto, quer a realização do
tipo (A. J. Latas, J. D. Duarte e P. V. Patto).

Ex.: Bernardo Cavala atira o seu automóvel contra o automóvel de Bernardo Pires para danificar o
veículo e atingi-lo fisicamente a ele, mas sabe que atingirá necessariamente outras pessoas que
seguem no veículo visado, pelo que quer igualmente este último resultado, o qual não constitui o
objectivo imediato ou directo de 1º grau do seu comportamento.

I.II - Dolo eventual ,( art. 12º nº3 Anteproj. do CP 2018) - age com dolo, sob a forma de dolo
eventual, quem representar a realização de um facto que preenche um tipo de crime como
consequência possível da sua conduta e, apesar disso, actuar conformando-se com aquela
realização.
Ex.: Vanda Lopes ao acelerar com a sua viatura numa rua estreita e movimentada admite a hipótese
de poder atingir algum transeunte, mas mantém o seu comportamento aceitando aquele facto se o
mesmo vier a ocorrer.

47
DIREITO PENAL-RESUMO Aiken Renkel Afonso – UMN - Faculdade de Direito - 2020

 DOLO EVENTUAL E NEGLIGÊNCIA CONSCIENTE


Na prática distinguir o dolo eventual da negligência consciente, chega a ser mais difícil do que
explicar a pobreza em África52.

Entretanto no dolo eventual o agente aceita o facto, conforma-se com a sua realização, o que não
sucede na negligência consciente, em que o arguido leva por diante o seu comportamento sem se
conformar com a sua produção e, portanto, actua sem vontade de realização do mesmo.

O problema está em saber quando é que o agente se conformou ou não com a realização do facto,
pelo que a doutrina penal tem defendido vários critérios para delimitar as duas figuras: teoria da
probabilidade, teoria da aceitação e teoria da fórmula hipotética de Frank.

A concepção actualmente dominante é conhecida como teoria da conformação (F. Dias), ou teoria
da conformação com o risco (Taipa de Carvalho), segundo o qual o que é decisivo para a afirmação
de um tipo de ilícito doloso é que o agente represente a possibilidade de a sua conduta realizar um
facto descrito num tipo penal, aceita correr esse risco. Ou seja que o agente tome a sério o risco de
(possível) lesão do bem jurídico, que entre com ele em contas e que, não obstante, se decida pela
realização do facto.” (F. Dias).

 Dolo geral ou dolus generalis: ocorre quando o sujeito pratica uma conduta objectivando
alcançar um resultado e, após acreditar erroneamente tê-lo atingido, realiza outro
comportamento, o qual acaba por produzi-lo.

Ex.: Abgar, para matar seu inimigo (Wilson Bruno), o golpeia fortemente, de modo que a vítima
desmaia, fazendo o Abgar, pensar equivocadamente que ele faleceu; em seguida, com a finalidade de
simular um suicídio, deixa o ofendido suspenso em uma corda amarrada ao seu pescoço, asfixiando-
o.
Embora as opiniões se dividam, prevalece o entendimento de que o dolo do agente, exteriorizado no
início de sua acção, generaliza-se por todo o contexto fático, fazendo com que ele responda por um
único crime de homicídio doloso consumado (há quem entenda que ocorra uma tentativa de
homicídio em concurso material com homicídio culposo).

 Dolo específico: a seu turno, é aquele em que no tipo penal é identificado o que denominamos de
especial fim de agir. Dito por outra forma é aquela em o agente com a sua acção atinge o
resultado pretendido.

52
É assunto alheio não me meto.

48
DIREITO PENAL-RESUMO Aiken Renkel Afonso – UMN - Faculdade de Direito - 2020

2- Negligencia
A negligência é a ausência de precaução ou indiferença em relação ao acto realizado. Dito por outro
age com negligência quem, por não proceder com o cuidado a que, segundo as circunstâncias, está
obrigado e de que é capaz (art. 13º Anteproj. CP versão 2018). Ex.: deixar arma de fogo ao alcance
de uma criança.

2.1. MODALIDADES DE NEGLIGÊNCIA


A negligência pode assumir, essencialmente, duas formas:

2.1.1. Negligência consciente, quando o agente chegou a prever a realização do facto ilícito,
embora actuasse por estar convencido que tal evento não teria lugar.

Ex.: Um automobilista está a conduzir em excesso de velocidade, tem pressa de chegar a casa e o
piso está molhado, está convencido que nada vai acontecer.

2.1.2. Negligência inconsciente o agente não chegou a prever a possibilidade de verificação do


evento ilícito (embora devesse e pudesse tê-la previsto).

Exe.: o pai que brinca com o filho atirando-o ao ar, (vai acima, vai abaixo…) de repente o
Candengue escapa pimbas com a cabeça ao chão.

 Negligência grosseira: constitui em direito penal, um grau essencialmente ou intensificado de


negligência.
Nos dizer de F. Dias, a doutrina Alemã sustenta que esta constitui exclusivamente uma forma
qualificada da culpa negligente, com características da atitude do agente que operaria perfeitamente
a nível da culpa, ou uma graduação do ilícito em função do especial dever de cuidado que
concretamente sobre o agente recai do perigo aumentado e a probabilidade e de especial frequência
de verificação do resultado.

Roxin, quando defende que o conceito implica uma especial intensificação da negligência não só ao
nível da culpa, mas também do ilícito53.

53
A nível do tipo de ilícito: torna-se indispensável que esteja perante um comportamento particularmente perigoso e um
resultado de verificação altamente provável à luz da conduta adopta.
A nível da culpa: resulta nos casos inevitavelmente aumentado, antes de alcançar-se a prova autónoma de que o agente
revelou no facto uma atitude particularmente censurável de leviandade ou descuido perante o comando jurídico-penal.

49
DIREITO PENAL-RESUMO Aiken Renkel Afonso – UMN - Faculdade de Direito - 2020

DIFERENÇA ENTRE: IMPRUDÊNCIA, NEGLIGÊNCIA E IMPERÍCIA


Imprudência
Imprudência é a prática de uma conduta arriscada ou perigosa e tem carácter comissivo. É a
imprevisão activa (culpa in faciendo ou in committendo). Conduta imprudente é aquela que se
caracteriza pela intempestividade, precipitação, insensatez ou imoderação.
Imprudente será, por exemplo, o motorista que, embriagado, viaja dirigindo seu veículo automotor,
com visível diminuição de seus reflexos e acentuada liberação de seus freios inibitórios.

Negligência
Negligência é o desprazer no agir, a falta de precaução, a indiferença do agente, que, podendo
adoptar as cautelas necessárias, não o faz. É a imprevisão passiva, o desleixo, a inacção (culpa in
ommittendo). É não fazer o que deveria ser feito.

Negligente será, por exemplo, o motorista de autocarro vulgo João Lourenço que trabalha com as
portas do colectivo abertas, em super lotação causando a queda e morte de um passageiro, ou
morrendo alguém por asfixia.

Imperícia
Imperícia é a falta de capacidade, despreparo ou insuficiência de conhecimentos técnicos para o
exercício de arte, profissão ou ofício. A inabilidade para o desempenho de determinada actividade
fora do campo profissional ou técnico tem sido considerada na modalidade de culpa imprudente ou
negligente, conforme o caso.

3. ILICITUDE
Ilicitude é a violação de uma disposição legal, dá-se quando o agente opta por uma conduta
antijurídica.

4. CULPA
Culpa é o juízo de censura imposto ao comportamento proibido, produzido pelo agente. ( Ex. A
acção tem de ser imputável ao agente).

Como vimos a propósito do princípio da culpa, é hoje unanimemente considerado que não há
responsabilidade sem culpa. Portanto culpa é limite transponível da pena.

50
DIREITO PENAL-RESUMO Aiken Renkel Afonso – UMN - Faculdade de Direito - 2020

SECÇÃO I
O TIPO DE CULPA
1- GENERALIDADES
Vimos que a culpa constitui um puro juízo de reprovação, ao agente face a sociedade.

Ora bem, quando se diz que a culpa é elemento do tipo, faz-se referência à inobservância do dever de
diligência. Explicando a todos, no convívio social, é determinada a obrigação de realizar condutas de
forma a não produzir danos a terceiros. É o denominado cuidado objectivo.

A conduta torna-se típica “a partir do instante em que não se tenha manifestado o cuidado necessário
nas relações com outrem.

2- CULPA E TIPO DE CULPA DOLOSO


F. Dias, tipo de culpa doloso é o tipo de culpa negligente, se verifica apenas quando perante um facto
ilícito-típico doloso, se comprova que o seu cometimento deve imputa-se a uma atitude íntima do
agente contrária ou indiferente ao direito e as suas normas.

Se uma tal comprovação se não alcançar ou dever se negada o facto só poderá eventualmente vir a
ser punido a título de negligência. Quanto a isso não serei exaustivo contudo consulta o F. Dias na
pag.528.

3- A CHAMADA CONSCIÊNCIA CONDICIONADA OU EVENTUAL DO ILÍCITO


Segundo Roxin, a consciência condicionada aproxima-se da figura do dolo eventual. Uma tal
situação, quando para o agente não esta clara a situação jurídica. Quando recruta provável que o seu
comportamento seja permitido mas conta também com a possibilidade de que ele seja proibido.

Já nos dizeres de F. Dias, o autor também chama esta figura de delimitação dos limites da falta de
consciência do ilícito, segundo o qual não reside no mundo das representações do agente, como
certas prováveis ou possíveis a nível da sua consciência intencional, nem na possibilidade de obter
um mais claro conhecimento da situação jurídica.

Na mesma linha de raciocínio, o que aqui se pode relevar é o erro da consciência ética, face a uma
situação fáctica cujo a valoração jurídica é ela mesmo pouco clara ou mesmo duvidosa. Portanto o
problema que nesta sede suscita não é pois o da determinação dos limites da falta de consciência do
ilícito, mas o de uma sua incensurabilidade ou menor censurabilidade54.

54
F. Dias-tomo.2. Pag.557

51
DIREITO PENAL-RESUMO Aiken Renkel Afonso – UMN - Faculdade de Direito - 2020

SECÇÃO V
NEGAÇÃO DA CULPA
1. IMPUTABILIDADE
Imputabilidade, consiste no conjunto de condições de maturidade e sanidade mental, a ponto de
permitir ao sujeito a capacidade de compreensão e de autodeterminação. Ao passo que o inimputável
é tido como um indigno de censura.

Com efeito, intende-se indigno de censura um acto praticado por quem não tenha condições psíquicas
de compreender a ilicitude de seu comportamento. Não se pode considerar reprovável a atitude de
uma criança de pouca idade que, na sala de aula, exibe ingenuamente suas partes pudendas55.

2. IMPUTABILIDADE EM RAZÃO DA ANOMALIA PSÍQUICA


Imputabilidade em razão da anomalia psíquica, se aliada à falta de capacidade de compreender o
carácter ilícito do facto e de determinar-se de acordo com esse entendimento, produz a
inimputabilidade.

É inimputável quem, por força de anomalia psíquica, for incapaz, no momento da prática do facto, de
avaliar a ilicitude deste ou de se determinar de acordo com essa avaliação (art. 18º nº 3 Anteproj).

O sujeito que, nessa hipótese, praticar um crime será absolvido. Trata-se de absolvição imprópria,
pois a ele se aplicará uma medida de segurança. A verificação da doença depende de exame pericial.
Sempre que houver suspeitas a respeito da higidez mental do agente, deve o juiz, de ofício ou
mediante requerimento, determinar a instauração de um incidente de insanidade mental (art. 18º nº 3
Anteproj).

3. A CONEXÃO BIO-PSICOLÓGICA (ELEMENTOS)


Conexão bio psicologica é aquele que se baseia, para o fim de constatação da inimputabilidade.
Está ligado à causa ou elemento provocador, e outro relacionado com o efeito, ou a consequência
psíquica provocada pela causa.
Assim, por exemplo, um doente mental somente será considerado inimputável se, além de sua
enfermidade (causa), constatar-se que, no momento da conduta (acção ou omissão), encontrava-se
desprovido de sua capacidade de entender a natureza ilícita do acto ou de se determinar conforme
essa compreensão (efeito56).

55
Estefam, André-parte geral do direito penal-vol 7-2018
56
Estefam, André-parte geral do direito penal-vol 7-2018

52
DIREITO PENAL-RESUMO Aiken Renkel Afonso – UMN - Faculdade de Direito - 2020

Elementos bio psicológicos:57


1. As psicoses
2. A oligofrenia
3. As psicótias
4. As neuroses
5. Anomalias sexuais
6. Perturbações profundas da consciência
Anomalias sexuais- Também chamados de desvios sexuais, com um grau normalmente elevado
(hipersualidade) ou com grau diminuído (hipo sexualidade), da actividade sexual.

4. O PROBLEMA DITO DA IMPUTABILIDADE DIMINUTA


Fala-se comummente em imputabilidade diminuída. A expressão é incorrecta, pois o agente é
imputável. Há diminuição da responsabilidade (a pena é diminuída) e não da imputabilidade. Assim,
podemos falar em responsabilidade diminuída e não em imputabilidade diminuída.

A responsabilidade diminuída, como o próprio nome indica, não constitui causa de exclusão da
culpabilidade. O agente responde pelo crime com pena privativa de liberdade atenuada ou medida de
segurança. E a sentença é condenatória58.

5. A ACTIO LIBERA IN CAUSA


Por actio libera in causa ou alic entende-se a situação em que o sujeito pratica um comportamento
criminoso sendo inimputável ou incapaz de agir, mas, em momento anterior, ele próprio se colocou
nesta situação de ausência de imputabilidade ou de capacidade de acção, de maneira propositada ou,
pelo menos, previsível.

Ex.: o agente propositadamente se embriaga visando perder a inibição para importunar


ofensivamente o pudor de uma mulher, o estado inebriante verificado, ainda que possa comprometer
a capacidade de discernimento do sujeito, será irrelevante para efeito de sua responsabilidade penal;
isto é, a ele se imputará a infracção sexual correspondente ao acto praticado.

Ex: (Isalina Sungueth) motorista de caminhão, tendo que efectuar a entrega da mercadoria em curto
período de tempo, decide fazer a viagem ininterruptamente; para tanto, ingere remédio estimulante,
cujos efeitos colaterais fazem com que ela perca a consciência durante a condução do veículo, o qual

57
Ver em figueiredo Dias
58
Jesus, de Damásio – Direito penal-vol. 1-ed. 32

53
DIREITO PENAL-RESUMO Aiken Renkel Afonso – UMN - Faculdade de Direito - 2020

vem a atropelar e matar terceiros – ainda que desprovido de consciência, responderá pelo homicídio
culposo na direcção de veículo automotor.

É de ver que a aplicação da actio libera in causa deve encontrar alguns limites, de modo a evitar a
responsabilização penal objectiva. É fundamental, nesse sentido, que o resultado posteriormente
produzido tenha sido desejado ou seja, ao menos, previsível, no momento em que se realizou o acto
livre, causador da futura inimputabilidade ou falta de acção59.

SECÇÃO III
IMPUTABILIDADE EM RAZÃO DA IDADE
1- FUNDAMENTO
A imputabilidade teve ser excluída relativamente a qualquer agente que ainda não atingiu em
virtude da idade, sua maturidade psicológica e espiritual, esta conclusão não é posta em dúvida
disse o mestre do Direito penal Português F. Dias, pag. 594.

Nos termos da lei ( art. 17º Anteproj. 2018), imputabilidade penal adquire-se, aos 16 anos de
idade.

Abaixo de 16 anos, os menores estão sujeitos à jurisdição dos tribunais de menores e, em relação
a eles só podem ser tomadas medidas de assistência, educação ou correcção previstas em
legislação especial.

59
Estefam, André-parte geral do direito penal-vol 7-2018

54
DIREITO PENAL-RESUMO Aiken Renkel Afonso – UMN - Faculdade de Direito - 2020

TÍTULO II
OS FACTOS PUNÍVEIS DOLOSOS DA ACÇÃO
OS TIPOS INCRIMINADORES
TÍTULO III
O TIPO OBJECTIVO DE ILÍCITO
1- QUESTÕES GERAIS DA TIPICIDADE60
Como diz F. Dias, tantos os tipos incriminadores, como os tipos justificativos concorrem na
concretização de um sentido de ilicitude material que se reveste de uma certeza conduta.

Os tipos incriminadores compreendem os delitos dolosos de acção, compostos por elementos da


natureza objectiva e de natureza subjectiva, com os quais construir um tipo objectivo e subjectivo.

No tipo objectivo, identifica-se um certo número de problemas gerais directamente relacionados com
função e o sentido da tipicidade.

2- DETERMINAÇÕES CONCEITUAIS: TIPO DE ERRO E TIPO DE ILÍCITO


O tipo apresenta-se antes de tudo como tipo de garantia também por vezes chamado com propriedade
tipo legal de crime, isto é conjunto de elementos exigidos pelo art. 1º do CP.

2.1. TIPO DE ERRO


Tipo de erro é um conjunto de elementos que se torna necessário ao agente conhecer para que possa
afirmar-se o dolo do tipo, dolo do facto ou dolo natural.

2.2. TIPO DE ILÍCITO


Tipo de ilícito, é a figura sistemática também chamado as vezes de tipo sistemático, a qual a doutrina
penal se serve para exprimir um sentido de ilicitude, individualizando uma espécie de delito e
cumprindo deste modo, a função de dar a conhecer ao destinatário que tal espécie de comportamento
é proibida pelo ordenamento jurídico.

2.3 DESVALOR DA ACÇÃO


Desvalor da acção, compreende-se um conjunto de elementos subjectivos que conformam o tipo de
ilícito e o tipo de culpa nomeadamente a finalidade delituosa, a atitude interna do agente que ao facto
preside e a parte do comportamento que exprime faticamente este conjunto de elementos.
Ex.: crime tentado.

60
Dias J. Figueiredo

55
DIREITO PENAL-RESUMO Aiken Renkel Afonso – UMN - Faculdade de Direito - 2020

2.3. DESVALOR DO RESULTADO


Desvalor do resultado, compreende a criação de um estado juridicamente desaprovado e, assim o
conjunto de elementos objectivos do tipo que perfeccionam a figura do delito.
Ex.: crime consumado.

TÍTULO IV
CONSTRUÇÃO DOS TIPOS INCRIMINADORES (TIPOS DE CRIME)

1- QUANTO AO AUTOR
CRIMES COMUNS E CRIMES ESPECÍFICOS
1.1. Crimes comuns - são aqueles que podem ser praticados por qualquer pessoa. Ex.: homicídio,
furto, roubo etc.

1.2. Crimes específicos - São aqueles que pressupõem como autores dos crimes apenas as pessoas
que têm uma qualidade exigida pelo próprio tipo.

Ex.: accionista, funcionário público); profissional (comerciante, empregador, empregado, médico,


advogado); de parentesco (pai, mãe, filho); ou natural (gestante, homem).

 Os crimes específicos podem ser: crimes específicos próprios ou impróprios


1.2.1. Crimes específicos próprios - É um crime que só pode ser praticado por aquelas pessoas e
mais nenhumas. Ex.: crime de prevaricação, que só pode ser praticado por advogado ou solicitador.

1.2.2. Crimes específicos impróprios - são aqueles que exigindo embora essas qualidades
específicas do agente, têm paralelo para o comum das pessoas em termos de responsabilização
jurídico-penal.

Ainda quanto ao autor ou agente temos crimes: crimes plurisubjectivos ou de participação


necessária e crimes unisubjectivos ou unisingulares.

a) Crimes plurisubjectivos ou de participação – são aqueles praticados por duas ou mais


pessoas.
b) Crimes unisubjectivos ou unisingulares - são aqueles cometidos por uma só pessoa.

Importa enquadrar aqui também os chamados crimes de violação de dever – são crimes que violam
deveres jurídicos, normalmente deveres jurídicos de natureza profissional ou deveres jurídicos
funcionais a que uma determinada pessoa está adstrita.

56
DIREITO PENAL-RESUMO Aiken Renkel Afonso – UMN - Faculdade de Direito - 2020

2-QUANTO A CONDUTA
CRIMES DE RESULTADO E CRIMES DE MERA ACTIVIDADE
2.1. Crimes de resultado – são crimes em que a sua consumação só se verifica quando se apura uma
alteração externa espaço-temporalmente distinta da conduta.

2.2. Crimes de mera actividade ou formais -também chamados crimes de intenção ou de


consumação antecipada, por sua vez, são aqueles cujo tipo penal descreve uma conduta e um
resultado, embora, para efeito de consumação, não seja necessário que ambos se produzam, sendo
suficiente a conduta, dirigida ao resultado.

SECÇÃO IV
CRIMES DE OMISSÃO
1. GENERALIDADE
A princípio os crimes correspondem a uma acção, situações há em que o agente opta por um não,
quando a lei diz sim, logo estaremos diante de uma omissão estas podem ser: crimes de omissão
impura ou imprópria também chamado dever de garante e omissões puras ou próprias.

Todavia, um crime pode também consistir numa omissão. A omissão, que naturalisticamente é um
nada, um non faccere, um não agir e, no sentido comum o contrário de acção, a verdade é que não
deixa de, constituir uma realidade que supõe uma valoração e que constitui uma conduta do agente,
dependente da vontade deste, e que pode ter relevância penal. É assim, que nos termos do art. 250º do
C. Penal angolano vigente prevê o crime de Omissão de auxílio.

Referimos que na “decomposição” e análise do crime, surge-nos deste logo o conceito de acção, pois
só o agir humano é susceptível de constituir um acto típico.

Em regra o tal corresponde o conceito corrente de acção, no sentido em que alguém pega numa arma,
subtrai uma coisa, atinge com um soco, uma facada, etc.

a. Crimes de omissões puras - há, responsabilidade jurídico-penal do agente, não porque ele tenha
actuado, mas precisamente porque omitiu uma conduta que lhe era exigível por lei.

Verifica-se, assim que efectivamente a lei descreve as circunstâncias em que era exigível a conduta,
punindo precisamente a omissão dessa conduta exigida.

Ex.: é o que se passa, entre outras normas, no âmbito do preceituado no artº 250º do CP de 1886
Omissão de auxílio:

57
DIREITO PENAL-RESUMO Aiken Renkel Afonso – UMN - Faculdade de Direito - 2020

b. Omissões impuras - aqui o agente é responsabilizado por um determinado resultado que tem
lugar não por sua acção, não porque ele tenha directamente adoptado uma conduta típica descrita
na lei, mas precisamente porque dá origem a um resultado por uma inactividade sua, violando
desta forma uma norma ou um preceito de natureza proibitiva.

Ex.: o artº 349º CP — crime de homicídio — contém uma norma proibitiva: veda precisamente a
adopção de uma conduta descrita na lei, veda a adopção da conduta de matar, porque quem matar
outrem é responsabilizado criminalmente.

Na omissão imprópria o agente é responsabilizado por crime de homicídio precisamente porque sobre
ele impendia um dever jurídico que pessoalmente o obrigava a evitar a produção desse resultado -
morte.

FONTES DO DEVER DE AGIR OU FONTES DA OMISSÃO


a) A Lei- dá-se nos casos em que o dever de agir se funda na Lei.
b) Contrato – dá-se naquelas situações em que há pessoas encarregadas de vigiar idosos ou
crianças.
c) Ingerência- é o caso de quem cria o perigo de verificação do resultado que, por omissão, não
remove61.
3. QUANTO AO BEM JURÍDICO
CRIMES DE DANO E CRIME DE PERIGO
3.1. Crimes de dano – São crimes em que a realização do tipo incriminador tem como consequência
uma lesão efectiva do bem jurídico: Ex.: homicídio, violação sexual e Injúria.

3.2. Crime de perigo - São aqueles em que basta que o bem jurídico seja colocado em perigo, para
se consumarem. (Ex: crime de exposição ou de abandono). Em outras palavras, para a consumação
deste crime basta que o bem jurídico, vida, seja posto em perigo, não sendo necessário que a vítima
morra.), estes dividem-se em: (crimes de perigo concreto e abstracto).

3.2.1. Crimes de perigo concreto - exigem que a conduta do agente provoque um perigo real.
3.2.2. Os crimes de perigo abstracto ou presumido - são aqueles em que a lei não exige que a
conduta provoque um perigo real basta o perigo em que a vítima encorre.

61
Posição de ingerência – Quando o agente cria um perigo para o bem jurídico fica numa posição de garante do bem.
(exemplo; quando alguém faz uma queimada fica obrigado a prevenir, evitar ou combater o incêndio).

58
DIREITO PENAL-RESUMO Aiken Renkel Afonso – UMN - Faculdade de Direito - 2020

3.1. CRIMES SIMPLES E CRIMES COMPLEXOS


3.1.1. Crimes simples – são crimes em que está em causa a violação de um bem jurídico.

Ex.: homicídio, cujo bem jurídico é a vida, ou do furto, para o qual o objecto jurídico é o património.

3.1.2. Crimes complexos – Crimes em que estão em causa dois ou mais bens jurídicos.

Como o roubo, que tutela o património e a integridade psíquica ou física da vítima. Também se
considera crime complexo a extorsão mediante sequestro, cujo tipo tutela o património e a liberdade
de locomoção do agente.

4. QUANTO AO GRUPO DE TIPOS OU FIGURAS TÍPICAS


4.1. Crimes privilegiado
4.2. Crimes duradouros ou permanentes
4.3. Crimes habituais
4.4. Crimes de empreendimento
4.5. Crime preterintencional
4.6. Crime agravado pelo resultado
4.7. O versari in re ilícita
4.8. Crimes hediondos
4.9. Crimes instantâneos
4.10. Crime continuado
4.11. Crime progressivo
4.12. Crime putativo
4.13. Crime impossível
4.14. Crime falho
4.15. Crime em trânsito
4.16. Crime transeunte
4.17. Crime de ímpeto
4.18. Crimes conexos
4.19. Crime multitudinário
4.20. Crimes intrauneus e extraneus

1- Crimes Privilegiados – são aqueles que visam a diminuição de pena imposta a conduta do
agente. Contudo, não se trata de elementos típicos, mas de causas de diminuição de pena. Tais
causas privilegiadas são as seguintes: estado de intensa emoção, compaixão, desespero ou outro
motivo relevante que diminua consideravelmente a sua culpa.

59
DIREITO PENAL-RESUMO Aiken Renkel Afonso – UMN - Faculdade de Direito - 2020

2- Crimes duradouros ou permanentes – Quando a consumação do crime se prolonga no tempo,


por vontade do autor.

3- Crimes habituais - é a reiteração da mesma conduta reprovável, de forma a constituir um estilo


ou hábito de vida.

4- Crimes de empreendimento – também chamados crimes de atentado, são aqueles em que se


verifica uma equiparação típica entre tentativa e resultado. (para estes crimes não é válida a
atenuação especial da pena prevista para a tentativa, nem o facto de haver desistência).
5- Crime preterintencional - Crime preterdoloso ou preterintencional é aquele em que a acção
causa um resultado mais grave não pretendido pelo agente. O sujeito quer um minus e a sua
conduta produz um majus. Dito por outra forma é aquele em que resultado vai além da intenção
do agente.

6- Crimes qualificados pelo resultado – são tipos cuja pena aplicável é agravada em função de um
evento ou resultado que da realização do tipo fundamental derivou. Esta qualificação em- função
do resultado tem de estar prevista na parte especial do CP, sob pena de violar o preceito “nullum
crimen, nula poena, sine lege”.

7- Princípio versari in re illicita ou princípio do crime agravado pelo resultado – Quem


pratica um ilícito, responde pelas consequências, mesmo casuais que dele promanem.

8- Crimes instantâneos - são os que se completam num só momento. A consumação se dá num


determinado instante, sem continuidade temporal. Ex.: homicídio, em que a morte ocorre num
momento certo.

9- Crime continuado - Diz-se que há crime continuado “quando o agente, mediante mais de
uma acção ou omissão, pratica dois ou mais crimes da mesma espécie e, pelas condições de tempo,
lugar, maneira de execução e outras semelhantes, devendo o subsequente ser havidos como
continuação do primeiro.

10- Crime progressivo - o corre o crime progressivo quando o sujeito, para alcançar a produção
de um resultado mais grave, passa por outro menos grave.

No crime de homicídio, p. ex., antes da produção do resultado morte há a lesão ou lesões à


integridade física da vítima. O evento menos grave é absorvido pelo de maior gravidade.

60
DIREITO PENAL-RESUMO Aiken Renkel Afonso – UMN - Faculdade de Direito - 2020

11- Crime putativo - ocorre o delito putativo (ou imaginário, ou erroneamente suposto) quando o
agente considera erroneamente que a conduta realizada por ele constitui crime, quando, na verdade, é
um facto atípico. Só existe na imaginação do sujeito.

O delito putativo, na realidade, não é uma espécie de crime, mas uma maneira de expressão para
designar esses casos de “não crime”.

12- Crime impossível - é também chamado quase crime, tentativa inadequada ou inidónea. Por
outras palavras dá-se o crime impossível por ineficácia absoluta do meio ou por absoluta
impropriedade do objecto, é impossível consumar-se o crime.

a) Por ineficácia absoluta do meio empregado — o meio, por sua natureza, é inadequado, inidóneo,
absolutamente ineficaz para produzir o resultado pretendido pelo agente. É indispensável que o
meio seja inteiramente ineficaz. Se a ineficácia for relativa, haverá tentativa punível.

b) Por absoluta impropriedade do objecto — o objecto é absolutamente impróprio para a realização


do crime visado. Aqui também a inidoneidade tem de ser absoluta. Há crime impossível, por
exemplo, nas manobras abortivas em mulher que não está grávida; no disparo de arma de fogo,
com animus necandi, em cadáver.

13- Crime falho - é a denominação que se dá à tentativa perfeita ou acabada, em que o sujeito faz
tudo quanto está ao seu alcance para consumar o crime, mas o resultado não ocorre por circunstâncias
alheias à sua vontade.
Ex.: o sujeito, sabendo que seu inimigo não sabe nadar, atira-o num rio, mas ele é salvo por
terceiros.

14- Crime exaurido é aquele que depois de consumado atinge suas últimas consequências.

15- Crimes hediondos - São delitos repugnantes, sórdidos, decorrentes de condutas que, pela
forma de execução ou pela gravidade objectiva dos resultados, causam intensa repulsa.

Ex.: o homicídio simples, desde que cometido em acção típica de grupo de extermínio, o homicídio
doloso qualificado, o latrocínio, a extorsão qualificada pela morte, a extorsão mediante sequestro, o
estupro, o estupro de vulnerável, a falsificação, a corrupção, a adulteração ou alteração de produto -
destinado a fins terapêuticos ou medicinais, a epidemia com resultado morte e o genocídio, tentados
ou consumados.

61
DIREITO PENAL-RESUMO Aiken Renkel Afonso – UMN - Faculdade de Direito - 2020

16- Crime em trânsito - é aquele em que o sujeito desenvolve a actividade em um país sem
atingir qualquer bem jurídico de seus cidadãos.
Ex.: uma carta injuriosa que, enviada do Congo para África do Sul, passa pelo nosso território.

17- Crime transeunte - é o que não deixa vestígios.

18- Crime gratuito - é o delito praticado sem motivo.

19- Crime de ímpeto - é aquele em que a vontade delituosa é repentina, sem preceder
deliberação.
Ex.: homicídio cometido sob o domínio de violenta emoção, logo em seguida a injusta provocação da
vítima.

20- Crimes conexos - pode suceder que o mesmo sujeito pratique vários crimes sem que entre
eles haja qualquer ligação.
Assim, o sujeito pode praticar um furto; dias depois, um homicídio. Não há qualquer circunstância
em comum entre os dois crimes, a não ser a identidade do agente, são independentes.

21- Crime multitudinário - é o praticado por uma multidão em tumulto, espontaneamente


organizada no sentido de um comportamento comum contra pessoas ou coisas.

Ao tratar da co-autoria o nosso Código não cuidou do assunto de forma expressa. Todavia, constitui
circunstância atenuante “ter o agente cometido o crime sob a influência de multidão em tumulto, se
não o provocou”.

22- Crimes intrauneus – são aqueles tipos específicos, em que a sua força constitutiva exigem
qualidade especiais quer do agente quer da vítima. Ex.: O parricídio.

23- Crimes extraneus – são aqueles tipos comuns ou seja que não exigem qualidades quer do
agente ou da vitima para os realizar, portanto podem ser cometidos por qualquer pessoa62.
Ex.: homicídio próprio.

62
Sugeridos por Nelson Fina- cit. F. Dias

62
DIREITO PENAL-RESUMO Aiken Renkel Afonso – UMN - Faculdade de Direito - 2020

TÍTULO V
IMPUTAÇÃO OBJECTIVA DO RESULTADO À ACÇÃO
(é o nexo de causalidade63 que liga o crime ao seu autor.)

1- GENERALIDADE
Uma análise feita a luz dos ensinamentos de Figueiredo Dias64
De modo sucinto, pode-se dizer que a teoria geral da imputação objectiva (conforme concebida por
Roxin) consiste num conjunto de pressupostos jurídicos que condicionam a relação de imputação
(atribuição) de um resultado jurídico (ou normativo) a um determinado comportamento (penalmente
relevante65).
Portanto a imputação objectiva, Consiste em estabelecer o nexo de causalidade entre a acção e o
resultado. É a possibilidade de atribuir a responsabilidade a alguém pelo evento, através do
estabelecimento de um nexo de relação entre o facto e o resultado.

2- TEORIAS QUE REBATEM A QUESTÃO DA IMPUTAÇÃO OBJECTIVA


Inúmeras são as teorias que rebatem sobre a imputação objectiva, entre as quais temos:
1.Teoria da causalidade (conditio sine qua non);
2.Teoria da adequação;
3.Teoria do risco.

63
Conceito de relação de causalidade: é o vínculo estabelecido entre a conduta do agente e o resultado por ele gerado,
com relevância para formar o facto típico. Portanto, a relação de causalidade tem reflexos directos, em nosso entender, na
tipicidade. Causalidade significa sucessão no tempo. “Literalmente, significa que o tempo se segue, que um tempo se
segue a um outro. Por conseguinte, Kant diz, por exemplo: ‘tempos diversos não são ao mesmo tempo, mas são um
depois do outro’. O tempo ‘flui constantemente’. Sua ‘constância’ é o fluir”.
Conceito de resultado: há dois critérios para analisar o resultado:
a) NATURALÍSTICO: é a modificação sensível do mundo exterior. O evento está situado no mundo físico, de modo
que somente se pode falar em resultado quando existe alguma modificação passível de captação pelos sentidos. Exemplo:
a morte de uma pessoa é um resultado naturalisticamente comprovável.
b) JURÍDICO OU NORMATIVO: é a modificação gerada no mundo jurídico, seja na forma de dano efectivo ou na de
dano potencial, ferindo interesse protegido pela norma penal. Sob esse ponto de vista, toda conduta que fere um interesse
juridicamente protegido causa um resultado. Ex.: a invasão de um domicílio, embora possa nada causar sob o ponto de
vista naturalístico, certamente provoca um resultado jurídico, que é ferir o direito à inviolabilidade de domicílio do dono
da casa.
Conceito de causa: significa toda acção ou omissão indispensável para a configuração do resultado concreto, por menor
que seja o seu grau de contribuição. Não há qualquer diferença entre causa, condição (aquilo que permite à causa produzir
o seu efeito) e ocasião (circunstância acidental que favorece a produção da causa), para fins de aplicação da relação de
causalidade. Para apurar se alguma circunstância fática é causa do crime, deve-se utilizar o critério do juízo hipotético de
eliminação, ou seja, abstrai-se determinado fato do contexto e, se ainda assim o resultado se produzisse, não seria ele
causa do resultado. Ex.: a vítima morre em razão de ferimentos causados por disparos de arma de fogo dados por A; este,
por sua vez, adquiriu o revólver de B; o fabricante C construiu a arma, vendida por B. São causas do resultado morte: dar
o tiro + vender a arma + fabricar o revólver. Subtraído qualquer desses antecedentes – em juízo hipotético –, o resultado
morte não teria ocorrido.
64
Dias J. Figueiredo- parte geral do direito penal-questões fundamentais do crime- tomo 1-ed.2-ano 2007
65
Idem

63
DIREITO PENAL-RESUMO Aiken Renkel Afonso – UMN - Faculdade de Direito - 2020

2.3. TEORIA DA CAUSALIDADE


Primeiro degrau – a categoria da causalidade:
Teoria sine qua non ( ou das condições equivalentes) – a premissa básica desta teoria é a de que,
causa de um resultado é toda a condição, sem a qual o evento não teria tido lugar.

Segundo a mesma todas as condições, que de alguma forma contribuíram para que o resultado se
tivesse produzido, são causais em relação a ele e devem ser considerados equivalentes entre si, sendo
apta qualquer delas a produzir o resultado típico. Teria o juiz de suprimir mentalmente cada uma
dela, até atingir a condição sem a qual o resultado não se tivesse produzido.

2.4. TEORIA DA ADEQUAÇÃO


Segundo degrau – A causalidade jurídica sob a forma da adequação:
Evoluindo a partir da conditio sine qua non, afastando diversas condições naturais ou mesmo legais
de verificação do resultado, foi concebida a Teoria da adequação ou da causalidade adequada.

Esta teoria surge da necessidade de evitar injustiças derivadas da aplicação da conditio sine qua non
aos crimes agravados pelo resultado.

Assim, não serão relevante todas as condições, mas só aquelas que, segundo as máximas da
experiência e a normalidade do acontecer – e, portanto, segundo o que é, em geral, previsível – são
idóneas para produzir o resultado; assim se deve interpretar.

O legislador optou, em termos básicos, por empregar a teoria da causalidade adequada à imputação
objectiva do resultado ao evento.

A extracção da causa adequada realiza-se através de um juízo de prognose póstuma; tal significa que
o intérprete, o juiz, se deve deslocar mentalmente para o passado, para o momento em que foi
praticada a conduta e ponderar, enquanto observador objectivo, se, dadas as regras gerais da
experiência e o normal acontecer dos factos, a acção justificada teria como consequência a produção

64
DIREITO PENAL-RESUMO Aiken Renkel Afonso – UMN - Faculdade de Direito - 2020

do evento. Se entender que a produção do resultado era imprevisível ou que, sendo previsível, era
improvável ou de verificação rara, a imputação não deverá ter lugar.

Ao juízo de prognose póstuma, devem ser levados em conta os especiais conhecimentos do agente,
bem como a figura do homem médio; assim, a construção a efectuar pelo juiz deverá ser: “era
previsível e provável, para o homem médio, colocado na posição do agente e com os especiais
conhecimentos do mesmo que a acção levada a cabo por si era apta à produção do resultado típico?”

Esta teoria falha no que diz respeito à criação de riscos consideráveis para os bens jurídicos e a
mesma não soluciona os resultados, surgindo, assim, a moderna teoria do risco.

Notas:
“A” será punido criminalmente por homicídio doloso, já que deu causa à morte de “B”

“C” e “D”, como regra, não serão penalmente responsabilizados, pois não é razoável supor que o
vendedor e o fabricante de armas, quando em situação legalizada, tenham alguma participação nos
delitos que possam ocorrer com o emprego das armas comercializadas.

Podem ter suas condutas consideradas como antecedentes causais válidos para sua responsabilização
penal, caso se prove que algum deles tenha agido com dolo ou culpa para a ocorrência do resultado
“morte”.

65
DIREITO PENAL-RESUMO Aiken Renkel Afonso – UMN - Faculdade de Direito - 2020

2.5. TEORIA DO RISCO


Terceiro degrau – Conexão do risco:
Segundo a teoria do risco, o resultado só deve ser imputado à conduta, quando esta tenha criado,
aumentado ou não diminuído um risco proibido para o bem jurídico protegido pelo tipo de ilícito e
esse risco se tenha materializado no resultado típico.

Factores dependentes da teoria a imputação pelo risco:


1º - Que o agente tenha criado um risco não permitido;

2º Que o agente tenha aumentado ou não diminuído um risco já existente;

2º - Que esse risco tenha conduzido à produção do resultado concreto. Se tal não se verificar, a
imputação é excluída.

 COMPORTAMENTOS LÍCITO ALTERNATIVO


Nestes casos demonstra-se que o resultado típico teria sido, seguramente, sensivelmente o mesmo,
ainda que a conduta ilícita não tivesse lugar.

Neste caso é desaconselhada a imputação objectiva, visto que não se demonstra, como sustenta
Roxin,que o agente criou um risco não permitido, verificando-se que a conduta indevida tal como a
conduta lícita alternativa produziriam o resultado típico, pelo que a sua aplicação violaria o princípio
da igualdade.

TÍTULO VI
TIPO SUBJECTIVO DE ILÍCITO
GENERALIDADE
Nos termos artigo 11.º do Anteprojecto CP versão 2018, a Imputação Subjectiva, só é punível o
facto praticado com dolo ou, nos casos especialmente previstos na lei, com negligência.

(Dolo e Negligencia), já abordamos em outro momento, quando falamos sobre o conteúdo e estrutura
do tipo, cumpre agora abordar a problemática do erro com incidência directa no elemento intelectual
ou cognitivo do tipo subjectivo.

Portanto, vale dizer, que algumas vezes poderá existir por parte do agente uma falsa representação do
elemento volitivo e intelectual, dando lugar a figura do erro, que pode suceder quando o agente
desconhece o elemento constitutivo do tipo (descritivo e normativo) ou tem um conhecimento
defeituoso do mesmo. Assim, não obstante o erro praticado pelo agente, terá a sua relevância em sede de
culpa, como veremos.

66
DIREITO PENAL-RESUMO Aiken Renkel Afonso – UMN - Faculdade de Direito - 2020

1- Erro sobre o objecto (error in persona vel objecto) - verifica-se este erro quando o agente
atinge com a sua acção um objecto típico diferente daquele que representou66.

É o que sucede quando um caçador dispara sobre um vulto, que vê mexer atrás de um arbusto
supondo ser uma peça de caça quando, na realidade, se trata de uma pessoa. Sendo elemento típico -
objectivo do crime de homicídio a morte de uma pessoa, para que se cometa o respectivo crime
impõe-se que o agente saiba que está a atingir uma pessoa (ainda que não seja quem ele pensa,), o
que corresponde ao elemento intelectual do dolo, como vimos.

Faltando esse conhecimento em virtude do apontado erro sobre o objecto (típico), encontra-se
excluído o dolo. Significa que o caçador pode vir a ser punido pela prática de um crime de homicídio
por negligência.

Nguena, pretendia matar Amaro e mata o cão, porque a figura deste estava oculta atrás de um
arbusto lhe pareceu a cabeça e parte do tronco do vizinho deitado e meio oculto.
O Nguena não representou o objecto típico do dano (uma coisa) mas sim o objecto típico do
homicídio (uma pessoa), que ele pretendia realizar. O seu dolo é de homicídio e não de dano.
No entanto, ele praticou todos os actos de execução necessários a produzir o resultado que visava
com a sua acção, ou seja, matar outra pessoa, o qual não se verificou por razões alheias à sua vontade
isto é actuou em erro sobre o objecto típico - pelo que deve o mesmo ser punido por tentativa67.

2- Erro sobre a identidade do objecto - situações semelhantes às anteriores mas delas diferentes num
aspecto essencial, são os casos de erro sobre a identidade do objecto, que agora veremos:
 Error in persona – engana-se na qualidade ou identidade da pessoa – ou error in objecto, quando
se engana no objecto concreto.

Este erro verifica-se quando o agente representa correctamente a existência de um objecto, que
corresponde às características exigidas pelo tipo legal, mas erra sobre a sua identidade, em concreto:
Anselmo quer matar a mulher de Ovídeo mas mata a mulher de Celestino, por confundi-la com
aquele.
Wilingui pretende danificar o carro de Nucho mas danifica o automóvel de Paita, por confundir
ambas as viaturas;

66
Latas, António J.-Duarte, Jorge D. e Patto, P. Vaz - direito penal e processual penal-ano ed.2007.
67
Quanto a esse aspecto eu sou apologista da teoria do premio, estou certo de que quanto ao seu vizinho Amaro o agente
não poderia ser responsabilizado, por inedoniedade do objecto. Já quanto ao animal aqui o tipo incorreria num crime de
dano.

67
DIREITO PENAL-RESUMO Aiken Renkel Afonso – UMN - Faculdade de Direito - 2020

Em ambas estas situações é irrelevante o erro sobre a identidade, não eximindo de responsabilidade
criminal.
A lei pune a morte de outra pessoa e não da pessoa A ou B, ou mesmo da pessoa com estas ou
aquelas características em si mesmas consideradas, ou em relação com o agente, tal como o do
mesmo Código pune a danificação do semovente pertencente a outrem, independentemente da
identidade do respectivo titular.

3- Erro sobre o processo causal – o corre quando a um desvio no processo que determina o
resultado a acção. Ou seja, ocorre quando o agente dirige a acção a um determinado objecto de acção,
atinge esse objecto de acção, mas através de um processo diferente.

Normalmente o processo causal vem referido a propósito da imputação objectiva, quando o erro
sobre o processo causal é relevante, exclui-se a imputação do resultado do agente.
Contudo para se saber se há imputação do resultado á acção terá de se verificar 2 requisitos:
Essencial
Se o desvio é
Previsível
Ex.: Donizelia atira Edmilda ao rio, mas Edmilda não morre afogada, mas sim comida pelo jacaré.
Donizelia é punido pela tentativa de homicídio porque este tipo de morte não era previsível. Não é
previsível que haja jacaré no rio68.

4- Erro na execução (aberration ictus) - erro de execução ou “aberratio ictus”, que significa
precisamente «desvio do golpe». O agente não consegue sequer, com a sua acção, alcançar o objecto
que se pretende atingir e atinge um objecto diferente, por falta de perícia ou por um motivo de força
maior.
No chamado erro de execução há antes uma desconformidade entre o objecto visado e o objecto
atingido por razões externas ligadas ao agente ou que têm a ver com a sua destreza ou perícia69.
Assim, o Kordeiro que faz pontaria na direcção de Cláudio e, por imperícia, atinge Ilavoco.

68
Pese embora existir erro sobre os elementos objectivos e não subjectivos, e o agente com sua conduta, representar e
quer tal resultado fica difícil afastar o dolo, quer sim ou não o dolo tem de ser mesmo afastado, por força da teoria do
riso, veja-se que não é o mesmo agente que consuma o crime. Repara o seguinte exemplo: Paulo Bravo querendo matar
Maria, espanca brutalmente, ficando esta inconsciente Paulo pensa que a mesma está morta, leva-a até ao corredor
deixando a mesma deitada no referido local, chegando mais tarde Pai Inglês (bandido do referido bairro), dirige-se
vitima, esta voltando a sua sã consciência tenta fugir é alvejado com dois tiros por este e morre. A questão é como devem
ser responsabilizados Paulo e o Pai Inglês? Tanto é que Paulo pensava que com os socos dados já havia matado a vítima.
69
Latas, António J.-Duarte, Jorge D. e Patto, P. Vaz - direito penal e processual penal-ano ed.2007.

68
DIREITO PENAL-RESUMO Aiken Renkel Afonso – UMN - Faculdade de Direito - 2020

TÍTULO VII
OS TIPOS JUSTIFICATIVOS (CAUSAS DA EXCLUSÃO DA ILICITUDE)

1- GENERALIDADE
As causas de justificação não têm natureza penal, antes podem emanar de um outro ramo do direito,
pois é entendimento dominante e mesmo positivado na lei penal que o facto não é punível quando a
sua ilicitude (penal) for excluída pela ordem jurídica considerada na sua totalidade, tal como expresso
no art. 44º do C. Penal vigente.

2- LEGITIMA DEFESA
É talvez a mais emblemática das causas de justificação ou exclusão da ilicitude (na linguagem da lei).

Genericamente, a legítima defesa cobre situações da vida em que, para afastar um ataque à esfera
jurídica própria ou de terceiro, alguém reage contra o autor dessa agressão, causando danos à sua
pessoa ou património70.

Exemplo: Joana agride Rose, Dr.Cláudio intervém em defesa de Rose. Dr.Canuco aparece no
meio da confusão, e vendo Joana a ser agarrado pelo Dr.Cláudio, pensa que ela está a ser agredida e
agride Dr.Cláudio.

A reacção de Dr.Cláudio foi lícita, estava em situação de legítima defesa, no interesse de um terceiro
logo a reacção de Dr.Canuco não é lícita.

a) Requisitos da legítima:
1- Que se verifique uma agressão proveniente de conduta humana, ilícita ou antijurídica. Por
outro lado, tal violação não carece de ser culposa, concebendo-se, assim, legítima defesa contra acto
praticado por inimputável (crianças ou dementes), por motivo de erro ou ainda num situação de
inexigibilidade.
2- A agressão deve ser actual; e deve apresentar-se como iminente ou em execução, mas não
consumada. Só assim não será nos crimes duradouros ou contínuos em que a consumação material se
prolonga no tempo, devendo a agressão considerar-se actual nesses casos, para efeitos da legítima
defesa.
3- Um de natureza subjectiva: o «animus defendendi», que consiste no intuito de preservar o
bem jurídico ameaçado. Para tanto exige-se que o defendente actue com consciência de que está
iminente ou em execução uma agressão a bem jurídico próprio ou de terceiro

70
Latas, António J.-Duarte, Jorge D. e Patto, P. Vaz - direito penal e processual penal-ano ed.2007

69
DIREITO PENAL-RESUMO Aiken Renkel Afonso – UMN - Faculdade de Direito - 2020

Não pode a agressão estar consumada, no sentido de finda, pois a legítima defesa consiste num meio
de impedir a agressão (seja o início, seja sua continuação) e não de desforra ou sanção por agressão já
terminada.
Entretanto, exige-se que:
a) Se verifique a impossibilidade de recorrer à força pública em tempo útil;
b) A actuação do defendente se mostre adequada ou idónea para suster a agressão, atentas as
características do caso concreto;
c) O defendente escolha a conduta que causar menos danos ao lesante, entre as adequadas a
suster a agressão, com exclusão das desonrosas ou infamantes.
d) Recurso à fuga perante a iminência de ofensas corporais, quando o agressor for um menor ou
idoso.

Excesso de legítima defesa


Excesso de legítima defesa, consiste na utilização de meios que excedem – em grau ou espécie – os
meios idóneos ou adequados, ou seja, os meios necessários para repelir a agressão.

Este excesso pode ser asténico resultante de medo, perturbação, susto) ou esténico (cólera, furor,
desejo de vingança) e estão ambos sujeitos ao mesmo regime. Isto é, em ambos os casos a conduta é,
em princípio, ilícita, mas a pena pode ser especialmente atenuada; no caso de excesso asténico, o
agente pode não ser punido se o excesso resultar de perturbação, medo ou susto, não censuráveis.

3- ESTADO DE NECESSIDADE
O estado de necessidade caracteriza-se pela colisão de interesses juridicamente protegidos, devendo
um deles ser sacrificado em prol do interesse social. Como salientava a doutrina maioritária: “O que
justifica a acção é a necessidade que impõe o sacrifício de um bem em situação de conflito ou
colisão, diante da qual o ordenamento jurídico permite o sacrifício do bem de menor valor”, desde
que imprescindível, acrescentamos, para a salvaguarda do bem preservado.

Portanto o confronto são de idêntico valor e outras em que os bens a proteger são manifestamente
superiores aos bens a sacrificar, que o legislador angolano optou por criar os art.45º do C. Penal vig.,
e o art. 32º do anteprojecto do CP versão 2018.

No exemplo clássico, dois náufragos disputam a mesma tábua, que não suporta mais de um; uma vida
terá de ser sacrificada para salvar outra. Em tais hipóteses, o Direito, reconhecendo sua impotência
para salvar os bens em perigo, admite que um deles seja sacrificado em benefício do outro,
aguardando a solução natural, para proclamá-la legítima.

70
DIREITO PENAL-RESUMO Aiken Renkel Afonso – UMN - Faculdade de Direito - 2020

Requisitos do estado de necessidade:


São os seguintes: existência de perigo actual e inevitável; não provocação voluntária do perigo;
inevitabilidade do perigo por outro meio; inexigibilidade de sacrifício do bem ameaçado; direito
próprio ou alheio; elemento subjectivo: finalidade de salvar o bem do perigo; ausência de dever legal
de enfrentar o perigo.

DIFERENÇA ENTRE LEGÍTIMA DEFESA E ESTADO DE NECESSIDADE:


a) No estado de necessidade há um conflito de interesses legítimos, e a sobrevivência de um
significará o perecimento do outro; na legítima defesa o conflito ocorre entre interesses lícitos, de um
lado, e ilícitos, de outro;
b) Na legítima defesa a preservação do interesse ameaçado se faz por meio de defesa, enquanto no
estado de necessidade essa preservação ocorre por meio de ataque;
c) No estado de necessidade existe acção, e na legítima defesa reacção.

4- OS CONSENTIMENTOS JUSTIFICANTES
No entendimento do Prof. Eduardo Correia, o qual admitia o consentimento como causa geral de
justificação desde que o potencial lesado tivesse o necessário discernimento para consentir, que o
consentimento fosse prestado para cada situação concreta, em momento anterior à acção e que esta-
não contrariasse os bons costumes, exigindo ainda que o consentimento diga respeito a bens jurídicos
livremente disponíveis pelo respectivo titular71. Tal como dispões o art.34º do anteprojecto., do CP
versão 2018, vale dizer que o consentimento pode ser real ou presumido.

PRESSUPOSTOS FORMAIS DO CONSENTIMENTO:


b) A capacidade para consentir;
c) A seriedade e a liberdade do consentimento: têm como corolário o dever de informação e
esclarecimento.
d) A disponibilidade do bem jurídico tutelado, por parte do ofendido, que consente. Excluídos os
bens jurídicos da colectividade, serão disponíveis os bens pessoais de natureza patrimonial e
mesmo outros dentro dos condicionalismos acolhidos na lei
e) Não ofenda os bons costumes.
Consentimento real – é o consentimento propriamente dito.
Consentimento presumido - verifica-se quando a situação em que o agente actua lhe permite
razoavelmente supor que o titular do direito daria o seu consentimento se o pudesse fazer.

71
Latas, António J.-Duarte, Jorge D. e Patto, P. Vaz - direito penal e processual penal-ano ed.2007

71
DIREITO PENAL-RESUMO Aiken Renkel Afonso – UMN - Faculdade de Direito - 2020

5- OBEDIÊNCIA HIERÁRQUICA
Ordem de superior hierárquico é a manifestação de vontade do titular de uma função pública a um
funcionário que lhe é subordinado, no sentido de que realize uma conduta (positiva ou negativa).
A ordem pode ser:
a) Legal ou
b) ilegal.
Quando a ordem é legal, nenhum crime comete o subordinado (nem o superior), uma vez que se
encontra no estrito cumprimento de dever legal.

Ex.: o oficial de justiça, em cumprimento a um mandado de prisão preventiva expedido pelo juiz,
executa a ordem judicial, prendendo alguém. O juiz e o oficial da justiça não cometem crime algum.
Ordem ilegal é o oposto da ordem legal.

A ordem ilegal pode ser:


a) Manifestamente ilegal ou
b) Não manifestamente ilegal.

Quando a ordem é manifestamente ilegal, respondem pelo crime o superior e o subordinado. Ex.: o
delegado de polícia determina ao soldado que exija do autor de um crime determinada quantia, a fim
de não ser instaurado inquérito policial. Os dois respondem por crime de concussão. Em relação ao
subordinado há uma atenuante genérica.

É possível que a ordem emanada do superior hierárquico não seja manifestamente ilegal. É o caso
apresentado por Nélson Hungria: “um bisonho soldado de polícia, por ordem do comandante da
escolta, mata com um tiro de fuzil, supondo agir por obediência devida, o criminoso que tenta fugir
ou opõe resistência passiva ao mandado de prisão.

72
DIREITO PENAL-RESUMO Aiken Renkel Afonso – UMN - Faculdade de Direito - 2020

DA INIMPUTABILIDADE POR EMBRIAGUEZ


1. CONCEITO
Embriaguez é a intoxicação aguda e transitória causada pelo álcool, cujos efeitos podem progredir de
uma ligeira excitação inicial até ao estado de paralisia e coma72.

Possui as seguintes fases:


a) Excitação (euforia, loquacidade, diminuição da capacidade de autocrítica);
b) Depressão (confusão mental, falta de coordenação motora, irritabilidade);
c) Fase de sono (o ébrio cai e dorme, havendo anestesia e relaxamento dos esfíncteres, culminando
com o estado de coma).

A embriaguez pode ser:


a) Completa e
b) Incompleta.
A embriaguez completa - corresponde ao segundo e ao terceiro períodos (fases), sendo que neste
último (período letárgico) o sujeito só pode cometer crimes omissivos ou comissivos por omissão.
A embriaguez incompleta - corresponde à primeira fase.

Tendo em vista o elemento subjetivo do agente em relação à embriaguez, esta pode ser:
a) Voluntária ou culposa (não acidental);
b) Acidental.

Embriaguez voluntária - quando o sujeito ingere substância alcoólica com intenção de embriagar-
se.
Existe ebriez culposa - quando o sujeito não ingere substância alcoólica com a finalidade de
embriagar-se, mas em face de excesso imprudente vem a embriagar-se.
A embriaguez é acidental - quando não voluntária nem culposa. Pode ser proveniente de: (caso
fortuito e força maior).

a) A embriaguez é proveniente de caso fortuito - quando o sujeito desconhece o efeito inebriante


da substância que ingere, ou quando, desconhecendo uma particular condição fisiológica, ingere
substância que possui álcool (ou substância análoga), ficando embriagado. Ex.: o sujeito
(citadino) toma um duplo ou quádruplo de canhome, sendo que em face de condição fisiológica
que desconhece fica embriagado.

72
Cat. Por André Estefom, Manzini, Trattato di diritto penale, 1950, v. 2, p. 140.

73
DIREITO PENAL-RESUMO Aiken Renkel Afonso – UMN - Faculdade de Direito - 2020

b) Há embriaguez proveniente de força maior - no caso, p. ex., de o sujeito ser obrigado a ingerir
bebida alcoólica.

DA INIMPUTABILIDADE POR DOENÇA MENTAL OU DESENVOLVIMENTO MENTAL


INCOMPLETO OU RETARDADO
Vimos que a culpabilidade é composta de três elementos:
a) Imputabilidade;
b) Potencial consciência da ilicitude e
c) Exigibilidade de conduta diversa.

A imputabilidade pode ser excluída por determinadas causas, denominadas causas de


inimputabilidade. Não havendo imputabilidade, primeiro elemento da culpabilidade, não há
culpabilidade e, em consequência, não há pena. Assim, em caso de inimputabilidade, o agente que
praticou o facto típico e antijurídico deve ser absolvido, aplicando-se medida de segurança.

São causas de exclusão da imputabilidade:


a) Inimputabilidade por doença mental;
b) Inimputabilidade por desenvolvimento mental incompleto (menoridade penal);
c) Inimputabilidade por desenvolvimento mental retardado;
d) Inimputabilidade por embriaguez completa, proveniente de caso fortuito ou força maior.

TÍTULO VIII
CAUSAS DE EXCLUSÃO DA CULPA (A INEXIGIBILIDADE73)
As causas da exclusão da culpa estão previstas tanto no código penal de 1886, art. 44º e no art. 36º e
ss do anteprojecto de versão 2018.
1- Excesso de legítima defesa desculpante (Artigo 36.º ant. proj CP versão 2018);
2- Estado de necessidade desculpante (Artigo 37.º ant. proj CP versão 2018);
3- Conflito de deveres desculpante (Artigo 38.º ant. proj CP versão 2018).

73
Ver. F. Dias-pag.511-622

74
DIREITO PENAL-RESUMO Aiken Renkel Afonso – UMN - Faculdade de Direito - 2020

TÍTULO IV
FORMAS DO CRIME
A PREPARAÇÃO E A TENTATIVA
CAPITULO
ITER CRIMES

CONCEITO
Desde os momentos iniciais, quando o delito está apenas na mente do sujeito, até sua consumação,
quando o crime se concretiza inteiramente, passa-se por todo um caminho, por um itinerário,
composto de várias etapas ou fases – o chamado iter criminis (ou “caminho” do crime)74.

OS ESTÁGIOS DE REALIZAÇÃO DO CRIME:


COGITATIO, ACTOS PREPARATÓRIOS, TENTATIVA, CONSUMAÇÃO E EUXARIMENTO

1- COGITATIO
Trata-se do momento interno da infracção. Só há crime na esfera psíquica, na mente do sujeito, que
ainda não exteriorizou nenhum acto. Essa fase é totalmente irrelevante para o Direito Penal, uma vez
que cogitationis poenam nemo patitur.

2- OS ACTOS PREPARATÓRIOS
Os actos preparatórios verificam-se quando a ideia passa da esfera mental e se materializa mediante
condutas voltadas ao cometimento do crime.

Dito de outro modo, são actos preparatórios os actos externos destinados a facilitar ou a preparar a
execução do facto mas que não constituam ainda começo de execução ( art. 19º Anteproj. 2018).

Os actos preparatórios podem ser: simples e autónomos.


Actos preparatórios simples- são os actos do dia-a-dia, e geralmente não são puníveis( art. 19º nº 2
Anteproj. 2018). (Ex.: comprar uma faca, comprar uma caixa de fósforo, gasolina e veneno de rato).

Actos preparatórios autónomos (art. 12º CP vigente) - são puníveis se constituírem crimes
autónomos. (Ex.: promoção ou fundação de organizações criminosas, 210⁰, 443⁰ e 444⁰ Todos da lei
antiga CP).

Assim, o sujeito que, pretendendo matar seu inimigo (cogitação) e possuindo porte de arma de fogo,
apodera-se do instrumento bélico (preparação).

74
Estefam, André-parte geral do direito penal-vol 7-2018

75
DIREITO PENAL-RESUMO Aiken Renkel Afonso – UMN - Faculdade de Direito - 2020

3- A TENTATIVA
O crime considera-se tentado quando, apesar de iniciada a sua execução, não se consuma por
circunstâncias alheias à vontade do agente (CP, art. 11º Vig. e art. 20º do anteprojecto. CP versão
2018).

A tentativa (ou conatus), portanto, pressupõe: a) início de execução; b) não consumação; c) por
circunstâncias alheias à vontade do agente.

3.1.ESPÉCIES DE TENTATIVA:
a) Tentativa Perfeita (crime falho): o agente percorre todo o iter criminis que estava à sua
disposição, mas ainda assim, por circunstâncias alheias à sua vontade, não consuma o crime (ex.: o
sujeito descarrega a arma na vítima, que sobrevive e é socorrida a tempo por terceiros).

b) Tentativa Imperfeita: o agente não consegue, por circunstâncias alheias à sua vontade,
prosseguir na execução do crime (ex.: o sujeito entra na residência da vítima e, quando começa a se
apoderar dos bens, ouve um barulho que o assusta, fazendo-o fugir).

3.2. PUNIBILIDADE DA TENTATIVA


O Artigo 21.º, do anteprojecto do CP versão 2018, descreve os requisitos a punibilidade a tentativa,
salvo disposição em contrário, a tentativa só é punível se ao crime consumado respectivo
corresponder pena superior a 3 anos de prisão.

2- A tentativa é punível com a pena aplicável ao crime consumado, especialmente atenuada.


3- A tentativa não é punível quando for manifesta, considera-se manifesta nos seguintes casos:
a) A ineptidão do meio empregado pelo agente;
b) A inexistência do objecto essencial à consumação do crime.

Não obstante do disposto normativo, ainda sim, é importante chamarmos as teorias discutidas pelo
prof. F. Dias, como sejam:
 Quanto ao fundamento da punibilidade há 3 teorias:
a) Teoria objectiva;
b) Teoria subjectiva;
c) Teoria ecléctica ou mista: a teoria da impressão em particular.

76
DIREITO PENAL-RESUMO Aiken Renkel Afonso – UMN - Faculdade de Direito - 2020

Teoria objectiva: - fundamento: (colocação em perigo do bem jurídico tutelado pela norma).
O fundamento que esta teoria dá para a punição da tentativa não explica satisfatoriamente a
punibilidade da tentativa impossível, uma vez que nesta não há colocação em perigo de qualquer bem
jurídico.

Teoria subjectiva: - fundamento: (a manifestação, por parte do agente, de uma vontade contrária ao
Direito). Como critica, esta teoria justificaria a punibilidade dos actos preparatórios, por outro lado
tende a equiparar a tentativa ao crime e, porventura, os actos preparatórios à consumação.

Teorias Eclécticas – a Teoria da Impressão: - fundamento: (a vontade manifestada contrária ao


direito, mas que implique uma lesão da confiança da comunidade na vigência da ordem jurídica e na
paz jurídica).

4- CONSUMAÇÃO E DETERMINAÇÃO
Dá-se o Crime consumado quando o agente realiza todos os elementos essenciais do tipo.

 CRIMES QUE NÃO ADMITEM TENTATIVA


1. Crimes culposos - O crime culposo dá-se quando o agente produz o resultado de maneira acidental,
por imprudência, negligência ou imperícia;
2- Crimes praeter-dolosos- Nestes, o agente realiza um comportamento doloso, mas o crime se
consuma com a produção de um resultado agravador, que decorre de imprudência, negligência ou
imperícia; isto é, ele não o desejava;
3- Contraversões - A tentativa de contravenção penal, por força de lei, não é punível;
4- Crimes omissos próprios - Os delitos omissivos puros, como a omissão de socorro também são
incompatíveis com a figura da tentativa;
5- Crimes formais ou de mera conduta – são aqueles em que a lei equipara a tentativa e a
consumação;
6- Crimes permanentes de forma omissa - Os crimes permanentes são aqueles cuja consumação se
prolonga no tempo. Quando praticados de forma exclusivamente omissiva, não admitem a forma
tentada, isto porque, ou o agente se omite e o facto estará consumado ou age e o crime não foi
praticado.

77
DIREITO PENAL-RESUMO Aiken Renkel Afonso – UMN - Faculdade de Direito - 2020

5- DESISTÊNCIA VOLUNTÁRIA A TENTATIVA, ARREPENDIMENTO EFICAZ75


5.1. Desistência voluntária, arrependimento eficaz - essas figuras também são chamadas de
tentativa abandonada ou qualificada. Ocorrem quando o agente inicia a execução de um crime que
pretende consumar, porém não o faz por vontade própria. (art. 22º ant. proj. CP versão 2018).
Diferem da tentativa, porque nela o agente não logra consumar o delito por circunstâncias alheias à
sua vontade. Na tentativa, portanto, o agente quer, mas não pode, ao passo que, na desistência
voluntária e no arrependimento eficaz, ele pode, mas não quer (Frank).

5.2. Desistência e arrependimento são figuras distintas: a desistência pressupõe que tenha o agente
meios para prosseguir na execução, ou seja, ele ainda não esgotou o iter criminis posto à sua
disposição. Ex.: sua arma possui outros projécteis, mas ele desiste de dispará-los.

5.3. No arrependimento eficaz: subentende-se que o sujeito já tenha esgotado todos os meios
disponíveis e que, após terminar todos os actos executórios (mas sem consumar o facto), pratica
alguma conduta positiva, tendente a evitar a consumação. Ex.: o sujeito descarregou sua arma e,
diante da vítima agonizando, arrepende-se e a socorre.

5.4. Conceito de arrependimento posterior: trata-se da reparação do dano causado ou da


restituição da coisa subtraída nos delitos cometidos sem violência ou grave ameaça, desde que
por acto voluntário do agente, até o recebimento da denúncia ou da queixa.

TÍTULO V
A COMPARTICIPAÇÃO NOS CRIMES DOLOSOS DE ACÇÃO

1- GENERALIDADE
Uma infracção penal, na grande maioria das vezes, é obra de uma só pessoa. Casos há, entretanto, em
que várias pessoas reúnem esforços, materiais ou intelectuais, com o fim de cooperar para o mesmo
delito. Como regra, os crimes podem ser praticados por uma só pessoa ou por várias, em co-autoria
ou participação76.

Tais delitos denominam-se unissubjetivos, monossubjetivos ou de concurso eventual. Na doutrina


estrangeira, fala-se também em tipos unipessoais.

75
Estefam, André-parte geral do direito penal-vol 7-2018

76
Latas, António J.-Duarte, Jorge D. e Patto, P. Vaz - direito penal e processual penal-ano ed.2007

78
DIREITO PENAL-RESUMO Aiken Renkel Afonso – UMN - Faculdade de Direito - 2020

2- DELIMITAÇÃO ENTRE A AUTORIA E PARTICIPAÇÃO


2.1.AUTORIA
Há uma série de concepções diferentes acerca da autoria:
Conceito amplo ou extensivo de autor: todo aquele que concorre para o crime é seu autor,
mostrando-se suficiente a relevância causal e o vínculo psicológico. Como resultado, essa teoria não
distingue o autor do partícipe.

Conceito restritivo ou restrito de autor : autor é aquele que realiza a conduta descrita no tipo penal,
ou seja, executa a acção consubstanciada no verbo núcleo do tipo. O partícipe: por sua vez, apenas
coopera com o delito, induzindo, instigando ou auxiliando materialmente seu autor.

Teoria do domínio do fato: os contornos dessa teoria foram elaborados por Claus Roxin, em
trabalho monográfico publicado em 1963, muito embora existam referências anteriores à ideia de
domínio do facto no trabalho de Hans Welzel e, antes dele, em Lobe (1933) e Hegler (1915).

Cuida-se de uma teoria que se apoia na premissa de que o autor é a figura central no acontecer típico,
de modo que a participação, tanto moral quanto material, constitui causa extensiva da punibilidade,
pois se trata de imputar a alguém a responsabilidade por facto de terceiro.

A teoria do domínio do facto, que não tem pretensão de universalidade (ou seja, não pretende ser
aplicável a todos os tipos de crime), decorre dessa linha de pensamento e sustenta que autor é o
sujeito que detém o controlo central sobre a configuração do facto criminoso. Tem como uma de suas
peculiaridades a distinção entre autor imediato ou directo e autor mediato ou indirecto77.

Cá entre nós Autor é aquele que tem o domínio do facto. (é aquele que detém o poder de decisão
sobre a realização ou não do crime). É quem tem o poder de conduzir o processo até ao fim. Ele é
quem tem o domínio de o fazer parar a qualquer momento. Autor é quem tem em seu poder o sucesso
da acção ilícita78.

O autor tem o domínio do processo causal, quer positivo, porque é dele que depende a prática de
actos de execução, quer negativo, porque pode fazer parar a execução do crime.

É punível como autor quem: (art. 24º Anteproj. 2018)


a) Executar o facto, por si mesmo;
b) Executar o facto, utilizando como instrumento outra pessoa;

77
Estefam, André-parte geral do direito penal-vol 7-2018
78
jaca

79
DIREITO PENAL-RESUMO Aiken Renkel Afonso – UMN - Faculdade de Direito - 2020

c) Tomar parte directa na sua execução, por acordo ou juntamente com outro ou outros;
d) Determinar, dolosamente, outra pessoa à prática do facto, desde que haja execução ou começo de
execução.

2.2. PARTICIPAÇÃO
Todo aquele que, não praticando a conduta descrita no tipo penal, coopera com o crime (antes de sua
consumação) responde pelas penas a estas cominadas, sendo considerado seu partícipe.

 AS CONCRETAS FORMAS DE AUTORIA:


Autor material ou imediato (directo), autor mediato (indirecto) e coa-autor

a) Autor material ou imediato (directo) - autor é aquele que pratica actos de execução do
crime por si mesmo. Tem o domínio positivo do facto, tem o domínio da acção. ou seja é
aquele que determina directamente a realização de um crime utilizando, ou fazendo actuar,
outro por si. Autor material - é aquele que vai executar o crime.

b) Autor mediato (indirecto) - é aquele que pratica o crime através de outrem.

c) Coa-autor - é co-autor aquele que conheceu da actividade dos outros e colaborou


conscientemente nela, executando total ou parcialmente o crime e por isso é responsável por
toda a actividade.

 A CO-AUTORIA
Co-autores são os que, por acordo e conjuntamente, cometem ou executam um crime. Exemplo claro
é o de duas pessoas que praticam um crime de sequestro, encarregando-se um de captura e imobilizar
a vítima, cabendo a outro, por acordo entre ambos, transportá-la para lugar ermo. Participaram ambos
na execução realizando as tarefas acordadas e tinham ambos o domínio do facto (e não, apenas, um
deles).

REQUISITOS DA CO-AUTORIA:
a) Decisão conjunta;
b) Contribuição objectiva para a realização do facto;
c) Domínio conjunto do facto.

Duvidoso é o caso da chamada autoria sucessiva - em que um dos agentes só toma parte no caso
depois de este se encontrar parcialmente realizado, pois a punição de ambos como co-autores79.

79
Latas, António J.-Duarte, Jorge D. e Patto, P. Vaz - DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL-ano ed.2007

80
DIREITO PENAL-RESUMO Aiken Renkel Afonso – UMN - Faculdade de Direito - 2020

3- A INSTIGAÇÃO COMO AUTORIA


Nos termos do art. 22⁰ CP de 1886 vig., o instigador é aquele que cria dolosamente no autor uma
vontade, “ex novo”, convence outra pessoa a praticar o crime. Ou seja Instigador é aquele que
determina o executor à prática do facto, sendo certo que, este deve ser considerado autor imediato do
facto e não mero executor material do mesmo, assim se distinguindo da autoria mediata em sentido
estrito.

4- O ALICIAMENTO
Conceição Valdágua, sustenta que o aliciamento dá-se naquelas situações em que há um homem-de-
trás levar o executor a praticar um facto tipicamente ilícito em contra partida na realização de uma
determinada participação de coisa ou de facto80.
Não tem que ser o homem-de-trás a realizar, o mesmo é imputado nos mesmo termos que autoria
imediata.

5- A AUTORIA PARALELA
Autoria paralela - é aquela em que há uma pluralidade de agentes não actuam por acordo ou em
associação, em conjugação com outros, antes desenvolvendo cada um por si a actividade criminosa
dirigida ao mesmo objecto.

Será o caso de duas pessoas (Damião Nguetche e O. Kamulacamué), decidem matar um terceiro (
Mangundo), por envenenamento, sem nenhum deles saber do outro, concluindo-se mais tarde que
nenhuma das doses era letal, e só a soma de ambas as quantidades acabou por causar a morte.
Não é claramente um caso de autoria, levando a que conforme ensina Conceição Valdágua ambos os
autores devem ser punidos por tentativa de homicídio e não como autores do crime consumado81.

6- AUTORIA COLATERAL E AUTORIA INCERTA


Dá-se a autoria colateral - quando duas pessoas concorrem para um mesmo resultado, sem que haja
entre eles vínculo subjectivo.

Ex.: dois atiradores efectuam disparos contra uma mesma pessoa sem que um saiba da conduta do
outro.
Nesse caso, muito embora ambas tenham cooperado para o mesmo resultado, não há falar-se em
concurso de pessoas, pois falta o vínculo subjectivo. Cada agente responde pelo crime cometido.

80
Cit. Por F. Dias-807
81
Latas, António J.-Duarte, Jorge D. e Patto, P. Vaz - direito penal e processual penal-ano ed.2007

81
DIREITO PENAL-RESUMO Aiken Renkel Afonso – UMN - Faculdade de Direito - 2020

Dá-se a autoria incerta - quando, diante de uma hipótese de autoria colateral, é impossível
determinar quem foi o responsável pelo resultado.

Se no exemplo acima não houver condições de aferir qual o disparo é o causador da morte, ambos os
atiradores devem responder por tentativa de homicídio82.

TÍTULO XI
1- CUMPLICIDADE E PARTICIPAÇÃO83

CUMPLICIDADE (art. 25⁰ do CP vigente e art. 22º do ant.proj versão 2018) - é uma forma de
participação criminosa que consiste em prestar auxílio ao autor do crime - a participação do cúmplice
não é determinante para gerar a resolução criminosa.

2- Espécie de cumplicidade: Cumplicidade material, cumplicidade moral.


a) Cumplicidade material - é a prestação de uma ajuda material para a execução do crime; o
cúmplice material ajuda materialmente na prática do facto típico e ilícito, fornecendo os meios
para a execução do crime.

b) Cumplicidade moral - é o auxílio moral à prática por outrem de um facto doloso Trata-se de um
conselho, um acto não determinante da prática do facto criminoso (se for determinante é autoria).

c) Participação moral - é o facto de incutir na mente do autor principal o propósito criminoso ou


reforçar o preexistente. Participação material - é o facto de alguém insinuar-se no processo da
causalidade física.
Ex.: Leandro aconselha Cipriana a matar Otelo. Praticada a figura típica do homicídio, Leandro é
partícipe moral do facto delituoso cometido por Cipriana (autor principal).

Kambongue sabendo que Betilson pretende matar Tchissingue, empresta-lhe uma arma. Praticada a
conduta criminosa, Kambongue é partícipe material do comportamento principal de Betilson.

82
Estefam, André-parte geral do direito penal-vol 7-2018
83
Dias, Jorge de Figueiredo - direito penal-parte geral-questões gerais e doutrina do crime-tomo-ed.2-ano 2007

82
DIREITO PENAL-RESUMO Aiken Renkel Afonso – UMN - Faculdade de Direito - 2020

TÍTULO XII
O CONCURSO DE CRIMES
1- GENERALIDADE
Quando duas ou mais pessoas praticam um crime surge o “concurso de agentes” (concursus
delinquentium). Quando um sujeito, mediante unidade ou pluralidade de acções ou de omissões,
pratica dois ou mais delitos, surge o concurso de crimes (concursus delictorum) (art. 28º Anteproj.
2018).

É possível que o facto apresente concurso de agentes e de crimes. É o caso de duas ou mais pessoas,
em concurso, praticarem dois ou mais crimes.

2- POSIÇÃO DA MATÉRIA: CONCURSO DE CRIMES OU DE PENAS


Como deve ser graduada a pena? Sobre o assunto, há cinco sistemas:

2.1.Sistema do cúmulo material - considera que as penas dos vários delitos devem ser somadas.
Sistema a adoptado em país como Brasil, Estados Unidos da América e outros.

2.2.Sistema da absorção - a pena mais grave absorve a menos grave. Tem o defeito de permitir que
o agente rodeie o crime mais grave de infracções de menor gravidade, que ficariam impunes.

2.3.Sistema da acumulação jurídica - a pena aplicável não é da soma das concorrentes, mas é de tal
severidade que atende à gravidade dos crimes cometidos, esta foi adopta no nosso ordenamento
tal com dispõe o artigo 100º ao 105º todos do CP de 1886.

2.4.Sistema da responsabilidade única e da pena progressiva única: os crimes concorrem, mas


não se acumulam, devendo-se aumentar a responsabilidade do agente ao crescer o número de
infracções.

2.5.Sistema da exasperação da pena: aplica-se a pena do crime mais grave, aumentada de um


quantum determinado. Foi adoptado no concurso formal e no crime continuado.

83
DIREITO PENAL-RESUMO Aiken Renkel Afonso – UMN - Faculdade de Direito - 2020

BIBLIOGRAFIA
 Dias J. Figueiredo- parte geral do direito penal-questões fundamentais do crime-
tomo 1-ed.2-ano 2007
 Estefam, André - Direito penal : parte geral (arts. 1º a 120) / André Estefam –7.
ed. – São Paulo : Saraiva Educação, 2018.
 Jesus, Damásio de Direito penal, volume 1: parte geral / Damásio de Jesus —
32. ed. — São Paulo : Saraiva, 2011.
 António João Latas, Jorge Dias Duarte e Pedro Vaz Patto, direito penal e
processual penal/ tomo I- Projecto Apoio ao Desenvolvimento dos Sistemas
Judiciários (no âmbito do Programa PIR PALOP II – VIII FED) Formação
contínua para Magistrados Edição: 2007.
 JACAH-2018.
 Apontamentos sem fronteiras - antónio filipe garcez josé/
www.cogitoergosun4.no.sapo.pt.
 Artigos: Teresa Beleza, Paita de Carvalho, Conceição Valdagua.
 Anteprojecto de código penal, versão 2017.
 Código Penal 1886, vigente.
 Correcções da UMN, 3º.
 Justos, A. Santos- INESD-Ed.6-2012.
 Venosa, Sílvio de Salvo – INESD-Ed 2- editora atlas S.A. – 2009.
 Bitencourt, Cezar Roberto – Código penal comentado-Ed 7-editora Saraiva-
2012.
 Masson, Cleber - Código penal comentado-Ed 2-editora revista actualizada-
2014.

84

Você também pode gostar