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UNIVERSIDADE LUEJI A´NKONDE

REGIÃO ACADÉMICA IV – LUNDA-NORTE, LUNDA-SUL E MALANGE

FACULDADE DE DIREITO

DIREITO DOS RECURSOS NATURAIS

5° ANO
ANO ACADÉMICO 2020/2021

Dundo, Outubro De 2020

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Capítulo I: Direitos dos recursos naturais

1.1. Noção e caracterização do Direito dos Recursos Naturais


O Direito Dos Recursos Naturais é uma disciplina jurídica integrado por
normas que regulam as condições de acesso e uso dos recursos naturais, visando a
afectação de poderes sobre o seu aproveitamento, uso e conservação aos diferentes
sujeitos de Direito.
Existem várias noções de Direito dos Recursos Naturais.
Para Carlos Alberto Cavuquila, o Direito dos Recursos Naturais é o «conjunto
de normas, regras e princípios que garantem o modo de revelação e aproveitamento
dos recursos bem como definem o regime de propriedade de cada um dos recursos e
disciplinam o seu acesso e uso»...
O objecto das relações sociais do Direito dos Recursos Naturais são os
recursos naturais, incluindo as normas que regulam o acesso e uso de recursos que
não são dádivas da natureza.
Assim, integram-se no âmbito do Direito dos Recursos Naturais apenas as
normas que regulam o sistema de acesso, uso e gestão das terras, das águas, dos
minerais, do petróleo e gás natural, dos recursos biológicos aquáticos e dos recursos
da fauna e da flora.
O acesso, uso e gestão de cada um desses recursos naturais estão regulados
em legislação específica como na Lei de Terras (LT), Lei das águas (LA), Código
Mineiro, Lei das actividades petrolíferas (LAP), Regime Jurídico e Fiscal sobre as
Actividades de Prospecção, Pesquisa, Avaliação, Desenvolvimento e Produção do
Gás Natural em Angola (RJFGNA), Lei dos Recursos Biológicos e Aquáticos (LRBA),
e na Lei de Bases de Florestas e Fauna Selvagem (LBFFS).
Esta dispersão legislativa torna o DRN uma disciplina uma disciplina jurídica
complexa.
Antonieta Coelho considera que o obejecto do Direito dos Recursos Naturais
está integrado pelos seguintes grupos de normas:
a) Normas sobre a titularidade de direitos sobre recursos naturais;
b) Normas sobre o ordenamento dos recursos;
c) Normas sobre os acordos entre diferentes interessados nas acções e
uso do desenvolvimento sustentável que envolvem acesso e uso de recursos naturais.

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O direito dos recursos naturais tem como características:

a) Multiplicidade de fontes (heterogeneidade dos seu objecto) porque


o conteúdo do Direito dos Recursos Naturais está integrado por normas de Direito
Interno e de Direito Internacional, de Direito Público e Direito Privado, de Direito
Positivo e Direito Consuetudinário, e ainda normas resultantes da concertação e dos
acordos entre os respectivos sujeitos.
b) Multiplicidade dos sujeitos e fragmentação dos poderes- Os direitos
(poderes) de soberania, patrimoniais e de gestão, conferidos pelas normas de DRN
são múltiplos e afectados a sujeitos diversificados, desde o Estado (assembleia
Nacional e Executivo), autarquias locais, institutos públicos, empresas públicas,
instituições do poder tradicional, comunidades rurais e as famílias, até as pessoas
singulares e colectivas de direito.
c) Diversidade e especificidade dos RN- quanto diferenciação e
diversidade dos respectivos regimes de acesso e uso, podendo variar consoante os
recursos naturais sejam renováveis, raros ou abundantes, essenciais ou não
essenciais para a satisfação das necessidades básicas da pessoa humana.
d) Mutabilidade e permeabilidade- As normas de DRN estão ligadas ou
vinculadas aos valores políticos, económicos e ambientais, factores que implicam a
alteração das mesmas em caso de mudança dos referidos valores.

A interdisciplinaridade é bem patente no Direito dos Recursos Naturais ao


tratar de matérias integradas noutros ramos de Direito como o Direito Civil, Direito
Agrário, Direito Florestal, Direito Mineiro, Direito de Petróleo e Gás, Direito das Águas,
Direito do Ambiente, Direito do ordenamento do território e Direito do Urbanismo, mas
assegurando uma abordagem do ecossistema e integradora da regulação jurídica
dessas matérias, uma vez que cada um dos bens ambientais objecto de cada um dos
bens ambientais objecto de cada uma dessas disciplinas tem um papel e influência
sobre os demais.

Para Carla Amado Gomes, defende que o Direito do Ambiente e o Direito dos
Recursos Naturais têm objetos parcialmente idênticos (os recursos naturais), mas
finalidades diferentes, afirmando que o segundo é sub-ramo do primeiro. Daí que, para
ela se o Direito do Ambiente tem " por objetivo a prevenção, inibição e responsabilização de
condutas que afectem grave ou irreversivelmente a qualidade de elementos da natureza especialmente
merecedores de proteção em atenção ao seu potencial de factores de equilíbrio para o ecossistema".

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Por sua vez, "o Direito dos Recursos Naturais tem por objectivo a regulação da exploração e do
aproveitamento económico dos elementos da natureza escassos e utilidade económica ".

De qualquer modo, é pertinente assinalar que pelas razões acima referidas, o


Direito dos Recursos Naturais e o Direito do Ambiente são ramos de Direito autónomo,
embora possa, entre os mesmos, existir uma relação no âmbito da
interdisciplinaridade. O D.R.N refere-se ao regime de acesso, uso e gestão dos
recursos naturais, sendo que estes são apenas os elementos naturais do ambiente,
relevando-se mais normas de acesso e gestão do que de uso. O regime do D.A tem
uma perspectiva da conservação e protecção dos elementos naturais e artificiais do
ambiente, tendo uma maior preocupação com as matérias referentes ao uso dos RN.

Actualmente tende a existir uma forte interpretação entre o DA e o DRN,


passando aquele a estudar algumas matérias referentes ao acesso e este a
aprofundar o estudo das matérias referente ao uso e conservação RN.

Os RN são assim designados em função da sua importância para a satisfação


das necessidades humanas.

Contudo, em Angola, o D. Administrativo exerce grande influência sobre os


regimes jurídicos dos RN. Esta realidade decorre do facto desses recursos serem na
sua maioria propriedade do Estado e o acesso aos mesmos pelos particulares estar
dependente de autorizações diversas concedidas na sequência de procedimentos
administrativos. Assim, o DRN pode ser entendido como uma disciplina jurídica que
ao regular o acesso, uso e gestão dos RN, atribui poderes de decisão aos diversos
sujeitos de direito e estabelece relações com os diversos ramos do saber jurídico e
não jurídico.

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Capítulo II: Os Princípios de direito dos recursos naturais

Os princípios são as linhas gerais de orientação de um determinado


ordenamento jurídico como é o caso do DRN em que o princípio do desenvolvimento
sustentável e os direitos à vida e à inerente dignidade da pessoa humana atribuem-
lhe um carácter integrador.

Os princípios do DRN estão, num primeiro momento, consagrados na


Constituição da República de Angola (CRA), considerada fonte de vários princípios.
Num primeiro momento, os princípios de DRN estão consagrados e concretizados, na
lei de bases do ambiente (LBA) e na de mais legislação sobre os RN.

Os princípios do DRN são também concretizados pelo intérprete-aplicador


do Direito, designadamente, o Tribunal, Administração Pública e demais agentes.

No presente capítulo, serão estudados os princípios do desenvolvimento


sustentável, direito à vida e inerente dignidade de pessoa humana, iniciativa
económica privada, garantia da propriedade, igualdade de oportunidade no acesso
aos direitos sobre recursos naturais, uso sustentável dos RN, função social dos
direitos sobre RN, cooperação internacional, valorização dos RN e utilizador pagador,
ordenamento do território e dos RN.

2.1. Princípio do desenvolvimento sustentável

Segundo a Lei de Base do Ambiente (LBA), artigo 4.° o desenvolvimento


sustentável, é baseado numa gestão ambiental que satisfaz as necessidades da
presente geração sem comprometer o equilíbrio do ambiente e a possibilidade das
futuras gerações também satisfazerem as suas necessidades.

O princípio da equidade é um princípio fundamental para alcançar o


desenvolvimento sustentável. A equidade refere-se à ideia de justiça. Para alcançar o
desenvolvimento sustentável, considera-se fundamental equitativo e a distribuição
dos benefícios dos recursos naturais entre os países desenvolvidos e os países em
desenvolvimento, entre os ricos e os pobres, entre as presentes gerações, bem como
entre os seres humanos e outras espécies.

Refere-se a equidade intergeracional (concernente ao direito das gerações


futuras também desfrutarem o património comum a um nível justo) e equidade
intrageracional respeitante ao direito que assiste a todas pessoas dentro dentro da
actual geração em ter acesso justo aos recursos naturais da terra). No entanto, Kiss
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e equidade para ressaltar o valor intrínseco da natureza, independentemente da sua
utilidade para os seres humanos.
2.1.1. Equidade intergeracional refere-se à relação, do ponto de vista
da justiça natural, entre os seres humanos em vida e por nascer e, geração futura
refere-se às pessoas não nascidas cujos direitos estão protegidos por instrumentos
nacionais e internacionais.
2.1.2. Equidade intrageracional destina-se a reduzir o fosso entre as
nações desenvolvidas e em desenvolvimento. Questões como direitos humanos,
necessidades humanas básicas, esperança de vida, direito a dignidade, bem-estar,
qualidade de vida, progresso social, redução de fosso entre ricos e pobres e
erradicação da pobreza, etc., foram e continuam a ser centro das atenções no discurso
do Direito Internacional.
2.1.3. Equidade inter-espécie procura assegurar a equidade entre
seres humanos e espécies abióticos, como árvores, animais, etc. também analisa a
forma como os seres humanos se relacionam com os seus habitats abióticas.
2.2. Princípio da integração visa articular os factores sociais, económico e
ambientais do processo de desenvolvimento sustentável e a sua integração nos
planos, programas, políticas e estratégia de desenvolvimento, económico e territoriais
ao nível global, regional, nacional e local.
2.2.1. Integração institucional, no país, existem vários departamentos
ministeriais (ministérios) com atribuições em matéria de gestão ambiental e dos RN.
O carácter fragmentado da administração pública angolana é uma realidade. Na
legislatura de 2017/2022 tem atribuições que interferem diretamente na gestão
ambiental e dos RN, os seguintes departamentos ministeriais.
a) Ministério do ambiente, auxilia o PR na formação e execução da
política do executivo relativa ao ambiente no domínio da proteção, preservação e
conservação da qualidade do ambiente, controlo da poluição, áreas de conservação
e valorização do património natural, bem como a preservação e uso nacional dos RN
(artigo 1° do respectivo estatuto orgânico.
b) Ministério da agricultura e floresta auxilia o PR na formação e
execução da política do executivo nos domínios da agricultura, pecuária, florestas,
segurança alimentar, numa perspectiva do desenvolvimento sustentável (artigo 1° do
respectivo estatuto orgânico.

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c) Ministério do ordenamento do território e habitação, auxilia o PR na
formação e execução da política do executivo sobre o ordenamento do território, do
urbanismo, fundiário, do cadastro e da habitação (art.° 1° do respectivo estatuto
orgânico).
d) O Ministério da energia e água auxilia o PR na formação e execução
da política do executivo nos domínios da energia e água (art. ° 1° do r5espectivo
estatuto orgânico.
e) O Ministério das pescas e do mar auxilia o PR na formação e execução
da política do executivo sobre à gestão e ordenamento dos recursos aquáticos, e das
atividades de pesca e aquicultura, da produção do sal, bem como da coordenação
transversal dos assuntos do mar, a investigação, inovação e o desenvolvimento
tecnológicos na área do amar, o seu ordenamento, prospecção, uso, exploração e
potenciação de recursos aquáticos, e de economia do mar sustentável (art. 1° do
respectivo estatuto orgânico)
f) Ministério dos recursos minerais e petróleos, auxilia o PR na
formação execução da política do executivo sobre as atividades geológicas e
minerais, de petróleo, gás e biocombustíveis, nomeadamente a prospecção, pesquisa,
desenvolvimento e produção de minerais, petróleo bruto e gás, refinação,
petroquímica, armazenagem, distribuição e comercialização de produtos minerais e
petróleos, bem como a produção e comercialização de biocombustíveis, sem prejuízo
da protecção do ambiente (art.° 1° do respectivo estatuto orgânico).

Do ponto de vista constitucional, os titulares do departamento ministeriais em


matéria dos respectivos pelouros, exercem competências delegadas pelo presidente
da república que, para a legislatura de 2017/2022, foram conferidas pelos despachos
presidencial n° 289/17, de 13 de outubro (art. 137° CRA e 35, n°2 do Dec. Legislativo
n° 3/17, de 13 de Outubro).

Embora o sistema de gestão ambiental e dos RN ainda seja concentrado, os


órgãos e serviços da Administração Local do Estado, também têm atribuições e
competências sobre essas matérias. Ao nível da província é representado pelo
governador provincial, na administração na administração da respectiva província,
tendo em matéria ambiental e dos RN a atribuição genérica de promover medidas
tendentes à defesa e promoção do ambiente, nos termos do artigo 13° alínea w do
Dec. Presidencial n° 2008/17, de 22 de Setembro- Regulamento da Lei da

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Administração Local do Estado (RLALE). Num exercício desta atribuição, o
Governador Provincial auxiliado pelos vices governadores na área política social e
económico, quanto ao ambiente e gestão dos RN (artigo 17°, n° 1, al. C), d) e f) do
RLALE), e para área dos serviços técnicos e infraestruturas quanto ao ordenamento
do território, saneamento básico, gestão urbana e ordenamento do rural (artigo 17, n°
2 a), do RLALE) e pelos gabinetes do ambiente, gestão de resíduos e serviços
comunitários (art. ° 43. ° RLALE), da agricultura, pecuária e pescas, (42° do RLALE)
e da insfraestruturas ne serviços técnicos (art. ° 41. ° do RLALE)...

2.2.2. Integração jurídica, diz respeito a integração dos factores


econômicos, social e ambiental nos projectos, acções, programas, planos política, leis.
A LBFFS constitui um dos grandes exemplos deste tipo de integração porque não se
preocupa apenas com actividades de exploração da madeira e de outros Recursos da
fauna e da flor, mas também trata da protecção do ambiente e do desenvolvimento
económico e social das comunidades existentes nas regiões onde a actividade é
exercida. A integração jurídica é também designada por princípio do equilíbrio nos
termos da alínea d) do artigo 4° da LBA. Fala-se aqui da integração jurídica, podendo
esta ser normativa ou do raciocínio judiciário.
2.3. Direito à vida e a dignidade da pessoa humana
O direito à vida tem consagração no artigo 30° da CRA, segundo o qual (o
Estado respeita e protege a vida da pessoa humana, que é inviolável). O direito à vida
desdobra-se em vários direitos e é considerado a razão de ser dos demais direitos.
A inerente dignidade da pessoa humana refere-se ao princípio de que ninguém pode
ser submetido tratamento cruel, desumano ou degradante.
Antonieta Coelho considera a pobreza como forma de tratamento degradante
porque implica a fome, a nudez, a falta de abrigo, doença sem cuidado de saúde e
vida num ambiente degradado e poluído. A inerente dignidade da pessoa humana
está consagrada nos artigos 1°, 31°, n° 2, 32°, n° 2, da 2, da CRA, artigo 1° da DUDH,
artigo 5° da CADHP.
Em Direito dos Recursos Naturais, tal como o direito à vida, inerente dignidade
da pessoa humana concretiza-se através de outros princípios e direitos,
designadamente:
a) Princípio da proteção do ambiente e direito de viver num ambiente
sadio e não poluído.

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O artigo 21°, alínea m), e 39° da CRA consagra do Princípio da proteção do
ambiente e o direito de viver num ambiente sadio e não poluído.

O direito de viver num ambiente sadio e não poluído concretiza o direito à vida e a
inerente dignidade da pessoa humana. A título exemplificativo, uma pessoa que
se alimenta de peixes capturados de um rio poluído ou das águas desse rio pode
adoecer e pode mesmo correr risco de vida. Um ambiente poluído é um atentado
à vida e a dignidade da pessoa humana, CRA e a legislação sobre os Recursos
Naturais impõe aos titulares de direitos sobre recursos naturais o dever de proteger
o ambiente e adoptar condutas que não prejudiquem o direito de terceiros de viver
num ambiente sadio e não poluído.

b) O direito ao mínimo de existência

O direito ao mínimo de existência concretiza o direito à vida e a inerente


dignidade da pessoa humana por permitir que todos tenham acesso a direitos
patrimoniais essências à satisfação das necessidades básicas ligadas a sua
sobrevivência como ser humano. O direito ao mínimo de existência é também uma
das vertentes da justiça social consagrada no artigo 90° da CRA através da qual o
Estado garante a justa redistribuição da riqueza nacional, privilegiando os grupos
sociais mais vulneráveis e carenciados, assegurando que todos os cidadãos usufruam
dos benefícios resultantes do desenvolvimento.

A realização do direito ao mínimo de existência é uma das atribuições


fundamentais do Estado, cabendo a este o dever de garantir o seguinte: a) criar
progressivamente as condições necessárias para tornar efectivos os direitos
económicos, sociais e culturais dos cidadãos; b) promover o bem-estar, a
solidariedade social e elevação da qualidade de vida do povo angolano,
designadamente dos grupos populacionais mais desfavorecidos; c) promover a
erradicação da pobreza; d) promover políticas que permitam tornar universais e
gratuitos os cuidados primários de saúde; e) promover políticas que assegurem o
acesso universal ao ensino obrigatório gratuito.

A legislação de DRN prevê vários direitos que concretizam o direito ao mínimo


de existência, nomeadamente:

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1- Direito ao uso comum de águas, previsto nos artigos 22° e 23° da Lei da
Água;
2- Direito do domínio útil consuetudinário e direitos fundiários sob
concessão gratuita, nos artigos 37° e 50° da Lei de terras.
3- Direito de pesca de subsistência (artigo 42° LRBA)
4- Direito de subsistência sobre os Recursos Florestais (artigo 65°, 66° e
98° LBFFS).
c) Direito ao desenvolvimento

O direito ao desenvolvimento refere-se ao direito assistido a todos para saída


do círculo vicioso da pobreza e, deste modo, garantindo-se a melhoria das condições
de vida dos cidadãos. O Direito ao desenvolvimento é um pouco mais que o direito ao
mínimo de existência porque inclui não só o direito de subsistência, mas também o
direito de melhorar a condição de vida.

Continuação da aula

2.4. Direito ao benefício do uso racional dos Recursos Naturais.


O direito aos benefícios de uso racional dos recursos naturais também concretiza
o princípio o princípio de justiça social previsto no artigo 90° da CRA e, segundo
Antonieta Coelho, tem vindo a ter as seguintes formas de densificação em Angola:
a) Direito de acesso aos recursos naturais propriedade do Estado para
assegurar o mínimo de existência;
b) Direito de acesso às actividades económicas relativas aos recursos
naturais para assegurarem os direitos ao desenvolvimento, livre iniciativa económica
e à igualdade de oportunidades;
c) Direito de viver num ambiente sadio e não poluído em harmonia com a
natureza;
d) Direito à afectação, directas ou indirectas, de rendimentos provenientes
da renda dos recursos em termos da realização da justiça social prevista no artigo 90°
da CRA.

O Direito ao benefício do uso racional dos Recursos Naturais pressupõe a


realização da exploração e uso racional dos RN (artigos 39°, n°2, da CRA e 3°, n°2
da LBA), bem como a redistribuição da renda dos RN propriedade do Estado (artigo
90° alínea a), da CRA.

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2.5. Princípio da iniciativa económica
O princípio da iniciativa económica privada, consagrado nos artigos 14°, 38°
e 89°, alínea b) e d) da CRA, concretiza o direito a participar no processo de
desenvolvimento. A iniciativa privada é uma liberdade económica fundamental
enquadrada na categoria dos direitos e liberdades económicas, sociais e culturais cujo
conteúdo inclui a liberdade de celebração e fixação do conteúdo de negócios, a
liberdade de empresa, livre concorrência, entre outras.
A iniciativa privada é um dos pilares de modelo de economia de mercado
adaptado por Angola e te grande relevância para os regimes de direito do recursos
naturais, pois, além de regular os RN propriedade de Estado, também regula as
actvidades económicas que exercem sobre os recursos.
Em sede de DRN, a iniciatica enconómicas privada pode ser analisada em
duas vertentes. A primeira refere-se as tendências impostas pela consolidação do
princípio do desenvolvimento sustentável na perspectiva da limitação da
discricionariedade da administração pública quanto aos requisitos, condições e
fundamentos de constituição, modificação e extinção de direitos sobre RN propriedade
de Estado. Administração pública está obriga a tomar decisões sobre a constituição,
modificação e extinção de direitos sobre RN, em observância aos requisitos,
condições e fundamentos legalmente estabelecidos. A administração pública está
também vinculada ao cumprimento de procedimentos administrativos de concessão
legalmente previstos, devendo observar as formalidades essenciais com os
subprocedimentos da avaliação do impacto ambiental e da consulta pública,
permitindo a participação das partes interessadas nos processos de tomada de
decisão.
Por outro lado, as razões de gestão sustentável dos recursos e da empresas
impõe a necessidade de uma maior segurança jurídica para os direitos concedidos,
prolongando-se os prazos de duração destes, como, por exemplo:
a) O direito de exploração florestal empresarial, que era de um ano à luz do
revogado regulamento florestal, passou a ter duração prevista na Lei de Terra para o
direito de superfície (artigos 68° n° 3 e 69°, alínea a)), da LBFFS;
b) O direito de pesca passou do prazo de um ano, na antiga Lei de Pescas,
para o prazo máximo de 20 anos no artigo 39° da LRBA.

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Para evitar prejuízos a outros valores constitucionais, a CRA permite que a
lei imponha restrições à iniciativa privada, baseada em razões económicas, sociais e
ecológicas, nomeadamente:

a) Sugestão de usos dos RN às medias previstas e instrumentos de


ordenação do território e do ordenamento dos recursos. As medidas de ordenamento
de recursos impõe limites as quantidades de Recursos que podem ser exploradas
durante certo período de tempo para garantir a sustentabilidade dos destes. Por
exemplo, em sede dos Recursos Biológicos, os titulares de direito deve apenas extrair,
capturar ou colher recursos dentro dos limites físicos estabelecidos pela captura total
admissível (TAC) e cota de pesca para os recursos biológicos aquáticos ou pelos
contingentes de recursos florestais e faunísticos.
b) Os limites físicos dos Recursos Renováveis e não renováveis impostos
pela gestão sustentável deste impõe barreiras na entrada de novos agentes
económicos no seu acesso nos casos em que a captura total admissível contingente
anuais estejam integralmente complicados pelos Direitos concedidos ou ainda nos
casos de não existirem áreas disponíveis para novas concessões. Nestas situações,
para garantir uma melhor concorrência e acesso do maior número de pessoa aos RN,
a lei pode impor limites de áreas a conceder a cada titular como nos casos decorrentes
de Código Mineiro (CM). Quanto as áreas de prospecção e de mineração artesanal,
limites de áreas máximas de concessão no caso da Lei de Terra, bem como fixar uma
cota delicado tal como decorre da LRBA (artigo 22°, n° 3 e 4, alínea a)) ao estabelecer
que a cota de pesca atribuída ao titular de direito de pescas não pode ser superior à
cota de mercada fixada nos termos a regulamentar;
c) Sujeição das atividade económicas sobre o recursos a autorizações
prévias do Estado, incluindo a avaliação de impacto ambiental (AIA) e o licenciamento
ambiental (LA). No caso dos RN, embora sejam propriedade do Estado, os
particulares podem exercer actividades económicas sobre eles mediante concessão
ou outras formas de autorização temporária que não envolva a transmissão da
propriedade, o exercício da atividade económica sobre os RN propriedade do Estado
do Estado constitui reserva relativa do Estado, nos termos do Artigo 13. °, n° 4 da Lei
de Delimitação de sectores de Actividades Económicas (LDS).
d) As atividades económicas dos sectores do petróleo e dos minerais
estratégicos constituem reserva do controlo por que os direitos mineiros são

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exclusivamente concedidos às concessionárias nacionais (Agencia nacional de
petróleo e gás, Endiama-EP e Ferrangol-EP), mas os particulares podem exercer
atividades económicas sobre estes recursos desde que se associem à agencia
nacional de petróleo e gás, no caso dos petróleo e gás (artigo 4°, 5° e 13° da Lei das
Actividades Petrolíferas-LAP), ou à uma empresa com domínio público detida pela
Emdiama-EP (no caso do diamante e metais raros e elementos de terra raras) ou pela
Ferrangol-EP (no caso do ouro.
2.6. A garantia da propriedade

A propriedade é considerada uma instituição social criada para atender as


necessidades de uma sociedade organizada através da divisão de trabalho. Baetjer
Jr. Defende que a propriedade privada e as liberdade económicas são veículos
importantes de mercado por incentivarem os seus actores a satisfazerem os
interesses das outras pessoas à medida que concretizam os seus objectivos. Por esta
razão, a sociedade protege os actos que se confirmam com os usos da riqueza que
atendam essa necessidade económica e restringe actos de tendenciais contrárias.
John Locke, defendendo a sacralidade da propriedade privada sobre a terra, entende
que está aliada ao trabalho e aos meios de trabalho e é condição para vida humana.

No direito Internacional, o Direito de propriedade está consagrado no artigo


17° da DUDH e do artigo 14° da CADHP. No direito angolano, o direito de propriedade
está nos artigos 14°, 37° e 98° da CRA.

O artigo 37°, n° 2 da CRA considera que a propriedade e demais Direitos


Reais são quase invioláveis (ou absolutos), permitindo apenas a sua limitação nos
casos e nos termos previstos na constituição e na lei. Estes casos dizem respeito a
expropriação e a requisição civil. Por um lado, a expropriação e a requisição civil
apenas são validadas se forem realizadas com o fundamento de interesses públicos
(utilidade pública).

2.7. Princípio da igualdade de oportunidades de acesso aos recursos


naturais propriedade do Estado
O princípio da igualdade de oportunidades, também designado por princípio de
igualdade material, constitui um mecanismo de realização da justiça social,
suavizando-se os possíveis efeitos negativos decorrentes da interpretação extrema
do princípio da igualdade formal previsto no artigo 23° da CRA.

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A igualdade material permite o tratamento diferenciado de situações desiguais, sendo
por isso uma das tarefas fundamentais do Estado “promover a igualdade de
oportunidades entre os angolanos, sem preconceitos de origem, raça, filiação
partidária, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação.
A legislação do RN estabelece várias formas de concretização do princípio da
igualdade de oportunidades, nomeadamente:
a) Isenção de prévia autorização e de quaisquer pagamentos como nos casos do
direito comum de águas, direito de pesca de subsistência, direito de
subsistência dos recursos florestais e direito de caça de subsistência.
b) A lei estabelece procedimentos de concessão simplificados a
favor de pessoas singulares ou colectivas que pretendam exercer actividades sobre
recursos de pequena dimensão visando eliminar as barreiras administrativas
susceptíveis de afectar a igualdade de oportunidade como são os casos do direito
mineiro de produção artesanal, direito de exploração florestal comunitário e do
licenciamento das instalações das actividades conexas de pescas a favor de micro e
pequenas empresas...
2.8. Princípio do uso sustentável dos recursos naturais
O princípio do uso sustentável dos RN está consagrado no n°2 do artigo
39. ° da CRA, referido que “Estado adopta medidas necessárias (...) à exploração e utilização
racional de todos os recursos naturais”.

Segundo Antonieta Coelho, “o uso sustentável refere-se à utilização dos recursos


naturais a taxas e segundo métodos que não conduzam o seu esgotamento ou degradação no longo
prazo, mantendo assim o seu potencial para satisfazerem necessidades das gerações actuais e
futuras”. Para a autora “o uso sustentável dos RN impõe, por um lado, a utilização óptima dos RN, ou
seja, a taxas que permitam a satisfação do maior número de necessidades actuais mantendo o seu
potencial para a satisfação de necessidades futuras”.
A carta mundial da natureza (CMN) estabelece algumas regras sobre o
uso sustentável dos RN, nomeadamente:
a) Os recursos vivos não devem ser usados excedendo a sua
capacidade natural de regeneração;
b) A produtividade dos solos deve ser mantida ou reforçada através
de medidas que salvaguardem a sua fertilidade a longo prazo e o processo orgânico
de decomposição, e previnam a erosão e outras formas de degradação;
c) Restrição da exploração dos Recursos não Renováveis. (...)
2.9. Princípio da função social dos direitos sobre recursos naturais
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A função social dos direitos patrimoniais pode ser encarada na perspectiva do princípio
da solidariedade social e da justiça distributiva, impondo responsabilidades a todos aqueles que
detenham bens com sociedade.
Existem várias normas na legislação sobre recursos naturais nesse
domínio:
a) O n° 2 do artigo 26° da Lei das actividades Petrolíferas estabelece o
dever de cooperação da concessionária nacional e as suas associadas com
autoridades administrativas nas acções de promoção do desenvolvimento económico
e social do país;
b) A gestão e concessão de terrenos subdividem-se às propriedades de
interesse público e do desenvolvimento do território, protecção do ambiente e
utilização economicamente eficiente e sustentável de terras. (...)
2.10. Princípio do aproveitamento útil efectivo dos recursos naturais e da
capacidade adequada

O princípio do aproveitamento útil e efectivo além de realizar a função social


dos direitos sobre recursos naturais, materializa também o princípio do uso
sustentável dos recursos naturais, tendo em atenção a importância dos recursos
naturais para o alcance do desenvolvimento e da satisfação das necessidades.

2.11. Princípio da cooperação internacional

Transmite a ideia que a protecção do ambiente e dos Recursos Naturais não


é apenas tarefa de um único Estado e que existem recursos naturais que são bens
comuns globais como é o caso dos recursos do alto mar, e outros recursos naturais
que são partilhados entre dois ou mais Estados. A cooperação internacional é
necessária, por exemplo, para a gestão e exploração de poços petrolíferos partilhados
ou de cursos de águas partilhadas, ou ainda para a gestão e exploração sustentável
dos recursos marinhos vivos do alto mar e não vivos da área internacional.

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CAPÍTULO III: ACESSO AOS RECURSOS NATURAIS

3.1. Sistema de Acesso

O acesso aos RN propriedade do Estado ocorre mediante à constituição de


direitos sobre estes recursos. O sistema de acesso sobre RN variam de um
ordenamento jurídico para outro, fundados na realização das exigências da sua
gestão sustentável e integrada, vinculada à necessidade de proteção do ambiente e
da satisfação das necessidades básicas das pessoas e da realização dos fins de
desenvolvimento económico e social de um determinado País.

No direito angolano, o acesso aos RN pode ser feito através do sistema de


acesso livre e gratuito e do sistema de acesso sujeito a autorização prévia.

No primeiro sistema, o acesso às actividades económicas sobre recursos


naturais decorre directamente da lei ou do costume e não está sujeito a qualquer
autorização ou pagamento de emolumentos ao Estado.

Exemplo:

1) Direito de uso e fruição comunitário de recursos florestais; (artigo XX da


LFFS);
2) Direito de caça de subsistência (artigo XX da LFFS);
3) Direito de domínio útil consuetudinário, artigo XX da LT);
4) Direito de pesca de subsistência, artigo XX LRBA);

É também gratuito, acesso de águas a favor dos titulares de direitos fundiários para
fins agrários nos seguintes casos:

5) Águas dos lagos, lagoas e pântanos existentes no interior do respectivo


talhão, a não ser que pelo seu volume ou importância tal utilização careça de licença
ou concessão;
6) Águas de nascentes, correndo livremente, sem transpor os limites do
respectivo talhão ou não se lancem numa corrente;
7) Águas subterrâneas não incluídas em zonas de proteção, desde que não
perturbem o seu regime, nem deteriorem a sua qualidade;
8) Águas pluviais dentro dos limites definidos em regulamento.

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O sistema de acesso livre e gratuito vincula-se à satisfação das necessidades
básicas das pessoas e funda-se na importância dos recursos naturais para a
realização do direito ao mínimo de existência e, consequentemente, do direito a vida
e da inerente dignidade da pessoa humana.

Os demais casos vigora o sistema de acesso aos RN sujeito a autorização


prévia. Esta autorização prévia é designada por concessão.

3.2. Licenças e contratos. Tendência contratualista

Conceito de Licença. Uma licença (do latim licentĭa) “é uma permissão para fazer algo. O
termo também permite designar o documento (um alvará, por exemplo) ou o contrato em que consta a
licença em questão. Exemplo: “A empresa adquiriu a licença para comercializar este produto em todo
o mercado latino-americano”. O contrato de licença é uma autorização que cede o direito de uso de um
bem a outra pessoa ou organização. Segundo Amaral, Feijó e Paca entendem “licença é um
acto pelo qual um órgão da administração atribui a alguém do direito de exercício de uma actividade
que é por lei relativamente proibida”. E concessão “é um acto pelo qual um órgão da administração
transfere para uma entidade diferente da sua o exercício de uma actividade pública, que o
concessionário desempenhará por sua conta, mas no interesse público”.

Em Direito dos Recursos Naturais, a concessão pode ser um acto unilateral


normalmente designado por licença, ou um acto bilateral normalmente designado por
contrato de concessão ou simplesmente concessão1. As licenças são verdadeiros
contratos públicos ou administrativos. Concessão, segundo Antonieta Coelho é um
“acto unilateral do Estado (concedente) ou negócio bilateral pelo qual uma pessoa singular ou colectiva
(concessionário) adquire, por prazo variável, a totalidade ou parte dos direitos do Estado relativos a um
dado recurso (ou vários recursos), numa área determinada, mediante o preenchimento de certos
requisitos, devendo o concessionário, como contrapartida, efectuar um conjunto de prestações
positivas e negativas, incluindo o pagamento de uma (ou um conjunto de diferentes) remunerações ao
Estado, que integrarão a chamada renda do recurso”.

Na Lei de águas, o acesso aos direitos de usos privativos de águas é feito


mediante licença, nos casos em que a necessidade de utilização de recursos hídricos

1
Contratos administrativos: é o contrato celebrado entre a administração e outra pessoa com o objecto
de associar esta por certo período ao desempenho regular de alguma atribuição administrativa, mediante prestação
de coisa ou serviços, retribuir pela forma que for estipulada, e ficando reservado aos tribunais administrativos o
conhecimento das contestações entre as partes, relativas à validade, interpretação e execução das suas cláusulas.

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não implique a alteração da qualidade e quantidade das águas, bem como do
equilíbrio ecológico. Nos casos contrários, os direitos de usos privativos adquirem-se
mediante concessão, sendo contrato de concessão.

Na LRBA, os direitos de pesca constituem-se mediante acto de concessão


do Ministro competente. Trata-se de um acto administrativo, unilateral.

Na LBFFS, os direitos de exploração florestal comunitários, direitos de


exploração florestal de lenha, carvão vegetal e de produtos não lenhosos e os direitos
de caça são constituídos mediante licença. Mas os direitos de exploração florestal
empresarial são constituídos mediante contrato de concessão.

Na Lei de Terras, os direitos fundiários adquirem-se mediante os seguintes


contratos de concessão:

a) O direito de propriedade adquire-se mediante contrato de compra e


venda;
b) O direito do domínio útil civil adquire-se mediante contrato de aforamento
para a constituição do referido direito;
c) O direito de superfície adquire-se mediante contrato especial de
concessão para a constituição do referido direito;
d) O direito de ocupação precária adquire-se mediante o contrato de
arrendamento para a concessão do referido direito.

No Código Mineiro, o sistema de acesso aos direitos mineiros é misto porque


consiste, em regra, na celebração de um contrato de investimento mineiro ou contrato
de concessão, seguido da emissão de títulos mineiros nomeadamente a licença ou
título de prospeção para as actividades mineiras da primeira fase e a licença ou título
de exploração para as actividades mineiras da segunda fase. Nos demais casos, a
concessão é feita mediante acto administrativo, revestindo as formas de despacho e
despacho presidencial, nomeadamente:

a) Os actos administrativos de concessão de direitos mineiros de produção


artesanal são titulados por uma senha mineira;
b) Os actos administrativos de concessão de direitos mineiros sobre
materiais para a construção civil são titulados por alvará mineiro.

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Ainda nos termos da alínea b) do n.º 1 do artigo 46.º da Lei de Terras, o direito
de propriedade pode também ser constituído através da aquisição forçada do domínio
direito por parte do enfiteuta que se opera por força de um acordo das partes ou
venda judicial resultante do exercício do direito potestativo do foreiro integrado por
decisão judicial, o designado direito de remissão do foro.

No Código Mineiro, o sistema de acesso aos direitos mineiro é misto porque


consiste, em regra, na celebração de um contrato de investimento mineiro ou contrato
de concessão, seguido da emissão de títulos mineiros nomeadamente a licença ou
título prospecção para as actividades mineiras da primeira fase e licença ou título de
prospecção para as actividades mineiras da segunda fase. Nos demais casos, a
concessão mineira é feita mediante acto administrativo, revestindo as formas de
despacho e despacho presidencial, nomeadamente:

a) Os actos administrativos de concessão de direitos mineiros de produção


artesanal são titulados por uma senha mineira;
b) Os actos administrativos de concessão de direitos mineiros sobre
materiais para a construção civil são tituladas por alvará comercial.

Na Lei das Actividades Petrolíferas, os direitos mineiros são concedidos


mediante Decreto Presidencial de concessão (artigo 44.º) a concessionária mediante
autorização do executivo pode associar-se a entidades nacionais ou estrangeiras
devendo tal associação assumir as formas de contrato de sociedade comercial,
contrato de consórcio, contrato de partilha de produção, ou ainda de contrato de
serviço com risco (artigo 14.º)

3.3. Competência de concessão de direitos sobre recursos naturais

Um dos pontos críticos do quadro constitucional e normativo do direito dos RN


actual prende-se com a repartição de competências em matérias de concessão de
direitos sobre RN propriedade do Estado visto que a Constituição da República de
Angola introduziu alterações sistémicas consideráveis que tornam muitas disposições
da legislação ordinária afectadas por vício de inconstitucionalidade orgânica por
invadirem o âmbito das Competências do Presidente da República enquanto titular do
poder Executivo.

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Muita legislação sobre RN foi aprovada antes da entrada em vigor da actual
Constituição. Tanto esta como as leis que vêm sendo aprovadas depois de 2010,
continuam a repartir competências entre o presidente da República e Ministros
responsáveis pelos sectores específicos de actividade económica, facto que merece
algumas notas.

Nos termos do artigo 117.º CRA, as Competências do Presidente da


República decorrem exclusivamente da Constituição, o que implica afirmar que a lei
não tem legitimidade para fixar Competências do Presidente da República. Ou seja,
em matéria da função executiva ou administrativa, as Competências do Presidente da
República são residuais, o que significa que todas as Competências não atribuídas
por lei ou regulamento, aos órgãos da administração local (do Estado ou autónoma)
são do presidente da república enquanto titular do poder executivo.

Sob pena de inconstitucionalidade orgânica, a lei e o regulamento não podem


fixar competências dos Ministros que superintendam os diversos sectores de
actividade económica porque as competências que estes órgãos exerçam são do
presidente da república, e, como já referido, as competências deste órgão decorrem
da Constituição e são residuais. Sendo estas Competências do Presidente da
República, os Ministros de Estado ou Ministros, enquanto órgãos auxiliares do
Presidente da República, exercem-nas mediante delegação de poderes (artigos 108.º,
n.º 2, e 137.º da CRA). Assim que o Presidente da República toma posse ou designa
um novo Ministro que superintenda um sector de actividade económica sobre RN, é
exarado um despacho presidencial de delegação de competências, além dom
despacho presidencial de delegação genérica de competências.

Por sua vez, o PR, nestes casos, conserva sempre a competência


constitucional de praticar actos no âmbito dos poderes delegados, bem como de
avocar para si as competências delegadas, revogar os actos praticados no exercício
dos poderes delegados, ou mesmo ainda de apreciar os recursos hierárquicos sobre
os actos praticados pelos Ministros de Estado e Ministros (artigo 16.º e 118.º da Norma
do Procedimento das Actividades Administrativas-NPAA). Um dos problemas da
gestão sustentável dos recursos naturais prende-se com o facto da maior parte das
competências de concessão de direitos sobre recursos naturais estarem concentradas
na Administração Central do Estado, pelo que é necessário a sua desconcentração e

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descentralização para a administração local, de modo a garantir que estes recursos
atendem também às necessidades do desenvolvimento local.

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Capítulo IV- regime de acesso e uso de Terras

4.1. Vinculação da concessão fundiária aos planos territoriais

A ocupação, uso e aproveitamento da terra deve obedecer aos instrumentos


e as operações de ordenamento do território, onde se destacam os planos territoriais,
profundamente estudados em sede do Direito Ordenamento do Território e dos
Urbanismo.

Dentre estes relevam os planos municipais e especiais que têm natureza


regulamentar, sendo, por isso, imperativos e de cumprimento obrigatório para toda
Administração Pública e todos os particulares (artigos 52.º da LOT e 6.º n.º, do
REPTUR).

4.2. Os terrenos

4.2.1. Definição

O direito fundiário tem por objecto a terra cuja definição é, nos termos da Lei
de Terras, o mesmo que terrenos.

Os terrenos são parte delimitada do solo, incluindo o subsolo e as construções


neles existentes que não tenham autonomia económica. Terão autonomia económica
os jazigos de minerais integrados na composição do subsolo, deixando assim de fazer
parte do conceito adoptado pela Lei de Terras. As construções feitas num terreno para
o explorar, por faltar-lhes autonomia económica, integram-se no conceito de terreno.
De acordo com artigo 81.º do REPTUR os terrenos classificam-se em:

a) Terrenos concedíveis e terrenos não concedíveis;


b) Terrenos urbanos e terres rurais;
c) Terrenos do domínio público e terrenos do domínio privado;
d) Terrenos do Estado, terrenos das autarquias locais ou terrenos de particulares.

Feita a classificação, os terrenos são qualificados. A operação de qualificação


visa determinar o uso do terreno classificado. E, de acordo com artigo 82.º REPTUR
os terrenos podem ser qualificados em:

a) A qualificação dos terrenos urbanos;


b) A qualificação dos terrenos rurais; e

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c) A qualificação dos terrenos não concedíveis.
4.2.2. Tipologias de terrenos

Quanto aos tipos jurídicos, os terrenos podem ser concedíveis, quando


podem ser objecto de transmissão ou de oneração, ou não concedíveis, quando não
podem ser transmitidos ou onerados. As categorias de terrenos não concedíveis:

a) Terrenos integrados no domínio público;


b) Terrenos abrangidos por uma serva total;
c) Terrenos rurais comunitários;
d) Terrenos do domínio privado do Estado ou das autarquias locais afectos
aos fins de interesse público; e
e) Terrenos já concedidos.

Todos os demais terrenos são, por exclusão de partes concedíveis.

Para efeitos do seu aproveitamento, os terrenos o terrenos concedíveis ruais


ou urbanos.

Para feitos do seu aproveitamento, os terrenos concedíveis podem ser rurais


ou urbanos.

Os terrenos urbanos são prédios rústicos situados na área delimitado por foral
ou na área delimitada de um aglomerado urbano e que se destine para fins de
edificação urbana. Os terrenos, de acordo com o critério do fim urbanístico, podem
ser:

a) Terrenos urbanos: são aqueles terrenos cujos fins concretos estão


definidos pelos planos urbanísticos ou como tal classificados por decisão das
autoridades competentes, contanto que neles estejam implementadas infraestruturas
de urbanização, entre outras, as redes de saneamento básico, distribuição de energia
eléctrica e de água;
b) Terrenos de construção: são terrenos urbanizados que estando
abrangidas por uma operação de loteamento devidamente aprovada, se destinem à
construção de edifícios, contanto que tenha sido que tenha sido licenciado pela
autoridade competente.

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c) Terrenos urbanizáveis: são os que embora abrangidos por uma área
delimitada por farol ou no perímetro urbano equivalente, hajam sido classificados, por
planos urbanísticos ou plano equivalente, como reserva urbana de expansão.

Os terrenos rurais são prédios rústicos situados fora da área delimitada por
um foral ou fora da área de um aglomerado urbano e se destinem aos fins de
exploração agrícola, pecuária, silvícola, mineira e outros. Por sua vez, de acordo com
os fins e regime jurídico a que estão sujeitos, os terrenos rurais podem ser:

a) Terrenos rurais comunitários: são todos aqueles ocupados por famílias


de uma comunidade rural para a sua habitação, exercício de outras actividades ou
realização de outros fins reconhecidos por lei ou pelo costume.
b) Os terrenos agrários: são aqueles aptos para agricultura,
nomeadamente, o exercício da catividade agrícola e pecuária;
c) Os terrenos florestais: são aqueles aptos para o exercício da catividade
silvícola, nomeadamente para exploração racional de florestas naturais ou artificiais.
d) Terrenos de instalação: são aqueles destinados à implementação de
instalações minerais, industriais agroindústrias.
e) Terrenos viários: são aqueles afectos a implementação de vias terrestres
de comunicação, de redes de abastecimentos de águas e de electricidade, bem como
de redes de drenagem pluvial e de esgotos.

4.2.3. A área de concessão

A área de concessão de terrenos está sujeito aos limites mínimos e máximos


que variam consoante o terreno seja urbano ou rural. Para a concessão de terrenos
urbanos, a lei fixa apenas limites máximos. Quando os terrenos estejam situados na
zona suburbana, a área não pode exceder a cinco hectares e quando situados zona
urbana, a área não pode exceder a dois hectares.

A área dos terrenos rurais não pode ser inferior a dois hectares (limite mínimo)
nem superior a 10.000 hectares (limite máximo).

A área do terreno sujeita a ocupação precária não pode exceder, para cada
contrato celebrado com a mesma pessoa singular ou colectiva, a um hectare para a
exploração de pedraria ou meio hectare para outros fins. Estes limites podem ser
ultrapassados quando haja interesse do Estado.

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A fixação destes limites visa garantir a repartição justa e equitativa da terra,
combatendo os minifúndios, no caso dos limites mínimos, para permitir que as famílias
possam deter parcelas de terras suficientes para o exercício de actividade económica
que garantam a sua subsistência e prosperidade, contribuindo para combate a
pobreza.

Para actividade agrícola, a fixação dos limites mínimos de áreas de terrenos


é uma solução aos problemas da má distribuição de terras que os pequenos
agricultores enfrentam em África que tem contribuído para sua baixa produção
agrícola e o sequente aumento da pobreza. Para o Almeida considera que as
hipóteses de sucesso dos agricultores que tenham 1 ou menos hectare são mínimas
ou inexistente. Ao passo que Wiggins et. Al., citado por Almeida, esta situação afecta
negativamente a sua capacidade de gerar rendimentos que os coloquem acima da
linha da pobreza.

A fixação dos limites máximos aos terrenos objecto de concessão visa


prevenir os latifúndios, evitando a escassez de terrenos resultante de facto de um
pequeno grupo de pessoas possuir grandes superfícies de terras que não chegam de
as utilizar racional e integralmente.

4.2.4. Competência de concessão de terrenos

A Lei de terras refere-se ao Conselho de Ministros, Ministro que tutela o


cadastro e ao Governo Provincial com órgãos que têm competência em matéria
fundiária. Estas disposições da Lei de terras devem merecer uma interpretação
actualista de modo a conformá-la à CRA e às novas normas sobre a organização e
funcionamento da Administração Local do Estado.

Por um lado, as competências atribuídas ao Conselho de Ministros devem


considerar-se atribuídas ao PR, enquanto titular do Poder Executivo, nos termos dos
artigos 108.º, n.º 1, 117.º e 120.º da CRA. No caso do Ministro que tutela o cadastro,
enquanto auxiliar do Titular do Poder, exerce competências em matéria fundiária
mediante delegação genérica ou específica do titular do Poder Executivo. As
competências referidas nos artigos 43.°, n.º 1, alínea c) e 66. °, n. °3, da Lei de Terras,
podem ser consideradas genericamente delegadas no âmbito da delegação genérica
de competências concedida por Despacho Presidencial n. ° 2, da Lei de Terras,

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podem ser objecto de delegação específica do Presidente da República ao Ministro
que tutela o sector do cadastro.

As competências genericamente delegadas no Ministro que tutela o cadastro,


em matéria de concessão de terrenos rurais de área superior a 1000 hectares e igual
ou inferior a 10.000 hectares, estão vinculadas ao parecer da entidade que tutela a
respectiva área. Aqui a área deve ser compreendida como sector da actividade. Por
exemplo, a decisão do Ministro do Ordenamento do Território e Habitação em
conceder direitos fundiários para fins agrários ou florestais sobre um terreno rural de
hectares, deve obedecer ao conteúdo do parecer vinculativo do Ministro da Agricultura
e Florestas.

Por outro lado, o Governo Provincial deixou de ser um órgão deliberativo


(órgão colegial executivo) e passou a ser um órgão colegial consultivo do Governador
Provincial (artigo 12. °, alínea b), da LALE e 5. °, n. ° 3, alínea a), do RLALE,
competências em matéria fundiária, com destaque a concessão de terrenos.

Em contrapartida, nos termos do artigo 52.°, n. ° 3, alínea g) do RLALE,


compete a Administração Municipal “ autorizar a concessão de direitos fundiários até
ao limite previsto por lei ”. Os limites previstos por lei, são os estabelecidos nos termos
do n. ° 1 e 2 do artigo 43. ° da Lei de Terras. Ou seja a Administração tem competência
para conceder direitos fundiários até aos seguintes limites:

a) Nos terrenos urbanos: 1- até a área de 2 hectares na zona urbana; 2-


até a área de 5 hectares na zona suburbana;
b) Nos terrenos rurais, área de 2 hectares até 1.000 hectares.

A atribuição de competências de concessão de terrenos à Administração


Municipal reforça o processo de desconcentração administrativa em curso de 1999.

A nível central, o Instituto Geográfico Cadastral de Angola (IGCA) é o serviço


central de gestão técnica das terras, nos termos do artigo 67. ° da Lei de Terras, a
quem são conferidas as seguintes atribuições em matéria fundiária:

a) “Organizar e conservar o tombo, de modo a permitir a identificação de


cada terreno, não só quanto a situação, como também quanto aos factos jurídicos
sujeitos a ele respeitantes;

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b) Organizar e executar os trabalhos técnicos relativos a demarcação dos
terrenos reservas;
c) Organizar e manter actualizado o cadastro geométrico;
d) Preparar a programação geral da cartografia do país e submeter a
autoridade competente a sua comprovação e mate-la actualizada;
e) Executar as zonas rurais as directivas contidas nos planos de
ordenamento do território.”

Os serviços do Instituto Geográfico e Cadastral de Angola têm também, nos


termos do artigo 134.° do RGCT, a atribuição de organizar e instruir o processo de
concessão de terrenos que depois de concluída, deve submetê-lo a decisão do órgão
(entidade) concedente.

Ao nível local, a Direcção Municipal de Gestão Urbanística, Urbanismo e


Cadastro, é o serviço técnico de gestão fundiária com as seguintes atribuições e
competências estabelecidas nos termos das alíneas f) e i) do n.º 2 do artigo 80.° do
RLALE:

a) Licenciar terrenos para os diversos fins, nos da Lei;


b) Instruir, emitir pareceres e decidir sobre os processos de pedido de
terrenos para construção.

Em matéria de instrução de processo de concessão de terrenos, as alíneas f)


e i) do n.° 2 do artigo 80.° do Regulamento da Lei da Administração Local do Estado
devem ser interpretadas tendo em atenção ao enquadramento sistemático das
mesmas, bem como em conformidade a Lei de Terras e o Regulamento Geral de
concessão de terrenos. Neste sentido, devemos entender o seguinte:

a) As competências para concessão de terrenos são da administração


Municipal nos termos anteriormente referidos, cabendo à Direcção Municipal de
Gestão Urbanística, Urbanismo e Cadastro a tarefa de instruir os processos de
concessão referentes a terrenos urbanos e organizar o respectivo cadastro fundiário
municipal, urbano e rural, que deve ser integrado no cadastro fundiário nacional.
b) Ao Instituto Geográfico Cadastral de Angola cabe instruir os processos
de concessão de terrenos rurais, ainda que a respectiva concessão caibam no âmbito
das competências da Administração Municipal, devendo a Direcção de Gestão

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Urbanística, Urbanismo e Cadastro apenas, talvez participar ou ainda emitir parecer
no processo de concessão fundiária.

4.2.4.1. Competência de terrenos para plantação florestal

O Regulamento Florestal delimita as competências em matéria de concessão


de tipologia de terrenos nos seguintes termos:

a) Ao Governo Provincial, quando área de concessão exceda 1.000


hectares;
b) Ao Ministro que Superintende o sector florestal, quando a área de
concessão superior a 1.000 hectares e inferior 10.000 hectares;
c) Ao Presidente da República sob proposta do Ministro que superintende
o sector florestal, quando a área de concessão for superior a 10.000 hectares.

O artigo 115° n°1, do Regulamento Florestal (RF) levanta três problemas cuja
abordagem reputa-se de grande importância técnico-jurídica. Primeiro diz respeito à
técnica legislativa utilizada na repartição de competências efectuada pelo artigo 115°,
n°1, do Regulamento Florestal que levanta o problema relacionado com o facto de nos
termos dos artigos 108.°, n°2, e 137.° da CRA, os Ministros, enquanto auxiliares do
Titular do poder Executivo, não podem ter competências próprias. Ou seja as suas
competências são meramente delegadas pelo Presidente da República.

O segundo problema refere-se pelo facto do artigo 115°, n°1 do Regulamento


Florestal não ter seguido o princípio de repartição de competências em matéria
fundiária a nível da Administração Central de Estado, definidos na Lei de Terras
consistente na sua concentração ao órgão responsável pelo cadastro, devendo os
Ministros que superintendem o sector de actividade limitar-se a emitir um parecer
vinculativo. Este princípio assenta na lógica de se garantir maior ordenamento e
organização na gestão fundiária e do território, evitando-se a intervenção de vários
órgãos em matéria de concessão fundiária.

A atribuição da competência de concessão de terrenos de vários órgãos gera


o risco de aumentar os conflitos fundiários, bem como de distorcer o sistema de um
cadastro fundiário devidamente organizado. Estes riscos justificam-se pelo facto de
atribuição de tais competências ao Ministro que superintende o sector florestal
levantar dúvidas quanto ao serviço com a missão de instruir processos de concessão

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fundiária que provavelmente não será o IGCA mas sim, talvez um outro serviço
designado pelo referido Ministro, situação que, do nosso ponto de vista, talvez seja
susceptível de prejudicar um ordenamento adequado do território nacional.

O terceiro problema prende-se com o facto do artigo 115°, n°1, alínea a) do


Regulamento Florestal representar um retrocesso em matéria de desconcentração
administrativa ao limitar as competências de concessão de terrenos para plantação
florestal apenas ao Governador Provincial. Em sentido inverso, tal como ficou
anteriormente discutido, as competências de concessão de terrenos são, no quadro
do RLALE, da Administração Municipal, que também está provida de um serviço que
a auxilia na instrução dos respectivos procedimentos administrativos.

4.5. Direitos fundiários

4.5.1. Noção

Os direitos fundiários são direitos que recaem sobre terrenos integrados no


domínio privado do Estado, de que são titulares quer pessoas singulares quer pessoas
colectivas de direito público ou privado, nacionais, estrangeiras ou internacionais. O
conceito amplo de direitos fundiários também pode ser direito de propriedade privada,
direito de superfície e o direito de domínio útil civil, quando incidem sobre terrenos que
não sejam propriedade originária de Estado.

Assim, teremos:

a) Direitos- faculdade ou poder que a ordem jurídica reconhece aos sujeitos


de direitos;
b) Podem ser titulares de direitos fundiários, pessoas singulares quer
pessoas colectivas de direito público ou privado, nacionais, estrangeiras ou
internacionais;
c) Tem por objecto terrenos rurais ou urbanos, integrados no domínio
privado de Estado.

O nosso estudo restringe-se ao conceito de direitos fundiários em sentido


estrito. Por força do princípio da taxatividade, a lei de Terras tipifica os seguintes
direitos fundiários:

a) Direito de propriedade privada;

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b) Direito de domínio útil civil consuetudinário;
c) Direito de domínio útil civil; e
d) Direito de superfície;
e) Direito de ocupação precária.

O princípio da taxatividade, também designado de princípio do numerus


clausus, plasmado no artigo 8° da Lei de terras, refere-se a ideia de uma tipologia
taxativa de direitos reais previstos na referida lei. Por essa razão, o n° 2 do referido
artigo comina a sanção de nulidade a todos os negócios ou actos jurídicos
constitutivos de direitos fundiários não previstos na presente Lei. Assim, consideram-
se nulos, por exemplo, o contratos-promessa ou as declarações de titularidades
passados pelas administrações municipais e outras entidades administrativas,
constitutivas de direitos sobre terrenas pelo facto de tais não respeitarem as tipologias
de direitos fundiários previstos no artigo 34° da Lei de Terras.

Para o Eduardo entende que na próxima revisão da Lei de Terras, propõe-se


a eliminação do domínio útil civil e do domínio útil consuetudinário por não vislumbrar
utilidade prática na existência de cinco tipos de direitos fundiários.

4.5.2. Requisitos subjectivos dos titulares de direitos fundiários

Tal como já referido, os terrenos propriedade originária de Estado podem ser


concedidos a pessoas singulares ou colectivas nacionais, estrangeiras ou
internacionais e da natureza privada pública ou cooperativa.

Às entidades estrangeiras de direito público, a lei exige que, para concessão


de direitos fundiários, a sua capacidade de aquisição de terrenos esteja prevista em
acordos internacionais e que haja reciprocidade de tratamento a entidades angolanas
congéneres (artigo 42°, f), da Lei de Terras.

As pessoas singulares ou colectivas estrangeiras, no momento da


constituição de direito fundiário devem expressamente declarar que, em caso de
conflito referente à terra sobre a qual incide, sujeitam-se a jurisdição de tribunais
angolanos (artigo 72° da Lei de Terras.

As concessões gratuitas apenas podem ser atribuídas as pessoas que não


tenham meios para pagar as prestações devidas em cada tipo de direito fundiário ou
instituições de utilidade pública reconhecida que prossigam a realização de fins de
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solidariedade social, cultural, religiosos ou desportivos (artigos 50°. e 57° da Lei de
Terras).

O sujeito que pretende adquirir direitos fundiários deve demostrar capacidade


adequada de garantir o aproveitamento útil e efectivo, anteriormente estudada (artigo
45°. da Lei de Terras). O sujeito deve também provar o aproveitamento útil e efectivo
da Terras sobre os quais tenha direitos fundiários constituídos (artigo 44° da Lei de
Terras).

4.5.3. Direito de propriedade privada

Para tudo quanto seja aplicável e não esteja regulado na Lei de Terras, artigo
35°, n° 1, desta Lei remete expressamente para os artigos 1302° e 1384° do CC.

A propriedade é um direito real pleno que, como escreve Tartuce, tem as


seguintes principais características:

a) Direito absoluto ou “erga omnes” por ser um direito sobre a coisa em


face de pessoas, impondo a todos os demais sujeitos de direito uma obrigação passiva
ou um dever geral de abstenção. Todos, salvas as limitações previstas na Lei, têm o
dever geral de se abster de praticar actos que interfiram com propriedade;
b) Direito exclusivo, porque salvo nos casos de condomínio e
compropriedade, uma coisa não pode pertencer a mais de uma pessoa, tendo esta, o
poder de excluir todas as demais;
c) Direito perpétuo porque o exercício da propriedade não tem duração
limitada no tempo, a não ser que ocorram determinadas causas de extinção permitidas
pela Constituição e por lei.
d) Direito elástico porque o seu conteúdo pode ser comprimido por outros
direitos reiais menores (ex.: a hipoteca ou o direito de superfície), retornando a sua
plenitude em caso de extinção do direito real menor que comprimia o seu conteúdo;
e) Direito complexo por integrar vários atributos, nomeadamente as
faculdades que o seu titular tem de usar, fruir e dispor a coisa (artigo 1305° do CC).
Inclui também a faculdade de reivindicar ou defender a coisa contra quem
injustamente a possua ou detenha, previstas nos termos do artigo 1311° a 1314° do
CC.
f) Direito fundamental garantido nos termos dos artigos 14° e 37° da CRA.

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O conteúdo positivo do direito de propriedade integra o direito de usar, fruir e
dispor da coisa sobre a qual incide (artigo 1305° do CC). Assim, o proprietário pode
utilizar racionalmente o terreno, arrendar o terreno e em consequência colher os
respectivos frutos civis (rendas), bem como alienar o terreno.

Só as pessoas singulares da nacionalidade angolana podem adquirir direitos


de propriedade que, por sua vez, apenas incide sobre terrenos urbanos integrados no
domínio privado do Estado, nos termos do artigo 35°, n° 2 e 3, da Lei de Terras. Isto
implica dizer que o Estado não pode transmitir a propriedade, mesmo as pessoas
singulares de nacionalidade angolana, sobre terrenos rurais quer se integrem no seu
domínio privado ou público. Esta disposição da Lei de Terras que proíbe às pessoas
de nacionalidade angolana adquirirem o direito de propriedade privada sobre terrenos
rurais é supervenientemente inconstitucional pelo facto do n° 3 do artigo 98. ° da CRA
não reconhecer tal limitação. Esta norma constitucional limita-se apenas a reconhecer
a possibilidade do Estado constituir direito de propriedade privada sobre terrenos seus
a favor de cidadãos angolanos, sem distinguir se tal direito incide sobre terrenos
urbanos ou rurais. Ou seja, a exclusão do direito incide de propriedade incidir sobre
terrenos rurais é uma limitação que a CRA não prevê. Por isso, o Estado pode
transmitir aos cidadãos angolanos a sua propriedade sobre terrenos urbanos e rurais,
pois, do ponto de vista da CRA, basta ser cidadão angolano para ter acesso ao direito
de propriedade, não importando se o terreno é urbano ou rural. Partindo dessa premissa,
Carlos Feijó defende “revisão, ainda que pontual, da Lei de Terras, para adequá-la à Filosofia em
que assenta a CRA, “mais permissiva de constituição de direitos privados sobre a terra.”

O direito de propriedade da Lei de Terras distingue-se do direito de


propriedade consagrado no Código Civil, pelo facto de ser uma propriedade sob
condição administrativamente resolúvel nos cassos em que o adquirente não tenha
feito o aproveitamento útil e efectivo no prazo de três anos seguidos ou seis anos
interpolados. Este regime contraria a tese tradicional segundo a qual o não uso total
ou parcial da coisa é também uma forma de exercer o direito. Apesar da condição
resolutiva a que está sujeita, não se põe em causa o carácter perpétuo deste direito
(artigo 55°, n°1, alínea a), da Lei de Terras).

O titular do direito pode livremente transmitir a propriedade a uma pessoa


singular angolana, desde que tenha feito o aproveitamento útil e efectivo durante cinco
anos a contar da concessão ou contar da última transmissão (artigo 36. °, n. °3, e 48.
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°, n. ° 4 da Lei de Terras). A verificação dos índices de aproveitamento útil e efectivo
funciona como um verdadeiro limite ao direito de dispor do proprietário.

Entende-se depois de decorrido o período de cinco anos de aproveitamento


útil e efectivo, o terreno entra definitivamente no regime de propriedade privada.

Outra limitação é a que decorre do facto dos poderes de uso e transformação


dos terrenos por parte do proprietário estarem sujeitos ao conteúdo dos planos
urbanísticos e aos fins urbanísticos neles definidos e a que se destinam (artigo 36°,
n° 4, da Lei de Terras). Por exemplo, os planos urbanísticos podem fixar o zonamento
territorial de certa área urbana, destinando-a para as edificações comerciais ou
industriais, pesada e poluente, proibindo quaisquer construções para fins
habitacionais.

O direito de propriedade pode ser adquirido através do contrato de compra e


venda ou remição do foro por parte do enfiteuta (artigo 36. °, n. ° 2, 46. °, n. 1, alínea
a) e b), 48. °, da Lei de Terras e 48. ° e seguintes do RGCT).

A venda de terreno é, em regra, feita mediante arrematação em hasta pública,


nos termos dos artigos 48. °, n. ° 1, da Lei de Terras e 48. ° e seguintes do RGCT. O
procedimento da arrematação em hasta pública tem o objectivo de garantir maior
concorrência e valorização dos terrenos.

4.5.4. Direito de domínio útil consuetudinário

O domínio útil consuetudinário é concretização do princípio constitucional do


respeito pelos direitos de acesso de acesso e uso de terras pelas comunidades rurais
(artigo 15. ° 1, e 98. ° 1, da CRA). É um direito reconhecido às famílias que integram
as comunidades rurais, de ocupação, posse, uso e fruição de terrenos rurais
comunitários aproveitados de forma útil e efectiva segundo o costume (artigo 37. °, n.
° 1, da Lei de Terras e 72. ° do RGCT). O domínio útil consuetudinário tem por objecto
os terrenos rurais comunitários. O domínio útil consuetudinário tem por objecto os
terrenos rurais comunitários.

Com a consagração do domínio útil consuetudinário, a Lei de Terras


“procedeu ao reenvio para o direito costumeiro regular a gestão dos terrenos
rurais comunitários”, devendo os órgãos das respectivas comunidades locais tomar
decisões sobre acesso, uso e exclusão de terras.
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O domínio útil consuetudinário decorre directamente da lei. Todavia, a
autoridade competente deve emitir um título de reconhecimento (artigo 37. °, n. °2, da
LT).

O exercício do domínio útil consuetudinário é gratuito, não estando sujeito a


pagamento de taxas, foros, emolumentos ou prestações de qualquer natureza (artigo
37. °, n. ° 6, da LT e 73. ° RGCT).

O domínio útil consuetudinário é intransmissível por morte e em vida. Também


é proibido o desmembramento do domínio útil consuetudinário, não permitindo assim,
as comunidades rurais ou às suas famílias arrendar as terras sobre as quais incide
este direito, mesmo quando tal seja necessário para garantir seu aproveitamento útil
e efectivo.

Mas levanta-se aqui controvérsias, pelo facto do artigo 65. ° RGCT não
conformar-se com o artigo 7. ° da CRA, por ser uma norma constitucional é
hierarquicamente superior que a norma do regulamento. Por cabe ao costume
aplicável em cada região, permitir ou proibir o desmembramento do domínio útil
consuetudinário.

Certa controvérsia resulta do artigo 63. °, n. ° 4, da LT que atribui às


comunidades a faculdade de hipotecar o domínio útil consuetudinário para garantir o
pagamento do empréstimo bancário contraído para a realização do aproveitamento
útil e efectivo do terreno comunitário. Caso as comunidades não consigam cumprir
com as obrigações assumidas, o banco que facultar o crédito pode requerer a
execução judicial deste direito. Esta é a única excepção à impenhorabilidade do
domínio útil consuetudinário (artigo 37. °, n. ° 83 e 66°, n. ° 4, da LT e 76. ° do RGCT).

Apesar de ser um direito imprescritível e perpétuo, o domínio útil


consuetudinário pode extinguir-se pelo seu não uso e pela sua livre desocupação nos
termos das costumeiras (artigo 37. °, n. ° 7, e 55. ° n. ° 1, alínea b) da LT e 74. ° do
RGCT). A desafectação do domínio útil consuetudinário depende da verificação dos
seguintes pressupostos cumulativos:

a) Audição prévia das instituições do poder tradicional (artigo 37. °, n. ° 4


da LT);

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b) Livre desocupação dos seus titulares de harmonias com as normas
costumeiras em vigor (artigo 37. °, n. ° 5, da LT);
c) Outorga de outros terrenos aos membros da comunidade em causas
(artigo 37. ° n. ° 4 da LT).

As outras formas de extinção do domínio útil consuetudinário são a


expropriação por utilidade pública ou por requisição.

A lei de terra reconhece personalidade e capacidade judiciárias às


comunidades rurais para defesa dos seus direitos colectivos (artigo 70. °, n. ° 3). Ou
seja, as comunidades rurais têm a susceptibilidade de serem parte em juízo.

4.5.5. Direito de domínio útil civil

O direito de domínio útil civil pode constituir-se sobre terrenos urbanos ou


rurais (artigo 38. °, n. ° 3 da L) e conforme ao respectivo titular o direito de utilizar a
coisa perpetuamente como proprietário.

Neste direito, também chamado de enfiteuse, há o desmembramento da


propriedade em dois domínios, o domínio directo (eminente) pertencente ao Estado e
o domínio útil pertencente ao utilizador da terra ou enfiteuta. Assim, constituem direitos
do enfiteuta (artigo 38. °, n. ° 1, da LT):

a) Usar a terra como sua;


b) Alienar ou onerar o seu domínio por morte ou acto entre vivos (hipotecar
o seu domínio (38. °, n. ° 11, da LT);
c) Preferir na venda ou dação em cumprimento do domínio directo (artigo
48. °, n. ° 6, da LT);
d) Direito de reduzir o foro (artigo 1501. ° e 1509. ° do CC), tendo em
consideração os artigos 38. °, n. ° 5. 47. °, n. ° 3, e 57. ° da LT;
e) Direito de remir do foro após 20 anos de exercício do direito, mediante o
pagamento de 10 foros (artigo 38. °, n. °s 7 e 9, da LT).

4.5.5. Direito de superfície

Direito de superfície confere ao seu titular de a faculdade de construir, manter


obras, plantar ou manter plantações em terrenos rurais ou urbanos integrados no

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domínio privado do Estado. O superficiário goza ainda a faculdade de hipotecar o
direito (artigo 39. °, n. ° 4, da LT).

O negócio jurídico de constituição do direito de superfície é o contrato especial


de concessão do direito de superfície, nos termos dos artigos 46. °, n. ° 1, alínea d),
da Lei de terras e 77.° do RGCT. O direito de superfície tem a duração de 60 anos
renováveis por períodos sucessivos se nenhuma parte o tiver denunciado no prazo e
na forma convencionados (artigos 55. ° n. °s 1 alínea d), e 2 da LT).

A concessão do direito de superfície é inicialmente dada a título provisório


durante o período a ser fixado no contrato de concessão. Este não pode ter duração
superior de cinco anos. Para que este título se converta em definitivo é necessário
que se verifique o aproveitamento útil e efectivo pré-estabelecidos, que o prazo
constante no contrato tenha decorrido e que o terreno tenha sido objecto de
demarcação definitiva (artigo 78. ° da LT).

Tudo quanto não esteja regulado na Lei de Terras e seu regulamento, aplica-
se, com as devidas adaptações, o regime jurídico estabelecido nos artigos 1524. ° a
1542. ° CC.

4.5.6. Direito de ocupação precária

O direito à ocupação precária está regulado na Lei de Terras nos artigos 40.
° e 81.° e seguintes do RGCT, e constitui-se mediante contrato de arrendamento
celebrado por tempo determinado.

A ocupação precária tem por objecto um terreno a utilizar temporariamente e


aquele em relação ao qual se revele inconveniente a constituição de direito fundiário
de carácter duradouro como é o caso dos terrenos integrados no domínio público.

O direito de ocupação precária tem por objecto terrenos para implementação


de construção não definitiva destinadas a apoiar:

a) A construção de edifícios de carácter definitivos;


b) As actividades de prospecção e exploração mineira;
c) As actividades de investigação científica;
d) As actividades de estudo e protecção da natureza.

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O direito de ocupação precária tem duração de um ano renovável por períodos
sucessivos se nenhuma das partes o tiver denunciado no prazo e na forma
convencionados. (artigo 55. °, n. °s 1, alínea e), e 2, da Lei de Terras e 83. ° RGCT).
Ex.: estação de 7 cunhas situado no Samacaca.

4.5.7. Obrigações dos titulares dos direitos fundiários

Nos termos do artigo 56. ° da LT estabelece os seguintes deveres a que os titulares


estão direitos fundiários estão sujeitos:

a) Pagar tempestivamente os foros e demais prestações a que, conforme


os casos, esteja obrigado. Nos termos do artigo 47. ° LT, a constituição e transmissão
de direitos fundiários é onerosa, exceptuando-se os casos de concessões gratuitas e
do domínio útil consuetudinário.
b) Efectuar o aproveitamento útil e efectivo do terreno concedido de acordo
com os índices fixados;
c) Não aplicar o terreno a fim diverso daquele a que se destina;
d) Não violar as regras do ordenamento do território e dos planos
territoriais;
e) Utilizar o terreno de modo a salvaguardar a capacidade de reprodução
natural de regeneração do mesmo e dos recursos naturais nele existente;
f) Respeitar as normas de preservação do ambiente;
g) Não exceder os limites impostos pela boa-fé, fim económico e social que
determinou a concessão do terreno, nos termos do artigo 18. ° da Lei de Terras;
h) Respeitar os direitos fundiários das comunidades rurais,
designadamente as servidões de passagem que recaiam sobre o seu terreno;
i) Prestar às comunidades competentes todas as informações por elas
solicitadas quanto ao aproveitamento útil e efectivo do terreno;
j) Dever de conservar os marcos perimetrais do seu terreno e de não
cortar, derrubar ou destruir as árvores que sirvam de pontos de demarcação do terreno
sem intervenção dos serviços de agrimensura (artigo 122. ° RGCT);
k) Observar a Lei de Terras e os seus regulamentos, e não só.

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